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Blog-jornalismo: interatividade e construção coletiva

da informação∗
Kátia Fonseca Aguiar
2006

Índice são exemplos dessas novas maneiras de lidar


com a informação no ciberespaço. Com um
1 Interatividade e Inteligência Coletiva: grande potencial interativo, eles se apresen-
conceitos em aberto 2 tam como a possibilidade de um jornalismo
2 Jornalismo Interativo e Coletivo 4 coletivo, construído a muitas mãos, numa co-
3 Blog do Noblat: um exemplo de jor- municação horizontal. O público deixa de
nalismo interativo e coletivo 6 ser encarado como uma massa disforme e
4 Conclusão 7 passa a se constituir de pessoas, ativas, pron-
tas para se expressarem e opinarem.
Introdução Para tentar dar conta da complexidade
desses novos fenômenos de comunicação e
As últimas décadas foram marcadas por um das transformações sócio-culturais que se
intenso avanço tecnológico, que se reflete em processam a partir desse cenário, idéias e
mudanças significativas em todas as esferas conceitos surgem, ganham novos contornos
da sociedade. Na comunicação, muita coisa e passam a pautar as discussões sobre comu-
muda, principalmente, com o desenvolvi- nicação.
mento da Internet e dos diversos fenômenos Interatividade e Inteligência Coletiva são
comunicacionais nascidos a partir dela.
Nesse contexto, novas formas de jorna- nário Oxford da língua inglesa) é uma abreviação de
lismo surgem e se desenvolvem. O web- weblog que, por sua vez, vem da junção de duas pa-
lavras em inglês: web (forma simplificada de se refe-
jornalismo traz novidades na produção, di- rir à world wide web), que significa rede, e log, que
vulgação e consumo de notícias. Os blogs1 significa registro. Assim, weblogs ou blogs são uma

espécie de registro na web.
Trabalho apresentado como requisito parcial para Duas características principais os diferenciam de
a aprovação na disciplina Pensamento Comunicacio- outros tipos de páginas: o microconteúdo e a orga-
nal contemporâneo, ministrada pelo professor Delfim nização cronológica. Além disso, é marcante o uso
Afonso Neto. Curso de Especialização em Comuni- dos recursos de comentários, que são espaços onde o
cação: Imagens e Culturas Midiáticas. Universidade leitor ou visitante tem a oportunidade de comentar e
Federal de Minas Gerais-UFMG. criticar as mensagens postadas e até mesmo sugerir
1
A expressão blog (cunhada pelo norte-americano assuntos para novas mensagens.
Jorn Barger em 1997 e inserida em 2003 no dicio-
2 Kátia Fonseca Aguiar

