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http://www.facebook.com/groups/kinoolho
Esta
revista
é
editada
de
forma
artesanal
com
o
objetivo
informativo.
Os
textos
fazem
parte
de
um
circuito
de
discussões
semanais
a
partir
dos
encontros
http://twitter.com/jpmiranda82
do
grupo
Kino-‐Olho.
Cada
integrante
e
amigo
tem
o
direito
de
expressar
de
forma
escrita
os
seus
pensamentos
a
respeito
de
CINEMA.
http://www.youtube.com/jpmiranda82
NESTA
EDIÇÃO
CONTAMOS
COM
OS
TEXTOS
ABAIXO
“A
retomada
tem
nome:
Selton
Mello”
de
Rafael
Spaca-‐
PG
01
“A
pichação,
os
pichadores
e
o
arquivamento
do
si;
Os
Filmes
de
pichadores
sobre
a
pichação”
de
Daniel
Mittmann-‐
PG
03
“Botucatu
coloca
o
interior
no
cinema”
de
Luiz
Carlos
Lucena–
PG
08
“Precisamos
Falar
sobre
Kevin”
de
Raoni
Reis–
PG
13
GALERIA
DE
IMAGENS
–
PG
16
“Alegoria
e
catástrofe
em
La
soufrière”
de
Tatiana
Hora
Alves
de
Lima
–
PG
23
KINOOLHO.BLOGSPOT.COM
01
João
Paulo
Miranda
Maria
A
retomada
tem
nome:
Selton
Mello
coordenador
do
Grupo
Kino-‐Olho.
Por
Rafael
Spaca,
Desde
1995
ouço
falar
na
“retomada”
do
cinema
brasileiro.
O
filme
que
inicia
esse
processo
é
‘Carlota
Joaquina’,
da
cineasta
Carla
Camurati.
Mas
para
falar
desta
“retomada”,
preciso
dar
um
passo
para
trás
e
contextualizar
o
leitor.
O
então
Ministro
da
Cultura,
Antonio
Houaiss,
cria
a
Secretaria
para
o
Desenvolvimento
do
Audiovisual,
que
passa
a
liberar
recursos
para
produção
de
filmes,
cria-‐se
então
o
Prêmio
Resgate
do
Cinema
Brasileiro.
Depois,
com
o
nome
de
Lei
do
Audiovisual,
ela
entra
em
vigor
no
governo
do
Fernando
Henrique
Cardoso.
O
filme
de
Carla
Camurati
é
financiado,
em
parte,
por
este
programa,
conquista
a
bilheteria
e
a
crítica,
concorre
ao
Oscar
e
parte
da
nossa
população
passa
acreditar
na
propaganda,
enganosa,
que
o
cinema
nacional
volta
a
respirar.
Depois
de
‘Carlota
Joaquina’,
qual
filme,
ou
melhor,
quais
filmes
vieram
depois?
Conseguimos
de
fato
conquistar
as
distribuidoras
estrangeiras,
as
nacionais,
o
público
daqui
e
de
fora
com
os
nossos
filmes?
Houve
mesmo
um
movimento
revolucionário
incendiando
nosso
cinema?Conseguiamos
assistir
as
produções
nacionais
nas
salas
de
cinema?
Conquistamos
espaços?
A
televisão
exibe
nossa
produção
ou
só
rarissimas
excessões?
Seu
posicionamento
e
postura
dentro
e
fora
das
telas
GAGNEBIN,
Jeanne
Marie.
História
e
narração
em
Walter
ocasionaram
essa
mudança.
A
partir
dele
o
cinema
Benjamin.
2°
Ed.
São
Paulo:
Perspectiva,
2004.
começa
a
triunfar.
Primeiro
na
sua
figura
carismática,
que
arrasta
multidões
ao
cinema.
Depois,
ao
levantar
a
LOWY,
Michael.
Walter
Benjamin:
aviso
de
incêndio
–
uma
leitura
das
teses
“Sobre
o
conceito
de
história”.
