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Em Livro dos sonetos podemos notar a predominância de rimas do tipo heróicas e sáficas, postas de forma
desordenada. Estranhamente, encontramos no 6º verso uma rima do tipo martelo agalopado, que dá uma maior
variedade à entoação.
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Na 2ª estrofe não parece haver realmente uma rima entre as palavras ESQUELETO e ASPECTO, pois na sílaba
tônica da primeira palavra o “E” é fechado e na 2ª palavra, o som da letra “E” é aberto, mas consideraremos
rimas por ambas as palavras terminarem em TO, formando assim como na 1ª estrofe uma rima ABAB.
(eSqueleto, fez-Se, desfez-Se) e 7 ( julgueiS, aS, coisaS, aSpecto), o que nos
remete a impressão do som produzido pelo vento.
De acordo com a regra estruturalista de imanência, na qual analisamos o
sistema por si sem a necessidade de elementos externos, temos na escolha do título
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“Livro de Sonetos” a informação implícita de que trata-se do árduo processo de
criação poética, o título remete a idéia de um conjunto dos poemas que tem como
característica 14 versos – tradicionalmente dispostos em dois quartetos e dois
tercetos – geralmente decassílabos – denominados sonetos. A partir deste
pensamento temos uma relação entre a o sistema como um todo e o
sintagma/substantivo feminino “torre” – que se repete na 1ª, 2ª e na 4ª estrofe do
poema – sinônimo de fortaleza, solidez, o eu-lírico quer explicitar quanto a
rigorosidade.
O poema é composto por versos herméticos, ou seja, o poeta utilizou-se de
termos obscuros, de difícil entendimento para o público (se esse não tiver um
conhecimento amplo da linguagem), mas o poeta demonstra não se preocupar com
o entendimento de terceiros, mas sim com a necessidade de expressar o que se
passa com ele próprio. Isso fica claro na 1ª estrofe, quando faz uso da expressão
“torre de marfim” e “torre alada”, o eu-lírico posiciona-se na condição de ser sublime,
superior, apenas limitado pela imagem do “céu”. Apesar dessa superioridade, nos
versos 2,3 e 4, diante de expressões tais como “esguia e triste” e “galerias de
sombras e lamentos”, temos a percepção de algo solitário, melancólico, frágil. Essa
fragilidade é notória no 5º verso, de marfim (algo tenaz) sua “estrutura” passa para
algo não tão concreto (esqueleto), tornando o eu-lírico mais humano, ate desfazer-
se em dado momento.
Ao longo do poema é perceptível a presença de inúmeras figuras de
pensamento, tais como: antítese presente entre os versos 3 e 13, “corredores de
bruma congelada” e “e vi a torre transformar-se em brasa”; paradoxo ao adjetivar por
“marfim”, “alada” e “esguia” a torre (estrutura fixa); no verso 7º, utilizando a
apóstrofe, o interlocutor procura criar uma interação com o receptor “Ó! não julgueis
as coisas pelo aspecto”. Podemos perceber ainda na 2ª estrofe uma idéia de
efemeridade quando o eu-lírico diz para que o receptor não se prenda à imagem das
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Os sonetos constantes no Livro de Sonetos de Jorge de Lima não possuem título, porém neste trabalho
estabelece-se como tal o nome do conjunto da obra.
coisas, pois essas mudam de aspecto de forma corrente, tal qual a velocidade do
vento.
Já na 3ª estrofe o eu-lírico retoma o conceito (no verso 9) de que o vento é
agente responsável pela ação metamórfica sofrida pela torre. Nos versos 10 e 11, o
eu-lírico alerta para o risco do uso excessivo de criatividade, pois pode quebrar o
automatismo perceptivo do receptor.
Na quarta estrofe o interlocutor coloca-se na condição de testemunha, que
acompanha desde a notória debilidade da “torre de marfim”, expressa no verso 12
(percebemos pelo uso do termo exangue); passando pelo começo de uma reação no
verso 13 (de algo apagado ela passa à “brasa”: um fogo que não está extinto, ainda
arde) e finalmente, no verso 14, a sua ressurreição simbolizada pela imagem do
“sangue”, que se contrapõe à idéia de “exangue”, restabelecendo a vitalidade da
torre.
Segundo a regra estruturalista da comutação, uma mensagem transmitida
permanece inalterada, mesmo que haja a seleção e troca de itens, pois se preserva
a relação entre eles, responsável pelo sentido. Assim, sendo, é correto afirmar
que se realizarmos a troca do termo “peixes” (estrofe 3) por outro que animal que
não voa, contudo paroxítono, a fim de se conservar o ritmo nos versos 9, 10 e 11,
posto que conforme Eikhenbaum, o ritmo é “fator construtivo e fundamental do
verso”.
A regra de compatibilidade baseia-se na distinção dos termos pertencentes ao
sintagma, bem como os pertencentes ao sistema. Conclui-se que estes versos (3
e 4, 7 e 8, 10 e 11, 13 e 14) são termos de três sistemas distintos (as estrofes)
assumem a mesma função no poema (sintagma) explanam quanto às mudanças
ocorridas, portanto relacionam-se quanto a compatibilidade.
Quanto à variação diacrônica podemos estabelecer a seguinte relação: nos
dois primeiros versos dos quartetos (1º quarteto: “A torre de marfim, a torre alada /
esguia e triste sob o céu cinzento”, 2º quarteto: “A torre de marfim fez-se esqueleto /
e o esqueleto desfez-se num momento”) enquanto que no primeiro verso de cada
terceto (1º terceto: “E com o vento revive o que era inerme.”, 2º tercetos: “Olhei a
torre de marfim exangue”) os versos mencionados exprimem a idéia de mutação da
matéria seguindo uma linha temporal, aplica-se aqui a regra de integração: esta
continuidade lógica no desenvolvimento do eu-lírico.
A escolha dos termos ”marfim”, “alada”, “esguia“ e ”triste” para designar a
“torre” merece destaque, pois são pertinentes ao transmitir a inquietação do eu-lírico
sobre algo real em sua complexidade que ele não consegue representar de forma
exata devido ao caráter mutável.
Referências bibliográficas