Você está na página 1de 12

2º Seminário - A Intervenção no Património.

Práticas de Conservação e Reabilitação 1

AVALIAÇÃO IN SITU DA RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO DO BETÃO

E. S. JÚLIO
Prof. Auxiliar
FCTUC
Coimbra

SUMÁRIO

Neste artigo apresentam-se os principais métodos de avaliação in situ da resistência à


compressão do betão e abordam-se questões relevantes como: (a) selecção do(s) método(s);
(b) definição do número e localização dos ensaios; (c) desenvolvimento de relações de
correlação; e (d) combinação de dois ou mais métodos.

1. INTRODUÇÃO

As razões pelas quais se torna necessário intervir numa determinada estrutura são diversas. No
caso de construções que nunca foram alvo de operações de manutenção, a razão mais frequente
prende-se com a degradação dos materiais seus constituintes. Outras razões, como a alteração
da função original para outra mais exigente em termos de solicitações, ou a ocorrência de
acidentes, sismos ou outras acções extremas, podem igualmente obrigar a reparar e/ou reforçar
a estrutura. Durante a fase construtiva, as estruturas também podem ter de sofrer este tipo de
intervenções se se verificar existirem erros ao nível do projecto de estabilidade e/ou erros de
execução.

Em qualquer uma das situações anteriormente descritas, antes de intervir na estrutura existente,
é necessário realizar uma inspecção e diagnóstico do seu estado de conservação e efectuar uma
caracterização mecânica dos materiais seus constituintes. Para avaliar a necessidade de
proceder a obras de reforço, o passo seguinte consiste em calcular a capacidade resistente dos
diferentes elementos da estrutura e determinar o comportamento desta quando sujeita às
combinações de acções regulamentares.
2 2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação

Em Portugal, a maior parte das estruturas recentes foram construídas em betão armado. A
formação dos engenheiros civis nacionais continua, ainda hoje, essencialmente vocacionada
para a concepção e dimensionamento de estruturas novas utilizando este material. No entanto,
tal como no caso das construções tradicionais, cada vez mais será necessário saber intervir
sobre o edificado existente. Também para as estruturas recentes em betão armado, mesmo
quando se tem acesso ao respectivo projecto de estabilidade, é fundamental caracterizar do
ponto de vista mecânico os materiais seus constituintes, em especial, o betão. Actualmente,
vários ensaios [1] permitem avaliar in situ a característica mecânica mais relevante do betão: a
sua resistência à compressão. Muitos destes ensaios não medem esta mas outra grandeza mas é
possível estabelecer relações de correlação entre ambas. No entanto, sendo estas definidas
empiricamente e existindo uma série de factores que afectam os resultados, importa conhecer
as limitações e as potencialidades de cada teste, antes de o utilizar. Com este artigo, pretende-
se fornecer informação relevante que sirva de orientação: na selecção do(s) método(s) mais
indicado(s); na definição do número e localização dos ensaios; no desenvolvimento de relações
de correlação; e na combinação de dois ou mais métodos.

2. MÉTODOS IN SITU MAIS UTILIZADOS

Os métodos in situ mais utilizados para determinar a resistência à compressão do betão são:
(1) ensaio de carotes; (2) medição da resistência à tracção; (3) medição da resistência à
penetração; (4) determinação do tempo de propagação de ultra-sons; e (5) avaliação da dureza
superficial.

Com o primeiro dos métodos referidos, a grandeza medida é a pretendida. Com o segundo e
terceiro ensaios, não se mede directamente a resistência à compressão do betão mas outra
resistência correlacionável empiricamente com esta: a resistência à tracção e a resistência à
penetração do betão, respectivamente. Com os dois últimos métodos enunciados, não se mede
uma resistência, mas outra grandeza igualmente correlacionável empiricamente com a
resistência à compressão do betão: o tempo de propagação de ultra-sons e a dureza superficial
do betão, respectivamente.

A selecção do método mais adequado tem de ter em consideração os objectivos pretendidos,


como por exemplo a precisão, assim como as restrições, geralmente o tempo e o orçamento
disponíveis, e ainda as limitações e o campo de aplicação de cada um dos métodos.
Provavelmente, em muitos casos, não será possível seleccionar apenas um, chegando-se à
conclusão de que é preferível considerar uma combinação de dois ou mais métodos.
Seguidamente, apresenta-se sucintamente cada um dos cinco métodos in situ considerados
neste artigo.

