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ARTIGO

GÊNERO DOCUMENTAL
NA ARQUIVÍSTICA:
REVISITANDO O
CONCEITO

Vanderlei Batista dos Santos


Arquivista. Doutor em Ciência da Informação.
re vista d o arquivo público d o e stad o d o e spírito santo artigo vanderlei batista d os santos gênero d o cumental …

Resumo Abstract selho Internacional de Arquivos e o Conselho Nacio- 2. A visão difundida pelo CONARQ:
nal de Arquivos promovem, realizam e difundem Dicionário Brasileiro de Terminologia
A terminologia de uma área do conhecimento é um cons- The terminology of an area of ​​knowledge is a theoretical estudos de importância capital para a área. Todavia, Arquivística
tructo teórico e técnico que visa a facilitar a comunicação and technical construct that aims to facilitate communi- por serem, geralmente, elaborados por grupos de
entre os pares e desses com as demais disciplinas. Seu es- cation between peers and those with the other disciplines. trabalhos, câmaras, comissões e comitês de compo- Segundo o Dicionário Brasileiro de Terminologia Ar-
tado de evolução e uso tem relação direta com o estágio Its state of evolution and use is directly related to the stage sição técnica as mais variadas e por, ao menos no que quivística - Dibrate (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.99),
de desenvolvimento e estratificação do conhecimento da of development and stratification of the knowledge of the nos permite observar, serem finalizados sem uma gênero é a “reunião de espécies documentais que
disciplina. No Brasil, talvez pela Arquivística ser uma dis- same discipline. In Brazil, perhaps because of Archivistics necessária comparação com estudos anteriores des- se assemelham por seus caracteres essenciais, par-
ciplina com poucos controles institucionais, seja por parte being a discipline with few institutional controls, either on sas mesmas instituições, não raramente apresentam ticularmente o suporte e o formato, e que exigem
das universidades, das associações profissionais ou das ins- the part of the university, professional associations or ar- incoerência entre várias de suas publicações técnicas processamento técnico específico e, por vezes, me-
tituições arquivísticas, essa terminologia tem apresentado chival institutions, this terminology has presented many oficiais, confundindo o público que se vale desses es- diação técnica para acesso”. Por outro lado, espécie
muitas incongruências. Para ilustrar essa situação e propor inconsistencies. To illustrate this situation and propose tudos para fundamentar seus projetos de pesquisa documental é a “divisão de gênero documental que
formas de confrontar esse problema utiliza-se como estu- ways of confronting this problem, the term “gênero do- ou elaboração de normas. reúne tipos documentais por seu formato. São exem-
do de caso o termo “gênero documental”. Conclui-se que é cumental” was chosen as case study. It is concluded that Tal fato fica evidente quando se observa que, plos de espécies documentais ata, carta, decreto,
imprescindível a existência de uma instituição que ofereça it is essential to have an institution that offers technical por exemplo, a Câmara Técnica de Documentos Ele- disco, filme, folheto, fotografia, memorando, ofício,
suporte técnico para as atualizações terminológicas, a fim support for terminological updates in order to reduce the trônicos (CTDE), do Conselho Nacional de Arquivos planta, relatório” (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.85).
de reduzir as distinções na definição de termos arquivísticos distinctions in the definition of archival terms in reference (CONARQ), tem discordado em seus textos técnicos Ao compilar citações de Bellotto (2004), Ar-
em publicações de referência. A adoção de tal medida, cer- publications. The adoption of such a rule will certainly con- da classificação de “documentação eletrônica” como quivo Nacional (2005) e Bernardes (1998), se obtém
tamente, contribuirá para o fortalecimento da terminolo- tribute to the strengthening of terminology as a respecta- “gênero documental”, entendimento registrado no um número muito maior de exemplos de espécies
gia como linguagem técnica respeitável. Entende-se que, no ble technical language. It is understood that, in Brazil, this Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística, documentais, incluindo: ata, carta, certificado, con-
Brasil, essa competência poderia ser exercida pelo Conselho competence could be exercised by the National Archives aprovado no âmbito do CONARQ. ta, convite, despacho, edital, exposição de motivos,
Nacional de Arquivo por meio, por exemplo, de uma Câma- Council through, for example, a Technical Chamber of Ar- O conceito de “gênero documental”, embora memorando, mensagem, ofício, ordem de serviço,
ra Técnica de Terminologia Arquivística. chival Terminology. fartamente presente na literatura nacional, está re- portaria, prestação de contas, processo, protocolo,
pleto de vácuos conceituais e/ou algumas incongru- relatório e translado. A ausência de disco e filme não
ências mais facilmente identificáveis, como confun- causa estranheza, sendo lugar comum na literatura
dir espécie documental com suporte de registro de da área, uma vez que remetem mais a suporte que a
informação. documento. Mesmo na compilação apresentada por
No papel de um pesquisador interessado na Sousa (2007, p.155-157), em que são relacionadas 138
afirmação da Arquivística como disciplina, entendo espécies documentais, essas duas “espécies” não es-
que aspectos tão difundidos da teoria precisam pas- tão elencadas.
sar por uma análise mais detida, preferencialmente, O Dibrate apresenta os seguintes termos e defi-
1. Introdução adequado ou respaldada pelos pares de forma mais oriunda de visões distintas, mas sempre sob critérios nições para tipos de gêneros documentais, aos quais,
crítica. A depender dos autores e dos órgãos que as técnicos. Tais estudos, como este ora apresentado, neste estudo, foram agregadas definições de outros
Já há algum tempo estudos acadêmicos da área tem produziram ocorre uma naturalização das propostas não visam se sobrepor a manifestações discordantes autores e obras:
registrado que a teoria Arquivística carece de matu- sem os debates necessários. Isso ocorreu, por exem- ou propostas revisoras provenientes dos demais pes-
ridade científica, tanto nacional quanto internacio- plo, com os termos arquivologia e arquivística, clas- quisadores da área, mas, ao promover a existência de • documento textual: “gênero documental inte-
nalmente. Dentre outros aspectos que podem ser sificação e arranjo, plano de classificação e código uma visão teórica e técnica coerente defendida por grado por documentos manuscritos, datilografa-
arrolados, podem-se identificar os estudos apresen- de classificação, princípios arquivísticos e o entendi- um órgão gestor nacional, fortalecer a Arquivística dos ou impressos, como atas de reunião, cartas,
tando novas perspectivas da área e as definições re- mento sobre quais são as características documen- lhe dando maior credibilidade frente às outras áreas decretos, livros de registro, panfletos e relatórios”
vistas, atualizadas e difundidas que tem colaborado tais arquivísticas. do conhecimento. (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.79). Paes (2004, p.29)
para a evolução da área. Todavia, muito dessa produ- Instituições normatizadoras e definidoras de também denomina este gênero de “escrito”. Outros
ção teórica tem sido feita sem um aprofundamento tendências de pesquisa em arquivística como o Con- exemplos: memorando, ofícios, circulares; o enfo-

