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Tempo Geológico PDF
Tempo Geológico PDF
ABSTRACT Within the last two centuries there was a complete change on
the concealed age of the Earth by specialists: it changed from some thousands to nearly 4,6
billion years. The study of geological time requires an integrated application of specific
methods for the determination of rock ages: the stratigraphical, paleontological and
geochronological methods. In order to get best results under different situations, the methods
* Este documento deve ser
are often combined; this interdependence belongs to the foundations of the study of Earths
referido como segue: past. Analogies are often applied to help explaining the ideas of deep time or abyss of
Carneiro, C.D.R.; Mizusaki, time, but these are probably among the most complex concepts to be understood by
A.M.P.; Almeida, F.F.M. de.
2005. A determinação da
people in general, for the complex relationships to be stablished and the unusual scales
idade das rochas. Terræ involved. The evolution of Geology as a science followed such inflexion on the way of
Didatica, 1(1):6-35. thinking on the age of the Earth. Within the modern concept of both Geosciences or
<http://
www.ige.unicamp.br/ Earth Sciences, a knowledge on the heated discussions linked to the subject is needed
terraedidatica/> to understand the way the principles and methods turned out the planet aged.
O número de anos em que nós, seres humanos, temos escalas, diversos graus de precisão. Se, para o as-
observado o nascer do Sol não é nada, virtualmente trônomo, por exemplo, a ordem de grandeza das
nada, na história de nosso planeta. relações de idade varia entre milhões e bilhões de
WEINER, Jonathan. 1988. p. 14. anos, para o biólogo, que trata de eventos na vida
de seres vivos, os intervalos relativos podem ser
muito menores, da ordem de anos, meses ou dias.
Físicos nucleares estudam processos e reações que
1. Introdução ocorrem em intervalos pequenos, da ordem de 10-9
segundo. Em cada caso precisamos encontrar di-
Hoje aceita-se com naturalidade que a Terra te- ferentes relógios, cuja sensibilidade seja compa-
nha cerca de 4,6 bilhões de anos (ver How old is it? tível com o evento que se pretende medir.
National Geographic. set. 2001, Carneiro & Almeida Um fenômeno geológico como a erosão afeta
1989, Mizusaki et al. 2000). Com certa facilidade, continuamente grandes porções da crosta terrestre,
a história da natureza é dividida em períodos com mas ao longo de uma vida humana é difícil notar
dezenas de milhões de anos cada um (Gradstein et mudança significativa no relevo de uma região. De-
al. 2004); assim procedendo, podemos estender ao pois de um episódio de chuvas, por exemplo, per-
passado, cada vez mais, a origem da vida e do ho- cebemos que as águas de um rio tornam-se aver-
mem. Damos pouca atenção, entretanto, ao signifi- melhadas, devido ao material argiloso que foi reti-
cado histórico e cultural dessas informações e, mui- rado de áreas altas próximas. Contudo, o processo
tas vezes, menosprezamos que boa parte da huma- é tão lento que milhares de anos são necessários pa-
nidade desconheça ou refute essas idéias, tidas ra que sejam retirados poucos centímetros da cama-
como inacreditáveis. De fato, dependemos de me- da superficial de um continente. Na moderna Geo-
táforas, na maior parte das vezes, para transmitir o logia aplicam-se os dois tipos de escalas (absoluta e
significado e tentar compreender por aproxima- relativa), dentro das mais variadas ordens de gran-
ção a idéia de tempo profundo (Gould 1987). deza, com a finalidade de reconstruir a história do
planeta. Isso permite compreender o funcionamen-
to da Terra nos dias de hoje e realizar previsões.
a. Escalas relativas e absolutas
No estudo dos fenômenos do passado, o racio-
Estamos acostumados a medir o tempo nas cínio indutivo e as analogias são essenciais, mas
nossas atividades diárias; dizemos que uma pessoa dependemos das pistas registradas nas rochas,
é pontual quando cumpre seus compromissos com analisadas por meio dos métodos geológicos de
certa precisão, ou seja, respeita uma escala de tem- estudo do tempo: os estratigráficos, paleontológicos
po medida em dias, horas, minutos e segundos. e geocronológicos.
Neste exemplo de escala absoluta de tempo, todos
os demais acontecimentos podem ser mais ou me-
b. A polêmica sobre o tempo
nos amarrados. Mudar as convenções de tempo
é aparentemente simples, mas exige planejamen- Na segunda metade do século XVIII, época em
to: a definição dos horários de verão, por exem- que James Hutton, considerado o pai da Geolo-
plo, deve ser meticulosamente organizada, pois afe- gia, começara a estudar rochas da região de Edim-
ta uma infinidade de atividades humanas que acon- burgo, na Escócia, onde vivia, acreditava-se que a
tecem ao mesmo tempo. Existem ainda as escalas Terra teria sido formada por influência divina, há
relativas, que permitem seqüenciar os acontecimen- não mais que 7000 anos. Em 1654, o arcebispo ir-
tos em uma dada ordem, admitida como a mais landês James Ussher utilizara complexa combina-
lógica. Isso também obedece a certos procedi- ção de dados para obter a idade da Terra. A partir
mentos muito bem definidos. Quando afirmamos, da cronologia bíblica, dados históricos e estudos
por exemplo, que a maior parte das bacias petrolí- astronômicos, ele determinou a Criação do mun-
feras brasileiras hoje conhecidas formou-se depois do e suas criaturas no sagrado ano 4004 AC, tendo
da separação dos continentes, não estamos dizen- John Lightfoot, diretor do St. Catherines College,
do quando, mas apenas em que ordem um fe- de Cambridge, Inglaterra, refinado ainda mais a
nômeno veio depois do outro. datação do arcebispo, precisando que a Criação se
A medida do tempo requer, além de diferentes deu exatamente às 9 horas da manhã do dia 26 de
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Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M. TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005
outubro daquele ano, data que foi impressa em vá- podem se alternar com longos intervalos de erosão
rias edições da Bíblia. Por outro lado, no século lenta. O método da contagem é, além disso, aplicá-
XVIII, o pensador francês Buffon1 impressionou- vel a intervalos muito pequenos de tempo. Na Sué-
se com suas próprias conclusões: os eventos ocor- cia, por exemplo, a contagem de camadas alterna-
ridos no planeta sugeriam eras de dezenas de mi- das sucessivas de uma rocha chamada varvito, de
lhares de anos, ao que denominou de abismo do tem- origem glacial, permitiu calcular que o gelo recuou
po. A idade da Terra estender-se-ia, segundo ele, do sul daquele país há 13.500 anos, tendo deixado
por cerca de 75 mil anos (Gohau 1991). o norte da Suécia há 8.700 anos (Bradshaw 1973).
Para explicar as repentinas extinções em mas-
sas de seres vivos, admitia-se que eventos catastró-
ficos teriam ocorrido no passado da Terra. A teoria 2. A determinação da idade da Terra
levou o nome de catastrofismo, sendo impregnada
de dogmas religiosos. Sua refutação deve-se, entre William Thompson (1824-1907), homena-
outros, ao consistente trabalho de Sir Charles Lyell geado com o título de Lorde Kelvin, admitira que
(1795-1875), para quem o relevo terrestre seria a Terra viria sofrendo resfriamento contínuo des-
explicável pela atuação de forças contínuas, mas de um estado quente e fluido. Utilizara a idéia de
culminou na obra-prima de Charles Darwin A ori- Joseph Fourier sobre condução do calor; este de-
gem das espécies, que desprezara tanto o catastrofis- terminara, ponto-a-ponto, em um sólido, em qual-
mo, como os inúmeros atos espontâneos de cria- quer instante, tanto a temperatura, como a taxa de
ção de seres vivos. Darwin baseava-se em variadas variação desta. Sadi Carnot, estudando a máquina
- e numerosas - observações, deixando clara a in- a vapor, demonstrara que calor e trabalho poderi-
fluência de Lyell. Se o passado pode ser explicado am ser convertidos um no outro. Thompson con-
pelos mecanismos que hoje atuam, necessaria- siderou, ainda, que uma parte do calor não está dis-
mente um longo tempo deveria estar envolvido na ponível para gerar trabalho nessas máquinas. Da
evolução. O mecanismo da seleção natural que for- mesma forma que na máquina a vapor, a fuga de
necera enfrentou a dificuldade de ser dualista, ao energia térmica da Terra é irrecuperável e constan-
tratar da evolução e da seleção em si mesmas. Na te, como se observa em minas e poços profundos:
seleção natural não há um selecionador ativo; o pro- quanto mais fundo se escava, maior a temperatu-
cesso se faz a posteriori e a natureza é que faz a sele- ra; o calor fluiria do interior para fora do planeta.
