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Antes dos Europeus

As Origens do Homem Americano

O Homem, quando chegou ao continente americano, já havia passado por uma longa evoluçã o,
desde o aparecimento do Homo Erectus, que viveu há 1,7 milhã o de anos até 200 mil anos atrá s.
Pertencia ao grupo do Homo Sapiens. Nã o há, até o presente momento, unanimidade sobre a origem
dos primeiros povos que colonizaram a América, mostrando ser assim um problema complexo.
Diversas teorias abordam a questã o, sendo a mais aceita aquela que defende terem os primeiros
homens vindos da Á sia, através do Estreito de Bering, atingindo a América do Norte durante a
ú ltima Era Glacial. Um grande volume de á guas retidas nas geleiras provocou o abaixamento do
nível das á guas do mar, fazendo surgir uma ligaçã o terrestre entre a Á sia e América. Segundo a
pesquisadora Betty J. Meggers, "a mais antiga ponte terrestre existiu entre cerca de 50.000 e 40.000
anos atrá s e foi usada por vá rias espécies de mamíferos do Velho Mundo (...) Apó s um intervalo de
submergência que durou uns 12.000 anos, a ponte reapareceu entre cerca de 28.000 e 10.000 anos
atrá s". Nesse período, contudo, uma camada de gelo surgiu como obstá culo à passagem humana
durante alguns milhares de anos. Acontece que, como esclareceu Meggers, "no decorrer de alguns
milênios, antes que os segmentos de Leste e Oeste se fundissem e um corredor se abrisse
novamente a ponte terrestre foi transitá vel." Permitindo, assim, a caminhada humana. Foi
aproveitando essa oportunidade que os asiá ticos teriam penetrado no continente americano.

Existem provas de cará ter antropoló gico, etnográ fico e lingü ístico a favor da teoria asiá tica, mas
Paul Rivet acreditou que essa nã o foi a ú nica via de acesso do homem ao continente americano.
Essas provas se restringiram a uma regiã o, a parte setentrional da América do Norte, segundo Rivet.
É justamente por essa razã o que ele defende uma origem mú ltipla: os australianos teriam invadido
a regiã o mais meridional da América do Sul. Para Rivet, portanto, uma das influências étnicas que
podem destacar-se na América é de origem australiana. Sua açã o, por discreta e limitada que tenha
sido, loga impor-se pela antropologia, pela lingü ística e pela etnografia". Acredita ainda esse
cientista que uma parte da América foi povoada pelos polinésios, apresentado provas lingü ísticas,
culturais e tradicionais.

Paul Rivet é de opiniã o que o Atlâ ntico funcionou como uma barreira intransponível para que o
homem chegasse até ao continente americano e que, "ao contrá rio, o litoral do ocidente da América
foi permeá vel a migraçõ es mú ltiplas, em toda a sua extensã o. O Pacífico nã o se tornou de forma
alguma um obstá culo. Foi, sim, um traço de uniã o entre o mundo asiá tico, a Oceania e o Novo
Mundo".

A teoria da origem mú ltipla de Raul Rivet foi defendida por alguns, porém combatida pelos seus
adversá rios. A verdade é que, apesar do avanço nessa discussã o, a questã o ainda nã o foi totalmente
solucionada.

A controvérsia nã o atinge apenas a via de acesso, mas igualmente a época em que os primeiros
colonos povoaram a América. Para Betty Meggers, "as discordâ ncias surgem das informaçõ es
esporá dicas inconclusivas, da presença do homem do Novo Mundo entre 40.000 e 12.000 anos
passados, dataçã o que alguns autoridades aceitam e outras nã o."

O certo é que o "homem entrou no Novo Mundo enquanto estava ainda subsistindo à base de
plantas e animais selvagens", nas palavras da mesma autora. Esse homem, ao migrar para outras
regiõ es, caminhou a pé. Teria ocorrido, desse modo, vá rias migraçõ es.

As primeiras comunidades agrícolas surgiram no México, na América Central, Equador e Bolívia.


Viviam em pequenos bandos. Eram caçadores e coletores. À medida em que avançavam para o sul,
segundo os que acreditam na origem ú nica, asiá tica, as comunidades foram passando por
mudanças, com o objetivo de se adaptarem ao novo ambiente. Essas adaptaçõ es foram importantes
para o desenvolvimento dos diversos grupos.
A agricultura promoveu uma verdadeira revoluçã o. Posteriormente, surgiram grandes civilizaçõ es:
Astecas, Maias e Incas.

Migração para as terras Brasileiras

Com relaçã o à presença dos primeiros homens no Brasil, existe também uma grande controvérsia.
A ocupaçã o de terras brasileiras pelo homem ocorreu entre 9.000 e 11.300 anos, segundo alguns
pesquisadores. Outros defendem uma data bem mais remota. Aos poucos é que o quadra vai se
delineando. Constataram-se, pelo menos, duas á reas de influência - a Bacia Amazô nica e outra
compreendendo o Planalto Central do Brasil - que foram ocupadas através de vagas sucessivas, até
chegar ao Rio Grande do Norte" por um processo de migraçã o que permitiu culturas estabelecidas
em determinadas á reas fossem substituídas por outras, no decorrer de milênios e até séculos", de
acordo com Tarcísio Medeiros.

Em síntese, o homem primitivo teria seguido o seguinte roteiro: Andes, Planalto do Brasil, Nordeste
e, finalmente, o Rio Grande do Norte.

O centro de dispersã o dos tupis, segundo o mesmo autor, aconteceu no "istmo do Panamá. Desse
ponto, um ramo alcançou a foz do Amazonas; do outro rumou para o Nordeste brasileiro; e um
terceiro desceu o Tapajó s, o Madeira e iniciou uma migraçã o pelo Xingu acima".

Os Primitivos habitantes do RN

O Rio Grande do Norte foi habitado pelos animais da megafuna na era Cenozó ica e, dos estudos
realizados sobre o assunto, é possível chegar a duas conclusõ es, como disse Tarcísio Medeiros:

"a) A extinçã o dos grandes mamíferos processou-se mais recentemente do que se supõ e em partes
dessa regiã o."

"b) Que a presença do homem, em comum com esses animais da megafauna no mesmo territó rio, é
mais antiga do que se considera habitualmente".

Exemplo dessa presença humana no Nordeste: Chá do Caboclo (Pernambuco).

Os primitivos habitantes eram formados pelos grupos de caçadores e coletores. Os homens


contemporâ neos da megafauna deixaram vestígios que se encontram nos sítios Angicos e Mutamba
II. Diversos estudos arqueoló gicos foram feitos pelo Museu Câ mara Cascudo, tendo à frente o
pesquisador A. F. G. Laroche que, com suas investigaçõ es, em Pernambuco e no Rio Grande do
Norte, forneceu importantes subsídios para a pré-histó ria nordestina. Ná ssaro Souza Nasser e
Elizabeth Mafra Cabral analisaram as inscriçõ es rupestres do Estado, publicando posteriormente
um estudo sobre o assunto. A arqueó loga Gabriela Martín, da Universidade Federal de Pernambuco,
pesquisou intensamente as inscriçõ es rupestres do Rio Grande do Norte, resultando em estudos
como o intitulado "Amor, Violência e Solidariedade no Testemunho da Arte Rupestre Brasileira".
Participou também do "Projeto Vila Flor", financiado pelo SPAN/Pró -Memó ria, cujo objetivo era o
"estudo arqueoló gico e levantamento da documentaçã o histó rica da Antiga Missã o Carmelita de
Gramació ". A mesma pesquisadora recentemente publicou um livro sobre a pré-histó ria do
Nordeste.

Na fase Megalítica, os homens se tornaram sedentá rios. O pesquisador Ná ssaro Nasser descobriu as
"Tradiçõ es Cerâ micas", chamadas de Papeba e Curimataú . O professor Laroche, por sua vez,
encontrou vestígios de diversas culturas pré-histó ricas, sendo a mais antiga do sítio "Mangueira",
em Macaíba.

O professor Paulo Tadeu de Souza Albuquerque, coordenador do Laborató rio de Arqueologia da


Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Larq/UFRN), realizou uma série de pesquisas,
trazendo novas luzes sobre o longínquo passado potiguar. Participou de escavaçõ es realizadas na
Fortaleza dos Reis Magos e na antiga catedral, onde encontrou o tú mulo de André de Albuquerque
Maranhã o.

Alberto Pinheiro de Medeiros, coordenando investigaçõ es de alunos da UFRN, enveredou por


outras vertente sobre o tema pesquisado, chegando a sistematizar uma alternativa - descrita no
item sobre as inscriçõ es rupestres, mostrado a seguir que poderia ser acrescida à s conclusõ es já
apresentadas sobre os primeiros habitantes do Rio Grande do Norte.

Os Significados das Inscrições Rupestres

Os primeiros habitantes do Rio Grande do Norte deixaram nas rochas e nas paredes das cavernas
sinais incisos ou pintados. Em alguns sítios, existem apenas inscriçõ es rupestres incisas (Fazenda
Umburana, regiã o do Abernal, município de Serra Negra-RN) e em outros locais encontram-se, no
mesmo painel, inscriçõ es incisas e pinturas (Fazenda Soledade, Apodi-RN).

Na atualidade é praticamente impossível saber quais foram os autores de tais legados. Mesmo
assim, diante desse contexto, ainda se pode tirar algumas conclusõ es. Em primeiro lugar, é prová vel
que tenham ocorrido dois está gios culturais. O mais primitivo estaria representado, pelos desenhos
incisos. O outro está gio, mais desenvolvido, estaria caracterizado pelas pinturas que requeriam
uma técnica mais complexa a elaboraçã o de tintas. Para comprovar tal afirmaçã o é suficiente
apontar como exemplo o sítio que existe na Fazenda Flores, no município de Apodi-RN), onde os
traços incisos eram feitos no chã o e numa rocha, larga na base e que vai se estreitando à medida
que sobe. Na rocha também há pinturas representando pares de mã os. Outro detalhe: os incisos
estã o quase apagados e grosseiramente desenhados. As mã os pintadas, porém, sã o muito bem
feitas e apresentam grande nitidez Esse sítio poderia ser o testemunho de uma evoluçã o cultural.

Outra questã o que se discute - e esta é universal - seria o significado, ou seja, o que representariam
ser de fato as inscriçõ es rupestres: arte, escrita ou símbolos religiosos.

Existe, em princípio, uma dificuldade: como interpretar o pensamento do homem primitivo pelas
pessoas que vivem no século XX? É possível ao homem contemporâ neo penetrar na mentalidade de
um ser nascidos séculos e séculos atrá s? Por essa razã o torna-se necessá rio fazer um esforço para
recuar no tempo e se despir da cultura na qual o pesquisador nasceu e vive. Seria isso possível?

Esse é um problema de difícil soluçã o, que exige muita competência e humildade por parte do
pesquisador. Uma saída, provavelmente, é pesquisar os caracteres daqueles povos que tiveram sua
escrita decifrada. Estudar, por exemplo, os Astecas (México) que possuíam uma escrita "pintada" e
uma fonética. A escrita estava ligada aos sacerdotes, como na Suméria. O significado, no dizer de
Có rdova Ituburu, era determinado pela deformaçã o de certas partes e das cores. Os sacerdotes
daquele povo lidavam com caracteres simbó licos secretos. O conteú do religioso de determinados
símbolos nã o invadia a tese da escrita Richard E. Leakey estava certo quando disse que "as
amostras de ocre que parecem em diversos sítios da Europa de 200 mil anos ou mais de idade,
certamente, sugerem ornamentaçã o ritual das pessoas e dos artefatos. Ritual e simbolismo aludem
francamente à competência lingü ística".

Tudo leva a crer que as inscriçõ es rupestres que existem no Rio Grande do Norte constituem de fato
uma escrita. Diferente, naturalmente, de que se usa na atualidade. Mas com certeza era um
instrumento de comunicaçã o. Os autores das inscriçõ es possivelmente desenhavam ou pintavam
para transmitir uma mensagem. O seu significado se perdeu no tempo, mas nã o pode ser
considerado arte, porque tais caracteres nã o eram produzidos para deleite espiritual, nem para
expressar o belo. A razã o disso é muito simples: o homem primitivo, pelas dificuldades que
enfrentava para sobreviver, era prá tico e rude. Quando sentia fome procurava resolver de imediato
o seu problema. Nã o tinha condiçõ es de praticar uma atividade voltada para o embevecimento
espiritual. Havia sim, grande necessidade de se comunicar.

A reproduçã o de um objeto através de um desenho é uma tentativa de fazer referência a algo que
impressiona, de mostrar a outro ou a uma comunidade o valor daquele objeto. Traços em formas de
barras ou entã o círculos ou pontos podem significar elementos de contagem. Mas na mente do
homem primitivo poderiam também ter outra significaçã o qualquer. Uma conclusã o pode ser
considerada como certa: eles desenhavam ou pintavam para transmitir uma mensagem. E naqueles
tempos difíceis para a humanidade, a comunicaçã o, certamente, era fundamental para a
sobrevivência de um grupo, de todo o gênero humano...

Etnias Mais Recentes e Áreas Ocupadas

O litoral norte-rio-grandense, na época da descoberta do Brasil, era habitado pelos tupis,


originá rios do Paraguai e do Paraná . Falavam o abanheenga que, segundo Varnhagen, era uma
língua aglutinativa, porém, com reflexõ es verbais. Receberam o nome local de potiguares.

Tarcísio Medeiros descreve o tipo físico dos potiguares: "tinham o porte mediano, acima de 1,65
cm, reforçados e bem feitos no físico, olhos pequenos, negros, encavados e erguidos, amendoados
(...), eram mais ou menos baços, claros. Pintavam o corpo com desenhos coloridos (...), furavam os
beiços".

Os tapuias, que moravam no interior, foram descritos da seguinte maneira, por Olavo de Medeiros
Filho: "as mulheres eram, indistintamente, pequenas e mais baixas de estatura que os homens.
Possuíam a mesma cor atrigueirada, sendo muito bonitas de cara, obedecendo cegamente aos
maridos em tudo que fosse razoá vel".

E, mais adiante, acrescenta: "os tapuias andavam inteiramente nus. Nã o usavam barbas e depilavam
sistematicamente todos os pêlos surgidos no corpo, inclusive as sobrancelhas (...) Os tapuais
pintavam hediondamente o corpo com tinta extraída do fruto de jenipapo, a fim de adquirirem um
aspecto terrível nos combates".

Tarcísio Medeiros apresenta a seguinte classificaçã o da populaçã o nativa, formada por diversas
naçõ es, na época da descoberta do Brasil:

Litoral: potiguares.

Serído: arius, cariris, panatis, curemas, pebas e caicó s

Chapada do Apodi: paiacus, cariris, pajéus, pegos, moxoió s e canindés.

Zona Serrana: pacajus, panatis, icó s e parins.

Os Europeus

Expansão Européia Pela Via Marítima


A Europa, no final do século XV, se encontrava presa em seus limites, sentindo a necessidade de se
expandir. O comércio das especiais, monopolizado pelas cidades italianas e desenvolvidas do
Mediterrâ neo, prejudicava o restante dos países do continente. A razã o era muito simples: os
produtos eram vendidos por um preço muito alto. A necessidade de quebrar esse monopó lio
passou a ser uma questã o de sobrevivência para uma economia monetá ria, como narrou Rolando
Mausmier: "o numerá rio é totalmente insuficiente para as monarquias e para um comércio em
plena expansã o". Era preciso, com urgência , encontrar ouro. Como diversas lendas colocassem
grandes tesouros na Á frica e na Á sia, os europeus sonhavam em se apossar dessas fortunas. Era
preciso, também, acabar com os intermediá rios, e o país que realizasse tal feito obteria lucros
fabulosos.

Além da necessidade de conseguir ouro, a Europa se encontrava apertada entre o mar e seus
inimigos. Em 1453, com a tomada de Constantinopla pelos turcos, o caminho para o oriente se
fechava para os europeus. A situaçã o ficava crítica. Havia uma soluçã o apenas: atingir o Oriente pela
via marítima/

Portugal, por sua posiçã o geográ fica, se lançou ao mar mais cedo. Adquirindo experiência nessas
viagens, saía na frente em busca de um caminho marítimo para o Oriente. Seria a salvaçã o do
império lusitano. Havia outro motivo: as condiçõ es eram precá rias para as atividades agrícolas em
Portugal, razã o pela qual a sua populaçã o tinha que tirar o alimento do mar. Pescando, os lusitanos
foram se afastando do litoral, atingindo a Terra Nova, rica em bacalhau, salmã o etc. Aos poucos, e
como conseqü ência dessas empreitadas, os portugueses foram aperfeiçoando os seus navios. No
século XV, as galeotas e as galés de dois mastros haviam sido ultrapassadas, surgindo as barcas,
barinés e as caravelas, que se imortalizaram durante as grandes descobertas.

A expansã o marítima, organizada de maneira sistemática pelos lusos, começou com a conquista de
Ceuta, em 1415. Toda viagem através do Oceano Atlâ ntico, naquela época, era uma perigosa
aventura, porque ninguém garantia o retorno. Apó s a conquista da Ceuta, os navegantes passaram a
receber estímulos, sobretudo do infante D. Henrique que, por essa razã o, foi chamado de "O
Navegador". Acontece que a vida desse personagem foi envolvida por uma série de lendas. Como
resultado, a sua personalidade foi exaltada, até ao exagero, por alguns historiadores, quer
portugueses, quer brasileiros.

Pedro Calmon é um deles: "deu-se perdidamente às ciências, casto e austero (...) de fulguraçõ es de
lenda, leitor insaciá vel, colecionador de tudo o que se escrevera sobre cosmografia e navegaçã o,
transferiu para Vila de Terça Naval, junto de Sagres e do Cabo de Sã o Vicente, o séquito de
matemá ticos judeus, cartó grafos catalã es, pilotos de vá rias origens, e outros que para isto educava e
com eles criou um seminá rio de estudos ná uticos chamando-lhe, sem rigor verbal, Escola de Sagres.
Foi na verdade uma escola, mas de obstinado trabalho, em que era aluno e mestre aquele príncipe
letrado".

Tudo porém nã o passa de uma lenda. O infante D. Henrique nã o possuía um vasto sobre a Escola de
Sagres jamais existiu, seja qual for o sentido que se queira dar a ela. Nem como uma escola no
significado clá ssico da palavra, nem como um grupo de especialistas que discutissem problemas
ná uticos. Os avanços técnicos ocorridos com os navios portugueses foram conseqü ência da
experiência adquirida através de suas inú meras viagens pelo Atlâ ntico, o que, certamente, nã o
diminuiu o mérito daqueles viajantes e das conquistas feitas pelo império lusitano.

É preciso também deixar bem clara a causa principal da expansã o marítima de Portugal. Para
justificar sua expansã o, os portugueses alegaram a defesa do cristianismo. Tinham como divisa "A
propaganda da Igreja de Cristo e a conversã o dos infiéis", dando a impressã o de que se tratava de
uma nova cruzada. Acontece que o objetivo era real outro bem diferente: a busca desesperada pelo
ouro.

A conquista da Ceuta demonstrou tal fato. O escritor Georg Friederici narrou com muito realismo o
ataque português contra Ceuta: "entregaram-se, de sú bito, a tremenda chacina, nã o respeitando a
idade, nem sexo, nã o poupando mulheres nem crianças. Seguiram o saque e a devastaçã o vandá lica:
os assaltantes devassavam, remexiam e escavavam. Depredavam os magníficos prédios preciosos e
jó ias. Os lusitanos semi-bá rbaros arrebentavam as jó ias das mulheres e das moças, arrancado-lhes e
cortando-lhes as orelhas e os dedos".

A finalidade da expansã o européia era, tã o somente, a busca de riquezas. E mais: durante o


processo de colonizaçã o no continente americano, portugueses, espanhó is, franceses, holandeses e
ingleses se igualaram no vandalismo. Contrariando, assim, os princípios cristã os que diziam
defender... A evangelizaçã o dos gentios se resumia apenas ao trabalho dos missioná rios. Os colonos,
contudo, procuravam explorar os nativos, realizando à s vezes, verdadeiros massacres.

Frei Bartolomeu de Las Casas, considerado o "Apó stolo dos Índios", denunciou as crueldades dos
espanhó is durante a conquista: "faziam apostas sobre quem, de um só golpe de espada, fenderia um
homem pela metade, ou quem, mas habilmente e mais destramente, de um só golpe lhe cortaria a
cabeça, ou ainda sobre quem abriria melhor as entranhas de um só golpe".

Cristóvão Colombo Descobre a América

Antes da unificaçã o da Espanha, o Reino de Aragã o, desde o século XII, estava voltado para o
Mediterrâ neo: "Mesmo apó s a criaçã o do Estado Nacional, a coroa espanhola seguiu dupla
orientaçã o: européia e mediterrâ nea, segundo interesses aragoneses, americana e atlâ ntica,
atendendo à s aspiraçõ es castelhanas", como registra o livro "Histó ria das Sociedades - das
sociedades modernas às sociedades atuais", de Rubim Santos de Aquino e outros autores. Mais
tarde, quando se criou o Estado Nacional, com a expulsã o dos muçulmanos, a Espanha nã o se
preocupou em navegar pelo Ocidente para atingir o Oriente.

Essa política tinha uma série resistência. O seu grande defensor era um estrangeiro, filho de
Gênova, chamado Cristó vã o Colombo. E a viagem só se efetivou graças ao apoio de dois grupos
poderosos: o cató lico, liderado por Luís de Santangel. Colombo, na realidade, nã o pensava em
descobrir um continente e no entanto foi o que aconteceu. A partir desse momento (1492), a
Espanha teve que valorizar uma política Atlâ ntica, principalmente apó s as descobertas de minas de
prata e de ouro no continente americano.

As conseqü ências do descobrimento ultrapassaram os limites das fronteiras do império hispâ nico e
se tornaram universais: "a Europa também se transforma graças, sobretudo, ao ouro e à prata,
vindos do novo continente. A exploraçã o das colô nias, na América, promove a formaçã o de grandes
riquezas, cujo capital foi aplicado na indú stria. Surge, assim, o regime capitalista", como comentou
Alberto Pinheiro de Medeiros, no trabalho "A descoberta da América e as Mudanças", publicado no
seminá rio "Dois Pontos", em outubro de 1992.

Ambições Ibéricas e a Descoberta do Brasil

As ambiçõ es expansionistas da Espanha e Portugal entravam em conflito. Portugal consegue, com D.


Joã o (1418) do Papa Martinho V. a bula Sane Charissimus. Seguem outras bulas: Eti Suscepti
(1442), Romanus Pontifex (1454), Inter Coetera (1456).

Apó s a descoberta da América por Cristó vã o Colombo, a Espanha entra na briga, procurando obter
benefícios da Igreja, graças ao prestígio que desfrutava na Cú ria Romana. As bulas iam saindo,
refletindo a maior ou menor influência de uma das duas potências ibéricas, em dado momento
provocando, inclusive, o protesto do teó logo Francisco Vitó ria.

Finalmente, Espanha e Portugal chegaram a um acordo. Com o Tratado de Tordesilhas (7 de junho


de 1494), o mundo ficaria dividido entre as duas potências ibéricas.

Descoberto o caminho marítimo para as Índias por Vasco da Gama, D. Manuel prepara uma grande
esquadra que parte rumo ao Oriente. O comando da armada é entregue à Pedro Á lvares Cabral,
alcaidemor de Asurara que, segundo Pedro Calmon, "pertencia à melhor gente da beija, cujo grande
feito foi, justamente, a descoberta do Brasil".
Como diz ainda o mesmo autor, a armada "ia defrontar o ignoto, nas paragens do Índico: a paz ou a
guerra. Devia ser forte. Foi preparada com magnificência: nã o mais para descobrir \, como a de
Vasco da Gama, mas para aliciar ou intimidar o "samorin" de Calecute, nos Estados opulentos".

Participavam da armada nomes ilustres: Nicolau Coelho, Sancho de Tovar, Péro Escobar, Pedro de
Ataíde, Vasco de Ataíde, o bacharel mestre Joã o etc.

No dia 9 de março de 1500, apó s missa solene no dia anterior, Cabral e seus companheiros
iniciavam a viagem. Roteiro: ilhas Caná rias, Sã o Nicolau. No dia 23, a nau de Vasco de Ataíde
desapareceu. No mês seguinte, no dia 22, os expedicioná rios avistam um monte que recebeu o
nome de Monte Pascoal.

Nicolau Coelho manteve os primeiros contatos com os nativos. Fotam celebradas duas missas,
ambas por Henrique Coimbra. A primeira, num domingo, dia 26 de abril de 1500, e a segunda, no
dia 1º de maio.

No dia seguinte, a esquadra partia rumo ao Oriente. Estava, oficialmente, descoberto o Brasil. O
acontecimento foi narrado de maneira brilhante na carta de Pero Vaz de Caminha.

A Carta de Pero Vaz de Caminha

A carta de Pero Vaz de Caminha narrando a descoberta do Brasil, já muito estudada, foi reproduzida
na íntegra em alguns livros de Histó ria do Brasil. A quase totalidade desses estudos se caracteriza
pela erudiçã o. A Dominus lançou uma ediçã o pioneira para o grande pú blico, sem se perder em
vulgaridade, contando com uma introduçã o que é um pequeno estudo sobre aquele documento,
escrito por Leonardo Araú jo.

A carta foi redigida por uma testemunha ocular do fato, mais do que isso, um eminente humanista.
Nã o é apenas um relató rio narrando as peripécias dos navegantes lusitanos numa viagem marítima.
Fornece subsídios para uma melhor compreensã o daquele acontecimento.

A descriçã o, pela primeira vez, da terra descoberta é, talvez, a parte do texto mais conhecida: "as
saber, primeiramente, de um grande monte, muito alto e redondo: e de outras serras mais ao sul
dele, e de terra chã , com grandes arvoredos; ao qual monte alto o capitã o pô s o nome de o Monte
Pascoal e à terra a Terra de Vera Cruz!

Grande observador, descreve os homens da terra com riqueza de detalhes: "A feiçã o deles é serem
pardos, um tanto avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem coberta
alguma (...) Ambos traziam o beiço de baixo furado e metido nele um osso verdadeiro, de
comprimento de uma mã o, e da grossura de um fuso de algodã o, agudo na ponta como furador (...).
Os cabelos sã o corredios".

Narra também o contato de homens que possuíam culturas diferentes e que nativos e portugueses
procuravam se entender através de festos, na falta de conhecimento do idioma do interlocutor.
Surgindo, naturalmente, alguns desentendidos: "acenava para a terra e novamente para as contas e
para o colar do capitã o (que era de ouro) como se dariam por aquilo".

"Isto tomá vamos nó s nesse sentido, por assim o desejamos! Mas se ele queria dizer que levaria as
contas e mais o colar, isto nã o queríamos nó s entender, porque lhe havíamos de dar!" E mais
adiante: "Ali por nã o houve fala ou entendimento com eles, por a barbaria deles ser tamanha que se
nã o entenderia nem ouvia ninguém". Lança, portanto, a culpa do nã o entendimento na barbaria em
que se encontravam os nativos. Essa observaçã o nã o passam de uma prova a mais do
etnocentrismo europeu. Os brancos eram os "civilizados", os seres superiores; e os donos da terra,
ao contrá rio, pobres coitados ...
Mas nã o se pode dizer que o referido documento seja a primeira pá gina da Histó ria do Brasil por
uma razã o muito simples: a Histó ria do Brasil começa quando chegaram nesta terra os primeiros
homens, numa época bem anterior à vinda dos europeus.

A carta de Pero Vaz de Caminha é, no entanto, um relato longo, minucioso, com dados importantes,
fornecendo subsídios nã o somente para a Histó ria do Brasil, mas ao mesmo tempo para outras
ciências, como, por exemplo, a antropologia.

Com ela se encerra a fase pré-histó rica do País, começando um novo período: o da histó ria escrita,
entrando a terra descoberta para o clube do mundo dos "civilizados" ... E os portugueses,
certamente, nã o estavam sozinhos. Portugal teria que enfrentar uma grande concorrência e teve
que lutar muito para ficar de posse definitiva do Brasil.

Tese Ousada: Cabral no Litoral Potiguar

Lenine Pinto, pesquisador norte-rio-grandense, afirma que a expediçã o de Pedro Á lvares Cabral,
que descobriu o Brasil, ao contrá rio do que se tem dito até hoje, teria pela primeira vez atingido o
Brasil provavelmente na praia de Touros, em abril de 1500.

Klécius Henrique, repó rter da TRIBUNA DO NORTE que entrevistou o escritor, escreveu o seguinte:
"Lenine Pinto argumenta que Cabral em sua viagem rumo à Índia teria seguido a volta do mar numa
manobra a partir do Cabo Verde, a oeste, coroneando a corrente subequatorial do Atlâ ntico que se
bifurcava no Cabo de Sã o Roque, numa aproximaçã o dramá tica do litoral potiguar, onde teria
aportado em 22 de abril de 1500".

Lenine Pinto desenvolveu, entre outros, o seguinte argumento: "Joã o da Nova, em 1501, quando
saiu à procura de Cabral, de Cabo Verde, levou trinta dias para chegar ao cabo de Sã o Roque. Como
Cabral, no mesmo tempo, chegaria ao sul da Bahia?

"A duraçã o da viagem de Cabral, Portugal-Brasil, é muito importante. É preciso, portanto, saber o
tempo que se gastaria para realizar a viagem Portugal-Touros e a viagem Portugal-sul da Bahia,
naquela época.

Lenine diz ainda o seguinte: "Há muitos locais no RN semelhantes aos narrados por Caminha na
carta ao rei D. Manuel". Acontece que fica difícil acreditar que os historiadores nã o tenham
percebido antes o erro, afirmando que o lugar atingido por Cabral foi o sul da Bahia. A distância é
muito grande. Como explicar tal equívoco?

A tese foi lançada. A dú vida poderá ser dissipada quando Lenine Pinto publicar o seu livro
"Reinvençã o do Descobrimento do Brasil".

Prioridade Européia

Controvérsias Sobre a Presença Espanhola

A prioridade da descoberta do Brasil continua sendo uma questã o polêmica. Para alguns
estudiosos, os espanhó is chegaram primeiro. Varnhagen, por exemplo, defende que Alonso de
Ojeda teria atingido o delta do Açu no Rio Grande do Norte. Outros autores concordam que o
navegador espanhol visitou o Brasil, divergindo apenas do local. "Vinguand discorda e aponta como
sendo o local correto as proximidades do Cabo de Sã o Roque". Capistrano de Abreu e outros autores
negam que Ojeda tivesse passado pelo Brasil.

A viagem de outro navegante espanhol também é alvo de discussõ es. Parece que Vicente Yañ ez
Pinzon teria realmente vindo ao Brasil. Robert Southey chegou a afirmar o seguinte. "A primeira
pessoa que descobriu a costas do Brasil foi Vicente Yañ ez Pinzon".
Segundo os cronistas, no dia 26 de janeiro de 1500, Pinzon chegou a um lugar que denominou de
Santa Maria de la Consolació n. A controvérsia que existe é sobre onde ficaria essa Santa Maria de La
Consolació n. Para uns, seria o cabo de Santo Agostinho. Varnhagen indica a Ponta de Mucuripe.
Guanino Alves, que pesquisou a viagem de Vicente Pinzon, discorda e indica a ponta de Itapajé, no
litoral norte do Ceará , como o local certo. O fato é que o navegante hispâ nico tomou posse da terra
em nome da Espanha. E deu à regiã o visitada o nome de Rostro Hermoso. Depois, Pinzon se dirigiu
para o Norte, chegando até a foz do rio Amazonas, que denominou de Santa Maria de la Mar Dulce.

Outro navegador espanhol que provavelmente passou pelo Rio Grande do Norte foi Diego de Lepe e,
segundo alguns pesquisadores, teria atingido a enseada do Açu.

Apesar das controvérsias, nã o se pode negar que os espanhó is antecederam aos portugueses na
descoberta do Brasil, considerando que estiveram no País antes de abril de 1500.

Os Franceses no Rio Grande do Norte

Quando os franceses foram expulsos do Sul do País seguiram rumo ao Norte, mantendo um ativo
comércio com os nativos. Nã o conseguiram no entanto instalar uma colô nia. Chegaram a contar
com um intérprete: "Um castelhano tornado potiguar, beiço furado, tatuado, pintado de jenipapo e
urucu, falando o nheengatu em serviço dos franceses com os quais se foi embora", narrou Câ mara
Cascudo. A base deles era o Rio Grande do Norte.

Os franceses passaram a fazer investidas contra a Paraíba, com o apoio dos potiguares. O ataque
mais audacioso se realizou entre 15 a 18 de agosto de 1597. Portanto treze navios, o embate se deu
com a fortaleza de Santa Catarina de Cabedelo, sob o comando do aventureiro Jacques Riffaul, que
desembarcou trezentos e cinqü enta homens. E mais: "Vinte outras naus reforçaram a investida,
esperando a ordem no rio Potengi". Nã o foi um simples assalto de corsá rios, mas se constituiu uma
verdadeira batalha. A fortaleza foi defendida por apenas vinte soldados. A artilharia contava com
cinco peças. Os portugueses resistiram ao ataque, forçando os franceses a baterem em retirada.

Vilma Monteiro analisa a importâ ncia dessa vitó ria: "Determina os novos rumos da conquista da
regiã o Norte. Permite a posse efetiva da Capitania do Rio Grande, seu povoamento e colonizaçã o,
com isso abrindo as portas para a expansã o civilizadora sobre novos territó rios".

Os franceses, diante desse quadro, ameaçavam a Paraíba; apó s a caída desta, a pró xima conquista
seria Pernambuco ...

Foram eles que iniciaram o processo de miscigenaçã o entre europeus e americanos na regiã o. Dois
aventureiros se destacaram: Charles de Voux e Jacques Riffault. Ainda hoje um local guarda no
nome a lembrança de Riffault, no bairro do Alecrim em Natal, onde se ergueu a Base Naval
(Refoles).

A Era Lusitana e o Marco de Posse

A primeira expediçã o que alcançou terras potiguares foi a de 1501. Essa viagem, iniciada no dia 10
de maio de 1501, se encontra envolvida em controvérsias. A começar sobre quem a teria
comandado. Alguns nomes sã o apresentados: D. Nuno Manoel, André Gonçalves, Fernando de
Noronha, Gonçalo Coelho e Gaspar de Lemos - o nome mais aceito. Quem participou também dessa
expediçã o foi Américo Vespú cio.

Apó s sessenta e sete dias de viagem, foi alcançado o Rio Grande à altura do Cabo de Sã o Roque e,
segundo Câ mara Cascudo, ali foi plantado o marco de posse mais antigo do País, registrando-se, na
ocasiã o, contatos entre portugueses e potiguares.

O povo, por causa dos desenhos em forma de cruz no Marco de Posse, acreditou ser ele milagroso,
surgindo assim, um culto. Oswaldo Câ mara de Souza disse o seguinte: "O culto popular chegava à s
raias do fetichismo, havendo a crença absurda do que um chá preparado com fragmentos da pedra
tinha poderes milagrosos, trazendo alívio e cura à s mazelas do corpo e do espírito".

Nesse período, o governo lusitano, verificando que o litoral brasileiro estava sendo visitado por
corsá rios, entre eles aventureiros franceses, resolveu enviar expediçõ es militares para defender sua
colô nia. Foram as chamadas expediçõ es guarda-costas, sendo consideradas as mais marcantes
aqueles que vieram sob o comando de Cristó vã o Jacques, entre 1516 a 1519 e 1526 a 1528. Uma
iniciativa ingênua, considerando a imensa extensã o do litoral. É o pró prio Cristó vã o Jacques que
sugere o início do povoamento como soluçã o para resolver o problema. Eminentes portugueses
aprovaram e defenderam a idéia. D. Joã o III, entã o envia uma expediçã o colonizadora chefiada por
Martim Afonso de Souza.

A base estava lançada e em 1532 fundava-se Sã o Vicente, no Sudeste do País, o que era muito pouco
pois o Brasil possuía dimensõ es continentais. Cristó vã o Jacques, entre outras coisas, sugere que se
aplicasse no Brasil um sistema que já vinha sendo feito nas ilhas do Atlâ ntico: o das Capitanias
Hereditá rias. Uma, na realidade, já havia sido criada em 1504 por D. Manuel, a de Fernando de
Noronha. D. Joã o III adota oficialmente o sistema no Brasil, criando quatorze capitanias no período
compreendido entre 1934 e 1936. Entre elas, a de Joã o de Barros, no futuro Rio Grande, como
lembra Câ mara Cascudo, "começando da Baía da Traiçã o (Acejutibiró , onde há cajus azedos,
segundo Teodoro Sampaio), limite norte da Donatá ria Itamaracá , pertencente a Pero Lopes de
Souza, até a extrema indefinida".

A capitania possuía cem léguas de extensã o. Em 1535, Joã o de Barros, Aires da Cunha e Fernã o
Á lvares prepararam a maior esquadra particular que havia saído do Tejo até aquele momento:"
Com cinco naus e cinco caravelas, novecentos homens e mais de cem cavalos". O comando coube a
Aires da Cunha. O governo investiu também nessa expediçã o: "D. Joã o III emprestara artilharia,
muniçõ es e armas retiradas do pró prio Arsenal Régio", informa Câ mara Cascudo. Por essa razã o,
muitos eram de opiniã o que Aires da Cunha pretendia, além de fundar colô nias no Norte do Brasil,
atingir o Peru pelo interior... Formando mais uma controvérsia ...

Varnhagen fala de um conflito entre nativos e portugueses à altura do rio Ceará -Mirim, Câ mara
Cascudo nega o incidente, afirmando que Varnhagen "arquitetou tal viagem". É taxativo: "Aires da
Cunha nunca esteve no Rio Grande do Norte". Passando pelo litoral potiguar, o navegante seguiu
viagem rumo ao Norte.

A expediçã o foi um fracasso total com a morte de Aires da Cunha. Os portugueses conseguiram
fundar, ao Norte, o povoado de Nazaré, onde permaneceram três anos. Morreram setecentos
homens. Os expedicioná rios partiram em busca de melhor sorte. Os resultados, porém, foram
péssimos. Alguns foram jogados nas Antilhas; outros atingiram Porto Rico. E um grupo formado por
Sã o Domingos e Joã o de Barros conseguiu reaver seus filhos que, quando regressavam de Nazaré,
numa tentativa infrutífera, procuravam colonizar o Rio Grande. Foi nessa oportunidade que teria
ocorrido o conflito entre potiguares e lusitanos, mencionado por Varnhagen. Mesmo fracassando,
essa foi, na opiniã o de Câ mara Cascudo, "a primeira tentativa de colonizaçã o no Rio Grande do
Norte".

A Fundação de Natal

Disputa Acaba em União Peninsular

O cardeal D. Henrique assumiu o governo português em 1578. O prelado contava sessenta e seis
anos e, como nã o tinha filhos, criava um problema para a sucessã o do trono português. No dia 31 de
janeiro de 1580, o governante morreu.

Entre os diversos pretendentes ao trono, três netos de D. Manuel se apresentavam com maiores
possibilidades: D. Antô nio, prior do Crato, D. Catarina e Felipe II, rei da Espanha renunciou a favor
de Felipe II. A disputa se reduziu entre D. Antô nio, que era filho bastardo do infante D. Luís, e o
monarca espanhol, que era o mais poderoso pois contava com o apoio de importantes figuras da
nobreza e do clero lusitano. Os dois rivais partiram para a disputa armada. D. Antô nio enfrentou as
tropas fiéis a Felipe II, chefiados pelo duque de Alba, sendo posteriormente derrotado.

A crise abalou profundamente Portugal e no dia 28 de junho, como narra Jâ nio Quadros, "iniciou-se
a tomada de Portugal pelos duque de Alba, enquanto setenta e duas galés sob o comando do
marquês de Santa Cruz, acompanhadas de setenta naus, chalupas e caravelas, encetavam as
operaçõ es navais. As cidades, vilas, lugares e povoaçõ es caíram uma a uma em poder dos invasores,
a despeito, aqui e ali, dos esforços dos partidá rios de D. Antô nio em contê-los".

D. Felipe nã o agiu somente pela força das armas, fez praticamente, tudo. Propostas tentadoras aos
membros da nobreza, além do apoio da Companhia de Jesus. Em síntese, ele comprou o apoio
recebido de seus adversá rios com ouro e também através de seu poderio militar.

Tudo isso porque Felipe II tinha grandes interesses na anexaçã o de Portugal ao reino espanhol: "O
grande palco dos efeitos políticos espanhó is na era filipina havia sido, até aquela data, o
Mediterrâ neo, seria através desta unificaçã o que a Espanha passaria a tomar parte na grande era
atlâ ntica inaugurada por Portugal", segundo a "Histó ria Geral da Civilizaçã o Brasileira", Vol. I. Por
outro lado, os portugueses já participavam das atividades comerciais espanholas. Era importante
para a Espanha a anexaçã o do reino lusitano, justificando assim todo o empenho do monarca
hispâ nico. Nã o foi difícil ocupar Portugal. Venceu Felipe II e, em 1581, as cortes de Tomar
aclamaram-se rei de Portugal. Estava efetivada a "Uniã o Peninsular", que terminaria apenas no ano
de 1640.

Para o Brasil, esse período foi uma fase altamente positiva. Exemplo: a conquista do Norte e
Nordeste do País.

O Interesse de Filipe II Pelo Rio Grande

Os franceses se fixaram no litoral potiguar sem necessidade de dominar o nativo e, justamente por
essa razã o, tiveram a populaçã o local como aliada. Escondiam suas naus no rio Potengi e, de sua
base, se lançavam contra os colonos portugueses que se encontravam na Paraíba. O Rio Grande era,
de fato, uma á rea estratégica. Da regiã o, os franceses podiam se deslocar para o norte e igualmente
para o sul.

Filipe II, ao anexar Portugal e suas colô nias, sentiu a situaçã o de abandono em que estava parte do
Nordeste e todo o Norte do Brasil. E o que era pior: a constante ameaça que representava a
permanência dos franceses no Rio Grande. Tendo em vista essa situaçã o, o monarca nã o perdeu
tempo. Através de duas Cartas Régis (9 - 11 - 1596 e 15 - 03 - 1597), determinou a expulsã o do
inimigo e que fosse construída uma fortaleza e ainda, fundada uma cidade. Em síntese: conquistar o
Rio Grande, consolidando tal feito através da colonizaçã o. Por essa razã o, um fato deve ficar bem
claro: a expulsã o dos franceses do Rio Grande foi uma iniciativa de Filipe II, o que significa dizer,
hispâ nica.

A Expedição de Manuel Mascarenhas Homem

A conquista do Rio Grande nã o se apresentava como sendo uma tarefa fá cil. E foi por assim
compreender que D. Francisco de Souza, governador-geral do Brasil, determinou que o capitã o-mor
de Pernambuco, Manuel Mascarenhas Homem, tomasse todas as providências para que se
organizasse uma grande expediçã o militar com o objetivo de que as ordens de Filipe II fosse
executadas. Assim foi feito. Uma poderosa expediçã o foi organizada. Desta, uma parte iria por mar
com uma esquadra formada por sete navios e cinco caravelõ es, sob o comando de Francisco de
Barros; e outra seguiria caminhando por terra, liderada por Feliciano Coelho, capitã o-mor da
Paraíba.

Manuel Mascarenhas Homem assumiu o comando geral, agindo com o má ximo de empenho para
que nada faltasse a fim de que os objetivos fossem alcançados: expulsar os franceses, construir uma
fortaleza e fundar uma cidade. Participaram da jornada um grupo de religiosos: os jesuítas Gaspar
de Samperes (autor da planta da futura fortaleza) e Francisco Lemos, e mais dois franciscanos -
Bernadino das Neves, que funcionava como intérprete, e Joã o de Sã o Miguel.

Narra Câ mara Cascudo: "Feliciano Coelho partiu por terra com as quatro companhias
pernambucanas e uma paraibana capitaneada por Miguel Á lvares Lobo, num total de 178 homens e
90 indígenas guerreiros de Pernambuco e 730 da Paraíba, com seus tuixauas prestigiosos e bravos:
Pedra Verde (Itaobi), Mangue, Cardo-Grande etc. a 17 de dezembro de 1597 o exército marchou.
Mascarenhas viera com as naus".

Acontece que as forças terrestres foram atingidas pela varíola, sendo obrigadas a retroceder, com
exceçã o de Jerô nimo de Albuquerque que se uniu à expediçã o marítima. Havia uma justificativa:
Jerô nimo desfrutava de grande prestígio entre os nativos.

A viagem pelo mar continuou e, no caminho, sete naus franceses fugiram para evitar um confronto
com a esquadra lusitana.

No dia 25 de dezembro, a frota luso-espanhola atingia o rio Potengi. No final do ano de 1997 esse
fato completa exatos quatrocentos anos.

A primeira providência dos invasores foi fazer um entricheiramento com varas de mangue para que
pudessem se defender das investidas dos potiguares. Medida acertada, porque nã o demorou muito
os nativos atacaram com toda violência. Era a guerra que começava. Com o passar dos dias, os luso-
espanhó is começaram a perder terreno no conflito armado. A situaçã o se agravou a tal ponto que
ficou crítica, como narrou Vicente Salvador: "Depois de continuar os assaltos que puseram os
nossos em tanto aperto que esacassamente podiam ir buscar á gua para beber a uns poçozinhos que
tinham perto da cerca".

O quadro era muito triste: mortos, feridos e doentes. O clima ficava, a cada momento, mais
insustentá vel. Foi quando, providencialmente, chegou Francisco Dias com reforço, evitando uma
humilhante derrota. Servindo para que os luso-espanhó is pudessem manter a posiçã o onde se
encontravam. Nã o fosse a chegada de Feliciano Coelho, que partiu da Paraíba com mais soldados,
armas e municõ es, tudo estaria perdido. A situaçã o, ainda assim, continuava delicada. Era preciso
negociar a paz com urgência.

A Imponente Fortaleza dos Reis Magos

A fortaleza de madeira nã o foi construída, como pensava Câ mara Cascudo, em um "arrecife a


setecentos e cinqü enta metros da barra do Potengi". A razã o é muito simples: naquele local, a
construçã o nã o suportaria o impacto das á guas. O edifício, esclarece Hélio Galvã o, foi erguido na
praia.

A planta da fortaleza, apesar de ser contestada por alguns autores, foi feita pelo padre Gaspar de
Samperes. Segundo a arquiteta Jeanne Fonseca Leite, "a concepçã o 'antropomorfa' dos italianos
encontrou acolhida por parte do padre Samperes que a introduziu no seu projeto destinado à
construçã o da Fortaleza dos Reis Magos".

Fortaleza e nã o forte, Hélio Galvã o esclarece a dú vida: "Forte é uma pequena edificaçã o sem guarda
permanente. Fortaleza, ao contrá rio, é um grande edifício com um contingente de soldados
permanente. A fortaleza, localizada na barra do Potengi, se destaca pela sua beleza e pela sua
imponência. Nã o poderia ser de maneira alguma um forte'.

Para Hélio Galvã o, que pesquisou exaustivamente sobre a Fortaleza, o nome correto seria Fortaleza
da Barra do Rio Grande. O problema nã o é tã o simples. Naquela época se usava de maneira
indiferente mais de um nome para indicar um prédio pú blico. Aquele edifício pode ser chamado
também de Fortaleza dos Reis Magos, o que nã o pode, certamente é designá -lo por "Forte dos Reis
Magos", que por sinal é a versã o popular usada de maneira errada pelos cronistas tradicionais.
Os trabalhos de construçã o da fortaleza começaram no dia 6 de janeiro de 1598. Hélio Galvã o
explica o seguinte: "O trabalho se desenvolvia entre dificuldades e imprevistos, a ameaça constante
de índios e franceses, a atençã o dos homens voltada para a vigilâ ncia do acampamento. Diríamos
que Mascarenhas Homem lançou a pedra fundamental e a partir daí ninguém parou. O material foi
chegando, as pedras que vinham de Lisboa lastrando os navios eram guardadas, acumulava-se cal e
os implementos imprescindíveis eram providenciados".

A primeira fortaleza, a de madeira, foi concluída no dia 24 de junho de 1598. E tinha, como
descreveu Câ mara Cascudo, "a forma clá ssica do forte marítimo, afetando o modelo do polígono
estrelado".

Em 1614, o engenheiro-mor do Brasil, Francisco Frias de Mesquita, realizou trabalhos na fortaleza,


fazendo pequenas modificaçõ es sem alterar a planta original. A obra foi concluída somente em
1628.

Paz Firmada e Posse Definitiva da Terra

A capitania se chamava, no início, do Rio Grande, passando a incluir "do Norte" quando surgiu outra
de igual nome, no Sul do País.

Nã o houve, no Rio Grande, uma conquista. A expediçã o de Manuel Mascarenhas Homem estava
praticamente derrotada. Os missioná rios saíram da fortaleza para se transformarem em
embaixadores da paz. Um passo significativo nesse sentido foi dado quando os nativos conseguiram
distinguir os militares e colonos dos sacerdotes. O padre Francisco Pinto foi, na realidade, o grande
e incansá vel apó stolo. Percorreu o sertã o, enfrentou mú ltiplas vicissitudes. Nos momentos mais
difíceis conseguia reunir novas forças graças à sua fé, operando verdadeiros milagres na obra de
persuasã o.

Primeiro, a catequese e, através dela, o padre Francisco Pinto e seus companheiros missioná rios
procuravam levar os silvícolas para o lado dos portugueses. O padre Pero Rodrigues, numa carta,
transcrita por Hélio Galvã o, registra o trabalho á rduo e difícil dos religiosos. Os padres ajudavam ao
exército com os acostumados exercícios da Companhia, que eram "a edificaçã o de todos, pregando,
confessando, fazendo amizades e nã o se negando a nenhum trabalho, de dia e de noite, como no
acudir aos índios nossos amigos, que nos ajudavam na guerra, por adoecerem gravemente de
bexigas e, quando era possível, acudiam a curar e consolar na morte".

No processo de pacificaçã o, os missioná rios nã o agiram sozinhos. Contaram com o apoio de alguns
chefes nativos: Mar Grande e Pau Seco, entre outros. Os líderes potiguares foram negociar a paz
com os brancos porque as suas mulheres exigiram o fim das hostilidades. Contribuíram também
com o processo de cristrianizaçã o de seus irmã os ao lado dos missioná rios.

Nã o se pode esquecer, igualmente, o desempenho de Jerô nimo de Albuquerque que foi de suma
importâ ncia. Filho de Jerô nimo Santo Arco Verde (Ubirá - Ubi) que, por sua vez, era filha do chefe
nativo Arco Verde. Mestiço, possuía sangue tupi em sua veia; corajoso e há bil, falando o idioma
nativo, desfrutava de grande influência entre os habitantes de todo o Nordeste.

A paz era o anseio das duas facçõ es em luta e as negociaçõ es obtiveram êxito. Terminadas as
hostilidades, Manuel Mascarenhas Homem partiu para a Bahia, com o objetivo de relatar os
acontecimentos ao governador, D. Francisco de Souza que, sem demora, determinou que fossem
solenemente celebradas as pazes. Isso aconteceu no dia 11 de junho de 1599, na Paraíba, na
presença de muitas autoridades - Mascarenhas Homem; Feliciano Coelho de Carvalho, ouvidor-mor
geral, e Brá s de Almeida; de diversos chefes nativos; do intérprete frei Bernadino das Neves e do
apó stolo dos potiguares, padre Francisco Pinto. As pazes foram finalmente ratificadas e estava
assim assegurada a posse definitiva da terra, ou mais precisamente da Capitania do Rio Grande.

Um presente dado por Felipe II ao império lusitano ...


Dúvidas Históricas: A Cidade do Natal

Expulso o francês, construída uma fortaleza, faltava apenas fundar uma cidade. E esse era, dos três
objetivos, provavelmente o mais fá cil de ser executado. Acontece que, graças à destruiçã o de
documentos pelos holandeses, a histó ria da fundaçã o da capital potiguar se perdeu, talvez, para
sempre. A luta dos historiadores norte-rio-grandenses para reconstruir tal acontecimento tem
gerado uma grande controvérsia através dos tempos. As pesquisas começaram a dar bons frutos e a
questã o começa agora a ficar mais clara, com alguns problemas solucionados.

Ainda hoje se discute quem teria sido o fundador da Cidade do Natal. Os primeiros cronistas
indicavam o nome de Jerô nimo de Albuquerque, alegando que, por sua participaçã o no processo de
pacificaçã o, com sua garra e valentia, teria sido o primeiro capitã o-mor do Rio Grande e logo depois
fundado Natal. A informaçã o se baseava muito mais na intuiçã o do que em qualquer base
documental. É , portanto, compreensível que os primeiros historiadores se confundissem. Frei
Vicente Salvador, por exemplo, narra o seguinte: "Feitas as pazes com os potiguares, como fica dito
se começou logo a fazer uma povoaçã o no Rio Grande a uma légua do forte, a que chamam a Cidade
dos Reis, a qual governa também o capitã o do forte que El Rei costuma mandar cada três anos".

Outro historiador, Francisco Adolfo Varnhagen, avança mais nas explicaçõ es se valendo de detalhes:
"Feitas as pazes com os índios, passou Jerô nimo de Albuquerque a fundar no pró prio Rio Grande
uma povoaçã o. E como era para isso impró pria a porçã o do arrecife ilhada (em preamar) onde
estava o forte, segundo ainda hoje se pode ver, escolheu para isso o primeiro chã o elevado e firme,
que se apresenta à s margens direitas do rio, obra de meia légua acima de sua perigosa barra (...). A
dita povoaçã o, depois vila e cidade, de cujo nome nã o conseguiu fazer - se digna por seu
correspondente crescimento, se chamou de Natal em virtude, sem dú vida, de se haver inaugurado o
seu pelourinho ou a igreja matriz a 25 de dezembro desse ano da fundaçã o (1599)".

Vicente de Salvador confundiu a "povoaçã o dos Reis" com a futura capital do Rio Grande do Norte.
Na realidade, durante a construçã o da fortaleza, Manuel Mascarenhas Homem mandou erguer
algumas casas para abrigar os oficiais que participaram da tentativa de conquista. Com isso, surgiu
uma povoaçã o que se chamou de Santos Reis. Natal seria fundada, posteriormente, e nã o tinha
nenhuma relaçã o com a povoaçã o que nasceu pró xima daquele edifício militar...

Varnhagen vai mais além, descreve a evoluçã o daquele nú cleo urbano: "A dita povoaçã o, depois vila
e cidade". Essa afirmaçã o, porém, nã o é sustentá vel. Natal como disse Câ mara Cascudo, "nasceu
cidade". Nã o há , desse modo, nenhuma relaçã o com a primitiva povoaçã o que floresceu nas
proximidades da fortaleza. A razã o é clara: Felipe III mandou que se fundasse uma cidade e nã o
uma povoaçã o... Natal surgiu no local onde floresceu a povoaçã o. Natal nasceu cidade, porém, sem
casas e sem ruas, aumentando a controvérsia.

A Capitania do Rio Grande possuía dois nú cleos: uma povoaçã o em decadência e uma cidade que, na
prática, nã o existia... Mas aos poucos, com o passar do tempo, começava a surgir. Essa situaçã o
provocou muita confusã o entre os autores, como demonstram as diversas denominaçõ es que Natal
recebeu: "Natal los Reys", "Cidade dos Reis", "Cidade do Natal do Rio Grande" e até o nome muito
estranho de "Cidade de Santiago"...

Afinal, quem fundou Natal?

A primeira versã o que contou no início com a quase unanimidade dos historiadores, inclusive dos
pesquisadores da terra, era a que apontava Jerô nimo de Albuquerque como fundador da Cidade do
Natal. Essa teoria, que tem entre seus defensores ilustres nomes, como Vicente Lemos, Tavares de
Lyra e Tarcísio Medeiros, em síntese seria a seguinte: Mascarenhas Homem nomeou Jerô nimo de
Albuquerque comandante da fortaleza e depois seguiu para a Bahia com a finalidade de prestar
contas da missã o que desempenhara, por determinaçã o do governador-geral do Brasil. Veio a
seguir a pacificaçã o dos nativos e, em seguida, a fundaçã o da cidade. Como Jerô nimo se destacou no
processo e era o capitã o-mor da Capitania do Rio Grande, logo fora ele o fundador de Natal. Tavares
de Lyra chega até a afirmar que "é de presumir". Portanto, nã o se tratava de fato e, sim, de uma
possibilidade.
Com o avanço das pesquisas, ficou provado que Mascarenhas Homem nã o designou Jerô nimo de
Albuquerque para exercer a funçã o de capitã o-mor do Rio Grande e, o que é mais importante,
Jerô nimo nã o se encontrava presente na data da fundaçã o da cidade e portanto nã o pode ser
considerado como sendo seu fundador ...

Luís Fernandes (1932) defendeu ter sido Manuel Mascarenhas Homem o fundador da Cidade do
Natal. Alegava que, construindo o primeiro edifício (a fortaleza) e ainda as casas que deram origem
à povoaçã o que se formou pró xima à fortaleza, seria o verdadeiro padrinho da cidade.
Argumentaçã o falha, considerando que o novo centro urbano nã o possuía nenhuma relaçã o com
tudo o que existia anterior à data da sua fundaçã o.

José Moreira Brandã o Castelo Branco publicou em 1950, na revista Bando, o texto "Quem fundou
Natal", onde defendia a tese de ser Joã o Rodrigues Colaço o prová vel fundador da capital potiguar.
Posteriormente, esse estudo foi publicado na revista do Instituto Histó rico e Geográ fico do Rio
Grande do Norte, em 1960, provocando uma polêmica. Câ mara Cascudo chegou inclusive a apoiar a
teoria defendida por Castelo Branco (1955). Pouco tempo depois mudou de opiniã o, acreditando
que o fundador da cidade teria sido outro: "Para mim, o padrinho da Cidade do Natal foi Mamuel de
Mascarenhas Homem, capitã o-mor de Pernambuco, comandante da expediçã o colonizadora:. E
argumenta: "Continuava tã o interessado no cumprimento das reais determinaçõ es que fora à
Paraíba, em juno desse 1599, assistiu à solenidade do contrato das pazes com os potiguares, ato
possibilitador da criaçã o da Cidade seis meses depois. Acontece que, nessa época, Mascarenhas
Homem estava em Natal onde concedeu, a 9 de janeiro de 1600, data nesta fortaleza dos REIS
MAGOS (...), a primeira sesmaria, à margem esquerda do rio, numa á gua a que chamam da Papuna,
justamente ao capitã o Joã o Rodrigues Colaço, seu subalterno. Nã o abandonaria funçõ es de
governaça se nã o tivesse deveres de suma importâ ncia, como satisfazer a ú ltima parte das
instruçõ es do rei, participando da fundaçã o da cidade. Nã o outra explicaçã o para a sua presença em
Natal. Tinha sido encarregado da missã o e deveria cumpri-la até o final".

Essa teoria se fundamenta nos seguintes pontos:

1 - A presença de Manuel Mascarenha em dois eventos:

a) Solenidade da ratificaçã o da paz com os nativos.

b) Data da fundaçã o da cidade.

2 - E, ainda, os seguintes argumentos:

a) Doou a primeira sesmaria no Rio Grande do Norte a Joã o Rodrigues Colaço, ato administrativo
que provaria que estava à frente do governo da capitania.

b) Mascarenhas Homem tinha como missã o expulsar os franceses, construir uma fortaleza e fundar
uma cidade. Deveria executar objetivos e, assim, teria para cumprir a ú ltima missã o: a fundaçã o de
Natal.

Manuel Mascarenhas Homem prestigiou os eventos citados como representante do governador-


geral do Brasil e foi representando D. Francisco de Souza que doou a sesmaria a colaço. É bom
lembrar que, como comandante de uma expediçã o militar, ele nã o poderia doar sesmaria ...

Mascarenhas Homem construiu a fortaleza de madeira, lançando os fundamentos da fortaleza


definitiva. Expulsou os franceses, mas nã o fundou a cidade do Natal porque em dezembro de 1599
já existia um governante, o capitã o-mor Joã o Rodrigues Colaço, habilitado legalmente para fundar a
cidade e iniciar o processo de colonizaçã o...

Nã o se pode esquecer, também, que no documento da doaçã o de capitã o da fortaleza, D. Manuel


Mascarenhas Homem disse claramente que "por mandato do dito Senhor vim conquistar este Rio
Grande e fazer nele a fortaleza dos Reis Magos". Nã o afirma que veio fundar uma cidade e, no
entanto, Natal já estava fundada! Chega-se a uma conclusã o: Manuel Mascarenhas nã o fundou a
Cidade do Natal. Falta examinar apenas a teoria que defender ter sido Joã o Rodrigues Colaço o
verdadeiro fundador.

Vicente Lemos foi o primeiro historiador a afirmar que Joã o Rodrigues Colaço teria sido o homem
que exerceu, pela primeira vez, a funçã o de capitã o-mor do Rio Grande, numa nota publicada na
revista do Instituto Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte, Vol. 6, pá gina 138: A conquista
iniciada em princípios de 1598, e na qual tanto distinguiu-se Jerô nimo de Albuquerque, remete no
ano seguinte, e, ciente D. Francisco de Souza, governador-geral do Brasil, de bom êxito da empresa,
nomeou capitã o-mor do forte a Joã o Rodrigues Colaço, o primeiro que realmente governou a
capitania".

Depois, entretanto, Vicente de Lemos muda de opiniã o. No seu livro "Capitã es Mores e
Governadores do Rio Grande do Norte", declarou que Jerô nimo de Albuquerque foi o fundador da
Cidade do Natal.

Capitania do Rio Grande

Novas Luzes Sobre a Fundação de Natal

Foi o escritor José Moreira Castelo Branco quem procurou solucionar, de maneira definitiva, o
problema da fundaçã o de Natal. Com base numa exaustiva pesquisa, publicou um estudo intitulado
"Quem Fundou Natal", onde provou que Joã o Rodrigues Colaço foi de fato o primeiro capitã o-mor
do Rio Grande. Apresentou dois documentos, encontrados por Serafim Leite. Um deles é uma carta
do provincial Pero Rodrigues, que registrava o trabalho de catequese realizado no Rio Grande pelos
padres Francisco Pinto e Gaspar de Samperes, e diz ainda que "a tudo isso se achava presente o
capitã o da fortaleza, Joã o Rodrigues Colaço".