São
bandeira
do
cinema
em
“detrimento”
da
televisão,
Paulo:
Boitempo,
2005.
atiça
a
classe
(de
atores)
que
passa
a
acompanhar
sua
luta.
WITTGENSTEIN,
Ludwig.
Tratactus
Logico-‐Philosophicus.
Rodrigo
Santoro,
Wagner
Moura,
Lázaro
Ramos,
entre
Companhia
Editora
Nacional,
editora
da
Universidade
de
São
Paulo.
São
Paulo,
1968.
outros,
inspirados
nessa
postura,
passam
a
dar
prioriadade
aos
trabalhos
no
cinema
e
valorizar,
com
suas
respectivas
imagens,
nosso
audiovisual.
Selton
transita
na
produção,
atuação
e
direção
de
filmes.
Não
foram
poucas
as
vezes
que
li
uma
entrevista
com
determinada
atriz
ou
ator
que
diziam
“quero
ser
como
o
Selton
Mello’.
34
03
COMOLLI,
Jean-‐Louis.
Ver
e
poder
–
a
inocência
Contudo,
a
vida
urbana
transgride
a
cada
momento
essa
ordem.
No
movimento
da
cidade,
os
interesses
perdida:
cinema,
televisão,
ficção,
documentário.
Belo
mercantis
cruzam-‐se
com
os
históricos,
estéticos
e
Horizonte,
Editora
UFMG,
2008.
comunicacionais.
As
lutas
semânticas
(grifo
meu)
para
neutralizar,
perturbar
a
mensagem
dos
outros
ou
DIDI-‐HUBERMAN,
Georges.
A
sobrevivência
dos
vaga-‐ mudar
seu
significado,
e
subordinar
os
demais
à
própria
lógica,
são
encenações
dos
conflitos
entre
as
lumes.
Belo
Horizonte:
Editora
UFMG,
2011.
forças
sociais:
entre
o
mercado,
a
história,
o
Estado,
a
publicidade
e
a
luta
popular
para
sobreviver.
FOUCAULT,
Michel.
Vigiar
e
punir:
o
nascimento
da
(CANCLINI,
1997)
prisão.
Editora
Vozes:
Petrópolis,
2004.
1
Filósofo
(UNISINOS),
Pós-‐graduado
em
Sociologia
(FESP/SP)
e
mestrando
em
__________________
História
da
loucura
na
idade
Educação
(UNESP/Rio
Claro).
(Proto)intelectual
de
origem
operária,
está
interessado
no
debate
das
questões
relativas
à
dinâmica
do
poder
e
dos
seus
clássica.
Editora
Perspectiva:
São
Paulo,
1978.
agenciamentos
no
espaço
urbano
da
cidade
capitalista
global,
bem
como
das
possibilidades
de
resistências
e
do
surgimento
de
dispositivos
de
autogestão
HOBSBAWN,
Eric.
A
era
dos
extremos:
o
breve
século
de
práticas
conflituosas
de
caráter
cultural,
social
e
política
dentro
da
forma-‐
cidade.
A
filiação
teórica
desses
estudos
tem,
inevitavelmente,
passado
por
XX.
São
Paulo,
Companhia
das
Letras,
1995.
Michel
Foucault,
Gilles
Deleuze,
Félix
Guattari,
Toni
Negri,
Guy
Debord
e
Hakim
Bey.
04
33
Dessa
forma,
a
pichação
–
ou
o
grafite,
como
No
entanto,
a
não-‐erupção
do
vulcão
revela
a
imagem
mencionado
por
Canclini
–
é
entendido
como
uma
do
documentário
uma
imagem
enquanto
ruína.
O
filme
manifestação
semântica,
que
disputa
espaço
com
adquire
um
caráter
alegoricamente
reflexivo
a
partir
outras
diversas
manifestações,
todas
em
busca
de
do
instante
em
que
questiona
a
certeza
da
qual
o
comunicar
algo,
ou
ainda,
de
interferir
na
comunicação
documentário
partiu.
