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Tratamento farmacológico da incontinência urinária

Introdução
Incontinência urinária é definida como a perda involuntária de urina, que se
torna um problema social e/ou higiênico. Pode ser classificada em diferentes tipos
- incontinência urinária de esforço, incontinência por urgência, incontinência mista.

A incontinência por urgência é a perda involuntária de urina associada ao


forte desejo de micção. Neste caso, as pacientes apresentam instabilidade do
controle da micção. O tratamento neste caso, diferentemente da incontinência
urinária de esforço, é basicamente farmacológico.

A urgência pode estar associada a dois diferentes distúrbios Hiperatividade


do músculo detrusor (urgência motora) e Hipersensibilidade vesical (urgência
sensorial).

A hiperatividade do músculo detrusor, caracteriza-se pela presença de


contrações não inibidas durante a fase de enchimento vesical, identificadas no
estudo urodinâmico. Pode ser classificada em dois tipos:

• instabilidade do detrusor (ou instabilidade vesical) - usado para caracterizar


contrações involuntárias do detrusor em pacientes sem distúrbio neurológico
coexistente;
• hiper-reflexia do detrusor - caracterizado pela presença de contrações não
inibidas do detrusor, causadas por um distúrbio neurológico, sendo estabelecido
uma relação de causa-efeito.

Hipersensibilidade vesical caracteriza-se pela urgência urinária, sem que


seja identificada hiper-atividade do músculo detrusor no estudo urodinâmico.

2. Tratamento farmacológico
Para um melhor entendimento, os medicamentos foram divididos em dois
grupos: drogas que agem melhorando o armazenamento vesical de urina (fase de
enchimento) e drogas que melhoram o esvaziamento vesical.

Este artigo faz referência somente ao primeiro grupo de medicamentos,


mais utilizado na prática clínica.
2.1. Drogas que diminuem a contratilidade vesical
2.1.1. Agentes anticolinérgicos

Os medicamentos anticolinérgicos antagonizam os receptores muscarínicos


na bexiga. Com isso, observa-se um aumento na capacidade total da bexiga e
diminuição na amplitude da contração vesical, aumentando assim o volume
vesical antes da primeira micção. O exemplo clássico deste grupo é a atropina.

As drogas anticolinérgicas usadas no tratamento da incontinência urinária


agem em outros órgãos regulados pelo sistema parassimpático (apresentam
pouca seletividade para o trato urinário), o que é responsável pela maioria dos
efeitos colaterais observados.

Não são incomuns os sintomas de "boca seca" (inibição da secreção


salivar), constipação intestinal (diminuição da motilidade intestinal), turvação visual
(bloqueio da íris e músculos ciliares) e taquicardia (bloqueio vagal).

A sensação de "boca seca" é o efeito colateral mais comumente observado.


A paciente deve ser orientada a não aumentar muito a ingesta hídrica, o que pode
fazer com que haja piora dos sintomas urinários. Os anticolinérgicos são contra-
indicados em pacientes portadores de glaucoma de ângulo fechado.

Brometo de Propantelina

Seus efeitos anticolinérgicos são semelhantes aos da atropina. Entretanto,


tem uma biodisponibilidade ruim quando utilizado por via oral. Para aumentar a
absorção deve ser tomado antes das refeições.

A dose habitual é de 15 a 30mg, 3 a 4 vezes ao dia. Os efeitos colaterais


são observados, em graus variáveis, em até 50% das pacientes.

Nome comercial:

Pro banthine 7,5 e 1 15 mg (Medicamento importado)

Hioscinamina, Sulfato de Hioscinamina e Escopolamina

São medicações anticolinérgicas também utilizadas no tratamento da


instabilidade do detrusor. Também apresentam pouca seletividade para o trato
urinário. Existem poucos estudos a respeito do uso destas drogas.
Nome comercial

Escopolamina: Hiocina - Vital Brasil. Comprimidos de 10 mg e ampolas 1 ml com


20 mg

Brometo de Emeprônio

Apresentam uma biodisponibilidade ruim quando utilizados por via oral, com
absorção de apenas 6% da droga. A dosagem usual é de 100 a 200mg três, vezes
por dia.

Nome Comercial

Cetiprim: Comprimidos de 100 mg

2.1.2. Agentes antiespasmódicos com ação anticolinérgica variável

Além da ação anticolinérgica, este grupo de medicamentos tem uma ação


antiespasmódica, promovendo relaxamento da musculatura lisa vesical e uma
ação anestésica local.

Também não devem ser utilizados em pacientes portadores de glaucoma de


ângulo fechado. A intensidade dos efeitos colaterais varia em função da droga
utilizada.