apenas alguns desses conceitos a partir dos de interação técnica. É no rol desse último
quais os pensadores, teóricos, profissionais tipo de interação que ele situa a interativi-
de comunicação e a sociedade em geral ten- dade. Assim, para ele, interatividade pode
tam compreender e explicar essa realidade ser caracterizada como “uma ação dialógica
desterritorializada e virtualizada da comuni- entre o homem e a técnica”. Essa ação di-
cação mediada por computador (CMC). alógica pode estar inserida em um contexto
analógico-mecânico ou concernida em am-
biente eletrônico-digital. Neste caso, além
1 Interatividade e Inteligência
de interagir com a máquina, o homem pode
Coletiva: conceitos em aberto também interagir com o conteúdo, com a in-
No cenário da comunicação mediada por formação e com outro homem.
computador, a interatividade aparece como Já Primo restringe a interatividade à “inte-
uma das mais festejadas potencialidades. A ração mediada por computador”, definindo-
definição para o termo, no entanto, não é a como “uma ‘ação entre’ os participantes
consensual. Para Lévy, “a interatividade é do encontro”. Segundo ele, “nesse sentido,
muitas vezes invocada a torto e a direito, o foco volta-se para a relação estabelecida
como se todos soubessem perfeitamente do entre os integrantes e não para as partes que
que se trata” (1999, p. 79). Esse uso in- compõem o sistema global” (2004,p.38). O
discriminado tanto por parte de técnicos e autor propõe a existência de dois tipos de
pesquisadores quanto pelo público em geral interação mediada por computador: a in-
gera questionamentos e definições variadas. teração mútua, em que ocorre uma trans-
De acordo com o dicionário Houaiss de formação em ambos os pólos da comuni-
Língua Portuguesa2 , interatividade se refere cação, com constante negociação entre eles
à “capacidade de um sistema de comunica- e a interação reativa, onde há “previsibili-
ção ou equipamento de possibilitar intera- dade e automação nas trocas” (ibid, p.55). É
ção”, ou ao “ato ou faculdade de diálogo in- possível, ainda, segundo ele, se pensar em
tercambiável entre o usuário de um sistema e um processo de multiinteração, que ocorre
a máquina, mediante um terminal equipado quando, numa mesma situação comunicaci-
de tela de visualização”. Essas definições onal, o usuário se depara com interações mú-
trazem à tona dois aspectos comumente rela- tuas (conversas com outra pessoa num chat,
cionados ao termo: a troca intersubjetiva de por exemplo) e reativas (relacionamento com
informações e a mediação dessa troca pela a interface do software, mouse, teclado etc).
máquina. “Nesse sentido, em muitos casos, podem-
Nesse sentido, Lemos (1997) propõe uma se estabelecer, simultaneamente, interações
classificação das diversas formas de intera- tanto reativas quanto mútuas” (ibid, p.56).
ção que fazem parte do cotidiano. Ele se Partindo da idéia de que a interatividade
refere à troca de informações entre homem- se refere à “participação ativa do beneficiá-
homem definindo-a como interação social e rio de uma transação de informações”, Lévy
à troca entre homem-máquina, denominada analisa o termo a partir de uma outra pers-
pectiva, mais centrada na mídia, mas sem se
2
Houaiss: http://houaiss.uol.com.br deter exclusivamente na comunicação medi-

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ada por computador. Para ele, qualquer re- • a implicação da imagem dos participan-
ceptor “a menos que esteja morto, nunca é tes nas mensagens,
passivo” (1999, p. 79), uma vez que ele de-
• a telepresença (ibid, p.82).
codifica a mensagem que lhe é apresentada e
se posiciona em relação a ela. Desta forma, Ele ilustra sua idéia com diversos exem-
para ele, qualquer situação comunicacional plos e salienta que uma mesma mídia pode
implica em interação, em participação do re- apresentar diferentes graus de interatividade,
ceptor. dependendo do eixo escolhido para se proce-
Ainda assim, reforçando o fato de que de- der a análise.
finir e estudar a interatividade não pode ser A partir da explanação e das discussões
tarefa tão simples, Lévy defende que é pos- desses autores, que são apenas alguns dos
sível definir o tipo de interatividade a partir que tratam deste tema, é possível perceber
da relação entre receptor e mensagem, clas- que o termo interatividade, assim como as
sificando essa relação em: “mensagem li- suas implicações podem ser analisados tendo
near não-alterável em tempo real; interrup- em vista vários enfoques, várias perspecti-
ção e reorientação do fluxo informacional vas.
em tempo real e implicação do participante É em função dessa multiplicidade e das di-
na mensagem”. Ele propõe ainda uma classi- ficuldades de se formular um conceito único
ficação dos dispositivos de comunicação em: e válido em qualquer situação que Lèvy
“difusão unilateral; diálogo, reciprocidade chama a atenção para o fato de que “a intera-
e diálogos entre vários participantes” (ibid, tividade assinala muito mais um problema, a
p.83). necessidade de um novo trabalho de observa-
Ele apresenta também cinco eixos a par- ção, de concepção e de avaliação dos modos
tir dos quais é possível se analisar as si- de comunicação, do que uma característica
tuações ou dispositivos de comunicação e simples e unívoca atribuível a um sistema es-
compreendê-los no que concerne a seu grau pecífico” (1999, p.82).
de interatividade maior ou menor: Assim, para se fazer um estudo de um blog
informativo a partir do seu potencial intera-
• as possibilidades de apropriação e de tivo é necessário, antes, se fazer um recorte
personalização da mensagem recebida, nesse conceito amplo. Para esta análise, es-
seja qual for a natureza dessa mensa- pecificamente, parece ser viável a utilização
gem, do eixo que Lèvy chama de “reciprocidade
da comunicação”. Essa reciprocidade é uma
• a reciprocidade da comunicação (a
das marcas dos blogs, que se mostram como
saber, um dispositivo comunicacional ambientes propícios para a troca de informa-
‘um-um’ ou ‘um-todos’), ções, para o diálogo e para a construção co-
• a virtualidade, que enfatiza aqui o cál- letiva da notícia.
culo da mensagem em tempo real em Essa conjuntura de troca e de colaboração
função de um modelo e de dados de en- para a construção da informação é uma das
trada, bases para o que Lévy chama de inteligên-
cia coletiva. “Uma inteligência distribuída

