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Pe. ASCANIO BRAND.

AO

A Humildade
. . .

http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
Nihil obstat.

Pe. Ferd. Baumhoff S. C. J.


Censor ad hoc.

Imprimatur.

Taubaté, 15-12"41

Mona. João José Azevedo


Vic. Ca:p.
lNDICE

Uma pala.vra 5

Que é a humildade f 7

Necessidade 9

Raiz da santidade 11

Humildade e Amor 13

A humildade e os santos 15

Vantagens da humildade 25

Como adquirir a humildade' 27


UMA PALAVRA...

Ai vai este opúsculo.


A humildade foi o seu tema.
Começemos pelo alicerce, pela raiz.
Fundamento do edifício da perfeição
e raiz das virtudes é a humildade.
Não se constrói sem alicerce, e toda
árvore dá frutos quando bem enraizada
e alimentada pelas raizes profundas. Se
algum bem fizer este livrinho, peço a
Nosso Senhor, conceda-me a graça de
viver as páginas que escrevi.
E' tão facil escrever sobre a humil­
dade e tão 'difícil praticá-la! Rezai por
mim, piedosos leitores!
O AUTOR.
A HUMILDADE

I - Que é a humildade?

E' uma virtude que pertenc e à virtu­


de cardial da temperança e tem por
fim moderar as nossas loucas aspirações
de grandezas.
Humildade vem de humus : terra.
Humildade .quer dizer: o que está aba­
tido ·até a terra. A virtude da humilda­
de modera, regula as tendências da al­
ma que deseja se elevar acima dos li­
mites traçados pe la razão e pela graça.
E' um conhecimento de si mesmo sem
as ilusões do amor próprio. Uma luz
que faz o homem se eonhecer e conhecer
melhor a Deus.
-8-

E' o desprezo de si até o amor de


Deus, como o orgulho é o amor de si
mesmo até o desprezo de Deus no expres­
sivo dizer de Santo Agostinho (1).
Enfim "a humildade é a uerdade" diz
Sta. Teresa. E' um ato da inteligência
e da vontade. A inteligência que conhe­
ce a sua miséria e pequenez e reconhece
a grandeza de Deus. A vontade que se
abate e se humilha, enfim.
Pode-se então definir a humildade: -

uma uirtude sobrenatural que, pelo co­


nhecimento que nos dá de nós mesmos,
nos inclina a nos estimarmos em nosso
justo ualor, e a buscarmos o abatimento
e o desprezo (2).
Nouerim me, noue'rim te!;, d�z Sto.
Agos:inho: - que eu me conheça, ó Se­
nhor, e que eu Vos conheça!
Nouerim me ut despiciam mel Que eu
me conheça para que me despreze!

(1) De civitate Del - L. XIV - c. 28.


(2·) Tanquerey- Ascêtica e mlstica.
11 part. cap. 11.
-9

Nouerim Te ut amem Te! Que eu Vos


conheça, para que Vos ame!
Eis aí a humildade.
E', sim, a verdade pura. Para ser
humilde basta, pois, ser verdadeiro. Re­
conhecer e confessar nossas m1ser1as,
nosso nada. E, mais ainda, aceitar esta
.condição miseravel, eis ai a dupla h u­
mildade de espírito e de coração.
Quando a alma esclarecida sobre a
- sua condição, se vê bem pequenina e
pobre, então, pode dizer ao Senhor:
- "Nada sou, nada tenho, nada pos­
so. Só tenho de próprio á. miséria e o
pecado, o nada. Na ordem natural e
sobrenatural nada tenho e tudo recebi
de Vós".
Quando de coração se chegou a reco­
nhecer e viver práti-camente de acordo
com estes sentimentos, eis a humildade.

11 - Neeessidade
A humiMade ·é necessária absoluta­
mente para se chegar à perfeiÇão. A
- 10 -

�ssêncHi da perfeição é o Amor Divino,


li Caridade. Entretanto, como Deus não
concede o seu Divino Amor aos orgulho­
sos, vem a ser a humildade o fundamen­

to, o alicerce � a condição essencial de


toda perfeição cristã.

E é neste sentido que dizem os San­


tos Padres ser a humildade a essência
d'a perfeição e a sua ,condiç-ão prin­
cipal.