Lembremos
de
algumas
de
outrem.
Os
grafites2,
para
Canclini,
representam
a
formulações
da
sexta
proposição
do
filósofo
voz
dos
dissonantes,
de
um
setor
deles,
em
relação
à
Wittgenstein
no
Tratactus
Logico-‐Philosophicus,
em
política
urbana
majoritária.
Segundo
ele,
que
identifica
que
ele
trata
da
forma
geral
da
função
de
verdade,
os
grafites
–
ou
as
pintas
em
castelhano
–
com
as
quando
remete
ao
fato
de
que
a
verdade
não
pode
ser
manifestações
sociais
e
políticas
–
de
oposição
–
os
dita:
“grafites,
cartazes
comerciais,
manifestações
sociais
e
6.36311
Que
o
sol
se
levante
amanhã
é
uma
politicas,
monumentos”
são
as
“linguagens
que
hipótese,
e
isto
quer
dizer:
não
sabemos
se
se
representam
as
principais
forças
que
atuam
na
levantará.
6.37
Não
há
obrigação
para
algo
cidade.”
(CANCLINI,
1997).
Cada
uma
dessas
acontecer
depois
de
alguma
coisa
ter
acontecido.
expressões
representaria
um
setor
social,
um
Não
há
necessidade
que
não
seja
lógica.
6.371
Na
base
de
toda
moderna
visão
de
mundo
está
a
ilusão
determinado
grupo
posto
em
determinado
espaço
–
de
que
as
assim
chamadas
leis
naturais
sejam
social,
econômico,
político,
cultural
–
do
esclarecimentos
a
propósito
dos
fenômenos
esquadrinhamento
da
urbe.
naturais
(WITTGENSTEIN,
1968
p.125).
Segundo
Foucault
(2004),
a
partir
do
século
XIX
as
prédio
e
começa
a
escalar,
nervosamente,
a
estrutura,
com
a
lata
de
spray
presa
na
bermuda.
Seu
punições
foram
deixando
de
lado
o
caráter
de
castigo
alvo
é
um
trecho
da
parede,
no
terceiro
andar,
onde
físico
e
reencenação
do
crime
através
da
face
invertida
ele
quer
deixar
a
sua
marca.
Naquela
fria
e
tensa
do
pagamento
da
pena,
para
ganhar
o
estatuto
de
madrugada,
Tokaya,
um
pichador
da
Zona
Norte
do
tratamento
educativo,
de
correção
disciplinar
para
Rio,
é
o
astro
solitário
de
mais
uma
cena
do
filme
readequação
dos
indivíduos
em
sociedade
–
ou,
nos
independente
“100
comédia
Brasil”.
(Segundo
Caderno
–
O
Globo)
casos
de
pena
de
morte,
um
fim
não
doloroso
e
asséptico.
De
acordo
com
Foucault
(2004,
p.16),
Uma
estratégia
que
se
mostrou
bastante
interessante
e
“desaparece,
destarte,
em
princípios
do
século
XIX,
o
significativa
para
o
desenvolvimento
de
nossa
pesquisa
grande
espetáculo
da
punição
física:
o
corpo
supliciado
sobre
a
prática
da
pichação,
vinculada
ao
mestrado
em
é
escamoteado;
exclui-‐se
do
castigo
a
encenação
da
Educação
da
UNESP
de
Rio
Claro,
foi
à
análise
de
uma
dor.
Penetramos
na
época
da
sobriedade
punitiva”.
No
série
de
filmes
de
pichação,
ou,
mais
precisamente
entanto,
o
espetáculo
em
torno
do
sofrimento
de
falando:
de
filmes
de
pichadores,
pois
os
mesmos
são
Cyparis,
que
se
tornou
atração
de
circo,
revela
ainda
levados
a
cabo
pelos
próprios
pichadores.
