Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Chanceler
Dom Jaime Spengler
Reitor
Joaquim Clotet
Vice-Reitor
Evilázio Teixeira
Conselho Editorial
Presidente
Jorge Luis Nicolas Audy
Diretor da EDIPUCRS
Gilberto Keller de Andrade
Editor-Chefe
Jorge Campos da Costa
Agemir Bavaresco
Augusto Buchweitz
Carlos Gerbase
Carlos Graeff-Teixeira
Clarice Beatriz da Costa Söhngen
Cláudio Luís C. Frankenberg
Érico João Hammes
Gleny Terezinha Guimarães
Lauro Kopper Filho
Luiz Eduardo Ourique
Luis Humberto de Mello Villwock
Valéria Pinheiro Raymundo
Vera Wannmacher Pereira
Wilson Marchionatti
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
FALHAS E SOLUÇÕES
porto alegre
2015
© EDIPUCRS 2015,
Versão Eletrônica da 1º Edição impressa no anos de 2011;
CAPA Vinícius Xavier
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas gráficos,
microfílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos. Vedada a memorização e/ou a recuperação total ou parcial, bem como
a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições aplicam-se também às características
gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184 e parágrafos, do Código Penal), com pena de prisão e
multa, conjuntamente com busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais).
AGRADECIMENTOS
Apresentação 9
Cátia Brock1
João Bernardes da Rocha Filho2
1
Mestra em Educação em Ciências e Matemática (EDUCEM/PUCRS), Licenciada em Física (FAFIS/PUCRS),
professora do Magistério Público do Estado do Rio Grande do Sul.
2
Organizador deste livro.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Das respostas dos estudantes foi possível concluir que, embora a situação
socioeconômica do magistério público estadual seja, por si, um fator que aparece
como uma das fontes da rejeição pela licenciatura em física, mesmo daqueles alu-
nos que não estudam em escolas públicas e apenas ouvem notícias e comentários
sobre o tema, a fonte de maior influência negativa é, dominantemente, a atitude
dos próprios professores de física. Isso parece vinculado ao fato de que os profes-
sores apresentam formalmente a física aos estudantes do nível médio e comu-
nicam a eles, mais ou menos diretamente, as possibilidades da profissão, muitas
vezes de forma negativa. O professor faz parte da linha de frente da educação for-
mal, pois interage contínua e diretamente com o beneficiário do produto dos dife-
rentes sistemas educacionais e é natural que receba sobre si a quase totalidade da
carga de responsabilidade pelo sucesso ou fracasso da educação, especialmente
no discurso dos estudantes, que podem não considerar a totalidade dos muitos e
complexos fatores que influenciam a qualidade da educação que recebem.
Mas, independentemente das respostas ao questionário, considerando ape-
nas a alta frequência de estudantes que fracassam no empreendimento de apren-
der a física ensinada na escola, enquanto têm sucesso em outras disciplinas, pode-
se concluir que há uma responsabilidade claramente atribuível ao professor de
física, que parece incapaz de despertar em seus alunos o desejo de compreender
a descrição física dos fenômenos naturais. No entanto, a motivação dos estudan-
tes está ligada à crença do professor na sua própria eficácia educacional (GOYA,
BZUNECK, GUIMARÃES, 2008), o que permite concluir que o fenômeno que surge
como desmotivação dos alunos deriva, pelo menos em parte, da desmotivação dos
professores, cujas atitudes são compreendidas pelos estudantes como uma men-
sagem negativa sobre a profissão.
Nesse contexto, o relatório governamental sobre a escassez de professores do
ensino médio (BRASIL, 2007) mostra que a licenciatura em física ocupou o último
lugar em número de formados entre 1990 e 2005, em uma lista que inclui todas
as graduações exigidas para o exercício do magistério em nível médio, segundo o
núcleo comum definido pela Lei 5.692/1971. A Tabela 1 esclarece numericamente
essa defasagem. A mesma fonte alerta também que existe uma carência acumula-
da de 55 mil professores de física, sendo que, nos 15 anos abrangidos pelo estudo,
apenas pouco mais de 13 mil graduandos receberam diplomas dessa habilitação.
Além disso, uma parcela expressiva dos licenciados não se encaminha para o ma-
gistério no ensino médio, mas se dirige à pesquisa, à pós-graduação, à indústria, à
metrologia ou à física médica. Como o número anual de formados tem-se mantido
inferior ao total de vagas novas e vagas deixadas pelos professores que se afastam
da docência, vem ocorrendo um aumento progressivo do déficit de professores de
12
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
física nas escolas de nível médio, culminando na atual escassez. Nesse quadro
deficitário, apenas 9% dos professores que lecionam física nas escolas têm for-
mação na área. Os 91% restantes são professores de outras disciplinas que foram
deslocados para física, ou ainda estão em formação (ibidem).
Tabela 1. Número de licenciados nas diversas disciplinas ou áreas do currículo
mínimo do ensino médio, para cada licenciado em física, entre 1990 e 2005.
História 8,9
Matemática 7,6
Biologia 7,1
Geografia 6,6
Química 1,8
Física 1,0
13
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
ampla rejeição à licenciatura em física persiste, e esta não pode ser compreendida
apenas com números, pois é de natureza complexa, com causas envolvendo fato-
res humanos, políticos, econômicos, sociais e didático-pedagógicos, cada um deles
merecendo ser alvo de consideração. No entanto, devido justamente à complexi-
dade do tema, não pode ser excluída a chance de que uma modificação na forma
de condução do ensino de física do ensino médio produza resultados positivos,
invertendo a tendência de queda na procura por licenciaturas em física. Nisto se
baseou esta pesquisa, que foi saber dos alunos que fatores os afastam da física.
Ainda que os alunos possam contribuir apenas com suas percepções sobre
a questão e que essas percepções sejam naturalmente restritas à perspectiva que
têm como estudantes, suas opiniões são importantes, porque justamente eles de-
cidem, ao fim e ao cabo, quais profissões seguirão. Por isso, o caminho adotado
nesta investigação para identificar as variáveis interferentes negativamente na
opção profissional dos estudantes pela licenciatura em física foi buscar informa-
ções sobre o ponto em questão em uma amostra dos alunos do último ano do
ensino médio, obtendo seus depoimentos sobre as impressões que têm em relação
à física que aprenderam na escola. Desse modo, os dados permitiram identificar
quais fatores conscientes determinaram que os estudantes do final do ensino mé-
dio desta amostra das escolas de Porto Alegre rejeitassem a carreira no magistério
em física. No entanto, como a pesquisa teve caráter exploratório, a amostra foi
restrita à cidade de Porto Alegre e os dados foram analisados qualitativamente,
não é possível generalizar seus resultados.
A CONDUÇÃO DA PESQUISA
A pesquisa recebeu apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimen-
to Científico e Tecnológico (CNPq) e teve caráter qualitativo, exploratório, com ca-
racterísticas explicativas e de levantamento, envolvendo estudantes do último ano
do ensino médio de escolas de dezesseis regiões orçamentárias do município de
Porto Alegre, uma por região. Os bairros e as regiões das escolas visitadas foram:
Navegantes, na primeira região; Passo D’Areia, na segunda região; Jardim do Salso,
na terceira região; Lomba do Pinheiro, na quarta região; Sarandi, na quinta região;
Mário Quintana, na sexta região; Partenon, na sétima região; Restinga, na oitava
região; Cascata, na nona região; Medianeira, na décima região; Cristal, na décima
primeira região; Cavalhada, na décima segunda região; Belém Novo, na décima ter-
ceira região; Rubem Berta, na décima quarta região; Tristeza, na décima quinta re-
gião; e Floresta, na décima sexta região. Em geral, as escolas foram contatadas por
intermédio de suas direções, que informaram aos professores de física sobre os ob-
jetivos e a forma de realização da pesquisa. Após a concordância das partes, os pro-
14
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
15
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
16
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
17
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
corda com a literatura, que tem mostrado que os professores sofrem com a carên-
cia de tempo, ministram muitas aulas semanais, assumem trabalhos burocráticos
desgastantes, manifestam descrença no ensino (STOBAUS et al., 2007), trabalham
mais do que gostariam, estão esgotados pelas exigências do sistema escolar, dos
pais e da sociedade em geral, e em especial pela falta de respeito, cortesia e bons
modos dos colegas e alunos (ROCHA FILHO et al., 2007). A formação constante
e a participação em congressos e outros eventos poderiam ser formas eficazes
de os professores melhorarem continuamente suas atuações, porém eles quase
sempre não recebem apoio das direções e secretarias de educação para isso, pois
a formação continuada significa mais professores fora de sala de aula e proventos
adicionais a serem pagos futuramente. Além disso, a estratégia tradicional de pro-
ver uma educação centrada unicamente na reunião de professor e alunos dentro
de uma sala de aula, com quadro de escrever e livros, sem recursos adicionais,
também não favorece o surgimento de aulas diferenciadas.
Os alunos respondentes relacionaram diretamente a física com a aplicação
de fórmulas e cálculos, e ao seu modo relataram que estão sendo sistematica-
mente treinados para ouvirem explicações teóricas e fazerem exercícios, em aulas
de quadro e giz, não interativas. No entanto, curiosamente, suas respostas suge-
rem que estão tão habituados com a didática da escola tradicional – a única que
conhecem – que consideram que ela é interativa. No entanto, muitos dos alunos
pesquisados relataram que sentem grande dificuldade ao memorizar as fórmulas,
acham a física complexa demais e não compreendem quais fórmulas utilizar ou
quando devem aplicá-las. O ensino que recebem parece se limitar a fórmulas e
exercícios, em um contexto didático que não contempla a contextualização, a ex-
perimentação e o exercício da análise discutida ou da argumentação.
Quando incentivados a escreverem sobre as aulas que tiveram, uma pequena
parcela dos estudantes lembrou momentos gratificantes, geralmente associados
ao início do ensino médio. Esses momentos foram associados a professores que
os alunos gostariam de ter novamente e que, às vezes com dificuldade, juntavam
materiais e propunham experimentos; relacionavam os conteúdos com o dia a dia;
eram engraçados; eram atenciosos; eram descontraídos; eram divertidos; eram
espontâneos; amavam a profissão; orientavam trabalhos em grupo; eram calmos;
eram pacientes; incentivavam e valorizavam questionamentos dos alunos; e can-
tavam, tocavam instrumentos musicais, interpretavam ou contavam histórias em
sala de aula. Essa lista de características dos professores marcantes, extraída dos
relatos dos estudantes pesquisados, sintetiza o perfil do educador em física que
conquista os alunos e os ajuda a construir um aprendizado significativo.
18
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
No entanto, em quase todos os relatos fica evidente a repulsa dos alunos pela
disciplina de física, e o quanto isso se deve à atuação dos professores. Sobre esses
professores, os alunos escreveram que: eram chatos; não gostavam de serem ques-
tionados nem de repetirem explicações; eram muito rígidos; não tinham preparo
ou disposição para oferecer exemplos do cotidiano; eram metodologicamente iguais
aos outros professores; não se esforçavam para serem entendidos; não tinham
capacidade para o diálogo; eram desmotivados; eram professores de outras disci-
plinas, alocados para física; ou pareciam alienados, loucos, fora da casinha, estranhos e
insignificantes. Os alunos que rejeitam professores de física com essas caracterís-
ticas e comportamentos rejeitam também a licenciatura em física, como sugere
a alta correlação entre os alunos que responderam assim e os que manifestaram
aversão explícita e enfática à carreira do magistério em física.
Apenas dois alunos, ou cerca de 1% da amostra, responderam que não está
descartada a possibilidade de que venham a escolher licenciatura em física como
carreira de nível superior. No entanto, mesmo esses julgam negativamente seus
professores e veem a carreira no magistério em física como uma forma de repu-
diar o modo como foram ensinados. A quase totalidade dos alunos rejeita suma-
riamente a licenciatura. Cerca de 9% da amostra referenciaram também, como
justificativa para essa rejeição, a questão da baixa valorização socioeconômica
do magistério, e 4% dos respondentes assinalaram complementarmente falta de
habilidade para a ação educativa. Esses percentuais incluem sobreposições e, por-
tanto, não devem ser somados. Quanto às características docentes que emergi-
ram das respostas ao questionário como principais fatores da rejeição, foi possível
agrupá-las em duas categorias, uma delas mais ligada à personalidade do profes-
sor e outra mais ligada aos aspectos técnicos da condução do processo educativo.
Essa classificação é apresentada no Quadro 2.
19
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Positivas Negativas
INFERÊNCIAS
Os alunos rejeitam uma carreira na licenciatura em física basicamente como
resposta a três fatos: majoritariamente, a rejeição à física decorre da má condu-
ção do processo educacional das aulas de física e, minoritariamente, à falta de
vocação e à baixa valorização profissional que setores do magistério enfrentam,
20
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
mas que os estudantes e a sociedade em geral entendem como sendo uma marca
generalizada da profissão.
Uma das características negativas listadas pelos alunos em relação ao en-
sino de física é a ausência de oportunidades de manifestação. De forma geral a
educação almeja indivíduos com consciência global, que respeitem a sociedade,
capazes de ações que beneficiem as pessoas. Portanto, a limitação de chances de
argumentação dos alunos é um erro fatal na realização da educação, pois, ao inibir
a manifestação dos alunos, tornam-se impossíveis a identificação e o confronto
do seu pensamento com o do professor e dos demais colegas. Sem diálogo, não
surgem dúvidas e novas ideias, por isso a comunicação deve ser receptiva, sem
preocupação estrita com o uso da linguagem formal da física, que surge gradual-
mente, como decorrência do processo educativo. Em educação, o diálogo aparece
como meio de comunicação que possibilita o dizer e a aproximação de cada um,
de forma que é impossível conceber uma educação que não seja fundamentada
no diálogo, pois “o diálogo é uma exigência existencial, [...] é o encontro em que
se solidarizam o refletir e o agir de seus sujeitos, endereçados ao mundo a ser
transformado e humanizado” (FREIRE, 1997, p. 79). Ser educador, portanto, exige
comprometimento com o diálogo.
Ao professor ainda cabe desviar-se da opção que a maioria das escolas fazem
ao priorizarem o vestibular ou o mercado de trabalho. Os Parâmetros Curriculares
Nacionais – PCN – (BRASIL, 2002) orientam para que a prática docente se preocupe
em fazer com que a física seja construída como um instrumento de compreensão
do mundo, uma ferramenta que auxilie na forma de o educando pensar e agir. O
espírito dessas orientações aponta para a preparação do educando para enfren-
tar situações inusitadas, para pensar, analisar os problemas, filtrar o que é mais
importante e chegar a uma melhor conclusão ou resolução, não importando se
no vestibular, na vida cotidiana ou no mercado de trabalho. Mas a análise dos
depoimentos mostrou que os alunos veem a física como algo que existe somente
dentro da escola e têm dificuldades em perceber a presença da física no mundo e
nos seus cotidianos.
As respostas também sugerem que, quando no ensino fundamental o estu-
dante tem a oportunidade de ser aluno de um professor que propõe o estudo da fí-
sica, a relação que o aluno desenvolve com essa ciência no ensino médio tem maior
probabilidade de ser boa. A última série do ensino fundamental é vista como uma
oportunidade de introdução à física, e o professor pode ficar à vontade para traba-
lhar os conteúdos como julgar melhor para a realidade na qual a escola se insere,
fazendo medições e experiências, elaborando relatórios científicos, compreendendo
a física dos eletrodomésticos, as contas de energia elétrica e propondo minifeiras de
21
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
22
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maneira como a física chega aos estudantes do ensino médio pesquisados
é evidentemente distorcida, o que acarreta rejeição por uma possível carreira na
licenciatura em física. O fato mais relevante descoberto nesta pesquisa é que o
agente principal dessa distorção é o próprio professor de física. Essa ação aparen-
temente contraditória parece se originar da percepção negativa que os próprios
professores têm acerca da profissão que escolheram, mas passa necessariamente
pela metodologia empregada, que se caracteriza pelo apego à aula copiada, des-
contextualizada, excessivamente matematizada, fixada em exercícios repetitivos
e sem experimentação. Voluntariamente, ou por motivos que não são propria-
mente gerados por eles, são principalmente os professores de física que afastam
os alunos da carreira docente em física, e o fazem em grau mais elevado que os
professores de quaisquer outras disciplinas, como mostram os números do MEC/
CNE/CEB (BRASIL, 2007).
Para evitar a rejeição dos alunos pela carreira docente em física, os profes-
sores poderiam abandonar as metodologias mais tradicionais, que não educam
porque não despertam nos alunos o interesse por essa ciência. Também pode-
riam eliminar das aulas de física as técnicas didáticas que contemplam somente
a aplicação e memorização de fórmulas e abandonar o método repetitivo que se
caracteriza por matéria no quadro e muitos exercícios. De alguma forma, é preci-
so evitar a desmotivação do professor, causada pelo acúmulo de trabalho, assim
como buscar meios paralelos de incentivo para ele realize atualizações profissio-
nais e tenha acesso a pesquisas recentes sobre educação científica. Mesmo que
faltem laboratórios didáticos de física, o professor não pode desistir dos experi-
mentos, mas sim construir seu próprio laboratório portátil ou exigir a ajuda da
escola, quando cabível, contando com a participação da comunidade escolar para
conseguir o material necessário.
23
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
REFERÊNCIAS
BRASIL. Secretaria da Educação. Os parâmetros curriculares nacionais. Brasília: DF, 2002.
Disponível em: <http://www.integral.br/downloads/resultado.asp?categoria=161&codi
go=55>. Acesso em: 20 set. 2008.
_______. Ministério da Educação. Escassez de professores no ensino médio. Brasília: DF, 2007.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/escassez1.pdf>. Acesso em:
24 de jun. 2008.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 6ª. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 1997.
24
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
MORAES, Roque; GALIAZZI, Maria R. Análise Textual Discursiva. Ijuí: Unijuí, 2007.
25
ORIGENS DA OPÇÃO PELA LICENCIATURA EM FÍSICA
ção das dificuldades salariais da profissão, subsiste uma imagem negativa quanto
ao status social do professor da educação básica, o que contribui para a recusa dos
estudantes em se voltar para uma carreira que promova o retorno ao ambiente
escolar (ATAÍDE, 2006).
Outro fator crítico está ligado ao retorno financeiro do investimento nos es-
tudos. Muitos estudantes oriundos de classes economicamente menos favoreci-
das encontram dificuldades em manter os gastos gerados pela vida acadêmica e
acabam abandonando-a para trabalhar e alcançar objetivos mais urgentes, como
a própria subsistência. Embora o estudo possa ser compreendido como um in-
vestimento de longo prazo, cujo retorno pode ser gratificante e compensador, a
paciência e o empenho são primordiais.
O Governo Federal está agindo para que a escassez de professores se redu-
za, ampliando verbas para cursos de formação, inaugurando novos cursos e ins-
tituições, criando bolsas de incentivo e campanhas de valorização do trabalho
docente. Tudo isso pode contribuir para a solução, mas a modificação do status
social do professor passa necessariamente por um processo de valorização sala-
rial e somente isso pode resolver o problema de forma definitiva. Em vista deste
problema complexo, ser professor envolve resignação e dedicação, o que pode ser
mais do que o jovem está disposto a oferecer a uma carreira, ainda mais em um
período no quais os adolescentes passam por transformações e mudanças físicas
e psicológicas, gerando assim conflitos capazes de influenciar a decisão de sua
vida profissional futura (FILIZATTI, 2003).
Segundo relatório do MEC/CNE/CEB sobre a escassez de professores no en-
sino médio (BRASIL, 2007), a educação no Brasil sofre um caos pela falta de pro-
fessores capacitados nas escolas, principalmente nas disciplinas ligadas à ciência.
Ainda neste relatório, os autores citam que apenas 1% do número total de licen-
ciandos escolhe seguir carreira em física, cerca de 70% dos licenciandos em física
evadem nos primeiros anos de estudo, e apenas 9% dos professores de física da
educação básica possuem formação na área.
A pesquisa aponta como causa principal desta crise a remuneração salarial,
considerada baixa em relação a outras profissões. Essa impressão negativa acaba
por afastar possíveis interessados em alguns substratos do magistério. A Tabela
1, com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (BRASIL,
2001), aponta e compara os salários das profissões mais escolhidas pelos jovens, e
os salários dos professores, por região.
28
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
29
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
portantes nas condições de ensino, pela grande disparidade econômica dos mu-
nicípios brasileiros. Seriam necessários mais programas de incentivo a serem de-
senvolvidos e implantados pelo Governo, buscando uma melhora no atual quadro
educacional. Entre eles, a educação continuada de professores ainda ativos no
ensino básico e a promoção de bolsas e auxílios a estudantes interessados em cur-
sarem o magistério em áreas com falta de profissionais formados (BRASIL, 2007).
Também na Tabela 1 pode-se verificar que os salários dos professores dos níveis
iniciais da educação escolar são cerca de cinco vezes menores do que os salários
dos professores universitários. Em países da Europa, como a Espanha, esta relação
não ultrapassa duas vezes.
Apesar do salário pouco atrativo para os níveis iniciais da carreira, em vista
da carência de professores, cabe investigar os fatores determinantes na escolha
profissional pelo ensino de física. Por isso, cada vez mais vemos a preocupação de
pesquisadores em buscar explicações para a falha da educação de jovens oriundos
do nível médio, com vários fatores apontados, porém, sem soluções viáveis para
esta questão e o efetivo combate do problema.
MATERIAIS E MÉTODOS
A pesquisa aqui apresentada foi caracterizada como qualitativa, exploratória
e de levantamento (FRANCO, 2003) e utilizou questionários que foram distribuídos
a oitenta e seis alunos de cursos de licenciatura em física de quatro grandes uni-
versidades, sendo duas de Porto Alegre, uma da Região Metropolitana e uma do
interior do Estado do Rio Grande do Sul.
Através da análise qualitativa, pode-se analisar em minúcias as frases elabo-
radas pelo entrevistado, extraindo delas mensagens importantes para a pesquisa.
Assim, nosso questionário continha três perguntas dissertativas que instigavam
o aluno a lembrar-se de sua educação básica e das origens de seu interesse pela
licenciatura em física. As perguntas contidas na pesquisa foram: a) Pense na sua
história e na sua vivência escolar no ensino fundamental e médio e escreva os
motivos que o levaram a cursar licenciatura em física; b) Seus professores de física
contribuíram para a decisão de tornar-se professor? Relate acontecimentos que
ilustram a origem dessa decisão; e c) Quais são as suas principais expectativas em
relação ao curso e à carreira de professor de física, e o que você espera que ocorra
no curso e na profissão?
30
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
Quantidade
Motivos que levaram a cursar licenciatura em física de respostas
5 Bolsa de estudos 3
8 Falta de opção 3
9 Motivação do professor 4
14 Familiares 13
16 Gostar de ensinar 19
19 Gostar da ciência 74
Total 233
Fonte: dados da pesquisa.
31
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
13 Nenhum incentivo 45
Total 135
Fonte: dados da pesquisa.
32
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
Cerca de 87% das respostas sugerem que o professor teve importância crítica
na decisão profissional dos licenciandos. Apenas os itens 1, 3, 6, 7 e 9 da Tabela 3,
que juntos constituem cerca de 13% das respostas à segunda pergunta, sugerem
que, conscientemente, alguns licenciandos investigados não consideram seus pro-
fessores como tendo sido decisivos na escolha profissional que fizeram. No entan-
to, em várias destas respostas negativas, veem-se críticas contundentes à atuação
dos professores, mostrando que os licenciandos já são capazes de identificar as-
pectos das atitudes de seus professores que eles, provavelmente, tentarão evitar.
