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Sebastião Geraldo de Oliveira

INDENIZAÇÕES W

POR ACIDENTE DO
TRABALHO OU
DOENCA OCUPACIONAI
9

7a edição
I n d e n iza ç õ e s por
A cidente do T rabalho ou
D o en ç a O c u p a c io n a l
1â edição — julho, 2005
1§ edição — 2a tiragem — setembro, 2005
1a edição — 3a tiragem — dezembro, 2005
2 - edição — abril, 2006
2 - edição — 2a tiragem — agosto, 2006
2 - edição — 3a tiragem — novembro, 2006
3â edição — março, 2007
3a edição — 2a tiragem — agosto, 2007
4a edição fevereiro, 2008
4a edição — 2® tiragem — outubro. 2008
5a edição — maio, 2009
6§ edição — abril, 2011
7- edição — fevereiro, 2013
SEBASTIÃO GERALDO DE OLIVEIRA
Desembargador ao I riounai negionai oo i raoalho da 3aRegião.
Mestre em Direito pela UFMG. Professor do Curso de Especialização
em Direito do Trabalho da Faculdade de Direito Milton Campos — MG.

I n d e n iz a ç õ e s por

A c id e n t e d o T rabalho ou

D oença O c u p a c io n a l

7 edição
-

revista e atualizada

L Ir
V Al©
] IR

A
EDITORA LTDA.
© Todos o s direitos reservados

Rua Jaguaribe, 571


C EP 01224-001
São Paulo, SP — Brasil
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P rojeto de capa: FÁ B IO G IG LIO
Im pressão: BA RTIRA G R Á FIC A E EDITORA

LTr 4804.0
F e v e re iro , 2013

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Oliveira, Sebastião Geraldo de


Indenizações por acidente do trabalho ou
doença ocupacional / Sebastião Geralco de
Oliveira. — 7. ed. rev. c atual. — São Paulo:
LTr, 20 1 3 .

Bibliografia
ISBN 9 7 8 -8 5 -3 6 1 -2 4 2 0 -9

1. Acidentes do trabalho - Brasil 2. Danos


(Direito civil) — Brasil 3. Doenças profissionais —
Brasil 4. Indenização — Brasil I. Título.

1 2 -1 5 2 0 3 ___________________________________________________ C D U -34:331.823:347.426.6(81)

índice para catálogo sistem ático:


1. Brasil : Acidentes do trabalho: Indenizações :
Direito do trabalho 3 4 :3 3 1 .8 2 3 :3 4 7 .4 2 6 .6 (8 1 )
2. Brasil : Doenças ocupaçionais: indenizações :
Direito do trabalho 3 4 :3 3 1 .8 2 3 :3 4 7 .4 2 6 .6 (8 1 )
3. Brasil : Doenças profissionais: Indenizações :
Direito do trabalho 3 4 :3 3 1 .8 2 3 :3 4 7 .4 2 6 .6 (8 1 )
Dedico este livro a duas mulheres especiais:
Ana Maria, minha mãe, e à Sueli, minha mulher.
Com a primeira, encontrei a vida; com a Sueli,
a vida me encontrou.
Aos ex-estagiários
Marcus Vinícius de Almeida, Marius Fernando de Carvalho,
Leonardo Nogueira de Oliveira, Cynthia Lessa da Costa,
Henrique Fonseca Alves e Luciana Sifuentes Reis,
que, em períodos distintos, colaboraram
na pesquisa bibliográfica e jurisprudencial.
SUMÁRIO

Abreviaturas e siglas u s a d a s .................................................................................. 15

Apresentação à 1- e d iç ã o ........................................................................................ 19

Prefácio da prim eira edição — Humberto Theodoro J ú n io r................................. 21

in tro du çã o ................................................................................................................... 27

1. Acidentes do trabalho no B ra s il........................................................................ 31


1.1. Importância do problema................................................................................. 31
1.2. Os números dos acidentes............................................................................ 33
1.3. Histórico das leis acidentárias....................................................................... 38

2. Abrangência do conceito de acidente do tra b a lh o ........................................ 42


2.1. Necessidade do enquadramento le g a l.......................................................... 42
2.2. Espécies legais de acidentes do trabalho.................................................... 44
2.3. Acidente típ ic o ................................................................................................ 45
2.4. Doenças ocupacionais.................................................................................... 50
2.5. Concausas....................................................................................................... 56
2.6. Acidente de trajeto.......................................................................................... 59
2.7. Outras hipóteses............................................................................................. 60

3. Caracterização do acidente do tra b a lh o .......................................................... 62


3.1. Comunicação do Acidente do Trabalho — C A T .......................................... 62
3.2. Enquadramento técnico do acidente pelo IN S S .......................................... 67
3.3. Recurso administrativo contra o enquadramento......................................... 69
3.4. Ação judicial contra o enquadramento.......................................................... 71
10 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

4. Responsabilidade civil por acidente do trabalho.......................................... Tl


4.1. Direitos acidentários e reparações c iv is ....................................................... 77
4.2. Noção sobre responsabilidade c ivii................................................................ 78
4.3. Evolução da responsabilidade civil por acidente do tra ba lh o ..................... 80
4.4. Cumulação com os benefícios acidentários................................................. 84
4.5. Espécies de responsabilidade c iv il................................................................ 94
4.6. Responsabilidade civil subjetiva.................................................................... 96
4.7. Responsabilidade civil objetiva...................................................................... 97
4.8. Responsabilidade civil por atos dos empregados ou prepostos................. 97
4.9. Responsabilidade civil nas terceirizações.................................................... 101

5. Acidente do trabalho e responsabilidade civil objetiva................................109


5.1. Desenvolvimento da teoria do risco...............................................................109
5.2. Abrangência da responsabilidade civil o b je tiva ........................................... 112
5.3. A teoria do risco acolhida no novo Código C ivil........................................... 118
5.4. É aplicável a inovação do Código Civil no acidente do trabalho?...............119
5.5. Extensão da responsabilidade objetiva do novo Código C ivil..................... 126
5.6. A mensuração do risco pelo Fator Acidentário de Prevenção.................... 135
5.7. O seguro acidentário e a indenização pela teoria do ris c o ......................... 137
5.8. Perspectivas da responsabilidade civil por acidente do trabalho ...............141

6. Nexo causal no acidente do trabalho................................................................151


6.1. Causalidade como pressuposto da indenização.......................................... 151
6.2. Enfoque acidentário e da responsabilidade c iv il.......................................... 152
6.3. Nexo nos acidentes e doenças ocupacionais...............................................158
6.4. Nexo concausal .............................................................................................. 162
6.5. Excludentes do nexo causal.......................................................................... 168
6.6. Culpa exclusiva da vítim a...............................................................................168
6.7. Caso fortuito ou de força m aior...................................................................... 171
6.8. Fato de terceiro............................................................................................... 176

7. Culpa do empregador no acidente do trabalho..............................................182


7.1. A culpa como pressuposto da indenização..................................................182
7.2. Distinção entre dolo e culpa........................................................................... 182
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 11

7.3. Abrangência do conceito de cu lp a .................................................................183


7.4. Culpa contra a legalidade................................................................................186
7.5. Culpa por violação do dever geral de ca ute la ...............................................203
7.6. Graus de culpa: grave, leve e levíssim a...................................................... 208
7.7. Culpa exclusiva da vítim a...............................................................................212
7.8. Culpa concorrente da vítim a .......................................................................... 212
7.9. Presunção de culpa do empregador...............................................................219

8. Danos decorrentes do acidente do tra b a lh o ...................................................228


8.1. O dano como pressuposto da indenização................................................... 228
8.2. Quando o acidente provoca danos.................................................................230
8.3. Dano m aterial...................................................................................................231
8.3.1. Abrangência ......................................................................................231
8.3.2. Dano emergente...................................................................................... 232
8.3.3. Lucro cessante........................................................................................ 233
8.4. Dano m oral......................................................................................................... 234
8.4.1. Evolução e abrangência......................................................................... 234
8.4.2. Fundamentos constitucionais do dano m o ra l...................................... 238
8.4.3. Cumulação com o dano material............................................................ 241
8.4.4. Finalidade da indenização por dano m oral............................................242
8.4.5. Cabimento do dano moral no acidente do trabalho.............................243
8.4.6. Prova do dano m oral...............................................................................245
8.4.7. Critérios para arbitramento da indenização...........................................248
8.4.8. Controle do montante indenizatório pelo T S T ...................................... 252
8.4.9. Dano moral na responsabilidade o b je tiva .............................................254
8.5. Dano estético.....................................................................................................256
8.5.1. Conceito e abrangência......................................................................... 256
8.5.2. Cumulação com o dano m o ra l...............................................................257
8.6. Perda de uma chance........................................................................................260
8.7. Do risco ergonômico para o risco econômico.................................................266

9. Indenizações nos acidentes do trabalho com ó b ito ........................................ 268


9.1. Considerações iniciais......................................................................................268
9.2. Apuração e reparação dos d a n o s .................................................................... 269
9.2.1. Danos emergentes............................................................................. . 269
12 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

9.2.2. Lucros cessantes ou pensão................................................................ 270


9.2.3. Danos m orais..........................................................................................272
9.3. Natureza jurídica da pensão............................................................................274
9.4. Beneficiários da pensão................................................................................... 279
9.4.1. Titulares do direito ao pensionamento................................................. 279
9.4.2. Pensionamento do cônjuge ou companheiro.................................... . 281
9.4.3. Pensionamento dos filhos......................................................................285
9.4.4. Pensionamento dos pais........................................................................286
9.4.5. Pensionamento de outros beneficiários............................................... 287
9.5. Base de cálculo da pensão.............................................................................. 288
9.6. Constituição de capital para garantia do pensionamento............................. 294
9.7. Termo final da pensão......................................................................................299
9.8. Direito de acrescer dos beneficiários remanescentes...................................307
9.9. Legitimidade para postular a indenização por dano m o ra l............................ 310
9.9.1. Transmissibilidade do dano m oral......................................................... 311
9.9.2. Titulares do direito à indenização por dano moral .............................. 318
9.9.3. Arbitramento da indenização quando há vários lesados.....................322

10. Indenizações nos acidentes do trabalho sem ó b ito......................................325


10.1. Danos quando a vítima sobrevive ao acidente.......................................... 325
10.2. Prova pericial para mensuração dos danos............................................... 326
10.3. Indenizações no caso de invalidez permanente...................................... 334
10.4. Indenizações no caso de redução da capacidade...................................342
10.5. Possibilidade de revisão do pensionamento.............................................. 347
10.6. Opção do acidentado pelo pagamento integral.......................................... 349
10.7. Indenizações no caso de incapacidade tem porária.................................355
10.8. Indenizações no caso de acidente sem afastam ento.............................358

11. Prescrição...................... ....................................................................................... 359


11.1. Considerações iniciais................................................................................. 359
11.2. Prazo prescricional: civil ou trabalhista?................................................... 360
11.3. Regras de transição para a prescrição civil............................................... 368
11.4. Prescrição nas ações ajuizadas antes da EC n. 45/2004...................... 371
11.5. Prescrição nas ações ajuizadas após a EC n. 45/2004......................... 376
In d e n iz a ç õ e s p o r A c id e n t e d o T r a b a lh o ou D o e n ç a O c u p a c io n a l 13

11.6. Início da fluência do prazo prescricional.................................................... 380


11.7. Prescrição nas ações ajuizadas por dom ésticos...................................... 387
11.8. Prescrição nas ações do trabalhador não empregado...............................389
11.9. Pronunciamento de ofício da prescrição.................................................... 390

12. Ação revisional nas indenizações por acidente do trabalho....................... 397


12.1. Considerações iniciais..................................................................................397
12.2. Cabimento da ação revisional...................................................................... 398
12.3. Competência para julgam ento......................................................................401
12.4. Limites e efeitos da ação revisional............................................................402
12.5. Alteração ocorrida antes do trânsito em julgado........................................ 406
12.6. Questões controvertidas sobre o cabimento da ação revisional.............. 408
12.7. Alteração ocorrida após a indenização paga de uma só v e z ................... 408
12.8. Alteração ocorrida após a celebração de acordo....................................... 410
12.9. Morte do acidentado......................................................................................411

13. Controvérsias sobre a competência.................................................................. 413


13.1. Histórico das controvérsias sobre a competência..................................... 413
13.2. Consolidação da competência da Justiça do T rabalho .............................420
13.3. Processos em andamento na Justiça Comum...........................................425
13.4. Ação ajuizada por pessoa diversa do acidentado..................................... 427
13.5. Ação do acidentado sem vínculo de emprego............................................ 431
13.6. Ação rescisória de julgado da Justiça Comum...........................................433
13.7. Ação revisional do pensionamento..............................................................435
13.8. Ação ajuizada pelo acidentado em face do INSS ..................................... 437

14. Acidente sofrido por trabalhador doméstico ou não em pregado............... 440


14.1. Considerações iniciais.................................................................................. 440
14.2. Acidente do trabalho e acidente no trabalho...............................................440
14.3. Acidente ocorrido no âmbito doméstico ..................................................... 442
14.4. Competência para julgar a ação indenizatória............................................443
14.5. Análise do cabimento de indenização.........................................................443
14.6. Ajustamentos na apreciação da culpa.........................................................444
14.7. Fixação do valor da indenização................................................................. 448
14.8. Prescrição aplicável ..................................................................................... 450
14 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

15. Liquidação da sentença nas ações indenizatórias......................................... 451


15.1. Considerações iniciais.................................................................................. 451
15.2. Contribuição para a Previdência S ocial...................................................... 452
15.3. Correção monetária....................................................................................... 452
15.4. Juros de m o ra ................................................................................................456
15.5. Retenção de imposto de renda na fo n te ..................................................... 459
15.6. Quadro sinóptico das incidências cabíveis................................................467

Anexo I — Agentes patogênicos causadores de doenças profissionais ou do


trabalho, conforme previsto no art. 20 da Lei n. 8.213/1991 ............469
Anexo II — Lista A — Agentes ou fatores de risco de natureza ocupacional
relacionados com a etiologia de doenças profissionais e de outras
doenças relacionadas com o trabalho................................................478
Anexo III — Lista B — Doenças e os respectivos agentes etiológicos..............495
Anexo IV — Lista C — Hipóteses em que se reconhece o Nexo Técnico Epide-
miológico — Relação entre CID e C N A E .......................................... 528
Anexo V — Relação das situações que dão direito ao auxílio-acidente.............535
Anexo VI — Tabela da SUSEP para cálculo da indenização em caso de invalidez
permanente........................................................................................... 540
Anexo VII — Tabela da Lei n. 11.945/2009 para cálculo da indenização em caso
de invalidez permanente das vítimas cobertas pelo Seguro DPVAT... 542
Anexo VIII— Tabelas de expectativa de sobrevida no Brasil — Ano 2007 . 544
Anexo IX — Tabelas de expectativa de sobrevida no Brasil — Ano 2008 ..547
Anexo X — Tabelas de expectativa de sobrevida no Brasil — Ano 2 0 0 9 .550
Anexo XI — Tabelas de expectativa de sobrevida no Brasil — Ano 2010 ..553
Anexo XII — íntegra do acórdão do Conflito de Competência n. 7.204-1, julgado
pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, no dia 29 de junho de
2005.......................................................................................................556

Bibliografia................................................................................................................... 573

índice Alfabético e Remissivo 585


ABREVIATURAS E SIGLAS USADAS

ABNT — Associação Brasileira de Normas Técnicas


Ac. — Acórdão

AGREsp. — Agravo no Recurso Especial

AgRg no Ag. — Agravo Regimental no Agravo de Instrumento


Al — Agravo de Instrumento
Al RR — Agravo de Instrumento em Recurso de Revista
ANAM ATRA — Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho

APS — Agência da Previdência Social

Câm. — Câmara
CAT — Comunicação de Acidente do Trabalho
CC — Conflito de Competência

Cf. — Confira

CFM — Conselho Federal de Medicina


Cl D — Classificação Internacional de Doenças
Cl D — Código Internacional de Doenças
Cl PA — Comissão Interna de Prevenção de Acidentes

CLT — Consolidação das Leis do Trabalho

Cód. — Código
CPC — Código de Processo Civil
CRPS — Conselho de Recursos da Previdência Social

Des. — Desembargador

DJ — Diário da Justiça
DJe — Diário da Justiça eletrônico
16 S eb a stião G er ald o de O liveir a

DPVAT — Seguro O brigatório de Danos Pessoais C ausados por


Veículos Automotores de Vias Terrestres

EPI — Equipamento de Proteção Individual


ERR — Embargos em Recurso de Revista
FAP — Fator Acidentário de Prevenção

FGTS — Fundo de Garantia do Tempo de Serviço


HC — Habeas Corpus
IBGE — Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INPS — Instituto Nacional de Previdência Social
INSS — Instituto Nacional do Seguro Social

JRPS — Junta de Recursos da Previdência Social


LER/DORT — Lesões por Esforços Repetitivos/Distúrbios Osteomuscula-
res Relacionados ao Trabalho

n. — número

NR — Norma Regulamentar
NTEP — Nexo Técnico Epidemiológico
OIT — Organização Internacional do Trabalho
PAIR — Perda Auditiva Induzida por Ruído

PPP — Perfil Profissiográfico Previdenciário


RE — Recurso Extraordinário para o Supremo Tribunal Federal
Rei. — Relator

REsp — Recurso Especial para o STJ

RO — Recurso Ordinário

RR — Recurso de Revista para o TST


SBDI-I — Subseção I Especializada em Dissídios Individuais
SBDI-II — Subseção II Especializada em Dissídios Individuais

STACivSP — Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo


STF — Supremo Tribunal Federal
SUS — Sistema Único de Saúde
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l

SUSEP — Superintendência de Seguros Privados

T. — Turma

TAMG — Tribunal de Alçada de Minas Gerais

TJMS — Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul

TJRJ — Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro

TJRO — Tribunal de Justiça de Rondônia

TJRS — Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

TJSP — Tribunal de Justiça de São Paulo

TRT — Tribunal Regional do Trabalho

TST — Tribunal Superior do Trabalho


APRESENTAÇÃO À 7a EDIÇÃO

O esgotamento da 6§ edição animou-nos a realizar, novamente, uma


cuidadosa revisão de toda a obra, procedendo aos ajustes, acréscimos e
atualizações necessários para que este livro continue sendo uma ferramenta
útil, atual e confiável para todos os que atuam na área.

Estamos conscientes de que a grande aceitação do livro implica, em


contrapartida, muito compromisso e dedicação do autor. Com efeito, para
tentar corresponder às legítimas expectativas do leitor, não medimos esforços
para registrar a evolução ocorrida sobre o tema nos últimos anos e apontar
as ten d ê n cia s atuais da ju risp ru d ê n cia , e spe cialm e nte dos trib u n a is
trabalhistas, sem deixar de expor nossa opinião devidamente fundamentada.

Na atualização do livro, alguns tópicos foram reescritos, para mais bem retratar
o pensamento atual sobre o tema, as inovações legislativas pertinentes ou mesmo
a sedimentação da jurisprudência a respeito de determinadas controvérsias.

É inegável que a Justiça do Trabalho vive um momento histórico singular,


rico em mudanças e com intensa renovação conceitual. Estamos ao mesmo
tempo consolidando os avanços rumo ao Estado Democrático de Direito, de
acordo com os princípios fundamentais da Constituição de 1988, assimilando
os conceitos novos do Código Civil de 2002 e consolidando a jurisprudência a
respeito das outras matérias decorrentes da ampliação de com petência
im plem entada pela Emenda C onstitucional n. 45/2004, sem contar as
freqüentes mudanças legislativas. Parece que ingressamos numa era de
reformas permanentes, na qual predomina a ideia de renovação continuada.

Diante desse quadro de efervescência é natural que haja muitas questões


controvertidas, que geram substancioso debate doutrinário, antes que se firme o
entendimento nos tribunais superiores. Para retratar essa realidade em movimento,
indicamos as principais correntes e seus defensores, para que o leitor também
possa vislumbrar os prováveis caminhos da doutrina e da jurisprudência.

Na esperança de m ais uma vez te r atin g id o o nosso propósito,


submetemos esta 1- edição ao julgamento do prezado leitor.

Sebastião Geraldo de Oliveira


PREFÁCIO DA PRIMEIRA EDIÇÃO

Desde que, nos primórdios do século XX, concebeu-se a necessidade,


entre nós, de acobertar o trabalhador contra os riscos de lesões por acidente
do trabalho, surgiu a ideia de que o seguro obrigatório, na espécie, teria duplo
objetivo: garantir ao acidentado uma reparação de natureza objetiva, que o
isentasse do ônus de provar a culpa do empregador, e, em contrapartida,
dispensasse este da responsabilidade pelo risco decorrente da atividade
empresarial, uma vez que, custeando o seguro previdenciário, ter-se-ia a
transferência total da responsabilidade ressarcitória para a seguradora.
Logo, no entanto, chegar-se-ia à conclusão de que a soma segurada
quase nunca se mostrava suficiente para garantir todo o prejuízo suportado
pelo acidentado e seus dependentes. Não seria justo, então, nos casos de
culpa do empregador, que o obreiro suportasse sozinho o peso de seu
infortúnio. Em nome principalm ente da repressão ao dolo, passou-se a
entender, na jurisprudência, que o patrão teria de responder civilmente pela
complementação do ressarcimento, de modo que, além da verba do seguro
obrigatório da infortunística, seria proporcionado ao lesado um suplemento
por parte daquele que fora o direto causador da lesão.
No início, a tese se lastreava na gravidade da conduta dolosa do
empregador que conscientemente conduzia o empregado a sofrer o dano.
Mais tarde, ao dolo se equipararia a culpa grave, por orientação traçada pelo
Supremo Tribunal Federal.

O passo seguinte consistiu em elim inar o caráter com plem entar da


indenização a cargo do empregador, quando sujeito à responsabilidade civil
concorrente com a reparação previdenciária, a pretexto de que cada uma
das indenizações teria causa própria e independente. Se, pois, o patrão, por
dolo ou culpa grave, fora o causador da lesão imposta a seu empregado, teria
de indenizar por inteiro toda a extensão do mal injusto infligido à vítima. Pouco
im portava que esta tivesse sido beneficiada tam bém pela reparação
previdenciária.

A C onstituição de 1988 deu mais um grande passo na tutela dos


acidentados no trabalho, dispondo que a reparação previdenciária não excluiria
a responsabilidade civil comum na hipótese de culpa do patrão. Eliminando-se
22 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

a exigência de culpa grave, a concorrência das duas indenizações tornou-se


completa. Qualquer que fosse o grau da culpa do empregador na causação do
acidente do trabalho, estaria sujeito ao dever de proporcionar indenização
comum completa.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça fixou-se no sentido de


que duas modalidades de responsabilidade concorriam na espécie: uma
objetiva, disciplinada pela legislação acidentária, e outra subjetiva, instituída
pela regra constitucional e cujo montante haveria de ser apurado segundo as
regras comuns de reparação do ato ilícito.
Levando em conta os novos rumos que o Código Civil de 2002 traça
para a responsabilidade civil, ao admiti-la em certas situações, como fundada
apenas na teoria do risco, o estudo ora divulgado pelo juiz e professor
Sebastião Geraldo de Oliveira avança e defende a possibilidade de estender
a novidade norm ativa também à responsabilidade de direito comum do
empregador, quando relacionada com dano oriundo do trabalho.

Reconhece o autor a com plexidade da controvérsia que envolve a


polêmica suscitada pela tormentosa questão; e ressalva que, “de qualquer
forma, essas inovações somente estarão consolidadas e seus contornos
melhor estabelecidos quando a jurisprudência firmar entendimento sobre o
tema”.

Por enquanto, o estudo trabalha com perspectivas extraídas daquilo que


o autor chama de “um nítido deslocamento do pensamento jurídico em direção
à responsabilidade objetiva, especialmente nas questões que envolvem maior
alcance social”.

O autor se mostra, notoriamente, imbuído da consciência do papel criador


que cabe a todo cientista, inclusive o dedicado à ciência do direito. Nesse
mister, contestar, inovar e ousar são atitudes naturais e indispensáveis, pois,
como adverte Carlos Ari Sundefeld, “ao cientista cabe a angústia de criar”
(Direito administrativo ordenador. São Paulo: Malheiros, 1993). Tem-se no
presente estudo o exemplo elogiável do jurista que não padece do hábito
comum no meio doutrinário apontado por Edmond Picard, configurador de
uma “relativa preguiça mental e que o leva a evitar a quebra da segurança
representada pela estabilidade de seus preconceitos e da paz estabelecida
por suas efêmeras certezas”. Como bom jurista, o autor não se contenta com
a mansidão das ideias e conceitos assentes nem se conforma com a simples
exegese das normas positivas da lei. Vai fundo na manifestação dos dados
sociológicos, econômicos, morais e humanos em sentido muito amplo. Produz,
nesse clima, obra de muita reflexão e estímulo à revisão de dogmas que
entrevê como abalados pela nova ordem social implantada no atual Estado
Democrático de Direito.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 23

Nessa visão criativa, o autor age como um pensador, que não se contenta
em contemplar o que existe à sua volta e que se atreve a imaginar o que
ainda virá a existir, levando em conta a experiência já vivida e os rumos que
ela permite divisar para o futuro.

Não é, porém, um sonhador nem um visionário. Tem consciência da


gravidade da revolução por que passa a responsabilidade civil no processo
lento e espinhoso do plano subjetivo para o objetivo, ou seja, da teoria da
culpa para a teoria do risco.

É certo que se faz mais justiça à vítim a quando se lhe assegura a


indenização em qualquer situação danosa, com ou sem culpa do agente
ocasionador de seu prejuízo. É necessário, contudo, imaginar, também, a
possibilidade de se fazer injustiça àquele de quem se exige uma indiscriminada
e imprevisível responsabilidade indenizatória individual, quando o risco que
se põe sobre suas costas decorre de uma verdadeira sujeição social. Numa
sociedade de massas estruturada sobre a vida mecanizada, em todos os
detalhes, o risco que cada um tem de enfrentar, para amoldar-se ao padrão
que a sociedade determina, não pode ser visto como fruto da conveniência e
alvedrio de cada indivíduo apenas. O grande problema é social e não individual.
A sociedade moderna que o criou é quem, na verdade, tem de suportá-lo. É
justo que o indivíduo aprisionado nas garras de um convívio perigoso, sem
meios de evitá-lo, reclame responsabilidade para quem lhe impõe danos. Mas,
sendo de dimensões sociais esse clima de risco inafastável, sua solução
também tem de ser social.

Como registra o autor, valendo-se da lição de Silvio Venosa, em sua


obra, o fundamento da teoria da responsabilidade objetiva, que impõe o dever
de indenizar apenas em função do nexo causal, sem cogitar da culpa do
causador do dano, “atende melhor à justiça social, mas não pode ser aplicado
indiscriminadamente para que não se caia no outro extremo de injustiça.”(1)
Há de se ter em mente que nem sempre o agente dispõe de meios ou recursos
para suportar toda a carga da responsabilidade objetiva generalizada, sem
sacrificar sua própria subsistência e a de sua família.

Daí por que a doutrina europeia e a nacional mais atualizada preconizam


o e n c a m in h a m e n to da re s p o n s a b ilid a d e c iv il para as “té c n ic a s de
socialização do dano para o fim de ser garantida pelo menos uma indenização
básica para qualquer tipo de acidente pessoal” . É o que — anota Sérgio
Cavalieri Filho — a doutrina denomina de “ reparação coletiva, indenização
autônoma ou social.”(2)

(1) VENOSA, Silvio. D ireito civil. Parte geral. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 570.
(2) C AV A LIE R I FILHO, S érgio. Program a de re sp o n sa b ilid a d e civil. 4. ed. São Paulo:
Malheiros, 2003. p. 156.
24 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

“O dano, nessa nova perspectiva, deixa de ser apenas contra a vítima


para ser contra a própria coletividade, passando a ser um problema de toda a
sociedade.”(3)
Os princípios da solidariedade social e da justiça distributiva não podem
ser enfrentados apenas com o achar alguém para indenizar o dano em
qualquer situação em que ele ocorra, seguindo-se rigidamente a teoria da
responsabilidade civil objetiva. Os novos contornos desta visão coletiva da
responsabilidade apontam para uma linha de tendência que não se resume
apenas à “intensificação dos critérios objetivos de reparação” , mas que re­
comendam, também, o “desenvolvimento de novos mecanismos de seguro
social.”(4)
O estudo do Dr. Sebastião Geraldo de Oliveira não descura desse
preocupante aspecto da progressiva implantação da teoria do risco, em cujo
nome se instituiu há um século a teoria do acidente do trabalho e se implantou
o respectivo seguro obrigatório, à custa dos empregadores.
Ao s u g e rir que se cu m u le ao se g u ro da in fo rtu n ís tic a a nova
responsabilidade civil de Direito Comum na modalidade objetiva, o autor
reconhece a possibilidade de se argumentar, com razão, “que a indenização
representará um custo elevado para o empregador, sendo que, em alguns
casos, poderá até inviabilizar o prosseguimento de sua atividade”. Sua tese,
todavia, não se restringe tão apenas à implantação da responsabilidade
patrimonial sem culpa. “ É provável” — a seu modo de ver — “que a técnica
da socialização dos riscos, por intermédio do mecanismo inteligente do seguro
da responsabilidade civil, venha a ser o ponto de equilíbrio para acomodar
todos os interesses, sem ônus excessivos para ninguém”.
O que, enfim, se extrai do estudo é a preocupação do autor com a
insuficiência do atual seguro de previdência social para cobrir todo o prejuízo
ocasionado pelo acidente do trabalho, havendo, pois, necessidade de se
buscarem novos remédios jurídicos para acobertar o acidentado e sua família,
de maneira mais efetiva. Talvez não haja necessidade de se cogitar de duas
responsabilidades civis objetivas na espécie, uma coberta pelo seguro
acidentário e outra pelo seguro de responsabilidade civil. Tudo (quem sabe?)
poderia ser enfrentado e solucionado por meio de uma reestruturação e
ampliação do seguro de acidente do trabalho.
Além do tema principal já referido, outras questões de alta relevância
são inteligentem ente tratadas pelo Dr. Sebastião G eraldo de Oliveira,
merecendo destaque, por sua grande atualidade, as referentes à competência

(3) MENEZES DIREITO, Carlos Alberto; CAVALIERI FILHO, Sérgio. C omentários ao novo
Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v. XIII, p. 40.
(4) T E P E D IN O , G ustavo. Tem as de d ire ito civil. 2. ed. Rio de Janeiro: R enovar, 2001.
p. 175-176.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 25

para as causas de responsabilidade civil comum derivadas de acidente do


trabalho, ao tema da prescrição dessas mesmas ações e ao problema dos
acidentes ocorridos com empregados de empresas terceirizadas.

Merece, ainda, destaque o enfoque específico da obra sobre a teoria do


acidente do trabalho em sentido estrito. Antes de ingressar no exame da
responsabilidade civil de Direito Comum, o estudo dedica três capítulos, de
real substância, ao histórico das leis acidentárias no Brasil, ao conceito
de acidente do trabalho e à sua caracterização.

Após a b o rd ar a possível co n co rrê n cia entre a re sp on sabilid ade


acidentária e a responsabilidade civil comum, outros capítulos importantes
cuidam da caracterização das diversas modalidades de danos indenizáveis
(dano m aterial, m oral e estético), do nexo causal e das respectivas
excludentes (culpa da vítima, caso fortuito ou de força maior e fato de terceiro).
A culpa do empregador merece, por sua vez, cuidadosa análise. Por fim, dois
capítulos são dedicados às particularidades das indenizações nos casos de
acidente com óbito e sem óbito.

Pela rique za e p e rtin ê n cia dos dados úteis aos pro ce d im e n to s


administrativos e judiciais referentes aos acidentes do trabalho, que a obra
coligiu e analisou, seu valor se evidencia tanto no plano doutrinário como no
plano prático da vida forense, onde, sem dúvida, haverá de ser muito bem
acolhida.

Humberto Theodoro Júnior


Maio de 2005
INTRODUÇÃO

Diariamente, no Brasil, por volta de 830 pessoas entram em gozo de


auxílio-doença acidentário, com afastamento por período superior a 15 dias.
Além disso, por volta de 50 brasileiros a cada dia deixam definitivamente o
mundo do trabalho, por morte ou por incapacidade laborativa permanente, e a
maioria deles em razão de acidentes causados por culpa do empregador.

Desde 1990, quando iniciamos os estudos a respeito da proteção jurídica


à saúde do trabalhador, as indenizações decorrentes dos acidentes do trabalho
e das doenças ocupacionais vêm chamando a nossa atenção. Ao longo desse
período, durante aulas, julgamentos, palestras e debates, costumeiramente
surgiam indagações instigantes relacionadas ao tema, deixando evidente a
carência de estudos jurídicos mais elaborados, para dar efetividade à inovação
introduzida pelo art. 7Q, XXVIII, da Constituição da República de 1988(1).

O entendimento que prevaleceu por muito tempo, no século passado,


era que ao acidentado ou aos seus dependentes só restava o direito de auferir
os limitados benefícios garantidos pelas leis da Infortunística. No entanto, as
prestações decorrentes do seguro de acidente do trabalho são de caráter
marcadamente alimentar, pois asseguram tão somente a sobrevivência da
vítima ou da sua família. Não têm como objetivo a reparação do dano causado,
de acordo com o princípio secular da re stitu tio in integrum , adotado
reiteradamente no campo da responsabilidade civil.

Nas últimas décadas, porém, ocorreu uma importante mudança no Brasil:


a Previdência Social praticamente absorveu a Infortunística, passando a
conceder benefícios com valores idênticos, sem distinguir se o acidente ou a
doença teve ou não nexo causal com o trabalho desempenhado pelo segurado.
À medida que os direitos acidentários perdiam a identidade, confundindo-se
com os benefícios previdenciários, foi crescendo a percepção sobre a
necessidade de reparar os danos causados pelos acidentes do trabalho e
situações equiparáveis. Na realidade, o chamado seguro de acidente do

(1) “Art. 7° — São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social: ... XXVIII — seguro contra acidentes de trabalho, a cargo
do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em
dolo ou culpa;”
28 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

trabalho não garante indenização ao acidentado: concede apenas aqueles


direitos já reconhecidos pela Previdência Social.

A pós a C o n stitu içã o de 1988, restou p a cifica d a a co n tro vé rsia


jurisprudencial sobre o cabimento da responsabilidade civil do empregador
pelo acidente do trabalho, quando este incorrer em dolo ou culpa de qualquer
grau. Com efeito, cada vez mais a Justiça do Trabalho vem sendo acionada
por acidentados postulando indenizações por danos materiais, morais ou
estéticos em face do empregador. Por se tratar de um direito relativamente
recente, todos que militamos na área sentimos falta de uma abordagem
doutrinária da responsabilidade civil voltada especialmente para o tema das
in denizações de co rre n te s dos acidentes do tra b a lh o e das doenças
ocupacionais.

Questões tormentosas como o enquadramento legal do acidente do


trabalho, as doenças ocupacionais e as concausas, a cum ulação da
indenização com os benefícios acidentários, a análise da presença dos
pressupostos da responsabilidade civil, a mensuração dos danos, o valor e
os beneficiários da pensão, a legitimidade para pleitear o dano moral, o
cabimento ou não da responsabilidade civil objetiva, as hipóteses de exclusão
do nexo causal, a prescrição aplicável, dentre várias outras, continuam
gerando muitas interrogações. Além disso, o Código Civil de 2002 trouxe
inovações substanciais no campo da responsabilidade civil, cujos contornos
só agora começam a ser delineados na doutrina e jurisprudência, com intensas
repercussões no tema deste livro.

Diante de tantas demandas e questionamentos, animou-nos o propósito


de esboçar uma sistem atizaçã o da m atéria da respon sabilid ade civil
decorrente dos acidentes do trabalho, abordando o posicionamento legal,
doutrinário e jurisprudencial. Procuramos, na medida do possível, abordar
não só as correntes doutrinárias que alimentam as diversas controvérsias
jurídicas sobre o tema, mas também indicar a teoria mais acolhida nos
tribunais, para que o livro venha a ser uma ferramenta útil e confiável para
todos os que atuam nessa área.

Por ocasião da primeira edição deste livro anotamos: “Não sabemos se


o nosso objetivo foi atingido, mormente em razão da complexidade e extensão
da matéria. Mas, estamos envolvidos por um sentimento de paz e gratidão
pela oportunidade de poder oferecer uma contribuição para o aprofundamento
neste tema pouco estudado, mas muito presente nos tribunais do País.
Certamente, o tempo e a crítica construtiva do leitor contribuirão para os
aperfeiçoamentos que se fizerem necessários.”

Agora que o livro atinge a 7- edição, com sucessivas tiragens, já


podemos concluir que o nosso propósito vem obtendo êxito e tem contribuído
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 29

para efetivar a justa reparação dos danos das inúmeras vítimas de acidente
do trabalho, ou dos seus dependentes, que batem às portas da Justiça do
Trabalho.
Por fim, subscrevemos integralmente a manifestação do grande mestre
C aio M ário, re g istra d a na a p re se n ta çã o do seu livro a re sp e ito da
responsabilidade civil, tantas vezes citado neste livro: “Não aspiro às galas
de inovador, pois que em Direito as construções vão-se alteando umas sobre
as outras, sempre com amparo no que foi dito, explicado, legislado e decidido.
Ninguém se abalança a efetuar um estudo qualquer, sem humildemente
reportar-se ao que foi exposto pelos doutos e melhor dotados”(2).

O autor

(2) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. 8 - 1. Rio de Janeiro: Forense,
2 0 0 2 . p. X.
CAPÍTULO 1

ACIDENTES DO TRABALHO NO BRASIL

1.1. Importância do problema

Neste livro o nosso enfoque estará direcionado especialm ente para


as indenizações dos danos decorrentes dos acidentes do trabalho e todas as
situações juridicam ente equiparadas. Contudo, vale uma breve notícia e
reflexão a respeito da importância da questão acidentária no Brasil.
Q uando nos debruçam os sobre o tem a do acidente do trabalho,
deparamo-nos com um cenário dos mais aflitivos. As ocorrências nesse
campo geram conseqüências traumáticas que acarretam, muitas vezes, a
invalidez permanente ou até mesmo a morte, com repercussões danosas
para o trabalhador, sua família, a empresa e a sociedade. O acidente mais
grave interrompe abruptamente a trajetória profissional, transforma sonhos
em pesadelos e lança uma nuvem de sofrimentos sobre vítimas indefesas,
cujos lam entos ecoarão distantes dos ouvidos daqueles em presários
displicentes que atuam com a vida e a saúde dos trabalhadores como simples
ferramentas produtivas utilizadas na sua atividade.
A dimensão do problema e a necessidade premente de soluções exigem
mudanças de atitude. É praticamente impossível “anestesiar” a consciência,
comemorar os avanços tecnológicos e, com indiferença, desviar o olhar dessa
ferida social aberta, ainda mais com tantos dispositivos constitucionais e
princípios jurídicos entronizando a dignificação do trabalho. A questão fica
ainda mais incômoda quando já se sabe que a implementação de medidas
preventivas, algumas bastante simples e de baixo custo, alcança reduções
estatísticas significativas, ou seja, economizam vidas humanas(1).

Desde que o Brasil obteve o lamentável título de campeão mundial de


acidentes do trabalho na década de 70 do século passado(2), diversas

(1) No nosso livro Proteção ju ríd ica à saúde do trabalhador, publicado por esta Editora,
fo ca liza m o s d e ta lh ad a m e n te as m edidas ju ríd ic a s que podem ser a d o ta d a s para dar
efetividade às normas legais a respeito da segurança, higiene e saúde do trabalhador.
(2) Durante o ano de 1975, segundo os dados oficiais, dos 12.996.796 de trabalhadores com
registro formal no Brasil, 1.869.689 sofreram acidente do trabalho, acarretando 4.001 mortes.
32 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

alterações legislativas e punições mais severas foram adotadas e muitos


esforços estão ocorrendo para melhorar a segurança e a qualidade de vida
nos locais de trabalho. Apesar do progresso obtido, é imperioso registrar que
estamos longe da situação considerada aceitável, especialmente quando
comparamos os dados brasileiros com as estatísticas internacionais. Enquanto
nos países industrializados os acidentes fatais se estabilizaram ou até
diminuíram, nos países em desenvolvim ento ou emergentes os índices
continuam altos, o que leva à conclusão de que o progresso está sendo
alcançado ao preço constrangedor de muitas vidas.

Por outro enfoque, os custos dos acidentes do trabalho no Brasil são


muito elevados para os empregadores e indiretamente para toda a sociedade.
Estimativas do Conselho Nacional de Previdência Social indicam que a
ausência de segurança nos ambientes de trabalho no Brasil gerou, em 2003,
um custo de aproximadamente R$ 32,8 bilhões para o país(3). O professor
José Pastore assegura que esse custo para as empresas atinge R$ 41 bilhões
por ano. Chega-se a esse número computando-se os prêmios de seguro, o
tem po perdido, as despesas dos prim eiros socorros, a destruição de
equipamentos e materiais, a interrupção da produção, os salários pagos aos
empregados afastados, as despesas administrativas etc. Além desses custos
mais visíveis, há também o prejuízo para a imagem da empresa no mercado
em que atua, as ações postulando reparação de danos pelos acidentes e
doenças profissionais, os gastos dos fam iliares dos acidentados, dentre
outros. Somando-se os gastos diretos e indiretos, mais os dispêndios que o
Estado suporta para o atendimento médico dos trabalhadores, conclui o
professor Pastore que os custos dos acidentes do trabalho no Brasil
ultrapassam 71 bilhões de reais por ano, som ente con sid e ra n d o os
trabalhadores formais(4).
A gravidade do problema acidentário levou diversos países, organizações
e, finalmente, a Organização Internacional do Trabalho — OIT, desde 2001, a
instituir o dia 28 de abril de cada ano como Dia Mundial pela Saúde e Segurança
do Trabalho(5). Esta data foi adotada primeiramente em 1969, para lembrar a

(3) Cf. Resolução do Conselho Nacional de Previdência Social n. 1.236 de 28 de abril de


2004, publicada no Diário Oficial da União do dia 10 de maio de 2004.
(4) Cf. Revista Proteção, Novo Hamburgo, v. XXV, n. 242, p. 20, fev. 2012.
(5) “Cerca de 2 millones de personas mueren cada ano a causa de su trabajo. Esta es una
cifra global elaborada a partir de los cálculos más recientes de Ia OIT. (...) La muerte no es
cosa dei destino. Los accidentes no ocurren porque si. La enfermedad no es producto dei
azar. Todos ellos tienen una causa. La mayoría de las muertes relacionadas con el trabajo,
los accidentes de trabajo y las enfermedades profesionales que tienen lugar en el mundo
puede prevenirse. Este m ensaje debe ser difundido y el 28 de abril, D ia Mundial de Ia
Seguridad y Ia Salud en el Trabajo, nos ofrece una buena oportunidad para ello. Cada país,
cada ciudad, cada pueblo conm em ora sus muertos en Ia guerra. Entonces, <j,por qué no
establecer un dia para rendir homenaje a aquellos hombres, mujeres y ninos que murieron
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 33

explosão da mina de Farmington, West Virginia, nos Estados Unidos, onde


morreram 78 trabalhadores®. O Brasil, desde 2003, também incluiu no seu
calendário de eventos esse dia do ano para prestar homenagens às vítimas
dos acidentes do trabalho, sendo que a Lei n. 11.121, de 25 de maio de 2005,
instituiu o “Dia Nacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do
Trabalho” , a ser celebrado no dia 28 de abril de cada ano. Também foi instituído
o “Dia Nacional de Luta dos Acidentados por Fontes Radioativas”, pela Lei n.
12.646, de 16 de maio de 2012, a ser comemorado, anualmente, no dia 13 de
setembro.
É preciso enfatizar que todos perdem com o acidente do trabalho: o
empregado acidentado e sua família, a empresa, o governo e, em última
instância, toda a sociedade. Se todos am argam preju ízo s visíve is e
mensuráveis, é inevitável concluir que investir em prevenção proporciona
diversos benefícios: primeiramente, retorno financeiro para o empregador;
em segundo lugar, reconhecimento dos trabalhadores pelo padrão ético da
empresa; em terceiro, melhoria das contas da Previdência Social e, finalmente,
ganho emocional dos empregados que se sentem valorizados e respeitados.
Todos esses fatores conjugados geram um efeito sinérgico positivo
resultando maior produtividade, menor absenteísmo e, consequentemente,
m ais lucratividade. Com o se vê, a gestão adequada dos riscos para
preservação da saúde e integridade dos trabalhadores não se resume
simplesmente ao cumprimento de normas para atender à legislação e evitar
as multas trabalhistas. Vai muito além disso. Representa uma moderna visão
estratégica da atividade econôm ica e requisito im prescindível para a
sobrevivência empresarial no longo prazo.

1.2. Os núm eros dos acidentes

De acordo com levantamento da OIT divulgado em 1985, a cada três


minutos um trabalhador perdia a vida no mundo em consequência de acidente

víctim as de su trabajo? Y, ^p o r qué no utilizarlo para poner de relieve Ia urgente necesidad


de que existan mejores condiciones de seguridad y saiud en el lugar de trabajo? A partir de
esta idea simple, en 1989, trabajadores estadounidenses y canadienses fijaron el 28 de
abril como dia recordatorio para sus colegas fallecidos o lesionados. El acontecim iento se
propago rápidam ente. A ctualm ente, este dia se recuerda en cerca de cien países. Esta
globalización dei dia recordatorio ha sido vigorosam ente prom ovida por el m ovim iento
laboral y en particular por Ia C onfederación Internacional de O rganizaciones Sindicales
Libres (CIOSL). La OIT, que durante mucho tiem po ha apoyado estos dias recordatorios, se
ha sumado a él de manera oficial y desea anadir un aspecto característico de Ia OIT, el
tripartismo. En otras palabras, Ia cooperación entre gobiernos, empleadores y trabajadores,
quienes dialogan en un plano de igualdad.” Cf. La seguridad en cifras. Ginebra: Oficina
Internacional dei Trabajo, 2003. p. 1.
(6) Cf. Revista Proteção, Novo Hamburgo, v. XVI, n. 138, p. 18, jun. 2003.
34 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

do trabalho ou de doença profissional, e a cada segundo, pelo menos, quatro


trabalhadores sofriam algum tipo de lesão(7).

Em pouco mais de duas décadas a situação piorou sensivelmente.


Estatísticas recentes da mesma OIT atestam que ocorrem por ano no mundo
por volta de 337 milhões de acidentes, representando uma média aproximada
de 923 mil por dia ou mais de dez por segundo. Desse elevado número de
ocorrências, resultam a cada ano por volta de 2,3 milhões de acidentes do
trabalho com óbito ou mais de quatro mortes por minuto(8). Além das perdas
humanas e todos os efeitos colaterais dolorosos, há um custo econômico
extraordinário que ultrapassa anualmente um trilhão de dólares americanos,
por volta de 4% do produto interno bruto global, o que demonstra a necessidade
urgente de adoção de políticas efetivas voltadas para o enfrentamento do
problema(9). Como enfatizou a Doutora Sameera Maziadi Al-Tuwaijri, Diretora
do Programa de Segurança e Saúde no Trabalho da OIT, ”a experiência
demonstra que a maior parte destes acidentes são previsíveis”, enfatizando,
ademais, que “os acidentes não são parte do trabalho.”(10)
Essas estatísticas lamentáveis reforçam o paradoxo da situação: o local
de trabalho, que deveria servir para o homem ganhar a vida, está se
transformando, em muitas ocasiões, em lugar sinistro para encontrar a morte!

No Brasil, a questão tam bém vem sendo intensam ente debatida,

(7) El trabajo en el mundo. Ginebra: Oficina Internacional dei Trabajo, 1985. v. 2, p. 145.
(8) Dados disponíveis em: < http://www.ilo.org/wcm sp5/groups/public/— ed_protect/— protrav/
— safew ork/docum ents/publication/w cm s_124341 .pdf>. Acesso em: 21 dez. 2010.
(9) “S egún da d o s de Ia O fic in a In te rn a c io n a l dei T ra b a jo (O IT ), las e n fe rm e d a d e s
profesionales y los accidentes relacionados con el trabajo provocan cada ano dos millones
de muertes, cuyo costo para Ia econom ia global se estim a asciende a 1,25 trillones de
dólares de los Estados Unidos. En un informe titulado “ Por una cultura para Ia seguridad en
el trabajo” , Ia OIT senala que el número de muertes y enfermedades accidentales podría
contenerse si los trabajadores, los em pleadores y los gobiernos respetasen las normas
internacionales existentes en matéria de seguridad. Según Juan Somavia, Director General
de Ia OIT, “los accidentes y enfermedades no deben form ar parte dei trabajo cotidiano. Las
muertes, accidentes y enfermedades en el trabajo pueden prevenirse. Debemos promover
una nueva ‘cultura de Ia seguridad’ en el lugar de trabajo -donde quiera que éste se realice-
que esté respaldada por políticas y programas nacionales adecuados para lograr lugares
de trabajo más sanos y seguros para todos” . En el nuevo informe se pasa revista a los
conocim ientos actuales sobre el número de enferm edades, accidentes y muertes que se
p ro d u c e n en el lu g a r de tra b a jo , c u y o c o s to s u p o n e u n a s p é rd id a s a n u a le s de
aproxim adam ente 1,25 trillones (1.250.000 m illones de dólares de los Estados Unidos)
para el producto interior bruto (PIB) global. La OIT senala que sus estimaciones se basan en
cálculos conforme a los cuales el costo de los accidentes de trabajo y las enfermedades
profesionales representa aproxim adam ente el 4 por ciento dei PIB anual.” Cf. OIT. EL
TRABAJO PELIGROSO MATA A MILLONES Y CUESTA BILLONES. Disponível em: chttp://
w w w .oit.org/public/spanish/bureau/inf/features/03/hazards.htm >. Acesso em: 27 dez. 2005.
(10) Disponível em: < http://www.oit.org.br/news/nov/ler_nov.php?id=3123>. Acesso em: 21
dez. 2010.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 35

especialmente a partir de 1975, quando os índices de acidentes do trabalho


atingiram números alarmantes, bem superiores à média mundial. Durante os
20 anos seguintes (1975-1994) ocorreram quedas praticamente sucessivas,
baixando o volume de acidentes do trabalho da casa dos dois milhões anuais
para algo próximo de 400 mil.
De 1995 a 2001 a quantidade de acidentes manteve-se praticamente no
mesmo patamar, já demonstrando que a política nacional de segurança e
saúde no local de trabalho havia chegado ao seu limite de resposta, pois não
conseguia mais reduzir os acidentes do trabalho e precisava ser aprimorada.
É certo que ocorreram algum as m elhorias pontuais, especialm ente nos
acidentes fatais e nas doenças ocupacionais, resultantes de m edidas
específicas, mas longe de merecerem comemoração.

Nos últimos anos a quantidade de acidentes voltou a subir, deixando


evidente a necessidade de medidas legais e governamentais que, aliás, já
estão sendo tomadas para tentar reverter essa tendência.

Vale conferir os dados oficiais da Previdência Social sobre os acidentes


do trabalho no Brasil, do período de 1975 a 2011:

Trabalhadores Acidentes Acidentes Doenças Total dos Mortes


Anos
form ais típicos de trajeto ocupacionais acidentes
1975 12.996.796 1.869.689 44.307 2.191 1.916.187 4.001
1976 14.945.489 1.692.833 48.394 2.598 1.743.825 3.900
1977 16.589.605 1.562.957 48.780 3.013 1.614.750 4.445
1978 16.638.799 1.497.974 48.511 5.016 1.551.501 4.342
1979 17.637.127 1.388.525 52.279 3.823 1.444.627 4.673
1980 18.686.355 1.404.531 55.967 3.713 1.464.211 4.824
1981 19.188.536 1.215.539 51.722 3.204 1.270.465 4.808
1982 19.476.362 1.117.832 57.874 2.766 1.178.472 4.496
1983 19.671.128 943.110 56.989 3.016 1.003.115 4.214
1984 19.673.915 901.288 57.054 3.233 961.575 4.508
1985 21.151.994 1.010.340 63.515 4.006 1.077.861 4.384
1986 22.163.827 1.129.152 72.693 6.014 1.207.859 4.578
1987 22.617.787 1.065.912 64.830 6.382 1.137.124 5.738
1988 23.661.579 926.354 60.202 5.025 991.581 4.616
1989 24.486.553 825.081 58.524 4.838 888.343 4.554
1990 23.198.656 632.012 56.343 5.217 693.572 5.355
1991 23.004.264 579.362 46.679 6.281 632.322 4.527
1992 22.272.843 490.916 33.299 8.299 532.514 3.516
1993 23.165.027 374.167 22.709 15.417 412.293 3.110
1994 23.667.241 350.210 22.824 15.270 388.304 3.129
1995 23.755.736 374.700 28.791 20.646 424.137 3.967
1996 23.830.312 325.870 34.696 34.889 395.455 4.488
1997 24.104.428 347.482 37.213 36.648 421.343 3.469
1998 24.491.635 347.738 36.114 30.489 414.341 3.793
1999 24.993.265 326.404 37.513 23.903 387.820 3.896
2000 26.228.629 304.963 39.300 19.605 363.868 3.094
36 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Anos Trabalhadores Acidentes Acidentes Doenças Total dos Mortes


form ais típicos de trajeto ocupacionais acidentes
2001 27.189.614 282.965 38.799 18.487 340.251 2.753
2002 28.683.913 323.879 46.881 22.311 393.071 2.968
2003 29.544.927 325.577 49.642 23.858 399.077 2.674
2004 31.407.576 375.171 60.335 30.194 465.700 2.839
2005 33.238.617 398.613 67.971 33.096 499.680 2.766
2006 35.155.249 407.426 74.636 30.170 512.232 2.798
2007 37.607.430 417.036 79.005 22.374 659.523* 2.845
2008 39.441.566 441.925 88.742 20.356 755.980* 2.817
2009 41.207.546 424.498 90.180 19.570 733.365* 2.560
2010 44.068.355 417.295 95.321 17.177 709.474* 2.753
2011 46.310.631 423.167 100.230 15.083 711.164* 2.884
Obs.: 1. No número total de acidentes, a partir de 2007, foram incluídos os acidentes registrados
pelo INSS sem CAT emitida, sendo 141.108 em 2007, 204.957 em 2008, 199.117 em 2009, 179.681
em 2010 e 172.684 em 2011; 2. A coluna “Trabalhadores formais” considerou, a partir de 1985, os
dados da RAIS, já que o INSS não publica o número de empregados abrangidos pelo Seguro de
Acidente do Trabalho.

As entidades sindicais ainda demonstram desconfiança quanto à vera­


cidade das estatísticas oficiais. Alegam que estão encontrando dificuldades
para o reconhecimento das doenças ocupacionais pelos empregadores e junto
à perícia médica do INSS, tanto que é considerável o aumento das demandas
judiciais buscando o enquadramento da patologia como doença ocupacional.
Mesmo assim, o número das doenças ocupacionais reconhecidas aumentou
bastante nos últimos anos, especialmente em razão do aperfeiçoamento da
análise dos fatores causais da relação trabalho-doença, já que os médicos
do trabalho estão mais atentos para visualizar o paciente no seu ambiente
laboral e a legislação ampliou consideravelmente as hipóteses das doenças
consideradas ocupacionais.
Um forte sinal da subnotificação pode ser observado no descompasso
estatístico entre os acidentes registrados e a quantidade de mortes. Enquanto
o número de acidentes nos últimos trinta anos teve redução significativa, o
volume de mortes manteve-se elevado; pode ocorrer a ocultação do acidente
do trabalho, mas é muito difícil omitir um óbito...

Além disso, há outro fator im portante que acarretava distorção nas


estatísticas. Muitas doenças originadas do trabalho, portanto equiparadas
legalmente a acidentes do trabalho, eram diagnosticadas e tratadas como
doenças comuns, gerando no INSS o benefício auxílio-doença previdenciário
(B-31) e não o auxílio-doença por acidente do trabalho (B-91). Tratava-se
apenas do paciente e não do paciente-trabalhador.

É importante mencionar que a estatística oficial era feita, até 2006, com
base tão som ente nas inform ações prestadas pelas Comunicações dos
Acidentes do Trabalho — CAT. Todavia, muitos acidentes ou doenças
ocupacionais não eram comunicados à Previdência Social, por ignorância
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 37

dos envolvidos, por receio das conseqüências ou por falta de registro formal
do trabalhador. Avaliava-se que as comunicações só atingiam por volta de
50% dos acidentes efetivamente ocorridos, principalmente a partir de 1991,
quando o art. 118 da Lei n. 8.213 instituiu a garantia de emprego por doze
meses, após a cessação do auxílio-doença acidentário.
Para combater os efeitos nocivos da subnotificação, foi instituído pela
Lei n. 11.430/2006 o nexo técnico epidemiológico, que autoriza ao INSS
reconhecer a doença como de natureza ocupacional, tão somente a partir da
relação de predominância de determinadas doenças com certas atividades
econômicas, de acordo com os levantamentos estatísticos oficiais dos últimos
anos(11). Com efeito, desde o ano-base de 2007, a Previdência Social passou
a publicar também a estatística dos acidentes do trabalho reconhecidos sem
a emissão da CAT pelo empregador. Em 2011, dos 711.164 acidentes do
trabalho ocorridos no Brasil, 76% foram reconhecidos após a emissão da
CAT (538.480) e 24% foram enquadrados como de origem ocupacional,
mesmo sem a emissão de CAT (172.684), com base apenas no nexo técnico
epidemiológico.
Pode-se observar uma crescente preocupação dos empresários com a
questão da saúde e segurança do trabalhador. A pressão sindical, as
repercussões negativas na mídia, as atuações do Ministério Público do
Trabalho e da Inspeção do Ministério do Trabalho e, especialmente, as
indenizações judiciais estão promovendo mudanças no gerenciamento desse
tema. Auditorias especializadas já mensuram o chamado “passivo patológico”
das organizações, com provando que o investim ento na prevenção de
acidentes e doenças reflete-se positivamente no balanço, com repercussão
na avaliação mercantil da empresa.
Os números dos acidentes do trabalho deixam à mostra a marca dolorosa
do problema, mormente na construção civil, na indústria e no setor de serviços.
Basta dizer, com base na estatística de 2011, que ainda ocorrem no Brasil
por volta de oito mortes a cada dia por acidente do trabalho. Se somarmos o
número de mortes por acidente do trabalho (2.884) com a quantidade daqueles
que se aposentam por incapacidade permanente (14.811), concluiremos que
diariamente perto de 50 pessoas deixam definitivamente o mundo do trabalho.
Além disso, em média, 830 trabalhadores por dia entram em gozo de auxílio-
-doença acidentário com afastamento por período superior a 15 dias. Diante
desses números, continua atual o pensamento do Engenheiro da Fundacentro
Dorival Barreiros, em artigo divulgado em 1990: “a problemática do acidente
e da doença do trabalho tem, no Brasil, as feições de uma guerra civil.”(12)

(11) A sistemática do nexo técnico epidem iológico será analisada com vagar no Capítulo 6,
que aborda o nexo causal no acidente do trabalho.
(12) BARREIROS, Dorival. Saúde e segurança nas pequenas empresas. Revista Brasileira
de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 18, n. 70, p. 25, abr./jun. 1990.
38 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

1.3. Histórico das leis acidentárias

Para receber judicialmente as indenizações tratadas neste livro, a vítima


primeiramente deve obter o enquadramento do evento como acidente do
trabalho ou doença ocupacional, nos termos da legislação própria. Daí a
importância de conhecer um breve histórico da legislação acidentária brasileira,
que foi construída em sete etapas mais significativas ao longo do século
passado, até atingir a norma legal atualmente em vigor.
O incremento da industrialização, a partir do século XIX, aumentou o
número de mutilados e mortos provenientes das precárias condições de
trabalho. Os reflexos sociais desse problema influenciaram o advento de
normas jurídicas para proteger o acidentado e seus dependentes de modo a,
pelo menos, remediar a situação. Foi assim que a Alemanha, em 1884, instituiu
a primeira lei específica a respeito dos acidentes de trabalho, cujo modelo
logo se espalhou pela Europa(13).
No Brasil, normas esparsas tratavam do acidente do trabalho, valendo
citar dois dispositivos do Código Comercial de 1850:
“A rt. 79: Os acidentes im previstos e inculpados, que im pedirem aos prepostos o
exercício de suas funções, não interromperão o vencimento do seu salário, contanto
que a inabilitação não exceda a 3 (três) meses contínuos.”

“Art. 560: Não deixará de vencer a soldada ajustada qualquer indivíduo da tripulação
que adoecer durante a viagem em serviço do navio, e o curativo será por conta deste;
se, porém, a doença for adquirida fora do serviço do navio, cessará o vencim ento da
soldada enquanto ela durar, e a despesa do curativo será por conta das soldadas
vencidas; e se estas não chegarem, por seus bens ou pelas soldadas que possam vir
a vencer.”

Desde o início do século XX, diversos projetos buscavam instituir uma lei
específica para regulamentara infortunística do trabalho. Esse esforço resultou
na aprovação do Decreto Legislativo n. 3.724, de 15 de janeiro de 1919,
considerado a primeira lei acidentária brasileira. O empregador foi onerado com
a responsabilidade pelo pagamento das indenizações acidentárias. Essa norma,
apesar das críticas e falhas, teve o mérito do pioneirismo e marcou a instituição
de princípios especiais da infortunística. Assevera Hertz Costa que o Decreto
Legislativo n. 3.724/1919 “significou a emancipação da infortunística do cordão
umbilical que a mantinha de alguma forma presa ao Direito Comum, reforçando
sua autonomia do Direito Trabalhista específico, não obstante as resistências
dos saudosistas da monarquia.”(14)

(13) Inform a Teresinha Lorena P. Saad que o exem plo da A lem anha foi seguido pela
Áustria em 1887, N oruega em 1894, Inglaterra em 1897, França, D inam arca e Itália em
1898 e Espanha em 1900. Cf. R esponsabilidade civil da em presa nos acidentes de trabalho.
São Paulo: LTr, 1999. p. 35.
(14) COSTA, Hertz J. Acidentes do trabalho na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003. p. 44.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r a ba lh o ou D oença O c u p a c io n a l 39

A segunda lei acidentária — Decreto n. 24.637, de 10 de julho de 1934


— ampliou o conceito de acidente para abranger as doenças profissionais
atípicas e estabeleceu a obrigação do seguro privado ou depósito em dinheiro
junto ao Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal, para garantia do
pagamento das indenizações, sendo que o valor do depósito variava de acordo
com o número de empregados.

Dez anos depois, em 10 de novembro de 1944, adveio a terceira lei


acidentária pelo Decreto-lei n. 7.036. Vale registrar o pensamento inspirado
de Alexandre Marcondes Filho, Ministro do Trabalho da época, constante do
anteprojeto que resultou no diploma legal mencionado, citado por Teresinha
Saad:

“A vida humana tem, certamente, um valor econômico. É um capital que


produz, e os atuários matemáticos podem avaliá-lo. Mas a vida do homem
possui também valor espiritual inestimável, que não se pode pagar com
todo o dinheiro do mundo. Nisto consiste, sobretudo, o valor da prevenção,
em que se evita a perda irreparável do pai, do marido e do filho; enfim,
daquele que sustenta o lar proletário, e preside os destinos de sua família.
Por mais que se despenda com a prevenção racional, ela será sempre
m enos onerosa que o sistem a de indenizações, além de evitar
oportunidade de discórdia entre elementos essenciais da produção,
capital e trabalho.”(15)
O Decreto-lei n. 7.036/1944 promoveu nova ampliação do conceito de
acidente do trabalho, incorporando as concausas(16) e o acidente in itinere,
instituindo ainda a obrigação, para o empregador, de proporcionar a seus
empregados a máxima segurança e higiene no trabalho, prevendo, por outro
lado, o dever dos empregados de cumprir as normas de segurança expedidas
pelo empregador(17). Além disso, o empregador estava obrigado a formalizar
seguro contra os riscos de acidente perante a instituição previdenciária da
filiação do empregado.
Outro ponto relevante desse Decreto-lei, especialmente para o tema
deste livro, foi a previsão legal possibilitando, pela primeira vez, a acumulação
dos direitos acidentários com as reparações por responsabilidade civil,
conforme constou da parte final do art. 31: “O pagamento da indenização
estabelecida pela presente lei exonera o em pregador de qualquer outra

(15) SAAD, Teresinha L. P. Responsabilidade civil da empresa nos acidentes de trabalho.


3. ed. São Paulo: LTr, 1999. p. 34.
(16) D ecreto-lei n. 7.036, 10 nov. 1944, art. 3Q: “C onsidera-se caracterizado o acidente,
ainda quando não seja ele a causa única e exclusiva da morte ou da perda ou redução da
capacidade do empregado, bastando que entre o evento e a morte ou incapacidade haja
uma relação de causa e efeito.”
(17) Decreto-lei n. 7.036, 10 nov. 1944, arts. 77 e 79.
40 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

indenização de direito comum, relativa ao mesmo acidente, a menos que este


resulte de dolo seu ou de seus prepostos.”(18) Na interpretação desse artigo,
a jurisprudência avançou, equiparando ao dolo a culpa grave do empregador,
culminando com a adoção, pelo Colendo Supremo Tribunal Federal da Súmula
n. 229, em 1963, com o teor seguinte: “A indenização acidentária não exclui a
do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador.”
A quarta lei brasileira sobre infortunística do trabalho — Decreto-lei n.
293, de 28 de fevereiro de 1967, baixado por força do Ato Institucional n. 4 —
marcou inegável retrocesso, mas teve vigência de apenas seis meses. Atribuiu
ao seguro de acidente um caráter exclusivamente privado, permitindo ao INPS
ope ra r em co n co rrência com as S ociedades S eguradoras. A ssevera
Teresinha Saad que esse “foi um dos diplomas legais mais impróprios,
retrocedendo a tudo quanto de bom havia sido conquistado na legislação sobre
infortunística.”(19)
Ainda no ano de 1967, em 14 de setembro, foi promulgada a quinta lei de
acidente do trabalho — Lei n. 5.316 — , restaurando dispositivos do Decreto-
-lei n. 7.036. Essa lei transferiu ao INPS o monopólio do seguro de acidente
do trabalho e criou plano específico de benefícios previdenciários acidentários.
Nova mudança ocorreu em 19 de outubro de 1976, quando foi promulgada
a Lei n. 6.367 — a sexta lei acidentária — , que manteve as linhas básicas da
lei anterior, porém aprimorando o conceito de acidente do trabalho e das
concausas. Como inovação, incluiu a doença proveniente da contaminação
acidental do pessoal da área médica como situação equiparada a acidente do
trabalho. Em casos excepcionais, também permitiu a equiparação de doenças
não indicadas pela Previdência Social, quando tais patologias estivessem
relacionadas com as condições especiais em que o serviço foi prestado.
Vigora, atualmente, a Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991 — sétima lei
acidentária — , que foi promulgada no bojo do Plano de Benefícios da Previdência
Social, em harmonia com as diretrizes da Constituição da República de 1988.
Os aspectos centrais do acidente do trabalho estão disciplinados nos arts. 19
a 23 da Lei mencionada, com regulamentação pelo Decreto n. 3.048, de 6 de
maio de 1999. Os benefícios do acidentado, após a Lei n. 9.032/1995,
praticamente foram equiparados aos benefícios previdenciários, tanto que não
existe diferença alguma, quanto ao valor, da prestação por doença comum ou
doença ocupacional. Neste sentido pontua Hertz Costa que “a bem da verdade,
o País não tem uma lei de acidentes do trabalho, mas regras infortunísticas
disseminadas nos benefícios da Previdência Social”(20).

(18) Decreto-lei n. 7.036, 10 nov. 1944, art. 31.


(19) SAAD, Teresinha L. P. Responsabilidade civil da empresa nos acidentes de trabalho.
3. ed. São Paulo: LTr, 1999. p. 101.
(20) COSTA, Hertz J. Acidentes do trabalho na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003. p. 63.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 41

A Lei n. 11.430, de 26 de dezembro de 2006, introduziu o art. 21 -A na Lei


n. 8.213/1991, instituindo o nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o
agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade
mórbida motivadora da incapacidade. Essa inovação teve o mérito de com­
bater a subnotificação dos acidentes do trabalho, ajudando a revelar, com
mais nitidez, a situação da infortunística no Brasil. Só no ano de 2011 foram
detectados, pelo mecanismo do nexo epidemiológico, 172.684 casos de aci­
dente do trabalho sem emissão da correspondente comunicação de acidente
do trabalho.
CAPÍTULO 2

ABRANGÊNCIA DO CONCEITO
DE ACIDENTE DO TRABALHO

2.1. Necessidade do enquadramento legal

A Constituição da República assegura aos trabalhadores, no art. 7Q,


XXVIII, o direito aos benefícios do seguro contra acidentes do trabalho, sem
excluir a indenização a que o empregador está obrigado, quando incorrer em
dolo ou culpa. Assim, a postulação judicial das indenizações por danos
materiais, morais e/ou estéticos, por parte daquele empregado que foi vítima
de acidente ou doença ocupacional, exige, previamente, que o evento danoso
esteja enquadrado em uma das hipóteses que a Lei n. 8.213/1991 considera
como acidente do trabalho.
Algumas situações rotineiras podem impedir ou, pelo menos, dificultar o
reconhecimento, em termos técnicos, da ocorrência como acidente do trabalho.
Primeiramente, menciona-se a hipótese de o trabalhador sofrer acidentes ou
doenças que não tenham vinculação direta ou indireta com a execução do
contrato de trabalho. Em segundo lugar, há situações em que o empregador
procura obstar o enquadramento nas previsões legais a respeito, por receio
das conseqüências jurídicas da garantia de emprego do art. 118 da Lei n.
8.213/1991, das indenizações por responsabilidade civil ou mesmo da ação
regressiva do INSS(1).

Além disso, também ocorrem muitos acidentes ou doenças ocupacionais


com verdadeiros empregados, mas que não estão regularmente registrados
ou que trabalham mediante contratos fraudulentos de empreitada, cooperativa,
estágio, parceria, representação com ercial, sociedade ou prestação de
serviços autônomos.

(1) A ação regressiva deve ser ajuizada pelo INSS para buscar o reembolso dos dispêndios
com benefícios acidentários, quando o em pregador tiver sido negligente quanto às normas-
-padrão de segurança e higiene do trabalho, indicadas para proteção individual ou coletiva
do trabalhador, conforme previsto no art. 120 da Lei n. 8.213/1991.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 43

Em síntese, antes de avaliar a possível indenização, será necessário


estabelecer indubitavelmente o enquadramento da ocorrência como acidente
do trabalho ou situação legalmente equiparada, isto é, verificar se tal evento
guarda nexo de causalidade com a execução do contrato de trabalho.

É oportuno mencionar que ao trabalhador avulso foram estendidos os


direitos assegurados aos trabalhadores com vínculo de emprego permanente,
conforme previsão expressa do art. 7Q, XXXIV, da Constituição da República.
Assim , ocorrendo acidente do trabalho ou doença ocupacional com o
trabalhador avulso, a Comunicação do Acidente do Trabalho — CAT — deverá
ser emitida pela empresa tomadora dos serviços ou, na sua falta, pelo sindicato
da categoria ou pelo órgão gestor de mão de obra(2). As normas de segurança,
higiene e saúde aplicáveis ao trabalhador avulso foram regulamentadas pela
NR-29 da Portaria do Ministério do Trabalho n. 3.214/1978, que trata da
Segurança e Saúde no Trabalho Portuário. Além disso, a Lei n. 9.719/1998,
que dispõe sobre as normas e condições gerais de proteção ao trabalho
portuário, estabelece no art. 9S: “Compete ao órgão gestor de mão de obra, ao
operador portuário e ao empregador, conforme o caso, cumprir e fazer cumprir
as normas concernentes a saúde e segurança do trabalho portuário.” A
responsabilidade solidária do operador portuário e do órgão gestor no
pagamento das indenizações por acidente do trabalho encontra respaldo
no art. 2° §4° da Lei n. 9.719/1998, que prevê: “O operador portuário e o órgão
gestor de mão de obra são solidariamente responsáveis pelo pagamento dos
encargos trabalhistas, das contribuições previdenciárias e demais obrigações,
inclusive acessórias, devidas à Seguridade Social, arrecadadas pelo Instituto
Nacional do Seguro Social — INSS, vedada a invocação do benefício de
ordem.”<3>

Os empregados domésticos não estão abrangidos pela legislação de


acidente do trabalho, uma vez que o art. 7e, parágrafo único, da Constituição
da República, ao relacionar os direitos destes trabalhadores, não incluiu o
inciso XXVIII. Dessa forma, se um trabalhador doméstico sofrer acidente,
receberá do INSS os benefícios previdenciários correspondentes, que, aliás,
depois da Lei n. 9.032/1995, passaram a ter equivalência com os valores dos
b e n e fíc io s a c id e n tá rio s . T am bém p o d e rá re c e b e r in d e n iz a ç ã o por
responsabilidade civil do empregador se estiverem presentes os pressupostos
do dano, nexo causal com o trabalho e culpa patronal, mas fica dispensada a
etapa do enquadramento do evento como acidente do trabalho no sentido
técnico-legal.

(2) Cf. Instrução Normativa INSS/PRES. n. 45, 6 ago. 2010, art. 358, III.
(3) A respeito deste tem a vale conferir o artigo doutrinário de Carlos Alberto Crispin intitulado
“A responsabilidade civil por acidente do trabalho do trabalhador portuário avulso” , publicado
na Revista L T rn . 71, n. 02, de fevereiro de 2007.
44 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

É certo que cabe indenização por responsabilidade civil decorrente de


qualquer ato ilícito do tomador dos serviços que tenha causado danos à vítima,
conforme preceitua o Código Civil, independentemente da sua condição de
empregado. Nessa situação enquadram-se as hipóteses de acidentes com
trabalhadores sem vínculo de em prego, tais com o os estagiários, os
cooperados, os autônomos, os empreiteiros, os representantes comerciais e
os prestadores de serviço em geral. Todavia, convém assinalar que os deveres
quanto às normas de segurança, higiene e saúde do simples tomador ou
usuá rio de serviço s são d ife re n te s d a q ueles que são a trib u íd o s ao
em pregador, em razão do caráter m arcadam ente tutelar da legislação
trabalhista. Com efeito, o acidente sofrido pelo trabalhador que mantém relação
de e m p re g o com o b e n e fic iá rio do s e rv iç o a c a rre ta m ais s e ve ra s
conseqüências jurídicas e gera maiores possibilidades de deferimento ao
acidentado das indenizações por responsabilidade civil<4).

2.2. Espécies legais de acidentes do trabalho

O legislador não conseguiu formular um conceito de acidente do trabalho


que abrangesse todas as hipóteses em que o exercício da atividade profissional
pelo empregado gera incapacidade laborativa.
Diante dessa dificuldade conceitual, a lei definiu apenas o acidente do
trabalho em sentido estrito, também denominado acidente típico ou acidente-
-tipo. No entanto, acrescentou outras hipóteses que se equiparam ao acidente
típico para os efeitos legais. Isso porque a incapacidade também pode surgir
por fatores causais que não se encaixam diretamente no conceito estrito de
acidente do trabalho, tais como: enfermidades decorrentes do trabalho; aci­
dentes ou doenças provenientes de causas diversas, conjugando fatores do
trabalho e extralaborais (concausas); acidentes ocorridos no local do traba­
lho, mas que não têm ligação direta com o exercício da atividade profissional;
acidentes ocorridos fora do local da prestação dos serviços, mas com vínculo
direto ou indireto com o cumprimento do contrato de trabalho e acidentes ocorri­
dos no trajeto de ida ou volta da residência para o local de trabalho. Como se
vê, o legislador formulou um conceito para o acidente do trabalho em senti­
do estrito, o acidente típico, e relacionou outras hipóteses que também geram
incapacidade laborativa, os chamados acidentes do trabalho por equipara­
ção legal.
A Previdência Social e o Ministério do Trabalho divulgam estatísticas
apontando as quatro principais espécies de acidente do trabalho: o acidente
típico, a doença ocupacional, o acidente de trajeto e o acidente sem CAT
registrada. Com base na estatística oficial de 2011, os acidentes típicos

(4) Vamos tratar com mais vagar das conseqüências jurídicas dos acidentes sofridos por
trabalhadores domésticos ou não em pregados no Capítulo 14.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 45

atingiram 60% das ocorrências, os acidentes de trajeto 14%, as doenças


ocupacionais 2% e os acidentes sem CAT registrada 24%.

Nos tó p ic o s s e g u in te s va m o s d e ta lh a r as p o s s ib ilid a d e s de
enquadram ento do evento danoso nas diversas hipóteses consideradas
tecnicamente como acidente do trabalho, conforme previsto nos arts. 19 a
21-A da Lei n. 8.213/1991.

2.3. Acidente típico

O conceito de acidente do trabalho em sentido estrito, chamado acidente


típico, teve redações diferentes em cada uma das sete leis acidentárias
brasileiras. Para efeitos comparativos e com o propósito de estabelecer melhor
compreensão da sua abrangência atual, vale reproduzir esta evolução:

NORMALEGAL CONCEITO DE ACIDENTE DO TRABALHO


1â Lei acidentá­ Art. 1s. Consideram-se acidentes no trabalho, para os fins da
ria: Decreto presente lei: a) o produzido por uma causa súbita, violenta, ex­
Legislativo n. terna e involuntária no exercício do trabalho, determinando le­
3.724, de 15 sões corporais ou perturbações funcionais, que constituam a
janeiro de 1919. causa única da morte ou perda total ou parcial, permanente ou
temporária, da capacidade para o trabalho.
2a Lei acidentá­ Art. 1s. Considera-se acidente do trabalho, para os fins da pre­
ria: Decreto n. sente lei, toda lesão corporal, perturbação funcional, ou doença
24.637, de 10 de produzida pelo exercício do trabalho ou em consequência dele,
julho de 1934. que determine a morte, ou a suspensão ou limitação, permanente
ou temporária, total ou parcial, da capacidade para o trabalho.
3a Lei acidentá­ Art. 1s. Considera-se acidente do trabalho, para os fins da pre­
ria: Decreto-lei n. sente lei, todo aquele que se verifique pelo exercício do trabalho,
7.036, de 10 de provocando, direta ou indiretamente, lesão corporal, perturbação
novembro de funcional, ou doença, que determine a morte, a perda total ou par­
1944. cial, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
4a Lei acidentá­ Art. 1s. Para os fins do presente Decreto-lei, considera-se aci­
ria: Decreto-lei n. dente de trabalho todo aquele que provocar lesão corporal ou
293, de 28 de perturbação funcional no exercício do trabalho, a serviço do
fevereiro de empregador, resultante de causa externa súbita, imprevista ou
1967. fortuita, determinando a morte do empregado ou sua incapacidade
para o trabalho, total ou parcial, permanente ou temporária.
5a Lei acidentá­ Art. 2S. Acidente do trabalho será aquele que ocorrer pelo exer­
ria: Lei n. 5.316, cício do trabalho, a serviço da empresa, provocando lesão cor­
de 14 de setem­ poral, perturbação funcional ou doença que cause a morte ou a
bro de 1967. perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para
o trabalho.
46 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

NORMA LEGAL CONCEITO DE ACIDENTE DO TRABALHO


6â Lei acidentária: Art. 2e, Acidente do trabalho é aquele que ocorre pelo exercício
Lei n. 6.367, de 19 do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal
de outubro de 1976. ou perturbação funcional que cause a morte, ou perda, ou redu­
ção permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

7- Lei acidentária: Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do
Lei n. 8.213, de 24 trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos
de julho de 1991. segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provo­
É a norma que cando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte
se encontra em ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacida­
vigor. de para o trabalho.

Pode ser observado que o conceito de acidente do trabalho recebeu


vários aperfeiçoamentos nas leis mais recentes. Nas duas primeiras normas
o foco da definição estava centrado na lesão produzida, depois foi alterado
para os fatores causais, com melhor técnica diante da infortunística do
trabalho(5). Não há mais a exigência de “causa única” da primeira lei, alargando-
-se o campo de abrangência para acolhimento das concausas. Abandonou-
-se também a referência à “causa involuntária e violenta” , porquanto tais
requisitos, como resquícios da teoria da culpa, estavam dificultando o
enquadram ento do evento como acidente do trabalho e, muitas vezes,
atribuindo ao próprio trabalhador a responsabilidade pela ocorrência, como
resultante de ato voluntário deste. Ademais, a antiga expressão “perda total
ou parcial da capacidade de trabalho” foi mais bem redigida passando para
“perda ou redução da capacidade para o trabalho”, em sintonia com a
orientação atual de pagamento de benefícios de natureza continuada, em vez
da antiga indenização tarifada.
Mesmo com os aperfeiçoamentos anotados, continua válida a crítica feita
por Bueno Magano desde a 5ã lei acidentária de 1967, no sentido de que a
definição (Acidente do trabalho é o que ocorre ou aquele que ocorre) não deve
conter o termo a definir, cabendo buscar o gênero mais próximo que no caso é
o vocábulo “evento” . Com base nisso, sugere o seguinte conceito: “Acidente
do trabalho é o evento verificado no exercício do trabalho de que resulte lesão
corporal, perturbação funcional ou doença que cause a morte ou a perda ou
redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.” (6)
Na realidade a norma legal não define o “acidente” propriamente dito,
mas apenas uma de suas espécies, o acidente do trabalho. Neste sentido é
oportuna e esclarecedora a lição do médico do trabalho Primo Brandimiller:

(5) MAGANO, Octavio Bueno. Lineam entos de infortunística. São Paulo: José Bushatsky,
1976. p. 30.
(6) Ibidem, p. 30 e 37.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 47

“No sentido genérico, acidente é o evento em si, a ocorrência de


determinado fato em virtude da conjugação aleatória de circunstâncias
causais. No sentido estrito, caracteriza-se também pela instantaneidade:
a ocorrência é súbita e a lesão imediata. Os acidentes ocasionam lesões
traumáticas denominadas ferimentos, externos ou internos, podendo
ta m b é m re s u lta r em e fe ito s tó x ic o s , in fe c c io s o s ou m esm o
exclusivamente psíquicos.
O acidente comporta causas e conseqüências, contudo não pode ser
definido, genericamente, nem pelas causas nem pelas conseqüências.
As circu n stâ n cia s causais perm item cla ssifica r os acidentes em
e sp é cie s: a c id e n te s do tra b a lh o , a cid e n te s de trâ n s ito etc. As
conseqüências também classificam os acidentes: acidentes com ou sem
danos pessoais, acidentes com ou sem danos materiais, acidente grave,
acidente fatal etc.
Embora o termo dano pessoal seja juridicamente mais amplo, em infor­
tunística refere-se às conseqüências físicas ou psíquicas decorrentes
do acidente. O acidente do trabalho considerado pela regulamentação
legal do Seguro de Acidentes do Trabalho é, portanto, toda ocorrência
casual, fortuita e imprevista que atende conjugadamente aos seguintes
requisitos: quanto à causa: o acidente que decorreu do exercício do tra­
balho a serviço da empresa — o que justifica o tipo: acidente do trabalho;
quanto à consequência-, o acidente que provocou lesão corporal ou per­
turbação funcional causando a morte ou a perda ou redução, permanente
ou temporária, da capacidade para o trabalho.

A denominação adequada seria acidente do trabalho com dano pessoal.


Nos seguros privados fala-se em acidentes pessoais (AP). Contudo
consagrou-se em infortunística o termo acidente do trabalho, que constitui
uma das categorias do dano pessoal.”(7)
Como o INSS garante aos seus segurados cobertura nos afastamentos
por todos os acidentes, havendo ou não nexo causal com o trabalho, o
regulamento da Previdência Social registra um conceito genérico de acidente
de qualquer natureza, sem as amarras da definição de acidente do trabalho,
qual seja: “Entende-se como acidente de qualquer natureza ou causa aquele
de origem traumática e por exposição a agentes exógenos (físicos, químicos
e biológicos), que acarrete lesão corporal ou perturbação funcional que cause
a morte, a perda, ou a redução permanente ou temporária da capacidade
laborativa.’{8) Nessa hipótese, porém, o trabalhador ou seus dependentes terão

(7) BRANDIM ILLER, Primo A. Perícia ju d ic ia l em acidentes e doenças do trabalho. São


Paulo: SENAC, 1996. p. 145-146.
(8) Decreto n. 3.048, de 6 maio 1999, art. 30, parágrafo único.
48 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

direito somente aos benefícios previdenciários, não havendo espaço para


postular indenizações em face do empregador, uma vez que o evento não se
enquadra na definição normativa de acidente do trabalho.
Tomando-se como base o conceito legal, são identificados os seguintes
requisitos cumulativos para a caracterização do acidente do trabalho:

a) evento danoso;

b) decorrente do exercício do trabalho a serviço da empresa;

c) que provoca lesão corporal ou perturbação funcional;


d) que causa a morte ou a perda ou a redução, permanente ou temporária,
da capacidade para o trabalho.

Esses requisitos merecem comentários adicionais. Feijó Coimbra assevera


que “a palavra acidente já imprime ao conceito a marca da casualidade, do
acontecim ento não desejado, nem ocasionado voluntariam ente.” (9) Com
pensamento semelhante enfatiza Hertz Costa que “a noção de acidente
forçosamente nos conduz à ideia de algo ligado a desgraça, desastre, fatalidade,
um acontecimento fortuito e anormal, que destrói, desorganiza ou deteriora,
produzindo conseqüências de ordem material.”(10)

O fato gerador do acidente típico geralmente mostra-se como evento


súbito(11), inesperado, externo ao trabalhador(12) e fortuito no sentido de que
não foi provocado pela vítim a(13). Os efeitos danosos norm alm ente são
imediatos e o evento é perfeitamente identificável, tanto com relação ao local
da ocorrência quanto no que tange ao momento do sinistro, diferentemente
do que ocorre nas doenças ocupacionais.

Para Hertz Costa, o acidente típico é um “acontecimento brusco, repen­


tino, inesperado, externo e traumático, ocorrido durante o trabalho ou em ra­
zão dele, que agride a integridade física ou psíquica do trabalhador.”(14)

(9) COIMBRA, J.R. Feijó. Acidentes de trabalho e moléstias profissionais. Rio de Janeiro:
Edições Trabalhistas, 1990. p. 21.
(10) COSTA, Hertz J. Acidente do trabalho na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003. p. 69.
(11) “A subitaneidade diz com a rapidez do acontecim ento o que não requer, contudo,
aparecimento instantâneo da lesão no organismo humano.” Cf. MAGANO, Octavio Bueno.
Lineam entos de infortunística. São Paulo: José Bushatsky, 1976. p. 31.
(12) “ Por exterioridade, entende-se a causa que não diz respeito à constituição orgânica da
vítima. Realmente, a maioria dos sinistros são causados por força lesiva estranha à vítima,
a saber, máquinas, ferramentas etc.” MAGANO, Octavio Bueno. Lineam entos de infortunística.
São Paulo: José Bushatsky, 1976. p. 31.
(13) RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de previdência social. Rio de Janeiro: Forense,
1983. p. 350.
(14) COSTA, Hertz J. A cidente do trabalho na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003. p. 74.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 49

O art. 19 da Lei n. 8.213/1991 é expresso quanto à exigência de que o


evento decorra do exercício do trabalho a serviço da empresa. Em outras
palavras, é necessário que entre a atividade do empregado e o acidente haja
uma relação de causa e efeito, também chamada de nexo etiológico ou nexo
causal(15). Daí a locução correta acidente do trabalho e não acidente no
trabalho. O trabalhador pode sofrer acidente em sua própria casa, promovendo
um reparo hidráulico, cuidando do jardim ou numa atividade de lazer ou, ainda,
numa viagem recreativa, mas não há, nessas hipóteses, nexo causal do evento
com a prestação de serviço subordinada, decorrente do contrato de trabalho.
“Não são os riscos gerais a que se sujeitam todos os cidadãos que caracterizam
o acidente do trabalho, mas sim os riscos específicos decorrentes do exercício
do trabalho.”(16)

É da essência do conceito de acidente do trabalho que haja lesão corporal


ou perturbação funcional. Quando ocorre um evento sem que haja lesão ou
perturbação física ou mental do trabalhador, não haverá, tecnicamente,
acidente do trabalho. Tanto que há expressa menção legal que não será
considerada doença do trabalho a que não produza incapacidade laborativa(17).
No entanto, nem sempre a perturbação funcional é percebida de imediato,
podendo haver manifestação tardia com real demonstração do nexo etiológico
com o acidente ocorrido. “A lesão pode sertão profunda que não se apresente
aos olhos dos peritos, imediatamente, mas decorridos alguns dias ou até
meses. Basta lembrar os vários casos de perturbações nervosas, causadas
por acidentes do trabalho.”(18)
Além da lesão ou perturbação funcional, é necessário, para completar o
conceito de acidente do trabalho, que o evento acarrete a morte, ou a perda
ou a redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho. A
incapacidade tem porária não significa necessariam ente afastam ento do
trabalho, pode ser mesmo apenas o tempo para realizar um pequeno curativo
ou da visita a um hospital, tanto que o INSS determina que “a CAT deverá ser
emitida para todo acidente ou doença relacionados ao trabalho, ainda que
não haja afastamento ou incapacidade.V9)

(15) Antônio Lopes M onteiro e Roberto Fieury de Souza Bertagni assinalam que tecnicamente
não se pode utilizar como sinônimos “nexo causal” e “nexo etiológico” . O primeiro é mais
abrangente, pois inclui a concausalidade e os casos de agravamento. Já o segundo é o que
origina ou desencadeia o dano laboral, sendo, portanto, mais restrito. Cf. A cidentes do
trabalho e doenças ocupacionais. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 16.
(16) MAGANO, Octavio Bueno. Lineam entos de infortunística. São Paulo: José Bushatsky,
1976. p. 33.
(17) Lei n. 8.213, 24 jul. 1991, art. 20, § 1Q, alínea c.
(18) OPTIZ, Oswaldo; OPTIZ, Sílvia C. B. A cidentes do trabalho e doenças profissionais. 3.
ed. São Paulo: Saraiva, 1988. p. 16.
(19) Cf. Anexo da Portaria MPAS n. 5.817, de 06 out. 1999 que instituiu o M anual de
Instruções para Preenchimento da CAT.
50 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Pode ser observada uma seqüência lógica necessária no conceito:


trabalho de um empregado, durante o qual ocorre acidente, que provoca lesão
ou perturbação funcional, que acarreta a incapacidade para o trabalho, podendo
esta ser total, parcial ou tem porária (trabalho -> acidente -> lesão ou
perturbação funcional incapacidade).

Convém anotar, no entanto, que a mudança da Lei de Benefícios da


Previdência Social, promovida pela Lei n. 11.430/2006, de certa forma ampliou
o conceito genérico de acidente do trabalho, porquanto o art. 21-A da Lei n.
8.213/1991 determina que a perícia médica do INSS considere a natureza
acidentária da incapacidade quando constatar a ocorrência de nexo técnico
epidemiológico entre o trabalho e o agravo, em conformidade com o que
dispuser o regulamento. E o Decreto n. 6.042/2007, ao regulamentar a referida
mudança, introduziu o § 42 no art. 337 do Regulamento da Previdência Social(20),
com o seguinte teor: “Para os fins deste artigo, considera-se agravo a lesão,
doença, transtorno de saúde, distúrbio, disfunção ou síndrome de evolução
aguda, subaguda ou crônica, de natureza clínica ou subclínica, inclusive
morte, independentemente do tempo de latência.”

Se antes a caracterização do acidente do trabalho pela perícia médica


do INSS exigia a ocorrência de morte, lesão ou perturbação funcional, agora
a relação foi ampliada para incluir no conceito o transtorno de saúde, o distúrbio,
a disfunção ou a síndrome de evolução aguda, subaguda ou crônica, de
natureza clínica ou subclínica, independentemente do tempo de latência.

2.4. Doenças ocupacionais

Desde a primeira lei acidentária de 1919, as doenças provocadas pelo


trabalho do empregado são consideradas como acidente do trabalho. O art.
1S do Decreto Legislativo n. 3.724/1919 mencionava a “moléstia contraída
exclusivamente pelo exercício do trabalho.” No correr do tempo, a legislação
in co rp o ro u as do e n ça s p ro fis s io n a is a típ ic a s , que passaram a ser
denominadas “doenças do trabalho” , desde a quarta lei acidentária de 1967.

Como adverte Russomano, o acidente e a enfermidade têm conceitos


próprios. A equiparação entre eles se faz apenas no plano jurídico, com efeitos
nas reparações e nos direitos que resultam para o trabalhador nos dois casos.
Enquanto o acidente é um fato que provoca lesão, a enfermidade profissional
é um estado patológico ou mórbido, ou seja, perturbação da saúde do
trabalhador(21). O acidente caracteriza-se pela ocorrência de um fato súbito e

(20) Decreto n. 3.048, de 6 maio 1999.


(21) RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de previdência social. Rio de Janeiro: Forense,
1983. p. 350-351.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o o u D oença O c u p a c io n a l 51

externo ao trabalhador, ao passo que a doença ocupacional normalmente vai


se instalando insidiosamente e se manifesta internamente, com tendência de
agravamento.
A Lei n. 8.213/1991 regula as doenças ocupacionais, com a seguinte
redação:
“A rt. 20. C o nsideram -se acidente do trabalho, nos term os do artigo a n terior, as
seguintes entidades mórbidas:

I — doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício


do tra b a lh o p e cu lia r a d e te rm in ad a a tivid a de e con sta n te da respectiva relação
elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

II — doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função


de con d içõ e s e s p e c ia is em que o tra b a lh o é re a liza d o e com ele se re la cio n e
diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.”

Cabe, neste passo, precisar o conceito das três denominações: doença


profissional, doença do trabalho e doença ocupacional, já que a lei, como
princípio hermenêutico, não contém palavras inúteis.

A doença profissional é aquela peculiar a determinada atividade ou pro­


fissão, também chamada de doença profissional típica, tecnopatia ou ergopatia.
O exercício de determinada profissão pode produzir ou desencadear certas
patologias, sendo que, nessa hipótese, o nexo causal da doença com a ativi­
dade é presumido. É o caso, por exemplo, do empregado de uma mineradora
que trabalha exposto ao pó de sílica e contrai a silicose. Afirma Tupinambá do
Nascimento que, nas tecnopatias, a relação com o trabalho é presumida juris
et de jure, inadmitindo prova em sentido contrário. Basta comprovar a pres­
tação do serviço na atividade e o acometimento da doença profissional(22).
Sinteticamente, pode-se afirmar que doença profissional é aquela típica de
determinada profissão.

Por outro lado, a doença do trabalho, também chamada mesopatia ou


doença profissional atípica, apesar de igualmente ter origem na atividade do
trabalhador, não está vinculada necessariamente a esta ou aquela profissão.
Seu aparecimento decorre da forma em que o trabalho é prestado ou das
condições específicas do ambiente de trabalho. O grupo atual das LER/DORT é
um exemplo das doenças do trabalho, já que podem ser adquiridas ou
desencadeadas em qualquer atividade, sem vinculação direta a determinada
profissão. Nas doenças do trabalho, “as condições excepcionais ou especiais do
trabalho determinam a quebra da resistência orgânica com a conseqüente eclosão
ou a exacerbação do quadro mórbido, e até mesmo o seu agravamento.”(23)

(22) CASTRO DO NASCIMENTO, Tupinam bá M. C omentários à nova lei de acidentes do


trabalho. Porto Alegre: Síntese, 1977. p. 50.
(23) OLIVEIRA, José de. Acidentes do trabalho. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 2.
52 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

Diferentemente das doenças profissionais, as mesopatias não têm nexo


causal presumido, exigindo comprovação de que a patologia desenvolveu-se
em razão das condições especiais em que o trabalho foi realizado.

Essa questão, no entanto, teve alteração significativa no final de 2006,


no sentido de facilitar o enquadramento como doença ocupacional, porque a
Lei n. 11.430/2006 instituiu o nexo técnico epidemiológico, acrescentando um
novo artigo à Lei n. 8.213/1991, com o seguinte teor:
“Art. 21-A. A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária
da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidem iológico entre
o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da em presa e a entidade
m órbida m otivadora da incapacidade elencada na C lassificação Internacional de
Doenças — CID, em conform idade com o que dispuser o regulamento.

§ 12 A perícia m édica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando


demonstrada a inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo.

§ 2e A em presa poderá requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de


cuja decisão caberá recurso com efeito suspensivo, da em presa ou do segurado, ao
Conselho de Recursos da Previdência Social.”

Diante dos significados específicos de doença profissional e doença do


trabalho, a denominação “doenças ocupacionais” passou a ser adotada como
o gênero mais próximo que abrange as modalidades das doenças relaciona­
das com o trabalho. A NR-7 da Portaria n. 3.214/1978 do Ministério do Traba-
Iho e Emprego, que regulamenta o Programa de Controle Médico de Saúde
Ocupacional, faz referência às doenças ocupacionais ou patologias ocupa­
cionais, como vocábulo gênero(24). Para evitar a expressão doença pro fis­
sional ou do trabalho, é preferível englobá-las na designação genérica de
doenças ocupacionais, conforme recomenda o médico do trabalho Primo
Brandim iller(25).

A relação das doenças profissionais e do trabalho mencionada no art.


20, I, retro, está inserida no Anexo II do atual Regulamento da Previdência
Social(26). O mencionado Anexo, após a mudança introduzida pelo Decreto n.
6.957/2009, engloba quatro relações importantes: a primeira indica os agentes
patogênicos causadores de doenças profissionais ou do trabalho; a segunda

(24) “As doenças ocupacionais são aquelas deflagradas em virtude da atividade laborativa
desem penhada pelo indivíduo. Valendo-nos do conceito oferecido por Stephanes, são as
que ‘resultam de constante exposição a agentes físicos, químicos e biológicos, ou mesmo de
uso inadequado de novos recursos tecnológicos, como os da inform ática’. Dividem-se em
doenças profissionais e do trabalho.” CASTRO, Carlos Alberto Pereira; LAZZARI, João Batista.
Manual de direito previdenciário. 11. ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2009. p. 544.
(25) BRANDIMILLER, Primo A. Perícia ju d ic ia l em acidentes do trabalho. São Paulo: SENAC,
1996. p. 148.
(26) Decreto n. 3.048, de 6 maio 1999.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 53

— Lista A — aponta os agentes ou fatores de risco de natureza ocupacional,


relacionados com a etiologia de doenças profissionais e de outras doenças rela­
cionadas com o tra b a lh o ; a te rc e ira — L ista B — indica as doenças
ocupacionais e os possíveis agentes etiológicos ou fatores de risco de natu­
reza ocupacional e a quarta — Lista C — aponta as hipóteses em que se
reconhece o nexo técnico epidemiológico.

Com efeito, iniciando-se a investigação pela Lista A, é possível localizar


a doença a partir do seu agente causal; pesquisando-se pela Lista B, ao
contrário, pode-se chegar ao agente causal a partir da doença ocupacional e
consultando a Lista C é possível aferir se aquela patologia, diante da
Classificação Nacional de Atividade Econômica da empresa, gera nexo
técnico epidemiológico.

Para evitar tratamentos diferenciados por parte da Previdência Social e


do Sistema Único de Saúde, a relação das doenças ocupacionais foi também
adotada pelo Ministério da Saúde, por intermédio da Portaria n. 1.339/GM de
18 de novembro de 1999. Com o propósito de facilitar a consulta do leitor,
reproduzimos no Anexo I deste livro os agentes patogênicos causadores de
doenças profissionais ou do trabalho; no Anexo II, a Lista A; no Anexo III, a
Lista B e no Anexo IV, a Lista C.

Convém mencionar que as relações mencionadas não diferenciam


doenças profissionais ou do trabalho, pois englobam as duas hipóteses numa
lista única. Esse posicionamento reflete as dificuldades doutrinárias para
estabelecer uma linha divisória nítida entre as duas espécies de patologias
decorrentes do trabalho(27). O Professor René Mendes, participante destacado
da comissão que elaborou tal lista em 1998, informa que, “do ponto de vista
conceitual, a comissão preferiu trabalhar com a com preensão ampla de
‘doenças relacionadas com o trabalho’, o que permitiu a superação da confusa
denominação ou — talvez — sutil diferença entre ‘doenças profissionais’ e
‘doenças do trabalho’, presentes na conceituação legal (Lei n. 8.213/1991 ).”(28)

(27) O médico do trabalho Primo A. Brandimiller assevera que “o mais razoável é deixar de
lado estas conceituações form alm ente defeituosas e ater-se aos princípios e ao sentido
geral da legislação acidentária que, a propósito, nunca conseguiu conceituar precisamente
os dois tipos de doenças a que se refere. A lei anterior referia-se à doença profissional ou
doença do trabalho com o sinônim os.” Para dem onstrar as sutilezas do enquadram ento
entre doenças profissionais e do trabalho, formula o seguinte exemplo: “Se o segurado é
jateador de areia e apresenta silicose, sendo o risco inerente à atividade, trata-se de doen­
ça profissional. Se o silicótico é operador de em pilhadeira em uma cerâmica, trata-se de
doença do trabalho, por não ser o risco inerente à sua atividade de operador de em pilha­
deira, mas decorrente das condições especiais em que esta é realizada.” Cf. Perícia ju d icia l
em acidentes do trabalho. São Paulo: SENAC, 1996. p. 152.
(28) MENDES, René. Conceito de patologia do trabalho. In :_________. Patologia do trabalho.
2. ed. São Paulo: Atheneu, 2003. v. 1. p. 56.
54 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

A relação das doenças ocupacionais (profissional ou do trabalho) anexa


ao D e creto n. 3 .0 4 8 /1 9 9 9 não tem c a rá te r e xa u stivo , m as apenas
exemplificativo(29). Aliás, há previsão legal expressa nesse sentido no art. 20,
§ 2S, da Lei n. 8.213/1991, com o seguinte teor: “Em caso excepcional,
constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e
II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado
e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la
acidente do trabalho.”

Esse dispositivo legal deixa largo espaço para o enquadramento como


acidente do trabalho das doenças relacionadas com o trabalho (mesopatias),
mesmo quando o agente patogênico não consta da relação da Previdência
Social, bastando que haja nexo causal entre a doença e as condições em
que o trabalho era executado. Como exemplo, pode ser citado um caso de
estupro ocorrido no Rio de Janeiro em 1997, caracterizado pelo INSS como
acidente do trabalho, quando uma empregada, que trabalhava como gerente
de uma loja de artigos femininos, foi violentada pelo filho do dono da empresa.
Além de contrair herpes, a vítima ficou sem condições de trabalhar, pois en­
frenta momentos de pânico, necessitando de acompanhamento psiquiátrico(30).

Grandes controvérsias surgem no que se refere às exclusões do conceito


de doença do trabalho, conforme indicado no art. 20 da Lei n. 8.213/1991:
“§ 1s. Não são consideradas como doença do trabalho:

a) a doença degenerativa;

b) a inerente a grupo etário;

c) a que não produza incapacidade laborativa;

d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se


desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato
direto determinado pela natureza do trabalho.”

Nas hipóteses mencionadas nesse parágrafo, pode-se perceber que a


doença não tem nexo causal com o trabalho; apareceu no trabalho, mas não
pelo trabalho. Normalmente, as doenças degenerativas ou inerentes ao grupo
etário independem do fator laboral e poderiam aparecer mesmo que o
trabalhador estivesse desempregado ou aposentado. Como exemplos podem

(29) Asseveram Irineu Pedrotti e W illiam Pedrotti: “Não constando a doença profissional ou
do trabalho do Anexo II, mas comprovado que ela resultou de condições especiais em que
o trabalho é executado, e com ele se relacione diretam ente, configura-se o acidente do
trabalho. O Anexo é meramente exemplificativo e não exaustivo e as lesões dele excluídas
são reparáveis quando seguram ente dem onstrada a natureza redutora da capacidade de
trabalho do segurado.” Cf. Acidentes do trabalho. 4. ed. São Paulo: Liv. e Ed. Universitária
de Direito, 2003. p. 109.
(30) Cf. Revista Proteção, v. XII, n. 94, p. 48, 1999.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 55

ser citadas a perda auditiva em razão da idade, denominada presbiacusia,


diferentes tipos de câncer, a osteoartrose da coluna vertebral, as doenças
reumáticas etc.(31)
É preciso cuidado, porém, para não se apegar dem asiadam ente à
interpretação literal do dispositivo, porquanto muitas doenças ocupacionais
são de natureza degenerativa, como alerta o médico do trabalho Primo
Brandimiller:
“O p ro ce sso d e g e n e ra tiv o pode se r de n a tu re za b io m e câ n ica ,
m icrotraum ática ou mesmo macrotraumática. O câncer ocupacional
também é doença degenerativa, causada por agentes cancerígenos
ocupacionais, alguns deles listados na NR-15. A própria surdez
ocupacional é um processo degenerativo das células nervosas do órgão
de Corti.
Provada sua relação direta com a atividade laborativa, deve o processo
degenerativo ser caracterizado como doença do trabalho.
Na tra u m a to lo g ia o c u p a c io n a l e d e s p o rtiv a , cabe c o n s id e ra r
especialm ente o processo degenerativo osteoarticular de origem
mecânica, representado por microtraumatismos repetitivos (esforços
repetitivos, impacto articular) e as posturas viciosas prolongadas.
Destaca-se ainda um tipo de degeneração articular induzida por vibrações
mecânicas nas mãos, decorrentes da utilização de equipamentos elétricos
e p rin c ip a lm e n te p n e u m á tic o s , com o fu ra d e ira s , lix a d e ira s ,
parafusadeiras, britadeiras, serras portáteis etc.”(32)
Nem sempre é fácil garantir a existência ou inexistência de causalidade
da ocupação com a doença — especialmente diante das possibilidades das
concausas, que serão tratadas no item seguinte — , exigindo-se, muitas vezes,
um bom diagnóstico diferencial, após cuidadosa anamnese ocupacional e
exames complementares específicos(33).
Além disso, se a doença não acarreta incapacidade para o trabalho, não
se reconhece o acidente do trabalho (alínea “c”, retro), já que a cobertura do

(31) Exemplos colhidos da obra do médico do trabalho Primo A. Brandimiller, Perícia ju d icia l
em acidentes do trabalho. São Paulo: SENAC, 1996. p. 155.
(32) BRANDIMILLER, Primo A. Perícia ju d icia l em acidentes e doenças ocupacionais. São
Paulo: SENAC, 1996. p. 155-156.
(33) Segundo o M anual de P rocedim entos para os S erviços de S aúde elaborado pelo
M inistério da Saúde em 2001, “a anam nese ocupacional faz parte da entrevista médica,
que com preende a história clínica atual, a investigação sobre os diversos sistem as ou
aparelhos, os antecedentes pessoais e fam iliares, a história ocupacional, hábitos e estilo
de vida, o exame físico e a propedêutica com plem entar.” Cf. MINISTÉRIO DA SAÚDE DO
BRASIL. Doenças relacionadas ao trabalho: manual de procedimentos para os serviços de
saúde. Org. DIAS, Elizabeth Costa. Brasília: Ministério da Saúde do Brasil, 2001. p. 30.
56 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

seguro acidentário está voltada para a inaptidão laborativa. O Manual de


Procedimentos para Serviços de Saúde editado pelo Ministério da Saúde
menciona a incapacidade laborativa, definida pelo INSS, como:

“A impossibilidade do desempenho das funções específicas de uma ativi­


dade (ou ocupação), em consequência de alterações morfopsicofisiológi-
cas provocadas por doença ou acidente. (...) Para a imensa maioria das
situações, a Previdência trabalha apenas com a definição apresentada,
entendendo impossibilidade como incapacidade para atingir a média de
rendimento alcançada em condições normais pelos trabalhadores da ca­
tegoria da pessoa examinada. Na avaliação da incapacidade laborativa, é
necessário ter sempre em mente que o ponto de referência e a base de
comparação devem ser as condições daquele próprio examinado enquanto
trabalhava e nunca os da média da coletividade operária.”(34)

0 nexo causal do acidente ou doença ocupacional com o trabalho será


tam bém analisado com o um dos pressupostos para deferim ento das
indenizações por acidente do trabalho no Capítulo 6.

2.5. Concausas

A primeira lei acidentária de 1919 só admitia o acidente do trabalho ou


doença profissional originados de causa única; todavia, desde o Decreto-lei
n. 7.036/1944, passou a ser admitida a teoria das concausas. A legislação
atual (Lei n. 8.213/1991) tem previsão expressa a respeito:
“Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para os efeitos desta Lei:

1 — o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja
contribuído diretamente para a morte do segurado, para a redução ou perda da sua
capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua
recuperação;”

Ensina Cavalieri Filho que a “concausa é outra causa que, juntando-se à


principal, concorre para o resultado. Ela não inicia e nem interrompe o processo
causal, apenas o reforça, tal como um rio menor que deságua em outro maior,
aumentando-lhe o caudal.”(35)

Para o acidente do trabalho em sentido amplo, podem contribuir causas


ligadas à atividade profissional com outras extralaborais, sem qualquer vínculo

(34) MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL. Doenças relacionadas ao trabalho: manual de


procedimentos para os serviços de saúde. Org. DIAS, Elizabeth Costa. Brasília: Ministério
da Saúde do Brasil, 2001. p. 56.
(35) C AVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 62.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 57

com a função exercida pelo empregado. Além disso, mesmo o acidente já


ocorrido pode ser agravado por outra causa, como, por exemplo, um erro
cirúrgico no atendimento hospitalar ou a superveniência de uma infecção por
tétano, depois de pequeno ferimento de um trabalhador rural.

No entanto, a aceitação normativa da etiologia multicausal não dispensa


a existência de uma causa eficiente, decorrente da atividade laboral, que “haja
contribuído diretam enté’ para o acidente do trabalho ou situação equiparável.
Em outras palavras, a concausa não dispensa a presença da causa de origem
ocupacional. Deve-se verificar se o trabalho atuou como fator contributivo do
acidente ou doença ocupacional; se atuou como fator desencadeante ou
agravante de doenças preexistentes ou, ainda, se provocou a precocidade
de doenças comuns, mesmo daquelas de cunho degenerativo ou inerente a
grupo etário(36).

(36) “Agravo de instrum ento em recurso de revista. Indenização p o r danos decorrentes de


acidente de trabalho. A m putação parcial do pé esquerdo. Trabalhador diabético. Concausa.
Nos termos do inciso I do art. 21 da Lei n. 8.213/91, equipara-se a acidente de trabalho o
acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído
diretam ente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o
trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação. Como se
observa, a configuração do evento como concausa, gera a equiparação do fato a acidente
do trabalho, desencadeando o dever de indenizar os danos dele decorrentes. Assim , o
acidente de trabalho não se apresenta como causa única e exclusiva da lesão, pois pode
haver a conjugação da concausa, que pode ser verificada quando o trabalhador já era
portador de alguma enfermidade no momento em que iniciou a atividade laboral, in casu, o
d ia b ete s, m as, em v irtu d e de d e te rm in a d o a c id e n te na sua a tiv id a d e la b o ra l, há o
a p a re c im e n to dos s in to m a s ou o a g ra v a m e n to da d o e n ç a , de m o d o a c a u s a r-lh e
incapacidade para o exercício de suas atividades, na hipótese, a amputação parcial do pé
esquerdo. Nesse contexto, as alegações de que a am putação parcial do pé esquerdo
decorreu da ausência de utilização de calçado adequado e do fato de o autor ser diabético
não socorrem a recorrente, pois é n e ce ssá rio apenas que a causa laboral con trib u a
diretamente para a doença, mas não que contribua decisivamente. Agravo de instrumento
conhecido e não provido.” TST. 8ã Turma. AIRR — 11238-34.2010.5.04.0000, Rei.: Ministra
Dora Maria da Costa, D J 30 set. 2011.
“ E m e n ta : In d e n iz a ç ã o p o r d a n o s m o ra is — D o e n ç a re la c io n a d a a o tra b a lh o —
Concausalidade — O fato de a doença sofrida pelo trabalhador ser fundada em mais de
uma causa, não afasta a sua caracterização como patologia ocupacional, se pelo menos
uma delas tiver relação direta com o trabalho para sua eclosão ou agravam ento (art. 21, I,
da Lei n. 8.213/91). Para a verificação da concausa, aplica-se a teoria da equivalência das
condições, segundo a qual se considera causa, com valoração equivalente, tudo o que
concorre para o adoecimento. No caso dos autos, dem onstrada a realização peio obreiro
de atividades laborais que contribuíram diretam ente para o agravam ento da doença de
origem degenerativa sofrida, fica caracterizada a concausa, a justificar a responsabilização
civil da ex-em pregadora pelos danos morais decorrentes do adoecim ento.” Minas Gerais.
TRT 3- Região. 3a Turm a. RO n. 01383-2008-021-03-00-3, Rei.: Juiz Convocado Danilo
Siqueira de Castro Faria, DJ 08 fev. 2010.
58 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

As concausas podem ocorrer por fatores preexistentes(37), superveni­


entes ou concomitantes com aquela causa que desencadeou o acidente ou a
doença ocupacional. Vale transcrever nesse sentido a lição de Antônio Lo­
pes Monteiro;

“Em outras palavras, nem sempre o acidente se apresenta como causa


única e exclusiva da lesão ou doença. Pode haver a conjunção de outros
fatores — concausas. Uns podem preexistir ao acidente — concausas
antecedentes; outros podem sucedê-lo — concausas supervenientes;
por fim, há, tam bém , os que se verificam concom itantem ente —
concausas simultâneas. Exemplo do primeiro caso é o diabético que
venha a sofrer um pequeno ferimento que para outro trabalhador sadio
não teria maiores conseqüências. Mas o diabético falece devido à intensa
hemorragia causada. Temos assim uma morte para a qual concorre o
acidente associado a um fator preexistente, a diabete.

Já os fatores supervenientes verificam-se após o acidente do trabalho ou


da eclosão da doença ocupacional. Se de um infortúnio do trabalho
sobrevierem complicações como as provocadas por micróbios patogê­
nicos (estafilococos, estreptococos etc.) determinando, por exemplo, a
amputação de um dedo ou até a morte, estaremos diante de uma con­
causa superveniente.

(37) “Recurso de revista — Acidente do trabalho — Nexo de concausalidade. Segundo a


previsão do art. 21, I, da Lei n. 8.213/91, equipara-se ao acidente do trabalho o acidente
ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente
para a morte do segurado, para a redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou
produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação. Não obstante o Tribunal
a quo sustentar que, in casu, não restou dem onstrado o nexo causal — uma vez que a
autora era portadora de doença preexistente — , da leitura dos autos verifica-se facilmente
que as atividades desenvolvidas pela reclamante funcionaram como concausa do acidente
de tra b a lh o . C om o e xp re s s a m e n te co n s ig n a d o pelas in s tâ n c ia s in fe rio re s , a p e rícia
dem onstrou o agravam ento da lesão preexistente (escoliose) pela atividade laboral de
caixa, que exige movimento de rotação de tronco (coluna) sob seu eixo, e que a reclamante
não possui o biótipo adequado para a função de caixa de superm ercado. R ecurso de
revista conhecido e provido.” TST. 1a Turma. RR — 23300-32.2007.5.14.0001, Rei.: Ministro
Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DJ 16 dez. 2011.
“Lim itação funcional originada na infância, porém agravada pelas condições de trabalho.
N exo con ca u sa l. Teoria da e q u iv a lê n c ia das co n d içõe s. O a g ra va m e n to da d oença
preexistente em face das condições de labor proporciona ao trabalhador vitim ado o direito
de pretender indenização pelo dano nos mais variados aspectos da boa condição laboral,
física e psíquica que vier a projetar. A doença preexistente não deixa de ser enquadrada
como patologia ocupacional se o exercício da atividade laborativa houver contribuído direta,
mas não decisivamente, para a sua eclosão ou agravamento, nos termos do art. 21, I, da Lei
n. 8.213/91. Aplica-se para a verificação da concausa a teoria da equivalência das condições,
segundo a qual se considera causa, com valoração equivalente, tudo o que concorre para
o adoecim ento.” Santa Catarina. TRT 12a Região. 1a Turma. RO n. 01048-2006-028-12-00-
9, Rei,: Viviane Colucci, DJ 26 fev. 2008.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 59

As causas concomitantes, por sua vez, coexistem ao sinistro. Concre-


tizam-se ao mesmo tempo: o acidente e a concausa extralaborativa. O
exemplo típico é a disacusia (PA1R), da qual é portador um tecelão de
cinqüenta anos. A perda auditiva é consequência da exposição a dois
tipos de ruído concomitantes: o do ambiente do trabalho, muitas vezes
elevado durante vinte ou trinta anos, e, durante o mesmo tempo, o do
fator etário (extralaborativo): concausa simultânea.”(38)

2.6. Acidente de trajeto

Outra espécie de acidente do trabalho com peso estatístico considerável


é o chamado acidente de trajeto ou acidente in itinere. Só no ano de 2010 o
INSS acusou a ocorrência de 94.789 acidentes dessa modalidade o que
representa, em média, 260 por dia ou 13,5% da totalidade dos acidentes do
trabalho no Brasil. Desde 2001, o número de acidentes de trajeto vem subindo
sistematicamente todos os anos, alcançando em uma década crescimento
de 155%, sendo que uma parte considerável deste aumento pode ser atribuída
aos acidentes com motociclistas profissionais, em razão do fenômeno recente
dos serviços de motofrete. Chama a atenção também o número de óbitos
decorrentes dos acidentes de trajeto, que no ano de 2010 atingiu 44% das
mortes por acidente do trabalho no Brasil.
O volume de “acidentes de trajeto” está inserido no contexto maior dos
acidentes de trânsito em geral, cujos números são assustadores no Brasil. O
Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde (SIM) aponta
que o número de mortes por acidentes com transporte terrestre atingiu 40.610
em 2010, ou seja, uma média de 111 óbitos por dia, sendo que 25% delas por
ocorrências com m otocicletas(39). Se com pararm os com outros países,
poderemos aferir o absurdo dos números brasileiros(40):

Número médio de veículos necessários para atingir um óbito por ano


Suécia 6.900 EUA 5.300 França 3.000
Japão 5.600 Alemanha 4.200 Brasil 900

A primeira norma acidentária a tratar do acidente de trajeto foi o Decreto


n. 24.637/1934, que estabelecia a responsabilidade patronal nos acidentes
ocorridos “na ida do empregado para o local de sua ocupação ou na sua volta

(38) MONTEIRO, Antônio Lopes; BERTAGNI, Roberto Fleury de Souza. Acidentes do trabalho
e doenças ocupacionais. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 19-20.
(39) Disponível em: < http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/noticia/2933/162/transito-
e-responsavei-por-m ais-de-40-m il-m ortes-no-brasil.htm l>. Acesso em: 11 out. 2012.
(40) Cf. Revista Proteção, v. XV, n. 123, p. 14, mar. 2002.
60 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

d a li’ quando houvesse condução especial fornecida pelo em pregador<41).


Incorporando aperfeiçoamentos adquiridos nas normas posteriores, o acidente
in itinere está hoje regulamentado pela Lei n. 8.213/1991, com o seguinte teor:
“Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para os efeitos desta Lei: (...)

IV — o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:
(...)

d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer


que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.”

Surgem grandes controvérsias quanto ao entendimento do que seja o


“percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela.” O
trabalhador com frequência desvia-se desse percurso por algum interesse
particular, para uma atividade de lazer ou compras em um supermercado ou
farmácia, por exemplo. Como será necessário estabelecer o nexo causal do
acidente com o trabalho, são aceitáveis pequenos desvios e toleradas algumas
variações quanto ao tempo de deslocamento, desde que “compatíveis com o
percurso do referido trajeto”, porquanto a Previdência Social, na esfera
administrativa, não considera acidente do trabalho quando o segurado, por
interesse pessoal, interrompe ou altera o percurso habitual(42), Se houver
registro policial da ocorrência, deve-se apresentar o respectivo boletim.
Se o tempo do deslocamento (nexo cronológico) fugir do usual ou se o
trajeto habitual (nexo topográfico) for alterado substancialm ente, resta
descaracterizada a relação de causalidade do acidente com o trabalho(43). No
entanto, se o trabalhador tiver mais de um emprego, será também considerado
acidente de trajeto aquele ocorrido no percurso de um para o outro local de
trabalho.

2.7. Outras hipóteses

Restam, ainda, as outras hipóteses que a Lei n. 8.213/1991 equipara ao


acidente do trabalho para os efeitos dos benefícios da legislação acidentária:

(41) Decreto n. 24.637, 10 jul. 1934, art. 2e, § 2a.


(42) Cf. Instrução Normativa INSS/PRES. n. 45, 6 ago. 2010, art. 348, § 52.
(43) “Evidentemente que não se impõe ao acidentado o emprego de uma ‘rota usual’, ‘mais
côm oda’, ‘mais direta’ ou ‘mais curta’, constituindo-se tal fato um condicionam ento indevido
ao conceito de ‘percurso’. Nem se deve levar em conta, também, a ‘habitualidade do percurso’,
com o, por exem plo, do lugar que parte ou daquele a que regressa o tra b a lh a d o r, na
caracterização do instituto, já que tais exigências não se acham no âmbito da lei. Nem é
dem asia lem brar que o percurso pode ser m odificado por razões de segurança pessoal,
falta de conduções apropriadas ou que sejam excessivam ente dem oradas, por m otivo
de chuvas, greves de coletivos, etc., sem que isso quebre o nexo causal na eventualidade de
um acidente com incapacidade superveniente.” Cf. COSTA, Hertz J. Acidentes do trabalho
na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003. p. 83.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 61

“Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para os efeitos desta Lei: (...)

II — o a c id e n te s o frid o p elo s e g u ra d o no local e no h o rá rio do tra b a lh o , em


consequência de:

a) ato de agressão, sabotagem ou terrorism o praticado por terceiro ou companheiro


de trabalho;

b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada


ao trabalho;

c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro


de trabalho;

d) ato de pessoa privada do uso da razão;

e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força


maior;

III — a doença proveniente de contam inação acidental do empregado no exercício de


sua atividade;

IV — o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:

a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;

b) na prestação espontânea de qualquer serviço à em presa para lhe evitar prejuízo


ou proporcionar proveito;

c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiado por esta
dentro de seus planos para melhor capacitação da mão de obra, independentemente
do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado; (...)

§ 1s Nos períodos destinados à refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de


outras necessidades fisiológicas, no local de trabalho ou durante este, o empregado
é considerado no exercício do trabalho.

§ 2S Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão


que, re su lta n te de a cid e n te de o u tra origem , se a sso cie ou se s u p e rp o n h a às
conseqüências do anterior.”

Os acidentes do trabalho m encionados nesses dispositivos legais


acontecem raramente, tanto que nem constam separadamente nas estatísticas
da Previdência Social. São hipóteses que, mesmo ocorrendo no local e no
horário de trabalho, não estão diretamente relacionadas com a atividade
profissional, apesar do vínculo causal indireto. Além disso, são indicados os
acidentes ocorridos fora do local ou do horário de trabalho, mas que guardam
vinculação estreita com o cum prim ento do contrato laboral. “Q uando o
empregado estiver à disposição do empregador, independentemente do local
e dia, em horário de trabalho e no ambiente da empresa, mesmo sem estar
efetivam ente trabalhando (períodos destinados às refeições e a outras
necessidades fisiológicas), verificando-se o acidente, este assume a natureza
de acidente do trabalho.”(44)

(44) MONTEIRO, Antônio Lopes; BERTAGNI, Roberto Fleury de Souza. Acidentes do trabalho
e doenças ocupacionais. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 21.
CAPÍTULO 3

CARACTERIZAÇÃO DO ACIDENTE DO TRABALHO

3.1. Comunicação do Acidente do Trabalho — CAT

O primeiro passo para o reconhecimento de qualquer direito ao empregado


que sofreu acidente do trabalho ou situação legalmente equiparada é a
comunicação da ocorrência à Previdência Social, cuja legislação, no Brasil,
incorporou a infortunística do trab alh o(1). Com o objetivo de fa cilita r a
concessão rápida dos benefícios e, ainda, diante do caráter social do seguro
acidentário, a norma legal atribui ao empregador a obrigação de expedir a
com unicação do acidente, ficando dispensada, assim, a vítim a ou seus
dependentes da iniciativa do requerimento. Estabelece a Lei n. 8.213/1991:
“Art. 22. A em presa deverá com unicar o acidente do trabalho à Previdência Social até
o 1- (primeiro) dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à
autoridade competente, sob pena de multa variável entre o limite mínimo e o limite
m áxim o do salário de contribuição, sucessivam ente aum entada nas reincidências,
aplicada e cobrada pela Previdência Social.”

A Comunicação do Acidente do Trabalho à Previdência Social deverá


ser expedida pela empresa, de acordo com formulário próprio criado pelo
INSS(2), cujo modelo pode ser obtido pela Internet no endereço chttp://
www.previdenciasocial.gov.br> sendo que atualmente a remessa também
pode ser feita eletronicamente13*.
Se do acidente resultar óbito, além da comunicação ao INSS até o primeiro
dia útil seguinte, a empresa deverá comunicar a ocorrência imediatamente à

(1) Estabelece o art. 129 da Lei n. 8.213/1991 que os litígios e medidas cautelares relativos
ao acidente do trabalho serão apreciados na via judicial mediante petição inicial instruída
pela prova da efetiva notificação do evento à Previdência Social, por meio de Comunicação
de Acidente do Trabalho — CAT.
(2) O form ulário da CAT e as respectivas instruções de preenchimento estão regulados pela
Portaria n. 5.817 de 06 outubro de 1999 e Ordem de Serviço INSS/DSS n. 621, de 5 de maio
de 1999. Mais recentemente o tem a foi tratado pela Instrução Normativa do INSS/PRES. n.
45, de 6 de agosto de 2010.
(3) A Instrução Normativa do INSS/PRES. n. 45, de 6 de agosto de 2010, prevê no art. 356:
“A C A T po derá ser re g istra d a em um a das APS ou pela Internet, no sítio e le trô n ico
<w w w .previdencia.gov.br>.”
•.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 63

autoridade policial. Isso porque é preciso investigar no inquérito próprio se há


delito a ser punido na esfera crim inal, razão pela qual assum e grande
importância a colheita imediata das provas no local do infortúnio.
Caso o acidente laboral seja detectado tardiamente, quando o trabalhador
estiver desempregado, o que é comum ocorrer nas hipóteses das doenças
ocupacionais ou nos exames médicos para admissão em novo emprego, a
CAT deverá ser emitida pela ex-empregadora ou pelas pessoas designadas
no art. 336, § 32, do Regulamento da Previdência Social, o Decreto n. 3.048/
1999(4).
Não cabe ã empresa que está promovendo a admissão emitir a CAT
porque ainda não é a empregadora do candidato; além disso, não detém
informações dos fatos ocorridos no emprego anterior para afirmar que aquelas
perturbações funcionais guardam nexo etiológico com o trabalho.

O acidente do trabalho pode ser o fato gerador de diversas e sérias


conseqüências jurídicas que se refletem no contrato de trabalho, na esfera
criminal, nos benefícios acidentários, nas ações regressivas promovidas pela
Previdência Social, nas indenizações por responsabilidade civil, na Inspeção
do Trabalho, no pagamento de indenização de seguros privados que cobrem
a morte ou a invalidez permanente, e na reação corporativa do sindicato da
categoria profissional.

Com receio de tantas repercussões onerosas, muitos empregadores


sonegam a comunicação, procurando impedir a publicidade do sinistro. O
legislador, no entanto, com o objetivo de combater a subnotificação, instituiu
normas visando facilitar a comunicação do acidente e ampliar a sua divulgação
entre todos os interessados, para que possam tom ar as m edidas que
entenderem cabíveis. A ssim , no caso de om issão ou resistê n cia do
empregador, a CAT também pode ser emitida pelo próprio acidentado, seus
dependentes, a entidade sindical competente(5), o médico que o assistiu ou
qualquer autoridade pública, mesmo após vencido o prazo fixado para a
comunicação pela empresa(6). Além disso, passou-se a exigir a emissão em

(4) Instrução Norm ativa do INSS/PRES. n. 45, de 6 de agosto de 2010, art. 358, IV. As
pessoas designadas no art. 336, § 3-, do RPS são: o próprio acidentado, seus dependentes,
a entidade sindical competente, o médico que o assistiu ou qualquer autoridade pública.
(5) Os sindicatos sempre reclamam de um certo preconceito ou desatenção por parte do
INSS, em relação às C om unicações de A cidentes do Trabalho por eles em itidas. Para
afastar essa suspeita, a Diretoria de Benefícios do INSS baixou o Memorando Circular n.
48, de 31 de outubro de 2005, esclarecendo aos setores internos que a CAT emitida pelo
Sindicato profissional da categoria não pode ser recusada, pois tem o mesmo valor probatório
daquela providenciada pela empresa.
(6) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991, art. 22, § 2Qou Decreto n. 3.048, de 06 maio 1999, art. 336,
§ 3Q. A Instrução Norm ativa do INSS/PRES n. 45/2010 relaciona, no art. 359, § 2Q, quais
são as autoridades que podem em itir a CAT: “ Para efeito do disposto no § 12 deste artigo,
64 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

quatro vias, com a seguinte destinação: 1ã via — INSS; 2- via — Segurado


ou dependente; 3ã via — Sindicato dos trabalhadores; 4- via — Empresa(7). É
dever da empresa remeter as cópias para os destinatários mencionados, bem
como informar ao segurado ou aos seus dependentes em qual agência do
INSS a CAT foi registrada.

Uma questão difícil, especialmente no caso das doenças ocupacionais,


é estabelecer a partir de que momento ou circunstância a emissão da CAT
torna-se obrigatória, passando a ser direito do trabalhador e dever do
empregador. Nos últimos anos, nota-se um inconformismo crescente de
trabalhadores e sindicatos contra a conduta daquelas empresas que se negam
a emitir a CAT, sob alegação de que não existe ainda o “ diagnóstico firmado”
da doença ocupacional. De fato, se verificarmos o “Manual de Instrução para
preenchimento da CAT” disponível no sítio eletrônico do INSS, publicado por
intermédio da Ordem de Serviço INSS/DSS n. 621/1999, há previsão expressa
de que “todos os casos com diagnóstico firmado de doença profissional ou
do trabalho devem ser objeto de emissão de CAT pelo empregador” e, ainda,
de que “no caso de doença profissional ou do trabalho, a CAT deverá ser
emitida após a conclusão do diagnóstico.”

Essa norma administrativa está dificultando a emissão da CAT em muitas


situações já que, para diversas doenças relacionadas com o trabalho, é
possível formular hipóteses diagnosticas de doenças degenerativas ou do
grupo etário ou, ainda, demandar prolongados exames complementares para
form ular diagnóstico diferencial, retardando em demasia a “conclusão do
diagnóstico”. Entendemos, todavia, que referida exigência, além de equivocada,
é ilegal, pois contraria frontalmente a lei. Diz o art. 169 da CLT, com a redação
dada pela Lei n. 6.514/1977:
“Art. 169 — Será obrigatória a notificação das doenças profissionais e das produzidas
em virtude de condições especiais de trabalho, com provadas ou objeto de suspeita,
de conform idade com as instruções expedidas pelo Ministério do Trabalho.”

Por outro lado, a NR 7 da Portaria n. 3.214/1978, no item 7.4.8, estabelece


que sendo verificadas alterações que revelem qualquer tipo de disfunção de

consideram -se autoridades públicas reconhecidas para tal finalidade os m agistrados em


geral, os membros do Ministério Público e dos Serviços Jurídicos da União e dos Estados,
os com andantes de unidades m ilitares do Exército, da M arinha, da A eronáutica e das
Forças Auxiliares (Corpo de Bombeiros e Polícia Militar), prefeitos, delegados de polícia,
diretores de hospitais e de asilos oficiais e servidores da adm inistração direta e indireta
federal, estadual, do Distrito Federal ou municipal, quando investidos de função.”
(7) A Ordem de Serviço INSS/DSS n. 621/1999, que aprovou o modelo do form ulário da
comunicação, estabelecia que a CAT deveria ser em itida com seis vias, sendo a 5a via para
o SUS e a 6a via para a DRT. No entanto, a Instrução Normativa INSS/DC n. 118/2005 e mais
recentemente o art. 357 da Instrução INSS/PRES n. 45/2010 limitaram a emissão às quatro
vias indicadas no art. 22, § 12, da Lei n. 8.213/1991 (INSS, Segurado, Sindicato e Empresa).
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 65

órgão ou sistema biológico, mesmo sem sintomatologia, caberá ao médico


coordenador ou encarregado so licita r à em presa a em issão da CAT,
encaminhando o trabalhador à Previdência Social para estabelecimento de
nexo causal, avaliação de incapacidade e definição da conduta previdenciária
em relação ao trabalho.

Ora, não pode uma simples Ordem de Serviço, ato administrativo que é,
limitar ou restringir o alcance da lei. Assevera Hely Lopes Meirelles, em síntese
feliz: “Sendo o regulamento, na hierarquia das normas, ato inferior à lei, não a
pode contrariar, nem restringir ou ampliar suas disposições. Só lhe cabe
explicitar a lei, dentro dos limites por ela traçados, ou completá-la, fixando
critérios técnicos e procedim entos necessários para sua aplicação.”(s) É
oportuno registrar o magistério seguro de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello
sobre o campo de abrangência do regulamento:

“O regulamento tem limites decorrentes do Direito Positivo. Deve respeitar


os textos constitucionais, a lei regulamentada e a legislação em geral, e
as fontes subsidiárias a que ela se reporta. Ademais, sujeita-se a
comportas teóricas. Assim, não cria, nem modifica e sequer extingue
direitos e obrigações, senão nos termos da lei, isso porque o inovar,
originariamente, na ordem jurídica consiste em matéria reservada à lei.
Igualmente, não adia a execução da lei e, menos ainda, a suspende,
salvo disposição expressa dela, ante o alcance irrecusável da lei para
ele. Afinal, não pode ser emanado senão conforme a lei, em virtude da
proeminência desta sobre ele.”(9)

Acreditamos, todavia, que as autoridades do INSS já perceberam o


equívoco da exigência do “diagnóstico firmado” para formalização da CAT,
porquanto a Instrução Normativa n. 98, que aprovou a Norma Técnica a
respeito das LER/DORT, baixada em dezembro de 2003 pela Diretoria
C olegiada do INSS, estabeleceu que “ todos os casos com suspeita
diagnostica de LE R /D O R T devem se r objeto de em issão de C A T pelo
empregador.”

Assim, a partir do momento em que surge a “suspeita diagnostica” de


doença relacionada ao trabalho, é dever do empregador e direito do empregado
a emissão da CAT. De qualquer forma é necessário que haja alguma alteração,
sintom a ou sinal clínico que possa levar à “suspeita” , para não cair no
comportamento excessivo de emissão da CAT pela simples desconfiança ou
mero capricho por parte do empregado.

(8) MEIRELLES, Hely Lopes. Direito adm inistrativo brasileiro. 29. ed. São Paulo: Malheiros,
2004. p. 127.
(9) MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios gerais de direito adm inistrativo. 2. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1979. p. 360.
66 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Aliás, estabelece o Código de Ética Médica, no Capítulo I, que trata dos


princípios fundamentais, que “o médico não pode, em nenhuma circunstância
ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir
quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a
correção de seu trabalho.”
Nesse diapasão, a Resolução CFM n. 1.488/1998 estabelece: “Art. 3o
— Aos médicos que trabalham em empresas, independentemente de sua
especialidade, é atribuição: (...) IV — Promover a emissão de Comunicação
de Acidente do Trabalho, ou outro docum ento que com prove o evento
infortunístico, sempre que houver acidente ou moléstia causada pelo trabalho.
Essa emissão deve ser feita até mesmo na suspeita de nexo causal da
doença com o trabalho. Deve ser fornecida cópia dessa documentação ao
trabalhador.” Também a Convenção n. 161 da OIT estabelece que o pessoal
prestador de serviços de saúde no trabalho deverá gozar de independência
profissional completa com relação ao empregador, aos trabalhadores e aos
seus representantes005.
A data em que ocorreu o sinistro é facilmente indicada na CAT quando
se trata de acidente típico, mas é de difícil apuração nas doenças ocupacionais.
Diante da impossibilidade prática de precisar o “momento do adoecimento” , o
legislador estabeleceu, por presunção legal, como dia do acidente: a data do
início da incapacidade laborativa para o exercício da atividade habitual, ou o
dia da segregação compulsória, ou o dia em que for realizado o diagnóstico,
valendo o que ocorrer primeiro(11). Como é necessário emitir a CAT quando
houver suspeita de doença ocupacional, a data a ser colocada na comunicação
será aquela em que o médico formulou a suspeita diagnostica.
Vale enfatizar que a CAT deverá ser preenchida em todos os casos em
que ocorrer acidente ou doença ocupacional, mesmo que não haja afastamento
do trabalho ou incapacidade. Sabe-se, porém, que a subnotificação nos
acidentes que não acarretam afastamento é grande, até porque é muito difícil
o fato ser detectado pela fiscalização.
O número elevado de trabalhadores sem carteira assinada no Brasil gera
m uitas em issões de CAT para em pregados que só foram adm itid os
formalmente, com data retroativa, após a ocorrência do acidente ou da morte,
especialmente porque os benefícios acidentários não exigem período de
carência, estando garantida a cobertura desde o primeiro dia de trabalho(12).

(10) Convenção n. 161 da OIT, art. 10. Esta Convenção, que trata dos “Serviços de Saúde
no Trabalho” , foi prom ulgada pelo Decreto n. 127 de 1991 e está em vigor no Brasil desde
18 de maio de 1991.
(11) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991, art. 23.
(12) Segundo dados do IBGE, relativos a setem bro de 2012, os trabalhadores com Carteira
de Trabalho assinada atingem apenas 54%. Dos extratos restantes, os que trabalham sem
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 67

Esse comportamento acentua o propalado déficit previdenciário, visto que o


trabalhador só está sendo registrado quando já adquiriu direito ao benefício
decorrente do acidente, ou seja, a Previdência Social se depara com uma
despesa certa quando nada arrecadou ainda com relação a esse novo
segurado/beneficiário.

O Código Penal, com as modificações da Lei n. 9.983/2000, estabelece


a pena de reclusão de dois a seis anos para quem insere na folha de pagamento
ou em documento para fazer prova perante a Previdência Social pessoa que
não possua a qualidade de segurado obrigatório ou quem omite a vigência de
contrato de trabalho ou de prestação de serviços(13). O desafio dos operadores
jurídicos, portanto, é exigir a aplicação da lei já em vigor, pois o que intimida o
infrator contumaz e o leva a mudar o comportamento não é a severidade da
pena, mas a certeza ou o fundado receio de que possa vir a ser condenado.
Convém registrar que os tribunais já estão apreciando considerável quantidade
de processos criminais envolvendo fraudes contra a Previdência Social.

3.2. Enquadramento técnico do acidente pelo INSS

A emissão da CAT não significa automaticamente que houve confissão


da em presa quanto à ocorrência de acidente do trabalho, porquanto a
caracterização oficial do infortúnio é feita pela Previdência Social, depois de
comprovar o liame causal entre o acidente e o trabalho exercido.

O setor de Perícia Médica do INSS, nos afastamentos superiores a quinze


dias, faz análise técnica para conferência do nexo entre o trabalho e o agravo,
considerando-se como agravo a lesão, doença, transtorno de saúde, distúrbio,
disfunção ou síndrome de evolução aguda, subaguda ou crônica, de natureza
clínica ou subclínica, inclusive morte, independentem ente do tempo de
latência(14).

Para esclarecer os fatos que eventualmente estejam gerando dúvidas


quanto ao nexo causal, a perícia médica do INSS poderá ouvir testemunhas,

carteira assinada (16%) mais os que atuam por conta própria (18% ) atingem 34% dos
trabalhadores. Sabemos, porém, que a grande maioria de trabalhadores enquadrados na
categoria “por conta própria” gravita em torno das empresas, praticam ente na condição de
empregados sem registro. Quando ocorre acidente no trabalho, para garantir a sobrevivência
durante a incapacidade, a vítim a pleiteia o registro com data retroativa, até porque muitos
ditos autônom os nem recolhem o INSS regularm ente. Tam bém o tom ador dos serviços
prefere “transferir o problema" para o INSS e assina a carteira até mesmo para “ajudar” o
acidentado.
(13) Código Penal, art. 297, § 3°.
(14) Decreto n. 3.048, de 6 maio 1999, art. 337.
68 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

efetuar pesquisa ou realizar vistoria do local de trabalho, bem como solicitar o


documento Perfil Profissiográfico Previdenciário — PPP — diretamente ao
empregador(15).

Como se vê, o acidente ou doença comunicado pela empresa pode ser


ou não caracterizado tecnicamente como acidente do trabalho. Se a Perícia
indicar que não há nexo causal do acidente ocorrido com o trabalho, o INSS
reconhecerá apenas o acidente de qualquer natureza, conferindo à vítima os
benefícios previdenciários cabíveis, mas não os direitos acidentários(16). Igual
desfecho ocorrerá se a doença, mesmo considerando-se as possíveis
concausas, não estiver relacionada ao trabalho.

Com frequência acontece de o trabalhador procurar o INSS sem nem


mesmo saber que o acidente ou a doença de que foi acometido tem relação
com o trabalho. Daí acontece que muitos acidentes do trabalho no sentido
técnico, especialm ente os de trajeto e as doenças ocupacionais, são
enquadrados como ocorrências comuns, por falta de iniciativa ou de empenho
para verificação do nexo causal com o trabalho. O próprio em pregado
inicialmente se acomoda com a situação quando é informado que não terá
prejuízo algum com um ou outro enquadramento, porquanto, desde a Lei n.
9.032/1995, a Previdência Social igualou o valor dos benefícios nas duas
hipóteses.

A empresa, por sua vez, nem sempre se empenha para emitir a CAT
porque o enquadramento do evento como acidente do trabalho, além de gerar
a estabilidade provisória no emprego após a alta, quando o afastamento for
superior a 15 dias, acarreta a obrigação de depositar o FGTS no período de
afastamento. Ademais, a indenização por responsabilidade civil prevista no
art. 7-, XXVIII, da Constituição da República, exige a prévia caracterização
da ocorrência como acidente do trabalho, sendo este, provavelmente, o fato
mais preocupante para o empregador. É fácil concluir, portanto, que além da
subnotificação explícita, há uma outra mascarada, mais sutil, que reduz a
estatística dos acidentes do trabalho, mas sobrecarrega o desembolso dos
benefícios previdenciários.

Essa questão, todavia, teve importante alteração no sentido de facilitar o


enquadramento da patologia como de natureza ocupacional, porquanto a Lei
n. 11.430/2006, que criou o nexo técnico epidemiológico, praticamente instituiu
o nexo causal presumido, ao acrescentar o art. 21-A na Lei n. 8.213/1991:

(15) Cf. Instrução Normativa do INSS/PRES. n. 45, de 6 de ago. 2010, art. 350.
(16) “Entende-se como acidente de qualquer natureza ou causa aquele de origem traum ática
e por exposição a agentes exógenos (físicos, quím icos e biológicos), que acarrete lesão
corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda, ou a redução permanente ou
tem porária da capacidade laborativa.” Cf. Decreto n. 3.048, 6 maio 1999, art. 30, parágrafo
único.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 69

“Art. 21-A. A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária


da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidem iológico entre
o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da em presa e a entidade
m órbida m otivadora da incapacidade elencada na C lassificação Internacional de
Doenças — CID, em conformidade com o que dispuser o regulamento.

§ 1a A perícia m édica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando


dem onstrada a inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo.”

Com efeito, se a perícia médica do INSS constatar a presença do nexo


técnico epidemiológico, deverá reconhecer, por presunção legal, a natureza
ocupacional da patologia, na forma especificada no art. 337 do Decreto n.
3.048/1999, que aprovou o Regulamento da Previdência Social. O empregador,
no entanto, poderá requerer a não aplicação do nexo epidemiológico ao caso
concreto, com efeito suspensivo, quando puder demonstrar a inexistência do
nexo causal entre o trabalho e o agravo(17).

3.3. Recurso administrativo contra o enquadramento

Quando o segurado discordar do enquadramento do infortúnio, conforme


caracterizado pela Previdência Social, poderá interpor recurso administrativo,
istc é, tentar modificar a decisão no âmbito do próprio INSS, antes de ingressar
com ação perante o Poder Judiciário. Pode-se dizer, portanto, que o recurso
administrativo é o remédio jurídico disponível ao segurado para provocar o
reexame de uma decisão, na esfera administrativa, pela mesma autoridade
ou outra de hierarquia superior.

Essa prerrog ativa do segurado tem respaldo na C onstituição da


República, que assegura a todos, independentemente do pagamento de taxas,
a possibilidade de petição aos Poderes Públicos(18) em defesa de direito ou
contra a ilegalidade ou abuso de poder e que assegura também aos litigantes,
em processo judicial ou administrativo, o contraditório e a ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes(19). Tem apoio, ainda, no art. 126 da Lei n.
8.213/1991(20) e na Lei n. 9.784/1999, que regula o processo administrativo no
âmbito da Adm inistração Pública Federal. O detalham ento dos trâm ites

(17) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991, art. 21 -A, § 2S e Decreto n. 3.048, de 06 de maio 1999, art.
337, § 7a. No mesmo sentido, o art. 349 da Instrução Normativa INSS/PRES. n. 45, de 6 de
agosto de 2010.
(18) O INSS, que ainda detém o monopólio do seguro de acidente do trabalho, enquadra-se
juridicam ente como autarquia federal, vinculada ao Ministério da Previdência Social.
(19) Constituição da República, de 5 out. 1988. Art. 5a, Incisos XXXIV e LV.
(20) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991, art. 126: “Das decisões do Instituto Nacional do Seguro
S ocial — INSS nos p ro ce sso s de in te re sse dos b e n e ficiá rio s e dos co n trib u in te s da
S eguridade Social caberá recurso para o C onselho de Recursos da Previdência Social,
conforme dispuser o R egulam ento.”
70 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

processuais do recurso administrativo pode ser verificado no Regimento


Interno do Conselho de Recursos da Previdência Social — CRPS(21).

Se o INSS, por exemplo, entender que a doença que acarretou o


afastamento é de natureza degenerativa, sem nexo causal com o trabalho e
conceder ao segurado apenas o auxílio-doença previdenciário comum (código
B. 31), este poderá interpor recurso administrativo para tentar comprovar que
a doença eclodiu em razão das tarefas exercidas, com agravamento pelas
condições inadequadas de trabalho, pelo que deveria receber o auxílio-doença
por acidente do trabalho (código B. 91).

A primeira decisão do INSS quanto ao enquadramento ou não do evento


como acidente do trabalho é tomada na Agência da Previdência Social —
APS — onde foram registrados a CAT e o requerimento do benefício por
incapacidade. Se a Perícia Médica desta Agência entender que não há nexo
causal do evento com o trabalho, o segurado poderá interpor recurso ordinário
no prazo de 30 dias para a Junta de Recursos do CRPS, que é considerada
a primeira instância adm inistrativa(22). Por outro lado, a empresa também
poderá recorrer da decisão do INSS, com efeito suspensivo, conforme prevê
o art. 337, § 13, do Decreto n. 3.048/1999, com as modificações introduzidas
pelo Decreto n. 6.042/2007. Conforme ocorre com os recursos em geral, o
segurado deverá expor detalhadamente as razões do seu inconformismo e o
INSS, ao julgar o apelo, tem o dever de mencionar os fundamentos da decisão.

Uma vez apresentado o recurso, novo exame do nexo causal será feito.
Se a conclusão for favorável ao segurado, comprovando o nexo, imediatamente
será concedido o direito postulado, ficando dispensado o pronunciamento da
Junta de Recursos; porém, se o parecer médico mantiver a decisão anterior,
o processo seguirá para julgamento na JRPS(23).

(21) O Regimento Interno do CRPS, que vigora atualmente, foi aprovado pela Portaria MPS
n. 323, de 27 de agosto de 2007.
(22) Tem sido aceito em algum as APS o pedido de revisão do nexo causal por simples
re q u e rim e n to do se g u ra d o , a n te s m esm o da in te rp o s iç ã o de re cu rso p ara a JR PS,
e s p e c ia lm e n te q u a n d o o s e g u ra d o a c re s c e n ta d o c u m e n to ou e xa m e c o n v in c e n te ,
oferecendo subsídios para o M édico-Perito reanalisar a conclusão anterior. Essa postura
tem suporte na garantia constitucional do direito de petição (art. 5S, XXXIV), tanto que a
Portaria n. 323 do MPS, de 27 de agosto de 2007, estabelece no art. 34 que: “O INSS pode,
em qualquer fase do processo, reconhecer expressam ente o direito do interessado e reformar
sua decisão, deixando de encam inhar o recurso à instância competente, ou, caso o recurso
esteja em andam ento perante o órgão julgador, será necessário com unicar-lhe sua nova
decisão, para fins de extinção do processo com apreciação do mérito, por reconhecimento
do pedido. Parágrafo único. Na hipótese de reforma parcial de decisão do INSS, o processo
terá seguimento em relação à questão objeto da controvérsia rem anescente.”
(23) Cf. Decreto n. 3.048, de 6 maio 1999, art. 305, § 3S.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 71

Na etapa de instrução do processo administrativo o recorrente poderá


juntar documentos e pareceres, requerer diligências ou perícias, aduzir
alegações, sendo que os elementos probatórios deverão ser considerados
nos fundamentos da decisão(24). Somente poderão ser recusadas, mediante
decisão fundamentada, as provas ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou
protelatórias(25). Se os Conselheiros da Junta de Recursos entenderem que a
instrução processual está incompleta, poderão converter o julgamento em
diligência para produção de novas provas, sendo que é vedado ao INSS
escusar-se de cumprir as diligências solicitadas*26’.

Não cabe apelo da decisão das Juntas de Recursos para as Câmaras


de Julgamento (segunda instância) quando se tratar de matéria exclusivamente
médica e houver convergência entre os pareceres da Assessoria Técnico-
-Médica e os laudos emitidos pelos Médicos Peritos do INSS. Essas questões
são consideradas pelo INSS como matérias de alçada exclusiva da primeira
instância administrativa, ou seja, das Juntas de Recursos<27).
É oportuno mencionar que a tramitação do recurso administrativo, por
expressa determinação legal, deve obedecer aos princípios jurídicos funda­
mentais do processo em geral e do Direito Administrativo, sob pena de nuli-
dade, tais como: princípio da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade,
proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,
interesse público e eficiência(28). Em sintonia com tais princípios, é pacífico o
entendimento de que o INSS, percebendo seu eventual equívoco, pode, a
qualquer tempo, reformar sua própria decisão, especialmente diante da rele­
vância e natureza dos benefícios acidentários e/ou previdenciários(29).

Se a decisão do processo administrativo for desfavorável ao segurado,


resta-lhe a possibilidade de ver atendida sua pretensão pela via judicial,
conforme veremos no item seguinte.

3.4. Ação judicial contra o enquadramento

A interposição de recurso administrativo não impede o ajuizamento de


ação judicial posteriormente, caso a decisão do INSS, rejeitando o enquadra­

(24) Cf. Lei n. 9.784, de 29 jan. 1999, art. 38, bem como Portaria MPS n. 323, de 27 de ago.
2007, art. 37.
(25) Lei n. 9.784, de 29 jan. 1999, art. 38, § 2S.
(26) Decreto n. 3.048, de 6 de maio 1999. Art. 308, § 2° e Instrução Normativa INSS/PRES.
n. 45, de 6 ago. 2010, art. 636.
(27) Cf. Portaria MPS n. 323, de 27 de ago. 2007, art. 18.
(28) Lei n. 9.784, de 29 jan. 1999, art. 22.
(29) Cf. Decreto n. 3.048, de 6 maio de 1999, art. 305, § 3e e Portaria MPS n. 323, de 27 de
ago. 2007, art. 34.
72 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

mento do evento como acidente do trabalho, não seja convincente para o


segurado. Todavia, se, durante a tramitação do processo administrativo, houver
ajuizamento de ação com o mesmo objeto, considera-se que houve renúncia
ao direito de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso inter-
posto(30).

Após a Lei n. 5.316/1967, firmou-se o entendimento no STF de que o


ajuizamento da ação acidentária só seria possível depois de esgotadas as
possibilidades de recurso na esfera administrativa perante a Previdência
Social(31). Em decorrência das diversas mudanças legislativas posteriores,
instalou-se acesa discussão doutrinária e jurisprudencial se permanecia tal
exigência. No entanto, desde a Constituição de 1988 a discussão perdeu
intensidade porquanto restou consagrado que lei alguma pode excluir da
apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça de direito(32).
Atualmente, a matéria está pacificada no STJ pelo entendimento adotado pela
S úm ula n. 89: “A ação a cidentária p re scin d e do exau rim e nto da via
administrativa", sendo que o próprio STF já deixou de aplicar a Súmula n. 552(33).

A ação judicial contra o enquadramento será ajuizada em face do INSS,


perante a Justiça Comum estadual, juntando-se com a inicial, sempre que
possível, a prova da emissão da CAT e sua remessa à Previdência Social(34).
Naturalmente que todos os dados e exames realizados perante o INSS serão
juntados no processo judicial, mas a perícia médica agora será realizada por
profissional habilitado independente, de livre escolha do juiz, sem vinculação
com as conclusões do processo administrativo. Se o Judiciário acolher o
pedido do acidentado, o INSS, após o trânsito em julgado da sentença, deverá
rever seu enquadramento, concedendo o benefício na categoria acidentária.
Vale citar alguns exemplos de decisões judiciais a respeito:
“ Direito Civil. Seguro. Microtraumas. Tenossinovite. Acidente Pessoal. Cobertura
Securitária. Orientação da Turm a. Recurso Acolhido. Nos term os da orientação
desta Turma, inclui-se no conceito de acidente de trabalho o m icrotrauma repetitivo
que ocorre no exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão que
causa incapacidade laborativa.” STJ. 4- Turma. REsp n. 456.456/MG, Rei.: Ministro
Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 17 mar. 2003, p. 237.

“A cidente no trabalho. Perda de audição. Microtraumas. Enquadra-se no conceito


de acidente do trabalho a perda da audição provocada por microtraumas produzidos

(30) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991, art. 126, § 3S.


(31) STF. SÚM ULA N. 552: “Com a regulam entação do art. 15, da Lei n. 5.316/67, pelo
Decreto n. 71.037/72, tornou-se exeqüível a exigência da exaustão da via adm inistrativa
antes do início da ação de acidente do trabalho.”
(32) Constituição da República, de 5 out. 1988, art. 5-, XXXV.
(33) No julgam ento do RE n. 91.742 (RTJ 93/911) a Primeira Turma do STF, conhecendo e
dando provimento ao recurso, entendeu que a Súmula n. 552 está superada com o advento
da Lei n. 6.367/1976. Nesse sentido veja também RE n. 87.160 (RTJ 98/1107).
(34) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991, art. 129.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 73

no local de trabalho excessivam ente ruidoso. Recurso conhecido em parte e provido.”


STJ. 4a Turma. REsp. n. 325.896/SP, Rei.: Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJ 18 fev.
2002, p. 456.

“Acidente do trabalho. Doença. Neurose fóbica. Nexo causal. Reconhecimento.


Detectada patologia não oriunda necessariamente do mister, entretanto, no caso em
questão, o obreiro, o perador industrial na Cosipa, por longo período (02.10.71 a
06.08.90) lidando com benzeno, restando verificado o trabalho noturno, em turnos,
acarretando distúrbios de sono e desajustando o relógio biológico consignando o
‘expert’ (psiquiatra) haver relação do quadro de neurose fóbica com o mister, de rigor
a substituição da aposentadoria previdenciária por acidentária, nos term os da Lei n.
8.213/91 e alterações posteriores.” São Paulo. STACivSP. 7a Câm. Cível. Apelação s/
Revisão n. 633.025-00/8, Rei.: Juiz Américo Angélico, julgado em 14 out. 2003.

Anteriormente havia um interesse financeiro direto pelo enquadramento


do infortúnio como acidente do trabalho, em razão da superioridade dos valores
dos benefícios, mas, com o advento da Lei n. 9.032/1995, esse motivo ficou
superado, uma vez que o legislador promoveu a equiparação monetária dos
benefícios previdenciários aos acidentários. Aliás, essa equalização de valores
teve mesmo um propósito explícito de reduzir as demandas judiciais sobre
enquadramento, conforme se verifica na Mensagem do Poder Executivo
encaminhando o Projeto que deu origem à lei:
“ 13. O anteprojeto ao propor tam bém a alteração de d isp o sitivo s referentes aos
acidentes do trabalho busca dar solução ao verdadeiro caos que hoje existe na área,
com interpretações as mais diversas, além de fraudes e procedim entos irregulares.
Existem mais de 300 mil ações acidentárias em andamento na Justiça brasileira que
poderão assim serem eliminadas de imediato. A proposta de equalização dos valores
dos benefícios acidentários com os demais benefícios previdenciários será elemento
im portante para que sejam reduzidas as ações judiciais contra a Previdência Social,
a sse g u ra n d o m e lh o re s c o n d içõ e s de c á lc u lo de b e n e fíc io para a p o s e n ta d o s e
pensionistas.”(35)

O maior interesse do segurado no enquadramento como acidente do


trabalho, como já mencionado, reside na expectativa dos reflexos desse fato
em outras áreas, especialmente a estabilidade provisória no emprego depois
da cessação do auxílio-doença e as eventuais indenizações por danos mate­
riais, morais ou estéticos. Diante dessas repercussões, algumas empresas,
antevendo futuras demandas judiciais, estão ingressando em juízo na condi­
ção de assistente do INSS na ação acidentária, com o propósito de atuar
para que a ocorrência não seja caracterizada como acidente do trabalho ou
doença ocupacional(36). Ademais, a empresa poderá requerer a não aplica­

(35) Mensagem do Poder Executivo n. 285/1995, que encaminhou o Projeto de Lei n. 199
de 1995, com a E xposição de M otivos n. 021-AM PAS, assinada pelo M inistro R einhold
Stephanes, publicada no Diário do Congresso Nacional — Seção I, de 21 de abril de 1995,
p. 7002.
(36) Código de Processo Civil. Art. 50. “ Pendendo uma causa entre duas ou mais pessoas,
o terceiro, que tiver interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, poderá
intervir no processo para assisti-la” . Parágrafo único. A assistência tem lugar em qualquer
74 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

ção do nexo técnico epidemiológico, ainda no âmbito administrativo perante a


Previdência Social, conforme previsto no art. 21-A da Lei n. 8.213/1991 e
respectiva regulamentação*37'.

Veja no quadro abaixo uma síntese das conseqüências jurídicas para o


em pregado e para o em pregador, d e co rrentes da ca ra cte riza çã o do
a fa sta m e n to com o a cidente do tra b a lh o (B ene fício a cid e n tá rio ), em
com paração com o sim ples afastam ento por acidente ou doença não
relacionados ao trabalho (Benefício previdenciário):

Conseqüências Jurídicas do enquadramento do Afastamento Afastamento


evento como acidente do trabalho previdenciário acidentário
1. Garantia provisória de emprego — Lei n. 8.213/ Não Sim
1991, art. 118.
2. Depósito do FGTS no período do afastamento — Não Sim
Decreto n. 99.684/1990, art. 28.
3. Dispensa período carência para auferir determinados Não Sim
benefícios no INSS — Lei n. 8.213/1991, art. 26.
4. Majoração da alíquota do seguro de acidente do Não Sim
trabalho — Decreto n. 3.048/1999, art. 202-A.
5. Possíveis efeitos criminais — Código Penal. Não Sim
6. Possíveis multas aplicadas pela Inspeção do Trabalho. Não Sim
7. Possível ação regressiva do INSS em face do Não Sim
empregador — Lei n. 8.213/1991, art. 120.
8. Possível indenização pelo empregador dos diversos Não Sim
danos sofridos pelo acidentado.

A não emissão da CAT pelo empregador, apesar de dificultar, não impede


o enquadramento do evento como acidente do trabalho. Segundo o art. 129

dos tipos de procedimento e em todos os graus de jurisdição; mas o assistente recebe o


processo no estado em que se encontra.” Decidiu o Segundo Tribunal de Alçada Civil de
São Paulo: “Sempre que o empregado, em ação acidentária movida contra o INSS, imputar
a seu em pregador a responsabilidade pelo acidente que sofreu ou m oléstia de que se
tornou portador, terá este último interesse jurídico em atuar no feito como assistente da
autarquia, interesse esse que resulta claro do disposto no art. 120 da Lei n. 8.213/91.” Cf. Al
n. 761.567-0/8, 4- Câm. Cível, Rei.: Juiz Amaral Vieira, julgado em 18 mar. 2003. No mesmo
sentido: “Adm ite-se em lide de natureza acidentária a intervenção da em pregadora como
assistente. Todavia não se discutirá eventual doio ou culpa do em pregador.” Cf. Al n. 753.857-
00/5, 2a Câm. Cível, Rei.: Juiz Norival Oliva, julgado em 17. fev. 2003. Estes acórdãos estão
disponíveis na íntegra em <http://w ww .stac.sp.gov.br>. Vale anotar, todavia, que também
há entendim entos negando a possibilidade da assistência.
(37) Decreto n. 3.048, de 06 de maio 1999, art. 337, § 7- a § 13. No mesm o sentido, a
Instrução Normativa INSS/PRES. n, 45, de 6 ago. 2010.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 75

do Código Civil de 2002, reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a


condição, cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte, a quem
desfavorecer. Verificando-se pelas provas dos autos que ocorreu a hipótese
egalmente classificada como acidente do trabalho, são reconhecidos pela
sentença todos os efeitos jurídicos, como se a CAT tivesse sido regularmente
emitida:
“Agravo de instrum ento — A cidente do trabalho — Estabilidade provisória. 1. O
Reclamante sofreu acidente de trabalho nos term os da legislação previdenciária —
art. 21, IV, “d” , da Lei n. 8.213/91. 2. Em seguida, a Ré tencionou dispensá-lo, o que
não foi possível em razão da inaptidão aferida pelo exame demissional. Mesmo após
tal ocorrência, não emitiu a CAT. 3. O Autor esteve afastado do serviço, em função das
seqüelas do acidente, e teve os salários pagos pela Empresa. 4. O acórdão regional
relata que a Empresa, conhecedora da situação do Empregado, deixou de em itir a
CAT, que era exigida na hipótese e perm itiria ao Reclamante ver cumprida a garantia
estabilitária, inclusive com a percepção do auxílio-doença acidentário. 5. O acórdão
regional considerou estarem preenchidos os requisitos para o reconhecim ento da
estabilidade provisória no emprego. Inteligência da Súmula n. 378 do TST. Agravo de
In s tru m e n to a q u e se n e g a p ro v im e n to .” T S T . 8® T u rm a . A IR R n. 4 0 3 9 -
58.2010.5.04.0000, Rei.: Ministra Maria Cristina Peduzzi, DJ 26 nov. 2010.

“Acidente do trabalho. Não em issão da CAT. Preenchim ento dos pressupostos da


e s ta b ilid a d e p ro v is ó ria p revista no art. 118 da Lei n. 8.213/91. C om provada
judicialm ente a lesão sofrida pelo trabalhador e o nexo de causalidade com o serviço,
tem -se por caracterizado o acidente do trabalho conforme se dessume do disposto
no art. 337 do Decreto n. 3.048/99, que aprovou o Regulamento da Previdência Social.
A om issão do em p re g ad o r em não e m itir a C AT (C o m u n ica çã o de A cid e n te do
Trabalho) não poderá, nesse caso, prejudicar o trabalhador, reputando-se, em face
dos elem entos dos autos, ‘verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo
implem ento for m aliciosam ente obstado pela parte a quem desfavorecer’, conforme
reza o art. 129 do C ódigo Civii de 2002. O fundam ento teleológico da garantia de
em prego insculpida no art. 118 da Lei n. 8.213/91 não é o recebimento simplesm ente
do auxílio-doença acidentário; é o afastamento superior a 15 dias ocorrido por causa
do acidente. A lei não criou a estabilidade provisória porque o em pregado recebeu
auxílio-doença acidentário e sim porque houve um afastam ento por período mais
prolongado, indicando um acidente de m aior gravidade, com incapacidade para o
trabalho. Logo, ocorrido o acidente do trabalho, constatados o nexo causal com o
serviço e o afastam ento do tra b a lh a d o r por prazo superior a 15 dias, tem -se por
preenchidos os pressupostos exigidos pela lei para a garantia de emprego pelo prazo
mínimo de doze meses após a cessação do benefício previdenciário.” Minas Gerais.
TRT 3ã Reg. 4- Turma, RO n. 00619-2003-086-03-00-5, Rei.: Juiz convocado Mauro
César Silva, DJ 07 ago. 2004.

É pertinente anotar que durante a 1â Jornada de Direito Material e


Processual na Justiça do Trabalho, realizada em Brasília em novembro de
2007(38), foram aprovados dois im portantes Enunciados a respeito das
conseqüências jurídicas da não emissão da CAT:

(38) A 1s Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho foi realizada no


mês de novem bro de 2007, nas dependências do TST em Brasília, m ediante prom oção
conjunta da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho — ANAMATRA,
76 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

“Enunciado 42. Acidente do trabalho. Nexo técnico epidem iológico. Presume-se a


ocorrência de acidente do trabalho, mesmo sem a emissão da CAT — Comunicação
de Acidente de Trabalho, quando houver nexo técnico epidem iológico conforme art.
21-A da Lei n. 8.213/91.”

“Enunciado 43. Estabilidade acidentária. Ausência de em issão da CAT. A ausência


de emissão da CAT — Comunicação de Acidente do Trabalho pelo empregador não
impede o direito à estabilidade do art. 118 da Lei n. 8.213/91, desde que comprovado
que o trabalhador deveria ter se afastado em razão do acidente por período superior
a quinze dias.”

Tribunal Superior do Trabalho — TST e da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoam ento


de M agistrados — ENAM AT. M aiores d e ta lh e s dessa Jo rn a d a estão d isp o n íve is em:
<w w w .anam atra.org.br/jornada/index.cfm >.
CAPÍTULO 4

RESPONSABILIDADE CIVIL POR


ACIDENTE DO TRABALHO

4.1. Direitos acidentários e reparações civis

O primeiro pensamento daquele que foi vítima de acidente do trabalho


ou doença ocupacional aponta no sentido de que deve procurar o INSS, em
busca dos benefícios concedidos pela legislação do seguro de acidentes do
trabalho. A maioria ignora que, além dos direitos acidentários, podem ser
cabíveis outras reparações devidas pelo empregador, de acordo com os
preceitos seculares da responsabilidade civil.
O empregado frequentemente confunde ou não percebe a diferença entre
a cobertura atribuída a todos os segurados do INSS e os benefícios e demais
direitos derivados do acidente do trabalho. Contribui para essa falta de clareza
o fato de a regulamentação da infortunística do trabalho no Brasil estar
mesclada com a legislação previdenciária. O trabalhador imagina que se
sobrevier alguma incapacidade, parcial ou total, só lhe cabem os benefícios
garantidos pela Previdência Social.
Também o empresário, de alguma forma, permanece acomodado porque
tem a falsa percepção de que o pagamento do seguro de acidente do trabalho,
juntamente com o recolhimento do INSS, cobre todos os riscos que afetam
os seus empregados. Praticamente desconhece que a cobertura acidentária
não exclui, quando cabível, a responsabilidade civil do empregador.
A indenização por acidente do trabalho, independentem ente dos
benefícios acidentários, só foi mesmo consagrada, de forma incontestável, a
partir da Constituição Federal de 1988, que estabelece:
“Art. 7°. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social: (... )

XXVIII — seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a


indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;”

É certo que esse direito foi construído paulatinamente, desde o Decreto-


-lei n. 7.036/1944, com intensas controvérsias doutrinárias ejurisprudenciais,
78 S e b a s t iã o G e r a ld o de O l iv e ir a

mas até hoje os seus contornos e recortes teóricos não estão suficientemente
consolidados, de modo a proporcionar estabilidade e segurança para os
operadores jurídicos. Aliás, é oportuno mencionar que, a rigor, não se trata
de “indenização do direito com um ” , como asseveram muitos autores e
acórdãos, mas indenização fundada na Constituição da República. Nesse
sentido a advertência oportuna do civilista Sérgio Cavalieri:

“Ainda que com matriz constitucional, advogados e juizes, curiosamente,


continuam falando em indenização acidentária fundada no direito comum,
para diferenciá-la daquela outra que decorre diretamente da legislação
acidentária. Não nos parece adequada a expressão porque essa
indenização é fundada na própria Constituição (norma expressa) e não
no direito comum.”(1)

Neste e no próximo Capítulo, vamos lançar os fundamentos básicos da


responsabilidade civil decorrente dos acidentes do trabalho e situações
equiparáveis e, nos capítulos seguintes, farem os o desdobram ento dos
pressupostos para o deferimento das indenizações.

4.2. Noção sobre responsabilidade civil

Assentado o cabimento de indenização à vítima de acidente do trabalho,


quando o em pregador incorrer em dolo ou culpa de qualquer grau ou, ain­
da, quando exercer atividade de risco, cabe delinear uma breve noção a
respeito do instituto jurídico que oferece o suporte dogmático para tal direito,
qual seja, a responsabilidade civil.

Apesar de suas raízes longínquas, a responsabilidade civil continua


desafiando os estudiosos e ocupando espaço considerável e crescente na
literatura jurídica. Antigas ideias são invocadas a todo momento para solucionar
novas ocorrências, m antendo-se a efervescência saudável do debate
jurídico®.

Marton, citado por Aguiar Dias, define a responsabilidade “como a situação


de quem, tendo violado uma norma qualquer, se vê exposto às conseqüências
desagradáveis decorrentes dessa violação, traduzidas em medidas que a

(1) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Atlas,
2010. p. 148.
(2) Assevera Maria Helena Diniz que “a responsabilidade civil é, indubitavelmente, um dos
tem as mais palpitantes e problem áticos da atualidade jurídica, ante sua surpreendente
e xpansão no d ire ito m oderno e seus reflexos nas a tivid a d e s hum anas, co n tra tu a is e
extracontratuais, e no prodigioso avanço tecnológico, que im pulsiona o progresso material,
gerador de utilidades e de enormes perigos à integridade da vida humana” . Cf. Curso de
direito civil brasileiro. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v, 7, p. 3.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 79

autoridade encarregada de velar pela observação do preceito lhe imponha...”.(3)


Para Maria Helena Diniz, “a responsabilidade civil é aplicação de medidas
que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a
terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela
responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”.(4)
Assinala Caio Mário que “no desenvolvimento da noção genérica de
responsabilidade civil, em todos os tempos, sobressai o dever de reparar o
dano causado”.(5) De forma semelhante, assevera José de Aguiar Dias que
“o interesse em restabelecer o equilíbrio econômico-jurídico alterado pelo dano
é a causa geradora da responsabilidade civil” .(6)
Onde houver dano ou prejuízo, a responsabilidade civil é invocada para
fundamentar a pretensão de ressarcimento por parte daquele que sofreu as
conseqüências do infortúnio. É, por isso, instrumento de manutenção da
harmonia social, na medida em que socorre o que foi lesado, utilizando-se do
patrimônio do causador do dano para restauração do equilíbrio rompido. Com
isso, além de punir o desvio de conduta e amparar a vítima, serve para
desestimular o violador potencial, o qual pode antever e até mensurar o peso
da reposição que seu ato ou omissão poderá acarretar.

Para compreensão da responsabilidade civil — denominação utilizada


para d istin çã o da re sp o n sa b ilid a d e p e n a l ou c rim in a l — , devem ser
examinados, nos limites da proposta deste livro, alguns pilares fundamentais:
as diversas espécies de dano, o nexo causal ou concausal, a culpa ou a
exploração da atividade de risco e a necessidade de reparação.
A norma central da responsabilidade civil no Código Civil de 1916 estava
insculpida no art. 159, com a redação seguinte:
“A quele que, por ação ou om issão voluntária, negligência, ou im prudência, violar
direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. A verificação da
culpa e a avaliação da responsabilidade regulam -se pelo disposto neste Código,
arts. 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553”<7>.

(3) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. 1, p. 3.
(4) DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
v. 7, p. 35.
(5) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 29.
(6) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. 1, p. 42.
(7) O Código Criminal do Brasil, de 1830, já estabelecia regras importantes sobre a reparação
do dano: “Art. 21. O delinqüente satisfará o dano que causar com o delito. Art. 22. A satisfação
será sempre a mais com pleta que for possível e, no caso de dúvida, a favor do ofendido.
Para esse fim, o mal que resulta à pessoa do ofendido será avaliado em todas as suas
partes e conseqüências” . Cf. DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1995. v.1, p. 22.
80 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

No Código Civil de 2002, o núcleo da responsabilidade civil pode ser


identificado, especialmente, em três dispositivos que se completam:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivam ente moral, comete ato
ilícito.”

“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-io, excede
manifestamente os limites impostos peio seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou
pelos bons costum es.”

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo (...)”

Com apoio no novo Código, asseveram Carlos Alberto Menezes Direito


e Sérgio Cavalieri que “a responsabilidade civil opera a partir do ato ilícito
com o nascimento da obrigação de indenizar, tendo por finalidade tornar
indem ne o lesado, colocar a vítim a na situação em que estaria sem a
ocorrência do fato danoso”(8).

4.3. Evolução da responsabilidade civil por acidente do trabalho

Por causa da legislação especial a respeito do acidente do trabalho,


houve m uita discussão no Brasil quanto à re sp on sabilid ade civil do
empregador, porquanto a obrigatoriedade do pagamento do seguro acidentário,
com o já m encionado, sugeria que estavam cobertos todos os riscos
relaciona dos com os in fo rtú n io s laborais. Ficava a im pressão que o
recebimento dos benefícios acidentários mais a indenização suportada pelo
empregador implicaria dupla reparação pelo mesmo motivo, caracterizando a
figura combatida do bis in idem.

De fato, na vigência do Decreto n. 24.637/1934, havia previsão expressa


excluindo a responsabilidade civil: “Art. 12. A indenização estatuída pela
presente lei exonera o empregador de pagar à vítima, pelo mesmo acidente,
qualquer outra indenização de direito comum.” Ocorre, porém, que a cobertura
da lei acidentária tinha limites estabelecidos que não atingiam o ressarcimento
integral do dano. Com isso, paradoxalmente, a lei especial, que veio para
proteger o acidentado, acabava trazendo prejuízo na questão indenizatória,
visto que a cobertura securitária era inferior àquela prevista no próprio Código
Civil, de aplicação geral.

O art. 31 do Decreto-lei n. 7.036/1944 iniciou a correção desse problema,


prevendo a responsabilidade civil quando o acidente resultasse de dolo do
empregador ou de seus prepostos: “O pagamento da indenização estabelecida

(8) DIREITO, Carios A lberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Com entários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 48.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 81

pela presente lei exonera o empregador de qualquer outra indenização de


direito comum, relativa ao mesmo acidente, a menos que este resulte de dolo
seu ou de seus prepostos.” Ficou assegurado, portanto, que cabia acumular
a indenização do direito comum com os benefícios concedidos pela lei
acidentária, nos casos em que o empregador tivesse agido com dolo no
acidente do trabalho.
Essa m u d a n ça le gal gerou in te n s a d is c u s s ã o na épo ca. Os
em pregadores alegavam que a indenização por responsabilidade civil
acumulada com os benefícios previstos na lei do seguro de acidente do
trabalho representava verdadeiro bis in idem e, de outro lado, os empregados
e sindicatos entendiam que, além de caber essa cumulação no caso de dolo,
também seria devida a indenização adicional nos acidentes ocorridos por
culpa do empregador.
Em diversos pronunciamentos, o Supremo Tribunal Federal não só
reputou válida a cumulação do art. 31, acima mencionado, como avançou no
entendimento para estabelecer o direito da vítima à reparação civil também
nos casos de culpa grave do empregador. O defensor desse posicionamento
no STF foi o Ministro Antônio Gonçalves de Oliveira, que, atuando como
Relator, no julgamento do RE n. 49.462, enfatizou:
“Não somente em caso de dolo, mas, em caso de falta grave, em que o
em pregador dem onstre pela negligência e om issão de precauções
elem entares, despreocupação e m enosprezo pela segurança do
empregado, dando causa ao acidente, neste caso, não tenho dúvida em
admitir a ação de direito comum. (...). Além do caso de dolo, a ele se
equiparam , pois, a n eg ligência grave, a om issão consciente do
empregador, que não se incomoda com a segurança do empregado,
expondo-o a perigo, ao acidente. Neste caso é que a ação de direito
comum tem cabimento: tal falta se equipara ao dolo, a que se refere o
art. 31 da Lei de Acidentes.”(9)
O pensamento do Ministro Gonçalves de Oliveira, no período de 1961 a
1963, foi encampado pelos demais componentes do STF, conforme se verifica
nos seguintes julgamentos: RE 23.192 Embargos, RE 48.894, RE 49.462,
RE 43.984, RE 46.643 Embargos, RE 49.462 Embargos e RE 50.297. Com a
sedimentação do entendimento pela cumulação das indenizações, na Sessão
Plenária realizada no dia 13 de dezembro de 1963, o STF aprovou a Súmula
n. 229, com a redação seguinte: “A indenização acidentária não exclui a do
direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador.”
A partir dessa súm ula do STF, o debate nos tribunais nas ações
indenizatórias passou a ser o grau de culpa do empregador no acidente, uma

(9) Disponível em: < http://www.stf.gov.br>.


82 S e b a s t iã o G eraldo de O liv e ir a

vez que somente nas hipóteses de culpa grave comprovada é que caberia a
indenização por responsabilidade civil, acum ulada com os benefícios
acidentários.

Após a revogação do Decreto-lei n. 7.036/1944 pelo Decreto-lei n. 293,


de 28 de fevereiro de 1967, sobreveio o questionamento se ainda seria
aplicável o verbete da Súmula n. 229, já que as leis acidentárias posteriores
(Leis ns. 5.316/1967 e 6.367/1976) silenciaram a respeito da responsabilidade
civil patronal, não repetindo o preceito que constava no art. 31 do Decreto-lei
n. 7.036/1944 retrocitado, que havia inspirado o entendimento sumulado. O
STF, no entanto, manteve o posicionamento cristalizado na Súmula n. 229,
reafirmando que cabia a indenização por responsabilidade civil nos casos de
dolo ou culpa grave do empregador no acidente do trabalho, sem dedução
dos benefícios acidentários recebidos, conforme se verifica nos seguintes
acórdãos:
“ Ementa: Responsabilidade civil por ato ilícito. Não é de se deduzir do quantum da
in d e n iz a ç ã o a im p o rtâ n c ia c o rre s p o n d e n te a b e n e fíc io p re v id e n c iá rio , d ire ito
inalienável da fam ília do contribuinte. Recurso extraordinário conhecido, à vista do
dissenso de julgados, negando-se-lhe, porém, acolhida.” STF. 1ã Turma. RE n. 79.446,
Rei.: Ministro Djaci Falcão, DJ 08 jan. 1975.

“ Em enta: A cid ente do trabalho . Indenização de d ireito com um . Súm ula 229.
Perm anece válida a S úm ula 229, ainda sob a vigência da legislação acidentária
p o s te rio r à q u e la da su a fo rm u la ç ã o e re fe rê n c ia . R e cu rso e x tra o rd in á rio não
conhecido.” STF. 1ã Turma. RE n. 92.093/SP, Rei.: Ministro Rafael Mayer, DJ 19 fev.
1982.

“Ementa: Recurso extraordinário. A indenização acidentária não exclui a de direito


comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador. Súm ula 229. Não cabe
deduzir, do montante dessa indenização de direito comum, o valor da indenização,
com apoio na legislação da infortunística. Dissídio de jurisprudência dem onstrado.
D ivergência do acórdão com a S úm ula 229. R ecurso extra o rd iná rio conhecido e
provido para, a fastada a carência da ação, d e te rm in ar se prossiga na dem anda
ajuizada” . STF. 1B Turma. RE n. 107.861, Rei.: Ministro Néri da Silveira, julgado em 04
dez. 1987, DJ 13 set. 1991.

Na Assembleia Nacional Constituinte instalada em 1987, a questão dos


acidentes do trabalho foi bastante debatida, especialm ente diante das
estatísticas absurdas de mortes, doenças ocupacionais e aposentadorias
por invalidez no Brasil. O avanço para um Estado Democrático de Direito não
poderia ignorar a situação aflitiva das vítimas dos infortúnios laborais. A
ampliação da responsabilidade civil, para abranger qualquer acidente em que
o empregador tenha contribuído com dolo ou culpa de qualquer grau, foi inserida
no projeto da Constituição de 1988, desde a Subcomissão até a Comissão de
Sistem atização. Todavia, no substitutivo apresentado pelo “Centrão” , a
redação foi alterada, limitando-se a prever “o seguro contra acidentes do
trabalho a cargo do empregador” .
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D o e n ç a O c u p a c io n a l 83

Para restabelecer o texto da Comissão de Sistematização, quando da


votação do projeto em plenário, o Deputado Constituinte Nélson de Carvalho
Seixas apresentou destaque com emenda aditiva, propondo acrescentar a
seguinte expressão: sem excluir a indenização a que este está obrigado,
quando incorrer em dolo ou culpa". No encaminhamento da votação, este
destaque foi defendido em vibrante discurso pelo Deputado Constituinte
Antônio Carlos Mendes Thame, que enfatizou:

A realidade é que o Brasil registra um dos mais altos índices de


acidentes do trabalho. Não vou aqui repetir estatísticas, mostrar o número
de casos fata is, ou descreve r os riscos a que se subm etem os
trabalhadores brasileiros, gerando milhares de leucopênicos por benzeno,
ou vítimas da contaminação por chumbo, asbesto, xilol ou sílica. Venho
apenas defender a emenda que repõe no texto, além do seguro contra
acidentes do trabalho, a cargo do empregador, a ‘indenização no caso
de dolo ou culpa do em pregador’. (...) Defendemos uma Constituição
em que haja uma escala de prioridades: em primeiro lugar o homem, em
segundo a produção e em terceiro a propriedade. E quando colocamos
na Carta Magna um dispositivo como este que vamos agora votar,
estamos dizendo que acima da produção está o homem, criado à imagem
e sem elhança de Deus. Quando contratamos um homem, estamos
admitindo um eletricista, um maquinista, um torneiro, um pedreiro, um
carpinteiro, e não um provador de benzeno. O que a emenda propõe é
pouquíssimo, é quase nada. É menos do que já existe para o meio
ambiente. Peço que todos analisem esta emenda (...). É este o apelo
que faço aos Constituintes, e tenho certeza de que todos aqui estão,
independentemente da sua orientação ideológica, imbuídos do desejo
de se fazer uma Constituição que corresponda realmente aos anseios
legítimos da maioria da população brasileira”(10).

A emenda aditiva teve aprovação consagradora, com 389 votos sim,


apenas 2 não e 5 abstenções e seu texto foi incorporado na Constituição com
a seguinte redação:
“Art. 7°. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social: (...) XXVIII — seguro contra acidentes de trabalho, a
cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando
incorrer em dolo ou culpa” .

Observe-se que o dispositivo constitucional alargou sobremaneira o


campo da responsabilidade civil quando não qualificou a culpa do empregador
no acidente, pelo que é imperioso concluir que todas as suas espécies ou
graus geram o direito à indenização. Restou ampliado e, portanto, superado o

(10) Cf. CONGRESSO NACIONAL. Diário da Assem bleia Nacional Constituinte de 26 fev.
1988, p. 7.673.
84 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

entendim ento da Súmula n. 229/STF, que só deferia a indenização ao


acidentado no caso de dolo ou culpa grave. Desse modo, desde a Constituição
de 1988, havendo culpa do empregador, de qualquer espécie ou grau, mesmo
na hipótese de culpa levíssima<11), o acidentado faz jus à indenização(12).

Em sintonia com o preceito constitucional, o art. 121 da Lei n. 8.213/


1991 prevê que: “o pagamento, pela Previdência Social, das prestações por
acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de
outrem.”<13)

4.4. Cumulação com os benefícios acidentários

A responsabilidade civil do empregador, decorrente do acidente do


trabalho, não gera mais resistência, especialmente diante do peso e dimensão
do preceito constitucional do art. 7Q, XXVIII. Todavia, percebem-se, ainda,

(11) "Responsabilidade civil. Ação de indenização. A cidente do trabalho. Perda auditiva.