ção. Se não contasse com explicações de como a evo- Faltava, porém, a demonstração (um cálculo) de
lução ocorre, contudo, a teoria seria mera especu- que a energia dissipada pudesse causar esgotamen-
lação e as idéias criacionistas seriam, ao menos, tão to dos sistemas naturais.
boas quanto elas. Partindo da suposição de que a Terra fazia par-
Em meados do século XIX já haviam sido feitas te do Sol e originalmente tinha a mesma tempe-
ratura que este, seria viável calcular a idade da Ter-
inúmeras estimativas sobre a idade da Terra, utili-
ra com alguma exatidão. Em 1846 ele comunicou
zando-se vários modelos. Alguns métodos eram de-
os resultados, mesmo reconhecendo pontos fracos
masiadamente precários, como as medições basea-
na abordagem: o tempo requerido para a Terra atin-
das em sedimentos: se fôssem medidos o volume
gir as temperaturas do presente seria cerca de 100
dos sedimentos existentes e as taxas de erosão ou de
milhões de anos, uma estimativa dentro de dois
sedimentação responsáveis por eles, poderia ser cal-
extremos: o tempo mínimo seria 20 Ma2 e o má-
culada a idade do sedimento mais antigo. Uma al-
ximo 400 Ma.
ternativa seria a medição de estratos sedimentares:
O limite de história da Terra em 100 Ma era
assumindo-se que rochas com bandamento rítmi-
estreito demais para que a seleção natural realizas-
co tivessem se formado por alternância de condi-
se todo seu trabalho. Este obstáculo central à teoria
ções climáticas (verão e inverno, por exemplo), bas-
da evolução, aliás, havia sido bem compreendido
taria contar o número de estratos em um local com
por Darwin: na 6a edição de A origem das espécies
padrão repetitivo, para saber o número de anos
envolvidos na deposição. As duas alternativas eram
frágeis, porque jamais as taxas de erosão (ou de se- 1 Filósofo da época das Luzes (Iluminismo)
dimentação) podem ser consideradas constantes: 2 Utilizam-se as siglas Ma (mega-age) para milhões de anos
períodos de erosão rápida, na história geológica, e Ga (giga-age) para bilhões de anos
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TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005 Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M.
(1872, apud Hellman 1999), admite ser um dos silicatadas. Os condros são reunidos por inclusões
problemas mais sérios do modelo: refratárias ricas em Ca, Al e Ti, contidos numa ma-
triz. Os condritos são amostras do material que ser-
Só posso dizer, primeiramente, que não sabemos qual viu à formação do Sol e seus planetas e asteróides.
é a taxa, medida em anos, em que as espécies se modi- Suas inclusões refratárias constituem os mais ve-
ficam e, segundo, que muitos filósofos não estão dis- lhos objetos do Sistema Solar. Datações pelo Méto-
postos a admitir que saibamos o suficiente sobre a cons-
do urânio-chumbo permitiram conhecer com pre-
tituição do universo para especular com segurança so-
bre sua duração passada. cisão a idade dessas inclusões refratárias: 4.566 ± 3
Ma (Zanda 1996). Admite-se que a Terra como um
Muitos cientistas aceitaram os cálculos de corpo fundido formou-se durante os 120 Ma se-
Thompson e ele passou a apoiar os verdadeiros guintes. Desconhece-se a idade de consolidação de
geólogos: pretendia ajudá-los a tornar científi- sua crosta, mas datações recentes de rochas da Aus-
cas suas teorias, afastando aspectos inexatos ou de- trália e norte do Canadá indicam que já estava for-
pendentes de hipóteses. A teoria de Darwin seria mada há uns 3.900 Ma. Assim, permanece indefi-
incompleta, sem provas que refutassem a geração nida a idade do início do Arqueano.
espontânea: a vida só procederia da vida. Em cam- Admite-se que logo após a consolidação da
po oposto reuniram-se outros cientistas (como crosta, quando já se realizavam processos em sua
Thomas Henry Huxley) que defendiam que, mes- superfície ligados à presença de água, surgiu a vida.
mo existindo inúmeros indícios de geração espon- Sinais dela acham-se presentes na natureza de cris-
tânea, as condições físico-químicas do passado ge- tais de apatita contidos em rochas metassedimen-
ológico não seriam mais reproduzidas no presen- tares datadas recentemente em 3,85 Ga, em ilha da
te. Thompson explicara a origem da vida pelos costa noroeste de Groenlândia (Stephen Moyzsis,
meteoritos, que seriam portadores de sementes. cit. in Svitl 1998). Surgiu provavelmente como re-
Eles teriam encontrado condições favoráveis na sultado de fenômenos químicos, pelo que também
Terra para iniciar a vida. poderá existir em outros planetas de características
Os rumos do debate mudaram graças a três comparáveis às da Terra.
descobertas inesperadas para os cientistas da épo-
ca: a descoberta do elemento rádio por Madame b. Os principais métodos geológicos
Curie, a descoberta, pelo marido de Mme. Curie,
de que o rádio irradia constantemente calor e a ter-
de estudo do tempo
ceira, por Lord Rayleigh, de que o rádio está lar-
gamente distribuído através de todas as rochas (...) um mundo sem vestígio de um início nem
(Holmes 1923, p. 19). Fôra descoberta uma imen- perspectiva de um fim.
sa fonte de calor: a radioatividade; isso revelou, no James Hutton
início do século XX, que geólogos e biólogos esta-
vam corretos. Um discípulo de Kelvin, Ernest Antes de chegar aos sofisticados métodos de
Rutherford, foi decisivo no avanço dos cálculos datação de rochas e estudo da idade da Terra, con-
sobre a idade da Terra. vém lembrar que uma das pedras fundamentais
erigidas por Hutton para entender as dimensões
a. A idade da crosta terrestre do tempo geológico foi o reconhecimento de prin-
Com o advento da geocronologia e os progres- cípios3 das investigações para se determinar idades
sos no conhecimento do Sistema Solar tornou-se de rochas e das seqüências das quais elas fazem
possível conhecer com precisão a idade da Terra. parte. Os principais métodos de estudo da moder-
O Sistema Solar, que inclui o Sol e sua corte de na Geologia, abordados a seguir, são os estratigrá-
planetas, asteróides e cometas que o orbitam, for- ficos, os paleontológicos e, finalmente, os geocro-
mou-se a partir de acreções de gases e poeiras conti- nológicos. Assim, começaremos o estudo pelos
dos na nuvem solar. Os meteoritos são objetos pro- métodos estratigráficos.
venientes do Sistema Solar que caem na superfície
da Terra. São de vários tipos, entre eles os chama- 3 Princípio consiste em um ponto de partida; é uma referên-
dos condritos, que possuem inclusões cristalinas cia, de certo modo inquestionável, sem a qual não se pode
esféricas, os condros, formadas a partir de gotículas avançar, em Ciência, com qualquer segurança.
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Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M. TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005
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TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005 Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M.