A Tabela 4 mostra as expectativas dos alunos quanto à formação acadêmica
e a atual situação da educação básica.
Tabela 4. Expectativas quanto ao curso e à carreira de física.
2 Não muito boas, o curso é difícil e exige muito dos estudantes, porém 2
não é recompensado
33
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Total 204
Fonte: dados da pesquisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entres os resultados encontrados nesta pesquisa, pode-se destacar que, em
geral, os estudantes universitários dos cursos de licenciatura em física investiga-
dos sentem-se motivados a cursar física por gostarem de ciências e pelos misté-
rios que a envolvem e que foram preponderantemente influenciados nesta deci-
são por eventos que ocorreram na escola ou em atividades relacionadas a ela e
aos professores. Esses jovens também são otimistas quanto ao futuro da profissão
que escolheram e críticos em relação aos professores que eles julgam não terem
correspondido às expectativas discentes.
REFERÊNCIAS
ATAÍDE, J. S. P.; MOTA LIMA, L.; ALVES, E. O. A repetência e o abandono escolar no curso
de licenciatura em física: um estudo de caso. XVII Seminário Nacional de Ensino de Física
– SNEF, 2006. Disponível em: <http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/xvii/sys/
resumos/T0026-1.pdf>. Acesso em: 26 nov. 2010.
34
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
_______. Ministério da Educação. Escassez de professores no ensino médio. Brasília: DF, 2007.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/escassez1.pdf>. Acesso em:
24 jun. 2008.
FILIZATTI, R. O desafio da escolha profissional. Revista PsicoUSF, Jun. 2003, vol. 8, n.1, p.
93-94.
35
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E O ENSINO
DA FÍSICA NAS ESCOLAS DO ENSINO MÉDIO
Aldoir Rigoni1
38
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
39
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
40
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
41
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
42
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
cilita respostas às clássicas perguntas: o que ensinar? Quando ensinar? Como en-
sinar? Como avaliar os resultados? Hoje, diferentemente do que acontecia há 50
anos, a política educativa considera o ensino da ciência como algo mais socializa-
do, mais ao alcance de toda a população da escola secundária, mais adequado à
diversidade de interesses e possibilidades dos alunos e, planificado, considerando
uma sociedade democrática e altamente tecnificada.
Em resumo, pode-se dizer que a didática da ciência planifica o seu ensino a
grupos ou indivíduos de estilos diferentes e pesquisa os problemas que dele deri-
vam. O seu campo específico de atuação refere-se à formação de professores. Em
determinados países europeus, como é o caso da Espanha, há grande avanço na pes-
quisa em didática específica, juntamente com o que acontece nos campos das Ciên-
cias Sociais, Psicologia, Sociologia e outras, viabilizando desta forma a descoberta e
construção de modelos próprios, eliminando marcos teóricos fragmentados.
CARACTERIZAÇÕES DA AMOSTRA
A relação formação de professores & ensino da física, apresentada no estudo
teórico, é enriquecida a partir de informações recolhidas com o uso de um ques-
tionário aplicado a 44 professores de física, com atividade em escolas do ensino
médio da Região Metropolitana de Porto Alegre. Esta representação equivale ao
percentual aproximado de 30% dos professores em atividade, formados na década
de 1990 nas duas escolas de procedência local. As variáveis que compõem o ins-
trumento procuram valorizar a prática profissional dos professores, voltada à sua
formação na universidade. Tratam da estrutura do curso, organização acadêmi-
co-administrativa, processos de ensino e aprendizagem e prática avaliativa, entre
outros. Na amostragem, 56,8% dos professores são do sexo masculino, e 43,2% do
sexo feminino, sendo que 68,2% deles têm idade entre 30 e 49 anos, o que sugere
um período razoável de inserção no Sistema Educacional.
43
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
RESULTADOS ALCANÇADOS
Uma tabela, com as médias das variáveis qualitativas, como medida de ten-
dência central (Média), o desvio padrão (DP), como medida de dispersão, e o coefi-
ciente de variação (CV ou desvio padrão/média), como medida de dispersão relativa
ao valor médio, expressa os resultados alcançados. Na aquisição das informações
adotou-se um conjunto de equivalências que representa a intensidade percebida
em relação às variáveis do questionário. Assim, na Tabela 1 temos: Nada satisfató-
rio: 1; Pouco satisfatório: 2; Regular: 3; Satisfatório: 4; e Plenamente satisfatório: 5.
Tabela 1. Valorização da prática profissional e formação recebida.
44
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O item de maior destaque é o que trata da competência didática para ensi-
nar física. Alcançou média 4,20, no intervalo de validade [1 a 5]. O elevado escore
é muito provável que esteja relacionado à experiência dos professores já alcan-
çada em atividades de ensino e, quem sabe, à falta de despojamento, ainda que
inconsciente, para opinar realisticamente. O relacionamento com os membros da
comunidade escolar e conhecimento científico da física também aparecem em
destaque, ambos com média de satisfação superior a 4,00. Em relação ao conhe-
cimento científico da física que julga possuir, vale a observação feita para o item,
competência didática. Um Professor diria que não conhece física, ou não conhece
suficientemente? Entretanto, consideramos as perguntas pertinentes, dada a im-
portância que apresentam no contexto do exercício da docência.
Com pontuação abaixo do valor central do intervalo considerado, aparece a
conduta dos estudantes (comportamento em sala de aula) e motivação ao estudo
da física. Preocupante, mas não surpreendente, pois, o comportamento atual dos
jovens, de modo especial quando em grupos, o contexto social, o nível cultural da
sociedade, de modo geral, as relações com o mercado de trabalho e outras variá-
veis do gênero não apontam para momentos de alento. Ao contrário, a violência
crescente, a falta de perspectivas profissionais e o desrespeito às pessoas parecem
não ter fim. Certamente a falta de motivação para o estudo da física tem origem
no histórico educacional do aluno, que não percebe a importância da mesma em
sua vida. Provavelmente nunca lhes foi mostrado ou dito que o desenvolvimento
de uma nação passa pelo domínio da ciência e que ela em muito pode contribuir
para a sua realização profissional. Mesmo que os professores tenham apontado
que a conduta dos estudantes não é boa, há que destacar que o seu relacionamen-
to com eles, em sala de aula foi positivamente avaliado, alcançando média 3,70.
Ver item 5 da tabela.
Houve preocupação em destacar somente os itens de maior evidência, nas
partes superiores e inferiores da tabela. As assertivas intermediárias, com médias
próximas ao valor central do intervalo, como compreensão da física, condições de
trabalho, rendimento escolar e outras, não estão sendo comentadas. Dessa forma,
entendemos que a consulta feita aos professores em atividade nas escolas acres-
centa informações de maneira fática ao texto teórico produzido, além de aproxi-
mar mais as questões ligadas à formação do professor e as questões próprias do
fazer pedagógico.
45
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
REFERÊNCIAS
BRASIL. Resolução CNE/CP 2/2002. Diário Oficial da União, 04/03/2002.
GIL PÉREZ, D.; MONTERO MESA, L.; VEZ JERENIAS, J. M. Las didácticas específicas en la
formación del profesorado. Santiago de Compostela: Tóculo Artes Gráficas, 1994.
HERNÁNDEZ, F.; SANCHO, J. M. Para enseñar no basta saber la asignatura. Barcelona: Laia,
1989.
SAGAN, C. Bilhões e Bilhões: reflexões sobre vida e morte na virada do milênio. São Paulo:
Schwarcz, 1998.
46
A CONSTITUIÇÃO DA MOTIVAÇÃO NO TRABALHO DOCENTE
1
Doutora em Psicologia da Educação pela Universidade de Barcelona. Professora da Faculdade de Educação
da PUCRS. Coordenadora do grupo de pesquisa Processos Motivacionais em Contextos Educativos.
2
Doutoranda em Educação pela PUCRS, Mestre em Educação pela PUCRS, Especialista em Educação In-
fantil, Licenciada em Educação Física, Docente convidada na Especialização em Psicopedagogia –PUCRS,
Professora da Rede Municipal de Ensino de Porto Alegre.
3
Mestre em Educação (PUCRS), Especialista em Educação Infantil (FAPA), Licenciada em Matemática
(UFRGS), Docente convidada no curso de Especialização em Psicopedagogia da PUCRS e professora na
Rede Municipal de Educação de Porto Alegre.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
O PROFISSIONAL DOCENTE
Desvelar a figura do professor perpassa além das esferas institucionais, é
preciso retomar a função social e educacional do mesmo. Ao referir-se ao desen-
volvimento profissional dos professores, elencam-se a formação inicial (acadêmi-
ca), a formação no exercício da profissão, as novas competências dos professores
do século XXI, a importância do trabalho cooperativo em equipe e a formação
numa perspectiva de aprendizagem ao longo da vida.
Esse indivíduo professor, não está distante das influências familiares e so-
ciais carregadas por toda uma vida, ele resgata, indubitavelmente, o concreto dos
espaços por ele próprio vivenciados; ser educador revela o ser humano em todas
as suas construções e ações, configurando seus saberes.
Antunes (2007, p. 38) salienta:
O educador, em qualquer instância ou representação de ensino formal,
representa um ser humano ímpar em subjetividades, inter-relações e constru-
ções de saberes. Sempre em desenvolvimento, compõe em si valores, hábitos,
concepções e ações educativas que o identificam como tal.
48
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
49
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Portal (2006, p. 116) corrobora que a nós professores cabe investir nos proces-
sos de autoconhecimento e autodesenvolvimento que implica responsabilizarmos
pelo projeto do nosso crescimento, tornando-nos sujeitos/agentes transformado-
res, criadores e diretores do nosso próprio projeto de vida.
A responsabilidade de ser professor, a diversidade de papéis sociais assumi-
dos, as precárias condições de trabalho, a dificuldade de manter relações pessoais
saudáveis em ambientes educativos, muitas vezes hostis, geram, entre outros fato-
res, mal-estar docente e desmotivação. Assim, torna-se necessário um novo olhar
sobre a figura do professor, a partir de uma análise crítica dessa realidade e que
possibilite estabelecer ações que evidenciem a construção do bem-estar docente.
A começar por um caminho de afetividade, de uma personalidade saudável.
Um outro aspecto fundamental para o bem-estar do professor refere-se à au-
torrealização pessoal e profissional. Mosquera e Stobäus (2006) sugerem a busca
pela autorrealização como possibilidade docente de personalidade saudável. Para
esses autores, “autorrealização pressupõe chegar a ser alguém ou realizar algo
que seja importante para nossa própria vida ou a dos demais” (p. 99). Para isso, a
formação docente inicial e continuada precisa ser condizente com as tantas ad-
versidades e diversidades pessoais.
Não obstante a todas essas circunstâncias sociais e pessoais, está a própria
ação docente que necessita estar ligada à construção histórica educacional, refle-
tindo-a no papel do educador, mas calcadas nas experiências desse profissional.
Sabendo-se que, nessas vivências de ensino, estão imbricados os paradigmas e as
concepções que acabam por nortear cada pessoa enquanto educador.
A SUBJETIVIDADE DOCENTE
O espaço escolar é um ambiente de representações sociais, lugar para o es-
tabelecimento de interações entre as pessoas, mas, acima de tudo, constitui-se
num marco de relações sociais e de trocas afetivas e cognitivas, com importan-
tes e decisivas transformações pessoais. Essas relações de interpessoalidades são
constituídas nas e pelas interações de indivíduos entre si, através das atividades
diversificadas compartilhadas no cotidiano.
Vygostsky (1989) afirma que cada sujeito não é apenas ativo, mas interativo,
construindo conhecimentos a partir de relações intra e interpessoais. É na troca
com os outros e na intrapessoalidade, que internalizamos informações, papéis e
funções sociais. Trata-se de um processo do nível social, via relações interpessoais
ao nível individual, das relações intrapessoais.
O início das relações interpessoais ocorre no ambiente familiar e se prolonga
ao longo da vida, desde a infância e as primeiras aprendizagens escolares. Nos di-
50
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
51
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
52
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
mundo. Segundo Polaino Lorente (2004, p. 21), “a autoestima não é outra coisa que
a estimação de si mesmo, o modo como a pessoa se ama a si mesma”.
Outra definição de autoestima também apresentada por Polaino Lorente
(2004) se refere ao termo autoconceito, sustentando que a pessoa constrói teorias
acerca de si mesmo e do mundo, as quais servirão de embasamento para situa-
ções da realidade. A construção do autoconceito parece ser uma função das expe-
riências adquiridas na solução de problemas, configurando-se num instrumento
de integração e adaptação, cuja finalidade é manter a estabilidade da autoestima.
Por isso, para a maioria das pessoas, o autoconceito desempenha um papel deter-
minante no nível de autoestima.
Assim, o autoconceito que o ser humano vai construindo ao longo de sua
vida está diretamente relacionado com a aquisição e a manutenção de uma au-
toestima positiva, sendo essa indispensável ao desenvolvimento psicológico. De
certo modo, a autoestima é tida como a avaliação afetiva do autoconceito, ou seja,
como a pessoa se avalia em relação às características que se autoatribui, diferen-
ciando-se em função do aspecto de maior ou menor nível de autoestima: uma
pessoa com uma autoestima elevada valoriza-se, sentindo-se bem consigo mes-
ma, enquanto que uma pessoa com baixa autoestima tende a pouco valorizar-se
e sente-se mal consigo mesma.
A construção de um autoconceito representa as ações sociais que se edifica-
ram em construções internalizadas de autoimagem e autoestima. Essas constru-
ções, por serem tão individualizadas, revelam as diferenças de cada ser humano.
Ou seja, as vivências sociais determinam a construção do ser humano em cada
pessoa. Com isso, a autoimagem e autoestima podem não representar o ser real, e,
sim, o que é percebido do social em cada um e por cada um individualmente.
Sob o ponto de vista educacional, a existência de um autoconceito docente
está associada à representação que o professor tem de si mesmo como aprendiz e
como ensinante, como indivíduo instituído de capacidades e habilidades disponí-
veis para enfrentar os desafios do cotidiano e da profissão. Mosquera (1987, p. 53)
releva que “a importância de autoimagem e da autoestima decorre, efetivamente,
das possibilidades qualitativas da experiência e da construção de mundos ideoló-
gicos, que dão sentido à personalidade humana, nas diferentes etapas da vida”.
A maneira como o professor percebe os acontecimentos em si mesmos e a
crença acerca de suas competências profissionais, pessoais e interpessoais permi-
tem um autoconhecimento. Se o docente possuir um bom nível de autoconheci-
mento, ele se torna capaz de identificar os seus pensamentos, atitudes, expectati-
vas e atribuições, tentando orientar o seu funcionamento no sentido de um maior
bem-estar e realização profissional.
53
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
54
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
55
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
56
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
VISÃO PROSPECTIVA
Ser professor, face a tantas exigências políticas, sociais e profissionais que
são impostas no exercício da profissão, requer uma diversidade de saberes que vão
muito além de uma formação acadêmica. O exercício da docência no panorama
educacional da atualidade requer uma gama de qualidades pessoais e interpesso-
ais que possam contribuir para uma prática de ensino personalizada, motivadora
e sucessora, que só a formação continuada pode compor e, contudo, ainda não é
efetiva, em grande parte das instituições educativas.
O enfrentamento de novas funções e de inúmeras responsabilidades, repre-
sentando uma sobrecarga de trabalho, provoca o esgotamento e, consequente-
mente, a desmotivação. Por isso, torna-se compreensível que muitos docentes
se sintam desmotivados e pouco comprometidos com o seu fazer pedagógico. A
partir de pesquisas desenvolvidas, percebem-se a necessidade e a importância
da realização de um trabalho voltado aos aspectos relacionados à subjetividade
docente/discente. Nesse sentido, ainda entende-se que o campo de investigação
precisa ser ampliado, com vistas a proporcionar formação continuada docente,
para conscientizá-los da relevância da motivação e bem-estar.
Proporcionar um trabalho de formação docente continuada, orientado
para a valorização de um conjunto de qualidades pessoais e interpessoais,
traduz um modelo relacional (JESUS, 2004). O mundo de relações constituídas
entre professores, seus pares e alunos é um aspecto de grande importância na
educação da atualidade.
Segundo Jesus (2004, p. 45):
A formação contínua enquadrada no modelo relacional deve constituir
fundamentalmente uma oportunidade para o trabalho em equipe, em clima
de autenticidade e de cooperação por parte dos professores participantes nas
ações de formação, orientado para a resolução de problemas comuns, para
além do desenvolvimento de competências profissionais relevantes para essa
resolução, de acordo com o tema e os objectivos de cada ação.
57
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Denise Dalpiaz. Relatos Significativos de Professores e Alunos e sua Autoimagem e
Autoestima. Dissertação de Mestrado do Programa de Pós-Graduação PUCRS, 2007.
58
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
HUERTAS, Juan Antonio. Motivación: Querer aprender. Buenos Aires: Aiqué, 2001.
JESUS, Saul Neves de. Bem-estar dos professores. Estratégias para realização e
desenvolvimento profissional. Porto: Porto Editora, 1998.
_______. Professor sem stress: realização e bem-estar docente. Porto Alegre: Mediação, 2007.
NÓVOA, António. O passado e o presente dos professores. In: _______. (org.). Profissão
Professor. 2. ed. Porto: Porto, 1999.
SANTOS, Bettina, Steren dos; ANTUNES, Denise, D. Vida Adulta, Processos Motivacionais e
Diversidade. Educação, ano XXX, n. 61, p. 149-164, jan./abr. 2007.
_______; ANTUNES, Denise D.; BERNARDI, Jussara. O docente e sua subjetividade nos
processos motivacionais. Educação, V. 31, n. 1, p. 46-53, jan./abr.2008.
SCHILDER, Paul. A imagem do corpo: as energias construtivas de psique. 3. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1999.
TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.
59
UM TESTE PARA VERIFICAR SE O RESPONDENTE
POSSUI CONCEPÇÕES CIENTÍFICAS SOBRE
CORRENTE ELÉTRICA EM CIRCUITOS SIMPLES
CONTRAPONDO AS CONCEPÇÕES
ALTERNATIVAS ÀS CONCEPÇÕES CIENTÍFICAS
O professor interessado não apenas em verificar se os seus alunos possuem
as concepções científicas, mas também, caso não as tenham, em ajudá-los a apren-
1
Doutor em Educação pela PUCRS, Mestre em Física pela UFRGS e Graduado em Física pela UFRGS. Atu-
almente é professor associado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tem experiência na área
de Física, com ênfase em Pesquisa em Ensino de Física, atuando principalmente nos seguintes temas:
métodos quantitativos aplicados à pesquisa, história e filosofia da ciência, tópicos em física geral. Além
de trabalhar na graduação, é docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Física
do IF-UFRGS.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
der sobre circuitos elétricos simples, poderá valer-se do teste e, depois de aplicá-lo,
realizar uma profícua discussão sobre o tema. Para tal discussão, é importante em
um primeiro momento a explicitação clara e definida das CA, articuladas em um
conjunto de enunciados.
A Tabela 1 apresenta de forma sucinta as principais ideias sobre corrente
elétrica. A tabela foi construída de maneira a contrapor lado a lado os enunciados
que descrevem as CA e os enunciados científicos. A tabela pode ser utilizada para
prever que tipo de resposta um aluno dá a uma questão do teste quando possui as
CA. Exemplificaremos a seguir com as duas primeiras questões do teste.
Se o aluno acredita que a corrente se “desgasta” ao passar por um elemento,
como, por exemplo, o filamento de um lâmpada ou um resistor, então certamente
responderá que alguma das lâmpadas dos circuitos das Figuras 1 e 2 apresentará
brilho diferente das demais lâmpadas. Entretanto, é interessante também notar
que esta ideia errada de que a corrente se “desgasta”, é “consumida”, se “dissi-
pa”, diminui de intensidade, pode explicar por que em uma associação em série
de lâmpadas diferentes (com diferentes resistências elétricas) uma lâmpada de
fato brilha de forma diferente das demais. De fato, a explicação científica para tal
evento nada tem a ver com um possível “desgaste” da corrente elétrica. Quando o
professor discutir as CA e as concepções científicas, deverá ter o cuidado de alertar
para esses casos aparentemente corroboradores das CA, demonstrando que as
concepções científicas permitem entendê-los também, e com vantagem.
Tabela 1. Concepções sobre corrente elétrica em circuitos simples.
62
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
63
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste artigo apresentamos um teste que permite investigar se um respon-
dente possui ou não possui as concepções científicas sobre corrente elétrica em
circuitos simples. Conforme argumentamos, o teste se presta também para uma
frutífera discussão conceitual, contrapondo as CA com as concepções científicas.
Os aspectos teóricos e conceituais de qualquer corpo de conhecimento em física
devem ser sempre valorizados e anteceder a discussão quantitativa, baseada em
“fórmulas” ou “equações”, sob pena de o corpo de conhecimentos não fazer senti-
do para os aprendizes.
REFERÊNCIAS
SILVEIRA, F. L.; MOREIRA, M. A.; AXT, R. Validação de um teste para verificar se o aluno
possui concepções científicas sobre corrente elétrica em circuitos simples. Ciência e
Cultura, São Paulo, 41(11): 1129−1133, nov. 1989.
ANEXO
Em todas as questões deste teste, admite-se que as lâmpadas sejam iguais.
Os brilhos das lâmpadas crescem quando a intensidade da corrente elétrica au-
menta. A bateria representada tem resistência elétrica desprezível.
1) No circuito da Figura 1 pode-se afirmar que:
64
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
a) o brilho de L1 aumenta.
b) o brilho de L1 permane-
L1 L2
ce o mesmo.
+ - c) o brilho de L1 diminui.
+ -
65
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
L2
L1 L4
L3
+ -
66
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
L2
L1 L4
+ -
11) Quando se compara o brilho de L1 nos circuitos das figuras 9 e 10, ele é:
a) maior no circuito 10. b) menor no circuito 10. c) o mesmo nos dois.
12) Quando se compara o brilho de L4 nos circuitos das figuras 9 e 10, ele é:
a) maior no circuito 10. b) menor no circuito 10. c) o mesmo nos dois.
13) No circuito da Figura 11:
L3
a) L1 e L2 têm o mesmo brilho que é menor
do que o de L3.
67
MODELOS EM AMBIENTES DE APRENDIZAGEM
DE FÍSICA: CIRCUITOS ELÉTRICOS SIMPLES
Francisco Catelli1
Valquíria Villas Boas2
Fernando Siqueira da Silva3
70
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
71
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
72
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
L1 L2 L3
rede
Figura 1. Três lâmpadas de filamento, com bulbo transparente, são ligadas em série à rede elétrica
(220 V). L1 e L2 são lâmpadas de 60 W quando ligadas em 220 V e L3, 40 W quando ligada a 220 V.
73
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Figura 2. Foto do circuito empregado. Note o brilho maior da lâmpada L3, à direita. Os
conectores permitem leituras de DDP através de um multiteste digital. A corrente elétrica pode
ser verificada nos “anéis” de fio rígido com um amperímetro de garra, o que permite uma grande
segurança de operação. As duas chaves permitem “curto circuitar” L1 e (ou) L2.
74
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
analogia pode oferecer, pois sem dúvida é mais fácil aprender algo novo a
partir do que já sabíamos.