Culpa do em pregador. \ — Consoante firm e orientação jurisprudencial da Corte, com o
advento da Lei n. 6.367/76 passou a não prevalecer as disposições da Súmula n. 229/STF,
que exigia culpa grave do em p re g ad o r para en se jar d ire ito re p aratório d e corrente de
acidente do trabalho, sendo suficiente a sua concorrência com culpa, em qualquer grau,
ainda que leve. II — No caso em análise, o conjunto das provas demonstra que a perda da
capacidade auditiva do recorrente se desenvolveu em decorrência do ambiente insalubre
e da falta de proteção adequada, m otivados por negligência da em presa recorrida, que
deve, por isso, ser responsabilizada. Recurso especial provido.” STJ. 3- Turma. REsp n.
512.393/SP, Relator p/ Acórdão: Ministro Castro Filho, DJ 11 ago. 2007.
(12) Assinala Ricardo Bechara Santos que, “em não medindo a culpa, o legislador constituinte
deixa patente que o empregador responderá até mesmo por culpa levíssima, voltando a lhe
incom odar os preceitos da responsabilidade civil do direito comum , segundo os quais o
menor pecadilho de culpa gera obrigação de indenizar, desde que assentado o tripé ato
ilícito, dano e nexo de causalidade” . Cf. O seguro de responsabilidade civil do empregador
e a nova Carta Constitucional de 1988, dolo e cuipa. Revista Forense, Rio de Janeiro, v.
304, p. 347, out./dez. 1988.
(13) “ Indenização p o r danos m ateriais e m orais decorrentes de acidente do trabalho —
A tu a lm e n te , e s tá p a c ific a d a a c o n tro v é rs ia so b re o c a b im e n to da re p a ra ç ã o c iv il
independentem ente da indenização acidentária a cargo da Previdência Social. Desde o
Decreto-lei n. 7.036/44, teve início a previsão legal da reparação civil nos casos de acidente
do trabalho e situações equiparadas, quando o em pregador agia com dolo. A Súmula n.
229 do STF estendeu o direito à indenização quando o empregador tivesse dolo ou culpa
grave no evento. A C onstituição da R epública de 1988 dissipou as dúvidas a respeito,
prevendo o dire ito do em pregado ao seguro co n tra a cidente do trabalho, a cargo do
empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo
ou culpa (art. 7e, XXVIII), sem qualificar a natureza dessa culpa. Assim, mesmo na culpa
levíssima é cabível a indenização. Finalmente, o art. 121 da Lei n. 8.213/91, estabeleceu
que ‘o pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não
exclui a responsabilidade civil da em presa ou de outre m ’ , não havendo mais qualquer
dúvida de que as reparações são distintas e podem ser acum uladas.” Minas Gerais. TRT 3®
Região. 3* Turma. RO n. 10821/01, Rei.: Sebastião Geraldo de Oliveira, DJ 27 nov. 2001.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 85

hesitações ou incompreensões no que tange à cumulação das reparações


civis com os b e n e fício s a cid e n tá rio s . A inda e n co n tra m o s acórdã os
determinando a dedução dos valores recebidos do INSS na apuração dos
danos materiais fixados, com o argumento básico de que a vítima não deveria
ter um acréscimo de rendimento por causa do acidente, bastando a reposição
do nível de renda anterior. Aduzem outros que a reparação não pode ser
superior ao limite do dano causado, razão pela qual, no cálculo da indenização,
dever-se-ia deduzir o valor dos benefícios acidentários.
Cabe, portanto, a pergunta: qual o fundamento lógico e jurídico dessa
cum ulação? A resposta m erece algum a profund am e nto para m elhor
compreensão.

O empregado acidentado recebe os benefícios da Previdência Social,


cujo pagamento independe da caracterização de culpa, já que a cobertura
securitária está fundamentada na teoria da responsabilidade objetiva. E pode
receber, também, as reparações decorrentes da responsabilidade civil, quando
o empregador tiver dolo ou culpa de qualquer grau na ocorrência, com apoio na
responsabilidade de natureza subjetiva. Como registra o texto da Constituição,
a cobertura do seguro acidentário não exclui o cabimento da indenização(14).

Anota Teresinha Lorena Saad que “a reparação infortunística decorre


da teoria do risco, amparada pelo seguro social a cargo da Previdência Social,
enquanto a responsabilidade civil comum tem como supedâneo a culpa do
patrão ou seu preposto. As causas e os sujeitos passivos da obrigação de
reparar são distintos.”(15> Para José Luiz Dias Campos, “a ação de acidente
do trabalho, por ser de natureza alimentar é compensatória e a responsabili­
dade civil é indenizatória, visando restabelecer a situação existente e anterior
ao dano.”(16)

Discorrendo sobre o assunto, assinala Cretella Júnior que “a culpa é


vinculada ao homem, o risco é ligado ao serviço, à empresa, a coisa, ao

(14) No julgam ento da A pelação Cível n. 127.911.4, a C âm ara Civil do T ribunal de


Alçada de Minas Gerais registrou a diversidade dos fundam entos da ação acidentária e de
re s p o n s a b ilid a d e c iv il: “A p rim e ira — a c id e n tá ria — p ro p ria m e n te d ita , re s u lta da
responsabilidade social do indivíduo, na sociedade, pelo vínculo empregatício, e garantia
do obreiro e sua família, independentemente de culpa ou dolo do patrão. Na segunda ação,
a indenização ou pensionam ento do empregado ou de sua família, depende da comprovação
da ilicitude, culpa ou dolo, na conduta do patrão.” Minas Gerais. TAMG. 1ã Câm. Cível. Rei.:
Juiz Páris Pena, julgado em 29 set. 1992, Revista de Julgados do TAMG, Belo Horizonte, v.
48, p. 148, jul./set. 1992.
(15) SAAD, Teresinha L. P. R esponsabilidade civil da empresa nos acidentes do trabalho.
3. ed. São Paulo: LTr, 1999. p. 241.
(16) CAMPOS, José Luiz Dias. Responsabilidade civil e criminal decorrente do acidente do
trabalho na C onstituição de 1988 — Ação civii pública — M inistério Público e o ambiente
do trabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 52, n. 12, p. 1.429, 1988.
86 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

aparelhamento. A culpa é pessoal, subjetiva; pressupõe o com plexo de


operações do espírito humano, de ações e reações, de iniciativas e inibições,
de providências e inércias. O risco ultrapassa o círculo das possibilidades
humanas para filiar-se ao engenho, à máquina, à coisa, pelo caráter impessoal
e objetivo que o caracteriza.”(17)
A cobertura acidentária pelo INSS deslocou a natureza contratual do
seguro de acidente do trabalho para um sistem a de seguro social, de
solidariedade mais ampla, cujos benefícios são concedidos ao acidentado
independentemente da prova de culpa, já que qualquer trabalho, de certa forma,
implica riscos. Não se deve esquecer, ademais, de que o trabalhador também
contribui para a Previdência Social e a empresa paga um percentual a mais
para financiar os benefícios acidentários. Esse seguro social obrigatório,
entretanto, não exime o empregador do dever de diligência, de garantir o direito
ao ambiente de trabalho saudável e à redução dos riscos inerentes ao trabalho,
por meio de normas de saúde, higiene e segurança, conforme previsto no art.
7° XXII, da Constituição Federal. Cabe citar neste sentido a lição de Teresinha
Lorena Saad:
“Quando uma vida é ceifada ou uma invalidez é determinada, prematu­
ramente, e de modo definitivo, pela conduta negligente ou imprudente
daquele que tem a obrigação de zelar pela segurança física do seu em­
pregado, a responsabilidade migra para o campo do direito comum,
levando para o passivo da empresa toda a dimensão do dano e a indeni­
zação conseqüente. Indeniza o empregador não pelo risco (elemento
intrínseco de seu empreendimento), pois esse é ressarcido dentro das
fronteiras securitárias, mas pela ilicitude da sua conduta.”(18)
Assim, quando o empregador descuidado dos seus deveres concorrer
para o evento do acidente com dolo ou culpa, por ação ou omissão, fica
caracterizado o ato ilícito patronal, gerando o direito à reparação, independente
da cobertura acidentária. Pode-se concluir, portanto, que a causa verdadeira
do acidente, nessa hipótese, não decorre do exercício regular do trabalho,
mas do descumprimento dos deveres legais de segurança, higiene e prevenção
atribuídos ao empregador.
Com a transposição da competência para julgar as ações de indenização
por acidente do trabalho da Justiça Comum dos Estados para a Justiça do
Trabalho, determinada pela Emenda Constitucional n. 45/2004 e consolidada
com o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, no histórico julgamento

(17) CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira de 1988. 2. ed. Rio
de Janeiro: Forense Universitária, 1991. v .2, p. 1019.
(18) SAAD, Teresinha L. P. A indenização devida ao acidentado do trabalho. Revista de
Previdência Social, São Paulo, v. 20, n. 183, p. 111, 1996.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 87

do Conflito de Competência n. 7.204, ocorrido em 29 de junho de 2005, algumas


questões que estavam pacificadas na jurisprudência voltaram a ser agitadas
ou revisitadas.

Dentre as controvérsias já superadas no âmbito da Justiça Comum pode


ser citada esta questão do acúmulo da indenização por acidente do trabalho
com os benefícios previstos na lei acidentária. Alguns juizes trabalhistas, ao
tomarem contato com os assuntos desta nova competência, estão hesitantes
quanto ao cabimento dessa cumulação, indagando se não seria o caso de,
pelo menos, com pensar os valores pagos pelo INSS para evitar que o
acidentado venha a obter um padrão de renda superior ao que detinha antes
do acidente.
A prudência recomenda que, antes de adotar posicionamento sobre essa
questão, é conveniente verificar a evolução doutrinária e jurisprudencial a
respeito, construída ao longo de várias décadas no âmbito da Justiça Comum.
Os institutos jurídicos normalmente demandam longo período de maturação
até sedimentarem uma diretriz que ofereça segurança e previsibilidade para
os operadores jurídicos. A leitura do tópico anterior (item 4.3, supra) demonstra
as diversas etapas da evolução legislativa a respeito da cumulação dos
benefícios acidentários com a indenização por responsabilidade civil do
empregador.

A cumulação, que já era pacífica na jurisprudência anterior, ganhou status


de garantia constitucional em 1988, porquanto ficou assegurado no art. 7S,
XXVIII, da Constituição que a cobertura do seguro acidentário não exclui o
cabimento da indenização, nos casos de dolo ou culpa do empregador.

Uma vez fixada a diretriz constitucional pela cumulação, ficou superada


também a pretensão do empregador de compensar a parcela recebida pela
vítima, ou seus dependentes, da Previdência Social, porquanto o deferimento
de um direito não exclui, nem reduz o outro. O seguro acidentário destina-se
a proteger a vítima e não diminuir ou substituir a obrigação do empregador de
reparar o dano causado pelo acidente ocorrido por sua culpa ou dolo. O fato
gerador da indenização não foi, a rigor, o exercício do trabalho, mas o com­
portamento ilícito do patrão.
É oportuno lembrar que o acidentado que ficou inválido também contribuía
para a Previdência Social e poderia, depois de aposentado por tempo de
contribuição, exercer outra atividade remunerada, o que não mais ocorrerá
pelo advento do acidente. Pode até acontecer que o acidentado já esteja
aposentado, mas continua em atividade, não havendo razão lógica para
determinar a compensação do valor daquele benefício previdenciário. Vale
registrar, ainda, a situação do empregado doméstico, que nem mesmo está
acobertado pelo seguro de acidente do trabalho, mas, quando for acometido
88 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

de qualquer incapacidade laboral em razão de acidente em serviço, recebe


os benefícios do INSS, não havendo por que se falar em compensação.

Por outro lado, o seguro de acidente do trabalho no Brasil, apesar da


denominação, não tem natureza jurídica nem conteúdo de seguro propriamente
dito. Não obstante o título de “seguro”, só garante ao acidentado um benefício
estrito de cunho alimentar. O seguro de acidente do trabalho não contempla
indenização alguma, nem determina reparação dos prejuízos sofridos; apenas
são concedidos benefícios para garantir a sobrevivência da vítima e/ou seus
dependentes, como ocorre com todos os demais segurados da Previdência
Social.

Também do ponto de vista da doutrina mais autorizada, está pacificado


o entendimento no sentido do cabimento da indenização por responsabilidade
civil, acumulada com os benefícios acidentários, sem compensação alguma,
como se verifica nas seguintes transcrições:

1. Miguel Serpa Lopes: “Em síntese, as condições gerais para que se dê


a compensatio lucri cum damno são as seguintes: a) os lucros e os
prejuízos devem provir do mesmo ato ilícito; b) o ato ilícito deve ser
realmente a causa tanto dos prejuízos como dos lucros a compensar e
não somente a ocasião em que surgem; c) que não esteja excluída por
algum princípio legal. Vejamos algumas questões práticas. No caso de
liberalidades ou subscrições públicas, se o lesado for assim favorecido,
todos são unânimes em recusar a aplicação da compensatio, pois se
trata de benefícios eventuais, sem nenhuma conexão com o fato causador
do dano.

Pela mesma razão não se leva em conta o que a vítima recebeu em


razão de um seguro pessoal, seja de vida ou de outra qualquer natureza,
atento a que a indenização não resultou do ato ilícito, o qual apenas
atuou como uma ocasião e não como uma causa. Além disso, a noção
de contrato de seguros em relação à saúde, à vida ou à integridade da
pessoa humana, constitui um valor inestimável, para o qual não há limite
prefixado. Diferente é o caso de seguro de coisa, mas aí não se trata de
compensatio, senão da sub-rogação. (...)

Se, para que se dê a compensatio lucri cum damno se torna necessário


que lucro e prejuízo decorram ambos do fato ilícito, não há como se
escapar desse requisito, abrindo-se uma exceção, no caso de ter a vítima
ou os seus herdeiros uma pensão de aposentadoria. A ideia de que a
vítima irá lucrar com essa cumulação se esboroa ante esta: transferir o
lucro de um lado para colocá-lo a serviço do causador do dano. Planiol,
Ribert e Esmein se baseiam numa jurisprudência a esse respeito, que
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 89

autoriza a sub-rogação da entidade responsável nos direitos da vítima


ou de seus herdeiros.”(19)

2. Teresinha Lorena Saad: “A indenização civil nada tem que ver com os
benefícios acidentários, conforme os seguintes fundamentos da referida
Turma Especial do TJSP — Uniformização de jurisprudência (Ap. 38.705-
1, Turma Especial da 1ã Seção Civil, julgado em 19.10.84 — Rei.: Des.
Alves Braga). ‘Houve, sem dúvida, uma socialização do risco por acidente
do trabalho, embora com participação maior do empregador. E nessa
socialização, tam bém o próprio acidentado participa do rateio do
respectivo custeio... O que é exclusivo do em pregador é apenas o
acréscimo necessário para a cobertura dos danos, segundo os cálculos
atuariais. E de todos os empregadores do país, e não apenas daquele
cujo empregado vier a sofrer o acidente. Entram na composição do
m ontante necessário para custear os encargos respeitantes aos
acidentes do trabalho, como é clara a disposição legal, também as
contribuições previdenciárias a cargo da União (coletividade), da empresa
(todos os empregadores) e do segurado (de todos os segurados e não
apenas do acidentado), o que dá bem a ideia da socialização do risco.
Os benefícios cobertos com participação tão ampla não podem ser
invocados pelo empregador quando de sua eventual responsabilidade
civil perante o acidentado’.
Esses argumentos colhidos na jurisprudência de São Paulo são extre­
mamente importantes para o deslinde da controvérsia, pois, a nosso
ver, neles reside a resposta fundamental ao tema.

Havendo dolo ou culpa na ocorrência infortunística, pode o acidentado,


ou seus b e n e ficiá rio s, no caso de m orte dele, recebe r as duas
reparações, sem compensação. São direitos autônomos fundados em
pressupostos diferentes: a prestação pecuniária acidentária coberta
pelas contribuições e paga pela Previdência Social, que responde por
obrigação própria, e a indenização civil reparadora do dano decorrente
do ato ilícito.”(20)

3. Sebastião Luiz Amorim e José de Oliveira: “Não há falar em ‘compen­


sação’ dos valores da indenização com a aposentadoria por invalidez
recebida pelo acidentado do INSS. Como é sabido, o benefício acidentário
tem fundamento na responsabilidade objetiva (ou sem culpa) da autar­

(19) LOPES, Miguel Maria da Serpa. Curso de direito civil. 5. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1989. v. II: Obrigações em geral, p. 386 e 387.
(20) SAAD, Teresinha Lorena Pohlmann. Responsabilidade civil da empresa nos acidentes
do tra b a lh o : c o m p a tib ilid a d e da in d e n iz a ç ã o a c id e n tá ria com a de D ire ito C om um ,
Constituição de 1988 — art. 7- , XXVIII. 3. ed. São Paulo: LTr, 1999. p. 242-243.
90 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

quia. A indenização a cargo da empresa, de outro lado, no art. 159 do


Código Civil, estando a obrigação de indenizar fundada na culpa (res­
ponsabilidade subjetiva). (....)
A pensão mensal é devida, pois, sendo consequência da culpa dos réus,
não encontra óbice à sua concessão o fato de estar o autor amparado
pela Previdência Social.
A indenização securitária prestada pelo INSS por acidente do trabalho
não é compensável com a indenização devida pela empresa (por ato
ilícito) em decorrência de sua responsabilidade civil, em razão da di­
versidade de causas e, mais, a responsabilidade do INSS é objetiva
(responsabilidade sem culpa), e a responsabilidade do patrão está fun­
damentada na culpa, ainda que leve.
A indenização em razão do dano culposo ou doloso do empregador é de
natureza diferente daquela paga pelo INSS; diferem quanto a sua natureza
e destinação.”(21)
4. Carlos Roberto Gonçalves: “Não se reduzem da indenização as
quantias recebidas pela vítima, ou seus beneficiários, dos institutos
previdenciários ou assistenciais. O entendimento generalizado na doutrina
é o de que a indenização decorrente de um montepio ou de uma pensão
vitalícia não mantém com o fato determinador do prejuízo qualquer relação
de causalidade, senão apenas de ‘ocasião’.”(22)
5. Rui Stoco: “O artigo 7Q, inciso XXVIII, da Constituição Federal de 1988
dispõe ser direito dos trabalhadores urbanos e rurais, o ‘seguro contra
acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização
a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa’. Como se
verifica, prevê, ainda, o direito do trabalhador de ser indenizado em caso
de acidente do trabalho quando decorra de dolo ou culpa do empregador.
(...). Essa indenização é independente do seguro-acidente, como visto
anteriormente, com ele não se confunde e não será deduzida do valor da
indenização do direito comum, conform e Súm ula 229 do Colendo
Supremo Tribunal Federal.”(23)
6. Arnaldo Rizzardo; “Justamente em face do caráter indenizatório da
responsabilidade não se dá a compensação com outras quantias que
recebe a vítima, ou que passam para os dependentes da mesma.

(21) AM ORIM , S ebastião Luiz; OLIVEIRA, José de. R esponsabilidade civil: acidente do
trabalho: indenização acidentária do direito comum: comentários, jurisprudências, casuística:
interpretação jurisprudencial. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 434.
(22) G O NÇALVES, C arlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 569-570.
(23) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011. p. 714-715.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 91

Trata-se de um dos assuntos mais pacíficos na jurisprudência e na


doutrina, consagrando-se, à unanimidade, a soma de indenizações
previdenciárias, como pensão, seguro, verba recebida a título de acidente
do trabalho, com a indenização determinada pelo ato determinante da
indenização.

As diferentes indenizações demandam de causas distintas, apresen­


tando, pois, naturezas próprias, não se confundindo uma com a outra. A
reparação por acidente do trabalho, devida se a vítima foi colhida en­
quanto estava a serviço do empregador, emerge do seguro social. A
pensão, a cargo da Previdência Social, corresponde a prestações des­
contadas por ela. Nem o valor do seguro particular é dedutível, porque
decorre dos prêmios ou contribuições que o falecido recolhia à entidade.
De forma que os benefícios concedidos pelos órgãos previdenciários
são correspectivos das contribuições pagas pela vítima. Devem rever­
ter em favor de seus beneficiários, e não do ofensor, mitigando a sua
responsabilidade.
Diversas sendo as fontes de que procedem as contribuições, não se
destinam a reembolsar os prejuízos pelo fato ilícito, pois foram estabele­
cidas para favorecer o lesado ou seus dependentes, e não o causador
do dano.”(24)

7. Sérgio Cavalieri Filho: “O seguro contra acidente do trabalho não


exonera de responsabilidade o empregador se houver dolo ou culpa de
sua parte. (...) Tem os, assim , por força de expresso dispositivo
constitucional, duas indenizações por acidente do trabalho, autônomas
e cumuláveis. A acidentária, fundada no risco integral, coberta pelo seguro
social e que deve ser exigida do INSS. Mas, se o acidente do trabalho
(ou doença profissional) ocorrer por dolo ou culpa do empregador, o
empregado faz jus à indenização comum ilimitada. Noutras palavras, o
seguro contra acidente do trabalho só afasta a responsabilidade do
empregador em relação aos acidentes de trabalho que ocorrerem sem
qualquer parcela de culpa; se houver culpa, ainda que leve (e esta deve
ser provada), o empregador terá a obrigação de indenizar.”(25)

O C olendo S u perior T ribunal de Justiça, que, antes da Em enda


Constitucional n. 45/2004, era a Corte que unificava a jurisprudência a respeito
deste tema, sintonizado com o entendimento do Supremo Tribunal Federal,
reiteradamente vem se posicionando no sentido de que a indenização devida

(24) RIZZARDO, Arnaldo. R esponsabilidade civil: Lei n. 10.406, de 10.1.2002. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 908.
(25) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 158.
92 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

pelo empregador é autônoma em relação aos direitos concedidos pelo seguro


de acidente do trabalho, razão pela qual é cabível a cumulação e sem qualquer
dedução ou compensação.

Uma am ostra da ju risp ru d ê n cia do STJ dos últim os anos revela


claramente como o assunto está cristalizado naquela Corte:
“Civil e trabalho. Responsabilidade civil e por acidentes do trabalho. Indenizações
cumuladas. Jurisprudência do STJ. A jurisprudência do STJ assentou entendimento
no sentido de que a indenização acidentária não obsta a de direito comum, quando o
empregador incorre em culpa grave, nem a da incapacidade para o trabalho e a da
depreciação sofrida excluem a devida em razão do dano estético e, enfim, do valor da
indenização comum não se deduz a recebida em razão da legislação infortunística.
Inteligência do art. 1.538 do Código Civil” . STJ. 3ã Turma. REsp n. 35.120/RS, Rei.:
Ministro W aldem ar Zveiter, julgado em 21 set. 1993, DJ 25 out. 1993.

“Civil e Processual. Agravo regimental em agravo de instrumento. Ação rescisória.


Dedução do q u a n tu m devido por força do ilícito civil. Impossibilidade. I. A orientação
fixada no Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em face da diversidade de
suas origens — uma advinda de contribuições específicas ao INSS e outra devida
pela prática de ilícito civil — não pode haver, no pagamento desta úitima, dedução de
quaisquer parcelas pagas à vítim a a título de benefício previdenciário. II. Precedentes
do STJ. III. Agravo regimental improvido” . STJ. 4- Turma. AgRg no Ag. n. 540.871/PR,
Rei.: Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ 22 mar. 2004.

“A d m in istrativo e p ro cessual civ il. R esp o n s a b ilid a d e civil do estado. A ção


in d e n iz a tó ria . D a n o s m a te ria is c u m u la ç ã o com p e n s ã o p r e v id e n c iá r ia .
Possibilidade. A jurisprudência desta Corte é disposta no sentido de que o benefício
previdenciário é diverso e independente da indenização por danos materiais ou morais,
porquanto, ambos têm origens distintas. Este, pelo direito comum; aquele, assegurado
pela Previdência. A indenização por ato ilícito é autônom a em relação a qualquer
benefício previdenciário que a vítim a receba. Precedentes: REsp 823.137/MG, Relator
Ministro Castro Filho, Terceira Turma, DJ 30.6.2006; REsp 750.667/RJ, Relator Ministro
Fernando G onçalves; Q uarta Turm a, DJ 30.1 0 .2 0 0 5 ; REsp 575.839/E S , R elator
M inistro A ldir Passarinho Junior, Q uarta Turm a, DJ 14.3.2005; REsp 133.527/RJ,
R elator Ministro Barros Monteiro, Q uarta Turm a, DJ 24.2.2003; REsp 922.951/RS,
Rei. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 10.2.2010. Agravo regimental improvido.”
STJ. 2ãTurma. AgRg no AgRg no REsp n. 1292983/AL, Rei.: Ministro Humberto Martins,
DJ 7 mar. 2012.

Também na Justiça do Trabalho, apesar de algumas hesitações iniciais


logo após a vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004, o entendimento é
no sentido de rejeitar a pretensão patronal de compensar, no arbitramento do
valor da indenização, o benefício que o acidentado recebe da Previdência
Social. Oportuno transcrever algumas ementas do TST:
“Embargos. Doença ocupacional. Danos materiais. Indenização / pensão vitalícia
paga pelo em p reg ad or e pensão paga pelo INSS. C um ulação. P ossibilidade.
Recurso de revista conhecido e provido. A jurisprudência do c. TST já se firmou no
sentido de que é possível a cumulação do pagamento de indenização (pensão vitalícia),
a in d a que o e m p re g a d o que s o fre u a c id e n te de tra b a lh o p e rc e b a b e n e fíc io
previdenciário. O fundam ento tem como suporte a literalidade do art. 950 do Código
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 93

Civil. Ainda assim, é de se verificar que decisão que não reconhece a possibilidade
de cum ulação entre o benefício p revidenciário (seguro por acidente de trabalho)
cumulado com a indenização pelo pagamento de pensão ao empregado acidentado,
viola a literalidade do art. 7-, XXVIII, da Constituição Federal que dá suporte ao direito
instituído na norm a legal, quando assegura seguro contra acidentes de trabalho, a
cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando
incorrer em dolo ou culpa. Correta a decisão da c. Turma do TST que, apreciando o
tem a, reconhece v io la ç ã o lite ra l do art. 7-, X X V III, da C arta M agna. E m bargos
conhecidos e desprovidos.” TST. SDI-1. E-ED-RR n. 31840-88.2006.5.05.0281, Rei.:
Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, DJ 17 ago. 2012.

“Recurso de Em bargos interposto na vigência da Lei n. 11.496/2007. Doença


profissional. Danos patrim oniais. Pagam ento de pensão mensal. Os proventos
recebidos mensalm ente do INSS, pela vítim a do acidente do trabalho ou por seus
dependentes, não devem ser com pensados ou deduzidos do valor da indenização
por responsabilidade civil atribuída ao em pregador. Além dos fundam entos legais
(art. 7-, XXVIII, da Constituição Federal de 1988 e art. 121 da Lei n. 8.213/1991), a
controvérsia está solucionada no Supremo Tribunal Federal por intermédio da Súmula
n. 229. Ademais, este entendimento está uniform emente pacificado na doutrina mais
autorizada a respeito e na torrencial jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,
assim com o deste Tribunal S uperior do Trabalho, conform e precedentes recentes
tra n s c rito s . R ecurso de E m bargos co n h e c id o por d iv e rg ê n c ia ju ris p ru d e n c ia l e
desprovido.” TST. SDI-I. E-ED-RR n. 162700-86.2005.5.15.0071, Rei.: Desembargador
Convocado Sebastião Geraldo de Oliveira, DJ 9 jan. 2012.

“Recurso de revista. Danos materiais. Lucros cessantes. Pensão. Cum ulatividade


da pensão paga pelo em pregador com benefício previdenciário. A indenização
decorrente de acidente de trabalho não pode ser compensada com o auxílio-acidentário
pago pela Previdência Social, à luz do próprio art. 79, XXVIII, da Carta Magna que
garante ao empregado seguro contra acidente de trabalho, a cargo do empregador,
sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou
culpa. C om o pontu a a m e lh o r d o u trin a , ‘O a cid e n ta d o que fico u com in va lid e z
perm anente tam bém c o n trib u ía para a P re vid ê ncia Social e p oderia, d epois de
aposentado por tem po de contribuição, exercer outra atividade rem unerada, o que
não mais ocorrerá pelo advento do acidente. Pode até acontecer que o acidentado já
e steja ap osentado, mas co n tin u a em a tivid a de , não havendo razão lógica para
determ inar a com pensação do valor daquele benefício previdenciário. (...) O seguro
de acidente do trabalho no Brasil, apesar da denominação, não tem natureza jurídica
nem conteúdo de seguro propriamente dito. Apesar da denominação — seguro — , só
garante ao acidentado um benefício estrito de cunho alimentar. O seguro de acidente
do tra b a lh o não co n te m p la in d e niza çã o algum a, nem d e te rm in a re p a ra ção dos
prejuízos sofridos; apenas são concedidos benefícios para garantir a sobrevivência
da vítim a e/ou seus dependentes, como ocorre com todos os demais segurados da
P revidência S o cia l’ (S ebastião G eraldo de O liveira, Indenização por acidente do
trabalho ou doença ocupacional. 4. ed. São Paulo: LTr, 2008). (...) Recurso de revista
conhecido e provido.” TST. 3ã Turm a. RR n. 369/2007-005-24-00.8, Rei.: Ministra
Rosa Maria Weber, 3ã Turma, DJ 6 nov. 2009.

A título de conclusão, por tudo que foi exposto, pode-se afirm ar


seguramente que os proventos recebidos mensalmente do INSS, pela vítima
do a cid e n te do tra b a lh o ou por seus d e p e n d e n te s, não devem ser
compensados ou deduzidos do valor da indenização por responsabilidade
94 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

civil atribuída ao empregador. Além dos fundamentos legais (art. 7-, XXVIII,
da Constituição de 1988 e art. 121 da Lei n. 8.213/1991), a controvérsia está
solucionada no Supremo Tribunal Federal por intermédio da Súmula n. 229.
Ademais, este entendimento está uniformemente pacificado na doutrina mais
autorizada a respeito e na torrencial jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça e dos Tribunais de Justiça dos Estados e mais recentemente no Tribunal
Superior do Trabalho.

Aliás, a respeito desse tema foi aprovado por ocasião da 1§ Jornada de


Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, realizada em Brasília
em novembro de 2007, o Enunciado n. 48 com o seguinte teor: “Acidente do
trabalho. Indenização. Não compensação do benefício previdenciário. A
indenização decorrente de acidente de trabalho ou doença ocupacional, fixada
por pensionamento ou arbitrada para ser paga de uma só vez, não pode ser
compensada com qualquer benefício pago pela Previdência Social.”

4.5. Espécies de responsabilidade civil

Para avançarmos no tema deste livro é oportuno indicar, ainda que


sucintamente, as espécies de responsabilidade civil, com as diferenças dos
seus efeitos.

Quem infringe um dever jurídico, causando danos a outrem, responde


pelo ressarcimento do prejuízo. Essa é a ideia central da responsabilidade civil.
O fato gerador do direito à reparação do dano pode ser a violação de um
ajuste contratual das partes ou de qualquer dispositivo do ordenamento jurídico,
incluindo-se o descumprimento do dever geral de cautela. Quando ocorre a
primeira hipótese, dizemos que a responsabilidade é de natureza contratual;
na segunda, denominamos responsabilidade extracontratual ou aquiliana(26).
A indenização por acidente do trabalho ou doença ocupacional, em
princípio, enquadra-se como responsabilidade extracontratual porque decorre
de algum comportamento ilícito do empregador, por violação dos deveres

(26) A denom inação “ re sp o nsabilidade a q u ilia n a ” com o sinônim o de responsabilidade


extracontratual tem origem na antiga “Lex Aquilia” . Essa denominação está ligada ao tribuno
“A quilius” , que propôs um plebiscito por volta do século III a.C. cujo resultado foi pela
aprovação da referida Lei, a qual se tornou, desde os primórdios, o referencial absoluto a
respeito do que se entende por responsabilidade extracontratual. Cf. FRANÇA, Limongi R.
R esponsabilidade aquiliana e suas raízes. In: CAHALI, Y ussef Said. R esponsabilidade
civil: doutrina e jurisprudência. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1988. p. 241 -261, passim. Assegura
Caio M ário que o maior valor da Lei A quilia foi substituir as multas fixas por uma pena
proporcional ao dano causado, abrindo os horizontes da responsabilidade civil, ou seja, o
princípio geral da reparação do dano. Cf. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 4 e 63.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 95

orevistos nas normas gerais de proteção ao trabalhador e ao meio ambiente


jo trabalho. Essa responsabilidade não tem natureza contratual porque não
há cláusula do contrato de trabalho prevendo a garantia de integridade
osicobiofísica do empregado ou da sua incolumidade(27).
No entanto, a classificação de maior importância para o tema deste livro
e aquela formulada quanto ao fundamento da responsabilidade. Nesse aspecto,
a responsabilidade civil pode se apresentar como de natureza subjetiva ou
objetiva.
A responsabilidade será subjetiva quando o dever de indenizar surgir
em razão do comportamento do sujeito que causa danos a terceiros, por dolo
ou culpa. Já na responsabilidade objetiva, basta que haja o dano e o nexo de
causalidade para surgir o dever de indenizar, sendo irrelevante a conduta
culposa ou não do agente causador. É por isso que a responsabilidade objetiva
é também denominada teoria do risco, porquanto aquele que, no exercício da
sua atividade, cria um risco de dano a outrem responde pela reparação dos
prejuízos, mesmo quando não tenha incidido em culpa alguma. É a tendência
apontada por Irineu Strengerde despersonalização da responsabilidade civil(28).
Em resumo, para o implemento da responsabilidade subjetiva é imprescindível
a comprovação da culpa, enquanto que, na responsabilidade objetiva, cabe a
reparação do dano ocorrido tão somente pelo risco da atividade.
A indenização dos danos sofridos por acidente do trabalho tem como
suporte principal a responsabilidade subjetiva, isto é, exige-se a comprovação
da culpa do empregador, de qualquer grau, para gerar o direito da vítima.
Entretanto, há inovações im portantes no campo da responsabilidade de
natureza objetiva que apontam no sentido da socialização dos riscos,
desviando o foco principal da investigação da culpa (dano causado) para o
atendimento da vítima (dano sofrido), de modo a criar mais possibilidades de
reparação dos danos(29).

(27) Há autores que defendem, com argum entos atraentes, a existência de uma cláusula
contratual implícita que garante a incolumidade do empregado, como, por exemplo, o Juiz
do Trabalho José Cairo Júnior na dissertação de mestrado publicada em 2003, com o título
O a c id e n te do tra b a lh o e a re s p o n s a b ilid a d e c iv il do em p re g ad o r, p ela LTr E ditora.
Entendemos, todavia, que a tentativa de adoção da responsabilidade contratual foi uma
etapa para facilitar a prova da culpa por parte da vítim a, im aginando-se uma obrigação
im plícita de seguridade, com o ocorre no contrato de tra n sp o rte s. Da culpa subjetiva,
imaginou-se avançar para a culpa contratual presumida. No entanto, o progresso da teoria
objetiva ou do risco m o stro u -se m ais efica z p ara a p ro te çã o da v ítim a , p o rq u a n to o
pressuposto da culpa fica definitivam ente dispensado, bastando, para gerar a indenização,
a presença do dano e do nexo causal. Por outro lado, se prevalecer o entendim ento da
responsabilidade subjetiva, aquele entendim ento poderá prosperar.
(28) STRENGER, Irineu. R esponsabilidade civil no direito interno e internacional. 2. ed. São
Paulo: LTr, 2000. p. 56.
(29) A questão do cabimento ou não da responsabilidade civil objetiva do empregador com
relação ao acidente do trabalho será tratada no Capítulo 5.
96 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

4.6. Responsabilidade civil subjetiva

O ponto de partida para o cabimento da indenização é o advento do


dano. Centrando-se a análise no tema deste livro, normalmente teremos a
presença do dano quando ocorrer acidente do trabalho ou doença ocupacional.

Pela concepção clássica da responsabilidade civil subjetiva, só haverá


obrigação de indenizar o acidentado se restar comprovado que o empregador
teve alguma culpa no evento, mesmo que de natureza leve ou levíssima. A
ocorrência do acidente ou doença proveniente do risco normal da atividade
da empresa não gera automaticamente o dever de indenizar, restando à vítima,
nessa hipótese, apenas a cobertura do seguro de acidente do trabalho,
conforme as normas da Previdência Social.
O substrato do dever de indenizar tem como base o comportamento
desidioso do patrão que atua de forma descuidada quanto ao cumprimento
das normas de segurança, higiene ou saúde do trabalhador, propiciando, pela
sua incúria, a ocorrência do acidente ou doença ocupacional. Com isso, pode-
-se concluir que, a rigor, o acidente não surgiu do risco da atividade, mas
originou-se da conduta culposa do empregador.

Na responsabilidade subjetiva só caberá a indenização se estiverem


presentes o dano (acidente ou doença), o nexo de causalidade do evento
com o trabalho e a culpa do empregador. Esses pressupostos estão indica­
dos no art. 186 do Código Civil e a indenização correspondente no art. 927 do
mesmo diploma legal, com apoio maior no art. 7-, XXVIII, da Constituição da
República. Se não restar comprovada a presença simultânea dos pressu­
postos mencionados, não vinga a pretensão indenizatória.
Na prática forense tem sido comum, por exemplo, a vítima comprovar
que a doença tem origem ocupacional, mas sem demonstrar nenhuma falha
ou descumprimento por parte da empresa das normas de segurança, higiene
e saúde do trabalhador ou do dever geral de cautela. Nessas hipóteses, ficam
constatados os pressupostos do dano (a doença) e do nexo causal (de origem
ocupacional), mas falta o componente “da culpa” para acolher o pedido
indenizatório. Aliás, essa dificuldade probatória do autor, diante de atividades
empresariais cada vez mais complexas, foi um dos principais motivos para a
eclosão da teoria da responsabilidade civil objetiva, baseada tão somente no
risco da atividade, desonerando a vítima de demonstrar a culpa patronal.
Também gerou o desenvolvimento da teoria da culpa patronal presumida (ou
inversão do ônus da prova), conforme veremos no item 9 do Capítulo 7.

Diante da importância dos três pressupostos mencionados (dano, nexo


causal e culpa), vamos abordá-los em capítulos distintos (vide Caps. 6 a 8)
com o propósito de oferecer exposição detalhada dos pontos controvertidos
e das discussões doutrinárias e jurisprudenciais a respeito.
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 97

4.7. Responsabilidade civil objetiva

Como já mencionado, para o cabimento da indenização com apoio na


teoria da responsabilidade objetiva, basta a ocorrência do dano e a presença
do nexo causal. Atualmente, discute-se intensamente sobre a aplicação ou
não dessa teoria nas indenizações por acidente do trabalho, especialmente
após a vigência do Código Civil de 2002.

Em razão da ampla controvérsia doutrinária e dos diferentes posiciona-


nentos da jurisprudência, resolvemos prestigiar o tema com um capítulo es-
oecífico, para proporcionar abordagem mais elaborada dos diversos ângulos
da questão. Com efeito, no próximo capítulo vamos analisar o cabimento ou
não da responsabilidade civil de natureza objetiva nas indenizações por aci­
dente do trabalho ou doença ocupacional.

4.8. Responsabilidade civil por atos dos empregados ou prepostos

Em regra, responde pela reparação civil o causador do dano. Para as


Indenizações por acid e n te do tra b a lh o ou doe nças o cu p a cio n a is, o
responsável direto é o empregador, mesmo que o acidente provenha de atos
culposos dos seus prepostos ou de outros empregados que estejam no
exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.

No Código Civil de 1916 a responsabilidade pelos atos dos prepostos,


serviçais ou empregados dependia de comprovação de que o empregador
tivesse concorrido com culpa ou negligência para o implemento do dano, con­
forme previa o art. 1.523. Essa exigência, contudo, foi mitigada, em 1963,
quando o Supremo Tribunal Federal adotou a Súmula n. 341 com o seguinte
teor: “Épresum ida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empre­
gado ou preposto”.
O Código Civil de 2002 superou a hesitação do Código anterior e
estabeleceu, sem deixar margem a dúvidas, que o empregador responde pelos
atos dos seus empregados, serviçais ou prepostos desde que estejam no
exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele (art. 932, III). Para
evitar questionamentos e deixar evidente o alcance do preceito, prevê o art.
933 que o empregador responde por tais atos, ainda que não haja culpa de
sua parte. Com efeito, a norma atual foi além da simples presunção de culpa
da Súmula n. 341 do STF, visto que consagrou a responsabilidade patronal
pelo dano culposo causado por seus empregados ou prepostos. Nesse
sentido, cabe registrar um Enunciado aprovado por ocasião da V Jornada de
Direito Civil, promovida em Brasília pelo Centro de Estudos Judiciários do
Conselho da Justiça Federal no ano de 2011, com o seguinte teor:
98 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

“ Enunciado 451 — Arts. 932 e 933: A responsabilidade civil por ato de terceiro funda-
-se na responsabilidade objetiva ou independente de culpa, estando superado o
modelo de culpa presum ida” .

Importa esclarecer, todavia, que o fato de o acidente ter sido provocado


por prepostos ou empregados não implica automaticamente a responsabilidade
prevista no art. 932, III, do Código Civil. O empregador responde objetivamente
pelos danos causados por seus empregados ou prepostos, mas é necessário
verificar se o mencionado dano é mesmo passível de indenização. Se não
estiverem presentes todos os pressupostos da responsabilidade civil, por
ó b vio não cabe a co n d e n a çã o in d ire ta da em p re sa . D esse m odo,
primeiramente é preciso conferir se no momento do acidente o causador do
dano (empregado ou preposto da empresa) estava no exercício do trabalho
que lhe competia ou se atuava em razão do vínculo mantido com o empregador.
Se a resposta for negativa, não haverá nexo causal do dano com o trabalho
e, nessa hipótese, o empregado ou preposto causador do dano responderá
isoladamente pela indenização. Em segundo lugar, pode ser que haja alguma
excludente do nexo causal que exonere de responsabilidade o causador do
acidente — e, consequentemente, também o empregador — , tais como: motivo
de força maior ou caso fortuito, culpa exclusiva da vítima, legítima defesa ou
fato de terceiro. A responsabilidade do empregador é objetiva, conforme art.
932, III, do Código Civil, em relação à reparação que for devida por seu
empregado ou preposto causador do dano, mas não em relação à vítima do
infortúnio.

O empregador responde não só pelos atos ilícitos causados por seus


empregados diretos, mas por todos os trabalhadores que lhe prestem serviços
ou alguma atividade em seu nome ou proveito, pouco importando a natureza
jurídica do vínculo. O vocábulo “prepostos” , indicado no art. 933, III, do Código
Civil, tem sido interpretado com bastante amplitude, entendendo-se como tais
os autônomos, prestadores de serviço em geral, estagiários, cooperados,
mandatários, parceiros, representantes comerciais, dentre outros. É oportuno
citar, neste passo, o magistério de Maria Helena Diniz:

“O preposto ou empregado é o dependente, isto é, aquele que recebe


ordens, sob o poder de direção de outrem, que exerce sobre ele vigilância
a título mais ou menos permanente. O serviço pode consistir numa
atividade duradoura ou num ato isolado (pessoa que se incumbe de
entregar uma mercadoria), seja ele material ou intelectual. Pouco importará
que o preposto, serviçal ou empregado seja salariado ou não; bastará
que haja uma subordinação voluntária entre ele e o comitente, ou patrão,
pois a admissão de um empregado dependerá, em regra, da vontade do
empregador, que tem liberdade de escolha. O empregado ou preposto
são pessoas que trabalham sob a direção do patrão, não se exigindo
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 99

que entre eles haja um contrato de trabalho. Bastará que entre eles exista
um vínculo hierárquico de subordinação.”(30)

O Colendo STJ reiteradamente tem adotado esse entendimento, ou seja,


“para o reconhecimento do vínculo de preposição, não é preciso que exista
um contrato típico de trabalho; é suficiente a relação de dependência ou que
alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem.”(31)

Também tem sido interpretada com largueza a expressão “no exercício


do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”. Aliás, nesse ponto o Código
Civil atual ampliou a responsabilidade do empregador ao substituir a frase
“por ocasião dele”, prevista no art. 1.523 do Código Civil anterior, para a
expressão mais abrangente “em razão dele” . Assim, os atos lesivos dos
prepostos ou empregados, suportados pelo empregador, não ficam restritos
aos praticados no período temporal da prestação dos serviços, uma vez que
podem ocorrer outras tarefas em benefício da empresa mesmo fora do local
ou do horário do trabalho(32).

(30) DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7, p.
518.
(31) Conferir dentre outros os REsp ns. 304.673/SP, 284.586/RJ e 200.831/RJ.
(32) “R esponsabilidade civil. A to do preposto. Culpa reconhecida. R esponsabilidade do
em pregador, (art. 1.521, inciso III, CC/16; art. 932, inciso III, CC/2002). A to praticado fora
do horário de serviço e contra as ordens do patrão. Irrelevância. A ção que se relaciona
funcionalm ente com o trabalho desempenhado. Morte do esposo e p a i dos autores. Culpa
concorrente. Indenizações p o r danos materiais e morais devidas. 1. A responsabilidade do
em pregador depende da apreciação quanto à responsabilidade antecedente do preposto
no dano causado — que é subjetiva — e a responsabilidade conseqüente do preponente,
que independe de culpa, observada a exigência de o preposto estar no exercício do trabalho
ou o fato ter ocorrido em razão dele. 2. Tanto em casos regidos pelo Código Civil de 1916
quanto nos regidos pelo Código Civil de 2002, responde o empregador pelo ato ilícito do
preposto se este, embora não estando efetivam ente no exercício do labor que lhe foi confiado
ou mesmo fora do horário de trabalho, vale-se das circunstâncias propiciadas pelo trabalho
para agir, se de tais circunstâncias resultou fa cilita çã o ou auxílio, ainda que de form a
incidental, local ou cronológica, à ação do empregado. 3. No caso, o preposto teve acesso
à máquina retroescavadeira — que foi má utilizada para transportar a vítim a em sua “concha”
— em ra zão da fu n çã o de ca se iro que d e s e m p e n h a v a no sítio de p ro p rie d a d e dos
e m p re g ad o re s, no qual a m e n cio n a d a m á q u in a e sta va d e p o sita d a , fic a n d o p o r isso
e v id e n c ia d o o lia m e fu n c io n a l e n tre o ilíc ito e o tra b a lh o p re s ta d o . 4. A d e m a is , a
jurisprudência sólida da Casa entende ser civilm ente responsável o proprietário de veículo
autom otor por danos gerados por quem lho tomou de form a consentida. Precedentes. 5.
Pela aplicação da teoria da guarda da coisa, a condição de guardião é im putada a quem
tem o com ando intelectual da coisa, não obstante não ostentar o com ando m aterial ou
m esm o na hip ótese de a coisa esta r sob a dete n çã o de outrem , com o o que ocorre
frequentem ente nas relações ente preposto e preponente. 6. Em razão da concorrência de
culpas, fixa-se a indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais),
bem com o pensionam ento m ensal em 1/3 do salário m ínim o vigente à época de cada
pagamento, sendo devido desde o evento danoso até a data em que a vítim a completaria
65 (sessenta e cinco) anos de idade. 7. Recurso especial conhecido e provido.” STJ. 4-
Turma. REsp n. 1072577/PR, Rei.: Ministro Luis Felipe Salomão, DJ 26 abr. 2012.
100 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

É pacífico o entendimento de que o empregador responde pelos danos


causados, ainda que o seu empregado ou preposto extrapole suas funções
ou atue abusivamente. Não cabe ao terceiro prejudicado discernir se o em­
pregado ou preposto estava ou não nos limites das suas atribuições, presu­
mindo-se que a empresa tenha sido cuidadosa em selecionar trabalhadores
idôneos, oferecendo o devido treinamento para que pudessem exercer dili­
gentemente suas funções. Vejam a respeito a lição do Desembargador e dou-
trinador Sérgio Cavalieri:

“O nosso Direito não exige rigorosa relação funcional entre o dano e a


atividade do empregado. Diferentemente de outros países, basta que o
dano tenha sido causado em razão do trabalho — importando, isso, dizer
que o empregador responde pelo ato do empregado ainda que não guarde
com suas atribuições mais do que simples relação incidental, local ou
cronológica. Na realidade, a fórmula do nosso Código Civil é muito ampla
e bastante severa para o patrão. Bastará que a função tenha oferecido
ao preposto a oportunidade para a prática do ato ilícito; que a função
tenha lhe proporcionado a ocasião para a prática do ato danoso. E isso
ocorrerá quando, na ausência da função, não teria havido a oportunidade
para que o dano acontecesse.”(33)

Na linha desse entendimento, é oportuno transcrever a ementa de um


julgado em que atuamos como Relator, cuja decisão adotou a responsabilidade
objetiva do empregador por ato ilícito praticado por seu empregado:
“Ementa — A cidente fatal causado no estabelecim ento da em presa por culpa de
colega de trabalho. Responsabilidade objetiva do empregador. No início do século
XX o empregador só respondia pelos danos causados por seus em pregados se ficasse
também com provada a sua culpa ou descum prim ento do seu dever de vigilância. A
partir de 1963, o STF adotou o entendimento de que é presum ida a culpa do patrão
pelo ato culposo do seu empregado (Súmula 341). O Código Civil de 2002 deu mais
um passo em benefício da vítim a ao estabelecer a responsabilidade do empregador,
independentemente de qualquer culpa de sua parte, pelos danos causados por culpa

“Responsabilidade civil. Furto praticado em decorrência de inform ações obtidas pelo preposto
p o r ocasião do seu trabalho. Responsabilidade solidária do empregador. — O em pregador
responde civilm ente pelos atos ilícitos praticados p o r seus prepostos (Art. 1.521 do C C B /
1916 e Súmula n. 341/STF). — Responde o preponente, se o preposto, ao executar serviços
de dedetização, penetra residência aproveitando-se para conhecer os locais de acesso e
fuga, para — no dia seguinte — furtar vários bens. — A expressão ‘por ocasião dele’ (Art.
1.521, III, do Código Beviláqua) pode alcançar situações em que a prática do ilícito pelo
em pregado ocorre fora do local de serviço ou da jornada de trabalho. — Se o ilícito foi
facilitado pelo acesso do preposto à residência, em função de serviços executados, há
relação causal entre a função exercida e os danos. Deve o empregador, portanto, responder
pelos atos do empregado.” STJ. 3® Turma. REsp n. 623.040/MG, Rei.: Ministro Humberto
Gomes de Barros, DJ 4 dez. 2006.
(33) C AVALIERI FILHO, Sergio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 217.
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 101

de seus empregados ou prepostos, conforme previsto nos arts. 932, III e 933. Assim,
restando comprovado que o acidente fatal foi causado por empregado da reclamada
que n u m a a titu d e in c o n s e q ü e n te , a títu lo de s im p le s b rin c a d e ira , d e s lo c a a
carregadeira que se encontra sob sua direção sobre colegas de trabalho, causando
a morte imediata de um deles por decapitação, é imperioso deferir a responsabilidade
civil da em presa pela indenização postulada pelos dependentes da vítim a.” Minas
Gerais. TRT 38 Região. 2- Turma. RO n. 00642-2008-091-03-00-0, Rei.: Des. Sebastião
Geraldo de Oliveira, DJ 3 jul. 2009.(34)

É certo, porém, que o empregador que responder pelo acidente provocado


abusivamente (dolosamente) por seu empregado ou preposto poderá ajuizar
ação regressiva para tentar o reembolso dos valores despendidos, conforme
previsto no art. 934 do Código Civil(35) ou mesmo promover o desconto nos
salários. Entretanto, se o empregado que causou o acidente tiver agido apenas
oorn culpa, o empregador deverá, além de comprová-la de forma convincente,
exibir a cláusula do contrato de trabalho estabelecendo a possibilidade de
desconto pelos danos causados, conforme previsto no art. 462, § 1Q, da CLT.
É preciso registrar, para evitar equívocos, que na maioria dos acidentes
do trabalho há alguma participação ocasional ou incidental, direta ou indireta,
de colega ou colegas de trabalho. São riscos criados pela própria dinâmica
das atividades desenvolvidas, ou mesmo perigo decorrente de descuido do
empregador em adotar as medidas preventivas adequadas. Em tais hipóteses
a responsabilidade do empregador, quando cabível, é direta porque os seus
orepostos ou empregados estavam atuando licitamente no cumprimento das
suas atribuições regulares. A responsabilidade indireta aqui tratada somente
ocorre quando a causa do sinistro reside no com portam ento ilícito do
empregado ou preposto e tenha sido fator determinante para o acidente do
trabalho.

4.9. Responsabilidade civil nas terceirizações

A tendência empresarial de transferir parte da execução dos serviços a


terceiros gera questionam entos sobre a responsabilidade solidária ou
subsidiária da tom a dora (em presa co ntrata nte ) pelo pagam ento das
ndenizações cabíveis aos acidentados que atuam como trabalhadores da
orestadora de serviço (empresa contratada).

(34) Essa decisão foi mantida pelo Colendo TST em julgam ento da 4 - Turma, ocorrido no
z.a 23 de março de 2011, quando atuou como Relator o Ministro Fernando Ono. O Recurso
za Embargos interposto pela reclamada para a SBDI-I do TST, julgado no dia 1a de dezembro
de 2011, não foi conhecido, conforme acórdão relatado pelo Ministro José Roberto Freire
Pimenta. Cf. Processo E-RR n. 64200-50-2008.5.03.0091.
(35) Código Civil. Art. 934. “Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o
que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente
seu, absoluta ou relativamente incapaz.”
102 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

Em decorrência do fenôm eno da terceirização, m uitas em presas


desenvolvem suas atividades contando com trabalhadores indiretos que
prestam serviços por intermédio das empresas interpostas, contratadas na
condição de subempreiteiras, fornecedoras de trabalho temporário ou como
simples prestadoras de serviço. A prática tem demonstrado que os serviços
terceirizados são os que mais expõem os trabalhadores a riscos e, por
consequência, a sofrerem acidentes ou doenças ocupacionais, pois se referem
a em pregos de baixo nível rem uneratório e pouca especialização, que
normalmente dispensam experiência e treinamento.

As em presas de prestação de serviços são criadas com relativa


facilidade, sem necessidade de investim ento ou capital, porque atuam
simplesmente intermediando mão de obra de baixa qualificação e de alta
rotatividade. Como ficam na inteira dependência das empresas tomadoras de
serviços e enfrentam a concorrência, nem sempre leal, de outras empresas
do ramo, dificilmente experimentam crescimento próprio ou solidez econômica,
sendo freqüentes as insolvências no setor. Com isso, acabam aceitando
margens de lucro reduzidas, sacrificando, para sobreviver, as despesas
necessárias para garantia da segurança, higiene e saúde dos trabalhadores.

Aqueles que militam na Justiça do Trabalho conhecem de perto o volume


a ssu sta d o r de ações tra b a lh ista s propo stas por ex-em pregados das
chamadas prestadoras de serviços. Essas empresas fecham as portas e
“desaparecem” com a mesma facilidade com que foram criadas, até porque,
quase sempre, não têm patrimônio algum, pois só dispõem de um imóvel
alugado para intermediar o fornecimento da mão de obra.

A dinâmica dos fatos desafia o aplicador da lei para decidir casos novos,
muitas vezes com regras antigas, mas sempre com apoio nos princípios
gerais, que permitem amoldar os comandos normativos às contingências de
cada época. Para os novos problemas da realidade atual, é preciso buscar
também soluções inovadoras, sob pena de se apegar às regras fossilizadas
de épocas passadas. Nesse sentido, é oportuno o ensinamento de Vicente
Ráo: “Por força de necessidades novas, novas regras são necessárias para
a solução dos problemas do nosso tempo. Transforma-se, pois, o Direito, no
sentido da maior extensão do seu poder normativo, mas, semelhante extensão
não destrói, antes, confirma, dia a dia, a generalidade e a universalidade dos
princípios gerais.”(36)
A ciência jurídica não pretende — e nem consegue — deter a fluência
dos fatos econômicos, mas tem por objetivo assegurar um sentido de justiça

(36) RÁO, Vicente. O Direito e a vida dos direitos. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1991. v.1, p. 22.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 103

e harmonia aos relacionamentos entre os cidadãos para garantir a paz social.


O ordenamento jurídico normalmente reconhece como válidos os contratos
de subempreitada, de serviços temporários ou de prestação de serviços, mas
vincula o beneficiário efetivo para responder solidária ou subsidiariamente
pelo cum prim ento das obrigações relacionadas com os contratos dos
trabalhadores.

O princípio norteador, cada vez mais aceito, proclama que aquele que
se beneficia do serviço deve arcar, direta ou indiretamente, com todas as
obrigações decorrentes da sua prestação. Nada mais justo, porquanto quem
usufrui dos bônus deve suportar os ônus, como assevera a antiga parêmia
“qui habet commoda, ferre debet onera”. Nessa linha de pensamento foram
editadas várias normas legais, com o propósito de reforçar a garantia para os
empregados das empresas terceirizadas, tais como o art. 455 da CLT(37), o
art. 16 da Lei n. 6.019/1974, que trata do trabalho temporário(38), e o art. 82 da
Convenção 167 da Organização Internacional do Trabalho(39). Em período
mais recente a Lei n. 12.023/2009, que “dispõe sobre as atividades de movi­
mentação de mercadorias em geral e sobre o trabalho avulso”, estabeleceu:
“Art. 8- As em presas tom adoras do trabalho avulso respondem solidariam ente pela
efetiva rem uneração do trabalho contratado e são responsáveis pelo recolhim ento
dos encargos fiscais e sociais, bem como das contribuições ou de outras importâncias
de vidas à S e g u rid a d e S ocial, no lim ite do uso que fize re m do tra b a lh o avulso
interm ediado pelo sindicato.

Art. 9a As empresas tom adoras do trabalho avulso são responsáveis pelo fornecim ento
dos Equipamentos de Proteção Individual e por zelar pelo cumprimento das normas
de segurança no trabalho” .

37) CLT, art. 455: “ Nos contratos de subem preitada responderá o subem preiteiro pelas
o b rig a çõ e s d e riv a d a s do c o n tra to de tra b a lh o que c e le b ra r, c a b e n d o , to d a v ia , aos
empregados, o direito de reclam ação contra o em preiteiro principal pelo inadim plem ento
daquelas obrigações por parte do primeiro. Parágrafo único. Ao em preiteiro principal fica
ressalvada, nos termos da lei civil, ação regressiva contra o subem preiteiro e a retenção de
Importâncias a este devidas, para a garantia das obrigações previstas neste artigo.”
38) Lei n. 6.019, de 3 jan. 1974, art. 16: “No caso de falência da empresa de trabalho
temporário, a em presa tom adora ou cliente é solidariam ente responsável pelo recolhimento
das contribuições previdenciárias, no tocante ao tem po em que o trabalhador esteve sob
suas ordens, assim como em referência ao mesmo período, pela remuneração e indenização
previstas nesta Lei.”
39) OIT. Convenção 167, art. 8a: “Quando dois ou mais empregadores estiverem realizando
atividades sim ultaneam ente na mesma obra: a) a coordenação das medidas prescritas em
matéria de segurança e saúde e, na medida em que for compatível com a legislação nacional,
a responsabilidade de zelar pelo cum prim ento efetivo de tais m edidas recairá sobre o
empreiteiro principal ou sobre outra pessoa ou organism o que estiver exercendo controle
efetivo ou tive r a principal responsabilidade pelo conjunto de atividades na obra;” . Esta
Convenção entrou em vigor no Brasil em 19 de maio de 2007. A ratificação ocorreu pelo
Decreto Legislativo n. 61/2006 e prom ulgação pelo Decreto n. 6.271, de 22 nov. 2007.
104 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Merece realçar, nessa seqüência, as previsões contidas nas Normas


Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego, constante da Portaria
n. 3.214/1978. Essas normas têm força normativa diferenciada, porque são
baixadas com apoio em delegações da própria CLT, especialmente do art. 200.

A NR-5, que trata da “Comissão Interna de Prevenção de Acidentes —


CIPA” , tem um tópico específico regulam entando o relacionamento das
contratantes e contratadas, no que tange à prevenção de acidentes e doenças
ocupacionais:
“5.46 Q uando se tra ta r de e m p re ite ira s ou e m p re sa s p re sta d o ra s de se rviço s,
considera-se estabelecim ento, para fins de aplicação desta NR, o local em que seus
empregados estiverem exercendo suas atividades.

5.47 Sempre que duas ou mais empresas atuarem em um mesmo estabelecimento, a


C IP A ou d e s ig n a d o da e m p re sa c o n tra ta n te d e ve rá , em c o n ju n to com as das
contratadas ou com os designados, definir mecanismos de integração e de participação
de to d o s os tra b a lh a d o re s em re la ç ã o às d e c is õ e s das C IP A e x is te n te s no
estabelecim ento.

5.48 A co n tra ta n te e as c o n tra ta d a s, que atuem num m esm o e sta b e le cim e n to ,


deverão im plem entar, de form a integrada, m edidas de prevenção de acidentes e
doenças do trabalho, decorrentes da presente NR, de form a a garantir o mesm o
nível de proteção em m atéria de segurança e saúde a todos os trabalhadores do
estabe lecim en to .

5.49 A em presa contratante adotará m edidas necessárias para que as em presas


contratadas, suas CIPA, os designados e os demais trabalhadores lotados naquele
estabelecim ento recebam as inform ações sobre os riscos presentes nos ambientes
de trabalho, bem como sobre as medidas de proteção adequadas.

5.50 A em presa contratante adotará as providências necessárias para acompanhar o


cum prim ento pelas em presas contratadas que atuam no seu estabelecim ento, das
medidas de segurança e saúde no trabalho.”

De forma semelhante, a NR-9, que trata do “Programa de Prevenção de


R iscos A m b ie n ta is — PPRA, esta b e le ce : “9.6.1 Sem pre que vários
em pregadores realizem sim ultaneam ente atividades no mesmo local de
trabalho terão o dever de executar ações integradas para aplicar as medidas
previstas no PPRA visando à proteção de todos os trabalhadores expostos
aos riscos ambientais gerados.”

Também a NR-10, que trata da “Segurança em instalações e serviços


em eletricidade”, tem normas sobre as responsabilidades dos contratantes:
“ 10.13.1 As responsabilidades quanto ao cumprimento desta NR são solidárias aos
contratantes e contratados envolvidos.”

“ 10.13.2 É de responsabilidade dos contratantes manter os trabalhadores informados


sobre os riscos a que estão expostos, instruindo-os quanto aos procedim entos e
medidas de controle contra os riscos elétricos a serem adotados.”
‘ .DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 105

Cabe citar, ainda, a NR-32, que trata da “Segurança e saúde no trabalho


em estabelecimentos de saúde”, cujo item 32.11.4 estabelece: “A responsa-
oiiidade é solidária entre contratantes e contratados quanto ao cumprimento
:esta NR.”

O princípio da responsabilização solidária ou subsidiária do beneficiário


aos serviços aplica-se aos direitos trabalhistas, previdenciários, acidentários,
bem como às hipóteses de responsabilidade civil do empregador, incluindo a
ação regressiva da Previdência Social(40). Daí por que, atualmente, quase
todos os trabalhadores das terceirizadas que ingressam em juízo indicam no
polo passivo o em pregador direto e a em presa tom adora dos serviços,
exatamente para ter a garantia do cumprimento da sentença, no caso de
eventual condenação.

Seguindo a diretriz principiológica de vincular a beneficiária real dos


serviços, o Colendo TST pacificou o entendimento sobre os efeitos jurídicos
da terceirização na Súmula n. 331:

“Contrato de prestação de serviços. Legalidade I — A contratação de trabalhadores


por em presa interposta é iiegal, form ando-se o vínculo diretam ente com o tom ador
dos serviços, salvo no caso de trabalho tem porário (Lei n. 6.019, de 3.1.1974). II — A
contratação irregular de trabalhador, mediante em presa interposta, não gera vínculo
de em prego com os órgãos da Adm inistração Pública direta, indireta ou fundacional
(art. 37, II, da C F/1988). III — Não form a vínculo de em prego com o to m a d o r a
contratação de serviços de vigilância (Lei n. 7.102, de 20.6.1983) e de conservação e
limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador,
desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta, IV — O inadimplemento
das obrigações trabalhistas, por parte do em pregador, im plica a responsabilidade
subsidiária do tom ador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja
participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V —
Os e n te s in te g ra n te s da A d m in is tra ç ã o P ú b lic a d ire ta e in d ire ta re s p o n d e m
subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta
culposa no cum prim ento das obrigações da Lei n. 8.666, de 21.6.1993, especialmente
na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de
se rviço com o e m p re g a d o ra . A a lu d id a re s p o n s a b ilid a d e não d e c o rre de m ero
inadim plem ento das obrigações trabalhistas assum idas pela em presa regularm ente
contratada. VI — A responsabilidade subsidiária do tom ador de serviços abrange
todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação
labo ra l.”

Como se depreende do exposto, quando o em presário transfere a


terceiros a execução de parte da sua atividade, deve atuar com bastante
diligência, escolhendo criteriosam ente empresas que tenham capacidade

(40) A Lei n. 8.212/1991, que dispõe sobre a organização e custeio da Seguridade Social,
também estabelece a responsabilidade dos tom adores de serviços nos arts. 30 e 31, com o
propósito de garantir o recolhim ento da contribuição previdenciária.
106 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

técnica, econômica e financeira para arcar com os riscos do empreendimento*41>.


Deve, também, fiscalizar com rigor o cumprimento do contrato de prestação
de serviços e a observância dos direitos trabalhistas dos empregados da
contratada, especialmente o cumprimento das normas de segurança, higiene
e saúde dos trabalhadores. Nesse sentido tem sido o entendimento adotado
pela jurisprudência:
“Recurso de revista. A cidente de trabalho. Prestação de serviços. R esponsabili­
dade solidária da tom adora de serviços. Dono da obra. Vínculo em pregatício. Ter­
ceirização. Esta Corte já se manifestou no sentido de que a responsabilização soli­
dária da tom adora de serviços quanto a acidente de trabalho encontra respaldo na
disposição contida nos arts. 927 e 942 do C ódigo Civil. Precedentes. A discussão
acerca da caracterização da condição de dona da obra, de vínculo em pregatício
form ado diretam ente com a recorrente e da responsabilidade subsidiária não foram
prequestionados no Regional atraindo a incidência da S úm ula 297 do TST. Não
conhecido.” TST. 5- Turma. RR n. 11600-38.2006.5.21.0021, Rei.: Ministro Emmano-
el Pereira, DJ 19 nov. 2010.

“Responsabilidade civil. Contrato de empreitada. Acidente de trabalho que vitimou


fatalm ente o obreiro. Ação proposta por herdeiros da vítima. Falta de fornecim ento
e utilização de equipamentos de segurança. Dever de fiscalização. Culpa in eligendo
e in vigilando. Responsabilidade solidária da em presa ré. Dano moral arbitrado
em atenção aos parâm etros da razoabilidade e proporcionalidade. 1. Responde
solidariam ente a tom adora de serviços pelos acidentes causados aos trabalhadores
que se encontrem executando obras em suas dependências, não obstante a ausência
de vínculo empregatício entre estes e a tom adora de serviços. 2. Documento existente
nos autos que comprova o elemento culpa e o nexo de causalidade entre o acidente
que vitimou o trabalhador e a atividade por este exercida, sendo certo, ainda, que no
referido docum ento consta a inform ação de que, segundo testem unhas, o operário
não usava equipam entos de segurança no momento do acidente. 3. Culpa in eligendo
e in vigilando. 4. Negligência na escolha do prestador de serviços para a execução da
obra e falta de fiscalização do uso efetivo dos equipam entos de proteção por parte
dos trabalhadores que executavam o serviço. 5. A cláusula contratual que estabelece
a respo nsabilida d e e xclu siva do p re sta d o r de se rviço s por to d a s as o brigações
trabalhistas, previdenciárias e sociais não tem o condão de excluir a responsabilidade
solidária da tom adora de serviços, consoante o disposto no art. 1.521, III, do CC/1916.
6. Danos m orais que na hipótese foram m oderada e razoavelm ente arbitrados. 7.
Desprovim ento do recurso.” Rio de Janeiro. TJRJ. 17a Câm. Cível. Apelação Cível n.
0103695-36.1998.8.19.0001. Rei.: Des. Elton Leme, DJ 17 jul. 2008.

“Responsabilidade civil. Acidente do Trabalho. Concurso de Agentes. Responsa­


bilidade solidária do em preiteiro e do dono da obra. Há coparticipação quando as

(41) C a be m e n c io n a r um a e x c e ç ã o à re g ra m e n c io n a d a , a d o ta d a p e la O rie n ta ç ã o
Jurisprudencial n. 191 da SBDI-I do Colendo TST: “ Contrato de empreitada. Dono da obra
de construção civil. Responsabilidade. Diante da inexistência de previsão legal específica,
o contrato de em preitada de construção civil entre o dono da obra e o em preiteiro não
enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas
pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma em presa construtora ou incorporadora.”
Cumpre ressaltar que esse entendim ento excepcional só é aplicável quando se contrata
efetivam ente obras de construção civil e não nos casos de simples terceirização de serviços
da em presa tomadora.
■•DEN1ZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 107

condutas de duas ou mais pessoas concorrem efetivam ente para o evento, gerando
responsabilidade solidária, conform e artigo 1518 do anterior Código Civil. Cada um
dos agentes que concorre adequadam ente para o evento é considerado pessoal­
mente causador do dano e obrigado a indenizar. A omissão do empreiteiro em fornecer
material de proteção ao trabalhador, e a do dono da obra ao não propiciar ambiente
de trabalho seguro, torna ambos solidariamente responsáveis pela indenização infor­
tunística.” Rio de Janeiro. TJRJ. 2 - Câm. Cível, Apelação n. 2004.001.05250, Rei.:
Des. Sérgio Cavalieri Filho, julgada em 05 maio 2004.

Se é uma realidade o fenômeno da terceirização, é também certo que


essa prática empresarial não pode servir de desvio improvisado ou artifício
engenhoso para reduzir ou suprimir direitos dos trabalhadores, sobretudo
daqueles que foram vítimas de acidente do trabalho ou doenças ocupacionais.
A transferência das atividades para uma prestadora de serviço não exime a
contratante de suportar, juntamente com a contratada, os custos relativos
aos danos sofridos pelos trabalhadores da empresa terceirizada.

O art. 942 do Código Civil estabelece a solidariedade na reparação dos


danos dos autores, coautores e das pessoas designadas no art. 932<42), valendo
tal preceito para o acidente ocorrido por culpa do empregador ou pela atividade
de risco acentuado, fundamento esse sempre invocado nos julgamentos para
estender a solidariedade passiva ao tom ador dos serviços. No caso da
solidariedade, o credor tem direito de exigir e receber de um ou de alguns dos
devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum(43), preferindo, naturalmente,
cobrar daquele que estiver em melhores condições financeiras.
É oportuno mencionar a doutrina da desconsideração da pessoa jurídica,
acolhida expressamente pelo art. 50 do Código Civil de 2002 e pelo Código
de Proteção e Defesa do Consumidor — Lei n. 8.078/1990, normas essas
que também reforçam o princípio de que o beneficiário dos serviços deve
arcar com as indenizações acidentárias. O art. 28 desse último Código
estabelece:
“O ju iz poderá desco n sid e ra r a personalidade ju ríd ic a da sociedade quando, em
detrim ento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei,
fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração
tam bém será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento
ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má adm inistração.”

À semelhança do princípio da primazia da realidade aplicado no Direito


do Trabalho, a teoria da disregard of legal entity supera a barreira formal da
pessoa jurídica para alcançar os verdadeiros responsáveis pela reparação

(42) Código Civil, art. 942: “Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de
outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor,
todos responderão solidariam ente pela reparação. Parágrafo único. São solidariam ente
responsáveis com os autores, os coautores e as pessoas designadas no art. 932.”
(43) Código Civil, art. 275.
108 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

dos prejuízos. Aliás, o § 5e do mencionado art. 28 prevê que “também poderá


ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de
algum a forma, obstáculo ao ressarcim ento de prejuízos causados aos
consumidores.”
A relevância social da proteção jurídica ao acidentado justifica plenamen­
te, e até por mais severas razões, a aplicação desse preceito do Código do
Consumidor. É louvável a proteção conferida ao que pode consumir, mas é
imperioso amparar também aquele que precisa sobreviver, após perder a ca­
pacidade de trabalho, a saúde e muitas vezes até o direito de ter esperança.
Cabe citar, por fim, a Lei n. 9.605/1998, que dispõe sobre as “sanções
penais e administrativas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente”,
cujo art. 4Qestabelece: “Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre
que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados
à qualidade do meio ambiente.”

A pacificação do entendimento no sentido de que a empresa contratante


responde, solidária ou subsidiariamente, pelas indenizações e outros direitos
dos empregados da prestadora de serviços está provocando um movimento
de retomada das atividades que eram terceirizadas, fenômeno que está sendo
denominado de “primarização” ou “desterceirização”. Ora, se está pacificado
na jurisprudência que a empresa tomadora continuará responsável por tais
direitos, é melhor que ela tenha sob o seu controle direto o cumprimento das
normas de prevenção de acidentes ou doenças ocupacionais. Percebe-se
agora, com maior clareza, que a terceirização está perdendo um dos seus
principais atrativos: a redução de custos.
CAPITULO 5

ACIDENTE DO TRABALHO E
RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA

5.1. Desenvolvimento da teoria do risco

A responsabilidade de natureza subjetiva tem raízes milenares e está


visceralmente impregnada em toda a dogmática da responsabilidade civil.
Por essa razão, aquele que sofre um dano tem, como primeiro pensamento,
praticamente como reação instintiva, a necessidade de procurar o culpado
para cobrar a reparação. Assinala a professora Maria Celina Bodin que “a
ideia subjacente à responsabilidade subjetiva possui raízes tão profundas na
cultura ocidental que nunca foi preciso, realmente, explicar porque a culpa
enseja responsabilidade, sendo ela própria a sua razão justificativa.”(1)
No entanto, a complexidade da vida atual, a multiplicidade crescente
dos fatores de risco, a estonteante revolução tecnológica, a explosão
demográfica e os perigos difusos ou anônimos da modernidade acabavam
por deixar vários acidentes ou danos sem reparação, uma vez que a vítima
não lograva dem onstrar a culpa do causador do prejuízo, ou seja, não
conseguia se desincumbir do ônus probatório quanto aos pressupostos da
responsabilidade civil. Assim, ainda hoje, é comum deparar-se com uma
situação tormentosa para os operadores jurídicos: o dano sofrido pela vítima
é uma realidade indiscutível, mas a dificuldade de provar a culpa do réu impede
o deferimento da indenização. No caso do acidente do trabalho, tem sido
freqüente o indeferimento do pedido por ausência de prova da culpa patronal
ou por acolher a alegação de ato inseguro do empregado ou, ainda, pela
conclusão da culpa exclusiva da vítima.
O choque da realidade com a rigidez da norma legal impulsionou os
estudiosos no sentido da busca de soluções para abrandar, ou mesmo excluir,
o rigorismo da prova da culpa como pressuposto para indenização, até porque

(1) MORAES, M aria Celina Bodin de. Risco, solidariedade e responsabilidade objetiva.
Revista RT, São Paulo, v. 854, p. 22, dez. 2006.
110 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

o fato concreto, colocado em pauta para incômodo dos juristas, era o dano
consumado e o lesado ao desamparo... Pouco a pouco, o instrumental da
ciência jurídica começou a vislumbrar nova alternativa para acudir as vítimas
dos infortúnios. Ao lado da teoria subjetiva, dependente da culpa comprovada,
desenvolveu-se a teoria do risco ou da responsabilidade objetiva, segundo a
qual basta o autor demonstrar o dano e a relação de causalidade, para o
deferimento da indenização. Em outras palavras, os riscos da atividade, em
sentido amplo, devem ser suportados por quem dela se beneficia.
Aponta Caio Mário que a proposição originária da doutrina objetiva surge
em 1897 quando Raymond Saleilles publica estudo especializado intitulado
“Les Accidents de TravaiI et Ia Responsabilité Civile — Essai d ’une théorie
objective de Ia responsabilité delictuelle.”{2) Mais tarde, o Professor de Direito
Civil da Faculdade de Lyon, Louis Josserand, defende abertamente a teoria
objetiva, asseverando que a causa da constante evolução da responsabilidade
“deve ser procurada na multiplicidade de acidentes, no caráter cada vez mais
perigoso da vida contemporânea; (...) multiplicam-se os acidentes, muitos
permanecem anônimos e sua causa verdadeira fica desconhecida.”(3) Em
outro trecho, Josserand deixa transparecer sua desconfortável inquietação:
“Quando um acidente sobrevêm, em que à vítima nada se pode censurar, por
haver desempenhado um papel passivo e inerte, sentimos instintivamente
que lhe é devida uma reparação; precisamos que ela a obtenha, sem o que
nos sentiremos presos de um mal-estar moral, de um sentimento de revolta;
vai-se a paz da nossa alma.”(4)
No B ra sil v á rio s a u to re s a p ro fu n d a ra m e s tu d o s no te m a da
responsabilidade objetiva, valendo citar o Professor Alvino Lima, que, em 1938,
defendeu tese para concorrer à cátedra de Direito Civil, perante a Faculdade
de Direito de São Paulo, intitulada “Da culpa ao risco”, posteriormente publicada
com o título Culpa e Risco(5). Anos mais tarde, o notável Professor Wilson
Melo da Silva apresentou tese perante a Faculdade de Direito da Universidade
Federal de Minas Gerais, defendendo ardorosamente a corrente objetivista,
com o título “Responsabilidade sem Culpa”(6). De grande relevo também as
posições dos mestres José de Aguiar Dias e Caio Mário da Silva Pereira em
obras específicas a respeito da responsabilidade civil.

Cabe registrar, por outro lado, que a teoria da responsabilidade objetiva


coleciona também vários opositores. Reclamam que “a demasiada atenção à

(2) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p .16.
(3) JOSSERAND, Louis. Evolução da responsabilidade civil. Revista Forense, Rio de Janeiro,
v. 86, p. 549, jun. 1941.
(4) Ibidem, p. 550.
(5) LIMA, Alvino. Culpa e risco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1963.
(6) SILVA, Wilson Melo da. Responsabilidade sem culpa. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1974.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 111

vítima acaba por negar o princípio da justiça social, impondo cegamente o


dever de reparar, e levando-o a equiparar o comportamento jurídico e injurídico
do agente.”(7) Alegam que, se o pressuposto da culpa for afastado, aquele
que age corretamente, tomando todas as medidas recomendáveis para evitar
os danos, receberia o mesmo tratamento do outro que atua displicentemente.
Os irmãos Mazeaud, considerados os campeões contra a doutrina do risco,
afirmam que “a equidade exige que aquele que retira os proveitos suporte os
riscos, mas exige também que não se inquiete aquele cujo procedimento é
irrepreensível.”(8)
Como se vê, a aceitação progressiva da teoria da responsabilidade objetiva
demandou amadurecimento prolongado, especialmente pelos confrontos das
ideias antagônicas e dos ricos embates doutrinários. O desenvolvimento da
“culpa” até o “risco” , como pressuposto indispensável para a reparação, ocorreu
por etapas que o transcurso do tempo ajudou a consolidar. Num primeiro passo,
mesmo reconhecendo a necessidade da culpa para o cabimento da indenização,
houve concessões ou tolerância dos julgadores para abrandar o rigor desse
pressuposto em benefício da vítima, o que o mestre Caio Mário denomina de
adelgaçamento da própria noção de culpa, porquanto os juizes, invocando o
velho adágio In lege Aquilia, et levissima culpa venit, entendiam que a mais
mínima culpa já era o bastante para gerar a responsabilidade®. Numa etapa
posterior, ainda com apoio na teoria da responsabilidade subjetiva, adotou-se a
técnica intermediária da culpa presumida, favorecendo sobremaneira a vítima
pela inversão do ônus da prova. No Brasil, a Súmula n. 341 do STF, adotada
em 1963, consagrou que “é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato
culposo do empregado ou preposto”, suplantando a interpretação literal do art.
1.523 do Código Civil de 1916. Da etapa da presunção da culpa, bastou um
passo a mais para atingir a responsabilidade sem culpa, conforme preconiza a
teoria objetiva.
A responsabilidade civil objetiva, ao longo do século XX, ganhou adeptos
notáveis e crescente densidade doutrinária, tanto que foi incorporada por
diversas leis especiais em muitos países, contemplando hipóteses em que a
comprovação da culpa mostrava-se mais difícil ou complexa. Ficou evidente
a tendência apontada por Georges Ripert no sentido de que o direito moderno
já não visa ao autor do dano, porém à vítima(10). E foi na questão do acidente

(7) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 271.
(8) A pud DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1995. vol. 1, p. 69.
(9) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 267.
(10) A pud PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 18.
112 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

do trabalho que essa teoria surgiu e obteve maior aceitação dos juristas, tanto
que foi adotada sem grandes controvérsias no campo do seguro acidentário(11).

É necessário registrar, todavia, que a responsabilidade objetiva não su­


plantou, nem derrogou a teoria subjetiva, mas afirmou-se em espaço próprio
de convivência funcional, para atender àquelas situações em que a exigência
da culpa representa demasiado ônus para as vítimas, praticamente inviabili­
zando a indenização do prejuízo sofrido. Não há dúvida, portanto, que conti­
nuará sendo aplicável a responsabilidade subjetiva, quando a culpa do infrator
restar demonstrada, hipótese em que ficará mais fácil o êxito da demanda
para o lesado e até com a possibilidade de obter indenização mais expressi­
va. Como afirmou com segurança Louis Josserand, “a responsabilidade mo­
derna comporta dois polos, o polo objetivo, onde reina o risco criado e o polo
subjetivo onde triunfa a culpa; é em torno desses dois polos que gira a vasta
teoria da responsabilidade.”(12)

5.2. Abrangência da responsabilidade civil objetiva

O embasamento doutrinário que proporcionou o desenvolvimento da


responsabilidade objetiva, bastante sintetizado no item anterior, para não fugir
dos limites deste livro, promoveu reflexos visíveis na jurisprudência e também
em leis especiais. Ao lado da responsabilidade subjetiva de previsão genérica,
o ordenamento jurídico brasileiro contempla várias hipóteses de aplicação da
teoria objetiva(13), sem falar na inovação do Código Civil de 2002, que será
abordada no próximo item.

(11) “Tudo começou com uma dificuldade que parecia secundária: a da prova da culpa no
caso específico dos acidentes do trabalho. Para enfrentá-la, de início a jurisprudência e,
logo em seguida, o legislador francês criaram, como hipótese absolutamente excepcional,
uma regra de responsabilidade civil que independia da culpa. Foi o início de uma revolução.”
Cf. MORAES, M aria Celina Bodin de. Risco, solidariedade e responsabilidade objetiva.
Revista RT, São Paulo, v. 854, p. 35, dez. 2006.
(12) JO S S E R A N D , Louis. Evolução da responsabilidade civil. R evista Forense, Rio de
Janeiro, v. 86, p. 559, jun. 1941.
(13) P rincipais hipóte se s de re sp o n sa b ilid a d e o b je tiva p re vista s em leis esparsas: 1)
Responsabilidade das estradas de ferro, conforme Decreto n. 2.681, de 7 de dez. 1912; 2)
O seguro de acid ente do tra b a lh o , regulado a tu a lm e n te pela Lei n. 8 .213/1991; 3) A
indenização prevista pelo Seguro Obrigatório de responsabilidade civil para os proprietários
de veículos autom otores; 4) A indenização m encionada no art. 37, § 6Q, da Constituição da
República; 5) A reparação dos danos causados pelos que exploram a lavra, conform e o
Código de Mineração, no art. 47, III; 6) A reparação dos danos causados ao meio ambiente,
c o n fo rm e a rt. 2 2 5 , § 3 a, da C o n s titu iç ã o da R e p ú b lic a e Lei n. 6 .9 3 8 /1 9 8 1 ; 7) A
responsabilidade civil do transportador aéreo, conforme arts. 268 e 269 do Código Brasileiro
de Aeronáutica; 8) Os danos nucleares, conforme art. 21, XXIII, da Constituição da República;
9) O Código de Defesa e Proteção do Consumidor, em diversos artigos.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 113

A responsabilidade sem culpa já ocorre, por exemplo, nos danos nucleares,


conforme disposição do art. 21, XXIII, c, da Constituição da República de
Também o art. 225, § 3Q, estabelece a obrigação de reparar os danos
causados pelas atividades lesivas ao meio ambiente, sem cogitar da existên­
cia de dolo ou culpa. Esse último dispositivo constitucional merece leitura
atenta porque permite a interpretação de que os danos causados pelo empre­
gador ao meio ambiente do trabalho, logicamente abrangendo os emprega­
dos que ali atuam, devem ser ressarcidos independentemente da existência
oe culpa, ainda mais que o art. 200, VIII, da mesma Constituição, expressa­
mente inclui o local de trabalho no conceito de meio ambiente.
Pode-se invocar, também, em respaldo a essa tese, a Lei n. 6.938/1981,
que estabelece a política nacional do meio ambiente, cujo art. 14, § 1° prevê:
É o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar
ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por
sua atividade.” E o conceito de poluição, que, conforme nosso entendimento,
alcança boa parte dos fatores causais das doenças ocupacionais, foi inserido
no art. 3S, III, da mesma lei, com o seguinte teor: “ Entende-se por poluição a
degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou
hdiretamente prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população...”

Vale dizer, a propósito, que não faz sentido a norma ambiental proteger
todos os seres vivos e deixar apenas o trabalhador, o produtor direto dos
oens de consumo, que, muitas vezes, consome-se no processo produtivo,
sem a proteção legal adequada. Ora, não se pode esquecer — apesar de
óbvio, deve ser dito — que o trabalhador também faz parte da população e é
um terceiro em relação ao empregador poluidor. Além disso, não há dúvida
de que o ruído, a poeira, os gases e vapores, os resíduos, os agentes
oiológicos e vários produtos químicos degradam a qualidade do ambiente de
rabalho, gerando conseqüências nefastas para a saúde do empregado.
É curioso constatar que o Direito Ambiental tem mais receptividade na
sociedade e nos meios jurídicos, quando comparado com a proteção jurídica
a saúde do trabalhador. O seu prestígio é tamanho que praticamente ninguém
defende a sua flexibilização, como vem ocorrendo com os direitos trabalhistas.
E provável que a explicação para essa diversidade de tratamento resida no
fato de que o Direito Ambiental leva em conta o risco de exclusão do futuro de
:odos, enquanto o direito à saúde ocupacional só compreende a categoria
dos trabalhadores. Por outro lado, o inconformismo do vizinho, do cidadão ou
de qualquer do povo, que luta para preservar boas condições ambientais, é
de mais fácil manifestação, se comparado com o do empregado que luta para
manter sua fonte de sobrevivência e qualquer reclamação pode atrair o
^antasma do desem prego. Em síntese, o Direito Am biental pretende a
“salvação” de todos, enquanto o direito à saúde do trabalhador só abrange os
oroblemas de alguns.
114 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Discorrendo a respeito da responsabilidade civil objetiva do empregador


nas doenças ocupacionais, assevera Júlio César de Sá da Rocha, estudioso
do Direito Ambiental, que:

“A Constituição estabelece que, em caso de acidente de trabalho, o


empregador pode ser responsabilizado civilmente, em caso de dolo ou
culpa. O dispositivo fundamenta-se no acidente de trabalho tipo individual.
Contudo, ocorrendo doença ocupacional decorrente de poluição no
ambiente de trabalho, a regra deve ser da responsabilidade objetiva,
condizente com a sistemática ambiental, na medida em que se configura
a hipótese do art. 225, § 3e, que não exige qualquer conduta na
responsabilização do dano ambientai. Em caso de degradação ambiental
no am biente do trabalho, configura-se violação ao direito ‘ao meio
ecologicamente equilibrado’, direito eminentemente metaindividual. Como
se trata de poluição no meio ambiente do trabalho que afeta a sadia
qualidade de vida dos trabalhadores, a compreensão dos dispositivos
mencionados não pode ser outra senão a de que a responsabilidade em
caso de dano ambiental é objetiva; e quando a Magna Carta estabelece
a responsabilidade civil subjetiva, somente se refere ao acidente de
trabalho, acidente-tipo individual, diferente da poluição no ambiente
do trabalho, desequilíbrio ecológico no habitat de labor, que ocasiona as
doenças ocupacionais.”(14)

Sobre essa questão, João José Sady aponta inquietante contradição


lógica, que reforça a tese da responsabilidade objetiva para o caso das
indenizações provenientes das doenças ocupacionais:

“ Im aginem os, por exem plo, que o poluidor-pagador deve reparar,


independentemente de culpa, o prejuízo gerado pelo dano ambiental ao
terceiro. Como hipótese, examine-se o caso de uma empresa que polui
um rio destilando um poluente orgânico persistente, que gera doenças
terríveis para o empregado, assim como a degradação do curso de água.
O terceiro que tem uma propriedade ribeirinha prejudicada irá gozar do
conforto de tal responsabilidade objetiva do poluidor, enquanto o
empregado doente terá que provar a culpa da empresa?”(15)

Aliás, a respeito desse tema, por ocasião da 1ã Jornada de Direito Material


e Processual na Justiça do Trabalho realizada em Brasília em novembro de
2007, foi aprovado o Enunciado n. 38, com o seguinte teor: “Responsabilidade
civil. Doenças ocupacionais decorrentes dos danos ao meio ambiente

(14) ROCHA, Júlio César de Sá da. Direito am biental e m eio am biente do trabalho. São
Paulo: LTr, 1997. p. 67.
(15) SADY, João José. D ireito do meio ambiente do trabalho. São Paulo: LTr, 2000. p. 37.
' iDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 115

do trabalho. Nas doenças ocupacionais decorrentes dos danos ao meio


am biente do trabalho, a respon sabilid ade do em pregador é objetiva,
^terpretação sistem ática dos artigos 79, XXVIII, 200, VIII, 225, § 3e, da
Constituição Federal e do art. 14, § 1s, da Lei n. 6.938/1981.”

O Código de Proteção e Defesa do Consumidor, considerado um marco


no avanço da responsabilidade civil no Brasil, contempla abertamente a teoria
objetiva, prevendo a reparação independentemente da existência de culpa,
, alendo citar dois artigos principais:
“Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o im portador
respondem, independentem ente da existência de culpa, pela reparação dos danos
c a u sa d o s aos c o n s u m id o re s por d e fe ito s d e c o rre n te s de p ro je to , fa b ric a ç ã o ,
construção, montagem, fórm ulas, m anipulação, apresentação ou acondicionam ento
de seus produtos, bem com o por inform ações insuficientes ou inadequadas sobre
sua utilização e riscos.”

“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentem ente da existência de


culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à
prestação dos serviços, bem com o por inform ações insuficientes ou inadequadas
sobre sua fruição e riscos.”

A posição doutrinária, de que a responsabilidade civil subjetiva era a


egra básica no Brasil, restou superada ou, pelo menos, abalada, desde a
/igência do Código do Consumidor, que trouxe avanços extraordinários nessa
area. Desenvolvendo esse pensamento, pontua o Desembargador Sérgio
Cavalieri:

“Trata-se de diploma legislativo que, ao fazer da responsabilidade objetiva


regra para todas as relações de consumo, conquistou imenso território
que antes pertencia à responsabilidade subjetiva (...). E tudo ou quase
tudo em nossos dias tem a ver com o consumo, de sorte que não haverá
nenhuma impropriedade em se afirmar que hoje a responsabilidade
objetiva, que era exceção, passou a ter um campo de incidência mais
vasto do que a própria responsabilidade subjetiva.”(16)

Uma vez consolidada a estrutura básica da responsabilidade objetiva,


surgiram várias correntes com propostas de demarcação de seus limites,
oriando modalidades distintas da mesma teoria, mas todas gravitando em
:orno da ideia central de reparação do dano tão somente pela presença do
-isco, independentemente da comprovação de culpa do réu. Assim, podem
ser indicadas as teorias do risco proveito, do risco criado, do risco profissional,
do risco excepcional e do risco integral.

16) C AVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 156.
116 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Na teoria do risco proveito, aquele que se beneficia da atividade deve


responder pelos danos que seu empreendimento acarreta; quem se aproveita
dos bônus, deve suportar todos os ônus. A dificuldade prática dessa teoria
reside na indagação do que seria “proveito” , com a possibilidade de restringir
a reparação apenas quando haja proveito econômico.

A modalidade mais aceita e que supera o embaraço anterior é a do risco


criado, porquanto não indaga se houve ou não proveito para o responsável; a
reparação do dano é devida pela simples criação do risco. Segundo o saudoso
Caio Mário, “o conceito de risco que melhor se adapta às condições de vida
social é o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento uma
qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade gera
para os indivíduos, independentemente de determinar se em cada caso,
isoladamente, o dano é devido à imprudência, à negligência, a um erro de
conduta, e assim se configura a teoria do risco criado."^7)

A teoria do risco profissional considera que o dever de indenizar decorre


da atividade profissional da vítima, sendo que o seu desenvolvimento está
diretamente ligado aos acidentes do trabalho. Assevera Sérgio Cavalieri que
“a desigualdade econômica, a força de pressão do empregador, a dificuldade
do empregado de produzir provas, sem se falar nos casos em que o acidente
decorria das próprias condições físicas do trabalhador, quer pela sua
exaustão, quer pela monotonia da atividade, tudo isso acabava por dar lugar
a um grande número de acidentes não indenizados, de sorte que a teoria do
risco profissional veio para afastar esses inconvenientes.”(18)

A teoria do risco excepcional justifica o dever de indenizar, independen­


temente da comprovação de culpa, sempre que a atividade desenvolvida pelo
lesado constituir-se em risco acentuado ou excepcional pela sua natureza
perigosa. São exemplos: atividades com redes elétricas de alta tensão, ex­
ploração de energia nuclear, materiais radioativos etc.(19) Esclarece Carlos
Alberto Bittar que a teoria objetiva obteve sua aplicação mais elástica quando
da exploração pacífica do átomo, fazendo a responsabilidade incidir automa­
ticamente, em caso de acidente nuclear, sobre o explorador da atividade, em
uma verdadeira “responsabilidade automática” ou “obrigação legal de indeni­
zar”, em face da extraordinária exacerbação dos riscos nesse setor(20).

(17) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 270.
(18) C AVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 153-154.
(19) Ibidem, p. 154.
(20) BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil nas atividades perigosas. In: CAHALI,
Yussef Said (Coord.). R esponsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva,
1988. p. 97.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 117

A teoria do risco integral é considerada a modalidade extremada da


'esponsabilidade objetiva, já que exige somente o dano para acolher a
ndenização, mesmo que o prejuízo tenha ocorrido por culpa exclusiva da
/ííima, caso fortuito ou força maior(21). Dada a sua grande abrangência, essa
modalidade só é adotada em situações específicas indicadas em leis especiais,
como é o caso das indenizações devidas pelo seguro obrigatório — DPVAT
— às vítimas de acidentes de veículos, mesmo que o acidente tenha sido
:rovocado por veículo desconhecido ou que tenha ocorrido culpa exclusiva
za vítima(22).
Qualquer que seja a teoria adotada, percebe-se a preocupação cada
vez maior de não desam parar o lesado e que os danos sofridos sejam
'eparados. Em vez de concentrar o foco na pesquisa da ilicitude do evento
aanoso, preocupa-se mais em buscar ressarcir o dano injusto sofrido pela
vítima.
O fundamento da reparação dos danos, nas atividades de risco, repousa
"a violação do dever jurídico de garantir segurança ao trabalhador. Quanto
maior a probabilidade de ocorrer acidentes do trabalho, pela natureza da
atividade exercida, maior deverá ser a diligência patronal na adoção das
medidas preventivas. Pontua Sérgio Cavalieri que o dever jurídico violado, no
:aso de responsabilidade objetiva, é o dever de segurança que a lei estabelece,
mplícita ou explicitamente, para quem cria risco para outrem.(23)
Também anota com percuciência Roger Aguiar que “a introdução do
'isco como fator resolutivo da equação reparatória teve como propósito
'esponder ao ponto de tensão criado pela ausência de segurança e, com
isso, emitir para a sociedade uma mensagem de reafirmação de que esta —
a vivência em um ambiente seguro — era possível.”(24)
Em síntese, na atividade de risco, o empregador indeniza o acidentado
oorque violou o dever de segurança dos trabalhadores, que ficaram expostos
a uma maior probabilidade de sofrer danos. Considerando que não é possível
garantir totalm ente a segurança do trabalhador, procura-se proporcionar
relativa segurança jurídica. Se na sociedade atual os riscos são crescentes
e alguns danos praticamente inevitáveis ou mesmo previsíveis, é necessário,
pelo menos, assegurar aos prejudicados que não lhes faltarão a solidariedade,
a cooperação e a reposição dos prejuízos.

(21) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII. p. 15.
(22) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 161.
(23) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 155.
(24) AGUIAR, Roger Silva. Responsabilidade civil — a culpa, o risco e o medo. São Paulo:
Atias, 2011. p. 220.
118 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

O elastecimento das hipóteses de indenização está incrementando a


técnica contemporânea da contratação de seguro, como a melhor forma de
socializar os riscos, garantindo-se o amparo das vítimas, com a participação
indireta de todos, sem sobrecarregar demasiadamente aquele que explora a
atividade onde ocorreu o evento danoso. Com esse mesmo pensamento,
Gustavo Tepedino aponta os caminhos para a universalização do seguro
social, entrevendo-se uma espécie de “securitização das atividades produti-
vas”(25), ou “mutualização compulsória de danos” , como afirmou Patrícia Ser­
ra Vieira(26).

5.3. A teoria do risco acolhida no novo Código Civil

Como vimos nos itens anteriores, a responsabilidade objetiva no Brasil


era considerada exceção à regra principal da teoria subjetiva, uma vez que
tinha aplicação apenas em determinadas situações, nos casos previstos em
leis especiais. Faltava uma norma de caráter geral ou uma cláusula geral da
responsabilidade objetiva. Com o advento do Código Civil de 2002 não falta
mais, visto que foi adotada norma genérica encampando expressamente a
teoria do risco, no parágrafo único do art. 927, com o teor seguinte:
“ H averá obrigaçã o de re p a ra r o dano, in d e p en d e n te m e n te de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade norm almente desenvolvida pelo autor do
dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem .”

Ponderam, com acerto, Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri


que esse dispositivo do novo Código Civil, por sua extensão e importância e,
ainda, por não guardar relação de subordinação com o caput, deveria ter sido
disciplinado em artigo autônomo(27).

A previsão do parágrafo único do art. 927 do Código Civil representa a


consolidação da teoria da responsabilidade objetiva no Brasil, que passa a
conviver no mesmo patamar de importância e generalidade da teoria da
responsabilidade civil subjetiva. Desse modo, não se pode mais dizer que no
Brasil a responsabilidade objetiva tenha caráter residual ou de exceção. Nesse
sentido, vale transcrever o magistério de Maria Celina Bodin:

“De acordo com as previsões do Código Civil de 2002 pode-se dizer


que, comparativamente, a responsabilidade subjetiva é que se torna re­
sidual, tantas são as hipóteses de responsabilidade que independem da

(25) TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 184.
(26) SERRA VIEIRA, Patrícia Ribeiro. A responsabilidade civil objetiva do direito de danos.
Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 158.
(27) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. 2. ed. Comentários ao
novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 149.
■DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 119

culpa. Assim, cumpre mencionar, além da cláusula geral do parágrafo


único do art. 927, as previsões relativas à responsabilidade do amental
(art. 928), do empresário (art. 931), do transportador (art. 734), as diversas
hipóteses de responsabilidade indireta (arts. 932 e 933), a responsabili­
dade pelo fato dos animais (art. 936), a responsabilidade decorrente da
ruína (art. 937), isto é, inteiras searas do direito de danos, antes vincula­
das à culpa, hoje cumprem o objetivo constitucional de realização da
solidariedade social, através da ampla proteção aos lesados, cujos da­
nos sofridos, para sua reparação, independem completamente de negli­
gência, imprudência, imperícia ou mesmo da violação de qualquer dever
jurídico por parte do agente. São danos (injustos) causados por atos
lícitos, mas que, segundo o legislador, devem ser indenizados.”(28)

5.4. É aplicável a inovação do Código Civil no acidente do trabalho?

Cabe analisar, neste passo, se a norma geral da teoria do risco, prevista


”0 parágrafo único do art. 927, tem aplicação nas ações indenizatórias
decorrentes de acidente do trabalho. A partir do Código Civil de 2002, o
empregador arca com as indenizações quando ocorre acidente do trabalho,
mesmo quando não fica comprovada a sua culpa no evento?
A questão suscita fundadas controvérsias, formando-se duas tendências
ou correntes entre os doutrinadores. A primeira corrente entende que o
oarágrafo único do art. 927 não se aplica nas hipóteses de acidente do trabalho,
sob o argumento básico de que a Constituição da República tem norma
expressa estabelecendo como pressuposto da indenização a ocorrência de
oulpa do empregador: “Art. 7° São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais,
além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXVIII: seguro
contra acidentes de trabalho, a cargo do em pregador, sem e xclu ir a
indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;”
Assim, norma alguma de hierarquia inferior poderia contrariar a previsão
constitucional. Assevera Rui Stoco que, se a Constituição “estabeleceu, como
princípio, a indenização devida pelo empregador ao empregado, com base no
Direito Comum, apenas quando aquele obrar com dolo ou culpa, não se pode
orescindir desse elemento subjetivo com fundamento no art. 927, parágrafo
único, do CC.”(29) Afinado com esse pensamento registra enfaticamente Helder
Dal Col:

(28) MORAES, M aria Celina Bodin de. Risco, solidariedade e responsabilidade objetiva.
Revista RT, São Paulo, v. 854, p. 25, dez. 2006.
(29) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011. p. 719.
120 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

“Querer responsabilizar objetivamente o empregador por qualquer acidente


sofrido pelo empregado é fadar a relação de trabalho ao insucesso, tor­
nando-a inviável. A ele cabe a responsabilidade pela falha na preven­
ção, pelo excesso de jornada imposto, pela inobservância das regras de
ergonomia, segurança e outras, que comprometam a normalidade do
ambiente do trabalho ou das condições em que este devia ter-se realiza­
do, ou seja, quando cria condições inseguras para o trabalhador. O sis­
tema da culpabilidade subjetiva é, ainda, o mais coerente para fins de
reparação de danos, sobretudo quando estabelecido no país um siste­
ma de previdência social, que repara objetivamente o acidente, funcio­
nando como seguro contra a infortunística. E se pudesse ser tido como
atividade culposa do empregador, permitir o trabalho em atividades que
são perigosas por sua própria natureza, haveria séria justificativa para
desestimular a produção, agravando o desemprego, que já assola a so­
ciedade com índices crescentes e alarmantes.”<30)

A segunda corrente, ao contrário, sustenta que o novo dispositivo tem


inteira aplicação no caso de acidente do trabalho. Isso porque entendemos
que a previsão do inciso XXVIII mencionado deve ser interpretada em harmo­
nia com o que estabelece o caput do artigo respectivo, que prevê: “São direitos
dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de
sua condição social.” Assim, o rol dos direitos mencionados no art. 1- da
Constituição não impede que a lei ordinária amplie os existentes ou acres­
cente “outros que visem ã melhoria da condição social do trabalhador.” Como
lecionava o saudoso Arnaldo Süssekind, o elenco de direitos relacionados no
art. 1- é meramente exemplificativo, admitindo complementação(31). Aliás, no
julgamento da ADI n. 639 pelo STF, o Ministro relator Joaquim Barbosa ano­
tou nos fundamentos do voto: “Deve-se mencionar que o rol de garantias do
art. 7Qda Constituição não exaure a proteção aos direitos sociais”.

Poder-se-ia argumentar que a previsão do Código Civil, nesse ponto,


seria incompatível com o dispositivo constitucional. Também não enxergamos
dessa forma. A rigor, o preceito realmente consagrado no inciso XXVIII do
art. 1- é o de que cabe a indenização por reparação civil independentemente
dos direitos acidentários. Aliás, o art. 121 da Lei n. 8.213/1991 bem captou
esse princípio, ao estabelecer: “ O pagamento, pela Previdência Social, das
prestações p o r acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da
empresa ou de o u t r e m Observe-se que foi mencionada a responsabilidade
civil genericamente, o que permite concluir que todas as espécies estão

(30) DAL COL, H elder M artinez. R e sp o nsa b ilid a d e c iv il do em p re g ad o r: a cid e nte s do


trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 195.
(31) SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2001. p. 93.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o o u D oença O c u p a c io n a l 121

:ontempladas. Haveria incompatibilidade, se a redação do inciso XXVIII tivesse


:omo ênfase a limitação a uma espécie de responsabilidade, como, por exemplo,
se a redação fosse assim lavrada: Só haverá indenização por acidente do
trabalho quando o empregador incorrer em dolo ou culpa. Além disso, não há
dúvida de que a indenização do acidentado, com apoio na teoria da
responsabilidade objetiva, visa à melhoria da condição social do trabalhador
ou do ex-trabalhador, como previsto no caput do art. 1- da Constituição da
República. No mesmo sentido conclui o festejado Dallegrave Neto:

“Nem se diga, contudo, que o parágrafo único do art. 927 do novo Código
Civil é inconstitucional por suposta afronta à parte final do art. 1-, XXVIII,
da C o nstitu ição Federal. A m elhor exegese sistêm ica da ordem
constitucional garante legitimidade ao parágrafo único do art. 927 do novo
Código Civil, uma vez que o caput do art. 1- da Constituição Federal
assegura um rol de direitos mínimos sem prejuízo de outros que visam à
melhor condição social do trabalhador.”(32)

Discussão semelhante ocorreu quando a Lei n. 8.213/1991 instituiu, no


art. 118, a estabilidade provisória do acidentado, pelo período de um ano,
após a alta concedida pela Previdência Social. Os defensores da inconstitu-
cionalidade desse dispositivo argumentavam que, diante da previsão do art.
7-, I, da Constituição Federal, somente lei complementar poderia criar nova
estabilidade. Superada a hesitação inicial, a jurisprudência acabou por rejei­
tar a inconstitucionalidade aventada, mormente após o julgamento, no dia 13
de abril de 1992, da Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade
n. 639, quando o STF, na sua composição plenária, por votação unânime,
indeferiu o pleito de suspensão do art. 118 mencionado. Finalmente, na Ses­
são Plenária do dia 02 de junho de 2005 essa Ação Direta de Inconstituciona­
lidade foi julgada improcedente, superando de vez qualquer questionamento.

Por outro lado, a prevalecer o entendimento da primeira corrente, chega­


ríamos a conclusões que beiram o absurdo ou ferem a boa lógica. Se um
autônomo ou um empreiteiro sofrer acidente, o tomador dos serviços respon­
de pela indenização, independentemente de culpa, com apoio na teoria do
risco; no entanto, o trabalhador permanente, com os devidos registros forma­
lizados, não tem assegurada essa reparação! Se um bem ou equipamento de
terceiros for danificado pela atividade empresarial, haverá indenização, con­
siderando os pressupostos da responsabilidade objetiva, mas o trabalhador,
exatamente aquele que executa a referida atividade, ficará excluído.,.(33).

(32) DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 4.


ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 392.
(33) Ponto de vista sem elhante adota o ju rista e ju iz R odolfo P am plona Filho, quando
assevera, com razão: “A aceitar tal posicionam ento, vem o-nos obrigados a reconhecer o
122 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

Conforme menciona Adib Salim, “não se poderia pensar que, em um acidente


que atingisse diversas pessoas, dentro do exercício de uma atividade em­
presarial com risco inerente, a empresa respondesse objetivamente em rela­
ção a todos, à exceção dos seus empregados.”(34)

Não se deve esquecer que o desenvolvim ento da responsabilidade


objetiva tem estreita ligação histórica com a questão dos acidentes do trabalho.
É principalmente nesse tema, tão aflitivo para o trabalhador, que a teoria do
risco encontra a primazia de sua aplicação e a maior legitimidade dos seus
preceitos. Vale reproduzir, neste sentido, a lição sempre abalizada de Caio
Mário:

“O caso mais flagrante de aplicação da doutrina do risco é o da indeniza­


ção por acidente no trabalho. Historicamente, assenta na concepção
doutrinária enunciada por Sauzet na França, e por Sainctelette na Bélgi­
ca, com a observação de que na grande maioria dos casos os acidentes
ocorridos no trabalho ou por ocasião dele, restavam não indenizados. A
desigualdade econômica, a força de pressão do empregador, a menor
disponibilidade de provas por parte do empregado levavam frequente­
mente à improcedência da ação de indenização. Por outro lado, nem
sempre seria possível vincular o acidente a uma possível culpa do pa­
trão, porém causada direta ou indiretamente pelo desgaste do material
ou até pelas condições físicas do empregado, cuja exaustão na jornada
de trabalho e na monotonia da atividade proporcionava o acidente. A
aplicação da teoria da culpa levava bastas vezes à absolvição do em­
pregador. Em tais hipóteses, muito numerosas e freqüentes, a aplicação
dos princípios jurídicos aceitos deixava a vítima sem reparação, contra­
riamente ao princípio ideal de justiça, embora sem contrariedade ao di­
reito em vigor. Observava-se, portanto, um divórcio entre o legal e o
justo. ”(35)

Por ocasião da IV Jornada de Direito Civil promovida em Brasília pelo


Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, em outubro
de 2006, foi adotado um Enunciado importante na linha de pensamento da
segunda corrente: “Enunciado n. 377 — O art. 7S, inc. XXVIII, da Constituição

seguinte paradoxo: o em pregador, pela atividade exercida, responderia objetivam ente pelos
danos por si causados, mas, em relação a seus empregados, por causa de danos causados
justam ente pelo exercício da m esm a atividade que atraiu a responsabilização objetiva,
teria um direito a responder subjetivam ente... Desculpe-nos, mas é m uito para o nosso
fígado...” Responsabilidade civil nas relações de trabalho e o novo Código Civil brasileiro.
Revista LTr, São Paulo, v. 67, p. 563, maio 2003.
(34) SALIM, Adib Pereira Netto. A teoria do risco criado e a responsabilidade objetiva do
empregador em acidentes de trabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 69, p. 461, abr. 2005.
(35) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 275.
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 123

-ederal não é impedimento para a aplicação do disposto no art. 927, parágrafo


único, do Código Civil quando se tratar de atividade de risco.”

De forma semelhante, na 1ã Jornada de Direito Material e Processual na


Justiça do Trabalho realizada em Brasília em novembro de 2007, foi aprovado
o Enunciado n. 37, com o seguinte teor: “Responsabilidade civil objetiva
no acidente de trabalho. Atividade de risco. Aplica-se o art. 927, parágrafo
jn ico , do Código Civil nos acidentes do trabalho. O art. 7-, XXVIII, da
Constituição da República, não constitui óbice à aplicação desse dispositivo
legal, visto que seu caput garante a inclusão de outros direitos que visem à
melhoria da condição social dos trabalhadores.”

Como se depreende do exposto, entendemos perfeitamente aplicável,


com as devidas ponderações, a teoria do risco na reparação civil por acidente
do trabalho.

Nas decisões recentes do Tribunal Superior do Trabalho sobre indeni­


zações por acidente do trabalho está prevalecendo a corrente que admite a
aplicação da responsabilidade civil objetiva, quando o empregador explora
atividade de risco:
“Recurso de em bargos interposto na vigência da Lei n. 11.496/2007. A cidente de
trabalho. Dano moral. R esponsabilidade civil do empregador. Teoria do risco. Art.
7-, cap ut e inciso XXVIII, da C onstituição Federal. R esponsabilidade objetiva.
Motorista. Acidente automobilístico. Possibilidade. O caput6o art. 7a da Constituição
Federal constitui-se tipo aberto, vocacionado a albergar todo e qualquer direito quando
m a te ria lm e n te v o lta d o ã m e lh o ria da c o n d iç ã o s o c ia l do tr a b a lh a d o r. A
resp onsabilid ade s u b je tiva do em pregador, pre vista no inciso XXVI11 do referido
preceito constitucional, desponta, sob tal perspectiva, como direito mínimo assegurado
ao obreiro. Trata-se de regra geral que não tem o condão de excluir ou inviabilizar
outras formas de alcançar o direito ali assegurado. Tal se justifica pelo fato de que,
não raro, afigura-se difícil, se não impossível, a prova da conduta ilícita do empregador,
tornando intangível o direito que se pretendeu tutelar. Não se pode alcançar os ideais
de ju s tiç a e e q uida d e do tra b a lh a d o r — ínsitos à te o ria do risco — , ad m itin d o
interpretações mediante as quais, ao invés de tornar efetivo, nega-se, por equivalência,
o d ire ito à re p a ra ç ã o p re v is ta na C a rta M a g n a . C o n s e n tâ n e o com a o rd e m
constitucional, portanto, o entendim ento segundo o qual é aplicável a parte final do
parágrafo único do art. 927 do CCB, quando em discussão a responsabilidade civil
do empregador por acidente de trabalho. Verifica-se, ademais que, no caso concreto,
a atividade de m otorista exercida pelo Reclamante configura-se de risco. A despeito
de tratar-se de um ato da vida comum — dirigir automóvel, que estaria inserido, como
tal, no risco genérico, a frequência do exercício de tal atividade, necessária e habitual
à consecução dos objetivos patronais, expõe o Reclamante a maior probabilidade de
sinistro. Esse é o entendimento que adoto acerca do assunto, não obstante tenho me
posicionado de form a diversa no âmbito da Quarta Turma, por questão de disciplina
judiciária. Embargos conhecidos e desprovidos.” TST. SDI-1. E-ED-RR n. 102300-
42.2007.5.03.0016, Rei.: Ministra Maria de Assis Calsing, DJ 18 nov. 2011.

“Dano moral. Acidente do trabalho. Risco inerente à atividade. Responsabilidade


objetiva. A atividade de transporte de valores em carro forte é, pela sua natureza,
124 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

indubitavelmente uma atividade de risco acentuado e, de acordo com o art. 2° da CLT,


os riscos da atividade econômica devem ser suportados pelo empregador. Saliente-
-se que, em bora o art. 7a, inc. XXVIII, da C onstituição da República estabeleça a
o b rig a ç ã o do e m p re g a d o r, q u a n d o in c o rre r em d olo ou cu lp a , de in d e n iz a r o
empregado em razão de acidente de trabalho, o caput desse dispositivo ressalta que
os direitos ali previstos não o são de form a taxativa, ao dispor — além de outros que
visem à m elhoria de sua condição social — . D essa form a, não há im pedim ento
constitucional para a incidência do art. 927 do C ódigo Civil, que no seu parágrafo
único dispõe: — Haverá obrigação de reparar o dano, independentem ente de culpa,
nos casos especificados em lei, ou quando a atividade norm alm ente desenvolvida
pelo autor do dano implicar, p o r sua natureza, risco para os direitos de outrem. Dessa
forma, revela-se objetiva a responsabilidade do empregador quando há risco inerente
à sua atividade. Recurso de Embargos de que se conhece e a que se dá provim ento.”
TST. SDI-I. E-RR n. 84700-90.2008.5.03.0139, Rei.: Ministro João Batista Brito Pereira,
DJ 11 dez. 2009.

“Recurso de embargos interposto na vigência da Lei n. 11.496/2007. — indenização


por dano moral. Acidente do trabalho. Responsabilidade do empregador. A previsão
insculpida no parágrafo único do art. 927 do Código Civil é aplicável nas indenizações
por acidente do trabalho, visto que o caput do art. 7e da Constituição da República
relaciona os direitos mínimos dos trabalhadores, mas assegura a inclusão de outros
que visem à melhoria da sua condição social. Desse modo, a responsabilidade civil
de natureza objetiva pode ser aplicada nos casos em que o trabalhador foi vítim a de
a c id e n te a u to m o b ilís tic o , o c o rrid o no e x e rc íc io e em d e c o rrê n c ia da a tiv id a d e
desem penhada para a Reclamada, porque não há dúvida de que a função de motorista
no transporte rodoviário de carga enquadra-se como de risco acentuado e, uma vez
dem o n stra d o o dano e o nexo causal, é im p e rio so c o n c lu ir pelo c a b im e n to da
indenização, independentemente da comprovação de culpa do empregador. Embargos
conhecidos por divergência jurisprudencial e desprovidos.” TST. SDI-1. E-RR — 31100-
91.2007.5.17.0013, Rel.: Desembargador Convocado Sebastião Geraldo de Oliveira,
DJ 11 nov. 2011.

“ In d e n iz a ç ã o p o r d a n o s m o ra is e m a te ria is — A c id e n te de tr a b a lh o —
R esp o n sab ilid ad e o bjetiva — A tivid ad e de risco — S erviço de v ig ilâ n c ia —
P o s s ib ilid a d e . 1. O art. 7 S, X X V III, da CF e s ta b e le c e co m o c o n d iç ã o para a
re spo nsa bilida d e do em p re g ad o r por danos m a te ria is ou m orais d e co rre nte s de
acidente de trabalho a existência de dolo ou culpa. Assim, a jurisprudência e doutrina
p re d o m in a n te s têm a firm a d o que a re s p o n s a b ilid a d e que se e x tra i do te x to
constitucional é de natureza subjetiva, a exigir, portanto, além do dano e do nexo de
causalidade, a dem onstração de culpa por parte do agressor. 2. O C ódigo Civil de
2002, em seu art. 927, parágrafo único, em homenagem à — teoria do risco criado — ,
prevê a possibilidade de se reconhecer a responsabilidade de natureza objetiva, ao
dispor que — haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos
casos especificados em lei, ou quando a atividade norm alm ente desenvolvida pelo
a u to r do dano im p lica r, por sua n atureza, risco para os d ire ito s de outre m . 3.
Pessoalmente, entendo que, em matéria trabalhista, o direito positivo brasileiro alberga
tão som ente a teoria da responsabilidade subjetiva, diante do que expressam ente
preceitua o art. 1°, XXVIII, da CF, não havendo dúvidas de que a responsabilidade
civil do em pregador deve sempre derivar de culpa ou dolo do agente da lesão. Nesse
mesm o sentido, entendo que a teoria do risco criado não se aplica a hipóteses em
que o obreiro, no desenvolvim ento de suas atividades laborais, sofre, sem culpa ou
dolo do empregador, acidente/lesão decorrente de ação praticada por terceiro estranho
à relação empregatícia, pois, nessas situações, o — autor do dano — de que trata o
'JDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 125

parágrafo único do art. 927 do CC, a toda evidência, não é o empregador. Com efeito,
não havendo por parte do empregador nenhuma conduta com issiva ou omissiva, a
lesão não é passível de lhe ser imputada, pois ausente um dos elementos necessários
à caracterização da obrigação de reparar o dano, qual seja, o nexo causal. 4. Contudo,
tem a jurisprudência m ajoritária desta Corte se direcionado no sentido de considerar
que a teoria do risco criado tem aplicabilidade nas situações em que a atividade
d e s e n v o lv id a pelo e m p re g a d o r ve n h a a c a u s a r ao tra b a lh a d o r um risco m ais
acentuado do que aos demais membros da coletividade, como é o caso do serviço de
vigilância. 5. Aos que objetam cuidar-se de preceito inaplicável à esfera das relações
laborais, ante as condições contidas no art. 7S, XXVII, da CF, sustenta-se que a leitura
restritiva do texto constitucional contrariaria o próprio espírito da Carta, relativamente
aos direitos funda m e n ta is do trabalho, no que estabelece apenas um núcleo de
garantias essenciais que, por sua própria natureza, não pode excluir outros direitos
que venham a ser reconhecidos no plano da legislação infraconstitucional doméstica
(art. 7-, caput, da CF) ou mesmo no direito internacional (art. 59, § 3fi, da CF), consoante
o entendimento adotado em diversos precedentes do TST e dos quais guardo reserva,
exatam ente por inovarem na ordem jurídica. 6. Na hipótese dos autos, é incontroverso
que a Empregadora é em presa que atua na área de segurança privada, o que revela
a existência do pressuposto indicado no parágrafo único do art. 927 do CC, atraindo
a responsabilização objetiva. 7. Por conseguinte, à luz da teoria do risco criado, as
indenizações por danos morais e materiais decorrentes de disparo de arma de fogo
sofrido pelo Empregado, em seu labor como vigilante, impõe-se, independentemente
de culpa das Reclamadas, razão pela qual o acórdão regional merece ser reformado,
com o reconhecim ento das indenizações pleiteadas, o que implica a restituição da
sentença quanto a esse particular. Recurso de revista provido.” TST. 1- Turma. RR n.
90600-80.2007.5.15.0066, Rei.: Ministro Ives Gandra Martins Filho, DJ 4 maio 2012.

“Acidente de trabalho. Doença ocupacional. Desossa de aves. Responsabilidade


objetiva da empregadora. Compatibilidade. Art. 7-, XXVIII, da CF e art. 927, parágrafo
único, do C ód ig o C ivil. T ra ta n d o -se de a tivid a de e m presarial, ou de dinâm ica
laborativa (independentem ente da atividade da empresa), fixadoras de risco para os
trabalhadores envolvidos, desponta a exceção ressaltada pelo parágrafo único do
art. 927 do C C, to rn a n d o o b je tiv a a re s p o n s a b ilid a d e e m p re s a ria l p o r da n o s
acidentários (responsabilidade em face do risco). Na hipótese dos autos, extrai-se do
acórdão regional que a empregada trabalhava no setor de desossa de frangos, com
o d e se m p e n h o de a tiv id a d e s que e xig ia m m o vim e n to s re p e titiv o s , qu a n d o foi
acom etida de doença ocupacional que acarretou seu afastam ento do trabalho e
c o n se q ü e n te gozo de a u x ílio -d o e n ç a a c id e n tá rio . S e g u n d o c o n sta do a có rd ã o
Regional, a em presa possui — eficiente program a de prevenção, equipe médica e
fisio te ra p e u ta , g in á s tic a no local de tra b a lh o , e n fe rm e iro s e sp e c ia liz a d o s — , e
desenvolve — estudo constante para m elhorar as condições do trabalho de seus
funcionários. Adem ais, a teor do acórdão regional, a em presa não só cum pre as
normas de saúde e segurança no trabalho, como implementa — outras medidas que
objetivam evitar a ocorrência de lesões e doenças ocupacionais nos empregados — , e,
com re la ç ã o à R e c la m a n te , a d o to u p ro v id ê n c ia s e s p e c ífic a s , ta is c o m o o
rem anejamento de função, solicitado pelo médico da própria empresa, bem como o
oferecim ento de tratam ento fisioterápico. O corre que a função desenvolvida pela
R e c la m a n te , p o r fo rç a do seu c o n tra to de tra b a lh o , a tra i a a p lic a ç ã o da
responsabilidade civil objetiva ao em pregador, porque resulta em exposição do
empregado a risco exacerbado. Observe-se que o Regulamento da Previdência Social,
em atenção ao art. 22, II, “c ”, da Lei n. 8.212, de 24 de ju lh o de 1991, considera a
atividade preponderante exercida em frigorífico para abate de anim ais como de risco
grave para ocasionar incapacidade laborativa decorrente dos riscos am bientais do
126 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

trabalho (anexo V do Decreto n. 3.048, de 6 de m aio de 1999, com a redação do


Decreto n. 6.957, de 9 de setem bro de 2009). Ressalte-se, ainda, que o próprio acórdão
re g io n a l re la ta a e x is tê n c ia de o u tra s d e m a n d a s em que se b uscou a p u ra r a
responsabilidade da em presa em razão de doença ocupacional por esforço repetitivo
na a tividade d esem penhada, a e x istê n cia de d e n ú n cia s perante a P ro curadoria
Regional do Trabalho de lesões ocorridas principalmente no setor de corte de aves e
no se to r de processam ento de lingüiças, bem com o a c ircu n stâ n cia de te r sido
instaurado inquérito civil com a fin a lid a d e de apurar possíveis irregularidades no
am biente de trabalho da empresa, assim como de ter se realizado fiscalização pela
DRT. Assim, a Reclamada deve responder pelos prejuízos sofridos pela empregada
no desem penho de suas funções, em d e co rrê n cia da re sp o n sa b ilid a d e o b jetiva
legalm ente fixada. Evidentem ente que a conduta da empresa, buscando m inorar o
risco, influi, em seu favor, na fixação do montante indenizatório. Recurso de revista
conhecido e provido em parte.” TST. 3ã Turma. RR n. 1755-87.2010.5.18.0000, Rei.:
Ministro Mauricio Godinho Delgado, DJ 19 out. 2012.

Finalmente, merece registro, neste tópico, o entendimento adotado por


ocasião da 1- Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho,
realizada em Brasília em novembro de 2007, no sentido de que é aplicável a
responsabilidade civil objetiva quando o acidentado for empregado de pessoas
jurídicas de Direito Público interno: “Enunciado 40. Responsabilidade civil.
Acidente do trabalho. Empregado público. A responsabilidade civil nos
acidentes do trabalho envolvendo empregados de pessoas jurídicas de Direito
Público interno é objetiva. Inteligência do art. 37, § 62, da Constituição Federal
e do art. 43 do Código Civil.”

5.5. Extensão da responsabilidade objetiva do novo Código Civil

Uma vez concluído que é aplicável a teoria do risco nas indenizações


por acidente do trabalho, cumpre-nos analisar a extensão e os contornos da
cláusula geral de responsabilidade objetiva, conforme insculpida no Código
Civil de 2002, com maior ênfase para o tema deste livro. Estabelece o parágrafo
único do art. 927:
“ H averá obriga çã o de re p a ra r o dano, in d e p e n d e n te m e n te de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do
dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem .”

Primeiramente, convém enfatizar que só haverá indenização se houver


dano; o simples exercício da atividade de risco não gera ressarcimento a
título de responsabilidade civil. Pode até ser que a exposição ao risco acarre­
te o pagamento do adicional de periculosidade ou insalubridade, mas para
deferimento da indenização será imprescindível a constatação de algum dano.
Merece destaque, também, o fato de que a reparação ocorrerá independente­
mente de culpa, bastando que haja o dano e o nexo de causalidade deste
com a atividade desempenhada pela vítima.
> .: e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o o u D oença O c u p a c io n a l 127

O enunciado da primeira parte do dispositivo, de que haverá indenização,


-dependentemente de culpa, nos casos especificados em lei, “torna certo
: je continuam em vigor as leis especiais que, antes do novo Código, já haviam
::nsagrado a responsabilidade objetiva. Portanto, o Código de Defesa do
I :nsum idor e outros diplomas legais não foram revogados.”(36) Esse cuidado
: : legislador previne eventual discussão sobre a validade ou a convivência
das regras especiais, atuais ou futuras, em confronto com a inovação do
Código Civil de 2002.
O texto legal, ao mencionar a atividade normalmente desenvolvida pelo
a J o rd o dano, deixa claro que a indenização não decorre do comportamento
do sujeito, ou seja, havendo o dano, não é necessário que haja comprovação
de qualquer ação ou omissão do empregador, como previsto no art. 186 do
Código Civil, para gerar a reparação, porquanto ela decorre tão somente do
exercício da atividade de risco, dentro da concepção histórica da responsa-
: idade objetiva(37). O vocábulo “atividade”, especialmente quando analisado
para a hipótese do acidente do trabalho, indica a prestação de serviço condu­
zida pelo empregador, tanto pelo conceito estampado no art. 2- da CLT(38),
:uanto pelo que estabelece o art. 3° § 2-, do Código de Defesa do Consumi­
dor, ao mencionar que “serviço é qualquer atividade”.

Neste ponto, porém, surge a indagação: pela responsabilidade objetiva,


: dano proveniente do exercício de qualquer atividade gera para o acidentado
o direito à reparação? A resposta sem dúvida é negativa, porque o dispositivo
expressamente limita a indenização aos danos ocorridos naquelas atividades
que, por sua natureza, impliquem riscos para os direitos de outrem. Enfatiza
Roger Silva Aguiar que “o princípio geral firmado no art. 927, parágrafo único,
nicia-se com a conjunção quando, denotando que o legislador acolheu o
entendimento de que nem toda atividade humana importa em ‘perigo’ para
:erceiros com o caráter que lhe foi dado na terceira parte do parágrafo.”<39)
Apesar de resolvida essa primeira dúvida, continuamos diante de um
problema embaraçoso, porque todos os afazeres humanos, em maior ou menor

36) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Zódigo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 150.
37) “A responsabilidade, fundada no risco, consiste, portanto, na obrigação de indenizar o
:ano produzido por atividade exercida no interesse do agente e sob o seu controle, sem
:u e haja qualquer indagação sobre o com portam ento do lesante, fixando-se no elemento
:ojetivo, isto é, na relação de causalidade entre o dano e a conduta do seu causador.” Cf.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro', responsabilidade civil. 21. ed. São
Daulo: Saraiva, 2007. v. 7, p. 51.
38) CLT — Art. 22: “C onsidera-se em pregador a em presa, individual ou coletiva, que,
assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal
se serviço.”
39) AGUIAR, Roger Silva. Responsabilidade civil objetiva: do risco à solidariedade. São
-aulo: Atlas, 2007. p. 50.
128 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

grau, implicam riscos; as estatísticas indicam, por exemplo, que ocorrem


acidentes do trabalho em todos os ramos de atividade. Então, como separar
o risco que autoriza o direito à reparação daquele que o torna incabível? Ou,
por outro enfoque, a partir de que grau de risco da atividade do empregador o
acidentado passa a ter direito ã indenização, independentem ente de
comprovação da culpa patronal?

Antes de tentar elaborar uma resposta, é conveniente m encionar


dispositivos semelhantes no Direito Comparado para ajudar na compreensão
do alcance da inovação do Código Civil de 2002:
C ó d ig o C ivil da Itália: A rt. 2.050. Q u a lq u e r um que ca u sa dano a outrem no
desenvolvim ento de uma atividade perigosa, por sua natureza ou pela natureza dos
meios em pregados, é obrigado a indenizar se não provar haver adotado todas as
medidas idôneas para evitar o dano.(40)

Código Civil do México: Articulo 1913. Cuando una persona hace uso de mecanismos,
instrumentos, aparatos o substancias peligrosas por si mismos, por Ia velocidad que
desarrollen, por su naturaleza explosiva o inflamable, por Ia energia de Ia corriente
electrica que conduzcan o por otras causas analogas, está obligada a responder dei
dano que cause, aunque no obre ilicitamente, a no ser que dem uestre que ese dano
se produjo por culpa o negligencia inexcusable de Ia victima.

Código Civil de Portugal: Artigo 493®. 2. Quem causar danos a outrem no exercício
de uma actividade, perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios
utilizados, é ob rigado a repará-los, e xcepto se m ostrar que em pregou todas as
providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir.

De início, convém assinalar que a previsão do Código Civil italiano


representou um grande avanço para a sua época (1942), porque passou a
exigir daquele que explora atividade perigosa um comportamento preventivo
e cauteloso muito acima do exigido para o homem médio, o bonus pater
familias, visto que o réu só fica desonerado da indenização se comprovar
que adotou “todas as medidas idôneas a evitar o dano” .
O Código Civil brasileiro, no entanto, promulgado já no século XXI, foi
além dos dispositivos citados, que tiveram como base de inspiração o Código
Civil italiano de 1942. Nos textos legais alienígenas mencionados, o enfoque
principal está centrado nos danos decorrentes das “atividades perigosas”,
sem que haja “provas da adoção de todas as medidas idôneas a evitar o
dano”, ao passo que o preceito legal brasileiro, bem mais abrangente e
favorável à vítima, só exige como pressuposto para reparação do dano o
exercício de “atividades que implicam riscos para os direitos de outrem”.

(40) No original: “Chiunque cagiona danno ad altri nello svolgim ento di un’attività pericolosa,
per sua natura o per Ia natura dei mezzi adoperati, è tenuto al risarcimento se non prova di
avere adottato tutte le misure idonee a evitare il danno.”
•OENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 129

Não se pode equiparar, para efeitos jurídicos, os vocábulos risco e perigo,


-*na vez que a frase atividades que im plicam riscos não tem o mesmo
s gnificado de atividades perigosas. Aqueles que defendem, sem maior
acrofundamento, a aplicação da responsabilidade objetiva somente nas
■ oóteses de atividades perigosas, como ocorre nos países mencionados,
estão, a bem da verdade, tentando reduzir ou limitar a amplitude normativa do
:exto legal brasileiro.
Do ponto de vista técnico, a diferença entre risco e perigo pode ser
verificada na redação do art. 193 da CLT:
“São consideradas atividades ou operações perigosas, na form a da regulamentação
aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou
métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente
do trabalhador a: I — inflam áveis, explosivos ou energia elétrica; II — roubos ou
outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal
ou patrim onial.”

Pelo enunciado desse artigo, pode-se concluir que atividade perigosa é


aquela exercida em condições de risco acentuado ou de alto risco. A NR — 26
da Portaria do Ministério do Trabalho n. 3.214/1978, que trata da sinalização de
segurança nos locais de trabalho, estabelece que a palavra de advertência
'oerigo” deve ser usada para indicar substâncias que apresentam alto risco;
cuidado” para as substâncias que apresentam risco médio e “atenção” para
substâncias que apresentam risco leve. O engenheiro André Lopes Netto, ex-
-cresidente da Sociedade Brasileira de Engenharia de Segurança, discorrendo
sobre a confusão a respeito desses dois termos, esclarece que risco é a
orobabilidade da ocorrência de um evento que cause ou possa causar dano”,
enquanto perigo é a “situação ou condição em que o risco seja acentuado.”(41)
Buscar a precisão dos termos técnicos é fundamental para apreender o
alcance da norma. Como bem disse Alfredo Buzaid, na exposição de motivos
zo CPC de 1973, “o rigor da ciência jurídica depende substancialmente da
: ureza da linguagem não devendo designar com um nome comum institutos
:iversos, nem institutos iguais com nomes diferentes.” A presunção, portanto,
e que o legislador tenha preferido a linguagem técnica, especialmente neste
:ema de extraordinária relevância, conforme o ensinamento de Carlos Maxi-
-ilia n o : “Todas as ciências, e entre elas o Direito, têm a sua linguagem
crópria, a sua tecnologia; deve o intérprete levá-la em conta... A lingua­
gem tem por objetivo despertar, em terceiros, pensamentos semelhantes ao
caquele que fala; presume-se que o legislador se esmerou em escolher ex-
cressões claras e precisas, com a preocupação meditada e firme de ser bem
compreendido e fielmente obedecido.”(42)

41) LOPES NETTO, André. Risco e perigo. Revista CIPA, São Paulo, v. XXVI, n. 311, p. 100,
out. 2005.
42) MAXIM ILIANO, Carlos. Herm enêutica e aplicação do direito. 9. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1984. p. 109, 111.
130 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

O Desembargador paulista Carlos Roberto Gonçalves, ao comparar o


parágrafo único do art. 927 com o art. 2.050 do Código Civil italiano, concluiu
que o Código brasileiro adotou solução mais avançada e mais rigorosa,
porquanto não prevê a possibilidade de o agente, mediante a inversão do
ônus da prova, exonerar-se da responsabilidade civil, demonstrando que
adotou todas as medidas aptas para evitar o dano(43).

Com pensamento semelhante registra o Professor Anderson Schreiber


na sua percuciente tese de doutoramento sobre os novos paradigmas da
responsabilidade civil, defendida na Itália em 2006: “Foi, contudo, mais além
a nova codificação brasileira, ao optar francamente pela responsabilidade
objetiva, e não por um sistema intermediário, de presunção de culpa, como
fizeram os legisladores português e italiano.”(44)

O relato insuspeito de Miguel Reale confirm a o que estam os aqui


defendendo(45). Informa o saudoso mestre que houve proposta de inclusão de
uma ressalva no parágrafo único do art. 927, com o seguinte teor: “salvo se
comprovado o emprego de medida de prevenção tecnicamente adequada.”
O acréscimo dessa restrição, no entanto, foi rejeitado peio entendimento de
que o dispositivo do projeto estava consagrando a doutrina do risco, com
fundamento na responsabilidade objetiva(46). Como se vê, as ressalvas que
reduzem a abrangência da responsabilidade do causador do dano, previstas
nos Códigos da Itália e de Portugal, não foram adotadas no texto que resultou
no Código Civil de 2002. Logo, é imperioso concluir que o preceito legal
brasileiro ampliou intencionalmente a proteção em favor da vítima.
Depois dessa digressão necessária, voltemos à pergunta: a partir de
que grau de risco da atividade do empregador a vítima passa a ter direito à
indenização?
Esclarece mais uma vez Miguel Reale, o grande maestro do projeto do
Código Civil: “quando a estrutura ou natureza de um negócio jurídico como o
de transporte ou de trabalho, só para lembrar os exemplos mais conhecidos,
implica a existência de riscos inerentes à atividade desenvolvida, impõe-se a
responsabilidade objetiva de quem dela tira proveito, haja ou não culpa.”(47)

(43) G O NÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 241.
(44) SCHREIBER, Anderson. Novos paradigm as da responsabilidade civil: da erosão dos
filtros da reparação à diluição dos danos. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 22.
(45) O jurista e filósofo Miguel Reale confessa que foi dele a sugestão de incluir no Código
Civil a responsabilidade civil de natureza objetiva, conforme redação do art. 927, parágrafo
único. Cf. História do novo Código Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 21.
(46) REALE, Miguel. História do novo Código Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
p. 21.
(47) Ibidem, p. 235.
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 131

Entendemos, porém, que na hipótese de acidente do trabalho a questão


:everá ser analisada casuisticamente, considerando a natureza da atividade
;o empregador, ou seja, o grau específico de risco da sua atividade, daí a
expressão explicativa colocada no texto legal “por sua natureza”. A propósito,
:onclui o professor Clayton Reis que a redação do artigo pode ser assim
/aduzida: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,
cuando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar a
oossibilidade de gerar prejuízos ou riscos para os direitos de outrem.(48)
De fo rm a s e m e lh a n te , nos “ P rin c íp io s de D ire ito E u rop eu da
Responsabilidade Civil” , elaborados por mais de uma década pelo European
3roup on Tort Law e divulgados em 2005, está prevista a responsabilidade
celos danos causados, independentemente de culpa, quando a atividade criar
um risco previsível e bastante significativo de dano, mesmo com observância
:o cuidado devido” , sendo que o “ risco de dano pode ser considerado
significativo tendo em consideração a gravidade ou a probabilidade do dano.”(49)
É verdade que todos que estamos vivos corremos riscos, entretanto,
Determinadas ocupações colocam o trabalhador num degrau de m aior
:robabilidade de sofrer acidentes, em razão da natureza ou da periculosidade
ntrínseca da atividade patronal. A partir desse pensamento que traduz a
essência do preceito legal, a diretriz aprovada na 1§ Jornada de Direito Civil,
cromovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal
em 2002, aponta um interessante critério de interpretação para identificar os
r scos que propiciam a aplicação da responsabilidade civil objetiva:
“Enunciado 38 — Art. 927: A responsabilidade fundada no risco da atividade, como
prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo C ódigo Civil,

^8) REIS, Clayton. A teoria do risco na modernidade — uma antevisão do futuro. In: LEITE,
Eduardo de Oliveira (Coord.). Grandes temas da atualidade — Responsabilidade civil. Rio
:3 Janeiro: Forense, 2006. v. 6, p. 70.
-9 ) Capítulo 5. Responsabilidade objectiva — Art. 5:101. Actividades anorm alm ente
oerigosas. (1) Aquele que exercer uma actividade anorm almente perigosa é responsável,
"dependentem ente de culpa, peios danos resultantes do risco típico dessa actividade. (2)
Jm a actividade é considerada anorm almente perigosa quando: a. cria um risco previsível e
rastante significativo de dano, mesm o com observância do cuidado devido, e b. não é
:ojecto de uso comum. (3) O risco de dano pode ser considerado significativo tendo em
:onsideração a gravidade ou a probabilidade do dano. (4) Este artigo não recebe aplicação
:om respeito a um a actividade e specificam ente sujeita ao regim e da responsabilidade
:ojectiva por uma outra disposição destes Princípios, da legislação nacional ou de uma
Convenção Internacional. Art. 5:102. Outras fontes de responsabilidade objectiva — (1)
As leis nacionais podem estabelecer outras categorias de responsabilidade objectiva por
actividades perigosas, mesmo que essas actividades não sejam anorm almente perigosas.
(2) Salvo se a lei nacional dispuser em sentido contrário, as disposições que estabelecem
jm a responsabilidade objectiva podem ser aplicadas analogicamente a situações de risco
:om parável. Disponível em: < http://www.egtl.org/publications.htm >. Acesso em: 28 dez. 2010.
132 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar


a pessoa determinada um ônus m aior do que aos demais membros da coletividade.”

P elos p a râ m e tro s desse E n unciado d o u trin á rio , para que haja


indenização será necessário comparar o risco da atividade que gerou o dano
com o nível de exposição ao risco dos demais membros da coletividade.
De fato, qualquer um pode tropeçar, escorregar e cair em casa ou na
rua, se r a tro p e la d o na c a lç a d a por um a u to m ó v e l d e s c o n tro la d o ,
independentemente de estar ou não no exercício de qualquer atividade,
podendo mesmo ser um desempregado ou aposentado. No entanto, acima
desse risco genérico que afeta indistintamente toda coletividade, de certa
forma inerente à vida atual, outros riscos específicos ocorrem pelo exercício
de determinadas atividades, dentro da concepção da teoria do “risco criado”.
A raiz histórica da redação do parágrafo único do art. 927 dá respaldo a
esse raciocínio. Esclarece Caio Mário da Silva Pereira:
“Das modalidades de risco, eu me inclino pela subespécie que deu ori­
gem à teoria do risco criado. Como já mencionei (Capítulo XVIII, supra),
ao elaborar o Projeto de Código de Obrigações de 1965, defini-me por
ela, no que fui seguido pelo Projeto de Código Civil de 1975 (Projeto 634-B).
Depois de haver o art. 929 deste Projeto enunciado o dever ressarcitório
fundado no conceito subjetivo, seu parágrafo único esposa a doutrina do
risco criado, a dizer que, independentemente da culpa, e dos casos es­
pecificados em lei, haverá obrigação de reparar o dano ‘quando a ativi­
dade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua
natureza, risco para os direitos de outrem’ .”(50)
Assim, se a exposição do trabalhador estiver acima do risco médio da
coletividade em geral, caberá o deferimento da indenização, porquanto, nessa
hipótese, foi o exercício do trabalho naquela atividade que criou esse risco
adicio nal. Em outras palavras, consideram -se de risco, para fins da
responsabilidade civil objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do Código
Civil, as atividades que expõem os empregados a uma maior probabilidade
de sofrer acidentes, comparando-se com a média dos demais trabalhadores.
Por ocasião da V Jornada de Direito Civil, realizada no STJ em novembro
de 2011, foram aprovados mais dois Enunciados para retratar a evolução do
entendimento doutrinário a respeito do alcance da responsabilidade civil
objetiva, conforme previsto no art. 927, parágrafo único, do Código Civil:
“Enunciado 446 — Art. 927. A responsabilidade civil prevista na segunda parte do
parágrafo único do art. 927 do Código Civil deve levar em consideração não apenas
a proteção da vítim a e a atividade do ofensor, mas também a prevenção e o interesse
da sociedade.”

(50) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 284.
•DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 133

“Enunciado 448 — Art. 927. A regra do art. 927, parágrafo único, segunda parte, do
CC aplica-se sempre que a atividade normalmente desenvolvida, mesmo sem defeito
e não essencialm ente perigosa, induza, por sua natureza, risco especial e diferenciado
aos direitos de outrem. São critérios de avaliação desse risco, entre outros, a estatística,
a prova técnica e as máximas de experiência.”

Como se vê, na interpretação do referido dispositivo o julgador pode


cuscar subsídios em dados estatísticos, nas máximas da experiência, nos
nados epidemiológicos, nos laudos periciais, nas relações normativas das
atividades de risco acentuado, sem olvidar o princípio da prim azia da
crevenção (Art. 7S, XXII, da CF) e os fins sociais da norma legal (Art. 52 da Lei
de Introdução às normas do Direito Brasileiro).
Cabe mencionar ainda que algumas vezes a conduta da vítima contribui
rara o evento danoso na atividade de risco, fato esse que deve ser considerado
como atenuante no arbitramento da indenização, ou seja, a culpa concorrente
ca vítima juntamente com o risco acentuado da atividade podem interagir para
crovocar o acidente. Nesse sentido, foi aprovado na V Jornada de Direito
Civil, realizada em 2011, o Enunciado 459, com o seguinte teor: “Art. 945: A
conduta da vítim a pode ser fator atenuante do nexo de causalidade na
responsabilidade civil objetiva”. Vejam algumas decisões a respeito:
“Agravo de Instrum ento. Acidente de trabalho. Atividade de risco. Óbito. Respon­
sabilidade objetiva do em pregador. C onsiderando que o próprio TRT reconhece
que a atividade desempenhada pelo de cujus era de notório risco, constata-se que o
tem a merece enfrentam ento pela potencial violação do artigo 927, parágrafo único,
do Código Civil. Agravo de instrum ento provido. Recurso de revista. A cidente de
trabalho. Atividade de risco. Óbito. Responsabilidade objetiva do empregador. Se
o próprio TR T reconhece que a atividade era de risco, não há como se admitir que a
responsabilidade fosse exclusiva da vítima. E a culpa concorrente do trabalhador não
exclui a responsabilidade objetiva do empregador, atua, apenas, na fixação do dano.
R e c u rs o de re v is ta c o n h e c id o e p ro v id o .” T S T . 3 ã T u rm a . RR n. 1 7 0 1 0 0 -
91.2008.5.07.0032, Rei.: M inistro Horácio R aym undo de Senna Pires, DJ 11 maio
2012.

“A cid ente do trabalho . S eparação e corte de m adeiras em pilhadas em tiras.


Atividade de risco acentuado. Responsabilidade objetiva (art. 927, parágrafo único,
do Código Civil). Há atividades em que é necessário atribuir-se um tratamento especial,
a fim de que sejam apartadas do regime geral da responsabilidade, em virtude do seu
caráter perigoso, sempre presente na execução cotidiana do trabalho. Nesses setores
não se pode analisar a controvérsia à luz da teoria da culpa; há risco maior e, por isso
mesmo, quem o cria responde por ele. Tal ocorre com o trabalho que envolve a
separação e o corte de madeiras em tiras, mormente quando guardadas de forma
em pilhada umas sobre as outras. Acidente de trabalho. Culpa concorrente. Danos
moral e material. Indenização devida com redução proporcional. Se as provas dos
autos conduzem à ilação de que houve negligência do empregador no cumprimento
e fis c a liz a ç ã o das norm as té c n ic a s de s e g u ra n ça , bem com o p re ca rie d a d e de
o rien tações e inform ações dada ao em pregado quanto à form a de p ro ce d e r na
separação e corte de madeiras empilhadas, deve indenizar a vítim a do acidente. A
cu lp a da vítim a , contu d o , em fa ce das c irc u n s tâ n c ia s que e n vo lvera m o caso,
caracterizada pela subida nas pilhas em contrariedade à ordem do sócio de que
134 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

assim não se fizesse, deve ser co n sid e ra d a para e fe ito de fixa çã o do v a lo r da


reparação.” Bahia. TRT 5- Região. 2a Turma. RO n. 0011700-55.2007.5.05.0133, Rei.:
Cláudio Brandão, DJ 19 ago. 2010.

“Em enta: A cid ente do trabalho. C ulpa concorrente. T eoria do risco criado — É
cabível o deferim ento das indenizações por danos materiais e morais, quando, embora
o tra b a lh a d o r ten h a agido de m odo tem erário, a e m pregadora contribuiu para a
ocorrência do infortúnio, por não ter cumprido as determinações legais de segurança,
além de a natureza da atividade em si atrair a aplicação da teoria do risco criado, em
face da qual a reparação do dano é devida pela sim ples criação do risco.” Minas
G erais. T R T da 3 a R egião. 2 a T urm a. RO n. 0 0 5 1 4 0 0 -4 6 .2 0 0 8 .5 .0 3 .0 0 4 0 , Rei.:
Desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira, DJ 11 fev. 2009.

Contudo, se o acidente do trabalho tiver ocorrido por culpa exclusiva da


vítima, mesmo no exercício da atividade de risco, não haverá responsabiliza­
ção do empregador por falta do pressuposto do nexo causal, conforme abor­
damos no item 6.6, ao qual nos reportamos(51).
Resta apreciar a interpretação do vocábulo “normalmente” inserido no
dispositivo ora analisado. Se a lei não contém palavras inúteis, é imperioso
buscar o seu alcance, dar-lhe um sentido hermenêutico. Nada melhor do que
consultar o pensamento do autor do primeiro Projeto, cuja proposta original
acabou sendo acolhida no texto legal do novo Código. Esclarece, mais uma
vez, o mestre Caio Mário:
“Desde logo exclui-se a ideia de anormalidade do ato danoso, uma vez
que o Projeto cogita de vincular a obrigação ressarcitória a uma ‘atividade
normalmente desenvolvida’ pelo causador do dano. Encarada, pois a
questão sob esse aspecto, ou seja, tendo em vista tratar-se de ato normal,
o que se leva em conta, no primeiro plano, é que a vítima não necessita
de provar se o agente estava ou não estava no exercício de sua atividade
habitual, ou se procedia dentro dos usos e costumes do ambiente social
em que opera. Por outro lado, descabe para o causador do dano a
escusativa de não haver incidido em um comportamento excessivo. A
eliminação destas qualificações retira, portanto, a doutrina do risco criado
de qualquer influência da teoria subjetiva.”(52)

(51) “Indenização p o r danos morais. A cidente de trabalho. Teoria do risco acentuado. Culpa
exclusiva da vítima. Matéria fática. Súmula 126/TST. O Tribunal de origem, com amparo nas
provas coligidas aos autos, afirmou que o acidente de trabalho ocorreu por culpa exclusiva
do e m p re g a d o . C om e s c o ra em ta l p re m is s a , re s ta a fa s ta d a a p o s s ib ilid a d e de
responsabilizar o empregador pelo infortúnio, condenando-o ao pagamento de indenização,
porque, ausente o nexo de causalidade, não se vislum bra liame, ainda que sob a ótica da
teoria do risco acentuado, albergada no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, entre o
dano sofrido pelo obreiro e a atuação patronal. E ntendim ento contrário d em andaria o
reexam e de fatos e provas, p rovidência vedada em sede de recurso excepcional, nos
termos da Súmula 126 do TST.” TST. 3a Turma. Al RR n. 99502/2006-872-09-40, Rei.: Ministra
Rosa Maria W eber Candiota da Rosa, DJ 18. mar. 2008.
(52) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 285.
‘ .DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 135

Em razão do exposto, pode-se concluir que não é necessário que haja


comportamento anorm al ou ilícito do em pregador para gerar o direito à
ndenização, pois o simples exercício da sua atividade rotineira, ainda que
normalmente desenvolvida, pode acarretar o direito ã indenização, caso tenha
crovocado danos à vítima.

5.6. A mensuração do risco pelo Fator Acidentário de Prevenção

Uma novidade introduzida no ordenamento jurídico em 2003, regulamen-


:ada em 2007, indica um caminho interessante para apurar se a atividade de
ceterminado empregador tem um grau de risco acima ou abaixo da média, em
sintonia com os critérios sugeridos pelos Enunciados n. 38, 446 e 448, acima
ranscritos, adotados nas Jornadas de Direito Civil, promovidas pelo Centro
;e Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal. Vejam a previsão do
art. 10 da Lei n. 10.666/2003:
“A alíquota de contribuição de um, dois ou três por cento, destinada ao financiam ento
do benefício de aposentadoria especial ou daqueles concedidos em razão do grau
de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho,
poderá ser reduzida, em até cinqüenta por cento, ou aum entada, em até cem por
cento, conforme dispuser o regulamento, em razão do desempenho da em presa em
re la çã o à re s p e c tiv a a tiv id a d e e co n ô m ic a , a p u ra d o em c o n fo rm id a d e com os
resultados obtidos a partir dos índices de frequência, gravidade e custo, calculados
segundo m etodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social.”

Com efeito, foram criados o Fator Acidentário de Prevenção — FAP e


Nexo Técnico Epidemiológico — NTEP, com base nos índices de frequência,
gravidade e custo dos afastam e nto s deco rrentes das incapacidades
aborativas de cada empresa, em comparação com os mesmos índices da
'espectiva atividade econômica. Dependendo do FAP apurado, o empregador
cagará a contribuição destinada ao financiamento da aposentadoria especial
e dos benefícios concedidos em razão do grau de incapacidade laborativa
decorrente dos riscos ambientais, conforme previsto no art. 202 do Decreto
n. 3.048/1998, com redução de 50% ou agravamento de até 100%.
O cálculo do FAP é feito a partir da base de dados dos benefícios
orevidenciários, levando-se em conta os índices de frequência, gravidade e
custo, conforme especificam os arts. 202-A e 202-B do Regulamento da
Previdência Social, após as alterações promovidas pelos Decretos n. 6.042/
2007, 6.957/2009 e 7.126/2010:
“Art. 202-A. As alíquotas constantes nos incisos I a III do art. 202 serão reduzidas em
até cin q ü e n ta po r c e n to ou a u m e n ta d a s em até cem por ce n to , em ra zã o do
desempenho da em presa em relação à sua respectiva atividade, aferido pelo Fator
Acidentário de Prevenção — FAP.

§ 1a O FAP consiste num multiplicador variável num intervalo contínuo de cinco décimos
(0,5000) a dois inteiros (2,0000), aplicado com quatro casas decimais, considerado o
critério de arredondamento na quarta casa decimal, a ser aplicado à respectiva alíquota.
S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

§ 2 e Para fins da redução ou majoração a que se refere o caput, proceder-se-á ã


discrim inação do desempenho da empresa, dentro da respectiva atividade econômica,
a partir da criação de um índice composto pelos índices de gravidade, de frequência
e de custo que pondera os respectivos percentis com pesos de cinqüenta por cento,
de trinta cinco por cento e de quinze por cento, respectivamente.

§ 3Q(Revogado pelo Decreto n. 6.957/2009)

§ 4 q Os ín d ice s de fre q u ê n c ia , g ra v id a d e e c u s to se rã o c a lc u la d o s s e g u n d o
m etodologia aprovada pelo C onselho N acional de P revidência Social, levando-se
em conta:

I — para o índice de frequência, os registros de acidentes e doenças do trabalho


inform ados ao INSS por meio de Com unicação de Acidente do Trabalho — CAT e de
benefícios acidentários estabelecidos por nexos técnicos pela perícia médica do INSS,
ainda que sem CAT a eles vinculados;

II — para o índice de gravidade, todos os casos de auxílio-doença, auxílio-acidente,


aposentadoria por invalidez e pensão por morte, todos de natureza acidentária, aos
quais são atribuídos pesos diferentes em razão da gravidade da ocorrência, como
segue:

a) pensão por morte: peso de cinqüenta por cento;

b) aposentadoria por invalidez: peso de trinta por cento; e

c) auxílio-doença e auxílio-acidente: peso de dez por cento para cada um; e

III — para o índice de custo, os valores dos benefícios de natureza acidentária pagos
ou devidos pela Previdência Social, apurados da seguinte forma:

a) nos casos de auxílio-doença, com base no tem po de afastamento do trabalhador,


em meses e fração de mês; e

b) nos casos de m orte ou de in va lid e z, p a rcia l ou to ta l, m e d ia n te p ro je çã o da


expectativa de sobrevida do segurado, na data de início do benefício, a partir da tábua
de mortalidade construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
— IBGE para toda a população brasileira, considerando-se a média nacional única
para ambos os sexos.

§ 5 QO M inistério da P revidência Social publicará anualm ente, sem pre no mesm o


mês, no Diário Oficial da União, os róis dos percentis de frequência, gravidade e custo
por S ubclasse da C la ssifica çã o N acional de A tivid a d e s E conôm icas — CNAE e
d ivu lg a rá na rede m u ndial de c o m p u ta d o re s o FAP de ca d a e m presa, com as
re s p e c tiv a s o rd e n s de fre q u ê n c ia , g ra v id a d e , c u s to e d e m a is e le m e n to s que
possibilitem a esta verificar o respectivo desempenho dentro da sua CNAE-Subclasse.

§ 6 2 O FAP pro d u zirá e fe ito s trib u tá rio s a p a rtir do p rim e iro dia do q u arto mês
subsequente ao de sua divulgação.

§ 7- Para o cálculo anual do FAP, serão utilizados os dados de janeiro a dezembro de


cada ano, até com pletar o período de dois anos, a partir do qual os dados do ano
inicial serão substituídos pelos novos dados anuais incorporados.

§ 8- Para a empresa constituída após janeiro de 2007, o FAP será calculado a partir
de 1s de janeiro do ano seguinte ao que com pletar dois anos de constituição.

§ 9- Excepcionalmente, no primeiro processam ento do FAP serão utilizados os dados


de abril de 2007 a dezembro de 2008.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D o e n ç a O c u p a c io n a l 137

§ 10. A metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social indicará


a sistem ática de cálculo e a form a de aplicação de índices e critérios acessórios à
com posição do índice composto do FAP.
Art. 202-B. O FAP atribuído às empresas pelo Ministério da Previdência Social poderá
s e r c o n te s ta d o p e ra n te o D e p a rta m e n to de P o lític a s de S a ú d e e S e g u ra n ç a
O cu p a cio n a l da S e c re ta ria de P o lítica s de P re vid ê n cia S ocial do M in isté rio da
Previdência Social, no prazo de trinta dias da sua divulgação oficial.
§ 1- A contestação de que trata o caput deverá versar, exclusivamente, sobre razões
relativas a divergências quanto aos elementos previdenciários que compõem o cálculo
do FAP.
§ 2 QDa decisão proferida pelo Departam ento de Políticas de Saúde e Segurança
Ocupacional, caberá recurso, no prazo de trinta dias da intimação da decisão, para a
Secretaria de Políticas de Previdência Social, que exam inará a matéria em caráter
term inativo.
§ 32 O processo administrativo de que trata este artigo tem efeito suspensivo.”

Em razão do exposto, considerando-se que o Ministério da Previdência


Social publicará anualmente os índices de frequência, gravidade e custo dos
oenefícios concedidos por atividade econômica, decorrentes dos riscos
ambientais do trabalho, além do FAP específico de cada empresa, tornou-se
fácil constatar o grau de risco da atividade do empregador de cada acidentado.
Além de poder apurar se a atividade que o acidentado exercia tem um
grau de risco de acidente do trabalho considerado leve, médio ou grave, con­
forme previsto no art. 22, IV, da Lei n. 8.212/1991 e Anexo V do Regulamento
da Previdência Social (Decreto n. 3.048/1999), é possível verificar se o “Fa­
tor Acidentário de Prevenção” daquela empresa a coloca num grau de risco
acima ou abaixo da média da respectiva atividade econômica. É possível,
portanto, obter duas informações relevantes: a do risco inerente, com base
no potencial de risco da atividade, e a do risco criado, apurado a partir
da sinistralidade específica daquele empregador, ou seja, quando o FAP da
empresa estiver acima da média da respectiva atividade econômica.
De todo modo, como se trata de informações técnicas que exigem
conhecimentos especializados, o mais recomendável é deixar essa apuração
ao encargo do Perito Oficial, mediante a formulação de quesito pela parte
interessada ou mesmo pelo Juízo.
Pelo que se depreende do exposto, a constatação do FAP específico da
empresa fornecerá mais um elemento de convicção, em conjunto com as
demais provas dos autos, para decidir se a atividade onde atuava o acidentado
pode ser enquadrada num grau de risco que seja suficiente para fundamentar
a condenação com apoio na responsabilidade civil de natureza objetiva.

5.7, O seguro acidentário e a indenização pela teoria do risco

Como vimos no item 4.4, é devida a indenização por acidente do trabalho,


apoiada na responsabilidade civil de natureza subjetiva, independentemente
138 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

dos benefícios concedidos pela legislação do seguro de acidente do trabalho.


Concluímos que não ocorre a figura do bis in idem porque os benefícios
acidentários são pagos em razão dos riscos normais do trabalho, enquanto a
indenização prevista no art. 7S, XXVIII, da Constituição Federal, decorre de
um dano em que o empregador tenha participado com dolo ou culpa. Assim, o
fato gerador dessa indenização é o comportamento ilícito do empregador.
Agora, com a previsão de ressarcim ento dos danos, com base na
responsabilidade civil de natureza objetiva, conforme previsto no art. 927,
parágrafo único, do Código Civil de 2002, tem-se a impressão de que tanto o
pagamento dos benefícios acidentários quanto a indenização devida pelo
empregador têm um único fundamento: a cobertura dos riscos da atividade
exercida pelo trabalhador. Estaria, então, nessa hipótese, ocorrendo o
mencionado bis in idem? Pode-se perguntar ainda: se o empregador vai
indenizar de qualquer forma, por que pagar o seguro de acidente do trabalho
previsto na Lei n. 8.213/1991?
Acreditamos que a resposta a tais indagações pode ser resumida numa
frase: o seguro de acidente do trabalho no Brasil não tem natureza jurídica
nem conteúdo de seguro propriamente dito. Apesar da denominação, só
garante um benefício estrito de cunho alimentar. Sua regulamentação não
contem pla indenização alguma, nem determina reparação dos prejuízos
sofridos; apenas concede b e n efício s p re vid e n ciá rio s para g a ra n tir a
sobrevivência da vítima e/ou seus dependentes, como ocorre com todos os
dem ais segurados da P revidência Social. Dentro dessa perspectiva,
asseverou Rui Stoco: “Esse seguro-acidente, pelas suas características, não
tem natureza propriamente indenizatória, mas de benefício social ou seguro
social, de natureza previdenciária.”(53)
Quando cogitam os sobre a contratação de um seguro de vida, de
automóvel, residencial ou de qualquer outro bem, logo vem a ideia de garantir
a cobertura de um determinado valor para o ressarcimento de eventual prejuízo
pelos danos sofridos. Como afirma Sérgio Cavalieri, “o que o seguro faz é
transferir as conseqüências econôm icas do risco caso ele venha a se
materializar em um sinistro. O segurado compra a sua segurança mediante o
pagamento do prêmio do seguro. Que segurança? De natureza patrimonial,
pois sabe que, se ocorrer o sinistro, terá os recursos econômicos necessários
para reparar o seu prejuízo e recompor o seu patrimônio.”(54)

No entanto, no caso do seguro de acidente do trabalho, ocorrendo o


sinistro, não há pagamento algum de natureza indenizatória, especialmente

(53) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011. p. 714.
(54) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 463,
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 139

depois que a infortunística foi encampada pela Previdência Social, desde a


Lei n. 5.316/1967, cuja ementa enunciava esse objetivo: “ Integra o seguro de
acidentes do trabalho na previdência social, e dá outras providências.”<55)
Comentando o propósito dessa Lei, assinalou Feijó Coimbra:

“O legislador teve em vista, na realidade, foi substituir a indenização por


morte ou incapacidade por prestações previdenciárias tais como auxí­
lio-doença, auxílio-acidente, auxílio suplementar, aposentadoria por in­
validez, pensão por morte e pecúlios, com o que caracterizava a proteção
contra o acidente de trabalho como pura e simples ação da Previdência
Social. (...) Na verdade, seguro, no sentido mercantilista, já não existe,
em tema de acidente de trabalho. O que há, agora, é a ação de um orga­
nismo da previdência social, proporcionando prestações previstas na
Constituição.”<56)

Pode-se perceber, portanto, que a atual legislação securitária do acidente


do trabalho só pode ser enquadrada na categoria de seguro num sentido
amplo, já que revela natureza eminentemente social de marcante interesse
Dúblico. Garante ao lesado apenas um mínimo para subsistência, concedendo
prestações periódicas, mas nem de longe tem o propósito de assegurar a
reparação dos danos sofridos. Essa diferença foi também captada por Gabriel
Saad, há trinta anos, em lúcido artigo doutrinário:

“O empregado recebe da Previdência Social, na condição de acidentado,


não uma indenização, mas um benefício especial, de caráter alimentar,
que lhe permite sobreviver enquanto subsistir a causa incapacitante para
o trabalho. O desfalque patrimonial do empregado motivado pelo acidente
não é coberto pelo seguro social do acidente do trabalho, eis que o
correspondente benefício não se equipara a uma indenização.”(57)

Como se depreende do exposto, a natureza social do seguro de acidente


do trabalho é bem diversa daquela inerente aos seguros em geral, conforme
previsto nos arts. 757 a 777 do Código Civil, visto que:

(55) O art. 1- da Lei n. 5.316/1967 estabelecia: “O seguro obrigatório de acidentes do


trabalho, de que trata o art. 158, XVII, da Constituição Federal, será realizado na previdência
social.” Já o art. 6- previa: “Em caso de acidente do trabalho ou de doença do trabalho, a
m o rte ou a p e rd a ou re d u ç ã o da c a p a c id a d e p a ra o tra b a lh o d a rã o d ire ito ,
in d e pend ente m ente do pe río d o de ca rê n cia , às p re sta çõ e s p re v id e n c iá ria s ca b íve is,
concedidas, m antidas, pagas e reajustadas na form a e pelos prazos da legislação de
previdência social...”
(56) COIMBRA, J. R. Feijó. Acidente de trabalho e m oléstias profissionais. Rio de Janeiro:
Edições Trabalhistas, 1990. p. 15.
(57) SAAD, E duardo G abriel. O a cid e nte do tra b a lh o , o b e n e fício p re v id e n c iá rio e a
indenização de direito comum. Revista LTr, São Paulo, v. 47, n. 8, p. 906, 1983.
140 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

a) não tem natureza contratual (art. 757), já que deve ser cumprido
obrigatoriamente por força de lei;
b) não há pagamento de prêmio negociado (art. 757), mas simples
recolhimento de percentual adicional para o custeio dos benefícios, conforme
previsto na lei previdenciária;
c) não pode ser contratado com qualquer seguradora autorizada (art.
757, parágrafo único), uma vez que o seguro de acidente do trabalho ainda é
monopólio da Previdência Social;
d) não há apólice ou bilhete de seguro (art. 758), bastando a assinatura
da carteira de trabalho;

e) não exige proposta escrita com declaração do interesse a ser garantido


e do risco (art. 759), pois a cobertura tem limites fixos previstos em lei;
f) não há limite temporal estabelecido (art. 760), porquanto cobre todo o
período de vigência do contrato de trabalho;
g) não exige que o em pregador esteja em dia com o recolhimento
previdenciário para deferir os benefícios cabíveis ao acidentado (art. 763).

A integração do acidente do trabalho no âmbito da Previdência Social


está clara no art. 201, § 10, da Constituição da República e na Lei n. 8.213/
1991 que, em seu art. 18, prevê: “O Regime Geral da Previdência Social
compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos
decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços...”
Além disso, o art. 22 da Lei n. 8.212/1991 estabelece o recolhimento de
contribuição para a Seguridade Social, incluindo, no inciso II, percentuais
adicionais para financiamento de benefícios concedidos em razão de acidente
do trabalho ou doenças ocupacionais.
A integração mencionada ficou ainda mais patente quando a Lei n. 9.032/
1995 igualou o valor dos benefícios acidentários aos dem ais direitos
concedidos pela Previdência Social. Dessa forma, o afastamento do serviço
por incapacidade, decorrente ou não de acidente do trabalho, tem concessão
de benefício exatamente no mesmo valor. Aliás, o benefício concedido por
incapacidade do empregado doméstico ou do contribuinte individual, para os
quais nem há recolhimento de parcelas do seguro de acidente do trabalho,
tem o mesmo valor do benefício concedido para o afastamento do empregado
acidentado.
Em síntese, o chamado seguro de acidente do trabalho não oferece
cobertura alguma além da que já é concedida normalmente pela Previdência
Social. O valor que o empregador recolhe hoje a esse título apenas financia
os benefícios previdenciários em geral, aos quais todo trabalhador segurado
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 141

:em direito, dentro da amplitude da seguridade social, para a qual também o


empregado contribui com sua parte. Assim, não se recolhe, a rigor, seguro de
acidente do trabalho, mas uma parcela adicional para financiar os benefícios
orevidenciários concedidos pelo INSS, dentre eles, aqueles decorrentes dos
infortúnios do trabalho(58).
Como o seguro de acidente do trabalho da Previdência Social, no sentido
técnico, não indeniza os prejuízos da vítima, restou um amplo espaço para
acolhimento da responsabilidade civil de natureza objetiva. Basta mencionar
que a reparação dos danos materiais, morais ou estéticos nem é cogitada na
legislação previdenciária, o que torna o acidentado vítima de real prejuízo. O
benefício de natureza alimentar, concedido pelo INSS, garante apenas um
mínimo de subsistência, porém distante de atender ao princípio milenar da
restitutio in integrum, ou mesmo de assegurar a manutenção do padrão de
vida que o acidentado desfrutava antes do evento danoso.
Se é indispensável garantir a livre-iniciativa no exercício da atividade
econômica, para o desenvolvimento nacional, por outro lado, os ditames da
justiça social exigem que as vítimas involuntárias dessas atividades não sejam
entregues à própria sorte, suportando pessoalmente parte do risco da atividade
econômica. Não é suficiente garantir a sobrevivência concedendo benefícios
de caráter alimentar; é fundamental assegurar a existência digna, evitando,
ainda, que a prosperidade de alguns venha a significar a ruína de muitos. Daí
não se vislum brar o apontado bis in idem, na cum ulação de benefícios
acidentários com a indenização devida pelo empregador, mesmo quando o
acidente do trabalho ocorra sem culpa deste, conforme previsto no art. 927,
parágrafo único, do Código Civil de 2002.

5.8. Perspectivas da responsabilidade civil por acidente do trabalho

N e ste passo é o p o rtu n o e s b o ç a r os p o s s ív e is c a m in h o s da


responsabilidade civil na questão do acidente do trabalho. Na efervescência
natural da ciência jurídica, com sua vocação inata de buscar sempre entronizar
o justo, pode-se perceber que algumas ideias vão ganhando densidade,
incorporando adesões, consolidando tendências, indicando novos rumos. E
esse é o caso da teoria do risco ou da responsabilidade civil de natureza
objetiva.
A evolução da responsabilidade civil por acidente do trabalho foi aborda­
da com vagar no item 4.3. Registramos a fase da irresponsabilidade patronal,

(58) Octavio Bueno Magano já assinalava, em obra de 1976, que “a prestação a cargo do
segurado perdeu a natureza de prêmio contraposto a risco assegurado, para converter-se
numa das parcelas das contribuições exigidas pelo Estado, para a manutenção do sistema de
seguros sociais.” Cf. Lineamentos de infortunística. São Paulo: José Bushatsky, 1976. p. 69.
142 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

mais tarde substituída pela responsabilidade só em caso de dolo, posterior­


mente alterada para responsabilidade quando houvesse culpa grave e, após
a Constituição de 1988, modificada para responsabilidade do empregador por
culpa de qualquer grau. Agora, coloca-se o questionamento se a cláusula
geral da responsabilidade sem culpa, lançada no art. 927, parágrafo único, do
Código Civil de 2002, tem aplicação nas indenizações por acidente do trabalho,
conforme mencionamos no item anterior.

Nota-se um nítido deslocamento do pensamento jurídico em direção à


responsabilidade objetiva, especialmente nas questões que envolvem maior
alcance social. Uma observação cuidadosa permite mesmo identificar o ritmo
de certo movimento nesse sentido, em razão do qual é possível intuir os
próximos passos, com boa margem de acerto.

A indenização baseada no rigor da culpa está cedendo espaço para o


propósito maior de reparar os danos, buscando amparar as vítimas dos
infortúnios, mesmo sem a presença da culpa comprovada, em harmonia com
o objetivo fundamental de construir uma sociedade livre, justa e solidária,
com erradicação da pobreza e da marginalização, conforme exposto no art. 39
da Constituição da República. Desse modo, o instrumental jurídico está
mudando seu foco de atenção dos danos causados para os danos sofridos(59).

Importa assinalar também que os pressupostos da responsabilidade


objetiva guardam maior sintonia e coerência com o comando do art. 170 da
Lei Maior, segundo o qual a ordem econôm ica deve estar fundada na
valorização do trabalho e a propriedade deve ter uma função social.

O grande impacto nos rumos da responsabilidade civil, causado pelo Có­


digo do Consumidor de 1990, recebe agora reforço significativo com as previ­
sões do Código Civil de 2002. Como assevera Humberto Theodoro, “o novo
Código é, acima de tudo, um estatuto comprometido com as tendências sociais
do direito de nosso tempo, com o que procura superar, em profundidade, o
velho e intolerável individualismo forjado nos costumes do século XX.”(60)

(59) Leciona Maria Celina Bodin: “A transform ação da responsabilidade civil em direção à
obje tivação corresponde a uma m udança so cio cu ltura l de s ig n ific a tiv a relevância que
continua a influenciar o direito civil neste início de século. Ela traduz a passagem do modelo
individualista-liberal de responsabilidade, com patível com a idelologia do Código Civil de
1916, para o chamado modelo solidarista, baseado na Constituição da República e agora
no Código Civil de 2002, fundado na atenção e no cuidado para com o lesado: questiona-
-se hoje se à vítima deva ser negado o direito ao ressarcimento e não mais, como outrora, se
há razões para que o autor do dano seja responsabilizado.” Cf. MORAES, M aria Celina
Bodin de. Risco, solidariedade e responsabilidade objetiva. Revista RT, São Paulo, v. 854,
p. 18, dez. 2006.
(60) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. vol. III, t. II, p. XI.
•fflENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 143

De qualquer forma, essas inovações somente estarão consolidadas e


seus contornos demarcados com mais nitidez quando a jurisprudência firmar
entendimento sobre o tema. Enquanto aguardamos as súmulas e a consoli­
dação dos precedentes dos tribunais, um bom indicativo dos prováveis rumos
da responsabilidade civil de natureza objetiva pode ser encontrado na inter-
cretação defendida atualmente pelos doutrinadores mais consagrados nesse
assunto. A abordagem científica e sistemática do tema, colhida em livros pu-
Dlicados nos últimos anos, que já consideraram o impacto enriquecedor do
Código Civil de 2002, permite vislumbrar as perspectivas quanto ao futuro da
'esponsabilidade civil, mormente no campo do acidente do trabalho. Com esse
oropósito, valem as transcrições seguintes:

1) Caio Mário da Silva Pereira, em obra de 2002: “Dentro deste movi­


mento, cada vez maior e mais absorvente, foi que se esboçou e tomou
corpo a teoria da responsabilidade sem culpa. A jurisprudência, e com
ela a doutrina, convenceu-se de que a responsabilidade civil fundada na
culpa tradicional não satisfaz para a solução de numerosos casos. A
exigência de provar a vítima o erro de conduta do agente deixa o lesado
sem reparação, em grande número de casos. (...) Desta sorte, e pouco
a pouco, a responsabilidade civil marcha a passos largos para a doutri­
na objetiva, que encontra maior supedâneo na doutrina do risco.”(61)

2) Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho, em obra de


2007: “Para onde caminha a responsabilidade civil? Qual a sua tendên­
cia no limiar deste novo século? O movimento que se acentuou nas
últimas décadas do século findo, no sentido da socialização dos riscos,
deverá continuar cada vez mais forte, expandindo ainda mais o campo
da responsabilidade civil objetiva. Se antes a regra era a irresponsabili­
dade, e a responsabilidade, a exceção, porque o grande contingente de
atos danosos estavam protegidos pelo manto da culpa, agora, e daqui
para a frente cada vez mais, a regra será a responsabilidade por exigência
da solidariedade social e da proteção do cidadão, consumidor e usuário de
serviços públicos e privados. O legislador, a jurisprudência e a doutrina
continuarão se esforçando, pelos mais variados meios e processos téc­
nicos apropriados, para estarem sempre ao lado da vítima a fim de lhe
assegurar uma situação favorável. A vítima do dano, e não mais o autor
do ato ilícito será o enfoque central da responsabilidade civil. Em outras
palavras, a responsabilidade, antes centrada no sujeito responsável,
volta-se agora para a vítima e a reparação do dano por ela sofrido. O
dano, nessa nova perspectiva, deixa de ser apenas contra a vítima para
ser contra a própria coletividade, passando a ser um problema de toda a

(61) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 267.
144 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

sociedade. Ao fim e ao cabo, a sociedade de nossos dias está em busca


de uma melhor qualidade de vida, e o direito é instrumento poderoso
para garantir essa aspiração maior das pessoas humanas.”(62)

3) Carlos Roberto Gonçalves, em obra de 2012: “Os novos rumos da


responsabilidade civil, no entanto, caminham no sentido de considerar
objetiva a responsabilidade das empresas pelos danos causados aos
empregados, com base na teoria do risco criado, cabendo a estes
somente a prova do dano e do nexo causal.”(63)

4) Sérgio Cavalieri Filho, em obra de 2012: “Nas últimas décadas vem-se


acentuando, cada vez mais forte, um movimento no sentido da sociali­
zação dos riscos. Em face do alarmante aumento de acidentes, princi­
palmente no trabalho e no trânsito, tornando, muitas vezes, irreparável o
dano, não só pelo montante da indenização, mas, também, pela falta de
patrimônio da parte que o causou, lança-se mão de técnicas de sociali­
zação do dano para o fim de ser garantida pelo menos uma indenização
básica para qualquer tipo de acidente pessoal. É o que, em doutrina, se
denomina de reparação coletiva, indenização autônoma ou social. A ví­
tima do dano, e não mais o autor do ato ilícito, passa a ser o enfoque
central da responsabilidade civil.”(64)

5) Rui Stoco, em obra de 2011: “Nos últimos anos o Direito brasileiro


evoluiu no sentido de desenvolver a teoria da guarda e da incolumidade
e do risco da atividade. A pessoa ou bem que esteja sob a guarda de
outrem tem direito ao resguardo da sua incolumidade. Assim ocorre com
o transporte de pessoas e coisas, com os bens depositados em cofres
de segurança ou instituições financeiras, com os veículos estacionados
em garagens e estacionamentos e, no plano pessoal, exemplifique-se,
ainda, com o aluno entregue à guarda da escola (pública ou privada) e a
criança acolhida em creches, sob a supervisão de terceiros, ou com os
condenados e presos, sob a fiscalização e guarda do Poder Público.
Em todas essas hipóteses impunha-se ou a responsabilidade objetiva
ou a responsabilidade subjetiva mediante presunção de culpa, invertendo-
-se o ônus da prova. Resta aguardar eventual alteração legislativa ou a
evolução do pensamento de nossos pretórios, através da jurisprudência.
A valorização do trabalho e a proteção integral do trabalhador são os
meios mais eficazes para a busca da paz social, do desenvolvimento

(62) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 40.
(63) GO NÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 420.
(64) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 165-166.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 145

econômico sustentado da nação e da erradicação da doença, da pobreza


e da violência.”(65)
6) Maria Helena Diniz, em obra de 2007: “A insuficiência da culpa para
cobrir todos os prejuízos, por obrigar a perquirição do elemento subjetivo
na ação, e a crescente tecnização dos tempos modernos, caracteriza­
do pela introdução de máquinas, pela produção de bens em larga escala
e pela circulação de pessoas por meio de veículos automotores, au­
mentando assim os perigos à vida e à saúde humana, levaram a uma
reformulação da teoria da responsabilidade civil dentro de um processo
de humanização. Este representa uma objetivação da responsabilidade,
sob a ideia de que todo risco deve ser garantido, visando à proteção
jurídica à pessoa humana, em particular aos trabalhadores e às vítimas
de acidentes, contra a insegurança material, e todo dano deve ter um
responsável. A noção de risco prescinde da prova da culpa do lesante,
contentando-se com a simples causação externa, bastando a prova de
que o evento decorreu do exercício da atividade, para que o prejuízo por
ela criado seja indenizado. Baseia-se no princípio do ubi emolumentum,
ibi ius (ou ibionus), isto é, a pessoa que se aproveitar dos riscos ocasiona­
dos deverá arcar com as suas conseqüências.”(66)

7) Gustavo Tepedino, em obra de 2001: “Com efeito, os princípios da


solidariedade social e da justiça distributiva, capitulados no art. 3Q, incisos
I e III, da Constituição, segundo os quais se constituem em objetivos
fundamentais da República a construção de uma sociedade livre, justa e
solidária, bem como a erradicação da pobreza e da marginalização e a
redução das desigualdades sociais e regionais, não podem deixar de
moldar os novos contornos da responsabilidade civil. (...) Impõem, como
linha de tendência, o caminho da intensificação dos critérios objetivos
de reparação e do desenvolvimento de novos mecanismos de seguro
social.”(67)
8) Anderson Schreiber, em obra de 2009: “As dificuldades de demons­
tração da culpa, tomada em sentido moral e psicológico, exacerbaram-
-se com o desenvolvimento industrial e tecnológico, ensejador de ‘danos
anônimos’ cuja culposa imputação ao empreendedor exigia das vítimas
uma verdadeira probatio diabólica. O resultado disso é que a imensa
maioria dos danos permanecia irressarcida, fato que gerou a reação dos

(65) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011. p. 725.
(66) DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. ed. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 7. p. 12-13.
(67) T E P E D IN O , G ustavo. T em as de d ire ito civil. 2. ed. Rio de Ja n e iro : R enovar, 2001.
146 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

tribunais e da doutrina, que passaram a buscar na linguagem dos códi­


gos, ou mesmo à revelia deles, presunções de culpa. Tais presunções,
inicialmente relativas, foram se convertendo em presunções absolutas,
irreversíveis, que acabaram por manter certos setores da atividade pri­
vada apenas nominalmente sob o manto da responsabilidade subjetiva.
Paralelamente, desenvolveu-se a teoria do risco como novo fundamen­
to da responsabilidade civil, dando ensejo à responsabilidade objetiva,
adotada pelo legislador em hipóteses particulares. Foi somente em um
momento posterior que a responsabilidade objetiva veio a ser incorpora­
da como cláusula geral aplicável às atividades de risco, a exemplo do
que se vê do art. 927, parágrafo único, do Código Civil brasileiro. Com
isto, a responsabilidade objetiva perdeu, a um só tempo, a conotação
excepcional e o caráter ex lege que lhe vinham tradicionalmente atribuí­
dos. Atualmente, um exame abrangente das diversas hipóteses de res­
ponsabilidade objetivas existentes em cada ordenamento jurídico revela,
em muitos deles, o seu destacamento da própria noção de risco e a sua
afirmação como simples responsabilidade independente de culpa.”(68)
9) Sílvio Rodrigues, em obra de 2002: “Muito aplauso merece o legislador
de 2002 pela inovação por ele consagrada. Em conclusão, poder-se-ia
dizer que o preceito do novo Código representa um passo à frente na
legislação sobre a responsabilidade civil, pois abre uma porta para
ampliar os casos de responsabilidade civil, confiando ao prudente arbítrio
do Poder Judiciário o exame do caso concreto, para decidi-lo não só de
acordo com o direito estrito, mas também, indiretamente, por equidade.”(69)
10) Arnaldo Rizzardo, em obra de 2005: “Nas últimas décadas, tem ad­
quirido importância a teoria do risco, que assenta a responsabilidade no
mero fato de exercer uma atividade perigosa, ou de utilizar instrumentos
de produção que oferecem risco pela sua manipulação ou controle. (...).
Vai evoluindo e se impondo a responsabilidade objetiva, que subdivide-
-se em teoria do risco e teoria do dano objetivo. Em consonância com a
primeira, advindo dano na prática de atividade de risco, desencadeia-se
o dever de reparar ou indenizar. Já pela segunda, o ressarcimento de­
corre automaticamente pela verificação do dano. O que se verifica é a
tendência de dar proeminência ao instituto da reparação, que decorre do
mero exercício de uma atividade de risco, ou do aparecimento de um
dano. Entretanto, mantém-se a responsabilidade subjetiva, que se colo­
ca ao lado da objetiva, naqueles desdobramentos.”(70)

(68) SCHREIBER, Anderson. Novos paradigm as da responsabilidade civil: da erosão dos


filtros da reparação à diluição dos danos. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 241-242.
(69) RODRIGUES, Sílvio. Direito civil: responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva,
2002. v. 4, p. 162.
(70) RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 34-35.
•.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 147

11) Maria Celina Bodin de Moraes, em obra de 2003: “Modernamente,


contudo, buscou-se desvincular a ideia de injustiça da ideia de antijuridi-
cidade, procurando critérios mais amplos que englobassem também ‘in­
teresses que são dignos da tutela jurídica e que, por isso, quando são
lesionados, façam nascer ações indenizatórias’ para reparar os prejuí­
zos sofridos. (...) O dano será injusto quando, ainda que decorrente de
conduta lícita, afetando aspectos fundamentais da dignidade humana,
não for razoável, ponderando os interesses contrapostos, que a vítima
dele permaneça irressarcida. (...). De fato, não parece razoável, na le­
galidade constitucional, estando a pessoa humana posta na cimeira do
sistema jurídico, que a vítima suporte agressões, ainda que causadas
sem intenção nem culpa, isto é, sem negligência, imperícia ou imprudên­
cia. O que impede que se proteja o autor do dano em detrimento da
vítima, como se fazia outrora, ou, melhor, o que torna hoje preferível
proteger a vítima em lugar do lesante, é justamente o entendimento (ou,
talvez, o sentimento) da consciência de nossa coletividade de que a
vítima sofreu injustamente; por isso, merece ser reparado.”(71)

12) Patrícia Ribeiro Serra Vieira, em obra de 2005: “ Inicia-se, nesse


momento, uma fase de transição no direito, incidindo em particular na
responsabilidade civil, que passa a tender para a objetivação. A culpa já
não responde mais às diversas e novas questões que vêm surgindo,
sendo, então, necessário ampliar, pelo risco, o critério adotado quando
da imputação de responsabilidade civil. (...) As orientações doutrinárias
propagam a generalização da responsabilidade objetiva pela adoção,
como regra, da possibilidade de se exigir a indenização de prejuízos
causados por fatos dos quais o responsável não pode considerar-se
autor no plano ético-jurídico, mas sim no plano ético-social. Um dos ca­
minhos para essa generalização é considerar ilícito todo fato danoso,
entendido como tal o descumprimento de um dever mesmo sem culpa,
desde que origine prejuízos.”(72)

13) Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, em obra de 2005: “Os


pensadores do Direito, jusfilósofos e jus-sociólogos, buscaram critérios
de identificação para as novas ocorrências e exigências da vida dos
homens, como se buscassem um padrão de fundamentação, ou uma
tábua de pressupostos, ou, enfim, um denominador comum que fosse
capaz de expressar, como fonte ou matriz do velho dever de indenizar o
dano que alguém injustamente sofra. (...) Quem se decide por assumir

(71) M O R A E S , M a ria C e lin a B odin de. D a n o s à p e s s o a h u m a n a : um a le itu ra c iv il-


-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 178-180.
72) VIEIRA, Patrícia Ribeiro Serra. A responsabilidade civil objetiva no direito de danos.
Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 158 e 162.
148 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

um risco, arrisca-se — conforme indica a proposital formulação pleo-


nástica — e deve saber-se responsável pelas perdas que sofrer, mas,
especialmente, pelos danos que a outrem causar. (...) A regra, enfim, é a
certeza de que as lesões evitáveis devem ser reparadas. Para tanto, as
prescrições do legislador, transmudas em textos legislativos que prede­
terminam e presumem a ocorrência do dano, igualmente imputam, ao
agente, o dever de repará-lo. Somente os danos absolutamente inevitá­
veis deixarão de ser reparados, exonerando-se o responsabilizado. (...)
O evoluir jurisprudencial, então, cada vez mais, passa a registrar deci­
sões que se expressam em termos de presunção de responsabilidade e
não presunção de culpa. ’m)
14) Cléber Lúcio de Almeida, em obra de 2003: “O novo Código Civil,
que entrou em vigor em janeiro de 2003, ao tipificar o desenvolvimento
de atividade perigosa como fato gerador da obrigação de reparar o dano
causado a outrem, tem decisiva influência sobre a responsabilidade do
empregador pelos danos resultantes de acidentes de trabalho, na medida
em que representa o definitivo abandono da culpa como fundamento único
da obrigação de reparar o dano causado a outrem, colocando como
primordial a realização do objetivo primeiro da responsabilidade civil, que
é a reparação do dano.”(74)
15) Cláudio Mascarenhas Brandão, em obra de 2006: “O trabalhador
possui um direito de proteção à saúde, elevado ao patamar de norma
constitucional com natureza jurídica de direito fundamental e que o em­
pregador possui a responsabilidade objetiva pelos danos a ele causa­
dos, em virtude de acidentes do trabalho ocorridos no desenvolvimento
de atividade de risco acentuado, o que representa a consagração, no
plano interno, da tendência internacional de priorizar o homem como
centro da proteção dos sistemas jurídicos, inserindo o Brasil, pelo me­
nos no que tange ao modelo teórico, entre os países com regras avan­
çadas referentes à reparação civil.”(75)
16) José Affonso Dallegrave Neto, em obra de 2010; “No campo da re­
paração civil, é imperiosa a defesa do alargamento da responsabilidade
civil da empresa independentemente de culpa, sobretudo em face da
funcionalização de seu conceito legal: assunção dos riscos da atividade
econômica (art. 2°, da CLT) e dos riscos e perigos da atividade normal­
mente desenvolvida (art. 927, parágrafo único, do CC). Na seara repa-

(73) HIRONAKA, Giselda Maria F. Novaes. Responsabilidade pressuposta. Belo Horizonte:


Del Rey, 2005. p. 347-351.
(74) A LM E ID A, C léber Lúcio de. R esponsabilidade c iv il do e m p re g ad o r e acid e nte de
trabalho. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 77.
(75) BRANDÃO, C láudio, A cidente do trabalho e responsabilidade civil do em pregador.
São Paulo: LTr, 2006. p. 23.
OENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 149

ratória do contrato de trabalho, o norte há de ser o princípio constitucional


da função social da empresa como expressão da propriedade (art. 170,
III, da CF) e o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1s, III, da
CF).”(76)
17) Ney Stany Morais Maranhão, em obra de 2010: “O fato, contundente,
é que, nos últim os anos, tam bém a responsabilidade civil tem se
reconstruído à luz do princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana (artigo 12, inciso III). Seu formato, seus fundamentos, seus
fatores de legitimação, tudo tem se inclinado no afã de se adaptar ao
necessário predomínio dos valores existenciais em detrim ento dos
patrimoniais. E o mais perceptível reflexo desse fenômeno humanizante
é a crescente objetivação da responsabilidade civil, que, movida por
anseios éticos e de justiça material, tendentes a não deixar irressarcidas
as vítimas de danos injustos, operou o franco declínio científico do até
então intocável fator culpa e a vertiginosa ascensão dogmática — não
raro, a fórceps — do fator risco. ’{77)
Por tudo que foi exposto e considerando o centro de gravidade das lições
dos doutrinadores mencionados, é possível concluir que a implementação
efetiva da teoria do risco ou responsabilidade civil objetiva, na questão do
a oidente do trabalho, é mera questão de tempo.
Pode-se argumentar, e com razão, que o pagamento da indenização
apresentará um custo elevado para o empregador, sendo que, em alguns
:asos, poderá até inviabilizar o prosseguimento da sua atividade. Uma das
ranclusões da tese de doutorado de Anderson Schreiber bem sintetiza essa
: reocupação:
“O problema da responsabilidade civil contem porânea não é, a rigor,
a expansão do dano ressarcível, mas a atribuição do ônus inevitável
desta expansão a um único indivíduo em cada caso particular. Inspirada
na solidariedade social, a jurisprudência tem, por toda parte, se recusado
a deixar as vítimas dos danos sem reparação. As cortes flexibilizam,
deste modo, a configuração dos pressupostos da responsabilização, no
solidário reconhecimento de que, de alguma forma, por vivermos em
sociedade, todos somos culpados por todos os danos e todos somos
causadores de todos os danos. Este itinerário, todavia, se conclui,
atualmente, com o lançamento do dever de indenizar sobre um único
agente, despertando sentimentos de injustiça e suscitando perplexidade
quanto ao papel da responsabilidade civil. Mais: parece evidente que,

~6) DALLEGRAVE NETO, José Affonso. R esponsabilidade civil no direito do trabalho. 4.


ed. São Paulo: LTr, 2 0 1 0 . p. 5 8 5 -5 8 6 .
77) MARANHÃO, Ney Stany Morais. R esponsabilidade civil objetiva pelo risco da atividade:
uma perspectiva civil-constitucional. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2 0 1 0 .
: 2 9 2 -2 9 3 .
seja diante da crise de legitimidade deste modo de atuação, seja pela
possível insuficiência patrimonial do réu, a própria reparação da vítima
fic a c o m p ro m e tid a com o re s u lta d o in d iv id u a lis ta da ação de
responsabilização. É inegável que, se solidarizamos os pressupostos
da reparação, também o dever de reparar deve ser solidarizado.”(78)

É mesmo provável que a técnica da socialização dos riscos, por intermédio


do mecanismo inteligente do seguro de responsabilidade civil(79), contratado
obrigatoriamente por todos que exploram alguma atividade, venha a ser o ponto
de equilíbrio para acomodar os diversos interesses, sem ônus excessivos para
ninguém. Como enfatizou a rainha Elizabeth I, há mais de três séculos: “Com o
seguro, o dano é um fardo que pesa levemente sobre um grande número de
pessoas, em vez de insuportavelmente sobre um pequeno número.”(80)

Para finalizar este capítulo, podemos esboçar uma síntese dos prováveis
rumos da responsabilidade civil, apontando dez tendências mais evidentes:

VISÃO TRADICIONAL DA RC TENDÊNCIAS A TUAIS DA RC

1. O caso é apreciado no enfoque do dano O caso é apreciado no enfoque do dano


causado pelo réu sofrido pela vítima

2. O réu indeniza pela ilicitude ou antiju- O réu indeniza pelo dano injusto, mesmo
rídicidade do seu ato quando decorrente de atividade lícita

3. O réu indeniza porque agiu com negli­ O réu indeniza porque criou a oportunida­
gência, imperícia ou imprudência de ou a ocasião para o advento do dano

4. Punição do culpado: sanção Amparo da vítima: proteção

5. Culpa psicológica Culpa normativa

6. Não provada a culpa, a vítima suporta O risco da atividade é sempre de quem


o custo do dano e, implicitamente, o pró­ dela tira proveito, que deve indenizar
prio risco da atividade mesmo quando não provada a sua culpa

7. Princípio da reparação integral Princípio da solidariedade com a vítima

8. Juízo de reciprocidade: compensatório Juízo de proporcionalidade: equitativo


9. Responsabilidade subjetiva Responsabilidade objetiva

10. Responsabilidade civil Direito dos danos

(78) SCHREIBER, Anderson. Novos paradigm as da responsabilidade civil: da erosão dos


filtros da reparação à diluição dos danos. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 247-248.
(79) C ódigo Civil. Art. 787. “ No seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o
pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.”
(80) A pud CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 467-468.
CAPÍTULO 6

NEXO CAUSAL NO ACIDENTE DO TRABALHO

6.1. Causalidade como pressuposto da indenização

Na teoria clássica da responsabilidade civil, para que o lesado tenha


direito à indenização alguns pressupostos são imprescindíveis: o dano injusto,
o nexo causal e a culpa do causador do dano. Neste capítulo vamos analisar
o pressuposto do nexo causal, também denominado liame de causalidade.