Estes
registros
resquícios
de
uma
sociedade
acostumada
a
encontrar
fílmicos
acabam
valendo
como
uma
espécie
de
arquivo
na
punição
dos
condenados
uma
forma
de
etnográfico,
revelando-‐nos
nosso
objeto
de
pesquisa,
entretenimento
sádico.
bem
como
os
seus
atores
em
ação.
O
suplício
do
negro
Cyparis,
assim
como
a
miséria
em
Djan
Cripta,
um
dos
precursores
da
pichação
paulista
e
que
viviam
os
três
negros
que
decidiram
permanecer
hoje
um
assumido
“aposentado”
do
spray,
tem
se
na
Ilha
de
Guadalupe,
suscitam
uma
nova
inspiração
ao
mostrado
um
profícuo
realizador
de
filmes
filme
que
não
encontra
a
catástrofe
inevitável.
Werner
“documentais”
acerca
da
pichação
e
dos
pichadores.
Herzog,
apesar
de
concluir
que
o
seu
documentário
Autor
de,
entre
outros,
“100
comédia
Brasil”,
Cripta
vem
a
alguns
anos
trabalhando
para
documentar
em
vídeo
a
ficou
sem
sentido,
afirma
que
o
filme
chamou
a
ação
dos
pichadores
paulistas
e
mais
recentemente
de
atenção
para
as
precárias
condições
de
vida
em
que
outras
capitais
brasileiras.
Como
é
o
caso
do
filme
citado
viviam
os
negros
naquela
região.
O
filme
finda
com
acima,
em
que
o
diretor
percorre
cidades
como
Porto
uma
utopia
de
pequenas
salvações
inscritas
nas
Alegre,
Rio
de
Janeiro,
Curitiba,
Belo
Horizonte,
além
de
imagens
que
produzem
relatos
sobre
os
dominados,
os
São
Paulo,
óbvio,
para
captar
imagens
dessa
prática
de
esquecidos.
escrita
urbana
ilegal,
tentando
entender
quais
são
as
semelhanças
e
as
diferenças
da
pichação
entre
as
regiões
por
sua
câmera
cartografadas.
Considerações finais
O
experiente
pichador
da
cidade
de
Osasco,
grande
O
saber
proposto
pelo
filme,
assim,
finda
por
evidenciar
São
Paulo,
Djan
Cripta
lançou
no
mês
de
dezembro
de
a
ruína
de
um
sentido
último,
trazendo
à
tona,
mais
2011
o
seu
novo
filme
documentário.
Denominado
além,
o
caráter
inefável
e
inapreensível
da
realidade.
como
100comédia
Brasil
–
Edição
Sul
&
Sudeste
o
DVD
O
documentário
termina
com
o
cineasta
questionando
o
tenta
captar
o
que
está
acontecendo
no
circuito
da
valor
do
filme
que
ele
se
encarregou
de
realizar.
Herzog,
pichação
nas
capitais
dessas
regiões
do
país.
Cripta
circulou,
na
companhia
de
pichadores
locais,
pelas
já
através
da
voz
over,
afirma:
“Para
nós,
rodar
este
filme
adquiriu
um
caráter
patético.
E
assim
tudo
termina
em
citadas
cidades
de
Porto
Alegre,
Curitiba,
Belo
nada,
de
fato,
num
ridículo
total.
Agora
será
um
Horizonte,
Rio
de
Janeiro
e
São
Paulo,
buscando
captar
com
a
sua
câmera
(olho),
sua
experiência
e
documentário
de
uma
catástrofe
inevitável
que
nunca
ocorreu”.