Figura 2 Estratificação sedimentar em turbiditos de sedimentos do Grupo Itararé, contendo finas camadas e
discretas descontinuidades, que formam planos horizontais ou inclinados. As estruturas são indicativas de
topo e base; mesmo local da foto anterior, Itu (SP)
registrado pelas camadas de sedimentos que cons- c. Princípio da continuidade lateral original
tituem a estratificação (Fig. 2). A natureza episódica
Seqüências estratigráficas idênticas expostas em
do registro sedimentar consiste, basicamente, em
lados opostos de um vale devem ser interpretadas
uma sucessão finita de camadas separadas por como restos de camadas que já foram contínuas na
descontinuidades, cuja duração no tempo é peque- área na qual o vale foi aberto.
na quando comparada ao tempo envolvido na for- Steno reconhecera que muitas formações atual-
mação de uma discordância, por exemplo. mente interrompidas por vales ou cadeias de mon-
tanhas eram contínuas, antes que as feições mais
b. Princípio da horizontalidade original jovens se implantassem. Uma camada sedimentar
forma-se, na época de sua deposição, como uma
As formações sedimentares são depositadas ori- lâmina contínua que terminaria apenas ao se afi-
ginalmente na posição horizontal. Qualquer mer- nar até o desaparecimento, ou pela mudança gra-
gulho que elas apresentem é resultado de subse- dual para uma camada de composição diferente ou
qüente dobramento ou basculamento. ainda pelo encontro de uma parede ou barreira,
A acumulação de sedimentos ocorre na maio- como a linha de costa, que confinasse a área
ria das vezes em uma disposição planar ou muito deposicional (Press & Siever 1986, p. 28).
próxima da horizontalidade. Assim, este princípio Embora aparentemente simples, o raciocínio
constitui a base de qualquer interpretação regional envolve notável discernimento, mesmo admitin-
em ambientes de rochas estratificadas. Mesmo que do-se que a maioria das formações geológicas é
algumas estruturas encontradas em camadas se- extensa e espalha-se em todas as direções ao longo
dimentares sejam desde o início dispostas em ca- de grandes áreas da crosta terrestre. Os limites des-
madas inclinadas, como as marcas de onda em arei- tas podem ser bruscos ou graduais, dependendo de
as de praia, algumas frentes de deposição de areia suas relações com as unidades dispostas ao lado,
em dunas ou barras de rio, seus limites mais gerais acima ou abaixo. Tais relações foram construídas
são dados por superfícies que se mantiveram hori- quando a bacia sedimentar em que as camadas se
zontais durante a sedimentação. depositaram esteve em processo de subsidência4 ,
Há exceções, no entanto, como inúmeras lâ- durante intervalos de tempo incalculáveis, há muito
minas sedimentares (ver Fig. 2), alguns depósitos tempo atrás. O princípio traz implícito que a dinâ-
inclinados em encostas montanhosas, camadas de- mica da natureza pode alternar, na mesma parte da
positadas nos flancos de grandes dunas (ver Al- crosta terrestre, condições de subsidência (quando
os sedimentos são depositados e aprisionados) com
meida & Carneiro 1998) e certos depósitos mari-
condições de soerguimento, quando rochas
nhos, como em bordas de grandes recifes subma-
rinos. Nesses casos, a inclinação original da cama-
da não deve ser assumida como zero ou próxima 4 Subsidência é o fenômeno de afundamento gradual de uma
de zero, mas interpretada com algum cuidado. parte da crosta terrestre
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Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M. TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005
anteriormente formadas são erodidas e podem de- reconhece-se a idéia de cronologia; em outras, ela
saparecer, ou ficarem representadas somente pelos permanece implícita, mas não necessariamente as
chamados testemunhos5 (Fig. 3a). pessoas percebem com clareza o(s) mecanismo(s)
envolvido(s) no fenômeno considerado.
d. Princípio das relações de intersecção Observando-se, por exemplo, uma casa sendo
construída, vemos que há uma sucessão de etapas,
Qualquer rocha que foi cortada por um corpo desde a definição dos limites do lote, a terraplena-
intrusivo ígneo ou por uma falha é mais antiga que gem, as fundações, as paredes, o telhado, a pintura
o corpo ígneo ou falha. e assim por diante. Em uma sucessão de camadas
As relações de intersecção, de certo modo, fa-
cortadas por falhas ou por um veio, por exemplo, a
zem parte do senso comum. Em diferentes situações
ordem de aparecimento das estruturas pode ser
determinada se reconhecermos qual feição corta
5 Testemunhos são restos de camadas ou massas de rocha,
outra. A mais jovem delas será a que atravessa to-
isolados geograficamente na paisagem. das as demais (Fig. 3b).
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TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005 Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M.
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Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M. TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005
colunares, resultantes da acreção de detritos cap- dantes no fim desse Eon. Embora sejam às vezes
turados e aglutinados por colônias de bactérias e úteis para correlações entre continentes, são fós-
algas cianofícias, existindo em rochas de até 3.600 seis de valor cronológico muito reduzido.
Ma, também atestando ser esse valor um mínimo
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para a existência da vida na Terra. Representam a Almeida & Carneiro (2004) adotam para a base do erátema
Mesozóico o termo Triásico, que significa triádico, composto
mais antiga comunidade de vida conhecida. Proli- por três, triplo, salientando que a palavra Triássico, também
feraram no Proterozóico, sendo sobretudo abun- usual, sofre óbvia influência de Jurássico e do Inglês Triassic.
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TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005 Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M.
Os fósseis e indícios de compostos orgânicos delas teve lugar no Permiano Superior a terminal,
correspondentes a cerca de três quartos da existên- assinalando o limite entre as Eras Paleozóica e
cia da vida no planeta mostram que ela então evo- Mesozóica. Estima-se que entre 10 a 15 milhões
luiu muito lentamente, pelo que não fornece ele- de anos finais do período cerca de 83% dos gêne-
mentos para o estabelecimento de limites biológi- ros de invertebrados marinhos desapareceram
cos para divisões do chamado Pré-Cambriano, que (Sepkoski Jr. 1986). Também se extinguiram mais
reúne esses dois Eons. De tal modo as subdivisões de 80% das famílias de répteis, três quartas partes
do Pré-Cambriano são feitas com base em eventos das de anfíbios (Olson 1982, Sepkoski Jr. 1982) e
tectônicos de maior grandeza, como o aparecimen- 30% dos insetos, mas a vida vegetal foi pouco per-
to de grandes blocos rígidos da crosta (crátons) e a turbada. Nessa ocasião quase desapareceram os
evolução de faixas de dobramentos. amonóides, crinóides e corais, muito se reduziram
Apesar da lenta evolução da vida pré-cambria- os peixes e extinguiram-se os trilobitas. A extinção
na, ela assistiu ao aparecimento dos organismos permiana foi a primeira a afetar de modo significa-
microscópicos unicelulares (protozoários) e, mais tivo a vida terrestre, pois nas anteriores a maioria
tarde, há uns 3 Ga, ao dos multicelulares (meta- da vida era marinha. No Permiano os continentes
zoários), que evoluíram para formas mais comple- haviam se reunido num supercontinente que se
xas, assim como ao advento da reprodução sexuada denominou Pangea (em português, adota-se Pan-
há uns 2 Ga. Há cerca de 700 Ma, portanto já pró- géia); vários autores consideram esse fator como a
ximo do final do Proterozóico, um acontecimento principal causa da grande extinção.
biológico importante ficou assinalado pelo apa- Outros quatro episódios expressivos de extin-
recimento da primeira fauna de metazoários, ani- ções se deram no Ordoviciano Superior quando
mais multicelulares certamente marinhos, encon- 57% dos gêneros marinhos desapareceram; no
trados em Ediacara no sul da Austrália (Gaessner Devoniano Superior, com grande perda de famílias
1984) e também em outros continentes. Eram de invertebrados marinhos e de peixes; no Triásico
animais moles, aparentemente não vinculados a Superior, com o desaparecimentos de répteis e an-
phyla fanerozóicos. fíbios primitivos e de 75% das espécies de inver-
Tal fauna sofreu extinção em massa antes do tebrados marinhos. A última grande extinção se deu
término do Proterozóico, sucedendo-se, após no Cretáceo terminal. Foi a segunda em grandeza,
algumas dezenas de milhões de anos, a explosão tendo-se realizado há 65,5 Ma, no limite entre o
cambriana quando, a par de animais de corpo mole Cretáceo e o Terciário (conhecido como limite K-
embora complexo, surgiram os primeiros meta- T). Causou o desaparecimento de 47% dos gêne-
zoários providos de carapaças, pernas e outros apên- ros animais, incluindo os répteis voadores e mari-
dices duros, passíveis de fossilização. Uma evolução nhos e muitos dos terrestres, como os dinossauros.