A exigência do nexo causal como requisito para obter a indenização


encontra-se expressa no art. 186 do Código Civil quando menciona “aquele
que ... causar dano a outrem.” Pode até ocorrer o deferimento da indenização
sem que haja culpa, como previsto no art. 927, parágrafo único, do Código
Civil, mas é incabível o ressarcimento quando não ficar comprovado o nexo
que vincula o dano ao seu causador.
A necessidade de estabelecer o liam e causal com o requisito da
indenização funda-se na conclusão lógica de que ninguém deve responder
por dano a que não tenha dado causa. “Se houve o dano mas sua causa não
está relacionada com o com portam ento do lesante, inexiste relação de
causalidade e também a obrigação de indenizar.”(1) Aliás, de forma semelhante
prevê o Código Penal no art. 13: “O resultado, de que depende a existência
do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a
ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.”

Assevera o Desembargador Sérgio Cavalieri Filho que “o conceito de


nexo causal não é exclusivamente jurídico; decorre primeiramente das leis
naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e
o resultado. (...) É um conceito jurídico-normativo através do qual poderemos
concluir quem foi o causador do dano.”(2) No mesmo sentido pontua Gisela

(1) GONÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003.
v. 11, p. 318.
(2) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Atlas,
2012. p. 49.
152 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Sampaio: “Para que se configure a obrigação de indenizar, não basta que o


agente haja procedido contra o Direito, nem que tenha criado um risco,
tampouco que a vítima sofra um dano; é preciso que se verifique a existência
de uma relação de causalidade a ligar a conduta do agente, ou sua atividade,
ao dano injustamente sofrido pela vítima.”(3)

Para o tema deste livro, o nexo causal é o vínculo que se estabelece


entre a execução do serviço (causa) e o acidente do trabalho ou doença
ocupacional (efeito). Pode-se afirmar que esse pressuposto é o primeiro que
deve ser investigado, visto que se o acidente ou a doença não estiverem
relacionados ao trabalho é desnecessário, por óbvio, analisar a extensão dos
danos ou a culpa patronal.

Assim, uma vez constatado que o empregado foi vítima de algum acidente
ou doença cabe verificar em seguida o pressuposto do nexo causal, isto é,
se há uma relação de causa e efeito ou liame de causalidade entre tal evento
e a execução do contrato de trabalho. Se o vínculo causal for identificado,
então estaremos diante de um acidente do trabalho conforme previsto na
legislação; no entanto, se não for constatado, torna-se inviável discutir qualquer
indenização. Nesse sentido o art. 19 da Lei n. 8.213/1991 menciona que
“acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da
empresa.”

Como visto, nem todo acidente ou doença que acomete o empregado


tem relação com o cumprimento do contrato de trabalho, pelo que, muitas
vezes, não se consegue constatar o liame causal para fundamentar o pedido
de indenização em face do empregador, como veremos nos itens seguintes.

6.2. Enfoque acidentário e da responsabilidade civil

O nexo de causalidade do acidente com o trabalho do empregado é


pressuposto indispensável tanto para a concessão dos benefícios da lei do
se g u ro a c id e n tá rio q u a n to para a co n d e n a çã o do e m p re g a d o r por
responsabilidade civil.

Historicamente, a discussão do nexo causal nos acidentes do trabalho


sempre esteve atrelada ao ramo da infortunística, uma vez que a reparação
civil, independentemente dos direitos acidentários, só ficou mesmo consagrada
pelo art. 7S, XXVIII, da Constituição da República de 1988.

A análise do nexo causal no âmbito da responsabilidade civil deve ser


feita com alguns ajustes ou adaptações porquanto os princípios que norteiam

(3) CRUZ, Gisela Sampaio da. O problem a do nexo causal na responsabilidade civil. Rio de
Janeiro: Renovar, 2005. p. 4.
I é d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 153

: seguro social do acidente do trabalho são mais elásticos em comparação


: : m aqueles que orientam as reparações dos prejuízos no enfoque do Direito
P • vado. Da mesma forma, a análise do nexo causal feita no Direito Penal
soebe adaptações quando o fato é apreciado na óptica do Direito Civil.
A lei acidentária caracteriza o nexo causal do acidente com o trabalho
em três modalidades: causalidade direta, concausalidade e causalidade
"direta.
Na causalidade direta o nexo fica caracterizado quando o acidente ocorre
rs/o exercício do trabalho a serviço da empresa.” Observa-se uma vinculação
~9diata entre a execução das tarefas e o acidente ou doença que afetou o
e-pregado. O acidente típico e a doença ocupacional estão enquadrados
■essa modalidade de nexo causal(4).

Nas hipóteses das concausas, o acidente continua ligado ao trabalho,


~ a s ocorre por m últiplos fatores, conjugando causas relacionadas ao
trabalho, com outras, extralaborais. O empregado, por exemplo, pode atuar
:omo caixa bancário exposto a movimentos repetitivos e fazer serviços
=jtônom os de digitação em casa aumentando a possibilidade de adoecimento;
rode trabalhar em local ruidoso e participar de uma banda de rock exposto a
som excessivamente alto. Para constatação do nexo concausal, basta que o
:rabalho tenha contribuído diretamente para o acidente ou doença(5).

Na causalidade indireta o fato gerador do acidente não está ligado à


sxecução do serviço num sentido estrito mas, para oferecer maior proteção
ao empregado, a lei acidentária estendeu a cobertura do seguro aos infortúnios
;ue só têm ligação de forma oblíqua com o contrato de trabalho. Podem ser
snquadrados na causalidade indireta a agressão praticada por terceiros contra
o empregado no local de trabalho; os acidentes decorrentes de desabamento,

4) Lei n. 8.213, de 24 ju l.1991 — “Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício
do trabalho a serviço da em presa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no
nciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que
:ause a morte ou a perda ou redução, perm anente ou temporária, da capacidade para o
trabalho.” (...) “Art. 20. Consideram -se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior,
as seguintes entidades mórbidas: I — doença profissional, assim entendida a produzida ou
:esencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determ inada atividade e constante da
respectiva relação elaborada pelo M inistério do Trabalho e da Previdência Social; II —
:oença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições
especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da
'elação m encionada no inciso I.”
(5) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991 — “Art. 21. Equiparam-se tam bém ao acidente do trabalho,
para efeitos desta Lei: I — o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a
causa única, haja contribuído diretam ente para a m orte do segurado, para redução ou
oerda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica
para a sua recuperação.”
154 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

incêndio, casos fortuitos ou de força maior; os acidentes de trajeto, no


deslocamento da residência para o trabalho ou deste para aquela etc.(6)

Pode-se concluir, portanto, que a lei concedeu uma amplitude maior ao


nexo causal para os efeitos do seguro acidentário, incluindo situações não
relacionadas diretamente ao exercício do trabalho. Desse modo, algumas
hipóteses de eventos cobertos pelo seguro acidentário, no âm bito da
responsabilidade civil, são enquadradas como excludentes do nexo causal
ou da indenização, como são os acidentes ocorridos por motivo de força
maior, caso fortuito, bem como aqueles provocados pela própria vítima ou
por terceiros.

Essa diversidade de tratamento do nexo causal decorre da diferença do


bem jurídico protegido ou do interesse tutelado: de um lado os benefícios da
infortunística e de outra parte as reparações da responsabilidade civil. O
seguro acidentário tem um caráter marcadamente social com apoio na teoria
da responsabilidade objetiva na modalidade de risco integral(7). Se a sociedade

(6) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991 — “Art. 21. Equiparam-se tam bém ao acidente do trabalho,
para efeitos desta Lei: (...) II — o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do
trabalho, em consequência de:
a) ato de agressão, sabotagem ou terrorism o praticado por terceiro ou com panheiro de
trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por m otivo de disputa relacionada ao
trabalho;
c) ato de im prudência, de negligência ou de im perícia de terceiro ou de com panheiro de
trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabam ento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força
maior; (...)
IV — o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à em presa para lhe evitar prejuízo ou
proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da em presa, inclusive para estudo quando financiada por esta
dentro de seus planos para m elhor capacitação da mão de obra, independentem ente do
meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;
d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que
seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.
§ 1- Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de
outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o em pregado é
considerado no exercício do trabalho.”
(7) Só não fica caracterizado como acidente do trabalho quando o evento for provocado
dolosam ente pelo próprio empregado, porque aquele que “lesa o próprio corpo ou a saúde,
ou agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou
valor de seguro”, comete crime de estelionato, conforme previsto no art. 171, § 2-, do Código
Penal. E naturalm ente q u a lquer com portam ento tip ifica d o com o crim e não pode gerar
benefício para o seu autor, ou como diz a antiga parêmia: ninguém pode beneficiar-se da
própria torpeza.
VDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 155

como um todo é beneficiária do progresso e do trabalho dos empregados,


:ambém deve ampará-los por ocasião dos infortúnios, socializando os riscos.
Basta que o acidente tenha alguma vinculação com o trabalho, mesmo que
ndireta, para que haja o nexo causal e a cobertura dos benefícios securitários.
Argumenta Odonel Gonçales que, “dentro da filosofia de dar proteção ao
rabalhador vítima de acidente do trabalho, o legislador amplia essa proteção
a outras situações que não têm vinculação direta com a atividade desenvolvida
oelo obreiro.”(8)
Por outro lado, no âmbito da responsabilidade civil só haverá obrigação
de indenizar se houver nexo causal ou concausal ligando o acidente ou a
doença com o exercício do trabalho a serviço da empresa. As hipóteses de
causalidade indireta admitidas na cobertura acidentária não caracterizam o
nexo causal para fins de reparação civil. Assim, os requisitos para fins inde-
nizatórios deverão ser analisados conjugando-se a legislação da infortunística
com os postulados da reparação dos danos, conforme sedimentado no Direito
Comum, seja pela prática de algum ato ilícito por parte do empregador ou
seus prepostos, seja pelo exercício da atividade de risco ou do dano injusto,
de acordo com a teoria que for adotada.

No campo da infortunística a cobertura tem nítido caráter social; na es­


fera da responsabilidade civil o interesse protegido é individual. Pelo seguro
acidentário a sociedade, por intermédio da autarquia previdenciária, ampara
a vítima ou seus dependentes, concedendo-lhes prestações alimentares para
garantir a sobrevivência digna; na responsabilidade civil o lesante deve repa­
rar o prejuízo total, apoiado no princípio da restitutio in integrum. A prestação
securitária estará sempre garantida pelo órgão estatal; os valores da indeni­
zação civil somente serão quitados se o lesante tiver condições financeiras
de suportar os pagamentos.

Ultim am ente, no entanto, tem -se observado uma tendência de fle xi­
bilização dos pressupostos da responsabilidade civil, com o propósito de
aumentar a proteção das vítimas dos danos injustos. Em cuidadosa disserta­
ção de mestrado, anotou na parte conclusiva a professora carioca Gisela
Sampaio:

“ Nos ú ltim o s te m p o s, a c o m p a n h a n d o as tra n s fo rm a ç õ e s da


responsabilidade civil, o conceito de nexo causal foi flexibilizado, com
vistas a permitir a efetivação do princípio da reparação integral. Não é
mais possível em alguns casos, à luz dos princípios constitucionais,
exigir da vítima a prova cabal e absoluta da relação de causalidade.
Dessa forma, apesar de o nexo causal ser, tal qual o dano, um dos

(8) GONÇALES, Odonel Urbano. Manual de direito previdenciário. 10. ed. São Paulo: Atlas,
2002. p. 194.
156 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

elementos da responsabilidade civil, exige-se, com fundamento na nova


ordem constitucional, que a prova da relação de causalidade seja
flexibilizada em certas situações.”(9)

A ssim , é p ro v á v e l que em pou co te m p o os p re s s u p o s to s da


responsabilidade civil sejam também flexibilizados nas hipóteses de acidente
do trabalho, em razão da sua natureza e das sérias repercussões dos danos
sofridos para a vítima, para a família e toda a sociedade.

A propósito, foi nesse sentido de facilitar o reconhecimento do nexo causal


que a Lei n. 11.430/2006 introduziu o art. 21-A na Lei n. 8.213/1991, com o
seguinte teor:
“Art. 21-A. A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária
da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidem iológico entre
o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da em presa e a entidade
m órbida m otivadora da incapacidade elencada na C lassificação Internacional de
Doenças (CID), em conform idade com o que dispuser o regulamento.

§ 1- A perícia m édica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando


dem onstrada a inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo.

§ 2a A em presa poderá requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de


cuja decisão caberá recurso com efeito suspensivo, da em presa ou do segurado, ao
Conselho de Recursos da Previdência Social.”(10)

Essa inovação legal reforça sobremaneira a técnica da inversão do ônus


da prova em favor do acidentado, pois incorpora a figura do nexo causal

(9) CRUZ, Gisela Sampaio da. O problem a do nexo causal na responsabilidade civil. Rio de
Janeiro: Renovar, 2005. p. 347. Na apresentação desta obra, anota o civilista Gustavo
Tepedino: “Diante da inquietante proliferação dos fatores de risco, que se constituem em
potenciais causadores de danos no conturbado cenário da sociedade industrial e tecnológica,
afigura-se o nexo causal como o m aior problema da responsabilidade civil contem porânea.
(...) De fato, fala-se hoje, com certa frequência, de causalidade presum ida, causalidade
alternativa, causalidade flexível, causalidade elástica e outras tantas teorias que se voltam
à proteção da vítim a. A responsabilidade civil encontra-se, neste m om ento, diante de
verdadeira escolha de Sofia no que diz respeito ao nexo causal: se por um lado, não se
pode desconsiderar o nexo causal com o elem ento da responsabilidade civil, por outro,
exige-se, com fundam ento na nova ordem constitucional, uma maior proteção da vítim a do
dano injusto.”
(10) A redação proposta pela Medida Provisória n. 316, de 11 de agosto de 2006, era mais
incisiva quanto à inversão do ônus da prova em favor do acidentado. Vejam o texto original:
Art. 21-A. Presume-se caracterizada incapacidade acidentária quando estabelecido o nexo
técnico epidem iológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade
da empresa e a entidade m órbida m otivadora da incapacidade, em conform idade com o
que dispuser o regulam ento. Todavia, diante da forte reação em presarial e da polêm ica
instaurada (foram apresentadas 33 emendas), a bancada governista, quando da votação
na Câmara dos Deputados do Projeto de Lei de Conversão, negociou um texto intermediário
que re su lto u na reda çã o da Lei n. 1 1 .4 3 0 /2 0 0 6 , ou seja, c o n s a g ro u o nexo causal
epidem iológico, mas com algum as atenuantes.
«VDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 157

roidemiológico, ou seja, de acordo com os dados estatísticos das doenças


ocupacionais em determinada empresa, catalogados pela Previdência Social
a partir dos benefícios efetivamente concedidos, ocorrerá a presunção de
:ue o adoecimento foi causado pelo exercício do trabalho. Para o Secretário
oa Previdência Social Helmut Schwarzer, o nexo epidem iológico é uma
metodologia que serve para identificar se existe correlação entre determinado
setor de atividade econôm ica e determ inadas doenças, de acordo com
evantamentos realizados durante vários anos em diversas bases de dados
;om registros de pagamentos de benefícios(11).
É oportuno transcrever um trecho da exposição de motivos da Medida
Provisória n. 316/2006, que foi convertida na Lei acima mencionada, na parte
oue justifica a instituição do nexo técnico epidemiológico:
“7. Diante do descum prim ento sistem ático da regras que determinam a emissão da
C AT, e da d ific u ld a d e de fis c a liz a ç ã o p o r se tra ta r de fa to in d iv id u a liz a d o , os
tra b a lh a d o re s a ca b a m p re ju d ic a d o s nos s e u s d ire ito s , em fa c e da in c o rre ta
caracterização de seu benefício. Necessário, pois, que a Previdência Social adote um
novo mecanismo que segregue os benefícios acidentários dos comuns, de form a a
neutralizar os efeitos da sonegação da CAT.

8. Para atender a tal mister, e por se tratar de presunção, matéria regulada por lei e
não por meio de regulamento, está-se presumindo o estabelecim ento do nexo entre o
trabalho e o agravo, e consequentem ente o evento será considerado como acidentário,
sempre que se verificar nexo técnico epidem iológico entre o ramo de atividade da
em presa e a entidade mórbida relacionada na CID motivadora da incapacidade.

9. Essa m etodologia está em basada na CID, que se encontra atualm ente na 10a
Revisão. Em cada processo de solicitação de benefício por incapacidade ju n to à
P re vid ê ncia S ocial, c o n sta o b rig a to ria m e n te o re g istro do d ia g n ó stico (C ID -10)
identificador do problem a de saúde que motivou a solicitação. Esse dado, que é
e x ig id o p a ra a c o n c e s s ã o de b e n e fíc io p o r in c a p a c id a d e la b o ra tiv a ,
independentemente de sua natureza acidentária ou previdenciária, e cujo registro é
de responsabilidade do médico que prestou o atendimento ao segurado, estabelece
a relação intrínseca entre a incapacidade laboral e a entidade mórbida que a provocou.

10. Assim, denomina-se Nexo Técnico Epidemiológico a relação entre Classificação


Nacional de Atividades Econômicas — CNAE e o agrupamento CID-10. É, na verdade,
um a m ed ida de a s s o c ia ç ã o e sta tís tíc a , que se rve com o um dos re q u is ito s de
causalidade entre um fator (nesse caso, pertencer a um determinado CNAE-classe) e
um desfecho de saúde, m ediante um agrupamento CID, como diagnóstico clínico. Por
meio desse nexo, chega-se à conclusão de que pertencer a um determinado segmento
econômico (CNAE-classe) constitui fator de risco para o trabalhador apresentar uma
determ inada patologia (agrupam ento C ID -10).”(12)

Como se viu acima, a Previdência Social deverá reconhecer o afasta­


mento de natureza acidentária (e não só previdenciária), sempre que se veri­
ficar a ocorrência do nexo técnico epidemiológico, entre o ramo de atividade

(11) Cf. Revista Proteção, Novo Hamburgo, Ano XX, n. 185, p. 34, maio 2007.
(12) Disponível em: <w w w .planalto.gov.br>.
158 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

econômica da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade(13).


Aliás, se for constatado o nexo epidemiológico, a perícia médica do INSS
somente poderá deixar de reconhecer a natureza acidentária do benefício
quando dispuser de informações ou elementos circunstanciados e contem­
porâneos ao exercício da atividade que evidenciem a inexistência do nexo
causal entre o agravo e o trabalho(14).
De todo modo, o reconhecimento pela Previdência Social de um benefício
de natureza acidentária não assegura, necessariamente, a existência do nexo
causal para fins de responsabilidade civil. Por se tratar de presunção juris
tantum, poderá o em pregador apresentar provas em sentido contrário,
demonstrando que aquele acidente ou adoecimento não teve vínculo causal
com a execução do contrato de trabalho. A decisão administrativa do INSS,
apesar de todos os atributos do ato administrativo, não vincula o Poder
Judiciário. Entretanto, se o empregador não apresentar provas convincentes
para afastar a presunção, tem-se como atendido o pressuposto do nexo causal
para fins da reparação civil. Aliás, o Enunciado n. 42, aprovado por ocasião
da 1ã Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho realizada em
Brasília, em novembro de 2007, também adota este entendimento: “Acidente
do trabalho. Nexo técnico epidem iológico. Presum e-se a ocorrência de
acidente do trabalho, mesmo sem a em issão da CAT — Com unicação
de Acidente de Trabalho, quando houver nexo técnico epidemiológico conforme
art. 21-A da Lei n. 8.213/1991.”

6.3. Nexo nos acidentes e doenças ocupacionais

O estudo do nexo de causalidade no âmbito da responsabilidade civil


em geral abrange enorme variedade de danos e a busca da identificação do
lesante para constatar a ligação deste com o prejuízo causado, de modo a
viabilizar as reparações cabíveis. Para as hipóteses abordadas neste livro,
no entanto, a verificação do nexo causal é menos tormentosa, visto que basta
demonstrar a existência de relação entre o exercício do trabalho a serviço da
empresa com o acidente sofrido pelo empregado.

Numa seqüência lógica, o exame da causalidade deve ser feito antes da


verificação da culpa ou do risco da atividade, porquanto poderá haver acidente
onde se constata o nexo causal, mas não a culpa do empregador; todavia,
jamais haverá culpa patronal se não for constatado o liame causal do dano
com o trabalho.

(13) O detalhamento quanto ao método de apuração do Nexo Técnico Epidemiológico foi feito
pelo Decreto regulamentar n. 6.042/2007, com os acréscimos dos Decretos ns. 6.957/2009 e
7.126/2010. Conferir também a Instrução Normativa INSS/PRES. n. 45, de 6 ago. 2010.
(14) Instrução Normativa INSS/PRES. n. 31, de 10 set. 2008, art. 6e, § 3g.
•DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 159

No acidente do trabalho típico a presença do nexo causal fica bem


evidente. A simples leitura da CAT já permite a verificação do dia, hora, local
e os detalhes da ocorrência. A descrição mencionada facilita a percepção do
, ínculo de causalidade do infortúnio com a execução do contrato laboral.

Por outro lado, a identificação do nexo causal nas doenças ocupacio-


nais exige maior cuidado e pesquisa, pois nem sempre é fácil comprovar se a
enfermidade apareceu ou não por causa do trabalho. Em muitas ocasiões
serão necessários exames complementares para diagnósticos diferenciais,
som recursos tecnológicos mais apurados, para formar convencimento quanto
a origem ou às razões do adoecimento. A própria lei acidentária exclui do
sonceito de doenças do trabalho as enfermidades degenerativas e aquelas
nerentes ao grupo etário(15). Isso porque, em tese, os empregados que têm
cropensão a tais patologias estão vulneráveis ao adoecimento independente­
mente das condições de trabalho. Nessas hipóteses, as doenças apenas
ocorreram “no” trabalho, mas não “pelo” trabalho; aconteceram no trabalho,
Tias não tiveram o exercício do trabalho como fator etiológico(16).

Além disso, há muitas variáveis relacionadas com as doenças ocupaci­


onais. Em determinados casos, o trabalho é o único fator que desencadeia a
doença; em outros, o trabalho é tão somente um fator contributivo; pode ser
ainda que o trabalho apenas agrave uma patologia preexistente ou determine
a precocidade de uma doença latente. O manual de procedimentos dos serviços
de saúde para as doenças relacionadas ao trabalho, elaborado pelo Ministé­
rio da Saúde, aponta quatro grupos de causas das doenças que acometem
os trabalhadores:

“• Doenças comuns, aparentemente sem qualquer relação com o trabalho;

• Doenças comuns (crônico-degenerativas, infecciosas, neoplásicas,


traumáticas etc.) eventualmente modificadas no aumento da frequência
de sua ocorrência ou na precocidade de seu surgimento em trabalhado­
res, sob determinadas condições de trabalho. A hipertensão arterial em
motoristas de ônibus urbanos, nas grandes cidades, exemplifica esta
possibilidade;
• Doenças comuns que têm o espectro de sua etiologia ampliado ou
tornado mais complexo pelo trabalho. A asma brônquica, a dermatite de

(15) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991, art. 20, § 12.


(16) “A cidente do trabalho — Doença — Disacusia bilateral neurosensorial — Nexo causal
— Não reconhecim ento — Gota acústica — Ausência — Inindenizabilidade — Perda auditiva
assimétrica e que não apresenta gota acústica em seu traçado audiom étrico não tem nexo
de causalidade com a atividade laborativa, ainda que ruidosa.” São Paulo. STACivSP. 3a
Câm. Apelação sem Revisão n. 653.077-00/2, Rei.: Juiz Cambrea Filho, julgado em 28 jan.
2003.
160 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

contato alérgica, a perda auditiva induzida pelo ruído (ocupacional),


doenças musculoesqueléticas e alguns transtornos mentais exemplificam
esta possibilidade, na qual, em decorrência do trabalho, somam-se (efeito
aditivo) ou multiplicam-se (efeito sinérgico) as condições provocadoras
ou desencadeadoras destes quadros nosológicos;

• Agravos à saúde específicos, tipificados pelos acidentes do trabalho e


pelas doenças profissionais. A silicose e a asbestose exemplificam este
grupo de agravos específicos.”(17)

Diante das inúm eras controvérsias a respeito da causalidade nas


doenças relacionadas ao trabalho, acarretando profundas divergências nos
laudos periciais, o Conselho Federal de Medicina baixou a Resolução CFM n.
1.488, de 11 de fevereiro de 1998, recomendando os procedimentos e critérios
técnicos mais apropriados para o estabelecimento ou negação do nexo causal
nas perícias médicas a respeito das doenças ocupacionais:
“Art. 2- Para o estabelecim ento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as
atividades do trabalhador, além do exam e clínico (físico e m ental) e os exam es
com plem entares, quando necessários, deve o médico considerar:

I — a história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação


de nexo causal(18);

II — o estudo do local de trabalho;

III — o estudo da organização do trabalho;

IV — os dados epidemiológicos;

V — a literatura atualizada;

VI — a ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições


agressivas;

VII — a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes


e outros;

(17) MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL. Doenças relacionadas ao trabalho: manual de


procedimentos para os serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde do Brasil, 2001. p. 27.
(18) “Doença ocupacional equiparada a acidente do trabalho. Perda auditiva induzida pelo
ruído (PAIR). Pluralidade de em pregadoras no polo passivo. Hipótese em que o reclamante
ajuíza demanda em face de três ex-em pregadoras, para as quais prestou a mesm a atividade
— operador de máquina perfuratriz — por diferentes períodos e em distintas condições de
trabalho. Não verificado qualquer agravam ento da perda auditiva da qual o reclamante já
era p o rta d o r quando do seu in g re sso na se g u n d a e te rc e ira re cla m a d a s, in viá ve l o
reconhecimento do elem ento nexo causal entre a perda auditiva do reclamante e o labor
prestado nessas em presas, não havendo falar em responsabilidade das em pregadoras
que não contribuíram para o evento danoso. R ecurso da segunda e terceira reclam ada
provido para absolvê-las da condenação imposta.” Rio Grande do Sul. TRT 4- Região. 4-
Turma. RO n. 0108400-24.2005.5.04.0511, Rei.: Des. Hugo Carlos Scheuerm ann, DJ 02
jul. 2009.
ÍDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 161

VIII — o depoim ento e a experiência dos trabalhadores;

IX — os conhecim entos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais,


sejam ou não da área da saúde.”

Entendemos que os procedimentos técnicos recomendados por essa


-iesolução representam uma diretriz de segurança importante. Além de indicar
:odos os fatos que contribuem para o adoecimento, apontando dados que
: everão ser considerados, privilegia o conhecimento científico multidisciplinar
como roteiro mais seguro para se encontrar a verdade. A sua aplicação com
certeza contribuirá para a m elhoria da qualidade dos laudos periciais,
oferecendo ao julgador melhores e mais convincentes subsídios para conceder
a indenização ao que efetivamente foi lesado ou negar o pedido quando a
coença não estiver relacionada com o trabalho(19).

O perito do juízo deverá também considerar as recomendações da


Resolução INSS/DC n.10, de 23 de dezembro de 1999, que aprovou os
Protocolos Médicos sobre 14 grupos de doenças, com detalhamento sobre o
ciagnóstico, o procedimento médico para o estabelecimento do nexo causal,
os fatores etiológicos, a mensuração da incapacidade laborativa, além de
outras importantes recomendações(20).
De qualquer forma, em muitas ocasiões, as provas colhidas não permi­
tem concluir com certeza qual a origem do adoecimento. Nem a ciência jurídi­
ca ou a medicina trabalham com exatidão rigorosa dos fatos como ocorre nos
domínios das ciências exatas. As provas não devem ser avaliadas mecani­
camente com o rigor e a frieza de um instrumento de precisão, mas com a
racionalidade de um julgador atento que conjuga fatos, indícios, presunções

(19) “A cidente do trabalho. Doença p u lm o n a r obstrutiva crônica — Nexo causal — Não


reconhecim ento — Inindenizabilidade. O obreiro sofre de “doença pulm onar obstrutiva
crô n ica ” , p a to lo g ia que pode c o m p re e n d e r a asm a b rô n q u ica , b ro n q u ite e e n fise m a
pulmonar, onde o fum o é a causa decisiva, declarando-se o autor fum ante há mais de vinte
anos, além de alcoólatra. Não bastasse, dos achados pulm onares nada indica sinais de
danos característicos da inalação de pó de sílica, de cunho restritivo quanto à função
pulm onar, distúrbio que poderia te r sido causado pelo am biente laboral, padecendo o
promovente apenas de distúrbio obstrutivo. A simples existência de dano e incapacidade
desautoriza o deferim ento de benefício acidentário se o nexo causal com a atividade não
restar evidenciado.” São Paulo. STACivSP. 4- Câm. Apelação sem Revisão n. 709.617-00/
8, Rei.: Juiz Francisco Casconi, julgado em 1- jul. 2003.
“Doença profissional. Nexo causal não demonstrado. Indenização indevida. Apresentando
a reclamante quadro de agravam ento da perda auditiva mesmo tendo cessado a exposição
ao ruído, em razão do afastamento do trabalho, não se configura o nexo causal, capaz de
ensejar direito ao pagamento de indenização, já que a PAIR (perda auditiva induzida por
ruído ocupacional) tem por característica que, uma vez cessada a exposição ao ruído,
m antém -se estável, sem progressão. Recurso não provido.” Rio Grande do Sul. TR T 4-
Região. RO 00050-2006-261-04-00-5 RO, Rei.: Carmen Gonzaiez, DJ 20 jun. 2007.
(20) D isp o n ível em: < h ttp ://w w w 8 1 .d a ta p re v .g o v .b r/s is le x /p a g in a s /7 2 /IN S S -D C /1 9 9 9 /
10.htm>. Acesso em: 10 nov. 2012.
162 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

e a observação do que ordinariamente acontece para formar seu convenci­


mento. Conforme alertou Agostinho Alvim, “nem sempre há certeza absoluta
de que certo fato foi o que produziu determinado dano. Basta um grau eleva­
do de probabilidade.”(21) Um julgado do Segundo Tribunal de Alçada Cível de
São Paulo retrata bem essa questão:
“Acidente do trabalho — Benefício — Conversão — Aposentadoria previdenciária
em acidentária — Doença — Mal da coluna — Nexo causal — Prova. A presença do
nexo causal se mede por razoável probabilidade, não por matemática certeza, mesmo
porque a ciência médica não é exata. Se o fosse, as calculadoras seriam feitas para
os médicos e estes estariam livres de todas as acusações e indenizações pelos erros
que vivem cometendo. Vale dizer, é o possível lógico, não o absolutamente certo, que
embasa a conclusão pela presença do nexo causal e concausal. Cabe converter a
apo se n ta d o ria por in va lid e z p re vid e n ciá ria na hom ônim a a cid e ntá ria , ainda que
calculadas ambas com o percentual de 100% do salário de benefício, para que, com
o correto enquadramento jurídico da incapacidade do segurado, possa ele gozar de
todas as im plicações daí advindas, mormente as indiretas, dentre estas a eventual
geração de responsabilidade baseada no direito comum .” São Paulo. STACivSP. 12-
Câm. Apelação sem Revisão n. 690.457-00/5, Rei.: Juiz Palma Bisson, julgado em 28
ago. 2003.

6.4. Nexo concausal

Os acidentes ou as doenças ocupacionais podem decorrer de mais de


uma causa (concausas), ligadas ou não ao trabalho desenvolvido pela vítima.
Estaremos diante do nexo concausal quando, apesar da presença de fatores
causais extralaborais, haja pelo menos uma causa relacionada à execução
do contrato de trabalho que tenha contribuído diretamente para o acidente ou
adoecimento.

Assevera Cavalieri Filho que “a concausa é outra causa que, juntando-


-se à principal, concorre para o resultado. Ela não inicia e nem interrompe o
processo causal, apenas o reforça, tal como um rio menor que deságua em
outro maior, aumentando-lhe o caudal.”(22)

Prevê o art. 21, I, da Lei n. 8.213/1991, que também se equipara ao


acidente do trabalho “o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha
sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado,
para a redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido
lesão que exija atenção médica para a sua recuperação.” Como se vê, a
presença de condições diversas que agravam ou contribuem para os

(21) ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências. 4 ed. atual.
São Paulo: Saraiva, 1972. p. 341.
(22) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 62.
N d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 163

Tialefícios de causa laboral não impede a caracterização do evento como


acidente do trabalho(23).
As concausas podem ocorrer por fatos preexistentes, supervenientes
ou concom itantes àqueles que desencadearam o im plem ento do nexo
de causalidade(24). Vale transcrever nesse sentido a doutrina abalizada de
Antônio Lopes Monteiro:

“Nem sempre o acidente se apresenta como causa única e exclusiva da


lesão ou doença. Pode haver a conjunção de outros fatores — concau­
sas. Uns podem preexistir ao acidente — concausas antecedentes;
outros podem sucedê-lo — concausas supervenientes; por fim, há, tam­
bém, os que se verificam concomitantemente — concausas simultâneas.
Exemplo do primeiro caso é o diabético que venha a sofrer um pequeno
ferimento que para outro trabalhador sadio não teria maiores conseqüên­
cias. Mas o diabético falece devido a intensa hemorragia causada. Te­
mos assim uma morte para a qual concorre o acidente associado a um
fator preexistente, a diabete.
Já os fatores supervenientes verificam-se após o acidente do trabalho ou
da eclosão da doença ocupacional. Se de um infortúnio do trabalho
s o b re vie re m c o m p lic a ç õ e s com o as p ro vo ca d a s por m icró b io s
patogênicos (estafilococos, estreptococos etc.), determ inando, por
exemplo, a amputação de um dedo ou até a morte, estaremos diante de
uma concausa superveniente.

(23) As concausas não impedem a caracterização do evento com o acidente do trabalho,


mas podem te r influência para reduzir o m ontante da indenização, especialm ente nos
valores dos danos morais, como verem os no Cap. 8.
(24) É oportuno transcrever o entendim ento de Carlos Alberto M enezes Direito e Sérgio
Cavalieri Filho sobre as concausas que, fazendo as devidas adequações, têm aplicação
nas hipóteses de acidente do trabalho: “As concausas preexistentes não eliminam a relação
causal, considerando-se como tais aquelas que já existiam, quando da conduta do agente,
que são antecedentes ao próprio desencadear do nexo causal. Assim , por exemplo, as
condições pessoais de saúde da vítim a, bem com o as suas predisposições patológicas,
embora agravantes do resultado, em nada diminuem a responsabilidade do agente. Será
irrelevante, para tal fim, que de uma lesão leve resulte a morte, por ser a vítim a hemofílica;
de um atropelam ento ocorram complicações, por ser a vítim a diabética; da agressão física
ou moral, a morte, por ser a vítim a cardíaca; de um pequeno golpe, uma fratura do crânio,
em razão da fragilidade congênita do osso frontal etc. Em todos esses casos, o agente
responde pelo resultado mais grave, independentem ente de ter ou não conhecim ento da
concausa antecedente que agravou o dano. A situação da causa superveniente é idêntica
à da causa antecedente que acabamos de examinar. Ocorre já depois do desencadeamento
do nexo causal e, embora concorra tam bém para o agravam ento do resultado, em nada
favorece o agente. A vítim a de um atropelam ento não é socorrida em tempo, perde muito
sangue e vem a falecer. Essa causa superveniente, apesar de ter concorrido para a morte
da vítima, será irrelevante em relação ao agente, porque, por si só, não produziu o resultado,
apenas o reforçou.” Cf. Comentários ao novo Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2007. v. XIII, p. 85-86.
164 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir -

As causas concomitantes, por sua vez, coexistem ao sinistro. Concre­


tizam-se ao mesmo tempo: o acidente e a concausa extralaborativa. O
exemplo típico é a disacusia (PAIR), da qual é portador um tecelão de
cinqüenta anos. A perda auditiva é consequência da exposição a dois
tipos de ruído concomitantes: o do ambiente do trabalho, muitas vezes
elevado durante vinte ou trinta anos, e, durante o mesmo tempo o do
fator etário (extralaborativa): concausa simultânea.”(25)

O nexo concausal aparece com frequência no exame das doenças


ocupacionais. A doença oriunda de causas múltiplas não perde o enquadramen­
to como patologia ocupacional, se houver pelo menos uma causa laboral que
contribua diretamente para a sua eclosão ou agravamento, conforme prevê o
art. 2 1 ,1, da Lei n. 8.213/1991. Como já enfatizamos anteriormente, a aceitação
normativa da etiologia multicausal não dispensa a existência de uma causa
eficiente, decorrente da atividade laboral, que “haja contribuído diretamente''
para o acidente do trabalho ou situação equiparável ou, em outras palavras, a
concausa não dispensa a presença da causa de origem ocupacional(26).

Diante dessa previsão legal, aplica-se na hipótese a teoria da equivalência


das condições ou da conditio sine qua non, como ocorre no Direito Penal,
pois tudo o que concorre para o adoecimento é considerado causa, pois não
se deve criar distinção entre causa e condição(27). Não há necessidade de se
precisar qual das causas foi aquela que efetivamente gerou a doença, como
ocorre na aplicação da teoria da causalidade adequada, pois todas as
condições ou causas têm valoração equivalente. É necessário apenas que a
causa laboral contribua diretamente para a doença, mas não que contribua
decisivamente. Vejam o entendimento da jurisprudência a respeito:

(25) MONTEIRO, Antônio Lopes; BERTAGNI, Roberto Fleury de Souza. Acidentes do trabalho
e doenças ocupacionais. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 19-20.
(26) “ Indenização. D ano m aterial e moral. Doença profissional. R edução da capacidade
auditiva. Não obstante tenha a em pregadora, em determ inado m om ento do contrato de
trabalho, encaminhado a CAT ao INSS, que, em sua perícia médica, autorizou a concessão
do auxílio-acidente ao empregado, por certo período, estes fatos não elidem a conclusão
pericial, do perito do juízo, ratificada pelos assistentes das empresas reclamadas e dotada
de va lio so s subsídios, co m p ro va do s nos autos, de que a perda a u d itiva so frid a pelo
reclamante é preexistente à sua admissão na em presa e que no correr do longo tem po que
lhe prestou serviços, até sua aposentadoria proporcional por tem po de serviço e posterior
dispensa, não foi ag ravada em de co rrê ncia das condições em que os se rviços foram
prestados. Nesse contexto, embora presente o dano, ausentes o nexo causal e a culpa, que
dariam suporte à pretensão indenizatória m anifestada na exordial.” Minas Gerais. TRT 3a
Região. 3- Turma. RO n. 329-2006-088-03-00-7, Rei.: Des. César Pereira da Silva Machado
Júnior, DJ 28 abr. 2007.
(27) OPTIZ, Oswaldo; OPTIZ, Sílvia. Acidentes do trabalho e doenças profissionais. 3. ed.
São Paulo: Saraiva, 1988. p. 26.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 165

“Agravo de instrum ento. Recurso de revista. Doença ocupacional. Indenização


por dano s m o rais e m a te ria is . C on c a u s a . Q u an tu m in d e n iza tó rio . D ecisão
denegatória. Manutenção. O pleito de indenização por dano moral e material resultante
de acidente do trabalho e/ou doença profissional ou ocupacional supõe a presença
de três requisitos: a) ocorrência do fato deflagrador do dano ou do próprio dano, que
se constata pelo fato da doença ou do acidente, os quais, por si sós, agridem o
patrim ônio moral e emocional da pessoa trabalhadora (nesse sentido, o dano moral,
em tais casos, verifica-se in re /psa); b) nexo causal, que se evidencia pela circunstância
de o malefício ter ocorrido em face das circunstâncias laborativas; c) culpa empresarial,
a qual se presum e em face das circunstâncias ambientais adversas que deram origem
ao m a le fíc io (e x c lu íd a s as h ip ó te s e s de re s p o n s a b ilid a d e o b je tiv a , em que é
prescindível a prova da conduta culposa patronal). Embora não se possa presum ir a
culpa em diversos casos de dano moral — em que a culpa tem de ser provada pelo
autor da ação — , tratando-se de doença ocupacional, profissional ou de acidente do
trabalho, essa culpa é presum ida, em virtude de o em pregador te r o controle e a
direção sobre a estrutura, a dinâmica, a gestão e a operação do estabelecim ento em
que ocorreu o malefício. Pontue-se que tanto a higidez física como a mental, inclusive
emocional, do ser humano são bens fundam entais de sua vida, privada e pública, de
sua intimidade, de sua autoestim a e afirmação social e, nesta medida, também de sua
h o n ra . São b ens, p o rta n to , in q u e s tio n a v e lm e n te tu te la d o s , re g ra g e ra l, p ela
C onstituição (art. 5e, V e X). Agredidos em face de circunstâncias laborativas, passam
a m erecer tutela ainda mais forte e específica da C arta Magna, que se agrega à
genérica anterior (art. 72, XXVIII, CF/88). Assim, se as condições de trabalho a que se
subm etia o trabalhador contribuíram diretam ente para a redução ou perda da sua
capacidade laborativa, deve-lhe ser assegurada a indenização pelos danos sofridos.
No caso em tela, restou consignado pelo Regional que o trabalho do Reclam ante
co m o a u x ilia r de s e rv iç o s g e ra is do e s to q u e (a tiv id a d e s de c a rre g a m e n to e
descarregam ento de caminhões, limpeza e organização do estoque, classificação de
g a rra fa s , e a m a rra r g a rra fa s ) c o n trib u iu , de fo rm a d e c is iv a e d ire ta , p a ra o
desencadeam ento de hérnia discai lombar, o que configura o nexo de concausalidade.
Nessa situação, presume-se a culpa da em pregadora pela doença ocupacional e era
dela o ônus de com provar a adoção das necessárias medidas preventivas exigidas
pela ordem jurídica em matéria de segurança e saúde no trabalho — deveres anexos
ao contrato de trabalho — , a fim de evitar o infortúnio ocorrido, ônus de que não se
desonerou, a teor do que consta do acórdão regional. Assim, deve ser assegurada a
indenização pelos danos sofridos. Não há como assegurar o processam ento do recurso
de revista quando o agravo de instrumento interposto não desconstitui os fundam entos
da decisão denegatória, que subsiste por seus próprios fundam entos. A gravo de
instrum ento desprovido.” TST. 3a Turm a. A IR R n. 53600-93.2009.5.04.0741, Rei.:
Ministro Mauricio Godinho Delgado, DJ 21 set. 2012.

“Acidente de trabalho. Doença ocupacional. LER/DORT. Nexo concausal. Teoria


da equivalência das condições. A doença que se origina de múltiplos fatores não
deixa de ser enquadrada com o patologia ocupacional se o exercício da atividade
laborativa houver contribuído direta, mas não decisivamente, para a sua eclosão ou
agravamento, nos termos do art. 21, I, da Lei n. 8.213/91. Aplica-se para a verificação
da concausa a teoria da equivalência das condições, segundo a qual se considera
causa, com valoração equivalente, tudo o que concorre para o adoecim ento.” Santa
Catarina. TRT 12a Região. 1a Turma. RO n. 06060-2009-030-12-00-9, Rei.: Viviane
Colucci, DJ 30 jul. 2012.

“Doença ocupacional — Culpa da em presa —- Cadeia causal — Concausa —


R esponsabilidade trabalhista pela indenização por danos m orais — A doença
166 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

ocupacional pode, em certas situações, ter mais de uma causa, sendo, inclusive e
eventualmente, uma intra e outra extraocupacional. Concausa significa a coexistência
de causas geratrizes de determ inada patologia. Segundo Houaiss, concausa é a
‘causa que se junta a outra preexistente para a produção de certo efeito’. Para fins de
fixação da responsabilidade empresarial, na concausa não se mede, necessariamente,
a extensão de uma e de outra causa, já que ambas se somam, se fundem, se agrupam
para desencadear a doença. Os reflexos, isto é, os fragmentos de cada causa podem
até atingir o horizonte do arbitramento do quantum indenizatório; dificilmente, porém,
o núcleo deflagrador e agravador da doença. A situação não é, por conseguinte, de
principalidade ou de acessoriedade, nem de anterioridade ou de posterioridade da
doença, mesmo porque a medicina não é uma ciência exata, que permita ao Médico,
sempre e sempre, um diagnóstico m ilim etricam ente preciso a esse respeito. O que
im porta efetivam ente, na esfera da responsabilidade trabalhista, é a existência ou
não de fa to re s re la c io n a d o s com o tra b a lh o , que te n h a m c o n trib u íd o p a ra o
desencadeam ento da doença ocupacional, mormente se se levar em consideração,
em casos difíceis, que o risco da atividade econômica é, intrínseca e extrinsecamente,
da empresa: seria como que um risco ao mesmo tempo econômico e social. Casos há
em que, para os operadores do Direito, a causa invisível se esconde por detrás da
causa visível, cabendo ao Perito a realização de exame meticuloso e a confecção de
laudo elucidativo, a fim de que se possa verificar, com segurança e com justiça, a
ocorrência do nexo de causalidade, que pode, com o assinalado, ser um nexo de
concausalidade. O juiz tem o comando do processo e a verdade real interessa com
igual intensidade a todos os ramos do processo, pouco importando se penal, trabalhista,
cível, mas ganha contornos significativos quando se trata de doença, cujas seqüelas
restringem ainda mais o já limitadíssim o mercado de trabalho, e, por consequência, o
acesso ao direito ao em prego, constitucionalm ente garantido. Logo o ju iz pode e
deve designar as perícias que entender necessárias, com fincas no art. 765 da CLT.
Se a empresa, por ação ou omissão, pratica ato ilícito de índole trabalhista de modo a
estabelecer a sua culpa, identificado o nexo etiológico entre as condições em que o
trabalho era executado e a doença ocupacional, aflora a sua responsabilidade pela
indenização trabalhista por danos morais, a ser fixada prudente e equitativam ente
pelo juiz, levando, inclusive, em consideração, o grau de culpa ondeada, naquilo e na
proporção em que for possível a apuração, por imputação direta à em pregadora.”
Minas Gerais. TRT 3a Região. 4a Turma. RO n. 01242-2005-035-03-00-0, Rei.: Des.
Luiz Otávio Linhares Renault, DJ 06 out. 2007.

Na lição de Sérgio Cavalieri, “para se saber se uma determinada condição


é causa, elimina-se mentalmente essa condição, através de um processo
hipotético. Se o resultado desaparecer, a condição é causa, mas, se persistir,
não o será. Destarte, condição é todo antecedente que não pode ser eliminado
mentalmente sem que venha a ausentar-se o efeito.”(28)

O manual de procedimentos para as doenças relacionadas ao trabalho,


elaborado pelo Ministério da Saúde, indica três categorias da relação traba­
lho e saúde, conforme classificação proposta por Shilling(29):

(28) C AVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 51.
(29) MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL. Doenças relacionadas ao trabalho: manual de
procedimentos para os serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde do Brasil, 2001. p. 28.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o o u D oença O c u p a c io n a l 167

CLASSIFICAÇÃO DAS DOENÇAS


SEGUNDO SUA RELAÇÃO COM 0 TRABALHO

Categoria Exemplos

I - Trabalho como causa Intoxicação por chumbo


necessária Silicose
Doenças profissionais legalmente reconhecidas

II - Trabalho como fator Doença coronariana


contributivo, mas não Doenças do aparelho locomotor
necessário Câncer
Varizes dos membros inferiores

III - Trabalho como Bronquite crônica


provocador de um distúrbio Dermatite de contato alérgica
latente, ou agravador de Asma
doença já estabelecida Doenças mentais

A própria existência de diversas teorias e classificações a respeito do


liame causal nas concausas já demonstra que não há fórmula infalível que se
aplique a todas as situações. São apenas técnicas auxiliares sedimentadas
pela doutrina, que indicam possíveis roteiros de solução das controvérsias
quanto ao nexo causal. A realidade, no entanto, é m uito mais rica e
diversificada do que qualquer esquema classificatório e cada caso concreto
tem especificidades que somente a argúcia do julgador permitirá encontrar o
caminho mais adequado para dirimir a controvérsia. A propósito, cabe citar o
ensinamento de Humberto Theodoro Júnior:

“O problema da causalidade ultrapassa o terreno do direito e transita por


vários planos como o da lógica e o das ciências naturais. Por mais que
se tente em doutrina equacionar-se uma regra para a generalidade dos
casos de ato ilícito civil, as soluções são sempre incompletas e servem
apenas de um roteiro, cuja observância dependerá sempre de uma
integração a cargo do juiz, que haverá de valer-se da prudência e da
lógica do razoável, à luz dos detalhes do caso concreto.”(30)

Oportuno mencionar, também, a opinião de Ludwig Enneccerus, quando


analisa as dificuldades na identificação do nexo causal e aponta a solução
casuística indicada pela Lei Processual Civil da Alemanha — LPC: “A difícil
questão de saber até onde vai o nexo causal não se pode resolver nunca, de

(30) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. 2, p. 94.
168 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

uma maneira plenamente satisfatória, mediante regras abstratas, mas em


casos de dúvida o juiz há de resolver segundo sua livre convicção, ponderando
todas as circunstâncias, segundo lhe faculta o § 287 da LPC.”(31)

6.5. Excludentes do nexo causal

Alguns acidentes do trabalho, apesar de ocorrerem durante a prestação


de serviço, não autorizam o acolhimento da responsabilidade civil patronal
por ausência do pressuposto do nexo causal ou do nexo de imputação do
fato ao empregador. Podem ser indicados nesse grupo especialmente os
acidentes causados por culpa exclusiva da vítima, caso fortuito, força maior
ou fato de terceiro.

Nas hipóteses de exclusão da causalidade os motivos do acidente não


têm relação direta com o exercício do trabalho e nem podem ser evitados ou
controlados pelo empregador. São ocorrências que impedem a formação do
liame causal e, portanto, afastam o dever de indenizar porquanto não há
constatação de que o empregador ou a prestação do serviço tenham sido os
causadores do infortúnio.

É certo que a Lei n. 8.213/1991, ao regulamentar o seguro acidentário,


admite no art. 21 o enquadramento desses casos como acidente do trabalho,
pela modalidade de nexo causal indireto, mas na órbita da responsabilidade
civil tais eventos, em princípio, afastam o nexo causal. Ocorrido o acidente, a
vítima terá direito a todos os benefícios concedidos pelo seguro de acidente
do trabalho, mas não obterá a indenização do empregador por ausência dos
pressupostos da responsabilidade civil.

Nos tópicos seguintes vamos analisar separadam ente as principais


hipóteses de exclusão do nexo causal nos acidentes do trabalho.

6.6. Culpa exclusiva da vítima

Quando o acidente do trabalho acontece por culpa exclusiva da vítima


não cabe reparação civil, em razão da inexistência de nexo causal do evento
com o desenvolvim ento da atividade da empresa ou com a conduta do
empregador.

Em doutrina, a terminologia mais técnica recomenda a expressão “fato


da vítima”, em vez de “culpa da vítima”, já que essa exclusão da responsabi-

(31) A p ud ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências. 4. ed.


São Paulo: Saraiva, 1972. p. 371.
‘ . d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o o u D oença O c u p a c io n a l 169

idade está no território da causalidade e não da culpabilidade(32). Apesar da


orocedência da observação, continuaremos a utilizar a locução “culpa da ví­
tima” por já estar consagrada pelo uso e empregada até mesmo no art. 936,
ao Código Civil de 2002(33).

De qualquer modo, quando não se vislumbra o nexo causal inexiste


:ambém culpa daquele que é apontado como o causador do dano, daí por que
nas hipóteses de exclusão do nexo causal (culpa da vítima, caso fortuito,
•orça maior ou fato de terceiro) muitas decisões negam a indenização,
adotando como fundamento a ausência de culpa do empregador.

Se o acidente ocorrer por culpa concorrente da vítima e do empregador,


o nexo causal do acidente com o trabalho continua, mas a indenização poderá
ser reduzida proporcionalmente, conforme previsto no art. 945 do Código
Civil(34). Aliás, na V Jornada de Direito Civil, realizada em 2011, foi aprovado o
Enunciado 459 que prevê: “Art. 945. A conduta da vítima pode ser fator
atenuante do nexo de causalidade na responsabilidade civil objetiva.”

Fica caracterizada a culpa exclusiva da vítima quando a causa única do


acidente do trabalho tiver sido a sua conduta, sem qualquer ligação com o
descumprimento das normas legais, contratuais, convencionais, regulamen-
íares, técnicas ou do dever geral de cautela por parte do empregador. Se o
empregado, por exemplo, numa atitude inconseqüente, desliga o sensor de
segurança automática de um equipamento perigoso e posteriormente sofre
acidente em razão dessa conduta, não há como atribuir culpa em qualquer
grau ao empregador, pelo que não se pode falar em indenização. O “causa­
dor” real do acidente foi o próprio acidentado, daí falar-se em rompimento do
nexo causal ou do nexo de imputação do fato ao empregador.

Se um empregado não habilitado e sem permissão do empregador ou de


seus prepostos assume a direção de um veículo no interior da fábrica e provoca
colisão e capotamento ao cruzar com outro automóvel, vindo a sofrer dano
estético nos dedos da mão, não terá direito a qualquer indenização em face
do empregador. O acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, não havendo
liame causal direto do evento com o exercício regular do trabalho a serviço
da em presa. C aberão ao acid e n ta d o tão som ente os b e n e fício s da
infortunística, cuja cobertura abrange até os acidentes ocorridos por culpa da
vítima ou que tenham causalidade remota com o serviço.

(32) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 69.
(33) C ódigo Civil, art. 936: “O dono, ou detentor, do anim al ressarcirá o dano por este
causado, se não provar culpa da vítim a ou força m aior.”
(34) A hipótese de culpa concorrente será apreciada no item 7.8 do próximo Capítulo.
170 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

Mesmo nos casos dos danos nucleares, em que a responsabilidade é


objetiva, há previsão expressa exonerando o operador do dever de indenizar,
se comprovada a culpa exclusiva da vítima, como prevê o art. 6Q da Lei n.
6.453/1977: “Uma vez provado haver o dano resultado exclusivamente de
culpa da vítima, o operador será exonerado, apenas em relação a ela, da
obrigação de indenizar.” De forma semelhante há previsão nos arts. 12, § 3a,
e 14, § 3° do Código de Proteção e Defesa do Consumidor exonerando de
responsabilidade o fabricante, o construtor, o produtor ou o fornecedor dos
serviços nas hipóteses de “culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”
Pode ser citado também, por analogia, o art. 936 do Código Civil, que
estabelece: “O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado,
se não provar culpa da vítima ou força maior.”

Convém registrar alguns exemplos de julgados a respeito da culpa


exclusiva da vítima em acidentes do trabalho:
“Agravo de Instrum ento. Recurso de Revista. Acidente do trabalho. Responsabi­
lidade civil do empregador. Fato da vítima. Matéria fática. Súm ula 126/TST. Deci­
são denegatória. O fato da vítim a (também denominado como culpa da vítim a no CC
— art. 936) é fator excludente da reparação civil, por inexistência de nexo de causa­
lidade do evento danoso com o exercício da atividade laboral. Nesse norte, a carac­
terização da culpa exclusiva da vítim a é fator de exclusão do elemento do nexo causal
para efeito de inexistência de reparação civil no âmbito laboral quando o infortúnio
ocorre por causa única decorrente da conduta do trabalhador, sem qualquer ligação
com o descumprimento das normas legais, contratuais, convencionais, regulamenta-
res, técnicas ou do dever geral de cautela por parte do empregador. Isto é, quando
não há o liame causal direto do evento com o exercício do trabalho a serviço da
empresa. Na hipótese, o Regional considerou ter havido culpa exclusiva do R ecla­
mante pelo acidente que resultou na lesão do tendão da mão do obreiro. O que
emerge do conjunto probatório assentado pelo Regional é que o Reclamante, quan­
do estava limpando janela, começou a bater com socos no vidro para que os colegas
a fechassem , constando do acórdão recorrido que não havia necessidade dessa
conduta, pois o próprio obreiro poderia ter fechado a janela ou chamado verbalmente
os colegas para que o fizessem. O Regional consignou, ainda, que o fato de o Recla­
mante não estar com luva de látex não impediria a lesão causada pelo rompimento do
vidro, pois esse EPI não seria suficiente para evitar a lesão, o que afasta a culpa
concorrente. Ressalte-se, também, que eventual culpa presum ida da Reclamada pelo
descum prim ento de normas de segurança restou elidida pelo fato de ter o Regional
assentado que não havia qualquer determinação para que o empregado assim agis­
se ou que estivesse em situação emergencial que o obrigasse a tom ar tal atitude. De
par com tudo, a conduta do obreiro escapa do mínim o razoável que se espera do
indivíduo, provocando, por ato inusitado e insensato, consequência lesiva desneces­
sária. Portanto, para se adotar entendimento em sentido oposto, seria imprescindível
o revolvim ento de fatos e provas, inadmissível nesta seara recursal de natureza extra­
ordinária, de acordo com a diretriz perfilhada pela Súmula 126/TST. Agravo de instru­
mento desprovido.” TST. 38 Turma. AIRR n. 288400-43.2008.5.12.0009, Rei.: Ministro
Mauricio Godinho Delgado, DJ 19 out. 2012.

“Recurso de revista. Acidente de trabalho. Dano moral e material. Responsabili­


dade objetiva. Culpa exclusiva da vítim a. Conform e entendim ento doutrinário, a
IENÍZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 171

caracterização da culpa exclusiva da vítim a é fator de exclusão do elemento do nexo


causal para efeito de reparação civil no âmbito laboral, que se dá “quando a causa
única do acidente de trabalho tiver sido a sua conduta, sem qualquer ligação com o
descum prim ento das normas legais, contratuais, convencionais, regulamentares, téc­
nicas ou do dever geral de cautela por parte do em pregador” . Isto é, quando não há o
liame causal direto do evento com o exercício do trabalho na empresa. No caso em
exame, com base nos fatos narrados pelo Regional, pode-se concluir que a conduta
da reclamante, que dirigia a moto na contramão no momento do infortúnio, foi a causa
única do acidente de trabalho, ensejando a exclusão da responsabilidade objetiva da
empregadora pelo dano. Recurso de revista de que não se conhece.” TST. 6a Turma.
RR n. 3400-48.2008.5.09.0072, Rei.: Ministra Kátia Magalhães Arruda, DJ 28 set. 2012.

“A cidente de trabalho. Culpa exclusiva do trabalhador. Indenizações indevidas.


Nos casos de excludente do nexo causal, como é o caso da culpa exclusiva da vítima,
o dano sofrido pelo trabalhador não tem origem em ação ou omissão voluntária do
em pregador (responsabilidade subjetiva), nem no risco pelo norm al exercício da
a tivid a d e (re s p o n s a b ilid a d e o b je tiv a ), razão pela qual não se pode im p u ta r ao
empregador o dever de indenizar.” Santa Catarina. TR T 12a Região. 2a Turma. RO n.
00552-2009-045-12-00-0, Rei.: Juíza Sandra Mareia Wambier, DJ 17 maio 2010.

“Indenização por dano moral e patrimonial — Indevida quando com provada a culpa
exclusiva do em pregado — Comprovada nos autos a entrega e fiscalização do uso
de equipam entos individuais de segurança, bem como o fato do autor estar embriagado
no momento do acidente, não há que se falar em responsabilidade do empregador. O
acidente de trabalho ocorreu por exclusiva culpa do empregado, não fazendo jus à
indenização postulada.” Paraná. TRT 9a Região. 4a Turma. RO n. 99513-2006-661-
09-00, Rei.: Sérgio Murilo Rodrigues Lemos, DJ 30 maio 2006.

6.7. Caso fortuito ou de força maior

A legislação do seguro acidentário equipara ao acidente do trabalho pela


causalidade indireta o “desabamento, inundação, incêndio e outros casos
fortuitos ou decorrentes de força maior.”(35) Todavia, os acidentes ocorridos
por tais causas, em regra, não geram responsabilidade civil do empregador
por falta de nexo causal direto do evento com o exercício do trabalho. São
circunstâncias ou condições que escapam a qualquer controle ou diligência
do empregador, daí por que nesses acidentes não se vislumbram o nexo de
causalidade nem o dever de indenizar.

Mesmo tendo ocorrido no local e horário de trabalho, não foi a prestação


dos serviços ou a conduta do empregador que causou o acidente, porquanto
não é possível fazer prevenção daquilo que por definição é imprevisível, nem
de impedir o que é naturalmente inevitável.Vejam algumas decisões judiciais
a respeito:
“A gravo de instrum ento em R ecurso de R evista — A cid ente de trab alh o —
Ind en ização por danos m oral e m aterial — Im proced ên cia do pedido ante a

(35) Lei n. 8.213, 24 jul. 1991. Art. 21, II, e.


172 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

constatação de ocorrência de caso fortuito — Inexistência de nexo causal. A


conclusão a que chegou a Corte regional foi lastreada nas provas dos autos, mormente
no laudo pericial e no depoim ento do próprio reclamante, no sentido da inequívoca
ocorrência de caso fortuito, o que exclui a existência de nexo causal, ensejando a
improcedência da postulação. Incidência da Súmula n. 126. Agravo de instrum ento
desprovido.” TST. 4a Turma. AIRR n. 183-93.2010.5.04.0030, Rei.: Ministro Luiz Philippe
Vieira de Mello Filho, DJ 31 ago. 2012

“A gravo de instrum ento. Recurso de revista. Indenização por danos m orais/


patrim oniais. A cidente de trabalho. Caso fortuito ou força maior. A usência de
culpa. Não configuração da hipótese legal de responsabilidade objetiva (parágrafo
ú n ico do a rt. 9 27, C C B ). D e c is ã o d e n e g a tó ria . M a n u te n ç ã o . A le g is la ç ã o
previdenciária, no art. 21, II, “e” , da Lei n. 8.213/91, equipara ao acidente de trabalho
o “desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força
maior” . Contudo, os acidentes ocorridos em tais circunstâncias não geram o dever de
indenizar do em pregador por faltar-lhe o nexo de causalidade, se efetivam ente forem
imprevisíveis e de conseqüências inevitáveis e não estiverem intrinsecamente ligados
à atividade de risco do empregador. Na hipótese, o Regional, analisando o conjunto
probatório dos autos, assentou que a morte do de cujus ocorreu enquanto laborava
na colocação de vidro em janela, tendo como causa fulminação por energia natural,
decorrente de fenôm eno da natureza (eletricidade atmosférica). Concluiu o Regional
que “o acidente ocorreu por fator externo não imputável à em presa, não havendo
qualquer componente culposo a ela atribuível”. Afirmou que o de cujus se utilizava,
no m om ento do a cid e nte , de e q u ip a m e n to de p roteção, não d e te c ta n d o que o
em pregador tenha agido sem observância do dever geral de cautela ou tenha adotado
conduta que revelasse im prudência, negligência ou im perícia (art. 186 do Código
Civil). Assim , o reexam e pretendido torna-se absolutam ente inviável nesta esfera
recursal de natureza extraordinária, porquanto a matéria em discussão está assente
no conjunto fático-probatório e se esgota no duplo grau de jurisdição, a teor da Súmula
126/TST. Registre-se que não se trata da hipótese do art. 927, parágrafo único, do
CCB (responsabilidade objetiva). Não há como assegurar o processam ento do recurso
de revista quando o agravo de instrumento interposto não desconstitui os fundam entos
da decisão denegatória, que subsiste por seus próprios fundam entos. Agravo de
instrumento desprovido.” TST. 6- Turma. AIRR n. 1000-76.2009.5.04.0812, Rei.: Ministro
Mauricio Godinho Delgado, DJ 24 fev. 2012.

“A cidente do trabalho. Reparação de danos m ateriais e morais. Caso fortuito.


Inexistência de culpa do empregador. É inviável cogitar-se de responsabilidade do
e m p re g ad o r pelo fa le c im e n to do em p re g ad o seu que, d irig in d o -s e ao tra b a lh o ,
conduzindo uma bicicleta, envolve-se em acidente de trânsito que resulta na sua
m orte, dado o ca rá te r im p re visíve l do evento danoso e o fa to de que nenhum a
providência poderia ter sido adotada pela empresa, que mensalm ente lhe fornecia
vales-transporte para trabalhar. Fatos ou circunstâncias que escapam a qualquer
controle ou diligência do em pregador não geram a responsabilidade deste, não se
podendo exigir dele a adoção de m edidas preventivas daquilo que por definição é
imprevisível, como o caso fortuito ocorrido nessa situação exam inada.” Minas Gerais.
TRT 3- Região. 5a Turma. RO n. 00152-2006-062-03-00-6. Rei.: Emerson José Alves
Lage. DJ 27 maio 2006.

“Responsabilidade civil — Acidente do trabalho — Indenização — Direito Comum


— Caso fortuito — Culpa do em pregador — Ausência — Descabimento — Restando
comprovada a existência de para-raios na empregadora, e que apesar da presença
deles, dependendo da intensidade da descarga elétrica, a proteção não é absoluta,
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 173

conclui-se que o falecim ento de seu em pregado atingido na sua área de proteção
vitim ado por raio é acontecim ento trágico, imprevisível e inevitável, puro evento de
origem natural, estando, assim, excludente de encargo in denizatório.” São Paulo.
STACivSP. 10- Câm. Apelação com revisão n. 577.478-00/0, Rei.: Juiz Marcos Martins,
julgado em 20 set. 2000.

Cabe considerar, todavia, o que estabelece o art. 501 da CLT: “Entende-


-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do
empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou
ndiretam ente.” Im portante enfatizar a ressalva constante do parágrafo
primeiro: “A imprevidência do empregador exclui a razão de força maior.”

Como visto, antes de adotar posicionamento definitivo sobre as hipóteses


de força maior ou caso fortuito, é preciso avaliar se o empregador, pelo que
ordinariam ente acontece, dentro da razoabilidade e do estágio atual da
■ecnologia, poderia adotar medidas preventivas que teriam evitado o acidente
ocorrido(36).
Aliás, a falta de previdência do empregador caracteriza mesmo a sua
culpa no acidente, ficando também reconhecido o nexo de causalidade do
evento com a sua conduta omissiva. Se o fato for imprevisível, mas as
conseqüências evitáveis, cabe ao empregador adotar as medidas para tanto,
sob pena de restarem configurados os pressupostos do nexo causal e da
culpa patronal, tornando cabível a indenização(37).
É oportuno registrar neste passo a tese interessante elaborada por
Dallegrave Neto, defendendo o deferimento da indenização pela metade, nos
acidentes ocorridos por motivo de força maior ou caso fortuito, por aplicação
analógica do art. 502 da CLT. O raciocínio, sem dúvida, merece consideração,
especialmente porque está em sintonia com a tendência da objetivação da
'esponsabilidade civil do empregador ou mesmo da responsabilidade sem
culpa, conforme mencionamos no Capítulo 5. Vejam os fundamentos do douto
urista paranaense:
“Na esfera do Direito do Trabalho, em face do seu conteúdo tutelar e
mais social do que os contratos civilistas, o dano do empregado ocorrido

36) Assevera, com propriedade, Judith Martins-Costa que: “Toda inevitabilidade é relativa,
no tempo e no espaço (...). É preciso ver a pessoa e o evento, porém, não abstratamente, mas
situadamente, em relação ao tempo e ao espaço, ao seu ambiente ou contexto. Daí a importante
consciência do tempo em que vivemos, tempo que não é ‘unânime’, mas plurifacetado, como
plurifacetada é a sociedade contem porânea.” In: C om entários ao novo C ódigo Civil: do
ínadimplemento das obrigações. Rio de Janeiro: Forense, 2003. v. V, t. II, p. 205.
37) A professora Judith Martins-Costa, ao com entar o art. 393 do novo Código Civil, afirma:
‘Se o fato for im previsível, mas as conseqüências forem evitáveis, porém o devedor não
cuidar de evitá-las, o caso pode configurar Ínadimplemento por culpa e não impossibilidade
devido ao fortuito ou força m aior.” In: Com entários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro,
2003. v. V, t. II, p. 203.
174 S e b a s t iã o G er aldo de O l iv e ir a

no ambiente do trabalho, ainda que decorrente de força maior ou caso


fortuito não exime, por completo, o empregador. Assim, ao nosso crivo,
por aplicação analógica dos arts. 501 e 502, II, da CLT, a indenização
deverá ser fixada pela metade. (...)
Observe-se que essa solução é consentânea com a tendência do novo
Código Civil, quando em seus arts. 944 e 945 autoriza a redução da
indenização conform e o grau de culpa do agente. É exatam ente o
fundamento da nossa tese que parte de um juízo de ponderação por
parte do julgador, ou seja, se de um lado o empregador não concorreu
para o dano motivado por um evento inevitável e imprevisível, de outro
lado está o empregado que foi vítima de um dano manifestado durante
a execução do contrato do trabalho e que merece ser reparado, máxime
porque o empregador quando delibera em explorar alguma atividade
econômica assume os riscos dela decorrentes, nos termos do art. 2Q
da CLT.
Com efeito, diante desse conflito axiológico, aplica-se o princípio da
proporcionalidade reduzindo-se pela metade a indenização a ser paga
pelo agente em pregador, conform e já havia previsto o legislador
trabalhista em situação similar envolvendo rescisão do contrato por força
maior, ex vi do art. 502 da CLT.”(38)

Diante das divergências doutrinárias sobre o conceito de caso fortuito e


de força maior, normalmente essas duas causas de danos são indicadas
conjuntamente nos diplomas legais. Não teria mesmo muito sentido empre­
ender um esforço exegético de maior profundidade para estabelecer a dis­
tinção se os efeitos de um e outro são os mesmos. Assim, aqueles fatos
necessários, cujos efeitos não se podiam evitar ou impedir são enquadrados
como caso fortuito ou força maior, conforme previsto no art. 393, parágrafo
único, do Código Civil de 2002, repetindo o que previa o art. 1.058, pará­
grafo único, do Código de 1916.
De todo modo convém transcrever o pensamento abalizado de Sérgio
Cavalieri sobre as diferenças conceituais entre o caso fortuito e a força maior:

“ Estarem os em face do caso fortuito quando se tratar de evento


imprevisível e, por isso, inevitável; se o evento for inevitável, ainda que
previsível, por se tratar de fato superior às forças do agente, como
normalmente são os fatos da Natureza, como as tempestades, enchentes
etc., estaremos em face da força maior, como o próprio nome diz. É o
act of God, no dizer dos ingleses, em relação ao qual o agente nada

(38) DALLEGRAVE NETO, José Affonso. R esponsabilidade civil no direito do trabalho. 4.


ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 400-401.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 175

pode fazer para evitá-lo, ainda que previsível. A imprevisibilidade, portanto,


é o elemento indispensável para a caracterização do caso fortuito,
enquanto a inevitabilidade o é da força maior.”(39)

Nas hipóteses legais de aplicação da teoria da responsabilidade objetiva,


quando a indenização é devida pelo simples risco da atividade, doutrina e
jurisprudência não consideram como excludente do nexo causal o caso for­
tuito interno, isto é, aquele fato danoso imprevisível que está ligado à atividade
do empregador e, portanto, abrangido pelo conceito mais amplo de risco do
negócio. Seguindo essa diretriz doutrinária, foi aprovado na V Jornada de
Direito Civil, realizada em 2011, o Enunciado 443, com o seguinte teor: “Arts.
393 e 927. O caso fortuito e a força maior somente serão considerados como
excludentes da responsabilidade civil quando o fato gerador do dano não for
conexo à atividade desenvolvida.”

Para o civilista Sílvio Rodrigues, “quando o fato de que resultou o acidente


está ligado à pessoa, ou à coisa, ou à empresa do agente causador do dano
(o que se poderia chamar de fortuito interno), mais rigoroso deve ser para
com este o julgador, ao decidir a demanda proposta pela vítima.”<40) Só mesmo
os casos fortuitos ou de força maior de origem externa produzem o efeito de
excluir o nexo de causalidade(41). Discorrendo a respeito do caso fortuito interno
esclarecem Carlos Alberto Direito e Sérgio Cavalieri:

(39) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 71. No julgam ento do Recurso Especial n. 264.589/RJ anotou o Colendo
STJ: “Na lição de Clóvis, caso fortuito é ‘o acidente produzido por força física ininteligente,
em condições que não podiam ser previstas pelas partes’, enquanto a força m aior é ‘o fato
de terceiro, que criou, para a inexecução da obrigação, um obstáculo, que a boa vontade do
devedor não pode vencer’, com a observação de que o traço que os caracteriza não é a
im pre visib ilid a d e , mas a in e v ita b ilid a d e .” Cf. STJ. 4- T urm a. Rei.: M inistro S álvio de
Figueiredo, julgado em 14 nov. 2000.
(40) RODRIGUES, Sílvio. R esponsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 175-
176. No julgam ento da Apelação Cível n. 197254352, ocorrido em 14 de maio de 1998, o
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul asseverou: “A empresa de transporte coletivo
rodoviário que contrata aposentado para a estressante função de motorista, que vem a ter
enfarte do miocárdio, provocando acidente, não prova, satisfatoriamente, nas circunstâncias,
a im previsibilidade do evento, m ediante sim ples atestado m édico de sanidade física e
mental feito seis m eses antes. Som a-se que m esm o adm itindo-se a im previsibilidade,
portanto, configurando-se caso fortuito, teria ele origem interna, e não externa. Logo, não
excludente da responsabilidade porque inserido no risco natural da atividade lucrativa
exercida.” Vale observar, no entanto, que neste julgam ento o Tribunal estava apreciando
ação ajuizada pelo usuário do transporte coletivo que foi atingido pelo acidente mencionado.
(41) Vejam também neste sentido: ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações. 4. ed.
São Paulo: Saraiva, 1972. p. 330; GO NÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil.
14. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 643; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade
civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 303; N ORONHA, Fernando. D ireito das
obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1, p. 626; DIREITO, Carlos Alberto Menezes;
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,
176 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

“Entende-se por fortuito interno o fato imprevisível, e por isso inevitável,


que se liga à organização da empresa, relaciona-se com os riscos da
atividade desenvolvida pelo transportador. O estouro de um pneu do
ônibus, o incêndio do veículo, o mal súbito do motorista etc. são exemplos
do fo rtu ito in terno ; por isso que, não ob sta n te a co n te cim e n to s
imprevisíveis, estão ligados à organização do negócio explorado pelo
transportador. A imprensa noticiou, faz algum tempo, que o comandante
de um Boeing, em pleno voo, sofreu um enfarte fulminante e morreu.
Felizmente, o copiloto assumiu o comando e conseguiu levar o avião
são e salvo ao seu destino. Eis, aí, um típico caso de fortuito interno.”(42)

6.8. Fato de terceiro

Também se inclui entre os fatos que impedem a formação do nexo causal


em face da empresa o acidente provocado por terceiros, ainda que no local e
horário de trabalho, já que não há participação direta do empregador ou do
exercício da atividade laboral para a ocorrência do evento. Aliás, o Código de
Defesa do Consumidor, aqui invocado por analogia, tem previsão expressa
exonerando o fo rn e ce d o r da indenização pelos danos causados aos
consumidores, quando ocorrer a culpa exclusiva de terceiros (arts. 12, § 3Q,
III, e 14, § 3Q, II).

Será considerado “fato de terceiro”, causador do acidente do trabalho,


aquele ato lesivo praticado por alguém devidamente identificado que não seja
nem o acidentado, nem o empregador ou seus prepostos. Apenas o fato de o
acidente ter ocorrido durante a jornada de trabalho não gera necessariamente
o liame causal para fins de responsabilidade civil do empregador, se a
prestação dos serviços não tiver pelo menos contribuído para o infortúnio.
Como enfatiza Caio Mário, “ocorre o dano, identifica-se o responsável aparente,
mas não incorre este em responsabilidade, porque foi a conduta do terceiro
que interveio para negar a equação agente-vítima, ou para afastar do nexo
causal o indigitado autor.”(43)

Diferentemente, no enfoque do seguro acidentário, o art. 21 da Lei n.


8.213/1991 equipara ao acidente do trabalho, na modalidade de nexo causal
indireto, as seguintes ocorrências envolvendo atos de terceiros:

2007. v. XIII, p. 90; RODRIGUES, Sílvio. Responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva,
2002. v. 4, p .175; M ARTINS-COSTA, Judith. C om entários ao novo C ódigo Civil. Rio de
Janeiro: Forense, 2003. v. V, t. II, p. 201.
(42) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 90.
(43) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 301.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 177

“ II — o a cid e nte s o frid o p elo s e g u ra d o no lo ca l e no h o rá rio do tra b a lh o , em


consequência de:

a) ato de agressão, sabotagem ou terrorism o praticado por terceiro ou companheiro


de trabalho;

b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada


ao trabalho;

c) ato de imprudência, de negligência ou de im perícia de terceiro ou de companheiro


de trabalho;

d) ato de pessoa privada do uso da razão;”

Como se verifica, no acidente provocado exclusivamente por terceiros,


a vítima terá o amparo dos benefícios previstos na legislação acidentária;
contudo, não caberá a reparação civil por parte do empregador em razão da
ausência do nexo causal do acidente com a prestação do trabalho. O
acidentado, entretanto, poderá, se for o caso, postular a devida indenização
em face do terceiro causador do dano, porquanto em relação a ele estará
presente o nexo causal direto.

A ju risp ru d ê n cia fornece exem plos reiterados de exoneração da


responsabilidade civil do empregador quando resta comprovado que o terceiro
é o verdadeiro causador do acidente do trabalho:
“A g ravo de in s tru m e n to em recu rso de revista. R e s p o n s a b ilid a d e civil do
empregador. O Regional asseverou que a atividade exercida pelo reclamante (limpeza
do pátio) não era de risco e que a reclamada adotou recursos preventivos, tais como
sinalização da via interna, orientação e fiscalização dos motoristas. Concluiu, também,
com amparo nas provas dos autos, ter o acidente que vitimou o reclamado ocorrido
por culpa exclusiva de terceiro estranho à relação de empregado, qual seja o motorista
de outra empresa, que adentrou em via proibida e em velocidade acima do permitido,
d e s re s p e ita n d o a s in a liz a ç ã o e x is te n te no local. D iante desse co n te x to fá tic o ,
insusce tíve l de reexam e na atual fa se recursal, não há com o re sp o n sa b iliza r a
reclam ada pelo acidente ocorrido, seja subjetiva ou objetivam ente. Incidência da
Súmula n. 126 do TST. Agravo de instrum ento conhecido e não provido.” TST. 8-
Turma. AIRR n. 170600-22.2009.5.23.0051, Relatora: Ministra Dora Maria da Costa,
DJ 24 ago. 2012.

“Acidente do trabalho. Fato de terceiro. Excludente do nexo causal — O simples


fato de um acidente ter ocorrido no local e horário de trabalho não gera o liame causal
para fins de responsabilidade civil, se tiver sido causado exclusivamente por um fato
de terceiro, alheio ao contrato de trabalho, sem participação direta do empregador ou
da prestação dos serviços para a ocorrência do evento. De fato, embora o infortúnio
ca u sa d o p or te rc e iro s se c a ra c te riz e com o um a c id e n te do tra b a lh o para fin s
previdenciários, nos termos do artigo 21, inciso II, alínea a, da Lei n. 8.213/91, não há
c a u sa lid a d e para fin s de re sp o n s a b ilid a d e c iv il. A liá s, o C ó d ig o de D efesa do
C onsum ido r, aqui in vo ca do por an a log ia , tem p revisão e xp re ssa e xo n e ra n d o o
fornecedor da indenização pelos danos causados aos consumidores, quando ocorrer
a culpa exclusiva de terceiros (arts. 12, § 3Q, III, e 14, § 3-, II).” Minas Gerais. TRT 3-
Região. 2- Turma. RO n. 00118-2007-137-03-00-0, Rei.: Des. Sebastião Geraldo de
Oliveira, DJ 23 maio 2007.
178 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

“Direito civil. Responsabilidade civil. Transporte coletivo. Bala perdida. Fato de


terceiro. Bala perdida não é fato conexo aos riscos inerentes do deslocamento, mas
constitui evento alheio ao contrato de transporte, não im plicando responsabilidade
da transportadora.” STJ. 4- Turma. REsp n. 613.402/SP, Rei.: Ministro César Asfor
Rocha, DJ 4 out. 2004.

“ Responsabilidade civil do em pregador. Acidente do trabalho. Apara de grama na


margem da rodovia. A tropelam ento por veículo de terceiro. Ausência de culpa e
de nexo de causalidade. Veículo de terceiro que se desgovernou, atropelando a
vítim a no acostamento, onde trabalhava. Independentemente de qualquer medida de
segurança por parte do em pregador, o evento danoso se daria, afastando o nexo
causal. Fato exclusivo de terceiro, que exclui a responsabilidade civil do em pregador.”
Rio de Janeiro. TJRJ. 18a Câm. Cível. Apelação n. 2003.001.13629, Rei.: Des. Célia
Meliga Pessoa, julgado em 12 ago. 2003.

Também se enquadra como fato de terceiro o acidente provocado por


roubo à mão armada, mormente porque a segurança pública é dever do Estado
e não do empregador. Entrementes, o empregador passa a ter responsabilidade
civil quando deixa de adotar as cautelas necessárias e expõe o trabalhador a
perigo previsível. Vale transcrever alguns julgados a respeito de assalto à
mão armada:
“A cidente no trabalho. C obrador de ônibus. A ssalto durante a prestação dos
serviços. Caso fortuito. Ausência de responsabilidade do empregador. A violência
urbana é uma questão de segurança pública à qual todos estamos submetidos, não
se podendo atribuir a responsabilidade por essa violência ao empregador, mormente
porque o risco de ser assaltado não é inerente à atividade de transporte público, uma
vez que decorre da ação de terceiros alheios à relação contratual de trabalho, e não
da atividade profissional em si, como seria o acidente de trânsito. Assim, não há falar
em violação aos arts. 72, inc. XXVIII, da Constituição da República e 927, parágrafo
único, do Código Civil. Recurso de Revista de que se conhece em parte e a que se dá
provim ento.” TST. 5ã Turma. RR n. 447-76.2010.5.03.0018, Rei.: Ministro João Batista
Brito Pereira, DJ 3 ago. 2012.

“Recurso de revista. Indenização por danos morais e m ateriais decorrentes de


acidente de trabalho. Óbito de m otorista de ônibus. Culpa exclusiva de terceiro. 1.
A regra geral no Direito Brasileiro é a responsabilidade subjetiva, que pressupõe a
ocorrência concom itante do dano, do nexo causal e da culpa do empregador. Sem a
conjugação de todos esses requisitos, não há de se falar em responsabilidade. É o
que se extrai da exegese do art. 186 do C ódigo Civil. 2. Tratando-se, todavia, de
acidente de trabalho em atividade de risco, há norma específica para ser aplicada a
responsabilidade objetiva (independente de culpa), conforme se extrai do parágrafo
único do art. 927 do Código Civil. Desse modo, em se tratando de atividade empresarial
que im plique risco acentuado aos em pregados, a responsabilidade é objetiva, ou
seja, independe de culpa do empregador, já que a exigência de que a vítim a comprove
erro na conduta do agente, nessas hipóteses, quase sempre inviabiliza a reparação.
3. No caso em tela, verifica-se, contudo, que a Corte a quo, soberana na análise do
c o n ju n to fá tic o -p ro b a tó rio , c o n c lu iu q u e o — fa tíd ic o — in fo rtú n io o c o rre u ,
exclusivamente, em face da conduta criminosa de um passageiro (terceiro estranho
ao pacto laborativo). Logo, diante da caracterização da culpa exclusiva de terceiro,
não há como se vislum brar nexo causal ou culpa da Reclamada, como escorreitamente
decidido pelo Regional. O acidente decorreu de uma causa inevitável e imprevisível,
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 179

não estando ao alcance do em pregador evitá-lo. 4. O assassinato ocorrido durante


jornada de trabalho não é fato conexo aos riscos inerentes à profissão de motorista de
ônibus, constitui, sim, um evento alheio, ligado à segurança pública, que é dever do
Estado prestá-la (art. 144 da CF). Recurso de Revista não conhecido.” TST. 4- Turma. RR
n. 165900-50.2006.5.16.0003, Rei.: Ministra Maria de Assis Calsing, DJ 22 out. 2010.

“Agravo regimental no recurso especial. Responsabilidade civil. Assalto no interior


de ônibus. Caso fortuito ou força maior. Excludente de responsabilidade. Agravo
im provido. 1. O fato de terceiro, que não exim e de responsabilidade a em presa
transportadora, é aquele que guarda uma relação de conexidade com o transporte. 2.
Segundo pacífico entendimento firm ado nesta Segunda Seção, a ocorrência de assalto
no interior de com posição ferroviária mostra-se fato inteiramente alheio à relação de
tra n s p o rte p ro p ria m e n te d ita , e x c lu in d o a re s p o n s a b ilid a d e da e m p re s a
concessionária de transporte público. 3. Agravo improvido.” STJ. 4- Turma. AgRg no
REsp n. 960.578/SP, Rei.: Ministro Hélio Quaglia Barbosa, DJ 08 out. 2007.

“Responsabilidade civil — Acidente do trabalho — Indenização — Direito Comum


— Obreiro no exercício de sua atividade — Assalto seguido de morte — Caso
fortuito ou força maior — Descaracterização — Por estar a instituição financeira
obrigada por lei (Lei n. 7.102/83) a tom ar todas as cautelas necessárias a assegurar
a incolumidade dos cidadãos, inclusive seus funcionários diretos e terceirizados, não
pode alegar força maior, por ser o roubo fato previsível na atividade bancária.” São
Paulo. STACivSP. 7a Câm. Apelação com revisão n. 666.188-00/2, Rei.: Juiz Paulo
Ayrosa, julgado em 13 abr. 2004.

Importa registrar, no entanto, que o entendimento tradicional de que a


interveniência do terceiro exclui a responsabilidade civil vem recebendo
ressalvas e atenuações, de acordo com as circunstâncias do caso concreto.

Tem-se cogitado, em determinados casos, que a possibilidade de sofrer


o acidente, mesmo causado por terceiros, foi aumentada em razão do exercício
do trabalho da vítima, pelo que seria cabível aplicar a responsabilidade civil
objetiva do em pregador, com apoio na teoria do risco criado. A m aior
vulnerabilidade do acidentado estaria no campo do risco conexo e previsível
daquela atividade econômica. Em vez de se concentrar na assertiva de
indenizar os danos causados pelo empregador, desloca-se o pensamento no
sentido de indenizar os danos sofridos pelo acidentado durante a prestação
dos serviços. É certo, porém, que o empregador, se for o caso, pode acionar
o terceiro causador do acidente para reembolso do valor da indenização.

Como observa Sílvio Venosa, a exclusão do dever de indenizar por fato


de terceiro é tormentosa na jurisprudência, e o juiz, por vezes, vê-se perante
uma questão de difícil solução. Salienta ainda que, “na maioria das vezes, os
magistrados decidem por equidade, embora não o digam.”(44)

Não há dúvida, portanto, que há uma tendência de ampliar as hipóteses


de reparação dos danos causados por terceiro, para não deixar a vítima ao

(44) VENOSA, Sílvio de Salvo. D ireito civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. v. IV, p. 53-54.
180 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

desamparo(45). Reforça essa linha de pensamento o art. 735 do Código Civil


de 2002, sem c o rre s p o n d e n te no C ó d ig o a n te rio r, que p re vê : “A
responsabilidade contratual do transportador por acidente com passageiro
não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.”<46)

Poder-se-ia argumentar que a analogia com o art. 735 do Código Civil


não seria pertinente, porque no contrato de transporte está implícita a garantia
de incolumidade pela qual o transportador assume obrigação de resultado,
qual seja, conduzir o passageiro são e salvo ao seu destino. O argumento,
entretanto, comporta objeções porque, cada vez mais, vem sendo exigido do
empregador o dever de segurança dos empregados, tanto que o art. 7S, XXII,
da Constituição estabelece como direito dos trabalhadores a “redução dos
riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e
segurança.” Além disso, o risco da atividade econômica é da empresa e não
do empregado, conforme estabelece o art. 2° da CLT.

Na jurisprudência atual pode ser observada a flexibilização do fato de


terceiro como excludente do dever de indenizar:
“R ecurso de em b arg o s. T écnico em in fo rm ática. E xercício de ativ id a d e em
rodovias interm unicipais. Atividade de risco. A cidente de trabalho em veículo
au to m o to r com evento m orte. C ulpa exclu siva de terceiro . Em bora hoje haja
verd a d e ira co n tro v é rs ia na do u trin a e na ju ris p ru d ê n c ia com o fim de a fa sta r a
responsabilidade do em pregador, por fato de terceiro, ainda que em atividade de
risco, a m até ria m erece um a re fle x ã o m ais cu id a d o s a , na m e d id a em que tal
afastam ento decorre da possibilidade de o autor vir a ajuizar ação de regresso ao
terceiro, causador do dano. Tal entendim ento, todavia, no direito do trabalho, não
pode se r recep cio n a d o , quando é ce rto que a re s p o n s a b ilid a d e pela a tivid a de
econôm ica é do em pregador, e não do em pregado. A leitura a ser feita da norma
inscrita no art. 2° da CLT c/c art. 927, parágrafo único, do CC, em conjunção com os
princípios que regem a relação jurídica trabalhista, é no sentido de que a indenização
é devida ao empregado e que eventual ação de regresso, a ser intentada, deverá ser
feita pelo empregador, contra aquele cuja conduta ensejou a sua responsabilidade
na reparação do dano. Recurso de embargos conhecido e desprovido.” TST. SDI-1.
E-RR n. 1299000-69.2008.5.09.0016, Rei.: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, DJ 13
abr. 2012.

“Ação de indenização. A rrem esso de pedra de dentro da estação ferroviária.


Precedentes da Corte. 1. Se o Tribunal de origem, com apoio na prova dos autos,
reconhece que a pedra foi arrem essada de dentro da estação ferroviária e assim

(45) Anderson Schreiber assevera que: “A gradual perda de rigor na apreciação do nexo de
causalidade, extraída de tantos expedientes em pregados pela jurisprudência, com maior
ou menor apoio na doutrina, efetivam ente assegura às vítim as em geral a reparação dos
danos sofridos. Até aqui, o que vem sendo apontado como relativização da prova do nexo
causal parece legitimar-se por aquilo que já foi denominado como ‘o imperativo social da
reparação’.” Cf. Novos paradigm as da responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
p. 74.
(46) Na realidade o art. 735 incorpora no direito positivo o que a jurisprudência já havia
consolidado desde 1963, por interm édio da Súmula n. 187 do Supremo Tribunal Federal.
'ÍDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU ÜOENÇA OCUPACIONAL 1 81

identifica a responsabilidade pela falta de cautela da ré que não cuidou de prevenir a


presença de estranhos em suas dependências usando drogas, fato perfeitam ente
conhecido da segurança da em presa, deve m anter-se a condenação im posta. 2.
Recurso especial não conhecido.” STJ. 3ã Turma. REsp n. 666.253/RJ, Rei.: Ministro
Carlos Alberto Menezes Direito, D J 29 jun. 2007.

“A ção de responsabilidade civil. Empresa de transporte coletivo. Fato de terceiro.


Precedentes da Corte. 1. Cuida o caso de saber se a culpa do terceiro motorista do
caminhão, que empurrou o carro para baixo do ônibus e fez com que este atropelasse
os pedestres, causando-lhes morte e ferim entos severos, exclui o dever de indenizar
da em presa transportadora. O princípio geral é o de que o fato culposo de terceiro,
nessas circunstân cia s, vin cu ia -se ao risco da em presa de tra n sp o rte , que com o
prestadora de serviço público responde pelo dano em decorrência, exatam ente, do
risco da sua atividade, preservado o direito de regresso. Tal não ocorreria se o caso
fosse, realmente, fato doloso de terceiro. A jurisprudência tem adm itido claramente
que, mesmo ausente a ilicitude, a responsabilidade existe, ao fundam ento de que o
fato de terceiro que exonera a responsabilidade é aquele que com o transporte não
guarde conexidade. Se o acidente ocorre enquanto trafegava o ônibus, provocado
por outros veículos, não se pode dizer que ocorreu fato de terceiro estranho ou sem
conexidade com o transporte. E sendo assim, o fato de terceiro não exclui o nexo
causal, obrigando-se a prestadora de serviço público a ressarcir as vítimas, preservado
o seu direito de regresso contra o terceiro causador do acidente. É uma orientação
firm e e benfazeja baseada no dever de segurança vinculado ao risco da atividade,
que a m oderna responsabilidade civil, dos tem pos do novo milênio, deve consolidar.”
STJ. 3ã Turma. REsp n. 469.867/SP, Rei.: Ministro Carlos Alberto M enezes Direito, DJ
14 nov. 2005.

“Apelação cível. Responsabilidade civil. Empresa de transporte de passageiros.


Indenização. Fato de terceiro. Excludente não caracterizada. Provimento do recurso.
A responsabilidade da transportadora pela incolumidade de seus passageiros, consiste
na obrigação de conduzi-los são e salvos, enquanto estes estiverem sob sua guarda.
O fato de terceiro que exonera de responsabilidade a em presa de transporte, baseado
no d e v e r de s e g u ra n ç a e v in c u la d o ao ris c o da a tiv id a d e , q u e a m o d e rn a
responsabilidade civil adota, é aquele que com o transporte não guarda conexidade.”
Minas Gerais. TJMG. 13s Câmara Cível. Apelação Cível n. 1.0079.05.201049-7/001,
Rei.: Hilda Teixeira da Costa, DJ 19 jan. 2007.
CAPÍTULO 7

CULPA DO EMPREGADOR NO
ACIDENTE DO TRABALHO

7.1. A culpa como pressuposto da indenização

O estudo da culpa é fundamental para o tema da responsabilidade civil


decorrente dos acidentes do trabalho. Para os defensores da teoria do risco,
bastam a ocorrência do acidente do trabalho e a comprovação do nexo causal
com a atividade do empregador para o deferimento da indenização corres­
pondente. Todavia, para os seguidores da responsabilidade civil de natureza
subjetiva, é imprescindível a presença simultânea dos três pressupostos:
acidente ou doença ocupacional, nexo causal da ocorrência com o trabalho e
culpa do empregador. Como se vê, a exigência de comprovação da culpa é o
ponto que diferencia a responsabilidade subjetiva da objetiva.

Considerando-se que a responsabilidade de natureza objetiva ainda gera


controvérsias e a responsabilidade civil com apoio na culpa é uma realidade
indiscutível, sempre que o lesado pretender indenização, por ter sofrido
acidente do trabalho ou doença ocupacional, deve-se verificar primeiramente
se o empregador incidiu em alguma conduta culposa ou antijurídica. Mesmo
com o crescim ento do prestígio da teoria da responsabilidade objetiva,
conforme mencionamos no Capítulo 5, a pretensão terá maior possibilidade
de êxito e a indenização por dano moral poderá alcançar valor mais elevado
quando a culpa patronal estiver caracterizada.

Em síntese, a comprovação da culpa atende a um requisito essencial


para o deferimento das indenizações no enfoque da responsabilidade subjetiva
e a sua gravidade representa importante circunstância a ser considerada no
arbitramento da indenização por danos morais.

7.2. Distinção entre dolo e culpa

Quando oriundo de ato ilícito, o acidente do trabalho pode ocorrer por


culpa ou mais raramente por dolo do empregador.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 183

Configura-se o comportamento doloso quando o patrão ou algum de seus


prepostos, intencionalmente, atua para violar direito ou praticar o ato ilícito. Na
linguagem do Código Penal (art. 1 8 ,1), pode-se dizer que ocorre o dolo quando
o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo. Desde o início da
ação, já existe uma vontade direcionada para causar o dano ou produzir resultado
danoso. Para Rui Stoco, o dolo é a vontade dirigida a um fim ilícito; é um
comportamento consciente e voltado à realização de um desiderato(1). A conduta
dolosa do empregador, que causa o acidente do trabalho, caracteriza crime
contra a pessoa (homicídio, lesões corporais, perigo para a vida ou a saúde),
acarretando, portanto, repercussões jurídicas na esfera penal.

No comportamento culposo, o empregador não deseja o resultado, mas


adota conduta descuidada ou sem diligência, que pode provocar o acidente
ou a doença ocupacional. “No dolo o agente quer a ação e o resultado, ao
passo que na culpa ele só quer a ação, vindo a atingir o resultado por desvio
acidental de conduta decorrente de falta de cuidado.”(2) Nesse sentido, afirmava
Kant que uma transgressão involuntária mas imputável chama-se culpa; uma
transgressão voluntária, isto é, unida à consciência de que se trata na verdade
de uma transgressão, chama-se delito(3). Na hipótese de culpa do empregador
também poderá haver conseqüências penais, porquanto a conduta que gerou
o evento danoso tem possibilidade de ser enquadrada como crim e na
modalidade culposa.

7.3. Abrangência do conceito de culpa

Para compreensão do conceito de culpa é importante registrar que no


suporte de todo o sistema jurídico há um valor fundamental: para ser possível a
vida em sociedade, todos estamos submetidos ao cumprimento de deveres.
Esses deveres indicam determinadas condutas a serem observadas, dentre
as quais a de não lesar a ninguém, conforme já mencionava a locução latina
neminem laedere, adotada inicialmente por Ulpiano e incorporada nas Institutas
de Justiniano(4). A conduta humana, portanto, deve ser cuidadosa, diligente,
para não causar prejuízo a outrem. Nesse sentido o ensinamento doutrinário:

(1) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011. p. 154.
(2) CAVALIERI, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2012.
p. 32.
(3) A pud ABBAGNANO, Nicola. D icionário de filosofia. 2. ed. São Paulo: Mestre Jou, 1982.
p. 209.
(4) O jurisconsulto romano Domício Ulpiano indicava três princípios fundam entais do Direito:
viver honestamente, não lesar a ninguém e dar a cada um o que é seu. A locução neminem
laedere (a ninguém ofender ou lesar) era indicada nos três ju ris praecepta com o alterum
non laedere com o mesmo significado.
184 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

“Vivendo em sociedade, o homem tem que pautar a sua conduta de modo


a não causar dano a ninguém. Ao praticar os atos da vida, mesmo que
lícitos, deve observar a cautela necessária para que de seu atuar não
resulte lesão a bens jurídicos alheios. Essa cautela, atenção ou diligência,
convencionou-se chamar de dever de cuidado objetivo. (...) A culpa tem
sido definida como a conduta contrária à diligência ordinária e comumente
usada. Por diligência entende-se o zelo, a cautela, o cuidado para cumprir
o dever; o esforço da vontade exigível para determinar e executar a
conduta necessária ao cumprimento de determinado dever.”(5)

O núcleo conceitual da culpa, por conseguinte, está apoiado na falta de


observância do dever geral de cautela ou de agir de modo a não lesar nin­
guém. Savatier assevera que a culpa é a inexecução de um dever que o
agente podia conhecer e observar(6). Já Alvino Lima afirma que a culpa é um
erro de conduta, moralmente imputável ao agente e que não seria cometido
por uma pessoa avisada, em iguais circunstâncias de fato(7). Para Aguiar
Dias, “a culpa é a falta de diligência na observância da norma de conduta, isto
é, o desprezo, por parte do agente, do esforço necessário para observá-la,
com resultado, não objetivado, mas previsível, desde que o agente se detives­
se na consideração das conseqüências eventuais da sua atitude.”(8) Nessa
seqüência vale citar ainda o pensamento do Desembargador paulista Rui Stoco:

“A culpa pode empenhar ação ou omissão e revela-se através: da im ­


prudência (comportamento açodado, precipitado, apressado, exagera­
do ou excessivo); da negligência (quando o agente se omite, deixa de
agir quando deveria fazê-lo e deixa de observar regras subministradas
pelo bom-senso, que recomendam cuidado, atenção e zelo); e da impe-
rícia (a atuação profissional sem o necessário conhecimento técnico ou
científico que desqualifica o resultado e conduz ao dano).”(9)
O Código Civil de 2002 trata da culpa no art. 186: “Aquele que, por ação
ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano
a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Como se vê, a culpa no acidente do trabalho fica caracterizada quando


o empregador adota uma conduta que revela imprudência, negligência ou

(5) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI, Sérgio. Comentários ao novo Código
Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 67.
(6) A pud DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1995. v. 1, p. 110.
(7) LIMA, Alvino. Culpa e risco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1963. p. 76.
(8) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. 1, p. 120.
(9) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011. p. 130.
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 185

mperícia. O entendimento doutrinário é que o termo negligência mencionado


no art. 186 abrange a imperícia, visto que possui um sentido amplo de omissão
no cumprimento de um dever(10). Essas formas de exteriorização da conduta
culposa foram bem sintetizadas por Carlos Roberto Gonçalves:
“A conduta im prudente consiste em agir o sujeito sem as cautelas
necessárias, com açodam ento e arrojo, e im plica sempre pequena
consideração pelos interesses alheios. A negligência é a falta de atenção,
a ausência de reflexão necessária, uma espécie de preguiça psíquica,
em virtude da qual deixa o agente de prever o resultado que podia e
devia ser previsto. A imperícia consiste sobretudo na inaptidão técnica,
na ausência de conhecimentos para a prática de um ato, ou omissão de
providência que se fazia necessária; é, em suma, a culpa profissional.”(11)

Na questão da segurança e saúde ocupacional, o em pregador tem


obrigação de adotar a diligência necessária para evitar os acidentes e as
doenças relacionadas com o trabalho, devendo considerar todas as hipóteses
razoavelmente previsíveis de danos ou ofensas à saúde do trabalhador.
Assevera, com propriedade, Cavalieri Filho que só há o dever de evitar o
dano que for razoável prever. E previsível é aquilo que tem certo grau de
probabilidade de ocorrer(12).

Por outro lado, aquelas ocorrências imprevistas ou inevitáveis, que


mesmo o empresário diligente não as teria considerado, escapam ao controle
patronal e estão fora da área de abrangência da culpa, atingindo o território
limítrofe do caso fortuito, da força maior ou do fato de terceiro, já abordados
no Capítulo 6.
A culpa pode decorrer da violação de uma norma legal ou regulamentar.
É o que Sérgio Cavalieri denomina “culpa contra a legalidade, visto que o dever

(10) Nesse sentido a lição de Carlos Roberto Gonçalves. In: R esponsabilidade civil. 14. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 51. De form a sem elhante pontua Humberto
Theodoro Júnior: “O Código Civil, diversam ente do C ódigo Penal, não arrola a im perícia
entre as m odalidades de culpa. Não quer isto dizer que a imperícia não represente culpa
para a configuração do delito civil. O certo é que não se tem na espécie algo realmente
diverso das figuras tradicionais da negligência e da imprudência. A imperícia é apenas a
violação do dever de conduta que decorre da circunstância de exigir-se do agente o emprego
de conhecim entos técnicos no ato que acabou tornando-se lesivo. A imperícia, nessa ordem
de ideias, tanto pode operar por omissão como por comissão, no tocante ao em prego da
técnica necessária, de sorte que, no final, ter-se-á uma negligência ou uma imprudência,
embora rotulada de imperícia.” Cf. C omentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense,
2003. v. III. t. 2, p. 106.
(11) GO NÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 51-52.
(12) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 37.
186 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

transgredido resulta de texto expresso de alguma norma jurídica. Desse modo,


a mera infração da norma, quando o comportamento acarreta algum dano, já
desencadeia a responsabilidade civil em favor da vítima, pois cria a presunção
de culpa, incumbindo ao réu o ônus da prova em sentido contrário(13).
Mas não somente a infração das normas legais ou regulamentares gera
a culpa. Os textos normativos, por mais extensos e detalhados que sejam,
não conseguem relacionar todas as hipóteses do comportamento humano
nas suas múltiplas atividades. Assim, além da culpa contra a legalidade, pode
surgir a culpa tão somente pela inobservância do dever geral de cautela em
sentido lato, ou seja, do comportamento que se espera do homem sensato e
prudente que os romanos denominavam bonus pater familias. É por essa
razão que o art. 186 do Código Civil utiliza a expressão mais ampla “violar
direito”, em vez de violação da lei.
Nos itens seguintes vamos detalhar a culpa contra a legalidade e a culpa
por violação do dever geral de cautela, com o foco direcionado para o tema
das indenizações por acidente do trabalho.

7.4. Culpa contra a legalidade

Na investigação da possível culpa do reclamado, relacionada com o


acidente do trabalho ou doença ocupacional, o primeiro passo é verificar se
houve descumprimento das normas legais ou regulamentares que estabelecem
os deveres do empregador quanto à segurança, higiene, saúde ocupacional
e meio ambiente do trabalho. A simples violação de alguma dessas normas,
havendo dano e nexo causal, cria a presunção de culpa do empregador pelo
acidente do trabalho ocorrido, uma vez que o descumprimento da conduta
normativa prescrita já representa a confirmação da sua negligência, a ilicitude
objetiva ou a culpa contra a legalidade(14).
Essa pesquisa, entretanto, não é tarefa fácil atualmente porque a estrutura
normativa da proteção jurídica à segurança e saúde do trabalhador no Brasil
deixa muito a desejar. As normas que tratam do assunto estão dispersas em
vários dispositivos legais desconexos, abrangendo diversos ramos do Direito,
sem uma consolidação adequada, o que dificulta o seu conhecimento, consulta
e aplicação(15).

(13) Ibidem, p. 43.


(14) “Em matéria de segurança do trabalho, a simples inobservância das normas pertinentes
induz a culpa do empregador, na modalidade culpa contra a legalidade lato sensu.” Minas
Gerais. TAMG. 6a Câm. Cível. Apelação n. 351.727-1, Rei.: Juiz Belizário de Lacerda, julgado
em 8 ago. 2002.
(15) Há norm as sobre segurança, higiene e saúde do trabalhador em leis da área de saúde,
trabalhista, previdenciária e convenções internacionais. No Brasil falta um organism o de
w c em zaç õ es por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 187

Além disso, as principais normas legais de segurança e saúde do


Taoalhador estão defasadas mais de três décadas, especialmente porque
■ão incorporaram o avanço ocorrido no Direito Ambiental, não assimilaram
as inovações e os princípios da Constituição da República de 1988 e nem
: sciplinaram suficientemente a internalização das diretrizes adotadas nas
: .ersas Convenções da OIT ratificadas pelo Brasil nos últimos anos.

Diga-se a propósito que, no nosso entendimento, devem ser priorizados


:s esforços para elaboração de um “Estatuto Nacional de Segurança e Saú-
de do Trabalhador”, conforme tem sido cogitado. A reunião da matéria em um
s: diploma legal organiza e estrutura as ideias fundamentais, dá mais coe-
-ència ao sistema e facilita a sua compreensão, obtendo, com isso, maior
r'etividade(16).

A p rom ulg ação do E statuto m encio nado d e sp e rta ria nos m eios
acadêmicos maior interesse pelo assunto e, com o tempo, é provável que na
"'m a ç ã o jurídica haveria uma disciplina específica para estudar o tema,
::d e n d o ser denominada Direito Ambiental do Trabalho ou Direito à Saúde
: : Trabalhador. Um Estatuto legal sobre o tema poderia abordar aspectos do
direito material relacionados à segurança, higiene e saúde do trabalhador; as
cjestões modernas do meio ambiente do trabalho; as tutelas processuais
~ais adequadas para garantir a segurança e a saúde do trabalhador; a
eoaração dos danos decorrentes dos acidentes e doenças ocupacionais; as
~edidas preventivas e pedagógicas; a educação am biental do trabalho;
as penalidades etc.
A expectativa é que um novo diploma legal traria um impacto positivo
cara a segurança e saúde nos locais de trabalho, bem como despertaria a
:outrina para aprofundar no exame e no progresso deste ramo especial do
Iíre ito (17). Será também uma demonstração inequívoca para as empresas e
:ara os trabalhadores que o legislador assumiu o compromisso de fomentar
a cultura preventiva de segurança e saúde no local de trabalho. Em síntese,
essa mudança poderá representar uma verdadeira revolução cultural, um novo
narco legal em favor da preservação da vida e do trabalho digno.

:3ntrole central para melhor coordenação e aplicação dessas regras, como recom enda o
art. 15 da Convenção 155 da OIT.
' 6) A tendência do Direito contem porâneo é no sentido de adoção de minicódigos temáticos,
:enom inados de m icrossistem as ou estatutos, que tratam de uma matéria específica de
:rm a sistematizada, abordando os conceitos básicos, os princípios próprios e os direitos e
garantias correspondentes. Dentro dessa perspectiva, foram adotados no Brasil o Código
de Defesa do Consumidor, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso e o
Estatuto da Cidade, só para citar os exemplos mais conhecidos.
17) Encontra-se em tram itação na Câm ara Federal o Projeto de Lei n. 7.097/2002, que
nstitui o C ódigo Brasileiro de Segurança e Saúde no Trabalho, de autoria do Deputado
-rna ldo Faria de Sá. Em 2012, o referido Projeto foi apensado ao PL 1.216/2011.
188 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Enquanto não tivermos um estatuto normativo sistematizando a matéria,


na verificação da possível culpa patronal será necessário percorrer diversos
diplomas legais ou regulamentares, para encontrar os dispositivos que tratam
dos deveres daquele em pregador quanto à segurança, higiene e saúde
ocupacional dos seus em pregados, de acordo com a atividade do seu
empreendimento. Indicaremos a seguir as principais normas sobre o assunto,
procedendo a pequeno comentário, se for o caso.

1. Constituição da República

1.1. “Art. 7Q. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de
outros que visem à melhoria de sua condição social: ... XXII: redução dos
riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e
segurança.”

A Constituição anterior assegurava aos trabalhadores apenas “higiene


e segurança no trabalho”(18). A Constituição de 1988, afinada com a tendência
internacional de assegurar a eliminação dos riscos na origem, deu um passo
a mais, já que assegurou a “ redução dos riscos” . A segurança visa à
integridade física do trabalhador e a higiene tem por objetivo o controle dos
agentes do ambiente de trabalho para a manutenção da saúde no seu amplo
sentido. Pela primeira vez, o texto da Constituição menciona “normas de
saúde”, e, por isso, não pode ser relegado a segundo plano o conceito amplo
de saúde, abrangendo o bem-estar físico, mental e social. A conclusão que
se impõe é que o empregador tem obrigação de promover a redução de todos
os riscos (físicos, químicos, biológicos, fisiológicos, estressantes, psíquicos
etc.) que afetam a saúde do empregado no ambiente de trabalho. Essa
previsão constitucional consagra o princípio do risco mínimo regressivo que
deve em basartoda a legislação ordinária a respeito(19).
1.2. Art. 225. “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicam ente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

O meio ambiente do trabalho está inserido no meio ambiente geral (art.


200, VIII, da Constituição da República), de modo que é impossível alcançar
qualidade de vida sem ter qualidade de trabalho, nem se pode atingir meio
ambiente equilibrado e sustentável, ignorando o meio ambiente do trabalho.
Dentro desse espírito, a Constituição de 1988 estabeleceu expressamente
que a ordem econômica deve observar o princípio da defesa do meio ambiente

(18) Constituição da República de 1967, art. 165, IX.


(19) Para maior aprofundam ento a respeito do “princípio do risco mínimo regressivo” consultar
nosso livro intitulado “ Proteção jurídica ã saúde do trabalhador” , 6. ed. São Paulo: LTr,
2011. p. 147-148.
Í\DEN1ZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 189

art. 170, VI). Como assevera José Afonso da Silva, “o problema da tutela
jrídica do meio ambiente manifesta-se a partir do momento em que sua
:egradação passa a ameaçar não só o bem-estar, mas a qualidade da vida
"umana, senão a própria sobrevivência do ser humano.”(20) Com o passar do
:empo e o acúmulo da experiência, a legislação vem atuando para garantir o
embiente de trabalho saudável, de modo a assegurar que o exercício do
yabalho não prejudique outro direito humano fundamental: o direito à saúde,
complemento imediato e inseparável do direito à vida. As preocupações
ecológicas avançam para também preservar a qualidade do meio ambiente
ao trabalho.

2. Convenções da OIT

O Brasil ratificou diversas Convenções da OIT a respeito do tema de


segurança e saúde do trabalhador. Com efeito, dependendo da atividade da
empresa, será necessário consultar convenções específicas, para verificar
se o empregador adotou todas as medidas preventivas indicadas, como por
exemplo: Convenção 115 sobre radiações ionizantes; Convenção 136 sobre
oenzeno; Convenção 139 sobre substâncias ou produtos cancerígenos;
Convenção 148 sobre contaminação do ar, ruído e vibrações; Convenção
162 sobre asbesto; Convenção 167 sobre segurança e saúde na construção;
Convenção 170 sobre produtos químicos; Convenção 171 sobre trabalho
noturno; Convenção 176 sobre segurança e saúde nas minas.

Algumas convenções ratificadas, no entanto, têm aplicação genérica e


estabelecem regras de conduta obrigatórias para o em pregador, cujo
descumprimento já sinaliza para a caracterização da culpa no acidente.
Vejamos alguns exemplos:

2.1. Convenção 155: art. 16 — 1. “Deverá ser exigido dos empregadores


que, à medida que for razoável e possível, garantam que os locais de trabalho,
o maquinário, os equipamentos e as operações e processos que estiverem
sob seu controle são seguros e não envolvem risco algum para a segurança
e a saúde dos trabalhadores. 2. Deverá ser exigido dos empregadores que, à
medida que for razoável e possível, garantam que os agentes e as substâncias
químicas, físicas e biológicas que estiverem sob seu controle, não envolvam
riscos para a saúde quando são tomadas medidas de proteção adequadas.
3. Quando for necessário, os empregadores deverão fornecer roupas e
equipamentos de proteção adequados a fim de prevenir, na medida que for
razoável e possível, os riscos de acidentes ou de efeitos prejudiciais para a
saúde.”

(20) SILVA, José Afonso da. Direito am biental constitucional. 3. ed. São Paulo: Malheiros,
2000. p. 28.
190 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

2.2. Convenção 155: art. 18. “Os empregadores deverão prever, quando
for necessário, medidas para lidar com situações de urgência e com acidentes,
incluindo meios adequados para a administração de primeiros socorros.”
2.3. Convenção 155: art. 19. “Deverão ser adotadas disposições, em
nível de empresa, em virtude das quais: (...) c) os representantes dos
trabalhadores na empresa recebam informação adequada acerca das medidas
tomadas pelo empregador para garantir a segurança e a saúde,\e possam
consultar as suas organizações representativas sobre essa informação, sob
condição de não divulgarem segredos comerciais; d) os trabalhadores e seus
representantes na empresa recebam treinamento apropriado no âmbito da
segurança e da higiene do trabalho;”
2.4. Convenção 161: art. 5. “Sem prejuízo da responsabilidade de cada
empregador a respeito da saúde e da segurança dos trabalhadores que
em prega, e tendo na devida conta a necessidade de participação dos
trabalhadores em matéria de segurança e saúde no trabalho, os serviços de
saúde no trabalho devem assegurar as funções, dentre as seguintes, que
sejam adequadas e ajustadas aos riscos da empresa com relação à saúde
no trabalho: a) identificar e avaliar os riscos para a saúde, presentes nos
locais de trabalho; b) vigiar os fatores do meio de trabalho e as práticas de
trabalho que possam afetar a saúde dos trabalhadores, inclusive as instalações
sa n itá rias, as cantin as e as áreas de habitação, sem pre que esses
equipamentos sejam fornecidos pelo empregador; c) prestar assessoria quanto
ao planejamento e à organização do trabalho, inclusive sobre a concepção
dos locais de trabalho, a escolha, a manutenção e o estado das máquinas e
dos equipamentos, bem como sobre o material utilizado no trabalho; d)
participar da elaboração de programas de melhoria das práticas de trabalho,
bem como dos testes e da avaliação de novos equipamentos no que concerne
aos aspectos da saúde; e) prestar assessoria nas áreas da saúde, da
segurança e da higiene no trabalho, da ergonomia e, também, no que concerne
aos equipamentos de proteção individual e coletiva; f) acompanhar a saúde
dos trabalhadores em relação com o trabalho; g) promover a adaptação do
trabalho aos trabalhadores; h) contribuir para as medidas de readaptação
profissional; i) colaborar na difusão da informação, na formação e na educação
nas áreas da saúde e da higiene no trabalho, bem como na da ergonomia; j)
organizar serviços de primeiros socorros e de emergência; k) participar da
análise de acidentes de trabalho e das doenças profissionais.”
2.5. C onvenção 161: art. 13. “Todos os trabalhadores devem ser
informados dos riscos para a saúde inerentes a seu trabalho.”
3. Leis Ordinárias
3.1. CLT — A CLT estabelece diversas normas de segurança, medicina e
saúde do trabalhador no Capítulo V do Título II, abrangendo do art. 154 ao 201.
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 191

D d e scu m p rim e n to de a lgum as dessas norm as já pode in d ica r a


-esponsabilidade patronal pelo acidente, nos termos retromencionados de culpa
:ontra a legalidade. Convém destacar alguns artigos de aplicação genérica:
3.1.1. CLT — art. 157. “Cabe às empresas: I — cumprir e fazer cumprir
as normas de segurança e medicina do trabalho; II — instruir os empregados,
a:ravés de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de
evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais; III — adotar as medidas
;ue lhes sejam determinadas pelo órgão regional competente; IV — facilitar o
exercício da fiscalização pela autoridade competente.”
A previsão do inciso I tem sido muito utilizada nos julgamentos para con-
; gurar a culpa da empresa por omissão, quando esta deixa de fiscalizar e de
exigir o cumprimento das normas de segurança. Não basta ao empregador
:ornecer equipamentos de proteção ou orientar o empregado quanto às nor-
~ias de segurança e saúde. É preciso ir além e exigir o cumprimento das
~ormas para atender ao comando legal do “cumprir e fazer cumprir”. Nesse
sentido também a Súmula n. 289 do TST: “O simples fornecimento do apare-
no de proteção pelo empregador não o exime do pagamento do adicional de
nsalubridade. Cabe-lhe tomar as medidas que conduzam à diminuição ou eli­
minação da nocividade, entre as quais as relativas ao uso efetivo do equipa­
mento pelo empregado.”
3.1.2. C LT— art. 163. “Será obrigatória a constituição de Comissão Interna
ce Prevenção de Acidentes (CIPA), de conformidade com instruções expedidas
oelo Ministério do Trabalho, nos estabelecimentos ou locais de obra nelas
especificadas. Parágrafo único — O Ministério do Trabalho regulamentará as
atribuições, a composição e o funcionamento das CIPA (s).”
A CIPA foi regulamentada pela Norma Regulamentar 5 (NR-5) da Portaria
n. 3.214/1978, do Ministério do Trabalho, com as modificações da Portaria n.
8, de 23 de fevereiro de 1999. Para conhecimento das iniciativas ou falhas da
empresa quanto à segurança, higiene e saúde do trabalhador é recomendável
requerer a exibição em juízo das atas das reuniões da CIPA, mormente porque,
oelo que prevê o item 5.27, “reuniões extraordinárias deverão ser realizadas
quando: a) houver denúncia de situação de risco grave e im inente que
determine aplicação de medidas corretivas de emergência; b) ocorrer acidente
do trabalho grave ou fatal.” As atas das reuniões são documentos obrigatórios,
cuja exibição não pode ser recusada pelo em pregador(21), sob pena de
oresumirem-se verdadeiros os fatos alegados pelo autor(22).

(21) Código de Processo Civil. Art. 355: “O juiz pode ordenar que a parte exiba documento
ou coisa, que se ache em seu poder.”
(22) Código de Processo Civil. Art. 359. “Ao decidir o pedido, o juiz admitirá como verdadeiros
os fatos que, por meio do docum ento ou da coisa, a parte pretendia provar: I — se o
requerido não efetuar a exibição, nem fizer qualquer declaração no prazo do art. 357; II —
se a recusa for havida por ilegítima.”
192 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

3.1.3. CLT — art. 166. “A empresa é obrigada a fornecer aos emprega­


dos, gratuitamente, equipamento de proteção individual adequado ao risco e
em perfeito estado de conservação e funcionamento, sempre que as medi­
das de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de
acidentes e danos à saúde dos empregados.”

O detalhamento quanto às obrigações referentes aos equipamentos


individuais pode ser encontrado na NR-6 da Portaria n. 3.214/1978 do Ministério
do Trabalho, com as modificações introduzidas pela Portaria n. 25, de 15 de
outubro de 2001 e diversas portarias posteriores de atualização. Para
exemplificar, citamos a obrigação de o empregador fornecer EPI adequado
ao risco de cada atividade, devendo orientar e treinar o trabalhador sobre o
seu uso correto.

3.1.4. CLT — art. 168. “Será obrigatório exame médico, por conta do
empregador, nas condições estabelecidas neste artigo e nas instruções
complementares a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho: I — na
admissão; II — na demissão; III — periodicamente.”

O d e ta lh a m e n to quanto aos exam es m édicos o b rig a tó rio s será


encontrado na NR-7 da Portaria n. 3.214/1978 do Ministério do Trabalho. Essa
norma relaciona todas as obrigações do empregador quanto aos exames
médicos, exigindo sua realização periódica, bem com o quando houver
mudança de função ou no retorno ao trabalho, além de estabelecer regras
quanto aos exames complementares e ao atestado de saúde ocupacional
com indicação dos riscos ocupacionais específicos. Se nesses exames for
constatada exposição excessiva ao agente nocivo, com alteração dos
indicadores biológicos, mesmo sem sintomatologia, é dever do empregador
afastar o empregado do risco, até a normalização. Se a empresa não cumprir
essa obrigação regulamentar, ficará caracterizada a culpa pelo aparecimento
ou agravamento da patologia(23).

3.1.5. CLT — art. 170. “As edificações deverão obedecer aos requisitos
técnicos que garantam perfeita segurança aos que nelas trabalhem.”

A CLT trata nos arts. 170 a 174 das condições das edificações, tais
como: altura livre do piso ao teto (pé-direito), inexistência de saliências e
depressões no piso, aberturas nas paredes, condições de segurança e higiene
das paredes, escadas, rampas etc. Esses artigos foram regulamentados pela
NR-8 da Portaria já mencionada. Mais recentemente foi aprovada também
a NR-35, que trata do Trabalho em altura, pela Portaria SIT n. 313, de 23 de
março de 2012.

(23) Portaria do Ministério do Trabalho n. 3.214, de 8 jun. 1978, Norma Regulamentar 7,


itens 7.4.7 e 7.4.8.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 193

3.1.6. CLT — art. 180. “Somente profissional qualificado poderá instalar,


operar, inspecionar ou reparar instalações elétricas.”

Os arts. 179 a 181 da CLT, que tratam das instalações elétricas, foram
regulamentados pela NR-10 da Portaria n. 3.214/1978, a qual estabelece todos
os procedim entos de segurança dos em pregados que trabalham com
eletricidade, desde a fase de transmissão, distribuição e consumo de energia
elétrica. Como exemplo, estabelece essa NR que no desenvolvimento de
serviços em instalações elétricas devem ser previstos sistemas de proteção
coletiva por meio de isolamento físico de áreas, sinalização, aterramento
provisório e outros similares, nos trechos onde os serviços estão sendo
desenvolvidos (subitem 10.3.1.1).

3.1.7. CLT — art. 184. “As máquinas e os equipamentos deverão ser


dotados de dispositivos de partida e parada e outros que se fizerem
necessários para a prevenção de acidentes do trabalho, especialmente quanto
ao risco de acionamento acidental.”

Esse artigo foi regulamentado pela NR-12 da Portaria n. 3.214/1978, com


previsão detalhada quanto à instalação, áreas de circulação, acionamento,
chave geral, lançamento de partículas, anteparos, assentos e mesas, reparos,
manutenção etc., com anexos específicos para motosserras e cilindros de
massa. Essa NR passou por importante atualização por intermédio da Portaria
SIT n. 197 de 17 de dezembro de 2010, consagrando, dentre outras inovações,
o princípio da falha segura.

3.1.8. CLT — art. 197. “Os m ateriais e substâncias em pregados,


manipulados ou transportados nos locais de trabalho, quando perigosos ou
nocivos à saúde, devem conter, no rótulo, sua composição, recomendações
de socorro im ediato e o sím bolo de perigo correspondente, segundo a
padronização internacional. Parágrafo único — Os estabelecimentos que
mantenham as atividades previstas neste artigo afixarão, nos setores de
trabalho atingidos, avisos ou cartazes, com advertência quanto aos materiais
e substâncias perigosos ou nocivos à saúde.”

Esse artigo foi regulamentado pela NR-26 da Portaria n. 3.214/1978 já


m encionada, com detalham ento quanto à sin a liza çã o de segurança,
armazenamento de substâncias perigosas e rotulagem preventiva.

3.1.9. CLT — art. 199. “Será obrigatória a colocação de assentos que


assegurem postura correta ao trabalhador, capazes de evitar posições
incômodas ou forçadas, sempre que a execução da tarefa exija que trabalhe
sentado. Parágrafo único — Quando o trabalho deva ser executado de pé, os
empregados terão à sua disposição assentos para serem utilizados nas
pausas que o serviço permitir.”
194 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Os arts. 198 e 199 da CLT têm regulam entação na NR-17 sobre


ergonomia, estabelecendo os parâmetros para a adaptação das condições
de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores. Essa NR
estabelece regras para movimentação de carga, mobiliário dos postos de
trabalho, condições ambientais, iluminação, organização do trabalho, pausas
etc.

3.2. Lei n. 8.213/1991 — Benefícios da Previdência Social. Art. 19, § 3Q:


“É dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos
da operação a executar e do produto a manipular.”
Em sintonia com as Convenções da OIT, o empregador tem obrigação
legal de informar minuciosamente ao trabalhador os riscos existentes no local
de trabalho. É muito mais fácil adotar medidas preventivas quando o perigo é
bem identificado e o empregado está orientado para operar dentro dos padrões
de segurança. Se na em presa não houver uma cultura prevencionista,
normalmente o trabalhador não recebe orientação a respeito dos riscos do
trabalho que executa, ficando mais vulnerável aos infortúnios laborais.

3.3. Lei n. 8.078/1990 — Código de Proteção e Defesa do Consumidor.


Art. 9Q. “O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou
perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e
adequada, a respeito de sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da
adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto.”

Esse artigo do Código do Consumidor tem aplicação supletiva no tema


da segurança e saúde do trabalhador. Em muitas ocasiões, o empregado
também atua como consumidor de equipamentos e produtos disponibilizados
pelo empregador para o desenvolvimento das tarefas. Além disso, a norma
analisada não tem como destinatário somente o consumidor em sentido estrito,
já que não haveria sentido lógico em excluir da proteção exatamente o
empregado que trabalha com os produtos e serviços potencialmente perigosos.
3.4. Lei n. 8.080/1990. Lei Orgânica da Saúde. Essa Lei estabelece que
a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover
as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, mas esclarece que o
dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da
sociedade (art. 2Q). Também menciona que estão incluídas no campo de
atuação do Sistema Único de Saúde a execução de ações de saúde do
trabalhador, bem como a colaboração na proteção do meio ambiente, nele
compreendido o do trabalho (art. 6e). Além disso, relaciona o conjunto de
atividades englobadas no conceito de saúde do trabalhador, que merece
transcrição:
Art. 6Q, § 3Q: “Entende-se por saúde do trabalhador, para fins desta lei, um conjunto de
atividades que se destina, através das ações de vigilância epidem iológica e vigilância
In d e n iz a ç õ e s p o r A c id e n te d o T r a b a lh o o u D o e n ç a O c u p a c io n a l 195

sanitária, à prom oção e proteção da saúde dos trabalhadores, assim com o visa à
recuperação e reabilitação da saúde dos tra b a lh a d o re s subm etidos aos riscos e
agravos advindos das condições de trabalho, abrangendo:

I — assistência ao trabalhador vítim a de acidentes de trabalho ou portador de doença


profissional e do trabalho;

II — participação, no âmbito de competência do Sistema Único de Saúde (SUS), em


estudos, pesquisas, avaliação e controle dos riscos e agravos potenciais à saúde
existentes no processo de trabalho;

III — participação, no âmbito de com petência do Sistema Único de Saúde (SUS), da


n o rm a tiz a ç ã o , fis c a liz a ç ã o e c o n tro le das c o n d iç õ e s de p ro d u ç ã o , e x tra ç ã o ,
arm azenam ento, transporte, distribuição e manuseio de substâncias, de produtos, de
máquinas e de equipam entos que apresentam riscos à saúde do trabalhador;

IV — avaliação do impacto que as tecnologias provocam à saúde;

V — inform ação ao trabalhador e à sua respectiva entidade sindical e às empresas


sobre os riscos de acidentes de trabalho, doença profissional e do trabalho, bem
como os resultados de fiscalizações, avaliações ambientais e exames de saúde, de
admissão, periódicos e de demissão, respeitados os preceitos da ética profissional;

VI — participação na normatização, fiscalização e controle dos serviços de saúde do


trabalhador nas instituições e empresas públicas e privadas;

VII — revisão periódica da listagem oficial de doenças originadas no processo de


trabalho, tendo na sua elaboração a colaboração das entidades sindicais; e

VIII — a garantia ao sindicato dos trabalhadores de requerer ao órgão competente a


interdição de máquina, de setor de serviço ou de todo ambiente de trabalho, quando
houver exposição a risco iminente para a vida ou saúde dos trabalhadores.”

3.5. Outras normas legais de proteção: Em diversas outras leis ordinárias


há disposições esparsas que se aplicam, conforme o caso, à proteção da
vida e da saúde do trabalhador, tais como:
a) Lei n. 5.280/1967, que proíbe a entrada no país de máquinas e
maquinismos sem os dispositivos de proteção e segurança do trabalho exigidos
pela CLT;

b) Lei n. 5.889/1973, que estatui as normas reguladoras do trabalho rural;

c) Lei n. 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio


Ambiente;

d) Lei n. 7.802/1989, que dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a


produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a
comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação,
o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle,
a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins;

e) Lei n. 8.069/1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do


Adolescente;
196 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

f) Lei n. 9.503/1997, que institui o Código de Trânsito brasileiro;


g) Lei n. 9 .6 0 5 /1 9 9 8 , que d is p õ e so b re as sa n çõ e s p e n a is e
administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente;
h) Lei n. 9.719/1998, que dispõe sobre normas e condições gerais de
proteção ao trabalho portuário;
i) Lei n. 9.976/2000, que dispõe sobre a produção de cloro no Brasil;
j) Lei n. 10.406/2002, que institui o Código Civil;
k) Lei n. 10.803/2003, que trata dos trabalhos em condições análogas à
de escravo;
I) Lei n. 11.788/2008, que trata sobre o estágio de estudantes;
m) Lei n. 12.009/2009, que regulam enta o exercício das atividades
dos profissionais em transporte de passageiros, “m ototaxista”, em entre­
ga de mercadorias e em serviço com unitário de rua, e “m otoboy” , com o
uso de motocicleta.
n) Lei n. 12.436/2011, que veda o emprego de práticas que estimulem o
aumento de velocidade por motociclistas profissionais;
o) Lei n. 12.619/2012, que dispõe sobre o exercício da profissão de mo­
torista, regulamentando e disciplinando a jornada de trabalho e o tempo de
direção do motorista profissional.
4. Decreto n. 7.602/2011, que dispõe sobre a Política Nacional de
Segurança e Saúde no Trabalho
Trata-se de documento normativo muito importante porque atende a uma
determinação da Convenção n. 155 da OIT que vigora no Brasil desde 18 de
maio de 1993 (Decreto n. 1.254/1994). O referido Decreto disciplina e organiza
a tão esperada “Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho”, com
atribuição de responsabilidades e indicação dos objetivos, princípios e
diretrizes, bem como os meios para sua implementação.
5. Portaria n. 3.214/1978 do Ministério do Trabalho
Essa Portaria aprova a regulamentação das previsões contidas na CLT
relativas à segurança, higiene e saúde do trabalhador. Em razão da amplitude
de sua abrangência e da diversidade das matérias, foi adotada a técnica de
dividir o texto da Portaria em normas regulamentadoras específicas, atingindo
atualmente 35 NRs, sendo que a última delas foi publicada em março de 2012,
tratando de “Trabalho em altura”(24).Vejam um quadro sinóptico com a relação
das Normas Regulamentadoras que estão em vigor:

(24) A NR-35 foi aprovada pela Portaria SIT n. 313, publicada no DOU e m 27 mar. 2012.
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 197

NORMAS REGULAMENTADORAS DA PORTARIA N. 3.214/78


DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO
NR-1 — Disposições Gerais NR-2 — Inspeção Prévia
NR-3 — Embargo ou Interdição NR-4 — Serviços Especializados em
Engenharia de Segurança e em Medicina
do Trabalho
NR-5 — Comissão Interna de Prevenção NR-6 — Equipamentos de Proteção
de Acidentes — CIPA Individual — EPI
NR-7 — Programas de Controle Médico NR-8 — Edificações
de Saúde Ocupacional - PCMSO
NR-9 — Programas de Prevenção de NR-10 — Segurança em Instalações e
Riscos Ambientais - PPRA Serviços em Eletricidade
NR-11 — Transporte, Movimentação, NR-12 — Máquinas e Equipamentos
Armazenagem e Manuseio de Materiais
NR-13 — Caldeiras e Vasos de Pressão NR-14 — Fornos
NR-15 — Atividades e Operações NR-16 — Atividades e Operações
Insalubres Perigosas
NR-17 — Ergonomia NR-18 — Condições e Meio Ambiente
de Trabalho na Indústria da Construção
NR-19 — Explosivos NR-20 — Líquidos Combustíveis e
Inflamáveis
NR-21 — Trabalho a Céu Aberto NR-22 — Segurança e Saúde Ocupacio­
nal na Mineração
NR-23— Proteção Contra Incêndios NR-24 — Condições Sanitárias e de
Conforto nos Locais de Trabalho
NR-25— Resíduos Industriais NR-26 — Sinalização de Segurança
NR-27 — Registro Profissional do Técnico NR-28 — Fiscalização e Penalidades
de Segurança do Trabalho (Revogada)
NR-29 — Segurança e Saúde no Traba­ NR-30 — Segurança e Saúde no Traba­
lho Portuário lho Aquaviário
NR-31 — Segurança e Saúde no Trabalho NR-32 — Segurança e Saúde no Traba­
na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, lho em Estabelecimentos de Saúde
Exploração Florestal e Aquicultura
NR-33 — Segurança e Saúde no Traba­ NR-34 — Condições e Meio Ambiente
lho em Espaços Confinados de Trabalho na Indústria da Construção
e Reparação Naval
NR-35 — Trabalho em altura

Essas normas regulamentadoras têm eficácia jurídica equiparada à da


lei ordinária, por expressa delegação normativa do art. 200 da CLT, além de
diversas delegações específicas também previstas no mesmo diploma legal.
198 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

A CLT traçou o núcleo dos mandamentos, as ideias básicas e delegou


com petência ao M inistério do Trabalho para com pletar e disciplinar os
preceito s norm ativos, o que tem sido cham ado d o u trin a ria m e n te de
discricionariedade técnica, deslegaiização, competência normativa secundária
ou delegação normativa.

Naturalmente, essa Portaria, mesmo inovando na ordem jurídica, não


poderá afastar-se das razões objetivas da delegação recebida, nem contrariar
qualquer preceito expresso ou implícito contido na lei delegante. Nota-se,
portanto, uma ampliação da competência normativa da Administração Pública,
delegada expressamente pelo próprio Poder Legislativo, mormente em razão
do avanço da ciência e da complexidade técnica da matéria tratada. Algumas
normas são de caráter genérico, aplicáveis a todos os empregadores e outras
são específicas porque direcionadas para determinadas atividades.

Cabe mencionar que atualmente tem sido comum atribuir ao Executivo a


regulam entação de m a té ria s nas q u a is p re d o m in a o c a rá te r técnico-
-científico<25). Anota Marçal Justen que “a discricionariedade administrativa é
atribuída por via legislativa, caso a caso. Isso eqüivale a reconhecer, dentre
outros poderes atribuídos constitucionalm ente ao Legislativo, aquele de
transferir ao Executivo a competência para editar normas complementares
àquelas derivadas da fonte legislativa.”'26'

Essa ampliação do poder regulamentar da Administração Pública foi bem


registrada pelo constitucionalista Clémerson Merlin:

“A importância do poder regulamentar vem aumentando, ultimamente,


em virtude do desenvolvimento técnico da sociedade moderna, bem como
da exasperação das responsabilidades do Estado. O número de matérias
a exigir disciplina normativa cresce de modo assustador. Nas áreas de
cunho absolutam ente técnico (com posição quím ica dos alim entos
industrializados, por exemplo) o legislador, inclusive por não dispor da

(25) Discorrendo a respeito do assunto o adm inistrativista José dos Santos Carvalho Filho
registra: “Modernam ente, contudo, em virtude da crescente com plexidade das atividades
técnicas da Adm inistração, passou a aceitar-se nos sistem as normativos, originariam ente
na França, o fenôm eno da deslegaiização, pelo qual a com petência para regular certas
matérias se transfere da lei (ou ato análogo) para outras fontes normativas por autorização
do próprio legislador: a norm atização sai do dom ínio da lei ( dom aine de Ia loi) para o
dom ínio de ato regulam entar (dom aine de l ’ordonnance). O fundam ento não é difícil de
conceber: incapaz de criar a regulamentação sobre alguma matéria de alta complexidade
técnica, o próprio Legislativo delega ao órgão ou à pessoa adm inistrativa a função específica
de instituí-la, valendo-se de especialistas e técnicos que m elhor podem dispor sobre tais
assuntos.” Cf. M anual de direito adm inistrativo. 14. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
p. 43.
(26) JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito adm inistrativo. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2006. p. 169.
‘-DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 199

formação adequada, vê-se compelido a transferir ao Executivo o encargo


de completar a disciplina normativa básica contida em lei.”(27)
Por tudo que foi exposto, cabe concluir que, na investigação da possível
culpa no acidente ou doença ocupacional, é necessário verificar se o em-
oregador cumpriu as prescrições dessas Normas Regulamentadoras, com ên­
fase para aquelas mais diretamente ligadas às atividades do empreendimento.
Se a vítima, por exemplo, trabalhava com explosivos, devem-se pesquisar
rodas as regras prescritas na NR-19; se atuava em obras de construção, é
necessário analisar a NR-18 e assim por diante. Se o acidente ocorreu du-
'ante a utilização de máquina no estabelecimento do empregador, deve ser
/erificado se tal máquina atendia ao “princípio da falha segura” , como previsto
na nova redação da NR-12.(28) Uma vez constatado qualquer descumpri-
mento e que esse comportamento foi a causa do acidente, o empregador
arcará com as indenizações pertinentes porque ficará caracterizada a culpa
oontra a legalidade. Vejam a respeito o entendimento já sedimentado na juris­
prudência:
“Recurso de revista — Indenização por danos m orais — Trabalhador rural —
Am biente de trabalho inadequado — Lesão à segurança e à saúde. Nos termos dos
arts. 7S, XXII, da Constituição Federal e 157, I, da CLT, é direito do trabalhador a
e d içã o de no rm a s que reduzam os risco s in e re n te s ao tra b a lh o e é d e v e r do
empregador zelar pela observância das normas relativas à segurança e m edicina do
trabalho. Logo, o tra b a lh a d o r faz ju s a um am biente laboral que preserve a sua
integridade física e mental. Por conseguinte, o não oferecim ento de condições de
trabalho adequadas e o desrespeito à Norma R egulam entar n. 31 do M inistério do
Trabalho, específica para os trabalhadores do campo, ofende o direito do empregado
à segurança e à saúde no trabalho — direitos da personalidade — e é passível de
reparação moral. Recurso de revista não conhecido.” TST. 4- Turma. RR n. 1026-
83,2010.5.03.0063, Rei.: Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DJ 15 jun. 2012.

“Acordo em Dissídio Coletivo — Segurança e Medicina do Trabalho — NR 7 —


D es c u m p rim e n to — E xc lu s ã o de C lá u s u la . As d is p o s iç õ e s da NR n. 7, que
e sta b e le ce m a o b rig a to rie d a d e da e la b o ra ç ã o e im p le m e n ta çã o , por parte dos
e m p re g ad o re s e in s titu iç õ e s que ad m ita m tra b a lh a d o re s com o e m p re g a d o s do
Program a de C ontrole M édico de Saúde O cupacional — PCM SO e disciplinam a
re a liza çã o de exam e m édico o c u p a c io n a l, têm com o o b je tiv o a p ro m o çã o e a
preservação da saúde dos trabalhadores. Cuida-se, como se vê, de normas de ordem
pública e como tal excluídas da disponibilidade das partes, que sobre elas não podem
transigir. A inobservância de tais dispositivos invalida as cláusulas ajustadas. Recurso
ordinário provido.” TST. SDC. RODC n. 759.045/01.0, Rei.: Ministro Milton de Moura
França, julgado em 13 set. 2001.

“A cidente do trabalho fatal. Indenizações — A lei incumbe o empregador de zelar


pela integridade física dos seus empregados. Nesse sentido, o art. 157 da CLT e o §

(27) CLÈVE, Clémerson Merlin. Atividade legislativa do P oder Executivo. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2000. p. 140.
(28) Pelo “princípio da falha segura” , previsto no item 12.5 da NR-12 da Portaria n. 3.214/
1978 do Ministério do Trabalho e Emprego, a máquina deve entrar autom aticamente em um
"estado seguro”, quando ocorrer falha de um com ponente relevante de segurança.
200 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

12 do art. 19 da Lei n. 8.213/91. O risco do negócio é sempre do empregador; assim


sendo, deste se exige que tenha cuidado quanto à prevenção de acidentes. Nesse
diapasão, por ter perm itido que a “cam inhonete” em que estava a vítim a entrasse na
área de manobra dos “caminhões fora de estrada” e, além disso, ficasse ali estacionada,
e vid e n cia -se a culpa da e m p re g ad o ra pelo in fo rtú n io a co n te cid o ao “de c u ju s” ,
achando-se configurados: I) o descum prim ento das determ inações previstas pelos
dispositivos legais sobreditos; II) a inobservância da Norma R egulam entadora n. 22
do Ministério do Trabalho, que, nos itens 22.7.1 e 22.7.7, exige: “22.7.1 Toda mina
deve possuir plano de trânsito estabelecendo regras de preferência de m ovimentação
e distâncias m ínim as entre m áquinas, equipam entos e veículos com patíveis com
a segurança, e ve lo cid a d e s p erm itidas, de acordo com as co n d içõe s das pistas
de rolamento. (...) 22.7.7 Os veículos de pequeno porte que transitam em áreas de
m ineração a céu aberto devem possuir sinalização, através bandeira de sinalização
em antena telescópica ou, outro dispositivo que perm ita a sua visualização pelos
operadores dos demais equipam entos e veículos, bem como manter os faróis acesos
durante todo dia, de form a a facilitar sua visualização” ; e III) a transgressão ao seu
próprio normativo interno, preconizador de que o caminhão fora de estrada só pode
entrar na área de manobra, se não houver veículo leve no local. Ainda que assim não
fosse, a natureza da atividade em si, executada nesse tipo de equipamento, gera uma
probabilidade m aior de ocorrência de evento desditoso, o que atrai a aplicação da
teoria do risco criado, em face da qual a reparação do dano seria devida pela simples
criação do risco. Logo, presentes os pressupostos exigidos pelos arts. 186 e 927 do
Código Civil de 2002, o deferim ento das indenizações é m ero consectário.” Minas
Gerais. T R T 3 ã Região. 28 Turma. RO n. 01632-2008-060-03-00-3, Rei.: Des. Sebastião
Geraldo de Oliveira, DJ 29 set. 2010.

“Acidente de trabalho. Lesão provocada por serra circular. Inobservância da NR-


18. E m pregador que não se dedica p rep o n d eran tem en te à constru ção civil.
Irre le v â n c ia . C u lp a re c o n h e c id a . A in d a que o e m p re g a d o r não se d e d iq u e ,
preponderantemente, à construção civil, deve observar o disposto nos itens 7.1, 7.2 e
7.3, da NR-18, que exigem, respectivamente, qualificação específica do trabalhador
para operações em m áquinas e equipam entos de carpintaria, que a serra circular
utilizada seja provida de coifa protetora do disco e de cutelo divisor e a utilização de
d isp o sitivo e m p u rra d o r nas ope ra çõ e s de co rte de m adeira. Não provado, pelo
empregador, o cumprimento das normas mencionadas, ônus que lhe incumbe, ante
os term os dos arts. 818 da CLT e 333, II, do CPC, sua culpa por acidente de trabalho
ocorrido em serra circular deve ser reconhecida. Recurso a que se nega provim ento.”
São Paulo. T R T 15a Região. 3- Turma. RO n. 0368-2005-111-15-00-0, Rei.: Jorge
Luiz Costa, DJ 13 jul. 2007.

“A cid ente do trabalho . D escum prim ento das norm as de p roteção à saúde e
segurança do trabalhador. Reparação dos danos morais e materiais. A NR-12 do
M inistério do Trabalho, no seu item 12.1.2, determ ina que ‘os pisos dos locais de
trabalho onde se instalam máquinas e equipam entos devem ser vistoriados e limpos,
sempre que apresentarem riscos provenientes de graxas, óleos e outras substâncias
que os tornem e sco rre g ad io s’, de m odo a perm itir que os tra b alhadores possam
m o vim e n ta r-se com s e g u ra n ça . R esponde p ela re p a ra ção dos danos m orais e
materiais experim entados pelo empregado que sofre acidente do trabalho em razão
do d e s c u m p rim e n to d e s s a n o rm a té c n ic a a e m p re s a que p ra tic a a to ilíc ito ,
consubstanciado em conduta om issiva de descum prir obrigação legal de observar as
normas de segurança e m edicina no trabalho (art. 157/CLT) e ainda deixa de implantar
medidas de segurança e programas de prevenção de acidentes, como a tanto estão
obrigados todos os em pregadores (por exemplo, os PPRA e PCMSO exigidos nas
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 201

NR-07 e NR-09 do Ministério do Trabalho) para evitar que os equipam entos usados
como fatores de sua produção venham a atingir os trabalhadores e sua higidez física.”
Minas Gerais. TRT 3a Região. 1- Turma. RO n. 00980-2007-148-03-00-7, Rei.: Des.
Emerson José Alves Lage, DJ 21 out. 2008.

Em mais de uma oportunidade as entidades patronais tentaram, sem


êxito, a declaração de inconstitucionalidade das Normas Regulamentares do
M nistério do Trabalho junto ao STF. Em 1990, a Federação Nacional das
Empresas de Serviços Técnicos de Informática e Similares — FENAIFO —
ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 360-7 em face da Portaria n.
3 435 do Ministério do Trabalho, que tratava da NR-17 a respeito de Ergonomia,
nas o STF, por unanimidade, não conheceu da ação. De forma semelhante,
em 1995, a Confederação Nacional de Transportes — CNT — ajuizou a Ação
Direta de Inconstitucionalidade, com pedido cautelar, n. 1.347-5, insurgindo-
-se contra as Portarias ns. 24 e 25/1994 baixadas pelo Secretário de Segurança
e Saúde no Trabalho, as quais reformularam as NRs 7 (PCMSO) e 9 (PPRA)
da Portaria n. 3.214/1978, mas também nesse caso o STF não conheceu da
ação. O entendimento reiterado do STF é que não cabe ação direta de
nconstitucionalidade para o exame de ato regulamentar de lei, sendo que
eventual extravasamento das Portarias aos comandos legais poderá ensejar
; controle difuso de legalidade, por ocasião do julgamento do caso concreto(29).

Aliás, o próprio Supremo Tribunal Federal, em sua composição plenária,


ao julgar a ADI-MC n. 1.347-5 acima mencionada, registrou nos fundamentos
do acórdão que a implementação das medidas de proteção à saúde, previstas
_a NR-7, está em sintonia com os princípios fundamentais da Constituição
de 1988:
“Não se pode perder de perspectiva, neste ponto, que também os valores sociais do
tra b a lh o c o n stitu e m um dos fu n d a m e n to s so b re os q u a is se e d ifica , de m odo
permanente, a construção do Estado dem ocrático de direito (CF, art. 1g, IV, primeira
parte), pois é preciso reconhecer que o sentido tutelar que emana desse postulado
axiológico abrange, dentre outras providências, a adoção, tanto pelos organism os
públicos quanto pela própria com unidade em presarial, de m edidas destinadas a
proteger a integridade da saúde daqueles que são responsáveis pela força de trabalho.
A preservação da saúde de classe trabalhadora constitui um dos graves encargos de
que as empresas privadas são depositárias.”

Os gerentes e os prepostos do empregador devem estar habilitados e


conscientizados para a necessidade de cumprimento das Normas Regula-
nentadoras sobre segurança, higiene e saúde do trabalhador, sob pena de
se caracterizar a culpa in eligendo, isto é, a má escolha que se fez da pessoa
a quem se confiou uma tarefa diretiva. Demais, a ausência de fiscalização
acerca das condições de trabalho e da implementação das medidas para

29) Conferir nesse sentido o julgam ento pelo STF das ADI ns. 996, 1.258, 1.388, 1.670,
1 946, 2.398, dentre outras.
202 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

neutralizar ou eliminar os agentes perigosos ou nocivos caracteriza culpa in


vigilando pelo descuido do dever de velar pelo cumprimento da norma, ou
mesmo culpa in omittendo, diante da omissão ou indiferença patronal. Essas
espécies de culpa, no entanto, estão perdendo relevância diante da previsão
expressa da responsabilidade objetiva do empregador pelos atos de seus
empregados, serviçais ou prepostos, insculpida no art. 933 do Código Civil,
conforme abordamos no item 4.9 do Capítulo 4, retro.
Cumpre registrar que não basta o empregador tão somente fornecer aos
empregados os equipamentos de proteção individual, como muitos ainda
imaginam. Não tem sido acolhida a alegação patronal de que o empregado
sempre se recusava a utilizar o equipamento de proteção, porquanto o
empregador dispõe do poder diretivo e disciplinar para exigir a observância
das normas de segurança, podendo até mesmo promover a dispensa por
justa causa, quando houver descum prim ento sistem ático e sem causa
justificada do seu comando(30).
Em síntese, haverá cuipa no acidente ou doença ocupacional se o
empregador ou seus prepostos não diligenciarem ostensivamente na exigência
do uso dos equipamentos de segurança e nas medidas necessárias para
que o trabalho seja prestado em condições saudáveis e sem riscos. As
decisões dos tribunais apontam nesse sentido:
“Insalubridade — Aparelho de proteção — O simples fornecim ento do aparelho de
proteção pelo empregador não o exime do pagamento do adicional de insalubridade,
ca b e n d o -lh e to m a r as m e d id a s que c o n d u za m à d im in u iç ã o ou e lim in a ç ã o da
n o c ivid a d e , d e n tre as q u a is as re la tiv a s ao uso e fe tiv o do e q u ip a m e n to pelo
empregado.” TST. Súmula n. 289.

“Acidente. Morte por soterramento. Negligência da empresa. Indenização por danos


m orais e m ateriais. C om provada a negligência da em presa na trágica m orte do
trab alha dor, vítim a de sote rra m e n to , se ja pelo tre in a m e nto in su ficie n te , fa lta de
fornecim ento de E P I's adequados e sobretudo, pela ausência de escoram ento e
ram pa ou escada de proteção da obra, descum prindo o próprio Manual Básico de
Segurança e Higiene por ela fornecido, resulta inequívoco o dever de indenizar os
danos materiais e morais decorrentes. Com efeito, fossem propiciadas condições de
segurança eficazes, o evento danoso ta lv e z tive sse sido e vitado ou, ao menos,
m inim izado, sem ocasionar óbito. A cuipa do acidente fatal não pode, assim, ser
debitada à vítima, nem na qualidade de culpa exclusiva, nem como culpa concorrente,
eis que esta circunstância não restou cabalm ente dem onstrada nos autos, incidindo
à espécie o disposto nos artigos 159 e 1537 do Código Civil de 1916, vigente à época
dos fatos.” São Paulo. TRT 2a Região. 4a Turma. RO n. 0501-2005-032-02-00-2, Rei.:
Ricardo A rtur Costa e Trigueiros, DJ 26 out. 2007.

“R esponsabilidade civil. A cidente do trabalho. Culpa exclusiva da em presa. Direi­


to à indenização por danos materiais. O empregador, como detentor do poder de
organização dos fatores de produção, tem o dever de ordená-los de modo a excluir os

(30) CLT, art. 158, parágrafo único.


-.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 203

riscos inerentes à execução da atividade. Se a Reclamada não fornece EPIs adequa­


dos à atividade exercida, não realiza constantes treinam entos dos empregados, atu­
alizando e reforçando as inform ações atinentes às normas de segurança, e não ofe­
rece condições salubres de labor, com provada sua conduta omissiva e o nexo causal
entre essa e o dano, consubstanciado na morte do obreiro, ensejando o dever de
indenizar. Recurso da Reclamada a que se nega provim ento.” Paraná. TRT 9a Re­
gião. 1a Turma. RO 99506-2006-659-09-00-5, Rei.: Ubirajara Carlos Mendes, DJ 21
jul. 2006.

“Indenização — A cidente do trabalho — Equipam ento de proteção — Culpa in


vig ilan d o — Prova — Incapacidade laborativa parcial — O art. 72, XXVIII, da CF não
distingue grau de culpabilidade do empregador, sendo devida a indenização comum
por acidente do trabalho ainda que levíssima a culpa do patrão, não tendo a Súmula
229 do STF, por esse motivo, sido recepcionada pela Carta Magna. O fato de a vítim a
de acidente do trabalho não portar EPI no momento do sinistro já é suficiente para
caracterizar a culpa in vigilando do empregador, já que a ele compete não só fornecer
o material, mas também obrigar o empregado a utilizá-lo. A em presa só se esquiva da
responsabilidade civil se provar que o empregado, a despeito da séria e constante
vigilância exercida se despojou do material no instante do acidente ou apresentava
particular rebeldia quanto ao uso do equipam ento de segurança, apesar de reiteradas
advertências a esse respeito.” Minas Gerais. TAMG. 6a Câm. Civil. Apelação Cível n.
261.977-2, Rei.: Juiz Belizário de Lacerda, Ac. 17 set. 1998, DJ 5 fev. 1999.

6. Outras normas de segurança, higiene e saúde do trabalhador


As normas legais e regulamentares retrocitadas de modo algum esgotam
as regras de segurança que o em pregador deverá obedecer. Para cada
atividade da em presa deve rã o ser pesq uisa das regras de condutas
específicas, fixadas em docum entos legais, regulam entos técnicos ou
simplesmente consagradas pela experiência ou costume.
Em muitas ocasiões o Perito do Juízo deve pesquisar, dentre outras,
-egras de trân sito, norm as da ABNT, regras in stituídas em posturas
■nunicipais, estaduais ou corporações profissionais ou ainda buscar os
orocedimentos geralmente aceitos e implantados, de acordo com a época,
os recursos tecnológicos disponíveis e a área onde atuava a vítima. Tudo isso
cara apurar qual era o dever de segurança que o empregador deveria cumprir
9 fazer cumprir. Aliás, o art. 154 da CLT estabelece que a observância, em
:odos os locais de trabalho, do disposto no Capítulo V do Título II, que trata da
segurança e medicina do trabalho, não desobriga as empresas do cumprimento
de outras disposições que, com relação à matéria, sejam incluídas em códigos
de obras, ou regulamentos sanitários dos Estados ou Municípios em que se
situem os respectivos estabelecimentos, bem como daquelas oriundas de
convenções coletivas de trabalho.

7.5. Culpa por violação do dever geral de cautela

O acidente do trabalho pode também surgir, por culpa do empregador,


sem que tenha ocorrido violação legal ou regulamentar de forma direta, como
204 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

mencionamos no item precedente. Isso porque as normas de segurança e


saúde do trabalhador, ainda que bastante minuciosas, não alcançam todas
as inumeráveis possibilidades de condutas inadequadas do empregado e do
empregador na execução do contrato de trabalho.
Assim, como não é possível a norma estabelecer regras de comporta­
mento para todas as etapas da prestação dos serviços, abrangendo cada
passo, gesto, variável, atitude, forma de execução ou manuseio dos equipa­
mentos, exige-se do empregador o dever de observar uma regra genérica de
diligência, uma postura de cuidado permanente, a obrigação de adotar todas
as precauções para não lesar o empregado.

Com efeito, em muitas ocasiões, as normas legais ou regulamentares


simplesmente apontam diretrizes gerais para a conduta patronal, tais como:
adotar precauções no sentido de evitar acidentes; reduzir até eliminar os riscos
existentes no local de trabalho; promover a realização de atividades de
conscientização, educação e orientação dos trabalhadores para a prevenção
de acidentes do trabalho e doenças ocupacionais; esclarecer e estimular os
em pregados para a prevenção dos acidentes; identificar situações que
venham a trazer riscos para a segurança e saúde dos trabalhadores; prevenir,
rastrear e diagnosticar precocemente os agravos à saúde relacionados ao
trabalho; elaborar programa visando à preservação da saúde e da integridade
dos trabalhadores, por meio de antecipação, reconhecimento, avaliação e
conseqüente controle da ocorrência de riscos ambientais existentes ou que
venham a existir no ambiente de trabalho etc.

A constatação de culpa, nessa modalidade, resultará de um processo


comparativo do comportamento do empregador que acarretou o infortúnio,
com a conduta padrão esperada de uma empresa que zela adequadamente
pela segurança e saúde dos trabalhadores. Assevera o Desembargador
paulista Carlos Roberto Gonçalves que “agir com culpa significa atuar o agente
em termos de, pessoalmente, merecer a censura ou reprovação do Direito. E
o agente só pode ser pessoalmente censurado, ou reprovado na sua conduta,
quando, em face das circunstâncias concretas da situação, caiba afirmar
que ele podia e devia ter agido de outro modo.”(31)
A culpa, portanto, será aferida diante das circunstâncias do caso concreto,
após verificação se o empregador poderia e deveria ter adotado outra conduta
que certamente teria evitado a doença ou o acidente. Formula-se a seguinte
indagação: um empregador diligente, cuidadoso, teria agido de forma diferente?
Se a resposta for sim, estará caracterizada a culpa patronal, porque de alguma

(31) GO NÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 437.
.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 205

•orma pode ser apontada determinada ação ou omissão da empresa, que se


snquadra no conceito de imprudência, imperícia ou negligência(32).
Importa assinalar que o dever geral de cautela assume maior relevância
jrídica na questão do acidente do trabalho, porquanto o exercício da atividade
aa empresa inevitavelmente expõe a riscos o trabalhador, o que de antemão
á aponta para a necessidade de medidas preventivas, tanto mais severas
nuanto maior o perigo da atividade. Qualquer descuido ou negligência do
smpregador com relação à segurança, higiene e saúde do trabalhador pode
:aracterizar a sua culpa no acidente ou doença ocupacional e ensejar o
cagamento de indenizações à vítima. Vejam alguns exemplos de culpa patronal
:olhidos nas decisões dos Tribunais:
“Recurso de Revista — Acidente do trabalho. Responsabilidade civil do empregador.
Inobservância do dever geral de cautela. Negligência quanto ao dever de instruir
os em pregados acerca do correto manuseio do maquinário. Atividade de risco. 1.
É dever do em pregador tom ar as m edidas necessárias a im pedir a ocorrência de
acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais. 2. Nesse passo, cumpre ao patrão,
além de fornecer os equipam entos de segurança adequados à atividade desenvolvi­
da, instruir seus em pregados acerca do correto desem penho de suas atribuições,
inclusive fornecendo treinam ento prévio para que os trabalhadores possam operar o
maquinário existente na empresa (arts. 7-, XXII, da Constituição Federal, 157 e 166 da
CLT e 338, caput e § 1s, do Decreto n. 3.048/99). 3. Assim, ao se om itir no seu dever
geral de cautela, a reclamada concorre com culpa, na modalidade negligência, para
a ocorrência do acidente do trabalho que venha a vitim ar seus empregados, devendo
ser responsabilizada pelos prejuízos morais e m ateriais suportados pelo trabalhador
vítim a do infortúnio. 4, Além disso, o dever de indenizar se ju stifica tam bém pela
aplicação da responsabilidade civil objetiva (teoria do risco), pois se reconhece que
o manejo da máquina causadora do dano expunha os seus operadores a uma maior
potencialidade de sujeição a acidentes em relação aos dem ais tra balhadores da
em p resa . R ecu rso de re v is ta não c o n h e c id o .” T S T . 1- T u rm a . RR n. 132800-
47.2005.5.04.0303, Rei.: Ministra Delaíde Miranda Arantes, DJ 11 out. 2012.

“A cidente do trabalho. Indenização por danos morais e patrimoniais. Responsabi­


lidade civil do empregador. 1. O novo Código Civil Brasileiro manteve, como regra, a
teoria da responsabilidade civil subjetiva, calcada na culpa. Inovando, porém , em
relação ao C ódigo Civil de 1916, am pliou as hipóteses de responsabilidade civil
objetiva, acrescendo aquela fundada no risco da atividade em presarial, consoante
previsão inserta no parágrafo único do art. 927. Tal acréscimo apenas veio a coroar o
entendimento de que os danos sofridos pelo trabalhador decorrentes de acidente do
trabalho conduzem à responsabilidade objetiva do empregador. 2. Na presente hipó­

32) “A cidente do Trabalho — Indenização — Empresa que deixa de dotar equipam ento de
tr,abalho de dispositivo de segurança disponível no m ercado à época do evento — Culpa
: aracterizada — Verba devida. Ao deixar a em presa de dotar o equipam ento de trabalho de
; spositivo de segurança hábil e então disponível no mercado, para evitar o acidente ocorrido,
agiu de form a negligente e imprudente, ficando configurada sua culpa grave no evento,
recorrendo daí sua obrigação de indenizar, já que existentes o dano e o nexo causal.” São
-aulo. STACivSP. 1® Câm. Civil. Apelação com revisão n. 487.857-00/8, Rei.: Juiz Vieira de
.'oraes, Ac. de 5 maio 1997, Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 743, p. 330, set. 1997.
206 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

tese, além de configurado o exercício de atividade de risco — circunstância apta a


ensejar a responsabilidade objetiva do empregador — , resulta caracterizada a culpa
por om issão, decorrente da não observância do dever geral de cautela, visto que
comprovado que a reclamada não providenciou o adequado treinam ento do obreiro,
nem o orientou ou fiscalizou a efetiva prestação dos serviços, visando a prevenir a
ocorrência de acidente do trabalho. 3. Recurso de revista conhecido e provido.” TST.
1S Turma. RR n. 172300-33.2007.5.12.0011, Rei.: Ministro Lélio Bentes Corrêa, DJ 3
abr. 2012.

“Direito am biental do trabalho. A cidente do trabalho. Em presa prestadora de


serviços. Dever gera! de cautela. Incumbe à empresa prestadora de serviços tomar
todas as precauções para resguardar a integridade física de seus empregados, ainda
que a atividade laboral seja exercida nas dependências de outra empresa (cliente ou
tomadora de serviços). O ordenamento jurídico-trabalhista impõe o dever geral de cautela
ao empregador, na forma do art. 157 da CLT, em conformidade com a Constituição
Federal, que assegura ao trabalhador o direito ao meio ambiente laboral seguro e
saudável (incisos XXII, XXIII e XXVIII do art. 7- combinados com o inciso VIII do art. 200
e caput do art. 225 da CF/88).” Rio Grande do Sul. TRT 4- Região. 2a Turma. RO n.
0031400-96.2006.5.04.0030, Rei.: Des. Denise Pacheco, DJ 11 mar. 2010.

“A cidente de trabalho. Culpa exclusiva da em presa. Ausência de m edidas de


segurança. Inércia dos prepostos. Dever de cautela. Seqüelas perm anentes.
Indenização devida. O dever de indenizar se impõe ao revelar violação do dever geral
de cautela pela empregadora, omissão do dever de vigilância e proteção à saúde e à
integridade física dos trabalhadores imposto pelos arts. 72, XXII, da CF/88, 157 da CLT.
No caso concreto restou configurada a omissão da empregadora em adotar medidas
de segurança adequadas e eficazes tais como a fixação dos cintos de segurança em
cabos aéreos e o sistema de escoras abaixo da viga onde realizavam a concretagem,
de molde a que, na possibilidade de desabamento não seriam os empregados atingidos.
Alia-se a esse contexto a inércia de seus prepostos quando do indício de iminência do
risco se concretizar. A cautela era passível de ser realizada, na medida em que o feitor
de concretagem e o engenheiro estavam presentes quando do estalo que antecedeu o
desabamento, silenciando-se quando lhes era perfeitamente possível obstar, de forma
imediata, a continuidade do trabalho realizado pelos empregados, o que asseguraria a
integridade física obreira e dos demais trabalhadores. Om itindo-se nessa conduta e
quedando-se inertes os prepostos, assumiram o risco da ocorrência e, portanto, a culpa
pelo fato ocorrido. Expondo o empregado a risco, quando era previsível e, portanto,
passível de ser evitado, impõe-se a obrigação de indenizar. Danos materiais e morais
reconhecidos. Recurso da Ré que se nega provimento, nesse particular.” Paraná. TRT
Q- Região. 1ã Turma. RO n. 99536-2006-659-09-00-1-A C O -02335-2009, Rei.: Des.
Janete do Amarante, DJ 30 jan. 2009.

“Responsabilidade civil — Acidente do trabalho — Indenização — Direito Comum


— C ulpa do e m p re g a d o r — C a ra c te riza ç ã o — Fica c a ra c te riza d a a cu lp a do
em preg ad or por ato do preposto, m o to rista de cam inhão, que exe cu ta m anobra
perigosa realizada sem as cautelas devidas, dando marcha à ré sem auxílio para a
operação.” São Paulo. STACivSP. 8- Câm. Civil. Apelação com revisão n. 665.280-
00/2, Rei.: Juiz Ruy Coppola, julgado em 22 abr. 2004.

O grau de diligência exigido do empregador vai além daquele esperado


dos atos da vida civil comum, visto que a empresa tem o dever legal e normativo
de adotar as medidas preventivas cabíveis para afastar os riscos inerentes ao
trabalho, aplicando todos os conhecimentos técnicos até então disponíveis para
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 207

eliminar as possibilidades de acidentes ou doenças ocupacionais. Não é


aceitável que a empresa adote apenas a diligência ordinária do homem médio,
na forma da vetusta máxima do comportamento do bonus paterfam ilias{33).

Desse modo, a verificação da culpa patronal no acidente ou doença


ocupacional deve tom ar como paradigm a a figura do bom em presário,
tecnicamente preparado e ostensivamente empenhado em reduzirão mínimo
que for possível os riscos do ambiente de trabalho (art. 7Q, XXII, da CF), com
observâ ncia cu id a d o sa das norm as de segu ra nça, higie ne e saúde
ocupacional exigíveis para o desenvolvimento da sua atividade. Aliás, no art.
-87.2 do Código Civil de Portugal há dispositivo expresso nessa linha de
oensamento: “A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência
de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.”

Também nos “Princípios de Direito Europeu sobre Responsabilidade


Civil” , divulgados em maio de 2005 pelo European Group on Tort Law, ficou
assentado no art. 4.101: “A pessoa que, intencionalmente ou por negligência,
violar o padrão de conduta exigível responde por culpa.” No artigo seguinte
foi detalhado o alcance da expressão “padrão de conduta exigível” :
“Art. 4:102. (1) O padrão de conduta exigível corresponde ao de uma pessoa razoável
colocada nas mesmas circunstâncias e depende, especialmente, da natureza e valor
do interesse protegido em questão, da periculosidade da atividade, da perícia que é
de e sp era r da pessoa que a exerce, da p re visib ilid a d e do dano, da relação de
proxim idade ou da particular confiança entre as partes envolvidas, bem com o da
disponibilidade e custos de métodos preventivos ou alternativos.

(2) O padrão de conduta pode ser ajustado em função da idade, de deficiência psíquica
ou fís ic a , ou q u a n d o , d e v id o a c irc u n s tâ n c ia s e x tra o rd in á ria s , não se p o ssa
legitimam ente esperar que a pessoa em causa atue em conform idade com o mesmo.

(3) As disposições que prescrevem ou proíbem uma determ inada conduta devem ser
tom adas em consideração a fim de se estabelecer o padrão de conduta exigível.”<34)

33) “A cidente do trabalho com óbito — Colisão com motocicleta — Falta de carteira nacional
rs habilitação — D ano m oral e m aterial. O dever de diligência da em presa que explora
at ,id a d e econôm ica que im plique em risco para a vida do em pregado e para a vida de
serceiros não pode ser o mesmo daquele exigido para o homem médio, pois a potencialidade
de oausar danos é consideravelm ente m aior nas atividades de uma em presa em comparação
: : n os atos da vida normal de um cidadão comum. Desse modo, ao não exigir do empregado
; carteira nacional de habilitação para a função de ‘m oto-boy’, a em presa agiu de modo
■ecligente e assum iu o risco de produzir o acidente que causou o óbito do empregado.
ZSva concorrente que se reconhece para deferir aos dependentes indenização por dano
moral e material, na proporção da culpa da R eclam ada Porto Cais Adm inistradora Ltda.
-e curso de Revista conhecido e provido.” TST. 3- Turma. RR n. 1574/2005-005-24-00.9,
Rei.: Ministro Carlos Alberto Reis de Paula, DJ 19 dez. 2008.
34) Em 1992 um grupo de juristas de diversos países, sem qualquer vinculação a organismos
ciais, fundou o “European Group on Tort Law”, com o propósito de estudar a unificação
3u, pelo menos, apresentar propostas de aproxim ação do direito privado europeu na área
208 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Como se depreende do exposto, o conceito clássico de culpa está pas­


sando por significativa mudança, abandonando-se aquela antiga noção cen­
trada no comportamento negligente, imprudente ou imperito do causador do
dano, de ordem acentuadamente moral e psicológica que praticamente con­
siderava a culpa um “pecado jurídico”(35). Agora, para avaliar o comportamento
do réu, compara-se a sua conduta com o padrão de diligência recomendável
no âmbito daquela atividade, livre dos aspectos anímicos ou psicológicos,
com ênfase nas normas de segurança recomendáveis, de acordo com as
especificidades do risco a que o lesado estava exposto. Assim, em vez do
padrão abstrato, subjetivo e sem uniformidade do comportamento do bom pai
de família, deve-se comparar a conduta do lesante com o padrão concreto e
objetivo do empregador exemplar que explora aquela atividade. Desloca-se,
então, o pensamento da antiga concepção de culpa dita psicológica para a
modernamente denominada culpa normativa(36).

7.6. Graus de culpa: grave, leve e levíssima

A doutrina tradicional, de acordo com a gravidade da falta cometida pelo


causador do dano, classifica a culpa em três graus: grave, leve ou levíssima.

Já no início do século passado, o Decreto Legislativo n. 2.681 de 1912,


que regula a responsabilidade civil das estradas de ferro, mencionava no art.
15, § 3S, o grau de culpa como critério para divisão de responsabilidade, na
reparação dos danos ou avarias das mercadorias transportadas, quando mais
de uma estrada de ferro tivesse concorrido para o transporte. Também a Lei
n. 5.250/1967, conhecida como Lei de Imprensa, estabelece no art. 53 alguns

da responsabilidade civil ou dos direitos dos danos. Após mais de 12 anos de estudos e
debates foram apresentados, em m aio de 2005, os “ P rincípios de D ireito Europeu da
Responsabilidade Civil” . Para maiores inform ações sobre o trabalho do grupo e das linhas
gerais adotadas nos princípios mencionados, consultar artigo doutrinário de Miquel Martin
C a sa is d isp o n íve l em: < h ttp ://w w w .a s o c ia c io n a b o g a d o s rc s .o rg /c o n g re s o /5 c o n g re s o /
p o n e n c ia s /M iq u e lM a rtin P rin c ip io s .p d f>. A ce sso em: 29 dez. 2009. O in te iro te o r dos
“Princípios de Direito Europeu da Responsabilidade Civil” encontra-se disponível em: <http:/
/civil.udg.edu/tort/Principles/pdf/PETLPortuguese.pdf>. Acesso em: 29 dez. 2010.
(35) A expressão da culpa como uma “espécie de pecado jurídico” foi mencionada por Paul
Esmein, citado por SCHREIBER, Anderson. Novos paradigm as da responsabilidade civil:
da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 34.
(36) Na linha desse pensam ento, vale citar, por todos, M aria C elina Bodin de Moraes:
“O rig in a lm e n te , culp a era apenas a a tu a çã o c o n trá ria ao d ire ito , porque n e g lig e n te ,
im p ru d e n te , im p e rita ou d o io s a , q u e a c a rre ta v a d a n o s a o s d ire ito s de o u tre m .
M odernam ente, todavia, d iversos a utores abandonaram esta conceituação, preferindo
considerar a culpa o descum prim ento de um standard de diligência razoável, diferenciando
esta noção, dita ‘norm ativa’ ou ‘objetiva’, da outra, dita ‘psicológica’.” Cf. Risco, solidariedade
e responsabilidade objetiva. Revista RT, São Paulo, v. 854, p. 21, dez. 2006.
bCENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 209

zntérios para o juiz arbitrar o valor do dano moral, dentre os quais figuram a
'íensidade do dolo e o grau de culpa do responsável.
No campo da indenização por acidente do trabalho, a gradação da culpa
leve importância destacada antes da vigência da Constituição de 1988, porque
a comprovação da culpa de natureza grave era requisito indispensável para
: cabimento da reparação civil, conforme entendimento sedimentado na Súmula
229 do Supremo Tribunal Federal: A indenização acidentária não exclui a
do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador. Mesmo
cepois da Constituição de 1988, a intensidade da culpa tem sido considerada
-o arbitramento da indenização por dano moral, diante do caráter pedagógico
e compensatório dessa condenação.
Com a entrada em vigor do Código Civil de 2002, o estudo da gradação
3a culpa ganhou maior prestígio e efeito prático, pela introdução de dois
cispositivos que não constavam do Código anterior, quais sejam:
a) — Art. 944, parágrafo único: “Se houver excessiva desproporção entre a gravidade
da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.”

b) — Art. 945: “Se a vítim a tiver concorrido culposam ente para o evento danoso, a sua
indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto
com a do autor do dano.”

Em resumo, seja para fixar o quantum indenizatório do dano material ou


cara o arbitramento do valor do dano moral será muito importante a verificação
co grau de culpa do empregador ou da vítima no acidente do trabalho(37). Por
essa razão, devem as partes agir com esmero na instrução processual,
oroduzindo provas que ofereçam ao julgador elementos suficientes para aferir
a intensidade de culpa dos envolvidos no acidente do trabalho.
A culpa será considerada grave quando o causador do acidente tiver
agido com extrema negligência ou imprudência, com grosseira falta de cautela,
atuando com descuido injustificável ao empregador normal. Pode ser também
chamada de culpa consciente, que se avizinha do dolo eventual do Direito
Penal(38).
A culpa leve, no entanto, será aquela infração que o empregador médio
teria evitado, ou seja, aquele patrão que adota o nível de atenção ordinária, o
equivalente ao bonus pater familias do caso concreto. Já a culpa levíssima
• cará caracterizada quando ocorre a falta cuja possível prevenção está acima
co padrão médio, mas um empregador diligente, especialmente cuidadoso,
tê-la-ia evitado.

37) O Enunciado 458 adotado por ocasião da V Jornada de D ireito Civil, realizada em
2011, prevê: “Art. 944. O grau de culpa do ofensor, ou a sua eventual conduta intencional,
:eve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano m oral.”
38) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Alias, 2012. p. 39.
210 S e b a s t iã o G eraldo de O liv e ir a

Uma análise vagarosa das normas de segurança, higiene e saúde do


trabalhador permite concluir que, atualmente, o empregador deverá adotar
uma rigorosa diligência na prevenção de acidentes e doenças ocupacionais,
sob pena de possibilitar à vítima a comprovação da culpa patronal, ainda que
na modalidade de culpa levíssima<39). Daí o dever atribuído à empresa de
contratar especialistas habilitados para manter o ambiente de trabalho seguro
e saudável, conforme mencionam as diretrizes para implantação dos Serviços
Especializados em Engenharia e em Medicina do Trabalho e os diversos
programas de prevenção. As estatísticas dos acidentes do trabalho no Brasil,
com números elevados e ainda crescentes nos últimos anos, estão justificando
essa tendência de exigir, cada vez mais, o rigoroso cumprimento das normas
protetivas da saúde e da segurança do empregado.