Não se pode construir sem alicerce.


"Quereis elevar bem alto o edificio da
perfeição?" pergunta Sto. Agostinho. -

Pensai antes de mais IUlda em cavar


bem fundo os alicerces da humilda­
de!" (1).
"A primeira virtude dos cris­
tãos é a humildade" afirma S. Jerônimo:
prima virtus christianorum, humili­
ias (2). "Deus só dá a sua graça aos
humildes - humilibus autem dai gra­
tiam" (3) diz o apóstolo. A humildade

(i) S. Au_g. Ep. 118 Ed. B.


-

(2) S. Jerõn. {Epfst. ad Ent.).


(3) Th. IV. 6.
-11

'é, pois, a chave dos tesouros de Deus.


E assim como de nada nos vale um te­
souro escondido e _trancado se não te­
rnos a chave para o abrir, assirq de nada
nos vale� os tesouros do Amor Divino
e da graça, se não temos a chav� da hu­
mildade. Nenhuma virtude é mais exal­
tada na Sagrada Escritura onde, no di­
zer de Santo Agostinho, não h4 página
que não eontenha pelo menos e!V·:.subs­
'.
Deus resi�ti aos
tância e�tas palavras:
soberbos e dá sua graça aos humildes.
Davi e Golfas, Amã e Mardoqueu, o
-· ·-· -·
FariseÜ e Ó PublicanO,Mád.a(eria� a Sa-
i
mar tana, a Cananéia, o bom ladrão, eis,
entre. muitos, modelos tocantes. de li­
ções da humildade nos 'livros sàntos. O
Antigo Testamento e o Evangelho ei>ntem
Uções de hun:úldade em . cada :página
provando-nos ser esta virtude :realmen­
te ofundamento da perfeição, e a chave
dos tesouros da graça, a virtude absolu­
tamente necessária a todo cristão.
-12-

III - A raiz da santidade

Dissemos que a humildade é o alicer­


ce da perfeição. E' mais próprio cha­
má-la raiz. O piedoso Pe. J. Do!Nla no
seu livro "L'union avec Dieu" cita uma
página admiravel de reflexões, diz ele,
traçadas pOr uma pessoa morta em odor
de santidade. Ei�la: "A raiz tira da
terra a seiv.a da vida que faz crescer as
grandes árvores. Seja amarg& ou insí­
pido o que ela suga, pouco importa. E'
a vida que há-de receber e dar. A raiz
é sempre desconhecida, calcada aos pés.
Trabalha em segredo para urna glória
que nunca lhe virá.Recebe para dar.
Quem é que louva uma raiz quando co­
lheu de uma árvore algum fruto belo e
saboroso? Ai! nunca recebe uma gota
de orvalho, um raio de sol. Não goza
a frescura das brisas. Em torno dela
tudo é frio e se.co, isolamento e silêncio,
-- 13-

Se mão benfazeja derrama sobre ela


um pouco ld'agua ·fresca, só a recebe
muito suja.
Alimenta-se de pura lama. O que sus­
tenta a raiz e a torna vigorosa, cheia de
seiva? O esterco.
Se uma pobre raiz julga ter o direito
de sair um pouco debaixo da terra, e vir
respirar o ar de fora, Jogo a foice a cor­
ta sem dó. Ela não pode absolutamente
aparecer. A árvore se carrega de frutos.
E os bons frutos nunca ela os há-de ver
sequer. Os maus, os· frutos podres, es­
tes só, lhe setão atirados como esterco.
E se � raiz quisesse ver a sua obra de
vida, o ·que produz a seiva que ela for­
nece, deixaria de ser raiz, ficaria bem
seca e nada mais produziria.
Quanto mais oculto e profundo é o tra­
balho de uma raiz tanto mais fecundo.
· E quando esta raiz é uma alma! Ei-la
quanto mais na apa'liência aniquilada,
tanto mais produz para a glória de Deus
e a salvação dos outros.
1'4-

"Se quereis viver unido a Nosso Se­


nhor, oh! antes de mais nada, é preciso
.ser raiz, isto é, ser humilde, oculto com
Jesús em Deus para ser fonte de Vida
em Jesús".
Como é b elo isto! Compreendemos
agora melhor o papel da humildade co­
mo rait da perfeição?