Em seguida, Castelo Branco faz o seguinte comentá rio: "isto ocorria em março ou abril de 1599,
porque a 19 deste ú ltimo mês, já os ditos padres, a fim de satisfazerem uma exigência do príncipe
Pau Seco, para melhor garantia e tornar a pacificaçã o mais firme, partiam do forte do Rio Grande,
em vista às aldeias dos potiguares, até chegar à s de Capaoba, donde seguiram com destino à
Paraíba".

O segundo documento, atribuído a Gaspar de Samperes, afirma o seguinte: "Joã o Rodrigues Colaço,
o primeiro capitã o que foi daquela capitania".

Castelo Branco, apresentando essas provas, constatou ter sido Rodrigues Colaço o primeiro capitã o-
mor do Rio Grande e, ainda, através do documento em que dom Manuel Mascarenhas Homem deu
sesmaria a Joã o Rodrigues Colaço, se comprova que esse senhor governava a capitania em janeiro
de 1600. Apó s examinar tudo isso, Castelo Branco conclui dizendo que "o primeiro capitã o-mor do
Rio Grande foi Joã o Rodrigues Colaço, que governava no ano de 1599, devendo, por isso, ter sido o
fundador da Cidade do Natal".

Como Castelo Branco nã o se posicionou de maneira categó rica, usando, inclusive, a expressã o
"devendo, por isso, ter sido o fundador", nã o fechava a questã o, deixando o problema em aberto. É
que o autor nã o dispunha de nenhum documento oficial que confirmasse a sua teoria.

A importâ ncia do estudo de Castelo Branco, contudo, é muito grande. Elaborou uma tese, hoje
vitoriosa. Abriu novas perspectivas, trazendo uma contribuiçã o significativa e despertando a
curiosidade de outros historiadores. A sua teoria, portanto, ficou no terreno das possibilidades, ou
seja, uma abordagem perfeitamente vá lida.

Permitiu, por outro lado, que a versã o que defendia sem dom Manuel Mascarenhas Homem o
fundador da Cidade do Natal ganhasse novos adeptos: Hélio Galvã o e Luís da Câ mara Cascudo.
Tarcísio Medeiros divulgou, pela primeira vez, em fevereiro de 1973, o Alvará de Nomeaçã o de Joã o
Rodrigues Colaço, em seu livro "Aspectos Geopolíticos e Antorpoló gicos da Histó ria do Rio Grande
do Norte". Através desse alvará se constata o seguinte:

1 - Joã o Rodrigues Colaço foi nomeado capitã o da Fortaleza, pelo governador geral do Brasil, dom
Francisco de Souza, confirmado, posteriormente, pela metró pole.

2 - Nã o houve, portanto, interrupçã o, desde a data de nomeaçã o, pelo governador geral do Brasil,
dom Francisco de Souza, até a designaçã o real, através do alvará de 18 de janeiro de 1600.

Esse alvará era, justamente, o documento oficial que Castelo Branco reclamava e que, infelizmente,
nã o chegou a conhecer.

O historiador Olavo de Medeiros Filho, em seu livro "Terra Natalense", afirmou o seguinte: "Quando
à transmissã o do comando da fortaleza a Jerô nimo de Albuquerque, referida por frei Vicente, nã o
há respaldo documental. Conforme se verifica, através da leitura da Relaçã o de Ambró sio de
Siqueira, de 24 de junho de 1598 até 5 de julho de 1603, houve a presença de um capitã o-mor da
fortaleza e da Capitania do Rio Grande, de Joã o Rodrigues Colaço, o qual foi provido pelo
governador geral do Brasil, dom Francisco de Souza".

Essa informaçã o é importante porque deixa claro que Joã o Rodrigues Colaço recebeu o comando da
fortaleza apó s a sua conclusã o e nã o posteriormente, como se dizia no passado.

Jerô nimo de Albuquerque, portanto, nã o foi designado capitã o da fortaleza por Mascarenhas
Homem no dia 24 de junho de 1598.

É possível também concluir que Joã o Rodrigues Colaço foi, inicialmente, designado para responder
pelo comando da fortaleza, por Mascarenhas Homem, e somente depois foi nomeado capitã o-mor
da Capitania do Rio Grande, pelo governador geral do Brasil, e, finalmente, confirmado nessa
funçã o, pelo governo metropolitano.

Examinando os documentos encontrados pelo padre Serafim Leite e publicados no livro "Histó ria
da Companhia de Jesus no Brasil"; a "Carta de Doacã o de Sesmarias a Joã o Rodrigues Colaço",
publicada pela revista do Instituto Histó rico e Geográ fico no Rio Grande do Norte; a "Relaçã o de
Ambró sio de Siqueira", transcrita em parte - um pequeno trecho - por Olavo de Medeiros Filho, em
"Terra Natalenses"; o Alvará de Nomeaçã o de Joã o Rodrigues Colaço, divulgado por Tarcísio
Medeiros em "Aspectos Geopolíticos e Antropoló gicos da Histó ria do Rio Grande do Norte" e, ainda,
"Quem Fundou Natal", de Castelo Branco, fica claro o seguinte" Joã o Rodrigues Colaço foi nomeado
capitã o da fortaleza por dom Francisco de Souza, sendo o primeiro a exercer tal funçã o no Rio
Grande, e como continuava governando a capitania, em janeiro de 1600, foi ele, JOÃ O RODRIGUES
COLAÇO QUEM FUNDOU A CIDADE DO NATAL, NO DIA 25 DE DEZEMBRO DE 1599.

A Nobre Sobriedade de João Rodrigues Colaço

Era militar. Casado com dona Beatriz de Menezes, filha de Henrique Muniz Teles.

Falando sobre o cará ter e a personalidade de Colaço, disse Hélio Galvã o: "a nobre sobriedade de
suas respostas sobre alguns temas, revela um homem de cará ter marcado, de personalidade alheia
a condicionamentos eventuais".

Olavo de Medeiros Filho informa que "no período de 15 de agosto de 1595 a 15 de março de 1596,
era capitã o de uma companhia transferida do Recife para a Bahia. A referida companhia, à quela
data, retornou a Pernambuco.

Um fato que ninguém pode negar é que Joã o Rodrigues Colaço pode ser considerado um dos
primeiros provoadores do Rio Grande, nascido na Europa. Por essa razã o é que requereu ao
representante do governador geral do Brasil, Manuel Mascarenhas Homem, uma sesmaria, com
2.600 braças, onde possuía inclusive roçados. Tinha, também, escravos da Guiné.

Colaço assumiu o cargo de capitã o da fortaleza no dia 24 de junho de 1598, como comprova a
"Relaçã o de Ambró sio Siqueira".

Olavo de Medeiros Filho afirma que no "período de 26 de novembro de 1601 a 6 de março de 1602,
nenhuma data e sesmaria foi concedida pelo governo de Rodrigues Colaço". Segundo esse autor,
provavelmente, nessa época, teria acontecido um conflito entre portugueses e nativos, descrito por
Anthony Knivet. O episó dio teria acontecido da seguinte maneira: os potiguares, em grande
nú mero, cercaram a Cidade do Natal. Aprisionaram e mataram muitos homens. Mascarenhas
Homem, ao tomar conhecimento do fato, partiu de Pernambuco e surpreendeu o inimigo que se
encontrava, naquele instante, devorando os prisioneiros mortos. Estavam ébrios. E sem a menor
condiçã o para reagir. Foram, entã o, massacrados. Muitos morreram, sendo assassinados a
pancadas! O saldo da chacina: cinco mil mortos! O chefe Pirajuva (Barnatana de um Peixe) solicitou
e obteve de Manuel Mascarenhas Homem, a paz.

Joã o Rodrigues Colaço, possivelmente, se encontrava ausente da capitania. Nã o há registro de


nenhum envolvimento de Colaço no acontecimento, antes ou depois do ocorrido.

Frei Vicente do Salvador narra, na sua Histó ria do Brasil, um fato interessante, que teria se passado
durante o governo de Joã o Rodrigues Colaço: o bispo de Leiria condenou um homem a passar três
anos no Brasil, "onde tornará rico e honrado". O degredado se casou com uma mulher portuguesa e
reuniu uma pequena fortuna. E, ainda, desfrutava da amizade de Colaço e de sua esposa.

Nã o se sabe, até o momento, de outro feito de Joã o Rodrigues Colaço, a nã o ser a fundaçã o da
Cidade do Natal. Depois de ter concluído o seu governo, voltou para Portugal. Nã o se tem outras
notícias da sua presença no Brasil. Nã o se sabe, também, onde e quando morreu. Mas a falta de
maiores dados sobre a vida de Colaço nã o justifica, de maneira alguma, a retirada do ú nico
momento de gló ria que ele viveu: ser o verdadeiro fundador da Cidade do Natal.

No momento em que Natal se prepara para comemorar os quatrocentos anos de sua existência,
ninguém pode deixar de fazer justiça ao seu humilde, desconhecido, porém, verdadeiro fundador.

Uma Cidade sem Pressa de Crescer

No início nã o houve uma preocupaçã o voltada para a construçã o de prédios pú blicos. A fortaleza
era suficiente. Outro edifício, cuja construçã o foi iniciada na época da fundaçã o da cidade, foi o da
matriz.

Durante o processo de conquista e de pacificaçã o, a capitania conheceu apenas duas atividades: a


dos soldados, construindo a fortaleza e lutando contra os nativos; e a segunda, marcada pela
atuaçã o dos missioná rios, ajudando enfermos e buscando a conciliaçã o com os potiguares.

Entre outros, se destacaram os seguintes religiosos: Francisco das Neves Pinto. Os primeiros atos
missioná rios foram realizados dentro da pró pria fortaleza.

Pedro Moura registra a construçã o de uma igreja, por Martim Soares Moreno, sob a proteçã o de
Nossa Senhora do Patrocínio. Colheu tal informaçã o em Miliet, por sinal, o ú nico cronista a falar
sobre aquele edifício.

Em 1598, Natal já era freguesia e o seu primeiro vigá rio, padre Gaspar Gonçalves da Rocha. Olavo
de Medeiros Filho transcreveu, em "Terra Natalense", o seguinte texto de frei Agostinho de Santa
Maria: "foi levantada uma paró quia que se dedicou à Rainha dos Anjos, Maria Santíssima, com o
título de Apresentaçã o, quando seus santíssimos pais, Joaquim e Ana, a foram oferecer no Templo,
sendo de idade de três anos. Na capela-mor se colocou, depois, um grande e formoso quadro de
pintura, em que se vê o mesmo mistério da Senhora historiada".
O primeiro documento que registra a matriz, em Natal, data de 1614, quando diz que a igreja nã o
tinha portas. A igreja matriz teria sido concluída em 1619. Foi, entretanto, destruída pelos
holandeses.

As datas concedidas no Rio Grande, como disse Olavo de Medeiros Filho, "no período de 1600 a
1614, acham-se discriminadas no "Traslado do Auto da Repartiçã o das Terras da Capitania".

A cidade nã o crescia, "andava", ou seja, se arrastava lentamente, rumo ao futuro. Conta Luís da
Câ mara Cascudo que "os trinta e quatro anos de cidade, 1599 - 1633, foram lentos, difíceis e
paupérrimos. Interessava ao rei o forte, a situaçã o territorial. Raríssimas mulheres brancas. Cidade
apenas no nome".

Havia, entretanto, uma coisa positiva. A pescaria que, segundo as testemunhas da época, era da
melhor qualidade. Abastecia a populaçã o local e exportava para os Estados vizinhos, Paraíba e
Pernambuco.

A maneira de viver da populaçã o, naquela época, foi descrita por Câ mara Cascudo: "os moradores
viviam espalhados nos sítios ao redor, plantando roças, caçando, colhendo frutos nos tabuleiros,
pouca criaçã o de gado que se desenvolveria vertiginosamente a ponto de ter 20.000 cabeças em
1633, e as pescarias, de anzol, rede e curral. Havia o sal, colhido nas marinhas do outro lado do rio,
Igapó , Aldeia Velha, antigas malocas dos potiguares. O peixe salgado e seco foi um dos produtos
mais rapidamente divulgado, com mercados abundantes e fá ceis".

Era, de fato, um lento caminhar. A cidade nã o tinha pressa em crescer. Para complicar, dentro em
breve deveria de passar por sua fase mais difícil: o período de invasã o holandesa, quando teve
prédios e documentos destruídos, retardando, mais ainda, o seu desenvolvimento.

Domínio Holandês

De João R. Colaço à Invasão Holandesa

Esta é uma fase das mais obscuras da Histó ria do Rio Grande do Norte, por uma razã o muito
simples: "nos arquivos do Estado nã o se encontrava nenhum documento anterior à conquista
holandesa. Nesse período, que se estende 1633 a 1654, foram todos destruídos", como narra
Tavares de Lyra.

Fica difícil inclusive de se estabelecer a data da posse de alguns governantes. Atualmente foi
desfeita a dú vida sobre quem teria sido o primeiro capitã o-mor do Rio Grande do Norte: Joã o
Rodrigues Colaço, fundador da Cidade do Natal.

A primeira casa que serviu de sede da administraçã o da capitania foi a Fortaleza da Barra do Rio
Grande ou, como é mais conhecida, Fortaleza dos Reis Magos. Falando sobre esse fato, disse Luís da
Câ mara Cascudo: "era a residência do capitã o-mor, sendo administrativa, comando militar, quartel
e refú gio dos raros moradores. Os soldados moravam dentro do forte e qualquer comoçã o geral
levava os colonos, à s carreiras, para as muralhas imponentes que garantiam o avanço no setentriã o
do Brasil".

Foi nessa fortaleza que moraram e governaram a Capitania do Rio Grande, os capitã es-mores, até a
invasã o holandesa.

Alguns historiadores elaboram listas, procurando estabelecer, por ordem cronoló gica, os
sucessores de Joã o Rodrigues Colaço.

Vicente Lemos escreveu um clá ssico sobre o assunto: "Capitã es-Mores e Governadores do Rio
Grande do Norte". Acontece, entretanto, que permaneceram algumas dú vidas.
Varnhagen, Tavares de Lyra, Vicente Lemos e Câ mara Cascudo classificam como sendo os primeiros
governantes da Capitania do Rio Grande: Manuel Mascarenhas Homem (comandante da expediçã o
que tentaria a conquista), Jerô nimo de Albuquerque, Joã o Rodrigues Colaço e novamente Jerô nimo
de Albuquerque. Equívoco que, felizmente, já foi devidamente esclarecido: o primeiro capitã o-mor
do Rio Grande do Norte foi Colaço. Manuel Mascarenhas Homem nã o governou o Rio Grande,
apenas foi o capitã o da conquista que, por sinal, nã o houve, porque a posse foi efetivada através de
um processo de pacificaçã o...

A lista dos governantes do Rio Grande do Norte começa, portanto, com Joã o Rodrigues Colaço,
sendo que Jerô nimo de Albuquerque governou apenas uma só vez!

Os sucessores desses dois foram os seguintes: Lourenço Peixoto Cirne, Francisco Caldeira de
Castelo Branco, Estevã o Soares de Albergaria, Ambró sio Machado de Carvalho. Como sucessor
desse ú ltimo, era apontado, por alguns, Bernardo da Mota. Hoje, o equívoco foi corrigido: o sucessor
de Ambró sio Machado de Carvalho foi, na realidade, André Pereira Temudo, que foi nomeado a 18
de março de 1621.

Tavares de Lyra pergunta: "Quem substituiu Francisco Gomes de Melo?", para depois, com base no
que escreveu Domingos da Veira, ele mesmo responder: "a ordem de sucessã o foi esta: Francisco
Gomes de Melo, Bernardo da Mota, Porto Carreiro".

Câ mara Cascudo, escrevendo em 1961, confirma Tavares de Lyra. Depois de Francisco Gomes de
Melo, os sucessores foram: Bernardo da Mota e Cipriano Porto Carreiro.

Quando os holandeses atacaram o Rio Grande, Pero Mendes de Gouveia governa a capitania.

Os Holandeses no Brasil: A Bahia

A primeira tentativa de implantar uma colô nia no Brasil, pelos neerlandeses, foi na Bahia. Os
armadores holandeses conheciam o Brasil, mantendo relaçõ es amistosas com os portugueses,
durante os reinados de Joã o III, D. Sebastiã o e o cardeal D. Henrique. Com a anexaçã o de Portugal e
suas colô nias pela Espanha, a situaçã o mudou. Felipe IV, inimigo dos Países Baixos, determinou "o
confisco dos navios flamengos que estivessem nos portos de seus novos domínios, europeus,
africanos, asiá ticos e americanos".

Fugitivos da Bahia contaram na Holanda como seria fá cil conquistar Salvador, devido à
precariedade do sistema montado para defender a colô nia. Um deles, Francisco Duchs, chegou a
participar do ataque que resultou na capitulaçã o da Bahia, em 1625. Guilherme Usselinex, porém,
foi quem "propô s e defendeu a idéia da formaçã o de uma nova companhia, semelhante à Oriental,
que na Índia havia adquirido tantos lucros e vantagens", como disse Varnhagen.

O sonho de dominar o Brasil era antigo, porém, como desfrutavam de lucros com a participaçã o no
comércio, durante o governo português deixaram de lado tal idéia. Agora, a situaçã o era diferente.
Os espanhó is se apresentavam como inimigos. Deviam, portanto, aproveitar a oportunidade para se
apossarem do Brasil foi a criaçã o da Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais, pela Carta
Patente de 3 de junho de 1621.

A companhia decidiu atacar a Bahia, mas precisamente Salvador, capital da colô nia, que, segundo
eles, arrecadava 8.000 florins anuais....

E, como narra Varnhagen, "equipou-se uma grande armada de que foi nomeado almirante Jacob
Willekens, vice-almirante o bravo e venturoso Pieter Pieterzoon Heyn, e comandante das tropas e
governador das futuras conquistas Johan Van Dorth. Consatava a expediçã o de vinte e três iates,
armados com quinhentos e nove bocas de fogo, tripulados de mil e seiscentos marinheiros e
guarnecidos de mil e setecentos homens de desembarque".
A notícia de que a Holanda iria atacar a Bahia chegou ao Brasil. O governador geral, Diogo de
Mendonça Furtado, procurou tomar todas as providências, porém, encontrou dificuldades, até
mesmo má vontade, como era o caso do bispo D. Marcos Teixeira.

A 8 de maio de 1624 os holandeses chegaram a Salvador e, apó s dois dias de luta, dominavam a
cidade. Preso Diogo de Mendonça Furtado, Johan Van Dorth passou a governar. Os batavos,
contudo, nã o foram felizes. O povo que havia abandonado a cidade, passado o susto, procurou
reagir, crescendo a figura de D. Marcos Teixeira, apesar de sua idade bastante avançada. Esgotado,
nã o suportou as vicissitudes e veio a falecer.

Os holandeses, entretanto, tiveram também suas baixas. Cedo perderam o cel. Van Dorth. O seu
substituto, Albert Schenteu, também morreu, sendo sucessor Wielen Schauten. Matias de
Albuquerque, em Pernambuco, assumiu o governo da colô nia e enviou para a Bahia um reforço, sob
o comando de Francisco Nunes Marinho.

A metró pole mandou uma esquadra, chefiada por D. Francisco de Moura. A armada, depois de
passar por Pernambuco, foi para a Bahia, onde realizou o cerco de Salvador. Era preciso, contudo,
muito mais.

Filipe II, diante da repercussã o negativa pela grande derrota, cuja conseqü ência foi a perda da
Bahia, resolveu tomar uma decisã o mais firme e, entã o, enviou ao Brasil a maior expediçã o militar
que atingiu o continente americano até aquele momento, com mais de 12.000 homens e 70 navios,
ficando conhecida na Histó ria como "Jornada dos Vassalos". D. Fadrique de Toledo Osó rio assumiu
o comando. Da expediçã o participaram nã o somente militares das duas nacionalidades, Espanha e
Portugal, como figurar ilustres.

No dia 22 de março de 1625, a armada atingiu a Bahia e a 01 de maio Salvador estava libertada.

Os holandeses, contudo, nã o desistiram de se apossar definitivamente do Brasil...

Os Holandeses no Brasil: O Nordeste

A Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais resolveu fazer nova investida contra a colô nia luso-
espanhola. O alvo, agora, seria Pernambuco, com mais de 130 engenhos, cuja safra ultrapassava as
mil toneladas, fazendo de Pernambuco "a principal e mais rica regiã o produtora de açú car do
mundo". No aspecto militar, o Nordeste brasileiro estava desguarnecido e, assim, nã o tinha
condiçõ es de resistir a um ataque de uma grande esquadra.

A notícia sobre uma nova invasã o holandesa ao Brasil se espalhava, rápida, pela Europa. Matias de
Albuquerque, que se encontrava em Madri, foi nomeado "Governador e Comandante Supremo do
Nordeste". O governador geral Diogo Luís de Oliveira recebeu instruçõ es da metró pole para
reforçar e melhorar o sistema de defesa da Bahia e Pernambuco.

Matias de Albuquerque partiu para o Nordeste brasileiro com poucos soldados, um reforço
verdadeiramente ridículo diante da grande ameaça. Ao chegar em Pernambuco constatou que, para
fazer frente aos holandeses, contava apenas com tropas que, na sua maioria, eram integradas por
homens inexperientes... Nã o precisava, portanto, ser vidente ou estrategista militar para prever
que, em caso de uma invasã o em grande escala, haveria de se repetir exatamente o que aconteceu
em Salvador.

No dia 15 de fevereiro de 1630, uma poderosa esquadra holandesa, com mais de 50 navios e 7.000
homens, sob a chefia de Hendrick Cornelizon Loncg, atacou Recife com toda sua força. Resistência
heró ica, porém, ineficaz e, assim, a 3 de março, caíram Olinda e Recife. Mas Matias de Albuquerque
nã o desistiu e, adotando a tá tica de guerrilha, concentrou suas forças no Arraial do Bom Jesus. Os
colonos levaram uma grande vantagem: conheciam a terra e atiravam desse fator o má ximo que
podiam, impedindo, ou melhor, retardando a vitó ria dos flamengos.
A 20 de abril de 1632 ocorre um fato que vai mudar o destino da guerra: a deserçã o, para o lado dos
invasores, de Domingo Fernandes Calabar. Profundo conhecedor da regiã o, passou a fornecer as
informaçõ es que os neerlandeses precisavam e, dentro em breve, ampliaram o seu domínio,
destruindo inclusive o Arraial do Bom Jesus.

A guerra trazia enormes prejuízos. A Companhia das Índias Ocidentais resolveu enviar o conde Jos'r
Maurício de Nassau Siegen, com amplos poderes para pacificar a populaçã o e promover o
desenvolvimento da colô nia, para enfim adquirir os tã o sonhados lucros. Começava outra fase da
dominaçã o holandesa.

O conde de Nassau veio com o título de "Governador Capitã o General e Almirante de Terra e Mar".
Vinha, portanto, para administrar e consolidar a conquista. Chegou no dia 23 de janeiro de 1637 no
Recife. E se apaixonou pelo País dos mais belos do mundo.

O conde de Nassau era, no dizer de Jânio Quadros, uma "figura do renascimento, amigo e protetor
de letrados e artistas e comprazendo-se na sua companhia, seria ainda um administrador capaz,
culto, enérgico e generoso".

Nassau, apesar de ter feito uma grande administraçã o, contudo, nã o se encontra isento de críticas.
Hélio Viana apresentou, de maneira objetiva, o outro lado da personalidade do governante
holandês: "interesseiramente protegeu os judeus, que para isso pagavam-lhe uma contribuiçã o, a
ponto de suscitar reclamaçõ es. E teve motivos inconfessá veis para amparar os calvinistas, pois uma
de suas amantes no Brasil foi exatamente a filha do respectivo pastor. Quanto aos cató licos, se por
interesse político durante algum tempo permitiu seu culto, nã o tardou a persegui-los, expulsando
do territó rio ocupado".

Trouxe consigo artistas, (Frans Jasz Post) e cientistas (Jorge Marograv e Wielen Piso), ganhando
fama de mecenas.

Entre seus feitos podem ser citados os seguintes: apoio os senhores de engenho, tomando medidas
que asseguravam uma melhor produçã o de açú car; reformulou a administraçã o pú blica; procurou
acalmar os â nimos dos portugueses; proibiu que se cobrasse juros de 18% ao ano, além de
promover diversã o para o povo.

Na á rea militar, realizou algumas conquistas (Alagoas, Ceará, Sergipe), porém sofreu um grande
revés na Bahia. O governo espanhol, satisfeito com essa grande vitó ria, resolveu premiar os que
nela se destacaram; Bagnuolo foi feito príncipe de Ná poles, a D. Antô nio Felipe Camarã o foi
entregue uma comenda, a dos Moinhos de Soure etc.

A derrota de Nassau despertou Madri que organizou uma grande esquadra, sob o comando do
Conde da Torre, D. Fernando Mascarenhas, para socorrer a colô nia.

No dia 12 de janeiro de 1640, ocorreu o primeiro combate entre a esquadra do Conde da Torre e a
holandesa, comandada pelo almirante Corweliszoon Loos e, apó s alguns combates - sem que
houvesse uma batalha decisiva -, o Conde da Torre desembarcou em Touros, Rio Grande do Norte,
mais de mil homens "sob comando do Mestre de Campo Luís Barbalho Bezerra, destemido cabo de
guerra que iria agora - numa travessia de centenas de léguas, em busca da Bahia, por trilhas
desconhecidas, em territó rio ocupado por conquistadores desalmados e bá rbaras gentes, sem
recurso de qualquer natureza, forçado pela necessidade e estimulado pelo patriotismo a escrever
uma das pá ginas mais gloriosas da histó ria da luta com os invasores", segundo conta Tavares de
Lyra.

Na altura do Potengi, Gartsmanm combate os comandados de Luís Barbalho Bezerra. É derrotado e


preso sendo levado como prisioneiro para a Bahia.

Informa Tavares de Lyra: "A 15 de fevereiro de 1641, chega a notícia da restauraçã o de Portugal".
Com D. Joã o IV assumindo o trono de Portugal, estava desfeita a "Uniã o Peninsular"...
Em 1642, Portugal assinou uma trégua com a Holanda. A 18 de abril desse ano, Nassau foi
notificado que deveria voltar à Europa em 1643. Recebeu muitas homenagens, partindo somente
em 1644.

A Insurreição Pernambucana

Alguns colonos estava descontentes com o domínio holandês, ainda na administraçã o de Nassau.
Devido ao regime, muito duro, imposto pela Companhia das Índias Ocidentais. Por outro lado, apó s
a trégua com a Holanda, Portugal almejava a devoluçã o de suas colô nias, porém, a Holanda nã o
concordava. Gerando, assim, um clima de hostilidade entre os dois impérios. Diante do impasse, o
governo português começou, secretamente, a fomentar a revolta nas terras ocupadas.

Em 1642, André Vidal de Negreiros e Joã o Fernandes Vieira já confabulavam, animados com a
restauraçã o do Maranhã o. Nã o estavam sozinhos. O governador geral Antô nio Teles da Silva enviou
em 1644, experientes militares, liderados por Antô nio Dias Cardoso, para Pernambuco, para que
atuassem como instrutores. Ainda nesse ano, André Negreiros e Joã o Fernandes, juntos elaboravam
um plano para iniciar a reaçã o contra os holandeses, tudo feito secretamente porque a trégua entre
Holanda e Portugal nã o permitia se agisse à s claras. Dentro desse contexto, em 1644, Henrique Dias
e seu batalhã o negro seguiam da Bahia para Pernambuco, como se estivessem fugindo. E, logo
depois, D. Antô nio Felipe Camarã o, com seus nativos, segue o mesmo rumo, oficialmente
perseguindo os fugitivos ...

Em 15 de maio de 1645, Joã o Fernandes Vieira e Antô nio Cavalcanti, na vá rzea de Capibaribe.
Assumiam um compromisso para lutar "em nome da liberdade divina". Pouco dias depois, ou seja,
23 de maio, os dois juntamente com outras personalidade (16), assinavam um documento onde
demonstravam sua disposiçã o de lutar pela "restauraçã o de nossa pá tria".

A insurreiçã o começou no dia 3 de junho de 1645, na vá rzea do Capibaribe. Em agosto, os


comandados de Joã o Fernandes Vieira ultrapassavam mil homens!

Entre as batalhas que obtiveram maior significaçã o podem ser apontadas: a de Tabocas, em 1645,
quando os revoltosos venceram os batavos do coronel Hans e do capitã o Blauer. E as duas batalhas
de Guararapes. A primeira, em 19 de abril de 1648, com os revoltosos sendo chefiados pelo mestre-
de-campo general Francisco Barreto e, ainda, as tropas de André Vidal, de Henrique Dias, de
Antô nio Felipe Camarã o e de Vieira. Os holandeses tinham no tenente-general Sigismundo von
Schoppe seu principal líder. A vitó ria sorriu para os coloniais. A segunda, que se realizou em 18 de
fevereiro de 1649, foi mais uma derrota dos neerlandes. Era, praticamente, o fim do domínio
holandês no Brasil.

A Holanda passava por uma crise, estando envolvida na "Guerra de Navegaçã o" contra os ingleses,
forçando desviar a atençã o e recursos que seriam destinados ao Brasil. A Inglaterra, interessada na
destruiçã o de sua rival, passou a ajudar a colô nia portuguesa em sua luta contra os batavos. Através
do "Ato de Navegaçã o", de Cromwell, ficaram os holandeses sem liberdade de açã o no mar, onde até
aí haviam gozado de inegá vel supremacia', como disse Hélio Vianna.

A expulsã o dos holandeses foi, sobretudo, uma grande vitó ria dos portugueses, mestiços e, também,
uma bela participaçã o de negros e nativos. Fez nascer, ou pelo menos reforçou, o sentimento
nativista, nacionalista. Demonstrou toda a força de um novo tipo que estava nascendo: o brasileiro,
e lançava as bases de uma futura naçã o independente: o Brasil.

A Preparação Para Conquistar o RN

A Fortaleza da Barra do Rio Grande, pela sua beleza, impunha respeito. Os holandeses sabiam da
importâ ncia de cunho estratégico daquele edifício militar. Possuíam, ao mesmo tempo, um certo
temor. Começar, entã o, a recolher o maior nú mero de informaçõ es para elaborar um plano eficaz
para capturá -la.
A 19 de julho de 1625, o capitã o Uzel Johannes de Laet fez um reconhecimento, encontrando no Rio
Grande um engenho e muito gado.

Em 1630, Adriano Verbo vinha com a "missã o especial de ver, ouvir e cantar", como resumiu
Câ mara Cascudo. Mesmo com essas informaçõ es, os flamengos nã o se arriscaram a armar uma
esquadra e tentar se apossar da fortaleza.

No outro ano, o nativo Marcial, fugitivo dos portugueses, se apresentou ao Conselho Político do
Brasil Holandês. Objetivo: realizar uma aliança com os batavos. Fornecendo, naturalmente,
preciosos dados aos flamengos. O Conselho Político, contudo, foi prudente... Enviou Elbert Simient e
Joost Closte ao Rio Grande, em 1631, para adquirir maior conhecimento da regiã o.

Foi nessa expediçã o que os batavos conseguiram, por sua sorte, importante dados que se
encontravam em poder dos portugueses e que facilitaram, posteriormente, a conquista do Ceará. Os
documentos se encontravam com um português chamado Joã o Pereira, que foi morto.

Tentativas de Conquista

O Fracasso do Primeiro Assalto

Apó s tantos estudos, os holandeses decidiram, finalmente, realizar a conquista do Rio Grande.

Narra Câ mara Cascudo: "A 21 de dezembro de 1631 partiram do Recife quatorze navios, com dez
companhias de soldados veteranos. Dois conselheiros da Companhia assumiram a direçã o suprema,
Servaes Carpenter e Van Der Haghen. As tropas eram comandadas pelo Tenente-Coronel Hartman
Godefrid Van Steyn-Gallefels. Combinaram desembarcar em Ponta Negra, três léguas ao sul de
Natal, marchando sobre a cidade".

O capitã o-mor Cipriano Pita Carneiro reagiu, ordenando que seus liderados abrissem fogo contra os
invasores. Os holandeses, contudo, desistiram de realizar a conquista. Depois, passaram por
Genipabu, agindo como verdadeiros salteadores, legando duzentas cabeças de gado...

Fracassou, assim, a primeira tentativa dos flamengos para dominar o Rio Grande.

A Rendição e a Tomada da Fortaleza

Ao que parece, os holandeses temiam encontrar uma fonte resistência por parte dos defensores da
fortaleza. Precisavam conquistar o Rio Grande, sobretudo porque a captura desta capitania
significava a soluçã o para o abastecimento de carne bovina para os batavos. Richshoffer, quando
esteve em Genipabu, nã o escondeu o seu entusiasmo: "consumimos mais carne fresca do que no
decurso de todo o ano anterior"...

Em 1632, nã o se realizou nenhum ataque.

Por que a tomada da fortaleza foi tã o fá cil?

A Fortaleza da Barra do Rio Grande estava apenas com um efetivo de oitenta homens, sendo seu
capitã o-mor Pero Mendes de Gouveia, que lutou como um bravo, mas cometeu um erro que lhe
seria fatal: abandonou as dunas pró ximas da fortaleza. Essas dunas deveriam ser defendidas. Caso
contrá rio, se os inimigos colocassem ali sua artilharia, transformariam aquele edifício num alvo
fá cil de ser atingido. Foi exatamente o que aconteceu.

O capitã o-mor Pero Mendes Gouveia agiu como se acreditasse que as muralhas da fortaleza fossem
inexpugná veis... Erro tá tico, que o levou para uma derrota ingló ria...
Os holandeses, ao contrá rio dos lusitanos, agiram como verdadeiros profissionais da guerra,
segundo interpretaçã o de Hélio Galvã o: "A operaçã o foi pré-traçada, dentro do quadro militar
rígido: uma operaçã o combinada".

No dia 5 de dezembro de 1633, partiu do Recife a esquadra sob o comando do almirante Jean
Cornelis Sem Lichtard. Comandava as tropas o tenente-coronel Baltazar Bijma.

Afirma Câ mara Cascudo: "Todo o dia 9 é de artilharia. Os holandeses montam as peças de 12 libras
e os morteiros lança-granadas erguem trincheiras com cestõ es e sobem os canhõ es para os morros,
a cavaleiro do forte. De lá atiram, quase de pontaria, desmontando as peças portuguesas. Assim 10,
com trocas de descargas, gritos, toque de cornetas e granadas. Dia 11 foi a mesma tarefa".

Tenente-coronel Bijma intimou o capitã o-mor Pero Mendes Gouveia para que se rendesse, através
de uma carta. Resposta de Gouveia: "V. Excia. deve saber que este forte foi confinado à minha
guarda por S.M. Cató lica e só a ela ou alguém de sua ordem o posso entregar". Atitude heró ica,
porém inú til. A artilharia flamega, montada nas dunas pró ximas da fortaleza falava mais alto...

Segunda-feira, dia 12 hasteada a bandeira branca pelos sitiados. O capitã o-mor Gouveia estava
gravemente ferido. Por essa razã o, nã o participou das negociaçõ es para a entrega da fortaleza ao
inimigo. Enfermo, nã o possuía mais o comando. Fala-se, inclusive, em traiçã o... Na realidade, as
negociaçõ es da rendiçã o foram realizadas por pessoas estranhas, como registra Hélio Galvã o:
'Sargento Pinheiro Coelho, foragido de uma prisã o na Bahia; Simã o Pita Ortigueira, preso na
fortaleza, condenado à morte; Domingos Fernandes Calabar, que viera na expediçã o".

Caía a Fortaleza da Barra do Rio Grande. Começava, a partir daquela data, o domínio holandês no
Rio Grande do Norte.

Os Massacres

A Destruição na Capela de Cunhaú

Segundo Câ mara Cascudo, "o engenho Cunhaú foi construído na sesmaria dada por Jerô nimo de
Albuquerque em 2 de maio de 1604 aos seus filhos Antô nio e Matias. Constava de 500 quadradas na
vá rzea de Cunhaú e mais duas léguas em Canguaretama".

No início do século, o engenho exportava açú car para Recife. Possuía um fortim, sob o comando do
capitã o Á lvaro Fragoso de Albuquerque. Foi construído por marinheiros de Dunquerque.

Esse fortim foi atacado, vencido e destruído pelo coronel Artichofski, em outubro de 1634.

A Companhia confiscou o engenho de Antô nio Albuquerque Maranhã o.

Depois, o engenho passou por vá rias mã os.

No dia 15 de julho de 1645, sá bado, Jacob Rabbi apareceu em companhia dos janduís, liderados por
Jererera, no engenho de Cunhaú . A simples presença dos tapuias e de potiguares causou pânico na
populaçã o.

Jacob Rabbi trazia instruçõ es de Paul Linge. Publicou um documento, convidando a populaçã o para,
no domingo, comparecer à capela para participar de uma reuniã o, quando seriam transmitidas
determinaçõ es do Conselho Supremo.

A capelinha tinha como padroeira Nossa Senhora das Candeias.

A maioria do povo atendeu ao convite, lotando o templo. Tiveram, entretanto, que deixar suas
armas do lado de fora.
O padre André de Soveral, paulista de Sã o Vicente, missioná rio e tupinó logo, começou a celebrar a
missa, considerando que a reuniã o seria realizada apó s o ato religioso. Possuía entre 70 e 90 anos.
Era muito querido pelos seus paroquianos.

Os nativos se aproximaram da capela. Fecharam as portas. Os fiéis compreenderam o que iria


acontecer. Tarde demais. Quando o padre André Soveral elevou a hó stia, era o sinal combinado,
começou o massacre. As vítimas mal tiveram tempo de pedir perdã o de seus pecados. Gritos,
sú plicas, gemidos.

Alguns tapuias procuraram atingir o sacerdote, André Soveral, entã o, disse:

- "Aquele que tocar no padre ou nas imagens do altar terá os braços e as pernas paralisados!"

Os tapuias recuaram, porém Jererera acertou um golpe violento no sacerdote, que caiu. Ainda
conseguiu se erguer, mas por pouco tempo, tombando sem vida. Morreram, ao todo sessenta e nove
pessoas.

A notícia se espalhou, provocando revolta. Iniciando, pouco depois, a fase das represá lias. Em
outubro de 1645, apareceu o capitã o Joã o Barbosa Pinto, matando holandês, com fú ria selvagem.
Em janeiro de 1646, Felipe Camarã o e o capitã o Paulo da Cunha só nã o fizeram o mesmo porque
nã o encontraram inimigo para matar.

Apó s a expulsã o dos holandeses, em 1645, a capela foi reconstruída pela família Albuquerque
Maranhã o, conforme registrou Fernando Tá vora.

Ataque a um Arraial Fortificado

Apó s o massacre de Cunhaú , os colonos, receosos de um novo ato de violência, procuraram se


refugiar na casa-forte de Joã o Lostã o Navarro, casado com Luzia da Mota, cuja filha Beatria Lostã o
se casou com Joris Gardtzman (governante holandês no Rio Grande).

Segundo Olavo Medeiros Filho, o Grande Conselho Holandês mandou prender Joã o Lostã o Navarro,
apontado como líder do movimento rebelde contra a dominaçã o flamenga.

Numa regiã o pró xima de Natal foi construído um arraial fortificado, que abrigava famílias, inclusive
com seus escravos.

Os holandeses, temendo que aquele nú cleo de luso-brasileiros se transformasse num forte centro
de resistência e, ainda , obedecendo ordens vindas de Recife, resolveram destruir aquele arraial.
Jacob Rabbi e seus aliados foram enviados para realizar tal missã o. Era setembro de 1645.

Da mesma maneira como agiu em Cunhaú , Jacob Rabbi solicitou a entrega das armas e exigiu a
rendiçã o. Os luso-brasileiros nã o aceitaram tais ordens. As armas eram para a defesa contra os
nativos. Rabbi insistiu na rendiçã o. Criado o impasse, começo o ataque. Foram três investidas sem
êxito. O judeu-alemã o, no firme propó sito de acabar com aquela resistência, foi ao Castelo Ceulen
(ou Keulen, como os holandeses passaram a chamar a Fortaleza dos Reis Magos) e retornou com
um tenente e dois canhõ es.

Os sitiados, para evitar um novo massacre, resolveram se entregar, depondo as armas.

Seguiram para a Fortaleza, como reféns, as seguintes pessoas: Estevã o Machado de Miranda,
Francisco Mendes Pereira, Vicente de Souza Pereira, Joã o da Silveira e Simã o Correia.

Era 1 de outubro de 1645.

Torturas Lendárias de Uruaçu


Nenhum massacre tinha ocorrido apó s o de Cunhaú e nã o havia, igualmente, sinais de algum
levante pró ximo ao Rio Grande.

Acontece que, no dia 2 de outubro de 1645, chegou de Recife o conselheiro Bullestraten. E se


reuniu, secretamente, com Gatdtzman. Tudo indica que trazia ordens para executar os portugueses.

Pelo menos, os acontecimentos futuros levaram a pensar em tal hipó tese.

No dia seguinte, 3 de outubro de 1645, os colonos que se encontravam no Castelo Ceulen foram
levados para Uruaçu: Antô nio Vilela, Cid, seu filho, Antô nio Vilela Jú nior, Joã o Lostau Navarro,
Francisco de Bastos, José do Porto, Diogo Pereira, Estevã o Machado de Miranda, Francisco Mendes
Pereira, Vicente de Souza Pereira, Joã o da Silveira, Simã o Correia e o padre Ambró sio Francisco
Ferro, que exercia as funçõ es de vigá rio de Natal.

Ao chegar em Uruaçu, a tropa formou um quadrado e, no interior desse quadrado, ficaram o


sacerdote mais os colonos. Foi dada a seguinte ordem: que eles se despissem e se ajoelhassem. Os
portugueses compreenderam, entã o, o que iria acontecer. O padre Ambró sio Ferro, com
tranqü ilidade, deu a absolviçã o.

O pastor Astetten fez uma exortaçã o para que os prisioneiros abjurassem a fé cató lica. Obteve,
entretanto, uma resposta negativa de todos, numa atitude firme e corajosa dos portugueses. Os
colonos se despediram uns dos outros, praticando atos de devoçã o. Isso irritou profundamente o
pastor e seus companheiros. Começaram a torturar as vítimas com tanto ó dio, que somente o
fanatismo religioso poderia explicar tal insanidade. Nã o ficam satisfeitos. Jacob Rabbi chamou os
nativos para que eles completassem o massacre. Fizeram corpos em pedaços. Arrancaram olhos,
línguas, etc.

Esse foi apenas o primeiro ato. O segundo nã o demoraria muito tempo.

Os holandeses se dirigiram até o arraial, afirmando que chegaram ordens do Supremo Conselho,
determinado que eles deveria assinar alguns documentos. Os homens se despediram de seus
familiares, chorando, porque sabiam que iriam caminhar para a morte. Durante o caminho,
rezavam. Os pressentimentos se realizaram.

Os cronistas fizeram relatos minuciosos. Narram, entre outros detalhes, o seguinte:

"Antô nio Baracho foi amarrado a uma á rvore e arrancam-lhe, quando ainda estava vivo, a língua.

Abriram o corpo de Matias Moreira e tiraram o seu coraçã o. Antes de morrer, ele disse: "Louvado
seja o Santíssimo Sacramento".

Espatifaram, com o pau, a cabeça de uma criança, filha de Antô nio Vilela.

A filha de Francisco Dias teve o seu corpo partido em duas partes.

A mulher de Manuel Rodrigues Moura, depois que o marido morreu, teve cortado os pés e as mã os.
A vítima sobreviveu, ainda, três dias ao lado do marido morto.

Os nativos procuraram salvar oito rapazes. Os holandeses ofereceram uma oportunidade para que
os jovens conseguissem a liberdade: eles teriam que passar para o lado dos holandeses. Joã o
Martins deu a seguinte resposta: "nã o me desamparará Deus dessa maneira, a minha Pá tria e o meu
rei. Matai-me logo, pois tenho inveja da morte e da gló ria dos meus companheiros".

Uma moça, muito bonita, foi vendida aos nativos, ou melhor, trocada por um cã o de raça.
Dois jovens, Manuel Á lvares e Antô nio Bernardes, com vá rias feridas, puxaram suas armas brancas,
investindo contra os tapuias, matando alguns inimigos antes de morrer.

Uma menina, de nome Adriana, ao saber que seus pais seriam mortos, se recolheu a uma casa,
chorando, em seguida. Foi quando a Virgem Santíssima apareceu, procurando consolar aquela
criança. E prometeu que seus pais seriam vingados".

Pouco tempo depois, Camarã o foi até o Rio Grande, punindo, com energia, os batavos.

"D. Beatriz, esposa de Joris Gardtzman, comandante do Castelo Ceulen, por piedade crista, levou as
viú vas dos portugueses que tinham falecido em Uruaçu, para Natal.

Durante a noite, Gardtzman e sua mulher, juntamente com outros holandeses, ouviram uma mú sica,
belíssima vindo do local onde ocorreu o morticínio".

Nã o se discute, até hoje, a veracidade dessas informaçõ es. Diferem apenas em alguns detalhes. No
essencial, ou seja, que os holandeses promoveram dois grandes massacres, liderados por Jacob
Rabbi, com a participaçã o dos janduís, constituem um fato indiscutível. Com relaçã o aos dois
ú ltimos itens é que, de uma maneira geral, existem dú vidas, colocando, ambos no plano das lendas,
fruto do espírito religioso e da ingenuidade do povo daquela época.

Na atualidade, contudo, é preciso ir além dos simples relatos para fazer uma aná lise de toda a
problemá tica.

Uma Pequena Análise Sobre as Ações Cruéis

Os massacres que os flamengos promoveram no Rio Grande do Norte nã o constituem um caso


isolado da colonizaçã o européia (ingleses, franceses, espanhó is, portugueses e holandeses), nas
terras americanas. Herbert Aptheker, resumiu numa palavra de açã o inglesa, com relaçã o aos
nativos: GENOCÍDIO!

Frei Bartolomeu de Las Casas, como lembra Eduardo Bueno, chamou os espanhó is de "sujos
ladrõ es", "tiranos cruéis" e "sangrentos destruidores".

Georgi Friederici, em texto citado anteriormente no fascículo I desta coleçã o, descreve com
realismo como foi feita a conquista de Ceuta pelos portugueses.

Os conquistadores nã o respeitavam nada, interessados apenas em conseguir ouro e, na falta desse


metal, qualquer mercadoria que desse lucro... Tudo dentro da filosofia mercantilista.

Os europeus se julgavam detentores da "civilizaçã o" nas terras incultas da América, agiram como se
fossem verdadeiros bá rbaros...

No caso específico do Rio Grande, porém, ocorreram determinadas circunstâ ncias, que merecerem
algumas observaçõ es.

Em primeiro lugar, os flamengos resolveram eliminar duas coisas ao mesmo tempo: os portugueses
e a religiã o cató lica. O morticínio de Cunhaú , por exemplo, foi realizado dentro de uma capela,
durante uma missa, justamente na hora em que o celebrante erguia a hó stia, numa demonstraçã o
clara de desmoralizaçã o da religiã o das vítimas.

Em Uruaçu nã o havia um templo cató lico. Existe, entretanto, a presença de um pastor que pretendia
os cató licos para a sua doutrina. A recusa firme dos colonos em mudar de crença, provocou nos
holandeses um ó dio insano, inclusive do pastor que, de maneira incompreensível, participou do
processo de tortura. Fizeram coisas terríveis com o vigá rio Ambró sio Francisco Ferro, quando ele
ainda estava vivo. Somente um ó dio muito grande justificaria tal atitude. Provocado pelo fanatismo
religioso.

Outro aspecto, que nã o é possível esquecer: os holandeses só iniciavam o massacre quando estavam
certos de que as vítimas nã o tinham a menor chance de reagir. Apareciam com promessas de paz
para, desarmadas as vítimas, praticarem a violência.

Nã o foi igualmente uma luta de um povo dominado contra seu opressor. Nã o a iniciativa partiu do
dominador para eliminar o povo subjugado. Os janduís receberam ordem para matar. Agiram como
soldados. Dentro de um contexto onde a violência fazia parte do existir. Os batavos, sem dú vida,
contrariaram os seus princípios, ou seja, "nã o matar", que dizer, massacrar! E até a maneira de viver
de pessoas CIVILIZADAS ...

A Igreja Cató lica do Rio Grande do Norte iniciou, recentemente, um processo para a canonizar os
má rtires de Cunhaú e Uruaçu.

A questã o deve ser colocada da seguinte maneira: as vítimas foram sacrificadas porque nã o
renunciaram à sua fé ou, na realidade, porque defenderam a causa lusitana? Eliminar o português
teria sido um problema político. Acontece que matar mulheres e crianças inocentes, sem nenhum
envolvimento político, nã o é justificá vel, a nã o ser pelo ó dio do grupo dominador ao catolicismo.

Estava tudo preparado. Os tapuias só entrariam em cena caso os colonos nã o aceitassem passar
para o lado flamengo e renegassem a fé dos dominadores. Foi, ao mesmo tempo, uma demonstraçã o
de patriotismo e, sobretudo, de fé. Quando tomaram consciência de que seriam mortos,
pronunciaram frases como, por exemplo, "LOUVADO SEJA O SANTÍSSIMO SACRAMENTO".

Nã o se pode, também, colocar Jacob Rabbi como o ú nico responsá vel. Apó s o morticínio de Cunhaú ,
ele deveria ter sido afastado de suas funçõ es. Nã o foi, entretanto, demitido, por uma razã o muito
simples: os holandeses precisavam de Rabbi e da presença dos janduís para, pelo terror, assegurar
o domínio do Rio Grande. Os holandeses optaram, portanto, pela violência. Antes dos massacres,
vieram ordens de Recife. A conclusã o é clara: o governo holandês, localizado no Recife, é o
responsá vel pelos massacres na Capitania do Rio Grande!

O Fim de Jacob Rabbi e do Morticínio

Existe uma unanimidade entre os historiadores sobre o cará ter violento e desnecessá rio dos
massacres promovidos pelos batavos, e seus aliados janduís, na Capitania do Rio Grande.

A execuçã o dessas matanças foram comandadas, como já foi demonstrado, pelo judeu-alemã o Jacob
Rabbi, que veio para o Brasil com o conde Joã o Maurício de Nassau, em 1637, originá rio de
Waldeck.

Para Câ mara Cascudo, ele era violento e astuto, cruel e sem escrú pulo, saqueador e mandante de
assassinatos, é a figura mais sinistra e repelente do domínio holandês no Nordeste brasileiro,
denegrida e acusada por todos os historiadores do seu tempo".

Olavo de Medeiros Filho completa o perfil de Jacob Rabbi, afirmando que o judeu-alemã o possuía
"certa cultura, poliglota (pelo menos falava os idiomas alemã o, holandês, português, tupi e taraiui).
De sua pena deixou uma crô nica famosa, ou relaçã o de viagem contendo preciosas informaçõ es
sobre a geografia da capitania, bem como sobre a etnografia dos tapuias".

Câ mara Cascudo chama a atençã o para outro aspecto: "todos os assaltos, saques, tropelias,
morticínios dos janduís rendiam gado, roupa, jó ias, ao amigo Rabbi". Como resultado, o judeu
conseguiu acumular uma pequena fortuna.

Jacob Rabbi permaneceu durante quatro anos vivendo entre os selvagens. Com o passar do tempo,
crescia a afinidade entre o europeu e os tapuias, Rabbi foi assimilando os costumes nativos. Passava
por um processo de indianizaçã o. De fato, na interpretaçã o de Câ mara Cascudo, "o só rdido e
desconfiado europeu inteligente e branco, que era por dentro um cariri autêntico, desde o
temperamento aos costumes diá rios".

Rabbi vivia com uma nativa, de nome Domingas, num sítio de sua propriedade, chamado "Ceará ".
Segundo Olavo de Medeiros Filho, "o sítio corresponde atualmente à localizaçã o denominada Araça,
ribeira do Ceará -Mirim entre Massagana e Estivas, e mesmo ao norte da cidade de Extremoz".

No massacre de Uruaçu, foi morto Joã o Lostau Navarro, sogro de Gardtzman que, revoltado, decidiu
se vingar, afirmando "que o mundo nada perderia se desembaraçassem de semelhante canalha".
Chegou, inclusive, a entrar em contato com dois homens para que matassem Jacob Rabbi. Primeiro
foi com Wilhelm Jansen, que colocou uma série de dificuldades. A outra pessoa foi Roeloff Baron,
que concordou em realizar a sinistra missã o, caso recebesse ordens do Alto Conselho Secreto.
Nesses contatos, portanto, Gardtzman nã o conseguiu efetivar seu intento. Mas nã o desistiu de
eliminar Rabbi.

Mais adiante, convidou o seu desafeto para uma reuniã o, com a finalidade de promover um
entendimento e esquecer as má goas passadas. O judeu-alemã o aceitou, finalmente, participar de
uma ceia que aconteceria na casa de Dirk Mulden Van Mel, a qual, segundo Câ mara Cascudo, estava
localizada nas proximidades de Refoles. Olavo Medeiros afirma que a casa de Muller "fica à margem
direita do entã o chamado riacho Guajaí (á gua dos caranguejos), entre os distritos de Igapó e Santo
Antô nio do Potengi. Dista cerca de 10,5 km da matriz".

Ainda participaram desse encontro outros militares: Wilhelm Becke, Roulox Baro, Jacob de Bolan,
Denys Baltesen, Johannes Hoeck, Wilhelm Tenberghe etc.

Apó s a realizaçã o da conferência ente os dois desafetos, Gardtzman saiu primeiro. Pouco depois é
que Rabbi saiu. E nã o demorou muito tempo para que se ouvissem dois disparos de fuzil. Caía,
mortalmente ferido, Jacob Rabbi. A vítima recebeu, além dos tiros, golpes de sabre que deformaram
partes do cadá ver.

Ficou provado, mais, uma vez, que a violência provoca violência, Jacob Rabbi, que praticou assaltos
e crimes, sendo um dos responsá veis, pelos massacres de Cunhaú e Uruaçu, morreu como
conseqü ência do ó dio, tendo seu corpo deformado por golpes de sabre. Olavo Medeiros descreve a
situaçã o em que o corpo foi encontrado: "Um dos tiros penetra-lhe do lado esquerdo do corpo,
fazendo-lhe um ferimento muito profundo, em que Muller pudera introduzir até o fim dos seus
dedos. A outra bala varara-lhe o lado direito das costelas falsas. Seis golpes de armas branca
haviam-lhe deformado o rosto, a cabeça e o braço direito. Um dos olhos do cadá ver estava aberto;
as suas algibeiras achavam-se voltadas e esvaziadas. Faltava-lhe um anel de ouro, que ainda trazia
no dedo quando se retirara da casa de Muller".

O crime ocorreu na noite de 4 de abril de 1646.

Jacob Rabbi foi sepultado no lugar onde morreu. Gardtzman, ao ser informado do crime,
cinicamente disse:

- "Antes ele do que eu".

Apesar de ter negado se o mandante do crime, ficou provado que houve um acordo entre
Gardtzman e Bolan para matar e depois roubar os bens de Jacob Rabbi.

Domingas foi despojada, totalmente, dos bens de seu companheiro.

Os janduís, decepcionados, voltaram para o sertã o. Nã o houve mais morticínio na Capitania do Rio
Grande.

O Brasão Holandês do Rio Grande


O conde Maurício de Nassau, e, 1639, deu a cada capitania o seu brasã o. O do Rio Grande foi
descrito por Barléu desta maneira: "A província Rio Grande tinha por armas um rio, em cujas
margens pisava ave. Havia, ainda, uma estrela de prata, na parte superior e o mote: velociter".

Para alguns autores, a ema foi escolhida para ilustrar o brasã o, porque essa ave existia em grande
nú mero na referida regiã o. Câ mara Cascudo, contudo, discorda e afirma: "a ema nunca foi em tempo
algum característica da fauna norte-rio-grandenses e especialmente no domínio holandês ". Mais
um argumento apresentado por Câ mara Cascudo" "caso Nassau desejasse colocar algo
característico da capitania, teria, naturalmente, escolhido o gado, uma das razõ es para a conquista
da regiã o". E aponta outro motivo para a escolha da ema: uma homenagem de Nassau a um grande
chefe cariri, Janduí, amigo dos holandeses, desenvolvendo uma argumentaçã o convincente: "Janduí
é o chefe das tropas fiéis, prontas, irresistíveis (...) Janduí é nome tupi, corruçã o de NHANDU, uma
pequena e por autonomia, o corredor, o que corre muito. Daí o lema, VELOCITER", num estudo
publicado na regista do Instituto Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte.

Câ mara Cascudo chegou a dizer o seguinte: "sem Janduí a companhia nã o sustinha o Rio Grande
duas semanas. Natural, portanto, que Nassau prestasse uma homenagem ao fiel amigo. E, ainda, os
janduís eram notá veis pela rapidez com que se deslocavam. Justificando, assim, o mote
"VELOCITER". Razã o, portanto, tem Câ mara Cascudo quando concluiu que "Janduí é a ema do
brasã o holandês no Rio Grande do Norte".

O Governo Holandês no RN

As se apossarem do Rio Grande, os holandeses mudaram o nome da fortaleza para Castelo Ceulen.
Natal passou a se chamar Amsterdã (ou Nova Amsterdã ). Logo apó s a conquista, Joris Gardtzman
assumiu o governo sozinho.

Em 1637 foram criadas as Câ maras dos Escabinos, presididas pelo esculteto, cargo que
correspondia ao de prefeito, na atualidade. Havia ainda os curadores autonomia.

O Rio Grande nã o possuía autonomia administrativa, "dependia da justificaçã o da Paraíba onde


residia um diretor".

Durante o domínio holandês, nada foi feito que dignificasse um governo. Havia somente duas
preocupaçõ es: dominar e explorar economicamente a regiã o. Isso significa dizer eliminar qualquer
resistência, que política, quer religiosa, para assegurar a exploraçã o econô mica. Subjugar pelas
armas para garantir o fornecimento de carne bovina e de farinha. Nesse aspecto, a administraçã o
batava, no Rio Grande, obteve êxito, garantindo o alimento necessá rio para que os invasores
pudessem ser mantidos em Recife. Caso contrá rio, eles teriam duas opçõ es: abandonar Pernambuco
ou morrer de fome...

Como mostra Tarcísio Medeiros, "a mestiçagem continuou no período holandês: a dos bugres com
portugueses ou holandeses, que produzia, no dizer de um cronista flamengo "belos tipos de
mulheres e homens. Do contato de mulheres brasileiras, tanto com portugueses como com
neerlandeses, nascem muitos bastardos, entre os quais nã o raro se encontram formosos e delicados
tipos quer de homens, quer de mulheres". Tarcísio Medeiros transcreveu essa ú ltima parte do texto
do livro de "Histó ria do Brasil", vol. 2. De Ernani Silva Bruno. E cita o testemunho de Gilberto
Freyre: "Seriam tais louros, em alguns casos, restos de normandos ou de flamengos do século XVI".

Em 1654 termina, para a felicidade dos que ainda restavam da populaçã o, o domínio holandês no
Rio Grande. Quando o capitã o Francisco de Figueirora, comandando 850 soldados,. Vinha reassumir
o governo da capitania, o Rio Grande era apenas abandono e ruínas, inclusive a capital que
praticamente foi destruída.

O Potiguar Antonio Felipe Camarão


Existe uma controvérsia na historiografia norte-rio-grandense a respeito de um chefe nativo, dos
potiguares, chamado Poti (Potiguaçu), que ao receber o batismo, passou a se chamar Antô nio Felipe
Camarã o.

Para alguns historiadores, em lugar de um tuixaua, teriam existido dois com o mesmo nome Poti,
sendo que o primeiro participou das negociaçõ es de paz entre portugueses e potiguares na
Capitania do Rio Grande. E o outro, filho dele, se destacou com brilhantismo durante a guerra
contra os holandeses.

Olavo de Medeiros Filho, no seu mais recente livro "Aconteceu na Capitania do Rio Grande",
divulgou parte de uma carta escrita por Felipe Camarã o, que diz o seguinte: "mi Padre fue ator de
loss pazes tan desseadas que mi nacion, y gente hizieron com los portugueses".

Antonio Felipe Camarã o, ao dizer que seu pai foi o autor das pazes, comprovou a existência de dois
chefes potiguares, com o mesmo nome, seu pai e ele.

Segundo o grupo de pesquisadores, o pai seria norte-rio-grandense e o filho teria nascido em terras
pernambucanas.

Essa tese, entretanto, nã o apresenta uma só lida argumentaçã o. A grande prova, apresentada pelos
defensores dessa teoria, é, a existência, na Torre do Tombo, em Lisboa, de um depoimento prestado
por Antonio Felipe Camarã o, num processo instaurado pela Inquisiçã o de Lisboa contra o padre
Manuel de Moraes, quando o chefe potiguar afirmou que morava na aldeia de Meratibi.

O historiador pernambucano Má rio Mello colocou a aldeia de Meraribi (Miritiba) nas terras de sua
família.

Ingenuidade ou simples coincidência?

Pedro Moura constata, através "de uma carta de doaçã o e sesmaria, passada por Ordem do Capitã o
do Rio Grande na Cidade de Natal, em 28 de fevereiro de 1706, SEBASTIÃ O NUNES COLLARES, mais
de três léguas de terra de rio abaixo anexados com s que os religiosos Carmelitas já tinham obtido
anteriormente. Esta fazenda do Carmo está situada à margem da estrada real que vai da cidade de
Assu à cidade de Mossoró , na ribeira do Panema, cujo rio corre e desá gua em territó rio
exclusivamente rio-grandense do Norte, com o mesmo leito que tinha, quando nasceu, viveu e
morreu Potyguaçu.

Apó s transcrever esse texto, Pedro Moura fez o seguinte comentá rio: "Foi nessa ribeira do Panema,
no seu afluente Meiritupe, que se encontrava a aldeia Meretipe ou Meretibe, aonde residia DOM
ANTÔ NIO FELIPE CAMARÃ O, como diz ele no seu depoimento, no processo do padre MANOEL DE
MORAES e foi desse SERTÃ O DONDE DESCEU, trazendo consigo todos os índios que lhe eram
sujeitos, como todas as suas mulheres e filhos, como diz Calado. Meretibe ou Merebiti, aldeia de
potiguares, jamais pertenceu à Capitania de Pernambuco e sim à do Rio Grande. Estava ao lado do
rio do mesmo nome, descoberto por GEDEÃ O MORRIS, com mais outro dois rios, oo lwypanim e
Wararacury, quando lá esteve em 1641".