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por toda a parte, incessantemente valorizada, berespaço e da economia do conhecimento.


coordenada em tempo real, que resulta em Esse período, também chamado de noolítico
uma mobilização efetiva das competências” ou de noosfera, não existe propriamente, mas
(2003, p.28). está em pleno processo de construção e en-
O conceito de inteligência coletiva remete contra suas bases na inteligência coletiva.
à idéia de um princípio em que as inteligên- Esta inteligência se assenta sobre dois
cias individuais são somadas e compartilha- conceitos fundamentais: cooperação e com-
das por toda a sociedade. Esse compartilha- petição. O aspecto cooperativo se refere ao
mento é possibilitado pela interconexão das vínculo social proporcionado pela dinâmica
inteligências individuais que, por sua vez, é criada pelos participantes dos eventos comu-
potencializada pelo advento das novas tec- nicativos que têm lugar no ciberespaço. Uma
nologias de comunicação, como a Internet. dinâmica orientada pela horizontalidade das
O ciberespaço seria, portanto, não mais que relações e pela sinergia das colaborações in-
“o indispensável desvio técnico para atingir a dividuais. Já o aspecto competitivo se refere
inteligência coletiva” (LÈVY, 1999, p.130). ao constante debate de idéias contraditórias
Para chegar à proposta de uma inteligência ou divergentes que surgem nesse ambiente.
coletiva, Lèvy (2003) parte de um viés evo- Sob essa ótica, é possível se pensar os
lucionista e apresenta quatro diferentes fases blogs informativos como ambientes interati-
por que a humanidade passou ou vem pas- vos de cooperação e competição, em que a
sando, chamando a atenção para o fato de informação jornalística é construída coleti-
que o surgimento de um novo período não vamente e permanentemente alterada e am-
exclui os anteriores, mas convive com eles e pliada tanto pelo jornalista quanto pelos lei-
os complementa. tores/usuários, através dos conflitos que sur-
Num primeiro momento, que ele chama gem ao longo do processo.
de espaço nômade da terra, a identidade se
constrói a partir de totens e linhagens e a co-
2 Jornalismo Interativo e
municação se dá através de ritos e mitos. Em
seguida, no que ele chama de espaço do ter- Coletivo
ritório, surgem a escrita, a geometria e a car- Por se tratar de ferramentas comunicacio-
tografia e as identidades passam a se consti- nais simples, baratas e de fácil utilização3 ,
tuir a partir da inscrição territorial. Um ter-
3
ceiro momento, chamado de espaço das mer- A principal atração dos blogs é a facilidade para
se criar e manter uma página. O blogueiro não pre-
cadorias é marcado pela construção da iden- cisa conhecer e entender linguagens de programação
tidade a partir do lugar na produção e no con- (HTML). Ele tem a sua disposição templates (mode-
sumo, enquanto que a sociedade se organiza los) prontos que devem ser seguidos. Esses modelos
em torno da economia, dos bens materiais e facilitam todo o processo de criação e manutenção,
da estatística. que passa a ser, então, realizada de uma forma intui-
tiva e visual, sem a necessidade de complicados có-
Por fim, no chamado espaço do saber, a digos. No Brasil, alguns servidores disponibilizam
identidade se baseia em competências, na co- essas ferramentas, como Blogger, Weblogger, Blig,
operação e na hibridização contínua ao passo dentre outros.
que a sociedade converge em torno do ci-