Segundo
o
cineasta,
o
fato
de
a
calamidade
subjetividade
de
pichador,
as
diversidades
(e
os
não
ter
acontecido
foi
muito
surpreendente
e
sotaques
regionais)
entre
um
pixo
e
outro.
permanece
um
grande
enigma
porque
nunca
na
história
Mais
uma
jornada
cumprida
pelas
Ruas
do
Brasil,
da
vulcanologia,
já
que
foram
detectados
sinais
de
dessa
vez
passando
por
Belo
Horizonte
e
Rio
de
grande
magnitude
sem,
no
entanto,
incorrer
em
Janeiro,
cada
estado
com
seu
estilo
e
sua
pegada,
confesso
que
estou
muito
admirado
com
a
potência
absolutamente
nada.
da
Pixação
nesses
estados,
os
mineiros
descendo
o
rolo
em
tudo
com
seus
extensores
de
9
metros,
já
Herzog
afirma
também
que
o
que
acabou
chamando
os
cariocas
carimbado
a
cidade
toda
com
seu
Xarpi,
mais
a
sua
atenção
foram
as
condições
miseráveis
em
difícil
encontrar
um
lugar
no
RIO
que
não
esteja
que
viviam
os
negros
naquela
ilha.
É
como
uma
imagem-‐
devastado.
vaga-‐lume
que
salva
a
história
daqueles
que
foram
esquecidos,
relegados
a
segundo
plano,
uma
imagem
Na
citação
acima,
Djan
comenta,
em
seu
site
de
que
age
a
contrapelo
da
invisibilidade
e
da
dominação.
fotografias
(flickr)3,
acerca
dessas
diferenças,
no
caso
Ao
tratar
da
busca
pelo
homem
que
havia
decidido
das
particularidades
da
pichação,
da
forma
de
pichar
e
permanecer
na
Ilha
de
Guadalupe
mesmo
diante
da
das
letras
do
pixo,
encontradas
na
capital
mineira
e
na
iminência
de
uma
erupção
devastadora,
Werner
Herzog
capital
carioca.
evoca
a
reminiscência
da
história
do
bandido
Cyparis,
O
filme
–
produzido
de
forma
alternativa
e
que
sobreviveu
à
erupção
do
vulcão
El
Pélee
na
cidade
independente
–
mostra
a
pichação
a
partir
do
olhar
de
Saint-‐Pierre
em
1901.
dos
próprios
pichadores,
constituindo-‐se
dessa
feita
Cyparis,
também
negro,
foi
o
único
sobrevivente
da
em
um
excelente
arquivamento
(de
si)
etnográfico.
O
catástrofe
ocorrida
em
Saint-‐Pierre.
O
filme
mostra
um
trailer,
que
está
disponível
na
internet
no
site
do
plano
da
solitária
onde
Cyparis
havia
sido
preso,
Youtube4,
traz
em
seu
comentário
uma
fala
bastante
enquanto
a
voz
over
relata
que
havia
entre
60
e
70
interessante,
onde
afirma
que
o
documentário
“mostra
prisioneiros,
mas
como
ele
era
considerado
o
bandido
a
adversidade
(sic)
de
estilos
de
letras
e
técnicas
de
mais
perigoso
da
cidade,
inclusive
por
ter
o
costume
de
apropriação
típicas
de
cada
estado”.
brigar
com
guardas,
Cyparis
foi
enclausurado
na
O
registro,
que
expõe
imagens
captadas
durante
o
ano
solitária.
Golpeado
pelo
calor
do
solo
durante
a
de
2011,
conta
com
a
participação
de
nomes
catástrofe,
ele
sofreu
graves
queimaduras
nas
costas,
importantes
no
circuito
nacional
da
pichação,
os
quais
tornando-‐se
mais
tarde
atração
de
um
circo
americano.
dão
destaque
às
formas
que
“a
pixação
se
apropria
das
O
documentário
mostra
uma
foto
de
Cyparis
cheio
de
paisagens
urbanas
das
grandes
cidades”.
queimaduras
sentado
numa
cama
de
hospital,
apresentando
o
semblante
letárgico
e
amargurado,
e
a
Ainda,
segundo
Cripta,
que
afirma
“ter
dado
um
tempo
voz
over
conta
que
o
bandido
teria
vivido
até
o
ano
de
no
pixo”
e
que
agora
é
“um
ex-‐pichador”,
o
seu
1956.
interesse
é
em
captar
e
registrar
a
pichação
pelo
olhar
de
um
pichador.
