Capítulo 5
Derrida e a escrita
1
Introdução: a desconstrução do logocentrismo
l’amour de Lacan”.
2
Sobre De la gramatologie
2.1
O desrecalcamento da escrita
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2.2
A escrita é a metaforicidade
2.3
Lingüística e gramatologia
2.4
A gramatologia de Derrida: os principais conceitos
2.4.1
O traço derridiano
2.4.2
A diferencia
arqui-escrita.
Contudo, a arqui-escrita não poderá nunca ser objetivada em uma
ciência, pois “ela é aquilo mesmo que não se pode deixar reduzir à forma
da presença” (idem, p. 69).
Hjelmslev teria chegado perto de objetivar esta arqui-escrita
através da Glossemática. Este linguista separou, do fonologismo de
Saussure, o princípio da diferença. Extraiu um conceito de forma que
permitia distinguir a diferença formal da diferença fônica. A gramática, por
exemplo, não depende nem da semântica nem da fonologia: é uma forma.
Hjelmslev criou o glossema que seria independente da substância
imaterial (semântica, psíquica ou lógica) e da material (fônica ou gráfica).
A Escola de Copenhagen vai mais adiante, defendendo que estas duas
substâncias de expressão, fluxo de ar e o fluxo de tinta, expressam uma
mesma língua e são mutuamente independentes.
Mas Derrida considera que a Glossemática de Hjelmslev não
chega à arqui-escrita porque opera só com a escrita strictu sensu.
Hjelmslev não queria, em sua teorização, recorrer a algo que não partisse
da imanência irredutível do sistema lingüístico. Não queria recorrer ao
conceito de experiência. Derrida também não gosta do recurso à
263
para o fato de que ninguém escapa da pergunta pela origem, mas pode-
se estar avisado disso e rasurar este conceito.
O arqui-traço faz justiça tanto a esta Necessidade, quanto a esta
rasura. É contraditório e inadmissível na lógica da identidade, pois não se
resume apenas a uma desaparição da origem. A origem não desapareceu
porque não foi retro-constituída, a não ser por uma não-origem. Há uma
forte semelhança com o conceito de objeto perdido: não houve um objeto
que foi perdido. O objeto falta originariamente. O traço não deriva de uma
presença, o que faria dele uma marca empírica, como talvez as marcas
mnêmicas do aparelho psíquico freudiano. É por isso que Derrida forja o
arqui-traço: conceito que “destrói seu nome” (idem, p. 75) pois tudo
começa pelo traço mas, ao mesmo tempo, não há traço originário. Derrida
acrescenta que embora a experiência em Husserl permaneça dominada
pela presença, este autor reconhece que a não-apresentação ou des-
apresentação é tão originária quanto a apresentação.
Derrida traz neste ponto o conceito de imprensão (empreinte):
impressão deixada por uma prensa. Aqui surge mais uma vez a diferencia
que é a referência temporal do traço: “Sem uma retenção na unidade
minimal da experiência temporal, sem um traço retendo o outro como
264
outro no mesmo” (idem, p. 76), não haveria nem diferença nem sentido. O
traço puro é a diferência. Embora a diferência não dependa de nenhuma
plenitude sensível, fônica ou gráfica, audível ou visual, ela é a condição
de existência delas. Parece-me que Derrida está aqui bem próximo de
Freud, do Freud do Projeto, quando as marcas mnêmicas se fazem pelas
diferenças entre as facilitações (bahnungen). E também de Lacan: rasura
pura de nenhum traço anterior (ver capítulo 4).
O arqui-traço ou diferência não existe propriamente; nunca é um
ente-presente. Ele é a formação da forma e por outro lado, é o ser
impresso da imprensão. Derrida o distingue da imagem acústica de
Saussure. A imagem acústica é o entendido, é o ser entendido do som. É
diferente do som real no mundo. Saussure considera esta imagem
acústica como psíquica. Derrida prefere pensar este psíquico de
Saussure, não como um som imaginado, mas como o aparecer
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2.4.3
O sujeito e a escrita
2.5
A gramatologia pode ser uma ciência? Do traço à grafia
2.6
Gramatologia e psicanálise
2.6.1
Uma topografia de traços e bahnungen
entre os neurônios Φ e Ψ.
Seria necessário agora explicar de onde procede esta
permeabilidade e este trilhamento que não é quantitativo. É a
periodicidade, recurso a um tempo descontínuo ou periódico que Freud
ainda não tinha considerado como podendo operar na transformação de
quantidade de um neurônio a outro. Os neurônios Ω, incapazes de
receber quantidade, apropriam-se do período de excitação. Este
descontinuísmo que marca uma diferença pura e uma diferença entre os
diastemas (ou intervalos), será fielmente retomado no bloco mágico.
Segundo Derrida, encontramos no Projeto uma tentativa obstinada
de dar conta do psíquico pelo espaçamento, por uma topografia de traços
e um mapa dos trilhamentos. Ao renunciar ao aspecto neurológico do
projeto, Freud não teria renunciado às suas preocupações topográficas:
“A escrita entra em cena, o traço transforma-se em grama e o campo do
trilhamento em espaço cifrado” (idem, p. 190).
281
2.6.2
A escrita dos sonhos: metafonética, não-linguística e a-lógica
2.6.3
O aparelho psíquico como máquina de escrever
Projeto.
“Uma Nota sobre o Bloco Mágico” é, primeiramente, uma analogia
entre o bloco mágico, o aparelho perceptivo e o inconsciente, como vimos
no capítulo 3. Derrida observa que Freud concebe a escrita em termos
platônicos: uma técnica auxiliar a serviço da memória e não a própria
memória, como a escrita psíquica permite supor. Esta escrita, técnica
auxiliar, é por isso considerada hipomnésia. O tema de Freud, contudo,
não é a memória, nem a relação desta com a censura e o recalque, e nem
o estatuto deste suplemento hipomnésico, o bloco mágico. Seu tema é o
tipo de superfície que suporta a escrita ou, no dizer de Derrida, o subjétil.
Contudo, há uma importante diferença em relação a Platão: a
escrita (no caso, o bloco mágico) é pensada como uma peça extraída e
materializada deste aparelho: “a superfície sobre a qual esta nota é
preservada, a caderneta ou folha de papel, é como se fosse uma parte
materializada do meu aparelho mnêmico que, sob outros aspectos, levo
invisível dentro de mim” (Freud, 1977, pág. 285, vol. XIX). Mais adiante,
Derrida vai tirar conclusões sobre a escrita com base neste aspecto de
artifício técnico.
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3
Conclusões