2.1 Ensaio de carotes

O “ensaio de carotes” consiste em retirar uma amostra cilíndrica, a carote, do elemento de


betão armado a analisar, a qual é posteriormente submetida a um ensaio de compressão axial
(Figura 1). É o único ensaio em que a grandeza medida é a pretendida, i.e., a resistência à
compressão do betão. Este ensaio é parcialmente destrutivo uma vez que, para extrair a carote,
2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação 3

tem de se provocar um pequeno dano no elemento a analisar, obrigando à sua reparação,


preferencialmente com uma argamassa não retráctil. Por este, entre outros motivos, não pode
ser utilizado de forma exaustiva, sendo preferível combinar a sua realização com a de outro
método verdadeiramente não destrutivo.

Figura 1: Determinação da resistência à compressão de uma carote de betão.

A extracção das carotes deve ser efectuada com alguns cuidados prévios, nomeadamente, antes
de posicionar o equipamento deve-se procurar identificar, utilizando um detector de armaduras,
a localização, diâmetro e profundidade (espessura do recobrimento) dos varões de aço, de
forma a efectuar o furo sem os danificar (Figura 2). Seguidamente, a carote deve ser cortada e
rectificada de modo a que as superfícies dos topos fiquem planas e perpendiculares ao seu eixo,
apresentando a relação entre o diâmetro e a altura um valor contemplado em documentos
normativos. Com efeito, devido ao atrito entre a carote de betão e o prato de aço da máquina de
ensaios, as superfície dos topos ficam confinadas ao realizar o ensaio de compressão, tendo
como consequência o facto de aquela relação ter influência nos resultados, devendo os valores
obtidos ser corrigidos. Outro factor que influencia os resultados é o teor de humidade das
carotes, pelo que devem ser secas em estufa antes da realização dos ensaios. A presença de
armaduras na carote, além do dano introduzido na estrutura, apresenta o inconveniente
adicional de alterar igualmente os resultados, sendo necessário corrigi-los.

Figura 2: Localização de armaduras; realização do furo; e extracção da carote.

2.2 Medição da resistência à tracção

O ensaio de medição in situ da resistência à tracção do betão (Figura 3) foi desenvolvido nos
anos 70 do século XX, ficando conhecido por pull-off test. Consiste em colar um disco de
metal, geralmente aço, à superfície do betão e, utilizando um dispositivo adequado, aplicar uma
força de tracção até se atingir a rotura. O valor assim obtido, dividido pela área do disco,
representa o valor nominal da resistência à tracção do betão de recobrimento. Recorrendo ao
equipamento de perfuração utilizado na extracção de carotes, é possível efectuar um furo até
4 2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação

uma profundidade previamente definida e, seguindo os passos descritos anteriormente, realizar


o pull-off test. Com este procedimento alternativo, obtém-se o valor da resistência à tracção do
betão a uma dada profundidade, em lugar da resistência à tracção do betão de recobrimento. A
determinação da resistência à compressão do betão através deste ensaio de medição in situ da
sua resistência à tracção baseia-se no facto de, para um dado betão, ser possível definir
empiricamente relações de correlação entre ambas.

Esta técnica pode ser igualmente utilizada para avaliar a resistência à tracção de interfaces
betão-betão, frequentes em elementos com partes prefabricadas e partes betonadas in situ ou
em operações de reforço de elementos de betão armado por aumento da sua secção [2].

Figura 3: Determinação da resistência à tracção do betão através do pull-off test.