O
corpo
de
Cyparis
é
castigado
com
o
suplício,
que
expõe
a
sua
dor
como
divertimento
de
outros,
o
que
3
A citação foi retirada (22/12/2011) do site de fotografias (flickr) de Cripta remete
a
uma
época
em
que
a
punição
era
sinônimo
de
Djan: http://www.flickr.com/photos/criptadjan/5902316075/
4
http://www.youtube.com/watch?v=L-1yQtgB9E0 acessado no dia espetáculo
em
praça
pública.
22/12/2011
30
07
–
assim
o
inesquecível
aflora
de
repente
em
seus
O
que
para
a
nossa
pesquisa
é
extremamente
relevante,
gestos
e
olhares,
conferindo
a
tudo
o
que
lhe
diz
pois,
sabendo
que
os
seus
vídeos
são
registros
da
prática
respeito
aquela
autoridade
que
mesmo
um
pobre
diabo
possui
ao
morrer,
para
os
vivos
em
seu
redor.
da
pichação
–
bem
como
de
encontros,
diálogos
e
ações
Na
origem
da
narrativa
está
essa
autoridade
diversas
–
captadas
e
recortadas
pelos
interesses
dos
(BENJAMIN,
1987
p.207-‐208).
próprios
agentes
da
pichação,
a
possibilidade
de
observar
o
que
de
fato
ocorre
é
mais
próxima.
O
narrador
e
mendigo
encontrado
por
Herzog
após
o
anúncio
no
jornal
acredita
na
vida
enquanto
uma
Cripta
neste
DVD
nos
apresenta
uma
ampliação
de
seus
vivência
da
morte.
O
mendigo
entrevistado
por
Herzog
interesses
de
registro,
alargar
a
compreensão
da
prática
pode
ser
considerado
por
muitos
como
um
louco
da
pichação
para
outros
estados
brasileiros,
buscando
devido
à
sua
decisão
de
esperar
pela
morte.
No
captar
o
que
existe
de
semelhança
bem
como
de
entanto,
no
documentário
as
suas
elucubrações
diferença
(DELEUZE)
nessas
pichações,
tanto
dos
traços,
surgem
como
uma
espécie
de
saber
místico
ao
qual
os
quando
da
forma
de
agir,
de
sociabilidade
etc.
homens
racionais
não
tem
acesso.
Como
afirma
Foucault
(1978),
na
época
da
Renascença
a
loucura
é
vista
como
a
revelação
de
um
saber
em
torno
do
vazio
Bibliografia
da
existência
humana,
subjugada
à
morte,
no
contexto
das
guerras
e
das
pestes
que
se
alastravam
sobre
a
CANCLINI,
Néstor
García.
Culturas
Híbridas,
estratégias
humanidade.
Do
mesmo
modo,
a
Guerra
Fria
suscita
para
entrar
e
sair
da
modernidade.
São
Paulo:
EDUSP,
uma
visão
da
loucura
como
contraponto
a
uma
razão
1997.
que
conduziu
às
catástrofes
através
da
evolução
do
capitalismo.
FOUCAULT,
Michel.
Des
espaces
autres.
In:
FOUCAULT,
Michel.
Dits
et
écrits
II:
1976-‐1988.
Paris:
Quarto,
A
ascensão
da
loucura
ao
horizonte
da
Renascença
Gallimard,
2001.
p.
1.571-‐1.581.
é
percebida,
de
início,
através
da
ruína
do
simbolismo
gótico:
como
se
este
mundo,
onde
a
rede
de
significações
espirituais
era
tão
apertada,
começassem
a
se
embaralhar,
deixando
aparecer
figuras
cujo
sentido
só
se
deixa
apreender
sob
as
espécies
do
insano.