Oxibutinina

É a droga mais utilizada no tratamento da instabilidade e hiperreflexia do


detrusor. Tem uma forte ação antiespasmódica e uma ação anticolinérgica
moderada (cerca de 20% da ação da atropina).

A oxibutinina reduz a amplitude e a freqüência das contrações não inibidas


do detrusor, aumentando a capacidade vesical.

Tem uma boa absorção no trato gastrointestinal e meia-vida de


aproximadamente 2 a 3 horas. A dose habitual é de 15 a 20mg/dia.

Os efeitos colaterais são conseqüência de sua ação anticolinérgica, sendo


mais comum a sensação de "boca seca". Ocorrem em 23 a 76% das pacientes,
sendo a razão de interrupção da medicação em até 10 a 23% dos casos.
Nome comercial

Incontinol: Comprimidos com 5 mg

Retemic: Comprimidos com 5 mg e xarope de 1mg por ml

Ditropan: Comprimidos com 5 mg e 10mg (Medicamento importado)

Flavoxato (Hidroclorato de Flavoxato)

Tem uma forte ação antiespasmódica e fraca ação anticolinérgica. É mais


utilizado no tratamento dos espasmos vesicais no período pós-operatório imediato.
A dose recomendada é de 100 a 200mg, três vezes ao dia.

Nome comercial

Genurin-S: Comprimidos com 200 mg

Diclomina (Hidroclorato de Diclomina)

É geralmente utilizada em pacientes que não toleram os efeitos colaterais


da oxibutinina. Apesar de apresentarem menos efeitos colaterais, são também
menos eficazes. A dose utilizada é de 20mg, três a quatro vezes por dia. Na
ausência de resposta clínica e efeitos colaterais, a dose pode ser aumentada até
160mg/dia.

Nome comercial

No Brasil temos a diciclomina: Bentyl comprimidos com 10 mg

Tolterodina (Tartarato de tolterodina)

É uma nova droga com ação antiespasmódica e anticolinérgica mais


seletiva para os receptores vesicais. Utilizada no tratamento da urgência e
incontinência por urgência.

Tem uma eficácia clínica comparável à oxibutinina, com menos efeitos


colaterais. É utilizada na dose de 4mg/dia (2mg 12-12 h).

Nome comercial

Detrusitol: Comprimidos com 1 mg e 2 mg


2.1.3. Antidepressivos tricíclicos

Os antidepressivos tricíclicos atuam basicamente de três formas: ação


anticolinérgica periférica e central, ação sedativa, provavelmente relacionada à
sua ação anti-histamínica e aumentam a resistência da uretra proximal devido à
estimulação dos receptores adrenérgicos na musculatura lisa vesical e uretra
proximal.

Os principais efeitos colaterais dos antidepressivos tricíclicos são fraqueza,


fadiga e tremor fino. Como podem causar hipotensão ortostática e predispor a
arritmias, devem ser utilizados com cautela em pacientes com doença
cardiovascular.

São contra-indicados em pacientes em uso de inibidores da monoamino-


oxidase, pois podem precipitar convulsões, pirose e coma.

Imipramina

Tem uma ação anticolinérgica e sedativa moderada. Tem efeito alfa e beta
adrenégico. Atua aumentando a capacidade vesical ao diminuir a contratilidade
vesical e aumentar a resistência de saída. Devido a este efeito combinado, é
especialmente útil no tratamento da incontinência urinária mista.

Devido ao seu efeito sedativo, deve preferencialmente ser utilizada somente


em uma dose noturna. Neste caso, associa-se uma droga anticolinérgica e
antiespasmódica diurna. Deve-se ressaltar que, neste caso, os efeitos colaterais
anticolinérgicos se somam.

É considerada uma droga de segunda escolha no tratamento da urgência


motora. É muito útil quando a instabilidade vesical está associada à enurese
noturna ou incontinência ao orgasmo.

Dose:> 6 anos: 25 mg VO à noite. Adulto 100 - 200 mg VO por dia.

Nome comercial

Tofranil: comprimidos com 10 e 25 mg

Amitriptilina

É geralmente utilizada no tratamento da cistite instersticial devido ao seu


potente efeito anti-histamínico e sedativo. Também tem uma importante ação
anticolinérgica, podendo ser utilizada como uma alternativa à imipramina.
Dose inicial: 25 mg ao deitar.

Nome comercial

Tryptanol: comprimidos com 25 mg.

Doxepina

É efetiva no tratamento da incontinência por urgência.

Dose usual: 50 mg ao deitar

2.1.4. Bloqueadores do Canal de Cálcio

A contração muscular é diretamente relacionada ao influxo de cálcio após a


despolarização da membrana. O bloqueio da entrada de cálcio leva ao
relaxamento da musculatura lisa vesical.

