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O ADAMASTOR

Canto V, 37-60
Gigante Adamastor
(CANTO V, 37-60)

As naus portuguesas navegavam há cinco dias, estando junto do Cabo das Tormentas (futuro Cabo da Boa Esperança) quando
subitamente aparece, perante o espanto dos marinheiros uma nuvem escura e imensa, que escondia o céu; o mar bramia e agitava-se,
pressagiando uma ameaça terrível.
Desenha-se a imensa figura do Adamastor, gigante de aspecto horrendo e irado. O Poeta compara-o ao colosso de Rodes, não se
poupando a adjectivos para a sua descrição. O monstro interpela os marinheiros aterrorizados, reduzidos pela sua presença
avassaladora à dimensão de seres frágeis e indefesos. Censura-lhes a ambição, a constante procura do novo, a ousadia de invadirem
domínios que jamais tinham sido atravessados.
Vasco da Gama enfrentando o próprio medo, ergue-se e frente àquela grandíssima estatura (59.5), ousa perguntar: Quem és tu?
(49.3).O poeta mostra, com estes efeitos cenográficos e intensamente dramáticos, a sua concepção de valentia: herói não é aquele
que não teme, mas o que supera o temor.
O gigante, irritado, profetiza a sua terrível vingança para os portugueses que ousarem por ali passar no futuro. Os segredos do
mar nunca tinham sido a nenhum grande humano concedidos (42.3), e nem a coragem reconhecida do povo luso poderá alterar essa
lei. Vasco da Gama fica a saber quais serão os destinos fatais de Pedro Álvares Cabral, Bartolomeu Dias, D. Francisco de Almeida e
Manuel de Sousa Sepúlveda, com sua mulher e filhos, que irão morrer naquele local, a que D. João II dá o nome de Cabo da Boa
Esperança.
Mas, diante da pergunta de Vasco da Gama, o Gigante muda o seu discurso. Explica que ele é o próprio Cabo Tormentoso,
castigo que os deuses lhe deram pela sua paixão por Tétis, que o despreza. A cólera das suas primeiras palavras termina em lágrimas
de dor. A nuvem negra desfaz-se, depois desta confidência.
O Adamastor condensa em si todos os medos que suscitava o Mar Tenebroso, com o imaginário domínio de forças sobrenaturais
e maléficas. Mais um obstáculo vencido, à custa da coragem e inteligência de alguns Portugueses.
ADAMASTOR

Significado/Simbolismo do episódio

Geograficamente simboliza o Cabo das Tormentas, posteriormente chamado da Boa Esperança.

Mitologicamente representa o Gigante apaixonado pela deusa Tétis, transformado em promontório


pelos deuses, que não toleram ousadias; símbolo da frustração amorosa.

Caraterísticas físicas: enorme estatura, aspeto disforme, barba imunda, olhos encovados, cabelos
cheios de terra, boca negra, os dentes amarelos e a sua voz parece sair do mar profundo.

Simbolicamente é a personificação das dificuldades e dos perigos que os portugueses tiveram de


enfrentar e vencer. No dizer de Amélia Pinto Pais, este episódio "é uma espécie de abóbada
arquitectónica do Poema, em que vêm concentrar-se as grandes linhas da epopeia: o real-
maravilhoso (...); a existência de profecias (...); é igualmente um episódio lírico (...); por outro
lado, é igualmente um episódio trágico (...). É sobretudo um episódio épico, em que se consolida
a vitória do homem, "bicho da terra", sobre uma natureza poderosa."
ADAMASTOR

Evolução dos comportamentos destas duas personagens

... do Gigante ... de Vasco da Gama


1 - mostra-se rancoroso, vingativo, 1 - amedrontado: "arrepiam-se as carnes e o
ameaçador; cabelo";
2 - dor profunda, raiva, desespero; humaniza- 2 - sem medo, de cabeça erguida (Alçado), num
se, reconhece a sua derrota; tom de igual para igual, quase de desafio;
3 - desaparecimento. 3 - atitude de fé: no momento em que o Gigante,
a chorar, desaparece, o Gama pede a Deus que
"removesse os duros/Casos que Adamastor
contou futuros."

A evolução dos comportamentos é oposta.


ADAMASTOR

DIVISÃO EM PARTES LÓGICAS


1. Introdução – Preparação do ambiente para o aparecimento do gigante (estrofes 37 e 38)
Depois de cinco dias claros (“cinco sóis”), surge uma nuvem negra "tão temerosa vinha e carregada" que põe “nos corações um
grande medo” e leva Vasco da Gama a interpelar o próprio Deus todo-poderoso.
2. Aparição do gigante: retrato físico e traços morais (estrofes 39-40)
A caracterização é feita sobretudo através da adjectivação sugestiva e abundante a mostrar a imponência, o terror e a estupefacção
de Vasco da Gama e dos seus companheiros (“Arrepiam-se as carnes e o cabelo/A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!”).
3. Discurso do gigante (estrofes 41-48)
A primeira parte do discurso é de carácter profético e ameaçador e nele Adamastor, num tom de voz “horrendo e grosso”,
anuncia os castigos e os danos por si reservados para aquela "gente ousada" que invadira os seus domínios: Bartolomeu Dias; D.
Francisco de Almeida (primeiro Vice-rei da Índia), o naufrágio e morte da família Sepúlveda e, em geral, a todas as naus
portuguesas que terão sempre “inimiga esta paragem”.
4. Interpelação do Gama (estrofe 49)
Incomodado com as profecias, Vasco da Gama interroga o monstro sobre a sua identidade. É essa questão tão simples que promove
a profunda viragem do seu discurso, fazendo-o recordar a frustração amorosa passada e meditar na sua actual condição de solitário
e petrificado.
5. Discurso do gigante - continuação
A segunda parte do discurso do gigante (estrofes 50-59) é de carácter autobiográfico e o tom é elegíaco (“com voz pesada e
amara”) e disfórico, pois assistimos à evocação do seu passado amoroso infeliz.
6. Epílogo (estrofe 60)
Dá-se o súbito desaparecimento do Gigante, agora choroso pela evocação do seu passado triste e levando consigo a nuvem negra
e o “sonoro bramido” do mar com que aparecera.
Vasco da Gama pede a Deus que remova "os duros casos que Adamastor contou futuros".
ADAMASTOR

DIVISÃO EM PARTES LÓGICAS

ESQUEMA-SÍNTESE

ESTROFES PARTES CONTEÚDO

37-38 1. Preparação do ambiente · «Uma nuvem que os ares escurece», «temerosa» e «carregada»
· «Bramindo, o negro mar de longe brada»

39-40 2. Retrato do gigante · Figura colossal


· Medo

41-48 3. Discurso do Adamastor (1ª parte) · Ameaças / sobre a «gente ousada»


· Elogio

49 4. Interpelação de Vasco da Gama · Pedido de identificação


· Espanto e sangue-frio

50-59 5. Discurso do Adamastor (2ª parte) · Humanização / frustração amorosa

60 6. Epílogo · Choro e desaparecimento do gigante

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