As
formas
góticas
subsistem
ainda
durante
algum
tempo,
mas,
aos
poucos,
tornam-‐se
silenciosas,
deixam
de
falar,
de
lembrar
e
de
ensinar,
e
nada
manifestam
(fora
de
toda
linguagem
possível,
mas
no
entanto
na
familiaridade
do
olhar)
além
de
sua
presença
fantástica.
Liberada
da
sabedoria
e
da
lição
que
a
ordenavam,
a
imagem
começa
a
gravitar
ao
redor
de
sua
própria
loucura
(FOUCAULT,
1978
p.23).
A imagem como ruína em um processo infinito de
significações é cerne da visão alegórica. E não
seria o documentário La soufrière um filme
acometido pela loucura impregnada na imagem? Se
o documentário parte do pressuposto de uma
calamidade infalível, que dá título ao filme, La
soufrière – à espera de uma catástrofe inevitável, o
documentário é surpreendido pela equivocidade do
real ao se dar conta de que a catástrofe
simplesmente não irá acontecer, apesar da certeza
dos cientistas e daqueles que moravam próximo ao
vulcão.
08
29
No
documentário
La
soufrière,
essa
tensão
alegórica
primeiro
longa
metragem,
ABRASASAS,
trabalhando
entre
dois
momentos
distintos,
as
ameaças
de
erupção
com
jovens
atores
desconhecidos
de
São
José
do
Rio
dos
vulcões
La
soufrière
e
El
Pélee,
não
incide
numa
Preto.
O
filme
ganhou
quatro
prêmios
Governador
do
relação
de
continuidade
ou
de
natureza
explicativa
Estado
(autoria,
melhor
ator
coadjuvante,
melhor
som,
entre
os
dois
fenômenos,
mas
sim
cristaliza
uma
melhor
direção
de
arte)
e
melhor
som
e
prêmio
Espírito
imagem
dialética.
Em
Walter
Benjamin,
a
imagem
Carioca
no
Rio
Cine
Festival.
Agora,
depois
de
se
dedicar
dialética
diz
respeito
a
uma
historicidade
que
consiste
à
televisão
e
à
produção
de
documentários,
Volpato
dá
num
contraponto
ao
tempo
cronológico
do
progresso,
os
toques
finais
para
a
produção
do
novo
longa.
que
pressupõe
uma
continuidade
entre
passado
e
Estranhas
Cotoveladas
já
contou
nos
últimos
seis
meses
presente
e
relações
de
causa
e
consequência.
Assim,
o
com
um
intenso
trabalho
de
pré-‐produção,
com
confronto
entre
passado
e
presente
não
produz
uma
pesquisa
de
locações,
elaboração
de
cenários,
leituras
sucessão
de
eventos
no
decorrer
do
tempo
públicas
do
roteiro
e
escolha
dos
atores.
E
praticamente
cronológico,
mas
uma
dialética
entre
os
todo
o
elenco
será
contemplado
com
artistas
do
interior
acontecimentos
reconhecidos
num
lampejo,
num
paulista.
O
longa
recebeu
verbas
do
ProAC
para
essa
instante.
primeira
etapa,
ganhou
o
Prêmio
Fomento
ao
Cinema
Paulista,
está
recebendo
o
incentivo
fiscal
de
várias
Não
é
que
o
passado
lança
luz
sobre
o
presente
ou
empresas
e
tem
as
filmagens
programadas
para
esse
que
o
presente
lança
sua
luz
sobre
o
passado;
mas
a
ano.
imagem
é
aquilo
em
que
o
ocorrido
encontra
o
agora
num
lampejo,
formando
uma
constelação.
Clássicos
do
interior
–
Nos
papéis
principais
do
filme,
Em
outras
palavras:
a
imagem
é
dialética
na
sua
Volpato
escalou
uma
“trindade”
de
artistas
do
interior
imobilidade.