Nifedipina

A nifedipina inibe, in vitro, ambas as fases da resposta contrátil da bexiga.


In vivo, poucas alterações são observadas na pressão vesical ou uretral após a
administração de 20 a 40mg de nifedipina.

Entretanto, em pacientes com hiperatividade do detrusor, resistentes aos


agentes anticolinérgicos, a associação da nifedipina pode ser útil.

Nome comercial

Adalat: comprimidos com 10 mg

Adalat Oros: comprimidos com 30 e 60 mg

Adalat Retard: comprimidos com 10 e 20 mg

Terodilina

É o bloqueador de canal de cálcio mais estudado no tratamento da


instabilidade vesical. Entretanto, após um período de uso em todo o mundo, não
está mais disponível para uso clínico devido a seus efeitos cardiovasculares.
2.2 Drogas que aumenta a contratilidade vesical
Cloreto de betanecol

Indicada no tratamento da retenção urinária não-obstrutiva (funcional) aguda pós-


operatória e pós-parto e da retenção urinária causada pela atonia neurogênica da
bexiga. A dose usual é de 10 a 50 mg três a quatro vezes ao dia. Solução estéril
subcutânea: A dose usual é de 1 ml (5 mg), embora alguns pacientes respondam
satisfatoriamente a doses menores, como 0,5 ml (2,5 mg).

Nome comercial

Liberan: comprimidos de 5mg, 10 mg e 25 mg. Ampolas de 1 ml com 5 mg.

2.3 Drogas que aumentam a resistência ao fluxo


2.3.1. Agonistas alfa-adrenérgicos

Como o colo vesical e a uretra proximal (trato de saída) possuem uma


quantidade relativamente grande de receptores alfa-adrenérgicos, os agonistas
alfa-adrenérgicos produzem a contração da musculatura lisa nesta região.

Os principais efeitos colaterais são aumento da pressão arterial, ansiedade,


insônia, cefaléia, fraqueza e palpitações.

Fenilefrina

Indicada principalmente na incontinência urinária de esforço, incontinência


pós-prostatectomia, e enurese. Utilizada na dose de 10 mg 3 a 4 x por dia

Nome comercial

Naldecon: comprimidos com 10 mg

Fenilpropanolamina

Com uma ação semelhante à efedrina, é útil no tratamento da incontinência


urinária esfincteriana. É utilizada na dose de 25-30mg, 3 vezes ao dia. Os
principais efeitos colaterais são xerostomia, fadiga, sonolência, cefaléia, náuseas
e vômitos
Nome comercial

Dimetapp Drágeas AP Comprimidos com 15 mg

2.2.2 Antagonistas beta-adrenérgicos

A principal droga neste grupo é o propranolol. Na dose de 40mg/dia (10 mg


4 vezes ao dia), tem sido utilizado no tratamento da incontinência urinária.

Os efeitos colaterais cardiovasculares são importantes e devem ser


avaliados cuidadosamente (hipotensão, bradicardia). Há também um aumento da
resistência das vias aéreas, o que contra-indica seu uso em pacientes asmáticos.
Devem ser utilizados com cautela em pacientes idosos, sendo contra-indicados
quando existem evidências de insuficiência cardíaca.

Nome comercial

Propranolol: comprimidos com 10 mg, 40mg e 80 mg

2.3 Drogas que diminui a resistência ao fluxo


2.3.1 Alfa-Bloqueadores

Fenoxibenzamina

É droga que provoca bloqueio alfa-adrenérgico diminuindo a pressão


uretral. É indicada na obstrução do colo vesical obstrução prostática parcial e
síndrome uretral. Pode ser associada ao Betanecol. Dose utilizada é de 10 a 40
mg por dia em doses divididas.

Nome comercial

Dibenzyline: comprimidos com 10 mg. (medicamento importado)

terazosin

Indicado, como agente único, para alívio dos sinais e sintomas de


hiperplasia prostática benigna.Assim como outros agentes bloqueadores alfa-
adrenérgicos, pode causar síncope com perda súbita de consciência. Na maioria
dos casos, acredita-se ter sido devido a um efeito hipotensor postural excessivo.
O tratamento deve ser sempre iniciado com 1 mg . não se deve iniciar com um
comprimido inteiro de 2 mg. Os comprimidos de 5 mg e 10 mg não são indicados
para a terapêutica inicial.

Nome comercial

Hytrin: comprimidos de 2 mg, 5 mg e 10 mg.

Cloridrato de tamsulosina

A tamsulosina é um antagonista dos receptores a 1-adrenérgicos, que se


destina ao tratamento dos sintomas funcionais da hiperplasia prostática benigna
(HPB). Foram observadas, ocasionalmente, as seguintes reações adversas:
vertigem, ejaculação retrógrada e, raramente, hipotensão ortostática, cefaléia,
astenia e palpitações. Deve ser usado 0,4 mg ao dia.