A realização do pull-off test requer uma preparação cuidadosa: (a) as superfícies (do disco e do
substrato) que irão ficar em contacto, deverão encontrar-se limpas e secas, antes de se proceder
à colagem; (b) deve ser utilizada uma cola com características mecânicas adequadas, em
função das condições higrotérmicas do ambiente e dos valores expectáveis da resistência à
tracção do betão; normalmente utiliza-se uma resina de epóxido; (c) o remanescente da cola
deve ser removido de imediato para evitar uma quantificação incorrecta (e por excesso) da
resistência; (d) no caso de se executar uma carotagem parcial para avaliar a resistência à
tracção do betão a uma dada profundidade, dever-se-á procurar garantir que o disco fique
centrado relativamente ao topo da carote, caso contrário haverá introdução de um momento
flector parasita, falseando os resultados; (e) ainda para esta situação, e para evitar o mesmo
problema, dever-se-á assegurar que o furo seja executado perpendicularmente à superfície; (f) a
aplicação da carga deverá ser feita com uma velocidade constante, correspondente a um
incremento de 50 kPa/s; (g) no caso de se utilizar este método para avaliação in situ da
resistência à tracção de interfaces betão-betão, é importante garantir que a profundidade do
furo ultrapasse em cerca de 15 a 20 mm a superfície de contacto, de forma a evitar
concentrações de tensões na periferia desta.

2.3 Medição da resistência à penetração

O ensaio de medição in situ da resistência à penetração do betão (Figura 4) foi desenvolvido


nos anos 60 do século XX. Consiste em disparar uma sonda em aço de alta resistência contra a
2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação 5

superfície de betão. Utiliza-se uma pistola especial, com cartuchos de pólvora que libertam
uma quantidade precisa de energia. O dispositivo mais divulgado é a pistola de Windsor¸
embora existam outros, menos conhecidos, como a pistola de Walsywa. Podem ser feitos
disparos individuais ou conjuntos de três disparos. Neste caso utiliza-se um triângulo metálico,
equilátero, com 178 mm de lado, para posicionar e guiar as sondas. A fundamentação para a
utilização deste ensaio in situ de medição da resistência à penetração do betão para determinar
a sua resistência à compressão é a mesma do ensaio anteriormente descrito, ou seja, a
possibilidade de definir empiricamente curvas de correlação entre ambos.

Os procedimentos a seguir na aplicação deste método incluem: (a) a selecção de uma superfície
lisa, limpa e livre de carbonatação; (b) se necessário, esta superfície deve ser regularizada para
permitir a aplicação do triângulo metálico; (c) o nível de energia a utilizar no disparo deve ser
seleccionado em função da resistência estimada para o betão; existem dois níveis disponíveis
para a pistola de Windsor, o low power, indicado para ensaiar betões com resistências
esperadas inferiores a 26 MPa (relativas a provetes cúbicos) e o standard power, para
resistências esperadas superiores a este valor; (d) após os disparos, deve-se remover o triângulo
e verificar se as três sondas estão firmemente cravadas no betão; (e) seguidamente, devem ser
colocadas as bases de leitura para efectuar a medição do comprimento exposto, utilizando um
micrómetro; (f) caso a ponteira do micrómetro não assente num pequeno círculo existente no
prato inferior de leitura, deve projectar-se nova sonda.

Figura 4: Medição da resistência à penetração do betão com a pistola de Windsor.

2.4 Determinação do tempo de propagação de ultra-sons

O ensaio de determinação do tempo de propagação de ultra-sons no betão (Figura 5) é um


método in situ verdadeiramente não destrutivo. Apresenta ainda, relativamente à generalidade
dos ensaios in situ, a vantagem de avaliar o betão no interior do elemento e não apenas o betão
de recobrimento. Consiste em emitir uma onda ultra-sónica através do elemento de betão e
medir o seu tempo de propagação. Baseia-se no facto, demonstrado por estudos desenvolvidos
nos anos 40 do século XX, de a velocidade de propagação de uma onda estar relacionada com
as propriedades elásticas do meio. Num betão, a uma maior resistência à compressão está
associado um módulo de elasticidade superior, logo uma maior velocidade de propagação de
uma onda ultra-sónica, o que implica um menor tempo de percurso desta. Tal como no caso
6 2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação

dos métodos atrás abordados, é possível estabelecer empiricamente curvas de correlação entre
as grandezas “tempo de propagação dos ultra-sons” e “resistência à compressão do betão”.

Os equipamentos actualmente utilizados, com o objectivo de determinar a resistência à


compressão do betão, são constituídos por uma unidade central, que inclui um gerador de
impulsos com frequências entre 20 e 150 kHz, um transdutor emissor, um transdutor receptor,
um amplificador e um dispositivo de medição do tempo entre a emissão e a recepção do
impulso. Os aparelhos mais divulgados são o V-meter, de fabrico norte-americano, e o
PUNDIT, fabricado no Reino Unido.