explosiva da vida animal, toda ela marinha, levou, Extinguiram-se cerca de 15% das famílias de ani-
nessa ocasião, ao aparecimento dos phyla de quase mais marinhos, inclusive as amonitas (Sepkoski Jr.
todos os metazoários modernos. Esse evento é um 1982). Nos dez milhões de anos finais do Cretáceo
marco importante na escala do tempo geológico pelo menos 30 gêneros de dinossauros habitavam
baseada na evolução da vida, assinalando o início o planeta, vários dos quais viveram até o limite K-
do Eon Fanerozóico. T, porém nenhum parece ter sobrevivido à grande
De acordo com a evolução da vida os Eons são extinção. Dos répteis só restaram crocodilos, lagar-
divididos em Eras, estas em Períodos, que por sua tos, tartarugas e cobras.
vez se dividem em Épocas, que ainda admitem sub- Os primeiros vegetais terrestres são represen-
divisões menores determinadas por gêneros e espé- tados por esporos provenientes de plantas desco-
cies fósseis característicos e datações radiométricas. nhecidas, datados do Ordoviciano Inferior. Na
Na correspondência com a coluna estratigráfica os época mais nova do período Siluriano os escorpi-
períodos equivalem aos sistemas e as épocas às sé- ões foram os primeiros animais a adotarem a res-
ries. A figura 4 indica as divisões maiores da escala piração aérea. Os insetos voadores mais antigos
do tempo geológico, sua idade em anos e relações surgiram no Devoniano. Os primeiros vertebrados,
com as etapas maiores da evolução da vida. representados por peixes cobertos por couraças e
Uma dúzia de extinções em massa da vida ani- sem maxilar (ostracodermos) são do período
mal manifestou-se durante o Fanerozóico. A maior Ordoviciano. Os verdadeiros peixes, ainda com
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Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M. TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005
esqueleto interno pouco ou não ossificado, são do dos carvões que deram o nome ao sistema.
Devoniano Inferior. No Devoniano Superior os No Triásico Superior e início do Jurássico co-
vertebrados ganharam a terra com o aparecimento meçou a se partir o supercontinente Pangéia, frag-
dos anfíbios, que originaram os répteis no Carbo- mentação que se acentuou no decorrer do Jurássico
nífero Superior. Nos tempos mais novos deste e Cretáceo. A grande extensão de plataformas con-
período desenvolveram-se as florestas de Cryp- tinentais dela decorrente e as transgressões mari-
togamas Vasculares e Gymnospermas formadoras nhas favoreceram a diversificação dos invertebrados
Mamíferos"
Mioceno
Terciário Oligoceno
Eoceno
Paleoceno Extinção dos dinossauros
65,5 e muitas outras espécies
Cretáceo
Fanerozóico
Mesozóico
Anfíbios abundantes
Devoniano
416 Primeiros insetos fósseis
Siluriano Primeiras plantas terrestres
443
Ordoviciano "Idade dos Primeiros peixes
488 Trilobitas
Cambriano Invertebrados"
Primeiros organismos com conchas
542
Proterozóico
4566
Origem do Sistema Solar
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TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005 Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M.
de águas rasas. Os vertebrados passaram a evoluir, 70% de espécies de conchas recentes de Pleistoceno
diferenciando-se nos continentes separados. Os (o mais recente), que mais tarde foram unidas ao
répteis tornaram-se importantes, com o apareci- Recente (Holoceno), para constituir as duas séries
mento dos crocodilianos, dinossauros terrestres, do sistema Quaternário. Paleoceno foi introduzi-
plesiossauros e ictiossauros marinhos e pterossauros do mais recentemente na coluna estratigráfica, para
voadores. Surgiram os mamíferos no fim do Triá- incluir algumas camadas que antes eram supostas
sico, originados dos répteis, mas sua evolução foi pertencerem ao final do Cretáceo.
lenta até o fim do Cretáceo. De acordo com recen-
te identificação de penas no dorso de um pequeno
réptil do Triásico Superior, Longisquama insignis, c. Causas das extinções em massa
feita por paleontólogos americanos e russos, ele foi
A partir da década de 80 vem sendo dada cres-
um ancestral das aves, que até agora tem-se consi-
cente atenção à possibilidade de a extinção em mas-
derado provirem dos répteis dinossauros.
sa no limite KT ter sido causada pelo impacto,
Durante o Jurássico continuaram e evoluir as
possivelmente no oceano, de um asteróide ou co-
faunas vindas do período anterior, acrescidas de
meta. Pesquisadores da Universidade da Califórnia
aves primitivas, como o célebre Archaeopteryx. Os
encontraram em Gubbio, na Itália, uma fina cama-
répteis ganharam grande importância e juntamen-
da de argila, antiga de 65 milhões de anos, parti-
te com os do Cretáceo justificam reconhecer-se o
cularmente rica no elemento químico irídio, que é
Mesozóico como a Era dos Répteis. A vegetação,
cerca de 10.000 vezes mais abundante em meteo-
constituída sobretudo de coníferas e cicadáceas co-
mo no Triásico, viu surgirem as Angiospermas, as ritos rochosos que nos materiais crustais. Essa ca-
primeiras plantas com flores. mada acha-se na passagem de camadas que con-
No Cretáceo a flora e a fauna vindas do período têm fósseis de dinossauros para outras acima, que
anterior continuaram sua evolução sem grandes não os possuem e pertencem ao Paleoceno Inferior.
transformações. Os répteis terrestres, marinhos e Alvarez et al. (1980) propuseram que o planeta foi
voadores atingiram seu apogeu. Na flora cretácea atingido nessa ocasião por um asteróide com cerca
destaca-se o papel crescente das Angiospermas em de 10 km de diâmetro, ou cometa (Hsü 1980).
relação às Gimnospermas. O mais antigo fóssil co- Numerosos cientistas concordam hoje que um
nhecido das Angiospermas pertence ao Hauteri- grande objeto chocou-se com o planeta por oca-
viano e o Cenomaniano é abundante em fósseis sião da extinção dos dinossauros. Cerca de uma
desses vegetais. centena de anomalias de irídio são hoje conheci-
Em 1760 o italiano Arduino, numa tentativa das nesse limite. Admitindo-se que o bólido caísse
de dividir os estratos, propôs sua classificação em no oceano abriria uma cratera com cerca de 200
Primitivos, Primários, Secundários e Terciários. Os km de diâmetro, afastaria a atmosfera em seu tra-
três primeiros termos caíram em desuso, mas per- jeto e formaria uma bola de fogo de alguns milhares
maneceu o Terciário, tendo Lyell denominado Pós- de quilômetros, que ventos de centenas de quilô-
Terciários os estratos que incluíam os produtos da metros por hora espalhariam, queimando a vege-
grande glaciação e restos humanos, que posterior- tação e matando os animais terrestres. As águas
mente viriam a fazer parte do período Quaternário. oceânicas seriam revolvidas, provocando turbilhões
As camadas correspondentes à Era Cenozóica que levariam águas da superfície ao fundo e deste
(Fig. 4, Quadro 1) foram divididas primeiramente elevariam águas frias pobres em oxigênio, com
por Lyell em seus Princípios de Geologia (1830- efeitos catastróficos para a vida. Tsunamis gigantes
1833), em três séries, com as designações de Eoceno varreriam as costas em todo o mundo. A poeira es-
(que significa aurora do recente) cujas camadas cureceria a atmosfera durante meses, causando uma
continham somente 3 a 4% das conchas moder- noite que inibiria a fotossíntese. Produzir-se-ia
nas; Mioceno (menos recente), com cerca de 18% chuva ácida, e a camada de ozônio, afetada, permi-
de conchas recentes e Plioceno (mais recente) com tiria a penetração da intensa radiação ultravioleta
mais de 40% de conchas recentes em sua fauna. solar mortífera.
