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Como Ajudar Mulheres

com Bulimia

Elyse Fitzpatrick1

Bulimia é um ciclo habitual de com- encontraremos mais e mais casos de bulimia


portamento caracterizado por ingerir uma em nossos aconselhamentos. Precisamos de
grande quantidade de alimentos e, em respostas seguras, claras e bíblicas, que falem
seguida, induzir o vômito ou alguma outra ao coração.
forma de purgação. Bulimia — literalmente Neste artigo, pretendo expor as ma-
“fome de boi” — ganhou, na última década, nifestações fisiológicas e comportamentais
um grande espaço na mídia com “vítimas” da bulimia, descrever algumas motivações
famosas como, por exemplo, a princesa pessoais mais comuns, identificar os pa-
Diana. À medida que os comportamentos e drões habituais errados e aqueles que devem
riscos característicos da bulimia são objeto de substituí-los, e esboçar um plano específico
sensacionalismo, com modelos e bailarinas que você, conselheira ou conselheiro bíblico,
que confessam o uso destes procedimentos pode usar com a sua aconselhada.
para controle do peso, muitas jovens tentam Antes de começar, quero fazer uma ob-
fazer o mesmo. Divulgar amplamente o servação sobre a nomenclatura diagnóstica
assunto e “educar” o público a respeito da ou “rótulos”. O que é “bulimia”? À seme-
bulimia induzem, ironicamente, um número lhança dos órgãos governamentais que têm
maior de mulheres a praticá-la. Nos grupos exigido informações verdadeiras nos rótulos
de emagrecimento que eu coordeno, tenho de produtos comercializados, os conselheiros
ouvido mulheres dizerem (brincando): bíblicos também precisam zelar pela verdade.
“Estou orando para ter bulimia”. Já que Qual é a verdade a respeito da nomenclatura
está na “moda” ser “bulímica”, imagino que usada nos diagnósticos? Em certo sentido,
ela pode ser útil. Por exemplo, estou usando
o termo “bulimia” neste artigo e você tem
1
Tradução e adaptação de Helping Bulimics Publicado uma ideia, em poucas palavras, do que estou
em The Journal of Biblical Counseling. v. 11, n.2, Winter querendo dizer. Todavia, há certos proble-
1993, p. 16-20. mas inerentes a esta nomenclatura que me

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levam a resistir ao uso do termo “bulimia” como causa comportamentos específicos, ela
com as aconselhadas. tem um diagnóstico, prognóstico e patologia
Primeiro, esta nomenclatura tende a estabelecidos com base orgânica.
promover a ideia de doença ou de um mode- Atualmente, muitos comportamentos
lo médico. Por ter um problema cujo nome — alcoolismo, co-dependência, bulimia,
soa ligado à medicina e é usado pela comu- anorexia etc. — estão sendo classificados
nidade médica, a aconselhada pode pensar popularmente como doença e tidos como
que está com uma doença. “Eu estou com doenças reais. É verdade que há certos efeitos
bulimia” pode ser usado da mesma forma fisiológicos da prática contínua da privação
que “Eu estou com gripe” ou “Eu estou com de alimentos ou da glutonaria seguida de
tuberculose”. Em vez de dizer “Eu pratico vômito, mas não há agentes químicos co-
um comportamento bulímico”, o que seria nhecidos, lesões cerebrais, genes, vírus ou
mais exato, ela fala sobre seus maus hábitos bactérias que causam estes comportamentos.
como se eles fossem uma doença com que Meu ponto de vista é o seguinte: bulimia não
ela “está” e sobre a qual não tem controle. Os é uma doença; ela é um comportamento.
termos médicos são obviamente úteis e apro- Segundo, o uso desta nomenclatura
priados para descrever os problemas somáti- pode enganar sutilmente a aconselhada e
cos, ou seja, as anormalidades orgânicas que levá-la a crer que ela tem uma desculpa para
prejudicam o funcionamento fisiológico nor- pecar. “Não há nada que eu possa fazer...
mal e podem derivar de infecções, fraquezas Não posso parar com isso... Eu estou com
constitucionais ou estresse ambiental.1 Em uma doença, estou com bulimia... foi o que
muitos casos, a pessoa não é responsável por o conselheiro me disse...” Nenhum de nós
estar doente. Em outros, a doença é causada (incluindo as nossas aconselhadas) precisa
por determinados comportamentos como de novas desculpas para pecar (“É uma do-
fumar, consumir bebidas alcoólicas em ex- ença”). Somo peritos em arranjar desculpas
cesso, manter relacionamentos promíscuos, por conta própria! Somos responsáveis por
abusar de drogas, alimentar-se mal etc. Mas nosso comportamento,3 quer este compor-
mesmo nestes casos em que a doença tem tamento tenha ou não um nome que se
pareça com doença. Desculpas não somente
“desculpam”, mas elas também condenam.
2
Há várias obras que lidam com a diferença entre
Se a sua aconselhada acredita que ela está
o modelo médico (doença) e o modelo bíblico com uma doença que não tem causa nem
(pecado) e que podem nos ser úteis. Destacamos cura conhecidas, ela pode facilmente perder
BOBGAN, Martin and Deidre, 12 steps to destruction. a esperança e se tornar uma presa de soluções
Santa Barbara, Calif.: EastGate, 1991; PLAYFAIR, enganosas.
William L. The useful lie. Wheaton, Ill.: Crossway, 1991;
WELCH, Edward T. The counselor’s guide to the braín and Terceiro, o uso desta nomenclatura
it’s disorders. Grand Rapids, Mich.: Zondervan, 1991. pode levar algumas aconselhadas a crer
Também há vários livros seculares que identificam que Deus precisa “curá-las” para que pos-
corretamente a diferença entre doenças “reais” e sam mudar. Se sofre de uma doença, a sua
problemas comportamentais: PEEL, Stanton. The
diseasing of America. Lexington, Mass.: Lexington,
aconselhada pode vir a crer que o único
1989; FINGARETTE, Herbert. Heavy drinking the
myth of alcoholism as a disease. Lexington, Mass.:
D.C.Heath, 1989. Romanos 14.12
3

