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AFFAIRS
' :':'. : -, . S EDIÇÃO BRAStlEIRA - NÚMERO 31 - ÀBRH// 1999
cluiriam os Estados Unidos tanto da ação como É de se supor que os responsáveis pelo novo romântica de amor e aventuras. É motivo de tris-
de qualquer apoio a ela. Além disso, que nação plano de saúde tenham sido aqueles ilumina- teza para o velho, que ama suas marionetes, o
consciente de sua dignidade iria querer assu- dos por um saber inacessível aos cidadãos co- fato de não serem capazes de se mexer sozinhas.
mir uma parcela do risco sem dispor de nenhu- muns. Nesse caso, porém, ao contrário de O monge ora por um milagre, e os bonecos co-
ma parcela de responsabilidade? Um dirigente muitas discussões sobre política externa, o meçam a se mover por conta própria, represen-
j-mpre deveria evitar cobrar dos outros o que império do sigilo podia ser contestado. Quan- tando a mesma história. Mas pequenas coisas co-
r _• próprio não faria. do o plano foi trazido do alto do monte Sinai, meçam a dar errado e o acúmulo delas acaba le-
O antídoto perfeito para tais demandas é a re- como as tábuas da lei, não foi difícil para os vando os namorados a se desentenderem e os
:omcndação feita por Madison de que as lide- grupos de pressão o moldarem a seus interes- amigos a trocarem socos. Exasperado, o velho
ranças americanas consultem a opinião alheia e ses. Embora o fracasso em incluir o povo seja grita: "Parem! Estou descendo para o palco!" A
tentem se ver pelos olhos dos outros. Atual- mais raro na política in- peça termina no momen-
mente, os Estados Unidos são a nação mais po-
derosa do mundo, mas esse poderio só poderá
terna, ele continua sen-
do de praxe na formula- —
05 novos centros de to em que o manipula-
— dor dos cordões vai ter
ser mantido se eles obtiverem a cooperação de
outros países. Quando publicou 'A Ascensão e
cão da política externa.
Sem dúvida, por vezes a —
poder só irão de agir, pela primeira
— vez, como um líder.
",)ueda das Grandes Potências", Paul Kennedy,
um historiador da Universidade Vale, foi acusa-
diplomacia tem necessi-
dade de "sigilo e preste- —
ampliar o poderio O velho das marione-
— tes, tal como Kissinger
do de prever o declínio dos Estados Unidos. Na
realidade, ele dizia que o poder internacional
za". Mas as ocasiões que
exigem ambos são rela-
dos Estados Unidos ou os autores do plano
de reforma do sistema
precisa ser distribuído para ser mantido, pois tivamente poucas em comparação com os inú- de saúde, achava que sabia o que era melhor
os novos centros de poder só irão ampliar o po- meros momentos em que se evoca sua neces- para os personagens que estava manipulando.
derio dos Estados Unidos, adquirindo os pro- sidade. Henry A. Kissinger criou um modelo Ele dispunha de todas as informações disponí-
dutos americanos e fornecendo-lhes bens e de competência na área de política externa veis sobre essas criaturas e os ambientes em
mão-de-obra. A difusão do poder é um proces- que valorizava sobretudo o correto enquadra- que circulavam. Mas o que lhe faltava era o atri-
so benigno, admitindo que, para se manter mento conceituai e o uso de informações for- to de outras mentes independentes. Ele não es-
próspera por muito tempo, não convém a uma necidas pelos serviços de Inteligência. Esses tava liderando e sim impondo-se, tal como os
nação eliminar todo e qualquer concorrente. instrumentos não têm nada a ver com lideran- Estados Unidos fizeram no caso dos países cu-
ça. Ter a melhor e mais clara concepção po- jos dirigentes foram derrubados. No final da
lítica não significa conseguir que outros paí- peça, contudo, o velho vê-se obrigado a con-
UMA PARÁBOLA ses atuem em função dela. Para tanto, é pre-
ciso conquistar o apoio da nação, não pela
ciliar os desejos, dúvidas e objeções das mario-
netes transformadas em atores.
