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MODELO GERAL PARA OTIMIZAÇÃO

E PROMOÇÃO DO AGRONEGÓCIO
DA IRRIGAÇÃO DO NORDESTE

1
SÉRIE POLÍTICAS E ESTRATÉGIAS PARA UM NOVO
MODELO DE IRRIGAÇÃO

V. 1 – A Importância do Agronegócio da Irrigação para o Desenvol-


vimento do Nordeste

V. 2 – Estado da Arte Nacional e Internacional do Agronegócio da


Irrigação 2000

V. 3 – Modelo Geral para Otimização e Promoção do Agronegócio da


Irrigação do Nordeste

V. 4 – Modelo Específico para a Otimização e Promoção do Projeto


de Irrigação Salitre – Juazeiro da Bahia

2
MODELO GERAL PARA OTIMIZAÇÃO
E PROMOÇÃO DO AGRONEGÓCIO
DA IRRIGAÇÃO DO NORDESTE

Francisco Mavignier Cavalcante França


Coordenador

BANCO DO NORDESTE
Fortaleza – 2001

3
Obra publicada pelo

Diretoria
Presidente: Byron Costa de Queiroz

Diretores: Osmundo Rebouças, Marcelo Pelágio da Costa Bomfim,


Ernani José Varela de Melo e Raimundo Nonato Carneiro Sobrinho

Ambiente de Recursos Logísticos


Célula de Produção Gráfica
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Coordenação Editorial: Ademir Costa


Revisão Vernacular: Floriano Lopes de Jordão
Normalização Bibliográfica: Rita de Cássia Alencar

Depósito Legal junto à Biblioteca Nacional, conforme decreto n.º 1823,


de 20 de dezembro de 1907
Copyright © by Banco do Nordeste
Banco do Nordeste

B213 Modelo geral para otimização e promoção do agronegócio da


irrigação do Nordeste/Francisco Mavignier Cavalcante França, co-
ordenador. – Fortaleza: Banco do Nordeste, 2001.

320. – (Série políticas e estratégias para um novo modelo de ir-


rigação, v. 3).

1 – Irrigação. 2 – Irrigação-Nordeste. 3 – Agronegócio – Nor-


deste. 4 – Desenvolvimento do Nordeste. I – França, Francisco
Mavignier Cavalcante. II – Série.
CDD: 631.587
Impresso no Brasil/Printed in Brazil

4
Coordenador Geral do Estudo
Francisco Mavignier Cavalcante França

Equipe do Consórcio Responsável pelo Estudo


Plena Consultoria de Engenharia Agrícola Ltda.
Elias Teixeira Pires (Coordenador do Consórcio)
Eliseu Andrade Alves
José Luiz dos Santos Rufino
Mário Ramos Vilela
Paulo Severino de Rezende
Ruy Aderbal Rocha Ferrari

Fundação Getúlio Vargas


Ednéia da Silva Bezerra
Gregory Honczar
Guilherme Soria Bastos Filho
Ignez Guatimosim Vidigal Lopes
Mauro de Rezende Lopes
Nuno Monteiro Casassanta
Stivilane Dornelas

PROJETEC - Projetos Técnicos Ltda.


André Luiz da Silva Leitão
Fábio Chaffim Barbosa
Jaco Charcot Rios
João Joaquim Guimarães Recena
Luiz Alberto Teixeira

Equipe Técnica do Banco do Nordeste


Cláudio Vasconcelos Frota Francisco Mavignier Cavalcante França
Maurício Teixeira Rodrigues Rubens Sonsol Gondim

Comitê Gestor Interinstitucional


Rômulo de Macedo Vieira (Coordenador) - Ministério da Integração Nacional
Edson Zorzin - CODEVASF
Francisco Mavignier Cavalcante França - Banco do Nordeste
Guilherme Lincoln Aguiar Ellery - DNOCS
José Honório Accarini - Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (SPI)
Washington Aquino de Mendonça - Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão (SEAIN)

5
Grupo de Apoio Técnico Interinstitucional
Francisco Mavignier Cavalcante França (Coordenador)
Artur Eustáquio R. Saabor - Ministério da Integração Nacional
Clésio Jean Almeida Saraiva - DNOCS
Edson Zorzin - CODEVASF
Euzébio Medrado da Silva - EMBRAPA
Humberto Leite Freitas Filho - Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão (SEAIN)
José Honório Accarini - Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão (SPI)
Manfredo Pires Cardoso - Secretaria de Agricultura e
Reforma Agrária da Bahia

Equipe do Banco Interamericano de Desenvolvimento


Francisco Basílio Souza (Coordenador)
Asako Yamamoto
Bernard Darnel
Charles Smith
Fausto Medina-Lopez
Juan Luna-Kelser
Myriam Quintero
Valnora Leister

Equipe de Advisers (Consultores Independentes)


Alejandro Luis Seminario Duany - Peru Augustín A. Millar - Chile
Francisco de Souza - Brasil Jim Charles Bryon - EUA
John Wilkison - Brasil José Cruz Roche - Espanha
Juan Sagardoy - Itália Pablo Lalanda Carrobles - Espanha

Colaboradores
Aluysio Antônio da Motta Asti, Armando Munguba Cardoso, Carlos Alberto
de Carvalho, Francis Puglise, Frederico Reis de Araújo, Hans Steinbichler,
José Airton Mendonça de Melo, José Bento Corrêa, José Eduardo
Borella, José Olimpio Rabelo de Morais, José Paulo Silveira, José
Raimundo Machado dos Santos, José William Araújo Sousa, Juscelino
Antonio de Azevedo, Laudo Bernardes, Leda Maria Marques Cavalcante,
Luís Carlos Ramos de Lima, Luiz Hildemar Colaço, Maria Lucinete
Valente, Otávio Gondim Pereira da Costa, Ricardo Lima de Medeiros
Marques, Roberto Duarte Vidal Silva, Rodrigo Magalhães Neiva Santos,
Valdir Castelo Branco, Yara Januzzi

6
APRESENTAÇÃO

O Nordeste brasileiro tem reconhecidamente as melhores condi-


ções para produção de frutas e hortaliças em todo o mundo, o que abre
grandes possibilidades para o desenvolvimento da agricultura irrigada na
Região. A relevância estratégica dessa atividade, que se destaca pela
geração de emprego, renda e divisas, inspirou a criação do projeto Novo
Modelo de Irrigação, no âmbito do Programa Avança Brasil, do Governo
Federal.
De caráter inovador, este projeto busca, principalmente, estimu-
lar o investimento privado em todas as fases do agronegócio da irriga-
ção, orientar a produção para as oportunidades de mercado e redirecio-
nar a participação do governo na atividade, priorizando os papéis de
indução, orientação, regulação e promoção. Objetiva, ainda, gerar siner-
gia entre a iniciativa privada e as esferas governamentais, garantir efici-
ência no uso e na gestão da água para irrigação, identificar novas fontes
e modelagens de financiamento e propor mecanismos para controle dos
impactos ambientais e sociais.
Diante da abrangência de objetivos, da importância estratégica e
do espírito inovador do Projeto, identificou-se a necessidade de elaborar
um estudo referencial para orientar os diversos organismos que estarão
envolvidos na implementação do Novo Modelo de Irrigação. A viabiliza-
ção de tão importante tarefa foi efetivada por meio da parceria entre o
Ministério do Planejamento e Gestão, Ministério da Integração Nacional,
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Banco do Nordeste.
Elaborado com a contribuição de mais de 1.500 especialistas
nacionais e internacionais em agronegócio da irrigação, este trabalho
consiste numa coleção composta dos seguintes volumes: 1 - A Impor-
tância do Agronegócio da Irrigação para o Desenvolvimento do Nordeste,
2 - Estado da Arte Nacional e Internacional do Agronegócio da Irrigação
2000, 3 - Modelo Geral para Otimização e Promoção do Agronegócio da
Irrigação e 4 - Modelo Específico para Otimização e Promoção do Proje-
to de Irrigação Salitre-Juazeiro da Bahia.
É com satisfação, pois, que o Banco do Nordeste traz a público
esse conjunto de estudos, como forma de disseminar, junto aos agentes
públicos e privados, as novas estratégias que irão dinamizar o agrone-
gócio da irrigação na Região, comprometendo-se, desde já, a incorporar
em suas políticas e programas as recomendações aqui apresentadas.

Byron Queiroz
Presidente do Banco do Nordeste

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8
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO...................................................................... 07
1 - INTRODUÇÃO ...................................................................... 13
2 - A IMPORTÂNCIA DA IRRIGAÇÃO PARA O NORDESTE
E PARA O BRASIL............................................................... 17
3 - A SITUAÇÃO ATUAL DA IRRIGAÇÃO NO BRASIL
E NO NORDESTE................................................................. 20
3.1 - A Atual Política de Irrigação do Brasil ............................ 20
3.1.1 - O quadro institucional vigente ................................ 20
3.2 - A Situação dos Projetos Públicos de Irrigação no
Nordeste ........................................................................... 29
3.2.1 - O foco na implantação de obras .............................. 29
3.2.2 - Área implantada em produção e a ser implantada .. 31
3.2.3 - A gestão de operação e manutenção ...................... 31
3.2.4 - O processo de produção ......................................... 32
3.2.5 - A participação da iniciativa privada ........................ 44
4 - MARCO TEÓRICO ................................................................ 47
5 - POLÍTICA NACIONAL DE IRRIGAÇÃO PROPOSTA .......... 56
5.1 - Diretrizes Gerais da Nova Política Nacional de
Irrigação........................................................................... 59
5.2 - Regime Jurídico Vigente .................................................. 61
5.2.1 - O domínio das águas, quem pode e como delas
usufruir .................................................................... 61
5.2.2 - A lei de irrigação em vigor (nº 6.662/79) .................. 62
5.3 - O Regime Jurídico Proposto............................................ 63
5.4 - Diretrizes para Implantação de Projetos de Irrigação .... 67
5.4.1 - Os papéis do poder público..................................... 68
5.4.2 - Princípios e recomendações ................................... 71
5.4.3 - Procedimentos para a implantação de projetos de
irrigação ................................................................... 75
5.5 - Estrutura de Regulação da Nova Política Nacional de
Irrigação ........................................................................... 80
6 - INSTRUMENTOS DA NOVA POLÍTICA NACIONAL DE
IRRIGAÇÃO........................................................................... 87
6.1 - Planejamento da Irrigação ............................................... 87

9
6.1.1 - Princípios básicos ....................................................87
6.1.2 - Diretrizes para o processo de planejamento............91
6.1.3 - Critérios para elegibilidade de área para
implantação de projetos públicos ...........................94
6.1.4 - Procedimentos e normas técnicas ...........................94
6.1.5 - Monitoramento da irrigação .....................................95
6.2 - Gerenciamento da Política, Planos, Programas e
Projetos de Irrigação........................................................96
6.2.1 - Amplitude do gerenciamento da irrigação ...............96
6.2.2 - Proposta de sistema gerencial aplicado ao
ambiente da gestão de irrigação ............................102
6.2.3 - Atribuições de cada ente gestor de projetos
públicos ..................................................................105
6.2.4 - Sistemas de gerenciamento de projetos de
irrigação..................................................................117
6.3 - Sistema de Produção, Pós-Colheita, Distribuição e
Mercado ..........................................................................124
6.3.1 - Sistema de gestão comercial .................................125
6.3.2 - Estratégias de mercado..........................................129
6.3.3 - Sistema de informação de mercado .......................134
6.3.4 - Sistema de informação tecnológica .......................140
6.4 - Serviços de Apoio ...........................................................141
6.4.1 - Plataforma de informações.....................................141
6.4.2 - Assistência técnica/gerenciamento da produção .....143
6.4.3 - Pesquisa e desenvolvimento (P&D) .......................144
6.4.4 - Programa de capacitação em gestão .....................146
6.4.5 - Serviços de gerenciamento ambiental ...................147
6.5 - Mecanismos Econômico-Financeiros............................147
6.5.1 - Fontes e mecanismos de financiamento ................148
6.5.2 - Modelos de financiamento .....................................167
6.5.3 - Descrição dos riscos financeiros...........................169
6.5.4 - Estratégias para mitigar os riscos do negócio ......180
6.5.5 - Descrição das taxas internas .................................181
6.5.6 - Premissas norteadoras da participação do setor
público, esferas federal, estadual e municipal ......181
7 - BIBLIOGRAFIA CONSULTADA..........................................191
8 - ANEXOS..............................................................................195

10
8.1 - Legislação e Normas Relativas ao Subsetor de
Irrigação do Brasil ......................................................... 197
8.2 - Contribuição ao Novo Marco Legal da Irrigação
no Brasil ......................................................................... 201
8.3 - Sistemas de Gestão Comercial...................................... 217
8.3.1 - Sistema de gestão comercial tipo 1........................220
8.3.2 - Sistema de gestão comercial tipo 2........................223
8.3.3 - Sistema de gestão comercial tipo 3........................224
8.3.4 - Sistema de gestão comercial tipo 4........................226
8.3.5 - Sistema de gestão comercial tipo 5........................227
8.4 - Modelos de Financiamento ............................................ 233
8.4.1 - Modelo de financiamento tipo 1..............................234
8.4.2 - Modelo de financiamento tipo 2..............................242
8.4.3 - Comparação dos modelos de financiamento
tipos 1 e 2...............................................................250
8.4.4 - Condições para viabilização dos modelos de
financiamento propostos........................................254
8.4.5 - Características gerais de riscos de empresas-
projeto .....................................................................269
8.4.6 - Observações finais .................................................272
8.5 - Pesquisa e Desenvolvimento para Agricultura
Irrigada no Nordeste...................................................... 275
8.5.1 - Organização do esforço de pesquisa em
agricultura irrigada no Nordeste e norte de Minas -
determinantes e inovações sugeridas......................276
8.6 - Risco da Variação do Valor da Produção na
Agricultura Irrigada........................................................ 302
8.6.1 - Estimativa do risco da variação do preço do
produto....................................................................304
8.6.2 - Variação das taxas internas de retorno..................307
8.6.3 - Observações sobre o estudo..................................309
8.6.4 - Anexo do capítulo ...................................................309

11
12
1 - INTRODUÇÃO

Entre os projetos que constituem o Programa Avança Bra-


sil, está o Projeto Novo Modelo de Irrigação. O enfoque moderno
considera a irrigação como negócio. E, por isto, a sua base é a
iniciativa privada, tanto na construção das obras de infra-estrutura,
na implantação e condução das atividades agrícolas, de industria-
lização e de comercialização, como na busca de uma relação di-
nâmica entre o ambiente externo, a cadeia produtiva e o Governo.
O Governo Federal, pelo Banco do Nordeste do Brasil S/A,
via concorrência internacional, contratou os serviços de consulto-
ria do Consórcio Plena-FGV-Projetec para desenvolver, validar e
estabelecer as bases estruturais, conceptuais e regulatórias, ope-
racionais e financeiras do modelo, com enfoque na região Nordes-
te do Brasil.
O estudo iniciou-se em maio de 1999. A sua execução foi
programada em dois segmentos que se complementam: o primei-
ro compõe-se de 3 relatórios (Antecedentes, Estado da Arte da
Irrigação e Proposta do Novo Modelo Conceptual); o segundo
contém os elementos necessários à aplicação imediata das dire-
trizes definidas no Novo Modelo Conceptual. Estes quatro relató-
rios compõem a série Políticas e Estratégias para um Novo Mode-
lo de Irrigação, sendo este documento o Volume 3.
O presente documento propõe o Novo Modelo Conceptual
que, na realidade, é uma definição operacional da Nova Política
Nacional de Irrigação.
O estudo foi realizado por uma equipe multidisciplinar de
consultores, com conhecimentos amplos de irrigação, desenvol-
vimento regional, administração pública, comercialização, pesqui-
sa e desenvolvimento agrícola, assistência técnica, economia,
meio ambiente, gestão de projetos públicos de irrigação, entre
outros temas. Vários profissionais dessa equipe são também em-
presários da agricultura irrigada, no norte de Minas e no Nordeste.
Tratando-se do desenvolvimento de um modelo conceptual
de política de irrigação, o estudo envolveu a participação estreita
de vários atores da cadeia da agricultura irrigada, do Nordeste e
13
do norte de Minas. Desde maio de 1999 até abril de 2000, foram
realizados vários eventos para discutir propostas de modelos e
colher subsídios dos vários segmentos da agricultura irrigada.
Destacam-se os seminários em pólos de irrigação do Nordeste e
norte de Minas (Petrolina/Juazeiro, Oeste Baiano, Norte de Minas,
Açu/Mossoró, Baixo Jaguaribe e Alto Piranhas); o seminário de
fevereiro de 2000, em Fortaleza, com representantes dos seg-
mentos do governo ligados à atividade; contatos e entrevistas com
investidores da agricultura irrigada e com investidores potenciais
e, finalmente, reuniões específicas com instituições ligadas ao
setor, para se discutir o modelo proposto.
Paralelamente aos eventos citados, buscaram-se também
subsídios na bibliografia nacional e internacional sobre os temas
ligados à irrigação (recuperação de investimentos públicos, tarifa-
ção de água, plataforma de negócios, visão de mercado, marco
legal e institucional, privatização e projetos públicos etc.) A revisão
da literatura é apresentada no Volume 2, Estado da Arte da Irriga-
ção, no qual se identificaram os obstáculos e facilidades encon-
trados e os correspondentes fatores causais, os caminhos percor-
ridos para sua superação ou manutenção, bem como a visão de
futuro que instituições e empreendedores têm da agricultura irri-
gada. Essa análise cobre 11 países que têm grande experiência
em irrigação, tanto privada como pública. Destacam-se os Esta-
dos Unidos (EUA) na irrigação privada, na participação pública e
transferência para organizações de agricultores de projetos públi-
cos, o México, a Colômbia e outros 8 países e, finalmente, Chile,
França, Espanha, EUA e Israel. Estes utilizam tecnologias sofisti-
cadas de irrigação e de comercialização.
Na concepção do modelo, além dos subsídios oferecidos pe-
los atores da cadeia do agronegócio da irrigação do Nordeste e norte
de Minas e daqueles obtidos da bibliografia nacional e internacional,
beneficiou-se das visitas de alguns consultores aos Estados Unidos
da América (EUA), Colômbia, México, Chile, Argentina, Espanha,
França e Israel. Lá foram para conhecer os problemas e as soluções
encontradas no que diz respeito a temas como irrigação, gestão de
perímetros, políticas governamentais e cadeia produtiva.
A proposta de uma política nacional de irrigação, com base
no Projeto Novo Modelo de Irrigação, considera que, num mundo
14
globalizado, a capacidade de competir define as possibilidades de
sobrevivência e de expansão de mercado. Quem dominar a tecno-
logia de informação sobreviverá e crescerá. A coordenação simé-
trica do mercado, e este recebe, processa, difunde e utiliza infor-
mações, viabiliza estratégias competitivas superiores.
A irrigação é importante instrumento de desenvolvimento,
especialmente para o Nordeste e norte de Minas, pela sua capa-
cidade de gerar renda, emprego estável, divisas e ampliar ofertas
de alimentos e fibras.
A proposta da Nova Política Nacional de Irrigação funda-
menta-se na participação do setor privado no agronegócio da
irrigação. Está alicerçada na proposta de mudanças da legislação
de irrigação vigente (Lei n.º . 6.662/79 e seus regulamentos), em
diretrizes de implantação e de planejamento da irrigação. Dá
bases para o gerenciamento de políticas, planos, programas e
projetos. Mostra como deve ser um sistema mais avançado de
produção, pós-colheita, distribuição e de mercado. Estabelece os
fundamentos dos serviços de apoio, como plataforma de
informação, assistência técnica/gerenciamento da produção,
pesquisa e desenvolvimento, programa de capacitação em
gestão, gerenciamento ambiente e de mecanismos econômico-
financeiros (ANEXO 8.2).
A proposta de alteração na lei de irrigação vigente, se a-
provada, permite a associação do setor público com o privado
(projeto misto), cria condições para a iniciativa privada participar
da implantação dos projetos públicos de irrigação em forma de
concessão, e mesmo financiando-os. Quando o governo implanta o
projeto público, somente pode operá-lo por um período limitado. Em
adição, o governo pode vender ou alugar a infra-estrutura coletiva.
A proposta da Nova Política muda o foco dos projetos pú-
blicos de irrigação apenas em obra para o agronegócio. Requer a
promoção do empreendimento, a implantação de plataforma de
informações (técnicas, de mercado, gerenciais) e a sua divulgação
em escala nacional, visando captar agricultores e empresas
competentes. Propugna pela organização dos produtores, visando
uma coordenação mais simétrica na cadeia do agronegócio. Pro-
põe um modelo de financiamento da agricultura que associa o
crédito rural a outros tipos de crédito e à gestão do negócio.

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O presente documento está apresentado em mais 6 capítu-
los a saber:
Capítulo 2 – A importância da irrigação para o Nordeste
e para o Brasil – Neste capítulo discute-se a importância da irriga-
ção para a região e para o Brasil, como instrumento de política, que
visa reter o homem no campo, porque gera empregos bem remune-
rados, além de aumentar a renda e a produção de alimentos.
Capítulo 3 – A situação atual da irrigação no Brasil e
no Nordeste – Neste capítulo, analisa-se a política de irrigação do
Brasil e os projetos públicos de irrigação do Nordeste, enfocando
as obras, área implantada e em produção e a ser implantada, a
gestão da operação e manutenção, o processo de produção e a
participação da iniciativa privada.
Capítulo 4 – Marco Teórico – Neste capítulo encontra-se
a base teórica destinada ao desenvolvimento do Novo Modelo,
enfocando aspectos de competitividade e coordenação de cadeias
agroindustriais.
Capítulo 5 – Política Nacional de Irrigação Proposta –
Este capítulo apresenta as diretrizes gerais da nova política, o
regime jurídico, as diretrizes de implantação de projetos de irriga-
ção e a estrutura de regulação.
Capítulo 6 – Instrumentos da Nova Política Nacional de
Irrigação – Neste capítulo, descrevem-se os instrumentos que
permitem a implementação da nova política. São instrumentos de
planejamento, de gerenciamento de política, planos, programas e
de projetos de irrigação, de sistemas de produção, pós-colheita,
distribuição e de mercado, de serviços de apoio e de mecanismos
econômico-financeiros.
Capítulo 7 – Bibliografia Consultada
Capítulo 8 – Anexos – Neste capítulo, complementam-se as in-
formações dos estudos apresentados nos capítulos anteriores, notada-
mente no segmento de marco legal, mecanismos econômico-
financeiros, pesquisa e desenvolvimento, gestão comercial e avaliação
de risco.

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2 - A IMPORTÂNCIA DA IRRIGAÇÃO PARA O NORDESTE
E PARA O BRASIL

A agricultura brasileira evoluirá para o patamar daquela


dos países avançados, que se caracteriza pelo emprego de uma
fração pequena da população economicamente ativa (PEA) do
País e se baseará também em número cada vez menor de esta-
belecimentos agrícolas.
A questão que se apresenta ao poder público é como con-
duzir esse processo de ajustamento, de modo a se atingirem três
objetivos, quais sejam: (i) abastecer, adequadamente, o mercado
interno; (ii) ampliar as exportações de produtos agrícolas in natura
ou industrializados e (iii) criar empregos no campo e na cidade e,
assim, reduzir o ímpeto do êxodo rural e seus malefícios. Dentre
eles estão o subemprego e o desemprego urbanos. Como se verá
a seguir, o êxodo rural desordenado tem sido característica mar-
cante da migração rural-urbana brasileira nos últimos 40 anos.
Políticas agrícolas que atendam, simultaneamente, os três
objetivos devem receber prioridade. Entre elas destaca-se a de
irrigação, porque: a) cria grande número de empregos estáveis
dentro da “porteira” do estabelecimento agrícola e nas cidades, ou
seja, fora da “porteira” (antes e depois dela); b) contribui para a-
tender à demanda interna de frutas e hortaliças que se eleva a
taxas elevadas, em função de uma elasticidade-renda igual ou
superior a 1 e isto em todas as classes de renda; c) amplia as
exportações, sem causar aumento dos preços internos e, ainda,
tem o papel adicional de contribuir para a solução de problemas
específicos, como o do abastecimento de feijão.
Relativamente ao êxodo rural, o problema está no Nordes-
te. Em 1996 abrigava 45,7% de toda a população rural brasileira,
ou seja, 15,6 milhões de habitantes (IBGE, 1997). O Sudeste é a
segunda região, do ponto de vista de população rural. Em 1996
continha 7,3 milhões de habitantes. Se o Nordeste caminhar para
o mesmo índice habitante/valor da produção do Sudeste (que não
é excepcional e, por isso, perfeitamente alcançável), sua popula-

17
ção rural cairá para 3 milhões de habitantes, conforme citado por
Alves, Lopes & Contini (1999).
Esses autores estimaram o êxodo rural, por década, a par-
tir de 1940, e mostraram que o Nordeste rural está perdendo mais
rapidamente seu contingente populacional. Assim, no período
1991/2000, quase metade do êxodo rural é nordestino, cerca de
4,3 milhões, em relação aos 10,1 milhões que migraram do meio
rural, em todo o Brasil. No período anterior, 1980/1991, o Nordes-
te e o Brasil perderam, respectivamente, 4,1 milhões e 10,4 mi-
lhões de habitantes rurais.
Os mesmos autores mostraram que o êxodo rural ganha
velocidade no Nordeste e desacelera-se nas três regiões sulinas.
Estas últimas têm um estoque de migrantes muito menor e uma
produtividade da terra e do trabalho que é, pelo menos, 4 vezes
superior à do Nordeste, o que atua como desacelerador da migra-
ção rural-urbana (Alves, Lopes & Contini, 1999).
Há, naquela região, 2,3 milhões de estabelecimentos. Este
montante equivale a 47,5% do número de estabelecimentos do
Brasil. Mas, em média, somente os estabelecimentos agrícolas
nordestinos com mais de 200 hectares (exceto as áreas irrigadas)
remuneram o trabalho familiar com um salário mínimo mensal ou
mais. Ocorre que estes estabelecimentos com área superior a 200
hectares correspondem a menos de 6% de todos os estabeleci-
mentos rurais nordestinos. Portanto, a grande maioria dos estabe-
lecimentos agrícolas daquela região é instável, por não oferecer
uma remuneração a cada trabalhador ocupado sequer igual a um
salário mínimo. Tendem, pois, ao desaparecimento e, assim, a
desempregar elevados contingentes de mão-de-obra familiar e
mesmo assalariada.
O trabalho familiar e o assalariado rural são ali muito instá-
veis, quanto à permanência no meio rural. Por conta das forças de
mercado e em virtude de o meio rural das demais regiões ser tam-
bém perdedor líquido de população, os rurícolas migrantes
nordestinos se encaminharão, de preferência, e como já vêm his-
toricamente fazendo, às cidades das três regiões sulinas. Como
segunda opção, se dirigem às cidades do próprio Nordeste e do

18
Norte, agravando, entre outros, o problema urbano de emprego
e de segurança pública. Este fato mostra que o Nordeste é prio-
ridade número um de toda política de retenção do homem no
campo, a fim de possibilitar uma transição rural-urbana com
menos sofrimento.
Mas a retenção de população no meio rural e nas cidades
atreladas à agricultura depende de ser viável uma agricultura que
pague salários competitivos. A agricultura irrigada oferece esta
condição. Sua capacidade empregadora é multiplicada, quando
associada às exportações, principalmente de frutas e hortaliças,
grãos e carnes. Desse modo, ela é prioritária para o Nordeste,
sobretudo para sua porção semi-árida, e ainda muito importante
para suas demais sub-regiões que também precisam reter popu-
lação, abastecer o País e contribuir para ampliação das exporta-
ções. Isto por que, pelo concurso da irrigação e o desenvolvimen-
to de algumas de suas áreas privilegiadas, em termos de dota-
ção de fatores (como as localizadas no oeste baiano, sul do
Maranhão e sudoeste do Piauí), o Nordeste tem condições de
contribuir acentuadamente para o abastecimento do mercado
interno e para as exportações, reduzindo, ademais, o fluxo de
migrantes para as cidades.
Efetivamente, na superação de tais desafios, a irrigação
tem sido uma estratégia bem-sucedida, sobretudo nos países com
maior área irrigada e, principalmente, nas regiões do Globo de
elevados déficits hídricos, como a semi-árida, a qual pertence o
Nordeste brasileiro. Ela tem a faculdade de reduzir o risco tecno-
lógico, decorrente de condições climáticas adversas, diminui a
oscilação da produtividade agrícola e incrementa a taxa de ocupa-
ção e a utilização intensiva de terras. Desse modo, a agricultura
contribui para ampliar a oferta de alimentos, fibras e, no caso bra-
sileiro, também de biomassa para fins energéticos. Assim, ela
melhora salário e renda e cria ocupação estável no campo, como
bem o demonstram os pólos de irrigação nordestinos, já mais
consolidados e implantados nas últimas décadas.

19
3 - A SITUAÇÃO ATUAL DA IRRIGAÇÃO NO BRASIL E
NO NORDESTE

3.1 - A Atual Política de Irrigação do Brasil

3.1.1 - O quadro institucional vigente

♦ Regime Jurídico

Preliminarmente, será apresentada uma análise sintética


do regime jurídico vigente das atividades inerentes à irrigação no
Brasil, compreendendo os preceitos constitucionais federais e as
normas infraconstitucionais, específicas e correlatas.
Observa-se que a implementação de projetos de irrigação,
quer públicos quer privados, está sujeita à observância de uma
legislação específica e correlata, que naturalmente alcança não só
o uso de recursos hídricos, mas perpassa pela conservação (em
quantidade e qualidade) e pelo desenvolvimento desse bem públi-
co. Contempla outras questões ambientes a eles relacionadas,
tais como: o uso e conservação dos solos, o manejo e conserva-
ção da flora, a execução direta ou delegada de obras e serviços
públicos, a regulamentação do setor de recursos hídricos e do
meio ambiente e a arbitragem.
Ademais, a agricultura irrigada, enquanto componente de
um agronegócio, como qualquer outra atividade econômica numa
economia de mercado, é regida por um conjunto genérico de nor-
mas legais formais que fornece aos diversos atores, públicos e
privados, envolvidos com ela, a necessária segurança jurídica em
suas relações contratuais. Assim, a política de irrigação ancora-
se, também, numa base legal, específica, correlata e genérica,
deveras ampla.
Interessa ao estudo, conforme explicitado nos Termos de
Referência, analisar aqui o primeiro grupo de normas legais,
mencionado no segundo parágrafo.

20
Para tanto, estão citadas, cronologicamente, no ANEXO
8.1, as normas infraconstitucionais que regem o uso de recursos
hídricos para a irrigação, suas interações com outros usos e com
o manejo integrado de recursos naturais, como o solo e a flora, e
aquelas relacionadas com a organização subsetorial da irrigação.
Como se depreende do exame do ANEXO 8.1, a preocu-
pação com a irrigação intensificou-se, na esfera do Governo Fede-
ral, a partir de 1967, com a edição do Decreto- Lei n.º 200. Ele
instituiu, entre outros, o Ministério do Interior, e destaca a irrigação
como assunto da competência desse Ministério, associada com
obras de proteção contra as secas e inundações (inciso V do art.
39). Mas o primeiro ordenamento jurídico sobre irrigação no Brasil
só ocorreu doze anos depois, em 25 de junho de 1979, com a
edição da Lei n.º 6.662, denominada Lei de Irrigação, e que dis-
pôs sobre a política nacional de irrigação (Brasil, 1979).
A Lei também só veio a ser regulamentada pelo Decreto
n.º 89.496, de 29 de março de 1984. Posteriormente foi alterado,
sucessivamente, pelos decretos n.ºs 90.309, de 16/10/84, 90.991,
de 26/02/85 e 93.484, de 29/10/84. Esses três últimos foram
revogados pelo Decreto n.º 2.178, de 17/03/97 (ANEXO 8.1).
Mais tarde, em 21 de maio de 1993, foi editada a Lei n.º
8.657, que acrescenta parágrafos ao artigo 27 da Lei de Irrigação
(ANEXO 8.1).
A Lei n.º 6.662/79, ainda em vigor, editada há mais de 20
anos em um contexto diverso do atual, retrata as características
econômicas e políticas da época. Posteriormente foi superada em
alguns de seus dispositivos pela Constituição de 1988. Recente-
mente, em janeiro de 1997, foi modificada pela Lei n.º 9.433, que
estabelece a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sis-
tema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regula-
menta o inciso XIX do artigo 21 da Constituição Federal e altera
o artigo 1º da Lei n.º 8.001, de 13 de março de 1990, que, por
sua vez, modificara a Lei n.º 7.990, de 28 de dezembro de 1989
(Brasil, 1997).

21
♦ O Papel do Setor Público na Irrigação

A Política Nacional de Irrigação foi formulada sobre postu-


lados que enfatizavam a função social da irrigação, em especial
nas regiões atingidas por fenômenos climáticos adversos.
Embora a Lei de Irrigação cite, por várias vezes, a partici-
pação dos estados, Distrito Federal, municípios e da iniciativa pri-
vada, ela centraliza no poder público federal, à época, no Ministé-
rio do Interior e suas entidades vinculadas, parcela preponderante
das responsabilidades e autoridade de implantação e gestão de
projetos públicos de irrigação. Ou seja, não somente o planeja-
mento, mas também a execução, operação e manutenção dos
projetos de irrigação, além das infra-estruturas sociais, instaladas
em função deles, ficaram sob a tutela do Estado (Brasil, 1979).
Cumpre salientar que, à época, o Ministério do Interior con-
tava, além de órgãos de execução, com as entidades a ele vincu-
ladas, órgãos de desenvolvimento regional, bancos de desenvol-
vimento e outras entidades voltadas para o desenvolvimento, vi-
sando melhor articulação interinstitucional.
Cabe ainda assinalar que, no período seguinte à edição da
Lei até o final da década de 80, foram abundantes os recursos
financeiros, baseados em empréstimos internacionais, destinados
à implantação de projetos públicos de irrigação.
Atualmente, a irrigação no Brasil (estimada em 2.870.000
ha, 1998) divide-se em particular e pública. O setor privado é res-
ponsável por 95% da área irrigada total e por 67% do total do Nor-
deste (estimada em 495000 ha, 1998). Mesmo no Nordeste, dois
terços da área irrigada foram implantados pelo setor privado. Nos
últimos, a propriedade da terra e da infra-estrutura de irrigação
parcelar é dos empreendedores privados. Em alguns casos,
principalmente na Região Sul, o Governo construiu, já algum tem-
po, represas e canais, cabendo a administração deles à iniciativa
particular. Mas não está sempre claro quem é o proprietário da
infra-estrutura. Ainda mais, nem informal nem formalmente se
desenvolveram mecanismos que permitissem a associação do
Governo com a iniciativa particular, pelos quais ele possa ser um

22
sócio capitalista. Ou seja, o projeto misto de irrigação não se tor-
nou realidade entre nós.
Os projetos públicos localizam-se no Nordeste e na região
norte de Minas Gerais. A maior área se encontra no médio e baixo
São Francisco, sob a responsabilidade da Companhia de Desen-
volvimento do Vale do São Francisco (Codevasf). O Departamento
Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) cobre as áreas não
contidas na bacia hidrográfica do rio São Francisco. Destacam-se,
mais recentemente, algumas iniciativas de governos estaduais
nessas duas regiões.
O Governo, pioneiramente e via projetos públicos, difundiu
a irrigação no Nordeste, assumindo os riscos que todo novo
empreendimento sempre traz. Criou, assim, oportunidades tanto
para a irrigação empresarial como para a agricultura familiar.
Gerou novos conhecimentos e, enfim, abriu horizontes para um
negócio competitivo. Atualmente, empenha-se em ampliar a
capacidade produtiva da agricultura e da indústria dos pólos
irrigados.
♦ Mecanismos de Financiamento da Irrigação

O crédito agrícola subsidiado foi o principal instrumento de


estímulo à iniciativa privada. Mas os prazos não guardavam uma
relação estreita com o retorno da atividade. Muito generosos em
algumas situações e, em outras, pressupuseram, ao menos impli-
citamente, retornos exageradamente elevados para a irrigação.
O Tesouro Federal é a principal fonte de financiamento das
obras de infra-estrutura de irrigação de uso coletivo, de apoio e de
natureza social nos projetos públicos das regiões Nordeste e do
norte de Minas Gerais. No Rio Grande do Sul, financiou as obras
de infra-estrutura de irrigação de uso coletivo. Financiamentos
externos geraram recursos para o Governo Federal e para alguns
estados, os quais foram utilizados na implantação e reabilitação
das infra-estruturas de uso coletivo, além de contribuírem para a
assistência técnica aos pequenos irrigantes. Entretanto, esta fon-
te, à semelhança do que vem ocorrendo com muitos outros paí-
ses, tem reduzido seus aportes, a partir dos anos 90.

23
♦ Mecanismos de Recuperação de Custos e do Capital

À medida que as fontes oficiais tradicionais de financia-


mento da irrigação perdem o ímpeto, tornam-se mais salientes os
constrangimentos criados pela legislação de irrigação vigente (Lei
n.º 6.662/79 e seus regulamentos (Brasil, 1979)) com o equilíbrio
econômico-financeiro da gestão dos projetos públicos.
O principal deles, por sua repercussão na estabilidade fi-
nanceira da gestão dos projetos, é a destinação de parcela da
tarifa de água (o componente K1), cobrada dos irrigantes, para a
amortização (integral ou parcial) dos investimentos públicos em
obras de infra-estrutura de irrigação de uso coletivo.
O art. 24 da Lei n.º 6.662/79, em seu § 3º , determina: a in-
fra-estrutura de irrigação terá seus investimentos amortizados
(grifo nosso), total ou parcialmente, pelos irrigantes, conforme
estabelecer o Poder Executivo. O art. 25 desta mesma Lei deter-
mina, equivocadamente, que: as infra-estruturas de irrigação, nos
projetos públicos implantados, financiados com recursos orçamen-
tários da União, serão de propriedade do Governo Federal (grifo
nosso), representado pelas entidades vinculadas ao Ministério do
Interior (Brasil, 1979).
Assim, ao regulamentar esses dispositivos da Lei, pelo De-
creto n.º 89.496, de 29 de março de 1984, o Governo Federal es-
tabeleceu no art. 43: o valor das tarifas incidentes sobre o uso de
água nos projetos públicos de irrigação, de que trata este Regu-
lamento, será composto pela adição (Brasil, 1984):
I – de parcela correspondente à amortização dos investi-
mentos públicos nas obras de infra-estrutura de irrigação de uso
comum, com base no valor atualizado das obras (grifo nosso) - o
denominado K1;
II – de parcela correspondente ao valor das despesas anu-
ais de administração, operação, conservação e manutenção das
infra-estruturas – o componente K2.
Mercê das conseqüências negativas da determinação legal
supramencionada, relativa à forma de amortização dos investi-

24
mentos públicos, em projetos públicos de irrigação, esta questão é
aqui analisada com mais detalhe, à luz de procedimentos interna-
cionalmente aceitos, abordando o significado de Aluguel, Depreci-
ação, Manutenção, K1 e K2.
- Aluguel do capital

A infra-estrutura de uso coletivo nos projetos de irrigação


constitui um bem de capital que, nos projetos públicos e pela lei
atual, é de propriedade do Governo. Sendo um bem de capital,
que presta serviços aos irrigantes, cabe-lhe uma remuneração, no
caso sob a forma de aluguel, o qual deve refletir o custo de opor-
tunidade do capital. Em termos de longo prazo e níveis internacio-
nais, este valor varia de 3 a 6% ao ano.
No entanto, na tradição brasileira de irrigação pública, ja-
mais se imputou valor a este aluguel. Tudo se passou como se os
serviços prestados por essa infra-estrutura de uso coletivo vales-
sem zero, como aluguel.
Alguém pode objetar que nenhum aluguel dessa infra-
estrutura coletiva foi formalmente cobrado. Mas os serviços que
ela presta são efetivamente disponibilizados aos irrigantes e, por
isto, em princípio, devem ser remunerados por quem deles usu-
frui. E a remuneração devida corresponde ao aluguel desta infra-
estrutura. É claro que o detentor ou proprietário do bem de capital
pode, como o poder público tem feito nos projetos públicos brasi-
leiros, e como a maioria dos onze países analisados, imputar zero
ao valor do aluguel. Mas, ao assim proceder, deve fazê-lo explícita
e transparentemente.
Cabe ainda salientar que são duas as situações, do ponto
de vista do dono do bem de capital: ele pode vender ou alugar
(inclusive a si mesmo, como empreendedor) o bem de capital.
Nenhuma outra possibilidade existe.
Digamos que o dono do capital também opere a empresa
implantadora do projeto de irrigação. Neste caso, ele é o capitalis-
ta e o empreendedor, ao mesmo tempo. Aluga o capital à empre-
sa e cobra, por isto, um aluguel. Como empreendedor, produz
pagando todos os fatores de produção, inclusive o aluguel do ca-

25
pital, a depreciação etc. O que sobrar, ao cotejar o valor da produ-
ção com o valor das despesas, é a remuneração do empreende-
dor. A remuneração do capitalista é o aluguel dos fatores de pro-
dução de sua propriedade.
Em resumo, o aluguel é pagamento dos serviços do capi-
tal. Como tal, deve refletir o custo de oportunidade desse capital.
Numa economia aberta, do ponto de vista de longo prazo, é o cus-
to de oportunidade, ao nível internacional, do capital.
Portanto, o poder público deve formalizar o aluguel da in-
fra-estrutura de uso coletivo aos irrigantes, por intermédio do dis-
trito de irrigação. Este valor pode ser utilizado, inclusive, para co-
brir obrigações com bancos, por empréstimos tomados. Caso ele
decida não cobrar dos usuários pelos serviços prestados por essa
infra-estrutura de uso coletivo (aluguel = 0), isto deve ser explici-
tado claramente.
- Depreciação

Todo bem de capital desgasta-se, fisicamente, com o uso.


Esta perda dá origem à depreciação. Outro tipo de perda é quan-
do o bem de capital se torna obsoleto, devido à inovação tecnoló-
gica. Nesse caso, se a empresa não o substituir, não terá condi-
ções de permanecer no mercado, porque se tornará menos com-
petitiva.
Há vários métodos de depreciar. O mais comum deles é o
linear. Baseia-se nas seguintes hipóteses:
a) o bem continua produzindo, com a mesma produtivi-
dade, durante sua vida útil, se adequadamente
mantido;
b) o bem desgasta-se contínua e proporcionalmente aos
anos de funcionamento;
c) o bem desaparece no último dia da vida útil, podendo
deixar um valor residual que precisa ser corretamente
descontado da depreciação, o qual é maior no caso de
obsoletismo.

26
Assim, o valor da depreciação deveria ser cobrado e
depositado numa conta específica, com o objetivo de substituir os
itens de capital que deixassem de funcionar. Jamais para
amortizá-lo, como estatui a legislação de irrigação em vigor.
Esta conta, obviamente, só deve ser movimentada para re-
ceber os valores correspondentes à depreciação e pagar a aquisi-
ção dos itens que foram substituídos. Não pode ser usada para
nenhuma outra finalidade, como honrar compromissos com ban-
cos, amortizar investimentos etc.
Alguns procedimentos que precisam ser observados, quan-
to à depreciação da infra-estrutura de uso coletivo, devem ser
esclarecidos. A depreciação é linear. É feita por itens. Para cada
item, a depreciação anual é o valor dele, sempre como se novo
fora, dividido pelo número de anos que permanecerá em pleno
uso. Uma vez calculada, não mudará de ano para ano, enquanto o
item durar, exceto pela atualização de valor, quando há inflação.
Se um item for substituído por um de melhor qualidade (por causa
do seu obsoletismo), a depreciação para o item introduzido será
calculada conforme o mesmo procedimento, tendo-se o cuidado
de abater o valor do item substituído, do valor da depreciação a-
nual. O mesmo procedimento aplica-se a novos investimentos e a
itens que ficaram obsoletos ou gastos e foram substituídos. Ou
seja, abate-se o item que foi substituído da depreciação, se for o
caso, e se introduz o novo item, tendo-se em conta seu valor e
duração. O valor total da depreciação é a soma das depreciações
dos itens.
- Manutenção

A vida útil de um bem de capital é estimada em anos. Para


seguir operando, adequadamente, durante o número de anos es-
tabelecidos como vida útil, o bem de capital requer manutenção.
Esta manutenção dá origem a despesas.
No caso dos projetos públicos de irrigação, quando se a-
gregam à despesa com manutenção aquelas despesas corres-
pondentes à operação (da infra-estrutura de irrigação de uso cole-
tivo) e administração (do perímetro irrigado), têm-se as despesas

27
integrantes do componente K2 da tarifa d’água (tal como adequa-
damente determina a Lei n.º 6.662/79, em seu art. 25, § 2º (Brasil,
1979)). As despesas correspondentes à administração, operação,
conservação e manutenção das infra-estruturas, mencionadas no
caput deste artigo (infra-estruturas de irrigação, nos projetos pú-
blicos, implantados com recursos orçamentários da União), serão
divididas proporcionalmente entre os irrigantes, na forma fixada
pelo Poder Executivo. O Decreto n.º 89.476, de 29 de março de
1984, em seu art. 43, assim regulamentou esta questão: o valor
das tarifas incidentes sobre o uso de água nos projetos públicos
de irrigação, de que trata este Regulamento, será composto pela
adição de parcela correspondente ao valor das despesas anuais
de administração, operação, conservação e manutenção das infra-
estruturas (Brasil, 1984).
Assim, os valores arrecadados dos irrigantes, para cobrir
despesas de manutenção, devem ser acumulados na Subconta Ma-
nutenção (da Conta Administração, Operação e Manutenção do Pe-
rímetro Irrigado) a fim de ocorrer às despesas correspondentes.
A remoção do óbice legal, criado com a forma de amortiza-
ção estabelecida pela legislação de irrigação em vigor, é imperati-
va. Ademais, para romper-se o círculo vicioso, assim descrito: o
baixo índice de adimplência no pagamento das tarifas d’água de-
vidas, observadas internacionalmente em muitos projetos, implica
a baixa qualidade dos serviços prestados aos usuários, que, por
sua vez, estimula a inadimplência.
Com efeito, ao não destinar, estritamente, o componente
K1 da tarifa d’água a sua real finalidade – a depreciação do ativo
de uso coletivo (e, desse modo, à reposição imediata de compo-
nentes, eventualmente gastos pelo uso ou obsoletos), comprome-
te seu desempenho. Além do mais, essa forma inadequada de
amortização leva à quebra da confiança na administração, por
parte dos irrigantes, já que resulta na prestação de serviços de má
qualidade e/ou a custos mais elevados de distribuição de água
aos lotes irrigáveis.
Não é sem razão que se procura, em alguns perímetros
públicos de irrigação, desvincular essa cobrança do K1 da tarifa

28
d’água, de modo a não comprometer a transparência da gestão.
Mas esta iniciativa não é suficiente. Há que se mudar a Lei de
Irrigação.

3.2 - A Situação dos Projetos Públicos de Irrigação no


Nordeste

No capítulo, apresenta-se uma breve avaliação do desen-


volvimento dos projetos públicos implantados, sob a luz da política
descrita anteriormente. Enfoca-se, como hoje é feito, a gestão de
operação e manutenção, os principais serviços de apoio (notada-
mente, assistência técnica, pesquisa e crédito rural) e a participa-
ção da iniciativa.

3.2.1 - O foco na implantação de obras

Ênfase foi dada aos aspectos de obras de engenharia, na


implementação dos projetos públicos de irrigação, pelos agentes
executores. Desenvolveu-se, inquestionavelmente, uma tecnolo-
gia de ponta, quer nos aspectos de estudos e projetos, como de
obras civis/hidráulicas. Assim, a imagem dos projetos refletiu-se
nos quilômetros de canais, na capacidade das barragens e das
estações de bombeamento, no comprimento das adutoras e, fi-
nalmente, na área disponível para irrigação.
A finalidade para a qual a obra fora desenvolvida, ou seja,
a produção agrícola (que gera emprego, renda, estimula o desen-
volvimento regional e assegura o retorno dos investimentos) não
encontrou, muitas vezes o mesmo aporte de interesse e recursos.
Cabe salientar que, ao se referir à produção agrícola, está-
se enfatizando todo o agronegócio: crédito rural, assistência técni-
ca, organização de produtores e produção, pesquisa, controle
sanitário e de qualidade, aspectos de mercado e comercialização,
estruturação viária, portuária, aeroportuária etc.
À medida que ações que visam o agronegócio mereceram
um pouco mais de atenção, os resultados apareceram à socieda-
de e ao produtor, como podem ser vistos em todo o Vale e, espe-
cialmente, nos projetos da região Petrolina/Juazeiro.
29
Ainda que na implantação dos projetos públicos de irriga-
ção predominasse o foco nas obras de engenharia, mais recente-
mente, a partir de meados da década de 80, como no caso da
Codevasf, voltaram-se as atenções à organização da operação e
manutenção e à produção, de forma pouco sistematizada, porém
avançando-se para ofertar um melhor apoio ao processo do agro-
negócio. Atualmente, o organograma dos projetos de irrigação é
representado por um segmento de engenharia e outro de organi-
zação, conforme esquema a seguir, bem definido nos projetos de
responsabilidade da Codevasf.
FIGURA 1

PROJETOS PÚBLICOS

ENGENHARIA ORGANIZAÇÃO

Projeto Viabilidade

OM Produção

Projeto Básico
Distrito • Coordenação
Verticalizada
Projeto Executivo
• P&D
• Assistência
Obra Técnica
• Informações
de Mercado
• Defesa Fitos-
sanitária
• Padronização

30
3.2.2 - Área implantada em produção e a ser implantada

Conforme dados levantados junto às instituições responsá-


veis, os projetos públicos correspondiam a uma área, em 1998, de
169.055 ha, em condições de operação e aptos para serem irriga-
dos. Dessa área, 107.493 ha estão efetivamente em produção. O
restante encontra-se em processo de licitação para venda de lotes
ou sem aproveitamento, devido a problemas como condições ina-
dequadas do crédito, baixa capacidade de endividamento dos
irrigantes (o que não lhes permite ter acesso ao crédito), baixa
disponibilidade de recursos próprios para empreender, especula-
ção, entre outros.
Existem, ainda, pelo menos 60.000 ha em fase final de im-
plantação que serão agregados nos próximos 2-3 anos ao proces-
so de produção.

3.2.3 - A gestão de operação e manutenção

A operação e manutenção (OM) dos projetos públicos de


irrigação do Nordeste compreende as seguintes formas:
- Realiza-se diretamente pelo agente executor, quer fede-
ral ou estadual, que não terceiriza a atividade.
- É feita a delegação à organização de produtores como o
distrito, a cooperativa ou outra forma de associação de
produtores.
A partir de meados da década de 80, iniciou-se, liderado
pela Codevasf, um processo de delegação da operação e manu-
tenção (OM) do Projeto para os usuários, pelo distrito de irrigação,
que representou um avanço bastante significativo, o qual não foi
acompanhado pelo Dnocs. Essa delegação, como vem ocorrendo
na maioria dos países, não é um processo muito rápido e tem
maior resposta quando o sistema de irrigação está em perfeitas
condições de funcionamento. Caso contrário, é necessário um
programa de recuperação. Além do mais, deve vir acompanhado
da capacitação dos usuários para assumirem, com segurança, as
responsabilidades que se impõem.

31
3.2.4 - O processo de produção
a) Assistência técnica

Para os pequenos produtores, vinculados à Codevasf, há


um programa que tem diretrizes e estratégias, nas quais se fun-
damenta a busca de resultados. Ele não é observado nos períme-
tros do Dnocs.
Quanto aos médios e grandes irrigantes, quer em projeto
público ou em propriedades privadas, a assistência técnica é de
empresas privadas ou de profissionais autônomos.
A evolução da assistência técnica, especificamente aos
projetos públicos, é de interesse para os objetivos do estudo e,
por isso, deve ser comentada.
Nas décadas de 60 e 70, os princípios que orientaram a
política de desenvolvimento, as políticas públicas do setor rural e
as de produção agrícola levaram à implantação de muitos projetos
públicos de irrigação e à definição da estratégia de funcionamen-
to. Foram criadas cooperativas em cada um deles. A assistência
técnica era prestada pelos próprios órgãos promotores, pelas en-
tidades oficiais de assistência técnica e extensão rural ou pelas
próprias cooperativas, custeadas pelo poder público.
Observa-se que, até meados dos anos 80, a estratégia de
intervenção do Estado no sistema de produção agrícola irrigada e
a forma e os meios utilizados para favorecer a autogestão e a
emancipação dos perímetros foram ineficientes, assim como as
ações da assistência técnica.
A partir do meado dos anos 80, os promotores dos projetos
públicos priorizaram investimentos na estrutura empresarial das
cooperativas para que pudessem alcançar o desempenho espera-
do. No início, os resultados foram estimulantes. Mas logo surgiram
problemas, principalmente devido à ausência de espírito associati-
vista e empreendedor, que levaram ao fracasso das cooperativas.
A direção da Codevasf acelerou, nos últimos quinze anos,
a emancipação, estimulando o debate de estratégias de co-

32
gestão, com ênfase na produção. A equipe de assistência técnica
teve papel importante na sua execução.
No início da década de 90, o Dnocs acompanhou a Code-
vasf, quanto à orientação do trabalho de assistência técnica; porém
abandonou tais procedimentos a partir de meados dessa década.
Verifica-se que, tanto ao nível de perímetro público (pe-
quenos, médios ou grandes irrigantes) quanto em propriedades
privadas, que o trabalho de assistência técnica tem dado ênfa-
se maior à produção dentro da propriedade, não se envolvendo
no agronegócio como um todo, a exemplo da França, Chile e
outros países.
Coexistem, nos perímetros irrigados, públicos ou privados,
diversas formas de assistência técnica. Elas variam em função da
gestão e das fontes de financiamento, como está descrito no Rela-
tório do Estado da Arte.

b) Pesquisa e desenvolvimento no semi-árido nordestino

Apesar do avanço da agricultura irrigada nos últimos vinte


anos, a pesquisa agrícola deu muito pouca ênfase à irrigação,
tanto no que concerne às técnicas de irrigação, de manejo d’água
e práticas culturais, quanto no desenvolvimento de novas varieda-
des. Em tempos recentes, mercê da pressão dos pólos de irriga-
ção, a atitude tem mudado. Mas a mudança é lenta. Como substi-
tuta, no curto prazo, a importação de tecnologias e de assistência
técnica internacional cresce rapidamente.
Como a geração de informações, principalmente na área
de fruticultura é lenta, a apropriação desses benefícios pelos agri-
cultores também se dá a médio e longo prazos, nos casos em que
a importação de tecnologias é impossível.
Apesar disso, existem resultados pontuais para alguns
produtos e práticas, principalmente para aqueles produtos de ciclo
mais curto.
Há, no entanto, um hiato entre o crescimento da agricultura
irrigada e a oferta de informações tecnológicas. Ele é maior nas

33
áreas de pesquisa, como em cultivares, manejo de irrigação e de
fertirrigação, fitossanidade, controle de plantas daninhas, colheita
e em pós-colheita. O problema é muito menos relevante em paí-
ses que investiram vigorosamente em pesquisa, como a França e
os Estados Unidos, entre outros.
Na área abrangida pelos pólos de irrigação do Nordeste,
existem algumas unidades de pesquisa agropecuária que vêm
desenvolvendo pesquisas com diversas fontes de recursos ou
estão integradas ao “Programa Avança Brasil”, bem como são
apoiadas pelo Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(FUNDECI) do Banco do Nordeste.

c) Organização dos produtores

Como observado também na experiência dos países anali-


sados, na implantação de grandes projetos de irrigação pelo setor
público, grande lapso de tempo costuma separar a fase de identi-
ficação, desenho do projeto, construção e arranjos de natureza
político-institucional-financeira - indispensáveis a sua efetiva im-
plantação – da fase de implementação final. É que, dado o volume
de recursos financeiros envolvidos, não raro, mudanças no quadro
macroeconômico, nas prioridades e no modus operandi dos go-
vernos patrocinadores resultam, invariavelmente, em descontinui-
dades, as quais não só retardam sua implantação física, como
também tumultuam a vida dos agricultores e suas organizações
pelas incertezas geradas.
Nos pólos de irrigação do Nordeste (Petrolina/Juazeiro,
Oeste Baiano, Baixo Jaguaribe, Alto Piranhas, Açu-Mossoró, Nor-
te de Minas), os projetos enfrentaram, com sucesso, tais vicissitu-
des, graças à ação das agências governamentais com eles envol-
vidas, dos irrigantes e de suas representações. Ressalte-se que
foram elevados os custos do atraso, tanto para os agricultores
como para os cofres públicos. Num caso, não arrecadaram as
tarifas e os impostos, e, no outro, a taxa de retorno dos investi-
mentos feitos ficou muito menor.
Relativamente à organização dos produtores nesses pólos,
pode-se verificar a seguinte caminhada no tempo:

34
a) Uma fase inicial, quando a seleção e o assentamento
dos irrigantes e as iniciativas de implantação de quais-
quer formas (econômica, social) de organização dos
produtores, após sua integração ao Projeto, eram intei-
ramente conduzidas pela agência responsável. Naquela
fase, só eram admitidos nos projetos pequenos agriculto-
res sem terra, preferencialmente da região dos projetos,
com pouca ou nenhuma experiência em agricultura co-
mercial e muito menos irrigada. Daí o viés assistencialis-
ta e fortemente dirigista da ação governamental, além de
centrada na engenharia dos projetos e suas obras.
b) Uma segunda fase, quando se evoluiu para a admissão,
além dos pequenos agricultores, de outras categorias
de irrigantes, como pequenos, médios e grandes em-
presários. Nesta fase, cuidou-se da transferência da
administração da infra-estrutura de uso comum e social
para a organização de produtores. Mudou-se o foco pa-
ra a promoção da agricultura irrigada, como força motriz
do desenvolvimento da região dos projetos (como e-
xemplo, os perímetros de responsabilidade da Code-
vasf, na região Petrolina/Juazeiro e Norte de Minas).
Assim, a agência governamental, agora de mãos dadas
com as organizações de produtores e outras instituições
públicas, contando com o apoio do Banco do Nordeste
(na área de crédito e capacitação gerencial), intensificou
as ações, voltadas para a modernização da agricultura,
das indústrias e das práticas comerciais. Investiu na
complementação, reabilitação e modernização dos es-
quemas de irrigação e drenagem dos projetos e mesmo
sua ampliação. Permite e incentiva a provisão de assis-
tência técnica e extensão rural pelas empresas privadas
contratadas, que passam a fazer planos de crédito rural,
credenciadas pelos agentes financeiros oficiais. Elas
continuaram ativas na seleção e assentamento de irri-
gantes nas novas áreas incorporadas. Desenvolvem
também ações que buscam maior envolvimento e coor-
denação de instâncias governamentais, inclusive esta-
duais e municipais, para a oferta de bens públicos es-

35
senciais ao bem-estar das famílias assentadas e cruci-
ais à geração de externalidades, das quais depende a
conquista de vantagem competitiva sustentável.
c) Ainda, nesta fase, predominam os esforços conjuntos
de assistência técnica e financeira e de mobilização in-
terinstitucional, na capacitação e fortalecimento dos
produtores-irrigantes e de suas organizações, para as-
sumirem, eles próprios, todas as decisões relacionadas
não somente à agricultura irrigada, mas também à ativi-
dade econômica, o negócio principal nos pólos. Ou seja,
os agricultores, por intermédio de suas organizações,
responsabilizam-se pelo processo de gestão dos proje-
tos de irrigação, suas interações (de natureza política,
social e econômica) com o ambiente externo e pela
promoção do desenvolvimento regional.
Surgem, então, as associações de produtores ligadas
às quadras hidráulicas. Observa-se a criação, sem inge-
rência do governo, de cooperativas de produção e seu
envolvimento ativo na comercialização de insumos e de
produtos. Algumas são cooperativas de crédito, no âm-
bito da intermediação financeira, como a Cooperativa
dos Fruticultores de Janaúba-MG (Frucoop) e Coopera-
tiva de Crédito do Vale do Gorutuba (Credivag), Coope-
rativa Agrícola de Juazeiro (CAJ). Elas estão exorcizan-
do uma história de insucessos, como foi, no passado, a
criação induzida, de cima para baixo e fortemente assis-
tencialista, de tais organizações, em projetos públicos
de irrigação no semi-árido brasileiro. Emergem, tam-
bém, formas mais avançadas de representação e mobi-
lização dos produtores irrigantes, como a Associação
Central dos Fruticultores do Norte de Minas (Abanorte)
que tem a missão de promover a fruticultura de elevada
qualidade, pelo fortalecimento do Associativismo e pela
articulação dos interesses públicos e privados, na busca
do desenvolvimento sócio-econômico da região. Outro
exemplo é a Associação dos Exportadores de Hortigran-
jeiros e Derivados do Vale do São Francisco (Valexport)
(Petrolina/Juazeiro), que promove os produtos do Vale

36
do São Francisco no Brasil e no exterior e ajuda os a-
gricultores a produzirem produtos de melhor qualidade.
d) Finalmente, está em curso a terceira fase. Nela a agên-
cia governamental libera-se do dia-a-dia dos projetos de
irrigação, quando participa apenas do Conselho de Ad-
ministração dos Distritos de Irrigação, ainda assim com
direito a veto, mas sem voto e aplica o tempo e a capa-
cidade empreendedora na identificação e promoção de
novos projetos na região do Nordeste brasileiro (inclusi-
ve nos atuais pólos de irrigação), sem prejuízo de conti-
nuar batalhando pela consolidação dos projetos já im-
plantados, emprestando às suas organizações, apoio
técnico, financeiro e político. Vencidas as naturais resis-
tências e dificuldades da transferência de responsabili-
dade de operação e manutenção da infra-estrutura cole-
tiva dos perímetros irrigados e da conseqüente devolu-
ção de poder aos usuários da água, surge nova forma
de atuação do setor público na irrigação, sobretudo no
Nordeste brasileiro. Por ela, as agências governamen-
tais, de natureza regional e setorial, atuam como promo-
toras do empreendimento e mobilizadoras de novas fon-
tes de recursos financeiros. Ou, então, como gerencia-
doras globais das grandes obras de infra-estrutura cole-
tiva dos novos projetos de irrigação, o que corresponde
envolver o setor privado em todas as fases do processo
decisório e nos investimentos necessários à viabilização
dos projetos.

d) Estrutura de organização da cadeia

A seção registra, de forma resumida, as formas de organi-


zação das “cadeias” existentes que compreendem organizações
do mercado e suas principais funções nos pólos estudados. Os
modelos são, obviamente, uma simplificação dos sistemas de co-
mercialização predominantes nos pólos. Estão classificados em 4
sistemas:

37
Sistema 1

PRODUTOR

AJUNTADOR RURAL

ATACADISTA DE DESTINO

VAREJISTAS:
- SUPERMERCADO
- SACOLÃO, FEIRA, ETC.

Características predominantes:

• Os atacadistas normalmente estão localizados nas Cen-


trais de Abastecimento S.A. (Ceasas).
• O “ajuntador”, normalmente, está vinculado ao atacadis-
ta e tem a função de preparar a carga, definir, com o
produtor, o esquema de compra: quantidades, data de
colheita, condições de pagamento, preço etc.
• O preço praticado é o vigente no dia.
• O frete, na maioria das vezes, é pago pelo atacadista.
• O atacadista fornece aos supermercados, sacolões, fei-
ras e outros varejistas.
• Às vezes, os atacadistas promovem a classificação e
embalagem, nos casos de produtos como limão, ma-
mão, manga, cebola etc. E esta é uma das atividades
de coordenação de mercado.
• Os atacadistas, quando justificado, possuem estrutura de
armazenamento, câmara fria e câmara de climatização.

38
Estima-se que este modelo de coordenação representa,
mais ou menos, 60-65% de todo o negócio, envolvendo as princi-
pais culturas dos pólos, tais como, banana, cebola, manga, limão,
cenoura e uva.
O produtor, quando tem volume para isso, negocia direta-
mente com o atacadista, sem a participação do “ajuntador rural”,
que, na verdade, é apenas um preposto do atacadista na realiza-
ção de pequenas funções que agregam pouco valor ao produto.
Há um “acerto ou contrato” informal entre o produ-
tor/ajuntador rural ou o produtor/atacadista, em que são definidos
valor de venda, condições e prazo de pagamento (normalmente
igual ou superior a 40 dias).
Sistema 2

PRODUTOR

VAREJISTAS:
SUPERMERCADO
SACOLÃO

FEIRA, HOTÉIS

AGROINDÚSTRIA

Características predominantes:

• O produtor tem volume, freqüência e qualidade predefi-


nidas.
• Pode existir o contrato informal que garante a compra
por um período pré-determinado ao preço vigente à é-
poca.
• Esse tipo de venda pode ser realizada dentro das Cea-
sas, em lugar definido para os produtores e/ou associa-

39
ções realizarem negócios. Neste caso, a venda está su-
jeita às condições do dia.
• Ter lugar para comercializar não garante um preço re-
munerador e, por isto, a venda pode não se realizar em
alguns dias.
• Estima-se que o sistema 2 cobre 5% a 10% do volume
de comercialização de produtos como banana, cebola,
limão, goiaba, manga, uva.
• Todo o risco do processo é do produtor.
Sistema 3

PRODUTOR

AGROINDÚSTRIA

SUPERMERCADO
OUTROS VAREJISTAS

Características predominantes:
• A agroindústria faz um contrato formal que define, para
cada safra, quantidade e preço do produto.
• A agroindústria fornece apoio ao processo de produção,
como: assistência técnica, insumos (parte) ou presta so-
lidariedade na obtenção de crédito.
• O produtor, ao decidir plantar, saberá, imediatamente,
das condições de preços, qualidade e quantidade. O
seu ganho dependerá de sua eficiência.
O sistema 3 representa, hoje, em torno de 5% do volume
de produção dos pólos de irrigação. As culturas mais comuns são:
tomate industrial, pimentão industrial, uva, manga, coco.
40
Sistema 4

PRODUTOR

EMPRESA PROCESSADORA E
DE COMERCIALIZAÇÃO

ATACADISTAS
SUPERMERCADOS
MERCADO INTERNACIONAL
INDÚSTRIAS / HOTÉIS

Características predominantes:
• A empresa faz um contrato formal, também informal, pa-
ra cada safra ou ano, definindo quantidade, qualidade,
preço, época de entrega e local de entrega.
• A empresa recebe o produto, beneficia e processa, dan-
do-lhe marca, especificações de qualidade etc.
• A empresa fornece assistência técnica.
• Às vezes, participa com apoio financeiro, em termos de
crédito ou de fornecimento de insumos.
• A empresa pode ter produção própria (algo em torno de
20 a 40%).
O sistema 4 corresponde, hoje, a uma comercialização de
10-15% do volume de produção dos pólos de irrigação. As frutas
mais beneficiadas são: manga, uva, melão, goiaba, limão, banana.
Uma variação do sistema 4 corresponde a organizações de
produtores ou empresas que se especializam, apenas, na comer-
cialização, principalmente para o mercado internacional.

