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Introdução
De toda a poesia romântica brasileira que, por convenção erudita, estende-se de 1830 a
1870, estender-nos-emos à lírica fúnebre de Álvares de Azevedo em uma ousada tentativa de
compreender parte de sua contribuição para o imaginário romântico da poética de sua época.
Para tal, o poema escolhido é intitulado Soneto, este presente na Lira dos vinte anos, obra
póstuma de Azevedo que conjunta poemas escritos em sua curta vida.
Desenvolvimento
Soneto
6 Pela maré das águas embalada! (A tônica recai sobre a 6ª e 10ª sílaba)
Embora esse tratamento puramente silábico adorado por muitos parnasianos e românticos não
permita a perfeita análise do ritmo, a percepção da tonicidade por si só é suficiente para
reconhecer grande parte da sonoridade do poema. Contudo, há outros procedimentos
linguísticos que contribuem para sua sonoridade e ritmo, constituintes estes que também serão
importantes à interpretação deste estudo.
A denominação de rima “perfeita” se dá pela repetição total dos fonemas após a última vogal
tônica, expressa, por exemplo, no 2º e 3º versos do poema. No caso, por se tratar de um
soneto, seu arranjo de rimas é fixo e pode ser expresso como ABBA ABBA CDC DCD.
O poema começa pela menção a uma figura pálida, reclinada em um leito de flores, esta
sem nome, mas referenciada pelo eu lírico no 4º verso como sendo uma mulher. No primeiro
verso, a moça é posta defronte a uma fúnebre luz. A lâmpada acompanhada pelo nome adjetivo
sombria adquire valor conotativo de “luz melancólica/cercada de trevas”, e por este teor
taciturno admite-se que se trata de uma metáfora para luar. No 3º verso, a voz poética compara
a mulher à própria lua coberta pela escuridão por noite embalsamada e estabelece, através da
símile, o paralelismo de amada morta e natureza observada, essa carregada de pessimismo
tétrico.
Na segunda estrofe, o paralelismo se mantém, mas dessa vez colocando a mulher
subjacente ao cenário pelágico.
Adiante, na 3ª estrofe, as qualidades observadas pela voz poética perdem seu caráter
cândido e tomam traços lascivos. A escolha de sintagmas como seio palpitando e formas nuas
denotam tais traços. Há de se observar que o apelo sexual adjacente à morbidez emana da
imagética ultrarromântica, fonte da qual bebe Álvarez de Azevedo e muitos outros de sua
geração.
No último terceto, por fim, a voz poética quebra a rememoração da amada morta e a ela
se dirige. Em catarse, o eu lírico declara as noites passadas em luto e a paixão que perdura, e,
nesse ponto, a dimensão do sonhar introduzida no 8o verso se fecha com a afirmação de amor
que perdurará até o fim da vida: Por ti - nos sonhos morrerei sorrindo! Procedimentalmente,
nos últimos versos, 13º e 14º, o uso da anáfora por ti é de grande valia. A repetição do referente
– a amada – e causa de luto e lamento da voz poética reforça suas próprias ações pela figura
funesta.
Considerações finais
O poema aborda questões centenárias de amor, perda, idealização e desejo, todos estes
evocados anteriormente pela inspiração ultrarromântica. Álvares de Azevedo, seguidor e
apreciador desse movimento estético ora fúnebre ora lascivo, o imprime em Soneto sob a
perspectiva de um amante em luto. Amante esse cujo desejo é latente e não consumado e cuja
paixão é destruída pela efemeridade da vida. A amada, agora distante, é revivescida na natureza
e essa, ao ser observada pela voz poética, é colocada em paralelo com a mulher morta,
estabelecendo no plano da metáfora e da símile a relação da mulher com o mar e a noite. Há
de se acrescentar, por fim, que sob esse mesmo plano o eu lírico despejará suas emoções e fará
idealizações, transportando-nos para um plano de ordem fantástica, de anjos em nuvens
d’alvorada.
Em conclusão, este estudo buscou interpretar o poema escolhido sob a luz de seus
constituintes linguísticos: metáforas, símiles e anáforas, bem como de sua métrica e estrutura
rítmica. Sua análise foi realizada buscando-se mergulhar no imaginário ultrarromântico, à
medida que constatações pudessem ser feitas a partir do efeito de organicidade dos elementos
linguísticos supracitados.
Referências
AZEVEDO, Álvares de. Lira dos Vinte Anos. São Paulo: Martins Fontes, 1996.