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que classificatório são os signos (linguagem escrita) integrado por impressos, como livros, folhetos e trar imagens e sons, não uma espécie documental. pôsteres ou destinadas a projeções como os diapo-
utilizados para representar as informações. periódicos” (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.73). É uma sitivos (slides), as radiografias e as transparências.
classificação com base no formato2 do documento, • documento micrográfico: “gênero documental
• documento iconográfico: “gênero documental observa-se que neste tipo de documento os signos integrado por documentos em microforma, como A pertinência do gênero bibliográfico é compro-
integrado por documentos que contêm imagens fi- poderiam ser textuais, iconográficos e/ou carto- cartões-janela, microfilmes e tab-jacks” (ARQUIVO metida pela existência dos gêneros textual e icono-
xas, impressas, desenhadas ou fotografadas, como gráficos. NACIONAL, 2005, p.77), jaquetas; classificação com gráfico. Afinal, livros, folhetos e periódicos são com-
fotografias e gravuras” (ARQUIVO NACIONAL, 2005, foco no formato do documento e na tecnologia uti- postos de textos e imagens. Na proposta apresentada
p.76); para Paes (2004, p.29), seu principal conteúdo • documento eletrônico: “gênero documental lizada para dar acesso às informações registradas, pelo Arquivo Nacional, mesmo se ampliarmos a visão
são imagens estáticas; pôsteres, cartazes, diaposi- integrado por documentos em meio eletrônico ou não nos signos utilizados para representar as infor- do gênero bibliográfico para contemplar os audio-
tivos; a classificação está enviesada pela identifica- somente acessíveis por equipamentos eletrônicos, mações registradas; como se sabe, microfilmes po- books ou periódicos eletrônicos atuais, ainda assim,
ção dos signos (imagens fixas) utilizados para repre- como cartões perfurados, disquetes e documentos dem ser utilizados para registrar textos imagens e, não necessitaríamos desse gênero, pois poderia ser
sentar as informações. digitais” (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.75). Para Paes até, sons. Camargo e Bellotto (1996, p.28) não iden- utilizado o relativo aos documentos eletrônicos3.
(2004, p.29), o gênero informático contempla os tificam a documentação micrográfica como gênero. A análise dos gêneros audiovisual e filmográ-
• documento cartográfico: “gênero documental “documentos produzidos, tratados ou armazenados fico já não é tão simples. A diferença substancial é
integrado por documentos que contêm represen- em computador (disquete, disco rígido, disco ótico)”; Ao analisar as definições propostas no Dicioná- que no audiovisual os documentos possuem som e
tações gráficas da superfície terrestre ou de corpos para Camargo e Bellotto (1996, p.27), os documentos rio Brasileiro de Terminologia Arquivística (ARQUIVO imagem (fixa ou em movimento), já no filmográfico
celestes e desenhos técnicos, como mapas, plantas, eletrônicos são apenas um conjunto de documentos NACIONAL, 2005), expostas anteriormente, se utiliza as imagens (sempre em movimento) podem ou não
perfis e fotografias aéreas” (ARQUIVO NACIONAL, “cujo conteúdo, registrado em suportes especiais, é como requisito primordial para a aceitação de cada estar acompanhadas por som. Segundo o Dicionário
2005, p.74). Possuem formatos e dimensões variá- acessível apenas por computador”. Pelo conceito um dos agrupamentos a objetividade no escopo de Michaelis, audiovisual congrega, necessariamente,
veis, contendo representações geográficas, arqui- de gênero documental (ARQUIVO NACIONAL, 2005, seu uso, ou seja, a impossibilidade de que um mes- som e imagem. Isso pode ser facilmente observado