Toda a exploração descrita a seguir foi baseada num circuito hidráulico, tal
como o esquematizado na Figura 3. As referências a este tipo de modelo analó-
gico são abundantes. Veja, por exemplo, Hewitt (2002, p. 393), Halliday, Resnick e
Walker (vol. III, p. 134), Máximo e Alvarenga (2006, p. 110, vol. III), Einstein e Infeld
(2008, p. 42) e outros. Einstein e Infeld usam, por exemplo, uma analogia hidráulica
para a conceitualização de fenômenos térmicos.
h1
h2
h3
h
bomba
Figura 3. Análogo hidráulico de um circuito em série de três lâmpadas. A tubulação está cheia
de água, e a bomba (o análogo de uma bateria, ou a rede elétrica) destina-se a elevar a água do nível
inferior até o superior, ao longo de uma altura h. O princípio da conservação de carga é exemplificado
através da constatação que a quantidade de água por unidade de tempo que passa pelos segmentos
cujas alturas são h1, h2 e h3 é a mesma; a conservação de energia é discutida a partir da igualdade
h = h1 + h2 + h3. Supõe-se que a água não enfrente nenhuma resistência ao circular pelos trechos
horizontais (de maior diâmetro) das tubulações.
Neste trabalho, os elementos aos quais foi dada uma atenção especial foram
a “conservação de água” – uma analogia para a conservação de carga – (a água que
circula em qualquer ponto do circuito, por unidade de tempo, é a mesma), e a con-
servação de energia (para uma dada quantidade de água Δm, Δm×g×h = Δm×g×h1
+ Δm×g×h2 + Δm×g×h3). Esta é a analogia para a lei das malhas.
Para não estender excessivamente este trabalho, não relataremos textual-
mente as reações dos estudantes ao uso dos modelos aqui propostos. Destaca-
mos apenas os resultados que nos pareceram mais importantes: a quantidade de
questões e, por consequência, a participação dos estudantes foram excepcionais.
As analogias fluxo de água – corrente elétrica e altura da queda – DDP foram feitas
rapidamente pela maior parte dos estudantes.
Como reproduzir o diagrama da Figura 3 com apenas duas lâmpadas ligadas
em série? Isso ocorre quando uma das chaves do painel – veja a Figura 2 – é ligada.
Como explicar o brilho proporcionalmente maior delas? Os estudantes propuse-
ram e resolveram de forma competente esses desafios.
75
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Como deve ser ligada uma lâmpada de modo que as especificações impres-
sas nela sejam válidas? Essa foi outra questão proposta e respondida satisfatoria-
mente pelos estudantes.
Tabela 1. Analogias empregadas. É importante destacar que, por exemplo,
um maior brilho da lâmpada é análogo a uma potência maior da queda de água.
Mas trata-se apenas de uma analogia, que certamente em algum momento
se mostrará limitada. (Veja também a Figura 3.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presença de concepções prévias ficou evidente; alguns modelos mentais
referidos na literatura foram confirmados. Ao longo das atividades de exploração
do modelo, detectou-se que os raciocínios envolvendo conservação de carga e con-
servação de energia passaram a predominar, a partir em especial das perguntas
feitas pelos próprios estudantes, e das soluções que eles propuseram, fundamen-
tadas em especial na exploração do modelo hidráulico. A geração de contradições
e sua discussão, (neste caso, a lâmpada com etiqueta de 40 W brilhando mais que
a lâmpada com etiqueta de 60 W) foi seguramente um elemento que propiciou a
evolução dos conceitos dos estudantes acerca dos circuitos elétricos simples.
Algumas conclusões adicionais, que não estavam dentro dos objetivos ini-
ciais do trabalho, puderam também ser colhidas. O circuito com lâmpadas é de
fato bastante propício à emergência de questões por parte dos estudantes. Isso
se deve – acreditamos – ao fato de que apenas o brilho das lâmpadas é em geral
suficiente para permitir a elaboração de hipóteses e conclusões. Paradoxalmente,
76
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
REFERÊNCIAS
ABDONOUR, O. J. Matemática e Música: O Pensamento analógico na construção de
significados. São Paulo: Escrituras, 1999.
BORGES, Jorge Luis. A história Universal da Infâmia (2 Ed.) Porto Alegre: Globo, 2001.
DE BONO, E. The Mechanism of Mind. Nova York: Simon and Shuster, 1969.
77
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
EVANS, J., Teaching electricity with batteries and bulbs, The Physics Teacher 16 (1), 15-22
(1978).
HALLIDAY, David; RESNICK, R.; WALKER, J. Física. vol. III, 4 edição. São Paulo: Ao Livro
Técnico, 1993.
MÁXIMO, Antônio; ALVARENGA, Beatriz. Curso de Física. vol. III. São Paulo: Ed. Scipione,
2006.
MCDERMOTT, Lillian C. Millikan Lecture 1990: What we teach and what is learned –
Closing the gap, American Journal of Physics, 59 (4), 301-315 (1991).
ROSNAY, Joel de. Le Macroscope. Vers une vision globale. Paris: Seuil, 1975.
SIMON, H, A.; NEWELL, A. (1956). Models: their uses and limitations. In Leonard D. White
(ed.), The State of the Social Sciences. Chicago: University of Chicago Press, p. 66-83, 1956.
VAN FRAASSEN, Bas C. A imagem científica. Tradução: Luiz Henrique de Araújo Dutra.
São Paulo. Editora UNESP: Discurso Editorial, 2007.
78
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES
DE FÍSICA: RUMOS E DESAFIOS
1
Licenciado em Física (UFRGS), Mestre e Doutor em Educação (PUCRS), Pós-Doutorado (Universidade de
Sevilha). Professor da Faculdade de Física da PUCRS.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
80
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
81
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
82
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
83
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Por trás desta questão está outro dilema sobre como tratamos e considera-
mos o “erro”. Normalmente, a polarização epistemológica mais assinalada está
entre o conhecimento científico (supostamente a explicação “correta” sobre os fe-
nômenos) e o conhecimento cotidiano (supostamente tomado como resultado de
nossa interação com o meio e resultado de uma elaboração pouco reflexiva sobre
as nossas vivências). Entretanto, García (1997) destaca que, do ponto de vista edu-
cacional, a polaridade relevante seria aquela entre uma visão simplista do conhe-
cimento e uma visão complexa do conhecimento. E essa ideia tem estreita relação
com o último dilema.
De fato, como discute este autor, certas situações do nosso dia a dia são
analisadas, muitas vezes, de forma muito mais reducionista do ponto de vista da
ciência do que pela abordagem cotidiana. Essa polaridade nos põe em frente a
enormes desafios. Por exemplo, como organizar os currículos de forma a superar
a fragmentação disciplinar que já não dá conta dos problemas que os cidadãos já
enfrentam hoje e, provavelmente, enfrentarão cada vez mais no futuro? Do ponto
de vista da formação de professores, uma questão análoga, com reflexos também
em nossas pesquisas, seria: estamos atendendo e considerando a enorme com-
plexidade da dinâmica de interação que ocorre em sala de aula, especialmente
quando esta se estrutura segundo perspectivas inovadoras do currículo (GARCÍA,
1998) e/ou da metodologia (AZCÁRATE, 1999)?
E, nesse sentido, outro desafio que se apresenta, relacionado também aos
anteriores dilemas, manifesta-se no momento de considerarmos o status (distin-
to?) que atribuímos ao conhecimento científico e às ideias dos alunos. Hashweh
(1996) mostrou, e alguns resultados nossos também confirmaram (HARRES, RO-
CHA, HENZ, 2001), que professores que têm uma concepção mais relativista sobre
as ideias dos alunos adotam estratégias de ensino com maior potencial para pro-
mover uma evolução conceitual.
Finalmente, de tudo isso pode ser derivada mais uma questão que guarda re-
lação íntima com todos os dilemas discutidos e, ao mesmo tempo, os encerra: como
integrar uma perspectiva formativa coerente com a necessidade de que os professo-
res aprendam a partir de suas próprias ideias e com a necessária ação de intervir?
REFERÊNCIAS
AZCÁRATE, P. G. Metodología de enseñanza. Cuadernos de Pedagogía, v. 276, p. 72-78, 1999.
CAÑAL, P.; LLEDÓ, A. I.; POZUELOS, F. J.; TRAVÉ, G. Investigar en la escuela: elementos
para una enseñanza alternativa. Sevilha: Díada, 1997.
84
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
_______. Hacia una teoría alternativa sobre los contenidos escolares. Sevilha: Díada, 1998.
_______; ROCHA, L. B.; HENZ, T. O que pensam os professores sobre o que pensam os alunos.
Uma pesquisa em diferentes estágios de formação no caso das concepções sobre a
forma da Terra. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, Porto Alegre,
v. 1, n. 2, p. 40-50, 2001.
_______; _______; FONSECA, M. C.; HENZ, T.; PREDEBON, F.; SEBASTIANY, A. P. (Orgs.).
Laboratórios de Ensino: inovação curricular na formação de professores de ciências.
Santo André: ESETec Editores Associados, 2005. 99 p.
_______; PIZZATO, M. C.; SEBASTIANY, A. P.; CENCI, D.; EDELWEIN, G. M.; DIEHL, I. F.;
MORS, M. F. As ideias dos alunos nas pesquisas de formação inicial de professores de
ciências. In: VIII Congreso Internacional sobre Investigación en la Didáctica de las Ciências,
2009.
_______; del POZO, R. M.; RIVERO, A.; HARRES, J. B. S.; PIZZATO, M. C. El cambio del
profesorado de ciencias I: marco teórico y formativo. Enseñanza de las ciencias, v. 28, n.1,
p. 31-46, 2010.
85
VAMOS BLOGGAR, PROFESSOR?
POSSIBILIDADES, DESAFIOS E REQUISITOS
PARA ENSINAR FÍSICA NO SÉCULO XXI
88
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
tivos são aqueles que já nasceram num mundo imerso em tecnologias digitais, e
desde sua infância convivem com aparatos diversos e associam o controle remoto,
o celular, o mouse, o Iphone ou qualquer dispositivo digital móvel a uma porta
para o grande mundo virtual. Enquanto seus professores observam estes recursos
como obstáculos a serem transpostos, como um conjunto de novas habilidades
a serem construídas. Esta lacuna entre a formação do professor e seu preparo
para usar recursos associados às tecnologias digitais vêm causando sérios pro-
blemas no cotidiano escolar. A falta de capacitação dos docentes para uso crítico
das tecnologias e não entender a necessidade de se criarem modelos pedagógicos
inovadores que incorporem estas possibilidades ofertadas pelo ciberespaço, está
criando um distanciamento entre a realidade do aluno fora da escola e a realidade
da sala de aula convencional.
O professor que atua na escola contemporânea percebe o impacto das tecno-
logias e a presença da cibercultura no cotidiano dos seus alunos. Win e Vrakking
(2009) destacam que os jovens de hoje fazem parte de uma nova geração, os Homo
Zappiens, aqueles que aprenderam desde cedo a “zapear” usando um controle
remoto ou dedilhando seus celulares. Essa geração, também denominada pelos
autores de “geração da rede”, está acostumada a interagir com seus amigos e, mui-
tas vezes, familiares, através das ferramentas de comunicação disponibilizadas na
Web 2.0 (chats, blogs, redes sociais, MSN, Twiter e outros). Eles possuem fluência
e ambiência com os elementos integrantes do ciberespaço e são sujeitos ativos
nessas comunidades virtuais das quais participam. Essa geração se diferencia das
anteriores por conseguir realizar várias tarefas ao mesmo tempo, segundo os au-
tores “são capazes de aumentar ou diminuir seu nível de atenção de acordo com
a fonte de informação, sem silenciar inteiramente outra e mantendo um nível
básico de contato com cada uma delas”. Os alunos da categoria Homo Zappiens
vivem intensamente a era digital. Quando um Zappiens está com problema ele
recorre a sua rede para buscar uma solução. Eles estão acostumados a serem pro-
ativos quando o assunto lhes interessa. A interação e a troca de informações são
fundamentais para o Zappiens.
As nossas escolas, na sua maioria, possuem professores que estão traba-
lhando na era “analógica”. Ou seja, não incorporaram na sua atividade docente
práticas que incluem o ciberespaço como meio alternativo/complementar para
trabalhar com seus alunos. Apesar dos esforços em capacitar e formar professores
para que incluam nas suas práticas as possibilidades ofertadas pelas tecnologias
digitais, estamos muito aquém do desejado. Segundo Zabalza (2001), os profes-
sores neste novo contexto, onde a escola não é mais o único lugar de busca da
informação e formação, devem transformar-se em gestores do processo de apren-
89
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
90
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
Point e outros), saber utilizar os recursos da internet, saber pesquisar com uso de
ferramentas de buscas, usar o e-mail, anexar adequadamente um arquivo, enviar
um documento para impressão, ter conhecimento de alguns atalhos do teclado,
que facilitam o manuseio, entre outros;
– Requisitos Não Funcionais: são aqueles relacionados ao aspecto de quali-
dade, que desenvolvemos por acreditar no propósito/objetivo/potencialidades da
atividade no ciberespaço. São eles: necessidade constante de mudanças e valori-
zação do trabalho docente na sala de aula; ser proativo, ter motivação para buscar
novidades e elementos novos para a complementação das aulas, ser acessível, ser
flexível, considerar as contribuições dos alunos como elementos importantes, sa-
ber trabalhar em grupo e entender a amplitude da autoria/produção coletiva.
Uma vez entendido o que são os requisitos no escopo deste capítulo, pergun-
ta-se: Quais são as implicações para o professor trabalhar em tempos de cibercul-
tura? Segundo Silva (2010), existe a necessidade de o professor entender que:
– Transitamos da mídia clássica para a mídia on-line;
– A interatividade como mudança fundamental do esquema clássico da co-
municação;
– A construção hipertextual intrínseca do ciberespaço.
A partir desses três itens vamos refletir acerca das implicações de atuar no ci-
berespaço, considerando tanto o escopo da Educação a Distância on-line, aquela que
oferta cursos e disciplinas totalmente desvinculadas da presencialidade, e utiliza de
encontros síncronos e assíncronos, como a sala de aula presencial, onde cada vez
mais os recursos do virtual são incorporados nas práticas docentes e discentes.
Ao criarmos uma sala virtual em qualquer plataforma que permita o esta-
belecimento de comunidades virtuais de apoio ao ensino e à aprendizagem, como
no caso do Moodle,2 precisamos considerar que os materiais a serem utilizados
devem estar disponíveis para download por parte dos alunos. Isso deve ocorrer
independente do seu formato (texto, áudio, vídeo, animações e outros).
O conceito inerente a essa proposta de EAD on-line é justamente o aluno
não se preocupar em trazer consigo os materiais que necessita e ter sempre a
sua disposição o ambiente da aula. Tanto no que se refere aos recursos, bem
como os espaços de interação utilizados para discussões, trocas de experiência
e até mesmo de avaliação.
Logo, cabe ao professor revisar suas fontes e buscar alternativas para dispo-
nibilizar os conteúdos em diferentes mídias e formatos. Essa geração está acos-
tumada à hipertextualidade da rede, onde as informações estão segmentadas de
forma a facilitar o acesso. Quando se afirma que os alunos não querem mais ler,
2
www.moodle.org.
91
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
permito-me discordar. Eles não desejam mais ler da forma como nós, docentes,
estamos acostumados a disponibilizar a informação. Eles vão ler 15 páginas de
conteúdo desde que elas não sejam oferecidas de forma sequencial, em um único
arquivo. Colocar a informação apenas em um meio também é complicado. Os estí-
mulos sensoriais da hipermídia fazem parte do cotidiano dos alunos internautas.
Se não buscarmos a diversidade de formatos e alternativas, a sala de aula será o
espaço mais enfadonho que eles vão frequentar. Se é que isto já não acontece!
Muitos docentes têm receio de trabalhar com salas de aula virtual, pois
acreditam que a falta do “olho no olho” proporcionada pelo encontro presencial
deixa profundas lacunas e impede o estabelecimento de um clima de coopera-
ção e cordialidade entre a turma. Evidentemente que se perde esta percepção
de conjunto, e o semblante do aluno é o que nos ajuda a entender se a aula está
funcionando ou não.
Nossa experiência com aulas virtuais desde 1997, quando o professor era um
multitarefa que necessitava ter domínio de múltiplas ferramentas que funciona-
vam de forma independente e, ao mesmo tempo, até os dias atuais, onde todos os
recursos estão integrados de forma acessível, demonstram que é possível esta-
belecer este clima fraterno e colaborativo entre o grupo, desde que o professor se
faça presente no mundo virtual. Como ele faz isto? Através do uso de ferramentas
de comunicação como o fórum, o chat, o uso de vídeos e áudios.
A interação no espaço virtual é a base de todo o processo de estabelecimento
da comunidade virtual de aprendizagem. Sem ela, o projeto não se estabelece.
Apenas colocar materiais, links, arquivos em formato pdf, vídeos e áudios sem
a devida contextualização não faz sentido e não vai funcionar bem. O elemento
agregador é o professor, através da sua monitoração e mediação.
Quem faz a diferença não é a tecnologia, mas sim o trabalho do professor.
Enfatizei há anos a seguinte mensagem: quem faz novas metodologias é o profes-
sor e não o computador. Cabe aos professores desmistificar os tabus relacionados
ao uso de tecnologias em sala de aula, buscar atualização e atender os requisitos
funcionais anteriormente mencionados. E, a partir dos seus requisitos não funcio-
nais, criar oportunidades de aprendizagem diversificadas para seus alunos.
Os alunos não esperam que os professores lhes ensinem como usar tecno-
logias. Isso eles já sabem. Eles continuam querendo aprender conteúdos que são
importantes para sua vida.
92
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
93
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
94
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
4
Blogosfera: universo dos blogs existentes na internet (CIPRIANI, 2006).
5
Blogsite : híbrido de site e blog. Geralmente são sites que possuem um blog.
6
Blooks: união das palavras blog e book. São livros criados com base nos posts de algum blog famoso. E nele
inseridos capítulos do livro como posts (CIPRIANI, 2006).
7
EduBlogs/EBlogs: blog como ferramenta de docência, aprendizagem e investigação (ORIHUELA, 2006).
8
FoodBlogs: blog que apresentam o conteúdo sobre gastronomia.
9
FotoBlogs: o conteúdo consiste em fotografias ao invés de textos (ORIHUELA, 2006).
10
MediaBlogs: o conteúdo é sobre os meios de comunicação (ORIHUELA, 2006).
11
MoBlogs: blogs mantidos pela transmissão de arquivos via telefones móveis.
12
TechBlogs: o conteúdo é sobre tecnologia.
13
VBlogs/VideoBlogs: os posts são baseados em vídeos em vez de textos (CIPRIANI, 2006).
95
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Salienta-se que o fato de esse blog ser muito acessado não garante que ele seja o
melhor. Atualmente, deve-se analisar com cuidado os primeiros links que surgem
em resposta a um pesquisa realizada na Internet, uma vez que os links patrocina-
dos estão cada vez mais comuns. Estes links pagam para aparecerem na lista dos
10 primeiros sites que a ferramenta de busca retorna. Dessa forma, o fato de um
site ou blog estar destacado não garante a qualidade pedagógica do seu conteú-
dos. Professor, aproveite e acesse este link sugerido e faça sua avaliação... já é um
bom começo e um ótimo exercício!
Agora que existe a motivação para criar um espaço virtual de apoio às suas
aulas, são oportunas as seguintes perguntas:
– Que ferramentas o professor pode utilizar para construir um Blog?
– É muito difícil construir um Blog?
Considerando os requisitos já mencionados na primeira sessão deste capítu-
lo a resposta é não. Um professor familiarizado com uso de computadores, edito-
res e Internet poderá seguir os diversos tutorias “passo a passo” disponibilizados
na rede e fazer seu blog. Esses tutoriais podem ser acessados da mesma forma que
os Blogs: basta utilizar uma ferramenta de busca e colocar “como fazer um Blog?”,
e muitas opções, inclusive em vídeo (do YOUTUBE), serão disponibilizadas.
O site https://www.blogger.com/start?hl=pt-BR, por exemplo, coloca as op-
ções de construção do blog passo a passo e permite ao usuário construir sua apli-
cação sem custo. Outros sites interessantes são:
- http://www.criarumblog.com/;
- http://www.spaceblog.com.br/;
- http://fazerblogs.com/como-fazer-blog-gratis/;
- http://www.uniblog.com.br/.
Caso essas opções ainda não o auxiliem, faça sua pesquisa, busque um vídeo
que demonstre passo a passo como o usuário (professor) poderá resolver essa
questão. Um recurso muito importante num blog são os links de referência a ou-
tros blogs. Os blogs permitem incorporar vídeo e materiais selecionados. A seguir,
disponibilizamos alguns exemplos interessantes para o professor de física:
- http://sergioflima.pro.br/blogs/index.php/blogefisica/;
- http://ensinofisicaquimica.blogspot.com/;
- http://www.euprofessor.com.br/2009/02/videos-e-animacoes-de-ensino-de-fisica/;
- http://nautilus.fis.uc.pt/wwwfi/videos.html;
- http://www.fisica.net/;
- http://objetoseducacionais2.mec.gov.br/handle/mec/120;
- http://www.youtube.com/watch?v=elwfwRpC;
- http://www.youtube.com/results?search_query=ensinando+fisica&aq=f.
96
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A formação docente tem de mudar. As crenças de como se ensina e aprende
estão sendo revistas à luz dos novos meios de se disponibilizar informação e se
construir conhecimento. A minha geração aprendeu e foi formada sem tecnolo-
gias digitais. Fomos aos poucos adquirindo conhecimento e experenciando alter-
nativas, criando novas metodologias e nos atualizando. Aqueles que, como eu,
completam mais de 30 anos de magistério, tiveram o privilégio de acompanhar a
lenta e gradual inserção tecnológica da escola. Infelizmente, a escola ainda está
longe de ser o local das grandes reflexões e experimentações relacionadas ao uso
da tecnologia como elemento articulador e apoiador da aprendizagem desta nova
geração Zappiens que frequenta a escola.
Várias são as razões para que isso ocorra, destaco duas que considero fun-
damentais: políticas públicas que demoraram a disponibilizar uma infraestrutura
adequada e plena para que a escola ofereça um ambiente tecnológico moderno
e eficaz para apoiar as práticas docentes e discentes e programas eficientes que
capacitem os professores para atuar em tempos de cibercultura.
O contexto é favorável, e as boas iniciativas para correção destes problemas
estão em curso. No entanto, estamos muito aquém de onde deveríamos estar no
que concerne ao uso de tecnologias na sala de aula. Eu acredito no professor e na
sua força. Acredito em Educação. Ela é base de toda a mudança e da construção
de uma sociedade qualificada e que valoriza o ser humano. Por incrível que possa
parecer, o uso adequado e bem conduzido das tecnologias disponibilizadas, e es-
pecialmente as associadas à internet (Web 2.0), as quais permitem a comunicação
ampla entre as pessoas, aproxima e educa. Porém, nós temos de educá-las para
isto. Sem educar de maneira crítica os jovens para o uso das tecnologias, eles vão
utilizá-las apenas como lazer, e se perderá o potencial incrível que oferecem para
sua formação e seu aprendizado. O mundo caminha a passos largos para uma
total de digitalização de serviços. Vamos aproveitar para tirar de tudo isso boas
oportunidades para reviver a escola. Uma pessoa que aprende se liberta das limi-
tações que a ignorância traz. Precisamos do professor para fazer isso.
Uma das coisas que aprendi nestes quase 40 anos na rede, é que quan-
do o professor entra na sala de aula e fecha a porta, não importa quem seja
o secretário de educação, ou qual seja o currículo. Na hora de dar aula, ele
vai acabar fazendo o que preferir. A tarefa, então, é fazer com que ele se sinta
envolvido para que faça o que gostaríamos que fizesse. No final, tudo depende
dele (ERIC NADELSTERN, in GALL; GUEDES, 2010).