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caminho para ficar livre deste “sofrimento” te em desconforto estomacal, sono, vômito e
seja um encontro sobrenatural com o Se- outras formas de purgação (comportamentos
nhor. O processo de libertação de hábitos compensatórios). Os episódios bulímicos são
escravizadores é sobrenatural e ocorre no normalmente planejados, secretos e rápidos.
contexto da comunhão com Deus. Todavia, Tive oportunidade de ler o relatório de uma
o desejo de ser “curada” de modo especial mulher que ingeriu alimentos no total de 54
do comportamento bulímico não é bíbli- mil calorias em um período de oito horas,
co. A aconselhada pode correr em vão de alternando com vômitos autoinduzidos.
ministério em ministério de libertação ou Também há casos documentados de mulhe-
cura interior, procurando alguém com fé res que tomaram até duzentos laxantes antes
e poder suficientes para “curá-la”. É de se de dar início a um episódio bulímico ou que
esperar que ela acabe frustrada, desiludida, engoliram “marcadores” (pequenos pedaços
sem esperança. A Bíblia é clara sobre como de plástico colorido) para que pudessem
lidar com problemas que envolvem pensa- controlar a eliminação completa de todo o
mentos e comportamentos errados. Ela nos alimento ingerido.
dá todas as ferramentas de que precisamos Estes comportamentos são mais co-
para a vitória sobre o pecado. muns entre as mulheres jovens, mas não há
Quarto, o uso desta nomenclatura des- um limite de idade definido. Muitas vezes,
via os nossos olhos da verdade e os orienta em adolescentes começam a praticá-los durante
direção ao engano atraente. Uma doença não o ensino médio para controlar ou eliminar
é algo tão duro de encarar como o pecado. o aumento de peso natural entre os catorze
Quando estou com um mal-estar físico, em e dezesseis anos. Mais tarde, recorrem a este
lugar de reconhecer que sou egocêntrica e comportamento vez ou outra durante os
quero o melhor para mim, eu preferiria pensar anos da faculdade ou, na vida adulta, após
que meu resfria-do me faz agir de maneira o parto. Estatísticas mostram que muitas
indelicada com minha família. Há perigos no mulheres com bulimia vêm de famílias em
uso de “rótulos” com as aconselhadas, a menos que os pais são obesos.
que tanto elas como você saibam com clareza A prática contínua da bulimia pode ter
o que eles significam ou não. Neste artigo, vários efeitos fisiológicos: erosão do esôfago
faço uso do termo “bulimia” apenas com o e dos dentes, alterações no processo de di-
propósito de ser breve, e quero deixar claro gestão dos alimentos, vômito involuntário,
que defino bulimia como um determinado irregularidade no funcionamento intestinal
tipo de comportamento e não de doença. ou diarréia grave, ausência da menstruação,
E agora, mãos à obra. Bulimia é um batimento cardíaco fraco, hipotermia, cres-
padrão habitual de comportamento caracte- cimento de penugem no corpo. Embora o
rizado por episódios frequentes de ingestão peso esteja geralmente dentro da normali-
copiosa de alimentos,4 que resulta geralmen- dade, há oscilações frequentes dependendo
dos episódios bulímicos, dos procedimentos
4
NdT. O termo binge - usado na língua inglesa para compensatórios, das dietas e jejuns. Se você
descrever um episódio de ingestão alimentar copiosa
e descontrolada em um curto período de tempo - for procurado por uma aconselhada que
não tem tradução adequada para o português, sendo apresenta sinais de bulimia ou alguns dos
por vezes referido como “comer compulsivo”, sintomas fisiológicos mencionados acima,