tetônicas ou de engenharia (PAES, 2004, p.29); nova- p.99), os exemplos apresentados nesta definição – mo documento possa ser identificado em mais de nas acepções 1 e 2 presentes naquele Dicionário:
mente, a classificação tem como viés a identificação disquetes e documentos digitais – seriam espécies um agrupamento.
dos signos (imagens fixas, como o iconográfico) documentais, o que certamente é um equívoco. Assim, nossas considerações se iniciam pela re- Audiovisual:
utilizados para representar as informações, desta lação entre “documentos iconográficos” e “documen-
feita, uma especificidade de linguagem para mapas • documento filmográfico (ou cinematográfico): tos cartográficos”. Camargo e Bellotto (1996, p.27), 1. Diz-se de qualquer material, comunicação, men-
e plantas. “gênero documental integrado por documentos que numa visão com que concordamos, identificam os sagem, recurso, método etc. que busca estimular,
contêm imagens em movimento, com ou sem som, documentos “cartográficos” como uma especificida- simultaneamente, a audição e a visão.
• documento audiovisual: “gênero documental como filmes e fitas videomagnéticas” (ARQUIVO NA- de da “documentação iconográfica”. Parece-nos uma
integrado por documentos que contêm imagens, CIONAL, 2005, p.76); Camargo e Bellotto (1996, p.27) análise pertinente, visto que se tratam de imagens 2. Diz-se de qualquer meio de comunicação que se
fixas ou em movimento, e registros sonoros, como não relacionam esse conjunto de documentos como de superfícies e estruturas. Desta forma, conside- vale do som e da imagem na transmissão da men-
filmes e fitas videomagnéticas” (ARQUIVO NACIONAL, gênero; de qualquer forma, o foco está no formato ramos “documentos cartográficos” uma categoria sagem4.
2005, p.73). Paes (2004, p.29) não relaciona “audio- final do documento, qual seja, não é um documen- desnecessária ou, no mínimo, subordinada a “ico-
visual” entre os gêneros documentais; desta feita, to audiovisual qualquer (nesta definição, inclusive, nográfico”. Ao definir documentos iconográficos em
a classificação usa como base a identificação dos pode não possuir som, e a imagem tem que ser em um estudo sobre a documentação audiovisual, Lima Por este entendimento, o gênero audiovisual
signos (imagens e sons conjugados) utilizados para movimento), mas um filme. Observa-se, adicional- (SILVA; PALETTA, 2016, p.92) enumera uma grande va- não poderia contemplar os documentos exclusiva-
representar as informações. mente, que fita videomagnética é um termo melhor riedade deles, corroborando essas conclusões: mente sonoros ou imagéticos. Assim, primeiro fica
aplicado a um tipo de suporte onde se pode regis- evidente a necessidade de uma categoria para incluir
• documento bibliográfico1: “gênero documental Os documentos iconográficos são constituídos por os documentos sonoros. Embora esse agrupamento
imagens fixas, as quais podem ser em duas dimen-
Sinar, o que, por aplicação acaba sendo um tipo de terminologia oficial
do país. sões, opacas, como as fotografias, gravuras, dese- 3 Esse “gênero” será retomado adiante e discutido com mais profun-
1 É bastante incomum na literatura técnica a inserção de “bibliográfi-
co” como gênero documental, mas como já mencionado antes, o Dibra- 2 Formato: conjunto das características físicas de apresentação, das nhos, desenhos técnicos (projetos de arquitetura/ didade.
te é a terminologia arquivística recomendada pelo Conarq (Resolução técnicas de registro e da estrutura da informação e conteúdo de um do- engenharia), pinturas, caricaturas, cartões postais e 4 Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/
nº 23/2006) aos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Arquivos - cumento (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.94). busca/portugues-brasileiro/audiovisual/ Acesso em: 28 out. 2017.