O grau de culpa do empregador no acidente do trabalho não impede o


direito à indenização devida ao acidentado, já que o art. 7Q, XXVIII, da Cons­
tituição, só exige a presença do dolo ou culpa, sem mencionar o qualificativo
da culpa grave, como previsto na antiga Súmula n. 229 do STF, que ficou
superada nesse aspecto. Aliás, continua válido o brocardo romano que dizia:
In legeAquilia, et levíssima culpa venit, ou seja, mesmo se a culpa for mínima
nasce o dever de indenizar(40).

(39) “ Civil. Indenização. A ssalto a Banco. Morte de funcionário. D ever da instituição financeira
de p re sta r segurança. L e i n. 7.102/83. Fato previsível. Culpa grave. Inexigência. D ano
moral. P edidos cum ulados. Não obstante ter o banco instalado em sua agência alguns
d is p o s itiv o s m ín im o s de s e g u ra n ç a , d e te rm in a d o s p e la Lei n. 7 .1 0 2 /8 3 , d e ve ser
responsabilizado pelo dano causado ao seu funcionário, se esses aparatos não foram
suficientes para impedir a sua morte, ocorrida por ocasião de assalto. Em face dos constantes
assaltos a bancos, em razão dos elevados valores sob sua guarda, estes têm a obrigação
legal de zelar pela segurança das pessoas que se encontram na área de sua proteção,
assim como de seus funcionários. A diligência que se requer, para esse mister, não é a
mínima. Ao contrário, deve ficar caracterizado que todas as medidas possíveis e existentes
foram tom adas para se evitar o dano e essas foram eficazes no cum prim ento da função
(REsp. n. 89.784/RJ). Sendo perfeitamente previsível e evitável o assalto a agência bancária,
não se há de falar em ocorrência de caso fortuito ou força m aior, a excluir a culpa da
instituição financeira pela morte de seu funcionário na ocorrência de tal evento. Desde a
integração do seguro no sistema previdenciário, com a edição da Lei n. 6.367/76, não mais
se questiona a propósito do grau de culpa do em pregador na ocorrência do acidente de
trabalho, sendo suficiente a culpa leve para caracterizar a obrigação indenizatória. Havendo
pedidos indenizatórios cum ulados, deve o ju iz individualizar a verba relativa aos danos
morais, definindo a parte correspondente a cada um dos credores.” Minas Gerais. TJMG, 5ã
Câm. Cível. Ap. Cível n. 372.367-5, Rei.: Manuel Saramago, julgado em 12 jun. 2003.
(40) “A cidente de trabalho. Responsabilidade do em pregador. A caracterização da culpa,
prevista no art. 7-, XXVIII, da CF/88, independe do grau com que esta se verifique. Em outras
palavras, o em pregador responde por ato omissivo ou comissivo, tenha ele concorrido com
culpa grave, leve ou levíssima. No presente caso, a reclamada não promoveu o treinam ento
adequado e ainda permitiu que a m áquina empregada na compactação do lixo fosse utilizada
de form a inadequada, o que ce rta m e n te deu causa ao in fo rtú n io e xp e rim e n ta d o pelo
reclamante.” Pará. TRT 8® Região. 4a Turma. RO n. 01826-2005-010-8-00-2, Rei.: Odete de
Alm eida Alves, julgado em 25 abr. 2006.
k d e n iz a ç õ e s p o r A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 211

Cabe m encionar que a possibilid ade antes referida de reduzir a


'denização, quando houver excessiva desproporção entre a gravidade da
:jip a e o dano, deve ser apreciada com moderação, especialmente porque
está rompendo com o vetusto princípio da restitutio in integrum. Nesse sentido
: Enunciado n. 46 aprovado em 2002 pelo Centro de Estudos Judiciários do
lonselho da Justiça Federal, com a retificação adotada em 2006: “Art. 944: a
; -ssibilidade de redução do montante da indenização em face do grau de
culpa do agente, estabelecida no parágrafo único do art. 944 do novo Código
Civil, deve ser interpretada restritivamente, por representar uma exceção ao
r ' ncípio da reparação integral do dano.” Em 2011, por ocasião da V Jornada
de Direito Civil realizada pelo mesmo Centro de Estudos da Justiça Federal,
fo aprovado outro Enunciado seguindo a m esma linha de raciocínio:
'Enunciado 457: Art. 944 — A redução equitativa da indenização tem caráter
excepcional e somente será realizada quando a amplitude do dano extrapolar
os efeitos razoavelmente imputáveis à conduta do agente.”
O julgamento por equidade, quando o dano decorrente do acidente for
:rande e a culpa do empregador mínima, permitirá ao juiz dosar ponderada-
nente a indenização, considerando todas as singularidades do caso concre­
to e até mesmo as posses do ofensor e da vítima, especialmente no que se
•efere ao arbitramento dos danos morais(41). O mérito desse dispositivo do
Código Civil atual está em possibilitar ao juiz conceder reparação proporcio-
nal quando estiver naquele limite da dúvida se houve ou não alguma culpa do
empregador no acidente(42).
Na fixação dos danos materiais a cautela quanto à redução deve ser
ainda maior, uma vez que, geralmente, o acidentado é a parte hipossuficiente
:a relação e não deve suportar os riscos do negócio, que são atribuídos ao
empregador. Ademais, não se pode perder de vista que a redução por
equidade do valor da indenização só deverá mesmo ocorrer quando houver
'excessiva desproporção” entre a culpa e o dano.

O Código Civil de Portugal tem dispositivo semelhante com o seguinte


:eor: “ Quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemni-

41) Para Sílvio Rodrigues a indenização calculada pela extensão do dano, sem considerar
a gravidade da culpa, “por vezes se apresenta injusta, pois não raro de culpa levíssima
iesulta dano desmedido para a vítima. Nesse caso, se se impuser ao réu o pagamento da
n d e n iza çã o to ta l, a s e n te n ç a p o d e rá c o n d u z i-lo à ruína. E n tã o e s ta r-s e -á a p e n a s
sansferindo a desgraça de uma para outra pessoa, ou seja, da vítim a para aquele que, por
- nima culpa, causou o prejuízo.” In: D ireito civil: responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo:
3araiva, 2002. v. 4, p. 188.
42) Como assevera Agostinho Alvim, “sucede, às vezes, que, por culpa leve, sem esquecer
jm a dose de fatalidade, como acentua Rossel, vê-se alguém obrigado a reparar prejuízos
vastas proporções. O juiz poderia sentir-se inclinado a negar a culpa, para evitar uma
iDndenação que não com porta m eio-term o.” In: Da inexecução das obrigações e suas
:onsequências. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1972. p. 201.
212 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

zação ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia


aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situa­
ção econômica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o ju s­
t i f i q u e m . Também o Código Civil da Argentina estabelece: “Los jueces, aI
fijar las indemnizaciones por danos, podrán considerar Ia situación patrimoni­
al dei deudor, atenuándola si fuere equitativo; pero no será aplicabie esta
facultad si el dano fuere imputabie a dolo dei responsable.”,M>

7.7. Culpa exclusiva da vítima

Se o acidente ocorrer por culpa exclusiva da vítima, não cabe qualquer


pretensão desta no terreno da responsabilidade civil em face do empregador,
por ausência de liame de causalidade do evento com o trabalho. Analisamos
esse ponto no Capítulo 6, quando estudamos as hipóteses de exclusão do
nexo causal, no item 6.6, ao qual nos reportamos.

7.8. Culpa concorrente da vítima

Quando o acidente ocorre por culpa do empregador, a indenização será


devida pelo seu valor total, conforme já visto. Mas, com frequência, a defesa
alega que houve culpa exclusiva ou concorrente do empregado, com o
propósito de excluir a responsabilidade civil ou, pelo menos, reduzir o seu
valor. Diante de tal alegação, cabe ao julgador avaliar detidamente o conjunto
probatório para aferir se houve mesmo participação culposa da vítima e, se
positiva a resposta, qual foi a intensidade da sua contribuição no acidente
ocorrido.

Se a conduta culposa do empregado foi a única causa para a ocorrência


do acidente, então não há nexo de causalidade do infortúnio com o exercício
do trabalho e, consequentemente, nem responsabilidade civil do empregador
em razão da culpa exclusiva da vítima. Entretanto, se a conduta da vítima
apenas contribuiu para o acidente, estaremos diante da culpa concorrente ou
culpa recíproca que determina a redução proporcional do valor indenizatório.

A figura jurídica da culpa concorrente foi construída paulatinamente pela


ju risprudência, com o solução equitativa para o cálculo da reparação,
considerando as circunstâncias do caso concreto. Quando o julgador percebia
que o acidente ocorrera por culpa da vítima e do empregador, acabava

(43) Portugal. Código Civil. Decreto-Lei n. 47.344/1966. Art. 494g.


(44) Argentina. Código Civil. Lei n. 340/1869. Art. 1.069. O parágrafo transcrito foi introduzido
no art. 1.069 do Código Civil pela Lei n. 17.711/1968.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 213

repartindo os ônus reduzindo pela metade o valor da indenização. Esse


entendimento, que já era acolhido pela doutrina e jurisprudência, passou a
constar, de forma aperfeiçoada, no Código Civil de 2002: Art. 945. Se a vítima
íiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será
fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do
autor do dano{A5).
Como se depreende do exposto, a culpa concorrente não exclui a
responsabilidade civil do empregador, mas determina a fixação do valor
indenizatório na proporção da culpa das partes no acidente ocorrido. Anota
Rui Stoco que “nosso legislador já não se satisfaz com o entendimento
meramente matemático, mas sem qualquer conteúdo jurídico, de repartir o
dano pela metade, carreando ao ofensor e à vítima o prejuízo em partes iguais.
Adota-se no art. 945 critério dúctil, lógico e juridicamente correto, ou seja,
cada qual responderá na medida de sua culpa.”(46)
A concorrência de culpa ou das causas no acidente do trabalho leva à
distribuição proporcional dos prejuízos; todavia, ficará ao prudente arbítrio do
juiz fixar o percentual da indenização atribuído ao empregador, considerando
as circunstâncias do caso concreto, as provas colhidas e a gravidade da
culpa da vítima(47). Caso não seja possível estabelecer o grau de influência
de cada culpa, o caminho recomendável é o fracionamento da reparação em
partes iguais(48).
Em oportuna síntese, Carlos Alberto Direito e Sérgio Cavalieri apontam
cinco pressupostos que devem ser considerados no cálculo da redução do
valor indenizatório, na hipótese de culpa concorrente:

“ Para que a culpa da vítim a influencie na fixação da indenização é


necessário, primeiro, que haja nexo causal entre a sua participação e o

(45) De form a semelhante, o Código Civil português estabelece no art. 570°: “Quando um
fato culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravam ento dos danos, cabe
ao tribunal determ inar, com base na gravidade das culpas de am bas as partes e nas
conseqüências que delas resultaram , se a indenização deve ser totalm ente concedida,
reduzida ou mesmo excluída.”
(46) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011. p. 168.
(47) O mestre Caio Mário, ao discorrer a respeito da culpa concorrente, assevera que “o
m a io r p ro b le m a e s tá em d e te rm in a r a p ro p o rc io n a lid a d e . V a le d iz e r: a v a lia r
quantitativam ente o grau de redutibilidade da indenização, em face da culpa concorrente
da vítim a. Entra aí, evidentem ente, o arbítrio de bom varão do juiz, em cujo bom -senso
repousará o justo contrapasso, para que se não amofine em demasia a reparação a pretexto
da participação do lesado, nem se despreze esta última, em detrim ento do ofensor.” Cf.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 83.
(48) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. 2, p. 109.
214 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

evento danoso; segundo, que a sua participação não se confunda com


aquela do ofensor, isto é, seja autônoma, não uma consequência do
ilícito por ele praticado; terceiro, que seja também ilícito e culpável o ato
da vítim a, com o que estão exclu íd o s os atos pra tica d o s pelos
inimputáveis; quarto, que seja feita a ponderação da gravidade de sua
culpa em confronto com a do autor do dano; quinto, que seja aferida não
apenas a concorrência para o ato danoso, mas, também, se o seu ato
aumentou o dano causado.”(49)

É necessário registrar, entretanto, que a culpa concorrente no acidente


do trabalho deve ser avaliada com alguns ajustes em relação às demais
hipóteses da responsabilidade civil, pelas condições singulares do vínculo
de natureza empregatícia.

Na relação de emprego, o trabalhador atua de forma subordinada, com


limitado espaço para se insurgir contra os comandos patronais, mormente
pela inexistência de garantia de em prego num período de acentuada
precarização do contrato de trabalho. Além disso, é de exclusiva escolha do
em pregador o local de trabalho, os m étodos de produção, a estrutura
o rg a n iza cio n a l, o m obiliá rio, as fe rra m e n ta s que serão u tiliza d a s, o
preenchim ento dos cargos diretivos, os com prom issos de entregas, os
períodos de manutenção, a necessidade de prorrogação da jornada, a época
da concessão das férias, o ritmo da produção, o investimento em treinamento
ou atualização etc. Aliás, especialistas da área garantem que “no contexto
brasileiro, na maioria dos casos, arriscar-se é parte das tarefas habituais,
desenvolvidas em contextos de subsistemas técnicos extremamente precários
do ponto de vista de segurança.”(50)

Está sedimentado o entendimento de que os acidentes do trabalho ocorrem


em razão de uma rede de fatores causais, cujas variáveis são controladas, em
sua maior parte, exclusivamente pelo empregador. Com isso, muitas vezes a
culpa patronal absorve ou mesmo neutraliza a culpa da vítima, em razão das
diversas obrigações preventivas que a lei atribui às empresas. Assevera o
clássico Aguiar Dias que “a responsabilidade é de quem interveio com culpa
eficiente para o dano. Queremos dizer que há culpas que excluem a culpa de
outrem. Sua intervenção no evento é tão decisiva que deixa sem relevância
outros fatos culposos porventura intervenientes no acontecimento.”(51)

(49) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 405-406.
(50) BINDER, M aria C ecília Pereira; ALM EID A, lldeberto Muniz. A cidentes do trabalho:
acaso ou descaso? In: MENDES, René (Org.). P atologia do trabalho. 2. ed. São Paulo:
Atheneu, 2003. v. 1, p. 774.
(51) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 696.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 215

Estudos recentes estão demonstrando que há uma cultura arraigada no


Brasil de atribuir a culpa dos acidentes às “falhas humanas” , “inevitável
■atalidade” ou aos “atos inseguros” da própria vítima (culpabilização da vítima),
:esprezando todo o contexto em que o trabalho estava sendo prestado.
Quando ocorre um acidente, as prim eiras investigações, norm alm ente
ronduzidas por prepostos do em pregador, sofrem forte inclinação para
:onstatar um “ato inseguro” da vítima, analisando apenas o último fato
ríesencadeante do infortúnio, sem aprofundar nos fatores antecedentes e
:onexos da rede causal, até mesmo com receio das conseqüências jurídicas
ou para não expor a fragilidade do sistema de gestão de segurança da
empresa. Muitas empresas investigam o acidente apenas com o propósito de
encontrar culpados e aplicar punições exemplares.

Essa visão ultrapassada está impedindo que haja progresso nas políticas
de segurança e saúde do trabalhador, bastando mencionar que os índices de
acidentes do trabalho continuam elevados. Ora, se todos adotássemos
:erm anentem ente um nível extraordinário de atenção, praticam ente não
:correriam acidentes do trabalho, acidentes de trânsito ou qualquer outro
nfortúnio. Nenhum programa de prevenção sério pode considerar o empregado
:omo se fosse uma figura robótica que nunca comete deslize, distante de
sua natureza humana e falível. Cabe transcrever nesse sentido as conclusões
aa professora Maria Cecília Pereira Binder, especialista em acidentologia:
“Nas abordagens com portamental e ergonômica, a im portância dos
comportamentos do acidentado na etapa imediatamente antecedente à
lesão foi progressivamente sendo minimizada, criando-se o consenso
de que a prevenção não pode prescindir do desvendar dos fatores mais
remotos das origens dos acidentes. As análises dos acidentes do trabalho
(e tam bém as análises do trabalho) devem evidenciar os fatores
potencialmente capazes de desencadear tais eventos para planejar as
intervenções preventivas, incluindo aí aspectos da organização do
trabalho e do gerenciamento da empresa.
Os conceitos de atos inseguros e condições inseguras, originados na
década de 1930, com base na concepção de acidentes como seqüência
linear de eventos, foram abandonados por grande número de estudiosos
ou passaram por m udanças sig n ifica tiva s em sua interpretação.
D esconsiderando a evolução dos conhecim entos, em num erosas
empresas do país persiste a concepção dicotômica, atos inseguros e
condições inseguras, como norteadoras das investigações de acidentes
do trabalho.
Uma das conseqüências da evolução da concepção de acidentes tem
sido a crescente compreensão da inutilidade de recomendações de pre­
venção como ‘prestar mais atenção’, ‘conscientizar’, ‘tomar mais cuidado’
216 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

e assemelhadas. Firma-se o entendimento de que o trabalho desenvol­


vido em condições em que a segurança depende exclusivamente do
desempenho do indivíduo na tarefa, exigindo a manutenção de grau de
vigília incompatível com as capacidades humanas, configura ‘acidente
esperando para acontecer’ sendo, portanto, inaceitável.”(52)
Para o Engenheiro de Segurança e Consultor Reginaldo Lapa, a empre­
sa deve seguir um ritual de investigação do acidente do trabalho, observando
uma seqüência prevista em norma interna. Primeiramente, é necessário que
tenha orientação sobre a comunição do acidente e as ações imediatas logo
após a ocorrência. Em seguida, deve-se constituir um grupo de investigação
que fará o planejamento dos trabalhos, a coleta dos dados, a organização
dos elementos colhidos e a respectiva análise. Finalmente, atinge-se a etapa
do registro das conclusões e da proposta das ações necessárias para evitar
novas ocorrências. Enfatiza Reginaldo Lapa que “documentar as análises da
investigação e acompanhar as ações para verificar se estão sendo imple­
mentadas e se estão sendo capazes de evitar, de fato, as causas identificadas
é o que chamamos de ritual da investigação”.(53) Dessa forma, a investigação
em vez de centralizar o foco na identificação dos culpados para eventual
punição, prioriza a busca do conhecimento das causas do sinistro para im­
plementar boas práticas de gestão preventiva.
Para melhorar as investigações dos fatores causais dos acidentes do
trabalho, a Instrução Normativa n. 88 de 30 nov. de 2010, baixada no Ministé­
rio do Trabalho e Emprego por intermédio da Secretaria de Inspeção do
Trabalho — SIT — em conjunto com o Departamento de Segurança e Saúde
no Trabalho — DSST, estabeleceu diretrizes com o propósito de aperfeiçoar
as análises dos acidentes do trabalho efetuadas pelos Auditores-Fiscais do
Trabalho e o respectivo relatório. Vejam as recomendações relacionadas nos
arts. 5e e 6a:
“Art. 59. As providências para as análises de acidente de trabalho deverão ser tomadas,
a partir do conhecim ento do evento, com a urgência requerida por cada caso, e as
análises serão realizadas in loco, devendo o AFT:

I — in v e s tig a r a e x is tê n c ia de irre g u la rid a d e s e in fra çõ e s re la tiva s às N orm as


R eg ulam enta do ra s de S e gurança e S aúde no T ra b a lh o — NRs apro va d a s pela
Portaria MTb n. 3.214, de 8 de junho de 1978, especialm ente as de n. 1, 4, 5, 7 e 9, e
a provável deficiência na capacitação dos trabalhadores ou outros aspectos de gestão
de segurança e saúde do trabalho que influenciaram a ocorrência do evento;

(52) BINDER, M aria C ecília Pereira; ALM EID A, lldeberto Muniz. A cidentes do trabalho:
acaso ou descaso? In: MENDES, René (Org.). Patologia do trabalho. 2. ed. São Paulo:
Atheneu, 2003. v. 1, p. 787. A m édica Maria Cecília Binder é doutora em M edicina pela
UNICAMP, com pós-doutoramento no Departam ento de Acidentologia do institute Nacional
de Recherche et de Sécurité — INRS, Nancy, França.
(53) LAPA, Reginaldo. Buscar as causas em vez de culpados. Revista CIPA, São Paulo, v.
XXXIII, n. 385, p. 92, out. 2011.
‘ .DENiZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 217

II — investigar a influência de possíveis infrações decorrentes do descum prim ento da


legislação d isciplina d o ra da jo rn a d a de trabalho e dos períodos de descanso na
ocorrência do evento;

III — entrevistar os trabalhadores e outras pessoas direta ou indiretamente envolvidas


para a apuração dos fatos;

IV — relatar as medidas de prevenção que poderiam ter evitado o evento indesejado,


bem como as medidas de proteção, que poderiam ter reduzido as suas conseqüências;

Art. 6®. Ao término da análise do acidente, o A FT elaborará relatório para entrega ao


Chefe da Seção ou Setor de Segurança e Saúde no Trabalho da SRTE, emitido de
acordo com o modelo previsto no Anexo desta Instrução Normativa.

§ 19 O relatório previsto no caput deverá ser digitado, ter redação clara, precisa e com
ordem lógica e instruído com o m aior número possível de elem entos probatórios,
podendo ser incluídos diagramas, esquemas, fotos, vídeos e outros recursos.

§ 2- Os Autos de Infração lavrados no contexto de ação fiscal de análise de acidente


de trabalho devem especificar, em seu histórico, a ocorrência do evento.”(54)

Alguns exemplos colhidos na jurisprudência demonstram o entendimento


aos tribunais a respeito da culpa concorrente da vítima no acidente do trabalho:
“R ecurso de revista. A cid en te do trab alh o com óbito. R esp o n sab ilid ad e do
em pregador pela ação culposa de prepostos. Culpa concorrente da vítim a. Dano
moral e patrimonial. Indenização. Pensão mensal. Diante do quadro fático delineado
pelo colegiado de origem, acrescido pelos detalhes trazidos pelas próprias reclamadas,
incontroversos, ofende o art. 927 do Código Civil a decisão que conclui pela ausência
de responsabilidade das rés, em relação ao acidente do trabalho que acarretou a
morte do empregado. Com efeito, manifesta a ação/om issão culposa dos prepostos
— um responsável pela orientação do trabalhador inexperiente e que não o impediu
de deitar-se em local inapropriado, o outro, condutor do veículo, que adentrou a
lavoura de ré, no escuro, im prudentem ente, atropelando a vítim a — , a constatação de
co n d u ta in a d eq u a d a do p ró p rio a c id e n ta d o deve se r so p e sa d a no c á lc u lo das
indenizações, mas não elide a responsabilidade dos em pregadores pela culpa dos
demais em pregados, ante os termos dos arts. 932, 933 e 945 do Código Civil. A teor
da Súmula 341 da Suprema Corte, é presum ida a culpa do patrão ou comitente pelo
ato culposo do empregado ou preposto e, segundo Sebastião Geraldo de Oliveira, —
a culpa concorrente não exclui a responsabilidade civil do empregador, mas determina
a fixação do valor indenizatório na proporção da culpa das partes no acidente ocorrido
— (Indenizações p o r Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 5. ed. São Paulo:
LTr, 2009. p. 192-3). Recurso de revista conhecido e parcialm ente provido.” TST. 3-
Turma. RR n. 470-43.2010.5.15.0000, Rei.: Ministra Rosa Maria W eber, DJ 15 out.
2010.

“Acidente de trabalho. Culpa recíproca. Indenização por danos morais e materiais.


A existência de culpa concorrente da vítim a no evento danoso sempre foi considerada
pela doutrina e pela jurisprudência como fator de moderação/redução da indenização,

54) O Juiz, de ofício ou a requerim ento da parte, poderá requisitar cópia autêntica ou
: gitalizada do Relatório produzido ao Chefe do setor de Segurança e Saúde no Trabalho
da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego para fins de instrução do processo
art. 399 do CPC).
218 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

por uma questão de equidade, entendim ento que foi reconhecido e adotado pelo
legislador do atual Código Civil, que passou a prever que se a vítim a tiver concorrido
culposam ente para o evento danoso, a indenização será fixada tendo-se em conta a
gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano. Como se depreende
do c ita d o a rtig o , a c u lp a c o n c o rre n te não e x c lu i a re s p o n s a b ilid a d e c iv il do
empregador, mas determ ina a fixação de valor indenizatório na proporção da culpa das
partes no acidente ocorrido, o que leva à distribuição proporcional dos prejuízos. A
atitude negligente do laborista de d e srespeitar regra básica de trânsito, fato que
in flu e ncio u so b re m a n e ira na o c o rrê n c ia do a cid e n te de tra b a lh o a u to m o b ilís tic o
que o vitimou, deve ser contraposta à atitude culposa do em pregador de im por ao
tra b a lh a d o r a c u m u la d a m e n te o e x e rc íc io da fu n ç ã o de m o to ris ta , to ta lm e n te
desvinculada daquela para a qual foi contratado, sem providenciar a supervisão e o
treinam ento que tal função exigia, expondo o trabalhador a risco a respeito do qual
ele não estava preparado para lidar, em descumprimento ao comando constitucional
de prevenir acidentes, reduzindo os riscos existentes no local de trabalho (art. 7-,
XXII, da CF). Cabível, portanto, a redução da indenização deferida, observando-se o
princípio da razoabilidade, em atenção à culpa concorrente verificada.” Minas Gerais.
TRT 3a Região. 2a Turma. RO n. 00607-2010-008-03-00-4, Rei.: Sebastião Geraldo
de Oliveira, DJ 12 jul. 2011.

“Recurso ordinário. A cidente de trabalho. C ulpa recíproca ou concorrente. O


reclamante deixou de utilizar sponte própria as botas com biqueira de aço fornecidas
pela reclamada por ocasião de sua admissão, o que certamente amenizaria o resultado
danoso ocorrido poucos dias depois, não havendo, entretanto, como se afirmar que tal
procedimento afastaria totalmente a ocorrência do dano (esmagamento do dedo do pé
esquerdo). Ocorre que não se pode reconhecer a culpa exclusiva do obreiro, pois a
fiscalização do uso efetivo e da troca do EPI fornecido ao trabalhador cabe à empresa
(Súm ula 289 do C .TST), não devendo fica r a critério do em pregado o seu uso e
substituição pois trata-se normalmente de pessoa leiga no assunto de segurança do
trabalho. Constata-se, portanto, no caso em comento, a ocorrência do fenôm eno da
culpa recíproca ou concorrente já que ambas as partes contribuíram, ao mesmo tempo,
para a produção do mesmo evento danoso.” São Paulo. TRT 2- Região. 12a Turma. RO
n. 01232-2006-261-02-00-4, Rei.: Des. Marcelo Freire Gonçalves, DJ 18 dez. 2009.

“Acidente do trabalho. Culpa concorrente. Culpa exclusiva da vítima. Fixação da


indenização. A discussão de alegada culpa do em pregado no acidente do trabalho
d e ve se r e xa m in a d a p a rtin d o -s e da p re m is s a de que ca b e ao e m p re g a d o r a
implementação, treinamento e vigilância das normas de segurança do trabalho, inclusive
porque o empregado tem o direito constitucional à saúde e ao meio ambiente do trabalho
sadio (arts. 196 e 205). Consequentemente, milita contra o empregador a presunção de
sua culpa exclusiva no acidente. Nesse contexto, eventual coparticipação culposa do
empregado (que também está obrigado a cumprir as normas de segurança impostas
pela empregadora) não exime o em pregador de qualquer culpa no evento, a quem
c a b e rá in c lu s iv e o ô n u s da re s p e c tiv a p ro v a . C a b e ao J u d ic iá rio e x a m in a r
prudentem ente o grau de participação do em pregado no acidente, para concluir se
ocorreu a hipótese de culpa exclusiva da vítima, que não poderia ser evitada por qualquer
norma de segurança (inexistindo assim qualquer responsabilidade civil do empregador),
ou, se a participação do empregador foi tão intensa que excluiu a culpa obreira (sendo
assim devida a totalidade da indenização), ou, finalmente, se ocorreu culpa concorrente
(atraindo a aplicação do disposto no art. 945 do Código Civil, devendo a indenização se
fixada após a dedução proporcional da quota de responsabilidade do em pregado).”
São Paulo. TRT 15a Região. 3® Turma. 5a Câm. RO n. 00609-2004-029-15-00-0, Rei.:
Des. Samuel Hugo Lima, DJ 22 set. 2006,
■;d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 219

7.9. Presunção de culpa do empregador

Neste tópico vamos analisar se é cabível adotar a presunção de culpa


do empregador, quando ocorre o acidente do trabalho.
De início é preciso enfatizar que a investigação da culpa só é necessária
quando se discute a responsabilidade civil ou criminal do empregador, porquanto
□ara os benefícios concedidos pela legislação da infortunística, que tem como
oase a responsabilidade objetiva, esse pressuposto não é exigido.
Para atender a uma seqüência lógica de apreciação, a pesquisa sobre a
Dulpa somente deverá ser feita após a constatação do liame de causalidade.
Se o acidente não teve relação com o exercício do trabalho a serviço da
empresa ou se ocorreu apenas a causalidade indireta, sem participação
alguma do empregador, é dispensável indagar a respeito da culpa. Desse
modo, para os casos de acidente de trajeto em condução pública, força maior,
caso fortuito ou fato exclusivo de terceiro, em princípio, não há que se
questionar a respeito da culpa patronal em razão da ausência do nexo causal
direto do acidente com a prestação do serviço.

Na divisão tradicional do ônus da prova, conforme previsto no art. 3 3 3 ,1,


do CPC, cabe ao autor dem onstrar o fato constitutivo do seu direito(55).
Contudo, no processo trabalhista, nem sem pre o reclam ante consegue
desincum bir-se satisfatoriam ente do seu ônus, m orm ente porque é o
empregador que tem maior disponibilidade dos meios de prova, ou seja, é a
oarte que está mais apta para demonstrar em juízo os fatos controvertidos.
Diante dessa realidade, em diversas ocasiões tem-se adotado a inversão do
ônus da prova em favor do empregado(56).

(55) “In d e n iz a ç ã o p o r dan o m oral. A c id e n te de tra b a lh o . D o e n ças o s te o m u s c u la re s


relacionadas com o trabalho. Não dem onstração de culpa da reclam ada. 1. O Regional
concluiu que era devida a indenização por danos morais pleiteada na inicial, porquanto a
responsabilidade da Reclam ada era objetiva, presum indo-se sua culpa, de vez que não
provada. 2. Responsabilidade é o instituto que liga alguém às conseqüências do ato que
pratica, ou seja, é a obrigação de responder pelas conseqüências jurídicas decorrentes do
ato praticado, cujos pressupostos são o dano experim entado pelo ofendido, a ação ou a
omissão do causador, o nexo de causalidade e a culpa ou o dolo. 3. No caso dos autos,
verifica-se que foi demonstrado apenas o dano sofrido pela Obreira e o nexo de causalidade
entre a doença manifestada e o exercício das atividades funcionais da Obreira, restando
expressam ente consignada no acórdão vergastado a presunção da culpa, corolário da
adoção da teoria do risco objetivo, contrariando a jurisprudência desta Corte, a qual tem
adotado o entendimento de que a responsabilidade, nessas hipóteses, é subjetiva, restando
inafastável a necessidade de subm issão do caso concreto à verificação da existência da
culpa ou do dolo na conduta patronal a título de reparação do dano, na esteira do art. 7a,
XXVII, da CF. Recurso de revista conhecido e provido.” TST. 7- Turma. RR n. 1612/2005-
731-04-00, Rei.: Ministro Ives Gandra Martins Filho, DJ 14 dez. 2007.
(56) V eja m neste se n tid o as S ú m u la s ns. 16, 212 e 338 do T S T e as O rie n ta ç õ e s
Jurisprudenciais n. 233 e 306 da SBDI-I tam bém do TST.
220 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

O douto Ministro do TST Carlos Alberto Reis de Paula, em apreciada


obra a respeito do ônus da prova no processo do trabalho, sintetiza o
pensamento doutrinário sobre o tema:
“A inversão do ônus da prova é uma das peculiaridades do processo
trabalhista, fenôm eno justificado pela instrum entalidade do direito
processual, de form a genérica, e nas particularidades do processo
trabalhista, de forma específica. A inversão é inspirada em altíssimos
princípios de interesse social, sendo o meio para se obter o equilíbrio
processual, estabelecendo igualdade de condições entre as partes.
Torna-se possível a inversão do ônus da prova desde que haja incidência
de alguns dos seguintes princípios: da aptidão para a prova, do in dubio,
pro operário e da pré-constituição da prova. A disponibilidade dos meios
de prova importa no dever de colaboração, como decorrência do princípio
da aptidão para a prova, que é resultante de construção jurisprudencial.
Como consagrado por Carnelutti, o escopo do processo não é a simples
composição, mas a justa composição da lide,”(57)
Em muitas ocasiões, o acidentado se depara com enormes dificuldades
para comprovar a culpa do empregador, o que acaba por deixar sem reparação
muitas lesões. Como anota Sérgio Cavalieri, “a prova da culpa, em muitos
casos, é verdadeiramente diabólica, erigindo-se em barreira intransponível
para o lesado.”(58) Como efeito dessa constatação, a culpa presumida passou
a ser adotada em várias hipóteses em que a vítima reiteradamente encontrava
dificuldades para demonstrar o ato ilícito do causador do dano, sobretudo
naquelas atividades em que o grau de risco é maior. Afirma Alvino Lima que
“as presunções de culpa consagradas na lei, invertendo o ônus da prova,
vieram melhorar a situação da vítima, criando-se a seu favor uma posição
privilegiada.”(59)
No Brasil, já no ano de 1912, o D ecreto n. 2.681, que regula a
responsabilidade civil das estradas de ferro, estabeleceu no art. 17: “As
estradas de ferro responderão pelos desastres que nas suas linhas sucederem
aos viajantes e de que resulte a morte, ferimento ou lesão corpórea. A culpa
será sempre presumida, só se admitindo em contrário algumas das seguintes
provas: ! — caso fortuito ou força m aior; II — culpa do viajante, não
concorrendo culpa da estrada.”

De form a semelhante, a Súmula n. 341 do STF, adotada em 1963,


consagrou que “é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo

(57) PAULA, Carlos Alberto Reis de. A especificidade do ônus da prova no processo do
trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 193.
(58) C AVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 41.
(59) LIMA, Alvino. Culpa e risco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1963. p. 79.
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 221

do empregado ou preposto”, suplantando a interpretação literal do art. 1.523


do Código Civil de 1916.
O Código de Proteção e Defesa do Consumidor, considerado um marco
no tema da modificação do ônus da prova, estabeleceu no art. 6Q: “São
:ireitos básicos do consumidor: (...) VIII — A facilitação da defesa de seus direi­
tos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo
: vil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele
-ipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência.”(60)
Sem dúvida, todos os motivos que impulsionaram o desenvolvimento da
:9oria da culpa presum ida tam bém estão presentes nas questões que
envolvem o acidente do trabalho. É notória a dificuldade da vítima para
lomprovar as causas do acidente, sem contar as culpas anônimas ou pouco
visíveis dos desgastes do material, jornadas exaustivas, pressão da chefia,
resvios de função, treinamentos inadequados e tantos outros fatores que
rontribuem para o infortúnio laboral.
Além disso, se o acidente ou doença ocorreu no trabalho e a atividade é
:e risco, há uma tendência natural de se presumir a culpa do empregador, até
nesmo pela consideração do que ordinariamente acontece. Assim, a técnica
;a inversão do ônus da prova, bastante impulsionada pelo Código de Defesa
:o C onsum idor, tende a gan har cada vez m ais aco lh id a nas ações
idenizatórias decorrentes dos acidentes do trabalho. A propósito, vale
ranscrever parte dos fundamentos lançados em acórdão do Colendo TST
-aiatado pela Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi:
“5 — A aplicação do instituto da responsabilidade civil no Direito do
Trabalho distingue-se de sua congênere do Direito Civil. Ao contrário
das relações civilistas, lastreadas na presunção de igualdade entre as
partes, o Direito do Trabalho nasce e desenvolve-se com o escopo de
reequilibrar a posição de desigualdade inerente à relação de emprego.
Nesse sentido, a apuração da culpa no acidente de trabalho deve adequar-se
à especial proteção conferida pelo ordenamento jurídico ao trabalhador.
Essa proteção se concretiza, dentre outras formas, pela inversão do
ônus da prova, quando verificada a impossibilidade de sua produção
pelo empregado e a maior facilidade probatória do empregador.
6 — A regra do artigo 333 do CPC, segundo o qual compete à parte que
alega comprovar fato constitutivo de direito, enquanto à parte contrária
compete provar fato modificativo, extintivo ou impeditivo, deve ser aplicada
subsidiariamente na esfera trabalhista. Aqui, vige o princípio da aptidão
para a prova, determinando que esta seja produzida pela parte que a ela
tem acesso, quando estiver fora do alcance da parte contrária.

60) Lei n. 8.078, de 11 set. 1990.


222 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

7 — No presente caso, seria insensato exigir dos Reclam antes a


comprovação da inexistência de culpa da empresa no eventus damni,
sob pena de desvestir o instituto da responsabilidade civil de toda sua
eficácia e de negar vigência à garantia constitucional do art. 7-, inciso
XXVIII.

8 — Cabia à empresa, e, não, aos Reclamantes, desvencilhar-se do


ônus da prova da inexistência da culpa. Como não se desonerou do ônus
que milita em seu desfavor, presume-se a culpa, surgindo o conseqüente
dever de indenizar o trabalhador pelo prejuízo sofrido.”(61)

A responsabilidade civil por acidente do trabalho vem passando por


mudanças progressivas, sempre visando ao amparo da vítima. Na vigência
da segunda lei de acidentes do trabalho (Decreto n. 24.637/1934) havia
dispositivo expresso excluindo a responsabilidade civil; com o advento do
Decreto n. 7.036/1944 passou a ser devida a indenização no caso de dolo; a
Súmula n. 229 do STF de 1963 ampliou o cabimento da reparação para as
hipóteses de dolo ou culpa grave do empregador; a Constituição da República
de 1988 estendeu o cabimento das indenizações para os casos de culpa do
empregador de qualquer natureza, dispensando o requisito da gravidade (art.
7e, XXVIII), podendo ocorrer até mesmo nos casos de culpa levíssima. Agora,
o Código Civil de 2002, no art. 927, parágrafo único, sugere que o acidentado
terá direito à indenização independentemente da culpa do empregador quando
a atividade normalmente desenvolvida pela empresa implicar, por sua natureza,
risco para os direitos do empregado.

Na seqüência desse movimento em favor da vítima, merece registro a


criação do Nexo Técnico Epidemiológico no âmbito da Previdência Social,
pela Lei n. 11.430/2006, cujo propósito ostensivo foi tornar mais fácil o
reconhecimento do nexo causal entre o trabalho e o agravo, o que, de certa
forma, reforça a tendência de adotar a modificação do ônus da prova para
beneficiar o acidentado(62). O Médico do Trabalho e Auditor Fiscal do Ministério
do Trabalho, Mário Bonciani, bem explica o princípio da inversão do ônus da
prova que orientou a implantação do Nexo Técnico Epidemiológico e do Fator
Acidentário de Prevenção:

“Frente à suspeita (a partir de informações epidemiológicas) de relação


entre uma doença e uma atividade laborativa, quem tem mais condições
de bancar a contraprova, o trabalhador ou o empregador? Vamos lem­
brar que é o empresário quem conhece e determina as máquinas, os

(61) TST. 3a Turma. RR n. 930/2001-010-08-00, DJ 19 mar. 2004.


(62) Analisam os com vagar a inovação do Nexo Técnico E pidem iológico — NTEP e do
Fator Acidentário de Prevenção — FAP no Capítulo 2, item 2.3; no Capítulo 5, item 5.6 e no
Capítulo 6, item 6.2.
hDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 223

equipamentos e os produtos que são utilizados no processo produtivo,


bem como a forma como o trabalho é organizado. É também ele quem
define o profissional técnico que lhe dará assessoria, portanto, tem a
posse do PCMSO, PPRA, PCMAT etc. Com a presença de suspeita de
nexo (informada por meio do NTEP), seria justo manter a situação atual,
onde o trabalhador é que tem que arcar com o ônus da comprovação do
nexo? O justo é que, havendo evidências epidemiológicas de que deter­
minado segmento produtivo tem maior incidência de determinada doen­
ça, um trabalhador, com tal doença e com atividade compatível, seja
caracterizado a princípio como doença do trabalho. Evidente que pode­
rá não ser. Mas caberá ao empresário provar.”(63)

Atualmente, o fundamento para a indenização decorrente do acidente do


fcabalho oscila entre a responsabilidade subjetiva e a teoria do risco, com
zrvergências doutrinárias e jurisprudenciais, observando-se, porém, uma
: -escente força gravitacional atraindo o entendimento para a responsabilidade
de natureza objetiva.

Entretanto, entre o rigor do ônus da prova que sobrecarrega a vítima, na


teoria subjetiva, e o deferimento da reparação tão somente pelo risco da
üiv'idade, há um passo intermediário ou ponto de transição que é a culpa
: -^sumida do empregador. Sem se desprender da responsabilidade de índole
í-o je tiva , inverte-se o ônus da prova em favor da vítim a, cabendo ao
r~oregador, se for o caso, demonstrar que ocorreu algum fato que possa
: : r ;:ar a pretensão do autor. A presunção de culpa do empregador poderá
ec resentar um ponto de consenso possível ou de trégua entre os defensores
: a teoria do risco e os adeptos da responsabilidade subjetiva. Nessa linha de
'aciocínio, convém reproduzir a lição de Humberto Theodoro:

“Não se trata de dispensar o elemento subjetivo do ato ilícito, mas de


deduzi-lo indiretamente por meio da chamada prova crítica. Aliás, o Código
não joga apenas com as provas históricas e diretas, pois há expressa
previsão legal de que os fatos jurídicos podem ser comprovados, também,
por meio de presunções (art. 212, IV). Desde que os indícios sejam graves,
precisos e convergentes, o convencimento do juiz pode por meio deles
chegar à certeza, com tanta segurança como se o tivesse formado à
base de provas diretas. É o que se faz, na jurisprudência, com bastante
frequência, em tema de apuração da culpa. Se o dano se deu em situação
de anormalidade de conduta, ainda que não se compreenda exatamente
a causa pela qual o agente se portou de forma anômala, é de presumir-
-se, segundo a experiência da vida (isto é, do que comumente acontece),
que não tenham sido observadas as cautelas necessárias para impedir

p 3 Cf. Revista CIPA, São Paulo, Ano XXVIII, n. 329, p. 72, abr. 2007.
224 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

o evento danoso. (...) A presunção de culpa cria uma inversão do ônus


da prova: em lugar de ter o autor da demanda de provar a culpa do réu.
este é que tem de comprovar a ausência de culpa.”(64)
Tem-se falado muito em doutrina processual sobre a teoria moderna da
distribuição dinâmica do ônus da prova, em contraposição ao entendimento
clássico da divisão rígida das cargas probatórias, na forma prevista no art.
333 do CPC. Assinala Moura de Azevedo que “a doutrina contemporânea
vem pugnando pela flexibilização destas regras de distribuição do ônus da
prova, no sentido de permitir ao juiz que, deparando-se com nítido desequilíbrio
das condições probatórias entre as partes, motivadamente, decida por adequar
a regra de distribuição do ônus da prova ao caso concreto, determinando que
este ônus recaia sobre a parte que dispuser das melhores condições de provar
os fatos submetidos a julgamento.”(65) Na mesma linha de pensamento, é
oportuno transcrever a doutrina de Priscilla de Souza Carvalho:

“No campo específico da atividade probatória, a atribuição às partes de


um encargo rígido e im utável não mais condiz com a nova visão
teleológica e instrumentalista do processo, no qual os juizes tendem a
considerar as especificidades de cada caso concreto, na busca pela
tutela justa e efetiva do direito material. (...) Não importa a posição da
parte no processo e, tampouco, a natureza do fato, se constitutivo,
impeditivo, modificativo ou extintivo. O que se objetiva é aferir qual das
partes encontra-se em melhores condições de produzir as provas para
a solução do litígio, tomando-se como base a realidade concreta de cada
processo que é apresentado ao Estado-juiz.”(66)

Mesmo que se aplique a teoria clássica da divisão do ônus da prova,


c o n fo rm e p re v is to no art. 333 do CPC, p o d e-se a rg u m e n ta r que a
demonstração do fato constitutivo da indenização — o dano pessoal causado
pelo acidente ou doença ocupacional — é ônus do empregado, mas cabe ao
em pregador o encargo de provar os fatos im peditivos, m odificativos ou

(64) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. II, p. 106-107.
(65) AZEVEDO , A ntônio Danilo Moura de. A teoria dinâm ica de distribuição do ônus da
prova no direito processual civil brasileiro. Disponível em: < http://jus2.uol.com .br/doutrina/
texto.asp?id=10264>. Acesso em: 30 dez. 2010. Em outra passagem desse texto o autor
comenta: “O juiz poderá m odificar a regra geral para ajustá-la ao caso concreto reduzindo,
na m aior m edida do possível, as desigualdades das partes e, com isso, tentar evitar a
derrota da parte que possivelmente tem o melhor direito, mas que não está em melhores
condições de prová-lo.”
(66) CARVALHO, Priscilla de Souza. A teoria dinâm ica do ônus da prova e sua repercussão
no direito processual do trabalho. In: KOURI, Luiz Ronan Neves; FER N AN DES, Nadia
Soraggi; CARVALHO, Ricardo W agner Rodrigues de (Coord.). Tendências do processo do
trabalho. São Paulo: LTr, 2010. p. 153-154.
; ENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 225

intivos do direito pretendido. Consequentemente, bastaria ao acidentado a


ova do dano sofrido; se o em pregador não com provar quaiquer das
cludentes da responsabilidade civil, defere-se a indenização.

Como pudemos verificar, cresce a tendência da inversão ou modificação


: : ônus da prova em favor da vítima, presumindo-se a culpa do empregador
acidente do trabalho, salvo prova convincente em sentido contrário. Aliás,
■ ocasião da 1§ Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho
izada em Brasília, em novembro de 2007, foi adotado o Enunciado n. 41
:: n o seguinte teor: “Responsabilidade civil. Acidente do trabalho. Ônus
za prova. Cabe a inversão do ônus da prova em favor da vítima nas ações
' t enizatórias por acidente do trabalho.”

Na mesma linha de entendimento, foi aprovada uma tese por ocasião do


: 7 Congresso Nacional de Magistrados da Justiça do Trabalho, realizado
em Manaus, em maio de 2008, com o teor seguinte: “Nas ações indenizatórias
p: • acidente de trabalho, cabe a inversão do ônus da prova em favor da vítima.
3 9sume-se a culpa do empregador, admitindo-se, no entanto, prova em
sentido contrário.”

O avanço doutrinário já vem produzindo repercussões na jurisprudência,


tento que em diversos julgamentos, proferidos por tribunais diferentes, pode-
-se constatar a tendência da inversão do ônus da prova em favor do acidentado:
“Recurso de Revista. Doença ocupacional. Tendinopatia do supraespinhoso. LER/
DORT. Atividade na linha de produção em fábrica de tubos. Culpa presumida.
Ônus da prova do em pregador relativam ente aos deveres anexos ao contrato de
trab alh o ligados à m edicina, seg urança e saú de do trab alh ad o r. O pleito de
indenização por dano moral e material resultante de acidente do trabalho e/ou doença
profissional ou ocupacional supõe a presença de três requisitos: a) ocorrência do fato
deflagrador do dano ou do próprio dano, que se constata pelo fato da doença ou do
acidente, os quais, por si só, agridem o patrim ônio moral e em ocional da pessoa
trabalhadora (nesse sentido, o dano moral, em tais casos, verifica-se in re ipsa)\ b)
nexo causal, que se evidencia pela circunstância de o m alefício ter ocorrido em face
das circunstâncias laborativas; c) culpa empresarial, a qual se presume em face das
circunstâncias ambientais adversas que deram origem ao malefício. Embora não se
possa presum ir a culpa em diversos casos de dano moral — em que a culpa tem de
ser provada pelo autor da ação — , tratando-se de doença ocupacional, profissional
ou de acidente do trabalho, essa culpa é presumida, em virtude de o em pregador ter
o controle e a direção sobre a estrutura, a dinâm ica, a gestão e a operação do
estabelecim ento em que ocorreu o malefício. Pontue-se que tanto a higidez física
como a mental, inclusive emocional, do ser humano são bens fundam entais de sua
vida, privada e pública, de sua intimidade, de sua autoestim a e afirm ação social e,
nesta m edida, tam bém de sua honra. São bens, portanto, in q u estio n a ve lm e n te
tutelados, regra geral, pela Constituição (art. 5-, V e X). Assim, agredidos em face de
circunstâncias laborativas, passam a merecer tutela ainda mais forte e específica da
Carta Magna, que se agrega à genérica anterior (art. 1-, XXVIII, CF/88). Registre-se
que é do em pregador, evidentem ente, a responsabilidade pelas indenizações por
dano moral, material ou estético decorrentes de lesões vinculadas à infortunística do
226 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

trabalho. Na hipótese, o Tribunal Regional consignou expressam ente que a perícia


técnica constatou que a doença da qual a Reclamante é portadora (tendinopatia do
supraespinhoso) decorreu das atividades desenvolvidas na em presa (na linha de
produção de fábrica — setor de form atação de tubos laminados para medicamentos e
creme dental com atividades de inspeção dos tubos e encaixotamento). Contudo, o
R egional excluiu da condenação as indenizações por danos m ateriais e morais,
assentando que não teria prova de que a Reclamada cometera ato ilícito. Vale dizer
que adotou a tese de que caberia à Reclamante o ônus de provar a culpa ou dolo da
Reclamada pelo descumprimento das normas de segurança e m edicina do trabalho.
No entanto, considerando-se que o empregador tem o controle e a direção sobre a
estrutura, a dinâmica, a gestão e a operação do estabelecim ento em que ocorreu o
malefício, desponta a prem issa da culpa presum ida da Reclamada. Recurso de Revista
conhecido e parcialm ente provido.” TST. 3- Turma. RR n. 57300-79.2006.5.02.0372.
Rei. Ministro Maurício Godinho Delgado, DJ 19 out. 2012.

“Recurso de revista, indenização decorrente de acidente de trabalho. Atividade e


risco. Culpa presumida. É da teoria do risco da atividade econômica, por força do art.
2® da CLT, que se extrai a responsabilidade do empregador, quando do trabalho e do
risco a ele inerente o empregado se coloca na situação de sofrer danos, apenas por
executar a sua obrigação contratual. É incontroverso nos autos que o em pregado
sofreu acidente de trabalho a serviço da reclamada, enquanto realizava a retirada de
uma chapa de aço, cujo peso ultrapassava os 60 quilos. Verificado que a atividade
desem penhada pelo reclam ante era de risco, diante da possibilidade eminente de
sofrer dano à sua incolum idade física, a regra geral é de presunção de culpa. A
atividade do empregado, em sendo de risco, determina o dever de reparar, por força
da incidência do art. 927, parágrafo único, do CC c/c art. 2S da CLT. Recurso de revista
conhecido e provido.” TST. 6a Turma. RR n. 60400-37.2009.5.04.0451, Rei.: Ministro
Aloysio Corrêa da Veiga, DJ 20 abr. 2012.

“ R ecurso de revista. A cid ente de trab alh o . Ind en ização por danos m orais e
m a te ria is . Em que pese o T rib u n a l R egional te r d e s e n v o lv id o te se a ce rca da
re spo nsa bilida d e objetiva, subsiste, nos te rm o s do acórdão, a re sp o nsabilidade
subjetiva, considerando-se a aplicação, ao caso, da teoria da culpa presumida, pela
qual se inverte o ônus probatório em razão do princípio da aptidão para a prova, já
que é do em pregador a obrigação de tornar disponível a docum entação relativa à
segurança do trabalho. No caso, o R egional registrou que — ficou devidam ente
demonstrado, através do laudo pericial, a existência do nexo causal entre a doença
de que é acometido o reclamante e o trabalho exercido na reclamada. E, conforme se
depreende do acórdão do Regional, analisando as atividades desem penhadas pelo
reclamante, verifica-se que a reclam ada não providenciou o meio ambiente laboral
ade q u a d o , d e ix a n d o de fis c a liz a r se as norm as de s e g u ra n ç a esta va m sendo
cum pridas eficazm ente — dever inafastável da empregadora. Sendo im possível ao
empregado a produção de prova, deve-se adequar a apuração da culpa, por meio da
inversão do ônus da prova, por ser mais fácil ao empregador comprovar sua conduta
quanto ao fornecim ento de segurança, afastando sua culpa no evento danoso. Não
tendo, pois, se desincum bido do ônus que lhe com petia, presum e-se a culpa e o
conseqüente dever de indenizar. Assim, estando comprovados os pressupostos para a
re sp onsabiliza çã o do em p re g ad o r por a cidente do tra b a lh o , ou seja, o nexo de
causalidade entre a moléstia do trabalhador e as atividades por ele desenvolvidas na
empresa, bem como a culpa da empregadora, é seu dever indenizar os prejuízos sofridos
pelo empregado. Recurso de revista de que não se conhece.” TST. 6a Turma. RR n.
79301-77.2004.5.15.0045, Rei.: Ministra Kátia Magalhães Arruda, DJ 24 ago. 2012.
j»c e ‘ , z a ç õ e s p o r A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 227

" In d e n iz a ç õ e s p o r d a n o s m o ra is . A c id e n te do tra b a lh o . Na a p u ra ç ã o da
responsabilidade civil em decorrência do acidente de trabalho, o ônus da prova recai
sobre o e m p re g ad o r, que de ve c o m p ro v a r a in e x is tê n c ia da co n d u ta cu lp o sa.
Entretanto, não se desonerando do encargo que milita em seu desfavor, presume-se
a culpa, surgindo o conseqüente dever de indenizar o trabalhador pelo prejuízo sofrido.
Recurso de Revista não conhecido.” TST. 3a Turma. RR n. 84.813/2003-900-03-00.2,
Rei.: Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ 15 set. 2006.

'Princípio da aptidão para a prova. Om issão da reclamada em trazer as provas


em seu poder. A inversão do ônus probatório, com apoio no princípio da aptidão para
a prova, não está condicionada à existência de determinação judicial para a exibição
de docum ento e recusa injustificada ao seu cum prim ento. O Princípio da Aptidão
informa que se deve atribuir o ônus de fornecer a prova à parte que se apresentar
mais apta para produzi-la. O critério será o da proximidade real e o da facilidade de
acesso aos meios de prova. Somente dessa form a a distribuição do ônus da prova se
revelará um instrumento condizente com o escopo do processo, que não é a simples
composição, mas a justa composição da lide. Por isso, o ônus probatório deve recair
sobre a parte que melhor possa contribuir para que a convicção do juiz coincida com
a verdade. Esse prin cíp io e ncontra fu n d a m e n to na ju s tiç a d istrib u tiva a liada ao
princípio da igualdade, cabendo a cada parte aquilo que norm alm ente lhe resulta
mais fácil. Funda-se tam bém nos princípios da boa-fé e lealdade processual que
regem a conduta dos litigantes, e lhes impõe o dever de conjugar esforços com o
Estado no processo para solucionar o litígio, cooperando e trazendo aos autos as
provas que estão em seu poder independentemente de haver ou não determinação
judicial expressa nesse sentido. Diante desse entendimento, tem -se que a conduta
da Reclamada, que deixou de trazer os cartões de ponto, justifica a inversão do ônus
probatório e a presunção de veracidade do horário de trabalho declinado na petição
inicial, ainda que não tenha havido determ inação judicial expressa para a juntada de
qualquer docum ento, em face do princípio da aptidão para a prova. Em bargos de
D eclaração re je ita d o s.” TST. 5 a Turm a. EDRR n. 7 3 .6 4 7 /2 0 0 3 -9 0 0 -0 2 .0 0 .4 , Rei.
Ministro Rider de Brito, DJ 12 mar. 2004.
CAPÍTULO 8

DANOS DECORRENTES DO
ACIDENTE DO TRABALHO

8.1. O dano como pressuposto da indenização

Neste capítulo vamos tratar das modalidades de danos ou prejuízos que


o acidente do trabalho pode provocar. Já o tem a da quantificação ou
mensuração desses danos para fins indenizatórios, nas diversas hipóteses
dos infortúnios laborais, será abordado nos Capítulos 9 e 10.

No âmbito da responsabilidade civil, a constatação de que a vítima tenha


sofrido algum tipo de dano é pressuposto indispensável para o cabimento da
indenização. Daí afirmar Caio Mário que o dano é o elemento ou requisito
essencial na etiologia da responsabilidade civil(1). Pode ocorrer a hipótese de
indenização sem culpa, como nos casos de responsabilidade objetiva, mas
não há possibilidade de se acolher qualquer pedido de reparação quando não
houver dano caracterizado®.
Aliás, etimologicamente, o vocábulo indenização significa tornar indene(3),
ou seja, tornar íntegro, incólume, ileso, restaurado. Se não há prejuízo ou lesão,
logicamente não há o que reparar; em termos mais singelos, seria como pretender
consertar o que não foi danificado. Afirma Rui Stoco: “se não houver prova do
dano, falta fundamento para a indenização. Não se admite o dano incerto,
improvável ou eventual, o dano condicional e nem mesmo o dano hipotético.”(4)

(1) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. 8â t. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 37.
(2) Mesmo nos casos de assédio moral ou sexual, ainda que não haja adoecim ento da
vítima, também ocorre um dano, porém mais encoberto e subjetivo, como o constrangimento,
o desconforto, o mal-estar, o desrespeito e a humilhação. Na expressão lapidar do jurista
Adriano de Cupis, “tudo que o direito tutela, o dano vulnera”.
(3) O Dicionário Houaiss anota sobre o vocábulo indene: 1. que não sofreu perda, dano;
livre de prejuízo 2. que não foi atingido na sua integridade física; são e salvo 3. que se
indenizou, se ressarciu; com pensado, indenizado, rem unerado. ETIM. Lat. Indem nis que
não teve prejuízo, livre de perda, de dano. De fato, o prefixo de negação latino in mais o
radical dan, do latim damnum dá mesmo um sentido de tornar sem danos.
(4) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1395.
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 229

O conceito de dano abrange qualquer lesão a um bem tutelado pelo Direito,


aue tanto pode ser patrimonial, moral ou estético. O Enunciado 456, aprovado
:o r ocasião da V Jornada de Direito Civil, realizada em 2011, registra o
entendimento doutrinário atual sobre a amplitude do conceito de dano: “Art.
944. A expressão ‘dano’ no art. 944 abrange não só os danos individuais,
~iateriais ou imateriais, mas também os danos sociais, difusos, coletivos e
ndividuais homogêneos a serem reclamados pelos legitimados para propor
ações coletivas.”

Prevê o art. 2.101 dos Princípios de Direito Europeu da responsabilidade


civil que “o dano consiste numa lesão material ou imaterial a um interesse
-ridicamente protegido.” Para Enneccerus, dano é toda desvantagem que
experimentamos em nossos bens jurídicos, como o patrimônio, corpo, vida,
saúde, honra, crédito, bem-estar, capacidade de aquisição etc.(5)

O comportamento ilícito isoladamente não produz efeitos no âmbito da


•esponsabilidade civil, haja vista que para se obter a indenização será
•nprescindível comprovar que houve também a lesão de algum direito da
vítima. A redação do art. 186 do Código Civil exige a concomitância dos dois
'equisitos: violar direito e causar dano a outrem. “O ato ilícito nunca será
aquilo que os penalistas chamam de crime de mera conduta; será sempre um
aelito material, com resultado de dano.”(6)

O enfoque dessa questão é diferente nos aspectos trabalhista, criminal


e da responsabilidade civil, uma vez que naquele a sim ples ilicitude já
code gerar a penalidade, como, por exemplo, se a fiscalização do Ministério
ao Trabalho encontrar um empregado em local ruidoso, sem a utilização do
'espectivo equipamento de proteção individual (protetor auricular), poderá
"lultar o empregador pela conduta ilegal. Da mesma forma, se o empregador
expõe a vida ou a saúde do trabalhador a perigo direto e iminente pode ser
enquadrado, só por essa conduta, no crime previsto no art. 132 do Código
°enal(7). Apesar dessas ilegalidades flagrantes, o trabalhador só terá direito à
ndenização se demonstrar que sofreu algum dano ou prejuízo. A indenização,
:ortanto, não tem natureza de pena no sentido estrito, mas de ressarcimento,
compensação ou reparação.

5) Apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 475.
5) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Com entários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 94.
(7) Código Penal: “Art. 132 — Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente:
3ena — detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crim e mais grave,
^arágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da
saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços
em estabelecim entos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais.”
230 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

8.2. Quando o acidente provoca danos

Para o deferimento das indenizações ao acidentado será necessário


conferir se estão presentes todos os pressupostos da responsabilidade civil,
quais sejam: o dano, o nexo causal e a culpa do empregador. Se prevalecer
a teoria da responsabilidade objetiva abordada no Capítulo 5, a comprovação
do dano e do nexo causal já será suficiente para a condenação.

Todavia, não é todo acidente do trabalho que gera o direito à indeniza­


ção, ainda que perfeitamente caracterizados o nexo causal e a culpa do em­
pregador. O ressarcimento só ocorrerá se o acidente causar algum tipo de
dano ao empregado, que tanto pode ser material, moral, estético ou qualquer
outro prejuízo. Mesmo não detalhando todas as espécies de danos, o Código
Civil reserva espaço para incluir outras reparações ou algum outro prejuízo
que o ofendido prove haver sofrido, ou seja, se ficar demonstrado qualquer
dano juridicamente considerável, causado pelo acidente, pode ser cabível o
deferimento da indenização correspondente.

É indiscutível que os acidentes fatais, a invalidez, a perda parcial da


capacidade de trabalho ou o afastam ento prolongado provocam danos
reparáveis. É fácil também perceber o dano quando o empregado sofre alguma
lesão estética, mesmo que isso não prejudique sua capacidade de trabalho,
como, por exemplo, a perda parcial de uma orelha. Nessas hipóteses, se os
demais pressupostos estiverem presentes, a indenização será devida.
Mas ocorrem acidentes do trabalho m enores que não provocam
afastamentos, nem deixam evidências de danos e, portanto, não acarretam
indenização, como, por exemplo, uma pequena queda, uma torção ou um corte
superficial que, após simples atendimento ambulatorial na própria empresa,
propicia o retorno do empregado para suas atividades normais, sem outros
comprometimentos.

Poder-se-ia objetar que o art. 7Q, XXVIII, da Constituição da República,


determina a indenização para todo acidente do trabalho, porque não fez
distinção alguma, não podendo o intérprete fazê-la. Esse argumento, todavia,
não vinga porque é incabível determinar a reparação quando não existe
prejuízo. É certo que o acidente de pouca gravidade ainda assim pode causar
algum desconforto, aborrecimento ou mesmo afetar o bem-estar da vítima,
mas o dano, teoricamente existente, é tão diminuto que torna praticamente
inviável sua mensuração para fins reparatórios. Nem o acidentado tem interesse
real em postular reparação de valores insignificantes.

A questão da existência ou não dos danos fica mais complexa nos


acidentes de gravidade intermediária, que geram incapacidade temporária para
o trabalho. Nos primeiros quinze dias de afastamento o acidentado recebe do
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 231

empregador o seu salário integrai, período em que o contrato de trabalho fica


apenas interrompido<8). Entretanto, até nos afastamentos de poucos dias
coderá haver danos materiais indenizáveis, tais como despesas hospitalares,
riedicam entos, tratamentos diversos ou danos morais pela gravidade ou
'epercussão do acidente no equilíbrio psicofísico da vítima. Após os quinze
rias de afastamento, permanecendo a incapacidade, o contrato de trabalho
fica suspenso e o acidentado passa a receber auxílio-doença acidentário da
°revidência Social, tornando mais visíveis os danos ou prejuízos, tanto
-nateriais quanto morais pelo afastamento do trabalho.
Vale ressaltar que a identificação ou não dos danos indenizáveis
dependerá sempre da análise casuística, com todas as variáveis, agravantes
ou atenuantes do caso concreto. Voltaremos ao assunto nos Capítulos 9 e
" 0, quando trataremos das diversas hipóteses de quantificação dos danos
decorrentes dos acidentes do trabalho.

8.3. Dano material

8.3.1. Abrangência

O acidente do trabalho ou as situações equiparáveis podem provocar,


orincipalmente, danos de natureza material, moral ou estética. Neste tópico
/amos abordar apenas os danos materiais, também denominados danos
Datrimoniais.

O dano material é o prejuízo financeiro efetivo sofrido pela vítima,


causando por consequência uma diminuição do seu patrimônio, avaliável
-lonetariamente. “O dinheiro é a forma e o padrão natural de dimensioná-lo e
o instrumento idôneo para bem repará-lo.”(9) Enfatiza Maria Helena Diniz que
o dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que afeta um interesse relativo
ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial,
dos bens m ateriais que lhe pertencem , sendo suscetível de avaliação
pecuniária e de indenização pelo responsável(10).

O Código Civil estabelece no art. 402 que o ressarcimento dos danos


abrange parcelas de duas naturezas: o que efetivamente o lesado perdeu e o que

|8) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991. Art. 60, § 3a. “Durante os primeiros quinze dias consecutivos
ao do afastam ento da atividade por m otivo de doença, incum birá à em presa pagar ao
segurado empregado o seu salário integral.”
(9) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Com entários ao novo C ódigo Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. 2, p. 36.
10) DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. ed. São
Paula: Saraiva, 2007. v. 7, p. 66.
232 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

razoavelmente deixou de ganhar. Na apuração do que a vítima efetivamente


perdeu obteremos os chamados danos emergentes ou danos positivos; na
avaliação do que deixou de ganhar estaremos diante dos lucros cessantes
ou danos negativos. Como assevera Agostinho Alvim, pode-se dizer que o
dano ora produz o efeito de diminuir o patrimônio do credor, ora o de impedir-
-Ihe o aumento, ou o acrescentamento, pela cessação de lucros, que poderia
esperar(11).

O acidente do trabalho e as doenças ocupacionais podem provocar tanto


os danos emergentes, acarretando diminuição do patrimônio, quanto os lucros
cessantes, como veremos nos tópicos seguintes.

8.3.2. Dano emergente

O dano emergente é aquele prejuízo imediato e mensurável que surge


em razão do acidente do trabalho, causando uma diminuição no patrimônio
do acidentado. É o prejuízo mais visível porque representa dispêndios
necessários e concretos cujos valores são apuráveis nos próprios documentos
de pagam ento, tais como: despesas hospitalares, honorários médicos,
medicamentos, aparelhos ortopédicos, sessões de fisioterapia, salários para
acompanhantes no caso de a vítima necessitar de assistência permanente
de outra pessoa ou, nos casos de óbito, os gastos com funeral, luto, jazigo,
remoção do corpo etc.

Os arts. 948 e 950 do Código Civil mencionam as despesas de tratamento


até o fim da convalescença ou os desembolsos com o funeral e o luto da
família, mas asseguram que também são indenizáveis outras reparações ou
prejuízos que o ofendido prove haver sofrido. Assim, cabe à vítima ou a seus
dependentes relacionar, para fins de ressarcimento, qualquer outra despesa
efetiva que o acidente tenha gerado, para obter a recomposição integral do
patrimônio anterior ao evento, dentro do princípio da restitutio in integrum ou
da restauração do status quo ante. Isso porque a ideia central da indenização
está estruturada no propósito de recomposição do patrimônio do acidentado
ao mesmo patamar existente antes do acidente, pela lógica da equivalência
matemática(12).

(11) ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências. 4. ed. atual.
São Paulo: Saraiva, 1972. p. 173.
(12) O art. 10:101 dos P rincípios de D ireito Europeu da re sp o n sa b ilid a d e civil, antes
mencionados, estabelece: “A indenização consiste numa prestação pecuniária com vista a
com pensar o lesado, isto é, a repor o lesado, na medida em que o dinheiro o permita, na
posição em que ele estaria se a lesão não tivesse ocorrido.”
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 233

3.3.3. Lucro cessante

Além das perdas efetivas dos danos emergentes, a vítima pode também
; car privada dos ganhos futuros, ainda que temporariamente. Para que a
'eparação do prejuízo seja completa, o art. 402 do Código Civil determina o
cômputo dos lucros cessantes, considerando-se como tais aquelas parcelas
cujo recebim ento, dentro da razoabilidade, seria correto esperar. Em
decorrência desse comando, não deve ser considerada a mera probabilidade
de alguma renda, nem se exige, por outro lado, certeza absoluta dos ganhos.
O critério de razoabilidade expresso na lei indica que a apuração deverá
ser norteada pelo bom-senso e pela expectativa daquilo que ordinariamente
acontece(13). Com apoio nessa diretriz, é correto prever que o acidentado
continuaria no emprego, recebendo os seus salários normais com as devidas
correções alcançadas pela categoria profissional. É verdade que esse
empregado poderia vir a ser promovido recebendo salários mais elevados,
nas também seria possível imaginar que poderia ficar desempregado ou ser
vítima de alguma doença grave. Para fugir dessas cogitações que estão no
mundo do imponderável deve o intérprete procurar sustentação em dados
mais concretos e dentro da razoabilidade.
Pontua Agostinho Alvim que deve ser admitido que “o credor haveria de
íucrar aquilo que o bom-senso diz que lucraria. Há aí uma presunção de que
os fatos se desenrolariam dentro do seu curso normal, tendo-se em vista os
antecedentes.”(14) Assim, se a empresa tiver um plano de cargos e salários
prevendo promoção automática por antiguidade, o valor da indenização deverá
considerar essa hipótese, diante da razoável certeza do fato. Se a vítima que
se tornou inválida, por exemplo, tiver sido, anteriormente, aprovada em um
concurso público, a partir do momento em que for nomeado o candidato que
figure em seguida à sua classificação, o valor dos lucros cessantes deverá
contemplar os vencimentos que ela teria no cargo público.
No caso do acidente do trabalho, após os primeiros quinze dias, o
empregado ficará privado dos salários e demais vantagens, que é o caso
típico dos lucros cessantes. Convém enfatizar que o valor pago pela
Previdência Social a título de auxílio-doença acidentário não serve para repor
ou mesmo compensar parcialmente os lucros cessantes, conforme anotamos
no Capítulo 4, item 4.4.

(13) O Código Civil alemão tem dispositivo na linha desse entendimento, no § 252: “Tem-se
por frustrado o lucro que certas probabilidades induzissem a esperar, atendendo ao curso
normal dos acontecimentos ou às especiais circunstâncias do caso concreto e, particularmente,
às providências e medidas postas em prática." Cf. ALVIM, Agostinho. Da inexecução das
obrigações e suas conseqüências. 4. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1972. p. 190.
114) ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências. 4. ed. atual.
São Paulo: Saraiva, 1972. p. 189.
234 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Também neste ponto cabe a advertência iançada no item anterior, pois


são indenizáveis outras reparações ou prejuízos que o ofendido prove haver
sofrido, conforme previsto nos arts. 948 e 949 do Código Civil. Desse modo,
pode ocorrer a hipótese de a vítima ter um segundo emprego ou exercer
habitualmente outras atividades remuneradas e em razão do acidente ficar
impedida de auferir os rendimentos respectivos, o que também caracteriza
prejuízo indenizável. De qualquer forma, será necessário comprovar que os
danos têm relação de causalidade direta e imediata com o infortúnio laboral,
conforme prevê o art. 403 do Código Civi!(15).

A recom endação de Sérgio Cavalieri é oportuna para constatar a


extensão dos lucros cessantes: “Deve o juiz mentalmente eliminar o ato ilícito
e indagar se aquilo que está sendo pleiteado a título de lucro cessante seria a
consequência do normal desenrolar dos fatos; se aquele lucro poderia ser
razoavelmente esperado, caso não tivesse ocorrido o ato ilícito.”(16)

8.4. Dano moral

8.4.1. Evolução e abrangência

O dano moral propriamente dito sempre existiu, mas a possibilidade de


sua indenização foi conquista do progresso da civilização. Havia certo
em baraço ou m esmo constrangim ento em aceitar a com pensação de
sofrimentos, dores ou angústias por valores monetários, chegando-se até a
dizer, paradoxalmente, que era imoral postular a indenização por dano moral.
Contudo, não se pode mais ignorar o abalo moral provocado pelo ato ilícito,
que, em muitas ocasiões, tem maior relevo ou repercussão do que o prejuízo
material.
O primeiro pensamento que surge, quando se fala em indenização, está
ligado a efeitos patrimoniais, mensuráveis financeiramente. Atualmente, porém,
o Direito avança para proteger não somente os nossos bens, mas os valores
imateriais da personalidade, ou seja, além de proteger o que temos, resguarda
e valoriza o que somos. O professor Athos Gusmão Carneiro, quando atuava
como Ministro do STJ, defendendo o cabimento da indenização do dano moral
puro, enfatizou com propriedade:

(15) Código Civil. Art. 403. “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas
e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e
imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.”
(16) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 80.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 235

“Não posso conceber ó que o amassamento da porta de um automóvel


seja indenizado, e que a imensa dor causada pelo falecimento de um
ente querido não encontre nenhuma forma adequada de ressarcimento.
É claro que o problema surgido é o de encontrar um parâmetro pecuniário
para compensar a dor moral; mas maior injustiça será deixar essa dor
moral sem nenhuma forma de compensação, ainda que compensação
tão imperfeita como aquela realizada em dinheiro.”(17)

O reconhecimento do direito à indenização do dano moral passou por


íongo período de m aturação no Brasil. A rigor, havia mais resistência
oreconceituosa do que fundamento jurídico para negar esse direito. O art.
'5 9 do Código Civil de 1916 estabelecia a obrigação de reparar o dano, sem
distinguir entre o prejuízo material ou moral. O art. 76 do referido Código
asseverava que, para propor, ou contestar uma ação, era necessário ter
iegítimo interesse econômico, ou moral.(18)

Ora, se o Direito busca constantemente a entronização do que é justo, é


natural que as normas jurídicas e a jurisprudência, sintonizadas com a dinâmica
da vida, absorvam aquilo que a consciência social já elegeu como normal, ou
que repudia como intolerável(19). No dizer de José Jairo Gomes, o sistema
urídico “é uma realidade viva, encontrando-se em permanente movimento
ascendente. O permanente intercâmbio entre o sistema jurídico e a realidade
cultural circundante, permitido pela abertura e vaguidão da linguagem jurídica,
em particular a constitucional, enseja que a cada passo velhas formulações e
concepções sejam negadas e superadas, chegando-se a novas soluções,
mais consentâneas com as necessidades do tempo presente.”(20)

17) Cf. Voto proferido no STJ. 4- T. Recurso Especial n. 1.723-RJ. Rei.: Ministro Barros
Monteiro, DJ 2 abr. 1990.
18) Comentando esse artigo, Clovis Beviláqua foi enfático: “Se o interesse moral justifica a
acção para defendel-o ou restaurai-o, é claro que tal interesse é indemnizavel, ainda que o
oem moral não se exprima em dinheiro. É por uma necessidade dos nossos meios humanos,
sempre insufficientes, e, não raro, grosseiros, que o Direito se vê forçado a acceitar que se
computem em dinheiro o interesse de affeição e outros interesses moraes.” Cf. Código Civil
dos Estados Unidos do Brasil comentado. 4. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1939. v. 1,
p. 313.
119) “Os padrões de moralidade, consubstanciados na honestidade, integridade e dignidade,
são indicativos de civilização. Os grupos sociais somente conseguem manter-se coesos na
medida em que esses valores encontram -se presentes nos indivíduos e nos agrupamentos
humanos. A desagregação da vida grupai advém da violência e ausência de valores morais
que enobrecem e destacam os sentimentos do espírito. O homem sem valores é o pior dos
animais, pois, com seu espírito antivirtude, ele concorre para a destruição dos padrões de
moralidade, que constitui um acervo da civilização” . Cf. REIS, Clayton. Dano moral. 4. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 136.
(20) GOMES, José Jairo. Responsabilidade civil e eticidade. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.
p. 56.
236 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

As resistências contra a reparação pelo dano moral praticam ente


restaram superadas com o advento da Constituição da República de 1988,
que expressamente admitiu o cabimento da indenização decorrente da sua
violação nos incisos V e X do art. 52. O civilista Caio Mário, discorrendo a
respeito da indenização por dano moral, concluiu:
“Com as duas disposições contidas na Constituição de 1988 o princípio
da reparação do dano moral encontrou o batismo que o inseriu em a
canonicidade de nosso direito positivo. Agora, pela palavra mais firme e
mais alta da norma constitucional, tornou-se princípio de natureza cogente
o que estabelece a reparação por dano moral em o nosso direito.
Obrigatório para o legislador e para o juiz.”(21)
Na seqüência, o Código Civil de 2002 acolheu expressamente o dano
moral quando estabeleceu no art. 186: “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Esse dispositivo legal
completa o ciclo de positivação do direito à indenização pelo dano moral no
nosso ordenamento jurídico, suplantando de vez os argumentos daqueles
que ainda resistiam ao seu reconhecimento122'.
O amplo território do dano moral, as sutilezas do seu conteúdo e a
progressividade da sua abrangência dificultam a formulação de um conceito
que possa englobar todas as hipóteses que o caracterizam. Como bem
assinala André Gustavo Andrade, o dano moral é um conceito em construção
e, com o desenvolvimento social e a conseqüente evolução dos direitos da
personalidade, tende a ser ampliado para alcançar situações hoje ainda não
consideradas*23*. Entrementes, como se trata de “um conceito em construção”,
é conveniente registrar o pensamento corrente a respeito da sua abrangência.
Para R oberto F erreira, os bens m orais consiste m no e q u ilíb rio
psicológico, no bem-estar, na normalidade da vida, na reputação, na liberdade,
no relacionam ento social, e a sua danificação resulta em desequilíbrio
psicológico, desânimo, dor, medo, angústia, abatimento, baixa da consideração
à pessoa, dificuldade de relacionamento social(24). Aguiar Dias, citando Minozzi,

(21) PEREIRA, Caio M ário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. 8ã t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 58.
(22) Enfatiza Yussef Cahali a respeito do dano moral que “o instituto atinge agora a sua
m aturidade e afirm a a sua relevância, esm aecida de vez a relutância daqueles ju ize s e
doutrinadores então vinculados ao equivocado preconceito de não ser possível compensar
a dor moral com dinheiro.” Dano moral. 3. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 19.
(23) ANDRADE, Gustavo C. de. A evolução do conceito de dano moral. Revista da AJURIS,
Porto Alegre, v. XXX, n. 92, p. 139, dez. 2003.
(24) FERREIRA, Roberto Schaan. O dano e o tempo: responsabilidade civil. Revista Estudos
Jurídicos, São Leopoldo, v. 25, n. 64, p. 70, jan./abr. 1992.
friDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 237

assevera que o dano moral “não é o dinheiro nem coisa comercialmente


-eduzida a dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria
física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa,
atribuída à palavra dor o mais largo significado.”(25)

Já Yussef Said Cahali entende que “tudo aquilo que molesta gravemente
a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à
sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado,
cualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los
exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na
:'isteza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na des­
consideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no
devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos
:raumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas si-
:jações de constrangimento moral.”(26)
Em sintonia com os conceitos acima, no julgamento da Apelação Cível
n. 38.191-7, a 1- Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Paraná, em 10 de
setembro de 1991, tendo como relator o Juiz Celso Araújo Guimarães, anotou
nos fundamentos do acórdão:

“E induvidoso é também que a morte de um chefe de família repercute


como dano moral no seio da mesma, pela profunda dor que causa à
esposa e filhos, com reflexos no próprio modo de vida desta; desestrutura-
se a família que deixa de ter, no seu dia a dia, o bem-estar do convívio
do marido e pai, fazendo cessar o sentimento de normalidade de uma
vida estruturada, plena de m om entos felizes de convívio fam iliar;
despencam-se os planos futuros, e essa situação, certamente, projeta-
-se no tempo, por vezes até durante toda a vida dos membros da família
(...). A reparação pelo dano moral deve constituir-se de uma soma em
dinheiro aos beneficiários, que lhes mitigue a dor ou o sofrimento, pela
possibilidade de, com tal recurso, ter um maior conforto material, ou uma
oportunidade de uma atividade de lazer, (como uma viagem, v.g.), ou
a oportunidade de se custear determinado curso aos filhos da vítima em
prol de sua form ação etc. Enfim, que lhes proporcione qualquer
satisfação, seja de ordem moral, intelectual ou mesmo material, que possa
contribuir para a mitigação da dor e do sofrimento...”

Em período mais recente, asseveram os festejados juristas Pablo Stolze


e Rodolfo Pamplona que “o dano moral consiste na lesão de direitos cujo

(25) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. 2, p. 730.
(26) CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 3. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 22-23.
238 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro. Em


outras palavras, podemos afirmar que o dano moral é aquele que lesiona a
esfera personalíssima da pessoa (seus direitos da personalidade), violando,
por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e imagem, bens jurídicos
tutelados constitucionalmente.”(27)

Não resta dúvida, portanto, que o ato ilícito ou antijurídico pode provocar
da n o s m a te ria is e dan os m o ra is, ou seja, d a n o s p a trim o n ia is e
extrapatrimoniais. E o dispositivo constitucional já citado deixou patente que
a sanção do dano moral ocorre por intermédio da indenização(28).

8.4.2. Fundamentos constitucionais do dano moral

Pelo art. 5Q, V, da Constituição da República de 1988 foi assegurado o


direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano
material, moral ou à imagem. Também prevê o inciso X do referido artigo que
são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação.
O suporte principal desses dois dispositivos encontra-se na dignidade
da pessoa humana, que constitui um dos fundamentos da República, conforme
indicado expressamente no art. 1e da Constituição de 1988. O destaque da
dignidade como valor supremo do constitucionalismo contemporâneo ampliou
o conceito do direito à vida; ou seja, a Constituição não só protege o direito à
vida, mas pretende assegurar o direito de viver com dignidade.
Enfatiza Romita que “a dignidade da pessoa hum ana atua como
fundamento do princípio estruturante do Estado Democrático de Direito e, em
consequência, impregna a totalidade da ordem jurídica, espraia-se por todos
os ramos do direito positivo e inspira não só a atividade legislativa como
também a atuação do Poder Judiciário.” (29) Nessa mesma direção vale
citar também a lição da constitucionalista Cármen Lúcia Antunes Rocha, atual
Ministra do STF;
“A constitucionalização do princípio da dignidade da pessoa humana
modifica, em sua raiz, toda a construção jurídica: ele impregna toda a

(27) GAGLIANO, Pablo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 5. ed. rev.
e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. III: Responsabilidade civil, p. 55.
(28) Convém registrar, en passant, que há questionam entos doutrinários sobre o acerto da
s o lu ç ã o e n c o n tra d a p o rq u e , p a ra d o x a lm e n te , e s ta b e le c e a re p a ra ç ã o do d a n o
extrapatrimonial com bens de caráter patrimonial. Daí a dificuldade de avaliar com o rigor
monetário valores morais de certa form a imensuráveis.
(29) ROMITA, Arion Sayão. Direitos fundam entais nas relações de trabalho. 2. ed. rev. e
aum. São Paulo: LTr, 2007. p. 267.
n iz a ç ô e s p o r A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 239

elaboração do Direito, porque ele é o elemento fundante da ordem


constitucionalizada e posta na base do sistema. Logo, a dignidade da
pessoa humana é princípio havido como superprincípio constitucional,
aquele no qual se fundam todas as escolhas políticas estratificadas no
modelo de Direito plasmado na formulação textual da Constituição.”(30)

No estudo do dano moral decorrente do acidente do trabalho, não se


pode perder de vista que a República Federativa do Brasil constitui-se em
Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos, dentre outros, a
: anidade da pessoa humana e o valor social do trabalho. Além disso, a ordem
a-aonômica deve estar apoiada na valorização do trabalho (art. 170), a
□ 'dem social terá como base o primado do trabalho (art. 193) e constitui
: : etivo fundamental da República construir uma sociedade livre, justa e
idária (art. 32, I). O princípio constitucional de que a saúde é direito de
::o s e dever do Estado (art. 196), adaptado para o campo do Direito do
“ -abalho, indica que a saúde é direito do trabalhador e dever do empregador,
-ara isso, a Constituição garantiu no art. 7S, XXII, a redução dos riscos
■arentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.

Esses princípios fundamentais, entalhados para total visibilidade no alto


da hierarquia constitucional, devem estar no ponto de partida de qualquer
análise a respeito das normas de proteção à vida e à saúde dos trabalhadores
a. consequentemente, da indenização por danos morais decorrentes dos
acidentes do trabalho. No dizer de José Jairo Gomes, a Constituição não é
^ais uma norma inserta no sistema jurídico, à qual as demais normas devem
:eder o passo. Ela compõe o cerne, a essência do sistema. Define seus
imites e suas possibilidades. É como o DNA do sistema jurídico, nela estando
aorigado o germe do seu desenvolvimento. Não há, pois, que se falar em
subsunção da lei, pois a Constituição “é”.(31)
A função ordenadora e estruturante dos princípios permite compreender a
avolução e a crescente importância doutrinária atribuída ao estudo dos direitos
da personalidade, valendo citar o conceito jurídico de princípio, adotado por
Delso Antônio Bandeira de Mello: “Mandamento nuclear de um sistema,
verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes
-orm as com pondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata
compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade
do sistema normativo, no que lhe confere atônica e lhe dá sentido harmônico.”(32)

30) ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. O direito à vida digna. Belo Horizonte: Fórum, 2004. p. 38.
31) GOMES, José Jairo. R esponsabilidade civil e eticidade. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.
p. 9.
32) BANDEIRA DE MELLO, C elso Antônio. Curso de direito adm inistrativo. 22. ed. São
= aulo: Malheiros, 2007. p. 923.
240 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

O intérprete que não levar em consideração os princípios constitucionais


estará lidando apenas na periferia do Direito, ignorando as íntimas conexões
do ramo específico com o seu tronco de sustentação, sua causa primeira.
Avistando o continente, mas sem captar o seu conteúdo, atento ao detalhe,
mas distraído do conjunto, não perceberá a irradiação da seiva tonificante,
que parte do núcleo constitucional para abastecer e vitalizar toda a extensão
abrangida pela ciência jurídica, influenciando, com certeza, o regramento da
proteção à saúde do trabalhador.
O professor Gustavo Tepedino, ao discorrer a respeito do fenômeno
da constitucionalização do Direito Civil, registra com lucidez o propósito da
Constituição da República de 1988:

“O legislador constituinte, de maneira categórica, pretende evitar que a


iniciativa econôm ica privada possa ser desenvolvida de m aneira
prejudicial à promoção da dignidade da pessoa humana e à justiça social.
Rejeita, igualmente, que os espaços privados, como a família, a empresa
e a propriedade, possam representar uma espécie de zona franca para
violação do projeto constitucional. Daí ter regulamentado, sem cerimônia,
e malgrado as violentas e tão mal-humoradas críticas que sofreu, todas
as relações jurídicas de direito privado.”(33)

Aliás, o Supremo Tribunal Federal, em sua composição plenária, ao julgar


a ADI-MC n. 1.347-5, colocou nos fundamentos do acórdão a importância de
considerar os princípios constitucionais na análise das questões relacionadas
à saúde dos trabalhadores:
“Não se pode perder de perspectiva, neste ponto, que também os valores
sociais do trabalho constituem um dos fundamentos sobre os quais se
edifica, de modo permanente, a construção do Estado Democrático de
Direito (CF, art. 1Q, IV, primeira parte), pois é preciso reconhecer que o
sentido tutelar que emana desse postulado axiológico abrange, dentre
outras providências, a adoção, tanto pelos organismos públicos quanto
pela própria comunidade empresarial, de medidas destinadas a proteger
a integridade da saúde daqueles que são responsáveis pela força de
trabalho. A preservação da saúde de classe trabalhadora constitui um
dos graves encargos de que as empresas privadas são depositárias.”

Para arrematar essas considerações, convém citar a doutrina de Carlos


Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri, em obra conjunta, quando
asseveram que a Constituição de 1988 deu uma nova feição e maior dimensão
ao dano moral:

(33) TEPEDINO, Gustavo. A constitucionalização do direito civil: perspectivas interpretativas


diante do novo Código. In: NAVES, Bruno Torquato; FIÚZA, César; FREIRE DE SÁ, Maria de
Fátima (Coord.). Direito civil: atualidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p .118.
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 241

“Entendemos que todos os conceitos tradicionais de dano moral tiveram


que ser revistos pela ótica da Constituição de 1988. Assim é, porque a
atual Carta, na trilha das demais Constituições elaboradas após a eclosão
da chamada questão social, colocou o Homem no vértice do ordena­
mento jurídico da Nação, fez dele a primeira e decisiva realidade, trans­
formando os seus direitos no fio condutor de todos os ramos jurídicos.
E, ao inserir em seu texto normas que tutelam os valores humanos, a
Constituição fez também estrutural transformação no conceito e valores
dos direitos individuais e sociais, o suficiente para permitir que a tutela
desses direitos seja agora feita por aplicação direta de suas normas.
Ninguém desconhece que as normas constitucionais, por serem de hierar­
quia superior, balizam a interpretação e aplicação de toda a legislação
infraconstitucional, de sorte a não ser possível aplicar esta em desar­
monia com aquelas. A Constituição Federal, logo no seu primeiro artigo,
inciso III, consagrou a dignidade humana como um dos fundamentos do
nosso Estado Democrático de Direito. Temos hoje o que pode ser cha­
mado de direito subjetivo constitucional à dignidade. Ao assim fazer, a
Constituição deu ao dano moral uma nova feição e maior dimensão, por­
que a dignidade humana nada mais é do que a base de todos os valores
morais, a essência de todos os direitos personalíssimos. O direito à ima­
gem, à honra, ao nome, à intimidade, à privacidade, à liberdade estão
englobados no direito à dignidade, verdadeiro fundamento e essência de
cada preceito constitucional relativo aos direitos da pessoa humana. Essa,
sem dúvida, é a matriz constitucional para o conceito de dano moral.
Dano moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é do que violação
do direito à dignidade.”(34)

8.4.3. Cumulação com o dano material

Havia muita controvérsia, mesmo após a Constituição de 1988, se a


indenização pelo dano moral era devida cumulativamente com a reparação
oor danos materiais, quando decorrentes do mesmo fato. Percebeu-se, porém,
que faltava suporte lógico e mesmo jurídico para rejeitar a cum ulação,
oorquanto, apesar de terem origem no mesmo fato ou ato injusto, são danos
distintos, com efeitos diversos, pelo que merecem indenizações separadas.

A divergência jurisprudencial restou superada com a adoção da Súmula


n. 37 pelo Colendo STJ em 1992: “São cumuláveis as indenizações por dano
material e dano moral oriundos do mesmo fato.” Com o advento do Código
Civil de 2002, os artigos 948 e 949 relacionam os danos materiais provenientes

(34) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 102-103.
242 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

dos atos ilícitos, mas deixam espaço para a condenação pelo dano moral
quando asseguram: sem excluir outras reparações ou algum outro prejuízo
que o ofendido prove haver sofrido. Em síntese, está pacificado na doutrina e
jurisprudência o cabimento da indenização por dano moral cumulada com a
reparação do dano material, mesmo quando proveniente do mesmo fato ou
ato antijurídico, não gerando mais perplexidade alguma.

8.4.4. Finalidade da indenização por dano moral

As reflexões dos juristas e a crescente valorização da dignidade da pessoa


humana facilitaram a percepção dos dois fundamentos essenciais para justificar
a indenização pelos danos morais: a vítima não pode ser deixada ao desamparo,
nem os lesantes impunes. Esses dois fundamentos repercutem seriamente na
harmonia da convivência social, porque a vítima desamparada é tomada de
revolta e pode cultivar o desejo de vindita; por outro lado, a impunidade dos
causadores do dano acaba estimulando a ocorrência de novas lesões.
O Projeto de Lei n. 6.960/2002, apresentado pelo Deputado Ricardo Fiúza,
propõe introduzir mais um parágrafo no art. 944 do Código Civil, realçando
exatamente esses dois fundamentos da indenização por danos morais: § 2-
A reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e
adequado desestímulo ao lesante (NR). Em reiteradas decisões tanto o TST
quanto o STJ estão enfatizando a dupla finalidade da indenização por danos
morais, valendo citar, como exemplo:
“O montante pecuniário, a ser arbitrado pelo Juiz, visa a possibilitar ao ofendido a
reposição do seu patrim ônio imaterial ao estado anterior, como form a de com pensação
pelo sofrim ento causado. Tam bém serve para m itigar-lhe a dor, e funciona como
instrum ento pedagógico a refrear futuro com portam ento ilícito do ofensor.” TST. 6-
Turma. RR n. 1600/2004-002-23-40, Rei.: Ministro Aloysio C orrêa da Veiga, D J 18
maio 2007.

“O valor do dano moral tem sido enfrentado no STJ com o escopo de atender a sua
dupla função: reparar o dano buscando m inim izar a dor da vítim a e punir o ofensor,
para que não volte a reincidir.” STJ. 2- Turma. ED-REsp n. 845.001, Rei.: Ministra
Eliana Calmon, DJe 24 set. 2009.

Na mesma linha de pensamento, assevera o Ministro do TST Walmir


Oliveira da Costa: “A compensação por dano moral tem dupla natureza:
reparatória e punitiva. No primeiro caso, funciona como uma espécie de
compensação pelo sofrimento da vítima, e, no segundo, trata-se de sanção
que coíbe ou inibe atentados ou investidas indevidos contra os direitos da
personalidade.”(35)

(35) C O S T A , W a lm ir O liv e ira da. D ano m o ra l nas re la ç õ e s de tra b a lh o : q u e s tõ e s


controvertidas após a Emenda Constitucional n. 45. Revista do Tribunal S uperior do Trabalho,
Brasília, v. 73, n. 2, p. 120, abr./jun. 2007.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 243

Alguns autores entendem que não se mostra cabível a função punitiva


za indenização por danos morais, já que a pena deve ser tratada no seu ramo
próprio no campo criminal, com observância do princípio nulla poena sine
age. Enfatizam que a indenização deve ficar restrita à sanção civil, pelo que
"ão pode atingir o território da punição de caráter penal, como asseveram os
cefensores da teoria do valor de desestímulo, inspirada nos punitive damages
20 Direito norte-americano.
Apesar da resistência de parte da doutrina nacional, predomina nos
tribunais superiores, conforme já registrado, o sistema aberto que conjuga o
oaráter compensatório e punitivo da indenização pelo dano moral. Com efeito,
também na seara do Direito Civil é cabível o deferimento de indenização com
'halidade inibitória de futuras condutas lesivas, com apoio na cláusula geral
za ilicitude do art. 186 do Código Civil e na teoria do valor do desestímulo(36).
Conclui o magistrado e professor André Gustavo de Andrade, em cuidadosa
dissertação sobre o tema, que “a ideia da indenização punitiva surge como
'eflexo da mudança de paradigma da responsabilidade civil, que assume um
oapel complexo determinado pelo próprio desenvolvimento da sociedade
moderna. A responsabilidade civil deve preocupar-se não apenas com o dano
á consumado e a sua reparação, mas também com a prevenção do dano.”(37)

A propósito, por ocasião da IV Jornada de Direito Civil promovida em


Brasília pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal,
em outubro de 2006, foi aprovado o Enunciado n. 379, confirmando a validade
do aspecto punitivo e pedagógico da indenização pelos danos morais, com a
seguinte redação: “Art. 944 — O art. 944, caput, do Código Civil não afasta a
oossibilid ade de se reconh ecer a função pun itiva ou ped agóg ica da
responsabilidade civil.” De forma semelhante, por ocasião da 1ã Jornada de
Direito Material e Processual do Trabalho realizada em Brasília, em novembro
de 2007, foi adotado o Enunciado n. 51: “Responsabilidade civil. Danos
morais. Critérios para arbitramento. O valor da condenação por danos morais
decorrentes da relação de trabalho será arbitrado pelo juiz de maneira equitativa,
a fim de atender ao seu caráter compensatório, pedagógico e preventivo.”

8.4.5. Cabimento do dano moral no acidente do trabalho

O dano moral é muito acentuado quando decorrente do infortúnio laboral,


porquanto o trabalhador é atingido na sua integridade psicobiofísica, o que
muitas vezes significa o desmonte traum ático de um projeto de vida, o

(36) O art. 10:101 dos Princípios de Direito Europeu da responsabilidade civil prevê que “a
indenização tem também uma função preventiva.”
(37) ANDRADE, André Gustavo de. Dano m oral & indenização punitiva. 2.ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2009. p. 314.
244 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

encarceramento compulsório numa cadeira de rodas e o sepultamento precoce


dos sonhos acalentados quanto à possibilidade de um futuro melhor.
A indenização pelos danos materiais pode até alcançar a recomposição
do prejuízo e a “equivalência matemática” norteia os critérios de cálculo. No
entanto, a dor da exclusão, a tristeza da inatividade precoce, a solidão do
abandono na intimidade do lar, o vexame da mutilação exposta, a dificuldade
para os cuidados pessoais básicos, o constrangim ento da dependência
permanente de outra pessoa, a sensação de inutilidade, o conflito permanente
entre um cérebro que ordena a um corpo que não consegue responder, a
orfandade ou a viuvez inesperada, o vazio da inércia imposta, tudo isso e
muito mais não tem retorno ou dinheiro que repare suficientemente. Na verdade
a dor moral deixa na alma ferida aberta e latente que só o tempo, com vagar,
cuida de cicatrizar, mesmo assim, sem apagar o registro.
Por outro lado, se a reparação no seu sentido rigoroso não é atingível,
cabe pelo menos uma com pensação monetária, um lenitivo, que possa
oferecer ao lesado outro bem da vida para acalmar sua revolta e facilitar sua
resignação diante do fato consumado. Não se trata, porém, de estabelecer
um preço para a dor (pretium doloris), mas de criar possibilidades para que o
acidentado desenvolva novas atividades ou entretenimentos, para vencer as
recordações dolorosas e superar o sofrimento(38). Na expressão lapidar de
Cunha Gonçalves, a indenização pelo dano moral “não é remédio, que produza
a cura do mal, mas sim um calmante. Não se trata de suprimir o passado,
mas sim de melhorar o futuro.”(39)
A indenização por acidente do trabalho, independentem ente dos
benefícios acidentários, está prevista expressamente na Constituição da
República de 1988. Com efeito, estabelece o art. 7-\ “ São direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social: (...) XXVIII — seguro contra acidentes do trabalho, a cargo
do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando
incorrer em dolo ou culpa.”
O cabimento da indenização por danos morais decorrentes do acidente
do trabalho é, atualmente, questão pacificada na doutrina e jurisprudência.
Em primeiro lugar porque o dispositivo constitucional acima transcrito não

(38) “A indenização, em caso de danos morais, não visa reparar, no sentido literal, a dor, a
alegria, a honra, a tristeza ou a humilhação; são valores inestimáveis, mas isso não impede
que seja precisado um valor compensatório, que amenize o respectivo dano, com base em
alguns elem entos com o a gravidade objetiva do dano, a personalidade da vítim a, sua
situação fam iliar e social, a gravidade da falta, ou mesmo a condição econômica das partes.”
STJ. 5a Turma. REsp n. 239.973/RN, Rei.: Ministro Edson Vidigal, julgado em 16 maio de
2000, DJ 12 jun. 2000, p. 129.
(39) CUNHA GONÇALVES, Luiz da. Tratado de direito civil. São Paulo: Max Limonad, 1957.
v. 12, t. II, p. 543.
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 245

restringiu a indenização apenas aos aspectos patrimoniais, não devendo o


ntérprete impor limitações onde a norma não restringiu. Em segundo, porque
o Código Civil consagra a cláusula genérica da indenização decorrente do
ato ilícito no art. 186, no qual está indicado expressamente o dano moral. Em
:erceiro, porque o mesmo Código Civil quando trata da indenização por danos
oessoais indica as parcelas da reparação material, mas deixa a ressalva
“sem excluir outras reparações” (art. 948) ou “além de algum outro prejuízo
que o ofendido prove haver sofrido” (art. 949). Nessas ressalvas, não há
dúvidas, deve ser incluída a indenização pelos danos morais do acidentado
ou de seus dependentes.
Em síntese, se estiverem presentes os pressupostos para o deferimento
da indenização pelos danos materiais, é cabível também o deferimento da
compensação pelos danos morais, traduzida numa indenização pecuniária.

8.4.6. Prova do dano moral

Alguns juizes estão indeferindo o pedido de indenização a título de danos


morais decorrentes do acidente do trabalho, ao fundamento de não ter havido
prova efetiva da ocorrência do dano moral. De acordo com esse ponto de
vista não é devida a indenização, se a vítima suporta bem a ofensa ou se o
acidente ou a doença ocupacional não lhe com prom etem o aspecto
psicológico, apesar das seqüelas definitivas que possam ter ensejado o
deferimento de reparação dos danos materiais.
C onsideram os equivocado esse entendim ento, que coloca com o
pressuposto da indenização a prova de que o lesado passou por um período
de sofrim ento, dor, hum ilhação, depressão etc. Ora, é desnecessário
demonstrar o que ordinariamente acontece (art. 3 3 4 ,1, do CPC) e que decorre
da própria natureza humana, ou seja, o dano in re ipsa{40). Se houvesse mesmo
a necessidade dessa prova, o resultado poderia variar tão somente pelos
aspectos pessoais do acidentado: aquele mais sensível e emotivo seria
indenizado e o mais resignado teria o pedido indeferido. Discorrendo a respeito
do tema, anota Rui Stoco:

“A afirmação de que o dano moral independe de prova decorre muito


mais da natureza imaterial do dano do que das quaestionis facti. Explica-
-se: Como o dano moral é, em verdade, um ‘não dano’, não haveria como

(40) “ Provado o fato, não há necessidade de prova do dano moral, nos term os de persistente
jurisprudência da Corte.” Cf. STJ. 3- Turma. R Espn. 261.028/RJ, Rei.: Ministro Carlos Alberto
Menezes, DJ 20 ago. 2001. “Na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece
a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da
violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto.” STJ. 4 â
Turma. REsp n. 173.124/RS, Rei.: Ministro Asfor Rocha, DJ 19 nov. 2001.
246 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

provar, quantificando, o alcance desse dano, como ressuma óbvio. Sob


esse aspecto, porque o gravame no plano moral não tem expressão
matemática, nem se materializa no mundo físico e, portanto, não se
indeniza, mas apenas se compensa, é que não se pode falar em prova
de um dano que, a rigor, não existe no plano material.”(41)

Para a condenação compensatória do dano moral não é imprescindível


a produção de prova das repercussões que o acidente do trabalho tenha
causado, como ocorre no campo dos danos materiais; basta o mero implemento
do dano injusto para criar a presunção dos efeitos negativos na órbita subjetiva
do acidentado. Nesse sentido, a doutrina de Sérgio Cavalieri:

“O dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do


ilícito em si. Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a
concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras
palavras, o dano moral existe in re ipsa\ deriva inexoravelmente do
próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está
demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma
presunção hom inis ou facti, que decorre das regras da experiência
comum.”(42)

Ainda que a vítima, por características pessoais, tenha suportado bem o


acidente ou a doença ocupacional, permanece a necessidade da condenação,
pois a indenização pelo dano moral tem igualmente uma finalidade pedagógica,
já que demonstra para o infrator e para a sociedade a punição exemplar
decorrente do desrespeito às regras da segurança e saúde no local de trabalho.
Em sintonia com esse entendimento foi aprovado por ocasião da V Jornada
de Direito Civil, realizada em 2011, o Enunciado 445: “Art. 927. O dano moral
indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos
humanos desagradáveis como dor ou sofrimento.”

Enfatiza Carlos Alberto Bittarque “não se cogita, em verdade, pela melhor


técnica, em prova de dor, ou de aflição, ou de constrangimento, porque são
fenômenos ínsitos na alma humana como reações naturais a agressões do
meio social. Dispensam, pois, comprovação, bastando, no caso concreto, a
demonstração do resultado lesivo e a conexão com o fato causador, para
responsabilização do agente.”<43)

(41) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1.907.
(42) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 97.
(43) BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 3. ed. rev., atual, e ampl. 2-
t. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 136.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 247

Em resumo, se estiverem presentes os pressupostos para o deferimento


da reparação pelos danos materiais, é cabível também o acolhimento do
:edido de indenização pelos danos morais. É o que basta. A jurisprudência
~iais autorizada também adota o entendimento aqui esposado:
“Indenização por danos morais. Configuração. Prova do dano. Os fatos narrados
pela Corte regional demonstram, in re ipsa (a coisa fala por si), a caracterização do
dano moral, ante o sofrim ento físico e psíquico decorrente do com prom etim ento dos
m ovimentos corporais e da parcial incapacidade para o trabalho. A indenização por
dano moral tem sido admitida não apenas em casos de ofensa à honra objetiva (que
diz respeito à con sid era çã o perante te rce iro s), mas tam bém de afro n ta à honra
subjetiva (sentim ento da própria dignidade moral), a qual se presume. De acordo com
a jurisprudência pacífica, o que se exige é a prova dos fatos que ensejam o pedido de
indenização por danos morais (arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC), e não a prova dos
danos imateriais, esta, de resto, impossível. Portanto, o dano moral verifica-se in re
ipsa (a coisa fala por si). Recurso de revista de que não se conhece.” TST. 6a Turma.
RR n. 69700-76.2009.5.12.0038, Rei.: Ministra Kátia Arruda, DJ 5 out. 2012.

“Recurso de revista, indenização por dano moral. Com provação do prejuízo moral.
D esnecessidade. 1. O dano moral em si não é suscetível de prova, em face da
impossibilidade de fazer demonstração, em juízo, da dor, do abalo moral e da angústia
sofridos. 2. Trata-se, pois, de — dam num in re ipsa — , ou seja, o dano moral é
consequência do próprio fato ofensivo, de modo que, com provado o evento lesivo,
tem -se, com o consequência lógica, a configuração de dano m oral, exsurgindo a
obrigação de pagar indenização, nos termos do art. 52, X, da Constituição Federal. 3.
Na hipótese, a Corte de origem asseverou que o reclamante foi mantido como refém
durante rebelião dos internos de uma das unidades da reclam ada. Desse modo,
diante das premissas fáticas constantes do acórdão recorrido, tem -se por comprovado
o evento danoso, ensejando, assim, a reparação do dano moral. Recurso de revista
conhecido e provido.” TST. 1- Turma. RR n. 230940-08.2004.5.02.0045, Rei.: Ministro
W alm ir Oliveira da Costa, DJ 02 jul. 2010.

“Agravo regimental no recurso especial. Civil e processo civil. Responsabilidade


civil. Prova do dano moral. Descumprimento de ordem judicial para levantamento de
restrição patrimonial (penhora). Desídia de preposto da instituição financeira. Dano
‘in re ipsa’. Restabelecida sentença de procedência. Agravo desprovido. É cabível
a indenização por dano moral independentemente da prova do prejuízo na hipótese em
que preposto de instituição financeira, por desídia, descum priu ordem judicial para
levantamento da penhora do patrimônio de cliente, e este sofreu severas limitações no
mercado de consumo pela indevida manutenção da constrição após a regularização do
débito, tendo em vista tratar-se de dano moral in re ipsa, em que não há necessidade da
prova do abalo ou do sofrimento do lesado, e que é vinculado à própria existência do ato
ilícito, cujos efeitos nocivos são presumidos.” STJ. 3- Turma. AgRg no REsp n. 1206778/
SP, Rei.: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJ 20 ago. 2012.

“Indenização. Dano moral. Dano presum ido. Como se trata de algo imaterial ou
ideal, a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados
para a com provação do dano material. Por outras palavras, o dano moral está ínsito
na ilicitude do ato praticado, decorre da gravidade do ilícito em si, sendo desnecessária
sua efetiva demonstração, ou seja, como já sublinhado: o dano moral existe in re ipsa.
Afirm a Ruggiero: “ Para o dano ser indenizável, basta a perturbação feita pelo ato
ilícito nas relações psíquicas, na tranqüilidade, nos sentimentos, nos afetos de uma
pessoa, para produzir uma dim inuição no gozo do respectivo direito.” STJ. 1S Turma.
REsp n. 608.918, Rei.: Ministro José Delgado, DJ 21 jun. 2004.
248 S e b a s t iã o G eraldo de O liv e ir a

De qualquer forma, pode ser do interesse da vítima demonstrar a extensão


dos danos morais, com as singularidades do caso concreto, cujas provas
poderão influenciar no arbitramento do valor da indenização, mormente se o
acidente do trabalho tiver causado repercussões prejudiciais mais agudas,
acima do que a simples presunção sugere. Não se exige a prova dos danos
morais como pressuposto de condenação, mas na instrução processual
podem ser colhidos elem entos im portantes que auxiliem o julgador no
arbitramento adequado do montante indenizatório. O Enunciado 455, aprovado
por ocasião da V Jornada de Direito Civil, realizada em 2011, consagrou
entendimento nessa direção: “Art. 944. Embora o reconhecimento dos danos
morais se dê, em numerosos casos, independentemente de prova (in re ipsa),
para a sua adequada quantificação, deve o juiz investigar, sempre que entender
necessário, as circunstâncias do caso concreto, inclusive por intermédio da
produção de depoimento pessoal e da prova testemunhal em audiência.” Pode-
-se dizer, portanto, que o dano moral é presumido quanto à sua existência,
mas pode haver provas para demonstrar a sua extensão.

8.4.7. Critérios para arbitramento da indenização

O valor da indenização por dano moral tem sido fixado por arbitramento
do juiz, de acordo com as circunstâncias do caso, já que não existe, ainda,
dispositivo legal estabelecendo parâmetros objetivos a respeito(44).

(44) O Projeto de Lei n. 150 de 1999, aprovado no Senado, mas atualmente arquivado na
C âm ara (PL n. 7.124/2002), estabelecia os critérios para a fixação do valor dos danos
m orais:
“Art. 7- Ao apreciar o pedido, o juiz considerará o teor do bem jurídico tutelado, os reflexos
pessoais e sociais da ação ou omissão, a possibilidade de superação física ou psicológica,
assim como a extensão e duração dos efeitos da ofensa.
§ 1Q Se julgar procedente o pedido, o juiz fixará a indenização a ser paga, a cada um dos
ofendidos, em um dos seguintes níveis:
I — ofensa de natureza leve: até R$ 20.000,00 (vinte mil reais);
II — ofensa de natureza média: de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a R$ 90.000,00 (noventa
mil reais);
III — ofensa de natureza grave: de R$ 90.000,00 (noventa mil reais) a R$ 180.000,00 (cento
e oitenta mil reais).
§ 2- Na fixação do valor da indenização, o juiz levará em conta, ainda, a situação social,
política e econômica das pessoas envolvidas, as condições em que ocorreu a ofensa ou o
prejuízo moral, a intensidade do sofrim ento ou hum ilhação, o grau de dolo ou culpa, a
existência de retratação espontânea, o esforço efetivo para m inim izar a ofensa ou lesão e o
perdão, tácito ou expresso.
§ 3- A capacidade fina n ce ira do causador do dano, por si só, não autoriza a fixação da
ind enizaçã o em va lo r que p ropicie o e n riq u e cim e n to sem causa, ou d e sproporcional,
da vítim a ou de terceiro interessado.
§ 4- Na reincidência, ou diante da indiferença do ofensor, o juiz poderá elevar ao triplo o
valor da indenização.”
'.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 249

A opção atual do arbitramento do montante pelo Judiciário propicia ao


jiz fixar com mais precisão e liberdade a justa indenização, sem as amarras
normativas padronizadas, de modo a poder dosar, após análise equitativa, o
alor da condenação com as tintas específicas do caso concreto. Na
urisprudência sedim entou-se o pensam ento de que não há qualquer
larifamento para a indenização pelo dano moral, nem mesmo para aqueles
casos previstos na Lei de Imprensa: “Guiou-se a jurisprudência das Turmas
ntegrantes da 2a Seção do STJ, no sentido de que, em face da Constituição
de 1988, não mais prevalece a tarifação da indenização devida por dano moral,
decorrente de publicação considerada ofensiva à honra e dignidade das
pessoas.”(45) Em 2004, o STJ uniformizou seu entendimento por intermédio
da Súmula n. 281, com o seguinte teor: “A indenização por dano moral não
está sujeita à tarifação prevista na Lei de Imprensa.”

Enfatiza o professor Fernando Noronha que “a reparação de todos os


danos que não sejam suscetíveis de avaliação pecuniária obedece em regra
ao princípio da satisfação compensatória: o quantitativo pecuniário a ser
atribuído ao lesado nunca poderá ser equivalente a um ‘preço’, será o valor
necessário para lhe proporcionar um lenitivo para o sofrimento infligido, ou
uma compensação pela ofensa à vida ou à integridade física.”(46)
Assinala o Juiz A rtur Marques da Silva Filho que “a doutrina e a
jurisprudência vêm indicando que sempre deve ser considerado: o grau de
culpa, o dano em si, as condições econômicas e sociais da vítima e do ofensor.
A solução do problema de estimação do quantum deve ser casuística.”(47)
Para Caio Mário, a vítima “deve receber uma soma que lhe compense a dor
ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de
cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do
ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem
tão pequena que se torne inexpressiva.”(48)

Já o PL n. 1914/2003, apresentado na Câmara Federal pelo Deputado Marcus Vicente do


PTB-ES, propõe acrescentar ao art. 953 do Código Civil um parágrafo com o seguinte teor:
“Na fixação da indenização por danos m orais, o juiz, a fim de evitar o enriquecim ento
indevido do dem andante, levará em consideração a situação econôm ica do ofensor, a
intensidade do ânimo de ofender, a gravidade e repercussão da ofensa, a posição social ou
política do ofendido, bem com o o sofrim ento por ele experim entado (NR).” Aprovado na
Câmara Federal, o projeto encontra-se agora em tram itação no Senado Federal (PLC n.
169/2010).
(45) STJ. 4- Turma. REsp n. 103.312/RJ, Rei.: Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ 9 out.
2000, p. 150.
(46) NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundam entos do direito das obrigações:
introdução à responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1, p. 569.
(47) SILVA FILHO, A rtur Marques da. A responsabilidade civil e o dano estético. Revista dos
Tribunais, São Paulo, v. 689, p. 47, mar. 1993.
(48) PEREIRA, Caio M ário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. 8- t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 60.
250 S e b a s t iã o G eraldo de O liveira

Pode ser também invocada, analogicamente, a disposição do parágrafo


único do art. 953 do Código Civil, que estabelece: “Se o ofendido não pude'
provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, equitativamente, o valor da
indenização, na conformidade das circunstâncias do caso.”(49)

O valor da indenização por danos morais não obedece ao mesmo critério


de pagamento aplicado aos danos materiais. Em vez de se estabelecer um
valor mensal na forma de pensionamento, deve-se arbitrar uma indenização
para pagamento imediato, em parcela única, como forma rápida de ameniza
o sofrimento e propiciar alguma melhoria de vida para a vítima, considerando
as suas condições pessoais. Nesse sentido, observou o Juiz Páris Pena, do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que:
“Em matéria de dano moral, o valor da indenização há de ser suficiente
tanto para facilitar a que o ofendido obtenha lenitivos para sua dor, não
pela quantificação em termos materiais, como, também, porque, mercê
da in d e n iz a ç ã o re sp e c tiv a , po d e rá c e rc a r-s e de co n d içõ e s de
sobrevivência mais compatíveis com sua dignidade de pessoa humana,
tornando-a mais apta ao enfrentamento diuturno de sua deficiência. Além
disso, tal condenação tem o efeito pedagógico, no sentido de tornar a
sociedade efetivamente mais humana, colocando-a sob a égide dos
princípios éticos impedientes e dissuasivos de condutas quais a que
teve a ré.”(50)
Em arremate, podemos afirmar que, por enquanto, não há parâmetros
ou limites normativos para estipular o valor da indenização por dano moral,
ficando ao prudente arbítrio do juiz a sua fixação, diante das múltiplas especi-
ficidades do caso concreto(51). Todavia, algumas considerações importantes
assentadas na doutrina e jurisprudência devem nortear a dosimetria dessa
indenização:

(49) “Dano moral. Fixação do valor da indenização. A quantificação do dano moral deve
atender às necessidades da parte ofendida e aos recursos da parte ofensora, de modo a
não ser o valor da indenização dem asiado alto para acarretar um enriquecim ento sem
causa àquele que o recebe, nem tão insignificante a ponto de ser inexpressivo para quem
o paga. Devem ser consideradas, invariavelmente, a intensidade, a gravidade, a natureza
e os reflexos do sofrim ento experimentado, bem como a repercussão de caráter pedagógico
que a pena imposta trará ao ofensor. "Santa Catarina. TRT 12ã Região. Acórdão n. 2.487/
2001, Rei.: Juiz Gilm ar Cavalheri, DJ 15 mar. 2007.
(50) Cf. Minas Gerais. TAMG. 1ã Câm. Civil. Ap. Cível n. 213.381-9, Rei.: Juiz Páris Pena,
julgada em 11 jun. 1996.
(51) “Agravo de instrumento em Recurso de Revista — Dano moral — Valor arbitrado. No
que se refere ao quantum fixado à indenização, é de se ressaltar que os parâmetros para a
fixação do valor da indenização, isto é, valor justo e razoável, na verdade, são peculiares ao
caso concreto, em face da dor ou do dano causado ao trabalhador. Incólumes os dispositivos
s u s c ita d o s . A g ra vo de in s tru m e n to d e s p ro v id o .” T S T . 1§ T u rm a . A IR R n. 1 12540-
79.2006.5.06.0004, Rei.: Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DJ 17 set. 2010.
■DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 251

a) a fixação do valor indenizatório obedece a duas finalidades básicas


que devem ser ponderadas conforme as peculiaridades do acidente ou
doença ocupacional: compensar a dor, o constrangimento ou o sofrimento
da vítima e, pedagogicamente, combater a impunidade(52);
b) na função compensatória da indenização, a análise deve estar cen­
trada na pessoa da vítima, enquanto, na finalidade punitiva, a observa­
ção estará voltada para a pessoa do causador do dano;

c) é imprescindível considerar o grau de culpa do empregador e a gravi­


dade dos efeitos para a vítima do acidente ou doença ocupacional(53);

d) o valor da indenização pode ser agravado ou atenuado em razão das


singularidades da condição pessoal da vítima;

e) o valor arbitrado não tem como objetivo servir para enriquecimento da


vítima, nem de ruína para o empregador. Aliás, no art. 7-, § 3S, do Projeto
de Lei n. 150/1999, acima citado, ficou estabelecido que: “A capacidade
financeira do causador do dano, por si só, não autoriza a fixação da
indenização em valor que propicie o enriquecimento sem causa, ou
desproporcional, da vítima ou de terceiro interessado” ;

f) o arbitramento da indenização deve ser feito com a devida prudência,


mas temperado com a necessária coragem, fugindo dos extremos dos

(52) “ Dano moral. Valor fixado. Efeito pedagógico e punitivo. O escopo da reparação do
prejuízo experim entado pela vítim a concentra-se na inibição do agente causador do dano
a praticar outros atos ilícitos, sem perm itir o locupletam ento da outra parte. Nessa linha de
raciocínio, deflui-se que o valor arbitrado atingiu o desígnio esperado, ou seja, a função
pedagógica e punitiva que a indenização deve representar para o agente ofensor. Agravo
de instrumento a que se nega provim ento.” TST. 2- Turma. AIRR n. 4039/2002-902-02-00,
Rei.: Ministro Sim pliciano Fontes de F. Fernandes, DJ 23 jun. 2006.
“Valor fixado para o dano moral. Doença profissional. I — A indenização por dano moral
deve o b s e rv a r o c rité rio e stim a tivo , d ife re n te m e n te d a q u e la por dano m a te ria l, cujo
cálculo deve observar o critério aritmético. Na fixação da indenização do dano moral, a seu
turno, deve o juiz se nortear por três vetores, quais sejam, a gravidade do dano causado, a
estatura econôm ico-financeira do ofensor e o intuito inibidor de futuras ações lesivas à
honra e boa fam a do empregado. II — Tendo por norte as seqüelas psicológiéas, provenientes
da doença profissional que acom etera a recorrida, com irrefragável repercussão na sua
Intim idade profissional, a estatura econôm ica do recorrente e as condições culturais da
empregada vitimada, tanto quanto o caráter pedagógico inerente ao ressarcimento do dano
moral, sobressai a constatação de o valor arbitrado em R$ 10.000,00 revelar-se razoável e
proporcional, infirm ando-se a pretensa vulneração dos artigos 944 do C ódigo Civil e 5a,
inciso V, da Constituição, este por sinal impróprio à controvérsia, considerando que ele só
é inteligível no âm bito do inciso IV, no qual o C onstituinte assegurou o direito à livre
manifestação do pensamento. III — Recurso não conhecido.” TST. 4- Turma. RR n. 7803/
2005-026-12-00.5, Rei.: Ministro Barros Levenhagen, DJ 13 fev. 2009.
(53) O E nunciado n. 458 aprovado na V Jornada de D ireito Civil, realizada em 2011,
preceitua: “Art. 944. O grau de culpa do ofensor, ou a sua eventual conduta intencional,
deve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano moral.”
252 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

valores irrisórios ou dos montantes exagerados, que podem colocar em


descrédito o Poder Judiciário e provocar a banalização do dano moral:

g) deve-se ter em conta a situação econômica das partes, especialmente


para que a sanção tenha efeito prático com a necessária repercussão
pedagógica na política administrativa da empresa;

h) ainda que a vítima tenha suportado bem a ofensa, permanece a


necessidade da condenação, pois a indenização pelo dano moral também
tem uma finalidade educativa, já que demonstra para o infrator e para a
sociedade a punição exemplar daquele que desrespeitou as regras
básicas da segurança, higiene e saúde do trabalhador(54).

8.4.8. Controle do montante indenizatório pelo TST

Como não há parâmetros legais para o arbitramento da indenização por


danos m orais, fica ao prudente arbítrio do ju iz a fixação do valor da
condenação, de acordo com as especificidades do caso concreto, conforme
mencionado no tópico anterior. Em algumas ocasiões, entretanto, tem ocorrido
arbitramento de valores extremamente elevados ou excessivamente módicos.
Nas duas hipóteses há prejuízo para a ciência jurídica e risco de descrédito
para o Poder Ju diciá rio, podendo, paradoxalm ente, “d e sm o ra liza r” a
indenização do dano morai. Se o valor for insignificante, permanece a revolta
da vítima e o infrator não terá estímulo para alterar sua conduta; mas se for
exagerado, causará o enriquecimento da vítima e o inconformismo do infrator
pelo arbitramento desproporcional.

Diante de tais ocorrências, o Superior Tribunal de Justiça, desde 1997,


em casos excepcionais, vem atuando no sentido de estabelecer certa
razoabilidade nas indenizações por danos morais, para evitar os abusos da
fixação de valores irrisórios ou exorbitantes. Enfatizam Carlos Alberto Direito
e Sérgio Cavalieri que “diante dos excessos praticados com a imposição de

(54) Vale citar alguns exemplos de valores da indenização por danos morais fixados pelos
T rib u n a is S u p e rio re s , p a ra o c o rrê n c ia s m a is g ra v e s , n a tu ra lm e n te p a ra c a s o s e
circu n stâ n cia s d istinta s: 1. TS T — R R -3 4 5 0 0 -8 3 -2 0 0 6 -5 -1 7-2002, m antido o v a lo r de
R $ 2 0 0 .0 0 0 ,0 0 ; 2. T S T — A R R 6 9 2 0 0 -7 9 -2 0 0 6 -5 -1 2 -0 0 4 9 , re d u z id o o v a lo r p a ra
R$50.000,00; 3. TST — ARR 64700-05-2008-5-15-0020, mantido o valor de R$1.000.000,00;
4. TST — RR 48000-89-2006-5-17-0012, mantido o valor de R$500.000,00; 5. TST — RR-
379400-19-2008-5-09-0071, mantido o valor de R$100.000,00; 6. TST- AIRR 1358/2002-
011-11-41 — Mantida a condenação em 400 salários mínimos; 7.TST — AIRR 142900-37-
2003-5-05-0551, mantido o valor de R$100.000,00; 8. STJ. REsp 740059 — Indenização
aum entada para 500 salários mínimos; 9. STJ — REsp 612613 — Mantida a indenização de
500 s a lá rios m ínim os; 10. STJ — REsp 1171826/R S — Indenização aum entada para
R$558.000,00; 11. STJ — REsp 747474 — Reduzido o valor para R$305.000,00; 12. STJ-
REsp 515750 — Provimento do recurso para reduzir a indenização para 300 salários mínimos.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 253

verbas absurdas, fora da realidade, despropositadas, o Superior Tribunal de


Justiça entendeu necessário rever em recurso especial o valor da indenização,
superando o óbice da Súmula n. 07.”(55) O Ministro do STJ Nilson Naves,
'elator do acórdão pioneiro sobre o controle do valor do dano moral (REsp n.
53.321), indicou nos fundamentos daquela decisão:

“Por maiores que sejam as dificuldades, e seja lá qual for o critério origi-
nariamente eleito, o certo é que, a meu ver, o valor da indenização por
dano moral não pode escapar ao controle do Superior Tribunal de Justi­
ça. Urge que esta Casa, à qual foram constitucionalmente cometidas
tão relevantes missões, forneça e exerça controle, de modo a que o
lesado, sem dúvida alguma, tenha reparação, mas de modo também
que o patrimônio do ofensor não seja duramente ofendido. O certo é que
o enriquecimento não pode ser sem justa causa.”

Na mesma trilha do STJ(56), também o TST está admitindo o processa­


mento de recurso de revista para viabilizar a revisão do montante indenizatório
a título de dano moral, nas hipóteses de arbitramento em valores excessivos
ou irrisórios, de modo a garantir a observância dos princípios da razoabilida-
de e da proporcionalidade, conforme art. 5Q, V, da Constituição da República:
“Valor arbitrado aos danos morais — Conhecim ento do recurso de revista por
violação do art. 5S, V, da CF — Possibilidade. 1. Em sede de jurisdição extraordinária,
como é o caso do recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho, a violação do
art. 59, V, da CF tem sido admitida em casos teratoiógicos, para efeito de conhecimento
do apelo, em que o valor exagerado da indenização ou a sua fixação em montante
ínfimo exigiriam a intervenção desta Corte para corrigir, excepcionalmente, o eventual
despautério, para mais ou para menos, da indenização. De fato, à míngua de parâmetro
específico, tem-se o art. 5S, V, da CF como baliza genérica para a fixação do montante
da indenização, ao mencionar o princípio da proporcionalidade, mormente em face da
jurisprudência superlativamente restritiva da SBDI-1 do TST quanto ao conhecimento
de embargos por divergência jurisprudencial. 2. In casu o Reclamante sustentou, nas

(55) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 377.
(56) “P rocessual civil. Agravo regim ental no agravo em recurso especial. Responsabilidade
civil. Digitador. Lesão proveniente de esforço repetitivo. Redução da capacidade laborativa.
Total e perm anente. C um ulação de benefício p revidenciário com pensão decorrente de
ilícito civil. Possibilidade. Dano moral. Redução da indenização. Inviabilidade. Razoabilidade
na fixação do quantum. 1. É possível a cumulação de benefício previdenciário com pensão
decorrente de ilícito civil. 2. O recurso especial não com porta o exame de questões que
im pliquem revolvim ento do contexto fático-probatório dos autos, a teor do que dispõe a
S ú m ula n. 7/S T J. 3. C o n tu d o , em h ip ó te s e s e x c e p c io n a is , q u a n d o m a n ife s ta m e n te
evidenciado ser irrisório ou exorbitante o arbitram ento da indenização, a jurisprudência
desta Corte permite o afastamento do referido óbice, para possibilitar a revisão. 4. No caso
concreto, a indenização fixada pelo Tribunal local em 50 (cinqüenta) salários mínimos, em
razão da perda da capacidade laborativa do recorrido decorrente de lesão compatível com
DORT, não se revela excessiva. 5. Agravo regimental desprovido.” STJ. 4- Turma. AgRg no
AREsp n. 104.823/SP, Rei.: Ministro Antonio Carlos Ferreira, DJ 17 set. 2012.
254 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

razões dos embargos, a impossibilidade do conhecimento do recurso de revista, que


versava sobre valor arbitrado aos danos morais, por violação do art. 5g, V, da CF, por
entender que a ofensa somente ocorreria de forma reflexa, pois, para deslindar a con­
trovérsia, seria necessário analisar a aplicação de leis ordinárias que regem a matéria.
in casu, o art. 944 do CC, a teor de julgados de outras Turmas desta Corte. 3. In casu, a
Turma do TST reduziu de R$ 100.000,00 para R$ 50.000,00 o valor de indenização
devida em função de doença ocupacional (síndrome do túnel do carpo), fazendo-o
dentro do princípio da proporcionalidade albergada peio comando constitucional men­
cionado. Embargos desprovidos.” TST. SBDI-I. E-RR n. 252940-03.2005.5.02.0001.
Rei.: Ministro Ives Gandra Martins Filho, D J 10 ago. 2012.

“Agravo de instrum ento em recurso de revista. Apelo do reclamado. Assalto a


agência bancária. Morte do trabalhador. Indenização por danos morais devida à
esposa e ao filho do de cujus. Reexam e de fatos e provas. A pretensão recursal, ao
questionar a presença dos elementos da responsabilidade jurídica, desafia o reexame
de fatos e provas, esbarrando no óbice da Súmula n. 126/TST. Valor arbitrado à
in d e n iz a ç ã o . D a ta m á x im a vênia, é m o ra lm e n te in a c e itá v e l e ju rid ic a m e n te
insustentável rotular de excessiva a quantia de R$ 100.000,00 (cem mil reais) arbitrada
pelo Regional, dadas as circunstâncias evidenciadas no corpo do julgado. Agravo de
Instrumento não provido.” TST. 4- Turma. AIRR n. 188000-92.2009.5.08.0107, Rei.:
Ministra Maria de Assis Calsing, DJ 31 ago. 2012.

“Dano moral e material. Indenização. Valor arbitrado. A jurisprudência desta Corte


estabelece que a revisão do valor arbitrado a título de indenização por dano moral e
material apenas é viável quando a condenação se mostre irrisória ou exorbitante, não
atendendo a sua finalidade legal. No caso, o TRT da 9- Região deu provimento ao
recurso ordin ário do reclam ado, para re d u zir o v a lo r arb itra d o na s e n te n ça (R$
179.995,20) para R$ 40.000,00 e, ante os fatos consignados peio Regional, não se
mostra desproporcional o novo valor fixado, não justificando a excepcional intervenção
desta Corte no feito. Recurso de revista de que não se conhece.” TST. 6- Turma. RR
n. 44500-89.2009.5.09.0672, Rei.: Ministra Kátia Magalhães Arruda, DJ 21 set. 2012.

“D ano m o ral. P ro p o rc io n a lid a d e na fix a ç ã o do q u an tu m d eb eatu r. C aráter


excepcional da intervenção desta corte. 1. Embora as Cortes Superiores venham
adm itindo rever o valor fixado nas instâncias ordinárias a título de indenização por
danos morais, essa atividade deve ser exercida de form a parcim oniosa, visando a
reprimir apenas as quantificações estratosféricas ou excessivamente módicas. 2. No
caso, o valor fixado revela-se compatível com a lesão perpetrada, não se justificando
a e xce p cion a l in te rv e n ç ã o d e sta C orte. A g ra vo de in s tru m e n to a que se nega
provimento.” TST. 3- Turma. A IR R — 1091/2005-011-21-40, Rei.: Ministra Maria Cristina
Irigoyen Peduzzi, DJ 07 dez. 2007.

8.4.9. Dano moral na responsabilidade objetiva

Estando presentes os pressupostos para o deferimento da reparação


por danos materiais, é cabível também a indenização por danos morais. Assim,
mesmo quando se adota como fundamento da reparação a responsabilidade
civil objetiva, ou seja, aquela que independe de culpa do causador do dano,
não há impedimento para a condenação relativa aos danos morais. Mas,
nessa hipótese, entendem os que serão necessários alguns ajustes ou
atenuações no momento da fixação do quantum indenizatório.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 255

Conforme já enfatizamos, a indenização por danos morais tem duas


fin a lid a d e s b á sica s: dar um a c o m p e n sa çã o para a v ítim a e punir,
cedagogicamente, o infrator pela sua conduta. Ocorre que nas hipóteses em
: je o deferimento da indenização tem como fundamento tão somente a teoria
í co risco, especialm ente quando ausente qualquer prova de culpa do
empregador no acidente, parece não haver espaço para considerar o efeito
:jn itiv o da indenização. Sem dúvida, a finalidade de compensar a vítima
continua; todavia, se não foi a conduta culposa do réu que gerou o acidente,
~"as sim um risco inerente à atividade, é pelo menos questionável o aspecto
ca condenação com propósito punitivo-pedagógico.
Não se deve esquecer que o grau de culpa do empregador no acidente
ceve ser considerado para o arbitramento da indenização pelo dano moral,
:anto que o art. 944 do Código Civil estabelece no parágrafo único: “Se houver
excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz
-eduzir, equitativamente, a indenização.” Mas diante desse preceito legal cabe
indagar: E quando não houver culpa alguma do empregador, mas apenas
condenação pela teoria do risco, a redução equitativa da indenização é também
cabível?

Acreditamos que a resposta seja positiva e que o norte da fixação do


montante indenizatório será mesmo a equidade, que foi expressamente
mencionada no dispositivo transcrito. É oportuno citar nesse sentido o
entendimento doutrinário de Roger Silva Aguiar:

“O quantum a ser indenizado — se a obrigação de indenizar envolverá a


reparação integral, parcial ou mesmo se aproximar de zero — é uma
questão a ser decidida à luz dos dispositivos contidos no Capítulo II,
dos quais sobressai o art. 944, parágrafo único. O aludido dispositivo é
inegavelm ente a válvula reguladora da norma contida no art. 927,
parágrafo único, importando ressaltar de imediato sua construção também
sob bases valorativas: ‘poderá o ju iz reduzir, equitativam ente, a
indenização’. (...) O art. 944, parágrafo único, desempenha o papel de
complementar o trabalho valorativo do aplicador do direito quando este
se inicia no art. 927, parágrafo único. A possibilidade de ‘calibrar’ o valor
da indenização, segundo a participação do agente na origem do dano,
apresenta-se como peça-chave na construção de uma solução equitativa
na distribuição do ônus de arcar com o prejuízo.”(57)
Convém ressaltar neste passo o papel cada vez mais importante que a
doutrina e o legislador estão atribuindo à equidade para dimensionar a justa
reparação do dano, principalmente quando se trata de dano moral. Aliás, em

(57) AGUIAR, Roger Silva. Responsabilidade civil objetiva: do risco à solidariedade. São
Paulo: Atlas, 2007. p. 90.
256 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

juízo de equidade pode-se chegar até ao ponto de indeferir a indenização,


mesmo havendo o dano, conforme previsto no art. 928, parágrafo único, do
Código Civil: “A indenização prevista neste artigo, que deverá ser equitativa
não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele
dependem.”

Como se depreende do exposto, no campo das indenizações por aci­


dentes do trabalho o juiz dispõe de um poder discricionário mais elastecido
para proferir o julgamento, em razão das peculiaridades e conseqüências de
cada caso, que não podem ser ignoradas. No Estado Democrático de Direi­
to, a supe ra ç|0 de certos postulados de cunho estritamente patrimonialista
produz como efeito a relativizaçáo de princípios até então invioláveis, para
colocar em proeminência os valores axiológicos da dignidade da pessoa hu­
mana e da solidariedade, sem distinção essencial entre o autor e o réu. Como
assevera o Ministro do TST Carlos Alberto Reis de Paula, apoiado em Carnelutti,
“o escopo do processo não é a simples composição, mas a justa composição
da lide.”(58)

8.5. Dano estético

8.5.1. Conceito e abrangência

Além das indenizações por dano material e moral, pode ser cabível a
indenização por dano estético, quando a lesão decorrente do acidente do
trabalho compromete ou pelo menos altera a harmonia física da vítima.
Enquadra-se no conceito de dano estético qualquer alteração morfológica do
acidentado, como, por exemplo, a perda de algum membro ou mesmo de um
dedo, uma cicatriz ou qualquer m udança corporal que cause repulsa,
afeiamento ou apenas desperte a atenção por ser diferente(59).
O prejuízo estético não caracteriza, a rigor, um terceiro gênero de danos,
mas representa uma especificidade destacada do dano moral, sobretudo

(58) PAULA, Carlos Alberto Reis de. A especificidade do ônus da prova no processo do
trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 193.
(59) Para Griot, inclui-se na integridade corporal a integridade da aparência, da imagem,
principalm ente os traços da face e os m ovim entos habituais de uma pessoa. Observa,
ainda, que “haverá atentado à existência física não som ente em caso de ferim ento, de
secção ou fratura de uma parte do corpo, como tam bém quando o gravam e é feito à aparência
física: cada ser humano vem ao mundo envolvido na form a de seu corpo; ele será julgado,
em grande parte, conforme a sua aparência física, que lhe pode atrair, à primeira vista, a
sim patia ou a antipatia; é por sua aparência física que uma pessoa marca desde o início seu
círculo de ação, e esta aparência pode favorecer ou prejudicar o desenvolvim ento de sua
personalidade” . A p u d CAHALI, Y ussef Said. D ano morai. 3. ed. rev,, atual, e ampl. São
Pauio: Revista dos Tribunais, 2005. p. 203.
" C e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 257

: jando não produz repercussão de natureza patrimonial como ocorre no caso


Je um artista ou modelo. Aliás, pontua Teresa Ancona que o dano à estética
:essoal é uma das espécies do gênero dano moral(60).
A reparação do dano estético foi acolhida no Brasil bem antes da
'denização por dano moral. O Código Civil de 1916, quando previa no art.
‘ .538 a indenização para o caso de ferimento ou outra ofensa à saúde,
estabelecia que o valor seria duplicado se do ferimento resultasse aleijão ou
:eform idade. O referido dispositivo ainda recom endava os pontos que
zaveriam ser levados em consideração para fixar a indenização: posses do
rensor, circunstâncias do ofendido e a gravidade do defeito. Assim, ao
nencionar a indenização por “aleijão ou deformidade” , abriu o caminho para
aoranger qualquer alteração morfológica que alterasse o aspecto físico da
. ítima. Vejam a respeito o magistério de Maria Helena Diniz:
“O dano estético é toda alteração morfológica do indivíduo, que, além do
aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marcas e defeitos,
ainda que mínimos, e que impliquem sob qualquer aspecto um afeia-
mento da vítima, consistindo numa simples lesão desgostante ou num
permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferio­
ridade, exercendo ou não influência sobre sua capacidade laborativa.”(61)

3.5.2. Cumulação com o dano moral

Com o reconhecimento efetivo da possibilidade de reparação do dano


-loral pela C onstituição de 1988, durante algum tempo, predom inou o
entendimento de que a indenização desse dano, por ser mais ampla, já abrangia
o dano estético. Aliás, no IX Encontro de Tribunais de Alçada, realizado em
São Paulo no ano de 1997, adotou-se como conclusão unânime que “o dano
~ioral e o dano estético não se cumulam, porque ou o dano estético importa
em dano material ou está compreendido no dano moral.”
No entanto, mesmo estando o dano estético compreendido no gênero
:ano moral, a doutrina e a jurisprudência evoluíram para deferir indenizações
distintas quando esses danos forem passíveis de apuração em separado,
em decorrência de causas inconfundíveis. O dano estético está vinculado ao
sofrim ento pela deform a ção com seqü ela s perm anen tes, fa cilm e n te
cercebidas, enquanto o dano moral está ligado ao sofrimento e todas as demais
:onsequências nefastas provocadas pelo acidente(62).

30) LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2004. p. 21.
51) DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. ed. São
=3aulo: Saraiva, 2007. vol. 7, p. 80.
52) “Acidente de trabalho. Danos morais e estéticos. Cumuiatividade. As indenizações
:o r danos morais e estéticos decorrentes de um mesmo acidente de trabalho podem ser
258 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e if -

Desse modo, o dano estético materializa-se no aspecto exterior da vítima


enquanto o dano moral reside nas entranhas ocultas dos seus dramas
interiores; o primeiro, ostensivo, todos podem ver; o dano moral, mais
encoberto, poucos percebem. O dano estético, o corpo mostra; o dano mora
a alma sente.
A opção do Código Civil de 2002, de indicar genericam ente outras
reparações ou prejuízos que o ofendido prove haver sofrido (arts. 948 e 949).
deixa espaço para incluir a indenização pelo dano estético, conforme se apurar
no caso concreto. Assim, o acidente do trabalho que acarrete alguma
deformação morfológica permanente gera o dano moral cumulado com o dano
estético, ou apenas o primeiro, quando não ficar seqüela. Em outras palavras,
o acidentado que sofreu alguma deformação deve receber uma indenização
agravada por danos morais, cuja agravante (o dano estético) pode ser
calculada separadamente.

No julgamento da Apelação Cível n. 1.669/97 do antigo Tribunal de Alçada


do Rio de Janeiro, deferiu-se o pagamento de indenizações diversas para o
dano estético e o dano moral, adotando-se como fundamento: “Danos estéticos
e danos morais. Efeitos diversos, o dano estético correspondendo a uma
alteração m orfológica do indivíduo, à lesão física facilm ente perceptível
exteriorm e nte, à deform ação corporal que agride a visão, causando
desagrado, repulsa, desconforto etc., sendo o dano moral o sofrimento mental,
a dor da alma, a aflição e angústia a que a vítima é submetida, causando-lhe
depressão, desânimo e sensação irremovível de infelicidade.”<63)

Atualmente, a jurisprudência está sedimentada quanto à possibilidade


de cumulação das indenizações por dano moral e dano estético, devendo os
fundamentos da decisão indicar os motivos de um e outro deferimento:
“Acidente de trabalho, indenizações por dano moral e por dano estético. Cumulação
possível. A lesão acidentária tam bém pode causar dano estético à pessoa humana
atingida. E m bora o dano m oral seja c o n ce ito am plo, é possível, ju rid ic a m e n te ,
identificar-se específica e grave lesão estética, passível de indenização, no contexto
de gravam e mais largo, de cunho nitidam ente moral. Nesses casos de acentuada,
especial e destacada lesão estética, é pertinente a fixação de indenização própria
para este dano, sem prejuízo do montante indenizatório específico para o dano moral.
Ou seja, a ordem jurídica acolhe a possibilidade de cumulação de indenizações por
dano material, dano moral e dano estético, ainda que a lesão acidentária tenha sido

cum uladas, porquanto, quando a lesão im plica uma deform idade física perm anente, são
atingidos, ao mesmo tempo, bens jurídicos claramente distintos: a higidez emocional, ligada
ao so frim e n to p síq u ico p ro vo ca d o pelo a cid e nte , e a in te g rid a d e fís ic a , v in c u la d a à
deformação estética irreversível.” Santa Catarina. TRT 12a Região. RO n. 01476-2005-024-
12-00-5, Rei.: Juíza Maria Regina Olivé Malhadas, DJ 15 out. 2006.
(63) Rio de Janeiro. Tribunal de Alçada. 7- Câm. Civil, Rei.: Fabrício Paulo Bandeira Filho,
julgado em 02 abr. 1997.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 259

a mesma. O fundam entai é que as perdas a serem ressarcidas tenham sido, de fato,
diferentes (perda patrimonial, perda moral e, além dessa, perda estética). Recurso de
revista não conhecido, no tem a.” TST. 3- Turma. RR n. 217600-28.2009.5.09.0303,
Rei.: Ministro Mauricio Godinho Delgado, DJ 5 out. 2012.

“A gravo de instrum ento. Acidente de trabalho. Lesão no olho esquerdo da recla­


mante. Danos morais. Súm ula n. 126. Não provimento. 1. A existência de conduta
negligente da reclamada e de nexo causal entre essa e o dano ocasionado à recla­
mante, qual seja, lesão no olho esquerdo da reclamante, inclusive nervo ótico e visão,
traz como consequência a condenação em indenização por danos morais. Incidência
do óbice da Súmula n. 126. 2. Agravo de instrumento a que se nega provimento. Dano
moral e estético. Cum ulação. Possibilidade. Não provim ento. 1. Nos termos da
jurisprudência consolidada desta Corte Superior, há a possibilidade de cum ulação
do dano moral com o dano estético, uma vez que, embora oriundos do mesmo fato, os
bens tutelados são distintos. Precedentes desta Corte Superior. 2. Incidência da Sú­
mula n. 333. 3. Agravo de instrum ento a que se nega provim ento.” TST. 2- Turma.
AIRR n. 2008-65.2010.5.04.0000, Rei.: Ministro Guilherm e Augusto Caputo Bastos,
DJ 8 out. 2010.

“Cum ulação do dano estético e dano moral — Possibilidade jurídica. I — O dano


moral constitui lesão a direitos da personalidade e sua configuração se efetiva com o
abalo sentim ental da pessoa em sua consideração pessoal ou social, enquanto o
dano estético pressupõe seqüela física, tratando-se de lesão que com prom ete ou
altera a harmonia física da vítima. II — Apesar de não haver distinção ontológica entre
o dano moral e o dano estético, esse se constitui numa subespécie daquele, visto que
inconfundíveis os bens cuja reparação se procura obter, circunstância que dilucida a
p o ssib ilid a d e ju ríd ic a da cu m u la çã o das re sp e ctiva s in d e niza çõ e s, sem que se
materialize o coibido bis in idenn. Recurso conhecido e desprovido.” TST. 4- Turma.
RR n. 78003/2005-092-09-00.0, Rei.: Ministro Antônio José de Barros Levenhagen,
DJ 30 maio 2008.

“Dano m oral e dano estético — Cum ulação. Adm ite-se a cum ulação dos danos
moral e estético, ainda que derivados do mesmo fato, quando possuem fundam entos
distintos. O dano moral é compensável pela dor e constrangim ento impostos ao autor
e o dano estético pela anomalia que a vítim a passou a ostentar. O dano estético afeta
‘a integridade pessoal do ser humano, em geral, e em particular a harm onia física,
c o n c e b id a s co m o m a te ria liz a ç ã o de um d ire ito h u m a n o g a ra n tid o no n ív e l
c o n s titu c io n a l.’ Ele poderá ser o re su lta d o de um a fe rid a que gera cica triz, da
amputação de um membro, falange, orelha, nariz, olho ou outro elemento da anatom ia
hum ana. Q uando se constata que um sem elhante possui algum a parte do corpo
alterada em relação à imagem que tinha formado o observador, o fato causa impacto
a quem percebe através de seus sentidos. É inegável que esse dano estético provoca
também impacto sobre a percepção da própria vítima, afetada com a diminuição da
harm onia corporal. O que se visa proteger não é a beleza, valor relativo na vida
c o tid ia n a , m as g a ra n tir as c irc u n s tâ n c ia s de re g u la rid a d e , h a b itu a lid a d e ou
norm alidade do aspecto de uma pessoa; busca-se reparar que o ser humano, vítima
da cicatriz, se veja como alguém diferente ou inferior, ante a curiosidade natural dos
outros, na vida de relação. A reparação não resulta, portanto, do fato de a cicatriz ser
repulsiva, em bora essa circ u n s tâ n c ia possa a u m e n ta r o qu antum re ssa rcitó rio ,
tam pouco de ser sanada mediante uma cirurgia plástica, fato que poderá atenuar o
valor da indenização (GRANDOV, Baildomero e BASCARY Miguel Carrillo. Cicatrices.
Dano estético y derecho a Ia integridad física. Rosário: Editora FAZ, 2000, p. 34 e 40).”
Minas Gerais. TRT. 3® Região. 2- Turma. RO n. 01771-2002-032-03-00-2, Rei.: Juíza
Alice Monteiro de Barros. Revista LTr, São Paulo, v. 68, n. 3, p. 361, mar. 2004.
260 S e b a s t iã o G eraldo de O liveira

Em 2009, o Colendo Superior Tribunal de Justiça aprovou Súmula


pacificando o entendimento a respeito da possibilidade da cumulação: Súmula
387 — É licita a cumulação das indenizações de dano estético e dano mora

8.6. Perda de uma chance

Inicialmente, a ciência jurídica só admitia a reparação do dano material


ou patrimonial, mormente porque o prejuízo era visível e mensurável. No fina
do século XX, ampliou-se o entendimento em favor da vítima, no sentido de
que também seria cabível indenizar o dano moral e o dano estético. Atualmente,
já se vislumbra o surgimento de novas categorias de danos indenizáveis,
tanto que o Código Civil de 2002, na linha desse movimento expansionista,
relacionou no art. 948 as indenizações cabíveis no caso de homicídio, mas
deixou a ressalva: “sem excluir outras reparações.” Também o art. 949, quando
indica os danos indenizáveis provenientes de lesão ou outra ofensa à saúde,
assegura o complemento da reparação “de algum outro prejuízo que o ofendido
prove haver sofrido.”
Não há mais dúvidas, portanto, quanto ao cabimento da reparação dos
danos materiais, morais e estéticos. Contudo, o dano indenizável deve ser
certo, atual e subsistente. Não cabe indenizar o dano incerto, hipotético ou
que eventualmente possa ocorrer. Daí por que o art. 403 do Código Civil
restringe a indenização ao dano direto e imediato, ou seja, “as perdas e danos
só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e
imediato.”
Entretanto, o progresso da civilização impulsiona também o aperfeiçoa­
mento do Direito, possibilitando o advento de novas figuras jurídicas para
tutelar a reparação de lesões mais sutis, até então inobservadas. É certo que
só o dano efetivo deve ser indenizado, não cabendo reparação de danos
apenas hipotéticos. Mas qual a consequência jurídica quando o ato ilícito im­
pede um provável ganho ou vantagem, deixando a vítima frustrada, com a
quase certeza de ter sido prejudicada? O evento danoso não causou um
prejuízo concreto, mas impediu a chance de obter um ganho provável. Exata­
mente para essa situação é que foi desenvolvida a teoria da indenização pela
perda de uma chance<64).

(64) A ponta-se como prim eiro julgam ento no Brasil aplicando a teoria da perda de uma
chance um acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, do ano de 1990, com a
seguinte ementa: “ R esponsabilidade civil. Médico. Cirurgia seletiva para correção de miopia,
resultando névoa no olho operado e hipermetropia. Responsabilidade reconhecida, apesar
de não se tratar, no caso, de obrigação de resultado é de indenização por perda de uma
chance.” TJRS. 5- Câm ara, A pelação cível n. 589069996, Rei.: Ruy Rosado de A guiar
Júnior, julgado em 12 jun. 1990. Disponível em: <www .tjrs.jus.br>.
•o e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 261

A perda de uma chance, como categoria nova, engloba um percentual


do provável dano, que pode abranger tanto o lucro cessante como o dano
emergente. Pode, ainda, gerar indenização por danos morais, em razão da
'te n s a decepção ou frustração causada. Desse modo, não pode ser
enquadrada, no sentido estrito, como dano emergente, lucro cessante ou dano
—loral. Daí por que Raimundo Simão de Melo situa a perda de uma chance em
,Tia terceira espécie intermediária de dano, localizada entre o dano emergente
e o lucro cessante(65). Aliás, por ocasião da V Jornada de Direito Civil, realizada
em 2011, foi aprovado o Enunciado 444, com o teor seguinte: “Art. 927: A
'esponsabilidade civil pela perda de chance não se limita à categoria de danos
extrapatrimoniais, pois, conforme as circunstâncias do caso concreto, a chance
oerdida pode apresentar também a natureza jurídica de dano patrimonial. A
:hance deve ser séria e real, não ficando adstrita a percentuais apriorísticos.”

Em muitas ocasiões, o acidente do trabalho ou a doença ocupacional


provoca a incapacidade total ou parcial da vítima, de forma permanente ou
temporária, retirando-lhe a chance de alcançar provável vantagem ou pro­
gresso na carreira. Deve-se indenizar, então, a chance perdida e não o dano
provável, ou seja, um percentual referente à probabilidade de ganho que aca-
oou frustrada.

Vejam uma hipótese que vem ocorrendo com relativa frequência: um


:'abalhador da área bancária fazia o transporte valores no seu veículo
particular, levando numerário de um posto de atendimento até a agência
central, acima dos limites permitidos pela legislação. No percurso foi vítima
de assalto, sofreu lesões diversas e ficou internado por vários meses, antes de
obter a alta hospitalar. Apesar do tratamento recebido, ficaram seqüelas
definitivas que praticamente comprometeram sua capacidade de trabalho.
Ocorre que esse trabalhador estava na etapa final de um concurso para ocupar
cargo público cujos vencimentos eram quatro vezes superiores ao salário de
oancário. Além disso, contava com reais chances de êxito, pois já havia
superado as fases eliminatórias; contudo, não pôde comparecer para a última
etapa, perdendo a aprovação tão almejada.

Não se pode garantir que o referido trabalhador teria sido aprovado nessa
última etapa, mas suas possibilidades eram grandes, especialmente porque
já havia superado as etapas mais difíceis e concorridas do certame. O seu
prejuízo real, em razão do acidente do trabalho sofrido, foi a perda da chance
de continuar participando do concurso. Desse modo, a indenização não pode

(65) MELO, Raimundo Simão de. Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador. 3.
ed. São Paulo: LTr, 2008. p. 357. De forma semelhante, pontua Sérgio Cavalieri: “Há forte
corrente doutrinária que coloca a perda de uma chance como terceiro gênero de indenização,
a m e io c a m in h o e n tre o d a n o e m e rg e n te e o lu c ro c e s s a n te .” C f. P rogram a de
responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 84.
262 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

ser calculada tendo em conta o dano provável (os vencimentos do cargo


público), porquanto deve ser considerada a perda da chance de participar do
final do concurso, cujas principais etapas o trabalhador já havia superado. A
reparação, convém frisar, não é do dano total — a não ser que, já aprovado,
o trabalhador só estivesse aguardando a nomeação — , mas da perda da
chance do provável êxito, ou seja, a indenização não poderá ser da importância
integral do possível dano, mas do valor percentual da chance perdida. Vejam
a respeito a doutrina do jurista Dallegrave Neto:

“É importante esclarecer que na aplicação da teoria da perda de uma


chance não se indeniza o valor integral referente à perda de um pretenso
resultado favorável, até porque o resultado esperado se baseia numa
mera probabilidade de que haveria o ganho. Em verdade, o que se indeniza
é a perda da possibilidade (perda da chance) de conseguir aquela
determinada vantagem ou resultado.”(66)

Para que fique caracterizada a perda de uma chance, é imprescindível


que o evento danoso tenha impedido uma real probabilidade da vantagem, e
não uma simples possibilidade, até para não vulgarizar a figura jurídica,
colocando em descrédito essa nova m odalidade de indenização, como
assevera Sérgio Cavalieri:

“A vantagem esperada pelo lesado não pode consistir numa mera


eventualidade, suposição ou desejo, do contrário estar-se-ia premiando
os oportunismos, e não as oportunidades perdidas. (...) A perda de uma
chance, de acordo com a melhor doutrina, só será indenizável se houver
a probabilidade de sucesso superior a cinqüenta por cento, de onde se
conclui que nem todos os casos de perda de uma chance serão
indenizáveis.”(67)

No Brasil, ficou muito conhecido um caso de perda de uma chance (ou


perda de oportunidade) julgado na Bahia e apreciado, posteriormente, pelo
Superior Tribunal de Justiça. Uma participante do programa televisivo Show
do Milhão, Ana Lúcia de Freitas Matos, foi superando as etapas e alcançando
prêmios progressivos até acertar a pergunta que valia R$ 500.000,00. Chegou,
finalmente, o grande momento, a pergunta do milhão: Qual o percentual do
território nacional que a Constituição reserva aos indígenas? Foram indicadas
quatro opções de respostas: 22%, 2%, 4% e 10%. Se a participante acertasse
a resposta, ganharia a fabulosa quantia de um milhão de reais; se desistisse

(66) DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 4.


ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 227.
(67) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 81-82.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 263

naquela etapa, ganharia R$ 500.000,00 e, finalmente, se errasse a resposta,


ganharia apenas R$ 300,00. Depois de refletir por alguns instantes sobre a
oergunta e as respostas indicadas, por cautela, a participante preferiu desistir
e garantir os R$ 500.000,00.
Posteriormente, quando foi analisar com mais cuidado a pergunta,
constatou que não há dispositivo algum na Constituição Federal sobre o
oercentual de reserva de terra aos indígenas. Observou que esse percentual
navia sido obtido na Enciclopédia Barsa e que a pergunta fora mal formulada,
tirando-lhe a chance de tentar ganhar o prêmio de um milhão de reais. Decidiu,
então, ajuizar ação indenizatória postulando o valor total do prêmio.

Obteve o deferimento do pedido na primeira e na segunda instâncias,


mas a em presa prom otora do evento (BF Utilidades) recorreu ao STJ,
requerendo a improcedência do pedido ou, no máximo, que fosse deferida a
indenização proporcional pela perda de uma chance. E foi nesse sentido que
o STJ decidiu. A chance que a autora teria de acertar, se a pergunta tivesse
sido formulada corretamente, seria de no mínimo 25%, visto que havia quatro
opções de resposta. Então, o recurso foi provido para limitar o deferimento ao
pagamento de mais R$125.000,00. Vejam a ementa do acórdão respectivo:
“Recurso Especial. Indenização. Im propriedade de pergunta form ulada em pro­
gram a de televisão. Perda da oportunidade. 1. O questionamento, em programa de
perguntas e respostas, pela televisão, sem viabilidade lógica, uma vez que a Consti­
tuição Federal não indica percentual relativo às terras reservadas aos índios, acarre­
ta, com o decidido pelas instâncias ordinárias, a im possibilidade da prestação por
culpa do devedor, impondo o dever de ressarcir o participante pelo que razoavelm en­
te haja deixado de lucrar, pela perda da oportunidade. 2. Recurso conhecido e, em
parte, provido.” STJ. 49 Turma. REsp n. 788.459-BA, Rei.: Ministro Fernando Gonçal­
ves, DJ 13 mar. 2006.

Acreditamos até que seria mais razoável deferir o percentual de 50% —


pelo desempenho demonstrado nas etapas anteriores — , mas esse acórdão
do STJ de 2006 teve o mérito de servir de paradigma para diversos outros
casos, que estão hoje em tramitação nos tribunais.

A indenização pela perda de uma chance não se equipara àquela prevista


no art. 129 do Código Civil: “Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos,
a condição cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem
desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não verificada a condição
maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento.”
Na perda de uma chance, indeniza-se um provável prejuízo; na hipótese do
art. 129, considera-se implementada a condição, apurando-se o dano total.
Nesse sentido, pontua com propriedade Dallegrave Neto:

“A hipótese do art. 129 do CC é diversa da teoria da perda de uma chance,


pois nessa o agente viola o direito de buscar um resultado positivo que
264 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

poderia, ou não, ser alcançado. Já na hipótese prevista no art. 129 do


CC a condição maliciosamente obstada já era suficiente para a produção
integral dos efeitos jurídicos buscados pela parte credora da obrigação.”(68)

Na jurisprudência, encontram os vários casos de ações envolvendo


indenização por perda de chance contra advogados que perderam o prazo
de recurso ou não atentaram para o cumprimento dos pressupostos recursais.
Naturalmente que nesses casos, mesmo quando provada a alegação, não
se defere a indenização considerando o êxito total do recurso não processado
ou admitido, mas se defere um percentual da probabilidade de êxito que o
cliente prejudicado teria na reforma da decisão.

Voltando ao tema da perda de uma chance em decorrência de acidente


do trabalho, no cálculo da indenização cabível, depois de verificar os
pressupostos da responsabilidade civil (dano, nexo causal e culpa ou risco),
deve-se encontrar o valor da vantagem obstada, qual seja, o que o acidentado
poderia ter alcançado pela ordem natural das coisas. Em seguida, calcula-
-se, com base nos elementos dos autos, qual o grau de probabilidade que o
autor teria de alcançar a referida vantagem, fixando-se um percentual, como,
por exemplo, 60%. Desse modo, a indenização pela perda da chance será
correspondente a 60% do provável benefício que o acidentado alcançaria,
não fosse a intercorrê ncia do acidente do trabalho. O percentual de
probabilidade deve ser arbitrado com razoabilidade, podendo-se invocar como
fundamento a parte final do art. 402 do Código Civil: as perdas e danos
abrangem o que razoavelmente a vítima deixou de ganhar.

Atualmente, as decisões dos tribunais oferecem um considerável acervo


de condenações a respeito da indenização pela perda de uma chance, sendo
oportuno transcrever algumas ementas:
3.Teoria da chance perdida. Probabilidade séria e real de auferir vantagem.
Subtratação abrupta da oportunidade de obter ganho futuro, intensa sensação de
perda. Enquadramento na modalidade de dano moral. Possibilidade. 3.1. A dinâmica
da sociedade moderna, a despeito de prom over integração e crescimento, imprescinde
de mecanismo capaz de atuar tanto na prevenção de lesões, quanto na restauração
integral de prejuízos já consumados. 3.2. O impulso dessa estrutura contemporânea,
ao fom entar o aparecim ento de novos danos à pessoa, prom ove a edificação de
diferentes propostas de reparação, dentre elas: a teoria da perda da oportunidade de
obter vantagem certa e determinada “perte d ’une chance” , sob a perspectiva da ação
ou omissão responsável pela interrupção do curso natural do processo, antes, portanto,
da realização de seu objeto. 3.3. Sobreleva notar que somente a chance séria e real,
aqui com preendida com o a probabilidade de auferir ganho futuro, é que adm ite a
configuração dessa espécie de dano, pois, do contrário, ter-se-ia o ressarcim ento
indiscriminado de esperanças aleatórias ou hipotéticas. 3.4. Nesse contexto, não se

(68) DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 4.


ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 234.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 265

adm ite a reparação da perda da própria vantagem , mas do prejuízo decorrente da


subtração da chance de obter o resultado esperado, realidade que repercute, inclusive,
no valor da indenização. 3.5. A presença dos requisitos que dão alento à configuração
da responsabilidade pela perda da chance recomenda a apreciação da causa, sob o
enfoque de prejuízos m ateriais ou im ateriais. R ecurso de revista não conhecido.”
TST. 3- Turma. RR n. 93100-69.2003.5.07.0006, Rei.: Ministro Alberto Luiz Bresciani
de Fontan Pereira, DJ 14 set. 2012.

“D ireito civil e processual civil. R ecurso especial. 1) N egativa de prestação


jurisdicional afastada. 2) Perda de chance que gera dever de indenizar. 3) Candidato
a vereador, sobre quem publicada notícia falsa, não eleito por reduzida margem
de votos. 4) Fato da perda da chance que constitui matéria fática não reexaminável
pelo STJ. I — Os Embargos de Declaração são corretamente rejeitados se não há
omissão, contradição ou obscuridade no acórdão embargado, tendo a lide sido dirimida
com a devida e suficiente fundam entação. II — As Turm as que compõem a Segunda
Seção desta Corte vêm reconhecendo a possibilidade de indenização pelo benefício
cuja chance de obter a parte lesada perdeu, mas que tin h a possibilidade de ser
obtida. III — A plica-se a teoria da perda de uma chance ao caso de candidato a
Vereador que deixa de ser eleito por reduzida diferença de oito votos após atingido
por notícia falsa publicada por jornal, resultando, por isso, a obrigação de indenizar.
IV — Tendo o Acórdão recorrido concluído, com base no firmado pelas provas dos
autos, no sentido de que era objetivam ente provável que o recorrido seria eleito
vereador da Comarca de Carangola, e que esse resultado foi frustrado em razão de
conduta ilícita das rádios recorrentes, essa conclusão não pode ser revista sem o
revolvim ento do conteúdo fático-probatório dos autos, procedimento vedado em sede
de Recurso Especial, nos termos da Súmula 7 desta Corte. V — Recurso Especial
im provido.” STJ. 3ã Turma. REsp n. 821.004/MG, Rei.: Ministro Sidnei Beneti, DJe 24
set. 2010.

“Processual Civil e Direito Civil. Responsabilidade de advogado pela perda do


prazo de apelação. Teoria da perda da chance. A plicação. Recurso especial.
A dm issib ilid ad e. D eficiência na fu n dam entação. N ecessidade de revisão do
contexto fático-probatório. Súm ula n. 7, STJ. Aplicação. — A responsabilidade do
advogado na condução da defesa processual de seu cliente é de ordem contratual.
Embora não responda pelo resultado, o advogado é obrigado a aplicar toda a sua
diligência habitual no exercício do mandato. — Ao perder, de form a negligente, o
prazo para a interposição de apelação, recurso cabível na hipótese e desejado pelo
mandante, o advogado frustra as chances de êxito de seu cliente. Responde, portanto,
pela perda da probabilidade de sucesso no recurso, desde que tal chance seja séria
e real. Não se trata, portanto, de reparar a perda de ‘uma simples esperança subjetiva’,
nem tam pouco de conferir ao lesado a integralidade do que esperava ter caso obtivesse
êxito ao usufruir plenamente de sua chance. — A perda da chance se aplica tanto aos
danos m ateriais quanto aos danos m orais. — A hipótese revela, no entanto, que
os danos materiais ora pleiteados já tinham sido objeto de ações autônom as e que o
dano moral não pode ser m ajorado por deficiência na fundam entação do recurso
especial. — A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.
A plicação da S úm ula 7, STJ. — Não se conhece do Especial quando a decisão
recorrida assenta em mais de um fundam ento suficiente e o recurso não abrange
todos eles. Súmula 283, STF. Recurso Especial não conhecido.” STJ. 3- Turma. REsp
n. 1079185/MG, Rei.: Ministra Nancy Andrighi, DJe 4 ago. 2009.

“Agravo Interno. Decisão M onocrática em Apelação Cível que negou provimento ao


recurso interposto pela agravante em face de sentença que a condenou ao pagamento
266 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

de indenização por danos materiais e compensação por danos morais sofridos pelo
agravado, em virtude de lesão ocasionada no interior de coletivo da ré, que impediu
o autor de prosseguir em concurso público para Inspetor de Segurança Penitenciária
(prova de capacitação física). Perda de uma chance. R esponsabilidade Objetiva.
Correta valoração das provas. (....) Improvimento do Recurso.” TJRJ. 2a Câm. Cívei.
Apelação n. 2009.001.00165, Rei.: Des. Alexandre Câmara, julgado em 28 jan. 2009.

“ R espo n sabilid ade civil. V antagem séria e real perdida pelo em pregado em
decorrência de ato ilícito do empregador. Perda de uma chance. Dano patrimonial
in d en izável. A te o ria da responsabilidade civil pela perda de uma chance torna
in d e nizá ve l a p ro b a b ilid a d e sé ria de o b te n ç ã o de um re s u lta d o le g itim a m e n te
esperado que é obstado por ato ilícito praticado pelo agente ofensor. Se o reclamante
tinh a com o ju sta e real a probabilidade de um ganho salarial decorrente de sua
prom oção ao cargo de supervisor de vendas da reclam ada, porque aprovado em
processo seletivo interno da empresa, mas viu perdida a chance de conquistar esse
resultado em razão de ato ilícito praticado pelo empregador, quando da sua dispensa,
m anifestam ente abusiva e ilícita, faz jus à reparação patrim onial decorrente deste
ilícito (...).” TRT 3a Região. RO n. 01533-2007-112-03-00-5, Rei.: Desem bargador
Emerson José Alves Lage, DJ 02 out. 2008.

8.7. Do risco ergonômico para o risco econômico

O aperfeiçoamento da legislação sobre a saúde do trabalhador passou


a interessar ao planejamento estratégico das empresas, porquanto os riscos
envolvidos em razão dos acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais,
como visto, podem gerar expressivas indenizações, além de comprometer a
imagem institucional da empresa.

Enquanto a norma praticamente se limitava a conclamar o sentimento


humanitário dos empresários, pouco resultado foi obtido; agora, quando o
peso das indenizações assusta e até intimida, muitos estão procurando cum­
prir a lei, adotando políticas preventivas, nem sempre por convicção, mas até
mesmo por conveniência estratégica. Gostando ou não do assunto, concor­
dando ou discordando da amplitude da proteção, o certo é que o empresário
contemporâneo, com vistas à sobrevivência do seu empreendimento, terá de
levar em conta as normas a respeito da saúde no ambiente de trabalho e a
proteção à integridade física e mental dos seus empregados.
É provável que o vulto das indenizações acabe sendo o melhor e mais
convincente “argumento” para estimular os empresários descuidados a ze­
lar pela integridade física e pela saúde dos seus empregados. “Os danos e
custos que produzem os acidentes em serviço são de tal magnitude que a
empresa tem que compreender que é mais econômico prevenir do que inde­
nizar. O custo social não se esvazia com o pagamento do seguro social ou
com eventuais indenizações, no mais das vezes onerosas. Alastra-se negati­
vamente na economia do país. Além dos gastos com prestações em dinheiro e
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 267

em serviço, desvigoram a capacidade de produção da maior potencialidade


:e uma nação, que é a sua população economicamente ativa.”(69)

Na avaliação das empresas em processo de negociação, os consultores


especializados já estão computando a extensão do “passivo patológico”
ecumulado, orientando e prevenindo os compradores interessados sobre os
' scos envolvidos em eventuais ações indenizatórias.
Começa-se a tomar consciência de que o valor principal que o empresário
: irige é o homem enquanto trabalhador, para o qual devem convergir a
: rioridade da proteção e a função social da propriedade. O aprimoramento da
rivilização no mundo inteiro vem indicando que produtos, mercadorias, bens
de consumo, serviços e resultado econômico só se justificam do ponto de
. ista ético quando esse valor principal for preservado(70).

Na seqüência deste pensamento vale citar a opinião do jurista e Promotor


de Justiça de acidente do trabalho de São Paulo Antônio Lopes Monteiro:
“O dia em que o grau de sensibilidade de todos, Estados, empregadores
e operários, ultrapassar a visão do casuísmo indenizatório ou reparatório,
e leve a tratar a questão do acidente do trabalho e doença ocupacional,
e portanto, do trabalhador, com o respeito e a dignidade que merecem,
não precisaremos mais recorrer às teorias da responsabilidade aquiliana,
contratual ou objetiva para demonstrar os direitos do trabalhador. Serão
simples direitos da cidadania.”(71)

(69) SAAD, Teresinha Lorena P. Previdência Social como instrum ento de prevenção dos
riscos do trabalho. Revista de Previdência Social, São Paulo, v. 20, n. 190, p. 782, set. 1996.
70) O art. 2:102 (2) dos Princípios de Direito Europeu de responsabilidade civil estabelece:
'A vida, a integridade física ou psíquica, a dignidade hum ana e a liberdade gozam de
croteção mais extensa.”
71) MONTEIRO, Antônio Lopes. Os aspectos legais da tenossinovite. In: CODO, W anderley;
^LMEIDA, Maria Celeste C. G. de (Org.). LER: diagnóstico, tratamento e prevenção: uma
-oordagem interdisciplinar. Petrópolis: Vozes, 1995. p. 281.
CAPÍTULO 9

INDENIZAÇÕES NOS ACIDENTES


DO TRABALHO COM ÓBITO

9.1. Considerações iniciais

Uma vez constatado o dano, conforme abordamos no Capítulo anterior,


e estando presentes os demais pressupostos da responsabilidade civil, cabe
dimensionar os valores das indenizações e as formas de pagamento. Neste
Capítulo, no entanto, vamos abordar somente as reparações decorrentes do
acidente do trabalho com morte, em razão das singularidades quanto à
apuração dos danos, identificação dos beneficiários, quantificação dos valores
e duração do pensionamento.

0 Código Civil tem regra específica para as indenizações devidas quando


ocorre a morte da vítima, com aplicação indiscutível nas hipóteses de acidente
do trab alh o, se os pressupostos da respon sabilid ade civil estiverem
comprovados:
“Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:

1 — no pagamento das despesas com o tratam ento da vítima, seu funerai e o luto da
fam ília;

II — na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em


conta a duração provável da vida da vítim a.”

O bserva-se no dispositivo legal transcrito que os danos m ateriais


emergentes estão indicados no Inciso I; os lucros cessantes, no Inciso II, e
os outros danos podem ser enquadrados na ressalva contida no caput do
artigo.

Cabe mencionar, todavia, que o dano indenizável não é a morte da vítima


em si, mas os desembolsos ou prejuízos materiais ou morais dela decorrentes.
A ssim , um m esm o a cid e n te que a ca rre te vá rio s ó b ito s pode g e ra r
indenizações de valores diferentes em razão das características peculiares
dos dependentes de cada vítima. É por isso que, na maioria das vezes, o
'ÍDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 269

espólio não tem legitimidade para postular as indenizações por danos materiais
du morais, já que os titulares desse direito serão aqueles que foram diretamente
afetados(1).
O acréscimo da expressão “sem excluir outras reparações”, introduzida
no caput do art. 948 acima mencionado, veio para corrigir uma falha muito
oriticada do Código Civil anterior. Isso porque a interpretação literal do art.
1.537 limitava a indenização às verbas referentes ao tratamento da vítima,
:uneral, luto da família e aos alimentos aos dependentes do morto. Dessa
;orma, a reparação no caso concreto nem sempre atendia ao princípio milenar
da restitutio in integrum, já que podia gerar redução dos rendimentos do núcleo
familiar do falecido.

É verdade que a jurisprudência, mesmo na vigência do Código Civil


anterior, evoluiu para abandonar a interpretação meramente gramatical daquele
dispositivo, mas agora o novo texto consagra o entendim ento de que a
indicação das parcelas indenizatórias é meramente exemplificativa, ou seja,
qualquer prejuízo que restar comprovado, decorrente do acidente, é passível
de reparação(2). Além disso, a previsão expressa do cabimento de “outras
reparações” consolida a percepção de que o pagamento dos lucros cessantes
não se limita à concessão singela de alimentos aos dependentes da vítima.
Fica evidente que a indenização aos prejudicados deve ser ampla e completa,
abrangendo, dentre outras, a parcela dos alimentos.

9.2. Apuração e reparação dos danos

9.2.1. Danos emergentes

A indenização dos danos emergentes no acidente do trabalho com óbito


consiste no pagamento das despesas de tratamento da vítima, o funeral e o
luto da família (art. 948, i, do Código Civil). Doutrina e jurisprudência entendem
que estão abrangidos nos danos emergentes: despesas com tratamento
médico ou hospitalar; remoção do corpo da vítima, quando for o caso; gastos

(1) Vamos indicar os beneficiários do pensionam ento no item 9.4 e dos legitimados para
postular a indenização por danos morais no item 9.9.
(2) Carlos Roberto Gonçalves, ao com entar o art. 948 do atual Código Civil em comparação
com o art. 1.537 do Código anterior, anota: “Atribui-se a esse dispositivo o defeito de haver,
de certo modo, limitado a matéria da indenização. A interpretação literal, restritiva, perdurou
durante largo tempo. Aos poucos, entretanto, uma jurisprudência mais evoluída passou a
e n te n d e r que o art. 1.537 d e v ia s e r in te rp re ta d o com o m e ra m e n te e n u m e ra tiv o ou
e x e m p lific a tiv o de ve rb a s que devem n e c e s s a ria m e n te c o n s ta r da in d e n iz a ç ã o .” In:
Comentários ao Código Civil: parte especial: direito das obrigações. São Paulo: Saraiva,
2003. v. 11, p. 529.
270 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

diversos com os funerais, jazigo perpétuo ou a construção de mausoléu, de


acordo com os usos e costumes adotados pela classe social da vítima. Outros
danos comprovados também poderão ser objeto de ressarcimento, já que a
indicação legal é meramente exemplificativa.
Para evitar controvérsias sobre o quantum desembolsado, as despesas
devem ser comprovadas mediante recibos detalhados ou notas fiscais, le­
vando-se em conta, ainda, as tradições locais e os cultos religiosos prati­
cados pelos familiares do morto. Se não houver documentos com probatórios
das despesas, o valor será arbitrado pelo julgador, podendo-se invocar ana-
logicamente a Lei n. 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos
servidores públicos civis da União, cujo art. 226 prevê: “O auxílio-funeral é
devido à família do servidor falecido na atividade ou aposentado, em valor
equivalente a um mês da remuneração ou provento. § 1s No caso de acumu­
lação legal de cargos, o auxílio será pago somente em razão do cargo de
maior remuneração.”

Os danos emergentes devem ser ressarcidos de imediato e de uma só


vez, para recompor logo o patrimônio dos prejudicados, devendo-se apurar
todos os valores efetivamente despendidos, com apoio no princípio da restitutio
in integrum. Vale assinalar que o titular do direito ao ressarcimento é aquele
que efetivamente arcou com tais despesas, não sendo necessariamente os
dependentes diretos do acidentado®. Ademais, prevê o art. 943 do Código
Civil que “o direito de exigir a reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-
-se com a herança.”

9.2.2. Lucros cessantes ou pensão

A indenização dos lucros cessantes decorrentes da morte do acidentado


abrange a prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia,„
levando-se em conta a duração provável da vida da vítima (art. 948, II, do
Código Civil). A abordagem genérica quanto aos lucros cessantes foi feita no
item 8.3.3 do Capítulo anterior, cujas conclusões são aqui aplicáveis, sendo
desnecessária a repetição. Cabem, no entanto, algumas considerações
adicionais.

A morte do acidentado, por óbvio, interrompe os rendimentos gerados


pelo contrato de trabalho; consequentemente, a indenização tem o propósito
de assegurar ao grupo familiar que dependia da vítima o mesmo padrão de

(3) Em situação análoga, é oportuno citar o entendimento adotado pelo Colendo STJ: “Tem
legítim o interesse para p leitear indenização a pessoa que detinha a posse do veículo
sinistrado, independentemente de título de propriedade.” STJ. 3a Turma. Resp n. 5.130-SP,
Rei.: Ministro Dias Trindade, julgado em 8 abr. 1991.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o o u D oença O c u p a c io n a l 271

'enda até então mantido. Daí mencionar o art. 402 do Código Civil que as
oerdas e danos abrangem o que o prejudicado perdeu mais o que razoavel­
mente deixou de lucrar, ou de receber no caso do acidente do trabalho.

A lógica do cálculo dos lucros cessantes leva em conta os rendimentos


que a vítima percebia e não as necessidades dos seus dependentes. Como
adverte Aguiar Dias, “o que se procura, com a indenização, é restabelecer o
status quo anterior ao dano. A indenização não empobrece nem enriquece. O
responsável é obrigado a repor os beneficiários da vítima na situação em que
estariam, sem o dano.”<4) A concepção dos alimentos aqui tem enfoque e
natureza diferentes do que ocorre no Direito de Família, como veremos no
item 9.3.

Entendemos que no caso de morte do acidentado não se aplica a inova­


ção do parágrafo único do art. 950 do Código Civil, que faculta ao prejudicado
exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez. Tal exceção,
de acordo com a técnica de elaboração legislativa, vincula-se somente à pre­
visão do caput do art. 950 (quando a vítima sobrevive ao acidente), não se
aplicando ao que prevê o art. 948 (quando a vítima morre em razão do aci­
dente). Na primeira hipótese, o beneficiário da indenização é a própria vítima,
enquanto sobreviver; no caso de morte, os destinatários são os dependentes
da vítima, de acordo com as limitações temporais estabelecidas. Se a inten­
ção do legislador fosse estender a opção do pagamento de uma só vez para
todas as hipóteses de pensionamento decorrentes dos atos ilícitos, a inova­
ção viria em artigo independente e não como parágrafo único do art. 950.

Com efeito, considerando que o salário do empregado deve ser pago a


cada mês(5), também a indenização por lucros cessantes deverá ser paga
mensalmente, sob a forma de pensionamento. Aliás, quando a indenização
por ato ilícito incluir prestação de alimentos, estabelece o art. 475-Q do Código
de Processo Civil que o juiz poderá determinar a constituição de capital para
garantir o cumprimento da prestação mensal da pensão. E o provimento
alimentar, como sua própria natureza indica, prolonga-se no tempo e não se
esgota num ato isolado ou num pagamento único.

O pensionamento decorrente do acidente do trabalho com óbito comporta


diversas variáveis de estudo quanto à sua natureza jurídica, valores devidos,
beneficiários, base de cálculo, garantias, limites temporais, termo final, direito
de acrescer etc. Para facilitar a localização desses temas controvertidos,

(4) DIAS, José de Aquiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 756.
(5) CLT. Art. 459. “O pagamento do salário, qualquer que seja a modalidade de trabalho,
não deve ser estipulado por período superior a um mês, salvo o que concerne a comissões,
percentagens e gratificações.”
272 S e b a s t iã o G eraldo de O liv e ir a

resolvem os destinar mais adiante tópicos específicos nos quais serão


analisadas as principais discussões.

9.2.3. Danos morais

O enfoque genérico a respeito dos danos morais e dos critérios para o


seu arbitramento foi feito no Capítulo 8, item 4, ao qual nos reportamos. Neste
tópico, vamos acrescentar abordagens específicas dos danos morais no
acidente que tenha causado a morte do trabalhador.

É questão pacífica atualmente que o acidente fatal, quando preenchidos


os pressupostos da responsabilidade civil, acarreta danos m orais aos
familiares da vítima. Além do fundamento do art. 5Q, X, da Constituição de
1988, o Código Civil de 2002 prevê expressamente o dano moral no art. 186<6).
Por outro lado, o acréscimo da expressão “sem excluir outras reparações”,
no caput do art. 948 do mesmo Código, permite a inclusão do dano moral nas
indenizações provenientes da morte por acidente do trabalho.

Diga-se, a propósito, que o dano moral pode ser também deduzido do


próprio art. 948, I, do Código Civil, que determina o pagamento do “luto da
família.” Segundo Azevedo Marques, o luto da família não deve ser entendido
apenas como vestimentas lúgubres, mas, no dizer dos léxicos, o profundo
sentimento de tristeza causado pela perda de pessoa cara ou a tristeza
profunda causada por desgostos e sofrimentos. Acrescenta, ainda, que “o
luto não é somente o sinal de dor, é a própria dor; é o sofrimento moral íntimo;
donde surge para logo, necessariamente, logicamente, a ideia de dano, ou
melhor, de dor moral, esteja ou não escrito nas leis.”(7)
Comentando o dano moral proveniente de morte causada por ato ilícito,
registra, com autoridade na matéria, Yussef Cahali:
“No estágio atual de nosso Direito, seja em função de sua maturada
evolução histórica, seja agora em função dos preceitos genéricos do
art. 5Q, V e X, da Constituição de 1988, já não mais cabe questionar a
respeito da indenizabilidade do chamado dano moral puro; e, por evidência,
também se reconhece que o homicídio é causa geradora de lesão aos
sentimentos não patrimoniais das pessoas vinculadas, como parentes
ou aliados, ao falecido. (...) Seria até mesmo afrontoso aos mais sublimes
sentimentos humanos negar-se que a morte de um ente querido, familiar

(6) C ódigo Civil. “Art. 186. A quele que, por ação ou om issão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete
ato ilícito.”
(7) A pu d STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 1.421.
MDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 273

ou companheiro, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de


fácil e objetiva percepção. (...) Não mais se questiona que esses
sentimentos feridos pela dor moral comportam ser indenizados; não se
trata de ressarcir o prejuízo material representado pela perda de um
familiar economicamente proveitoso, mas de reparar a dor com bens de
natureza distinta, de caráter compensatório e que, de alguma forma,
servem como lenitivo.”(8)
A indenização arbitrada a título de dano moral deverá ser paga de uma
só vez, juntam ente com os valores apurados para ressarcir os danos
emergentes. O pagamento em parcela única atende de modo mais completo
as duas finalidades básicas da condenação por dano moral: dar uma
compensação imediata para atenuar a dor e acalmar a revolta dos dependentes
da vítima, bem como servir de desestímulo para novos comportamentos ilícitos
cor parte do lesante(9).
Não cabe o pagamento em parcelas, na forma de pensionamento, como
ocorre com os lucros cessantes, porque a indenização por dano moral não
:em natureza alimentar ou de ressarcimento. Como assevera Carlos Roberto
Gonçalves, “enquanto o ressarcimento do dano material procura colocar a
vítima no estado anterior, recompondo o patrimônio afetado mediante a
aplicação da fórmula ‘danos emergentes-lucros cessantes’, a reparação do
ja n o moral objetiva apenas uma compensação, um consolo, sem mensurar
a dor.”<10>
Tem sido esse também o posicionamento jurisprudencial, valendo citar
parte dos fundamentos do voto proferido pelo Ministro do STJ, Sálvio de
Figueiredo:
“ Na linha da jurisprudência deste Tribunal, mais recom endável se
apresenta a orientação que determina o pagamento por danos morais
de uma só vez, tendo em vista a natureza jurídica diversa que esse tipo de
indenização possui em relação àquela prevista nos art. 1.537-11do Código
Civil [art. 948-11 do Código atual] e Enunciado n. 490 da Súmula/STF.
Com efeito, os danos morais, no caso de perda de parente, traduz-se

(8) CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 3. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 114-118.
(9) Anota Y ussef Said Cahali: “À diferença do que ocorre com os danos patrim oniais do art.
1.537, II, do antigo CC (repetido no art. 948, II, do novo CC), em que a ‘prestação de
alim entos a quem o defunto os d e via ’ representa obrigação de trato sucessivo que se
desenvolve no tempo, inclusive com a garantia de pagamento do art. 602 do CPC [atual art.
475-Q], a quantia do dano moral, no caso, deve ser paga de uma só vez, de imediato, e não
em form a pensionai.” Cf. D ano m o ra i 3. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 182.
(10) GO NÇALVES, C arlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 506.
274 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e f -

em abrandamento da dor emocional sofrida pela parte, enquanto a pensã:


mensal visa à recomposição do patrimônio e tem fundamento no prejuíz:
objetivo, decorrente da perda da renda mensal que a vítima poderia
produzir. Assim sendo, diversa a natureza das indenizações, a forma de
pagamento e o arbitramento dos danos morais não merecem seguir o
mesmo critério utilizado para os danos materiais.”(11)
A questão polêmica sobre a legitimidade para postular indenização po-
danos morais pelos parentes, dependentes ou pessoas que mantinham algurr
vínculo com o acidentado morto será abordada adiante no item 9.9.