O Governador dos Índios

Tradição de Bravura Vai de Pai Para Filho

A simples existência de uma aldeia com o nome de Meratibi, em Pernambuco, nã o significa que essa
aldeia tenha sido a povoaçã o à qual dom Antô nio Felipe Camarã o se referiu em seu testemunho. E
mesmo que o historiador pernambucano estivesse certo, a palavra que se encontras no documento
citado é "residia" e, claro, existe uma diferença entre "residir" e "nascer". Esse documento, portanto,
nã o prova que o chefe potiguar tenha efetivamente nascido em Pernambuco...
Meratibi é o nome de uma aldeia pernambucana com grafia semelhante à de outra aldeia potiguar
chamada de Merebiti ou Meretibi. O escritor Má rio Mello aproveitou essa semelhança para forjar a
sua teoria de que Felipe Camarã o teria nascido em Pernambuco.

Outro aspecto que se deve destacar: Luís da Câ mara Cascudo provou que existe no Rio Grande do
Norte uma tradiçã o popular sobre dom Antô nio Felipe Camarã o entre pessoas iletradas, no interior
e na época em que ele realizou a pesquisa, na década de trinta. As mulheres que foram consultadas
desconheciam totalmente a controvérsia sobre Felipe Camarã o. Disse Câ mara Cascudo: "Essa
tradiçã o popular da naturalidade de Camarã o é um ponto de referência de singular força
argumentadora. Nenhum outro Estado disputante de seu berço pode empregar as mesmas armas.
Essa tradiçã o oral só existe no Rio Grande do Norte, onde dom Antô nio Felipe Camarã o é tido como
conterrâ neo".

Caso Felipe Camarã o tenha morado realmente na Mirituba pernambucana - Pedro Moura provou
que nã o -, ele já havia nascido e se encontrava na idade adulta, dirigindo o seu povo. Foi assim que
ele deixou o Rio Grande para lutar contra os holandeses em Pernambuco.

Falta ainda comentar outro argumento a favor da tese pernambucana. Em uma carta, Henrique Dias
disse o seguinte: "Meus senhores Olandeses, meu Camarada o Camarã o nã o está aqui, porém eu
respondo por ambos. Vossas Mercês, saibam que Pernambuco é sua pátria e minha, e que já nã o
podemos sofrer tanta ausência d'ella! Aqui havemos de deitar vossas mercês fora d'ella".

A questã o é fá cil de explicar. Com a palavra, novamente, Pedro Moura: "De fato, Camarã o nasceu
nesta província, isto é, na circunscriçã o naquele tempo criada por D. Diogo de Menezes, Capitania
do Rio Grande do Estado do Brasil", sujeita a um só governo geral, como parte integrante de uma
província militar - Pernambuco".

"Da mesma maneira frei Calado chamou "índios brasileiros, índios da terra, índios pernambucanos",
os nossos índios, indistintamente, nascido na província limitar de Pernambuco, fossem eles
tabajaras, fossem potyguares, fossem cahetés".

Em síntese, a "pá tria pernambucana" nã o significava apenas Pernambuco, porém uma á rea bem
mais ampla que incluía inclusive o Rio Grande. E Antô nio Felipe Camarã o, ao dizer que lutava pela
pá tria pernambucana, estaria também se referindo ao seu pequeno Rio Grande.

Henrique Dias, ao dizer "pátria", nã o estava se referindo exclusivamente à Capitania de


Pernambuco, porque ele nã o pretendia expulsar os holandeses apenas de uma capitania, mas de
todo o Nordeste.

A conclusã o que se extraia de tudo o que foi dito é o seguinte: existiram realmente dois chefes
potiguares, pai e filho, que possuíam o mesmo nome - Poti. O filho foi quem partiu do Rio Grande
para lutar contra os holandeses, em Pernambuco. O que nã o se comprova é que ambos nasceram no
Rio Grande do Norte.

As controvérsias nã o terminam aqui. Antes se imaginava que havia só um Poti. Agora, provado que
existiam dois, nã o fica fá cil esclarecer os fatos em que ambos se envolveram. Quem fez tal
empreendimento, foi o pai ou o filho? É preciso realizar, urgentemente, uma investigaçã o séria
sobre o problema.

Dom Antô nio Felipe Camarã o nasceu, provavelmente, na Aldeia Velha, no ano de 1580.

Com relaçã o ao seu batismo, Nestor Lima aponta para o dia 13 de junho de 1612 e parece estar
certo. Naquele dia, ao se tornar cristã o, o potiguar tomou o nome de Antô nio Felipe Camarã o. O
primeiro nome teria sido uma homenagem ao santo do dia, Santo Antô nio. O segundo nome seria
uma homenagem a Felipe IV, rei da Espanha. E, finalmente, Camarã o, que é traduçã o portuguesa do
seu nome primitivo em tupi: Poti.
No dia seguinte ao do seu batizado, Felipe cassou com uma de suas mulheres que, na pia batismal,
recebeu o nome de Clara. As solenidades do batizado e do casamento foram realizadas em grande
estilo na Capela de Sã o Miguel de Guajerú .

Antonio Soares, no "Dicioná rio Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte", transcreve a opiniã o
de D. Domingas do Loreto: "Na guerra da restauraçã o de Pernambuco, ostentou D. Clara, mulher do
governador dos índios. D. Antô nio Felipe Camarã o, o seu insigne valor com os mais ilustres realces:
porque, armada de espada e broquel, e montada em um cavalo, foi vista nos conflitos mais
arriscados ao lado do seu marido, com admiraçã o do holandez e aplauso dos nossos".

D. Antô nio Felipe Camarã o, além de grande guerreiro, foi igualmente há bil estrategista. Sua maior
vitó ria foi contra o general Arcizewski, que sentiu humilhado ao perder para um chefe nativo. Sã o
suas as seguintes palavras, transcritas por Antô nio Soares, no "Dicioná rio Histó rico e Geográ fico do
Rio Grande do Norte" : "Há mais de quarenta anos - disse o general - que nã o milito na Polô nia,
Alemanha e Flandres, ocupando sem interrupçã o postos honrosos, mas só o índio brasileiro
Camarã o veio abater-me o orgulho".

O valente chefe potiguar, pelo seu desempenho contra os inimigos, recebeu diversas honrarias: o
título de "Dom", dado por Felipe IV; Brasã o de Armas; "Capitã o Mor e Governador de Todos os
índios do Brasil", e as comendas "Cavaleiro da Ordem de Cristo" e dos "Moinhos de Saure".

Dom Antonio Felipe Camarã o morreu, segundo alguns autores, a 24 de agosto de 1648, sendo
sepultado na Vá rzea, em Pernambuco.

A Guerra dos Bárbaros

Um Prenúncio de Forte Tempestade

Apó s a expulsã o dos holandeses, a Capitania do Rio Grande apresentava o seguinte quadro, descrito
por Câ mara Cascudo: "a Capitania ficou devastada. A populaçã o quase desapareceu. Plantios, gado,
destruídos. Os flamengos tinham incendiado as casas principais, queimando livros de registro".

Antô nio Vaz Gondim assimiu o governo, tomando medidas para reorganizar a capitania, partindo
praticamente do nada. Reconstruindo edifícios )Fortaleza e Matriz), organizando a defesa da cidade,
mas, sobretudo, iniciando uma política de povoamento. Lançou os fundamentos de uma infra-
estrutura para que fosse possível efetivamente governar a capitania.

Nuvens negras, contudo, começavam a se acumular no horizonte, num prenú ncio de tempestade...

Os colonos que viviam no interior, sem recursos para a aquisiçã o de escravos africanos, capturavam
nativos. Mais do que isso, os sesmeiros provocavam os naturais da terra para que eles lutassem
contra os seus vizinhos, ou, entã o contra os brancos, que assim promoveriam a chamada "guerra
justa", obtendo maior nú mero de escravos. As vítimas tinham duas opçõ es: submeter-se, sofrendo
todo o tipo de humilhaçã o, ou recebelar-se.

A situaçã o se agravou porque, como disse Tavares de Lyra, os holandeses voltaram ao Nordeste
com um ú nico objetivo: levantar os silvícolas do Rio Grande do Norte contra os portugueses. Os
holandeses que se casaram com as viú vas lusitanas pleiteavam os bens de suas esposas ...

Tavares de Lyra chama a atençã o para o fato e acrescenta: "dada a situaçã o esta consulta faz
entrever, é prová vel que mais tarde, quando ainda se arrastavam na Europa as negociaçõ es para
ajustes internacionais, os ex-dominadores mantivessem insidiosamente as ferramentas de agitaçã o
na colô nia, para deles tirar partido, assim como que incitassem a virem para o Brasil fazer causa
comum com os revoltados".
Os portugueses cobiçavam as terras dos silvícolas, procurando se apossar delas, através do
extermínio ou empurrando os nativos para o interior. Irritando, dessa maneira, os tapuias e os
potiguares.

Tarcísio Medeiros é mais taxativo: "Essa forma de expansã o sem respeito aos bens dos índios, que
ainda eram preados para o eito escravo, concorreu para os primeiros atritos, o correr de sangue de
uma guerra que, por espaço de cinqü enta anos, chamada "Guerra dos Bá rbaros", o Rio Grande, mal
nascido, só conheceu violências, extorsõ es, vilipêndio e rapinagem".

Ambição dos Colonos Revolta os Índios

Nã o foi uma guerra comum.

Os nativos, diante das constantes provocaçõ es dos colonos, revoltaram-se. As tribos à s vezes se
aliavam e, em outras oportunidades, lutavam sozinhas. Nã o houve, entretanto, nenhuma
confederaçã o. Muito menos um comando ú nico, ao qual todos obedecessem. Tratava-se muito mais
der uma reaçã o contra as perseguiçõ es dos brancos que, inclusive, tinham interesse em manter
acesso o fogo da revolta: com a manutençã o do conflito, aos poucos, os naturais da terra seriam
exterminados.

Em 1685, os janduís já demonstravam descontentamento. Em 1687, a situaçã o se agravou, sendo


descrita por Câ mara Cascudo da seguinte maneira: "Os indígenas corriam incendiando, matando o
gado e os vaqueiros e plantadores do sertã o (...). Mais de cem homens mortos".

O capitã o-mor Pascoal Gonçalves de Carvalho, desesperado, pediu ajuda aos seus colegas de
Pernambuco e Paraíba, além do Senado da Câ mara de Olinda.

A situaçã o era crítica de fato. Os silvícolas avançavam rumo à capital. Atingiram Ceará -Mirim,
pró ximo de Natal. Para se defenderem, os colonos construíram casas-fortes e paliçadas.

Alguns reforços foram enviados para a capitania, como o terço dos paulistas e, posteriormente,
Domingos Jorge Velho. Nã o conseguiram terminar a guerra, apesar de seus esforços. É que a
soluçã o para o conflito dependia muito mais de visã o administrativa, habilidades e espírito de
justiça do que força e armas. O que mantinha a guerra era, sem dú vida, a ambiçã o e a crueldade de
determinados colonos que almejavam a todo preço as terras que pertenciam aos nativos... Mesmo
que, para isso, fosse preciso exterminar os verdadeiros donos das terras! Mas os portugueses e seus
descendentes necessitavam da proteçã o dos soldados para atingir tais objetivos... Acontece que, por
falta de recursos, os soldados nã o estavam sendo pagos. Passando fome, desertavam. E mais, como
disse Cascudo, as tropas "estavam obstruídas pela displicência, indiferença, descaso, ignorâ ncia, os
pecados dos desinteresse que a distâ ncia multiplica".

A guerra, portanto, continuava variando de intensidade. E continuaria sempre, caso nã o fosse


enviado para o Rio Grande do Norte um líder que desejasse acabar com o conflito, lutando contra os
interesses dos oportunistas e dos aventureiros, devendo se impor pela energia e, sobretudo, por
seu espírito de justiça!

Fim do Conflito e Paz com os Nativos

Em 1695, Bernardo Vieira de Melo assumiu o governo da capitania. Veio com objetivo de pacificar
os nativos. Todo o seu trabalho foi desenvolvido nesse sentido. Fundou o Arraial de Nossa Senhora
dos Prazeres, em 24 de abril de 1696. Permaneceu dois meses na regiã o, tomando todas as medidas
que fossem necessá rias para manter a paz entre os colonos e os nativos. Enfrentou mil e uma
dificuldade. Que deveriam ser mantidos pela populaçã o local. Sobre a sua atuaçã o, disse Tarcísio
Medeiros: "Bernardo Vieira de Melo, com atitudes firmes e demonstraçõ es de suas forças, somente
usou desses recursos para fazer-se respeitar e, ao mesmo, atrair e agradar os silvícolas, criando,
desta forma, um clima de confiança que permitiu o diá logo entre as partes e o ajuste de condiçõ es
capazes de satisfazer a todos".
Diante de sua atuaçã o, o Senado da Câ mara de Natal pediu a prorrogaçã o do mandato de Bernardo
Vieira de Melo. A solicitaçã o foi aceita. O capitã o-mor, contudo, além de enfrentar uma série de
vicissitudes, sofreu alguns aborrecimentos com a rebeldia e os desmandos de Moraes Navarro que,
finalmente, foi forçado a entregar os nativos que estavam presos, sob pena de ser excomungado
pelo bispo D. Frei Francisco de Lima. Navarro teve que se retirar da regiã o, vencendo a causa o
capitã o-mor do Rio Grande.

Bernardo Vieira de Melo conseguiu mais duas conquistas: que fosse dada "a cada Missã o uma légua
de terra em quadrado, medida e demarcada", e que a Capitania do Rio Grande passasse da
jurisdiçã o da Bahia para Pernambuco, fato que ocorreu em 11 de janeiro de 1701.

E foi graças ao seu esforço, energia e persistência que Vieira de Melo conseguiu pacificar os nativos.

Feitos e Sonhos de Vieira de Melo

Nasceu em Muriboca (hoje Jaboatã o), no Estado de Pernambuco, sendo filho de Bernardo Vieira de
Melo. Em primeira nú pcias, casou-se com D. Maria de Barros, com a qual nã o teve filhos. Casou-se,
pela segunda vez, com D. Catarina Leitã o, tendo quatro filhos.

Antonio Soares considera Bernardo Vieira de Melo um homem "enérgico, justiceiro, operoso,
patriota". Como Bernardo Vieira de Melo se envolveu em acontecimentos trá gicos, contrariando
interesses e, ainda, defendeu idéias perigosas, como a proclamaçã o de uma repú blica para o Brasil,
foi duramente criticado, sendo preso e morrendo na prisã o.

O que nã o se pode negar é que foi um grande soldado.

Exerceu as seguintes funçõ es, antes de governar a Capitania do Rio Grande: Capitã o do Rio Grande:
Capitã o de Infantaria das Ordenanças, Capitã o de Cavalos e Tenente-Coronel. Distinguiu-se na luta
contra o Quilombo de Palmares.

Foi também um bom administrador. Ocupou os cargos de capitã o-mor do Rio Grande, quando
pacificou a regiã o que vivia num clima de permanente hostilidade entre os nativos e os colonos
portugueses. Homem inteligente, compreendeu logo que os silvícolas se rebelavam porque eram
provocados pelos brancos. E adotou como lema, conforme relata Tarcísio Medeiros, "nã o combater
o nativo de forma desumana". Coerente com esse princípio, nã o promoveu nenhuma guerra contra
o gentio. Evitou, com energia, que os nativos fossem provocados, porque a ameaça era realmente a
ambiçã o dos portugueses que desejavam as terras dos selvagens... Agiu, portanto, sem derramar
sangue.

A luta era, porém, á rdua e difícil. Cansado, pediu substituto no dia 5 de junho de 1700.

Bernardo Vieira de Melo foi um homem de princípios rígidos, que nã o permitia o menor deslize. Ao
saber que seu filho, segundo informaçõ es maldosas, estava sendo traído pela esposa, agiu rápido e
precipitadamente. Mandou matar o possível amante de D. Ana Tereza, capitã o-mor e morgado de
cabo, Joã o Paes Barreto. Pouco depois, D. Ana Tereza foi assassinada...

Vieira de Melo também ousou sonhar com uma repú blica independente de Portugal, como esclarece
Tarcísio Medeiros: "Líder da corrente emancipacionista que no Senado da Câ mara de Olinda
propõ es a instituiçã o de uma repú blica à moda de Veneza, livre da tutela portuguesa". Possuindo
tais idéias, foi acusado, justamente com seu filho André, do crime de inconfidente e de lesa-
majestade. Nã o suportando a perseguiçã o, os dois, pai e filho, se apresentaram às autoridades.
Foram levados para Lisboa, ficando na prisã o de Limoeiro, onde vieram a falecer. O fim trá gico
desses dois homens foi narrado, por Tarcísio Medeiros, da seguinte maneira: "Bernardo, numa
noite muito fria, acendera no quarto um fogareiro de carvã o e pela manhã foi encontrado morto,
sufocado pelas emanaçõ es de gá s carbô nico. Quanto ao filho André, morria logo depois de um
ataque cardíaco, quando se entretinha a jogar com outros presos".
Administração e Economia

O Poder Executivo na Fase Colonial

O poder Executivo era exercido pelo capitã o-mor (de 1598 até 1821), com exceçã o de período sob a
dominaçã o holandesa. Como disse Tarcísio Medeiros, "a sua açã o exercia-se mais imediatamente na
manutençã o da ordem pú blica, na inspeçã o das tropas e fortalezas, na proteçã o devida à s
autoridades outras da capitania, à s quais podiam representar, ficando todos os seus atos sujeitos à
devassa, quando deixassem o governo".

Era nomeado através de um documento chamado Carta-Patente, menos o primeiro, Joã o Rodrigues
Colaço, designado inicialmente pelo governador geral do Brasil e confirmado no cargo
posteriormente por um Alvará Régio.

O cargo recebeu vá rias denominaçõ es "Capitã o-Mor do Rio Grande (até 1739), "Capitã o-Mor co Rio
Grande do Norte", para diferenciar de outra capitania, na regiã o meridional do Brasil, Rio Grande
do Sul, cuja colonizaçã o foi consolidada pelo Tratado de Madri. Em 1797, mais um nome
"Governador e Capitã o-Mor do Rio Grande do Norte" e, finalmente, de 1811 até o ú ltimo, em 1816,
nova mudança para Governador do Rio Grande do Norte.

Além do Executivo, havia o Provedor da Fazenda que recebia os impostos.

A administraçã o municipal estava entregue ao Senado da Câ mara, funcionando no consistó rio da


Matriz de Nossa Senhora da Apresentaçã o. Presidida por um juiz ordiná rio. Durante o império, foi
transformado em Câ mara Municipal (25/03/1824).

Até 1770, seis de seus membros substituíam o capitã o-mor, por sua morte ou qualquer outro
impedimento.

A partir daquela data, o capitã o-mor passou a ser substituído por uma junta, formada pelos
seguintes membros; vereador mais velho, comandante da fortaleza e o juiz ouvidor.

A capitania tinha apenas um município: Natal. Depois, surgiram Sã o José do Mipibu, Arês, Vila Flor,
Vila do Príncipe, Vila Nova e Vila do Regente.

Estrutura do Poder Judiciário

A autoridade má xima da comarca era o ouvidor. Primeiro, nomeado pelos donatá rios das
capitanias, e depois, pelo pró prio rei.

Ivoncísio Meira de Medeiros, entretanto, esclarece o seguinte: nunca tivemos, nessa fase, um
Ouvidor ou um Juiz de fora. Quando se pensou na nomeaçã o de um Juiz de fora para esta capitania,
o Senado da Câ mara fez ver ao Conselho Ultramarino, em Lisboa, a inconveniência dessa
Nomeaçã o". (...)

"Uma organizaçã o judiciá ria autô noma somente conquistamos em 18 de março de 1818, quando,
por força de alvará de D. Joã o VI, passamos a constituir uma comarca, com sede em Natal e
independente da Paraíba".

Além dessas duas autoridades citadas, havia outras, que eram as seguintes: juiz ordiná rio, almotacé
(ou almotacel, inspetor encarregado da aplicaçã o exata dos pesos e medidas e da taxaçã o dos
gêneros alimentícios), juiz da vintena e, ainda, alcaides, escrivã s dos almotacés etc.

O Pelourinho e Seus Significados


Falando sobre o Pelourinho, disse Câ mara Cascudo: "Símbolo de sua autonomia e jurisdiçã o
municipal, atesta a presença da justiça permanente e os direitos da populaçã o governar-se por
intermédio de seus eleitos".

E mais adiante acrescenta o seguinte "O Pelourinho é a imagem originá ria da Independência
Municipalista, a liberdade administrativa dos conselhos, a soberania democrá tica expressa na letra
dos forais". Pelourinho é lembrado, por alguns, como o lugar onde os criminosos eram punidos
publicamente, sobretudo, os escravos. Era, dessa maneira, a deformaçã o do significado do
Pelourinho. Câ mara Cascudo explica o porquê dessa mudança: "Depois é que com a predominâ ncia
dos reis, usurpando pela força as liberdades do município, o Pelourinho, encimado pela coroa Real,
dizia ser uma testemunha da onipotência arbitrá ria do monarca".

O Pelourinho da cidade ficava na atual praça André de Albuquerque, em frente ao Senado da


Câ mara e cadeia, informa Câ mara Cascudo.

Nã o se sabe a data no qual o Pelourinho foi erigido. Em 1695 já se colocava editais ou bandos no
Pelourinho, costume que se tornou tradiçã o até, possivelmente, em 1806.

Nas comemoraçõ es da Independência do Brasil, o Pelourinho foi derrubado porque, na opiniã o dos
manifestantes, certamente representava o símbolo da opressã o imperial.

Atualmente, depois de mudar de lugar algumas vezes, o Pelourinho se encontra na sede do Instituto
Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte.

Ciclos Econômicos e Períodos de Seca

O primeiro ciclo econô mico do Rio Grande do Norte, foi, como ocorreu com o Brasil de forma geral,
o do "pau-brasil". Além dos portugueses, outros europeus se beneficiaram da extraçã o dessa
madeira cobiçada. Principalmente os franceses, que entraram em contato com os nativos e,
contando com a amizade dos potiguares, exploraram e contrabandearam o pau-brasil para a
Europa.

Expulso o francês, o desenvolvimento se arrastava de maneira muito lenta. Predominou, no início


da colonizaçã o portuguesa, o interesse militar: a defesa da regiã o e a expansã o rumo ao Norte.

Em 1615, havia apenas o engenho de Cunhaú funcionando. A capitania apresentava uma situaçã o
melhor em 1630: "iniciava-se a produçã o açucareira e o ciclo do gado progredia:, ressaltou Câ mara
Cascudo. Começava o povoamento do sertã o, seguindo-se a expansã o da criaçã o de gado rumo aos
vales do Açu e Apodi e, igualmente, à regiã o do Seridó , Istvam Lá zio A'rbocz analisa esse processo:
"o ciclo do gado promoveu o desenvolvimento e o povoamento, embora de maneira muito esparsa,
de toda a Capitania do Rio Grande do Norte - condicionada pela pró pria atividade econô mica bá sica
(...) A atividade agrícola desenvolvia-se mediocremente à sombra dos "currais", voltada para o
abastecimento das populaçõ es locais".

O ciclo do gado criou uma maneira de viver pró pria, ou seja, uma cultura especial caracteriza pelo
"individualismo do seu participante", segundo Câ mara Cascudo. Continua o mesmo autor: "Dá -lhe a
noçã o imediata de independência, de improvisaçã o, de autonomia, de livre arbítrio, de arrojo
pessoal".

No século XVIII, a economia se baseava, principalmente, em duas fontes: a agricultura e a indú stria
pastoril. A cultura da mandioca chegou a produzir cerca de 56.400 alqueires de farinha. Por outro
lado, a indú stria pastoril cresceu bastante. Como lembra Tarcísio, "além de fornecer gado à s feiras
da Paraiba e Pernambuco, os criadores de Mossoró ou Açu nas oficinas" exploravam a indú stria de
carne seca.

Garibaldi Dantas, em um estudo realizado no início do século XX, trata da dependência da


agricultura da "boa ou má distribuiçã o do regime pluviométrico". Essa afirmaçã o é perfeitamente
vá lida para os séculos anteriores. Dois fatores, portanto, influenciavam a produçã o agrícola: a seca e
os açudes. O primeiro fator, a seca, foi definido por Garibaldi Dantas da seguinte maneira: "As secas
sã o fenô menos climatoló gicos caracterizados pela deficiência, a irregularidade ou má distribuiçã o
das precipitaçõ es pluviá ticas".

A seca, ao contrá rio do que possa imaginar, "vêm de datas antiquíssimas na nossa cronologia
histó rica". A primeira que se tem notícia data de 1600, em pleno século XVII. A seca atinge, e muito,
a pecuá ria, desorganizaçã o a criaçã o de gado.

No século XVII foram registradas cerca de quatro secas (1600, 1614, 1691, 1692) e no período
seguinte o fenô meno se repetiu em nú mero bem maior, num total de vinte e uma: 1710, 1711, 1723,
1724, 1726, 1727 etc.

Segundo D. José Adelino Dantas, "foi nesse século que se verificou a mais longa e mais calamitosa de
todas as secas do Nordeste, abrangendo cinco anos consecutivos, de 1723 a 1727, inclusive".

O gado bovino apresenta semelhança com a raça "Garaneza", provavelmente introduzida no Estado
pelos franceses, e "Cacacú , possivelmente vinda do Ceará . O fato é que o gado se apresentava com
uma grande fecundidade. Como comprova Garibaldi Dantas: "cinco anos apó s uma seca, o criador
vê recompor-se rebanhos por ela destruídos".

Revolução de 1817

Conjuntura da Época Gera Várias Rebeliões

A existência do "pacto colonial, que desde o descobrimento regulamentava as relaçõ es "colô nia-
metró pole, vai ser responsá vel por uma série de rebeliõ es no período compreendido entre 1680 e
1817. Estã o incluídas as Revoluçõ es de Beckmam (Maranhã o/1684), Guerra dos Emboabas (regiã o
da descoberta do ouro/1709), Guerra dos Mascate (Permanbuco/1710), Revolta de Felipe dos
Santos (Vila Rica/1720), Conjuraçã o Mineira (Vila Rica 1789), Conjuraçã o Baiana (Bahia/1798) e
finalmente Revoluçã o Pernambucana (Nordeste/1817).

Esses movimentos representaram no seu conjunto, apesar das particularidades locais de cada um
deles, uma resposta à metró pole que, através do rígido sistema da exclusividade comercial,
sufocava economicamente a colô nia.

Para o Nordeste brasileiro, o mais significativo desses movimentos foi a rebeliã o de 1817 que,
tendo se iniciado em Pernambuco, estendeu-se por quase toda regiã o.

O Movimento em Pernambuco

Como as demais rebeliõ es da época, a de 1817 teve entre suas causas principais a rivalidade entre
portugueses e brasileiros. Afirma-se que os brasileiros nunca alcançavam postos elevados nas
milícias, que eram sempre comandadas por portugueses. Mas nesse contexto, o quadro econô mico
nã o pode ser esquecido. Secas constantes, queda no mercado internacional do preço do açú car e do
algodã o levaram a uma recessã o econô mica de grande significado. Os abusivos impostos, cobrados
pela metró pole para manter a corte portuguesa que ainda se encontrava no Brasil, completou o
panorama do qual a revoluçã o deflagraria.

Informado de que se tramava no Recife um movimento de cará ter nativista, e também sobre o nome
dos envolvidos na conspiraçã o, o entã o governador, capitã o-general Caetano Pinto de Miranda
Montenegro, ordenou a prisã o de todos os comprometidos. A prisã o dos civis foi efetuada quase
sem reaçã o. Porém, ao receber a ordem de prisã o, o capitã o José Barros Lima. "O Leã o Coroado",
reagiu ferindo mortalmente o enviado ao governo que tentava detê-lo.

Iniciou-se, assim, o movimento que tratou de organizar um governo provisó rio, no qual havia
representantes de quase todos os segmentos da sociedade. Faziam parte do grupo; Domingos José
Martins, o representante do comércio; José Luís Mendonça, pela magistratura; Domingos Teotô nio
Jorge, escolhido o comandante em armas pelos militares; o padre Joã o Ribeiro, pelo clero; Manuel
Correia de Araú jo, pelos agricultores, e como secretá rio do interior foi nomeado o padre
Miguelinho. Para conselheiros foram escolhidos o ouvidor (autoridade judiciá ria) Antô nio Carlos
Ribeiro de Andrada; o dicionarista Antonio de Morais Silva, e o comerciante Gervá sio Pires Ferreira.
Para autoridades eclesiá stica, o deã o Luís Ferreira.

Uma nova "Lei orgâ nica" foi adotada pelo governo, que vigoraria até a elaboraçã o de uma Carta
Constitucional. Dentre outras providências, a nova lei determinava:

forma republicana de governo;

liberdade de imprensa e religiã o;

manutençã o do direito de propriedade e da escravidã o.

A reaçã o foi organizada por D. Marcos de Noronha e Brito, que contou com o apoio de comerciantes
portugueses do Recife e de alguns rebeldes mais moderados que temiam o cará ter socialista do
movimento. Recife foi bloqueada e, em maio de 1817, já estavam presos os revoltados, depois de
violenta repressã o.

O fim do movimento nã o apagou definitivamente a chama revolucioná ria no Nordeste. Ela voltaria a
aparecer em 1824, na "Confederaçã o do Equador".

Adesão de André de Albuquerque Maranhão

A Capitania do Rio Grande do Norte, à época da revoluçã o, era governada por José Iná cio Borges
que, ao ser informado do movimento pernambucano, preparou-se para resistir. Tratou de entrar
em contato com o comandante de Divisã o do Sul, André de Albuquerque Maranhã o, que se
encontrava em Goianinha. Chegaram a conferenciar por cerca de duas horas sobre a segurança da
capitania frente aos acontecimentos de Pernambuco. No retorno a Natal, o governador pernoitou no
Engenho Belém, pró ximo à atual cidade de Nísia Floresta. Ao amanhecer, José Iná cio Borges viu que
o engenho estava cercado pelas tropas sob o comando do pró prio André de Albuquerque, que
aderira ao movimento. Preso, o agora ex-governador José Iná cio Borges foi enviado a Recife.

André de Albuquerque Maranhã o entra solenemente em Natal com sua tropa no dia 28 de março,
dando início ao governo revolucioná rio, cuja sede seria o Edifício das Provedorias da Fazenda ou
Real Erá rio, onde atualmente funciona o memorial Câ mara Cascudo.

Da junta governamental faziam parte Antô nio Germano Cavalcanti de Albuquerque , capitã o de
infantaria; coronel de milícias Antonio da Rocha Bezerra e o padre Feliciano José Dornelas, vigá rio
de freguesia.

Insucesso da Revolução

Monarquistas Vencem André de Albuquerque

Nada foi feito pelo governo revolucioná rio. A promessa de aumento de soldo aos soldados nã o é
cumprida. A açã o se limitou a arrancar a Coroa Real da Câ mara em Extremoz, o que foi feito por
Rego Barros.

"Uma fase triste e cinzenta. No Palá cio da Rua Grande que teria seu nome, André trabalha ou vive
junto do Padre Joã o Damasceno. Nenhuma irradiaçã o; nenhuma popularidade; nenhuma conquista;
nenhuma vibraçã o...", narra Câ mara Cascudo.
A reaçã o monarquista, no Rio Grande do Norte, parte da residência do alfaiate Manuel da Costa
Bandeira. É de lá que surgem os contra-revolucioná rios, depois das noves badaladas do sino da
Igreja, o sinal pré-determinado para o ataque. Chegando ao Palá cio, encontraram o chefe
revolucioná rio só , sem guarda, sem defesa. Apó s um breve tumulto, André de Albuquerque tem a
virilha atravessada por uma espada. Ferido mortalmente, é conduzido prisioneiro para a fortaleza
onde, na madrugada de 26 de abril de 1817, falece, sem socorros médicos ou qualquer tipo de
assistência. Seu corpo foi arrastado pelas ruas da cidade , como se fosse um mendigo: "Amarram-no
a um pau, com cordas e oito soldados carregam o corpo para a cidade", descreve Cascudo. Morte
ingló ria para um homem da estatura de André de Albuquerque. Quando o corpo passava pela
Ribeira, foi envolvido por uma esteira dada por Ritinha Coelho. Albuquerque foi encarado como um
traidor da monarquia, por essa razã o, o povo gritava:

- Morreu Pai André!


- Viva dom Joã o!

André de Albuquerque foi sepultado na ú nica igreja existente na cidade.

É importante salientar que, em recente restauraçã o realizada na Igreja de Nossa Senhora da


Apresentaçã o, foram encontrados os restos mortais identificados como sendo os do chefe
revolucioná rio de 1817.

No mesmo dia do sepultamento de André de Albuquerque, foi organizado um governo interino, que
permaneceu no comando do Rio Grande do Norte até o regresso de José Iná cio Borges. Estava
encerrada, de maneira melancó lica, a participaçã o do Rio Grande no movimento revolucioná rio de
1817.

Os Atos de Inácio Borges

Em 1816, o sargento-mor de Infantaria José Iná cio Borges foi nomeado governador do Rio Grande
do Norte. Nã o fazia quatro anos que exercia o poder quando, em Recife, explodiu a Revoluçã o
Pernambucana de 1817. Procurou tomar todas as providências necessá rias para evitar que as
tropas revolucioná rias invadissem o Rio Grande do Norte pelas fronteiras com a Paraíba. Foi
pessoalmente falar com André de Albuquerque, coronel das Ordenanças do Distrito Sul. Aconteceu,
entã o, o inesperado: André de Albuqueque se uniu à s tropas invasoras e prendeu o governador no
Engenho Belém.

Algumas pessoas criticaram José Iná cio Borges por ter abandonado a capital. O mesmo aconteceu
com alguns historiadores, como, por exemplo, Tavares de Lyra que, depois de lembrar que Borges
desfrutava da amizade de André de Albuquerque Maranhã o, visitando seus engenhos, onde era por
sinal bem recebido, disse o seguinte "acoimadó " de vacilante e dú bio, sendo certo que, num
momento dado, ele se tornou realmente inexplicá vel. A sua ida ao Engenho Belém nã o tem
justificativa: foi um ato, senã o criminoso, pelo menos imprudente e leviano, ante a iminência de
uma sublevaçã o. Ela importou no abandono da capital quando mais necessá ria se fazia a presença
do supremo representante do poder pú blico, a fim de organizar a resistência e dar coesã o aos
elementos de defesa de sua autoridade, vigiando pela manutençã o da ordem e da segurança que,
ainda mesmo que nã o estivessem ameaçadas internamente, corriam sério perigo nas fronteiras".

Ao contrá rio da interpretaçã o de Tavares de Lyra, a ida do governante ao interior, dar ordens ao
responsá vel pela defesa das fronteiras, pessoalmente, é perfeitamente compreensível. Natal nã o
apresentava sinais de que iria explodir num movimento revolucioná rio... A ameaça se encontrava
justamente numa invasã o vinda da Paraíba! A sua atitude foi, portanto, correta. Jamais poderia
imaginar que seria preso pelo seu amigo! Deve ter ficado profundamente decepcionado, porque, na
justificativa em que explica sua atitude, chamou André de Albuquerque Maranhã o de "infame e
traidor". O pró prio Tavares de Lyra reconhece que José Borges condenou de pronto a revoluçã o e
tomou todas as medidas necessá rias para combater o levante realizado em Pernambuco. Mesmo
assim, o historiador potiguar vai mais longe, insinuando uma prová vel cumplicidade por parte do
governador em relaçã o ao movimento... Reconhece, entretanto, que nã o existem documentos que
comprovem tal dubiedade de comportamento.
O fato é que José Borges foi um grande administrador. Vencida a Revoluçã o Pernambucana de 1817,
reassumiu o governo e nã o aproveitou da situaçã o para praticar qualquer ato de vingança. Ao
contrá rio, agiu com prudência, procurando diminuir o grau de envolvimento dos participantes no
levante. Tavares de Lyra reconhece tal fato.

As propriedades dos Albuquerque foram depredadas, porém, Joã o Borges nã o teve nenhuma
participaçã o nesses atos que, segundo Câ mara Cascudo, sã o "exibiçõ es eternas de partidarismo
interesseiros e desonesto". E mais: conseguiu tornar a Capitania do Rio Grande do Norte autô noma
administrativamente, deixando de ser dependente de Pernambuco. Ao criar a Ouvidoria da
Comarca, libertou-a da tutela da Paraíba e, como disse Tarcísio Medeiros, conseguiu "formar o
primeiro Corpo de Tropa de Linha, composto de uma companhia de artilharia e duas infantarias
(22/01/1820), bem assim à instalaçã o da cada de Inspeçã o de Algodã o e a Junta da Fazenda, esta
em 01 de outubro de 1821".

Ainda quando administrava o Rio Grande do Norte, foi promovido a tenente-coronel e, depois, a
coronel de Artilharia.

Deixando o governo, foi senador por Pernambuco. Reformou-se como marechal de campo apó s a
Abdicaçã o de D. Pedro I. Foi, ainda, designado ministro da Fazenda, participando, assim, do
primeiro gabinete da Regência Provisó ria, ensina Tarcísio Medeiros.

José Borges morreu no dia 6 de dezembro de 1838, em Pernambuco.

Padre Miguelinho, um Potiguar idealista

O padre Miguel de Almeida e Castro nasceu na cidade do Natal, no dia 17 de setembro de 1768,
sendo seus pais o capitã o Manoel Pinto de Castro, português, e D. Francisca Antonio Teixeira. Foi
batizado em 3 de dezembro de 1768, na Matriz da Apresentaçã o.

Aos 16 anos foi morar em Recife. Em 1784, entrou para Ordem Carmelita da Reforma, quando seu
tronou frei Miguel de Sã o Bonifá cio, "Lembrança da avó materna que era Bonifá cia:, explicou
Câ mara Cascudo. Por essa razã o, ficou conhecido como frei Miguelinho. Acontece, entretanto, que
indo para a Europa, em 1800, requereu do Papa Pio VII, a sua secularizaçã o. Ao voltar ao Brasil, já
era padre, o que confundiu muita gente, fazendo com que o sacerdote potiguar continuasse sendo
chamado de frei Miguelinho. Mas o certo é chamá -lo de padre Miguelinho, por ter conseguido sua
secularizaçã o.

No ano de 1817 foi nomeado Mestre da Retó rica do Seminá rio de Olinda.

Em Recife, morou com sua irmã Clara de Castro.

Idealista, participou da Revoluçã o Pernambucana de 1817, sendo preso no dia 21 de maio de 1817.
Na noite anterior, juntamente com Clara Castro, ficou queimando os papéis que incriminavam todos
aqueles que tinham participado do movimento. Disse para sua irmã : "Mana, nada de choro. Está
ó rfã . Tenho enchido os meus dias, logo me vêem buscar para a morte. Entrego-me à vontade de
Deus e nele te dou um pai que nã o morre. Mas aproveitemos a noite e imita-me: ajuda-me a salvar a
vida de milhares de desgraçados".

Preso, foi levado à Fortaleza das Cinco Pontas. Padre Miguelinho, juntamente com setenta e dois
revolucioná rios, seguiu no brigue "Conosco" para Salvador. Desembarcou na capital da Bahia no dia
10 de junho. Durante o seu julgamento, perante uma comissã o, o conde dos Arcos tentou ajudá -lo,
perguntando se ele tinha inimigo, ao que o padre respondeu: "nã o senhor, nã o sã o contrafeitas. As
minhas firmas nesses papéis sã o todas autênticas. Por sinal, em uma delas falta o 'O' de Castro, ficou
pela metade por acabar porque faltou papel".

Foi condenado por crime de lesa-majestade e fuzilado no dia 12 de junho de 1817.


Segundo Adauto da Câ mara, "os restos mortais do Padre Miguelinho foram inumados no antigo
cemitério do Campo da Pó lvora, reservados aos escravos, aos pobres e aos que padecessem da
morte violenta".

Em 1912, quando foi criado um grupo escolar no Alecrim, por iniciativa de Cândido Medeiros (que,
segundo Nestor de Lima, era o "desdobramento de sua "escola dos pobres" de Sã o Vicente de
Paula") e por indicaçã o de Nestor de Lima, o governador Alberto Maranhã o deu à nova escola o
nome do sacerdote norte-rio-grandense, Frei Miguelinho. Depois, bem mais tarde, quando o grupo
se transformou em escola de primeiro e de segundo grau se transformou em escola de primeiro e
de segundo graus, passou a se chamar Instituto Padre Miguelinho, corrigindo o erro inicial.

A Causa da Independência

Considerações Sobre a Emancipação do Brasil

O quadro realmente impressiona. A tarde declinava, eram aproximadamente dezesseis horas. À s


margens de um pequeno rio, chamado do "Ipiranga", na província de Sã o Paulo, D. Pedro empunha
a espada e gruta: "Independência ou morte!".

O gesto do príncipe, para alguns estudiosos, sintetiza todo o processo da emancipaçã o política do
Brasil. Marcaria o momento em que D. Pedro decidiu lutar para livrar o Brasil da tutela portuguesa.
Naquela data, no entanto, o Brasil já se encontrava independente. Existem dois documentos que
comprovam esse fato. O primeiro, tem a data de 4 de agosto de 1822. É um "Manifesto à s Naçõ es
Amigas", escrito por José Bonifá cio e diz o seguinte: "proclama à face do universo a sua
independência política". Apesar dessa afirmaçã o, o que se pretendia deixar claro perante os outros
países é que o Brasil nã o se deixaria recolonizar por Portugal. Por essa razã o, o mesmo documento
afirma que "o Brasil continuava integrando o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algaves".

Era um prenú ncio do que estava para acontecer. A verdadeira Declaraçã o da Independência do
Brasil pode ser considerada a circular dirigida à s naçõ es amigas, com a data de 14 de agosto de
1822, que dizia, de maneira clara, o seguinte: "tendo o Brasil que se considera tã o livre como o
Reino de Portugal, sacudido o jogo da sujeiçã o e inferioridade com que o Reino irmã o o pretendia
escravizar e PASSANDO A PROCLAMAR SOLENEMENTE A SUA INDEPENDÊ NCIA". A afirmaçã o
dispensa qualquer comentá rio. O país assumia, naquele instante, sua autonomia política. Outra
parte do texto diz o seguinte: "O Brasil nã o reconhece mais o Congresso de Lisboa, nem as ordens
do seu executivo". Ou seja, nã o reconhecendo o poder executivo e, igualmente, o legislativo de
Portugal, o Brasil se considerava, de fato e de direito, uma naçã o independente!

Gesto Simbólico e Contexto Especial

O movimento da separaçã o política no Brasil assume características pró prias, principalmente


quando comparado à s demais naçõ es sul-americanas. Enquanto países como a Argentina, Colô mbia
ou Bolívia celebram heró is populares, no Brasil é o representante da dinastia reinante que, por
circunstâ ncias especiais, vai participar do processo de emancipaçã o. O Brasil se torna, apó s a
independência, um império moná rquico, diferentemente de seus vizinhos que se transformaram
em repú blicas.

Na histó ria dessa separaçã o, há ainda uma forte tendência para valorizar os acontecimentos do dia
7 de setembro de 1822 como sendo os mais significativos. Entretanto, uma moderna abordagem
mostra que a independência do Brasil foi um longo processo, elaborado desde os abusos do sistema
colonial, que originou rebeliõ es, e continuou com a chegada da Corte Portuguesa ao País,
fortificando-se com a resoluçã o do Príncipe regente de permanecer em terras brasileiras.

Sabe-se, hoje, que a independência do Brasil resultou da disputa entre comerciantes portugueses,
que vinham perdendo os seus privilégios fiscais, e brasileiros, que pretendiam para si esses
mesmos privilégios. Nesse contexto, o 7 de setembro deve ser visto como um gesto simbó lico.
Repercussões no Rio Grande do Norte

O Rio Grande do Norte, por Alvará Régio de 18 de março de 1818, se libertara legalmente da
dependência da Paraíba.

Reassumindo o governo do Rio Grande do Norte, depois dos acontecimentos de 1817, José Iná cio
Borges era considerado simpatizante da causa da independência. Foi nessa época que o conflito
entre separatistas e recolonizadores começou a ganhar vulto. É bem verdade que essas
divergências eram mais dirigidas aos indivíduos do que à s duas ideologias.

Com o afastamento de José Iná cio Borges do governo, foi formada uma Junta Constitucional
Provisó ria, composta por sete membros, e eleita no dia 3 de dezembro de 1821.

A citada junta era presidida pelo coronel Joaquim José do Rego Barros, ligado ao movimento de
1817, ainda sendo os demais membros da lista simpatizantes da causa separatista.

A junta teve que enfrentar todo tipo de dificuldades, inclusive a falta de material para expediente e
cadeiras. Os pedidos de ajuda eram sistematicamente negados, sob a alegaçã o de que a junta
deveria ser composta por cinco membros e nã o por sete. Sem outra alternativa, os dois menos
votados foram afastados do governo.

Um baixo-assinado com cerca de 50 assinaturas, tendo à frente o capitã o Joaquim Torquato Soares
Raposo da Câ mara, solicitava a criaçã o de uma nova junta, afirmando que a entã o governante era
ilegal e insustentá vel.

A reaçã o da junta nã o se fez esperar, determinou a prisã o nã o só do primeiro signatá rio da lista,
mas também do ouvidor. Temendo mais agitaçã o, o presidente da Câ mara convocou novas eleiçõ es.

Foi escolhido um governo temporá rio, eleito e empossado no mesmo dia. Finalmente no dia 18 de
março, tomou posse a Junta de Governo Provisó rio, que permaneceu no poder até 24 de janeiro de
1824. No dia de 2 de dezembro de 1822, chega ao Rio Grande do Norte a notícia da separaçã o
política. A 22 de janeiro de 1823, a junta promove , com grande pompa, as comemoraçõ es que o fato
merecia. No entanto, a coroaçã o do primeiro imperador brasileiro, no dia 01 de dezembro de 1822,
nã o foi comemorada, permaneceu ignorada pela populaçã o local, que passou a integrar o império
brasileiro.

A Insubordinação de Pernambuco

D. Pedro I dissolveu, em 1823, a Assembléia Constituinte, que tinha como objetivo elaborar a
primeira Constituiçã o do nascente império brasileiro.

A medida provocou descontentamento em todo o País. Como disse Rocha Pompo, "em Pernambuco,
onde eram vivas as tradiçõ es de protesto contra o despotismo, assumiu atitudes de resistência
formal pelas armas".

O que fez explodir o movimento em Pernambuco foi, sobretudo, uma questã o interna. A junta que
governava, renunciou, sendo eleito um novo governo cujo chefe era Manuel de Carvalho Pais de
Andrade. Mas havia um governante nomeado pelo imperador: o morgado do cabo Francisco Pais
Barreto, futuro marquês do Recife. Houve, entã o, o impasse. Carvalho Pais de Andrade nã o entregou
o cargo ao seu sucessor indicado por D. Pedro I. Representante de algumas municipalidades,
reunidos em Recife, apoiaram Carvalho Pais de Andrade. A guarniçã o de Recife ficou dividida: uma
parte ficou com País de Andrade e a outra, com Pais Barreto. A facçã o que defendia o morgado do
cabo prendeu Manuel de Carvalho e se retirou para o sul, com a finalidade de unir-se a um grupo de
correligioná rios. Aproveitando o clima de antagonismo entre os dois grupos, frei Joaquim do Amor
Divino Rabelo e Caneca, através das pá ginas do "Tifis Pernambucano", defendeu o separatismo.
Uma divisã o naval, comandada por John Taylor, bloqueou Recife, impedindo um conflito armado.
Mal Raylor saiu, Manuel Pais de Andrade, no dia 2 de julho de 1824, lançou uma proclamaçã o
rompendo com o governo imperial. O movimento marchava para a formaçã o de uma naçã o
independente. Sã o mantidos contatos com outras províncias: Piauí, Ceará , Paraíba, Alagoas e Rio
Grande do Norte. Era o Nordeste que se levantava contra o absolutismo de D. Pedro I e alguns
líderes iam mais adiante, desejando a proclamaçã o de uma repú blica!

A bandeira desenhada pelos rebeldes, que por sinal nunca foi utilizada em combate, trazia quatro
palavras que sintetizavam o pensamento dos: revoltosos religiã o, independência, uniã o, liberdade e
confederaçã o. A primeira se justifica pela presença dos sacerdotes frei Joaquim do Amor Divino
Rabelo e Caneca, padre Joã o Batista da Fonseca etc. A segunda, independência, dizia respeito ao
governo imperial, portanto, brasileiro. O termo uniã o se referia aos estados nordestinos e nortistas,
que deveriam estar juntos para vencer as tropas imperiais. Mais do que nunca a coesã o era
necessá ria e, uma vez criada a confederaçã o, a liberdade seria estabelecida em seu territó rio. A
ú ltima palavra, confederaçã o, significava que seus membros manteriam autonomia!

A Confederaçã o do Equador, contudo, nã o deu certo. As tropas imperiais dominaram o movimento.


A 01 de dezembro de 1824, jurava-se a Constituiçã o outorgada de 1824. O levante estava
totalmente vencido. E a ordem imperial restabelecida em todo o Nordeste e Norte do Brasil.

O Entusiasmo de Frei Caneca Pelo Seridó

Para D. José Adelino Dantas, o frade carmelita Joaquim do Amor Divino Rabelo e Caneca era "uma
figura exponencial, no ardor, na combatividade, na eloqü ência e na bravura".

Frei Caneca, como era mais conhecido, apó s a derrota do movimento que explodira em
Pernambuco, segue com um grupo rumo ao Norte, armados inclusive com peças de artilharia. Seu
roteiro até chgar ao Seridó foi o seguinte: Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte.

Conta D. José Adelino Dantas: "nos sítios de Malacacheta e Pedra Lavrada, atingem o Seridó pelo
'boqueirã o da serrota' , o atual boqueirã o de Parelhas (...) Calcando as brancas areia do rio Seridó ,
os homens de Frei Caneca acamparam, à tardinha do dia 22, na fazenda das almas".

Frei Caneca, entusiasmado com o Seridó , escreveu que "a descida da Serra da Borborema, ainda
nesta estaçã o, é lindíssima. Apresenta golpes de vista dos mais pitorescos, capazes de encantar os
olhos dos viajantes".

Seguindo caminho pelo Seridó , os expedicioná rios, a partir do sítio de S. Joã o atingiram a Serra de
Samaná u e, no dia 26 de outubro de 1824, ao meio dia, entraram em Caicó . Foram recebidos pelo
padre Francisco de Brito Guerra. O povo se confraternizou com os forasteiros.

D. Adelino Dantas, de maneira objetiva, descreveu os ú ltimos instantes que Frei Caneca passou em
Caicó : "A milícia confederada demorou em Caicó uma semana. Impunha-se descansar a tropa e
consertar as peças (...). Sob o belo luar de 2 de novembro de 1824, levantou acampamento e retorna
a marcha, rumo ao Ceará ".

Sem Choque de Armas no RN

Manuel Teixeira Barbosa assumiu o governo no Rio Grande do Norte numa hora difícil. Inquietaçã o
em todo o País. Conta Câ mara Cascudo que "Pais de Andrade apoiava-se na Tradiçã o de 1817, esta
polarizava simpatias por todo o Nordeste".

"No Rio Grande do Norte, os homens de 1817 eram queridos e admirados. Mas estavam divididos,
uns para o lado do imperador e outros para a aceitaçã o de um governo popular".

Pais de Andrade enviou Januá rio Alexandrino para manter contatos na escuna "Maria Zeferina", em
março de 1824. Ele vinha oficialmente, como médico, para divulgar um tipo de vacina. Porém, sua
missã o real era divulgar o movimento revolucioná rio pernambucano. Levava, inclusive, oficiais
para o Ceará e Pará .

O clima hostil que havia entre os dois grupos, a favor ou contra o imperador, crescia num prenú ncio
de violência.

Teixeira Barbosa, inseguro, passou a dar expediente no Quartel da Tropa de Linha, esperando,
ansioso, pelo seu substituto. Tomá s de Araú jo que, segundo se dizia, simpatizava com a causa
pernambucana, retardava, ao má ximo, assumir o governo. Ambos tinham consciência da
tempestade que se aproximava. Tomá s de Araú jo foi nomeado presidente da província em 25 de
novembro de 1823 e assumiu o governo em 5 de maio de 1824.

Na Paraíba, o presidente Felipe Neri Ferreira encontrou uma série de resistência ao seu nome,
sendo Félix Antô nio Ferreira de Albuquerque aclamado presidente. Era o retrato da crise política
que reinava no Nordeste.

As facçõ es em luta, na Paraíba e em Pernambuco, procuravam o apoio do Rio Grande do Norte. Pais
de Andrade enviou, inclusive, correspondência para o governante potiguar. Tomá s de Araú jo agiu
com cautela, preocupado em evitar uma guerra civil em sua província, atitude que nã o foi
compreendida por alguns historiadores. Enviou, entretanto, uma delegaçã o (padre Francisco da
Costa Seixas, José Joaquim Germiniano de Morais Navarro e José Joaquim Bezerra Carnaú ba) que
fez algumas exigências ao vice-presidente da Paraíba, Alexandre de Seixas Machado: "intimar-lhe a
eleiçã o de novos conselhos de governo, posse ao mais votado, anistia e volta aos seus empregos de
todos comprometidos, além das garantias naturais de segurança pessoal e propriedade", sintetizou
Câ mara Cascudo.

Alexandre de Seixas Machado, como resposta, mandou tropas para as fronteiras que se limitavam
com o Rio Grande do Norte.

A delegaçã o potiguar, depois de visitar a Paraíba, foi para Pernambuco, sendo que José Joaquim
Bezerra Caranú ba foi substituído por José Joaquim Fernando Barros. Essa delegaçã o assinou, com o
governo Pernambuco, uma concordata,. Em 3 de agosto de 1824, pela qual as duas províncias se
uniram "numa liga fraternal ofensiva e defensiva", devendo entrar em vigor quando fosse assinada
pelos governantes das duas províncias. Tomá s de Araú jo, ao que parece, nã o assinou o referido
documento. Mais uma atitude do presidente entendida como dú bia... Pode ser compreendida,
contudo, como uma prova de que nã o apoiava o movimento.

Tomá s de Araú jo enviou tropas para a regiã o sul, sob o comando de Miguel Ferreira Cabral que,
pouco depois, recebeu ordem para regressar. Havia a notícia de que uma força paraibana iria
combater os norte-rio-grandenses. A situaçã o ficou muito confusa. Tomá s de Araú jo mandou o
tenente José Domingues Bezerra de Sá para observar o que estava acontecendo. Na volta, Bezerra
de Sá informou que a tropa de Cabral estava reforçada com voluntá rios, oriundos de S. José de
Mipibu, que eram grandes entusiastas da Confederaçã o do Equador. Segundo Bezerra de Sá , o
objetivo era "levantar a bandeira republicana em Natal". Os expedicioná rios, vindo do sul, portanto,
eram rebeldes, adeptos da Confederaçã o do Equador... Diante de um possível confronto, Vicente
Ferreira Nobre e Joaquim José da Costa sã o designados para defender a cidade do Natal.

Câ mara Cascudo narrou os acontecimentos seguintes: "Ferreira Nobte e Costa ocupam os arredores
da cidade e nã o permitem que o emissá rio do presidente leve carta sua ao alferes. Cabral na tarde
de 5 de setembro. O presidente foi em pessoa suplicar os dois que permitissem a entrada da força
de Cabral. Permitiram, depois de muito rogados, com a condiçã o dos voluntá rios acamparem fora
da cidade". Uma situaçã o crítica. Ferreira Nobre e Costa, praticamente, assumem o poder ou, pelo
menos, ignoram a autoridade de Tomá s de Araú jo. Ao que parece, eles acreditavam que o
presidente estava do lado dos rebeldes ou, no mínimo, simpatizava com a causa da Confederaçã o do
Equador...
Apesar dessa circunstâ ncia, o esforço de Tomá s de Araú jo para evitar um conflito armado, nos
arredores de Natal, foi imenso e mesmo sem conseguir que suas determinaçõ es fossem aceitas
pelos chefes militares, conseguiu que o pior nã o acontecesse, como demonstrou Jayme da Nó brega:
"Tomá s de Araú jo evitou o choque de armas, à s portas de Natal, entre as tropas da guarniçã o, de 1 e
2 linhas, comandadas respectivamente pelo Capitã o Vicente Ferreira Nobre e Sargento-mor
Joaquim José da Costa, de um lado, e uma força de 50 soldados da mesma guarniçã o que fora
enviada ao litoral sul e voltava engrossada com voluntá rios rebeldes de Sã o José de Mipibu (...) sob
o comando do Alferes Miguel Ferreira Cabral, de outro lado".

"Conseguiu Tomá s de Araú jo em pessoa convencer os indisciplinados comandantes Nobre e Costa


de que pacificamente deveria passar pelo posto militar a tropa de Cabral e acampar fora o grupo de
moços voluntá rios revoltosos. Estes depois fugiram".

Os historiadores viram em Tomá s de Araú jo um velho fraco, que nã o estava à altura dos
acontecimentos. A verdade, porém, é que caso Tomá s de Araú jo tentasse se impor aos militares pela
força, teria sido preso ou, entã o, morto. E a conseqü ência teria sido a guerra civil! Tomá s de Araú jo,
para evitar o derramamento de sangue, através de um gesto heró ico, preferiu se sacrificar,
suportando humilhaçõ es para obter um bem maior: poupar o povo e a cidade das vicissitudes de
um conflito armado. Seu intento se realizou. Esse fato tem que ser reconhecido pela historiografia
potiguar.

Tomá s de Araú jo, pedindo demissã o, entregou o governo ao presidente da Câ mara, Lourenço José
de Moraes Navarro, que dirigiu os destinos da província até 20 de janeiro de 1825. Navarro, por sua
vez, passou o governo ao seu substituto legal, Manuel Teixeira Barbosa.

A conclusã o à qual se pode chegar é que, na realidade, o Rio Grande do Norte foi envolvido pelo
movimento revolucioná rio pernambucano sem sofrer, contudo, maiores conseqü ências.

O Patriarca Seridoense Tomás de A. Pereira

Nasceu em Acari, no ano de 1765. Era um homem alto e, segundo Jayme da Nó brega Santa Rosa, "de
olhos azuis, madrugador ativo, generoso, humano, isto é, compreensivo, fazendeiro de amplas
propriedades".

Sobre sua figura foi projetada uma imagem de homem bom, porém, sem cultura. Jayme da Nó brega
combate, com fundamento, tal versã o, afirmando que possuía "regular instruçã o" e que mantinha
"assídua correspondência com seus amigos. As suas cartas eram ditadas a secretá rios, um dos quais
era o seu neto Manuel Lopes de Araú jo Cananéia. Registra a tradiçã o oral que, ao mesmo tempo, às
vezes, ditava quatro, cinco cartas. Deduz-se da leitura de algumas dessas missivas que foram
conhecidas, e de documentos políticos impressos, que Tomá s de Araú jo se dedicava, nas ocasiõ es
pró prias, à leitura de livros". Jayme da Nó brega vai mais além, chegando, inclusive, a fazer uma
aná lise dos termos empregados por Tomá s de Araú jo.

O patriarca seridoense também conhecia a doutrina cristã a ponto de fazer preleçõ es. Jayme da
Nó brega acrescenta outros traços da sua personalidade: "astú cia, habilidade, bom senso, memó ria,
espírito de discernimento e capacidade de decisã o. E ainda desmente a versã o de que Tomá s de
Araú jo simpatizasse com os ideais da Confederaçã o do Equador.

Câ mara Cascudo afirmou que nã o podia compreender como o imperador escolhera um homem
idoso para administrar uma província que vivia uma situaçã o dramá tica, caó tica. Mais uma vez
Jayme da Nó brega desmente, de maneira firme, a lenda: "Em 1824 começava devagar um processo
de glaucoma. Quando à idade, estava entã o com 59 anos, de excelente saú de e boa disposiçã o (...).
Depois que Tomá s de Araú jo deixou a presidência, viveu com boa saú de 23 anos".

A imagem que os autores construíram, tendo por base as declaraçã o do pró prio Tomá s de Araú jo,
no Auto de Vereaçã o, teria como objetivo apenas justificar o seu pedido de demissã o do cargo de
presidente da província. Os historiadores nã o compreenderam essa verdade. A velhice começa, na
realidade, aos 65 anos e nã o aos 50... Confundiram paciência, capacidade de esperar para poder agir
corretamente, com inabilidade. É bom repetir: Tomá s de Araú jo, impediu que os combates se
desenrolassem na terra potiguar, sim. Os â nimos estavam muito exaltados. Evitar o derramamento
de sangue entre irmã os é tarefa muito mais relevante do que solucionar um conflito entre facçõ es
adversá rias, através do sacrifício de muitas vidas! Tomá s de Araú jo agiu nesse sentido de maneira
consciente: "temendo que se alçasse a guerra civil e caísse nesta Província a indelével nó doa de
sangue brasileiro de que até hoje isenta, propus e afiancei em nome de todos os feitos praticados de
parte a parte, tornado réu de culpa ao que traísse essa proposiçã o, e sendo por todos aceita e
aplaudida em alta voz, mandei que entrasse só a Tropa de I linha, abarracando-se a outra força, ao
que obedeceram".

Tomá s de Araú jo foi criticado, acusado de estar na "corda bamba", procurando agradar os dois
grupos em luta. Outro engano. Ele era monarquista. Disse isso claramente: "Jamais se deixaria levar
da impetuosa corrente de opiniõ es republicanas, aná rquica e subversivas da obediência e boa
ordem". Palavras que retratam perfeitamente o pensamento de um monarquista. Nã o ficou
indeciso, ao contrá rio, procurou combater a violência com a astú cia de um sertanejo experiente no
comando de pessoas...

Governou como se estivesse administrando uma de suas fazendas, determinando tarefas, por sinal,
pouco comuns, para seus subordinados. Mandou, por exemplo, que os soldados trabalhassem na
agricultura, para abastecer o quartel de alimentos... Combateu a prostituiçã o, fazendo com que as
mulheres tivessem uma missã o diá ria: fiar algodã o.

Honeste, "fiscalizou pessoalmente o Erá rio, impedindo que houvesse abusos", disse Jayme da
Nó brega Santa Rosa.

Confederação do Equador

A Penitência de Tomás de Araújo Pereira

Era rigoroso no castigo aos seus familiares, usando a palmató ria e uma pequena prisã o, a "cafua".
Manoel Dantas conta algo curioso, que pode ser até uma anedota, contudo, diz muito da
personalidade de Tomá s de Araú jo: estava velho, quase cego. Pediu a seu neto padre, que se
chamava também Tomá s, que o ouvisse em confissã o. O jovem sacerdote relutou, porém, o velho
patriarca nã o admitiu a recusa e tanto fez que terminou se confessando ao seu neto. Apó s a
confissã o, como penitência, o padre Tomá s determinou que o avô ficasse preso meia hora na
"cafua". Cumpriu a penitência. Depois, chamou um pedreiro e mandou demolir o cubículo... Outros
"casos" sã o contados sem que se possa distinguir os que sã o verdadeiros daqueles que fazem parte
do folclore do sertã o seridoense...

