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A FILOSOFIA MODERNA: CONTEXTO, FILÓSOFOS E

ESCOLAS

DOCENTE: PE. JOVÊNCIO VIEIRA CULIBENA

C O N TA C T O : 8 4 5 5 1 7 9 2 5 / 8 6 0 6 2 5 0 2 2

JCULIBENA@UCM.AC.MZ / JOVENCIOVIEIRACULIBENA@GMAIL.COM

FEVEREIRO DE 2024
Quando começa a "filosofia moderna"?
O início da Filosofia Moderna coincide com a profusão de
idéias filosóficas, históricas, culturais e científicas do século
XVI, e segue até o Iluminismo, ou Esclarecimento, típico do
século XVIII.
Por mais alguem esteja distante da filosofia,
certamentamente que já trá ouvido frases como:
 “Penso, logo existo” (formulada por Rená Descartes) ou;
 “O homem é naturalmente bom; é a sociedade que o
perverte” (formulada por Jean Jacques Rousseau) ou;
 mesmo “o coração tem razões que a própria razão
desconhece” (formulada por Blaise Pascal).
Talvez tenhamos ouvido falar do Racionalismo, do
Empirismo, do Dualismo, embora possamos não saber
exactamente como definir esses termos tão polêmicos no
domínio filosófico.
A visão que hoje temos do mundo ocidental foi forjada
pelas características do pensamento moderno, não apenas
na filosofia, mas na arte e, principalmente, na ciência.
Ao mesmo tempo, ela é condição sine qua non para a
compreensão da nossa própria relação com o mundo e com
outros seres humanos.
A modernidade nos presenteia com sofisticadas propostas
de organização das sociedades, que rivalizam com, e
acabam por substituir, as visões greco-romanas.
Historicamente, o período renascentista é tido como o fundador
da sociedade moderna, ainda que não corresponda plenamente
a ela.
O Humanismo e o Renascimento se situam num período em
que aparecem os primeiros sinais de um processo de
racionalização na sociedade.
Esse período, mais tarde, vai estabelecer-se como o Iluminismo,
no século XVIII, e redundará em determinantes mudanças no
pensamento humano, envolvendo a cultura, sociedade e
economia.
Em linhas gerais, o conjunto dessas transformações, desde o
Renascimento ao Iluminismo é conhecido como Modernidade.
Na antiguidade, o uso do termo “moderno” servia para
designar aquilo que era contemporâneo à época e que podia
ser diferenciado do que viera antes.
Porém, a novidade é que, por volta do século XVII, a este
sentido comum se agrega a ideia da superioridade do novo,
diante de tudo que era tradicional ou antigo.
Além desse sentido de progresso e ruptura, outra mudança
característica da modernidade consiste na valorização do
indivíduo e do seu potencial de conhecer, em oposição ao
saber das instituições religiosas e de outras formas de
autoridade.
Condições históricas do Renascimento e Humanismo

