Anderson apresentada para a disciplina História do Brasil Republicano: do Estado Novo aos dilemas do Brasil Contemporâneo, no curso de licenciatura em História, da Universidade Federal do Maranhão – UFMA. Prof. Me. Wagner Cabral da Costa
São Luís/MA 2017
O historiador inglês, Perry Anderson, no dito artigo, toma para si a difícil tarefa de analisar a tamanha “teia” de ambientação, entre os fatores que culminaram na atual crise política e econômica no Brasil. Situação essa, que por vias de interpretação, tem em seus tons cômicos e dramáticos, permanecido viva entre os debates fervorosos nos quatro cantos da nossa República, sistema esse, que tem na prática brasileira suas particularidades, em relação com os demais países que o adotaram (como é bem dito no artigo, em nenhum lugar o Executivo se separou tanto do Legislativo como no Brasil). Então, para entender, como se deu as atuais polarizações, que em diversas facetas se auto intitulam (um posicionamento mais contundente) e a pejorativizar o oposto (com termos chulos e piadista), com já clássicos personagens que encabeçam militâncias, partidárias ou populares (ou os dois juntos). Assim, para situar personagens marcantes, de Lula à Moro, de Dilma à Cunha, movimentos sociais e religiosos, de escândalos como o “Mensalão” ao “Petrolão”, além da “Lava-Jato” e seus diários protagonistas. Anderson concatena toda essa confusão a partir da crise financeira e recessão econômica que em 2008, no governo Lula, desestabilizou uma economia global, que era tida como sólida. A eleição de 2010, vencida por Dilma Russeff, escolhida por Lula, ainda demonstrava uma popularidade, desfrutou de um índice de aprovação de 75% em meados do primeiro mandato, algo que em 2014, não aconteceu. Analisando esse período, em que três meses após a apertada reeleição, a imagem que mais se via em veículos de comunicação, eram de grandes manifestações, “panelaços” e “buzinaços”. Como chegou a esse ponto? Para responder, Perry faz um amplo contexto econômico, que amiúdes pode ser exemplificado, com um crescimento de 7,5% em 2008, para apenas 1% em 2012, além do velho fantasma da inflação, que trazia consigo fortes traumas e nenhuma saudade, ultrapassando os 6% em 2013. Rapidamente a aprovação do governo caiu para a metade. E reagindo ao fim da bonança do comércio exterior, o consumo doméstico também entrou em declínio. Um baque na principal estratégia do PT, que foi expandir a demanda interna ao aumentar o poder de compra das classes populares. Sem o retorno esperado, em 2011, o alvo da nova matriz econômica foi estimular a economia a partir de um aumento nos investimentos, o que resultou com dois maiores bancos privados do Brasil, Itaú e Bradesco, valendo duas vezes a Petrobrás e da Vale, as duas principais empresas extrativas do país. Ainda assim, não foi suficiente para manter o apoio dos industrialistas e dos banqueiros. Contra essa frente, os sindicalistas ficaram mais ativos no governo Dilma. Entre as estratégias para melhorar os indicativos que demonstram os resultados obtidos pelos projetos de governo, a compra de eletrônicos, bens de consumo e veículos foram estimuladas (a compra de automóveis recebeu incentivos fiscais). A bolha de consumo se transformou numa dramática bolha imobiliária, Entre 2005 a 2014, o crédito para a especulação imobiliária e construção civil aumentou vinte vezes; em São Paulo e no Rio de Janeiro os preços por metro quadrado quadruplicaram. Mas isso, por sua vez, não reduz a escala da crise a qual o PT está agora envolto, que não é apenas econômica, mas também política. A conjectura da crise econômica e política, é compreendido com toda a representação sobre o PT, que apesar de toda a moderação da campanha de Lula na presidência, era visto – e ainda é – como um partido radical, posicionado à esquerda do verdadeiro pântano que domina o Legislativo. O PT tentou compensar a falta de parceiros naturais, criando assim um sistema de estímulos materiais para cooperações dentro do Congresso e por uma moeda de troca mais barata: ou seja, usando de