Em 1854 a parte superior do Eoceno foi separada É fácil imaginar os efeitos dessa catástrofe para a
com a denominação de Oligoceno (pouco recen- vida, tal como na instigante simulação do fenôme-
te). Em 1839 Lyell chamou as camadas contendo no na abertura do filme Armageddon. Mas existem
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Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M. TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005
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TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005 Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M.
que provocou luminescência em um papel cober- Joly (1908) reconheceu que certos halos ob-
to de platicianeto de bário em 1895. A lumines- servados em algumas amostras de rochas ao micros-
cência continuava, porém, enquanto o tubo de raios cópio eram causados por minerais radioativos. Ele
catódicos estivesse energizado. Aparentemente ele também mediu as concentrações de Th e Ra nos
emitia uma radiação misteriosa que podia pene- diferentes tipos de rochas e em 1909 publicou o
trar e ser impressa em papel preto os famosos livro intitulado Radioatividade e Geologia no qual
raios-X de Roëntgen. Becquerel, motivado pela sumariava suas conclusões. Destacava-se a idéia de
descoberta, retomara seus estudos anteriores com que a radioatividade forneceria a energia requerida
os sais de urânio. Para verificar se estes eram res- para a construção das montanhas.
ponsáveis pela emissão de raios-X, recobriu uma A radiação ionizante descoberta pelos Curie
chapa fotográfica com papel preto e colocou alguns levou Rutherford, que já havia estudado a ionização
cristais de sulfato de urânio em cima deste, expon- dos gases pelos raios-X, a efetuar um estudo desta
do o pacote à luz solar. Os cristais emitiram uma natureza, porém com a radiação emitida pelo Ra.
radiação invisível que atravessou o papel preto e Pouco tempo depois ele mostrara que a radiação
foi registrada na chapa fotográfica. A experiência, era originada a partir das substâncias radioativas e
embora simples, mostrou que os sais de urânio e consistia de três componentes denominados alfa
eventualmente até mesmo minerais de urânio po- (a), beta (b) e gama (g). O componente alfa, na rea-
deriam emitir radiação contínua mesmo quando lidade, é um núcleo do gás nobre Hélio (He). O
não expostos à luz solar. beta foi identificado como sendo elétrons. Somente
A descoberta animou grande número de pes- o raio gama mostrou ser uma radiação eletromag-
quisadores jovens como o casal Marie e Pierre nética semelhante aos raios-X de Roëntgen.
Curie. Esta devotou-se à procura sistemática de A teoria da desintegração radioativa formulada
outros elementos e compostos semelhantes aos por Rutherford e o químico Soddy diz que os áto-
utilizados por Becquerel e que emitissem radiação mos dos elementos radioativos se desintegram es-
similar, tendo descoberto que minerais de U e Th, pontaneamente formando átomos de outros ele-
conforme Becquerel já suspeitava, também emi- mentos e emitindo partículas alfa e beta. A desinte-
tem radiação, mais ativa que a dos sais destes ele- gração radioativa é evento estatístico, pois não se
mentos. Ao pesquisar com o minério da mina de pode prever nem a identidade de um átomo parti-
Joachimsthal (Tchecoslováquia), o casal Curie con- cular que irá se desintegrar nem o momento exato
seguiu provar a idéia e descobriu dois novos ele- em que o evento ocorrerá. No entanto, a inten-
mentos com propriedades semelhantes: Polônio sidade de radiação é proporcional ao número de
(Po) e Rádio (Ra). O fenômeno recebeu o nome átomos radioativos presentes. Os pesquisadores su-
de radioatividade pelas emissões observadas a partir geriram ainda que a estrutura do átomo era forma-
do Ra e rendeu o prêmio Nobel de Física de 1903 da por um núcleo (prótons) rodeado por uma co-
para o casal. roa eletrônica, formada por elétrons. Soddy, em
O efeito da descoberta na Geologia foi pro- outro grupo de trabalho, reconheceu as séries do
fundo, pois facilitava uma nova linha de pesquisa, U e do Th, verificando que ambos possuíam di-
visando medir a radioatividade das rochas. ferentes taxas de desintegração. As novas formas
A radioatividade gera calor nas rochas, pois é resultantes dessas desintegrações foram iden-
processo exotérmico, e também é um meio eficaz tificadas como elementos químicos, cuja caracterís-
de medida da idade de minerais e rochas. A possibili- tica principal é a presença de átomos de Th, porém
dade foi percebida tanto por Rutherford como Bolt- com pesos atômicos distintos. As diferentes amos-
wood, já em 1905. O primeiro propôs que se esti- tras de Th existiriam na mesma posição do Th ori-
masse a idade da série de minerais de U a partir da ginal na Tabela Periódica e constituiriam isótopos
quantidade de He neles acumulada; aplicara este (em grego: mesmo lugar).
método em inúmeros minerais de U e obtivera um Vários pesquisadores dedicaram-se a procurar
valor aproximado de 500 Ma. Boltwood publicou e caracterizar os isótopos. Após o término da Pri-
a seguir os resultados das primeiras determinações meira Guerra Mundial, um deles, Aston, tentou
de idade de três amostras de uraninita com base construir equipamentos que confirmassem e carac-
nas suas relações U/Pb. Os valores, entre 410 e 535 terizassem os isótopos: os espectrômetros de massa.
Ma, considerados razoáveis, são hoje concordantes Recebeu o prêmio Nobel em 1922 pela descoberta
com as idades obtidas por técnicas mais modernas. de 212 dos 287 isótopos de ocorrência natural.
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Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M. TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005
Partícula alfa
A enorme ampulheta, que mede a destruição das Núcleo radioativo Carga + 2
rochas na terra e a sua formação no fundo do mar, perde 2 cargas e 2 unidades de massa Massa 4
trabalha ininterruptamente. Decaimento beta
Arthur Holmes (1923, p. 11) Partícula beta (elétron)
Núcleo radioativo Carga - 1
ganha 1 carga Massa desprezível
Para estudar os problemas ligados à idade da Ter-
ra, Arthur Holmes começou medindo a composi- Captura de elétrons
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TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005 Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M.
que sejam as condições físicas e químicas, como na teoria é considerado infinito. No entanto, é sim-
pressão, temperatura e soluções-tampão. Os áto- ples determinar o tempo de desintegração da me-
mos de um nuclídeo radioativo específico, qual- tade dos átomos pais radioativos de determinado
quer que seja a sua idade, possuem cada um a mes- sistema, a chamada meia-vida.
ma probabilidade de preservação ou desintegração. Cada nuclídeo radioativo possui uma meia-
O processo é estatisticamente caótico e, por isto, vida única, t1/2, que se relaciona à sua constante de
pode-se estabelecer a desintegração por meio de desintegração. Isto é fundamental para a datação
uma constante de desintegração (g) que indica a radiométrica pois os métodos utilizados têm por
proporção de átomos radioativos existentes que se base a acumulação dos átomos-filho produzidos
desintegrarão na unidade de tempo. por um pai radioativo. Ao se formar, um mineral
O número total de átomos para desintegrar-se ou rocha contém somente o nuclídeo radioativo:
será dado por gN, onde N é o número total de áto- admite-se que a quantidade de filhos radiogênicos
mos radioativos pais que estão no sistema. Desde seja igual a zero. Portanto, a razão filho/pai inicial
que N decresce constantemente pela desintegra- é zero e a idade indicada também é zero. A desinte-
ção de uma dada amostra, o número real de áto- gração progressiva de átomos-pais radioativos pro-
mos a se desintegrar decrescerá com cada interva- duz átomos-filhos radiogênicos, que ficam aprisi-
lo sucessivo de tempo na proporção da redução do onados em suas respectivas posições no retículo
número de átomos radioativos pais sobreviventes. cristalino (Fig. 6).
O tempo de vida de um elemento pai radioativo Conhecendo-se a constante de desintegração
em um dado sistema não pode ser especificado, pois do pai radioativo, necessita-se apenas medir no sis-
tema a proporção de nuclídeos-filhos e pais (No/
Nt) de modo a calcular o tempo em que o sistema
Estado inicial Uma meia-vida Duas meias-vidas
depois depois se originou (Fig. 7), em anos antes do presente.