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conste do Dibrate5 (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.79) magnética “que contém imagens com ou sem regis- sar o conteúdo do documento digital sem interme- audio-visual, cartographic, cartographiques, cinémato-
sem a qualificação de gênero, Paes (2004, p.29) assim tros sonoros”. Assim, está claro que seu conteúdo é o diação de uma máquina, uma vez realizada a tra- graphiques, fílmicos, iconografici, iconographiques são
o considera, definindo-o como o gênero composto que foi utilizado para caracterizá-la como do gênero dução dos signos, a informação é obtida na forma utilizados apenas acompanhados de “conjunto de
por documentos “com dimensões e rotações variá- filmográfico. de texto, imagem, som ou na mistura de todas elas. documentos” não sendo comum tentativas de uso de
veis, contendo registros fonográficos (discos e fita A Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos Essa interpretação vai ao encontro daquela usada no um único termo6 para qualificá-los, como a palavra
audiomagnéticas)”. (CTDE) distingue documento digital e documento Dibrate para incluir fitas videomagnéticas no gênero “gênero” usada no Brasil. Esse entendimento pare-
Em segundo lugar, apenas os registros de ima- eletrônico, sendo o primeiro uma especificidade do audiovisual, ou seja, é o conteúdo que prevalece. ce ratificado pelo Dibrate que, após definir “gênero
gens em movimento sem som constituiriam o gêne- segundo. De acordo com o Glossário - Documentos Fica evidente no Dibrate, portanto, que não há documental”, não apresenta os termos relativos em
ro “filmográfico”, todo o restante seria classificado Arquivísticos Digitais (2014, p.19) da CTDE: um entendimento harmônico sobre o viés predo- outras línguas (Fig. 1), como ocorre em tantos outros
em “audiovisual”, pois ambos os gêneros têm como minante na identificação de um documento como verbetes da publicação.
intersecção os filmes que possuem som e imagem. Documento Digital: pertencente ou não a um gênero específico. Por ou-
Não se identifica nenhuma justificativa adicional tro lado, a que gêneros pertenceriam os livros ele-
para a existência do gênero filmográfico. Informação registrada, codificada em dígitos biná- trônicos (e-books), já mencionados, ou os filmes que,
Quanto ao gênero micrográfico, senão pelas di- rios, acessível e interpretável por meio de sistema atualmente, são produzidos diretamente em forma
mensões do registro da mensagem na microforma, computacional. digital? Ou ainda, os sites institucionais com textos,
os documentos que podem ser micrografados são áudios, vídeos e outros recursos tecnológicos?
textos, imagens e, até, som, na atualidade. São, por- [...] Em se aceitando a definição e os tipos de gê-
tanto, limitando-se às categorias listadas pelo Dibra- nero do Dibrate (ARQUIVO NACIONAL, 2005), seria ne-
te, do gênero textual ou iconográfico. Entendemos, Documento Eletrônico: cessário ter claro qual característica do documento Fig. 1. Gênero documental (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.99).
por se tratar de uma replicação, que não deve existir se sobrepõe às demais na hora de classificá-lo quan-
um “gênero micrográfico”. Informação registrada, codificada em forma analó- to ao seu gênero. Por exemplo: seria correto afirmar Entende-se que agrupar objetos segundo a
Finalmente, o “gênero eletrônico” talvez seja o gica ou em dígitos binários, acessível e interpretável que um ofício é, em princípio, um documento do gê- presença ou ausência de uma característica é um
que mereça uma análise mais detalhada. De início por meio de um equipamento eletrônico. nero textual, mas se estiver microfilmado passa a ser processo de classificação. Nas palavras de Liard (1979
cabe registrar que os exemplos mencionados (car- do gênero micrográfico e, se estiver em um computa- apud SOUSA, 2002, p.9), classificação pode ser defi-
tões perfurados, disquetes e documentos digitais) na As discussões sobre a existência de um gênero dor, é do gênero eletrônico? Além disso, relacionar as nida “como a distribuição de indivíduos em grupos
definição do Dibrate (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.75) eletrônico demandam a análise do documento digi- definições de gênero e de espécie documental mais distintos, de acordo com caracteres comuns e carac-
se referem a mídias e documentos que têm o com- tal, aquele que tem relação direta com os sistemas confunde que esclarece. Por exemplo, no caso ante- teres diferenciadores”.
putador como máquina mediadora e não aos demais computacionais. O que, como já mencionado, corres- rior, a espécie ofício pertence a que gênero? Neste sentido, é necessário o
documentos eletrônicos, como fitas videomagnéti- ponde aos exemplos citados na definição constante
cas (acessíveis por aparelho de videocassete) e fitas do Dibrate: cartões perfurados, disquetes e docu- estabelecimento de princípios de classificação para
audiomagnéticas (acessíveis por aparelhos toca-fitas mentos digitais. As informações são registradas nos 3. Ampliando a discussão as divisões de um conjunto (de ideias ou de objetos).
ou gravadores). documentos digitais na forma de bits. Uma vez que Podem ser utilizados quantos princípios de classifi-
Pode-se supor que isso se deve ao fato de fitas 0 (zero) e 1 (um), que constituem o bit, podem ser re- O gênero documental é uma criação brasileira que cação forem necessários. Entretanto, deve-se usar
videomagnéticas já estarem listadas no gênero fil- presentados fisicamente por opacidade ou transluci- propõe o agrupamento de espécies documentais um de cada vez. [...] Não se deve misturar em um
mográfico. Ainda assim, cumpre registrar que fita dez num disco ótico ou, ainda, pela positividade ou (ARQUIVO NACIONAL, 2005) / documentos (CAMARGO único nível unidades baseadas em princípios dife-
videomagnética não é um documento, mas a deno- negatividade dos registros em mídias magnéticas, o E BELLOTTO, 1996) de acordo com algumas caracte- rentes, pois, dessa forma, abriria-se a possibilidade
minação do suporte de armazenamento. Conforme documento digital é uma imagem, um caractere de rísticas. Essa afirmação baseia-se no fato de que, na
o próprio Arquivo Nacional (2005, p.92), é uma fita escrita ou um som? A codificação obtida pelo 0 e 1 é literatura estrangeira consultada, embora não seja
o que se denomina linguagem de máquina e exige a difícil encontrar termos que remetam a esses agru- 6 Em pesquisa na web identificou-se um único caso, no Glossário
da Society of American Archivists (Pearce-Moses, 2016), para uma das
utilização de um software para decodificá-la de for- pamentos de documentos (ou tipos de arquivo), não acepções de record type como uma classe de documentos arquivísticos
5 “Registro sonoro, como disco e fita audiomagnética”. Observo que ma a ficar acessível aos sentidos humanos. foi identificada uma definição tão rígida quando a definida por seu estilo, assunto, características físicas ou forma, cujos
esta definição apresenta uma confusão entre documento e suporte. A despeito do ser humano não conseguir aces- brasileira. Termos como audiovisual, audio-visuelles, exemplos incluem imagens em movimento, fotografias e história oral,
Um exemplo correto seria um discurso de autoridade. apresenta, portanto, viés distinto do brasileiro.

