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A Degradação do Lobolo

O lobolo é sem sombra de dúvidas um símbolo cultural do povo Moçambicano. Praticado


por várias gerações da nossa pátria amada. Mas o que é o lobolo nos dias de hoje? Será
que o que tem acontecido atualmente, honra o passado? O que esperar da prática do
Lobolo no futuro?

O Sentido do Lobolo
Antigamente o lobolo não era mais do que uma cerimónia que representava uma união
conjugal, extremamente tradicional. Isso para dizer que era de carácter obrigatório para
quem quisesse construir uma família.
A família do noivo era obrigada a levar para casa da noiva um certo dote, em forma de
“agradecimento” por ela ter sido bem tratada e educada. E nesse momento ambas
conheciam-se e selavam oficialmente a união conjugal, após satisfeitos os requisitos
exigidos pela família da Lobolada. As exigências variavam de acordo com o que existia
abundantemente em uma determinada época.
Por exemplo, houve alturas em que em Moçambique, na prática do lobolo as famílias da
noiva exigiam como sinal de “troca”, esteiras, pilões, enxadas … Mas com tempo as
exigências foram mudando, passando a ser alianças de ouro (visto que muitos jovens
haviam emigrado para a África do Sul à procura de trabalho e o mais frequente era
tornarem-se mineiros). Depois disso vieram as cabeças de gado (sobretudo no sul de
Moçambique), mas com as guerras, o gado também começou a escassear, daí vieram os
produtos das mercearias dos homens de raça branca e indiana (capulanas, panelas de
alumínio, vestidos, fatos…) … Mas nisso tudo, os factos materiais eram apenas uma
forma de gratificação que a família do esposo pretendia ceder, pelo facto de a noiva lhes
agradar. Observando que muitas delas se casavam virgens, e tendo conhecimentos de
todos os deveres domésticos que uma rapariga educada dentro dos parâmetros
tradicionais deveria ter.

Hoje…
Ao que pude apurar, essa é a essência do lobolo! O tempo passou, mas a tradição
continuou, assim como vieram novas exigências. Infelizmente tenho notado que o sentido
do Lobolo tem sido assustadoramente deturpado pelos nossos mais velhos. Sim, eles é
que fazem a lista das exigências da família! Mas vou focalizar um ponto: São muito raras
as mulheres que são loboladas virgens, e com conhecimentos de trabalhos domésticos.
Coisa que não acontecia, e se tal acontecesse, a família da noiva era obrigada a pagar
multa, saldando assim a dívida para com a família do noivo.
Isso para dizer que os mais velhos, não estão mais em posição de manter certas exigências
porque o cenário atual a não condiz com o que era defendido antigamente. Quantas são
as mulheres que voltam para casa dos seus pais após o rompimento das suas relações, e
estes nem se quer se preocupam em retribuir o que foi ofertado no lobolo? Pelo contrário,
ficam na esperança de voltar a receber uma segunda proposta vinda de uma outra família.
Não faz mais sentido, se se trata de tradição, que seja cumprida com o mesmo rigor com
que eles fazem tais exigências. E infelizmente, os homens que respondem a tais pedidos,
muitos deles usam e abusam das suas esposas. Elas são maltratadas e ofendidas pelos
maridos que esfregam diariamente em suas caras que “Eu paguei por ti, e tu vais fazer o
que eu quiser”. O amor é posto de lado, a mulher vira um objeto de troca entre as famílias,
uma peça fundamental nesse jogo de interesses. Daí muitas jovens da minha geração não
serem a favor do lobolo, esse símbolo da nossa Moçambicanidade!
O custo de vida está cada vez mais elevado, mas sempre é preservada a esperança de ter
uma família e construir um lar junto de quem amamos e acreditamos que será o nosso
parceiro até ao final dos nossos dias. Somos jovens, mas muitos de nós não se esquecem
da tradição, e pretendemos segui-la! Vários jovens vão as casas das noivas e expõem a
intenção de contrair o matrimónio com as mesmas, mas que antes disso desejam seguir o
trilho tradicional que os seus pais e avós… também seguiram. Só que após apresentadas
as exigências da família da noiva, muitos dão de cara com pedidos ABSURDOS!
Não consigo entender onde é que uma garrafa de Chivas, um automóvel, imóveis entram
numa lista tradicional do Lobolo! Porque é que é esquecida a capulana, as panelas, o
pilão? Símbolos que devem fazer parte da lista de exigências, não pelo seu valor
monetário, mas sim porque representam a nossa Africanidade, por serem a própria
essência do Lobolo, uma forma de honrar os nossos ancestrais! Não há explicação para
estes pedidos, porque se forem a dizer que trata-se da evolução dos tempos assim como
aconteceu antigamente, terei de acreditar que, futuramente os meus filhos e netos vão
exigir I Phone’s, Lap Top’s, Jantes Cromadas, Moet’s… e tudo mais que for a moda em
vigor. Deixando de fora as peças tradicionais que simbolizam o próprio, e que nos
identificam como africanos, e acima de tudo Moçambicanos. Esse facto é simplesmente
assustador! Chegaremos à fase em que as festas do Lobolo serão feitas em Hotéis, salões
de festas… em vez da casa dos pais da noiva. Sim, a este ritmo em que andam as coisas,
em que o conteúdo da tradição é deixado de lado para dar lugar ao jogo de interesse, não
me espantaria se tais imaginações minhas virassem realidade. Se for isso, eu prefiro que
o Lobolo seja extinto com o seu degradado valor, que ser exposto ao ridículo até ao final
dos tempos, só para seguir a moda. Eu não quero fazer parte de mais uma geração
cúmplice da morte gradual da nossa cultura!
Em jeito conclusivo direi apenas que, nós os jovens temos sido duramente criticados por
não conhecermos a nossa tradição, por darmos mais valor ao que vem de fora, que ao que
nos gerou.
Mas, Va mamane ni va papae, melhor desconhecer, que conhecer e não seguir, e, pior
ainda, corromper!
Acredito que nem tudo está perdido, ainda podemos parar com esse ato monstruoso e
fazer renascer a esperança de que futuras gerações, terão a perceção correta do verdadeiro
sentido das crenças como o Lobolo, e as preservem devidamente. Pois se as raízes
romperem, já poderemos dizer adeus ao espírito Moçambicano.

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