Figura 5: Determinação do tempo de propagação de ultra-sons no betão.

O modo de operar o PUNDIT deve ter em conta os seguintes pontos: (a) calibração do
equipamento, utilizando a barra fornecida pelo fabricante para esse efeito; deve-se proceder a
nova calibração sempre que as condições atmosféricas se alterarem; (b) selecção dos pontos a
aplicar os transdutores; as superfícies devem ser lisas e limpas; (c) marcação e medição
rigorosa da distância entre estes pontos; (d) aplicação de uma fina camada de massa condutora
nas faces dos transdutores; (e) comprimindo os transdutores contra as superfícies de betão,
esperar que a leitura estabilize; e registar o valor. Como a máxima energia de vibração é
transmitida perpendicularmente às faces dos transdutores, a transmissão directa, ou seja, a
colocação dos transdutores em faces opostas do elemento, é a mais eficiente. Contudo, por
vezes, esta situação não é possível. No caso de uma laje, por exemplo, pode só ser possível a
colocação na mesma face. Neste caso a transmissão é indirecta, os resultados obtidos têm de
ser corrigidos e a precisão dos resultados é menor, sendo influenciados pela qualidade do betão
de recobrimento. Há ainda a considerar a situação da transmissão semi-directa, em que os
transdutores são aplicados em faces perpendiculares do elemento, como no caso de pilares de
canto.

Os principais factores que afectam os resultados deste ensaio in situ são os seguintes:
(a) condições higrotérmicas do betão; (b) presença de vazios no interior do elemento,
apresentando como consequência um aumento do tempo de percurso; (c) presença de
armaduras no interior do elemento, apresentando o efeito contrário ao do caso anterior. Esta
situação poderá, eventualmente, ser evitada devendo-se, para tal, tentar localizar os varões de
aço utilizando um detector de armaduras. No caso de não ser possível evitar a presença de
armaduras, os valores obtidos deverão ser corrigidos ([3][4][5]).
2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação 7

2.5 Avaliação da dureza superficial

O ensaio in situ de avaliação da dureza superficial do betão foi desenvolvido nos anos 40 do
século XX por Ernest Schmidt que concebeu um aparelho de medição que ficou conhecido por
“esclerómetro de Schmidt” (Figura 6). Consiste em disparar uma massa conhecida, com uma
energia igualmente conhecida, contra a superfície do elemento de betão e medir o recuo da
mesma, traduzido num valor designado “índice esclerométrico”. Baseia-se no facto de a dureza
superficial do betão ser correlacionável empiricamente com a sua resistência à compressão.

O esclerómetro de Schmidt mais indicado para realizar ensaios em betões com resistências à
compressão estimadas entre 20 e 60 MPa é o tipo P, com uma energia de impacto de 2,2 J. A
utilização do aparelho é bastante simples devendo-se ter presente os seguintes aspectos: (a) a
superfície do elemento deve ser lisa e apresentar-se limpa, devendo ser evitadas zonas em que
tenha ocorrido carbonatação do betão; de facto, existe um aumento da dureza do betão
associada a esta patologia, o que se traduz numa estimativa incorrecta (e por excesso) da sua
resistência à compressão; (b) o aparelho deve ser aplicado perpendicularmente à superfície a
ensaiar; (c) o incremento de pressão deve ser constante até ocorrer o disparo da massa; deve-se
ter especial cuidado em evitar recuos intermédios para aumentar o impulso, sendo preferível
recomeçar o ensaio da posição inicial; (d) este ensaio apenas avalia o betão de recobrimento
sendo, por este motivo, muito sensível às suas características; deve-se procurar evitar quer
zonas com vazios, quer zonas com agregados próximos da superfície; (e) pela mesma razão,
não se deve realizar o ensaio em superfícies rebocadas; o erro introduzido pode ser
significativo, com a agravante de, sendo a dureza superficial do reboco, em geral, superior à do
betão, a estimativa ser por excesso; (f) superfícies húmidas devem igualmente ser evitadas,
pela razão oposta à da situação anterior, i.e., a estimativa da resistência à compressão do betão
ser, neste caso, por defeito.