97
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
sor necessita acreditar que essas mudanças são necessárias e farão diferença no
trabalho com seus alunos. Segundo, ele precisa ter garantias de que os recursos
estarão disponíveis para uso da forma como foi capacitado. E, por último, ele tem
de estar devidamente preparado para atuar na virtualidade. E sua formação não é
algo que se construa de fora para dentro.
O professor tem de observar seus alunos Zappiens e aprender com eles a
atitude investigativa, questionadora e as habilidades de construir redes sociais co-
laborativas para poder trocar informação e conhecimento com seus pares. A cons-
trução do conhecimento não é mais solitária, é solidária. Aprende-se na sala de
aula, em casa, no cybercafé, no clube, na LanHouse, no Orkut, no Twiter... aprende-
se em qualquer lugar.
Um excelente exemplo de como ensinar física nesta nova abordagem pode
ser visto em http://www.adorofisica.com.br/fisica.html. Neste site, o professor
encontra exemplos interessantes de como trabalhar os conceitos relacionados à
física e construir experimentos que auxiliem seus alunos a entender a física no
cotidiano, e a importância deste estudo. Alunos e professores podem contribuir
para enriquecer os exemplos e experimentos sugerindo atividades e enviando-as
por email. Um link no site permite que a informação seja enviada de forma au-
tomática. Além deste, o site http://www.sofisica.com.br/cotidiano.php mostra-se
um grande repositório de informações interessantes que a Internet oferta para o
professor organizar suas aulas.
Concluímos este capítulo transcrevendo o texto de motivação do site “Só fí-
sica” anteriormente indicado:
Quando se estuda física, principalmente na escola, a ideia que normal-
mente se tem é que nem tudo o que é aprendido realmente tem alguma utilidade
prática. No entanto, muito do que é visto como idealização de modelos tem gran-
de aplicação no dia a dia, desde as atividades físicas que realizamos até os equi-
pamentos sofisticados que carregamos, como os telefones celulares e relógios.
98
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
REFERÊNCIAS
ARETIO, L.G.; CORBELLA. M R; FIGAREDO, Daniel Dominguez. De la Educación a Distancia
a La Educación Virtual. Barcelona: Ariel, 2007.
BONK, C. The world is open: how Web technology is revolutionizing education. San
Francisco: Jossey-Bass, 2009.
FORTES, L. Blogs e seu uso educacional no ensino de Matemática. 2009. Dissertação (Mestrado
em Mestrado Em Ciências e Educação Matemática) - Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul. Orientador: Lucia Maria Martins Giraffa.
FRIEDMAN, T. O mundo é plano: uma breve história do século XXI. São Paulo: Objetiva,
2007.
GALL, N.; GUEDES, P. Possibilidades para o Brasil. Ed: Instituto Braudel, 2010. Acessado em
Maio de 2010 (E-book disponível em http://www.braudel.org.br/.)
99
PRÁTICAS EXPERIMENTAIS DE FÍSICA NO CONTEXTO DO
ENSINO PELA PESQUISA: UMA REFLEXÃO
102
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
103
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
104
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
105
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
106
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
não fosse essa a intenção original dos professores e teóricos da educação brasi-
leiros. Assim, por exemplo, a pedagogia crítica de Paulo Freire, cuja origem data
da mesma época, tende a não enfatizar a experimentação, da mesma forma que
as epistemologias e metodologias que dela sofreram influência, entre as quais a
educação pela pesquisa.
Por isso, coube à Moraes (2004) alertar a comunidade educacional de que a
experimentação se insere harmoniosamente nos pressupostos da educação pela
pesquisa. A experimentação que a educação pela pesquisa propõe, no entanto, é
aquela de cunho investigativo, que não se orienta para resultados definitivos ou
respostas prontas, que não pode ser confundida com demonstração e que neces-
sita de alunos ativos e empenhados no próprio desenvolvimento. Assumindo esse
perfil investigativo as atividades experimentais viabilizam o relacionamento entre
os aspectos teóricos e empíricos dos vários conteúdos, facilitando, por exemplo,
o alcance do domínio sobre a linguagem adotada pelas ciências, o que é um dos
objetivos oficiais da educação brasileira de nível médio.
107
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
108
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
109
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
110
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
Ainda assim, o grupo foi capaz de utilizar corretamente os conceitos físicos envol-
vidos, pois as situações-problema apresentadas foram interpretadas corretamente
e as estratégias de solução foram estruturadas de forma adequada. Os equívocos
se concentraram na aplicação de regras de sinais e isolamento de variáveis nas
equações que descrevem quantitativamente os fenômenos. Também ocorreram
erros de interpretação e falta de raciocínio lógico, mas em número pequeno quan-
do comparados aos erros matemáticos por deficiência de conhecimentos básicos.
Em síntese, foi possível introduzir a experimentação como atividade nuclear
em uma oficina de física centrada nos pressupostos da educação pela pesquisa,
no ensino médio. Porém, o direcionamento qualitativo, sem grupo de controle, e
a relativa brevidade da pesquisa não permitem extrapolações dos resultados, e
recomenda uma análise mais ampla das atitudes e comprometimentos dos estu-
dantes com a escola e com a disciplina de física, em prazo mais extenso. A avalia-
ção aplicada aos estudantes durante os encontros e ao término da oficina, assim
como a análise dos seus relatos e também dos relatos da bolsista e da professora,
sugere que essa orientação metodológica tende a produzir níveis mais elevados
de aprendizagem em relação aos resultados obtidos por meio de aulas tradicio-
nais. Além disso, os estudantes indicaram que gostariam de continuar com aulas
planejadas nesses moldes, e a dedicação que demonstraram na oficina sugere que
as dificuldades matemáticas poderiam ser resolvidas com relativa facilidade, na
continuidade do trabalho.
Quanto à questão norteadora da investigação que originou este artigo, a ex-
perimentação parece ser um modo eficaz de ampliar a profundidade e a abran-
gência da aprendizagem em física no contexto da educação pela pesquisa. Por
meio da investigação bibliográfica e da análise dos resultados da oficina, não foi
possível encontrar qualquer contradição ou incompatibilidade entre o uso da ex-
perimentação didática e a educação pela pesquisa. Ao contrário, a experimenta-
ção aplicada no contexto de uma educação baseada na pesquisa, especialmente
no ensino de física do nível médio, parece conduzir a benefícios consistentes em
termos de aprendizagem por motivos cujos efeitos se somam. O Quadro 1 mostra
uma síntese dos fatores que poderiam justificar essa interação construtiva.
111
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Amplia e aprofunda a
consideração dos aspectos Conduz à investigação histórica e ao
políticos do conhecimento questionamento ético da pesquisa
REFERÊNCIAS
BRASIL. (1999). PCN Ciências da natureza, matemática e suas tecnologias. Brasília: Ministério
da Educação – MEC. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/index.php?option=co
ntent&task=view&id=265&Itemid=255>. Acesso em: 28 nov. 2007.
112
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
_______. (2002). PCN+ Ciências da natureza, matemática e suas tecnologias. Brasília: Ministério
da Educação – MEC, Secretaria da Educação Média e Tecnológica – SEMTEC. Disponível
em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/CienciasNatureza.pdf>. Acesso em: 01
jul. 2010.
GALIAZZI, M. C.; MORAES, R. (2002). Educação pela pesquisa como modo, tempo e espaço de
qualificação da formação de professores de ciências. Ciência & Educação, v. 8, n. 2. Acesso em:
05 jul. 2010. Disponível em: <http://www2.fc.unesp.br/cienciaeeducacao/viewissue.
php?id=25#Artigos>.
KANBACH, B. G.; LABURU, C. E.; MOURA DA SILVA, O. H. (2005). Razões para a não
utilização de atividades práticas por professores de Física no ensino médio. In: Sociedade
Brasileira de Física, XVI Seminário Nacional de Ensino de Física – Rio de Janeiro: 2005. Anais.
Acesso em: 28 jun. 2010. Disponível em: http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/
xvi/cd/resumos/T0373-1.pdf.
LEDERMAN, L. (2001). Revolution in Science Education: Put Physics First! College Park:
American Institute of Physics. Physics Today, sept. 2001, p.11. Disponível em: <http://
scitation.aip.org/getpdf/servlet/GetPDFServlet?filetype=pdf&id=PHTOAD00005400000
9000011000001&idtype=cvips&prog=normal>. Acesso em: 16 jun. 2010.
113
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
PERRENOUD, P. (2000). Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: ARTMED.
PINA, F. (2005). Acordo MEC-USAID: ações e reações (1966-1968). In: ANPUH-USP/SP, XIX
Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão – São Paulo: 2008. Disponível em:
<http://www.anpuhsp.org.br/downloads/CD%20XIX/PDF/Autores%20e%20Artigos/
Fabiana%20Pina.pdf>. Acesso em: 14 jun. 2010.
STELLA, S. F.; CHOIT, S. Y. (2006). O não uso do laboratório de física nas escolas de
ensino médio da cidade de dourados. Revista Eletrônica de Ciências da Educação, vol.
5, n. 1. Disponível em: <http://revistas.facecla.com.br/index.php/reped/article/
viewFile/297/203>. Acesso em: 28 jun. 2010.
114
FÍSICA INTERATIVA: APROXIMANDO
A UNIVERSIDADE E A ESCOLA
116
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
117
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
118
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
119
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
120
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
121
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
O terceiro nível, o mais abstrato, foi alcançado de forma mais efetiva através
da intervenção ou mediação dos professores. Esse nível envolveu as habilidades
desenvolvidas pelos alunos, tais como: compreender, saber explicar, interpretar,
resolver situações problema e aprender. Essas puderam ser verificadas no mo-
mento em que eles expressaram as suas ideias físicas por escrito e durante a
apresentação oral. Verificou-se que as características desse nível não podem ser
avaliadas de forma separada umas das outras, por formarem um conjunto inse-
parável de grande importância, estando elas inter-relacionadas.
Analisando o questionário avaliativo respondido pelos alunos, verificou-se
um alto grau de satisfação dos mesmos em relação à atividade interativa realiza-
da. Os alunos consideraram que o Museu encanta e motiva para uma aprendiza-
gem de forma lúdica e prazerosa.
122
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A atividade transcorreu de modo harmonioso e produtivo. Vários fatores
contribuíram para o êxito desses resultados, dentre os quais, salienta-se: parti-
cipação dos mediadores, a organização e planejamento prévio de todas as ativi-
dades, o trabalho em equipe, uma atividade realizada fora do ambiente escolar e
a motivação dos alunos. Outro elemento que cooperou com o resultado foi o fato
dos alunos da educação básica desta escola já estarem acostumados a trabalhar
em grupo durante as atividades quotidianas, ou seja, já existia uma cultura de
interação na sua sala de aula, segundo informação da professora.
O saber questionar, base inicial do aprender a aprender, possibilitou aos alu-
nos da educação básica e aos licenciandos buscarem argumentos para as suas in-
dagações. Isso se justifica, pois a construção de respostas exige assumir a tomada
de decisão e auxilia a desenvolver a capacidade de argumentação própria, ou seja,
o saber pensar.
Analisar o trabalho dos alunos da educação básica, relacionando-o com os
níveis de interatividade, exigiu dos licenciandos uma tomada de decisão, o que
também contribuiu com o seu crescimento intelectual.
Igualmente, deve ser salientada a importância da interação entre professor,
licenciando e aluno, de forma construtiva e participativa, onde o aluno da educa-
ção básica e o grupo mediador foram considerados sujeitos da sua aprendizagem.
Assim sendo, testou-se a utilização da física interativa no Museu de Ciências e
Tecnologia da PUCRS, como uma extensão da sala de aula, uma maneira agradá-
vel de aprender, uma atividade motivadora, buscando auxiliar o aluno a relacionar
conceitos de física com o seu cotidiano.
Enfim, o sucesso da atividade pode ser atribuído à predisposição dos par-
ticipantes, à preparação da atividade e ao fato do MCT surpreender, conquistar,
encantar, cativar o aluno a todo o momento, mobilizando ações e reações. Esse
espaço não formal de aprendizagem tem a possibilidade de despertar no aluno a
vontade de aprender física com satisfação, favorecendo sua autonomia e desafian-
do-o a vivenciar o fabuloso mundo da ciência e da tecnologia.
123
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
REFERÊNCIAS
BERNASIUK, M.E.B.; BORCELLI, Anelise F.; AURICH, Nathassia K. Atividades interativas
e suas contribuições para o ensino de física. In: SNEF – Simpósio Nacional de Ensino de
Física, 18., 2009, Vitória. Anais eletrônicos. Vitória: SBF, 2009. Disponível em: <http://
www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/xviii/sys/resumos/T0536-1.pdf>. Acesso em:
15 set. 2010.
BORGES, Regina Maria Rabello; LIMA, Valderez Marina do Rosário; IMHOFF, Ana Lúcia.
In: BORGES, Regina Maria Rabello; MANCUSO, Ronaldo; LIMA, Valderez Marina do
Rosário (org). Museu Interativo: fonte de inspiração para a escola. 2. ed. rev. ampl. Porto
Alegre: EDIPUCRS, 2008. p. 7-19.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Parte III: Ciências da
Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília, DF: Ministério da Educação e
Cultura, 2000. 137 p.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 28. ed.
rev. ampl. São Paulo: Paz e Terra, 2003. 146 p.
HARGREAVES, A.; EARL, L.; MOORE, S.; MANNING, S. Aprendendo a mudar: o ensino para
além dos conteúdos e da padronização. Porto Alegre: ARTMED, 2002. 206 p.
MORAES, Roque. Análise de Conteúdo. Educação, Porto Alegre, v. 22, n. 37, p 7-31. 1999.
MORAN, José Manuel. A Educação que desejamos: novos desafios e como chegar lá. 4. ed.
Campinas, SP: Papirus, 2007. 174 p.
_______. Ensino e Aprendizagem, Enfoques Teóricos. São Paulo: Editora Moraes, 1985. 94 p.
124
A NECESSIDADE DE DESENVOLVER
COMPETÊNCIAS DE PENSAMENTO CIENTÍFICO
NA FORMAÇÃO DE DOCENTES DE CIÊNCIAS1
Mario Quintanilla2
Alberto Labarrere3
Olga Malvaez4
Carol Joglar5
Cristian Merino6
126
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
127
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
128
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
129
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Neste período, o ensino das ciências passa por uma modificação de foco, pois
se começa a pensar a importância da formação do docente de ciências. Enquanto
isso, Edwards (1977) destaca a importância dos programas de formação docente
baseados em competências em ciências, destacando seus pontos positivos e nega-
tivos. Nesse período, os artigos que apoiavam esses programas foram se tornando
comuns em grande parte das revistas de pesquisa especializadas no ensino das
ciências, mas existe uma série de publicações que é contrária a esse tipo de forma-
ção. As críticas se centram no ponto de que “existem somente estatísticas soltas”,
as quais não levam em conta, problemáticas como: a redução do número de inscri-
tos em carreiras docentes, em especial na área das ciências; a insatisfação pública
com a educação científica; e o crescente custo da educação pública. Para Edwards
(1997), isso era resultado das ações dos órgãos governamentais que se dirigiam ao
movimento de preparação de docentes baseados em competências. A identifica-
ção de competências científicas para o ensino de ciências levou à estruturação de
padrões mínimos para a docência, e não demorou que se relacionassem as com-
petências docentes à maior ou menor aprendizagem do estudante. Esta situação
levantou, na época, outra problemática inversa, onde se poderia supor que o mau
desempenho acadêmico dos estudantes é resultado do ensino por professores que
não possuem as competências necessárias para tanto, ou seja, o baixo rendimento
estudantil poderia ser resultado da incompetência docente.
Dentro dessa problemática, os programas baseados no desenvolvimento de
competências pareciam a única saída, já que os futuros docentes necessitariam
demonstrar habilidades específicas, isso poderia permitir que a sociedade espe-
rasse um grande nível de desenvolvimento, colocando assim grandes esperanças
nestes programas, em especial nos EUA, onde a classe média percebia na educa-
ção uma grande possibilidade de mobilidade social e econômica. No entanto, em
nossa época ainda não está claro o papel do docente, nem a natureza das ciências
que se estão ensinando (TOULMIN, 1977).
Na década de 80, Hodson (1988) destaca o desenvolvimento vigoroso do cur-
rículo, impelido pela consequente necessidade de desenvolvimento da área das
ciências. É necessário destacar que se tenta apresentar uma nova visão sobre a
natureza das ciências, desde: o ensino das ciências como um corpo de conheci-
mento estabelecido; a ciência como uma atividade humana; uma crescente ên-
fase nos processos e procedimentos da ciência. No entanto, o autor deixa claro
que nessa década, todavia, persiste a ideia de que o ensino de ciências tem como
objetivo a formação de cientistas. Também declara que, apesar dos esforços, tanto
na pesquisa, no tempo e nos recursos, os efeitos sobre as atitudes e interesses dos
130
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
131
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
132
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
133
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
REFERÊNCIAS
ABELL, S. (2000). Science Teacher Education. An International Perspective. Dordrecht:
Kluwer Academic.
_______. (2002). Naturaleza de la ciencia y formación epistemológica del profesor. Citado en:
didactica y construcción del conocimiento Disciplinar en la Escuela. Vol. 30. pp. 315-
330.RPE. Fac.de Educación PUC.
BARBER , M. Y; MOURSHED, M. (2008). Como hicieron los sistemas educativos con mejor
desempeño en el mundo para alcanzar sus objetivos. Buenos Aires: PREAL. N° 41.
BLUMENFELD, P. et al. (1998) Teaching for Understanding. In: BIDDLE, B. et al. (Eds.).
International Handbook of Teachers and Teaching, London, Kluwer, 819-878.
134
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
COBLE, C; KOBALLA, T. (1996) Science Education. En Sikula, J.; Buttery, T; Guyton, E. (ed).
Handbook of research on Teacher Education.
DRIVER, R.; LEACH, J.; MILLAR, R.; SCOTT, P. (1996). Young people’s image of science.
Buckingham, UK: Open University.
EDWARDS, C. (1977) Problems and promise of competency based science teacher preparation.
Science Education, 61(4) 519-525.
GALLEGO, R.; PÉREZ, R.; TORRES DE GALLEGO, L. (2004). Formación Inicial de Profesores de
Ciencias en Colombia: Un estudio a partir de Programas Acreditados. Ciência & Educação,
v. 10, n. 2, p. 219-234.
GIERE, R. (1999) Un nuevo marco para enseñar el razonamiento científico. Enseñanza de las
Ciencias, núm. Extra, junio, 1999, pp. 63-69.
135
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
_______. (2003). Time for action: Science education for an alternative future. International
Journal of Science Education, 25(6), 645-670.
KUHN, D. (1991). The Skills of Argument, Cambridge University Press, New York.
_______. (1993). Science as argument: Implications for teaching and learning scientific
thinking. Sci. Educ. 77(3): 319–337.
_______. (1999). A developmental model of critical thinking. Educ. Res. 28: 16–25.
LAVONEN, J.; KRZYWACKI-VAINIO, H.; AKELA, M.; KROKFORS, L.; OIKKONEN, J.;
SAARIKKO, H. (2007). Pre-service teacher education in chemistry, mathematics and physics. In
Pehkonen, Ahtee, Lavonen (Eds). How Finns Learn Mathematics and Science. (pp. 49-
67). Finland: Sense Publishers.
MARTINEZ, M.; RUÉ, J (2004). Les competéncies en la revisió dels Plans d’estudis de la UAB en
funció dels parémetres dels ECTS, ICE, UAB. 2004, Barcelona.
136
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
MATTHEWS, M. (1994). Science teaching: The role of history and philosophy of science.
Nueva York: Routledge.
MAUDSLEY, G.; STRIVENS J. (2000). 'Science', 'critical thinking' and 'competence' for
tomorrow's doctors. A review of terms and concepts. Med Educ. 34(1):53-60.
MCCOMAS, W. (ed.) (1998). The nature of science in science education. Rationales and
strategies. Dordrecht: Kluwer.
NORRIS, S (1984). Defining observational the competence. Science Education, 68 (2), 129-
142.
OKEY, J.; CAPIE, W. (1980). Assessing the competence of science teacher. Science Education,
64 (3) 279-287.
OLIVERA MARQUES, C.; CAMACHO, J.; ZUÑIGA, O. (2008). Formación de Profesores Química
en Latinoamérica. Un estudio desde algunos casos en Brasil, Colombia y Chile. Congreso
Iberoamericano de Química. XXIV Congreso Peruano de Química, Cusco, Perú.
FONDECYT 1070795.
PEHKONEN, AHTEE, LAVONEN (2007). How Finns Learn Mathematics and Science. Finland:
Sense Publishers.
_______; JOGLAR, C.; MERINO, C.; CUELLAR, L. (2010b) Scientific Thinking Competencies:
What do In-service Chemistry Teachers Think? (in press) FONDECYT 1095149.
_______; URRA, S.; MONZÓN, M.; JOGLAR, C.; JARA, R.; CUELLAR, L.; CAMACHO, J. (2009a)
La comunicación científica en el aula de secundaria. Argumentar y explicar ¿qué es el Enlace
137
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
químico. Enseñanza de las Ciencias Vol. 1 ISI. FONDECYT 1095149. Disponível em:
<http://ice.uab.cat/congresos2009/eprints/cd_congres/propostes_htm/propostes/art-
1477- 1480.pdf>.
_______; LABARCA, M.; ARISTIZABAL, A. (2009b) La noción de orbital atómico desde la física
y la química. Una comparación entre libros de texto de Chile y Colombia a partir de la historia y
filosofía de la ciencia. Tecné, Episteme y Didaxis. Número Especial, 815-825. Publicaciones
de la UPNB, Colombia. FONDECYT 1095149.
_______. (2006) Science, citoyenneté et valeurs – socle d’une approche réaliste et pragmatique
de l’enseignement des sciences: mise en perspective historique. Editados por UNESCO en el
International Science, Technology & Environmental Education Newsletter VOL. XXXI,
No. 3-4, 2006.
REIF, F.; SCOTT, L. A. (1999). Teaching scientific thinking skills: Students and computers
coaching each other. American Journal of Physics, 67 (9) pp. 819, 13.
SANMARTÍ, N. (2003). Aprendre ciències tot aprenent a escriure ciència. Barcelona: Edicions
62. (Coord.)
138
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
_______. (2001). Enseñar a enseñar ciencias en secundaria: Un reto muy complejo. Revista
Interuniversitaria de Formación del Profesorado, 40, 31-48.
SCHON, D. (1998) El profesional reflexivo. Cómo piensan los profesionales cuando actúan.
Barcelona, Paidós.
TAYLOR, P.; WILDING, D. (2009). Rethinking the values of the higher education-the
students as collaborator and producer? Undergruate research as a case study. Quality
Assurance Agency for Higher Education: <http://www.qaa.ac.uk/
students/studentEngagement/Undergraduate.pdf>.
139
O APRENDER NO ENSINO DE CIÊNCIAS
1
Doutora em Educação pela PUCRS, Especialista em Currículo por Atividades (UNISC/RS) e Gestão Univer-
sitária (UNIVATES/RS), Professora Adjunta no Centro Universitário UNIVATES – Lajeado, RS, Coordenadora
do Mestrado Profissional em Ensino de Ciências Exatas e do Curso de Especialização em Metodologia do
Ensino Superior da UNIVATES.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
142
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
143
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
144
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
145
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
146
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
147
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
148
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
REFERÊNCIAS
AUSUBEL, D. P. Educational psychology: a cognitive view. Nova York: Holt, Rinehart and
Winston, 1968.