O tempo, chamado de idade radiométrica do
sistema, é calculado pela equação:
Idade= ln (átomos-filho/átomos-pai + 1) X 1/l
0
za-se a meia-vida (t1/2) que é o tempo requerido
1/4 0 1 2
para que a metade da quantidade original de isótopo
presente no sistema seja desintegrada:
1/16
λ t1/2 = ln 2
0 1 2 3 4 5 6 t1/2 = ln 2/λ = 0,693/λ
1/2 = 1 meia-vida tempo
Duas suposições são fundamentais: o sistema
Figura 7 Funções lineares e exponenciais permaneceu fechado (nenhum átomo-pai ou filho
(modificado de Eicher 1969) foi adicionado ou removido do sistema quando este
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ser precisamente determinado como parte do pro- que contenham diferentes teores de Rb. Com isto
cesso de datação. Essa quantidade será subtraída torna-se possível a montagem da isócrona (Fig. 10).
quando do cálculo final da idade da amostra, para Supõe-se que, no tempo em que as amostras
evitar erros, uma vez que não foi originada pela cogenéticas foram formadas (tempo zero inicial),
desintegração do 87Rb contido. as razões 87Sr/86Sr eram as mesmas para todas, mas
O Sr original sempre contém 86Sr não-radio- era variável o conteúdo em Rb. Caso tivéssemos
gênico, que é facilmente detectado. Inicialmente, oportunidade de analisar estas amostras de rocha
a análise de uma amostra pobre em Rb permite de- logo após a sua formação conseguiríamos plotá-las
terminar a razão 87Sr/86Sr que se mantém no mate- segundo uma linha horizontal no gráfico da figura
rial a ser datado; uma vez que a quantidade de 86Sr que mostra a relação 87Sr/86Sr como eixo das orde-
na amostra não muda com o passar do tempo, procu- nadas e a razão 87Rb/86Sr como abcissa. Com o pas-
ra-se em seguida uma amostra rica em Rb pois pre- sar do tempo, o conteúdo de 87Rb deve decrescer
cisamos conhecer o valor do 86Sr (Fig. 9). Conhe- gradualmente, pois é transformado em 87Sr, o qual
cendo-se a relação inicial 87Sr/86Sr da amostra, po- deverá aumentar proporcionalmente nas amostras.
demos determinar a quantidade de 87Sr que é origi- No diagrama da figura 10 tal situação é acompa-
nal e aquela que é proveniente da desintegração do nhada pelo deslocamento da linha A-A, que irá
87
Rb. A idade é então calculada pela relação filho/pai reproduzir o comportamento atual das amostras
radioativo. É uma idade convencional, ideal para ro- cogenéticas (B-B). A série de amostras continua a
chas com minerais excepcionalmente ricos em Rb. definir uma linha reta, cuja inclinação em relação
Como isto nem sempre é possível ou surgem à reta horizontal inicial deve aumentar sistemati-
dúvidas quanto ao real valor do 87Sr, original, pro- camente com o tempo. A linha assim definida é a
cura-se utilizar o Método da Isócrona. Para aplicação isócrona e a inclinação atual indica a idade radiomé-
são necessárias várias amostras de rochas cogenéticas11 trica da rocha. Além disso, o ponto onde a isócrona
intercepta o eixo das ordenadas nos indica a razão
87
Sr/86Sr inicial do sistema.
2. Urânio-Chumbo em zircões
O Método Urânio-Chumbo, embora conheci-
87 do há bastante tempo, somente agora vem tendo
Rb
87
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Sr
então um elemento-chave para a detecção da quan-
tidade de chumbo original. Se é detectado no mine- Figura 10 - Montagem da isócrona do Método Rb/Sr
ral o 204Pb, que constitui uma fração do chumbo pre-
sente, então os outros isótopos como o 206Pb e o 207Pb Tabela 3 Isótopos dos elementos químicos Samário
também deveriam estar presentes quando da forma- e Neodímio (Geyh & Schleicher 1992)
ção do mineral. A composição isotópica do chum-
bo comum pode ser obtida a partir de amostras que
Elemento Isótopos
144
sejam pobres em urânio, à semelhança do que é fei- Sm Sm, Sm, Sm, 149Sm, 150Sm, 152Sm, 154Sm
147 148
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4. Carbono-14
206
Pb
238 A utilidade do 14C para datação ra-
U
1,2 4,9
diométrica foi demonstrada inicial-
4,8
4,5 4,6 mente por Libby em 1947. Na realida-
1,0
4,0 de, este isótopo, ao contrário dos outros
0,8 3,5
tradicionalmente utilizados para data-
ção, faz parte de um grupo de nuclídeos
0,6 3,0
2,5 radioativos de curta duração, origina-
0,4 2,0 dos na porção superior da atmosfera,
Material fino de superfície
onde partículas cósmicas de alta ener-
0,2 1,0 Brecha vulcânica
gia bombardeiam os núcleos do oxigê-
nio e do hidrogênio ali presentes fazen-
0 20 40 60 80 100 120 do com que estes liberem átomos. Os
207
Diagrama concórdia (Ga) Pb átomos assim produzidos irão se cho-
235
U car com átomos de nitrogênio - tam-
bém encontrados nas porções elevadas
Figura 11 Montagem da curva concórdia do Método U/Pb
para amostras de rochas trazidas da Lua da atmosfera resultando na formação
do 14C, cuja meia-vida é de aproxima-
damente 5.730 anos.
é igual à do RCHUR. Contudo, processos responsá- O radiocarbono produzido é oxidado para a
veis pela formação do magma do manto ocasionam forma de dióxido de carbono (CO2) e passa a fazer
fracionamento químico do Sm e do Nd em relação parte da atmosfera e, eventualmente, da hidrosfera
à sua fonte. O fator de fracionamento é definido (Fig. 13). Assim, pode entrar no ciclo geral do car-
pela relação: ƒSm/Nd = (Sm/Nd)amostra/(Sm/Nd)CHUR. bono na Terra como também pode ser dissolvido
Então ƒSm/Nd = 1 para a linha de evolução nos oceanos, precipitado em associação com os
CHUR. Para a maior parte das rochas curstais, este minerais carbonáticos ou utilizado pelos diferen-
fator é inferior a 1, o que significa que o Nd está se tes animais e plantas.
enriquecendo em relação ao Sm na crosta durante Os seres vivos acham-se em equilíbrio com a
o fracionamento e separação do manto. Contudo, atmosfera e o dióxido de carbono radioativo é absor-
a geração da crosta continental ocasiona depleção14 vido e usado pelas plantas, entrando finalmente na
de elementos nesse reservatório. Material do manto cadeia alimentar e no ciclo do carbono. As peque-
depletado tem uma linha de evolução diferente do nas quantidades de 14C radioativo passam a fazer
CHUR (De Paolo 1981) e assim quando idades- parte da estrutura dos animais, plantas e minerais
modelos são calculadas, os parâmetros para o manto propiciando-nos uma ferramenta extremamente
depletado devem ser utilizados aos níveis daqueles útil para datar com precisão os últimos 50.000 anos
de evolução do CHUR. O modelo assume que a da história da Terra (Tab. 4), assumindo-se que a
relação Sm/Nd somente será significativamente taxa de produção de Carbono-14 (e portanto a
alterada por processos geológicos subseqüentes, co- quantidade de raios cósmicos que atingem a Ter-
mo o metamorfismo ou processos ligados a ero- ra) tenha sido constante durante os últimos 70.000
são, desde que o sistema Sm/Nd tenha funciona- anos. Este limite relaciona-se ao fato de que, após a
do como um sistema fechado. Com isto torna-se morte do organismo que incorporou 14C, este não
possível o estabelecimento de uma linha a partir é mais adquirido (Fig. 13) e, com o tempo, vai pro-
das razões atuais 143Nd/144Nd e 147Sm/144Nd que, ao gressivamente sendo desintegrado para 14N. Como
interceptar-se com a linha de evolução do CHUR, os valores são muito pequenos é quase impossível
indicará uma idade modelo para o tempo de dife- a medição direta dos isótopos. Neste caso, opta-se
renciação dessa rocha a partir do manto. pela contagem da atividade de emissão beta do es-
pécime a ser datado e sua comparação com um pa-
drão cuja atividade seja muito bem conhecida.