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de ter mais de um local para classificar o mesmo do- Entende-se que a discussão sobre os gêneros Gêneros Fonte Análise Considerações

cumento. Isso destrói os objetivos da classificação iconográfico, textual, audiovisual e, até, fonográfico, 1996 2005

(SOUSA, 2007, p.91). já foi contemplada, restando apenas analisar a perti- Iconográfico Sim Sim Sim -

nência do gênero “em multimeios”. Uma questão que Textual Sim Sim Sim -
Ao se deter na definição de gênero documental se sobressai de início é a não identificação da palavra Audiovisual Sim Sim Sim -
(ARQUIVO NACIONAL, 2005, p.99), reproduzida na Fig. em três dicionários consultados (Grande Dicionário Filmográfico - Sim Não Contemplado pelo gênero audiovisual, exceto os filmes sem som.
1, percebe-se que não há um viés exclusivo que orien- Houaiss, Michaelis - Dicionário Brasileiro de Língua Fonográfico Sim - Sim -
te a classificação de gênero, podendo ser: suporte, Portuguesa, Dicionário Online de Português). O ter- Em multimeios Sim - Sim Alterar o título para “multimídia”.
formato, processamento técnico e mediação para mo mais próximo encontrado foi multimídia, anali- Micrográfico - Sim Não Contemplada por iconográfico e textual.
acesso. sado a seguir. Eletrônico - Sim Não Contemplada por iconográfico, textual, audio-
Considerando-se a observação de Sousa (2009, Entre as várias acepções de multimídia apre- visual, filmográfico e fonográfico.
p.91), nos parece mais adequada, porque construída sentadas no Michaelis7, destacaram-se duas: Bibliográfico - Sim Não Contemplada por textual e iconográfico
no escopo de regras de classificação, a proposta de Cartográfico - Sim Não Contemplada por iconográfico.
Camargo e Bellotto (1996, p.41), para quem gênero a) enquanto substantivo:
Tabela 1. Gênero documental: 1996 x 2005.
documental corresponde à “configuração que as-
sume um documento de acordo com o sistema de Sistema que combina som, imagens estáticas e ani- senta o termo multimídia na acepção da informática constantes do Dicionário de Terminologia Arquivísti-
signos utilizado na comunicação de seu conteúdo”. madas, vídeo, interatividade e textos, com funções como sendo ca (Camargo e Bellotto, 1996) e do Dicionário Brasi-
Naquele estudo, elaborado há mais de duas décadas, educativas, entre outras. leiro de Terminologia Arquivística (Arquivo Nacional,
Camargo e Bellotto propunham a divisão dos gêne- técnica para apresentação de informações que re- 2005). Na coluna “Análise” há a indicação da concor-
ros documentais em cinco agrupamentos: b) enquanto adjetivo: corre simultaneamente a diversos meios de comu- dância ou não com a manutenção do termo como
nicação, mesclando texto, som, vibrações e movi- gênero documental, utilizando-se a coluna “conside-
• documentação iconográfica: “gênero documen- Diz-se de produção que, fixada em um meio digital, mentos mecânicos e imagens fixas e animadas. rações” para sintetizar a justificativa:
tal que utiliza como linguagem básica a imagem” reúne em um único suporte diferentes modalidades Sugere-se, portanto, que os gêneros documen-
(CAMARGO E BELLOTTO, 1996, p.28) de expressão criativa, como, por exemplo, desenho, Em resumo, aplicando-se aos gêneros docu- tais arquivísticos sejam: textual, iconográfico, audio-
som, animação, vídeo, texto, performance etc. mentais, entende-se que o termo se refere àqueles visual, fonográfico e multimídia. Os filmes sem som
• documentação textual: “gênero documental documentos que se utilizam simultaneamente de seriam uma honrosa exceção a serem considerados
que utiliza como linguagem básica a palavra escrita” O Dicionário Online de Português8 apresenta múltiplas linguagens para transmitir seu conteúdo. no âmbito do gênero audiovisual, evitando-se a cria-
(CAMARGO E BELLOTTO, 1996, p.28) uma definição muito parecida com a proposta de Ca- O exemplo mais simples deste tipo de documento ção de uma classe para contemplar apenas a ausên-
margo e Bellotto arquivístico é o site ou sítio de internet de uma ins- cia de som em um filme.
• documentação audiovisual: “gênero documen- tituição. Tal recurso institucional deve ser enten- Além disso, entende-se necessário um apro-
tal que utiliza como linguagem básica a associação Apresentação multimídia, aquela que utiliza ima- dido como um ente único, a soma das partes que o fundamento nas discussões sobre o que caracteriza,
do som e da imagem” (CAMARGO E BELLOTTO, 1996, gens, vídeo, animação, som ou uma combinação constituem, embora várias das partes possam ser exatamente, o “documento textual”. Os documentos
p.27) dessas mídias. entendidas, separadamente, como entes distintos, escritos em braile, em código morse ou em notação
dependendo do contexto de análise. Via de regra, é musical são textuais? O que dizer dos hieróglifos,
• documentação fonográfica: “gênero documen- Finalmente, o Grande Dicionário Houaiss9 apre- um documento complexo, formado por diversos do- cuja escrita possui vários elementos de natureza
tal que utiliza como linguagem básica o som” (CA- cumentos digitais relacionados. Assim, entende-se imagética?
MARGO E BELLOTTO, 1996, p.27) necessária a existência de tal gênero. O conceito de documento textual permite al-
7 Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/ A fim de sistematizar as análises realizadas até guns questionamentos. Segundo o Dicionário Micha-
busca/portugues-brasileiro/multim%C3%ADdia/ Acesso em: 17 nov.
• documentação em multimeios: “gênero docu- 2017. o momento elaborou-se a tabela acima. Na primeira elis, textual10 é relativo a texto. Um conceito pouco
mental que utiliza simultaneamente múltiplas lin- 8 Disponível em: https://www.dicio.com.br/multimidia/ Acesso em: coluna (gênero), estão listadas as denominações re-
guagens” (CAMARGO E BELLOTTO, 1996, p.28) 17 nov. 2017. gistradas na coluna “fontes”, utilizando-se “sim” ou
9 Disponível em: https://houaiss.uol.com.br/pub/apps/www/v3-3/ “-” nas colunas 1996 e 2005, para indicar os termos 10 Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/
html/index.php#3 Acesso em: 17 nov. 2017. busca/portugues-brasileiro/textual/ Acesso em: 28 out. 2017.