CHECKLAND, P. Systems thinking, systems practice. New York: John Wiley&Sons, 1981.
DELORS, J. et al. Educação. Um tesouro a descobrir. 2.ed. UNESCO: Edições ASA, 1996.
_______. Os sete saberes necessários à Educação do Futuro. 5.ed. São Paulo: Cortez; Brasília,
DF: UNESCO, 2002.
149
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
NÉRICI, I. G. Introdução à Didática Geral. 12.ed. Rio de Janeiro: Ed. Científica, 1970.
_______. Seis estudos de psicologia. 24.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
SAWREY, J. M.; TELFORD, Charles W. Psicologia Educacional. Rio de Janeiro: Livros Técnicos
e Científicos, 1976.
ZABALA, A. A prática Educativa. Como ensinar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
150
O QUE “ENSINAR” EM UM CURSO DE FÍSICA?
Moacyr Marranghello1
1
Graduado em Física pela PUCRS, Mestre em Engenharia pela ULBRA, Professor de Física da ULBRA desde
1989.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Você poderia argumentar: “Como assim mantiveram seus valores? Foi exata-
mente o que modificaram em suas vidas”. Vou tentar argumentar. Independente-
mente de eles terem trocado “dinheiro” por “capim”, os valores intrínsecos dessas
pessoas sempre foram o respeito por si mesmos. Enquanto eles mantinham apa-
rências, havia um conflito interno que os corroia. Há alguns que nunca se deixam
ser levados por esses sentimentos, passam a vida toda trancando essas sensações
e acostumam-se com isso. Outros dizem que isso é natural: “a vida é uma coisa e
nossos sentimentos são outra e, por mais que queiramos, eles nunca se encontra-
rão”. Será? Teria sentido uma vida sem valores verdadeiros? Digo isso, pois não me
espanta que essas pessoas sejam academicamente esclarecidas.
A meu ver, a proposta é justamente colocar “pulgas” onde elas não existiam.
Parto do princípio que todos, independentemente de credos, cores ou gostos pes-
soais, são capazes de nortear suas vidas (aqui vai um breve comentário: a cultura
europeia é tão dominante em nosso meio que, nortear passou a ser sinônimo de
dar rumo, porque não inventamos o verbo “sulear” – mais um devaneio). Apesar
de toda essa introdução, não é meu “métier”, e consequentemente, não é minha
intenção escrever um tratado filosófico e/ou psicológico sobre os seres humanos.
Kant, Schopenhauer, Nietzsche, e tantos outros nos ajudaram com isso. Pretendo
utilizar algumas dessas considerações em minhas explanações a respeito do ato
de escolher uma profissão e, no caso específico, ministrar aulas de física.
Desculpem-me, mas vou voltar para Gramado. Onde eu estava mesmo? Ah!
Sim. Sacada, gafanhoto, verde, neblina, Sol. Bem, àquele gafanhoto que eu via na-
quele momento nunca lhe foi oferecido oportunidade de escolha. Vocês devem es-
tar pensando, mas que imbecil, é óbvio que a ser algum é dado essa possibilidade.
Nem mesmo aos humanos lhes é perguntado se querem nascer, ou qual o sexo
gostariam de ter, porque esse espermatozoide, e não o seguinte? (Isso me lembra
um ditado popular que diz: “se um dia te sentires inútil ou deprimido, lembra-te
que já houve um dia em que foste o espermatozoide mais rápido do grupo!” So-
mente ao homem é dado o livre-arbítrio e, mesmo assim, apenas com o tempo e
em algumas situações. Ao gafanhoto, a natureza impõe apenas necessidades, não
lhe é dada a oportunidade de optar entre carnívoro ou vegetariano, apaixonar-se
por uma linda “grilinha” ou experimentar mergulhar em mares profundos. Já nós,
depois que crescemos e passamos a decidir os nortes para a nossa própria vida e,
quem sabe até, de pessoas dependentes de nós, nos deparamos com uma infini-
dade de possibilidades. Se tivermos de ponderar todas, não sobraria tempo para
optarmos por alguma. Aprendemos, desde muito cedo, que uma das mais impor-
tantes decisões de nossa vida será nossa profissão.
Lembro-me do dia em que cheguei em casa e avisei aos meus pais que o que
152
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
eu queria mesmo era ser professor. Puxa! Que decepção! Meu pai tinha apostado
várias fichas no “filhinho” que se tornaria um bem-sucedido médico, como ele.
Quem sabe até seguiria a mesma especialidade. Nada disso. O “querido” iria dar
aulas. Observe que eu, propositadamente, escrevi “dar” aulas. Pois é. No Brasil é
exatamente o que se faz. No máximo, se “vende barato” em vez de “dar”. Meu pai,
com toda a calma que possuiu, sentou e disse: “se, apesar de saberes de todas as
dificuldades econômicas que vais passar pelo resto da vida, queres isso para ti e
para os teus, vai em frente”. Lembro também que, na época em que fiz esse comu-
nicado, existia um adesivo, diga-se de passagem, de mau gosto, que algumas pes-
soas colocavam em seus veículos com os seguintes dizeres: “Vou vencer na vida,
mesmo sendo professor”. Nunca me arrependi dessa escolha. Posso ter me arre-
pendido de tantas outras, mas dessa não (se bem que não foram tantas assim).
Olhando meus 30 anos de magistério, fiz amizades, cresci, tanto intelectual como
psicologicamente, procurei exercer minha paciência da melhor maneira possível
e, principalmente, aprendi muito com todos, colegas de profissão e alunos.
Depois de lecionar física para o ensino médio, durante 10 anos, em insti-
tuições públicas e privadas de Porto Alegre, fui convidado para lecionar em uma
Instituição de Ensino Superior. Era um novo desafio que se impunha em minha
vida. No início, eram estudantes de engenharia e de outros cursos, principalmente
lecionar física para cursos da área da saúde (fonoaudiologia, radiologia, optome-
tria, educação física e outros). De certa forma, confortava-me trabalhar com esses
cursos, pois parecia que eu estava realizando um pouquinho o sonho do meu pai.
Com o passar do tempo e com o crescimento da Universidade, houve a necessi-
dade de implementar novos cursos. Como o único curso de licenciatura que não
existia nesta instituição era o de física, resolvemos propor a sua criação. No ano de
2002, houve a primeira entrada de alunos que queriam graduar-se em física.
Pensem comigo: “como é que a gente pode ensinar alguém a ensinar os ou-
tros?” Acho que este era o maior dos desafios que tínhamos. Não bastava ensinar
física, era preciso que os acadêmicos aprendessem a ensinar. Segundo Meirieu [1], o
aprender consiste em compreender e se apropriar de uma parcela do mundo exte-
rior e construir um novo sistema de representações, cada vez mais aprimoradas, e
que permitam certas ações sobre esse mundo. O próprio Meirieu [2] fala sobre o ato
de ensinar, concordando com Freire [3], quando aponta que ensinar não é transmitir
conhecimentos, mas criar as possibilidades para a produção do saber. O engraçado é
que se olharmos em dicionários da língua portuguesa [4], o verbete ensinar tem al-
guns sinônimos, como: habituar a fazer alguma coisa; adestrar, doutrinar, castigar,
escarmentar. Ao mesmo tempo, o verbete aprender é definido como: “ficar sabendo”,
“reter na memória”, “tomar conhecimento de”. Complicado isso não?
153
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
154
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
se tenho a intenção de lê-lo), nada contra Roberto Freire [6], o autor, ou contra os
livros de autoajuda, mas ele foi tão feliz no título, que não sinto necessidade de ler
o que está escrito dentro do mesmo: “Sem tesão não há solução”.
Acredito e tento viver dessa forma. Tudo o que fazemos deve ser feito com
muito tesão, pois senão, não valerá a pena. Atire-se de corpo e alma em todos os
projetos que aparecerem na sua frente, pois só assim eles darão certo. Espere, isso
está parecendo papo de livro de autoajuda. Como assim, diz que não gosta desse
tipo de livro e vem pregar as mesmas coisas? Bem, não sou daqueles que acham
que se a “coisa” for feita com vontade dará certo por esse único motivo. Não, é pos-
sível, sim, que as coisas feitas com muita excitação também possam dar errado.
Não estou dizendo que uma coisa depende da outra, isto é, o sucesso é dependente
da vontade ou o insucesso da falta de vontade. Creio, sim, que a probabilidade de
ter sucesso quando há muita vontade canalizada para aquilo é bem maior.
Sempre digo para os meus alunos, assim como para os meus filhos, que as
atitudes de uma pessoa ensinam muito mais do que as palavras. Portanto, moti-
vem-se para dar uma boa aula. É mais importante que os alunos sintam que vocês
estão gostando da aula de vocês do que entendam o que vocês estão dizendo. Já fiz
várias vezes o seguinte comentário em sala de aula: “não sei se vocês estão enten-
dendo uma só palavra do que eu estou falando, mas eu estou adorando dar essa
aula pra vocês”. Concordo, em parte, quando os pedagogos dizem que o conteúdo
é supérfluo. Concordo, pois também acho que o conteúdo pode ser aprendido em
outras circunstâncias que não uma sala de aula. Discordo, pois sem conteúdo nos-
sas discussões não tem sentido, isto é, ninguém consegue teorizar qualquer coisa
sem conteúdo. Mesmo quando se fala sobre o vazio é necessário muito conteúdo.
Outra coisa que costumo afirmar para meus alunos, independentemente de
serem do ensino médio ou de cursos de graduação é: “leiam tudo que vocês pude-
rem, mesmo que não gostem, até para poderem dizer – não gostei”. Isso significa
que tu estás adquirindo conteúdo para poder discutir. Então, afinal de contas, o
que é mais importante “ensinar” para um aluno de graduação em física do que
como e o quê ele deve “ensinar” para um aluno de ensino médio? Na minha hu-
milde opinião, em primeiríssimo lugar: “tenham tesão pela profissão que vocês es-
colheram, pela vida, pelas pessoas…, sejam criativos, inventem, brinquem muito
com essa profissão e com seus alunos, não levem a vida e a sala de aula a ferro
e fogo (como diria minha filha: pensem que a vida é um morango), sejam leves,
flutuem, sejam competentes e cativem os outros”.
Bem, tentando ser um pouco mais prático, além do “tesão”, o que se deve “en-
sinar” (melhor seria dizer “trabalhar”) para acadêmicos de um curso de graduação
em física, para que eles possam “ensinar” para seus alunos do ensino médio? Se
155
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
me fizessem essa pergunta sem que eu tivesse tempo para pensar, com certeza a
resposta seria: “não faço a menor ideia”, ou então: “tudo”. Mas, tendo um pouco
mais de tempo para ponderar coisas a respeito do assunto, creio que teria outras
opções. Segundo Postman [7], o conhecimento humano é limitado e construído
através da superação do erro. O método científico, por exemplo, é a correção sis-
temática do erro. Basta dar uma olhada na história da ciência: “sabemos coisas,
mas muito do que sabemos está errado, e o que o substituirá poderá também es-
tar errado. Mesmo aquilo que é certo e parece não necessitar correção é limitado
em escopo e aplicabilidade”. Costumo brincar com meus alunos dizendo que o
conhecimento é construído em cima dos erros cometidos. Por exemplo, quando
a menina é pequeninha e chega perto do fogão, a mãe ralha com ela para evitar
acidentes, porém, depois que ela cresce, a mãe manda-a para o fogão para fazer a
comida (brincadeirinha machista, que explicita a visão da nossa sociedade – tam-
bém faço este comentário com eles).
Outro exemplo que costumo utilizar com alunos que estão iniciando o cur-
so de graduação em física é o conceito de massa. Lembro que quando eles eram
crianças não tinha a menor importância a confusão existente entre os conceitos
de massa e de peso. Posteriormente, eles aprendem um conceito mais químico
que afirma que massa “é a quantidade de matéria de um objeto”. Mais adiante, no
ensino médio, massa passa a ser definida como “a medida quantitativa da inércia
de um corpo”. Mais ou menos no meio do curso de física, massa será relacionada
à energia e ao momento, como “um ente físico que corresponde ao inverso da de-
rivada segunda da energia em relação ao momento”. Finalmente, se vocês chega-
rem ao final do curso de licenciatura em física tendo absoluta certeza de que “não
sabem qual a definição para a grandeza massa”, podem considerar-se formados
em física. Em outras palavras, o erro faz com que aperfeiçoemos nossos conceitos
e aprimoremos a forma como trabalhamos.
Então, que tal começarmos um curso de graduação discutindo os erros. Não
a matemática deles, não os conceitos, mas: Qual a necessidade de cometermos
esses erros? Quando eles devem ocorrer? Qual a utilidade desses erros quando
estamos lidando com os alunos? Foi essa a nossa proposta de trabalho para uma
introdução ao ensino de física. Dentro de um laboratório, fazendo experiências
muito simples, sem nenhum material sofisticado, inicialmente fazendo com que
os alunos cometam erros absurdos e sem fazer qualquer comentário sobre esses
erros. Somente na terceira ou quarta semana de aula, paramos para uma conver-
sa, que deverá nortear nosso curso ao longo dos semestres seguintes: qual a im-
portância do erro na nossa vida? Em 2005, quando da comemoração do Ano Inter-
nacional da Física, o Professor Dr. Bernard Marie Maréchal [8], do Departamento
156
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
A partir dessa discussão, analisando o erro como uma coisa normal da vida,
mesmo nos mais precisos instrumentos de medida que o homem já conseguiu
inventar, como, por exemplo, o relógio atômico com um único átomo de alumínio,
que é atualmente o relógio mais preciso do mundo (segundo o Physical Review
Letters [9], publicado em 25 de junho de 2010, este relógio vai atrasar 1 s a cada
3.700.000.000 de anos). Com isso, tento mostrar que, por mais preciso que tenta-
mos ser, mesmo assim, continuaremos cometendo erros. Dessa forma, passa a
ser mais importante tentarmos minimizar os erros, discutindo-os, analisando-os,
refazendo-os, do que o próprio acerto, se é que este existe!
Outra coisa que li, em um artigo de Ostermann et alli [10], é que a maioria das
produções nacionais recentes (2000 a 2007) sobre ensino de física, concentram-se
na temática ensino-aprendizagem, com o claro intuito de subsidiar professores do
ensino médio para a melhoria do desempenho de seus alunos. Melhorar as “no-
tas” dos alunos. Segundo o mesmo artigo, essas pesquisas mais instrumentalistas
e tecnicistas do processo educativo, não observam a complexidade dos diversos
aspectos que envolvem a educação. Como se o resultado da educação de uma
pessoa estivesse restrita apenas a expressão de um conceito. Em consonância com
uma sociedade onde a supremacia das tecnologias supera a beleza do conheci-
mento científico. Esta visão reforça o que Gérard Fourez [11] comenta ao afirmar
que: “a ideologia dominante dos professores é que as tecnologias são aplicações
das ciências. Quando as tecnologias são assim apresentadas, é como se uma vez
compreendidas as ciências, as tecnologias se seguissem automaticamente”.
Acredito fortemente que é preciso mostrar para acadêmicos graduandos
de cursos de licenciatura em física que há necessidade de encantar os alunos
do ensino médio com a física. Se continuarmos reproduzindo o que a sociedade
tecnicista e imediatista nos impõe, continuaremos a enfrentar resistências pelos
próprios alunos do ensino médio, sobretudo quanto à utilização excessiva de cál-
culos. É preciso agregar poesia, arte, história e tudo o que for possível e necessário,
com a intenção de mostrar que o mundo não é compartimentalizado, mas sim
157
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
inter-relacionado, como numa teia, onde um deve auxiliar o outro. Para mim, o
fim da educação em física deve ser a busca pela beleza. Pode ser que esteja sendo
muito romântico, com uma visão muito sonhadora, mas por que não? Vivemos em
uma sociedade onde os cargos são perfeitamente substituíveis, mas por que não
podemos mostrar para nossos alunos que as pessoas são insubstituíveis? Afinal
de contas, Sartre [12] dizia que a vida é uma eterna esperança. Já imaginaram
começar uma aula de eletricidade dizendo a um(a) aluno(a) “eu pensei que você
fosse uma manhã de natal”?
Quero terminar lembrando que Einstein disse certa vez que “a imaginação é
mais importante que o conhecimento”, e dizendo que não faço a menor ideia se
você leitor vai gostar ou não, concordar ou não, com o que está escrito aqui, mas,
primeiro, sugiro que você o leia até o final, mesmo que seja para dizer que não
gostou, e segundo, eu me diverti bastante ao escrever.
REFERÊNCIAS
[1] MEIRIEU, Philippe. Aprender... Sim, Mas Como?, Porto Alegre – RS: Artmed, 1998.
[2] MEIRIEU, Philippe. Carta a um jovem professor. Porto Alegre – RS: Artmed, 2006, 96 p.
[3] FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. 35ª ed. São Paulo – SP: Paz e Terra, 2008, 152 p.
[5] VERISSIMO, Erico. Solo de Clarineta. Vol. I. São Paulo – SP: Companhia das Letras,
2005, 344 p.
[6] FREIRE, Roberto. Sem tesão não há solução. Artur Nogueira – SP: Paradigma, 2004, 164 p.
[7] POSTMAN, Neil. The end of education: redefining the value of school. New York: Vintage
Books/Random House, 1996, 208 p.
[12] SARTRE, Jean Paul. A idade da razão. 4ª ed. Bonsucesso – RJ: Nova Fronteira,
2005, 342 p.
158
METODOLOGIAS E TEORIAS DE APRENDIZAGEM NO
COTIDIANO ESCOLAR DO ENSINO DE FÍSICA
Por que muitos alunos não gostam da disciplina de física? Por que a física é
considerada difícil e tem alto índice de reprovação e rejeição? Por que a procura
por cursos universitários de física é tão baixa? Em palavras simples e objetivas,
baseadas em nossa experiência no magistério público e particular, a imagem que
nossos alunos têm da disciplina de física no ensino médio inspira medo e despre-
zo. Muitos são os fatores que produzem este fenômeno, e aqui vamos explorar dois
deles: o primeiro são as metodologias ultrapassadas ainda aplicadas por alguns
professores, e o segundo é a falta de identidade ou o desconhecimento dos docen-
tes sobre uma teoria de aprendizagem que fundamente sua ação pedagógica.
Muitos colegas professores ainda aplicam uma metodologia ineficiente, e se
posicionam na sala de aula como se fossem proprietários do saber, aqueles que
transmitem conhecimentos, enquanto o aluno se mantém meramente passivo,
memorizando e reproduzindo o que recebeu, em uma pedagogia que caracterizou
a escola do passado e que já não surte efeito no século XXI. Essa pedagogia fun-
cionou bem apenas enquanto uma ínfima parcela da população tinha acesso aos
estudos de nível médio, que àquela época representava já uma garantia de bom
posicionamento social e econômico.
Ora, a aprendizagem é um processo de relacionamento com o conhecimento
que implica transformação e que ocorre devido a uma experiência de reajuste
entre o saber novo e o saber anterior, pelo menos na perspectiva ausubeliana.
Isso acontece constantemente, em função das vivências de cada pessoa, e todos
os seres humanos, ao aprenderem, modificam-se. Como a física está envolvida na
1
Professora de Física em escolas públicas e privadas de Porto Alegre, Licenciada em Física pela ULBRA,
Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela FACINTER, Mestranda em Educação em Ciên-
cias e Matemática pela PUCRS.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
160
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
161
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
162
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
163
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
164
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
fora da escola e orientação para que os alunos sejam capazes de documentar seu
trabalho e, assim, compreender seu processo de aprendizagem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teoria da afetividade, a teoria da aprendizagem significativa e a teoria das
inteligências múltiplas mostram uma concepção de aprendizagem em que o aluno
é o centro do processo de ensino-aprendizagem e construtor do seu conhecimento
e desenvolvimento global. O professor assume um papel importante de mediador
no desenvolvimento desses aspectos, em situações contextualizadas nas quais a
teoria é tomada junto à prática, realizando uma aprendizagem significativa.
Cada teoria de aprendizagem tem seus pontos positivos e negativos e são
mais ou menos adequados à época na qual foram propostas e mais ou menos apli-
cáveis em sala de aula. Mas todas elas podem contribuir para que nossas aulas de
física sejam diferenciadas e para que possamos observar os alunos como um todo,
como afirma a teoria cognitiva social e para que o erro possa ser percebido como
resultado de percepção do aluno, não mais nem menos que isso, como propõe o
método construtivista. Compreendê-las e aplicá-las pode ajudar-nos a fazer com
que nossas aulas sejam mais dinâmicas, que os alunos possam ser estimulados
por meio de perguntas que gerem estudos e pesquisas, como no método da apren-
dizagem por descoberta e não apenas por aulas de quadro e livros. Elas podem au-
xiliar-nos a atribuir significado à realidade por meio de nossos conteúdos, fazendo
com que o conhecimento construído em nossas aulas possa ser relacionado ao
cotidiano, como orienta a teoria da aprendizagem significativa, mas principalmen-
te elas podem ajudar-nos a criar laços de afeto com nossos alunos, como prega a
teoria da afetividade.
Mas o que se espera do professor de ensino médio de física é, mais do que
tudo, força de vontade para criar aulas dinâmicas e significativas, e resistência ao
atribuir somente ao aluno a culpa da não aprendizagem. Se os professores conhe-
cessem e aplicassem os métodos e pressupostos de uma das teorias de aprendi-
zagem, qualquer que seja ela, certamente o sucesso no ensino desta ciência seria
maior. A física está aí para ser aprendida, amada, e não para ser odiada e pensada
como algo distante do cotidiano.
Sabemos que o reflexo dos professores que tivemos ainda está impregnado
em nossas almas, como diz Rubens Alves (2000, p. 45): “Ensinar é um exercício de
imortalidade, de alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos apren-
deram a ver o mundo pela magia da nossa palavra e, o professor assim, não morre
jamais”. É importante refletir sobre o ensino que tivemos e o ensino que queremos
ter. Temos que ser felizes em nossas aulas, pois os alunos nos pedem isso.
165
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Escutamos o relato de muitos estudantes dizendo que não gostam das aulas
de física e de seus professores. Nesses relatos, muitos alunos alegam que os pro-
fessores não têm paciência, não explicam direito, oferecem aulas sempre iguais,
irritam-se com facilidade, os ameaçam com provas e reprovação, os expõem ao ri-
dículo, não têm domínio de turma, fazem comparações entre as turmas, faltam às
aulas, trocam de conteúdos sem que a maioria tenha aprendido a matéria, não sa-
bem os nomes dos alunos e ensinam uma física que lhes parece matemática. Pes-
quisas sérias que vão até os alunos, recolhem invariavelmente essas reclamações,
o que sugere que temos que mudar esta visão, e podemos iniciar com uma reflexão
de nossas próprias aulas, de como os alunos as percebem e nos percebem. O mais
admirável é que temos a capacidade de reconhecer a verdade por detrás destas
críticas e realizar a mudança necessária, pois, conforme Vasconcellos (1998, p. 24),
“Ser agente de transformação, implica, com efeito, a capacidade de criar condições
para a mudança da realidade... é justamente aí que o professor tem possibilidade
de recuperar sua dignidade e assumir seu papel transformador”.
E, por fim, não podemos deixar de reforçar a importância dos laços afetivos.