IV - Humildade e Amor

·E' preciso ser humilde para amar e é


preciso muito amar para ser humilde. A
humildade abre os alicerces onde o Amor
constrói o edifício da perfeição. Hu­
mildade e amor são inseparaveis como a
raiz e a árvore, o alicerce e a casa.· São
virtudes irmãs. "A humildade, diz S.
Próspero (1), é companheira da carida­
de e a caridade da humildade, E ambas
destroem o orgulho". Sem humildade
não é possível o amor de Deus.

(1) Epfst. ad Dom. in fine.


"Eu não compreendo, dizia Sta. Teie�
sa, que se possa ter humildade sem amor
e nem amor sem humildade" (1).
"Para obter o amor divino, diz Sta:
Mad, alena de Pazzis, só há � meio: hu­
milhar�se".
As almas s � ráficas foram as mais hu­
mildes e peq ueninas. Vede S. Francisco,
que a Santa Igreja chama "pauper et
humilis" e por isto lambem o denomina
Seráfico;
Humilide e pobre e, ao mesmo tempo,
abrasado nos ardores da Divina Cari­
dade, consumido no amor. Santa Tere­
sa tão humilde, foi transpassada pela
seta misteriosa do Amor.
·Duas festas litúrgicas celebram as or­
dens Franciscana e Carmelitana: - a
transverberação do coração de Santá Te­
resa, e, em 17 de setembro, a dos Sagra­
dos Estigmas de S. Francisco. Duas al­
mas humildes, duas almas seráficas!

(l),;t Caminho da Perfeição. cap. XVI,


- i6 ---

Lede a vida dos santos serâ.ficos, isto


·
é, os que mais se distinguiram pelo fogo
do amor. Foram <>s mais humildes, os
mais aniquilados e pequeninos aos seus
próprios olhos. Oh! sim, quem quiser se
.
abrasar nas chamas da Divina Caridà­
de há-d
. e \omeçar pela humildade.
Humilibus-dat grall'am. Deus conced!:
aos humildes a sua graça. Esta ·graça
é o Amor, Podemos bem dizer: - Hu­
milibus dat amorem - Aos humildes
Deus concede o seu amor.

V - A humildade e os santos

Os s;:mtos conhecem mais a Deus; por


i�to são mais humildes. Dizem que
Santo 1'omaz e Santa Teresa, luzeiros
da Igreja, gênios sublimes, nunca foram
nem sequer tentados pe}Q orgulho ou vai­
Idade. E por que? Não tiveram eles um
conhecimentQ tão elevado de Deus? O
orgulho é fruto de nossa ignorância do
que é Deris e do que somos ou podep1os.
''Eu não sei se sou humilde, dizia San·
ta Teresinha, mas sei que eu vejo. a rea­
lida(le em todas as coisC18" (1). E' jus­
tamente o que veem os homens esclare­
cidos pela ·luz superior da fé: - a rea�

lidade. E haverá maior realidade do que


o nosso nada, nossa miséria 'I
NãQ é mister grande esforço para
compreender a humildade: basta
abrir os olhos e ver a realidade, v er as
coisas tais como são, sem ilusões nem
.fantasias.
"Senhor/ exclamava S. Francisc.o -

Senhor/. Quem sou eu e quem sois vós?"


Sta. Teresa, falando das graças ex­
traordinárias que Deus lhe concedia:
"Oh/ o Senhor faz comigo como se- faz
com um muro velho que amea ça caiF de
todo lado; - enche-me de estacas por
toda parte pela sua graçà'.
"Todas as visões, revelaç-ões e senti­
mentos celestes, diz S. João da Cruz, não

(1) .Ste. Thêrêse de l'Enfant Jêil\111�


Oonsells et souve.nirs,
-18-

valem o inenor ato de 'humildade. A


humildade tem os efeitos da carida­
de" (1). ,
O sinal certissimo da santiidade é a
r.ar�dade na humildade. Dizia o Sagra­
do Coração à sua serva Sta. Margarida
Maria: - "Quero saber, minha filha,
por que me perguntas a razão das mi­
nhas visitas, descendo até junto de ti?
- Vós sabeis, meu Senhor, qp.e
' não
sou digna.
- Aprende isto, minha filha: ·quanto
mais te esconderes no teu nada, tanto
mais a minlw. grandeza te irá procurar",
respondeu Jesús (2),
---!
'
'Senhor/ concedei-me o tesouro da
humildade"'f ped,ia o santo Doutor de
Hipona (3).
Na sua autobiografia conta Sta. Te­
·

resa que Nosso Senhor, para lhe conce;

(1) Mont. liu Carn:ulol. - L. III. 8. Ed.