41
Na realidade, os 4 sistemas descritos também ocorrem em
outros países. Nos de mais tradição, os sistemas 3 e 4 dominam o
negócio.
Realçam-se, ainda, as empresas prestadoras de serviços,
tais como:
1. “Trading Companies”, que ligam produtores brasileiros
com compradores externos, estabelecem contatos com
distribuidoras no exterior, realizam o desembaraço adu-
aneiro e estabelecem contato com empresas nacionais.
Dependem de boa infra-estrutura de frigorificação (in-
clusive nos portos), transportes, serviços portuários e
comunicação.
2. Sistemas de Corretagem, que oferecem serviços de a-
gentes compradores e vendedores, em consignação,
sem repartição de riscos. Geram economias de escala
na comercialização. Facilitam a associação entre produ-
tores, distribuidores atacadistas e compradores de
grandes volumes. Dependem de padronização de pro-
dutos e da disposição dos produtores de se unirem para
ofertarem produtos de qualidade.
e) Crédito Rural

Considerando que o crédito rural é uma importante ferra-


menta do processo de desenvolvimento, apresenta-se, neste capí-
tulo, breve revisão do assunto e abordam-se as linhas de crédito e
as observações emitidas pelos agentes da cadeia da agricultura
irrigada, obtidas em entrevistas e em seminários.
Nos últimos anos, o Banco do Nordeste tem liderado a dis-
ponibilização de recursos e aplicação do crédito no Nordeste bra-
sileiro e no norte de Minas, também na agricultura irrigada. Em
adição, viabiliza a capacitação gerencial e técnica dos produtores,
do ponto de vista de desenvolvimento regional e de pólo de de-
senvolvimento, fundamentado no agronegócio. Neste aspecto, o
Banco do Nordeste é diferente de outros agentes financeiros ofici-
ais, que apenas provêm crédito rural. Outro fator importante, favo-
rável ao Banco do Nordeste, é o Fundo Constitucional de Financi-

42
amento do Nordeste (FNE) garantir recursos estáveis para finan-
ciar o desenvolvimento regional. E, por isto, o Banco não é um
mero repassador de recursos e, assim, tem a capacidade de esta-
belecer princípios e normas de aplicação, respeitando-se as re-
gras do Fundo.
Vários são os programas do Banco do Nordeste que con-
templam as atividades da agricultura irrigada na região estudada.
No entanto, muitas observações foram feitas pelo usuário do cré-
dito e foram identificadas em seminários realizados nos pólos e
em entrevistas com lideranças, produtores e comerciantes. As
observações mais freqüentes foram:
• Inadequação de algumas linhas de crédito entre as
condições de financiamento e as características técni-
cas da produção.
• Limite baixo de financiamento que não permite a imple-
mentação de alta tecnologia.
• Baixa disponibilidade de recursos para custeio.
• Restrições ao financiamento para as atividades de in-
fra-estrutura de beneficiamento, armazenamento e de
logística de transporte (ex.: packing house, caminhões
frigorificados).
• Demora no processo de liberação dos financiamentos,
considerando-se o tempo decorrido entre a solicitação,
autorização e aprovação.
• Disponibilização do crédito sem, muitas vezes, observar
as épocas favoráveis de plantio.
• Prazos de financiamento algumas vezes não guardam
relação com a vida útil dos bens de capital, com as ta-
xas de retorno e risco da atividade.
Por outro lado, em muito dos casos, os próprios produtores
são responsáveis por não terem acesso ao crédito ou por provo-
carem demora ao acesso. As principais causas são: demora na
entrega de documentos, projetos mal elaborados, restrições ca-

43
dastrais, falta de recursos próprios, condições de garantia inade-
quada ao processo, baixa capacidade gerencial, entre outras.

3.2.5 - A participação da iniciativa privada

Analisa-se, no capítulo, a participação pública x privada


nos empreendimentos da irrigação. Esta participação é um dos
pilares do novo modelo. Serão utilizados, na análise, o diagnóstico
dos seis pólos estudados (Petrolina/Juazeiro, Oeste Baiano, Baixo
Jaguaribe, Alto Piranhas, Açu-Mossoró, Norte de Minas), e apre-
sentado no Relatório Estado da Arte da Irrigação.
Até 1998, a infra-estrutura de irrigação foi realizada pela i-
niciativa privada em 49,8% do total da área irrigada desses pólos
(197.816 ha). A participação pública correspondeu a 50,9% da
mesma área. A informação pode provocar, aparentemente, duas
reações discordantes:
1a) A iniciativa privada tem participado numa intensidade
maior do que se imaginava.
2a) Na irrigação pública, toda a infra-estrutura de irrigação
é por conta do governo.
A maior parte da área irrigada dos particulares é em áreas
próximas da fonte de água e foi estimulada pelo crédito rural, com
taxas de juros subsidiadas. Enquanto, nos projetos públicos, hou-
ve a necessidade de construir represas para acumulação de água
ou de realizar captações em fontes com vazão suficiente e de dis-
tribuir água para áreas bem distantes da fonte de captação, em
virtude do vulto dos projetos e da escolha feita, levando-se em
consideração, também, objetivos políticos.
Nos últimos 10-15 anos, ao se analisarem os perímetros
públicos, defronta-se com as seguintes situações:
1. O governo investe na infra-estrutura hidráulica de uso
coletivo e posteriormente continua aportando recursos
(em maior ou menor escala) na sua operação e manu-
tenção.

44
2. O aproveitamento agrícola dos projetos (produção agríco-
la) não ocorre na velocidade imaginada, em conseqüência
de fatores relacionados à baixa capacidade de endivida-
mento dos produtores, crédito rural com restrições de uso,
quanto à quantidade e oportunidade, seleção inadequada
de pequenos irrigantes e de empresários.
3. Quando se refere à infra-estrutura parcelar (entenden-
do-se, irrigação, casa, packing house etc.), tem-se:
- no caso de pequenos irrigantes, a infra-estrutura de irri-
gação parcelar é implantada pelo governo, e o seu cus-
to adicionado ao valor da terra e pago conforme a legis-
lação. As demais infra-estruturas são de responsabili-
dade do irrigante, como: casa, galpão etc.
- as culturas permanentes são de responsabilidade dos
irrigantes e implantadas com recursos próprios ou de fi-
nanciamento.
4. Nos perímetros públicos, há uma forte participação da
iniciativa privada, pois o projeto de irrigação são as o-
bras hidráulicas de uso coletivo e um complexo proces-
so de produção agrícola que usa a tecnologia de aplica-
ção de água como ferramenta. Nos últimos 10-15 anos,
para se obter a produção agrícola nos projetos públicos,
foram necessários investimentos da ordem de US$
8.500 a 11.000/ha. A participação privada é de 64 a
68%, como se mostra a seguir:

45
TABELA 1
PARTICIPAÇÃO PÚBLICA E PRIVADA NOS PERÍMETROS
PÚBLICOS

Discriminação do Custo Valor em US$


Infra-estrutura hidráulica de uso coletivo................................± 3000 a 3500/ha
Infra-estrutura parcelar de irrigação ................................ ± 1500 a 2000/ha
Infra-estrutura parcelar de apoio (casa, galpão,
±
packing-house, etc.) ................................................................
700 a 1000/ha
Formação de culturas perenes ................................ ± 3000 a 4000/ha
±
Valor da terra ................................................................ 300 a 500/ha
Total de Investimentos no Projeto................................ ± 8500 a 11000/ha
Participação Pública (que se dá apenas na
estrutura hidráulica de uso coletivo) ................................ ± 35,3 a 31,82%
± 64,7 a 68,18%
Participação Privada ................................................................
FONTE: Plena Consultoria de Engenharia Agrícola Ltda.

Os projetos públicos têm um custo variável de US$ 4.500 a


5.500/ha, quando se imputa o custo com a infra-estrutura hidráuli-
ca de uso comum e infra-estrutura parcelar de irrigação do peque-
no irrigante.
Erroneamente, imputam-se ao projeto público de irrigação
custos como estradas, rede elétrica, casas, escolas etc. Sendo
assim, o valor dos projetos públicos alcança o intervalo de US$
7.000 a 8.000/ha. Tais itens, contudo, são de responsabilidade da
sociedade, na irrigação ou em qualquer outra situação.
Pela legislação atual, o irrigante do perímetro público
amortiza em 50 anos o custo dessa infra-estrutura hidráulica de
uso coletivo. Não tem, contudo, direito à posse, após concluída a
amortização. Como já salientado, os recursos, numa conceituação
correta, deveriam ser usados para recuperar o que se desgastou
da infra-estrutura hidráulica. Isso somente ocorre em parte.

46
4 - MARCO TEÓRICO

Tendo em vista a preocupação do estudo em propor uma


nova reestruturação do negócio da irrigação, buscou-se retratar o
marco teórico com apoio nas literaturas sobre competitividade e
coordenação de cadeias agroindustriais. Neste contexto, discute-
se o ambiente institucional, organizacional e competitivo no negó-
cio da irrigação.
A competitividade engloba duas dimensões tradicionalmen-
te separadas no enfoque analítico da teoria da organização indus-
trial, mas que se determinam e dificilmente podem ser identifica-
das isoladamente no mundo real: conduta e desempenho (Farina,
Azevedo & Saes, 1997). Enquanto desempenho, a competitivida-
de se expressa como a capacidade de sobrevivência e expansão
nos mercados nacionais e internacionais. Nesse contexto, o indi-
cador de participação no mercado é o mais representativo. A di-
mensão de conduta diz respeito ao processo de concorrência pro-
priamente dito. O agronegócio da agricultura irrigada deverá aten-
der a ambos os critérios/dimensões.
Assim, do ponto de vista das teorias de concorrência, a
competitividade pode ser definida como a capacidade de sobrevi-
ver e, de preferência, crescer em mercados correntes ou novos
mercados, como ocorrerá com o crescimento futuro da irrigação.
Decorre dessa definição que a competitividade é uma medida de
desempenho das firmas individuais. No entanto, esse desempe-
nho depende de relações sistêmicas, já que as estratégias empre-
sariais podem ser obstadas por gargalos de coordenação vertical
ou de logística.
Segundo Porter (1990), um conceito aplicável de competi-
tividade deve ser mais abrangente do que aquele baseado em
custos de produção, deve incluir possibilidades de associar com-
petitividade à organização interna eficiente e aos sistemas de co-
municação e coordenação de atividades interfirmas.
As ações estratégicas também são referidas na literatura
como componentes do sucesso competitivo de uma firma. Nesta

47
linha, chama-se a atenção para duas abordagens diferentes nos
enfoques de ações estratégicas:
• Ferraz, Kupfer & Haguenauer (1996) enfatizam as estra-
tégias como base da competitividade dinâmica e as de-
finem como o conjunto de gastos em gestão, recursos
humanos, produção e inovação, que visam ampliar e
renovar a capacitação das empresas nas dimensões e-
xigidas pelos padrões de concorrência vigentes nos
mercados de que participam. Nesse sentido, as estraté-
gias estão condicionadas pelo ambiente competitivo, no
qual são definidos os padrões de concorrência.
• Best (1990), por sua vez, define ação estratégica como
a capacidade que as empresas demonstram, individu-
almente ou em conjunto, de alterar, a seu favor, carac-
terísticas do ambiente competitivo, tais como: a estrutu-
ra do mercado e os padrões de concorrência
Há, portanto, uma importante diferença entre a concepção
de Ferraz, Kupfer & Haguenauer (1996) e Best (1990), no que
tange à capacidade de ação estratégica como base da competiti-
vidade. Para Best (1990), essa capacidade diz respeito a uma
intervenção deliberada sobre o ambiente competitivo. Isto é válido
nas cadeias produtivas de alimentos, verduras, frutas e fibras,
irrigados ou não, mesmo naquelas marcadas pela presença de
commodities como principais produtos, à medida que subsiste um
importante espaço para ações estratégicas, como, por exemplo, a
criação de novos mercados e a segmentação dos mercados exis-
tentes. Para Ferraz, Kupfer & Haguenauer (1996), a ação estraté-
gica pode alterar o ambiente competitivo, mas ambos são previa-
mente condicionados pelos padrões de concorrência.
As duas concepções são importantes e complementares
para a análise da competitividade dinâmica. No entanto, ambas
carecem de uma abordagem da capacidade de coordenação da
cadeia produtiva em que as empresas desenvolvem suas estraté-
gias. Uma estratégia de segmentação de mercado, baseada em
qualidade do produto, pode exigir a utilização de matérias-primas
com especificações mais rígidas. Se a empresa não consegue

48
obter essa especificação junto ao mercado fornecedor, terá ela
mesma de produzi-la por meio de integração vertical a montante
ou terá de convencer algum fornecedor a fazê-lo, dentro das es-
pecificações necessárias, envolvendo investimentos dedicados.
Trata-se de governar a transação vertical com o objetivo de viabi-
lizar a estratégia de concorrência horizontal. Este talvez não seja
o caso da hortifruticultura irrigada, que tem oferta estável de insu-
mos adequados.
Governar a transação significa incentivar o comportamento
desejado e, ao mesmo tempo, conseguir monitorá-lo. Essa gover-
nança pode ser obtida pelo sistema de preços, quando o produto
desejado tem baixa especificidade e é ofertado por vários produ-
tores. Caso contrário, a governança adequada pode exigir a
elaboração de contratos, nos quais ficam predefinidos
instrumentos de incentivo e controle, tais como: multas,
auditorias ou prêmios por resultado.
Estratégias competitivas dependem de estruturas de go-
vernança apropriadas, para que possam ser bem-sucedidas. Por
esse motivo, a capacidade de coordenação vertical torna-se ele-
mento constituinte tanto da competitividade estática quanto da
competitividade dinâmica. Essa coordenação permite à empresa
receber, processar, difundir e utilizar informações de modo a defi-
nir e viabilizar estratégias competitivas, reagir a mudanças no
meio ambiente ou aproveitar oportunidades de lucro.
As relações entre ambiente competitivo, estratégias e estru-
turas de governança e competitividade são ilustradas na FIGURA 2.

49
FIGURA 2
AMBIENTES INSTITUCIONAL, ORGANIZACIONAL
E COMPETITIVO
QUADRO 1 QUADRO 2 QUADRO 3
AMBIENTE AMBIENTE AMBIENTE
ORGANIZACIONAL INSTITUCIONAL TECNOLÓGICO

- Organizações - Sistema Legal - Paradigma


Corporativas - Tradições e Tecnológico
- Birôs Públicos e Costumes
Privados - Sistema Político - Fase da
- Sindicatos - Regulamentações Trajetória
- I nstitutos de - Política e Tecnológica
PesquIsa Macroeconômica
- Políticas - Políticas Setoriais
Setoriais Governamentais
Privadas

QUADRO 4
AMBIENTE
COMPETITIVO
G r upos
- Ciclo de Vida da
Estratégicos
Indústria
- Estrutura da
Indústria
- Padrões de
Concorrência
- Características do
Consumo

QUADRO 5
ESTRATÉGIAS Atributos das
INDIVIDUAIS Transações

- Preço / Custo ESTRUTURAS DE


- Segmentação GOVERNANÇA
- Diferenciação
- Inovação
- Crescimento
Interno
- Crescimento
por Aquisição RELAÇÕES
SISTÊMICAS

QUADRO 6 Subsistemas
DESEMPENHO Estratégicos
(Competitividade)
- Sobrevivência
- Crescimento

FONTE: Farina, Azevedo & Saes (1997).

50
O ambiente competitivo é constituído pela estrutura do
mercado relevante (concentração, economias de escala e escopo,
grau de diferenciação dos produtos, barreiras técnicas de entrada
e saída), pelos padrões de concorrência vigentes (concorrência
preço e extrapreço, presença de grupos estratégicos, barreiras de
mobilidade etc.), pelas características do consumidor/cliente, que
abrem possibilidades de segmentação de mercado, e pelo ciclo de
vida da indústria, coadjuvante na definição dos padrões de con-
corrência (Farina, Azevedo & Saes, 1997).
Os padrões de concorrência constituem as regras do jogo
competitivo, ou seja, quais as variáveis-chaves para que a empre-
sa possa competir em um determinado mercado (preço, marca,
atributos de qualidade, estabilidade de entrega, reputação de con-
fiança, inovação contínua em produto ou em processo etc.). O
conjunto dessas variáveis, assim como sua hierarquia, forma o
padrão de concorrência de uma agroindústria ou grupo estratégico
dentro da mesma agroindústria, como a hortifruticultura irrigada.
Para dispor desses instrumentos, são necessários investi-
mentos em ativos específicos, tais como: desenvolvimento e con-
solidação de marca junto a clientes e consumidores, equipamen-
tos dedicados, logística de suprimento e distribuição, recursos
humanos com treinamento específico etc. Esses representam os
ativos intangíveis tão importantes na agricultura irrigada. Isto é,
tem-se, de modo geral, um conjunto de investimentos em ativos
específicos, associado a um determinado padrão de concorrência.
Se no interior de uma mesma indústria convivem dois ou mais
grupos de empresas que se distinguem pelo padrão de concor-
rência adotado e pelo conjunto de ativos específicos de que dis-
põem, cada um desses grupos é denominado de grupo estratégi-
co – de investidores estratégicos – como definido em Oster
(1994). O grupo de investidores estratégicos será um elemento-
chave para a proposta da empresa-projeto usada neste trabalho.
Grupos estratégicos são definidos como clusters de firmas
dentro da indústria, os quais utilizam os mesmos ativos específi-
cos e o mesmo conjunto de variáveis de concorrência (preço,
marca, linha de produtos, lançamento de novos produtos, propa-
ganda, etc.) O que distingue os grupos estratégicos são as dife-

51
renças de estratégia competitiva (Oster, 1994). Efeitos cumulati-
vos de propaganda podem representar efetivas barreiras à entra-
da no segmento de marcas da indústria, mas não afetam a entra-
da no segmento commodity. As firmas que operam no segmento
commodity, por sua vez, enfrentam barreiras de mobilidade para o
segmento de marcas (Farina, Azevedo & Saes, 1997).
A literatura de organização industrial tem sistematicamente
mostrado que não há uma relação causal simples e unidirecional
entre estrutura de mercado, a conduta (estratégia) das firmas e o
desempenho do mercado. No entanto, essa complexidade teórica
e prática não torna inútil esse tipo de análise para as questões de
competitividade nem para a identificação de políticas públicas.
Se fosse certo que, agindo sobre uma determinada estrutu-
ra de mercado se produziria o desempenho almejado, bastaria,
então, atuar sobre essa estrutura. Seria o ponto de “Bliss”, tanto
da política industrial quanto das agências de defesa da concorrên-
cia. (Farina, Azevedo & Saes, 1997). É exatamente nesse sentido
que se incorporaram ao ambiente competitivo tanto a estrutura
dos mercados quanto os padrões de concorrência e as caracterís-
ticas da demanda, porque todos eles moldam o ambiente competi-
tivo onde as firmas têm de atuar.
O ambiente competitivo diz respeito ao ambiente externo à
firma, onde habitam seus rivais, clientes e fornecedores. Porter
(1990) analisa essas cinco forças (rivalidade competitiva, força
dos clientes, força dos fornecedores, ameaça de produtos substi-
tutos e ameaça de entrada de novos concorrentes), no sentido de
identificar ameaças à lucratividade (desempenho) da empresa.
Tanto o conceito de estrutura quanto de padrão de concor-
rência estão referidos a um mercado que se denomina relevante
para a análise. Esse mercado relevante inclui o conjunto de produ-
tos substitutos e o escopo geográfico da concorrência (escopo dos
rivais efetivos). É certo que se o mercado geográfico tem escopo
mundial, o padrão de concorrência relevante são os mercados
internacionais.
No entanto, quando se pensa em política pública e compe-
titividade de sistemas agroindustriais específicos, a referência é o

52
escopo nacional, onde as políticas são passíveis de serem
sugeridas e implementadas. Além disso, os padrões de
concorrência no mercado interno são importantes para as
estratégias individuais locais. Por último, a referência ao escopo
nacional pode contemplar soluções cooperativas, visando a
concorrência em terceiros mercados.
As firmas dispõem de um conjunto de recursos produtivos
(físicos, humanos, financeiros etc.) que devem ser ajustados para
atender às regras do jogo competitivo. Em mercados fragmenta-
dos, onde são comercializados produtos de baixa diferenciação
(dados de estrutura), tendem a predominar padrões de concorrên-
cia, nos quais a liderança de custo é a principal vantagem compe-
titiva, já que a variável básica de concorrência é preço, as mar-
gens são baixas e o giro deverá ser elevado. Nesse caso, econo-
mias de escala e escopo marcam as operações das empresas-
líderes (Best, 1990).
Se forem identificadas mudanças tecnológicas ou institu-
cionais que possam resultar na mudança desse padrão de concor-
rência, então as vantagens competitivas baseadas em liderança
de custos deixam de ser suficientes para sustentar a competitivi-
dade. Uma situação como essa é de alta relevância para a identi-
ficação de fatores que sustentam a competitividade dinâmica.
Padrões de concorrência se alteram no tempo, como res-
posta a mudanças institucionais (abertura comercial, proteção à
propriedade intelectual etc.), mudanças tecnológicas (como a bio-
tecnologia que gerou uma convergência entre indústrias químico-
farmacêuticas e a indústria de sementes), mudanças no próprio
ambiente competitivo, do qual o padrão de concorrência faz parte
(reestruturação industrial, mudanças de hábito do consumidor) e
mudanças nas próprias estratégias individuais das empresas que
buscam criar assimetrias e, quando bem-sucedidas, podem alterar
o padrão de concorrência ao serem imitadas por concorrentes
(Farina, Azevedo & Saes, 1997).
A grande dificuldade de tratar dessa dimensão da concor-
rência é sua natureza intrinsecamente qualitativa. Indicadores
sobre coordenação adequada são de difícil definição, embora seja

53
passível de análise, por meio do alinhamento dos atributos das
transações entre as etapas do processo produtivo, com as estrutu-
ras de governança adotadas (Williamson, 1985).
Exemplos típicos de ineficiência de coordenação são
encontrados em situações nas quais os sistemas de padronização
de produtos (por exemplo, grãos) que, por mudança nas exigên-
cias técnicas de processamento ou de novos produtos, não res-
pondem mais aos requisitos valorizados pelos consumidores ou
clientes, gerando dissonâncias entre ofertantes e demandantes.
O sucesso das estratégias individuais está condicionado,
ainda, à provisão de um conjunto de bens públicos ou privados,
sobre os quais a empresa não tem, individualmente, controle. A
logística é um exemplo cabal a esse respeito, já que depende de
infra-estrutura de transportes, portos etc. Para firmas cujo negócio
está associado a commodities, para os quais a liderança de cus-
tos define o padrão de concorrência, o impacto pode ser mortal.
No entanto, mesmo para firmas com posicionamento estratégico
em produtos diferenciados, a logística pode eliminar ou magnificar
suas vantagens competitivas (Farina, Azevedo & Saes, 1997).
A capacidade de ação estratégica, associada à competiti-
vidade sistêmica, inclui também a articulação de ações cooperati-
vas entre rivais, fornecedores, distribuidores, institutos de pesquisa
públicos ou privados. Significa ter a capacidade de mudar as regras
do jogo competitivo a seu favor ou mesmo o ambiente institucional -
exemplo: ações que visem a aprovação das leis de proteção à pro-
priedade intelectual, políticas setoriais governamentais etc.
A provisão de bens públicos e coletivos, cuja oferta ade-
quada depende da ação do Estado ou de organizações de inte-
resse privado, tais como, associações de produtores, distritos de
irrigação, sindicatos etc., ao que se denomina ambiente organiza-
cional, pode ser fundamental para a competitividade. Sistemas de
informação sobre mercados, tendências de consumo, monitora-
mento de inovações e difusão de novas tecnologias, acompanha-
mento da ação estratégica de concorrentes de outras regiões ou
países são bens necessários à competitividade individual, mas
que, por suas características de não-rivalidade e/ou não-exclusão,

54
admitem comportamentos do tipo “carona”. Isto implica um subin-
vestimento na provisão desses bens, ou replicam o mesmo inves-
timento em firmas individuais, resultando em desperdício de re-
cursos e ineficiência. Nesse sentido, o ambiente organizacional é
muito importante na análise da competitividade (Farina, Azevedo
& Saes, 1997; Best, 1990; Streek & Schmitter, 1985).
As estratégias e a competitividade dependem, ainda, do
ambiente institucional. Aí estão os sistemas legais de solução de
disputas, políticas macroeconômicas, tarifárias, tributárias, comer-
ciais e setoriais adotadas pelo Governo, assim como por governos
de outros países, parceiros comerciais e concorrentes. Nesse sen-
tido, destacam-se a crescente importância das barreiras não-
tarifárias e dos controles fitossanitários, os instrumentos de retali-
ação comercial e, em um contexto mais amplo, a formação de
blocos econômicos e a atuação das empresas transnacionais.
A definição das cadeias agroindustriais (no caso da agricul-
tura irrigada), como um nexo de contratos que vão da fazenda ao
consumidor, permite dar conta dessa gama de possibilidades or-
ganizacionais que respondem a determinantes tecnológicos, insti-
tucionais e estratégicos. Permite compreender tanto a organiza-
ção via mercados, quanto a integração vertical e os contratos com
fornecedores e distribuidores. Permite também compreender a
direção das mudanças organizacionais exigidas a partir de altera-
ções em variáveis do ambiente competitivo das firmas. Trata-se,
portanto, de um aparato conceitual particularmente adequado para
discutir competitividade (Farina, Azevedo & Saes, 1997).
Assim, a organização da firma, da cadeia produtiva, do se-
tor e a regulamentação determinam a competitividade, uma vez
que estão na base da capacidade de resposta às oportunidades
de negócios. Essa capacidade de resposta depende fundamen-
talmente da capacidade de coordenação das atividades de produ-
ção e distribuição, isto é, da capacidade de transmitir informação,
estímulos e controles ao longo da cadeia produtiva de forma a
responder a mudanças no ambiente competitivo.

55
5 - POLÍTICA NACIONAL DE IRRIGAÇÃO PROPOSTA

A análise do Estado da Arte da Irrigação, no Brasil e nos


onze países selecionados que respondiam, em 1990, por cerca de
36% da área irrigada no mundo, mostra, de modo incontestável,
que a manutenção e a expansão da área sob irrigação têm exigi-
do, por diferentes razões, o envolvimento crescente do setor pri-
vado, não somente na gestão dos projetos já implantados, como
no financiamento de novos projetos, assim como no aperfeiçoa-
mento das estratégias mercadológicas, o que exige uma mudan-
ça no quê e no como fazer do setor público para se ajustar aos
novos tempos.
Há razões objetivas para acreditar no sucesso da mudan-
ça. Avaliações já realizadas mostram que não houve queda na
qualidade dos serviços, agora realizados pela iniciativa particular,
e ampliou-se o aporte de recursos privados, não somente na ope-
ração e manutenção dos sistemas de irrigação, como também em
novos investimentos.
As dificuldades que obstam a sustentabilidade e a expan-
são de projetos públicos de irrigação levaram a esmagadora maio-
ria dos países - com grandes áreas irrigadas e incorporadas ao
processo produtivo, entre eles o Brasil - a buscar respostas para
as seguintes questões:
i) Como os investimentos, a depreciação, a manutenção e
operação da infra-estrutura de uso coletivo, em projetos
de irrigação, com forte participação pública, podem ser
financiados?
ii) Quem deve responsabilizar-se pelos serviços de capta-
ção da água, pelo transporte, pelos sistemas intermedi-
ários e pela entrega ao usuário em sua parcela ou lote
irrigável?
iii) Até que ponto os produtores-irrigantes têm interesse e
capacidade para assumir e pagar pela oferta desses
serviços, dentro de um quadro de necessidade de recu-

56
peração de custos de operação e manutenção e dos in-
vestimentos fixos?
iv) De que maneira o sistema de preços, via cobrança de
tarifas de água, pode ser utilizado como um instrumento
adequado para se obter um nível mais eficaz de aloca-
ção e de uso da água, numa perspectiva de escassez
relativa crescente desse insumo produtivo estratégico?
v) Que arranjos organizacionais podem contribuir para que
o segmento da produção primária, desenvolvida com o
concurso da irrigação, posicione-se para melhor compe-
tir, em virtude de menores custos, diferenciação de pro-
dutos e ganhos de escala na comercialização, alcan-
çando, assim, maior poder de mercado?
No tocante aos investimentos e à gestão de projetos de ir-
rigação, envolvendo forte participação do setor público, as preo-
cupações devem-se, em grande parte, ao resultado de avaliações,
como as já empreendidas em projetos públicos de irrigação, finan-
ciados pelo Banco Mundial, em todo o mundo (Jones, 1995). Elas
identificaram problemas generalizados de operação e manuten-
ção, de recuperação de custos e problemas com os grupos usuá-
rios. Os primeiros são os mais importantes, porque repercutem
nos benefícios do projeto. As avaliações concluíram que os gru-
pos que se favorecem com a irrigação podem ser valiosos parcei-
ros na condução direta dessas atividades, simplesmente porque
seus membros se identificam com o empreendimento. Em contras-
te, falta de participação freqüentemente reduz os benefícios do pro-
jeto e causa perturbações na implementação. Assim, a maneira
mais promissora de melhorar o desempenho da operação e ma-
nutenção é responsabilizar os beneficiários, proporcionando-lhes
apoio técnico.
A recuperação dos custos e a conseqüente segurança da
sustentabilidade financeira dos investimentos dependem de dois
fatores: em primeiro lugar, das formas de propriedade (a instância
de contratualidade), da aplicação e do cumprimento da regula-
mentação pertinente. Em segundo lugar, da capacidade de cada

57
arranjo organizacional de gestão em atender critérios de qualidade
e de bom desempenho.
Relativamente ao processo produtivo e à sua inserção com-
petitiva nos mercados (interno e ou externo), observa-se flagrante
diferença entre o Brasil e o que ocorre nos países em que o agrone-
gócio, baseado na agricultura irrigada, encontra-se mais avançado.
Nos países de agricultura irrigada avançada (EUA, Israel,
França, Espanha e Chile, por exemplo), a política de irrigação já
superou a fase pioneira. Evoluiu de centrada nas obras de enge-
nharia para a da agricultura irrigada, como negócio. No caso, as
atividades de produção, no interior de cada parcela irrigada, e
aquelas que ocorrem antes e depois da produção, são decisivas à
sustentabilidade econômica da própria continuidade da agricultura
irrigada e, portanto, de cada projeto de irrigação.
Respondem por esse diferencial o amadurecimento dos
agricultores-irrigantes, buscando novas tecnologias de produção e
novas formas de organizar e gerenciar o seu negócio, e, também,
a postura do setor público (nos níveis do Executivo e Legislativo)
em relação à atividade agrícola, que é considerada de alto inte-
resse. Como se apresenta muito mais exposta à concorrência,
próxima da condição de competição perfeita, é merecedora de
tratamento adequado do setor público, porque enfrenta a jusante e
a montante grandes imperfeições de mercado.
À medida que as atividades de implantação das obras de
engenharia cedem lugar às relacionadas com a produção e co-
mercialização, as quais exigem maior interação de agências go-
vernamentais, provedoras de bens públicos de variada natureza,
cresce a complexidade na sincronização e coordenação da ação
pública de apoio à agricultura irrigada. Ademais, as agências go-
vernamentais, especializadas na implantação de projetos públicos
de irrigação e que agem de forma vertical, no que respeita à coor-
denada, não mais encontram espaço para assim continuarem atu-
ando, em virtude da especialização (na prestação de serviços pú-
blicos) e conseqüente pulverização dos orçamentos públicos, o
que é característico da organização do Estado moderno e que,
entre nós, já alcança até a esfera municipal.

58
Depreende-se, pois, que as necessidades da agricultura ir-
rigada, embora contenham exigências do projeto de irrigação, em
muito o extravasam. Assim, sua inserção competitiva exige mu-
danças, no quê e no como fazer, pelos empreendedores privados
e também pelo poder público, que a estimula e apóia. Da experi-
ência internacional avaliada, o conceito que melhor reflete este
conjunto de necessidades diferenciadas, ou seja, não focado ape-
nas em obra, mas no agronegócio, bem como a forma pela qual o
setor público tem procurado atendê-las, em países como França,
Chile, EUA e Espanha, é o da PLATAFORMA DE INFORMA-
ÇÕES E NEGÓCIOS.
A plataforma está ancorada em blocos de informações bá-
sicas, como: estatísticas sobre áreas, produção, tecnologia dispo-
nível, condição de embalagem, descrição da qualidade dos produ-
tos, processo de exportação e inteligência de mercado. O conjunto
de informações, na realidade, contém peças importantes para
orientação e separação dos investimentos públicos e privados, e
forma sobre métodos e processos que cobrem o conhecimento do
potencial e as exigências de mercado, a atividade de produção e
sua logística de escoamento, visando atender adequadamente à
demanda identificada.
É evidente que os produtos finais, disponibilizados aos a-
gricultores pelo setor público, envolvem uma ampla e diversificada
rede de órgãos ou agências governamentais. Elas estão vinculadas
a diferentes ministérios/secretarias de Estado, cujas especificidades
de mandato ou missão procurou observar na elaboração do marco
jurídico-institucional que cristaliza a nova política de irrigação.

5.1 - Diretrizes Gerais da Nova Política Nacional de


Irrigação

A realização deste estudo tem como finalidade desenvol-


ver, validar e estabelecer as bases estruturais, conceptuais, regu-
latórias, operacionais e financeiras, com enfoque na região Nor-
deste, que permita a implementação do Novo Modelo de Irrigação
do Brasil. Para tanto, observaram-se estritamente as diretrizes
gerais dessa nova política de irrigação, quais sejam:

59
• A nova política nacional de irrigação, relativamente às
regiões Nordeste do Brasil e norte de Minas Gerais, de-
ve estimular maior participação do setor privado no de-
senvolvimento da agricultura irrigada daquelas regiões,
inclusive nos investimentos de implantação da infra-
estrutura de irrigação de uso coletivo dos projetos de ir-
rigação de maior porte ou complexidade. Assim, ela de-
ve incluir a utilização de outras modalidades ou meca-
nismos alternativos de financiamento, além dos conven-
cionais, de modo a permitir a ampliação da área irriga-
da, em bases sustentáveis e num horizonte de tempo
menos distante.
• Ela deve contribuir, inclusive, para a geração de infor-
mações necessárias, que facilitem a tomada de deci-
sões dos atores públicos e privados, segundo uma vi-
são de cadeia produtiva. Ou seja, contemplando todas
as fases do processo, desde o planejamento da infra-
estrutura de irrigação de uso coletivo do projeto até a
distribuição final dos produtos, incluindo, ainda, os sis-
temas de apoio ao processo produtivo e observando as
exigências inerentes à conservação do meio ambiente.
• A nova política de irrigação deve orientar o
desenvolvimento da produção agrícola irrigada, tendo
como base as oportunidades e exigências dos
mercados interno e externo, segundo os parâmetros de
competitividade do agronegócio.
• Ela deve permitir ao Governo reordenar sua atuação pa-
ra o subsetor, com ênfase no papel do Estado moderno
(orientação, regulação, promoção, dentre outros), inclu-
sive fortalecendo as parcerias entre a iniciativa privada
e o Governo, no âmbito das três esferas: federal, esta-
dual e municipal.
• Finalmente, a referida política deve estimular a implan-
tação, nos perímetros irrigados, de sistemas de
monitoramento da irrigação e de política tarifária,
aplicáveis ao Nordeste e norte de Minas Gerais, visando
ao uso racional da água, ou seja, considerando-se a
60
cional da água, ou seja, considerando-se a sustentabili-
dade ambiental, econômica e social.

5.2 - Regime Jurídico Vigente

5.2.1 - O domínio das águas, quem pode e como delas


usufruir

A Constituição Federal de 1988 prevê que, praticamente,


todas as águas são públicas, do domínio da União, dos Estados
e do Distrito Federal (art. 26, I), não contendo qualquer previsão
para as águas comuns, as particulares e as municipais (Brasil,
1998).
Mediante o instituto da concessão administrativa, outorga-
da pelo titular do domínio, os recursos hídricos podem ser utiliza-
dos pela iniciativa particular para irrigação. Ressalva aquele insti-
tuto que “Independem de outorga pelo Poder Público as deriva-
ções, captações e lançamentos considerados insignificantes. “(Lei
n.º 9.433/97, art. 12, § 1º (Brasil, 1997)).
O instituto da concessão administrativa pressupõe “sub-
rogação no exercício de um serviço público” e a concessão de uso
consiste na “outorga de direitos especiais de utilização sobre de-
pendência ou bens do domínio público”. Isto leva ao
reconhecimento de que o termo concessão, a que alude o art. 43
do Código de Águas, instituído pelo Decreto n.º 24.643, de
10/07/1934, prevê a possibilidade da ocorrência, tanto da
concessão de serviços públicos (como no caso do saneamento
ambiental), quanto da concessão de direitos de uso de águas
públicas (tratando-se da irrigação) (Brasil, 1934). Reitera-se que, a
partir da Constituição Federal de 1988, todas as águas nacionais
são do domínio público.
Quando, por uma questão de competência legal, ao poder
concedente do direito de uso do recurso hídrico couber prestar o
serviço público, para o qual a derivação de água pública é
necessária, dá-se a concessão da prestação de serviço público,
isto é, a “transferência, temporária ou resolúvel, por uma pessoa
coletiva de direito público, de poderes que lhe competem, para
outra pessoa, singular ou coletiva, pública ou privada, a fim de que
esta execute serviços de interesse geral, mas por sua conta e
61
execute serviços de interesse geral, mas por sua conta e risco”
(Brasil, 1934). Obviamente, se o destino da derivação não esti-
ver contido na competência legal do poder concedente, há a
concessão de direitos de uso do bem público - os recursos hí-
dricos, no caso.
Haveria, aqui, a outorga de direitos especiais de utilização
sobre este bem de domínio público, tal como previsto no art. 14 da
Lei Federal 9.433/97: A outorga efetivar-se-á por ato da autorida-
de competente do Poder Executivo Federal, dos Estados ou do
Distrito Federal. O § 1º deste mesmo artigo prevê que “o Poder
Executivo Federal poderá delegar aos Estados e ao Distrito Fede-
ral competência para conceder outorga de direito de uso de recur-
so hídrico de domínio da União” (Brasil, 1997).

5.2.2 - A lei de irrigação em vigor (nº 6.662/79)

Na concepção vigente, ditada pela Lei de Irrigação (n.º


6.662/79 e seus regulamentos), o projeto público de irrigação é
construído (ou adquirido) pelo poder público, que se torna proprietá-
rio da infra-estrutura de irrigação de uso coletivo. É sua a respon-
sabilidade de administração, muito embora possa delegá-la a uma
associação de irrigantes (distrito de irrigação etc.) (Brasil, 1979).
A Lei de Irrigação vigente determina o ressarcimento dos
investimentos públicos em infra-estruturas de irrigação de uso
coletivo. Na realidade, a tarifa d’água cobre, apenas, a deprecia-
ção e a manutenção da infra-estrutura de uso coletivo, além de
sua operação e a administração. A amortização dos investimentos
públicos, na forma como determina aquele diploma legal, não o-
corre porque ele impede a venda do projeto aos irrigantes ou a
qualquer outro ente privado, quando diz ser propriedade pública a
infra-estrutura de irrigação de uso coletivo.
A lei vigente, no entanto, permite que o poder público dele-
gue a uma associação de irrigantes (distrito de irrigação etc.) a
administração do projeto. Note-se que a administração é feita em
nome e no lugar do poder público. Não ocorre arrendamento, e
não cabe, portanto, a cobrança de aluguel.

62
Concluindo: na concepção ainda prevalecente no Brasil,
um projeto público é aquele construído ou adquirido pelo governo,
que permanece proprietário da infra-estrutura de irrigação de uso
coletivo e tem a responsabilidade de administrá-lo ainda que pos-
sa delegar essa administração a uma associação de usuários. O
projeto público, pela lei vigente, não pode ser arrendado, nem
vendido. Assim, a tarifa d’água cobre, apenas, a depreciação e as
despesas com a manutenção e operação da infra-estrutura de
irrigação de uso coletivo e com a administração desses serviços.
5.3 - O Regime Jurídico Proposto

Conforme discutido, a nova política de irrigação exige al-


gumas mudanças da legislação de irrigação vigente (Lei n.º
6.662/79 e seus regulamentos), de sorte a criar um ambiente pro-
pício, em termos de infra-estrutura institucional, com adequado
suporte legal que permita a implementação de contratos, subordi-
nada à estrutura de regulamentação do setor de recursos hídricos,
ora em fase avançada de definição pelo Poder Legislativo. A nova
legislação de irrigação deve oferecer a indispensável segurança
jurídica ao setor público e encorajar os agricultores-irrigantes e
outros empreendedores privados a investirem ainda mais na agri-
cultura irrigada.
Tramita no Senado Federal o Projeto de Lei n.º 229/95,
que “Dispõe sobre a Política Nacional de Irrigação e dá outras
providências”. Para este projeto de lei, por determinação do con-
tratante, o Consórcio antecipou o estudo e preparou uma minuta
de anteprojeto de lei de irrigação, a qual já foi apresentada ao
Banco do Nordeste. A antecipação foi solicitada ao Banco pelo
Ministério da Integração Nacional (MI), com vistas a subsidiar o
eminente Senador Osmar Dias, como relator naquela Câmara
Alta, na elaboração de substitutivo ao PL 229/95.
Em março de 2000, como decorrência do estudo, foi en-
caminhada pelo MI àquele eminente relator uma versão consoli-
dada da minuta de Substitutivo ao PL 229/95, resultado de ampla
discussão, no âmbito daquele Ministério, que envolveu sua As-
sessoria Técnica, órgãos vinculados e também secretarias de Es-
tado da região Nordeste. Houve inúmeras reuniões e o seminário

63
específico, promovido pelo Banco do Nordeste e realizado em
Brasília, em outubro de 1999. A versão consolidada encontra-se
no ANEXO 8.2 deste relatório.
Assim, visando superar os problemas já mencionados, a
proposta atualiza e aprimora a legislação vigente (Lei n.º
6.662/79), corrigindo o equívoco conceitual, relacionado à amorti-
zação de investimentos em infra-estrutura de irrigação de uso co-
letivo, em projetos públicos. Ainda encoraja e dá maior segurança
ao setor privado, na gestão e na ampliação de investimento em
irrigação, como asseguram vários de seus dispositivos, entre os
quais cabe salientar:
- O artigo 1º , parágrafo 3º , ao estabelecer que o potencial
de mercado e a participação da iniciativa privada consti-
tuem fatores relevantes de indução e apoio governa-
mentais à implantação de projetos de desenvolvimento
da agricultura irrigada.
- No artigo 2º, referente aos objetivos da Política Nacional
de Irrigação, o inciso V assegura, como objetivo estimu-
lar a atuação de agentes privados e públicos na agricul-
tura irrigada, em áreas prioritárias definidas, observan-
do-se critérios técnicos, culturais, sociais, econômicos e
ambientais.
- Em seguida, o inciso XVII, do artigo 3º, define o aluguel
como sendo valor da retribuição paga pelo irrigante cor-
respondente ao arrendamento da infra-estrutura de
irrigação e drenagem de uso coletivo. E, no inciso XVIII,
define que quota-parte é a fração ideal das obras de in-
fra-estrutura de irrigação de uso coletivo, de proprieda-
de do irrigante por aquisição ou pela co-
responsabilidade na construção, cuja fração integra,
como parte complementar e inseparável, o título de do-
mínio do lote.
- Este mesmo artigo 3º já definira, em seu inciso I - Proje-
to público de irrigação, aquele implementado pelo Poder
Público e cuja infra-estrutura de irrigação e drenagem,
de uso coletivo, seja, inicialmente, de sua propriedade,

64
podendo ser alienada ou arrendada. No parágrafo 1º es-
tá escrito: os projetos públicos de irrigação serão de ini-
ciativa dos Governos Federal, Estaduais, Municipais e
do Distrito Federal.
- Para tanto, o artigo 9º estabelece, em seu parágrafo 2º,
que o Poder Público poderá transferir aos usuários de
um projeto público de irrigação, organizados sob a for-
ma de distrito de irrigação ou outra entidade autogestio-
nária, a concessão dele, sob a forma de arrendamento.
- No inciso II - Projeto privado de irrigação, aquele im-
plementado pelo setor privado ou por este adquirido do
Poder Público, nos termos da legislação pertinente.
- No inciso III - Projeto misto de irrigação, aquele imple-
mentado de forma compartilhada pelo Poder Público e
setor privado.
- Já o inciso VII, do artigo 3º , não deixa margem à dúvida,
quanto ao significado econômico e destinação da tarifa
d’água, ao defini-la como o valor a ser pago pelo irrigan-
te pelo uso da água e da infra-estrutura de irrigação de
uso coletivo.
- No artigo 24, fica estabelecido que a infra-estrutura de
irrigação de uso coletivo dos projetos públicos e mistos
será administrada, operada e mantida por intermédio
dos próprios irrigantes organizados, preferencialmente,
em distrito de irrigação.
§ 1º . O Poder Público deverá promover a constituição
de um Distrito de Irrigação ou outra entidade autogesti-
onária, até o prazo de um ano, após a instalação do
primeiro irrigante.
§ 2º. As despesas correspondentes à administração,
operação e manutenção da infra-estrutura de irrigação
de uso coletivo serão rateadas entre os seus usuários,
sob forma de tarifa, de acordo com o estabelecido em
regulamento.

65
§ 3º . A tarifa d’água será cobrada compulsoriamente de
todos os irrigantes pelo Poder Público, distrito de irriga-
ção ou outro concessionário, e seu valor deverá ser su-
ficiente para cobrir as despesas com a administração,
operação e manutenção do projeto.
§ 4º . Nos projetos públicos de irrigação, o Poder Público
deverá custear os acréscimos de custos operacionais
correspondentes à área irrigável ainda não ocupada.
§ 5º . O Poder Público poderá contratar diretamente o
distrito de irrigação para a realização de obras de infra-
estrutura, observadas as normas legais.
- Art. 25 – Fica o Poder Público autorizado a alienar aos
irrigantes do projeto, por intermédio do Distrito de Irriga-
ção, independentemente de processo licitatório, as o-
bras de infra-estrutura de irrigação de uso coletivo, de-
vendo o prazo de pagamento limitar-se ao máximo de
cinqüenta anos.
§ 1º . Não integrarão o valor da venda, de que trata este
artigo, o custo das obras de infra-estrutura social reali-
zadas no projeto.
§ 2º . A cota-parte das obras de infra-estrutura de irriga-
ção de uso coletivo, que caberá a cada irrigante, será
proporcional à área do seu respectivo lote e o integrará
de forma indissociada, para fins de registro no cartório
de registro de imóveis competente.
Coincidindo com os estudos em curso, com vistas à im-
plementação do Novo Modelo de Irrigação, intensifica-se, na esfe-
ra legislativa, o debate da legislação de regulamentação da gestão
e desenvolvimento dos recursos hídricos, com a aprovação pela
Câmara dos Deputados, em 18/01/2000, da redação final do Pro-
jeto de Lei n.º 1.617-E, de 1999, que “Dispõe sobre a criação da
Agência Nacional de Águas (ANA), entidade federal de implemen-
tação da Política Nacional de Recursos Hídricos e de coordena-
ção do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídri-

66
cos, e dá outras providências”, ora em apreciação pelo Senado
Federal (Brasil, 2000).
A Nova Política de Irrigação Proposta (ANEXO 8.2 deste
Relatório) é considerada indispensável para a institucionalização
das diretrizes do Novo Modelo de Irrigação, sobretudo aquelas
relacionadas à maior participação do setor privado na irrigação, as
quais são atendidas, entre outros, pelo contido nos seguintes dis-
positivos desta proposta de lei: art. 1º, § 3º ; art. 2º, incisos X e XI;
art. 3º ; art. 5º ; art. 8º ; art. 9º ; art. 10º ; art. 12, § 3º ; art. 14, § 5º ; art.
21; art. 24; art. 25; art. 30 ; art. 31 e art. 32.
A nova política ensejará, de fato, se acolhida pelo Con-
gresso Nacional, importantes aperfeiçoamentos na Política Nacio-
nal de Irrigação, sintonizando-a com as necessidades e anseios,
principalmente da região Nordeste, em perfeita consonância com
os interesses das outras regiões e do País.
Ressalta-se, ainda, que a proposta apresentada não intro-
duz mudança radical no modus operandi atual, mas decorre de
sua própria evolução, de resto observada no Brasil, e, também, na
maioria dos países, os quais têm na irrigação um instrumento de
política agrícola, de desenvolvimento regional, de segurança ali-
mentar, de geração de emprego e renda, de ampliação das expor-
tações e de redução das disparidades regionais.
Cabe salientar que, nos últimos quarenta anos, o Brasil
evoluiu muito, em matéria de agricultura irrigada, tanto conceitual
como operacionalmente. Existem hoje, no Nordeste, agricultores-
irrigantes e corpo técnico competente. A parte mais difícil da ca-
minhada foi, assim, realizada. Com a desobstrução das restrições
legais, os investimentos públicos em irrigação terão, portanto, ta-
xas elevadas de retorno.

5.4 - Diretrizes para Implantação de Projetos de Irrigação

A legislação de irrigação proposta, se acolhida pelo Poder


Legislativo, enseja a observação das seguintes diretrizes de
implantação de projetos de irrigação, significando inegável avanço
(ANEXO 8.2):

67
i) Projeto público de irrigação, para ser implantado, preci-
sa demonstrar sustentabilidade econômico-financeira;
compatibilidade com prioridades nacionais e regionais;
observância das normas ambientais e de gestão de re-
cursos hídricos; capacidade de gerar emprego e de de-
senvolver o empreendimento familiar.
ii) Na região Nordeste, o poder público pode construir pro-
jetos de irrigação. Mas, para tanto, deverá organizar a
associação de produtores (distrito de irrigação, etc.) já
no primeiro ano de operação do projeto. Deve também
administrar o projeto de forma compartilhada com o distri-
to de irrigação e, em seguida, transferir, via arrendamen-
to, o projeto acabado à associação, que se responsabili-
zará pela sua operação e manutenção. Ocorrendo desis-
tência, o projeto será arrendado a uma empresa privada.
iii) O poder público sempre terá a opção de vender qual-
quer projeto público à iniciativa particular. Para tanto,
assegura-se aos produtores, nele instalados, prioridade
de aquisição.
iv) É admitido o projeto misto de irrigação, do qual o poder
público poderá participar, mas sempre minoritariamente.
5.4.1 - Os papéis do poder público

A legislação põe em relevo os novos papéis do poder pú-


blico e apresenta as bases, nas quais a ação se assenta. Assim,
um papel importante reservado ao setor público é o de oferecer
bens e serviços públicos de boa qualidade e não o de concentrar
na oferta solitária (não compartilhada) de bens e serviços priva-
dos, como fez na fase pioneira e desbravadora da irrigação aqui e
em todo o mundo. A nova postura do governo, como estabelecida
no novo modelo, dará substância e sustentabilidade à irrigação,
porque está alicerçada em conceitos modernos e na experiência
acumulada no Brasil e em muitos outros países.
Essencialmente, a nova legislação enfatiza que o papel do
poder público é criar condições e o de remover restrições ao de-
senvolvimento da irrigação particular, inclusive associando-se a

68
ela, como sócio minoritário, nos projetos mistos de irrigação. Ca-
be-lhe, ainda, em conjunto com o governo ou delegada pelo poder
público, desenvolver os projetos públicos de irrigação, nas regiões
Nordeste e norte de Minas Gerais. Mas a administração desses
projetos será sempre delegada ao distrito de irrigação ou à inicia-
tiva particular, via arrendamento. O poder público sempre terá a
opção de vender qualquer projeto público à iniciativa particular.
Para tanto, assegura-se aos produtores-irrigantes, por intermédio
do distrito de irrigação ou de qualquer outro tipo formal de organi-
zação de produtores, prioridade na aquisição e no arrendamento
de projetos públicos.
São, pois, atribuições do poder público estabelecer priori-
dades, incentivos e restrições, criar instâncias administrativas e
operá-las, com o objetivo de dirimir dúvidas e resolver conflitos
entre irrigantes e entre estes, distrito de irrigação ou empresas
particulares. Cabe-lhe ainda arbitrar tarifas d’água, fiscalizar e
supervisionar os projetos de irrigação públicos e mistos.
Especificamente, no caso do Nordeste, cabe ao poder
público as seguintes tarefas ou atribuições:
a) determinar os pólos de irrigação e definir projetos pa-
ra estudo de viabilidade, a fim de se determinarem
prioridades;
b) construir projetos de irrigação; organizar o distrito de
irrigação (ou outra entidade autogestionária), até o
prazo de um ano, após a instalação do primeiro
irrigante; administrar o projeto de forma compartilhada
com o distrito de irrigação neste período; e, ao final do
primeiro ano de operação, arrendar o projeto acabado
ao distrito de irrigação, que se responsabilizará então
pela sua operação e manutenção;
c) arrendar o projeto à iniciativa particular, quando falhar a
opção pelo distrito de irrigação;
d) vender o projeto público, prioritariamente, aos associa-
dos do distrito de irrigação ou, na sua desistência, à
empresa privada;

69
e) associar-se à iniciativa privada, minoritariamente; na
implantação de projetos mistos, o limite de participação
é de 49% e visa adquirir áreas para os empreendedores
familiares; o projeto misto de irrigação é gerido por um
conselho; a participação do Governo, neste conselho, é
proporcional ao capital que investiu;
f) estabelecer um conjunto de incentivos ajustados ao
Nordeste; os incentivos distribuem-se nos seguintes
blocos: (i) aos irrigantes e/ou empresas que vão com-
prar ou arrendar projetos públicos; (ii) às empresas que
vão construir projetos mistos de irrigação; (iii) aos irrigan-
tes para implantarem a infra-estrutura parcelar e as la-
vouras perenes; (iv) para custeio; (v) para industrializa-
ção de produtos da agricultura irrigada; e, finalmente, (vi)
para o desenvolvimento do comércio interno e externo;
g) quando os incentivos são traduzidos em crédito rural,
não deve haver subsídio econômico, ou seja, as taxas
de juros devem equivaler às dos países concorrentes,
respeitado o risco do cliente; os prazos devem ser com-
patibilizados com as taxas de retorno; o período de ca-
rência deve levar em conta o período estabelecido para
o funcionamento pleno daquilo que foi financiado; de-
vem somar-se, às exigências bancárias usuais, as de
competência para empreender o que foi acordado no
contrato de empréstimo.
Quanto às demais regiões, os projetos são privados ou,
então, mistos.
Cabe ainda ao poder público, considerando-se todas as
regiões:
h) estabelecer incentivos e restrições;
i) dirimir, na esfera administrativa, conflitos entre irrigantes
e entre estes e os distritos de irrigação ou empresas;
j) fiscalizar e supervisionar o distrito de irrigação;

70
k) estabelecer diretrizes; apoiar; fiscalizar e monitorar as
atividades da agricultura irrigada;
l) apoiar a capacitação técnica, a pesquisa e a difusão de
tecnologia;
m) determinar prioridades, em termos de pólos de irriga-
ção;
n) realizar estudos e, conforme o caso, chegar até a um
projeto pronto para licitar as obras;
o) outorgar direitos de uso de água; e
p) ministério competente elaborará, a cada quatro anos, o
Plano Nacional Plurianual de Irrigação e Drenagem, vá-
lido para os próximos quatro anos, especificando
prioridades, recursos e incentivos; anualmente,
elaborará o plano anual, que detalhará o que será feito,
onde, por quem e como; determinará os recursos,
fontes e incentivos; o Plano Plurianual é submetido ao
Congresso pelo Governo; o Anual é submetido ao
Ministério de Orçamento e Gestão; os recursos
demandados são incluídos na proposta de orçamento.

5.4.2 - Princípios e recomendações

A nova legislação (ANEXO 8.2) estabelece os marcos de


atuação do poder público, institucionaliza diretrizes e procedimen-
tos que deverão ser observados na implantação de projetos públi-
cos de irrigação. Ela busca assegurar o sucesso dos projetos,
inclusive da transferência deles à iniciativa particular.
Na construção das diretrizes e indicação de procedimen-
tos, levaram-se em consideração a experiência histórica e, sobre-
tudo, as recomendações recolhidas para superação de problemas
como aconselham as experiências brasileira e internacional, rela-
cionadas ao maior envolvimento do setor privado em projetos pú-
blicos de irrigação. Cabe salientar, respeitando-se a ênfase dos
pronunciamentos (ANEXO 8.2):

71
I) “coloque em prática uma clara e consistente política de
transferência do gerenciamento da irrigação;
II) a transferência é um processo lento e sujeito a retro-
cesso, se não houver um esforço deliberado e persis-
tente do governo que a patrocina. Assim, as linhas bá-
sicas da política de transferência devem permanecer
relativamente inalteradas, por um longo período, para
obter-se a resposta desejada;
III) a recuperação total de custos (para o capital investido
e de operação) não deve ser exigida num primeiro
momento da transferência. Ou seja, é preciso conside-
rar os ganhos da transferência, ao longo do tempo, pa-
ra se estabelecer a política de recuperação de custos.
Uma visão de curto prazo, quanto à recuperação de
custos, resultará em drástico incremento dos gastos
dos agricultores com os custos dos serviços de irriga-
ção, antes que compreendam a extensão dos benefí-
cios, o que pode resultar em um mar de protestos polí-
ticos, principalmente quando a política macroeconômi-
ca discrimina a agricultura. O estabelecimento de sub-
sídios cruzados para os custos dos serviços de forne-
cimento de água para irrigação e a obtenção de outras
fontes de receita, tais como a geração de energia, o
abastecimento humano de vilas e cidades ou a aqui-
cultura, são opções que permitem conciliar o curto
com o longo prazo, quando deve ocorrer a recupera-
ção total dos custos;
IV) exija e respeite a autonomia financeira da entidade
gestora. A exigência é crítica ao sucesso da transfe-
rência, tanto em países desenvolvidos, quanto em de-
senvolvimento;
V) a geração de receita suficiente para cobrir os custos
de operação do sistema provê um conjunto essencial
de ligações de feedback, que é necessário para tornar
o gerenciamento confiável para membros do distrito de
irrigação. Quando o incentivo público for necessário,

72
que ele seja especificado de tal maneira que não au-
mente exagerada e automaticamente as receitas de
operação e manutenção, de modo a levar os irrigantes
a perderem a noção da responsabilidade que têm de
honrar essas despesas. O prazo de duração do subsí-
dio precisa ser especificado com rigor;
VI) as organizações, como o distrito de irrigação, devem ter
autoridade para fazer acordos contratuais, obter finan-
ciamentos e aplicar sanções a seus próprios membros;
VII) providencie um sistema de outorga de direitos de uso
da água, seguro, bem especificado e de longo prazo,
inclusive que possa ser transferido, de modo a ofere-
cer segurança para investimentos de tempo e dinheiro;
VIII) assegure recursos e invista para entregar infra-
estrutura física ao nível do padrão, de preferência aci-
ma dele. A experiência demonstra que o programa que
alia o upgrading (se necessário) das instalações físi-
cas com a transferência é mais bem-sucedido;
IX) estabeleça um sistema profissional de auditoria exter-
na, competente, independente e transparente e faça-o
ser utilizado pela organização de gerenciamento. Ele
pode ser estabelecido pelo setor público e pelo setor
privado, desde que cuidadosamente regulamentado
para assegurar sua integridade; e, finalmente,
X) providencie novas tarefas, ocupação ou emprego ou
então compensação para o pessoal deslocado pela
transferência.”
Na experiência brasileira mais recente, os casos bem-
sucedidos de envolvimento dos irrigantes na gestão dos projetos
de irrigação tiveram:
“Como ingredientes fundamentais a entrega de projetos em
condições operacionais satisfatórias, o treinamento geren-
cial da administração e operacional do staff da organização
de usuários, antes de esta assumir as responsabilidades fi-
nanceira e técnica dos projetos de irrigação, e a supervisão
permanente das operações pela instituição concedente. O

73
envolvimento dos usuários foi intensificado a partir do final
dos anos 80 e no Vale do Rio São Francisco, pela CODE-
VASF, muito semelhante ao que ocorreu na experiência in-
ternacional” (Bandaragoda, 1998).