O termo “Renascimento” surge apenas no século XIX. Isso


ocorreu a partir da publicação da obra do historiador
alemão Jacob Burckhardt, intitulada A cultura da
renascença na Itália (1860).
Na perspectiva de Burkhardt, o Renascimento seria definido
como um fenômeno surgido na Itália, que se opunha ao
espírito medieval em função de características como o
paganismo, a autonomia do indivíduo e uma maior
flexibilidade e questionamento perante às autoridades
religiosas.
Mais tarde, a tese de Burkhardt foi questionada, por
aqueles que defendiam que muitos dos aspectos do mundo
medieval foram continuados na civilização do
Renascimento.
Porém há um consenso em determinar que o Renascimento
foi um movimento surgido na Itália e de lá se espalhou para
outros locais da Europa, alcançando matizes próprios em
cada um deles.
Sendo a Itália o centro irradiador do Renascentismo,
geralmente distinguem-se três fases históricas desse
movimento, que ficaram conhecidas a partir dos termos
italianos. São elas:
..trecento (século XIV);
..quatrocento (século XV); e
..quinquecento (século XVI).
A época do Trecento, também chamada de Pré-
Renascimento, é ainda marcada pelos elementos da Idade
Média, tais como a filosofia escolástica e a perspectiva
teocentrista imposta pela igreja.
Além da filosofia e da religião, outros campos da produção
cultural começaram a mostrar algum interesse nos aspectos
relacionados ao homem.
Na economia, por exemplo, aumenta a ênfase no livre
comércio e na necessidade do desenvolvimento dos meios
de produção; prenunciando-se aí as bases do capitalismo e o
rompimento com o sistema feudal.
Essa conjuntura resultará na formação de um clima
intelectual confiante na capacidade de realização do ser
humano, fazendo ecoar a afirmação feita há 2.500 anos por
Protágoras, de que “o homem é a medida de todas as
coisas”.
Eis as bases da virada do pensamento humano para o
antropocentrismo, que marca o nascimento da
modernidade.
O Renascimento constituiu um dos mais prósperos
movimentos intelectuais do Ocidente, mudando a imagem
que o homem tinha de si mesmo.
Conforme Sevcenko (1994), o campo das artes plásticas foi
onde as realizações culturais do novo pensamento
ganharam corpo. O pensamento da época passou a se nutrir
cada vez mais da filosofia grega, graças ao trabalho dos
humanistas.
O Renascimento também pode ser visto como um tempo de
indefinição, de polêmicas e conflitos.
A proposta histórica mais aceitável sobre essa relação é que
o Renascimento e o Humanismo são faces de um mesmo
movimento, surgido inicialmente na Itália.
A partir dali, o movimento esallhou-se por toda a Europa,
assumindo diferentes matizes em cada região. Contudo,
mesmo com diferenças, esse movimento teve como marca,
em todos os locais, um maior ou menor rompimento com a
tradição medieval, esta que, por sua vez, era religiosa e
teocêntrica.
Do ponto de vista filosófico, o Renascimento poder ser
compreendido como o movimento amplo e gradual de
enfraquecimento do pensamento medieval em face de um
novo despertar para a cultura clássica.
Já o Humanismo é justamente a perspectiva filosófica que
resulta desse movimento, marcada pela chamada “virada
antropocêntrica”. Nas palavras de Reale e Antiseri (2004, p.
4):
Nesse sentido, pensar o antropocentrismo renascentista como
“o homem no centro das atenções” significa o surgimento de
uma nova tônica envolvendo o ser humano e o Sagrado.
Ao contrário da ênfase medieval no homem como pecador,
necessitado da redenção por meio da religião, o Humanismo
renascentista vai enfatizar o homem enquanto filho de Deus,
criado à sua imagem e semelhança. Portanto, como tendo algo
divino dentro de si.
Essa presença do divino no homem, não será entendida
apenas do ponto de vista da religião; mas também como a
própria razão, capaz de compreender as maravilhas da criação
divina.
A visão histórica do Humanismo
O termo Humanismo foi usado pela primeira vez somente
no século XIX. Naquele momento, designava a área cultural
abarcada pelos estudos clássicos em oposição às disciplinas
científicas. Tratava-se de um conceito tardio em relação ao
aparecimento do movimento cultural do século XIV.
Ainda que o Humanismo seja reconhecido pela contribuição
fundamental à filosofia da Renascença, a opinião de