:ra'lfCes!:_.
(�� i!�ntemp. :- 50.
·Al S. August. - 1\fedlt. C. I.
1 9-

der alguma graça particular e impor­


tante, sempre escolhia o momento eni
que ela acabava de se humilhar profun­
damente no -11cu interior (1). "A alma
verdadeiramente hlmtilde, reve lou Jesús
à santa, é a que conhece o que eu posso
e o que ela não pode".
"A humildade é sinal de predestina­
ção", diz S. Gregório: humilitas signum
electorum (2).
Um dia. Sto Antão viu o mundo todo
.

cheio de redes e laços do demônio. E


gemeu de dor: - "Meu Deus, quem se
poderá sa}var e livrar-se de tanto pe­
rigo?" Uma voz lhe r·espendeu:
__. "Antão, meu servo, s6 a humildade
escapa com segurança. Quem tem a ca­
beÇa . baixa não deve temer o perigo".
Oh I sim, não h-á perigo para os hu­
mildes, no caminho da salvação.
'
.

Nosso Senhor mo�>trou a Santa Mar­


garida de Cortona, a penitente francis-

(1) Autobiografia. Cap. 38.


(2) ,_Moral. E. 34. c. 2.
·- 20-

cana, um trono de glória que lhe estava


preparado !!Dlre ps serafins pela humil­
dade da santa aqui na\ terra. A humildade
é a glória no céu e é remé<li'o eficaz na
terra pa�a todos ós DJ;lles .
· "A . humildade é unguento bom para
todas as feridas", diz Sta. Teresa (1).
E a santa Fundadora Sofia Barat cos­
tum.ava dizer: "a humildade é uma agu­
lha que remenda todos os buracos e ras­
gões, maravilhosamente".
Oh! sejamos humildes em todas as
circunstâncias de nossa vida�
A humildarde é nosso tesouro. A ora­
ção de Sto. Agostinho esteja sempre em
nossos lábios: Senhor, que eu vos co­
nheça e qúe eu . me conheça!
Santa Teresinha com o ·seu pequenino
caminho da infância· espiritual nos. en­
sina a humildade no seu grau mais ele­
vado - quer que sejamos criancinhas
como nos ensina o Evangelho.

(1") Ca.stelo lnt. 3.• mor. cap. 2·.


'"- 21

E nada mata o amor proprio 'com() o


espírito de infânCia, diz Mons. Gay.
·

Todos queremos ser grandes. Ninguem


se conforma com a sua pequenez, com
as suas misérias e fP&quezas. ·Poucos
aprendem aqUela :cibtcia de se gloriar
das próprias enfermidades (1) no ex­
pressivo dizer de São Paulo. E para se
aproximar de Jesús, diz Sta. Terezinha,
é preciso ser bem pequenino. Oh! há
muito poucas almas que gostam de ser
pequeninas e desconhecidas! (2)
A humildade para a santinha era o
qqe Santa Teresa, a Matriarca do Car­
mlllú, definia: "a hllmildade consis-­
-

ste qa verdade.· Eu não sei se sol! hu•


·
milde, mas sei que vejo a verdade em
tovlas as coisas (3) ".
Pouco antes da morte, naquela terrível
agonia de 30 de setembro de 1897, a
Superiora do Carmelo disse a Teresinha
para a consolar: A minha filhinha,
-

(1) li. Cor . . XII


- 5.
(2) 12-.• Carta a Cellna.
(3) Conseils et souvenlrs.
-22

esta bem preparada para comparecer


diante de Deus porque sempre com-·
pr:. endeu a virtwde da humildade.
-
E ela confirmou em doce paz. -- Sim,
eu o sinto bem. Minha alma nunca pro­
curou outra coisa a, não ser a verdade...
Sim, eu compreendi a humildade de
coração (1).
Felizes os que compreendem a humil­
dade de �ração como o Anjo do Carme­
lo de Lisieux!
Para ser humilJde ·basta ser verdadei­
ro. Nosso Senhor apareceu a Santa Ca­
tarina de Sena e lhe disse: Sabes. mi­

l!l:a filha, o que és e o que eu sou?