13 CHUR sigla derivada da expressão em Inglês: Chondritic
uniform reservoir
O número de emissões em um dado período de
14 Depleção significa perda, subtração gradual. Duarte (1997) tempo é proporcional ao número de átomos do 14C
refere-se a exaustão de uma jazida de petróleo. ainda presentes na amostra; quanto mais antigo,
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Aplica-se a intervalos
Método Baseia-se em
da ordem de (anos)
Análise de ciclos de Ciclos anuais e das 3.000
crescimento de árvores manchas solares
Análise de estratos Ciclos anuais, das manchas 15.000
argilosos solares e de precessão de equinócios
Carbono-14 Matéria orgânica morta 30.000 - 50.000
Métodos geológicos Velocidades admitidas de processos Sob restrições, a todos
como intemperismo, erosão etc. os períodos geológicos
Datação por U-Pb Decaimento radioativo de elementos Todos os períodos
e outros encontrados em rochas e minerais geológicos
menor deve ser essa atividade, o que nos limita ao A técnica é especialmente útil para alguns mi-
valor máximo datável de 50.000 anos. O Método nerais específicos como a apatita e o zircão, mas
14
C é utilizado para datação de matéria orgânica, pode ser empregada na datação de micas, tectitos
madeira, carvão, ossos, turfa e artefatos como roupas naturais e sintéticos (artificiais) e vidro. Os traços
e cerâmicas, além de conchas e calcários recentes. de fissão apresentam importante propriedade que
é o seu apagamento, ou seja, o desaparecimento
gradual quando submetidos a determinadas tempe-
h. Outros métodos de determinação de idades: raturas. Assim, os traços de fissão também permi-
exemplo dos traços de fissão tem a obtenção de idades aparentes, relacionadas à
Diversos métodos de determinação radiométrica sua reorganização quando estiveram submetidos a
de idades de rochas acham-se hoje bem desenvolvi- reaquecimento (idades de eventos térmicos).
dos e são aplicados a diferentes situações e ambien-
tes geológicos. Uma revisão abrangente acha-se em 6. Como decifrar o registro das rochas?
Dickin (1995) e Attendorn & Bowen (1997). Dentre
eles, o Método dos traços de fissão baseia-se na fis- O atualismo
são do U, que resulta no aparecimento de 2 fragmen-
É importante salientar o tema da uniformidade
tos, um mais leve e outro mais pesado, na liberação no comportamento da natureza, idéia fundamental,
de nêutrons e energia. Os fragmentos resultantes embora aparentemente simples. Leonardo da Vinci,
desta fissão recebem energia cinética e, graças a no século XVII foi o primeiro a formulá-la, ao dei-
forças repulsivas coulombianas, irão adquirir movi- xar implícito que só se poderia comprovar sua Lei
mentos em sentidos opostos. Os fragmentos ioni- da Superposição por meio de analogias com o pre-
zados, ao se deslocar através da estrutura de deter- sente geológico. Hutton, mais tarde, propôs o uni-
minados sólidos isolantes ou semi-condutores pro- formitarismo da natureza, nas três edições conheci-
vocam o aparecimento de defeitos (sob a forma de das de sua obra Theory of Earth, with proofs and
trilhas) que recebem o nome de traços latentes. illustrations, de 1793. Em uma delas, ele afirmou:
Os traços latentes são facilmente visíveis com o
microscópio eletrônico. No entanto, ataques quími- O homem percebe com prazer a ordem e a regulari-
cos específicos melhoram a visualização dos traços dade com que se apresentam as obras da natureza, em
pois permitem ampliar seus tamanhos. Com isto, vez do natural desgosto ante a desordem e confusão.
Se a pedra que hoje cai, amanhã se alçasse, seria o fim
os traços tornam-se visíveis ao microscópio óptico
da filosofia natural, nossos princípios fracassariam e
sendo então denominados traços de fissão. A etapa não continuaríamos investigando as regras da nature-
seguinte é a contagem dos traços aumentados (ou za segundo nossas observações (...);
anotação da densidade de traços em uma dada área).
O número de traços por unidade de área é uma função Na passagem para o século XIX, Playfair (1802)
da idade do material e da concentração de urânio. divulgou e aplicou mais claramente a teoria.
27
Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M. TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005
0,508
O presente é a chave do passado.
an
(m
UR
CH
em CO2 atmosférico
Alta atmosfera
nêutron de
raio cósmico Figura 13 Formação
do isótopo
Perda de radioativo 14C,
próton pelo bombardeio
de átomos de
14 14
7 C C
6
nitrogênio por
raios cósmicos. O
isótopo 14C entra
na molécula de
CO2 e acaba
incorporado a
sedimentos
carbonosos e
5.700 anos 17.100 anos 45.000 anos restos orgânicos
50 anos de idade (modificado de
(1/2 14C remanescente) 14
(1/8 C remanescente)
14
( C insignificante)
Eicher & McAlester
1980)
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TERRÆ DIDATICA 1(1):6-35, 2005 Carneiro, C.D.R, Mizusaki, A.M.P., Almeida, F.F.M.
natural seria irreversível, contrariando a repetição plenamente aceito que as leis que governam os fenô-
uniforme dos eventos naturais ao longo do tempo. menos terrestres sejam imutáveis (proposição a):
Uma tempestade de críticas assolava, no início do trata-se de ponto de partida (ou seja, um princípio)
século XX, o princípio fundamental da Geologia. para se realizar ciência. Portanto, subsiste a idéia de
Diante das objeções no aspecto da energia, as velo- uniformidade no aspecto dos fenômenos físicos.
cidades dos processos não poderiam ter-se man- A segunda proposição é também generalizada-
tido uniformes durante o tempo geológico. mente aceita pois os processos terrestres atuais ocor-
Ainda que a descoberta da radioatividade como reriam da mesma maneira (mas não necessariamente
fonte de calor endógeno na crosta afastasse as res- com a mesma intensidade) desde o passado (pro-
trições, no lado quantitativo dos processos, o avanço posição b). As proposições a e b tratam da-
do conhecimento geológico trouxe novas restrições, quilo que permanece, sob quaisquer circunstâncias,
agora qualitativas, às mudanças radicais de condi- invariável no tempo e no espaço; expressam a regu-
ções do ambiente geológico terrestre ao longo do laridade (por exemplo, a lei da gravidade, as leis da
tempo. As mudanças na composição da atmosfera termodinâmica etc.).
e mesmo o aparecimento ou expansão da vida, por As duas últimas, porém, foram profundamente
exemplo, poderiam ter provocado a extinção de abaladas, por envolverem fatos singulares, impos-
alguns processos e surgimento de outros. Novas síveis de se estudar sob a ótica estrita do uniformi-
causas, produzindo novos resultados. Outra res- tarismo. A terceira e quarta proposições foram rejei-
salva é que mesmas forças, atuando em configura- tadas graças a aspectos da natureza que variam com
ções distintas de um mesmo material, poderiam as circunstâncias, ou seja, fatores contingentes ou
produzir, inevitavelmente, resultados diversos. históricos. Não persistem em termos físicos, pois
O conjunto de objeções ao enunciado clássico inúmeros fatores modificaram-se ao longo do tem-
do princípio pode ser resumido em duas idéias po, como a duração dos dias do ano ou a intensida-
(Carneiro et al. 1994): de e natureza da radiação solar. Os aspectos singula-
A. novas condições (em quantidade e qualidade) res do uniformitarismo não constituem princípios
gerariam novas causas, novos processos e no- da ciência histórica e tampouco da ciência física.
vos resultados; Sintetizando o problema, Gould (1967) distin-
B. mesmas causas atuando em configurações di- guiu dois tipos de uniformitarismo:
versas gerariam resultados diferentes. l Uniformitarismo substantivo, que engloba as qua-
Tais objeções levam-nos a indagar sobre o que, tro proposições referidas. Segundo o autor, uma
afinal, restou do princípio do uniformitarismo tal visão do comportamento da Natureza moder-
como foi concebido originalmente por Hutton e namente inaceitável.