Pois,
enquanto
a
relação
do
presente
paulista.
Trindade,
não
trio.
Segundo
o
diretor,
o
termo
com
o
passado
é
puramente
temporal,
a
do
ocorrido
com
o
agora
é
dialética
–
não
de
natureza
tem
a
ver
com
a
trindade
divina,
o
conceito
de
que
o
temporal,
mas
imagética
(BENJAMIN,
2006
p.505).
Absoluto
se
manifesta
através
de
três
pessoas.
Assim
o
personagem
principal
do
filme
são
os
formadores
do
A
imagem-‐vaga-‐lume
triângulo
amoroso
que
vive
o
enredo.
O
primeiro
artista
Baseado
no
conceito
benjaminiano
de
imagem
contratado
para
viver
um
dos
personagens
dialética,
Georges
Didi-‐Huberman
(2011)
formula
a
emblemáticos
do
filme,
o
usineiro
Pedro
Álvares,
foi
o
defesa
de
um
cinema
político
ancorado
na
noção
de
ator
Domingos
Meira,
nascido
em
Botucatu,
“caipira
de
imagem-‐vaga-‐lume.
Na
terceira
tese
de
Walter
pé
vermeio”,
como
se
autodenomina,
com
seu
sotaque
Benjamin
(1987)
em
Sobre
o
conceito
de
história,
o
ainda
marcado
pela
prosódia
botucatuense.
Domingos
é
filósofo
defende
uma
história
a
contrapelo
da
história
ator
com
passagens
por
novelas
e
mini-‐séries
de
TV
que
oficial
dos
grandes
acontecimentos
e
dos
grandes
dedica
parte
do
tempo
à
produção
de
cinema.
Há
quase
líderes,
e
afirma:
“o
cronista
que
narra
os
20
anos
ele
produz
e
dirige
filmes
que
têm
a
cidade
e
a
acontecimentos,
sem
distinguir
entre
os
grandes
e
os
cuesta
de
Botucatu
como
cenário,
alguns
com
respostas
pequenos,
leva
em
conta
a
verdade
de
que
nada
do
interessantes
de
público
e
da
crítica,
como
o
curta
Três
que
um
dia
aconteceu
pode
ser
considerado
perdido
Pedras,
selecionado
para
o
festival
de
Gramado,
e
o
para
a
história”
(BENJAMIN,
1987
p.223).
homorístico
Kabumm!!,
que
envolveu
150
figurantes
da
cidade.
É
um
clássico
na
sua
filmografia,
diz
o
ator-‐
diretor.
No
início
Domingos
se
uniu
a
um
grupo
de
alunos
fanáticos
por
kung-‐fu
para
produzir
seus
filmes.
O
curta
Combinação
Mortal,
um
dos
primeiros
da
dupla,
“é
tão
ruim
que
ainda
está
inédito”,
afirma.
“Tenho
vergonha
de
mostrar
até
pra
minha
mãe”.
Mas com tanto caipira, Volpato lembra. “Será um Já na alegoria reside uma dialética entre expressão
filme dinâmico, caipira e multinacional, longe das e significação, pois “cada pessoa, cada coisa, cada
maneirices do Mazzaropi e do Jeca Tatu, que relação pode significar qualquer outra” (BENJAMIN,
propõe ser instrumento de reflexão e libertação 1984 p.196-197).
para toda a juventude brasileira nesse momento
Deste modo, a certeza da catástrofe vulcânica em
importante de transição e afirmação do País”.
La soufrière pode remeter ao temor pelo futuro da
humanidade diante do progresso capitalista, no
contexto do medo do fim do mundo na época da
Guerra Fria e das turbulências econômicas
existentes durante a década de 70, década de
crise. Lembremos que “nisso concerne o cerne da
visão alegórica: a exposição barroca, significativa
apenas nos episódios do declínio” (BENJAMIN,
188).
GALERIA DE IMAGENS
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