Se aprenderes bem estas duas coisas
s.·rtís bem-aventurada. Tu és a que não
és. e eu sou Aquele que sou. Nunca o ini­
m;uo te iludirá se souberes bem disto.
E obterás toda clareza, toda verdade,
toda graça (2).
Que pensamento belo e profundo I

(1) Hist. de uma alma -·· C. XII.


(2) Vle pàr Bx. HaymoJtd - 1.• part
cb. X.
-23-

A Santa Gertrudes disse Jesús "Mi­ -

nha filha, todas as vezes que ao pensal'es


na tua indignidade te rc.conheceres in­
digna de meus favores e te entregares ao
meu amor, tantas vezes me pagarâs a
renda que deves dos bens que eu te
dei" (1).
Oh! temos que dar contas a Nosso Se.
nhor dos talentos recebidos e fazer rl·n­
rdê-Ios para a vida eterna. Somos, }lO­
rem, tão miseraveis, tão pobres e pe,:a­
dores! Como pagar à Justiça Divina?
Sejamos humildes. Pagaremos a rrn­
_da dos bens recebidos, a Deus.
· O pensamento das graças recebidas
longe de nos envaidecer deve nos tornar
mais humildes. Quem mais receb1�u.
mais há-de dar. Nosso Senhor revelou
ao Irmão Pacífico da Ordem de S. Fran­
cisco um tro-no de glória no céu e <los
mais belos e fulgurantes.
- "Este Trono, disse o Senhor, que
admiras tanto, foi de um Anjo revolta-

(1) Rev. Llvr, "ri - e. XXX.


-24-

do. Agora será destinado ao humilde


Francis-.:o de. Assiz".
No dia seguinte à hora do recreio no
convento o irmão perguntou ao seu Pai.
- Meu padre, que pensa de si?
- Eu penso respondeu, Francisco,
que sou o mais miseravel e o último dos
pecadores!
- Como ousa dizer isto, meu Pai?
- Sim, meu Irmão, replica o Santo,
estou bem convencido de que se Nosso
Senhor, tivesse dado aos outros as gra­
ças .que me concedeu já eles teriam
aproveitado muito mais do que eu. Bela
resposta! E nós que pensamos qas gra­
ças recebidas? Podemos nos orgulhar
do que Deus na sua misericórdia nos
doou? Ah! se o utros houvessem rece;
bido as graças de que abusamos! Que
. motivos para sérias reflexões e profun­
do aniquilamento diante do Senhor!
Os santos foram humildes porque vi­
viam da verdade, esta verdade que cho­
ca o nosso tremerud() orgulho : - Somos
- 25 -

nada, somos miseraveis. - Nada somos,


nada temos, nada podemos.

VI- Vantagens da humildade

A humildade é o nosso tesouro da


vida espiritual. Tudo nos vem com ela.
Sem ela nada alcançamos de Deus.
1.• - Faz-nos agradaveis aos olhos - de
DeuL
Deus olha os humildes: lzumilia res­
picit (1) diz o profeta Davi. Por que
Nossa Senhora foi tão exaltada? Por­
que foi humilde, Deus a olhou e esco·
Iheu: respexit humilitatem ancillam
-

suani ..
Olhar uma alma, quer dizer, conceder­
-lhe favores e graças, como explica São
João da Cruz: - "El mirar de Dios és
amar Y hacer mercedes (2).

2.• - A humildade afasta os embustes

(1) SI. 1-3� - 6.