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os blogs vêm se multiplicando na rede, as- Lewinsky, por Matt Drudge5 , em janeiro de
sim como vêm se multiplicando, também, as 1998. Na época, o blog foi chamado, pejo-
formas de utilização e os objetivos deste tipo rativamente, de “panfleto digital” e suscitou
de páginas. O que nasceu como um “querido uma discussão até hoje acirrada acerca da va-
diário” virtual ou como uma espécie de guia lidade de se considerar os blogs como veícu-
de navegação4 ganha nova roupagem e co- los jornalísticos (RECUERO, 2003).
meça a despontar como uma nova tendência Discussão esta que ganhou novo fôlego
jornalística. Além de divulgar informações em 2003, no episódio da invasão do Ira-
e desabafos do autor, alguns blogs assumem que pelo exército americano. Com informa-
um caráter informativo e tratam de política, ções censuradas tanto pelo governo do Ira-
economia, esporte, além, é claro, de trazer que quanto pelo exército americano, surge o
as considerações, críticas e opiniões do au- blog de Salam Pax6 , um suposto iraquiano
tor sobre esses assuntos. Debates, divergên- que descrevia tudo o que via, ouvia ou pre-
cias de opiniões, interpretações variadas têm, senciava durante a invasão a Bagdá. O “blo-
nesse meio, espaço garantido. gueiro de Bagdá”, como ficou conhecido,
Como toda novidade, os blogs estão longe acabou se transformando em fonte de infor-
de serem unanimidade no meio acadêmico mações sobre o desenvolvimento da guerra.
e jornalístico. Por se tratar de um veículo Durante o conflito, outros blogs surgiram,
ainda novo e em pleno processo de constru- tanto de jornalistas que faziam a cobertura da
ção, eles ainda são encarados com ressalvas guerra, quanto de pessoas comuns narrando
tanto por jornalistas quanto por pesquisado- suas experiências (RECUERO, 2003).
res da área de comunicação. A discussão acerca da validade dos blogs
A principal polêmica surge com o pri- como veículos jornalísticos se justifica, afi-
meiro grande furo dado por um blog: a divul- nal, eles tocam em pontos cruciais e delica-
gação do caso entre o então presidente norte- dos do jornalismo, como a objetividade e a
americano Bill Clinton e a estagiária Mônica neutralidade.
4
Silva ressalta que “aquilo que é veiculado
As primeiras páginas desse tipo surgiram em me-
ados da década de 1990 e se apresentaram como uma em um blog não tem a pretensão de ser uma
espécie de guia para os usuários. Através de links informação ‘neutra’. Ao contrário, existe o
para outras páginas, o editor do blog conduzia o lei- pressuposto claro de que alguém escreve e
tor no emaranhado de sites que se acumulavam de- que a informação corresponde ao relato, à
sordenadamente na web. Esses links normalmente vi-
opinião deste alguém sobre o evento” (2003).
nham acompanhados de um texto explicativo ou crí-
tico. Com o desenvolvimento de ferramentas de bus- Não se trata de dizer que a expressão de
cas mais eficazes, eles perderam sua função de orga- opinião seja algo novo na mídia e que textos
nização dos conteúdos espalhados pela web. Ganhou opinativos não façam parte da imprensa con-
mais espaço, então, uma versão que já existia, mas vencional. Ao contrário, as opiniões, explí-
passou a se destacar: a versão eletrônica do “querido
citas ou não, sempre tiveram espaço no jor-
diário”. Nesse contexto, os blogs se tornam espaço
para o registro de confissões e divagações pessoais 5
Blog de Matt Drudge:
dos seus editores. Esse viés sempre esteve presente http://www.drudgereport.com
nos blogs, mesmo naqueles que se propunham a guiar 6
Blog de Salam Pax:
os internautas na busca de informações na internet. http://www.dearraed.blogspot.com