Lyell, no século passado? l Uniformitarismo metodológico, que engloba so-
É possível distinguir quatro proposições no mente as duas primeiras e ficou conhecido co-
enunciado (Gould 1965, 1967): mo Atualismo. Para as ciências físicas isso pode
a) a uniformidade das leis: as leis da natureza são ser um princípio, mas para a ciência histórica
invariáveis, no espaço e no tempo; não passa de um método, ou seja, é um dos
b) a uniformidade dos processos terrestres (atua- métodos históricos em Geologia, que atende à
lismo): os eventos geológicos do passado en- noção de simplicidade.
volveram processos de natureza essencialmente O Atualismo tem especial importância na Geo-
igual à dos que atualmente ocorrem; logia, porém é apenas um dos métodos históricos.
c) uniformidade de velocidades (gradualismo): os Como método da Geologia, envolve aplicação de
processos operariam com idênticas velocida- raciocínio indutivo e de analogias para o estudo dos
des, ainda que extremamente lentas e quase fenômenos do passado, além de depender das pistas
imperceptíveis aos sentidos humanos; obtidas do presente. O exemplo dos corais é típico:
d) uniformidade de condições (não-direciona- sabemos que atualmente os recifes de corais cres-
lismo): os ciclos naturais seriam intermináveis cem em águas tropicais, dentro de um espectro mui-
e a Terra, um lugar em constante mudança. to restrito de tolerâncias, e podemos assumir que
A primeira proposição relaciona o comporta- formas comparáveis viveram sob condições muito
mento da Natureza à constância das leis físicas, mas similares no passado, mas persiste a evidente res-
não é peculiar ao uniformitarismo nem à Geologia, trição de que os corais possam ter mudado seus há-
pertencendo ao domínio das ciências físicas. É bitos com o passar do tempo (Ager 1963, p. 33).
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b. O gradualismo e a noção de mudança pontuada mentos e outros fenômenos podem ser considera-
O gradualismo proposto por Lyell (proposição dos agentes episódicos regulares (Tab. 4) e não são
c) ainda que consiga explicar alguns fatos geoló- propriamente eventos raros, embora o possam ser
gicos, é demasiadamente restritivo e não permite para os padrões humanos.
explicar todas as mudanças na história física e bioló- Um evento raro depende de uma combinação
gica da Terra. O catastrofismo, em suas recentes ou conjugação especial de fatores que incluem tanto
versões, vem sendo retomado por autores que bus- aqueles intrínsecos como os extrínsecos ao planeta.
cam desligá-lo do forte compromisso com a idéia Para sintetizar as inúmeras evidências de mudanças
anterior de criacionismo científico. rápidas em escala global entremeadas com longos
Gretener (1984) destaca a importância dos pro- intervalos de monotonia, Gretener (1984) afirma
cessos episódicos em geologia, quando compara- que a história da Terra revela longos períodos de
dos aos processos contínuos; assinala ainda que o tranqüilidade interrompidos por momentos de
termo catastrofismo possui a conotação de de- ação. Essa proposição seria coerente com a impor-
sastre, dada por imagens de destruição e escom- tância relativa dos processos episódicos; dentre eles,
bros (Gretener op. cit., p. 85), e prefere o termo cabe atenção os chamados probabilidade de ocor-
pontuação, proposto por Gould (1977, apud rência seria da ordem de 95%, para que ocorram
Gretener 1984, p. 81), para referir-se à natureza pelo menos uma vez ao longo de intervalos de tem-
descontínua dos processos episódicos. po muito distintos.
O conceito de mudança pontuada (punctuational
change), da moderna geologia, pertence a uma vi- 7. Experimentos educativos e simulações
são pluralista da natureza: a mudança é marcada
por episódios curtos que quebram o equilíbrio an- A vasta bibliografia sobre métodos de determi-
terior e rapidamente estabelecem nova condição nação de idade radiométrica de rochas concentra-se
(Gould 1984). O modelo enfatiza a estabilidade em artigos especializados e compêndios científi-
duradoura dos sistemas terrestres e, por outro lado, cos sobre idades das formações geológicas. Textos
a concentração da mudança em momentos defini- didáticos são mais escassos, sobretudo em Português,
dos. Um exemplo, dentre outros, seria o impacto justificando um esforço adicional para facilitar a
de um asteróide com o planeta, possibilidade acei- compreensão do tema Tempo Geológico pelos estu-
ta hoje pela astronomia. A probabilidade de ocor- dantes, que é complexo e integrador de vários outros
rência de um evento raro, em geologia, embora conceitos da moderna Geologia, como: cronologia
possa ser extremamente baixa, jamais pode ser con- de eventos, duração, correlação, mudança geológica,
siderada nula. Assim, deve-se manter uma clara fácies e sucessão de causas. Enumeramos acima as-
distinção entre as idéias de impossível e impro- pectos fundamentais desses conceitos, mas cabe ci-
vável (Gretener 1984, p. 79). Sob o ponto de vista tar algumas abordagens didáticas disponíveis em pu-
geológico, tempestades, inundações, escorrega- blicações introdutórias ou artigos metodológicos.
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8. O dilema entre medir ou seqüenciar datado em 620 Ma, formado por duas partes: uma
clara e outra mais escura, quase preta. Sabe-se que
idades de rochas... rochas metamórficas originam-se a partir de ou-
A aplicação dos princípios da Estratigrafia, da tras, preexistentes, e, portanto, o primeiro problema
Paleontologia e dos métodos de datação inicia-se é saber qual das duas partes, que no exemplo é um
com o estudo das unidades geológicas no campo. gnaisse, formou-se primeiro e quais as etapas em
A partir dessa base de dados, pode-se definir correta- que se originou a rocha metamórfica.
mente qual (ou quais) evento(s) se pretende datar Na figura 15 nota-se que a rocha é cortada por
utilizando-se as técnicas da Geocronologia. Assim, falhas. Sabe-se ainda que, na metade direita da foto,
é possível selecionar as amostras de rocha mais ade- o gnaisse é atravessado por pequena intrusão de dio-
quadas, ou seja, mais representativas do material a rito; as falhas atravessam apenas o gnaisse não cor-
ser datado, o que requer controle rigoroso das amos- tam o diorito. Os minerais componentes da rocha
tras de rocha, bem como um cuidadoso estudo da permitem obter datações, mas as falhas muitas ve-
idade geológica dos materiais. Evidências de idade re- zes não oferecem material adequado. Admita-se que,
lativa são, pois, essenciais para se determinar a ida- nos mapas, ambos os corpos (o de gnaisse, meta-
de geológica: é preciso estabelecer as relações entre mórfico, e o de diorito) sejam recobertos por sedi-
uma determinada rocha e as outras ao seu redor. mentos de idade devoniana, datados pela Paleon-
tologia. Pelo princípio das relações de intersecção,
Nas datações radiométricas analisamos os mi-
determinamos a idade relativa das falhas e do dio-
nerais componentes da rocha ou a rocha como um
rito: as falhas são mais antigas que o diorito e am-
todo. Portanto, se a rocha teve história longa e com-
bos formaram-se em algum momento durante o
plexa, este fator deve ser bem controlado em todas
intervalo 620-416 Ma, ou seja, entre a idade das
as suas variáveis.
rochas metamórficas e o início do Devoniano (416-
359 Ma). A datação radiométrica do diorito revela-
a. Complementaridade de métodos ria mais precisamente quando se formaram as fa-
Para determinar a idade geológica, são essenciais lhas, mas apenas dentro de um intervalo de idades.
as evidências de idade relativa dos materiais, ou seja, Rochas metamórficas são produtos de modifi-
é preciso estabelecer relações cronológicas de uma cações no estado sólido, a partir de outras rochas
rocha com as demais. Suponhamos um corpo de preexistentes. Até mesmo sucessivos eventos de
rocha metamórfica (Fig. 15), radiometricamente cristalização ao redor de cristais mais antigos podem
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