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esclarecedor. Já texto11 pode ser entendido em várias


acepções, das quais destacam-se:
Fig. 5. Gênero documental em braile15

1 Sequência de frases de um autor, em um docu-


mento, folheto, livro etc.;[...]. Entende-se que mesmo os documentos escritos
Fig. 7. Hieróglifos egípcios – logogramas (ou ideogramas)18
em hieróglifos16 (Fig. 6), com caracteres ideográficos
2 Conjunto de palavras citadas com o intuito de pro- ou simbólicos misturados a caracteres de som po-
var determinada ideia, doutrina ou tese. dem ser considerados textuais. Os valores fonéticos Para definir a que gênero arquivístico perten-
dos hieróglifos podem ser iguais a uma ou à combi- ce a partitura musical é necessário entender o que
Um documento textual12 seria, portanto, aque- nação de duas ou três consoantes, mas também po- é notação musical (Fig. 8). Segundo o Dicionário de
le composto por um conjunto de palavras, formando dem ser ideogramas (Fig. 7), ou seja, um único carac- Música (MELOTECA, 2018), “notação” é o “conjunto de
frases numa sequência definida por um autor. Não se tere representando uma palavra como casa, sol etc. sinais convencionais utilizados para representar gra-
fala de alfabeto, mas de palavras e frases. Nessa in- ficamente a duração, altura, ritmo e outros aspectos
terpretação, o código morse poderia ser usado para de uma obra musical”. De forma similar, o Dicionário
produzir documentos textuais. Michaelis define “notação musical”19 como a “repre-
sentação por meio de sinais, do tom e duração dos
sons, e marcação das suspensões e pausas”.

Fig. 3. Código braile13

Essa análise baseia-se no entendimento de que,


Fig. 2. Código Morse no final, a mensagem se resume a um texto a ser re-
gistrado e, posteriormente, lido pelos interessados.
Fig. 6. Hieróglifos egípcios – fotogramas biliterais17
Por exemplo, como seria representado o termo “gê-
Certamente, o mesmo se aplica aos documen- nero documental” em código morse e em braile?
tos produzidos com o uso do braile, uma vez que seus
caracteres táteis (Fig. 3) são utilizados para represen- --. . -. . .-. --- / -.. --- -.-. ..- -- . -. - .- .-.. Fig. 8. Exemplos de notação musical
tar letras que formam palavras e textos.
Fig. 4. Gênero documental em código morse14.

Esses diversos sinais ou signos, ao serem inten-


cionalmente dispostos em pautas (ou pentagrama,
que são as cinco linhas horizontais paralelas utiliza-
11 Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/ 15 Tradutor para Braille – Projeto Matinv. Disponível em: http://www. das pelo músico para posicionar as notas e símbolos
busca/portugues-brasileiro/texto/ Acesso em: 28 out. 2017. atractor.pt/tb/ Acesso em: 17 nov. 2017.
12 Caberia uma discussão sobre uma possível adoção de “escrito” 16 Para maiores informações, consultar “A decifração dos hierógli-
ao invés de “textual”, mas aquele termo oferece uma interpretação 13 Figura disponível em: http://www.cienciasecognicao.org/min/?pa- fos”, disponível em: http://www.fascinioegito.sh06.com/decifra.htm 18 Gramática egípcia clássica. Disponível em: http://www.aegyptolo-
muito mais ampla que esse, podendo incluir, inclusive, “desenhos e ge_id=2911 Acesso em: 28 out. 2017. Acesso em 28 out. 2017. gus.com/egiptologia/licoes/#tabid-4 Acesso em: 17 nov. 2017.
pinturas”, conforme Rondinelli (2017), em análise do termo sob a visão 14 Conversor de código morse. Disponível em: https://www.invertex- 17 Gramática egípcia clássica. Disponível em: http://www.aegyptolo- 19 Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/
da Linguística. to.com/codigo-morse Acesso em: 30 out. 2017. gus.com/egiptologia/licoes/#tabid-2 Acesso em: 17 nov. 2017. busca/portugues-brasileiro/notação/ Disponível em: 28 out. 2017.