Ressuscita-se a geopolítica
por Charles Clover*
SONHOS DO CORAÇÃO mente antagônicas: a terra e o mar. Segundo este
modelo, o repositório natural do poder global ter-
vitável da história, agora depositam suas espe-
ranças para a volta da grandeza russa numa teo-
DA EURÁSIA restre são as terras centrais, o "coração" da Eurásia
- o território do antigo império russo. Quem con-
ria que é, de certa forma, o oposto do materia-
lismo dialético, A vitória hoje não mais se
Japão, a Alemanha e o Irã, baseada na rejeição nais são profundamente socialistas. Fazendo ele. "O fundamentalismo é compreendido coi
que todos esses países sentem pelo Ocidente uma habilidosa conexão entre o nacionaljsmo ét- uma volta às seculares tradições nacionais e
(ignorando o fato de que nem todos são de nico e as idéias comunistas de amizade entre as pirituais, e pode levar a resultados muito pôs
base terrestre), seria capaz de expelir do con- nacionalidades, conseguiu costurar todos os gru- vos. É a volta às normas morais nos relacionami
tinente a influência americana. Embora uma pos étnicos eurasianos e uni-los numa colcha de tos entre as pessoas (...) mantendo intacta a mo
tal aliança pareça totalmente implausível pa- retalhos anti-liberal, anti-Ocidente, favorável ao da" sociedade."
ra os leitores ocidentais - assim como a afir- tradicionalismo e do ao coletivismo. Essa fixação no relacionamento da Rús:
mação, que vai contra os fatos, de que a Ale- Esta estratégia rendeu frutos na campanha pre- com o Oriente é típica dos eurasianistas. Sc
manha e o Japão não são países "ocidentais" sidencial de Zyuganov verdade que são imp
- parece que algumas sugestões de Duguin
anteciparam certos direcionamentos da polí-
em 1996. Ele venceu fa-
cilmente em distritos não
Muitos russos vêem rialistas, não são naci
nalistas tradicionais; i
tica russa. Por exemplo, ele recomenda de-
volver ao Japão as disputadas Ilhas Kuril, co-
russos, graças à imagem
de defensor da auto-de-
seu país como verdade, a maioria di
eurasianistas tenta :
mo um passo para a construção de uma alian-
ça. No outono de 1998 justamente essa idéia
terminação e sua oposi-
ção ao nacionalismo rus-
um membro honorário distinguir dOS nadon
listas russos proponc
foi apresentada aos japoneses. As idéias de
Duguin também precederam as conclama-
so mais exclusionárío de
candidatos como Alexan-
do Oriente oprimido alianças com os vizinh<
asiáticos da Rússia, ei
ções de Yeltsin por um eixo Moscou-Berlim- der Lebed. especial os islâmicos. Como diz Prokhanov, '
Paris e as iniciativas de Primakov rumo ao Irã Se "Além do Horizonte" foi a tentativa de Zyu- idéia eurasiana é uma idéia de integração. O n;
e o Iraque (que começaram quando ele era ganov de associar o comunismo às tradições cionalismo russo é o oposto do eurasianismc
ministro do exterior). A correlação entre as russo-eurasianas, seu último livro, "A Geografia as duas ideologias são inteiramente incomp;
idéias de Duguin e as do "estabiishment" rus- da Vitória", é uma tentativa ainda mais ambicio- tíveis. Uma concepção puramente étnica [ru:
so é óbvia demais para se ignorar. sa de correlacionar a luta de classes com o con- sã] não leva em consideração o Tatarstão nem
flito Oriente-Ocidente. Neste livro, Zyuganov es- Cáucaso."
clarece a incompatibilidade entre a Rússia e a ci- Falar no Oriente só pode nos levar de volta
OS VERMELHOS vilização ocidental. "A Rússia jamais será
burguesa", afirma Zyuganov. Ele continua afir-
Primakov, proeminente especialista em estudo
árabes e orientais que depois se tomou primeiro