9.3. Natureza jurídica da pensão

A natureza jurídica do pensionamento decorrente do ato ilícito sempre


gerou controvérsias, com posicionamentos também conflitantes nos tribunais,
A redação do art. 1.537 do Código Civil de 1916 estabelecia que a
indenização, no caso de homicídio, consistia na “prestação de alimentos às
pessoas a quem o defunto os devia.” O Código Civil de 2002, nesse aspecto,
apenas substituiu o vocábulo “defunto” por “morto”, sem alterar o conteúdo
essencial do preceito. Assim, vigora atualmente o seguinte texto legal:
“Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
( ...)

II — na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em


conta a duração provável de vida da vítim a.”

A interpretação literal do artigo pode gerar confusão com a pensão


alimentícia regulada pelo Direito de Família, ou acarretar a limitação do paga­
mento somente aos alimentos de subsistência(12). Por outro lado, surge a
interrogação se o que esse dispositivo legal garante representa indenização
aos herdeiros (caráter hereditário) ou alimentos aos dependentes da vítima
(caráter alimentício) ou apenas o ressarcimento dos que provarem prejuí­
zos (caráter reparatório).
Apesar de a redação do artigo citado sugerir que a indenização por lucros
cessantes, no caso de homicídio, seria a simples concessão de alimentos

(11) Cf. STJ. 4- Turma. REsp n. 403.940, Rei.: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado
em 02 maio 2002.
(12) O Código Civil de 1916, no art. 396, previa a concessão de alimentos para a subsistência
do parente necessitado. O C ódigo Civil atual, m uito mais abrangente, menciona, no art.
1.694, alimentos necessários para o reclamante (parente, cônjuge ou companheiro) “viver
de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de
sua educação.” No entanto, os alim entos serão apenas os indispensáveis à subsistência
quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia, como prevê o § 2-
do mesmo artigo.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 275

aos dependentes do morto, uma análise mais detida afasta rapidamente essa
■alsa impressão inicial, como veremos a seguir.
Num breve apanhado histórico, pode-se observar que a interpretação
-estritiva do art. 1.537 do Código Civil de 1916 foi sendo gradativamente superada,
com decisiva contribuição da doutrina mais autorizada. Na segura lição de
Pontes de Miranda, “a expressão ‘alimentos’, no art. 1.537, II, do Código Civil,
de modo nenhum se refere somente às dívidas de alimentos conforme o Direito
de Família. Alimentos são, aí, apenas o elemento que se há de ter em conta
para o cálculo da indenização.” E mais adiante conclui: “Trata-se de indenização
a título de alimentos, e não de alimentos propriamente ditos.”(13)
De forma semelhante, assevera o clássico Aguiar Dias que “a expressão
alimentos tem somente a finalidade de orientar o julgador para o quantum da
Indenização. Não constitui fundamento da reparação, que, assim, perderia o
seu caráter de reconstituição, para assumir o de substituição da obrigação
alimentar.” E com apoio no voto do Ministro do STF, Laudo de Camargo,
sintetizou: “Não se trata de prestação de alimentos, que se fixa em proporção
das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada, e sim
de indenização, que visa a reparar, pecuniariamente, o mal originado do ato
ilícito.”(14) Nessa mesma trilha, o entendimento adotado pelo Colendo Supremo
Tribunal Federal, em julgamento de 1976:
“Reparação de dano em consequência de homicídio. A alusão a alimentos’ contida
no inciso II do artigo 1.537 do Código Civil é simples ponto de referência para o cálculo
da indenização e para a determinação dos beneficiários, e, sendo critério de liquidação
de obrigação de indenizar, não se destina a transformar a natureza dessa obrigação,
metamorfoseando-a em outra, de caráter diverso, como é a de prestar alimentos. Não é
c ab íve l, portan to, a co n ce ssã o de a lim e n to s p ro v is io n a is no cu rso da ação de
indenização de perdas e danos por homicídio. Recurso Extraordinário conhecido e
provido.” STF. RE n. 84.319, Rei.: Ministro Moreira Alves, julgado em 12 nov. 1976.

Em período mais recente, asseverou Yussef Cahali: “Era uniforme a


lição dos doutos e a manifestação dos tribunais no sentido de que a remissão
feita pelo dispositivo, referindo-se à ‘prestação de alimentos a quem o defunto
os devia’, não está acoplada à obrigação alimentar do direito de família (arts.
233, IV, 399 e 400 do CC, correspondentes aos arts. 1.568, 1.695 e 1.694, §
1° do atual CC), representando mera forma ou expediente técnico de que se
utiliza o legislador para determinar a maneira como se fará a liquidação do
dano resultante de homicídio, o que, aliás, vai refletir-se em matéria de ônus
probatório do dano.”(15)

(13) PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. 2. ed. Rio de
Janeiro: Borsoi, 1967. t. 54, p. 284-285.
(14) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 756-757.
(15) CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 3. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 110.
276 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

A interpretação evoluída do art. 1.537 do Código Civil de 1916, como a


denominou o civilista Sílvio Rodrigues(16), avançou para adotar o enfoque
reparatório da concessão de alimentos, em vez de simples garantia alimentar
Afinado com esse pensamento, afirma Rui Stoco: “Para nós dúvida não resta
de que os créditos nascidos dos atos ilícitos não têm natureza alimentar, neir
hereditária, posto que traduzem mero ressarcimento de um prejuízo ou dano
efetivo causado a terceiro.”(17)
Esse entendimento, que já contava com o respaldo doutrinário e de
inúmeros julgados dos tribunais, ficou agora ainda mais fortalecido com a
previsão de que “outras reparações” podem ser incluídas, conforme disposto
no caput do art. 948 do Código Civil de 2002, demonstrando fidelidade ao
princípio da restitutio in integrum, adotado no campo da responsabilidade civil,
segundo o qual a indenização deve ser integral ou a mais completa possível.

Por outro lado, se o art. 950 do Código Civil assegura ao acidentado que
ficou inválido uma pensão correspondente “à importância do trabalho para
que se inabilitou” , não há razão lógica, nem jurídica, para deferir a pensão
aos dependentes da vítima seguindo outras bases, apenas porque se trata
de acidente fatal. Discorrendo sobre essa questão, concluiu Rui Stoco: “Ambas
as hipóteses são de pensionamento mensal, seja aos dependentes do morto,
seja à própria vítima, de modo que a utilização das expressões ‘alimentos’ no
art. 948 e ‘pensão’ no art. 950 não significa que haja diferença ontológica e
substancial entre uma e outra. Ambas têm características de prestação
alimentar, mas não caráter alimentar propriamente dito.”<18)

A prestação de alimentos propriamente dita, conforme previsto no art.


1.694 do Código Civil, deve ser fixada “na proporção das necessidades do
reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.” Já na pensão decorrente
do ato ilícito, não se questiona sobre a necessidade ou não de alimentos por
parte dos dependentes do morto porque o objetivo é reparar o prejuízo da
perda da renda familiar. Ainda que os prejudicados tenham posses suficientes
para manter o padrão de vida anterior ao óbito, o ressarcimento é devido
como reparação do dano causado. O fato gerador da pensão é o ato ilícito do
causador do homicídio e não a necessidade de prover alimentos(19).

(16) RODRIGUES, Sílvio. Direito civil: responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva,
2002. v. 4, p. 217.
(17) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1.559.
(18) Idem.
(19) “Recurso Especial. Responsabilidade civil. Aplicação do art. 1.537, II, do Código Civil.
1. A reparação do dano não tem ca rá te r alim entar, estando d esvinculada da situação
econôm ico-financeira do beneficiário, correta a interpretação do acórdão recorrido sobre o
alcance do art. 1.537, II, do Código Civil. De fato, se fosse diversa a com preensão da regra
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r a b a lh o ou D oença O c u p a c io n a l 277

O Ministro do STJ, Eduardo Ribeiro, ao proferir voto no julgamento do


Recurso Especial n. 33.127-8, registrou, com propriedade, o caráter de
'essarcimento de prejuízo da pensão prevista no art. 1.537 do Código Civil
de 1916, que corresponde ao art. 948 do Código atual:
“Exigir-se a dependência econômica para que se possa reconhecer o
direito a indenização, em caso de morte, parece-me postura equivocada,
derivada possivelmente de o Código Civil, no artigo 1.537, II, referir-se a
alimentos. Ocorre que, de há muito, a doutrina mais autorizada vem
mostrando que a menção a alimentos não há de ser entendida nos
mesmos termos em que o é no Direito de Família. Tratando-se de
indenização, ter-se-á em conta é o prejuízo sofrido, que deve ser
reparado. Ora, ainda uma pessoa de recursos, não carecedora de
alimentos, poderá sofrer dano econômico com a morte de um parente e
isso se haverá de ressarcir. Assim, por exemplo, a mulher que, mesmo
dispondo de fortuna própria, fosse sustentada pelo marido.”(20)

Como se vê, a indenização prevista no artigo 948, II, do Código Civil,


não se restringe a simplesmente conceder alimentos para a subsistência dos
d e p e nde nte s, com o oco rre nas re la çõ e s de pa re n te sco , p o rqu anto
compreende o deferimento de uma pensão mensal que garanta a manutenção
do mesmo padrão de vida e de conforto material que a vítima assegurava ao
seu núcleo familiar.
Uma vez sedimentado o entendimento de que a concessão de alimentos
decorrentes do ato ilícito tem natureza jurídica de reparação dos prejuízos, e
não de prestação alimentícia em sentido estrito, muitas questões controvertidas
ficam solucionadas, tais como:

I) O pagamento da pensão independe de alegação ou comprovação


quanto à necessidade dos dependentes da vítima;

II) O valor do pensionamento terá como suporte básico os rendimentos


do acidentado falecido e não as necessidades dos seus dependentes;

III) Não há falar-se em prisão do devedor da pensão, como ocorre nos


alimentos derivados das relações de parentesco, até porque o seu pagamento
já pode estar garantido, conforme previsto no art. 475-Q do CPC(21);

jurídica invocada pela recorrente, estar-se-ia abrindo uma am pla frente para confinar a
indenização a uma certa situação econôm ico-financeira do prejudicado pelo evento danoso,
deixando de lado o fato do ilícito, com a conseqüente impunidade civil do agente.” STJ. 3a
Turma. REsp n. 62.963, Rei.: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, julgado em 06 maio
1997.
(20) STJ. 3a Turma. REsp n. 33.127-8, Rei.: Ministro Nilson Naves, julgado em 8 ago. 1995.
(21) “Habeas corpus. Alimentos devidos em razão de ato ilícito. Prisão civil. Ilegalidade. 1.
Segundo a pacífica jurisp ru d ê n cia do S uperior T ribunal de Justiça, é ilegal a prisão civil
278 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e if

IV) Não cabe a fixação de alimentos provisionais como previsto no a -


1.706 do Código Civil e art. 852 e seguintes do CPC(22) e nem mesmo os
alimentos provisórios previstos no art. 4e da Lei n. 5.478/1968;

V) Também não cabe a revisão do valor do pensionamento, caso ocorre


mudança na situação financeira das partes, como previsto no art. 1.699 dc
Código Civil, já que o objetivo é a reparação dos prejuízos, independentemente
da necessidade dos dependentes da vítima(23);

VI) O cônjuge sobrevivente que contrai novas núpcias ou união estáve


não perde o direito ao pensionamento, como ocorre no Direito de Família (ar.
1.708 do Código Civil)(24);

VII) Nas edições anteriores deste livro afirmamos que não cabia penhora
do im óvel reside ncia l, na execução da pensão m ensal d e ferid a aos
dependentes econômicos do acidentado, por ser inaplicável a ressalva do
art. 3Qda Lei n. 8.009/1990. Revendo o entendimento, concluímos agora, c o r
mais vagar, que é sim possível a penhora do imóvel residencial do executado
nessa hipótese. O art. 3Qda Lei n. 8.009/1990 exclui da impenhorabilidade o
crédito decorrente de “pensão alimentícia” . O art. 100, § 1Qda Constituição
da República, com a redação alterada pela Emenda Constitucional n. 62/2009,
esclarece o alcance jurídico da expressão pensão alimentícia: “Os débitos
de natureza alim entícia com preendem aqueles decorrentes de salários,
vencim entos, proventos, pensões e suas com plem entações, benefícios

decretada por descum prim ento de obrigação alim entar em caso de pensão devida em
razão de ato ilícito. 2. Ordem concedida.” STJ. 4- Turma. HC 182.228/SP, Rei.: Ministro João
Otávio de Noronha, DJe 11 mar. 2011.
“Responsabilidade civil — Acidente do trabalho — Indenização — Direito comum — Prisão
civil — Ato ilícito — Pagamento de prestação alimentícia fixada — Ausência — Descabimento
— Descabe a execução e cominação de prisão adm inistrativa contra sócio de sociedade
por cotas de responsabilidade limitada. A prisão civil de que trata o § 1a, do art. 733, do
C ó d ig o de P ro ce sso C ivil, c.c. art. 5 a, LX V II, da C o n s titu iç ã o F ederal é re s trita ao
Ínadimplemento de alimentos decorrentes de relação de direito de família; cuidando-se de
regra excepcional de prisão por dívida, aplica-se restritivam ente não se estendendo às
ações por responsabilidade ‘ex delito’.” São Paulo. STACivSP. 2- Câm. HC 791.388-00/1,
Rei.: Juiz Norival Oliva, julgado em 12 maio 2003.
(22) “Execução — Responsabilidade Civil — Acidente do trabalho — Indenização — Direito
Comum — Benefício — Pensão mensal vitalícia — Citação do devedor nos termos do art.
733 do Código de Processo Civil — Inadmissibilidade — Às execuções por renda mensal
de ações acidentárias pelo Direito Comum aplica-se o art. 602 e não 733, § 1a, do Código
de Processo Civil.” São Paulo. STACivSP. 2- Câm. HC n. 791.388-00/1, Rei.: Juiz Norival
Oliva, julgado em 12 maio 2003.
(23) E nte ndem o s que co n tin u a v á lid a nossa co n clu são , m esm o d epois da a lte ra çã o
introduzida pelo § 3a do art. 475-Q que sugere a possibilidade de alteração do valor do
pensionamento, caso sobrevenha modificação das condições econômicas da parte. Vamos
analisar a referida inovação legal no item 9.6 deste capítulo.
(24) Tratarem os com mais vagar deste tem a no item 9.4.2.
INIENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 279

:revidenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em


esponsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado
", Conjugando os dois dispositivos é im perioso concluir que o imóvel
■esidencial do executado pode ser penhorado, quando houver atraso no
cagamento de pensão fixada judicialmente aos dependentes ou ao próprio
aoidentado(25).

9.4. Beneficiários da pensão

9.4.1. Titulares do direito ao pensionamento

Em sintonia com o que foi apreciado no item precedente, cabe investigar


- este passo quais são os titulares do direito ao pensionamento decorrente da
norte do acidentado. Seriam os seus herdeiros, os seus dependentes ou os
:ue foram diretamente prejudicados?
Inicialmente, convém esclarecer que neste tópico só estamos identifi-
:ando os credores da pensão, uma das espécies de reparação do dano ma­
terial ou patrimonial. Os titulares do direito à indenização por danos morais
nem sempre serão os mesmos que têm direito ao pensionamento, já que os
cressupostos para deferimento de um e outro são diferentes. Em muitas oca­
siões os parentes ou determinados parentes não têm direito à pensão, pois

25) “Recurso Especial — Execução — Ação reparatória por ato ilícito — Acidente de trânsito
— Pensão alimentícia — Bem imóvel — Penhorabilidade — Possibilidade — Inaplicabilidade
oa Lei n. 8.009/90 — Recurso especial provido. I — A pensão alim entícia é prevista no art.
3S, inciso III, da Lei n. 8.009/90, como hipótese de exceção à impenhorabilidade do bem de
fam ília. E tal dispositivo não faz q u alquer distinção quanto à causa dos alim entos, se
recorrente de vínculo fa m ilia r ou de obrigação de reparar danos. II — Na espécie, foi
°iposta pensão alim entícia em razão da prática de ato ilícito — acidente de trânsito —
ensejando-se o reconhecim ento de que a im penhorabilidade do bem de fa m ília não é
:oonível à credora da pensão alimentícia. Precedente da Segunda Seção. III — Recurso
especial provido.” STJ. 3B Turma. REsp n. 1186225/RS, Rei. Ministro Massami Uyeda, DJ 13
set. 2012.
' E xecução de p en são m en sal v ita lícia . Bem de fa m ília. In a p lic á v e l a regra de
impenhorabilidade estabelecida na lei n. 8.009/90. O inciso III do art. 3e da Lei n. 8.009/90
excepciona a regra da im penhorabilidade quando a execução for prom ovida “pelo credor
de pensão alim entícia” . Entre os débitos de natureza alimentícia estão incluídas as pensões
e indenizações por m orte ou invalidez fundadas na responsabilidade civil, conform e o
disposto no art. 100, § 12-A, da C onstituição Federal, com redação dada pela Emenda
Constitucional n. 30/2000. Assim, à execução dos créditos trabalhistas que trata de pensão
mensal vitalícia não se aplica a regra da impenhorabilidade prevista no art. 3-, caput, da Lei
n. 8.009/90, por incompatibilidade com o disposto no art. 100, § 1a-A, da CF.” Paraná. TRT
9ã Região Seção Especializada. AP n. 991500-86.2006.5.09.0018. Rei.: Des. Luiz Eduardo
Gunther, DJ 11 maio 2012.
280 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir -

não demonstram qualquer dependência econômica da vítima, ou seja, do ponto


de vista material não sofreram diretamente qualquer prejuízo; no entanto, po­
dem ser titulares legítimos da pretensão indenizatória por danos morais dian­
te da intensa repercussão afetiva causada pelo acidente fatal. A legitimidade
para postular os danos morais será analisada no item 9.9 deste Capítulo.

Quando o acidente do trabalho provoca a invalidez total ou parcial, não


há dúvida de que o destinatário da pensão é a própria vítima, conforme previsto
nos arts. 949 e 950 do Código Civil. Contudo, no caso de morte, a questão
dos beneficiários é mais complexa e admite diversas variáveis, de acordo
com a situação familiar da vítima.

O art. 948 do Código Civil indica como credores dos alimentos “as
pessoas a quem o morto os devia” , ou, como interpretava Clóvis Beviláqua,
as pessoas a quem o falecido teria de prestá-los se fosse vivo(26). Não se
trata, portanto, de direito de natureza hereditária porquanto não são
necessariamente os sucessores da vítima, na forma da lei civil, que recebem
a pensão. Para identificar o beneficiário ou os beneficiários do pensionamento,
o eminente Caio Mário recomenda que seja formulada a seguinte indagação:
quem é ou quem são as pessoas diretamente atingidas pela morte da vítima?(27)

É certo que os primeiros prejudicados geralmente são o cônjuge e os


filhos. Mas o núcleo familiar a que a vítima pertencia, especialmente nos dias
atuais, pode comportar diversas configurações, valendo alguns exemplos: 1
— A vítima era solteira e ajudava na subsistência dos pais; 2 — A vítima era
casada e não tinha filhos; 3 — A vítima era casada e tinha filhos menores e
maiores; 4 — A vítima mantinha união estável com ou sem filhos; 5 — A
vítima pagava pensão alimentícia ao cônjuge anterior etc., etc.

Com efeito, em cada caso concreto é necessário verificar quem são


aqueles que diretam ente sofreram prejuízo m aterial com a m orte do
acidentado, ou seja, aqueles que efetivamente foram lesados. Enfatiza Maria
Helena Diniz que “a vida humana tem um valor econômico para alguém, que
não será o morto, que não é mais sujeito de direito, portanto, não é, no sentido
jurídico, um lesado, por não sofrer dano patrimonial nem moral por sua morte.
Os lesados são os que sobrevivem, que se verão privados do valor econômico
que para eles representava a vida da vítima.”(28)

(26) Apud PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. 8a t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 322.
(27) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. 8a t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 329.
(28) DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. ed. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 7, p. 77. Com pensamento semelhante anotou Rui Stoco: “Objetivou
o legislador suprir as necessidades da própria vítim a e, também, daqueles que dependiam
da vítim a falecida, de modo que se esta já não mais pode fazê-lo, evidenciada a carência
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 281

Como os titulares do direito ao pensionamento são os que sofreram


efetivamente prejuízo com a morte do acidentado, pela redução ou mesmo
supressão da renda que beneficiava aquele núcleo familiar, conclui-se que a
indenização é reclamada jure proprio, ou seja, cada pessoa lesada busca a
'eparação em nome próprio junto ao causador da morte do acidentado. Não
'eclamam na qualidade de herdeiros ou de sucessores do falecido, mas na
:ondição de vítimas do prejuízo, por serem beneficiários econômicos dos
'endimentos que o morto auferia(29).
Nesta linha de raciocínio, o espólio não detém legitimidade para postular
ou receber a reparação do dano material pelos chamados lucros cessantes
que norm alm ente são pagos aos diretam ente prejudicados m ediante
oensionamento mensal, da mesma forma que o espólio não recebe pensão
da Previdência Social pela morte do acidentado. Assevera Sílvio Venosa que
‘ o espólio é visto como simples massa patrimonial que permanece coesa até
a atribuição dos quinhões hereditários aos herdeiros.”(30)
O valor fixado para o pagamento da pensão será rateado entre os
beneficiários, podendo-se aplicar por analogia o critério estabelecido no art.
77 da Lei n. 8.213/1991, que trata dos benefícios da Previdência Social: “A
pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos
em partes iguais.” O direito de acrescer quando cessa o pensionamento para
algum dos credores será analisado no item 9.8 deste Capítulo.
Nos tópicos seguintes vamos examinar as hipóteses mais correntes
dos beneficiários do pensionamento, destacando as principais controvérsias.

9.4.2. Pensionamento do cônjuge ou companheiro

Em princípio, o prejudicado mais visível pela morte do acidentado é o


cônjuge sobrevivente, pelo desfalque im ediato sofrido nos rendimentos
familiares. Desse modo, não resta dúvida alguma quanto à sua condição
de beneficiário da indenização dos lucros cessantes, deferida na forma de
pensionamento mensal. Como já afirmamos noutra passagem, a pensão é devida
independentemente da condição econômica do cônjuge, já que se trata de
reparação dos prejuízos sofridos e não garantia de alimentos em sentido estrito.

que a morte do alimentante provocou no lar e aos seus dependentes, privados que estejam
para uma sobrevivência em condições sem elhantes àquela existente antes do evento,
caberá ao ofensor, na mesma proporção, fazê-lo.” Cf. Tratado de responsabilidade civil. 8.
ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 1484-1485.
(29) Conferir nesse sentido: DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de
Ja n e iro : F o re n se , 1995. v. II, p. 7 89; D IN IZ , M a ria H e le n a . Curso de d ireito civil:
responsabilidade civil. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7, p. 202; GONÇALVES, Carlos
Roberto. Responsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 482.
(30) VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito das sucessões. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 21.
282 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liveira

Equipara-se ao cônjuge sobrevivente, para fins de pensionamento, o


companheiro ou companheira que convivia em regime de união estável com
o acidentado(31), conforme reconhecido pelo art, 1.723 do Código Civil(32). Essas
disposições legais estão em sintonia com o que estabelece o art. 226, § 32,
da Constituição da República de 1988; “Para efeito de proteção do Estado, é
reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,
devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento.”(33)

O reconhecimento dos direitos dos companheiros, agora expressamente


previstos, passou por longo período de maturação, valendo citar a Súmula n.
35 do Supremo Tribunal Federal, adotada em 1963: “Em caso de acidente do
trabalho ou de transporte, a concubina tem direito de ser indenizada pela morte
do amásio, se entre eles não havia impedimento para o matrimônio.” Também
o art. 16 da Lei n. 8.213/1991, que trata dos benefícios da Previdência Social,
inclui dentre os dependentes do segurado a companheira ou o companheiro.

Por outro lado, se o acidentado estava impedido de se casar, a relação


paralela mantida, mesmo que prolongada, não gera direito à concubina quanto
ao pensionamento(34), mas pode levar ao reconhecimento da existência de
sociedade de fato com a conseqüente partilha do patrimônio adquirido pelo
esforço com um (35). Contudo, está ocorrendo um abrandam ento desse
entendimento, autorizando o rateio da pensão, mesmo no caso de concubinato,
quando restar comprovada a efetiva separação de fato entre os ex-cônjuges.

Vejam os entendimentos dos Tribunais Superiores a respeito:


“C om panheira e concubina — Distinção. Sendo o Direito uma verdadeira ciência,
impossível é confundir institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a
babel. União Estável — Proteção do Estado. A proteção do Estado à união estável
alcança apenas as situações legítim as e nestas não está incluído o concubinato.
Pensão — Servidor Público — Mulher — Concubina — Direito. A titularidade da

(31) “ Responsabilidade civil — Acidente do trabalho — Indenização — Direito comum —


Legitimidade — Companheira — União estável — Caracterização — Reconhecimento — A
coabitação, em verdadeiro more uxorio contínua e ininterrupta, é suficiente para caracterizar
o intuitu familiae, exigível para configuração de união estável (C onstituição Federal, art.
226, e art. 1- da Lei n. 9.278/96).” São Paulo. STACivSP. 11® Câm. Apelação com Revisão
667.370-00/6, Rei.: Juiz Clóvis Castelo, julgado em 24 maio 2004.
(32) Código Civil. “Art. 1.723. É reconhecida como entidade fam iliar a união estável entre o
homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida
com o objetivo de constituição de fam ília.”
(33) O § 3Qdo art. 226 da Constituição da República de 1988 foi regulado pela Lei n. 9.278/
1996. Também o Código Civil de 2002 trata da união estável nos arts. 1,723 a 1.727.
(34) Código Civil: Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos
de casar, constituem concubinato.
(35) Súmula n. 380 do STF: C om provada a e xistência de so ciedade de fato entre os
concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrim ônio adquirido pelo
esforço comum.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 283

pensão decorrente do falecim ento de servidor público pressupõe vínculo agasalhado


pelo o rd e n a m e n to ju ríd ic o , m o stra n d o -se im p ró p rio o im p le m e n to de d ivisã o a
beneficiar, em detrim ento da família, a concubina.” STF. ^ - Turma. RE n. 397.762-8.
Rei.: Ministro Marco Aurélio, DJ 12 set. 2008.

“Adm inistrativo. Agravo regim ental no agravo de instrum ento. Servidor público.
Concubina. Pensão. Rateio com a viúva. Im possibilidade. Precedentes do STJ e
do STF. Agravo não provido. 1. “A proteção do Estado à união estável alcança apenas
as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato” , sendo certo que a
“titularidad e da pensão decorrente do falecim ento de servidor público pressupõe
vínculo agasalhado pelo ordenam ento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento
de divisão a beneficiar, em detrim ento da família, a concubina (RE 590.779, Rei. Min.
Marco Aurélio, STF, Primeira Turma, DJe 26.3.09). 2. Hipótese em que o Tribunal de
origem reconheceu, com base no conjunto probatório dos autos, que o falecido servidor
não e ra s e p a ra d o de fa to , te n d o e s ta b e le c id o d o is n ú c le o s fa m ilia re s
concom itantem ente, com sua esposa e com a ora agravante. 3. Agravo regimental
não provido.” STJ. 1ã Turma. AgRg no Ag n. 1424071/RO, Rei.: Ministro Arnaldo Esteves
Lima, DJ 30 ago. 2012.

“S ervid o r Público Estadual falecido. Pensão por m orte. Rateio entre viúva e
concubina. Im possibilidade. Precedentes. No caso de pensão por morte, é possível
o rateio igualitário do benefício entre a ex-esposa e a com panheira de servidor falecido.
O reconhecimento da união estável pressupõe a inexistência de im pedim entos para
o casamento. A vigência de m atrim ônio não é em pecilho para a caracterização da
união estável, desde que esteja evidenciada a separação de fato entre os ex-cônjuges,
o que não é a hipótese dos autos. O concubinato não pode ser erigido ao mesmo
patam ar jurídico da união estável, sendo certo que o reconhecimento dessa última é
condição im prescindível à garantia dos direitos previstos na Constituição Federal e
na legislação pátria aos companheiros, inclusive para fins previdenciários. Recurso
O rdinário em Mandado de Segurança conhecido e provido.” STJ. 5a Turm a. RMS
30.414/PB, Rei.: Ministra Laurita Vaz, DJ 24 abr. 2012.

“Direito previdenciário. Pensão por morte. União estável. Concubina. Concom i­


tância. Im pedimento. Reconhecim ento. Im possibilidade. 1. A jurisprudência do STJ
prestigia o entendimento de que a existência de impedim ento para o matrimônio, por
parte de um dos pretensos companheiros, embaraça a constituição da união estável,
inclusive para fins previdenciários. 2. Afigura-se inviável, desse modo, reconhecer à
recorrida o direito à percepção da pensão por morte em concurso com a viúva, haja
vista que o de cujus, à época do óbito, perm anecia casado com a recorrente. 3.
Recurso especial provido.” STJ. 5a Turma. REsp n. 1114490/RS, Rei.: Ministro Jorge
Mussi, DJe 01 fev. 2010.

O novo casamento ou o vínculo de união estável acarreta a cessação


do pensionamento? A resposta comporta algumas observações, porque a
questão não alcançou ainda entendim ento uniform e na jurisprudência.
Acreditamos que a raiz das divergências resida no equivocado enquadramento
da natureza jurídica da pensão decorrente do ato ilícito, conforme discorremos
no item 9.3 retro. É verdade que no âmbito do Direito de Família o cônjuge
que contrai novas núpcias ou união estável perde o direito à pensão (art.
1.708 do Código Civil), o que, em muitas ocasiões, até estimula relacionamentos
clandestinos para evitar a interrupção do pagamento.
284 S e b a s t iã o G e r ald o de O liveira

A pensão decorrente da responsabilidade civil do em pregador terr


natureza jurídica de reparação de danos, razão pela qual o casamento ou a
união estável do cônjuge supérstite não deve im plicar a interrupção dc
pensionamento. O novo vínculo afetivo não afasta ou sequer atenua o ate
ilícito que provocou a morte, e, portanto, não pode ter influência nas
reparações a que tem direito o cônjuge ou companheiro prejudicado.

O saudoso Pontes de Miranda há muito asseverava: “A indenização po-


alimentos é por tempo correspondente à duração provável da vida da vítima
Não se leva em consideração qualquer mudança nos haveres do legitimado
ativo. Nem cessa a prestação à mulher do falecido se ela contrai novas núp-
cias.”(36) Também o mestre Aguiar Dias bem focaliza a questão quando afir­
ma que o direito à reparação “é parte integrante do patrimônio do prejudicado.
Por ocasião do dano, considera-se como retirada desse patrimônio a parcela
que, regularmente avaliada e afinal convertida em numerário, a ele volta, para
reintegrá-lo, em forma de indenização.”(37)

A jurisprudência também aponta no sentido de que o novo casamento


ou união estável não acarreta a interrupção do pensionamento:
“Direito civil. Responsabilidade civil. Pensionam ento à viúva da vítim a de acidente
fatal. Remaridação. A pensão prestada à viúva pelos danos m ateriais decorrentes
da morte de seu marido não termina em face da remaridação, tanto porque o casamento
não constitui nenhuma garantia da cessação das necessidades da viúva alimentanda.
quanto porque o prevalecim ento da tese oposta importa na criação de obstáculo para
que a viúva venha a co n tra ir novas núpcias, contrariando o interesse social que
estimula que as relações entre homem e mulher sejam estabilizadas com o vínculo
matrimonial. Recurso parcialm ente conhecido e, nessa parte, provido.” STJ. 4- Turma.
REsp n. 100.927/RS, Rei.: Ministro César Asfor Rocha, DJ 15 out. 2001.

“Indenização por ato ilícito — Pensão à com panheira e ao filho da vítima: limite
tem poral — Mulher e filho mantidos pela vítim a têm direito à indenização sob a forma
de alimentos, como estabeleceu o acórdão, em quantitativo que esta Corte não pode
dim ensionar por óbice da Súmula 07/STJ. A pensão fixada para a com panheira da
vítim a não pode ser condicionada à manutenção da sua situação de mulher sozinha,
dado o seu caráter indenizatório (precedentes do STJ).” STJ. 2- Turma. REsp n. 392.240/
DF, Rei.: Ministra Eliana Calmon, julgado em 04 jun. 2002.

“ Responsabilidade civil. Ação de indenização. O casamento ou a nova união estável


da com panheira não afasta o direito de recebimento da pensão por ato ilícito, a qual
não se confunde com os alimentos do Direito de Família.” Rio Grande do Sul. TJRS,
11a Câmara, Apelação Cível n. 70003033149, Rei.: Des. Jorge André Pereira Gailhard,
julgado em 30 abr. 2003.

(36) PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. 2. ed. Rio de
Janeiro: Borsoi, 1967. t. 54, p. 286.
(37) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 790.
NDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 285

9,4.3. Pensionamento dos filhos

Os filhos que dependiam economicamente do acidentado morto são


oeneficiários natos da pensão prevista no art. 948, II, do Código Civil. A
:ependência dos filhos menores não emancipados ou estudantes até os 25
anos é presumida; acima dessa idade é necessária a com provação do
orejuízo, como, por exemplo, a situação do filho inválido impossibilitado de
orover ao próprio sustento(38).
Se o filho, mesmo menor de 25 anos, já se casou, formando novo núcleo
'amiliar ou sobrevive sem nenhuma dependência econômica do acidentado
•norto, não lhe cabe participar do rateio da pensão, podendo, contudo, ser
oredorda indenização por dano moral. Conforme mencionado no item anterior,
o pensionamento não tem conotação de direito hereditário, mas de reparação
dos prejuízos de modo que aquele núcleo familiar possa manter o mesmo
padrão de vida que era assegurado, até então, pelos rendimentos da vítima.

O limite temporal para encerrar o direito dos filhos à pensão, atualmente


considerado pela jurisprudência em 25 anos, leva em conta aquilo que
ordinariamente acontece. Nessa idade, normalmente, o filho já completou sua
formação escolar ou universitária e já dispõe de condições para conquistar
sua independência financeira ou mesmo contrair matrimônio. Além disso, é
cabível a presunção de que toda pessoa adulta, não sendo inválida, deve
prover às suas próprias necessidades, o que aliás, é um dever ético. A
jurisprudência dos tribunais, especialmente do STJ, aponta nesse sentido:
“Responsabilidade civil do Estado. Pensionam ento. Term o final. Idade do filho. O
STJ firmou a jurisprudência de que é devida a pensão mensal aos filhos menores,
pela morte de genitor, até a data em que os beneficiários com pletem 25 anos de
idade.” STJ. 2- Turma. AgRg no Ag n. 1419899/RJ, Rei.: Ministro Herman Benjamin,
DJ 24 set. 2012.

“Responsabilidade civil do estado — Danos morais e materiais — Indenização. A


jurisprudência do STJ sedim entou-se no sentido de fixar a indenização por perda do
pai ou progenitor, com pensão ao filho menor até os 24 (vinte e quatro) anos de idade
(integralmente considerados), ou seja, até a data de aniversário dos 25 anos.” STJ. 2-
Turma. REsp n. 592.671/PA, Rei.: Ministra Eliana Caimon, julgado em 06 abr. 2004.

“Responsabilidade civil. Pensionam ento aos filhos. Limite de idade. Em casos que
tais, o pagamento da pensão será devido aos filhos menores até o limite de vinte e
cinco anos de idade, quando, presum ivelmente, os beneficiários terão concluído sua
form ação, inclusive em curso universitário, não mais se ju stifica n do o vínculo de
dependência.” STJ. 3- Turma. REsp n. 402.443, Rei.: Ministro Castro Filho, julgado
em 02 out. 2003.

(38) Segundo estabelece o art. 16, § 4Q, da Lei n. 8.213/1991, que dispõe sobre os benefícios
da Previdência Social, aqui invocada por analogia, é presum ida a dependência do cônjuge,
com panheira ou companheiro e do filho não emancipado menor de 21 anos ou inválido.
286 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liveira

9.4.4. Pensionamento dos pais

O corre um núm ero co n sid e rá ve l de acid e n te s do tra b a lh o com


empregados solteiros e que ainda residem com os pais, participando do rateio
das despesas. Especialmente nas famílias de baixa renda, é normal os filhos
contribuírem para a manutenção do lar, razão pela qual a morte representa
verdadeiro prejuízo no conjunto dos rendimentos, ou seja, fica perfeitamente
caracterizado o dano material.

Entretanto, depois de certa idade, é comum os filhos montarem sua


própria residência, seja pelo casamento, união estável ou apenas para terem
vid a in dependente. Desse modo, os trib u n a is, quando presentes os
pressupostos da responsabilidade civil, estão deferindo a pensão aos pais
até a idade em que o filho falecido completaria 25 anos e, posteriormente, o
valor da pensão é reduzido pela metade até quando o filho viesse a completar
sua duração provável de vida, caso haja a sobrevida dos pais. Esse
entendimento é justificável porque é fato notório no Brasil, nas populações de
baixa renda, que os filhos durante toda a vida colaboram para o sustento dos
pais, sobretudo diante da carência de políticas públicas de amparo à velhice.

A prestação de assistência aos pais necessitados, além de ser um de­


ver moral, é uma garantia prevista na Constituição da República de 1988, que
prevê no art. 229: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos
menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na
velhice, carência ou enfermidade.” Aliás, nessa mesma linha, o art. 399 do
revogado Código Civil de 1916 recebeu, em 1993, o acréscimo do parágrafo
único, que estabelecia: “No caso de pais que, na velhice, carência ou enfer­
midade, ficaram sem condições de prover o próprio sustento, principalmente
quando se despojaram de bens em favor da prole, cabe, sem perda de tempo
e até em caráter provisional, aos filhos maiores e capazes, o dever de ajudá-
-los e ampará-los, com a obrigação irrenunciável de assisti-los e alimentá-los
até o final de suas vidas.”

Por outro lado, se ficar comprovado que o filho não colaborava para as
despesas da família, não cabe o deferim ento de pensão aos pais, pela
inexistência de prejuízo material, podendo ser concedida, conforme o caso, a
indenização por danos morais.

As controvérsias maiores a respeito da pensão deferida aos pais, em


razão da morte do filho por ato ilícito, estão de alguma forma pacificadas na
Segunda Seção do STJ, que uniformiza a jurisprudência sobre a matéria de
Direito Privado, conforme se verifica nos acórdãos seguintes:
“Agravo regim ental. Recurso especial. Indenização. Morte de filho. Acidente de
trabalho. Dano moral. Pensão. Parcial provimento. 1. A indenização por dano moral
decorrente de morte aos fam iliares da vítim a é adm itida por esta Corte, geralmente,
Im d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 287

até o montante equivalente a 500 (quinhentos) salários mínimos. Precedentes. 2. A


pensão devida à genitora, economicamente dependente do filho falecido em acidente
de trabalho, é de 2/3 (dois terços) dos ganhos da vítim a fatal até a data em que
com pletaria 25 (vinte e cinco) anos de idade, passando a 1/3 (um terço) a partir de
então, quando se presume que o falecido constituiria fam ília e reduziria o auxílio dado
aos seus dependentes. 3. Agravo regimental a que se dá parcial provim ento.” STJ. 4a
Turma. AgRg no REsp 976.872/PE, Rei.: Ministra M aria Isabel Gallotti, DJ 28 fev.
2012.

“Civil e Processo civil. Indenização. Morte. Danos materiais. Pensão mensal. Valor
e term o final. I — A orientação da Segunda Seção, em casos de indenização por
morte de filho, é de que a pensão mensal arbitrada em favor dos pais deve ser integral
até os 25 (vinte e cinco) anos, idade presum ida do casamento da vítima, reduzindo-se
a partir de então essa pensão à metade até a data em que, também por presunção, a
vítim a atingiria os 65 (sessenta e cinco) anos de idade. II — Não correspondendo a
contribuição dos filhos, para o custeio da casa dos seus pais, à totalidade do seu
salário, afigura-se razoável e justo, em linha de princípio, fixa r a indenização no
percentual de dois terços (2/3) daquele.” STJ. 4 a Turma. REsp 302.298/M G , Rei.:
Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 7 maio 2002.

“Civil. Responsabilidade civil. Dissídio restrito ao termo finai da pensão: se quando


a vítima viesse a com pletar 25 anos (acórdão em bargado) ou 65 anos (acórdão
paradigm a). Assim com o é dado presum ir-se que o filho, vítim a de acidente fatal,
teria, não fosse o infausto evento, uma sobrevida até os sessenta e cinco anos, e até
lá auxiliaria a seus pais, prestando alim entos, tam bém pode-se supor, pela ordem
natural dos fatos da vida, que ele se casaria aos vinte e cinco anos, momento a partir
do qual já não mais teria a mesm a disponibilidade para ajudar m aterialmente a seus
pais, pois que, a partir do casamento, passaria a suportar novos encargos, que da
constituição de uma nova fam ília são decorrentes. A pensão fixada, com base nas
peculiaridades da espécie pelo Tribunal de origem, deve, a partir de quando a vítima
viesse a com pletar vinte e cinco anos, ser reduzida pela metade, assim ficando, caso
haja a sobrevida dos pais, até os presum íveis sessenta e cinco anos da vítim a.
Embargos de divergência acolhidos.” STJ. 2a Seção. Embargos de Divergência no
REsp n. 106.327, Rei.: Ministro César Asfor Rocha, DJ, 12. out. 2001.

Naquelas hipóteses em que o acidentado já contava com idade superior


a 25 anos, mas continuava residindo com a família, contribuindo para o
pagam ento das despesas, entende Carlos Roberto Gonçalves, citando
precedentes jurisprudenciais, que é razoável conceder a pensão aos pais
por mais 5 anos, no que estamos de acordo(39). Naturalmente, nessa hipótese,
após os primeiros 5 anos, o valor deverá ser reduzido pela metade, conforme
os precedentes acima citados.

9.4.5. Pensionamento de outros beneficiários

Os membros do núcleo familiar estrito são presumidamente dependentes


do acidentado falecido, como anotamos nos itens anteriores. Mas outros

(39) GONÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao Código Civil: parte especial: direito das
obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 11, p. 532.
288 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir -

parentes ou mesmo terceiros poderiam estar recebendo auxílios regulares


da vítima, quer por obrigação legal, quer por sentimento de fraternidade. Nãc
é raro o trabalhador assumir o sustento de um irmão inválido ou deficiente
amparar um tio, sobrinho, neto ou os avós necessitados ou ainda arcar corr
o pagamento de planos de saúde, mensalidade escolar ou pagamento de
asilo para tais necessitados. Pode ser também que a vítima já fosse devedora
de alimentos por decisão judicial.

Em todas essas hipóteses a morte do acidentado gera uma perda efetiva,


um p re ju íz o m e n su rá ve l, p a ssíve l de re p a ra çã o por in te rm é d io do
pensionamento, mesmo que o beneficiário não tenha relação de parentesco
com a vítima. Não se trata propriamente de estabelecer indenização pela
morte, mas reparar os prejuízos causados pela interrupção da fonte provedora.

Leciona Caio Mário que “todas essas situações podem ser enfeixadas
numa fórmula global ou num princípio genérico: têm legitimidade ativa para a
ação indenizatória as pessoas prejudicadas pelo ato danoso.”<40) Com
pensamento semelhante assevera Aguiar Dias: “Tem direito de pedir reparação
toda pessoa que demonstre um prejuízo e a sua injustiça. O quadro dos sujeitos
ativos da reparação deve atender a esse princípio, de ampla significação.
Assim sendo, quer se trate de dano moral ou de dano material, não se pode
cogitar de restringir a ação de indenização a privilégio do parentesco.”(41)

De qualquer forma, para o deferim ento da pensão nesses casos é


necessário comprovar efetivamente o dano material porque as perdas e danos
só incluem os prejuízos diretos e imediatos, como estabelece o art. 403 do
Código Civil e dentro da razoabilidade indicada no art. 402 do mesmo Código.
Sendo assim, o prejuízo não será demonstrado naquela hipótese em que a
vítima ajudava eventualmente a um parente ou mesmo a um terceiro ou com
a mera possibilidade de colaboração que algum dia pudesse ocorrer.

9.5. Base de cálculo da pensão

Sendo reparatória a natureza jurídica da pensão (item 9.3 retro), a sua


base de cálculo deve ser apurada considerando os rendimentos que a vítima
percebia e não as necessidades dos beneficiários, conforme já enfatizado.

Se restar comprovado que o acidentado morto recebia rendimentos


complementares, provenientes de um segundo contrato de trabalho ou outra

(40) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. 8ã t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 330.
(41) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 793.
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 289

rcupação perm anente, essa parcela, desde que habitual, deverá ser
adicionada ao valor da remuneração paga pelo empregador para compor a
rase de cálculo da pensão. Esse entendimento, que já era acolhido pela
-nsprudência, ficou agora mais fortalecido com o acréscimo da expressão
sem excluir outras reparações” no caput do art. 948 do Código Civil.

Pelo princípio da re stitu tio in integrum , que orienta o cálculo da


ndenização, devem-se apurar os rendimentos efetivos da vítima, computando-
-se o valor do seu último salário, mais a m édia das parcelas variáveis
‘ abitualmente recebidas, tais como: horas extras, adicional noturno, adicional
;e insalubridade ou de periculosidade, acréscimos previstos em convenções
zoletivas etc.

De acordo com o que estabelece o art. 457 da CLT, compreendem-se


*a remuneração as gorjetas recebidas. Também se integram ao salário as
: omissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagem quando
superiores a 50% do salário e abonos pagos pelo empregador. Compõem,
ainda, o cálculo da remuneração os valores correspondentes às utilidades
'ornecidas habitualmente pelo empregador, tais como: alimentação, habitação,
.estuário e outras prestações in natura, salvo as exceções mencionadas
(art. 458 da CLT).

Além das parcelas da remuneração, cabe acrescer à base de cálculo o


/alor relativo ao 13® salário, pelo seu duodécimo, ou determinar que no mês
de dezembro de cada ano haja uma prestação adicionai equivalente a tal
.antagem. Se a vítima estivesse viva, com certeza estaria recebendo, por
'orça de lei, a gratificação natalina, razão pela qual não seria correto excluir
do pensionamento o referido valor(42).

42) Súmula n. 207 do STF: As gratificações habituais, inclusive a de Natal, consideram-se


:acitam ente convencionadas, integrando o salário.
'Morte do obreiro — Benefício — Pensão mensal — Beneficiários (Esposa e filho) — Valor
zorrespondente a 2/3 do salário da vítima até a data em que completaria 65 anos — Inclusão
do 13B salário, férias e demais benefícios na condenação — Parte cabente ao beneficiário
menor impúbere até ele completar 25 anos — Admissibilidade. A pensão mensal devida
deve corresponder à remuneração que percebia em vida o obreiro, menos um terço, incluído
o 13Qsalário, férias e demais benefícios, até a data em que a vítim a com pletaria 65 anos de
idade, e o pensionam ento dos filh o s até com pletarem 25 anos de idade.” São Paulo.
STACivSP. 1a Câm. Apelação sem Revisão 671.662-00/4, Rei.: Juiz Aguilar Cortez, julgado
em 23 mar. 2004.
”Responsabilidade civil — Acidente do trabalho — Indenização — Direito Comum — Morte
do obreiro — Benefício — Pensão — Inclusão do 13g salário — Admissibilidade. À pensão
deferida por morte de obreiro no trabalho deverá ser acrescida mais uma parcela anual,
correspondente ao 13- salário, que aquele receberia se vivo estivesse, razão pela qual a
ela os seus dependentes fazem jus.” São Paulo. STACivSP. 12§ Câm. Apelação com Revisão
613.352-00/2, Rei.: Juiz Palma Bisson, julgado em 22 nov. 2001.
290 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Por outro lado, não cabe a integração no pensionamento da parcela


referente às férias porque tal direito não representava aumento da renda anua
do acidentado, já que seu principal objetivo era um repouso mais prolongado.
É razoável, todavia, computar o acréscimo correspondente ao adicional de 1/3
sobre as férias, também pelo seu duodécimo, porquanto esse valor compunha
o conjunto dos rendimentos ao longo do ano. Também os valores do FGTS
não devem ser incluídos na base de cálculo da pensão porque não faziam
parte da renda habitual do trabalhador(43).

O cálculo da indenização tem como objetivo restaurar, do ponto de vista


material, a situação existente antes do óbito. Para atingir esse propósito, a
apuração do quantum da pensão deverá retratar com fidelidade os ganhos
que efetivamente o acidentado morto auferia, tomando-se o cuidado para que
a indenização não se transforme em fonte de enriquecimento nem em causa
de empobrecimento dos beneficiários. É oportuno transcrever, nesse sentido,
a lição de Caio Mário:

“É também princípio capital, em termos de liquidação das obrigações,


que não pode ela transformar-se em motivo de enriquecimento. Apura-
se o quantitativo de ressarcimento inspirado no critério de evitar o dano
(de damno vitando), não porém para proporcionar à vítima um lucro (de lucro
capiendo). Ontologicamente subordina-se ao fundamento de restabelecer
o equilíbrio rompido, e destina-se a evitar o prejuízo. Há de cobrir a
totalidade do prejuízo, porém limita-se a ele.”(44)
Com apoio no princípio mencionado, percebeu-se que o deferimento da
pensão pela totalidade dos rendimentos da vítima, no caso de homicídio,
mostra-se excessivo ou repara além do real prejuízo porque não leva em
consideração que a vítima despendia parte dos rendimentos com o seu próprio
sustento e despesas pessoais. Considerando que o dano deve ser apurado
tomando-se como base as pessoas que foram lesadas (o morto não é mais
sujeito de direito), não seria correto permitir que o falecimento provocasse
um aumento de renda para os beneficiários da pensão.

(43) O valor da pensão deve ser calculado tom ando-se como base o prejuízo dos dependentes
da vítim â: A parcela do FGTS não com punha a renda mensal ou anual do acidentado,
porque só poderia ser sacada em situações excepcionais, como nos períodos de desemprego
ou na aposentadoria. Assim, a sua inclusão na base de cálculo do pensionamento implicaria
conceder rendimentos superiores aos que a vítima habitualmente recebia. Vejam entendimento
do TST a respeito: “Acidente do trabalho. Dano material. Pensão. Base de cálculo. FGTS. Não
compõe a base de cálculo da pensão prevista no art. 950 do CC a contribuição para o FGTS,
porquanto tal valor não integra os rendimentos efetivos do empregado. Precedente. Recurso
de revista não conhecido, no aspecto.” TST. 3- Turma. RR n. 172400-44.2007.5.03.0041,
Rei.: Ministro Maurício Godinho Delgado, DJ 28 set. 2012.
(44) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. 8- t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 316.
•DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 291

Diante dessa constatação, o Suprem o Tribunal Federal passou a


intender que, da base de cálculo do pensionamento, dever-se-ia deduzir o valor
correspondente a 1/3, como presumíveis despesas pessoais da vítima, sendo
aue tais decisões serviram de paradigma para consolidar o entendimento na
jrisprudência(45). Entretanto, a redução de 1/3 poderá ser alterada, para mais ou
oara menos, se houver provas demonstrando que naquele caso concreto a
oresunção não é verdadeira, em razão das evidências em sentido contrário.
Os valores que os dependentes da vítim a recebem da Previdência
Social, a título de pensão por morte, não devem ser deduzidos da base de
oálculo do pensionamento decorrente do ato ilícito, conforme já pacificado na
jurisprudência. A Constituição da República de 1988 estabelece claramente
que o pagamento das parcelas decorrentes do seguro acidentário não exclui
a indenização devida pelo empregador*46». Para evitar repetições, reportamo-
-nos ao Capítulo 4, item 4, em que abordamos os fundamentos lógicos e jurídicos
oelos quais não se compensam os proventos recebidos do INSS com o
pensionamento decorrente da responsabilidade civil por acidente do trabalho.

Até recentemente, em caso de homicídio ou invalidez, todos os tribunais


calculavam o valor do pensionamento inicial e o convertiam em números de
salários mínimos, de modo que a parcela mensal permanecia sempre atuali­
zada, dispensando aplicação de correção monetária. Esse posicionamento
atendia ao enunciado da Súmula n. 490 do STF, adotada em 1969, com o
seguinte teor: “A pensão correspondente à indenização oriunda de responsa­
bilidade civil deve ser calculada com base no salário mínimo vigente ao tem­
po da sentença e ajustar-se às variações ulteriores.”

Ocorre que a Constituição da República de 1988, no art. 7-, IV, optou por
vedar qualquer vinculação de valor ao salário mínimo, especialmente para

(45) “Indenização — Pensão por morte do chefe de família. Do cálculo da pensão deve ser
deduzido 1/3 que representa as presumíveis despesas pessoais da vítim a.” STF. 1ã Turma.
RE 85.417, Rei.: Ministro Cunha Peixoto, julgado em 31 ago. 1976.
"Responsabilidade civil. Acidente de trabalho. Pensão em favor da mãe. Dependência
econômica. Fixação em dois terços. Segundo entendimento da Segunda Seção desta Corte,
o pensionam ento em favor dos genitores decorrente do falecim ento de filho deve ser de
..dois terços da renda auferida pela vítim a já que, por presunção, esta consum iria pelo
menos um terço com o próprio sustento.” STJ. 4- Turma. REsp 435.157/MG, Rei.: Ministro
Fernando Gonçalves, julgado em 10 jun. 2003.
“Pensão devida a filho menor. Redução do pensionamento. Adequada a fixação do valor da
pensão em 2/3 (dois terços) dos rendim entos da vítima, deduzindo que o restante seria
gasto com seu sustento próprio.” STJ. 1® Turma. REsp n. 603.984, Rei.: Ministro Francisco
Falcão, julgado em 5 out. 2004.
(46) Constituição da República. Art. 1-, XXVIII: “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo
do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em
dolo ou culpa.” De form a semelhante prevê o art. 121 da Lei n. 8.213/1991: “O pagamento,
p e la P re v id ê n c ia S o c ia l, d a s p re s ta ç õ e s p o r a c id e n te do tra b a lh o não e x c lu i a
responsabilidade civil da em presa ou de outrem.”
292 S e b a s tiã o G e r a ld o de O live -

im pedir sua adoção com o indexador com o propósito de repor perda;


inflacionárias. É o que também estabelece a Lei n. 7.789/1989, que dispcf
sobre o salário mínimo: “Art. 3Q Fica vedada a vinculação do salário mínimc
para qualquer fim, ressalvados os benefícios de prestação continuada p e ;
Previdência Social.” A propósito, até mesmo as prestações da Previdência
Social deixaram de ter atualizações monetárias vinculadas ao salário mínimc
tanto que a Lei n. 11.430/2006 introduziu novo dispositivo na Lei n. 8.212
1991, estabelecendo: “Art. 41-A O valor dos benefícios em manutenção sera
reajustado, anualmente, na mesma data do reajuste do salário mínimo, prc
rata, de acordo com suas re sp e ctiva s datas de in ício ou do últimc
reajustamento, com base no índice Nacional de Preços ao Consumidor —
INPC, apurado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
— IBGE.”

Nos julgamentos do STF pode ser observado que a Corte, em respeito ao


dispositivo constitucional mencionado, não mais aceita a utilização do salário
mínimo como fator de correção do valor do pensionamento(47). Até reputa válida
a fixação do valor inicial em número de salários mínimos, mas as correções

(47) “ Dano moral. Fixação de indenização com vinculação a salário mínimo. Vedaçãc
Constitucional. Art. 7-, IV, da Carta Magna. — O Plenário desta Corte, ao julgar, em 1e. 10.97.
a ADIN 1425, firmou o entendimento de que, ao estabelecer o art. 7S, IV, da Constituição que
é vedada a vinculação ao salário m ínim o para qualquer fim, quis evitar que interesses
estranhos aos versados na norma constitucional venham a ter influência na fixação do valor
m ínim o a ser observado. — No caso, a indenização por dano moral foi fixada em 500
sa lá rio s m ínim os para que, in e q u ivo ca m e n te , o v a lo r do s a lá rio m ínim o a que essa
indenização está vinculado atue com o fator de atualização desta, o que é vedado pelo
citado dispositivo constitucional. — Outros precedentes desta Corte quanto à vedação da
vinculação em causa. Recurso extraordinário conhecido e provido.” STF. 1a Turma. RE n.
225.448, Rei.: Ministro Moreira Alves, DJ 16 jun. 2000.
Constitucional. Art. 7° Inc. IV, da Constituição da República. Não recepção do art. 3-, § 1°
da Lei Complementar paulista n. 432/1985 pela Constituição de 1988. Inconstitucionalidade
de vinculação do adicional de insalubridade ao salário mínimo: Precedentes. 1, O sentido
da vedação constante da parte final do inc. IV do art. 1- da C onstituição impede que o
salário m ínim o possa ser aproveitado como fator de indexação; essa utilização tolheria
eventual aumento do salário mínimo pela cadeia de aumentos que ensejaria se admitida
essa vinculação (RE 217.700, Ministro Moreira Alves). A norma constitucional tem o objetivo
de impedir que aumento do salário mínimo gere, indiretamente, peso maior do que aquele
diretam ente relacionado com o acréscimo. Essa circunstância pressionaria reajuste menor
do salário mínimo, o que significaria obstaculizar a implem entação da política salarial prevista
no art. 7°, inciso IV, da Constituição da República. O aproveitamento do salário mínimo para
form ação da base de cálculo de qualquer parcela rem uneratória ou com qualquer outro
o b je tivo p e cu n iá rio (in d e n iza çõ e s, pensões etc.) e sb a rra na vin c u la ç ã o ve d a d a pela
C o nstituição do Brasil. H istórico e análise co m parativa da ju risp ru d ê n cia do S uprem o
Tribunal Federal. Declaração de não recepção pela Constituição da República de 1988 do
Art. 3a, § 1a, da Lei Complem entar n. 432/1985 do Estado de São Paulo. ...” STF. Pleno. RE
n. 565.714-1, Rei. Ministra Cármen Lúcia, DJe 07 nov. 2008.
hCENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 293

^oervenientes não podem utilizá-lo como indexador automático(48). É certo


; je periodicamente o valor da pensão deverá sofrer as atualizações cabíveis,
referencialmente de acordo com as variações salariais da categoria profissio-
' 2 da vítima ou por outro índice oficial de atualização, mas essa correção não
poderá ter vinculação com o reajuste periódico do salário mínimo(49).

Diante dessa posição da Corte Maior, tudo indica que não deverá vingar
a inovação introduzida no CPC pela Lei n. 11.232/2005, cujo art. 475-Q, § 4S,
estabelece que “os alimentos podem ser fixados tomando por base o salário
mínimo.” Sem dúvida, a regra deverá ser aplicada nos casos em que a vítima
zercebia um salário mínimo mensal, mormente porque a lógica indica que
oelo menos essa quantia ela continuaria recebendo, não fosse o acidente.
Entretanto, nas hipóteses de remunerações superiores, a fixação do valor
:ela quantidade de salários mínimos poderá acarretar ao longo do tempo um
aumento real da pensão, especialmente em razão do propósito governamental,
; rmado nos últimos anos, de conceder reajuste do salário mínimo acima da
nflação anual. Ademais, o reajuste pela variação do salário mínimo conflita
com o que prevê o art. 7-, IV, da Constituição Federal, conforme acima men­
cionado.

Entendemos, portanto, que a previsão do art. 475-Q, § 4e, do CPC, só


deverá ser aplicada nos casos em que a vítima percebia remuneração men­
sal equivalente ao salário mínimo. Para os salários superiores, a pensão de­
verá ser fixada com base na remuneração real percebida, aplicando-se a
correção periódica do valor, preferencialmente de acordo com a variação
salarial da categoria profissional do acidentado. De todo modo, deverá ser
assegurado que o valor corrigido nunca será inferior ao salário mínimo legal,
vigente em cada época, salvo no caso de pagamento de pensão proporcional
na hipótese de redução da capacidade laborativa.

(48) “Em enta: Em bargos D eclaratórios recebidos com o agravo regim ental. Indenização.
Vedação de vinculação ao salário mínimo. Art. 7° IV, da Constituição. Questão apresentada
som ente em embargos à execução. À luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal,
é vedado o uso do salário mínimo como fator de atualização da indenização. O mesmo não
ocòrre, contudo, quando se faz uso dele como expressão do valor inicial da indenização.
No entanto, no caso, observo que se trata de recurso extraordinário originário de embargos
à execução. Assim, a vinculação da indenização ao salário mínimo é matéria que não pode
mais ser discutida, porquanto alcançada pela coisa julgada. Agravo regimental a que se
nega provim ento.” STF. 2- Turma. Al n. 537333. Rei. Ministro Joaquim Barbosa. DJe 12
maio de 2009.
(49) É oportuno transcrever a Súmula vinculante do STF n. 4, adotada em 2008, cujo teor
reforça o entendimento mencionado, apesar de tratar de assunto diverso: “Salvo nos casos
previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de
cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão
ju d ic ia l.”
294 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e f

9.6. Constituição de capital para garantia do pensionamento

Além de e sta belecer o direito à reparação dos danos causado;


injustamente, a lei criou meios para garantir o cumprimento da sentença, ;
modo que a vítima possa conseguir efetivamente o ressarcimento do prejuízc
sofrido. O próprio Código Civil estabelece no art. 942 que “os bens dc
responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos a
reparação do dano causado...” De forma semelhante, prevê o art. 591 d:
CPC que o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, c o r
todos os seus bens presentes e futuros.
Ocorre que a garantia da pensão mensal, cujo pagamento se prolonga
no tem po por vários anos ou até décadas, deve ser m ais rigorosa
especialmente em razão da natureza do direito protegido. Os dependentes
do acidentado morto não podem ficar sujeitos às incertezas das oscilações
econômicas, correndo o risco de perderem abruptamente a renda da pensão,
pelo fechamento da empresa ou mesmo pela falência do ex-empregador. Além
disso, muitas empresas de micro, pequeno ou médio porte nem mesmo teriam
estímulo para prosseguir na atividade sabendo da despesa mensal certa já
incluída inexoravelm ente no seu passivo. Tam bém não seria incomum
ocorrerem falências ou encerramentos propositais da empresa, como forma
calculada de exoneração do encargo mensal.

Com essas justas preocupações e com o objetivo de resguardar a


sobrevivência digna dos beneficiários da pensão, o legislador estabeleceu no
art. 475-Q do CPC, com a redação alterada pela Lei n. 11.232/2005:
“Quando a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, o juiz, quanto a
esta parte, poderá ordenar ao devedor constituição de capital, cuja renda assegure o
pagamento do valor mensal da pensão.”(50)

Mesmo considerando que o texto legal atual deixa a critério do juiz orde­
nar ou não a constituição de capital, é recomendável determinar sempre essa
garantia, ainda no processo de conhecimento(51), pelos sérios riscos já men-

(50) A redação do revogado art. 602 do CPC tinha comando imperativo: “Toda vez que a
indenização por ato ilícito in clu ir prestação de alim entos, o juiz, quanto a esta parte,
condenará o devedor a constituir um capital, cuja renda assegure o seu cabal cum prim ento.”
A gora a redação do art. 475-Q confere ao ju iz a facu ld a d e de ord e n a r ao d evedor a
constituição do capital para garantia do pagamento da pensão.
(51) Entendemos, com apoio na doutrina, que é possível determinar a constituição de capital
para garantia do pensionamento mesmo na fase de execução, de ofício ou a requerimento da
parte. Nesse sentido pondera Arnaldo Rizzardo: “Desde que surjam motivos para exigir a
garantia posteriormente, concede-se sua instituição. Se em dado momento as circunstâncias
não ensejavam a providência, não havia porque buscá-la. Surgindo uma situação que enseja
o colapso financeiro do obrigado, com prenúncios de insolvência, o direito que consolidou a
obrigação permite que se estabeleça a garantia.” Cf. Responsabilidade civil: Lei n. 10.406, de
10.1.2002. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 898-899.
INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 295

nonados, independentemente de pedido dos credores da pensão. E a garantia


'ão é só do pagamento da renda mensal; exige-se que seja destacado capi-
lal suficiente para gerar renda equivalente ao valor da pensão. Temos então
-■na seqüência lógica: capital que produz renda, que gera alimentos, que garan-
fe a sobrevivência. É o propósito da lei assegurar, com a fidelidade possível,
:ue a morte injusta do acidentado não faça desaparecer o rendimento provedor.

Comentando a respeito do novo disciplinamento legal do art. 475-Q do


3PC, o Juiz do Trabalho potiguar Luciano Athayde Chaves, elabora interes­
sante interpretação:
“A mim me parece que a ‘faculdade’ de constituir o capital somente terá
lugar se o juiz vislumbrar um outro modo de garantir o resultado útil da
execução do julgado no tempo, pelas outras formas admitidas no § 2-.
Sob esse prisma, a imperatividade de garantir a efetividade da obrigação
sucessiva representada pela prestação de alimentos não desaparece,
apenas é exercida num espectro mais amplo de possibilidades. Porém,
deverá ser exercida. (...) É de grande relevo, pois, que o Juiz do Trabalho,
ao acolher pretensão indenizatória que envolva prestação de alimentos,
fixe, desde a sentença de mérito, a forma pela qual deverá ser garantido
o capital para a satisfação da obrigação, atentando para tais ponderações,
de modo a aperfeiçoar a entrega da tutela jurisdicional.”(52)

O capital constituído por imóveis ou por títulos da dívida pública ou


aplicações financeiras em banco oficial será inalienável e impenhorável,
enquanto durar a obrigação do devedor (art. 475-Q, § 1s, do CPC). Os bens
indicados perm anecem n orm alm ente na posse do devedor, mas os
rendimentos têm destinação direcionada: garantir o pagamento mensal da
pensão. Somente quando cessar a obrigação é que o juiz fará a liberação do
gravame (art. 475, § 5e, do CPC).

Na liquidação da sentença transitada em julgado haverá parcelas da


pensão vencidas e vincendas. Serão apuradas para execução imediata as
parcelas vencidas porque o valor mensal estabelecido na sentença será
devido de forma retroativa, desde a data do óbito ou do acidente, conforme
fixado na sentença. Assim, as parcelas vencidas serão executadas no
procedimento comum; as vincendas, poderão ser acobertadas com a garantia
do art. 475-Q do CPC.
Anota Arnaldo Rizzardo, com apoio na jurisprudência, que é mais viável
a garantia por intermédio de um depósito bancário em caderneta de poupança,
que renda correção monetária e juros, com bloqueio dos saques, salvo o

(52) CHAVES, Luciano Athayde. A recente reforma no processo comum e seus reflexos no
direito judiciário do trabalho. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2007. p. 99-100.
296 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e -

valor da pensão mensal, tomando-se o cuidado para que o montante das


retiradas não consuma o capital constituído(53). Essa solução apontada pete
doutrina e jurisprudência acabou acolhida pelo novo dispositivo introduzic:
pela Lei n. 11.232/2005, que possibilitou a garantia também por “aplicações
financeiras em banco oficial” (art. 475-Q, § 1° do CPC).

Outra opção, um pouco mais flexível e menos burocrática, também indi­


cada por Arnaldo Rizzardo, é a que o devedor “clausule os bens de impenhc-
rabilidade e inalienabilidade” e passe a efetuar mensalmente o pagamento óa
pensão, já que o objetivo da norma é garantir o cumprimento das prestações
e não que aqueles bens gravados produzam diretamente as rendas. Enquar-
to perdura a obrigação do pensionamento, os imóveis ficarão onerados, de­
vendo ser expedido mandado de registro ao cartório competente para evita-
qualquer probabilidade de venda por parte do devedor. Dessa forma, se fe­
rem cumpridos regularmente os pagamentos da pensão, esses imóveis nãc
serão executados(54).

Também serve para garantir o cumprimento da obrigação a possibilidade


acrescentada pelo § 5S, do art. 20 do CPC, que faculta consignar a pensão na
folha de pagamento do devedor. Agora o art. 475-Q, § 2e, introduzido pela Le
n. 11.232/2005, estabelece que: “O juiz poderá substituir a constituição do
capital pela inclusão do beneficiário da prestação em folha de pagamento de
entidade de direito público ou de empresa de direito privado de notória
capacidade econômica, ou, a requerimento do devedor, por fiança bancária
ou garantia real, em valor a ser arbitrado de imediato pelo juiz.” Essa opção,
contudo, tem sido mais indicada quando o devedor for pessoa jurídica de
direito público, já que inexiste o risco da insolvabilidade, sendo também admitida
para as empresas públicas ou de economia mista com notória idoneidade.

A pretensão das empresas privadas de garantir a pensão pela simples


inclusão na folha de pagamento mensal deve ser apreciada com bastante
prudência e com análise cuidadosa de todas as variáveis do caso concreto.
Em primeiro lugar porque a determinação do juiz para que o devedor consti­
tua capital, conforme previsto agora no art. 475-Q do CPC, tem fundamento
jurídico inquestionável já sedimentado na jurisprudência, desde os revoga­
dos arts. 911 e 912 do CPC de 1939. Por outro enfoque, ninguém desconhe­
ce que ocorrem falências inesperadas, mesmo em grandes corporações. O
pensionamento pode ter duração prolongada por várias décadas, pelo que
qualquer previsão sobre a solidez econômica do devedor é arriscada e pre­
cária. Vejam o caso da morte de um acidentado com 22 anos que deixa como

(53) RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: Lei n. 10.406, de 10.1.2002. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 900.
(54) Ibidem, p. 901.
;DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 297

oeneficiária jovem viúva, situação que ocorre com razoável frequência. Esta
pensão poderá perdurar por mais de 50 anos, ou seja, o tempo da expectativa
de sobrevida da vítima(55). Por causa de tais receios e das lições da experiên­
cia, o entendimento no âmbito do STJ é o de que a constituição de capital
para as empresas privadas não deve ser dispensada(56). Com a pacificação
desse posicionamento, o STJ, em 2005, adotou a Súmula n. 313, com o
seguinte enunciado: “Em ação de indenização, procedente o pedido, é ne­
cessária a constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia de
pagamento da pensão, independentemente da situação financeira do deman­
dado.”'57)
A constituição de capital em estudo poderá ainda ser substituída por
fiança bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado pelo juiz (art. 475-Q,
§ 2e, do CPC). Pela fiança o Banco assume o encargo, caso o devedor não
pague a pensão, como ocorria com a antiga caução fidejussória prevista no
revogado art. 602, § 2Q, do CPC(58). Caberá ao juízo da execução, diante do
requerimento do executado, analisar a proposta dessa modalidade de garantia,
sempre com vistas à segurança futura dos beneficiários da pensão, podendo
acolher ou não o requerido, de acordo com as circunstâncias do caso(59).

(55) Vejam a questão da sobrevida provável da vítim a no item seguinte.


(56) Ação de indenização. Morte da vítima. Concessionária de serviço público. Constituição
de capital. Cabimento. A mera circunstância de a em presa ré ser concessionária de serviço
público não a exim e da constituição de capital garantidor, com o form a de assegurar o
cum prim ento da obrigação (Enunciado 313 da Súmula do STJ). STJ. 4® Turma. EDcl no
AREsp n. 46.278/MG, Rei.: Ministra Maria Isabel Gallotti, DJ 29 maio de 2012.
“R esponsabilidade civil. Morte. C onstituição de capital para g a ra n tir pensionam ento. Em
face da realidade econômica do país, que não mais permite supor a estabilidade, longevidade
e saúde empresariais, de modo a perm itir a dispensa de garantia, a Segunda Seção deste
Tribunal, no julgam ento do Recurso Especial n. 302.304/RJ, pacificou posição afirm ando a
impossibilidade da substituição da constituição de capital, prevista na lei processual civil,
pela inclusão do beneficiário de pensão em folha de pagam ento.” STJ. 3§ Turma. AgRg no
AG 469.577/MG, Rei.: Ministro Castro Filho, julgado em 17 fev. 2004.
(57) Vale registrar que a Súmula n. 313 do STJ foi adotada em 2005, mas antes da mudança
promovida pela Lei n. 11.232/2005, que introduziu no CPC o art. 475-Q, ou seja, enquanto
vigorava o art. 602 do CPC. Entretanto, diversos acórdãos do STJ publicados posteriormente
continuam aplicando a Súmula n. 313, como, por exemplo: REsp n. 669.696; 723.544; 899.869;
AgRg no Ag. n. 811.962 e 698.041; EDcl no AREsp 46.278 e EDcl no RESP n. 1137977.
(58) De Plácido e Silva define a caução fidejussória: “ É a caução por fiança pessoal prestada
por uma terceira pessoa, perante o credor, para garantia da dívida ou da obrigação do
devedor, no caso em que ele não a pague, ou não a cumpra. E se diz fidejussória, de fide e
jubere, porque justam ente significa fiança prestada por outrem. É a caução por fiança de
terceiro, que assum e todo o encargo de fiador e, nestas condições, se solidariza com o
devedor pelo pagamento da dívida ou cumprimento da obrigação.” Cf. Vocabulário jurídico.
10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987. v. I, p. 408.
(59) Como adverte Alcides de Mendonça Lima, “não é uma pena, nem um direito do devedor.
É m era faculdade conce d id a ao ju iz: ‘poderá su b s titu ir a co n stitu içã o de c a p ita l’.” In:
Comentários ao Código de Processo Civil. 5. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1987.
v. VI, p. 540.
298 S e b a s t iã o G er aldo de O l iv e if -

Para Sílvio Rodrigues, a caução fidejussória “pode representar um grande


benefício para o devedor, sem constituir ameaça para o credor. Isso porque,
através dela, fica o devedor exonerado de imobilizar grandes recursos, o que
lhe é altamente inconveniente, enquanto o credor terá a garantia do adimple-
mento, através da assunção da obrigação solidariamente por fiador idôneo.”(s:

Nada impede, como assegura Mendonça Lima, que “as partes façam
acordo quanto ao valor da indenização ou a forma de pagamento, indepen­
dentemente das normas aqui prescritas, que apenas têm aplicabilidade, se os
interessados não acertarem uma forma conciliatória de liquidar a obrigação.”*61
Por derradeiro, neste tópico, é necessário anotar que, em razão de
mudança nas condições econômicas, o capital ou a garantia constituída pode
tornar-se inadequado ou desproporcional ao objetivo proposto de assegura
a continuidade do pagamento da pensão, tanto pelo excesso quanto pela
insuficiência. Em tal circunstância, qualquer das partes poderá pedir ao juiz
da execução o aumento ou a redução do encargo, conforme previa o § 3Qdo
art. 602 do CPC(62). A redação atual do art. 475-Q, § 39, do CPC estabelece
que: “Se sobrevier modificação nas condições econômicas, poderá a parte
requerer, conforme as circunstâncias, redução ou aumento da prestação.”

Mesmo com a mudança mencionada do texto legal, entendemos que


não se trata da possibilidade de rever o valor da pensão, como ocorre nas
ações revisionais de alimentos no campo do Direito de Família. O pensiona­
mento aqui tem natureza jurídica reparatória e não alimentar no sentido estri­
to (Art. 7S, XXVIII, da CF), razão pela qual a posterior mudança na situação
econômica do devedor ou do credor não deve acarretar alteração do quan-
tum mensal estabelecido. Como pondera Humberto Theodoro, “a lei não tem
força, no tratar categorias jurídicas, de contrariar a natureza das coisas. A
palavra final não é a do legislador mas a da ciência jurídica.”(63)
Pode-se observar também que todo o propósito do art. 475-Q do CPC
está voltado para a garantia da continuidade do pagamento e não para alterar
o valor fixado na condenação. Assim, a exegese do § 3g não pode ser buscada
sem considerar o preceito básico estabelecido no caput do artigo. Nesse
sentido, merece transcrição o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves,

(60) RODRIGUES, Sílvio. D ireito civil: responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva,
2002. v. 4, p. 216.
(61) LIMA, Alcides de Mendonça. C omentários ao Código de Processo Civil. 5. ed. rev. e
atual. Rio de Janeiro: Forense, 1987. v. VI, p. 537.
(62) CPC. Art. 602, § 3S: “Se, fixada a prestação de alimentos, sobrevier modificação nas
condições econômicas, poderá a parte pedir ao juiz, conforme as circunstâncias, redução
ou aumento do encargo.”
(63) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. 2, p. 158.
•.DENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 299

suando analisou o texto do revogado art. 602 do CPC e que foi substituído
oelo atual 475-Q do mesmo Código:

“O § 3Q está ligado ao caput do art. 602, que trata da constituição de


capital para garantir o pagamento da pensão. Assim, ao mencionar a
possibilidade de se pedir redução ou aumento do encargo, está se refe­
rindo ao gravame que onera o bem. Destarte, se sofreu este uma desva­
lorização acentuada, de modo a que não mais garanta a satisfação da
dívida, poderá ser pleiteado o reforço da garantia. Do mesmo modo po­
derá ser pedida a sua redução, em caso de inesperada e desproporcio­
nal valorização.”(64)
Na edição atualizada da sua preciosa obra lançada em 2012, Carlos
Roberto Gonçalves, ao comentar a mudança introduzida pelo art. 475-Q do
CPC, pontua:

“Entendemos, no entanto, inaplicável a revisão em caso de homicídio. É


que não se pode confundir a pensão decorrente de um ato ilícito, que é
indenização, com a obrigação de pagar alimentos aos parentes ou ao
cônjuge necessitados. A primeira tem natureza reparatória de danos. A
segunda tem por pressuposto a necessidade dos familiares e cônjuge e
a possibilidade do prestante. Como já se salientou, a prim eira é
indenização a título de alimentos e não de alimentos propriamente ditos.
O fato gerador da indenização é o ato ilícito, não a necessidade de
alimentos. Entender de modo contrário levaria à absurda consequência
de que, se a vítim a é pessoa de abastados recursos, nenhum a
indenização deverá ser paga pelo delinqüente, precisamente porque a
família daquela não precisa de alimentos para a sua subsistência, como
afirma Carvalho Santos.”(65)

9.7. Termo final da pensão

De início, é oportuno informar que neste tópico só abordaremos o termo


final do pensionamento decorrente do acidente fatal, porquanto a pensão devida
à própria vítima, quando esta sobrevive ao acidente (arts. 949 e 950 do Código
Civil), tem tratamento diverso, como veremos no próximo Capítulo.

O termo final do direito à pensão pode ocorrer em razão de limite temporal


relacionado ao acidentado falecido ou aos próprios beneficiários. O primeiro

(64) GONÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil: doutrina, jurisprudência. 7. ed.


atual, e ampi. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 651.
(65) GO NÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 581.
300 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e -

limite a ser observado, que prepondera sobre todos os demais, é o que le a


em conta “a duração provável da vida da vítima”, conforme previsto no a-,
948, II, do Código Civil. A obrigação do pagamento mensal encerra-se q u a n :;
for atingida a provável sobrevida que a vítima teria, conforme fixado
sentença, independentem ente da idade, condição ou necessidade dc í
beneficiários.

A estimativa do tempo provável de sobrevida da vítima, para estabelece


o termo final do pagamento, ainda gera controvérsias, apesar da inovação c:
Código Civil de 2002. Muitos tribunais continuam fixando o limite de 65 anos
mas cresce o número de decisões adotando idade superior(66).

O Código Civil de 1916 (art. 1.537) não mencionava o prazo de duraçã:


do pensionamento e, por essa razão, coube à jurisprudência arbitrar o lapsc
temporal do benefício. É verdade que o revogado CPC de 1939 estabeleça
no art. 911: “No arbitramento da indenização proveniente de ato ilícito, os
lucros cessantes serão convertidos em prestação de renda ou pensão,
mediante pagamento de capital que, aos juros legais e levada em conta a duraçãc
provável da vida da vítima, assegure as prestações devidas”. Entretanto, c
art. 602 do CPC, promulgado em 1973, ao tratar da mesma garantia, sc
mencionou como prazo “enquanto durar a obrigação do devedor”, redação esta
que foi repetida pelo art. 475-Q, incluído pela Lei n. 11.232/2005.

O Supremo Tribunal Federal, nos anos 60 e 70 do século passado, fixava


a idade provável do brasileiro, para fins de encerramento da pensão, em 60
anos(67). Já na década de 80, ou seja, há mais de vinte e cinco anos, a idade
provável foi elevada para 65 anos, de acordo com cálculos atuariais da
época(68), limite esse que passou a ser largamente adotado nos julgamentos.

Ocorre que nos últimos trinta anos houve um aumento progressivo da


expectativa de vida e de sobrevida do brasileiro, conforme dados divulgados
pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística — IBGE. Basta
mencionar que em 1980 a expectativa de vida ao nascer era de 62,5 anos:
em 1991 passou para 66,9 anos; em 2000 para 70,4 anos e em 2010 para
73,5 anos. Na medida em que estatísticas mais atualizadas eram publicadas,
os julgam entos começaram a incorporar limites de expectativa de vida
superiores a 65 anos<69).

(66) “ Termo ad quem. Pensão. O termo ad quem do pensionam ento da viúva, consoante
entendim ento firm ado por esta Corte, deve ser a data em que a vítim a com pletaria 70
(setenta) anos de idade.” REsp n. 72.793-SP” . STJ. 4- Turma. Resp n. 468.934/SP, Rei.:
Ministro Fernando Gonçalves, julgado em 20 maio 2004.
(67) Cf. RE 66.253 e RE 74.769.
(68) Cf. RE 100.127.
(69) “ R esponsabilidade civil. Expectativa de vida da vítim a fixada, por maioria de votos, em
69 anos, de conform idade com tabela do M inistério da P revidência e A ssistência Social.
^ d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 301

O Código Civil de 2002, todavia, trouxe inovação significativa nesta


ruestão. O texto do art. 948, II, é muito claro ao estabelecer que a pensão no
raso de homicídio por ato ilícito deve levar em conta “a duração provável da
vida da vítima.” Assim, não faz mais sentido utilizar a média de vida do brasileiro
: u a expectativa de vida ao nascer, que conduzem a resultados distorcidos e
ultrapassados. Antes do novo Código Civil, ainda era válido considerar a
ongevidade média do brasileiro, mas agora o dispositivo legal é taxativo ao
estabelecer que a expectativa de sobrevida a ser apurada é a da vítima — ou
seja, a expectativa de vida específica daquela vítima — , pelo que não é
aceitável buscar outro critério por influência da jurisprudência baseada no
Dódigo Civil já revogado.

A pesquisa da “duração provável da vida da vítima” , conforme determina


o novo Código Civil, ficou muito facilitada por uma mudança ocorrida na
legislação previdenciária. A Lei n. 9.876/1999, que introduziu o fator
orevidenciário para cálculo dos benefícios das aposentadorias por idade ou
oor tempo de contribuição, acrescentou dois parágrafos importantes no art.
29 da Lei n. 8.213/1991, que tratam exatamente da expectativa de sobrevida:
“§ 1- O fator previdenciário será calculado considerando-se a idade, a expectativa de
sobrevida e o tem po de contribuição do segurado ao se aposentar, segundo a fórmula
constante do Anexo desta Lei.

^ecurso especial conhecido e provido, parcialm ente.” STJ. 4ã Turma. REsp n. 37.765/RJ,
Rei.: Ministro Barros Monteiro, julgado em 11 o u t.1993.
*Responsabilidade civil. Invalidez e posterior morte de vítima que contava 74 anos. Sobrevida
provável. Tabela progressiva da Previdência. IBGE. Quando, em casos de responsabilidade
civil, haja necessidade de estabelecer-se a presumível sobrevida, recomendável se faz a
utilização da tabela progressiva da Previdência Social divulgada pelo IBGE, critério que,
comparado ã adoção do limite fixo de 65 anos, se reveste de maior lógica e coerência.” STJ.
Turma. REsp n. 53.840/RS, Rei.: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 10
out. 1994.
Responsabilidade civil do Estado. Ação de indenização por danos morais e materiais.
Pensão. Termo ad quem. Data em que o de cujus completaria 70 anos. O critério para
:eterm inar o termo final da pensão devida à viúva é a expectativa de vida do falecido. Ela
~ão é indicador estanque, pois é calculado tendo em conta, além dos nascimentos e óbitos,
d acesso à saúde, à educação, à cultura e ao lazer, bem como a violência, a criminalidade,
a poluição e a situação econôm ica do lugar em questão. Q ualquer que seja o critério
adotado para a aferição da expectativa de vida, na hipótese de dúvida o juiz deve solucioná-
-la da maneira mais favorável à vítima e seus sucessores. A idade de 65 anos, como termo
fin a l p a ra p a g a m e n to de p e n s ã o in d e n iz a tó ria , não é a b s o lu ta , s e n d o c a b ív e l o
estabelecim ento de outro limite, conforme o caso concreto. Precedentes do STJ. É possível
a utilização dos dados e sta tístico s divulgados pela P revidência S ocial, com base nas
informações do IBGE, no tocante ao cálculo de sobrevida da população média brasileira.
Em hom enagem à alteração gradativa e prospectiva da ju risprudência, bem com o aos
precedentes referidos pelos recorrentes, o termo ad quem para o pensionam ento deve ser
a data em que o de cujus com pletaria 70 anos.” STJ. 2a Turma. REsp n. 1244979/PB, Rei.:
Ministro Herman Benjamin, DJ 20 maio 2011.
302 S e b a s t iã o G e r ald o de O liveira

§ 8- Para efeito do disposto no § 7a, a expectativa de sobrevida do segurado na idade


da aposentadoria será obtida a partir da tábua com pleta de mortalidade construída
pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e E statística — IBGE, considerando-
-se a média nacional única para ambos os sexos.”

No mesmo ano de 1999, o Decreto n. 3.266 regulamentou a periodicidade


e a publicação anual da tábua completa de mortalidade pelo IBGE:
“Art. 1a Para efeito do disposto no § 1° do art. 29 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de
1991, com a redação dada pela Lei n. 9.876, de 26 de novembro de 1999, a expectativa
de sobrevida do segurado na idade da aposentadoria será obtida a partir da tábua
c o m p le ta de m o rta lid a d e p ara o to ta i da p o p u la çã o b ra s ile ira , c o n s tru íd a pela
Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística — IBGE, considerando-se a
média nacional única para ambos os sexos.
Art. 2a Compete ao IBGE publicar, anualmente, até o dia primeiro de dezembro, no
Diário Oficial da União, a tábua com pleta de mortalidade para o total da população
brasileira referente ao ano anterior.”

Como se vê, a publicação anual do IBGE retrata, mediante critérios cien­


tíficos, a expectativa de sobrevida do brasileiro para qualquer idade a cada
ano, oferecendo uma tabela geral e outras duas específicas com separação
por sexo. Logo, a “duração provável da vida da vítima”, de que fala expressa­
mente o art. 948, II, do Código Civil, poderá ser encontrada com segurança
numa informação oficial, publicada por força de lei, por intermédio de uma
instituição de reconhecida idoneidade e competência técnica.
Com base na última publicação do IBGE a respeito da tábua completa
de mortalidade no Brasil, ocorrida em novembro de 2012<70), é possível montar
o quadro de sobrevida m édia do brasileiro, relativo ao ano de 2011,
considerando inicialmente ambos os sexos:

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — AMBOS OS SEXOS — 2011

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade E xpectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 63,7 35 42,4 58 22,8
13 62,7 36 41,5 59 22,0
14 61,7 37 40,6 60 21,2
15 60,7 38 39,7 61 20,5
16 59,8 39 38,8 62 19,7
17 58,9 40 37,9 63 19,0
18 57,9 41 37,0 64 18,3
19 57,0 42 36,1 65 17,6
20 56,1 43 35,2 66 16,9
21 55,2 44 34,3 67 16,2
22 54,3 45 33,5 68 15,5

(70) A tábua com pleta está disponível em: <http://w ww .ibge.gov.br>


INDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 303

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
23 53,4 46 32,6 69 14,9
24 52,4 47 31,7 70 14,2
25 51,5 48 30,9 71 13,6
26 50,6 49 30,0 72 13,0
27 49,7 50 29,2 73 12,4
28 48,8 51 28,4 74 11,8
29 47,9 52 27,5 75 11,2
30 47,0 53 26,7 76 10,7
31 46,0 54 25,9 77 10,1
32 45,1 55 25,1 78 9,6
33 44,2 56 24,3 79 9,1
34 43,3 57 23,5 80 ou mais 8,7

Fonte: Tábua com pleta de mortalidade — IBGE — 2011.

Ao consultar essa tabela, elaborada a partir de dados oficiais, basta


conferir a idade exata em que ocorreu o óbito e localizar a expectativa de
sobrevida daquela vítima. Esse será, portanto, o prazo do pensionamento
devido, desde a data do óbito, porque corresponde exatamente à duração
provável da vida da vítima, como estabelece o dispositivo legal mencionado.

É importante anotar que a expectativa de sobrevida, quando adicionada


à idade da vítima, acaba alcançando um resultado maior do que a expectativa
de vida ao nascer, em razão do ainda acentuado índice de mortalidade infantil
no Brasil. No ano de 2010, por exemplo, segundo os dados do IBGE, a
expectativa de vida média do brasileiro ao nascer era de 73,5 anos, mas a
sobrevida provável para quem já atingiu um ano de idade foi estimada em
74,1 anos. Um trabalhador que sofreu acidente fatal com 30 anos em 2010
tinha uma expectativa de sobrevida média de mais 46,8 anos, ou seja, a pensão
pode perdurar até quando a vítima viesse a completar 76,8 anos(71).

Entendemos, todavia, que o mais correto será considerar a mesma tábua


de mortalidade, porém adotando a projeção correspondente ao sexo do
acidentado, já que o comando legal indica a sobrevida específica da vítima.
Uma simples comparação deixa evidente a maior longevidade da mulher, o

(71) “ Civil. S obrevida pro vá ve l até os 70 anos de idade. A doção da tabela do IBGE. A
sobrevida da pessoa adulta não é a mesm a do recém -nascido, porque aquele já passou
por riscos de mortalidade que este ainda não enfrentou; a tabela do IBGE, a respeito, reflete
esse p rincípio, e prefere sobre o c rité rio da so b re vid a média, ap ro ve ita d o por outros
precedentes judiciais. Recurso especial conhecido, mas não provido.” STJ. 3a Turma. REsp
n. 119.649/RJ, Rei.: Ministro Ari Pargendler, julgado em 04 abr. 2000.
304 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

que acaba elevando a média indicada. Para essa finalidade, montamos a seguir
dois quadros da expectativa de sobrevida para os óbitos ocorridos em 201 1(72),
com separação por sexo:

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — SEXO FEMININO — 2011

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 67,2 35 45,0 58 24,4
13 66,2 36 44,1 59 23,6
14 65,2 37 43,1 60 22,8
15 64,2 38 42,2 61 22,0
16 63,3 39 41,2 62 21,2
17 62,3 40 40,3 63 20,4
18 61,3 41 39,4 64 19,6
19 60,3 42 38,4 65 18,9
20 59,4 43 37,5 66 18,1
21 58,4 44 36,6 67 17,4
22 57,4 45 35,7 68 16,7
23 56,5 46 34,8 69 15,9
24 55,5 47 33,9 70 15,3
25 54,6 48 33,0 71 14,6
26 53,6 49 32,1 72 13,9
27 52,6 50 31,2 73 13,2
28 51,7 51 30,4 74 12,6
29 50,7 52 29,5 75 12,0
30 49,8 53 28,6 76 11,4
31 48,8 54 27,8 77 10,8
32 47,8 55 26,9 78 10,2
33 46,9 56 26,1 79 9,7
34 45,9 57 25,3 80 ou mais 9,1
Fonte: Tábua com pleta de mortalidade — IBGE — 2011.

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — SEXO MASCULINO — 2011

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 60,2 35 39,7 58 20,9
13 59,2 36 38,8 59 20,2
14 58,3 37 38,0 60 19,5
15 57,3 38 37,1 61 18,8

(72) Colocamos nos Anexos VIII a XI a tabela da expectativa de sobrevida no Brasil por
sexo, aplicável para os óbitos ocorridos nos anos de 2007 a 2010, conforme foi divulgado
pelo IBGE.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 305

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
16 56,4 39 36,2 62 18,1
17 55,4 40 35,4 63 17,4
18 54,5 41 34,5 64 16,7
19 53,7 42 33,6 65 16,1
20 52,8 43 32,8 66 15,4
21 51,9 44 31,9 67 14,8
22 51,1 45 31,1 68 14,2
23 50,2 46 30,3 69 13,6
24 49,3 47 29,4 70 13,0
25 48,5 48 28,6 71 12,4
26 47,6 49 27,8 72 11,8
27 46,7 50 27,0 73 11,3
28 45,9 51 26,2 74 10,8
29 45,0 52 25,4 75 10,3
30 44,1 53 24,7 76 9,8
31 43,2 54 23,9 77 9,3
32 42,3 55 23,1 78 8,9
33 41,5 56 22,4 79 8,4
34 40,6 57 21,7 80 ou mais 8,0

Fonte: Tábua com pleta de mortalidade — IBGE — 2011.

Registramos aqui a expectativa de sobrevida para o Brasil como um


todo, porém será mais fiel a informação se for utilizada, no caso concreto, a
estatística de sobrevida própria da unidade da Federação onde residia a vítima.
É fato notório, por exemplo, que a longevidade no Sul do Brasil é bastante
superior àquela verificada no Nordeste. Além disso, como a busca é da
sobrevida pessoal da vítim a, se algum a circu n stâ n cia , devidam ente
comprovada, exercer influência decisiva nessa projeção, o juiz deverá tomá-
-la em consideração fazendo os devidos ajustes, com indicação dos motivos
do seu convencimento.

Mesmo antes do novo Código Civil, o Colendo STJ já vinha adotando a


tabela de sobrevida publicada pelo IBGE. No julgamento do Recurso Especial
n. 268.265/SP, o M inistro A ld ir Passarinho anotou nos fundam entos do
acórdão: “Essa questão já foi debatida no âmbito desta 4- Turma, que vinha
sempre adotando como critério o limite de 65 (sessenta e cinco) anos, até
que, mais recentemente, essa orientação restou modificada, para adotar-se
a tabela de sobrevida provável utilizada pela Previdência Social que, por sua
vez, segue a tabela do IBGE, que calcula a longevidade em face do tempo de
vida já decorrido de cada pessoa.” Os julgados recentes do STJ apontam no
mesmo sentido, indicando a sedimentação da jurisprudência:
306 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

“Civil. Ação de indenização. Atropelamento. Vítima fatal. Pensionamento. Sobrevida


provável. Tabela previdenciária e do IBGE. A longevidade provável de vítim a fatal,
para efeito de fixação do tem po de pensionamento, deve ser apurada em consonância
com a tabela de sobrevida adotada pela Previdência Social, de acordo com cálculos
elaborados pelo IBGE. Precedentes.” STJ. 4aTurma. REsp n. 268.265/SP, Rei.: Ministro:
Aldir Passarinho Junior, DJ 17 jun. 2002.

“ Responsabilidade civil. Acidente do trabalho. Morte da vítim a por leptospirose.


Esta C orte S up e rior de Ju s tiç a firm o u e n te n d im e n to no se n tid o de que, para a
e stip u laçã o da idade p re su m id a da v ítim a a ser a d o ta d a com o m arco fin a l do
pensionamento, deve ser observada a tabela de sobrevida utilizada pela Previdência
Social.” STJ. 4a Turma. REsp n. 723.544, Rei.: Ministro Hélio Quaglia Barbosa, DJ 12
mar. 2007.

“Responsabilidade civil do estado. Indenização por danos morais e materiais.


Média de sobrevida. Tabela do IBGE. ... 10. A idade de sobrevida não é estanque,
uma vez que se consideram vários elementos para sua fixação, como habitat, alim en­
tação, educação, meios de vida. Outrora, com o escopo de obter-se um referencial
para sua fixação, esta Corte vem adotando os critérios da tabela de sobrevida da
Previdência Social, de acordo com cálculos elaborados pelo IBGE. Precedentes: REsp
1027318/RJ, Segunda Turma, julgado em 7.5.2009, DJe 31.8.2009; REsp 503046/
RJ, Quarta Turma, julgado em 28.4.2009, DJe 25.5.2009; REsp 723544/RS, Quarta
Turma, julgado em 13.2.2007, DJ 12.3.2007 p. 240; REsp 746894/SP, Quarta Turma,
julgado em 15.8.2006, DJ 18.9.2006 p. 327; REsp 698443/SP, Quarta Turma, julgado
em 1-.3.2005, DJ 28.3.2005 p. 288; REsp 211073/RJ, Terceira Turm a, julgado em
21.10.1999, DJ 13.12.1999 p. 144. 11. A jurisprudência da Corte acata a mais especi­
alizada tabela do IBGE, consoante colhe-se dos seguintes precedentes: REsp 35842/
RJ, Quarta Turma, julgado em 21.3.1995, DJ 29.5.1995 p. 15518; REsp 211073/RJ,
Terceira Turma, julgado em 21.10.1999, DJ 13.12.1999 p. 144; REsp 1027318/RJ,
Segunda Turma, julgado em 7.5.2009, DJe 31.8.2009. 12. In casu, a vítima, contava
com 28 anos de idade, por isso que, utilizando-se a expectativa de sobrevida da
tabela do IBGE, para a época dos fatos, que era de 47,4 anos, alcança-se a idade de
75,4 anos, limite para a fixação do pensionam ento concedido aos autores da ação.”
STJ. 1a Turma. REsp n. 1124471/RJ, Rei.: Ministro Luiz Fux, DJ 19 jul. 2010.

Se a vítima do acidente fatal já contava com idade superior à média da


expectativa de vida indicada, mas continuava trabalhando regularmente,
d o u trin a e ju ris p ru d ê n c ia recom enda m co n c e d e r pen sã o aos seus
dependentes por mais cinco anos(73). Entendemos, todavia, que “à falta de
um critério científico ou técnico com maior objetividade” , que os doutrinadores
mencionam como fundamento para adotar o acréscimo padrão de cinco anos,
não serve mais de justificativa, porque a tábua de mortalidade publicada pelo
IBGE indica a sobrevida provável para qualquer idade, com respaldo em dados
atuariais devidamente sancionados pela ciência demográfica. Com efeito, se

(73) V erificar neste sentido: STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev.,
atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 1.499; RIZZARDO, Arnaldo. A
reparação nos acidentes de trânsito. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p.
174; GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 602.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 307

o acidentado morto já contava com idade avançada, deve-se aplicar a


sobrevida estimada pelo IBGE e não apenas os cinco anos. Naturalmente
que o critério científico de cálculo da provável sobrevida deverá prevalecer
sobre a estimativa aleatória até agora adotada.
Com relação ao termo final da pensão por fatores ligados aos beneficiários
(filhos, cônjuge, pais etc.), o assunto foi abordado no item 9.4 considerando
as particularidades de cada dependente, ao qual nos reportamos. Cabe
mencionar, porém, que o pensionamento cessa com a exclusão do último
beneficiário, ainda que esteja fluindo o prazo da expectativa de sobrevida que
a vítima teria.

9.8. Direito de acrescer dos beneficiários remanescentes

O termo final do direito à pensão normalmente ocorre em datas diferentes


para cada um dos beneficiários. No entanto, acontece a cessação simultânea
quando for atingida a data limite fixada na sentença, correspondente à provável
sobrevida do acidentado.

O chamado “direito de acrescer” surge quando algum dos dependentes,


enquanto perdura o lapso temporal da obrigação, perde o direito ao pensiona­
mento, seja por morte ou por ter atingido a idade-limite para a percepção do
benefício. Cabe, então, investigar se o valor da quota-parte que era atribuído
ao ex-beneficiário da pensão pode ser revertido ou rateado em favor dos
remanescentes.
No âmbito da Previdência Social, desde 1960, havia norma prevendo a
reversão do valor em favor dos pensionistas remanescentes(74). A lei atual de
benefícios tem norma expressa a respeito: “Art. 77. A pensão por morte, havendo
mais de um pensionista, será rateada entre todos em partes iguais. § 12 Reverterá
em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar,”(75)
Se a questão restou pacificada no Direito Previdenciário, ficava a dúvida
se o direito de acrescer era também aplicável no pensionamento proveniente
de ato ilícito, especialmente diante da omissão do Código Civil sobre o tema.

Em julgamento de 1972, o STF adotou o direito de acrescer em pensão


decorrente de responsabilidade civil(76). Após algumas hesitações e entendi­

(74) Lei n. 3.807, de 26 ago. 1960, art. 40: “Toda vez que se extinguir uma quota de pensão,
proceder-se-á a novo cálculo e a novo rateio do benefício na forma do disposto no art. 37 e
seu parágrafo único considerados porém apenas os pensionistas remanescentes. Parágrafo
único. Com a extinção da quota do último pensionista, extinta ficará também a pensão.”
(75) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991.
(76) “Responsabilidade civil, em consequência de acidente ferroviário. Pensão. Indenização
à viúva e à filha da vítima. Cessada a quota de pensão devida a uma das beneficiárias, ela
308 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

mentos contraditórios, o antigo Tribunal Federal de Recursos adotou, em 1980,


a Súmula n. 57, com o seguinte enunciado: “É cabível a reversão da pensão
previdenciária e daquela decorrente de ato ilícito aos demais beneficiários,
em caso de morte do respectivo titular ou a sua perda por força de impedi­
mento legal.”

O fundamento doutrinário para justificar o direito de acrescer reside na


constatação lógica de que a vítima, se viva fosse, quando cessasse o
desembolso para algum dos dependentes, presumivelmente assistiria melhor
aos demais. Nesse sentido afirma Carlos Roberto Gonçalves: “Justifica-se a
reversão da quota-parte do pensionamento daquele que tenha completado a
idade-limite, ou se casado, para os demais que não tenham perdido o direito
ao benefício, considerando-se que os pais, se vivos fossem, presumidamente
melhor assistiriam os filhos restantes e a esposa, quando um deles atingisse
a idade de autonomia econômica.”(77)

Não temos dúvida quanto ao cabimento do direito de acrescer nas


pensões decorrentes da responsabilidade civil por acidente do trabalho,
especialmente quando se considera a sua natureza reparatória. Entendemos
que a reversão da q u o ta -p a rte lib e ra d a em fa vo r dos dep ende nte s
remanescentes está em harmonia com o princípio basilar da restitutio in
integrum, sendo válida também a aplicação por analogia do dispositivo da
legislação previdenciária(78). Na esteira desse entendimento, assevera Rui
Stoco que, na hipótese de pensionamento mensal, “prevalece o direito de
acrescer, revertendo-se a quota-parte de um beneficiário para o outro, quando
a indenização é concedida a mais de uma pessoa.”(79)

Ainda que não tenha havido previsão a respeito no título executivo tran­
sitado em julgado, o direito de acrescer pode ser implementado posterior­
mente, ao longo do cumprimento da sentença(80). Contudo, o mais indicado é
que a decisão no processo de conhecimento já determine o recálculo do va­

reverterá em favor da rem anescente.” STF. 2- Turma. RE 73.463, Rei.: Ministro Eloy da
Rocha, julgado em 21 ago. 1972.
(77) GO NÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 603.
(78) A 1- Turm a do TST, no julgam ento do RR n. 729/2005-051-18-00, relatado pelo Ministro
P edro P aulo M anus, D J 30 m aio 20 0 8 , e n te n d e u c a b ív e l o d ire ito de a c re s c e r no
pensionam ento decorrente de acidente do trabalho.
(79) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1.512.
(80) ‘‘A gravo regimental. Civil e processual civil. Im pugnação ao cum prim ento de sentença.
Direito de acrescer. Ofensa à coisa julgada. Não ocorrência. 1. C abim ento do direito de
acrescer, independentem ente de previsão no título executivo, no caso de pensão ‘intuitu
fam iliae’, como na espécie. Precedentes.” STJ. 3§ Turma. AgRg nos EDcl no Ag n. 1209255/
MG, Rei.: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJ 13 ago. 2012.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 309

lor (direito de acrescer) sempre que encerrar o pensionamento para algum


dos beneficiários. Cabe anotar que o valor global da pensão para o devedor
não se altera em cada recálculo, o que muda é a quantidade de beneficiários
para o rateio. Daí porque o direito de acrescer pode ser deferido ainda que
não haja pedido expresso deduzido na petição inicial(81).

Nos últimos anos, a jurisprudência sedimentou-se em favor do direito de


acrescer, mesmo quando se trata de pensão decorrente de ato ilícito, como é
o caso da morte por acidente do trabalho ou doença ocupacional, quando
preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil:
“Agravo regim ental. Recurso especial. Ação de indenização. Morte da vítim a.
Direito da mãe e viúva acrescer o valor recebido pelo filho. Cabimento. É direito da
mãe e viúva do falecido acrescer o valor da pensão mensal percebida por seu filho
quando este deixar de receber o pensionam ento.” STJ. 4- Turma. AgRg no REsp n.
998.429/SP, Rei.: Ministra Maria Isabel Gailotti, DJ 23 mar. 2012.

“Pensão mensal. Term o final. Direito de acrescer. 1. A indicação de ofensa ao art.


944 do CCB não em polga o conhecim ento da revista na hipótese, em que discutida a
limitação tem poral da pensão fixada para a com pensação de danos materiais. 2. A
tese regional no sentido de que ‘é possível a reversão da indenização decorrente de
ato ilícito aos demais beneficiários, em caso de morte do respectivo titular ou a sua
perda por força de im pedim ento legal, ou seja, o beneficiário rem anescente terá
direito de acrescer à sua pensão o que era a esse título devido a outrem, em relação
ao qual se extinguiu o vínculo’, também não afronta o dispositivo em apreço, porquanto
não há alteração do montante fixado a título de pensão mensal, devida aos pais do de
cujus. 3. Inábeis ao cotejo os arestos paradigmas coligidos. Revista não conhecida,
no tem a.” TST. 3- Turma. RR n. 9950100-88.2005.5.09.0562, Rei.: Ministra Rosa Maria
Weber, DJ 24 jun. 2011.

“Pensão por morte ocasionada em acidente do trabalho — Direito de acrescer


dos beneficiários rem anescentes — O beneficiário da pensão decorrente do ilícito

(81) “Ementa — D ireito C ivil e Processual Civil. Indenização p o r danos materiais. Morte de
pai de família. Pensão mensal. Direito de acrescer. Cabimento. Decorrência lógica do pedido
de indenização. Julgam ento extra Petita. Inexistência. 1. Adm ite-se o direito de acrescer
nas hipóteses em que há mais de um beneficiário de pensão mensal paga em decorrência
de ilícito civil. Precedentes. 2. Não ocorre julgam ento extra petita se o Tribunal decide
questão que é reflexo do pedido contido na petição inicial. Precedentes. 3. O direito de
acrescer decorre logicamente do pedido form ulado na petição inicial das ações de natureza
indenizatória, cujo escopo é recom por o estado das coisas existente antes do evento danoso.
Assim, o direito de acrescer encontra fundam ento no fato de que a renda da vítim a sempre
seria re ve rtid a em b e n e fício dos dem ais fa m ilia re s quando q u a lq u e r deles não m ais
necessitasse dela. 4. Não se afigura razoável que, cessado o direito de um dos familiares
ao recebimento da pensão, o valor correspondente simplesm ente deixe de ser pago pelo
réu. Para m anter a coerência da prem issa que ju stifica a própria im posição da pensão
mensal — de que o pai de fam ília participaria do orçam ento dom éstico até a sua morte
natural — esta deve continuar a ser paga integralmente. A saída de um dos filhos do núcleo
fam iliar não permite inferir que a contribuição do pai diminuiria; apenas significa que esse
valor seria distribuído de form a diferente. Recurso especial a que se nega provim ento.” STJ.
3B Turma. REsp n. 1.155.739/MG, Rei.: M inistra Nancy Andrighi, DJ 10 out. 2012.
310 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

civil tem direito de acrescer à sua quota o montante devido a esse título aos outros
filhos do de cujus, em virtude do advento da maioridade destes ou em caso de morte
dos outros titulares, ju stificando-se o respectivo direito pela presunção de que os
pais, se vivos fossem , m elhor a ssistiria m os filh o s rem anescentes, até quando
alcançassem a idade-lim ite de 25 anos, adquirindo autonom ia econôm ica.” Minas
Gerais. TRT 3- Região. 8ã Turma. RO n. 331-2006-134-03-00-2, Rei.: Márcio Ribeiro
do Valle, DJ 07 out. 2006.

9.9. Legitimidade para postular a indenização por dano moral

É pacífico o entendimento atual a respeito do cabimento da indenização


por danos morais, quando ocorre acidente do trabalho fatal, se estiverem
presentes os pressupostos da responsabilidade civil, conforme discorremos
no item 9.2.3 acima.

A questão que ainda suscita controvérsias se refere à determinação


das pessoas que têm legitimidade para postular a indenização por danos
morais, dentre os familiares ou aqueles que de alguma forma mantinham
vínculos com a vítima. Juntamente com o tema da legitimidade, cabe discutir
a questão controvertida da transmissibilidade ou não do dano moral.

C o nsid era ndo o que ocorre no dia a dia, optam os por a b o rd ar


separadamente duas situações no acidente com morte, pelas repercussões
jurídicas diferentes que acarretam. Na prim eira hipótese, que é a mais
freqüente, o trabalhador sobrevive ao acidente, mas, passado algum tempo,
ocorre o óbito, ainda como efeito daquele infortúnio. Na outra situação, o
falecimento acontece logo após o acidente.

Quando a vítima sobrevive ao acidente por determinado tempo, não há


dúvida de que nesse período ela, que foi diretamente atingida, é a pessoa
legitimada para postular a indenização por danos morais, uma vez que,
configurada a lesão moral, nasceu o direito de buscar a reparação, em face
do causador do dano. Com efeito, no lapso temporal entre a ocorrência do
acidente e a morte, conforme as circunstâncias, pode a vítima ter ajuizado
ação indenizatória referente ao dano moral. Outras vezes o acidentado prefere
aguardar a consolidação das lesões, para melhor aquilatar a extensão dos
danos ou a possível recuperação, mas nesse período sobrevêm a morte.

De uma forma didática, portanto, é permitido concluir que a posterior morte


em razão do acidente pode acontecer: a) quando o acidentado já havia ajuizado
ação; b) quando o acidentado estava nos preparativos para o ajuizamento;
c) quando o acidentado nem havia cogitado reivindicar a indenização. Entretanto,
para focalizar de modo mais acertado os desdobramentos jurídicos dessas
três hipóteses, torna-se necessário apreciar primeiro o tema conexo da
transmissibilidade do direito à reparação por danos morais.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 311

9.9.1. Transmissibilidade do dano moral

Uma corrente doutrinária entende que o dano moral tem caráter


personalíssimo, não sendo, portanto, transmissível com a herança, já que a
personalidade desaparece com a morte do seu titular. Nessa linha de raciocínio
observa o clássico Wilson Melo da Silva:

“Os danos morais dizem respeito ao foro íntimo do lesado. Seu patrimônio
ideai é marcadamente individual, e seu campo de incidência o mundo
interior de cada um de nós. (...) Os bens morais são inerentes à pessoa,
incapazes, por isso, de subsistir sozinhos. Desaparecem com o próprio
indivíduo. Podem os terceiros compartilhar de minha dor, sentindo, eles
próprios, por eles mesmos, as mesmas angústias que eu. O que se não
concebe, porém, é que as minhas dores, as minhas angústias, possam
ser transferidas de mim para o terceiro. Isto seria atentatório da própria
natureza das coisas e, materialmente, impossível. Não existe, pois, o
ju s hereditatis relativamente aos danos morais, tal como acontece com
os danos puramente patrimoniais. A personalidade morre com o indivíduo,
arrastando atrás de si todo o seu patrimônio. Só os bens materiais
sobrevivem ao seu titular.”(82)

O Código Civil argentino adota expressamente como regra a corrente


da intransmissibilidade do direito à indenização pelo dano moral, salvo quando
a ação tiver sido ajuizada, anteriormente, pela vítima(83).
Cumpre assinalar, porém, que, mesmo para os defensores dessa
corrente, poderiam os dependentes da vítima reclamar a indenização, mas
agindo em nome próprio, pelo seu dano moral pessoal, a dor de cada um, e
não como direito do acidentado transmitido pela via hereditária.
Já os defensores da transmissibilidade, como o também clássico Aguiar
Dias, argumentam que “a ação de indenização se transmite como qualquer
outra ação ou direito aos sucessores da vítima. Não se distingue, tampouco,
se a ação se funda em dano moral ou patrimonial. A ação que se transmite

(82) SILVA, Wilson Melo. O dano m oral e sua reparação. 3. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro:
Forense, 1983. p. 649. No m esm o sentido pontua Y ussef Cahali: “Não se adquire esse
d ire ito p or s u c e ssã o , nem é ele tra n s m is s ív e l aos h e rd e iro s do seu titu la r. D ire ito
personalíssim o, atrelado, aliás, aos direitos da personalidade, só o respectivo titular se
legitima para o seu exercício, e ninguém pode fazê-lo por ele; não exercido em vida pelo
beneficiário, esse direito à reparação do dano moral fenece, levando o beneficiário para
seu túm ulo toda a consternação de um dano moral não reparado.” Cf. Dano moral. 3. ed.
rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 171.
(83) Argentina. Código Civil. “Art. 1.099. Si se tratase de delitos que no hubiesen causado
sino agravio moral, como Ias injurias o Ia difamación, Ia acción civil no pasa a los herederos
y sucesores universales, sino cuando hubiese sido entablada por el difunto.”
312 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

aos sucessores supõe o prejuízo causado em vida da vítima. Porque a um


morto não se pode causar nenhum dano.”(84)
A controvérsia, todavia, a despeito dos sábios fundamentos mencionados,
pode ser colocada sob outro enfoque mais esclarecedor, que permite superar
o antagonismo das ideias, sem contrariar, na essência, a lição dos mestres.
Logo que acontece o dano injusto, ocorre também o fato gerador do direito
à sua reparação. O Código Civil atual estabelece: violado o direito, nasce
para o titular a pretensão (art. 189). E como essa reparação normalmente é
feita em dinheiro, o patrimônio da vítima já passa a contar com aquele provável
crédito. Como a herança é considerada como um todo unitário (art. 1.791 do
Código Civil), também o crédito que poderá resultar daquela ação integra a
universalidade dos bens que a compõem.
Adotando-se essa linha de raciocínio, pode-se perceber que o dano moral
não é transmissível. É mesmo uma questão de lógica incontestável. O que
se transmite é o direito de acionar o responsável para reparar o dano causado
à vítima quando viva. O art. 943 do Código Civil atual prevê expressamente:
“O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a
herança.” Não fosse assim, a morte da vítima seria um prêmio para o lesante,
que estaria exonerado da obrigação. Em síntese, o dano sofrido pela vítima
tem natureza moral, mas a sua reparação, ao contrário, tem caráter patrimonial.
A abordagem do problema por esse enfoque foi realizada, há muito, por
Leon Mazeaud, merecendo transcrição, pela sua lucidez:
“O herdeiro não sucede no sofrimento da vítima. Não seria razoável admitir-
-se que o sofrimento do ofendido se estendesse ao herdeiro e este, fazendo
seu o sofrimento do morto, acionasse o responsável a fim de indenizar-se
da dor alheia. Mas é irrecusável que o herdeiro sucede no direito de ação
que o morto, quando vivo ainda, tinha contra o autor do dano. Se o
sofrimento é algo pessoal, a ação de indenização é de natureza patrimonial
e, como tal, transmite-se aos herdeiros. Sem dúvida a indenização paga
ao herdeiro não apaga ou elimina o sofrimento que afligiu a vítima. Mas
também é certo que, se a vítima, ela mesma, houvesse recebido uma
indenização, não eliminaria igualmente a dor que houvesse padecido. O
direito a uma indenização simplesmente ampliou seu patrimônio. A
indenização cumpre a sua finalidade compensatória, antes como depois
do falecimento da vítima, com as mesmas dificuldades que resultam da
reparação de um prejuízo moral por uma indenização pecuniária. Dano
m oral, por ser de natureza e xtra patrim o nial, não com unica esta
particularidade à ação de indenização.”(85)

(84) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 802.
(85) MAZEAUD, Leon. RecueiI Critique Dalloz , p. 46, 1943, apud PORTO, Mário Moacyr.
Dano moral. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 590, ano 73, p. 39, dez. 1984.
iNDENIZAÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL 313

Em sintonia com esse entendimento, enfatizou Mário Moacyr Porto que


"o sofrimento em si, é intransmissível, a dor não é ‘bem’ que componha o
patrimônio do de cujus. O que se transmite por direito hereditário, é o direito
de acionar o responsável, é a faculdade de perseguir em juízo o autor do
dano, quer material ou moral. Tal direito é de natureza patrimonial, e não
extrapatrimonial.”(86)
Está predominando a corrente que defende a natureza patrimonial da
ação indenizatória e consequentemente o seu caráter de hereditariedade,
quando a vítima falece no curso da referida ação. Alinham-se nesse sentido,
entre outros, Aguiar Dias, Sérgio Cavalieri, Maria Helena Diniz, Arnaldo
Rizzardo, Carlos Roberto Gonçalves, Carlos Alberto Bittar e Sérgio Severo(87).
Em sentido contrário, m anifestam -se Y ussef Said Cahali e Aparecida
Amarante(88).
Diante do que foi exposto, depreende-se que, se a morte ocorrer quando
o acidentado já tiver ajuizado a ação indenizatória a respeito do dano moral,
ocorre automaticamente a transmissão do eventual crédito para os herdeiros
(art. 943 do Código Civil combinado com art. 43 do CPC). Nesse aspecto
também está sedimentada a jurisprudência:
“R ecurso es p e c ia l dos a u to re s — D issíd io ju ris p ru d e n c ia l. D anos m orais.
Falecimento do autor. Direito patrimonial que alcança os herdeiros. Legitimidade
dos sucessores em dar prosseguim ento à ação. 1. O apeio foi interposto com base
na a lín e a “c” do p e rm is s iv o c o n s titu c io n a l, in d ic a n d o s u p o s ta d iv e rg ê n c ia de
entendimento quanto ao direito dos herdeiros em prosseguir em ação de indenização
pelos danos morais sofridos pelo genitor, o qual veio a falecer no curso do processo.
2. No caso dos autos, o autor pretende receber indenização por danos morais em
decorrência da perseguição política sofrida pelo seu genitor que foram sentidas pelos
seus herdeiros. 3. A jurisprudência desta Corte Superior reconhece a legitim idade
dos sucessores em prosseguir com a ação que visa o recebimento de indenização
por danos morais, em caso de óbito do autor, considerando que o direito patrimonial
perseguido é transm issível aos herdeiros. Precedentes. 4. Recurso especial provido.”
STJ. 2a Turma. REsp n. 1220982/RS, Rei.: Ministro Castro Meira, DJ 21 out. 2011.

(86) PORTO, Mário Moacyr. Dano moral. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 590, ano 73,
p. 39, dez. 1984.
(87) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 802; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 10. ed. São
P aulo: A tla s , 201 2. p. 100; D IN IZ , M a ria H e le n a . Curso de d ireito civ il b ra sile iro :
responsabilidade civil. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7, p. 203; RIZZARDO, Arnaldo.
A reparação nos acidentes de trânsito. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p.
247; G O NÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao Código Civil: parte especial: direito
das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 11, p. 351; BITTAR, Carlos Alberto. Reparação
civil por danos morais. 3. ed. rev., atual, e ampl., 2 - 1. São Paulo: Revista dos Tribunais,1999.
p. 157; SEVERO, Sérgio. Os danos extrapatrimoniais. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 33.
(88) CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 3. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 171 e 802-807; A M ARAN TE, A parecida. Responsabilidade civil por
dano â honra. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 141.
314 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

“Agravo de Instrum ento. Indenização por dano moral. Direito personalíssimo


Processo em curso. Sucessão. O falecimento do autor no curso do processo em que
busca a reparação por dano m oral não im pede a c o n tin u a çã o da dem anda por
interm édio de seus sucessores, vez que o direito reconhecido já ganhou contornos
patrim oniais. Agravo não provido.” TST. 4a Turma. AIRR n. 35806/2003-007-11-40.
Rei.: Juíza convocada Maria Doralice Novaes, DJ 08 jun. 2007.

“Processual civil. Recurso especial. Responsabilidade civil. Ação de indenização


por danos morais e materiais. Morte da vítima. Legitim idade ativa do espólio. Na
linha da jurisprudência desta Corte, o espólio detém legitim idade para suceder o
autor na ação de indenização por danos morais. Precedentes.” STJ. 4a Turma. REsp
n. 648.191/RS, Rei.: Ministro Jorge Scartezzini, DJ 06 dez. 2004.

O problema, no entanto, fica um pouco mais complexo quando a vítima


do acidente do trabalho falece antes de ajuizar a ação reparatória ou quando
o acidente provoca a morte instantânea do trabalhador. Nessas hipóteses,
cabe a transmissão do direito à indenização por dano moral, podendo o espólio
figurar como o autor da ação? Ou somente caberá a postulação indenizatória
dos familiares ou dos lesados, em nome próprio, reclamando a compensação
dos danos morais pela morte do acidentado? Ou, ainda, será cabível acumular
as duas pretensões?
Conforme relatamos nas edições anteriores deste livro, predominava o
entendimento no sentido de que o espólio não detinha legitimidade para postular
a indenização por dano moral, porque o eventual direito seria daqueles
indiretam ente lesados (dano em ricochete) e não necessariam ente dos
herdeiros. Isso porque o possível valor da indenização não chegou a compor
o patrimônio do acidentado morto, nem mesmo como expectativa de direito e,
portanto, não fazia parte da herança a ser inventariada e repartida entre os
herdeiros. Vejam um acórdão do STJ retratando o entendimento da época:
“Responsabilidade civil do Estado. Dano moral decorrente de morte causada por
acid en te de trab alh o . Espólio. Ile g itim id a d e . D ireito pessoal dos herdeiros.
C ontrovérsia gravitante em torno da legitim idade ativa do espólio para p leitear a
reparação por dano moral resultante do sofrim ento causado à fam ília do de cujus, em
decorrência de seu abrupto falecim ento em acidente de trabalho. O art. 1.526, do
Código Civil de 1916 (atual art. 943, do CC-2002), ao estatuir que o direito de exigir
reparação, bem como a obrigação de prestá-la, transmitem-se com a herança (droit
de saisir), restringe-se aos casos em que o dever de indenizar tenha como titular o
próprio de cujus ou sucessor, nos term os do art. 43, do CPC. Precedentes desta
Corte: RESP 648191/RS, Relator M inistro Jorge Scartezzini, Q uarta Turma, DJ de
6.12.200 4; RESP 602016/S P , R elator M in istro C astro Filho, T e rce ira Turm a, DJ
de 30.8.2004; RESP 470359/RS, Relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJ de
17.5.2004; AgRg no RESP 469191/RJ, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira,
Quarta Turma, DJ de 23.6.2003; e RESP 343654/SP, Relator Ministro Carlos Alberto
Menezes Direito, Terceira Turma, DJ de 1a.7.2002. Deveras, cediço que nem sempre
há coincidência entre os sujeitos da lide e os sujeitos do processo, restando inequívoco
que o dano moral pleiteado pela fam ília do de cujus constitui direito pessoal dos
herdeiros, ao qual fazem jus, não por herança, mas por direito próprio, deslegitimando-
se o espólio, ente despersonalizado, nom ine proprio, a pleiteá-lo, posto carecer de
In d e n iz a ç õ e s p o r A c id e n te d o T r a b a lh o o u D o e n ç a O c u p a c io n a l 315

autorização legal para substituição extraordinária dos sucessores do falecido. Recurso


especial desprovido.” STJ. 1® Turma. REsp n. 697.141, Rei.: Ministro Luiz Fux, DJ 29
maio 2006.

Em razão dos entendimentos divergentes nas Turmas do STJ, tanto


reconhecendo quanto negando a transmissibilidade do direito à indenização
pelo dano moral, buscou-se naquela Corte uma uniformização, de modo a
pacificar a controvérsia. O acórdão do Recurso Especial n. 978.651 retrata
bem essa mudança de posicionamento, cuja longa ementa merece transcrição
pela riqueza dos fundamentos adotados;
“Recurso especial do Estado de São Paulo. Responsabilidade civil. Dano moral.
Ofendido falecido. Legitim idade dos sucessores para propor ação de indenização.
Transm issibilidade do direito à reparação. 1. Na hipótese dos autos, o filho dos
recorridos, em abordagem policial, foi exposto a situação vexatória e a espancamento
efetuado por policiais militares, o que lhe causou lesões corporais de natureza leve e
danos de ordem moral. A ação penal transitou em julgado. Após, os genitores da
v ítim a , qua n d o esta já h a via fa le c id o por razões o u tra s, p ro p u se ra m açã o de
indenização contra o fato referido, visando à reparação do dano moral sofrido pelo
filho. 2. A questão controvertida consiste em saber se os pais possuem legitimidade
ativa ad causam para propor ação, postulando indenização por dano moral sofrido,
em vida, pelo filho falecido. 3. É certo que esta Corte de Justiça possui orientação
consolidada acerca do direito dos herdeiros em prosseguir em ação de reparação de
danos morais ajuizada pelo próprio lesado, o qual, no curso do processo, vem a óbito.
Todavia, em se tratando de ação proposta diretam ente pelos herdeiros do ofendido,
após seu fa le cim e n to , a ju ris p ru d ê n c ia do S u p e rio r T rib u n a l de J u s tiç a possui
orientações divergentes. De um lado, há entendimento no sentido de que ‘na ação de
indenização de danos morais, os herdeiros da vítim a carecem de legitimidade ativa
ad causam ’ (REsp 302.029/RJ, 3a Turma, Rei. Min. Nancy Andrighi, DJ de 1 10.2001);
de outro, no sentido de que 'os pais — na condição de herdeiros da vítim a já falecida
— estão legitimados, por terem interesse jurídico, para acionarem o Estado na busca
de in d e n iz a ç ã o p o r d a n o s m o ra is , s o frid o s p o r seu filh o , em ra zã o de a to s
adm inistrativos praticados por agentes públicos (...)’. Isso, porque ‘o direito de ação
por dano moral é de natureza patrimonial e, como tal, transmite-se aos sucessores da
vítim a (RSTJ, v. 71/183)’ (REsp 324,886/PR, 1ã Turma, Rei. Min. José Delgado, DJ de
3.9.2001). 4. Interpretando-se sistematicam ente os arts. 12, caput e parágrafo único,
e 943 do Código Civil (antigo art. 1.526 do C ódigo Civil de 1916), infere-se que o
direito à indenização, ou seja, o direito de se exigir a reparação de dano, tanto de
ordem m aterial com o m oral, foi assegurado pelo C ódigo Civil aos sucessores do
lesado, transm itindo-se com a herança. Isso, porque o direito que se sucede é o de
a çã o , que p o s s u i n a tu re z a p a trim o n ia l, e não o d ire ito m o ra l em si, que é
personalíssim o e, portanto, intransmissível. 5. José de Aguiar Dias leciona que não
há princípio algum que se oponha à transm issibilidade da ação de reparação de
danos, porquanto ‘a ação de indenização se transmite como qualquer outra ação ou
direito aos sucessores da vítima. Não se distingue, tampouco, se a ação se funda em
dano moral ou patrimonial. A ação que se transm ite aos sucessores supõe o prejuízo
causado em vida da vítim a’ (Da Responsabilidade Civil, V. II, 4. ed. Forense: Rio de
Janeiro, 1960. p. 854). 6. Como bem salientou o Ministro Antônio de Pádua Ribeiro,
no julgam ento do REsp 11.735/PR (2- Turma, DJ de 13.12.1993), ‘o direito de ação
por dano moral é de natureza patrimonial e, como tal, transm ite-se aos sucessores da
vítim a’. 7. ‘O sofrimento, em si, é intransmissível. A dor não é ‘bem ’ que com ponha o
patrim ônio transmissível do de cujus. Mas me parece de todo em todo transmissível,
316 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

por direito hereditário, o direito de ação que a vítima, ainda viva, tinha contra o seu
ofensor. Tal direito é de natureza patrimonial. Leon Mazeaud, em magistério publicado
no Recueil Critique Dalloz, 1943, p. 46, esclarece: ‘O herdeiro não sucede no sofrimento
da vítima. Não seria razoável admitir-se que o sofrim ento do ofendido se prolongasse
ou se entendesse (deve ser estendesse) ao herdeiro e este, fazendo sua a dor do
morto, dem andasse o responsável, a fim de ser indenizado da dor alheia. Mas é
irrecusável que o herdeiro sucede no direito de ação que o morto, quando ainda vivo:
tinha contra o autor do dano. Se o sofrim ento é algo entranhadam ente pessoal, o
direito de ação de indenização do dano moral é de natureza patrimonial e, como tal.
transm ite-se aos sucessores’. (Porto, Mário Moacyr, in Revista dos Tribunais, V. 661,
p. 7/10). 8. ‘O dano moral, que sempre decorre de uma agressão a bens integrantes
da personalidade (honra, imagem, bom nome, dignidade etc.), só a vítim a pode sofrer,
e enquanto viva, porque a personalidade, não há dúvida, extingue-se com a morte.
Mas o que se extingue — repita-se — é a personalidade, e não o dano consumado,
nem o direito à indenização. P erpetrado o dano (m oral ou m aterial, não importa)
contra a vítim a quando ainda viva, o direito à indenização correspondente não se
extingue com sua morte. E assim é porque a obrigação de indenizar o dano moral
nasce no mesmo momento em que nasce a obrigação de indenizar o dano patrimonial
— no momento em que o agente inicia a prática do ato ilícito e o bem juridicamente
tutelado sofre a lesão. Neste aspecto não há distinção alguma entre o dano moral e
patrim onial. Nesse mesm o m om ento, tam bém , o correlativo direito à indenização,
que tem natureza patrimonial, passa a integrar o patrim ônio da vítim a e, assim, se
transm ite aos herdeiros dos titulares da indenização’ (CAVALIERI FILHO, Sérgio.
Program a de R esponsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 85/88). 9.
Ressalte-se, por oportuno, que, conforme explicitado na r. sentença e no v. acórdão
recorrido, ‘o finado era solteiro e não deixou filhos, fato incontroverso comprovado
peio documento de fl. 14 (certidão de óbito), sendo os autores seus únicos herdeiros,
legitimados, pois, a propor a dem anda’ (fl. 154). Ademais, foi salientado nos autos
que a vítim a sentiu-se lesada moral e fisicam ente com o ato praticado pelos policiais
militares e que a ação somente foi proposta após sua morte porque aguardava-se o
trâ nsito em ju lgado da ação penal. 10. Com essas considerações d outrinárias e
jurisprudenciais, pode-se concluir que, embora o dano moral seja intransmissível, o
direito à indenização correspondente transmite-se causa mortis, na medida em que
integra o patrim ônio da vítima. Não se olvida que os herdeiros não sucedem na dor,
no sofrimento, na angústia e no aborrecimento suportados pelo ofendido, tendo em
vista que os sentimentos não constituem um ‘bem ’ capaz de integrar o patrim ônio do
de cujus. Contudo, é devida a transm issão do direito patrimonial de exigir a reparação
daí decorrente. Entende-se, assim, pela legitim idade ativa a d causam dos pais do
ofendido, já falecido, para propor ação de indenização por danos morais, em virtude
de ofensa moral por ele suportada. 11. Recurso especial do Estado de São Paulo
conhecido, mas desprovido.” STJ. 1 - Turma. REsp. n. 978651/SP, Rei.: Ministra Denise
Arruda, DJ 26 mar. 2009.

Como a decisão adotou posicionamento contrário aos interesses do réu,


foi a p re se n ta d o E m bargos de D ive rg ê n cia em R ecurso E sp ecia l e,
posteriormente, Agravo Regimental para a Corte Especial. O acórdão desse
importante julgamento que uniformizou o entendimento no âmbito do STJ
obteve a seguinte ementa:
“Agravo Regimental nos Embargos de Divergência em Recurso Especial. Dano
moral. Falecimento do titular. Ajuizamento de ação indenizatória. Transmissibilidade
do direito. Entendimento jurisprudencial consolidado. Súmula n. 168/STJ. A posição
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 317

atual e dom inante que vigora nesta c. Corte é no sentido de embora a violação moral
atinja apenas o plexo de direitos subjetivos da vítima, o direito à respectiva indenização
transm ite-se com o falecim ento do titular do direito, possuindo o espólio ou os herdeiros
legitim idade ativa ad causam para ajuizar ação indenizatória por danos morais, em
virtude da ofensa moral suportada pelo de cujus. Incidência da Súmula n. 168/STJ.
Agravo regimental desprovido.” STJ. Corte Especial. AgRg nos EREsp n. 978651/SP,
Rei.: Ministro Felix Fischer, DJ 10 fev. 2011(89).

A pacificação da controvérsia no STJ consolidou o pensamento a respeito


da transmissibilidade da reparação por danos morais, atribuindo legitimidade
ativa tanto ao espólio quanto aos herdeiros para ajuizar a respectiva ação
indenizatória. Na linha desse entendimento, por ocasião da V Jornada de
Direito Civil, realizada em 2011, foi aprovado o Enunciado n. 454: “ Art. 943:
O direito de exigir reparação a que se refere o art. 943 do Código Civil abrange
inclusive os danos morais, ainda que a ação não tenha sido iniciada pela
vítima.”

Essa conclusão, contudo, não prejudica nem inviabiliza que os herdeiros


ou mesmo outros lesados reclamem, em nome próprio, a indenização pelo
dano moral reflexo ou em ricochete por eles sofrido.

Resta analisar a situação em que a vítima, apesar de ter sobrevivido


lucidamente ao acidente, não esboçou desejo algum de buscar a reparação
do dano moral, nem mesmo manifestou o seu inconformismo. Se, por razões
pessoais, o acidentado não se sentiu ating ido m oralm ente, torn a-se
questionável falar em direito de reparação transmitido como integrante da
universalidade dos bens da herança. Isso porque ele não contava com o
valor da eventual indenização no seu patrimônio, ou por não ter se sentido
lesado, ou por ter deliberadamente renunciado ao eventual direito por razões
de foro íntimo. O Ministro do STJ, Ari Pargendler, por ocasião do seu voto-
-vista no julgamento do Recurso Especial n. 302.029, aduziu a respeito: “Em
princípio, portanto, o direito à indenização pelo dano moral se transmite
hereditariamente. Mas, para esse efeito, é preciso, salvo melhor juízo, que a
vítima, tenha, em vida, sentido o dano moral que os herdeiros querem ver
reparado.”

É certo, no entanto, que o comportamento do acidentado enquanto vivo,


optando por não reclamar a reparação do dano moral, não prejudica os
interesses dos seus familiares ou dos outros lesados indiretamente, que
poderão buscar a eventual indenização do dano extrapatrimonial em nome
próprio.

(89) Os julgam entos posteriores do STJ passaram a seguir esse entendimento, citando-se
com o exem plos: AgRg nos EDcl no RESP n. 1126313/PR; REsp n. 1071158/RJ; REsp
12200982/RS e REsp 1040529/PR. Ademais, conforme prevê a Súmula 168 do STJ, citada
no julgamento, “não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do tribunal
se firmou no mesm o sentido do acórdão embargado.”
318 S e b a s t iã o G er ald o de O liveira

9.9.2. Titulares do direito à indenização por dano moral

Cabe analisar neste tópico a questão controvertida a respeito da


legitimidade para postular a indenização por danos morais, especialmente no
caso de acidente fatal. Quais pessoas, dentre os familiares ou aqueles que
de alguma forma mantinham vínculos de proximidade com a vítima, são
titulares do direito à indenização por danos morais?
O acidente do trabalho fatal repercute intensamente no núcleo familiar
da vítima, mas projeta seus reflexos dolorosos sobre todos que de alguma
forma estavam a ela vinculados afetivamente. O passamento repentino do
trabalhador que saiu de casa para ganhar a vida, mas paradoxalmente a perde,
causa “um profundo sentimento de dor, de pesar, de frustração, de ausência,
de saudade, de desestímulo, de irresignação.”(90) Como observa Sérgio Severo,
“se a morte de alguém não aniquila o espírito das pessoas que lhe querem,
com certeza amputa-lhes uma importante parte do seu patrimônio afetivo.”*91
Com efeito, os danos causados pelo óbito atingem reflexamente outros
parentes ou m esm o terce iros que com partilhavam da convivência do
acidentado. São os cham ados danos morais indiretos ou em ricochete,
decorrentes do ato ilícito. O mesmo acontece nos acidentes graves que deixam
o trabalhador com invalidez permanente total, alterando por completo sua rotina
de vida, além de repercutir no dia a dia dos parentes mais próximos.
Se é verdade que todos os que se sentem lesados são, potencialmente,
titulares do direito à reparação dos danos morais e, ainda, que a morte projeta
repercussões diretas e indiretas sobre um grande número de pessoas, como
identificar, dentre aquelas atingidas, quem ou quais têm legitimidade para
receber indenização?
A resposta não é simples, sobretudo em razão da ausência de previsão
legal a respeito. Vejam que a morte poderá causar sofrimento intenso, conforme
as circunstâncias, para o cônjuge, filhos, pais, netos, avós, irmãos, sobrinhos,
tios, noras, genros, primos etc. Sem falar nas situações decorrentes da união
estável, ligações homossexuais duradouras, noivos, afilhados, amigos íntimos,
ex-cônjuge e inúmeras situações que poderão surgir na apreciação do caso
concreto.
Por outro lado, se for estendida a reparação para todos os que de algum
modo sentiram a dor da perda, há o risco de ampliar demasiadamente o âmbito
da indenização, podendo gerar uma indesejável banalização do dano moral.
Convém lembrar que no caso do dano material, aqui invocado por analogia, o

(90) CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 3. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 114.
(91) SEVERO, Sérgio. Os danos extrapatrimoniais. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 25.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 319

Código Civil estabeleceu que somente serão ressarcidos os danos diretos e


imediatos (art. 403).

Predomina, portanto, o entendimento de que a abrangência do dano moral


passível de indenização é mais restrita. A maior dificuldade é conseguir
formular um critério seguro para estabelecer essa delimitação.

Quando nos deparamos com essas demandas, o primeiro pensamento


sugere que os beneficiários da reparação serão os membros do núcleo familiar
mais íntimo da vítima. Mas essa colocação deve ser analisada com cautela,
porque nas últimas décadas ocorreu no Brasil uma mudança significativa no
perfil demográfico. A família, no sentido estrito, encolheu e a natureza do vínculo
afetivo diversificou-se. Além disso, os membros da família, em razão das
demandas profissionais, podem estar espalhados por diversas localidades
distantes, não havendo mais aquela convivência de proximidade, a não ser
para um grupo reduzido.

O Código Civil de 1916 estabelecia no parágrafo único do art. 76: “O


interesse moral só autoriza a ação quando toque diretamente ao autor, ou à
sua família.” Essa regra, contudo, não foi acolhida no Código de 2002. Talvez
pudéssemos fazer alguma analogia com a previsão estampada no parágrafo
único do art. 12(92).
Em Portugal o Código Civil(93) tem disposição expressa sobre os beneficiá­
rios da indenização por danos morais (ou danos não patrimoniais), sendo que a
existência dos parentes mais próximos exclui do direito os mais afastados:
“Art. 496s 2. Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais
cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado judicialm ente de pessoas e bens e aos
filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; e, por
último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem.”

De certa forma há um consenso doutrinário e jurisprudencial de que o


núcleo familiar básico, formado por aqueles que tenham residido sob o mes­
mo teto, convivendo diariamente com a vítima, compreende os legitimados
para postular a indenização por dano moral. Na maioria das vezes, as ações
têm sido ajuizadas pelo cônjuge sobrevivente, isoladamente ou em conjunto
com os filhos da vítima. Aliás, o STF, em decisão de 1967, já mencionava: “O
dano decorrente da morte de uma pessoa, ligada a outra por vínculo de sangue,
é presumido, daí, o direito a indenização.”(94)

(92) Código Civil. Art. 12. Parágrafo único: “Em se tratando de morto, terá legitimidade para
requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em
linha reta, ou colateral até o quarto grau.”
(93) Aprovado pelo Decreto-lei n. 47.344 de 25 nov. 1966.
(94) Cf. STF. Turma. RE n. 59358/GB, Rei.: Ministro Djaci Falcão, julgado em 05 jun.
1967.
320 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

Como visto, há uma presunção de danos morais para os componentes do


núcleo familiar mais próximo da vítima. No entanto, adverte Cavalieri Filho que
“só em favor do cônjuge, companheira, filhos, pais e irmãos menores há uma
presunção jurís tantum de dano moral por lesões sofridas pela vítima ou err
razão de sua morte. Além dessas pessoas, todas as outras, parentes ou não, terãc
que provar o dano moral sofrido em virtude de fatos ocorridos com terceiros.”195
Apesar da presunção mencionada, importa salientar que o laço de
parentesco não é o fator decisivo para o julgamento da legitimidade, porquanto
o pressuposto básico é o laço afetivo(96). Como pondera Aguiar Dias, há mortes
que causam alívio e não aflição aos parentes, enquanto, muitas vezes,
terceiros experimentam sofrimento intenso pela morte de alguém(97).
Ao trabalhar o tema dos legitimados à reparação pelo dano moral, Caio
Mário constata a complexidade da matéria, mas sugere alguns critérios de
identificação:
“Onde a matéria se complica é quando um terceiro pretende a indenização
por dano moral, em consequência da lesão sofrida por outrem (o pai em
relação ao filho, deste em relação àquele, do marido quanto à mulher e
vice-versa). O primeiro elemento a considerar é o grau do relacionamento
entre a vítima e o demandante. O segundo, são as circunstâncias de
fato, se os cônjuges, posto não legalmente separados, o estão de fato;
se o filho é rompido com o pai; e outras circunstâncias de fato ponderáveis.
Em terceiro lugar, o que inspira o juiz, a existência de ‘dor real e profunda’
a que se referem Mazeaud e Tunc, circunstância esta que Yves Chartier
qualifica como ‘necessariamente subjetiva’.”(98)
Afirma Carlos Alberto Bittar que “as pessoas legitimadas são, exatamente,
aquelas que mantêm vínculos firmes de amor, de amizade ou de afeição,
com os parentes mais próximos; os cônjuges que vivem em comum; os unidos
estavelmente, desde que exista a efetiva aproximação...”(99) Na concepção

(95) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 99.
(96) Na opinião do juiz paulista Ronaldo Alves de Andrade, além dos fam iliares nucleares,
“são legitim ados ao pleito de dano moral decorrente do homicídio, aquelas pessoas muito
próximas à vítim a e que com ela m antinham especial relação afetiva e que por essa razão
experim entaram extrem ada dor moral em razão da perda do ente querido. É o caso da
com panheira, noiva ou nam orada que durante anos m antinham estreita relação afetiva
com a vítim a e que m uita vez sofrem mais a perda do que os próprios fam iliares. Destarte,
nos parece injusta a solução que som ente reconhece legitim idade aos fam iliares da vítim a.”
Cf. Dano moral à pessoa e sua valoração. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000. p. 163.
(97) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 794.
(98) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. 8ã t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 317.
(99) BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 3. ed. rev., atual, e ampl. 2-
t. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 156, nota de rodapé n. 277.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalho ou D oença O c u p a c io n a l 321

de Vilson Rodrigues Alves, são legitimadas para postular o dano moral “as
pessoas mais próximas da vítima, porquanto essa proximidade suscita o
vínculo de afeição e, com a ruptura dele, o que traduz empiricamente o dano
apatrimonial, pela diminuição do que a dor acarreta à energia da vida.”(100)
Por tudo que foi exposto, é imperioso concluir que a identificação dos
legitimados para postular indenização por dano moral dependerá muito das
especificidades do caso concreto, de acordo com o prudente convencimento
do juiz. Com certeza o ponto de partida será sempre o núcleo familiar restrito,
dos que mantinham convivência mais íntima com a vítima — mesmo sem
dependência econômica — , e que são presumivelmente aqueles diretamente
afetados. O utros pretendentes tam bém poderão lograr êxito na ação
indenizatória, desde que apresentem provas convincentes de laço afetivo
duradouro com a vítima e dos efeitos emocionais danosos causados pela
morte, de modo a justificar o deferimento da reparação por danos morais.
Para finalizar este tópico, vale citar alguns julgados a respeito do tema:
“Agravo regim ental. Ação de indenização. Dano moral. A cidente aéreo. Irmãos da
vítim a. Legitim idade ativa. Precedentes da corte. Quantum indenizatório fixado
em R$ 120.000,00 para cada um dos quatro autores. Razoabilidade. 1. Os irmãos
podem p leitear indenização por danos m orais em razão do fa lecim ento de outro
irmão, sendo irrelevante a existência de acordo celebrado com os genitores, viúva e
filhos da vítim a que os ressarciram pelo mesmo evento. A questão não é sucessória,
mas obrigacional, pois a legitim idade ativa não está restrita ao cônjuge, ascendentes
e descendentes, mas a todos aqueles atingidos pelo sofrim ento da perda do ente
querido, desde que afirmem fatos que possibilitem esse direito’ (REsp 1.291,702/RJ,
Rela M inã Nancy Andrighi, DJe 30.11.2011). 2. Esta Corte só conhece de valores
fix a d o s a títu lo de d a n o s m o ra is que d e sto a m ra z o a b ilid a d e , o que, a n te as
peculiaridades do caso, não ocorreu no presente feito. 3. Agravo Regimental im provido.”
STJ. 3ã Turma. AgRg no AREsp n. 171,718/RJ, Rei.: Ministro Sidnei Beneti, D J 29 jun.
2012.

“ D ireito civil. Recurso especial. R esponsabilidade civil. Legitim idade para o


ajuizam ento de ação indenizatória de danos morais por morte. Noivo. Ilegitimidade
ativa. Necessária lim itação subjetiva dos autorizados a reclam ar com pensação.
1. Em tem a de legitim idade para propositura de ação indenizatória em razão de
morte, percebe-se que o espírito do ordenam ento ju ríd ico rechaça a legitim ação
daqueles que não fazem parte da ‘fam ília’ direta da vítima, sobretudo aqueles que
não se insere m , nem h ip o te tic a m e n te , na c o n d içã o de h e rd e iro . In te rp re ta ç ã o
sistem ática e teleológica dos arts. 12 e 948, inciso I, do Código Civil de 2002; art. 63
do C ódigo de Processo Penal e art. 76 do Código Civil de 1916. 2. Assim, como regra
— ficando expressam ente ressalvadas eventuais particularidades de casos concretos
— , a legitim ação para a propositura de ação de indenização por dano moral em razão
de morte deve mesm o alinhar-se, mutatis mutandis, à ordem de vocação hereditária,

(100) ALVES, Vilson Rodrigues. Acidentes de trânsito e responsabilidade civil. Campinas:


Bookseller, 2002. v. II, p. 756. Esse mesmo autor afirm a em nota de rodapé, na página
indicada, que “ não é a dor que se indeniza. É o que a dor d im inui da en e rg ia vital.
Rigorosam ente, o dano moral não é essa dor, mas o que essa dor acarreta.”
322 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

com as devidas adaptações. 3. Cumpre realçar que o direito à indenização, diante de


peculiaridades do caso concreto, pode estar aberto aos mais diversificados arranjos
fam iliares, devendo o ju iz a va lia r se as p a rticu la rid a d e s de cada fa m ília nuclear
justificam o alargam ento a outros sujeitos que nela se inserem, assim tam bém, em
cada hipótese a ser ju lg a d a , o prudente a rb ítrio do ju lg a d o r a va lia rá o total da
indenização para o núcleo fam iliar, sem excluir os diversos legitim ados indicados. A
m encionada válvula, que aponta para as m últiplas facetas que podem assum ir essa
realidade metam órfica cham ada fam ília, justifica precedentes desta Corte que conferiu
legitimação ao sobrinho e à sogra da vítim a fatal. 4. Encontra-se subjacente ao art.
944, caput e parágrafo único, do Código Civil de 2002, principiologia que, a par de
reconhecer o direito à integral reparação, ameniza-o em havendo um dano irracional
q u e e s c a p a d o s e fe ito s q u e se e s p e ra m do a to c a u s a d o r. O s is te m a de
responsabilidade civil atual, deveras, rechaça indenizações ilimitadas que alcançam
valores que, a pretexto de reparar integralm ente vítim as de ato ilícito, revelam nítida
d e sp ro p o rçã o e ntre a co n d u ta do ag e n te e os re s u lta d o s o rd in a ria m e n te dela
esperados. E, a toda evidência, esse exagero ou d e sp ro p o rçã o da indenização
estariam presentes caso não houvesse — além de uma lim itação quantitativa da
condenação — uma lim itação subjetiva dos beneficiários. 5. Nessa linha de raciocínio,
concede r legitim id a d e am pla e irre strita a todos aqueles que, de algum a form a,
suportaram a dor da perda de alguém — como um sem -núm ero de pessoas que se
encontram fora do núcleo fam iliar da vítim a — significa im por ao obrigado um dever
tam bém ilimitado de reparar um dano cuja extensão será sempre desproporcional ao
ato causador. Assim, o dano por ricochete a pessoas não pertencentes ao núcleo
fam iliar da vítim a direta da morte, de regra, deve ser considerado como não inserido
nos desdobram entos lógicos e causais do ato, seja na responsabilidade por culpa,
seja na objetiva, porque extrapolam os efeitos razoavelm ente imputáveis à conduta
do agente. 6. Por outro lado, conferir a via da ação indenizatória a sujeitos não inseridos
no núcleo fam iliar da vítim a acarretaria tam bém uma diluição de valores, em evidente
prejuízo daqueles que efetivam ente fazem jus a uma com pensação dos danos morais,
com o cônjuge/com panheiro, descendentes e ascendentes. 7. Por essas razões, o
noivo não possui legitim idade ativa para pleitear indenização por dano moral pela
morte da noiva, sobretudo quando os pais da vítim a já intentaram ação reparatória na
qual lograram êxito, como no caso. 8. Recurso especial conhecido e provido.” STJ. 4a
Turma. REsp n. 1076160/AM, Rei.: Ministro Luis Felipe Salomão, DJ 21 jun. 2012.

“Responsabilidade civil — Dano moral e material — A cidente de trabalho que


causa paraplegia ao m arido e pai — Dano reflexo — S ofrim ento dos fam iliares —
Dever de indenizar. A extensão dos danos morais aos membros da fam ília se torna
inevitável, pois em decorrência do princípio da solidariedade fam iliar. Os membros
ligados pelo sangue, afeto e amor, auxiliam o pai e marido debilitado, buscando facilitar
e amenizar a convivência com a nova situação, condignamente, tentando, sempre que
possível, abrandar o sofrimento, que no caso da paraplegia se torna patente. O direito
de indenizar o abalo emocional dos familiares deflui do próprio princípio do direito à
saúde, uma vez que, pela sua releitura podemos com preendê-lo como o completo
bem-estar psicofísico e social.” Minas Gerais. TJMG. 4a Câm. Cível. Apelação cível n.
1.0024.05.579590-0/001, Rei.: Dárcio Lopardi Mendes, DJ 19 abr. 2007.

9.9.3. Arbitramento da indenização quando há vários lesados

Nesta etapa vamos tecer algumas considerações sobre o arbitramento


do dano moral quando há pluralidade de legitimados ativos, integrantes ou
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D o e n ç a O c u p a c io n a l 323

não do núcleo familiar mais restrito. A indenização deverá ser fixada em valor
único para rateio entre os diversos credores ou atribuída separadamente a
cada um?
Discorrendo a respeito do assunto, assevera Carlos Alberto Bittar que
há “plena autonomia do direito de cada lesado, de sorte que, nas demandas
do gênero se atribuem indenizações próprias e in d ividualiza das aos
interessados: assim acontece, por exemplo, quanto à mulher e filho, com
respeito à morte provocada do marido ou pai (...)■ Nada impede se faça sob
litisconsórcio o pleito judicial, quando admissível, mas cada demandante faz
jus à indenização compatível com a sua posição.”(101)
De acordo com o m agistério de Hum berto Theodoro Júnior, seria
preferível atribuir a indenização ao “núcleo familiar como uma unidade ou uma
comunidade.”(102) Em obra específica a respeito do dano moral, o jurista mineiro
explica com mais vagar seu pensamento:
“Definidos os parentes a serem indenizados, remanesce outro problema
sério: o cálculo da indenização será feito de modo a multiplicar a verba
reparatória pelo número de parentes do ofendido, ou se apurará um valor
geral a ser rateado entre os membros do clã? Sempre nos pareceu que
a indenização do dano moral não deve ser apurada de maneira diversa
do que se passa com o dano material. Assim como o pensionamento se
estipula em bloco para a família, também a indenização da dor moral
deve ser única, e não repetida inúmeras vezes diante de cada parente
que compareça em juízo em busca de reparação.”(103)
Se os danos morais decorrentes do acidente do trabalho fatal atingiram
diretamente ou em ricochete diversas pessoas, não padece dúvida de que a
pretensão reparatória é individual de cada lesado, podendo ser apresentada
em juízo separadamente ou em litisconsórcio. Todavia, considerando que na
apuração do dano material o valor da pensão é rateado entre os beneficiários,
como argumentou Humberto Theodoro, é razoável também que o montante
da indenização por dano moral seja fixado de forma global para o conjunto
dos credores, solução essa que vem tendo acolhimento na jurisprudência
mais autorizada(104).

(101) BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 3. ed. rev., atual, e ampl. 2-
t. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 157.
(102) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. 2, p. 49.
(103) THEO DO RO JÚNIOR, Humberto. Dano moral. 4. ed. atual e ampl. São Paulo: Juarez
de Oliveira, 2001. p. 94.
(104) “ Responsabilidade Civil. Dano moral. Morte de esposa e mãe. D eferim ento de
inde niza ção e qu ivalen te a 500 sa lá rio s m ínim os, a ser re p a rtid a igualm ente entre os
beneficiários. Recurso conhecido em parte pela divergência e provido parcialm ente.” STJ.
4ãTurma. REsp n. 163484/RJ, Rei.: Ministro Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 20 a go.1998.
324 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

A indenização única ou fixada em bloco evita que ocorra elastecimento


excessivo da condenação, com o risco de desviar a reparação do dano moral
de suas verdadeiras finalidades. Nessa linha de raciocínio, colhe-se também
o entendimento do jurista Rui Stoco:

“Não se pode pôr em dúvida que a compensação do pretium doloris é


uma só. Se ingressa em juízo um só legitimado, terá direito a um deter­
minado valor. Por exemplo, 200 salários mínimos. Se ingressam dois ou
mais legitimados, deverão repartir entre si os mesmos 200 salários míni­
mos, e assim por diante. E se posteriormente outro legitimado pleiteia
reparação pelo mesmo fato, quando outro já tenha obtido aquele valor
em ação judicial, só restará a este último pleitear parte desse valor da­
quele que já recebeu e não pretender ‘valor novo’. Assim não fosse e
então estar-se-ia diante de verdadeira indústria da indenização, criando-se
insuportável ‘bola de neve’, o que não se admite.”(105)

“Ação indenizatória. Falecimento de esposa e filho menor. Dano m oral e material. Ao


reconhecer que os autores — esposo e pai, filhos e irmãos das vítim as — fazem tam bém jus
ao ressarcimento pelos danos materiais e morais sofridos, pode o STJ, em face do preceituado
no art. 257 do Regimento Interno, aplicar o direito à espécie, definindo, de logo, na medida
em que possível, à luz dos fatos incontroversos existentes nos autos, a indenização e/ou
seus parâm etros respectivos, consoante cada uma das postulações feitas na inicial. Dano
moral devido como com pensação peia dor da perda e ausência suportadas pelos autores,
no equivalente a 500 (quinhentos) salários m ínim os por cada uma das vítim as, a serem
repartidos equitativam ente, consideradas as circunstâncias dos autos.” STJ. 4a Turma. REsp
n. 41.614/SP, Rei.: M inistro Aldir Passarinho Junior, julgado em 21 out. 1999.
“Acidente do trabalho. Dano moral: Embora o dano moral seja individual, a quantificação da
indenização devida a cada um dos fam iliares deve atenção tam bém ao montante global
para não se onerar excessivam ente o agente responsável. Fixação da indenização em
valores diferenciados, conform e a proximidade do laço fam iliar.” Rio Grande do Sul. TJRS.
9- Câmara Cível. Apelação Cível n. 70003117819, Rei.: Des. Paulo Tarso Vieira Sanseverino,
julgada em 28 dez. 2001.
(105) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1.905.
CAPÍTULO 10

INDENIZAÇÕES NOS ACIDENTES


DO TRABALHO SEM ÓBITO

10.1. Danos quando a vítima sobrevive ao acidente

Todo acidente do trabalho provoca determinados danos, cuja extensão


pode variar desde um leve aborrecimento ou incômodo de alguns minutos,
sem maiores conseqüências, até a morte, no extremo de maior gravidade.
No Capítulo 9 tratam os das indenizações decorrentes dos acidentes do
trabalho com óbito; neste, vamos analisar as indenizações cabíveis nos
acidentes ou doenças ocupacionais em que a vítim a continua viva. No
entanto, convém enfatizar, a indenização somente será deferida quando
preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil, já analisados nos
Capítulos 6 a 8.

O estudo jurídico da invalidez nas suas diversas espécies (permanente


total, permanente parcial ou apenas temporária) pode ser conduzido pelo
enfoque previdenciário ou da infortunística (aposentadoria por invalidez, auxílio-
-acidente ou reabilitação profissional); pelo prisma dos seguros privados
(seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos — DPVAT ou
seguro de vida e acidentes pessoais) ou pelo ângulo da responsabilidade
civil (indenizações devidas pelo causador do dano). Vamos tratar, aqui,
somente dessa última modalidade, buscando, eventualmente, subsídios
pertinentes relacionados às outras duas hipóteses.

O Código Civil de 2002 trata das indenizações provenientes de lesões


ou outra ofensa à saúde, como é o caso dos acidentes do trabalho, em dois
artigos que se complementam:
“Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido
das despesas do tratam ento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença,
além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.”

“Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu
ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além
326 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá


pensão co rresp o nd e n te à im p o rtâ n cia do tra b a lh o para que se in a b ilito u , ou da
depreciação que ele sofreu.”*11

Q uando a vítim a sobrevive ao acidente, norm alm ente poderemos


constatar, conform e o caso, a ocorrência de danos materiais, morais e
estéticos. Em determinados acidentes os prejuízos são tão diminutos ou
inexpressivos que nem cabe reparação pecuniária, ao passo que noutras
situações poderão ocorrer sérios danos indenizáveis, que produzem invalidez
permanente e deformação estética, causando à vítima acentuada perda da
qualidade de vida.

Nos acidentes de menor gravidade pode ser que nem haja necessidade
de o acidentado se afastar do trabalho ou, então, que ocorra um afastamento
temporário até que ele se recupere integralmente. Por outro lado, nos casos
de maior gravidade, após consolidadas as lesões, poderá ocorrer perda
definitiva total ou parcial da capacidade para o trabalho. Cada uma dessas
hipóteses produz efeitos jurídicos distintos, conforme veremos nos tópicos
seguintes.

10.2. Prova pericial para mensuração dos danos

Quando a vítima de acidente do trabalho postula indenização em face do


seu empregador ou ex-empregador, apresenta como causa de pedir o relato
das lesões, danos ou perdas sofridas, indicando as repercussões na sua
capacidade de trabalho.

Os fatos alegados, todavia, deverão ser comprovados, em confronto


com as impugnações da defesa, para que o juiz possa apreciar com segurança
o pedido formulado. Meras alegações do acidentado sem respaldo em provas
convincentes não autorizam o deferimento das reparações pretendidas, salvo
quando for cabível a inversão do ônus da prova a respeito de determinados
fatos.

Além de buscar a comprovação do acidente ou doença ocupacional,


deve o julgador, conforme o caso, avaliar a extensão dos danos; a capacida­
de residual de trabalho; a possibilidade de readaptação ou reabilitação profis­
sional; o percentual da invalidez parcial ou o reconhecimento da invalidez

(1) Convém registrar que a fonte principal do direito ã indenização por acidente do trabalho
é o art. 7-, XXVI11, da C o n s titu iç ã o da R e p ú b lica q u a n d o re la c io n a os d ire ito s dos
trabalhadores. Todavia, o detalhamento da matéria deve ser buscado no Código Civil, por
aplicação subsidiária, conform e determ ina o art. 82, parágrafo único, da CLT: “O direito
comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível
com os princípios fundam entais deste.”
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o o u D oença O c u p a c io n a l 327

total; as lesões estéticas e seus reflexos na imagem da vítima; os membros,


segmentos, órgãos ou funções atingidas; os pressupostos da responsabili­
dade civil etc.
Todos os meios legais são hábeis para demonstrar a verdade dos fatos,
mas a prova de determinadas alegações exige conhecimento técnico ou
científico de profissionais especializados que atuam em outros ramos do
conhecimento. Não detém o julgador formação ou experiência na área médica
para avaliar e mensurar todos os efeitos das lesões causadas pelo acidente
ou doença ocupacional, razão pela qual deve valer-se do auxílio de um perito,
conforme estabelece o art. 145 do CPC(2). Assinala Amaral Santos que “a
perícia consiste no meio pelo qual, no processo, pessoas entendidas verificam
fatos interessantes à causa, transmitindo ao juiz o respectivo parecer.”(3)

Com efeito, nas ações indenizatórias, uma vez form ada a relação
processual, será determinada a realização da prova pericial, cujo laudo deverá
retratar a extensão dos danos ou da invalidez e todas as variáveis conseqüentes.
Deverá tam bém fornecer inform ações técnicas a respeito do nexo de
causalidade e da eventual conduta culposa do empregador, com o objetivo
de proporcionar ao juiz informações completas sobre os fatos controvertidos,
para que possa formar sua convicção e proferir o julgamento. Por tudo isso, a
diligência pericial envolvendo acidente do trabalho será mais demorada e
trabalhosa, com laudos extensos, pelo que deve m erecer por parte dos
m agistrados o arbitram ento de honorários condizentes para remunerar
adequadamente o perito oficial, certamente bem acima dos valores fixados para
os laudos envolvendo adicional de insalubridade ou de periculosidade.

Enfatiza Teixeira Filho que “o perito é um auxiliar do juízo, contribuindo,


mediante compromisso, com a sua cognição técnica para o descobrimento
da verdade. E porque auxiliar o é, não substitui o juiz, em suas funções
jurisdicionais. Supre-lhe, apenas, o desconhecimento ou a ciência imperfeita
a respeito de certos fatos de natureza técnica ou científica.”(4) Convém
esclarecer que a realização da prova pericial nas ações de indenização por
acidente do trabalho não é obrigatória, como ocorre quando se pede o adicional
de insalubridade ou periculosidade. Contudo, na quase totalidade das ações
dessa natureza, a perícia torna-se imprescindível para fornecer subsídios
técnico-científicos, de modo que o julgador possa dirimir com segurança a
controvérsia. Nesse sentido o entendimento jurisprudencial:

(2) CPC. Art. 145. “Quando a prova do fato depender de conhecim ento técnico ou científico,
o juiz será assistido por perito, segundo o disposto no art. 421.”
(3) SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 15. ed. São Paulo:
Saraiva, 1993. v. 2, p. 474.
(4) TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. A prova no processo do trabalho. 8. ed. São Paulo:
LTr, 2003. p. 385.
328 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

“Acidente no trabalho. Leucopenia. Perícia. Recusa do autor. A recusa do autor em


submeter-se à perícia ordenada pelo juiz fez persistir a dúvida sobre a existência do
fato — já que a leucopenia é reversível — levando ao juízo de im procedência da
ação. — Inexistência de ofensa à lei. — Recurso não conhecido.” STJ. 4- Turma. REsp
n. 208.71 O/SP, Rei.: Ministro Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 04 nov. 1999.

“Acidente do trabalho — Prova — Testem unha — Prevalência da prova pericial —


D e s n e c e s s id a d e . C o m p ro v a d a a m o lé s tia e a s e q ü e la p e la p e ríc ia m édica,
inadmissível se afigura a prova testemunhal para a prova de incapacidade, pois tal
fato se insere naquele rol que demanda conhecim ento técnico para a sua aferição.”
São Paulo. STACivSP. 11a Câm. Apelação sem Revisão n. 690.755-00/4, Rei.: Juiz
Artur Marques, julgado em 24 fev. 2003.

“Indenização. Danos. Doença ocupacional. Ausência injustificada do empregado


ao exam e pericial. Conseqüências processuais. Na pretensão de recebimento de
in d e n iz a ç ã o p o r d a n o s s u p o s ta m e n te d e c o rre n te s de d o e n ç a o c u p a c io n a l, a
injustificada ausência do empregado ao exame médico agendado com o perito oficial
prejudica a apuração da existência da doença indicada como causa de pedir e do
alegado nexo causal e ntre ela e o tra b a lh o desem p e n h a d o pelo em pregado na
empresa. Não se pode pensar no nexo “condições de trabalho-doença” sem que haja
exam e do su p o s to d o e n te . A liá s, o art. 231 do C ó d ig o C ivil atu a l e s ta b e le c e
expressam ente que: ‘Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário
não poderá aproveitar-se de sua recusa’. Tornadas inviáveis a obtenção da anamnese
clínica e ocupacional do empregado, a realização do exame físico e otológico, bem
como a colheita de inform ações sobre o serviço por ele desem penhado, ficam as
conclusões periciais limitadas aos elementos probatórios contidos na prova documental
já existente nos autos.” Minas Gerais. TRT 3â Região. 2- Turma. RO n. 00381-2006-
101-03-00-9, Rei.: Des. Sebastião Geraldo de Oliveira, DJ 14 fev. 2007.

E stabelece o art. 145 do CPC que o perito será escolhido entre


profissionais de nível universitário, devidamente inscrito no órgão de classe
competente, com especialidade na matéria. Se na localidade não houver
profissionais qualificados, a indicação do perito será de livre escolha do juiz.
Qual será, portanto, o profissional indicado para a perícia nas ações de
responsabilidade civil decorrente de acidente do trabalho?

A CLT prevê no art. 195 que o laudo para caracterização e classificação


da insalubridade ou periculosidade deverá ficar a cargo de Médico do Trabalho
ou Engenheiro de Segurança do Trabalho. A Lei n. 8.213/1991, no art. 58, §
1Q, estabelece que o laudo técnico das condições ambientais para fins de
aposentadoria especial deverá ser expedido por Médico do Trabalho ou
Engenheiro de Segurança do Trabalho.

Entendemos que o profissional indicado para realizar a perícia nas ações


indenizatórias para mensurar a extensão dos danos causados à vítima é o
médico que tenha concluído curso de especialização em Medicina do Trabalho,
com o devido registro dessa habilitação perante o Conselho Regional de
Medicina. A Medicina do Trabalho é reconhecida oficialmente como uma
especialidade na área médica, conforme detalhado nas Resoluções n. 1.634/
2002 e 1.666/2003 do Conselho Federal de Medicina. Para o médico obter o
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o o u D o e n ç a O c u p a c io n a l 329

título oficial de especialista em Medicina do Trabalho, são necessários dois


anos de formação específica, com elevada carga horária (1.920 horas), em
cursos aprovados no processo de “acreditação” perante a Associação
Nacional de Medicina do Trabalho — ANAMT, que envolvem atividades
teóricas e treinamento em serviço no campo da saúde do trabalhador.

Com o propósito de aprofundar conhecim entos na área pericial, o


Conselho Federal de Medicina, por intermédio da Resolução n. 1.973/2011,
alterou a especialização em “Medicina Legal” para “Medicina Legal e Perícia
Médica”, cuja formação demanda três anos e cuidadoso exame de suficiência
para obtenção do título de especialista, prestado perante a Associação
Brasileira de Medicina Legal e Perícias Médicas.

Além do Médico do Trabalho, para análise dos fatores causais do


acidente e da presença dos pressupostos da responsabilidade civil, poderá
ser muito útil a perícia realizada por Engenheiro, com especialização em
Engenharia de Segurança do Trabalho, conforme previsto na Lei n. 7.410/85.
Esse perito pode fornecer subsídios para o juiz verificar se a empresa cumpria
todas as normas de segurança, ergonomia e higiene no local de trabalho.
Pode também esclarecer as causas da ocorrência por meio de uma memória
descritiva da dinâmica dos fatos que desencadearam o acidente.

É oportuno m encionar que o M édico do Trabalho, por razões de


impedimento ético, não deve atuar como assistente técnico, em perícia judicial
envolvendo trabalhadores da empresa para a qual ele atua como empregado
ou contratado, conforme prevê a Resolução do Conselho Federal de Medicina
n. 1.810/2006, que introduziu o art. 12 na Resolução CFM n. 1.488/1998, com
o seguinte teor:
“Art. 12. O m édico de empresa, o m édico responsável por qualquer program a de
co n tro le de saúde o cu p a cio n a l de e m presa e o m édico p a rtic ip a n te do serviço
especializado em Segurança e Medicina do Trabalho não podem atuar como peritos
judiciais, securitários, previdenciários ou assistentes técnicos, nos casos que envolvam
a firm a contratante e/ou seus assistidos (atuais ou passados).”(5)

Com frequência surgem conflitos com o perito oficial, porque parentes,


advogados ou mesmo dirigentes sindicais insistem em acompanhar o exame
médico do(a) reclam ante, ocorrendo, algum as vezes, até am eaças ou
tentativas de intimidação. Em princípio, só o assistente técnico, devidamente
qualificado e indicado pela parte, pode presenciar o exame pericial(6). Não há

(5) Conferir no mesmo sentido a Sugestão de Conduta Médico-Adm inistrativa — SCMA n.


02, expedida pela A ssociação Nacional de M edicina do Trabalho — ANAMT. Disponível
em: < http://w ww .anam t.org.br/?idJtem =209& t=C onhecim ento>. Acesso em: 10 nov. 2012.
(6) Em situações excepcionais, o Perito pode autorizar que outras pessoas interessadas
acom panhem o exam e m édico-pericial, como, por exem plo, no caso de m enores ou de
pessoas que não conseguem, por qualquer motivo, prestar as inform ações solicitadas.
330 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

fundamento convincente para exigir o acompanhamento da diligência por


terceiros, sobretudo porque os valores principais a serem observados são a
preservação do direito à intimidade da parte autora, bem como a plena
autonomia e isenção do perito do juízo.

A propósito, o Parecer CFM n. 09/2006, resultante do Processo-consulta


n. 1.829/2006, concluiu que: “O exame médico-pericial é um ato médico. Como
tal, por envolver a interação entre o médico e o periciando, deve o médico
perito agir com plena autonomia, decidindo pela presença ou não de pessoas
estranhas ao atendimento efetuado, sendo obrigatórias a preservação da
intimidade do paciente e a garantia do sigilo profissional, não podendo, em
nenhuma hipótese, qualquer norma, quer seja administrativa, estatutária ou
regimental, violar este princípio ético fundamental.”

Nos casos das ações e n vo lven do doenças ocu p a cio n a is, cujas
controvérsias são mais complexas, o laudo pericial deve abranger com
suficiente profundidade técnica três etapas sucessivas, para oferecer ao
julgador amplo conhecimento dos fatos:

1. diagnóstico detalhado, com mensuração do grau de invalidez e da


capacidade residual de trabalho para a mesma ou para outras funções<7);

2. minuciosa descrição das condições ergonômicas em que os serviços


eram prestados e dos fatores etiológicos da doença, para aferir sobre a
existência ou não de nexo causal ou concausal com o trabalho;

3. investigação sobre o possível descumprimento das normas legais,


ergonômicas, técnicas e outras, bem como avaliação dos aspectos
organizacionais e psicossociais a que o trabalhador esteve exposto, para
verificar eventual culpa (grave, leve ou levíssima) do empregador.

Ocorre que para o exame concomitante dessas três etapas são exigidos
conhecimentos multidisciplinares, que raramente um só profissional que atua
como perito do juízo detém. Em diversos julgamentos de ações indenizatórias

(7) Segundo Primo B randim iller, podem ser estabelecidos os seguintes diagnósticos: 1)
Diagnóstico anátomo-patoiógico — descreve o tipo de lesão ou de processo patológico que
acomete determinado órgão, segmento corporal ou função: amputação da falange distai do
polegar direito, tenossinovite dos extensores do punho esquerdo. 2) Diagnóstico funcional
— indica o tipo e grau de intensidade em que se encontra alterada determ inada função:
in s u fic iê n c ia re s p ira tó ria o b s tru tiv a ; h ip o a c u s ia (ou d is a c u s ia ) n e u ro s s e n s o ria i. 3)
Diagnóstico sindrômico — tipifica a ocorrência de síndrome, entendida como um conjunto
de sinais e sintom as com uns a um grupo de d ife re n te s doenças: hip e rte n sã o arterial
sistêmica, síndrome vestibular periférica, parkinsonismo, icterícia. 4) Diagnóstico etiológico
— identifica a causa, ou causas, das lesões, reduções funcionais ou síndromes: tendinite
do supraespinhoso por esforços repetitivos, perda auditiva induzida por ruído, silicose,
dermatite de contato por cimento. Cf. Perícia judicial em acidentes e doenças do trabalho.
São Paulo: Senac, 1996. p. 178.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 331

temos observado maior atenção dos peritos para o diagnóstico, algumas


observações sobre os fatores causais e quase nada a respeito dos fatores
organizacionais e psicossociais. A introdução do art. 431-B no CPC, por
intermédio da Lei n. 10.358/2001, facilitou a superação desse problema, visto
que foi facultado ao juiz nomear mais de um perito quando se tratar de perícia
complexa que abranja mais de uma área de conhecimento especializado,
podendo a parte, também, indicar mais de um assistente técnico.
Por outro lado, os profissionais da área jurídica ressentem-se de formação
adequada no campo da saúde do trabalhador e dem onstram dificuldades
na elaboração dos quesitos, nas impugnações dos laudos periciais e mesmo na
formulação de perguntas pertinentes durante a instrução processual. As grades
curriculares das Faculdades de Direito no Brasil praticamente ignoram o tema
da saúde do trabalhador fora do aspecto da monetização do risco, pois
normalmente priorizam o estudo dos adicionais de insalubridade, periculosidade
ou as estabilidades dos membros da CIPA. Paradoxalmente, estuda-se Medicina
Legal para examinar os mortos, mas não se incluem os temas da saúde
ocupacional e do meio ambiente do trabalho sadio para preservar os vivos.

Observamos com frequência, ao proferir julgamento a respeito dos aci­


dentes ou das doenças ocupacionais, que faltam elementos fáticos importan­
tes para a solução justa do litígio, tais como: extensão da jornada de trabalho,
horas extras, trabalho noturno e em turnos, gozo regular de férias, duplo em­
prego, atividades fora do trabalho que atuam como fatores contributivos, con­
dições ergonômicas, tratamento da chefia, relacionamento interpessoal, pressão
da clientela ou da direção, remuneração por produção, intervalos de refeição
e descanso, pausas obrigatórias, treinamento adequado, cumprimento do
contrato de trabalho, monotonia ou repetitividade das tarefas etc. etc. Em
verdade, tais informações já deveriam constar da petição inicial ou da defesa,
com o necessário respaldo probatório ao longo da instrução processual.
Diante dessas dificuldades, no exercício da magistratura, sempre que
nos deparamos com ações indenizatórias decorrentes de acidente do trabalho
ou doenças ocupacionais, formulamos para resposta do perito oficial os
“Quesitos do Juízo” , conforme faculta o CPC(8), com o objetivo de facilitar a
instrução processual e obter melhores subsídios para proferir o julgamento,
conforme exemplo a seguir:

1. O autor foi acometido por alguma doença ou sofreu acidente do


trabalho?
2. Há nexo causal do trabalho com a doença ou o acidente?

(8) CPC. Art. 426: “Compete ao Juiz: I — indeferir quesitos impertinentes; II — form ular os
que entender necessários ao esclarecim ento da causa.”
332 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

3. O exercício do trabalho atuou como concausa no aparecimento ou


agravamento da doença ou na ocorrência do acidente? Explique a
resposta.

4. Houve concausa mensurável relativa a fatores extralaborais?

5. A empresa cumpria todas as normas de segurança e prevenção indi­


cadas na legislação e outras normas técnicas aplicáveis, especialmente
as NRs da Portaria n. 3.214/1978 do Ministério do Trabalho?

6. O autor foi treinado para o exercício da função?


7. O autor gozava regularmente de intervalos, repousos e férias?

8. Algum fator de caráter organizacional contribuiu para o aparecimento


da doença ou para a ocorrência do acidente?

9. No setor de trabalho do reclamante ocorreram casos semelhantes


nos últimos cinco anos?

10. Quais as alterações e/ou comprometimentos que a doença diagnos­


ticada acarreta na saúde do reclamante, na sua capacidade de trabalho
e na sua vida social?

11. É possível mensurar a eventual capacidade residual de trabalho do


reclamante e a viabilidade do seu aproveitamento no mercado, dentro da
sua área de atuação profissional ou em funções compatíveis?
12. Há possibilidade efetiva de reversão do quadro para recuperação da
aptidão normal de trabalho?

13. Há nexo epidemiológico da patologia que acometeu o autor com a


atividade da empresa?

14. Informar se o Fator Acidentário de Prevenção da empresa está acima


ou abaixo da média.

15. O tempo de exposição ao risco na empresa pode ser considerado


suficiente para acarretar o adoecimento? Houve exposição ao mesmo
risco em empregos anteriores?

16. Após o afastamento do risco houve repercussão no agravamento ou


melhora da doença?

A pesquisa do nexo causal nas doenças ocupacionais deverá ser


desenvolvida seguindo-se o roteiro indicado pela Resolução n. 1.488/1998
do Conselho Federal de Medicina mais os subsídios da Resolução INSS/DC
n. 10, de 23 de dezembro de 1999, conforme mencionamos no Capítulo 6,
item 6.3, ao qual nos reportamos para evitar repetições.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 333

Como se vê, compete à perícia médica a importante tarefa de avaliar


qualitativa e quantitativamente o dano causado no patrimônio físico e psíquico
do acidentado, fornecendo elementos para o arbitramento da indenização.
Para Primo Brandimiller, é de competência da perícia médica:
• diagnosticar as lesões e perturbações funcionais;
• exam inar a com patibilidade entre as características das lesões e
alterações funcionais diagnosticadas com as causas alegadas;
• avaliar as perdas ou reduções funcionais de órgãos, funções ou
segmentos corporais;
• avaliar percentualmente o prejuízo no patrimônio físico e psíquico;
• indicar a eventual necessidade de tratamentos especializados, próteses
e reabilitação profissional e estimar os respectivos custos(9).
De qualquer forma, é importante consignar que o juiz não fica vinculado
ao resultado do laudo pericial, podendo formar sua convicção com outros
elementos ou fatos provados nos autos(10), ou determinar a realização de nova
perícia, de ofício ou a requerimento da parte, quando a matéria não lhe parecer
suficientem ente esclarecida(11). Ademais, pode a parte interessada pedir
esclarecimentos do laudo pericial, impugnar suas conclusões ou até mesmo
requerer que o perito oficial preste os esclarecimentos em audiência, conforme
prevê o art. 435 do CPC. Pelo princípio da persuasão racional ou do livre
convencimento motivado goza o juiz de liberdade para valorar a prova, mas
deve indicar na sentença as razões que motivaram o seu entendimento. Vejam
alguns julgados a respeito:
“Civil. Prova pericial. Interpretação. Livre convencim ento. 1 — O fato de o mesmo
laudo pericial servir para a im procedência do pedido inicial na sentença e para a
procedência parcial no acórdão (apelação) não enseja violação aos arts. 131 e 436
do C PC , pois tra ta -s e a p e n a s de in te rp re ta ç ã o da p ro va , sob o c rivo do livre
convencim ento que é próprio das instâncias ordinárias, onde o conhecim ento fático-
-probatório é amplo. O julgador não está adstrito às conclusões da perícia que, como
meio de prova, serve apenas para elucidar os fatos e nortear o veredicto. De qualquer
forma, cuida-se de valoração da prova, prevalecendo, em última análise, a inteligência
m inistrada pela instância revisora. 2 — Recurso especial não conhecido.” STJ. 4-
Turma. REsp n. 1004078/SE, Rei.: Ministro Fernando Gonçalves, DJ 19 maio 2008.

“Responsabilidade civil. Acidente do trabalho. Laudo pericial no sentido de que


inexistente o nexo entre a doença e a atividade laboral. Conclusão da perícia

(9) BRANDIM ILLER, Primo A. Perícia ju d ic ia l em acidentes e doenças do trabalho. São


Paulo: Senac, 1996. p. 200.
(10) CPC. Art. 436. “O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo form ar a sua convicção
com outros elementos ou fatos provados nos autos.”
(11) CPC. Art. 437. “O ju iz poderá determ inar, de ofício ou a requerim ento da parte, a
realização de nova perícia, quando a matéria não lhe parecer suficientem ente esclarecida.”
334 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

afastada pelo julgador, que declarou sua incerteza sobre o nexo causal e, na
dúvida, decidiu em favor da parte menos favorecida. I — Nas ações de indenização
fundadas no art. 159 do Código Civil, cabe ao autor a prova do fato constitutivo de seu
direito, cum prindo-lhe dem onstrar a culpa do agente, o dano e o nexo causal entre o
ato culposo e o prejuízo. II — O julgador não está vinculado ao laudo pericial, podendo
apreciar livremente a prova (CPC, arts. 131 e 436). Porém, ao recusar as conclusões
do perito, deve expor as razões de seu convencim ento (CPC, art. 458, II). III — Recurso
especial conhecido e provido.” STJ. 3S Turma. REsp n. 442.247/M G , Rei.: Ministro
Pádua Ribeiro, julgado em 05 jun. 2003.

“ P e ríc ia - - N ova p e ríc ia — E xam e p e ric ia l h áb il e id ô n e o à fo rm a ç ã o do


convencim ento do juiz — Existência -gj Princípio da persuasão racional ou do livre
convencim ento m otivado — D esnecessidade. Não pode ser deferido pedido de
realização de nova perícia quando ausentes elementos a infirm ar o trabalho técnico
anteriormente apresentado, valendo lembrar que o sistema processual brasileiro, no
concernente à vaioração dos elem entos probatórios, é inform ado pelo princípio da
persuasão racional ou do livre convencim ento motivado, podendo o magistrado apreciar
de maneira ampla e irrestrita todos os elementos de convicção coligidos aos autos,
não ficando adstrito às conclusões do expert médico, aplicando-se o velho brocardo
que determina que o juiz é o peritus peritorum." São Paulo. STACivSP. 8ã Câm. Agr.
ins. n. 852.913-00/0, Rei.: Juiz Ruy Coppola, julgado em 24 jun. 2004.

10.3. Indenizações no caso de invalidez permanente

Segundo a Lei de Benefícios da Previdência Social, será devida a


aposentadoria por invalidez quando o segurado for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, após comprovação da incapacidade mediante exame médico-
-pericial(12).

O Código Civil, com exigência menos rigorosa, estabelece no art. 950 o


direito ã indenização por incapacidade permanente quando o ofendido não
puder mais exercer o seu ofício ou profissão. Não menciona a possibilidade
de readaptação da vítima para o exercício de outra função compatível.

A invalidez reconhecida pelo INSS cria a presunção da incapacidade da


vítima para o exercício da profissão para fins de responsabilidade civil. Não
se trata, porém, de presunção absoluta (Jure et de jure), podendo o empregador
produzir prova em sentido contrário, até porque o ato adm inistrativo da
Previdência Social não vincula o Poder Judiciário(13). A propósito, também no

(12) Lei n. 8.213, 24 de jul. 1991. Art. 42.


(13) “Responsabilidade civil — Acidente do trabalho — Indenização — Direito comum —
Prova da incapacidade com base na concessão de benefício acidentário pelo INSS —
Ausência de pedido de perícia médica, por parte da ré — Conformismo com as conclusões
periciais do INSS — Alegação de inexistência de seqüelas no obreiro não comprovada —
Indenizabilidade. A prova da incapacidade do obreiro, resultante de acidente do trabalho,
deve ser feita por perícia m édica, para efeito de concessão de indenização no âm bito do
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 335

campo do Seguro Privado, o entendimento é semelhante, sendo oportuno


mencionar que a Circular n. 302/2005 da SUSEP, no art. 5Q, parágrafo único,
estabelece que “a aposentadoria por invalidez concedida por instituições
oficiais de previdência, ou assemelhadas, não caracteriza por si só o estado
de invalidez permanente de que tratam as Seções III, IV e V deste Capítulo.”