comilança”, “ empanturramento”. Vamos dar
preferência ao uso da expressão episódio bulímico.
sua primeira tarefa é encaminhá-la para um

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médico, pois precisa ter certeza de que está O episódio bulímico pode ter curta duração,
lidando de fato com algo causado por um especialmente se ela for interrompida por
comportamento e não por um problema seus familiares, ou ele pode prosseguir du-
orgânico. rante horas, intercalado à ingestão copiosa
A seguir, identificarei quatro entre as de alimentos, ao remorso e ao desânimo com
motivações mais comuns na vida da mulher as práticas de purgação.
com comportamento bulímico, ligadas à Não se engane — esta compulsão
cobiça ou avidez. Não quero dizer com isso relacionada à ingestão de alimentos é tão
que todas as mulheres que praticam a buli- forte quanto aquela enfrentada pelos que
mia têm automaticamente estes desejos no têm o hábito de beber em excesso ou usar
controle de sua vida, nem mesmo quero eli- drogas, e provavelmente está presente entre
minar a possibilidade de haver outros desejos os membros de sua igreja. Você precisa
também presentes. Creio apenas que estes colher dados com cuidado, descobrindo
são os mais comuns. Use-os como ponto de os “gatilhos” do comportamento bulímico
partida para começar a pensar biblicamente da sua aconselhada. O que desencadeia os
a respeito das pessoas que passam por ciclos episódios bulímicos? Você pode descobrir
de episódios bulímicos e purgação. as inclinações da carne e dos pensamentos.5
Talvez os episódios bulímicos sejam desen-
1. Hábitos de cobiça e o desejo de cadeados por preocupação, ira ou estresse,
gratificação instantânea: “Um ou quem sabe por desejos naturais do
grande desejo de comidas no corpo associados a tensão, fatiga, fraqueza
deserto” ou tensão pré-menstrual. Pode ser parte do
Na vida da mulher com comporta- comportamento habitual da mulher dar lu-
mento bulímico, encontramos certos com- gar a um episódio bulímico às três da tarde,
portamentos que ela talvez descreva como aos sábados ou no primeiro dia de seu ciclo
“compulsivos”. Ela pode identificar uma menstrual. Seja como for, dados sobre o “ga-
forte sensação física de estar sendo compe- tilho” são importantes para que você possa
lida à ingestão copiosa e descontrolada de depois ensiná-la a se despojar dos velhos
alimentos. Assim que ela começa a comer, hábitos e revestir-se de novos hábitos.
ela pode nem mesmo sentir o sabor do ali- Estou convencida de que esta “com-
mento. Quando enche a boca de comida, ela pulsão” seria melhor definida biblicamente
pode não pensar de modo consciente sobre como uma cobiça hábitual. Cobiça é um
o que está fazendo, pode perder a noção do desejo voraz de obter mais do que aquilo que
tempo e de quanto alimento ingeriu. Ela você precisa ou merece, e já que cobiça é um
pode sentar em frente à televisão e assistir assunto tratado amplamente na Bíblia, há
a um programa qualquer enquanto devora como oferecer uma ajuda consistente à sua
batatas fritas, taças de sorvete, pacotes de aconselhada. Para começar, podemos gerar
salgadinhos ou biscoitos. Ela experimenta esperança desfazendo o aspecto místico deste
um certo prazer no comer, não apenas pelo comportamento (“compulsão”) e transpor-
gosto e textura do alimento ou pela reação tando-o para o campo da vivência cotidiana
química do açúcar no sangue, mas também
pelo relaxamento e calma que vêm após a
autoindulgência apressada e quase frenética. 5
Efésios 2.3