XI) “os elementos físicos e as regras básicas de operação


do sistema de irrigação também formam uma parte
relevante do contexto da transferência” (Bandaragoda,
1998). Por isso, devem ser observados:
1º. O sistema deve oferecer um suprimento de água, em
quantidade e no tempo, amplo e confiável.
2º. A alocação de água deve ser manejada com competên-
cia, com base numa demanda previamente acordada
(de consenso), tanto antes, como depois da transferên-
cia. Assim se permite aos agricultores considerável fle-
xibilidade e capacidade de resposta às condições de
mercado na escolha de culturas e padrões de cultivo.
3º. Deve haver clara demarcação de responsabilidades e
de controle, na qual quantidades medidas de água são
acordadas, mediante um amplo acordo e baseado em
regras rígidas, inclusive de pagamentos. As entregas de
água para as associações de irrigantes (como os distri-
tos de irrigação) e nos lotes ou parcelas irrigáveis são
tratadas como obrigações contratuais. A água é, assim,
considerada um bem econômico e não um direito social.
4º. As facilidades físicas do sistema serão adredemente re-
abilitadas ou melhoradas como parte do acordo de
transferência. Quando forem recebidas pelos distritos,
devem estar em boas condições de operação. Assim, a
transferência não é a mera entrega de um bem público
dilapidado, mas concessão de um ativo valioso e produ-
tivo. Adicionalmente, muito da expertise técnica neces-
sária para operar o sistema tem que ser transferida pelo
órgão concedente aos distritos de irrigação” (Svendsen
& Vermillion, 1995).
Não surpreende que, no conjunto dos países analisados e
citados no Relatório do Estado da Arte da Irrigação, os casos mais

74
bem-sucedidos têm um componente crítico comum que é a elei-
ção da meta de eficácia de uso dos recursos financeiros e da á-
gua. Ou seja, aqueles países que lograram identificar, com abso-
luta clareza, que a sustentabilidade financeira dos investimentos e
dos projetos, como um todo, depende da clara definição do nível a
ser alcançado de eficiência econômica dos recursos financeiros e
hídricos do projeto.
A tarifa de água dos projetos de irrigação passa a assumir
um significado importante, como um mecanismo (preço) que con-
diciona a otimização das decisões na direção correta, ou seja, a
busca da economia de recursos escassos.
A recuperação dos custos e a conseqüente garantia da
sustentabilidade financeira da gestão dependem de dois fatores-
chaves: em primeiro lugar, do tipo de arranjo organizacional para
a gestão e de uma instância de contratualidade (isto é, as formas
de propriedade e de operação e o cumprimento da regulamenta-
ção pertinente a cada modelo); em segundo lugar, da capacidade
de cada arranjo organizacional de atender a critérios de qualidade
e de bom desempenho, estabelecidos de forma negociada, via
construção de consensos. Tudo isso, obviamente, num ambiente
macroeconômico que não discrimine a agricultura.
5.4.3 - Procedimentos para a implantação de projetos de
irrigação

Na implantação de projetos de irrigação, dentro da política


proposta, devem ser observados os seguintes procedimentos, já
adequadamente contemplados no anteprojeto de lei oferecido:
a. o projeto público somente será construído depois de
descartadas as possibilidades do projeto misto;
b. mesmo que feita a opção por um projeto público, é
imperativo determinar a possibilidade de dividi-lo, de
modo que partes deles possam enquadrar-se no tipo
misto ou privado;
c. o poder público não gerirá o projeto público de irrigação
sozinho. Num período máximo, que a regulamentação

75
da lei proposta deve estipular, a gestão é compartilhada
com o distrito de irrigação. Findo o prazo, a gestão será
inteiramente de responsabilidade do distrito de irrigação;
d. independentemente do distrito de irrigação, o poder pú-
blico poderá arrendar o projeto à iniciativa particular, se
esta opção for julgada conveniente. Se for da preferên-
cia de 2/3 dos irrigantes do distrito, o poder público po-
derá vender o projeto a empresas interessadas,
mediante licitação;
e. o poder público somente construirá a infra-estrutura de
irrigação de uso coletivo e a social; aquela parcela é de
responsabilidade dos irrigantes;
f. os irrigantes serão selecionados por procedimento licita-
tório, reservando-se parte do projeto para os empreen-
dedores familiares, também selecionados por licitação;
a cota dos empreendedores familiares variará de projeto
para projeto;
g. o Governo tem interesse em aumentar a participação da
iniciativa privada dentro de, no máximo, um ano, a con-
tar da data da aquisição; o poder público dará escritura
definitiva de propriedade a todos os irrigantes, não po-
dendo constar cláusulas de inalienabilidade; o saldo de-
vedor é da responsabilidade do adquirente; em igualdade
de condições, o candidato à compra, proposto pelo distri-
to de irrigação, tem prioridade para a aquisição do lote;
h. o poder público financiará, por procedimentos especiais,
a construção da infra-estrutura parcelar dos empreen-
dedores familiares;
i. tratando-se do arrendamento de um projeto público de
irrigação, o valor mínimo do aluguel proposto pelo Go-
verno cobrirá o custo de oportunidade do capital; no ca-
so de o distrito de irrigação não concordar com o valor
mínimo de aluguel, o arrendamento do projeto será pos-
to em licitação, prevalecendo a melhor proposta;

76
j. na apuração do valor de venda, é também excluída a in-
fra-estrutura social; quando a venda se destina a em-
presas privadas, ela far-se-á mediante licitação, de a-
cordo com procedimentos usuais, estabelecidos em lei
específica;
k. se o distrito de irrigação não concordar com o preço e
com as condições de venda do projeto estabelecidas
pelo poder público, ele poderá requerer se faça uma lici-
tação e, em igualdade de condições, terá a preferência
para a aquisição;
l. para concorrer à compra, o distrito de irrigação deverá
demonstrar que os irrigantes têm condições econômicas
de realizá-la, uma vez que serão eles os compradores
de fato do projeto;
m. demonstrada a possibilidade de venda do projeto, o
prazo e as condições de venda devem ser flexíveis para
facilitar o negócio, de modo que o poder público possa
receber o que investiu;
n. o distrito de irrigação é responsável pelo cálculo da tari-
fa de irrigação nos projetos públicos. A tarifa é aprovada
numa reunião do seu conselho de administração para
isso especialmente convocada. A memória dos cálculos
feitos é parte dos documentos que serão submetidos ao
exame e decisão do referido conselho. O poder público
pode vetar a tarifa proposta, se for capaz de demonstrar
que ela é exagerada ou não cobre os custos. Nunca
poderá haver subsídios nas tarifas. O poder público po-
derá custear parte da tarifa d’água dos irrigantes em-
preendedores familiares, ajustando com o distrito de ir-
rigação, ou outro concessionário, em contrato específi-
co, o valor da parcela a ser custeada, a forma de paga-
mento, o prazo e as demais condições; no caso do pro-
jeto misto de irrigação, com o Conselho;
o. no estabelecimento da tarifa d’água no projeto público
de irrigação, não se inclui o custo de oportunidade do
capital, nem a infra-estrutura social. O aluguel cobre o

77
custo de oportunidade do capital. A tarifa d’água divide-
se em duas parcelas: depreciação e manutenção. A de-
preciação é linear e é feita por itens. Para cada item, a
depreciação anual é o valor dele, sempre como se novo
fora, dividido pelo número de anos que durará. Uma vez
calculada, não mudará de ano para ano, enquanto o i-
tem durar, menos de atualização de valor, devido à in-
flação do período. Se um item for substituído por outro,
de melhor qualidade, a depreciação para o item introdu-
zido será calculada conforme o mesmo procedimento,
tendo-se o cuidado de abater o item substituído do valor
da depreciação anual. O mesmo procedimento aplica-se
aos novos investimentos e para itens que ficaram obso-
letos ou gastos e foram substituídos. Ou seja, abate-se
o item que foi substituído da depreciação, se for o caso,
e se introduz o novo item, levando-se em conta seu va-
lor e duração. O valor total da depreciação é a soma
das depreciações dos itens;
p. a tarifa dos projetos mistos é aprovada pelo conselho.
Sua apresentação se faz acompanhar de memória de
cálculo detalhada;
q. havendo conflitos no estabelecimento de tarifas d’água,
a instância administrativa é a do órgão competente, dire-
tamente assistido por representantes do ministério com-
petente, especialmente designados por ato do ministro;
r. da licitação dos lotes, em projetos públicos, constarão
cláusulas que determinem o cronograma de implanta-
ção da infra-estrutura de irrigação e das atividades agrí-
colas. As etapas são rigorosamente estabelecidas. O
não-cumprimento de uma etapa apenará o irrigante com
multa equivalente a um percentual do valor do investi-
mento correspondente à etapa, por mês de atraso pre-
viamente definido nos editais. O responsável pelo lote
pode pedir mudança do cronograma, devidamente justi-
ficada, a qual, para ter validade, precisa ser aprovada
por maioria simples do distrito de irrigação ou pelo con-
selho, nos projetos mistos. No caso de revenda do lote,

78
o valor da multa devida terá de ser quitado antes que
um outro irrigante comece a explorar o lote ou assine a
escritura de compra. O irrigante substituto terá de seguir
o planejamento em vigor ou, então, terá de obter do dis-
trito ou do conselho a aprovação do novo cronograma;
s. do edital de licitação dos lotes constarão os prazos de
implantação da infra-estrutura de irrigação e as multas
que serão aplicadas no caso do descumprimento do
cronograma. Constarão também as cláusulas que farão
parte da escritura, inclusive as de retrovenda;
t. a escritura do lote conterá cláusulas de retrovenda deta-
lhadamente especificadas. O poder público delegará ao
distrito de irrigação ou ao Conselho a assinatura da es-
critura, bem como o poder de anulá-la;
u. se as multas não forem recebidas, decorridos seis me-
ses da aplicação da primeira multa, o distrito de irriga-
ção promoverá a anulação da escritura;
v. o irrigante assinará um contrato com o distrito de irriga-
ção ou com o conselho, que especifica suas obrigações
e as penalidades a que se sujeitará se não as cumprir.
Entre as obrigações está a de pagar a tarifa d’água. O
distrito de Irrigação ou conselho advertirá, por escrito,
todo o irrigante que atrasar, por um mês, o pagamento
da tarifa de irrigação. Um atraso de três meses ou atra-
sos intermitentes que somem três meses levam, auto-
maticamente, a suspensão da oferta d’água ao lote;
w. se o poder público detectar que o distrito de irrigação
está funcionando mal, ele tem o poder de convocar uma
assembléia geral de irrigantes para destituir a adminis-
tração. Na mesma reunião será eleita outra administra-
ção. Caso os irrigantes não queiram implantar uma ad-
ministração competente, o poder público anulará o con-
trato de arrendamento e licitará o arrendamento do pro-
jeto para a iniciativa particular. Se ficar demonstrado ser
a venda a melhor opção, e havendo a aquiescência de
2/3 dos irrigantes, o projeto será vendido em licitação

79
pública para a implantação dos projetos mistos de irri-
gação, o Governo fará um leilão de incentivos que deve
estar previsto no plano anual de irrigação e drenagem e
no plano de negócios do projeto.
No capítulo referente à Gestão de Projetos de Irrigação
são oferecidas diretrizes específicas, definindo claramente os pa-
péis e as responsabilidades de cada gestor nele envolvido, em
estrita observância à legislação sugerida.

5.5 - Estrutura de Regulação da Nova Política Nacional


de Irrigação

Conforme explicitado neste Relatório, na legislação de irri-


gação sugerida, estabelecem-se os marcos para a atuação do
poder público, os quais, se aprovados, institucionalizam diretrizes
e procedimentos que disciplinam o relacionamento entre os princi-
pais atores envolvidos em projetos de irrigação públicos ou priva-
dos. A regulação administra (harmoniza) a interface das decisões
estratégicas (no nível da formulação da política e elaboração de
planos, programas e projetos de irrigação) e das tático-
operacionais nos níveis da implantação dos projetos e da gestão
dos perímetros de irrigação que o constituem.
Na perspectiva de um Estado menos provedor e mais efi-
cientemente regulador, cresce a exigência de instrumentos efica-
zes de controle e de coordenação executiva, de sorte que sejam
efetivamente observadas as normas de conduta e as prioridades
acordadas. Não é tão-somente o respeito aos direitos dos consu-
midores de água na irrigação e, portanto, o respeito aos direitos
de cada usuário, em sua relação com a gestão do perímetro de
irrigação, mas, sobretudo, o controle social sobre o conjunto da
oferta de água ao projeto e a todos os usos dela na bacia hidro-
gráfica em que o projeto esteja implantado, independentemente
de as operadoras finais serem pessoas públicas ou privadas.
No caso da irrigação, a regulação envolve instrumentos de
articulação intersetorial e intergovernamental, além de amplas
franquias de controle social.

80
A arquitetura institucional moderna considera a peculiari-
dade do insumo água utilizado na agricultura irrigada, cujo ciclo
hidrológico impõe, para sua exploração sustentada, a solidarieda-
de em sua gestão e desenvolvimento, em termos de quantidade e
qualidade. Leva em conta que, na maioria dos países, prospera
uma firme tendência de uma atuação subsidiária do governo, em
termos de complementaridade no lugar de exclusividade de ações.
Elas são compartilhadas entre várias esferas governamentais e
grupos de interesse, localizados na esfera privada, a montante e a
jusante, e nas comunidades beneficiárias e/ou afetadas pelos proje-
tos de irrigação. Vale dizer que o compartilhamento de ações não
se limita à estrutura interna de um órgão setorial e a uma esfera de
governo. Permeia, assim, todo o aparato de gestão nos níveis es-
tratégico, tático e operacional do subsetor de irrigação.
Nessas circunstâncias, o ambiente institucional mais ade-
quado para a implementação bem-sucedida da política de irriga-
ção caracteriza-se pela prevalência de uma instância de
contratualidade, que não se esgota nos instrumentos jurídicos e
nas instituições reguladoras, mas também na possibilidade de
entendimento ou consenso entre os entes, públicos e privados, e
na prevalência de um ambiente macroeconômico que estimule a
agricultura irrigada. Do ponto de vista estrito da regulação do sub-
setor de irrigação, o esforço legisferante dos últimos 12 anos, a
partir da Constituição de 1988, é muito rico em conseqüências
para o subsetor de irrigação. Este esforço deságua na legislação
ambiental e de recursos hídricos e está ainda em curso o debate
legislativo sobre a criação da Agência Nacional de Águas (ANA).
Prossegue com a discussão, no Senado Federal, do Anteprojeto
de Lei n.º 229/95 – Lei de Irrigação. Esta Lei será apresentada
moderna se acolhidas as sugestões contidas na versão de substi-
tutivo, oferecida ao seu relator no Senado, pelo Ministério da Inte-
gração Nacional, porquanto oferece a necessária segurança jurí-
dica ao desenvolvimento sustentado da irrigação.
O arsenal jurídico-institucional permite, ademais, corrigir,
mediante mecanismos preventivos ou corretivos, os desvios ou
riscos de desvios que o modelo de gestão privado induz os diver-
sos atores. Os instrumentos de regulação institucional são, desse
modo, o complemento necessário para assegurar a estabilidade

81
do edifício proposto, ao qual traz a flexibilidade necessária para
adaptar-se à evolução da sociedade brasileira.
Registra-se a preocupação com a criação de uma agência
para cuidar dos interesses da irrigação. A preocupação, todavia,
carece de fundamento, à medida que a vigência da Lei n.º 9.433,
de 8 de janeiro de 1997, ainda pendente de regulamentação de
vários de seus dispositivos, já oferece, para o caso de aproveita-
mentos de recursos hídricos, inclusive na irrigação, os instrumen-
tos necessários à regulação desse uso, bem complementada com
outras disposições da ampla legislação ambiental.
A legislação existente ampara usos cuja fonte são os corpos
de água de domínio da União, quanto os da maioria dos estados
nordestinos e Minas Gerais, porque, da mesma forma, já dotados
de legislação de recursos hídricos, igualmente contemporânea.
Com o avanço da discussão do Projeto de Lei n.º 1.617- E,
de 1999, já aprovado na Câmara Federal , em 18/01/2000 e ora
em tramitação no Senado Federal, prospera a criação da Agência
Nacional de Águas (ANA), mais um instrumento de regulação do
setor de recursos hídricos, alcançando, inclusive, o de energia
elétrica, já dotado de uma agência reguladora, a Agência Nacional
de Energia Elétrica (ANEEL).
Com efeito, a Lei 9.433/97 já regula o que é fundamental
no uso da água para irrigação, isto é, o domínio público das á-
guas; as prioridades para outorga de direitos de usos da água; a
forma e sujeito da concessão dessa outorga; as restrições de uso;
a ação do poder público e o sistema (integrado e compartilhado)
de gerenciamento de recursos hídricos; as infrações das normas
de utilização e as penalidades decorrentes (Brasil, 1997).
Outros institutos, como a Lei de Concessões, a de Lici-
tações, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Ca-
de), a legislação ambiental, agrícola e agrária; de mineração e
florestal, entre tantas outras, arroladas no capítulo referente ao
marco legal, constituem a base legal em que se estribam os
entes públicos e privados em suas relações concernentes a
projetos públicos de irrigação.

82
Pendentes, restam apenas as questões referentes à amor-
tização dos investimentos públicos e à vedação da venda dos ati-
vos deles decorrentes, em projetos de irrigação, além da inexis-
tência da alternativa do projeto misto, as quais, se não removidas,
constituirão obstáculo apreciável na ampliação de investimentos
na irrigação, a par de dificultar o financiamento da gestão dos pro-
jetos públicos já implantados, frustrando, em conseqüência, a rea-
lização dos propósitos do Novo Modelo de Irrigação.
Ao se avaliar a adequação de um aparato de regulação,
podem-se relacionar as seguintes questões:
- quais processos de interação sistêmica, entre o setor
público, o setor privado e os usuários finais precisam
ser regulados?
- até que ponto são confiáveis os mecanismos auto-
reguladores do próprio sistema que incorporam elemen-
tos não-institucionais, como a regulação pelo mercado
ou a participação da sociedade civil?
Na legislação de irrigação proposta, se estabelecem os
marcos para a atuação do poder público e do setor privado, os
quais, se aprovados, institucionalizam diretrizes e procedimentos
que disciplinam o relacionamento entre os principais atores, públi-
cos e privados, envolvidos em projetos de irrigação.
É importante observar que, em decorrência da nova ordem
legal vigente no País, que tornou de domínio apenas público os
recursos hídricos (art. 21, Inciso XIX da Constituição Federal de
1988), a obtenção da outorga de direitos de uso da água para
irrigação passa a ser uma condição sine qua non para a existência
de um projeto de irrigação, independentemente da fonte de água
utilizada, de sua escala ou tamanho (exceto aqueles com uso in-
significante de água) e de sua natureza (público, misto ou privado).
Não é por outra razão que a legislação de irrigação propos-
ta, no Capítulo VII, art. 14, § 3º, estabelece que é parte intrínseca
dos lotes adquiridos em processos licitatórios o direito de uso da
água, nas quantidades especificadas nos editais (ANEXO 8.2).

83
Ao regulamentar o supramencionado dispositivo da Carta
Magna, a legislação de recursos hídricos (Lei n.º 9.433/97)
estabelece, no Capítulo IV, Seção III – Da Outorga de Direitos de
Uso de Recursos Hídricos, art. 12, que estão sujeitos à outorga
pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos
hídricos: I - a derivação ou captação de água para consumo final,
inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;
II – a extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo
final ou insumo de processo produtivo (Brasil, 1997).
O art. 3º desta mesma Lei determina que toda outorga es-
tará condicionada às prioridades de uso estabelecidas nos planos
de recursos hídricos e respeita a classe em que o corpo d’água
estiver enquadrado e a manutenção de condições adequadas ao
transporte hidroviário, quando for o caso. O seu § único acrescen-
ta que a outorga de uso dos recursos hídricos deverá preservar o
uso múltiplo destes (Brasil, 1997).
O art. 14 define que a outorga se efetivará por ato da auto-
ridade competente do Poder Executivo Federal, dos Estados ou
do Distrito Federal. No art. 35, Inciso X, a Lei 9.433/97 atribui ao
Conselho Nacional de Recursos Hídricos competência para esta-
belecer critérios gerais para outorga de direitos de uso de recur-
sos hídricos e para cobrança de seu uso (Brasil, 1997).
Esta mesma Lei determina, em seu art. 34, que o Conselho
Nacional de Recursos Hídricos é composto de (Brasil, 1997):
I- representantes dos Ministérios e Secretarias da Presi-
dência da República com atuação no gerenciamento
ou no uso dos recursos hídricos;
II- representantes indicados pelos conselhos Estaduais
de Recursos Hídricos;
III- representantes dos usuários dos recursos hídricos (gri-
fo nosso);
IV- representantes das organizações civis de recursos
hídricos.

84
Seu parágrafo único determina que o número de represen-
tantes do Poder Executivo Federal não poderá exceder a metade
mais um do total dos membros do Conselho Nacional de Recursos
Hídricos.
O art. 15 desta Lei estabelece que a outorga de direito de
uso de recursos hídricos poderá ser suspensa parcial ou totalmen-
te, em definitivo ou por prazo determinado, nas seguintes circuns-
tâncias (Brasil, 1997):
I- não-cumprimento do outorgado dos termos da outorga;
II- ausência de uso por três anos consecutivos;
III- necessidade premente de água para atender a situa-
ções de calamidade, inclusive as decorrentes de condi-
ções climáticas adversas (grifo nosso) ;
IV-necessidade de se prevenir ou reverter grave degrada-
ção ambiental;
V- necessidade de se atender a usos prioritários, de
interesse coletivo, para os quais não se disponha de
fontes alternativas;
VI-necessidade de serem mantidas as características de
navegabilidade do corpo d’água.
Visando, inclusive, regulamentar dispositivos desta Lei, o
Projeto de Lei n.º 1.617-E, de 1999, em sua redação final, aprova-
da pela Câmara Federal, em 18/01/2000, ora em apreciação pelo
Senado Federal, estabelece (Brasil, 2000):
Art. 5º. Nas outorgas de direito de uso de recursos hídricos
de domínio da União, serão respeitados os seguintes limites de
prazos, contados da data de publicação dos respectivos atos ad-
ministrativos de autorização:
I- até dois anos, para início da implantação do empreen-
dimento objeto da outorga;
II- até seis anos, para conclusão da implantação do em-
preendimento projetado;

85
III- até trinta e cinco anos, para vigência da outorga de di-
reito de uso.
§ 1º . Os prazos de vigência das outorgas de direito de uso
de recursos hídricos serão fixados em função da natureza e do
porte do empreendimento, levando-se em consideração, quando
for o caso, o período de retorno do investimento.
§ 2º . Os prazos a que se referem os incisos I e II poderão
ser ampliados, quando o porte e a importância social e econômica
do empreendimento o justificar, ouvido o Conselho Nacional de
Recursos Hídricos.
§ 3º . O prazo de que trata o inciso III poderá ser prorroga-
do, pela ANA, respeitando-se as prioridades estabelecidas nos
planos de recursos hídricos.
Do exame destas normas legais, verifica-se quão importan-
te será, doravante, atentar-se para esta questão da outorga de
direitos de uso da água nos projetos de irrigação (públicos, mistos
e privados), à medida que ela deixa de ser uma atribuição do mi-
nistro responsável pela política de irrigação, como determinava a
Lei de Irrigação n.º 6.662/79. Na verdade, ela é, agora, atribuição
do Conselho Nacional (para os rios de domínio da União) e para
os conselhos estaduais de recursos hídricos (para os rios de do-
mínio dos estados e do Distrito Federal), nos quais têm assento,
entre outros, os usuários da água.
Em segundo lugar, por ser um bem público, a outorga não
significa posse desse bem (a água), mas apenas uma permissão
de uso, claramente delimitada, e que pode ser revogada, em situ-
ações bem definidas pela legislação pertinente, quando fatos ou
interesses supervenientes assim o recomendarem.

86
6 - INSTRUMENTOS DA NOVA POLÍTICA NACIONAL DE
IRRIGAÇÃO

A implementação da nova política de irrigação, conforme


mencionada anteriormente, exigirá vários instrumentos facilitado-
res e promotores que passam pelo planejamento da irrigação, a
gestão de planos, programa, projetos, os serviços de apoio, os
mecanismos econômico-financeiros, entre outros, que serão dis-
cutidos a seguir.

6.1 - Planejamento da Irrigação

Nesta seção, apresenta-se a proposta referente ao plane-


jamento da irrigação, tendo em vista as diretrizes da nova política
de irrigação. Para isso, a “arquitetura” dos projetos públicos de
irrigação não poderá mais estar ligada apenas ao segmento de
engenharia e organização, como mostrado no item 3.2.1 do capí-
tulo 3 deste relatório. Será preciso acrescentar o segmento de
promoção, buscando uma definição competente de um plano de
negócios para o empreendimento.

6.1.1 - Princípios básicos

A irrigação deverá ser implementada mediante planos, pro-


gramas e projetos, que deverão:
a) dedicar atenção especial às áreas cujas condições hi-
drológicas naturais são desfavoráveis e podem ser re-
vertidas, permitindo o aproveitamento agrícola de forma
economicamente competitiva;
b) explorar racionalmente os recursos de água e solo;
c) compatibilizar-se com os outros planos e programas
setoriais;
d) integrar-se ao nível federal, estadual e municipal;

87
e) considerar critérios técnicos, culturais, sociais e eco-
nômicos; e
f) respeitar o meio ambiente.
No planejamento da irrigação deve-se procurar observar
as exigências e responder aos desafios impostos atualmente aos
demais ramos da agricultura. Entre eles, incluem-se a conserva-
ção do meio ambiente, a competitividade num mercado globali-
zado, a autonomia de cada setor produtivo, a descentralização
do planejamento, a liderança da iniciativa privada, a pressão
demográfica e urbana sobre a terra e a expansão do consumo.
A disputa pelos solos disponíveis obrigará a agricultura ir-
rigada a demonstrar capacidade de otimizar os resultados eco-
nômicos e sociais, minimizando, para tanto, impactos negativos,
incluídos os que têm denegrido a reputação da atividade, como a
destruição de solos por salinização.
No que diz respeito à disponibilidade hídrica, observa-se
uma tendência mundial de crescimento da competição entre os
diversos usos, algo que já atinge algumas bacias hidrográficas
brasileiras. O desenvolvimento da irrigação no Brasil depende,
portanto, do aprimoramento das funções de planejamento e ges-
tão dos recursos hídricos, a cargo das agências governamentais
e dos comitês de bacias. Assim, planejamento da irrigação deve
estar associado ao esforço de aprimoramento do manejo e alo-
cação da água e à valorização da sua disponibilidade.
Para consolidar-se como instrumento de desenvolvimen-
to, a irrigação deve, portanto, respeitar princípios e tendências
que se referem aos recursos hídricos:
a) a água deve ser tratada como um bem econômico, e o
seu uso deve ser cobrado;
b) a demanda por água vem-se expandindo continua-
mente, aumentando a possibilidade de conflitos no
seu uso;

88
c) a irrigação deve demonstrar eficiência no uso da água,
tanto quanto ao rendimento, quanto à preservação da
qualidade;
d) a preservação da produtividade das áreas em uso e a
expansão da área irrigada exigem cuidados com a dre-
nagem agrícola e salinização dos solos;
e) o sucesso dos sistemas de irrigação dependerá da a-
doção de tecnologias que permitam melhor controle da
água;
f) o manejo dos sistemas deve prever a disposição dos
fluxos que atingem os drenos, garantindo que a quali-
dade da água não comprometa o reuso, inclusive para
compor descargas com fins ambientais; e
g) o futuro da irrigação dependerá da flexibilidade e efici-
ência do sistema de alocação de água para essa ativi-
dade e para outros usos.
Verifica-se, assim, que a rentabilidade da agricultura irriga-
da e seu desenvolvimento sustentado estão vinculados:
a) à disponibilidade de água e, portanto, ao seu custo;
b) às políticas de recursos hídricos, quanto à outorga e
cobrança pelo uso da água;
c) ao desempenho geral da economia agrícola e do
comportamento dos mercados para os produtos
agrícolas;
d) às vantagens comparativas da irrigação em frente de
agricultura de sequeiro, tais como, a pequena variabili-
dade da produção entre anos, a garantia de sucesso de
safra, a melhor qualidade da produção e a capacidade
de superar restrições de ordem sazonal;
e) à evolução da eficiência do manejo da irrigação e dre-
nagem, apoiada na introdução de novas tecnologias;

89
f) à evolução do custo dos insumos, incluindo mão-de-
obra, energia, capital e outros itens envolvidos nas
fases produtiva e de comercialização, comparativa-
mente ao que ocorre com a produção da agricultura
convencional; e
g) às exigências de ordem ambiental.
Em termos de tecnologia, a atenção não se deve concen-
trar apenas nas questões dos componentes de maior porte (bar-
ragens e sistemas de distribuição de água), mas também no desa-
fio de otimizar o consumo ao nível parcelar.
Os projetistas deverão escolher métodos que, além da efi-
ciência de aplicação de água, considerem, também, as culturas a
serem exploradas, a topografia do terreno, a textura e velocidade
de infiltração do solo, a disponibilidade e custo da água, custo do
equipamento e da operação etc. Sempre que possível, a priori-
dade deverá ser dada à utilização de métodos de irrigação loca-
lizada, em razão das altas eficiências alcançadas no uso da á-
gua de irrigação.
Os projetos de irrigação, seu planejamento agrícola, calen-
dários e seleção de cultivos devem dedicar especial atenção à
redução do consumo futuro de água.
A construção de grande infra-estrutura deve vir junto com a
prioridade de otimização do manejo e da gestão. É factível que um
projeto já em operação, submetido à atualização tecnológica, pos-
sa reduzir à metade o consumo de água.
Nas fases do planejamento da irrigação, deve-se tirar par-
tido do seu potencial, que se fundamenta em:
a) a agricultura irrigada é um instrumento de
desenvolvimento e, como tal, deve ser fomentada pelos
governos federal, estaduais e municipais, a exemplo do
que vem sendo praticado com a indústria;
b) a agricultura irrigada, desde que devidamente apoiada,
é uma atividade econômica que pode disputar, em lu-
cratividade, com qualquer outra;

90
c) o Governo tem interesse em aumentar a participação da
iniciativa privada no negócio da agricultura irrigada, tam-
bém na região Nordeste;
d) as agências governamentais devem planejar o desen-
volvimento de novas áreas de irrigação, levando em
consideração que a iniciativa privada deverá ser atraída
para nelas investir mais intensamente;
e) a irrigação, principalmente a voltada para a horticultura
e fruticultura, tem repercussão decididamente positiva
para o desenvolvimento social, considerando a geração
de emprego estável e renda;
f) as populações rurais do Nordeste são as mais pobres e
mais vulneráveis, dada a dotação de fatores e de servi-
ços, tornando-se sujeitas à migração rural-urbana, em
condições desvantajosas.

6.1.2 - Diretrizes para o processo de planejamento

Para que o processo de planejamento seja bem conduzido:


a) é necessário manter atualizado um banco de dados, re-
gistrando as áreas potencialmente irrigáveis da região
Nordeste;
b) as áreas deverão ser incluídas no banco de dados, se-
gundo os critérios técnicos consagrados que incluem: i)
a disponibilidade hídrica e ii) a aptidão dos solos;
c) as áreas deverão passar então por um segundo proces-
so de classificação que levará em consideração a sua
vocação para a exploração individual ou coletiva;
As áreas a serem reservadas para a exploração indivi-
dual são aquelas que exigem menor investimento em in-
fra-estrutura hídrica, em geral localizadas nas margens
de rios e lagos.
As áreas direcionadas à exploração coletiva são as que
exigem maior investimento e podem ser reservadas pa-
ra projetos públicos ou mistos.
91
As agências governamentais devem planejar o desenvol-
vimento de novas áreas de irrigação, considerando-se
que a iniciativa privada deverá ser atraída para investir.
d) deverão ser classificadas as áreas em que a infra-
estrutura comum será implantada pelo setor público e
aquelas que deverão ser oferecidas à exploração mista
ou privada;
e) deve ser implantado um sistema de informações sobre
dados de disponibilidade de água e solos aptos, com
indicadores que auxiliem na execução de política de ir-
rigação e drenagem e apóiem as tomadas de decisão,
tanto do setor público como privado;
f) os indicadores devem orientar também as entidades
que têm atividades correlatas à agricultura irrigada que,
trabalhando interligadas, possibilitarão a melhoria do
processo de planejamento da irrigação;
g) o sistema de informações deve ser universalizado e
servir ao debate das questões associadas ao planeja-
mento da irrigação. O acesso deve ser permitido às
empresas de consultoria, entidades científicas e tecno-
lógicas, entidades de normatização (Banco do Nordes-
te, American Society of Agricultural Engineers (Asae),
International Standard Organization (Iso), Normas Euro-
péias), International Commission on Irrigation on Drai-
nage (Icid), Associação Brasileira de Irrigação e Drena-
gem (Abid), agricultores, fabricantes de equipamentos e
institutos de ensaios e certificação de componentes;
h) o planejamento da irrigação deve considerar os riscos
do projeto quanto aos diversos fatores, em especial
quanto à disponibilidade de água, redução de produtivi-
dade e dificuldades relacionados à pós-colheita.

92
6.1.3 - Critérios para elegibilidade de área para implanta-
ção de projetos públicos

Os seguintes critérios deverão nortear a elegibilidade de


áreas para implantação de projetos públicos:
- Clima: os projetos públicos de irrigação serão implanta-
dos na região semi-árida brasileira (limitada pela isoeta
de 800 mm/ano) ou em áreas onde os déficits no balan-
ço hídrico ocorram em 7 ou mais meses do ano ou, ain-
da, em áreas estratégicas, de interesse nacional.
- Solos: os solos deverão ser aptos à irrigação, conforme
critérios definidos pela Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa), e observar as recomendações
do manual de classificação de terras para irrigação do
Boreau of Reclamation dos EUA, publicado em Portu-
guês, pela Secretaria de Irrigação do Ministério da Inte-
gração Regional, em 1993.
- Drenagem: se os estudos pedológicos indicarem
potencialidade para deficiência de drenagem
(subterrânea) e qualidade de água que possa favorecer
a salinização, o projeto deverá incluir estudos específicos
e projetos de drenagem e recomendação de manejo. A
implantação do projeto de drenagem (subterrânea)
deverá ocorrer a partir de observações e comportamento
da agricultura.
- Água: as áreas deverão demonstrar, mediante estudos
hidrológicos específicos, a disponibilidade em tempo e
volume de água, qualidade e compatibilizada com as
necessidades da bacia hidrográfica. O agente de gestão
de recursos hídricos da bacia deve aprovar a utilização
da água para irrigação naquela área.
- Integração1: as áreas, prioritariamente, deverão estar
inseridas em regiões com programa de desenvolvimen-
to regional, de tal sorte que o projeto de irrigação venha

1
Ação desse tipo vem sendo desenvolvida pelo Banco do Nordeste nos pólos de
desenvolvimento integrado do Nordeste.

93
favorecer este processo de desenvolvimento. Deve ha-
ver um protocolo de intenções entre União, estado(s) e
município(s), definindo as responsabilidades de cada
um no futuro projeto.
- Situação fundiária: as áreas deverão estar com a situ-
ação fundiária regularizada.
- Competitividade: apresentar planos de negócios, com
maiores possibilidades de êxito, menores riscos associ-
ados e condições de estruturação de mercado.

6.1.4 - Procedimentos e normas técnicas

Os procedimentos e as normas técnicas para realização


de estudos básicos, estudos de pré-viabilidade, viabilidade, bási-
co e executivo deverão obedecer às normas dos manuais prepa-
rados pelo então Ministério da Integração Regional – Secretaria
de Irrigação em 1993, Manual de irrigação:
- Manual de planejamento geral de projetos de irrigação;
- Manual de classificação de terras para irrigação;
- Manual de avaliação econômica e financeira de proje-
tos de irrigação;
- Manual de especificações técnicas padronizadas;
- Manual de elaboração de projetos de irrigação.
Como esses manuais foram preparados em 1993, deve-
rão ser revisados e adaptados à realidade da nova política brasi-
leira de irrigação.
Além dos estudos mencionados na fase de pré-
viabilidade, deve ser desenvolvido, por especialistas, um plano
de promoção (plano de negócios) para o futuro perímetro. Nele
busca-se identificar as potencialidades de agronegócio e as con-
dições para sua operacionalização. Identificam-se, entre outros,
fatores de competitividade, fatores de restrição e infra-estrutura
de apoio (estradas, portos, energia, escola, saúde, lazer etc.),

94
potencialidade agronômica (cultura, custo, rentabilidade). Carac-
terizam-se os riscos, disponibilidade de crédito (quantidade, con-
dições etc.), a expectativa de rentabilidade empresarial, a dispo-
nibilidade e qualidade da mão-de-obra. Descrevem-se a estrutu-
ra de fornecimento de insumos, a vigilância fitossanitária, as á-
reas livres de condições adversas, quanto à fitossanidade e po-
tencialidade para agroindústria. Identificam-se as empresas do
ramo comercial, as empresas processadoras e a estratégia de
atração de investimentos privados e venda dos lotes. O plano de
negócio deverá indicar e mostrar a liderança da iniciativa privada
no processo de agronégocio.
A promoção do empreendimento deve ser iniciado imedia-
tamente após os estudos de viabilidade.

6.1.5 - Monitoramento da irrigação

Num projeto de irrigação, o maior consumo de água se dá,


efetivamente, ao nível parcelar (90-95% do consumo total).
A aplicação de água de irrigação em excesso significa sa-
turação do solo, formação do lençol freático, salinização, desper-
dício e perda de dinheiro. Em alguns casos é necessária a implan-
tação de um sistema de drenagem com o objetivo de recuperar a
capacidade produtiva do solo.
Uma das formas de efetuar a aplicação adequada da água
na irrigação é o monitoramento, com vistas à definição do momen-
to e da quantidade de água demandada pelas culturas. Vários
métodos e práticas se encontram disponíveis e pouco utilizadas
no Brasil. Os principais fatores que interferem nesse uso são:
• falta de parâmetros regionais que apontem a necessi-
dade econômica de água de cada cultura;
• falta de uma política de estímulo à utilização racional e
econômica da água no processo de produção;
Buscando minimizar essas influências e considerando a
importância que tem o insumo água no desenvolvimento regional,
propõe-se que:

95
• em cada perímetro público seja instalada uma estação
meteorológica composta de sensores científicos, com
informações de intervalo de leitura e precisão para me-
dida de temperatura, umidade relativa, radiações, vento,
chuva, umidade foliar; sistema de leitura in loco, sistema
de aplicação;
• sejam preparados, a partir da coordenação da Embrapa
e com base nas condições atuais de uso e de freqüên-
cia (ouvindo os técnicos regionais), guias de irrigações
regionais, definindo as diversas lâminas de água para
as diversas condições e culturas, e divulgados esses
parâmetros para cada região, além de orientações de
manejo versus dados da estação;

• seja definida uma política de incentivo, por exemplo, ta-


rifas de água diferenciadas X eficiência do uso parcelar
de água, aplicada em cada perímetro;

• seja definido e executado um programa de pesquisa ao


nível regional de otimização do uso d’água de irrigação
para as diversas culturas que indique, a médio prazo, a
melhor relação de manejo de água X solo X planta, e
sejam divulgadas tais informações.

6.2 - Gerenciamento da Política, Planos, Programas e


Projetos de Irrigação

6.2.1 - Amplitude do gerenciamento da irrigação

A gestão de um projeto de irrigação ancora-se em normas


que decorrem da política, dos planos e programas de irrigação.
Estabelecem-se, por esses instrumentos, incentivos, restrições,
prioridades, metas e recursos, e as normas asseguram a go-
vernança, indicando os limites de ação de cada agente público
ou privado.

A gestão cristaliza-se em quatro âmbitos (instâncias deci-


sórias) e níveis (ou categorias de decisão), quais sejam:

96
1º. O âmbito da determinação da política subsetorial de irriga-
ção (com seus princípios, diretrizes e instrumentos que ori-
entam a aplicação e implementação). Predominam decisões
de natureza política e estratégica e, como tal, invariavelmen-
te, relacionadas com questões político-institucionais e, ine-
vitavelmente, condicionadas pela legislação ambiental e de
recursos hídricos e pelo ambiente macroeconômico.
As decisões deste âmbito compreendem dois níveis ou
categorias:
Primeiro nível - de formulação e aprovação da política
subsetorial de irrigação. Cuida-se, neste nível, de conceitos, de
novos modelos, de propor (e aprovar) e de reformular leis. Como
exemplos, estão a discussão, pelo Senado Federal, do Projeto
de Lei n.º 229/95 - Lei de Irrigação, e, no âmbito do Poder Exe-
cutivo, a proposição de um novo modelo de gestão para a agri-
cultura irrigada, especialmente do Nordeste.
Segundo nível - de elaboração e aprovação de planos
(plurianual e anuais, de âmbito nacional) e dos programas regio-
nais e projetos localizados de irrigação.
Envolve-se, com intensidade crescente, a participação de
várias instâncias decisórias e de diferentes grupos de interesse
no processo decisório. As principais tarefas dos formuladores da
Política Nacional de Irrigação (hoje localizados principalmente
nos ministérios da Integração Nacional e do Planejamento, Or-
çamento e Gestão, na esfera federal) são obter consenso político
e instituir o sistema de gestão e os instrumentos jurídicos e téc-
nicos indispensáveis à operacionalização. Neles se incorporam
mecanismos econômico-financeiros que ensejam a alocação de
capital e a recuperação dos investimentos. A implantação e a
sustentação de programas e projetos de agricultura irrigada nas
regiões-alvos são totalmente dependentes.
2º. O âmbito dos processos decisórios, relacionados à loca-
lização e implantação do projeto de irrigação (normalmen-
te composto de um ou mais perímetros irrigados). Aqui
predominam decisões táticas que são da responsabilida-
de dos órgãos executores da política subsetorial de irri-

97
gação, os quais implantam o projeto, diretamente e/ou em
conjunto com outras esferas e instâncias governamentais
e com a iniciativa privada.
As decisões têm curso, mediante modelos de gestão,
que são dotados de ferramentas específicas de suporte às de-
cisões. Essas ferramentas são exigidas pelos planos e progra-
mas e de implantação dos projetos de irrigação aprovados, os
quais envolvem uma participação crescente do setor privado,
desde a formulação, financiamento até a instalação dos proje-
tos. Sendo assim, ocorre a correspondente redução da partici-
pação solitária do setor público.
Os co-executores da Política Nacional de Irrigação estão
localizados, atualmente, não somente no Ministério da Integra-
ção Nacional, mas também em outras instâncias do Governo
Federal, nas esferas estadual e municipal e na iniciativa privada.
Pelo intercâmbio destas esferas decisórias, busca-se obter co-
nhecimento sobre:
(i) a qualidade das informações de caráter geral e especí-
ficas do projeto, tais como, a situação hidrológica da ba-
cia hidrográfica e os cenários de seu desenvolvimento;
(ii) as condições geológicas, edafoclimáticas e ambientais
das áreas potenciais eleitas;
(iii) a infra-estrutura social básica preexistente e a ne-
cessária;
(iv) as condições de natureza mercadológica e agronômica;
(v) os aspectos econômico–financeiros;
(vi) as políticas que regem as relações entre organizações
públicas e privadas;
(vii) os empreendedores potenciais, o patrocinador e a ge-
renciadora global do projeto para estabelecer entre e-
les uma divisão aceitável de atribuições e responsabi-
lidades, de autoridade e de responsabilidade sobre
meios necessários.

98
Cabem às organizações-líderes (o patrocinador e a geren-
ciadora global) as seguintes tarefas:
(i) executar as obras de engenharia civil;
(ii) liderar, catalisar e coordenar as “engenharias” de
natureza política e financeira do projeto (coordena-
ção das coordenações), de modo a que os acordos
de natureza política, estabelecidos no primeiro âmbi-
to, sejam efetivamente validados e observados, para
que suas conseqüências se materializem de acordo
com o previsto;
(iii) implantar as atividades agropecuárias de forma inte-
grada com as demandas internas e externas, de modo
a gerarem riquezas que impulsionem o desenvolvi-
mento do agronegócio e da região;
(iv) elaborar e executar o plano de promoção do projeto
que é crítico para implementação bem-sucedida de um
projeto de irrigação.
3º. O âmbito da gestão do perímetro irrigado implantado. Aqui
predominam decisões de natureza tático-operacional que
evoluem da esfera pública para a privada, em todos os paí-
ses em que a irrigação é importante.
A evolução é conseqüência da multiplicidade e complexi-
dade das decisões que são tomadas, da existência de espectro
diversificado de atores e grupos de interesse, muitas vezes confli-
tantes, e da inabilidade do Governo de coletar e processar a mirí-
ade de informações que dita a vida de um projeto de irrigação.
Neste terceiro âmbito, são as seguintes as principais res-
ponsabilidades do sistema de gestão:
(i) desenvolvimento e implantação de procedimentos que
informem e avaliem os mecanismos econômicos e fi-
nanceiros, voltados à indução do uso racional, portan-
to, eficiente e não perdulário, dos recursos disponíveis,
como a terra e a água, entre tantos outros;

99
(ii) cristalizar investimentos capazes de garantir a auto-
gestão do perímetro e a sustentabilidade das ativida-
des econômicas nele desenvolvidas;
(iii) eleger e validar como objetivo a qualidade dos servi-
ços a serem prestados aos integrantes do projeto (o
patamar desejado);
(iv) estabelecer e validar o horizonte temporal para o alcan-
ce dos objetivos de qualidade e o método de avaliação;
(v) identificar claramente as fontes e a destinação dos re-
cursos financeiros necessários para se atingir patamar
desejado.
As experiências mais bem-sucedidas, do Brasil e da es-
magadora maioria dos países estudados, destacam, como mais
adequado, o arranjo organizacional ou o sistema de gestão de
perímetros públicos de irrigação, pelo qual os próprios agriculto-
res-irrigantes, mediante uma associação que atue em seu nome,
como é o distrito de irrigação, assumem a administração, a opera-
ção e a manutenção da infra-estrutura de irrigação de uso coleti-
vo. Inicialmente, de forma compartilhada com a gerenciadora glo-
bal e, logo depois, de forma autônoma e apenas acompanhada e
assistida pelo poder público.
Dependendo da complexidade do projeto (sobretudo da-
queles em que existe a presença de obras de aproveitamento ou
uso múltiplo dos recursos hídricos), o componente de geração de
energia elétrica, composto do barramento, do reservatório e da
unidade geradora de energia hidrelétrica (UHE), pode ser adminis-
trado, separadamente, por uma empresa pública ou privada.
No primeiro caso (empresa pública), o argumento para sua
presença à frente da administração diz que a geração de energia
deve subsidiar (subsídio cruzado) parte das operações do sistema
de irrigação. Quando o uso é o abastecimento urbano, o forneci-
mento de água bruta, antes do seu tratamento e distribuição, nor-
malmente fica com a associação de usuários da água para efeito
de irrigação, que, inclusive, se vale da venda de água para reduzir
a tarifa dos irrigantes. Em condições de conflitos com o abasteci-

100
mento da cidade ou mesmo com outros usos, a associação pode
reduzir a área irrigada, mediante compensações corretamente
estabelecidas, como ocorre no Oeste americano, em Israel e em
outros países.
Em ambos os casos, a justificativa econômica do subsídio
fundamenta-se em dois pontos:
(i) como os irrigantes, individualmente, não têm poder de
mercado, os ganhos de produtividade da tecnologia irri-
gação se transferem, via preços, para os consumidores;
(ii) o subsídio, no caso, corresponde a um imposto cobrado
dos consumidores de água que, assim, compensam os
irrigantes por parte dos ganhos que tiveram com a mo-
dernização da agricultura. Note-se que, neste caso, o
subsídio não causa nenhum impacto macroeconômico:
É mera transferência de renda para dois grupos.
Os projetos mais antigos, de grandes dimensões, tendem a
manter gestão repartida. Fica sob a responsabilidade de uma or-
ganização pública ou privada o fornecimento de água bruta, desde
a derivação/reserva e distribuição primária até a entrada de cada
perímetro. A condução e distribuição da entrada para frente fica
sob a responsabilidade das associações de usuários d’água.
4º. Finalmente, o âmbito ou domínio da gestão da atividade-
fim, que é da competência exclusiva do setor privado. Este
âmbito compreende a organização da produção agropecu-
ária e a coordenação de mercado.
A análise comparada da situação atual dos perímetros bra-
sileiros, vis-à-vis experiências bem-sucedidas em outros países,
mostra que a produção da maioria dos agricultores neles instala-
dos (pequenos, médios ou grandes irrigantes) é excessivamente
atomizada, defronta-se com canais de comercialização operados
por empresas de grande poder (ex. supermercados), e uma políti-
ca macroeconômica que discrimina a agricultura.

101
6.2.2 - Proposta de sistema gerencial aplicado ao ambiente
da gestão de irrigação

Busca-se, agora, prescrever a divisão de papéis entre esfe-


ras e instâncias governamentais e dessas com o setor privado, se-
gundo as diretrizes de implementação da nova política de irrigação.
Para facilitar a análise das mudanças propostas, lança-se
mão do clássico modelo de sistemas gerenciais de Kurstedt apud
Sink et al. (1993), introduzindo nele algumas modificações, con-
forme FIGURAS 3 e 4, a seguir. E, ainda, enfatiza-se a medição
e avaliação da gestão de políticas, visando melhorar o desem-
penho e assegurar resultados. Requer-se, para tanto, maior con-
trole (inclusive social) dos planos, programas, projetos e proces-
sos. São objetivos:
(i) saber, a qualquer momento, se estamos caminhando
na direção pretendida;
(ii) determinar o nível de eficiência: se estamos nos sain-
do tão bem quanto possível, ao longo da caminhada;
(iii) assegurar que exista apoio cultural, interno e, sobretu-
do, externo, à sustentabilidade (política, financeira
etc.) e conseqüente continuidade da política (e de
seus elementos constituintes: os planos, programas,
projetos e processos).
Na FIGURA 3, abaixo, os três blocos inferiores represen-
tam um sistema gerencial qualquer. Quem gerencia: todo gerente
tem um domínio – conjunto de coisas pelas quais ele é responsá-
vel, segundo o âmbito ou amplitude de seu mandato. Dentro des-
se domínio, existem pessoas e sistemas – o que é gerenciado,
mediante relacionamentos, ferramentas, tecnologia, informações
etc. – o que é usado para gerenciar. Observam-se também três
interfaces: entre decisão e ação, entre medição e dados e interfa-
ce e entre representação e percepção das informações.

102
FIGURA 3
MODELO DE SISTEMAS GERENCIAIS

OUTROS PÚBLICOS

Percepção das Representação


informações das informações
O que é usado
Quem Gerencia para gerenciar

Decisão Dados

Ações O que é Medidas


gerenciado

FONTE: Kurstedt apud Sink et al. (1993).

Na FIGURA 4, na página seguinte, o modelo genérico da


FIGURA 3 é aplicado ao ambiente da gestão da política nacional
de irrigação, especificando as três interfaces mencionadas, a sa-
ber: interface entre quem gerencia e aquilo que é gerenciado; a
interface entre representação/percepção - entre o que é usado
para gerenciar (ferramentas de armazenamento e recuperação de
dados; modelos de processamento, técnicas etc.) e quem geren-
cia e, finalmente, a interface entre o que é gerenciado e as ferra-
mentas usadas para converter dados em informação.

103
FIGURA 4
PROPOSTA DE SISTEMAS GERENCIAIS APLICADO AO
AMBIENTE DA GESTÃO DA IRRIGAÇÃO
Âmbito da Determinação da Política Nacional de Irrigação e Drenagem

Presidente
Congresso
Governadores
Prefeitos
Controle Sociedade, Públicos de Interesse
Social
Percepção das Representação das
informações informações

Output/Visibilidade Siste- Ferramentas e Técnicas


Ministério da Integração
de Medição e Avalia-
Nacional mas de Medição e Avaliação
ção: processo manipu-
lação dados

Planos, Programas
e Projetos e Técnicas Técnicas e Sistemas de
Medição: processo de
de melhoria
coleta de dados

Inputs Outputs

Sistemas a Montante Sistemas Organizacionais Sistemas a Jusante

FONTE: Kurstedt apud Sink et al. (1993).

Emergem, assim, mais três blocos intermediários: o das in-


tervenções (planos, programas e projetos e técnicas de melhoria);
o das técnicas e sistemas de medição e o processo de coleta de
dados, que ligam o Sistema Organizacional com as Ferramentas e

104
Técnicas de Medição e Avaliação e o Processo de Manipulação
de Dados. Finalmente o bloco que liga os sistemas de medição e
avaliação (do produto ou resultados e sua visibilidade) com
quem gerencia.
Existe ainda um terceiro conjunto, também composto de
três blocos. O primeiro bloco é o dos sistemas a montante, repre-
sentado pelos fornecedores de insumos. Neste nível mais elevado
da gestão, eles estão representados por quantos provêem o sis-
tema organizacional de recursos - humanas, materiais, financeiras
- de informações e conhecimentos especializados, necessários
para implementar as decisões da administração superior, deman-
dadas pela sociedade e pelos grupos de interesse.
O segundo bloco – sistemas a jusante – é representado
pelo mercado: os usuários e clientes que queremos/precisamos
atender, com os serviços prestados e produtos gerados.
Finalmente, o terceiro bloco – dos outros públicos,
composto, numa simplificação, do público externo, formado por
quantos não fazem parte do sistema organizacional e do público
interno, que é parte deste sistema. Embora citado por último, são
esses outros públicos que produzem resultados (o público interno)
e os convalidam (o público externo), assegurando ou não a
vitalidade e continuidade da política e de seus planos, programas
e projetos constituintes.

6.2.3 - Atribuições de cada ente gestor de projetos públicos

A seguir, descreve-se uma proposta de atribuições, papéis


e responsabilidades dos entes gestores da irrigação pública do
Nordeste, seja na gestão da infra-estrutura comum, seja na gestão
do agronegócio correspondente.

♦ Conceitos

São explicitados os conceitos básicos e que, juntamente


com as diretrizes dos termos de referência, condicionam o modelo
conceptual de irrigação.

105
a) Instituições, organizações e mudança institucional

Em linhas gerais, as instituições compõem-se de constitui-


ção, leis, decretos, portarias, regulamentos e normas informais,
que condicionam o comportamento dos indivíduos, das empresas
e do mercado. As organizações são entes que têm responsabili-
dades específicas de execução de tarefas, dentro daquilo que as
instituições permitem. Mudança institucional é mover de um para-
digma institucional para outro (North, 1991). Especificamente:

a1) Instituições

São a estrutura que se impõe nas interações entre as pes-


soas e as organizações e que, por conseguinte, define os incenti-
vos que (juntamente com outras restrições – orçamentárias,
tecnológicas etc.) determinam as escolhas que indivíduos fazem,
as quais, por fim, condicionam o desempenho de sociedades e
economias, em dado momento e ao longo do tempo.
Num modelo de decisão, as instituições constituem restri-
ções que devem ser observadas, além daquelas de natureza físi-
ca e financeira.
Tecnicamente, existe uma clara distinção entre as institui-
ções e as organizações.
Instituições consistem de (i) regras (normas) formais; de (ii)
restrições informais tais como as normas de comportamento, con-
venções e códigos de conduta auto-impostos, de sua observância
e dos meios que determinem o seu cumprimento.
O cumprimento ou observância das regras formais e das
restrições informais depende:
1º) do código de conduta auto-imposto do primeiro indiví-
duo (ou grupo);
2º) do segundo indivíduo – retaliação (e ou);
3º) de uma terceira parte – sanções da sociedade ou coer-
ção do Estado.

106
Em resumo, entende-se por instituição “um conjunto de re-
gras (formais) e normas (restrições informais) estabelecidas (auto-
impostas) e observadas (cumpridas) para satisfação dos interes-
ses coletivos” (Instituição, 1999).
As instituições afetam o desempenho econômico, determi-
nando – juntamente com a tecnologia e insumos empregados – os
custos de transação e de produção.
Assim, se instituições são as regras do jogo, organizações
são os jogadores.
a2) Organizações
Constituem-se de grupos de indivíduos, engajados em ati-
vidades de interesse ou vantajosas para eles e para o ambiente
que as envolve. As restrições impostas pelo arcabouço institucio-
nal (juntamente com outras restrições normais da economia) esta-
belecem a dimensão do conjunto de oportunidades e, por conse-
guinte, as organizações que podem emergir. De acordo com a
função-objetivo da organização (por exemplo, maximizar lucros,
vencer eleições, regular negócios ou educar pessoas), as corres-
pondentes firmas, partidos políticos, agências reguladoras ou es-
colas, no exemplo dado, engajar-se-ão na aquisição de insumos,
habilidades e conhecimento, a fim de tentarem aumentar suas
possibilidades de sobrevivência, num contexto de competição.
As habilidades e os conhecimentos adquiridos serão fun-
ção da estrutura de incentivo, inerente à matriz institucional. Por
exemplo, se elevadas taxas de retorno condicionam a possibilida-
de de sobrevivência e decorrem de incrementos de produtividade,
as empresas e outras organizações investirão em habilidades e
conhecimento que elas acreditam correlacionar com a produtivi-
dade. Se maiores possibilidades de sobrevivência decorrem de
vantagens competitivas artificiais (ou espúrias), as organizações
lutarão para que tais vantagens (ou status quo) sejam mantidas.
O marco institucional ou ambiente institucional abrange,
portanto, o sistema legal, as tradições e os costumes, o sistema
político e os mecanismos de regulação de um determinado país e
de suas unidades constituintes.

107
a3) Mudança institucional: agentes, fontes, processo, direção
O agente de mudança é o empreendedor, o tomador de
decisões nas organizações. Suas percepções subjetivas (modelos
mentais) determinam as escolhas (alternativas de ação) que ele
pode fazer.
As inspirações de mudança são as oportunidades, perce-
bidas como tais pelos empreendedores. Elas podem ter origem
externa, de mudanças no macroambiente ou, então, internas, do
aprendizado e da aquisição de habilidades, quando seu modelo
mental sugerir novos caminhos. Usualmente, são combinações de
mudança do ambiente externo (tal como mudanças nos preços
relativos) e de aprendizado interno, que têm levado às escolhas
que condicionam a mudança institucional.
Mudanças das regras formais incluem: (i) mudanças legis-
lativas, tais como a aprovação de nova lei ou regulamento; (ii)
mudança, via poder judiciário (como resultado de uma decisão da
Alta Corte, alterando uma lei ordinária); (iii) mudanças das normas
de regulação, estabelecidas por agências regulatórias, como a
Aneel; (iv) mudanças constitucionais, que alteram as regras pelas
quais outras normas são elaboradas (como a Constituição Fede-
ral, de 1988, que tornou a água um bem público, no Brasil, alte-
rando dispositivo do Código de Águas, de 1934).
Já a mudança institucional, resultante de modificações das
restrições informais (normas, convenções ou padrões pessoais de
conduta, por exemplo), tem as mesmas fontes de inspiração, ou
seja, o aprendizado interno ou mudanças nas variáveis econômi-
cas. Contudo, ela ocorrerá mais gradualmente.
O processo de mudança institucional é, inevitavelmente,
incremental, mesmo quando há o estrépito de uma revolução. A
razão disso é que economias de escopo, complementaridades e
externalidades que emergem da matriz institucional desaconse-
lham quebras bruscas de paradigmas, visto serem de elevado
risco e, quando este é devidamente considerado, elas são pouco
lucrativas. Quanto maior o número de regras que mudam, ceteris
paribus, mais elevado é o número de perdedores e, portanto, mai-
or é a oposição à quebra de paradigma.

108
A direção da mudança é determinada pelo curso ou cami-
nho de dependência. As organizações políticas e econômicas, que
mantêm sua existência em conseqüência da matriz institucional,
tipicamente apostam na perpetuação do arcabouço institucional
existente. Aceitam mudanças se bem demonstrado que estão en-
tre os ganhadores.
b) Envolvimento público
“Por envolvimento público entendem-se os processos, me-
diante os quais indivíduos, organizações privadas, agências
e entidades governamentais, que são impactados pelas
mudanças institucionais (das regras do jogo, que alteram
políticas, projetos etc.), são consultados e participam da
tomada de decisões, tornando-se também co-responsáveis
por suas conseqüências” (United States of America, 1980).

Cabe salientar que o envolvimento público só se estabele-


ce, efetivamente, quando atende, concomitantemente, aos inte-
resses da agência que o promove e do público-alvo.
c) Chegar a um consenso
Significa encontrar uma proposta aceitável, passível de ser
acolhida pelo grupo envolvido, de modo que todos os membros do
grupo possam apoiá-la e nenhum membro se oponha a ela. Ou
seja, todos podem aceitá-la, comprometendo-se ou co-
responsabilizando-se pelo seu sucesso. A obtenção de consenso
pode exigir que os ganhadores compensem os perdedores.
Portanto, consenso não é uma votação unânime, porque
nem sempre representa a prioridade máxima de todas as pesso-
as. Nem é um voto majoritário, pelo qual a maioria obtém algo que
a satisfaz, e a minoria pode obter algo que absolutamente não
quer. Também não é unanimidade, quando todo mundo fica com-
pletamente satisfeito com a decisão (Scholtes, 1992).
A melhor forma de chegar a um consenso, na gestão de
um projeto de irrigação, é a construção e escolha solidária de um
cenário, o qual, porque todos acreditam na sua viabilidade, tem
elevada probabilidade de tornar realidade.

109
d) Gestão sustentável da irrigação
Por gestão sustentável da irrigação entende-se o sistema
mediante o qual organizações e indivíduos:
(i) determinam, consensualmente, os objetivos do siste-
ma (este entendido como um conjunto de tarefas cor-
relacionadas, que, por sua vez, constitui um conjunto
de eventos também correlacionados);
(ii) estabelecem as condições necessárias e factíveis para
sua materialização;
(iii) mobilizam e exploram os recursos disponibilizados e
sua gestão, a fim de atenderem aos objetivos da cole-
tividade do projeto;
(iv) as atividades são desenvolvidas de modo a provoca-
rem o menor impacto negativo possível (IIMI, 1995).
e) Transferência do gerenciamento da irrigação
A transferência do gerenciamento da irrigação significa a
realocação da responsabilidade e autoridade da gestão de partes
ou da totalidade de sistemas (projetos) de irrigação, de agências
governamentais para organizações particulares, tais como as
associações de usuários da água (AUAs).
A transferência representa a redução do papel do governo
no dia-a-dia da gestão e a correspondente expansão do papel de
AUAs e outras instituições locais. Ela pode incluir responsabilida-
de e autoridade plenas ou apenas parciais. Pode ser implementa-
da no nível de subsistema, como o controle de canais intermediá-
rios de distribuição de água ou no sistema como um todo (Sagar-
doy, 1995).
A transferência passa, necessariamente, por uma instância
de contratualidade que não se esgota nos instrumentos jurídicos
ou nas instituições reguladoras, mas também na possibilidade de
entendimento ou consenso entre os entes público e privado, nela
mutuamente interessados.

110
As dificuldades de transferência dependem dos tipos de
projetos e arranjos, entre os quais se salientam:
• aqueles construídos pelos agricultores, individualmente,
mediante simples captação e derivação de água (proje-
tos privados). Nestes não há problema de transferência;
• arranjos mais amplos em que o gerenciamento é trans-
ferido de uma agência externa, normalmente estatal, a
qual implantou e pôs em marcha o projeto para uma or-
ganização de usuários, local e de direito privado, como
os distritos de irrigação. Como exemplo têm-se os proje-
tos Jaíba e Gorutuba, no norte de Minas, Nilo Coelho,
em Petrolina/Juazeiro (PE/BA), entre tantos outros no
Nordeste brasileiro e no mundo inteiro.
• quando uma agência do Governo Federal delega a ges-
tão do projeto para um órgão estadual, ocorre apenas
uma descentralização administrativa, como a já efetiva-
da em perímetros irrigados, no Rio Grande do Norte, no
Ceará e na Paraíba.
O envolvimento de associações de usuários da água (AU-
As) na gestão de projetos pode ir desde as ações como as
predecessoras de recuperação/adequação de terras para o de-
senvolvimento agrícola – land reclamation (como no Oeste ame-
ricano, desde o início do século XX), como até a participação dos
usuários na identificação, nos estudos técnico-econômicos, de
pré-viabilidade, viabilidade e de elaboração de projetos básico e
executivo.
O envolvimento, ainda, pode alcançar a contratação, cons-
trução, gerenciamento e o financiamento das obras de infra-
estrutura de irrigação de uso comum (como no Chile). Num está-
dio mais avançado, compreende a implantação de projetos, sua
administração, operação e manutenção (O&M) (como no México e
em alguns perímetros públicos de irrigação do Brasil) e culmina
com a aquisição do projeto pelos usuários, como no Peru.
Portanto, o processo de transferência pode envolver, me-
diante institutos jurídicos próprios, somente a transferência de

111
responsabilidades e a conseqüente delegação de poder para o
gerenciamento do projeto de irrigação e pode chegar até a devo-
lução desse poder aos usuários da água ou a terceiros.
No primeiro caso de delegação de poder, as seguintes si-
tuações podem ocorrer:
(i) a transferência dos títulos de propriedade dos lotes de
terra de um projeto público aos seus ocupantes, pela
venda, e a permissão para que a associação de usuá-
rios (“ato administrativo discricionário, pelo qual se
faculta a execução de serviços ou uso de bem público,
no interesse geral” Pompeu, 1998) passe a se
responsabilizar também pela operação e manutenção
da infra-estrutura de irrigação de uso coletivo do projeto;
(ii) a concessão “Contrato segundo o qual a Administração
Pública delega ao particular a execução remunerada de
serviço ou de obra pública ou lhe cede o uso de bem
público, para que explore por sua conta e risco, pelo
prazo e nas condições regulamentares e contratuais“
(Meirelles apud Pompeu, 1998) – encerra delegação do
poder concedente, via transferência, para a iniciativa
privada, da administração, operação e manutenção de
projetos públicos.
Nas situações (i) e (ii), a propriedade das obras e das
instalações hidroeletromecânicas de irrigação, de uso coletivo,
permanecem sob domínio do setor público.
No caso (ii), a devolução do poder corresponde à privatiza-
ção, com a transferência negociada do direito de uso de ativos de
terra e de infra-estrutura de irrigação coletiva, nos projetos públi-
cos, para a iniciativa privada. Os irrigantes são proprietários de
seus lotes.
Assim, tanto a delegação como a devolução de poder im-
plicam contração do poder do Estado e, em contrapartida, expan-
são do poder do setor privado. Ou seja, implicam ampliação das
responsabilidades dos irrigantes na gestão e no custeio e de in-
vestimentos na infra-estrutura de uso comum. A migração de res-

112
ponsabilidades e de autoridade – do setor público para o privado –
gera também modificações de caráter político nos procedimentos
(a construção de consenso, a regulação e o gerenciamento das
parcerias), nas práticas e, finalmente, no próprio desempenho da
agricultura irrigada.
f) Reforma política do subsetor de irrigação
A reforma política do subsetor de irrigação significa:
“Uma nova visão, ampla e de longo prazo, das responsabi-
lidades do poder público e da iniciativa particular, relativa-
mente ao gerenciamento dos recursos naturais, utilizados
pela irrigação. O objeto central de uma eventual reforma
institucional do subsetor alcança a estrutura, as estratégias
e os recursos das organizações existentes“ (Graaf & Toorn,
1995).

♦ No Âmbito da Gestão da Política Nacional de Irrigação


A determinação da política e a definição dos planos e pro-
gramas compreendem as seguintes atribuições e os respectivos
responsáveis:
a) Formulação da Política Nacional de Irrigação e Drenagem;
• Ministério da Integração Nacional (Coordenação).
• Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
• Ministério da Agricultura e Abastecimento.
b) Aprovação e Controle da Política Nacional de Irrigação
• Presidente da República.
• Congresso Nacional (provendo os instrumentos le-
gais necessários e acompanhando/ avaliando sua
execução).

113
c) Elaboração e Aprovação dos Planos Nacionais (Pluria-
nual e Anuais) e dos Programas Regionais de Irrigação
deles Integrantes
• Elaboração: Ministério da Integração Nacional –
Coordenação e Controle
É realizada com participação estreita dos órgãos vincu-
lados, de entes correlatos e parceiros e de entidades
representativas de empreendedores do agronegócio da
agricultura irrigada.
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
Ministério do Meio Ambiente/Conselho Nacional de Re-
cursos Hídricos: Compatibilização com política, planos e
programas de recursos hídricos e comprometimento
com a política de desenvolvimento sustentado de recur-
sos hídricos das bacias hidrográficas beneficiadas com
projetos de irrigação.
Ministério da Agricultura e do Abastecimento – Compa-
tibilização, sobretudo com as políticas, programas e
projetos de pesquisa e desenvolvimento, de defesa
sanitária agropecuária, de desenvolvimento e defesa
de mercados dos produtos agrícolas e, finalmente,
comprometimento com a execução e aplicação da polí-
tica agrícola vigente.
• Aprovação: o plano plurianual é aprovado pelo
Congresso Nacional e os planos anuais, pelo Ministério
da Integração Nacional.
• Validação:
A validação, na esfera política, ocorre no Congresso Na-
cional, nas assembléias legislativas e, mesmo, nas câmaras de
vereadores, dependendo ser ação de nível nacional, regional ou
local. O envolvimento de um poder depende, assim, da natureza do
projeto. Mais de um nível de poder pode-se envolver na validação.

114
♦ No Âmbito da Gestão dos Projetos de Irrigação
A definição da localização, do desenho e da implantação
dos projetos de irrigação será de responsabilidade do Ministério
da Integração Nacional (coordenação, acompanhamento e avalia-
ção), tendo como apoio:
- Secretaria de Infra-Estrutura Hídrica - supervisão e controle.
- Órgãos vinculados: Codevasf e Dnocs - co-execução.
Deverão ser observadas as seguintes atribuições:
a) Gerenciamento global dos projetos - definição da locali-
zação e desenho de projetos. Negociação, preparação
e lavratura de instrumentos contratuais de co-
financiamento e de gestão. Promoção e diligenciamen-
to. Captação e alocação de recursos financeiros. Su-
pervisão e controle da aplicação e recuperação dos in-
vestimentos.
b) Gerenciamento de obras - planejamento, contratação,
supervisão e controle do gerenciamento; provisão e alo-
cação de recursos financeiros nos projetos públicos.
c) Participação minoritária nos projetos mistos - provisão
de estudos de localização e de projetos de pré-
viabilidade que comportam até 49% do investimento pe-
lo poder público, fiscalização e assistência técnica (na
implantação e gestão) regulação da operação.
Como participantes neste âmbito há, ainda:
• Órgãos correlatos (ex.: bancos oficiais, bancos priva-
dos) - apoio, principalmente na implantação dos proje-
tos e, quando necessário, atuar como parceiro (spon-
sor), responsabilizando-se pela engenharia financeira,
co-participando na promoção do projeto e na captação
de investimentos (Project Finance).
• Parceiros privados participando na implantação de o-
bras hidráulicas de uso comum.