Ao deixar o governo, a situaçã o política continuava difícil. Mesmo assim, nã o recebeu nenhuma
garantia de vida. Saiu de Natal rumo a Acari e, numa determinada regiã o onde corria o risco de vida,
viajou escondido dentro de um barril, que foi levado na cabeça de seu fiel escravo, "Pai Benguela".

Em Acari, na Fazenda Mulungu, elaborou sua defesa, com o objetivo de excluir qualquer dú vida
sobre sua participaçã o nos episó dios relacionados com a Confederaçã o do Equador.

Tomá s de Araú jo passou o governo à Câ mara no dia 8 de setembro de 1824, sendo o novo
administrador o presidente da Câ mara, Lourenço José de Moraes Navarro, que dirigiu os destinos
da província até 20 de janeiro de 1825, quando o sonho da Confederaçã o do Equador estava
totalmente destruído.

Escravismo e Abolicionismo

O Inescrupuloso Comércio Humano


O negro foi trazido da Á frica para o Brasil porque, segundo Thales de Azevedo, "os portugueses
necessitavam de divisas para o seu comércio internacional e nã o havendo encontrado ouro no
Brasil, levavam ferro produzido para Portugal, por escravos no Congo e na Costa do Ouro para
trocar esses escravos pelo precioso metal que ali existia. Os comerciantes europeus, por sua vez,
estabeleciam-se em feitorias na Á frica, protegidos por seus governos e de comum acordo com os
potentados negros, para negociar suas manufaturas pelos produtos regionais. Assim, provocaram
ou estimulavam as lutas tribais que, desorganizando a ordem social e a economia, lhes permitiam
apoderar-se do comércio regional, ao mesmo tempo em que obtinham escravos para vender. Por
esse jogo complexo e inescrupuloso, diretamente encorajava-se o ganancioso comércio humano, o
qual também enriquecia os traficantes no Brasil".

As regiõ es africanas que mais forneceram escravos para o Brasil foram o litoral e o Golfo da Guiné.
No século XVI, vinham da Guiné; no século XVII, DE Angola, e no século seguinte, da Costa da Mina.

Do outro lado do Atlâ ntico, no Brasil, os três maiores centros que receberam os pretos oriundos da
Á frica eram Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro.

Escravatura Modela Perfil Brasileiro

Os negros, maltratados, se submetiam ou se rebelavam, fugindo para o mato, formando quilombos.


À s vezes, se refugiavam em comunidades "fechadas", nã o permitindo pessoas brancas no seu
convívio.

A grande lavoura exigia um grande nú mero de braços. Foi preciso, portanto, buscar o negro na sua
terra. Segundo Jaime Pinsky, houve "uma grande multiplicidade de grupos negros trazidos ao Brasil
pelos traficantes portuguesas ou ingleses, que se tornaram os mais expressivos já no século XVII".

Para Décio Freitas, "vicejou no Brasil a formaçã o mais importante do mundo. Nenhum outro país
teve sua histó ria tã o modelada e condicionada pelo escravismo em todos os aspectos, econô mico,
social, cultural. Pode-se dizer que a escravutura delineou o perfil histó rico do Brasil e produziu a
matriz da sua configuraçã o social".

Lei Áurea: Apenas uma Etapa Vencida

O movimento abolicionista no Brasil representou um sentimento, defendido por aqueles que


desejavam mudanças ou, entã o, por pessoas que agiam impulsionadas pelo cristianismo.

Pode ser analisado sob dois aspectos: o seu significado na época da libertaçã o dos escravos (1888)
e como é visto na atualidade.

A assinatura da Lei Á urea, pela princesa Isabel, foi aclamada pela multidã o, numa verdadeira
apoteose. Discursos. Aplausos. O dia 13 de maio foi apontado como sendo o ponto culminante de
um movimento liderado por jovens idealistas que pensavam que, libertando o negro, a obra estava
completa. Os abolicionistas esqueceram que tinham apenas vencido uma etapa. O passo mais
importante estaria por vir, aquele em que o negro deixaria de ser "peça", para transformar-se em
cidadã o, podendo lutar pelos seus direitos e, inclusive, participar do processo político. Era preciso
que o negro, antes de alcançar a sua liberdade, tivesse sido preparado para agir como cidadã o, Mas
nada foi feito nesse sentido, quer pelo governo, que por qualquer grupo de abolicionista. A falha foi
exatamente essa. O movimento abolicionista, portanto, nã o foi uma farsa e, sim, errou por nã o
compreender o que deveria ser feito apó s a destruiçã o do sistema escravista.

O fato é que nã o foi tomada nenhuma providência para que o negro, uma vez livre, pudesse inserir-
se na sociedade, com os mesmos direitos dos brancos... Resultado: nos primeiros momentos apó s a
Lei Á urea, os africanos e seus descendentes no Brasil viveram momentos de grandes dificuldades.
Por essa razã o, alguns estudiosos, hoje, afirmam que a aboliçã o da escravidã o no Brasil foi uma
verdadeira farsa. Sem nenhuma repercussã o histó rica. Mais uma vez, estã o enganados. Em primeiro
lugar, foram liberados mais de 700 mil escravos. E como mostrou Caio Prado Jú nior, esse nú mero
de pretos representava, para a populaçã o branca, "uma ameaça tremenda; ainda mais porque eles
se concentravam em maioria nos agrupamentos numerosos das fazendas e grandes propriedades
isoladas no interior e desprovidos de qualquer defesa eficaz".

Com a aboliçã o, o negro deixou de ser "peça" e passou a ser gente, pessoa humana. Ainda
discriminado, perseguido, rejeitado. A grande maioria, levando uma vida realmente miserá vel. Sem
perceber ainda o que representava a libertaçã o de um povo. Teria que ser assim, considerando que
o africano era discriminado, apontado como ser inferior, incapaz de qualquer ascensã o social. É
necessá rio ainda que pensemos no seguinte: nã o se muda a mentalidade de um indivíduo ou de
uma sociedade, independente de cor ou ideologia, através de decretos. Rodos processo de mudança
é lento e o novo é, quase sempre, rejeitado pela maioria. Naquela época, qualquer tipo de
transformaçã o ocorria muito devagar, a nã o ser quando imposta por uma revoluçã o. O negro foi
libertado, porém, continua sendo odiado ou, pelo menos, desprezado pela elite.

A aboliçã o, contudo, foi o primeiro passo dado pelo negro no Brasil para ascender socialmente
como povo.

A aboliçã o acabou, no mesmo instante, com duas classes sociais: a do senhor de escravos e a dos
escravos. De acordo com Décio Freitas, "a substituiçã o de um modo de produçã o por outro
configura uma revoluçã o social. Todos admitem que esta foi a mudança social mais importante
ocorrida desde a colonizaçã o".

Mão-de-obra Escrava e Comunidades Negras

O Rio Grande do Norte se abastecia de escravos em dois centros: Pernambuco e Maranhã o. De


Pernambuco os negros eram enviados para a regiã o açucareira potiguar, sobretudo a partir de
1845, quando a indú stria do açú car foi ativada nos municípios de Sã o Gonçalo, Ceará -Mirim, Sã o
José de Mipibu, Papari, Goianinha e Canguaretama.

Os negros comprados no Maranhã o chegavam ao Rio Grande do Norte via Ceará , sendo
desembarcados em Areia Branca, atendendo à s necessidades da indú stria salineira de Açu,
Mossoró , Macau e Areia Branca.

O negro, portanto, atuava principalmente em dois tipos de trabalho: nas indú strias açucareira e
salineira, e em menor quantidade nas fazendas de gado.

Alguns negros, contudo, nã o suportavam a vida miserá vel que levavam. Fugiam, penetrando no
interior, e formando comunidades "fechadas", que se isolavam da sociedade dos brancos, mantendo
somente um contato estritamente necessá rio, como aconteceu em Coqueiros, Sibaú ma, Zumbi,
Negros do Riacho, Capoeira dos Negros etc.

Essas comunidades, provavelmente, nã o se originaram de quilombos.

Exemplo: Capoeira dos Negros. Os habitantes desse local, conta o Sr. Severino Paulino da Silva, um
de seus descendentes, vieram de Açu, talvez por causa de uma grande seca. Faziam parte de uma
família formada pelo casal Joaquim e sua senhora, Caiada, e seus filhos, todos negros. O casal
vendeu doze cavalos nã o adultyos para comprar a propriedade. O Sr. Carrias, antigo dono da
Capoeira, enganou seu Joaquim entregando uma procuraçã o em lugar do documento de venda.
Quando o Sr. Joaquim morreu, o Sr. Carrias reuniu os filhos do falecido e disse a verdade, exigindo
mais cem mil réis para passar o documento legal da venda do sítio. Os filhos do Sr. Joaquim
pagaram a quantia exigida, assegurando a posse definitiva da terra.

Os bisavó s do Sr. Severino Paulino da Silva foram, portanto, o nú cleo original da populaçã o de
Capoeira dos Negros.

A á rea inicial da comunidade era de 36 quilô metros, conforme informa o Sr. Nobre. Nos dias atuais,
a á rea de Capoeira dos Negros diminuiu muito, porque alguns de seus moradores venderam suas
partes. Em Capoeira, nos dias de hoje, há dois grupos distintos, um de pessoas com cor de pele mais
escura e outro com a pele mais clara, fruto de uma miscigenaçã o. Por essa razã o, o antropó logo
Raimundo Teixeira, do Museu Câ mara Cascudo, já falecido, dividiu Capoeira em duas partes: uma
que ele chamou de "Capoeira Branca", e outra que ele denominou de "Capoeira Negra".

A comunidade costuma se reunir na sede do Bangu Futebol Clube. Nesse local se realizam também
reuniõ es do Sindicato e da Emater que, segundo informaçõ es obtidas in loco, financia a compra de
instrumentos agrícolas (enxada, foice, má quinas etc.).

Os agricultores compram as sementes através de um intermediá rio, geralmente uma pessoa fora do
grupo, para posteriormente vender sua produçã o a esse mesmo intermediá rio. Produzem
mandioca, feijã o e milho. Vendem seus produtores nas feiras de Macaíba, no sá bado, e na de Bom
Jesus, no domingo.

A religiã o predominante é a cató lica, ocorrendo, entretanto, um sincretismo com crendices


populares, oriundas de cultos africanos e nativos, conforme afirma Josenira F. Holanda.

Uma tradiçã o muito antiga da comunidade é a "Dança do Pau Furado", hoje sem continuadores,
lembrada pelos mais velhos, mas com tendência ao desaparecimento.

O Pioneirismo da Abolição Mossoroense

Disse Câ mara Cascudo: "a idéia da aboliçã o encontrou adeptos entusiastas e adversá rios com
antipatia pessoal aos propagandistas e nã o ao pensamento de restituir ao negro o estado de
liberdade". Esse clima de hostilidade entre os grupos antagô nicos, a favor ou contra, foi provocado,
certamente, pelo entusiasmo dos jovens, com ativa participaçã o em comícios pú blicos. Havia
também um clima de aventura.

O macauense Joaquim Honó rio da Silveira viajou para o Ceará , numa jangada, para levar "uma
petiçã o de Habeas Corpus em favor dos escravos que estavam prisioneiros na Fortaleza, sendo
condecorado com uma medalha de prata pelo "Clube do Cupim", narrou Pedro Moura.

Uma das características do movimento foi a participaçã o entusiá stica dos padres na campanha: "Pe.
Pedro Soares de Freitas, Pe. Joã o Cavalcanti de Brito (Natal), Pe. Antô nio Joaquim (Mossoró ), Pe.
Amaro Theat Castor Brasil (Caicó ), entre outros.

Macaíba contava, em 1869, com uma sociedade que lutava pela libertaçã o dos escravos. Mas foi em
Mossoró que se iniciou uma campanha sistemá tica, com forte influência cearense. A "Libertadora
Mossoroense" foi fundada em 6 de janeiro de 1883, libertando seus escravos no dia 30 de setembro
de 1883.

Damasceno de Menezes mostra a ascendência cearense no acontecimento: "Do Estado vizinho,


Mossoró recebera relevante contingente de homens de alta formaçã o cívica, e cedo a sociedade
local participara do espírito libertador pelas influências de intercâ mbio cultural e comercial que
desde os seus primó rdios se entrelaçaram à vida das comunidades do Oeste Potiguar".

O mesmo autor mostra que nã o houve, naquele trinta de setembro, um ato subversivo, porque nã o
feriu nenhum dispositivo legal. Os escravos foram libertados através da entrega das Cartas de
Liberdade. Isso acontecia de vá rias maneiras. A diferença é que, em Mossoró , no dia trinta de
setembro de 1883, as cartas foram entregues na mesma data, em solenidade pú blica, libertando
todos os escravos que ainda existiam no município. Segundo Damasceno de Menezes,
"juridicamente houve abolicionismo em Mossoró . Sim, comemorou-se o civismo de um povo. O
cristianismo houve por bem abalar os coraçõ es magnâ nimos do grande povo potiguar, o dar-se a
extinçã o antecipada do elemento servil em a terra de Santa Luzia, para exemplo, memó ria e prova
de altruísmo de uma geraçã o que diante da justiça e pelo amor, pela prova de alto espírito
compreensivo se tornou imortal".
Mas apó s o trinta de setembro, foi fundado o "Clube dos Spartacus", cujo primeiro presidente foi um
ex-escravo, de nome Rafael. O objetivo dessa associaçã o era promover a fuga de escravos de outros
municípios para Mossoró ... Essa concepçã o, na realidade, era subversiva, porque contrariava a
legislaçã o vigente no País. Mossoró era, assim, na prática, um município livre. Libertou seus
escravos de maneira legal, porém acabou com a instituiçã o da escravidã o em suas terras. Dentro
dessa perspectiva, houve abolicionismo em Mossoró .

O exemplo dessa cidade passou a ser seguido por outras comunidades do interior. Açu libertou seus
escravos em 24 de junho de 1885. Depois foi a vez de Carnaú ba (30/03/1887) e, logo a seguir,
Triunfo ( 25/05/1887). Natal nã o possuía mais escravos em fevereiro de 1888.

Natal teve sua Guarda Negra, criaçã o do Partido Conservador e instrumento de combate à s idéias
republicanas. Segundo os conservadores, os negros, por gratidã o deveriam defender a monarquia...
Em Natal, a Guarda Negra recebeu o nome de Clube da Guarda Negra. O seu presidente foi
Malaquias Maciel Pinheiro. Instalada a 10 de fevereiro de 1889, com muita festa, essa organizaçã o,
na apuraçã o de Câ mara Cascudo, nada fez de bom ou mal...

O Combate do Poeta Segundo Wanderley

Manoel Segundo Wanderley nasceu em Natal, em 6 de abril de 1860. Filho de Dr. Luiz Lins
Wanderley e D. Francisca Carolina Lins Wanderley.

Estudou em Natal e em Recife e, em 1880, partiu para Salvador, onde se formou em Medicina, no
ano de 1886. Nesse mesmo ano, ele se casou com Raimunda Amá lia da Motta Bittencourt.

Na concepçã o de Clá udio Augusto Pinto Galvã o, "por influência de Castro Alves, abraçou o
"condoreirismo", a terceira geraçã o do romantismo brasileiro, sentiu a indicaçã o dos caminhos da
forma, que nã o eram outros, senã o a forma e a temá tica do pró prio estilo, tã o populares ainda,
àquele momento".

O livro "Poesias", de Segundo Wanderley, teve três ediçõ es, dias editadas em Fortaleza (1910 e
1928) e a ú ltima, pela tipografia Galhardo, em Natal, no ano de 1915. A primeira ediçã o traz um
estudo de Gotardo Neto que analisa os dois poetas, o baiano Castro Alves e o potiguar Segundo
Wanderley, chegando a dizer que "no gênero patrió tico, as duas individualidades se completam
admiravelmente".

Segundo Wanderley foi considerado o maior poeta do Rio Grande do Norte de sua época.

Nã o foi apenas um grande poeta. Exerceu ainda diversas atividades: médico, foi também professor
de Atheneu Norte-Rio-Grandense e dramaturgo. Mas seu maior destaque foi, sem dú vida, como
poeta. Gotardo Neto, falando sobre a poesia de Segundo Wanderley, afirmou: "Falar do espó lio
intelectual de Segundo Wanderley é lançar uma vista sobre a poesia legítima de minha terra".

"Ele dominou e comoveu tanto o coraçã o patrício que, mesmo o eclipse da morte nã o ensombrou
sequer a grandiosidade das suas conquistas".

"Elas perduram e perdurarã o, alacres e soberanas, como o espírito altaneiro do poeta


desaparecido".

Na época em que morou em Salvador, predominou na mente de Segundo Wanderley a preocupaçã o


pelo destino do negro, combatendo a escravidã o. E é justamente esse aspecto que Clá udio Augusto
Pinto Galvã o salienta em seu estudo, publicado na revista "Histó ria UFRN". Em um dos versos
citados, segundo Wanderley chega a dizer:

"Uma idéia - Aboliçã o


Seu verbo - é mais que espada
Seu braço forte é a enxada
Do tú mulo da escravidã o".

Uma de suas poesias mais conhecidas entretanto, é provavelmente "O Naufrá gio do Solimõ es", que
começa assim:

"Tristeza! Funda tristeza


Nos enluta os coraçõ es;
Já nada resta das á guias,
Dos bravos do ‘Solimõ es’
O mar, esse negro abismo,
Que nã o respeita o heroísmo,
Nem sabe o que seja o lar,
Rolando, sobre as glaucas entranhas
Para os heró is sepultar".

Romulo C. Wanderley cita suas peças teatrais: "Amar e Ciú me", 1901; "A Providência", 1904,
"Brasileiros e portugueses", 1905. Escreveu ainda a fantasia "Entre o céu e a Terra", em
homenagem à memó ria do aeronauta Augusto Severo.

Apesar do seu talento, Segundo Wanderley foi duramente criticado, sobretudo por causa da forte
influência que recebeu do poeta baiano Castro Alves. Na defesa do poeta, argumenta Clá udio
Galvã o: "Muito se comentou no princípio do século, sobre a influência de Castro Alves na poesia de
Segundo Wanderley, como se consistisse em demérito ao discípulo, guardar as marcas do mestre".

Clá udio Galvã o destaca também um aspecto muito importante: "Segundo Wanderley foi o ú nico
poeta norte-rio-grandense a ter participaçã o ativa no movimento abolicionista".

Segundo Wanderley morreu em Natal, no dia 14 de janeiro de 1909.

Proclamação da República

Palavras Iniciais Sobre o Contexto da Época

O Brasil vivenciou a sua primeira experiência republicana quando D. Pedro I abdicou o trono do
Brasil, em favor do seu filho, a 7 de abril de 1831. Sendo o herdeiro ainda de menor idade, a soluçã o
constitucional encontrada foi a escolha de uma regência exercida por três membros, sob a
presidência do mais velho. Dessa forma, iniciou-se no País o Período Regencial, composto por
muitas características republicanas, como o aparecimento dos primeiros políticos, eleiçõ es para a
escolha dos regentes e, principalmente, a suspensã o do poder moderador do imperador, que era o
grande entrave ao exercício da democracia. A 23 de julho de 1840, com a vitó ria da campanha pela
antecipaçã o da maioridade do imperador, é encerrado o Período Regencial que, apesar de
conturbado por uma série de revoluçõ es internas, foi exatamente rico para a Histó ria Política.

A propaganda republicana vai aparecer no Brasil, de maneira sistemá tica, a partir de 1880. Os
jornais, os clubes e o P.R. (Partido Republicano) vã o ser os responsá veis pela divulgaçã o das idéias
que determinaram a queda da monarquia no Brasil..

Foi praticamente nula a participaçã o do povo, principalmente das classes mais desfavorecidas e da
classe média. Os republicanos aproveitaram a insatisfaçã o popular, pelas péssimas condiçõ es em
que viviam os menos afortunados, para atrair o povo, engrossando assim as fileiras do movimento
republicano.

Instala-se, nesse contexto, no dia 15 de novembro de 1889, um regime que poderia ter acontecido
em 1822, com a separaçã o política de Portugal, ou com a abdicaçã o em 1831. Entretanto, os
partidá rios da repú blica sustentaram, sempre a idéia de que foi o longo período monarquista que
deu condiçõ es para que o Brasil conservasse a sua integridade territorial, nã o se fragmentando em
vá rios países, a exemplo da parte espanhola da América.

Campanha Republicana No Rio Grande do Norte

No Rio Grande do Norte é através de um documento, enviado ao Clube Republicano do Rio de


Janeiro, em 30 de novembro de 1817, que aconteceu a primeira adesã o coletiva à s idéias
republicanas. Os signatá rios desse documento eram fazendeiros, comerciantes, senhores de
engenho, além de três vice-presidentes da província. Foram eles: Antô nio Basílio, Ribeiro Dantas,
Manuel Januá rio Bezerra Montenegro E Estevã o José Barbosa de Moura.

A reaçã o ao movimento republicano no Rio Grande do Norte era representada pelos partidos
Liberal e Conservador. Nã o havia, entretanto, unidade ideoló gica entre esses dois partidos. Ao
contrá rio as divergências internas eram muito acentuadas o que, de certa maneira, iria facilitar o
desenvolvimento da campanha pela substituiçã o do regime moná rquico no Brasil. O jornal "A
Gazeta de Natal" faria a contrapropaganda pelo partido Conservador, enquanto que a dos liberais
era mantida pelo "Correio de Natal".

A reuniã o que marcou a fundaçã o do Partido Republicano aconteceu na residência de Joã o Avelino,
situada na Praça Bom Jesus, no bairro da Ribeira, Natal, em 27 de janeiro de 1889, com a
participaçã o de Pedro Velho de Albuquerque Maranhã o, que passou a liderar a campanha.

A ata do nascimento do Partido Republicano registra a primeira diretoria, composta por Pedro
Velho, presidente; Hermogenes Tinô co, vice-presidente; Joã o Avelino, primeiro secretá rio; Joã o
Ferreira Nobre, segundo secretá rio; e Manuel Onofre Pinheiro, tesoureiro.

Teria sido em 1851, através do Jornal "Jaguarari", dirigido por Manuel Brandã o, o início oficial da
propaganda republicana no Rio Grande do Norte. Seguiu-se, em 1873, a revista "Eco Miguelinho",
de Joaquim Fagundes José Teó filo. O movimento cresce e adquire uma maior organizaçã o no
período entre 1857 e 1875, com a participaçã o de Joaquim Teodoro Cisneiro de Albuquerque.
Ampliando-se ainda mais o ideá rio republicano wuando, em 1886, Januncio Nó brega e Manuel
Sabino da Costa fundam um nú cleo republicano em Caicó .

Nasce, em seguida, o jornal "A Repú blica", ó rgã o oficial do partido recentemente fundado.

Início do Governo Republicano em Natal

Foi um telegrama assinado por José Leã o Ferreira Souto, dirigido ao Partido Republicano, que
trouxe a notícia da vitó ria da campanha republicana pela mudança do regime, para o Rio Grande do
Norte. Os monarquistas se inteiraram da novidade também por telegrama, esse assinado por
Umbelino Ferreira Gouveia, datado de 16 de novembro de 1889.

A proclamaçã o da Repú blica nã o foi comemorada, nem despertou reaçõ es. Supõ e-se que o povo
norte-rio-grandense, como os demais brasileiros, nã o teve consciência da mudança que se operava.
Aqui, também, o povo foi "arrastado" para a causa republicana.

Os liberais ainda tentaram fazer Antonio Basílio Ribeiro Dantas permanecer à frente do governo da
província. Porém a designaçã o de Pedro Velho, chefe do Partido Republicano, que chegou a Natal
assinada por Aristides Lobo, acabou com as pretensõ es liberais. Pedro Velho foi aclamado
governador do Estado, mas governou por poucos dias. No dia 30 de novembro, o Dr. Adolfo Afonso
da Silva Gordo era nomeado governador, pelo governo provisó rio do novo regime. Apesar da
frustraçã o, o chefe republicano no Rio Grande do Norte aceitou a nova nomeaçã o.

A designaçã o de Adolfo Gordo (paulista de Piracicaba) ensejou passeatas de protestos, muitos


telegramas e alguns boatos de conspiraçã o e discursos muito inflamados.
Posteriormente, Pedro Velho foi eleito deputado federal pelo Rio Grande do Norte com expressiva
votaçã o. Finalmente, no dia 28 de fevereiro de 1892, Pedro Velho de Albuquerque Maranhã o foi
eleito governador, pelo Congresso Estadual, administrando até 25 de março de 1886.

As Especialidades de Pedro Velho

Luís da Câ mara Cascudo afirma que Pedro Velho era um "orador esplêndido, claro, empolgador,
espalhando uma vibraçã o incontida de movimento e de seduçã o, jornalista magnífico, cultura
literá ria disciplinada, oportuna, justa e certa na citaçã o inflá vel, memó ria de estatística, gesto largo,
teatral, majestoso, impressionador, voz quente, plá stica, apta a qualquer desejo de queixa ou de
estertor, vocabulá rio rico, luzidio, vestindo de novo a velha idéia aposentada pelo uso, mímica
insubstituível, escolhida com requintes de conhecedor, todos os detalhes que a inteligência e a
vontade podem dar a um homem, Pedro Velho conseguira ou findara possuindo".

Pedro Velho nasceu em Natal, na rua Chile, no dia 27/11/1856. Filho de Amaro Barreto de
Albuquerque Maranhã o e de D. Feliciana Maria da Silva e Albuquerque.

Aprendeu as primeiras letras com o professor Antonio Ferreira de Oliveira. Começou seus estudos
secundá rios no Giná sio Pernambucano, de Recife e, depois, na Bahia concluiria os referidos estudos,
no Colégio Abílio. Iniciou o curso de Medicina em Salvador, porém, teve que se afastar da faculdade
por problemas de saú de. Voltando a estudar obteve grau em bacharel em ciências médicas,
defendeu a tese sobre "Condiçõ es Patogênicas das Palpitaçõ es do Coraçã o e dos Meios de Combatê-
los:, no dia 4 de abril de 1881.

Casou-se com D. Petronilha Florinda Pedrosa, em 27 de abril de 1881.

Pedro Velho, entã o, regressou ao Rio Grande do Norte, fixando residência em Sã o José de Mipubu,
onde passou pouco tempo, explorando uma farmá cia. Foi, posteriormente, morar em Natal
definitivamente, na rua Visconde do Rio Branco, nº 55.

Como médico, destacou-se nas especialidades de cardiologia, ginecologia e obstetrícia.

Professor, fundou o Giná sio Rio-Grandense (1882 a 1884) e ensinou Histó ria Geral e do Brasil no
Atheneu Norte-Rio-Grandese. Tavares de Lyra ressalta que "foi na ú ltima fase do movimento em
favor da emancipaçã o dos escravos que iniciou triunfalmente a sua carreira política, tornando-se o
chefe intimerato da propaganda, que fazia pela imprensa, em companhia de abnegados
correligioná rios, e pela tribuna, em excursõ es sucessivas aos lugares do interior, emancipado, à s
vezes, de chofre, ao efeito de sua palavra inspirada e fulgurante".

Líder político, teve uma grande atuaçã o. Fundou o partido republicano e, para divulgar suas idéias,
o jornal "A Repú blica". Foi o primeiro governador do Rio Grande do Norte na fase republicana.
Quando se pensou em fazer Pedro Velho senador, houve um problema: ele nã o tinha idade... Foi
entã o eleito deputado para a Constituinte. Perdeu o mandato porque foi eleito, posteriormente,
governador, administrando o Estado de 28 de fevereiro de 1892 até 25 de março de 1896. Nesse
ano, com a morte de Junqueira Alves, abriu-se uma vaga na Câ mara de Deputados, possibilitando
que Pedro Velho continuasse na luta política. Foi reconduzido à Câ mara de Deputados,
comprovando sua extraordiná ria liderança. Por essa razã o, José Augusto de Medeiros, afirmou:
"Pedro Velho era um condutor de homens, era um chefe". E mais: "por 18 anos consecutivos, desde
a proclamaçã o da Repú blica até o dia de sua morte, o chefe invencível das hostes republicanas no
Rio Grande do Norte. Nunca houve em qualquer época da histó ria daquele Estado da Federaçã o, um
homem que gozasse de tanto prestígio".

Pedro Velho, pouco dias antes de morrer, recebeu um documento, assinado por todos os
presidentes das intendência do Rio Grande do Norte, inclusive o capital, cujas palavras iniciais eram
as seguintes: "É a voz do povo do Rio Grande do Norte, pelo ó rgã o das suas municipalidades, que
vem trazer a V. Excia, nesta modesta mensagem, as mais afetuosas expressõ es do seu aplauso".
"Numa data que, preciosa para a família, tornou-se pela força natural das coisas, preciosa para o
Estado inteiro, partem de todos os extremos do Estado, de Natal a S. Miguel e de Macau a Jardim, os
votos de nosso afeto com as homenagens da nossa admiraçã o". A sua liderança se estendeu além-
fronteiras do Rio Grande do Norte, com políticos de outras terras vindo até Pedro Velho, para pedir
conselhos: Quintino Bocayuva, Manoel Vitorino etc. Rui Barnosa, quando ouviu Pedro Velho fazer
uma saudaçã o de improviso, comentou: "admirá vel orador".

Pedro Velho morreu no dia 9 de dezembro de 1907, quando estava no vapor Brasil, em Recife.

Constituição Federal Fixa Independência

No período compreendido entre a proclamaçã o da Repú blica a 15 de novembro de 1888 e a


revoluçã o de 3 de outubro de 1930, o Brasil viveu o que os historiadores convencionaram chamar
de "Primeira Repú blica" ou "Repú blica Velha".

As entã o "Províncias do Império" passaram à condiçã o de Estado da Federaçã o, que na época eram
vinte. A Lei Maior do País passou a ser a Constituiçã o federal de 1891, tendo cada Estado a sua
Constituiçã o.

Dentre as determinaçõ es constitucionais estavam: a independência entre os três poderes -


Executivo, Legislativo e Judiciá rio -; presidente eleito pelo voto direto para um mandato de quatro
anos, sendo eleitores os maiores de 21 anos, do sexo masculino e alfabetizados. Houve ainda a
separaçã o entre a Igreja e o Estado.

Durante a República Velha

Inauguração do Sistema Oligárquico

Durante a Primeira Repú blica (1889/1930), a exemplo da demais unidades da Federaçã o do Rio
Grande do Norte conheceu o sistema de oligarquias.

Coube ao fundador do Partido Republicano, Pedro Velho de Albuquerque Maranhã o, inaugurar o


sistema olugá rquico no Estado. A base econô mica dessa primeira oligarquia, caracteriza como
"personalista que evoluiu, mais tarde, para uma oligarquia tribal", segundo Mariz (1980), foi o
açú car.

A marca registrada do governo de Pedro Velho foi manter sempre os interesses da sua oligarquia,
antecedendo aos do partido. Prova dessa tendência foi o empenho do nosso primeiro oligarca em
indicar o seu irmã o Augusto Severo de Albuquerque Maranhã o para disputar a sua vaga, na Câ mara
Federal, aberta quando veio assumir o governo. Apesar da oposiçã o de outros chefes políticos,
Augusto Severo foi eleito a 2 de maio de 1892, Entretanto, essa eleiçã o nã o foi homologada, sendo
posteriormente anulada em todo o País. Finalmente, no novo pleito realizado a 23 de abril de 1883,
onde mais uma vez Pedro Velho impô s a candidatura do seu irmã o, Augusto Severo de Albuquerque
Maranhã o foi eleito para a Câ mara Federal. Pedro Velho conseguiu ainda nomear seu outro irmã o,
Alberto Maranhã o, secretá rio da sua administraçã o.

O substituto de Pedro Velho no governo foi o desembargador Joaquim Ferreira Chaves que, mesmo
nã o pertencendo à família Albuquerque Maranhã o, era ligado por estreitos laços de amizade aos
membros da primeira oligarquia estadual.

Por volta de 1920, o eixo econô mico do Estado se desloca do litoral (açú car e sal) para o interior
(exportaçã o de algodã o e pecuá ria). É nesse contexto que aparece a segunda oligarquia, liderada
por José Augusto Bezerra de Medeiros, com bases políticas no Seridó , onde predominava a
atividade econô mica de plantaçã o e exportaçã o do algodã o.

A segunda oligarquia é interrompida no governo de Juvenal Lamartine, quando eclode a revoluçã o


de 3 de outubro de 1930, que modificou significativamente o panorama do País.
Indústria Incipiente e Sistema Financeiro

No Rio Grande do Norte, o setor industrial era insignificante. Mesmo no contexto regional, ocupava
o sétimo lugar. Em nú mero de indú strias, está vamos apenas acima do Maranhã o e do Piauí.

Os setores de alimentaçã o e têxtil predominavam na incipiente atividade industrial.

Quanto ao setor financeiro, o primeiro estabelecimento bancá rio só apareceu no Rio Grande do
Norte no governo de Augusto Tavares de Lyra, em 1909. Era o Banco de Natal que, futuramente,
daria origem ao Bandern. Quase todo o Nordeste já possuía agência do Banco do Brasil, mas o Rio
Grande do Norte só foi inaugurar a sua primeira agência no dia 14 de abril de 1917. No setor
financeiro ainda devem ser lembradas as iniciativas de Juvenal Lamartine, responsá vel pela criaçã o
de bancos rurais e de caixas em algumas cidades do interior, como Acari, Caicó , Macau etc. Ulisses
de Gó is e Jovino dos Anjos foram responsá veis pelo aparecimento de cooperativas, com o objetivo
de facilitar o crédito.

A Passagem da Coluna Prestes no Estado

Na Repú blica Velha, foram freqü entes os protestos de militares e civis contra as fraudes eleitorais,
que a inexistência do voto secreto ensejava. Movimentos como "Os 18 do Forte de Copacabana", no
Rio de Janeiro, em 1922; a rebeliã o gaú cha de 1923, e a paulista, de 1924, atestam a insatisfaçã o do
povo contra o processo eleitoral vigente.

Foi no governo do presidente Artur Bernardes, que praticamente cumpriu o seu mandato sob
"Estado de Sítio:, com as garantias constitucionais suspensas, que se organizou a "Coluna Prestes".

O principal objetivo dos comandados de Luís Carlos Prestes e Miguel Costa era percorrer o Brasil,
levantando o povo contra o que consideravam "autoritarismo do presidente".

Os rebeldes entraram no Estado pela zona Oeste. Governava o Rio Grande do Norte o Dr. José
Augusto Bezerra de Medeiros (1924/1927), que procurou imediatamente se comunicar com o
presidente, recebendo a promessa de que seriam tomadas providências para melhorar a segurança
do Estado. Enquanto isso, o governo mobilizava civis e militares para fazer frente aos
revolucioná rios.

A 26 de janeiro de 1926, o primeiro contingente da polícia militar, sob o comando do tenente Joã o
Machado, seguiu para a zona oeste. Algumas cidades do Seridó , temendo uma invasã o pelo sul do
Estado, colocaram em alerta suas forças policiais.

Os combates entre rebeldes e as forças policiais do Rio Grande do Norte ocorreram quase
totalmente na regiã o oeste. Pela cidade de Luiz Gomes, os integrantes da coluna Prestes seguiram
para a Paraíba.

Coube ao governador Juvenal Lamartine recolher as armas que haviam sido distribuídas.

A passagem da Coluna Prestes é o ú ltimo acontecimento significativo da Repú blica Velha no Rio
Grande do Norte.

Duas Administrações de Alberto Maranhão

Alberto Frederico de Albuquerque Maranhã o nasceu em Macaíba, no dia 2 de outubro de 1872, filho
de Amaro Barreto de Albuquerque Maranhã o e D. Feliciana Pedroza de Albuquerque Maranhã o.

Os seus estudos iniciais foram realizados, primeiro, em Macaíba e, depois, em Natal. Mais tarde, foi
para Recife, onde se formou em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais de
Pernambuco, no dia 8 de dezembro de 1892, com 20 anos.
Alberto Maranhã o se casou com D. Inês Barreto. Teve seis filhos: Paula, Laura, Judite, Juvino,
Cleanto e Caio.

Segundo Meira Pires, "sua educaçã o esmerada, sua formaçã o moral, sua cultura, seu invulgar
espírito (...) um largo pendor diplomá tico pois sabia solucionar, com finura e habilidade
exemplares, as mais difíceis questõ es".

Participou, com brilhantismo, do "Congresso Literá rio", que mantinha o jornal "A Tribuna". Com
outros companheiros, fundou o "Grêmio Polymathico". Dirigiu o jornal "A Repú blica", onde, como
afirma Meira Pires, "teve o ensejo de reafirmar o seu invencível valor de jornalista e homem de
letras escrevendo, sem assinar, crô nicas, tó picos e editoriais".

Exerceu a funçã o de promotor pú blico em Macaíba. Ocupou o cargo de secretá rio de Estado na
administraçã o de Pedro Velho.

A 14 de junho de 1899, foi eleito governador do Estado, dirigindo os destinos do Rio Grande do
Norte no período de 1900 a 1904.

Durante sua administraçã o, aprovou a lei nº 145, de 6 de agosto de 1900, pela qual "é o governador
autorizado a premiar livros de ciência e literatura produzidos por filhos domicialiados no Rio
Grande do Norte, ou naturais de outros Estados quando neste tenham fixa e definitiva a sua
residência". Essa lei promoveu o desenvolvimento cultural do Estado, constituindo-se em fato
inédito no País.

No dia 24 de março de 1904, o governador inaugurou o Teatro Carlos Gomes (hoje Alberto
Maranhã o), com sua renda destinada para ajudar aos flagelados, vítimas da seca, que se
encontravam em Natal.

Concluída sua administraçã o, foi eleito deputado federal, e durante o exercício de seu mandato fez
parte da Comissã o de Diplomacia.

Em 1908 voltava a assumir o governo do Estado, realizando uma profícua administraçã o: fundou o
Conservató rio de Mú sica; o Hospital Juvino Barreto (hoje Onofre Lopes); o Derby Clube (para
incentivar o hipismo), e construiu a Casa de Detençã o e o Asilo de Mendicidade. Implantou a luz
elétrica em Natal e, posteriormente, os bondes elétricos. Inaugurou a Escola Normal, em 3 de maio
de 1908. Reconstruiu o Teatro Carlos Gomes, que atualmente tem o seu nome, dando-lhe as feiçõ es
atuais e que foi entregue ao pú blico no dia 19 de julho de 1912.

Alberto Maranhã o estendeu sua açã o também ao interior, como mostrar Itamar de Souza: "em Sã o
José de Mipibu, ele mandou as á guas de uma fonte natural e permanente para o abastecimento
d’á gua daquela cidade. Em Macaíba, sua terra natal, construiu o cais de atracaçã o, melhorando
assim o transporte fluvial entre aquela cidade e a capital do Estado. Em Macau, mandou fazer um
aterro, numa extensã o de quatro quilô metros, ligando esta cidade à estrada do sertã o, à margem do
rio Assu".

"Para facilitar o deslocamento de pessoas e produtos entre o sertã o e as cidades portuá rias, ele
construiu três mil quilô metros de estradas carroçá veis em direçã o à s cidades de Canguaretama e
Natal".

O segundo governo de Alberto Maranhã o surpreendeu pelo dinamismo, sendo considerado, por
unanimidade, como a melhor administraçã o durante a Repú blica Velha. Nem tudo, porém, foi
positivo na segunda administraçã o do oligarca potiguar que procurou, abertamente, imortalizar os
membros de sua família. O município de Vila Flor teve o seu nome mudado para "Pedro Velho".
Além dessa homenagem, mandou fazer um busto do irmã o que foi colocado na "square Pedro
Velho". Fazendo uma crítica ao ilustre político potiguar, disse Itamar de Souza: "Este segundo
governo de Alberto Maranhã o teve três características bá sicas: primeiro, procurou imortalizar os
membros da oligarquia aponto seus nomes em municípios, repartiçõ es pú blicas, monumentos e
praças; segundo, monopolizou importantes setores da economia estadual, favorecendo, assim, os
amigos e correligioná rios, em detrimento do erá rio pú blico; e, terceiro, realizou uma grande e
inovadora administraçã o com o dinheiro tomado emprestado no estrangeiro".

Alberto Maranhã o, apó s deixar o governo, em 31 de dezembro de 1913, foi deputado federal,
representando o seu Estado nessa funçã o, de 1927 até 1929.

Abandonado a vida política, saiu do Rio Grande do Norte e foi morar com a família em Parati, no Rio
de Janeiro.

Em 1918, publicou dois trabalhos: "Na Câ mara e na Imprensa" e "Quatro discursos histó ricos".

Faleceu no dia 01 de fevereiro de 1944, em Angra dos Reis, sendo sepultado no outro dia, em Parati.

As Lutas sem Trégua de José da Penha

José da Penha Alves de Souza nasceu a 13 de maio de 1875, na cidade de Angicos. Foram seus pais:
José Félix Alves de Souza e Maria Iná cia Alves de Souza.

Em 1880, José da Penha foi para Fortaleza, onde estudou no Colégio Militar. Depois, seguiu para o
Rio de Janeiro, onde, seguindo Aluízio Alves, fez toda a carreira militar; praça a 2 de agosto de 1890,
alferes a 3 de novembro de 1894, tenente a 8 de outubro de 1898 e capitã o a 2 de agosto de 1911".
Desde jovem, participava de polêmicas, conseguindo se destacar mesmo quando seus adversá rios
eram do nível de um Medeiros e Albuquerque ou de um José Veríssimo.

Nasceu, ao que parece, para debater. Discutir. Liderar. "Seu ardente ideal republicano, impregnado
da proteçã o de Benjamim Constant, o gosto pelo estudo da Histó ria dos Povos, a vivência
jornalística conduzindo-o à aná lise dos fatos diá rios, principalmente os de formaçã o da Repú blica
emergente, participaçã o militar característica dos primó rdios do novo regime, o espírito polêmico,
fariam inevitavelmente do jovem pensador-militar um líder político", relata Aluízio Alves.

Nã o sabia silenciar diante da injustiça.

Na aná lise de Câ mara Cascudo, "o nome de José da Penha Alves de Souza evoca o movimento da
luta, o choque de idéias, a controvérsia agitaçã o, sonoridade (...). Nasceu armado cavaleiro, de
couraça e elmo, com bandeiras e montante, jurando combater o bom combate. Toda a sua vida e
uma série de guerrilhas, de batalhas, de agonias, de sofrimentos, provocados, resistidos com altivez,
destemor e sobranceria invulgares".

José da Penha assistiu, no dia 3 de janeiro de 1904, atos de violência praticados por policiais na
cidade de Fortaleza. Revoltado, escreveu um artigo, no outro dia, demonstrando seu protesto.
Militar, foi preso, sendo submetido ao Conselho de Guerra. Foi absolvido. Sua esposa Altina Santos,
nã o suportando o sofrimento, suicidou-se com o revó lver do marido.

José da Penha resolveu seguir para o Rio Grande do Norte para lutar contra a oligarquia Maranhã o,
que dominava o Estado, como sintetiza Aluízio Alves: "de Pedro Velho o governo foi para Ferreira
Chaves, deste para Alberto Maranhã o, irmã o de Pedro Velho, indo em seguida para o genro, Tavares
de Lyra, Antonio de Souza preparou a volta de Alberto Maranhã o, que, por sua vez, fez retornar
Ferreira Chaves, sucedido, num segundo mandato, por Antonio de Souza, todos eles, nos intervalos,
guindados à representaçã o do Congresso Nacional, e Tavares de Lyra e Ferreira Chaves a
ministérios".

Foi para mudar essa situaçã o que José da Penha investiu contra a liderança de Alberto Maranhã o.
Procurou o apoio de um juiz de Caicó , José Augusto, que também combatia a oligarquia Maranhã o.
Mas José Augusto também nã o era favorá vel ao candidato escolhido pela oposiçã o, argumentado a
Joã o da Penha: "se o candidato da oposiçã o fosse o senhor, nestas circunstâ ncias, eu o apoiaria (...)
O que se pretende é destrui-la para montar uma oligarquia nacional, com o filho do presidente da
Repú blica, que nem sequer conhece o Rio Grande do Norte".

Estava certo o Dr. José Augusto. José da Penha, na realidade, combateu o que poderia ser uma
imposiçã o de uma oligarquia Ferreira Chaves, contra uma imposiçã o do pró prio José da Penha. E o
que é pior, ele pretendia impor uma pessoa totalmente estranha ao Rio Grande do Norte, o tenente
Leô nidas Hermes da Fonseca, que, por sinal, apresentava apenas uma qualidade: era filho do
presidente da Repú blica... O capitã o José da Penha teria, sem dú vida, muito mais chance de vitó ria
caso ele pró prio fosse o candidato. Mas é possível que o seu pensamento fosse realmente o de
derrotar a oligarquia Maranhã o: "O meu coraçã o tem a dureza daquelas pedras. E com este rochedo
de carne, hei de esmagar a oligarquia dominante".

José da Penha promovia, assim, a primeira campanha popular da histó ria do Rio Grande do Norte.
Sendo também o primeiro a falar diretamente com o povo. Fazendo uma campanha popular,
conclamando a populaçã o para derrubar uma oligarquia que possuía figuras ilustres, de grande
valor, como Alberto Maranhã o.

Aluízio relata: "a campanha incendiou os â nimos de todo o Estado. nã o foi um movimento restrito à
capital, sempre mais sensível a rebeliõ es populares. Nã o. As cidades do interior recebiam José da
Penha e seus caravaneiros com o povo nas ruas - homens, mulheres, crianças -,aclamando-os,
cantando o hino da campanha, desfraldando bandeiras".

A campanha se desenrolar num clima tenso, propício para que se cometesse violência. Com ameaça
de proibiçã o de comícios da oposiçã o.

José da Penha empolgava com sua orató ria que, na opiniã o de Câ mara Cascudo, "era calorosa e acre,
irritada, vergostante, panfletá ria, satírica:.

No dia 20 de julho de 1913, ocorreu um tiroteio que durou quarenta minutos. A casa em que José da
Penha estava hospedado foi cercada pelo Batalhã o de Segurança, desde a véspera. No tiroteio, D.
Leontina, companheira de José da Penha, foi ferida. Os seus adeptos foram presos e logo depois
soltos.

A primeira campanha popular terminaria de maneira melancó lica. José da Penha foi abandonado
pelo seu pró prio candidato que, na realidade, jamais assumiu a candidatura... Falando sobre o
assunto, Aluízio Alves considera que "a repercussã o na imprensa do Rio, as versõ es espalhadas de
que partira de José da Penha e de seus amigos, o tiroteio, o incitamento à greve, dias antes, a fábrica
de tecidos, fundada por Juvino Barreto, na Ribeira, foram os ú ltimos atos necessá rios para
desvendar o mistério: a primeira campanha popular do Rio Grande do Norte nã o tinha candidato".

Joaquim Ferreira Chaves partiu, entã o, sozinho para a eleiçã o, que se realizou no dia 14 de
setembro de 1913.

E, em 27 de setembro de 1913, José da Penha inicia a sua viagem de volta para o Ceará , via Recife.
No Ceará, ele havia sido eleito deputado estadual.

Pouco depois, Franco Rabelo convocou José da Penha para combater os adeptos do padre Cícero. No
dia 2 de fevereiro de 1914, partiu com duzentos homens para combater mais de mil guerreiros.
Armados e treinados pelo governo federal. Ao se despedir do povo de Fortaleza, vaticinou: "Vou
porque nã o posso faltar. É só voltarei vitorioso ou morto".

E foi o que aconteceu. Morreu combatendo. Suas tropas, contudo, venceram os jagunços, na batalha
de Miguel Calmon, no dia 22 de fevereiro de 1914.
A Questão de Grossos

Limite e Charqueada Criam problema

No século XVIII, o Ceará e o Rio Grande do Norte ainda nã o tinham seus limites demarcados.

Mossoró e Açu, quando fundaram as suas primeiras charqueadas, se tornaram rivais das "oficinas"
cearenses. Medidas sã o tomadas para acabar com as charqueadas do Rio Grande do Norte, inclusive
fechando os portos de Açu e de Mossoró . As carnes secas só poderiam ser fabricadas no Ceará. Para
fabricá -las, porém, era necessá rios o uso do sal produzido no Rio Grande do Norte...

A Câ mara de Aracati sugere estender seus limites, penetrando em territó rio potiguar. O pedido foi
indeferido, com a ressalva de que as vilas limítrofes deveriam concordar com tal medida, caso
contrá rio, a reivindicaçã o seria levada para a decisã o real. Caso as vilas limítrofes nada obstassem,
seria realizada a demarcaçã o. Aquirá s (Ceará ) e Açu (RN) protestaram. Contrariando o que ficou
determinado, o ouvidor substituto, Manoel Leocá rdio Rademarker, mandou dar posse dos terrenos
em litígio à vila de Aracati, ignorando os protestos.

Estava criado o problema.

O territó rio limítrofe continuou sem ser demarcado. O Ceará , porém, nã o desistiu. Em 1894, volta
ao assunto, impetrando uma açã o no Supremo Tribunal, alegando "conflito de jurisdiçã o", que se
transformou posteriormente em "açã o de limites".

A 13 de julho de 1901, a Assembléia Estadual do Ceará elevou Grossos à condiçã o de Vila, em uma
á rea pertencente ao Rio Grande do Norte: Tibau. Grossos etc. Em seguira, o presidente do Ceará ,
Pedro Augusto Borges, sancionou aquela resoluçã o...

Rui Barbosa Defende o Rio Grande do Norte

O governador potiguar, Alberto Maranhã o, protestou. Os norte-rio-grandenses que moravam na


á rea disputada, reagiram... Os dois governos (Ceará e Rio Grande do Norte) mandaram tropas para
o local. Prevaleceu, entretanto, o bom sendo e o conflito armado foi evitado...

A controvérsia foi levada para uma decisã o através do arbitramento, sendo o resultado favorá vel ao
Ceará.

Pedro Velho convidou Rui Barbosa para defender a causa do Rio Grande do Norte. Narra Nestor
Lima: "Assumindo o patrocínio por parte do Rio Grande do Norte, ele formulou uma memó ria
exaustiva do assunto, encarando-o sob todos aspectos, chegando à s conclusõ es magistrais da obra
em que se demonstrou, com a clarividência dos axiomas, a verdade em favor do bom direito ao Rio
Grande do Norte". Foi uma brilhante defesa. Como resultado, o jurista Augusto Petrô nio, através de
três acó rdã os (30/09/1908, 02/01/1915 e 17/07/1920) deu ganho de causa ao Rio Grande do
Norte, definitivamente.

Tavares de Lyra, uma "Relíquia Nacional"

Augusto Tavares de Lyra se entusiasmou, ficou totalmente empolgado com a defesa da causa do Rio
Grande do Norte, na questã o de limites com o Ceará , na chamada 'Questã o de Grossos". Foi, na
realidade, incansá vel. Publicou dois estudos, reunidos em volume, que forneceram importantes
subsídios para que Rui Barbosa elaborasse as suas "Razõ es Finais".

Augusto Tavares de Lyra nasceu no dia 25/12/1872, em Macaíba. Filho do coronel Feliciano
Pereira e de D. Maria Rosalina.
A respeito desse ilustre filho de Macaíba, Carlos Tavares de Lyra escreveu: "só brio no trajar, de
gestos cometidos, palavra fá cil, de limite suave; argumentador seguro, de prodigiosa memó ria,
capaz de citar fatos e episó dios com surpreendente precisã o de pormenores, impressionou,
certamente, a todos que tiveram a fortuna de ouvi-lo; no Parlamento Nacional, no plená rio do
Tribunal de Contas, na cá tedra de professor, na tribuna ,de conferencista (...) Homem raro,
raríssimo, pelo saber, pelas virtudes, pela coerência, pela compostura moral, social, política, de 85
anos lú cidos de vida dedicados à pá tria, à cultura, à família (...). Viveu uma grande e gloriosa vida;
uma vida em linha reta, limpa e clara".

Augusto Tavares de Lyra fez o curso de Humanidades, em Recife. Em 1892, era bacharel em
Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito de Recife. Escolheu advogar em Natal, onde
exerceu mais duas profissõ es: a de jornalista, sendo redator político do jornal "A Repú blica", e a de
professor de Histó ria Geral e do Brasil, no Atheneu Norte-rio-grandense, de 1892 a 1894. A partir
dessa data, surgiu no cená rio nacional, elegendo-se deputado federal, cargo que exerceu até o ano
de 1904. Foi nesse período que ele se empolgou com a defesa do seu Estado, na questã o de limites
contra o Ceará . Pesquisando, começou a se interessar pela Histó ria e Geografia do Brasil e do Rio
Grande do Norte. Em 1902 já tinha publicado "Questã o de Limites entre os Estados do Ceará e do
Rio Grande do Norte". Dois anos mais tarde publicou "Apontamentos sobre a questã o de limites
entre o Ceará e o Rio Grande do Norte".

Em 1904, uma nova experiência: governador do Estado, fazendo uma grande administraçã o,
concluída em 1906. O conselheiro Afonso Pena, impressionado pela inteligência do orador, resolveu
convidá -lo para ser o futuro ministro de Justiça e Interior. Tavares de Lyra aceitou o convite,
exercendo tal funçã o com eficiência até 1909. Lançou, em 1907, "Algumas notas sobre a Histó ria do
Rio Grande do Norte".

Apó s a morte do presidente Afonso Pena, Tavares de Lyra abandonou momentaneamente a vida
pú blica.

Em 1910 foi eleito senador da Repú blica, deixando a funçã o em 1914 para assumir o ministério da
Viaçã o e Obras Pú blicas, até 1918. Foi na presidência de Venceslau Brá s que exerceu por duas
vezes, interinamente, a pasta da Fazenda. Nessa época, publicou "Domínio Holandês no Brasil
especialmente no Rio Grande do Norte" (1915). Alguns anos depois, em 1921, lançou "Histó ria do
Rio Grande do Norte", sua obra mais importante.

No dia 26 de outubro de 1918 foi nomeado ministro do Tribunal de Contas, tomando posse do
cargo em novembro. Em 1940, se aposentou, justamente quando estava na presidência daquele
Tribunal.

O decreto de 11 de janeiro de 1952, publicado no Diá rio Oficial, mandava "inscrever o nome do
ministro Augusto Tavares de Lyra no referido "Livro do Mérito", como merecedor dessa alta
distinçã o, conforme parecer da competente Comissã o".

O presidente Getú lio Vargas considerou Augusto Tavares de Lyra como "uma relíquia nacional", no
discurso que pronunciou no salã o de honra do Palá cio do Catete, em cerimô nia realizada no dia 15
de agosto de 1953, que oficializou a inscriçã o do nome do eminente potiguar no Livro do Mérito.
Recebeu congratulaçõ es de expressivas instituiçõ es de todo o País.

O Instituto Histó rico e Geográ fico Brasileiro mandou cunhar medalha de ouro, alusiva aos 80 anos
de vida do ministro Tavares de Lyra. Esse Instituto dedicou ao ilustre potiguar uma ediçã o especial
de sua revista. O Instituto Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte seguiu o exemplo,
dedicando o vol. LII de sua revista 1a memó ria do ministro Augusto Tavares de Lyra, em 1959.

Tavares de Lyra faleceu na capital federal no dia 21 de dezembro de 1958.


Coronéis, Cangaceiros e Fanáticos

Opções do Sertanejo Abandonado e Pobre

O sertã o brasileiro, mais particularmente o interior do Nordeste, passava por uma crise social sem
precedentes durante o final do século XIX e o início do século XX. O sertanejo se sentia abandonado
pelas autoridades, isolado da civilizaçã o, e sofria com uma infra-estrutura que beneficiava os
grandes proprietá rios das fazendas, os "coronéis", que se tornaram os donos do sertã o. A vida
girava em torno desses "coronéis". Eles protegiam e perseguiam, mandava e desmandavam. Na
política, cometiam todo tipo de fraude para beneficiar seus candidatos. Em seus territó rios,
dependendo da maior ou menor liderança, nada se fazia sem a sua determinaçã o. Os humildes,
portanto, estavam sob o seu domínio.

Os coronéis cometiam arbitrariedades e suas vítimas nã o tinham a quem recorrer. "A situaçã o dos
pobres do campo no fim do século XX, e mesmo em pleno século XX, nã o se diferenciava daquela de
1856. Era mais do que natural, era legítimo, que esses homens sem terra, sem bens, garantias,
buscassem uma "saída" nos grupos de cangaceiros, beatos e conselheiros, sonhando a conquista de
uma vida melhor. E muitas vezes lutando por ela a seu modo, de armas nas mã os", comentou Rui
Facó .

Coronéis, cangaceiros e faná ticos fazem parte de uma mesma realidade. Os coronéis organizavam
grupos armados para, através deles, exercerem o poder. Esses homens armados antecederam o
cangaço. No instante em que se libertaram do jugo dos coronéis e passaram a fazer justiça pelas
pró prias mã os, se transformaram em cangaceiros.

Os cangaceiros foram imediatamente classificados de "bandidos", pelas autoridades e pela elite


sertaneja. Na realidade, eles estavam fora da lei, porque nã o se enquadravam dentro nas regras
vigentes na regiã o: obediência total aos grandes proprietá rios. Alguns fazendeiros de menor
prestígio, para fugir dos desmandos dos "coronéis", faziam aliança com cangaceiros...

Os coronéis podem cometer todo tipo de violência, tomar terras, cometer assassinatos, sem
problemas, porque representavam a sociedade, uma comunidade machista, a lei, o poder.

As oligarquias se auto-intitulavam defensores dos bons costumes, contrá rias, portanto, à açã o dos
"bandidos". O que elas defendiam, na realidade, eram seus bens, uma situaçã o que lhes dava
somente privilégios. Por outro lado, os homens humildes do sertã o, rudes, sem instruçã o, ofendidos
e humilhados, pensando em vingança, nã o podiam agir de outra maneira, a nã o ser através da
violência. O cangaço foi, num certo sentido, um levante contra o absolutismo dos coronéis, e filho da
miséria que reinava numa estrutura latifundiá ria obsoleta e injusta.

O pequeno agricultou, o trabalhador do campo, sonhava com um mundo diferente, onde nã o


houvesse seca, com rios perenes e onde, sobretudo, ninguém passasse fome e houvesse o império
da justiça... Era o mundo que os "beatos" e místicos prometiam para seus adeptos. Os trabalhadores
rurais queriam dialogar com Deus, mas nã o sabiam como agir em busca do caminho que levasse,
todos eles, para o Paraíso. Faltavam, entretanto, sacerdotes. Na ausência dos padres, homens
simples, analfabetos ou nã o, impressionados com a realidade em que viviam, apelavam para o
sobrenatural, rezavam e chegavam a imaginar a si pró prios enviados de Deus, para livrar o povo do
pecado e da miséria, através da oraçã o e de sacrifícios... Para eles somente assim os nordestinos
poderiam atingir a felicidade eterna!

Os dois maiores místicos foram: padre Cícero Romã o Batista e Antonio Conselheiro, ambos
cearenses! O primeiro exerceu uma grande influência em todo o Nordeste e ainda hoje mantém
adeptos no Rio Grande do Norte.

Diferente dos demais, o padre Cícero possuía uma grande cultura e era profundo conhecedor do
sertã o. Acontece que sua fama de "milagreiro" despertou uma reaçã o negativa na pró pria Igreja
Cató lica.
O padre Cícero é a pró pria síntese do sertã o nordestino: nã o foi apenas um fazedor de milagre. Foi
muito mais. Com o passar do tempo, cresceu o seu poder, exercendo grande influência política.
Passou a ser um "coronel". Conviveu com cangaceiros. Teve, inclusive, um encontro com Lampiã o,
dando-lhe a patente de capitã o. O que muitos nã o podiam compreender era a sua opçã o pelos
pobres, provocando um conflito com a ala conservadora da Igreja. Sobre ele, ponderou Neri Feitosa:
"Propô s-se a si mesmo ou recebeu de Deus a missã o de levantar o â nimo do nordestino humilhado
e sofredor, injustificado em seus direitos, embaraçados na saída do tú nel de suas desditas".

Como chefe político, sofreu também oposiçã o daqueles que seguiram orientaçã o contrá ria à sua
maneira de agir.

O Nordeste, naquela época, era uma regiã o onde predominava a miséria, ignorâ ncia e a violência.

Diante desse quadro, é compreensível que o homem rude, nã o fazendo parte dos protegidos dos
coronéis, optasse pelo cangaço para fugir da prepotência dos policiais ou procurasse seguir os
beatos, para se redimir de seus pecados e conseguir, através da oraçã o e do sacrifício, atingir a
felicidade eterna...

Os cronistas urbanos, quase sempre combatiam a açã o dos assaltantes, enquanto os cantadores,
geralmente exaltavam os cangaceiros e também os místicos.

A Arma Era a Lei

Os Reis do Sertão e do Cangaço

Lampiã o é apresentado, de uma maneira geral, como sendo um homem cruel, dos mais violentos.
Mas os cantadores, com seus versos e suas violas, procuravam geralmente justificar as atitudes frias
e violentas do "Rei do Cangaço":

"Por que no ano vinte,


seu pai fora assassinado
da rua da Mata Grande,
duas léguas arredado...

"Lampiã o desde desse dia


jurou vingar-se também,
dizendo: foi inimigo,
mato, nã o pergunto a quem...
Só respeito neste mundo
Padre Cisso e mais ninguém".

Antonio Silvino, diferentemente de Lampiã o, encarnava a figura do justiceiro protetor. Humilde,


ocupava o lugar das autoridades que falhavam pela ausência ou pela opressã o. Nã o possuía a fama
de perverso que acompanhou Lampiã o até sua morte. "A exaltaçã o dos cantadores pelas façanhas
de Antonio Silvino chegou ao delírio", disse Câ mara Cascudo que, comprovar sua afirmaçã o,
apresenta uma prova:

"Cai uma banda do céu,


seca uma parte do mar,
o purgató rio resfria,
vê-se o Diabo com medo,
o céu Deus manda trancar!".

"Admira todo o mundo


quando eu passo em um lugar.
Os matos afastam os ramos,
deixa o vento de soprar,
se perfilam os passarinhos.
Os montes dizem aos caminhos:
- Deixai Silvino passar! ..."