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e compreensível. Você pode enfatizar que a a ligação que o Senhor estabeleceu entre au-
sua aconselhada não está sozinha em sua luta toindulgência e preocupação com comida e
com a cobiça (1Co 10.13). O povo de Israel autoindulgência e preocupação com bebida.9
foi culpado de cobiça no deserto (Nm 11.4, Preocupação é um sub-produto da confiança
6, 13-14, 31-34), e muitos dos israelitas em si mesmo e deve ser tratada no contexto
foram até mesmo enterrados na “sepultura deste hábito de cobiça. O apóstolo Paulo tra-
do forte desejo”. As causas deste “forte de- ta da cobiça em Colossenses 3.5, afirmando
sejo” estão ilustradas na história de Israel. O que ela equivale à idolatria e é parte da velha
Salmo 78, a partir do versículo 17, fala em natureza que deve ser posta a morte. Como
rebeldia, tentar a Deus, falar contra Deus qualquer outra forma de idolatria, o que
e não ter fé em Deus: “porque não creram tem início como algo ocasional, agradável e
em Deus, nem confiaram na Sua salvação” inofensivo, toma-se uma armadilha escravi-
(Sl 78.22). Este Salmo fala com clareza dos zadora — uma “sepultura de fortes desejos”.
fortes desejos como sendo comuns e um Como conselheiro ou conselheira, é útil que
sub-produto da confiança em si mesmo para você use o termo “cobiça habitual” ao invés
obter satisfação e salvação, ao invés de uma de compulsão.
confiança depositada em Deus. Quando a
sua aconselhada está tensa, irada, triste ou 2. Um desejo pecaminoso de per-
preocupada, ao invés de se voltar para o seu feccionismo “aparente” e orgulho:
gracioso Salvador, ela procura salvar a si mes- “O fariseu interior”
ma e aplacar seus sentimentos de desconforto Uma combinação específica de moti-
com o alimento. Está evidente que ela precisa vações pecaminosas e implacáveis costuma
aprender a confiar em Deus.6 governar a mulher com comportamento
O Novo Testamento também fala bulímico. Associado aos hábitos domina-
amplamente sobre cobiça. Jesus nos reco- dores que envolvem cobiça, preocupação e
mendou: “Tende cuidado e guardai-vos de autoindulgência, há um forte desejo de estar
toda e qualquer avareza; porque a vida de no controle da situação e ter uma aparência
um homem não consiste na abundância dos bonita. As consequências naturais de episó-
bens que ele possui”.7 Se Jesus nos advertiu dios bulímicos regulares são o aumento do
a respeito de algo, há uma boa possibilidade peso e o desconforto. A mulher que pratica
de que sejamos enganados por aquilo. Ele a bulimia não está disposta a pagar o pre-
prossegue: “Por isso, eu vos advirto: não ço da sua autoindulgência. Ela oculta seu
andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao hábito, é desonesta e transfere a culpa para
que haveis de comer... Porque a vida é mais não encarar o aumento de peso resultante.
do que o alimento... Não andeis, pois, a Consequentemente, ela recorre à purga-
indagar o que haveis de comer ou beber e ção — pode usar laxantes ou autoinduzir
não vos entregueis a inquietações.”8 Perceba o vômito, pode jejuar por vários dias para

Jeremias 17.5-8
6 9
Veja também Lucas 21.34: “Acautelai-vos por vós
mesmos, para que nunca vos suceda que o vosso
Lucas 12.15
7
coração fique sobrecarregado com as consequências
Lucas 12.22, 23, 29
8
da orgia, da embriaguez e das preocupações deste
mundo...”