mesadas para não usar de lugares específicos dentro do governo. Quando esse esquema veio à tona em 2005, o chamado escândalo do ‘Mensalão’ (ou seja, de pagamentos mensaisaos deputados) fez com que Lula perdesse o apoio do eleitorado de classe média e por muito pouco não terminou precocemente com sua primeira presidência. O PT não teve outra escolha senão recuar e aceitar a solução que tanto temia em abraçar: o PMDB então entrou no bloco do governo, garantindo assim alguns importantes ministérios e postos centrais no Congresso, e assim permaneceu até o primeiro mandato de Dilma e no primeiro ano do segundo mandato. Contudo, isso não significa que a corrupção tenha diminuído e sim que ela aumentou drasticamente. E para entender a força que seu combate reuniu, vamos acompanhar Anderson na análise desses escândalos. A delação premiada foi introduzida no Brasil; a prisão cautelar, um antigo poder judiciário usado para lotar as cadeias do país com pobres, tornou-se pela primeira vez um instrumento aceitável para dobrar aqueles de classes superiores; e as sentenças na primeira instância não podiam mais ser deferidas por intervenção do Supremo, o que permitia apressar as prisões. Em 2013, gravações feitas num caixa de uma empresa de lavagem de carros (um ‘lava-jato’) em Brasília levou à prisão de um contrabandista com longa ficha criminal. Mantido em Curitiba, na região Sul, para proteger sua família, esse ‘doleiro’ passou a revelar a escala do sistema de corrupção da Petrobrás, na qual ele havia sido um dos principais intermediários na transferência de recursos entre contratantes, diretores e políticos dentro e fora do país. Os três principais partidos envolvidos – eles eram sete no total – foram o PMDB, o Partido Progressista (PP, um partido oriundo da Ditadura) e o PT. Liderando o ataque ao ‘Petrolão’, a equipe investigativa de Curitiba se tornou, assim como os juízes e policiais de Milão que os inspiravam, verdadeiras estrelas midiáticas. Jovens, de cara limpa, queixos quadrados, beneficiando-se de seu treinamento legal em Harvard, o juiz Sergio Moro e o promotor Deltan Dallagnol pareciam saídos direto de um desses seriados americanos de tribunais. O escândalo da Lava Jato estourou de fato na primavera de 2014 e sucessivas prisões e acusações chegaram às manchetes durante a corrida presidencial no outono. Surfando na onda das manifestações massivas contra Dilma, os dois principais grupos dessa direita radical – ‘Vem Pra Rua’ e ‘Movimento Brasil Livre’ – modelaram suas táticas assimilando elementos do ‘Movimento Passe Livre’, um movimento de extrema-esquerda que desencadeou os protestos de 2013, inclusive com o MBL deliberadamente fazendo um acrônimo com o MPL. No horizonte de toda essa situação, há também a ambígua nébula de uma nova religião. Mais de 20% dos brasileiros atualmente são convertidos a alguma variedade de protestantismo evangélico. Verdadeiros balcões de negócios que ficam ordenhando o dinheiro de seus fiéis para erigir verdadeiros impérios financeiros para os seus fundadores. Numa espécie de Wall Street religiosa – onde ocorrem performances de melodramáticos exorcismos nos telões e em que os fiéis cantam e oram, ultrapassa mais de 1 bilhão de Dólares. A bancada evangélica no Congresso, cerca de18% dos deputados, inclui congressistas de 22 partidos. Seus principais interesses residem em garantir concessões de rádio e televisão, evasão fiscal para igrejas e acesso à zoneamento urbano para a construção de monumentos faraônicos. Essa reflexão, que a cada dia ganha novos contornos e memes, é o retrato da preocupação que divide o Brasil, a dita “história do tempo presente”, nos assombra, e a pressão por compreender e interpretar todo o jogo de interesses que constrói a nossa Unidade Federativa, é o atual fardo dos que escolheram o ofício de historiador.
Artigo publicado originalmente na edição de Abril da London Review of Books
(hFp://www.lrb.co.uk/v38/n08 /perry-anderson/crisis-in-brazil). A tradução é de Fernando Pureza, para o Blog Junho (hp://blogjunho.com.br/criseno-brasil/).