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re vista d o arquivo público d o e stad o d o e spírito santo artigo vanderlei batista d os santos gênero d o cumental …

musicais, criando sua composição), formam uma Glossário, o termo permanece, embora com nomen- vistas, depoimentos, narração de jogos, palestras, ções nº 4/1996 (Revogado pela Resolução nº 14/2001)
partitura (Fig. 9) e permitem que um especialista clatura alterada, divergente da usada na resolução, reportagens etc.). Apesar da realidade dessa afir- e nº 26/2003 do CONARQ. A definição de 1996 (repeti-
(músico) registre e interprete uma música. Em outras mantendo a definição quase sem alterações, da se- mação, não nos parece coerente criar gêneros espe- da em 2001) é bastante sumária e usa o termo “do-
palavras, é a linguagem musical. As partituras musi- guinte forma: cíficos para contemplar esses documentos sonoros, cumentação” para se referir aos gêneros documen-
cais são, portanto, documentos escritos, do gênero mesmo quando registrados sob a forma de parti- tais que são limitados a seis tipos, conforme se pode
textual. A definição de “notação musical” (APRENDA Documento musicográfico - gênero documental turas e cifras, ou quando produzidos por derivação, constatar a seguir:
PIANO, 2018) como “o nome dado a todo sistema de integrado por documentos que se caracterizam por qual seja, a transcrição de depoimento capturado em
escrita, o qual representa com símbolos uma peça conter informação codificada através de notação áudio. Em ambos os casos, o resultado pode ser inclu- Gênero documental
musical” é bastante adequada à exemplificação da musical (ou equivalente), independentemente do ído do gênero textual. A não ser que se optasse pela Reunião de espécies documentais que se asseme-
visão aqui proposta. processo de produção, de registro ou fixação, e de criação de subgêneros. Mas aí é outro assunto. lham por seus caracteres essenciais, particularmen-
Na figura a seguir, por exemplo, pode-se ler reprodução ou realização. Exemplos de documen- te o suporte e a forma de registro da informação,
(solfejar, na linguagem musical) uma música infantil tos musicais: partituras, partes (vocais e/ou instru- como documentação audiovisual, documentação
muito conhecida. mentais), livros de coro e cartilhas20 (CÂMARA TÉC- 4. Considerações finais cartográfica, documentação iconográfica, docu-
NICA..., 2016, p.12). mentação informática, documentação micrográ-
Quando nos reportamos à terminologia de uma dis- fica, documentação textual. (ARQUIVO NACIONAL,
Conforme defendido anteriormente, a mencio- ciplina científica, entende-se imprescindível a exis- 1996, p.27; 2001, p.179; grifos nossos)
nada “codificação através de notação musical” é, na tência de uma instituição ou órgão que atue na busca
verdade, uma escrita técnica. Por essa interpretação por sua conformidade técnica no país. Entende-se, Na proposta de 2005, a expressão “a forma
já existiria um gênero que contempla esses docu- de uma forma geral, que ações desse tipo deveriam de registro da informação” é substituída por um
mentos, o textual. Ao nos afastarmos desse enten- ser de interesse das universidades que ministram texto mais extenso, ao que parece buscando maior
dimento, teríamos que produzir outra série de gê- cursos de Arquivologia, afinal, é imprescindível evitar clareza. O termo “documento” é usado em substi-
neros para contemplar documentos produzidos com confusões na aplicação dos vocábulos específicos da tuição a “documentação” para se referir aos gêneros
outros tipos de escrita, como os já mencionados em área, até porque o respeito à linguagem técnica é um documentais que, com a inclusão de bibliográficos e
Fig. 9. Partitura de “Brilha, brilha estrelinha”. código morse e braile. requisito para a consolidação da área. filmográficos, passam a ser oito. Além disso, “docu-
Pode-se ir além nessa discussão. Por exemplo, Por outro lado, no Brasil existe um Conselho mentação informática” é substituída por “documen-
Em 2014, no âmbito de uma das Câmaras em recente publicação (SILVA; PALETTA, 2016, p.86-99), Nacional de Arquivos – CONARQ, cuja atribuição legal tos eletrônicos”, conforme apresentado a seguir:
Técnicas do Conarq, foi divulgado um Glossário Vânia Lima, ao tratar de documentação audiovisual, é definir a política nacional de arquivos, como órgão
considera que central do Sistema Nacional de Arquivos – SINAR. Na Gênero documental
de termos que apresenta um novo gênero
busca de seus objetivos, o CONARQ tem produzido Reunião de espécies documentais que se asseme-
documental denominado “documento musical”. A informação sonora serve tanto para documentar resoluções que contemplam a definição e a revisão lham por seus caracteres essenciais, particularmen-
Tal proposta foi ratificada na Resolução nº 41, de e testemunhar a realidade, como para expressar de vários aspectos técnicos e teóricos da área. Em ou- te o suporte e o formato, e que exigem processa-
9 de dezembro de 2014, ao explicitar, em seus [e] representar emoções e sentimentos que nem tras palavras, o CONARQ tem produzido, formalizado mento técnico específico e, por vezes, mediação
sempre deixam entrever a palavra (SILVA; PALETTA, e atualizado a terminologia arquivística brasileira. técnica para acesso (1), como documentos audio-
considerandos 2016, p.91). Há que se agir com esmero, portanto, para evitar in- visuais, documentos bibliográficos, documentos
congruências no âmbito das comissões especiais e cartográficos, documentos eletrônicos, documen-
Documento musical - o gênero documental integra- Neste contexto, entende que as informações câmaras técnicas e setoriais que o constituem, a fim tos filmográficos, documentos iconográficos, do-
do por documentos que se caracterizam por conter sonoras podem ser divididas em musical ou ficcional de submeter ao Plenário apenas os documentos já cumentos micrográficos, documentos textuais (AR-
informação codificada através de notação musical, (gravações de músicas, poesias ou peças literárias, revisados e em conformidade com as orientações e QUIVO NACIONAL, 2005, p.99; grifos nossos).
independentemente do processo de produção, de peças teatrais e radionovelas) e documental (entre- resoluções já aprovadas.
registro ou fixação, e de reprodução ou realização. Por exemplo, o próprio conceito e os tipos de Não entro no mérito da correção ou não da pro-
“gênero documental” são apresentados de formas posta, mas o que justificou tais alterações? Com que
Dois anos mais tarde, em nova versão daquele 20 No original é “cartinha”, mas não foi encontrado tal termo em di- distintas nos documentos aprovados pelas Resolu- profundidade técnica e teórica ela foi realizada? Sa-
versos dicionários musicais consultados.