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compensar o episódio bulímico ou pode tamento bulímico recorre à purgação, ela
calcular a quantidade necessária de exercícios está querendo alcançar um alvo que não é
para compensar o aumento de peso. Em bíblico. O alvo apropriado não é meramente
quaisquer destes casos, ela está evitando a ter uma “boa aparência” (embora não haja
verdade sobre a sua autoindulgência. nada de errado com a boa aparência), mas
Mateus 23 fala sobre o costume de agradar a Deus com um coração submisso
viver pela aparência. Neste capítulo, Jesus a Ele. Amar e esforçar-se por alcançar os
confronta os fariseus e os escribas por sua padrões do mundo,10 ter “boa aparência” e
hipocrisia e seu orgulho: “Praticam todas buscar a aprovação de outros pela aparência
as suas obras com o fim de serem vistos dos física não deve encontrar lugar no coração
homens”; “Limpais o exterior do copo e do da mulher cristã. Julgar a si mesma ou aos
prato, mas estes, por dentro, estão cheios outros de acordo com a carne é pecado.
de rapina e intemperança”; “Exteriormente Visto que a sua aconselhada tem o
pareceis justos aos homens, mas, por dentro, pensamento centrado em descobrir como os
estais cheios de hipocrisia e de iniquidade”. outros a vêem, ela julgará com facilidade e
O Senhor fala com clareza ao coração de frequência as pessoas que lutam com excesso
todos nós. A menos que Ele nos liberte, de peso.11 Ela pode se assemelhar aos fariseus
na verdade, somos todos fariseus, prontos descritos por Jesus em Lucas 18.9, “...que
a agradar a homens e desejosos de cobrir confiavam em si mesmos, por se considerarem
o nosso pecado para que outros pensem o justos, e desprezavam os outros”. Pergunte-lhe
melhor a nosso respeito. À semelhança do como ela vê as pessoas que estão acima do
que Eva fez no jardim, a nossa aconselhada peso. Ela se compraz em receber cumpri-
faz vestes de folhas para si mesma: “Não mentos do tipo “Você está bonita! Meus
me veja como realmente sou!”. Somente o parabéns!”? Talvez ela goste de flertar (os
coração humilde, transparente e confiante, conselheiros devem estar atentos a esta ten-
que se abre diante de Deus e dos outros, dência). Há possibilidade de envolvimento
aprenderá a se libertar desta escravidão. atual ou anterior em comportamento imoral.
Para tanto, ela precisa se comprometer a
confessar todos os episódios bulímicos ou de
purgação ao marido (se for casada), aos pais
10
1 João 2.15-16. Perceba a ligação que este texto
estabelece entre o amor ao mundo, a cobiça e o
ou colega com quem mora, ou a você como orgulho. O padrão do mundo, “Eu devo ter boa
conselheiro(a). Não deve mais encobrir! Ela aparência para ser aceita e respeitada (adorada e
deve se comprometer a registrar toda a comi- obedecida)”, está em franca oposição à Palavra de
da que come durante determinado período Deus que ordena que a beleza da mulher não seja

meramente exterior... mas... o interior do coração,
de tempo (talvez seis meses).
unido ao incorruptível trajo de um espírito manso e
Conforme afirmei no artigo anterior, tranquilo, que é de grande valor diante de Deus”. Este
Corno Ajudar Mulheres que Comem em texto de 1Pedro será útil para mostrar o contraste entre
Excesso, não há uma ordem bíblica para ser o amor que a sua aconselhada nutre pelas aparências e
magra. Há mandamentos para glorificar a o amor do Senhor por um coração puro. Veja também
1Samuel 16.7; Isaías 3.16, 18-23 (perceba a ligação
Deus com o nosso corpo, praticar o domínio entre amor excessivo pela aparência, orgulho e “olhos
próprio, fazer tudo para a glória de Deus e sedutores”); Mateus 23.28; Romanos 2.28; 2Coríntios
para agradá-lO, mas não há uma ordem para 5.16; 1Timóteo 2.9-10.
ser magra. Quando a mulher com compor- 11
Romanos 14.10,11.