115
• Empreendedores privados de toda a cadeia produtiva.
• Investidores privados.
• Governos estaduais e municipais – apoio e co-
participação, principalmente na dotação de infra-
estruturas de apoio e social e na provisão de bens pú-
blicos de sua competência constitucional, na área de in-
fluência do projeto.
♦ No Âmbito da Gestão do Projeto Público de Irrigação
A administração do projeto, a operação e manutenção da
sua infra-estrutura de irrigação de uso coletivo serão de respon-
sabilidade do Ministério da Integração Nacional, pela Secretaria
de Infra-Estrutura Hídrica, tendo como apoio:
a. Órgãos vinculados:
Codevasf e Dnocs – co-gestão (apenas na fase de im-
plantação); co-financiamento da administração, da O&M
e da assistência técnica (para empreendedores familia-
res); supervisão, prestação de assistência técnica e ge-
rencial; fiscalização, auditagem da aplicação de recur-
sos financeiros e arbitragem (das políticas de distribui-
ção de água e tarifária).
b. Órgãos parceiros:
• por transferência de poder - Associações de Usuá-
rios da Água, Distritos de Irrigação (integrando pro-
dutores rurais de pequeno, médio e grande portes),
para, após a implantação do projeto, assumirem sua
administração e as atividades de O&M);
• por descentralização de poder - secretarias estaduais
- administração do projeto e transferência da O&M da
infra-estrutura de irrigação de uso coletivo para os
distritos.
c. Órgãos interessados (governamentais setoriais) -
provedores de bens públicos etc.

116
♦ No Âmbito da Organização da Produção Agrícola
Na organização da produção, desde o processo de produ-
ção até os aspectos de coordenação de mercado, deverão ser
observadas as atribuições:
a. Poder público
Prover bens públicos, desenvolver e promover merca-
dos, assegurar um adequado ambiente de contratuali-
dade e política econômica que não discrimine a ativida-
de agropecuária, de modo que se possa obter e manter
vantagem competitiva dinâmica das atividades compo-
nentes do agronegócio.
b. Empreendedores privados
Produtores de todos os portes, associados ou não em
grupos e/ou cooperativas e integrados, mediante ins-
trumentos contratuais com outros elos do agronegócio.

6.2.4 - Sistemas de gerenciamento de projetos de


irrigação

A experiência internacional de parceria público-privada no


uso de recursos hídricos, mesmo quando no conceito restrito de
operação de serviços de distribuição de água (como nos períme-
tros públicos de irrigação) sugere um leque de alternativas à nova
política de irrigação, no que respeita à ampliação da participação
do setor privado em projetos públicos de irrigação nas obras cole-
tivas de uso coletivo.
Esta experiência, embora valiosa, precisa, no entanto, ser
desenvolvida e aprimorada, de forma a atender, inclusive, ao mo-
derno conceito de gestão integrada de recursos hídricos, preconi-
zado pela Lei n.º 9.433/97. Isso significa, por exemplo, que, para
financiar obras de irrigação, é imprescindível equacionar a forma e
as fontes de recursos para a gestão dos recursos hídricos da ba-
cia hidrográfica, onde se situa o projeto. E, ainda, que se assegure
uma oferta firme (em quantidade e no tempo) da água outorgada e
que se elimine a insegurança dos irrigantes, quanto à oferta de

117
água, e, portanto, os conflitos de usos de água, cuidando-se, tam-
bém, de evitar impactos ambientais negativos.
As alternativas de participação do setor privado na utiliza-
ção de recursos hídricos para irrigação constituem função do nível
de delegação ou transferência de poder desejado pelos governos,
do nível de investimento e financiamento de capital, do risco co-
mercial do grau de risco admitido e da reversibilidade dos servi-
ços, em prazos que variam de um a trinta anos. Excetuam-se os
casos de transferência de ativos, em que esse prazo pode esten-
der-se por 50 anos.
Cinco modalidades principais de contratação, operacionali-
zadas em vários países, são aplicáveis aos projetos públicos de
irrigação: Contrato de Terceirização de Serviços, Contrato de Ges-
tão, Contrato de Arrendamento, Contrato para Build-Operate-
Transfer (BOT) ou para Build-Operate-Own (BOO) e Transferência
de Ativos.
i) Contratos de Terceirização de Serviços
Os contratos de terceirização de serviços, de execução
simples, mas com benefícios limitados, são aplicáveis, quando há
um objetivo operacional bem definido, quando se busca determi-
nada expertise e desejam-se a redução de custos e a melhoria da
eficiência dos serviços, no âmbito de autarquias, empresas e con-
cessionárias públicas, já relativamente bem administradas e que
operam com sistemas tarifários comercialmente viáveis.
Embora os contratos de terceirização de serviços não tra-
gam capital privado para investimento em obras, eles possibilitam
a agregação de tecnologias de gestão e operacional aos sistemas
geridos diretamente pelo setor público e, principalmente, estimu-
lam a competitividade entre as empresas privadas, no sentido da
busca de maior ganho de qualidade e produtividade, uma vez que
os referidos contratos têm uma duração muito curta, sendo reno-
vados, por licitação, de dois em dois anos, no máximo.
As experiências mal-sucedidas de terceirização, de parte
das responsabilidades operacionais gerenciadas por órgãos públi-
cos, decorrem, não raro, de sua própria incapacidade de escolher

118
os processos a serem delegados e de supervisionar sua execu-
ção, o que reforça a idéia de que essa modalidade só se aplica a
sistemas que já venham sendo bem administrados. Nos contratos
de terceirização mais comuns, por exemplo, nas companhias es-
taduais de saneamento, o maior erro tem sido a fragmentação de
processos, delegando-se à empresa contratada apenas uma ativi-
dade ou tarefa específica.
O sucesso da implementação de contratos de terceirização
está diretamente associado à seleção e contratação de um pro-
cesso inteiro, em que a empresa contratada possa ser desafiada a
melhorar e agregar ganhos de produtividade significativos e res-
ponsabilizada pelos erros. Assim, será possível remover o estigma
de que esse tipo de contrato vise apenas à contratação de mão-
de-obra mais barata, com o único e limitado objetivo de reduzir
custos, sem compromisso de melhoria da qualidade.
Nesse contexto, sob a égide da nova política de irrigação,
os contratos de terceirização só poderão ser aplicáveis à realiza-
ção de estudos e projetos e à supervisão de obras. As associa-
ções de usuários da água, como os distritos de irrigação,
responsabilizar-se-ão pela operação e manutenção das infra-
estruturas de irrigação de uso coletivo, inicialmente de forma
compartilhada com a promotora do projeto.
ii) Contratos de Gestão
Os contratos de gestão, que têm duração de três a cinco
anos, apresentam-se como um estádio preparatório para a imple-
mentação de alternativas mais sofisticadas de participação da
iniciativa privada, como o arrendamento, os contratos para BOT
ou BOO ou a venda de ativos.
Normalmente, contratos de gestão estão atrelados a obje-
tivos e compromissos de desempenho e podem oferecer uma re-
muneração fixa, acrescida de outra variável, em função das metas
de produtividade que vierem a ser alcançadas pela empresa con-
tratada. Entretanto, a responsabilidade pela viabilização dos re-
cursos financeiros cabe ao poder público. Neste caso, se a inten-
ção do Governo é promover investimentos a curto prazo, a gestão
contratada não oferece vantagens significativas. No caso brasilei-

119
ro, é notória a incapacidade do setor público em gerar recursos de
contrapartida para empréstimos ou bancar todos os investimentos
com recursos orçamentários.
Os contratos de gestão podem constituir um mecanismo
importante, de médio prazo, para abrir caminho à maior participa-
ção do setor privado na gestão e nos investimentos.
iii) Contratos de Arrendamento
Os contratos de arrendamento, mediante os quais o Go-
verno aluga determinado ativo, a infra-estrutura de irrigação de
uso coletivo, por exemplo, a um distrito de irrigação ou a uma em-
presa privada, que passa a responsabilizar-se por sua total opera-
ção, manutenção e conservação, é um passo importante na intro-
dução do risco, na gestão de perímetros públicos de irrigação.
Estes contratos têm duração de 8 a 15 anos.
iv) Contratos para BOT e BOO
Os contratos para BOT (Build-Operate-Transfer), mediante
o qual grupos privados são chamados para realizar as seguintes
tarefas:
(i) financiar e construir determinados sistemas comple-
tos (por exemplo, a infra-estrutura de irrigação de uso
coletivo de um perímetro irrigado, integrante de um
projeto de irrigação, uma estação de tratamento de
esgotos);
(ii) operar o sistema por um prazo determinado (20-30
anos) e, mediante essa operação, obter o retorno do
investimento feito;
(iii) devolver as instalações ao Poder Público concedente,
findo o prazo do contrato.
Estas modalidades são uma genuína alternativa de transi-
ção de Project Finance para implementação de ações que visam à
ampliação da participação do setor privado na irrigação.
O maior sucesso dessa modalidade de parceria ocorre,
justamente, quando há pressão para aumentar a área irrigada,

120
num prazo mais curto, numa conjuntura de recursos públicos es-
cassos e de prevalência de outras prioridades governamentais.
A alternativa de parceirização via BOT poderá vir a ser um
mecanismo de agilização para o cumprimento da diretriz da nova
política de irrigação, qual seja, de ampliação da participação do
setor privado nos projetos públicos de irrigação, nas regiões Nor-
deste e norte de Minas Gerais, considerando as seguintes vanta-
gens que a modalidade oferece:
a) utilização de financiamento privado para fornecer capi-
tal, o que aumenta a disponibilidade de recursos para
financiar mais ações do programa regional de irrigação;
b) aceleração da execução de obras complementares (co-
mo as de drenagem coletiva ainda não executadas ou
de expansão da área irrigável em projetos inconclusos),
integrantes de programas, apoiados por agências multi-
laterais de financiamento.
Existe uma variação da modalidade BOT, denominada
BOO (Build-Operate-Own), em que os ativos, objeto do contrato,
permanecem em poder da iniciativa privada, em vez de serem
devolvidos ao poder público concedente, ao final do prazo de re-
torno do capital investido.
Portanto, as modalidades BOT e BOO poderão constituir
alternativas de atração do capital privado e, como tais, poderão
ser incentivadas por um programa regional de irrigação, abran-
gendo grande parte das ações financiáveis do componente obras
e serviços de irrigação.
Ambas podem ser utilizadas, mesmo sob o império da le-
gislação atual de irrigação, na medida em que os ativos, quando
transferidos (modalidade BOT), são do setor privado para o públi-
co e não vice-versa, o que é vedado pela legislação.
v) Contratos de Transferência de Ativos
Os contratos de transferência de ativos possuem caracte-
rísticas de privatização, o que, na vigência da atual Lei de Irriga-
ção, é de aplicação vedada. Por ela os serviços são delegáveis,

121
mas os ativos são intransferíveis ao setor privado. Assim, sua a-
plicação dependerá de mudança na Lei 6.662/79, ora em discus-
são no Senado Federal. Na legislação de irrigação brasileira, o
prazo de pagamento pode ir até 50 anos.
De modo geral, todas as modalidades apresentadas têm
algumas características vantajosas e outras tantas desvantajosas
para o Governo e para a iniciativa privada. A aplicação de cada
uma delas, no contexto das ações financiáveis de um programa
regional de irrigação, deverá ser ajustada, quando do detalhamen-
to da execução de cada projeto e das condições específicas de
Project Finance.
O QUADRO 1, na página seguinte, apresenta uma síntese
das características principais de cada uma das alternativas de
parceria recomendadas, inclusive a de concessão, mais aplicável
ao subsetor de saneamento ambiental.

122
QUADRO 1
ANÁLISE COMPARADA DAS ALTERNATIVAS DE PARTICIPAÇÃO DO SETOR PRIVADO NO USO DE RECURSOS HÍDRICOS

ALTERNATIVA PROPRIEDADE OPERAÇÃO E INVESTIMENTO RISCO DURAÇÃO DO


DE ATIVOS MANUTENÇÃO DE CAPITAL COMERCIAL CONTRATO

TERCEIRIZAÇÃO Público-
Público Privado Público Público 1-2 ANOS

CONTRATO DE
Público Privado Público Público 3-5 ANOS
GESTÃO

ARRENDAMENTO Público Público Público-


Privado Privado 8-15 ANOS

CONCESSÃO Público Privado Privado Público 25-30 ANOS

Público-
BOT / BOO Privado Privado Público 20-30 ANOS
Privado

VENDA DE Público-
Privado Privado Privado Público Indefinido
ATIVOS

FONTE: Adaptado de World Bank, 1997.

123
6.3 - Sistema de Produção, Pós-Colheita, Distribuição e
Mercado

Nos pólos de irrigação do Nordeste predomina, basicamen-


te, uma segmentação entre a produção, a pós-colheita e a
distribuição, com negociação de preços no sistema “disponível”. O
produtor, normalmente, planta sem contratos de compra
antecipada e após a colheita oferece sua produção a compradores
que visitam o seu estabelecimento. Faltam vínculos contratuais
entre a produção e os segmentos a jusante do setor (vínculos
coordenados entre a colheita do produto, beneficiamento,
processamento, embalagem e transporte). Em se tratando de
produtos de alta perecibilidade, esta não é uma forma eficaz para
internalização de melhor recompensa para os produtores.
A informação gerada nos mercados finais de distribuição
não é transferida de forma sistemática e transparente aos produto-
res, devido à intermediação existente nas etapas subseqüentes à
produção. A informação de preços, qualidade, demanda, cadência
de absorção do mercado etc., é assimétrica e o comprador tem
maior poder relativo de barganha.
Não raro, as decisões de produção são desvinculadas de
contratos firmes de compra e venda. Quando existentes, são ain-
da frágeis e não generalizados como prática comum, amadurecida
e norteadora dos negócios. Se com os contratos há problemas de
repartição de riscos entre os segmentos, sem eles prevalece uma
assimetria na assunção de riscos que se reflete em menor poder
de barganha relativo nos elos que não conhecem os riscos de
comercialização e vendas.
O resultado deste sistema desvinculado de coordenação
mediante contratos é a presença de riscos elevados para todos os
atores do processo, desde o produtor até o agente financeiro, pas-
sando por todos os elos envolvidos.
Predominam riscos de mercado maiores para os produto-
res, quando a informação é assimétrica (desigualdade nos níveis
de informação entre os compradores e vendedores); quando o
produtor vende produto perecível após colhido (oferta inelástica);
quando os custos de transação são elevados, a produção é ato-

124
mizada e o mercado que compra é imperfeito. O acesso à infor-
mação permite a atores individuais na comercialização minimiza-
rem riscos, transferindo-os aos atores com menores níveis relati-
vos de informação, no caso, os produtores.
Além da assimetria de informação, no que se refere aos
aspectos de mercado e comercialização, também se observa a
dificuldade dos técnicos, pequenos e grandes irrigantes, quanto
à informação tecnológica disponível na pesquisa, ainda em
forma fragmentada, mas não adequada para o usuário, quando
não dispersa entre vários atores e não sistematizada e genera-
lizável para região.
Como se vê, o sistema de produção pós-colheita, distribui-
ção e de mercado, predominante nos pólos de irrigação do Nor-
deste e, portanto, nos projetos públicos de irrigação, é deficiente
por causa da assimetria de informação de preços e tecnológica e
gestão comercial.
Como instrumento de implementação da nova política de
irrigação, buscando-se sustentação econômica, financeira e ambi-
ental para os projetos públicos, inclusive com a maior participação
da agricultura irrigada nas exportações, o sistema de produção
pós-colheita, distribuição e mercado deve ser orientado para os
aspectos de gestão comercial, estratégia de mercado, informação
de mercado e tecnológica, assim como ocorre nos EUA, na Fran-
ça, no Chile e na Espanha, entre outros, e analisados no Relatório
do Estado da Arte da Irrigação.

6.3.1 - Sistema de gestão comercial

Atualmente, nos projetos públicos de irrigação, os irrigan-


tes (quer pequenos, médios ou grandes), de forma individual ou
mediante suas organizações (cooperativas, distritos, associações
etc.), desenvolvem muitas funções, dentro do processo de produ-
ção, desde a identificação de oportunidades de mercado e de
compra de insumos, até a viabilização da produção. Por isto, o
processo de decisão é complexo e envolve maiores riscos, princi-
palmente quando se trabalha com produtos hortícolas.

125
As mesmas limitações ocorrem com os produtores irrigan-
tes fora dos projetos públicos, mas nos pólos de irrigação do Nor-
deste. Espera-se que nesses pólos a produção irrigada cresça,
tornando-se um grande negócio. Por isto, é necessário descentra-
lizar as decisões e especializar as funções dos agentes envolvi-
dos, principalmente quando os volumes produzidos e comerciali-
zados são grandes. Assim, convém dividir e especializar funções
e riscos, e, naturalmente, os níveis de remuneração devem ser
proporcionais aos riscos.
Verifica-se, conforme relato no item 3.2.4 do capítulo 3,
que em torno de 65% do volume comercializado dos pólos ocor-
rem com a intermediação entre o produtor e o atacadista, sem
nenhuma simetria de informações. Interromper essa característica
significa maior ganho para os produtores, notadamente o peque-
no, que não tem volume e atua isoladamente. Isto será possível
se o processo de comercialização for realizado por organizações-
líderes (cooperativas de produtores, associações, agroindústrias,
empresas especializadas em comercialização etc.), quando o vo-
lume de produção individual não for suficiente ou diretamente pelo
produtor, quando o volume de produção individual for suficiente.
Além de a comercialização ser realizada pelas organiza-
ções-líderes, deve haver contrato de venda (qualidade, quantida-
de e condições de preço) entre cada organização e o seu receptor
final e entre as organizações e seus produtores.
As organizações-líderes estarão realizando a coordenação
de mercado e tornando as informações mais simétricas, porque é
de seu interesse. A ênfase é na gestão comercial. Concentra-se a
atenção na descoberta de negócios e na transmissão de sinais, de
preferências e de preços dos mercados finais, que são captados e
digeridos pelas organizações-líderes e destas fluem para os pro-
dutores que recebem os sinais de mercado decodificados. Assim,
podem produzir o que a demanda exige em termos de qualidade e
o que ela oferece como preços do mercado final.
Em resumo, a comercialização, que é baseada num siste-
ma de gestão comercial e tem como coordenadoras as organiza-
ções-líderes, apresenta o seguinte desenho:

126
FIGURA 5

PRODUTOR

Organizações-líderes
• cooperativas
• associações
• agroindústrias
• empresas de comercializa-
ção, etc.

Atacadista
Supermercado
Mercado externo

Vários sistemas de gestão comercial podem ser implemen-


tados (alguns desses sistemas estão descritos no ANEXO 8.3
deste relatório e refletem a experiência do Chile, EUA, França,
Espanha), na medida em que se elevam as produções, amadure-
cem e se consolidam as formas de organizações. Pode-se chegar
à forma mais avançada, na qual cada organização tem uma fun-
ção específica (ex.: uma organização só processa e embala), é
ligada a outra com funções próprias, complementares e especiali-
zadas (ex.: organização para venda no mercado externo).
À medida que se eleva a escala de produção, emergem as
organizações mais especializadas – dentro do princípio universal
da divisão do trabalho. Da mesma forma, elas passam a associar-
se de modo a operar eficientemente, mesmo que em grande esca-
la. As associações de organizações e, sobretudo, o estabeleci-
mento de formas de confiança mútua (confiabilidade solidária no
negócio) são importantes por duas razões: a) melhoram as condi-
ções de arbitragem nas negociações de preços; b) minimizam o
problema de ineficiência do sistema judiciário, que é o principal

127
óbice no caminho da implantação de um regime de contratos ca-
paz de ser devidamente respeitado.
A complexidade da organização cresce com o nível de
competição do mercado e à medida que aumenta o volume das
safras. Esta dinâmica merece atenção especial porque, ao passo
que se intensifica a competição, cresce também a necessidade de
harmonização de interesses entre os segmentos da cadeia, a fim
de facilitar negócios e, ainda, evitar o rompimento do tecido orga-
nizacional, em conseqüência de conflitos que nascem do inevitá-
vel e duro embate que as disputas de preços e de condições de
pagamento trazem.
À medida que aumentam a escala de produção e a compe-
tição no mercado final, crescem também os riscos e a necessida-
de de financiamentos, dentro de escalas técnicas e financeiras
compatíveis.
Deverá crescer muito a necessidade de processamento e
industrialização, requerendo a presença de empresas de grande
porte que operem em escalas compatíveis com o potencial de
produção, induzindo novos patamares de escala de produção. A
fim de manter o poder de mercado das grandes firmas longe de
níveis críticos que sacrificam os agricultores, a competência de re-
gulação do Governo tem de acompanhar a evolução do mercado.
Finalmente, como a produção tem potencial de crescer
mais que a demanda, as oportunidades do mercado externo pas-
sam a merecer atenção muito especial. Novas formas de organi-
zação deverão ser, para tanto, concebidas, de modo a atender às
exigências do mercado externo e para podermos nele competir
com sucesso.
Desse modo, os sinais indicam descentralização e
especialização crescentes, necessidade de coordenação, entre os
diversos agentes, das funções e dos processos de produção,
como: colheita, preparo e embalagem, logística de distribuição
física, processamento e prestação de serviços necessários ao
agronegócio da irrigação.

128
A implantação de sistemas de gestão comercial significa
mais coordenação de mercado e simetria no fluxo de informações,
a fim de diminuir o risco da atividade de agricultura irrigada. E pa-
ra que se aprimore a coordenação de mercado, é necessário que
o Governo invista na divulgação dessas idéias junto aos produto-
res e suas organizações, discutindo suas vantagens e desvanta-
gens, em seminários, divulgando material informativo, operaciona-
lizando em vários países contatos com representações de produ-
tores, capacitação de técnicos, gerenciamento da produção e in-
tercâmbio de experiências, entre outras ações.

6.3.2 - Estratégias de mercado

Neste capítulo, descrevem-se o mercado interno para um


projeto (perímetro ou região) e as atividades que devem ser esti-
muladas pelo Governo, embora de competência da iniciativa pri-
vada, ou seja, do seu agronegócio.

♦ Fundamentos
• Empresas, produtores, suas associações e cooperativas
comercializam, prioritariamente, diretamente com o sis-
tema varejista, com ênfase nos supermercados e vare-
jões. Em conseqüência, apropriam-se de margens, hoje
distribuídas pelos diversos atores da cadeia produção-
consumo.
• Pesquisa é um investimento muito lucrativo.
• A associação dos produtores é fundamental à obtenção
de ganhos de escala, os quais assegurem custos com-
petitivos.
• Caso a associação não seja possível, a opção são as
empresas de comercialização que já possuam tradição
no mercado.
• Profissionalismo é fundamental para o sucesso.

129
♦ Fases da Estratégia
FASE 1 – Conhecimento do mercado
1. Identificar e dimensionar as principais cidades que es-
tão dentro de raios de influência da região produtora.
Cidades maiores significam mercados maiores.
2. Pesquisar características da população, como: número
de habitantes, renda, escolaridade, faixa etária.
3. Identificar existência de Ceasas, sua dimensão, ori-
gem dos produtos comercializados. Obter informações
no departamento técnico das Ceasas. As informações
do atacado são referenciais importantes para os pre-
ços do varejo.
4. Identificar existência de redes de supermercados ou
de associação entre as lojas pequenas e médias e de
suas plataformas de compra. Se necessário, entrar em
contato com uma associação de supermercados, seja
ela estadual, seja local.
5. Dimensionar supermercados e varejões, levando em
consideração o número de lojas, número de caixas re-
gistradoras por loja, faturamento estimado, origem dos
produtos adquiridos.
6. Pesquisar, diretamente nas lojas, aspectos como tipos
de produtos comercializados, volumes de compras
semanais, variedades, classificação, ponto de matura-
ção, formas de exposição e embalagens, existência de
área de frio para armazenagem e exposição.
7. Pesquisar preços dos produtos por tipos; comparar
preços de produtos a granel com os embalados e os
pré-processados.
8. Pesquisar com os compradores das centrais de com-
pra, das plataformas de compra ou das lojas centrais
de redes a forma de aquisição dos produtos, no que
se refere à classificação, às embalagens, aos dias,

130
locais e horários de entrega, aos prazos e às formas
de pagamento.
9. Verificar exigências dos compradores para acesso às
lojas, tais como, pedágios (agrados, caixinhas etc.),
bonificações e volumes adicionais a título de promo-
ções, pagamento de produtores. Não esquecer das e-
xigências de promoções que se realizam em datas,
como: Dia das Mães, dos Pais, aniversário das lo-
jas/redes, Natal, Ano-Novo, entre tantos outros. Claro
está que estas despesas são custos que devem ser
apropriados aos custos finais.
10. Comparar as condições de compra das diversas re-
des/lojas. Negociar, de forma clara e objetiva, definin-
do as responsabilidades e os direitos de ambas as
partes. Embora seja difícil a formalização de contratos
de compra, deve-se buscar a melhor maneira de for-
malizar a venda.
11. Os contratos, principalmente os internacionais, devem
ser adaptados às condições e à legislação brasileira.
FASE 2 – Planejamento da produção
1. As informações coletadas permitem planejar a produ-
ção, de modo a atender às condições do(s) negócio(s)
fechado(s), nas condições pactuadas.
2. Planejar a produção de acordo com as exigências do
mercado e do “negócio” já pactuado, em relação a vo-
lumes, classificação, embalagens, pontos de colhei-
ta/maturação, aplicação de defensivos, periodicidade
da colheita e da entrega, criação de marca, entre tan-
tos outros aspectos.
3. As embalagens devem, também, ser definidas em fun-
ção da possível paletização, das exigências dos arma-
zéns, dos caminhões e das plataformas de embar-
que/desembarque, levando-se em consideração todo o
canal até o varejo. A paletização promove a diminui-
ção dos custos de movimentação e de frete das diver-

131
sas etapas da comercialização até o consumidor final,
além de permitir a automação de todo o processo de
carga/descarga.
4. Atenção para a Portaria n.º 127, de 04.10.91, do Minis-
tério da Agricultura (MA), que orienta a utilização de
embalagens em dimensões que permitem a paletiza-
ção das cargas.
5. Verificar os custos de acondicionar os produtos ou de
pré-processá-los (picar, fatiar, resfriar, congelar) em
embalagens de varejo. Comparar com os preços de
mercado e verificar se os custos destes processos, in-
cluindo máquinas, equipamentos, mão-de-obra, são
economicamente viáveis. Procurar apoio técnico de
especialistas em processos agroindustriais.
6. Manter acompanhamento da evolução dos preços dos
produtos negociados na(s) rede(s) com a(s) qual (is) o
“negócio foi fechado” e em seus concorrentes.
7. Criar marca própria que identifique e individualize o
produto. Definir classificação, ponto de colheita e em-
balagens. “Ter coragem de colocar endereço e data da
colheita” no rótulo da marca.
8. Definida a marca, preparar um plano de marketing pa-
ra divulgação de suas características, as quais a indi-
vidualizam e mostram que ela é diferente das concor-
rentes. Preparar estratégias para a inserção da marca
no mercado, como: promoções, degustações etc. Man-
ter a qualidade é a base do sucesso. Defender a mar-
ca é importante para a manutenção do mercado.
9. A garantia de que a marca seja única (e respeitada) no
mercado, registrada no Instituto de Propriedade Indus-
trial (Inpi), vinculado ao Ministério do Desenvolvimento
da Indústria, e no Departamento de Comércio e Expor-
tação (MDICX). É possível o registro direto pelo inte-
ressado. Existem, contudo, empresas especializadas
em marcas e patentes, localizadas em todas as capi-
tais e principais cidades do País.

132
FASE 3 – Pós-colheita e logística de comercialização
1. Dimensionar as instalações de packing house, de mo-
do que sejam adequadas à produção. Quando o volu-
me de produção não justificar o custo de implantação
dos equipamentos, buscar associação com outros
produtores.
2. Prever estoques estratégicos que cubram as necessi-
dades do mercado. Se a distância for muito grande,
prover o armazenamento a frio, se técnica e economi-
camente viável. Todas estas estruturas devem prever
a paletização de cargas, de modo a permitir a automa-
ção e a conseqüente diminuição de custos.
3. Estudar estratégias de entrega da produção, segundo
roteiros mais econômicos. Escolher caminhão compa-
tível com os pedidos, de forma a aproveitar, ao máxi-
mo, o espaço de cargas. Volumes maiores permitem
entrega em caminhões maiores, tornando menor o
custo unitário do frete.
4. Zelar pela qualidade em todas as etapas: da produção
até a entrega dos produtos no destino final. O Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
(Sebrae) tem a capacidade de promover treinamento
em processos que consideram a qualidade total.
5. Manter os compromissos e respeitar as condições do
contrato. Em caso de problemas de produção, adotar
providências para que o contrato seja cumprido, inclu-
sive comprando produção de terceiros.
FASE 4 – Pós-venda
1. É comum que problemas de produção sejam identifi-
cados nas áreas de venda dos supermercados e vare-
jões. É a assistência, do tipo pós-venda, que permite
que eles sejam detectados e solucionados. O contato
direto com os repositores das lojas e com os consumi-
dores é interessante para a coleta de informações que
auxiliem o planejamento da produção.

133
2. Contato de retorno com o comprador também permite
avaliar a operação e coletar subsídios estratégicos pa-
ra a continuação do negócio.
6.3.3 - Sistema de informação de mercado

O desenvolvimento das áreas irrigadas está relacionado à


implementação de estratégias que visem melhorar o perfil geren-
cial dos tomadores de decisões, seja na produção, seja na comer-
cialização, induzindo-os a melhorar o processo decisório.
As diversas tentativas de correção de rumos visa-
ram à produção, com pouca ênfase no mercado, seja o
pós-colheita, seja a comercialização, e não têm, por isto,
surtido os efeitos esperados.
No entanto, estudos realizados indicam que produtores
“desinformados” e com níveis insuficientes de informações che-
gam a perder até 75% do valor de mercado de seus produtos e,
por isto, é enorme a perda de renda. Os reflexos desta perda são
devastadores.
Com a finalidade de fazer prosperar a irrigação, propõe-se
a criação de um sistema de informações, mediante a realização
de ações, voltadas à coleta, ao tratamento e à difusão de informa-
ções que são úteis para a tomada de decisões gerenciais, no âm-
bito dos agricultores e de suas organizações. Pretende-se, assim,
transformar as informações no “elemento-chave” do aumento da
capacidade de competir. Estas ações se desenvolvem, como de
resto na maior parte do mundo, pelo Governo, em articulação com
o setor privado.
♦ Fundamentos
• A exploração hidroagrícola como está não é compatível
com a estrutura física existente nas áreas irrigadas.
• A carência de informações, em diversos níveis, leva à
estagnação dos produtores e suas organizações.

134
• Um fluxo contínuo e consistente de informações promo-
ve mudanças que conduzem ao crescimento econômico
e ao aumento da competitividade.
• O sistema de informação consistente e eficiente apóia o
Governo e o setor privado na formulação de estratégias
e na tomada de decisões.
• A fruticultura, pela condição de elasticidade-renda e-
levada e pelo alto volume de renda e emprego gera-
dos, é um importante fator de formação de pólos de
desenvolvimento.
• Tornar disponíveis informações relacionadas a crédito,
assistência técnica, organização de produtores, defesa
fitossanitária, pesquisa agrícola, mercado, pós-colheita,
promoção e mercado, em geral, contribui para a viabili-
zação das áreas irrigadas.
♦ Operacionalização
O Ministério da Integração Nacional (MI), assim como o
Banco do Nordeste, a Embrapa, a Codevasp, no contexto do Novo
Modelo de Irrigação, construiu um acervo de informações que
cobre o mercado nacional e internacional em aspectos como:
atacado e varejo, importações e exportações. Produz estatísticas
da produção e comércio nacional e mundial. Abrange pós-
colheita e produção. As informações consubstanciadas num
banco de dados constituirão o “Núcleo Central” do “Sistema de
Informação de Mercado”.
A utilização deste acervo de informações contribuirá para a
alteração do perfil gerencial de projetos de irrigação a partir da
coleta, análise e divulgação de um conjunto de informações que
serão difundidas mediante “Plataformas de Informação”.
A seleção do espaço geográfico de atuação ocorrerá a par-
tir de contatos técnicos entre MI e instituições federais, estatais ou
municipais. Entretanto, será dada prioridade aos pólos agroindus-
triais do Nordeste e que já vêm sendo motivo de estudo pelo Ban-
co do Nordeste.

135
As ações serão desenvolvidas por intermédio de multipli-
cadores selecionados em função da potencialidade de respostas
positivas das instituições envolvidas: associação de produtores,
perímetros irrigados e distritos de irrigação.
A preparação dos multiplicadores dar-se-á pelos cursos de
capacitação, a partir dos quais serão transferidos conhecimentos
de mercado, comercialização e pós-colheita, entre outros, que
lhes permitam contribuir para a alteração do processo de gestão
da(s) entidade(s) que representa(m), tornando-as mais competiti-
vas agrícola e economicamente.
A partir deste trabalho, serão indicadas pelos participantes
alternativas de solução para pontos de estrangulamento eventu-
almente encontrados, visando melhorar a competitividade agrícola
e econômica dos perímetros, inserindo-se, de forma eficiente, no
sistema de mercado.
Com a capacitação, os participantes tornar-se-ão capazes
de receber informações do Sistema de Informação de Mercado
ora apresentado, analisá-las e tomar decisões gerenciais a partir
delas. Em contrapartida, tornar-se-ão fontes de informação para o
mesmo Sistema, alimentando-o com dados da região produtora na
qual atuam.
Entre as informações de relevo para os irrigantes,
destacam-se:
• série histórica de dados de mercado;
• gráficos de comportamento;
• análises conjunturais;
• análises conjunturais da produção;
• análise prospectiva de mercado selecionados;
• boletins periódicos, com análise de mercado de frutas
selecionadas (FrutiSéries);
• revistas analíticas sobre mercados específicos (Fruti-
Fatos);

136
• técnicas de produção e pós-colheita;
• oportunidades comerciais do atacado e do varejo.
Alimentam o banco de dados, informações como:
• área plantada por espécie e variedade;
• evolução da produção: volume, épocas, eventuais pro-
blemas que venham alterar, para mais ou para menos,
a safra;
• evolução de preços ao produtor;
• custos de produção;
• logística da comercialização;
• compradores;
• frete: disponibilidade e preços;
• embalagem: tipo do material, preços, origem;
• armazenagem ao ambiente e a frio; localização, capaci-
dade, preços, disponibilidade;
• infra-estrutura pós-colheita: disponibilidade e capacida-
de de equipamentos de classificação, produtos;
• agroindústria: localização, capacidade, origem dos pro-
dutos com os quais trabalha, produção e destino da
produção, preços de aquisição, dentre outros;
• outros.
As plataformas de informação serão localizadas nos pólos
agroindustriais/distritos de irrigação, previamente selecionados. A
implantação dar-se-á via instalação de “sistemas pilotos”, constitu-
ídos de infra-estrutura física e de pessoal. Compõem a equipe um
técnico de nível superior, um técnico de nível médio, sala, micro-
computador, incluindo-se software, demais equipamentos, linha
telefônica e ligação a um provedor Internet. Em locais onde não

137
for possível a instalação de acesso à Internet, as informações po-
derão fluir via fax.
A operacionalização das plataformas ocorrerá mediante a
cooperação entre o IMinistério da Integração Nacional e a entida-
de receptora da unidade, consubstanciada num “contrato de reci-
procidade de informações”, no qual estará definida a atribuição
das partes.
Cabe à instituição receptora a cessão do local, pessoal e
manutenção dos equipamentos, alimentação do sistema com in-
formações locais e regionais. É da responsabilidade do Ministério
da Integração Nacional o provimento dos equipamentos de infor-
mática, treinamento, manutenção de fluxo de informação contínuo
e a supervisão dos trabalhos a serem desenvolvidos.
♦ Interação com Outras Instituições

Pela diversidade de ações, o sistema de informações,


constituído de plataformas, requer a troca sistemática de informa-
ções, envolvendo diversas instituições, como:
• Banco do Nordeste, Codevasf e Dnocs
Contribuir na seleção e prioridade de pólos, treinamento do
público-alvo, fornecimento de informações sobre áreas irrigadas,
levantamentos de produção, entre outros.
• Ministério da Agricultura e Abastecimento
A Secretaria de Desenvolvimento Regional cuidará do in-
tercâmbio de informações técnicas, do Programa Apoio ao De-
senvolvimento da Fruticultura Irrigada do Nordeste (Padfin). São
responsabilidades da Secretaria de Defesa Vegetal as barreiras
fitossanitárias, registro de defensivos, normas e padrões.
Embrapa - pesquisar e ajudar a difusão tecnológica em as-
pectos, como: novos cultivos e cultivares, manejo solo-água-
planta, tratos culturais, ponto de colheita, tratamentos pós-
colheita, armazenagem e análise econômica.
• Ministério das Relações Exteriores (MRE)

138
Informações sobre mercado internacional e oportunidades
comerciais, relacionamento com as embaixadas brasileiras, conta-
tos comerciais, apoio em feiras e exposições.
Apoio a estratégias de marketing de produtos brasileiros no
exterior.
• Ministério do Desenvolvimento da Indústria, do Comér-
cio e das Exportações.
Dados sobre exportação e importação.
Acesso de produtores ao processo de exportação, incluin-
do questões de ordem burocrática e de apoio financeiro à expor-
tação. Simplificação de normas de exportações.
• Secretarias estaduais e municipais de agricultura e irri-
gação – Contribuem para a implementação das plata-
formas de informação.
Selecionar áreas, priorizar implantação, em conjunto com
produtores e suas entidades.
Participar de processos de capacitação.
Articular-se com os distritos de irrigação, associações e
cooperativas ou com entidades que representam produtores, em-
presas-âncoras, entidades tecnológicas, entre outras.
• Ceasas/Atacadistas – fornecedor de dados de atacado.
• Distritos de irrigação e empresas, empresas-âncoras,
associações, cooperativas e entidades tecnológicas.
• Usuários das informações.
• Informações sobre as condições de produção, safras,
disponibilidade de transporte, insumos e outras condi-
ções de interesse do “sistema de informação”.
• Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equi-
pamentos (Abimaq) – fornece informações sobre dispo-
nibilidade, preços e tecnologias de irrigação,

139
• Bancos – informar as linhas e a disponibilidade de crédi-
to, condições de financiamentos, taxas de juros, garan-
tias. Acelerar a troca de informações cadastrais para e-
feito de financiamentos.
• Sebrae – apoiar as estratégias de ampliação de merca-
dos, inclusive do mercado externo, pelo Programa A-
gência de Promoção de Exportações (Apex), e capacitar
os empresários no que diz respeito à gestão e estraté-
gias de negócios.

6.3.4 - Sistema de informação tecnológica

A Embrapa coordena o Sistema Nacional de Pesquisa A-


gropecuária (SNPA). Com base nas informações de pesquisas,
nas observações dos vários sistemas de produção utilizados ao
nível regional e na análise econômica das tecnologias geradas, o
Governo deve organizar e disponibilizar, para cada pólo de irriga-
ção, sistemas de produção (“pacote tecnológico”), contendo, entre
outras, informações para cada cultura:
• cultivares, sua aceitação e compatibilidade com as exi-
gências de mercado;
• população de plantas/ha;
• adubação e correção de solos;
• indução foral;
• controle de pragas e doenças;
• formas de condução da cultura;
• tratos culturais;
• manejo da irrigação (como, quanto e quando irrigar);
• aspectos de colheita, armazenagem, embalagem etc.
Os sistemas de produção devem ser complementados
com planilhas de quantitativos e expectativa de produtividade, vida
útil da cultura, índices de produtividade física e econômica. Além
disso, devem disponibilizar informações sobre os trabalhos que

140
vêm sendo desenvolvidos para cada região, principalmente aque-
les demandados pelos produtores.

6.4 - Serviços de Apoio

A implementação bem-sucedida da nova política de irri-


gação exige a criação de um sistema de serviço de apoio que faci-
lite, ainda mais, a participação privada no negócio da irrigação
(entendido nos aspectos de mercado, comercialização, agroindús-
tria, implantação de projetos privados, participação nos projetos
mistos). E, ademais, crie condições para os pequenos produto-
res irrigantes dos projetos públicos se desenvolverem. Quanto
aos pólos de irrigação do Nordeste, é importante terem acesso
à caracterização específica do mercado, em aspectos como:
certificação de origem, certificação de qualidade e programação
da produção.
Discute-se um conjunto de serviços de apoio que devem
ser implementados ou assegurados por ações governamentais es-
pecíficas a cada pólo de irrigação, buscando dar-lhes competitivi-
dade. Trata-se dos serviços de plataforma de informações, assis-
tência técnica e gerenciamento da produção, pesquisa e desenvol-
vimento, capacitação em gestão e gerenciamento ambiental.

6.4.1 - Plataforma de informações

A plataforma de informações, em cada pólo de irrigação


do Nordeste, objetiva proporcionar, como em vários países, o a-
cesso dos diversos atores às informações técnicas e gerenciais
que subsidiam a iniciativa privada em tipos de decisões, como: a
implantação de agroindústria, de empresa exportadora e de proje-
to privado de irrigação. As informações, ainda, ajudam-lhe a deci-
dir sobre a aquisição de área, em projeto público, para atender a
determinado tipo de demanda e a decidir sobre os projetos mistos.
As informações devem ser detalhadas para permitirem avaliar os
riscos associados e a atratividade de qualquer empreendimento.
A plataforma permitirá que se possa transmitir aos peque-
nos produtores, em projetos públicos ou não, as formas mais con-
venientes de tecnologia e de organização da produção.

141
A plataforma de informação deverá estar na Internet e utili-
zar formas variadas de divulgação. Precisa ser constituída em
cada pólo de irrigação e conter, no mínimo:
- Informações básicas, relacionadas à climatologia, à
hidrologia e aos solos, à pré-viabilidade de projetos, à
caracterização ambiente, à disponibilidade de infra-
estrutura de escoamento, à saúde, à educação e às
barreiras fitossanitárias, entre outros.
- Informações tecnológicas, relacionadas às culturas
potenciais da região, conforme o item 5.3.4 do capítulo 5.
- Informações de mercado, relacionadas à série históri-
ca de dados de mercado das culturas, potencialmente
descritas nas informações tecnológicas, conforme cita-
dos no item 6.3.3 do capítulo 6.
- Informações gerenciais, neste bloco deve conter:
• área irrigada, pública e privada; características dos
projetos públicos, como: área, tipo de irrigante, custo
de tarifa de água, custo da recuperação do investi-
mento, volume de água utilizada por mês etc.
• produção por cultura nos últimos anos.
• condições e normas de exportação.
• organização da produção: tipo da organização de
compra e venda, agroindústria etc.
• agentes financeiros, linhas de crédito e suas condi-
ções, ou seja, o manual de crédito para agricultura
irrigada.
6.4.2 - Assistência técnica/gerenciamento da produção

Como visto no Relatório do Estado da Arte da Irrigação,


nos seis pólos de irrigação do Nordeste analisados, os pequenos
produtores, vinculados aos projetos públicos de irrigação de res-
ponsabilidade da Codevasf, recebem apoio financeiro e treina-
mento de um programa de assistência técnica, com diretrizes,

142
estratégias e busca de resultados. Não é, porém, o mesmo, o pro-
cedimento do Dnocs.
Quanto aos médios e grandes irrigantes, quer em projeto
público, quer em propriedades privadas, a assistência técnica é de
empresas privadas ou de profissionais autônomos.
Nos projetos públicos (para pequenos, médios ou gran-
des irrigantes) ou em propriedades privadas, o trabalho de assis-
tência técnica dá ênfase maior aos aspectos de produção, restrin-
ge-se aos limites da propriedade e pouco se envolve em interes-
ses do agronegócio. Ora, isto está na contramão da modernidade
e, portanto, não convém à agricultura competitiva que se deseja
ver predominar no País.
Quanto aos médios e grandes irrigantes, quer em projeto
público, quer em propriedades privadas, a assistência técnica é da
sua responsabilidade.
O Governo deve ajudar no treinamento da assistência téc-
nica particular, em áreas como gestão, comércio e promoção de
exportações. Deve, ademais, disponibilizar as informações técnicas
geradas ou identificadas pela pesquisa, incluindo-se, entre elas, as
de formação de preço e qualidade exigidas pelo consumidor.
Com relação aos empreendedores familiares (pequenos ir-
rigantes), o Governo deve participar do gerenciamento da produ-
ção, mediante equipe especializada que contemple os seguintes
pontos:
(i) ações voltadas à organização da produção que visem
mercado e qualidade;
(ii) ações que objetivem ensinar a negociar a compra de
insumos e a venda de produtos;
(iii) ações que visam esclarecer conceitos, como: custo de
produção, formação de preço de produtos, estrutura-
ção de marca e estratégias de venda de produtos in
natura ou agroindustrializados, ao nível de família ou
de organização de pequenos produtores.
Entende-se que o procedimento de gerenciamento da pro-
dução, e não apenas assistência técnica, permite aos empreen-
143
dedores familiares ou a pequenos irrigantes condições de compe-
titividade, numa agricultura cada vez mais dependente de produti-
vidade e qualidade e voltada para o mercado.
A estratégia proposta, como ocorre na agricultura em ou-
tros países, vale-se da participação e ajuda de organizações es-
pecializadas, mas de escopo mais amplo que a agricultura, como
o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), o Sebrae e a
plataforma de informações.

6.4.3 - Pesquisa e desenvolvimento (P&D)

No Relatório do Estado da Arte da Irrigação, a pesquisa


agrícola para a agricultura irrigada foi abordada como conceito e
como está organizada. As informações são de 1999. Abrangem
seis pólos de irrigação do Nordeste, norte de Minas e onze países.
Além disto, obteve-se, em seminários, com 243 participantes, reu-
niões e contatos individuais, a opinião de uma amostra significati-
va do público da agricultura irrigada sobre P&D.
Os principais pontos são os seguintes:
(i) As instituições de pesquisa agropecuária da região
(como as unidades da Embrapa, as empresas e os
institutos estaduais de pesquisa agrícola e as faculda-
des de Agronomia) estiveram, até recentemente,
estruturadas para fazer investigação com explorações
agrícolas sob regime de sequeiro. É verdade que es-
tão mudando para estudar os problemas da agricultura
irrigada, mas, ainda, lentamente.
(ii) Como problemas de pesquisa, destacam-se: criação
de cultivares, práticas de irrigação e de cultivo, pro-
blemas de pós-colheita, doenças e pragas, análise e-
conômica de tecnologias, do crédito rural, de preços e
das exportações.
(iii) A demanda de tecnologias cresce a taxas muito ele-
vadas, e as importações de tecnologias têm sido muito
freqüentes, sem as necessárias adaptações. Elas,

144
contudo, se manifestaram importantes na moderniza-
ção da agricultura irrigada.
(iv) A fim de reduzir o enorme hiato que existe entre a de-
manda e a oferta de tecnologias, é preciso ampliar os
investimentos públicos na pesquisa, voltada para a a-
gricultura irrigada, estimular os investimentos da inicia-
tiva particular e orientar os irrigantes a tirar proveito da
tecnologia internacional.
Como conseqüência do estudo, propõe-se:
i) Identificar e definir de sistemas de produção (pacotes
tecnológicos), envolvendo atores regionais (produto-
res, inovadores, técnicos de assistência técnica, de
pesquisa), com base em informações regionais. De-
vem-se quantificar os custos e a rentabilidade.
ii) Utilizar a metodologia de prospecção para determinar
a demanda de pesquisa, a qual se vale de seminários
temáticos regionais que envolvem a participação de
representantes dos elos do agronegócio da agricultura
irrigada, para levantar os problemas de pesquisa e es-
tratégias de solução e de financiamento. Entre os re-
presentantes estão produtores, técnicos, vendedores
de máquinas e equipamentos, fornecedores de energi-
a, distribuidores de sementes e mudas, vendedores de
insumos diversos, agroindústrias, atacadistas, consu-
midores. Nos seminários definem-se as prioridades, as
linhas de pesquisa, a atividade de difusão, a transfe-
rência, as ações governamentais, institucionais e pri-
vadas, a forma de co-financiamento de projetos, sob
encomenda específica. Essa metodologia vem sendo
aplicada, ainda de forma acanhada no Nordeste e nor-
te de Minas, porém é de uso crescente no mundo de-
senvolvido, onde, além dos pesquisadores, há forte
participação de membros do agronegócio. A metodo-
logia tem forte apelo à participação dos clientes na de-
finição dos problemas de pesquisa e não quer limitar
nem a intuição, nem a criatividade dos pesquisadores

145
No ANEXO 8.5 deste relatório tem-se mais detalhe da
proposta de atuação do serviço de apoio em pesquisa e desen-
volvimento.

6.4.4 - Programa de capacitação em gestão

A agricultura necessita dar sustentação econômica e


ambiental aos projetos de irrigação, quer públicos, quer privados.
Assim sendo, requer um nível elevado de profissionalização e a
maximização da eficiência de uso de todos os insumos e servi-
ços. Por isto, a nova política de irrigação não pode fugir à res-
ponsabilidade de apoiar um programa de capacitação em gestão
adaptado às características regionais. O Serviço Nacional de
Aprendizagem Rural (Senar) e o Serviço de Apoio às Micros e
Pequenas Empresas (Sebrae) podem organizá-los e, mesmo,
patrociná-los, tendo como público os atores do negócio.
O programa de capacitação deverá levar em consideração
o tipo de público envolvido, como os pequenos irrigantes e empre-
sários, cabendo subsídio para o primeiro grupo.
O currículo do programa de capacitação em gestão,
sempre com enfoque na cadeia produtiva, deverá conter, no mí-
nimo, os seguintes temas:
(i) contabilidade de custo;
(ii) formação de preço;
(iii) administração de organizações de usuários, voltadas
para comercialização;
(iv) qualidade de produto;
(v) organizações de usuários voltadas para operação e
manutenção de projetos de irrigação;
(vi) mudança comportamental.

6.4.5 - Serviços de gerenciamento ambiental

146
A crescente exigência de qualidade dos produtos agríco-
las, no mercado interno e externo, exige a utilização de selos de
origem, como controle de qualidade.
Competir significa produzir mais barato que os concorren-
tes, atender aos desejos dos consumidores e preservar o meio
ambiente. Procedimentos de controle ambiental dão sustentação à
qualidade e, conseqüentemente, aos selos de origem. Por isto, é
importante implantar nos projetos públicos de irrigação um siste-
ma de gerenciamento ambiental que observe as diretrizes do
Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente (Rima), monitore,
entre outros, a qualidade de água, a utilização de defensivos
(quantidade e tipo) e a disposição adequada do lixo (agrotóxico e
residencial), além de realizar trabalho educativo sobre as ques-
tões ambientais.

6.5 - Mecanismos Econômico-Financeiros

A agricultura irrigada compreende: (i) aquela de responsa-


bilidade exclusiva do setor privado e engloba desde áreas irriga-
das pequenas, com menos de 4 hectares, até áreas acima de
1.000 hectares; (ii) aquela em que o setor público constrói a infra-
estrutura de irrigação de uso coletivo e social, assenta irrigantes e
procura criar condições para o êxito da atividade
A nova legislação propõe também projeto misto em que o
poder público poderá juntar-se à iniciativa particular num empre-
endimento de irrigação, sendo sua participação acionária limitada
a até 49%.
Doravante, serão utilizados os termos projetos priva-
dos, projetos públicos e projetos mistos para designar estas
três modalidades.
Convém observar que o investimento direto do Governo no
projeto público, quando ele atingir a maturidade, representa uma
parte pequena do investimento total. Certamente, o custo da água é
menor que 5% das vendas de produtos, incluindo-se a venda de
industrializados, num projeto em plena carga. Admitindo-se propor-
cionalidade entre o fluxo de gastos e o investimento total, a relação
de investimento – Governo e setor privado – é menor que 0,2, ou

147
seja, de 1 para 5: R$ 1,00 do Governo para R$ 5,00 da iniciativa
particular. Sendo assim, mesmo nos projetos públicos o financia-
mento da iniciativa particular é de suma importância. Contudo, o
investimento público é fundamental, porque gera a infra-estrutura
de irrigação, sem a qual o setor privado não poderia operar.
Compete ao setor privado financiar os projetos mistos e
privados. Criam-se condições para que este setor se interesse em
financiar também os projetos públicos. Uma seção será dedicada
a este assunto.
No que diz respeito à agricultura irrigada e, mesmo, à agri-
cultura em geral, o crédito do Governo é o principal instrumento de
financiamento dos projetos privados e daquilo que compete à ini-
ciativa particular nos projetos públicos. Nestes, o Governo ainda
financia a parte que lhe cabe: elaboração de projeto, desapropria-
ção da área, construção da infra-estrutura de uso comum, estrada,
rede elétrica, assentamento de irrigantes, implantação e desen-
volvimento do distrito de irrigação e supervisão de sua ação.
Outra fonte importante de financiamento são os recursos
próprios existentes na época da implantação do projeto e gerados
a partir daí. Formas mais sofisticadas de financiamento não têm
sido ainda utilizadas. Faremos uma revisão delas, a fim de indicar
as condições que devem ser criadas para se tomar uma via adi-
cional de financiamento da irrigação.

6.5.1 - Fontes e mecanismos de financiamento

O financiamento da irrigação ocorre para implantação da


infra-estrutura de irrigação, de uso coletivo ou individual, da infra-
estrutura parcelar de irrigação, para a implantação da agricultura
(formação de cultura perene, ex.: fruticultura, custeio anual de
produção), para a implantação de agroindústrias e de organiza-
ções voltadas à área de comercialização (ex.: cooperativa de pro-
dutores, empresas especializadas etc.)
Neste capítulo, serão discutidos a fonte e os mecanismos
para o financiamento ao produtor ou à sua organização e para a
infra-estrutura de uso coletivo nos projetos públicos de irrigação.

148
♦ Crédito Rural

Do ponto de vista da recuperação de custos, é crucial


que os projetos públicos atinjam a maturidade no menor espaço
de tempo possível. Três fatores têm impedido que isto ocorra: (i)
demora do Governo em concluir as obras, selecionar e assentar
os irrigantes. A razão é o constante contingenciamento de recur-
sos por parte do Ministério da Fazenda, obrigando o Governo a
postergar investimentos; (ii) má seleção de irrigantes, tanto do
ponto de vista de capital humano, quanto de possuir o mínimo de
recursos próprios exigidos para a empreitada, já que a agricultura
irrigada é uma atividade capital intensiva e, finalmente, (iii) as
normas de crédito rural do Banco Central, que exigem um nível
exagerado de garantias, o que contribuiu para que a oferta de
crédito seja deficiente quanto a montante e prazo.
A) Funções do crédito
Vale a pena relembrar as seguintes funções clássicas do
crédito rural:
1. antecipar recursos, que demandariam muito tempo para
serem obtidos via poupança;
2. aumentar a segurança dos atores quanto à realização
dos investimentos;
3. criar uma “cultura” de confiabilidade entre os bancos, os
produtores e as empresas;
4. valorizar a tecnologia e a sua difusão;
5. estimular inovações na área empresarial, tais como:
empresas dedicadas à avaliação de cadastros, análise
de mercado etc.;
6. estimular o crédito condicionado às questões de comer-
cialização (notadamente qualidade);
7. estimular a criação de “certificação de origem”, com
controle de qualidade, em áreas como sanidade vege-
tal e animal.

149
B) Acesso ao crédito bancário
As normas de crédito, para as várias fontes disponíveis,
precisam ajustar-se às peculiaridades da irrigação, quanto a mon-
tante, prazos, juros, oportunidade e garantias.
As exigências de garantia e contrapartida de recursos pró-
prios que os bancos fazem têm como objetivo reduzir o risco de
inadimplência, inerente a toda operação de crédito. Os adminis-
tradores dos bancos têm de prestar conta dos seus atos aos seus
acionistas, ao acionista majoritário e zelar pela segurança dos
recursos captados junto ao público.
Numa operação de crédito está implícita a possibilidade de
o produtor-irrigante ou de a empresa mutuária não honrar as obri-
gações. As garantias reduzem o risco de inadimplência, tendo em
vista as penalidades previstas no contrato de financiamento. Esta
redução do risco de perda permite que o mercado opere com ta-
xas menores de juros. A contrapartida reduz o montante do em-
préstimo e fornece informações objetivas sobre a competência, no
ramo de negócios, de quem quer tomar crédito. Tem o mesmo
efeito sobre a taxa de juros das garantias. Na mesma linha, está a
análise de cadastro.
Resoluções específicas do Conselho Monetário Nacional
(CMN) e a ação fiscalizadora do Banco Central, que visam prote-
ger a instituição de crédito e o interesse dos depositantes, estabe-
lecem normas sobre garantias e recursos próprios.
A Resolução CMN n.º 394 estabelece, por exemplo, que as
operações de crédito dos bancos de desenvolvimento devem ser
asseguradas, isolada ou cumulativamente, por garantias reais,
alienação fiduciária, aval, fiança, além de outras formas, tais co-
mo: vinculação de recursos, como reserva irrevogável de formas
de pagamento, provenientes de cobrança de impostos, taxas, so-
bretaxas, rendas ou contribuições de qualquer espécie e outras
garantias. Trata-se de medidas cautelares para assegurar que os
“fundos de crédito” sejam sustentáveis, ou seja, para que o futuro
não seja comprometido pelo presente. As garantias reais devem
corresponder, no mínimo, a 125% do valor do financiamento. Se a
garantia real for insuficiente para a cobertura do valor total da ope-
ração à data da assinatura do contrato, pode-se admitir seu au-
150
mento progressivo na vigência do contrato, desde que, no curso
da execução do empreendimento, seja mantido o percentual mí-
nimo de 125%. Finalmente, só se admite fiança ou aval de pessoa
física ou jurídica, quando ela estiver em situação econômico-
financeira e patrimonial que lhe outorgue a qualificação de “notória
solvência” (Brasil, 1976).
A Resolução CMN n.º 18 determina que, na realização de
operações de financiamento de capital fixo, os bancos múltiplos,
com carteira de investimento, e os bancos de investimento devem
observar que os recursos fornecidos são complementares aos do
mutuário, que fará sempre investimento próprio em cada projeto,
conservando adequada proporção entre o seu capital e o valor
mutuado (Brasil, 1966).
Entretanto, a exigência de garantias e de contrapartida de
recursos próprios são fatores restritivos ao acesso ao crédito de
um número considerável de produtores-irrigantes, empresas pe-
quenas e médias, considerando-se o baixo índice de capitalização
dos recursos. As informações sobre o seu desempenho como
mutuários são inexistentes ou de pouca relevância, o que aumen-
ta as desconfianças do agente financiador, que acaba exigindo
garantias superiores ao mínimo legal.
No caso das empresas, nos financiamentos de curto prazo,
para capital de giro, as garantias exigidas são nota promissória,
aval, o próprio título mais aval (no caso de desconto de duplicatas
ou de notas promissórias) e, em alguns casos, alienação fiduciária
e outras garantias. Os financiamentos do processamento e da
industrialização são dificultados por esta sistemática – muito em-
bora, como se tenha demonstrado acima, haja razões econômicas
sólidas, num mundo de incertezas, para as exigências de con-
trapartidas e garantias. Nos projetos de médio e grande portes, a
exigência de aporte de recursos próprios pode superar o
montante de 30% do investimento total.
A cooperação entre as microempresas vem sendo utiliza-
da para melhorar o acesso ao crédito. A cooperação em termos
de garantias mútuas (avais recíprocos) permite o acesso ao crédi-
to de pequenos empreendedores que, de outra forma, poderiam
ficar à margem do crédito formal. Estas formas de “associação ou

151
de assunção solidária de passivos” minimizam os problemas que
as garantias e as contrapartidas trazem. Um sistema inovador que
facilita o acesso ao crédito é o fundo de aval, que vem sendo pra-
ticado na região pelo Banco do Nordeste.
Três questões importantes permeiam o crédito formal. Uma
delas é a preferência dos agentes financeiros, sobretudo privados,
por empreendedores de baixo risco. Essa preferência deixa de lado
os pequenos empreendedores e os que estão entrando no negócio.
Trata-se de seleção adversa, adverse selection. A outra questão é
a possibilidade de o futuro mutuário ser moralmente desqualificado
ou mal-intencionado, ou seja, na literatura inglesa, trata-se do moral
hazard problem. E, finalmente, vem a questão da assimetria de
informação, pela qual o agente financiador sabe mais que o mutuá-
rio e não partilha a informação. Pode também ocorrer o inverso, o
que aumenta o risco da operação. Tudo isto é conseqüência de um
mundo de incertezas que se reflete em maiores taxas de juros, ga-
rantias exageradas e exigências de contrapartida.
Os sistemas de joint liability (associação solidária de posi-
ção passiva), linhas de financiamento para a agricultura familiar e
os fundos de capital de risco locais resolvem estes problemas de
risco, sem as exigências de garantias e contrapartidas exagera-
das, que restringem o acesso dos produtores ao crédito.
O acesso ao crédito pode ser melhorado em função das
seguintes providências:
1. há um amplo reconhecimento de que a administração
eficaz do crédito depende da redução dos custos de
transação, para tomadores e instituições prestamistas.
Neste sentido, reforços nas linhas de unidades móveis e
unidades recebedoras de propostas ou iniciativas nesta
linha são essenciais;
2. outro ponto diz respeito às medidas de capacitação pa-
ra a gestão do crédito destinado à irrigação, área que
não deve ficar de fora do esforço de reestruturação da
atividade. Nesta área, não só a capacitação dos qua-
dros operacionais e a assistência técnica financeira ao
nível de carteira, mas também três áreas estratégicas
requerem a maior atenção possível:

152
• capacitação gerencial dos mutuários;
• capacitação dos mutuários em operações financeiras;
• capacitação dos mutuários em contabilidade de cus-
tos.
C) Manual de financiamento da agricultura irrigada
O crédito rural é, sem dúvida, um dos instrumentos mais
importantes de política para o setor de irrigação. Há uma boa den-
sidade de linhas de crédito disponíveis, principalmente para o se-
tor de produção. Entretanto, há necessidade de consolidação do
normativo em um único documento, com o título de manual de
financiamento da agricultura irrigada. Trabalho semelhante foi
realizado pelo Banco do Nordeste com o Book do Gestor.
A finalidade do manual é tornar disponíveis aos atuais e fu-
turos irrigantes informações sobre a política de irrigação, tipos de
crédito e normas e regulamentos que regem a matéria. Não pode
ser estático. Deve ser atualizado periodicamente e estar disponí-
vel, inclusive na Internet.
Os seguintes pontos devem nortear sua elaboração, além
da simplicidade e objetividade:
1. consolidação das leis e normas sobre o assunto, de
forma compreensível para leigos;
2. definição de projeto de irrigação e do que pode ser fi-
nanciado; modalidades de crédito disponíveis e suas
peculiaridades (finalidades, exigências etc.);
3. modalidades de crédito para agroindústria e normas
correspondentes;
4. modalidades de crédito para o comércio e respectivos
regulamentos;
5. necessidades de financiamento e disponibilidade de
crédito, inclusive indicando órgãos financiadores e a-
gências e suas peculiaridades;

153
6. possibilidades de financiar a cadeia produtiva como um
todo;
7. incentivos e restrições;
8. acesso ao crédito internacional, como fazê-lo.
Ainda devem ser explicitados os seguintes pontos:
• que é cadastro e como ele é feito;
• garantias exigidas por modalidade de empréstimo;
• contrapartida de recursos próprios por modalidade de
crédito;
• assistência técnica e financeira;
• fundos de aval;
• garantias de crédito (relacionamento entre as institui-
ções prestamistas e garantidoras).
♦ Bolsas de Valores: Títulos e Valores Mobiliários
O mercado financeiro se caracteriza pelos seguintes as-
pectos:
1. O volume de negócio não tem uma dispersão entre os
agentes e os montantes suficientes para reduzir ou
manter as possibilidades de manipulação em níveis to-
leráveis. Ressalte-se que se vem progredindo muito
neste setor.
2. As bolsas ainda se concentram em poucos papéis, no-
tadamente de estatais ou estatais recém-vendidas.
3. Baixos níveis de viabilização de outros instrumentos de
dívidas e valores mobiliários, tais como: commercial pa-
pers (mesmo assim, com prazos máximos de 180 dias)
e emissão de debêntures. Note-se que estes títulos são
essenciais para se obter financiamento fora do sistema
de crédito, ou seja, são essenciais ao equity funding.