Temos que estabelecer laços emocionais com nossos alunos para que ocorra em-
patia recíproca, para que o respeito entre ambos sempre prevaleça, e nossas aulas
possam ser mais prazerosas, dinâmicas e de real significado para a construção
efetiva do conhecimento. É um desafio diário para todos nós, que queremos plan-
tar sonhos com nossa prática pedagógica.
REFERÊNCIAS
ALVES, Rubem. A alegria de ensinar. São Paulo: Papirus, 2000.
166
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
167
DESPERTAR PARA CIÊNCIAS: A IMPORTÂNCIA
DA ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA NAS SÉRIES
INICIAIS E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR
1
Doutora em Didática das Disciplinas Científicas, opção Física, (Universidade de Paris VII, 1993), Mestra em
Engenharia de Minas, Metalúrgica e de Materiais (UFGRS, 1978) e Graduada em Licenciatura em Física (UFR-
GS, 1974). Atualmente, é Professora Titular da PUCRS, responsável pelo GPDC, desenvolvendo trabalhos na
área de Educação em Ciências, com ênfase no ensino-aprendizagem e na formação de professores.
2
Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, da Pontifícia Univer-
sidade Católica do Rio Grande do Sul, em 2009, possui Licenciatura Plena em Ciências Biológicas pela
mesma instituição, em 2006, e desenvolve trabalhos principalmente na área da Educação Científica e
Tecnológica e de Formação de Professores de Ciências. Atualmente, participa do Grupo de Pesquisa em
Didática das Ciências – GPDC, na Faculdade de Física (FAFIS) da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul.
3
Graduada em Física pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, participa do Grupo de
Pesquisa em Didática das Ciências, enfocando a Informática Educativa para séries inicias e Atividades
Experimentais em Física.
4
Graduanda em Psicologia (PUCRS), Pedagoga Multimeios e Informática Educativa (PUCRS), Mestre em
Educação em Ciências e Matemática (PUCRS), Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Didática das Ciên-
cias – GPDC.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
170
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
Dimensão do Sujeito
Desenvolvimento
psicocognitivo em nível
conceitual, atitudinal
e metodológico
Dimensão Institucional
Comprometimento da Dimensão Docente
universidade, integração Despertar o intesse Transposição didática,
escola/universidade, pelas Ciências. atividades interdisciplinares,
formação inicial e Despertar o aluno consideração do sujeito,
continuada, formação para a possibilidade contextualização, inclusão
pela pesquisa, ações de ser professor de da experimentação e da
interdisciplinares integrando Ciências/Física. Informática Educativa no
professores de Pedagogia, ensino de Ciências
Ciências e Física
171
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
172
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
173
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
de fontes textuais de informação e/ou dos próprios resultados obtidos nos experi-
mentos, visando a superação dos obstáculos detectados.
Como exemplo de estratégia para identificar as concepções dos alunos, rea-
lizou-se uma atividade experimental investigativa com um eletroscópio lúdico, na
qual um canudo, atritado com papel, eletriza por contato um boneco de cartolina
com gravata de papel de bala (Figura 3a). Os alunos elaboraram hipóteses, consi-
derando o calor gerado pelo atrito, ou a existência de um imã escondido no canu-
do, as razões do fenômeno observado. Ao expressarem suas concepções, eviden-
ciaram-se dificuldades na diferenciação entre as forças elétrica e magnética e na
identificação do fenômeno eletrostático, pela atribuição ao frio e ao calor a causa
do fenômeno observado. Tais obstáculos são relatados na história da eletrostática
(CARVALHO, 1973) e também em pesquisas realizadas com alunos de quatorze e
vinte anos, num contexto de atividades experimentais concretas (COELHO, 2000).
174
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
175
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
176
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
177
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
178
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
179
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
180
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
181
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Porém, para que o ensino de física passe a fazer parte da realidade escolar,
primeiramente, torna-se necessária sua incorporação nos cursos de pedagogia.
Pesquisas realizadas nesta área (RODRIGUES, 2008; RODRIGUES, COELHO, AQUI-
NO, 2009) indicam uma deficiência ou ausência de disciplinas de ciências nos cur-
sos de formação de professores, apontando a falta de vivência com atividades
experimentais e conhecimentos elementares em física, como obstáculos identi-
ficados na formação pedagógica. Atividades desenvolvidas por professores de sé-
ries iniciais têm se destinado, quase exclusivamente, ao letramento e primeiras
noções numéricas. Em pesquisa realizada (RODRIGUES, 2008), foram constatadas
algumas reflexões de futuros professores, comparando o ensino tradicional com o
ensino experimental de ciências, conforme ilustra o excerto abaixo.
Sujeito D: o conhecimento de física que a gente tem, normalmente não
é uma parte muito prática. [...] É que o professor normalmente trabalha o lado
tradicional. É quadro e sem experiência... e aqui a gente pode olhar, a gente foi
formulando os conceitos. Houve a parte prática, que é importante [...] traba-
lhar assim é bem interessante, tu construir. Às vezes, a gente pode construir o
conhecimento... tem como construir, só não sabe como... e tendo alguém para
mediar essa construção é interessante o método de trabalho. [...] tu podes apro-
veitar o que foi utilizado aqui, é uma forma de se trabalhar.
182
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
183
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
o aluno e o professor para o futuro. Ainda que, em nível de séries iniciais, a criança
não tenha desenvolvido plenamente suas estruturas cognitivas, a educação em
ciências poderá oportunizar um trabalho de sensibilização científica, por meio de
atividades investigativas e desafiadoras, visando a aquisição de atitudes, habilida-
des e valores, assim como o desenvolvimento psicocognitivo.
REFERÊNCIAS
ASTOLFI, J. P.; DELEVAY, M. A didática das ciências. 13.ed. Campinas: Papirus, 2009.
_______; NUNES, A. D.; WIEHE, L.N. Formação continuada de professores numa visão
construtivista: contextos didáticos, estratégias e formas de aprendizagem no ensino
experimental de Física. Caderno Brasileiro de Ensino de Física. v.25, n.1, p.7-34, abr,
2008.
_______; SANTOS, M. J.; TIMM, R. M. B. Educar pela Pesquisa: uma experiência investigativa
no ensino e aprendizagem de Física. Florianópolis, Caderno Brasileiro de Ensino de
Física, v.27, n.3, 2010. No prelo.
GIORDAN, A.; VECCHI, G. As Origens do Saber. Traduzido por Bruno Charles de Magne.
Paris: Delachaux & Niestlé, 1987.
184
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
LIMA, M. C. B.; ALVES, L. A. Pra quem quer ensinar Física nas séries iniciais. Caderno
Catarinense de Ensino de Física. v.12, n.2. p.107-22. ago, 1995.
PIAGET, J. Para onde vai a educação? Tradução de Ivete Braga. 18.ed. Rio de Janeiro: José
Olympio, 2007.
RODRIGUES, C. R. Ensino de Física nas Séries Iniciais: um estudo de caso sobre formação
docente com ênfase na experimentação e na Informática Educativa. Porto Alegre:
PUCRS, 2008. Dissertação (Mestrado em Educação e Ciências e Matemática), Faculdade
de Física, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008.
_______; COELHO, S. M.; AQUINO, A. S. Ensino de Física nas Séries Iniciais: um Estudo de
Caso Sobre Formação Docente. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, v.26, n.3, p.575-
608, 2009.
185
O ENSINO DE FÍSICA MEDIADO PELA AVALIAÇÃO
1
Graduada em Licenciatura em Ciências, Primeiro Grau, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul (1977), graduada em Licenciatura em Ciências, Habilitação em Biologia, pela Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul (1980), mestra em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Gran-
de do Sul (1998), e doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2003).
Atualmente, é professora adjunta da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
2
Graduada em Licenciatura em Matemática, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1986), mes-
tra em Educação, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2000), e doutora em Educa-
ção, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2007). Atualmente, é professora adjunta
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
188
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
PRODUÇÃO ESCRITA
Associa-se, de modo geral, a produção escrita a áreas como língua portu-
guesa, literatura, história, entre outras. No entanto, a importância da escrita vem
sendo defendida também na área das ciências exatas, por autores como Smole
e Diniz (2001), que destacam a importância da produção de textos nas aulas de
matemática, para a aprendizagem do aluno, pois, ao escrever, o aluno reflete
189
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
190
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
EXPOSIÇÃO ORAL
As aulas de física ainda são fortemente influenciadas pela pedagogia tra-
dicional, onde prevalece o silêncio do aluno em oposição às explicações do pro-
fessor. No entanto, é preciso superar a ideia de que o aluno aprende ouvindo as
explicações detalhadas do professor, pois a fala dos alunos traz importantes dados
para avaliação.
A exposição oral, que consiste na comunicação pública de saberes específi-
cos de uma área de conhecimento, é reconhecidamente uma competência indis-
pensável para que o sujeito participe de forma plena da vida social. Neste sentido,
seu exercício durante a formação é importante e desejável. A exposição oral é uma
competência que coloca em ação saberes de ordem conceitual, procedimental e
atitudinal. Dentre os de natureza conceitual, encontram-se os fatos, conceitos e
princípios afetos à temática comunicada. A busca de informações em diferentes
fontes, selecionando-as conforme o propósito da tarefa, a gestão do conteúdo infor-
mativo, a estruturação adequada e coerente do tema a ser comunicado, são saberes
procedimentais acionados na atividade de exposição oral. A autocrítica, a partir das
sugestões e observações efetuadas pelo professor e pelos colegas e a tomada de po-
sição sustentada por argumentos são algumas aprendizagens de caráter atitudinal
envolvidas em tarefas de comunicação oral (SCHNEUWLY, DOLZ, 2004).
191
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
SITUAÇÕES-PROBLEMA
Incluir a resolução de problemas como uma das estratégias de ensino ca-
paz de contribuir com a aprendizagem distancia-se da ideia de utilizar proble-
mas para exemplificar os conteúdos conceituais trabalhados. Woods (1987 apud
LOWMAN, 2004), ao estudar o uso de problemas em curso de engenharia, aponta
que os estudantes, durante os quatro anos do curso, observam os professores
resolverem mil problemas e eles próprios resolvem mais de três mil. O autor do
estudo alerta que o número expressivo de problemas resolvidos durante a for-
mação não assegura a aprendizagem nem dos conteúdos conceituais nem dos
conteúdos procedimentais envolvidos na tarefa. O mesmo pode ser constatado
nos níveis fundamental e médio de ensino, em que milhares de problemas e
exercícios são resolvidos pelo aluno, ou são resolvidos pelo professor e copiados
pelo aluno, sem que isso resulte em aprendizagem significativa. Trata-se de uma
visão mecanicista que reduz o conteúdo a um conjunto de regras, técnicas e al-
goritmos. Segundo Fiorentini (1995), a finalidade do ensino desta natureza seria
desenvolver habilidades e atitudes computacionais, capacitando o aluno apenas
para resolver exercícios ou problemas-padrão. O ensino através da resolução de
problemas emerge em contraposição à concepção de física como um conjunto
de fatos e de procedimentos algorítmicos ou, ainda, como um conhecimento que
se obtém por repetição ou por exercício mental.
O objetivo da resolução de problemas é levar o estudante a mobilizar conhe-
cimentos construídos, aplicando-os em novas situações, mas para que a ativida-
de cumpra esta função é importante que a escolha dos mesmos leve em conta
algumas condições. Em primeiro lugar a situação proposta necessita ser factível,
apresentando dados relevantes e riqueza de informações, que de fato auxiliem a
encontrar soluções adequadas. Em segundo lugar, parte dos conceitos envolvidos
precisa estar sendo teoricamente trabalhada no momento da proposição, pois é
lançando mão da teoria em estudo que o aluno encontrará as soluções ao desa-
fio proposto (WASSERMANN, 1994). Em terceiro lugar, depois de sua resolução, os
problemas devem ser amplamente discutidos, tornando-se, para aqueles que não
obtiveram êxito na resolução, uma oportunidade de perceberem os pontos frágeis
– ou inadequados – de seu raciocínio.
192
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
PROVA INDIVIDUAL
A prova individual, que pode ser oral ou escrita e, neste caso, objetiva ou
dissertativa, também constitui um válido instrumento de coleta de informações
sobre a aprendizagem dos estudantes quando utilizada em combinação com ou-
tros procedimentos.
Seja qual for a modalidade escolhida, é fundamental que o professor domi-
ne a técnica de elaboração de questões, formulando-as de modo a comunicar de
forma clara e precisa a tarefa a ser realizada. Em questões objetivas, por exemplo,
há apenas uma solução correta, não havendo interferência de critérios pessoais
nas respostas (MEDEIROS, 1981). Nas questões dissertativas, a solicitação deve ser
enunciada com exatidão, explicitando o que se espera que o aluno faça: análise,
descrição, crítica etc. Igualmente, para a elaboração da prova oral existem reco-
mendações específicas. Ressalta-se aqui a necessidade de o professor construir
um instrumento escrito, com critérios bem definidos, a fim de registrar as infor-
mações sobre o desempenho do aluno.
Cabe alertar, ainda, que as questões reflexivas devem prevalecer sobre aque-
las que demandam memorização, sendo desejável que, para atribuição de grau, o
tipo de questão apresentada seja de amplo conhecimento do estudante, já viven-
ciado por ele em outras situações.
No entanto, mesmo em questões nas quais é solicitada apenas a resolução
de um exercício, é possível considerar, além da resposta, o modo como o aluno in-
terpretou a sua resolução, as escolhas que fez para dar conta da tarefa, os conhe-
cimentos que utilizou e sua capacidade de comunicar-se. Além disso, os erros dos
alunos não devem ser apenas destacados, mas devem ser objeto de um trabalho
específico do professor com o estudante (PAVANELLO, NOGUEIRA, 2006).
193
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
TRABALHOS COLETIVOS
Outro aspecto a explorar, quando se pensa em formas de obtenção de dados
para avaliação, refere-se aos trabalhos coletivos. As atividades em grupo, quando
bem encaminhadas, são valiosíssimas para a formação do estudante por permi-
tirem que ele vivencie situações de trabalho em equipe, aprenda a partilhar ta-
refas e negociar consensos, desenvolvendo, ainda, o senso de comprometimento
e responsabilidade. Salienta-se que as atividades em grupo não prescindem da
coordenação do professor na orientação da tarefa e no acompanhamento durante
as etapas de desenvolvimento. A avaliação do trabalho em grupo requer o estabe-
lecimento prévio de critérios, sendo de fundamental importância que os alunos
estejam suficientemente esclarecidos sobre suas atribuições na atividade.
Uma dúvida comum quando se propõe trabalho em grupo diz respeito às
aprendizagens efetuadas e ao grau de envolvimento de cada integrante do gru-
po. Dentre as estratégias que auxiliam o professor a compreender melhor esses
pontos destaca-se a solicitação de uma breve manifestação individual do aluno
ou produção escrita, se a tarefa de aprendizagem conclui naquele mesmo perío-
do de aula. Outra possibilidade é a organização da atividade de modo a reservar
algumas aulas para a realização da mesma em classe, dedicando momentos, em
diferentes etapas do processo, para o grupo expor oralmente os avanços realiza-
dos até ali. Para coletar informações sobre a aprendizagem de cada componente
do grupo, é adequado solicitar relatórios individuais ou, ainda, realizar um teste
individual sobre o tema estudado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Todos os dispositivos aqui apresentados podem fornecer dados sobre a
aprendizagem de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais, devendo
o professor estabelecer, previamente, o tipo de informação que deseja coletar e o
momento ideal para proceder a coleta.
Cabe ressaltar que, para fazer uso dos exemplos citados, o professor precisa
identificar qual é o objeto da avaliação e reconhecer que esta definição não ocorre
no momento da elaboração do instrumento, mas na ocasião em que é delineado o
planejamento de ensino. Quais são os conteúdos importantes de serem avaliados?
A resposta a essa pergunta reflete as concepções acerca da física e do seu
papel na vida das pessoas, dá o rumo da ação docente e, por decorrência, da sele-
ção e da organização dos instrumentos de coleta de informações sobre a aprendi-
zagem. É no momento de identificar e selecionar os conteúdos representativos de
uma área de conhecimento que o professor decide sobre os tópicos essenciais a
194
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
serem aprendidos pelos alunos, e esta decisão direciona a escolha dos instrumen-
tos mais adequados.
Numa área como a física, na qual muitas vezes avaliar a aprendizagem se
confunde com comparar respostas, classificar, hierarquizar e, consequentemente,
excluir estudantes, faz-se necessário repensar o processo avaliativo, percebendo
a sua importância como um meio para compreender melhor a relação do aluno
com o conhecimento. Assim, a compreensão do caráter formativo da avaliação
torna-se fundamental para que o professor possa qualificar sua prática pedagógi-
ca e o aluno possa ampliar cada vez mais seus conhecimentos.
REFERÊNCIAS
D’AMBROSIO, U. Educação matemática: da teoria à prática. 4. ed. São Paulo: Papirus,
1998.
SMOLE, K. S.; DINIZ, M. I. (Org.). Ler, escrever e resolver problemas: habilidades básicas para
aprender matemática. Porto Alegre: Artmed, 2001.
195
HISTÓRIA DA CIÊNCIA NO ESTUDO DA TERMODINÂMICA
Margarete J. V. C. Hülsendeger1
Regina Maria Rabello Borges2
Se a história fosse vista como um repositório para algo mais do que ane-
dotas ou cronologias, poderia produzir uma transformação decisiva na imagem
de ciência que atualmente nos domina (KUHN, 2000, p. 19).
1
Mestre em Educação em Ciências e Matemática pela PUCRS, leciona a disciplina de Física em escolas
particulares.
2
Licenciada e Bacharel em História Natural, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(1970), Mestra em Educação, linha de pesquisa Educação e Ciências, pela Universidade Federal de Santa
Catarina (1991) e Doutora em Educação, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1997).
Atualmente, é professora adjunta da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
DESENVOLVIMENTO
O trabalho exigia uma constante retomada de ideias, com a finalidade de auxi-
liar os alunos a estabelecerem conexões entre o que eles liam e o que trabalhavam
em sala de aula. Uma das dificuldades enfrentadas pelos alunos foi a de conseguir
relacionar o que estava sendo dito na aula com o que pesquisavam fora dela.
Assim, por exemplo, ao discutir que a primeira lei da termodinâmica foi pos-
terior à construção das primeiras máquinas, convém esclarecer que, se por um lado
o desconhecimento dessas leis não impediu a sua construção, talvez isso tenha difi-
cultado o entendimento dos processos que explicam o seu funcionamento.
E qual seria o propósito de todo esse raciocínio, dentro do contexto da física
e, consequentemente, dos fenômenos termodinâmicos? Construir, por exemplo,
198
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
junto com os alunos, o conceito de energia interna e sua relação com a tempera-
tura. A ideia do que seja energia interna é um daqueles conceitos “complicados”
da termodinâmica, pois não pode ser medido diretamente e deve-se conhecer um
pouco do comportamento da estrutura molecular. Assim, o aluno se vê diante de
um conceito abstrato e, portanto, de difícil compreensão e até de aceitação.
Mesmo que se procure estabelecer analogias e utilizar exemplos, essas ideias
não são fáceis de ser percebidas, e seria inadequado tratar as dúvidas dos alunos
como se fossem absurdas ou ilegítimas. Contudo, a inserção desses conceitos den-
tro do contexto histórico e social no qual eles surgiram, realizando constantes
paralelos entre o abstrato – conceito de energia – e o concreto – funcionamento de
uma máquina – de alguma forma auxiliou os alunos a estabelecerem essas rela-
ções, principalmente quando, concomitantemente a isso, estavam realizando uma
pesquisa que exigia a compreensão dessas ideias. Foi constatado que, na história
do progresso dessas máquinas, a não compreensão desses conceitos levou à ocor-
rência de incidentes e equívocos, mas também permitiu que pudessem relacionar
a teoria científica com a tecnologia desenvolvida.
Muitos alunos se surpreenderam quando souberam que já existia um pro-
tótipo da máquina a vapor na antiguidade, pois acreditavam que a primeira má-
quina a vapor teria sido a de James Watt. Ficaram ainda mais surpresos quando
foram gradualmente percebendo que as máquinas térmicas se desenvolveram
na base da tentativa e do erro, fazendo-se ajustes, introduzindo-se melhorias e
aperfeiçoando-se os sistemas. Os conceitos abordados em sala de aula passaram
a ter mais significado, porque estavam associados a todo um trabalho realizado,
não por uma única pessoa, mas por várias que, ao longo da história, buscaram as
respostas a inúmeros questionamentos. E puderam perceber, assim, que também
podem tornar-se parte disso, saindo do papel de espectadores para tornar-se agen-
tes/atores nesse processo de elaboração e construção do conhecimento.
Abordando a termodinâmica e as conexões possíveis com a história da ci-
ência, chega-se a conceitos relacionados com a segunda lei da termodinâmica.
Assunto complexo, pois nele se encontra um dos conceitos mais modernos es-
tudados na física, o de entropia. Os alunos geralmente consideram esse tema,
além de difícil, muito “chato”, pois representa apenas a apresentação de novas
equações sem muito significado. Então, como em tantas outras situações de
aprendizagem na sala de aula, “o aluno enfrenta um ‘pseudoproblema’, já que
não se sente envolvido na sua solução, de forma que o resultado obtido lhe é
indiferente, tendo pouco significado para ele e, logicamente, não fazendo sentido
algum” (POZO, CRESPO,1998, p. 74).
No estudo da segunda lei, é válido destacar-se papel de Sadi Carnot na histó-
199
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
ANÁLISE E RESULTADOS
Nessa pesquisa, ao abordar o desenvolvimento da termodinâmica desde o
surgimento das primeiras máquinas térmicas até o segundo princípio, muitos
alunos começaram a romper com a visão ingênua de que a máquina “surgiu do
nada”, passando a compreender que ela, como qualquer outro produto do conhe-
cimento humano, resulta do esforço e da pesquisa, não de uma única pessoa, mas
de várias ao longo do tempo.
Houve, inclusive, alunos que chegaram a afirmar, no final do trabalho, que
James Watt não havia inventado nada, como diziam os livros, mas aperfeiçoado, e
que essa ideia, existente já na antiguidade, não foi adiante devido a uma visão de
mundo diferente. Todos os grupos, ao mencionarem, por exemplo, a máquina de
Heron, explicaram que ela foi considerada apenas um brinquedo, pois a visão de
mundo da época, sendo cíclica, não trazia em si uma ideia de progresso.
Assim, quando o professor de história procurou traçar um paralelo entre a
visão de mundo circular da Antiguidade e a visão linear do mundo moderno, ele
200
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
não só buscou confrontar o aluno com dois pensamentos diferentes, mas também
com duas realidades diferentes, e a consequência disso sobre como o conhecimen-
to é construído. E, quando questionados sobre como o ser humano percebia sua
própria história, uma aluna chegou a dizer que “a ideia de história do século XX
era descontínua, e no século XIX eles pensavam que uma coisa era consequência
da outra”, percebendo que até mesmo o conceito de história pode ter definições
diferentes, conforme o contexto cultural e social. Isso coincide com a expectativa
de que, ao entrar em contato com outras realidades, o aluno passe a compreender
melhor a sua própria e a percebê-la como parte de um contexto maior e mais
complexo. Segundo Morin (2002, p. 24-25), “O desenvolvimento da aptidão para
contextualizar tende a produzir a emergência de um pensamento “ecologizante”,
no sentido em que situa todo o [...] conhecimento em relação de inseparabilidade
com seu meio ambiente – cultural, social, econômico, político e, é claro, natural”.
