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Detectores para obtenção de imagens digitais

Tânia Aparecida Correia Furquim1

1 Introdução
O diagrama esquemático mostrado na Figura 1 mostra o caminho percorrido para a
formação e manuseio de uma imagem radiológica.

Figura 1 Esquema de obtenção e manuseio de uma imagem radiológica

Percebe-se que a atenuação da radiação de maneira diferenciada pelos tecidos e


órgãos do corpo humano, é o que vai possibilitar a formação de uma imagem
radiológica. Se todos os tecidos atenuassem da mesma maneira, não haveria
contraste e estruturas não seriam identificadas de forma individualizada. Assim, a
absorção dos raios X no detector deve apresentar um comportamento tal que não
possibilite muitas perdas em relação à imagem latente formada no momento da
atenuação pelos tecidos.

Como mostra o diagrama da Figura 2, a imagem radiológica pode ser formada pelo
sistema écran filme, sistema computadorizado e sistema digital. Enquanto o primeiro

1   Física   Médica   do   Instituto   de   Física   da   Universidade   de   São   Paulo.   Doutora   em   Tecnologia   Nuclear   -­‐  

Aplicações  (Instituto  de  Pesquisas  Energéticas  e  Nucleares  -­‐  SP),  Mestre  em  Biofísica  (Instituto  de  Física  
da  USP),  Especialista  em  Radiologia  Diagnóstica  (Associação  Brasileira  de  Física  Médica)  

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sistema produz imagens em filmes radiológicos, os dois últimos produzem imagens
digitais, as quais podem ser visualizadas em um monitor.

Figura 2 O diagrama ilustra alguns tipos de sistemas que formam as imagens radiológicas

2. Detectores para formação de imagens digitais


Os sistemas que produzem imagens digitais podem ser classificados como mostra a
Figura 3. As imagens podem ser produzidas por sistemas computadorizados
(Computerized Radiology - CR) e digitais. Este último pode ter ainda uma
subdivisão: diretos e indiretos.

Figura 3 Diagrama representando os sistemas que produzem imagens digitais, com a subdivisão da radiologia
digital, em função da conversão de raios X em luz

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1.1 Sistemas  Computadorizados  
Em 1975, George Luckey, um pesquisador da Kodak teve aprovada a patente de um
meio de armazenamento temporário que liberava imagem após estímulo por luz, os
fósforos. Essa patente chamava-se “Apparatus and Method for Producing Images
Corresponding to Patterns of High Energy Radiation” (Aparato e método para
produção de imagens correspondents a padrões de radiação em alta energia).
Nesse mesmo ano, a Kodak patenteou o primeiro sistema de varredura de ponto a
ponto para estes fósforos, o que deu nascimento ao sistema de radiologia
computadorizada. Em 19811, a Fuji começou comercializar o primeiro sistema
completo para radiologia, seguida de várias outras empresas como 3M, Agfa,
Fujistu, Siemens, Toshiba e Kodak.
Esses sistemas de radiologia computadorizada utilizam um chassi similar ao sistema
écran filme, e dentro dele, o detector utilizado é a placa de imagem, PI (ou Imaging
Plate, IP). Estas PIs são chamados fósforos fotoestimuláveis (Figura 4) uma vez que
possuem a propriedade de emitirem luz ao serem estimulados por fótons de luz, com
comprimentos de onda específicos, que é chamada de luminescência
fotoestimulável.

Figura 4 Composição de uma placa de imagem

Figura 5 Chassis contendo a placa de imagem em três tamahos distintos. Percebe-se que há uma
região com código de barras onde as imagens são identificadas e podem ser associados aos dados do paciente

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Os materiais utilizados nas placas de imagem utilizadas em radiologia
computadorizada em geral são os haletos de flúor bário dopado com európio
(BaFX:Eu, onde X pode ser Br ou I). A função do európio (Eu) é servir de ativador no
cristal para que haja a luminescência fotoestimulável2.

Os passos essenciais para a produção de uma imagem CR estão descritos abaixo.

Os raios X, quando atingem a PI, fornecem energia aos elétrons das


camadas externas dos átomos do flúor brometo de bário de forma que
estes mudam de nível de energia, saindo do estado fundamental. O Eu
então, perde elétron, tornando-se mais positivo, como mostra a Equação
1.