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Ela precisa aprender a se humilhar, a começar é justificado por obras da lei, e sim mediante
a olhar para as mulheres que estão acima do a fé em Cristo Jesus, também temos crido em
peso como irmãs (e não rivais) pelas quais ela Cristo Jesus, para que fôssemos justificados
deve orar fielmente, e olhar para os homens pela fé em Cristo e não por obras da lei, pois,
como irmãos e não objetos de conquista. por obras da lei, ninguém será justificado”.
Em outras palavras, ela precisa aprender a Independentemente de estar servindo a velha
amar o próximo como já ama a si mesma. lei ou o seu próprio legalismo13, ela não pro-
Uma tarefa prática útil pode ser estabelecer gredirá na caminhada com Cristo enquanto
contato com outras mulheres, descobrir fa- procurar servir a lei ao invés da graça.
tos significativos ou interessantes a respeito Arrependimento e confissão humildes
delas, aprender a compartilhar com elas o são assuntos importantes para discutir nos
evangelho, confessar seu orgulho pecamino- encontros, incluindo textos como 2Corín-
so e a autoindulgência, e orar com elas. tios 7.9-10, que contrasta a diferença entre a
tristeza segundo o mundo e a tristeza segun-
3. Um desejo de salvar a si do Deus para o arrependimento.14
mesma do seu pecado.
Creio que a purgação é de certa forma 4. A preguiça e o desejo de
um ato de penitência ou auto-flagelação, alcançar soluções instantâneas
na tentativa de mascarar ou reparar a au- “Trabalho diligente — o que é isso?
toindulgência pecaminosa. A penitência, Despojar-se e revestir-se — isso exigirá
em si, é pecado, pois expõe o coração que tempo e esforço”. A sua aconselhada talvez
confia em seus próprios esforços em vez de queira se ver livre do desconforto dos epi-
confiar em Cristo e Sua provisão. A pedra de sódios bulímicos ou mesmo do embaraço
tropeço da cruz é justamente o fato de que da purgação. Entretanto, com certa fre­
não podemos salvar a nós mesmos. Qualquer quência, quando você traça as linhas gerais
tentativa neste sentido despreza o sangue do trabalho diligente que precisa ser feito,
precioso de Cristo. este não lhe parece convidativo. Por que toda
É preciso investir algum tempo no esta resistência, mesmo por parte de uma
aconselhamento para esclarecer a diferença aconselhada que reconhece seus pecados no
entre arrependimento e penitência. Reco- comportamento e na motivação?
mendo o livro de C. John Miller Repentance Repare como Provérbios une a pre-
and 20th Century Man (Arrependimento e o guiça à cobiça. “O preguiçoso deseja e nada
Homem do Século 20).12 Estude com a sua tem...15 e “O preguiçoso morre desejando,
aconselhada Filipenses 3.7-9: “Mas o que, porque as suas mãos recusam trabalhar.
para mim, era lucro, isto considerei perda... O cobiçoso cobiça todo o dia...”16 A sua
para ganhar a Cristo e ser achado nele, não
tendo justiça própria, que procede de lei, senão
Para uma abordagem de como as pessoas constroem
13
a que é mediante a fé em Cristo, a justiça que
seus próprios sistemas legalistas, consulte o artigo de
procede de Deus, baseada na fé” e Gálatas Edward Welch “O aconselhamento bíblico é legalista?” em
2.16: “sabendo, contudo, que o homem não Coletâneas de Aconselhamento Bíblico v.4, p. 28.
14
Veja também Salmo 103.3, 12-13; Isaías 30.15; Joel
2.12-13; Hebreus 10.17; 1João 1.8-9.
Publicado por Christian Literature Crusade, 1975.
12 15
Provérbios 13.4

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aconselhada precisa aprender que pegar um A indolência, a preguiça e o desejo
atalho, o caminho da preguiça (a purgação), de “pegar um atalho”, que podem estar tão
levará apenas a uma cobiça cada vez maior óbvios nesta área específica da vida da sua
(o episódio bulímico) e finalmente à morte. aconselhada, podem se estender a outras
Trabalhar com diligência para se despojar de áreas também. Há outras situações em que
hábitos de autoindulgência pela prática de ela busca a saída mais fácil? Aprender a ser
uma dieta alimentar sábia, registrando todo totalmente honesta sobre o que ela come e
o alimento ingerido, vivendo em espírito onde ela consegue esta comida será para ela
de gratidão e oração ao invés de cultivar um grande passo rumo à santificação em
amargura e ansiedade levará finalmente a muitas outras áreas.
uma mudança verdadeira em sua vida. Este
processo de santificação não é apenas uma Um plano de ajuda
questão de aprender determinados hábitos A seguir, você encontra um plano
alimentares. Isto faz parte, mas é preciso que pode usar para identificar como as
que aconteça uma mudança de acordo com informações anteriores caracterizam indivi-
o propósito de Deus em outras áreas da sua dualmente a sua aconselhada.
vida. Também é bom lembrar que esta mu- 1. Certifique-se de que a sua aconselhada
dança será algo lento, uma firme progressão é salva. Verifique sempre o estado do
rumo à conformação com a imagem de seu relacionamento com Deus. Há
Cristo, e não uma transformação da noite convicção de pecado? Há confiança na
para o dia. Com frequência, o Senhor usa os misericórdia e poder de Deus?
hábitos envolvidos na bulimia para revelar 2. Colha dados a respeito dos seguintes
outras áreas de dúvida e incredulidade. A sua aspectos:
aconselhada precisa ser encorajada a traba- a. Início do comportamento
lhar diligentemente, sabendo que o Senhor ­bulímico.
também está operando nela para resultar na b. Histórico familiar:
sua liberdade e na glória dEle.17 - relacionamento com pais
Há muitas promessas maravilhosas e irmãos,
sobre a recompensa da diligência que enco- - problemas de peso na família,
rajarão sua aconselhada a continuar lidando - dietas e comportamento alimen-
com a autoindulgência de acordo com o tares na família.
método de Deus.18 Além disso, considere c. Peso atual e histórico de alterações
que Efésios 4.28 também fala em desones- do peso.
tidade (roubo) como tendo relação com a d. Comportamento alimentar atual.
indolência e a aversão ao trabalho. Muitas Faça com que ela mantenha um
mulheres, de fato, roubam comida de lojas diário alimentar durante algumas
ou de outras pessoas e mentem a respeito semanas, registrando tudo quanto
daquilo que comeram. come e quando come.
e. Problemas fisiológicos atuais.
Provérbios 21.25,26
16 Encaminhe para uma consulta
Filipenses 2.13
17 médica.
Deuteronômio 6.17; 28.1; Provérbios 10.4; 12.24,
18