154
4. Os papéis negociados no mercado secundário concen-
tram-se em poucas ações, notadamente de empresas
estatais. É assim, não obstante haver, inclusive, ofertas
de operações de garantia de viabilização de emissão e
negociação destes papéis no mercado secundário, por
parte de organismos internacionais. A International Fi-
nance Corporation (IFC) operaria também com debêntu-
res, com o objetivo de viabilizar investimentos em base
de equity financing.
5. A partir de 1994, os demonstrativos de resultados de
muitas empresas evidenciaram a presença de passivos
de difícil serviço. Com isso, o espaço para a emissão e
colocação de papéis fica muito comprometido pelo re-
ceio de falências. As análises de indicadores de rentabi-
lidade e de liquidez mostram também uma relativa fragi-
lidade das empresas. Por estas razões, o mercado des-
tes papéis estreitou-se. A oferta de capital de risco para
todas as empresas é reduzida não somente para as pe-
quenas e médias. A região Nordeste não foge à regra.
6. O Brasil tem ainda uma maioria das empresas constituí-
da sob a forma de sociedade limitada, o que impede
que elas (mantida essa forma de sociedade) tenham
acesso a recursos de capital de risco. Os custos eleva-
dos da transformação de sociedades limitadas, e poste-
rior manutenção, em sociedades anônimas inibem a
mudança. Simplificações e incentivos são importantes
para motivar as mudanças. Acredita-se que somente
valha a pena criar uma sociedade anônima para capta-
ção de recursos, se os investimentos forem superiores a
R$ 250 milhões (de ativos totais).
7. A capitalização, via emissão de ações ou debêntures
conversíveis em ações, tem-se mostrado difícil para
empresas de menor porte, concentrando-se este mer-
cado em emissões limitadas, por parte de bancos e de
instituições financeiras ou de grandes empresas. É difí-
cil o acesso de novas empresas ao mercado de capi-
tais, como seria o caso das empresas a serem financia-
das no negócio da irrigação, e de empresas de pequeno

155
e médio portes, muito embora possam ter boas
perspectivas de crescimento e rentabilidade.
Algumas sugestões:
a. Há sinais de mudanças. O mercado tem criado oportu-
nidades que devem ser consideradas pelos irrigantes e
suas organizações na área do negócio da irrigação. Há
novos negócios e novas alternativas de financiamento/
capitalização que, somadas àquelas já existentes, ten-
tam inserir no mercado de capitais um número bem
maior de empresas. Não obstante as dificuldades, este
mercado merece a atenção das empresas voltadas à ir-
rigação para financiar seus investimentos.
b. Nos projetos privados e mistos de irrigação, na área de
títulos e valores mobiliários, para grandes empresas ope-
radoras, sob a égide de um banco coordenador, pode-se
enumerar a emissão de ações para empresas que se
responsabilizarão pela infra-estrutura de uso comum.
c. Ainda nos projetos mistos e privados, outra vertente in-
teressante diz respeito às empresas que se instalarem
nos projetos, a partir de uma associação inicial de gran-
des empresas-líderes, com a fundação de uma empresa-
projeto inicial, seguida da abertura de capital, pela emis-
são de ações simples ou a abertura de capital pelo block
trade de ações, também com um banco coordenador.
d. Uma alternativa de capitalização da empresa-projeto
pode ser a emissão de debêntures simples para um
conjunto de tomadores, como o IFC e bancos interna-
cionais que lastrariam consórcios de empresas constru-
toras nacionais. Ou então, haveria a alternativa de e-
missão de debêntures conversíveis em ações para in-
vestidores, para bancos interessados em participar dos
empreendimentos, inclusive nas suas carteiras de in-
vestimentos e participações. Finalmente, existe a possi-
bilidade de emissão de debêntures simples, com cau-
ção para financiamento da infra-estrutura de uso co-
mum. A credibilidade das empresas associadas viabili-

156
zaria a colocação destes títulos e a capitalização delas
para o investimento.
♦ Companhias de Risco
As companhias de capital de risco canalizam investimentos
de investidores, com carteiras diversificadas, para as pequenas e
médias empresas de grande potencial de rentabilidade e cresci-
mento, pela participação societária. Os recursos dessas compa-
nhias provêem de investidores individuais, grandes empresas,
federações, associações e “clubes” empresariais, bancos, orga-
nismos de fomento e outros investidores, na expectativa de ga-
nhos acima das aplicações financeiras tradicionais de mercado.
Foram particularmente bem-sucedidas nas áreas de tecnologia.
As principais vantagens estão nos seguintes pontos: (i) são for-
mas mais avançadas de equity financing – condição hoje funda-
mental para viabilizar investimentos de média maturação (sem
isso, muitos investimentos no mundo não são viáveis, apesar de
altamente rentáveis); (ii) como buscam taxas elevadas de retorno,
são capazes de financiar investimentos mais arriscados, pois, onde
há risco, há maiores taxas de retorno; (iii) sabem compensar o ris-
co, atuando com empresas de tecnologia de ponta e mercados de
alto poder aquisitivo; (iv) por preferirem empresas de gerenciamen-
to competente, viabilizam as modernas técnicas de gerenciamento.
As principais desvantagens residem no fato de que não se
viabilizam quando operam: (i) com commodities de baixo valor
agregado; (ii) com sistemas que dependem de atividades mão-de-
obra intensivas; (iii) com operações muito complexas, dependendo
de muitos fornecedores de serviços e insumos intermediários; (iv)
com investimentos de longo período de maturação; (v) com em-
preendimentos em que crédito bancário é fonte principal de finan-
ciamento;(vi) com mercado de baixo nível de negociabilidade dos
direitos (ações); (vii) em regimes que não respeitam direitos mino-
ritários nos arranjos societários; (viii) em ambientes em que os
donos dos negócios não pagam nem dividendos, nem a participa-
ção; (ix) com investidores que não participam com capital de risco.
O investimento dessas entidades em capital de risco pres-
supõe não somente o aporte de recursos financeiros, mas tam-

157
bém um apoio tecnológico e gerencial de ponta ao empreendedor,
característica que as diferencia de outras formas de investimento.
Em muitos países, estas companhias facilitaram a “desova
de ações” dos investidores iniciais, mediante venda, em bolsa de
valores, das ações da empresa.
O mercado tem indicado: quando o sistema de venda em
bolsas não é um caminho viável, em vista de condições desfavo-
ráveis como mercados estreitos ou de porte relativamente peque-
no da empresa (relação acionistas majoritários/minoritários desfa-
vorável), as alternativas de financiamento, além do crédito rural,
são as seguintes:
a. instrumentos autoliquidáveis (ações resgatáveis ou de-
bêntures não conversíveis);
b. “cláusulas de put” ou acordos de recompra da participa-
ção pelo acionista original;
c. venda financiada para os administradores da empresa;
d. venda da participação para outras empresas ou investi-
dores;
e. fusões e aquisições.
Ressalte-se que estes mecanismos ainda não estão madu-
ros no Brasil. No Nordeste, por exemplo, existe apenas uma com-
panhia desta natureza, a Pernambuco S.A., que tem tido dificul-
dade em alocar a totalidade dos seus recursos em capital de risco.
A referida companhia atua nos estados de Pernambuco, Alagoas,
Paraíba e Rio Grande do Norte. O mercado financeiro acompanha
essa idéia com muito cuidado, porquanto já decorreram quase 50
anos para se difundir no País e só cresceu significativamente nos
últimos anos.
♦ Fundos Mútuos de Investimentos e Empresas Emergentes
Hoje responsáveis por uma parcela substancial das
aplicações de recursos de risco nos segmentos competitivos dos
mercados financeiros mundiais, estes fundos têm apresentado
resultados e crescimentos surpreendentes. São, inquestionavel-

158
mente, aplicações de riscos, inclusive riscos ampliados, devido ao
conjunto das empresas componentes dos fundos (o que, em certo
sentido, não ocorre com as companhias de capital de risco).
As experiências mundiais têm sido heterogêneas quanto
aos resultados. A maioria delas é muito boa e algumas poucas
muito ruins, ao contrário das bolsas, cujos resultados variam ao
longo do tempo. Neste caso, os resultados são conhecidos logo
nos primeiros anos de operação dos fundos. Entretanto, grande
parte dos investidores, inclusive devido a incentivos fiscais, em
termos de ganhos de capital, tem uma parte de seus portfólios
nestes fundos.
No Brasil, a referida iniciativa só se desenvolveu a partir de
meados dos anos 90, com a criação dos fundos mútuos de inves-
timento em empresas emergentes, regulamentados pela Instrução
Normativa CVM n.º 209, de 23/03/94 (Brasil, 1994).
Suas vantagens são: (i) diluição de riscos; (ii) potencial de
formação de um conjunto de participações de empresas de alta
rentabilidade (ainda que poucas em um conjunto maior de empre-
sas); (iii) alternativa de investimento fora do circuito de alta com-
petitividade de fundos e aplicações (que pouco mais rendem que
poupança, como considera o mercado); (iv) rapidez de expansão
da demanda de seus serviços, como ocorreu nos Estado Unidos e
Europa, com valorização das quotas (Brasil, 1994).
No Brasil, esses fundos não têm conseguido, até o mo-
mento, atender a um número expressivo de empresas. De acordo
com informações disponíveis até 1997, havia apenas oito fundos
constituídos e registrados na Comissão de Valores Mobiliários
(CVM). Destes oito, somente cinco estavam em funcionamento
até aquela data. Há indicações de que outros fundos encaminha-
ram pedidos de registro à CVM e existe uma tendência para que
todos os estados brasileiros sejam atendidos por este tipo de
instrumento. Na região Nordeste, o Banco do Nordeste, em par-
ceria com o Banco Bozano Simonsen, está montando um fundo
de abrangência regional, com um patrimônio inicial previsto de
R$ 30 milhões.
Quando se busca identificar os investidores, verifica-se
que, apesar de o valor mínimo da cota unitária ter sido reduzido

159
de R$ 100.000,00 para R$ 25.000,00, os recursos para investi-
mento pelos fundos ainda se originam, na sua maior parte, de
investidores institucionais, principalmente de fundos de pensão,
que podem aplicar até 5% do patrimônio nessa modalidade; do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social Partici-
pações S.A. (BNDESPAR), que é um fundo institucional de grande
porte; de empresas médias e grandes em articulação com as fe-
derações das indústrias de cada estado; e de investidores e orga-
nismos internacionais, grandes investidores, como a IFC, cujo
board tem recomendado o afastamento da instituição de participa-
ções minoritárias, no caso do Brasil.
Os fundos não têm sido capitalizados suficientemente,
ao nível regional. As oportunidades de fundos, formados por bo-
as empresas, não têm sido difundidas regionalmente. Há, inclu-
sive, má seleção de projetos. É reduzida a divulgação, no meio
empresarial, da alternativa de financiamento de capital de risco
que indique os requisitos necessários de acesso a essa modali-
dade de financiamento. Faltam mecanismos de garantia de liqui-
dez para os valores mobiliários de empresas emergentes, garan-
tindo-se um piso de compra futura. Finalmente, é necessário
incentivar e, mesmo, financiar a transformação de sociedades
limitadas em sociedades anônimas, utilizando-se de serviços
técnicos especializados.
As empresas emergentes, por definição da Instrução CVM,
são companhias de capital aberto. Entretanto, a grande maioria
das pequenas e médias empresas brasileiras, que operaria nos
perímetros irrigados, não foge à regra geral, porque são empresas
constituídas com a forma de sociedades limitadas. Isto impede as
empresas, assim constituídas, de terem acesso aos recursos dos
mencionados fundos.
Uma possibilidade é a mudança da regulamentação da
CVM para acomodar essa contingência. Mesmo que fosse autori-
zado pela regulamentação, teria condições de vender suas cotas
a grandes investidores institucionais, que participam do capital das
empresas mas não administram o seu dia-a-dia, um fundo que
investe em sociedades limitadas? A resposta é negativa.

160
O fato de a empresa limitada não poder emitir títulos ou va-
lores mobiliários; não estar obrigada a apresentar balanço e a
distribuir os resultados dos demonstrativos financeiros aos seus
quotistas indica que a solução mais realista para trazê-las ao mer-
cado de capital de risco é, em vez de se tentar mudar a legislação,
diminuir os custos e os principais entraves, que inibem a transfor-
mação de uma sociedade limitada em sociedade aberta.

♦ Fundos de Capital de Risco e Desenvolvimento Local


É um dos sistemas mais promissores de financiamento de
empresas de pequeno e médio portes nos projetos de irrigação.
Uma das suas principais vantagens é que na agricultura irrigada
há geração de renda suficiente para formar um fundo de poupan-
ça e de empréstimo de baixo custo operacional, sendo, portanto,
baixos os níveis de índices de dependência de subsídios (SDI, ou
seja, diferença entre os custos de captação, mais os custos de
administração e as taxas de empréstimos).
Os fundos de capital de risco e desenvolvimento local
complementam crédito normal. Assim, quando estes fundos se
organizam em associação com as linhas de financiamento para a
agricultura familiar, com as formas de crédito rotativo e solidário
(em que se cria a joint liability ou responsabilidade passiva solidá-
ria), com as formas que criam estímulos para poupanças vincula-
das ao crédito e com as formas inovadoras de tornar os mutuários
“acionistas” do sistema (mutualismo), eles atingem os mais eleva-
dos níveis de eficiência, contornando, em parte, a seleção adver-
sa. Ele cresce rapidamente em todo o mundo.
Esses fundos devem contar, majoritariamente, com recur-
sos de investidores da própria localidade. Por esta razão, são fun-
dos de poupança e empréstimo. Para credenciar-se ao crédito, o
produtor deve ter poupanças ou predispor-se a realizá-las, como
é da regra do jogo. Aos recursos locais podem-se somar os de
bancos de desenvolvimento, as agências bilaterais e multilaterais
e de investidores institucionais, como matching grants, exclusi-
vamente para desenvolvimento, e matching loans, para opera-
ções de empréstimos.

161
Dentre as vantagens, deve-se destacar: (i) o sistema é a-
dequado para operações pulverizadas em pequenas empresas e
localidades, beneficiando mutuários de pequeno porte relativo; (ii)
quando os bancos comerciais não dispõem de instrumentos ade-
quados para suprir de capital os pequenos empreendimentos de
empreendedores familiares; (iii) favorece o desenvolvimento do
crédito agrícola, pois a comunidade passa a exigir outros tipos de
financiamentos que não sejam só de geração de renda; (iv) os
recursos são destinados a públicos-metas específicos e não se
trata de crédito geral. E, assim, parte de necessidades locais e
garante que poupança será reinvestida onde foi gerada; (v) é cré-
dito barato, mas não subsidiado – com os spreads atuais, é possí-
vel oferecer crédito com juros reduzidos; (vi) é mais didático para
o mutuário que o crédito normal, porque o sistema é dele.
Fundos, como estes, têm a vantagem de superar as gran-
des dificuldades dos sistemas de crédito convencionais, que mis-
turam crédito de fomento com crédito comercial, prática já aban-
donada em alguns países.
Os sistemas convencionais têm apresentado baixa susten-
tabilidade financeira no longo prazo. São razões: as composições
de dívidas comprometem o uso futuro do “fundo”; de baixa credibi-
lidade financeira, em função da inadimplência; foram desenvolvi-
dos de cima para baixo, sem participação dos interessados; apre-
sentam centralização excessiva; as “entidades” locais e regionais
não participam da gestão; não está claro qual é o coeficiente de
dependência de subsídio; apresentam elevados custos de gestão
e transação (para bancos e mutuários).
Dentre as principais desvantagens há que mencionar: (i)
não há uma legislação “amigável” que permita o desenvolvimento
de iniciativas e idéias inovadoras neste campo; (ii) no mundo intei-
ro, os bancos comerciais e os bancos centrais se opuseram, por
muitos anos, a estes tipos de fundos, muito embora, mais tarde,
tenham a eles se associado e apoiado; (iii) as experiências no
Brasil são ainda reduzidas em número e capilaridade; (iv) é preci-
so criar a cultura da responsabilidade passiva solidária, que é um
obstáculo a ser vencido.

162
O mercado de capital local pode ter como âncora um ban-
co regional de grande capilaridade, em funcionamento harmônico,
como ocorre em muitos países.

♦ Securitização de Recebíveis de Vendas


Crescentes operações desta natureza, em todo o mundo,
atestam suas vantagens as quais se avolumam, significativamen-
te, a cada ano.
Na atualidade, a securitização está cada vez mais associ-
ada a operações financeiras de pequenas empresas, se sua ori-
gem estiver ligada a operações similares a descontos de títulos
(duplicatas mercantis, por exemplo) de grandes empresas. Pela
segurança que oferecem, estas operações estão despertando
interesse crescente dos bancos. Muitas operações de pequenas
empresas estavam concentradas em esferas “não-bancária” (co-
mo as factoring). Hoje, operações como “vendor” e securitização
de recebíveis interessam aos bancos não-especializados, com
arranjos totalmente apoiado em bancos comerciais.
A operação envolve basicamente: (i) títulos de uma “ativi-
dade homogênea”, disponibilizados por um “vendedor de contas a
receber”; (ii) um intermediário especializado como emissor de
“certificados” (servicer); (iii) investidores interessados em com-
prar estes certificados; (iv) um vínculo fiduciário que classifica os
recebíveis; (v) uma função auxiliar de reforço de crédito que adi-
ciona credibilidade.
As vantagens são as seguintes:
a. é uma fonte de “financiamento”, que pode ser de menor
custo relativo, pois as operações estão lastreadas em tí-
tulos de liquidez;
b. gera, nos balanços, receitas por “venda de serviços a
clientes, sem quase nenhum risco de capital”. Com isso,
há melhora dos indicadores de rendimento de capital;
c. reduz as imobilizações de capital para provimento de
débitos eventuais;

163
d. permite relativa redução do custo da informação para o
agente financeiro na análise de crédito para uma em-
presa vendedora e outra compradora;
e. são operações lastreadas em “produto real”;
f. independência em relação a dados de demonstrativos
financeiros;
g. independe de garantias (“credor de última instância”);
h. os bancos podem operar com pequenas e médias em-
presas e diversificar a carteira, a baixo custo relativo.
i. provê liquidez a crédito de empresas com baixa capaci-
dade de contração de empréstimos;
j. segrega os recebíveis do fluxo de caixa, o que facilita a
obtenção de empréstimos (operações passivas) de in-
vestidores fora do sistema bancário.
As desvantagens decorrem dos seguintes fatores:
a. a informalidade das empresas compradoras dos produtos
dos projetos e perímetros (alto risco para a operação);
b. custos elevados de pulverização de carteira;
c. sensibilidade ao volume de recebíveis e a valores míni-
mos;
d. é difícil a seleção de empresas (carteira selecionada),
as quais irão compor o conjunto daquelas que devem
pagar os recebíveis;
e. existem grandes dificuldades de os “investidores” obte-
rem informações;
f. existem grandes dificuldades de “classificação de risco”.
As tarifas de água se qualificam como um recebível
que pode ser securitizado.

164
♦ Financiamento dos Projetos Públicos
O financiamento da infra-estrutura de uso coletivo nos pro-
jetos públicos será realizado pelos recursos do Tesouro ou pelo
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BN-
DES), podendo ser complementado com recursos de instituições
internacionais.
No curto prazo, é possível que a iniciativa privada venha
financiar a infra-estrutura de irrigação de uso coletivo, desde que o
Governo esteja disposto a oferecer garantias, por exemplo, com
base no recebimento de tarifa de água. O Governo vende a infra-
estrutura no momento de assentamento dos irrigantes, mas a
transferência da propriedade definitiva ocorrerá no momento da
quitação da última parcela. As parcelas a serem recebidas dos
irrigantes são dadas, pelo Governo, como garantia, à firma que
financiou o projeto. Em adição, o Governo garante, por certo perí-
odo, negociado caso a caso, o pagamento das parcelas devidas
pelos irrigantes. Esta negociação está prevista no edital de licita-
ção do projeto. As parcelas também podem garantir a firma finan-
ciadora nos empréstimos que vier a tomar.
O projeto, assim financiado, destina-se a agricultores de
notória competência na tecnologia de irrigação e experientes no
negócio agrícola. Quer-se eliminar, ao máximo, o risco de o irri-
gante fracassar no seu empreendimento. Neste caso, cabe à inici-
ativa privada, o financiamento da infra-estrutura de irrigação de
uso coletivo em projeto público. Compete ao Governo:
a. desapropriar a área;
b. elaborar o projeto; neste, além do usual, estão especifi-
cadas as condições a que se sujeitará a firma que irá fi-
nanciá-lo e as garantias que receberá do Governo;
c. colocar o projeto em licitação com a finalidade de sele-
cionar a firma que irá financiá-lo. As firmas que partici-
parão da licitação serão pré-qualificadas de acordo com
critérios a serem definidos. Um deles é a demonstração
de competência em operar com outras formas de finan-
ciamento, além do crédito bancário. Um consórcio de
firmas pode participar da licitação. Para simplificar, do-

165
ravante referir-se-á à empresa financiadora, que pode
ser um consórcio de empresas;
d. firmar com a empresa financiadora, vencedora da con-
corrência, o contrato de financiamento, como estabele-
cido no edital de licitação;
e. entre as condições do contrato de financiamento, estão:
e.1 penalidades para o Governo e financiadora, pelo
descumprimento de cláusula do contrato;
e.2 garantia de financiamento aos irrigantes, em termos
de oportunidade, montante, taxa de juros e prazos;
e.3 garantia de financiamento à indústria e ao comércio,
conforme estabelecido no contrato;
e.4 garantia de que a seleção dos irrigantes não sofrerá
injunções políticas, obedecendo, rigidamente, às
condições acordadas;
e.5 se a empresa financiadora precisar de recursos de
bancos oficiais ou internacional, o Governo deverá
garantir aquilo que foi registrado no contrato de fi-
nanciamento.
e.6 indicação precisa de como será ressarcida a em-
presa financiadora e como o Governo garantirá a
operação.
De acordo com o contrato assinado, as seguintes ações
terão curso:
1º. em conjunto com a empresa financiadora, serão licita-
das as obras e supervisionada a sua construção. A
mesma firma pode financiar e construir o projeto;
2º. o Governo pagará as obras de infra-estrutura social,
conforme estabelecido no projeto;
3º. o Governo, em conjunto com a empresa financiadora e
respeitando as condições do contrato, elabora o edital
de seleção dos irrigantes;

166
4º. caberá à empresa financiadora o processo de promoção
do empreendimento;
5º. proceder à seleção dos irrigantes, os quais deverão as-
sinar o contrato, que é parte do edital de licitação. Por
ele, entre outras coisas, é assumida a responsabilidade
de pagamento das parcelas correspondentes à compra
da infra-estrutura de irrigação de uso coletivo e são a-
penas garantias específicas;
6º. neste modelo, relativamente à implantação e desenvol-
vimento do distrito, irrigação e desenvolvimento da agri-
cultura irrigada, a conta da assistência técnica é da res-
ponsabilidade dos irrigantes. Contudo, poderá caber ao
Governo a parcela dos custos correspondentes aos
empreendedores familiares.
6.5.2 - Modelos de financiamento

O modelo de financiamento, vigente nos pólos de irriga-


ção, depende do crédito bancário, crédito rural e de recursos pró-
prios. Os investidores são os proprietários dos meios de produção
(pequeno a grande irrigante), das organizações processadoras,
agro-industriais e de comercialização.
É preciso mudar o enfoque e o paradigma. É necessário
associar a gestão com o financiamento, sem o que não se viabi-
liza um sistema mais avançado de administração. A principal
característica de um sistema moderno de gestão é a capacidade
de captação de recursos de terceiros, dentro do regime de asso-
ciação de capital, em que é vital a comprovação de rentabilidade
do negócio como um todo e não, apenas, da produção agrícola.
O modelo proposto é designado por Modelo de Financiamento
Tipo – 1. Este associa os sistemas de gestão comercial com o
financiamento e se baseia no crédito rural/agroindustrial e capta-
ção de investimento.
O modelo, quando operado no âmbito de um sistema de
gestão avançado, obtém a condição pela qual o financiamento
global dos produtores e das organizações líderes poderá ser mai-
or do que o somatório dos créditos outorgados a segmentos indi-
viduais. Há, inclusive, a “solidariedade” e responsabilidades finan-
167
ceiras compartidas, tendo como foco o “valor do negócio” da irri-
gação como um todo.
Ele pode facilitar o fortalecimento das (e criação de novas)
agroindústrias que operam em várias regiões e que definem, pre-
viamente, o preço de compra de produtos dos agricultores, hon-
ram compromissos assumidos, além de apoiar o processo de
produção, dar orientação técnica e fornecer ou financiar parte
dos insumos.
É necessário mudar o perfil das empresas de comerciali-
zação dos pólos de irrigação. Estas somente compram o produto,
ajudando a modernizar o sistema de gestão e provendo apoio
creditício e financiamento para operação em maior escala.
Trata-se de criar uma nova “cultura de ajuda mútua”, medi-
ante um sistema de garantia que envolve todos os atores interes-
sados, dentro da visão de um negócio. Ou seja, trata-se de mudar
a visão atual, que é segmentada, para uma visão de agronegócio,
que é integrada.
Na realidade, o modelo é semelhante ao que existe no
setor. O que se requer, de novo, é a construção de competên-
cias incrementais pelo Estado, na área de bens públicos, para
que o setor privado realize uma rentabilidade consistente com
os riscos do negócio, e, assim, não haverá um número exage-
rado de falências.
A participação da iniciativa particular no negócio irrigação,
em área privada, de forma individual ou coletiva, poderá ganhar
contornos mais fortes, a partir das informações consistentes e
sistematizadas da rentabilidade do empreendimento (obtida da
plataforma de informações), o que poderá estimular o desenvolvi-
mento de empresas-projetos para implementar áreas privadas. A
empresa-projeto, conforme descrita no ANEXO 8.4 deste relatório,
corresponde ao Sistema de Gestão Comercial 5. Neste caso, o
modelo de financiamento, que deverá ser operacionalizado, é o
Modelo de Financiamento Tipo – 2, que se baseia num financia-
mento com parcerias, fundamentado nos ativos do projeto. A em-
presa-projeto é formada em termos de parcerias com empresas
líderes associadas e investidores estratégicos.

168
O Modelo de Financiamento Tipo – 2 - Financiamento de
um empreendimento particular (em projeto completo) que se de-
nomina empresa-projeto, no qual os participantes são atraídos
pela geração de um fluxo de caixa líquido positivo que propicia
rentabilidade potencial satisfatória, mas sujeita a riscos. Os parti-
cipantes são acionistas do projeto.
As vantagens e desvantagens do Modelo de Financiamen-
to Tipo 1 e 2, assim como uma descrição mais detalhada, poderão
ser encontradas no ANEXO 8.4 deste relatório.

6.5.3 - Descrição dos riscos financeiros

O objetivo deste capítulo é a avaliação dos riscos de inves-


timentos em empreendimentos comerciais dos projetos de irriga-
ção. Uma outra tarefa é avaliar os riscos cambiais dos projetos,
quando são financiados por empréstimos externos, aporte de capi-
tal de empresas do exterior e se destinam à exportação. Com a
liberação do câmbio, hoje em regime de liberdade de flutuação,
reduziu-se, significativamente, o risco que se origina no Governo.
E o câmbio passa a ser um preço que flutua de acordo com as
forças de mercado, não se desprezando as de natureza especula-
tiva. Nas condições dos projetos de irrigação, julgou-se que os
riscos de origem na nossa economia dominam amplamente aque-
les de câmbio. Assim, optou-se por não avaliá-los.
O enfoque adotado para este capítulo consistiu em avaliar
os riscos tais como são percebidos pelos investidores. Por isto,
foram consultados os potenciais investidores do negócio. Buscou-
se conhecer a opinião dos investidores que estão no negócio, co-
mo também os riscos dos projetos de irrigação. As próximas se-
ções deste capítulo resumem, portanto, entrevistas semi-
estruturadas com os investidores do setor.
O estudo dos riscos associados ao empreendimento da ir-
rigação foi dividido em duas partes:
a) os riscos que poderiam ser classificados como riscos
gerais dos projetos de irrigação;
b) os riscos financeiros de projetos de irrigação.

169
♦ Riscos Gerais dos Projetos de Irrigação
A pergunta central das entrevistas foi a seguinte: quais os
maiores riscos de um projeto de irrigação?
As respostas, algumas na forma de perguntas, foram as
seguintes em ordem de importância relativa:
1. Não é possível, até aqui, construir, a partir de vanta-
gens comparativas, vantagens competitivas.
2. Qual é o real tamanho do mercado para os produtos
da agricultura irrigada: mercado interno ou externo?
Há riscos de desconhecimento da real dimensão dos
mercados dos produtos.
3. As condições de logística – infra-estrutura pública são
adequadas?
4. Temos competência tecnológica?
5. Há uma integração das cadeias na agricultura irriga-
da na prática? Há uma visão holística dentro do pró-
prio setor?
6. Podemos confiar em uma união de toda a cadeia em
torno de organização com objetivos comuns de valori-
zação do negócio?
7. Como é a parceria do Governo com iniciativa privada
neste negócio? Existe uma tradição à altura dos novos
objetivos? Caso não, é possível mudá-la?
8. Que esforços há de desenvolvimento de mercado no
exterior, ou seja, de promoção comercial dos produtos
brasileiros?
9. A mão-de-obra qualificada existe? Alfabetizada? Ca-
pacitada?
10. Qual o peso dos encargos trabalhistas? Há incentivos?
11. Com relação ao fornecimento de energia elétrica, em
alguns perímetros a situação não é satisfatória.

170
12. Há também risco de fornecimento de água.
13. A carga fiscal e tributária é elevada para atividades in-
dustriais dos projetos de irrigação, principalmente a
tributação sobre o faturamento, abrangendo todas as
etapas, por intermédio do Confins.
14. A mão-de-obra é legislada. Deveria ser, de alguma
forma, “acordada”. Os pagamentos deveriam ser por
um sistema de quanti-qualidade.
15. Os encargos financeiros causam os maiores riscos (ci-
ta-se a variação da TJLP), incrementam o coeficiente
de incerteza e aumentam as dúvidas sobre a tempes-
tividade do crédito e a cobertura que as garantias pro-
porcionam.
16. No momento, mesmo tratando-se de frutas tropicais,
há países concorrentes, em termos de atração de in-
vestimentos privados e mercados, que apresentam
menores riscos relativos. Estes países são: Costa Ri-
ca, Porto Rico, Honduras, África do Sul, Israel. O Bra-
sil tem condições de oferecer melhores incentivos para
competir?
17. Um grave problema é não dispormos de um sistema
eficaz de defesa sanitária vegetal.

♦ Avaliação de Riscos Financeiros


Esta seção realiza idêntico levantamento da seção anteri-
or, porém focado em questões mais ligadas a riscos financeiros.
As respostas, em ordem de importância relativa, atribuídas a cada
item, são as seguintes:
a) Atrasos na implementação do projeto como um todo.
b) Restrições externas de capital (financiadores).
c) Restrições internas de capital (financiados).
d) Baixa capacidade de alavancagem (comprometimento
de ativos).

171
e) Peso de passivos onerosos das empresas em atividade
e potenciais.
f) Custos de capital, acima do esperado, nos fluxos de
caixa.
g) Falhas técnicas do projeto.
h) Falta de cumprimento dos compromissos de liberação
de recursos públicos planejados para etapas de forne-
cimento de água e infra-estrutura.
i) Problemas financeiros (falência) de participantes.
j) Interferências indevidas do Governo: risco institucional.
l) Perdas devidas a causas não seguradas (inclusive fi-
nanceiras).
m) Aumento dos preços ou escassez de matéria-prima.
n) Obsolescência técnica da planta e de tecnologia de pro-
cessos.
o) Perda de posição competitiva no mercado.
p) Administração fraca e concentrada em pessoas.
q) Avaliações otimistas do valor dos produtos: optimism
gap.
r) Insolvência ou quebra de contrato do Governo anfitrião
local.
s) Avaliação indevida dos fluxos de caixa e da viabilidade
financeira.
t) Falta de capacitação dos produtores para operações fi-
nanceiras.
♦ Risco da Variação de Preço do Produto Agrícola
A hipótese é que, na agricultura irrigada, o principal com-
ponente do risco origina-se na variação dos preços dos produtos.
É claro que os preços dos insumos, clima e doenças trazem
complicações para a produção irrigada. Contudo, o efeito é rela-
172
tivamente à variação dos preços dos produtos, em função do
controle que a agricultura irrigada proporciona, inclusive na com-
pra de insumos.
Os preços variam dentro do ano e entre os anos. Temos as
componentes sazonais e a tendência. Como o desenvolvimento
tecnológico tem feito a oferta crescer mais que a demanda, a ten-
dência geral é de decréscimo de preços. Mas é difícil modelar esta
tendência, porque isto eqüivale a modelar o progresso tecnológi-
co, o que é muito complicado.
A importância dos fatos citados, vividos intensamente pe-
los produtores, levou o consórcio a desenvolver estudo de casos,
avaliando o risco causado pela variação de preços do produto na
rentabilidade do investimento. Saliente-se que o estudo de casos
aqui apresentado serve como orientador para aplicação em situa-
ções específicas.
Do ponto de vista prático, pela aplicação de métodos eco-
nométricos, identifica-se que a série dos preços dos produtos é
estacionária, e, se o for, a média é usada como predito. E o risco
é o desvio padrão dividido pela média. Quando a série é não-
estacionária, o cálculo do risco é mais complicado. Em função do
uso que se fará, optou-se por prever o preço um passo à frente,
ou seja, um mês depois do término da série, quando os dados
são mensais. Obteve-se o desvio padrão deste predito e, em
seguida, o risco, dividindo-se o desvio-padrão do valor predito
pelo valor predito.
Os dados cobrem vários produtos da agricultura irrigada,
fornecidos pelas Ceasas de Minas Gerais e São Paulo, período
janeiro de 1995 a maio de 1999. Os dados são médias mensais;
junho de 1999 é o mês que corresponde a um passo à frente.
A justificativa do cálculo do risco, como o proposto, baseia-
se na hipótese de que os agricultores prefiram preços mais eleva-
dos, com a menor variância possível. Sendo assim, o coeficiente
de variação é uma medida adequada de risco; quanto menor, me-
lhor é do ponto de vista dos produtores. Na série não-estacionária,
reconhece-se que o procedimento de cálculo do risco equivale a
admitir que os produtores não acreditem que a tendência estima-
da venha, de fato, a prevalecer e que estão dispostos a aceitar,
173
apenas, o preço predito para o mês seguinte ao término da série,
nas suas decisões futuras. Outra limitação: dois observadores
podem fazer predições diferentes, se um deles tiver um mês de
informação a mais.
A Plena Consultoria de Engenharia Agrícola Ltda. vem as-
sessorando vários empresários da agricultura irrigada no norte de
Minas. Entre suas atividades de assessoria, avalia-se a taxa inter-
na de retorno financeiro do empreendimento. Trabalhou-se, então,
com os dados de 20 empreendimentos de agricultura irrigada,
iniciados em 1997. Esses empreendimentos têm como base de
produção as culturas de banana, manga, limão, cebola, limão-taiti,
mamão, melancia e coco.
O estudo de casos, desta seção, avalia o risco de variação
do preço para uma série de produtos, com base nos dados das
Ceasas-MG e Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de
São Paulo (Ceagesp), e avalia o risco da variação da taxa interna
dos 20 empreendimentos assessorados pela Plena no norte de
Minas. Para cada investimento, tem-se um fluxo de caixa que a-
presenta a produção anual para cada um dos doze anos e um
preço que se supõe prevalecer o mesmo durante doze anos. Na
série estacionária, a melhor estimativa é a média. Na série não-
estacionária, admite-se que a estimativa teria sido dada pelo pro-
cedimento de um passo à frente. Utilizou-se o preço estimado pela
Plena e o desvio padrão obtido no modelo. Além da produção,
apresentam-se dados completos de custos.
Como se admitiu variarem tão-somente os preços dos pro-
dutos, as taxas internas de retorno são recalculadas para o limite
inferior e superior à média dos preços, levando-se em conta a
estacionalidade ou não-estacionalidade. O intervalo de confiança
corresponde a média ± 1,96*(desvio padrão da média). A variação
dos preços no intervalo descrito permite, portanto, calcular o inter-
valo de variação das taxas de retorno.
Os detalhes e cálculos realizados encontram-se no ANE-
XO 8.6 deste relatório.
♦ Estimativa do Risco da Variação do Preço do Produto

174
A estacionalidade das séries foi avaliada via abordagem
clássica de Box & Jenkins (1976) com o estudo das funções de
autocorrelação, correlação parcial e autocorrelação inversa.
Quando necessário, a estacionalidade foi induzida com o uso de
operadores de defasagem. Em geral, de ordem um, para se elimi-
nar a tendência estocástica, e de ordem 12, para se eliminar a
sazonalidade estocástica. Depois deste processo preliminar de
suavização, escolheu-se um modelo na classe Autoregressive-
moving average (ARMA) (p,q) que se ajustasse, razoavelmente,
aos dados. A única exceção foi a série da manga, São Paulo, para
qual se ajustou um modelo tendência determinística. Como já ex-
plicado, como estimativa de longo prazo, nos casos de estaciona-
lidade, o risco é o desvio padrão da média dividido pela média. Na
presença de não estacionalidade, o risco é o desvio padrão do
predito de um passo dividido pelo valor do predito. Neste caso, o
risco obtido é uma próxis. Um observador com um mês a mais de
observação, que não estava disponível quando o modelo foi esti-
mado, poderia obter um risco distinto.
As TABELAS 2 e 3 apresentam as estimativas da média e
do desvio-padrão da média para um conjunto de produtos, repor-
tados pelas Ceasas de Minas Gerais e de São Paulo. As estimati-
vas foram obtidas de um modelo econométrico de série temporal.
Indica-se, também, se a série é estacionária ou não-estacionária.
TABELA 2
CONDIÇÃO DA SÉRIE, MÉDIA DOS PREÇOS MENSAIS,
DESVIO PADRÃO DA MÉDIA E RISCO PARA UM CONJUNTO
DE PRODUTOS, PERÍODO JANEIRO DE 1995-1999, CEASA-MG
Média D. padrão da Risco
Produtos Condição
(R$/kg) média (%)
Abóbora Estacionária 0,29635 0,019593 6,61
Batata-doce Estacionária 0,43993 0,030477 6,93
Beterraba Estacionária 0,4858 0,053604 11,03
Cebola Estacionária 0,59051 0,06689 11,32
Cenoura Estacionária 0,41022 0,03027 7,38
Melancia Não-estacionária 0,32866 0,011173 3,39
Melão Não-estacionária 0,10366 0,093018 89,73
Pimentão Estacionária 0,73703 0,04681 6,35
Pimenta (SP) Não-estacionária 0,072528 0,054246 74,79
Quiabo Estacionária 0,6814 0,047556 6,98
Tomate Estacionária 0,043376 0,032953 75,97

175
Abacaxi Não-estacionária 0,7218 0,081329 11,26
Banana-prata Não-estacionária 0,70689 0,097491 13,79
Banana-nanica Não-estacionária 0,4139 0,028975 7,00
Coco verde Não-estacionária 0,82926 0,05985 7,22
Limão-taiti Não-estacionária 0,62271 0,084018 13,49
Mamão Não-estacionária 0,851593 0,10660 12,52
Manga Não-estacionária 0,22965 0,04151 18,08
Maracujá Estacionária 1,2427 0,091669 7,38
Uva Estacionária 2,5397 0,10952 4,31
Inhame Não-estacionária 0,49793 0,024788 4,98
FONTE: Ceasa-MG. Dados trabalhados pelo Consórcio Plena-FGV-Projetec.

Na série tipo estacionária, apenas tomate tem risco muito


elevado (75,97%). Na série não-estacionária, destacam-se pimen-
ta (74,79%) e melão (89,73%). Manga tem um risco de 18,08%.
Com risco acima de 10%, há 10 produtos entre os 21 estudados,
cerca de 47,6%. Os exportáveis, uva, coco e banana-nanica, têm
risco menor. O melão foge ao referido padrão.
Do ponto de vista de estacionalidade, dez produtos mostra-
ram séries estacionárias e onze séries não-estacionárias. À exce-
ção de coco verde, as séries não-estacionárias apresentaram ten-
dência declinante para os preços.
São Paulo diverge de Minas Gerais em dois aspectos. Em
primeiro lugar, maior risco se igualou a 19,15%. Em segundo lu-
gar, apenas seis produtos apresentaram séries estacionárias con-
tra 15 de séries não-estacionárias. Cinco produtos superaram a
marca de 10% de risco, equivale a 23,8% dos vinte e um produ-
tos. Como em Minas Gerais, a tendência dos preços das séries
não-estacionárias é não-declinante.
Como o mercado de São Paulo é muito maior que o minei-
ro, inclusive bem conectado com o mercado externo e de outras
regiões, é natural ser lá menor o risco que em Minas Gerais. As
informações de São Paulo estão na TABELA 3.
TABELA 3
CONDIÇÃO DA SÉRIE, MÉDIA DOS PREÇOS MENSAIS,
DESVIO PADRÃO DA MÉDIA E RISCO PARA UM CONJUNTO
Média Desvio da
Produtos Condição Risco(%)
(R$/kg) média

176
Abóbora Não-estacionária 0,46031 0,015131 3,28
Batata-doce Não-estacionária 0,49482 0,032583 6,58
Beterraba Estacionária 0,40828 0,031527 7,72
Cebola Estacionária 0,594908 0,062633 10,52
Cenoura Estacionária 0,47415 0,036643 7,72
Melancia Não-estacionária 0,43855 0,030728 7,00
Melão Não-estacionária 0,92966 0,10416 11,20
Pimentão Estacionária 0,73703 0,04681 6,35
Quiabo Estacionária 0,64683 0,031553 4,87
Tomate Não-estacionária 0,84399 0,078698 9,32
Abacaxi Não-estacionária 1,2929 0,12078 9,34
(continua)
TABELA 3
CONDIÇÃO DA SÉRIE, MÉDIA DOS PREÇOS MENSAIS,
DESVIO PADRÃO DA MÉDIA E RISCO PARA UM CONJUNTO
(conclusão)
Média Desvio da
Produtos Condição Risco(%)
(R$/kg) média
Banana-prata Não-estacionária 0,97469 0,078162 8,02
Banana-nanica Não-estacionária 0,5199 0,046395 8,92
Coco verde Não-estacionária 0,9443 0,057135 6,05
Limão-taiti Não-estacionária 0,52659 0,076112 14,45
Mamão Estacionária 0,64067 0,093158 14,54
Manga Não-estacionária 1,7671 0,3385 19,15
Maracujá Não-estacionária 0,87005 0,06948 7,98
Uva Não-estacionária 1,2031 0,1047 8,70
Inhame Não-estacionária 0,46808 0,020863 4,45
FONTE: Ceagesp. Dados trabalhados pelo Consórcio Plena-FGV-Projetec.

♦ Variação das Taxas Internas de Retorno


É importante salientar que se admitiu uma rigidez absoluta
dos custos e da produção, em relação aos limites inferior e supe-
rior dos preços, o que, na prática, não ocorre. Sempre é possível
cortar custos, quando os preços dos produtos caem, como tam-
bém, ajustar a produção. E o inverso pode ocorrer quando eles
aumentam. O efeito destes ajustes nas taxas internas de retorno é
muito complicado de prever. Por isto, preferiu-se calcular o inter-
valo de variação delas, sem se considerarem os ajustes que os
produtores fariam, os quais podem reduzir ou aumentar a variação
das taxas. Tomou-se como base a estimativa de preço e de pro-
177
dução adotada pela Plena. O intervalo de variação do valor da
produção foi calculado, multiplicando-se os limites inferiores e
superiores dos preços pelas respectivas produções.
Como é usual, o estudo fixa os preços dos produtos no pe-
ríodo estabelecido, no caso 12 anos. A modificação feita diz res-
peito, apenas, a calcular o intervalo de confiança de cada preço e
multiplicar a produção respectiva pelos limites inferior e superior.
Assim, obtém-se o limite inferior e superior da produção. Depois,
segue-se a metodologia de cálculo da Plena e obtêm-se os limites
inferiores e superiores das taxas internas de retorno. A estrutura
de custo permaneceu invariante.
Outra opção é calcular a variância da produção que é a
soma dos quadrados das quantidades produzidas multiplicadas
pelas respectivas variâncias dos preços. A raiz quadrada da vari-
ância obtida é multiplicada por 1,96. Da produção obtida, soma-se
e subtrai-se o valor encontrado. Esta opção não foi seguida. As-
sim, o intervalo de variação da taxa de retorno foi calculado base-
ando-se na hipótese que se conhece, no primeiro ano, o preço
médio, o limite inferior do preço de cada produto e o limite superi-
or, e que as demais variáveis que entram no cálculo da taxa de
retorno são conhecidas com certeza, hipótese, obviamente, herói-
ca. O preço médio e os limites superior e inferior permanecem
constantes nos demais onze anos. Se a série for estacionária,
este procedimento é correto. Quando a série não é estacionária,
substituiu-se o preço médio pelo predito, seguindo o procedimento
de um passo à frente, conforme discutido.
Qualquer um dos 20 projetos apresentou taxa interna mé-
dia de retorno acima daquela do capital, que está em torno de
11%. Somente 4 deles têm os limites inferiores das taxas anuais
de retorno menores do que 7%. Chama, também, atenção para a
grande diferença que existe entre o limite inferior e o superior. Na
média dos projetos, se a taxa de retorno fosse 1%, o limite inferior
igualar-se-ia a 0,42, e o superior, a 1,62%.
As principais observações que se podem tirar desse estu-
do de casos são:
• as variações de preços durante o ano e a tendência
declinante de preços indicam a necessidade de se tra-

178
balhar com uma composição de produtos que permita
mitigar o risco do valor da produção da propriedade.
Além do mais, o mercado, extremamente competitivo,
indica a necessidade de cada vez mais os produtores
necessitarem de se capacitar no cálculo da formação
de preço do seu produto;
• cada vez mais, para garantir uma taxa de retorno mais
elevada e para compensar os outros tipos de riscos,
os produtores devem ter um gerenciamento eficaz na
venda do seu produto, procurando ofertá-lo em perío-
dos mais favoráveis e em quantidade capaz de dispu-
tar os melhores mercados.

6.5.4 - Estratégias para mitigar os riscos do negócio

Como na seção anterior, ouviram-se investidores a-


tuais e potenciais em agricultura irrigada no Nordeste brasi-
leiro e norte de Minas sobre a maneira de mitigar os riscos
citados. As propostas foram:
1. Informações detalhadas sobre os tipos de cultivos
possíveis de serem desenvolvidos nos projetos de irri-
gação, para efeito de estudo preliminar de mercado,
sem as quais o processo de decisão não se iniciaria.
2. Indicação de potencial para a exportação dos produtos
oriundos dos projetos, bem como das condições físi-
cas de embarque da produção vendida ao exterior.
3. Informações detalhadas de tecnologia de produção e
produtividades dos cultivos a serem explorados na á-
rea do projeto.
4. Garantias preliminares de que os projetos terão finan-
ciamento (notadamente do Banco do Nordeste).
5. Inventário da infra-estrutura social e produtiva disponí-
vel: estradas, escolas, eletricidade etc.

179
6. Disponibilidade de mão-de-obra e qualificação dos tra-
balhadores na região, bem como experiência no trato
da irrigação.
7. Indicações de prazo provável de estudos, implantação,
início de operação e horizonte de maturação dos in-
vestimentos no projeto.
8. Estimativas preliminares de horizonte de maturação e
taxas de retorno prováveis do projeto, com base em
experiências idênticas.
9. Adesão de empresas construtoras que seriam associ-
adas à formação de um grupo para execução das o-
bras do projeto.
10. Indicações de adesão de parcerias com bancos nacio-
nais ou estrangeiros (nas carteiras de participação) e
de garantia de créditos de capital fixo, de investimento,
custeio, comercialização e exportação.
11. Incentivos fiscais para aumentar e acelerar os retornos
de projetos economicamente viáveis.
12. Promoção permanente sobre os produtos brasileiros,
por parte do Governo.

6.5.5 - Descrição das taxas internas

Consulta realizada junto a investidores atuais e potenciais


do negócio da agricultura irrigada, considerando os aspectos de
riscos citados anteriormente, mostrou ser atrativo esse tipo de
investimento. A taxa interna de retorno financeiro foi calculada
conforme condições normais de operacionalização e variou de 45
a 50%.

6.5.6 - Premissas norteadoras da participação do setor


público, esferas federal, estadual e municipal

O papel do setor público é oferecer bens e serviços públi-


cos de boa qualidade. Não deve prover bens e serviços privados
que são da competência do setor privado. A agricultura irrigada é
180
muito exigente em termos de bens públicos estratégicos. Baseado
neles, o setor privado monta seus planos de gestão e investimen-
tos. Os investimentos serão tão mais viáveis quanto mais bem
empregados forem os escassos recursos públicos.
Para a atração dos investimentos privados é necessário,
em primeiro lugar, definir, precisamente, o papel do setor públi-
co, o que está sendo feito na proposta de lei que se encontra
em outra seção deste estudo. Em segundo lugar, devem-se
criar condições ótimas para que o setor privado invista com
lucro. Em terceiro lugar, é necessário mostrar que o negócio de
irrigação pode competir vantajosamente com outras oportuni-
dades de investimento.
Havendo uma definição irreversível acerca do papel do Es-
tado no novo paradigma, os investidores assumem suas respon-
sabilidades. A implantação da nova política de irrigação, com a
participação do setor privado, em volumes maiores de investimen-
tos, dependerá de mudança de paradigmas de atuação, tanto em
razão do porte dos investimentos necessários, quanto pelos riscos
associados.
São patentes a instabilidade institucional dos órgãos en-
volvidos com a irrigação e a carência de coordenação na presta-
ção de serviços e na oferta de bens públicos. A pergunta-chave é:
uma vez identificado o conjunto de bens públicos mínimos – o que
será feito neste capítulo – quem coordenará a oferta dos bens
públicos? Esta pergunta enseja um desafio a ser vencido.
♦ A Atividade de Suporte dos Órgãos Envolvidos na Área de
Irrigação
Nos projetos públicos, todas as etapas de estudos iniciais
até a implantação definitiva dos projetos são feitas pelos órgãos
ligados ao setor, nos mesmos moldes de como opera, por exem-
plo, a Codevasf. Esta sistemática de operação é conhecida.
Entretanto, para os projetos mistos e projetos privados, a
atuação do setor público concentra-se em algumas tarefas especí-
ficas para facilitar o investimento particular.

181
Em primeiro lugar, o setor público é responsável pelos es-
tudos de pré-viabilidade, incluindo-se as características hidráuli-
cas, estrutura fundiária etc. Caberá ao Estado ou ao órgão do E-
xecutivo realizar estudos de pré-viabilidade e mostrar as condi-
ções de execução de projetos e, assim, permitir a decisão, melhor
fundamentada, dos empresários.

182
♦ Atuação do Setor Privado a Partir da Atuação do Setor
Público

A partir da atuação do setor público, com a disponibilização


da plataforma de informações e estudos de pré-viabilidade, o setor
privado realiza uma série de atividades na definição do seu negócio
envolvendo o projeto de irrigação. De forma individual ou coletiva:
1. Elabora o projeto de viabilidade.
2. Promovem-se os estudos ambientais preliminares.
3. Realiza os estudos finais para licenciamento ambiental
(estudo de impacto ambiental e seu respectivo Rima).
4. Promove gestão para obter o licenciamento ambiental
e a outorga da água.
5. Realiza o estudo da hidroeconomicidade (volume de
produção e rentabilidade), produtividade hídrica (R$ por
metro cúbico de água), com base em cultivos mais ren-
táveis, estudos de mercado, prospeção de mercado.
6. Desenha e detalha o projeto financeiro, estima os flu-
xos de caixa líquidos dos projetos e realiza os cálculos
de rentabilidade do projeto.
7. Elabora o projeto de assistência técnica.
8. Identifica as necessidades de infra-estrutura básica,
em educação, saúde, transportes, energia elétrica.
9. Busca parcerias do governo estadual, para estradas e
energia, e do município, para saneamento, educação e
saúde.
10. Procura parcerias com empresas líderes e demais
empresas a serem associadas ao investimento.
11. Busca parcerias com agentes financeiros públicos e
privados.
12. Busca financiamento externo.

183
13. Faz a divulgação do projeto (lançamento) para a co-
munidade de corretores de negócio, investidores indi-
viduais e institucionais.
♦ Formas de Atuação Estratégica do Setor Público
Os bens públicos são de estratégica importância para a vi-
abilização dos investimentos privados na irrigação. Sobre este
conjunto de bens públicos devem recair os esforços do Estado,
em todas as esferas possíveis. A maior parcela de bens públicos
diz respeito a informações, que têm custos de geração muito ele-
vados, acima das possibilidades de investidores de pequeno e
médio portes. Outro papel importante é a implantação de sistemas
de regulamentação e legislação, que devem ser cumpridos e res-
peitados. Nesta seção é fornecida uma lista indicativa, não exaus-
tiva, de ações e bens públicos essenciais.
A assistência técnica, lato sensu, destaca-se como um pa-
pel do Estado e deve cobrir os seguintes elementos:
• Disponibilidade de água.
• Viabilidade financeira da irrigação (estudos indicativos
para o setor privado usar como elementos de julgamen-
to das decisões acerca dos investimentos)
• Identificação dos pólos de irrigação que têm potencial
de investimento (onde haja densidade de políticas pú-
blicas e condições de fornecimento de insumos básicos
da atividade).
• Pesquisa de novos produtos, sistemas eficientes de irri-
gação etc.
• Formação de parcerias em estudos de mercado, para
nortear o setor privado nas identificações de negócios.
• Facilitação de negócios no exterior – promoção comercial.
• Negociações comerciais nos âmbitos regional e multi-
lateral.

184
Nas esferas de regulamentação, cabe ao Estado a supervi-
são dos grandes projetos privados, de modo a evitar a geração de
externalidades “negativas” para as regiões onde são desenvolvidos.
Nesta mesma linha, cabe ao Estado, ainda, a legislação e regula-
mentação do uso da água. Finalmente, o Estado deve implementar
a nova legislação de recursos hídricos e do meio ambiente.
Há algumas funções, também, específicas, entre as quais
estão:
1. Normalização e padronização de produtos, equipamen-
tos e insumos agrícolas.
2. Reforço significativo da área de defesa sanitária vege-
tal, não somente em termos de pesquisa, como também
de pessoal de campo e capacitação institucional.
3. Credenciamento de instituições que certifiquem equi-
pamentos e insumos.
4. Compatibilização da legislação brasileira com a estran-
geira, no que tange a mercados, produtos, processos e
insumos.
5. Monitoramento do uso de recursos naturais e meio
ambiente (além da fiscalização normal, a pesquisa
nestas áreas).
Além das funções clássicas descritas acima, há um conjun-
to de investimentos estratégicos a ser conduzido pelo Estado, que
é essencial para o setor de irrigação. As aludidas ações podem
ser divididas em duas áreas: treinamento básico e ações na área
de crédito rural e financiamento.
Na área de capacitação, cabe destacar:
• Assistência Técnica às Organizações de Usuários e
Comunidades.
• Metodologia de Formação de Associações Comunitárias.
• Treinamento em Operação e Manutenção de Perímetros.
• Marketing e Processamento de Produtos.

185
• Tecnologia de Sanidade Vegetal.
• Controle de Qualidade.
Na área de treinamento de crédito rural e financiamento,
há que assinalar algumas ações estratégicas:
• Treinamento dos Mutuários em Técnicas de Administra-
ção de suas Contas Gráficas (treinamento de como ge-
rir empréstimos).
• Treinamento básico em Administração Financeira.
• Treinamento do Pessoal de Crédito em Assistência
Técnica ao Nível de Carteira.
• Disseminação de Cadernos de Assistência Técnica e
Financeira.
• Treinamento em Facilitação de Acesso ao Crédito.
• Treinamento em Operações de Crédito Solidário.
• Treinamento em Linhas de Financiamento para a Agri-
cultura Familiar e Modalidades Semelhantes.
• Treinamento em Participação em Fundos de Desenvol-
vimento Local.
♦ Incentivos Financeiros, Fiscais e Institucionais
Apresentam-se, nesta seção, os incentivos que servem
como fatores impulsionadores dos investimentos privados no setor
de irrigação.
1. Um grande incentivo para o setor é representado pela
aprovação da Lei de Irrigação (e as regulamentações
subseqüentes). Pela proposta, ela é “amigável” à atra-
ção de investimentos privados, sobretudo definindo,
claramente, os limites de atuação do Estado.
2. Disponibilização de recursos orçamentários dos esta-
dos para infra-estrutura de energia, estradas, comuni-
cação, transporte, com destinação às áreas em que o

186
setor privado demonstre interesse de investir ou em
áreas vocacionadas, por designação do Estado.
3. Disponibilização de fundos estaduais de irrigação,
formados com a finalidade específica de desenvolver a
irrigação. Um exemplo é o Fundo Estadual de Irriga-
ção (Feir), da Lei 12.532 (12/12/95), do Estado do Ce-
ará, apoiado por recursos do tipo matching grants, que
envolvem o Estado, o Município, a União, etc.; desti-
nados a estudos, pesquisas tecnológicas, dissemina-
ção de tecnologias e capacitação (Ceará, 1996).
O Feir também se destina a equalizar taxas de juros de em-
presas irrigantes, voltadas à exportação e à prática/substituição de
processos de produção por inovações recomendadas pela pesquisa.
4. Incentivos fiscais (Imposto Sobre Circulação de Mer-
cadorias e Serviços (ICMS), Imposto de Renda, Con-
tribuição para Financiamento da Seguridade Social
(Cofins) nos setores de processamento industrial, Im-
posto sobre Produtos Industrializados (IPI), nos de e-
quipamentos etc.).
5. Incentivos fiscais indutores de tecnologia e qualidade,
como, por exemplo, o abatimento de imposto para irri-
gantes que usem assistência técnica, preservem o
meio ambiente, façam o controle fitossanitário corre-
tamente, etc. (como no caso da experiência de Mato
Grosso com o algodão).
6. Incentivos para acelerar a taxa de retorno, não para
viabilizar economicamente o projeto.
7. Fundos de aval. Este mecanismo é importante para as
pequenas e médias empresas, no que diz respeito ao
fornecimento de garantias às instituições financeiras. É
o fundo de aval, previsto na Lei n.º 8.864/94, formado
por recursos do Sebrae.
8. Fundos de garantia de crédito que se tornaram possí-
veis, em virtude da aprovação da Resolução do CMN
n.º 2.211, de 16/11/95.

187
9. Outorga de créditos para a exportação (e importação),
pelas associações de instituições financeiras regio-
nais, como as iniciativas do Programa Especial de Ex-
portações (PEE) – já em plena fase de operacionaliza-
ção. Há consciência de que é necessário desenvolver
programa de financiamento de médio e longo prazos,
para incentivar as exportações de pequenas e médias
empresas da Região, vinculado à capacitação geren-
cial e modernização tecnológica.
10. Acesso a créditos institucionais de bancos de desen-
volvimento e fomento (como no caso do Banco do
Nordeste).
11. Ações de promoção de exportações estão sendo de-
senvolvidas, em âmbito estadual, pelos Sebraes e pe-
las Promoexports, com maior destaque, neste último
caso, para o Promoexport da Bahia, que atua de forma
dinâmica e se transforma num centro internacional de
negócios. Assim como vem sendo desenvolvido tarifa-
ções pela Gerência de Negócios Corporativos do Ban-
co do Nordeste.
Importante papel do Estado representam as ações que a-
traem para o setor investimentos da iniciativa particular. Alguns
estados da Região têm posto em prática, com relativo sucesso, as
referidas ações. São bem conhecidos os sistemas de captação de
investimentos. Eles podem ter um forte efeito de emulação para a
atração de maior número de investidores, inclusive do exterior.
Estão em ação os consultores de investimentos, importantes na
captação de novos investimentos.
Considerando-se a importância do comércio exterior para a
rentabilidade do negócio, torna-se imprescindível o financiamento
de empresas do exterior, potencialmente interessadas no negócio
da irrigação.
Os produtores, suas organizações e o negócio de irrigação
necessitam de formas de associação de capital. O capital tanto
pode vir sob a forma de recursos financeiros (mediante participa-
ção acionária), como na de capital tecnológico (tecnologia, consul-
toria de gestão, capacidade gerencial física, financeira e mercado-

188
lógica). Pode também estar associado à organização de mercado,
coordenação de produção, gestão de prestação de serviços, etc.
Por esse motivo, a atividade de promoção de investimentos mos-
tra-se essencial para a “animação” do ambiente de negócios. Ela
é muito mais importante quando ligada ao comércio exterior, atra-
indo para as empresas brasileiras capital financeiro e tecnológico,
mediante parcerias com empresas do exterior.
Os projetos estruturantes, ligados à promoção de investi-
mentos, visam mobilizar capital dentro da Região, atrair capital
externo, ampliar mercados e estimular a transferência de tecnolo-
gia para empreendimentos do setor. Um projeto desta natureza é
importante na formação de canais de informação e divulgação de
oportunidades de negócios
Finalmente, um problema importante é a elevada taxa de
mortalidade precoce de pequenas e médias empresas. Este é um
ponto que merece o devido cuidado. Para equacionar este pro-
blema, vale sugerir a criação de incubadoras de empresas.
Existem três principais fontes de geração de novas peque-
nas e médias empresas. A espontânea, o “spin-off” de empresas e
o “spin-off” de centros de pesquisas e universidades. Qualquer
que seja a fonte, é elevada a taxa de mortalidade. Nos EUA, che-
ga a 2/3 e, no Brasil, a 4/5.
A incubadora de empresas, que está sendo apontada pelo
Congresso Americano como paradigma de geração de empresas
novas, é a forma de dar ao empresário tempo para que este se
torne competitivo.
Geralmente a incubadora é ligada a um centro gerador de
tecnologia (empresa ou “centro-mãe”), mas não necessariamente.
A incubadora é criada por instituições interessadas na geração de
empregos e empresas. Consiste num local físico onde são forne-
cidos todos os ingredientes para as novas empresas reduzirem
drasticamente os custos fixos, pois eles são compartidos e, às
vezes, subsidiados.
A permanência em média de uma empresa numa incuba-
dora tecnológica, por exemplo, pode variar de 3 a 5 anos. Depen-
de, entretanto, da atividade que desenvolve.

189
Existem no Brasil mais de 700 empresas incubadas e a-
proximadamente 70 incubadoras.
A taxa de mortalidade das empresas americanas incuba-
das se aproxima de zero. No Brasil, dados da Associação Nacio-
nal de Entidades Promotoras de Empreendimentos de Tecnologia
Avançada (ANPROTEC) revelam que a taxa de mortalidade é de
20%. As incubadoras podem ser ou não de cunho tecnológico.
O atendimento às necessidades financeiras das pequenas
empresas de base tecnológica ainda é precário. O tratamento es-
pecial às empresas incubadas atende a um número muito reduzi-
do de empresas, não só pela carência de linhas de financiamento,
mas também pela capacidade de absorção de novas unidades
produtivas pelas incubadoras. Além disso, não há incentivo para o
processo de desincubação, o que pode aumentar a taxa de morta-
lidade desses empreendimentos.
A qualificação das empresas para a formulação adequada
de suas necessidades de financiamento é precária. Esta falha
deveria ser equacionada no processo de incubação ou em treina-
mento e capacitação. Verifica-se, na literatura, que há deficiência
de conhecimento das empresas pequenas e médias, quanto às
opções de financiamento, tanto quanto entre os produtores.
Outras vezes as empresas apresentam projetos que solici-
tam a aquisição de equipamentos e recursos para capital de giro,
deixando de lado aspectos essenciais para assegurar a competiti-
vidade, como: capacitação tecnológica e gerencial. Assim, solici-
tam crédito sem um plano de gestão compatível. Nesse sentido,
as instituições públicas (em associação com as entidades repre-
sentativas de empresas) têm um importante papel de capacitação
do empresariado.