A controvérsia tormentosa nas ações indenizatórias, nos casos de in­


validez permanente, refere-se à medida do grau da incapacidade. Basica­
mente são três os desfechos possíveis: 1. Inabilitação para a profissão que a
vítima exercia, mas com possibilidade de readaptação para o trabalho em
outra função; 2. Incapacidade para o exercício de qualquer profissão ou ativi­
dade; 3. Incapacidade total para qualquer atividade e ainda com necessidade
permanente do auxílio de outra pessoa para os atos normais da vida diária,
também chamada de grande invalidez.
No âmbito da reparação civil, em princípio, basta demonstrar a incapaci­
dade para a profissão que o acidentado exercia no momento do infortúnio,
conforme dispõe o art. 950 mencionado. Certos acidentes deixam a incapaci­
dade tão evidente que dispensam maiores indagações, tais como um moto­
rista ou um cirurgião que perdeu a visão, um violinista que perdeu o braço, um
jogador de futebol que teve amputada uma das pernas, o pedreiro que ficou
paraplégico etc.

Mas em muitas situações surgem dúvidas se o acidente causou invalidez


permanente total ou parcial, sobretudo pela freqüente alegação defensiva
quanto à possibilidade de readaptação da vítima para outra função compatível.

direito comum. Entretanto, se o autor pede o mesmo grau de incapacidade reconhecido


pelo INSS, o ônus de provar o desacerto dessa conclusão é do réu, por força do disposto no
inciso II do artigo 333 do C ódigo de Processo Civil. Não pleiteando este prova médico-
-pericial para apurar a efetiva redução da capacidade laborativa do autor, à m íngua de
outras provas, prevalecerá o laudo do Instituto Nacional do Seguro S ocial.” São Paulo.
STACivSP. 5- Câm. Apelação com Revisão n. 509.750, Rei.: Juiz Luís de Carvalho, julgado
em 27 maio 1998.
“Doença ocupacional. Inocorrêncla. O INSS reconheceu, em uma das oportunidades em
que a reclamante recebeu benefício previdenciário, nexo de causalidade entre as doenças
por ela sofridas e as suas atividades laborais. Em que pese a conclusão da perícia médica
realizada pelo INSS possa gerar uma presunção favorável à tese da reclamante, de que é
acom etida de doença ocupacional, essa presunção, no contexto dos autos, restou afastada
pelos demais elementos de prova produzidos, especialmente pelo laudo médico elaborado
por perito de confiança do Juízo. Com base neste laudo, não infirm ado pelos dem ais
elementos de prova dos autos, as patologias são de ordem exclusivamente degenerativa, e
não decorrentes das condições de trabalho da autora, não havendo falar em nexo causal.
Aplicação do art. 20, § 1a, alínea a, da Lei n. 8.213/91. Não reconhecido o nexo causal, não
há cogitar do pagamento das indenizações pretendidas. Provimento negado.” Rio Grande
do Sul. TRT 4- Região. 4- Turma. RO n. 00621-2005-661-04-00-3, Rei.: Fabiano de Castilhos
Bertolucci, DJ 11 dez. 2007.
336 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Recomenda Sílvio Rodrigues que “o juiz deverá agir com ponderação ao fixar
a indenização em casos tais, admitindo por vezes haver apenas redução na
capacidade laborativa, com o fito não só de impossibilitar um enriquecimento
indevido quando a vítima possa voltar a trabalhar em outro mister, como
também o de desencorajar um injustificado ócio”(14).

A decisão, acerca da ocorrência de incapacidade total ou parcial, não


pode ser tomada somente pela análise fria e isolada das lesões sofridas pela
vítima, mormente diante da relevância das consequências(15). Em tese, qua­
se todos os acidentados poderiam ser readaptados para outras atividades,
mas não cabe impor ao lesado a busca compulsória de profissão diversa, até
porque o serviço de reabilitação e readaptação profissional no Brasil ainda
funciona precariamente. Para acolher a incapacidade parcial, pontua Cavalieri
Filho, será preciso “demonstrar que, concretamente, a vítima trabalha nor­
malmente em profissão distinta sem sacrifício nem constrangimento, ainda
que com menor remuneração. Se isso ocorrer não será razoável o pensiona­
mento integral, para se evitar o enriquecimento sem causa.”(16) Nessa seqüên­
cia de ideias, é oportuno transcrever o pensamento abalizado de Caio Mário:

“Não existe um critério rígido para determinar o que seja a perda ou


habilitação para o exercício da atividade normal da vítima. Uma cantora
que perde a voz, pode trabalhar em outra atividade; um atleta que perde a
destreza não está impedido de ser comentarista. Uma e outro, no entanto,
sofrem a destruição inerente à sua atividade normal. A indenização a que
fazem ju s leva em consideração o prejuízo específico, uma vez que a
procura de outro trabalho é uma eventualidade que pode ou não vir a ser.”(17)

Como se depreende, a avaliação da incapacidade deve ser feita consi­


derando as especificidades do caso da vítima, tais como: idade, situação do

(14) RODRIGUES, Sílvio. Direito civil: responsabilidade civii. 19. ed. São Paulo: Saraiva,
2002. v. 4, p. 234.
(15) “Indenização p o r dano m a te ria l— Definição do grau de redução da capacidade laborativa
— omissão — A determ inação do grau de redução da capacidade de trabalho não envolve
explanação m atem ática, mas, sim, ju ízo de va io r fundam entado, segundo a persuasão
racional do magistrado. A ciência jurídica preocupa-se, antes, com a justa reparação do
dano sofrido, do que, especificam ente, com a precisão matemática dos cálculos. Segundo
o princípio do livre convencim ento motivado, cumpre ao magistrado exam inar e qualificar
as provas produzidas e juntadas aos autos, fundam entando sua decisão. A obrigatoriedade
de fundam entação dos atos judiciais, no entanto, não exige que o m agistrado destaque,
e n tre os c o m p o n e n te s do q u a d ro fá tic o -p ro b a tó rio , u m a ou o u tra p ro v a em que
especificam ente baseou sua decisão. Recurso não conhecido.” TST. 3- Turma. RR n. 930/
2001-010-08-00.6, Rei.: Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ, 19 mar. 2004.
(16) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 132.
(17) PEREIRA, Caio M ário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. 8- t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 319-320.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 337

mercado de trabalho, rendimento útil no trabalho, grau de instrução, segurança


e risco na prestação de serviço, local de moradia, deslocamento até o local
do trabalho. Assinala Hertz Costa que “para a avaliação da incapacidade
laborativa não deve o perito ou o julgador fundamentar-se simplesmente em
cálculos baseados em tabelas, nacionais ou internacionais, senão que deve, à
luz das repercussões das seqüelas incapacitantes, considerar a realidade eco­
nômica, social e familiar, que são efeitos determinantes da incapacidade.”(18)

O Ministro do STJ, Humberto Gomes de Barros, ao julgar essa questão,


registrou na ementa do acórdão em que atuou como relator: “Se o acidente
incapacitou o ofendido para a profissão que exercia, a indenização deve
traduzir-se em pensão correspondente ao valor do que ele deixou de receber
em v irtu d e da in a b ilita çã o . Nada ju s tific a sua redução pela sim ples
consideração, meramente hipotética, de que o trabalhador pode exercer outro
trabalho.”(19)

A preocupação com o futuro profissional do acidentado e a importância


acentuada da análise do caso concreto podem ser observadas em diversos
julgados a respeito do tema da incapacidade:
“A c id en te de tra b a lh o . M u tilação . In c a p a c id a d e p erm an en te para a função.
Indenização. Para caracterização da incapacidade laboral, considera-se invalidez
perm anente aquela que inviabiliza a aceitação da vítim a no mercado de trabalho em
função compatível com a form ação profissional da vítim a.” STJ. 3- Turma. REsp n.
240.406, Rei.: Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ 1- fev. 2006.

“Indenização. Dano material e dano moral. Acidente do trabalho. DORT (Distúrbio


O steom uscular Relacionado ao Trabalho). Art. 1.539 do Código Civil de 1916 (950
do vigente). Prova do dano. Lucros cessantes. O art. 1.539 do Código Civil de 1916
(art. 950 do vigente), na parte final, estabelece que a pensão será correspondente à
‘im portância do trabalho, para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu’.
Com isso, o que vale para a fixação do percentual, em princípio, é a incapacidade
para o trabalho que exercia no m om ento do ato lesivo, pouco relevando que haja
incapacidade apenas parcial para outras atividades, salvo a com provação de que o
ofendido efetivam ente exerce outro emprego rem unerado. A mera possibilidade de
fazê-lo está fora da presunção legal.” STJ. 3ã Turma. REsp n. 569.351/MG, Rei.: Ministro
Carlos Alberto Menezes Direito, D J 04 abr. 2005.

“Previdência social. Acidente de trabalho. Invalidez permanente. Am putação de


todos os dedos da mão direita. Conforme atestam as provas dos autos o autor perdeu
a função de pinça e preensão da mão direita, porque am putados todos os dedos,
desde o polegar. Tendo em consideração a pouca qualificação do segurado, faz jus
à aposentadoria por invalidez, pois sequer submetido ao procedimento de reabilitação.

(18) COSTA, Hertz J. Acidentes do trabalho na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003. p. 143.
(19) STJ. 3- Turma. AgRg no AgRg no Ag. 596.920, Rei.: Ministro Humberto Gom es de
Barros, DJ 1- jul. 2005. Com redação praticam ente idêntica, a Ementa do REsp n. 233.610,
tam bém julgado pela 3a Turm a do STJ em 09 nov. 1999, tendo como Relator o Ministro
Eduardo Ribeiro.
338 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Proveram o apelo, invertendo a sucum bência.” Rio Grande do Sul. TJRS. 10a Câm.
Cível. Apelação Cível n. 70008018517, Rei.: Des. José Conrado de Souza Júnior,
julgado em 16 set. 2004.

“Seguro de vida e/ou acid en tes p essoais — Ind en ização — R eadaptação —


Descaracterização da invalidez — Inocorrência — Adm issibilidade. A possibilidade
de readaptação não pode ser co n sid era d a com o elem ento d e sca ra cte riza d o r da
invalidez. A se pensar o contrário, invalidez alguma seria suscetível de indenização,
ao ponto de o absurdo daí decorrente somente servir para contentar as seguradoras,
então felicíssim as no paraíso de sempre poder contratar seguros por invalidez, sem
te r de h o n rá -lo s nu n ca d ia n te da a m p la e s tra d a da re a d a p ta ç ã o .” S ão Paulo.
STACivSP. 12a Câm. Apelação com Revisão n. 601.168-00/8, Rei.: Juiz Palma Bisson,
julgado em 9 ago. 2001.

“A pelação cível — R esponsabilidade civil — A cidente de trânsito com lesão


corporal grave — Amputação de parte da perna — Incapacidade total e permanente
para exercer a sua função de agente penitenciário e em grau geral de 65% —
Observados os elementos contidos nos autos, os danos morais foram corretamente
arbitrados em R$ 50.000,00. Pensão vitalícia devida na base de 100% dos vencimentos
que percebia na data do fato em razão da incapacidade para o exercício da profissão
para a qual o autor estava habilitado. Não pode restar dúvida de que a situação criada
pelo ato do réu gerou a n gústia e p rofundo s o frim e n to ao autor, pois, diante de
inescusável e inadmissível imprudência do seu preposto, foi o autor atropelado tendo
parte de sua perna esm agada com conseqüente amputação. Agora, o autor já não
pode mais exercer a função para a qual se habilitou e teve, para o resto de sua vida,
reduzida em 65% a sua capacidade para as demais atividades. Esta angústia, não é
aquela cotidiana a desautorizar a condenação moral. Afinal, os fatos acima narrados
não são usuais e corriqueiros da vida, mas, de certo, que são caracterizadores de
grave abalo psíquico capaz de gerar o direito à justa indenização. O laudo pericial foi
claro no sentido de que o autor ficou 100% incapacitado para exercer a função para
a qual se qualificou e isto é o quanto basta. Para a caracterização de invalidez total
perm anente é suficiente que o indivíduo seja incapacitado para exercer a função para
a qual estava habilitado. É inexigível, e até desumano, que o autor nesta altura da
vida, quase cinqüenta anos, venha a ter que habilitar-se para nova função e submeter-
-se ao m ercado de trabalho tendo em seu currículo a necessidade de utilização de
prótese para manter-se ereto. Esta verba é devida sem o abatimento do valor pago
pela previdência pública, eis que o entendim ento jurisprudencial predom inante é o
de que, pela inteligência do art. 1.539 do Código Civil vigente à época do fato, estas
verbas são independentes e cumuláveis, eis que não cabe ao intérprete criar restrições
onde a lei não restringiu.” Rio de Janeiro. TJRJ. 8a Câm. Cível. A pelação Cível n.
2004.001.05079, Rei.: Des. Marco Aurélio Froes, julgado em 04 maio 2004.

Se ficar caracterizada a chamada grande invalidez, situação em que o


acidentado necessita de assistência permanente de outra pessoa para os
cuidados pessoais ou para cumprir as tarefas domésticas que antes desem­
penhava, cabe incluir no cálculo da indenização os dispêndios necessários
para tal fim (20). Aliás, o acréscimo da expressão “além de algum outro prejuí­

(20) “Tendo a vítim a de acidente de trânsito ficado, em razão dos ferim entos, impossibilitada
de cuidar dos afazeres da casa, faz jus ao recebimento de indenização para contratação de
em pregada enquanto subsistir o impedimento. Tal verba não se confunde com a pensão, já
deferida, decorrente da redução da capacidade laborativa.” São Paulo. 1gTACivSP. 7a Câm.
Rei.: Juiz Luiz de Azevedo. In: STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8a ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 1.408.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 339

zo que o ofendido prove haver sofrido” no art. 949 do Código Civil de 2002
agasalha sem dúvida essa despesa adicional do acidentado(21). Por outro lado,
se essa despesa da vítima é inevitável, é justo e razoável que o ressarcimen­
to englobe tal valor em sintonia com o princípio da restitutio in integrum.
Uma vez decidido que ocorreu a invalidez permanente total e estando
presentes os pressupostos da responsabilidade civil, cabe o deferimento da
reparação dos danos materiais, morais, estéticos ou a perda de uma chance,
conforme o caso. A abordagem genérica dos danos como pressuposto da
indenização foi feita no Capítulo 8, ao qual nos reportamos. Neste tópico vamos
realçar algum as questões peculiares à indenização no caso dos danos
decorrentes da invalidez permanente.

A reparação dos danos materiais nos acidentes que acarretaram invalidez


permanente, de acordo com o art. 950 do Código Civil, abrange:

1. Despesas de tratamento até o fim da convalescença;

2. Lucros cessantes também até o fim da convalescença;


3. Pensão correspondente à importância do trabalho para que a vítima
se inabilitou.

Ocorrido o acidente do trabalho, sobrevêm o período do tratamento


médico até o fim da convalescença, ou seja, até a cura ou a consolidação
das lesões(22). Nessa etapa cabe a indenização de todas as despesas
necessárias para o tratamento, bem como dos lucros cessantes que no caso
do acidente do trabalho representam o valor da remuneração mensal que a
vítima percebia. Como salienta Carlos Roberto Gonçalves, “as despesas do
tratamento e os lucros cessantes serão mais elevados, em caso de lesão

(21) Confira nesse sentido: GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 14. ed.
São Paulo: Saraiva, 2012. p. 612. Pode ser também invocado por analogia o art. 45 da Lei
n. 8.213, de 24 jul. 1991, que trata dos benefícios da Previdência Social. O Anexo I do
Regulam ento da Previdência Social (Decreto n. 3.048/1999) relaciona as hipóteses que
autorizam o pagamento do adicional previsto no art. 45: 1 — Cegueira total; 2 — Perda de
nove dedos das mãos ou superior a esta; 3 — Paralisia dos dois membros superiores ou
inferiores; 4 — Perda dos membros inferiores, acima dos pés, quando a prótese for impossível;
5 — Perda de uma das mãos e de dois pés, ainda que a prótese seja possível; 6 — Perda de
um membro superior e outro inferior, quando a prótese for impossível; 7 — Alteração das
faculdades mentais com grave perturbação da vida orgânica e social; 8 — Doença que exija
permanência contínua no leito; 9 — Incapacidade permanente para as atividades da vida
diária. Vale anotar, no entanto, que a reparação civil é mais am pla e não está lim itada
somente a tais hipóteses ou ao percentual da regra previdenciária. O parâm etro principal
deve ser a reparação integral do prejuízo demonstrado,
(22) “Deve ser interpretado o período da convalescença como o período necessário à cura”.
Cf. DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 453.
340 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liveira

corporal de natureza grave, porque abrangem todas as despesas médicas e


hospitalares, incluindo-se cirurgias, aparelhos ortopédicos, fisioterapia etc.”(23

Depois da convalescença ou da consolidação das lesões, decidindo-se


pela incapacidade para o trabalho, o valor que era devido mensalmente pelo
empregador como reparação dos lucros cessantes passa a ser devido a título
de pensão vitalícia(24). O art. 950 do Código Civil expressamente prevê o
pag am ento dos lu cros ce ssa n te s até o fim da c o n va le sce n ça e do
pensionamento a partir de então. O tema da apuração da base de cálculo do
pensionamento foi abordado com vagar no Capítulo 9, item 5, ao qual nos
reportamos.

Se mesmo depois de consolidadas as lesões persistir a necessidade do


tratamento médico, conforme indicação do laudo pericial, a condenação deverá
prever verba para esse fim, já que a indenização do tratamento independe do
valor pago a título de pensionamento pela inabilitação da vítim a para o
trabalho(25). Já decidiu o STJ: “tratando-se de seqüelas duradouras, que exijam
tratam ento contínuo e prolongado, a indenização devida ao prejudicado
também deve abranger essas despesas, sendo desnecessária a propositura
de novas ações.”(26)

Convém enfatizar que a importância que a vítima recebe a título de


aposentadoria por invalidez, da Previdência Social, não deve ser deduzida da
base de cálculo do pensionamento decorrente do ato ilícito, conforme já
pacificado na jurisprudência(27). A Constituição da República de 1988 estabelece

(23) GO NÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 606.
(24) No ramo dos Seguros Privados, prevê a Circular n. 302/2005 da SUSEP: “Art. 12. Após
co n c lu s ã o do tra ta m e n to , ou e s g o ta d o s os re c u rs o s te ra p ê u tic o s d is p o n ív e is p ara
recuperação, e constatada e avaliada a invalidez perm anente quando da alta m édica
d e fin itiva , a so cie d a d e s e g u ra d o ra deve p a g a r um a in d e n iza çã o , de a co rd o com os
percentuais estabelecidos nas condições gerais e/ou especiais do seguro."
(25) “Indenização. Verba destinada às despesas de tratamento. Segundo o disposto no art.
1.539 do Código Civil, não se confundem, sendo suscetíveis de acumulação, as despesas
de tratam ento e a pensão correspondente à inabilitação para o trabalho. Recurso especial
conhecido, em parte, e provido.” STJ. 4 B Turma. REsp n. 50.903/RJ, Rei.: Ministro Barros
Monteiro, julgado em 21 fev. 1995.
(26) STJ. 3a Turma. REsp n. 651.225, Rei.: Ministro Castro Filho, julgado em 19 ago. 2004.
Em outro julgam ento decidiu o STJ: “A necessidade de cirurgias reparadoras durante alguns
anos justifica o deferim ento de verba para custear essas despesas, mas sem a imediata
execução do valor para isso arbitrado, uma vez que o num erário necessário para cada
operação deverá ser antecipado pela empresa-ré sempre que assim for determinado pelo
juiz, de acordo com a exigência médica. A devedora constituirá um fundo para garantir a
exigibilidade dessa parcela.” Cf. STJ. 4 B Turma. REsp n. 347.978/RJ, Rei.: Ministro Ruy
Rosado de Aguiar, julgado em 18 abr. 2002.
(27) “Civil. Acidente do trabalho. Indenização pelo direito comum. Se o em pregado teve,
comprovadam ente, uma redução irreversível na sua capacidade auditiva, faz jus à respectiva
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 341

claramente que o pagamento das parcelas decorrentes do seguro acidentário


não exclui a indenização devida pelo empregador(28). Para evitar repetições,
reportamo-nos ao Capítulo 4, item 4, no qual abordamos os fundamentos pelos
q ua is não se com pen sam os p ro ve n to s re ce b id o s do INSS com o
pensionamento decorrente da responsabilidade civil por acidente do trabalho.

O termo final da pensão devida à própria vítima não sofre a limitação


relativa à expectativa de vida ou de sobrevida, como ocorre no caso de morte
do acidentado. Na invalidez permanente, a pensão deve ser paga enquanto a
vítima viver; no caso de morte, o termo final será a provável sobrevida que o
acidentado teria, conforme abordado no Capítulo 9, item 7. A duração vitalícia
da pensão garante harmonia com o princípio da “reparação integral” porque a
vítima, não fosse o acidente, poderia trabalhar e auferir rendimentos enquanto
viva estivesse, mesmo depois de aposentada pela Previdência Social.

O Colendo STF já decidiu que no caso de incapacidade o pagamento


deve prolongar-se “pela duração da vida da vítima, não cabendo estabelecer
limite, com base na presunção de vida provável, visto que a vítima sobreviveu
ao acidente”(29). A propósito dessa questão, asseverou com propriedade Rui
Stoco:

indenização, independentem ente do benefício pre vid e n ciá rio correspondente. R ecurso
especial conhecido e provido, em parte.” STJ. 3a Turma. REsp n. 419.034/RJ, Rei.: Ministro
Ari Pargendler, julgado em 05 dez. 2002.
“Responsabilidade do empregador — Doença profissional. Incapacidade permanente. Dano
material. A incapacidade parcial e perm anente do em pregado, proveniente de doença
equiparada a acidente do trabalho e decorrente da negligência do em pregador, atrai a
obrigação de indenizar o dano material, nos moldes do art. 950 do Código Civil, quitada na
form a de pensão, em v a lo r igual à im p o rtâ n c ia do tra b a lh o para que se in a b ilito u o
trabalhador. O benefício previdenciário percebido atualm ente não exclui a pensão civil
reivindicada pelo autor, pois ela tem como fundam ento ato ilícito praticado pelo reclamado,
ao passo que os valores pagos pelo INSS decorrem das contribuições pagas pelo empregado
e pelo empregador no curso do contrato. As duas parcelas são distintas e não se compensam,
pois, consoante o artigo 7-, XXVIII, da Constituição, o seguro social contra acidentes do
trabalho não exciui a indenização civil devida pelo em pregador, quando incorrer em dolo
ou culpa. No mesmo sentido é a Súmula n. 329 do Excelso STF.” Minas Gerais. TRT 3a
Região. 7a Turma. RO n. 00484-2004-076-03-00-1, Rei.: Juíza Alice Monteiro de Barros, DJ
25 jan. 2005.
(28) Constituição da República. Art. 7°, XXVIII: “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo
do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em
dolo ou culpa.” De form a semelhante prevê o art. 121 da Lei n. 8.213/1991: “O pagamento,
p e la P re v id ê n c ia S o c ia l, d a s p re s ta ç õ e s p o r a c id e n te do tra b a lh o n ã o e x c lu i a
responsabilidade civil da em presa ou de outrem .” Aiiás, a Súmula n. 229 do STF menciona
que “a indenização acidentária não exclui a do direito com um ...”
(29) Cf. STF. 1a Turma. RE n. 94.429-0, Rei.: Ministro José Néri da Silveira, julgado em 30
abr. 1984. Vejam tam bém a respeito acórdão do STJ: “Agravo regimental no agravo em
recurso especial. Responsabilidade civil. Erro médico. Intoxicação do autor por mercúrio.
Necrose e amputação de dois dedos da mão. Condenação. Hospital. Pagamento. Pensão
vitalícia ã vítima. Não limitação da pensão ã data em que a vítima com pletar 65 anos.
342 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

“Se a vítima sobrevive mas fica total ou parcialmente incapacitada para


o trabalho, deve receber pensão vitalícia, ou seja, enquanto viver, sem
qualquer limitação temporal. E a razão é simples: se é ela incapaz hoje
em razão do infortúnio, o será aos 25 anos de idade, bem como quando
alcançar os 65 anos. Se hoje não tem condições de exercer uma atividade
produtiva e remunerada, muito menos as terá quando estiver com idade
mais avançada. Ora, nada justifica estabelecer tempo provável de vida
àquele que necessitará para o resto de sua sobrevivência de amparo
mensal. A ficção não pode sobrepor-se à realidade.”(30)
A inovação do Código Civil de 2002 que faculta ao prejudicado exigir que a
indenização, incluindo o valor do pensionamento, seja arbitrada e paga de uma
só vez (art. 950, parágrafo único) será abordada separadamente no item 10.6.

Além dos danos materiais, a invalidez perm anente total autoriza o


deferimento das indenizações pelos danos morais e danos estéticos, se for o
caso. No Capítulo 8, itens 4 e 5, aos quais nos reportam os, tratam os
detalhadamente sobre o cabimento da reparação dessas duas modalidades
de danos.

10.4. Indenizações no caso de redução da capacidade

No início do tópico anterior registramos as controvérsias quanto ao


enquadramento da incapacidade, se total ou parcial, especialmente quando a
perda funcional do acidentado é maior. M encionam os tam bém que a
incapacidade no enfoque da responsabilidade civil, em princípio, deve ser
avaliada tendo por referência a profissão da vítima, como literalmente aponta
o art. 950 do Código Civil. Com frequência, a redução da capacidade implica
o afastamento da vítima do mundo do trabalho, pela dificuldade de conseguir
novo emprego(31). Assim, para melhor compreensão deste tópico, é conveniente
a leitura prévia do item anterior.

Precedentes. 1, No caso, em que não houve óbito da vítima, inexiste razão para limitar a
pensão a ela devida à data em que com pletar 65 anos. “A estimativa de idade provável de
vida para o recebimento da pensão é feita quando a indenização é pedida, por exemplo,
pelos pais, em face da morte de algum filho, pois aí pode ser usada tabela do IBGE sobre
qual seria a idade provável de vida da vítima. Situação diversa do presente caso, em que o
agravado é a vítim a e está vivo” (AgRg no Ag 1294592/SP, Rei. Ministro Aldir Passarinho
Junior, Quarta Turma, julgado em 23.11.2010, DJe 3.12.2010) 2. Agravo regimental a que
se nega provimento, com aplicação de multa.” STJ. 4 - Turma. AgRg no AREsp n. 126.529/
SP, Rei. Ministro Luis Felipe Salomão, DJe 18 abr.2012.
(30) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1.499.
(31) “ Ação de indenização. Acidente de trabalho. Amputação parcial de membro. Danos
m ateriais, m orais e estético. Redução reconhecida na capacidade laboral. Aspecto
dissociado da eventual não diminuição salarial. Pensionamento devido. I. Diversamente do
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 343

Ocorre a incapacidade parcial permanente quando, após a convales­


cença, consolidadas as lesões, chega-se à conclusão de que a vítima sofreu
perdas parciais definitivas da capacidade de trabalho, conforme apontado
pelo laudo pericial. Sendo a redução parcial, a vítima poderá até ser reabilita­
da para exercer a mesma função ou readaptada para outra função compatí­
vel, naturalmente com menor rendimento e maior esforço.

Num primeiro passo, a medida do percentual de redução da capacidade


laborativa é uma questão técnica que o médico-perito, auxiliar especializado
do juízo, deverá apurar. Habitualmente, o fundamento principal utilizado no
julgamento tem como base as conclusões do perito oficial. Entretanto, o juiz
não está adstrito ao laudo, podendo adotar conclusão diversa devidamente
motivada ou optar pelas conclusões do assistente técnico indicado por uma
das partes ou, ainda, acolher as impugnações apresentadas. Desse modo,
para bem fundamentar a decisão, deve o julgador perquirir quais os critérios
utilizados pelo médico-perito para mensurar o grau ou percentual da incapa­
cidade.
No âmbito da responsabilidade civil não há, no Brasil, tabelas ou quadros
estabelecendo parâmetros oficiais para m ensurar as perdas parciais da
capacidade laborativa, mas essa matéria tem regulamentação detalhada no
campo dos benefícios previdenciários e dos seguros privados. Cabe, portanto,
uma breve notícia acerca da avaliação das perdas parciais da capacidade de
trabalho sob esses dois enfoques, os quais podem ser aplicados por analogia
na reparação civil, fazendo-se os necessários ajustamentos e ponderações.

No seguro acidentário, quando o infortúnio provoca seqüelas que impli­


quem redução da capacidade para o trabalho habitual da vítima, é cabível a
concessão do auxílio-acidente(32). O regulamento da Previdência Social (art.
104 do Decreto n. 3.048/1999) esclarece que o auxílio-acidente, correspon­
dente a 50% do salário de benefício, será concedido aos segurados quando,

benefício pre videnciário , a ind e niza çã o de cunho civil tem por o b jetivo não apenas o
ressarcimento de ordem econômica, mas, igualmente, o de com pensar a vítim a pela lesão
física causada pelo ato ilícito do em pregador, que reduziu a sua capacidade laboral em
caráter definitivo, inclusive pelo natural obstáculo de ensejar a busca por melhores condições
e rem uneração na m esm a em presa ou no m ercado de trabalho. II. Destarte, ainda que
eventualmente prosseguisse a empregada nas mesmas funções — o que sequer é o caso
dos autos — o desem p e n h o do tra b a lh o com m a io r s a c rifíc io em fa ce das seqüelas
p e rm a n en te s há de se r co m p e n sa d o p elo p a g a m e n to de um a p e n sã o re s s a rc itó ria ,
independentemente de ter ou não havido perda financeira concretam ente apurada.” STJ. 4-
Turma. REsp n. 588.649/RS, Rei.: Ministro Aldir Passarinho Júnior, julgado em 02 set. 2004.
(32) Lei n. 8.213, de 24 ju l. 1991. A rt. 86. “O a u xílio -a cid e n te será concedido, com o
indenização, ao segurado quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente
de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o
trabalho que habitualm ente exercia.”
344 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

após a consolidação das lesões decorrentes do acidente, resultar seqüela


definitiva, que implique:

I — redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exerciam;


II — redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exerciam
e exija maior esforço para o desempenho da mesma atividade que
exerciam à época do acidente; ou

III — impossibilidade de desempenho da atividade que exerciam à época


do acidente, porém permita o desempenho de outra, após processo de
reabilitação profissional, nos casos indicados pela perícia módica do
Instituto Nacional do Seguro Social.
O Anexo III do regulamento citado, em extensa tabela composta de nove
quadros, relaciona as lesões que autorizam a concessão do auxílio-acidente(33).
Segundo a doutrina, “a concessão do auxílio-acidente tornou-se hoje a questão
mais controvertida no direito infortunístico brasileiro em face do poder legiferante
das medidas provisórias e da confusão criada entre redução da capacidade
funcional e laborativa e impedimento para o exercício de qualquer atividade.”(34)

No ramo dos seguros privados, a m edição da in capacidade dos


acidentados é feita a partir de uma tabela elaborada pela Superintendência de
Seguros Privados — SUSEP, a qual indica o percentual de invalidez
permanente total ou parcial(35). Como exemplo, a perda total do uso de uma
das mãos caracteriza invalidez parcial de 60%; a perda total da visão de um
olho representa 30%; o encurtamento de um dos membros inferiores acima
de cinco centímetros aponta invalidez de 15%; a perda total do uso de um dos
dedos mínimos ou um dos dedos médios caracteriza invalidez de 12%(36).
Não se deve perder de vista, todavia, que essa tabela enquadra a invalidez
de forma genérica, sem levar em conta a profissão da vítima, diferentemente
da regulamentação do auxílio-acidente do INSS, que considera a capacidade
para o trabalho habitualmente exercido.

(33) Para facilitar a consulta, reproduzimos o inteiro teor da referida tabela como “Anexo V”,
no final deste livro.
(34) MONTEIRO, Antônio Lopes; BERTAGNI, Roberto Fleury de Souza. Acidentes do trabalho
e doenças ocupacionais. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 45. De form a semelhante,
sustenta Hertz Costa que o auxílio-acidente tornou-se um benefício polêm ico e fonte de
infindáveis discussões judiciárias. Cf. Acidentes do trabalho na atualidade. Porto Alegre:
Síntese, 2003. p. 111.
(35) A SUSEP é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da Fazenda, responsável
pelo c o n tro le e fis c a liz a ç ã o dos m e rc a d o s de se g u ro , p re v id ê n c ia p riv a d a a b e rta ,
capitalização e resseguro.
(36) Para facilitar a consulta, reproduzim os o inteiro teor da Tabela da SUSEP, adotada
pela Circular n. 029 de 20 dez. de 1991, como “Anexo VI” , no final deste livro. Vale esclarecer
que a Circular SUSEP n. 302, de 19 de setem bro de 2005, revogou a mencionada Circular
n. 029/1991, mas manteve em vigor a Tabela daquela norma.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 345

Especificamente para o cálculo das indenizações pela cobertura de


invalidez permanente do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados
por veículos autom otores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas
transportadas ou não — DPVAT, a Lei n. 11.941/2009 introduziu uma tabela
dos danos corporais totais ou segmentares, cuja utilização também poderá
ser útil para auxiliar o Perito no arbitramento do grau de invalidez da vítima do
acidente do trabalho(37).
Tende a ganhar maior aceitação no Brasil, pelo amplo detalhamento e
a n á lise das d iv e rs a s v a riá v e is , a C la s s ific a ç ã o In te rn a c io n a l de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, aprovada por 191 países durante a
54- Assembleia Mundial da Organização Mundial de Saúde, realizada em
maio de 2001. Essa classificação substituiu documento anterior de 1976 que
fazia a divisão das situações resultantes das doenças ou acidentes em
deficiência, incapacidade e desvantagem. Inspirado na referida Classificação
Internacional de Funcionalidade e no Guia Baremo de Avaliação das Lesões
Físicas e Psíquicas adotado pela União Européia, foi promulgado em Portugal
o Decreto-Lei n. 352/2007(38), que aprovou duas tabelas para apuração
das incapacidades: 1. Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de
Trabalho e D oenças Profissionais; 2. T abela Nacional para A valiação
de Incapacidades Perm anentes em D ireito Civil.

Sem dúvida, as diversas tabelas podem oferecer subsídios importantes


para o enquadramento da incapacidade parcial, mas a análise da questão
nos dom ínio s da re sp o n sa b ilid a d e civil agrega outros p re ssup osto s
importantes. Diferentemente do benefício acidentário e dos seguros privados,
a indenização por responsabilidade civil busca a reparação total do prejuízo,
dentro do multicitado princípio da restitutio in integrum ou da equivalência
matemática. Os arts. 949 e 950 do Código Civil asseguram claramente que a
indenização abrange: despesas de tratamento, lucros cessantes até o fim da
convalescença, pensão correspondente à importância do trabalho para o qual
a vítima se inabilitou, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver
sofrido, como são os casos dos danos morais, estéticos ou perda de uma
chance.

Cabe ao perito oficial “avaliar em cada caso a repercussão do prejuízo


funcional na execução das operações e atividades implicadas na função”,
bem como “avaliar qualitativa e quantitativamente o dano causado no patrimônio
físico e psíquico — um dos elementos que servem de base para o arbitramento

(37) Para facilitar a consulta, reproduzimos o inteiro teor da Tabela no Anexo VII, no final
deste iivro.
(38) Publicado no Diário da República do dia 23 de outubro de 2007, a partir da p. 7715,
com vigência desde 23 de janeiro de 2008.
346 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

da indenização.”(39) Ainda que o acidentado permaneça no emprego, exercendo


a mesma função, é cabível o deferimento da indenização, porquanto, “mesmo
se o trabalho desempenhado não sofrer, na prática, diminuição na qualidade
e intensidade, o dano precisa ser ressarcido, eis que a limitação para as
atividades humanas é inconteste. Talvez continue no mesmo trabalho, mas é
viável que resulte a impossibilidade para a admissão em outro que propicie
igual padrão de rendimentos.”(40) Nessa mesma linha de raciocínio pontuam
Gustavo Tepedino e colaboradores: “A lesão raras vezes gera uma imediata
redução salarial. A diminuição da capacidade laborativa repercutirá, pouco a
pouco, na estagnação profissional, na perda de oportunidades, na ausência
de promoções e na indiferença do mercado em relação à vítima.”(41)

De qualquer modo, como já mencionado, não está o julgador circunscri­


to às conclusões da perícia. A decisão judicial será proferida a partir do laudo
pericial, mas conjugada com as outras provas dos autos, com a realidade da
vida e todas as demais circunstâncias e singularidades que envolvem a pes­
soa do acidentado. Uma perda, apontada pelo perito, de 50% da capacidade
laborativa não deve ser apreciada como uma questão de simples percentual,
com o rigor inflexível das ciências exatas. Não basta medir a lesão isolada­
mente fora do contexto dos atributos e limitações da pessoa lesada. É neces­
sário visualizar o acidentado, agora portador de deficiência irreversível, na
busca de emprego ou de atividade rentável na sua área de atuação profissio­
nal, na região onde reside, em um mercado de trabalho cada vez mais seletivo
e competitivo.

Uma vez decidido que ocorreu a invalidez permanente parcial e estando


presentes os pressupostos da responsabilidade civil, cabe o deferimento da
reparação dos danos materiais, morais e estéticos, conforme o caso.

O cálculo e as particularidades das indenizações cabíveis nas hipóteses


de invalidez permanente foram abordados no item anterior, ao qual nos

(39) BRANDIMILLER, Primo A. Perícia ju d icia l em acidentes e doenças do trabalho. São


Paulo: Senac, 1996. p. 169 e 200.
(40) RIZZARDO, Arnaldo. R esponsabilidade civil: Lei n. 10.406, de 10.1.2002. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 232. Tam bém nesse sentido decidiu o STJ: “R esponsabilidade civil.
Acidente no trabalho. Direito comum. Redução da capacidade laborativa. Perda de dedos
da m ão esquerda. R etorno às a tivid a d e s p ro fis s io n a is . Irre le vâ n cia . A inda que tenha
retornado o obreiro às mesmas funções, o desempenho do trabalho com maiores sacrifícios
e a dificuldade natural de obter melhores condições no futuro justificam o pagamento de
p e n sã o re s s a rc itó ria , in d e p e n d e n te m e n te de te r h a v id o ou não p e rd a fin a n c e ira
concretamente apurada (REsps ns. 402.833-SP e 588.649-RS).” 4- Turma. REsp n. 536.140/
RS. Rei.: Ministro Barros Monteiro, DJ 17 abr. 2006.
(41) TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin de.
Código Civil interpretado conforme a Constituição da República. Rio de Janeiro: Renovar,
2006. v. II, p. 877.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 347

reportamos para evitar repetições. A diferença, quando ocorre a redução ou


depreciação da capacidade de trabalho, conforme estabelece o art. 950 do
Código Civil, reside no cálculo proporcional do valor da pensão, que deverá
observar o percentual arbitrado a respeito da invalidez permanente parcial.
Assim, se o laudo pericial, acolhido pelo julgador, indicar que o reclamante
teve redução da capacidade de trabalho de 30%, cabe o deferimento de uma
pensão mensal vitalícia também correspondente a 30% da sua remuneração
habitual.

Também na invalidez parcial a indenização abrangerá todas as despe­


sas de tratamento e lucros cessantes até a data da alta médica, quando o
acidentado estará apto a retornar ao trabalho, mesmo com as limitações par­
ciais sofridas. Observa Carlos Roberto Gonçalves que “o pagamento dos
lucros cessantes deve ser feito de modo integral até a obtenção da alta médica,
ou seja, até que a vítima esteja em condições de retornar ao trabalho normal.
Daí por diante, corresponderá a uma porcentagem do salário que deveria rece­
ber normalmente, proporcional à redução de sua capacidade laborativa.”<42)

Depois da cessação do auxílio-doença acidentário, a indenização dos


lucros cessantes passará a ser paga a título de pensão vitalícia, porém com
a redução fixada em razão da parcial incapacidade. Como já anotamos, se
mesmo depois de cessado o afastamento, houver necessidade de prosseguir
no tratam ento, os dispêndios deverão ser igualm ente suportados pelo
causador do dano.
A inovação do Código Civil de 2002, que faculta ao acidentado exigir que
a indenização, incluindo o pensionamento, seja arbitrada e paga de uma só
vez (art. 950, parágrafo único), será abordada separadamente no item 10.6.

Além dos danos materiais, a invalidez permanente parcial também pode


ensejar o deferimento da indenização dos danos morais e danos estéticos,
conforme o caso. No Capítulo 8, itens 4 e 5, aos quais nos reportamos,
abordam os detalhadam ente o cabim ento das reparações dessas duas
modalidades de danos.

10.5. Possibilidade de revisão do pensionamento

O valor fixado para a pensão mensal concedida à própria vítima, nos


casos de invalidez permanente, total ou parcial, derivada do acidente do
trabalho, pode ser revisto ou prevalece a imutabilidade da coisa julgada?

(42) GO NÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 611.
348 S e b a s t iã o G eraldo de O liv e ir a

Esse questionamento tem inspiração no preceito do art. 1.699 do Código


Civil atual, que estabelece: “Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na
situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o
interessado reclam ar ao juiz, conform e as circunstâncias, exoneração,
redução ou majoração do encargo.”

Conforme já analisado no Capítulo 9, item 9.3, o pensionamento derivado


da responsabilidade civil por acidente do trabalho não tem natureza jurídica
de alimentos no sentido adotado pelo Direito de Família. Consequentemente,
não resta espaço para revisão do valor arbitrado, com base no art. 1.699
mencionado, porque a pensão aqui tem natureza reparatória, cujo propósito é
o ressarcimento integral do prejuízo da vítima. Não há vínculo necessário do
montante da pensão com a situação econômica ou financeira do empregador,
nem com as necessidades do acidentado, como indica o art. 1.694, § 1° do
Código Civil.

Com efeito, consideramos equivocada e contrária a todo o entendimento


doutrinário a redação do art. 475-Q, § 3S, introduzido pela Lei n. 11.232, de 22
de dezem bro de 2005, que estabelece: “Se sobrevier m odificação nas
condições econômicas, poderá a parte requerer, conforme as circunstâncias,
redução ou aum ento da pre sta çã o .” Se o C ódigo C ivil determ inou o
ressarcimento integral dos danos incluindo outros prejuízos que o ofendido
prove haver sofrido (art. 949), não faz sentido a revisão do vaior da prestação
de natureza reparatória em razão da mudança das condições econômicas da
vítima ou do réu.

Entendemos que a interpretação do § 3Q retromencionado deverá ser


feita de forma sistemática, em harmonia com o caput do art. 475-Q, cujo
objetivo centra-se na constituição de capital para garantir o pagamento da
pensão. Assim, a “ m odificação econôm ica” deve ser entendida como a
alteração do patrimônio do réu que possa colocar em risco o pagamento da
pensão mensal. Nessa hipótese, a parte deve estar vigilante para pedir o
reforço da garantia com o propósito de assegurar o cumprimento futuro do
pensionamento mensal. Como bem pondera Humberto Theodoro em outra
passagem, “a lei não tem força, no tratar categorias jurídicas, de contrariar a
natureza das coisas. A palavra final não é a do legislador mas a da ciência
jurídica.”(43)

Todavia, é possível veicular o pedido revisional do valor do pensiona­


mento, em ação distinta, mas por outros fundamentos. A pensão mensal como
ressarcimento dos danos, correspondente à importância do trabalho para que

(43) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. 2, p. 158.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 349

o acidentado se inabilitou (art. 950 do Código Civil), foi estabelecida a partir


do estado em que este se encontrava no fim da convalescença, após a con­
solidação das lesões. No entanto, em se tratando de relação jurídica continuati-
va, sobrevindo modificação no estado de fato ou de direito da vítima, qualquer
das partes poderá pedir a revisão do valor fixado na sentença, conforme pre­
visto no CPC(44).
Desse modo, se o acidentado teve a pensão vitalícia deferida em razão
de invalidez permanente parcial, mas com o passar do tempo constata que
sua capacidade residual de trabalho diminuiu ou desapareceu, poderá pedir a
revisão para aumentar o valor arbitrado. Por outro lado, se a vítima foi consi­
derada totalmente inválida, mas obteve êxito na readaptação profissional,
desenvolvendo regularmente atividade remunerada, mesmo na condição de
portador de deficiência, poderá o réu pedir a redução do valor do pensiona­
mento. A recuperação inesperada da vítima (mudança no estado de fato) fez
desaparecer ou reduzir o prejuízo mensal proveniente do antigo acidente do
trabalho(45).
Considerando a importância que pode ter a ação revisional nos acidentes
do trabalho, resolvemos abordar com maior profundidade as diversas variáveis do
tema no Capítulo 12, ao qual nos reportamos.

10.6. Opção do acidentado pelo pagamento integral

O parágrafo único do art. 950 do Código Civil de 2002 introduziu importante


modificação normativa, quando estabeleceu: “O prejudicado, se preferir,
poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.”
Esse dispositivo rompeu longa tradição, que determinava o pagamento
parcelado com o propósito de substituir o rendimento mensal da vítima pela
pensão de valor equivalente, garantindo-se o cumprimento da obrigação
pela constituição de capital, de acordo com o previsto no art. 475-Q do CPC.
Em conferência proferida no ano de 1985, a respeito do Projeto de Lei que resultou
no Código Civil atual, o mestre Aguiar Dias posicionou-se contrário à inovação:

(44) CPC. Art. 471. “Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à
mesma lide, salvo: I — se, tratando-se de relação jurídica de natureza continuativa, sobreveio
modificação no estado de fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do
que foi estatuído na sentença;”
(45) Aliás, no âm bito da P revidência Social, diante dessas possibilidades de alteração,
prevê o art. 71 da Lei n. 8.212/1991: “O Instituto Nacional do Seguro Social — INSS deverá
rever os benefícios, inclusive os concedidos por acidente do trabalho, ainda que concedidos
judicialm ente, para avaliar a persistência, atenuação ou agravam ento da incapacidade
para o trabalho alegada como causa para a sua concessão.” Se for constatada a recuperação
da capacidade para o trabalho, o INSS deverá cessar o benefício, conforme especificado no
art. 49 do Decreto n. 3.048/1999.
350 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir -

“Autoriza-se o prejudicado a exigir a avaliação e o pagamento da reparação


de uma só vez, o que nos parece inconveniente. A orientação atualmente
seguida, no sentido de parcelamento da indenização, atende a interesse
do credor e do devedor e, ainda, a um interesse social, o da prevenção
da dilapidação da reparação global. O Projeto TUNC, de seguro dos
acidentes de trabalho na França, contempla a modalidade do pensiona­
mento, em vez da entrega da quantia integral.”(46)

Com pensamento semelhante, o civilista Rui Stoco demonstra perplexi­


dade diante dessa alteração. Em longo arrazoado aponta, em síntese, as
seguintes objeções: o abalo financeiro ou mesmo a insolvência que pode
sofrer o réu, pelo desembolso de uma só vez de um pensionamento que seria
devido por décadas; a possibilidade de o acidentado inválido dissipar em pouco
tempo o montante da indenização recebida com bens supérfluos ou em ou­
tras despesas aleatórias; o incentivo à transação de um direito de natureza
alimentar, praticamente transformando-o em reparação por danos morais; a
possibilidade de serem deferidas reparações com valores reduzidos, pois
não foi indicado um critério para o juiz “arbitrar” a indenização; há um conflito
entre esse dispositivo e o art. 475-Q do CPC, que trata de garantia do pensi­
onamento mensal(47).

Aliás, Arnaldo Rizzardo defende que a opção pelo pagamento de uma


só vez abrange tão somente as despesas de tratamento e lucros cessantes,
argumentando que se a pensão tem sua causa na inabilitação para o trabalho
ou sua depreciação, importando em pagamento que se vai prolongando no
tempo, não cabe a pretensão de pagam ento im ediato, envolvendo as
prestações futuras. Assevera que as pensões que se protraem no futuro
somente oportunizam a sua postulação na medida em que vencerem, do
contrário, não viria consignada a satisfação por meio de pensão, cujo termo
expressa o valor de uma renda que se paga periodicamente'481.

Apesar das objeções, o Código Civil faculta ao prejudicado, de forma


expressa, a opção de exigir o pagamento da indenização de uma só vez.
Asseveram Menezes Direito e Sérgio Cavalieri que a opção “depende, apenas,
da vontade do prejudicado. A nosso entender, o autor do dano não pode obstar
a opção da vítima, nem o Magistrado pode negá-la. Como está disposto,
somente a vítima pode fazer a opção. E esta pode já estar contida no pedido
inaugural que, igualmente, pode ser alternativo, isto é, a própria vítima pode

(46) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. 1, p. 39.
(47) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1495-1497.
(48) RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: Lei n. 10.406, de 10.1.2002. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 236.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 351

deixar a critério do Juiz decidir o que é melhor. Mas o importante é considerar


que a vontade do lesado é que conta.”(49)

A 1- Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciá­


rios do Conselho da Justiça Federal, no ano 2002, em Brasília, adotou o Enun­
ciado n. 48, com o seguinte teor: “Art. 950, parágrafo único: o parágrafo único
do art. 950 do novo Código Civil institui direito potestativo do lesado para
exigir pagamento da indenização de uma só vez, mediante arbitramento do
valor pelo juiz, atendido o disposto nos arts. 944 e 945 e à possibilidade eco­
nômica do ofensor.” Já por ocasião da IV Jornada de Direito Civil, também
promovida pelo Centro de Estudos Judiciários da Justiça Federal em 2006,
foi adotado o Enunciado n. 381 no mesmo sentido de flexibilizar racionalmen­
te a aplicação do referido dispositivo: “O lesado pode exigir que a indeniza­
ção, sob a forma de pensionamento, seja arbitrada e paga de uma só vez,
salvo impossibilidade econômica do devedor, caso em que o juiz poderá fixar
outra forma de pagamento, atendendo à condição financeira do ofensor e aos
benefícios resultantes do pagamento antecipado.”
Entendemos que a possibilidade de exigir o pagamento de uma só vez
fica restrita aos casos do pensionamento devido à própria vítima, ou seja,
quando ocorre invalidez perm anente total ou parcial. Ao se analisar a
localização topográfica do parágrafo e considerando a técnica de elaboração
legislativa, pode-se perceber que a faculdade só tem aplicação na hipótese
indicada no caputdo art. 950 do Código Civil, não abrangendo o pensionamento
decorrente de óbito do acidentado(50).
Questão tormentosa para o julgador é o estabelecimento de um critério
justo para o arbitramento do valor a ser pago acumuladamente, ponto não
esclarecido no texto legal. O primeiro pensamento a respeito — a nosso ver
equivocado — sugere que o cálculo deveria considerar a expectativa de
sobrevida da vítima, como acontece no caso de morte do acidentado(51).
Assim, se um pedreiro com 25 anos, que recebia remuneração média de
R$1.000,00 por mês, sofreu acidente do trabalho que acarretou invalidez

(49) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 458-459.
(50) Não cabe a e xig ê n c ia do p a g a m e n to único na h ip ó te se de pensão d e vid a aos
dependentes pela morte do acidentado, como previsto no art. 948 do Código Civil. Apenas
para argum entar, se fosse cabível deferir o pagam ento da pensão de uma só vez a cada
um dos dependentes econômicos do acidentado morto, haveria no arbitramento do valor um
cálculo com plexo e impreciso, com diversas variáveis e resultados diferentes, porquanto
cada dependente teria um limite tem poral diferente para auferir o rendimento. Além disso,
haveria o risco de transform ar o pagamento da pensão aos dependentes econômicos em
verba de natureza patrim onial a ser dividida igualmente entre os herdeiros, dependentes
ou não do acidentado.
(51) Ver item 9.7 do Capítulo 9 retro.
352 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liveira

permanente total, temos que a sua expectativa de sobrevida será de mais 48


anos, conforme tabela oficial do IBGE. Consequentemente, a indenização a
ser paga deveria considerar a remuneração de 624 meses, já incluindo o 13£
salário, o que resultaria num valor de R$624.000,00.
Se para a vítima o pagamento de uma só vez significa uma antecipação
de receita, abrangendo todo o período da sua provável sobrevida, para o
empregador representa concentrar as despesas de quase 50 anos num único
desembolso. Para o acidentado, no exemplo acima, o valor atinge uma pequena
fortuna que exige habilidades para ser bem administrada e preservada; por
outro lado, para 90% dos empregadores esse montante poderá dificultar a
continuidade dos negócios ou mesmo determinar o fechamento da empresa.
Além disso, com base ainda no exemplo citado, se a vítima aplicar o
valor da indenização recebida no mercado financeiro, mesmo em investimentos
considerados conservadores, certamente obterá um retorno de pelo menos
0,7% ao mês, o que resultará num rendimento por volta de quatro vezes
superior ao salário mensal até então recebido, o que não deixa de ser um
enriquecimento indevido. Como se percebe, na grande maioria das ações
indenizatórias, o pagamento da pensão de uma só vez poderá trazer muitas
dificuldades e embaraços para o julgador e para as partes.

Entendemos que, em linha de princípio, a opção da vítima pelo pagamento


antecipado não deve gerar para o causador do dano um ônus maior do que
representaria o pagamento feito na forma de pensionamento. É razoável
interpretar a previsão legal “a indenização seja arbitrada e paga de uma só
vez” como um indicativo de que, na fixação do valor indenizatório pelo julgador,
deve ser adotado um critério de justiça do caso concreto (arbitrar), sem
vinculação necessária com os rendimentos acumulados na provável sobrevida
da vítima. Ainda assim, mesmo com toda a ponderação do magistrado, o
arbitramento não deixa de ser, a longo prazo, arriscado para a vítima e, de
imediato, muito oneroso para o empregador.

Também não se pode olvidar que o pagamento único — correspondente


a vários anos de pensão — deve provocar, necessariamente, ajustamentos
no valor a ser arbitrado. Da mesma forma que o pagamento com atraso implica
acréscim os pela mora, a quitação antecipada deve gerar abatim ento
proporcional dos juros, até porque o credor poderá aplicar logo o montante
recebido, auferindo, de imediato, os respectivos rendimentos. Nesse sentido,
aliás, o art. 77 da Lei n. 11.101/2005 estabelece que a decretação da falência
determina o vencimento antecipado das dívidas do devedor, “com o abatimento
proporcional dos juroé'. Também a Lei n. 6.404/1976, que trata das sociedades
por ações, estabelece regras para avaliação dos ativos e passivos no balanço,
quais sejam: os elementos do ativo decorrentes de operações de longo prazo
“serão ajustados a valor presente” (art. 183, VIII); da mesma forma, as
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 353

obrigações, os encargos e os riscos classificados no passivo não circulante


“serão ajustados ao seu valor presente” (art. 184, III).

Com efeito, uma receita de longo prazo fixada em prestações mensais,


quando recebida antecipadamente, deve expurgar os efeitos dos juros futuros
pelo pagamento parcelado, apurando-se o seu “valor presente” para paga­
mento único. É oportuno mencionar que o Conselho Federal de Contabilidade
aprovou a Resolução n. 1.151, de 23 de janeiro de 2009, estabelecendo os
requisitos básicos a serem observados quando da apuração do “Ajuste a
valor presente”(52).
Não se deve perder de vista que a finalidade essencial do pensionamento
é garantir para a vítima o mesmo nível de rendimentos percebidos até então e
não lhe conceder um capital para produzir rendas futuras. Com efeito, se em
poucos anos o acidentado consum ir o valor recebido acum uladam ente,
passará o restante da vida em arrependimento tardio, porém ineficaz.

Entendemos, portanto, que a diretriz para nortear o “arbitramento” do


valor a ser pago de uma só vez, como estabelece o parágrafo único do art.
950, deve ser no sentido de que o montante encontrado proporcione rendi­
mentos semelhantes ao valor do pensionamento mensal, podendo-se utilizar
da técnica contábil de apuração do valor presente para o referido cálculo.
Vejam decisões que já proferimos a respeito:
“Ementa: Acidente de trabalho. Indenização por dano material. Arbitram ento. O
arbitram ento da pensão devida em face de acidente de trabalho deverá observar,
dentre outros fatores, o grau de incapacitação laborativa da vítim a. Por sua vez, a
decisão, acerca da ocorrência da incapacidade total ou parcial, não pode ser tomada
somente pela análise fria e isolada das lesões sofridas pela vítima, mormente diante
da relevância das conseqüências. A avaliação do grau de incapacidade deve ser
feita considerando as especificidades do caso da vítima, tais como: idade, situação do
m ercado de trabalho, rendim ento útil no trabalho, grau de instrução, segurança e
risco na prestação de serviço. Outrossim, se for pago de uma só vez, o pensionamento
não pode corresponder, simplesm ente, ao som atório de todas as parcelas mensais
vincendas, sob pena de gerar enriquecim ento indevido da vítim a e impor ao causador
do dano um ônus maior do que lhe traria o pagamento sob a form a de pensão, em
prestações quitadas mês a mês, sendo razoável interpretar o preceito do parágrafo
único do art. 950 do Código Civil (‘a indenização seja arbitrada e paga de uma só
vez’) com o um indicativo de que, na fixação do valor do quantum indenizatório, o
Julgador deve adotar um critério de justiça do caso concreto (arbitrar), sem vinculação
necessária com o va lo r global dos rendim entos durante a provável sobrevida da
vítim a.” Minas Gerais. TRT 3a Região. 2® Turma. RO n. 0147200-84.2009.5.03.0002,
Rei.: Sebastião Geraldo de Oliveira, DJ 18 ago. 2010.

“Ementa: Valor da indenização — Danos m ateriais — Artigo 950 do Código Civil —


Pagam ento em parcela única — Critério de fixação. A antecipação do pagamento

(52) Disponível em: <http://w w w .norm aslegais.com .br/legislacao/resolucaocfc1151_2009.


htm>. Acesso em: 30 out. 2012.
354 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

em parcela única do valor da pensão mensal vitalícia está prevista no parágrafo único
artigo 950 do Código Civil. É faculdade conferida pelo legislador ao ofendido, quando
expressam ente requerida na petição inicial. Entretanto, a fixação desse valor requer
cuidados especiais, para evitar desequilíbrio da equação financeira. Apurado o valor
da perda mensal de renda, deve ser estipulado um valor que alocado em aplicação
financeira de perfil conservador (e, portanto, seguro), à taxa média de juros de 0,5%
(juros legais e da caderneta de poupança), resulte no mesmo valor da perda mensal
de re n d a do a c id e n ta d o . A s s e n te n ç a s p ro fe rid a s em açã o re c la m a tó ria têm
s im p le sm e n te m u ltip lica d o o núm ero de m eses pelo v a lo r da perda m ensal do
acidentado, para pagamento antecipado, o que resulta em desequilíbrio da equação
financeira, pois deve ser considerado o rendimento mensal do capital antecipado (artigo
950 do Código Civil) e não o valor futuro do somatório das prestações mensais vincendas.
Recurso parcialmente provido, para adequar o valor da parcela de danos materiais, a
ser quitado por antecipação, ao conceito de indenização de capital suficiente para
cobrir a perda de renda do acidentado.” Minas Gerais. TRT 3- Região. 2- Turma. RO n.
00477-2008-152-03-00-1, Rei.: Jales Valadão Cardoso, DJ 10 jun. 2009.

Em face de tais dificuldades, tende a ganhar relevância — e até


demasiada extensão — a faculdade prevista no art. 944, parágrafo único, do
Código Civil, que prevê: “Se houver excessiva desproporção entre a gravidade
da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.”
Por tudo que foi exposto, diante da análise de cada caso, pode o juiz
indeferir a pretensão de pagamento único., com apoio no parágrafo único do
art. 950 do Código Civil, sempre que tiver fundamentos ponderáveis para
dem onstrar a sua inconveniência ou inviabilidade. Em muitas ocasiões,
considerando o valor maior da segurança jurídica e as condições econômicas
do devedor, o mais prudente será deferir o pensionamento na forma tradicional,
com a devida garantia do pagamento mensal na forma prevista no art. 475-Q
do CPC. O Colendo TST vem acolhendo esse entendimento, deixando ao
prudente arbítrio do juiz, conforme as circunstâncias do caso concreto, o
acolhimento ou não do pagamento de uma só vez ou o deferimento do
pensionamento na forma tradicional. Vejam a respeito acórdãos recentes:
“Embargos em recurso de revista — Pensão vitalícia — Pagam ento em parcela
única — art. 950, parágrafo único, do CC — Livre convencim ento do julgador.
Embora o art. 950, parágrafo único, do CC contenha a previsão de que o prejudicado
poderá exigir a satisfação da obrigação de indenizar de uma só vez, esta Corte tem o
entendim ento de que este não impõe ao julgador a sua observância quando assim
não entender, em face do princípio da persuasão racional, a teor do art. 131 do CPC,
de form a que é possibilitada ao magistrado, ante a discricionariedade na fixação da
parcela a ser paga, a estipulação da condenação em parcelas mensais e futuras ou
em parcela única. Embargos conhecidos e desprovidos.” TST. SBDI-I. E-RR n. 121100-
20.2005.5.17.0010, Rei.: Ministro Ives Gandra Martins Filho, DJ 28 set. 2012.

“R ecurso de em b arg o s. In d e n iza ç ã o por dano m aterial. Pensão. Pedido de


p agam ento em p arcela ú nica. P arág rafo ú nico do art. 950 do có dig o civil.
Pagam ento único ou em parcelas mensais. Discricionariedade do juiz. Quanto ao
pedido de pagamento de pensão, nos termos do art. 950 do Código Civil, tem o Juiz
margem razoável de discricionariedade para, analisando as circunstâncias dos autos,
escolher o critério de maior equidade entre as partes, seja decidindo pelo pagamento
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D o e n ç a O c u p a c io n a l 355

em parcela única, seja em parcelas mensais, ainda que tenha pedido expresso para
pagamento em uma única vez, nos term os do parágrafo único do referido dispositivo.
A norma inscrita no parágrafo único do art. 950 do CC deve ser apreciada levando em
consideração o princípio que norteia a fixação de capital, que é gerar a subsistência
da parte lesada, sem que se verifique que a mera exigência de que o prejudicado
pode exigir a indenização de uma só vez importe em dever legal imposto ao julgador,
sem levar em consideração os demais princípios que regem a prestação jurisdicional,
em especial aquele inscrito no art. 131 do CPC. Precedentes desta c. SBDI-1. Recurso
de e m b a rg o s c o n h e c id o e d e s p ro v id o .” T S T . S B D I-I. E -R R n. 2 6 2 0 0 -
09.2007.5.12.0012, Rei.: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, DJ 2 mar. 2012.

“Danos materiais. Acidente do trabalho. Pensão mensal. Opção por pagam ento
em parcela única. Art. 950, parágrafo único, do Código Civil. Conquanto o artigo
950 do Código Civil faculte ao prejudicado a possibilidade de exigir o pagamento, de
uma só vez, da indenização por danos m ateriais decorrentes de ato de que resulte a
impossibilidade do exercício do seu ofício ou a redução da sua capacidade de trabalho,
d a í não re su lta a o b rig a to rie d a d e do d e fe rim e n to , pelo ju iz, do p le ito tal com o
form ulado. Incumbe ao magistrado, no exercício prudente da jurisdição e à luz das
circ u n s tâ n c ia s e vid e n c ia d a s pela pro va dos a utos, d e c id ir so b re a fo rm a m ais
adequada de pagamento da referida indenização, para o que deverá levar em conta
as necessidades da vítim a, a higidez financeira e capacidade econôm ica do réu.
Hipótese em que a decisão judicial, no sentido de acolher parcialm ente a pretensão
obreira, determinando o pagamento da indenização em prestações mensais encontra
am paro no princípio do livre convencim ento m otivado, consagrado no art. 131 do
Código de Processo Civil. Precedentes desta Corte superior. Agravo de instrumento
não provido.” TST. 1- Turma. AIRR n. 37100-59.2007.5.15.0144, Rei.: Ministro Lélio
Bentes Corrêa, DJ 18 maio 2012.

10.7. Indenizações no caso de incapacidade temporária

Cabe nesta etapa verificar os danos passíveis de reparação, nos casos


de acidentes ou doenças ocupacionais que tenham gerado tão somente
incapacidade temporária para o trabalho.
A in ca p a cid a d e te m p o rá ria fica c a ra c te riz a d a quando ocorre o
afastamento do acidentado das suas atividades profissionais, para o devido
tratamento, até a sua recuperação e retorno ao trabalho, sem nenhuma seqüela,
perda ou redução da capacidade laborativa. Com efeito, o período desta
incapacidade corresponde ao lapso tem poral contado desde o dia da
interrupção do trabalho, em decorrência do acidente ou doença ocupacional,
até a data da cessação do benefício acidentário junto ao INSS.

No enfoque dos seguros privados, ocorre a incapacidade temporária


quando fica caracterizada a impossibilidade contínua e ininterrupta de o
segurado exercer a sua profissão ou ocupação, durante o período em que se
encontrar sob tratamento médico(53). Já o seguro acidentário, integrado ao

(53) SUSEP. Circular n. 302, de 19 set. 2005, art. 19, § 1Q.


356 S e b a s t iã o G er aldo de O l iv e ir a

sistema da Previdência Social, concede o benefício do auxílio-doença quando


o segurado ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade
habitual por mais de 15 dias consecutivos(54).

Estabelece o art. 949 do Código Civil: “No caso de lesão ou outra ofensa
à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos
lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo
que o ofendido prove haver sofrido.”

Após o acidente do trabalho ou a manifestação da doença ocupacional,


sobrevêm o período do tratamento que perdura até o fim da convalescença,
ou seja, até a cura ou estabilização da lesão. Nessa etapa a vítima deverá
ser indenizada de todas as despesas necessárias para o tratamento, bem
como dos “lucros cessantes” que, no caso, representam o valor da remune­
ração que a vítima percebia, desde o 16Q dia do afastamento até o dia da
cessação do benefício acidentário, permitindo o retorno normal ao trabalho(55).

Só deve ser com putado no cálculo dos lucros cessantes o valor


equivalente à remuneração do acidentado a partir do 16e dia de afastamento,
visto que o empregador já tem obrigação de continuar pagando normalmente
os salários dos primeiros 15 dias, conforme estabelece a Lei n. 8.213/1991(56).
Se o cálculo for feito desde a data do acidente, haverá duplicidade de
pagamento da quinzena posterior ao acidente, além de ferir o princípio da
razoabilidade insculpido no art. 402 do Código Civil.

Salienta Carlos Roberto Gonçalves que “na hipótese de terem sido


causadas lesões corporais transitórias, que não deixam marcas, serão pagas
pelo agente causador do dano as despesas do tratamento. Incluem-se nelas
as despesas hospitalares, médicas etc. Se exageradas, incluindo tratamento

(54) Lei n. 8.213, de 24 jui. 1991. Art. 59. “O auxílio-doença será devido ao segurado que,
havendo cum prido, quando for o caso, o período de ca rência exigido nesta Lei, fica r
incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze)
dias consecutivos.”
(55) “Deve ser interpretado o período da convalescença como o período necessário à cura.
Basta que haja im possibilidade do exercício da sua atividade normal, assim não apenas a
retenção ao leito hospitalar como, ainda, a perm anência em casa, ou seja, que ‘se veja
privado das vantagens que naturalmente obteria se estivesse em atividade’, como adverte
Clóvis. E as despesas são aquelas decorrentes do tratam ento hospitalar, do tratam ento
ambulatorial, do tratam ento domiciliar, incluída a medicação, a fisioterapia em suas diversas
modalidades, as próteses e órteses, tudo aquilo que for necessário ao tratamento da vítima
até sua com pleta recuperação. O que importa, na nossa avaliação, é a cura, isto é, a
indenização deve cobrir todas as despesas que são exigidas para a cura da vítima, sem
exceção.” Cf. DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio, Comentários
ao novo Código Civil. 2007, v. XIII, p. 454.
(56) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991. Art. 60, § 3a. “Durante os primeiros quinze dias consecutivos
ao do afastam ento da atividade por m otivo de doença, incum birá à em presa pagar ao
segurado empregado o seu salário integral.”
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 357

no estrangeiro, o juiz pode glosá-las. Também devem ser pagos os lucros


cessantes, isto é, aquilo que a vítima deixou de ganhar em virtude do acidente.
São os dias de trabalho perdidos.”(57)
Por outro lado, a importância que a vítima recebe a título de auxílio-doença
acidentário da Previdência Social, a partir do 162 dia do afastamento, não deve
ser deduzida do cálculo dos lucros cessantes. A Constituição da República de
1988 estabelece claramente que o pagamento das parcelas decorrentes do
seguro acidentário não exclui a indenização devida pelo empregador(58). Para
evitar repetições, reportamo-nos ao Capítulo 4, item 4, em que abordamos os
fundamentos pelos quais não se compensam os proventos recebidos do INSS
com a indenização devida em razão da responsabilidade civil do empregador
pelo acidente do trabalho ou situações equiparáveis.
Mesmo nas hipóteses de acidente do trabalho que tenha gerado apenas
incapacidade temporária, pode ser cabível o deferimento da reparação dos
danos morais, quando presentes os pressupostos da responsabilidade civil.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves, a expressão constante do art. 949 do
Código Civil além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido
permite que a vítim a pleiteie, também, reparação por dano moral. E na
seqüência argumenta: “Embora nem sempre a lesão corporal de natureza
leve justifique pedido dessa natureza, há casos em que tal pretensão mostra-
-se pertinente. Se a lesão resultou de uma agressão física, por exemplo, que
provocou uma situação vexatória para a vítima, é possível, conforme as
circunstâncias, pleitear-se a reparação do dano moral causado pela injusta e
injuriosa agressão, que será arbitrada judicialmente, em cada caso.”(59) A
questão dos danos morais nos acidentes do trabalho foi tratada com vagar no
Capítulo 8, item 4, ao qual nos reportamos para evitar repetições.

Pode ainda ocorrer de o acidentado ficar com alguma alteração morfoló-


gica, sem que haja qualquer comprometimento da capacidade laborativa para
a sua profissão, tais como uma cicatriz, um corte na orelha, a perda de uma
falange etc. Nessa hipótese, será cabível o deferimento da reparação pelo
dano estético, conforme mencionamos no Capítulo 8, item 5, ao qual também
nos reportamos.

(57) GO NÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 605.
(58) Constituição da República. Art. 7a, XXVIII: “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo
do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em
dolo ou culpa.” De form a semelhante prevê o art. 121 da Lei n. 8.213/1991: “O pagamento,
p e la P re v id ê n c ia S o c ia l, da s p re s ta ç õ e s p o r a c id e n te do tra b a lh o n ã o e x c lu i a
responsabilidade civil da em presa ou de outrem.” Aliás, a Súmula n. 229 do STF menciona
que “a indenização acidentária não exclui a do direito com um ...”
(59) GO NÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 605.
358 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

10.8. Indenizações no caso de acidente sem afastamento

Os acidentes do trabalho ou as doenças ocupacionais de menor


gravidade, que não geram incapacidade laborativa ou então só acarretam
afastamento por período inferior a 15 dias, não ensejam a indenização a título
de lucros cessantes, uma vez que o acidentado continuará recebendo
normalmente sua remuneração(60).

Mesmo não ocorrendo prejuízo quanto ao salário, pode ter havido


despesas em razão do tratamento até a convalescença, ou seja, até a vítima
recobrar totalmente a saúde, independentemente de estar ou não afastada
do serviço. Essas despesas representam os danos emergentes derivados do
acidente do trabalho (art. 949 do Código Civil) que deverão ser integralmente
ressarcidos, conforme já abordamos nos itens anteriores deste Capítulo. Além
disso, se o acidentado comprovar algum outro prejuízo relacionado com o
acidente, será cabível a indenização correspondente, conforme previsto na
parte final do art. 949 mencionado.

O que anotamos a respeito dos danos morais e estéticos quando o


acidente gera afastamento temporário (item 10.7 acima) também deve ser
aplicado para os casos de acidentes sem afastamento, com os ajustamentos
cabíveis em razão do caso concreto. É oportuno ressalvar, contudo, que o
mero aborrecimento ou simples desconforto sem maiores conseqüências,
causados pelos acidentes de menor gravidade não dão ensejo ao pagamento
de indenização por danos morais. Para hipótese semelhante, por ocasião da
III Jornada de Direito Civil promovida em 2004 pelo Conselho da Justiça
Federal, foi adotado o Enunciado n. 159 com o seguinte teor: “O dano moral,
assim compreendido todo o dano extrapatrimonial, não se caracteriza quando
há mero aborrecimento inerente a prejuízo material.”

(60) Lei n. 8.213, de 24 jul. 1991. Art. 60, § 3e. “Durante os primeiros quinze dias consecutivos
ao do afastam ento da atividade por m otivo de doença, incum birá à em presa pagar ao
segurado empregado o seu salário integral.”
CAPÍTULO 11

PRESCRIÇÃO

11.1. Considerações iniciais

O ordenamento jurídico assegura ao lesado a faculdade de se insurgir


contra a violação do seu direito e propor judicialmente sua pretensão de
ressarcimento dos danos sofridos. Todavia, o exercício desta pretensão
deverá ser feito dentro de determinado prazo fixado em lei, findo o qual ocorrerá
a prescrição(1). Vencido o prazo prescricional, o ressarcimento do dano ficará
ao exclusivo arbítrio ou boa vontade do devedor, que poderá até recusar-se
ao pagamento de qualquer indenização.

A prescrição sintetiza a convivência equilibrada entre dois valores


fundamentais do Direito: o ideal de justiça e a segurança jurídica. Enquanto
flui o prazo prescricional, a supremacia é do valor justiça, pois se assegura
ao prejudicado o exercício da pretensão para a busca da reparação coativa
do dano. Mas se a vítima, por inércia, conformação ou descaso, deixa vencer
o prazo para corrigir a injustiça, a prioridade desloca-se inexoravelmente para
o valor segurança jurídica, ficando sepultadas, sem avaliação de conteúdo,
todas as incertezas que poderiam gerar conflitos, de modo a preservar a paz
social e a estabilidade nas relações.

Prevê o art. 189 do Código Civil: “Violado o direito, nasce para o titular a
pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os
arts. 205 e 206.” Para Humberto Theodoro, consiste a prescrição “na abertura
de uma faculdade que a lei faz ao devedor para poder este, amparado no

(1) Para o clássico Antônio Luis da Câmara Leal, “prescrição é a extinção de uma ação
ajuizável, em virtude da inércia de seu titular durante um certo lapso de tempo, na ausência
de causas preclusivas do seu curso. A í estão, a dar-lhe corpo a individualidade, seus
diversos elementos integrantes: objeto, causa eficiente, fator operante, fator neutralizante e
efeito. Seu objeto: a ação ajuizável; sua causa eficiente: a inércia do titular; seu fator operante:
o tem po; seu fator neutralizante: as causas legais preclusivas de seu curso; seu efeito:
extinguir as ações.” Cf. Da prescrição e da decadência: teoria geral do direito civil. 4. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 1982. p. 12.
360 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

transcurso do tempo, negar-se a cumprir a prestação devida, que só veio a


ser reclamada depois de ultrapassado o prazo.”(2)

11.2. Prazo prescricional: civil ou trabalhista?

Nos últim os anos, in sta u ro u -se fu n d a d a polêm ica d o u trin á ria e


jurisprudencial quanto ao prazo de prescrição aplicável nas indenizações
provenientes dos acidentes sofridos pelo trabalhador, formando-se, então,
duas correntes que disputam a preferência dos operadores jurídicos(3).

Uma corrente defende que, por ser a indenização proveniente de acidente


do trabalho um direito de natureza eminentemente civil, deve prevalecer a
prescrição prevista no art. 206, § 3Q, inc. V, do Código Civil de 2002, ainda
que o julgam ento seja proferido pela Justiça do Trabalho, porquanto o
fundamental para estabelecer a competência é que a pretensão deduzida em
ju ízo esteja vinculada à relação de trabalho, pouco im portando se a
controvérsia de Direito Material deva ser dirimida à luz do Direito Comum.
Argumentam os defensores dessa corrente que o acidente representa uma
ocorrência extraordinária, alheia à expectativa normal do empregado e à
execução regular do contrato de trabalho. Assim, a vítima estará postulando
a reparação dos danos pessoais sofridos e não créditos trabalhistas
propriamente ditos.

Afirma Martinez Dal Col que os prazos prescricionais a serem observa­


dos serão os do Código Civil, visto que “os danos oriundos do acidente do
trabalho não se inserem no conceito de créditos resultantes das relações de
trabalho. Pelo contrário. Trata-se de gravames pessoais sofridos em decor­
rência de fatores que desequilibram o desempenho normal do trabalho e cons­
tituem anomalia em face das relações de trabalho.”(4) Complementa Jorge
Souto Maior, afirmando que “a Constituição especifica o instituto em questão
como indenização e, por óbvio, indenização não é crédito que decorra da
relação de trabalho, não se lhe podendo, também por este motivo, fazer inci­
dir na regra da prescrição trabalhista, prevista na mesma Constituição.”®

(2) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Com entários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. 2, p .159.
(3) A questão tornou-se polêmica a partir da vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004,
quando passou para a Justiça do Trabalho a competência para julgar as ações indenizatórias por
acidente do trabalho ou doenças ocupacionais. Enquanto a competência era da Justiça Comum
dos Estados, aplicava-se, sem controvérsia, o prazo prescricional previsto no Código Civil.
(4) DAL COL, H elder M artinez. A prescrição nas ações indenizatórias por acidente do
trabalho no Código Civil de 2002. Revista R T, São Paulo, v. 93, n. 821, p. 13, 2004.
(5) SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. A prescrição do direito de ação para pleitear indenização
por dano moral e material decorrente de acidente do trabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 70,
n. 5, p. 545, 2006.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r a ba lh o ou D oença O c u p a c io n a l 361

Com posicionamento semelhante, Raimundo Simão de Melo, igualmente,


defende a aplicação dos prazos prescricionais do Código Civil:

“A reparação por danos pessoais (moral, material ou estético) decorren­


tes de acidentes de trabalho constitui para a vítima um direito humano
fundamental de índole constitucional e não mero direito de natureza tra­
balhista ou civil; por não existir norma expressa sobre o prazo de pres­
crição das respectivas pretensões, aplicam-se subsidiariamente os pra­
zos previstos na lei civil: vinte anos para as ofensas ocorridas até
11.1.2003 (CC de 1916, art. 177) e dez anos para as ofensas ocorridas
a partir de 12.1.2003 (CC de 2002, art. 205), independentemente da data
em que tenha sido ajuizada a ação e se na Justiça Comum ou na do
Trabalho.”®

A outra corrente, todavia, assevera que a indenização por acidente do


trabalho é também um direito de natureza trabalhista, diante da previsão contida
no art. 7e, XXVIII, da Constituição da República de 1988(7), devendo-se aplicar,
portanto, a prescrição de cinco ou dois anos prevista no inciso XXIX do mesmo
art. 7Q(8). Esse argumento, sem dúvida, é de fácil acolhida porque a indenização,
na hipótese, não deixa de ser também “um crédito resultante da relação de
trabalho”, mesmo que atípico, e o litígio tem como partes o empregado e o
em pregador. De acordo com a observação de A rnaldo Süssekind, “a
expressão ‘créditos resultantes das relações de trabalho’ foi inserida no texto
com sua significação mais genérica. Corresponde aos direitos do sujeito ativo
das obrigações (o trabalhador), contra o qual corre a prescrição: direito a
prestações de dar, de fazer ou de não fazer, que devem ser satisfeitas pelo
sujeito passivo da obrigação (o empregador ou o tomador de serviços), em
favor de quem flui a prescrição.”(9)

(6) MELO, Raimundo Simão de. Direito am biental do trabalho e a saúde do trabalhador. 3.
ed. São Paulo: LTr, 2008. p. 463. Aliás, no sentido desse posicionamento, por ocasião da 1a
Jornada de Direito M aterial e Processual do Trabalho, realizada em Brasília, em novembro
de 2007, foi aprovado, por maioria, o Enunciado n. 45, com o seguinte teor: “Responsabilidade
civil. Acidente do trabalho. Prescrição. A prescrição da indenização por danos materiais ou
morais resultantes de acidente do trabalho é de 10 anos, nos termos do art. 205, ou de 20
anos, observado o art. 2.028 do Código Civil de 2002.”
(7) Art. 7- “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria
de sua condição so cia l:... XXVIII — seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador,
sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.”
(8) Art. 7a “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social: ... XXIX — ação, quanto a créditos resultantes das relações
de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais,
até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.”
(9) SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. 2. ed. ampl. e atual. Rio de
Janeiro: Renovar, 2001. p. 314. De form a semelhante, assevera Eduardo Fornazari Alencar
362 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Como se verifica, as duas correntes oferecem argumentos ponderáveis,


todavia, entendemos cabível o prazo prescricional aplicável aos créditos de
natureza trabalhista. Considerando, entretanto, a complexidade da questão e
a polêmica instaurada, é recomendável um aprofundam ento maior para
justificar nossa conclusão.

O instituto da responsabilidade civil não se aplica exclusivamente no


âmbito do Direito Civil, uma vez que a ilicitude no sentido amplo, que gera a
obrigação de indenizar, pode ocorrer em qualquer ramo do Direito(10). Assinala
o Prof. Antônio Álvares da Silva que a responsabilidade civil não é um instituto
peculiar do Direito Civil, mas um princípio que informa toda a ciência do Direito,
uma exigência lógica de qualquer ordenamento jurídico(11).

Desse modo, para lo ca liza r a prescrição aplicá vel é necessário


primeiramente identificar a natureza da relação jurídica controvertida e isso
será feito “tendo exclusivamente em vista a norma jurídica que impõe o dever
violado pelo agente.”(12) No mesmo sentido assinala com argúcia Pontes de
Miranda que “o ramo do direito em que nasce a pretensão é o que lhe marca
a prescrição, ou estabelece prazo preclusivo ao direito.”(13)

É certo que diversas indenizações previstas no âmbito do Direito Privado


submetem-se ao prazo prescricional estabelecido no Código Civil. Contudo,
o extraordinário progresso ocorrido no século XX determinou o fortalecimento
de ramos especializados que passaram a exigir regulamentação própria ou
mesmo microssistemas no Direito Privado, com normas peculiares, tendo o
Código Civil como suporte subsidiário. Afirma o Prof. Gustavo Tepedino que
“todos os institutos do direito civil, a rigor, foram perdendo a estrutura abstrata

que “a com preensão da palavra ‘cré d ito s’, no texto constitucional, deve se dar na sua
significação mais ampla e abrangente, como sendo ‘direitos’ ou ‘pretensões’ do trabalhador
em relação ao empregador, sejam eles de cunho patrimonial ou não.” Cf. A prescrição do
dano m oral decorrente de acidente do trabalho. São Paulo: LTr, 2004. p. 87.
(10) “ Ementa: Dano moral — natureza jurídica — prescrição. A questão do dano moral em si
mesma não tem natureza jurídica previamente definida. A moldura de tal natureza jurídica
depende, por acessoriedade, da natureza jurídica da relação principal na qual ocorreu. Assim,
se ocorreu em razão de relação civil, houve um dano moral civil. Se em razão de relação
comercial, houve um dano moral comercial. Se em razão de relação de trabalho, houve um
dano moral trabalhista. Tratando-se de dano moral trabalhista, o crédito pretendido resultaria
de comando obrigacional (por ilícito) trabalhista. Sendo assim, tal crédito subordina-se ao
estatuído pelo inciso XXIX, e alíneas, do art. 7B, da CRFB/88.” São Paulo. TRT 15a Região. 6-
Turma. RO n. 7563/04, Rei. Juiz Luiz Felipe Paim da Luz Bruno Lobo, DJ 19 nov. 2004.
(11) SILVA, Antônio Álvares da. Pequeno tratado da nova com petência trabalhista. São
Paulo: LTr, 2005. p. 234.
(12) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 15.
(13) PONTES DE MIRANDA, Francisco C. Tratado de direito privado. 2. ed. Rio de Janeiro:
Borsoi, 1955. t. VI, p. 101.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 363

e generalizante, em favor de disciplinas legislativas cada vez mais concretas


e específicas.”(14) Pode-se identificar, portanto, um Direito Privado comum ou
geral centrado na amplitude do Código Civil (por muitos até chamado de
Constituição do Direito Privado), mas com plem entado por outros ramos
especializados com regras específicas, tais como: Direito Comercial, Direito
do Trabalho, ou mesmo, em parte, o Direito do Consumidor. O professor
Dallegrave Neto, apoiado em sólida doutrina, sintetiza bem esse movimento:
“A verdade é que o chamado direito privado, que rege as relações jurídicas
travadas entre particulares, tem no direito civil seu núcleo fundamental.
Entretanto, isso não significa que o Direito Civil seja todo o direito priva­
do. Historicamente o direito privado confundiu-se com o Direito Civil,
fato que se modificou com o passar do tempo em face do desenvolvi­
mento da sociedade e o surgimento de necessidades específicas de
determinados segmentos da vida dos homens. Então, surgiram regras
especiais que, sistematizadas, deram origem ao chamado Direito Privado
Especial, incluindo-se, aqui, o Direito Comercial e o Direito do Trabalho.
O Direito Civil passou a ser denominado de Direito (privado) Comum,
encerrando o papel de integração das lacunas existentes nas normas
trabalhistas.”(15)
Se a regulam entação especial tem regra específica a respeito da
prescrição, não cabe adotar o preceito geral do Código Civil cuja aplicação
só deve ocorrer subsidiariam ente. Por essa razão, para decidir qual a
prescrição aplicável é necessário identificar o dever jurídico violado ou a
natureza da relação jurídica de suporte no âmbito da qual ocorreu a lesão do
direito da vítima(16).

Um mesmo trabalhador pode acionar seu em pregador postulando


indenização por danos sofridos tendo por base relações jurídicas diversas,

(14) T E P E D IN O , G ustavo. Tem as de d ire ito civil. 2. ed. Rio de Janeiro: R enovar, 2001.
p. 200.
(15) DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 4.
ed. São Paulo: LTr, 2008. p. 53.
(16) Anota Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena: “Como conceito técnico, a relação jurídica, em
si, não define um parcelamento de interesse, juridicam ente organizado. Sua característica
está em ser neutra, incolor. De seu conteúdo não se extrai uma direção tutelar do ordena­
mento jurídico, mas, apenas, um nexo entre o dever (qualquer que seja) e um direito (não
importa sua natureza), em que se defrontam dois polos (os sujeitos). Em uma só relação
ju ríd ica não se encontram critérios valorativos de preceituação jurídica, senão em seu
agrupamento, através de direitos e deveres que se entrecruzam. Insiste-se: unitariamente
considerada, a relação jurídica é incolor. Somente a reunião, o cruzam ento ou a superpo­
sição de relações ju ríd ica s é que revelarão um princípio organizado de tutela de interes­
ses, uma situação jurídica, um instituto jurídico (conceito que tem tonalidade fosca e, quase
sempre, difusa), uma posição jurídica firm ada segundo um princípio jurídico.” Cf. D ireito
público e direito p rivado: sob o prism a das relações jurídicas. 2. ed. rev. e atual. Belo
Horizonte: Del Rey, 1996. P. 64.
364 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

atraindo, em consequência, a aplicação de regramentos legais diferenciados.


Vejam o caso de um empregado que durante suas férias, por mero acaso,
venha a sofrer acidente de trânsito provocado por veículo do empregador,
mas sem nexo causal com o cumprimento do seu contrato laboral. Nessa
circunstância a reparação dos danos terá como base o Código de Trânsito
conjugado com o Código Civil, aplicando-se a prescrição civil. Numa outra
hipótese, esse mesmo trabalhador pode adquirir um produto fabricado pela
empresa, e ser vítima de um acidente de consumo na sua residência por fato
do produto. A reparação dos danos terá como base as normas do Direito do
Consumidor, aplicando-se a prescrição qüinqüenal prevista no art. 27 do Código
de Defesa do Consumidor(17). Poderá, ainda, aquele empregado sofrer acidente
do trabalho por culpa do empregador, decorrente de violação das normas de
segurança previstas na CLT, hipótese em que a prescrição aplicável será a
trabalhista.

O simples fato de grande parte do detalhamento da indenização estar


disciplinada no Código Civil não atrai a prescrição do Direito Comum porque
no campo especial do Direito do Trabalho há regra específica prevendo o
cabimento da indenização (art. 7-, XXVIII, da CF), bem como estabelecendo
o prazo prescricional (art. 7-, XXIX, da CF). Em decorrência do que estabelece
o art. 8Q da CLT, o Direito Comum será fonte subsidiária, mas somente na
ausência de regra própria trabalhista, ou como enfatiza Mozart Russomano:
“O Direito Comum, nos silêncios do Direito do Trabalho, é considerado sua
fonte subsidiária. Este provém daquele. Tudo quanto este cala, pois, importa
na implícita aceitação do que naquele se diz. O que acontece com o Direito
Comum também acontece com o Direito Judiciário Civil, na forma do que está
inscrito no art. 769, desta Consolidação.”<18)

Em cuidadosa dissertação de mestrado sobre a prescrição do dano moral


decorrente do acidente do trabalho, concluiu Eduardo Fornazari:

“O Constituinte, ao colocar tanto a indenização de acidente do trabalho


devida pelo em pregador (inciso X X VIII) quanto a prescrição das
pretensões relativas aos créditos resultantes das relações de trabalho
(inciso XXIX) dentro do mesmo rol — de direitos do trabalhador — e,
ainda, de forma subsequente o segundo ao primeiro, evidencia, de um
lado, ser um direito do trabalhador, ou seja, trabalhista, a indenização de
reparação civil devida pelo empregador, prevista no inciso XXVIII do art.

(17) Lei n. 8.078, de 11 set. 1990. Art. 27: “Prescreve em 5 (cinco) anos a pretensão à
reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II
deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecim ento do dano e de
sua autoria.”
(18) RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários à CLT. Rio de Janeiro: Forense, 1990. v. 1,
p. 46.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 365

7S, e, de outro, que a prescrição, disposta no inciso XXIX do mesmo


artigo, é abrangente à pretensão daquele direito. (...) A pretensão da
reparação de dano moral defluente de acidente do trabalho a que alude o
inciso XXVIII, do art. 7e, da Constituição, consiste em um direito (crédito
— no sentido lato) do trabalhador resultante da relação de trabalho, de
modo que a prescrição aplicável é a prevista no inciso XXIX do mesmo
preceito constitucional. Não há razão para aplicação supletiva ou
subsidiária do prazo prescricional estabelecido pelo Código Civil (velho
e novo), mormente porque a norma constitucional que prevê a prescrição
trabalhista, ao encerrar um único prazo prescricional para as pretensões
deduzidas perante a Justiça do Trabalho, não permite a invocação de
outros prazos fixados pelo diploma civil.”<19)

É importante citar também parte dos fundamentos do acórdão proferido


no Conflito de Competência n. 7.204/MG, no qual o STF adotou expressamente
o entendimento quanto à natureza trabalhista da indenização decorrente do
acidente do trabalho, fortalecendo significativamente o ponto de vista da
segunda corrente:

“Ora, um acidente de trabalho é fato ínsito à interação trabalhador/em­


pregador. A causa e seu efeito. Porque sem o vínculo trabalhista o infor­
túnio não se configuraria; ou seja, o acidente só é acidente de trabalho
se ocorre no próprio âmago da relação laboral. A possibilitar a deflagra­
ção de efeitos morais e patrimoniais imputáveis à responsabilidade do
empregador, em regra, ora por conduta comissiva, ora por comporta­
mento omissivo. (...) Vale dizer, o direito à indenização em caso de aci­
dente de trabalho, quando o empregador incorrer em dolo ou culpa, vem
enumerado no art. 1- da Lei Maior como autêntico direito trabalhista. E
como todo direito trabalhista, é de ser tutelado pela Justiça especial, até
porque desfrutável às custas do empregador (nos expressos dizeres da
Constituição).”(20)

Como a própria Constituição de 1988 incluiu o direito à indenização


decorrente do acidente do trabalho no rol dos direitos dos trabalhadores,
também a prescrição será aquela indicada para os créditos resultantes da
relação de trabalho. A existência de norma especial expressa afasta a
aplicação da previsão genérica do Direito Comum.

Ademais, se a Suprem a Corte, por unanim idade, entendeu que a


indenização por acidente do trabalho caracteriza-se como um “autêntico direito
trabalhista” , é imperioso concluir que a prescrição aplicável é também a

(19) ALENCAR, Eduardo Fornazari. A prescrição do dano m oral decorrente de acidente do


trabalho. São Paulo: LTr, 2004. p. 106 e 127.
(20) Esse acórdão está transcrito na íntegra no Anexo XII deste livro.
366 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

trabalhista. Nessa linha de entendimento enfatizou Rodrigues Pinto: “Do ponto


de vista lógico sempre nos pareceu agressivo à inteligência imaginar que o
acidente no trabalho pudesse ter natureza diversa da trabalhista,’W

Além de tudo que foi exposto, convém mencionar que há um raciocínio


quase automático que vincula a questão da competência ao prazo da prescri­
ção. Ou seja, os mesmos argumentos que fundamentam a competência da
Justiça do Trabalho acabam por influenciar na decisão a respeito da prescri­
ção aplicável(22).

Na real verdade, a Emenda Constitucional n. 45/2004, ao incluir na


competência da Justiça do Trabalho “as ações de indenização por dano moral
ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho” , também produziu o efeito
de evidenciar a natureza trabalhista das indenizações por acidente do trabalho.
Aliás, por ocasião da V Jornada de Direito Civil, realizada em 2011, adotou-
-se o Enunciado 420, com o seguinte teor: “Art. 206, § 3S, V. Não se aplica o
art. 206, § 3a, V, do Código Civil às pretensões indenizatórias decorrentes de
acidente de trabalho, após a vigência da Emenda Constitucional n. 45, incidindo
a regra do art. 7-, XXIX, da Constituição da República.”

Também a invocação do princípio da norma mais favorável ao trabalhador,


defendida por parte da doutrina, considerando o período prescricional mais
dilatado de vinte anos, previsto no Código Civil anterior, não mais se sustenta,
visto que o Código de 2002 reduziu para três anos o prazo dessa prescrição
(art. 206, § 3S, Inciso V).<23>

Nos diversos julgados do TST, a partir de 2008, pacificou-se o entendi­


mento em favor da prescrição trabalhista do art. 7°, XXIX da Constituição da
República, tanto na Seção de Dissídio Individual I quanto em todas as oito
Turmas da Corte:
“Dano moral. Prescrição. Acidente de trabalho ou equiparado. Evento ocorrido
antes da promulgação da Emenda Constitucional n. 45/2004. Prescrição trabalhista/

(21) RO D RIG U ES PINTO, José Augusto. Prescrição, indenização acidentária e doença


ocupacional. Revista LTr, São Paulo, v. 70, n.1, p. 9, jan. 2006.
(22) Observa o jurista Rodolfo Pamplona Filho: Reconhecida a competência da Justiça do
Trabalho para apreciar e julgar pedido de reparação de dano moral, a prescrição aplicável
a esse crédito deve ser a ordinária trabalhista, atualm ente prevista no art. 7-, XXIX, da
Constituição Federal de 1988. In: O dano m oral na relação de emprego. São Paulo: LTr,
1998. p. 115.
(23) O Projeto de Lei n. 6.476/2009 apresentado pelo Deputado Carlos Bezerra, em tramitação
na Câm ara dos Deputados, propõe novo prazo prescricional: “Art. 1a Prescreve em dez
anos a pretensão de reparação civil decorrente de acidente de trabalho, não se aplicando
à hipótese o inciso V do § 3a do art. 206 da Lei n. 10.426, de 10 de janeiro de 2002, que
‘Institui o Código Civil’. Parágrafo único. O term o inicial do prazo prescricional de que trata
este artigo será contado a partir do exame pericial que com provar a enfermidade ou verificar
a natureza da incapacidade laboral.”
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 367

c iv ilis ta . A pós a p ro m u lg a çã o da E m enda C o n s titu c io n a l n. 4 5 /2 0 0 4 , fix a d a a


competência da Justiça do Trabalho para apreciar e julgar as dem andas que tratam
das indenizações por dano moral e/ou material decorrentes de acidente de trabalho
ou equ iparado , a ju ris p ru d ê n c ia do T rib u n a l S u p e rio r do T ra b a lh o con sa g ro u o
entendimento de que se aplica o prazo prescricional trabalhista (art. 7-, inciso XXIX, da
CF/88), como regra geral, nas demandas que cuidam dessa matéria, e a observância
do prazo prescricional civilista tem lugar em caráter excepcional e extraordinário, quando
a lesão ocorrer em período anterior à promulgação do diploma constitucional reformador
(EC-45/2004), em respeito ao direito adquirido do trabalhador a um prazo prescricional
maior do tem po em que houve o deslocam ento da com petência para a Justiça do
Trabalho apreciar e julgar as demandas que tratam da matéria. Portanto, verificando-se
a razão jurídica do entendimento consolidado desta Corte — prazo prescricional civilista
mais alongado — é esse o prazo de prescrição que deve ser observado, em respeito ao
princípio da segurança jurídica. Na hipótese dos autos, extrai-se da decisão embargada
que o dano ocorreu em 1987, antes, portanto, do deslocamento da competência para a
Justiça Laboral apreciar e julgar as questões dessa natureza, e que esta ação foi
ajuizada em 13.11.2003, tendo sido registrado, ainda, que houve extinção do contrato
de trabalho em 1a.8.96. Aplica-se, portanto, a prescrição vintenária autorizada pela
regra de transição do art. 2.028 do Código Civil de 2002, porque transcorridos mais de
dez anos do fato gerador do dano até a data em vigor do citado código, motivo pelo qual
a pretensão da reclam ante não se encontra fulm inada pela prescrição. Embargos
conhecidos e desprovidos.” TST, SBDI-I, E-ED-RR n. 26400-73.2006.5.17.0121, ReL:
Ministro José Roberto Freire Pimenta, DJ 26 out. 2012.

“Recurso de revista. Indenização por danos morais decorrentes da relação de


emprego. Prescrição aplicável. Ciência da lesão e ação ajuizada após a edição da
EC/45, mas dentro do biênio contado a partir da cessação do contrato. Incidência
da prescrição trabalhista. Com o advento da EC n. 45/2004, ocorreu o deslocam ento
da competência para julgar ação de indenização por dano decorrente da relação de
emprego. Frente a esse contexto, e suas im plicações quanto à lesão geradora do
infortúnio laboral com o ilícito trabalhista, tem -se que o prazo prescricional a ser
a p lica d o , com o regra, nas re p a ra ç õ e s p o r dano m oral d e c o rre n te s de ato do
empregador, é o previsto no art. 7S, XXIX, da Constituição Federal. O Supremo Tribunal
Federal, por razões de política judiciária, adotou como marco tem poral para fixação
da com petência da Justiça do Trabalho a edição da Emenda C onstitucional n. 45/
2004. Nesse sentido, a SBDI-1 desta Corte pacificou o entendimento de que às ações
de in d e niza çã o por dano m oral d e c o rre n te s da re la çã o de em p re g o em que o
reclamante teve ciência da lesão depois da vigência da Emenda Constitucional n. 45/
2004, que ocorreu em 31.12.2004, aplica-se o prazo prescricional previsto no art. 72,
XXIX, da C onstituição Federal. Note-se que, no caso concreto, não transcorreram
dois anos entre a data da extinção do contrato de trabalho e a do ajuizam ento da
reclam ação (abril/2010), tam pouco mais de cinco anos entre a data do ato lesivo
(m aio/2005) e a citada propositura da dem anda. Recurso de revista conhecido e
provido.” TST. 6â Turma. RR n. 157-05.2010.5.20.0013, Rei.: Ministro Augusto César
Leite de Carvalho, DJ 5 out. 2012.

“A gravo de in strum ento em recurso de revista. P rescrição. D anos m orais e


materiais. Acidente do trabalho ocorrido após a entrada em vigor da EC n. 45/04.
Aplicação do art. 7S, XXIX, da CF/88. Encontra-se pacificado o entendimento nesta
Corte de que, ocorrido o infortúnio após o advento da EC n. 45/04, tendo a ação, por
óbvio, sido interposta após a referida Emenda Constitucional, o prazo prescricional a
ser observado é o previsto no art. 7°, XXIX, da CF/88. Precedentes desta Corte. Agravo
de Instrumento não provido.” TST. 4- Turma. AIRR n. 1089-52.2010.5.03.0114, Rei.:
Ministra Maria de Assis Calsing, DJ 5 out. 2012.
368 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

“Recurso de revista. Processo eletrônico — Prescrição. Indenização por danos


morais. Acidente de trabalho ocorrido na vigência da Emenda Constitucional n.
4 5 /2 0 0 4 . Nos te rm o s da ju ris p ru d ê n c ia d e sta C orte, a p re s c riç ã o a p lic á v e l às
pretensões de indenização por danos materiais e morais é definida de acordo com a
data em que ocorreu o acidente de trabalho ou em que o em pregado teve ciência
inequívoca da lesão. Tendo a lesão ocorrido em m om ento posterior à edição da
Emenda Constitucional n, 45, publicada em 8.12.04, o prazo prescricional aplicável é
aquele previsto no art. 7a, XXIX, da Constituição Federal. Recurso de Revista conhecido
e provido.” TST. 8a Turma. RR n. 246-66.2010.5.04.0403, Rei.: Ministro Márcio Eurico
Vitral Amaro, DJ 31 ago. 2012.

11.3. Regras de transição para a prescrição civil

Quando for cabível aplicar o prazo prescricional do Direito Comum, deverá


ser observada a regra de transição prevista no art. 2.028 do Código Civil
atual, conforme o caso, que estabelece: “Serão os da lei anterior os prazos,
quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já
houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.”
Considerando a redução do prazo de vinte anos para três e as regras do
Direito intertemporal, pode-se adotar, didaticamente, a seguinte divisão no
que se refere aos prazos prescricionais nas ações indenizatórias por acidente
do trabalho:
1. Acidentes ocorridos antes de 12 de janeiro de 199324' — Será
observada a prescrição de 20 anos prevista no art. 177 do Código Civil
de 1916, uma vez que na data de vigência do novo Código já haviam
tra n sco rrid o m ais de dez anos do início da contagem do prazo
prescricional (art. 2.028 do Código de 2002).
2. Acidentes ocorridos entre 12 de janeiro de 1993 e 11 de janeiro de
2003 — É certo que será aplicada a prescrição do novo Código Civil (art.
2.028), mas o texto legal não estabelece a regra de contagem. Uma leitura
apressada pode até sugerir que, se na data de vigência do novo Código já
tivessem transcorrido mais de três anos do acidente, a prescrição já estaria
consumada. Essa equivocada conclusão, além de atribuir efeito retroativo
ao novo Código, ainda surpreenderia a vítima, fulminando a pretensão tão
somente pela vigência da nova regra da prescrição(25).

(24) É oportuno m encionar que o atual Código Civil, publicado no dia 11 de janeiro de 2002,
entrou em vigor no dia 12 de janeiro de 2003, em razão do que prevê o seu art. 2.044
combinado com o art. 8-, § 1a, da Lei Complem entar n. 95/1998: “A contagem do prazo para
entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com inclusão da
data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua
consum ação integral.”
(25) “Agravo de instrumento. Acidente do trabalho. Responsabilidade civil. Prescrição. Direito
intertemporal. A partir da vigência do novo Código Civil, o prazo prescricional das ações de
reparação de danos que não houver atingido a metade do tem po previsto no Código Civil
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 369

O entendimento que está prevalecendo na doutrina e jurisprudência


recomenda a aplicação do novo prazo reduzido, porém com sua contagem
tendo início a partir da vigência da lei nova, ou seja, despreza-se o tempo
transcorrido na vigência do Código anterior e contam-se os três anos a partir
de 12 de janeiro de 2003, data da vigência do Código atual. Aliás, nesse sentido
é a previsão da Lei de Introdução ao Código Civil alemão, conforme registra
Campos Batalha: “Se o prazo de prescrição, conforme o Código Civil, é mais
curto que segundo as leis anteriores, computa-se o prazo mais curto a partir
da entrada em vigor do Código Civil. Se, entretanto, o prazo mais longo
determ inado pelas leis anteriores expira mais cedo que o mais curto,
determinado pelo Código Civil, a prescrição se completa com o fim do prazo
mais longo.”(26) Pode-se apontar, ainda, em abono dessa tese, a previsão do
art. 916 da CLT: “Os prazos de prescrição fixados pela presente Consolidação
começarão a correr da data da vigência desta, quando menores do que os
previstos pela legislação anterior.”
A base desse entendimento doutrinário remonta à obra clássica de Paul
Roubier sobre Direito intertemporal, com ampla aceitação no Brasil(27). Com
efeito, durante a 1ê Jornada de D ireito C ivil prom ovida pelo Centro de
Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, realizada em 2002, foi
adotado o Enunciado n. 50, com a seguinte redação: “Art. 2.028: a partir da
vigência do novo Código Civil, o prazo prescricional das ações de reparação
de danos que não houver atingido a metade do tempo previsto no Código Civil
de 1916 fluirá por inteiro, nos termos da nova lei (art. 206).” Pode-se observar
que essa diretriz doutrinária vem sendo acolhida sem resistência pela juris­
prudência:

de 1916 fluirá por inteiro a partir da vigência do novo Código, sob pena de se im por a
retroatividade da lei civil e se perpetrar uma inconstitucionalidade tal a de contrariar o
princípio da isonomia.” Rio Grande do Sul. TJRS. 9- Câm. Cível. Al n. 70010969012, Rei.:
Des. Marilene Bonzanini Bernardi, julgado em 21 fev. 2005.
“R e sp o n sa b ilid a d e c iv il — A c id e n te do tra b a lh o — In d e n iza çã o — D ire ito com um —
Prescrição — Prazo pela nova le i (art. 206, v, § 3-, v c.c. art. 2.028, do código civil de 2002)
— Fluência a pa rtir da data da vigência do novo código — Irretroatividade — Reconhecimento.
A lei nova, sob pena de inconstitucionalidade, não pode retroagir para suprim ir direitos e,
assim, a redução do prazo prescricional conta-se a partir de sua entrada em vigor.” São
Paulo. STACivSP, 2a Câm. Cível, Al n. 830.741-00/8, Rei.: Juiz Felipe Ferreira, julgado em
15 mar. 2004.
(26) BATALHA, Wilson de Souza Campos. Direito intertemporal. Rio de Janeiro: Forense,
1980. p. 246.
(27) A respeito, consultar, dentre outros: 1) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários
ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2003. vol. III, t. 2, p. 296-302; 2) SANTOS,
Antônio Jeová. Direito intertem poral e o novo Código Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2003. p. 103-108; 3) GONÇALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 10. ed. São
Paulo: Saraiva, 2012. p. 656-657.
370 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

“Recurso de revista — Prescrição. Indenização por danos m orais e materiais


decorrentes de acidente de trabalho. Regra de transição do art. 2.028 do Código
Civil de 2002. O TST pacificou o entendimento de que nas ações em que se busca
reparação decorrente de acidente do trabalho ocorrido antes da entrada em vigor da
Emenda Constitucional n. 45/2004, deve ser observada a regra de transição prevista
no art. 2.028 do Código Civil de 2002, segundo a qual, não tendo transcorrido mais da
metade do prazo prescricional de vinte anos, previsto no C ódigo Civil de 1916, o
prazo prescricional a ser considerado é o estabelecido no novo Código Civil, trienal,
tom ando-se como marco inicial a data do início de sua vigência e como prazo final a
data de 11.1.2006. No caso dos autos, a ação foi ajuizada em 4.9.2006, quando já
decorrido o prazo trienal em questão, porquanto o acidente de trabalho ocorrera em
4.7.2002, restando, pois, prescrita a pretensão. R ecurso de R evista conhecido e
provido.” TST. 8ã Turma. RR n. 100400-11.2006.5.17.0132, Rei.: Ministro Márcio Eurico
Vitral Amaro, DJ 5 out. 2012.

“ Prescrição — Indenização por dano moral decorrente de acidente do trabalho —


Infortúnio ocorrido antes da definição da com petência da Justiça do Trabalho —
Aplicação da lei civil — Regra de transição do artigo 2.028 do Código Civil — Prazo
trienal contado a partir da data de vigência no novo Código Civil. I — A SBDI-1 do
T S T tem firm a d o e n te n d im e n to de que a p re s c riç ã o tra b a lh is ta nas a çõ e s de
indenização por danos m orais decorrentes de acidente de trabalho som ente tem
aplicação no caso de infortúnios ocorridos após a definição da com petência da Justiça
do Trabalho no bojo da Em enda C onstitucional n. 45/2004, por ser indiscutível a
natureza trabalhista reconhecida ao evento nesta hipótese. II — Ademais, entende
aquela douta Subseção que, para os infortúnios do trabalho ocorridos antes da referida
definição, aplica-se ou a prescrição vintenária do Código Civil anterior ou a trienal
prevista no art. 206, § 39, V, do Código Civil de 2002, observada a regra de transição
erigida no art. 2.028 do Novo C ódigo Civil, sendo que, para a contagem do prazo
trienal, o marco inicial a ser considerado é a data de entrada em vigor do novo Código,
ou seja, 11.1.2003. Precedentes citados. III — Recurso de revista conhecido e provido.”
T S T .4 ã Turma. RR n. 107640-24.2006.5.02.0373, Rei.: Ministro Antônio José de Barros
Levenhagen, DJ 03 set. 2010.

Para tornar mais claro o entendimento doutrinário, durante a IV Jornada


de Direito Civil realizada em 2006, também promovida pelo Centro de Estu­
dos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, foi aprovado o Enunciado n.
299, com a seguinte redação: “Art. 2.028. Iniciada a contagem de determina­
do prazo sob a égide do Código Civil de 1916, e vindo a lei nova a reduzi-lo,
prevalecerá o prazo antigo, desde que transcorrido mais de metade deste na
data da entrada em vigor do novo Código. O novo prazo será contado a partir
de 11 de janeiro de 2003, desprezando-se o tempo anteriormente decorrido,
salvo quando o não aproveitamento do prazo já decorrido implicar aumento
do prazo prescricional previsto na lei revogada, hipótese em que deve ser
aproveitado o prazo já decorrido durante o domínio da lei antiga, estabelecen-
do-se uma continuidade temporal.”

Assim, a pretensão reparatória quanto aos acidentes do trabalho ocorridos


entre 12 de janeiro de 1993 e 11 de janeiro de 2003 só prescreveu no dia 12
de janeiro de 2006. Diga-se, a propósito, que o STF tem precedente nessa
linha de pensamento: “no caso em que a lei nova reduz o prazo exigido para
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 371

a prescrição, a lei nova não se pode aplicar ao prazo em curso sem se tornar
retroativa. Daí, resulta que o prazo novo, que ela estabelece, correrá somente
a contar de sua entrada em vigor; entretanto, se o prazo fixado pela lei antiga
deveria terminar antes do prazo novo contado a partir da lei nova, mantém-se
a aplicação da lei antiga, havendo aí um caso de sobrevivência tácita desta
lei, porque seria contraditório que uma lei, cujo fim é diminuir a prescrição,
pudesse alongá-la.”(28)

3. Acidentes ocorridos a partir de 12 de janeiro de 2 0 0 3 — A prescri­


ção será de três anos, conforme previsto no art. 206, § 3S, inc. V, do
Código Civil de 2002, vigente a partir dessa data. A existência do prazo
especial de três anos afasta o prazo geral de dez anos, ainda quando se
trate de reparação de danos de natureza pessoal.
Todavia, é necessário registrar que há uma corrente doutrinária enten­
dendo que o prazo prescricional aplicável é o geral de dez anos (art. 205 do
Código Civil), sob o argumento de que não se trata de simples reparação de
danos. Nesse sentido alega Raimundo Simão de Melo, em cuidadoso artigo,
que a indenização buscada decorre da violação de um direito fundamental
inerente à pessoa humana e aos direitos da personalidade, com assento cons­
titucional, acima das categorias de direitos civis ou trabalhistas(29). Corrobo­
rando o entendimento dessa corrente, por ocasião da 1SJornada de Direito
Material e Processual do Trabalho, realizada em Brasília, em novembro de
2007, foi aprovado o Enunciado n. 45, com o seguinte teor: “Responsabili­
dade civil. Acidente do trabalho. Prescrição. A prescrição da indenização
por danos materiais ou morais resultantes de acidente do trabalho é de 10
anos, nos termos do artigo 205, ou de 20 anos, observado o artigo 2.028 do
Código Civil de 2002.”

11.4. Prescrição nas ações ajuizadas antes da EC n. 45/2004

Concluímos no item 11.2 acima pela aplicação da prescrição trabalhista,


mesmo nas pretensões relativas às indenizações decorrentes de acidente
do trabalho ou doença ocupacional. Contudo, surge a questão delicada das
ações que foram ajuizadas antes da vigência da Emenda Constitucional n.
45/2004, muitas delas perante a Justiça Comum, e que foram remetidas à
Justiça do Trabalho em razão da alteração da competência. Se fosse aplicada
automaticamente a prescrição trabalhista, inúmeros processos recebidos da
Justiça Comum seriam abruptamente extintos, mormente nos casos das ações

(28) STF. 1s Turma. RE 51.706, Rei. Ministro Luis Gallotti, julgado em 04 abr. 1963. No
mesmo sentido o RE n. 79.327, julgado em 03 out. 1978.
(29) MELO, Raimundo Simão de. Prescrição nas ações acidentárias. Revista LTr, São Paulo,
v. 70, n. 10, p. 1.171, out. 2006.
372 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

ajuizadas antes de 12 de janeiro de 2003, cujo prazo prescricional pelo Código


Civil de 1916 era de vinte anos.

Preocupado com o tema da prescrição na mudança de competência,


anotou o Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 4- Região, Dr.
Ricardo Gehling:

“Neste aspecto, a violência seria desmedida porque um número inco-


mensurável de lesões perpetradas, cujas pretensões ainda não haviam
sido atingidas pelo manto prescricional, como num passe de mágica
seriam soterradas. O mesmo se faria, com maior insídia, no caso de ser
pronunciada a prescrição qüinqüenal ou bienal em processo iniciado
na Justiça Comum dentro do prazo vintenário então vigente, remetido à
Justiça do Trabalho por força da incompetência absoluta declarada no
curso do feito.”(30)

Também a Juíza do Trabalho do Paraná, Dra. Ilse Marcelina, mostrou-


-se apreensiva com o acolhimento da prescrição trabalhista nos processos
remetidos da Justiça Comum para a Justiça do Trabalho, após a vigência da
Emenda Constitucional n. 45/2004:

“Questão que vem causando perplexidade no julgamento de tais ações


pela Justiça do Trabalho diz respeito à prescrição aplicável, (...) pois,
não raro, após anos de tramitação na Justiça Estadual, o processo,
chegando à Vara do Trabalho, é extinto, com exame do mérito, em razão
da pronúncia da prescrição disciplinada no art. 7°, XXIX, da Constituição
Federal, m uitas vezes apenas arguida pelo in teressa do após o
encaminhamento dos autos pela Justiça Estadual.”(31)

C om partilham os das mesmas inquietações externadas pelos dois


eminentes magistrados. A prescrição para as ações que se encontravam em
tram itação no advento da Emenda Constitucional n. 45/2004 deverá ser
apreciada com a devida ponderação sem se distanciar de um valor muito
caro ao Direito: a segurança jurídica.

Os o p e ra d o re s ju ríd ic o s têm co n h e cim e n to de que até 2004 o


entend im ento predo m inante nos trib u n a is su pe riores indicava que a
competência para julgamento das ações de indenização por acidente do
trabalho era da Justiça Comum. Basta consultar a jurisprudência do STF, do

(30) G E H LIN G , R icardo. A çõ e s so b re a c id e n te do tra b a lh o co n tra o e m p re g a d o r —


competência, coisa julgada e prescrição. Revista LTr, São Paulo, v. 69, n. 12, p. 1.451, dez.
2005.
(31) LORA, Ilse Marcelina Bernardi. A prescrição nas ações de indenização decorrentes de
a c id e n te s do tra b a lh o — o p ro b le m a d a c o m p e tê n c ia . D is p o n ív e l em : < h ttp ://
www.anam atra.org.br>. Acesso em: 10 fev. 2006.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 373

STJ e até do TST daquele período para localizar centenas de acórdãos


afirmando e reafirmando a competência da Justiça Comum, sob o argumento
principal de que a reparação postulada tinha natureza de ilícito civil e não
trabalhista.
Ora, se até 2004 os tribunais superiores julgavam que essa indenização
era um direito de natureza civil e o acidentado, confiando no entendimento da
cúpula do Poder Judiciário, considerava o prazo prescricional mais elastecido
do Código Civil para o ajuizamento da ação perante a Justiça Comum, não
poderia agora ser surpreendido, tão somente pela mudança da competência,
com a extinção quase automática da sua pretensão. Não se encontra presente
o pressuposto básico da prescrição, consagrado no vetusto brocardo jurídico:
dormientibus non succurrit jus. O inesperado dessa decisão, que acolhe a
prescrição aplicável aos créditos trabalhistas nos processos iniciados antes
da Emenda n. 45/2004, contraria frontalmente os valores da estabilidade e
segurança jurídica, deixando o acidentado com a impressão de ter sido
novamente vítima, mas desta vez de uma armadilha jurídica.
Não se pode cogitar de descaso, incúria ou renúncia do acidentado ao
exercício da sua pretensão, como ocorre naquelas hipóteses em que a
prescrição é pronunciada, porquanto sabendo ele que dispunha legalmente
de um prazo de vinte anos, deixou para ajuizar a ação na época que lhe
pareceu mais oportuna. Nesse sentido, cita-se mais uma vez a doutrina
abalizada de llse Marcelina:

“Não se pode atribuir a tais empregados a pecha de negligentes, na


medida em que exercitaram em Juízo tempestivamente sua pretensão.
Puni-los com o mal da prescrição porque acreditaram na interpretação
conferida pelas mais altas cortes de Justiça a dispositivo constitucional
significa subverter os próprios fundamentos da prescrição, que busca
justamente a paz social, o equilíbrio e a harmonia. Proclamar a prescri­
ção trabalhista em ações da espécie, muitas vezes somente arguida
quando o feito, já contestado na Justiça Estadual, é recepcionado na
Justiça laboral, é impingir ao titular do direito, que diligentemente invocou
a prestação jurisdicional em tempo oportuno, castigo indevido. Também
representa a legitimação da esperteza e da chicana, em manifesta afronta
à consciência social que ‘não costuma aceitar que o direito desapareça
apenas pelo passar do tempo e, ao contrário, censura o devedor que se
ampara na prescrição como única justificativa para não pagar o que deve’.
(...) Nos processos encaminhados pela Justiça Estadual à Justiça do
Trabalho, por força da Emenda Constitucional 45 e da decisão do STF
proferida no julgamento do conflito de competência 7.204-1, a prescrição
aplicável é aquela prevista no Código Civil. Sendo um dos fundam en­
tos da prescrição a punição à inércia do credor, não se pode, razoavel­
374 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

mente, atribuir a pecha de negligente ao trabalhador que, confiando no


entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante, no prazo fixado
na lei civil deduziu sua pretensão perante o Juízo então havido compe­
tente.”(32)
Pouco importa o entendimento que hoje prevalece a respeito do assunto,
já que na época em que a ação foi proposta, corretamente ou não, a conclusão
jurídica era diversa. Além disso, convém enfatizar que a prescrição deve ser
considerada de acordo com o pensam ento que prevalecia na data do
ajuizamento, sobretudo porque “a interrupção da prescrição retroagirá à data
da propositura da ação” , conforme dispõe o art. 219, § 1e, do CPC. Se o
julgamento fosse realizado naquela oportunidade, como, por exemplo, no caso
de revelia, adotar-se-ia, com certeza, a prescrição do Código Civil. Foi dentro
dessa perspectiva que o STF adotou a Súmula n. 445, com o teor seguinte:
“A Lei n. 2.437, de 7.03.1955, que reduz prazo prescricional, é aplicável às
prescrições em curso na data de sua vigência (1e. 1.1956), salvo quanto aos
processos então pendentes.”
É certo que tecnicamente a prescrição é um instituto do direito material,
mas sua aplicação só acontece validamente no âmbito do processo, daí a
conexão e com plem entaridade do regram ento do assunto nas normas
processuais. A mudança do texto constitucional — regra processual — teve
o efeito prático de tornar visível a natureza jurídica da indenização por acidente
do trabalho, tanto que o STF a considerou como marco divisório para separar
a com petência relativamente aos feitos em andamento. Como diz, com
elegância, o jurista Rodrigues Pinto, a propósito da Emenda n. 45/2004: “sendo
visceralmente orgânico, o Direito é fundamentalmente sistêmico. Daí resulta
que qualquer alteração de seu todo, por mínima e despretensiosa que seja,
lhe afeta o organismo e o sistema, despertando uma série de dúvidas sobre o
modo e a regularidade de seu funcionamento a partir dela.”(33)
Deve ser considerado, ainda, que as mudanças de competência sempre
recomendam ajustamentos transitórios e algumas concessões à regra gerai
para os processos que já se encontrem em andamento, de modo a não
surpreender as partes. Nesse sentido merece transcrição um trecho da ementa
do acórdão do CC n. 7.204 julgado em 2005 pelo STF em sua composição
plenária:

“A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça comum


estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito. É dizer: as ações

(32) LORA, llse Marcelina Bernardi. A prescrição nas ações de indenização decorrentes de
a c id e n te s do tra b a lh o — o p ro b le m a da c o m p e tê n c ia . D is p o n ív e l em : < h ttp ://
www.anam atra.org.br>. Acesso em: 10 fev. 2006.
(33) PIN TO , José A ug u sto R odrigues. P re scriçã o , in d e niza çã o a c id e n tá ria e doença
ocupacional. Revista LT r, São Paulo, v. 70, n.1, p. 5, 2006.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 375

que tramitam perante a Justiça comum dos Estados, com sentença de


mérito anterior à promulgação da EC n. 45/2004, lá continuam até o
trânsito em julgado e correspondente execução. Quanto àquelas cujo
mérito ainda não foi apreciado, hão de ser remetidas à Justiça do
Trabalho, no estado em que se encontram, com total aproveitamento
dos atos praticados até então. A medida se impõe, em razão das
características que distinguem a Justiça comum estadual e a Justiça do
Trabalho, cujos sistemas recursais, órgãos e instâncias não guardam
exata correlação. O Suprem o T ribunal Federal, guardião-m or da
Constituição Republicana, pode e deve, em prol da segurança jurídica,
atribuir eficácia prospectiva às suas decisões, com a delimitação precisa
dos re s p e c tiv o s e fe ito s, toda vez que p ro c e d e r a re visõ e s de
jurisprudência definidora de competência ex ratione materiae. O escopo
é preservar os jurisdicionados de alterações jurisprudenciais que ocorram
sem mudança formal do Magno Texto.”

O mesmo raciocínio que orientou essa diretriz processual de transição,


mutatis mutandis, tem inteira pertinência no caso da prescrição a ser adotada.
A mensagem da decisão da Suprema Corte de algum modo está dizendo: a
indenização por acidente do trabalho deve ser considerada de natureza civil
até 2004 e trabalhista depois da vigência da Emenda Constitucional n. 45/
2004. Basta mencionar que a Justiça Comum continua aplicando a prescrição
civil para aquelas ações cujo julgamento em primeira instância ocorreu antes
da mudança constitucional e que agora estão sendo apreciadas em grau de
recurso.
Em síntese, por tudo que foi exposto, é im perioso concluir que a
prescrição aplicável nas ações indenizatórias decorrentes de acidente do
trabalho deve ser a do Código Civil para as ações ajuizadas até 2004 e a
trabalhista para aquelas iniciadas posteriormente. Também a jurisprudência
está acolhendo esse entendimento:
“Recursos de em bargos interpostos por am bas as reclam adas regidos pela Lei n.
11.496/2007. A nálise em conjunto. Prescrição. Indenização por danos morais.
Lesão ocorrida antes da prom ulgação da Em enda C onstitucional n. 45/2004.
D epreende-se da decisão recorrida que a lesão acarre ta d o ra do fa le cim e n to do
empregado confunde-se com a data da extinção do contrato de trabalho, ocorrida em
22.5.2000, e a ação foi ajuizada em 21.5.2003. Em princípio, seria aplicável a regra
prescricional prevista no Código Civil de 1916. Todavia, em janeiro de 2003, entrou
em vigor o Novo Código Civil, o qual alterou o prazo prescricional relativo à reparação
de dano. Assim, em consonância com a inteligência do art. 2.028 do Código Civil de
2002, o qual estabeleceu regra de transição, é de três anos o prazo prescricional
relativo à reparação de dano, quando, pela lei anterior, não houver transcorrido mais
da metade do prazo anteriormente estabelecido. Ademais, tem -se que a prescrição
prevista no art. 7-, XXIX, da CF, se aplicada, causaria aos em bargantes o prejuízo que
se quis evitar com a norma de transição. Desse modo, considerando-se que, ao início
da vigência do Código Civil de 2002 (12.1.2003), ainda não havia transcorrido metade
376 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

do lapso tem poral da prescrição vintenária, há de se aplicar ao caso o prazo trienal


previsto no art. 206, § 3S, V, do Novo Código Civil, contado a partir da data na qual
entrou em vigor. Recursos das reclamadas conhecidos e não providos.” TST. SDI-1.
E-RR n. 164640-24.2005.5.02.0047, Rei.: Ministro Augusto César Leite de Carvalho,
DJ 28 set. 2012.

“Recurso de em bargos regido pela Lei n. 11.496/2007. Indenização por danos


decorrentes de acidente do trabalho. Lesão anterior à EC n. 45/2004. Prescrição
aplicável. Tratando-se de pedido de danos morais e materiais decorrentes de acidente
do trabalho, esta Subseção tem jurisprudência reiterada no sentido de que, quando a
lesão for anterior à Emenda Constitucional n. 45/2004, o prazo prescricional aplicável
será o previsto na legislação civil, bem assim que, quando a lesão for posterior à
referida emenda, o prazo prescricional aplicável será o trabalhista, previsto no art. 7-,
XXIX, da CF. No presente caso, o acórdão em bargado registra que o acidente do
trabalho que deu origem à pretensão indenizatória ocorreu em 27.6.1995, antes da
vigência da EC n. 45/2004, sendo aplicável a prescrição civil vintenária prevista no
art. 177 do CC de 1916, de modo que ajuizada a ação em 1a. 10.2001 não há prescrição
a ser declarada. S aliente-se que não há falar em aplicação da regra de transição
contida no art. 2.028 do CC de 2002, uma vez que a ação foi ajuizada antes mesmo da
vig ê n c ia do refe rid o d ip lo m a no rm a tivo , qu a n d o a única p re s c riçã o a p licá ve l à
pretensão era a vintenária prevista no CC de 1916 vigente à época. R ecurso de
embargos conhecido e não provido.” TST. SDI-1. E-RR n. 133400-28.2006.5.04.0402,
Rei.: Ministra Dora Maria da Costa, DJ 31 ago. 2012.

11.5. Prescrição nas ações ajuizadas após a EC n. 45/2004

Em decorrência do posicionamento adotado no item anterior, nas ações


indenizatórias por acidente do trabalho ajuizadas após a vigência da Emenda
Constitucional n. 45/2004, deve-se aplicar a prescrição trabalhista. Mas o
início da contagem do prazo prescricional poderá sofrer alguns ajustes de
transição quando o acidente que dá suporte ao pedido de indenização tiver
ocorrido antes da Emenda Constitucional mencionada.
Com efeito, se o dano indenizável ocorreu até 2004, mas a reclamação
correspondente foi ajuizada após a vigência da EC n. 45, será necessária a
observância de uma regra de transição quanto ao início da fluência do prazo
prescricional, porquanto, em algumas hipóteses, a aplicação automática da
prescrição trabalhista leva à conclusão injusta que vulnera gravemente o valor
da segurança jurídica.

Cita-se, como exemplo, a hipótese de um empregado que sofreu acidente


do trabalho em setembro de 1992, mas só ajuizou a ação indenizatória em
agosto de 2005. Um primeiro e superficial raciocínio poderia concluir que, se
o ajuizamento ocorreu após a Emenda Constitucional n. 45/2004, o prazo da
prescrição é o trabalhista e, sendo assim, a pretensão já estaria fulminada
pela prescrição. Ora, o acidentado que até então dispunha do prazo de vinte
anos para reclamar judicialmente a indenização, ou seja, até setembro de
2012, mesmo após a vigência do Código Civil de 2002 (art. 2.028), seria
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 377

surpreendido com o pronunciamento imediato da prescrição trabalhista. Como


poderemos afastar essa conclusão desarrazoada?

Sempre que ocorre a redução do prazo prescricional, é usual adotar-se


regras transitórias para não surpreender o lesado, como fez o legislador do
novo Código Civil no art. 2.028, acima mencionado. Mas no campo do Direito
do Trabalho há regra legal a respeito que entendemos perfeitamente aplicável
na hipótese em estudo. Trata-se do art. 916 da CLT, cujo enunciado preceitua:
“Os prazos de prescrição fixados pela presente Consolidação começarão a
correr da data da vigência desta, quando menores do que os previstos pela
legislação anterior.”
Fazendo o devido ajustamento no teor desse antigo dispositivo, pode-se
concluir que, se o prazo da prescrição trabalhista, diante do caso concreto,
implicou redução do lapso temporal previsto no Código Civil, para os aciden­
tes ocorridos antes da vigência da Emenda C onstitucional n. 45/2004,
somente deveremos iniciar a contagem da prescrição trabalhista a partir de
1S de janeiro de 2005. Esse marco temporal deve ser considerado porque o
STF, no julgamento do Conflito de Competência n. 7.204, fixou entendimento
de que a mudança da competência ocorreu com a promulgação da Emenda
Constitucional n. 45/2004. Conforme já assinalamos, a mudança do texto
constitucional, mesmo sendo regra de natureza processual, teve o efeito prá­
tico de tornar visível a natureza jurídica da indenização por acidente do traba­
lho e a conseqüente prescrição aplicável. No exemplo acima, a prescrição
trabalhista somente seria pronunciada a partir de 12 de janeiro de 2010 ou de
2007, dependendo da variável se o contrato de trabalho foi ou não extinto
antes do ajuizamento.
Adotando essa linha de raciocínio, ao apreciar a prescrição arguida para
os danos provenientes dos acidentes ou doenças ocupacionais ocorridos
até 31 de dezembro de 2004, será imprescindível apurar tanto a prescrição
civil que seria aplicável quanto a trabalhista. Se restar evidenciado que a
prescrição trabalhista reduziu o lapso temporal da prescrição civil em curso,
então a contagem do prazo daquela prescrição somente terá início a partir da
vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004, ou seja, 1Qde janeiro de 2005.
Essa conclusão, mutatis mutandis, está em sintonia com o Enunciado n. 299
adotado durante a IV Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da
Justiça Federal em 2006, com o seguinte teor:
“Art. 2.028. Iniciada a contagem de determinado prazo sob a égide do Código Civil de
1916, e vindo a lei nova a reduzi-lo, prevalecerá o prazo antigo, desde que transcorrido
mais de metade deste na data da entrada em vigor do novo Código. O novo prazo
será contado a partir de 11 de janeiro de 2003, desprezando-se o tempo anteriormente
decorrido, salvo quando o não aproveitamento do prazo já decorrido implicar aumento
do prazo prescricional previsto na lei revogada, hipótese em que deve ser aproveitado
o p ra zo já d e c o rrid o d u ra n te o d o m ín io da lei a n tig a , e s ta b e le c e n d o -s e um a
continuidade tem poral.”
378 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Conclui-se, portanto, que a regra transitória de contagem de prazo,


prevista no art. 916 da CLT, deverá ser aplicada nas ações indenizatórias por
acidente do trabalho ou doenças ocupacionais sempre que, no caso concreto,
a consumação da prescrição trabalhista ocorrer antes do tempo previsto no
Código Civil. Nessa hipótese excepcional, o prazo da prescrição fluirá por
inteiro a partir de 1Q de janeiro de 2005, data da vigência da Emenda
Constitucional n. 45/2004 e não da data da violação do direito(34).

Convém mencionar, contudo, que o TST passou a adotar o entendimento


de que o prazo prescricional, para as pretensões decorrentes dos acidentes
do trabalho ocorridos antes da vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004,
ainda que a ação tenha sido ajuizada a partir de 2005, é o previsto no Código
Civil e para aqueles ocorridos em datas posteriores, o prazo aplicável é o
trabalhista. Vejam alguns acórdãos:
“Recurso de revista. Prescrição. A cidente de trabalho ocorrido posteriorm ente
à Emenda Constitucional n. 45/2004. Incidência da prescrição trabalhista prevista
no art. 7-, XXIX, da C onstituição Federal. Prescrição das pretensões anteriores
ao prazo de cinco anos contados do ajuizam ento da ação. Até a vigência da
Emenda C onstitucional n. 45, que determ inou a com petência da Justiça do Trabalho
para causa relativa a acidente de trabalho, havia fundada dúvida sobre a justiça
com petente para dirim ir o conflito, se a cível ou a trabalhista. E, em razão dessa
circunstância, pacificou-se o entendim ento nesta Corte de que a data da ocorrência
do fato lesivo é que rege a aplicação da prescrição, de m odo que, ocorrido este
após a vigência da Emenda C onstitucional n. 45 de 8.12.2004, apiica-se a regra do
direito do trabalho. No caso dos autos, o acidente do trabalho ocorreu em 03/06/
2005 e a ação trabalhista foi ajuizada em 10/03/2009, dentro, portanto, do prazo de
cinco anos, não havendo prescrição a ser declarada. Recurso de revista conhecido
e provido.” TST. 6â Turm a. RR n. 25500-42.2009.5.04.0511, Rei.: M inistro Aloysio
C orrêa da Veiga, DJ 5 out. 2012.

“In d en ização por danos m orais. A cid ente do trabalho . D oença profissional.
Prescrição. 1. O rienta-se o entendim ento da colenda SBDI-I no sentido de que a
regra prescricional aplicável à pretensão relativa à indenização por danos morais
decorrente de acidente do trabalho é definida a partir da data em que a parte tem
ciência inequívoca do evento danoso. Ocorrido o acidente ou cientificada a parte da
incapacitação ou redução da sua capacidade laboral em ocasião posterior ao advento
da Emenda Constitucional n. 45/2004, por meio da qual se definiu a competência da

(34) “Ação indenizatória — Acidente do trabalho — Prescrição aplicável. A indenização por


danos materiais e morais decorrentes de acidente de trabalho é um direito de natureza
trabalhista, pela regra do inciso XXVIII do art. 7- da Constituição Federal, razão pela qual a
prescrição aplicável é a prevista no respectivo inciso XXIX. Existindo regras específicas a
regular a matéria, de ordem constitucional e de direito do trabalho, as regras do direito
comum incidem apenas de forma subsidiária, pela regra do parágrafo único do art. 89 da
CLT. Mas cabe considerar a regra específica do art. 916 da CLT, porque a parte não pode
ser surpreendida com as alterações do entendimento jurisprudencial sobre a competência,
m atéria c ontrovertida até o p ronunciam ento do E xcelso Suprem o T ribunal Federal no
Julgamento do CC-7.204-1.” Minas Gerais. TRT 3a Região. 2® Turma. RO n. 00930-2005-
064-03-00-9, Rei.: Des. Jales Valadão Cardoso, DJ 26 jul. 2006.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 379

Justiça do Trabalho para processar e julgar tais demandas, a prescrição incidente é a


prevista no art. 7-, XXIX, da C onstituição da R epública, porquanto indiscutível a
natureza trabalhista reconhecida ao evento. Contrariam ente, verificado o infortúnio
anteriorm ente à entrada em vigor da referida em enda constitucional, prevalece a
prescrição civil, em face da controvérsia que pairava nas Cortes quanto à natureza do
pleito — circunstância que não pode ser tom ada em desfavor da parte. 2. Na presente
hipótese, conforme reconhecido pelo Tribunal Regional, o acidente do trabalho ocorreu
em 10.5.1999 — ou seja, em data anterior à edição da Emenda Constitucional n. 45/
2004. A prescrição incidente, portanto, é a civil, com a regra de transição consagrada
no art. 2.028 do Código Civil de 2002, porquanto não transcorridos mais de dez anos
até a data da entrada em vigor do referido Código. 3. Assim, em face da regra contida
no indigitado dispositivo de lei, forçoso concluir que a prescrição aplicável, no presente
caso, é a trienal, estabelecida no art. 206, § 3S, V, do novel Código Civil, iniciando-se
a contagem a partir da sua entrada em vigor — ou seja, 12.1.2003 — e findando em
12.1.2006. 4. Ajuizada a presente ação em 23.6.2008, encontra-se prescrita a pretensão
relativa à reparação por danos m orais e patrim oniais decorrentes de acidente do
trabalho. 5. Agravo de instrum ento a que se nega provimento.” TST. 1® Turma. AIRR n.
96700-07.2008.5.02.0445, Rei.: Ministro Leiio Bentes Corrêa, DJ 5 out. 2012.

Contudo, com a devida vênia, continuamos a defender nosso ponto de


vista, no sentido de considerar como marco delimitador da regra prescricio­
nal a data da propositura da ação — antes ou depois da EC n. 45/2004 — e
não a data da lesão ou do acidente do trabalho. Todos que propuseram ações
indenizatórias até 2004 estavam convictos, na época, que se tratava de uma
pretensão de natureza civil, mas os que ajuizaram reclamações a partir da
Emenda Constitucional n. 45/2004 já estavam cientificados que a pretensão
era de natureza trabalhista, mormente após o beneplácito da Corte Maior. O
art. 291, § 1Q, do CPC estabelece que a interrupção da prescrição retroagirá
á data da propositura da ação, ou seja, devemos considerar a prescrição
aplicável naquela data. Ora, se a ação foi proposta após a EC n. 45, a preten­
são, mesmo para os acidentes ocorridos em anos anteriores, já passou a
ostentar claramente a natureza trabalhista, o que atrai por consequência a
prescrição trabalhista. O acórdão do CC n. 7.204-1 do STF, em sua compo­
sição plenária, esclareceu no item 4 da ementa:
“A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça Comum Estadual,
desde que pendentes de julgam ento de mérito. É dizer: as ações que tramitam perante
a Justiça Comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à prom ulgação da EC
45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente execução. Quanto
àquelas cujo m érito ainda não foi apreciado, hão de ser rem etidas à Ju stiça do
T ra balho, no estado em que se e ncontram , com total a p ro ve ita m e n to dos atos
praticados até então. A medida se impõe, em razão das características que distinguem
a Justiça Comum Estadual e a Justiça do Trabalho, cujos sistemas recursais, órgãos
e instâncias não guardam exata correlação.”

Se o acidentado, por exemplo, ajuizou ação em 2005 para reclamar di­


reitos decorrentes de acidente ocorrido em maio de 2004, o prazo prescricio­
nal a ser considerado será o trabalhista de dois ou cinco anos e não o prazo
trienal do Código Civil. Com efeito, na data do ajuizamento o STF já havia
380 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

esclarecido que a indenização por acidente do trabalho tem natureza jurídica


trabalhista e não civil; mas, por razões de “política judiciária” e “em prol da
segurança jurídica”, limitou a competência da Justiça Comum para as ações
que já tivessem sentença de mérito proferida até dezembro/2004. Como se
vê, o marco escolhido pelo STF para implementar a alteração da competên­
cia não considerou a data da lesão, visto que separou os períodos conside­
rando a vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004. Em outras palavras,
para garantir a segurança jurídica e uma transição da competência sem mai­
ores sobressaltos, a Suprema Corte implicitamente asseverou que a indeni­
zação por acidente do trabalho deve ser considerada de natureza civil para
as ações ajuizadas até 2004 e trabalhista para as ações propostas depois da
vigência da EC n. 45/2004. É imperioso concluir, portanto, que o marco tem­
poral adotado pelo STF para delimitar a competência material da Justiça do
Trabalho também repercute na identificação da norma de regência a respeito
da prescrição aplicável.

Cabe registrar, por fim, que o critério mais direto adotado pelo TST, fixando
a regra de regência da prescrição de acordo com a data da ocorrência do fato
lesivo — se antes ou depois da Emenda Constitucional n. 45/2004 — ,
soluciona bem a grande maioria das controvérsias a respeito da prescrição
e, com o passar do tempo, essa questão tende a ficar superada pela aplicação
exclusiva da prescrição trabalhista.

11.6. Início da fluência do prazo prescricional

Cabe focalizar, neste passo, a questão tormentosa da contagem do prazo


da prescrição, especialm ente no caso das pretensões decorrentes das
doenças ocupacionais, que são legalmente equiparadas ao acidente do
trabalho.
Diz o art. 189 do Código Civil que, violado o direito, nasce para o titular
a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição. Leciona o mestre Humberto
Theodoro que, “no caso da prescrição, o termo a quo é aquele em que nas­
ce a pretensão e o final é aquele em que se completa o lapso temporal
assinalado pela lei para o exercício da ação destinada a fazer atuar em
juízo a pretensão.”(35)

Se o empregado foi acometido de incapacidade decorrente de doença


do trabalho ou profissional e preenche os pressupostos para o deferimento
das indenizações cabíveis, surge a indagação: a partir de que momento
poderemos dizer que ocorreu o termo a quo do prazo prescricional?

(35) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. III, t. 2, p. 175.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 381

A pergunta realm ente é em baraçosa porque o adoecim ento é um


processo gradual (período de latência) que pode levar vários anos até atingir
o grau irreversível de incapacitação total ou parcial para o trabalho.
Normalmente, no início da enfermidade, o tratamento começa com simples
acom panham ento médico, sem interrupção do trabalho; depois, com o
agravamento dos sintomas e sinais clínicos, surgem afastamentos temporários,
às vezes intercalados com altas e retornos ao trabalho; em seguida, ocorre
afastamento mais prolongado, com o pagamento de auxílio-doença pela
Previdência Social; finalmente, após a consolidação dos efeitos da doença
ou do acidente, constata-se a invalidez total ou parcial para o trabalho.
Ao longo desse percurso, a vítima pode ter se submetido a inúmeras
consultas médicas, perícias, tratam entos diversos ou até intervenções
cirúrgicas, sempre alimentando a esperança de recuperação da saúde e da
capacidade laborativa. A partir de que momento, portanto, ocorreu a violação
do direito e a pretensão reparatória (actio nata) tornou-se exercitável?

A absorção pelo Direito positivo brasileiro da teoria da actio nata, conforme


o texto do art. 189 do Código Civil de 2002 ( Violado o direito, nasce para o
titulara pretensão...), foi a consagração do entendimento doutrinário de que a
fluência do prazo prescricional só tem início quando a vítima fica ciente do
dano e pode aquilatar sua real extensão, ou seja, quando pode veicular com
segurança sua pretensão reparatória(36).

O próprio Código Civil atual estipula no art. 200 que, no caso de fato que
deva ser apurado no juízo crim inal, não correrá a prescrição antes da
respectiva sentença definitiva. Para as indenizações oriundas de seguro de
vida em grupo ou acidentes pessoais (art. 206, II, b), a prescrição só começa
a correr quando o segurado tem ciência do fato gerador da pretensão(37).

(36) O Código Civil italiano tem dispositivo expresso nesse sentido: “Art. 2.935: La prescrizione
com incia a decorrere dai giorno in cui il diritto può essere fatto valere.”
(37) “Seguro de vida em grupo e acidentes pessoais. Prescrição ânua. Termo inicial. Surdez
bilateral. Síndrom e neuropsíquica. M ales da coluna. A prescrição da ação indenizatória
somente flui a partir da data em que o segurado tom a conhecim ento inequívoco acerca da
existência da incapacidade permanente, através de laudo médico elaborado para esse fim,
indicando causa, natureza e extensão, não se considerando suficiente te r ele realizado
consultas, tratam entos ou recebido diagnósticos. R ecurso especial conhecido e provido
parcialm ente para afastar a prescrição com respeito à síndrome neuropsíquica e aos males
da coluna.” STJ. 4- Turma. REsp n. 166.316/SP, Rei.: Ministro Barros Monteiro, D J 14 fev.
2005.
“Seguro de vida em grupo e acidentes pessoais. Prescrição ânua. Termo inicial do prazo.
S egundo a jurisprudência do STJ, o dies a quo do lapso prescricional não é a data do
s in is tro , m as a q u e la em que o s e g u ra d o te ve c iê n c ia in e q u ív o c a da in c a p a c id a d e
perm anente que o acom etera e de sua extensão. Recurso especial conhecido e provido
parcialm ente.” STJ. 4- Turma. REsp n. 156.661/SP, Rei.: Ministro Barros Monteiro, DJ 21
ago. 2000.
382 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Na linha desse raciocínio, cabe transcrever o ensinamento doutrinário


de Câmara Leal, em obra clássica sobre o tema da prescrição:

“Não nos parece racional admitir-se que a prescrição comece a correr


sem que o titular do direito violado tenha ciência da violação. Se a pres­
crição é um castigo à negligência do titular — cum contra desides homi-
nes, et sui juris contentors, odiosae excepciones oppositae sunt — , não
se compreende a prescrição sem a negligência, e esta, certamente, não se
dá quando a inércia do titular decorre da ignorância da violação. Nosso
Código Civil, a respeito de diversas ações, determina expressamente o
conhecimento do fato, de que se origina a ação, pelo titular, como ponto
inicial da prescrição. Exercitar a ação, ignorando a violação que lhe dá
origem é racionalmente impossível, e antijurídico seria responsabilizar o
titular por uma inércia que não lhe pode ser imputada — ad impossibilia
remo tenetur. ’<38)

Também o Código de Defesa do Consumidor tem regras coerentes com


o princípio da actio nata:
“Art. 26, § 32. Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento
em que ficar evidenciado o defeito.”

“Art. 27. Prescreve em 5 (cinco) anos a pretensão à reparação pelos danos causados
por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a
contagem do prazo a partir do conhecim ento do dano e de sua autoria.”

A aplicação analógica do art. 27 supra tem indiscutível pertinência porque


os danos causados por fato do produto ou do serviço (acidente ou doença),
em m uitas ocasiões, guardam bastante sim ilitu d e com os preju ízo s
decorrentes das doenças ocupacionais. Pode ser que o consumidor faça
uso de determ inado produto de higiene pessoal ou m esmo de algum
medicamento que lhe venha provocar danos à saúde, caracterizando o que a
doutrina consumerista denomina “acidente de consumo”. Só depois que esse
consumidor toma conhecimento de que é portador de determinada doença e,
ainda, que identifica qual foi o fornecedor, é que começará a fluir o prazo
prescricional quanto à pretensão reparatória dos danos. Vale citar a respeito
doutrina abalizada da área do Direito do Consumidor:

“Antônio Herman V. Benjamin ensina que o conhecimento do dano rela­


ciona-se efetivamente com a percepção do consumidor de que foi vítima
de um acidente de consumo. O dano experimentado pelo consumidor
não se confunde com o conhecimento do evento lesivo pelo mesmo con­
sumidor. O autor supracitado esclarece a questão jurídica com um caso
hipotético de um consumidor ter sido contaminado radioativamente em

(38) LEAL, Antônio Luis da Câmara. Da prescrição e da decadência: teoria geral do direito
civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1982. p. 23-24.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 383

virtude de ingestão de alimentos. Ato contínuo, o consumidor verifica


perda de cabelo, mas, diante da falta de informação, atribuiu o fato à
calvície. Nesse caso, o consumidor identificou apenas os efeitos do dano,
desconhecendo o fato de ter sido vítima de um acidente de consumo.

O Código de Defesa do Consumidor abandona o paradigma do instante


da ocorrência do evento danoso. Acolhe-se como um dos requisitos para
o marco inicial do curso da prescrição o momento do conhecimento do
dano, não pelo fornecedor ou agente público, mas pelo consumidor que
efetivamente experimentou prejuízos.
O segundo requisito cumulativo do início do prazo prescricional nas
relações de consumo é quanto ao conhecimento da autoria do dano.
Não é suficiente a ciência do evento danoso para operar-se a prescrição.
Necessariam ente deve-se conhecer o fornecedor que provocou o
acidente de consumo.”(39)

Até mesmo a interpretação da contagem do prazo prescricional nas ações


indenizatórias por danos pessoais ajuizadas em face do Poder Público vem
sendo adaptada ao princípio norteador da actio nata. Vejam que o Decreto n.
20.910/1932, que regula a prescrição aplicável na hipótese, estabelece
claramente no art. 12: “As dívidas passivas da União, dos Estados e dos
Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda
federal, estadual ou municipal, seja de que natureza for, prescrevem em 5
anos, contados da data do ato ou fato do qual se originaram.” No entanto, a
jurisprudência do Colendo STJ, evitando a mera interpretação literal desse
dispositivo, considera que ocorreu “a data do ato ou fato” somente quando a
vítima tem ciência do dano e sua extensão:
“Adm inistrativo. Recurso Especial. Indenização. Danos morais. Responsabilidade
do Estado. Prescrição. Term o a quo. Data da efetiva constatação da lesividade e
não do evento danoso. Decreto n. 20.910/32. O termo a quo para auferir o lapso
prescricional para ajuizamento de ação de indenização contra o Estado não é a data
do acidente, mas aquela em que a vftim a teve ciência inequívoca de sua invalidez e
da extensão da incapacidade de que restou acom etida. C o n siderando-se que a
administração emitiu laudo definitivo caracterizando a extensão do dano em data de
9.7.96 e que a ação foi proposta em 10.2.99, não se encontra consum ado o lapso
prescricional previsto no art. 1s do Decreto n. 20.910/32.” STJ. 1B Turma. REsp n.
673.576/RJ, Rei.: Ministro José Delgado, DJ 21 mar. 2005.

“Processo Civil e Administrativo — Responsabilidade civil do Estado — Prescrição:


Decreto n. 20.910/32 — Term o a quo. 1. O art. 1e do Decreto n. 20.910/32 determina
como term o inicial da prescrição qüinqüenal a data do ato ou fato que deu origem à
ação de indenização. 2. Entende-se como fato aquele que é capaz de gerar o direito
de indenização. 3. Um acidente, por si só, não gera lesão. A lesão surge depois de

(39) SANTANA, Héctor Valverde. Prescrição e decadência nas relações de consumo. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 100.
384 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

avaliadas as conseqüências do acidente. 4. Termo a quo da prescrição a partir da data


em que ficou constatada a lesão provocada por disparo de arma de fogo por policial
militar. Inteligência do art. 1a do Decreto aludido. 5. Recurso especial não conhecido.”
STJ. 2a Turma. REsp n. 68,181/SP, Rei.: Ministra Eliana Calmon, DJ 28 ago. 2000.

“Adm inistrativo. Responsabilidade civil do Estado (art. 37, § 6a, CF). Contaminação
pelo vírus HIV. Hospital público (transfusão sanguínea). Prescrição qüinqüenal
inocorrente. Dec. Federal 20.910/1932 (Art. 1s). 1. O fato vértice para a contagem
do prazo qüinqüenal (art. 1a, Dec. Federal n. 20.910/1932), no caso, finca-se na data do
conhecim ento do resultado revelado pelo exame técnico laboratorial e não de causa
externa anterior, desconhecida pelo destinatário da transfusão de sangue (HIV). Em
contrário pensar, seria a revolta do direito contra a realidade dos fatos, homenageando-
se co m p re e nsã o iló g ica de p ré vio co n h e c im e n to pelo d e s tin a tá rio e vo lu n tá ria
aceitação de transfusão fatal com sangue contaminado. 2. Recurso improvido.” STJ.
1a Turma. REsp n. 140.158/SC, Rei.: Ministro Milton Luiz Pereira, DJ 17 nov. 1997.

Igualmente, a Lei n. 8.213/1991, que disciplina o seguro de acidente do


trabalho, tem disposição expressa a respeito da contagem do prazo
prescricional e também pode ser aplicada analogicamente nas ações de
reparação dos danos acidentários ajuizadas em face do empregador:
“Art. 104. As ações referentes à prestação por acidente do trabalho prescrevem em 5
(cinco) anos, observado o disposto no art. 103 desta Lei, contados da data:

I — do acidente, quando dele resultar a morte ou a incapacidade temporária, verificada


esta em perícia médica a cargo da Previdência Social; ou

II — em que for reconhecida pela Previdência Social, a incapacidade perm anente ou


o agravam ento das seqüelas do acidente.”

Como se verifica, há muito a questão suscita controvérsias, mas já conta


com posicionamento sedimentado nos tribunais superiores. O STF, em 1963,
adotou a Súmula n. 230, que prevê: “A prescrição da ação de acidente do
trabalho conta-se do exame pericial que comprovar a enfermidade ou verificar
a natureza da incapacidade” .
Em 2003, o STJ editou a Súmula n. 278, consolidando o entendimento
de que “o termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a
data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral.”
Esse posicionamento é de grande importância porque diversas patologias
decorrentes de exposição aos agentes nocivos do ambiente de trabalho só
se m anifestam m uitos anos depois, com o é o caso da asbe sto se (40).

(40) “A cidente no trabalho. Prescrição. Termo inicial. Asbestose. Amianto. O term o inicial da
prescrição da pretensão indenizatória não flui da data do desligamento da empresa, mas
de quando o operário teve conhecim ento da sua incapacidade, origem, natureza e extensão,
que no caso corresponde à data do laudo. O fato do decurso de 34 anos da despedida do
empregado impressiona, mas deve ser examinado em conjunto com as características da
doença provocada pelo contato com o amianto (asbestose), que pode levar muitos anos
para se manifestar. Recurso conhecido e provido.” STJ. 4 a Turma. REsp n. 291.157/SP,
Rei.: Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Ac. de 1s mar. 2001, DJ 3 set. 2001.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 385

Corroborando esse entendimento, por ocasião da 1- Jornada de Direito


Material e Processual do Trabalho, realizada em Brasília em novembro de
2007, foi aprovado o Enunciado n. 46, com o seguinte teor: “Acidente do
trabalho. Prescrição. Termo inicial. O termo inicial do prazo prescricional
da indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho é a data em
que o trabalhador teve ciência inequívoca da incapacidade laboral ou do
resultado gravoso para a saúde física e/ou mental.”
Importa observar que a Súmula do STJ menciona corretamente “ciência
inequívoca da incapacidade” e não ciência da doença; a reparação será
avaliada não pela doença ou acidente em si, mas a partir dos efeitos danosos
ou incapacidade total ou parcial da vítima. Vejam a respeito a lição de Caio
Mário: “No caso de ocorrerem danos continuados, porém subordinados a
uma causa única, o prazo prescricional inicia-se quando se com pletar a
lesão. Ao revés, em se tratando de fatos danosos autônomos, a pretensão
o b je tiv a -s e em re la çã o a ca d a um d e le s e, c o n s e q u e n te m e n te , a
prescrição.”(41)
Se o reclam ante estiver afastado do serviço percebendo benefício
previdenciário ou aposentadoria por invalidez, o prazo prescricional, contado
a partir da ciência inequívoca da incapacidade, será de cinco anos porque o
contrato de trabalho, nessa hipótese, fica apenas suspenso (Súmula n. 160
do TST). A propósito, o Colendo TST, em 2010, firmou entendimento no sentido
de que ocorre a fluência regular do prazo prescricional no período em que o
em pregado estiver afastado pela Previdência Social, percebendo auxílio-
-doença ou aposentadoria por invalidez, salvo se ele estiver acometido de
enfermidade que inviabilize totalmente o seu acesso ao Judiciário(42).
Por tudo que foi exposto, pode-se concluir que o termo a quo da contagem
do prazo prescricional nas doenças ocupacionais não está vinculado à data
da extinção do contrato de trabalho, ou do aparecimento da doença ou do
diagnóstico, ou mesmo do afastam ento. É incabível exigir da vítim a o
ajuizamento precoce da ação quando ainda persistem questionamentos sobre
a doença, sua extensão e grau de comprometimento, a possibilidade de
recuperação ou mesmo de agravamento, dentre outros. A lesão no sentido
jurídico só fica mesmo caracterizada quando o empregado toma conhecimento,
sem margem a dúvidas, da consolidação da doença e da estabilização dos
seus efeitos na capacidade laborativa ou, como diz a Súmula n. 278 do STJ,

(41) PEREIRA, Caio Mário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. 8® t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 340.
(42) TST. OJ n. 375 da SBDI-I. “Auxílio-doença. Aposentadoria p o r invalidez. Suspensão do
contrato de trabalho. Prescrição. Contagem. A suspensão do contrato de trabalho, em virtude da
percepção do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, não impede a fluência da
prescrição qüinqüenal, ressalvada a hipótese de absoluta impossibilidade de acesso ao Judiciário.”
386 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

quando ele tem “ciência inequívoca da incapacidade laboral.” Vejam a respeito


o posicionamento dos tribunais:
“Recurso de revista. Prescrição. Marco inicial. Indenização por danos m orais e
m ateriais decorrentes de acidente do trabalho. A posentadoria por invalidez. 1.
As pretensões relacionadas com as seqüelas decorrentes de doença ocupacional
— por lei e q u ip a ra d a a a cid e n te do tra b a lh o — têm seu dies a quo, para fins
prescricionais, coincidente com a data da ciência inequívoca da incapacidade para
o trabalho. 2. Por se tratarem as seqüelas decorrentes de doença profissional de um
processo gradual, com possibilidade de recuperação ou de agravam ento, não se
p ode c o n s id e ra r a d a ta da e m is s ã o da C A T (a fa s ta m e n to do tra b a lh o ) com o
inequívoca ciência do em pregado de sua incapacidade. 3. C onstatando-se que a
reclam ante fundam entou o pedido de indenização por danos morais e materiais em
decorrência não som ente da doença ocupacional que adquiriu, mas, sobretudo, de
sua subsequente incapacidade para o trabalho, dificu lta nd o a sua reinserção no
m ercado laboral, tem -se que a ciência inequívoca da lesão ocorreu em 7.9.2005,
data em que foi concedida sua aposentadoria por invalidez. 4. Ajuizada a presente
ação em 27.1.2 0 0 6 , não há p re scriçã o a ser de cla ra d a . 5. R ecurso de revista
conhecido e provido.” TST. 1a Turm a. RR n. 27800-28.2006.5.05.0034, Rei.: Ministro
Lélio Bentes Corrêa, DJ 5 out. 2012.

“Recurso de revista. A cidente de trabalho. A posentadoria por invalidez. Danos


m orais. Início do fluxo prescricional. Embora a R eclam ada defenda que o início do
prazo prescricional seja fixado a p artir da ocorrência do dano, entendo que este
som ente passou a fluir a partir da concessão da aposentadoria por invalidez pelo
INSS. Com efeito, som ente com a concessão do benefício previdenciário é que a
R eclam ante pôde co n clu ir de form a definitiva, bem com o fa ze r prova inconteste,
a ce rca de sua in c a p a c id a d e la b o ra tiv a . S obre a te m á tic a em exam e, o ilu stre
M agistrado e Jurista S ebastião G eraldo de Oliveira, acentua, verbis: — Não se pode
e x ig ir da v ítim a o a ju iz a m e n to p re c o c e da a ç ã o q u a n d o a in d a p e rs is ta m
questionam entos sobre a doença, sua extensão ou g rau de com prom etim ento, a
possibilidade de recuperação ou m esm o de agravam ento, entre outros. A lesão só
fica m esm o caracterizada quando o em pregado toma conhecim ento, sem m argem a
d ú v id a s , da c o n s o lid a ç ã o da d o e n ç a e da e s ta b iliz a ç ã o dos s e u s e fe ito s na
capacidade laborativa ou, com o diz a Súmula 278 do STJ, quando ele tem — ciência
in e q u ív o c a da in c a p a c id a d e la b o r a l— (O L IV E IR A , S e b a s tiã o G e ra ld o de. in:
Indenizações por acidentes de trabalho ou doença ocupacional. 2. ed. São Paulo:
LTr, p. 337/338). Tendo e. TRT da 18- Região registrado que o acidente de trabalho
sofrido culm inou com a aposentadoria da obreira, em 3.9.2005, e que a presente
ação fora ajuizada em 8.11.2005, inequívoca a conclusão de que não há prescrição
a ser declarada.” TST. 6ã Turma. RR — 1673/2005-082-18-00.2, Rei. M inistro Horácio
R aym undo de Senna Pires, DJ 21 nov. 2008.

“ R espo n sabilid ade civil do E stado. Pretensão de ind en ização co ntra a fazen d a
nacional. Erro m édico. D anos m orais e p atrim o niais. P rescrição. T erm o inicial.
D ata da c o n s o lid a ç ã o do c o n h e c im e n to e fe tiv o da v ítim a d a s le s õ e s e su a
extensão. P rincípio da a ctio nata. 1. O term o a quo para a fe rir o lapso p re scricio n a l
p a ra a ju iz a m e n to de a çã o de in d e n iz a ç ã o c o n tra o E s ta d o não é a d a ta do
acide nte, m as a q u e la em que a vítim a te ve ciê n cia in e q uívo ca de sua invalidez
e da e x te n s ã o da in c a p a c id a d e de q u e re s to u a c o m e tid a . P re c e d e n te s da
P rim eira S eção.” STJ. 2- Turm a. A gRg no REsp n. 931.896, Rei.: M inistro H um berto
M artins, D J 03 out. 2007.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 387

11.7. Prescrição nas ações ajuizadas por domésticos

Neste tópico vamos abordar o prazo prescricional aplicável nas ações


in d e n iza tó ria s p ro ve n ie n te s dos a cidentes so frid o s por em pregados
dom ésticos(43).
A prescrição envolvendo os créditos trabalhistas desses empregados
sempre foi controvertida na doutrina e jurisprudência. Em primeiro lugar, porque
a CLT no art. 7e, alínea a, estabelece que os seus preceitos não se aplicam
aos empregados domésticos. Em segundo, porque o parágrafo único do art.
7- da Constituição da República não assegura aos domésticos o direito previsto
no inciso XXIX. Na falta de norma legal específica, uma corrente defende a
aplicação aos domésticos da prescrição trabalhista; outra, a prescrição do
Código Civil e uma terceira corrente ainda invoca o antigo Decreto-lei n. 1.237,
de 02 de maio de 1939, que estabelece no art. 101: “Não havendo disposição
especial em contrário, prescreve em dois anos qualquer reclamação perante
a Justiça do Trabalho.”
Segundo a Professora Alice Monteiro de Barros, está prevalecendo a
corrente que aplica aos empregados domésticos a prescrição trabalhista,
apesar da omissão do inciso XXIX no rol dos direitos indicados no parágrafo
único do art. 7- da Constituição de 1988:
“Filiamo-nos aos que entendem que a pretensão resultante da relação
de trabalho doméstico está sujeita à prescrição a que se refere o art. 7Q,
XXIX, da Constituição da República de 1988, embora o citado artigo não
inclua este item em seu parágrafo único, no qual arrola os direitos sociais
atribuídos aos domésticos. Essa circunstância não afasta a aplicação
do disposto no mencionado inciso ao doméstico, pois a prescrição não é
direito social, mas perda da pretensão, logo, a boa técnica legislativa
não autorizaria a inserção da prescrição no citado parágrafo único.”(44)
A nova redação do art. 11 da CLT, dada pela Lei n. 9.658/1998, fortaleceu
sobremaneira o entendimento da corrente que aplica a prescrição trabalhista
aos créditos dos empregados domésticos, porque foi substituída a antiga
redação: “Não havendo disposição especial em contrário nesta Consolidação,
prescreve em dois anos o direito de pleitear a reparação de qualquer ato
infringente de dispositivo nela contido”, para a redação seguinte: “Art. 1 1 . 0
direito de ação quanto a créditos resultantes das relações de trabalho
prescreve: I — em cinco anos para o trabalhador urbano, até o limite de dois
anos após a extinção do contrato..."

(43) No Capítulo 14 abordamos as singularidades das indenizações por acidentes ocorridos


com trabalhadores domésticos.
(44) BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2009.
p. 1.056.
388 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

Como se vê, o prazo prescricional previsto no art. 11 da CLT não fica


mais restrito aos atos infringentes dos dispositivos da CLT, mas a qualquer
lesão de créditos resultantes da relação de trabalho. Comentando a respeito
dessa inovação, pontuam os notáveis Rodolfo Pamplona e Marco Antônio
Villatore:

“A regra infraconstitucional, que não se limita mais aos preceitos contidos


na consolidação, parece ser, finalmente, a consagração da salutar ideia
de unificação do prazo prescricional (agora também alçada, no âmbito
constitucional, ao trabalhador rural) para todas as formas de trabalho
subordinado. Sendo assim, refletimos que, hoje, o melhor entendimento
sobre a prescrição aplicável aos empregados domésticos é o estampado
na nova redação do art. 11 da Consolidação das Leis do Trabalho, por
força da Lei n. 9.658/98.”(45)

Também no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho está prevalecendo


o entendimento de que a prescrição aplicável ao empregado doméstico é a
mesma do empregado comum:
“A gravo regim ental. A gravo de instrum ento. Recurso de revista. Em pregado
doméstico. Prescrição. Art. 79, XXIX, da Carta Magna. Aplicação. Nega-se provimento
a agravo regimental em que a reclamante não consegue desconstituir os fundam entos
da decisão proferida no agravo de instrumento em recurso de revista. Na linha dos
precedentes desta Corte Superior, o prazo de prescrição constante do inciso XXIX do
art. 7S da Constituição Federal é aplicado a todos os trabalhadores, sendo irrelevante
a c irc u n s tâ n c ia de a p re s c riç ã o não e s ta r e le n ca d a no rol dos d ire ito s so cia is
assegurados aos em pregados dom ésticos. A prescrição, com natureza de direito
material, não se confunde com o direito subjetivo, tendo a finalidade de extinguir a
pretensão (ação de direito material), produzindo efeitos no âmbito do processo (CPC,
art. 269, IV). Agravo regimental a que se nega provim ento.” TST. 1a Turma. AgR-AIRR
n. 632-27.2010.5.15.0036, Rei.: Ministro W alm ir Oliveira da Costa, DJ 29 jun. 2012.

“Empregado dom éstico. Prescrição. Em que pese o parágrafo único do art. 7- da


C o nstitu ição Federal, quando enum era os direitos e stendidos aos tra balhadores
d o m é stico s, não fa z e r m enção e x p re s s a ao in c is o X X IX , te m -s e que o prazo
prescricional de cinco anos até o limite de dois anos após a extinção do contrato de
trabalho é norma geral, dirigida a todos os trabalhadores. De fato, não há exceção
expressa quanto aos dom ésticos na C onstituição Federal, tam pouco na legislação
infraconstitucional. Recurso de Revista não conhecido.” TST. 2- Turma. RR n. 41700-
07.2003.5.15.0034, Rei.: Ministro José Sim pliciano Fontes de F. Fernandes, DJ 07
abr. 2009.

“Empregado dom éstico. Prescrição. Não obstante o parágrafo único do artigo 7e da


Carta Magna não se refira expressam ente ao inciso XXIX, o prazo prescricional de
cinco anos até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho é critério
geral, d irigido a todos os tra b a lh a d o re s urbanos e rurais, não existindo exceção
expressa quanto aos dom ésticos, seja na C onstituição Federal ou na legislação

(45) PAM PLONA FILHO, Rodolfo; VILLATORE, Marco Antônio César. D ireito do trabalho
doméstico. 2. ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 133.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 389

infraconstitucional. Precedentes do TST. Recurso de revista não conhecido.” TST. 8a


Turma, RR n. 1484/2002-102-04-00.3, Rei.: Ministra Dora Maria da Costa, DJ 09 maio
2008.

Entendem os, portanto, que a prescrição aplicável às pretensões


ressarcitórias por acidente ocorrido com o empregado doméstico deve ser
mesmo a trabalhista. Já está pacificado no Colendo TST que as indenizações
por acidente decorrem da relação de trabalho e estão enquadradas no conceito
amplo de créditos resultantes da relação de trabalho, conforme previsto no
art. 7-, XXIX, da Constituição e art. 11 da CLT.

Poder-se-ia até cogitar de aplicar a prescrição do Código Civil para as


pretensões dos trabalhadores domésticos, decorrentes de acidente sofrido
em serviço, especialmente porque o inciso XXVIII do art. 7- da Constituição
Federal não consta do rol dos direitos que lhes foram assegurados, razão
pela qual a base jurídica para o deferimento da indenização seria a normativa
geral do Código Civil. Contudo, se a regulamentação especial (Direito do
Trabalho) tem regra específica a respeito da prescrição, não cabe invocar o
preceito geral do Código Civil, cuja aplicação só deve ocorrer subsidiariamente,
conforme sustentamos no item 11.2 acima. Ainda que o evento não se enquadre
na categoria de acidente do trabalho propriamente dito, trata-se de lesão
ocorrida durante a prestação dos serviços, com nexo causal direto com a
execução do contrato de trabalho do empregado doméstico.

11.8. Prescrição nas ações do trabalhador não empregado

Após a ampliação da competência pela Emenda Constitucional n. 45/


2004, a Justiça do Trabalho passou a julgar também as ações indenizatórias
por acidente ocorrido com trabalhadores que prestam serviço sem vínculo de
emprego(46).
Utilizando redação idêntica à do art. 114, prevê o art. 7-, XXIX, da
Constituição Federal, os prazos prescricionais quanto aos créditos resultantes
das “relações de trabalho”. Também o art. 11 da CLT, com a redação alterada
pela Lei n. 9.658/1998, menciona a prescrição quanto a “créditos resultantes
das relações de trabalho.” É inevitável concluir, portanto, que o prazo da
prescrição aplicável, mesmo nos casos das indenizações por acidente com os
trabalhadores que atuam sem vínculo de emprego, é também o trabalhista(47).

(46) No Capítulo 14 abordamos as singularidades das indenizações por acidentes ocorridos


com esses trabalhadores.
(47) Vale registrar que até a 4- edição deste livro mencionamos, en passant, que a prescrição
aplicável nas indenizações postuladas por acidentados não empregados seria a do Código
C ivil. A pa rtir da quinta edição, no entanto, evoluím os para o e n tendim ento de que a
prescrição cabível é tam bém a trabalhista.
390 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

Como se trata da mesma expressão do texto constitucional — relação


de trabalho — , seria paradoxal atribuir-lhe um sentido amplo para fins de
consagrar a competência da Justiça do Trabalho (art. 1 1 4 ,1e VI) e, ao mesmo
tempo, um sentido restrito para afastar a aplicação do prazo da prescrição
tra b a lh ista (art. 7-, XXIX). Valem neste passo, portanto, os m esmos
argumentos utilizados no tópico anterior, quando apreciamos a prescrição
aplicável às pretensões formuladas pelo empregado doméstico, que foi vítima
de acidente ou doença relacionada ao trabalho.
Pode-se argumentar, é verdade, que a relação de trabalho do autônomo,
do eventual ou de qualquer prestador de serviço sem vínculo de emprego é
de natureza civil, tanto que o art. 593 do Código Civil estabelece: “A prestação
de serviço, que não estiver sujeita às leis trabalhistas ou a lei especial, reger-
-se-á pelas disposições deste Capítulo.” E sendo de natureza civil a relação
de trabalho, caberia aplicar o prazo prescricional de três anos previsto no art.
206, § 3e, V, do Código Civil.
O argumento até parece atraente, mas estaríamos considerando para fins
hermenêuticos duas espécies de relação de trabalho: relação de trabalho de
natureza trabalhista (trabalho subordinado) e relação de trabalho de natureza
cível (trabalho sem subordinação). Daí logo surge a pergunta embaraçosa: por
que estaríamos considerando a relação de trabalho (gênero) para fins da
competência (art. 114) e apenas a relação de trabalho de natureza trabalhista
(espécie) para fins da prescrição (art. 7Q, XXIX), criando uma interpretação
diferenciada e casuística onde o texto constitucional não estabeleceu distinção?
De todo modo, como essa questão é complexa e nova na seara da Justiça
do Trabalho, é provável que ainda haja entendimentos diversificados, tanto
no sentido de aplicar a prescrição trabalhista quanto no de adotar a prescrição
civil, até que a controvérsia seja pacificada nos tribunais superiores.

11.9. Pronunciamento de ofício da prescrição

A tradição do nosso ordenamento jurídico, a exemplo de diversos outros


países(48), indicava que o juiz não podia conhecer da prescrição se não fosse
invocada pela parte interessada. Assim previam o art. 194 do Código Civil de
2002(49) e o art. 166 do Código de 1916(50).

(48) A obra clássica de Antônio Luís da Câmara Leal inform a que a maioria dos Códigos
estabelece que a prescrição não pode ser conhecida pelo juiz e x officio. Como exemplo cita
os C ódigos da França, Itália, Suíça, Portugal, Argentina, Bolívia, Chile, Peru, Uruguai,
Venezuela e Japão. Cf. Da prescrição e da decadência: teoria geral do direito civil. 4. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1982. p. 79.
(49) Art. 194. “O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer
a absolutam ente incapaz.”
(50) Art. 166. “O juiz não pode conhecer da prescrição de direitos patrimoniais, se não for
invocada pelas partes.”
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 391

No entanto, a Lei n. 11.280/06 modificou a redação do § 5e do art. 219 do


CPC, que passou a ser: “§ 5S O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição.” Na
previsão anterior desse parágrafo era vedado ao juiz pronunciar de ofício a
prescrição quando se tratasse de direitos patrimoniais(51). Para completar a
mudança, foi revogado expressamente o art. 194 do Código Civil atual. De
acordo com a nova redação do dispositivo processual supramencionado, o
juiz deverá pronunciar a prescrição, ainda que não alegada pela parte. Para
auxiliar na compreensão dessa mudança, é oportuno pesquisar no processo
legislativo os fundamentos adotados para a sua aprovação.
O dispositivo alterado teve origem em Projeto de Lei apresentado pelo
Poder Executivo em 2004, com a seguinte justificativa na mensagem de
encaminhamento, no ponto que estamos apreciando:
“Sob a perspectiva das diretrizes estabelecidas para a reforma da Justiça,
faz-se necessária a alteração do sistema processual brasileiro com o
escopo de conferir racionalidade e celeridade ao serviço de prestação
jurisdicional, sem, contudo, ferir o direito ao contraditório e à ampla defesa.
(...) No mesmo sentido, louvável a disposição que permite ao juiz decretar
de ofício, sem necessidade de provocação das partes, a prescrição, em
qualquer caso, conforme proposta de redação inédita ao parágrafo 5g do
art. 219 do CPC.”<52>
Na Câmara, o Deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores, Maurício
Rands, designado relator da matéria (Projeto de Lei n. 4.726/2004), opinou
favoravelmente à mudança, lavrando parecer que merece transcrição:
“Igualmente conveniente é a norma do art. 219, § 52, do CPC, que permite
o reconhecimento ex officio da prescrição, ainda que se trate de direitos
patrimoniais. O Código Civil, no art. 194, ora revogado, já ampliava essa
possibilidade quando a prescrição favorecesse o absolutamente incapaz,
de forma que a doutrina entendia derrogado o referido § 5Qdo art. 219, do
CPC. Agora permite-se que o juiz reconheça, de ofício, a prescrição,
independentemente da natureza dos direitos em litígio e da capacidade
das partes. A providência é salutar, uma vez que, podendo a prescrição
ser alegada em qualquer grau de jurisdição (art. 193 do Código Civil),
não raro o seu reconhecimento tardio ocasionava a tramitação inócua
do processo, gerando uma extinção do feito que poderia ter ocorrido
muito antes (art. 269, IV, CPC).”(53)
Completando a tramitação legislativa do projeto mencionado, o Senador
pelo Partido dos Trabalhadores, Aloísio Mercadante, relator da matéria no

(51) Redação anterior: CPC. Art. 219, § 52. “Não se tratando de direitos patrimoniais, o juiz
poderá, de ofício, conhecer da prescrição e decretá-la de im ediato.”
(52) Disponível em: <w w w .cam ara.gov.br>.
(53) Idem.
392 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Senado Federal (Projeto de Lei da Câmara n. 116/2005), também opinou


favoravelmente à aprovação, com os seguintes fundamentos sobre o tema
da prescrição pronunciada de ofício:

“Quanto ao mérito, as alterações propostas merecem nosso apoio, uma


vez que seguem as diretrizes traçadas no ‘Pacto de Estado em Favor
de um Judiciário mais Rápido e R epublicano’, firm ado por ilustres
representantes desta Casa, da Câm ara dos Deputados, do Poder
Judiciário e do Poder Executivo. Nesse sentido, esta proposição vem
no bojo de um grande esforço conjunto para a reformulação do nosso
sistema de prestação jurisdicional, tornando-o mais célere e racional,
sem, contudo, ferir os direitos e garantias dos jurisdicionados. (...) O
projeto também altera o § 5Q, do art. 219, do Código de Processo Civil,
para fixar a regra geral que permite ao juiz conhecer da prescrição,
independentem ente de provocação das partes. Este dispositivo é
complementado pela revogação do art. 194 do Código Civil. Esta medida
acabará com as restrições impostas ao conhecimento da prescrição, de
ofício, pelo magistrado, contribuindo para a redução da morosidade
processual, uma vez que impedirá a prática de atos desnecessários
naquelas demandas em que o direito material controvertido já foi fulminado
pela prescrição.”(54)

Não resta dúvida, portanto, de que o propósito da alteração foi mesmo


estabelecer o pronunciamento da prescrição de ofício “independentemente
da natureza dos direitos em litígio.” De todo modo, é surpreendente que uma
mudança tão importante não tenha sido debatida previamente com a sociedade
para o devido amadurecimento. O projeto foi aprovado numa convocação
extraordinária, com votações sumárias, sem maior aprofundamento e reflexão
sobre todos os contornos da questão. Daí por que o insigne Humberto
Theodoro Júnior, após qualificar a mudança como “desastrosa inovação” ou
“um grave equívoco ideológico da reforma” , conclui:

“A não fatalidade do prazo prescricional, sujeito que é a numerosos e


constantes fatores de interrupção e suspensão (Cód. Civil, arts. 197 a
204), não permite ao juiz sequer reconhecer, sem o concurso da parte, a
consumação da prescrição, na generalidade dos casos. A decretação
in limine litis da prescrição agride o devido processo legal, violando
interesses legítimos tanto do credor quanto do devedor, ao negar-lhes o
eficaz contraditório e ampla defesa e privá-los do livre exercício de direitos
e faculdades assegurados pela ordem jurídica material.

A decretação autoritária e sumária da prescrição, sem a necessária


provocação da parte, ofende ainda a garantia do devido processo legal

(54) Disponível em: <www .senado.gov.br>.


I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 393

por não respeitar os interesses tanto do credor como do devedor: do


credor, porque o surpreende, sem dar-lhe oportunidade de adequada
demonstração das objeções que legalmente possa opor a uma causa
extintiva que não é automática e que em regra envolve, ou pode envolver,
complexos elementos de fato e de direito; ao devedor, porque lhe impõe
o reconhecimento de uma obrigação e uma exoneração que nem sempre
correspondem a seus desígnios éticos e jurídicos.

As regras procedimentais que cogitam de decretação de prescrição sem


condicioná-las à provocação do devedor (CPC, arts. 295, IV, e 219, §
5S) somente podem ser aplicadas, in concreto nos casos em que a lei
material considere indisponível o direito patrimonial (casos, v. g., de
prescrição em favor de pessoas absolutamente incapazes) ou quando a
própria lei substancial determine a aplicação exofficio da prescrição (caso
como o da Lei de Execução Fiscal, art. 40, § 4e, a respeito dos créditos
tributários). Essa é a única interpretação que permite aos referidos
dispositivos processuais harmonizarem-se com o sistema e os objetivos
da prescrição, disciplinada pela ordem jurídica substancial.

Melhor mesmo seria revogar, de lege ferenda, a infeliz inovação, mas,


enquanto isto não se der, o dever do intérprete e aplicador da lei inovadora
será o de buscar minimizar as impropriedades contidas em sua literalidade,
e reduzir sua aplicação apenas às hipóteses compatíveis com a natureza,
finalidade e sistema da prescrição dentro do direito material.”(55)

Em virtude dessa inesperada alteração, que rompeu um preceito secular


perfeitamente sedimentado na lei, doutrina e jurisprudência, surgiram muitas
dúvidas a respeito do cabimento de sua aplicação, especialmente no processo
do trabalho.

Assevera o professor Arion Romita que a pronúncia da prescrição de


ofício, no processo do trabalho, aproveita apenas ao empregador inadimplente,
diferentemente do que ocorre com a relação de Direito Civil. Posicionando-se
contrário à inovação, conclui que “o novel preceito legal é incompatível com a
norm a constitucional que prom ove a m elhoria da condição social dos
trabalhadores e, assim, por força do princípio da subsidiariedade, não tem
aplicação no processo do trabalho.”<56) Na mesma toada, o professor mineiro
Ricardo Wagner de Carvalho entende que a aplicação do § 5e do art. 219 do

(55) THEODORO JÚNIOR, Humberto. /As novas reformas do Código de Processo Civil. 1.
ed. 5a t. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 67-69.
(56) ROM ITA, Arion Sayão. Pronúncia de ofício da prescrição trabalhista. Suplem ento
Trabalhista LTr, São Paulo, n. 100, p. 422-423, 2006.
394 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

CPC deve sofrer um exame à luz dos princípios e normas trabalhistas e conclui
pela incompatibilidade do acolhimento ex officio da prescrição no processo
do trabalho(57).

Muitos magistrados trabalhistas não estão aplicando a referida inovação,


ao arg u m e n to de que o c ré d ito tra b a lh is ta é irre n u n c iá v e l e que o
pronunciamento da prescrição de ofício seria contrário aos princípios que
orientam o Direito do Trabalho, além de malferir a Constituição Federal,
conforme mencionado por Arion Romita. Consoante a doutrina do Ministro
Godinho Delgado, “a pronúncia oficial da prescrição pelo Juiz, principalmente
em situações que não envolvam o patrimônio público, subverte toda a estrutura
normativa do Direito Material e Processual do Trabalho, não só nos seus
princípios como também a lógica que cimenta suas regras jurídicas.”(58)

Adotando posicionamento em sentido contrário, mesmo sem demonstrar


entusiasmo com a inovação, Rodrigues Pinto entende que, sendo a legislação
processual trabalhista omissa a respeito da iniciativa para declaração dos efeitos
prescricionais, aplica-se aos dissídios trabalhistas a alteração da Lei n. 11.280/
2006, como já se aplicava o próprio art. 219, § 5Q, antes dela(59). Nesta mesma
trilha, Francisco Antonio de Oliveira conclui incisivamente que “as novas regras
da prescrição têm plena aplicação em sede trabalhista, não só na matéria civilista
adquirida por força da EC n. 45/04, mas também na matéria de núcleo
vocacionalmente trabalhista que liga empregado e empregador.”(60) Também
Manoel Antonio Teixeira Filho entende que a inovação incidirá no processo do
trabalho(61).

Os julgamentos mais recentes sobre o tema no TST estão sedimentando


o entendimento sobre a incompatibilidade da aplicação do art. 219, § 52, do
CPC, no Processo do Trabalho:
“Recurso de em bargos. Prescrição. Art. 219, § 5S, do CPC. Incom patibilidade com
o processo do trabalho. Recurso de revista conhecido e provido para afastar a

(57) CARVALHO, Ricardo W agner Rodrigues de. O instituto da prescrição e a arguição ex


officio: aplicação no processo do trabalho. In: KOURI, Luiz Ronan Neves; FERNANDES,
N adia S o ra ggi; C A R V A LH O , R icardo W a g n e r R o d rig u e s de (C o o rd .). T endências do
processo do trabalho. São Paulo: LTr, 2010. p. 127-136.
(58) DELGADO, Mauricio Godinho. Direito do trabalho e processo do trabalho: critérios para
a importação de regras legais civis e processuais civis. Revista LTr, São Paulo, v. 71, n. 5, p.
554, maio 2007.
(59) PINTO, José Augusto Rodrigues. Reconhecimento ex officio da prescrição e processo
do trabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 70, n. 4, p. 395, abr. 2006.
(60) OLIVEIRA, Francisco Antonio. A prescrição com nova cara. Revista LTr, São Paulo, v.
70, n. 5, p. 522, maio 2006.
(61) TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. As novas leis alterantes do processo civil e sua
repercussão no processo do trabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 70, n. 3, p. 298, mar. 2006.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D o e n ç a O c u p a c io n a l 395

prescrição. A prescrição é a perda da pretensão pela inércia do titular no prazo que


a lei considera ideal para o exercício do direito de ação. Não se mostra compatível
com o processo do trabalho a regra processual inserida no art. 219, § 5a, do CPC, que
determ ina a aplicação da prescrição, de ofício, em face da natureza alim entar dos
créditos trabalhistas. Ao contrário da decadência, onde a ordem pública está a antever
a estabilidade das relações jurídicas no lapso temporal, a prescrição tem a mesma
finalidade de estabilidade apenas que entre as partes. Deste modo, necessário que a
prescrição seja arguida pela parte a quem a aproveita. A decisão da c. Turm a merece
ser mantida, porque consoante a jurisprudência atual desta c. Corte, que se manifesta
pela incompatibilidade do art. 219, § 52, do CPC com o processo do trabalho, conforme
precedentes. Embargos conhecidos e desprovidos.” TST. S D I-1. E-ED-RR n. 2558400-
16.2008.5.09.0015, Rei.: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, DJ 18 maio 2012.