Antonio Silvino dominou o sertã o do Nordeste durante vinte anos, obtendo títulos como "O Rei do
Sertã o" e "Governador do Sertã o".

Em 19 de fevereiro de 1937, Antonio Silvino recebeu o indulto do governo federal.

Diferente foi o destino de Lampiã o. Agressivo, nã o perdoava os seus inimigos. Foi, contudo, uma
vítima da sociedade. Nã o era apenas um bandido e, sim, um grande líder, guerrilheiro infernal,
estrategicamente notá vel, e sabia lutar muito bem contra a polícia.

E esse homem foi derrotado pelos mossoroenses!

Lampião Deixa Rastro de Destruição no RN

No dia 10 de junho de 1927, Lampiã o penetrou com seu bando em Luiz Gomes, no Rio Grande do
Norte. O objetivo dessa marcha era atacar Mossoró . No seu caminho, deixou um rastro de
destruiçã o. Seqü estrou pessoas apenas para pedir resgate. Transformou fazendas em ruínas. Como
disse Raul Fernandes: "O prazer era destruir:.

Em "Caiçara dos Tomá s" houve um confronto com os soldados comandados pelo tenente Napoleã o
de Carvalho Angra, com a derrota dos policiais.

Onde chegava, o bando ameaçava e exigia, sempre dinheiro e jó ias.

Uma parte do grupo de Lampiã o tentou atacar Apodi. A populaçã o, contudo, estava preparada.
Quando os bandidos se aproximaram da cidade, o tenente Juventino Cabral, á frente de policiais e
civis, ordenou que abrissem fogo. Os salteadores resolveram nã o se arriscar. Recuaram.

Em Dix-sept Rosado, praticamente sem ninguém, o bando de Lampiã o praticou diversos atos de
vandalismo. Raul Fernandes transcreveu no seu livro "A Marcha de Lampiã o", a descriçã o feita por
uma testemunha dos acontecimentos: "Demô nios entregues aos maiores desatinos, quebrando
portas, espaldeirando quem encontravam, exigindo dinheiro, roubando tudo, numa fú ria diabó lica.
A palavra de ordem era matar e roubar".

O ataque a Mossoró estava pró ximo.

Rodolfo Fernandes e a Defesa de Mossoró

Poucas pessoas acreditavam que Lampiã o tivesse a ousadia de atacar Mossoró . Um absurdo, diziam
praticamente todos, ou seja, a maioria da populaçã o da "Capital Oeste".

O governador do Estado, José Augusto, encontrava dificuldades em organizar a defesa contra uma
possível investida do "Rei do Cangaço".

O prefeito de Mossoró , coronel Rodolfo Fernandes, contudo, acreditava nessa possibilidade. Ele
tinha consciência de que a situaçã o da cidade era, na realidade, crítica. O tenente Laurentino de
Morais, enviado pelo governo estadual, constatou que a força policial estava composta somente por
vinte e dois soldados... Era preciso tomar medidas urgentes.

Rodolfo Fernandes enviou um emissá rio até Fortaleza (Alfredo Fernandes) para conseguir ajuda do
governador Moreira da Rocha. A missã o fracassou. Apesar de nã o ter atingido seu objetivo, Alfredo
Fernandes adquiriu armas e muniçõ es na capital cearense, que foram de grande utilidade quando
surgiu a hora de defender Mossoró .

O prefeito armou civis e lançou um manifesto, publicado por Raul Fernandes, e que termina com as
seguintes palavras: "A Prefeitura está devidamente autorizada a criar uma Guarda Municipal para
garantir na cidade, que hoje mesmo entrará em açã o. Acresce que recebemos armas suficientes do
Estado e compradas pelo comércio desta praça, que ficam à disposiçã o do Governo Municipal".

Com o tempo passava e o ataque nã o ocorria, tudo fazia crer que o tã o falado ataque jamais
aconteceria. Era o que pensavam também os governadores de três Estados: Rio Grande do Norte,
Ceará e Paraíba.

Dia 12 de junho. O prefeito, incansá vel, promoveu uma reuniã o. Era mais uma tentativa de Rodolfo
Fernandes para alertar o povo da cidade. Esforço inú til. O grosso da populaçã o continuava nã o
acreditando num possível ataque de Lampiã o. Houve, inclusive, neste dia, uma partida de futebol
entre dois grandes clubes rivais: Humaitá x Ipiranga.

Notícias alarmantes, infelizmente, chegavam a Mossoró : o bando de Lampiã o se encontrava em Sã o


Sebastiã o. O delegado tenente Laurentino de Morais, integrado ao grupo do prefeito, tinha,
entretanto, tomado algumas medidas: havia criado vá rias trincheiras.

De repente, os sinos das igrejas começaram a tocar. Era o alarme. Nã o havia mais dú vida, o ataque
de Lampiã o iria se realizar!

O pânico tomou conta da cidade. Alguns procuraram fugir de carro, outros de trem, e determinadas
pessoas, desorientadas, nã o sabiam como agir. A ordem expedida era muito clara: toda pessoa que
nã o tivesse uma arma deveria abandonar a cidade. A razã o para tal medida era que a cidade vazia
facilitaria a defesa, na opiniã o do prefeito. Ele estava certo, como provaria o desenrolar dos
acontecimentos. No tumulto, dois homens se destacaram: o prefeito Rodolfo Fernandes e Vicente
Sabó ia.

O governador José Augusto foi, no mínimo, indeciso. Falhou como governante. Possivelmente
porque nã o acreditasse no ataque de Lampiã o ao município de Mossoró . O Governador, por falta de
medidas urgentes e rá pidas, possibilitou que um grupo de cangaceiros passeasse pelo Estado,
matando, roubando, levando o terror a todas as comunidades interioranas...

Certamente nã o adianta discutir, nos dias atuais, se o governador poderia ter evitado a açã o de
Lampiã o no Rio Grande do Norte, inclusive o ataque a Mossoró . O fato é que medidas importantes
deixaram de ser tomadas e Lampiã o agiu como previra o prefeito Rodolfo Fernandes. Outro aspecto
a considerar é que houve tempo para preparar uma defesa, com distribuiçã o de tropas em pontos
estratégicos, com concentraçã o de forças em Mossoró e em Caicó .

Mossoró Resiste às Investidas de Lampião

Lampiã o mandou um ultimato ao prefeito de Mossoró , exigindo quatrocentos contos para evitar a
invasã o e posterior saque da cidade. A carta onde ele pedia o resgate foi escrita por Antonio Gurgel
do Amaral e entregue por Pedro José.

Rodolfo Fernandes respondeu dizendo que nã o podia enviar a importâ ncia exigida: "Estamos
dispostos a recebê-los na altura em que desejarem. Nossa situaçã o oferece absoluta confiança e
inteira segurança".

Lampiã o nã o se conformou e enviou um bilhete com novas ameaças. Rodolfo Fernandes respondeu
com altivez, reafirmando que nã o dispunha do valor pedido. Concluiu dizendo que "Estamos
dispostos a acarretar com tudo o que o sr. queira fazer contra nó s. A cidade acha-se firmemente
inabalá vel na sua defesa, confiando na mesma".
O ataque começou à s dezesseis horas. Dentro de pouco tempo, o tiroteio atingiu o auge. A
resistência, porém, continuou. O ataque contra a cidadela do prefeito fracassou. Os cangaceiros
tentaram completar o certo. O pessoal da Estaçã o impediu que isso acontecesse. Apó s muito
tiroteio, a vitó ria sorriu para os mossoroenses.

Um grande feito, do qual todo norte-rio-grandense deve orgulhar-se.

Por que Lampião Atacou Mossoró?

O ataque de Lampiã o a Mossoró foi reconhecido por todos, inclusive pelo pró prio "Rei do Cangaço",
como sendo de seu maior erro. Como explicar tal falha de um homem tã o experiente? O ataque foi
idealizado pelo cangaceiro potiguar Massilon Leite Benevides, que conhecia muito bem a regiã o. O
objetivo, como disse Aglae Lima de Oliveira: "saquear as instalaçõ es do Banco do Brasil, a indú stria
e o comércio e as residências, para obter boa colheita", ou entã o, receber de quinhentos a
quatrocentos contos de réis, uma quantia expressiva na época.

Massilon apostou na indiferença da populaçã o que nã o acreditava num ataque de Lampiã o. Nesse
ponto ele acertou. O que jamais poderia imaginar é que, naquela cidade, havia um prefeito com a
clarividência de Rodolfo Fernandes e que os homens daquela terra procurassem corrigir o seu
pró prio equívoco, lutando com bravura até conseguir a vitó ria.

O Sertanista Rodolfo Fernandes de Oliveira

Nasceu em Portalegre, no dia 24 de maio de 1872.

"Ainda adolescente iniciou-se no comércio, em Pau dos Ferros. Emigrou para o Amazonas durante o
primeiro ciclo da borracha (...). Chefiou grupos de seringueiros. Dois anos depois, regressou,
passando a morar em Macau. Trabalhou para a Companhia do Comércio durante cerca de dois anos,
construindo salinas. Fixou-se em Mossoró . Em 1900, consorciou-se com Isaura Fernandes Pessoa,
tendo quatro filhos - José, Julieta, Paulo e Raul. Na firma Tertuliano Fernandes & Cia., também
construiu salinas e substituiu o corta-vento para puxar á gua pelo motor a ó leo, determinando maior
aproveitamento das marés. Em 1918, estabeleceu-se por conta pró pria na indú stria salineira. Eleito
prefeito, de 1926 a 1918, levantou a planta da cidade. Arborizou-a iniciou o calçamento. Projetou
avenidas. Fez vá rias praças e jardins", Registrou Raul Fernandes.

Foi o grande líder da resistência contra Lampiã o e seu bando. Sobre esse tema, afirma Raimundo
Nonato: "divergindo de muitos, cedo se apercebeu da existência do perigo e tomou a iniciativa da
organizaçã o da defesa da cidade com a presteza e energia que a situaçã o reclamava".

"Nã o perdeu tempo com palavras e tergiversaçõ es, mobilizou os elementos necessá rios para a luta,
planejou a resistência, conclamou o povo e advertiu as autoridades da iminência do perigo. (...) Esse
espírito de previdência do atilado sertanista foi a salvaçã o da cidade, dias depois, defendida
corajosamente, pela sua populaçã o civil em armas que se aportou com valentia, destemor e a
serenidade que lhe assegurou a vitó ria final".

Em um aviso dirigido à populaçã o de Mossoró , com o objetivo de tranqü ilizar a todos, Rodolfo
Fernandes de Oliveira descreve as medidas tomadas pelo governo do Estado. Essa afirmaçã o visava
realmente dar a impressã o que a prefeitura estava pronta, em termos militares, para enfrentar um
ataque de um bando de criminoso fortemente armados. Nã o estava. Mas tinha que tomar tal posiçã o
para nã o semear a intranqü ilidade e o pavor.

A certeza de que Mossoró seria atacada por Lampiã o se baseava em informaçõ es recebidas pelo
prefeito. Joaquim Felício de Moura, comerciante de Mossoró , foi avisado por Antonio Pereira de
Lima, na localidade de Misericó rdia, que Lampiã o pretendia assaltar a cidade. Pediu, inclusive, que
levasse a notícia ao coronel Rodolfo Fernandes, Argemiro Liberato, da Paraíba, escreveu uma carta
ao prefeito revelando as pretensõ es de Lampiã o em invadir Mossoró .
O empenho do coronel Rodolfo Fernandes em defender a cidade foi tã o intenso que ele se
descuidou dos negó cios particulares, inclusive de si mesmo e de sua saú de. Por essa razã o, nã o
chegou a terminar o seu mandato. Morreu no dia 11 de outubro de 1927 no Rio de Janeiro.

O Cangaceiro Potiguar Jesuíno Brilhante

Jesuíno Alves de Melo Calado nasceu no sítio Tuiuiú , no município de Patu, Rio Grande do Norte, em
1844.

Filho de José Alves de Melo Calado e D. Alexandrina Brilhante de Alencar.

Para Câ mara Cascudo, ele "foi o cangaceiro gentil-homem, o bandoleiro româ ntico, espécie matuta
de Robin Hood, adorado pela populaçã o pobre, defensor dos fracos, dos velhos oprimidos, das
moças ultrajadas, das crianças agredidas (...) Baixo, espadaú do, ruivo, de olhos azuis, meio fanhoso,
ficava tartamudo quando zangado. Homem claro, desempenado, cavaleiro maravilhoso, atirador
incompará vel de pistola e clavinote, jogava bem a faca e sua força física garantia-lhe sucesso na
hora do "corpo a corpo". Era ainda bom nadador, vaqueiro afamado, derrubador e laçador de gado.

Sua pontaria infalível causava assombro, especialmente porque Jesuíno, ambidestro, atirava com
qualquer das mã os.

Casou com D. Maria, tendo cinco filhos dessa uniã o.

Envolvido com uma questã o de família, Jesuíno matou o negro Honorato Limã o, no dia 25 de
dezembro de 1871. Foi sua primeira vítima.

Como lembra Tarcísio Medeiros, era "irredutível em questã o de honra". O autor, em seguida, cita
um texto de Raimundo Nonato, que narra um episó dio, onde Jesuíno Brilhante se hospedou em uma
casa. O marido estava ausente. Um bandido, de nome Montezuma, procurou se aproveitar da
situaçã o para perseguir a proprietá ria da casa. Jesuíno, revoltado, matou o malfeitor. Outro caso:
assassinou um escravo, José, porque tentou violentar uma mulher.

Segundo Cascudo, "ficaram famosos os assaltos à cadeia de Pombal(PE) para libertar seu irmã o
Lucas (1874) e, no ano de 1876, à cidade de Martins (RN). Cercado pela polícia local, Jesuíno e seus
dez companheiros abriram passagem através de casas, rompendo as paredes, cantando a antiga
"Curujinha".

Câ mara Cascudo afirma ainda que Jesuíno "nunca exigiu dinheiro ou matou para roubar".

A imaginaçã o popular acrescentou à biografia do cangaceiro centenas de batalhas, das quais Jesuíno
Brilhante teria participado sem que tivesse levado um só tiro...

Em dezembro de 1879, na regiã o das Á guas do Riacho de Porcos, Brejos da Cruz, na Paraíba, Jesuíno
foi atingido no braço e no peito, sendo levado, agonizante, por seus amigos. Morreu no lugar
chamado "Palha", onde foi sepultado.

Em 1883, o Dr. Francisco Pinheiro de Almeida visitou o tú mulo do bandido e levou a caveira do
cangaceiro para sua casa, em Mossoró . Apó s sua morte, a caveira de Jesuíno foi levada para o Grupo
Escolar "30 de Setembro". No ano de 1924, a caveira foi transferida para a Escola Normal.

A Estrutura Política do Coronelismo

Os grandes inimigos dos cangaceiros eram as "volantes" (polícia) e os grandes proprietá rios das
fazendas, conhecidos pela denominaçã o genérica de "coronéis".
Para Joã o Camillo de Oliveira Torres, o coronelismo é a "estrutura política por intermédio da qual
os chefes de clã s rurais e grande latifundiá rios assumiram o controle da açã o política". E acrescenta:
"a distribuiçã o de postos da Guarda Nacional, que exercia mais funçõ es de "ordem honorífica" do
que, propriamente, de corpo de tropa, obedecia ao critério de posiçã o social e política dos
indivíduos".

O coronel é, portanto, o chefe político, quase sempre o grande latifundiá rio, exercendo um
verdadeiro monopó lio da terra. E "o monopó lio da terra, abrigando em seu seio uma economia
voltada essencialmente para a exportaçã o de alguns produtos, entravou brutalmente o crescimento
das forças produtivas", analisa Rui Facó .

O mesmo autor acredita ainda que foi "o monopó lio da terra que nos reduziu ao mais lamentá vel
atraso cultural, como isolamento, ou melhor, o encarceramento em massa das populaçõ es rurais na
interlâ ndia a que chamamos sertã o, estagnada por quatro séculos. Analfabetismo quase
generalizado. Ignorâ ncia completa do mundo exterior, mesmo o exterior ao serã o, ainda que nos
limites do Brasil".

É nesse cená rios que os coronéis reinavam.

O coronel, para exercer sua influência em sua regiã o, tinha que ser "homem macho", capaz de matar
ou mandar matar qualquer pessoa que contrariasse os seus interesses...

Contava também com um grande nú mero de protegidos, seus ä filhados"...

Maria Isaura Pereira de Queiró s registra as interminá veis lutas de família, que deixaram um rastro
de sangue nas terras nordestinas. Cita exemplos: os Cunha e os Pereira, no Ceará .

O fato é que nã o se pode analisar o fenô meno do coronelismo somente como uma forma do poder
privado, sem qualquer relaçã o com o cangaço e com o fanatismo religioso. É igualmente um
"compromisso" do poder pú blico. Resultado em fenô menos como mandonismo, filhotismo,
falseamento de votos e na "desorganizaçã o dos serviços pú blicos", como mostra Joã o Camilo de
Oliveira Torres. Do compromisso resulta a "reciprocidade", ou seja, o coronel, na sua á rea de açã o,
recebe ajuda do poder pú blico (nomeaçõ es de funcioná rios pú blicos), facilitando, por sua vez, a
atuaçã o do governo.

Em síntese, esse é o contexto do coronelismo no Nordeste nos primeiros tempos da Repú blica.

Theodorico Bezerra: de Cabo a "Major"

Nasceu em Santa Cruz, Rio Grande do Norte, sendo filho de José Pedro Bezerra e Anna Bezerra.

Fez os primeiros estudos em sua terra. Em 1917 foi estudar em Natal, no colégio Santo Antonio.
Apó s dois anos de estudos voltou para Santa Cruz, por causa da situaçã o financeira precá ria de sua
família.

Em 1915 exercia o comércio, como ambulante. Nascimento Bezerra informa que "em princípio
compra e vende tudo, mas o negó cio de couro é que tem maior expressã o. Parou suas atividades
quando foi servir o exército, mais precisamente no 21º Batalhã o de Caçadores, onde permaneceu de
1923 até 1924, quando chegou até o posto de cabo. Por essa razã o, ficou conhecido pela alcunha de
"cabo". O título de "major" apareceu depois, quando militava na política.

Saindo do exército, comprou, juntamente com um amigo, um caminhã o. Depois, vendeu sua parte e
comprou, em Natal, o "Hotel dos Leõ es". Aos poucos, foi comprando outros, como afirma Raimundo
Alves de Souza:"o internacional", Avenida e "Palace Hotel", até fixar-se definitivamente no ramo
com o arrendamento do "Grande Hotel", em 1939.
Theodorico Bezerra, apesar de suas inú meras atividades, ficou conhecido sobretudo como algo que
na realidade nunca deixou de ser: um coronel, do tipo definido por Maria Bezerra: "é um coronel
que emerge e se modela no trânsito entre o novo apogeu do coronelismo e seu rápido declínio.
Projeta o perfil de um "novo coronel" despido das características anteriores de truculência,
jaguncismo, desacato à s autoridades constituídas que lhe estorvassem os propó sitos particulares
vestindo-o de uma roupagem de corte mais ajustado ao figurino da época que transcorre: pacifismo,
moradores desarmados, colaboraçã o à s instituiçõ es governamentais.

Um dos traços fundamentais da personalidade de Theodorico Bezerra é o seu dinamismo. Sempre


procurou diversificar suas atividades, sendo vencedor em todas elas. Como fazendeiro, chegou a
criar um verdadeiro império: Irapuru, sua maior fazenda. Como comerciante, se tornou só cio de
uma agência de carros; proprietá rio de uma farmá cia; dono de uma casa de fogos. Chegando
inclusive a fazer parte da diretoria da Associaçã o Alves de Souza. Como político, foi um grande líder,
com uma importante participaçã o na vida partidá ria do Rio Grande do Norte. Entrou para a política
sob a influência do interventor Fernandes Dantas. No dia 23 de maio de 1945 ingressou no Partido
Social Democrá tico. No ano de 1947, foi eleito deputado estadual. Venceu as eleiçõ es para
governador.

O primeiro projeto de Theodorico Bezerra na Assembléia Legislativa foi a criaçã o do município de


Sã o José de Campestre, que se transformou em lei. Foi também membro da Comissã o do Comércio,
Indú stria, Agricultura e Obras Pú blicas.

No dia 3 de fevereiro de 1949, assumiu o comando do PSD. Em 1950 foi eleito deputado federal. No
ano de 1960 apoiou Aluízio Alves e monsenhor Walfredo Gurgel para governador e vice,
respectivamente. Grande campanha, cujo desenrolar será estudado mais adiante, em outro
fascículo. Dois anos mais tarde o "major", acostumado a vencer, obteve sua primeira derrota na
política; nã o conseguiu se eleger senador da Repú blica. Ficou muito frustado, como se pode
constatar, através dessa declaraçã o, citada por Raimundo Alves de Souza: "Fiz tudo para ter o padre
como companheiro de disputa das vagas no Senado. Desejava ver dois pessedistas vitoriosos.
Porém esqueci que tem mais capelas, igrejas e santuá rios que diretó rios do PSD. E o padre teve
mais votos do que eu". Pouco tempo depois, assumiu o cargo de vice-governador, na vaga deixada
por monsenhor Gurgel, eleito senador. Assumiu também a presidência da Assembléia Legislativa do
Rio Grande do Norte.

Como político, é claro, possuía uma visã o coronelística. Tudo era vá lido, contando que levasse à
vitó ria: "ameaça, suborno, pedido humilde, favores, traiçõ es, tudo".

Em sua fazenda Irapuru, recebia os visitantes com grandes festas. Possuía duas bandas, uma
integrada por homens e outra composta totalmente por mulheres.

Certa vez, recebeu uma turma de alunos e professores de uma escola do município de Natal,
soltando foguetõ es e com desfile de duas bandas. Uma moça, ao sair do ô nibus, descascava uma
laranja para comer. Theodorico viu e ordenou que a estudante guardasse a laranja porque, caso
contrá rio, nã o teria fome na hora do almaço. E foi servido realmente um grande banquete, farto em
alimento e bebidas...

Theodorico Bezerra, inteligente e trabalhador, sabendo tirar proveito da influência que desfrutava
na política, conseguiu somar uma grande fortuna. Em suas fazendas chegou a produzir, à s vezes, mil
quilos de algodã o. Possuiu ainda duas usinas de beneficiamento de algodã o; três fábricas de ó leo, e
uma refinaria de ó leo, informa Maria do Nascimento Bezerra. Em Natal, dirigiu o Grande Hotel, que
teve um papel de destaque durante a Segunda Guerra Mundial, considerado como sendo o melhor
da cidade. Sobre Theodorico Bezerra, nesse período, Clyde Smith Junior fez a seguinte observaçã o:
"um norte-rio-grandense simpatizante dos alemã es, mas interessado principalmente em dinheiro"...
Foi dono da Rá dio Trairi e do Jornal do Comércio de Natal.

Quanto morreu, já nã o desfrutava do prestígio de outrora.


Fanáticos da Serra de João do Vale

Luís da Câ mara Cascudo pediu, em um de seus artigos, "licença para contar uma histó ria que nunca
foi contada". Esse estudo foi publicado pela primeira vez no Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro,
em 9 de fevereiro de 1941 e transcrito, posteriormente, na revista do Instituto Histó rico e
Geográ fico do Rio Grande do Norte.

Tema do artigo: os faná ticos da Serra de Joã o do Vale. Mais tarde, Tarcísio Medeiros abordou o
assunto em seu livro "Aspectos Geográ ficos e Antropoló gicos da Histó ria do Rio Grande do Norte".

É , portanto, uma histó ria pouco conhecida.

O local em que tudo aconteceu foi a Serra de Joã o do Vale, que fica no município de Augusto Severo.
Possui tal denominaçã o porque herdou o nome do seu primitivo proprietá rio, Joã o do Vale Bezerra.

Joaquim Ramalho do Nascimento, que seria um dos chefes dos faná ticos, nasceu no sítio "Cajueiro",
em 1862, filho de Manuel Ramalho do Nascimento e de dona Isabel Maria da Conceiçã o.

Luís da Câ mara Cascudo traçou o perfil de Joaquim Ramalho, com as seguintes palavras: "Gordo,
lento, apá tico, amarelo, foi menino sujeito à s cismas, meditaçõ es longas, olhar parado,
acompanhando um pensamento misterioso. Com poucos anos, afirma-se a tendência mística, nas
oraçõ es sem fim, passos tirmoados, braços para o firmamento, rezando missas, impondo
penitências".

Joaquim Ramalho cresceu e, adulto, se casou, passando a morar na Vila do Triufo. Continuou,
entretanto, com o mesmo comportamento estranho, rezando sempre.

No final de 1894, morreu o vigá rio de Triunfo, padre Manuel Bezerra Cavalcante, com oitenta anos,
sendo chorado por toda a comunidade.

No ano de 1898, Joaquim Ramalho teve um ataque, assim descrito por Câ mara Cascudo:
"Bruscamente parou, nauseante, gorgulhando vô mitos e caiu de bruços, pesadamente". Durante a
crise, começou a cantar. Quando recobrou os sentidos, nã o se lembrava de nada. O fenô meno se
repetiu nas outras tardes seguintes. A notícia se espalhou rapidamente, crescendo o nú mero de
curiosos, todos querendo assistir à cena. Estava nascendo mais um líder místico no sertã o
nordestino. Como Joaquim Ramalho tinha lido Allan Kardec, acreditou que estava sendo possuído
pelo espírito do velho vigá rio. Dentro em breve, segundo o beato, o espírito de outro sacerdote
passou a se encarnar nele: padre Manuel Fernandes, vigá rio de Macau.

À medida que o arraial crescia, tudo se desorganizava nos arredores. As pessoas abandonavam o
trabalho para seguir o beato, ao mesmo tempo em que aumentava a devassidã o.

Um mestiço, de nome Sabino José de Oliveira, de acó lito de Joaquim Ramalho subiu de categoria
quando recebeu o espírito de um padre italiano, chamado Brito de Maria da Conceiçã o.

Nessa altura dos acontecimentos, "a moral desceu à quota zero" na palavras de Câ mara Cascudo.

Começaram, entã o, a surgir reclamaçõ es. O coronel Luiz Pereira Tito Já come denunciou o
movimento ao governador do Estado, desembargador Joaquim Ferreira Chaves que, recebendo
vá rias queixas, nomeou o tenente do Batalhã o de Segurança, Francisco Justino de Oliveira Cascudo,
para acabar com a festa.

Os dois místicos foram presos em "Pitombeira". Nã o houve nenhuma reaçã o. Joaquim Ramalho
disse apenas que "Deus foi preso, quando mais eu...".
Sabino caiu no chã o, como se estivesse sendo possuído por um espírito. O tenente, inteligente,
percebeu a "farsa", e bateu nele com a espada. Sabino se ergueu rá pido, dizendo: "Pronto seu
tenente, o espírito já saiu, Voou na ponta da espada...

"Joaquim e Sabino foram presos e levados para a cadeia de Triunfo. E desmoralizados perante seus
adeptos, por causa das declaraçõ es que eles prestaram à polícia. O processo policial, contudo, nã o
deu em nada. Os dois beatos foram colocados em liberdade.

Joaquim Ramalho, ao sair da prisã o, voltou a trabalhar na agricultura. Morreu no seu sítio "Malhada
Redonda", com idade avançada, picado por uma cascavel. Nunca mais recebeu "espírito"... O outro
nã o se sabe como terminou. Uma coisa é certa: ficou totalmente curado...

A Revolução de 1930

Impasse na Política Café com Leite

Foram principalmente os motivos de origem política e econô mica que determinaram a eclosã o do
movimento revolucioná rio de 1930 no Brasil.

A crise do sistema capitalista mundial a parti de outubro de 1929, que atingiu as nossas
exportaçõ es de café, funcionou como determinante de ordem econô mica. Quando o presidente
Washington Luís transferiu ao Instituto do Café do Estado de Sã o Paulo a responsabilidade para
solucionar o impasse surgido no setor exportador do principal produto brasileiro, perdeu o apoio
dos cafeicultores, que lhe conferiam sustentá culo político.

O rompimento da política "café com leite", que determinava a alternâ ncia de um presidente paulista
e um mineiro frente ao governo do País, teria sido a causa política.

A comprovaçã o de fraude eleitoral na escolha de Jú lio Prestes para a Presidência da Repú blica, o
assassinato de Joã o Pessoa, vice-presidente derrotado, funcionaram como causas imediatas do
movimento revolucioná rio que marca o início da Segunda Repú blica no Brasil.

Um Marco na História Brasileira

A revoluçã o de 30 foi, na realidade, um marco na histó ria brasileira. Com ele terminou a Repú blica
Velha.

Questionam historiadores e soció logos quanto à natureza do movimento de outubro de 1930.


Alguns consideram que pode ser chamado de "revoluçã o", pois teria sido responsá vel pelo
desmoronamento da ultrapassada estrutura política das Primeira Repú blica. Outros negam essa
denominaçã o alegando que as mudanças advindas em 1930 nã o teriam alterado radicalmente o
País.

É também questionado o cará ter "burguês" do movimento. As críticas sã o justificadas, na alegaçã o


de que nã o houve uma oposiçã o significativa entre o setor agrá rio-exportador e a burguesia
industrial que, naquela época, nã o tinha força suficiente para liderar qualquer movimento. Além do
mais, a "Aliança Liberal" nã o poderia, na sua totalidade, ser apresentada como porta-voz da
burguesia industrial, pois era uma realidade a presença de elementos extremamente
"conservadores" em suas fileiras.

O que se pode concluir é que, em 1930, forças heterogêneas se somaram e preparam o cená rio para
a açã o que de certa maneira viria alterar, a ambiência política da época.

Regime de Exceção

Elogios e Críticas à Era Vargas


Certos depoimentos daqueles que participaram, direta ou indiretamente, dos episó dios que
marcaram a Revoluçã o de 1930 no Brasil sã o marcados pela emoçã o, pelo grau de simpatia ou de
rejeiçã o. Sobretudo à figura do seu principal líder, Getú lio Vargas. Algumas críticas, por outro lado,
estã o marcadas por um forte conteú do ideoló gico.

Os elogios e as críticas confirmaram que a Revoluçã o de 1930 se constituiu num marco da


historiografia brasileira. Quando o vendaval de paixõ es passar - o que parece que já está ocorrendo
-, será possível ter uma idéia mais clara do conjunto de suas realizaçõ es, sua contribuiçã o maior ou
menor para o engradecimento do País.

Enquanto isso, algumas conclusõ es, a priori, sã o definitivas. Como a de Boris Fausto de que "a
Revoluçã o de 1930 põ e fim à hegemonia da burguesia do café, desenlace inscrito na pró pria forma
de inserçã o do Brasil no sistema capitalista (...). No ataque ao predomínio da burguesia cafeeira,
revelando traços específicos, que nã o podem ser reduzidos simplesmente ao protesto das classes
médias (...) Vitoriosa a revoluçã o, abre-se uma espécie de vazio do poder, por foça do colapso
político da burguesia do café e da incapacidade das demais fraçõ es de classe para assumi-lo, em
cará ter exclusivo. O Estado de compromisso é a resposta para esta situaçã o. Na descontinuidade de
outubro de 1930, o Brasil começa a trilhar enfim o caminho da maioridade política.
Paradoxalmente, na mesma época em que tanto se insistia nos caminhos originais autenticamente
brasileiros para a soluçã o dos problemas nacionais, iniciava-se o processo de efetiva constituiçã o
sobre a nacionalizaçã o do trabalho; salá rio mínimo; sindicalizaçã o", disse Cruz Costa.

Houve, naturalmente, algumas distorçõ es na polícia trabalhista. Mas nã o se pode negar, por causa
disso, o grande valor da legislaçã o trabalhista, considerada, como todos sabem, "uma das mais
avançadas do mundo". Afirmou ainda Cruz Costa que "a legislaçã o trabalhista de Vargas antecipou-
se no tempo aos conflitos que iriam dar aos operá rios a consciência política de seu papel numa
sociedade em processo de industrializaçã o".

Vargas pode nã o ter sido o criador do Estado brasileiro, porém, usou um regime de exceçã o para
consolidar o Estado Nacional brasileiro. Antes de 37, cada Estado praticamente se constituía numa
unidade autô noma, com um governo federal muito frá gil. Sã o Paulo, por exemplo, tinha sua Força
Pú blica (polícia) um verdadeiro exército que contou, inclusive, "com uma missã o instrutora
composta de oficiais franceses", informa Cruz Costa.

O lado negra "Era Vargas" foi, sem dú vida, o cará ter fascista de sua administraçã o durante o
período em que agiu como ditador.

Os Tenentes de Juarez Távora no NE

A propagaçã o do ideá rio de 1930 chegou ao Nordeste quando o coronel Maurício Cardoso foi
nomeado para comandar o 22º BC, sediado na entã o cidade da Paraíba, capital do Estado do mesmo
nome. Como ele vieram três oficiais: Jurandir Mamede, Agildo Barata Ribeiro e Juraci Magaljã es.
Esses homens eram conhecidos como sendo os "tenentes" de Juarez.

Nã o é possível uma apreciaçã o do movimento de 1930 no Nordeste sem uma referência a Juarez
Tá vora. Na época, ele estava detido na Fortaleza de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, por determinaçã o
da polícia de Washington Luís. Conseguindo, mesmo prisioneiro, entrar em contato com Luís Carlos
Prestes, chefe do Partido Comunista, foi incentivado a fugir para comandar o movimento no
Nordeste. Tá vora fugiu, conseguindo chegar até a Paraíba. A sua fuga foi considerada quase
impossível de se realizar, na ocasiã o.

A Paraíba que depois tornou-se a cidade de Joã o Pessoa, e a capital pernambucana, Recife, se
tornaram os centros de divulgaçã o no Nordeste. A primeira, por concentrar um grande contingente
militar, e Recife, pela sua importâ ncia política e econô mica na regiã o nordestina,

A data escolhida para o início da revoluçã o foi 3 de outubro. A hora estabelecida seria 17h30.
Contam Antonio Augusto Faria e Edgard Luiz de Barros que "em Pernambuco, Juarez Tá vora se
atrasou um dia para atacar Recife; mas a populaçã o tomou prédios e depó sitos de armas, facilitando
a açã o dos rebeldes, que logo tomaram também a Paraíba. Enviando tropas para dominar a Bahia,
sob o comando de Juraci Magalhã es, e o Pará , com Landy Salles, Juartez e os "tenentes" em poucos
dias controlavam todo o Norte e o Nordeste".

Aliança Liberal e Dias de Pânico em Natal

Juvenal Lamartine governa o Rio Grande do Norte. Além de uma extrema dependência em relaçã o
ao poder central, o seu governo se caracterizou pela intolerâ ncia política para com os seus
adversá rios. Nesse contexto, Joã o Café Filho fazia oposiçã o. Perseguido, fugiu para a Paraíba. E se
integrou ao movimento promovido pela "Aliança Liberal", que defendia a candidatura de Getú lio
Vargas para presidente da Repú blica e Joã o Pessoa para vice.

Os candidatos da oposiçã o ao governo Washington Luís, Getú lio e Joã o Pessoa, foram derrotados no
Rio Grande do Norte. Afirmam os historiadores que a derrota foi causada pelo apoio dado por
Juvenal Lamartine ao paulista Jú lio Prestes.

Os adeptos da "Aliança Liberal" no Rio Grande do Norte formavam, na realidade, um pequeno grupo
que recebeu o apoio do coronel Dinarte Mariz no Seridó .

Juvenal Lamartine, ao tomar conhecimento do início da revoluçã o, abandonou o Estado, na noite de


5 de outubro de 1930.

O maior Luiz Tavares Guerreiro, à frente do 29º BC, partiu da Paraíba e chegou a Natal no dia 6, sem
encontrar qualquer tipo de resistência. Natal viveu dias de pânico, assim descritos por Tarcísio
Medeiros: "tropas de desocupados, aventureiros, que atemorizaram as famílias natalenses,
obrigando os incautos, nos comícios das praças, ajoelhar quando era cantado o hino a Joã o Pessoa:
"Joã o Pessoa, Joã o Pessoa, bravo filho do sertã o. Toda a pá tria espera um dia a sua ressurreiçã o... '
Ai daquele que nã o obedecesse!".

Para governar o Rio Grande do Norte foi formado um triunvirato composto por Luiz Tavares
Guerreiro, capitã o Abelardo Torres da Silva e o tenente Jú lio Perouse Pontes.

A junta procurou manter a ordem durante o período que governou, de 6 a 12 de outubro de 1930.
Apó s essa data, o Estado passou a ser governado pelos dois civis (o primeiro e o ú ltimo) e três
militares.

O Rio Grande do Norte voltaria a ser governado por interventores apó s a decretaçã o do Estado
Novo, em 1937.

Os Interventores no Rio Grande do Norte

Com a nomeaçã o dos interventores, começou a fase institucional da Revoluçã o de 30 no Rio Grande
do Norte.

Marlene Mariz define o sistema instaurado da seguinte maneira: "Os interventores eram o pró prio
instrumento de controle do poder central em cada Estado. Representam o empenho deliberado de
alterar as relaçõ es Estado/Uniã o, transformaçã o esta desejada pelos tenentes e, especificamente,
por todos os revolucioná rios nortistas".

O Rio Grande do Norte contou com cerca de cinco interventores: Irine Jofily (apoiado por Café
Filho), Aluísio de Andrade Moura, Hercolino Cascardo, Bertino Dutra da Silva e, finalmente Má rio
Leopoldo Câ mara.
Irineu Jofily encontrou dificuldades para implantar os ideais revolucioná rios no Estado porque os
oligarcas estavam ainda muito fortes. O sistema oligá rquico nã o permitia que medidas contrá rias
aos seus interesses fossem implantadas. Por essa razã o, Jofily pediu demissã o.

Aluísio Moura iniciou a fase de administradores militares.

Juarez Tá vora, que comandava a Delegacia do Norte, designou dois militares para "assessorar" o
novo interventor: os tenentes Ernesto Geisel, para a Secretaria Geral e diretor do Departamento de
Segurança Pú blica, e Paulo Cordeiro de Melo, para o Comando do Regimento Policial. Existe apenas
uma explicaçã o para justificar essas duas nomeaçõ es: falta de confiança de Juarez Tá vora em
Aluísio Moura...

Com o objetivo de afastar Café Filho e seus adeptos da administraçã o, os cafeístas foram acusados,
pelo interventor, de comunistas que conspiravam contra o governo. Como resultado, todos foram
presos. Pedro Dias Guimarã es, que exercia a funçã o de prefeito de Natal, e ainda Edgar Siqueira,
José Anselmo e Sandoval Wanderley. Depois, o interventor, alegando que tudo que se dizia dos
cafeístas era falso, mandou libertar a todos...

Cresceu o descontentamento dos setores ligados à Revoluçã o de 30, por causa do apoio dado ao
grupo que se encontrava no poder antes de 1930, por essa razã o, Aluísio Moura foi substituído por
outro militar: o comandante Hercolino Cascardo.

O Rio Grande do Norte se encontrava nessa época, numa situaçã o difícil. Cascardo, contudo,
procurou desenvolver o Estado, atuando sobre os produtos que sustentavam sua economia: cultura
do algodã o e indú stria salineira. Outro aspecto importante é que ele procurou governar sem se
envolver nos conflitos locais, escolhendo seus auxiliares entre os mais capazes. Sentindo-se
desprestigiado perante o governo provisó rio, pediu exoneraçã o do cargo, apesar do apoio de Café
Filho e de seus correligioná rios.

O novo interventor, Bertino Dutra da Silva, encontra o Rio Grande do Norte numa situaçã o muito
dedicada. As forças políticas tradicionais continuavam sendo um obstá culo para que os ideais
revolucioná rios se instalassem no Estado.

Em 1932 explodiu a Revoluçã o Constitucional, liderada por Sã o Paulo e que, segundo alguns,
possuía um cará ter separatista. Foi fundada no Rio Grande do Norte a "Uniã o Democrá tica Norte-
rio-grandense", comandada pelo monsenhor Joã o da Matha e por Gentil Ferreira de Souza,
apoiando o movimento a favor da constitucionalizaçã o do País. Como afirma Marlene Mariz, "os
coronéis potiguares chegaram até enviar seus capangas para lutar ao lado dos paulistas contra o
governo provisó rio e o regime de exceçã o".

As forças conservadoras nã o ficaram apenas nesta açã o. Visando a eleiçã o da Constituinte Nacional
de 1933, fundaram o "Partido Popular", chefiado por Dr. José Augusto Bezerra de Medeiros, líder
seridoense.

O interventor Bertino Dutra reagiu e fundou o 'Partido Social Nacionalista do Rio Grande do Norte".

A campanha se desenvolveu num clima de agitaçã o, com atitudes que caracterizavam um grande
radicalismo.

A 3 de maio de 1933, realizou-se a eleiçã o para a Constituinte Nacional, com a vitó ria da oposiçã o
que conseguiu eleger três candidatos: Alberto Roseli, Francisco Martins Veras e José Ferreira de
Souza, Kerginaldo Cavalcanti de Albuquerque foi o ú nico eleito pela situaçã o.

Café Filho, o homem forte do governo, era o alvo preferido da oposiçã o, sendo inclusive baleado
pelo capitã o do exército Everardo Vasconcelos apó s uma discussã o entre os dois.

Derrotado, Bertino Dutra passou o cargo ao seu substituto legal, tenente Sérgio Marinho.
O novo interventor, Má rio Leopoldo da Câ mara, foi designado para executar a missã o de pacificar o
Rio Grande do Norte, formando uma aliança com o Partido Popular, o mais forte do Estado.

Entretanto, apesar de sua eficiência como administrador, Má rio Câ mara permitiu que crescesse o
clima de agitaçã o e de violência. Joã o Medeiros Filho, no programa "Memó ria Viva", da TV
Universitá ria, traçou o seu perfil: "Má rio Câ mara era um administrador honesto. Depois, foi
envolvido pelos políticos profissionais, fincando alucinado pelo poder. Daí a violência que
caracterizou o final do seu governo".

Em vez de se unir à s forças tradicionais, terminou fazendo uma aliança com Café Filho, com o fim de
derrubar o Partido Popular.

O Rio Grande do Norte viveu, entã o, um clima de agitaçã o nunca antes experimentado em sua
histó ria, incluindo assassinatos, espancamentos etc.

Em síntese, como administrador, Má rio Câ mara fez vá rias obras (construir 43 prédios escolares,
abriu estradas etc.), porém "com esse homem caiu sobre a terra potiguar a maldiçã o terrível da
desuniã o política, que fez desencadear a mais torpe campanha eleitoral de 1934", afirma Tarcísio
Medeiros.

Como uma conseqü ência desse clima de agitaçã o, se pode apontar a intentona comunista de 1935.

Ao se fazer um balanço sobre a Revoluçã o de 30 no Rio Grande do Norte, cujas diretrizes deveriam
ser executadas pelos interventores, fica muito claro que as oligarquias, com o seu sistema político
consolidado, evitaram que mudanças maiores de operassem no Estado, gerando um confronto num
clima de agitaçã o e violência entre os partidá rios da Revoluçã o de 30 e os oligarcas.

Joã o Café Filho se destacou na luta para destruir as velhas estruturas, mas nã o reunia força
suficiente para conseguir realizar os seus propó sitos.

Por outro lado, os conservadores possuíam grandes líderes, alguns detentores de vasto saber,
como, por exemplo, José Augusto de Medeiros, o grande arquiteto da resistência das forças
tradicionais.

A massa popular queria mudança, porém, iletrada, nã o sabia que rumo tomar, praticando, às vezes,
atos de violência como sinal de protesto.

Segundo Marlene Mariz, "a Revoluçã o trouxe efeitos para o Rio Grande do Norte no tocante a
mudanças no comportamento do operariado, com sindicatos organizados e amparados pelas leis
trabalhistras, que vã o marcar o início do populismo", graças à atuaçã o de Café Filho.

João Café Filho: Do Sindicato ao Catete

Joã o Café Filho foi o grande líder da Revoluçã o de 30 no Rio Grande do Norte.

Nasceu no dia 3 de fevereiro de 1899, na rua do Triunfo, Ribeira, em Natal. Filho de Joã o Fernandes
Campos Café e de Florência Amélia Campos Café.

Os seus estudos iniciais foram realizados nas escolas de Amá lia Benevides, Edilbertina Ataíde e
Á urea Magalhã es, para um pouco mais tarde ingressar sucessivamente nos seguintes
estabelecimentos de ensino: Colégio Americano, Grupo Escolar Augusto Severo, Escola Normal e
Atheneu Norte-Rio-Grandense.

Mesmo sem concluir curso superior, exerceu a advocacia como provisionado, tendo feito exames no
Tribunal de Justiça em Natal.
Na juventude, foi atleta de poucos recursos, conseguindo, entretanto, jogar na posiçã o de goleiro no
Alecrim Futebol Clube, uma das agremiaçõ es esportivas mais tradicionais do Estado. Mas teve uma
importante atuaçã o como integrante da diretoria do pró prio Alecrim, e igualmente do Centro
Esportivo Natalense.

Muito cedo, com apenas quinze anos, começou a sua vida de jornalista, quando publicou "O Bonde"
e "A Gazeta", ambos manuscritos. Depois fundou e dirigiu o "Jornal de Natal". Nesse jornal, começou
a abordar a questã o social do Estado.

Adulto, Café se casou com D. Jandira Carvalho de Oliveira Café.

Em 1923, liderou as primeiras graves que ocorreram no Rio Grande do Norte. Por essa razã o, a
polícia cercou o quarteirã o onde sua casa se localizava e o jornal que dirigia. Conseguiu fugir.
Depois, partiu para Recife e, logo em seguida para Bezerros, onde foi nomeado secretá rio da
prefeitura. Fundou o jornal "Correio de Bezerros" e o Clube Social e Esportivo Palameira. Voltando
para Recife, em 1925, dirigiu mais um jornal, "A Noite", quando entrevistou Antonio Silvino na
Penitenciá ria de Recife. Ainda na capital pernambucana, redigiu um documento "concitando os
subalternos do Exército a desobedecerem as ordens recebidas" e participar da Coluna Prestes.
Como conseqü ência, foi processado e condenado pelo Supremo Tribunal Federal. Fugiu para
Itabuna, na Bahia. Apó s um certo tempo, regressou a Natal, onde foi preso.

Em 1928, foi eleito vereador. Uma façanha, porque, naquela época, era difícil alguém da oposiçã o
vencer. O "sistema eleitoral" vigente pode ser ilustrado com um exemplo, contado pelo pró prio Café
Filho: "A oposiçã o elegeu a maioria da Câ mara Municipal. O Governo do Estado, em represá lia pela
derrota sofrida, mandou queimar as atas eleitorais. O atentado foi executado pelo chefe político
local, seguindo as instruçõ es dos chefes das oligarquias. Destruídas as atas, o situacionismo
procedeu a "eleiçã o" dos seus pró prios vereadores, a bico de pena"...

A oligarquia nã o deixava Café Filho em paz. Sendo mais uma vez perseguido, fugiu novamente para
Recife e viajou para o Rio de Janeiro, onde se integrou à campanha política a favor da Aliança
Liberal. Depois foi enviado para a Paraíba com o objetivo de divulgar o movimento. Recebido por
Joã o Pessoa, voltou a atuar como jornalista, reeditando o "Jornal da Noite". Atuante, percorreu toda
a Paraíba fazendo campanha pela Aliança Liberal.

No dia 2 de outubro de 1930, entrou no Rio Grande do Norte em plena efervescência


revolucioná ria. As tropas paraibanas invadiram o Rio Grande do Norte sem encontrar resistência.
Nas negociaçõ es para compor o governo, se pretendia eleger o desembargador Silvino Bezerra
Neto, irmã o de José Augusto, líder das oligarquias e, portanto, adversá rio das idéias
revolucioná rias... Joã o Café Filho, sempre vigilante, impediu que tal designaçã o fosse feita. E o
governo provisó rio foi entregue a uma Junta Militar.

O povo, insatisfeito, pedia medidas radicais. Para acalmar a populaçã o, sobretudo a natalense, Café
Filho foi designado chefe de Polícia. Mais tarde, afastado do cargo, voltou a assumir a Chefia da
Polícia durante a administraçã o do interventor federal comandante Bertino Dutra. Foi nessa
segunda gestã o que Café Filho criou a Guarda Civil e a Guarda Nortuna.

Em 1933 e anos seguintes exerceu as funçõ es de Inspetor do Trabalho, no Rio de Janeiro.

Foi eleito deputado federal em 1935, porém, nã o concluiu seu mandato por causa da decretaçã o do
Estado Novo em 1937. Perseguido por fazer oposiçã o ao governo Vargas, conseguiu asilo na
Argentina.

Em 1945, de volta ao Brasil, fundou o Partido Social Progressista no Rio Grande do Norte. A
conselho de Adhemar de Barros, registrou o partido com o nome de Partido Republicano
Progressista. Justificativa de Adhemar: "poderia atrair, pela identidade fonética, os antigos
partidá rios e eleitores do Partido Republicano Paulista, os 'perrepistas' de antes de 1930". Como
nã o conseguiu os objetivos desejados, posteriormente o partido voltou a ser chamado pela
denominaçã o original.

Joã o Café Filho foi eleito novamente deputado federal em 1945. Essa foi a sua fase mais dinâ mica,
segundo ele pró prio: "Exerci, em minha atividade parlamentar, no Palá cio Tiradentes, o período de
maior vitalidade e energia de minha vida".

Um feito de Café Filho: com um discurso apenas provocou a exoneraçã o de Correia e Castro,
ministro da Fazenda do governo Dutra.

Em 1950 Café Filho se elegeu vice-presidente da Repú blica, juntamente com Getú lio Vargas, que
assimiu a presidência da Repú blica, juntamente com Getú lio Vargas, que assumiu a presidência do
País.

Apó s o suicídio de Getú lio Vargas, a 24 de agosto de 1954, passou a exercer a funçã o de presidente
do Brasil. De acordo com suas palavras, foi "o ú nico momento que me tocou verdadeiramente, que
me confortou, que foi pleno e sem contrastes em esplendor e confiança".

Porém, nã o chegou a concluir o seu mandato, inicialmente por causa de uma crise cardiovascular, e
depois foi 'impedido', afastado da presidência. Falava-se em "golpe" e em "contra-golpe".

Nereu Ramos, entã o, assumiu o governo. A complicaçã o nã o se resumia ao afastamento de Café


Filho. Havia outro impasse. Juscelino Kubitschek de Oliveira, eleito presidente através do voto
popular, estava ameaçado de nã o tomar posse...

Fora do poder, Joã o Café Filho foi nomeado ministro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro.

Posteriormente, escreveu suas memó rias sob o título "Do Sindicato ao Catete", em dois volumes.

Faleceu no dia 11 de fevereiro de 1970 no Rio de Janeiro.

O Rio Grande do Norte prestou uma homenagem ao ú nico norte-rio-grandense que chegou a ser
presidente da Repú blica, inaugurando a Casa Café Augusto, e onde se encontra atualmente um
grande acervo sobre o ilustre jornalista e político potiguar.

A Intentona Comunista

Um Contexto de Agudos Conflitos Sociais

A Intentona Comunista de 1935 nã o foi um episó dio isolado que ocorreu apenas no Rio Grande do
Norte. Ela surgiu dentro de um contexto internacional e, ao mesmo tempo, brasileiro.

Na "Histó ria do Povo Brasileiro" se encontra a descriçã o do cená rio no qual a Intentona se realizou:
"Naquela época de agudos conflitos sociais, a democracia clá ssica se imobiliza, enleada em
impedimentos formais, enquanto os ditadores de esquerda e de direita, vencidos os impecilhos
internos preparavam-se para o inevitá vel confronto mundial (...) O Brasil tornou-se, assim, o grande
centro de competiçõ es entre os idealistas totalitá rios, na América Latina, no interregno liberal de
1934 a 1937.

A Constituiçã o de 1934, que havia escolhido Getú lio Vargas para presidente da Repú blica por via
indireta, ensejou a formaçã o de partidos políticos. Entre as organizaçõ es partidá rias nascidas na
ocasiã o estava a "Aliança Nacional Libertadora", de orientaçã o comunista, cujo presidente de honra
era Luís Carlos prestes, filiado ao PC (Partido Comunista) desde 1928. A "Aliança Nacional
Libertadora' encarregou-se organizar greves e manifestaçõ es pú blicas onde pediam o
candelamento da dívida imperialista, nacionalizaçã o de empresas estrangeiras e o fim do latifú ndio,
entre outras reivindicaçõ es. Objetivam também: impor o vasto programa da ANL (Aliança Nacional
Libertadora); a queda do governo Vargas; o fim do fascismo; a defesa da pequena propriedade;
jornada de oito horas de trabalho; aposentadoria, e defesa do salá rio mínimo.

Foi a ANL que inspirou o movimento comunista que eclodiu em novembro de 1935 na cidade de
Natal e que ficou conhecido como sendo a Intentona Comunista.

O fato é que, como disse Tarcísio Medeiros, "foi nesse ambiente que o interregno liberal, de 1934 a
1937, foi dominando o Brasil, no qual as correntes democrá ticas perdiam o controle das massas e
das ruas, envolvidas nas competiçõ es pessoais e nas tricas de campaná rio".

Ação Armada e o Domínio de Natal

As raízes do movimento comunista de 1935 no Rio Grande do Norte possuíram, sem dú vida alguma,
causas locais e que podem ser apontadas como resquícios da campanha eleitoral de 1934, quando
predominou um clima de violência.

Má rio Leopoldo Pereira da Câ mara, apesar do mérito de algumas realizaçõ es efetuadas durante sua
administraçã o, foi responsá vel pela implantaçã o de um clima favorá vel ao aparecimento de
movimentos armados.

O substituto de Má rio Câ mara, Rafael Fernandes Gurjã o, continuou perseguindo seus adversá rios
políticos, a exemplo de seu antecessor. Rafael Gurjã o contribuiu com o aumento do nú mero dos
descontentes, engrossando o grupo dos revoltosos. Chegou, inclusive, a extinguir a Guarda Civil, um
ó rgã o completamente descomprometido com a política, só porque havia sido criada por Café Filho,
inimigo político do novo governante... Dentro desse contexto, as divergências arrastaram para o
movimento pessoas que desconheciam a ideologia comunista, mas viam na açã o armada uma
maneira de derrubar o governo...

A Intentona Comunista foi iniciada na noite de 23 de novembro de 1935, ocasiã o em que no Teatro
Carlos Gomes - hoje Alberto Maranhã o - estava acontecendo uma solenidade de colaçã o de grau do
Colégio Marista. O governador Rafael Fernandes Gurjã o e o secretá rio geral do Estado, Aldo
Fernandes, abrigaram-se na residência de Xavier Miranda, nas proximidades do teatro, e depois
foram para o Consulado da Itá lia, sob os cuidados do cô nsul Guilherme Letieri. O prefeito Gentil
Ferreira, também presente à solenidade, foi para o Consulado do Chile, sob a proteçã o do cô nsul
Carlos Lamas.

Coube ao maior Luís Jú lio, da Polícia Militar e ao coronel Pinto Soares, do 21º BC, a organizaçã o da
resistência. Os combates estenderam-se por vá rias horas, até acabar a muniçã o, quando as forças
legais se renderam. As comunicaçõ es telefô nicas foram cortadas, resistindo apenas a estaçã o
telegrá fica de Macaíba, através da qual os legalistas pediram socorro à capital federal.

Durante os combates, o quartel da polícia militar resistiu, lutando contra um inimigo "muitas vezes
superior em nú mero", relata Joã o Medeiros Filho. A resistência durou vá rias horas, terminando
quando os policiais gastaram a ú ltima bala. Os legalistas fugiram pelo Rio Potengi.

Os rebeldes dominaram Natal e, no dia 25 de novembro de 1935, organizaram um Comitê popular


Revolucioná rio, composto por Lauro Cortês, ex-diretor da Casa de Detençã o, como ministro de
Abastecimento e Quintino de Barros, 3º sargento, mú sico do 21º BC, como ministro da Defesa. O
comitê se instalou na Vila Cinanto, até entã o residência oficial do governador.

Durante a vigência do governo revolucioná rio, a populaçã o da Cidade do Natal atravessou momento
de grandes dificuldades, principalmente para a aquisiçã o de gêneros alimentícios, uma vez que os
rebeldes saquearam muitos armazéns e lojas que abasteciam a cidade. Entre os estabelecimentos
saqueados figuram os seguintes: M. Martins & Cia.m Viana & Cia., M. Alves Afonso etc. O comércio
de diversas cidades do interior também nã o escapou. Por onde os rebeldes passavam, implantavam
o pâ nico.
No tempo em que os comunistas estiveram no poder, circulou um jornal intitulado "Liberdade", que
publicou as seguintes palavras, transcritas por Joã o Medeiros Filho: "Enfim, pelo esforço invencível
do povo, legitimamente representado por Soldados, Marinheiros, Operá rios e Camponeses,
inaugura-se no Brasil a era da Liberdade, sonhada por tantos má rtires, centralizados e
corporificados na figura legendá ria de Luís Carlos Prestes, o "Cavaleiro da Esperança".

Versões Sobre os Combates no Interior

Ao tomar conhecimento do que estava acontecendo na capital potiguar, Dinarte Mariz entrou em
contato com o governador da Paraíba, Argemiro de Figueiredo que, atendendo ao apelo do líder
seridoense, ordenou que policiais paraibanos penetrassem no Rio Grande do Norte rumo a Natal.

O primeiro encontro entre comunistas e sertanejos foi em Serra Caiada, com vitó ria para os
legalistas.

Para alguns historiadores, o principal combate entre as duas facçõ es teria ocorrido na Serra do
Doutor, entre as cidade de Santa Cruz e Currais Novos, Joã o Medeiros Filho, por exemplo, descreve
que "os sertanejos que numa açã o fulminante rechaçaram o inimigo, abrindo caminho para Natal
onde chegaram no dia 27, já encontrando a cidade ocupada pelas tropas da polícia paraíba".

Aluízio Alves, entretanto, no depoimento que prestou à TV Universitá ria, disse que nã o ocorreu
nenhuma batalha na Serra do Doutor. E justificou, afirmando que quando os comunistas saíram de
Natal já tinham conhecimento do fracasso do movimento no Rio de Janeiro e em Recife. Estavam,
portanto, fugindo. "Essa histó ria de guerra na Serra do Doutor é uma imagem colorida de uma
guerra que nã o houve", argumenta Aluízio.

O testemunho de Enoch Garcia ao mesmo programa da TV Universitá ria, "Memó ria Viva", confirma
o entrevero, mas nã o os personagens de outros relatos: "Todo mundo queria que Dinarte tivesse
tomado parte na Serra do Doutor. Ele nã o tomou parte na Serra do Doutor, como eu nã o tomei,
como Humberto Gama nã o tomou. Lá , tomaram parte esses oficiais dos quais eu já falei: Pedro
Siciliano, José Epaminondas, Genésio Cabral, Antô nio de Castro... e, inclusive muitos civis".

Intentona Não se Sustenta

Tiroteio e Fuga dos Combatentes

Dinarte Mariz, segundo Enoch Garcia, telefonou para o governador da Paraíba, Argemiro de
Figueiredo, que prometeu e efetivamente enviou tropas paraibanas para o Rio Grande do Norte
para combater os revoltosos da Intentona Comunista.

Enoch recebeu o seguinte telegrama de Florêncio Luciano: "Enoch, eu nã o sei o que aconteceu, mas
o nosso povo reagiu em cima da Serra, e o esbandalho foi grande. Até agora está correndo gente
deles e gente nossa...".

Conclusã o: aconteceu realmente um tiroteio, provocando a debandada de ambas as facçõ es. Entre
os revolucioná rios, muitos eram reservistas e nada tinham com a ideologia comunista. Na primeira
oportunidade, largaram as armas e fugiram... Os integrantes do outro lado eram sertanejos, em sua
maioria homens simples, pequenos agricultores ou trabalhadores rurais que nã o estavam dispostos
a participar de conflito algum. Aos primeiros anos, fugiram.

Portanto, houve realmente um confronto na Serra do Doutor, interior do Rio Grande do Norte,.
Porém, sem as dimensõ es que se pretendeu dar. De qualquer maneira, o fato marcou o final da
Intentona Comunista de 35 no Rio Grande do Norte.

Repressão Violenta e Prisões Injustas


A repressã o apó s a Intentona Comunista foi violenta. O chefe da Polícia do governo Rafael
Fernandes, Joã o Medeiros Filho, reconheceu que houve "excesso"...

Segundo Aluízio Alves, "Rafael Fernandes e Aldo Fernandes se empenharam para nã o misturar a
polícia estadual com a reaçã o da revoluçã o (...) Houve muitas pressõ es injustas, na época, apesar de
toda a resistência, sobretudo de Aldo Fernandes, que se incompatibilizou muito com o Partido
Popular, por conta de suas atitudes corretíssima, digníssima, distinguindo as responsabilidades da
revoluçã o, da participaçã o eventual emocional do Marismo e do Caféismo".

Êxito Momentâneo Não Assegurou Poder

O levante de 35, que explodiu no Rio Grande do Norte, teve um cunho comunista, como prova a
criaçã o de um Comitê Popular Revolucioná rio e ainda o editorial do ó rgã o oficial da Intentona, "A
Liberdade", exaltando o líder comunista Luís Carlos Prestes, chamado de "Cavaleiro da Esperança".
Outros fatores que contribuíram para o êxito momentâ neo do movimento: muitos funcioná rios
pú blicos, descontentes com as demissõ es e perseguiçõ es políticas - incluindo os militares -, se
engajaram na luta pensando que se tratava de um levante contra o governador. Alguns soldados,
reservistas, participaram apenas para cumprir ordens, sem saber ao certo o que estava
acontecendo. Além do mais, faltou um líder que reunisse as massas e, ao mesmo tempo,
esclarecesse o povo para conseguir sua adesã o consciente. Resultado: as camadas mais humildes
ficaram desorientadas, praticando desordens. E alguns oportunistas se aproveitaram do momento
para saquear e roubar. Nã o houve, igualmente, uma maior sintonia entre os chefes militares e os
líderes civis. O que determinou que o movimento acabasse caindo num vazio...

O principal obstá culo a um levante de esquerda nã o estava na capital e sim no interior. As


oligarquias que dominavam o Estado nã o aceitariam nenhum governo que contrariasse os seus
interesses, como aconteceu anteriormente com a Revoluçã o de 30.