Ao entrevistar as coordenadoras de grupo, designadas como Morgana, Es-
trela e Cristal, e ao questioná-las sobre a validade desse trabalho para a compre-
ensão dos fenômenos físicos tratados na termodinâmica, as opiniões se dividiram.
Estrela, apesar de achar o trabalho interessante, principalmente a tarefa de ter
que produzir um texto “mais elaborado”, não via a física no contexto da pesquisa,
o mesmo ocorrendo com Morgana. Já Cristal, aparentando ter uma visão mais cla-
ra da proposta, chegou a afirmar que, “se a gente lembrar a máquina vai entender
as leis da termodinâmica”, e que tudo se relaciona, não só à pesquisa propriamen-
te dita, mas também aos assuntos que estão sendo desenvolvidos em aula.
Essa situação ficou bastante clara quando, ao entrevistar Morgana, coorde-
nadora de um dos grupos, e que estava pesquisando e estudando a Revolução
Industrial, ela declarou não conseguir ver com clareza a influência da máquina a
vapor dentro do contexto histórico. Da mesma forma, Estrela, outra coordenadora
de grupo, afirmou entender o que estava sendo explicado em aula, mas não en-
xergava as relações disso com o aperfeiçoamento da máquina a vapor. No entanto,
quando insistia em perguntar sobre influências ou relações, elas reconheciam que
existiam, mas não se mostravam muito confiantes.
Isso faz pensar o quanto é importante possibilitar ao aluno uma compre-
ensão maior dos fenômenos abordados na disciplina e, como consequência, um
maior envolvimento com a dinâmica da sala de aula. Pois, como afirma Rubem
Alves, “ensina-se, nas escolas, muita coisa que a gente nunca vai usar, depois, na
vida inteira” (2002, p. 65). Segundo Morin (2002, p. 33), “a cultura das humanidades
favorece a aptidão para a abertura a todos os grandes problemas, para meditar
sobre o saber e para integrá-lo à própria vida, de modo a melhor explicar, correlati-
vamente, a própria conduta e o conhecimento de si”. Mas é importante lembrar as
201
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
202
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
203
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
204
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
por exemplo, a pesquisa realizada por eles, isso poderia ter comprometido o en-
tendimento e muito teria se perdido. Isso ficou claro na fala de uma aluna quando,
questionada sobre a validade do trabalho, reconheceu:
Apesar de o trabalho ter sido extenso, eu acho que se ele tivesse sido
fragmentado, um grupo não iria aprender uma parte direito. Por exemplo, se tu
tivesses dado um trabalho sobre Termodinâmica e dividido, o meu grupo pode-
ria entender o Primeiro, mas não iria conseguir entender o Segundo Princípio.
Sem contar que esse ramo da física surgiu pela evolução da máquina, então a
primeira parte é mais teórica.
205
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa aqui comentada indica a importância de que o aluno tenha a
oportunidade de desenvolver um olhar crítico em relação à realidade que o cerca
e em relação a si, e possa, gradualmente, ir percebendo que física e história são
faces diferentes da mesma realidade – não antagônicas, mas complementares.
Mas esse é um processo que se desenvolve ao longo do tempo, não trazendo resul-
tados imediatos. Ao final do trabalho, constatamos que muitos alunos ainda têm
dificuldades para: distinguir diferenças entre os conceitos de calor e temperatura;
lembrar, um ano depois, as equações que descrevem os fenômenos termodinâmi-
cos; estabelecer conexões entre o que estudam na física e na história.
Entretanto, apesar dessas dificuldades, os resultados da investigação indi-
cam que o trabalho com a história da ciência pode ser válido, não só para auxiliar
o aluno a compreender os fenômenos estudados na física, mas, principalmente,
como uma forma de possibilitar o entendimento de que todo o conhecimento está
interligado, e que a divisão instaurada pelas disciplinas é ilusória, podendo, com
um pouco de esforço, ser superada.
REFERÊNCIAS
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa, Edições 70, 1977.
FEYNMAN, Richard P. Física em seis lições. 3. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1999.
KUHN, Thomas S. A Estrutura das Revoluções Científicas. 5.ed. São Paulo: Perspectiva, 2000.
PAVIANI, Jayme. Ensinar: Deixar Aprender. Porto Alegre: EDIPUCRS (coleção Filosofia:
154), 2003.
206
AS ORIGENS DO ENSINO EXPERIMENTAL
DE FÍSICA NO BRASIL
208
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
209
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
OS GABINETES DE FÍSICA
O primeiro registro do esforço de implantação de uma abordagem experi-
mental no ensino de ciências é observado no decreto de criação do Colégio Pedro
II: "Haverá no colégio gabinete de física, laboratório de química, uma coleção ele-
mentar de produtos dos três reinos..." (MOACYR, 1938).
Os gabinetes de física constituíam-se de uma série de máquinas e complica-
dos aparelhos prontos, destinados à manipulação exclusiva do professor ou ins-
trutor de laboratório, por meio de experimentos de demonstração. As instalações
do laboratório, no qual os equipamentos se encontravam, em geral, armazenados
em salas anexas a um grande anfiteatro, o que já se constituía por si um obstáculo
à participação do aluno no trabalho experimental.
210
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
No mesmo ano de 1893 são criados, em todas as escolas normais sob a res-
ponsabilidade do Estado, os cargos de "preparadores de física e química", preen-
chidos por alunos dos cursos superiores, nomeados pelo Governo. O Artigo 336
estabelece:
2
Leis e Regulamentos sobre Instrucção Publica – Typographia do Diario Official, São Paulo, 1893, p. 49-
71.
211
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
212
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
Figura 2. Página do catálogo do fabricante Les Fils D’Emile Deyrolle (1907), apresentando a
máquina eletrostática de Ramsden, armazenada em escola em Porto Alegre.3
3
Catalogue méthodique: Physique: instruments de précision, matériel de laboratoire: Cabinets de Phy-
sique et de Chimie: Aout 1907 / Les Fils d'Émile Deyrolle, 46 rue du Bac, Paris 7. - [S.l.: S.n.], 1907, 160 p.
Disponível em: <http://www.astropa.unipa.it/biblioteca/Strumenti/frameset.html>.
213
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
4
Max Kohl, Physikalische Apparate, Germany, Chemnitz: 190-, p. 23. Disponível em: <http://www.sil.
si.edu/digitalcollections/trade-literature/scientific-instruments/files/51636/>.
214
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
215
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
216
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
O período situado entre 1930 e 1945 pode ser considerado como marcado
pela luta entre as influências das concepções humanista tradicional, representada
pelos católicos, e humanista moderna, representada pelos renovadores.
A Reforma Francisco Campos, entre 1931 e 1932, determina uma nova or-
ganização do ensino superior, secundário, comercial e da Universidade do Rio de
Janeiro (ROMANELLI, 1987).
O ensino secundário tem seu currículo seriado e passa a se constituir de dois
ciclos: o primeiro ciclo, ou fundamental, com duração de cinco anos, comum a to-
dos os estudantes, com o objetivo de preparar o homem para a vida em sociedade,
formando o cidadão como um todo; o segundo ciclo, ou complementar, com dura-
ção de dois anos, com o intuito de preparar o indivíduo para os exames de ingresso
nos cursos superiores, assumindo, assim, um caráter eminentemente propedêu-
tico. Nesta nova organização do ensino secundário, além do caráter propedêutico
e dualista, institui-se um currículo enciclopédico e um sistema avaliativo extre-
mamente rígido e massacrante. O aluno, ao fim do ano letivo, era submetido a
aproximadamente “80 arguições ou provas mensais, 40 provas parciais e 10 provas
finais, num total de 130 provas e exames” (ROMANELLI, 1987, p. 137).
Assim, o ensino da física volta-se unicamente à preparação para o exame
de admissão ao ensino superior, mantendo a obsolescência dos seus métodos de
ensino – superficial, generalista e expositivo (DIOGO e GOBARA, 2008).
Dois fatores adicionais concorrem para uma modificação da abordagem do en-
sino de física nas escolas secundárias: o início da formação de físicos para atuação
como professores no ensino secundário, pelas faculdades de Filosofia, em substitui-
217
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
218
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
219
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
220
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante todo o período analisado, de 1808 a meados da década de 60, di-
versos fatores determinaram a abordagem do ensino de física e a importância
dada ao uso da experimentação. Observa-se que o ensino de física é fortemente
influenciado pelo contexto econômico, social e político do País. Esta retrospectiva
revela que o ensino de física enfrentou dificuldades relacionadas às condições de
cada momento histórico, destacando-se, no período entre 1808 e o início da déca-
da de 20, o predomínio do ensino de humanidades, a forte influência dos exames
de admissão ao ensino superior, o ensino expositivo, baseado na memorização,
o número insuficiente de aulas e a excessiva dependência dos livros didáticos. O
uso da experimentação nesse período, apoiado em gabinetes de física, era desti-
nado à manipulação exclusiva do professor ou instrutor de laboratório, por meio
de experimentos de demonstração. Os equipamentos se encontravam, em geral,
armazenados em salas anexas a um grande anfiteatro, o que já se constituía em
uma dificuldade para a participação do aluno na atividade experimental.
Em um movimento que atingiu não somente a física, mas também outras
disciplinas, a partir da década de 30, o formalismo matemático é introduzido com
grande força no ensino, com a introdução de exercícios numéricos e de aplicação
de fórmulas nos livros didáticos. O ensino da física volta-se unicamente à prepa-
ração para o exame de admissão ao ensino superior. O ensino experimental perde
221
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
o pequeno espaço conquistado nas escolas com maiores recursos, sendo relegado
a uma atividade extracurricular, somente utilizado no caso de aquisição de dados
e comprovação de leis físicas.
Assim, esta análise leva à conclusão de que o ensino de física vem sendo
sistematicamente prejudicado pelas reformas educacionais implementadas pelos
governos. Atualmente, entre os problemas apresentados anteriormente, apenas o
predomínio do ensino de humanidades teve sua influência amenizada em função
da emergência de uma sociedade eminentemente tecnológica.
Todos esses fatores, no entanto, não impossibilitaram o surgimento de um
movimento em busca da superação do quadro precário em que se encontrava o
ensino de física, capitaneado por pesquisadores em ensino de física, que culmi-
nou com a realização do primeiro Simpósio Nacional de Ensino de Física (SNEF),
realizado em 1970. Esse primeiro evento possibilitou a criação de um espaço de
discussão e divulgação de pesquisas, relatos e propostas de experiências no ensino
de física, que permanece até hoje. Por meio da aproximação entre os pesquisado-
res em ensino de física nas universidades e os professores que atuam na realidade
escolar espera-se superar a lacuna existente entre as pesquisas acadêmicas e a
sala de aula de física nas escolas secundárias. Acreditamos que apenas o trabalho
integrado entre a academia e a escola, particularmente na formação inicial de
professores, permitirá superar essa distância e promoverá a efetiva melhoria do
ensino de física.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA JÚNIOR, J. B. A evolução do ensino de Física no Brasil (2a parte). Revista
Brasileira de Ensino de Física, São Paulo, v. 2, n. 1, p. 55-73, 1980.
_______. A evolução do ensino de Física no Brasil. Revista Brasileira de Ensino de Física, São
Paulo, v. 1, n. 2, p. 45-58, 1979.
222
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
CHAGAS, V. O Ensino de 1o e 2o graus: antes, agora e depois? São Paulo: Saraiva, 1980.
MARCIANO, Ir. M. Física: ciclo colegial : segunda série do curso científico. Rio de Janeiro:
Francisco Alves, 1946.
NAGLE, J. Educação e Sociedade na Primeira República. São Paulo: EPU; Rio de Janeiro:
Fundação Nacional de Material Escolar, 1974.
223
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
224
ENSINO DE FÍSICA – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Carmo Heinemann1
O ENSINO DE FÍSICA
Atribui-se a George Bernard Shaw a afirmativa de que o homem razoável
adapta-se ao mundo e o homem não razoável adapta o mundo a si. Assim, todo o
progresso se deve aos homens não razoáveis...
Se fôssemos classificar os problemas de nosso País, certamente a questão
educacional estaria incluída entre as mais graves e, certamente, figuraria como
a raiz de muitos dos demais problemas atualmente citados (e não citados). Se o
analfabetismo aparece sempre como aquele aspecto mais conspícuo, é evidente,
também, que todo o sistema educacional brasileiro, do nível mais elementar até
os cursos de pós-graduação, encontra-se com evidentes falhas, seja no aspecto
quantitativo (número de vagas), seja no aspecto qualitativo.
O ensino no nível médio, em particular, sofre de vários problemas... a começar
pela sua própria vocação. Quais seriam os objetivos do ensino no nível médio?
A formação do indivíduo no seu aspecto mais amplo, qual seja, o do desen-
volvimento de suas dimensões humanas, deveria ser colocada como a finalidade
do ensino do nível fundamental e médio, acrescido da educação formal. Entre-
tanto, o caráter pragmático de nossa sociedade, aliado aos outros problemas, tem
falhado na execução deste propósito.
O que dizer a respeito do ensino de ciências, em particular, o de física? Come-
cemos pelo número de físicos formados pelas escolas superiores do Brasil. Com-
parado com outras profissões, verifica-se que é extremamente pequeno. Assim, a
maioria das aulas de física, nos cursos de nível médio, é ministrada por pessoas/
profissionais advindos de outras áreas: matemática, biologia, economia, engenha-
rias, veterinária, medicina etc... Esses profissionais de outras áreas, por sua vez,
assumem as aulas, na maioria dos casos, para complementarem os seus salários,
seja de profissionais da indústria e do comércio, como, também, do já sofrido salá-
rio de professor de outras matérias.
1
Graduado em Ciências – Licenciatura Curta, Matemática – Licenciatura Plena e Física – Licenciatura
Plena, pela UNISINOS, Especialista em Energia e Meio Ambiente, pela UFRGS, Mestre em Engenharia Me-
talúrgica, pela UFRGS. Coordenador do Curso de Licenciatura em Física da Universidade do Vale do Rio
dos Sinos – UNISINOS, São Leopoldo, RS.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
226
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
riores, nem sempre foi entregue aos profissionais mais capacitados. “Educadores”
infiltraram-se (ou foram infiltrados!) no ensino de ciências e, nada conhecendo de
ciências, de sua evolução e estrutura, tornaram este ensino o mais eficiente méto-
do de limitar a evolução cultural e técnica de um povo.
O QUE É FÍSICA?
A física é a ciência fundamental da natureza. A física nos conta o que a hu-
manidade já aprendeu deste mundo, como os homens descobriram o que conhe-
cemos e como e o quê ainda está sendo descoberto nos dias de hoje.
Quando um clarão de um relâmpago corta a escuridão, os seus olhos ficam
ofuscados por alguns segundos. Passado um intervalo de tempo, ouve-se o es-
trondo do trovão e uma vidraça solta estremece. Numa estação meteorológica, a
milhares de quilômetros de distância, um sensor pode acusar o relâmpago. Um
meteorologista, ao analisar e conjugar diversos dados atmosféricos (temperatura,
umidade do ar, pressão atmosférica, direção e velocidade do vento etc.), ao ouvir
o estrondo distante fica satisfeito pelo acerto que fez na previsão e no alerta que
emitiu referente à chegada de uma tempestade.
Eis uma sequência de fenômenos, de acontecimentos diversos, ocorrendo em
locais e instantes diferentes, mas que estão todos encadeados. A questão é: como
eles estão interligados e, mais especificamente, como eles ativam a vista, o ouvido,
os sensores/medidores e alteram a própria atmosfera?
Os homens, antigamente, temiam a “doença do Sol”, situação em que o Sol
desaparecia e a Terra escurecia. Após compreender o movimento complexo da
Lua em torno da Terra, pode-se prever a ocorrência de eclipses com maior preci-
são do que as condições do tempo de um dia para outro. A Lua gira em torno da
Terra desde muito antes do primeiro dinossauro aparecer na mesma. Atualmente,
o homem consegue colocar satélites em órbita, como se fossem minúsculas luas e
utiliza estes satélites para uma infinidade de aplicações.
A física possibilita a obtenção de respostas para uma grande variedade de
questões. Ela permite a capacidade de prever, de planejar, de compreender e de
se aventurar. Novas coisas são produzidas, e novos conhecimentos são gerados a
partir do que se aprendeu na física. Com as respostas da física, novas perguntas
são formuladas, perpetuando a evolução do conhecimento científico e o desen-
volvimento tecnológico.
A partir da construção do telescópio astronômico por Galileu e da descoberta
das luas de Júpiter, surgiram questões como a tentativa de explicações dos movi-
mentos complexos de corpos celestes. Isso desencadeou um grande desenvolvimen-
to de um ramo matemático especial denominado mecânica. O novo conhecimento
227
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
228
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
especialistas do que a própria física. Isso se repetiu várias vezes em outras áreas
do conhecimento: na eletricidade, na aviação, na hidrodinâmica etc. Mais recen-
temente, a liberação da energia nuclear, criação da física no século vinte, tornou-
se uma importante e fascinante atividade técnica, especializada e independente,
chamada engenharia nuclear.
Esse é o caminho da física. A física dá origem a outras ciências e a suas
proveitosas aplicações, denominadas tecnologias. Essas ciências, tal como filhas
agradecidas, retribuem, com frequência, dando à física novos materiais, novos
instrumentos e novas ideias. Muitos dos equipamentos desenvolvidos tornam-se
indispensáveis para novos avanços na física. Tanto a pesquisa moderna como a in-
dústria da televisão são subordinadas à eletrônica que, por sua vez, é descendente
direta do que há um século pareciam fenômenos obscuros e sem importância nos
laboratórios de física.
229
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
230
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
231
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
232
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
PROCEDIMENTOS:
1. Fixe a folha de papel sobre a placa de isopor. Deite o bloco de vidro sobre
a folha de papel e, com o lápis, trace seus limites. Enfie dois alfinetes em A e B,
conforme mostrado na figura.
2. Olhe através do bloco, do lado oposto aos alfinetes. Alinhe a régua com as
imagens dos dois alfinetes e trace a linha DF. Observe que, aparentemente, os pon-
tos A, B, D e F estão sobre a mesma linha reta, vista através do bloco de vidro.
3. Trace, agora, paralelamente a AB, a linha A’C’ e enfie alfinetes em A’ e C’.
Alinhe novamente a régua, no outro lado do bloco de vidro, com as imagens dos
dois alfinetes e trace a linha E’F’, conforme mostrado na Figura 1.
4. Remova o bloco de vidro. Trace as linhas BD e C’E’. Esses são os caminhos
da luz no interior do bloco de vidro, provenientes dos alfinetes colocados em AB e
A’C’, respectivamente.
5. Trace BB’ perpendicular a A’C’ e CC’ perpendicular a BD. O segmento B’C’ é
a distância que a luz se propaga no ar no mesmo intervalo de tempo em que ela
se propaga, no vidro, o correspondente ao segmento BC.
6. Meça as distâncias B’C’ e BC e anote-as.
7. Calcule o índice de refração do vidro em relação ao ar a partir da expressão
acima, onde
Resulta, portanto:
233
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
REFERÊNCIAS
ÁVILA, A.P. et al. Experiências de Física para o 1o Grau, 2a ed. São Leopoldo: Ed. Unisinos,
1996.
BLACKWOOD, O.H. et al. Física na Escola Secundária. Rio de Janeiro, Companhia Editora
Nacional, 1958.
PHYSICAL SCIENCE STUDY COMMITTEE. Física. 2a ed. São Paulo: EDART, 1966.
234
A IMPORTÂNCIA DAS EXPERIÊNCIAS DOCENTES DESDE
O INÍCIO DA LICENCIATURA DA ÁREA CIENTÍFICA PARA UMA
FORMAÇÃO QUALIFICADA DE PROFESSORES
CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS
Integra a matriz curricular do curso de Licenciatura em Química da PUCRS,
desde 1999 as disciplinas de Tutoramento em Prática de Ensino I, II, III e IV e Está-
gio Supervisionado, bem como as disciplinas de Projetos de Ensino de Química e
1
Graduado em Química – Licenciatura Plena e Bacharelado, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Mestre em Educação, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Doutor em Educa-
ção, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Atualmente, é professor titular da PUCRS,
atuando no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática e na Licenciatura em
Química, na Faculdade de Química da PUCRS.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa tem natureza qualitativa, pois, de acordo com Flick (2004, p. 28),
“é orientada para a análise de casos concretos em sua particularidade temporal e
local, partindo das expressões e atividades das pessoas em seus contextos locais”.
236
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
237
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
Essas evidências estão de acordo com o que tem sido mencionado por vários
autores que tratam da formação de professores. A reflexão é ação fundamental de
transformação do profissional docente em professor pesquisador, conforme Zei-
chner e Pereira (2003) e Stenhouse, Rudduck e Hopkins (1987). O professor torna-
se profissional diferenciado quando assume a reflexão e a crítica como base para
modificar e qualificar a sua prática docente de modo autônomo.
Assim, os licenciandos citam que é importante dialogar com os orientadores
sobre a experiência na escola, pois o diálogo com docentes mais experientes pode
contribuir para a reconstrução da concepção sobre ensino e aprendizagem, que
eles trazem de sua formação, tendo por base a prática na escola. Essa reconstru-
ção ocorre, principalmente, pela análise com o orientador sobre as dúvidas dos
licenciandos. São as dúvidas e questionamentos dos alunos estagiários que são
matéria-prima para o diálogo com o orientador.
Também é um importante objeto de análise e de diálogo os planos que os
licenciandos elaboram para as suas aulas. Analisar esses planos e devolvê-los aos
alunos com proposições e críticas gera subsídios para o diálogo, conforme indica o
sujeito A: “Realizar planejamentos com prévia correção antes da execução das au-
las, nos ajuda a perceber erros, corrigi-los e muitas vezes melhorá-los” (sujeito A).
No entanto, para poder dialogar com os orientadores é necessário ter argu-
mentos consistentes e relevantes, conforme refere o sujeito L: “Ter argumentos é
importante para concordar com o que é apresentado em sala de aula ou discordar
com o professor tutor de que não é daquela maneira, que isso, por exemplo, de-
pende atualmente em sala de aula, com as condições de cada escola” (sujeito L).
Os sujeitos também destacam que as disciplinas de Tutoramento em Prática
de Ensino são espaços para relatar as experiências vivenciadas nas escolas, que
servem de objeto de reflexão. O simples fato de poderem falar sobre as experiên-
cias possibilita encontrarem sentido no que fazem. Isso fica evidente nos enun-
ciados do sujeito F.
O espaço que temos para discutirmos nossas experiências nas escolas é mui-
to importante, pois às vezes outros colegas ou o professor pode nos auxiliar com
resolução de problemas ou melhorar nossa maneira de fazer a aula. Dessa for-
ma, ao falarmos, vamos simultaneamente refletindo e também analisando com o
grande grupo o que poderia ter sido diferente ou melhorado (sujeito F).
Para que ocorra a tomada de consciência sobre o papel do professor durante
essa etapa inicial da formação em química, é importante esse espaço no qual os
licenciandos podem exercer a crítica, pois é por meio da crítica que os futuros
professores podem questionar a própria prática, identificando “como agir, qual o
caminho a ser seguido, que postura ter perante situações atípicas em sala de aula
238
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
etc.” (sujeito I). É nessa situação de questionamento que podem analisar “se o mé-
todo proposto é realmente o adequado para aquele tipo de conteúdo, por exemplo”
(sujeito I). Além disso, “discursos existentes precisam ser dissolvidos e desconstru-
ídos para poderem emergir novos” (MORAES, GOMES, 2006, p. 211).