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nalismo em todas as suas formas. Mas, no na neutralidade, como já foi comentado ante-
ambiente digital, mais especificamente nos riormente, é outro aspecto considerado rele-
blogs, vante no jornalismo e que se rompe no blog.
O fato é que os blogs são uma realidade
vemos o fenômeno mais caracterizado, que vem mexendo com as estruturas da mí-
onde se fomentam discussões e deba- dia convencional. Algumas empresas jorna-
tes através da análise e opinião nos tex- lísticas já percebem essa situação e inves-
tos. Estes debates traduzidos sob forma tem nessa nova forma de comunicação. Os
de opiniões e discussões são estimula- principais sites noticiosos brasileiros como
dos através dos sistemas de comentários, O Globo8 , O Estado de São Paulo9 , Último
dentro dos quais os leitores podem in- Segundo10 e Folha de São Paulo11 , por exem-
teragir com a publicação e com o autor. plo, criam blogs para seus colunistas e man-
(SILVA, 2003, p. 8). tém uma comunicação paralela com seu pú-
blico através deles, inclusive utilizando cha-
Na blogosfera7 , a relação entre o jornalista madas nas suas páginas principais para tex-
e o leitor é radicalmente diferente daquela tos desses blogs. Enquanto isso, nos Estados
estabelecida entre eles na mídia convencio- Unidos, o jornal The New York Times12 , por
nal, já que existe uma troca constante de da- exemplo, proibiu seus jornalistas de mante-
dos, uma produção e compartilhamento de rem este tipo de página pessoal.
sentidos através da relação entre os sujeitos A discussão é pertinente e deve se alongar
envolvidos e não a transmissão de informa- por muito tempo ainda antes que se chegue a
ções pura e simples. Essa troca também está um consenso. Mas, a realidade é que muitos
presente em outras mídias através das seções jornalistas estão virando blogueiros e muitos
de cartas de leitores, por exemplo. Mas, nos blogueiros estão desempenhando o papel de
blogs essa participação é ampliada e a rela- jornalistas.
ção que se estabelece é mais próxima e hori-
zontal.
Partindo do pressuposto de que o jorna- 3 Blog do Noblat: um exemplo
lismo se assenta sobre a publicação periódica de jornalismo interativo e
de informações de interesse da coletividade coletivo
através de meios de comunicação massiva,
pode-se dizer que os blogs constituem, de Ricardo Noblat é um desses jornalistas
fato, uma forma de jornalismo. Em contra- que viraram blogueiros. Depois de passar
partida, alguns pressupostos do jornalismo por importantes veículos impressos do país,
estão ausentes dessa prática, como a trans- como as revistas Veja e Istoé, Jornal do Bra-
missão de informações, que nos blogs não 8
Jornal O Globo: http://oglobo.globo.com
são meramente fornecidas, mas construídas 9
O Estado de São Paulo:
coletivamente por jornalista/blogueiro e lei- http://www.estadao.com.br
10
tores/visitantes. A ênfase na objetividade e Último Segundo: http://ultimosegundo.ig.com.br
11
Folha de São Paulo: http://www.folha.uol.com.br
7 12
Blogosfera: neologismo que se refere ao mundo The New York Times: http://www.nytimes.com
dos blogs.