Os revolucioná rios contavam com a vitó ria do movimento no Rio de Janeiro e em Recife. Como o
fracasso do levante nesses dois centros urbanos, eles perderam a confiança, procurando fugir.
Abandonaram a capital sem nenhuma resistência. Na realidade, nã o tinham a menor possibilidade
de permanecer no poder por um período maior. Além das diversõ es internas, qualquer resistência
seria esmagada pelas forças paraibanas e pernambucanas, que certamente seriam enviadas para o
Rio Grande do Norte com o objetivo de destruir a rebeliã o.

A Epopéia da Aviação

Os Hidroaviões Aterrissam no Potengi

A localizaçã o da Cidade do Natal fez com que seu nome ocupasse uma posiçã o de relevo na histó ria
da aviaçã o mundial. Sobretudo nos tempos iniciais ou, mais precisamente, no período
compreendido entre 1922 e 1937, que se divide em duas fases: a dos hidroaviõ es e as dos aviõ es. Os
hidroaviõ es desciam nas á guas do Rio Potengi e, posteriormente, os aviõ es pousavam num campo
em terra firme.

Os portugueses Sacadura Cabral e Gago Cointinho inauguraram a primeira fase com o "raid" Á frica-
Natal, cobrindo uma distância de 1.890 milhas. Por causa de dificuldades, os lusitanos desceram em
Fernando de Noronha, passando por Natal e indo até Recife.

No dia 21 de dezembro de 1922, o brasileiro Euclides Pinto Martins e o norte-americano Walter


Hinton chegava a Natal, fazendo o "Sampaio Correia II" amerissar nas á guas do Rio Potengi.
Estavam realizando o "raid" Nova Iorque-Rio de Janeiro.
Apó s essas façanhas, a capital norte-rio-grandense passou a receber grande nú mero de aviadores
famosos, que com suas aventuras escreviam a histó ria da aviaçã o. Todos eles foram recebidos como
verdadeiros heró is.

Os natalenses acompanharam a açã o dos pioneiros com muito interesse.

Exemplo: a 24 de fevereiro de 1927, Natal recebeu com manifestaçõ es de jú bilo o marquês De


Pinedo, italiano que juntamente com Carlo Del Prete e Victale Zachetti chegaram à cidade viajando
no "Santa Maria". De Pinedo, além de percorrer as principais ruas natalenses em carro aberto,
participou de um almoço em sua homenagem. No discurso de agradecimento, o marquês
sentenciou: "Natal será a mais extraordiná ria estaçã o da aviaçã o mundial".

No mesmo ano, chegou ao Rio Grande do Norte a esquadrilha do exército norte-americano - a


primeira esquadrilha a baixar no Rio Potengi - sob o comando do major Herbert Dangue e integrada
pelos hidroaviõ es "Santo Antonio", "Sã o Luís" e "Sã o Francisco".

Nessa época, a França tinha planos de abrir rotas aéreas comerciais estabelecendo uma linha
Europa-América do Sul, que nã o se concretizou. Mas a partir de 1924, revela Clyde Smith Junior,
"empresas particulares assumiram a tarefa de executar esse projeto".

A Lignes Latéroère procurou estender sua açã o até o Brasil. Essa companhia enviou Paul Vachet a
Natal, num Breguet, um biplano que foi forçado a aterrissar na praia da Redinha porque Natal nã o
contava ainda com um local apropriado.

O Breguet pilotado por Paul Vachet foi, portanto, o primeiro aeroplano - ou seja, aviã o que pousava
em terra e nã o nas á gua, como os anteriores - a aterrissar no Rio Grande do Norte. Iniciando, assim,
uma nova fase na histó ria da aviaçã o em terras potiguares.

Nasce o Aeroporto de Parnamirim

Paul Vachet foi enviado a Natal pela Lignes Latécoère para estabelecer aqui uma base dentro da
rota Brasil-Dakar. E para isso precisava de um campo de pouso.

Vachet procurou, entã o, um terreno apropriado para construir um aeroporto. Segundo Câ mara
Cascudo, "um oficial do Exército, o coronel Luís Tavares levava para Parnamirim o batalhã o sob o
seu comando para exercícios militares. Em 1927, indicou-o como campo de pouso para os aviõ es da
Latércoère. Feita uma limpeza sumá ria no mato ralo e nivelamento provisó rio, inaugurando-o, à s
23h45 de 14 de outubro de 1927, o "Numgesser-et-Coli", um monomotor Breguet-19, pilotado por
Dieu Coster e Le Brix, concluindo com êxito o roteiro Saint Louis do Senegal-Natal.

Clyde Smith Junior informa que "esse foi o primeiro vô o transatlâ ntico em sentido leste-oeste (...)
Essa façanha marcou o início do serviço aéreo entre Paris e Buenos Aires".

Juvenal Lamartine e o Aéro Clube

O Rio Grande do Norte nã o poderia ficar apenas recebendo aviõ es. Era preciso participar de uma
maneira mais ativa. Juvenal Lamartine, consciente do problema, apresentou um projeto na Câ mara
Federal para criar um avió dromo em Natal. A 29 de dezembro de 1928, era fundado o Aéro Clube.

Tarcísio Medeiros descreve o evento: "Participaram das festividades, numa revoada de Parnamirim
a Natal, um "Beu-Vird", pilotado pelo diretor-técnico, comandante Djalma Petit, trazendo a bordo o
Sr. Fernando Pedroza, e um aparelho da Générale Aéropostale (C.G.A), pilotado por Depecker. Na
ocasiã o, foi batizado o primeiro aeroplano do "club", com o nome de Natal".

A diretoria do Aéro Clube era formada por Juvenal Lamartine, presidente; Dioclécio Duarte, vice-
presidente, e Adauto Câ mara, primeiro secretá rio.
A sede estava situada no bairro do Tirol., onde ainda hoje se encontra, apesar de ter passado por
sérias crises. E de acordo com Tarcísio Medeiros, possuía um "pequeno campo de pouso ao lado do
poente da sede social'".

Esquadrilha Balbo e Coluna Capitolina

No dia 6 de janeiro de 1931, chegava a Natal a esquadrilha da força aérea italiana, comandada pelo
general Ítalo Balbo. Composta inicialmente por doze aviõ es, apenas dez conseguiram atingir Natal.

Poucos dias antes, ou seja, em 1º de janeiro do mesmo ano, o navio italiano "Lanzeroto Malocell",
sob o comando do capitã o-de-fragata Carlos Alberto Coraggio, trazia a Coluna Capitolina, doada
pelo chefe do governo italiano, Benito Mussolini. A peça havia sido encontrada nas ruínas de Roma
e foi oferecida ao povo natalense para comemorar o "raid" Roma-Natal, realizado pelos aviadores
Del Prete e Ferrarin.

Nessa data, governava o Rio Grande do Norte o interventor federal Irineu Joffily. Participaram da
comissã o de recepçã o o prefeito Dias Guimarã es e Joã o Café Filho.

Em uma das faces da Coluna Capitolina há uma mensagem em italiano que foi traduzida para o
português no livro "Aspectos Geopolíticos e Antropoló gicos da Histó ria do Rio Grande do Norte", de
Tarcísio Medeiros: "Trazida de uma só lance sobre asas velozes além de toda distâ ncia tentada por
Carlos Del Prete e Arturo Ferrerin, a Itá lia aqui chegou a 5 de julho de 1928. O oceano nã o mais
divide e sim une as agentes latinas de Itá lia e Brasil".

A Viagem Inédita de Jean Mermoz

Um dos aviadores que marcou presença em Natal durante essa época foi o francês Jean Mermoz.

No dia 13 de maio de 1930, Jean Mermoz realizou a sua primeira travessia. Partindo de Sã o Luís do
Senegal, chegou a Natal vencendo uma distâ ncia de 3.100 quilô metros.

Passou alguns dias na capital potiguar planejando uma viagem de regresso, o que seria um fato
inédito.

O aviador francês voltou a Natal em abril do ano de 1933, pensando ainda em realizar o seu sonho:
a viagem Natal-Dakar. Fez muitas amizades no Rio Grande do Norte. Um de seus amigos, Eudes de
Carvalho, revelou que o francês "adquiriu, com o tempo, apego à terra e à gente potiguar e previu o
futuro de Parnamirim como base aérea de destaque mundial".

Jean Mermoz, finalmente, conseguiu concretizar sua antiga aspiraçã o. Partindo de Natal num
trimotor, o "Arc-en-Ciel", pousou em Dakar, sendo o primeiro a realizar tal façanha.

O piloto francês participou de outras atividades em açã o militar, recebendo as medalhas "Cruz da
Guerra' e "Levante".

Tarcísio Medeiros narra outro feito de Mermoz: "bateu, entre 11 e 12 de abril de 1930, o "record"
mundial de permanência no ar, em circuito fechado, cobrindo 4.343 quilô metros em 30 horas e 30
minutos, em Laté-28 com flutuadores, no qual voou para Natal".

Jean Mermoz desapareceu nas á guas do Oceano Atlâ ntico a bordo do seu "Croix-de Sud", em
dezembro de 1936.

Concorrência Européia nos Céus Natalenses

Depois da França, a Aleamha entrou em cena. A Lufthansa estendeu sua açã o comercial até Natal
durante 1933. No outro ano, informa Clyde Smith Junior, "as linhas aéras francesas e alemã s
entraram em um acordo que exercia uma cooperaçã o técnica e uma cidisã o de itinerá rio. Em torno
de 1937, elas concordaram em associar suas receitas relativas ao trecho Á frica-Natal e, em 1939, a
Air France (antiga Lignes Latécoère) e a Condor (Lufthansa) tornaram seus bilhetes permutá veis na
Á frica do Sul".

A Itá lia também esteve presente em Natal através da Linee Aeree Transcontinentali Italiane - Ala
Litoria (LATI). A empresa foi organizada pelo governo italiano e, posteriormente, foi acusada pelos
adversá rios, durante a guerra, de estar a serviço das "Tropas do Eixo".

A Inglaterra e os Estados Unidos nã o participaram desse esforço inicial, em rotas que envolveram
Natal no processo de desenvolvimento da aviaçã o.

Somente durante o início da Segunda Guerra Mundial é que a companhia norte-americana Pan
American manteve uma rota que passava por Natal.

O Grande Projeto de Augusto Severo

Augusto Severo nasceu na cidade de Macaíba, no dia 11 de janeiro de 1864, filho de Amaro Barreto
de Albuquerque Maranhã o e D. Feliciana Maria da Silva de Albuquerque Maranhã o.

Entre seus irmã os, os que mais se destacaram foram Pedro Velho e Alberto Maranhã o.

O bió grafo Augusto Fernandes traçou em poucas palavras a personalidade de Augusto Severo:
"físico avantajado era o espelho fiel de espírito vigoroso. Figura simpática, sabendo o que dizia e
trazendo-o desembaraçadamente, com os olhos mansos, o sorriso fá cil e os gestos aristocratas,
conquistava sem dificuldade as pessoas mais esquivas".

Iniciou os estudos na terra onde nasceu, Macaíba, e depois continuou a sua vida de estudante em
duas outras cidades: Natal e Salvador. Fez o curso de humanidades com brilhantismo.

Entrou posteriormente para a Escola Politécnica, no Rio de Janeiro. Quando cursava o segundo ano,
adoeceu e teve que voltar para Natal.

Exerceu, entã o, a funçã o de professor de Matemá tica no Giná sio Norte-Riograndense, escola da qual
chegou a ser vice-diretor.

Quando o Giná sio fechou, em 1883, foi forçado a se dedicar ao comércio, trabalhando como guarda-
livros da loja "Guararapes".

Idealista participou ao lado de Pedro Velho da campanha abolicionista.

Com relaçã o à s suas preocupaçõ es como homem de ciência, Augusto Severo se dedicou primeiro em
descobrir o modo-contínuo. Depois, abandonou essa pesquisa. Pensou também em estudar o "mais"
pesado que o ar". Desistiu. Os seus interesses começavam a se voltar para outra direçã o: "agora,
todos os seus estudos e esforços buscava descobrir um meio para dar estabilidade e segura
dirigibilidade aos balõ es. Imaginou e desenhou, entã o, o "Potiguarâ nis", que nã o chegou a ser
realizado, mas influiu na construçã o, mais tarde, do Bartolomeu de Gusmã o, realmente o seu
primeiro dirigível".

Continuando seus estudos, chegou ao "PAX', considerado pelos técnicos como um importante
avanço na conquista do espaço.

Criou também o "tubo motor de reaçã o", que dizem ter sido usado pela torpedeira "A Turbina", que
pertencia à marinha inglesa. Segundo Augusto Fernandes, a "Turbina" chegou a atingir uma
velocidade de 37 milhas.
É ainda Augusto Fernandes que fala sobre outra criaçã o do cientista norte-rio-grandense: inventou
"o sistema de hélice introduzida no interior de um tubo, que atravessa o navio seguindo o grande
eixo, permitindo-lhe marchar avante e a ré".

Em 1893, Augusto Severo substituiu o irmã o Pedro Velho no Congresso.

Em 19 de outubro de 1901, Santos Dumont, com o dirigível 'Santos Dumont nº 6", realizou um
grande feito, pelo qual recebeu o prêmio "Deutsc" . Depois de levantar vô o de Saint-Cloud, para
assombro do povo de Paris, contornou a Torre Eiffel.

Anterior a essa data, houve um movimento no Brasil para prestar uma homenagem ao aeronauta
brasileiro. No Congresso Nacional, o deputado federal Bueno de Paiva propô s, no dia 17 de julho de
1901, um voto de louvor a Santos Dumont, por ter encontrado "a soluçã o do secular problema" da
dirigibilidade e estabilidade. Acontece que Augusto Severo, um profundo conhecedor da questã o,
sabia que tal soluçã o nã o havia sido encontrada e protestou contra a inverdade. Mas, reconhecendo
a importâ ncia do aeronauta, propô s que fosse inserido em ata um voto de louvor a Alberto Santos
Dumont e ainda concedido ao ilustre brasileiro, como prêmio o valor de 100:000$000, importâ ncia
que ele precisava para continuar suas experiências. O discurso de Augusto Severo foi simplesmente
brilhante. Ao conclui-lo foi, além de muito aplaudido, abraçado pelos deputados presentes.

Augusto Severo, apó s licenciar-se da Câ mara Federal, partiu para Paris com a finalidade de fazer,
igualmente, experiência no campo da aeroná utica.

Augusto Fernandes, numa síntese, demonstra toda a importâ ncia de Severo: "os balcõ es de Dumont,
como os de seus antecessores, sob o ponto de vista científico, nã o possuíam as características
necessá rias de ESTABILIDADE e, portanto, perfeita NAVEGABILIDADE. Esta conquista pertence,
exclusivamente, a Augusto Severo".

Ele nã o se tornou, como chegaram a comentar em Paris, um rival de Santos Dumont, E sim, afirma
Augusto Fernandes, "um concorrente sério, competente, leal, para Dumont. E sim, afirma Augusto
Fernandes, "um concorrente sério, competente, leal, para Dumont ou qualquer outro que tentasse
as mesmas experiências".

Paralelamente à s suas experiências, Augusto Severo, com sua simpá tia contagiante de verdadeiro
aristocrata, fez sucesso na sociedade parisiense e européia, conseguindo a amizade de grandes
personalidades da época, como Zola e Paul Rousseau. Chegou inclusive a receber uma carta da
princesa Wiszniewska, presidente d fundadora da "Aliança Universal das Mulheres pela Paz e pela
Educaçã o".

Finalmente, o grande projeto de Augusto Severo estava pronto: o "PAX"! Revistas da França e da
Inglaterra abriram suas pá ginas para falar sobre a experiência que estava prestes a acontecer. Era a
gló ria!

Na construçã o do PAX, Severo contou com a importante ajuda do mecâ nico George Sachet.

Na madrugada do dia 12 de maio de 1902, Augusto Severo e George Sachet realizavam, para o povo
de Paris, o tã o almejado vô o. Quando o PAX se encontrava aproximadamente a 400 metros de
altura, um clarã o e, depois, uma explosã o. Era o fim do sonho. Morreram ambos, Severo e Sachet.

Um texto e "A Notícia", no jornal do Rio de Janeiro (23/6/1902), narrando o enterro de Augusto
Severo, poetizou: "nã o acredito haja alguém, lá fora, que possa em pleno dia - um dia rú tilo de sol
pelas ruas apinhadas de gente e passando, entretanto, silencioso, recolhido, sem um rumor, como se
as mais vastas praças fossem pequenas câ maras mortuá rias, em que se anda nas pontas dos pés,
com um respeito religioso (...). Que dia esplêndido de gló ria! Gló ria triste - mas, apesar de tudo,
gló ria!".

Natal na Segunda Guerra Mundial


Os Aliados e as Forças do Eixo

Quando Adolf Hitler invadiu a Polô nia, alegando que a Alemanha necessitava de "espaço vital",
estava iniciando o Segundo Conflito Mundial. De um lado, estavam os "Aliados": França, Inglaterra e
Estados Unidos. Do lado oposto, Itá lia, Alemanha e Japã o formavam as "Forças do Eixo". Os dois
grupos lutaram (com a posterior entrada de outras naçõ es, inclusive os Estados Unidos da América)
durante o período entre 1939-1945, levando o mundo a uma devastaçã o que até entã o nenhuma
outra guerra tinha provocado.

Apó s a sua entrada no conflito, os norte-americanos procuram uma aproximaçã o com o Brasil,
porque necessitavam instalar ou melhorar as bases aéreas do Nordeste brasileiro.

Havia uma grande preocupaçã o dos norte-americanos em demonstrar aos brasileiros que a sua
presença naquela regiã o do País era apenas para ganhar a guerra. Nada de conquista territorial.

Em Natal, contudo, havia adeptos das "Forças do Eixo". Em outubro de 1942, ocorreu um fato
tragicô mico: a Rá dio Educadora de Natal colocou no ar uma marcha militar alemã e, logo em
seguida, o hino nacional alemã o. A transmissã o provocou protesto de grande parte da populaçã o e a
emissora foi fechada, sendo reaberta dois dias depois.

Apesar de oficialmente neutro, o Brasil vai aos poucos se aproximando da causa dos "Aliados", e se
afastando das "Forças do Eixo". Essa situaçã o se reflete em Natal, com a maioria da populaçã o
torcendo pela vitó ria dos "Aliados".

Em dezembro de 1941, chega a Natal o Esquadrã o de Patrulhamento da Marinha dos Estados


Unidos, como nove aeronaves e o aviã o auxiliar "Clemson". Pouco depois, chegavam os fuzileiros
navais. Em 1942 eram duzentos homens.

O almirante Ary parreiras, enviado para construir a Base Naval do Natal, demonstra, na opiniã o de
Cascudo, "força realizados, obstinaçã o, ditadura da honestidade, mítica do sacrifício silencioso,
discreto e diá rio".

Os norte-americanos, por sua vez, constró em "Parnamirim Field", uma verdadeira megabase,
durante o período de guerra.

Em termos de forças terrestres, desde 12 de junho de 1941, Natal contava com o 16 RI, criado
aproveitando os efetivos do 29 BC e do II BC de Minas Gerais.

Segundo Tarcísio Medeiros, "no dia 11 de outubro, o general Gustavo Cordeiro de Farias assumia o
comando da 2ª Brigada de Infantaria (...) A aviaçã o unificada desde 18 de janeiro com a criaçã o do
Ministério da Aeroná utica, possuindo o campo de Parnamirim, estabeleceu a sede da 2ª Zona Aérea,
cujo comando, confiado ao brigadeiro Eduardo Gomes, impulsionou o primeiro grupo de aviõ es que
partia, policiando os ares (...) e os comboios marítimos, num serviço assíduo de cobertura e
vigilâ ncia".

O Brasil Entra na Guerra

No ú ltimo dia da Terceira Conferência de Ministros Estrangeiros, em 28 de janeiro de 1941,


realizada no Rio de Janeiro, o Brasil rompeu as relaçõ es com as Forças do Eixo.

Passando alguns meses, no dia 22 de agosto de 1942, o Brasil declarou guerra à Alemanha e à Itá lia.

O avanço das "Tropas do Eixo", lideradas por Rommel, no continente africano, colocou em perigo a
navegaçã o do Atlâ ntico, da costa brasileira, como também de todo o continente americano. Teria
sido por causa desse risco que o Brasil cedeu bases militares no litoral do Nordeste para servir de
apoio à s operaçõ es militares que seriam desenvolvidas na Á frica. E entrou na guerra.
Natal, por sinal, já vivia um clima de guerra, inclusive com blecautes diá rios. Contava também com
os serviços da Cruz Vermelha, Legiã o Brasileira de Assistência, Defesa Civil, e ainda abrigos
antiaéreos familiares e pú blicos.

Numa síntese, disse Câ mara Cascudo: "Ao redor do campo, Natal, tabuleiros e praias, foi organizada
e dispostas a defesa militar, muniçõ es, matérias-primas em tonelagem astronô mica. Exército,
Marinha, Aeroná utica, ergueram as barreiras defensivas, diá rias e contínuas.

Dois Presidentes na "Conferência de Natal"

Quando o presidente dos Estados Unidos Franklin Delano Roosevelt se encontrava em Marrocos,
solicitou ao almirante Jonas Ingram para marcar um encontro com Getú lio Vargas, presidente do
Brasil, na Cidade do Natal.

Acertada a reuniã o, todas as providências foram tomadas em sigilo.

O presidente Getú lio Vargas chegou em Natal no dia 27 de janeiro de 1943, acompanhado de sua
comitiva. Ficou alojado no Dstró ier Jouett. Na manhã do outro dia, dois aviõ es trouxeram o
presidente dos Estados Unidos, Roosevelt, e sua comitiva.

As autoridades brasileiras sediadas em Natal nã o foram informadas das ilustres presenças e a


segurança dos dois americanos, causando um mal-estar.

O governante potiguar Rafael Fernandes foi convidado para comparecer à base sozinho. Chegando
lá é que soube da novidade. Depois, Getú lio Vargas e Roosevelt, acompanhados de Rafael
Fernandes, cumpriram um programa de inspeçõ es: base de hidroaviõ es, Parnamirim e os quartéis
brasileiros do exército e da aeroná utica.

À noite, Vargas e Roosevelt participaram da "Conferência de Natal" que, segundo Clyde Smith
Junior, "girou em torno de interesses mú tuos e laços de amizades entre seus países, a prevençã o de
um possível e perigoso ataque dirigido de Dakar para o hemisfério ocidental, e o apoio do Brasil aos
objetivos de guerra de Roosevelt. No dia seguinte, Roosevelt. No dia seguinte. Roosevelt voou para
Trinidad e Vargas voltou ao Rio acompanhado pelo almirante Ingram e pelo general Wash".

Ao que parece, Roosevelt teria "pedido" ao presidente Vargas, o envio de tropas brasileiras para o
"front" na Europa e o estadista gaú cho "concordou".

A reuniã o, portanto, nã o foi apenas um encontro cordial de amigos para conversar futilidades. Nela,
ficou acertado o envio de tropas brasileiras para o "front".

Influência Americana e Mudança dos Costumes

A presença norte-americana em Natal mudou os hábitos de uma pequena cidade nordestina.

Lenine Pinto relata que "dos bares vazava a mú sica das Wurlitzers, das lojas o burburinho de
consumidores á vidos e, quando as ruas esvaziavam-se, acendiam-se os salõ es de bailes, fluíam
fantasias (...) Naquele tempo as festas sucediam-se freneticamente, dançava-se freneticamente,
amava-se freneticamente".

A Cidade do Natal modificou-se de maneira muito significativa com a presença do grande nú mero
de militares estrangeiros aqui sediados. Do entrosamento entre americanos e jovens natalenses
resultaram alguns casamentos. O drama das jovens, nã o só natalenses, mas nordestinas que nã o
tiveram os seus romances com jovens americanos referendados pelo casamento, é descrito pelo
poeta Mauro Mota no seu "Boletim Sentimental da Guerra no Recife", através dos versos:
"Meninas, tristes meninas,
de mã o em mã o hoje andais.
Sois autênticas heroínas
da guerra, sem ter rivais.
Lutastes na frente interna
com bravura e destemor.
À vitó ria aliada destes
o sangue do vosso amor.

Ingênuas meninas grá vidas,


o que é que fô stes fazer?
Apertai bem os vestidos
pra família nã o saber.
Que os indiscretos vizinhos
vos percam também de vista.
Saístes do pediatra
para o ginecologista".

Surgiram associaçõ es recreativas como, por exemplo, os "Clubes 50". Tanto o Aéro Clube como
igualmente o "Clube Hípico", foram alugados com o objetivo de realizar bailes. A finalidade
principal, certamente, era promover uma maior integraçã o dos militares norte-americanos com a
populaçã o natalense. Houve, por causa disso, uma invasã o de ritmos estrangeiros: "rumba",
"conga", "bolero".

As moças passaram a agir com mais autonomia e, conforme relata Lenine Pinto, "tendo incorporado
modos e modismos americanos, algumas aproveitaram para alongar o passo: começaram a fumar
(por ser o Chesterfield um cigarro "fraquinho", era a desculpa); a bebericar "Cube Libre" (com a
Coca-Cola inocentando a mistura de rum) e a pegar os primeiros "foguinhos".

Natal perdia aos poucos suas características de cidade pequena, com seus habitantes levando uma
vida modesta e tranqü ila. Tomando inclusive um aspecto cosmopolita, com a passagem, pela cidade,
de pessoas de outras nacionalidades, com direito a figuras importantes: D. Francis J. Spellman
(arcebispo de Nova York), Bernard (príncipe da Holanda), Higinio Morringo (presidente do
Paraguai), Sra. Franklin D. Roosevelt (esposa do presidente dos Estados Unidos), Sr. Noel Cherles
(embaixador do Reino Unido no Brasil) etc.

Os preços aumentaram por causa da injeçã o de dó lares na economia local.

A influência norte-americana se fez sentir também na linguagem, com a introduçã o de algumas


palavras e expressõ es inglesas, exemplificadas por Clyde Smith Junior: "change money" (troque
dinheiro), "drink beer" (beba cerveja), "give me a cigarrette" (dê-me um cigarro), "blackout"
(blecaute) etc.

Outro fato lembrado pelo mesmos autor: "de uma cidade pequena e desconhecida, passou a ser
conhecida por milhõ es de americanos e outros aliados".

Durante a guerra. Natal cresceu muito, aumentando consideravelmente a sua populaçã o.

O Populismo no RN

Forte Característica: O Carisma do Líder

Os teó ricos se dividem quando procuram conceituar o que seja populismo. Na realidade, os líderes
políticos brasileiros classificados com o ró tulo de "populista" apresentam uma grande diversidade
na maneira de agir. Nã o se pode dizer que líder populista é aquele que busca o apoio popular,
porque todos, da direita, do centro ou da esquerda, fazem promessas demagó gicas com o objetivo
de conquistar o voto das camadas mais humildes, prometendo atender as reivindicaçõ es
populares...

Mas a característica principal dos líderes populistas é o carisma. Alguns chegavam a levar multidõ es
ao delírio, criando um clima favorá vel ao fanatismo. De uma madeira geral, nã o entravam em
confronto com as oligarquias, recebendo inclusive o apoio de algumas famílias tradicionais. Em
algumas regiõ es, o populismo ganhou como aliada a burguesia industrial, sobretudo nos centros
urbanos, onde esse segmento da sociedade começava a surgir com bastante força.

O populismo surge, quase sempre, quando existe uma forte crise na oligarquia, forçando-a fazer
concessõ es pois para sobreviver precisa de um governo que atenda, ao mesmo tempo aos
interesses das três classes: conservadora, média e popular... A roupagem é popular, porém, o poder
permanece nas mã os da elite. À s vezes, contudo, se volta para a esquerda, tomando um cará ter mais
radical, no sentido de promover reformas em favor do povo.

Nã o existe, portanto, uma política populista ú nica e sim diretrizes, variando o seu conteú do de
acordo com a formaçã o ideoló gica e cultura de cada líder.

Oposições Vitoriosas nos Anos 60

Nos anos 60, o Brasil, passava por uma série crise política, agravada pelo conflito ideoló gico
esquerda versus direita, com radicalismo de ambas as partes. Dentro desse contexto, se destacava o
antagonismo entre as forças nacionais ("comunistas") e as forças conservadoras ("entreguistas"),
com a participaçã o ativa de políticos operá rios e estudantes.

Como conseqü ência da crise que abalava o País. Quadros renunciou, entregando o cargo de
presidente da Repú blica a Joã o Goulart, em agosto de 1961. Goulart, em agosto de 1961. Goulart
tomou posse em 7 de setembro e governou, em regime parlamentarista, até ser deposto pelo golpe
militar em 1964.

As constantes crises políticas vividas pelo País refletiam e deixavam profundas marcas na regiã o
nordestina. Apesar do crescimento de sua produçã o industrial, a participaçã o do Nordeste no
produto total do País caía para 15,5% ! Índice menor do que o de outras regiõ es.

Como conseqü ência do processo de industrializaçã o, cresceram os centros urbanos, e, ao mesmo


tempo, aumentava o êxodo rural, com o deslocamento de grande nú mero de famílias para as
grandes cidades.

Um dos fatores que contribuíram para o êxito do populismo no Rio Grande do Norte foi a atuaçã o
da Igreja Cató lica, com a instalaçã o dos sindicatos rurais e com o Movimento de Educaçã o de Base.

As campanhas de educaçã o popular contribuíram também para acelerar o processo de politizaçã o


das camadas mais humildes. Exemplos: a "Campanha de Pé no Chã o Também se Aprende a Ler", em
Natal, e ao Movimento de Cultura Popular" em Recife, ambas em 1960.

Foi sobretudo no processo político que o descontentamento popular se refletiu no Nordeste, com
grandes vitó rias conquistadas pela oposiçã o durante o período compreendido entre 1956 a 1962.
No Rio Grande do Norte, em 1960, Aluízio Alves se elegeu governador e, no mesmo ano, Djalma
Maranhã o chegou à prefeitura de Natal, também pela oposiçã o.

A campanha política de 1960 se desenrolou num clima de muita agitaçã o. O governo Dinarte Maris
deixou um testamento político que desorganizou, completamente, as finanças do Estado.

O povo norte-rio-grandense estava asfixiado, aspirava por se livrar daquela situaçã o, recebendo
com entusiasmo a mensagem oposicionistas que prometia reformular os processos administrativos,
dinamizar a administraçã o pú blica e criar as condiçõ es bá sicas para iniciar a industrializaçã o,
começando, dessa maneira, o desenvolvimento do Estado. Essa proposta de governo era defendida
por um jovem e dinâ mico político: Aluízio Alves . Uma vez candidato, rapidamente assumiu a
liderança do seu grupo, organizando uma coligaçã o partidá ria com a denominaçã o de "Cruzada da
Esperança", formada pelo PSD, PTB, PCB, PRP, PTN e dissidentes da UDN. Para vice-governador foi
indicado o monsenhor Walfredo Gurgel, uma das mais expressivas lideranças do PSD seridoense.
Para a prefeitura da Cidade do Natal, dois líderes representantes da esquerda: Djalma Maranhã o,
para titular, e Luiz Gonzaga, para vice-prefeito.

A nível nacional, a Cruzada da Esperança dividia-se. PSD, PTB e PTN apoiavam o marechal Lott para
presidente da Repú blica, um homem honesto, nacionalista, porém, sem nenhuma aptidã o política.
Aluízio Alves e a dissidência da UDN apoiavam Jâ nio Quadros. Para vice-presidente, os candidatos
eram Joã o Goulart, com apoio do PSD, PTB e PTN, e Milton Campos, apoiado por Aluízio.

Djalma Maranhã o, um homem da classe média sem nenhuma ligaçã o com qualquer grupo
econô mico forte, de mã os limpas, partiu para a sua campanha com muita garra.

Sua atuaçã o vai se caracterizar, principalmente, por dois aspectos. Primeiro, um cará ter
nitidamente ideoló gico. Nacionalista, desencadeava uma luta aberta contra o imperialismo.
Segundo, a participaçã o direta e espontâ nea do povo, em seus segmentos mais pobres.

Dentro dessa linha de açã o, foram criados os Comitês Nacionalistas, cuja importâ ncia foi salientada
por Moacyr de Gó es: "a organizaçã o da campanha se fez em funçã o dos Comitês Nacionalistas. A
mobilizaçã o origina-se do Comitê, para o Comitê e pelo Comitê. Entre janeiro e fins de setembro,
foram organizados e funcionaram 240 Comitês Nacionalistas também conhecidos como Comitês
Populares ou Comitês de Rua. Esse nú mero ganha maior expressã o quando situado numa cidade de
160 mil habitantes, à época, tendo tido um comparecimento eleitoral de pouco mais de 36 mil
votantes".

A mobilizaçã o foi, portanto, muito grande. Crescia de importâ ncia porque nã o se fazia apenas a
exaltaçã o da personalidade do candidato Djalma Maranhã o, mas ao mesmo tempo eram discutidos
temas locais, regionais e nacionais. Paralelamente à campanha política propriamente dita, se
realizava também um verdadeiro trabalho de politizaçã o das massas. Claro, uma vez politizado, o
eleitor se integrava na luta nacionalista e antimperialista.

A sua campanha fugia, e muito, das tradicionais campanhas políticas, cuja base era o ataque pessoal,
tã o comum no Rio Grande do Norte e no restante do Brasil.

A campanha de Aluízio Alves foi radicalmente diversa da realizada por Djalma Maranhã o quanto à
metodologia de açã o empregada. Bem mais sofisticada. Utilizando inclusive uma empresa
publicitá ria. Empregando, de maneira racional e inteligente, os meios de comunicaçã o de massa
(rá dio e jornal). Usando slogans, como "Fome ou Libertaçã o?". "mendicâ ncia ou trabalho?", ou ainda
"Miséria ou Industrializaçã o?", colocava diante do eleitor o caos em que se encontrava o Estado,
sugerindo uma mudança radical através da vitó ria da oposiçã o. Esse triunfo marcaria o início de um
processo de desenvolvimento no Estado do Rio Grande do Norte.

A "Tribuna do Norte", jornal de Aluízio Alves, produzia cerca de 5 mil exemplares diá rios, uma
tiragem, bem maior do que "A Folha da Tarde", de Djalma Maranhã o. Como disse Agnelo Alves,
irmã o de Aluízio Alves, e também jornalista, "foi o jornal que sedimentou a imagem de Aluízio,
levando diariamente, durante dez anos, seu nome a todo o Estado".

A 'Tribuna do Norte' serviu para influenciar determinados segmentos da sociedade, como


intelectuais, estudantes e grande parte do funcionalismo pú blico federal, estadual e municipal.
Contribuiu igualmente para a tomada de decisã o de muitos indecisos. Com suas manchetes,
notícias, fotos e editoriais, traçava um quadro inteiramente favorá vel aos candidatos da Cruzada da
Esperança.

A situaçã o caó tica em que se encontrava o Estado foi uma importante causa da vitó ria desta
coligaçã o partidá ria.
A liderança carismá tica de Aluízio Alves empolgou o povo. Ciente de seu magnetismo pessoal, ele
procurava por todos os meios manter o contato direto e pessoal com os eleitores. O seus comícios e
as suas passeatas impressionavam pelo nú mero de participantes e pelo entusiasmo. Velhos, moços,
crianças, mulheres de todas as idades, agitando nas mã os bandeiras e ramos verdes, cantando as
mú sicas da campanha e gritando "Aluízio, Aluízio, Aluízio". Um espetá culo nunca visto no Rio
Grande do Norte, suplantando, portanto, a campanha de José da Penha, o primeiro líder popular da
histó ria política do Estado.

Enfim, Aluízio Alves aparecia como um "homem comum", simples, pobre, de resistência física
extraordiná ria, passando noites inteiras acordado, em virtude de vigílias, lutando e sofrendo
sempre ao lado do povo. Nesse aspecto, certamente, se aproximavam os dois líderes populistas:
Djalma Maranhã o e Aluízio Alves. Ambos se apresentavam como pessoas pobres, da classe média,
sem dinheiro, lutando contra a má quina lubrificada, manipulada pelos poderosos.

Havia, entretanto, uma grande diferença com relaçã o ao posicionamento ideoló gico. Um da
esquerda, o outro do centro. Para Djalma Maranhã o, "o nacionalismo é ainda um movimento, uma
revoluçã o em marcha, para se transformar, no futuro, no mais poderoso partido de toda a Histó ria
do Brasil".

Aluízio Alves definia o seu nacionalismo de outra maneira: "o nosso nacionalismo é, por isso,
pragmá tico, e se despe de qualquer sentido ideoló gico de classe. Ele assenta no esforço capitalista, o
esforço pú blico, no esforço misto. Os seus dois objetivos sã o: primeiro, entregar a instrumentos
brasileiros que representam a iniciativa privada e pú blica o comando da economia, estabelecendo
mecanismo através do qual o enriquecimento nacional nã o se acumula nas mã os de poucos e antes
alcance seu legítimo usufrutuá rio, que é o povo; segundo, criar no Nordeste parcela significativa e
ponderá vel de um grande mercado interno que funcione para si e apenas secundariamente para o
mercado externo".

"Tal nacionalismo nã o é anti coisa alguma. Nem anticapitalista nem antisocialista. Ele se situa fora
da á rea do debate ideoló gico para inserir-se corretamente na á rea em que o nacionalismo deve, por
natureza colocar-se para colher o apoio de toda a Naçã o".

As Prioridades de Djalma Maranhão

O primeiro problema grave enfrentando por Djalma Maranhã o foi, sem dú vida, o déficit
orçamentá rio. O prefeito encarou o problema como sendo um grande desafio para seu governo. Em
primeiro lugar, integridade. Em segundo lugar, tomou medidas para solucionar a crise: Có digo
Tributá rio do Município. Cadastro Fiscal da Prefeitura e aumento de alíquota do imposto de
Indú stria e Profissõ es. Conseguiu reverter o quadro e, no lugar de déficit, apresentou um superá vit
de Cr$ 19,770.826,00!

Djalma Maranhã o promoveu uma série de iniciativas que marcaram o dinamismo de sua
administraçã o: Galeria de Arte, Palá cio dos Esportes, Estaçã o Rodoviá ria, construçã o de galerias
pluvias, etc.

Na á rea cultural, realizou o "I Seminá rio de Estudos dos Problemas de Educaçã o e Cultura do
Município de Natal", quando diversos temas forma tratados com objetividade por eminentes
especialistas: Luís da Câ mara Cascudo, Joã o Wilson Melo, Pe. Manoel Barbosa, Ivamar Furtado, Max
Cunha Azevedo, Chicuta Nolasco Fernandes, Newton Navarro, entre outros.

Mas o que imortalizou o governo de Djalma Maranhã o foi, sem dú vida, a "Campanha de Pé no Chã o
Também se Aprende a Ler", coordenada pelo professor Moacyr de Gó es, secretá rio de Educaçã o.

O objetivo da campanha era a erradicaçã o do analfabetismo na Cidade do Natal. A situaçã o, nesse


setor, impressionava. Segundo Moacyr de Gó es, "o índice de analfabetismo na populaçã o acima de
14 anos, era o mais alto do Nordeste (59,97%) e, em Natal. O Censo de 1960 revelava a existência
de 60.254 adultos".
A campanha nasceu da aspiração popular

Consultando as pessoas residentes nos bairros periféricos, Djalma Maranhã o descobriu que a
necessidade nú mero um, reclamada por todos, era uma só "escolas para crianças que, sem poder
adquirir farda ou sapatos, nã o podiam freqü entar os grupos escolares construídos pelo governo do
Estado. As crianças sem estudos, sem divertimentos, sem boa alimentaçã o, sem roupas, na miséria,
eram as futuras prostitutas e os futuros marginais. Elas precisavam, portanto, aprender a ler e a
escrever para, prosseguindo nos estudos, pudessem ascender socialmente.

A escola deveria, fornece tudo: o professor, a carteira, o material escolar e, inclusive, a merenda. A
educaçã o, portanto, seria o ú nico caminho pelo qual os meninos pobres poderiam mudar de
"status", sair da miséria.

Djalma Maranhã o, ligado desde suas origens, às reivindicaçõ es populares, compreendeu de


imediato a dramaticidade daquela necessidade. Aceitou o desafio. Designou o professor Moacyr de
Gó es para planejar, organizar e executar a campanha para erradicar o analfabetismo em Natal.

Uma diretora de Acampamento, ao observar que seus alunos chegavam atrasados à s aulas, teve
uma idéia: antes do início das aulas, promovia uma minipartida de futebol. Assim, diariamente, os
meninos jogavam sua partidazinha de futebol. Criando, ao mesmo tempo, o há bito de acordar cedo
para chegar na escola na hora certa.

Em abril de 1961, através de uma carta, Djalma Maranhã o mostrava o porquê da campanha: "Há
momentos decisivos na vida dos povos. É a hora em que a Histó ria marfa as suas encruzilhadas.
Acreditamos que o povo brasileiro vive um desses momentos. Na sua luta contra o
subdesenvolvimento ele precisa se erguer do solo e ganhar a sua independência de açã o. E só
poderá fazer isso se for alfabetizado e tiver uma educaçã o mínima que o faça afirmativo na
sociedade. Acreditamos que chegamos nessa encruzilhada: ou o povo se alfabetiza ou se escraviza.".

Apó s apresentar dados estatísticos sobre o analfabetismo em Natal, dizia o que estava fazendo: "o
nú mero de 'Escolinhas' já está em 205. Mas sã o precisas 1.878 para erradicar o analfabetismo da
Cidade. Presentemente estamos ensinando a ler até debaixo de palhas, pois nas Rocas construímos
cinco pavilhõ es de 8 metros por 30, cobertos de palhas de coqueiros, com piso de barro batido,
onde estudam cerca de 1.200 crianças e 300 adultos. Bem justificado é o nosso slogan: "DE PÉ NO
CHÃ O TAMBÉ M SE APRENDER A LER.

Para realizar tal obra, o prefeito solicita ajuda da populaçã o: "Por outro lado, a Prefeitura, sozinha,
nã o está capacitada financeiramente para arcar com todos os ô nus da educaçã o popular na cidade.
Precisamos, assim, da ajuda de todos. Precisamos da sua ajuda".

Para concluir, afirma Djalma Maranhã o: "Queremos ser soldados da campanha de um amanhã
melhor para o povo, através da educaçã o. Nessa mensagem queremos recordar a você. De Natal
subdesenvolvido, no Nordeste subdesenvolvido, clamamos para todo o Brasil: precisamos nos dar
as mã os, numa grande força, para alfabetizar o povo e oferecer-lhe a educaçã o necessá ria ao
desenvolvimento do País".

A campanha cresceu de maneira extraordiná ria passando por vá rias fases. A das "escolinhas
municipais", que funcionavam em salas cedidas por particulares. Depois, os "Acampamentos
Escolares", escolas rú sticas com piso de barro batido e cobertas por palhas de coqueiros. Para os
adultos que nã o queiram estudar nos "acampamentos", o ensino era feita na casa do analfabeto,
onde se reunia um grupo nã o superior a seis pessoas. Os professores eram recrutados entre
meninos e meninas do Grupo Escola Isabel Gondim, que se apresentavam para ensinar sem receber
salá rio. Um fato de grande importâ ncia foi sem dú vida a construçã o do Centro de Formaçã o de
Professores, cuja direçã o, foi entregue à professora Margarida de Jesus Cortês. O "Centro" passou a
ser o cérebro da campanha.
Atendemos a uma necessidade da populaçã o mais carente, da periferia da cidade, foi criada a
"Campanha de Pé no Chã o Também se Aprende uma Profissã o".

Simultaneamente, o governo do Estado adotou o médico Paulo Freire, em iniciativa pioneira de


alfabetizaçã o em 40 horas.

Três Séculos em Apenas Três Anos

O governo Aluízio Alves pretendia revolucionar a administraçã o pú blica, inovando, modernizando


através de uma açã o dinâ mica, construindo as condiçõ es bá sicas para o desenvolvimento do Rio
Grande do Norte.

Aluízio Alves tinha consciência, portanto, da verdadeira situaçã o em que se encontrava o Estado:
uma regiã o atrasada, subdesenvolvida e totalmente despreparada para construir o seu
desenvolvimento industrial. Além dessa conjuntura geral, o funcionalismo e os fornecedores do
governo estavam sem receber pagamento há sete meses.

O governador procurou melhorar o nível dos funcioná rios, através de cursos, criando gratificaçõ es
e dando promoçõ es aos que participassem desses treinamentos. Essa política era bá sica para um
governo que tinha pressa. Isso, contudo, nã o era suficiente para modernizar o processo
administrativo. A máquina burocrá tica, arcaica e ultrapassada, nã o oferecia condiçõ es para atender
a demanda de tantas iniciativas. Para suplantar tais obstá culos, o governo nã o vacilou em criar
novas entidades, como a Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte (Cosern),
Companhia Telefô nica do Rio Grande do Norte (Telern), Serviço Cooperativo de Educaçã o (Secern)
etc.

Para iniciar o processo de desenvolvimento era necessá rio, sobretudo energia farta e barata.,
facilidade de comunicaçã o com os grandes centros urbanos e boas estradas.

Na criaçã o da Companhia Hidroelétrica de Sã o Francisco (Chesf), para trazer energia elétrica de


Paulo Afonso para o Nordeste, foram excluídos os Estados do Rio Grande do Norte, Paraíba e Ceará ,
sob a alegaçã o da exploraçã o econô mica pela distâ ncia superior a 500 quilô metros. Deputado
federal em 1947, Aluízio Alves lutou durante 13 anos para mudar essa situaçã o, só vindo a
conseguir a inserçã o dos três Estados em 1960. Em em 1963, como governador do RN, criou, pela
lei 2.721, de 14 de setembro de 1961, a Cosern - Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande do
Norte, que implantou a energia de Paulo Afonso no territó rio norte-rio-grandense, iniciando uma
grande obra de infra-estrutura para o desenvolvimento industrial e, mais tarde, agro-industrial.
Resultado: diversas cidades passaram a contar com a energia de Paulo Afonso (Taipu, Currais
Novos, Acari, etc.). O custo total do plano de eletrificaçã o atingiu a cifra de Cr$ 2.283 milhõ es. Para
que se possa ter uma idéia do significado da obra realizada, é suficiente dizer que, em 1960, 14% da
populaçã o se beneficiava dos serviços elétricos. Em 1965, 39% da populaçã o recebiam os benefícios
da energia elétrica.

No campo das telecomunicaçõ es, o governo investiu cerca de Cr$ 1,3 bilhõ es, devendo salientar que
90% desse capital saiu dos cofres estaduais e o restante foi completado pelas prefeituras
municipais.

A 3 de setembro de 1963, foi criado a Telern. Era uma iniciativa pioneira, das mais importantes que,
juntamente com o plano de eletrificaçã o e com a construçã o de estradas (365,6 Km de estradas
construídas de 1961 a 1964, num investimento total de Cr$ 7.476.933.146,00), criavam aquelas
condiçõ es mínimas que possibilitariam um desenvolvimento maior do Rio Grande do Norte.

A educaçã o, contudo, se constituía num dos problemas mais graves do Estado. Por essa razã o,
passou a ser uma das prioridades do novo governo.

Nessa á rea, a situaçã o era caó tica, como demonstram os dados divulgados na época: "mais de 65%
de analfabetos; podendo-se afirmar que cerca de 80% da populaçã o ativa apenas sabia assinar o
nome; das 250.655 crianças em idade escolar, as escolas estaduais só podiam atender a 55 mil,
enquanto as municipais apenas 27 mil e as particulares nã o abrigavam mais de 28 mil, num total
deprimente de 110 mil matrículas. O déficit de mais de 140 mil crianças sem escola, sem nenhuma
possibilidade de aprender a ler e a escrever, representava mais da metade da populaçã o escolar. O
Estado contava tã o somente com 1.020 salas de aula, ocupando 826 prédios, dos quais só 660
portavam diploma, e entre os restantes incluíam-se diaristas sem habilitaçã o para o magistério e
sem estabilidade funcional, reduzindo-se a apenas 2.121 professores".

Para mudar esse quadro, o governo elaborou diversos projetos que, para sua execuçã o, contou com
recursos da Aliança para o Progresso, da Sudene, do MEC e, ainda, do governo do Estado. Para
administrar os recursos recebidos, foi criado um ó rgã o estruturado de maneira moderna e
dinâ mica, a Secern, cujo diretor executivo era o secretá rio de Educaçã o, o jornalista Calazans
Fernandes.

O governo lançou, entã o, o plano de "FAZER EM 3 ANOS O QUE NÃ O SE FEZ EM TRÊ S SÉ CULOS".

A grande meta "seria" alfabetizar 100 mil pessoas acima da idade escolar primá ria". O governo
almejava ainda a extensã o da escolaridade a todas as crianças do Estado e a construçã o de mil salas
de aulas.

Para educar o maior nú mero de pessoas no menor espaço de tempo foi lançada a Experiência de
Angicos, quando foi adotado o método do professor Paulo Freire. O resultado da experiência foi
considerado altamente positivo: "A batalha durou 40 dias como estava prevista. Encerrou-se a
experiência pioneira, como resultados que despertaram a atençã o de todo o Brasil: aproveitamento
de 70% na alfabetizaçã o e 80% na conscientizaçã o cívica".

Em 1965, cresceu o nú mero de professores, ou seja, 61% a mais do que em 1960!

Para atender a demanda sempre crescente de alunos e acabar com o déficit de edifícios escolares, o
executivo estadual agiu da seguinte maneira:

a) recuperou velhos prédios;

b) construiu novos edifícios;

c) cursos de 1º grau passaram a funcionar em prédios de grupos escolares.

No ensino de primeiro grau, foram construídas 253 salas de aula em sessenta e sete escolas, num
total superior a 30 mil metros quadrados de á rea coberta.

No ensino secundá rio, o governo construiu três edifícios, onde funcionam o Instituto Padre
Miguelinho, Instituto Presidente Kennedy - onde hoje está instalado um Curso de Licentiatura
Plena, preparando professores para o Ensino Fundamental - e o Centro Educacional Winton
Churchil.

A capacidade de matrícula, de 1960 até 1965, aumentou cerca de 63%.

Nessa á rea de atuaçã o, até o final de governo, foi investida uma importâ ncia no valor de Cr$
6.329.654.000,00.

No ensino superior, foi criada a Faculdade de Jornalismo, instalado o Instituto Juvenal Lamartine de
Pesquisas Sociais e, ainda, adquirida a Faculdade de Filosofia. Foi criada também a Fundaçã o José
Augusto, que abrigou em seu seio, além das instituiçõ es já citadas, outras como a Biblioteca Pú blica,
Centro de Estudos Afro-Asiá sticos, Centro de Cultural Hispâ nica e Escola de Arte Infantil Câ ndido
Portinari, fazendo com que essa fundaçã o se transformasse numa verdadeira secretaria para
assuntos culturais.
Na cultura, o governo aplicou Cr$ 1.201.945.000,00.

Aluízio Alves adotou uma política de bem-estar social da maior importâ ncia. Investiu no campo da
saú de, assistência social, habitaçã o popular e abastecimento de á gua. Ampliou os serviços de
abastecimento de á gua em Natal, Mossoró e Caicó , implantando o sistema de Angicos e Santana do
Matos. Instalou o serviço de mini-abastecimento em 30 municípios. Em Natal, no ano de 1965, com
relaçã o ao serviço de á gua, os prédios atingidos por esse benefício chegavam à casa dos 100%! O
sistema de esgoto, na capital, atingia, em 1960, apenas 10% dos edifícios e em 1965, quando Aluízio
deixou o governo, o índice já alcançava 75% dos edifícios.

No interior, a cidade de Touros, na época, com 2.200 habitantes, foi a primeira cidade do Brasil a ser
totalmente saneada.

A Telern (Companhia Telefô nica do Rio Grande do Norte) promoveu a interligaçã o, pelo sistema
interurbano, de vá rias cidades do Estado (Caicó , Currais Novos, Cerro Corá , Macau, Mossoró e Areia
Branca) com Natal. Ligando, pelo mesmo sistema, o Rio Grande do Norte com outros Estados do
País.

No turismo, o Rio Grande do Norte nã o possuía nenhum hotel de grande porte. O governo construiu
o Hotel Reis Magos, o primeiro de categoria internacional.

O poder pú blico estadual criou ainda a Codern (Companhia de Desenvolvimento do Rio Grande do
Norte) para planejar o desenvolvimento, orientando os investimentos que modificaram a estrutura
econô mica do Rio Grande do Norte.

Aluízio Alves construiu durante o seu governo cerca de 1.300 obras durante 1.825 dias.

Por ter criado as condiçõ es para que o Estado pudesse se desenvolver, pela modernizaçã o que
implantou, o governo de Aluízio Alves foi considerado por alguns como verdadeiramente
revolucioná rio.

Teve, entretanto, seus críticos. A oposiçã o acusava o governo de perseguir funcioná rios e nã o
aceitava a maneira como conduziu o movimento militar de 1964.

Aluízio Alves, falando sobre o assunto, disse: "Lutei. Sofri injustiças. Cometi involuntariamente
outras. Despertei amor e gerei ó dios. Conquistei o povo, perdi amigos e ganhei inimigos".

A Precocidade de Aluízio Alves

Aluízio Alves nasceu na cidade de Angicos, no dia 11 de agosto de 1921.

Foi um menino precoce, iniciando sua carreira de jornalista ainda criança. Fundou o jornal "O
Clarim", que era datilografado e possuía apenas um exemplar, passando de casa em casa. O jornal,
segundo Aluízio, era "por mim mesmo desenhado em vermelho, e por mim todo ele escrito: desde o
editorial à s notas de aniversá rios, notícias de festas, entrevistas etc., à s vezes, jornalista e
datiló grafo de dois dedos, levada o dia inteiro, até sem almoço, entrava pela noite, sob o protesto da
minha mãe. Tudo era compensado pelas alegrias do domingo: o jornal ia passando de casa em casa,
com os comentá rios dos vizinhos, leitores de toda a cidade".

Mais adiante, duas outras iniciativas, ambas no campo do jornalismo: o jornal "A Palavra" e a
revista "Potiguarâ nia". Dirigiu também o jornal "O Estudante".

O Partido Popular, quando criou "A Razã o" , designou Aluízio para trabalhar como repó rter. O
jornal pertencia a Dinarte Mariz e seu diretor era Eloy de Souza.
Apó s a vitó ria do Partido Popular, que consegue eleger três deputados, e a situaçã o apenas um,
Aluízio Alves escreveu um artigo com o título "Três a Um", quando chamou o interventor Bertino
Dutra de "apêndice podre da Marinha brasileira", Diante da ofensa, a Marinha mandou prender
Aluízio. Foi criado, entã o, o impasse: o autor do artigo era menor, contava apenas 13 anos de idade...
Como soluçã o, o jornal foi fechado. Na administraçã o de Má rio Câ mara, a publicaçã o voltou a
circular.

O jornalista-mirim enfrentou outro problema semelhante. O major Abelardo de Castro deu uma
entrevista criticando a situaçã o que havia no Rio Grande do Norte. Essa entrevista foi publicada no
"Diá rio de Pernambuco". Como o jornal da oposiçã o se encontrava fechado, a entrevista foi
impressa em forma de boletim. Na noite seguinte, Aluízio, com outras pessoas, pregavam com grude
os boletins nas paredes das casas, edifícios pú blicos etc. Quando Aluízio estava colando as folhas
atrá s da catedral velha, foi preso. Mas nã o podia ser preso por causa da idade. O chefe da Polícia,
capitã o da Marinha, Paulo Má rio, chamou o pai do menino, aconselhou, ameaçou, porém o jovem
rebelde foi colocado em liberdade.

Aluízio, repó rter de "A Razã o", junto à Assembléia Legislativa", viveu momentos difíceis nessa fase:
"lá à s seis horas da manhã para "A Razã o", escrevia vá rias matérias. Quinze para as oito e eu ia para
o colégio e ficava até onze horas. À s onze horas voltava para a "A Razã o" para escrever e fazer a
revisã o da matéria. Uma hora da tarde voltava para o colégio, até aí sem comer, sem almoçar, ficava
no colégio até três e meia da tarde. Quando saía à s três e meia da tarde. Quando saía à s três e meia
da tarde, eu ia para o jornal, assistia ao final do jornal".

Aluízio Alves começou a se interessar por política no ano de 1932, com onze anos de idade, quando,
apó s a derrubada do prefeito de Angicos, Joã o Cavalcanti, seu pai, Manoel Alves, foi eleito prefeito.

Nesse ano, ocorria uma terrível seca e os flagelados da regiã o procuraram seu "Nezinho", que
convocou os comerciantes para colaborar: recebendo e distribuindo gêneros alimentícios, estava ali
presente o menino Aluízio Alves.

Outro acontecimento vai marcar a carreira precoce do político Aluízio Alves: durante a revoluçã o
Constitucional de 32, ele se encontrava em Ceará Mirim. Nessa cidade só havia um rá dio, na casa de
Waldemar de Sá . O menino Alves ouvia os discursos dos líderes do movimento, repetindo para os
presentes.

Aluízio, indo para o Ceará, estudou no Giná sio Sã o Luiz. Ocorreu entã o o seguinte fato: um
motorista de ambulâ ncia dirigia em alta velocidade para salvar um doente. A ambulâ ncia virou, o
motorista morreu, porém, o doente sobreviveu. O acontecimento emocionou a cidade de Fortaleza.
Aluízio foi escolhido para fazer a oraçã o, durante uma homenagem prestada pelos estudantes aos
familiares da vítima do acidente. Seu discurso emocionou a todos os presentes. A partir daquele
momento passou a ser o orador oficial do giná sio!

Em 1940, em Angicos, a Paró quia organizou a festa de Cristo Rei. Estiveram presentes o governador
Rafael Fernandes e Aldo Fernandes. Na oportunidade, Aluízio pronunciou uma conferência sobre a
Paró quia de Angicos. Como resultado, o menino-conferencista foi convidado por Aldo Fernandes
para trabalhar no jornal "A Repú blica", quando se tornou repó rter e editor do referido ó rgã o de
imprensa, na época, dirigido por Edgar Barbosa.

Em 1942, uma grande seca. Natal foi invadida pelos flagelados. Aldo Fernandes chamou Aluízio,
dizendo que queria fazer uma reuniã o com as principais autoridades da cidade. Aluízio, entã o,
escreveu um artigo inti-tulado 'Convocaçã o à família natalense", sendo designado para organizar o
trabalho de assistência aos flagelados. Dentro de três dias. 8 mil pessoas estava abrigadas.
Terminada a seca, Aluízio Alves organizou a volta dos retirantes, fazendo com que cada um levasse
instrumento de trabalho, além de recursos para recomeçar a vida, inclusive, comida para um mês.
Aconteceu que, no final, ficaram 60 menores de ambos os sexos. Aluízio Alves sugeriu, entã o, criar
um Serviço de Assistência ao Menor. Aprovada a idéia, Aluízio Alves foi para Recife e, naquela
cidade, entrou em contato com as autoridades que tratavam do problema.
Foi fundado o "Abrigo Melo Matos", com Orígenes Monte assumindo a direçã o.

Incansá vel, Aluízio Alves, com ajuda da Legiã o Brasileira de Assistência, criou o Instituto Padre Joã o
Maria e, com auxílio da prefeitura, organizou o Abrigo Juvino Barreto. Ambos foram inaugurados no
dia 19 de abril de 1943.

Marcos Empreendedores

Preocupações Sociais, Jornalismo e Política

Depois de criar o Instituto Padre Joã o Maria e organizar o Abrigo Juvino Barreto, em 1943, Aluízio
Alves partiu para uma iniciativa maior: criou a Escola de Serviço Social.

Durante a Segunda Guerra Mundial, o jornalista realizou o grande feito de entrevistar, com ajuda de
um intérprete, Eleanor Roosevelt, que veio a Natal em campanha para eleger seu marido, Delano
Roosevelt, presidente dos Estados Unidos.

Nesse período, Aluízio Alves tinha dois programas radiofô nicos. Aos domingos, levava ao ar "Gló rias
do Brasil", com o objetivo de mobilizar a opiniã o pú blica a favor dos aliados. O outro, chamado 'Ave
Maria', era diá rio e começava à s 6 horas.

O Serviço de Proteçã o ao Menor se estendeu ao interior e, com a ajuda dos bispos de Caicó e de
Mossoró , chegou a reunir mais de 10.000 menores, em regime de semi-internato.

No governo do interventor general Dantas, Aluízio Alves foi o diretor do SERAS, instituiçã o por ele
organizada.

Aos 23 anos, Aluízio foi eleito deputado federal, sendo o mais moço da Assembléia Nacional
Constituinte, em 1946, causando sensaçã o no Rio de Janeiro, por ser apenas nã o o mais jovem, mas
também o ú nico deputado que era estudante. O artigo da Constituiçã o de 1946 sobre assistência
aos menores e à maternidade é de sua autoria.

Reeleito deputado federal nos anos de 1950, 1954 e 1958, foi o responsá vel pela criaçã o do
programa de Crédito de Emergência, para o período de seca no Nordeste. E no ano de 1960 foi
eleito governador, por maioria absoluta.

Deixando o governo, continuou fazendo política, conseguindo expressivos resultados. Elegeu o seu
sucessor, monsenhor Walfredo Gurgel, com 54% dos votos, e seu irmã o, Agnelo Alves, chegava à
prefeitura de Natal, com 61% dos votos.

Com o golpe militar de 1964, os partidos (PSD, UDN, etc) foram extintos. Em seu lugar foram
criados dois novos partidos: ARENA e PMDB.

Aluízio Alves voltou à Câ mara Federal em 1966, quando obteve 60.000 votos.

Em 1969, a grande frustraçã o: foi cassado pelo Ato Institucional nº 5. Afastado oficialmente da vida
política, reagiu, fazendo com que seus aliados mais fiéis se transferissem para o MDB.

Em 1970, Odilon Ribeiro Coutinho perdeu a eleiçã o para o Senado. O vitorioso foi Dinarte Mariz.
Henrique Alves, filho de Aluízio, foi eleito deputado federal, com grande votaçã o.

Um marco na vida de Aluízio Alves, em sua profissã o de jornalista, foi quando fundou, juntamente
com Carlos Lacerda, o jornal "Tribuna da Imprensa", no Rio de Janeiro. Lacerda assumiu a direçã o e
Aluízio, o cargo de redator-chefe. Quando Carlos Lacerda partiu para o exílio, depois da eleiçã o de
Juscelino Kubistchek, Aluízio assumiu a direçã o geral do ó rgã o de imprensa.
Outra importante iniciativa nessa á rea é a fundaçã o, no dia 24 de março de 1950, em Natal, da
"Tribuna do Norte", empresa em que seu fundador exerceu a direçã o. Posteriormente, adquiriu a
Rá dio Cabugi. Surgia, assim, o Sistema Cabugi de Comunicaçõ es que, na atualidade, é formado pela
Tribuna do Norte, TV Cabugi, Rá dio Cabugi AM, Rá dio Difusa de Mossoró , Rá dio Cabugi do Seridó e
líder FM, de Parnamirim.