Eu 2+ → Eu 3+
Equação 1

Os elétrons liberados passam a ocupar vacâncias no cristal, criando a


imagem latente.
Acabada a irradiação do paciente, o chassi contendo a PI com a imagem
latente é levado ao leitor3. Esses últimos executam algumas etapas para
obter a imagem a partir da imagem latente na PI:
Um sistema mecânico introduz o chassi fechado para dentro do leitor
(Figura 6), onde a PI é retirada e enviada para um escâner;

A. B.

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Figura 6 Exemplos de leitores de placa de imagem A. Agfa, com leitura de um chassi, com o
monitor de verificação da imagem e, B. Philips, com leitura para múltiplos chassis.

Um feixe laser (comprimento de onda, λ, em torno de 630 nm) faz uma


leitura de toda a placa de imagem, com estimulação ponto por ponto. Os
elétrons então movem do cristal para a banda de condução, ocorrendo o
que mostra a equação 2:

Eu 3+ → Eu 2+
Equação 2

O retorno dos elétrons ao estado fundamental causa a emissão de luz (λ≈


460 nm) que é capturada por tubos fotomultiplicadores;
Essa luz é convertida em sinal de saída que é digitalizada e mostrada em
forma de imagem da região anatômica de interesse.
Assim, a PI é irradiada com uma intensa luz branca para fornecer a
energia suficiente aos elétrons que ainda não retornaram ao estado
fundamental. A PI então pode voltar ao serviço para ser reutilizada4;

A imagem digital que é gerada pelo sistema CR é visualizada inicialmente em um


monitor local e dali, enviada ao Picture Archiving and Communications Systems
(Sistema de arquivo de imagem e comunicações) – PACS. Assim, essa imagem
pode ser avaliada pelo radiologista para obtenção de diagnóstico.

Comparando-se o sistema CR com o écran-filme pode-se dizer3:


Possui uma limitação em relação à resolução espacial, uma vez que
chega a 3 a 5 pl/mm, enquanto os sistemas écran-filme chegam a 10-15
pl/mm em radiologia convencional;
A resolução de contraste pode ser manipulada e tornar-se melhor, uma
vez que é adequada ao observador;
Possui uma eficiência de detecção quântica maior, o que significa que
maior habilidade em converter os raios X que saem dos pacientes em
dados úteis para a formação da imagem diagnóstica.
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Muitos fabricantes de sistemas CR proporcionam um método de relacionar a dose
fornecida ao paciente aos valores de tons de cinza obtidos na região anatômica
irradiada. Como a faixa dinâmica é ampla, pode haver sub ou super exposição, e
desta forma haver perda de informação. Para avaliar a exposição apropriada à PI
deve-se observar os indicadores de exposição (Tabela 1) associados aos
histogramas de análise.

Tabela 1 Indicadores de exposição fornecidos pelos respectivos fabricantes de sistemas CR

Fabricante Índicador de exposição Símbolo Cálculo

Fuji Sensitivity number S S ≈ 200/Exposição (mR)

Kodak Exposure Index EI EI ≈ 1000 x log (Exposição [mR]) + 2000

Agfa Relative exposure database lg M --

Konica Relative EXposure REX Similar a S

1.2 Sistemas  Digitais  


Os sistemas digitais de placas planas (flat panel) foram introduzidos em meados da
década de 19905 em imagem radiológica. O surgimento da radiologia digital (Digital
Radiology - DR) trouxe a expectativa de abaixar a dose de radiação X aos pacientes
minimizando a repetição de exames devido à qualidade de imagem insuficiente ao
diagnóstico. Dois tipos de detectores foram desenvolvidos: de silício amorfo (a-Si) e
de selênio amorfo (a-Se). Esses detectores podem ser classificados de acordo com
o tipo de processo de conversão da energia de raios X em cargas elétricas.

1.2.1 Sistemas digitais indiretos

Os sistemas digitais indiretos são assim chamados por utilizar um material cintilador
que converte os fótons de raios X incidentes em luz antes que sejam convertidos em
cargas elétricas e formem a imagem, como mostra o esquema da Figura 7.

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Figura 7 Diagrama ilustrando o processo de conversão de energia dos raios X em cargas
elétricas do sistema de detecção indireta.

A detecção indireta pode utilizar dois tipos de detectores: dispositivo de carga


acoplada (charge-coupled device – CCD) e fotodiodos com transistor de filme fino
(Figura 8).

1.2.1.1 Cintilador + CCD

O dispositivo de carga acoplada (CCD) é um chip eletrônico (sensor) que contém


elementos sensíveis à luz, similar aos CCDs encontrado em câmaras fotográficas.
Por possuir um tamanho pequeno, para compor o detector é necessário montar uma
matriz de CCDs.
O processo de formação de imagem começa com a incidência dos raios X que saem
dos pacientes e chegam a um material cintilador (iodeto de césio dopado com tálio,
CsI:Tl, ou óxissulfito de gadolínio, Gd2O2S) que tem a propriedade de converter a
energia dos raios X em luz. A luz alcança o CCD e, então, é transformada em cargas
elétricas6 (Figura 8 A.). Esse sinal analógico, em forma de cargas, é convertido em
sinal digital no conversor de sinal analógico-digital (analog-to-digital converter -
ADC).