Figura 6: Avaliação da dureza superficial do betão.

3. SELECÇÃO DO MÉTODO

A selecção do método in situ a utilizar, para determinação da resistência à compressão do


betão, depende de vários factores: (a) limites de validade do ensaio; o ensaio de avaliação da
dureza superficial (esclerómetro de Schmidt) ou o ensaio de medição da resistência à
penetração (pistola de Windsor), por exemplo, não são adequados para elementos de betão com
reduzidas características mecânicas, concretamente, não devem ser usados em elementos de
betão com uma resistência à compressão estimada inferior a 10 MPa; (b) precisão dos
8 2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação

resultados; o ensaio adoptado será diferente consoante se pretenda ter uma ideia aproximada ou
um valor bastante rigoroso da resistência à compressão do betão; (c) dano introduzido; alguns
ensaios referidos são parcialmente destrutivos pelo que não podem ser utilizados de forma
exclusiva e sistemática; por exemplo, o ensaio à compressão de carotes extraídas de vários
pontos de todos os elementos da estrutura seria, obviamente, um absurdo; (d) custos da
operação; os custos de utilização dos diferentes ensaios são muito distintos pelo que a
utilização exclusiva e sistemática de um ensaio com custos elevados é inviável; por exemplo a
utilização da pistola de Windsor em vários locais de todas as lajes, vigas e pilares da estrutura,
além de introduzir danos, implicaria uma despesa igualmente absurda.

A abordagem correcta do problema passa por uma combinação adequada de vários métodos e
não pela adopção de um único. Desta forma, consegue-se reduzir custos, danos e ainda,
eventualmente, aumentar a precisão dos resultados. Na Figura 7, apresenta-se uma fotografia
do espaço requalificado da cobertura de um edifício de betão armado do início do século XX,
da autoria do Arq. Raul Lino. Para avaliar a segurança da laje, foi efectuada previamente uma
inspecção que incluiu a realização de ensaios de detecção de armaduras, avaliação da dureza
superficial e extracção de carotes. Foram realizadas doze leituras com o esclerómetro de
Schmidt em cada um dos onze pontos indicados na Figura 7. O objectivo deste conjunto de
ensaios não teve por objectivo estimar a resistência à compressão do betão mas identificar
zonas da laje em que o betão evidenciasse valores significativamente distintos. Não tendo sido
este o caso, procedeu-se à extracção de apenas três carotes as quais foram, posteriormente,
ensaiadas à compressão. Deste modo, conseguiu-se estimar a resistência do betão,
minimizando os danos introduzidos na estrutura, reduzindo o tempo de actuação e sem
diminuição de precisão.

11 10 9 8

1 2 3 4 5 6 7

Figura 7: Laje de betão e locais onde se efectuaram leituras com o esclerómetro de Schmidt.

4. NÚMERO E LOCALIZAÇÃO DOS ENSAIOS

A selecção dos métodos in situ a utilizar numa determinada inspecção é sempre uma situação
de compromisso entre precisão e custos, directos e indirectos. Inclui-se, nos últimos, os custos
associados ao tempo da realização do conjunto de ensaios in situ e à reparação dos danos
introduzidos, no caso da utilização de métodos parcialmente destrutivos. Conforme referido no
ponto anterior, a abordagem óptima inclui a combinação de vários métodos, sendo a
localização e o número de ensaios a realizar, com cada um destes, definidos de forma a
minimizar os custos da operação e a maximizar a precisão dos resultados.
2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação 9

Relativamente à localização dos ensaios, deve ser tal que constitua uma amostra
estatisticamente representativa do conjunto dos elementos estruturais e, para cada um dos
elementos da amostra, deve constituir uma discretização adequada do mesmo. Por exemplo, o
número de pilares analisados deve ser representativo da totalidade e, em cada pilar, a
localização dos ensaios deve ser representativa do mesmo. Isto significa que devem ser
efectuadas leituras, ainda para o exemplo do pilar, na base, a meia altura e no topo, pelo menos.