190
7 - BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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de gerenciamento de recursos hídricos, regulamenta o inciso
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Lei 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei 7.990,
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retificado em 27 jul. 1934. Seção 1, p. 15.358-15.459.
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194
8 - ANEXOS

195
196
8.1 - Legislação e Normas Relativas ao Subsetor de
Irrigação do Brasil

Legislação e normas relativas ao meio ambiente, aos recursos hídricos e


à organização do subsetor de irrigação do Brasil. Em ordem cronológica.
N.º Instrumento legal Ementa
1 Decreto n.º 7.619, de 21/10/1909 Cria a Inspetoria de Obras Contra as
Secas (Iocs)
2 Decreto n.º 13.687, de 09/07/19 Transforma a Inspetoria de Obras Contra
as Secas em Inspetoria Federal de Obras
Contra as Secas (Ifocs)
3 Decreto n.º 24.643, de 10/07/34 Institui o Código de Águas
4 Decreto-Lei n.º 852, de 11/11/ 38 Introduz modificações no Código de
Águas
5 Decreto-Lei n.º 8.486, de 28/12/45 Estrutura o Departamento Nacional de
Obras Contra as Secas (Dnocs)
6 Lei n.º 541, de 15/12/48 Cria a Comissão do Vale do São Francis-
co (CVSF)
7 Decreto-Lei n.º 45.445, de 20/02/59 Transforma o Grupo de Trabalho para o
Desenvolvimento do Nordeste (GTDN)
em Conselho de Desenvolvimento do
Nordeste (Codene)
8 Lei n.º 3.692, de 15/12/59 Cria a Superintendência de Desenvolvi-
mento do Nordeste (Sudene)
9 Lei n.º 4.771, de 15/09/65 Institui o Código Florestal
10 Lei n.º 5.197, de 03/01/67 Dispõe sobre proteção à fauna
11 Decreto-Lei n.º 200, de 25/02/67, vigo- Aprova a Reforma Administrativa, institu-
rando a partir de 15/03/67 indo o Ministério do Interior
12 Decreto-Lei n.º 270, de 28/02/67 Institui o Código de Mineração
13 Decreto-Lei n.º 292, de 28/02/67 Transforma a Comissão do Vale do São
Francisco em Superintendência do Vale
do São Francisco (Suvale)
14 Decreto n.º 63.775, de 11/12/68 Cria o Grupo Executivo de Irrigação para
o Desenvolvimento Agrícola, no âmbito
do Ministério do Interior
15 Lei n.º 6.088, de 16/07/74 Cria a Companhia de Desenvolvimento
do Vale do São Francisco (Codevasf)
16 Lei n.º 6.225, de 14/07/75 Discrimina regiões de execução obrigató-
ria de planos de proteção do solo e de
combate à erosão
17 Decreto n.º 77.775, de 08/06/75 Regulamenta a Lei n.º 6.225/75
(continua)

197
(continuação)
N.º Instrumento legal Ementa
18 Lei n.º 6.662, de 25/06/79 Lei de Irrigação – dispõe sobre a Política
Nacional de Irrigação
19 Lei n.º 6.766, de 19/12/79 Estabelece as áreas de proteção especi-
al, que trata do parcelamento do solo
urbano
20 Decreto n.º 86.146, de 23/06/81 Implementa o Programa de Aproveita-
mento das Várzeas Irrigáveis (Provárzeas
Nacional), pelo Ministério da Agricultura
21 Lei n.º 6.938, de 31/08/81 Dispõe sobre a Política Nacional de Meio
Ambiente
22 Decreto n.º 86.916, de 10/02/82 Institui o Programa de Financiamento
para Equipamentos de Irrigação (Profir)
23 Decreto n.º 88.351, de 01/06/83 Regulamenta a Lei 6.938/81 e a Lei n.º
6.902/81
24 Decreto-Lei n.º 2.032, de 29/06/83 Dispõe sobre o ressarcimento de investi-
mentos realizados em irrigação nas
regiões semi-áridas do Nordeste
25 Decreto n.º 89.336, de 31/01/84 Dispõe sobre reservas ecológicas e áreas
de relevante interesse ecológico
26 Decreto n.º 89.496, de 29/03/84 Regulamenta a Lei n.º 6.662/79, Lei de
Irrigação
27 Decreto n.º 90.309, de 16/10/84 Altera o Decreto n.º 89.496/84
28 Decreto n.º 90.991, de 26/02/85 Altera o Decreto n.º 89.496/84
29 Resolução CONAMA n.º 004, de 18/09/85 Trata das reservas ecológicas
30 Resolução CONAMA n.º 001, de 23/01/86 Estabelece responsabilidades, critérios,
definições, diretrizes para Avaliação de
Impacto Ambiental
31 Decreto n.º 92.344, de 29/01/86 Institui o Programa de Irrigação do Nor-
deste (Proine)
32 Decreto n.º 92.395, de 12/02/86 Institui o Programa Nacional de Irrigação
(Proni)
33 Portaria n.º 74, de 03/06/86, do Ministro Dispõe sobre o destino de lotes, em
Extraordinário para Assuntos de Irrigação projetos públicos de irrigação, para pro-
fissionais de Ciências Agrárias
34 Resolução CONAMA n.º 20, de 18/06/86 Estabelece a classificação das águas
doces, salobres e salinas do Território
Federal
(continua)

198
(continuação)
N.º Instrumento legal Ementa
35 Decreto n.º 93.484, de 29/10/86 Altera o Decreto n.º 89.496/84
36 Decreto n.º 93.407, de 04/11/86 Regulamenta o Decreto-Lei n.º 2.032/83
37 Decreto n.º 94.314, de 07/05/87 Aumenta o prazo para execução do Proni
38 Decreto-Lei n.º 2.369, de 11/11/87 Altera o Decreto-Lei n.º 2.032/83
39 Decreto n.º 95.192, de 12/11/87 Altera o Decreto n.º 93.507 ou 93.407
40 Decreto n.º 95.733, de 12/02/88 Dispõe sobre a inclusão no orçamento
dos projetos e obras federais, de recursos
destinados a prevenir ou a corrigir prejuí-
zos de natureza ambiental
41 Lei n.º 7.735, de 22/02/89 Extingue a Secretaria Especial do Meio
Ambiente (Sema) e a Superintendência
de Desenvolvimento da Pesca (Sudepe)
e cria o Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama)
42 Decreto n.º 97.628, de 10/04/89 Regulamenta o art. 21, da Lei n.º
4.771/65 – Código Florestal
43 Decreto n.º 97.635, de 10/04/89 Regulamenta o art. 27, da Lei n.º
4.771/65 – Código Florestal
44 Lei n.º 7.803, de 18/07/89 Altera a Lei n.º 4.771/65 – Código Flores-
tal
45 Lei n.º 7.804, de 18/07/89 Altera a Lei n.º 6.938/81, que dispõe
sobre a Política Nacional de Meio Ambi-
ente
46 Lei n.º 7.875, de 13/11/89 Modifica o Código Florestal instituído pela
Lei n.º 4.771/65
47 Portaria Normativa n.º 1, de 04/01/90, do Dispõe sobre a cobrança no fornecimento
IBAMA de Licença Ambiental, bem como sobre
os custos operacionais referentes à
análise e vistoria de projetos
48 Lei n.º 8.029, de 12/04/90 Extingue a Superintendência de Desen-
volvimento do Centro Oeste (Sudeco),
Superintendência de Desenvolvimento da
Região Sul (Sudesul) e o Departamento
Nacional de Obras de Saneamento
(DNOS)
continua

199
continuação
N.º Instrumento legal Ementa
49 Decreto n.º 99.240, de 07/05/90 Regulamenta a Lei n.º 8.029/90
50 Decreto n.º 99.274, de 06/06/90 Regulamenta a Lei n.º 6.938/81
51 Decreto n.º 99.451, de 15/08/90 Transfere para a Secretaria Nacional de
Irrigação do Ministério da Agricultura e
Reforma Agrária as atribuições e acervo
do extinto DNOS e as atividades de
controle das cheias para a Secretaria de
Políticas Regionais da Presidência da
República
52 Lei n.º 8.657, de 21/05/93 Altera a Lei n.º 6.662/79 – Lei de Irriga-
ção
53 Lei n.º 8.666, de 21/06/93 Regulamenta o art. 37, inciso XXI da
Constituição Federal, institui normas para
licitações e contratos da Administração
Pública
54 Lei n.º 9.074, de 07/07/95 Disciplina forma de participação dos
usuários na fiscalização de serviços
públicos concedidos
55 Resolução CONAMA n.º 02, de 18/04/96 Reparação de danos ambientais
56 Lei n.º 9.433, de 08/01/97 Institui a Política Nacional de Recursos
Hídricos e cria o Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos -
.Lei das Águas
57 Decreto n.º 2.178, de 17/03/97 Altera o Decreto n.º 84.496/84 que regu-
lamenta a Lei de Irrigação
58 Resolução CONAMA n.º 237, de 19/12/97 Redefine conceitos relacionados a meio
ambiente, atividades sujeitas a licencia-
mento, competências de órgãos ambien-
tais, dentre outros.
59 Lei n.º 9.417, de 26/12/97 Institui a Agência Nacional de Energia
Elétrica (Aneel)
60 Lei n.º 9.605, de 31/02/98 Lei de Crimes Ambientais
61 Lei n.º 9.649, de 27/05/98 Dispõe sobre a organização da Presidên-
cia da República e dos Ministérios
62 Decreto nº 2.612, de 03/06/98 Regulamenta o Conselho Nacional dos
Recursos Hídricos, previsto na Lei nº
9.433/97
63 Lei n.º 9.795, de 27/04/99 Dispõe sobre Educação Ambiental, insti-
tui a Política Nacional de Educação Am-
biental
(continua)

200
(conclusão)
N.º Instrumento legal Ementa
64 Medida Provisória n.º 1.874-13, de Altera a Lei n.º 9.605/98 – Lei de
28/07/99 Crimes Ambientais
65 Medida Provisória n.º 1.911-8, de Altera a Lei n.º 9.649/98, que dispõe
29/07/99 sobre a organização da Presidência
da República e dos Ministérios
66 Decreto n.º 3.179, de 21/09/99 Regulamenta a Lei n.º 9.605/98, de
Crimes Ambientais

8.2 - Contribuição ao Novo Marco Legal da Irrigação no


Brasil

Dentre os objetivos previstos no estudo, inclui-se a realiza-


ção de um conjunto de estudos para complementar a análise das
reformas institucionais necessárias, inclusive sugerindo a elabora-
ção de propostas de legislação e regulamentação, indispensáveis
à utilização eficiente e eqüânime da água na irrigação.
Esta atividade foi iniciada em agosto de 1999, ante dispo-
sição do Banco de atender à demanda do Ministério da Integração
Nacional, de oferecer subsídios para a discussão em curso, no
Congresso Nacional, do Projeto de Lei 229/95, relativo à Irrigação.
Assim, pelo Relatório Específico - CONTRIBUIÇÕES AO
NOVO MARCO LEGAL DA IRRIGAÇÃO NO BRASIL, o Consórcio
atendeu, em dezembro de 1999, ao determinado pelo Banco.
Na condução do trabalho, o Consórcio realizou detida aná-
lise comparada da legislação em vigor (Lei de Irrigação, n.º
6.662/79 e seus regulamentos), do PL 229/95 e de legislação cor-
respondente de onze países, cuja análise se encontra no Volume
2 Estado da Arte da Irrigação.
Em seguida, uma primeira versão de substitutivo foi por ele
elaborado e discutido prévia e sucessivamente com o Banco e
Assessoria Técnica do Ministério da integração Nacional, tendo
como referências não só a legislação de irrigação e correlata em
vigor, o PL 229/95, como também uma proposta de lei, elaborada
pela Codevasf, resultando, então, uma segunda versão, ainda
preliminar, levada à discussão, em seminário específico, promovi-
do pelo Banco e pelo Ministério da Integração Nacional, em Brasí-

201
lia, ao final de outubro de 1999. Na oportunidade, participaram
mais de 100 pessoas das mais diversas áreas.
Uma terceira e última versão foi então finalizada e discuti-
da exaustivamente com a Assessoria Técnica do Ministério e por
esta com seus órgãos vinculados, resultando, por fim, na presente
versão do Ministério da Integração Nacional e por este oferecida
ao eminente Relator do PL 229/95, Senador Osmar Dias.

202
MINUTA DE PROJETO DE LEI

LEI N.º , DE DE DE

Dispõe sobre a Política Nacional de


Irrigação e dá outras providências.

CAPÍTULO I
DA POLÍTICA NACIONAL DE IRRIGAÇÃO

Art. 1º - A Política Nacional de Irrigação será executada na


forma desta Lei, com vistas ao aproveitamento racional dos recur-
sos de água e solos para o desenvolvimento de projetos hidroagrí-
colas, orientados para a prática da agricultura irrigada sustentável.
§ 1º . A política definida nesta Lei será executada de modo
compatível com as políticas agrícola, de recursos hídricos e meio
ambiente.
§ 2º . Para os efeitos desta Lei, entende-se por aproveita-
mento racional dos recursos de água e solos aquelas práticas que
promovam a maximização da produção com a utilização mínima
desses recursos.
§ 3º . O potencial de mercado e a participação da iniciativa
privada constituem fatores relevantes de indução e apoio gover-
namentais à implantação de projetos de desenvolvimento da agri-
cultura irrigada.

CAPÍTULO II
DOS OBJETIVOS

Art. 2º - A Política Nacional de Irrigação tem como objetivos:


I – aumentar a produção e produtividade agropecuárias;
II – reduzir os riscos inerentes à atividade agropecuária;

203
III – garantir a prioridade da função econômica e social dos
solos irrigáveis;
IV – apoiar a irrigação em âmbito nacional, especialmente
em áreas onde as condições hidrológicas são desfavoráveis para
a prática da agricultura, mas que apresentem vantagens competi-
tivas;
V – estimular a atuação de agentes privados e públicos na
agricultura irrigada, em áreas prioritárias definidas, observando-se
critérios técnicos, culturais, sociais, econômicos e ambientais;
VI – estimular e apoiar o desenvolvimento de pesquisa,
adaptação e adequação de tecnologia orientada para o uso racio-
nal de recursos de água e solos, e prevenção de doenças veicula-
das pela água;
VII – integrar-se com outros planos setoriais do planeja-
mento de utilização dos recursos de água e solos da bacia hidro-
gráfica;
VIII – difundir tecnologia de uso e manejo dos recursos de
água e solos;
IX – enfatizar e apoiar a formação regular e a capacita-
ção intensiva e permanente de recursos humanos em agricultu-
ra irrigada;
X – promover a participação da iniciativa privada nos proje-
tos de irrigação;
XI – conciliar a promoção do desenvolvimento hidroagríco-
la com a gestão ambiental e de recursos hídricos; e
XII – prevenir endemias rurais.

CAPITULO III
DAS DEFINIÇÕES

Art. 3º - Para os efeitos desta Lei entende-se por:


I - Projeto público de irrigação, aquele implementado pe-
lo Poder Público e cuja infra-estrutura de irrigação e drenagem, de

204
uso coletivo, seja, inicialmente, de sua propriedade, podendo ser
alienada ou arrendada;
II - Projeto privado de irrigação, aquele implementado
pelo setor privado ou por este adquirido do Poder Público;
III - Projeto misto de irrigação, aquele implementado de
forma compartilhada pelo Poder Público e setor privado;
IV - Irrigante, pessoa física ou jurídica que explora a ativi-
dade de agricultura irrigada;
V - Área irrigável, área de terra que, em decorrência de
estudos técnicos e econômicos, é considerada apta para a prática
da agricultura irrigada;
VI - Áreas de sequeiro, áreas de terras adjacentes às á-
reas irrigáveis ou internas, dentro dos limites dos projetos de irri-
gação, não suscetíveis de serem irrigadas;
VII - Tarifa, valor a ser pago pelo irrigante pelo uso da á-
gua e da infra-estrutura de irrigação de uso coletivo;
VIII - Distrito de irrigação, sociedade civil de direito priva-
do, sem fins lucrativos, com personalidade jurídica, patrimônio e
administração próprios, com prazo de duração indeterminado, que
congrega os irrigantes de um ou mais projetos de irrigação, com a
finalidade de administrar, operar e manter a infra-estrutura de irri-
gação de uso coletivo;
IX - Infra-estrutura de uso múltiplo, compreende todas
as obras que servem aos objetivos da área irrigada e de outras
finalidades e que, normalmente, são compartilhadas com o subse-
tor de irrigação;
X - Infra-estrutura de irrigação de uso coletivo, compre-
ende todas as obras, estruturas e equipamentos de uma área irri-
gada e que servem compartilhadamente a mais de um irrigante;
XI - Infra-estrutura social, as edificações e os equipamen-
tos destinados às áreas de saúde, educação, lazer e segurança;
XII - Infra-estrutura parcelar, compreende as benfeitorias
e equipamentos internos implantados nos lotes agrícolas;

205
XIII – Empreendedor familiar, irrigante, pessoa física, que
atua diretamente na produção agropecuária, em lote cuja dimen-
são e critérios são definidos com base em estudos específicos
para cada projeto, em área cuja dimensão seja capaz de assegu-
rar a sua promoção econômica e social e de sua família;
XIV - Benfeitorias úteis e necessárias, são aquelas cons-
truídas pelo irrigante, em seu lote, para complementar o sistema
de irrigação, bem como a infra-estrutura de armazenagem, de
beneficiamento e de produção agroindustrial;
XV - Plano Nacional de Irrigação, conjunto de programas
de irrigação que tem por finalidade o desenvolvimento da agricul-
tura irrigada no País;
XVI - Programa de Irrigação, conjunto de ações e proje-
tos de irrigação que tem por finalidade o desenvolvimento sócioe-
conômico de determinada região;
XVII - Aluguel, valor da retribuição paga pelo irrigante cor-
respondente ao arrendamento da infra-estrutura de irrigação e
drenagem de uso coletivo;
XVIII - Cota-parte, é a fração ideal das obras de infra-
estrutura de irrigação de uso coletivo, de propriedade do irrigante
por aquisição ou pela co-responsabilidade na construção, cuja
fração integra, como parte complementar e inseparável, o título de
domínio do lote.

CAPÍTULO IV
DOS INSTRUMENTOS

Art.4º - São instrumentos da Política Nacional de Irrigação:


I - o Sistema Nacional de Informações de Agricultura Irri-
gada, integrado ao Sistema Nacional de Informações Sobre Re-
cursos Hídricos;
II - o zoneamento ecológico-econômico;
III - os programas de pesquisa, assistência técnica e difu-
são de tecnologia;
IV - as normas, diretrizes, planos e programas para o setor;

206
V - o intercâmbio técnico em âmbito nacional e internacional;
VI - os incentivos fiscais e institucionais;
VII - os recursos financeiros do poder público e da iniciativa
privada;
VIII - o crédito agrícola.

CAPÍTULO V
DA AÇÃO DO PODER PÚBLICO

Art. 5º - Incumbe ao Poder Público, em seus respectivos


âmbitos de domínio e áreas de atuação, na implantação da Políti-
ca Nacional de Irrigação:
I - normatizar, apoiar, fiscalizar e monitorar as atividades
relacionadas à agricultura irrigada;
II - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos;
III - apoiar a capacitação técnica, a pesquisa e a difusão de
tecnologia;
IV - estimular a organização comunitária com vistas à au-
togestão dos projetos de irrigação;
V - estimular o desenvolvimento da agricultura irrigada;
VI - promover a articulação no âmbito federal, com Esta-
dos, Distrito Federal, Municípios e o setor privado;
VII - privilegiar a aplicação de recursos em projetos públi-
cos e mistos de indiscutível prioridade e rentabilidade;
VIII - estimular e apoiar investimentos privados na agricul-
tura irrigada; e
IX - estimular a criação de mecanismos indutores do de-
senvolvimento das cadeias produtivas ligadas à irrigação.

207
CAPÍTULO VI

DO PLANO, DOS PROGRAMAS E DOS PROJETOS DE


IRRIGAÇÃO

Art. 6º - O Plano Nacional de Irrigação, de caráter pluria-


nual, terá por base as disposições desta Lei, e conterá as priori-
dades do poder público federal para a irrigação compatibilizadas
com as prioridades regionais e das unidades federadas.
Parágrafo único - O Poder Público definirá os órgãos exe-
cutores do Plano Nacional de Irrigação.
Art. 7º - Os programas de irrigação serão elaborados pelos
Governos Federal, Estaduais, Municipais e do Distrito Federal, de
acordo com o Plano Nacional de Irrigação.
Art. 8º - Os projetos de irrigação serão previamente sub-
metidos aos órgãos competentes, para fins de outorga de direito
de uso de recursos hídricos e licenciamento ambiental.
Art. 9º - Os projetos de irrigação podem ser públicos, pri-
vados ou mistos.
Art. 10 - Projeto público de irrigação é aquele implementa-
do pelo Poder Público e cuja infra-estrutura de irrigação, de uso
coletivo, seja, inicialmente, de sua propriedade, podendo ser alie-
nada ou arrendada.
§ 1º. Os projetos públicos de irrigação serão de iniciativa
dos Governos Federal, Estaduais, Municipais e do Distrito Federal.
§ 2º . O Poder Público poderá transferir aos usuários de
um projeto público de irrigação, organizados sob a forma de
distrito de irrigação ou outra entidade autogestionária, a con-
cessão do mesmo, sob a forma de arrendamento, nos termos
da legislação pertinente.
Art. 11 - Projeto privado de irrigação é aquele cuja infra-
estrutura de irrigação de uso coletivo é projetada e implantada
pela iniciativa privada, ou por esta adquirida do Poder Público.

208
Art. 12 - Os projetos mistos de irrigação são aqueles im-
plementados de forma compartilhada pelo Poder Público, nos
três níveis, federal, estadual/Distrito Federal e municipal e setor
privado.
§ 1º. Os projetos mistos de irrigação serão organizados
sob a forma de entidade regida pelo direito privado, na qual o Po-
der Público detenha até 49% do capital social.
§ 2º . Nos projetos mistos de irrigação, o Poder Público,
com a parcela do capital investido, adquirirá parte da área do
projeto para instalação de empreendedores familiares, os quais,
por sua delegação, poderão ser instalados diretamente pelo se-
tor privado.
§ 3º . Nos projetos mistos de irrigação a parte da área ad-
quirida pelo Poder Público deverá ser alienada aos empreendedo-
res familiares por intermédio de processo licitatório, na forma da
lei, sendo facultada a delegação de competência ao setor privado
para a execução deste processo.
§ 4º . Os direitos e obrigações do Poder Público e da inicia-
tiva privada nos projetos mistos de irrigação serão ajustados em
contrato a ser celebrado entre as partes.

CAPÍTULO VII
DOS PROJETOS PÚBLICOS E MISTOS

SEÇÃO I
DO USO DO SOLO

Art.13 - Os projetos públicos de irrigação serão implanta-


dos, em terras do patrimônio público, para este fim desapropria-
das ou adquiridas.
§ 1º . Os projetos mistos de irrigação poderão ser localiza-
dos em terras do patrimônio público ou em áreas privadas.
§ 2º . Nos projetos públicos e na parte pública dos projetos
mistos as propriedades são resolúveis e os lotes destinados a
empreendedores familiares são indivisíveis.

209
§ 3º . As áreas necessárias à implantação de projetos pú-
blicos e mistos poderão ser desapropriadas ou adquiridas.
§ 4º . Para efeito de alienação, todas as obras e serviços
executados no lote terão seu custo incorporado ao valor da terra.
Art. 14 - Nas áreas desapropriadas ou adquiridas, de que
trata o artigo anterior, as terras agricultáveis serão sempre desti-
nadas à exploração intensiva, agropecuária ou agro-industrial e
divididas em lotes de dimensões variáveis, de acordo com a estru-
tura de produção projetada e a capacidade gerencial do irrigante.
§ 1º . Os lotes serão alienados a pessoas físicas ou jurídi-
cas mediante licitação pública.
§ 2º . Das licitações para venda dos lotes somente poderão
participar pessoas físicas ou jurídicas que tenham como objetivo
a agricultura irrigada e demonstrem capacidade para desenvolvê-
la, na forma estabelecida nos respectivos editais.
§ 3º . É parte intrínseca dos lotes adquiridos em processos
licitatórios o direito de uso da água, nas quantidades especifica-
das nos editais.
§ 4º . Para cada projeto será definida a área irrigável máxi-
ma passível de alienação a uma única pessoa física ou jurídica.
§ 5º . Nos estudos de implantação dos projetos públicos e
mistos de irrigação deverão ser previstas áreas cujos lotes serão
destinados exclusivamente aos empreendedores familiares.
Art. 15 - O lote do empreendedor familiar, cuja dimensão
não poderá ser inferior à área mínima de produção capaz de as-
segurar a promoção econômica e social do irrigante e sua família,
será definido com base em estudos específicos para cada projeto
e região.
Art.16 - Estabelecido o condomínio em razão da sucessão
por falecimento do empreendedor familiar, os condôminos esco-
lherão dentre eles o administrador do lote, ao qual competirá a
representação legal para todos os fins.

210
Parágrafo único – Inexistindo herdeiros, a entidade alie-
nante do lote poderá reivindicar a adjudicação em seu nome, de-
positando em juízo o valor da respectiva avaliação.
Art. 17 - As áreas em projetos públicos destinadas a obras
de infra-estrutura social, que deverão, preferencialmente, estar
situadas em terras não-irrigáveis, poderão ser objeto de cessão
gratuita.
§ 1º . Excepcionalmente, poderá ser cedido lote para enti-
dade pública, destinado a atividades de treinamento e experimen-
tação em agricultura irrigada.
§ 2º . A cessão gratuita de que trata este artigo será rever-
tida, caso não tenha sido cumprida sua destinação no prazo de
dois anos.
Art. 18 - As áreas consideradas urbanas, situadas em pro-
jetos públicos, poderão ser transferidas aos municípios onde se
localizem.
Art. 19 - Nos projetos públicos e mistos, em caso de apro-
veitamento da estrutura fundiária preexistente, os proprietários
das terras serão considerados irrigantes, desde que atendam aos
requisitos legais e aos objetivos dos respectivos projetos.
Parágrafo único - O não-cumprimento dos deveres de irri-
gante ensejará a desapropriação das terras.
Art. 20 - Os trabalhadores rurais que tenham exercido,
comprovadamente, atividades por mais de cinco anos nas áreas
adquiridas ou desapropriadas para implantação de projetos públi-
cos, serão considerados irrigantes, desde que atendam aos requi-
sitos legais e aos objetivos dos respectivos projetos.
Art. 21 - Nos projetos públicos, as obras de infra-estrutura
de irrigação de uso coletivo, implantadas com recursos públicos
e as respectivas faixas de domínio, serão, inicialmente, de
propriedade da entidade pública que implantar o projeto e, para
fins de alienação ou arrendamento, deverão ser avaliadas de
forma conjunta.

211
Art. 22 - Por ato do Presidente da República, poderão ser
declaradas de utilidade pública ou interesse social, para fins de
desapropriação, as áreas ou terras selecionadas para a implanta-
ção ou expansão de projetos públicos e mistos de irrigação, apli-
cando-se, no que couber, a legislação sobre desapropriações e a
regulamentação da presente Lei.

SEÇÃO II
DA INFRA-ESTRUTURA

Art. 23 - A infra-estrutura dos projetos públicos é composta


pela infra-estrutura de irrigação de uso coletivo, pela infra-
estrutura social e pela infra-estrutura parcelar.
Art. 24 - A infra-estrutura de irrigação de uso coletivo dos
projetos públicos e mistos será administrada, operada e mantida
por intermédio dos próprios irrigantes organizados, preferencial-
mente, em distrito de irrigação.
§ 1º . O Poder Público deverá promover a constituição de
um Distrito de Irrigação, ou outra entidade autogestionária, até o
prazo de um ano, após a instalação do primeiro irrigante.
§ 2º . As despesas correspondentes à administração, ope-
ração e manutenção da infra-estrutura de irrigação de uso coletivo
serão rateadas entre os seus usuários, sob forma de tarifa, de
acordo com o estabelecido em regulamento.
§ 3º . A tarifa de água será cobrada compulsoriamente de
todos os irrigantes pelo Poder Público, distrito de irrigação ou outro
concessionário, e seu valor deverá ser suficiente para cobrir as
despesas com a administração, operação e manutenção do projeto.
§ 4º . Nos projetos públicos de irrigação o Poder Público
deverá custear os acréscimos de custos operacionais correspon-
dentes à área irrigável ainda não ocupada.
§ 5º . O Poder Público poderá contratar diretamente o distri-
to de irrigação para a realização de obras de infra-estrutura, ob-
servadas as normas legais.

212
Art. 25 - Fica o Poder Público autorizado a alienar aos irri-
gantes do projeto, por intermédio do Distrito de Irrigação, inde-
pendentemente de processo licitatório, as obras de infra-estrutura
de irrigação de uso coletivo, devendo o prazo de pagamento limi-
tar-se ao máximo de cinqüenta anos.
§ 1º . Não integrarão o valor da venda, de que trata este arti-
go, o custo das obras de infra-estrutura social realizadas no projeto.
§ 2º. A cota-parte das obras de infra-estrutura de irrigação
de uso coletivo, que caberá a cada irrigante, será proporcional à área
do seu respectivo lote e o integrará de forma indissociada, para fins
de registro no Cartório de Registro de Imóveis competente.
Art. 26 - Nos projetos públicos e mistos a implantação da
infra-estrutura parcelar é de responsabilidade do irrigante.
Art. 27 - Na construção da infra-estrutura de irrigação e
drenagem de uso coletivo a responsabilidade do Poder Público
limitar-se-á às obras de derivação, captação, reservação, adução,
condução e distribuição da água até à tomada na entrada do lote,
propiciando condições ao empreendedor familiar para construção
da sua infra-estrutura parcelar.

SEÇÃO III
DO IRRIGANTE

Art. 28 - São deveres do irrigante:


I - adotar medidas e práticas recomendadas pela adminis-
tração para o uso da água, utilização e conservação do solo;
II - obedecer a normas legais, regulamentos e decisões
administrativas pertinentes à situação e atividade de irrigante;
III - explorar a área irrigável sob sua responsabilidade, de
acordo com a orientação técnica recomendada e referendada para
a região onde ele atua;
IV - permitir a fiscalização das atividades inerentes ao uso
da água e do solo e prestar as informações solicitadas;

213
V - permitir a execução dos trabalhos necessários à con-
servação, ampliação, modernização ou modificação das obras e
instalações da infra-estrutura de irrigação de uso coletivo;
VI - pagar as tarifas devidas;
VII - cumprir as obrigações assumidas no contrato firmado
com a administração do projeto;
VIII - pagar os valores referentes à aquisição do lote e suas
benfeitorias;
IX - pagar, quando for o caso, a parcela de aluguel corres-
pondente ao arrendamento das obras de infra-estrutura de irriga-
ção e drenagem de uso coletivo;
X - pagar, quando for o caso, a cota-parte que lhe cabe na
aquisição das obras de infra-estrutura de irrigação e drenagem de
uso coletivo.
Parágrafo único - O irrigante dos projetos privados de irri-
gação fica sujeito aos deveres constantes dos incisos de I a VI
deste artigo.
Art. 29 - A infringência de qualquer dos deveres estabele-
cidos no artigo 28, bem como das demais disposições legais, re-
gulamentares e contratuais, inerentes à condição de irrigante, a-
carretará a suspensão de fornecimento da água, a reversão da
propriedade ou rescisão da concessão de uso com a reintegração
da posse do imóvel à entidade alienante.
§ 1º . As penalidades previstas no caput deste artigo serão
aplicadas gradativamente na ordem descrita.
§ 2º . Ocorrendo a reversão, a entidade alienante promoverá
a indenização das benfeitorias úteis e necessárias em duas parce-
las anuais, vencendo-se a primeira um ano após a reintegração.

214
CAPÍTULO VIII
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 30 - As instituições financeiras oficiais poderão, em con-


junto com a administração pública, criar mecanismos de incentivo à
produção, através de financiamento, podendo, neste caso, serem
os lotes objeto de hipoteca, para investimento no próprio lote.
§ 1º . A reversão prevista no artigo 29 não se operará caso
o imóvel esteja hipotecado a instituições financeiras oficiais.
§ 2º . Se a instituição financeira pretender a imediata satis-
fação do seu crédito hipotecário, em razão de inadimplência do
irrigante devedor, deverá ela notificar a entidade alienante, trinta
dias antes de promover a execução forçada.
§ 3º . A entidade alienante notificada, pretendendo benefi-
ciar-se da reversibilidade, poderá, no prazo assinalado, oferecer à
instituição financeira credora, garantia suficiente para a substitui-
ção da hipoteca.
Art. 31 - As instituições financeiras oficiais manterão linha
de crédito para financiar a iniciativa privada na implantação dos
projetos privados de irrigação e na integralização do capital nos
projetos mistos, bem como para financiar a aquisição das obras
de infra-estrutura de uso coletivo nos projetos públicos.
Art. 32 - Para efeito da alienação que trata o artigo 25, so-
bre o valor final da alienação, calculado após a dedução do res-
sarcimento já efetivado, o poder público poderá conceder descon-
to de até cinqüenta por cento, a ser definido em regulamento, de
acordo com as características de cada projeto.
Art. 33 - É preeminente a atividade de irrigação no uso dos
solos irrigáveis das regiões áridas e semi-áridas.
Art. 34 - O caput do art. 1º da Lei n.º 8.001, de 13 de março
de 1990, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1°. A distribuição mensal da compensação financeira
de que trata o inciso I do § 1º do art. 17 da Lei n.º 9.648, de 27 de

215
maio de 1998, com a redação alterada por esta Lei, será feita da
seguinte forma:
I – quarenta e cinco por cento aos estados;
II – quarenta e cinco por cento aos municípios;
III – três inteiros e quatro décimos por cento ao Ministério
do Meio Ambiente;
IV – dois inteiros e seis décimos por cento ao Ministério de
Minas e Energia;
V – dois por cento ao Ministério da Ciência e Tecnologia;
VI – dois por cento ao Ministério da Integração Nacional.”
Art. 35 - O Art. 36 da Lei n.º 9.433, de 8 de janeiro de
1997, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 36. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos será
gerido por:
I – um Presidente, que será o Ministro titular do Ministério
do Meio Ambiente;
II – um Vice-Presidente que será o Ministro titular do Minis-
tério da Integração Nacional;
III – um Secretário Executivo, que será o titular do órgão in-
tegrante da estrutura do Ministério do Meio Ambiente, responsável
pela gestão dos recursos hídricos.”
Art. 36 - Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
Art. 37 - Revogam-se a Lei n.º 6.662, de 25-06-1979, o
Decreto-Lei n.º 2032/83 e a Lei n.º 8.657, de 21-05-1993.

216
8.3 - Sistemas de Gestão Comercial

O principal objetivo desta sessão é identificar os sistemas


mais bem sucedidos de coordenação das relações entre a produ-
ção, pós-colheita, distribuição e mercado, dentro da experiência
nacional e internacional, propondo formas aprimoradas, por e-
xemplo, de organizações-líderes, ou de coordenação de mercado,
para tipos específicos de projetos de irrigação.
Nos sistemas atuais, as organizações que atuam nos pro-
jetos públicos de irrigação (bem como os indivíduos) desenvolvem
muitas funções, desde a identificação de oportunidades de mer-
cado, até a viabilização da produção, com uma organização de
todas as informações e suprimento de insumos intermediários. O
processo de decisão é complexo e envolve maiores riscos, nestas
condições, principalmente com produtos hortícolas, base de sus-
tentação dos projetos.
Se a produção irá crescer na agricultura irrigada na região-
alvo, tornando-se um grande negócio, será necessário descentra-
lizar as decisões e especializar as funções dos agentes envolvi-
dos. Estes princípios devem ser respeitados, desde que os volu-
mes a se produzirem e comercializarem sejam muito grandes.
Neste caso, será conveniente dividir e especializar funções, riscos
e, naturalmente, diferentes níveis de remuneração proporcionais a
estes riscos.
Os sistemas propostos evoluem gradualmente com o porte
dos projetos, partindo de um projeto relativamente pequeno, até
atingir projetos de grande porte ou um sistema de múltiplos proje-
tos. À medida que os projetos crescem e amadurecem as formas
de organização e se consolidam os tipos de organizações-líderes,
ou coordenadoras, novas formas são propostas, segundo princí-
pios de complexidade e especialização crescentes – representan-
do a tendência futura de organização do setor da agricultura irri-
gada. Nas formas mais avançadas de organização, cada uma tem
função específica e é ligada a outra com funções próprias, com-
plementares e especializadas.

217
A ênfase é na gestão do processo comercial, concentrando
a atenção na descoberta de negócios e transmissão de sinais de
preferência e preços dos mercados finais, para as empresas em-
baladoras, processadoras industriais e, em seguida, para o setor
da produção primária que recebe os sinais de mercado “decodifi-
cados” para produzir o que a demanda exige, na qualidade neces-
sária, aos preços do mercado final.
Em todos os desenhos dos sistemas apresentados à fren-
te, as setas longas indicam a direção do sistema de formação de
preços e a coordenação do negócio das cadeias, para todos os
setores envolvidos. Essas setas partem sempre dos sinais de
mercado.
O ponto mais importante a ser levado em consideração é o
conjunto de princípios que norteiam as formas de organização do
negócio, na seqüência de concepção de cadeias propostas. Este
conjunto de formas de organização parte do pressuposto de que,
à medida que os investimentos e a produção no negócio da irriga-
ção crescem na Região, as formas e combinações das organiza-
ções deverão apresentar complexidade crescente.
À medida que se eleva a escala de produção, necessita-se
de organizações cada vez mais especializadas – dentro do princí-
pio universal de especialização do trabalho. Da mesma forma,
elas passam a associar-se para um desempenho comum capaz
de operar de forma eficiente em grande escala. Estas associações
e, sobretudo, o estabelecimento de formas de confiança mútua
(confiabilidade solidária no negócio) é importante por duas razões:
a) melhoram as condições de arbitragem nas negociações de pre-
ços; b) minimizam o problema da falta de eficiência do sistema
judiciário brasileiro, que dificulta a implantação de um regime de
contratos capaz de ser devidamente respeitado.
A complexidade das formas de organização cresce tam-
bém com o nível de competição que se instalará no mercado in-
terno, à medida que evolua o volume das safras. Com o cresci-
mento da competição no mercado, cresce também a necessidade
de harmonização de interesses entre todos os segmentos dentro
da cadeia, para a questão estratégica da facilitação de negócios,
sob pena de rompimento do tecido organizacional das empresas,

218
devido ao inevitável e duro embate, entre as empresas, nas nego-
ciações de preços e condições de pagamento.
Outro princípio importante: À medida que se eleva a escala
de produção e a competição no mercado final, crescem também
os riscos e a necessidade de financiamento para empresas, den-
tro de escalas técnicas e financeiras compatíveis.
Um outro princípio é o de que deverá crescer muito a ne-
cessidade de processamento e industrialização, requerendo a
presença de empresas de grande porte que operem em escalas
compatíveis com o potencial de produção e induzindo novos pa-
tamares de escala de produção.
Finalmente, ao crescer a produção, as oportunidades de
mercado no exterior passam a merecer atenção muito especial.
Novas formas de organização deverão ser concebidas de modo a
atenderem às exigências desses mercados e neles competirem
com sucesso.
Desse modo, os princípios são de descentralização e es-
pecialização crescentes de funções, nas formas de organização
da gestão da coordenação comercial (de mercado) e das funções
e processos internos de produção, colheita, preparo e embala-
gem, logística de distribuição física, processamento e gestão da
prestação de todos os serviços necessários a todas as funções do
agronegócio da irrigação.
Os sistemas podem ser mais bem percebidos com a se-
qüência de gráficos a seguir. No Sistema 1, a coordenação de
mercado é realizada por uma indústria de concentrados ou outros
produtos processados ou por uma organização de produtores. No
Sistema 2, por uma empresa de comercialização. No Sistema 3,
essa coordenação é realizada por uma empresa multicomerciali-
zadora internacional, de produtos frescos e/ou processado. No
Sistema 4, por exportadores e importadores com bancos no país e
no exterior, com a responsabilidade de avaliar os riscos dos negó-
cios, para garantir sua eficiência e expansão Finalmente, no Sis-
tema 5, uma empresa-projeto lidera um bem avançado sistema de
gerenciamento global.

219
8.3.1 - Sistema de gestão comercial tipo 1

FIGURA 6
ORGANIZAÇÃO-LÍDER – INDÚSTRIA E ORGANIZAÇÃO
DE PRODUTORES

MERCADO IN NATURA

FONTE: Consórcio Plena-FGV-Projetec.

A organização-líder baseia sua atividade numa modalidade


de gestão / operação e num sistema de contratos, descritos a seguir.

♦ Modalidade de Arranjo Institucional, de Gestão e Operação

Neste sistema de gestão/operação existe uma empresa in-


dustrial única, que pode associar-se a uma empresa concentrado-
ra (concentrados e sucos), que adquire a produção dos produtores
e empresários-irrigantes e faz a coordenação dessa oferta com o
mercado, no qual atua, ou uma organização de produtores (p. ex.:
cooperativa), que assume o processo de pós-colheita, comerciali-
zação e distribuição.

220
Esse sistema de gestão é muito utilizado na França, EUA,
Chile, Espanha e em vários pólos de irrigação do Nordeste do
Brasil.
O aprimoramento proposto neste modelo consiste em atrair
mais indústrias, com capacidade de gerar elevado valor agregado
ao produto final (industrialização) e organizações/packing houses,
instaladas nas áreas de produção, capazes de elevar a concor-
rência na compra da produção (o poder de barganha dos produto-
res, no segmento a montante da cadeia).
A proposta visa aumentar a competição pelo produto atra-
vés de organização de, por exemplo, cooperativas. A presença da
cooperativa/ packing houses viabiliza o contato mais direto do
segmento produtor com o mercado de produtos in natura, como
opção de venda ou com a exportação; além de Ceasas, super-
mercados, devido à maior escala e à padronização e tipos de em-
balagens adequadas.
A presença da indústria de maior porte e a agregação de
valor aos produtos da agricultura irrigada visam elevar a escala
técnica, econômica e financeira deste agronegócio e estabelecer a
sincronização da compra de matéria-prima, com os produtores, e
de fornecimento de produtos processados, com os distribuidores.
Por outras palavras, estas novas plantas industriais pro-
moveriam um maior equilíbrio entre o poder de barganha do seg-
mento produtor e o poder de mercado da indústria, anteriormente
instalada, devido ao aumento do volume comprado, criação de
valor adicionado, etc. Os produtores passam a assumir o papel de
fornecedores estratégicos de matéria-prima, pois, no sistema atu-
al, quanto menor o porte dos compradores e das empresas, tanto
menor o valor (estratégico) da matéria-prima.

♦ Modalidades de Contratos da Empresa Coordenadora

Os tipos de contrato, no modelo 1, poderão ser desenvol-


vidos a partir de contratos de compromisso (não formalizados,
mas com base na confiança) e contratos escritos de compra e
venda compromissadas. Os contratos poderão conter cláusulas de
assistência técnica, creditícia e outras formas de garantia da en-

221
trega da produção e qualidade. Estes contratos são formas mais
simplificadas de comprometimento, entre produtores e as coope-
rativas, indústrias concentradoras, indústrias de elevado grau de
processamento industrial e elevado valor adicionado.
O sistema de contratos está alicerçado em um conjunto de
contratos duplos e sincronizados: um contrato de compra e venda
(fornecimento) entre a empresa-líder e os produtores e um contra-
to de fornecimento entre a empresa-líder e distribuidores (varejis-
tas e/ou atacadistas).
O primeiro contrato tem as seguintes cláusulas, além da
identificação do promitente-comprador e vendedor: a) compromis-
so de plantio, cultivo e colheita, por parte do produtor, com especi-
ficação do produto, quantidade e qualidade e programação (parce-
la do lote, área, semana de plantio, variedades, ciclo estimado de
produção, produção estimada, período de colheita e entrega da
produção); b) fixação de preço garantido, FOB estabelecimento,
de acordo com qualidade (ágios e deságios preestabelecidos); c)
fornecimento do que for necessário e acordado (mudas, semen-
tes, fertilizantes, insumos intermediários); d) assistência técnica e
inspeção dos tratos culturais e vistoria dos cultivos; e) condições
de transportes; f) condições de rejeição e recusa da produção
(abaixo e fora de padrões de qualidade); g) condições de paga-
mento; h) condições especiais de fornecimento de crédito de cus-
teio, com penhor da safra, vinculado a banco financiador; i) defini-
ção de cláusula de causas fortuitas e de força maior que impeçam
o cumprimento do contrato; e, j) definição das penalidades aplicá-
veis ao descumprimento do contrato.
O segundo tipo de contrato é o de fornecimento da empre-
sa-líder com os distribuidores, com as seguintes cláusulas, além
da identificação de promitente-comprador e vendedor: a) forma de
pedido de compra firme; b) definição do produto processado, com
todas as características pertinentes e perfeita identificação dos
mesmos; c) definição de produtos impróprios para a venda que
poderão ser recusados ou devolvidos a critério do comprador (a-
cordado com o vendedor); d) condições de amostragem dos pro-
dutos, para caso de arbitragem; e) definição de marcas e rotula-
gem; f) condições de emissão de nota fiscal; g) definição dos sis-
temas de acondicionamento e transporte (Free on board (FOB) ou

222
Cost, insurance and freight (CIF)); h) das condições e cadência de
entrega – com respeito às quantidades programadas; i) penalida-
des (descontos, recusa de parte ou de todo o carregamento e de-
volução da mercadoria); j) procedimentos de conferência das en-
tregas e cargas; l) condições de pagamento e eventual prorroga-
ção do vencimento do compromisso de pagamento; m) documen-
tação exigida para o transporte e pagamento do produto fornecido.
Este sistema de organização, quando amadurece o siste-
ma de contratos é a semente das formas de organização mais
avançadas, que serão apresentadas a seguir.

8.3.2 - Sistema de gestão comercial tipo 2

FIGURA 7
ORGANIZAÇÃO-LÍDER – EMPRESA DE COMERCIALIZAÇÃO

FONTE: Consórcio Plena-FGV-Projetec.

Neste sistema, uma organização-líder de comercialização


coordena todos os negócios dos perímetros de irrigação, conec-
tando os setores a montante, com as empresas embaladoras e
processadoras industriais, com os setores a jusante, com as dis-
tribuidoras no exterior, as tradings, do mercado externo, redes de

223
distribuição no exterior, atacadistas nas Ceasa’s, supermercados
e outros varejistas no mercado interno.
Esse sistema é usualmente utilizado na França, Chile, EUA,
Espanha, entre outros países.
Esta organização-líder apresenta elevado grau de especia-
lização e está concentrada na ligação de negócios das empresas
a montante e a jusante de todo o sistema. Sua competência in-
cremental é comercializar e vender, com redistribuição de respon-
sabilidades nos segmentos a montante e a jusante do projeto.
Trata-se de empresa típica de um projeto singular de gran-
de porte, porém com poucas empresas (apenas uma embaladora
e uma processadora industrial).
O sistema de contratos poderá ser desenvolvido a partir de
contratos de compromisso (não formalizados, mas com base em
confiança), contratos escritos de compra e venda compromissa-
das, com preços a fechar, com vendas em consignação e diversas
formas hoje existentes no mundo.
A Empresa Embaladora pode ser uma organização dos
próprios produtores, assim como a empresa de comercialização,
uma empresa composta de organizações de produtores.

8.3.3 - Sistema de gestão comercial tipo 3


FIGURA 8
ORGANIZAÇÃO-LÍDER – EMPRESA
MULTICOMERCIALIZADORA INTERNACIONAL

FONTE: Consórcio Plena-FGV-Projetec.

224
Conhecida como Sistema de Malha Comercial, esta em-
presa coordenadora é especializada em multicomercialização ou
representação comercial de diversas empresas embaladoras e
multiprocessadoras a montante do sistema, com concentração e
elevado nível de atuação no mercado internacional. Pode operar
inclusive com contratos de produção em outros países, no caso de
sazonalidade da demanda.
A vantagem da malha comercial é a densidade de produtos
que são ofertados no mercado internacional, como base para
“descoberta de negócios” (novos) nos mercados internacionais.
Apresenta ainda elevado grau de integração com empre-
sas congêneres no mercado internacional e pode celebrar acordos
de vendas com outras empresas do ramo no mundo.
Concentra suas atenções na prospecção e desenvolvimen-
to de mercados de produtos típicos de uma horticultura do tipo
“tropical”, com produtos específicos.
Oferece serviços de comercialização e vendas a diversas
empresas embaladoras e multiprocessadoras. Vão-se especiali-
zando por intermédio de marcas, tipos de produtos, padrões de
qualidade e, sobretudo, em mercados específicos com seus res-
pectivos graus de exigência e qualidade dos produtos, no exterior.
É empresa típica de áreas com diversos projetos em ope-
ração ou com projetos de grande porte, com grande diversidade
de produtos e um maior número de empresas especializadas em-
baladoras e multiprocessadoras. Está sendo utilizada nos EUA.
A exemplo da empresa-líder anterior, há sistemas de con-
trato, desenvolvidos a partir de contratos formalizados, ou seja,
contratos escritos de compra e venda compromissadas, com pre-
ços a fechar, com vendas em consignação e diversas formas mais
avançadas hoje existentes no mundo.
Assim como nos outros sistemas, tanto as empresas
embaladoras ou multiprocessadoras podem ser uma organização
de produtores, uma multicomercializadora internacional pode ser
uma empresa composta pelas organizações de produtores.

225
8.3.4 - Sistema de gestão comercial tipo 4

FIGURA 9
ORGANIZAÇÃO-LÍDER – EXPORTADORA – IMPORTADORA

FONTE: Consórcio Plena-FGV-Projetec.

Sistema avançado de tendência de abertura de grandes


volumes de exportação para mercados externos já consolidados.

226
Neste sistema há estreita sincronização de atividades e intercâm-
bio de informações entre exportadores (empresas especializadas
como nos casos anteriores) e importadores. Com interveniência
de serviços bancários que asseguram a integridade e o cumpri-
mento de compromissos (tradição) de exportadores nacionais,
através de bancos nacionais, e importadores do exterior, com a
interveniência de bancos no exterior.
O foco de todo o sistema está no relacionamento exporta-
dor-importador, com interveniência de bancos nacionais e estran-
geiros que “liquidam” operações financeiras, dentro de um sistema
logístico mais ágil e competente. Encontra-se este sistema nos
EUA, Chile e França.
O sistema é baseado em contratos de fornecimento e
compra, com compromissos firmes.

8.3.5 - Sistema de gestão comercial tipo 5

Como observado, nos modelos anteriores como nos tradi-


cionais, a coordenação está compartimentada. A idéia é de uma
nova forma de planejamento, implantação e gestão abrangente de
todas as áreas afins em articulação com as demais empresas e
instituições complementares à implantação de um negócio de irri-
gação inteiramente estruturado, tendo uma empresa gerenciadora
global.
A empresa gerenciadora global deverá cuidar de: a) análi-
se de mercado e de rentabilidade – gestão de oportunidades de
mercado e meta de vendas; b) gestão de investimentos (ou con-
tratar uma gerenciadora especializada); c) análise de competitivi-
dade dos sistemas de organização, coordenação e gestão – ges-
tão de contratos; d) realizar análise de competitividade, com for-
mulação de uma estratégia para ampliar e enfrentar a concorrên-
cia – gestão de competitividade; e) conduzir a gestão de custos
com alta eficiência (tudo ao menor custo possível); f) fazer gestão
de qualidade; e, g) fazer gestão de comunicação e informação.
A empresa deverá ser competitiva por: a) grande capaci-
dade de gerar competências incrementais; b) capacidade de arti-
culação nas áreas de organização de mercado, coordenação das

227
unidades agrícolas e industriais e gestão das empresas que ofe-
recem serviços necessários; c) liderança de estrutura de baixos
custos aliadas a altos níveis de eficiência técnica e financeira; d)
diferenciação de liderança na qualidade de produtos (e serviços);
e, e) capacidade de identificar e explorar nichos de mercado.
Neste modelo há uma coordenação central do negócio
como um todo, exercido por um conjunto de empresas líderes e
investidores estratégicos, para o desenho e implementação de
todas as decisões estratégicas da cadeia, desde a prospeção
de mercado até a organização das empresas prestadoras de
serviços. Este sistema vem sendo utilizado em alguns projetos
nos EUA.
É forçoso reconhecer que este modelo não se aplica nos ca-
sos em que a produção é muito atomizada e de difícil organização.
O referido tipo de empresa de gerenciamento global não
funciona muito bem em projetos públicos, onde ela não tem con-
trole sobre toda a organização, coordenação e gestão de tudo o
que se passa no projeto. Funciona, contudo, nos projetos mistos e
privados, tendo sido desenhada especificamente para estes dois
casos.
O gráfico, a seguir, mostra o desenho deste modelo, com
enfoque em: a) organização das atividades de mercado; b) coor-
denação da produção e pós-colheita; e, c) gestão de todas as ati-
vidades de apoio (do projeto de engenharia até o fornecimento de
água e insumos). Na parte inferior do gráfico está o modelo eco-
nômico-financeiro que, com base em rentabilidade, irá atrair o
funding da empresa de gerenciamento global.

228
FIGURA 10
ORGANIZAÇÃO-LÍDER – GERENCIADORA GLOBAL

FONTE: Consórcio Plena-FGV-Projetec.


229
A seguir, descrevem-se quais os atributos de uma empresa
privada capaz de assumir um projeto de irrigação moderno como
gerenciadora global do empreendimento. A descrição das compe-
tências requerida ajuda a melhor defini-las, no caso de projetos de
irrigação. São elas:
1. Viabilização de pequenos negócios de irrigação
2. Capacidade de prospeção de negócios: Identificação
de clientes compradores dos produtos e investidores.
3. Declaração de capacitação corporativa
4. Demonstração de capacidade de transferência de
competências nas áreas estratégicas de organização e
gestão.
5. Capacidade de elaboração do projeto básico ou proje-
to de viabilidade a partir do projeto de pré-viabilidade
fornecido pelos órgãos públicos.
6. Comprovação de competência de gestão de mecanis-
mos de coordenação das cadeias e dos agronegócios.
7. Comprovação de experiência nacional e/ou internacional
8. Comprovação de capacidade de levantamento de clien-
tes (carteira de clientes investidores ou capacidade de
mobilização de investidores). Fazer o funding de parte
do projeto, com complementação de empresas investi-
doras estratégicas.
9. Capacidade de desenho do sistema legal, de acordo
com a legislação nacional. Articulação com as autori-
dades responsáveis pela fiscalização da parte legal.
10. Comprovação de competências dos staffs em agrono-
mia e assistência técnica e capacitação, com base em
conhecimento científico.
11. Capacidade de competir em lucratividade com outros
investimentos considerados por investidores privados
em outros setores da economia.

230
As principais condições de capacidade de coordenação,
gestão e operação de uma gerenciadora global são:
1. Demonstração de clientes e compradores que irão com-
prar os produtos e compromissos firmes de compra.
2. Capacidade de elaboração de contratos de forneci-
mento dos produtos para os clientes.
3. Elaboração do marco de especificação dos produtos
(todas as características demandadas pelo cliente-
comprador, para disseminação junto aos produtores ir-
rigantes). Descrição exata do padrão do produto, como
grau de maturação etc.
4. Demonstração de capacidade logística, desde a planta
processadora até o porto de desembarque e distribui-
ção no exterior. Estrutura organizacional de logística
integrada, sob responsabilidade da empresa.
5. Capacidade de realizar prospecção de mercado (mar-
ket outlook) e de planejamento de produção progra-
mada, inclusive determinação da combinação de culti-
vos (crop mix), de acordo com a demanda do mercado
– inclusive planejamento.
6. Capacidade de elaboração do planejamento dos culti-
vos e dos planos de ação de assistência técnica.
7. Tecnologia de processamento de produto. Elaboração
dos padrões necessários de controle de qualidade nos
packing houses, segundo as exigências dos clientes-
compradores (serviços nas plantas de processamento,
etiquetagem, embalagem, gestão de engenharia de
frio no local e portos etc.).
8. Capacidade de realização dos estudos de engenharia
hidráulica e agronômica.
9. Capacidade de elaboração e implantação de projetos
de irrigação e drenagem.

231
10. Entrosamento com os centros de pesquisa e desen-
volvimento.
11. Instalação de serviços laboratoriais de testes.
12. Monitoramento da sanidade vegetal (dinâmica da den-
sidade populacional de patógenos e pragas, controle
integrado de pragas e doenças etc.).
13. Instalação de mini-estações meteorológicas, com da-
dos climáticos diários, tais como fotoperíodo, umidade
relativa do ar, precipitação, ventos, temperaturas para
determinar a evapotranspiração potencial, intensidade
de ataque – inclusive instalação de equipamentos es-
pecializados. Deverão ser criados registros de controle
simplificados para que os irrigantes os entendam e
adotem as recomendações da assistência técnica.
14. Oferta de serviços de monitoramento e controle dos
usos do solo e da água.
15. Utilização dos enfoques de hidroprodutividade e hidro-
economicidade, no gerenciamento da distribuição de
água e respectiva política tarifária, visando a mais ele-
vada eficácia técnica e financeira possível, envolven-
do: capacidade de atingimento das metas de eficiência
na irrigação; eleição de metas especiais de redução de
custos etc.
16. Capacidade de cumprimento do objetivo de manejo
sustentável dos recursos naturais envolvidos no proje-
to (conforme a legislação ambiental e de recursos hí-
dricos em vigor e as melhores práticas, comprovadas
pela experiência mundial).
17. Capacidade de desenho de sistemas de drenagem
(perfis dos solos, condições da saturação da água nos
solos, status da salinidade dos solos, condutividade
hidráulica dos solos, sistemas recomendados e custos
das soluções; especificações técnicas detalhadas dos
sistemas; especificações de materiais e custos etc.).

232
18. Capacitação na área de assistência técnica e financei-
ra aos produtores irrigantes associados – inclusive
rendimentos ótimos e lucratividade, serviços agronô-
micos de assistência técnica e difusão de tecnologias.
Capacidade de organização dos serviços. Atuação sob
a forma de uma empresa (própria ou contratada) de
“consultoria técnica e financeira”.
19. Desenho e instalação de sistemas computadorizados
de controle de custos, monitoramento dos produtores
associados (entrega de produtos), controle de qualida-
de, contas gráficas dos produtores e todos os contro-
les financeiros das operações, empresas, prestação
de serviços, etc. para operação e projeções.
20. Elaboração de contas gráficas dos irrigantes partici-
pantes em sistemas simplificados (smart charts) de fá-
cil leitura.
21. Capacidade comprovada de elaboração de contratos
de fidelidade dos irrigantes. inclusive participação nos
arranjos financeiros com os bancos investidores estra-
tégicos, para garantias de produção e cumprimento
dos contratos de crédito.
22. Capacidade de articulação com os investidores estra-
tégicos no financiamento dos produtores irrigantes,
bancos de desenvolvimento, nos segmentos mais di-
fíceis (com elevados custos de transação). Os inves-
tidores estratégicos nos financiamentos aos produto-
res-irrigantes desempenham papel fundamental no
processo.
23. Capacidade de operação nos pólos de desenvolvimen-
to, de forma integrada e participativa.

8.4 - Modelos de Financiamento

Nesta seção se discutirá como se deverá operar as con-


dições de financiamento para os sistemas de gestão comercial
apresentados. Serão discutidos dois modelos de financiamento: o

233
1º modelo estará caracterizando as condições para os modelos de
gestão comercial tipos 1, 2, 3 e 4 discutidos anteriormente; o 2º
para o modelo comercial tipo 5, em que a infra-estrutura coletiva e
todas as outras ações são totalmente privadas, ou seja, têm como
empreendedor uma empresa-projeto.

8.4.1 - Modelo de financiamento tipo 1

O modelo de financiamento correspondente aos sistemas


de gestão comercial tipos 1, 2, 3 e 4 descritos, baseia-se, em
grande parte, no financiamento tradicional, preponderantemente
através de crédito bancário. Parte dos recursos utilizados nos
segmentos produtivos provém de recursos próprios. Os investido-
res são os proprietários dos meios de produção (pequenos a
grandes irrigantes), das instalações embaladoras e das indústrias,
assim como das organizações de comercialização. Este sistema é
conhecido e opera, como hoje, nos pólos de irrigação. Seu conhe-
cimento fica ampliado com a análise das vantagens e desvanta-
gens do modelo, em termos de riscos financeiros.
A FIGURA 11 a seguir retrata a representação esquemática.

234
FIGURA 11
Modelo de Financiamento – Tipo 1
LIDERANÇA
CONHECIMENTO
COMPETÊNCIA
GANHOS INCREMENTAIS
INFORMAÇÃO
MUDANÇA DE PARADIGMA
F i n a n c i a m e n t o T r a d i c i o n al Financiamentos
Básicos (Bancos) Processos
Recursos de Pagamentos dos
de Vendas
Alavancagem Crédito Financiamentos Acordos
Venda Direta

Terra Unidades de Produção


P ó s -Colheita
FORNECEDORES
Supermercado
Insumos Intermediários
Pequenos
Fertilizantes Trabalho C o m p radores
Ceasas
Sementes L
Médios Beneficiamento
Defensivos O
Atacadistas
Fornecedores Capital G
Grandes
Energia Elétrica Í
Exportadores
M ã o -d e -O b r a Processamento S
Empresas
Tecnologia T
Distribuidoras
I
Grandes Empresas
C
Packing Houses
Pesquisa A
Distritos de Irrigação
Infra-E s t r u t u r a d e U s o C o m u m
Embalagem
Propriedade do Estado Assistência
Técnica Industrialização
F o r n e c i m e n t o d e Á g u a - Tarifas
Retorno aos Recursos de
Investidores Capital
IRRIGANTES Transporte
Investidores
Pequenos Organização dos
Médios Pontos de Entrega
Proprietários
Grandes Prospecção
Empresas Ativos Estocagem a Frio
Grandes Empresas Individuais

FONTE: Consórcio Plena-FGV-Projetec.

235
É conveniente propor uma mudança de enfoque e de pa-
radigma. É necessária uma associação da gestão (do modelo de
gestão) com o financiamento (modelo de financiamento), através
do crédito e de algo essencial para viabilizar sistemas mais avan-
çados de gestão e financiamento: a captação de recursos de tercei-
ros, dentro de regimes de associação de capital – onde se torna
vital a comprovação da rentabilidade do negócio como um todo.
O modelo de financiamento através de crédito e captação
de investimento desempenhará um papel muito importante na
viabilização de um modelo de gestão mais avançado, com organi-
zações líderes como empresas embaladoras, processadoras, a-
groindústrias, cooperativas e empresas de venda, indispensáveis
para criar força de barganha diante de mercados com comprado-
res de relativo poder de mercado.
Por outro lado, um modelo de organização (gestão do ne-
gócio da irrigação) mais avançado, como os propostos, poderá
alavancar um sistema de crédito em que o financiamento global
dos produtores e das empresas poderá ser maior do que o soma-
tório dos créditos outorgados a segmentos individuais, inclusive
com “solidariedade” e responsabilidades financeiras compartidas,
tendo como foco o “valor do negócio” da irrigação como um todo.
Este modelo pode acomodar o fortalecimento e criação de
novas agroindústrias que trabalham em várias regiões, com preço
definido, apoio ao processo de produção, orientação técnica, for-
necimento de parte dos insumos, através de apoio creditício e
financiamento.
É necessário mudar o perfil das poucas empresas de co-
mercialização que hoje atuam nos pólos de irrigação e que so-
mente compram o produto, fortalecendo-as com novos sistemas
de “gestão”, apoio creditício e financiamento para operação em
maior escala.
Trata-se de criar uma nova “cultura de ajuda mútua”, dis-
ponibilizando-se um sistema de “garantia de um para garantia de
investimentos de todos”, dentro da visão de um negócio. Por ou-
tras palavras, trata-se de mudar a visão atual para uma visão de
“cadeia” dos segmentos envolvidos.

236
A) Vantagens Relativas do Modelo de Financiamento Tipo 1

1. Simplicidade operacional e tradição de operação.


2. O financiamento pode ser rapidamente montado.
3. Os credores têm tradição de análise de riscos indi-
viduais.
4. Os credores têm total direito de regresso sobre os ati-
vos (principais e “acessórios”) participantes.
5. Os riscos são diluídos entre os ativos participantes.
6. Os credores se valem da carteira (selecionada) de a-
tivos das empresas e dos proprietários para a garan-
tia do serviço da dívida.
7. Maior seletividade de clientes por parte dos credores.
É importante assinalar que este modelo é similar ao que
hoje existe no setor. Dependerá sempre da construção de compe-
tências incrementais, por parte do Estado, na área de bens públi-
cos que impulsionam o crescimento do setor. Se o Estado não
apoiar este modelo com bens públicos, o setor privado não reali-
zará rentabilidade consistente com os riscos do negócios e as
falências serão freqüentes. Sempre faltará um elemento essencial
para viabilizar o negócio. A irrigação de um negócio com riscos
relativos se tornará uma atividade de alto risco.

B) Desvantagens Relativas do Modelo de Financiamento Tipo 1

1. Baixos índices de alavancagem de recursos de tercei-


ros inviabilizam o negócio. Este é o maior problema.
Ativos comprometidos como garantias.
2. Encargos financeiros elevados inviabilizam o negócio.
3. Encargos financeiros elevados aumentam o risco de
inadimplência.
4. Fluxos de caixa de diversos ativos e negócios se mis-
turam.

237
5. Controle da empresa é feito pela gerência (controle
concentrado).
6. Os “acionistas” são representados e não exercem con-
trole direto.
7. Excessiva dependência da gerência administrativa das
empresas.
8. A administração tem latitude de decisão de utilização
dos resultados financeiros (entre dividendos e reinves-
timento – conflict of agency).
9. Possibilidade de gestão não totalmente profissionali-
zada.
10. Gestão do negócio de irrigação pulverizada entre di-
versos atores com objetivos (de preços) conflitantes.
Difíceis mecanismos de coordenação.
11. Os credores têm de conhecer a “real dimensão” das
necessidades de capital dos atores podendo sub ou
superestimar o montante do crédito.
12. Riscos de crédito têm de ser avaliado caso a caso.
13. A dívida pode não ser “totalmente” garantida.
14. Pode haver desequilíbrio de provimento de capital en-
tre os segmentos da cadeia, com problemas de liqui-
dez em segmentos específicos. Poucas fontes de cré-
dito. Problemas de eficiência do negócio por falta de
capital.
15. Dificuldades em uma atividade de uma empresa ou
produtor podem drenar recursos de bons projetos,
comprometendo o serviço da dívida ou a produção em
quaisquer dos negócios de uma “boa” empresa ou de
um “bom” produtor.
16. A insolvência de um segmento pode comprometer to-
do o negócio da irrigação.

238
17. O credor é o único a ser convencido da rentabilidade
do projeto (que pode ser um agente financeiro e não
um empresário do setor real da economia).
18. Mais fácil “ocultação de riscos”.

♦ Organização do Sistema de Financiamento

O objetivo desta seção é identificar que tipos de financia-


mento, de mecanismos, instituições e de recursos estariam dispo-
níveis ou poderiam ser potencialmente utilizados para implemen-
tação dos segmentos que compõem os sistemas de gestão co-
mercial 1, 2, 3 e 4. Serão utilizadas todas as alternativas de fi-
nanciamento seja de crédito (debt financing), seja de participa-
ção acionária (equity financing) e de novos arranjos institucionais
e mecanismos de financiamento que estão crescendo no mundo
atualmente.

A) Financiamento dos Produtores Irrigantes

As principais questões relacionadas a este tipo de financi-


amento são: a) quais as condições/financiamentos a serem ofereci-
das aos irrigantes para que possam implantar a infra-estrutura par-
celar, seus cultivos e acelerar o processo de produção; b) como
garantir o comprometimento dos recursos na totalidade e tempesti-
vidade necessárias ao empreendimento até a sua plena produção.
Adicionalmente, cumpre indagar quais as taxas de encar-
gos financeiros compatíveis com o custo do investimento e o perío-
do de maturação do mesmo? Como mitigar os riscos de um negó-
cio relativamente dispendioso e de longo período de maturação?
Neste caso, os recursos poderão ser os de produtores com
capacidade de alavancagem de recursos iniciais para o empreen-
dimento. Alternativamente, poderão ser utilizados recursos bancá-
rios de linhas especiais para este fim e para investimentos de lon-
go período de maturação. Uma outra hipótese é a abertura de
linhas de crédito público para esta finalidade: investimento de de-
senvolvimento de um projeto de interesse público.