estudiosos sobre a sua importância não é uniforme. Ao
longo dos séculos, uma diversidade de teorias e propostas
de interpretação procurou dar conta do sentido desse
movimento cultural.
Há duas importantes visões de interesse para a
compreensão da não unanimidade dos estudiosos em
relação a importância do humanismo.
A primeira refere-se ao pensamento defendido por Kristeller
(1976). Que indica que os humanistas não foram
precisamente filósofos e seu programa se limitava às
questões culturais e pedagógicas. E a leitura mais
significativa e reformuladora da filosofia clássica ocorre
somente a partir da segunda metade do século XVIII, quando
filósofos como Imannuel Kant avançaram a partir das ideias
surgidas no século XVII.
Para Kristeller, isso deveu-se a hostilidade dos estudiosos à
Idade Média, os quais, ao repudiarem as realizações do
medievo, não viram a leitura inovadora de Aristóteles que
se fez no Renascimento.
Foi pelo fato desse aristotelismo renascentista ter se
apropriado de certos elementos da escolástica, que o
mesmo acabou sendo associado à estrutura medieval. Em
virtude desse factor, na visão de Kristeller, o “novo”
aristotelismo foi ofuscado, e o mérito da articulação do
novo pensamento recaiu sobre os humanistas.
Eugene Garin, se opõe a essa visãoe reivindica a
legitimidade para o Humanismo, afirmando que o repúdio à
sua importância e originalidade deriva de uma concepção
da filosofia mais fechada e distante dos problemas práticos.
Defende também que o Humanismo inaugurou uma nova e
particular forma de ler o passado, impondo um
distanciamento e situando os acontecimentos no seio desse
próprio passado histórico.
O prelúdio da filosofia moderna – A Reforma Protestante e a
Revolução Científica
No decorrer do século XVI, as condições iniciais do
Renascimento entraram em declínio, a partir de eventos
como a Reforma protestante, que mudou a feição da
religião cristã para sempre.
A Reforma e a Contra-reforma foram os eventos sociais mais
marcantes do início da modernidade, alterando
significativamente não apenas a perspectiva religiosa, mas
grande parte das práticas sociais e instituições em geral.
A Reforma e a Contra-reforma católica trouxeram grandes
implicações para o pensamento filosófico.
Como um movimento concomitante ao Renascimento e à
Reforma, a Revolução Científica constitui o terceiro
elemento fundamental para a compreensão do nascimento
da filosofia moderna.
Trata-se de um evento amplo e gradual, geralmente
demarcado pelos eventos ocorridos na Europa, no período
compreendido entre os séculos XVI e XVII. Foi por meio
desse processo que o método experimental, hoje tomado
como a característica central da prática científica, veio a ser
progressivamente desenvolvido e aplicado.
A Reforma Protestante
Antecedentes da reforma
A Reforma não ocorreu do dia para a noite, mas proveio de
uma crise que vinha se desenvolvendo na sociedade
europeia desde o fim da Idade Média, quando se percebe já
existir um notório descontentamento e até mesmo repúdio
ao clero por parte de outros setores da sociedade.
À medida que a igreja foi se fortalecendo e estruturando a
sua hierarquia nos primeiros séculos da Idade Média, ela
passou a adotar a palavra “heresia”, identificando como
hereges todos aqueles que posicionassem contrariamente
aos princípios da estrutura eclesiástica.
A partir do Humanismo, a igreja começa a perder o controlo
sobre a produção do conhecimento, num processo gradual de
separação entre a Filosofia e a Teologia e entre a Ciência e a
Religião.
No entanto, o ambiente intelectual não era inteiramente liberal.
Muitos inovadores eram levados a cultivar segredo sobre suas
descobertas ou opiniões, como no caso de Leonardo, Fernel e
Copérnico, o qual só publicou suas conclusões muitos anos após
tê-las formulado.
Do ponto de vista da economia, o capitalismo comercial que
se instalava na Europa chocava-se com os ideais católicos
que preconizavam o “justo preço”.
Esse princípio determinava que o preço do produto fosse
aquele resultante da soma da matéria-prima com o custo da
mão de obra, e era contra o lucro livre.
Havia também a condenação dos juros obtidos pelo
empréstimo de dinheiro. Essa oposição entre os dogmas e
as mudanças na economia contribuiu para dividir opiniões e