Quanto ao número de ensaios a realizar em cada ponto, deve ser definido em função do
coeficiente de variação do método considerado. Este aspecto é particularmente relevante e deve
ser enfatizado. Tomando como referência o valor da resistência à compressão do betão obtido
com o ensaio de dois provetes standard, o número de medições a efectuar com cada um dos
ensaios considerados neste artigo, para obter a mesma precisão, é o seguinte [3]: (a) 3 ensaios
de carotes; (b) 8 ensaios de tracção directa; (c) 3 ensaios de resistência à penetração; (d) 1
ensaio de tempo de propagação de ultra-sons; e (e) 18 medições da dureza superficial.

5. RELAÇÕES DE CORRELAÇÃO

As relações de correlação são a componente fundamental na avaliação in situ da resistência à


compressão do betão. Conforme referido anteriormente, à excepção do ensaio de carotes, em
nenhum outro método in situ se determina a resistência à compressão do betão e, em muitos
destes ensaios, a grandeza medida não é sequer uma resistência. O cálculo da resistência à
compressão do betão é então efectuado com base em curvas de correlação, determinadas
empiricamente. Alguns dos fabricantes fornecem, juntamente com os equipamentos dos
ensaios in situ, curvas de correlação para estimar imediatamente a resistência à compressão do
betão.

No caso do esclerómetro de Schmidt, por exemplo, são geralmente fornecidas três curvas de
correlação, em função da posição em que o aparelho é utilizado (na horizontal; de cima para
baixo; ou de baixo para cima), uma vez que a gravidade afecta o impacto e o recuo da massa.
No entanto, não sendo este o único factor que influencia os resultados, as estimativas obtidas a
partir destas curvas de correlação devem ser consideradas com grande reserva.

É importante realçar que, quando se pretende obter estimativas fiáveis da resistência à


compressão do betão e não apenas efectuar uma análise qualitativa, o procedimento a seguir
deve prever a realização de ensaios in situ utilizando o(s) método(s) adoptado(s), em locais
previamente seleccionados, acompanhada da extracção de carotes na vizinhança dos mesmos,
para desenvolvimento de relações de correlação.

A título ilustrativo apresenta-se, na Figura 8, a curva adoptada para correlacionar os valores fc,
obtidos com o ensaio de resistência à compressão de provetes standard de um betão de
elevados desempenhos, com os valores V, da velocidade de propagação de ultra-sons, medida
nos mesmos provetes, definida pela seguinte função polinomial, com um coeficiente de
correlação (R2) de 0,9840 [6]:

fc = -461,71 × V2 + 4801,3 × V – 12371 (1)


10 2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação

De acordo com Pereira [3] e Pascale et al. [7], a resistência à compressão do betão pode ser
expressa como uma potência ou exponencial da velocidade de propagação de ultra-sons.
Contudo, para o caso em estudo, tal como noutros casos [8], verificou-se que a função de
correlação polinomial de 2.º grau se adaptava melhor aos resultados obtidos.

Este estudo foi realizado pelo motivo, atrás apresentado, de ser indispensável a definição de
curvas de correlação para a avaliação quantitativa da resistência à compressão do betão através
de ensaios in situ, apenas sendo possível utilizar as curvas fornecidas pelo fabricante do
equipamento utilizado no caso de se pretender uma estimativa grosseira desta grandeza.
Acresce ainda, neste caso, o facto de os valores de resistência à compressão do betão de
elevados desempenhos em estudo, ultrapassarem claramente o valor do limite superior do
campo de aplicação do PUNDIT.

130

125

120

115
fc,cubos [MPa]

110

105

100

95

90

85

80
4.85 4.90 4.95 5.00 5.05 5.10 5.15 5.20 5.25
V [km/s]

Figura 8: Resistência à compressão do betão versus velocidade de propagação de ultra-sons.

6. COMBINAÇÃO DE RESULTADOS

Duas possibilidades de combinação de dois métodos de ensaio in situ, com vantagens óbvias,
foram já referidas anteriormente: utilização do detector de armaduras, antes de extrair carotes,
para evitar danos na estrutura além do inconveniente adicional da alteração dos resultados dos
ensaios devido à presença de armaduras nas carotes; e utilização do esclerómetro de Schmidt
para seleccionar zonas/elementos com betões de resistências diferentes, para reduzir o número
de carotes a extrair, minimizando também, deste modo, os danos introduzidos na estrutura.