27; 13.4; 21.5

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3. Estabeleça o propósito para o aconse- b. Identificar aquilo que a tenta. Bus-
lhamento — não aceite nada menos car o Deus de misericórdia e graça
que viver para agradar a Deus. para receber ajuda em tempo de
4. Planeje como lidar com a resistência — necessidade (Hb 4.16).
lembre-se de Provérbios 26.16. c. Deste momento em diante, evitar
5. Construa esperança! lugares e alimentos que desenca-
6. Estabeleça prestação de contas nos deiam os episódios bulímicos.
seguintes aspectos: d. MUDAR. MUDAR. MUDAR!
a. Envolvimento da família. Faça com que ela mude de lugar
b. Confissão de episódios bulímicos ou atividade, ou mesmo saia de
e purgação. casa se for preciso.
c. Registro diário do alimento inge- e. Lembrar que é responsável por
rido e do momento devocional. prestar contas dos episódios bulí-
d. Pesagem semanal (no caso de um micos — deve pegar uma caneta e
conselheiro, deve ser feita pela começar a escrever o que comeu.
secretária ou outra mulher). f. Lembrar que a purgação como meio
e. Memorização semanal de versí- de escape não é mais uma opção
culos. Os versículos mencionados para ela. Ela deve se voltar para Jesus
anteriormente podem ser úteis. como seu Salvador, o verdadeiro
f. Lista de motivos de louvor a meio de escape (1Co 10.13).
Deus. g. Entoar seus cânticos e hinos favo-
g. Oração e ação de graças antes de ritos e começar a louvar a Deus.
comer qualquer coisa — 1Timóteo h. Chamar uma pessoa amiga para
4.4-5. orar com ela.
h. Eliminação de todos os laxantes, diuré- i. Mesmo que ela já tenha dado início
ticos e balanças que tiver em casa. ao episódio bulímico, ela pode pa-
i. Se possível, comprometer-se com rar, clamando pela ajuda de Deus
nunca comer sozinha. Comer j. Colocar trechos de Isaías 53 na
sozinha facilita os episódios bulí- porta da geladeira e despensa. Deve
micos. De qualquer forma, você lê-los.
deve lembrá-la de que nunca está k. Estar ciente dos “gatilhos” espe-
sozinha — Jesus Cristo está ao seu cíficos: estado de ânimo, período
lado. do mês, circunstâncias difíceis.
j. Guardar o seu coração de modo Planejar com antecedência como
que não gaste tempo fantasiando enfrentará a tentação.
sobre alimentos. Para concluir, como conselheira ou
7. Ensine-a a lidar com a tentação de se conselheiro bíblico, não se deixe intimidar
entregar aos episódio bulímicos: nem duvide da sua habilidade para ajudar
a. Clamar pela ajuda de Deus, con- mulheres que lutam nesta área. As atitudes
fiando humildemente nEle. do coração da mulher que pratica a bulimia
são decididamente semelhantes às do seu
coração. A Bíblia fala de modo maravilhoso
e penetrante a todos nós.

146 Coletânea de Aconselhamento Bíblico  Volume 2

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