“Recurso de em bargos interposto na vigência da Lei n. 11.496/2007- Prescrição


— Declaração de ofício — Art. 219, § 5e, do CPC — Aplicação ao processo do
trabalho — Prevalece nesta Corte o entendimento de que não cabe aplicar a prescrição
de ofício no âmbito do processo trabalhista, por ser essa inovação, prom ovida pela
Lei n. 11.280/2006, incompatível com os princípios que norteiam o Direito do Trabalho.
Como bem recom enda Humberto Theodoro Júnior ‘melhor mesmo seria revogar, de
lege ferenda, a infeliz inovação, mas, enquanto isso não se der, o dever do intérprete
e aplicador da lei inovadora será o de buscar minim izar as impropriedades contidas
em sua literalidade, e reduzir sua aplicação apenas às hipóteses com patíveis com a
natureza, finalidade e sistem a de prescrição dentro do direito m aterial.’ Precedentes
da S DI-I. E m bargos conh e cid o s e não p ro v id o s .” TST. S D I-1. E-RR n. 269800-
45.2007.5.12.0029, Rei.: Desem bargador convocado Sebastião Geraldo de Oliveira,
DJ 9 jan. 2012.

“Recurso de revista. Prescrição. Pronúncia de ofício. Incom patibilidade do art.


219, § 5 S, do CPC com o processo do trabalho. O art. 219, § 5-, do CPC, é incompatível
com os princípios que regem o Processo do Trabalho, de maneira que nesta Justiça
Especializada a prescrição dos créditos trabalhistas só pode ser pronunciada quando
houver provocação da parte interessada. Art. 896, § 4a, da CLT.” TST. 4- Turma. RR n.
6100-96.2005.5.05.0012, Rei.: M inistra Maria de Assis Calsing, DJ 10 set. 2010.

Pode-se argumentar, também, que, se o reclamado não argui a prescri­


ção, ocorre a renúncia tácita, na forma prevista no art. 191 do Código Civil,
que estabelece: “A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só
valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se con­
sumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, in­
compatíveis com a prescrição.” A propósito, durante a IV Jornada de Direito
Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal em 2006, foi aprovado o
Enunciado doutrinário n. 295, com a seguinte redação: “Art. 191. A revoga­
ção do art. 194 do Código Civil pela Lei n. 11.280/2006, que determina ao juiz
o reconhecimento de ofício da prescrição, não retira do devedor a possibilida­
de de renúncia admitida no art. 191 do texto codificado.”

Como a prescrição extingue a pretensão, gerando o “atrofiamento” do


direito, deve-se apreciar com cuidado a sua aplicação de ofício, pelo que, na
dúvida, a interpretação deve ser contra a prescrição, ou seja, a favor do direi­
to da vítima. Com apoio no escólio de Washington de Barros Monteiro, em
396 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

matéria de prescrição “as disposições são sempre de aplicação estrita, não


comportando interpretação extensiva, nem analogia; a exegese será sempre
restritiva. Na dúvida, deve julgar-se contra a prescrição, meio talvez antipáti­
co de extinguir-se a obrigação.”(62)

Desse modo, antes do eventual pronunciamento da prescrição de ofício


pelo juiz, é imperioso analisar, também de ofício, se não teria ocorrido alguma
causa impeditiva, suspensiva ou interruptiva da prescrição, tais como:

1. O autor ou alguns dos autores pode ser menor (arts. 198 do Código
Civil e 440 da CLT);

2. A vítima do acidente ou doença pode ter-se tornado incapaz, perdendo


o discernim ento necessário para prom over o ajuizamento da ação,
mesmo que transitoriamente (arts. 3e e 198 do Código Civil);

3. A ciência inequívoca do dano ou do nexo causal (actio nata) só ocorreu


muito tempo depois da extinção do contrato de trabalho, não havendo
anteriormente fluência do prazo da prescrição, especialmente nos casos
de doenças ocupacionais;

4. O autor pode ter ajuizado ação anterior, mesmo que tenha sido
arquivada, produzindo o efeito da interrupção do prazo prescricional em
curso (art. 202 do Código Civil e Súmula n. 268/TST);

5. O reclam ado pode ter renun ciado à prescrição , expressa ou


tacitamente, ao praticar atos incompatíveis com a prescrição (art. 191
do Código Civil);

6. O reclamado pode ter praticado algum ato inequívoco, ainda que


extrajudicial, que importe reconhecimento do direito do autor (art. 202,
VI, do Código Civil).

Em harmonia com o pensamento que rejeita a aplicação da prescrição


de ofício no processo do trabalho, a Orientação Jurisprudencial n. 130 da
SBDI-I do Colendo TST prevê: “Ao exarar o parecer na remessa de ofício, na
qualidade de ‘custos legis’, o Ministério Público não tem legitimidade para
arguir a prescrição em favor de entidade de direito público, em matéria de
direito patrimonial (arts. 194 do CC de 2002 e 219, § 5S, do CPC).”

(62) MONTEIRO, W ashington de Barros. Curso de direito civil. 34. ed. São Paulo: Saraiva,
1985. v. 1: Parte Geral, p. 294.
CAPÍTULO 12

AÇÃO REVISIONAL NAS INDENIZAÇÕES


POR ACIDENTE DO TRABALHO

12.1. Considerações iniciais

Nas ações indenizatórias por acidente do trabalho ou doença ocupacio­


nal é comum o deferimento de pensão mensal à própria vítima, em razão de
invalidez total permanente, ou pensão proporcional pela redução da capaci­
dade laborativa. O art. 950 do Código Civil estabelece que a indenização será
correspondente à importância do trabalho para o qual o acidentado se inabili­
tou ou da depreciação que ele sofreu(1).

Essa indenização projeta-se para o futuro, prolongando-se por todo o


período de sobrevivência da vítima, podendo, assim, perdurar por várias
décadas. Ocorre que, no período do pensionamento, o acidentado pode sofrer
alterações no “estado de fato” da invalidez ou do adoecimento, tanto no sentido
da recuperação da capacidade de trabalho, para a mesma profissão ou para
outra, quanto no sentido de agravamento dos danos, podendo até sofrer o
dano máximo: a morte.
Diante dessas ocorrências, quais as soluções que o ordenamento jurídico
oferece para ajustar o comando da decisão já transitada em julgado ao novo
estado de fato da vítima? E se ocorrer alteração do dano durante a tramitação
do processo? Mesmo após a celebração de um acordo ou quando a vítima
tenha recebido a indenização de uma só vez, cabe alguma revisão? Qual a
Justiça competente para julgar a ação revisional nos casos de sentenças
proferidas na Justiça Comum dos Estados? Na tentativa de responder a essas
indagações e a outras correlatas, resolvemos esboçar este Capítulo.

(1) Código Civil. Art. 950. “Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa
exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabaiho, a indenização,
além das despesas do tratam ento e lucros cessantes até o fim da convalescença, incluirá
pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação
que ele sofreu.”
398 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

12.2. Cabimento da ação revisional

Para iniciar este tópico, formulamos a seguinte pergunta: é cabível o


ajuizamento da ação revisional para alterar o valor da pensão decorrente do
acidente do trabalho ou doença ocupacional?

O tema da ação revisional é muito debatido nas demandas envolvendo


benefícios previdenciários, prestações de alimentos, valor dos aluguéis ou
normas coletivas de trabalho(2). Contudo, possivelmente por desconhecimento
das partes, tem sido pouco utilizada a reavaliação dos danos, com vistas à
revisão do valor do pensionamento decorrente de responsabilidade civil.

O deferimento da pensão mensal vitalícia institui entre o acidentado e o


devedor da indenização uma relação jurídica de natureza continuativa. O
julgador toma como base, para fundamentar sua decisão, um determinado
quadro fático, captado durante a instrução processual, até porque não lhe
cabe proferir sentença condicional disciplinando os efeitos jurídicos de
mudanças que podem vir a acontecer, ou não, na fluência do pensionamento(3).

No entanto, com o passar do tempo, a extensão do dano, considerada


para arbitrar o pensionamento, pode sofrer alteração, tanto para melhorar
quanto para piorar a situação da vítima, criando um descompasso entre o
valor da pensão mensal e o grau da sua incapacidade laborativa. Em razão
dessa m udança superveniente, o va lor fixado na sentença não mais
representará a reparação adequada do dano, tornando a prestação mensal
injusta para uma das partes.

Diante dessa realidade da vida, que não pode ser ignorada, é imperioso
concluir que as alterações ocorridas com a vítima, enquanto perdura essa
relação jurídica continuativa, devem repercutir no direito ao pensionamento,
em face da mudança do “estado de fato” que o juiz levou em consideração no
momento de proferir o julgamento. Nessa relação jurídica estatuída, de alguma
forma, está presente ou implícita a cláusula rebus sic stantibus, permitindo
que a decisão primitiva sofra uma adaptação, por meio de nova decisão judicial
para garantir continuadamente a manutenção da justa reparação do dano(4).

(2) CLT. Art. 873. “ D ecorrido mais de 1 (um) ano de sua vigência, caberá revisão das
decisões que fixarem condições de trabalho, quando se tiverem modificado as circunstâncias
que as ditaram, de modo que tais condições se hajam tornado injustas ou inaplicáveis.”
(3) CPC. Art. 460. “ É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa
da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que
lhe demandado. Parágrafo único. A sentença deve ser certa, ainda quando decida relação
jurídica condicional.”
(4) Assinala Caio Mário que os juristas da Idade Média, atentando em que nos contratos de
execução diferida o ambiente no momento da execução pode ser diverso do que existia no
da celebração, sustentaram que o contrato devia ser cum prido no pressuposto de que se
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 399

Consoante o ensinamento de Liebman, “de certo modo, todas as sentenças


contêm implicitamente a cláusula rebus sic stantibus, enquanto a coisa julgada
não impede absolutamente que se tenham em conta os fatos que intervierem
sucessivamente à emanação da sentença.”(5)
A ação revisional ou ação de modificação, como a denominava Pontes
de Miranda, está assegurada expressamente no art. 4 7 1 ,1, do CPC, aplicável
no Processo do Trabalho em razão do que prevê o art. 769 da CLT(6). Urge
frisar que não há impedimento, vedação ou incompatibilidade quanto ao seu
cabimento nas indenizações por acidente do trabalho quando se deferem
parcelas vincendas em forma de pensionamento. Vale transcrever o dispositivo
mencionado:
“Art. 471. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma
iide, salvo:

I — se, tratando-se de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação do estado


de fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído
na sentença;”

É oportuno citar, nesse passo, a lição de Pontes de Miranda: “Quando,


em caso de condenação a prestações periódicas futuras, as circunstâncias
se modificarem de tal maneira, que não mais se justifiquem as prestações, no
todo, ou em parte, ou a própria condenação, ou a duração delas, — cabe à
parte reclamar pela chamada ação de modificação”, ressaltando que “a ação
de modificação supõe que a sentença mesma, que formalmente transitou em
julgado, pode ser alterada no que dispusera para o futuro: a eficácia no futuro
é que está sujeita, devido à natureza da sentença, a mudança, se o juízo a
reconhecer.”(7) No mesmo sentido, comenta Sérgio Sahione Fadei:

“Há (...) situações que estão sempre sujeitas a alterações, porque as


questões propostas pelos litigantes, mesmo depois de resolvidas, per­

conservassem im utáveis as condições externas, mas que, se houvessem alterações, a


execução devia ser igualm ente m odificada. S intetiza o m estre que “a te o ria tornou-se
conhecida como cláusula rebus sic stantibus, e consiste, resumidamente, em presumir, nos
contratos com utativos, uma cláusula, que não se lê expressa, mas figura implícita, segundo
a qual os contratantes estão adstritos ao seu cum prim ento rigoroso, no pressuposto de que
as circunstâncias ambientes se conservem inalteradas no momento da execução, idênticas
às que vigoravam no da celebração.” Cf. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de
direito civil, 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986. v. III, p. 110.
(5) LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1984. p. 25.
(6) CLT. Art. 769: “Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do
direito processual do trabalho, exceto naquilo em que fo r incom patível com as norm as
deste Título.”
(7) PONTES DE MIRANDA, Francisco C. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1997. tom o V, p. 148.
400 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

manentemente devem ser modificadas, porque não é vontade do Estado,


que as resolveu, se mantenham estáveis e imutáveis, mas, ao contrário,
que se ajustem às novas condições e aos fatos estranhos supervenien­
tes. No campo das obrigações, a teoria da imprevisão já é um exemplo
atual de que o ato jurídico, para ser realmente perfeito e imutável, deve
manter constantemente atualizadas as circunstâncias em que se cele­
brou. Aliás, no campo processual, essa regra poderia ser afirmada em
outros termos: a verdadeira imutabilidade da coisa julgada é aquela que
sustenta a mesma autoridade e a mesma eficácia, através dos tempos,
mercê da manutenção das circunstâncias de fato e de valor vigorantes
na ocasião em que se formou.”(8)
Desse modo, a mudança na capacidade laborativa ocorrida com a vítima
autoriza o ajuizamento, por qualquer das partes, de uma nova ação com o
objetivo de modificar a sentença anterior transitada em julgado.
Na doutrina especializada em responsabilidade civil, tem-se como certo
o cabimento da ação revisional, sendo oportuno citar o ensinamento de Antônio
Lindbergh Montenegro:
“Acontece, às vezes, que após o trânsito em julgado da sentença
condenatória, o dano vem a sofrer sensível alteração para mais ou para
menos. O equânime será adaptar o ressarcimento ao novo estado de
fato. Do contrário, o Direito estaria permitindo que se pagasse mais ou
se recebesse menos do que o devido. Na verdade, tanto seria injusto
continuar a pagar-se uma pensão por incapacidade física que deixou de
existir, quanto não reajustar essa mesma pensão, como se exprime
Alfredo Orgaz, ‘por força de uma agravação imprevista, qual o estado de
demência sobrevindo à vítima em consequência das lesões que sofreu’.
Aparece então a revisão do julgamento, também denominada ação de
modificação, como o remédio idôneo para adaptar o ressarcimento ao
verdadeiro valor do prejuízo.”(9)
O doutrinador Carlos Alberto Menezes Direito, em obra conjunta com
Sérgio Cavalieri, concluiu: “Incontestável, destarte, o direito à revisão da
condenação, no todo ou em parte, seja em favor do devedor, seja em prol da
vítima, sempre que ocorrer fato superveniente modificativo da relação jurídica
anteriormente decidida.”(10) Também opinam pelo cabimento da ação revisional

(8) FADEL, Sérgio Sahione. Código de Processo C ivil comentado. 7. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2004. p. 537-538.
(9) MONTENEGRO, Antônio Lindbergh C. Ressarcim ento de danos. 8. ed. ampl. e atual.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 218.
(10) DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo
C ódigo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. XIII, p. 394-397.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 401

no pensionamento decorrente de responsabilidade civil, dentre outros, José


de Aguiar Dias(11), Carlos Roberto Gonçalves(12), Rui Stoco(13) e Sérgio Cavalieri
Filho'14’.
Além do posicionamento doutrinário, o cabimento da ação revisional, na
hipótese em estudo, já se encontra bem sedimentado na jurisprudência pátria,
conforme se verifica nas ementas dos acórdãos seguintes:
“R evisão de pensão. Pensão por morte integral. Relação jurídica continuativa.
O fensa à coisa julgada. Não ocorrência. Precedentes desta Corte. 1. Nas relações
jurídicas continuativas, é possível a revisão da decisão transitada em julgado, desde
que tenh a ocorrido a m od ifica çã o no estado de fato e de d ire ito à vista do que
preceitua o art. 471, inciso I, do C ódigo de Processo Civil. 2. Agravo regim ental
desprovido.” STJ. 5- Turm a. AgRg no REsp n. 573.686, Rei.: Ministra Laurita Vaz, DJ
30 out. 2006.

“A ção de re visã o de p e n s io n a m e n to v ita líc io d e c o rre n te de in c a p a c id a d e


laborativa. Relação jurídica continuativa. Possibilidade jurídica do pedido. Não
agressão à coisa julgada. Em princípio, o pedido de revisão de pensão sob a alegação
de ocorrência de alteração fática superveniente é cabível, ante a natureza continuativa
da relação jurídica. Uma vez fixada pensão em razão de incapacidade laborativa
permanente e parcial, atestada por perícia, somente uma outra perícia poderia constatar
eventuais m odificações no grau de incapacidade. C onfigurada a possibilidade de
eventual revisão no pensionamento, o processo deve ser remetido ao primeiro grau,
para que haja a instrução. Provim ento do recurso. Anulação da sentença.” Rio de
Janeiro. TJRJ. 2S Câmara Cível. Apelação Cível n. 2005.001.39627, Rei.: Elisabete
Filizzola, DJ 24 jan. 2006.

“INSS. Ação de revisão de benefício acidentário. A posentadoria por invalidez.


Persistência de incapacidade laboral. Improcedência. A legislação processual civil
admite a revisão de verba pecuniária arbitrada por sentença, quando se trata de relação
jurídica continuativa, e ocorre posterior modificação no estado de fato ou de direito de
uma das partes, circunstância esta que não se vislumbra na hipótese em apreço, visto
que o segurado permanece incapacitado para o trabalho, sendo portador de patologia
indenizável na base de 100% (cem por cento).” Rio de Janeiro. TJRJ. 11a Câmara Cível.
Apelação Cível n. 2005.001.15111, Rei.: Cláudio de Mello Tavares, DJ 31 ago. 2005.

12.3. Competência para julgamento

A competência para o julgamento da ação revisional de indenizações


por acidente do trabalho é da Justiça do Trabalho, mesmo quando se busca

(11) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
v. II, p. 785-786.
(12) GO NÇ ALVES, Carlos Roberto. R esponsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 581.
(13) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1464-1465.
(14) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 141-142.
402 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

rever o pensionamento deferido em sentença transitada em julgado perante a


Justiça Comum. Isso porque, desde a Emenda Constitucional n. 45/2004,
a competência absoluta em razão da matéria para julgar as indenizações por
acidente do trabalho, seja na ação principal ou na revisional, passou a ser da
Justiça do Trabalho.

A abordagem da ação revisional, no aspecto da competência, será feita,


com maior profundidade, no Capítulo 13, item 13.7, ao qual nos reportamos.

12.4. Limites e efeitos da ação revisional

Superada a questão do cabimento da ação revisional e da competência


para o seu julgamento, cabe analisar os contornos da sua abrangência e a
extensão dos seus efeitos, especialmente em comparação com a sentença
anterior transitada em julgado.

Não há dúvida de que a decisão anterior tem força de lei nos limites da
lide e das questões decididas (art. 468 do CPC). Assim, não há espaço, na
via da ação revisional, para rediscutir os pressupostos da responsabilidade
civil apreciados no primeiro julgamento, tais como o dano indicado no primeiro
pedido, o nexo causal, a culpa ou a responsabilidade civil objetiva. Podem até
ser cabíveis tais questionam entos, em casos excepcionais, mas por
intermédio da ação rescisória, no prazo e nas estritas hipóteses legais. Nessa
linha de pensamento assevera Rui Stoco:

“O direito à reparação em si é matéria que não mais pode ser rediscutida


com o advento do trânsito em julgado da decisão que a reconheceu.
Mas a necessidade — e possibilidade — de manutenção do seu quantum
originalmente fixado não é atingida pela imutabilidade, pois não se estará
alterando o que ficou decidido, mas reafirmando o valor que ali foi
estabelecido.”(15)

Convém mencionar que a ação revisional não pode ser manejada como
se fosse mais um recurso da sentença primitiva, porquanto a discussão
possível refere-se às mudanças fáticas ou de direito ocorridas após o primeiro
julgamento, em razão da natureza continuativa da relação jurídica criada pela
sentença. Não há, portanto, violação da coisa julgada anterior, conforme bem
analisa Sérgio Cavalieri:

“A revisão não afronta a coisa julgada, porque estamos em face de uma


sentença que decidiu uma relação jurídica continuativa e que, por isso,

(15) STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 8. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011. p. 1588.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 403

traz im plícita a cláusula rebus sic stantibus. Constatando um fato


superveniente que modificou a relação jurídica anterior, decidida pela
sentença, nada impede um novo pronunciamento judicial, mesmo porque
já teremos uma nova relação jurídica, uma outra lide, não abrangida pela
res judicata.’V6)

O segundo julgamento em outra ação apenas ajusta o comando da


sentença anterior à nova realidade fática, para garantir a continuidade do
espírito de justiça do valor ou percentual da indenização fixada em forma de
pensionamento(17>. Presume-se que o prolator do primeiro julgamento, se
estivesse diante desse novo estado de fato da vítima, teria proferido a mesma
sentença da ação revisional(18). Pode-se afirm ar, portanto, que não há
desrespeito, mas verdadeira fidelidade à coisa julgada, como bem registra
Alexandre de Paula:
“No fundo, a revisão se opera em homenagem mesmo à coisa julgada,
de vez que a sentença considerou, no momento de sua emissão, fatos e
circunstân cias relevantes que não mais perduram , que sofreram
alterações de tal ordem, que traduziria sum ma injuria, verdadeira
denegação da Justiça, m antê-la intocável na sua letra, por omnia
seci//a...”(19)

De qualquer forma, importa anotar que o pedido revisional só terá êxito


se ficar comprovada a mudança superveniente alegada. Assim, por exemplo,
se o reclamante postula aumento da pensão pelo agravamento da doença
ocupacional, terá que comprovar o novo dano (agravamento da doença ou do
percentual de invalidez fixado na primeira sentença) e o nexo causal desse
agravamento com a situação que gerou a referida doença ocupacional. Pode

(16) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 141.
(17) “ Previdenciário. Processo civil. A ção revisional de benefícios. A cidentário. R elação
jurídica continuativa. Art. 471, inciso I, do CPC. Im provim ento do recurso. É de natureza
continuativa as ações revisionais acidentárias, vez que o auxílio-acidente mensal é vitalício
e corresponde a percentual do salário de benefício do segurado (art. 86, § 1e da Lei n.
8.213/91 alterada pela Lei n. 9.032/95). A revisão prevista no art. 471, inciso I, do Código de
Processo Civil é uma exceção à regra geral de que nenhum juiz decidirá novam ente as
questões já decididas relativa à mesm a lide, e por conseguinte não agride o ato jurídico
perfeito ou a coisa julgada. Recurso desprovido.” STJ. 5a Turma. REsp n. 141.486 /P E , Rei.:
Ministro José Arnaldo da Fonseca, D J 03 maio 1999.
(18) C om o bem assevera José de A guiar Dias, “sem dúvida que a sentença deve ser
executada fielmente. Mas a linguagem da lei deve ser entendida de form a que corresponda
ao seu espírito e não de maneira a traí-lo, m ediante interpretação farisaica, que consiste em
sim ular respeito à lei, para deixar de aplicá-la.” Cf. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1995. v. II, p. 726.
(19) PAULA, Alexandre de. Código de Processo Civil anotado. 3. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1986. p. 637.
404 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

ser que o dano adicional (a redução da capacidade ou a invalidez total) tenha


surgido em decorrência de outras atividades desenvolvidas pela vítima ou
por razões de doenças degenerativas ou do grupo etário, sem ligação com a
patologia incapacitante considerada na sentença primitiva. Nessa hipótese,
apesar de comprovado o novo dano, não há nexo causal com o trabalho
anteriormente desempenhado pelo acidentado, o que inviabiliza o acolhimento
do pedido revisional.
Para o Desembargador Sérgio Cavalieri, a eficácia jurídica da nova
sentença será exnunc, a partir do seu trânsito em julgado, vigendo até então
os efeitos da sentença anterior(20). Concordamos apenas em parte com esse
entendimento. Estamos de acordo, sem dúvida, quanto aos efeitos ex nunc
da decisão proferida na ação revisional julgada procedente, dada a sua
natureza constitutiva, porquanto alterará a relação jurídica vigente entre as
partes(21). No entanto entendemos, data venia, que as conseqüências da
sentença devem ser consideradas desde a data do ajuizamento da nova ação
na Justiça do Trabalho, podendo a parte autora requerer o deferimento da
tutela antecipatória ou mesmo decisão cautelar, se for o caso(22).
Se o acidentado, por exemplo, vinha recebendo uma pensão equivalente
a 50% do seu último salário em razão de invalidez parcial, mas, vencidos
alguns anos, tornou-se totalmente incapaz, deve receber a pensão integral
desde a data do ajuizamento da ação revisional. Se for adotado o entendimento
de que os efeitos da decisão revisional só devem ser computados a partir do
seu trânsito em julgado, o acidentado pode ser seriamente prejudicado porque
durante o período da tramitação processual, que pode demorar anos, ficará
privado do novo valor da pensão.
Aliás, entendemos pertinente aplicar por analogia a previsão constante
da Lei n. 5.478/1968, que trata da ação de alimentos:
“Art. 13. O disposto nesta iei apiica-se igualmente, no que couber, às ações ordinárias
de desquite, nulidade e anulação de casamento, à revisão de sentenças proferidas
em pedidos de alimentos e respectivas execuções.

(20) CAVALIERI FILHO, Sérgio. Program a de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012. p. 142.
(21) THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 45. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2006. v. 1, p. 611.
(22) Entendo razoável aplicar, m utatis mutandis, a cautelar adm itida na rescisória para
suspen d er total ou parcialm ente a execução, conform e e n tendim ento conso lid a d o na
Orientação Jurisprudencial n. 76 da SBDI-II: “Ação rescisória. Ação cautelar para suspender
execução. Juntada de docum ento indispensável. P ossibilidade de êxito na rescisão do
ju lg a d o . É in d is p e n s á v e l a in s tru ç ã o da açã o c a u te la r com as p ro va s d o c u m e n ta is
necessárias à aferição da plausibilidade de êxito na rescisão do julgado. Assim sendo,
devem vir junto com a inicial da cautelar as cópias da petição inicial da ação rescisória
principal, da decisão rescindenda, da certidão do trânsito em julgado da decisão rescindenda
e inform ação do andamento atualizado da execução.”
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 405

§ 1a. Os alimentos provisórios fixados na inicial poderão ser revistos a qualquer tempo,
se houver modificação na situação financeira das partes, mas o pedido será sempre
processado em apartado.

§ 2°. Em qualquer caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação.”

Vale citar, tam bém , a Lei n. 8.245/1991, que regula as locações


imobiliárias, cujo art. 69 estabelece que, na ação revisional de aluguel, o novo
valor fixado na sentença retroage à data da citação, sendo que, se houver
pedido, o juiz, com base nos elementos fornecidos pelo autor, poderá fixar
um valor a título de aluguel provisório (art. 68, I). Pode-se invocar, ainda, o
dispositivo do art. 478 do Código Civil, quando estabelece que os efeitos da
sentença que decretar a resolução do contrato por onerosidade excessiva
retroagirão à data da citação.

Nessa linha de raciocínio, coloca-se a Súmula n. 226 do STF, segundo


a qual os alimentos são devidos desde a inicial e não a partir da data da
decisão que os concede. Também a Súmula n. 277 do STJ firmou entendi­
mento no sentido de que, julgada procedente a investigação de paternidade,
os alimentos são devidos a partir da citação.

A revisão pretendida deve ser intentada por intermédio de processo


distinto e autônomo, pelo que é inviável pretender a revisão da sentença
anterior mediante simples oposição de Embargos à Execução(23). Mesmo não
havendo norm a legal expressa a respeito, esse entendim ento acabou
consagrado pela doutrina e jurisprudência, sobretudo porque na execução
não cabe alterar os limites fixados na decisão transitada em julgado(24). Além
disso, são mais restritas as possibilidades dos Embargos à Execução, tanto
que no Processo do Trabalho as decisões proferidas em execução de
sentença não são passíveis de recurso de revista, salvo na hipótese de ofensa

(23) CLT. Art. 879, § 19. “Na liquidação, não se poderá modificar, ou inovar, a sentença
liquidanda, nem discutir matéria pertinente à causa principal.” No mesmo sentido prevê o
art. 475, G, do CPC: “É defeso, na liquidação, discutir de novo a lide ou m odificar a sentença
que a julgou.”
(24) “ Processual civil. R ecurso especial em agravo de instrumento. Liquidação de sentença.
Pensão m ensal vitalícia. Alegação de fato novo (reabilitação da vítima). Suposta violação
do art. 471, /, do CPC. Não ocorrência. Desprovimento. 1. O juiz pode decidir novamente as
questões já decididas, quando sobrevier, na relação jurídica continuativa, a modificação no
estado de fato ou de direito (CPC, art. 471, I). 2. O juízo de prim eiro grau, no entanto,
e q u iv o c o u -s e na a p lic a ç ã o d e s s a re g ra , p o rq u a n to s u p rim iu , sem o b s e rv â n c ia do
contraditório, o direito do recorrido — garantido por coisa julgada material — à percepção
de pensão m ensal v ita líc ia e s ta b e le c id a no títu lo ju d ic ia l c o n d e n a tó rio . 3. E ventual
recuperação do recorrido (fato novo) deve ser, indiscutivelm ente, avaliada e comprovada
em perícia médica, sob pena de ofensa à coisa julgada material e ao devido processo legal
(CF/88, art. 52, XXXVI, LIV e LV). 4. Recurso especial desprovido.” STJ. 1a Turma. REsp n.
782.087/RJ, Rei.: Ministra Denise Arruda, DJ 02 ago. 2007.
406 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

direta e literal de norma da Constituição Federal(25). Comentando a respeito


desse assunto, anotou o insigne Moacyr Amaral Santos:
“A ação de revisão ou de m odificação deverá ser m anifestada em
processo distinto do em que foi proferida a sentença revisionanda, perante
o juiz de primeiro grau que a proferiu, ainda que esta tenha sido objeto de
recurso e por este afinal decidida.”(26)
Para finalizar este tópico, convém mencionar que a pretensão deduzida
na ação revisional não está sujeita à prescrição, visto que a segunda decisão
só produzirá efeitos ex nunc a partir do ajuizam ento, conform e acima
mencionado. Uma vez decidido na sentença anterior o pagamento da pensão
mensal, o fundo do direito está garantido enquanto durar essa relação jurídica
de natureza continuativa. Dessa forma, a ação revisional poderá ser ajuizada
em qualquer época durante o pensionamento, desde que ocorra uma alteração
relevante e mensurável do estado de fato ou de direito, que foi considerado
por ocasião do primeiro julgamento.
Poder-se-ia até cogitar da prescrição parcial de dois ou cinco anos,
conforme o caso, se fosse atribuído o efeito exnunc da ação revisional a partir
da ciência inequívoca da mudança do estado de fato da vítima e não da data do
ajuizamento, como acima defendido. Nessa hipótese, seria válido aplicar por
analogia o entendimento sedimentado nas Súmulas ns. 327 do TST(27) e 85 do
STJ(28>. Também seria cabível, como reforço de fundamentação, considerar a
previsão do art. 104 da Lei n. 8.213/1991, segundo o qual as ações (rectius:
pretensões) referentes a prestações por acidente do trabalho prescrevem em
cinco anos, contados da data em que for reconhecida pela Previdência Social
a incapacidade permanente ou o agravamento das seqüelas do acidente.

12.5. Alteração ocorrida antes do trânsito em julgado

Quando a modificação ocorre durante a tramitação do processo, mas


antes do trânsito em julgado da sentença, não cabe, ainda, o ajuizamento de

(25) CLT. Art. 896, § 2°. “Das decisões proferidas pelos Tribunais Regionais do Trabalho ou
por suas Turmas, em execução de sentença, inclusive em processo incidente de embargos
de terceiro, não caberá Recurso de Revista, salvo na hipótese de ofensa direta e literal de
norma da C onstituição Federal.”
(26) SANTOS, M oacyr Amarai. Com entários ao Código de P rocesso Civil. 4. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1986. v. IV, p. 454.
(27) Súmula n. 327 do TST: A pretensão a diferenças de com plem entação de aposentadoria
sujeita-se à prescrição parcial e qüinqüenal, salvo se o pretenso direito decorrer de verbas
não recebidas no curso da relação de em prego e já alcançadas pela prescrição, à época da
propositura da ação.
(28) Súmula n. 85 do STJ: “Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública
figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição
atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.”
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 407

ação revisional. Não há como rever a decisão que ainda é passível de recurso
e, portanto, sujeita a mudança pela instância superior. Nessa hipótese poderá
a parte interessada invocar, quando cabível, a aplicação do art. 462 do CPC,
que estabelece:
“Art. 462. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou
extintivo do direito influir no julgam ento da lide, caberá ao juiz tom á-lo em consideração,
de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença.”

O comando estabelecido no art. 462 do CPC favorece a economia dos


atos processuais, porquanto evita o ajuizamento de nova ação, além de
propiciar que o julgamento reflita com mais fidelidade a situação das partes
no momento da decisão final. Como assevera Galeno Lacerda, “o processo
deixa de ater-se a um momento estático no tempo, para afeiçoar-se, ao
contrário, ao dinamismo e à fluência da vida, a fim de, com olhos voltados à
economia das partes e à necessidade de eliminar-se o litígio com presteza,
aproveitar o já instaurado para fazer justiça ulterior ao momento inicial.”(29) Em
sintonia com esse pensamento, coloca-se a Súmula n. 394 do TST, com o
seguinte teor:
“Art. 462 do CPC. Fato superveniente. O art. 462 do CPC, que admite a invocação de
fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito, superveniente à propositura da
ação, é aplicável de ofício aos processos em curso em qualquer instância trabalhista
(ex-OJ n. 81 da SBDI-1 — inserida em 28.4.1997).”

A título de exemplo, podemos citar alguns fatos supervenientes que


podem ocorrer durante a tram itação processual: morte do acidentado,
concessão de aposentadoria por invalidez junto à Previdência Social,
cancelamento de aposentadoria por invalidez, recebimento pela vítima de
indenização de seguro patrocinado pelo empregador, celebração de acordo
em outra ação, amputação de um dedo ou membro, posse do reclamante
como servidor público etc., etc.
A disposição do art. 462 mencionado, contudo, deve ser aplicada com a
necessária cautela, zelando para que a parte contrária não seja surpreendida
com a alegação de fato novo, sem que tenha oportunidade de impugnação ou
até mesmo de apresentar contraprova. Os princípios do contraditório, da ampla
defesa e do devido processo legal não podem ser ignorados ou relegados a
plano secundário, especialmente quando a alegação do fato superveniente
ocorre após o julgamento da primeira instância(30). Aliás, no STF firmou-se o

(29) LACERDA, Galeno. O Código e o form alism o processual. Ajuris, Porto Alegre, n. 28, p.
12, jul. 1983.
(30) Com igual pensamento assevera Araken de Assis: “De tal ordem é a influência do fato
superveniente, no desfecho da causa, que o órgão judiciário não deverá surpreender as
partes, aplicando-o ex officio, com o lhe autoriza o art. 462, sem apresentá-lo ao debate
conjunto. F eita a alegaçã o pelo in te re ssa d o , im põe-se a o b se rvâ n cia do co n tra d itó rio ,
408 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

entendimento de que não se aplica o disposto no art. 462 do CPC na fase


extraordinária, a não ser em casos absolutamente excepcionais(31).

12.6. Questões controvertidas sobre o cabimento da ação revisional

O caso típico de cabimento da ação revisional ocorre quando o acidentado


é beneficiário de pensão mensalmente paga pelo empregador, proveniente
de sentença transitada em julgado em ação de indenização por acidente do
trabalho ou doença ocupacional. Havendo alteração da situação fática da
vítima, qualquer das partes pode pedir a revisão ou mesmo a supressão do
valor do pensionamento fixado na sentença.

No entanto, além da hipótese mais comum acima mencionada, ocorrem


outras alterações em momentos e situações diversas, que geram efeitos
jurídicos distintos. Nem sempre será cabível a ação revisional propriamente
dita, mas a alteração do estado de fato ou de direito, após o trânsito em julgado,
poderá ensejar outra demanda correlata, conforme passaremos a expor nos
tópicos seguintes.

12.7. Alteração ocorrida após a indenização paga de uma só vez

O Código Civil de 2002, no art. 950, parágrafo único, facultou ao


prejudicado exigir que a indenização pela perda ou redução da capacidade
laboral seja arbitrada e paga de uma só vez. Ocorre que, após o pagamento
da indenização de uma só vez, pode o acidentado apresentar alteração
importante quanto à perda funcional, modificando a situação fática considerada
no arbitramento da indenização pelo juiz. Caberia, também nessa hipótese, a
veiculação da ação revisional?

Entendemos pelo não cabimento da ação revisional propriamente dita


porque a sentença, ao determ inar o pagam ento de uma só vez, não

colhendo o juiz a manifestação da parte contrária e, se for o caso, admitindo sua prova” . Cf.
“ Extinção do processo por superveniência de dano irreparável.” In: Doutrina e prática do
processo civil contemporâneo. São Paulo: RT, 2001. p. 198.
(31 ) “D ire ito do T rabalho. A g ra v o re g im e n ta l em re c u rs o e x tra o rd in á rio com agravo.
Im possibilidade de aplicação do art. 462 do CPC. A jurisprudência desta Corte firm ou-se no
sentido de que o art. 462 do CPC não se aplica na instância extraordinária.” STF. 2- Turma.
ARE 665710 AgR, Rei.: Min. Gilmar Mendes, DJ 20 jun. 2012.
“A g ra vo re g im e n ta l no re cu rso e xtra o rd in á rio . A rt. 4 6 2 do C ó d ig o de P ro ce sso Civil.
Inaplicabilidade. O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que o art. 462 do
C ódigo de Processo C ivil, salvo em hipóteses excepcionais, não se aplica ao recurso
extraordinário.” STF. 1ã Turma. RE 433592 AgR, Rei.: Min. Dias Toffoli, DJ 31 maio 2012.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 409

estabeleceu uma relação jurídica de natureza continuativa. O juiz considerou


o grau de invalidez comprovado nos autos e arbitrou a indenização cabível
para ser paga em parcela única. A ação revisional é típica das relações jurídicas
de trato sucessivo. Dessa forma, se a vítima, anos mais tarde, recuperar
parcial ou totalmente a capacidade laborativa, não pode o empregador requerer
a devolução parcial do valor arbitrado porque a indenização de uma só vez
pôs termo ao processo nos limites do dano alegado, do pedido formulado e da
sentença proferida. O trânsito em julgado ocorrido tornou imutável e indiscutível
a sentença (art. 467/CPC).
Todavia, se houver agravamento comprovado da incapacidade laborativa,
entendem os que o acidentado poderá ajuizar outra ação postulando a
indenização, mas tão somente desse dano adicional, desde que ainda haja
nexo causal com o acidente do trabalho anteriormente ocorrido e estejam
presentes os pressupostos da responsabilidade civil. Trata-se, na hipótese,
de uma nova demanda com pedido e causa de pedir diferentes, fora dos limites
objetivos da coisa julgada anterior(32). Como bem acentua Barbosa Moreira,
“é ocioso salientar o que há de óbvio na asserção: coisa julgada não pode
deixar de ser a coisa (res) que se julgou. Aquilo que não se julgou ... não se
converte, à evidência, em coisa julgada!”(33)

Essa segunda ação não tem o propósito de rever os efeitos futuros ou


pretéritos da sentença anterior, mas de estabelecer a reparação cabível para
um novo dano, em ação diversa, ou seja, um novo pedido e por outra causa
de pedir. Assim, se o acidentado, na primeira ação, teve comprovada a redução
da capacidade de trabalho em 50% e mais tarde, porém, após o recebimento da
indenização em parcela única, a situação avançou para incapacidade total,
cabe discutir na segunda ação apenas o alegado dano superveniente.

É certo que a coisa julgada anterior é inviolável, mas tão somente nos
limites da lide e das questões decididas (art. 468/CPC). Os motivos e os
fatos discutidos e adotados como fundamento para o julgamento anterior não
fazem coisa julgada e nem vinculam o julgador dessa segunda causa (art.
469/CPC).
Pode ocorrer, por exemplo, que nessa segunda ação fique demonstrado
que o agravamento da doença incapacitante não teve etiologia ocupacional,

(32) “ C oisa ju ig a d a . S egunda dem anda. Indenização. A sentença tra n sita em julgado,
deferindo indenização correspondente à incapacidade em grau menor do que o apurado
no processo judicial, que ali não poderia ser reconhecida porque fora do pedido inicial, não
im p e d e u m a s e g u n d a d e m a n d a p ro p o s ta p a ra o b te r a d ife re n ç a de in d e n iz a ç ã o
correspondente ao m aior grau de incapacidade. Recurso conhecido e provido.” STJ. 4-
Turma. REsp n. 175.681/SP, Rei.: Ministro Ruy Rosado de Aguiar, D J 08 fev. 1999.
(33) MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
1998. p. 243.
410 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

sendo incabível qualquer nova condenação. Mesmo que na sentença anterior


o julgador tenha considerado a doença como de natureza ocupacional, essa
verdade estabelecida como fundamento da sentença não vincula o prolator
da segunda decisão. Como assevera com propriedade Ovídio Baptista, “a
influência que a sentença pode exercer sobre o juiz do futuro processo não
passará de efeito de precedente, capaz, seguidamente, de exercer acentuada
ou quase irresistível influência psicológica sobre o espírito do juiz, mas não
irá além dessa sim ples autoridade moral a que o julgador não se liga
juridicamente, permanecendo livre para decidir de modo diverso.”(34)
Convém assinalar que, na hipótese deste tópico, o prazo prescricional
dos direitos decorrentes do agravamento do dano — diferentemente do que
ocorre com a ação revisional típica — só com eça a fluir quando restar
constatado de forma inequívoca o dano adicional, independentemente da data
de extinção do contrato de trabalho, aplicando-se, também aqui, o entendimento
da Súmula n. 278 do STJ(35). Nesse sentido assinala o mestre Caio Mário:
“No caso de ocorrerem danos continuados, porém subordinados a uma causa
única, o prazo prescricional inicia-se quando se completar a lesão. Ao revés,
em se tratando de fatos danosos autônomos, a pretensão objetiva-se em
relação a cada um deles e, consequentemente, a prescrição.”(36) O prazo
prescricional é o mesmo, porém o início da sua contagem só ocorre quando
se constata efetivamente a violação do direito, ou seja, a partir do nascimento
da pretensão, que no caso é o agravamento do dano.

12.8. Alteração ocorrida após a celebração de acordo

A ocorrência de dano superveniente à celebração de acordo também


não enseja o ajuizamento da ação revisional propriamente dita, a não ser que
o termo de conciliação tenha estabelecido o pagamento de pensão mensal,
criando, efetivamente, uma relação jurídica de natureza continuativa.
De toda forma, mesmo após a extinção do processo por acordo, quando
se ajustou uma indenização para pôr fim ao litígio, ainda pode ser cabível o
ajuizamento de outra ação com pedido indenizatório quando se verificar o
agravamento do dano, de modo semelhante ao exposto no tópico anterior.

Importa salientar que a quitação dada no termo de conciliação só abrange


os limites do pedido e das lesões até então conhecidas. Os limites objetivos

(34) SILVA, Ovídio A. Baptista. Sentença e coisa julgada: ensaios e pareceres. 4. ed. rev. e
ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 95.
(35) STJ. SÚMULA N. 278: “O term o inicial do prazo prescricional, na ação de indenização,
é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral.”
(36) PEREIRA, Caio M ário da Silva. R esponsabilidade civil. 9. ed. 8ã t. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 340.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 411

da coisa julgada, conforme previsto no art. 468 do CPC, não mudam em razão da
celebração do acordo. Assim, não pode ser acolhida ou considerada válida a
quitação de eventuais danos futuros, incertos e indeterminados, antes mesmo
do nascimento da pretensão reparatória. O termo de conciliação, por óbvio,
não produz o efeito de impedir o aparecimento de novos danos até então
desconhecidos, nem impede o nascimento de pretensão quando, mais tarde,
for constatada a efetiva violação do direito. Até porque a Constituição da
República veda excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou
ameaça de direito (art. 5Q, XXXV). Vale lembrar, ainda, que a transação deve
ser interpretada restritivamente, como dispõe expressamente o art. 843 do
Código Civil, pelo que não se admite que haja quitação implícita de danos
desconhecidos e futuros no momento da celebração do ajuste.

12.9. Morte do acidentado

Quais os efeitos jurídicos derivados da morte do acidentado, que vinha


percebendo pensão mensal deferida em ação indenizatória de acidente do
trabalho ou doença ocupacional? Caberia nessa hipótese ação revisional?

Vamos com eçar pela resposta da segunda indagação. Não cabe o


ajuizamento da ação revisional quando ocorre a morte do acidentado. O direito
ao pensionamento deferido ao falecido encerrou-se com a sua morte, nos
exatos limites fixados na sentença anterior. O direito que se transmite com a
herança (art. 943 do Código Civil) é o de exigir reparação de danos, de bens
que já integravam o patrimônio da vítima e não os proventos futuros deferidos
a título de pensão ou de lucros cessantes. Se a morte encerrou a relação
jurídica de natureza continuativa entre o empregador e o acidentado, não há
falar em revisional de pensão, agora inexistente(37).
Todavia, esse fato novo — a morte — pode ensejar o ajuizamento de
outra ação indenizatória, mas por parte dos que foram diretamente lesados.
Com efeito, aquelas pessoas a quem o morto devia alimentos, conforme
mencionado no art. 948, II, do Código Civil, podem postular, em nome próprio,

(37) “ R ecurso ordinário em mandado de segurança. Administrativo. Responsabilidade civil


do Estado. Redução da capacidade laborativa. P ensão vitalícia. Extensão da obrigação
aos dependentes. Impossibilidade. 1. Indenização por ato ilícito não se confunde com pensão
enquanto benefício previdenciário (Resp 811.193/GO, Min. Rei. Jorge Scartezzini, 4- T., DJ
de 6.11.2006). A indenização, reconhecida em sentença, representada por pensão mensal
vitalícia, devida a quem teve reduzida a capacidade laborativa, tem caráter personalíssimo,
perdurando enquanto vivo o seu titular. Falecido o credor, em respeito à natureza da obrigação
e aos limites da coisa julgada, os seus dependentes não têm direito a continuar percebendo
a indenização. 2. R ecurso ordinário im provido.” STJ. 1a Turm a. RMS 21611 / PR, Rei.:
Ministro Teori Albino Zavascki, DJ 08 maio 2007.
412 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

a reparação dos prejuízos sofridos em razão desse fato superveniente. São


elas que detêm legitimidade para ajuizar outra ação indenizatória em face do
empregador, postulando o pagamento da pensão mensal para garantir o
mesmo nível de renda que o falecido conferia àquele núcleo fam iliar,
descontando-se a parcela que ele habitualmente despendia com suas próprias
despesas.

De qualquer forma, os dependentes econômicos do acidentado falecido


som ente terão dire ito ao pen sion am e nto se estiverem p resen tes os
pressupostos da responsabilidade civil, ou seja, que a morte tenha nexo de
causalidade com o acidente anterior e que tenha havido culpa do empregador
ou que a atividade deste implicava riscos, na forma do art. 927, parágrafo
único, do Código Civil. Havendo evidências de que ocorreu a morte prematura
do acidentado em decorrência de um agravamento dos efeitos da doença
ocupacional ou do acidente anteriorm ente sofrido, estará preenchido o
pressuposto do nexo causal.

Por outro lado, se for constatado que a morte ocorreu por motivos
diversos, sem ligação com o acidente anterior ou por uma doença sem origem
ocupacional, como, por exemplo, uma doença degenerativa ou inerente ao
grupo etário, não cabe indenização alguma aos dependentes do falecido.

Convém mencionar, como registramos acima, que os motivos e os fatos


discutidos e adotados como fundamento para o julgamento da ação anterior,
que deferiu o pensionamento ao próprio acidentado, não fazem coisa julgada
e nem vinculam o julgador dessa segunda causa (art. 469/CPC). Apesar da
semelhança das questões discutidas, os limites objetivos e subjetivos da coisa
julgada anterior são diversos, visto que tanto a parte (os dependentes) quanto
o pedido (pensionamento fracionado entre os autores) e a causa de pedir (a
morte) são diferentes. É certo que o julgamento anterior pode ter importante
influência no convencimento do julgador, mas não ocorre uma vinculação
necessária.

É possível, ainda, ocorrer uma terceira hipótese: o acidente do trabalho


anterior pode ter atuado como fator concausal para a morte prematura. Os
efeitos ou seqüelas do acidente do trabalho, conjugados com outras causas
pessoais da vítima, podem ter acelerado o processo mórbido para atingir o
dano maior: a morte. O nexo concausal não impede a indenização, mas reduz
o seu valor; o montante deverá ser apurado na proporção e na intensidade
em que o acidente do trabalho tenha contribuído para a morte antecipada do
acidentado.
CAPÍTULO 13

CONTROVÉRSIAS SOBRE A COMPETÊNCIA

13.1. Histórico das controvérsias sobre a com petência

Após a prom ulgação da Constituição de 1988, a com petência para


processar e julgar as ações indenizatórias decorrentes dos acidentes do
trabalho gerou controvérsias e decisões contraditórias que se tornaram mais
acentuadas com a prom ulgação da Emenda Constitucional n. 45/2004.
Somente no julgamento memorável do Conflito de Competência n. 7.204-1,
ocorrido no dia 29 de junho de 2005, o Supremo Tribunal Federal, em sua
composição plenária, pacificou de vez o entendimento quanto à competência
da Justiça do Trabalho e não mais da Justiça Comum dos Estados.

Para com preender o significado transcendente dessa m udança de


com petência, vam os fazer um breve histórico das discussões havidas,
valendo ressaltar que a polêmica sempre esteve presente desde a criação
da Justiça do Trabalho, ramo do Poder Judiciário especializado na solução
dos litígios entre o trabalhador e a empresa. De fato, a competência que era
atribuída à Justiça Comum dos Estados para o julgamento de tais ações
representava uma anomalia no sistema, de difícil aceitação.

Quando do advento da CLT, em 1943, não havia discussão a respeito


dessa competência porque o Decreto n. 24.637/1934, que regulamentava o
seguro de acidente do trabalho, expressamente excluía a responsabilidade
civil do empregador(1). As demandas judiciais envolvendo acidente do trabalho
som ente versavam sobre os d ire ito s a sse g u ra d o s na le g isla çã o da
infortunística. Daí a ressalva indicada no art. 643, § 2S, da CLT: “As questões
referentes a acidentes do trabalho continuam sujeitas à justiça ordinária, na
forma do Decreto 24.637, de 10 de julho de 1934, e legislação subsequente.”

Na Assembleia Constituinte de 1946, o projeto original, além de incluir a


Justiça do Trabalho entre os órgãos do Poder Judiciário, atribuía-lhe a

(1) Decreto n. 24.637, de 10 jul. 1934. Art. 12. “A indenização estatuída pela presente lei
exonera o empregador de pagar à vítima, pelo mesmo acidente, qualquer outra indenização
de Direito C om um .”
414 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

competência para julgar os dissídios relativos aos acidentes do trabalho, por


se tratar de típica demanda decorrente da relação de trabalho. Todavia, foi
apresentada a Emenda n. 2.662 para excluir da Justiça do Trabalho a
competência para julgamento das questões acidentárias, com o propósito de
atender “aos interesses das companhias seguradoras privadas que temiam a
benevolência dos órgãos da Justiça trabalhista em favor dos acidentados.”®
Com efeito, ao art. 123 da Constituição de 1946, que tratou da competência da
Justiça do Trabalho, foi acrescido o § 1° com ressalva expressa: “Os dissídios
relativos a acidentes do trabalho são de competência da Justiça ordinária.”
Mesmo quando a seguradora era uma autarquia federal, o STF entendia que a
competência para a ação de acidente do trabalho era da Justiça Comum(3).

Da mesma forma, o Projeto original da Constituição de 1967, quando


tratava da com petência da Justiça do Trabalho, não excluía os litígios
decorrentes dos acidentes do trabalho. No entanto, a Emenda n. 820-2, de
autoria do Senador Gilberto Marinho, apoiada pela de n. 849-5, do Senador
Eurico Resende indicou a inclusão de um parágrafo sob a alegação singela de
que: “Guanabara, São Paulo, Minas, Rio Grande, Pernambuco, Bahia e outros
Estados, com suas Varas especializadas, perfeitam ente aparelhadas,
processam e julgam no momento mais de cem mil causas relativas a acidentes
do trabalho, o que torna facílimo prever as conseqüências de um hiato no sistema
atual.”(4) Por conseguinte, a Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional
de 1969 mantiveram a mesma ressalva da Constituição de 1946.0 entendimento
era que a competência para julgar as causas referentes à indenização por
responsabilidade civil, decorrentes de acidente do trabalho era da Justiça Comum
Estadual, uma vez que o art. 142, que fixava a competência da Justiça do
Trabalho, contemplava uma exceção no § 2° com o seguinte teor: “Os litígios
relativos a acidentes do trabalho são de competência da justiça ordinária dos
Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, salvo exceções estabelecidas
na Lei Orgânica da Magistratura Nacional.”
Naquela época, contudo, já se discutia a responsabilidade civil do
empregador por acidente do trabalho, porque a Súmula n. 229 do STF, publicada
em 1963, fixara entendimento de que “a indenização acidentária não exclui a do
Direito Comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador.”

Quando a Lei n. 5.316/1967 integrou o seguro de acidente do trabalho na


Previdência Social, o seu art. 16 dizia: “Os juizes federais são competentes

(2) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira. 4. ed. São
Paulo: Saraiva, 1983. p. 526.
(3) STF. Súmula n. 235, de 16 dez. 1963 — “É competente para a ação de acidente do trabalho a
justiça cível comum, inclusive em segunda instância, ainda que seja parte autarquia seguradora.”
(4) SARASATE, Paulo. A Constituição do Brasil ao alcance de todos. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1967. p. 463.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 415

para julgar os dissídios decorrentes da aplicação desta Lei.” Esse artigo,


porém, foi considerado inconstitucional porque estava em vigor a Constituição
de 1967, cujo art. 142, acima mencionado, adotava ressalva expressa
atribuindo à Justiça Comum a competência dos litígios relativos aos acidentes
do trabalho. Diante desse entendimento, o STF adotou, em 1969, a Súmula n.
501, cujo enunciado esclarecia: “Compete à Justiça ordinária estadual o
processo e o julgamento, em ambas as instâncias, das causas de acidente
do trabalho, ainda que promovidas contra a União, suas autarquias, empresas
públicas ou sociedades de economia mista.”(5)
Entretanto, desde a promulgação da Constituição da República de 1988,
a questão da competência mereceu tratamento diverso, que não pode ser
ignorado. Em primeiro lugar, porque o art. 114 não repetiu a ressalva acima
registrada, não devendo o intérprete criar distinção onde a Lei Maior não
distinguiu; em segundo, porque a indenização a cargo do empregador,
proveniente do acidente do trabalho, foi incluída expressamente no rol dos
direitos dos trabalhadores (art. 7S, XXVIII).

O professor Roland Hasson, em cuidadosa tese de doutoramento sobre


esse assunto, defendida perante a Universidade Federal do Paraná, ao analisar
a supressão pela Constituição de 1988 da ressalva que constava no art. 142,
§ 22, da Constituição de 1967, concluiu:

“A não reprodução de uma regra constante do ordenamento constitucional


anterior, sem a ressalva de sua continuidade, é um ato de vontade do
constituinte. Se é suprimida uma norma proibitiva, é evidente a sua
intenção de permitir o que antes era vedado. Como visto, os elaboradores
da Constituição de 1969 e o constituinte de 1988 trataram de modo diverso
a questão da competência da Justiça do Trabalho. A comparação entre
ambas as Constituições evidencia que, na vigente, não foi repetido o
dispositivo que retirava do âmbito da Justiça Especial a análise das lides
acidentárias.”(6)
Com pensam ento sem elhante, Rodrigues Pinto, em obra de 1993,
mencionava que a Constituição de 1946 (art. 123, § 2°) e a Constituição de
1967 (art. 142, § 2Q) expressamente excluíam o acidente do trabalho da
competência da Justiça do Trabalho. E ainda acrescentava: “Considerando
não haver na Constituição atual nenhuma norma conservando essa exclusão

(5) Vale citar uma das ementas indicadas nos precedentes que deram origem à Súmula n.
501: “ Conflito negativo de jurisdição. A cidente do trabalho. Ainda quando ajuizado contra o
INPS a com petência é da Justiça Estadual. Inconstitucionalidade do art. 16 da Lei n. 5.316,
de 14.9.1967 (CJ n. 3.893-G B ). P rocedência.” STF. Pleno. CJ 4759/S C , Rei.: M inistro
Thompson Flores, julgado em 21 ago. 1968.
(6) HASSON, Roland. Acidente de trabalho & competência. Curitiba: Juruá, 2002. p. 145.
416 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

da com petência trabalhista para conhecer de dissídios de acidentes no


trabalho, parece-nos fora de dúvida que eles devem passar a ser julgados
pelos órgãos da Justiça do Trabalho, em harmonia com a regra geral e natural
da competência em razão da matéria.”(7)

Como se verifica, as decisões que estavam atribuindo competência à


Justiça Comum dos Estados para apreciar tais litígios, data vertia, só tinham
como sustentáculo o apego às construções jurídicas do passado. Como bem
acentua o Juiz do Trabalho Saulo Fontes, não se pode estabelecer uma
espécie de “competência por tradição”, pois tal critério agride o princípio do
juízo natural(8).

Alguns julgados do STF registravam o entendimento de que o art. 1 0 9 ,1,


da Constituição de 1988 havia excluído da competência da Justiça Federal
as causas relativas ao acidente do trabalho, bem como aquelas sujeitas à
Justiça do Trabalho(9). A partir desse fundam ento precário concluíam que
a Justiça Comum era a competente para todas as ações de reparação de
danos decorrentes do acidente do trabalho(10). Contudo, uma leitura mais
atenta evidencia que aquele dispositivo apenas registra uma exceção à regra
geral, qual seja, sem pre que participar da relação processual entidade
autárquica federal — como é o caso da Previdência Social — , a competência
é da Justiça Federal, exceto quando se tratar de causas relativas a acidentes
do trabalho, as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho. Quando
se trata de identificar tecnicamente o juízo correto, o primeiro passo é investigar
se a com petência é das Justiças Especiais, visto que a Justiça Comum

(7) PINTO, José Augusto Rodrigues. Processo trabalhista de conhecimento. São Paulo: LTr,
1993. p. 113.
(8) FONTES, Saulo Tarcísio Carvalho. Acidente de trabalho — com petência da Justiça do
Trabalho: os reflexos da Emenda Constitucional n. 45. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes;
FAVA, Marcos Neves (Coord.) Nova com petência da Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr,
2005. p. 358.
(9) Constituição da República, de 5 out. 1988. Art. 109. “Aos juizes federais compete processar
e julgar: I — as causas em que a União, entidade autárquica ou em presa pública federal
forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de
falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;”
(10) “Ninguém, certamente, considera que interpretar a lei seja interpretar a passagem de
um artigo ou de um inciso, colocando-o ao m icroscópio e exam inando suas partículas,
absolutamente desinteressado de todo o organism o vivo, do qual faz parte esse fragmento.
Isso não é interpretar, é apenas ler um texto. A leitura pode s e rtã o inteligente e compreensiva
quanto se queira; poderá o leitor conhecer a etimologia de todas e de cada uma de suas
palavras, dom inando suas raízes históricas; poderá ele ser um sagaz crítico gram atical,
capacitado a pôr em relevo as exatidões ou os erros do trecho examinado. Mas se o trabalho
não vai além disso, se se limita a exam inar o fragm ento que se encontra no microscópio,
não haverá interpretação. Toda tarefa interpretativa pressupõe trabalho de relacionar a
parte com o todo. O sentido é extraído inserindo-se a parte no todo.” Cf. COUTURE, Eduardo
J. Interpretação das leis processuais. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 28-29.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 417

Estadual tem a competência residual. Em outras palavras, somente será


atribuída à Justiça Comum aquela causa que não puder ser enquadrada na
competência de alguma das Justiças Especiais(11).
A interpretação que concluía pela competência da Justiça Comum incidia
em visível equívoco, porque em vez de privilegiar a regra da competência
ampla da Justiça do Trabalho, conforme previsto no art. 114 da Constituição,
buscava solução por obscura via transversa numa exceção à competência
da Justiça Federal. Ora, a ressalva do art. 109, I, da Carta Maior só indica
que as causas de falência, de acidente do trabalho e as sujeitas à Justiça
Eleitoral e à Justiça do Trabalho não são da competência da Justiça Federal,
mesmo quando forem interessadas a União, entidade autárquica ou empresa
pública federal. Assinala o professor Roland Hasson que “é por demais
incoerente e forçado o entendimento de que a definição da competência entre
a Justiça Estadual e a do Trabalho para as demandas acidentárias que
envolvam a responsabilidade do empregador esteja contida não no art. 114,
mas em dispositivo constitucional destinado a determinar a competência de
um terceiro órgão jurisdicional, ou seja, destinado a tratar da Justiça Federal
(art. 109, l).”<12>
O art. 129 da Lei n. 8.213/1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios
da Previdência Social, fixa a competência da Justiça Estadual para as causas
decorrentes dos acidentes do trabalho apenas no que tange aos direitos
acidentários, oriundos do seguro infortunístico, tanto que m enciona as
hipóteses de apreciação dos litígios na esfera adm inistrativa ou na via
judicial(13). Por outro lado, esses litígios em que se postulam benefícios

( 1 1 ) 0 Juiz do Trabalho da 3- Região, Vander Zambeli Vale, em cuidadoso artigo doutrinário,


assinalou: “Data maxima venia, incidem em deslize de interpretação, passando ao largo de
noções básicas de processualística, os que argum entam pela incom petência da Justiça
especial para o julgam ento de ação de (ex)empregado em face do (ex)empregador, quando
se pede indenização por dano decorrente de acidente do trabalho. Seu raciocínio eiva-se
de simplismo na medida em que procuram primeiramente enquadrar a matéria no âmbito de
com petência da Justiça comum , sabidam ente residual, sem antes verificarem o cam po
delim itado para as Justiças especiais. Ora, se a com petência comum é em inentem ente
resid ual, para fixa çã o de seu âm bito, o p rim e iro passo há de se r a d e lim ita çã o das
competências das especiais, adotando-se obviamente em tal mister os critérios estabelecidos
pela Constituição e demais leis, situando-se, assim, por exclusão, o campo de atuação da
Jurisdição comum. A inversão da ordem atenta contra a Constituição e fere o senso lógico
quando se procura a com petência residual sem se considerar a expressam ente prevista” .
Cf. A cidente do Trabalho — C ulpa do E m pregador — Indenização — C om petência da
Justiça do Trabalho. Jornal Trabalhista, Brasília, v. 13, n. 601, p. 392, 1996.
(12) HASSON, Roland. Acidente de trabalho & competência. Curitiba: Juruá, 2002. p. 156.
(13) Art. 129. “Os litígios e m edidas cautelares relativos a acidentes do trabalho serão
apreciados: I — na esfera administrativa, pelos órgãos da Previdência Social, segundo as
regras e prazos aplicáveis às demais prestações, com prioridade para a conclusão, e II —
na via judicial, pela Justiça dos Estados e do Distrito Federal, segundo o rito sumaríssimo,
418 S e b a s t iã o G eraldo de O liv e ir a

acidentários, ainda que provenientes da execução do contrato de trabalho,


não têm o empregador no polo passivo, já que a ação é ajuizada pelo segurado
em face da Previdência Social, que detém o monopólio do seguro de acidente
do trabalho(14).

Ademais, não há dúvida de que os danos sofridos pelo empregado,


provenientes dos acidentes do trabalho, estão diretamente relacionados à
execução do contrato laboral, mormente porque a culpa do empregador ou
mesmo o risco da atividade, nessa hipótese, quase sempre resulta da não
observância das normas regulamentares de segurança, higiene e saúde no
ambiente de trabalho previstas na legislação trabalhista.

Como se depreende do exposto, a conclusão inarredável seria que, após


a Constituição da República de 1988, os litígios referentes às indenizações
por danos materiais, morais ou estéticos postuladas pelo acidentado em face
do empregador, provenientes de acidente do trabalho, deveriam ser aprecia­
dos pela Justiça do Trabalho.

A pesar dessa sólida fundam entação, durante vários anos houve


decisões contraditórias sobre o tema nos tribunais superiores(15), sendo que

inclusive durante as fé ria s forenses, m ediante petição instruída pela prova de efetiva
no tifica çã o do evento ã P revidência S ocial, através de C o m unicação de A cid e n te do
Trabalho — CAT.”
(14) “D anos m orais — D oença p ro fis s io n a l — C om petência da ju s tiç a do trabalho. A
com petência da Justiça do Trabalho é definida peio art. 114/CF, estando nela inserido o
julgam ento de todos os dissídios individuais, entre trabalhadores e em pregadores, que
tenham origem na relação de trabalho. Ao definir a com petência da Justiça Federal, no art.
109 a CF/88 dispõe que com preende o processam ento e julgam ento de causas em que
forem partes a União, entidade autárquica ou em presa pública federal, exceto as de acidente
de trabalho e aquelas sujeitas à Justiça do Trabalho, dentre outras ali enumeradas. Conclui-
-se, assim, que as causas de acidente de trabalho, em que forem parte o empregado na
condição de segurado e o INSS são da com petência da Justiça Estadual. Não se pode,
e n tre ta n to , p re te n d e r seja a J u s tiç a C om um co m p e te n te p ara ju lg a r d is s íd io s e ntre
em pregado e em pregador que tenham origem no acidente do trabalho desde que nada
seja postulado em relação ao INSS, como é o caso dos autos, sendo a com petência da
Justiça do Trabalho, por força do art. 114, CF/88. A conclusão inevitável é a de que o § 2Q,
do art. 643, da CLT, foi revogado pelo art. 114 CF/88. O pedido de indenização por dano
moral form ulado com base na m oléstia que o obreiro acredita ter origem profissional, é
dirigido diretam ente contra o empregador, não tendo qualquer efeito reflexo contra o INSS,
estando fundado no disposto pelo art. 7-, XXVIII, CF/88, sendo, portanto, desta Justiça
E specializada a com petência ratione m ateriae para a p re ciá -lo .” M inas G erais. T R T 3-
Região. 3ã Turma. RO n. 9150/99, Rei.: Juíza convocada Cecília Alves Pinto, DJ 30 maio
2000.
(15) “R ecurso extraordinário. Medida Cautelar. Deferimento. É de deferir-se medida cautelar
de suspensão dos efeitos do acórdão objeto de RE já adm itido na origem e adstrito a
questão de com petência da Justiça Comum ou da Justiça do Trabalho para o processo,
quando, à prim eira vista, a solução dada na instância a quo, ao afirm ar a com petência
da Justiça Estadual para o caso — ação de indenização contra o em pregador por danos
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 419

no ano de 2004 prevaleceu no STF(16) e no STJ o entendimento de que a


com petência era da Justiça Comum , enquanto no TST predom inou a
conclusão de que a competência era da Justiça do Trabalho(17). Aliás, a Súmula
n. 392 do Colendo TST, adotada em 2005, sintetiza o entendimento: “Dano
moral. Competência da Justiça do Trabalho. Nos termos do art. 114 da
CF/1988, a Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsias
referentes à indenização por dano moral, quando decorrente da relação de
trabalho.” Vejam que essa Súmula do TST menciona dano moral de forma
genérica, não distinguindo se a causa tem como suporte acidente do trabalho
ou a mera execução do contrato laboral.

A publicação da Súmula n. 736 pelo STF, em dezembro de 2003, sinalizou


para a superação da controvérsia, porquanto foi adotado o entendimento de
que “compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa
de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança,
higiene e saúde dos trabalhadores” . Todavia, os precedentes dessa Súmula
indicam que sua aplicação está mais voltada para os pedidos que envolvam

decorrentes de acidente do trabalho -, é contrária à orientação do Supremo Tribunal.” STF.


1ã Turma. Pet. n. 2.260-2, Rei.: Ministro Sepúlveda Pertence, DJ ^e mar. 2002.
“Competência: Justiça comum: ação de indenização fundada em acidente de trabalho,
ainda quando movida contra o empregador. 1. É da jurisprudência do STF que, em geral,
compete à Justiça do Trabalho conhecer de ação indenizatória por danos decorrentes da
relação de em prego, não im portando deva a controvérsia ser dirim ida à luz do direito
comum e não do Direito do Trabalho. 2. Da regra geral são de excluir-se, porém, por força
do art. 1 0 9 ,1, da Constituição, as ações fundadas em acidente de trabalho, sejam as movidas
contra a autarquia seguradora, sejam as propostas contra o em pregador.” STF. 1® Turma.
RE n. 349.160/BA, Rei.: Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 19 mar. 2003.
(16) “Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Competência da Justiça Comum para
processar e julgar causas de acidente de trabalho. Precedentes. 3. Agravo regimental a
que se nega provim ento.” STF. 2- Turma. RE n. 430.377 AgR, Rei.: Ministro Gilmar Mendes,
DJ 12 nov. 2004.
“Competência: Justiça comum: CF, art. 109, I: ação de indenização fundada em acidente do
trabalho, ainda quando m ovida contra o em pregador: precedente (RE n. 349.160, 1- T.,
Pertence, DJ 14.3.03).” STF. 1â Turma. RE n. 388.277 AgR, Rei.: Ministro Sepúlveda Pertence.
DJ 08 ago. 2004.
(17) “Embargos — Competência da Justiça do Trabalho — Indenização por dano material
— Acidente de trabalho. A Justiça do Trabalho é competente para conhecer e julgar ação
versando pedido de indenização por dano material decorrente de culpa do empregador em
acidente de trabalho sofrido pelo empregado. A com petência da Justiça Comum é para
apreciar a ação acidentária, prom ovida pelo acidentado contra o Instituto Nacional do Seguro
Social — INSS — , autarquia federal, visando ao pagam ento do benefício previdenciário
respectivo. No caso dos autos, todavia, está em discussão o pedido de ressarcimento por
danos m ateriais decorrentes de a cidente de trabalho, causado em razão de culpa do
em pregador. Nessa hipótese, a obrigação de indenizar decorre diretam ente da relação
empregatícia, donde exsurge a conclusão de que a Justiça do Trabalho é com petente para
conhecer e julgar a ação, nos termos do art. 114 da Constituição. Embargos não conhecidos.”
TST. SBDI-I. ERR n. 575533/99, Rei.: Ministra Maria Cristina Peduzzi, DJ 13 fev. 2004.
420 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

preceitos cominatórios para exigir o cumprimento de normas de preservação


do m eio am biente do trabalho. De qualquer form a, não pode passar
despercebido que os acidentes ou doenças ocupacionais normalmente
decorrem do descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança,
higiene e saúde do trabalhador.

A pacificação desta tumultuada controvérsia, que durou mais de 50 anos,


só viria mais tarde com a Reforma do Judiciário, como abordaremos no item
seguinte.

13.2. Consolidação da competência da Justiça do Trabalho

A publicação da Emenda Constitucional n. 45, no apagar das luzes do


ano de 2004, indicava que a polêmica estaria solucionada. A nova redação
do art. 114 estabelece expressamente que: “Compete à Justiça do Trabalho
processar e julgar: ... VI — as ações de indenização por dano moral ou
patrimonial, decorrentes da relação de trabalho.”

Se antes dessa Emenda a conclusão técnico-jurídica já apontava a


com p e tê n cia da Ju stiça do T rabalho, depois, com o be n e p lá cito da
interpretação autêntica da Lei Maior, não restaria mais espaço para atribuir à
Justiça Comum a competência para instruir e julgar as ações de indenização
por danos morais, patrimoniais ou estéticos decorrentes da relação de trabalho,
abrangendo os acidentes do trabalho e doenças ocupacionais(18). Aliás, o
principal e mais freqüente pedido de dano moral ou patrimonial formulado pelo
em pregado em face do em pregad or aparece exatam ente nas ações
reparatórias decorrentes dos acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais.

Poder-se-ia objetar que o dispositivo da Emenda Constitucional não


menciona que estão abrangidos os danos provenientes do acidente do trabalho.
Esse argumento, todavia, não vinga porque, de acordo com os princípios da
hermenêutica, se o gênero está contemplado não há necessidade de relacionar
as espécies. Por conseguinte, todos os litígios relacionados aos danos morais
ou patrimoniais decorrentes da relação de trabalho atraem a competência da
Justiça do Trabalho, sendo oportuno enfatizar, apesar de óbvio, que só ocorre
“acidente do trabalho” quando existe previamente uma relação de emprego.

(18) Assegura o douto Edilton Meireles que “esse dispositivo, ao certo, serviu muito mais
para acabar com as controvérsias quanto à competência para julgam ento dos feitos em que
se pede o ressarcim ento de danos morais e materiais, inclusive quando decorrentes do
acidente de trabalho”. Cf. A nova Justiça do Trabalho — com petência e procedimento. In:
COU TINH O , G rijalbo Fernandes; FAVA, M arcos Neves (C oord.). N ova com petência da
Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr, 2005. p. 67.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 421

Pela técnica de redação legal, quando é intenção do legislador excluir do


gênero alguma de suas espécies, coloca-se ressalva expressa e explícita,
mormente em se tratando de norma a respeito de competência material. Aliás,
a Lei Complementar n. 95/1998, que dispõe sobre a elaboração, redação,
alteração e a consolidação das leis, incluindo as emendas à Constituição,
editada em cumprimento ao que determina o art. 59 da Constituição de 1988,
estabelece que:
“Art. 11. As disposições norm ativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem
lógica, observadas, para esse propósito, as seguintes normas: (...)

III — para a obtenção de ordem lógica:

a) reunir sob as categorias de agregação — subseção, seção, capítulo, título e livro —


apenas as disposições relacionadas com o objeto da lei;

b) restringir o conteúdo de cada artigo da lei a um único assunto ou princípio;

c) expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada


no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida;”

Por outro lado, a ação para reparação dos danos provenientes dos
acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais é tipicamente trabalhista,
envolvendo o empregado e o empregador. A Justiça do Trabalho é o ramo do
Poder Judiciário que se encontra mais próximo do dia a dia dos trabalhadores,
das relações do empregado com a empresa, das ocorrências habituais no
meio ambiente do trabalho. Consequentemente está mais habilitada para
verificar o cumprimento dos deveres do empregado e do empregador quanto
às normas de segurança e saúde no local de trabalho, conforme previsto na
Consolidação das Leis do Trabalho e nas normas regulamentares. Na trilha
do ensinamento de Giuseppe Chiovenda, “quando a lei atribui a um juiz uma
causa tendo em vista a natureza dela, obedece à consideração de ser esse
juiz mais idôneo que outro para decidir; e essa consideração não tolera aos
particulares parecer diferente.”(19)
Com pensamento semelhante, assevera o Ministro do TST João Oreste
Dalazen, estudioso do tema: “Não se pode ignorar também que o acidente de
trabalho é um mero desdobramento do labor pessoal e subordinado prestado
a outrem e, em decorrência, gera uma causa acessória e conexa da lide
trabalhista típica. De sorte que não há mesmo razão jurídica ou lógica para
que as lides decorrentes de acidente de trabalho entre em pregado e
empregador transcendam da competência da Justiça do Trabalho.”(20)

(19) C H IO V EN D A, G iuseppe. Instituições de direito processual civil. 2. ed. C am pinas:


Bookseller, 2000. p. 187.
(20) DALAZEN, João Oreste. A reforma do Judiciário e os novos marcos da competência
material da Justiça do Trabalho no Brasil. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos
Neves (Coord.). Nova competência da Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr, 2005. p. 173.
422 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Quando tudo indicava que a polêmica estaria pacificada de vez pela


Emenda Constitucional n. 45, o STF ainda adotou entendimento diverso
afirmando que a competência seria da Justiça Comum. Na sessão plenária
do dia 09 de março de 2005, ao julgar o Recurso Extraordinário n. 438.639,
interposto pela Mineração Morro Velho Ltda., entendeu a maioria dos Ministros
do STF que a Justiça Comum era a competente para instruir e julgar as ações
indenizatórias decorrentes do acidente do trabalho. Foram apontados como
fundamentos da decisão o “princípio da unidade de convicção” , “razões de
ordem prática” e “a consistência de funcionalidade” .

Entendemos, todavia, que o alegado princípio da unidade de convicção


favorece, na realidade, a com petência da Justiça do Trabalho porque
raramente o acidentado propõe ação judicial na Justiça Comum para ver
declarada a ocorrência do acidente do trabalho. Normalmente a Previdência
Social caracteriza o acidente administrativamente, em razão da emissão da
Comunicação do Acidente do Trabalho feita pelo empregador. Desde que a
Lei n. 9.032/1995 uniform izou o valor dos benefícios previdenciários e
acidentários, praticamente acabaram as ações judiciais para enquadramento
do evento como acidente do trabalho(21). Além disso, a Justiça do Trabalho
julga a estabilidade prevista no art. 118 da Lei n. 8.213/1991, decorrente do
mesmo acidente do trabalho, reforçando ainda mais que a unidade de
convicção ou a consistência de funcionalidade foi atribuída a essa Justiça e
não à Justiça Comum.
Também não se sustentava o argumento das “razões de ordem prática” .
Ora, a Justiça do Trabalho atualmente conta com Varas instaladas em todas
as cidades-polo do País, não havendo dificuldade para acesso do acidentado.
Só no interior do Estado de Minas Gerais, por exemplo, há mais de 90
(noventa) Varas da Justiça do Trabalho. A propósito, se o empregado procura
a Justiça do Trabalho para pleitear a reparação dos direitos trabalhistas
violados pelo empregador, por que deveria procurar outro ramo do Judiciário
se a lesão for decorrente de acidente do trabalho?

Diante desse entendimento da maioria do STF, a nosso ver equivocado,


data vertia, resolvemos apresentar pessoalmente aos Ministros daquela Corte
um memorial defendendo a competência da Justiça do Trabalho, com os
argum entos já m encionados. V isitam os, com o apoio operacional da
Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho — ANAMATRA, todos os
onze Ministros da Corte Maior, quando pudemos também expor sucintamente
nosso ponto de vista. Paralelam ente, em vários artigos doutrinários e
m a n ife sta çõ e s p ú b lica s, d ive rso s Ju ize s do T ra b a lh o e re sp e ctiva s

(21) No Capítulo 3, item 3.2 abordamos a questão da ação judicial para enquadramento do
evento como acidente do trabalho, ao qual nos reportamos.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 423

associações de classe apontavam o equívoco do primeiro julgamento, na


esperança de que o STF adotasse o entendimento pela competência da Justiça
do Trabalho.

A Corte Suprema, ao perceber o equívoco da decisão anterior, teve a


coragem, a grandeza intelectual e científica para mudar o entendimento, pouco
mais de três meses após o julgamento ocorrido em março de 2005. Com
efeito, no dia 29 de junho de 2005, ao julgar o Conflito de Competência n.
7.204-1, suscitado pelo Tribunal Superior do Trabalho em face do extinto
Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, o STF, por unanimidade, definiu
a competência da Justiça do Trabalho para julgamento das ações por danos
morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho. Vejam a ementa
do referido acórdão:
“Constitucional. Com petência judicante em razão da matéria. Ação de indenização
por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, proposta
pelo em pregado em face de seu (ex-)em pregador. C om petência da Justiça do
T rab alh o . A rt. 114 da M agna C arta. R edação a n te rio r e p o sterio r à Em enda
Constitucional n. 45/04. Evolução da jurisprudência do Suprem o Tribunal Federal.
P rocessos em curso na Ju stiça Com um dos Estados. Im perativo de política
judiciária. 1. Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro,
o Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações de indenização por danos morais
e p a trim o n ia is d e c o rre n te s de a c id e n te do tra b a lh o , a in d a que m o vid a s pelo
empregado contra seu (ex-)empregador, eram da com petência da Justiça comum dos
Estados-M em bros. 2. R evisando a m atéria, porém , o Plenário concluiu que a Lei
Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja porque o
art. 114, já em sua redação originária, assim deixava transparecer, seja porque aquela
primeira interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa verdade,
influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte sob a égide das Constituições
anteriores. 3. Nada obstante, com o im perativo de política judiciária — haja vista o
significativo núm ero de ações que já tram itaram e ainda tram itam nas instâncias
ordinárias, bem como o relevante interesse social em causa, o Plenário decidiu, por
maioria, que o marco tem poral da competência da Justiça Trabalhista é o advento da
EC n. 45/04. Emenda que explicitou a competência da Justiça Laboral na matéria em
apreço. 4. A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça Comum
Estadual, desde que pendentes de ju lg a m e n to de m érito. É dizer: as ações que
tramitam perante a Justiça Comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à
prom ulgação da EC n. 45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente
execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi apreciado, hão de ser remetidas
à Justiça do Trabalho, no estado em que se encontram, com total aproveitam ento dos
atos praticados até então. A m edida se impõe, em razão das características que
distinguem a Justiça Comum Estadual e a Justiça do Trabalho, cujos sistemas recursais,
órgãos e instâncias não guardam exata correlação. 5. O Supremo Tribunal Federal,
guardião-m or da Constituição Republicana, pode e deve, em prol da segurança jurídica,
a trib u ir e fic á c ia p ro s p e c tiv a às suas d e cisõ e s, com a d e lim ita ç ã o p re c is a dos
respectivos efeitos, toda vez que proceder a revisões de jurisprudência definidora de
competência ex ratione materiae. O escopo é preservar os jurisdicionados de alterações
jurisprudenciais que ocorram sem mudança formal do Magno Texto. 6. Aplicação do
precedente consubstanciado no julgam ento do Inquérito 687, Sessão Plenária de
25.8.99, ocasião em que foi cancelada a Súmula n. 394 do STF, por incompatível com
424 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

a Constituição de 1988, ressalvadas as decisões proferidas na vigência do verbete. 7.


Conflito de com petência que se resolve, no caso, com o retorno dos autos ao Tribunal
Superior do Trabalho.” STF. PLENO. Conflito de Com petência n. 7.204-1-MG; Rei.:
Ministro Carlos Ayres Britto, DJ 09 dez. 2005.

Em razão do significado histórico dessa decisão, resolvemos transcrever


o inteiro teor do acórdão no Anexo XII deste livro. O julgamento, além de
registrar a mudança de posicionam ento já m encionada, dem onstra em
diversas passagens uma nova e enriquecida visão dos Ministros do órgão de
cúpula do Poder Judiciário a respeito da Justiça do Trabalho e sua expansão
no Brasil.

Essa decisão do STF representa um marco da ampliação da competência


da Justiça do Trabalho e ficará na memória dos operadores jurídicos como
um dos momentos da emancipação institucional deste importante ramo do
Poder Judiciário. O Juiz do Trabalho, desde então, além de julgar o adicional
de insalubridade, julga também a doença que o agente nocivo causou; quando
julga o adicional de periculosidade, terá em mente os acidentes ocorridos nos
trabalhos em condições perigosas; ao julgar as horas extras paradoxalmente
chamadas de habituais, tem conhecimento da fadiga crônica, do estresse e
seus efeitos prejudiciais decorrentes das jornadas de trabalho exaustivas;
enfim, não julga tão somente parcelas rescisórias ou verbas trabalhistas, visto
que aprecia, em muitas ocasiões, a “sucata humana” que o trabalho produziu.
Isso confere um sentido de unidade em questões aparentemente desconexas
e maior coerência sistemática na proteção jurídica à saúde e integridade
psicobiofísica dos trabalhadores.

Para consolidar de vez o entendimento, o Supremo Tribunal Federal, em


dezembro de 2009, editou a Súmula Vinculante n. 22, com o seguinte teor: “A
Justiça do Trabalho é com petente para processar e julgar as ações de
indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de
trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que
ainda não possuíam sentença de m érito em prim eiro grau quando da
promulgação da Emenda Constitucional n. 45/04.”

A inovação da súm ula de natureza vin cula nte foi introduzida na


Constituição da República pela Emenda Constitucional n. 45/2004 (art. 103-
A), com o propósito de aumentar a segurança jurídica dos jurisdicionados e
com bater a m orosidade dos julgam entos. Além disso, evita decisões
contraditórias e impede a repetição de recursos sobre a mesma matéria nos
Tribunais Superiores, deixando o STF mais liberado para cumprir a sua função
precípua de guardião maior da Constituição da República.

Uma vez definida a competência da Justiça do Trabalho para julgar o


mais delicado e pungente conflito decorrente das relações laborais, cabe aos
seus juizes o importante desafio de demonstrar para os operadores jurídicos
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 425

e para o mundo do trabalho o acerto da Emenda Constitucional n. 45/2004 e


da decisão do STF que dirimiu de vez a controvérsia. Agora, passados mais
de oito anos de vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004, podemos fazer
um balanço positivo dessa alteração de competência, visto que, como era
esperado, a Justiça do Trabalho está cumprindo com êxito e celeridade a
importante atribuição que lhe foi confiada. E a perspectiva é de aperfeiçoamento
contínuo, bastando lembrar a crescente produção doutrinária dos magistrados
trabalhistas, envolvendo o tem a da saúde do trabalhador e das ações
indenizatórias por acidente do trabalho ou doenças ocupacionais.

13.3. Processos em andamento na Justiça Comum

Merece realce a diretriz adotada pelo STF naquele julgamento histórico


para s o lu c io n a r as q u e stõe s e m b araçosa s de d ire ito in te rte m p o ra l,
especialmente para os processos que se encontravam em andamento por
ocasião da vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004. Ficou assentado,
sem muito rigor técnico, mas como “imperativo de política judiciária” e “em
prol da segurança jurídica”, que a nova orientação que atribuiu a competência
à Justiça do Trabalho alcança os processos em andamento na Justiça Comum
Estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito.

Em síntese, todos os processos que no dia 1Qde janeiro de 2005, data


do início da vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004, já tinham sentença
proferida na Justiça Comum, lá deverão permanecer até o trânsito em julgado
e respectiva execução; todos os demais passaram para a competência da
J u stiça do T rabalho, no estado em que se en co n tra va m , com total
aproveitamento dos atos. A ementa do acórdão do CC n. 7.204-1, no item 4,
bem sintetiza a decisão do STF a esse respeito:
“A nova orientação alcança os processos em trâm ite pela Justiça Comum Estadual,
desde que pendentes de julgam ento de mérito. É dizer: as ações que tramitam perante
a Justiça Comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à prom ulgação da EC
45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente execução. Quanto
àquelas cujo m érito ainda não foi apreciado, hão de se r rem etidas à Ju stiça do
T ra b a lh o, no esta d o em que se e ncontram , com total a p ro ve ita m e n to dos atos
praticados até então. A medida se impõe, em razão das características que distinguem
a Justiça Comum Estadual e a Justiça do Trabalho, cujos sistemas recursais, órgãos
e instâncias não guardam exata correlação.”

A súmula vinculante n. 22 ratificou também este entendimento quando


acrescentou na parte final do verbete: “inclusive aquelas que ainda não
possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da
Emenda Constitucional n. 45/04.”
O Ministro do STF Marco Aurélio ficou vencido argumentando que este
acréscimo na parte final do verbete dizia respeito às ações nas quais, ao
426 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

tempo da edição da súmula, ainda não havia sido proferida sentença de mérito
em primeiro grau. Concluiu tratar-se de situações residuais, de 2004, que já
estavam ultrapassadas.

A solução adotada pelo STF pacificou o entendimento e prevalece até


mesmo sobre decisões anteriores do STJ atribuindo competência à Justiça
Estadual, em processos que se encontram em andamento. Assim, todos os
processos em tramitação que ainda não possuem sentença de mérito no
primeiro grau, mesmo com decisão anterior do STJ no sentido da competência
da Justiça Estadual, deverão ser remetidos à Justiça do Trabalho. Não cabe
aqui aplica r a preclusão processual, diante do peso da interpretação
constitucional emanada do Tribunal constitucional competente, ou seja, a
súmula vinculante do STF sobrepaira de forma inexorável sobre decisões
determinativas de competência, proferidas sob fundamento diverso, no âmbito
infraconstitucional. Vejam acórdãos recentes do STJ nesse sentido:
“Conflito de com petência. A cidente do trabalho. Indenização a parentes próximos
de trabalhador falecido. Decisão em conflito anterior com trânsito em julgado.
S u p e rven iê n cia da súm ula v in c u la n te n. 22 do S uprem o T rib u n al Federal e
julgamento com reconhecimento de repercussão geral. Nova apreciação do conflito
em razão do 543-B, § 3S, do CPC. Retratação do julgado. Com petência da justiça
do trabalho declarada. 1. A determinação da com petência da Justiça Estadual, no
caso, diante da Súmula vinculante 22-STF (Tribunal Pleno, 2.12.2009, DJe, 11.2.1009),
sem d ú v id a d á -s e em prol da J u s tiç a do T ra b a lh o — na re le v a n te a trib u iç ã o
constitucional, aliás, de ju lg a r as “ações oriundas da relação de trabalho” (CF, art.
114, I, com redação da Em enda C o n stitu cion a l 45/2004, resultante de pleito de
entidades representativas da própria Justiça do Trabalho). 2. Hipótese em que, no dia
da prom ulgação da Emenda Constitucional n. 45/2004 (dia 8.12.2004), o processo
em exame ainda “não possuía sentença de mérito em primeiro grau” . 3. A interpretação
constitucional, dada pelo Tribunal C om petente para ela, ou seja, o E. STF, e em
S ú m ula v in cu la n te , s o b re p a ira so b re d e cisõ e s d e te rm in a tiv a s de co m p e tê n cia ,
proferidas sob fundam ento diverso, no âmbito infraconstitucional. Assim, o argumento
fundado na preclusão do julgam ento desta Corte, com base em outros fundamentos,
consubstanciado na decisão monocrática proferida em Conflito de Competência, cede
diante do peso da in te rp re ta çã o co n s titu c io n a l v in cu la n te em anada do T rib u n a l
constitucional competente. 4. A interpretação do texto constitucional incide a partir da
data do dispositivo constitucional em que se fundam enta, não havendo como subsistir
preclusão processual que contrarie o texto constitucional anterior. 5. Retratando-se
nos term os do § 3- do art. 543-B do CPC, conhece-se do Conflito de Competência
para declarar a com petência da Justiça do Trabalho.” STJ. 2a Seção. CC n. 115.983/
BA, Rei.: Ministro Sidnei Beneti, DJ 25 maio de 2012.

“A gravo reg im ental. R eclam ação co nstitu cion al. CF art. 105, I. A leg ação de
descum prim ento de decisão proferida em conflito de com petência julgado por
esta corte. Justiça do Trabalho. Ação de indenização por danos morais decorrentes
de acidente de trabalho. Herdeiros. Com petência. Emenda Constitucional n. 45.
Súm ula vinculante n. 22 do STF. Cancelam ento do verbete 366 do STJ. 1. Acórdão
da Justiça Estadual (perante a qual tram itava o processo por força de decisão preclusa
do STJ em conflito de com petência) declinatório da com petência para a Justiça do
Trabalho, com base na S úm ula V inculante 22 do STF. 2. Nos term os da Súm ula
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 427

Vinculante 22 é a Justiça do Trabalho com petente para processar e julgar as ações


de indenização por danos morais e patrim oniais decorrentes de acidente do trabalho
propostas por em pregado contra empregador, inclusive aquelas que não possuíam
s e n te n ç a de m é rito em p rim e iro g ra u q u a n d o da p ro m u lg a ç ã o da E m e n d a
Constitucional n. 45/04. 3. Hipótese em que não havia sentença de mérito em primeiro
grau quando editada a EC n. 45/04. Competência da Justiça do Trabalho. 4. Decisão do
STJ no conflito de competência proferida em data anterior à súmula vinculante do STF.
Não havendo sentença de mérito transitada em julgado, correta a adoção, pelo acórdão
reclam ado, do entendim ento consagrado na súm ula vinculante. Im procedência da
reclamação. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.” STJ. 2- Seção. AgRg na
Rcl n. 4.778/RS, Rei.: Ministra Maria Isabel Gallotti, DJ 15 maio 2012.

13.4. Ação ajuizada por pessoa diversa do acidentado

O acidente do trabalho, muitas vezes, produz danos reflexos ou em


ricochete sobre terceiros, como mencionamos em diversas partes deste livro.
Desse modo, a ação indenizatória pode ser ajuizada, em nome próprio, por
qualquer outra pessoa que tenha sofrido danos materiais ou morais em razão
do acidente ou doença ocupacional, tais como o cônjuge, os dependentes,
familiares mais próximos ou mesmo alguém que convivia ou dependia do
acidentado.

As ações ajuizadas por pessoas diversas do acidentado aparecem, em


maior número, nos casos de acidentes com óbito, quando os dependentes do
falecido postulam, em nome próprio, o pagamento de pensão e/ou indenização
por danos morais. Também é comum ocorrerem pedidos de reparação de
danos morais ou materiais por outros intensamente atingidos pela invalidez
total da vítima. Muitos acidentados tornam-se paraplégicos ou tetraplégicos e
passam a depender de cuidados permanentes, até mesmo para a higiene
pessoal e alimentação, causando, assim, danos reflexos sobre as pessoas
mais próximas, em razão da mudança compulsória da rotina doméstica, sem
falar nas repercussões emocionais.

Em qualquer dessas hipóteses, se o pedido de indenização por danos


morais ou materiais estiver fundado em acidente do trabalho ou doença
ocupacional, a competência, sem dúvida, é da Justiça do Trabalho. A nova
redação do art. 114 da Constituição da República, promovida pela Emenda
C onstitucional n. 45/2004, atribui à Justiça Laboral com petência para
processar e julgar “as ações oriundas da relação de trabalho” e, mais
enfaticamente no Inciso VI, “as ações de indenização por dano moral ou
patrimonial, decorrentes da relação de trabalho.”
Como se verifica, essa competência foi atribuída em razão da matéria e
não da pessoa, visto que o cerne da controvérsia a ser apreciada continuará
sendo se ocorreu o acidente do trabalho ou situação equiparada, se o
428 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

empregador agiu com dolo ou culpa, se houve (des)cumprimento das normas


de segurança da CLT, se ocorreu culpa exclusiva ou concorrente da vítima,
se as condições e a organização do trabalho eram seguras e saudáveis etc.
Logo, não há razão plausível para mudar a competência considerando a pessoa
que formula a pretensão: se for a própria vítima, competente a Justiça do
Trabalho; se for algum dos seus dependentes, a Justiça Comum.

É verdade que o STJ, inicialmente, resistiu em adotar o entendimento


que estamos defendendo, tanto que em 2008 publicou a Súmula n. 366, com
o teor seguinte: “Com pete à Justiça estadual processar e ju lg a r ação
indenizatória proposta por viúva e filhos de empregado falecido em acidente
de trabalho.”

Discordamos, data venia, desse posicionamento. Na realidade, o STJ


estava restringindo ou limitando a decisão do STF proferida no Conflito de
Competência n. 7.204, porquanto estava decidindo que a competência para
julgamento das ações indenizatórias por acidente do trabalho era da Justiça
do Trabalho, exceto quando ocorresse acidente fatal, criando, assim, uma
exceção inexistente na Constituição Federal e no referido julgado.

Além disso, haveria — a í sim — violação do princípio da unidade de


convicção. Basta citar o caso do dano moral reflexo postulado pela esposa
do acidentado que ficou tetraplégico. Pelo antigo entendimento do STJ, a
postulação do acidentado seria julgada pela Justiça do Trabalho, ao passo
que a ação veiculada por sua esposa seria apreciada pela Justiça Comum
Estadual, com o risco evidente de decisões contraditórias a respeito do mesmo
fato.

O Ministro do STF Carlos Ayres Britto, nos fundamentos do acórdão do


RE-AgR n. 503.043, explicitou as razões do seu convencimento sobre a
com petência da Justiça do Trabalho, quando a ação for ajuizada pelos
dependentes do acidentado falecido, sendo oportuno destacar os trechos
seguintes:

“Foge ao propósito das regras definidoras da competência da Justiça do


Trabalho pretender que a qualidade das partes m odifique o juízo
competente para a apreciação da causa. Se a lide está calçada na relação
de trabalho, se a controvérsia depende da análise dos contornos e do
conteúdo dessa relação, a competência é da Justiça Especial. (...) No
caso, a agravante defende a competência da Justiça Comum Estadual
porque não foi o trabalhador quem ajuizou a ação e sim o seu espólio.
Entende, assim, que a controvérsia não decorre de relação trabalhista
alguma, pois nunca teve nenhum liam e com o e sp ó lio de seu ex-
-trabalhador. Sucede que a causa do pedido de indenização por danos
morais, deduzido pelo espólio, é o acidente do trabalho sofrido pelo
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 429

trabalhador no curso de sua relação laboral com a agravante. A matéria


é a mesma. Causa de pedir e pedido, também. Logo, a competência da
Justiça do Trabalho permanece. Não fosse assim, e a seguir o raciocínio
da agravante, poder-se-ia chegar à espantosa conclusão de que a Justiça
trabalhista, declarada pelo STF a Justiça competente para julgar pedido
de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente
do trabalho, deixaria de sê-lo quando o acidente vitimasse o trabalhador:
vivo ele teria a tutela da Justiça especial; já morto, seus herdeiros
deveriam recorrer à Justiça comum. Decerto que uma tal solução é
inteiramente descabida.”(22)
Apesar da resistência do STJ, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a
competência para julgar tais ações é mesmo da Justiça do Trabalho, mesmo
não figurando o acidentado como autor da ação, sobretudo porque a causa
de pedir continua sendo o acidente do trabalho ocorrido. Após alguns
julgamentos das Turmas nesse sentido, a questão foi apreciada pelo Plenário
do STF, no julgamento do Conflito de Competência n. 7.545, que praticamente
pacificou a controvérsia:
“Ementa: Conflito de com petência. Constitucional. Juízo Estadual de prim eira ins­
tância e Tribunal Superior. Com petência originária do Suprem o Tribunal Federal
para solução do conflito. Art. 102, I, “O ”, da CB/88. Justiça Comum e Justiça do
Trabalho. Com petência para julgam ento da ação de indenização por danos morais
e materiais decorrentes de acidente do trabalho proposta pelos sucessores do
em pregado falecido. Com petência da Justiça Laboral. 1. C om pete ao Supremo
Tribunal Federal dirim ir o conflito de com petência entre Juízo Estadual de primeira
instância e Tribunal Superior, nos term os do disposto no art. 102, I, “o”, da C onstitui­
ção do Brasil. Precedente [CC n. 7.027, Relator o Ministro CELSO DE MELLO, DJ de
1.9.95] 2. A com petência para julgar ações de indenização por danos morais e m ate­
riais decorrentes de acidente de trabalho, após a edição da EC n. 45/04, é da Justiça
do Trabalho. Precedentes [CC n. 7.204, Relator o Ministro CARLOS BRITTO, DJ de
9.12.05 e AgR-RE n. 509.352, Relator o Ministro MENEZES DIREITO, DJe de 1Q.8.08],
3. O ajuizamento da ação de indenização pelos sucessores não altera a competência
da Justiça especializada. A transferência do direito patrim onial em decorrência do
óbito do empregado é irrelevante. Precedentes. [ED-RE n. 509.353, Relator o Ministro
SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 17.8.07; ED-RE n. 482.797, Relator o Ministro RI­
C ARDO LEW AN D O W SKi, DJe de 27.6.08 e ED-RE n. 541.755, R elator o Ministro
CÉZAR PELUSO, DJ de 7.3.08]. Conflito negativo de com petência conhecido para
declarar a com petência da Justiça do Trabalho.” STF. CC n. 7.545, Rei.: Min. Eros
Grau, Tribunal Pleno, DJe 13 ago. 2009.

Diante desse posicionamento firme do Supremo Tribunal Federal, o STJ


resolveu cancelar a Súmula n. 366, rendendo-se, finalmente, ao entendimento
de que a competência é da Justiça do Trabalho:
“Conflito negativo de com petência. A cidente de trabalho. Em pregado público
municipal. Vínculo celetista. Alteração introduzida pela Emenda Constitucional n.

(22) STF. 1ã Turma. RE-AgR 503.043/SP, DJ 15 jun. 2007.


430 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

45/2004. Ação de indenização. Proposta por viúva do em pregado acidentado.


Reiterada jurisprudência das Turmas e do plenário do STF afirmando a competência da
Justiça do Trabalho. Entendimento diferente da Súmula n. 366/STJ. Conflito conhecido
para, cancelando a Súmula, declarar a competência do juízo suscitante.” STJ. Corte
Especial. CC n. 101.977/SP, Rei. Ministro Teori Albino Zavascki, DJ 05 out. 2009.

Tam bém o T rib u n a l S u p e rio r do T ra b a lh o , em s in to n ia com os


fundamentos jurídicos mencionados, está decidindo pela competência da
Justiça do Trabalho:
“Recurso de revista. Com petência da justiça do trabalho. Acidente de trabalho
com óbito. Ação de indenização ajuizada por viúva e filhos do empregado falecido.
O ajuizam ento de ação de indenização por sucessores e/ou parentes, em nome
próprio, visando à reparação de danos morais ou m ateriais sofridos em razão da
m orte de tra b a lh a d o r vítim a de acid e nte do tra b a lh o , não p rovoca a lte ra çã o na
com petência material desta Justiça Especializada para julgam ento, porquanto persiste
como causa de pedir o acidente do trabalho. A qualidade das partes não redunda em
m odificação da com petência atribuída, por com ando constitu cio n a l, à Ju stiça do
Trabalho. Inteligência do art. 114, VI, da Constituição da República. Precedentes da
S D I-I. R ecurso de re vista c o n h e cid o e p ro v id o .” TST. 1ã T u rm a . RR n. 93700-
93.2005.5.15.0072, Rei.: Ministro Hugo Carlos Scheuermann, DJ 28 set. 2012.

“Recurso de revista. Dano moral decorrente de acidente de trabalho com óbito —


Ação ajuizada pelo espólio —- com petência da Justiça do Trabalho. É indubitável
que a competência da Justiça do Trabalho, prevista no art. 114 da Constituição Federal,
com a nova redação dada pela Emenda Constitucional n. 45, de 2004, em seu inciso
VI, incluído pela referida emenda constitucional, estende-se às ações de indenização
por dano m oral ou p a trim o n ia l, d e co rre nte s da relação de tra b a lh o . T od a via , a
demanda, no presente caso, é atinente à pretensão de indenização por danos morais
e materiais dos herdeiros do empregado da reclamada que morreu em decorrência
de acidente de trabalho. Ainda assim, tal situação não altera a com petência material
da Justiça do Trabalho. Isso porque a causa de pedir persiste estritamente ligada ao
acidente do trabalho, sendo, desse modo, decorrente da relação de em prego do de
cujus com a reclam ada. R essalte-se que a Em enda C onstitucional n. 45/2004 ao
atribuir à Justiça do Trabalho com petência para processar e julgar ação de indenização
por dano moral e patrimonial, decorrentes da relação de trabalho, o fez em razão da
matéria, e não da pessoa. Desse modo, a com petência da Justiça do Trabalho não se
altera quando a ação é ajuizada por herdeiros do em pregado falecido. Recurso de
revista conhecido e não provido.” TST. 2- Turma. RR n. 11940-19.2004.5.06.0231,
Rei.: Ministro Renato de Lacerda Paiva, DJ 28 set. 2012.

“Com petência da Justiça do Trabalho. Dano moral. Acidente de trabalho. Morte do


empregado. Na hipótese, conquanto os reclamantes sejam dependentes do de cujus,
buscam direito decorrente de fato — acidente de trabalho — cujo liame com a relação
de em prego havida entre o em pregado e a reclam ada é indiscutível. Dessa forma,
não há com o afastar a com petência da Justiça do Trabalho, porquanto o pedido é
decorrente da relação de emprego, permanecendo, pois, inalterada a causa de pedir.
Recurso de Embargos de que se conhece e a que se nega provim ento.” TST. SDI-I. E-
ED-RR n. 175000-74.2007.5.09.0072, Rei.: Ministro João Batista Brito Pereira, DJ 11
jun. 2010.

Cabe registrar, ainda, o entendimento adotado por ocasião da 1ãJornada


de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, realizada em Brasília
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 431

em novembro de 2007, quando foi aprovado o Enunciado n. 36, com o seguinte


teor: “Acidente do trabalho. Competência. Ação ajuizada por herdeiro,
dependente ou sucessor. Compete à Justiça do Trabalho apreciar e julgar
ação de indenização por acidente de trabalho, mesmo quando ajuizada pelo
herdeiro, dependente ou sucessor, inclusive em relação aos danos em
ricochete.”
Em conclusão, desde a vigência da Emenda Constitucional n. 45/2004,
a com petência para julgar ação indenizatória em face do empregador,
decorrente de acidente do trabalho ou doença ocupacional, mesmo quando
ajuizada por terceiro em nome próprio, é da Justiça do Trabalho.

13.5. Ação do acidentado sem vínculo de emprego

O conceito de acidente do trabalho propriamente dito, conforme previsto


nos arts. 19 a 21 da Lei n. 8.213/1991, não abrange o acidente ocorrido com
o prestador de serviço sem vínculo de emprego. Contudo, nos infortúnios
sofridos por esses trabalhadores também ocorrem danos materiais, morais
ou estéticos passíveis de reparação pelo tom ador dos serviços, quando
estiverem presentes os pressupostos da responsabilidade civil(23).
Então, qual será a Justiça competente para julgar a ação indenizatória
dos danos sofridos em acidente envolvendo o trabalhador não empregado,
tais como o autônomo, o empreiteiro, o cooperado, o estagiário, a diarista, o
jardineiro e outros?
Com a promulgação da EC n. 45/2004, a competência da Justiça do
Trabalho foi ampliada para julgar as ações oriundas da relação de trabalho
(gênero) e não somente aquelas decorrentes da relação de emprego (espécie).
Além disso, prevê o art. 114, VI, da Constituição da República, com a nova
redação, que compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as “ações de
indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho.”
Assim, não há dúvida de que a competência material para processar e julgar
as ações indenizatórias em face do tomador de serviços, decorrentes de
acidentes envolvendo trabalhadores com ou sem vínculo de emprego, é da
Justiça do Trabalho. Nesse sentido, aliás, já decidiu o Colendo STJ:
“C on flito de co m p etên cia. In d en ização d ecorren te de a c id e n te de trabalho .
Contrato de em preitada. Em preiteiro operário. 1. De acordo com o art. 652, “a” , III,
da CLT, com pete às Varas do Trabalho o julgam ento dos dissídios resultantes de
contratos de em preitadas em que o em preiteiro seja o próprio operário ou artífice.
2. Com petência que encontrava fundam ento constitucional no caput do art. 114 da

(23) Tratam os das indenizações cabíveis no caso de acidente sofrido por tra b a lh a d o r
doméstico ou sem vínculo de em prego no Capítulo 14.
432 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Constituição e, hoje, no inciso IX do art. 114 da CF/88, com a redação dada pela EC
4 5/200 4. P recedentes. 3. C o n flito co n h e cid o p ara d e c la ra r co m p e te n te o Juízo
suscitante.” STJ. 2ã Seção. CC n. 111.295/SP, Rei.: Ministra Maria Isabel Gallotti, Du
17 maio 2011.

“Agravo regim ental no conflito negativo de com petência. Ação de indenização


decorrente de acidente de trabalho. S ervid o r público m unicipal. Contratação
tem porária pela m unicipalidade, sem concurso público. Incidência das regras
previstas na CLT. Com petência da Justiça Laboral. 1. A controvérsia em exame diz
respeito à ação de indenização por danos morais e estéticos decorrentes de acidente
do trabalho. Dessarte, subjaz que as indenizações perquiridas resultaram de relação
de trabalho; isso porque, sem que houvesse o vínculo empregatício, sequer existiria
o acidente de trabalho. 2. No caso em foco, sobreleva notar que, para se aferirem os
elem entos típicos do ato ilícito, tais como o nexo causal e a culpa, é imprescindível
que se esteja o mais próximo do dia a dia da complexa relação do trabalho. 3. O autor
da demanda foi contratado pela entidade municipal sem concurso público e mediante
contrato tem porário, atraindo a incidência das regras previstas na Consolidação das
Leis do Trabalho. Nesse sentido, conforme já decidiu esta egrégia Corte, prevalece a
com petência da Ju stiça laboral para d ecidir sobre a indenização do acidente de
trabalho de servidor público, admitido indevidamente sem concurso público, através
de contrato de caráter celetista. Precedentes: CC 50.443 — SP, Rei. Ministro Luiz Fux,
Prim eira Seção, DJU 2.4.07 e CC 33.84/SP, Rei. M inistro Paulo Gallotti, Terceira
Seção, DJU 24.4.06). 4. Agravo regimental não provido.” STJ. 1ã Seção. AgRg no CC
n. 108.627/MS, Rei.: Ministro Benedito Gonçalves, DJ 4 mar. 2010.

“C o n flito de C o m p etên cia. A cid en te so frido por p restad o r (te rc e iriza d o ) de


serviços. A expressão ‘as ações de indenização por dano moral ou patrim onial,
decorrentes da relação de trabalho’, inscrita no art. 114, VI, da Constituição Federal,
não re strin g e a c o m p e tê n c ia da J u s tiç a do T ra b a lh o às a çõ e s a ju iz a d a s pelo
empregado contra o empregador, e vice-versa. Se o acidente ocorreu no âmbito de
uma relação de trabalho, só a Justiça do Trabalho pode decidir se o tom ador dos
serviços responde pelos danos sofridos pelo prestador terceirizado. Agravo regimental
desprovido.” STJ. 2- Seção. AgRg. no CC n. 82.432/BA, Rei.: Ministro Ari Pargendler,
DJ 08 nov. 2007.

Não vinga a objeção de que as relações de trabalho sem vínculo de


em prego não são regidas pela CLT e que, portanto, estariam fora da
competência trabalhista. Ora, na antiga redação do art. 114 da Constituição
de 1988, essa ponderação teria acolhimento, porque a competência até então
atribuída à Justiça do Trabalho era para conciliar e julgar os dissídios entre
trabalhadores e empregadores. Após a Emenda Constitucional n. 45/2004,
no entanto, a competência expandiu-se para abranger as “ações oriundas da
relação de trabalho”, pouco importando qual o direito material aplicável para
solucionar a controvérsia(24).

(24) “A cidente no trabalho. Trabalhadora autônom a. R esponsabilidade civil. Esta Justiça


do Trabalho, após a EC n. 45/2004, passou a ser competente para o julgam ento de ‘causas
oriundas da relação de tra b a lh o ’, aí incluídas a indenização por dano m aterial e moral
decorrente da relação de trabalho, que deve ser entendida como relação de trabalho lato
sensu. Ainda que não caracterizada nos autos a relação de emprego, é inegável que houve
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 433

Corroborando esse entendimento, cabe citar os fundamentos utilizados


pelo Ministro do STF, Cezar Peluzo, no julgamento do Agravo de Instrumento
n. 578.880/MG, quando asseverou: “ Ressalto que mesmo que a causa
decorra da relação de trabalho como sustenta o agravante, é velha e aturada
a orientação da Corte no sentido de que compete à Justiça do Trabalho, como
princípio ou regra geral, processar e julgar ação de indenização de danos,
morais e materiais, decorrentes de relação de trabalho, pouco se dando, para
esse fim, deva a controvérsia ser dirimida à luz do Direito Civil ou doutra
província normativa (cf. CJ n. 6.959, Red. p/ o acórdão Min. Sepúlveda
Pertence, RTJ 134/96; RE n. 238.737, Rei. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de
05.02.1999, e decisão monocrática no RE n. 409.699, Rei.: Min. Carlos
Velloso).”
Entretanto, a com petência da Justiça do Trabalho não alcança o
julgamento das ações indenizatórias envolvendo os acidentes sofridos por
servidores públicos estatutários, porquanto o STF, ao julgar a liminar da Ação
Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395-DF, entendeu que estão excluídos
da abrangência da expressão “relação de trabalho” os vínculos decorrentes
de típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo.
Essas demandas, portanto, serão apreciadas pela Justiça Comum Estadual
ou pela Justiça Federal, conforme for o caso.

13.6. Ação rescisória de julgado da Justiça Comum

Qual a Justiça competente para julgar a ação rescisória proposta em


razão de sentença transitada em julgado na Justiça Comum, a respeito
de indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional? Antes de
esboçar a resposta, não se pode esquecer que, além de almejar a rescisão
do julgado (iudicium rescindens), a parte interessada pode pretender também
um novo julgamento da causa (iudicium rescissorium), como autoriza o art.
488, I, do CPC.
Sempre que ocorrem alterações de com petência, surgem algumas
perplexidades diante de questões pontuais relativas ao período de transição,
como é o caso da pergunta acima. Nas indenizações por acidente do trabalho
acreditamos que outras dúvidas ainda surgirão, sobretudo porque o STF, por

a prestação de serviços, em prédio de propriedade dos dem andados, e em favor deles,


durante a qual ocorreu a cidente que deixou seqüelas na reclam ante. D em onstrada a
existência dos requisitos caracterizadores da responsabilidade civil subjetiva, respondem
os réus pelos danos, incidindo na espécie o art. 927 do Código Civil. Recurso provido.” Rio
Grande do Sul. TRT 4a Região. 4- Turma. RO n. 0209-2006-522-04-00-3, Rei.: Fabiano de
Castilhos Bertolucci, julgado em 17 jan. 2008.
434 S e b a s t iã o G eraldo de O liv e ir a

razões de política judiciária e segurança jurídica, autorizou a permanência de


uma competência residual da Justiça Comum com relação aos processos
que já contavam com sentença de mérito anterior à promulgação da Emenda
Constitucional n. 45/2004.

É pacífico na doutrina e jurisprudência que cada ramo do Poder Judiciário


rescinde suas próprias decisões pelo tribunal hierarquicamente competente.
Desse modo, nas ações propostas para rescindir decisões da Justiça Comum
dos Estados a respeito de indenizações por acidente do trabalho, compete a
essa Justiça e não à Justiça do Trabalho decidir a rescisória, mas apenas no
que toca ao efeito rescindente.

Entretanto, se na ação rescisória ajuizada houver também pedido de


novo julgamento (efeito rescisório) e sendo acolhida a rescisão do julgado na
Justiça Comum (efeito rescindente), os autos do processo deverão ser
remetidos à Justiça do Trabalho para que o tribunal competente profira a
decisão cabível. Isso porque desde o advento da Emenda Constitucional n.
45/2004 a Justiça Comum não mais detém competência para proferir decisão
de mérito a respeito das indenizações por acidente do trabalho, ressalvando-
-se tão somente os processos que já se encontravam em andamento com
sentença de mérito proferida até dezembro de 2004, conforme já mencionado.

Esse posicionamento de cindir o julgamento da ação rescisória, quando


ocorre mudança de competência, foi adotado em 1982 pelo Pleno do STF. Na
época, contrariamente ao que hoje está ocorrendo, a Justiça do Trabalho
proferiu sentença em lide que seria da competência da Justiça Comum,
conforme entendeu o STF. Vejam a ementa do acórdão:
“R escindir decisão proferida pela Justiça do Trabalho, só à Justiça do Trabalho é
competente; não, à Justiça comum. Rescindida a sentença trabalhista, outra decisão
sobre a matéria, é de ser proferida pela Justiça Estadual, com petente de julgar litígio
relativo a direito de trabalhador contra o seu respectivo sindicato. Conflito de jurisdição
conhecido, para se ter de competente, para processar e julgar a rescisória da decisão
trabalhista, a Justiça do T rabalho.” STF. Tribunal Pleno, CJ 6.339D PE, Rei.: Min.
Firmino Paz, DJ de 11 jun. 1982.

Inspirado nesse julgamento do STF, o Colendo STJ julgou conflito negativo


de competência estabelecendo que na ação rescisória de decisão da Justiça
Estadual, a respeito de representação sindical, essa Justiça é a competente
para ju lga r o efeito rescindente e a Justiça do Trabalho, por sua vez,
competente para proferir o julgamento da ação rescisória, mas apenas no
efeito rescisório:
“C onflito negativo de com petência. Ação rescisória. R epresentação sindical.
Emenda constitucional n. 45/04. Juízos rescindente e rescisório. 1. O iudicium
rescindens é da própria essência da ação rescisória. Nele, busca o autor a rescisão
do julgado com fundam ento em algum dos incisos elencados no art. 485 do CPC. No
iudicium rescissorium pretende a parte o rejulgam ento da causa. Trata-se de juízo
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 435

eventual, pois dependente do tipo de ação e do resultado a que chegou a decisão


re s c in d e n d a . 2. C aso a s e n te n ç a re s c in d e n d a te n h a e fic á c ia d e c la ra tó ria ou
constitutiva, sendo de procedência, não caberá a cum ulação do juízo rescisório ao
juízo rescindente. Nas ações essencialm ente declaratórias, a rescisão do julgado faz
com que a certeza declarada a favor do autor na sentença rescindenda se transmude
a favor do réu. Já nas ações constitutivas ou desconstitutivas (constitutivas negativas),
a rescindibilidade opera como se o pedido originário fosse julgado improcedente. 3.
As inúmeras alterações trazidas pela Emenda Constitucional n. 45/04 repercutem, de
maneira insólita, na com petência para julgam ento das ações rescisórias. A decisão
rescindenda, proferida sob o pálio da regra de com petência anterior, deverá ser
anulada pelo próprio tribunal prolator que, muitas vezes, já não detém competência
em razão da matéria para proferir um novo julgamento. Em outras palavras, a Corte
de onde se origina o aresto rescindendo será com petente para o juízo rescindente,
mas não para o rescisório. 4. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Conflito de
Jurisdição 6.339/PE, R elator o Ministro Firm ino Paz, entendeu que a com petência
deve ser cindida, cabendo ao órgão p ro la to r da decisão rescindenda o iudicium
rescindens, e à Corte detentora de com petência material o iudicium rescissorium. 5.
No caso, a matéria de fundo tratada no acórdão rescindendo, após a EC n. 45/04,
passou à com petência da Justiça do Trabalho, nos termos do art. 114, III, da CF/88.
Cuida-se de controvérsia atinente à representação sindical, em que dois sindicatos
disputam, com base no princípio da unicidade, o direito de constituir-se e organizar-
-se legitimam ente em uma mesma base territorial. 6. O acórdão rescindendo detém
eficácia exclusivam ente declaratória e resultou na procedência do pedido formulado
pelo Sindicato autor. Nesses termos, a ação rescisória se esgota em único juízo, o
rescindente, não havendo espaço para o iu d iciu m rescissorium . D e snecessária,
portanto, a cisão de julgamento. 7. Tratando-se de ação rescisória que apenas comporta
o iudicium rescindens, a competência para apreciá-la recai sobre o tribunal prolator,
independentem ente de ter sido a matéria de fundo transferida para outra jurisdição
em virtude de alteração constitucional. 8. C onflito de com petência conhecido para
declarar competente o Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, o suscitado.”
STJ. 18 Seção. CC n. 74.683-ES, Rei.: Ministro Castro Meira, DJ 21 maio 2007.

Em resumo, a competência para julgar a ação rescisória de julgamentos


proferidos pela Justiça Comum, a respeito de indenização por acidente do
trabalho, é desta mesma Justiça, mas tão somente no efeito rescindente. Se,
após a rescisão do julgado, a Justiça Comum perceber que cabe também
proferir novo julgamento (efeito rescisório), os autos deverão ser remetidos à
Justiça do Trabalho para que o tribunal competente profira a nova decisão
que entender cabível.

13.7. Ação revisional do pensionamento

A ação revisional de decisão da Justiça do Trabalho(25) deverá ser


ajuizada e decidida perante a Vara do Trabalho que a proferiu e estiver

(25) No Capítulo 12 retro detalham os as hipóteses de cabim ento da ação revisional das
decisões transitadas em julgado sobre indenizações decorrentes do acidente do trabalho
ou doença ocupacional.
436 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

executando, mesmo que a condenação tenha sido fixada em grau de


recurso(26). Respalda esse entendimento a previsão do art. 108 do CPC,
segundo o qual a ação acessória será proposta perante o juiz competente
para a ação principal(27). E não há dúvida quanto ao caráter acessório da
ação revisional, conforme bem acentua Agrícola Barbi:

“Entre duas ou mais ações pode haver relação tal que uma delas, porque
mais importante quanto ao objetivo do autor, tem posição de principal; e
as outras, que a ela se ligam, porque se destinam a complementá-la ou
porque dela decorrem , assum em uma situação secundária, e são
consideradas acessórias em relação a ela. Essas ações acessórias
pressupõem, pois, a existência da principal.”(28)
Questão que deve despertar maior questionamento refere-se aos casos
das ações julgadas definitivamente pela Justiça Comum e que não foram
a b ran gida s pela a lte ra çã o de co m p e tê n cia p rom ovid a pela Em enda
Constitucional n. 45/2004. Nessa hipótese, a ação revisional deverá ser
proposta ainda perante a Justiça Comum ou na Justiça do Trabalho?
Respondemos, sem hesitar, que o ajuizamento deverá ocorrer perante
a Justiça do Trabalho, porquanto desde a Emenda Constitucional n. 45/2004
a competência absoluta em razão da matéria para julgar as indenizações por
acidente do trabalho passou a ser da Justiça do Trabalho.
Não cabe aqui nem mesmo a ressalva aposta pelo STF, no julgamento
da CC n. 7.204, no sentido de que “as ações que tramitam perante a Justiça
comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à promulgação da EC
45/2004, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente execução.”
A ação revisional instaura uma nova relação processual para apreciar os
efeitos jurídicos da mudança ocorrida no quadro fático após o julgamento
anterior, visto que não se enquadra como um mero incidente de execução da
sentença primitiva. Aliás, no julgamento mencionado ficou também decidido:
“Quanto àquelas (ações) cujo mérito ainda não foi apreciado, hão de ser
remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se encontram, com total
aproveitamento dos atos praticados até então.”

(26) “Ação revisional — Competência — O Juiz competente para a ação de revisão ou de


modificação é o Juiz de primeiro grau que proferiu a sentença revisanda, ainda que esta
tenha sido objeto de recurso. Ref.: Art. 4 7 1 ,1, CPC.” Minas Gerais. TRT 3- Região. 4- Turma.
RO n. 1731/92, Rei.: Nilo Álvaro Soares, DJ 23 jan. 1993.
(27) “ Conflito de competência. Ação de revisão de alimentos. Distribuídas no mesmo foro,
com petente a Vara de Família por onde tram itou a ação de fixação da pensão, sendo a
revisional desta oriunda, sem falar até na facilitação da instrução probatória. Acessoriedade.
Art. 108 do C PC .” M inas G erais. TJMG. 2- C âm ara Cível. C onflito de C om petência N.
000.238.465-9/00, Rei.: Abreu Leite, DJ 08 fev. 2002.
(28) BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. 4. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1986. v. 1, p. 471.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 437

A competência para julgar a ação revisional a respeito das sentenças


proferidas na Justiça Comum é mesmo da Justiça do Trabalho, mormente
porque, nessa hipótese, não há efeito rescindente a ser declarado, como ocorre
na ação rescisória, mas um outro julgamento, em processo distinto, com novo
pedido e causa de pedir, para produzir efeitos e x n u n c a partir do ajuizamento,
diante da mudança do quadro fático do acidentado e que serviu de base para
a decisão primitiva.

É im perioso concluir, portanto, que desde o advento da Emenda


Constitucional n. 45/2004 a Justiça Comum não mais detém competência
para proferir sentença de mérito envolvendo as ações indenizatórias por
acidente do trabalho, seja a ação principal ou mesmo a revisional.

13.8. Ação ajuizada pelo acidentado em face do INSS

Com a mudança da competência introduzida pela Emenda Constitucional


n. 45/2004, alguns operadores jurídicos defendem que também passou para
a Justiça do Trabalho a competência para julgar os pedidos de benefícios
acidentários em face da Previdência Social, quando o litígio for decorrente de
acidente do trabalho ou doença ocupacional.

Data vertia, não entendemos dessa forma. Ainda que a ideia seja atraente
do ponto de vista operacional e de especialização, a sua aplicação depende
de outra mudança constitucional. A com petência atribuída à Justiça do
Trabalho pela Emenda Constitucional n. 45/2004 refere-se às indenizações
postuladas em face do em pregador, com apoio no art. 7e, XXVIII, da
Constituição da República. Situação diversa ocorre quando o acidentado
busca obter judicialm ente, em face do INSS, os benefícios de natureza
acidentária, tais como auxílio-doença acidentário, aposentadoria por invalidez,
auxílio-acidente etc.

Na demanda acidentária, a relação processual forma-se entre o segurado


e a Autarquia Previdenciária, sem a participação do empregador. Não se trata,
portanto, de lide entre o trabalhador e o tomador de serviços ou entre o
empregado e o empregador. Essa competência, portanto, continua sendo da
Justiça Comum, conforme previsto no art. 109, I e § 3S da Constituição de
1988, bem como na Lei n. 8.213/1991, que prevê:
“Art. 129. Os litígios e m edidas cautelares relativos a acidentes do trabalho serão
apreciados:

I — na esfera adm inistrativa, pelos órgãos da Previdência Social, segundo as regras


e prazos aplicáveis às demais prestações, com prioridade para conclusão; e

II — na via judicial, pela Justiça dos Estados e do Distrito Federal, segundo o rito
sum aríssim o, inclusive durante as férias forenses, m ediante petição instruída pela
438 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

prova de efetiva notificação do evento à Previdência Social, através de Comunicaçao


de Acidente do Trabalho — CAT.”

O STF confirmou esse entendimento, enfatizando que tal competência


continua sendo da Justiça Comum dos Estados, mesmo após a Emenda
Constitucional n. 45/2004:
“A gravo reg im ental em recu rso e x tra o rd in á rio . A cid en te do tra b a lh o . Ação
acidentária ajuizada contra o INSS. Com petência da Justiça Com um Estadual.
Inciso I e § 3S do art. 109 da Constituição Federal. Súm ula n. 501 do STF. A teor do
§ 3- c/c inciso I do art. 109 da Constituição Republicana, compete à Justiça comum
dos Estados apreciar e julgar as ações acidentárias, que são aquelas propostas pelo
segurado contra o Instituto Nacional do Seguro Social — INSS, visando ao benefício
e aos serviços previdenciários correspondentes ao acidente do trabalho. Incidência
da Súmula 501 do STF. Agravo regimental desprovido.” STF. 1a Turma. RE-AgR. n.
478.472, Rei.: Ministro Carlos Britto, DJ 1a jun. 2007.

Nos fundamentos do acórdão acima, o eminente Relator, Ministro Carlos


Ayres Britto, esclarece com precisão a diferença entre a ação indenizatória
em face do empregador e a ação para reivindicar direitos acidentários junto
ao INSS:
“6. De início, lembro que no julgam ento do Conflito de Com petência n. 7.204 este
excelso Tribunal tratou exclusivamente da com petência para processar e julgar pedido
de indenização por danos morais e patrimoniais, decorrentes de acidente do trabalho,
pedido deduzido pelo trabalhador contra o tom ador do trabalho. Para essas causas,
o Plenário concluiu ser com petente a Justiça trabalhista, não apenas por conta da
redação do inciso VI do art. 114 da Lei Maior, introduzido pela EC n. 45/04, como
também a teor da redação originária do mesmo artigo.

7. Ora, no presente caso, a m atéria é inteiram ente diversa: a autora pretende o


reconhecimento, em juízo, de acidente do trabalho não admitido pelo Instituto Nacional
do Seguro Social — INSS, e a conseqüente condenação da Autarquia ao pagamento
do benefício previdenciário e à prestação dos serviços correspondentes. Como não
podia deixar de ser, o pedido foi deduzido contra o INSS; a lide se instaurou entre
segurado e seguradora, por assim dizer. Logo, cuida-se de típica ação acidentária,
que visa o benefício previdenciário em si e não se confunde com a ação de indenização
por danos morais e patrim oniais sofridos pelo acidentado. Em tal hipótese — de ação
acidentária — , a com petência é da Justiça comum dos entes federados, conform e
disposição expressa da Constituição Republicana (inciso I e § 3Q do art. 109).

8. Cumpre recordar, por oportuno, que as Constituições brasileiras tradicionalm ente


remetem a com petência para as ações acidentárias à Justiça comum dos Estados-
-membros: § 1- do art. 123 da Carta de 1946; § 2- do art. 134 da Carta de 1967; e § 2g
do art. 142 da EC n. 1 de 1969. Não por outra razão, o Supremo Tribunal Federal
editou, há muito (Sessão Plenária de 3.12.1969), a Súmula n. 501, assim enunciada:
“C om pete à Justiça ordinária Estadual o processo e o julgam ento, em am bas as
instâncias, das causas de acidente do trabalho, ainda que prom ovidas contra a União,
suas autarquias, empresas públicas ou sociedades de economia mista.”

9. Nessa contextura norm ativa, tenho que o verbete da S úm ula 501 continua em
pleno vigor, mesmo porque a EC n. 45/04 não trouxe nenhuma modificação para o
inciso I e o § 3- do art. 109 da Constituição de 1988. Daí retirar da Justiça comum
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 439

estadual a com petência para as ações acidentárias significaria negar vigência a esses
preceitos constitucionais. E entregar essa mesma com petência à Justiça do Trabalho
significaria melindrar o princípio da distribuição de com petência em razão da matéria,
norteador da nova redação do art. 114, dada pela EC n. 45/04. É que, muito embora
a causa remota da ação acidentária seja uma relação de trabalho, pois sem essa o
acid e nte do tra b a lh o s e q u e r pode se r c a ra c te riz a d o , o fa to é que a n a tu re za
exclusivamente previdenciária dessa ação afasta a com petência da Justiça especial.”

O mesmo entendimento vem sendo reiteradamente adotado pelo Colendo


STJ, conforme se verifica na ementa do acórdão seguinte:
“Conflito negativo de com petência entre Juízo Estadual e Juízo Trabalhista —
Ação previdenciária decorrente de acidente do trabalho — Súm ulas ns. 15D STJ e
501D STF — Competência do Juízo Estadual. I. “Compete à Justiça Estadual processar
e ju lg a r os litígios decorrentes de acidente do trabalho” (Súm ula n. 15D STJ). II.
“C om pete à Justiça O rdinária Estadual o processo e o julgam ento, em am bas as
instâncias, das causas de acidente do trabalho, ainda que promovidas contra a União,
suas autarquias, em presas públicas ou sociedades de econom ia m ista” (Súmula n.
501D STF). III. A com petência para processar e julgar ação previdenciária buscando
a concessão de auxílio-acidente, decorrente de acidente do trabalho, é da Justiça
Estadual. Precedentes. IV. O entendimento esposado pelo Egrégio Supremo Tribunal
Federal nos autos do CC 7.204D MG diz respeito à competência da Justiça Trabalhista
para julgar ações decorrentes de acidente do trabalho propostas pelo empregado em
face do em pregador, não abarcando as ações previdenciárias propostas contra o
INSS. V. Competência da Justiça Comum Estadual.” STJ. 3a Seção. CC n. 70.717/SP,
Rei.: Ministra convocada Jane Silva, D J 21 fev. 2008.
CAPÍTULO 14

ACIDENTE SOFRIDO POR TRABALHADOR


DOMÉSTICO OU NÃO EMPREGADO

14.1. Considerações iniciais

Desde a Emenda Constitucional n. 45/2004 também passou para a


com petência da Justiça do Trabalho processar e ju lg a r as ações de
indenização, por danos decorrentes dos acidentes sofridos por aqueles que
atuam como empregados domésticos ou que prestam serviço sem vínculo
de natureza empregatícia.

No entanto, quando nos deparamos com ações indenizatórias ajuizadas


por esses trabalhadores, surgem vários questionamentos: pode-se enquadrar
o evento com o a cidente do tra b a lh o ? Q uando cabe in d enização ao
acidentado? Para deferir a indenização é necessária a comprovação da culpa
do tomador dos serviços ou seria cabível aplicar a teoria da responsabilidade
civil objetiva? Como avaliar os deveres do tomador dos serviços com relação
ao cumprimento das normas de segurança e prevenção das doenças ou
acidentes? O arbitramento do valor da indenização sofre algum ajuste? Qual
a prescrição aplicável?

As conseqüências jurídicas dos acidentes ocorridos com trabalhadores


que atuam no âmbito doméstico ou que prestam serviços sem vínculo de
emprego, pelas suas peculiaridades, devem ser apreciadas com algumas
ponderações, quando comparadas com as repercussões dos acidentes ou
doenças ocupacionais sofridos pelos empregados de empresas, conforme
passaremos a expor.

14.2. Acidente do trabalho e acidente no trabalho

Costumeiramente, consideramos acidente do trabalho qualquer dano


pessoal sofrido por alguém durante a prestação de serviços em benefício de
outrem ou mesmo em proveito próprio. Todavia, essa denominação corrente,
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o o u D oença O c u p a c io n a l 441

apesar de estar consagrada pelo uso, nem sempre é correta, visto que não é
todo acidente ocorrido no ambiente de trabalho que pode ser enquadrado,
tecnicamente, como acidente do trabalho.
Do ponto de vista jurídico, o “acidente do trabalho” tem limites bem
delineados na legislação. Estabelece o art. 19 da Lei n. 8.213/1991: “Acidente
do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou
pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11
desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a
morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para
o trabalho.” São equiparadas ao acidente do trabalho típico as doenças
profissionais e as do trabalho (art. 20 da Lei n. 8.213/1991), bem como os
acidentes ocorridos no trajeto da residência para o local de trabalho ou deste
para aquela (art. 21 da referida lei).
Como se verifica, somente se enquadra no conceito legal acima transcrito
o acidente sofrido por aqueles segurados relacionados pela legislação da
infortunística e que tenha nexo causal direto ou indireto com o exercício do
trabalho. Consequentemente, não são considerados acidente do trabalho, em
termos legais, os acidentes sofridos no trabalho pelo empregado doméstico,
pelo trabalhador autônomo, pelo cooperado, pelo estagiário, pelo sócio ou
qualquer prestador de serviço sem vínculo de natureza empregatícia(1). De
forma semelhante, os acidentes sofridos pelos servidores públicos federais,
regidos pela Lei n. 8.112/1990, também não se enquadram no conceito legal
de acidente do trabalho, recebendo a denominação própria de acidente em
serviço(2).
Os trabalhadores que atuam no âmbito doméstico (empregados ou
autônomos) são apenas segurados da Previdência Social, mas não são
beneficiários do seguro de acidente do trabalho; quando sofrem acidentes ou
ficam incapacitados por doença relacionada ao trabalho, recebem benefícios
previdenciários, mas não aqueles de natureza acidentária. Daí por que o
empregador ou tomador dos serviços domésticos não recolhe o Seguro de
Acidente do Trabalho, nem está sujeito à emissão da Comunicação de Acidente
do Trabalho — CAT.

Como tais eventos não estão incluídos no conceito legal de acidente do


trabalho, a Previdência Social os enquadra como acidentes de qualquer

(1) Convém m encionar que, excepcionalmente, a lei considera acidente do trabalho aquele
sofrido pelo trabalhador avulso ou pelo segurado especial.
(2) Lei n. 8.112, de 11 dez. 1990. Art. 212. "Configura acidente em serviço o dano físico ou
mental sofrido pelo servidor, que se relacione, mediata ou imediatamente, com as atribuições
do cargo exercido. P arágrafo único. E quipara-se ao acidente em serviço o dano: I —
decorrente de agressão sofrida e não provocada pelo servidor no exercício do cargo; II —
sofrido no percurso da residência para o trabalho e vice-versa.”
442 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

natureza ou causa. É o que prevê o art. 30, parágrafo único, do Regulamento


da Previdência Social, o Decreto n. 3.048/1999: “Entende-se como acidente
de qualquer natureza ou causa aquele de origem traumática e por exposição
a agentes exógenos (físicos, químicos e biológicos), que acarrete lesão
corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda, ou a redução
permanente ou temporária da capacidade laborativa.”

Em síntese, o empregado doméstico e o prestador de serviços sem


vínculo de emprego, apesar de sofrerem acidente “no” trabalho, não são
vítimas, do ponto de vista técnico, de acidente “do” trabalho. O evento é
considerado acidente apenas em termos genéricos, sendo que na legislação
previdenciária enquadra-se no conceito de acidente de qualquer natureza ou
causa.

14.3. Acidente ocorrido no âmbito doméstico

São freqüentes os acidentes ou doenças de natureza ocupacional


sofridos pelos prestadores de serviços que atuam no âmbito residencial. É
oportuno lembrar que o art. 12 da Lei n. 5.859/1972 conceitua como empregado
doméstico “aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade
não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas.”
Segundo a doutrina de Alice Monteiro de Barros, compreendem-se no
conceito de empregado doméstico “não só a cozinheira, a copeira, a babá, a
lavadeira, o mordomo, a governanta, mas também os que prestam serviço
nas dependências ou em prolongamento da residência, como o jardineiro, o
vigia, o motorista, o piloto ou marinheiro particular, os caseiros e zeladores
de casas de veraneio ou sítios destinados ao recreio dos proprietários, sem
qualquer caráter lucrativo.”(3)
Em razão dos perigos e da falta de segurança nas grandes cidades, os
espaços públicos de lazer estão sendo substituídos pelo lazer privado ou
privativo de determinados grupos. Com isso, muitas residências atualmente
são equipadas com pequenas academias de ginástica, quadras esportivas,
saunas e piscinas, tornando o ambiente de trabalho doméstico mais vulnerável
a diversos riscos de acidentes, especialmente para os que atuam nos serviços
de limpeza e manutenção.

Além dos acidentes ou doenças que acometem o empregado doméstico,


tam bém há ocorrências danosas com outros prestadores de serviços
eventuais ou autônomos, tais como faxineiras, passadeiras, jardineiros,
bombeiros, eletricistas, decoradores, professores particulares etc.

(3) BARROS, Alice M onteiro de. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2009.
p. 335.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 443

14.4. Competência para julgar a ação indenizatória

Tratamos do tema da competência para julgar as ações indenizatórias


por acidente sofrido por aqueles que prestavam serviço sem vínculo de
emprego no Capítulo 13, item 13.5, ao qual nos reportamos.

14.5. Análise do cabimento de indenização

Considerando que os acidentes ocorridos com o empregado doméstico


ou com os diversos prestadores de serviço sem vínculo de emprego não são
enquadrados, legalm ente, como acidentes do trab alh o(4), surge logo o
questionamento: cabe indenização quando ocorrem tais acidentes?

É certo que o parágrafo único do art. 7° da Constituição da República,


não estende aos em pregados dom ésticos a previsão do inciso XXVIII.
Entretanto, essa om issão indica apenas que tais em pregados não são
beneficiários dos direitos concedidos pelo seguro de acidente do trabalho.
Aliás, na indenização deferida ao empregado doméstico, por acidente ocorrido
no trabalho, nem cabe o questionamento sobre a cumulação do valor mensal
pago pela Previdência Social com a indenização por responsabilidade civil,
uma vez que ele não recebe benefícios acidentários, mas apenas prestações
de natureza previdenciária. O direito da indenização por acidente cumulado
com os benefícios previdenciários concedidos ao trabalhador doméstico nunca
gerou discussão ou dúvida. A Súmula n. 229 do STF foi adotada para dirimir
controvérsia a respeito da cumulação da indenização devida pelo empregador
com os benefícios decorrentes do seguro de acidente do trabalho, e não com
as prestações concedidas pela Previdência Social propriamente dita.

Se ocorrer acidente de qualquer natureza, tanto com o empregado


dom éstico quanto com o simples prestador de serviços sem vínculo de
emprego, a vítima pode ter direito à indenização por responsabilidade civil, se
estiverem presentes os pressupostos do dano, nexo causal e culpa do
empregador ou tomador dos serviços.

O direito de qualquer lesado à reparação dos danos está consagrado de


modo amplo no ordenamento jurídico nacional, em especial no Código Civil.
Assim, não há fundamento legal ou lógico para afastá-lo nos danos oriundos
dos acidentes ocorridos com os trabalhadores domésticos ou sem vínculo
de emprego, a não ser que haja alguma das excludentes da responsabilidade,
tais como a culpa exclusiva da vítima (ou fato da vítima), o caso fortuito ou
força maior e o fato de terceiro. De todo modo, serão necessárias determinadas

(4) Vejam o item 14.2 acima, em que analisamos a diferença entre o acidente do trabalho e
o acidente no trabalho.
444 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

adaptações da regra geral, em razão da natureza do vínculo (empregado ou


autônomo), da mensuração da culpa (deveres do empregador ou do simples
tomador) ou ainda dos critérios a considerar na fixação do valor da indenização
(caráter compensatório e punitivo), como veremos a seguir.

14.6. Ajustamentos na apreciação da culpa

Para o d e ferim ento da in denização por re sp o n sabilid ade civil é


imprescindível que estejam presentes o dano, o nexo causal e a culpa ou
risco da atividade. Nos acidentes ocorridos no âmbito residencial ou com
trabalhadores não empregados, a análise do dano e do nexo causal deve ser
feita de forma semelhante ao que ocorre nos acidentes do trabalho em geral.
Contudo, na apreciação da culpa, em razão da natureza da prestação dos
serviços, cabem algumas ponderações.

Inicialmente, é preciso separar, para fins de avaliar os deveres do tomador


dos serviços, os trabalhadores que atuam com subordinação e aqueles outros
que agem com independência funcional, técnica e operacional.

No primeiro grupo, podemos relacionar os empregados domésticos em


geral, mas também a faxineira, a passadeira ou a diarista, dentre outros, que
atuam apenas alguns dias por semana. Ainda que não haja prestação de
serviço de natureza contínua (art. 1Q da Lei n. 5.859/1972), o trabalho é
desenvolvido com a dependência típica dos verdadeiros empregados, com
observância das orientações e dos comandos do tom ador dos serviços.
Também devem ser incluídos nesse grupo os cooperados e os estagiários,
mormente porque a recente Lei n. 11.788, de 25 de setembro de 2008,
estabeleceu expressamente no art. 14: “Aplica-se ao estagiário a legislação
relacionada à saúde e segurança no trabalho, sendo sua implementação de
responsabilidade da parte concedente do estágio.”

Com efeito, para esse primeiro grupo de trabalhadores, o tomador dos


serviços deve cumprir fielmente as normas de segurança, higiene e saúde no
local de trabalho, com obrigação de treinar, orientar, fornecer equipamentos
de proteção individual, exigir e fiscalizar a observância de condições de
trabalho seguras e saudáveis. Aplicam-se, nesse caso, com as adaptações
pertinentes, os mesmos deveres previstos no art. 157 da CLT.

Já no segundo grupo estão os trabalhadores autônomos ou eventuais


que são contratados para prestar serviços determinados, tais como: um
bombeiro, um eletricista, um paisagista, um técnico de informática ou mesmo
um professor particular. Esses profissionais, normalmente, são detentores
de habilidades especiais e são contratados exatamente para desempenhar
uma tarefa mais qualificada, que exige experiência e conhecimento específico.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 445

Agem com independência funcional quanto às precauções a tomar no sentido


de evitar acidentes e, presumidamente, conhecem e dominam os riscos
inerentes aos serviços que vão executar. No desenvolvimento dos serviços
desses trabalhadores, em princípio, não cabe ao tom ador fiscalizar o
cumprimento das normas de segurança e saúde quanto aos riscos inerentes
à tarefa, até porque ele contratou um profissional qualificado para ter essa
tranqüilidade.

Pode até haver responsabilidade, ou culpa concorrente, se o tomador


dos serviços não agiu com a diligência necessária na contratação (culpa in
eligendo) e concordou em atribuir tarefa sabidamente perigosa a um aventureiro,
sem a devida qualificação técnica ou experiência, levado tão somente pela
oferta do melhor preço. Ainda que a deficiência não tenha sido percebida no
momento do ajuste, pode ser que ao longo da execução dos serviços tenha
ficado visível, para qualquer pessoa de m édia prudência ou senso de
observação, o despreparo do trabalhador ou de seus auxiliares.

Por outro lado, o acidente pode ocorrer por fatores causais que não são
inerentes à tarefa que o contratado estava executando, por se tratar de risco
existente no local, que podia e devia ser controlado e vigiado pelo tomador
dos serviços. Não são riscos inerentes, mas riscos alheios aos serviços
contratados.

O trabalhador autônomo no âmbito residencial pode, por exemplo, ser


atacado por um cão feroz que fugiu do canil, ou cair numa cisterna desativada
no quintal da casa, ou esbarrar em um fio com carga elétrica colocado em um
sistema de alarme mal instalado, ou chocar-se com algum obstáculo deixado
imprudentemente na área de circulação etc. O prestador de serviço eventual
numa empresa pode ficar exposto a um gás nocivo ou inflamável, a queda ou
deslocamentos de objetos ou qualquer outro agente prejudicial ali existente.

O dever de redução dos riscos no local de trabalho previsto no art. 7Q,


XXII, da C onstitu ição da R epública, não se restringe ao tra b a lh a d o r
empregado, mas beneficia a todos os trabalhadores urbanos e rurais. Aliás,
nesse sentido há previsão expressa do art. 8.2 da Convenção 167 da OIT:
“Quando empregadores ou trabalhadores autônomos realizarem atividades
simultaneamente em uma mesma obra terão a obrigação de cooperarem na
aplicação das medidas prescritas em matéria de segurança e saúde que a
legislação nacional determinar.”(5)

(5) A Convenção 167 da OIT foi ratificada pelo Brasil (Decreto Legislativo n. 61/2006), com
vigência interna desde 19 de maio de 2007. A prom ulgação ocorreu por interm édio do
Decreto n. 6.271, de 22 nov. 2007.
446 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Na análise do caso concreto, é importante avaliar a memória descritiva


do acidente ocorrido e verificar se o tomador dos serviços deixou de adotar
as m edidas de segurança ou cautela que a prudência ou a legislação
recom enda. Por outro lado, se a ocorrência estiver fora de qualquer
previsibilidade, estaremos diante da hipótese de caso fortuito ou força maior,
que são fatores excludentes do nexo causal e do dever de indenizar. Ninguém
tem o dever de fazer prevenção daquilo que se mostra imprevisível.

Em resumo, para os acidentes ocorridos com os trabalhadores do


primeiro grupo (os subordinados ou equiparados), a análise do comportamento
do tomador dos serviços deve ser feita tomando-se como referência os deveres
de segurança que se exigem do empregador comum. Entretanto, para os
acidentes ocorridos com os trabalhadores autônomos ou eventuais, em
princípio, não cabe atribuir cuipa ao contratante pelos riscos inerentes aos
serviços contratados, salvo se ficar caracterizada a sua culpa por ter criado,
por ação ou omissão, um risco adicional que gerou o acidente (ou risco alheio
aos serviços contratados). Cabe citar nesse passo alguns entendimentos
da jurisprudência:
“Ementa: Trabalhador autônom o — Acidente durante a prestação de serviço —
In existên cia de re sp o n sab ilid ad e do c o n tra ta n te — No tra b a lh o autônom o, o
prestador, com organização própria, desenvolve a atividade sem subordinação e
com am p la a u to n o m ia na p re s ta ç ã o de s e rv iç o , não h a ve n d o in g e rê n c ia pelo
contratante. Logo, entende-se que o prestador de serviço autônom o se obrigou a todo
e qualquer serviço compatível com as suas forças e condições, assumindo os riscos
de seu labor, cum prindo-lhe entregá-lo feito ao contratante, não se podendo exigir
deste as m esm as obrigações do em pregador de fornecer e cobrar a utilização de
EPIs, bem como a obrigação de indenizar o autônom o por acidentes ocorridos durante
sua a tivid ade, nos m oldes p re visto s nos arts. 927 a 933 do C ódigo C ivil/2 0 0 2 ,
principalmente quando não há provas de que as ferram entas utilizadas pelo prestador
eram de propriedade do Reclamado, inviabilizando aferir a negligência deste.” Minas
G erais. T R T 3 - R egião. 8 a T urm a. RO n. 0 1 6 8 6 -2 0 0 5 -0 5 3 -0 3 -0 0 -8 , R ei.: Ju íza
Convocada Olívia Figueiredo Pinto Coelho, DJ 16 set. 2006.

“A cidente de trabalho. Trabalhador autônom o. Ainda que o reclamante não fosse


empregado do réu, tendo sido contratado como autônom o para efetuar o serviço na
sede da reclamada, isto não significa que o contratante não responda por acidente
ocorrido no desempenho das tarefas se não tom ar os cuidados necessários quanto à
segurança do trabalhador. Para a configuração do acidente de trabalho, não é exigida
relação de emprego e sim relação de trabalho. Ao réu incumbia verificar as condições
em que o trabalho do autor seria executado, devendo fiscalizar e exigir que as normas
de segurança fossem cum pridas, o que não fez, devendo responder pelos danos
causados.” Rio Grande do Sul. TRT 4- Região. 3a Turma. RO n. 00715-2006-332-04-
00-3, Rei.: Des. Beatriz Renck, D J31 ago. 2007.

“Responsabilidade civil — Acidente de trabalho — Lesão do dedo — M áquina de


cortar gram a — C ulpa concorrente — D anos m orais — C abim ento. Age com
im p ru d ê n cia o ja rd in e iro que, o p e ra n d o m á q u in a de c o rta r gram a ve ih a e que
“engasgava”, e cuja operação de limpeza exigia que fosse previamente desconectada
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 447

da tom ada, realiza tal procedim ento apenas desligando a chave geral. Inafastável,
contudo, a culpa do acionado, por fornecer equipam ento em más condições de uso,
perm itindo seu uso sem o b se rvâ n cia das regras que m inim izariam os riscos de
acidente. Concorrência de culpa para o acidente de trabalho, que autoriza a redução
à m e ta d e da in d e n iz a ç ã o a que te ria d ire ito o o b re iro , c a s o a c u lp a fo s s e
exclusivam ente do réu.” TJSP. 35® Câmara. Apelação com revisão n. 836203-0/8.
Rei.: Des. Clovis Castelo, DJ 13 dez. 2007.

“Indenização por danos m aterial e moral. Contrato de em preitada. Não restou


comprovado que o alegado evento lesivo tenha decorrido de ato ilícito da reclamada,
consubstanciado em om issão, negligência ou im perícia (arts. 186 e 927 do Código
C ivil). A d em ais, tra ta n d o -s e de ‘pe q u e n a e m p re ita d a ’ , não se pode a trib u ir ao
reclamado a obrigação de fiscalizar a execução dos serviços a ponto de tom ar todas
as cautelas, como se empregador fosse, cum prindo os deveres de cuidado quanto às
rotinas das atividades e ao am biente de trabalho, a fim de preservar a incolumidade
física do empreiteiro, como se empregado fosse, pois tal evidenciaria a existência de
subordinação jurídica, incompatível com a empreitada ajustada entre as partes (e não
infirmada pelo recorrente). Provimento negado ao recurso do reclamante.” Rio Grande
do Sul. TRT 4® Região. 5a Turma. RO n. 01053-2005-541-04-00-5, Rei.: Paulo José da
Rocha, DJ 17 jul. 2007.

“Acidente de trabalho. Trabalhador autônom o. Responsabilidade. Prestação de


serviço autônom o de mecânico, de conserto de equipam ento da empresa. Hipótese
em que o tom ador do serviço não teve qualquer ingerência no desenvolvim ento do
serviço contratado. O autor agiu com imprudência e negligência, ao realizar o trabalho
com o equipam ento conectado à rede de energia elétrica. Acidente cuja ocorrência é
inimputável à reclamada.” Rio Grande do Sul. TRT 4a Região. 1a Turma. RO n. 0055600-
50.2009.5.04.0811, Rei.: lone Salin Gonçalves, DJ 05 maio 2010.

É pertinente mais uma indagação neste tópico: é cabível aplicar a


responsabilidade civil objetiva, também denominada teoria do risco, nos
acidentes sofridos por trabalhadores que prestam serviços no âm bito
residencial?

Pelo que dispõe o parágrafo único do art. 927, haverá obrigação de reparar
o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar,
por sua natureza, riscos para os direitos de outrem. Por ocasião da 1ãJornada
de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho
da Justiça Federal em 2002, foi adotada uma diretriz interessante para
interpretar o alcance do dispositivo insculpido no parágrafo único do art. 927
do Código Civil, conforme se verifica no teor do Enunciado n. 38:
“Enunciado 38 —- Art. 927: A responsabilidade fundada no risco da atividade, como
prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo C ódigo Civil,
configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar
a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade.”

Partindo desse entendimento, os serviços realizados no âmbito residencial


poderiam ser enquadrados como exercício de atividade de risco, suficiente
para gerar a indenização independentemente de culpa? Entendemos que não.
448 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Em regra, quem atua em tais serviços está exposto ao mesmo grau de risco
da média dos demais membros da coletividade. Além disso, o tomador dos
serviços no âmbito residencial não desenvolve atividade econômica, nem
cria um risco adicional de acidente pela natureza das tarefas que ajusta com
o trabalhador(6).

14.7. Fixação do valor da indenização

Cabe, neste tópico, tecer algum as considerações sobre o valor da


indenização, principalmente considerando o fato de o empregador ou tomador
dos serviços domésticos não exercer atividade econômica.

Se estiverem presentes os pressupostos da responsabilidade civil, não


há mudança de abordagem quanto ao valor do dano material, em comparação
com o acidente do trabalho sofrido pelo trabalhador que presta serviços para
empresas. A indenização deve ser calculada no sentido de garantir a reparação
integral do prejuízo do acidentado, tanto dos danos materiais emergentes
quanto dos lucros cessantes. Se houver incapacidade total ou parcial para o
trabalho, deverá ser deferida pensão correspondente à importância do trabalho
para o qual a vítima se inabilitou, ou na proporção da depreciação sofrida,
conforme previsto no art. 950 do Código Civil.
No caso do trabalhador que presta serviços sem vínculo de emprego, a
dificuldade pode residir na apuração do valor dos lucros cessantes ou pensão.
Será necessário comprovar o valor médio dos rendimentos habitualmente
recebidos e, se não houver prova convincente, deve ser garantido, pelo
menos, um valor equivalente ao salário mínimo mensal.

(6) “ Indenização p o r acidente de trabalho. Pessoa física (réu) que contrata trabalhador
autônom o (autor), para prestação de serviços no âm bito de sua residência — poda de uma
árvore. P restação de se rviço s que, in casu, não está v in c u la d a a q u a lq u e r a tividade
econôm ica desenvolvida pelo tom ador, não se aplicando a norma do parágrafo único do
a rtig o 92 7 do C ó d ig o C iv il (r e s p o n s a b ilid a d e o b je tiv a ), e sim , a re g ra g e ra l da
responsabilidade civil, fundada na culpa do agente (artigos 186 e 927, caput, do CC). Culpa
do tom ador não demonstrada. Recurso provido para absolver o réu da condenação.” Rio
Grande do Sul. TRT 4a Região. 1a Turma. RO n. 01664-2006-030-04-00-0, Rei.: Des. Maria
da Graça Ribeiro Centeno, DJ 24 jun. 2008.
“Agravo de instrumento. A cidente de trabalho. Indenização p o r dano m oral e/ou patrimonial.
A v. decisão afastou a responsabilidade objetiva de pessoa física que contrata trabalhador
autônom o para poda de uma árvore, e entendeu que não houve conduta culposa, pela
ausência de ingerência no serviço ou responsabilidade para observância de normas de
segurança do trabalho, em face do acidente ao cortar um galho de uma árvore que resultou
na fratura do fêmur. Não dem onstrada violação literal de dispositivo constitucional ou legal,
nem divergência jurisprudencial apta ao confronto de tese. Art. 896, e alíneas, da CLT."
TST. 6a Turma. AIRR n. 166440-50.2006.5.04.0030, Rei.: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga,
DJ 07 abr. 2009.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 449

Já com relação aos danos morais e danos estéticos, os valores devem


ser arbitrados levando-se em conta as duas finalidades básicas: compensar
a vítim a e punir o infrator. A indenização, porém, deve ser fixada com
moderação, não devendo servir para enriquecer a vítima, nem para levar o
infrator à ruína.

Além disso, quando o juiz considerar o objetivo punitivo ou pedagógico


para o tom a dor dos serviços dom ésticos, no m om ento de a rb itra r a
indenização, deve fazer a devida ponderação do caso concreto, pelo que não
servem de parâmetro os valores dos danos morais fixados para as empresas
que em pregam m uitos tra b a lh a d o re s e têm ca p a cid a d e eco n ô m ica
diferenciada. Naturalmente que serão também considerados outros fatores
que podem influenciar no arbitramento do valor, tais como: o grau de culpa do
tomador dos serviços ou a culpa concorrente da vítima, a gravidade dos danos
sofridos, a possibilidade de recuperação do acidentado, a situação econômica
do infrator etc.

Nos casos em que a vítima sobrevive ao acidente, é bem provável que


haja pedido de pagamento da pensão de uma só vez, conforme autoriza o
parágrafo único do art. 950 do Código Civil. Esse pedido deverá ser analisado
com bastante prudência pelo julgador porque muitas vezes será praticamente
impossível o pagamento de uma só vez, porém, é bem provável que o
reclamado tenha condições de efetuar o pagamento da pensão mensal. Aliás,
essa inovação do Código Civil de 2002 mereceu severas censuras da doutrina
e vem sendo frequentemente flexibilizada pela jurisprudência(7).

Por ocasião da IV Jornada de Direito Civil, promovida em Brasília pelo


Centro de Estudos Judiciários da Justiça Federal no ano de 2006, foi adotado
entendimento doutrinário no sentido de flexibilizar racionalmente o direito
potestativo de o lesado exigir o pagamento da indenização de uma só vez.
Vejam o teor do Enunciado n. 381:
“O lesado pode exigir que a indenização, sob a form a de pensionamento, seja arbitrada
e paga de uma só vez, salvo impossibilidade econômica do devedor, caso em que o
juiz poderá fixa r outra form a de pagam ento, atendendo à condição financeira do
ofensor e aos benefícios resultantes do pagamento antecipado.”

A possibilidade de exigir o pagamento de uma só vez fica restrita aos


casos do pensionamento devido à própria vítima, ou seja, quando ocorre
invalidez permanente total ou parcial. Ao se analisar a localização topográfica
do parágrafo e considerando a técnica de elaboração legislativa, pode-se

(7) Tratam os com vagar das críticas e inconvenientes a respeito do pagamento de uma só
vez no item 10.6, supra. Anotam os também naquele tópico o entendimento atual do TST no
sentido de analisar, na hipótese do caso concreto, a conveniência ou não de deferimento
da indenização de uma só vez.
450 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

perceber que essa opção só tem cabimento na hipótese indicada no caput do


art. 950 referido, não abrangendo a pensão decorrente de óbito do acidentado
prevista no art, 948 do Código Civil(8).

14.8. Prescrição aplicável

Tratamos da prescrição aplicável nas ações ajuizadas por acidentados


que atuavam como empregado doméstico no Capítulo 11, item 11.7 e dos
acidentados que prestavam serviços sem vínculo de emprego, no item 11.8
do mesmo Capítulo.

(8) Para maiores fundam entos a respeito dessa conclusão, sugerimos a leitura do item 10.6,
supra.
CAPÍTULO 15

LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA
NAS AÇÕES INDENIZATÓRIAS
r
15.1. Considerações iniciais

Resolvemos abordar neste Capítulo as questões que envolvem a liqui­


dação da sentença nas indenizações por acidente do trabalho ou doenças
ocupacionais. Na nossa atuação judicante, percebemos que há particula­
ridades que exigem alguns ajustam entos em relação ao trato habitual do
tema, mormente quando são incluídas na condenação parcelas vencidas
e vincendas.
Como bem assinala o eminente processualista Bezerra Leite, as sen­
tenças condenatórias, via de regra, tornam certo apenas o débito (an debeatui),
cabendo à liquidação a fixação do quanto devido (quantum debeatur')(1). Além
de apurar o valor principal da condenação, cabe também calcular as parcelas
acessórias da correção monetária e dos juros de mora, bem como proceder
á retenção legal do imposto de renda na fonte, quando for o caso. Aliás, os
juros de mora e a correção monetária deverão ser incluídos na liquidação da
sentença, ainda que omisso o pedido inicial ou a condenação, conforme en­
tendimento pacificado no Colendo TST pela Súmula n. 211.
São freqüentes os questionamentos sobre a época própria da incidência
da correção m onetária e dos ju ros de m ora no cálculo das diversas
modalidades de indenização (dano material emergente, lucros cessantes ou
p e n s io n a m e n to m ensal, dano m oral e dano e s té tic o ). T am bém há
controvérsias a respeito do cabimento ou não da retenção do imposto de
renda na fonte sobre tais parcelas.
Trataremos da correção monetária e dos juros de mora levando em
consideração que as indenizações por acidente do trabalho têm natureza
jurídica de crédito trabalhista, ainda que atípico. Para os que sustentam que

(1) LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 6. ed. São
Paulo: LTr, 2008. p. 878.
452 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

tais indenizações são de natureza civii, devem ser feitas algumas adaptações
pontuais, especialmente na questão dos juros de mora.

15.2. Contribuição para a Previdência Social

Não cabe a incidência ou a retenção de contribuição para a Previdência


Social sobre as indenizações por acidente do trabalho, nem mesmo quando
se defere o pagamento de lucros cessantes ou pensão mensal ao empregado
que continua em atividade, em razão da natureza jurídica dessas parcelas.

As indenizações deferidas não têm caráter contraprestrativo, nem


integram o salário de contribuição do INSS para cálculo de futuros benefícios,
como sucede com as diversas parcelas de cunho salarial. O propósito das
indenizações é reparar os danos causados e não remunerar o trabalhador.
Nesse sentido, estabelece o Regulamento da Previdência Social que não
integram o salário de contribuição, além das diversas verbas de natureza
indenizatória previstas na CLT, as importâncias recebidas pelo empregado a
título de indenização, desde que expressamente previstas em lei(2).

15.3. Correção monetária

Os surtos inflacionários ocorridos no Brasil ao longo do século passado


levaram o le g isla d o r a e sta b e le ce r norm as legais para a sse g u ra r a
recomposição do poder aquisitivo da moeda. Os débitos trabalhistas, desde
o advento do Decreto-lei n. 75, de 21 de novembro de 1966, passaram a ser
corrigidos monetariamente e, mais tarde, a Lei n. 6.899/1981, instituiu a
aplicação da correção monetária para todos os débitos oriundos de decisão
judicial.
A correção monetária visa garantir a integridade do poder de compra
dos valores da condenação, considerando o dia do vencimento fixado na
sentença. Tem por objetivo, tão somente, a recomposição do valor diante da
corrosão in fla cio n á ria , sem o propósito de apenar o deve dor com o
agravamento do valor real do débito. A ementa de um acórdão do Colendo
Superior Tribunal de Justiça sintetiza, com inteira pertinência, os fundamentos
da correção monetária:
“ Processual civil. R estituição de p agam ento indevido. C orreção m onetária.
Incidência. A correção monetária não se constitui em um ‘plus’, senão em uma mera
atualização da m oeda aviltada pela inflação, im pondo-se com o um im perativo de
ordem jurídica, econômica e ética. Jurídica, porque o credor tem o direito tanto de ser

(2) Decreto n. 3.048, 6 maio 1999, art. 214, § 99, V, alínea m.


I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 453

integralmente ressarcido dos prejuízos da inadimplência, como o de ter por satisfeito,


em toda a sua inteireza, o seu crédito pago com atraso. Econômica, porque a correção
nada mais significa senão um mero instrum ento de preservação do valor do crédito.
Ética, porque o credito pago sem correção im porta um verdadeiro enriquecim ento
sem causa do devedor, e a ninguém é lícito tirar proveito de sua própria inadimplência.
Recurso im provido.” STJ. 1a Turma. REsp n. 57.644/SP, Rei.: Ministro César Asfor
Rocha, DJ 08 maio 1995.

Como se viu acima, para compensar a deterioração do valor da moeda,


promove-se a sua atualização diária, de acordo com a variação do índice
oficial. Atualmente, a correção monetária do débito trabalhista está prevista
na Lei n. 8.177/1991, cujo art. 39 prevê:
“Art. 39. Os débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo
empregador nas épocas próprias assim definidas em lei, acordo ou convenção coletiva,
sentença norm ativa ou cláusula contratual sofrerão ju ro s de m ora equivalentes à
TRD acumulada no período com preendido entre a data do vencim ento da obrigação
e o seu efetivo pagamento.

§ 12 Aos débitos trabalhistas constantes de condenação na Justiça do Trabalho ou


decorrentes dos acordos feitos em reclam atória trabalhista, quando não cum pridos
nas condições homologadas ou constantes do term o de conciliação, serão acrescidos,
nos juros de mora previstos no caput, juros de um por cento ao mês, contados do
ajuizam ento da reclamatória e aplicados pro rata die , ainda que não explicitados na
sentença ou no termo de conciliação.”

Esse dispositivo legal transcrito, além de instituir a atualização diária,


fixou os marcos temporais para o cálculo da correção monetária do débito: o
período compreendido entre a data do vencimento da obrigação e o seu efetivo
pagamento. Desse modo, a responsabilidade do devedor pela correção
monetária diária incidente sobre o débito exequendo não cessa com o depósito
em dinheiro para garantia da execução, mas tão somente na data do efetivo
pagamento ou disponibilidade do numerário ao credor(3).
O caput do m encionado art. 39 da Lei n. 8.177/1991 estabelece a
incidência de “juros de mora”, mas na roupagem camuflada de atualização
m onetária porque, na época, era intenção do le g isla d o r prom over a
desindexação total da economia, como forma de combater a inflação crônica.
Apesar da denominação “juros de mora” , trata-se, a rigor, de verdadeira
correção monetária, tanto que o TST, por intermédio da OJ n. 300 da SBDI-1,
fixou entendimento de que “não viola norma constitucional (art. 59, II e XXXVI)
a determinação de aplicação da TRD, como fator de correção monetária dos
débitos trabalhistas, cumulada com juros de mora, previstos no artigo 39 da
Lei n. 8.177/1991 e convalidado pelo artigo 15 da Lei n. 10.192/2001.”

(3) A Súm ula n. 15 do Tribunal Regional do Trabalho da 3ã R egião prevê: “Execução.


Depósito em dinheiro. Atualização monetária e juros. A responsabilidade do executado
pela correção monetária e juros de mora incidentes sobre o débito exequendo não cessa
com o d epósito em din h eiro para g a ra n tia da execução, m as sim com o seu efetivo
pagam ento.”
454 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

Com o propósito de facilitar a compreensão do leitor, vamos abordar,


separadamente, a época própria para início de fluência da correção monetária
a respeito das diversas parcelas que podem compor as indenizações por
acidente do trabalho ou doenças ocupacionais.
a) Dano material emergente: Como se refere a despesas suportadas
pela vítima ou por alguém em nome dela, o valor deve ser corrigido desde a
data em que foi efetuado o desembolso, conforme restar comprovado nos
autos. Como exemplos das indenizações por danos emergentes podem ser
mencionadas as despesas com assistência médica ou hospitalar, tratamentos
ou funeral.
b) Lucros cessantes ou pensionamento — Parcelas vencidas: Essas
indenizações têm como objetivo recompor os rendimentos mensais que o
acidentado auferia. Sendo assim, as parcelas vencidas no momento da
liquidação da sentença devem ser corrigidas com observância da mesma
periodicidade do vencim ento dos salários, aplicando-se, nesse caso, o
entendimento da Súmula n. 381 do TST(4). Como fundamento dessa conclusão,
pode-se raciocinar que, não fosse o infortúnio, naquelas datas, mensalmente,
o acidentado estaria recebendo o pagamento do salário.

c) Lucros cessantes ou pensionamento — Parcelas vincendas: As


indenizações fixadas a tais títulos só passarão a ensejar correção monetária
se não forem pagas nas datas do vencimento, conforme fixado na sentença
ou termo de conciliação. Se a decisão for omissa quanto ao vencimento,
presume-se que o pagamento deve ser feito na mesma periodicidade fixada
em lei para o salário. Naturalmente, se houver atraso no pagamento mensal
estipulado, calcula-se a atualização monetária separadamente a partir do
vencimento de cada parcela, como ocorre com as verbas salariais.

Vale anotar que o valor da pensão fixado na sentença deverá sofrer as


atualizações periódicas — normalmente uma vez por ano — , de acordo com
a variação salarial da categoria profissional do acidentado ou na mesma
proporção das variações do salário mínimo (art. 475-Q, § 42, do CPC)(5). Neste
tópico, no entanto, só estamos tratando da correção monetária decorrente da
mora no pagamento.
d) Pensionam ento arbitrado para pagamento de uma só vez: O
Código Civil atual (art. 950, parágrafo único) faculta ao prejudicado exigir que
a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez. Nessa hipótese, como o

(4) “ Correção monetária. Salário. Art. 459 da CLT. O pagamento dos salários até o 5Qdia útil
do mês subsequente ao vencido não está sujeito à correção monetária. Se essa data limite
for ultrapassada, incidirá o índice da correção monetária do mês subsequente ao da prestação
dos serviços, a partir do dia 1a.” (TST. Súmula n. 381)
(5) Abordam os com vagar essa questão no Capítulo 9, item 9.6, retro.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 455

juiz vai arbitrar um valor único em razão do pagam ento antecipado do


pensionamento, a correção monetária deverá incidir a partir da data da
prolação da sentença ou do acórdão que fixou o valor final da indenização,
salvo se a decisão liquidanda expressamente tiver estabelecido outro termo
inicial de fluência ou acolhido integralmente o pedido do autor. Isso porque o
arbitramento do montante indenizatório, normalmente, é feito considerando a
dimensão do valor à luz dos dados econômicos do momento da sua fixação e
não da data do acidente ou do ajuizamento, que podem ter ocorrido muitos
anos antes ou do trânsito em julgado da decisão, que pode ocorrer vários anos
depois.
e) Dano moral ou dano estético: O entendimento que prevalece a
respeito do valor da indenização por dano moral ou dano estético é de que o
a rb itram e nto deve ser feito a crité rio do ju lg a d o r, mas devidam ente
fundam entado, considerando as circunstâncias do caso concreto, para
pagamento em parcela única. Também aqui o arbitramento da indenização
normalmente é feito considerando a dimensão do valor à luz dos dados
econômicos do momento da sua fixação. Desse modo, a correção monetária
deve ser computada a partir da data da sentença ou acórdão, que fixou o
valor definitivo da condenação a ser liquidada, independentemente da data do
trânsito em julgado.
Excepcionalmente caberia aplicar a correção monetária do dano moral
ou dano estético a partir da data do ajuizamento da ação, quando a sentença
acolher integralmente o pedido deduzido pelo acidentado*6*.

Importa anotar, ainda, que o Enunciado n. 52, aprovado por ocasião da


1ã Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho realizada em Brasília,
em n o ve m b ro de 200 7, a d o to u o e n te n d im e n to aqui d e fe n d id o :
“Responsabilidade civil. Danos morais. Correção m onetária. Term o
inicial. O termo inicial de incidência da correção monetária sobre o valor fixado
a título de indenização por danos morais é o da prolação da decisão judicial
que o quantifica.”

Finalmente, o STJ adotou em 2008 a Súmula n. 362 com o seguinte teor:


“A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a
data do arbitramento.” Seguindo a mesma trilha, o TST também pacificou a

(6) “ Correção Monetária — indenização dano m aterial e m oral — Data de apuração — Em


se tratando de indenização por dano material a correção monetária deve ser apurada a
partir da data efetiva do dano. Em relação ao dano moral, a partir da data do ajuizamento da
reclam ação, se de ferid o o va lo r pedido pelo R eclam ante, pois se presum e ten h a ele
considerado o período transcorrido entre a data do dano e o da reclamação. Se outro valor
for arbitrado na sentença, a atualização deve ser apurada à data em que fixado na decisão
exequenda.” Minas Gerais. TRT 3S Região. 6a Turma, AP n. 00254-2004-063-03-00-6, Rei.:
Antônio Fernando Guimarães, DJ 23 fev. 2006.
456 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

discussão ao aprovar, em 2012, a Súmula n. 439: “Nas condenações por


dano moral, a atualização monetária é devida a partir da data da decisão de
arbitramento ou de alteração do valor. Os juros incidem desde o ajuizamento
da ação, nos termos do art. 883 da CLT.”

15.4. Juros de mora

Enquanto a correção monetária visa à reconstituição permanente do


poder de compra da moeda, em face da corrosão inflacionária, os juros de
mora representam a remuneração ou frutos do capital, do qual ficou privado
temporariamente o titular do crédito.

Assevera Arnaldo Rizzardo que o juro é a remuneração do credor por


ficar sem a posse ou a utilização do capital, sendo que os juros moratórios
constituem-se em pena imposta ao devedor pelo atraso no adimplemento da
prestação, porquanto a mora corresponde ao não pagamento no tempo
marcado(7). Já o eminente Juiz do Trabalho paranaense José Aparecido dos
Santos assevera que os juros não correspondem a uma penalidade, mas
apenas à remuneração do capital retido, pelo que a incidência deles sobre as
multas não caracteriza bis in idem{8).
Em a p e rta d a sín te se , a co rre çã o m o n e tá ria re com põe o va lo r
(atualização) ao passo que os juros de mora remuneram o capital (rendimento).
Diante dessa conclusão, pacificou-se o entendimento no sentido de que os
juros de mora só devem ser calculados após a recomposição do valor da
condenação pela correção monetária(9).

A incidência dos juros de mora sobre os débitos trabalhistas está prevista


expressamente na CLT:
“Art. 883. Não pagando o executado, nem garantindo a execução, seguir-se-á penhora
dos bens, tantos quantos bastem ao pagam ento da im portância da condenação,
acrescida de custas e juros de mora, sendo estes, em qualquer caso, devidos a partir
da data em que for ajuizada a reclamação inicial.”

A Lei n. 8.177/1991, que tratou da implantação do Plano Real, de alguma


forma ratificou o art. 883 da CLT, quando estabeleceu no art. 39, § 12:
“A os d é bito s tra b a lh is ta s co n sta n te s de co ndenação na Ju s tiç a do T ra b a lh o ou
decorrentes dos acordos feitos em reclam atória trabalhista, quando não cum pridos

(7) RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.
511-514.
(8) SANTOS, José Aparecido dos. Curso de cálculos de liquidação trabalhista. 2. ed. Curitiba:
Juruá, 2008. p. 473.
(9) “Juros de mora. Incidência. Os juros de mora incidem sobre a importância da condenação
já corrigida monetariam ente.” (TST. Súmula n. 200)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 457

nas condições homologadas ou constantes do term o de conciliação, serão acrescidos,


nos juros de mora previstos no caput, juros de um por cento ao mês, contados do
ajuizamento da reclamatória e aplicados pro rata die, ainda que não explicitados na
sentença ou no termo de conciliação.”

Mais tarde, a Lei n. 9.069/1995 estabeleceu no art. 27, § 6Q: “Continua


aplicável aos débitos trabalhistas o disposto no art. 39 da Lei n. 8.177, de 1e
de março de 1991

Não restam dúvidas, portanto, que os juros de mora dos débitos


trabalhistas, incluindo as indenizações por acidente do trabalho, em regra,
são computados a partir da data do ajuizamento da reclamação(10). Tem sido
esse também o entendimento do Colendo TST:
“Recurso de revista do reclamante — Responsabilidade civil — Indenização por
danos material e moral — Juros de mora — Term o inicial. A definição da competência
da Justiça Trabalhista para o processam ento e o julgam ento das ações reparatórias
de danos materiais, morais e estéticos oriundos de acidentes de trabalho ou moléstias
profissionais im plica a análise da questão sob o enfoque especial do sistem a jus
laboral, o que impõe a utilização, quando existentes, dos dispositivos norm ativos
específicos e a interpretação a partir dos princípios que validam e consagram essa
ordem . N esse sentido, o term o inicial para a in cid ê n cia dos ju ro s de m ora nas
obrigações trabalhistas é matéria regulada nos arts. 883 da CLT e 39, § 1a, da Lei n.
8.177/91, que determinam que os juros de mora incidentes sobre o valor atribuído à
condenação, em qualquer caso, deverão ser calculados da data em que ajuizada a
reclamação trabalhista. Recurso de revista conhecido e provido.” TST. 4 - Turma. RR
n. 9950500-14.2006.5.09.0095, Rei.: Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DJ
19 out. 2012.

“Recurso de revista da reclamada. Indenização por danos materiais. Incidência


de juros de mora. Term o inicial. Não conhecimento. Em se tratando de pedido de
indenização por danos materiais decorrentes de acidente de trabalho, e considerando
que a condenação ao pagam ento de indenização por danos morais e m ateriais se
torna exigível a p artir da decisão ju d icia l que reconheceu tais patrim ônios com o
violados, os juros de mora devem incidir a partir do ajuizamento da Reclamação, nos
termos do art. 883 da CLT. Decisão regional que adota tal posicionamento deve ser
m a n tid a . R e c u rs o de R e v is ta não c o n h e c id o .” T S T . 4 - T u rm a . RR n. 3 0 5 -
53.2010.5.04.0662, Rei.: Ministra Maria de Assis Calsing, DJ 28 set. 2012.

“Recurso de revista. A cidente de trabalho. Dano moral. Data da incidência dos


juros de mora. Sendo a indenização pleiteada uma verba de natureza trabalhista,
pois decorrente de relação de emprego, os juros de mora incidem desde o ajuizamento
da reclamação trabalhista até a data do efetivo pagamento ao credor, na esteira dos
arts. 883 da CLT e 39, caput e § 1a, da Lei n. 8.177/91, que regulamentam a aplicação
dos juros m oratórios nos créditos trabalhistas. Recurso de revista não conhecido.”
TST. 6a Turm a. RR n. 105100-42.2005.5.04.0030, Rei.: M inistro M auricio Godinho
Delgado, DJ 16 set. 2010.

(10) Até mesmo as parcelas do FGTS, que têm norma própria prevista na Lei n. 8.036/1990
a respeito dos juros e correção monetária, quando deferidas em sentença trabalhista passam
a ser co rrig id a s pelos m esm os índices a p lic á v e is aos d é b ito s tra b a lh is ta s , conform e
entendimento pacificado pela Orientação Jurisprudencial n. 302 da SDI-I do TST.
458 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e f -

A Súmula n. 439 do Colendo TST, aprovada em 2012, fixou o entendiment;


de que também nas condenações por dano moral, os juros incidem desde :
ajuizamento da ação, nos termos do art. 883 da CLT(11).

Apesar dessa disposição genérica, nos casos das indenizações a título


de lucros cessantes ou pensionamento, cujos pagamentos sejam fixados
mensalmente, só haverá contagem dos juros de mora após o vencimento da
obrigação, ou seja, se o pagamento das parcelas vincendas for efetuado até
a data fixada, não haverá nenhum acréscimo de juros de mora. O devedor só
será considerado em mora quando não efetuar o pagamento no tempo, lugar
e forma estabelecidos na sentença, em sintonia com o preceito do art. 394 do
Código Civil. E como consequência lógica, não poderão ser calculados juros
moratórios do período anterior à constituição do devedor em mora.

Por outro lado, se no momento da liquidação da sentença houver parcelas


vencidas referentes aos lucros cessantes ou pensionamentos do período
posterior ao ajuizamento, haverá incidência dos juros moratórios desde o
vencim ento de cada parcela até a data do efetivo pagamento. Para as
prestações deferidas referentes ao período situado entre o evento danoso e
a data do ajuizamento da ação, não haverá cálculo dos juros de mora, diante
da previsão expressa do art. 39 da Lei n. 8.177/1991 e do art. 883 da CLT, a
não ser a partir da data do ajuizamento.

Não se pode negar que a previsão legal dos juros de mora para os créditos
trabalhistas, especialmente para aqueles decorrentes do acidente do trabalho,
ficou defasada e necessita de urgente atualização. O Código Civil de 2002
estabelece no art. 398 que, “nas obrigações provenientes de ato ilícito,
considera-se o devedor em mora, desde que o praticou.” Esse entendimento
há muito tempo vem sendo aplicado pelo STJ, que adotou em 1992 a Súmula
n. 54, com o seguinte enunciado: Os juros moratórios fluem a partir do evento
danoso, em caso de responsabilidade extracontratual. Vejam o entendimento
daquele Tribunal:
“Agravo regim ental. Recurso especial. Acidente de trabalho. Danos morais. Valor
da indenização. Correção monetária. Juros de mora. Súm ulas ns. 54 e 362/STJ. 1.
Fixada a indenização por danos morais em R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais)
para cada um dos nove recorrentes, valor que está bem próximo do que já arbitrou
esta Corte em casos semelhantes, não se pode considerá-la ínfima a justificar nova
revisão.2. A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde
a data do arbitram ento (Súm ula n. 362). 3. Os juros m oratórios incidem desde o
evento danoso (Súmula n. 54/STJ). 4. Agravo regimental não provido.” STJ. 4B Turma.
AgRg no REsp n. 685.309/MG, Rei.: Ministro Raul Araújo, DJ 17 set. 2012.

(11) TST. Súmula n. 439: “ Nas condenações por dano moral, a atualização monetária é
devida a partir da data da decisão de arbitram ento ou de alteração do valor. Os juros
incidem desde o ajuizamento da ação, nos termos do art. 883 da CLT.”
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 459

“Responsabilidade civil. Acidente do trabalho. Morte. Indenização por dano moral.


Juros de mora. Data do evento danoso. Os juros m oratórios, em se tratando de
acidente de trabalho, estão sujeitos ao regime da responsabilidade extracontratual,
aplicando-se, portanto, a Súmula n. 54 da Corte, contabilizando-os a partir da data do
evento danoso. Precedentes.” STJ. 3 - Turma. REsp n. 931.556/RS, Rei.: Ministra Nancy
Andrighi, DJ 05 ago. 2008.

“Indenização. Dano material e dano moral. Acidente do trabalho. DORT (Distúrbio


Osteom uscular Relacionado ao Trabalho). Juros moratórios. Os juros moratórios,
em se tratando de acidente do trabalho, estão sujeitos ao regime de responsabilidade
extracontratual, aplicando-se, portanto, a Súm ula n. 54 da C orte.” STJ. 3â Turma.
REsp n. 569.351, Rei.: Ministro Menezes Direito, DJ 04 abr. 2005.

Se do ponto de vista técnico os juros representam a remuneração pelo


tempo em que o devedor utilizou o capital pertencente ao credor, não é justo
que a vítima do acidente do trabalho só passe a ter essa remuneração após
o ajuizamento da ação, uma vez que desde a data do evento danoso já era
virtual credora do valor da indenização, tendo ficado privada dos frutos que
esse capital poderia produzir.

15.5. Retenção de imposto de renda na fonte

De início, cumpre anotar que a Justiça do Trabalho tem competência


para decidir a respeito da incidência ou não do imposto de renda sobre as
indenizações deferidas ou sobre as parcelas constantes dos acordos
homologados. Nesse sentido, aliás, mesmo antes da explicitação legal dessa
competência, já havia se pronunciado o Supremo Tribunal Federal:
“Ementa: Com petência — Execução — Título judicial trabalhista — Descontos
previdenciário e do imposto de renda — Controvérsia. Cumpre à própria Justiça do
Trabalho, prolatora do título judicial e com petente para a execução respectiva, definir
a incidência, ou não, dos descontos previdenciário e para o imposto de renda.” STF.
2- Turma. RE n. 196517/PR, Rei.: Ministro Marco Aurélio, DJ 20 abr. 2001.

Na mesma linha do entendimento da Corte Suprema, a Lei n. 10.833, de


29 de dezembro de 2003, estabelece:
“Art. 28 Cabe à fonte pagadora, no prazo de 15 (quinze) dias da data da retenção de
que trata o caput do art. 46 da Lei n. 8.541, de 23 de dezembro de 1992, comprovar,
nos respectivos autos, o recolhim ento do imposto de renda na fonte incidente sobre
os rendimentos pagos em cum prim ento de decisões da Justiça do Trabalho.

§ 19. Na hipótese de omissão da fonte pagadora relativamente à com provação de que


trata o caput, e nos pagam entos de honorários periciais, co m petirá ao Juízo do
Trabalho calcular o im posto de renda na fonte e determ inar o seu recolhim ento à
instituição financeira depositária do crédito.”(12>

(12) Diante dessa previsão legal o C orregedor Geral da Ju stiça do T rabalho adotou o
Provimento TST/CG n. 3, de 3 de maio de 2005, dispondo sobre a retenção do imposto de
renda na fonte incidente sobre os rendim entos pagos em cum prim ento de decisões da
Justiça do Trabalho.
460 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

Mais recentemente, a Lei n. 11.457, de 16 de março de 2007, conhecida


como a lei que instituiu a “Super-receita”, deixou ainda mais clara essa
competência, quando estabelece no art. 16, § 32:
“Com pete à Procuradoria-Geral Federal representar judicial e extrajudicialmente: (...)
II — a União, nos processos da Justiça do Trabalho relacionados com a cobrança de
contribuições previdenciárias, de imposto de renda retido na fonte e de multas impostas
aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações do trabalho, mediante
delegação da Procuradoria-G eral da Fazenda N acional.”

Além disso, essa mesma lei, ao acrescentar no art. 832 da CLT os §§ 4e


e 5Q, facultou à União interpor recurso relativo aos tributos a ela devidos, ou
seja, para se insurgir contra a discriminação da natureza das parcelas do
acordo ou da sentença trabalhista. Discorrendo a respeito dessa inovação,
assinalou com propriedade o Juiz do Trabalho mineiro, Marco Aurélio Treviso:

“Um segundo aspecto que merece atenção especial é a substituição da


expressão ‘contribuições’, que antigamente constava no § 4Qdo art. 832
da CLT, pela expressão ‘tributos’, alcançando, como se vê pelo art. 16 da
Lei n. 11.457/07, o imposto de renda retido na fonte decorrente dos débitos
executados na Justiça do Trabalho. Este talvez seja o grande avanço
desta nova lei. É que, com base na interpretação sistemática destas
normas, é possível concluir que a cobrança judicial e os recursos ao
e n ca rg o da P ro c u ra d o ria G eral F ed era l a lc a n ç a rã o não só as
contribuições previdenciárias, mas, também, os valores devidos a título
de imposto de renda. (...) A partir de agora, em conjunto com a execução
da contribuição previdenciária, a União poderá promover a cobrança
efetiva e concreta dos valores devidos a título de imposto de renda.”(13)

Superada a questão da competência da Justiça do Trabalho, surge a


indagação: cabe retenção de imposto de renda na fonte sobre as parcelas
pagas em juízo pelo reclamado, decorrentes das indenizações por acidente
do trabalho ou doenças ocupacionais?