Há outros casos em que o procedimento de combinação de resultados de dois ensaios in situ


apresenta outras vantagens. Na maior parte das situações, a combinação de resultados obtidos
por dois ou mais ensaios in situ conduz ainda a um aumento da precisão da estimativa da
resistência à compressão do betão. A combinação do ensaio de medição da dureza superficial
(esclerómetro de Schmidt) com o ensaio de medição do tempo de propagação de ultra-sons
(PUNDIT) é, talvez, a mais habitual.
2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação 11

A estimativa combinada da resistência à compressão do betão pode ser efectuada a partir da


análise conjunta dos resultados obtidos isoladamente com cada um dos métodos, corrigindo-os
com base numa análise de variância, aumentando assim a precisão [9]. Outro processo consiste
em desenvolver uma única relação de correlação entre a resistência à compressão do betão
(obtida com o ensaio de carotes) e as grandezas medidas através de cada um dos ensaios in situ
adoptados, realizando de seguida uma análise de regressão múltipla [3].

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com este artigo sobre avaliação in situ da resistência à compressão do betão pretende-se,
considerando métodos sobejamente divulgados, enfatizar aspectos fundamentais a uma correcta
utilização dos equipamentos e a um eficaz tratamento dos resultados obtidos, contribuindo
deste modo para evitar estimativas erradas com consequências potencialmente graves.

Em resumo: (1) deve-se procurar minimizar os danos introduzidos na estrutura, através da


utilização prévia do detector de armaduras e da combinação da extracção e ensaio de carotes
com métodos não destrutivos; (2) deve-se ter presente os factores que influenciam os
resultados do método que se está a utilizar, evitando-os se possível, ou corrigindo os valores
medidos, caso contrário; (3) deve-se considerar locais estatisticamente representativos da
estrutura e dos seus elementos resistentes; (4) em cada ponto, deve-se realizar o número de
leituras suficiente para obter a precisão pretendida; (5) deve-se definir curvas de correlação,
sempre que se pretenda obter uma estimativa quantitativa da resistência à compressão do betão;
(6) deve-se ainda procurar maximizar a precisão desta estimativa, através da combinação de
resultados obtidos com diferentes técnicas.

8. REFERÊNCIAS

[1] Padrão, J. A. L. M., Técnicas de Inspecção e Diagnóstico em Estruturas, dissertação de


Mestrado, DEC - FEUP, Porto, 2004.
[2] Júlio, E. N. B. S. et al., Concrete-to-Concrete Bond Strength. Influence of the Roughness
of the Substrate Surface, Elsevier, Construction and Building Materials 18 (9): 675-681
NOV 2004.
[3] Pereira, J. P. V. V., Avaliação da Resistência à Compressão do Betão Através de Ensaios
Não-Destrutivos, dissertação de Mestrado, DEC - FCTUC, Coimbra, 1999.
[4] Bungey, J H, “The influence of reinforcement on ultrasonic pulse velocity testing”, The
British Institute of Non-Destructive Testing, International Conference, Univ. Liverpool,
April 1993, pp 229-246.
[5] Chung, H W, “Effects of Embedded Steels Bars Upon Ultrasonic Testing of Concrete”,
Magazine of Concrete Research, V. 30, N. 102, March 1978, pp 19-25.
[6] Júlio, E. N. B. S. et al., Observação de Estruturas de Betão de Elevados Desempenhos
através de Ensaios “In Situ” Não-Destrutivos, Encontro Nacional de Betão Estrutural,
FEUP, Porto, 17 a 19 de Novembro, 2004.
12 2º Seminário - A Intervenção no Património. Práticas de Conservação e Reabilitação

[7] Pascale, G. et al., “Evaluation of actual compressive strength of high strength concrete by
NDT”, 15th WCNDT - World Conference on Non-Destructive Testing, Roma (Italia) 15-
21 October 2000, 8 p.
[8] Runkiewicz, L., Runkiewicz, M., “Application of the ultrasonic and sclerometric methods
for the assessment of the structures made of high-strength concrete”, 15th WCNDT -
World Conference on Non-Destructive Testing, Roma (Italia) 15-21 October 2000, 5 p.
[9] Leshchinsky, A M, “Combined Methods of Determining Control Measures of Concrete
Quality”, Materials and Structures, V 24, N 141, May 1991, pp 1777-184.

Você também pode gostar