Cassado de seus direitos políticos, Aluízio Alves investiu em sua carreira de empresá rio, fundando,
no Rio de Janeiro, a Editora Nosso Tempo. É assim que ele resume a sua atuaçã o como
empreendedor: "diretor industrial de um grupo empresarial, construindo no Rio Grande do Norte a
primeira indú stria de cartonagem: uma grande indú stria de confecçõ es, a Sparta; a primeira e até
agora ú nica fá brica de tecidos, a Seridó , depois, Coteminas; o Hotel Ducal Palace, na época, entre os
três melhores do Nordeste. No Sul, era presidente de indú strias e de duas grandes empresas
comerciais do mesmo grupo, com mais de 100 lojas em Sã o Paulo, Rio e Minas".

Como escritor, Aluízio Alves publicou alguns livros, entre eles "Angicos" (em 1997 foi lançada a 2ª
ediçã o, pela Fundaçã o José Augusto), "A Primeira Campanha Popular do Rio Grande do Norte",
"Sem ó dio e sem medo". A verdade que nã o é secreta etc.

No dia 16 de agosto de 1992, Aluízio Alves tomou posse na Academia Norte-Rio-Grandense de


Letras, em solenidade realizada apó s 17 anos de eleiçã o no Salã o dos Grandes Atos, da Fundaçã o
José Augusto. Foi saudado pelo acadêmico Má rio Moacyr Porto, que encerrou o seu discurso com as
seguintes palavras: "Ingressai nesta casa de homens de letras, senho acadêmico Aluízio Alves, pela
porta larga do talento. Nã o se aplica à V. Excia, o apelido de imortal por adulaçã o estatutá ria, mas de
quem alcançará , pelos seus feitos, um lugar destacado na admiraçã o dos pó s-terros. Sede bem-
vindo".

Aluízio, num longo discurso, lembrou importantes fases de sua vida na suas diversas facetas:
jornalista, político e escritor. E suas grandes amizades, como, por exemplo, a de Hélio Galvã o.
Confessou que "jamais foi minha ambiçã o pessoal chegar à Academia".

Concluido, disse: "E por isso, diante de todos, posso repetir, quando 72 anos tentam inutilmente
reduzir-me o â nimo, e apagar, na noite das vicissitudes, a chama da esperança, uma palavra que,
numa hora difícil se tornou meu apelo e meu caminho: "a luta continua".

Aluízio Alves foi também ministro de Estado por duas vezes: ministro de Administraçã o do governo
de José Sarney e, por sete meses, ocupou como titular o Ministério da Integraçã o Regional, no
governo Itamar Franco, quando elaborou o Projeto de Transposiçã o das á guas do Sã o Francisco,
beneficiando os Estados do Ceará , Rio Grande do Norte e da Paraíba.

O Golpe de 1964

Deposição de João Goulart

No final de 1963 já se delineava uma crise no Brasil. O governo Joã o Goulart reforçava sua linha de
governo de cará ter nacionalista e reformista, fazendo com que as forças conservadoras se
aglutinassem para derrubá -lo. San Tiago Dantas procurou unificar os grupos esquerdistas numa
frente ú nica, sem sucesso. A cada dia que passava, o radicalismo aumentava.

Um decreto que obteve grande repercussã o foi o que autorizava a SUPRA (Superintendência da
Reforma Agrá ria) "para concluir convênio destinado a delimitar as á reas marginais à s estradas e
açudes, com fins de expropriaçã o, para distribuiçõ es de terras".

O tempo passava e esquerdistas e direitistas se acusavam, mutuamente, dizendo abertamente que


estavam se preparando para um conflito armado.
Em janeiro de 1964, o deputado federal Leonel Brizola denunciava: "nã o existe ninguém no poder
do País, neste momento". Era uma verdade. O presidente Joã o Goulart tinha perdido o comando,
nã o podendo evitar o rumo dos acontecimentos.

Resolveu, entã o, partir para a extrema esquerda, precipitando os acontecimentos. A situaçã o se


agravou quando da realizaçã o de um comício, promovido pelo governo, que se realizou no dia 13 de
março de 1964, na praça Cristiano Otô ni, na Guanabara. Como a praça se localizava na fronteira da
Estaçã o D. Pedro II, da Central do Brasil, ficou conhecido como sendo o "Comício da Central".

O governo pretendia demonstrar força, fazendo com que seus ministros comparecessem. Alguns
governadores se fizeram presentes: Miguel Arraes, de Pernambuco; Seixas Dó ria, de Sergipe;
Badger Silveira, do Rio de Janeiro. O presidente da Repú blica, na ocasiã o, assinou dois decretos. Um
encampava as refinarias de petró leo particulares e o outro tratava da desapropriaçã o de terras.

O conflito caminhava para o desenlace. Os distú rbios, nas ruas, começavam a surgir. A disciplina na
Marinha foi quebrada. A crise também atingia as forças armadas.

Em Sã o Paulo foi realizada a "Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade", que contava com um
grande nú mero de senhoras da sociedade, autoridades civis e o apoio do clero.

Marinheiros e fuzileiros se rebelaram e o destacamento destinado a prendê-los aderiu ao


movimento.

A essa altura dos acontecimentos, ninguém mais podia evitar. A crise haveria de terminar num
conflito armado. Nã o poderia vir da esquerda, que estava com o governo. A reaçã o deveria partir da
extrema direita, que pretendia acabar com o "comunismo no Brasil". E comunista, para as classes
conservadoras, era qualquer pessoa que se apresentasse como sendo de esquerda; defendesse o
nacionalismo, combatendo o "entreguismo" contra, portanto o capitalismo internacional... Por
causa desses equívocos, muita injustiça foi cometida!

No dia 31 de março de 1964 eclodiu o movimento militar para derrubar o governo Joã o Goulart.

Sem condiçõ es de resistir ao golpe planejado pelos altos chefes militares, com o apoio de parcelas
da sociedade, em 1º de abril de 1964, o presidente Joã o Goulart partiu de Brasília para o Rio Grande
do Sul e, logo em seguida, viajou para o Uruguai como exilado político. Ranieri Mazzilli, presidente
da Câ mara Federal, foi provisoriamente empossado presidente da Repú blica.

O movimento militar de 64 se consolidou com a promulgaçã o do Ato Institucional e a posse do


marechal Humberto de Alencar Castelo Branco como presidente.

Confroto e Rede de Investigação no RN

A radicalizaçã o entre esquerda e direita atingiu também o Rio Grande do Norte.

A causa esquerdista, no Estado era defendida por Djalma Maranhã o e seus correligioná rios e, ainda,
por grande parte dos estudantes e de operá rios. Essas forças defendiam os ideais do nacionalismo e
lutavam contra a direita.

Quando a crise ideoló gico-militar explodiu no Sul, o prefeito Djalma Maranhã o, de imediato, ficou
solidá rio com Joã o Goulart. Foi mais além, transformou o prédio da prefeitura como sendo "o
quartel-general da legalidade e da resistência".

O governador Aluízio Alves divulgou uma nota, onde dizia que o governo "pede ao povo que se
conserve calmo, evitando atos ou manifestaçõ es que aprofundem as divisõ es desta hora em que
todos os esforços devem ser feitos para a restauraçã o da paz e preservaçã o da democracia".
Começou, entã o, a fase de investigaçõ es com a Comissã o Geral de Investigaçõ es instalada pelos
militares e mais duas comissõ es criadas pelo Ato Institucional nº 2.

No dia 1º de abril, Djalma Maranhã o publicou uma nota oficial, do governo municipal do Natal,
concluindo com as seguintes palavras: "a legalidade é Jango!".

No dia 2 de abril foram presos, o prefeito Djalma Maranhã o e o seu vice. Luís Gonzaga dos Santos.
Foram levados para o QG da Guarniçã o Militar de Natal. Depois, foi comunicado aos vereadores que
os dois, sendo comunistas, nã o poderiam exercer os seus mandatos. Como a comunicaçã o foi verbal,
a Mesa da Câ mara solicitou ao comando militar que fosse enviado um ofício, para dar um cará ter
administrativo à questã o. A Câ mara Municipal ficou reunida, esperando a comunicaçã o oficial, que
chegou por volta das 22 horas. Os vereadores declararam o "impeachemet" de Djalma Maranhã o e
de Luís Gonzaga dos Santos. O vereador Raimundo Elpídio assumiu, em cará ter interino, a funçã o
de prefeito. Mais tarde, os vereadores elegeram, em definitivo, o almirante Tertius César Pires de
Lima Rebelo como prefeito e Raimundo Elpídio, vice-prefeito.

Os vitoriosos consolidaram o movimento no Rio Grande do Norte, porém, deixando profundas


marcas no seio da família potiguar, como demonstra o desabafo da escritora Mailde Pinto Galvã o:
"Por uma suspeita absolutamente infundada e sem sentido, invadiam as residências, prendiam
pessoas e expunham as famílias ao vexame das investigaçõ es na vida pessoal e profissional. Perdia-
se a privacidade, o direito de defesa e a estabilidade nos empregos".

Para José Wellington Germano, "na verdade, nã o foi esboçada nenhuma tentativa concreta de
resistência. As forças principais trataram logo de ocupar, na manhã do dia 1º de abril, os principais
pontos da cidade, cercado alguns sindicatos, e na noite do mesmo dia, intervindo e dissolvendo uma
assembléia de estudantes que se realizava no restaurante universitá rio da Av. Deodoro; também foi
desfeito o QG da legalidade pelas pró prias forças militares que penetraram no edifício da
prefeitura".

O mesmo autor ainda informa que os sindicatos marítimos de Areia Branca e Macau entraram em
greve, a Federaçã o dos Trabalhadores Rurais colocou à disposiçã o do presidente da Repú blica cerca
de cinqü enta mil camponeses e a Uniã o Estadual de Estudantes lançou um manifesto.

O prefeito Raimundo Elpídio da Silva, no dia 3 de abril de 1964, exonerou o professor Moacyr de
Gó es da funçã o de secretá rio de Educaçã o. A funçã o foi assumida, posteriormente, pelo capitã o-de-
corveta Tomaz Edson Goulart do Amarante.

No dia 7 de abril, foi realizada a "Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade", para comemorar a
vitó ria do golpe militar.

O novo governo municipal demitiu vá rios funcioná rios, considerados perigosos: "Omar Pimenta, da
diretoria do Ensino Municipal; Mailde Pinto, da diretoria de Documentaçã o e Cultura; a professora
Maria da Conceiçã o Pinto de Gó es e, ainda, o professor Geniberto Campos, respectivamente dos
cargos de diretor e vice-diretor do Giná sio Municipal", narrou José Wellington Germano.

Uma grande preocupaçã o dos novos detentores do poder foi a de eliminar livros que, para eles,
continham ensinamentos de uma ideologia marxista. Para realizar tal missã o, invadiram
bibliotecas, destruindo muitos volumes.

E como sempre acontece nesses casos, alguns militares, por excesso de zero ou por ignorâ ncia,
cometeram arbitrariedade. Exemplo: quando invadiram a casa do professor Moacyr de Gó es,
colocaram uma metralhadora na cabeça da mã e do ex-secretá rio de Educaçã o, já bastante idosa e
que merecia, portanto, maior respeito".

Vá rios inquéritos militares foram instaurados, dos quais resultaram diversas prisõ es: Hélio Xavier
de Vasconcelos, Omar Fernandes Pimenta, Moacyr de Gó es, Vulpiano Cavalcanti de Araú jo, Eider
Toscano de Moura, Danilo Bessa, Marcos José de Castro Guerra, Carlos Alberto de Lima, Luiz Igná cio
Maranhã o Filho, etc.

Nas prisõ es, houve uma série de torturas. Como disse Moacyr de Gó es, "é fá cil implantar o terror
numa cela. Fá cil e covarde. Basta que os carcereiros empreguem a força bruta no espancamento dos
prisioneiros em sucessivos interrogató rios. Ou entã o que aos mesmos carcereiros seja permitido
criar condiçõ es tais de insegurança para os prisioneiros que estes sintam o real risco de nã o sair do
cá rcere com vida".

O Jogo Claro de Djalma Maranhão

Djalma Maranhã o nasceu em Natal, no dia 27 de novembro de 1915. Filho de Luís Iná cio de
Albuquerque Maranhã o e de dona Salomé de Carvalho Maranhã o, teve os seguintes filhos: Lamarck
(falecido), Marcos e Ana Maria.

Djalma Maranhã o foi um homem simples, inteligente e que sabia exatamente o que queria da vida.
Nã o transigia nas suas idéias. Amaca os mais humildes e lutava para atender às reivindicaçõ es das
classes menos favorecidas. Nacionalista, denunciava, gritava, protestava. Expressava sua ideologia
de maneira clara e inequívoca, acreditando na vitó ria do socialismo, convicto de que "somente a
dialética marxista-leninista libertará as massas da opressã o e da fome através da socializaçã o dos
meios de produçã o e da entrega da terra aos camponeses".

Como nã o se acomodava à s intrigas políticas, nem concordava ou se adaptava a qualquer tipo de


corrupçã o, foi expulso de alguns partidos.

Militante comunista, quando era cabo do exército participou da Intentona Comunista de 35, sendo
preso. É o pró prio Djalma Maranhã o que diz: "Andei pelos presídios políticos e pelos campos de
concentraçã o, martirizado pelos esbirros de Felinto Mü ller e de Getú lio Vargas".

Em 1946, foi expulso do partido comunista, porque denunciou os diretores do partido como
desonestos. Foi eliminado, quando se encontrava ausente de plená rio, sem que pudesse se
defender. A acusaçã o feita por Djalma Maranhã o foi escrita.

Era de fato um homem temperamental. À s vezes, contudo, sabia se conter. Exemplo: durante a
campanha de 1960 para prefeito de Natal, Djalma Maranhã o entrou irado na sala de redaçã o da
"Folha da Tarde" com um exemplar na mã o. Perguntou, entã o, quem tinha escrito a manchete de
seu jornal, que dizia o seguinte: "Lott - Jango - Walfredo - Maranhã o - Gonzaga. Vote do primeiro do
sexto". Ao saber que o autor da manchete foi Moacyr de Gó es, de conteve e disse: "A manchete está
certa. É assim mesmo. Nã o vamos ficar em cima do muro. Jogo claro. Honrar as alianças".

Mantinha cordiais relaçõ es com a Igreja. Certo dia, uma funcioná ria criticou as pessoas que
trabalhavam para a Arquidiocese. Djalma Maranhã o sorriu e disse: "Deixe o padre fazer o trabalho
dele. E nó s faremos o nosso".

Na campanha "De Pé no Chã o Também se Aprende a Ler" trabalhavam cristã os (cató licos e
protestantes), espíritas e marxistas. Por essa razã o, o professor Moacyr de Gó es chamou o
movimento de uma "frente".

Profundamente humano. Intransigente contra a falsidade e a desonestidade, admitia o erro, desde


que fosse cometido por alguém que desejasse acertar.

Para ele, governar era realizar. Nas suas administraçõ es como prefeito de Natal, procurou deixar
uma marca de dinamismo.

Nas eleiçõ es de 31/10/1954, foi eleito deputado estadual pelo Partido Social Progressista, obtendo
ó tima votaçã o em Natal. Como legislador, teve um grande desempenho, sendo inclusive autor do
projeto que deu autonomia ao município de Natal.
Em 1955, Djalma Maranhã o apoiou Dinarte Mariz para governador, na coligaçã o PSP-UND. Mariz
derrotou Jocelyn Vilar, do PSD. Como conseqü ência do acordo dessas eleiçõ es, Djalma Maranhã o foi
designado prefeito da Cidade do Natal, cuja posse ocorreu no dia 1/2/1956.

De acordo com Moacyr de Gó es, "nessa primeira administraçã o de Djalma Maranhã o, a Prefeitura
vai implantar o programa municipal de ensino, através das escolinhas de alfabetizaçã o e do Giná sio
Municipal de Natal".

No ano de 1959, Djalma Maranhã o rompeu com Dinarte Mariz. Suplente, assumiu o cargo de
deputado federal, onde se destacou como membro atuante da Frente Parlamentar Nacionalista.

Em 1960, se candidatou a prefeito, participando da coligaçã o "Cruzada da Esperança", juntamente


com Aluízio Alves, candidato ao governo do Estado.

Vitorioso, no dia 5/11/60 Djalma Maranhã o assumiu novamente a Prefeitura de Natal, sendo dessa
vez através do voto. Foi, portanto, o primeiro prefeito natalense eleito diretamente pelo povo,
obtendo 66% dos voto.

Em sua segunda administraçã o, Djalma Maranhã o demonstrou toda a sua capacidade de trabalho e
de liderança política. Aos poucos conquistou a confiança e o respeito da classe média, aumentando
seu prestígio junto das classes populares.

Djalma Maranhã o nã o foi apenas um político. Atuou, igualmente, como jornalista. Segundo
Leonardo Arruda Câ mara, "a imprensa foi a grande vocaçã o. Revisor, repó rter esportivo, repó rter
político, redator, secretá rio de redaçã o, editorialista, diretor e proprietá rio de jornais, percorreu na
carreira de jornalista todos os postos e funçõ es. Fundou o "Monitor Comercial", o "Diá rio de Natal"
e a "Folha da Tarde".

"Foi diretor e proprietá rio do "Jornal de Natal".

Como escritor, publicou "O Brasil e a Luta Anti-Imperialista", pelo Departamento de Imprensa
Nacional, ediçã o da Frente Parlamentar Nacionalista, no Rio de Janeiro, em 1960, e "Cascudo",
Mestre do Folclore Brasileiro", lançado em 1963. Tem também uma obra pó stuma: "Carta de um
Exilado".

Com o golpe militar de 1964, Djalma Maranhã o foi preso. Libertado, posteriormente, através de um
"habeas corpus", concedido pelo Supremo Tribunal Federal, conseguiu se asilar na Embaixada do
Uruguai, indo morar naquele país, onde veio a faleceu, no dia 30 de julho de 1971.

No ú ltimo livro produzido pelo antropó logo Darcy Ribeiro, "O povo Brasileiro - A formaçã o e o
sentido do Brasil", publicado em 1997, o escrito refere-se à morte e ao apego de Djalma Maranhã o
ao Brasil, sem contudo citar seu nome. "Pude sentir, no exílio, como é difícil para um brasileiro
viver fora do Brasil. Nosso país tem tanta seiva de singularidade que torna extremamente difícil
aceitar e desfrutar do convívio com outros povos. O prefeito de Natal morreu em Montevidéu de
pura tristeza. Nunca quis aprender espanhol, nem o suficiente para comprar uma caixa de fó sforo",
relata Darcy Ribeiro.

Segundo Leonardo Arruda Câ mara, Djalma Maranhã o "foi sepultado em Natal no Cemitério do
Alecrim, graças à interferência do senador Dinarte Mariz, acompanhado de grande multidã o no
maior enterro já realizado em nossa capital que atestou o quanto ele era amado e querido por sua
gente".

Pausa no Radicalismo

Uma Obra Para o Bem da Coletividade


O processo político no Rio Grande do Norte sempre se caracterizou pelo radicalismo. Houve,
entretanto, um período de paz e tranqü ilidade na terra potiguar, implantado por um homem
inteligente, justo e honesto: monsenhor Walfredo Gurgel. Ele buscou a paz com tenacidade. Ao
traçar as diretrizes de sua administraçã o, disse: "sou homem que pretende governar com a
simplicidade da minha formaçã o e do meu temperamento. Desejo e espero o convívio cordial de
todos os que me cercam e a todos darei o exemplo de tolerâ ncia e de compreensã o".

Deixou bem claro que nã o aceitaria apoio em troca de benefícios: "nã o procurarei adversá rios. Nã o
buscarei adesõ es. Nã o transacionarei apoio. Mas nã o recusarei ajuda nobre e espontânea à
administraçã o que estou iniciando porque nã o tenho o direito de repelir aqueles que se disponham
a trabalhar pelo Rio Grande do Norte. Nã o perseguirei adversá rios. Nã o procurarei ferir ninguém.
Numa palavra: desejo que haja respeito ao governo e o governo respeitará a todos, aliados ou
adversá rios".

Cumpriu com a palavra. Jamais se afastou desses princípios. Outra característica do seu governo,
talvez a maior, foi a austeridade. "Quando aos critérios administrativos, o meu governo será de
austeridade, de contençã o de despesas supérfluas", afirmou.

Fugiu sempre da ostentaçã o. Por essa razã o, nã o admitiu no seu governo que se colocasse nas
placas, que anunciavam as obras pú blicas, o nome de qualquer autoridade. Como disse Bianor
Medeiros, "o governo para ele nã o era o seu nome, mas a obra que surgia para o bem da
coletividade".

A principal obra do seu governo foi, na realidade, a ponte rodo-ferroviá ria de Igapó . Procurou
melhorar as rodovias, pensando na circulaçã o das riquezas do Estado.

Na á rea da agricultura, segundo Bianor Medeiros, "construiu parques, armazéns e atacou o setor
através da melhoria dos rebanhos e forragens".

O Hospital Walfredo Gurgel, foi obra da sua administraçã o. E, ainda, a construçã o do prédio da
Telern, no centro da cidade. Fundou a Biblioteca Câ mara Cascudo, além de diversas escolas.

Nã o se pode esquecer o grande desenvolvimento que te o Banco do Rio Grande do Norte durante
sua administraçã o, inaugurando diversas agências na capital e em vá rias cidades do interior (Caicó ,
Ceará -Mirim, Mossoró , etc).

Mas a grande contribuiçã o do seu governo foi, sem dívida, a construçã o de um clima de paz,
evitando qualquer tipo de antagonismo que pudesse gerar ó dio, sendo por essa razã o respeitado
pela posiçã o. Bianor Medeiros declarou que Monsenhor Walfredo Gurgel "nunca cometeu ou
permitiu uma violência, nem a mais leve injustiça contra os seus mais rancorosos adversá rios; com
estes sempre foi de uma exemplar generosidade, quando os via em situaçã o difícil".

Exemplos do Monsenhor Walfredo Gurgel

Nasceu no dia 2 de dezembro de 1908, na cidade de Caicó , Rio Grande do Norte. Filho de Pedro
Gurgel do Amaral e Oliveira e dona Joaquina Dantas Gurgel.

Perdeu o pai aos dez anos. Tempos difíceis, e o menino Walfredo, para ajudar a família, vendia
banana. Continuou. Entretanto, seus estudos no Grupo Escolar Senador Guerra, onde fez o curso
primá rio.

Queria ser padre, porém, havia uma dificuldade: sua mã e, viú va e pobre, nã o podia financiar sua
estadia no seminá rio. D. José Pereira Alves, bispo diocesano, contornou a situaçã o. E assim, "em 3
de fevereiro de 1922, ingressava no Seminá rio de Sã o Pedro o menino caicoense que, apó s 4 anos,
concluía o curso de Seminá rio Menor".
"Aluno laureado, ao lado do Santo gênio, padre Monte, foi contemplado com uma bolsa de estudos
para, em Roma, cursar Filosofia e Teologia". Concluindo esses dois cursos, "doutorou-se, a seguir,
em Direito Canô nico, pela universidade Gregoriana, ordenando-se padre no dia 15 de outubro de
1931, na Capela do Pontifício Colégio Pio-Americano".

Voltou ao Brasil no dia 14 de agosto de 1932. Foi recebido com grandes festas, inclusive um
banquete, ao qual compareceram figuras expressivas da regiã o. O á gape foi realizado na
Intendência de sua cidade.

O novo sacerdote, inteligente e culto, assumiu o cargo de reitor do Seminá rio de Sã o Pedro, além de
lecionar algumas disciplinas, como Teologia.

A exemplo de grande nú mero de intelectuais cató licos de sua época, ingressou na Açã o Integralista
Brasileira.

Mais tarde, foi designado vigá rio de Acari, Freguesia de Nossa Senhora da Guia e, depois, vigá rio de
Caicó .

Homem dinâ mico, participou, ao lado de outros seridoenses, de luta pela criaçã o da Diocese de
Caicó . Essa causa se tornou vitoriosa, com D. José de Medeiros Delgado nomeado bispo de Caicó .
Walfredo Gurgel assumiu a funçã o de vigá rio-geral.

Professor e sacerdote, Walfredo Gurgel se preocupou muito com a educaçã o dos jovens do Seridó .
Batalhou entã o, pela construçã o de uma escola, a nível de primeiro grau, para os meninos. Em 1942,
o seu sonho se realizava, com a inauguraçã o do Giná sio Diocesano. Assumiu a sua direçã o e o ensino
de algumas disciplinas. Incansá vel, fazia praticamente tudo, como narra o seu bió grafo, Bianor
Medeiros: "contador, administrador da obra em andamento e, ainda, sobrava-lhe tempo para
treinar os times de futebol, de vô lei e assistir aos ensaios da banda de mú sica, que organizava e que
tinha, com regente, o querido e estimado mestre Bedé".

Sendo um líder, era natural que um dia, mais cedo ou mais tarde, ele ingressasse na vida política.
Seguindo o mesmo caminho de um José Augusto de Medeiros e de um Dinarte de Medeiros Mariz...
Convidado por Georgino Avelino, foi para o Partido Social Democrá tico, PSD. Dez parte do Diretó rio
Regional do seu partido. Nessa legenda, conseguiu se eleger deputado federal na Constituinte, ao
lado de Dioclécio Duarte, José Varela e Mota Neto na sua legenda.

Continuando sua carreira política, Walfredo Gurgel conseguiu se eleger vice-governador do Estado,
com Aluízio Alves, governador. Presidiu, nessa funçã o, a Assembléia Legislativa Estadual. Nã o
chegou a concluir o seu mandato, porque apó s outra vitó ria nas urnas, chegou ao Senado da
Repú blica, com grande votaçã o.

Sofreu críticas de alguns de seus adversá rios, que nã o compreenderam nem perdoavam o seu êxito.
Foi forçado a ir na tribuna do Senado, algumas vezes, para defender seus correligioná rios:
"Lamento mais uma vez, ser compelido a ocupar a tribuna do Senado para tratar de assuntos
regionais, mas à s vezes, somos levados a isso - quando há tantos problemas de ordem nacional que
exigem a nossa palavra, que exigem o nosso esforço e a nossa inteligência (...) A todos estimo,
porque, mesmo sendo adversá rios políticos, sã o meu amigos pessoais, meus companheiros nesta
Casa, onde defendemos os interesses do povo e devemos trabalhar, incessantemente, pela
felicidade e grandeza de nossa pá tria".

Com essa postura, conseguiu se impor ao respeito de todos.

Definia a política como algo transitó rio, que nã o justificava a intriga e o ó dio. O importante era
conservar as amizades, porque elas sim deveriam ser duradouras. Disse Bianor Medeiros: "A cada
resposta que dava, a qualquer esclarecimento que prestava, a cada aparte que recebia, sempre se
erguia como verdadeiro estadista, diplomata, sereno e seguro".
Este era o perfil do senador Walfredo Gurgel.

Aconteceu, entretanto, que o povo do Rio Grande do Norte convocou Walfredo Gurgel para mais
uma missã o: governar o Estado. O seu vice foi Cló vis Mota. Nessa nova missã o, continuou agindo
com a mesma serenidade e honradez.

Apó s deixar o governo, realizou uma viagem de 45 dias ao continente europeu, visitando vá rios
países: Portugal, Alemanha, Espanha, Á ustria, Inglaterra, etc.

No dia 3 de outubro de 1971, foi constatado que Walfredo Gurgel sofria de câ ncer no pulmã o,
durante um exame que fez no Instituto de Radiologia de Natal. Logo a seguir, agravou o seu estado
de saú de, falecendo no dia 3 de novembro de 1971, em Natal.

Sobre o veló rio e a partida do corpo para Caicó , Bianor Medeiros, seu bió grafo, narrou os
acontecimento da seguinte maneira: "Velado pelo povo o corpo do Monsenhor Walfredo Gurgel
permaneceu na câ mara-ardente armada no saguã o do primeiro andar do Palá cio do Governo
durante toda a noite até à s seis horas da manhã de ontem, quando foi transladado para a Catedral
Metropolitana".

"Em fila dupla o povo subiu até o saguã o do Palá cio para ver o monsenhor pela ú ltima vez e rezar
pela sua alma, entregue a Deus. A fila muitas vezes chegava até a Ulisses Caldas, e nã o rara vezes
dava volta pela praça Sete de Setembro.

"Todos os ex-secretá rios do governo do monsenhor estavam presentes. Na praça Sete de Setembro,
o povo permanecia silencioso, triste, enquanto algumas pessoas rezavam e outras choravam (...)
Exatamente à s 5h50, o caixã o fechado (...) A pé, acompanhado por uma multidã o enorme, o corpo é
trasladado para a Catedral Metropolitana. Nas calçadas do pró prio Palá cio e da Praça André de
Albuquerque, o povo se comprime (...) A missa foi celebrada por doze padres, à frente o arcebispo
Dom Nivaldo Monte. Eram exatamente 6h05. Silêncio profundo na igreja, somente quebrado por
soluços de pessoas (muitas) que choravam".

"Apó s a missa teve lutar a encomendaçã o do corpo por Dom Nivaldo Monte, coadjuvado por todos
os vigá rios que concelebravam a missa. À s 7 horas o corpo é levado pelos auxiliares do monsenhor
Walfredo Gurgel até o carro fú nebre, já a esta altura a multidã o era muito maior. O povo chorava
nas calçadas. Todos queriam ainda tocar no caixã o. Todos queriam ver o monsenhor pela ú ltima
vez".

"Dezenas de carros foram acompanhando o cortejo, que foi precedido por um carro da rá dio-
patrulha que, de sirena aberta, abria passagem para o féretro. Muitas pessoas foram até Macaíba, de
onde voltaram apó s o ú ltimo adeus. E o corpo no monsenhor seguiu para ser sepultado na sua
cidade natal: Caicó ".

A Tradição e a Renovação

Evolução do Ensino e das Escolas no RN

As ordens religiosas, sobretudo a dos jesuítas, foram as instituiçõ es que primeiro se dedicaram ao
ensino no Brasil.

No Rio Grande do Norte, o processo educativo começou quando foram instaladas as vilas, que
ficaram sob a administraçã o dos missioná rios, inclusive com a tarefa da instruçã o civil e religiosa.

As meninas foram excluídas do ensino.

Quando as missõ es religiosas foram extintas, o missioná rio foi substituído pelo mestre-escola nas
sete vilas que existiam no Rio Grande do Norte.
Em 1827, surgiram as primeiras escolas primá rias. Foram duas: uma pertencia a dona Francisca
Josefa Câ mara e a outra, a Francisco Pinheiro Teixeira.

As primeiras escolas do interior surgiram dez anos depois: Sã o José de Mipibu, Princesa, Goianinha,
Arês, Touros, Mossoró , Acari, Apodi.

Em 1834, o ensino primá rio foi desmembrado do secundá rio, e os governos provinciais passaram a
manter os cursos chamados de "Humanidades" ou "Aulas Maiores".

Basílio Quaresma Torreã o fundou o Ateneu que passou a funcionar no dia 3 de fevereiro de 1834.
Basílio Quaresma escolheu o nome da escola, da versã o portuguesa de Athénaion. Como explicou
Câ mara Cascudo, "no Ateneu de Atenas os poetas liam os poemas e os historiadores o relato das
jornais pelas terras estranhas e misteriosas".

O Ateneu passou a funcionar numa dependência do Quartel do Batalhã o de Linha, porque o prédio
estava desocupado. Foi extinto em 1852. O presidente da Província, Antô nio Bernardo de Passos,
fez a escola voltar a funcionar em 1856, mas só se considerou a partir de 1º de março de 1859,
quando o presidente Nunes Gonçalves instalou-a num edifício novo.

No dia 11 de março de 1954, reinstalou-se o Ateneu em um prédio moderno, em forma de X, com


um giná sio coberto, para a prá tica de esportes e de educaçã o física, graças aos esforços do professor
Severino Bezerra de Melo, diretor do Departamento de Educaçã o, e do interesse do governador
Sylvio Pedrosa, em cujo governo a obra foi concluída. O nome foi modificado para Instituto de
Educaçã o porque se pretendia, de fato, fazer funcionar um instituto de Educaçã o, inclusive com um
Grupo Escolar Modelo. Essa proposta nã o foi concretizada na sua totalidade. O Ateneu absorveu
tudo. Conforme Chicuta Nolasca Fernandes, "a Escola Normal ocupou uma perninha do X,
exatamente onde nem sequer havia sanitá rios. "Por essa razã o, ela desabafou: "A Escola Normal era
uma hó spede indesejá vel no Ateneu". E numa entrevista com Sylvio Pedrosa fez reivindicaçõ es.
Como conseqü ência dessa conferência, o governo construiu outro edifício, destinado à Escola
Normal, Escola de Aplicaçã o e Jardim Modelo, formando um novo Instituto de Educaçã o.

O ensino que visava preparar professores, para lecionar no ensino primá rio, teve um começo dos
mais difíceis. A primeira Escola Normal, criada pelo presidente Joã o Capistrano Bandeira de Melo
Filho, foi inaugurada no dia 1º de março de 1874, funcionando numa dependência do Ateneu, sendo
extinta pelo presidente José Nicolau Tolentino de Carvalho.

Foram criadas, outras duas escolas normais. Ambas, entretanto, nã o chegaram a funcionar. A quarta
Escola Normal foi a que frutificou, segundo Câ mara Cascudo. Fundada em 24/4/1908, como a
primeira, anexada ao Ateneu até 1910.

A 2 de janeiro de 1911, iniciou os seus trabalhos no prédio do Grupo Escola Augusto Severo.

Em março de 1966, no governo Aluízio Alves, a Escola Normal, apó s ser "hó spede" do Instituto de
Educaçã o e funcionar na praça Pedro Velho, foi transferida para novas instalaçõ es, em Lagoa Nova,
com linhas arquitetô nicas modernas, passando a se chamar Instituto Presidente Kennedy.
Inaugurado quando o senador norte-americano Roberto Kennedy veio a Natal.

Revoluçã o no ensino primá rio, em Natal, foi realizado pela Campanha 'De Pé no Chã o Também se
Aprende a Ler", na administraçã o Djalma Maranhã o (61/64).

Em 1962, Djlama Maranhã o fundou o Centro de Formaçã o de Professores, com o Giná sio Normal e o
Pedagó gico.

Na administraçã o do prefeito Tertius César Pires Rebello, o Centro passou a se chamar Instituto
Municipal de Educaçã o,
O ensino normal teve seu grande momento em 1966, quando o professor Alberto Pinheiro de
Medeiros, diretor do IME, idealizou uma semana do normalista, promovida em conjunto pelas
Escolas Normais de Natal. Contou, de imediato, com o apoio da professora Chicuta Nolasco
Fernandes, diretora do Instituto Presidente Kennedy.

Participaram do evento o Instituto Municipal de Educaçã o, Instituto Presidente Kennedy, Instituto


Nossa Senhora Auxiliadora e o Colégio Imaculada Conceiçã o. A 1ª Semana do Normalista Conjunta ,
ocorreu no período de 10 a 14 de outubro de 1966. Houve desfile, conferências, debates e jogos. Foi
encerrada, solenemente, com um festival artístico, no Teatro Alberto Maranhã o. Circulou um jornal.
"O normalista", que publicou trabalhos das alunas.

Voltando a falar sobre o Ateneu, é preciso dizer que o nome Instituto de Educaçã o teve curta
duraçã o. Passou, pouco depois, a se chamar Colégio Estadual do Rio Grande do Norte, porém, no dia
3 de fevereiro de 1959, durante o governo de Dinarte Mariz, recebeu a denominaçã o de Colégio
Estadual do Ateneu Norte-Rio-Grandense.

Desde os primeiros tempos, o Ateneu se tornou um centro de cultura, como disse Tarcísio
Medeiros: "em derredor da vida docente e discente do Ateneu, pode-se dizer sem susto, criou-se e
expandiu-se a cultura potiguar. Os alunos graduados por ele formaram instituiçõ es outras que
existem até hoje. Criaram centros literá rios, jornais e associaçõ es nos quais imprimiram culto de
moral e civismo".

Apó s a proclamaçã o da Repú blica, o ensino progredia, abrindo, inclusive, novas oportunidades à s
pessoas do sexo feminino. Em 1903, as primeiras mulheres prestam exames de Humanidades, no
Ateneu. Algumas mulheres se destacaram na vida intelectual potiguar: Isabel Gondim, Dionísia
Gonçalves Pinto (Nísia Floresta) e Auta de Sousa.

O século XX marca o aparecimento de outras escolas. Em Natal: Colégio da Imaculada Conceiçã o


(1901), Colégio Diocesano Santo Antô nio (1903), Colégio Nossa Senhora das Neves (1932). No
interior: Colégio Coraçã o de Maria (Mossoró - 1912), Colégio Santa Terezinha do Menino Jesus
(Caicó - 1952), Colégio Santa Á guida (Ceará -Mirim - 1937), Colégio Nossa Senhora das Vitó rias (Açu
- 1927), etc.

A 10 de setembro de 1914, foi criada a Escola Doméstica, a primeira do Brasil na sua especialidade,
sendo um de seus fundadores, Henrique Castriciano de Sousa e contava no seu corpo docente com
professoras francesas, inglesas, norte-americanas e suíças. O corpo discente era formado também
por alunas vindas de outros Estados, porém, a maioria das alunas eram jovens de famílias
interioranas, filhas de fazendeiros, comerciantes e criadores.

Em 24 de junho de 1917, surgiu uma instituiçã o que desempenhou grande influência na formaçã o
moral e cívica da juventude natalense: "Associaçã o dos Escoteiros do Alecrim", fundada por um
grupo de idealistas (Luís Soares Correia de Araú jo, Eló i de Souza, Meira e Sá , Henrique Castriciano,
Moisés Soares e Monteiro Chaves).

O ensino fundamental começou a ser ministrado no século XX, com a fundaçã o da Escola do
Comércio de Natal, no dia 8 de dezembro de 1919. E, sob a inspiraçã o do segundo bispo de Natal. D.
Antô nio dos Santos Cabral, foi instalada a Escola Feminina de Comércio, que teve uma experiência
efêmera. Depois, surgiu outra, que funcionou no Colégio Imaculada Conceiçã o, em 1932. Três anos
depois, Mossoró instalava uma escola de comércio. No ano de 1940, o Colégio Nossa Senhora das
Neves ganhava a sua.

O crescimento do ensino nessa á rea culminou com a criaçã o de duas escolas de nível superior. Em
Natal, foi fundada a Faculdade de Ciências Econô micas e Contá beis (1957). Um pouco depois, 1961,
a Uniã o Caixeiral de Mossoró fundou a Faculdade de Ciências Econô micas.

O primeiro estabelecimento de ensino superior, entretanto, foi fundado em 1923, pelo decreto nº
192: Faculdade de Farmá cia, que conseguiu formar apenas dois alunos. Á lvaro Torres Navarro e
José de Almeida Jú nior, fechando logo depois. Um de seus professores, contudo, Varela Miranda,
criou um produto que ainda hoje é comercializado com o nome de "Sanarina".

Apó s 1934, o ensino secundá rio passou por algumas transformaçõ es, até chegar o ensino de
primeiro grau e de segundo grau.

Nessa época, somente os estudantes filhos de pais ricos ou que pertenciam a uma família que
tivesse bons recursos financeiros poderiam estudar em faculdades, em outras capitais do Nordeste
ou mesmo do Sul do País.

Acontece que Natal passou por grande mudanças, devido à Segunda Guerra Mundial, possibilitando,
como disse Itamar de Souza, "à s elites locais um intercâ mbio como personagem de uma cultura,
mais cosmopolita. (...) A guerra desprovincializou Natal".

Outro fator importante: o movimento operá rio cresceu no País, com os deputados federais
debatendo na Câ mara questõ es sociais, com reflexos no Rio Grande do Norte. Cresceu, em Natal, o
prestígio de Café Filho nas classes mais humildes, José Augusto de Medeiros, adversá rio político de
Joã o Café Filho, eleito governador do Estado, criou a 1º de maio de 1925, numa solenidade realizada
no Teatro Carlos Gomes (hoje Alberto Maranhã o), a primeira universidade popular do Rio Grande
do Norte. As aulas eram administradas através de conferências, sendo assistidas por grande
nú mero de operá rios.

Surgiram, posteriormente, as universidades populares de Goianinha e a de Touros, ambas em 1925.

Em 1944, por iniciativa de D. Marcolino Dantas, o curso de Filosofia dos padres salesianos, que era
ministrado em Jaboatã o (PE), foi transferido para Natal. Tratava-se, como disse Itamar de Souza,
"do Instituto Filosó fico Sã o Joã o Bosco, destinado a formar os clérigos salesianos em filosofia,
ciências e letras". Esse instituto funcionou até 1959.

Atualmente, no Colégio Santo Antô nio (Marista) funcionava o Curso Superior de Ciências Religiosas,
do Instituto de Humanidades Marcelino Champagnat, pertencente à Universidade Cató lica do
Paraná . O curso é dirigido pelo irmã o Iná cio Ferreira Dantas.

A Escola de Serviço Social foi fundada em 1945

Câ mara Cascudo fundou a universidade popular, sendo instalada no dia 1º de maio de 1948, na
sede do Instituto Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte.

Com a multiplicaçã o das escolas de nível superior, começava a se formar a base da futura
universidade federal: Faculdade de Medicina (1955), Escola de Auxiliar de Enfermagem (1955),
Faculdade de Filosofia (1955), Escola de Engenharia (1957).

Dr. Onofre Lopes, apó s grandes esforços, conseguiu ver seu sonho realizado: a universidade
estadual foi criada pela lei 2.307, de 25/06/1958, no governo de Dinarte Mariz. Dr. Onofre Lopes da
Silva foi o seu primeiro reitor. Incansá vel, iniciou a luta pela federalizaçã o. Essa aspiraçã o se
concretizou pela lei no 3.849, em 18/12/1960, assinada pelo presidente da Repú blica, Juscelino
Kubitschek de Oliveira.

Como conseqü ência de um verdadeiro "boom" universitá rio no Brasil, a Universidade Federal do
Rio Grande do Norte passou por um período de expansã o, ocorrido sobretudo nos anos
compreendidos entre 1971 e 1979, nas administraçõ es de Gená rio Alves Fonsêca (1971 a 1975) e
de Domingos Gomes de Lima (1976 a 1979).

Com Gená rio Alves Fonseca, em 1972, foi implantada a TV Universitá ria . Em 1974, algumas
unidades foram transferidas para o campus e foram, também, criados novos cursos de graduaçã o:
Arquitetura, Engenharia Elétrica, Química, etc.
No ano de 1973, a universidade partia para conquistar o interior, com a instalaçã o do Nú cleo
Avançado de Caicó . Depois, viram os campi de Currais Novos, Macau e Santa Cruz.

Anteriormente, a universidade tinha criado o CRUTAC, que prestou grandes serviços à comunidade
norte-rio-grandense, com alunos estagiando e atuando em diversas á reas.

A administraçã o do professor Gomes de Lima foi sintetizada da seguinte maneira por Itamar de
Souza: "Este foi o quadriênio de maior dinamismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
A capacidade de trabalho do Magnífico Reitor, professor Domingos Gomes de Lima, transformou a
vida universitá ria em todos os setores".

Em síntese, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte nã o apenas substituiu o papel exercido
antes pelo Ateneu, como foi mais além, dando uma efetiva contribuiçã o ao desenvolvimento do
Estado.

Na Zona Oeste, foi instalada a Universidade Regional do Rio Grande do Norte que também se
expandiu, desenvolvendo um papel de relevo naquela regiã o.

O Instituto Presidente Kennedy, no governo de José Agripino, quando Marcos Guerra exercia as
funçõ es de secretá rio de Educaçã o, foi redimensionado, através de uma proposta com o objetivo de
formar um novo professor. Passou, entã o, a ofertar um convênio entre a Universidade Regional do
Rio Grande do Norte, que legalmente oferta o curso, Secretaria de Educaçã o do Estado, contando
com a assessoria do professor Michel Brault (Programa de Cooperaçã o Técnica Brasil-França).
Mantém o 1º Grau como escola laborató rio.

A primeira diretora, a partir da execuçã o desse projeto, foi a professora Eleika Bezerra Guerreiro,
contando com a consultora pedagó gica Maria Isaura Pinheiro, com larga experiência na formaçã o
de professores.

Os professores-alunos pertencem ao Estado e a alguns municípios.

O diretor atual é o professor e psiquiatra Quinho Chaves.

O sistema cooperativista de ensino foi implantado em Natal, no ano de 1993, quando começou a
funcionar o Colégio Cooperativista Independente, fundado por funcioná rios do Banco do Brasil.

Outra escola que funcionava nesse sistema é o Colégio Cooperativista Freinet, fundado em 1996.
Para Eleika Bezerra Guerreiro, uma das fundadoras do Freinet, "trata-se de garantir aos pais a
opçã o de um ensino de qualidade a preços acessíveis. Com isto estaremos contribuindo para a
diminuiçã o de um grave problema social".

Poetas, Escritores e Intelectuais

A vida intelectual, no Rio Grande do Norte, estava ligada ao jornalismo político. E a "modinha", no
dizer de Câ mara Cascudo, representava a "exteriorizaçã o literá ria".

O mesmo autor descreve o contexto da época: "os poetas ficavam na classe populesca dos
improvisados ou dos modinheiros, versos eram musicados e cantados nas serenatas,
acompanhados pelos vilõ es sonoros".

Alguns poetas que se destacaram na época foram Miguel Vieira de Melo (1821-1856), Gustavo da
Silva (1832-1856), Rafael Aracanjo da Fonseca (1811-1882), etc.

O primeiro jornal do Rio Grande do Norte, o "Nordeste", foi fundado pelo padre Francisco Brito
Guerra, em 1832.
Depois, Joã o Manuel de Carvalho, fundou o primeiro ó rgã o de imprensa de cará ter literá rio,
chamado 'O Recreio'.

Outros jornais foram surgindo com maior ou menor duraçã o, revelando para a comunidade
diversos jornalistas e intelectuais: Joaquim Fagundes (1857-1877) e José Teó filo (1852-1879), por
exemplo.

Na década 1870 - 1880, os bailes, que eram mensais, se transformaram em locais onde as pessoas
cantavam e declamavam poesias.

Merece destaque uma potiguar que passou vinte e oito anos na Europa e se tornou célebre pela sua
luta a favor do soerguimento da mulher, sendo igualmente, uma grande escritora. Dionísia
Gonçalves Pinto, mais conhecida pelo seu pseudô nimo Nísia Floresta, nasceu no sítio Floresta, em
Papari (hoje Nísia Floresta, em sua homenagem), no dia 12 de outubro de 1810, falecendo na
França, em Rouen, a 24 de abril de 1885. A sua bibliografia é ampla: "Daciz ou a Jovem Completa"
(Rio, 1847), "Itineraire d'un voyage en Allemagne" (Paris, 1857), "A Mulher" (Londres, 1856), etc.

Falando sobre Nísia Floresta, Maria Eugênia M. Montenegro classificou-a como "ilustre pensadora e
idealista, a autodidata, a revolucioná ria, a enfermeira, a jornalista e abolicionista e republicana, que
pregava a igualdade das províncias e das casas. "(Revista Brasília, no LXX, abril - maio de 1996).

Constância Lima Duarte publicou, em 1995, um livro sobre a vida e obra de Nísia Floresta, onde
constata "que a histó ria de Nísia Floresta nã o se limita à s primeiras pá ginas onde apresento dados
específicos referentes a sua vida e obra. Nem termina realmente ao final da aná lise do ú ltimo texto.
Se cada um deles introduz dados, revela traços de sua personalidade, de suas lutas, de suas
obsessõ es, de seus conflitos, a figura de Nísia Floresta Brasileira Augusta fica por ainda se compor, a
partir de tudo isso que aí está , e de tudo o mais, que teima em se manter oculto aos nossos olhos".

Luís Carlos Lins Wanderley é o autor de "Mistério de um Homem", em dois volumes. É apontado por
alguns como sendo o primeiro romance escrito no Rio Grande do Norte.

Isabel Urbana de Albuquerque Gondim nasceu, provavelmente, em 1839, também em Papari. Foi
professora, poetisa e a primeira historiadora do Estado. Escreveu vá rias obras, como 'Sediçã o de
1817, na Capitania do ora Estado do Rio Grande do Norte"(1919), "O Sacrifício do Amor" (1919),
"Lira Singela" (1933), etc.

No movimento abolicionista, brilhou Segundo Wanderley.

Vem, depois, a geraçã o do Oá sis que, como disse Câ mara Cascudo, "nasceu literalmente com o
advento republicano". Dessa fase se destacaram dois irmã os: "Henrique Castriciano e Auta de
Souza.

Henrique Castriciano, bacharel em Direito, muito viajado, e possuidor de uma grande cultura,
chegou a ser vice-governador do Estado. Como disse Romulo Wanderley, foi "jornalista, escritor,
crítico, impõ es-se aos seus contemporâ neos pelo talento, pela cultura e pela inspiraçã o poética".

Sã o seus os seguintes versos:

"Ah! Como é triste o aboio! Ah, como é triste o canto sem palavras - tã o vago - a saudade
exprimindo.

Das selvas do sertã o, no mês de junho rindo.

Pelos olhos azuis das crianças, enquanto

No tamarinho verde, asas abertas, trina


À beira dos currais, o galo de campina!

Auta de Souza, poetisa, escreveu apenas um livro, "Horto", com vá rias ediçõ es.

A poesia "Meu Pai", começa assim:

"Desce, meu Pai, a noite baixou mansa

Nem uma nuvem se vê mais no céu:

Aninham-se aqui no peito meu,

Onde, chorando, a negra dor descansa".

Os primeiros teatros de Natal foram barracõ es de palha, construídos no local onde hoje é a praça
Gonçalves Lêdo. Todos os três foram destruídos pelo fogo.

Os grupos de amadores, contudo, nã o desanimam. "Representavam em teatrinhos improvisados",


disse Câ mara Cascudo.

O comerciante Joã o Crisó stomos de Oliveira fundou o Teatro de Santa Cruz, localizado na atual Joã o
Pessoa, em 1880. Nã o dava lucro. Os amadores se apresentavam de graça. Falando sobre a
importâ ncia desse teatro, Câ mara Cascudo fez o seguinte comentá rio: "De 1880 em diante o Santa
Cruz reú ne todas demonstraçõ es literá rias da terra. Com a aboliçã o aí se funda a Libertadora
Natalense. Com a Repú blica, aí discursaram os tribunos, Olinto Meira, Braz de Melo, Nascimento de
Castro, Augusto Severo, Pedro Velho. Nas cisõ es políticas, aí acampam os oposicionistas com o
Clube Republicano 15 de novembro. Ali a companhia de José de Lima Penante recebeu aplausos e
deixou saudades".

No dia 17 de abril de 1894, caiu a cobertura do teatro que desapareceu nesse momento.

O século XX é a frase da Oficina Literá ria, onde se destacaram Francisco Cavalcanti, Jorge
Fernandes, Clementino Câ mara.

Um grande poeta dessa geraçã o foi Manoel Virgílio Ferreira Itajubá , que nasceu em Natal,
escrevendo versos como os que se seguem:

"Vi-te. Era noite. A lua decorada

Brilhava nas paragens luminosas

E a noite estava toda embalsamada,

Porque exalavam no canteiro as rosas".

No dia 29/3/1902, foi fundado o Instituto Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte, por um
grupo de intelectuais, entre eles, Vicente Lemos, autor do clá ssico "Capitães Mores e Governadores
do Rio Grande do Norte". Faziam parte do instituto Luís Fernandes, Manoel Dantas,. Pedro Soares e
tantos outros. O instituto publica, ainda hoje, uma revista. O seu atual presidente é o advogado
Enélio Lima Petrovich.

O Teatro Carlos Gomes foi inaugurado em 1904, no primeiro governo de Alberto Maranhã o. O
ilustre político, nã o satisfeito, ao assumir o governo pela segunda vez, promoveu grandes reformas
no teatro que hoje tem o seu nome. Câ mara Cascudo descreveu que "nasceu outro teatro, amplo,
confortá vel, arejado, moderno".
No início do século, o coronel Francisco Justino de Oliveira Cascudo fundou "A Imprensa" (1914-
1926), que teria brilhante trajetó ria. O Centro Polimá tico (1920-1924) lançou uma revista que
publicava importantes estudos, que segundo Humberto Hermenegildo de Araú jo, foi "de valor
fundamental para a compreensã o do processo de criaçã o de uma consciência, digamos "potiguar".
"Apareceu também uma revista feminina, chamada Via Lá ctea (1914-1915), onde se destacaram
Palmira e Carolina Wanderley.

Foi uma época de grande efervescência literá ria, onde brilharam nomes como Nascimento
Fernandes, Anfiló quio Câ mra, Armando Seabra, Jayme Wanderley. Segundo Humberto
Hermenegildo de Araú jo, "publicaram-se, naquela década, alguns títulos que ainda hoje sã o de
fundamental importâ ncia para a compreensã o do início da nossa vida literá ria: "Alma patrícia"
(1921) e "Joio" (1924), ambos de Luís da Câ mara Cascudo; "Poetas Rio-Grandenses do Norte"
(1922), de Ezequiel Wanderley", "Versos" (1927), de Lourival Açucena'e "Terra Natal" (1927), de
Ferreira Itajubá ".

Câ mara Cascudo, atendendo a um apelo da Federaçã o das Academias de Letras, com um grupo de
amigos e intelectuais, fundou a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, em 14/11/1936, na sede
do Instituto de Mú sica, sendo eleito Henrique Castriciano, presidente. Entre os fundadores da
academia, podem ser citados os seguintes intelectuais: Adauto Câ mara, Otto de Brito Guerra, H.
Castriciano, Edgar Barbosa, Antonio Soares de Araú jo, Nestor dos Santos Lima, Januá rio Cicco,
Floriano Cavalcanti, Lu;is Gonzaga do Monte.

O atual presidente dessa academia é o advogado Dió genes da Cunha Lima.

A partir do século XX, surgiram vá rios jornais, em diversos municípios do Rio Grande do Norte. Em
Açu: "O Alphabeto" (1917), "A Cidade" (1901 a 1908), "Jornal do Sertã o" (1928), "O Vale (1937). Em
Caicó : "A Folha" (1928), "Jornal de Caicó " (1930), "O Seridó " (1900-1901), "A Verdade" (1933). Em
Macau: "Folha Nova" (1913), "Gazeta de Macau" (1909), "O Imparcial" (1918), "O Nacionalista"
(1959), "A Voz de Macau" (1951). Em Mossoró : "Jornal do Oeste" (1948), "A Palavra" (1926), "O
Trabalho" (1926), "Desfile" (1946).

A "Coleçã o Mossoroense" tem editada uma série muito grande de livros, prestando, assim, uma
efetiva colaboraçã o ao desenvolvimento cultural do Estado. Publicou "Notas e Documentos para a
Histó ria de Mossoró ", de Luís da Câ mara Cascudo; "Lampiã o em Mossoró ", de Raimundo Nonato;
"Um possível caso de telegonia entre os nossos indígenas", de Jerô nimo Vingt Rosado Maia, etc.

De Açu, brilha Maria Eugênia Montenegro. Natural de Lavras (MG), se integrou no movimento
literá rio potiguar. Publicou livros de poesias ("Azul Solitá rio') e, inclusive, um de ficçã o filosó fica
("Alfar, A que Está Só ").

Pertence à s academias de letras de vá rios Estados e à do Rio Grande do Norte.

De Macau, Edinor Avelino, jornalista, colaborou em diversos jornais da capital ("A Imprensa", "A
Repú blica", "A Opiniã o" e "Democrata") e em outros do interior: "Folha Nova" (Macau), "A Cidade"
(Açu), "O mossoroense" (Mossoró ).

No poema "Macau", considerado como sendo sua obra-prima, escreveu:

"A minha terra, calma e boa, trago-a nas cismas de saudade em que ando atento,

contemplando-a com os olhos cheios d'á gua.

nos grandes vô os do meu pensamento.

É das mais ricas terras pequeninas.


Apraz-me repetir, quando converso;

possui alvas e esplêndidas salinas,

as melhores salinas do universo".

De Ceará -Mirim, três nomes. Nilo Pereira, que tece, entretanto, uma grande atuaçã o em
Pernambuco, onde foi diretor da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal de Pernambuco,
com extensa bibliografia, podendo se citados: "O destino das Faculdades de Filosofia na
Universidade" (Natal, 1957), "Humanismo de Luiz de Camõ es" (Recife, 1957) e "Evocaçã o do Ceará -
Mirim" (Recife 1959), etc.

José Sanderson Deodato Fernandes de Negreiros, poeta, jornalista, quando foi eleito para a
Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, era o mais jovem daquela instituiçã o. Trabalhou na
"Tribuna do Norte", "Diá rio de Natal", sendo também, redator e repó rter de duas revista do Sul do
País, "Manchete" e "Visã o".

Autor de "Ritmo da Busca" (1956) e "Lances Exatos" (1966), é também de sua autoria a poesia "O
gesto":

Despe o corpo, tatuado de

relâ mpagos. Ensarilhas ventos

ao som da ternura e apunhalas

o horizonte. Mas dentro de ti,

o coraçã o canta, além.

do remoto mar das tapeçarias.

Deitaste o pã o e á gua em minha

solidã o, e amo-te por me teres

amado pelo pró prio amor

desprotegida, ó incendiá ria do repouso".

Edgar Barbosa, formado em Direito, no Recife, em 1932, trabalhou em vá rios jornais: "A Repú blica",
"O Debate", "A Ordem", etc. Foi fundador da Faculdade de Filosofia e seu primeiro diretor. Escreveu,
entre outros livros: "Histó ria de uma campanha (1936), "Três Ensaios" (Recife, 1960), "Imagens do
Tempo" (Natal, 1966).

De Nova Cruz, Dió genes da Cunha Lima Filho, poeta, advogado, professor, ex-reitor da UFRN, ex-
presidente da Educaçã o e Cultural do Estado, publicou "Lua Quatro Vezes Sol" (1967), "Tradiçã o e
Cultura de Massa" (1973), "Câ mara Cascudo, um homem feliz", etc.

Em "Memó rias das Á guas", diz Dió genes da Cunha Lima:

"O espectro do rio foge

Quando dorme o Potengi.


Sua memó ria lavada

Em muitas á guas desliza

Das nascentes do verã o".

De Sã o Vicente, D. José Adelino Dantas, com grande atuaçã o no Seridó . Foi bispo de Caicó , nomeado
pelo papa Pio XII, em 1952. Colaborou no jornal "A Ordem". Depois, foi nomeado bispo de
Garanhuns (PE) e, a seguir, de Rui Barbosa, na Bahia.

Pertenceu à Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, tendo publicado "A Formaçã o do


Seminarista"(1947), "Homens e Fatos do Seridó Antigo" (1962), "O Coronel de Milícias Caetano
Dantas" (S/Data).

Falando sobre D. Adelino Dantas, disse Sanderson Negreiros: "pesquisador que se debruça sobre o
documento faz isso com amor e sabedoria, com calor humano e absoluta sinceridade de
propó sitos".

Em abril de 1963, o governo Aluízio Alves inaugurou a Fundaçã o José Augusto que funcionou
inicialmente "como faculdade para os cursos de Jornalismo, Sociologia e Política e Escola Superior
de Administraçã o, além de manter o Instituto Juvenal Lamartine de Pesquisas Sociais e a Grá fica
Manibu. Somente a partir de 1968, com a mudança do Estatuto, é que a Fundaçã o passa a fazer o
trabalho de fomento à cultura potiguar, exercendo um papel semelhante ao de uma Secretaria de
Cultura estadual".

"Presente na vida cultural do Estado, desde a ediçã o de livros, promoçã o de eventos, até a
preservaçã o do patrimô nio histó rico, a Fundaçã o José Augusto também detém a guarda e
manutençã o de importantes prédios e instituiçõ es, como o Forte dos Reis Magos e o Memorial
Câ mara Cascudo, a Biblioteca Pú blica Câ mara Cascudo, Museu Café Filho e o de Arte Sacra".

"O teatro Alberto Maranhã o, onde funciona uma Escola de Danças, o Instituto de Mú sica Waldermar
de Almeida, com mais de 500 alunos matriculados, sã o outras entidades geridas pela Fundaçã o José
Augusto, presidida pela segunda vez pelo jornalista Woden Madruga (a primeira gestã o ocorreu de
1987 a 1990)".

"Uma Orquestra Sinfô nica em plena atividade, que realiza concertos oficiais, populares e educativos
mensais, sempre trazendo ao Estado renomados solistas, um coral (Canto do Povo), com
reconhecimento nacional e no exterior, tendo representado o Brasil em 1995 em temporada na
Alemanha, França e Itá lia, onde se apresentou para o papa Joã o Paulo II, sã o outros dos orgulhos da
Fundaçã o José Augusto".

"Na atual administraçã o, vá rios projetos de sucesso têm sido desenvolvidos, como o Projeto Seis e
Meia, que é apresentado todas as terças-feiras, à s 18h30, no Teatro Alberto Maranhã o, sempre com
um cantor local e um nacional. Esse projeto, que tem uma média de pú blico, por sessã o de 620
pessoas, é no estilo do extinto Projeto Pexinguinha, que foi realizado em todo o País na década de
70. Por ele já passaram artistas como Paulinho da Viola, Leila Pinheiro, Jamelã o e Sivuca, entre
tantos outros.

"Na luta para revitalizar os grupos e artistas populares, foram dadas indumentá rias, instrumentos,
oportunidades de apresentaçã o em Natal e fora do estado, e criado o Projeto Chico Traíra, que edita
e distribui com os autores de jovens e contemporâ neos. Edita ainda o jornal cultural "O Galo",
mensalmente, promovendo Salõ es de Artes Plá sticas e de Humor e dando apoio à s atividades
teatrais, seja através da apresentaçã o do teatro brasileiro, como Amir Haddad". (Documento
fornecido pela Asssessoria de Imprensa da Fundaçã o José Augusto - 1997).

Mestres de Ontem e de Hoje


Riqueza Intelectual Norte-rio-grandense

No governo do monsenhor Walfredo Gurgel, a Fundaçã o José Augusto promoveu o "Prêmio


Nacional Luís da Câ mara Cascudo", cujo vencedor, foi o escritor Américo De Oliveira Costa
(profundo conhecedor da literatura francesa), com o trabalho "Viagem ao Universo de Câ mara
Cascudo", que foi editado pela pró pria FGA, em 1969, na gestã o de Hilma Melo.