abalar a posição do clero como autoridade absoluta em
todos os campos da atividade humana.
A antiga ordem social, oriunda da Idade Média, pautava pela
negação do trabalho como atividade lucrativa e no desapego
aos bens materiais.
Max Weber (1997, p. 128), entende que “a ética medieval, não
apenas tolerava a mendicância, como a glorificou nas ordens
mendicantes”.
Os teóricos reformistas, ao reinterpretar os textos sagrados,
formularam novas posições quanto a estas questões e,
lentamente, defenderam uma nova conduta, em que o trabalho
como forma de obtenção de lucro e, consequentemente, de
riquezas, passou não apenas a ser legalizado, mas valorizado e
aceite por Deus.
Esse novo posicionamento atendeu plenamente aos anseios
da burguesia, que cada vez mais se fortalecia enquanto
classe social autônoma a partir dos lucros do trabalho.
O pensamento reformista
A Reforma Protestante foi um movimento resultante do
inconformismo ante a atuação da igreja e das novas
condições sociais e econômicas da Europa.
Em certo sentido, pode-se dizer que os filósofos
humanistas, ao redescobrirem o homem no século XVI,
estavam também redescobrir Deus.
Erasmo de Roterdam, cultivou um espírito humanista crescente
de maneira que nas suas primeiras obras, ele falava da
decadência dos valores, desprezando as doutrinas escolásticas.
Na sua obra O Elogio da Loucura, publicada em 1511, ele fez
uma crítica à sociedade do seu tempo, inclusive ridicularizando
a corrupção do clero católico. Para alguns historiadores, este
polêmico livro trazia a maior parte do que os reformadores
criticavam na conduta da igreja.
Erasmo concebeu o mundo como um lugar controlado pela
loucura. A loucura foi apresentada por Erasmo de diferentes
modos: ora se mostrava séria, ora irônica, ora humorística.
Para Erasmo, a Reforma consistia em limpar dos textos
sagrados tudo aquilo que “o poder eclesiástico e as disputas
dos escolásticos acrescentaram à simplicidade das verdades
evangélicas, confundindo-as e complicando-as.”
Assim, mostra-se evidente a sua postura humanista de
retomada do sentido original dos clássicos, a partir de
criteriosos estudos filológicos e doxográficos.
Em oposição a Escolástica, a posição filosófica de Erasmo ia
contra a especulação sobre problemas metafísicos e
dialéticos. Para ele, a filosofia deveria ter um sentido de
conhecimento da vida cristã e, para esta, não haveria
necessidade de grandes elaborações, bastando poucos
trechos dos livros sagrados.
Erasmo se espelhava na vida dos grandes santos cristãos,
voltada para a simplicidade, contemplação e a realização
prática dos ensinamentos de Cristo.
Martinho Lutero (1483-1546), como Erasmo de Roterdan,
mostrou preocupação quanto aos males morais presentes
no meio eclesiástico, mas a sua posição foi menos tolerante.
Lutero defendeu a instituição de um novo modo de
conceber e praticar os ensinamentos cristãos. Entre as suas
ideias mais polêmicas, está aquela que apregoa a
impossibilidade da alma humana alcançar a salvação por
seus próprios méritos, sem a rendição completa por meio
da fé.
O principal alvo das suas críticas era a metafísica e a
filosofia moral aristotélica.
Lutero rejeitava as especulações metafísicas por acreditar
que elas representavam uma tentativa do ser humano se
apoderar dos mistérios divinos.
O pensamento de Lutero assume um carácter pessimista
em relação à dimensão material da existência.
Uma das principais motivações para o pensamento
reformista foi a mundanização da classe clerical ao longo do
período final da Idade Média.
Lutero não acreditava que o homem tivesse livre arbítrio
para interferir no seu destino após a morte, isto é, para
garantir ou não a sua salvação.
Ele almejava que a igreja retornasse à doutrinária pura dos
apóstolos. Para ele tudo o que deriva do homem é
perpassado pelo amor egoísta e interessado. Somente o
desprendimento dessa perspectiva egoista possibilitaria o
ingresso no reino de Deus.
Referências Bibliográficas
Jungblut, C. A. Pereira, L. e Targa, D. C (2011). História da filosofia III :
livro didático, revisão e actualização de conteúdo Dante Carvalho Targa ;
design instrucional Luiz Henrique Queriquelli, Sabrina Bleicher. – 3. ed. –
Palhoça : UnisulVirtual, 2011.220 p. : il. ; 28 cm.

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