239
No caso de empreendedor familiar, sendo este um público-
meta específico, seria de interesse público o financiamento para
esta categoria de produtor-irrigante, justificando-se uma linha de
crédito especial para o seu desenvolvimento.
O crédito deve abranger todas as fases: implantação, cus-
teio anual, pós-colheita e comercialização.

B) Financiamentos às Empresas Processadoras

- Investimentos Iniciais de Implantação


As empresas agrícolas poderão ser embaladoras – que re-
querem investimentos relativamente modestos – ou empresas de
processamento, como as produtoras de sucos e produtos proces-
sados, que poderão associar-se às embaladoras ou empresas
industriais. É conveniente a associação de uma embaladora com
uma empresa processadora, por exemplo, de sucos e polpas, pa-
ra um maior e melhor aproveitamento do produto, para consumo
in natura ou para processamento.
Neste caso, poderão ser usados recursos próprios das
empresas que, capitalizadas, ou associadas a outras empresas
compradoras dos produtos, poderão alavancar recursos para in-
vestimentos.
Os recursos bancários poderiam ser disponibilizados –
com facilidades relativamente maiores, em relação a produtores,
devido a melhores níveis de garantias – e, caso sejam empresas
com ativos intangíveis de valor, tradição e conhecimento de mer-
cado, não faltarão capitais para se associarem às empresas em
projetos de alta viabilidade financeira.

- Crédito de Capital de Giro

As empresas embaladoras necessitam de somas mais


modestas para financiamento de capital de trabalho: basicamente
de curto período e para insumos intermediários (embalagens e
produtos necessários ao processamento). Por outro lado, as ne-
cessidades das empresas de processamento industrial são muito

240
maiores, pois os produtores colhem e vendem a produção em
poucos meses e as empresas têm de processar e estocar o
produto processado por 7 a 8 meses para comercialização. Há
uma fase aguda de gastos, seguida de uma fase prolongada de
venda.
Neste último caso, as necessidades de capital de trabalho
são muito altas. O crédito bancário é uma alternativa, dentro de
limites. Não haveria, contudo, uma carência de recursos tão
grande quanto a carência para segmentos econômicos de menor
porte. Além disso, os encargos financeiros seriam toleráveis na
atual conjuntura.
Sistemas ágeis de caução de recebíveis de boa qualidade,
com crédito rotativo – como em um sistema de float – em que a
liquidação dos recebíveis serve para abater os débitos pendentes,
podem facilitar enormemente as negociações de taxas de encar-
gos financeiros relativamente mais reduzidos.

C) Financiamento às Empresas Industriais

- Investimentos Iniciais de Implantação

As grandes empresas industriais têm acesso facilitado a fi-


nanciamentos de médio prazo. O sistema de alavancagem de
capital, havendo densidade de produção e mercado para seus
produtos, poderia ser facilitado até o limite da abertura de capital.
O levantamento de recursos de investimento, neste caso, não
preocupa tanto.

- Crédito de Capital de Giro

O caso do financiamento das empresas processadoras de


grande porte se assemelha às empresas de processamento, dis-
cutidas anteriormente. Neste caso, as necessidades de capital de
trabalho são muito maiores, devido basicamente às necessidades
de financiamento de um volume muito maior de matérias-primas e
de insumos intermediários.

241
D) Projetos Mistos

A criação dentro da legislação dos projetos mistos facilita o


equacionamento do problema de financiamento dos projetos de
irrigação. Com a participação acionária do Estado fixada em, no
máximo, 49%, os projetos poderão ter no poder público, em qual-
quer de suas esferas, um forte fator alavancador de recursos para
o desenvolvimento de projetos de irrigação. A participação acioná-
ria do Estado pode viabilizar as obras de infra-estrutura de uso
comum, reduzindo os custos iniciais dos investidores. O Estado
pode participar acionariamente garantindo a compra de um per-
centual de lotes dos projetos para o empreendedor familiar.
Os projetos mistos podem-se desenvolver a partir da aber-
tura de capital. Os montantes de recursos necessários à implanta-
ção desses projetos justificam a abertura de capital, por exemplo,
em um projeto de 5.000 hectares. A participação acionária viabili-
zaria um projeto desde que os investidores estratégicos tenham
credibilidade para iniciar o empreendimento.
Tanto nos projetos mistos como nos projetos privados
cresce no Brasil o desenho de empresas com arquitetura financei-
ra (ou o denominado “pacote financeiro”) liderada por um grande
banco. No caso, além dos investidores estratégicos (ver, mais
tarde, esta definição no caso da empresa-projeto) há investidores
institucionais e participação de bancos estatais (BNDESPAR). O
número de empresas nesta modalidade cresce a cada dia.
Deve-se preservar o desenho desses projetos para a cria-
tividade e idéias inovadoras do setor privado. O Estado deve-se
conter, não adotando qualquer forma de dirigismo – pois este gera
risco de capital.

8.4.2 - Modelo de financiamento tipo 2

A FIGURA 12 a seguir mostra a concepção do modelo de


financiamento da empresa-projeto, ou seja, modelo de gestão
comercial tipo 5, proposto como uma das opções no negócio da
irrigação com a forte participação da iniciativa privada. A figura
contém todos os elementos iniciais para se avaliar a empresa-

242
projeto formada com base em parcerias de empresas-líderes, as-
sociadas e investidores estratégicos.
Este modelo de financiamento proposto, destina-se a atrair
a iniciativa privada para implementar projetos privados de irrigação
no Nordeste, dentro de uma visão mais sistêmica e coordenada.
FIGURA 12
Modelo de Financiamento Tipo 2
Financiamento com Parcerias com Base nos Ativos do Projeto
PROJETO INTENSIVO EM
EMPRESAS LÍDERES LIDERANÇA
EMPRESAS ASSOCIADAS CONHECIMENTO
IMPLANTAÇÃO Investidores Estratégicos COMPETÊNCIAS
OBRAS Empresas Compradoras Investimentos GANHOS INCREMENTAIS
Empresas Distribuidoras Fluxo de Caixa INFORMAÇÃO
Gerenciadora Empresa de Engenharia Retorno do Capital MUDANÇA DE PARADIGMA
Geral Fornecedores de Insumos
Risco
Distritos de Irrigação
Empresas de Assistência Técnica Empresas Estrangeiras com
Elevado Grau de "Corporate
Recursos de Bancos Pagamento
Capability" no Ramo
empréstimos Credores da Dívida

Matérias-primas
Terra Unidades de Produção
Pós Colheita
FORNECEDORES Contrato (s) de
Insumos Intermediários Compra
Pequenos
Fertilizantes Trabalho Compradores
Sementes L
Médios Beneficiamento
Defensivos E O Produção
Fornecedores Capital M G
Grandes
Energia Elétrica P Í
Supermercado
Processamento R S
Empresas
Contrato (s) de Tecnologia E T
Ceasas
Fornecimento S I
Grandes Empresas
Mão-de-Obra A C
Packing Houses Atacadistas
Pesquisa A
Distritos de Irrigação
Exportadores
Infra-Estrutura de Uso Comum
Embalagem
Propriedade do Estado Assistência
Distribuidoras
Técnica
Fornecimento de Água - Tarifas Industrialização
Recursos de Retorno aos Acordo de
Capital Investidores Suporte de
Crédito

Investidores Investidores / IRRIGANTES


Investidores Recursos de
de capital Associadas Pequenos
Capital
Médios
Retorno aos Proprietários
Investidores Grandes
Empresas Ativos
Grandes Empresas Individuais

FONTE: Consórcio Plena-FGV-Projetec.

A) Vantagens Relativas do Modelo Financiamento Tipo 2

1. Menores riscos decorrentes de encargos financeiros e-


levados.

243
2. Menores riscos relativos de inadimplência de todo o ne-
gócio (juros).
3. O negócio tem de provar que é lucrativo: os testes de
rentabilidade são mais rigorosos, pois há maior número de “acio-
nistas” a serem convencidos a participar da empresa-projeto com
seus recursos.
4. Maior participação das empresas componentes: do sis-
tema turn key para o sistema atual com concorrência: enormes
economias de custos.
5. A empresa-projeto pode ser organizada como empresa
de responsabilidade limitada para utilizar os benefícios oriundos
de incentivos fiscais decorrentes da propriedade e lucros.
6. Os fluxos de caixa e os ativos da empresa-projeto são
separados dos mesmos das empresas-líderes.
7. A administração permanece no controle mas tem de
“prestar contas” a um grupo maior de “acionistas” (empresas parti-
cipantes).
8. A centralização dos ativos e fluxos de caixa empresa-
projeto facilita maior fiscalização e controle por parte das empre-
sas associadas.
9. Há condições contratuais que regem gestão, geração
de resultados, dívidas e patrimônios, facilitando enormemente o
controle.
10. Parte dos riscos da construção do projeto e obras pode
ser transferida a terceiros (por performance bond), ou diluídos
entre outras empresas-líderes.
11. A exposição financeira dos credores é específica aos
ativos do projeto.
12. Os contratos diluem os riscos entre atividades e em-
presas participantes.
13. Maior solidariedade na prestação de serviço e no projeto.

244
14. Os riscos do projeto podem ser mais bem alocados às
empresas que melhor possam assumi-los. Especialização de tra-
balho e riscos.
15. Quem oferece o serviço tem interesse no lucro do
negócio.
16. As empresas participantes não se envolvem em riscos
operacionais (contratam profissionais de reconhecida capacidade).
17. Gestão do negócio da irrigação sem conflitos de inte-
resses (de preços).
18. A administração não tem latitude de decisão entre dis-
tribuição de dividendos e reinvestimento: o fluxo de caixa líquido é
distribuído, por contrato, entre os investidores de capital.
19. Baixos níveis de conflitos entre investidores e empre-
sas e a administração na distribuição de resultados (conflict of
agency).
20. Maior e melhor monitoramento por parte dos investido-
res e empresas.
21. A dívida pode ser mais bem garantida por ativos da
empresa-projeto.
22. Os contratos de endividamento são feitos “sob medida”
para a empresa-projeto e a dívida pode ser, até certo ponto, mais
garantida.
23. As empresas participantes compartilham também do fi-
nanciamento: (diversificação de fontes, desde os fornecedores de
insumos até os compradores do produto) do capital de trabalho e
dos lucros.
24. Maior alavancagem de recursos com liability diluída e
joint liability.
25. A insolvência de uma empresa individual não afeta a
empresa-projeto.

245
B) Desvantagens Relativas do Modelo de Financiamento Tipo 2

1. Modelagem financeira mais complexa.


2. Dependência de contratos muito mais “sofisticados”.
3. A montagem da empresa-projeto requer mais informa-
ção e envolve maiores custos de transação, com contratos, arre-
gimentação de participantes, etc.
4. Dependência de eficiência da justiça.
5. Os credores têm direito de regresso limitado ao ativo da
empresa-projeto.
6. Os credores não têm direito de regresso aos ativos das
empresas participantes.
7. Os projetos financeiros, em particular, muito mais rigoro-
sos na demonstração de geração de fluxo de caixa líquido, con-
somem mais tempo.
8. Requerem correta avaliação de riscos, encarecendo a
montagem dos projetos. Projetos sensíveis a riscos.
9. Os riscos de os credores não recuperarem seus créditos
são maiores, pois a dívida pode não ser resgatável com os recur-
sos de outros ativos, de outros projetos das empresas.
Este modelo é o que melhor serve ao critério de eficiência
na redução de custos (cost effectiveness), ou participação da co-
munidade de beneficiários na montagem e financiamento do proje-
to. De preferência, esta montagem deve ser no sistema mais re-
cente de investimentos, de repartição de responsabilidades de
execução de serviços com aporte de capital.
O sistema usado até recentemente pelo setor privado era
de “turn key” (“chave na mão” ou ponto de água ligado), com a
contratação de uma empresa de engenharia para execução total.
O referido sistema mudou neste ano. Agora, da sua implementa-
ção participam a empresa do projeto global, a fornecedora de e-
quipamentos, a gerenciadora geral, fornecedores, etc. Com a con-
corrência – que deverá aparecer na irrigação com a participação

246
do setor privado – foi necessário baixar muito os custos e o “turn
key” não é mais satisfatório.

♦ Características Gerais do Modelo de Financiamento Tipo 2

Entidade Jurídica Separada

Os participantes (empresas-líderes e empresas associa-


das) da unidade ou empresa-projeto podem achar vantajoso for-
mar uma nova entidade jurídica destinada a construir, deter a pro-
priedade e operar o projeto.
Se forem previstos lucros suficientes, a empresa do projeto
poderá financiar a construção com base no projeto que envolve a
emissão de títulos patrimoniais (para as empresas participantes
ou “sócios”) e títulos de dívida. Os referidos títulos são desenha-
dos de forma a serem liquidáveis através das receitas líquidas
derivadas da operação do projeto.

Estrutura Jurídica

A escolha da estrutura jurídica pode encerrar importantes


considerações fiscais e contábeis.
Também pode afetar a disponibilidade de recursos para
um projeto e seu custo de financiamento.
O modelo tipo 2 exige que as recompensas econômicas
sejam alocadas de forma consistente e comensurável aos riscos
do projeto.
As partes envolvidas devem trabalhar estreitamente em
conjunto com os consultores financeiros e jurídicos do projeto para
avaliarem as estruturas legais alternativas e determinarem a mais
vantajosa.
Genericamente, existem nos EUA as seguintes formas al-
ternativas principais:
• Condomínio de interesse comum indivisível

247
• Corporação
• Parceria
• Empresa de responsabilidade limitada

Captação de Recursos

É a captação de recursos para financiar um projeto de in-


vestimento de capital, economicamente separável, no qual os pro-
vedores de recursos (sócios e credores) vêem o fluxo de caixa
proveniente do projeto como fonte primária de recursos para aten-
der o retorno sobre o capital investido no projeto.
Os prazos de vencimento e os valores dos títulos são pro-
jetados de acordo com as características dos fluxos de caixa livres
do projeto.
Para efeito de garantia, os títulos de dívida do projeto de-
pendem da lucratividade e (pelo menos parcialmente) dos ativos
do projeto; mas a ênfase está sempre na lucratividade do projeto.

Características Financeiras Básicas de Segurança do Investidor

1. Um acordo entre as partes financeiramente responsá-


veis para a disponibilização, ao projeto, de todos os re-
cursos financeiros necessários à sua finalização.
2. Um acordo entre as partes financeiramente responsá-
veis (tipicamente na forma de compra da produção do
projeto) que garanta que o projeto, após sua finaliza-
ção, tenha fluxo de caixa suficiente par atender suas
despesas operacionais e serviços da dívida, mesmo
que o projeto não seja bem sucedido por motivos de
força maior.
3. Garantias das partes financeiramente responsáveis de
que, ocorrendo dificuldades, antes ou após sua finaliza-
ção, haverá recursos adicionais disponíveis para devol-
ver ao projeto condições de operação.

248
Distinções Importantes

O Modelo 2 é distinto de um financiamento direto conven-


cional. Mas não pode constituir uma forma que não seja tão fi-
nanceiramente viável quanto um projeto de financiamento con-
vencional.
No financiamento direto convencional os credores têm a
carteira total dos ativos da empresa para geração de fluxos de
caixa para o serviço de seus empréstimos. Os ativos e seu fi-
nanciamento são integrados às carteiras de ativos e passivos da
empresa.
No Modelo 2, o projeto é uma entidade jurídica distinta. Os
sócios normalmente oferecem os ativos do projeto, mas nenhum
dos demais ativos (estranhos ao projeto), para garantir os emprés-
timos ao projeto.
Os conceitos acerca de arquitetura financeira são ampla-
mente mal empregados e compreendidos.
O sistema do Modelo 2 não é um meio de alavancar recur-
sos para financiar um projeto de baixa rentabilidade econômica e
financeira, que não possa gerar fluxos de caixa operacionais sufi-
cientes para servir suas dívidas, pagar taxas e impostos e forne-
cer retorno adequado aos seus sócios.
Em outras palavras, o Modelo 2 não é um meio de finan-
ciar projetos que não possam ser financiados em bases
convencionais.

Considerações Importantes:

Este tipo de projeto requer uma cuidadosa engenharia fi-


nanceira para alocar os riscos e retornos entre as partes envolvi-
das (sócios e credores), de forma mutuamente aceitável.
Para ser financiado através de uma empresa-projeto, um
projeto deverá incluir todas as condições necessárias para que
constitua uma unidade operacional independente e, sobretudo,

249
economicamente viável. Por exemplo, não poderá ser parte inte-
grante de outra (s) instalação (ções).
Se o projeto depender de ativos de propriedade de outros
em qualquer estágio de seu ciclo operacional, deverá ser garanti-
do o acesso incondicional do projeto a essas instalações (por con-
tratos), sempre que for preciso, independentemente de eventos
que possam ocorrer.
O Modelo 2 é eficiente para uma empresa que tenha um
projeto em vista ou já proposto, quando:
a) a produção do projeto tiver uma demanda tão forte que
os compradores estejam dispostos a aceitar contratos de compra
de longo prazo;
b) os contratos tiverem condições fortes o suficiente para
que os bancos (credores) estejam dispostos a adiantar recursos
para financiar a implementação do projeto com base nos contra-
tos.

8.4.3 - Comparação dos modelos de financiamento tipos


1e2

A) Modelo de Financiamento Tipo 1

Definição

Trata-se de um projeto financeiro convencional onde os


participantes e empresas são os responsáveis pelo sucesso ou
fracasso do projeto, arcando com a totalidade dos lucros ou preju-
ízos de seus empreendimentos.
Fornecedores de insumos, credores e compradores não
têm nenhuma responsabilidade, nem comprometimento, nem inte-
resse no sucesso do projeto de irrigação como um todo. Interesse
aqui significa ganhar algo “adicional” pela soma das competências
das empresas associadas.
Se as empresas ou os produtores não gerarem individual-
mente fluxos de caixa suficientes para pagar suas contas, isola-

250
damente ou em grupo executarão cobrança judicial das dívidas,
inclusive pedindo a falência do projeto e, caso necessário, execu-
tando as garantias fornecidas pelos indivíduos e empresas.

Questões Importantes: Grandes Riscos Sistêmicos

Eventualmente, os riscos podem ser grandes o suficiente


para comprometer todo o projeto de irrigação. Neste caso, cada
participante toma medidas cautelares para afastar o risco dos de-
mais participantes.
Este sistema pode apresentar elevado risco (falta de água,
por exemplo, pode comprometer todo o projeto). Com o modelo 2
busca-se isolar os riscos de um projeto de forma que um fracasso
no projeto não possa comprometer outros ativos dos acionistas
em outros segmentos do projeto.
Para conseguir isolar os riscos do projeto, deve-se realocar
os riscos de maneira que seja aceitável para as partes envolvidas
receber como garantia de seus investimentos apenas os ativos do
próprio projeto.

B) Modelo de Financiamento Tipo 2

Definição

É o financiamento de uma unidade econômica particular


(um projeto completo, desenhado de forma harmônica e integral),
denominada Empresa-Projeto, na qual os participantes são atraí-
dos pela geração de um fluxo de caixa líquido positivo que propi-
cia uma dada rentabilidade potencial, mas com risco.
O projeto é concebido, desenhado, planejado e executado
de forma integral, com escala econômica e técnica ótimas. É um
conjunto de ativos relacionados entre si, e de forma harmônica,
capazes de funcionar de lucrativamente como unidade econômica
independente.

251
O projeto proporcionará lucro, pagos os financiamentos
porventura necessários. As garantias de todos são de um patri-
mônio restrito aos ativos do tamanho do projeto. Os ativos desta
unidade empresa-projeto são suficientes como garantia colateral
do empréstimo.
Trata-se de um projeto com aplicação de técnicas destina-
das à solução de problemas financeiros com distribuição de auto-
financiamento e repartição de riscos.
O projeto não é uma forma “melhor de gerar riqueza”. É
uma forma de envolver maior grau de autofinanciamento, menor
dependência de recursos de terceiros e repartição de riscos. Os
participantes são acionistas do projeto. Trata-se de uma troca. Os
participantes ganham menos, em compensação não têm risco
além dos seus investimentos no próprio projeto.
Os credores aceitam garantias menores, em compensação
podem ganhar mais com o sucesso da administração e gestão
solidária do projeto. Os compradores se comprometem com de-
terminados níveis de compra, em compensação pagam menos
pelos produtos.
Os fornecedores se comprometem mais com o fornecimen-
to de matérias-primas e/ou instalações em um relacionamento de
parceria; em compensação recebem uma taxa de retorno maior.
Os participantes que oferecem serviços têm interesse em
melhor ofertá-los, pois lucram com isso. E os que os utilizam têm
maior garantia de qualidade e menor risco de não ter o serviço
prestado. E assim sucessivamente.

Adaptação do Modelo 2 a um Projeto de Irrigação

A demanda pelos produtos da agricultura irrigada é conhe-


cida e depende dos arranjos de compromisso de compra. Fora
de uma produção programada, os riscos de mercado são muito
elevados.
O projeto depende de um elevado grau de integração e en-
trosamento entre todos os segmentos. Um projeto de irrigação

252
tem de ser um todo harmônico, com mecanismos de coordenação
entre todas as etapas e atividades. Caso contrário, há riscos de
mal funcionamento do sistema.
O problema é que em um projeto de irrigação financiado
com capital de terceiros, existe a preocupação com o pagamento
do serviço da dívida. Os riscos de mercado e preços são gran-
des (produtos perecíveis). Qualquer problema de suprimento de
bens e serviços compromete a qualidade e a quantidade do pro-
duto final.
Assim, em determinadas ocasiões é possível que o resul-
tado bruto das operações seja tão baixo que não se consigam
juros e a amortização do empréstimo. Tecnicamente, este seria
um estado de insolvência para indivíduos ou empresas. Pode ha-
ver ainda acumulação do estoque da dívida.
Os bancos sabem disso. Conseqüentemente, para em-
prestarem recursos em cenário de incerteza, exigem garantias
extras. Por exemplo, para atender ao que pedem os bancos em
termos de garantias não é suficiente o conjunto de bens dos pro-
dutores, empresas, etc; tanto mais se consideramos que os mui-
tos ativos do projeto são de propriedade do Estado (exceto no
caso dos projetos privados).
São solicitadas garantias adicionais para os empréstimos.
Deverão incluir também os bens dos indivíduos e das empresas
em outras atividades. Assim, um problema no projeto poderá levar
mesmo um grupo sólido de empresas a ter de pedir concordata ou
ser requerida sua falência. Com os riscos existentes, o projeto
desperta pouco interesse.
Uma solução para este problema será encontrada quando
se lograr admitir no negócio (projeto) um novo sócio ou novos só-
cios (com ações preferenciais, por exemplo), com capital próprio,
para, em adição ao “capital próprio dos sócios ordinários”, financi-
arem o projeto. Com este “novo sócio” (empresas líderes ou em-
presas associadas) a necessidade de capital de terceiros cai para
um nível no qual os bens do próprio projeto já são suficientes para
servirem de garantias bancárias sem necessidade de outros bens.

253
O “novo sócio” ou novo arranjo societário – de empresas
líderes e empresas associadas – está interessado no negócio pois
tem forte atuação no mercado (de construção civil, gestão de re-
cursos hídricos, oferta de insumos etc.); ou, o que é melhor ainda,
pode haver uma empresa-líder que seja grande compradora dos
produtos do projeto.
Os rendimentos potenciais dos novos investimentos asso-
ciados, em uma grande empresa-projeto, dos “novos sócios”, se-
rão potencialmente maiores e distribuídos através de dividendos
preferenciais (participação nos lucros) e da compra (fechada) de
produtos do projeto com grandes descontos (supermercados, ata-
cadistas, distribuidores no Brasil ou no exterior, etc.)
Uma das vantagens é que, com a venda pré-programada
de parte dos produtos (para os novos “sócios”), a volatilidade da
receita diminui. Com a volatilidade da receita diminuindo e com
“satisfação” da necessidade de capital de terceiros, muito meno-
res são os riscos de inadimplência. Eles podem ser dramatica-
mente reduzidos se incluímos na empresa-projeto empresas as-
sociadas como líderes que representam a demanda pelos produ-
tos e a oferta dos insumos críticos no processo de produção.

8.4.4 - Condições para viabilização dos modelos de fi-


nanciamento propostos

♦ Condições Gerais para Viabilização e Implantação dos


Novos Modelos

Estas condições dizem respeito mais propriamente


ao tipo de empresa-projeto, mas podem ser aplicadas a
quaisquer tipos de investimentos com a liderança do setor
privado. Estas condições são necessárias para atrair investi-
dores financeiros de grande porte.
Os pontos mencionados a seguir são respostas e observa-
ções feitas por investidores potenciais nas áreas de projeto de
irrigação, quando estimulados por entrevistas semi-estruturadas,
conduzidas com o propósito de conhecer as condições segundo
as quais estes investidores se interessariam pelo negócio. Esta
254
consulta foi conduzida junto a um grupo de dirigentes empresari-
ais, eventualmente interessados no negócio da irrigação, mas sem
experiência na área desse tipo de projeto.
As definições essenciais para a participação em um projeto
de financiamento de irrigação seriam:
1. Definição do mecanismo de repartição dos riscos do
negócio ou empreendimento: quais outros grupos es-
tariam associados ao empreendimento?
2. Os ativos das empresas associadas não seriam cola-
terais nos financiamentos.
3. Aceitação de elevado grau de associação nos riscos e
nos lucros, relativa disposição para investimento no
setor real da economia com reduzidos riscos tecnoló-
gicos.
4. Identificação de qual empresa associada ficará com
que tipo de risco, de forma bem definida no projeto –
com uma pré-condição essencial: pelo menos uma
empresa associada com tradição no ramo e experiên-
cia de gerenciamento.
5. Os investidores se associam a bancos, fornecedores,
compradores, vendedores, construtores etc. (todos os
segmentos envolvidos), pois isso representa a ten-
dência do mercado de negócios no setor real, com
participação acionária no financiamento; não atuar de
forma isolada.
6. Rígida definição do regime de contratos; a parte jurídi-
ca e a legal são muito importantes entre as partes. Al-
ternativamente poderia haver formas de contratos com
juízo arbitral.
7. Comprometimento do Governo (BNDES); como forma
de hedging contra risco o de o Governo mudar “as re-
gras do jogo”, de preferência dentro de uma política
institucional de governo.

255
8. Comprometimento do governo local – estados e muni-
cípios – como forma de hedging contra o risco da falta
de infra-estrutura e, de preferência, com alguma forma
de participação financeira. Preferência por estados
“hospitaleiros” e com tradição de fomento de investi-
mentos privados.
9. Incentivos fiscais: os grandes investimentos estão
sempre visados para ações fiscais e de investigação
por parte do fisco. Os incentivos não devem ser con-
cedidos para viabilizar economicamente o projeto,
mas sim para aumentar em valor e rapidez o retorno
dos projetos.
10. As holdings das empresas não darão garantias de in-
vestimento.
11. Separação dos ativos. Os ativos dos participantes não
compartilham um eventual fracasso do empreendimen-
to; não são ativos solidários. No Brasil ocorreu experi-
ência negativa de solidariedade financeira com eleva-
dos riscos.
12. Estruturas financeiras, jurídicas e econômicas separa-
das: as garantias podem eventualmente ser comple-
mentares.
13. O número de investidores-chaves deve ser suficiente
para garantir e viabilizar o negócio.
14. Criação dos chamados “fatores detonadores”, partici-
pantes de grande credibilidade e definição de um ne-
gócio capaz de gerar serviço da dívida do “passivo”
dos projetos; a rentabilidade pode ser ligeiramente
mais baixa, mas com pequenos riscos. Retornos mí-
nimos de 12, 14 e 16% ao ano, sem riscos, para servir
os “passivos” dos investidores.
15. Condições especiais:
a. tecnologia conhecida;

256
b. mercado garantido;
c. fontes de suprimento de materiais, insumos inter-
mediários garantidos e confiáveis;
d. mão-de-obra capacitada.
16. Bom histórico de governo local: não hostilizar o inves-
timento.
17. Existência de contratos de venda firmes.
18. Volume de vendas dos produtos finais – produto com-
prado e distribuído, pronto para faturar.

♦ Condições para Atração de Investimentos Privados Nacio-


nais nos Projetos do Novo Negócio de Irrigação

Esta seção tem por objetivo resumir e registrar os resulta-


dos de consultas feitas a dirigentes de empresas e grupos de in-
vestidores institucionais que eventualmente participariam de
investimentos no negócio de agricultura irrigada. São condições
para atração de investimentos privados.
Os pontos relacionados abaixo refletem um resumo das
pré-condições mencionadas por informantes qualificados e diri-
gentes de grupos empresariais potencialmente interessados em
investir na agricultura irrigada. Os pontos têm mais ou menos uma
ordem de importância, como a seguir:
1. Informações detalhadas dos tipos de cultivos possíveis
de serem desenvolvidos nos projetos de irrigação, pa-
ra efeito de estudo preliminar de mercado, sem o qual
o processo de decisão não se iniciará.
2. Indicação de potencial para a exportação dos produtos
oriundos dos projetos, bem como das condições físi-
cas de embarque da produção vendida no exterior.
3. Informações detalhadas de tecnologia de produção e
produtividades dos cultivos a serem explorados na á-
rea do projeto.

257
4. Garantias preliminares de que os projetos teriam fi-
nanciamento (notadamente do BNDES).
5. Inventário da infra-estrutura social e produtiva disponí-
vel: estradas, escolas, eletricidade etc.
6. Disponibilidade de mão-de-obra e qualificação dos tra-
balhadores na região, bem como experiência no trato
da irrigação.
7. Indicações de prazo provável de estudos, implantação,
início de operação e horizonte de maturação dos in-
vestimentos no projeto.
8. Estimativas preliminares de horizonte de maturação e
taxa de retorno prováveis do projeto, com base em ex-
periências idênticas.
9. Adesão de empresas construtoras que seriam associ-
adas à formação de um grupo para execução das o-
bras do projeto.
10. Indicações de adesão de parcerias de bancos nacio-
nais ou estrangeiros (nas carteiras de participação) e
de garantia de créditos de capital fixo, de investimento,
custeio, comercialização e exportação.
11. Incentivos fiscais para aumentar e acelerar os retornos
de projetos economicamente viáveis.

♦ Condições para Atração de Investidores Internacionais

Há vantagens na atração de empresas investidoras inter-


nacionais que podem aportar elementos importantes tais como
tecnologia de organização, coordenação e gestão, além de tecno-
logia de última geração.
Para isso é necessário um estudo para a definição dos e-
lementos essenciais do documento conhecido internacionalmente
como Statement of Corporate Capability, que registra as condi-
ções de competência dos potenciais investidores internacionais
(empresas entendidas como “corporações”).

258
Para atender às necessidades de desenvolvimento de pro-
jetos no Brasil, essa declaração statement deverá ser composta
de um conjunto de requisitos especiais, desenhados a partir dos
interesses do Brasil no acolhimento e celebração de parcerias
com esses investidores internacionais.

A) Condições Mínimas para Aceitação das Empresas

1. Capacidade de descobrir negócios investigando opor-


tunidades de mercado;
2. Desenho de bons planejamento e projeto de
engenharia;
3. Organização integral da engenharia financeira do pro-
jeto, do início até a produção permanente.
4. Capacidade de desenvolvimento e construção.
5. Capacidade de gestão dos sistemas de produção, do
produtor, dos insumos etc.
6. Logística de transportes; marketing e comercialização;
7. Treinamento, timing de implantação de todas as ope-
rações.
8. Timing da logística;
9. Pesquisas e testes de “melhoristas” e teste de novas
variedades;
10. Sementes produtos de insumos.
11. Processamento, empacotamento e industrialização.

B) Estudo das Condições de Participação de Investidores


Especializados em Irrigação nos Projetos

O propósito desta seção é indicar como serão investigadas


as condicionantes da participação dos investidores que são do

259
“ramo” em projetos no Brasil, de acordo com o que existe de expe-
riência mundial.
Identificação dos componentes principais para a formação
de um ambiente propício ao investimento, transferência de tecno-
logia e conformação de parcerias com grupos nacionais.
Identificação dos portes de investimentos de investidores
do ramo de irrigação em diversos países do mundo, dimensões
médias de projetos (pelo critério dos ativos totais). Existência de
um programa integrado em escala externa de distribuição e co-
mercialização.
Estudo das modalidades e limites de participação do sis-
tema de financiamento debt financing.
Estudo das modalidades e limitações de financiamento
com participação societária e divisão de risco equity financing.
Indicação de equilíbrio e proporcionalidade do financiamento e o
equity financing para projetos de irrigação.
Avaliação de instrumentos de financiamentos utilizados pe-
los investidores privados internacionais: do crédito bancário, swap
simples, ou uso de debt equity funds, para investidores de porte
moderado que serão definidos em termos de porte dos empreen-
dimentos.
Estudo de condições de flexibilização de aportes de recur-
sos em moeda forte, conversibilidade e expatriação de lucros,
para indicação aos investidores como esse conjunto mudou de
forma notável no Brasil dos anos 80 de centralização do câmbio
até nossos dias, com a abertura comercial.

C) Capacidade de Alavancagem Financeira

Estudo de condições a serem atendidas pelos inves-


tidores com experiência internacional para participação em
programas de desenvolvimento de projetos:
a) sólida experiência em projetos de, no mínimo, três paí-
ses, de preferência sob condições idênticas às do Brasil;

260
b) participação acionária em empresas co-irmãs no ramo
no exterior;
c) possuir preferencialmente uma subsidiária ou empresa
associada no setor de distribuição, ou deter qualquer
forma de participação em organizações de distribuição e
mercados em centros de convergência e distribuição
(Rotterdam, Le Havre, EUA, Europa, Meio Oriente, A-
mérica do Sul e Japão, por exemplo);
d) potencial de condução de estudos de viabilidade;
e) participação com capital próprio dos empreendimentos;
f) capacidade de alavancagem de participação acionária
em investimentos com moderada a baixa participação
de financiamento, através de débito (high investment
equity e low debt financing );
g) identificação do máximo do financiamento alcançável
para um projeto de excelente padrão e percentual de
participação acionária consistente com esse máximo fi-
nanciável;
h) comprovada capacidade de diversificação acionária e
flexibilização da participação do capital da empresa. A-
tuação no Brasil, no regime de equity partners, com uma
participação substancial de empresas nacionais no regi-
me de corporate investment e participação acionária;
i) comprovada capacidade de conduzir negociações com
potenciais investidores e de atrair capital de investimen-
tos, empréstimos, participação acionária, quaisquer for-
mas de participação de investidores individuais, etc. pa-
ra países em desenvolvimento;
j) core business centralizado em processamento, industri-
alização e marketing, forma de organização preferencial
com participação de produtores independentes com re-
gime de contratos, ficando com o controle de proces-
samento e comercialização da produção e pequena u-
nidade de suprimento de insumos e gerência de crédito

261
(para contato direto com os agentes financeiros), de
preferência como repassadores dos créditos;
l) capacidade de montar modelos de demonstração de u-
nidades de produção, controle dos produtores associa-
dos em forma de parceira;
m) capacidade de desenvolver planejamento dos projetos,
análise de viabilidade, organização empresarial comple-
ta, serviços e unidades de gestão, assistência técnica,
treinamento dos irrigantes, processamento de alimen-
tos, comercialização de comprovada eficiência e credibi-
lidade, em condições similares às prevalecentes nos pa-
íses em desenvolvimento;
n) experiência em geração e transferência de tecnologia
aplicada e treinamento de profissionais locais tanto em
tecnologia quanto, principalmente, em processos de o-
peração e gestão;
o) sólida experiência na área de contratos, organização de
gestão por parcerias e contratos, nas áreas de produ-
ção, fornecimento de insumos e de crédito;
p) comprovar que o regime de operação com interconexão
dos diversos elos através de contrato e boas práticas de
operação reduzem o risco do empreendimento;
q) capacidade de oferecer alguma forma de garantia de
preços que sirva ao propósito de seguro de preços para
os produtores e os agentes financeiros da área de crédi-
to de custeio - inclusive como forma (a ser definida ex-
plicitamente) de redução de custos;
r) dispor de quadros mínimos de agrônomos, engenheiros
agrícolas, especialistas em irrigação, técnicos em hidro-
logia, entomologistas, especialistas em aquacultura,
técnicos em gestão e especialistas em auditoria de con-
tabilidade; auditoria;
s) comprovada capacidade de servir clientes de grandes
empresas corretoras de fundos e investimentos de cli-

262
entes privados de todos os portes, corretores de fundos;
estimular a participação nos empreendimentos de com-
pradores dos produtos no ramo industrial, celebrando
não só contratos de parceria de fornecimento, mas con-
tratos de participação societária no investimento;
t) capacidade de realizar trabalhos de testes de melhorias
de novas sementes e variedades, cultivos, uso de insu-
mos, em condições de clima temperado, subtropical e
tropical e em diferentes altitudes, regimes pluviométri-
cos e evapotranspiração;
u) permitir auditoria externa, de acordo com a legislação
nacional;
v) capacidade de montagem de sistemas computadoriza-
dos de acompanhamento de produtores, sistemas de
cultivo, controles de fornecimento de insumos, usos de
tecnologias, controles de custos de produção, controles
de contas gráficas dos “mutuários”, registro de qualida-
de de produto entregue por produtor, sistemas de moni-
toramento e gestão do projeto como um todo, fluxo de
caixa, geração de demonstrativos e resultados financei-
ros e relatórios para efeito fiscal.
D) Vantagens Relativas Destas Empresas

As empresas investidoras internacionais dispõem de sis-


temas computadorizados de controle de água, solos, condições
climáticas, radiação solar, umidade, precipitação, movimento do ar
e temperatura para controle de evapotranspiração, previsão das
safras com base no sistema inclusive controle de fertilizantes, de-
fensivos e agrotóxicos.
Têm ainda timing correto da fertilização dos solos, tempo
certo e quantidade adequada, testes e ensaios de solos para qua-
lidade física e química dos solos e da água.
Além disso, contam ainda com análises laboratoriais dos
tipos: análise da água, do solo, dos nutrientes etc. inclusive grau de

263
toxidez das quantidades de defensivos e produtos químicos utiliza-
dos para preservação dos recursos naturais e do meio ambiente.
As empresas têm experiência na emissão de performance
bonds para as fases de implantação dos projetos, experiência e
credibilidade internacional reconhecidas.
Muito importante: têm potencial de operação com cultivos
de média e baixa rentabilidade relativa, mas que são importantes
para o Brasil em termos de substituição de importações.

E) Porte dos Investimentos Destas Empresas

Em geral, o porte dos investimentos destas empresas são:


pequenos, até 3 milhões de US$; médios, até 35 milhões de US$;
grandes, acima de US$ 50 milhões de US$. Áreas: médias, de
12.000 ha.

F) Precondições para Atração Destas Empresas

As precondições exigidas pelos investidores e empresas


internacionais na área de irrigação seriam:
a) acesso à terra;
b) liberdade de interferência do governo, no sentido de po-
líticas que, de alguma forma, gerem risco institucional
ou, alternativamente, se houver alguma forma de inter-
ferência, que esta se processe com regras claras e pre-
definidas, de forma compatível com projetos de longa
maturação;
c) baixa densidade populacional relativa (para não haver
concorrência pela terra e elevação do custo de oportu-
nidade do fator terra - o que é um risco);
d) custo relativo de terra barato;
e) custo de recuperação de custos de obras de infra-
estrutura básica relativamente baratos;

264
f) baixos riscos políticos lato sensu, em todas as esferas
do governo;
g) conversibilidade da moeda, sem riscos de centralização
de câmbio ou medidas dessa natureza;
h) disponibilidade de alguma forma de redução de custos
de financiamento.

♦ Participação de Empresas Corretoras de Negócios

Uma vez criados os incentivos para a atração de investi-


mentos privados, um passo importante é acionar empresas que
conheçam negócios no exterior e possam atrair investidores de
grande porte para os projetos.
Exemplos de Empresas: Mackinsey, Andersen Consulting,
Booz Allen, Arthur D. Little, BCG, A. T. Kearney, Price
Waterhouse, Ernest Young, Delloite, KPMG, Arthur Andersen,
Trevisan Associados, Mac Rich etc.
Entretanto, são necessários:
1. Estudo e proposição de critérios de seleção de empre-
sas de aproximação de cliente, incorporação e correta-
gem de negócios.
2. Fixação das “regras do jogo” de participação das em-
presas nacionais e estrangeiras candidatas potenciais
ao sistema de incorporação.
3. Definição da forma de atuação das operadoras de in-
corporação, com remuneração da parte fixa, para o es-
tudo de pré-viabilidade, parte para o estudo de viabili-
dade e parte da remuneração como taxa de sucesso,
sob a forma de associação de risco.
4. Projeto básico de viabilidade técnica, econômica e fi-
nanceira e, principalmente, os de engenharia financeira
são feitos pelo incorporador que poderá buscar sócios
no início do processo.

265
5. Condições de lançamento do projeto no mercado inter-
no e no exterior, com disponibilização das informações
do projeto em exposição permanente para empresas
mundiais.
Deve-se exigir:
Experiência em avaliação de coporate finance, de avalia-
ção de ativos e passivos para merges, fusões e aquisições, parce-
rias etc.
Conhecer empresas candidatas a trabalhar na área de au-
ditoria e corretagem de negócios, lato sensu.
As empresas corretoras devem ser capazes, através de
um statement of corporate capability, de saber identificar quem
deseja comprar e vender, o quê e como comprar, inclusive com
avaliação do desempenho dos potenciais investidores.
Deve ter credibilidade, acesso ao mercado internacional de
projetos de inversão e acesso a empresas de atuação em diver-
sos países.
Deve ter acesso às empresas de médio e de grande
porte.

♦ Atratividade de Investimentos no Processamento e Indus-


trialização no Negócio de Irrigação

Os pontos relacionados a seguir refletem as opiniões de in-


formantes qualificados do setor de industrialização de produtos
oriundos de projetos de irrigação. Os pontos mencionados refle-
tem uma identificação, em caráter preliminar, do padrão mínimo
de informações necessárias à atração dos investimentos de agro-
indústrias que eventualmente se interessariam em participar de
uma joint venture em um projeto de irrigação.
A) Etapa de Estudos Prévios

Na referida etapa deveriam ser conduzidos estudos preli-


minares de potencial de mercado, uma vez que se considera que

266
o mercado brasileiro é muito competitivo e um investimento de
porte tenderia a ter um período de maturação longo.
As etapas dos estudos básicos seriam:
Etapa I: estudos de mercado: o que produzir e onde vender
Etapa II: estudos de comercialização: condições de concor-
rência
Etapa III: desenvolvimento de projetos agroindustriais: tec-
nologia
Etapa IV: desenvolvimento do projeto financeiro completo
Etapa V: desenvolvimento do projeto físico detalhado
A tecnologia não representa uma barreira ao acesso. Há
feiras mundiais de máquinas de processamento industrial com
tecnologia de primeira geração e suppliers credit. Os problemas
são os riscos de mercado.

B) Etapa do Planejamento Logístico

São necessárias informações e estudos de procedimentos


de pós-colheita, a saber: condições de colheita e transporte nos
caminhões apropriados; lavagem, triagem, refrigeração, armaze-
nagem, etc. Na parte de produção, um ponto importante é o con-
trole de amadurecimento dos frutos. O estudo de viabilidade do
investimento depende do planejamento logístico.

C) Condicionantes Para o Investimento

1. Disponibilidade da escala de produção e de qualidade


2. Baixo custo relativo da mão-de-obra qualificada
3. Existência de infra-estrutura e transporte (fator distanci-
amento das linhas de suprimento)
4. Área mínima que viabilize a agroindústria

267
♦ Princípios para o Êxito dos Projetos Privados

Os principais princípios para o êxito de projetos privados


podem ser resumidos nos seguintes pontos:
1. A meta do projeto deve ser, de forma irredutível: auto-
sustentabilidade financeira.
2. Deve haver a menor dependência possível de fontes de
fundos de elevada incerteza, como nos casos de fundos
públicos.
3. Dever haver, em todos os perímetros e projetos, princi-
palmente os públicos, uma redução dos subsídios e tari-
fação de água de acordo com os custos.
4. Um princípio fundamental de uma boa administração fi-
nanceira e de credibilidade de um empreendimento é a
irredutível recuperação de todos os custos envolvidos,
principalmente dos custos de obras de infra-estrutura de
uso comum, de investimentos em capital fixo e de traba-
lho etc. inclusive custos de operação e manutenção.
5. Deve-se observar rigorosamente o princípio de reparti-
ção de responsabilidades financeiras de todos os bene-
ficiários, principalmente a participação de capital dos
usuários.
6. A administração deve ser descentralizada em unidades
celulares e não concentrada em uma única unidade de-
cisória.
7. Deve haver a delegação de competência e a transfe-
rência da administração e propriedade dos projetos para
os usuários-irrigantes, como o afastamento do Estado e
do apoio de fundos públicos.
8. Os projetos têm de passar por uma rigorosa avaliação
da rentabilidade do projeto.
Além disso, as comunidades de usuários passam a assu-
mir novos papéis e novas responsabilidades nos projetos, tais

268
como formar associações competentes para gerir principalmente a
prestação de serviços de água; participar do desenho do projeto,
desde sua concepção inicial; participar da execução e implemen-
tação do projeto; contratar, por sua conta e risco, assistência téc-
nica; e avaliar permanentemente o grau de satisfação dos mem-
bros participantes com o desempenho do projeto como um todo.
Um princípio fundamental é o de que o desenho dos proje-
tos deve partir do usuário que sabe o quanto e se pode pagar pe-
los serviços a eles prestados (como no caso da tarifa de água),
com atividades que pode e sabe fazer. Se o Estado quiser assen-
tar empreendedores familiares, terá de habilitá-los para conviver
com empreendedores de um novo negócio da irrigação.

8.4.5 - Características gerais de riscos de empresas-projeto

Apesar da indiscutível superioridade do sistema das em-


presas-projeto sobre os sistemas convencionais em que os negó-
cios são montados de forma segmentada, com graves riscos de
não-cumprimento dos planos de instalação dos negócios, as exi-
gências dessa forma de gestão/financiamento são muito maiores
que os sistemas atuais.
O número de exigências é maior, porquanto a empresa-
projeto envolve maiores riscos e a viabilidade do projeto tem de
ser rigorosamente comprovada. Os riscos mais comuns devem
ser afastados. Os mais complicados devem ser equacionados. Um
exemplo disso é o ponto fundamental de que o empreendimento
da empresa-projeto, por melhor que seja tecnicamente concebido,
não deve ser iniciado sem que todo, o financiamento esteja dispo-
nível, para investimento em capital fixo e provimento de capital e
financiamento para a posterior operação do projeto – coisa que
não é considerada nos projetos atuais. Falta de financiamento
integral é um risco; senão o maior deles.
O ponto mais importante é encontrar um (ou um conjunto)
de investidores estratégicos, uma empresa-líder ou um grupo
de empresas-líderes que se disponham a formar a empresa-
projeto, de forma solidária, inclusive para alavancar em conjun-

269
to recursos financeiros. Outro risco é o da credibilidade de in-
vestidores estratégicos.
A adesão de empresas depende da respeitabilidade das
empresas líderes. Deve predominar o efeito “manada” – onde um
grupo adere e outras empresas aderem pela credibilidade do gru-
po-líder. Os ativos intangíveis (marcas, know-how, gestão, capa-
cidade de organização, coordenação e gestão), dependendo da
complexidade do negócio, como no caso do negócio da irrigação,
são tão importantes quanto os ativos tangíveis.
Os principais riscos perceptíveis pelos investidores poten-
ciais são, em relativa ordem de importância:
1. Risco de crédito no “equity financing” – ou seja, risco
do “acionista” é mais elevado na empresa-projeto, muito
embora os lucros possam ser potencialmente maiores,
pois a percepção é de que o investimento é privado,
com menores custos e maior controle sobre resultados.
2. Estudos de viabilidade e planejamento financeiro têm
de ser criteriosos e cuidadosamente preparados, in-
clusive com cenários de riscos, como se faz na análise
de risco em projetos privados.
3. Os custos das matérias-primas e outros insumos in-
termediários e produtos necessários à produção terão
de estar assegurados.
4. O suprimento e a qualidade da energia elétrica (a um
custo razoável) estão assegurados.
5. Existe mercado para o produto a ser produzido, com
elevado grau de previsibilidade, inclusive consideran-
do-se a concorrência nos próximos anos.
6. Existem meios de transportar (a um custo razoável) os
produtos para os mercados de destino.
7. Existem meios de comunicação adequados disponíveis.
8. Materiais de construção estão disponíveis a custos e
quantidades necessários.

270
9. A empresa construtora é experiente e confiável.
10. A empresa operadora é experiente e confiável.
11. O pessoal administrativo é experiente e confiável. A
administração e a gestão serão profissionalizadas e
especializadas.
12. A tecnologia é conhecida e não é fator de competiti-
vidade no mercado. Não há barreiras tecnológicas à
entrada.
13. Os contratos entre as diversas empresas parceiras é
possível e operacional. O sistema jurídico local é efici-
ente e pode ser utilizado; existe possibilidade de con-
tratos com juízo arbitral.
14. O ambiente político é amigável e estável. O governo
local é cooperativo. Está disposto a associar-se ao
projeto. Licenças e permissões estarão disponíveis. O
governo local promove investimentos.
15. Não existe risco de desapropriação parcial nem total
do projeto.
16. O risco do país é conhecido (deve ser baixo, de prefe-
rência).
17. O risco de direitos de propriedade é baixo.
18. Os riscos cambiais das moedas envolvidas foram con-
siderados e podem ser resolvidos (dólar e real).
19. As empresas participantes (as mais importantes) que
são chave do processo contribuíram adequadamente
com sua parte de recursos ou contribuíram adequa-
damente com o esforço de captação dos mesmos.
20. O projeto tem valor como colateral (garantia).
21. Avaliações satisfatórias dos recursos e dos ativos fo-
ram obtidas por processo rigoroso dentro das melho-
res técnicas disponíveis.

271
22. Seguros podem providenciar coberturas adequadas.
23. O risco de força maior foi considerado.
24. O risco de surto (grande aumento) nos custos foi con-
siderado.
25. O risco de atrasos foi considerado.
26. O projeto apresenta adequados índices de retorno pa-
ra os investidores.
27. As projeções de inflação são realistas.
28. As projeções para as taxas de juros são realistas.
29. Os riscos ambientais são administráveis – cumprir-se-
ão com a lei.
30. O projeto está de acordo com leis “amigáveis” existen-
tes e vigentes no estado, no município e no país.

8.4.6 - Observações finais

A literatura que trata da questão da atração do investimen-


to privado e investiga as restrições para o desenvolvimento, por
parte do setor privado, da atividade de irrigação, indicava que uma
precondição importante para o empreendimento privado (em qual-
quer setor da economia, diga-se de passagem) é o que se con-
vencionou chamar “ambiente comercial” previsível, isto é, onde as
políticas de irrigação, de crédito, de preços e mercados fossem
mais estáveis. Um ambiente comercial previsível encorajaria o
setor privado a investir na exploração da atividade da irrigação. O
setor privado tende a afastar-se quando há riscos institucionais de
várias naturezas.
Um dos riscos mais importantes que inviabilizam o investi-
mento privado é o da mudança dos cenários de fatores que afe-
tam a rentabilidade dos negócios e dos sinais emitidos pelas polí-
ticas públicas, principalmente o paternalismo.
Quando os cenários que determinam a rentabilidade dos
negócios não estão claros num horizonte de tempo necessário
272
para viabilizar o investimento de médio e longo prazos, a reação
dos investidores é negativa. Os negócios não são feitos, não há
transparência e tradição de rentabilidade.
Quando existem riscos institucionais ou das políticas públi-
cas, não só há perda econômica como ameaça de perdas finan-
ceiras irrecuperáveis para o setor privado. Um dos riscos mais
importantes que afetam a atividade e a rentabilidade da irrigação
(assim como a atividade econômica em geral), são os riscos insti-
tucionais, para os quais não há seguro.
Outro fator de elevado risco que afeta a rentabilidade de
investimento e que afasta o setor privado é a insegurança em
relação ao crédito público, geralmente prometido e tido como
confiável. Porém, no Brasil, os orçamentos de aplicação de re-
cursos públicos sejam para gasto fiscal clássico ou para aplica-
ções de créditos são orçamentos indicativos e as aplicações são
contingenciadas.
Quando existe a promessa de provimento do crédito públi-
co, o crédito privado, por parte dos agentes financeiros, se afasta
(é o conhecido crowding out). Sem a garantia do crédito, é prati-
camente impossível, para um irrigante, fazer um planejamento os
seus cultivos com desembolsos financeiros programados, que não
são atendidos com a devida tempestividade. Isto é tanto mais gra-
ve quanto maior o investimento feito com recursos próprios pelo
produtor irrigante que já comprometeu sua capacidade de alavan-
cagem financeira para viabilizar o seu projeto, cuja natureza é de
longo prazo.
Outra incerteza decorre da existência de incentivos e sub-
sídios (ou promessa deles) produzam condições desiguais de
competitividade dentro de um projeto ou entre projetos. Regimes
de incentivos que variam de projeto para projeto ou de produtor
para produtor violam um princípio da eqüidade na distribuição dos
mesmos, princípio esse indispensável para atrair o setor privado.
O Estado deve ter uma atuação seletiva, mas há um limite, além
do que se torna difícil a participação do setor privado. A experiên-
cia internacional mostra que, se houver um competidor ao lado de

273
outro que desfruta de condições especiais de incentivos, alteram-
se as condições de competitividade nos mercados.
Outro ponto importante de risco diz respeito às tarifas ou à
remuneração dos investimentos de infra-estrutura comum de irri-
gação, de operação e de manutenção. A recuperação destes cus-
tos, que se consubstanciam nas tarifas e taxas, deve ter um de-
nominador comum para todos os produtores-irrigantes. Do contrá-
rio, é possível que haja diferenças entre custos de produção de
um dado cultivo, até mesmo dentro de um mesmo projeto. Além
disso, a cobrança das tarifas e taxas deve conter condições míni-
mas de eqüidade e, sobretudo, condições de que “todos devem
pagar”. A falta de cobrança de tarifas cria “tarifas diferenciadas”. A
recuperação de custos é um traço comum no estado das artes dos
modelos de irrigação vigentes hoje em todos os países estudados.
A literatura mostra que o projeto de irrigação deve estar
assentado em bases de eqüidade, em termos de custos para to-
dos, no tocante à recuperação dos investimentos. Deve haver
uma definição das regras do jogo, básicas para todos, dentro do
projeto e entre projetos, e alguma forma de garantia de que o se-
tor privado pode investir. O Estado não deve conceder subsídios
discriminatórios sob a forma de obras, tarifas, taxas, créditos, para
não tornar o ambiente comercial e a concorrência desiguais.
Para o investidor individual, as condições de crescimento
de déficit fiscal, elevação de juros e cortes no fornecimento de
crédito podem criar graves problemas, principalmente quando há
um “rompimento de um contrato“ de fornecimento de serviços bá-
sicos que seja unilateralmente descumprido pelo Estado. O rom-
pimento desse contrato pode criar enormes embaraços ao investi-
dor individual e uma rejeição, de sua parte, para a atuação nessa
atividade. O relacionamento do Estado, através dos órgãos públi-
cos, com o irrigante, tanto quanto o relacionamento do irrigante
com empresas prestadoras de serviços, devem ser regulados num
regime de contratos de obrigações e deveres mútuos, com seve-
ras punições no caso de seu descumprimento.
Essa é uma pré-condição essencial para atração do inves-
timento privado e dela faz parte a questão da recuperação dos

274
custos, como foi demonstrado. É preciso atentar para o fato de
que as relações econômicas estão assentadas em regimes de
contratos, sem os quais se torna impossível o exercício de qual-
quer atividade econômica.

8.5 - Pesquisa e Desenvolvimento para Agricultura


Irrigada no Nordeste

Analisando os diagnósticos realizados mais recentemente,


relativos aos problemas com que se defrontam os agricultores-
irrigantes no Nordeste e norte de Minas Gerais, e confrontando-as
com as indicações dos agricultores, especialista da assistência
técnica e creditícia, empresas fornecedoras de máquinas, semen-
tes e mudas e de outros insumos agrícolas, participantes dos se-
minários realizados nos seis pólos agroindustriais do Nordeste e
norte de Minas, foi possível identificar temas e respectivas linhas
de pesquisa de interesse e relevância comuns. Se implementa-
das, serão capazes de oferecer soluções tecnológicas relevantes
para agricultura irrigada daquelas regiões.
Como ponto de partida, de nova forma de atuação solidária
das organizações de pesquisa agropecuária, atuando no e para o
Nordeste e norte de Minas e livremente integradas no sistema de
pesquisa aqui proposto, os temas e respectivas linhas de pesqui-
sa, deveriam compor a primeira etapa de um PROGRAMA INTE-
GRADO DE PESQUISA EM AGRICULTURA IRRIGADA PARA O
NORDESTE BRASILEIRO, muitas das quais já em execução na-
quela região, inclusive com apoio financeiro do Programa Avança
Brasil, já mencionado.
A expectativa é de que, se endossados pelos responsáveis
pela implementação do Novo Modelo de Irrigação, naquelas regi-
ões, eles deveriam, inclusive, constituir uma das precondições
para o financiamento público da pesquisa agropecuária para agri-
cultura Irrigada nas regiões Nordeste e norte de Minas.
Essa proposta, além das sugestões dos usuários finais,
como citado anteriormente, teve também como base discussões
com técnicos e dirigentes da EMBRAPA e vários órgãos estaduais
de pesquisas.

275
8.5.1 - Organização do esforço de pesquisa em agricul-
tura irrigada no Nordeste e norte de Minas - de-
terminantes e inovações sugeridas

♦ Determinantes

As grandes transformações que ocorrem no mundo atual


trazem novos desafios também para a agricultura irrigada. Entre
elas, sobressaem: a globalização, com o conseqüente acirramento
da competição, além da continuidade das distorções no comércio
internacional, causadas pelos subsídios agrícolas - “somente os
países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico (OCDE) desembolsaram algo em torno de US$ 360
bilhões em financiamentos à agricultura em 1998, o que leva os
consumidores do mundo industrializado a pagar por seus alimen-
tos quase um terço a mais do que pagariam se o governo não
subsidiasse os produtores.
Além disso, as tarifas sobre os produtos agrícolas ainda
são, em média, de 40%, contra muito menos de 10% para os pro-
dutos manufaturados, e as cotas de importação continuam rígidas”
(THE ECONOMIST, 2000).
Some-se ainda crescente consciência sobre a necessidade
de conservação do meio ambiente (inclusive com a imperiosa ne-
cessidade de economizar água; um insumo estratégico – e cada
vez mais crítico, para a agricultura irrigada nordestina); a revolu-
ção tecnológica, fundamentada na biotecnologia, robótica e tecno-
logia de informação e o reconhecimento do poder do consumidor,
realidades essas que, somadas, determinam mudanças também
nas necessidades e prioridades das ações de pesquisa e desen-
volvimento em agricultura irrigada, agravadas pela persistente
redução de recursos para P&D, uma realidade para sistemas de
pesquisa do mundo inteiro.
Por isso, o agronegócio brasileiro busca também alcançar
maior competitividade, centrada na maior eficiência no uso de
recursos, na geração de produtos de melhor qualidade em suas
cadeias produtivas, com menores custos de produção e melhor
gerenciamento de todas as atividades envolvidas.

276
Esse ajustamento estrutural afeta, de forma diferenciada,
os diferentes segmentos da cadeia produtiva. Os produtores são
os mais pressionados, principalmente aqueles de subsistência e
os inseridos na agricultura de transição.
Paulatinamente, as ações do governo são menos interven-
cionistas e tornam-se mais de caráter regulatório e de suporte.
Não obstante, enquanto a agricultura comercial se orienta pelos
sinais do mercado, a agricultura de subsistência e a de transição
(normalmente explorada por pequenos e médios agricultores) ne-
cessitarão de apoio governamental para se integrar ao mercado
de forma sustentável.
Ao lado das grandes transformações, apontadas acima, os
seguintes aspectos são ainda determinantes de mudanças na
execução das atividades de P&D:
a) no ambiente da ciência e tecnologia brasileira, há cres-
cente interesse internacional por parcerias com o Brasil,
maior disponibilidade de pessoal de pesquisa, melhor
qualificado, em contraste com o inequívoco enfraqueci-
mento do sistema público, internacional e nacional, de
pesquisa agropecuária e de extensão rural. Delineia-se,
assim, um novo modelo de financiamento da pesquisa,
baseado em fundos competitivos, com acirramento da
disputa interinstitucional por recursos, levando a que se-
ja induzida e acelerada a formação de núcleos de exce-
lência, interdisciplinares e a alocação de recursos em
projetos temáticos, multi-institucionais;
b) aguçam os problemas relativos ao fluxo de germo-
plasmas;
c) consolida-se a legislação de propriedade intelectual, o
que estimula o desenvolvimento científico e tecnológico
com a participação do setor privado e, de outra parte,
limita a utilização de tecnologias de base;
d) cresce o protecionismo não tarifário, através de barrei-
ras sanitárias, sociais e questões ambientais (agora,
sob o manto capcioso da multifuncionalidade da agricul-

277
tura, estendido pelo primeiro mundo sobre sua atividade
agropecuária menos competitiva);
e) a visão integrada de desenvolvimento sustentável, que
tem como pilar o conceito da eqüidade de oportunida-
des e na distribuição dos ganhos dos avanços tecnoló-
gicos; a conservação ambiental e da biodiversidade e a
geração de renda;
f) a mobilidade geográfica do desenvolvimento agropecu-
ário, apoiada em ações de P&D, em políticas macroe-
conômicas não-discriminadoras e em investimentos pú-
blicos e privados que estimulem o uso das tecnologias
geradas. É o caso dos cerrados brasileiros que, nos úl-
timos 20 anos, ampliarem a estreita fronteira agrícola do
sul para o centro-oeste do País e que se estendeu para
o oeste baiano, sudoeste do Piauí, sul do Maranhão, a-
tingindo, agora, o extremo norte do País;
g) a organização e modernização em curso das principais
cadeias produtivas, cada vez mais aptas na especifica-
ção e explicitação de suas demandas tecnológicas;
h) a decisão governamental, que possibilitou às Institui-
ções de pesquisa e ensino agrícolas, como a Embrapa
e as universidades brasileiras, encetarem amplo e inten-
sivo programa de pós-graduação, fornecendo os recur-
sos básicos em pesquisa e desenvolvimento (P&D), por-
que intensiva em capital intelectual. A qualidade desse
capital humano reflete-se diretamente na qualidade dos
resultados, não havendo substituto para profissionais
bem treinados, comprometidos e recompensados;
i) o fortalecimento, em todos os níveis, da pesquisa voltada
para o mercado, com o aprimoramento de instrumentos
que levem à incorporação de conhecimentos básicos
para solução de problemas reais dos produtores e a
conversão deste conhecimento em conceitos tecnoló-
gicos inovadores, que sejam validados, viáveis eco-
nomicamente e que sejam, sem tardança, transferidos
para o mercado;

278
j) a constatação de que P&D público e privado são com-
plementares, ou seja, antes de antagônicos, eles são
sinérgicos. Nem por isso deve o primeiro perder o senso
de relevância e objetividade da pesquisa. Por outro la-
do, as instituições públicas devem buscar um balanço en-
tre o esforço tecnológico e pré-tecnológico. Esse balanço
é determinado em conformidade com a estrutura do a-
gronegócio, na perspectiva de propriedade intelectual e
segundo a natureza de cada tecnologia considerada.
As novas condições de produção e comercialização deter-
minam novas formas de abordagem da questão do desenvolvi-
mento tecnológico e da transferência de tecnologias para o agro-
negócio, baseado na agricultura irrigada, no Nordeste brasileiro.
No segmento anterior à produção agrícola, um novo relacio-
namento tem de ser implementado com as empresas produtoras
de máquinas, equipamentos e insumos. Na indústria de sementes
e mudas, o apoio tecnológico a pequenas e médias empresas,
sem programa de pesquisa próprio, é essencial para sua sobrevi-
vência. A ocupação de nichos, como o representado por agriculto-
res pobres e localizados em áreas de pouco interesse para em-
presas produtoras de sementes de alto conteúdo tecnológico é
outro ponto essencial. Por outro lado, é necessário que a pes-
quisa pública, voltada para a agricultura irrigada, também partici-
pe dos avanços que estão ocorrendo na área biotecnológica.
Formas de relacionamento com empresas multinacionais, que
atuam neste segmento, são necessárias para que o País possa
dominar os conhecimentos imprescindíveis ao desenvolvimento
da moderna tecnologia.
No caso de empresas produtoras de insumos, a indústria
química e a de máquinas e equipamentos, o relacionamento é
também necessário para o processo de adaptação desses produ-
tos às condições brasileiras e para informação aos agricultores
sobre suas características e desempenho, além de seus impactos
no meio ambiente. Assim, é imperioso fazer chegar na agricultura
irrigada brasileira o conceito de hidroeconomicidade, desenvol-
vendo equipamentos mais eficientes na distribuição de água e
cultivares de plantas menos exigentes em água. Também o mo-

279
derno conceito de agricultura de precisão deve ser introduzido
neste setor, sabidamente intensivo no uso de insumos.
No segmento posterior ao agrícola, tem de ser considerado
o atendimento das necessidades das indústrias de transformação
e das empresas de distribuição, no que diz respeito a um produto
de qualidade, seja para atender às novas necessidades da indús-
tria, seja para atender ao seu programa de eficiência, para convi-
ver com uma situação de margens cada vez mais estreitas, em
um mercado de intensa e crescente competição, e cada vez mais
concentrado.

♦ O Segmento Diversificado da Produção Agrícola

No segmento agrícola as responsabilidades são maiores.