(�) Çfint, espirit. 19 estrot,
-26-

do · Klemônió. Sempre sai vitoriosa de


qualquer tentação a alma humilde.
3.• - Traz à conciência uma doce paz.
Tudo na alma entra em equilíbrio. O
orgulho agita, perturba, afl! ge, irrita, é
uni tirano que não dá sossego ao ho­
me�. A humildade aplaca as teplpes­
tades do amor próprio, é doce paciente.
Faz tanto bem à alma I
Como é bom ser humilde e ficar no
último lugar I
4.• - Atrai a simpatia e a estima de
todos. Ninguem se torna mà is insupor�
tavel que o orgulhoso. Até os que o li­
songeiam e parecem amá-lo, o detestam e
desprezam no intimo do coração. E'
t�o doce tratar co� uma criatura hu­
milde!
5.• - A humildade é o suplemento do
que nos falta, diz S. Bernardo. Ser hu�
milde é ser paciente, casto, caritativo :
obediente. Qual é a virtude que pode sub­
sistir sem a humildade? O Bom Ladrão
fez-se um grande santo em poucos mi�
-27-

nulos porque foi profundamente hu­


milde.
6.• - A humildade no� alcança no céu
uma grande glória. Quais os maiores
santos '1 os mais humildes na terra.
7.• Enfim a humildade é um sinal
-

bem certo de predestinação. O céu é


dos humildes e dos pequeninos. "Sinal
e�id(mte de reprovação, diz S. Gregório
Magno, é o orgulho. Ao contrário, Sinal
de predestinação é a humildade" (1).

VII - Como adquirir a


humildade?

A .tática a seguir na conquista da hu­


mildade nos. ensina o Doutor Angélico,
o grande Sto. Tomaz de Aquino, na sua
Suma Teológica: "O homem chega à hu­
mildade por dois meios : em primeiro
lugar e antes de tudo o mais, pela graça;
e em seguida pelos esforços constantes
que faz para reprimir: primeiro os de-

(1) Moral - L - 34 - c. 2.
-28-

feitos exteriores contrários à humildade


e extirpá-los. E depois, cortar a raiz
oculta do orgulho (1).
Donde se CoQnclu.e que para adquirir
a humildade é preciso orar e orar
muito.
Pedi a Deus a graça da humildade.
Seja nossa oração contínua, a de Santo
Agostinho. Meu Deus! Que éu vos co­
nheça e me conheça! Senhor! (azei-me
bem humilde, bem pequenino, livrai-me
das ilusões perigosas do meu amor pró­
prio/
Nosso Senhor nunca deixou de ouvir
a oração dos humildes. Abri o Evan­
gelho . O Centur.ião, o Cego .de Jericó,
Madalena, o leproso, a Cananéia. Humi­
lharam-se, pediram abatidoQs. aniquila­
dos e Jesús os cum_ulou de graças. Ha­
bituemo-_nos à oração da humildade.
Vivamos na atitude do publicano(): -

Senhor, tende compaixão de mim peca­


dor/ A S. Francisco de Bórgia perguntou

(1) Swn. Teol. I qn. 104 - a I ad 4.


-29-

um homem o qutl devia fazer para se


santificar.-Meu amigo, responde o
santo, pense todo dia na sua miséria e
se humilhe diante de Deus/
Ver-se miseravel e recorrer a Miseri­
córdia!
Que belo programa de santidade! De­
pois da oração, o esforço. Não basta pe­
dir, é preciso lutar. -E que combate tcr­
rivel não é o da conquista da humil­
dade!
Lutemos, diz Sto. Tomaz, para repri­
mir os defeitos exteriores contra a hu­
mildade. Não falar de si mesmo nem
se gabar dos dotes tl graças recebidas.
Franqueza e sinceridade na confissão
de nossas misérias. Evitemos esta hu­
mildade falsa que se humilha pa.ra rece­
'ber elogios. A. huníild.We 4Wê :Ser dis­
creta, singela. É; m elhor não dizer de si
nem bem nem mal.
Se houver ocasião, antes falar mal
que bem de si próprio. Nas palavras,
nos gestos, nas atitudes, sejamos reser­
vados. Nada de querer parecer mais do
·-- 30 ---

que som<>s. Evitemos estes modos afe­


ta,!qs, ares de gente grande ou rica, ati­
tuJes de piedade exagerada e singulari­
dades. Procuremos ser bem comuns,
·bem como toda gente. As pessoas exó­
til'as, afetadas, singulares, palradQras,
exageradas na linguagem, meu Deus!
como são aborrecidas e ridículas!
E' de grande interesse mesmo social
e humano, ser humilde. O mundo ·oom
to.lo o seu orgulho e maldade, ele mes­
m.J sente-se atraído pelo encanto de uma
pessQa verdadeiramente humilde, modes­
.
ta, despretenciosa.
E, !depois, diz Sto. Tomaz, é preciso
cortar. a raiz oculta do orgulho,
Qual e?
E' o nosso instinto depravado do eu
da personalidade que se e.xalta desmesu­
radamente. Queremos distinção, honra­
ria, o primeirQ lugar.
L'á bem no 'fundo de nós, está a raiz
do orgulho. E' preciso cortá-la.
O orgulho, como diz Sto, Ag{)stinho,
não nos engrandece, UQS incha.
-31-