No final dos anos 60 surgiu um movimento literá rio, provocando um impacto no Rio Grande do
Norte e também no Brasil: o lançamento simultâ neo em Natal e no Rio de Janeiro do
Poema/Processo. Segundo Á lvaro de Sá , "o Poema/ Processou criou muito e radicalmente". Por
essa razã o, entrou em conflito com a tradiçã o, cometendo algumas injustiças. Moacyr Cirne, um dos
fundadores do movimento, reconhece que "nã o soubemos enfrentar a questã o cascudeana". Mas o
inimigo nã o seria Cascudo e sim "toda uma estrutura política, econô mica e ideoló gica conservadora,
reacioná ria, castradora". O movimento encontrou, na realidade, uma resistência muito forte, Nei
Leandro de Castro chegou a dizer, num grande desabafo, que "o poema/processo me faz passar oito
ou dez anos sem escrever poesia, pode desencanto, por desalento". Nei Leandro de Castro foi
premiado em 1996, pela revista Playboy, com o conto "Nossa semelhança com os deuses". É
também romancista, escreveu o livro "Ojuara" (As Pelejas de Ojuara).

Entre os poetas ,que se destacaram na vida literá ria potiguar e que faleceram numa época nã o
muito distante, podem ser citados:

- Myriam Coeli, natural de Manaus, porém, norte-rio-grandense de Sã o José de Mipibu por opçã o.
Segundo Carlos Guimarã es, a poetisa conseguiu fazer a "interaçã o exata entre a idéia e a forma". Seu
livro de estréia, "Imagem Virtual" (1961), foi escrito em parceria com seu marido, Celso da Silveira
que, como ela, também fazia versos, além de atuar como jornalista. Outros trabalhos de Myriam
Coeli sã o "Vivência sobre Vivência" e "Cantigas de Amigos" (1980).

- Zila da Costa Mamede, nasceu na vizinha Paraíba, em Nova Palmeira, vindo para Natal no ano de
1935. Seu primeiro livro, "Rosa de Pedra", é de 1953. Publicou, ainda, "Salinas" (1958), "Navegos"
(1978) etc. Assim Zila Mamede cantou a rua Trairi, onde morou:

"Meu chã o se muda em novos alicerces,


sob as pedreiras rasgam-se meus passos;
e a velha grama (posto de lirismo)
afoga-se nos sulcos das enxadas".

Ex-diretora da Biblioteca Central da UFRN, Zila Mamede escreveu "Luís da Câ mara Cascudo: 50
anos de vida intelectual - 1918 a 1968", pela Fundaçã o José Augusto, 1970.

- Esmeraldo Siqueira foi, como disse Romulo Wanderley, um "crítico, ora impiedoso, ora humano,
poeta de profunda sensibilidade e apurado gosto na forma de seus versos". Entre outros livros,
escreveu "Caminhos Sonoros" (1950) e "Poemas" (1950).

Nos dias atuais um novo livro: "poço, festim, mosaico".

- Outro poetisa de grande força é Diva Cunha, autora de obras como "Canto de Pá gina" (1986), onde
diz:

"desta janela
ela é menos velha
que vista palmo a palmo
é luz de luz dourada
é verde ainda que
tarde".
Falando sobre a poetisa, disse Vicente Serejo: "Diva, que tem nas mã os os grã os da poesia,
plantados no tempo e germinando nos invernos da alma".

- Paulo de Tarso Correia de Melo é um autor premiado. Recebeu em 1991 dois prêmios: Prêmio
Estadual de Poesia Auta de Souza, com "Natal: secreta biografia" e o Prêmio Municipal de poesia
Othoniel Menezes, com a publicaçã o do livro "Folhetim Cordial da Guerra em Natal e Cordial
Folhetim da Guerra em Parnamirim". Em sua poesia, sem qualquer vislumbre de pedantismo,
transparece a marca da só lida formaçã o acadêmica de que é portador. Daí a propriedade da
apreciaçã o: "A poesia de Paulo de Tarso foi caracterizada como sendo intencionalmente textual e
oralizante, marcada pela tentativa de integraçã o do ancestral ao regional e pelo aproveitamento do
falar cotidiano".

- Luís Carlos Guimarã es escreveu sete livros, entre os quais podem ser citados: "O Aprendiz e a
cançã o" (1961), "O sal da palavra" (1961) e o ú ltimo, "O fruto maduro", quando segundo Hildeberto
Barbosa Filho, "como que se refaz e se repensa no â mbito mesmo da sua particular textualidade".

Na "Elegia para Zila Mamede", ele presta uma homenagem à sua amiga:

"Sabias que morrerias no mar


Assim seria, disseste sem medo
em cançã o e alegia. Acreditar
só acreditamos quando tã o cedo
Partiste: a morte - como anunciada-
boiava à deriva no corpo morto
e pela luz da manhã revelada
lançou a â ncora no ú ltimo porto".

A poesia visual continua seu caminhar, através dos trabalhos de Jota Medeiros, Anchieta Fernandes,
Franklin Capistrano, além de outros.

Ao contrá rio do que muita gente imagina, o Rio Grande do Norte teve e tem ficcionistas, como, por
exemplo Antô nio José de Melo e Souza, mais conhecido pelo seu pseudô nimo Polycarpo Feitosa.
Como intelectual, ele foi escritor, jornalista, poeta, historiador, contista e romancista. A sua atuaçã o
maior, contudo, foi como contista e romancista. Alguns de seus livros: "Flor do Sertã o" (1928),
"Gizinha" (1930) e "Alma Bravia" (1934).

Eulício Farias de Lacerda, paraibano, fixou residência em Natal desde 1952. Escreveu contos e
romances: "O Rio da Noite Verde" (Prêmio Câ mara Cascudo, 1972, editado em 1973), "As Filhas do
Arco-Íris" (1980) e "Os desertados da chuva" (1981) sã o marco de sua carreira de escritor.

Newton Navarro, além de ser artista plá stico de grande talento e poeta, escreveu um livro de
contos, "O Solitá rio Vento do Verã o" (1961), e um de crô nicas, "Do outro lado do rio, entre os
morros".

Manoel Onofre Jú nior, contista e autor de diversos livros: "Serra Nova" (1964), "Chã o dos Simples"
(1985), "A Primeira Feira de José" (1973). Escreveu, também, "Estudos Norte-Riograndenses"
(1978).

Falando sobre o autor, disse Edgar Barbosa: "Pessoas, paisagens, costumes, as coisas que você
guardou além do tempo e da distâ ncia, saem do espaço físico para o mundo colorido da verdade: a
literatura nã o ordena mais do que isso ao verdadeiro escritor. Assim, você vem construindo uma
"saga" na melhor concepçã o que lhe imprimiram Guimarã es Rosa e Má rio Palmério".

Alberto Pinheiro de Medeiros, "Destaque Especial", no VII Concurso Nacional de Contos (1995),
com a 'Missa no Santuá rio da Virgem Maria", obra publicada na antologia "Contos do Brasil
Contemporâ neo", no vol. XXI. 1995.
O seu ú ltimo trabalho premiado foi o conto "Matar o presidente?", publicado na antologia "Contos
do Brasil Contemporâ neo", vol. XXIII, 1997. Recebeu, nesse ano, a lá urea "Stella Brasiliense",
indicado pelo Conselho Editorial na revista Brasília. É verbete da Enciclopédia da Literatura
Brasileira Contemporâ nea", vol. VI, 1995, Rio de Janeiro, organizada pelo jornalista e escritor Reis
de Souza.

José Melquíades de Marcelo escreveu o romance "Juca Porfiro" (1997) além de biografias, como a
do "Padre Francisco de Brito Guerra, um senador do Império" (1968). Apó s curso de especializaçã o
em Literatura e Lingü ística, nos Estados Unidos, a Mulher e o Cachorro" (1960). Para Veríssimo de
Melo, o autor é "um homem de cultura clá ssica, lú cido e de á gil inteligência".

Iaperi Araú jo, autor do livro "Cançõ es da Terra" (1965), quando reuniu cerca de dez contos,
prestando homenagem aos "homens que lutam na gleba queimada, para toda uma populaçã o, fixa
na terra, amando o amargo chã o, que o sol crêma com violência".

Além de Newton Navarro e Iaperi Araú jo, outros nomes surgiram no mundo das artes plá sticas:
Dorian Gray Caldas, Tomé Filgueira, Tú lio Fernandes, Carlos José, Socorro Trindade, Maria Má rcia
de Medeiros Dantas e Má rcia Tresse.

No campo da Histó ria, desaparecidos grandes pesquisadores, como Vicente Lemos, Tavares de Lyra,
Câ mara Cascudo, Hélio Galvã o, continuam produzindo Tarcísio Medeiros ("Proto Histó ria do Rio
Grande do Norte" - 1985), Olavo de Medeiros Filho ("Aconteceu na Capitania do Rio Grande" -
1997), Joã o Wilson Mendes Melo (Introduçã o ao Estudo da Histó ria"1984), Hélio Dantas ("José
Pacheco Dantas" - 1978), Clá udio Pinto Galvã o ("Osvaldo de Souza, o canto do Nordeste" - 1988),
todos do Instituto Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte.

Um nú cleo só lido de pesquisadores surgiu no Departamento de Histó ria da UFRN. A pesquisa foi
incentivada, sobretudo, a partir da fundaçã o de uma revista, "Histó ria UFRN", em 1987, quando o
Curso de Histó ria comemorava trinta anos de existência. Faziam parte desse grupo, Denine
Monteiro Takeya ("Um Outro Nordeste, o algodã o na economia do Rio Grande do Norte" - 1985),
Sebastiã o Fernandes Gurgel Filho (Ensaios Literá rios e Políticos"- 1988), Zélia Pinheiro de
Medeiros (co-autora de "Roteiro para o Estudo da Histó ria do Rio Grande do Norte" - S/data),
Geraldo Batista ("Moleque de Acari" - 1993), Marlene da Silva Mariz ("A Revoluçã o de 1930 no Rio
Grande do Norte, 1930 - 1934" - 1984), Clyde Smith Jú nior ("Trampolim para Vitó ria" - 1993) etc.

A verdade é que a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, nas diversas á reas de atuaçã o, tem
contribuído para o desenvolvimento só cio-cultural-científico e econô mico do Estado. O seu atual
reitor é o professor Ivonildo Rego.

Recentemente foi inaugurada, em Natal, a Universidade Potiguar, com impressionante crescimento,


desfrutando de grande credibilidade na sociedade norte-rio-grandense. O seu primeiro e atual
reitor é o professor Mizael Araú jo Barreto. No ú ltimo vestibular, realizado em novembro de 1997,
aprovou cerca de 2.250 candidatos.

Nas artes cênicas, Jesiel Figueiredo procurou soerguer o teatro, encenando peças infantis e dramas
clá ssicos, obtendo grande sucesso. Chegou, inclusive, a fazer funcionar um teatro, no bairro do
Alecrim, com o seu nome.

Na atualidade, um dramaturgo ganhou importância: Racine Santos.

O bailarino e coreó grafo Roosevelte Pimenta, no Ballet Municipal, vem se tornando conhecido pelo
seu talento, promovendo grandes e belos espetá culos, e, ainda, conseguindo descobrir novos
valores.

Por outro lado, Corpovivo Companhia de Dança se encontra numa ó tima fase, trazendo a professora
Kelli Griffin para dar aulas de dança. A Companhia foi convidada para se apresentar na cidade de
Salvador, durante a Oficina Nacional de Dança Contemporâ nea.
Entre os intelectuais, da época contemporâ nea, podem ser citados: Moacyr de Gó es ("Sem
paisagem" - 1991), Joã o Medeiros Filho ("82 horas de Subversã o" - 1980), Alvamar Furtado de
Mendonça ("José da Penha, um româ ntico da Repú blica - 1970), Francisco das Chagas Pereira
("Eloy de Souza" - 1982), Jayme da Nó brega Santa Rosa ("Acari - Fundaçã o, Histó ria,
Desenvolvimento - 1974), Bianor Medeiros ("Monsenhor Walfredo Gurgel - um símbolo" - 1976),
Lenine Pinto ("Natal, USA" - 1995), Antonio Soares Filho ("Antídio de Azevedo" = 1978), Edinor
Avelino ("Síntese" - 1968), José Wellington Germano ("Lendo e Aprendendo" - 1992), Nilo Pereira
("Imagens do Ceará -Mirim" - 1969), José Lacerda Felipe ("Aspectos Naturais do Seridó " - 1978), D.
Nivaldo Monte ("Se todos os homens... conhecessem o dom de Deus" - 1963), Jurandir Navarro
("Antologia do Padre Monte") etc.

Literatura Rompe as Fronteiras

Em 1964, Veríssimo de Melo publicava o estudo "Dois Poetas do Nordeste", da Coleçã o "Aspectos",
do Ministério da Educaçã o e Cultura, abordando o trabalho de Jorge Fernandes e Ascenço Ferreira.

Manuel Bandeira ficou entusiasmado com a poesia de Jorge Fernandes a ponto de dizer o seguinte:
"Jorge Fernandes falou em muitos dos seus poemas com um timbre que é só dele: falou de coisas do
Brasil com o sabor que é só dele; aquele seu livro deve estar na biblioteca de todos os brasileiros".
Outro admirador do poeta potiguar foi Má rio de Andrade que fez o seguinte comentá rio: "Você é
original, é incontestá vel e é de uma originalidade natural nada procurada".

Jorge Fernandes provocou um escâ ndalo em Natal, porque foi o primeiro poeta potiguar a
desprezar rima, cultivando os versos livres.

Em 1979, os poetas potiguares Joã o Batista de Morais Neto, Franklin Jorge, Vicente Vitoriano e
Carlos Humberto Dantas tiveram seus poemas traduzidos pelo crítico e tradutor Gilbert Chaudanne
e publicados na revista francesa Prisme.

Outros intelectuais do Rio Grande do Norte obtiveram êxito nos concursos literá rios, promovidos
anualmente pelo Grupo Brasília de Comunicaçã o, tiveram seus trabalhos em antologias e, ainda,
alguns viram suas crô nicas publicadas no Anuá rio do Clube Literá rio de Brasília.

Entre os intelectuais que tiveram suas obras incluídas em antologias editadas pelo Grupo Brasília
de Comunicaçã o, podem ser citados: Adalzirene Nunes de Carvalho (Mossoró ), Emídio Lopes de
Araú jo (Natal), Fá bia Maria Dió genes (Natal).

A poeta Marize Castro teve recentemente o seu poema "Vinho", traduzido por Steven F. White, para
a revista The American Voice:

"Se o queres seco


para molhar a garganta
eu o quero suave
para reinventar
essa chama
se o queres branco
para velar a virgem
eu o quero
vermelho
do porto
para aportar
as paixõ es
que me dividem".

Nivaldete Ferreira, paraibana, radicada em Natal, teve o conto "O Descanso das Sílabas" e o livro
"psilinha Cosmo de Caramelo" premiados em concurso promovidos pela Uniã o Brasileira de
Escritores, com sede no Rio de Janeiro.
A Prosa Animada de Câmara Cascudo

Segundo Dió genes da Cunha Lima, Câ mara Cascudo foi um "escritor, folclorista, etnó grafo,
antropologista cultural, crítico, soció logo, orador, conferencista". Possuindo, "sobretudo, o dom da
prosa, animada, viva, cintilante, com a faculdade rara, feliz, de espalhar bom humor e irradiar
simpatia em torno de si".

Luís da Câ mara Cascudo nasceu no dia 30 de dezembro de 1898, no bairro da Ribeira, Natal, Filho
do coronel Francisco Justino de Oliveira Cascudo e de dona Ana da Câ mara Cascudo.

Estudou no Externato Sagrado Coraçã o de Jesus, colégio feminino, dirigido por duas irmã s,
Guilhermina e Maria Emília de Andrade.

Teve dois professores particulares, Pedro Alexandrino, ensinando Literatura Clá ssica, e Francisco
Ivo Cavalcanti, lecionando Conhecimentos Gerais.

O pai, discordando da educaçã o feminina que recebia, colocou o filho no Colégio Santo Antô nio.

Foi menino rico, pois, como ele mesmo disse, "meu pai e seus amigos enchiam-me de presentes,
trazidos do sul ou mandados vir da Europa (...) Mas, brincava sozinho. "Esse fato marcou o menino
de tal maneira que, quando adulto, nã o esqueceu: "falar só , abstraçã o, timidez - repulsa ao grupo,
silêncio pelo isolamento, intensidade de vida, interior suprindo a distâ ncia da convivência menina.
Lia muito, mais do que apreciava os jogos materiais. Ficava horas e horas imó vel, num caldeirã o de
braços com o livro na perna, viajando na imaginaçã o. Deveria ser introvertido, ensimesmado,
caladã o. Foi ao contrá rio"- sou extrovertido, palrador, derramado".

Apesar de rico, foi um menino triste: "Fui menino magro, pá lido, enfermiço. Cercado de dietas e
restriçõ es clínicas. Proibiram-me movimentaçã o na lú dica infantil".

Ao crescer, Câ mara Cascudo, era um jovem elegante, com roupas confeccionadas pelo Joca Lira. E
fazia compras nas melhores lojas: Paris em Natal, Natal Modelo e A Chilena. Era um rapaz muito
estimado pelas moças natalenses. E se dizia, inclusive, que ele possuía duas namoradas com o
mesmo nome: Alzira...

Apaixonou-se, entretanto, por uma moça de dezesseis anos, Dá lia, filha do desembargador Teotô nio
Freire e de dona Sinhá Freire. Com ela se casou, no dia 21 de abril de 1929. Teve dois filhos:
Fernando Luís e Ana Maria Cascudo.

Menino rico, rapaz elegante, adulto pobre, sendo obrigado a trabalhar para viver. Exerceu vá rias
funçõ es pú blicas: professor, chegando a ser diretor do Ateneu Norte-Rio-Grandense. Exerceu os
cargos de secretá rio do Tribunal de Justiça e consultor jurídico do Estado. Em 1951, ingressou na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte como professor de Direito Internacional Pú blico.

Em 1948, recebeu o título de "Historiador da Cidade do Natal", das mã os do prefeito Sylvio Pedroza.

Ingressou no jornalismo, escrevendo a seçã o "Bric-à -Brac", no jornal de seu pai, "A Imprensa".
Assinou uma crô nica diá ria, em "A Repú blica", que o tornou famoso:: "Acta Diurna" (foram escritas,
ao lado cerca de 3.200 crô nicas).

Colaborou em vá rios ó rgã os de imprensa de Recife: Jornal do Comércio, Diá rio de Pernambuco,
Diá rio da Manhã , e, também, em outros jornais do país.

Câ mara Cascudo foi, como disse Luiz Gonzaga de Melo, "um dos maiores divulgadores da ideologia
da Açã o Integralista Brasileira", chegando, inclusive, a ser o chefe desse movimento no Rio Grande
do Norte. Toda a divulgaçã o, feita por Cascudo, foi através da imprensa. Ele se tornou um assíduo
colaborador do semaná rio "A Ofensiva" e, ainda, das revistas "Anauê" e "Panorama".
Em artigo publicado na revista "A Ofensiva" (31-05-1934). Câ mara Cascudo faz um questionamento
de uma impressionante atualidade: "para a burguesia liberal, governar é arrecadar impostos. Que
importa o sofrimento dos homens? Que importa o desenvolvimento constante de classe exploradas
ao lado de um pequeno grupo de exploradores? Que importa o acorrentamento da naçã o ao
capitalismo estrangeiro?

Musicó logo, como esclarece Gumercindo Saraiva, "nã o é somente aquele que executa melodia,
compõ e peças ou estuda acú stica e teoria musical". E, sim, igualmente aquele "que se dedica em
torno da musicologia, abordando qualquer dos aspectos dessa ciência, o bió grafo, o historiador este
sim é um musicoló go".

Gumercinco Saraiva faz uma afirmaçã o que demonstra todo o prestígio de Câ mara Cascudo em sua
cidade natal: "Nada fazia na província em sentido de cultura sem primeiro ouvi-lo". Desfrutando
esse prestígio quando possuía apenas 39 anos. Gumercindo Saraiva disse ainda o seguinte: "Sua
orientaçã o nos setores artísticos, contribuindo com ensinamentos sá bios, trouxeram novos
horizontes para a cultura musical do Estado". Alguns títulos de crô nicas de Cascudo comprovam
sua atuaçã o como musicó logo: "Prelú dio sobre Bach", "Modinhas e modinheiros de Natal", "Da
cançã o brasileira", "A cantoria sertaneja", etc.

Câ mara Cascudo fundou a Sociedade de Cultura Musical, presidiu o Instituto de Mú sica do Rio
Grande do Norte e dirigiu a revista "Som".

Câ mara Cascudo é considerado ainda hoje como sendo um dos maiores folcloristas do mundo, o
maior do Brasil. A sua obra mais importante, nessa á rea, chama-se "Dicioná rio do Folclore
Brasileiro" (1954). Outros livros de Cascudo sobre o folclore: "Geografia dos Mitos Brasileiros"
(Prêmio Joã o Ribeiro, da Academia Brasileira de Letras, 1948), "Folclore do Brasil" (1976), etc.

Renato Almeida, escrevendo sobre o mundo folcló rico de Câ mara Cascudo, disse que "nã o limita aos
livros que tem publicado, numa imensa bibliografia, todo o seu cabedal de conhecimentos. Tem a
arte difícil de conversar e ouvi-lo é um encanto continuado. A ele podemos aplicar em tudo quanto
se refere ao folclore, aquele dístico do já desaparecido jornal cinematográ fico Pathé - tudo vê, tudo
sabe, tudo informa".

Como historiador, Cascudo escreveu uma obra definitiva, "Histó ria do Rio Grande do Norte" (1995)
e, ainda, o livro que até o presente nã o foi suplantado: "Histó ria da Cidade do Natal" (1947).

No campo da etnografia, escreveu um livro completo: "Jangada" (1957). Outros livros: "Nomes da
Terra" (1968), "Histó ria da Alimentaçã o no Brasil" (3 vols- Iº vol. (1967), "Rede de Dormir" (1959),
"O Tempo e Eu" (1968) etc. Escreveu, ao todo, 150 livros.

Recebeu diversas condecoraçõ es: "Comendador da Ordem de Cristo" (Portugal), "Comendador da


Ordem dos Cisneiros" (Espanha), "Comendador da Ordem de Sã o Gregó rio" (Santa Sé), "Oficial da
Ordem da Coroa" (Itá lia), "Medalha Nina Rodrigues" (S. Paulo), "Medalha da Campanha do Atlâ ntico
Sul" (Aeroná utica) etc.

Distinçõ es recebidas: "Prêmio Nacional de Cultura" (1970), concedido pela Fundaçã o Cultural do
Distrito Federal; "Troféu Juca Pato", dado pela Uniã o Brasileira de Escritores (1976); "Prêmio
Henning Albert Boilesen" (1973); "Doutor Honoris Causa", da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, etc.

Câ mara Cascudo pertenceu a diversas instituiçõ es culturais: Academia Nacional de Filosofia,


Sociedade Brasileira de Antropologia e Enologia, Sociedade de Folk-lore do México, Sociedade de
Geografia de Lisboa, Societé des Americanistas de Paris, entre outras.

Luís da Câ mara Cascudo morreu em Natal, no dia 30 de julho de 1986.

Sabedoria e Arte Conservadas Pelo Povo


Segundo Cascudo, "esse nome FOLK-LORE foi criado por um arqueó logo inglês, William John Thoms
(1803-1885), propondo a denominaçã o num artigo com esse título, publicado na revista Rhe
Athenaeum, de Londres, a 22 de agosto de 1846, com o pseudô nimo de Ambrose Mertor". Folk-Lore
seria "the lore of the people", a sabedoria do povo. Tornou-se universal e comum.

Mas o que vem a ser, na realidade, folclore?

É o pró prio Cascudo quem responde: "Todos os países do mundo, raça, grupos humanos, famílias,
classes, profissionais, possuem um patrimô nio de tradiçõ es que se transmite oralmente e é
defendido e conservado pelo costume. Esse patrimô nio é milenar e contemporâ neo. Cresce com os
conhecimentos diá rios desde que se integram nos há bitos grupais, domésticos ou nacionais. Esse
patrimô nio é o FOLCLORE".

O folclore potiguar é uma conseqü ência de tradiçõ es portuguesas, nativas e africanas. Com o passar
do tempo essas tradiçõ es se misturaram, provocando uma danças.

Uma dessas tradiçõ es mais antigas é a vaquejada, cuja origem é desconhecida.

Hoje, a vaquejada se transformou num esporte, praticado pelos filhos dos fazendeiros, juntamente
com seus vaqueiros. É a festa popular, com distribuiçã o de valiosos prêmios.

A vaquejada tem por principal objetivo derrubar o touro, puxando o animal pela cauda. Dois
cavaleiros correm, de maneira paralela, um procurar levar o boi numa determinada direçã o, o outro
tenta derrubá -lo. Quando o objetivo é alcançado, aplausos. Caso contrá rio, vaias....

As festas populares mais conhecidas do Rio Grande do Norte pertencem ao ciclo junino (Santo
Antô nio, Sã o Joã o e Sã o Pedro) e aquelas que fazem parte do ciclo natalino.

Nos festejos de Sã o Joã o, comemorados com mais intensidade, predominam iguarias de milho:
canjica, pamonha, milho assado, etc.

Com fogueiras, fogos, adivinhaçõ es, bandeiras de papel, iluminaçã o com muitas lâ mpadas, com
destaque para a dança chamada quadrilha. Essa festa, antigamente, era realizada nas fazendas.
Atualmente, a quadrilha foi transportada para a cidade, quando se realizam os "arraiá s" em ruas
interditadas especialmente para os festejos juninos.

Campina Grande, na Paraíba, se transformou num grande centro de festas juninas do Nordeste,
atraindo milhares de turistas, inclusive, potiguares.

Do ciclo natalino, se destaca uma festa bem tradicional que durante os anos vinte monopolizava as
atençõ es da cidade do Natal, como mostra o testemunho de Joã o de Amorim Guimarã es: a festa dos
Santos Reis.

Narra o poeta e cronista: "Desde a tarde da véspera começava a chegar gente. Iniciavam-se os
"terços", respondidos por todos e repetidos a noite inteira (...) Na hora da missa à s nove horas da
manhã, a praia estava apinhada de devotos, ricos e pobres, pretos e brancos, abstêmios e bêbados.

"Depois da missa a festa continuava. Orquestra sem conta, tocando em bailes improvisados;
cantores anô nimos deliciando o povo, acompanhados de violõ es dengosos, sentimentalizando,
cantando, chorando, nos sons deliciosos do instrumento que soube sempre seduzir o coraçã o e
almal...

"Ali almoçava-se, bebia-se, deliciava-se o espírito e o coraçã o, o dia todo, tudo dentro do respeito e
da consideraçã o recíproca, de um povo feliz, que se compreendia e se estimava...".
Pertencente ainda ao ciclo natalino existem alguns folguedos populares. Um dos mais conhecidos é
o Boi Calemba (Bumba meu Boi), que se exibe no período que vai de novembro até o início de
janeiro.

As primeiras exibiçõ es datam do século XVIII.

Segundo Deífilo Gurgel, o Boi Calemba se diferencia dos outros brasileiros e nã o tem enredo, por ter
se descaracterizado, "limitando-se o brinquedo hoje, pelo menos em Natal e em Sã o Gonçalo, quase
só as danças e cantigas".

Do elenco se destaca o Mestre que, quase sempre, é o dono do espetá culo. De;ífilo Gurgel conta que
"os antigos Mestres de Boi Calembra de Ceará -Mirim e Sã o José de Mipibu vinham a Natal contratar
seus espetá culos empunhando uma espada desembainhada", porque a espada simbolizava o poder.

Outro personagens: os Galantes sã o em nú mero de quatro a oito. As duas damas sã o, na realidade,


dois meninos vestidos de mulher. Os mascarados possuem os seguintes nomes: Mateus, Birico e
Catirina.

Entre as figuras, podem ser citadas: Burrinha, Bode, Cheque, Gigante e sua mulher Dra. Maria
Zidora da Conceiçã o Pia.

Como disse Deífilo Gurgel, "O Boi é a figura central do folguedo. É o ú ltimo que se apresenta. Depois
que ele sai de cena, cantam-se as despedidas".

Já o Pastoril tem por objetivo louvar o menino Jesus, representando a visita que os pastores fizeram
ao está bulo de Belém. É formado por vá rias jornadas, com dois grupos de pastoras: o cordã o azul e
o cordã o vermelho, ambos possuem os seguintes personagens: Diana Mestra, Contramestra, Cigana,
etc.

Antigamente, o Pastoril era representado diante de um presépio, com imagens de santos.

Renato Almeida, citado por Câ mara Cascudo, diz o seguinte: "O que tem maior significado no
pastoril é constituírem as pastoras o elemento bá sico na funçã o coro, tomado como personagem.
Ele é que tem o papel dramá tico".

O Fandango nã o existiu em Portugal, porém, as mú sicas receberam influência européia, cujos


temas, como diz Câ mara Cascudo, foram organizados "anonimamente no Brasil". Consta de vinte e
quatro jornadas. Os personagens vestem "fardas" da marinha. É a histó ria da "Ná u Catarineta",
justificando, assim, a presença de um barco. Alguns personagens do elenco: Capitã o, Piloto,
Imediato, Médico, etc.

A Chegança, que em Portugal era dança, ao chegar no Brasil se transformou em um auto. Como
disse Câ mara Cascudo, "a chegança é representada com cenas marítimas, culminando pela
abordagem dos mouros, que sã o vencidos e batizados".

Em 1745, a Chegança foi proibida por D. Joã o V, em Portugal, por ser considerado indecente.
Segundo Câ mara Cascudo, essa dança nã o tem nenhuma relaçã o com o auto brasileiro que "é
dividido em partes e nã o há acompanhamento musical ao canto que decorre ritmado pelos
tambores, caixas-de-guerra, em rufos incessantes".

Os Congos ou Congadas, pelo nome, denunciam influência africana. No enredo, lutas de africanos,
buscando sua autonomia contra os portugueses. Nã o foi, contudo, importado da Á frica. Surgiu no
Brasil, invençã o dos escravos negros. Principais personagens: Rei Cariongo, Príncipe Sueno,
Secretá rio-Sala, Rainha Jinga e o Embaixador.
Encontram-se, na atualidade, em decadência. Segundo Tarcísio Medeiros, "em Caicó e Jardim do
Seridó , entretanto, conservam, por ocasiã o das festas à Nossa Senhora do Rosá rio".

Os Caboclinhos se apresentam durante o carnaval. Nã o chega a ser um auto. Os seus integrantes


fazem, apenas, coreografia, fantasiados de nativos. Como afirma Tarcísio Medeiros, eles "desfilam
pelas ruas ao som do batuque dos seus tambores, gaitas e chocalhos, dançando em cordõ es que
evoluem de acordo com as cenas representadas pelo caçador ferido, manifestaçõ es de feitiçaria do
Pajé e o culto dos deus Tupan, carregado num andor, tudo sob as ordens do Cacique, que imprime
sua vontade por meio do toque de um bú zio".

Bambelô é uma dança, com o grupo formando um círculo, e no interior da "roda", dançam um ou
dois dançarinos. É , ainda, Tarcísio Medeiros, quem diz que o "cantar", geralmente, é improvisado; o
refrã o ou segue a estrofe ou se intercala nela. Poeticamente, apenas, o refrã o é fixo, constituindo o
caracterizado do coco".

Em Alagoas a dança é conhecida pelo nome de "Coco".

Em Natal, duas sociedades continuam dançando o Bambelô : Araruna e Asa Branca.

Deífilo Gurgel Turismo e Folclore

Apó s o falecimento de Luís da Câ mara Cascudo, um homem continua pesquisando o folclore do Rio
Grande do Norte: "Deífilo Gurgel. Desde muito tempo que o professor Deífilio Gurgel vem
publicando livros sobre as tradiçõ es populares do Estado.

Recentemente terminou uma viagem que durou um ano, depois de ter percorrido 1.500 km, com o
objetivo de publicar um livro, com 240 pá ginas, com o apoio do Programa Municipal de
Financiamento à Cultura, e terá o seguinte título: "Introduçã o ao Estudo do Folclore". Na opiniã o do
autor, o livro será uma "antologia ou mini-enciclopédia do folclore potiguar".

Deífilo Gurgel lamenta o desinteresse da populaçã o pelo folclore. Ele, porém, nã o desiste. Sonha em
construir uma vila, com o nome de Chico Santeiro, para promover "um intercâ mbio entre o folclore
e turismo, na esteira do potencial de Natal em ambas as á reas".

Dois Séculos

Século XIX: Novas Atividades Produtivas

No século XIX, além da predominâ ncia da criaçã o de gado, houve também a expansã o das culturas
do algodã o e da cana-de-açú car e, ainda, cresceram as atividades extrativas, sal, marinho e cera de
carnaú ba.

Na segunda metade desse século, a criaçã o de gado foi prejudicada por duas secas: a de 1844/45 e
1877/79.

A cana-de-açú car passou a ser a principal atividade econô mica, chegando a produzir, em 1860,
cerca de 4.176.570 quilos. Depois, entretanto, começou a decadência.

A indú stria salineira, que se deu bem no princípio do século. pouco depois entrou em declínio,
porém, posteriormente, conseguiu uma notá vel recuperaçã o, nas regiõ es de Mossoró , Macau e Areia
Branca.

No final do século XIX, outro produto atingiu um grande desenvolvimento: a cera de carnaú ba.

A indú stria têxtil apresentou, desde o começo, 1870, um lento desenvolvimento, graças a uma dupla
concorrência : a da indú stria têxtil do Sudeste e a do Estado de Pernambuco. Denise Rakeya aponta
outro fator, ou seja, "a estrutura do mercado consumidor. Com exceçã o daquela parte da populaçã o
localizada nos nú cleos urbanos, a maior parte nã o poderia, de fato, constituir esse mercado".

A indú stria têxtil vai se configurar como uma realidade a partir de 1877, quando "o presidente da
província contratou com Amaro Barreto de Albuquerque Maranhã o a instalaçã o de uma fábrica de
fios e de tecidos em Natal, e a inauguraçã o ocorreu no ano de 1888. Em 1904, passou a funcionar
outro estabelecimento industrial, a Fá brica de Ó leos e Farelos de Algodã o", já, portanto, no século
XX.

Avanços e Recuos no Século XX

Devido à importâ ncia do algodã o, o governo criou o Serviço Estadual do Algodã o e pouco depois
(1927), o Serviço de Classificaçã o do Algodã o.

A Inspertoria Federal de Obras Contra as Secas, criada em 1909, em parceria com o governo
estadual, construiu "vá rias estradas no RN - entre as quais se destacava a que ligava Natal ao Seridó
- que posteriormente viriam completar o quando de integraçã o de Natal com as zonas algodoeiras
do Estado", afirmam Marconi Gomes da Silva, Má rcia Maria Bezerra e Geraldo Gurgel de Azevedo.

A baixa qualidade do algodã o potiguar, em algumas regiõ es, foi combatida pelo governo através de
estaçõ es experimentais e de campos de demonstraçã o, visando uma melhor participaçã o no
comércio internacional. Como resultado, a cotonicultura atingiu uma posiçã o hegemô nica no
começo do século XX. Com a concorrência dos paulistas, a situaçã o começou a mudar. Em 1940, a
produçã o paulista atingiu praticamente o triplo da produçã o nacional.

A exportaçã o do sal marinho, contudo, cresceu muito. De 7.115 toneladas, nos anos de 1851/55,
pulou para cerca de 92.902 toneladas no período 1905/1909. Com destaque para Macau e Areia
Branca.

O mesmo nã o ocorreu com a indú stria açucareira. A explicaçã o é muito simples: enquanto a
indú stria salineira melhorou sua tecnologia de produçã o, a do açú car permaneceu praticamente
com os velhos bangü ês. A modernizaçã o dessa indú stria foi muito lenta. Em 1942, o Rio Grande do
Norte contava apenas com três usinas!

O rebanho potiguar, durante os períodos de 1950/54 e 1975/79, cresceu 265%! Desse rebanho, a
criaçã o bovina aumentou de tal maneira que suplantou, em muito, as criaçõ es se suínos, caprinos e
ovinos, como demonstra Dominique Simone Colombert.

No período compreendido entre 1950 a 1970, entretanto, houve, nas fazendas com menos de cem
hectares, uma diminuiçã o do rebanho.

Petróleo e Luta por Uma Refinaria

Um fator importante na economia atual do Rio Grande do Norte é o petró leo, responsá vel por uma
posiçã o de destaque dentro do País. Por essa razã o, as autoridades estaduais, unidas a
determinados setores, lançaram uma campanha pela construçã o de uma refinaria de petró leo no
Estado, criando o "Movimento S. O. S. Refinaria no Rio Grande do Norte".

A existência do petró leo foi confirmada em 1974, com a abertura do poço pioneiro. Apesar da
importâ ncia da Bacia Potiguar, "o Rio Grande do Norte, na sua condiçã o de exportador de energia
primá ria, é duplamente penalizado, na medida em que se restringe a oportunidade de potencializar
o seu desenvolvimento, via verticalizaçã o industrial da sua produçã o mineral e, ao mesmo tempo,
vê reduzidas as transferências, constitucionais de recursos da Uniã o, por ter sua renda per capita
aumentada pela agregaçã o do valor do petró leo extraído do seu sub-solo".

"Adicionalmente, por força de um dispositivo constitucional que isenta o petró leo da cobrança do
ICMS nas operaçõ es de transferência interestadual, o Rio Grande do Norte se vê financiando o
desenvolvimento de Estados ricos e industrializados, na medida em que deixa de arrecadar cerca de
US$ 65 milhõ es em impostos, por ano, valor que deve entrar como uma variá vel de custo, favorá vel
ao RN, no estudo de viabilidade ora em execuçã o pela Petrobrá s" (Movimento SOS Refinaria no Rio
Grande do Norte).

A campanha, infelizmente, nã o obteve nenhum resultado.

A Zona Homogênia Mossoroense é apontada pelos técnicos, como sendo uma regiã o privilegiada
para se instalar uma refinaria.

O investimento da Petrobrá s para o Rio Grande do Norte, em 1996, incluindo impostos, constou de
aproximadamente 500 milhõ es de dó lares.

O Rio Grande do Norte é o maior produtor nacional de petró leo em terra e o segundo no mar.
Produçã o total diá ria de 100 mil barris. É o segundo produtor de gá s natural do Nordeste, com 75
milhõ es de metros cú bicos/ano.

A Potencialidade do Turismo

Outro setor importante na atualidade é o turismo. Apesar da construçã o de uma rede de hotéis,
inclusive dois de cinco estrelas, na Via Costeira, o turismo sofre por falta de uma infra-estrutura.
Natal ainda nã o se preparou adequadamente para receber um grande nú mero de visitantes. Muitos
turistas deixam de conhecer belos recantos, havendo uma concentraçã o nos passeios de bugres nas
duas de Jenipabu e no Carnatal, no final do ano.

Surgem, entretanto, grande esperanças, num futuro pró ximo.

A Secretaria Estadual de Turismo, no início de 1997, organizou uma grande festa que abriu a VI
BNTM (Brazil National Tourism Mart), na Vila Folia, com a presença do governador Garibaldi Alves
Filho e mais de dois mil participantes.

No Pavilhã o Parque das Dunas do Centro de Convençõ es foram armados os estantes do evento. Na
oportunidade, foi apresentada a maquete da ampliaçã o do aeroporto Augusto Severo, com
mudanças que vã o transformá -lo num dos mais modernos do País. Também há planos para a
construçã o de um segundo aeroporto na regiã o da Grande Natal.

Projeto Hídrico e Pólo Industrial

O governo Garibaldi Alves Filho está desenvolvendo um projeto hídrico muito importante para a
economia do Rio Grande do Norte.

O objetivo é interligar as principais bacias, numa garantia de distribuiçã o de á gua de boa qualidade
para consumo da populaçã o e, ainda, que seja a garantia de irrigaçã o para uma vasta regiã o do
territó rio potiguar.

O canal do Pataxó promove a transposiçã o das á guas da Barragem Armando Ribeiro Gonçalves para
o rio Pataxó , significando 2.500 hectares de á rea irrigada, etapa já concluída no final de 1955.

A barragem Gargalheiras ampliará a sua capacidade de armazenamento de á gua, sendo esse


acontecimento de grande importâ ncia para uma regiã o que está incluída na á rea mais seca do
Nordeste.

Com a construçã o da adutora do sertã o Cabugi, as á guas do reservató rio Armando Ribeiro
Gonçalves vã o abastecer oito cidades (Angicos, Fernando Pedrosa, Lages, Pedro Avelino, Pedra
Preta, Jardim de Angicos, Caiçara do Rio dos Ventos, Riachuelo) e, ainda, 21 comunidades rurais.
Serã o, também, aproveitadas as á guas da Lagoa do Bonfim, sendo atendidos outros municípios:
Monte Alegre, Lagoa de Pedra, Lagoa Salgada, até Santa Cruz.

O sistema conta ainda com as seguintes adutoras: a de Mossoró , Serra do Mel, Jardim do Seridó ,
Serra de Sant’ana e Meio Oeste. O programa engloba 670 quilô metros de adutoras e é o maior do
Brasil.

Outro grande projeto, que trará grandes investimentos produtivos para o Estado, é o "Pologá s-sal",
uma das grandes bandeiras levantadas pelo governador Garibaldi Alves, que inclusive já assinou
um protocolo para a sua instalaçã o. A obra conta com apoio do governo federal. Segundo o ministro
das Minas e Energia, o "Pologá s-sal é irreversível".

Comércio Exterior e Outros Números

O comércio exterior do Rio Grande do Norte apresentou, um crescimento de 1,84% no primeiro


semestre de 1997, em relaçã o ao mesmo período do ano anterior.

As exportaçõ es somaram US$ 45,2 milhõ es, sendo o maior índice dos dez ú ltimos anos, liderando o
setor de frutas tropicais, com 32,6% de todo o produto comercializado para o exterior.

O PIB per capita vem evoluindo positivamente no Rio Grande do Norte, como demonstram os
nú meros: em 1980, era de 1.246,06, o Nordeste tinha 1.649,32 e o Brasil 3.553,07. Em 1996, o Rio
Grande do Norte apresentava 3.013.60, o Nordeste 2.578 e o Brasil 4.752,08.

Com uma produçã o de 4 milhõ es de toneladas/ano, o Rio Grande do Norte é o maior produtor de
sal marinho do País.

No setor de gá s natural, a posiçã o do Estado é muito boa: é o segundo, com uma produçã o de 75
milhõ es de metros cú bicos.

Na agricultura, o Rio Grande do Norte ocupa o segundo lugar, como pó lo de fruticultura irrigada do
Nordeste.

Os maiores importadores dos produtos potiguares, no primeiro semestre de 1997 foram os


seguintes: Estados Unidos (US$ 13.4 milhõ es), Nigéria (US$ 5,2 milhõ es), Reino Unido (US$ 4,8
milhõ es).

História do RN - Uma Síntese

Da Pré-História ao Final do 2º Milênio

O homem primitivo, nascido em terras potiguares antes da vinda dos europeus, é bem mais antigo
do que se imaginava.

Antes de chegar ao Nordeste, teria vindo possivelmente da Á sia, através do Estreito de Bering ou
por outras vias. O fato é que, com o passar do tempo, atingiu as terras que formariam, no futuro, o
Rio Grande do Norte.

Esses povos desenvolveram culturas, procurando se comunicar, inventaram um tipo de escrita,


conhecida pelo nome de inscriçã o rupestre, uma linguagem formada por traços, círculos, pontos e
até pinturas.

A coloniza européia, no Nordeste brasileiro, foi conseqü ência da expansã o do imperialismo


europeu. Nesta regiã o, tentaram se fixar franceses, espanhó is, holandês e portugueses.
Filipe II, da Espanha, ao anexar Portugal e suas colô nias, procurou de imediato se apossar de todo o
Nordeste e da regiã o Norte. Mandou expulsar os franceses da Capitania do Rio Grande, construir
uma fortaleza (a Fortaleza da Barra do Rio Grande ou, como é mais conhecida, Fortaleza dos Reis
Magos) e fundar uma cidade.

A expediçã o armada, comandada por Mascarenhas Homem, fracassou, porém, Jerô nimo de
Albuquerque, os jesuítas e os líderes nativos conseguiram, através de navegaçõ es, a pacificaçã o da
regiã o.

Expulsos os franceses, construída a fortaleza no dia 25 de dezembro de 1599, Joã o Rodrigues


Colaço fundou Natal, que deveria funcionar como nú cleo inicial de colonizaçã o se desenrolasse de
maneira lenta.

Os holandeses tentaram conquistar o Nordeste, primeiro, procurando se apossar da capital da


colô nia (1624/1625). Sonhavam com 8.000 florins que a Bahia arrecadava anualmente. E, a partir
daquela capitania, conquistar todo o País. Foi, contudo, um sonho que se desmoronou, por sinal
bem rá pido.

O fracasso foi total, mas a idéia de tomar o Brasil da Espanha continuava, pois nã o admitiam a
derrota que sofreram para seu grande rival... E fizeram uma segunda tentativa. Escolheram, agora, a
terra do açú car, Pernambuco!

Conseguem o seu objetivo, se apossando de Pernambuco e, ainda, avançam, conquistando todo o


Nordeste.

O conde de Nassau, figura invulgar, procurou nã o apenas explorar as terras sob seu domínio, como
desejava a Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais, e sim agir como se fosse um "mecenas".
Incentivou a arte, a ciência e a cultura. Mostrou-se, ao mesmo tempo, há bil político e bom
administrador.

O Rio Grande possuía um vasto rebanho de gado bovino, necessá rio para abastecer os invasores.
Era urgente, portanto, a sua conquista, apó s muita pesquisa - porque a fortaleza da Barra do Rio
Grande (Reis Magos) aparecia como um grande obstá culo. Mas, ao contrá rio, a tomada da fortaleza
foi bem mais fá cil do que eles esperavam. Aqui, os holandeses agiram de uma maneira bem
diferente: nenhuma preocupaçã o pela arte, ciência, cultura. A capitania foi transformada numa
fornecedora de carne bovina para Pernambuco.

No Rio Grande, o conflito se agravou por causa do fanatismo religioso, provocando dois grandes
massacres: o de Cunhaú e o de Uruaçu.

Apesar da violência, a tradiçã o indicava os holandeses como sendo os autores de obras


importantes, como a fortaleza dos Reis Magos ou, entã o, a ponte (antiga) de Igapó , construída muito
depois de sua expulsã o... Existe apenas uma explicaçã o para tudo isso: uma resistência, pelo menos
a nível de subconsciente, contra a colonizaçã o lusitana.

O ú ltimo ato dos batavos, no Rio Grande, foi mais violência. Vencidos, obrigados a deixar a
capitania, lançaram fogo, destruindo o que podiam, inclusive, documentos.

Apó s os flamengos, a capitania conheceu outro momento de grande violência: "A Guerra dos
Bá rbaros". Provocada pelos brancos, que desejavam tomar a terra dos seus legítimos donos, ou seja,
dos nativos. A violência gerou violência. Bernardo Vieira de Melo, compreendendo essa verdade,
agiu com competência e justiça, conseguindo aplicar a regiã o sob o seu comando.

Essas duas guerras, contra os holandeses e dos "Bá rbaros", foram responsá veis pelo atraso, ou seja,
impediram o desenvolvimento natural do Rio Grande do Norte.

No século XVIII, a economia tinha por base apenas a agricultura e a indú stria pastoril.
A Revoluçã o de 1817, em Recife, teve reflexos no Estado. José Iná cio Borges, que governava a
capitania, procurou reagir, sendo preso por André de Albuquerque. O movimento nã o contou com o
apoio popular. A reaçã o monarquista veio logo a seguir, triunfando. André de Albuquerque, ferido,
foi levado preso para a fortaleza, onde faleceu.

A independência do Brasil foi outro acontecimento que nã o conseguiu entusiasmar o povo. Houve
apenas uma festa para comemorar a emancipaçã o política do País, no dia 22 de janeiro de 1823.

A Confederaçã o do Equador, no Rio Grande do Norte, se caracterizou pela atuaçã o de Tomá s de


Araú jo Pereira, para evitar que ocorressem conflitos armados no Estado. Sofreu, chegando a se
humilhar, porém, conseguiu o seu intento.

A escravidã o representava, no final do século XIX, o atraso, identificada com a decadente


monarquia.

O abolicionismo, ao contrá rio, representava o novo e para muitos fazia parte dos ideais
republicanos. Foi, contudo, a princesa Isabel quem decretou o fim da escravidã o, no dia 13 de maio
de 1888.

A grande falha do abolicionismo, no Brasil, foi a de nã o ter lutado pela integraçã o do negro na
sociedade, apó s a sua libertaçã o. Como resultado, os africanos e seus descendentes passaram por
grande dificuldades. Alguns se deslocaram para regiõ es distantes das cidades, formando
comunidades fechadas, como em Capoeira dos Negros.

A libertaçã o dos escravos, no Rio Grande do Norte, foi defendida por grupos de jovens e
intelectuais, que fundavam, em seus municípios, associaçõ es que batalhavam pela emancipaçã o do
negro.

Mossoró foi a primeira cidade que libertou seus escravos, no dia 30 de setembro de 1883.

A Proclamaçã o da Repú blica, a exemplo de outros acontecimentos, nã o despertou grande


entusiasmo no povo potiguar. Teve cará ter meramente adesista.

No novo regime, predominavam os interesses da oligarquia Albuquerque Maranhã o. Contra ela, se


insurgiu José da Penha Alves de Souza, promovendo a primeira campanha popular do Rio Grande
do Norte. Patrocinou a candidatura do tenente Leô nidas Hermes da Fonseca, que nã o conhecia e
nem desejava governar o Estado... Abandonado pelo seu candidato, José da Penha voltou para o
Ceará, onde chegou a ser eleito deputado estadual.

Quando o eixo econô mico passou do litoral (açú car-sal) para o sertã o (algodã o-pecuá ria), apareceu
uma nova oligarquia, liderada por José Augusto Bezerra de Medeiros, cujo domínio terminou com a
Revoluçã o de 1930.

O regime político, apodrecido pelas fraudes, corrupçã o, provocou o descontentamento de grupos


militares e civis. Dentro desse contexto, Luís Carlos Prestes e Miguel Costa percorreram o País com
uma tropa, a "Coluna Prestes", protestando contra o autoritarismo do presidente Artur Bernardes.
A "Coluna Prestes" entrou no Rio Grande do Norte pela Zona Oeste, travando combates com a
polícia, durante o governo de José Augusto Bezerra de Medeiros.

A ‘Questã o de Grossos" começou no século XVIII, quando Rio Grande do Norte e Ceará nã o tinham
definido suas fronteiras. O Ceará precisava do sal potiguar para poder fabricar suas carnes de sol. A
Câ mara de Aracati (Ceará ) pretendeu além das de seu Estado, penetrando em terras do Rio Grande
do Norte. Era a chamada "Questã o de Grossos".

Em 1901, a Assembléia Estadual do Ceará elevou Grossos à condiçã o de vila, incluindo no seu
territó rio uma vasta á rea do Rio Grande do Norte. Alberto Maranhã o, governador do RN, protestou.
Era iminente um conflito armado entre os dois Estados. Para evitar o agravamento da crise, a
controvérsia foi levada para uma decisã o, através do arbitramento. Na primeira fase, o resultado foi
favorá vel ao Ceará . Pedro Velho, entã o, convidou Rui Barbosa para defender a causa potiguar. Essa
defesa também contou com a participaçã o de Augusto Tavares de Lyra. Como resultado, o jurista
Augusto Petronio, através de três acó rdã os, deu ganho de causa em definitivo ao Rio Grande do
Norte, em 1920. A "Questã o de Grossos" estava encerrada.

A Repú blica foi ingrata com o sertã o, que continuou abandonado, isolado dos grandes centros
urbanos, com a maioria de sua populaçã o na ignorâ ncia e na miséria.

No sertã o dos coronéis, os mais humildes tinham três opçõ es: viver eternamente agregado à s
famílias dos coronéis; integrar-se ao cangaço, ou penetrar no mundo místico, cujo fiéis terminavam
enfrentando os coronéis e se transformavam em grupos de "faná ticos".

Lampiã o levou pâ nico ao interior nordestino, chegando a invadir Mossoró , sendo derrotado pelo
povo daquela cidade, sob a liderança do coronel Rodolfo Fernandes.

O cangaceiro, no sertã o, era um misto de bandido e de justiceiro, ú nico a fazer frente ao absolutismo
dos coronéis.

Jesuíno Brilhante é o representante potiguar típico do cangaço.

Os grandes místicos do Nordeste foram: padre Cícero e Antô nio Conselheiro.

Os faná ticos da Serra de Joã o do Vale, liderados por Joaquim Ramalho e Sabino José de Oliveira,
foram os místicos mais conhecidos da histó ria do Rio Grande do Norte. O fim deles, porém, foi
melancó lico, derrotados pelo tenente Francisco de Oliveira Cascudo.

A Revoluçã o de 30 irrompeu no Brasil para modificar a estrutura política existente no País.


Governava o Estado, Juvenal Lamartine, muito dependente do poder central, e teve, segundo seus
adversá rios, uma preocupaçã o bá sica: perseguir seus inimigos... Com a Revoluçã o de 30, perdeu o
governo, caindo sem resistir.

A Revoluçã o de 30, no Rio Grande do Norte, significa, sobretudo, a atuaçã o de Joã o Café Filho. Foi
um lutador, procurando isntalar no seu Estado os ideais revolucioná rios. Encontrando sempre a
resistência das oligarquias, lideradas por José Augusto de Medeiros.

A Revoluçã o de 30 enfrentou momentos difíceis, por causa da oposiçã o das classes conservadoras,
representadas pelo Partido Popular. O governo central orientou Má rio Câ mara para fazer uma
composiçã o de forças, com o Partido Popular. O interventor, entretanto, nã o conseguiu efetivar tal
aliança. Em vez de pacificaçã o, cresceu o clima de agitaçã o, fazendo com que o final da
administraçã o se transformasse no período de maior violência ocorrido até aquele momento.

A classe operá ria, contudo, começou a se organizar, se unindo em torno dos sindicatos.

Cinco anos depois de ter ocorrido a Revoluçã o de 30, surgiu outro movimento armado, a Intentona
Comunista. Gerado, em parte, pelo descontentamento provocado pelo governo de Má rio Câ mara, e
que foi liderada por um grupo de comunistas. Vitoriosa a rebeliã o, uma grande agitaçã o dominou
Natal, com estabelecimentos comerciais assaltados e, ainda, com assassinatos.

A resistência maior foi feita pela polícia, sob o comando do major Luís Jú lio e do coronel Pinto
Soares. Surgiu um mito, transformado em heró i: o soldado Luiz Gonzaga.

Foi instalado o "Comitê Popular Revolucioná rio" no dia 25 de novembro de 1935. Circulou o jornal
"Liberdade".
Com o fracasso da Intentona, no Recife e Rio de Janeiro, os rebeldes abandonaram Natal, seguindo o
rumo do Seridó . Na Serra do Doutor houve o encontro dos fugitivos com forças sertanejas, com a
debandada de ambas as facçõ es... Terminava, assim, a Intertona Comunista. A repressã o foi violenta,

Mas o destino de Natal nã o seria, apenas, a de ser palco de violência. A sua localizaçã o geográ fica
fazia com que a cidade fosse predestinada para ocupar um lugar de destaque na histó ria da aviaçã o,
desde os primó rdios, na época dos hidroaviõ es, quando grandes aeronautas passaram por Natal:
marquês De Pinedo, Paul Vachet, Jean Mermoz, etc.

O primeiro aeroplano que aterrissou no Estado foi um Breguet, pilotado por Paul Vachet.

Em 1927, o coronel Luís Tavares Guerreiro indicou a Vachet um local apropriado para construir um
aeroporto, que aeroporto, que servisse de pouso para os aviõ es da Lignes Latércoère. Aprovado,
nasceu assim o Aeroporto de Parnamirim. Foi inaugurado por um "Numgesser-e-Coli", pilotado por
Dieu Domé Costes e José le Brix, concluindo, com êxito, o roteiro Saint Louis do Senegal-Natal.

Graças ao empenho de Juvenal Lamartine, no dia 29 de dezembro de 1928 foi fundado o Aéro Clube.

Em 1º de janeiro de 1931, o navio italizano "Lazeroto Malocello", comandado pelo capitã o de


fragata Carlo Alberto Coraggio, chegava a Natal, trazendo a Coluna Capitolina, ofertada pelo chefe
do governo italiano Benito Mussolini, para comemorar o "raid" Roma-Natal, feito pelos aviadores
Del Prete e Ferrarin.

Cinco dias depois, Natal recebeu a visita da esquadrilha da Força Aérea italiana, comandada pelo
general Balbo. Governava o Rio Grande do Norte, Irineu Joffily.

Natal iria ficar mais famosa ainda durante a Segunda Guerra Mundial. Os norte-americanos, nesse
período, construíram uma megabase, que desempenhou um papel tã o significativo no grande
conflito que se tornou conhecida pelo nome de "O Trampolim da Vitó ria".

Em Natal, ocorreu a reuniã o entre o presidente do Brasil, Getú lio Vargas e o presidente dos Estados
Unidos, Franklin D. Roosevelt, na chamada "Conferência de Natal" (28-1-1943).

A cidade cresceu, multiplicou sua populaçã o, foi visitada por personalidades ilustres de diversos
países, e, sobretudo com o progresso, a populaçã o mudou de há bitos.

Para uma maior integraçã o dos militares americanos com os nataleses, foram realizados, inú meros
bailes. Como conseqü ência, houve uma invasã o de ritmos estrangeiros: rumba, conga e boleros.

Natal, assim, perdeu definitivamente seu jeito de cidade provinciana.

O populismo se impô s, no Rio Grande do Norte, durante os anos 60, através de dois grandes líderes
políticos: Aluízio Alves e Djalma Maranhã o. O primeiro, oriundo do Partido Popular, se apresentava
como sendo do Centro, iniciando o processo de modernizaçã o do Estado. O segundo nacionalista
radical, homem de esquerda.

O golpe militar de 64 se caracterizou, no Rio Grande do Norte, apenas pelas perseguiçõ es a jovens e
intelectuais da terra, como Moacyr de Gó es, Djalma Maranhã o, Mailde Pintou e outros. Luís
Maranhã o, ao que parece, foi morto pelas forças da repressã o. Djalma Maranhã o, exilado, com
saudade do seu povo, morreu no Uruguai. Aluízio Alves, Garibaldi Alves e Agnelo Alves tiveram seus
direitos políticos cassados pelo AI5

Na histó ria educacional do Estado, um colégio se destacou: Ateneu, que se transformou num centro
cultural de grande importâ ncia.
A "Campanha de Pé no Chã o Também se Aprende a Ler" provocou uma verdadeira revoluçã o no
processo educacional do Rio Grande do Norte, nos anos 60, liderada por Djalma Maranhã o, Moacyr
de Gó es e Margarida de Jesus Cortez.

O ensino "normal" passou por uma série de vicissitudes até o funcionamento do Instituto
Presidente Kennedy. Inaugurado, por sua vez, com grandes festas, no governo de Aluízio Alves.
Recentemente, foi redimensionado, ministrando o curso de 3º grau, visando a formaçã o de um novo
professor, cotando com a assessoria do professor Michel Brault.

A cultura no Rio Grande do Norte apresenta pá ginas brilhantes. Desde a fundaçã o do seu primeiro
jornal, "O Natalense", em 1832, pelo padre Francisco de Brito Guerra, até o presente momento, a
imprensa escrita ocupou um lugar de destaque.

No século XIX apareceu o primeiro romance, "Mistério de um Homem", de Luís Carlos Lins
Wanderley.

Nomes femininos que brilharam no século XIX e início do século XX: Isabel Gondim, Auta de Souza e
Nísia Floresta.

Ferreira Itajubá é considerado o grande poeta do século XIX. A partir dessa época, surgiram grandes
poetas até os dias atuais.

No dia 29-3-1902 foi fundado o Instituto Histó rico e Geográ fico do Rio Grande do Norte. Luís da
Câ mara Cascudo, no dia 14-11-1936, fundou a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras.

O movimento cultural cresceu muito e jornais se multiplicaram em praticamente todos os


municípios do Estado.

Na atualidade, algumas instituiçõ es têm contribuído para o desenvolvimento cultural do Estado:


Fundaçã o José Augusto, "Coleçã o Mossoroense" e Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

O estado conta, até o presente momento, com duas antologias, reunindo os poetas do Rio Grande do
Norte: a primeira, organizada por Ezequiel Wanderley, foi publicada em 1922 sob o título "Poetas
do Rio Grande do Norte" e a segunda, escrita por Romulo Chaves Wanderley, que publicou, em
1965, o "Panorama da Poesia Norte-Rio-Grandense".

Novas antologias estã o sendo preparadas. Uma delas organizada por Constância Lima Duarte,
juntamente com a poetisa Diva Cunha.

A economia do Estado teve um lento caminhar, prejudicada por períodos de longas estiagens. Teve
alguns ciclos: gado, cana-de-açú car, algodã o, sal, etc.

A partir de 1974, com a abertura do poço pioneiro, o petró leo começou a crescer na economia
estadual. Fala-se, agora, no "Pologá s-sal", que caso venha a se tornar realidade, trará grandes
benefícios para o Rio Grande do Norte.

O turismo é apontado pelos especialistas como um setor que tende a crescer, pela potencialidade
que a terra potiguar possui.

Foi construída uma rede de hotéis na Via Costeira e recentemente a Secretaria Estadual de Turismo
organizou uma grande festa que abriu a VI BNTM (Brazil National Tourism Mart). Durante o evento,
mais de 2.000 participantes freqü entaram os estandes dos nove Estados, armados no Pavilhã o
Parque das Dunas, do Centro de Convençõ es, em Ponta Negra.

O Rio Grande do Norte se encontra incluído no polígono das secas.


O governo Garibaldi Alves elegeu a irrigaçã o como uma das metas prioritá rias de sua
administraçã o. O seu projeto é interligar as principais bacias, como uma maneira de levar á gua de
boa qualidade para a populaçã o, incluída nas comunidades atingidas pela seca, com a irrigaçã o de
uma vasta á rea do territó rio potiguar.

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