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re vista d o arquivo público d o e stad o d o e spírito santo artigo

tronicos.arquivonacional.gov.br/media/publicacoes/glossa-
be-se que o Dibrate foi colocado em consulta pública, rio/2008ctdeglossariov4.pdf Acesso: 8 mar. 2009.
mas, a despeito da competência e do conhecimento CAMARGO, Ana Maria de Almeida; BELLOTTO, Heloisa Liberalli.
dos coordenadores da revisão do dicionário, qual o Dicionário de Terminologia Arquivística: São Paulo : AAB-NRSP/Se-
nível de colaboração recebido? Quais os critérios para cretaria de Estado da Cultura, 1996.
aceitar ou refutar uma proposta enviada? CONSELHO NACIONAL DE ARQUIVOS. Resolução nº 4, de 28 de março
de 1996. Dispõe sobre o Código de Classificação de Documentos
A comunidade arquivística brasileira não tem de Arquivo para a Administração Pública: atividades-Meio, a ser
participado tão efetivamente da discussão e da defi- adotado como um modelo para os arquivos correntes dos ór-
nição desses termos de modo que caberia ao Conarq gãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Arquivos
- SINAR, e aprova os prazos de guarda e a destinação de docu-
verificar se as propostas de termos e conceitos cons-
mentos estabelecidos na Tabela básica do temporalidade e des-
tantes de novos documentos e normas a serem ratifi- tinação de documentos de arquivo relativos às Atividades-Meio
cadas no Plenário daquele Conselho estão aderentes da Administração Pública. Diário Oficial da União, Suplemento
aos já aprovados e adotados no país. Não é uma solu- ao n°62, 29 de março de 1996. Brasília : Imprensa Nacional, 1996.
ção fácil, mas é necessário confrontar esse problema _____. Resolução nº 23, de 16 de junho de 2006. Dispõe sobre a
adoção do Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística
e utilizá-lo como uma oportunidade para conseguir pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de
maior reconhecimento da Arquivística. Arquivos – SINAR. Disponível em: http://www.conarq.arquivo-
nacional.gov.br/resolucoes-do-conarq/265-resolucao-n-23,-de-
16-de-junho-de-2006.html Acesso em: 20 nov. 2017.
Referências
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APRENDA PIANO. O que é notação musical? Disponível em: https:// a inserção dos documentos audiovisuais, iconográficos, sonoros
aprendapiano.com/notacao-musical/ Acesso em: 8 jan. 2018. e musicais em programas de gestão de documentos arquivísti-
ARQUIVO NACIONAL. Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivísti- cos dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de
ca. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2005. Arquivos - SINAR, visando a sua preservação e acesso. Disponível
ARQUIVO NACIONAL. Conselho Nacional de Arquivos. Classifica- em: http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/resolucoes-do-
ção, temporalidade e destinação de documentos de arquivo; relativos conarq/283-resolucao-n-41,-de-9-de-dezembro-de-2014.html
às atividades-meio da administração pública. Rio de Janeiro: Acesso em: 8 jan. 2018.
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