As modificações nos segmentos a jusante e a montante têm de
ser internalizadas, via processo de adaptação e ajustamento, por
parte dos agricultores. Alguns deles têm mais facilidade e maior
acesso às informações, que possibilitam esse ajustamento em
tempo aceitável. No caso dos agricultores pobres, isto é mais difí-
cil e o tempo necessário para os ajustes é maior. Como sua so-
brevivência econômica está relacionada a esse ajuste, algum tipo
de ação tem de ser desenvolvido, de modo a impedir que eles
sejam alijados do mercado ou que sobrevivam em condições mar-
ginais, o que, a longo prazo, exaurirá suas reservas e as do ambi-
ente natural por ele explorado.

♦ Inovações Sugeridas na Organização e Gestão da Pesquisa

Diante dessas novas realidades, também novas exigências


se colocam para o sistema de pesquisa, para fazer face aos novos
desafios que se apresentam para a competitividade dinâmica da
agricultura irrigada do Nordeste e norte de Minas. Elas determi-
nam, por fim, alterações no modus operandi dos sistemas de pes-
quisa, entre os quais sobressaem:

280
Foco no cliente

Adequar as características dos produtos da agricultura irri-


gada às necessidades e demandas do agronegócio (cliente inter-
mediário) e da sociedade (cliente final).

Qualidade

Constituir-se, cada unidade do sistema de pesquisa, um


centro de excelência, pautando as ações na eficácia e eficiência
na busca de resultados e soluções para os produtores-irrigantes.

Agilidade

Atingir, com objetividade, as metas planejadas, das ações


de pesquisas, visando atender, a tempo, às necessidades dos
clientes.

Foco na obtenção de soluções

Internalizar as demandas, visando ao avanço do co-


nhecimento, através da mobilização das capacidades interna
e externa, integrando-as em ações definidas e objetivas para
obtenção de soluções.

Parcerias

Ampliar a interação das unidades integrantes do sistema


de pesquisa, voltadas para a agricultura irrigada, pela cooperação
institucional entre instituições de ensino, pesquisa e extensão,
públicas e privadas. O consórcio de pesquisa, ensejando às orga-
nizações de pesquisa atuarem em rede, mantendo, contudo, sua
individualidade, é uma alternativa, sobretudo quando recursos
humanos, materiais e financeiros são críticos e as demandas por
soluções tecnológicas aumentam. Um bom exemplo da eficácia
desse modus operandi é o vitorioso esforço brasileiro no seqüen-
ciamento do código genético do agente causal do amarelinho dos
citrus – a bactéria Xilella perniciosa.

281
Mas as parcerias não se esgotam nesse universo restrito
das interações entre organizações de ensino, pesquisa e desen-
volvimento. Ela deve considerar, também como parceiro, todo
indivíduo ou organização, pública ou privada, com quem o sistema
de pesquisa e suas unidades integrantes e associadas possam
assumir e manter, de forma temporária ou permanente, uma rela-
ção de cooperação, compartilhando riscos, custos e benefícios para
a pesquisa e desenvolvimento e/ou transferência de tecnologia.

♦ Objetivos do Sistema de Pesquisa em Agricultura Irrigada

As soluções viabilizadas pela pesquisa devem ter por obje-


tivo final resolver problemas e aproveitar oportunidades, relacio-
nadas com o agronegócio, para seu desenvolvimento e o bem-
estar de toda a sociedade. Este propósito comum deve ser tradu-
zido nos objetivos gerais que seguem:

Objetivo Geral 1

Viabilizar soluções tecnológicas para o desenvolvimento


competitivo do agronegócio, baseado na agricultura irrigada, em
uma economia globalizada.
Para cumprir este primeiro objetivo, o sistema de pesquisa
deve implementar ações direcionadas prioritariamente para:
a) introduzir, avaliar e utilizar germoplasmas, para fins de
desenvolvimento de material básico, no melhoramento e
obtenção de linhagens e cultivares, através de métodos
clássicos;
b) utilizar técnicas de biotecnologia para apoiar programas
convencionais de melhoramento genético para a obten-
ção de novos cultivares para o ambiente irrigado;
c) implementar programas interativos com empresas pri-
vadas para o desenvolvimento de novos cultivares e
manter a produção de híbridos para as empresas que
não têm programas próprios de melhoramento genético,

282
ou que se disponham a utilizar combinações híbridas
disponíveis no sistema;
d) ocupar nichos estratégicos em pesquisa biotecnológica
(qualidade, padrões desejáveis, tais como: formato,
transportabilidade, adaptação a estresses) não utiliza-
dos pela iniciativa privada;
e) desenvolver ferramentas biotecnológicas de suporte a
programas de obtenção de cultivares mais adaptados e
tolerantes a condições de estresses e que gerem produ-
tos com melhor qualidade física, química, organoléptica
e nutricional;
f) incorporar, dentro do conceito de banco de germoplas-
ma, microorganismos com potencial para uso na agricul-
tura irrigada sustentável;
g) desenvolver linhagens e combinações híbridas que
possam ser licenciadas, após proteção, num arranjo do
tipo Foundation Seed;
h) desenvolver e adaptar metodologias e processos para
aquisição automática de dados, tratamento e interpreta-
ção de informações e avaliação de sistemas agrícolas
irrigados;
i) desenvolver e ajustar sistemas de controle e de suporte
à tomada de decisão para uso racional de recursos na-
turais e de insumos agrícolas;
j) aprimorar os sistemas de plantio de hortícolas (hortali-
ças, frutas e flores), bem como as tecnologias para co-
lheita, maturação, armazenamento e transporte em at-
mosfera controlada;
l) otimizar processos e sistemas, de forma a reduzir per-
das físicas e qualitativas na colheita, preparo, armaze-
nagem, transporte e exposição para venda de produtos
da agricultura irrigada;

283
m) identificar fatores intervenientes na formação e desen-
volvimento de pólos agro-industriais;
n) acompanhar, sistematizar e disponibilizar informações
de mercado da cadeia produtiva de produtos irrigados;
o) integrar informações do zoneamento agroclimático, zo-
nas diferenciais de adaptação e indicação de cultivares;
p) disponibilizar sistemas de informações geográficas so-
bre os cultivos irrigados, de fácil acesso ao público;
q) participar de ações de desenvolvimento regional basea-
das na competitividade do agronegócio;
r) utilizar metodologias participativas para prospecção de
demandas; segmentação, definição de públicos-alvo e
posicionamento no mercado; marketing tático e de ge-
renciamento de controles e estratégias de marketing
para o direcionamento das atividades de pesquisa e
desenvolvimento;
s) atuar no processo de incubação de empresas de base
tecnológica, afim de incrementar a transferência de tec-
nologias geradas e apoiar o empreendorismo regional e
setorial;
t) ampliar as ações de transferência de tecnologia que
aumentem a sua efetividade;
u) aperfeiçoar e internalizar a gestão de propriedade inte-
lectual.

Objetivo Geral 2

Viabilizar soluções tecnológicas para o agronegócio da a-


gricultura irrigada que promovam e compatibilizem a sustentabili-
dade das atividades econômicas com o equilíbrio ambiental.
Para cumprir este segundo objetivo geral, o sistema de
pesquisa deve implementar ações direcionadas prioritariamente
para:

284
a) identificar mecanismos de adaptação a estresses am-
bientais visando minimização de perdas e estabilidade
de produção;
b) gerar conhecimentos e tecnologias que permitam in-
troduzir alterações genéticas em plantas, de modo a
garantir a sustentabilidade agrícola e reduzir ou mini-
mizar estresses bióticos e abióticos e impacto ambien-
tal negativo da atividade agrícola;
c) identificar mecanismos de interação planta-patógeno e
planta-inseto que levem a métodos mais seguros e e-
fetivos de controle de pragas e doenças;
d) preservar o meio ambiente, através do desenvolvimen-
to de alternativas de manejo cultural que possibilitem a
redução do uso de agroquímicos em sistemas de pro-
dução agrícola;
e) promover a sustentabilidade e a competitividade dos
principais sistemas de produção, envolvendo plantio
direto, agricultura irrigada, colheitas para explorar ja-
nelas de mercado (interno e externo) e integração a-
gricultura irrigada e aquicultura (observando a outorga
de água do projeto);
f) integrar os conceitos de agricultura de precisão e agri-
cultura conservacionista;
g) identificar, selecionar e desenvolver tecnologias para a
utilização de organismos benéficos visando maior pro-
dutividade e estabilidade dos agroecossistemas;
h) identificar genes de resistência; avaliar e selecionar ge-
nótipos-elites, resistentes às pragas e doenças e desen-
volver tecnologias para o manejo dessa resistência;
i) desenvolver e adaptar estratégias de controle de do-
enças e pragas, através de métodos culturais, biológi-
cos, físicos e químicos;

285
j) monitorar e estabelecer modelos preditivos de ocor-
rência e de expansão de doenças e pragas, principal-
mente em regiões de agricultura irrigada intensiva;
l) desenvolver técnicas de manejo e intervenção no am-
biente que contribuam para o aumento da eficiência no
uso de insumos, racionalização de sua utilização e mi-
nimização da contaminação de agroecossistemas.
Objetivo Geral 3

Viabilizar soluções tecnológicas para o agronegócio,


principalmente em pólos agro-industriais do Nordeste e norte de
Minas, que contribuam para diminuir os desequilíbrios, regional
e social.
Para cumprir este terceiro objetivo, o sistema de pesquisa
deve implementar ações direcionadas prioritariamente para:
a) melhorar o desempenho dos sistemas de produção, vi-
sando à sustentabilidade econômica e ecológica da a-
gricultura familiar daquelas regiões;
b) identificar as razões da baixa utilização de sementes e
mudas melhoradas de hortícolas, grãos e algodão, por
agricultores pobres, e desenvolver ações de difusão de
cultivares adequados para estes agricultores, ampliando
o uso de metodologias de campanhas, como a atual
Campanha Nacional de Produção de Sementes de Mi-
lho Variedade em Comunidades Rurais, coordenada pe-
la Embrapa – Milho e Sorgo;
c) aperfeiçoar o processo de transferência de tecnologias
e conhecimento, tendo como base o entendimento dos
conceitos e dos princípios organizacionais e gerenciais
da agricultura de transição (da agricultura de subsistên-
cia para a agricultura irrigada de mercado);
d) concentrar esforços no aumento da produtividade do
trabalho pela mecanização em pequenas proprieda-
des, como forma de agregar renda (por exemplo, ferti-
irrigação);

286
e) diversificar a linha de cultivares para a agricultura irriga-
da, contemplando, inclusive, a agricultura de transição,
procurando obter variedades que possam ser multipli-
cadas pelos agricultores e híbridos duplos com qualida-
de nutricional melhorada;
f) incrementar um programa de armazenamento ao nível
de propriedade, voltado para a agricultura familiar.

Objetivo Geral 4

Viabilizar soluções tecnológicas para fornecimento de


matérias-primas e alimentos do agronegócio da agricultura irriga-
da, que promovam a saúde e a melhoria do nível nutricional e da
qualidade de vida da população.
Para cumprir este quarto objetivo geral, o sistema de
pesquisa deve implementar ações direcionadas prioritariamente
para:
a) executar pesquisas relacionadas com a qualidade de
frutas e hortaliças, grãos e fibras no pós-colheita,
desenvolvendo tecnologias que contribuam para o
controle integrado de insetos (pragas) desses produ-
tos, quando estocados, com e sem atmosfera
controlada, para a redução do uso de agrotóxicos
residuais e para a redução de perdas físicas e grãos
livres de micotoxinas;
b) articular com o setor agroindustrial o desenvolvimento
de novos produtos na agricultura irrigada, tanto para
uso industrial, como para alimentação humana;
c) desenvolver pesquisas relacionadas com a qualidade
dos produtos da agricultura irrigada (v.g. milho e sorgo
com maior teor de óleo, de ferro, de aminoácidos es-
senciais, digestibilidade etc.) que contribuam para sua
melhor utilização na alimentação animal e humana;
d) implementar, em colaboração com órgãos/ empresas
de assistência técnica e extensão rural, Organizações

287
Não-Governamentais (ONGs), prefeituras etc., pro-
gramas de utilização de milho com qualidade protéica
para alimentação de grupos da população com carên-
cias nutricionais.

♦ Metas Sugeridas

O alcance dos seguintes tipos de metas dever-se-ia bus-


car como resultado das ações a serem implementadas, em con-
formidade com o estabelecido nos planos plurianuais de P&D,
durante a sua vigência. Elas envolvem tanto aspectos relativos a
P & D como à transferência de tecnologias e à gestão do esforço
de pesquisa.
1. Incrementar a produtividade média dos cultivares da
agricultura irrigada de importância econômica.
2. Lançar uma média, no período do plano, de ´n´ cultiva-
res de “p” espécies a cada ano, que incorporem ga-
nhos de resistência às principais pragas, doenças e
estresses abióticos.
3. Lançar, até o final do período, híbridos e cultivares a-
daptados às condições do semi-árido e da agricultura
irrigada do Nordeste do Brasil e norte de Minas.
4. Desenvolver tecnologia para geração e interpretação
de informações georeferenciadas de sistemas de pro-
dução validando-o como instrumento útil de recomen-
dação para sistemas de agricultura de precisão.
5. Identificar e promover caracterização detalhada de pe-
lo menos um mecanismo de tolerância a alumínio, um
mecanismo de eficiência para fósforo, um mecanismo
de tolerância a seca.
6. Desenvolver duas técnicas de biologia molecular, celu-
lar e de transformação genética em condições de uso
nos programas de melhoramento genético de plantas
para condições tropicais, visando a tolerância a es-

288
tresses bióticos e abióticos e à melhoria da qualidade
nutricional e física do grão.
7. Desenvolver uma estratégia de manejo integrado de
pragas e doenças importantes para as culturas irriga-
das, na região Nordeste.
8. Desenvolver pelo menos 60 práticas/processos agríco-
las para melhorar a sustentabilidade/competitividade
de sistemas de produção envolvendo cultivos irrigados
de grãos, frutícolas e olerícolas.
9. Implantar e disponibilizar de forma sistematizada os
custos de produção rentabilidade e competitividade dos
sistemas de produção que envolvem as culturas irriga-
das nos principais pólos agroindustriais do Nordeste
10. Desenvolver um modelo e software para recomenda-
ção de manejo de irrigação utilizando o balanço de
água no solo, em sistemas de produção sob irrigação
de grãos, frutícolas e olerícolas.
11. Desenvolver metodologia visando corrigir, predizer e
disponibilizar a evapotranspiração de referência atra-
vés de redes neurais artificiais para racionalização de
práticas de manejo de irrigação.
12. Desenvolver uma estratégia de manejo integrado de
pragas e doenças para manutenção da qualidade
pós-colheita dos produtos da agricultura irrigada do
Nordeste.
13. Caracterizar os cultivares comerciais, disponíveis no
mercado, com relação à qualidade nutricional e pro-
cessamento industrial.
14. Chegar no fim do período com uma relação de 1,5 pu-
blicação técnica (artigos em revistas indexadas ou em
anais de congresso e capítulos de livro) por pesquisa-
dor da equipe.

289
15. Atingir um total, no último ano, de 10.000 horas de
cursos.
16. Implantar a estrutura organizacional de núcleos temá-
ticos.
17. Implantar a gestão administrativa por processos.
18. Implantar os segmentos referentes aos produtos da
agricultura irrigada do Nordeste nas Redes: Embrapa
de Informação Tecnológica e de Irrigação do Banco do
Nordeste do Brasil, incorporando, entre os usuários,
agentes de assistência técnica e de extensão rural,
pública e privada, e da equipe de vendas das empre-
sas licenciadas para produção de sementes e mudas
dos programas de melhoramento do sistema de pes-
quisa, atuando no e para o Nordeste
19. Adequação do quadro de pessoal, terceirizando ativi-
dades de apoio e concentrando recrutamento em á-
reas diretamente ligadas à atividade fim.
20. Implantar anualmente uma campanha para produção
e/ou utilização de sementes e mudas melhoradas em
perímetros de irrigação e assentamentos rurais.

♦ Diretrizes Estratégicas Sugeridas

Para cumprir os objetivos propostos no âmbito de sua mis-


são, o sistema de pesquisa em agricultura irrigada deveria nortear
suas diretrizes estratégicas focadas em:

Capital Humano

Sendo o recurso humano crítico nas atividades de P&D, o


realinhamento deve-se apoiar em sua constante evolução. É ne-
cessário definir estratégias de aperfeiçoamento contínuo, no con-
texto de projetos estruturantes que visam à motivação, o compro-
metimento e à mobilização das pessoas com o realinhamento es-
tratégico, para que ele se concretize.

290
O processo de mobilização e realinhamento deve ocorrer
através das seguintes iniciativas, de caráter organizacional:
a) promover uma política de reposição, atualiza-
ção/desenvolvimento, remanejamento de recursos hu-
manos, incorporando novas habilidades, fortalecendo a
área de P&D e de transferência de tecnologia;
b) redimensionar a área gerencial de apoio administrativo
no sentido de agilizar, simplificar, flexibilizar e integrar
os diferentes estratos da instituição visando um melhor
apoio a P&D e transferência de tecnologia, liberando
pesquisadores de atividades-meio;
c) adotar mecanismos que possibilitem criar um ambiente
propício para inovação, criatividade, avaliação de de-
sempenho e premiação por excelência;
d) criar mecanismos que permitam treinar, na própria uni-
dade, profissionais jovens com habilidades distinguíveis;
e) promover programas de capacitação para adequar os
empregados à nova realidade de cada integrante do sis-
tema de pesquisa, realinhando o perfil profissional dos
segmentos gerencial, técnico científico e operativo;
f) fortalecer as ações para a gestão compartilhada, com
o envolvimento e participação dos empregados nas
decisões;
g) intensificar as ações de esclarecimento junto a todos os
empregados sobre os sistemas de avaliação;
h) simplificar os sistemas de avaliação e sua utilização
como ferramenta de gestão efetiva;
i) capacitar gerentes para execução de ações de plane-
jamento, acompanhamento e avaliação e para condu-
ção das relações humanas que ocorrem no ambiente de
trabalho;
j) desenvolver e implantar programas que visem melhorar
as relações interpessoais.

291
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D)

Para o direcionamento estratégico das atividades prioritá-


rias de P&D do sistema de pesquisa em agricultura irrigada, de-
vem ser implementadas as seguintes ações:
1. Desenvolver mecanismos de levantamento e acompa-
nhamento das aspirações e das necessidades da soci-
edade e do nível de satisfação com as suas tecnologias,
produtos e serviços oferecidos pelo sistema de pesqui-
sa e pelos concorrentes.
2. Reorganizar o programa de P & D no sentido de dire-
cionar, prioritariamente as ações de núcleos temáticos
para problemas e temas de valor estratégico, atendendo
a prioridades governamentais e de mercado e respei-
tando o meio ambiente.
3. Utilizar intensivamente as tecnologias de informação e
modernizar os métodos de pesquisa e desenvolvimento.
4. Direcionar as ações de P&D prioritariamente para temas
e áreas estratégicas para o agronegócio da agricultura
irrigada e para o desenvolvimento científico e tecnológi-
co, dentro de uma visão prospectiva, integrada e sistê-
mica, fortalecendo o conceito de cadeias produtivas e
de sistemas como o enfoque básico da pesquisa.
5. Monitorar continuamente o avanço do conhecimento ci-
entífico mundial, internalizando-o no Sistema de Pes-
quisa em agricultura irrigada.
6. Buscar a consolidação da integração organizacional,
fortalecendo parcerias entre todos os integrantes do sis-
tema, organizações dos setores público e privado, pro-
dutores rurais, melhorando a capacidade do sistema de
pesquisa para interagir com o mercado.
7. Internalizar as demandas oriundas da necessidade da
promoção do avanço do conhecimento e mobilizar as
capacidades interna e externa, integrando-as em ações
definidas e objetivas.
292
Transferência de Tecnologias

Para o direcionamento estratégico das atividades prioritárias


de transferência de tecnologias do sistema de pesquisa em agricul-
tura irrigada, deverão ser implementadas as seguintes ações:
1. Desenvolver, internalizar e utilizar mecanismos de apro-
priação e uso estratégico de direitos de propriedade in-
telectual.
2. Desenvolver uma política de administração do processo
de transferência de tecnologias que assegure: a dispo-
nibilidade de conhecimentos e tecnologias que tenham
interesse real para a sociedade; a negociação para a dis-
tribuição dos conhecimentos e das tecnologias geradas
por ela ou por seus parceiros e a promoção dos conhe-
cimentos e das tecnologias entre os diversos públicos.
3. Ampliar a rede de transferência de tecnologia, a partir
da utilização de instrumentos como: Rede Embrapa de
Informação Tecnológica (Reit); Rede de Irrigação, cujo
networker é o Banco do Nordeste do Brasil; consolida-
ção do papel de gerente de produto; coleta, sistemati-
zação e disponibilização de informações tecnológicas e
treinamento.
4. Ampliar a captação de recursos, mediante a venda ou
cessão de direitos de utilização dos resultados da pes-
quisa via projetos de P&D e transferência de tecnologias.
5. Estabelecer um núcleo integrado de informação para o
agronegócio da agricultura irrigada, reforçando o pro-
cesso de transferência de tecnologias.
6. Criar, manter e ampliar fluxos de comunicação, de modo
a estimular a interação entre o sistema de pesquisa e
seus públicos interno e externo, usando modernos sis-
temas, métodos e ferramentas de comunicação (Intra-
net, Internet etc.);
7. Capacitar o sistema de pesquisa em agricultura irriga-
da na produção de informação qualificada, voltada pa-

293
ra uma visão moderna desse agronegócio e para as
demandas, expectativas e necessidades dos distintos
públicos.
8. Reforçar o processo de controle social sobre as organi-
zações integrantes do sistema e pesquisa, estabele-
cendo mecanismo de acompanhamento dos projetos de
pesquisa, envolvendo, principalmente, os usuários dos
produtos e serviços dessas organizações.

Up grading na Gestão da Pesquisa

Para o suporte das atividades prioritárias de P&D e de


transferência de tecnologias das organizações integrantes do sis-
tema de pesquisa em agricultura irrigada devem ser implementa-
das medidas de aperfeiçoamento, na gestão da pesquisa em agri-
cultura irrigada, tais como:
1. Promoção de gestão fundamentada em princípios de
qualidade, focada no cliente, estruturada por processos
e embasada na avaliação de resultados, conjugada a
um sistema de recompensas.
2. Promoção da racionalização e fusão de estruturas e de
atividades, por meio da gestão por processos, terceiri-
zação, automação, informatização e mecanização.
3. Fortalecimento das atividades de planejamento em to-
dos os níveis.
4. Aprimoramento periódico do desenho organizacional e
do programa de pesquisa, concentrando as ações em
questões estratégicas para a sociedade brasileira.
5. Ampliar a parceria com fundações de fomento e apoio à
pesquisa e desenvolvimento.

294
Infra-estrutura física e recursos financeiros

1. Promover a terceirização de atividades que não sejam o


foco de atuação da unidade, dentro da disponibilidade
orçamentária e financeira.
2. Concentrar investimentos em equipamentos para me-
canização, automação, infra-estrutura de laboratório, in-
formática e informação.
3. Adotar um programa contínuo de racionalização de
custos.
4. Ampliar a capacidade de captação de recursos em fon-
tes alternativas.
5. Promover a participação do setor privado no financia-
mento do desenvolvimento tecnológico.

♦ Projetos Estratégicos

O sistema de pesquisa para a agricultura irrigada deve a-


perfeiçoar, fortalecer e viabilizar projetos estratégicos em anda-
mento e dedicar esforços para a introdução, de forma eficiente e
eficaz, de novos projetos para a implementação das diretrizes
estratégicas definidas, abrangendo todas as atividades diretamen-
te relacionadas à missão, visão e valores da organização de pes-
quisa e suas unidades descentralizadas.

Núcleos Temáticos

Os núcleos temáticos, encontradiços em sistemas avança-


dos de pesquisa de vários países, inclusive no Brasil, são focados
em áreas e temas de grande relevância, visando à solução de
problemas que envolvem várias áreas de conhecimento, oriundos
de demandas dos clientes e parceiros, no âmbito de atuação da
organização de pesquisa. São constituídos por equipes multidisci-
plinares da organização de pesquisa e por parceiros de outras
instituições públicas ou privadas, nacionais e internacionais.

295
Os núcleos temáticos deverão, crescentemente, constituir
formas eficientes e abrangentes de solução de problemas identifi-
cados entre os diferentes segmentos das diversas cadeias produ-
tivas, do agronegócio da agricultura irrigada, pela possibilidade de
viabilizar e promover a integração, o fortalecimento e a constitui-
ção de equipes interdisciplinares; de viabilizar o enfoque sistêmico
e a solução de problemas de forma integrada; e de reduzir custos,
pela utilização otimizada da infra-estrutura, dos recursos de inves-
timento e custeio e do capital humano.

Seminários Temáticos

O sistema de pesquisa em agricultura irrigada deverá in-


centivar, apoiar e promover a realização de foros prospectivos em
ciência e tecnologia, nos quais pessoas de diferentes organiza-
ções, grupos de interesse e disciplinas têm a oportunidade de se
manifestarem acerca de temas relevantes, indicando problemas e
dificuldades, formas e métodos de solução e de necessidades de
envolvimento e apoio, buscando o aprimoramento e o aumento da
competitividade das atividades objeto dos temas tratados. O prin-
cipal enfoque é a priorização de áreas de atuação nas quais cada
unidade, o sistema de pesquisa e o país alcancem e sustentem
vantagens competitivas dinâmicas. Desses foros sairão projetos
integrados de pesquisa e desenvolvimento em áreas relevantes,
onde serão incentivadas parcerias entre universidades, institui-
ções públicas e privadas, órgãos de governo, organismos e uni-
versidades internacionais, visando otimizar o apoio científico e
tecnológico.
Informação Tecnológica

O sistema de pesquisa e suas organizações devem intensi-


ficar e institucionalizar novos mecanismos de tratamento e difusão
de informação, ágeis e flexíveis. Para isso, deve-se dar ênfase à
rapidez com que a informação transita desde as equipes de pes-
quisadores, às bases de dados, aos agentes de assistência técni-
ca e ao usuário ou cliente, e também no sentido inverso, incenti-
vando e promovendo uma pronta atualização das informações
disponibilizadas e a retroalimentação dos pesquisadores, com

296
informações sobre a eficácia e oportunidade da solução/serviço
oferecido, bem como de novos problemas apresentados.
Devem ser utilizados meios como redes de computado-
res, televisão, programas de rádio, jornais e revistas, como forma
de atendimento massal de seu público. Na medida do possível,
deve ser promovida a segmentação da informação e dos meios
de comunicação utilizados, de forma a atingir estratos definidos
de clientes.

Oficina de Projetos

Para reforçar a atividade de captação, deve ser estruturada


uma área de apoio aos pesquisadores, ampliando-se a organiza-
ção existente, no sentido de apoiar as etapas relacionadas ao
ciclo de um projeto, compreendendo a identificação de fontes pro-
vedoras de recursos, a elaboração de proposta de financiamento,
segundo normas de cada fonte, apresentação, negociação, acom-
panhamento da execução e avaliação dos resultados do projeto.
Para tanto, a oficina de projetos identificará e divulgará pa-
ra os pesquisadores informações sobre agenda de prioridades das
agências financiadoras, disponibilidades para financiamento de
projetos, preparará informações detalhadas sobre procedimentos
requeridos pelas diferentes agências financiadoras, estabelecerá
contatos permanentes com fontes de financiamento, elaborará e
divulgará cadastros de agentes financiadores, estabelecerá parce-
rias com fundações de apoio à pesquisa e ao desenvolvimento,
com vistas a possibilitar maior rapidez e eficiência no gerencia-
mento dos projetos e dos contratos de prestação de serviços.

Administração por Processos

O modelo de gestão por processos deve substituir a visão


funcional tradicional pela visão integrada das atividades de inova-
ção tecnológica. Possibilitará, ainda, que o fluxo de trabalho ocor-
ra de uma forma mais horizontalizada, independente do local onde
são executadas as diversas atividades.

297
Os processos podem ser entendidos como unidade de ne-
gócios e para sua implantação demandam um novo padrão de
desenvolvimento profissional.
As ações para adoção de gestão por processo, para me-
lhorar a eficiência operacional, compreenderão:
a) capacitação dos dirigentes, supervisores, líderes for-
mais e informais e outros responsáveis pela gestão das
organizações integrantes do sistema de pesquisa, na
aplicação dos princípios e metodologia da gestão por
processo;
b) definição do modelo estrutural dos processos da uni-
dade de pesquisa, partindo da sua identificação, des-
crição e priorização, objetivando organizá-lo de modo
horizontal, desde os níveis estratégicos até os níveis
operacionais;
c) organização e divisão do trabalho de acordo com a vi-
são de processos.
Gestão Estratégica da Infra-Estrutura de Pesquisa

A gestão estratégica da infra-estrutura deve ajustar a dis-


ponibilidade de recursos às necessidades da unidade de pesqui-
sa, baseada na sua programação atual e potencial, buscando utili-
zar, manter, modernizar e desmobilizar, estrategicamente bens
patrimoniais em geral, visando a melhoria e eficácia das opera-
ções de cada organização integrante do sistema de pesquisa.
As ações a serem desenvolvidas consistem em:
a) promover a desmobilização de veículos, máquinas e
equipamentos obsoletos e a disponibilização, para par-
ceiros interessados, dos desnecessários;
b) demolição de imóveis cuja recuperação é inviável técni-
ca ou economicamente;
c) promover a terceirização de atividades que não sejam o
foco da unidade de pesquisa;

298
d) promover estudos de disponibilização e utilização de
áreas inaproveitáveis ou desnecessárias;
e) concentrar investimentos em equipamentos para meca-
nização das atividades de campo, automação de prepa-
ro de ensaios, laboratórios e equipamentos para infor-
mática e informação;
f) realizar estudo sobre ociosidade e necessidade de re-
distribuição de equipamentos em laboratórios.
As terceirizações deverão estar contidas dentro do orça-
mento de custeio dos próximos anos e poderão também gerar
recursos.

Incubadora de Empresas

A atividade de incubação de empresas de base tecnológica


visa promover novos negócios e estimular a difusão de inovações
que possam gerar benefícios para a sociedade, do ponto de vista
tecnológico, econômico e social. A criação e o desenvolvimento
de pequenas e microempresas de base tecnológica esbarra na
indisponibilidade de tecnologias que lhes garantam um desempe-
nho efetivo, por não disporem de conhecimentos próprios nem
recursos suficientes para sua aquisição, além do risco empresarial
a que estão sujeitas. A incubadora de empresas de base tecnoló-
gica abre perspectivas para que as pequenas e microempresas
nacionais possam-se lançar no mercado, com mais segurança,
num ambiente de alta competitividade tecnológica e comercial.
Esta ação pretende dar suporte à gestão de incubadoras
que atuarão na área biológica. A estruturação do trabalho será
feita em dois módulos: idealização e desenvolvimento. O módulo
de Idealização compreende a identificação de tecnologias e sua
transferência como forma de concretizar uma oportunidade real de
negócio e a identificação e treinamento de empreendedores. O
módulo de desenvolvimento compreenderá a elaboração de um
plano de negócios, implantação de uma base de produção, posi-
cionamento da empresa incubada no mercado e, por fim, a matu-

299
ração da empresa, quando ela estará em condições de se integrar
na comunidade técnica e comercial, desligando-se da incubadora.
A iniciativa leva em consideração um problema importan-
te, no quadro do desenvolvimento empresarial de pequenas e
médias empresas: no Brasil e, em certo sentido, no mundo como
um todo, qual seja, a elevada taxa de mortalidade precoce de pe-
quenas e médias empresas, quando uma nova empresa entra
direto num mercado competitivo. A taxa de mortalidade nos USA
chega a 2:3 e no Brasil a 4:5.
Para mitigar este problema a criação de incubadoras de
empresas tem sido uma alternativa utilizada, como forma de dar
ao empresário tempo para que se torne competitivo.
Geralmente a incubadora é ligada a um centro gerador de
tecnologia (empresa de P&D ou centro-mãe), mas não necessari-
amente. A incubadora é criada por instituições interessadas na
geração de empregos e empresas. Consiste num local físico onde
são fornecidos todos os ingredientes para as novas empresas
reduzirem drasticamente os custos fixos, pois eles são comparti-
lhados e às vezes subsidiados.
A permanência, em média, de uma empresa numa incuba-
dora tecnológica, por exemplo, pode variar de 3 a 5 anos, mas
depende da atividade que esta desenvolva.
Existem no Brasil mais de 700 empresas incubadas e a-
proximadamente 70 incubadoras.
A taxa de mortalidade das empresas incubadas america-
nas é próxima de zero. No Brasil, dados da Associação Nacional
de Entidades Promotoras dos Empreendimentos de Tecnologia
Avançada (ANPROTEC) revelam que a taxa de mortalidade é de
20%. As incubadoras podem ser ou não de cunho tecnológico.
Entretanto, o atendimento às necessidades financeiras das
pequenas empresas de base tecnológica ainda é precário. O tra-
tamento especial ofertado às empresas incubadas atende a um
número muito reduzido de empresas, não só pela carência de
linhas de financiamento, mas também pela capacidade de absor-
ção de novas unidades produtivas pelas incubadoras. Além disso,
300
não há incentivo para o processo de desincubação, o que pode
aumentar a taxa de mortalidade desses empreendimentos.
Há relativa falta de qualificação das empresas para a for-
mulação adequada de suas necessidades de financiamento – falta
esta que deveria ser equacionada no processo de incubação ou
em treinamento e capacitação de forma independente. Verifica-se,
na literatura, que há uma certa deficiência no conhecimento pelas
empresas pequenas e médias quanto às opções de financiamento
– tanto quanto entre os produtores.
Outras vezes as empresas apresentam projetos em que
solicitam a aquisição de equipamentos, além de recursos para
capital de giro, deixando de lado aspectos essenciais para a me-
lhora de sua competitividade como capacitação tecnológica e ge-
rencial – isto é, a solicitação de crédito sem um plano de gestão
compatível. Nesse sentido, as instituições públicas (em associa-
ção com as entidades representativas de empresas) têm um im-
portante papel de capacitação do empresariado para o crescimen-
to do setor.

Avaliação dos resultados e impacto socioeconômico dos


produtos e serviços

Os núcleos temáticos e seus projetos deverão sofrer avali-


ações e revisões periódicas, quando se procurará determinar a
evolução dos projetos, a sua produção científica, os produtos tec-
nológicos obtidos e a transferência de tecnologia efetuada para o
mercado.
De forma mais abrangente, a avaliação de impacto deve
considerar em que medida os produtos tecnológicos do sistema
de pesquisa contribuíram para aumentar a competitividade dinâ-
mica do agronegócio, melhorar a sustentabilidade dos recursos
naturais, reduzir os desequilíbrios regional e de renda e contribuir
para a melhoria dos níveis nutricionais e saúde da população.
Adicionalmente, devem-se realizar não só estudos de im-
pacto ex post, mas também ex ante como forma de se avaliarem
as prioridades de investimento em pesquisa. As avaliações das
tecnologias geradas devem considerar também a distribuição de

301
ganhos por grupos de interesse, de forma a considerar os seus
aspectos distributivos dentro da sociedade.

8.6. - Risco da Variação do Valor da Produção na


Agricultura Irrigada

A hipótese é que, na agricultura irrigada, a principal com-


ponente do risco origina-se na variação dos preços dos produtos.
É claro que os preços dos insumos, clima e doenças trazem com-
plicações para a produção irrigada. Contudo, o efeito é, relativa-
mente à variação dos preços dos produtos, pequeno, em função
do controle que a agricultura irrigada proporciona, inclusive na
compra de insumos.
Os preços variam dentro do ano e entre eles. Temos as
componentes sazonais e a tendência. Como o desenvolvimento
tecnológico tem feito a oferta crescer mais que a demanda, a ten-
dência geral é de decréscimo de preços. É difícil modelar essa
tendência, porque equivale a modelar o progresso tecnológico.
A importância dos fatos citados, vividos intensamente pe-
los produtores, levou o Consórcio Plena-FGV-Projetec, a desen-
volver estudo de casos, avaliando o risco causado pela variação
de preços do produto na rentabilidade de investimento com agri-
cultura irrigada, apresentado nesta seção. Naturalmente que este
estudo de casos serve como orientador para aplicação em situa-
ções específicas.
Do ponto de vista prático, identifica-se, pela aplicação de
métodos econométricos, que a série é estacionária; se o for, a
média é usada como preditor e o risco é o desvio padrão dividido
pela média. Quando a série é não-estacionária, o cálculo do risco
é mais complicado. Em função do uso que se fará, optou-se por
prever o preço um passo à frente, ou seja, um mês depois do tér-
mino da série quando os dados são mensais. Obteve-se o desvio
padrão deste preditor e, em seguida, o risco, dividindo-se o des-
vio-padrão do valor predito pelo seu valor predito.

302
Os dados cobrem vários produtos da agricultura irrigada,
fornecidos pelas Ceasas, Minas Gerais e São Paulo, período ja-
neiro de 1995 a maio de 1999. Os dados são médias mensais.
Junho de 1999 é o mês que corresponde a um passo à frente.
A justificativa do cálculo do risco, como o proposto, baseia-
se na hipótese de que os agricultores prefiram preços mais eleva-
dos, com a menor variância possível. Sendo assim, o coeficiente
de variação é uma medida adequada de risco: quanto menor, me-
lhor é do ponto de vista dos produtores. Na série não-estacionária,
se reconhece que o procedimento de cálculo do risco equivalente
a admitir que os produtores não acreditem que a tendência esti-
mada venha, de fato, a prevalecer e que estão dispostos a aceitar,
apenas, o preço predito para o mês seguinte ao término da série,
nas suas decisões futuras. Outra limitação: dois observadores
podem fazer predições diferentes se um deles tiver a mais um
mês de informação.
A Plena Consultoria de Engenharia Agrícola Ltda., vem as-
sessorando vários empresários com agricultura irrigada no norte
de Minas. E dentre suas atividades de assessoria, avalia-se a taxa
interna de retorno financeiro do empreendimento. Utilizando-se os
dados de 20 empreendimentos que desenvolveram com agricultu-
ra irrigada, iniciados em 1997. Esses empreendimentos têm como
base de produção as culturas de banana, manga, limão, cebola,
limão-taiti, mamão, melancia, coco.
O estudo de casos desta seção, avalia o risco de variação
de preço para uma série de produtos, com base nos dados da
Ceasa-MG e Ceagesp, e avalia o risco da variação da taxa interna
dos 20 empreendimentos assessorados pela Plena no norte de
Minas. Para cada investimento, tem-se um fluxo de caixa que a-
presenta a produção anual para cada um dos doze anos e um
preço que se supõe prevalecer o mesmo durante doze anos. Na
série estacionária, a melhor estimativa é a média. Na série não-
estacionária, admite-se que a estimativa tenha sido dada pelo
procedimento de um passo à frente. Aceitou-se o preço estimado
pela Plena e usou o desvio-padrão obtido no modelo. Além da
produção, apresentam-se dados completos de custos.

303
Como se admitiu que variavam tão-somente os preços dos
produtos, as taxas internas de retorno são recalculadas para o
limite inferior e superior da média dos preços, levando-se em con-
ta a estacionalidade ou não-estacionalidade. O intervalo de confi-
ança corresponde à média ± 1,96*(desvio-padrão da média). A
variação dos preços no intervalo descrito permite, portanto, calcu-
lar o intervalo de variação das taxas de retorno.

8.6.1 - Estimativa do risco da variação do preço do


produto

Apresentar-se-á uma explicação resumida do modelo. A


estacionalidade das séries foi avaliada via Abordagem Clássica de
Box & Jenkins (1976), com o estudo das funções de autocorrela-
ção, correlação parcial e autocorrelação inversa. Quando neces-
sário, a estacionalidade foi induzida com operadores de defasa-
gem. Em geral, de ordem um para se eliminar a tendência esto-
cástica e de ordem 12 para se eliminar a sazonalidade estocásti-
ca. Depois deste processo preliminar de suavização, escolheu-se
um modelo na classe arma (P,Q) (Autoregressive-Moving Avera-
ge) que se ajustasse, razoavelmente, aos dados. A única exceção
foi a série da manga, São Paulo, para qual se ajustou um modelo
tendência determinística. Como estimativa de longo prazo, nos
casos de estacionalidade, o risco é o desvio-padrão da média di-
vidido pela média. Na presença de não-estacionalidade, o risco é
o desvio-padrão do preditor de um passo dividido pelo valor do
preditor. Neste caso, o risco obtido é uma próxis. Um observador
com um mês a mais de observação, que não estava disponível
quando o modelo foi estimado, poderia obter um risco distinto.
As duas tabelas seguintes apresentam as estimativas da
média e do desvio-padrão da média para um conjunto de produ-
tos, reportados pelas Ceasas de Minas Gerais e de São Paulo. As
estimativas foram obtidas de um modelo econométrico de série
temporal. Indica-se, também, se a série é ou não-estacionária. No
item 8.6.4 deste capítulo encontra-se o procedimento para cálculo
das culturas de manga (SP) e banana-prata (MG), modelo que
permitiu a confecção das TABELAS 4 e 5.

304
TABELA 4
CONDIÇÃO DA SÉRIE, MÉDIA DOS PREÇOS MENSAIS,
DESVIO-PADRÃO DA MÉDIA E RISCO PARA UM CONJUNTO DE
PRODUTOS, PERÍODO JANEIRO DE 1995-1999, CEASA-MG.
Média Desvio padrão
Produtos Condição Risco(%)
(R$/kg) da média
Abóbora Estacionária 0,29635 0,019593 6,61
Batata-doce Estacionária 0,43993 0,030477 6,93
Beterraba Estacionária 0,4858 0,053604 11,03
Cebola Estacionária 0,59051 0,06689 11,32
Cenoura Estacionária 0,41022 0,03027 7,38
Melancia Não-estacionária 0,32866 0,011173 3,39
Melão Não-estacionária 0,10366 0,093018 89,73
Pimentão Estacionária 0,73703 0,04681 6,35
Pimenta (SP) Não-estacionária 0,072528 0,054246 74,79
Quiabo Estacionária 0,6814 0,047556 6,98
Tomate Estacionária 0,043376 0,032953 75,97
Abacaxi Não-estacionária 0,7218 0,081329 11,26
Banana-prata Não-estacionária 0,70689 0,097491 13,79
Banana-nanica Não-estacionária 0,4139 0,028975 7,00
Coco verde Não-estacionária 0,82926 0,05985 7,22
Limão-taiti Não-estacionária 0,62271 0,084018 13,49
Mamão Não-estacionária 0,851593 0,10660 12,52
Manga Não-estacionária 0,22965 0,04151 18,08
Maracujá Estacionária 1,2427 0,091669 7,38
Uva Estacionária 2,5397 0,10952 4,31
Inhame Não-estacionária 0,49793 0,024788 4,98
FONTE: Ceasa-MG. Dados trabalhados pelo Consórcio Plena-FGV-Projetec.

Na série tipo estacionária, apenas tomate tem risco muito


elevado (75,97%). Na série não-estacionária, destacam-se pimen-
ta (74,79%) e melão (89,73%), seguindo-se a manga com 18,08%.
Com risco acima de 10%, há 10 produtos entre os 21 estudados,
cerca de 47,6%. Os exportáveis (uva, coco e banana-nanica) têm
risco menor. O melão foge do padrão.
Do ponto de vista de estacionalidade, dez produtos mostra-
ram séries estacionárias e onze séries não-estacionárias. À exce-
ção de coco verde, as séries não-estacionárias apresentaram ten-
dência declinante para os preços.

305
São Paulo diverge de Minas Gerais em dois aspectos. Em
primeiro lugar, o maior risco se igualou a 19,15%. Em segundo
lugar, apenas seis produtos apresentaram séries estacionárias
contra 15 de séries não-estacionárias. Cinco produtos superaram
a marca de 10% de risco, o que equivale a 23,8% dos vinte e um
produtos. Como em Minas Gerais, a tendência dos preços das
séries não-estacionárias é não-declinante.
Como o mercado de São Paulo é muito maior que o minei-
ro, inclusive bem conectado com o mercado externo e de outras
regiões, é natural que o risco seja menor que em Minas Gerais.
As informações de São Paulo estão na TABELA 5, a seguir.
TABELA 5
CONDIÇÃO DA SÉRIE, MÉDIA DOS PREÇOS MENSAIS,
DESVIO-PADRÃO DA MÉDIA E RISCO PARA UM CONJUNTO DE
PRODUTOS, PERÍODO JANEIRO DE 1995-1999, CEAGESP
Média Desvio da
Produtos Condição Risco(%)
(R$/kg) média
Abóbora Não-estacionária 0,46031 0,015131 3,28
Batata-doce Não-estacionária 0,49482 0,032583 6,58
Beterraba Estacionária 0,40828 0,031527 7,72
Cebola Estacionária 0,594908 0,062633 10,52
Cenoura Estacionária 0,47415 0,036643 7,72
Melancia Não-estacionária 0,43855 0,030728 7,00
Melão Não-estacionária 0,92966 0,10416 11,20
Pimentão Estacionária 0,73703 0,04681 6,35
Quiabo Estacionária 0,64683 0,031553 4,87
Tomate Não-estacionária 0,84399 0,078698 9,32
Abacaxi Não-estacionária 1,2929 0,12078 9,34
Banana-prata Não-estacionária 0,97469 0,078162 8,02
Banana-nanica Não-estacionária 0,5199 0,046395 8,92
Coco verde Não-estacionária 0,9443 0,057135 6,05
Limão-taiti Não-estacionária 0,52659 0,076112 14,45
Mamão Estacionária 0,64067 0,093158 14,54
Manga Não-estacionária 1,7671 0,3385 19,15
Maracujá Não-estacionária 0,87005 0,06948 7,98
Uva Não-estacionária 1,2031 0,1047 8,70
Inhame Não-estacionária 0,46808 0,020863 4,45
FONTE: Ceasa-MG. Dados trabalhados pelo Consórcio Plena-FGV-Projetec.
NOTA: No item 7.6.4 desta seção têm-se os cálculos realizados para cada
produto.

306
8.6.2 - Variação das taxas internas de retorno

No item 7.6.4 desta seção, tem-se o modelo de fluxo para


o cálculo da taxa interna de retorno de 20 empreendimentos, cal-
culados pela Plena, para investidores com agricultura irrigada no
norte de Minas. Como é usual, o estudo fixa os preços dos produ-
tos no período estabelecido, no caso 12 anos. A modificação feita
diz respeito, apenas, a calcular o intervalo de confiança de cada
preço e multiplicar a produção respectiva pelos limites inferior e
superior. Assim, obtém-se o limite inferior e superior da produção.
Depois, segue-se a metodologia de cálculo da Plena e obtêm-se
os limites inferiores e superiores das taxas internas de retorno A
estrutura de custo permaneceu invariante.
Outra opção é calcular a variância da produção que é a
soma dos quadrados das quantidades produzidas multiplicadas
pelas respectivas variâncias dos preços. A raiz quadrada da vari-
ância obtida é multiplicada por 1,96. Da produção obtida, soma-se
e subtrai-se o valor encontrado. Esta opção não foi seguida. As-
sim, o intervalo de variação da taxa de retorno foi calculado com
base na hipótese que se conhece, no primeiro ano, o preço médio,
o limite inferior do preço de cada produto e o limite superior e que
as demais variáveis que entram no cálculo da taxa de retorno são
conhecidas. O preço médio e os limites superior e inferior perma-
necem constantes nos demais onze anos. Se a série for estacio-
nária, este procedimento é correto. Quando a série não é estacio-
nária, substituiu-se o preço médio pelo predito pelo procedimento
de um passo à frente, conforme discutido.
É importante salientar que estamos admitindo uma rigidez
absoluta dos custos e da produção em relação aos limites inferior
e superior dos preços, o que, na prática, não ocorre. Sempre é
possível cortar custos, quando os preços dos produtos caem, co-
mo, também, ajustar a produção. E o inverso pode ocorrer quando
eles aumentam. O efeito destes ajustes nas taxas internas de re-
torno é muito complicado de prever. Por isto, preferiu-se calcular o
intervalo de variação das mesmas, sem se considerarem os ajus-
tes que os produtores fariam, os quais podem reduzir ou aumentar
a variação das taxas. Tomou-se como base a estimativa de preço
307
e de produção adotada pela PLENA e o intervalo de variação do
valor da produção foi calculado, multiplicando-se os limites inferio-
res e superiores dos preços pelas respectivas produções. Os da-
dos obtidos estão citados na TABELA 6.

TABELA 6
TAXA INTERNA DE RETORNO DE PROJETOS DO NORTE DE MINAS,
LIMITE SUPERIOR, MÉDIA E LIMITE INFERIOR. RELAÇÕES DO LIMI-
TES SUPERIOR E INFERIOR COM A MÉDIA
Taxa interna de retorno(%)
Projetos Limite Limite Limite Limite
Média
superior inferior sup/média inf/média
1 66,46 47,21 27,37 1,41 0,58
2 66,72 46,31 26,56 1,44 0,57
3 91,23 55,35 9,59 1,65 0,17
4 121,33 61,26 23,37 1,97 0,40
5 60,05 44,02 28,50 1,36 0,65
6 82,14 48,33 9,18 1,70 0,20
7 85,72 57,39 30,74 1,49 0,54
8 60,04 36,94 7,02 1,63 0,19
9 47,78 32,04 14,00 1,49 0,44
10 61,31 36,08 4,59 1,70 0,13
11 111,12 47,51 0 2,34 0,00
12 64,54 40,64 13,92 1,59 0,34
13 107,38 52,58 5,66 2,04 0,11
14 74,36 47,32 22,34 1,57 0,47
15 50,03 32,92 15,45 1,51 0,50
16 64,93 45,34 26,23 1,52 0,58
17 61,16 38,40 10,36 1,59 0,27
18 68,20 48,03 26,08 1,42 0,54
19 83,35 51,72 3,08 1,61 0,06
20 77,81 56,35 33,74 1,38 0,60
Média 75,28 42,68 16,9 1,62 0,40
FONTE: Plena.

Todos os 20 projetos apresentaram taxa interna média de retor-


no muito bem acima do retorno médio do capital, em torno de 11%. So-
mente 4 deles têm os limites inferiores das taxas anuais de retorno meno-
res do que 7%. Existe grande diferença entre o limite inferior e o superior.
Na média dos projetos, se a taxa de retorno fosse 1%, o limite inferior seria
de 0,42 e o superior, a 1,62%.

308
8.6.3 - Observações sobre o estudo

As principais observações que se podem tirar desse estudo de


casos são:

- As variações de preços durante o ano e a tendência de-


clinante de preços indicam a necessidade de se traba-
lhar com uma composição de produtos que permita mi-
tigar o risco do valor da produção da propriedade. Além
do mais, o mercado extremamente competitivo indica a
necessidade de os produtores se capacitarem, cada vez
mais, no cálculo da formação do preço do seu produto.
- Para garantir uma taxa de retorno mais elevada e com-
pensar outros tipos de riscos, os produtores devem ter
um gerenciamento eficaz na venda de seu produto, pro-
curando ofertá-lo em períodos mais favoráveis e em
quantidade capaz de disputar os melhores mercados.

8.6.4 - Anexo do capítulo

309
♦ Modelo da Memória de Cálculo das Taxas de Retorno de Empreendimentos com
Agricultura Irrigada – Para o Empreendimento n.º 1
TABELA 7
FLUXO GLOBAL DO EMPREENDIMENTO - EMPREENDIMENTO - 1
R$/ANO
ESPECIFICAÇÕES
ANO 1 ANO 2 ANO 3 ANO 4 ANO 5 ANO 6 ANO 7 ANO 8 ANO 9 ANO 10 ANO 11 ANO 12
1- CUSTOS
1.1- Investimentos (A) 102.967,60 16.700,00
1.2- Investimentos (B) 49.465,60 16.560,40 9.899,50 3.466,00
1.3- Custeio 2.640,00 45.447,00 65.138,00 77.159,00 85.434,50 90.155,50 90.400,50 90.400,50 90.400,50 90.400,50 90.400,50 90.400,50
1.4- Pagamento do Empr.
Investimento (A) 8.361,25 8.631,15 11.238,92 12.080,23 14.874,87 16.266,50 17.444,29 15.293,63
1.5- Pagamento do Empr.
Investimento (B) 4.094,39 4.226,56 5.503,54 5.915,52 7.284,02 7.965,48 8.542,22 7.489,08
1.6- Pag. do Empr. Investi-
mento (B) - Capitalização 640,74 640,74 640,74 640,74 640,74
1.7- Pagamento do Empr.
Custeio 2.640,00 10.466,10
1.8- Custo Financeiro do
Empr. Investimento (A) 6.672,30 12.502,90 11.499,55 10.463,81 9.115,14 7.665,51 5.880,53 3.928,55 1.835,24
1.9 - Custo Financeiro do
Empr. Investimento (B) 1.424,61 3.061,25 5.631,17 5.123,98 4.463,56 3.753,70 2.879,61 1.923,76 898,69
1.10 - Custo Fin. do Empr.
Invest. (B) - Capitaliza-
ção 142,46 192,22 384,45 307,56 230,67 153,78 76,89
1.11 - Custo Financeiro do
Empr. Custeio 174,24 690,76

TOTAL DOS CUSTOS (1) 163.170,11 109.683,88 116.375,02 113.980,44 117.957,26 124.605,00 124.187,15 122.956,95 115.917,13 90.400,50 90.400,50 90.400,50
(continua)

310
TABELA 7
FLUXO GLOBAL DO EMPREENDIMENTO - EMPREENDIMENTO – 1
(conclusão)
R$/ANO
ESPECIFICAÇÕES
ANO 1 ANO 2 ANO 3 ANO 4 ANO 5 ANO 6 ANO 7 ANO 8 ANO 9 ANO 10 ANO 11 ANO 12
2 - RECEITAS
2.1 - Valor da Produção
Agrícola 132.300,00 160.390,00 161.160,00 162.790,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00
2.2 - Empréstimo de Crédito
- Investimento (A) 92.670,84 11.520,00
2.3 - Empréstimo de Crédito
- Investimento (B) 39.572,48 11.448,32
2.4 - Empréstimo de Crédito
- Custeio 2.640,00 10.466,10
TOTAL DAS RECEITAS (2) 134.883,32 165.734,42 160.390,00 161.160,00 162.790,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00 179.540,00

3 - BALANÇO -
FINANCEIRO (2-1) 28.286,79 56.050,54 44.014,98 47.179,56 44.832,74 54.935,00 55.352,85 56.583,05 63.622,87 89.139,50 89.139,50 89.139,50
4 - RECURSOS
PRÓPRIOS 28.286,79
5 - CAPACIDADE DE
PAGAMENTO ANUAL 56.050,54 44.014,98 47.179,56 44.832,74 54.935,00 55.352,85 56.583,05 63.622,87 89.139,50 89.139,50 89.139,50
6 - CAPACIDADE DE
PAGAMENTO
ACUMULADA 56.050,54 100.065,52 100.065,52 144.898,27 199.833,26 255.186,11 311.769,16 375.392,04 464.531,54 553.671,04 642.810,54
7 - RENDA MÉDIA
MENSAL 4.670,88 3.667,92 3.931,63 3.736,06 4.577,92 4.612,74 4.715,25 5.301,91 7.428,29 7.428,29 7.428,29

(A) - Investimentos Fundo Jaíba.


(B) - Investimentos Nordeste Competitivo.
Balanço TIR -155.073,20 53.592,60 85.352,50 80.535,00 77.355,50 89.384,50 89.139,50 89.139,50 89.139,50 89.139,50 89.139,50 89.139,50

TIR = 47,21%
Tir inferior 27,37 0,58
Tir média 47,21 1
Tir superior 66,46 1,4078
FONTE: Plena.
311
♦ Cálculo Modelar da Variação de Preço de Manga (SP) e
Banana-Prata (MG)

Análise da Manga - SP 69

Model: MODEL1
Dependent Variable: PREÇO

Analysis of Variance

Sum of Mean
Source DF Squares Square F Value Prob>F

Model 1 42.63817 42.63817 51.814 0.0001


Error 51 41.96796 0.82290
C Total 52 84.60613

Root MSE 0.90714 R-square 0.5040


Dep Mean 1.76712 Adj R-sq 0.4942
C.V. 51.33418

Parameter Estimates

Parameter Standard T for H0:


Variable DF Estimate Error Parameter=0 Prob > |T|

INTERCEP 1 4.053871 0.34124518 11.880 0.0001


T 1 -0.058635 0.00814569 -7.198 0.0001

Análise da Manga - SP 70

OBS PREÇO P STDI L95 U95

1 1.12376 3.29162 0.93983 1.40483 5.17841


2 5.25697 3.23299 0.93803 1.34982 5.11616
3 4.17334 3.17435 0.93629 1.29466 5.05404
4 3.58482 3.11572 0.93463 1.23938 4.99206
5 3.91435 3.05708 0.93303 1.18395 4.93022
6 3.40085 2.99845 0.93150 1.12839 4.86851
7 2.34951 2.93982 0.93004 1.07269 4.80694

312
8 4.46460 2.88118 0.92864 1.01685 4.74551
9 2.65585 2.82255 0.92732 0.96087 4.68422
10 1.57092 2.76391 0.92607 0.90475 4.62307
11 0.73996 2.70528 0.92489 0.84849 4.56206
12 1.24306 2.64664 0.92377 0.79209 4.50119
13 2.62932 2.58801 0.92273 0.73555 4.44047
14 2.07344 2.52937 0.92176 0.67886 4.37988
15 3.84760 2.47074 0.92086 0.62204 4.31944
16 1.79894 2.41210 0.92003 0.56507 4.25914
17 2.56054 2.35347 0.91927 0.50795 4.19899
18 2.96169 2.29484 0.91859 0.45069 4.13898
19 3.79212 2.23620 0.91797 39329 4.07911
20 4.22628 2.17757 0.91743 33575 4.01939
21 1.93423 2.11893 0.91696 27806 3.95981
22 1.29498 2.06030 0.91656 22022 3.90037
23 0.85697 2.00166 0.91624 16224 3.84108
24 0.82146 1.94303 0.91598 10412 3.78194
25 0.58382 1.88439 0.91580 04584 3.72294
26 3.32740 1.82576 0.91569 -01257 3.66409
27 2.26722 1.76712 0.91566 -0.07113 3.60538
28 1.54272 1.70849 0.91569 -0.12984 3.54682
29 1.21383 1.64986 0.91580 -0.18869 3.48840
30 0.94233 1.59122 0.91598 -0.24769 3.43013
31 1.47438 1.53259 0.91624 -0.30683 3.37201
32 1.03848 1.47395 0.91656 -0.36612 3.31403
33 1.25967 1.41532 0.91696 -0.42556 3.25619
34 0.78729 1.35668 0.91743 -0.48514 3.19850
35 0.61473 1.29805 0.91797 -0.54486 3.14096
36 0.57810 1.23941 0.91859 -0.60473 3.08355
37 0.93502 1.18078 0.91927 -0.66474 3.02630
38 1.69447 1.12214 0.92003 -0.72489 2.96918
39 1.55872 1.06351 0.92086 -0.78519 2.91221
40 1.22821 1.00488 0.92176 -0.84563 2.85539
41 1.71721 0.94624 0.92273 -0.90622 2.79870
42 1.17999 0.88761 0.92377 -0.96695 2.74216
43 0.64959 0.82897 0.92489 -1.02781 2.68576
44 0.61621 0.77034 0.92607 -1.08882 2.62950
45 0.62701 0.71170 0.92732 -1.14997 2.57338
46 0.48236 0.65307 0.92864 -1.21126 2.51740
47 0.42713 0.59443 0.93004 -1.27269 2.46156
48 0.51925 0.53580 0.93150 -1.33426 2.40586
49 0.59817 0.47717 0.93303 -1.39597 2.35030
50 0.71158 0.41853 0.93463 -1.45781 2.29487

313
51 0.71166 0.35990 0.93629 -1.51979 2.23958
52 0.54549 0.30126 0.93803 -1.58191 2.18443
53 0.55000 0.24263 0.93983 -1.64416 2.12942
54 0.18399 0.94170 -1.70655 2.07453

Análise da Manga - SP 71

OBS PREÇO P STDI L95 U95

55 . 0.12536 0.94364 -1.76907 2.01978


56 . 0.06672 0.94564 -1.83172 1.96517
57 . 0.00809 0.94770 -1.89451 1.91069
58 . -0.05055 0.94984 -1.95742 1.85633
59 . -0.10918 0.95204 -2.02047 1.80211
60 . -0.16781 0.95430 -2.08365 1.74802

Análise do Maracujá - SP 72

ARIMA Procedure

Name of variable = PREÇO.

Period(s) of Differencing = 1,12.


Mean of working series = 0.009215
Standard deviation = 0.374848
Number of observations = 40
NOTE: The first 13 observations were eliminated by differencing.

314
Autocorrelations

Lag Covariance Correlation -1 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1

0 0.140511 1.00000 | |********************|


1 -0.081607 -0.58079 | ************| . |
2 0.024316 0.17306 | . |*** . |
3 0.0088724 0.06314 | . |* . |
4 -0.038038 -0.27071 | . *****| . |
5 0.023662 0.16840 | . |*** . |
6 0.011540 0.08213 | . |** . |
7 -0.039631 -0.28205 | . ******| . |
8 0.059908 0.42636 | . |********* |
9 -0.044221 -0.31472 | . ******| . |
10 0.014951 0.10640 | . |** . |

"." marks two standard errors

Inverse Autocorrelations

Lag Correlation -1 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1
1 0.55438 | . |*********** |
2 0.25038 | . |*****. |
3 0.22600 | . |*****. |
4 0.16301 | . |*** . |
5 -0.02274 | . | . |
6 -0.08060 | . **| . |
7 -0.07660 | . **| . |
8 -0.16880 | . ***| . |
9 -0.06599 | . *| . |
10 -0.01625 | . | . |

315
Análise da Manga - SP

Análise da Banana P - MG 49

ARIMA Procedure

Name of variable = PREÇO.

Period(s) of Differencing = 1.
Mean of working series = -0.01602
Standard deviation = 0.111507
Number of observations = 52
NOTE: The first observation was eliminated by differencing.

316
Autocorrelations

Lag Covariance Correlation -1 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1


0 0.012434 1.00000 | |********************|
1 0.0054752 0.44035 | . |********* |
2 0.00031847 0.02561 | . |* . |
3 -0.0027813 -0.22368 | . ****| . |
4 -0.0025307 -0.20353 | . ****| . |
5 -0.0020480 -0.16471 | . ***| . |
6 -0.0007959 -0.06401 | . *| . |
7 -0.0003658 -0.02942 | . *| . |
8 -0.0030622 -0.24628 | . *****| . |
9 -0.0023216 -0.18672 | . ****| . |
10 -0.0006546 -0.05265 | . *| . |
11 0.0028496 0.22918 | . |***** . |
12 0.0027612 0.22207 | . |**** . |
13 0.0026722 0.21491 | . |**** . |

"." marks two standard errors

Inverse Autocorrelations

Lag Correlation -1 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1
1 -0.44278 | *********| . |
2 0.11823 | . |** . |
3 0.09427 | . |** . |
4 -0.03810 | . *| . |
5 0.11408 | . |** . |
6 0.04324 | . |* . |
7 -0.16429 | . ***| . |
8 0.22722 | . |*****. |
9 -0.09434 | . **| . |
10 0.13456 | . |*** . |
11 -0.17031 | . ***| . |
12 0.08314 | . |** . |
13 -0.05001 | . *| . |

317
Análise da Banana P - MG 50

ARIMA Procedure

Partial Autocorrelations

Lag Correlation -1 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1
1 0.44035 | . |********* |
2 -0.20877 | . ****| . |
3 -0.18858 | . ****| . |
4 -0.01003 | . | . |
5 -0.10780 | . **| . |
6 -0.00948 | . | . |
7 -0.05902 | . *| . |
8 -0.36303 | *******| . |
9 0.04637 | . |* . |
10 -0.02474 | . | . |
11 0.16480 | . |*** . |
12 -0.05046 | . *| . |
13 0.07599 | . |** . |

Autocorrelation Check for White Noise

To Chi Autocorrelations
Lag Square DF Prob
6 17.87 6 0.007 0.440 0.026 -0.224 -0.204 -0.165 -0.064
12 31.32 12 0.002 -0.029 -0.246 -0.187 -0.053 0.229 0.222

Análise da Banana P - MG 51

ARIMA Procedure

Maximum Likelihood Estimation

Approx.
Parameter Estimate Std Error T Ratio Lag
MU -0.01521 0.02463 -0.62 0
AR1,1 0.43500 0.12653 3.44 1

Constant Estimate = -0.008596

318
Variance Estimate = 0.01040747
Std Error Estimate = 0.102017
AIC = -87.652149
SBC = -83.749661
Number of Residuals= 52

Correlations of the Estimates

Parameter MU AR1,1

MU 1.000 -0.003
AR1,1 -0.003 1.000

Autocorrelation Check of Residuals

To Chi Autocorrelations
Lag Square DF Prob
6 5.11 5 0.403 0.098 -0.081 -0.235 -0.091 -0.096 0.012
12 16.14 11 0.136 0.126 -0.244 -0.115 -0.103 0.245 0.088
18 20.36 17 0.256 0.165 0.013 -0.109 0.016 -0.125 -0.029
24 23.78 23 0.416 0.063 0.030 -0.101 -0.031 0.124 0.070

Model for variable PREÇO

Estimated Mean = -0.0152142


Period(s) of Differencing = 1.

Autoregressive Factors
Factor 1: 1 - 0.435 B**(1)

Análise da Banana P - MG 52

ARIMA Procedure

Forecasts for variable PREÇO

Obs Forecast Std Error Lower 95% Upper 95%


54 0.5304 0.1020 0.3305 0.7304

319
Análise da Banana P

320
321

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