Nome comercial

Secotex; comprimidos com 0,4 mg

Doxazosina Mesilato

É indicado no tratamento da obstrução do fluxo urinário e sintomas


associados à hiperplasia prostática benigna (HPB): sintomas obstrutivos
(hesitação, intermitência, gotejamento, fluxo urinário fraco, esvaziamento
incompleto da bexiga) e sintomas irritativos (noctúria, frequência urinária,
urgência, queimação)

A dose inicial é de 1 mg administrado em dose única diária. Conforme a


resposta sintomatológica e urodinâmica individual do paciente a dose pode ser
aumentada após 1 ou 2 semanas de tratamento para 2 mg, e assim a intervalos
similares para 4 mg e 8 mg, sendo esta a dose máxima recomendada.
O intervalo de dose usualmente recomendado é de 2 a 4 mg diários.

Nome comercial

Carduran: comprimidos de 2mg e 4 mg


Unoprost: comprimidos de 1mg, 2 mg, e 4 mg
Alfuzosina Cloridrato

Tratamento dos sintomas funcionais da hipertrofia prostática benigna. A posologia


recomendada é de 1 comprimido de 2,5 mg três vezes ao dia (7,5 mg/dia).

Nome comercial

Xatral: comprimidos com 2,5 mg

2.3.2 Inibidores polissinápticos

Baclofeno

indicado na spasticidade dos músculos esqueléticos na esclerose múltipla.


Estados espásticos nas mielopatias de origem infecciosa, degenerativa,
traumática, neoplásica ou desconhecida, por exemplo: paralisia espinal
espasmódica, esclerose lateral amiotrófica, siringomielia, mielite transversa,
paraplegia ou paraparesia traumática e compressão do cordão medular; espasmo
muscular de origem cerebral infantil bem como após acidentes cérebro-vasculares
ou na presença de doença cerebral degenerativa ou neoplásica. A dose ótima
geralmente varia entre 30 e 80 mg/dia, dividida em 3 x por dia. O tratamento deve
sempre ser iniciado com doses baixas que são gradualmente elevadas até que se
atinja a dose diária ótima.

Nome comercial

Lioresal: comprimidos com 10 mg.

Diazepam

Indicado na espasticidade do esfíncter esterno.Dose de 5 a 10 mg Via oral


3 a 4 x por dia.

Nome comercial

Diazepan: comprimidos de 5 e 10 mg

2.3.3 Relaxantes da musculatura esquelética

Dantroleno
É indicado em casos de espasticidade do esfíncter externo,Tem ação
potente e causa relaxamento esquelético geral. Utilizado na dose de 25 a 200 mg
VO 2x por dia

Nome comercial

Dantrium (Medicamento importado)

3. Considerações finais

A etiologia da incontinência urinária é multifatorial, complexa e ainda pouco


entendida. A terapia medicamentosa não é indicada em todos os casos, devendo
estes ser selecionados adequadamente. Além disso, os efeitos colaterais não são
infreqüentes, sendo uma causa comum de abandono de tratamento.

O conhecimento dos grupos de medicamentos, seus mecanismos de ação,


seus principais efeitos colaterais e uma boa relação médico-paciente são fatores
essenciais para se obter um bom resultado.

Uma paciente mal orientada sobre os sinais e sintomas que possa vir a
experimentar, sobre a necessidade de um eventual ajuste de dose ou mesmo
troca da medicação é uma grande candidata ao abandono do tratamento.

Antonio Fernandes Neto

Bibiliografia

1) Creighton SM, Stanton SL. Detrusor instability: drug therapy and biofeedback.
In: OSTERGARD DR, BENT AE. Urogynecology and urodynamics - theory and
practice. Baltimore: Williams & Wilkins, 1991. Cap 34.

2) Homes DM, Monty FJ, Stanton SL. Oxybutinin versus propantheline in the
management of detrusor instability:A patient regulated variable dose trial. Br J
Obstet Gynaecol, 96: 607, 1989.

3) Tratado de Ginecologia - FEBRASGO - Volume II - 2000 - Ed. REVINTER

4) Gilman AG, Rall TW, Nies AS, Taylor P - As Bases Farmacológicas da


Terapêutica - 8a edição - 1991 - Ed. Guanabara & Koogan.

5) Cardozo LD, Stanton SL. Genuine stress incontinence and detrusor instability: a
review of 200 cases. Br J Obstet Gynaecol, 87: 184, 1980.
6) Kaisary AU. Beta adrenoceptor blockade in the treatment of female stress
urinary incontinence. J urol , 90: 351, 1984

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