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sil e Correio Brasiliense, ele “migrou” para estatização da exploração de petróleo pelo
a web. O Blog do Noblat13 está no ar desde governo da Bolívia, o tom dos textos, bem
março de 2004, fazendo a cobertura dos bas- como dos comentários é mais sério. Sobre
tidores da política brasileira. esse assunto, os debates são mais acirrados
A web-estréia do jornalista acontece em entre os leitores simpatizantes do Partido dos
função de uma coluna semanal mantida no Trabalhadores e os que rechaçam o governo
jornal O Dia. Como suas notas não se sus- federal.
tentavam até o final da semana, surgiu a idéia A possibilidade oferecida aos leitores para
de criar um blog para poder atualizar os tex- que eles deixem suas impressões faz com
tos mais freqüentemente. Assim, ele poderia que o espaço dos comentários seja conver-
aproveitar a possibilidade de realizar atuali- tido em uma espécie de palanque político.
zações contínuas em seus textos. Idéias divergentes se encontram e os con-
Mesmo com o fim da coluna, o blog se flitos aparecem. Essa troca de informações
manteve e passou a servir de referência na e esses debates sobre temas polêmicos são
discussão de assuntos ligados à política na- exemplos claros daquilo que Primo (2004)
cional. Em tempos de corrida presidencial chama de interação mútua, em que ocorrem
o acesso à página aumenta e, conseqüente- constantes negociações. Essa realidade re-
mente, o número de posts e de comentários mete, também, à idéia de Lèvy de que a in-
também. teratividade se refere á participação ativa da-
Entre os dias 30 de abril e 06 de maio fo- quele que recebe a informação e ao diálogo
ram disponibilizados 281 posts, entre textos entre vários participantes ou, ainda, à reci-
e imagens, numa média de 40 blocos de in- procidade da comunicação.
formações por dia. O número de acessos não Esse ambiente de troca e compartilha-
é disponibilizado na página, mas os comen- mento de sentidos pode ser entendido como
tários giraram em torno dos 1.820 por dia, aquele que Lèvy considera adequado para a
totalizando 12.759 comentários ao longo da construção da inteligência coletiva, que su-
semana. pera a mera somatória de saberes individuais
Dois assuntos ganharam destaque du- e emerge como uma nova forma de lidar com
rante esse período: a greve de fome do o conhecimento e com a informação.
pré-candidato à presidência da República,
Anthony Garotinho e a crise do gás combus-
4 Conclusão
tível deflagrada pelo anúncio da estatização
da exploração do petróleo feita pelo governo Polêmica e mutante, a Internet se mostra um
boliviano. campo fértil para o surgimento de novas for-
Quanto ao primeiro assunto, a greve de mas de comunicação e, conseqüentemente,
fome de Anthony Garotinho, tantos os tex- para novas discussões acerca das mesmas.
tos do jornalista quanto os comentários são Situações novas pedem conceitos novos e é
fortemente marcados pela ironia. Já em re- exatamente isso que vem acontecendo em
lação ao segundo tema, a crise em torno da torno da “grande rede”.
13
Conceitos como cibercultura, ciberespaço,
Blog do Noblat: http://noblat1.estadao.com.br
interatividade, inteligência coletiva, webjor-

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nalismo dentre tantos outros nascem, se peito da validade desse jornalismo feito em
transformam, ganham destaque no meio aca- blogs, o fato é que a utilização desse tipo
dêmico e fora dele. Conceitos estes que nem de recurso é cada vez maior e vem se mos-
sempre encontram uma definição clara e pre- trando eficaz não para a mera transmissão de
cisa. Do mesmo modo, novos veículos de in- informações, mas para o estabelecimento de
formação surgem, como os blogs, por exem- debates e diálogos e para a promoção de uma
plo, e trazem consigo o embrião de mais e participação mais efetiva do público na cons-
mais discussões acadêmicas ou não. trução da informação.
Analisar um dispositivo comunicacional Não se trata, de forma alguma, de di-
novo sob a ótica de conceitos igualmente no- zer que essa nova forma de jornalismo que
vos não é tarefa fácil, mas, com certeza, é emerge com o surgimento dos blogs vá subs-
algo instigante e desafiador. Essa, contudo, tituir o jornalismo convencional. No entanto,
é uma área movediça em que as certezas se não se pode simplesmente fechar os olhos
perdem facilmente e sempre há coisas novas, a essa realidade. Os blogs estão aí, infor-
olhares novos, problemas novos surgindo. mando, promovendo a construção e o de-
Assim, o presente trabalho não tem, nem bate de idéias e de informações. Em parce-
poderia ter, a intenção de apresentar uma ria com a mídia convencional, eles surgem
idéia conclusiva e definitiva sobre os blogs como uma forma de comunicação comple-
informativos como ambientes interativos de mentar, que aproxima jornalista e leitores,
construção coletiva da inteligência. Mas, a veículo e público.
partir da análise desses conceitos e do que
vem sendo postulado por autores que tra-
tam desses temas, é possível se tirar algumas
conclusões provisórias a esse respeito.
Não é difícil perceber que a postura do su-
jeito inserido nesse contexto muda sensivel-
mente. Ele já não recebe passivamente as
informações, mas precisa acessá-las, buscá-
las. E, ele também não apenas absorve as in-
formações, mas também ajuda a construí-las,
fornecendo uma resposta ao emissor, agora
convertido em seu interlocutor.
Nesse contexto, mudam os papéis do jor-
nalista e do leitor. A dissolução dos pólos
emissor-receptor, o deslocamento do papel
do jornalista que passa de emissor para co-
autor e o caráter fluido, inconstante e per-
manentemente em construção da informação
são algumas das características das peculia-
ridades da informação veiculada na Rede.
Embora haja um questionamento a res-

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