Somos uma bola de vento. Uma picnda


de humilhação faz bem e é necessária
para esvaziá-la de vez em quando. Quan-·
do formos humilhados, diz S. Bernardo,
mudemos a humilhação em humildade.
Quer dizer: aproveitemos a humilhação.
Há os que se irritam com a humilhação,.
os que a sofrem e os que a aceitam. Os
primeiros- são culpados, os segundos Ps­
capam do pecado, os últimos se santifi­
cam (1).
Pois vamos aproveitar o tesouro das
humilhações para nossa santificação.
Que mina de ouro é a humildade!
E' preciso ser humilde de coração so­
bretudo quando trabalhamos para a gló­
ria _de Deus.
O Apóstolo sem hwnildade pende o
seu tempo. Observa e com razão o \Te­
neravel Padre de La Colombiere. Nos
trabalhos apostólicos é mister tomar
cuidado com o amor próprio. Uma gran­
de humildade � necessária e uma gra11de

(1) s� Bernardo, 3 4 - 3.
- 32

força wrq resisti.r ao encanto que se


acha em converter os corações, e ganhar
a confiança das pessoas convertidas/
Façamos nosso apostolado humilde. A
graça é um dom do céu. Somos apenas
·
o instrumento da graça junto de nossos

irmãos. Atribuir a nós o bem que faze­


mos às almas é como negar o tratado
da graça. Dizia o Pe. Lacordaire a um
jovem: - "se encontrares, meu ami­
go, almas não tocadas pela graça de
Deus, verás que nada as pode conver­
ter. Nem mil vidas oferecidas numa hora
e uma eloquência de fazer chorar o már­
more nada conseguiriam (1).
Oh! como o apóstolo há-de ser humil­
de se quiser salvar almas! sem :1. humil­
dade seremos vaidosos pregoeiros de
nós mesmos e não de Cristo Nosso Se­
nhor. A humildade só é que converte e
salva. O Filho de Deus salvou o mundo
pelo aniquilamento e nós o quereríamos

(1) -Lacordaire - Lettres a des jeunes


gens.
-33-

salvar com uma vã estima dos homens


e falsas honras? pergunta Bourdaloue
no seu impressionante sermão sobre S.
Francisco Xavier.
Para adquirir a humildade nos traba­
lhos brilhantes do apostolado. sobretudo
no púlpito e na imprensa, é mister uma
reflexão muito séria do valor da humil­
dade e da pureza de intenção. Sem isto,
muita coisa que se chama zelo não pas­
sará de orgulho disfarçado e nem se
salvam as almas nem o apóstolo.
- Procuremos ser humildes.
- A alma bem humilde é a pérola do
Sagrado Coração de Jesús.
E' tal o poder das almas humildes so­
bre o Coração de Deus, disse Jesús, à
Soror Benigna. (1) - que uma só alma
destas verdadeiramente humildes é mais
poderosa para desarmar a minha justi­
ça do que mil pecadores para a provocar
e armar.

(1) ·Eroror Benigna C. Ferrero - Vade­


-mecum.
-34-

Nestes dias de tanto orgulho satânico


a perder as almas, sejamos humildes em
espírito de reparação pelo orgulho dos
homens.
Jesús Crucificado seja a nossa gran­
de lição e nosso . remédio eficaz na cura
de nosso orgulho. "E se tal remédio não
cura nosso orgulho, diz Sto. Agostinlw!
não sei o que o poderá ·curar (1). Lute­
mos contra o nosso terrível amor pró­
prio. Empreguemos a arma da humil­
dade e sairemos vencedores. .Lem­
bremo-nos de que o Reino do Céu é dos
pequeninos e dos humildes.

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-(1) Sermo - 77 - Ed. B.

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