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Raios X

Raios X

Luz Lu
z

Sinal analógico

Sinal analógico

Sinal Digital
Sinal Digital
A. B.
Figura 8 Esquema de dois tipos de detectores digitais indiretos utilizando: A. câmaras CCD e B.
Fotodiodos com transistor de filmes finos

1.2.1.2 Cintilador + fotodiodo + transistor de filme fino

Neste caso, o componente que recebe a luz que é produzida pelo material cintilador
(CsI:Tl ou Gd2O2S) é o fotodiodo com transistor de filme fino (thin-film transistor –
TFF).

O fotodiodo, de silício amorfo (a-Si), transforma a luz em cargas elétricas que são
capturadas pelo arranjo de TFFs, capacitores de armazenamento e eletrônica
associada3. Esses TFFs são relativamente simples de produzir e são fixos. A
proposta dos capacitores é coletar as cargas e armazená-las. Um ADC converte
essas cargas em sinal digital, como mostra a Figura 8B.

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1.2.2 Sistemas digitais diretos

Esses sistemas possuem muitos componentes :


Fonte de alta tensão;
Eletrodo do topo;
Camada dielétrica;
Fotocondutor;
Eletrodo de coleta;
Transistor de filme fino (TFF);
Capacitor de armazenamento de cargas;
Vidro como substrato.

O componente principal é o fotocondutor, que geralmente é o selênio amorfo (a-Se),


que tem a função de converter os fótons de raios X diretamente em cargas elétricas
(Figura 9). Outros fotocondutores podem ser utilizados, porém, a escolha do a-Se se
dá por suas propriedades de detecção e maior alta resolução espacial quando
comparada aos demais.

Figura 9 Diagrama ilustrando o processo de conversão de energia dos raios X em cargas


elétricas do sistema de detecção direta

Um arranjo de TFFs e eletrônica associada ao a-Se coletam e armazenam as cargas


elétricas produzidas. O sinal analógico então, é convertido em sinal digital por um
ADC.

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Raios X

Sinal analógico

Sinal Digital
Figura 10 Esquema de detectores digitais diretos utilizando fotocondutor

O arranjo de TFFs é chamado de matriz de elemento detector e está associada à


matriz de pixels produzidos na imagem, como mostra a Figura 11. Pode-se perceber
que a área sensível para a detecção de sinal tem uma perda de informação, onde
está posicionada a parte eletrônica. O tamanho do pixel e espaçamento entre eles
(pitch) determinam a resolução espacial da imagem.

Figura 11 Diagrama exemplificando a matriz de elementos detectores de um sistema de


radiologia digital

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Uma característica importante neste tipo de detector é o fator de preenchimento,
que considera a área total do pixel e a área sensível. Esse fator determina o quanto
da informação pode ser perdida (equação 3).

Área sensível do pixel


Fator de preencimento = Equação 3
Área total do pixel

Por exemplo, se o fator de preenchimento é de 85 %, significa que 15 % do pixel não


é sensível à informação.
Quanto maior o fator de preenchimento maior será a resolução espacial e a
resolução de contraste do detector3.

Referências:

1
SCHAETZING, R. Computad Radiography Technology. In: Advances in Digital Radiography: RSNA
Cathegorical Course in Diagnostic Radiology Physics, Chicago, 2003

2
BUSHONG, S. C. Ciência, Radiológica para Tecnólogos: Física, Biologia e Proteção. Tradução
da 9ª. edição, Elsevier Editora Ltda., São Paulo, 2010.

3
SEERAM, E. Digital Radiography: An Introduction. Delmar, New York, 2011.

4
FURQUIM, T.A.C., COSTA, P. C. Garantia de Qualidade em Radiologia Diagnóstica. Revista
Brasileira de Física Médica, v. 3 (1), p. 91-99, 2009.

5
SIEBERT, J. A., MORIN, R. L. The standardized exposure index for digital radiography: an
opportunity for optimization of radiation dose to the pediatric population. Pediatr. Radiol., v. 41, p. 573-
581, 2011.

6
YAFFE, M. J. Detectors for Digital Mammography. In: DIEKMANN, F., BICK, U. Digital
Mammography. Springer, Berlin, 2010.

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