Contribuem também, para a análise da própria prática, as observações, que
fazem das aulas dos professores, principalmente na disciplina de Tutoramento
em Prática de Ensino I, o primeiro contato com a sala de aula e com a escola. So-
bre isso, afirma o sujeito M que “é nessa situação que podemos perceber com um
olhar mais crítico como nós pretendemos lecionar, o que devemos e não devemos
fazer em sala de aula” (sujeito M).
Quando ingressa na sala de aula nas primeiras vezes e, quiçá isso ocorra
sempre, é importante fazer uma autoavaliação do que foi realizado para qualificar
essa prática. Sobre isso, o sujeito J afirma que “há a necessidade de se avaliarem as
aulas para poder aprimorá-las e torná-las menos monótonas, buscando metodo-
logias e recursos para alcançar o objetivo maior que é o aprendizado” (sujeito J).
Em relação a isso, para Demo (1998, p. 48), “saber avaliar-se, teorizando cons-
tantemente sua prática e assumindo-se como orientação instigadora do desempe-
nho criativo do aluno” é iniciativa indispensável para combater o fracasso escolar.
Portanto, refletir sobre a ação pedagógica é necessário quando o objetivo é
o aperfeiçoamento, principalmente, dos licenciandos que iniciam a sua trajetória
rumo a constituição do “ser professor”. É necessário que o futuro professor comece
a pensar o que fazer, por exemplo, quando os alunos não mostrarem interesse.
Como questiona Arroyo (2007, p. 56), “o desinteresse dos alunos por nossa docên-
cia não questiona nossa docência?”
A reflexão após a aula contribui para rever a prática pedagógica. Dos dezes-
sete sujeitos, onze referiram algo diretamente sobre a importância da reflexão
para a qualificação das aulas. Apontam que essa qualificação se dá pela “oportu-
nidade de rever a prática pedagógica” (sujeito B) e “pela possibilidade de melhorar
o plano para as próximas aulas” (sujeito C).
Outro aspecto que é referido pelos sujeitos, é o fato de terem bastante tempo
para a reflexão na escola, com a possibilidade de compartilhar com os colegas e
professores orientadores, os quais ajudam na formação. No entanto, observam
que os professores das escolas têm pouco tempo para essa reflexão, como refere
o sujeito B, quando afirma: “Acredito fielmente na importância do planejamento
e da reflexão pós-aula, mas também tenho observado que os professores não têm
tempo para fazer esta reflexão final. Muitas vezes pelo fato de darem aulas em
vários lugares” (sujeito B).
239
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
240
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
241
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
242
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
gera, contribui para que o professor trabalhe com mais exemplos do cotidiano, o
que, em geral, é uma preocupação dos licenciandos.
Um aspecto bastante citado pelos licenciandos foi o desenvolvimento da se-
gurança durante os estágios nas disciplinas de Tutoramento e no próprio Estágio,
com mais segurança na realização da aula. Dos dezessete sujeitos, nove fizeram
alguma referência a esse aspecto. Nesse sentido, um dos aspectos que contribui
para essa segurança é colocar-se diante dos próprios medos e dificuldades e co-
nhecer a rotina da sala de aula. Isso contribui para que o licenciando adquira con-
fiança e autocontrole, reduza a sua timidez e desenvolva a capacidade de aceitar e
conviver com a crítica. Alguns depoimentos ilustram esse aspecto.
Esta aula me auxiliou e as demais também, pois com a experiência fui
perdendo esta minha insegurança, timidez e foi melhorando cada vez mais mi-
nha prática educativa (sujeito F). Nos coloca diante de medos, expectativas que
certamente no dia a dia da profissão se apresentarão (sujeito P). Iniciar as ativi-
dades em sala de aula no início do curso nos torna mais críticos, seguros, enfim,
desenvolve habilidades para lidar com o dia a dia de "ser professor" (sujeito M).
243
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
com os alunos; de outro, os licenciandos não querem ficar mal diante dos alunos,
caso não saibam responder às suas perguntas. Isso tem a ver com as crenças e va-
lores. Essas “não se discutem, se praticam com fiel religiosidade” (ARROYO, 2000, p.
171). Como vamos educar para a incerteza, se não abrimos mão das certezas? Essa
é uma reflexão necessária nos cursos de formação de professores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente texto pretendeu apresentar algumas respostas à pergunta:
Como a prática de planejar, executar e avaliar aulas de química, no ambiente
escolar, desde os semestres iniciais do curso de licenciatura, é percebida por
licenciandos que vivenciaram essa experiência? Pretendeu fazê-lo com base em
depoimentos de quem teve essa vivência. Nessas respostas os sujeitos de pes-
quisa, alunos de um curso de formação de professores de química, mostram-se
satisfeitos com a experiência e com a consciência da importância de iniciar a
prática docente em escolas reais, com alunos reais. Os principais argumentos
para sustentar essa adesão são os seguintes: os estágios são oportunidades de
reflexão a partir do diálogo com os docentes que têm mais experiência, pois
são espaços para relatar as experiências vivenciadas nas escolas, onde se pode
exercer a crítica e proceder a autoavaliação sobre o que foi realizado; a reflexão
contribui para a melhoria do planejamento e da ação docente, bem como para
tomar consciência da incompletude, o que conduz à busca da melhoria e do
aperfeiçoamento; o contato com a realidade escolar e com a sala de aula con-
tribui para conhecer o significado do “ser professor” e para o sentir-se professor,
o que é estimulante para dar sequência ao curso; o exercício do planejamento
ao longo de vários semestres contribui para a organização interna, do sujeito, e
externa, da ação pedagógica; defrontar com problemas reais da escola e da sala
de aula contribui para que o sujeito aprenda modos de lidar com situações di-
fíceis; conhecer as situações problemáticas do ensino de química e as próprias
fragilidades estimula e encaminha para o estudo tanto dos temas específicos
dessa área quanto para o estudo das questões pedagógicas; atuar na sala de
aula, desde o início do curso, proporciona segurança ao futuro professor, pois são
reduzidos os medos de enfrentar as situações que emergem na prática docente
e de propor e experimentar situações novas e, por isso, conduz a um amadureci-
mento profissional, já durante curso de formação inicial do professor; é também
uma forma de mostrar ao licenciando se é essa a profissão que deseja seguir.
Essas evidências, que podem ser teses relacionadas à formação inicial de
professores, podem contribuir para o aperfeiçoamento dos cursos de formação de
244
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
REFERÊNCIAS
ARROYO, Miguel G. Ofício de Mestre. 9. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.
BRASIL. Ministério da Educação. Lei No. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial
da União. Brasília. 23 dez. 1996.
DEMO, P. Educar pela pesquisa. Ed. Campinas, SP: Autores Associados, 1998.
SCHNEUWLY, B.; BRONCKART, J.P. (Orgs.) Vigotsky hoy. Madrid: Editorial popular, 2008.
SCHÖN, D. The reflective practioner: how professional think in action. London: Temple
Smith, 1983.
TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.
245
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
ZEICHNER, Kenneth M.; PEREIRA, Júlio Emílio Diniz. A pesquisa na formação e no trabalho
docente. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
246
A FÍSICA COMO ELEMENTO DE
MOTIVAÇÃO PARA GOSTAR DE FÍSICA
Délcio Basso1
Maria do Carmo B. Lagreca2
Maria Eulália Pinto Tarragó3
248
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
ída e nunca será. A história tem mostrado que a percepção humana da realidade
muda junto com os paradigmas que a física utiliza na suas descrições. Por exemplo,
tanto para a física clássica como para a relativística, tempo e espaço são realidades
físicas: absolutas e imutáveis na visão clássica, mutáveis e interdependentes na
visão relativística. Quando este paradigma for substituído, a percepção humana da
realidade será modificada e certamente teremos uma visão mais abrangente dos
fenômenos, inclusive (e finalmente) entenderemos por que inércia e gravidade são
equivalentes, sem a necessidade de essa equivalência ser postulada.
Também é fascinante a contribuição decisiva da física para o entendimento
de nossa inter-relação com o que chamamos de universo. A observação do univer-
so, quer a olho nu ou com telescópio, acarretou mudanças nas concepções cosmo-
lógicas e nas físicas que lhes davam suporte. Por exemplo, a cosmologia e a física
aristotélicas acabaram sendo substituídas por uma cosmologia heliocêntrica.
Esta nova concepção cosmológica de colocar o Sol no centro e a Terra como
planeta gerou uma nova física, com as leis do movimento e a lei da gravitação,
a qual serviu de ponto de partida para o desenvolvimento de outras áreas da
física, como a termodinâmica e o eletromagnetismo. Estas, por sua vez, levaram
ao aperfeiçoamento das máquinas térmicas que propiciaram a Revolução Indus-
trial e o surgimento da era da eletricidade, que levou até a era das telecomuni-
cações e da telemática.
Devido ao fato de a ciência estar sempre em construção, provavelmente, es-
tamos na iminência de uma nova revolução advinda, novamente, da observação
do céu. Como se sabe, diversos fenômenos astronômicos só podem ser explicados
se admitirmos que uma parte significativa da massa do universo apresenta-se em
uma forma desconhecida para nós, e devido ao fato de não podermos detectá-la,
senão apenas por seus efeitos gravitacionais, é chamada matéria escura. Quando
este mistério for desvendado, uma nova física, com certeza, surgirá.
Qualquer mudança que venha a ocorrer na física deverá vencer o dogmatis-
mo atual, que pode ser exemplificado na última definição do metro. Lembramos
que a penúltima definição do metro (de acordo com a XI Conferência Geral de
Pesos e Medidas, ocorrida em 1960) era baseada no comprimento de onda da luz
emitida por um gás excitado por descarga elétrica. Tal definição caducou com o
surgimento da tecnologia do laser, na qual se empregam ressonadores ópticos
constituídos por espelhos (ou semiespelhos) que devem estar distanciados de um
número inteiro de comprimentos de onda da luz que será emitida. Viu-se aí uma
limitação: a definição do metro baseada num comprimento de onda comprometia
qualquer medida linear da ordem de comprimento de onda. No estado da arte
249
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
atual, os relógios são mais precisos do que as réguas mais precisas, que são os
interferômetros, que permitem medir frações de comprimentos de onda.
No intuito de apresentar uma definição mais precisa para o metro, os físicos
transformaram um princípio da Teoria da Relatividade em um dogma, pois na
XVII Conferência Geral de Pesos e Medidas, ocorrida em 1983, o metro foi definido
como a distância que uma onda eletromagnética percorre no vácuo, no tempo de
segundos, com a exata velocidade de 299792458m/s. A esse respeito, Basso (2005)
faz o seguinte comentário:
Quando consultamos uma tabela com as constantes fundamentais da fí-
sica encontramos os valores com suas respectivas incertezas. Para a velocidade
da luz no vácuo não há incerteza, pois seu valor é exato, uma vez que este é o
desejo dos físicos, respaldados pela Relatividade, que assim definiram o metro.
A natureza irá concordar com isso?
250
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
251
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
252
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
253
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
254
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
Figura 1. Representação, não em escala, da Terra em três posições na sua órbita ao redor
do Sol.
255
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
tação da Terra, 86.164s, pode ser feita utilizando-se como referência qualquer
outra estrela que não seja o Sol, por isso, este intervalo de tempo é também
chamado de período sideral.
Hiparco de Nicea (190-120 a.C.) foi um astrônomo e matemático grego
que, entre outras façanhas na instrumentação astronômica, conseguiu medir o
deslocamento extremamente lento dos equinócios, o qual atualmente atribui-se
ao movimento de precessão do eixo de rotação terrestre. Hiparco certamente co-
nhecia a discrepância entre o período sideral e o período solar médio, e poderia ter
utilizado a mesma como um contundente argumento para justificar a rotação da
Terra em torno do Sol. Não o fez, por que estava por demais impregnado pelo ge-
ocentrismo e, principalmente, pelo dogma do movimento circular uniforme (acre-
ditava-se, então, após uma decisiva “contribuição” de Platão para a astronomia,
que os movimentos dos planetas deveriam ser composições de perfeitos movi-
mentos circulares e uniformes). Nem mesmo Copérnico, que desencadeou o helio-
centrismo, valeu-se daquele argumento, preferindo uma justificativa mística para
colocar o Sol na região central e, ainda mais, acabou empregando uma quantidade
de movimentos circulares e uniformes maior do que havia utilizado Ptolomeu, na
sua grande síntese do geocentrismo.
REFERÊNCIAS
BARAIS, A.W.; VERGNAUD, G. Students' conceptions in physics and mathematics: biases
and helps. In CAVERNI, J.P.; FABRE, J.M.; GONZALEZ, M. (Eds.). Cognitive biases. North
Holland: Elsevier Science Publishers, 1990.
CHALMERS, A.F. O que é Ciência, Afinal? São Paulo: Ed. Brasiliense (1993).
COMINS, N.F; KAUFMANN III, W.J. Descobrindo o Universo. Porto Alegre: ARTMED EDITORA
S.A., 2010.
256
ENSINAR E APRENDER
Vicente Hillebrand1
ENSINAR X APRENDER
Ensinar é ação de professor e aprender é um processo desenvolvido pelo es-
tudante. Há quem defenda ferrenhamente que se o aluno não aprendeu é porque
o professor não ensinou ou não ensinou corretamente. Não consigo concordar
com essa ideia, pois é possível aprender sem que haja ensino formal, e com frequ-
ência o aluno não aprende apesar de ter havido um bom ensino por parte do pro-
fessor. Pode-se aprender muitas coisas por iniciativa própria, pela observação de
fenômenos, por meio de leituras, buscas em sites da internet, e por muitas outras
maneiras, sem haver a intervenção direta de um professor. De nada servirá, no en-
tanto, uma brilhante ação do professor se o aluno não fizer sua parte: ESTUDAR!
Muitos alunos não sabem como estudar ou tentam sem um método e uma
determinada disciplina comportamental. Neste sentido, é importante que o pro-
fessor oriente seus alunos para o estudo. Costumo fazer isso dizendo-lhes:
Se vocês desejam aprender, lembrem-se que:
1 - Conhecimento não se transmite; constrói-se. Pode-se transmitir informa-
1 Professor de física da Faculdade de Física da PUCRS. Professor do magistério público estadual. Mestre e
doutor em Educação.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
ções. Essas precisam ser processadas pelo indivíduo que deseja aprender. Apren-
der é um processo interior e não ocorre de fora para dentro. Portanto, não esperem
por seu professor; ele não pode “transmitir” o conhecimento que ele já construiu
processando as informações que obteve de alguma forma. O professor, os colegas,
os livros, a internet, o meio... podem auxiliar no processamento das informações
que chegam a vocês de alguma forma.
2 - Vocês são os principais responsáveis por sua aprendizagem. Se vocês não
fizerem sua parte no processo, de nada adiantará que o professor faça a parte dele,
por mais brilhante que seja.
3 - Não basta “assistir às aulas”. Fora do ambiente da aula vocês precisam reto-
mar os conteúdos abordados em aula, relendo suas anotações e realizando leituras
complementares em livros (disponíveis na biblioteca) ou em sites disponíveis na in-
ternet (há inúmeros... – basta utilizar os sites de busca). Se possível, façam isso com
algum colega interessado e tentem explicar a ele o que entenderam.
4 - É altamente recomendável ler a respeito dos conteúdos ANTES de serem
abordados pelo professor. Isso facilita a compreensão por ocasião da explicação
do professor na sala de aula. Se nunca fizeram isso, experimentem fazê-lo pelo
menos uma vez para sentirem a diferença na compreensão dos conteúdos.
5 - Vocês não podem restringir-se a um único autor. Estudem o mesmo as-
sunto em diversos autores. O que vocês não entenderam em determinado autor,
podem entender em outro, pelo simples fato de esse usar outra linguagem ao
explicar o mesmo tema.
6 - É imprescindível que vocês prestem o máximo de atenção às explicações
do professor em aula. Durante a explicação do professor, vocês não devem dar
nem pedir explicações ao seu colega, pois dessa forma, vocês e ele (e mais outros
colegas...) perderão a explicação do professor. A discussão com colegas é impor-
tantíssima, mas não ao mesmo tempo em que ocorre a explicação do professor...
7 - Fazer resumos (sínteses) é extremamente importante. Quando vocês es-
crevem, conseguem memorizar melhor do que quando apenas leem. Exercícios
precisam ser repetidos até que vocês consigam realizá-los sem se atrapalhar e até
serem capazes de explicá-los a um colega. “A prova de que se sabe alguma coisa é
saber explicá-la.” (Frase atribuída a Aristóteles.)
8 - É importante manter-se em dia com os conteúdos já explicados em aula.
Será muito difícil revisar todo o conteúdo no dia antes de uma prova, por isso,
revisem permanentemente os conteúdos já estudados.
9 - É importante desenvolver a “autonomia intelectual”. Não esperem que o
professor mande fazer algo. Tenham iniciativa: busquem informações por conta
própria. A internet é uma ferramenta extraordinária para isso.
258
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
259
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
260
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
Aprender requer disciplina mental, não comum entre os jovens que costu-
mam ter uma atenção múltipla, alternada e com pequena duração: dizem que são
capazes de estudar ao mesmo tempo em que escutam música, às vezes cantam
junto, assistem a programas de TV, comunicam-se com os amigos por meio de
sites de relacionamento etc. Aprender requer atenção continuada (não alternada)
e profunda (não superficial).
A distinção entre alunos e estudantes e o fracasso escolar remetem nova-
mente à questão do ensino, tema alardeado em jornais e na televisão.
261
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
262
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
263
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
264
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
TORNANDO-NOS MELHORES!
Podemos melhorar o mundo, tornando-nos melhores e tornando melhor o
ambiente em que estamos, quer estejamos na rua, numa loja, num parque, numa
fábrica, num elevador, numa escola ou numa universidade. Às vezes basta um
sorriso para quem nos olha ou um elogio sincero para uma pessoa que fez algo
que mereceu nossa admiração ou a admiração de outra pessoa.
Ultimamente está me chamando muito a atenção o fato de como pequenos
gestos podem ter grandes significados e grandes repercussões. Gestos compreen-
265
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
dem também palavras. Esses pequenos gestos ou palavras de que estou falando,
podem repercutir tanto positiva quanto negativamente. É, portanto, muito impor-
tante estarmos atentos ao que dizemos e ao modo como o dizemos, sobretudo em
uma sala de aula. Por outro lado, é bom não nos furtarmos a fazer elogios sinceros
quando alguém faz algo merecedor desse elogio, pois esse gesto fará bem a quem
o recebe e a quem o realiza.
Vigiar as próprias atitudes é uma forma de nos tornarmos melhores e, para
isso, é interessante perguntar-nos com frequência: – Hoje, já fiz algo que deu ale-
gria a alguém? Se não, talvez ainda haja tempo... – Hoje, fiz algo que magoou
alguém? Se não houver tempo hoje para pedir perdão, faça-o tão logo que possa e
você se sentirá melhor.
REFERÊNCIAS
DEGROOT, A. F.; THOMPSON, G. G. A study of the distribution of teacher approval and
disapproval among sixth-grade pupils. Journal of Experimental Education, n. 18, p. 51-75,
1949.
MORAIS, R. de (Org.). Sala de aula. Que espaço é esse? Campinas: Papirus, 1988.
266
O ESTÁGIO CURRICULAR COMO
DESAFIO NA FORMAÇÃO DOCENTE
1
Mestranda em Engenharia e Tecnologia de Materiais, Bacharel em Física Médica e Licenciada em Física
pela PUCRS, Professora da Escola Técnica em Saúde, do HCPA, e do Colégio Santa Dorotéia.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
268
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
269
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
270
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
271
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
CONCLUINDO
Durante a formação inicial, surgem diversos questionamentos entre a teoria
aprendida na universidade e a prática vivenciada nas escolas, e é preciso haver
convicção de que a busca por uma educação ideal passa por um pensar e repen-
sar constante, muitas vezes utópico, e que sem este ir e vir não são construídas
as competências necessárias ao futuro educador, que estará compelido a tomar
decisões diariamente numa realidade complexa, para além da sala de aula.
Os formadores devem contemplar certas necessidades formativas, em par-
ticular, a problemática da (re)elaboração pedagógica de conceitos científicos e o
desconhecimento sobre a complexidade da prática docente, pois a sala de aula
é um espaço complexo, sendo impossível caracterizá-la sem levar em conta tal
complexidade (SILVA, SCHNETZLER, 2008). O trabalho coletivo, aprendido desde
a formação profissional, permite aos sujeitos a construção de significados e o de-
senvolvimento do sentimento de cooperação, tão necessários ao trabalho docente.
Essa parceria entre os diferentes níveis de ensino oportuniza o trabalho em grupo,
a descontração e a possibilidade de discussão (DINIZ, CAMPOS, 2004). Nessa pers-
pectiva, o estagiário e os professores envolvidos podem ser estimulados a continu-
ar refletindo sobre suas práxis, sem acomodar-se e sem cair na mediocridade, pois
a formação deve ser encarada como um processo permanente. Assim, os estagiá-
rios são desafiados a configurarem-se como "decisivos tempos de metamorfose na
formação docente" (SILVA, SCHNETZLER, 2008, p. 183).
REFERÊNCIAS
ALARCÃO, I. (Org.) Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed Editora, 2001.
272
João Bernardes da Rocha Filho (Org.)
GARCÍA, J.E.; PORLÁN, R. Ensino de ciência e prática docente: uma teoria do conhecimento
profissional. Caderno pedagógico, UNIVATES n. 3, jul. 2000, p. 7-42.
MORIN, E. O método. – As idéias: habitat, vida, costumes, organização. 2. ed. Porto Alegre:
Sulina, 2001-2005. v.4, 2002.
SILVA, A. F da. Significado das vivências no estágio em pedagogia – séries iniciais. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2002.
273
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O livro Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções foi elaborado como uma
tentativa de contribuir para a solução do grave problema da falta
de professores de física no País, apresentando elaborações de quarenta autores
expertises no tema, concatenadas pelo organizador. O eixo comum de todos os
capítulos foi, assim, a melhoria da atuação profissional dos professores em ativi-
dade, pois depende disso a solução desta crise que enfrenta a educação.
Neste livro, financiado pelo CNPq e distribuído gratuitamente a todos os
professores de física da Região Metropolitana de Porto Alegre pelos sindicatos dos
professores locais – CPERS e SINPRO, foi oferecido aos professores uma ampla re-
lação de reflexões e resultados de pesquisa. Com essas contribuições, esperamos
que os professores atuais consigam tocar o espírito de seus alunos, incentivando-
os a seguirem carreira na licenciatura em física.
Como pôde ser visto nos três capítulos resultantes das pesquisas financia-
das pelo CNPq e pela FAPERGS, dos quais o organizador colabora como coautor,
os estudantes de ensino médio apontam a atuação equivocada de um grupo sig-
nificativo de professores como o principal agente responsável pelo esvaziamen-
to da carreira docente. Simultaneamente, os estudantes universitários de física
apontam os professores que tiveram como os principais responsáveis por suas
escolhas. Fica claro que não se tratam dos mesmos professores e que aqueles
que conseguem ensinar física despertando o interesse pela ciência são os que le-
vam seus alunos a seguirem a carreira docente. Os outros, porém, aparentemen-
te em muito maior número, contribuem opostamente para afastar os estudantes
desta opção profissional.
Também está evidente, embora este tópico não tenha sido abordado nas
pesquisas, que atingiram apenas estudantes, que a melhora na atuação dos pro-
1
Organizador deste livro.
Física no Ensino Médio: Falhas e Soluções
276