Antes de esboçar a resposta, é conveniente recordar que as reparações


mencionadas podem gerar parcelas indenizatórias de três modalidades:

1. Danos emergentes. Indenização referente aos desembolsos realizados


pela vítima, ou alguma pessoa em nome dela, com assistência médica,
tratamentos, funeral ou outras despesas relacionadas;

2. Lucros cessantes ou pensão. Indenização convertida em parcelas


que deverão ser pagas mensalmente à vítima ou aos seus dependentes,
conforme o caso, de acordo com o previsto nos artigos 948 a 950 do Código

(13) TREVISO, Marco Aurélio Marsiglia. A Lei n. 11.457/2007 e o processo do trabalho. In:
Jornal Trabalhista Consulex, Brasília, Ano XXIV, n. 1175, p. 10, jun. 2007.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 461

Civil, com o propósito de manter o mesmo nível dos rendimentos do acidentado


ou dos seus dependentes econômicos;

3. Danos m orais e/ou estéticos. Indenização por danos de caráter


extrapatrimonial, de natureza com pensatória, paga à vítim a ou a outras
pessoas legitimadas, conforme o caso.

Estabelece a Lei n. 7.713/1988 que ficam isentos do imposto de renda


os rendimentos percebidos por pessoa física, referentes às indenizações por
acidente do trabalho(14). Contudo, prevê o Regulamento do imposto de renda
que as indenizações convertidas em pagamento de prestações continuadas
são computadas no rendimento bruto para fins de tributação(15).

É pacífico na doutrina e jurisprudência que a indenização dos danos


emergentes, por representar mera recomposição do patrimônio do acidentado,
não gera a incidência do imposto de renda. Todavia, com relação à indenização
convertida em pagamentos mensais, a título de lucros cessantes ou pensão,
há entendimentos divergentes.

Uma corrente defende a tributação porque a pensão mensal representa


a m anutenção dos rendim entos futuros e não a reposição de perdas
patrimoniais. Nas orientações da Receita Federal para a declaração do imposto
de renda do ano de 2012, consta a seguinte diretriz a respeito da tributação
das indenizações por invalidez ou morte:
“275 — Os re n d im e n to s c o rre s p o n d e n te s a in d e n iz a ç õ e s re p a ra tó ria s em
decorrência de ato ilícito são tributáveis?

Os prejuízos físicos ou materiais, em consequência de ato ilícito praticado por terceiros,


são indenizáveis na form a da lei civil. Essas indenizações têm por finalidade repor o
patrim ônio danificado ou destruído, bem como substituir os rendimentos não percebidos
em decorrência da perda do bem, de invalidez temporária, permanente ou de morte.

As indenizações por ato ilícito podem ser:

1 — indenizações por bem m aterial danificado ou destruído, denom inadas “danos


em ergentes” . São valores que visam exclusivam ente repor o bem destruído ou a
reparar o bem danificado, até o limite fixado em condenação judicial. Não sofrem
incidência do imposto sobre a renda;

2 — indenização reparatória por invalidez ou morte — o pagamento dessa indenização


pode ocorrer das seguintes maneiras:

(14) Lei n. 7.713, de 22 dez. 1988. Art. 6e. Ficam isentos do imposto de renda os seguintes
rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) IV — as indenizações por acidentes do
trabalho.
(15) Decreto n. 3.000, 26 mar. 1999. Art. 39: “Não entrarão no cômputo do rendimento bruto:
(...) XVI — a indenização reparatória por danos físicos, invalidez ou morte, ou por bem
m aterial d a nificad o ou d estruído, em d e co rrê n cia de acid e nte , até o lim ite fixa d o em
condenação judicial, exceto no caso de pagamento de prestações continuadas;”
462 S e b a s t iã o G er aldo de O liv e ir a

a) quantia paga periodicamente, cujo total é indeterm inável previamente (desconhecido


o term o final da obrigação), caracteriza-se como pensão civil por ato ilícito, também
deno m in ada “ lucros c e s sa n te s” . Sob essa designação, o em pregado p ostula os
salários que deixa de perceber; o profissional liberal, os honorários; a pessoa jurídica,
os lucros; o locador, o aluguel; o a p lica d o r, os re n d im e n to s do títu lo (correção
monetária, deságios, juros e outros). Tem por finalidade substituir os rendimentos que
a vítim a deixou de p erceber em razão da invalidez ou m orte. T ais valores devem
ser oferecidos à tributação, no mês do seu recebimento e na declaração. Podem ser
deduzidas as despesas judiciais ou extrajudiciais suportadas pelo contribuinte ou por
seu beneficiário para a obtenção dos rendim entos pagos acum uladam ente, desde
que não ressarcidas;

b) quantia certa paga de uma vez ou dividida em um número certo de parcelas —


referindo-se ao ressarcimento dos danos anteriormente causados e guardando com
eles equivalência — caracteriza-se com o indenização. Esses valores não sofrem
incidência do imposto sobre a renda.

Na hipótese do item 2, as quantias recebidas para cobrir despesas médico-hospitalares


necessárias ao restabelecim ento da vítima, inclusive próteses de qualquer espécie,
estão fora do campo de incidência do imposto sobre a renda. (Decreto n. 3.000, de 26
de março de 1999 — Regulamento do Imposto sobre a Renda (RIR/1999), art. 39,
inciso XVI; Instrução Normativa SRF n. 15, de 6 de fevereiro de 2001, art. 5S, inciso
XXIV; Ato Declaratório Normativo Cosit n. 20, de 1989)” .<16)

De fato esses pagamentos (lucros cessantes ou pensão) têm por objetivo


substituir os rendimentos que a vítima perceberia ao longo do tempo, não
fosse a ocorrência da invalidez ou morte, ou seja, visam garantir a continuidade
de uma renda que já era tributável. Vejam a respeito o pensamento de Hugo
Machado, professor titular de Direito Tributário da Universidade Federal do
Ceará:

“A indenização para o lucro cessante é indenização do patrim ônio


econômico potencial. O dano, no caso, não afeta o patrimônio atual, mas
a sua perspectiva de crescimento. Atinge o lucro que, em face das
circunstâncias, se podia ter como certo. Faz cessar o lucro que vinha
sendo obtido, ou cuja obtenção era prevista com razoável grau de certeza.
(...) Em se tratando de indenização por lucro cessante é inegável a
ocorrência do crescim ento patrim onial. Os lucros são acréscim os
patrimoniais, e como tais são tributáveis. Na medida em que sejam
substituídos por indenizações, evidentemente estas assumem a posição
daqueles.”(17)

De forma semelhante, pontua o Ministro do STJ José Augusto Delgado:


“O lucro cessante caracteriza-se por lucro certo que alguém deixou de

(16) <http://w ww .receita.fazenda.gov.br/publico/perguntao/irpf2012/perguntaserespostasirpf


2012,pdf>. Acesso em: 12 nov. 2012.
(17) MACHADO, Hugo de Brito. Regim e tributário das indenizações. Fortaleza: Instituto
Cearense de Estudos Tributários — ICET, 2000. p. 102 e 109.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 463

concretizar, em decorrência de dano praticado por outrem. A verba paga a


título de lucro cessante não é indenização. É o pagamento de uma renda que
deixou de ser obtida pelo credor. O que ocorre é a substituição do agente
devedor. (...) O tratamento tributário, portanto, do lucro cessante passa a ser
o de receita obtida por alguém.”(18)
Diante do entendimento de que a parcela dos lucros cessantes ou da
pensão mensal gera a incidência do imposto de renda na fonte, como fica a
tributação quando a vítima opta por receber a indenização de uma só vez, na
form a prevista no art. 950, parágrafo único do Código Civil atual? Pela
literalidade da Lei n. 7.713/1988 já citada, esse pagamento fica isento do
imposto de renda.
Essa conclusão encerra um aparente paradoxo: a simples opção do
autor de transformar o pensionamento mensal em indenização antecipada
produz o efeito de alterar a natureza do rendimento de tributável para isento?
Entendemos que não e, por essa e outras razões, defendemos uma
segunda corrente no sentido de que a indenização por lucro cessante ou
pensão decorrente do acidente do trabalho não é tributável. O pagamento
da pensão mensal tem natureza indenizatória e não remuneratória, pelo que
dispõem expressamente os arts. 948 a 950 do Código Civil. Não foi a opção
da vítima pelo pagamento de uma só vez que tornou a verba indenizatória,
pois essa natureza já era da sua essência, ex vi legis.
A isenção prevista na Lei n. 7.713/1988 é abrangente e não pode o
intérprete criar uma distinção onde a lei não distinguiu. Vamos reproduzir,
para melhor compreensão, o texto legal: “Art. 6e Ficam isentos do imposto de
renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) I V — as
indenizações por acidentes do trabalho.” Convém sublinhar que o vocábulo
“ in d e n iza çõ e s” foi grafado no plural, ou seja, todas as indenizações
decorrentes do acidente do trabalho estão amparadas pela isenção. A opção
por uma ou outra modalidade de pagamento da indenização não produz o
efeito surpreendente de modificar sua natureza jurídica. Desse modo, o inciso
XVI do art. 39 do Decreto n. 3.000/1999, na sua parte final, extrapola os limites
legais, criando uma parcela tributável onde a lei expressamente concedeu
isenção, especialmente no caso de acidente do trabalho.
Em síntese, entendemos que não cabe a incidência do imposto de renda
so b re os v a lo re s pagos m e n sa lm e n te ao a c id e n ta d o , ou aos seus
dependentes, a título de pensão ou lucros cessantes. Nesse sentido a
jurisprudência do Colendo STJ:

(18) DELGADO, José Augusto. Reflexões sobre o regime tributário das indenizações. In:
MACHADO, Hugo de Brito. Regime tributário das indenizações. Fortaleza: Instituto Cearense
de Estudos Tributários — ICET, 2000. p. 173.
464 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

“R ecurso esp ecial. E m bargos à execução. V erba in d en izató ria. A cid ente do
trabalho. Incom petência da Justiça Federal (CF, art. 109, I, parte final). Acordo.
Parcela retida pela devedora a título de im posto de renda. Im possibilidade. Não
incidência de im posto de renda sobre parcela indenizatória, ainda que paga
m ediante pensionam ento. Recurso especial desprovido. 1. Nos termos do art. 109,
i, da C onstituição Federal, estão excluídas da com petência da Justiça Federal as
causas relativas a acidente do trabalho. 2. Os valores recebidos a título de indenização
não sofrem a incidência do imposto sobre a renda, pois representam com pensação
pela perda da capacidade laboral, e não acréscimo patrimonial. Precedentes. 3. Ainda
que a indenização seja paga sob a forma de pensionam ento mensal, os pagamentos
não perdem a natureza indenizatória, não subsistindo razão para a retenção de imposto
de renda na fonte. Precedente. 4. Recurso especial desprovido.” STJ. 4- Turma. REsp
n. 1106854/RJ, Rei.: Ministro Raul Araújo, DJ 17 out. 2011.

“Direito civil. Ação de indenização por danos materiais e morais decorrentes de


a c id e n te s de v e íc u lo s . T ra n s a ç ã o c e le b ra d a p e la s p a rte s in s titu in d o
pensionam ento, m ediante inclusão em folha de pagam ento mensal. Retenção
indevida de imposto de renda na fonte. Diante de transação em que as partes instituem
pensionam ento mensal, com inclusão em folha de pagamento, pondo fim a demanda
inde nizatória , os pagam entos conservam a n atureza in d e niza tó ria da origem da
obrigação, não havendo fundam ento para retenção do imposto de renda na fonte.
Recurso Especial provido.” STJ. 3â Turma. REsp n. 1012843/RJ, Rei.: Ministro Sidnei
Beneti, DJ 17 fev. 2009.

Resta, neste tópico, analisar outra questão polêmica: cabe ou não a


incidência do imposto de renda sobre a parcela deferida a título de danos
morais ou estéticos?

Por um lado, pode-se argum entar que os valores percebidos como


indenização não devem ser tributados, mas por outro enfoque é possível
sustentar que o ingresso dessa verba acarreta aumento real no patrimônio
econômico da vítima; o dano moral é de natureza extrapatrimonial, mas o
valor deferido para sua reparação ostenta a qualidade de um bem patrimonial.

Segundo as orientações da Receita Federal, com apoio no art. 43 do


Código Tributário Nacional(19), a quantia recebida a título de danos morais é
tributável porque provoca acréscimo patrimonial, ainda mais que a simples
aquisição de disponibilidade econômica, oriunda de proventos de qualquer
natureza, também se enquadra legalmente como fato gerador do imposto de
renda(20).

(19) C ódigo T ributário Nacional. “Art. 43. O imposto, de com petência da União, sobre a
re n d a e p ro v e n to s de q u a lq u e r n a tu re z a te m c o m o fa to g e ra d o r a a q u is iç ã o da
disponibilidade econômica ou jurídica: I — de renda, assim entendido o produto do capital,
do trabalho ou da combinação de ambos; II — de proventos de qualquer natureza, assim
enten did os os acréscim o s p a trim o n ia is não co m pre e nd id o s no inciso a nterior. § 19 A
in c id ê n c ia do im p o sto in d e p e n d e da d e n o m in a ç ã o da re ce ita ou do re n d im e n to , da
localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da form a de percepção.”
(20) Nas orientações da Receita Federal para a Declaração de 2010 há uma pergunta a
respeito da tributação do dano moral. Vejam a orientação: “209 — Qual o tratam ento tributário
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 465

Apesar dessa posição da Receita Federal, o entendimento majoritário


da jurisprudência afasta a incidência do imposto sobre tal parcela, visto que o
valor recebido como reparação de um dano não deve ser incluído no conjunto
das verbas tributáveis. A indenização obtida pelo ofendido não se caracteriza
como fruto do capital ou do trabalho, mas apenas uma compensação dos
prejuízos imateriais sofridos, não havendo, assim, justificativa plausível ou
moralmente aceitável para concluir pela incidência do imposto por acréscimo
de renda(21). Aliás, desde o final de 2008, o Colendo STJ passou a decidir
nesse sentido, após uniformização do entendimento pela 1ã Seção:
“Tributário, im posto de renda. Indenização por danos morais. Natureza da verba.
A c ré s c im o p a trim o n ia l. N ão in c id ê n c ia . P rin c íp io da re p a ra ç ã o in te g ra l.
Precedentes do STJ. 1. A indenização por dano estritamente moral não é fato gerador
do Im posto de Renda, pois lim ita-se a recom por o patrim ônio im aterial da vítim a,
atingido pelo ato ilícito praticado. 2. In casu , a negativa de incidência do Imposto de
Renda não se faz por força de isenção, mas em decorrência da ausência de riqueza
nova — oriunda dos frutos do capital, do trabalho ou da com binação de ambos —
capaz de caracterizar acréscim o patrim onial. 3. A indenização por dano moral não
aumenta o patrim ônio do lesado, apenas o repõe, pela via da substituição monetária,
in statu quo ante. 4. A vedação de incidência do Imposto de Renda sobre indenização
por danos morais é também decorrência do princípio da reparação integral, um dos
pilares do Direito brasileiro. A tributação, nessas circunstâncias e, especialmente, na
hipótese de ofensa a direitos da personalidade, reduziria a plena eficácia material do
princípio, transform ando o Erário sim ultaneam ente em sócio do infrator e beneficiário
do sofrim ento do contribuinte. 5. Recurso Especial não provido.” STJ. 1a Seção. REsp
n. 963.387/RS, Rei.: Ministro Herman Benjamin, DJ 05 mar. 2009.

“ Processo Civil e Tributário. Recurso Especial representativo de controvérsia.


Art. 543-C, do CPC. Indenização por dano moral. Incidência do im posto de renda.
Im possibilidade. Caráter indenizatório da verba recebida. 1. A verba percebida a
título de dano moral tem a natureza jurídica de indenização, cujo objetivo precípuo é
a reparação do sofrim ento e da dor da vítim a ou de seus parentes, causados pela
lesão de direito, razão pela qual torna-se infensa à incidência do imposto de renda,
porquanto inexistente qualquer acréscimo patrimonial. (Precedentes: REsp n. 686.920/
MS, Rei. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 6.10.2009, DJe
19.10.2009; AgRg no Ag 1021368/RS, Rei. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 21.5.2009, DJe 25.6.2009; REsp 865.693/RS, Rei. Ministro TEORI ALBINO
ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18.12.2008, DJe 4.2.2009; AgRg no REsp
1017901/RS, Rei. M inistro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURM A, julgado em
4.11.2008, DJe 12.11.2008; REsp 963.387/RS, Rei. Ministro HERMAN BENJAMIN,
PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 8.10.2008, DJe 5.3.2009; REsp 402035 / RN, 2® Turma,
Rei. Min. Franciulli Netto, DJ 17.5.2004; REsp 410347 / SC, desta R elatoria, DJ

da indenização recebida por danos morais? Essa indenização, paga por pessoa física ou
jurídica, em virtude de acordo ou decisão judicial, é rendimento tributável sujeito à incidência
do imposto sobre a renda na fonte e na declaração de ajuste. (Decreto n. 3.000, de 26 de
março de 1999 — Regulamento do Imposto sobre a Renda — RIR , art. 718).” Disponível
em: < http://w w w .receita.fazenda.gov.br/P essoaFisica/IR P F/2010/P erguntas/D efault.htm >
(21) Decidimos neste sentido quando atuamos como Relator no julgam ento do AP n. 01561-
2005-114-03-00-3, Minas Gerais. TRT 3a Região. 2a Turma, DJ 11 fev. 2009.
466 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

17.2.2003). 2. In casu, a verba percebida a título de dano moral adveio de indenização


em reclamação trabalhista. 3. Deveras, se a reposição patrim onial goza dessa não
incidência fiscal, a fortiorí, a indenização com o escopo de reparação imaterial deve
subsumir-se ao mesmo regime, porquanto ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio.
4. “Não incide imposto de renda sobre o valor da indenização pago a terceiro. Essa
ausência de incidência não depende da natureza do dano a ser reparado. Qualquer
espécie de dano (material, moral puro ou impuro, por ato legal ou ilegal) indenizado,
o valor concretizado como ressarcimento está livre da incidência de imposto de renda.
A prática do dano em si não é fato gerador do imposto de renda por não ser renda. O
pagamento da indenização também não é renda, não sendo, portanto, fato gerador
desse imposto. (...) Configurado esse panorama, tenho que aplicar o princípio de que
a base de cálculo do imposto de renda (ou de qualquer outro imposto) só pode ser
fixada por via de lei oriunda do poder competente. É o comando do art. 127, IV, do
CTN. Se a lei não insere a ‘indenização’, qualquer que seja o seu tipo, como renda
tributável, inocorrendo, portanto, fato gerador e base de cálculo, não pode o fisco
exigir imposto sobre essa situação fática. (...) Atente-se para a necessidade de, em
homenagem ao princípio da legalidade, afastar-se as pretensões do fisco em alargar
o cam po da incidência do im posto de renda sobre fatos estranhos à vontade do
legislador.” (“ Regime T ributário das Indenizações” , C oordenado por Hugo de Brito
Machado, Ed. Dialética, pg. 174/176).” STJ. 1ã Seção. REsp n. 1.152.764/CE, Rei.:
Ministro Luiz Fux, DJ 1Qjui. 2010.

Como se depreende do exposto, no caso de pagamento dos danos


morais decorrentes de acidente do trabalho, não cabe a incidência do imposto
de renda, tanto na retenção pela fonte pagadora quanto na declaração anual
de ajuste elaborada pelo contribuinte, uma vez que a Lei n. 7.713/1988
expressam ente concede isenção sobre a indenização genericam ente
considerada, sem fazer qualquer diferenciação quanto a sua natureza ou
espécie(22). A controvérsia restou pacificada no STJ com a edição da Súmula
n. 498, publicada em 13 de agosto de 2012: “Não incide imposto de renda
sobre a indenização por danos morais”.

Em síntese, as parcelas indenizatórias decorrentes dos acidentes do


trabalho ou doenças ocupacionais deferidas a título de danos materiais
emergentes, lucros cessantes ou pensão, danos estéticos ou danos morais
não sofrem incidência do imposto de renda.

(22) “Imposto de renda na fonte e indenização p o r dano moral derivado de doença do


trabalho. Como as indenizações (plural) referentes a acidente de trabalho são isentas de
imposto de renda, consoante previsão da Lei n. 7.713/1988 (art. 6Q, inciso IV), a deferida,
condenatoriamente, pela Justiça do Trabalho por danos morais, em virtude de doença do
trabalho equiparada para todos os fins a acidente de trabalho, não tem como não se aninhar
no comando legal excludente da retenção na fonte do referido imposto.” Minas Gerais. TRT.
3ã Reg. 2- Turma. AP n. 0665/2003, Rei.: Juiz Antônio Fernando Guimarães, DJ 26 mar.
2003.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 467

15.6. Quadro sinóptico das incidências cabíveis:

RESUMO DAS INCIDÊNCIAS SOBRE AS INDENIZAÇÕES POR


ACIDENTE DO TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL

Parcelas Correção Juros de Imposto de


indenizatórias monetária mora renda na fonte
Dano material In c id e d e s d e a d a ta In c id e m d e s d e a Ise n to
emergente d o d e s e m b o ls o . d a ta do
a ju iz a m e n to .

Lucros cessantes In c id e d e s d e o Só passam a Is e n to (1)


ou pensionamento v e n c im e n to de in c id ir a p a rtir d a
— Parcelas c a d a p a rc e la d a ta do
vencidas a n te s do m e n sa l, a ju iz a m e n to .
ajuizamento se p a ra d a m e n te .

Lucros cessantes In c id e d e s d e o In c id e m d e s d e o Is e n to (1)


ou pensionamento v e n c im e n to de v e n c im e n to de
— Parcelas c a d a p a rc e la c a d a p a rc e la
vencidas a p ó s o m e n sa l, m e nsa l,
ajuizamento se p a ra d a m e n te . se p a ra d a m e n te .

Lucros cessantes N ão in c id e . S e N ã o in c id e m . S e Is e n to (1)


ou pensionamento p a g a s co m a tra s o , p a g a s c o m a tra s o ,
— Parcelas s ó in c id e a p ó s o só in c id e m a p ó s o
vincendas v e n c im e n to . v e n c im e n to .

Pensionamento In cid e a p a rtir da In c id e m d e s d e a Ise n to


pago de uma só d a ta d o ju lg a m e n to . d a ta do
vez a ju iz a m e n to .

Dano moral ou In c id e a p a rtir d a In c id e m d e s d e a Is e n to (1)


dano estético d a ta d o ju lg a m e n to . d a ta do
a ju iz a m e n to .

Observações:

1. Para a Receita Federal, são tributáveis tanto os valores pagos a título de lucros cessantes
ou pensionam ento quanto a parcela deferida a título de indenização por danos morais.
2. Não cabe in cid ê n cia ou retenção da c o n trib u iç ã o para o INSS em q u a lq u e r das
indenizações citadas.
3. 0 cálculo dos ju ro s de m ora deve se r fe ito d epois da recom posição do v a lo r da
indenização pela incidência da correção monetária (Súmula n. 200-TST).
ANEXO l<1>
AGENTES PATOGÊNICOS CAUSADORES DE DOENÇAS PROFISSIONAIS OU
DO TRABALHO, CONFORME PREVISTO NO ART. 20 DA LEI N. 8.213, DE 1991

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

Químicos

I — Arsênio e seus compostos 1. metalurgia de minérios arsenicais e indústria


arsenicais eletrônica1
2. extração do arsênio e preparação de seus com­
postos;
3. fabricação, preparação e emprego de tintas,
lacas (gás arsina), inseticidas, parasiticidas e
raticidas;
4. processos industriais em que haja desprendi­
mento de hidrogênio arseniado;
5. preparação e conservação de peles e plumas
(empalhamento de animais) e conservação da
madeira;
6. agentes na produção de vidro, ligas de chum­
bo, medicamentos e semicondutores
II — Asbesto ou amianto 1.extração de rochas amiantíferas, furação, cor­
te, desmonte, trituração, peneiramento e mani­
pulação;
2. despejos do material proveniente da extração,
trituração;
3. mistura, cardagem, fiação e tecelagem de ami­
anto;
4. fabricação de guarnições para freios, materiais
isolantes e produtos de fibrocimento;
5. qualquer colocação ou demolição de produtos
de amianto que produza partículas atmosféricas de
amianto.
III — Benzeno ou seus homólogos Fabricação e emprego do benzeno, seus homó­
tóxicos logos ou seus derivados aminados e nitrosos:
1. instalações petroquímicas onde se produzir
benzeno;
2. indústria química ou de laboratório;
3. produção de cola sintética;

(1) Lista Anexa ao Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999


470 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

4. usuários de cola sintética na fabricação de


calçados, artigos de couro ou borracha e móveis;
5. produção de tintas;
6. impressores (especialmente nafotogravura);
7. pintura a pistola;
8. soldagem.
IV — Berílio e seus compostos tó­ 1. extração, trituração e tratamento de berílio;
xicos
2. fabricação e fundição de ligas e compostos;
3. utilização na indústria aeroespacial e manu­
fatura de instrumentos de precisão e ordenado-
res; ferramentas cortantes que não produzam
faíscas para a indústria petrolífera;
4. fabricação de tubos fluorescentes, de ampo-
las de raios X, de eletrodos de aspiradores, ca-
todos de queimadores e moderadores de reato­
res nucleares;
5. fabricação de cadinhos, vidros especiais e de
porcelana para isolantes térmicos.
V — Bromo Fabricação e emprego do bromo e do ácido brô-
mico.
VI — Cádmio ou seus compostos 1. extração, tratamento, preparação e fundição
de ligas metálicas;
2. fabricação de compostos de cádmio para sol­
dagem;
3. soldagem;
4. utilização em revestimentos metálicos (galva­
nização), como pigmentos e estabilizadores em
plásticos, nos acumuladores de níquel-cádmio
e soldagem de prata.
VII — Carbonetos metálicos de Produção de carbonetos sinterizados (mistura,
tungstênio sinterizados pulverização, modelado, aquecimento em forno,
ajuste, pulverização de precisão), na fabricação
de ferramentas e de componentes para máqui­
nas e no afiamento das ferramentas. Trabalha­
dores situados nas proximidades e dentro da
mesma oficina.
VIII — Chumbo ou seus compos­ 1. extração de minérios, metalurgia e refinação
tos tóxicos do chumbo;
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 471

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

2. fabricação de acumuladores e baterias (placas);


3. fabricação e emprego de chumbo-tetraetila e
chumbo-tetrametila;
4. fabricação e aplicação de tintas, esmaltes e
vernizes à base de compostos de chumbo;
5. fundição e laminação de chumbo, de bronze
etc.;
6. fabricação ou manipulação de ligas e com­
postos de chumbo;
7. fabricação de objetos e artefatos de chumbo,
inclusive munições;
8. vulcanização da borracha pelo litargírio ou
outros compostos de chumbo;
9. soldagem;
10. indústria de impressão;
11. fabricação de vidro, cristal e esmalte vitrifi-
cado;
12. sucata, ferro-velho;
13. fabricação de pérolas artificiais;
14. olaria;
15. fabricação de fósforos.
IX — Cloro Fabricação e emprego de cloro e ácido clorídrico.
X — Cromo ou seus compostos 1. fabricação de ácido crômico, de cromatos e
tóxicos bicromatos e ligas de ferrocromo;
2. cromagem eletrolítica de metais (galvano-
plastia);
3. curtição e outros trabalhos com o couro;
4. pintura a pistola com pigmentos de compos­
tos de cromo, polimento de móveis;
5. manipulação de ácido crômico, de cromatos
e bicromatos;
6. soldagem de aço inoxidável;
7. fabricação de cimento e trabalhos da constru­
ção civil;
8. impressão e técnica fotográfica.
472 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

XI — Flúor ou seus compostos tó­ 1. fabricação e emprego de flúor e de ácido fluo-


xicos rídrico;
2. siderurgia (como fundentes);
3. fabricação de ladrilhos, telhas, cerâmica, ci­
mento, vidro, esmalte, fibra de vidro, fertilizantes
fosfatados;
4. produção de gasolina (como catalisador alqui-
lante);
5. soldagem elétrica;
6. galvanoplastia;
7. calefação de superfícies;
8. sistema de combustível para foguetes.
XII — Fósforo ou seus compostos 1. extração e preparação do fósforo branco e de
tóxicos seus compostos;
2. fabricação e aplicação de produtos fosforados
e organofosforados (sínteses orgânicas, fertilizan­
tes, praguicidas);
3. fabricação de projéteis incendiários, explosi­
vos e gases asfixiantes à base de fósforo branco;
4. fabricação de ligas de bronze;
5. borrifadores, trabalhadores agrícolas e respon­
sáveis pelo armazenamento, transporte e distri­
buição dos praguicidas organofosforados.

XIII — Hidrocarbonetos alifáticos


ou aromáticos
(seus derivados halogena-
dos tóxicos)
— Cloreto de metila Síntese química (metilação), refrigerante, agen­
te especial para extrações.
— Cloreto de metileno Solvente (azeites, graxas, ceras, acetato de ce­
lulose), desengordurante, removedor de pinturas.
— Clorofórmio Solvente (lacas), agente de extração.
— Tetracloreto de carbono Síntese química, extintores de incêndio.
— Cloreto de etila Síntese química, anestésico local (refrigeração).
1.1 — Dicloroetano Síntese química, solvente (resinas, borracha, as­
falto, pinturas), desengraxante.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 473

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

1.1.1 — Tricloroetano Agente desengraxante para limpeza de metais


e limpeza a seco.
1.1.2 — Tricloroetano Solvente.

— Tetracloroetano Solvente.

— Tricloroetileno
Desengraxante, agente de limpeza a seco e de
extração, sínteses químicas.
— Tetracloroetileno
Desengraxante, agente de limpeza a seco e de
— Cloreto de vinila extração, sínteses químicas.
Intermediário na fabricação de cloreto de polivi-
— Brometo de metila nila.
Inseticida em fumigação (cereais), sínteses quí­
— Brometo de etila micas.
Sínteses químicas, agente especial de extração.
1.2 — Dibromoetano
Inseticida em fumigação (solos), extintor de incên­
— Clorobenzeno dios, solvente (celulóide, graxas, azeite, ceras).
— Diclorobenzeno Sínteses químicas, solvente.
Sínteses químicas, solvente.
XIV — lodo Fabricação e emprego do iodo.
XV — Manganês e seus compos­ 1. extração, tratamento e trituração de pirolusita
tos tóxicos (dióxido de manganês);
2. fabricação de ligas e compostos do manganês;
3. siderurgia;
4. fabricação de pilhas secas e acumuladores;
5. preparação de permanganato de potássio e
fabricação de corantes;
6. fabricação de vidros especiais e cerâmica;
7 soldagem com eletrodos contendo manganês;
8. fabricação de tintas e fertilizantes;
9. curtimento de couro.
XVI — Mercúrio e seus compos­ 1. extração e fabricação do mineral de mercúrio
tos tóxicos e de seus compostos;
2. fabricação de espoletas com fulminato de
mercúrio;
3. fabricação de tintas;
474 S e b a s t iã o G eraldo de O liv e ir a

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

4. fabricação de soida;
5. fabricação de aparelhos: barômetros, manô-
metros, termômetros, interruptores, lâmpadas,
válvulas eletrônicas, ampolas de raio X, retifica-
dores;
6. amalgamação de zinco para fabricação de ele­
trodos, pilhas e acumuladores;
7. douração e estanhagem de espelhos;
8. empalhamento de animais com sais de mer­
cúrio;
9. recuperação de mercúrio por destilação de re­
síduos industriais;
10. tratamento a quente de amálgamas de ouro
e prata para recuperação desses metais;
11. secretagem de pelos, crinas e plumas, e fel-
tragem à base de compostos de mercúrio;
12. fungicida no tratamento de sementes e bri­
lhos vegetais e na proteção da madeira.

XVII — Substâncias asfixiantes Produção e distribuição de gás obtido de com­


1. Monóxido de carbono bustíveis sólidos (gaseificação do carvão); me­
cânica de motores, principalmente movidos a
gasolina, em recintos semifechados; soldagem
acetilênica e a arco; caldeiras, indústria química;
siderurgia, fundição, mineração de subsolo; uso
de explosivos; controle de incêndios; controle de
tráfego; construção de túneis; cervejarias.

2. Cianeto de hidrogênio ou seus Operações de fumigação de inseticidas, síntese


derivados tóxicos de produtos químicos orgânicos; eletrogalvano-
plastia; extração de ouro e prata; produção de
aço e de plásticos (especialmente o acrilonitrilo-
estireno); siderurgia (fornos de coque).

3. Sulfeto de hidrogênio (Ácido sul- Estações de tratamento de águas residuais; mi­


fídrico) neração; metalurgia; trabalhos em silos; proces­
samento de açúcar da beterraba; curtumes e
matadouros; produção de viscose e celofane;
indústria química (produção de ácido sulfúrico,
sais de bário); construção de túneis; perfura­
ção de poços petrolíferos e gás; carbonização
do carvão a baixa temperatura; litografia e foto-
gravura.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 475

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

XVIII — Sílica livre (Óxido de silí­ 1. extração de minérios (trabalhos no subsolo e


cio - Si 02) a céu aberto);
2. decapagem, limpeza de metais, foscamento
de vidros com jatos de areia, e outras atividades
em que se usa areia como abrasivo;
3. fabricação de material refratário para fornos,
chaminés e cadinhos, recuperação de resíduos;
4. fabricação de mós, rebolos, saponáceos, pós
e pastas para polimento de metais;
5. moagem e manipulação de sílica na indústria
de vidros e porcelanas;
6. trabalho em pedreiras;
7. trabalho em construção de túneis;
8. desbastes e polimento de pedras.

XIX — Sulfeto de carbono ou dis- 1. fabricação de sulfeto de carbono;


sulfeto de carbono 2. indústria da viscose, raiom (seda artificial);
3. fabricação e emprego de solventes, insetici­
das, parasiticidas e herbicidas;
4. fabricação de vernizes, resinas, sais de amo­
níaco, tetracloreto de carbono, têxteis, tubos ele­
trônicos a vácuo, gorduras;
5. limpeza a seco; galvanização; fumigação de
grãos;
6. processamento de azeite, enxofre, bromo,
cera, graxas e iodo.

XX — Alcatrão, breu, betume, hu­ Processos e operações industriais ou não, em


lha mineral, parafina e produtos ou que sejam utilizados alcatrão, breu, betume,
resíduos dessas substâncias, cau­ hulha mineral, parafina e produtos ou resíduos
sadores de epiteliomas primitivos dessas substâncias.
da pele

Físicos

XXI — Ruído e afecção auditiva Mineração, construção de túneis, exploração de


pedreiras (detonação, perfuração); engenharia
pesada (fundição de ferro, prensa de forja); tra­
balho com máquinas que funcionam com poten­
tes motores a combustão; utilização de máqui­
nas têxteis; testes de reatores de aviões.
476 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

XXII — Vibrações (Afecções dos Indústria metalúrgica, construção naval e auto­


músculos, tendões, ossos, articula­ mobilística; mineração; agricultura (motosserras);
ções, vasos sanguíneos periféricos instrumentos pneumáticos; ferramentas vibrató­
ou dos nervos periféricos) rias, elétricas e manuais; condução de cami­
nhões e ônibus.

XXI11— Ar comprimido 1. trabalhos em caixões ou câmaras pneumáti­


cas e em tubulões pneumáticos;
2. operações com uso de escafandro;
3. operações de mergulho;
4. trabalho com ar comprimido em túneis pres­
surizados.

XXIV — Radiações ionizantes 1. extração de minerais radioativos (tratamento,


purificação, isolamento e preparo para distribui­
ção), como o urânio;
2. operação com reatores nucleares ou com fon­
tes de nêutrons ou de outras radiações corpus-
culares;
3. trabalhos executados com exposições a rai­
os X, rádio e substâncias radioativas para fins
industriais, terapêuticos e diagnósticos;
4. fabricação e manipulação de produtos quími­
cos e farmacêuticos radioativos (urânio, radô-
nio, mesotório, tório X, césio 137 e outros);
5. fabricação e aplicação de produtos lumines-
centes radíferos;
6. pesquisas e estudos dos raios X e substâncias
radioativas e laboratórios.
Biológicos

XXV — Micro-organismos e parasi­


tas infecciosos vivos e seus pro-
dutos tóxicos

1. Mycobacterium; vírus hos­ Agricultura; pecuária; silvicultura; caça (inclusi­


pedados por artrópodes; ve a caça com armadilhas); veterinária; curtume.
cocciclióides; fungos; his-
toplasma; leptospira; ri- Construção; escavação de terra; esgoto; canal
cketsia; bacilo (carbúnculo, de irrigação; mineração.
tétano);ancilóstomo; tripa-
nossoma; pasteurella. Manipulação e embalagem de carne e pescado.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 477

Agentes Patogênicos Trabalhos que contêm o risco

2. Ancilóstomo; histoplasma; Manipulação de aves confinadas e pássaros.


cocciclióides; leptospira;
bacilo; sepse. Trabalho com pelo, pele ou lã.
3. Mycobacterium; brucellas;
Veterinária.
estreptococo (erisipela);
fungo; ricketsia; pasteu-
Hospital; laboratórios e outros ambientes envol­
rella.
vidos no tratamento de doenças transmissíveis.
4. Fungos; bactérias; mixoví-
rus (doença de Newcastle). Trabalhos em condições de temperatura elevada
e umidade (cozinhas; ginásios; piscinas etc.).
5. Bacilo (carbúnculo) e pas-
teurella.
6. Bactérias; mycobacteria;
brucella; fungos; leptospi­
ra; vírus; mixovírus; ricket­
sia; pasteurella.
7. Mycobacteria, vírus; outros
organismos responsáveis
por doenças transm issí­
veis.
8. Fungos (micose cutânea).

POEIRAS ORGÂNICAS

XXVI — Algodão, linho, cânhamo, Trabalhadores nas diversas operações com po­
sisal eiras provenientes desses produtos.

XXVII — Agentes físicos, químicos Trabalhadores mais expostos: agrícolas; da cons­


ou biológicos, que afetam a pele, trução civil em geral; da indústria química; de
não considerados em outras rubri­ eletrogalvanoplastia; de tinturaria; da indústria
cas. de plásticos reforçados com fibra de vidro; da
pintura; dos serviços de engenharia (óleo de cor­
te ou lubrificante); dos serviços de saúde (medi­
camentos, anestésicos locais, desinfetantes); do
tratamento de gado; dos açougues.
ANEXO ll<1>LISTA A
AGENTES OU FATORES DE RISCO DE NATUREZA OCUPACIONAL
RELACIONADOS COM A ETIOLOGIA DE DOENÇAS PROFISSIONAIS
E DE OUTRAS DOENÇAS RELACIONADAS COM O TRABALHO

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)
I — Arsênio e seus compostos 1. Angiossarcoma do fígado (C22.3)
arsenicais
2. Neoplasia maligna dos brônquios e do pulmão
(C34.-)
3. Outras neoplasias malignas da pele (C44.-)
4. Polineuropatia devida a outros agentes tóxi­
cos (G52.2)
5. Encefalopatia Tóxica Aguda (G92.1)
6. Blefarite (H01.0)
7. Conjuntivite (H10)
8. Queratite e Queratoconjuntivite (H16)
9. Arritmias cardíacas (I49.-)
10. Rinite Crônica (J31.0)
11. Ulceração ou Necrose do Septo Nasal (J34.0)
12. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema
Crônico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica
(J68.4)
13. Estomatite Ulcerativa Crônica (K12.1)
14. Gastroenterite e Colites tóxicas (K52.-)
15. Hipertensão Portal (K76.6)
16. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)
17. Outras formas de hiperpigmentação pela
melanina: “Melanodermia” (L81.4)
18. Leucodermia, não classificada em outra par­
te (Inclui “Vitiligo Ocupacional”) (L81.5)
19. Ceratose Palmar e Plantar Adquirida (L85.1)
20. Efeitos Tóxicos Agudos (T57.0)

(1) Lista Anexa ao Decreto n. 3,048, de 6 de maio de 1999.


I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 479

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

II — Asbesto ou Amianto 1. Neoplasia maligna do estômago (C16.-)


2. Neoplasia maligna da laringe (C32.-)
3. Neoplasia maligna dos brônquios e do pulmão
(C34.-)
4. Mesotelioma da pleura (C45.0)
5. Mesotelioma do peritônio (C45.1)
6. Mesotelioma do pericárdio (C45.2)
7. Placas epicárdicas ou pericárdicas (I34.8)
8. Asbestose (J60.-)
9. Derrame Pleural (J90.-)
10. Placas Pleurais (J92.-)

III — Benzeno e seus homólogos 1. Leucemias (C91-C95.-)


tóxicos 2. Síndromes Mielodisplásicas (D46.-)
3. Anemia Aplástica devida a outros agentes
externos (D61.2)
4. Hipoplasia Medular (D61.9)
5. Púrpura e outras manifestações hemorrágicas
(D69.-)
6. Agranulocitose (Neutropenia tóxica) (D70)
7. Outros transtornos especificados dos glóbu­
los brancos: Leucocitose, Reação Leucemoide
(D72.8)
8. Outros transtornos mentais decorrentes de
lesão e disfunção cerebrais e de doença física
(F06.-) (Tolueno e outros solventes aromáticos
neurotóxicos)
9. Transtornos de personalidade e de comporta­
mento decorrentes de doença, lesão e de disfun­
ção de personalidade (F07.-) (Tolueno e outros
solventes aromáticos neurotóxicos)
10. Transtorno Mental Orgânico ou Sintomático
não especificado (F09.-) (Tolueno e outros sol­
ventes aromáticos neurotóxicos)
11. Episódios depressivos (F32.-) (Tolueno e ou­
tros solventes aromáticos neurotóxicos)
480 S e b a s t iã o G er ald o de O liv e ir a

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

12. Neurastenia (Inclui “Síndrome de Fadiga”)


(F48.0) (Tolueno e outros solventes aromáticos
neurotóxicos)
13. Encefalopatia Tóxica Crônica (G92.2)
14. Hipoacusia Ototóxica (H91.0) (Tolueno e Xi-
leno)
15. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)
16. Efeitos Tóxicos Agudos (T52.1 eT52.2)

IV — Berílio e seus compostos 1. Neoplasia maligna dos brônquios e do pulmão


tóxicos (C34.-)
2. Conjuntivite (H10)
3. Beriliose (J63.2)
4. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”) (J68.0)
5. Edema Pulmonar Agudo devido a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Edema
Pulmonar Químico”) (J68.1)
6. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema
Crônico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica (J68.4)
7. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)
8. Efeitos Tóxicos Agudos (T56.7)

V — Bromo 1. Faringite Aguda (“Angina Aguda”, “Dor de


Garganta”) (J02.9)
2. Laringotraqueíte Aguda (J04.2)
3. Faringite Crônica (J31.2)
4. Sinusite Crônica (J32.-)
5. Laringotraqueíte Crônica (J37.1)
6. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”) (J68.0)
7. Edema Pulmonar Agudo devido a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Edema
Pulmonar Químico”) (J68.1)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 481

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

8. Síndrome de Disfunção Reativa das Vias


Aéreas (SDVA/RADS) (J68.3)
9. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema
Crônico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica (J68.4)
10. Estomatite Ulcerativa Crônica (K12.1)
11. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)
12. Efeitos Tóxicos Agudos (T57.8.)

VI — Cádmio ou seus compostos 1. Neoplasia maligna dos brônquios e do puimão


(C34.-)
2. Transtornos do nervo olfatório (Inclui “Anosmia”)
(G52.0)
3. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”) (J68.0)
4. Edema Pulmonar Agudo devido a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Edema
Pulmonar Químico”) (J68.1)
5. Síndrome de Disfunção Reativa das Vias
Aéreas (SDVA/RADS) (J68.3)
6. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema
Crônico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica (J68.4)
7. Enfisema intersticial (J98.2)
8. Alterações pós-eruptivas da cor dos tecidos
duros dos dentes (K03.7)
9. Gastroenterite e Colites tóxicas (K52.-)
10. Osteomalácia do Adulto Induzida por Drogas
(M83.5)
11. Nefropatia Túbulo-lntersticial induzida por
metais pesados (N14.3)

12. Efeitos Tóxicos Agudos (T56.3)

VII — Carbonetos metálicos de 1. Outras Rinites Alérgicas (J30.3)


Tungstênio sinterizados 2. Asma (J45.-)
3. Pneumoconiose devida a outras poeiras
inorgânicas especificadas (J63.8)
482 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)
VIII — Chumbo ou seus compostos 1. Outras anemias devidas a transtornos enzimá-
tóxicos ticos (D55.8)
2. Anemia Sideroblástica secundária a toxinas
(D64.2)
3. Hipotireoidismo devido a substâncias exóge-
nas (E03.-)
4. Outros transtornos mentais decorrentes de
lesão e disfunção cerebrais e de doença física
(F06.-)
5. Polineuropatia devida a outros agentes tóxi­
cos (G52.2)
6. Encefalopatia Tóxica Aguda (G92.1)
7. Encefalopatia Tóxica Crônica (G92.2)
8. Hipertensão Arterial (110.-)
9. Arritmias Cardíacas (I49.-)
10. “Cólica da Chumbo” (K59.8)
11. Gota Induzida pelo Chumbo (M10.1)
12. Nefropatia Túbulo-lntersticial induzida por
metais pesados (N14.3)
13. Insuficiência Renal Crônica (N17)
14. Infertilidade Masculina (N46)
15. Efeitos Tóxicos Agudos (T56.0)

IX — Cloro 1. Rinite Crônica (J31.0)


2. Outras Doenças Pulmonares Obstrutivas Crô­
nicas (Inclui “Asma Obstrutiva”, “Bronquite Crô­
nica”, “Bronquite Obstrutiva Crônica”) (J44.-)
3. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”) (J68.0)
4. Edema Pulmonar Agudo devido a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Edema
Pulmonar Químico”) (J68.1)
5. Síndrome de Disfunção Reativa das Vias Aé­
reas (SDVA/RADS) (J68.3)
6. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema Crô­
nico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica (J68.4)
7. Efeitos Tóxicos Agudos (T59.4)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 483

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)
X — Cromo ou seus compostos 1. Neoplasia maligna dos brônquios e do pulmão
tóxicos (C34.-)
2. Outras Rinites Alérgicas (J30.3)
3. Rinite Crônica (J31.0)
4. Ulceração ou Necrose do Septo Nasal (J34.0)
5. Asma (J45.-)
6. “Dermatoses Pápulo-Pustulosas e suas com­
plicações infecciosas” (L08.9)
7. Dermatite Alérgica de Contato (L23.-)
8. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)
9. Úlcera Crônica da Pele, não classificada em
outra parte (L98.4)
10. Efeitos Tóxicos Agudos (T56.2)

XI — Flúor ou seus compostos 1. Conjuntivite (H10)


tóxicos 2. Rinite Crônica (J31.0)
3. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”) (J68.0)
4. Edema Pulmonar Agudo devido a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Edema
Pulmonar Químico”) (J68.1)
5. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema
Crônico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica
(J68.4)
6. Erosão Dentária (K03.2)
7. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)
8. Fluorose do Esqueleto (M85.1)
9. Intoxicação Aguda (T59.5)

XII — Fósforo ou seus compostos 1. Polineuropatia devida a outros agentes tóxi­


tóxicos cos (G52.2)
2. Arritmias cardíacas (I49.-) (Agrotóxicos orga­
nofosforados e carbamatos)
3. Dermatite Alérgica de Contato (L23.-)
484 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

4. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)


5. Osteomalácia do Adulto Induzida por Drogas
(M83.5)
6. Osteonecrose (M87.-): Osteonecrose Devida
a Drogas (M87.1); Outras Osteonecroses Secun­
dárias (M87.3)
7. Intoxicação Aguda (T57.1)
Intoxicação Aguda por Agrotóxicos Organofos-
forados: (T60.0)
XIII — Hidrocarbonetos alifáticos ou 1. Angiossarcoma do fígado (C22.3)
arom áticos (seus d erivados 2. Neoplasia maligna do pâncreas (C25.-)
halogenados tóxicos)
3. Neoplasia maligna dos brônquios e do pul­
mão (C34.-)
4. Púrpura e outras manifestações hemorrági­
cas (D69.-)
5. Hipotireoidismo devido a substâncias exóge-
nas (E03.-)
6. Outras porfirias (E80.2)
7. Delirium, não sobreposto à demência, como
descrita (F05.0) (Brometo de Metila)
8. Outros transtornos mentais decorrentes de le­
são e disfunção cerebrais e de doença física
(F06.-)
9. Transtornos de personalidade e de comporta­
mento decorrentes de doença, lesão e de dis­
função de personalidade (F07.-)
10. Transtorno Mental Orgânico ou Sintomático
não especificado (F09.-)
11. Episódios Depressivos (F32.-)
12. Neurastenia (Inclui “Síndrome de Fadiga”)
(F48.0)
13. Outras formas especificadas de tremor
(G25.2)
14. Transtorno extrapiramidal do movimento não
especificado (G25.9)
15. Transtornos do nervo trigêmio (G50.-)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 485

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

16. Polineuropatia devida a outros agentes tóxi­


cos (G52.2) (n-Hexano)
17. Encefalopatia Tóxica Aguda (G92.1)
18. Encefalopatia Tóxica Crônica (G92.2)
19. Conjuntivite (H10)
20. Neurite Óptica (H46)
21. Distúrbios visuais subjetivos (H53.-)
22. Outras vertigens periféricas (H81.3)
23. Labirintite (H83.0)
24. Hipoacusia ototóxica (H91.0)
25. Parada Cardíaca (I46.-)
26. Arritmias cardíacas (I49.-)
27. Síndrome de Raynaud (I73.0) (Cloreto de Vi-
nila)
28. Acrocianose e Acroparestesia (I73.8) (Clore­
to de Vinila)
29. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”) (J68.0)
30. Edema Pulmonar Agudo devido a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Edema
Pulmonar Químico”) (J68.1)
31. Síndrome de Disfunção Reativa das Vias
Aéreas (SDVA/RADS) (J68.3)
32. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema
Crônico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica
(J68.4)
33. Doença Tóxica do Fígado (K71.-): Doença
Tóxica do Fígado, com Necrose Hepática (K71.1);
Doença Tóxica do Fígado, com Hepatite Aguda
(K71.2); Doença Tóxica do Fígado com Hepatite
Crônica Persistente (K71.3); Doença Tóxica do
Fíqado com Outros Transtornos Hepáticos
(K71.8)
34. Hipertensão Portal (K76.6) (Cloreto de Vinila)
486 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

35. “Dermatoses Pápulo-Pustulosas e suas com­


plicações infecciosas” (L08.9)
36. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)
37. “Cloracne” (L70.8)
38. Outras formas de hiperpigmentação pela
melanina: “Melanodermia” (L81.4)
39. Outros transtornos especificados de pigmen­
tação: “Profiria Cutânea Tardia” (L81.8)
40. Geladura (Frostbite) Superficial: Eritema Pér-
nio (T33) (Anestésicos clorados locais)
41. Geladura (Frostbite) com Necrose de Teci­
dos (T34) (Anestésicos clorados locais)
42. Osteólise (M89.5) (de falanges distais de qui-
rodáctilos) (Cloreto de Vinila)
43. Síndrome Nefrítica Aguda (N00.-)
44. Insuficiência Renal Aguda (N17)
45. Efeitos Tóxicos Agudos (T53.-)

XIV — lodo 1. Conjuntivite (H10)


2. Faringite Aguda (“Angina Aguda”, “Dor de Gar­
ganta”) (J02.9)
3. Laringotraqueíte Aguda (J04.2)
4. Sinusite Crônica (J32.-)
5. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”)
6. Edema Pulmonar Agudo devido a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Edema
Pulmonar Químico”) (J68.1)
7. Síndrome de Disfunção Reativa das Vias Aé­
reas (SDVA/RADS) (J68.3)
8. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema Crô­
nico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica (J68.4)
9. Dermatite Alérgica de Contato (L23.-)
10. Efeitos Tóxicos Agudos (T57.8)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 487

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

XV — Manganês e seus compostos 1. Demência em outras doenças específicas


tóxicos classificadas em outros locais (F02.8)
2. Outros transtornos mentais decorrentes de
lesão e disfunção cerebrais e de doença física
(F06.-)
3. Transtornos de personalidade e de comporta­
mento decorrentes de doença, lesão e de dis­
função de personalidade (F07.-)
4. Transtorno Mental Orgânico ou Sintomático
não especificado (F09.-)
5. Episódios Depressivos (F32.-)
6. Neurastenia (Inclui “Síndrome de Fadiga”)
(F48.0)
7. Parkisonismo Secundário (G21.2)
8. Inflamação Coriorretiniana (H30)
9. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”) (J68.0)
10. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema
Crônico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica
(J68.4)
11. Efeitos Tóxicos Agudos (T57.2)

XVI — Mercúrio e seus compostos 1. Outros transtornos mentais decorrentes de le­


tóxicos são e disfunção cerebrais e de doença física
(F06.-)
2. Transtornos de personalidade e de comporta­
mento decorrentes de doença, lesão e de dis­
função de personalidade (F07.-)
3. Transtorno Mental Orgânico ou Sintomático
não especificado (F09.-)
4. Episódios Depressivos (F32.-)
5. Neurastenia (Inclui “Síndrome de Fadiga”)
(F48.0)
6. Ataxia Cerebelosa (G11.1)
7. Outras formas especificadas de tremor (G25.2)
488 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)
8. Transtorno extrapiramidal do movimento não
especificado (G25.9)
9. Encefalopatia Tóxica Aguda (G92.1)
10. Encefalopatia Tóxica Crônica (G92.2)
11. Arritmias cardíacas (I49.-)
12. Gengivite Crônica (K05.1)
13. Estomatite Ulcerativa Crônica (K12.1)
14. Dermatite Alérgica de Contato (L23.-)
15. Doença Glomerular Crônica (N03.-)
16. Nefropatia Túbulo-lntersticial induzida por
metais pesados (N14.3)
17. Efeitos Tóxicos Agudos (T57.1)

XVII — Substâncias asfixiantes: 1. Demência em outras doenças específicas


Monóxido de Carbono, Cianeto de classificadas em outros locais (F02.8)
Hidrogênio ou seus derivados 2. Transtornos do nervo olfatório (Inclui “Anos-
tóxicos, Sulfeto de Hidrogênio mia”) (G52.0) (H2S)
(Ácido Sulfídrico)
3. Encefalopatia Tóxica Crônica (G92.2) (Seqüela)
4. Conjuntivite (H10) (H2S)
5. Queratite e Queratoconjuntivite (H16)
6. Angina Pectoris (I20.-) (CO)
7. Infarto Agudo do Miocárdio (121.-) (CO)
8. Parada Cardíaca (I46.-) (CO)
9. Arritmias cardíacas (149.-) (CO)
10. Bronquite e Pneumonite devida a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Bronquite
Química Aguda”) (HCN)
11. Edema Pulmonar Agudo devido a produtos
químicos, gases, fumaças e vapores (“Edema
Pulmonar Químico”) (J68.1) (HCN)
12. Síndrome de Disfunção Reativa das Vias
Aéreas (SDVA/RADS) (J68.3) (HCN)
13. Bronquiolite Obliterante Crônica, Enfisema
Crônico Difuso ou Fibrose Pulmonar Crônica
(J68.4) (HCN; H2S)
14. Efeitos Tóxicos Agudos (T57.3; T58; T59.6)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 489

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

XVIII — Sílica Livre 1. Neoplasia maligna dos brônquios e do pulmão


(C34.-)
2. Cor Pulmonale (I27.9)
3. Outras Doenças Pulmonares Obstrutivas Crô­
nicas (Inclui “Asma Obstrutiva”, “Bronquite Crô­
nica”, “Bronquite Obstrutiva Crônica”) (J44.-)
4. Silicose (J62.8)
5. Pneumoconiose associada com Tuberculose
(“Sílico-Tuberculose”) (J63.8)
6. Síndrome de Caplan (J99.1; M05.3)

XIX — Sulfeto de Carbono ou 1. Demência em outras doenças específicas


Dissulfeto de Carbono classificadas em outros locais (F02.8)
2. Outros transtornos mentais decorrentes de
lesão e disfunção cerebrais e de doença física
(F06.-)
3. Transtornos de personalidade e de comporta­
mento decorrentes de doença, lesão e de dis­
função de personalidade (F07.-)
4. Transtorno Mental Orgânico ou Sintomático
não especificado (F09.-)
5. Episódios Depressivos (F32.-)
6. Neurastenia (Inclui “Síndrome de Fadiga”)
(F48.0)
7. Polineuropatia devida a outros agentes tóxi­
cos (G52.2)
8. Encefalopatia Tóxica Crônica (G92.2)
9. Neurite Óptica (H46)
10. Angina Pectoris (I20.-)
11. Infarto Agudo do Miocárdio (121.-)
12. Ateroesclerose (I70.-) e Doença Ateroescle-
rótica do Coração (125.1)
13. Efeitos Tóxicos Agudos (T52.8)
490 S e b a s t iã o G e r ald o de O liv e ir a

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)
XX — Alcatrão, Breu, Betume, 1. Neoplasia maligna dos brônquios e do pul­
Hulha Mineral, Parafina e produtos mão (C34.-)
ou resíduos dessas substâncias,
2. Outras neoplasias malignas da pele (C44.-)
ca usadores de epite iio m a s
primitivos da pele 3. Neoplasia maligna da bexiga (C67.-)
4. Dermatite Alérgica de Contato (L23.-)
5. Outras formas de hiperpigmentação pela me-
lanina: “Melanodermia” (L81.4)

XXI — Ruído e afecção auditiva 1. Perda da Audição Provocada pelo Ruído


(H83.3)
2. Outras percepções auditivas anormais: Alte­
ração Temporária do Limiar Auditivo, Compro­
metimento da Discriminação Auditiva e Hipera-
cusia (H93.2)
3. Hipertensão Arterial (110.-)
4. Ruptura Traumática do Tímpano (pelo ruído)
(S09.2)
XXII — Vibrações (afecções dos 1. Síndrome de Raynaud (I73.0)
músculos, tendões, ossos, articula­ 2. Acrocianose e Acroparestesia (I73.8)
ções, vasos sanguíneos periféricos
3. Outros transtornos articulares não classifica­
ou dos nervos periféricos)
dos em outra parte: Dor Articular (M25.5)
4. Síndrome Cervicobraquial (M53.1)
5. Fibromatose da Fascia Palmar: “Contratura
ou Moléstia de Dupuytren” (M72.0)
6. Lesões do Ombro (M75.-): Capsulite Adesiva
do Ombro (Ombro Congelado, Periartrite do
Ombro) (M75.0); Síndrome do Manguito Rotató­
rio ou Síndrome do Supraespinhoso (M75.1); Ten­
dinite Bicipital (M75.2); Tendinite Calcificante do
Ombro (M75.3); Bursite do Ombro (M75.5); Ou­
tras Lesões do Ombro (M75.8); Lesões do Om­
bro, não especificadas (M75.9)
7. Outras entesopatias (M77.-): Epicondilite Me­
diai (M77.0); Epicondilite lateral (“Cotovelo de
Tenista”); Mialgia (M79.1)
8. Outros transtornos especificados dos tecidos
moles (M79.8)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 491

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)
9. Osteonecrose (M87.-): Osteonecrose Devida
a Drogas (M87.1); Outras Osteonecroses Secun­
dárias (M87.3)
10. Doença de Kienbòck do Adulto (Osteocon-
drose do Adulto do Semilunar do Carpo) (M93.1)
e outras O steocondropatias especificadas
(M93.8)

XXIII — Ar Comprimido 1. Otite Média não supurativa (H65.9)


2. Perfuração da Membrama do Tímpano (H72
ou S09.2)
3. Labirintite (H83.0)
4. Otalgia e Secreção Auditiva (H92.-)
5. Outros transtornos especificados do ouvido
(H93.8)
6. Osteonecrose no “Mal dos Caixões” (M90.3)
7. Otite Barotraumática (T70.0)
8. Sinusite Barotraumática (T70.1)
9. “Mal dos Caixões” (Doença da Descompres-
são) (T70.4)
10. Síndrome devida ao deslocamento de ar de
uma explosão (T70.8)

XXIV — Radiações lonizantes 1. Neoplasia maligna da cavidade nasal e dos


seios paranasais (C30-C31.-)
2. Neoplasia maligna dos brônquios e do pulmão
(C34.-)
3. Neoplasia maligna dos ossos e cartilagens ar-
ticulares dos membros (Inclui “Sarcoma Ósseo”)
4. Outras neoplasias malignas da pele (C44.-)
5. Leucemias (C91-C95.-)
6. Síndromes Mielodisplásicas (D46.-)
7. Anemia Aplástica devida a outros agentes
externos (D61.2)
8. Hipoplasia Medular (D61.9)
492 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Agentes Etiológicosou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

9. Púrpura e outras manifestações hemorrági­


cas (D69.-)
10. Agranulocitose (Neutropenia tóxica) (D70)
11. Outros transtornos especificados dos glóbu­
los brancos: Leucocitose, Reação Leucemoide
(D72.8)
12. Polineuropatia induzida pela radiação (G62.8)
13. Blefarite (H01.0)
14. Conjuntivite (H10)
15. Queratite e Queratoconjuntivite (H16)
16. Catarata (H28)
17. Pneumonite por radiação (J70.0 e J70.1)
18. Gastroenterite e Colites tóxicas (K52.-)
19. Radiodermatite (L58.-): Radiodermatite Agu­
da (L58.0); Radiodermatite Crônica (L58.1); Ra­
diodermatite, não especificada (L58.9); Afecções
da pele e do tecido conjuntivo relacionadas com
a radiação, não especificadas (L59.9)
20. Osteonecrose (M87.-): Osteonecrose Devi­
da a Drogas (M87.1); Outras Osteonecroses
Secundárias (M87.3)
21. Infertilidade Masculina (N46)
22. Efeitos Agudos (não especificados) da Radi­
ação (T66)
XXV — Micro-organismos e parasi­ 1. Tuberculose (A15-A19.-)
tas infecciosos vivos e seus pro­
2. Carbúnculo (A22.-)
dutos tóxicos (Exposição ocupa­
cional ao agente e/ou transmissor 3. Brucelose (A23.-)
da doença, em profissões e/ou con­ 4. Leptospirose (A27.-)
dições de trabalho especificadas)
5. Tétano (A35.-)
6. Psitacose, Ornitose, Doença dos Tratadores
de Aves (A70.-)
7. Dengue (A90.-)
8. Febre Amarela (A95.-)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 493

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

9. Hepatites Virais (B15-B19.-)


10. Doença pelo Vírus da Imunodeficiência Hu­
mana (HIV) (B20-B24.-)
11. Dermatofitose (B35.-) e Outras Micoses Su­
perficiais (B36.-)
12. Paracoccidiomicose (Blastomicose Sul Ame­
ricana, Blastomicose Brasileira, Doença de Lutz)
(B41.-)
13. Malária (B50-B54.-)
14. Leishmaniose Cutânea (B55.1) ou Leishma-
niose Cutâneo-Mucosa (B55.2)
15. Pneumonite por Hipersensibilidade a Poeira
Orgânica (J67.-); Pulmão do Granjeiro (ou Pul­
mão do Fazendeiro) (J67.0); Bagaçose (J67.1);
Pulmão dos Criadores de Pássaros (J67.2); Su-
berose (J67.3); Pulmão dos Trabalhadores de
Malte (J67.4); Pulmão dos que Trabalham com
Cogumelos (J67.5); Doença Pulmonar Devida a
Sistemas de Ar Condicionado e de Umidificação
do Ar (J67.7); Pneumonites de Hipersensibilida­
de Devidas a Outras Poeiras Orgânicas (J67.8);
Pneumonite de Hipersensibilidade Devida a Po­
eira Orgânica não especificada (Alveolite Alérgi­
ca Extrínseca SOE; Pneumonite de Hipersensi­
bilidade SOE (J67.0)
16. Dermatoses Pápuio-Pustulosas e suas com­
plicações infecciosas (L08.9)

XXVI — Algodão, Linho, Cânhamo, 1. Outras Rinites Alérgicas (J30.3)


Sisal 2. Outras Doenças Pulmonares Obstrutivas Crô­
nicas (Inclui “Asma Obstrutiva”, “Bronquite Crôni­
ca”, “Bronquite Obstrutiva Crônica”) (J44.-)
3. Asma (J45.-)
4. Bissinose (J66.0)

XXVII — Agentes físicos, químicos 1. Dermatoses Pápuio-Pustulosas e suas com­


ou biológicos, que afetam a pele, plicações infecciosas (L08.9)
não considerados em outras rubri­
2. Dermatite Alérgica de Contato (L23.-)
cas
3. Dermatite de Contato por Irritantes (L24.-)
494 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Agentes Etiológicos ou Fatores Doenças Causalmente Relacionadas com os


de Risco de Natureza Respectivos Agentes ou Fatores de Risco
Ocupacional (Denominadas e Codificadas
Segundo a CID-10)

4. Urticária Alérgica (L50.0)


5. “Urticária Física” (devida ao calor e ao frio)
(L50.2)
6. Urticária de Contato (L50.6)
7. Queimadura Solar (L55)
8. Outras Alterações Agudas da Pele devidas a
Radiação Ultravioleta (L56.-): Dermatite por Fo-
tocontato (Dermatite de Berloque) (L56.2); Urti­
cária Solar (L56.3); Outras Alterações Agudas
Especificadas da Pele devidas a Radiação Ultra­
violeta (L56.8); Outras Alterações Agudas da Pele
devidas a Radiação Ultravioleta, sem outra es­
pecificação (L56.9)
9. Alterações da Pele devidas a Exposição Crô­
nica a Radiação Não lonizante (L57.-): Ceratose
Actínica (L57.0); Outras Alterações: Dermatite
Solar, “Pele de Fazendeiro”, “Pele de Marinhei­
ro” (L57.8)
10. “Cloracne” (L70.8)
11. “Elaioconiose” ou “Dermatite Folicular” (L72.8)
12. Outras formas de hiperpigmentação pela
melanina: “Melanodermia” (L81.4)
13. Leucodermia, não classificada em outra par­
te (Inclui “Vitiligo Ocupacional”) (L81.5)
14. Úlcera Crônica da Pele, não classificada em
outra parte (L98.4)
15. Geladura (Frostbite) Superficial: Eritema Pér-
nio (T33) (Frio)
16. Geladura (Frostbite) com Necrose de Teci­
dos (T34) (Frio)
ANEXO III — LISTA B<1>

DOENÇAS E OS RESPECTIVOS AGENTES ETIOLÓGICOS

(Redação dada pelo Decreto n. 6.957, de 2009).

Nota:
1 — As doenças e respectivos agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza
ocupacional listados são exemplificativos e complementares.

DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS RELACIONADAS


COM O TRABALHO (Grupo I da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

I — T uberculose (A15-A19.-) Exposição ocupacional ao Mycobacterium tuber-


culosis (Bacilo de Koch) ou Mycobacterium bo-
vis, em atividades em laboratórios de biologia, e
atividades realizadas por pessoal de saúde, que
propiciam contato direto com produtos con­
taminados ou com doentes cujos exames bac­
teriológicos são positivos (Z57.8) (Quadro XXV)
Hipersuscetibilidade do trabalhador exposto a
poeiras de sílica (Sílico-tuberculose) (J65.-)
II — Carbúnculo (A22.-) Zoonose causada pela exposição ocupacional ao
Bacillus anthracis, em atividades suscetíveis de
colocar os trabalhadores em contato direto com
animais infectados ou com cadáveres desses
animais; trabalhos artesanais ou industriais com
pelos, pele, couro ou lã. (Z57.8) (Quadro XXV)
III — Brucelose (A23.-) Zoonose causada pela exposição ocupacional a
Brucella melitensis, B. abortus, B. suis, B. canis
etc., em atividades em abatedouros, frigoríficos,
manipulação de produtos de carne; ordenha e
fabricação de laticínios e atividades assemelha­
das. (Z57.8) (Quadro XXV)

(1) Lista Anexa ao Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999. Regulamento da Previdência


Social.
496 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
IV — Leptospirose (A27.-) Exposição ocupacional a Leptospira icterohaemor-
rhagiae (e outras espécies), em trabalhos expon­
do ao contato direto com águas sujas, ou efetua­
do em locais suscetíveis de serem sujos por de­
jetos de animais portadores de germes; trabalhos
efetuados dentro de minas, túneis, galerias, es­
gotos em locais subterrâneos; trabalhos em cur­
sos d’água; trabalhos de drenagem; contato com
roedores; trabalhos com animais domésticos, e
com gado; preparação de alimentos de origem
animal, de peixes, de laticínios etc. (Z57.8) (Qua­
dro XXV)

V — Tétano (A35.-) Exposição ao Clostridium tetani, em circunstân­


cias de acidentes do trabalho na agricultura, na
construção civil, na indústria, ou em acidentes
de trajeto (Z57.8) (Quadro XXV)

VI — Psitacose, Ornitose, Doença Zoonoses causadas pela exposição ocupacio­


dos Tratadores de Aves (A70.-) nal a Chlamydia psittaci ou Chlamydia pneumo-
niae, em trabalhos em criadouros de aves ou
pássaros, atividades de Veterinária, em zoológi­
cos, e em laboratórios biológicos etc.(Z57.8)
(Quadro XXV)

VII — Dengue [Dengue Clássico] Exposição ocupacional ao mosquito (Aedes ae-


(A90.-) gypti), transmissor do arbovírus da Dengue, prin­
cipalmente em atividades em zonas endêmicas,
em trabalhos de saúde pública, e em trabalhos
de laboratórios de pesquisa, entre outros.(Z57.8)
(Quadro XXV)

VIII — Febre Amarela (A95.-) Exposição ocupacional ao mosquito (Aedes ae-


gypti), transmissor do arbovírus da Febre Ama­
rela, principalmente em atividades em zonas
endêmicas, em trabalhos de saúde pública, e
em trabalhos de laboratórios de pesquisa, entre
outros. (Z57.8) (Quadro XXV)
IX — Hepatites Virais (B15-B19.-) Exposição ocupacional ao Vírus da Hepatite A

patite C (HCV); Vírus da Hepatite D (HDV); Ví­


rus da Hepatite E (HEV), em trabalhos envolven­
do manipulação, acondicionamento ou emprego
de sangue humano ou de seus derivados; traba-
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 497

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
lho com “águas usadas” e esgotos; trabalhos em
contato com materiais provenientes de doentes
ou objetos contaminados por eles. (Z57.8) (Qua­
dro XXV)

X — Doença pelo Vírus da Imu­ Exposição ocupacional ao Vírus da Imunodefi­


nodeficiência Humana (HIV) ciência Humana (HIV), principalmente em traba­
(B20.-B24.-) lhadores da saúde, em decorrência de acidentes
perfurocortantes com agulhas ou material cirúr­
gico contaminado, e na manipulação, acondicio-
namento ou emprego de sangue ou de seus de­
rivados, e contato com materiais provenientes de
pacientes infectados. (Z57.8) (Quadro XXV)

XI — Dermatofitose (B35.-) e Exposição ocupacional a fungos do gênero Epi-


O utras Micoses S uperficiais dermophyton, Microsporum e Trichophyton, em
(B36.-) trabalhos em condições de temperatura elevada
e umidade (cozinhas, ginásios, piscinas) e ou­
tras situações específicas de exposição ocupa­
cional. (Z57.8) (Quadro XXV)
XII — Candidíase (B37.-) Exposição ocupacional a Candida albicans, Can-
dida glabrata etc., em trabalhos que requerem
longas imersões das mãos em água e irritação
mecânica das mãos, tais como trabalhadores de
limpeza, lavadeiras, cozinheiras, entre outros.
(Z57.8) (Quadro XXV)

XIII — P aracoccidioidom icose Exposição ocupacional ao Paracoccidioides bra-


(Blastom icose Sul Americana, siliensis, principalmente em trabalhos agrícolas
Blastomicose Brasileira, Doença ou florestais e em zonas endêmicas. (Z57.8) (Qua­
de Lutz) (B41.-) dro XXV)

XIV — Malária (B50 - B54.-) Exposição ocupacional ao Plasmodium malari-


ae; Plasmodium vivax; Plasmodium falciparum
ou outros protozoários, principalmente em ativi­
dades de mineração, construção de barragens
ou rodovias, em extração de petróleo e outras
atividades que obrigam a entrada dos trabalha­
dores em zonas endêmicas (Z57.8) (Quadro XXV)
XV — Leishm aniose Cutânea Exposição ocupacional à Leishmania braziliensis,
(B55.1) ou Leishmaniose Cutâneo- principalmente em trabalhos agrícolas ou flores­
-Mucosa (B55.2) tais e em zonas endêmicas, e outras situações
específicas de exposição ocupacional. (Z57.8)
(Quadro XXV)
498 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

NEOPLASIAS (TUMORES) RELACIONADOS COM O TRABALHO


(GRUPO II da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Neoplasia maligna do estômago Asbesto ou Amianto (X49.-; Z57.2)(Quadro II)
(C16.-)
II — Angiossarcoma do fígado 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X48.-;
(C22.3) X49.-; Z57.5) (Quadrai)
2. Cloreto de Vinila (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
III — Neoplasia maligna do pâncreas 1. Cloreto de Vinila (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
(C25-) 2. Epicloridrina (X49.-; Z57.5)
3. Hidrocarbonetos alifáfitos e aromáticos na
Indústria do Petróleo (X46.-; Z57.5)
IV — Neoplasia maligna da cavida­ 1. Radiações ionizantes (W 88Z57.1 )(Quadro XXIV)
de nasal e dos seios paranasais 2. Níquel e seus compostos (X49.-; Z57.5)
(C30-C31.-)
3. Poeiras de madeira e outras poeiras orgânicas
da indústria do mobiliário (X49.-; Z57.2)
4. Poeiras da indústria do couro (X49.-; Z57.2)
5. Poeiras orgânicas (na indústria têxtil e em
padarias) (X49.-; Z57.2)
6. Indústria do petróleo (X46.-; Z57.5)
V — Neoplasia maligna da laringe Asbesto ou Amianto (Z57.2) (Quadro II)
(C32.-)
VI — Neoplasia maligna dos brôn- 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X48.-;
quios e do pulmão (C34.-) X49.-; Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2. Asbesto ou Amianto (X49.-; Z57.2) (Quadro II)
3. Berílio (X49.-; Z57.5) (Quadro IV)
4. Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)
(Quadro VI)
5. Cromo e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(Quadro X)
6. Cloreto de Vinila (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
7. Clorometil éteres (X49.-; Z57.5) (Quadro XIII)
8. Sílica-livre (Z57.2) (Quadro XVIII)
9. Alcatrão, breu, betume, hulha mineral, parafina
e produtos de resíduos dessas substâncias (X49.-;
Z57.5) (Quadro XX)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 499

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
10. Radiações ionizantes (W88-; Z57.1) (Quadro XXIV)
11. Emissões de fomos de coque (X49.-; Z57.5)
12. Níquel e seus compostos (X49.-; Z57.5)
13. Acrilonitrila (X49.-; Z57.5)
14. Indústria do alumínio (fundições) (X49.-; Z57.5)
15. Neblinas de óleos minerais (óleo de corte)
(X49.-; Z57.5)
16. Fundições de metais (X49.-; Z57.5)

VII — Neoplasia maligna dos ossos e Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro XXIV)
cartilagens articulares dos membros

VIII — Outras neoplasias malignas 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


da pele (C44.-) Z57.4 e Z57.5) (Quadrai)
2. Alcatrão, breu, betume, hulha mineral, parafina e
produtos de resíduos dessas substâncias causadores
de epiteliomas da pele (X49.-; Z57.5) (Quadro XX)
3. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro XXIV)
4. Radiações ultravioletas (W89; Z57.1)
IX — Mesotelioma (C45.-):Mesote- Asbesto ou Amianto (X49.-; Z57.2) (Quadro II)
lioma da pleura (C45.0); Mesotelio­
ma do peritônio (C45.1) e Mesote­
lioma do pericárdio (C45.2)
X — Neoplasia maligna da bexiga 1. Alcatrão, breu, betume, hulha mineral, parafina
(C67.-) e produtos de resíduos dessas substâncias (X49.-;
Z57.5 (Quadro XX)
2. Aminas aromáticas e seus derivados (Beta-
naftilamina, 2-cloroanilina, benzidina, o-toluidina, 4-
cloro-orto-toluidina (X49.-; Z57.5)
3. Emissões de fomos de coque (X49.-; Z57.5)

XI — Leucemias (C91-C95.-) 1. Benzeno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)


2. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro XXIV)
3. Óxido de etileno (X49.-; Z57.5)
4. Agentes antineoplásicos (X49.-; Z57.5)
5. Campos eletromagnéticos (W90.-; Z57.5)
6. Agrotóxicos clorados (Clordane e Heptaclor)
(X48.-; Z57.4)
500 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

DOENÇAS DO SANGUE E DOS ÓRGÃOS HEMATOPOÉTICOS


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo III da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Síndromes Mielodisplásicas 1. Benzeno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
(D46.-)
2. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro
XXIV)

II — Outras anemias devidas a Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)


transtornos enzimáticos (D55.8) (Quadro VIII)

III — Anemia Hemolítica adquirida Derivados nitrados e aminados do Benzeno (X46.-;


(D59.2) Z57.5)

IV — Aplástica devida a outros 1. Benzeno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)


agentes externos (D61.2)
2. Radiações ionizantes (W88.-) (Quadro XXIV)

V — Anemia Aplástica não especi­ 1. Benzeno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)


ficada, Anemia hipoplástica SOE,
2. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro
Hipoplasia medular (D61.9) XXIV)

VI — Anemia Sideroblástica se­ Chumbo ou seus compostos tóxicos (X46.-; Z57.5)


cundária a toxinas (Inclui “Anemia (Quadro VIII)
Hipocrômica, Microcítica, com
Reticulocitose”) (D64.2)

VII — Púrpura e outras manifesta­ 1. Benzeno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)


ções hemorrágicas (D69.-)
2. Cloreto de Vinila (X46.-) (Quadro XIII)
3. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro
XXIV)

VIII— Agranulocitose (Neutropenia 1. Benzeno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)


tóxica) (D70)
2. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro
XXIV)
3. Derivados do Fenol, Pentaclorofenol, Hidroxiben-
zonitrilo (X49.-; XZ57.5)

IX — Outros transtornos especifica­ 1. Benzeno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)


dos dos glóbulos brancos: leucoci- 2, Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro
tose, reação leucemoide (D72.8) XXIV)

X — Metahemoglobinemia (D74.-) Aminas aromáticas e seus derivados (X49.-; Z57.5)


I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 501

DOENÇAS ENDÓCRINAS, NUTRICIONAIS E METABÓUCAS


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo IV da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Hipotireoidismo devido a subs­ 1. Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-;
tâncias exógenas (E03.-) (uuaaro viiij
2. Hidrocarbonetos halogenados (Clorobenzeno e
seus derivados) (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
3. Tiuracil (X49.-; Z57.5)
4. Tiocinatos (X49.-; Z57.5)
5. Tiureia ÍX49.-: Z57.5}
II — Outras Porfirias (E.80.2) Clorobenzeno e seus derivados (X46.-; Z57.4 e
Z57.5) (QuadroXIII)

TRANSTORNOS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO


RELACIONADOS COM O TRABALHO
(Grupo V da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

I — Demência em outras doenças 1. Manganês (X49.-; Z57.5) (Quadro XV)


específicas classificadas em outros 2. Substâncias asfixiantes: CO, H2S etc. (se­
locais (F02.8) qüela) (X47.-; Z57.5) (Quadro XVII)
3. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)

II — Delirium, não sobreposto a 1. Brometo de Metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5) (Qua­


demência, como descrita (F05.0) dro XIII)
2. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)

1. Tolueno e outros solventes aromáticos neuro-


III — Outros transtornos mentais
tóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
decorrentes de lesão e disfunção
cerebrais e de doença física (F06.-): 2. Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-;
Transtorno Cognitivo Leve (F06.7) Z57.5) (Quadro VIII)
3. Tricloroetileno, Tetracloroetileno, Tricloroeta-
no e outros solventes orgânicos halogenados neu-
rotóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
4. Brometo de Metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5) (Qua­
dro XIII)
5. Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro XV)
502 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
6. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
7. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)
8. Outros solventes orgânicos neurotóxicos
(X46.-; X49.-; Z57.5)
IV — Transtornos de personalida­ 1. Tolueno e outros solventes aromáticos neuro­
de e de comportamento decorren­ tóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
tes de doença, lesão e de disfun­ 2. Tricloroetileno, Tetracloroetileno, Tricloroeta­
ção de personalidade (F07.-): no e outros solventes orgânicos halogenados neu­
Transtorno Orgânico de Personali­ rotóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
dade (F07.0); Outros transtornos 3. Brometo de Metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5) (Qua­
de personalidade e de comporta­ dro XIII)
mento decorrentes de doença, le­ 4. Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;
são ou disfunção cerebral (F07.8) Z57.5) (Quadro XV)
5. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
6. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)
7. Outros solventes orgânicos neurotóxicos
(X46.-; X49.-; Z57.5)
V — Transtorno Mental Orgânico 1. Tolueno e outros solventes aromáticos neuro­
ou Sintomático não especificado tóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
(F09.-) 2. Tricloroetileno, Tetracloroetileno, Tricloroeta­
no e outros solventes orgânicos halogenados
neurotóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
3. Brometo de Metila (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
4. Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro XV)
5. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
6. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)
7. Outros solventes orgânicos neurotóxicos
(X46.-; X49.-; Z57.5)
VI — Transtornos mentais e com- 1. Problemas relacionados com o emprego e com o
portamentais devidos ao uso do desemprego: Condições difíceis de trabalho (Z56.5)
álcool: Alcoolismo Crônico (Rela­ 2. Circunstância relativa às condições de traba­
cionado com o Trabalho) (F10.2) lho (Y96)
VII — Episódios Depressivos (F32.-) 1. Tolueno e outros solventes aromáticos neuro­
tóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
2. Tricloroetileno, Tetracloroetileno, Tricloroeta­
no e outros solventes orgânicos halogenados
neurotóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 503

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
3. Brometo de Metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5) (Qua­
dro XIII)
4. Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro XV)
5. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
6. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5)(Quadro XIX)
7. Outros solventes orgânicos neurotóxicos
(X46.-; X49.-; Z57.5)
VIII — Reações ao “Stress” Grave e 1. Outras dificuldades físicas e mentais relacio­
Transtornos de Adaptação (F43.-): nadas com o trabalho: reação após acidente do
Estado de “Stress” Pós-Traumático trabalho grave ou catastrófico, ou após assalto
(F43.1) no trabalho (Z56.6)
2. Circunstância relativa às condições de traba­
lho (Y96)
IX — Neurastenia (Inclui “Síndrome 1. Tolueno e outros solventes aromáticos neuro­
de Fadiga”) (F48.0) tóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
2. Tricloroetileno, Tetracloroetileno, Tricloroetano
e outros solventes orgânicos halogenados (X46.-;
Z57.5) (Quadro XIII)
3. Brometo de Metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5) (Qua­
dro XIII)
4. Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro XV)
5. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
6. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)
7. Outros solventes orgânicos neurotóxicos
(X46.-; X49.-; Z57.5)
X — Outros transtornos neuróticos Problemas relacionados com o emprego e com
especificados (Inclui “Neurose o desemprego (Z56.-): Desemprego (Z56.0); Mu­
Profissional”) (F48.8) dança de emprego (Z56.1); Ameaça de perda de
emprego (Z56.2); Ritmo de trabalho penoso
(Z56.3); Desacordo com patrão e colegas de tra­
balho (Condições difíceis de trabalho) (Z56.5);
Outras dificuldades físicas e mentais relaciona­
das com o trabalho (Z56.6)
XI — Transtorno do Ciclo Vigília- 1. Problemas relacionados com o emprego e com
-Sono Devido a Fatores Não o desemprego: Má adaptação à organização do
Orgânicos (F51.2) horário de trabalho (Trabalho em Turnos ou Tra­
balho Noturno) (Z56.6)
2. Circunstância relativa às condições de traba­
lho (Y96)
504 S e b a s t iã o G e r a l d o de O liv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
XII — Sensação de Estar Acabado 1. Ritmo de trabalho penoso (Z56.3)
(“Síndrome de Burn-Ouf, “Síndrome
2. Outras dificuldades físicas e mentais relacio­
do Esgotamento Profissional”) (Z73.0)
nadas com o trabalho (Z56.6)

DOENÇAS DO SISTEMA NERVOSO


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo VI da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Ataxia Cerebelosa (G11.1) Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.4
e Z57.5) (Quadro XVI)

II — Parkinsonismo Secundário devi­ Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;


do a outros agentes externos (G21.2) Z57.5) (Quadro XV)
III — Outras formas especificadas 1. Brometo de metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5) (Qua­
de tremor (G25.2) dro XIII)
2. Tetracloroetano (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
3. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
4. Outros solventes orgânicos neurotóxicos (X46.-;
X49.-; Z57.5)
IV — Transtorno extrapiramidal do 1. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
movimento não especificado Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
(G25.9) 2. Cloreto de metileno (Diclorometano) e outros
solventes halogenados neurotóxicos (X46.-;
Z57.5) (Quadro XIII)

V — Distúrbios do Ciclo Vigília- Problemas relacionados com o emprego e com


-Sono (G47.2) o desemprego: Má adaptação à organização do
horário de trabalho (Trabalho em Turnos ou Tra-
balho Noturno) (Z56.6)

VI — Transtornos do nervo trigê- Tricloroetileno e outros solventes halogenados


mio (G50.-) neurotóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)

VII — Transtornos do nervo olfató- 1. Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)


rio (G52.0) (Inclui “Anosmia”) (Quadro VI)
2. Sulfeto de hidrogênio (X49.-; Z57.5) (Quadro XVII)
VIII — T ranstornos do plexo braquial Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)
(Síndrome da Saída do Tórax, Síndro­
me do Desfiladeiro Torácico) (G54.0)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 505

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

IX — Mononeuropatias dos Mem­ Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)


bros Superiores (G56.-): Síndrome
do T únel do Carpo (G56.0); Outras
Lesões do Nervo Mediano: Síndro­
me do Pronador Redondo (G56.1);
Síndrome do Canal de Guyon
(G56.2); Lesão do Nervo Cubital
(u ln ar): S índrom e do Túnel
Cubital(G56.2); Lesão do Nervo
Radial (G56.3); Outras Mononeu­
ropatias dos Membros Superiores:
Compressão do Nervo Supraesca-
pular(G56.8)

X — Mononeuropatias do mem­ Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)


bro inferior (G57.-): Lesão do Nervo
Poplíteo Lateral (G57.3)

XI — Polineuropatia devida a ou­ 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


tros agentes tóxicos (G62.2) Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2. Chumbo e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro VIII)
3. Fósforo (X48.-; X49.-; Z57.4 e Z57.5) (Quadro XII)
4. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5)(Quadro XIX)
5. n-Hexano (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
6. Metil-n-Butil Cetona (MBK) (X46.-; Z57.5)
XII — Polineuropatia induzida pela Radiações ionizantes (X88.-; Z57.1) (Quadro XXIV)
radiação (G62.8)

XIII — Encefalopatia Tóxica Aguda 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


(G92.1) Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2. Chumbo e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro VIII)
3. Hidrocarbonetos alifáticos ou aromáticos (seus
derivados halogenados neurotóxicos) (X46.-;
Z57.5) (Quadro XIII)
4. Mercúrio e seus derivados tóxicos (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
506 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
XIV — Encefalopatia Tóxica Crôni­ 1. Tolueno e Xileno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
ca (G92.2) 2. Chumbo e seus compostos tóxicos (X49,-;
Z57.5) (Quadro VIII)
3. Solventes orgânicos halogenados neurotóxi-
cos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
4. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro XVI)
5. Substâncias asfixiantes: CO, H2S etc. (se­
qüela) (X47.-; Z57.5) (Quadro XVII) Sulfeto de Car­
bono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)

DOENÇAS DO OLHO E ANEXOS


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo VII da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Blefarite (H01.0) 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2. Radiações lonizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro
XXIV)
3. Cimento (X49.-; Z57.2)
11— Conjuntivite (H10) 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2. Berílio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro IV)
3. Flúor e seus compostos tóxicos (X49.-)
(Quadro XI)
4. lodo (X49.-; Z57.5) (Quadro XIV)
5. Cloreto de etila (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
6. Tetracloreto de carbono (X46.-; Z57.5) (Quadro
XIII)
7. Outros solventes halogenados tóxicos (X46.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XIII)
8. Acido sulfídrico (Sulfeto de hidrogênio) (X49.-;
Z57.5) (Quadro XVII)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 507

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

9. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro


XXIV)
10. Radiações Ultravioletas (W89; Z57.1)
H .A crilatos (X49.-;Z57.5)
12. Cimento (X49.-; Z57.2)
13. Enzimas de origem animal, vegetal ou
bacteriana (X44.-; Z57.2)
14. Furfural e Álcool Furfurílico (X45.-; Z57.5)
15. Isocianatos orgânicos (X49.-; Z57.5)
16. Selênio e seus compostos (X49.-; Z57.5)

III — Queratite e Queratoconjun- 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


tivite (H16) Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2. Ácido sulfídrico (Sulfeto de hidrogênio) (X49.-;
Z57.5) (Quadro XVII)
3. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro
XXIV)
4. Radiações Infravermelhas (W90.-; Z57.1)
5. Radiações Ultravioletas (W89.-; Z57.1)

IV — Catarata (H28) 1. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro


XXIV)
2. Radiações Infravermelhas (W90.-; Z57.1)
V — Inflamação Coriorretiniana Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;
(H30) Z57.5) (Quadro XV)

VI — Neurite Óptica (H46) 1. Brometo de metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5)


(Quadro XIII)
2. Cloreto de metileno (Diclorometano) e outros
solventes clorados neurotóxicos (X46,-; Z57.5)
(Quadro XIII)
3. Tetracloreto de carbono (X46.-; Z57.5) (Quadro
XIII)
4. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)
5. Metanol (X45.-; Z57.5)

VII — Distúrbios visuais subjetivos 1. Brometo de metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5)


(H53.-) (Quadro XIII)
2. Cloreto de metileno e outros solventes clorados
neurotóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
508 S e b a s t iã o G e r a ld o de O l iv e ir a

DOENÇAS DO OUVIDO RELACIONADAS COM O TRABALHO


(Grupo VIII da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Otite Média não supurativa 1. “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)
(H65.9) 2. Pressão atmosférica inferior à pressão padrão
(W94.-; Z57.8)

II — Perfuração da Membrana do 1. “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)


Tímpano (H72 ou S09.2) 2. Pressão atmosférica inferior à pressão padrão
(W94.-; Z57.8)
III — Outras vertigens periféricas C loreto de m etileno e outros so lventes
(H81.3) halogenados tóxicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)

IV — Labirintite (H83.0) 1. Brometo de metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5)


(Quadro XIII)
2. “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)
V — Efeitos do ruído sobre o ou­ Exposição ocupacional ao Ruído (Z57.0; W42.-)
vido interno/ Perda da Audição (Quadro XXI)
Provocada pelo Ruído e Trauma
Acústico (H83.3)

VI — Hipoacusia O totóxica 1. Homólogos do Benzeno otoneurotóxicos


(H91.0) (Tolueno e Xileno) (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
2. Solventes orgânicos otoneurotóxicos (X46.-;
Z57.8) (Quadro XIII)

VII — Otalgia e Secreção Auditiva “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)
(H92.-): Otalgia (H92.0), Otorreia
(H92.1) ou Otorragia (H92.2)

VIII — Outras percepções auditivas Exposição ocupacional ao Ruído (Z57.0; X42.-)


anormais: Alteração Temporária do (Quadro XXI)
Limiar Auditivo, Comprometimento
da Discriminação Auditiva e Hipe-
racusia (H93.2)

IX — Outros transtornos especifi­ 1. Brometo de metila (X46.-; Z57.4 e Z57.5)


cados do ouvido (H93.8) (Quadro XIII)
2. “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)

X — O tite B arotra u m á tica 1. “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)


(T70.0) 2. Alterações na pressão atmosférica ou na
pressão da água no ambiente (W94.-; Z57.8)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 509

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
XI — S inusite Barotraum ática 1. “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)
(170.1) 2. Alterações na pressão atmosférica ou na
pressão da água no ambiente (W94.-)

XII — “Mal dos Caixões” (Doença 1. “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8)(Quadro XXIII)
de Descompressão) (T70.4) 2. Alterações na pressão atmosférica ou na
pressão da água no ambiente (W94,-; Z57.8)

XIII — Síndrome devida ao desloca­ 1. “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)
mento de ar de uma explosão 2. Alterações na pressão atmosférica ou na
(T70.8) pressão da água no ambiente (W94.-; Z57.8)

DOENÇAS DO SISTEMA CIRCULATÓRIO


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo IX da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Hipertensão Arterial (110.-) 1. Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro VIII)
2. Exposição ocupacional ao Ruído (Z57.0; X42.-)
(Quadro XXI)
3. Problemas relacionados com o emprego e com
o desemprego (Z56.-)

II — Angina Pectoris (I20.-) 1. Monóxido de Carbono (X47.-; Z57.5) (Quadro XVII)


2. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)
3. Nitroglicerina e outros ésteres do ácido nítrico
(X49.-; Z57.5)
4. Problemas relacionados com o emprego e com
o desemprego (Z56.-)

III — Infarto Agudo do Miocárdio 1. Monóxido de Carbono (X47.-; Z57.5) (Quadro XVII)
(121.-)
2. Sulfeto de Carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)
3. Nitroglicerina e outros ésteres do ácido nítrico
(X49.-; Z57.5)
4. Problemas relacionados com o emprego e com
o desemprego (Z56.-)
510 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

IV — Cor Pulmonale SOE ou Doen­ Complicação evolutiva das pneumoconioses gra­


ça Cardiopulmonar Crônica (I27.9) ves, principalmente Silicose (Z57.2) (Quadro XVIII)

V — Placas epicárdicas ou pericár- Asbesto ou Amianto (W83.-; Z57.2) (Quadro II)


dicas (I34.8)

VI — Parada Cardíaca (I46.-) 1. Derivados halogenados dos hidrocarbonetos ali-


fáticos (X46.-) (Quadro XIII)
2. Monóxido de Carbono (X47.-; Z57.5) (Quadro
XVII)
3. Outros agentes potencialmente causadores de
arritmia cardíaca (Z57.5)
VII — Arritmias cardíacas (I49.-) 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;
Z57.5) (Quadro I)
2. Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro VIII)
3. Derivados halogenados dos hidrocarbonetos ali-
táticos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
4. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(Quadro XVI)
5. Monóxido de Carbono (X47.-; Z57.5) (Quadro
XVII)
6. Agrotóxicos organofosforados e carbamatos (X48;
Z57.4) (Quadros XI le XXVII)
7. Exposição ocupacional a Cobalto (X49.-; Z57.5)
8. Nitroglicerina e outros ésteres do ácido nítrico
(X49.-; Z57.5)
9. Problemas relacionados com o emprego e com
o desemprego (Z56.-)

VIII— Ateroesclerose (I70.-) e Doen­ Sulfeto de carbono (X49.-; Z57.5) (Quadro XIX)
ça Ateroesclerótica do Coração
(125.1)

IX — Síndrome de Raynaud (I73.0) 1. Cloreto de vinila (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)


In d e n iz a ç õ e s p o r A c id e n te do T r a b a lh o o u D o e n ç a O c u p a c io n a l 511

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

2. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro XXII)


3. Trabalho em baixas temperaturas (frio) (W93.-;
Z57.6)

X — Acrocianose e Acroparestesia 1. Cloreto de vinila (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)


(I73.8) 2. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro XXII)
3. Trabalho em baixas temperaturas (frio) (W93.-;
Z57.6)

DOENÇAS DO SISTEMA RESPIRATÓRIO


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo X da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Faringite Aguda, não especifica­ 1. Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)
da (“Angina Aguda”, ”Dor de Gargan­ 2. lodo (X49.-; Z57.5) (Quadro XIV)
ta”) (J02.9)

II — Laringotraqueíte Aguda (J04.2) 1. Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)


2. lodo (X49.-; Z57.5) (Quadro XIV)

III— Outras Rinites Alérgicas (J30.3) 1. Carbonetos metálicos de tungstênio sinteri-


zados (X49.-; Z57.2 e Z57.5) (Quadro VII)
2. Cromo e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(Quadro X)
3. Poeiras de algodão, linho, cânhamo ou sisal
(Z57.2) (Quadro XXVI)
4. Acrilatos (X49.-; Z57.5)
5. Aldeído fórmico e seus polímeros (X49.-; Z57.5)
6. Aminas aromáticas e seus derivados (X49.-;
Z57.5)
7. Anidrido ftálico (X49.-; Z57.5)
8. Azodicarbonamida (X49.-; Z57.5)
9. Carbetos de metais duros: cobalto e titânio (Z57.2)
512 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
10. Enzimas de origem animal, vegetal ou
bacteriana (X44.-; Z57.3)
11. Furfural e Álcool Furfurílico (X45.-; Z57.5)
12. Isocianatos orgânicos (X49.-; Z57.5)
13. Níquel e seus compostos (X49.-; Z57.5)
14. Pentóxido de vanádio (X49.-; Z57.5)
15. Produtos da pirólise de plásticos, cloreto de
vinila, teflon (X49.-; Z57.5)
16. Sulfitos, bissulfitos e persulfatos (X49.-; Z57.5)
17. Medicamentos: macrólidos; ranetidina;
penicilina e seus sais; cetalosporinas (X44.-; Z57.3)
18. Proteínas animais em aerossóis (Z57.3)
19. Outras substâncias de origem vegetal
(cereais, farinhas, serragem etc.) (Z57.2)
20. Outras susbtâncias químicas sensibilizantes
da pele e das vias respiratórias (X49,-; Z57.2)
(Quadro XXVII)
IV — Rinite Crônica (J31.0) 1. Arsênico e seus compostos arsenicais (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2. Cloro gasoso (X47.-; Z57.5) (Quadro IX)
3. Cromo e seus compostos tóxicos (X49.-)
(Quadro X)
4. Gás de flúor e Fluoreto de Hidrogênio (X47.-;
Z57.5) (Quadro XI)
5. Amônia (X47.-; Z57.5)
6. Anidrido sulfuroso (X49.-; Z57.5)
7. Cimento (Z57.2)
8. Fenol e homólogos (X46.-; Z57.5)
9. Névoas de ácidos minerais (X47.-; Z57.5)
10. Níquel e seus compostos (X49.-; Z57.5)
11. Selênio e seus compostos (X49.-; Z57.5)

V — Faringite Crônica (J31.2) Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)

VI — Sinusite Crônica (J32.-) 1. Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)


2. lodo (X49.-; Z57.5) (Quadro XIV)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D o e n ç a O c u p a c io n a l 513

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

VII — Ulceração ou Necrose do 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


Septo Nasal (J34.0) Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2, Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)
(Quadro VI)
3. Cromo e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(Quadro X)
4. Soluções e aerossóis de Ácido Cianídrico e
seus derivados (X47.-; Z57.5) (Quadro XVII)

VIII — Perfuração do Septo Nasal 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


(J34.8) Z57.4eZ57.5) (Quadro I)
2. Cromo e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(Quadro X)

IX— Laringotraqueíte Crônica (J37.1) Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)

X — Outras Doenças Pulmonares 1. Cloro gasoso (X47.-; Z57.5) (Quadro IX)


Obstrutivas Crônicas (Inclui: “Asma 2. Exposição ocupacional à poeira de sílica livre
Obstrutiva”, “Bronquite Crônica”, (Z57.2-) (Quadro XVIII)
“Bronquite Asmática”, “Bronquite
3. Exposição ocupacional a poeiras de algodão,
Obstrutiva Crônica”) (J44.-)
linho, cânhamo ou sisal (Z57.2) (Quadro XXVI)
4. Amônia (X49.-; Z57.5)
5. Anidrido sulfuroso (X49.-; Z57.5)
6. Névoas e aerossóis de ácidos minerais (X47.-;
Z57.5)
7. Exposição ocupacional a poeiras de carvão
mineral (Z57.2)

XI — Asma (J45.-) Mesma lista das substâncias sensibilizantes


produtoras de Rinite Alérgica (X49.-; Z57.2, Z57.4
e Z57.5)

XII — Pneumoconiose dos T rabalha- 1. Exposição ocupacional a poeiras de carvão


dores do Carvão (J60.-) mineral (Z57.2)
2. Exposição ocupacional a poeiras de sílica-livre
(Z57.2) (Quadro XVIII)

XIII — Pneumoconiose devida ao Exposição ocupacional a poeiras de asbesto ou


Asbesto (Asbestose) e a outras fi­ amianto (Z57.2) (Quadro II)
bras minerais (J61.-)
XIV— Pneumoconiose devida à po­ Exposição ocupacional a poeiras de sílica-livre
eira de Sílica (Silicose) (J62.8) (Z57.2) (Quadro XVIII)
514 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

XV — Beriliose (J63.2) Exposição ocupacional a poeiras de berílio e seus


compostos tóxicos (Z57.2) (Quadro IV)

XVI — Siderose (J63.4) Exposição ocupacional a poeiras de ferro (Z57.2)

XVII — Estanhose (J63.5) Exposição ocupacional a poeiras de estanho


(Z57.2)
XVIII — Pneumoconiose devida a 1. Exposição ocupacional a poeiras de carboneto
outras poeiras inorgânicas especifi- de tungstênio (Z57.2) (Quadro VII)
C3.U9.S ( J b o .o )
2. Exposição ocupacional a poeiras de carbetos
de metais duros (Cobalto, Titânio etc.) (Z57.2)
3. Exposição ocupacional a rocha fosfática
(Z57.2)
4. Exposição ocupacional a poeiras de alumina
(AI203) (“Doença de Shaver”) (Z57.2)

XIX — Pneumoconiose associada Exposição ocupacional a poeiras de sílica-livre


com Tuberculose (“Sílico-Tuberculo- (Z57.2) (Quadro XVIII)
se”) (J65.-)

XX — Doenças das vias aéreas Exposição ocupacional a poeiras de algodão,


devidas a poeiras orgânicas linho, cânhamo, sisal (Z57.2) (Quadro XXVI)
(J66.-): Bissinose (J66.0), devidas
a outras poeiras orgânicas espe­
cificadas (J66.8)
XXI — Pneumonite por Hipersensi­ 1. Exposição ocupacional a poeiras contendo
bilidade a Poeira Orgânica (J67.-): micro-organismos e parasitas infecciosos vivos
Pulmão do Granjeiro (ou Pulmão do e seus produtos tóxicos (Z57.2) (Quadro XXV)
Fazendeiro) (J67.0); Bagaçose 2. Exposição ocupacional a outras poeiras
(J67.1); Pulmão dos Criadores de orgânicas (Z57.2)
Pássaros (J67.2); Suberose (J67.3);
Pulmão dos Trabalhadores de Mal­
te (J67.4); Pulmão dos que Traba­
lham com Cogumelos (J67.5); Do­
ença Pulmonar Devida a Sistemas
de Ar Condicionado e de Umidifi-
cação do Ar (J67.7); Pneumonites
de Hipersensibilidade Devidas a
Outras Poeiras Orgânicas (J67.8);
Pneumonite de Hipersensibilidade
Devida a Poeira Orgânica não es­
pecificada (Alveolite Alérgica Ex-
trínseca SOE); Pneumonite de Hi­
persensibilidade SOE (J67.0)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o o u D oença O c u p a c io n a l 515

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

XXII — Bronquite e Pneumonite 1. Berílio e seus compostos tóxicos (X49.-;


devida a produtos químicos, gases, Z57.5) (Quadro IV)
fumaças e vapores (“Bronquite Quí­ 2. Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)
mica Aguda”) (J68.0)
3. Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)
(Quadro VI)
4. Gás Cloro (X47.-; Z57.5) (Quadro IX)
5. Flúor ou seus compostos tóxicos (X47.-; Z57.5)
(Quadro XI)
6. Solventes halogenados irritantes respiratórios
(X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
7. lodo (X49.-; Z57.5) (Quadro XIV)
8. Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro XV)
9. Cianeto de hidrogênio (X47.-; Z57.5) (Quadro
XVII)
XXIII — Edema Pulmonar Agudo 1. Berílio e seus compostos tóxicos (X49.-;
devido a produtos químicos, gases, Z57.5) (Quadro IV)
fumaças e vapores (Edema Pulmo­ 2. Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)
nar Químico) (J68.1)
3. Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)
(Quadro VI)
4. Gás Cloro (X47.-; Z57.5) (Quadro IX)
5. Flúor e seus compostos (X47.-; Z57.5)
(Quadro XI)
6. Solventes halogenados irritantes respiratórios
(X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
7. lodo (X49.-; Z57.5) (Quadro XIV)
8. Cianeto de hidrogênio (X47.-; Z57.5) (Quadro XVII)
XXIV — Síndrome de Disfunção 1. Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)
Reativa das Vias Aéreas (SDVA/ 2. Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)
RADS) (J68.3) (Quadro VI)
3. Gás Cloro (X47.-; Z57.5) (Quadro IX)
4. Solventes halogenados irritantes respiratórios
(X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
5. lodo (X49.-; Z57.5) (Quadro XIV)
6. Cianeto de hidrogênio (X47.-; Z57.5) (Quadro XVII)
7. Amônia (X49.-; Z57.5)
516 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

XXV — Afeccções respiratórias 1. Arsênico e seus compostos arsenicais (X49.-;


crônicas devidas à inalação de Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
gases, fumos, vapores e substân­ 2. Berílio e seus compostos (X49.-; Z57.5) (Qua­
cias químicas: Bronquiolite Oblite- dro IV)
rante Crônica, Enfisema Crônico 3. Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro V)
Difuso, Fibrose Pulmonar Crônica
(J68.4) 4. Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)
(Quadro VI)
5. Gás Cloro (X47.-; Z57.5) (Quadro IX)
6. Flúor e seus compostos (X47.-; Z57.5) (Quadro XI)
7. Solventes halogenados irritantes respiratórios
(X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
8. lodo (X49.-; Z57.5) (Quadro XIV)
9. Manganês e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro XV)
10. Cianeto de hidrogênio (X47.-; Z57.5) (Quadro XVII)
11. Ácido Sulfídrico (Sulfeto de hidrogênio) (X47.-;
Z57.5) (Quadro XVII)
12. Carbetos de metais duros (X49.-; Z57.5)
13. Amônia (X49.-; Z57.5)
14. Anidrido sulfuroso (X49,-; Z57.5)
15. Névoas e aerossóis de ácidos minerais (X47.-;
Z57.5)
16. Acrilatos (X49.-; Z57.5)
17. Selênio e seus compostos (X49.-; Z57.5)
XXVI — Pneumonite por Radiação Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro XXIV)
(manifestação aguda) (J70.0) e Fi­
brose Pulmonar Conseqüente a Ra­
diação (m anifestação crônica)
k ^ l V — Derrame pleural (J90.-) Exposição ocupacional a poeiras de Asbesto ou
Amianto (Z57.2) (Quadro II)
Exposição ocupacional a poeiras de Asbesto ou
XXVIII — Placas pleurais (J92.-)
Amianto (Z57.2) (Quadro II)
XXIX — Enfisema intersticial (J98.2) Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)
(Quadro VI)
XXX — Transtornos respiratórios 1. Exposição ocupacional a poeiras de Carvão
em outras doenças sistêmicas do Mineral (Z57.2)
tecido conjuntivo classificadas em 2. Exposição ocupacional a poeiras de Sílica livre
outra parte (M05.3): “Síndrome de (Z57.2) (Quadro XVIII)
Caplan” (J99.1)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 517

DOENÇAS DO SISTEMA DIGESTIVO


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo XI da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

I — Erosão Dentária (K03.2) 1. Névoas de fluoretos ou seus compostos tóxi­


cos (X47.-; Z57.5) (Quadro XI)
2. Exposição ocupacional a outras névoas áci­
das (X47.-; Z57.5)

II— Alterações pós-eruptivas da cor 1. Névoas de Cádmio ou seus compostos (X47.-;


dos tecidos duros dos dentes Z57.5) (Quadro VI)
(K03.7) 2. Exposição ocupacional a metais: Cobre, Níquel,
Prata (X47.-; Z57.5)

III — Gengivite Crônica (K05.1) Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(Quadro XVI)

IV — Estomatite Ulcerativa Crônica 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


(K12.1) Z57.5) (Quadro I)
2. Bromo (X49.-; Z57.5) (Quadro XII)
3. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(Quadro XVI)

V — Gastroenterite e Colite tóxicas 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


(K52.-) Z57.5) (Quadro I)
2. Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5) (Qua­
dro VI)
3. Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro XXIV)

VI — Outros transtornos funcionais Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)


do intestino (“Síndrome dolorosa (Quadro VIII)
abdominal paroxística apirética, com
estado suboclusivo: “cólica do
chumbo”) (K59.8)
VII — Doença Tóxica do Fígado 1. Cloreto de Vinila, Clorobenzeno, Tetracloreto
(K71.-): Doença Tóxica do Fígado, de Carbono, Clorofórmio, e outros solventes halo-
com Necrose Hepática (K71.1); genados hepatotóxicos (X46.- e X48.-; Z57.4 e
Doença Tóxica do Fígado, com Z57.5) (Quadro XIII)
Hepatite Aguda (K71.2); Doença 2. Hexaclorobenzeno (HCB) (X48.-; Z57.4 e Z57.5)
Tóxica do Fígado com Hepatite
3. Bifenilas policloradas (PCBs) (X49.-; Z57.4 e
Crônica Persistente (K71.3); Doença
Z57.5)
518 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
Tóxica do Fígado com Outros 4. Tetraclorodibenzodioxina (TCDD) (X49.-)
Transtornos Hepáticos (K71.8)

VIII — Hipertensão Portal (K76.6) 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;


Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
2. Cloreto de Vinila (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
3.Tório (X49.-; Z57.5)

DOENÇAS DA PELE E DO TECIDO SUBCUTÂNEO


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo XII da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Outras Infecções Locais da Pele 1. Cromo e seus compostos tóxicos (Z57.5) (Qua­
e do Tecido Subcutâneo: “Dermato- dro X)
ses Pápulo-Pustulosas e suas com­ 2. Hidrocarbonetos alifáticos ou aromáticos (seus
plicações infecciosas” (L08.9) derivados tóxicos) (Z57.5) (Quadro XIII)
3. Micro-organismos e parasitas infecciosos vi­
vos e seus produtos tóxicos (Z57.5) (Quadro XXV)
4. Outros agentes químicos ou biológicos que
afetem a pele, não considerados em outras ru­
bricas (Z57.5) (Quadro XXVII)
1. Cromo e seus compostos tóxicos (Z57.5) (Qua­
II — Dermatite Alérgica de Contato dro X)
devida a Metais (L23.0)
2. Mercúrio e seus compostos tóxicos (Z57.5)
(Quadro XVI)
III — Dermatite Alérgica de Conta­ Adesivos, em exposição ocupacional (Z57.5)
to devida a Adesivos (L23.1) (Quadro XXVII)
IV — Dermatite Alérgica de Conta­ Fabricação/manipulação de Cosméticos (Z57.5)
to devida a Cosméticos (fabrica­ (Quadro XXVII)
ção/manipulação) (L23.2)
V — Dermatite Alérgica de Conta­ Drogas, em exposição ocupacional (Z57.5) (Qua­
to devida a Drogas em contato com dro XXVII)
a pele (L23.3)
VI — Dermatite Alérgica de Con­ Corantes, em exposição ocupacional (Z57.5)
tato devida a Corantes (L23.4) (Quadro XXVII)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 519

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
VII — Dermatite Alérgica de Con­ 1. Cromo e seus compostos tóxicos (Z57.5) (Qua­
tato devida a outros produtos quí­ dro X)
micos (L23.5) 2. Fósforo ou seus produtos tóxicos (Z57.5) (Qua­
dro XII)
3. lodo (Z57.5) (Quadro XIV)
4. Alcatrão, Breu, Betume, Hulha Mineral, Para­
fina ou resíduos dessas substâncias (Z57.8)
(Quadro XX)
5. Borracha (Z57.8) (QuadroXXVII)
6. Inseticidas (Z57.5) (Quadro XXVII)
7. Plásticos (Z57.8) (Quadro XXVII)
VIII — Dermatite Alérgica de Conta­ Fabricação/manipulação de Alimentos (Z57.5)
to devida a Alimentos em contato (Quadro XXVII)
com a pele (fabricação/ manipula­
ção) (L23.6)
IX — Dermatite Alérgica de Conta­ Manipulação de Plantas, em exposição ocupa­
to devida a Plantas (Não inclui plan­ cional (Z57.8) (Quadro XXVII)
tas usadas como alimentos) (L23.7)

X — Dermatite Alérgica de Conta­ Agentes químicos, não especificados anterior­


to devida a outros agentes (Causa mente, em exposição ocupacional (Z57.5) (Qua­
Externa especificada) (L23.8) dro XXVII)
XI — Dermatite de Contato por Irri­ Detergentes, em exposição ocupacional (Z57.5)
tantes devida a Detergentes (L24.0) (Quadro XXVII)

XII — Dermatite de Contato por Irri­ Óleos e Gorduras, em exposição ocupacional


tantes devida a Óleos e Gorduras (Z57.5) (Quadro XXVII)
(L24.1)
XIII — Dermatite de Contato por Irri­ 1. Benzeno (X46.-; Z57.5) (Quadro III)
tantes devida a Solventes: Cetonas, 2. Hidrocarbonetos aromáticos ou alifáticos ou
Ciclohexano, Compostos do Cloro, seus derivados halogenados tóxicos (Z57.5)
Ésteres, Glicol, Hidrocarbonetos (Quadro XIII)
(L24.2)

XIV — Dermatite de Contato por Ir­ Cosméticos, em exposição ocupacional (Z57.5)


ritantes devida a Cosméticos (L24.3) (Quadro XXVII)
XV — Dermatite de Contato por Ir­ Drogas, em exposição ocupacional (Z57.5) (Qua­
ritantes devida a Drogas em con­ dro XXVII)
tato com a pele (L24.4)
520 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
XVI — Dermatite de Contato por 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (Z57.5)
Irritantes devida a outros produtos (Quadro I)
químicos: Arsênio, Berílio, Bromo, 2. Berílio e seus compostos tóxicos (Z57.5)
Cromo, Cimento, Flúor, Fósforo, (Quadro IV)
Inseticidas (L24.5) 3. Bromo (Z57.5) (Quadro V)
4. Cromo e seus compostos tóxicos (Z57.5)
(Quadro X)
5. Flúor ou seus compostos tóxicos (Z57.5) (Qua­
dro XI)
6. Fósforo (Z57.5) (Quadro XII)
XVII — Dermatite de Contato por Alimentos, em exposição ocupacional (Z57.8)
Irritantes devida a Alimentos em (Quadro XXVII)
contato com a pele (L24.6)
XVIII — Dermatite de Contato por Plantas, em exposição ocupacional (Z57.8) (Qua­
Irritantes devida a Plantas, exceto dro XXVII)
alimentos (L24.7)

XIX — Dermatite de Contato por Ir­ Agentes químicos, não especificados anterior­
ritantes devida a outros agentes: mente, em exposição ocupacional (Z57.5) (Qua­
Corantes (L24.8) dro XXVII)

XX — Urticária Alérgica (L50.0) Agrotóxicos e outros produtos químicos (X48.-;


Z57.4 e Z57.5) (Quadro XXVII)

XXI — Urticária devida ao Calor e Exposição ocupacional a calor e frio (W92,-;


ao Frio (L50.2) W93.-; Z57.6) (Quadro XXVII)

XXII — Urticária de Contato (L50.6) Exposição ocupacional a agentes químicos, fí­


sicos e biológicos que afetam a pele (X49.-; Z57.4
e Z57.5) (Quadro XXVII)
XXI11— Queimadura Solar (L55) Exposição ocupacional a radiações actínicas
(X32.-;Z57.1) (Quadro XXVII)
XXIV — Outras Alterações Agudas Radiação Ultravioleta (W89.-; Z57.1) (Quadro
da Pele devidas a Radiação Ultra­ XXVII)
violeta (L56.-): Dermatite por Foto-
contato (Dermatite de Berloque)
(L56.2); Urticária Solar (L56.3);
Outras Alterações Agudas Espe­
cificadas da Pele devidas a Radia­
ção Ultravioleta (L56.8); Outras Al­
terações Agudas da Pele devidas
a Radiação Ultravioleta, sem outra
especificação (L56.9);
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 521

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
XXV — Alterações da Pele devidas Radiações não ionizantes (W89.-; X32.-; Z57.1)
a Exposição Crônica a Radiação (Quadro XXVII)
Não lonizante (L57.-): Ceratose
Actínica (L57.0); Outras Altera­
ções: Dermatite Solar, “Pele de Fa­
zendeiro”, “Pele de Marinheiro”
(L57.8)
XXVI — Radiodermatite (L58.-): Ra- Radiações ionizantes (W88.-; Z57.1) (Quadro
diodermatite Aguda (L58.0); Radio­ XXIV)
dermatite Crônica (L58.1); Radioder­
matite, não especificada (L58.9);
Afecções da pele e do tecido con-
juntivo relacionadas com a radiação,
não especificadas (L59.9)
XXVII — Outras formas de Acne: 1. Derivados halogenados dos hidrocarbonetos
“Cloracne” (L70.8) aromáticos, Monoclorobenzeno, Monobromoben-
zeno, Hexaclorobenzeno (X46.; Z57.5) (Quadro XIII)
2. Derivados do fenol, pentaclorofenol e do hidro-
benzonitrilo (X49.-; Z57.4 e Z57.5) (Quadro XXVII)
3. Policloretos de Bifenila (PCBs) (X49.-; Z57.4
e Z57.5) (Quadro XXVII)
XXVIII — Outras formas de Cistos Óleos e gorduras de origem mineral ou sintéti­
Foliculares da Pele e do Tecido Sub- cos (X49.-; Z57.5) (Quadro XXVII)
cutâneo: “Elaioconiose” ou “Derma­
tite Folicular” (L72.8)
XXIX — Outras formas de hiperpig- 1. Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;
mentação pela melanina: “Melano- Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
dermia” (L81.4) 2. Clorobenzeno e Diclorobenzeno (X46.-; Z57.4
eZ57.5) (Quadro XIII)
3. Alcatrão, Breu, Betume, Hulha Mineral, Para­
fina, Creosoto, Piche, Coaltar ou resíduos des­
sas substâncias (Z57.8) (Quadro XX)
4. Antraceno e Dibenzoantraceno (Z57.5) (Qua­
dro XX)
5. Bismuto (X44.-; Z57.5) (Quadro XXVII)
6. Citostáticos (X44.-; Z57.5) (Quadro XXVII)
7. Compostos nitrogenados: Ácido nítrico, Dini-
trofenol (X49.-; Z57.5) (Quadro XXVII)
8. Naftóis adicionados a corantes (X49,-; Z57.5)
(Quadro XXVII)
522 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
9. Óleos de corte (Z57.5) (Quadro XXVII)
10. Parafenilenodiamina e seus derivados (X49.-;
Z57.5) (Quadro XXVII)
11. Poeira de determinadas madeiras (Z57.3)
(Quadro XXVII)
12. Quinino e seus derivados (Z57.5) (Quadro
XXVII)
13. Sais de ouro (X44.-; Z57.5) (Quadro XXVII)
14. Sais de prata (Seqüelas de Dermatite Crôni­
ca de Contato) (X44.-; Z57.5) (Quadro XXVII)

XXX — Leucodermia, não classifi­ 1. Arsênio e seus compostos (X49.-; Z57.4 e


cada em outra parte (Inclui “Vitiligo Z57.5) (Quadro I)
Ocupacional”) (L81.5) 2. Hidroquinona e ésteres derivados (X49.-; Z57.5)
(Quadro XXVII)
3. Monometil éter de hidroquinona (MBEH) (X49.-;
Z57.5) (Quadro XXVII)
4. para-Aminofenol (X49.-; Z57.5) (Quadro XXVII)
5. para-Butilfenol (X49.-; Z57.5) (Quadro XXVII)
6. para-Cresol (X49.-; Z57.5) (Quadro XXVII)
7. Catecol e Pirocatecol (X49.-; Z57.5) (Quadro
XXVII)
8. Clorofenol (X46.-; Z57.4 e Z57.5)(Quadro XXVII)

XXXI — Outros transtornos especi­ Derivados halogenados dos hidrocarbonetos aro­


máticos: minocloro-benzeno, monobromo-ben-
ficados da pigmentação: “Porfiria
zeno, hexaclorobenzeno (X46.-; Z57.4 e Z57.5)
Cutânea Tardia” (L81.8)
(Quadro XIII)
XXXII — Ceratose Palmar e Plan­ Arsênio e seus compostos arsenicais (X49.-;
tar Adquirida (L85.1) Z57.4 e Z57.5) (Quadro I)
XXXIII — Úlcera Crônica da Pele, 1. Cromo e seus compostos tóxicos (Z57.5)
não classificada em outra parte (Quadro X)
(L98.4) 2. Enzimas de origem animal, vegetal ou bacte-
riana (Z57.8) (QuadroXXVII)

XXXIV — Geladura (Frostbite) Su­ 1. Cloreto de etila (anestésico local) (W93.-;


perficial (T33): Eritema Pérnio Z57.6) (Quadro XIII)
2. Frio (X31.-; W93.-; Z57.6) (Quadro XXVII)

XXXV — Geladura (Frostbite) com 1. Cloreto de etila (anestésico local) (W93.-;


Necrose de Tecidos (T34) Z57.6) (Quadro XIII)
2. Frio (X31.-; W93.-; Z57.6) (Quadro XXVII)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o o u D oença O c u p a c io n a l 523

DOENÇAS DO SISTEMA OSTEOMUSCULAR E DO TECIDO


CONJUNTIVO, RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo XIII da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

I — Artrite Reumatoide associada 1. Exposição ocupacional a poeiras de carvão


a Pneumoconiose dos Trabalhado- mineral (Z57.2)
res do Carvão (J60.-): “Síndrome 2. Exposição ocupacional a poeiras de sílica livre
de Caplan” (M05.3) (Z57.2) (Quadro XVIII)
II — Gota induzida pelo chumbo Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-;
(M10.1) Z57.5) (Quadro VIII)
III — Outras Artroses (M19.-) Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)
IV — Outros transtornos articula- 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)
res não classificados em outra 2. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro
parte: Dor Articular (M25.5) XXII)
V — Síndrome Cervicobraquial 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)
(M53.1) 2. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro XXII)
VI — Dorsalgia (M54.-): Cervical- 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)
gia (M54.2); Ciática (M54.3); Lum­ 2. Ritmo de trabalho penoso (Z56.3)
bago com Ciática (M54.4) 3. Condições difíceis de trabalho (Z56.5)
VII — Sinovites e Tenossinovites 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)
(M65.-): Dedo em Gatilho (M65.3); 2. Ritmo de trabalho penoso (Z56.3)
Tenossinovite do Estiloide Radial 3. Condições difíceis de trabalho (Z56.5)
(De Quervain) (M65.4); Outras Si­
novites e Tenossinovites (M65.8);
Sinovites e Tenossinovites, não
especificadas (M65.9)
VIII — Transtornos dos tecidos 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)
moles relacionados com o uso, o 2. Ritmo de trabalho penoso (Z56.3)
uso excessivo e a pressão, de ori­
3. Condições difíceis de trabalho (Z56.5)
gem ocupacional (M70.-): Sinovite
Crepitante Crônica da mão e do
punho (M70.0); Bursite da Mão
(M 70.1); Bursite do O lécrano
(M70.2); Outras Bursites do Coto­
velo (M70.3); Outras Bursites Pré-
-rotulianas (M70.4); Outras Bursi­
tes do Joelho (M70.5); Outros
transtornos dos tecidos moles re­
lacionados com o uso, o uso ex-
524 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional

cessivo e a pressão (M70.8);


Transtorno não especificado dos
tecidos moles, relacionados com
o uso, o uso excessivo e a pres­
são (M70.9).

IX — Fibromatose da Fascia Pal­ 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)


mar: “Contratura ou Moléstia de 2. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro XXII)
Dupuytren” (M72.0)

X — Lesões do Ombro (M75.-): Cap- 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)


sulite Adesiva do Ombro (Ombro 2. Ritmo de trabalho penoso (Z56)
Congelado, Periartrite do Ombro)
(M75.0); Síndrome do Manguito 3. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro XXII)
Rotatório ou Síndrome do Supra-
espinhoso (M75.1); Tendinite Bici-
pital (M75.2); Tendinite Calcificante
do Ombro (M75.3); Bursite do
Ombro (M75.5); Outras Lesões
do Ombro (M75.8); Lesões do Om­
bro, não especificadas (M75.9)
XI — Outras entesopatias (M77.-): 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)
Epicondilite Mediai (M77.0); Epi- 2. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro XXII)
condilite lateral (“Cotovelo de Te­
nista”); Mialgia (M79.1)

XII — Outros transtornos especifi­ 1. Posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8)


cados dos tecidos moles (M79.8) 2. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro XXII)

XIII — Osteomalácia do Adulto in­ 1. Cádmio ou seus compostos (X49.-) (Quadro VI)
duzida por drogas (M83.5) 2. Fósforo e seus compostos (Sesquissulfeto de
Fósforo) (X49.-; Z57.5) (Quadro XII)
XIV — Fluorose do Esqueleto Flúor e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(M85.1) (Quadro XI)
XV — Osteonecrose (M87.-): Os­ 1. Fósforo e seus compostos (Sesquissulfeto de
teo n ecrose devida a drogas Fósforo) (X49.-; Z57.5) (Quadro XII)
(M87.1); Outras Osteonecroses 2. Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (Quadro
secundárias (M87.3) XXII)
3. Radiações ionizantes (Z57.1) (Quadro XXIV)
XVI — Osteólise (M89.5) (de falan­ Cloreto de Vinila (X49.-; Z57.5) (Quadro XIII)
ges distais de quirodáctilos)
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 525

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
XVII — Osteonecrose no “Mal dos “Ar Comprimido” (W94.-; Z57.8) (Quadro XXIII)
Caixões” (M90.3)

XVIII — Doença de Kienbõck do Vibrações localizadas (W43.-; Z57.7) (QuadroXXII)


Adulto (Osteocondrose do Adulto
do Semilunar do Carpo) (M93.1) e
outras Osteocondropatias especi­
ficadas (M93.8)

DOENÇAS DO SISTEMA GENITURINÁRIO


RELACIONADAS COM O TRABALHO
(Grupo XIV da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Síndrome Nefrítica Aguda Hidrocarbonetos alifáticos halogenados nefrotó-
(N00.-) xicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
II — Doença Glomerular Crônica Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-; Z57.5)
(N03.-) (Quadro XVI)
III — Nefropatia túbulo-intersticial 1. Cádmio ou seus compostos (X49.-; Z57.5)
induzida por metais pesados (N14.3) (Quadro VI)
2. Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro VIII)
3. Mercúrio e seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.4 e Z57.5) (Quadro XVI)
IV — Insuficiência Renal Aguda Hidrocarbonetos alifáticos halogenados nefrotó-
(N17) xicos (X46.-; Z57.5) (Quadro XIII)
V — Insuficiência Renal Crônica Chumbo ou seus compostos (X49.-; Z57.5) (Qua­
(N18) dro VIII)
VI — Cistite Aguda (N30.0) Aminas aromáticas e seus derivados (X49.-;
Z57.5)
VII — Infertilidade Masculina (N46) 1. Chumbo ou seus compostos tóxicos (X49.-;
Z57.5) (Quadro VIII)
2. Radiações ionizantes (W88.-: Z57.1) (Quadro XXIV)
3. Chlordecone (X48.-; Z57.4)
4. Dibromocloropropano (DBCP) (X48.-; Z57.4 e
Z57.5)
5. Calor (trabalho em temperaturas elevadas) (Z57.6)
526 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

TRAUMATISMOS, ENVENENAMENTOS E ALGUMAS OUTRAS


CONSEQÜÊNCIAS DE CAUSAS EXTERNAS,
RELACIONADOS COM O TRABALHO
(Grupo XIX da CID-10)

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
I — Efeitos tóxicos de Solventes Exposição ocupacional a agentes tóxicos em
Orgânicos (T52.-): Álcoois (T51.8) outras indústrias (Z57.5)
e Cetonas (T52.4); Benzeno, Tolu­
eno e Xileno (T52.1 e T52.2); Deri­
vados halogenados dos Hidrocar-
bonetos Alifáticos e Aromáticos
(T53): Tetracloreto de Carbono
(T53.0); Clorofórmio (T53.1); Triclo-
roetileno (T53.2); Tetracloroetileno
(T53.3); Dicloroetano (T53.4); Clo-
rofluor-carbonos (T53.5); Outros
derivados halogenados de hidrocar-
bonetos alifáticos (T53.6); Outros
derivados halogenados de hidrocar-
bonetos aromáticos (T53.7); Deri­
vados halogenados de hidrocarbo-
netos alifáticos e aromáticos, não
especificados (T53.9); Sulfeto de
Carbono (T65.4)
II — Efeito tóxico de Substâncias Exposição ocupacional a agentes tóxicos em
Corrosivas (T54): Fenol e homólo­ outras indústrias (Z57.5)
gos do fenol (T54.0); Flúor e seus
com postos (T65.8); Selênio e
seus compostos (T56.8); Outros
compostos orgânicos corrosivos
(T54.1); Ácidos corrosivos e subs­
tâncias ácidas similares (T54.2);
Álcalis cáusticos e substâncias
alcalinas similares (T54.3); Efeito
tóxico de substância corrosiva, não
especificada (T54.9).
III — Efeito tóxico de Metais (T56): Exposição ocupacional a agentes tóxicos em
A rsênico e seus com postos outras indústrias (Z57.5)
(T57.0); Cádmio e seus compos­
tos (T56.3); Chumbo e seus com­
postos (T56.0); Cromo e seus
compostos (T56.2); Manganês e
seus compostos (T57.2); Mercúrio
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 527

Doenças Agentes Etiológicos ou Fatores de Risco de


Natureza Ocupacional
eseus compostos (T56.1); Outros
metais (T56.8); Metal, não especi­
ficado (T56.9).
IV — Asfixiantes Químicos (T57- Exposição ocupacional a agentes tóxicos em outras
59): Monóxido de Carbono (T58); indústrias (Z57.5)
Ácido cianídrico e cianetos (T57.3);
Sulfeto de hidrogênio (T59.6); Ami-
nas aromáticas e seus derivados
(T65.3)
V — Praguicidas (P esticidas, Exposição ocupacional a agentes tóxicos na
“Agrotóxicos”) (T60): Organofosfo- Agricultura (Z57.4)
rados e Carbamatos (T60.0); Halo-
genados (T60.1); Outros praguicidas
(T60.2)
VI — Efeitos da Pressão do Ar e Exposição ocupacional a pressões atmosféricas
da Pressão da Água (T70): Baro- anormais (W94.-; Z57.8)
trauma Otítico (T70.0); Barotrauma
Sinusal (T70.1); Doença Descom-
pressiva (“ Mal dos C a ixõ es”)
(T70.3); Outros efeitos da pressão
do ar e da água (T70.8).
ANEXO IV<1>LISTA C

HIPÓTESES EM QUE SE RECONHECE


O NEXO TÉCNICO EPIDEMIOLÓGICO — RELAÇÃO
ENTRE CID E CNAE

LISTA C
(Incluído pelo Decreto n. 6.957, de 2009)

Nota:
1 — São indicados intervalos de CID-10 em que se reconhece Nexo Técnico
Epidemiológico, na forma do § 3fl do art. 337, entre a entidade mórbida e as classes de
CNAE indicadas, nelas incluídas todas as subciasses cujos quatro dígitos iniciais
sejam comuns.

Intervalo CID-10 CNAE

A15-A19 0810 1091 1411 1412 1533 1540 2330 3011 3701 3702
3811 3812 3821 3822 3839 3900 4120 4211 4213 4222
4223 4291 4299 4312 4321 4391 4399 4687 4711 4713
4721 4741 4742 4743 4744 4789 4921 4923 4924 4929
5611 7810 7820 7830 8121 8122 8129 8610 9420 9601
E10-E14 1091 3600 3701 3702 3811 3812 3821 3822 3839 3900
4120 4211 4213 4222 4223 4291 4292 4299 4313 4319
4329 4399 4721 4921 4922 4923 4924 4929 4930 5030
5231 5239 8011 8012 8020 8030 8121 8122 8129 8411
9420
F10-F19 0710 0990 1011 1012 1013 1220 1532 1622 1732 1733
2211 2330 2342 2451 2511 2512 2531 2539 2542 2543
2593 2814 2822 2840 2861 2866 2869 2920 2930 3101
3102 3329 3600 3701 3702 3811 3812 3821 3822 3839
3900 4120 4211 4213 4221 4292 4299 4313 4319 4321
4329 4399 4520 4912 4921 5030 5212 5221 5222 5223
5229 5231 5232 5239 5250 5310 6423 7810 7820 7830
8121 8122 8129 8411 8423 8424 9420

F20-F29 0710 0990 1011 1012 1013 1031 1071 1321 1411 1412
2330 2342 2511 2543 2592 2861 2866 2869 2942 3701
3702 3811 3812 3821 3822 3839 3900 4120 4211 4213
4222 4223 4291 4292 4299 4312 4391 4399 4921 4922

(1) Lista Anexa ao Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999. Regulamento da Previdência


S ocial.
In d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 529

Intervalo CID-10 CNAE

4923 4924 4929 5212 5310 6423 7732 7810 7820 7830
8011 8012 8020 8030 8121 8122 8129 8423 9420

F30-F39 0710 0892 0990 1011 1012 1013 1031 1220 1311 1313
1314 1321 1330 1340 1351 1359 1411 1412 1413 1422
1531 1532 1540 2091 2123 2511 2710 2751 2861 2930
2945 3299 3600 4636 4711 4753 4756 4759 4762 4911
4912 4921 4922 4923 4924 4929 5111 5120 5221 5222
5223 5229 5310 5620 6110 6120 6130 6141 6142 6143
6190 6311 6422 6423 6431 6550 8121 8122 8129 8411
8413 8423 8424 8610 8711 8720 8730 8800
F40-F48 0710 0990 1311 1321 1351 1411 1412 1421 1532 2945
3600 4711 4753 4756 4759 4762 4911 4912 4921 4922
4923 4924 4929 5111 5120 5221 5222 5223 5229 5310
6110 6120 6130 6141 6142 6143 6190 6311 6422 6423
8011 8012 8020 8030 8121 8122 8129 8411 8423 8424
8610
G40-G47 0113 0210 0220 0810 1011 1012 1013 1321 1411 1412
1610 1621 1732 1733 1931 2330 2342 2511 2539 2861
3701 3702 3811 3812 3821 3822 3839 3900 4120 4211
4213 4222 4223 4291 4292 4299 4313 4319 4399 4921
4922 4923 4924 4929 4930 5212 8011 8012 8020 8030
8121 8122 8129
G50-G59 0155 1011 1012 1013 1062 1093 1095 1313 1351 1411
1412 1421 1529 1531 1532 1533 1539 1540 2063 2123
2211 2222 2223 2229 2349 2542 2593 2640 2710 2759
2944 2945 3240 3250 4711 5611 5612 5620 6110 6120
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1042 1051 1052 1061 1062 1063 1064 1071 1072 1091 1092
1093 1094 1096 1099 1122 1311 1312 1321 1323 1340 1351
1353 1354 1359 1411 1412 1510 1529 1531 1532 1533 1540
1610 1621 1622 1623 1629 1710 1721 1722 1731 1732 1733
1741 1742 1749 1813 1931 2012 2019 2029 2061 2063 2091
2092 2123 2211 2212 2219 2221 2222 2223 2229 2311 2312
2319 2330 2341 2342 2349 2391 2392 2399 2431 2439 2441
2443 2449 2451 2452 2511 2512 2513 2521 2522 2531 2532
2539 2541 2542 2543 2550 2591 2592 2593 2599 2632 2651
2710 2721 2722 2732 2733 2740 2751 2759 2790 2811 2812
2813 2814 2815 2821 2822 2823 2824 2825 2829 2831 2832
2833 2840 2852 2853 2854 2861 2862 2864 2865 2866 2869
2920 2930 2941 2942 2943 2944 2945 2949 2950 3011 3012
3032 3091 3092 3099 3101 3102 3103 3104 3220 3230 3240
3250 3291 3299 3319 3329 3701 3702 3811 3812 3821 3822
3832 3839 3900 4120 4211 4213 4221 4222 4223 4291 4292
4299 4312 4313 4319 4321 4322 4329 4391 4399 4520 4621
4622 4623 4632 4634 4661 4671 4672 4673 4674 4679 4681
4682 4685 4686 4687 4689 4711 4721 4722 4741 4742 4743
4744 4789 4930 5211 5212 5320 5819 5829 7719 7732 7810
7820 7830 8121 8122 8129 8423 9420 9529
S70-S79 0210 0220 1011 1012 1013 1033 1122 1610 1621 1622 2330
2391 2511 2512 2539 3101 3329 3701 3702 3811 3812 3821
3822 3839 3900 4120 4211 4213 4221 4222 4223 4291 4299
4312 4321 4391 4399 4520 4530 4541 4542 4618 4687 4731
4732 4741 4742 4743 4744 4784 4789 4921 4930 5212 5221
5222 5223 5229 5232 5250 5320 7810 7820 7830 8011 8012
8020 8030 8121 8122 8129 9420

S80-S89 0210 0220 0230 0500 0710 0810 0990 1011 1012 1013 1031
1033 1041 1051 1061 1062 1064 1071 1072 1092 1096 1099
1122 1321 1351 1354 1411 1412 1510 1531 1532 1540 1610
1621 1622 1623 1629 1710 1721 1722 1732 1733 1931 2012
2019 2029 2073 2091 2211 2219 2222 2312 2320 2330 2341
2342 2391 2439 2443 2449 2451 2511 2512 2521 2522 2539
2542 2543 2550 2592 2593 2651 2710 2812 2813 2815 2821
2822 2823 2831 2832 2833 2840 2852 2854 2861 2862 2864
2865 2866 2869 2930 2943 2944 2945 2950 3011 3101 3102
3329 3600 3701 3702 3811 3812 3821 3822 3839 3900 4120
4211 4213 4221 4222 4223 4291 4292 4299 4312 4313 4319
4321 4322 4329 4391 4399 4520 4530 4541 4542 4618 4621
4622 4623 4632 4635 4636 4637 4639 4661 4671 4672 4673
4674 4679 4681 4682 4685 4686 4687 4689 4711 4722 4723
4731 4732 4741 4742 4743 4744 4784 4789 4912 4921 4922
534 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Intervalo CID-10 CNAE


4923 4924 4929 4930 5211 5212 5221 5222 5223 5229 5232
5250 5310 5320 7719 7732 7810 7820 7830 8011 8012 8020
8030 8121 8122 8129 8423 8424 9420
S90-S99 0210 0220 0500 0810 1011 1012 1013 1031 1033 1041 1051
1061 1062 1064 1071 1072 1092 1093 1122 1311 1321 1351
1354 1411 1412 1510 1532 1610 1621 1622 1623 1629 1710
1721 1722 1732 1733 1931 2029 2091 2219 2221 ???? 2312
2330 2341 2342 2391 2431 2439 2441 2443 2449 2451 2511
2512 2513 2521 2522 2531 2539 2542 2543 2592 2593 2710
2722 2815 2822 2831 2832 2833 2840 2852 2853 2854 2861
2862 2865 2866 2869 2920 2930 2943 2944 2945 2950 3011
3101 3102 3329 3600 3701 3702 3811 3812 3821 3822 3839
3900 4120 4211 4213 4221 4222 4223 4291 4292 4299 4312
4313 4319 4321 4322 4329 4391 4399 4621 4622 4623 4661
4681 4682 4685 4686 4687 4689 4711 4784 4912 4921 4922
4930 5111 5120 5212 5221 5222 5223 5229 5232 5250 5310
5320 6423 6431 6550 7719 7732 7810 7820 7830 8011 8012
8020 8030 8121 8122 8129 8423 8424 8610 9420
T90-T98 0210 0220 0710 0810 0892 0910 1011 1013 1020 1031 1033
1041 1042 1061 1062 1071 1072 1091 1092 1093 1122 1220
1311 1312 1321 1351 1352 1353 1411 1412 1510 1531 1532
1533 1540 1610 1621 1622 1629 1733 1932 2014 2019 2029
2032 2091 2211 2221 2223 2229 2312 2320 2330 2341 2342
2391 2451 2511 2512 2521 2522 2539 2542 2592 2593 2640
2740 2751 2790 2813 2814 2822 2862 2864 2866 2869 2920
2930 2944 2945 2950 3091 3092 3101 3102 3600 3701 3702
3811 3812 3821 3822 3839 3900 4120 4211 4213 4221 4291
4292 4299 4312 4313 4319 4321 4322 4391 4399 4635 4661
4681 4682 4687 4721 4741 4743 4744 4784 4922 4923 4924
4929 4930 5012 5021 5030 5212 5221 5222 5223 5229 5231
5232 5239 5250 5310 5320 7719 7732 8011 8012 8020 8030
8121 8122 9420
ANEXO V<1>

RELAÇÃO DAS SITUAÇÕES QUE DÃO


DIREITO AO AUXÍLIO-ACIDENTE

QUADRO N. 1

Aparelho visual
Situações:
a) acuidade visual, após correção, igual ou inferior a 0,2 no olho acidentado;
b) acuidade visual, após correção, igual ou inferior a 0,5 em ambos os olhos,
quando ambos tiverem sido acidentados;
c) acuidade visual, após correção, igual ou inferior a 0,5 no olho acidentado,
quando a do outro olho for igual a 0,5 ou menos, após correção;
d) lesão da musculatura extrínseca do olho, acarretando paresia ou paralisia;
e) lesão bilateral das vias lacrimais, com ou sem fístulas, ou unilateral com fístula.
NOTA 1 — A acuidade visual restante é avaliada pela escala de Wecker, em
décimos, e após a correção por lentes.
NOTA 2 — A nubécula e o leucoma são analisados em função da redução da
acuidade ou do prejuízo estético que acarretam, de acordo com os quadros respectivos.

QUADRO N. 2

Aparelho auditivo
TRAUMA ACÚSTICO
a) perda da audição no ouvido acidentado;
b) redução da audição em grau médio ou superior em ambos os ouvidos, quando
os dois tiverem sido acidentados;
c) redução da audição, em grau médio ou superior, no ouvido acidentado, quando
a audição do outro estiver também reduzida em grau médio ou superior.
NOTA 1 — A capacidade auditiva em cada ouvido é avaliada mediante audiometria
apenas aérea, nas frequências de 500, 1.000, 2.000 e 3.000 Hertz.
NOTA 2 — A redução da audição, em cada ouvido, é avaliada pela média aritmética
dos valores, em decibéis, encontrados nas frequências de 500,1.000, 2.000 e 3.000
Hertz, segundo adaptação da classsificação de Davis & Silvermann, 1970.
Audição normal — até vinte e cinco decibéis;
Redução em grau mínimo — vinte e seis a quarenta decibéis;

(1) Relação constante do Anexo III do Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999. Regulamento
da Previdência Social.
536 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Redução em grau médio — quarenta e um a setenta decibéis;


Redução em grau máximo — setenta e um a noventa decibéis;
Perda de audição — mais de noventa decibéis.

QUADRO N. 3

Aparelho da fonação
Situação:
Perturbação da palavra em grau médio ou máximo, desde que comprovada por
métodos clínicos objetivos.

QUADRO N. 4

Prejuízo estético
Situações: Prejuízo estético, em grau médio ou máximo, quando atingidos crânios,
e/ou face, e/ou pescoço ou perda de dentes quando há também deformação da arcada
dentária que impede o uso de prótese.
NOTA 1 — Só é considerada como prejuízo estético a lesão que determina
apreciável modificação estética do segmento corpóreo atingido, acarretando aspecto
desagradável, tendo-se em conta sexo, idade e profissão do acidentado.
NOTA 2 — A perda anatômica de membro, a redução de movimentos articulares
ou a alteração da capacidade funcional de membro não são consideradas como prejuízo
estético, podendo, porém, ser enquadradas, se for o caso, nos quadros respectivos.

QUADRO N. 5

Perdas de segmentos de membros


Situações:
a) perda de segmento ao nível ou acima do carpo;
b) perda de segmento do primeiro quirodáctilo, desde que atingida a falange
proximal;
c) perda de segmentos de dois quirodáctilos, desde que atingida a falange proximal
em pelo menos um deles;
d) perda de segmento do segundo quirodáctilo, desde que atingida a falange
proximal;
e) perda de segmento de três ou mais falanges, de três ou mais quirodáctilos;
f) perda de segmento ao nível ou acima do tarso;
g) perda de segmento do primeiro pododáctilo, desde que atingida a falange
proximal;
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 537

h) perda de segmento de dois pododáctilos, desde que atingida a falange proximal


em ambos;
i) perda de segmento de três ou mais falanges, de três ou mais pododáctilos.
NOTA: Para efeito de enquadramento, a perda parcial de parte óssea de um
segmento eqüivale à perda do segmento. A perda parcial de partes moles sem perda
de parte óssea do segmento não é considerada para efeito de enquadramento.

QUADRO N. 6

Alterações articulares
Situações:
a) redução em grau médio ou superior dos movimentos da mandíbula;
b) redução em grau máximo dos movimentos do segmento cervical da coluna
vertebral;
c) redução em grau máximo dos movimentos do segmento lombo-sacro da coluna
vertebral;
d) redução em grau médio ou superior dos movimentos das articulações do ombro
ou do cotovelo;
e) redução em grau médio ou superior dos movimentos de pronação e/ou de
supinação do antebraço;
f) redução em grau máximo dos movimentos do primeiro e/ou do segundo
quirodáctilo, desde que atingidas as articulações metacarpo-falangeana e falange-
-falangeana;
g) redução em grau médio ou superior dos movimentos das articulações coxo-
-femural e/ou joelho, e/ou tíbio-társica.
NOTA 1 — Os graus de redução de movimentos articulares referidos neste quadro
são avaliados de acordo com os seguintes critérios:
Grau máximo: redução acima de dois terços da amplitude normal do movimento
da articulação;
Grau médio: redução de mais de um terço e até dois terços da amplitude normal
do movimento da articulação;
Grau mínimo: redução de até um terço da amplitude normal do movimento da
articulação.
NOTA 2 — A redução de movimentos do cotovelo, de pronação e supinação
do antebraço, punho, joelho e tíbio-társica, secundária a uma fratura de osso longo do
membro, consolidada em posição viciosa e com desvio de eixo, também é enquadra­
da dentro dos limites estabelecidos.
538 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

QUADRO N. 7

Encurtamento de membro inferior


Situação:
Encurtamento de mais de 4 cm (quatro centímetros).
NOTA: A preexistência de lesão de bacia deve ser considerada quando da avaliação
do encurtamento.

QUADRO N. 8

Redução da força e/ou da capacidade funcional dos membros


Situações:
a) redução da força e/ou da capacidade funcional da mão, do punho, do antebraço
ou de todo o membro superior em grau sofrível ou inferior da classificação de
desempenho muscular;
b) redução da força e/ou da capacidade funcional do primeiro quirodáctilo em
grau sofrível ou inferior;
c) redução da força e/ou da capacidade funcional do pé, da perna ou de todo o
membro inferior em grau sofrível ou inferior.
NOTA 1 — Esta cla ssifica ção se aplica a situações decorrentes de
comprometimento muscular ou neurológico. Não se aplica a alterações decorrentes
de lesões articulares ou de perdas anatômicas constantes dos quadros próprios.
NOTA 2 — Na avaliação de redução da força ou da capacidade funcional é utilizada
a classificação da carta de desempenho muscular da The National Foundation for
Infantile Paralysis, adotada pelas Sociedades Internacionais de Ortopedia e
Traumatologia, e a seguir transcrita:
Desempenho muscular
Grau 5 — Normal — cem por cento — Amplitude completa de movimento contra
a gravidade e contra grande resistência.
Grau 4 — Bom — setenta e cinco por cento — Amplitude completa de movimento
contra a gravidade e contra alguma resistência.
Grau 3 — Sofrível — cinqüenta por cento — Amplitude completa de movimento
contra a gravidade sem opor resistência.
Grau 2 — Pobre — vinte e cinco por cento — Amplitude completa de movimento
quando eliminada a gravidade.
Grau 1 — Traços — dez por cento — Evidência de leve contração. Nenhum
movimento articular.
Grau 0 (zero) — zero por cento — Nenhuma evidência de contração.
Grau E ou EG — zero por cento — Espasmo ou espasmo grave.
Grau C ou CG — Contratura ou contratura grave.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 539

NOTA — O enquadramento dos casos de grau sofrível ou inferior abrange, na


prática, os casos de redução em que há impossibilidade de movimento contra alguma
força de resistência além da força de gravidade.

QUADRO N. 9

Outros aparelhos e sistemas


Situações:
a) segmentectomia pulmonar que acarrete redução em grau médio ou superior
da capacidade funcional respiratória; devidamente correlacionada à sua atividade
laborativa;
b) perda do segmento do aparelho digestivo cuja localização ou extensão traz
repercussões sobre a nutrição e o estado geral.

DOENÇAS PROFISSIONAIS E AS DO TRABALHO

As doenças profissionais e as do trabalho, que após consolidações das lesões


resultem seqüelas permanentes com redução da capacidade de trabalho, deverão ser
enquadradas conforme o art. 104 deste Regulamento.
ANEXO VI
TABELA DA SUSEP PARA CÁLCULO DA INDENIZAÇÃO
EM CASO DE INVALIDEZ PERMANENTE™

Invalidez % Sobre
Discriminação Importância
Permanente
segurada
Perda total da visão de ambos os olhos 100
Perda total do uso de ambos os membros superiores 100
T Perda total do uso de ambos os membros inferiores 100
0 Perda total do uso de ambas as mãos 100
1 Perda total do uso de um membro superior e um membro 100
A inferior
L
Perda total do uso de uma das mãos e de um dos pés 100
Perda total do uso de ambos os pés 100
Alienação mental total e incurável 100
Perda total da visão de um olho 30
Perda total da visão de um olho, quando o segurado já 70
P
não tiver a outra vista
A
R Surdez total incurável de ambos os ouvidos 40
C Surdez total incurável de um dos ouvidos 20
I Mudez incurável 50
A
Fratura não consolidada do maxilar inferior 20
L
DIVERSOS Imobilidade do segmento cervical da coluna vertebral 20
Imobilidade do segmento tóraco-lombo-sacro da coluna 25
vertebral
Perda total do uso de um dos membros superiores 70
P
A Perda total do uso de uma das mãos 60
R Fratura não consolidada de um dos úmeros 50
C Fratura não consolidada de um dos segmentos rádio- 30
I -ulnares
A
Anquilose total de um dos ombros 25
L
MEMBROS Anquilose total de um dos cotovelos 25
SUPERIORES Anquilose total de um dos punhos 20

(1) Tabela instituída pela revogada Circular da Superintendência de Seguros Privados —


SUSEP n. 29, de 20 de dez. de 1991, mas que foi m antida em vigor pelo art. 110 da
Circular SUSEP n. 302, de 19 de setembro de 2005.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 541

% Sobre
Invalidez
Discriminação Importância
Permanente
segurada
Perda total do uso de um dos polegares, inclusive o 25
D metacarpiano
A Perda total do uso de um dos polegares, exclusive o 18
R metacarpiano
C
Perda total do uso da falange distai do polegar 9
I
A Perda total do uso de um dos dedos indicadores 15
L Perda total do uso de um dos dedos mínimos ou um dos 12
MEMBROS dedos médios
SUPERIORES Perda total do uso de um dos dedos anulares 9
Perda total do uso de qualquer falange, excluídas as do polegar:
indenização equivalente a 1/3 do valor do dedo respectivo
Perda total do uso de um dos membros inferiores 70
Perda total do uso de um dos pés 50
Fratura não consolidada de um fêmur 50
Fratura não consolidada de um dos segmentos tíbio- 25
-peroneiros
P Fratura não consolidada da rótula 20
A Fratura não consolidada de um pé 20
R Anquilose total de um dos joelhos 20
C
I Anquilose total de um dos tornozelos 20
A Anquilose total de um quadril 20
L Perda parcial de um dos pés, isto é, perda de todos os 25
MEMBROS dedos e de uma parte do mesmo pé
INFERIORES Amputação do 1s (primeiro) dedo 10
Amputação de qualquer outro dedo 3
Perda total do uso de uma falange do 12dedo, indenização equivalente
a 1/2, e dos demais dedos, equivalente a 1/3 do respectivo dedo
Encurtamento de um dos membros inferiores
de o (cinco) centímetros ou mais 15
de 4 (quatro) centímetros 10
de 3 (três) centímetros 6
Menos de 3 (três) centímetros : sem indenização
ANEXO VII

TABELA DA LEI N. 11.945/2009 PARA CÁLCULO DA INDENIZAÇÃO EM CASO


DE INVALIDEZ PERMANENTE DAS VÍTIMAS COBERTAS PELO SEGURO DPVAT

_ . n
Danos Corporais Totais Percentuali da
~i

Repercussão na íntegra do Patrimônio Físico Perda


Perda anatômica e/ou funcional completa de ambos os
membros superiores ou inferiores
Perda anatômica e/ou funcional completa de ambas as
mãos ou de ambos os pés
Perda anatômica e/ou funcional completa de um membro
superior e de um membro inferior
Perda completa da visão em ambos os olhos (cegueira
bilateral) ou cegueira legal bilateral
Lesões neurológicas que cursem com: (a) dano cognitivo- 100
-comportamental alienante; (b) impedimento do senso de
orientação espacial e/ou do livre deslocamento corporal;
(c) perda completa do controle esfincteriano; (d)
comprometimento de função vital ou autonômica
Lesões de órgãos e estruturas crânio-faciais, cervicais,
torácicos, abdominais, pélvicos ou retroperitoneais
cursando com prejuízos funcionais não compensáveis de
ordem autonômica, respiratória, cardiovascular, digestiva,
excretora ou de qualquer outra espécie, desde que haja
comprometimento de função vital
Danos Corporais Segmentares (Parciais)
Percentual da
Repercussões em Partes de Membros Superiores e
Perda
Inferiores
Perda anatômica e/ou funcional completa de um dos
membros superiores e/ou de uma das mãos
70
Perda anatômica e/ou funcional completa de um dos
membros inferiores;
Perda anatômica e/ou funcional completa de um dos pés 50
Perda completa da mobilidade de um dos ombros,
cotovelos, punhos ou dedo polegar; 25
Perda completa da mobilidade de um quadril, joelho ou
tornozelo
Perda anatômica e/ou funcional completa de qualquer um
dentre os outros dedos da mão;
10
Perda anatômica e/ou funcional completa de qualquer um
dos dedos do pé
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 543

Danos Corporais Segmentares (Parciais) Percentual da


Outras Repercussões em Órgãos e Estruturas Corporais Perda
Perda auditiva total bilateral (surdez completa) ou da
fonação (mudez completa) ou da visão de um olho 50

Perda completa da mobilidade de um segmento da coluna


25
vertebral exceto o sacral
Perda integral (retirada cirúrgica) do baço 10

Observação: Quando se tratar de invalidez permanente parcial incompleta, a


indenização será proporcional, correspondente a 75% para as perdas de repercussão
intensa, 50% para as perdas de média repercussão, 25% para as de leve repercussão e
de 10% para as seqüelas residuais (art. 3e, § 22, da Lei n. 6.194/1974).
ANEXO VIII

TABELAS DE EXPECTATIVA DE SOBREVIDA


NO BRASIL -1 ANO 2007

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — AMBOS OS SEXOS — 2007

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 62,9 35 41,7 58 22,5
13 61,9 36 40,8 59 21,8
14 60,9 37 39,9 60 21,1
15 59,9 38 39,0 61 20,3
16 59,0 39 38,1 62 19,6
17 58,0 40 37,2 63 18,9
18 57,1 41 36,4 64 18,3
19 56,2 42 35,5 65 17,6
20 55,3 43 34,6 66 16,9
21 54,3 44 33,8 67 16,3
22 53,4 45 32,9 68 15,6
23 52,5 46 32,1 69 15,0
24 51,6 47 31,2 70 14,4
25 50,7 48 30,4 71 13,8
26 49,8 49 29,6 72 13,3
27 48,9 50 28,8 73 12,7
28 48,0 51 27,9 74 12,2
29 47,1 52 27,1 75 11,7
30 46,2 53 26,3 76 11,2
31 45,3 54 25,6 77 10,7
32 44,4 55 24,8 78 10,3
33 43,5 56 24,0 79 9,9
34 42,6 57 23,3 80 ou mais 9,4

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2007.


I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 545

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — SEXO FEMININO — 2007

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 66,4 35 44,3 58 24,1
13 65,5 36 43,4 59 23,3
14 64,5 37 42,5 60 22,6
15 63,5 38 41,5 61 21,8
16 62,5 39 40,6 62 21,0
17 61,6 40 39,7 63 20,3
18 60,6 41 38,8 64 19,6
19 59,6 42 37,8 65 18,8
20 58,7 43 36,9 66 18,1
21 57,7 44 36,0 67 17,4
22 56,7 45 35,1 68 16,7
23 55,8 46 34,3 69 16,1
24 54,8 47 33,4 70 15,4
25 53,8 48 32,5 71 14,8
26 52,9 49 31,6 72 14,2
27 51,9 50 30,8 73 13,5
28 51,0 51 29,9 74 13,0
29 50,0 52 29,1 75 12,4
30 49,1 53 28,2 76 11,8
31 48,1 54 27,4 77 11,3
32 47,2 55 26,6 78 10,8
33 46,2 56 25,7 79 10,3
34 45,3 57 24,9 80 ou mais 9,9

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2007.


546 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — SEXO MASCULINO — 2007

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 59,3 35 38,9 58 20,7
13 58,4 36 38,1 59 20,1
14 57,4 37 37,2 60 19,4
15 56,4 38 36,4 61 18,7
16 55,5 39 35,5 62 18,1
17 54,6 40 34,7 63 17,4
18 53,7 41 33,9 64 16,8
19 52,8 42 33,0 65 16,2
20 51,9 43 32,2 66 15,6
21 51,0 44 31,4 67 15,0
22 50,2 45 30,6 68 14,4
23 49,3 46 29,8 69 13,8
24 48,4 47 29,0 70 13,3
25 47,6 48 28,2 71 12,7
26 46,7 49 27,4 72 12,2
27 45,8 50 26,6 73 11,8
28 45,0 51 25,9 74 11,3
29 44,1 52 25,1 75 10,8
30 43,2 53 24,3 76 10,4
31 42,4 54 23,6 77 10,0
32 41,5 55 22,9 78 9,6
33 40,7 56 22,1 79 9,2
34 39,8 57 21,4 80 ou mais 8,9

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2007.


ANEXO IX

TABELAS DE EXPECTATIVA DE SOBREVIDA


NO BRASIL — ANO 2008

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — AMBOS OS SEXOS — 2008

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 63,1 35 41,8 58 22,6
13 62,1 36 40,9 59 21,9
14 61,1 37 40,0 60 21,2
15 60,2 38 39,2 61 20,4
16 59,2 39 38,3 62 19,7
17 58,3 40 37,4 63 19,0
18 57,3 41 36,5 64 18,4
19 56,4 42 35,6 65 17,7
20 55,5 43 34,8 66 17,0
21 54,5 44 33,9 67 16,4
22 53,6 45 33,1 68 15,7
23 52,7 46 32,2 69 15,1
24 51,8 47 31,4 70 14,5
25 50,9 48 30,5 71 13,9
<10 49 29,7 13,4
27 49,1 50 28,9 73 12,8
28 48,2 51 28,1 74 12,3
29 47,3 52 27,3 75 11,8
30 46,4 53 26,5 76 11,3
31 45,5 54 25,7 77 10,8
32 44,5 55 24,9 78 10,3
33 43,6 56 24,1 79 9,9
34 42,7 57 23,4 80 ou mais 9,5

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2008.


548 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — SEXO FEMININO — 2008

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 66,7 35 44,5 58 24,3
13 65,7 36 43,6 59 23,5
14 64,7 37 42,6 60 22,47
15 63,7 38 41,7 61 21,9
16 62,7 39 40,8 62 21,2
17 61,8 40 39,8 63 20,4
18 60,8 41 38,9 64 19,7
19 59,8 42 38,0 65 19,0
20 58,9 43 37,1 66 18,2
21 57,9 44 36,2 67 17,5
22 56,9 45 35,3 68 16,8
23 56,0 46 34,4 69 16,2
24 55,0 47 33,5 70 15,5
25 54,0 48 32,7 71 14,9
26 53,1 49 31,8 72 14,2
27 52,1 50 30,9 73 13,6
28 51,2 51 30,1 74 13,0
29 50,2 52 29,2 75 12,5
30 49,2 53 28,4 76 11,9
31 48,3 54 27,5 77 11,4
32 47,3 55 26,7 78 10,9
33 46,4 56 25,9 79 10,4
34 45,5 57 25,1 80 ou mais 9,9

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2008.


I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 549

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — SEXO MASCULINO — 2008

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 59,6 35 39,1 58 20,8
13 58,6 36 38,2 59 20,1
14 57,6 37 37,4 60 19,5
15 56,7 38 36,5 61 18,8
16 55,7 39 35,7 62 18,1
17 54,8 40 34,8 63 17,5
18 53,9 41 34,0 64 16,9
19 53,0 42 33,2 65 16,2
20 52,1 43 32,3 66 15,6
21 51,2 44 31,5 67 15,0
22 50,4 45 30,7 68 14,4
23 49,5 46 29,9 69 13,9
24 48,6 47 29,1 70 13,3
25 47,8 48 28,3 71 12,8
26 46,9 49 27,5 72 12,3
27 46,0 50 26,7 73 11,8
28 45,2 51 26,0 74 11,3
29 44,3 52 25,2 75 10,9
30 43,4 53 24,4 76 10,4
31 42,6 54 23,7 77 10,0
32 41,7 55 23,0 78 9,6
33 40,8 56 22,2 79 9,3
34 40,0 57 21,5 80 ou mais 8,9

Fonte: Tábua com pleta de mortalidade - IBGE - 2008.


ANEXO X

TABELAS DE EXPECTATIVA DE SOBREVIDA


NO BRASIL — ANO 2009

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — AMBOS OS SEXOS — 2009

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 63,3 35 42,0 58 22,7
13 62,3 36 41,1 59 22,0
14 61,4 37 40,2 60 21,3
15 60,4 38 39,3 61 20,5
16 59,4 39 38,4 62 19,8
17 58,5 40 37,6 63 19,1
18 57,6 41 36,7 64 18,5
19 56,6 42 35,8 65 17,8
20 55,7 43 34,9 66 17,1
21 54,8 44 34,1 67 16,5
22 53,9 45 33,2 68 15,8
23 52,9 46 32,4 69 15,2
24 52,0 47 31,5 70 14,6
25 51,1 48 30,7 71 14,0
26 50,2 49 29,9 72 13,4
27 49,3 50 29,0 73 12,9
28 48,4 51 28,2 74 12,3
29 47,5 52 27,4 75 11,8
30 46,6 53 26,6 76 11,3
31 45,6 54 25,8 77 10,9
32 44,7 55 25,0 78 10,4
33 43,8 56 24,3 79 10,0
34 42,9 57 23,5 80 ou mais 9,6

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2009.


I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 551

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — SEXO FEMININO — 2009

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 66,9 35 44,7 58 24,4
13 65,9 36 43,8 59 23,6
14 64,9 37 42,8 60 22,8
15 63,9 38 41,9 61 22,1
16 63,0 39 41,0 62 21,3
17 62,0 40 40,0 63 20,5
18 61,0 41 39,1 64 19,8
19 60,0 42 38,2 65 19,1
20 59,1 43 37,3 66 18,4
21 58,1 44 36,4 67 17,6
22 57,1 45 35,5 68 17,0
23 56,2 46 34,6 69 16,3
24 55,2 47 33,7 70 15,6
25 54,2 48 32,8 71 15,0
26 53,3 49 32,0 72 14,3
27 52,3 50 31,1 73 13,7
28 51,4 51 30,2 74 13,1
29 50,4 52 29,4 75 12,6
30 49,5 53 28,5 76 12,0
31 48,5 54 27,7 77 11,5
32 47,5 55 26,9 78 11,0
33 46,6 56 26,0 79 10,5
34 45,7 57 25,2 80 ou mais 10,0

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2009.


552 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — SEXO MASCULINO — 2009

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 59,8 35 39,3 58 20,9
13 58,8 36 38,4 59 20,2
14 57,8 37 37,5 60 19,5
15 56,9 38 36,7 61 18,9
16 55,9 39 35,8 62 18,2
17 55,0 40 35,0 63 17,6
18 54,1 41 34,1 64 16,9
19 53,2 42 33,3 65 16,3
20 52,3 43 32,5 66 15,7
21 51,4 44 31,7 67 15,1
22 50,6 45 30,8 68 14,5
23 49,7 46 30,0 69 13,9
24 48,8 47 29,2 70 13,4
25 48,0 48 28,4 71 12,8
26 47,1 49 27,6 72 12,3
27 46,2 50 26,9 73 11,8
28 45,4 51 26,1 74 11,4
29 44,5 52 25,3 75 10,9
30 43,6 53 24,5 76 10,5
31 42,7 54 23,8 77 10,1
32 41,9 55 23,1 78 9,7
33 41,0 56 22,3 79 9,3
34 40,1 57 21,6 80 ou mais 9,0

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2009.


ANEXO XI

TABELAS DE EXPECTATIVA DE SOBREVIDA


NO BRASIL — ANO 2010

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL — AMBOS OS S E X O S i- 2010

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 bo,b 35 42,2 58 z ^ ,y
13 62,6 36 4 1,o 22,1
14 o i ,b O/ 40,4 60 ,4
15 60,6 38 39,5 61 20,7
16 59,7 39 38,6 62 19,9
17 oo, / 40 O/ , / 63 19,2
18 57,8 41 36,9 64 18,6
19 56,8 42 36,0 65 17,9
20 55,9 43 35,1 66 17,2
21 55,0 44 34,2 67 16,5
22 54,1 45 00,4 bo i o,y
tLÓ 53,2 4b 0^,0 69 15,3
24 52,3 47 31,7 70 14,7
25 51,3 48 30,8 71 14,1
5U,4 4y oU,U 72 13,5
27 49,5 50 73 12,9
28 48,6 51 28,4 /4 12,4
29 47,7 52 tLl ,o 75 l i ,y
30 46,8 53 26,7 76 11,4
31 45,8 54 25,9 77 10,9
32 44,9 55 25,2 78 10,5
33 44,0 56 24,4 79 10,0
34 43,1 57 23,6 80 ou mais 9,6

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2010.


554 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO BRASIL SEXO FEMININO — 2010

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 67,1 35 44,9 58 24,6
13 66,1 36 44,0 59 23,8
14 65,1 37 43,0 60 23,0
15 64,2 38 42,1 61 22,2
16 63,2 39 41,2 62 21,4
17 62,2 40 40,2 63 20,7
18 61,2 41 39,3 64 19,9
19 60,3 42 38,4 65 19,2
20 59,3 43 37,5 66 18,5
21 58,3 44 36,6 67 17,8
22 57,4 45 35,7 68 17,1
23 34,8 16,4
24 55,4 47 33,9 70 15,7
25 54,5 48 33,0 71 15,1
26 53,5 49 32,1 72 14,4
52,5 31,2 73 13,8
28 51,6 51 30,4 74 13,2
oU,b DtL 29,5 75 12,6
30 49,7 53 28,7 76 12,1
31 48,7 54 27,8 77 11,5
32 47,7 55 27,0 78 11,0
33 46,8 56 26,2 79 10,5
34 45,9 57 25,4 80 ou mais 10,1

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2010.


I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 555

EXPECTATIVA DE SOBREVIDA NO B R A SIL— SEXO MASCULINO — 2010

Idade Expectativa de Idade Expectativa Idade Expectativa


exata em sobrevida em exata em de sobrevida exata em de sobrevida
anos anos anos em anos anos em anos
12 60,0 35 39,4 58 21,0
13 59,1 36 38,6 59 20,3
14 58,1 37 37,7 60 19,6
15 57,1 38 36,9 61 19,0
16 56,2 39 36,0 62 18,3
17 55,3 40 35,1 63 17,6
18 54,3 41 34,3 64 17,0
19 53,4 42 33,5 65 16,4
20 52,6 43 32,6 66 15,7
21 51,7 44 31,8 67 15,1
22 50,8 45 31,0 68 14,6
23 49,9 46 30,2 69 14,0
24 49,1 47 29,4 70 13,4
25 48,2 48 28,6 71 12,9
26 47,3 49 27,8 72 12,4
27 46,4 50 27,0 73 11,9
28 45,6 51 26,2 74 11,4
29 44,7 52 25,4 75 11,0
30 43,8 53 24,7 76 10,5
31 42,9 54 23,9 77 10,1
32 42,1 55 23,2 78 9,7
33 41,2 56 22,4 79 9,4
34 40,3 57 21,7 80 ou mais 9,0

Fonte: Tábua completa de mortalidade — IBGE — 2010.


ANEXO XII
ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO DO CONFLITO DE COMPETÊNCIA
N. 7.204-1, JULGADO PELO PLENO DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL, NO DIA 29 DE JUNHO DE 2005

Ementa: Constitucional. Competência judicante em razão da matéria. Ação


de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente
do trabalho, proposta pelo empregado em face de seu (ex-)empregador.
Competência da Justiça do Trabalho. Art. 114 Da Magna Carta. Redação
anterior e posterior à Emenda Constitucional n. 45/04. Evolução da juris­
prudência do Supremo Tribunal Federal. Processos em curso na Justiça
Comum dos Estados. Imperativo de política judiciária.
1. Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro, o
Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações de indenização por danos
morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, ainda que movidas
pelo empregado contra seu (ex-)empregador, eram da competência da Justiça
comum dos Estados-Membros.
2. Revisando a matéria, porém, o Plenário concluiu que a Lei Republicana de
1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja porque o art. 114, já
em sua redação originária, assim deixava transparecer, seja porque aquela pri­
meira interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa verdade,
influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte sob a égide das Constitui­
ções anteriores.
3. Nada obstante, como imperativo de política judiciária — haja vista o significa­
tivo número de ações que já tramitaram e ainda tramitam nas instâncias ordiná­
rias, bem como o relevante interesse social em causa — , o Plenário decidiu, por
maioria, que o marco temporal da competência da Justiça trabalhista é o advento
da EC 45/04. Emenda que explicitou a competência da Justiça Laboral na maté­
ria em apreço.
4. A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça comum esta­
dual, desde que pendentes de julgamento de mérito. É dizer: as ações que trami­
tam perante a Justiça comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à
promulgação da EC 45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente
execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi apreciado, hão de ser remetidas
à Justiça do Trabalho, no estado em que se encontram, com total aproveitamento
dos atos praticados até então. A medida se impõe, em razão das características
que distinguem a Justiça comum estadual e a Justiça do Trabalho, cujos sistemas
recursais, órgãos e instâncias não guardam exata correlação.
5. O Supremo Tribunal Federal, guardião-mor da Constituição Republicana, pode
e deve, em prol da segurança jurídica, atribuir eficácia prospectiva às suas deci-
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 557

sões, com a delimitação precisa dos respectivos efeitos, toda vez que proceder
a revisões de jurisprudência definidora de competência ex ratione materiae. O
escopo é preservar os jurisdicionados de alterações jurisprudenciais que ocor­
ram sem mudança formal do Magno Texto.
6. Aplicação do precedente consubstanciado no julgamento do Inquérito 687,
Sessão Pienária de 25.08.99, ocasião em que foi cancelada a Súmula 394 do
STF, por incompatível com a Constituição de 1988, ressalvadas as decisões
proferidas na vigência do verbete.
7. Conflito de competência que se resolve, no caso, com o retorno dos autos ao
Tribunal Superior do Trabalho.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer do conflito e, por maioria,
definir a competência da justiça trabalhista a partir da Emenda Constitucional n. 45/
2004, para julgamento das ações de indenização por danos morais e patrimoniais
decorrentes de acidente de trabalho, vencido, no caso, o Senhor Ministro Marco Auré­
lio, na medida em que não estabelecia a edição da emenda constitucional como mar­
co temporal para competência da justiça trabalhista. Votou a Presidente.
Brasília, 29 de junho de 2005.
Ellen Gracie — Presidente.
Carlos Ayres Britto — Relator.
RELATÓRIO
O Senhor Ministro Carlos Ayres Britto (Relator)
Trata-se de conflito negativo de competência, suscitado pelo Tribunal Superior do
Trabalho em face do recentemente extinto Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais.
2. Por meio dele, conflito, discute-se a competência para processar e julgar ação
indenizatória por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, quando
tal ação é proposta por empregado contra o seu empregador. Donde a controvérsia:
competente é a Justiça comum estadual, ou a Justiça especializada do trabalho?
3. Pois bem, o fato é que Vicente Giacomini Perón ajuizou, na Justiça do Trabalho e
contra o então Banco do Estado de Minas Gerais/BEMGE, ação de indenização por
motivo de doença profissional. O que levou a Junta de Conciliação e Julgamento de Ubá/MG
a se dar por incompetente e determinar a remessa dos autos a uma das Varas Cíveis
daquela mesma Comarca. Pelo que a Justiça estadual julgou o pedido parcialmente pro­
cedente, resultando daí a interposição de recurso de apelação pelo Banco demandado.
4. Acontece que, ao apreciar o apelatório, o Tribunal de Alçada de Minas Gerais
declinou de sua competência e determinou a devolução dos autos à Junta de Concilia­
ção e Julgamento de Ubá/MG. Esta última, agora sim, aceitou o processamento da
ação e, também ela, julgou parcialmente procedente o pedido do autor. Fato que ense­
jou a interposição de recurso ordinário — apenas parcialmente provido pelo TRT/3®
Região — e, posteriormente, recurso de revista.
558 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

5. Foi quando, na análise desta última impugnação, a 5- Turma do egrégio Tribu-


nal Superior do Trabalho reconheceu a incompetência da Justiça especial, de maneira
a suscitar o presente conflito negativo de competência (tendo em vista a recusa ante­
riormente externada pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais).
6. Prossigo neste relato para consignar que o Ministério Público Federal opinou
pela procedência da suscitação, em parecer assim ementado:
“Conflito negativo de competência. Quinta Turma do TST e Tribunal de Alçada
de Minas Gerais. Ação de indenização por danos materiais e morais decorren­
tes de acidente de trabalho. Art. 109, Inciso I, DA CF, e Art. 114, da CF, com a
nova redação dada pela emenda constitucional n. 45/2004. Remanesce a com­
petência da Justiça Estadual para julgar ação indenizatória fundada em acidente
de trabalho. Precedentes. Parecer pelo conhecimento do conflito, para que se
declare competente a Justiça Comum Estadual” .
É o relatório, que submeto ao egrégio Plenário desta Casa (RI/STF, art. 6° inciso I, “d”).
VOTO
O Senhor Ministro Carlos Ayres Britto (Relator) — Conforme visto, a questão que
se põe neste conflito consiste em saber a quem compete processar e julgar as ações
de reparação de danos morais e patrimoniais advindos do acidente do trabalho. Ações
propostas pelo empregado em face de seu empregador, de sorte a provocar o seguinte
questionamento: a competência é da Justiça comum estadual, segundo concluiu o
órgão suscitante (TST), ou é da Justiça Obreira, como entendeu o suscitado (antigo
Tribunal de Alçada de Minas Gerais)?
9. Começo por responder que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal pro­
clama a competência da Justiça trabalhista para o conhecimento das ações indeniza­
tórias por danos morais decorrentes da relação de emprego. Pouco importando se
a controvérsia comporta resolução à luz do Direito Comum, e não do Direito do Trabalho.
Todavia, desse entendimento o STF vem excluindo as ações reparadoras de
danos morais, fundadas em acidente do trabalho (ainda que movidas pelo empre­
gado contra seu empregador), para incluí-las na competência da Justiça comum dos
Estados. Isso por conta do inciso I do art. 109 da Constituição Republicana. Foi o que
o Tribunal Pleno decidiu, por maioria de votos, quando do julgamento do RE 438.639,
Sessão do dia 09.03.2005, na qual fiquei vencido, como Relator, na companhia do
eminente Ministro Marco Aurélio.
10. Nada obstante, valendo-me do art. 62 do Regimento Interno da Casa, trago o
presente conflito ao conhecimento deste colendo Plenário para rediscutir a matéria. É
que, a meu sentir, a norma que se colhe do inciso I do art. 109 da Lei das Leis não
autoriza concluir que a Justiça comum estadual detém competência para apreciar as
ações que o empregado propõe contra o seu empregador, pleiteando reparação por
danos morais ou patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho. É dizer: quanto
mais reflito sobre a questão, mais me convenço de que a primeira parte do dispositivo
constitucional determina mesmo que compete aos juizes federais processar e julgar
“as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem
interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes... ”. Mas esta é
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 559

apenas a regra geral, plasmada segundo o critério de distribuição de competência em


razão da pessoa. Impõe-se atentar para a segunda parte do inciso, assim vocalizada:
"... exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral
e à Justiça do Trabalho". E esta segunda parte, como exceção que é, deve ser com­
preendida no contexto significante daquela primeira, consubstanciadora de regra ge­
ral. Em discurso quiçá mais elucidativo: à luz da segunda parte do inciso I do art. 109
da Constituição Federal, tem-se que as causas de acidente do trabalho em que a União,
entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas, na condição de
autora, ré, assistente ou oponente, não são da competência dos juizes federais.
11. Remarque-se, então, que as causas de acidente do trabalho, excepcional­
mente excluídas da competência dos juizes federais, só podem ser as chamadas
ações acidentárias. Ações, como sabido, movidas pelo segurado contra o INSS, a fim
de discutir questão atinente a benefício previdenciário. Logo, feitos em que se faz
presente interesse de uma autarquia federal, é certo, mas que, por exceção, se deslo­
cam para a competência da Justiça comum dos Estados. Por que não repetir? Tais
ações, expressamente excluídas da competência dos juizes federais, passam a caber
à Justiça comum dos Estados, segundo o critério residual de distribuição de compe­
tência. Tudo conforme serena jurisprudência desta nossa Corte de Justiça, cristaliza­
da no enunciado da Súmula 501.
12. Outra, porém, é a hipótese das ações reparadoras de danos oriundos de
acidente do trabalho, quando ajuizadas pelo empregado contra o seu emprega­
dor. Não contra o INSS. É que, agora, não há interesse da União, nem de entidade
autárquica ou de empresa pública federal, a menos, claro, que uma delas esteja na
condição de empregadora. O interesse, reitere-se, apenas diz respeito ao empregado
e seu empregador. Sendo desses dois únicos protagonistas a legitimidade processual
para figurar nos polos ativo e passivo da ação, respectivamente. Razão bastante para
se perceber que a regra geral veiculada pela primeira parte do inciso I do art. 109 da Lei
M aior------ definidora de competência em razão da pessoa que integre a lide — não
tem como ser erigida a norma de incidência, visto que ela não trata de relação jurídica
entre empregados e empregadores. Já a parte final do inciso I do art. 109 da Magna
Carta, segundo demonstrado, cuida é de outra coisa: excepcionar as hipóteses em
que a competência seria da própria Justiça Federal.
13. Deveras, se a vontade objetiva do Magno Texto fosse excluir da competência
da Justiça do Trabalho matéria ontologicamente afeita a ela, Justiça Obreira, certa­
mente que o faria no próprio âmbito do art. 114. Jamais no contexto do art. 109,
versante, este último, sobre competência de uma outra categoria de juizes.
14. Noutro modo de dizer as coisas, não se encaixando em nenhuma das duas
partes do inciso I do art. 109 as ações reparadoras de danos resultantes de acidente
do trabalho, em que locus da Constituição elas encontrariam sua específica norma de
regência? Justamente no art. 114, que proclama a competência da Justiça especial
aqui tantas vezes encarecida. Competência que de pronto se define pelo exclusivo fato
de o litígio eclodir entre trabalhadores e empregadores, como figura logo no início do
texto normativo em foco. E já me antecipando, ajuízo que a nova redação que a EC n.
45/04 conferiu a esse dispositivo, para abrir significativamente o leque das competên­
cias da Justiça Laboral em razão da matéria, só veio robustecer o entendimento aqui
esposado.
560 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

15. Com efeito, estabelecia o caput do art. 114, em sua redação anterior, que era
da Justiça do Trabalho a competência para conciliar e julgar os dissídios individuais e
coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias
decorrentes da relação de trabalho. Ora, um acidente de trabalho é fato ínsito à
interação trabalhador/empregador. A causa e seu efeito. Porque sem o vínculo traba­
lhista o infortúnio não se configuraria; ou seja, o acidente só é acidente de trabalho se
ocorre no próprio âmago da relação laboral. A possibilitar a deflagração de efeitos
morais e patrimoniais imputáveis à responsabilidade do empregador, em regra, ora por
conduta comissiva, ora por comportamento omissivo.
16. Como de fácil percepção, para se aferir os próprios elementos do ilícito,
sobretudo a culpa e o nexo causal, é imprescindível que se esteja mais próximo do dia
a dia da complexa realidade laboral. Aspecto em que avulta a especialização mesma
de que se revestem os órgãos judicantes de índole trabalhista. É como dizer: órgãos
que se debruçam cotidianamente sobre os fatos atinentes à relação de emprego (mui­
tas vezes quanto à própria existência dela) e que por isso mesmo detêm melhores
condições para apreciar toda a trama dos delicados aspectos objetivos e subjetivos
que permeiam a relação de emprego. Daí o conteúdo semântico da Súmula 736, deste
Excelso Pretório, assim didaticamente legendada: “Compete à Justiça do Trabalho
julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas traba­
lhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores”.
17. Em resumo, a relação de trabalho é a invariável matriz das controvérsias que
se instauram entre trabalhadores e empregadores. Já a matéria genuinamente aciden­
tária, voltada para o benefício previdenciário correspondente, é de ser discutida com o
INSS, perante a Justiça comum dos Estados, por aplicação da norma residual que se
extrai do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro.
18. Nesse rumo de ideias, renove-se a proposição de que a nova redação do art.
114 da Lex Maxima só veio aclarar, expletivamente, a interpretação aqui perfilhada.
Pois a Justiça do Trabalho, que já era competente para conciliar e julgar os dissídios
individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras
controvérsias decorrentes da relação trabalhista, agora é confirmativamente com­
petente para processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patri­
monial, decorrentes da relação de trabalho (inciso VI do art. 114).
19. Acresce que a norma fundamental do inciso IV do art. 1Qda Constituição
Republicana ganha especificação trabalhista em vários dispositivos do art. 7e, como o
que prevê a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde,
higiene e segurança (inciso XXII), e o que impõe a obrigação do seguro contra
acidente do trabalho, sem prejuízo, note-se, da indenização por motivo de
conduta dolosa ou culposa do empregador (inciso XXVIII). Vale dizer, o direito à
indenização em caso de acidente de trabalho, quando o empregador incorrer em dolo
ou culpa, vem enumerado no art. 7- da Lei Maior como autêntico direito trabalhista. E
como todo direito trabalhista, é de ser tutelado pela Justiça especial, até porque des-
frutável às custas do empregador (nos expressos dizeres da Constituição).
20. Tudo comprova, portanto, que a longa enunciação dos direitos trabalhistas
veiculados pelo art. 7- da Constituição parte de um pressuposto lógico: a hipossufi-
ciência do trabalhador perante seu empregador. A exigir, assim, interpretação extensiva
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 561

ou ampliativa, de sorte a autorizar o juízo de que, ante duas defensáveis exegeses do


texto constitucional (art. 114, como penso, ou art. 109, inciso I, como tem entendido
esta Casa), deve-se optar pela que prestigia a competência especializada da Justiça
do Trabalho.
21. Por todo o exposto, e forte no art. 114 da Lei Maior (redações anterior e
posterior à EC 45/04), concluo que não se pode excluir da competência da Justiça
Laboral as ações de reparação de danos morais e patrimoniais decorrentes de
acidente de trabalho, propostas pelo empregado contra o empregador. Menos
ainda para incluí-las na competência da Justiça comum estadual, com base no inciso
I do art. 109 da Carta de Outubro.
22. No caso, pois, julgo improcedente este conflito de competência e determino
o retorno dos autos ao egrégio Tribunal Superior do Trabalho, para que proceda ao
julgamento do recurso de revista manejado pelo empregador.
23. É o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso — Senhora Presidente, na verdade não há falar em
procedência ou improcedência. Sugiro: conheço do conflito e dou pela competência da
Justiça do Trabalho.
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — Pode ser também assim.
O Sr. Ministro Carlos Velloso — Esta parece-me ser, tecnicamente, a melhor.
O Sr. Ministro Marco Aurélio — Quando o conflito seria procedente?
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente) — Seria procedente se o conflito fosse
positivo.
RETIFICAÇÃO DE VOTO
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — Acho melhor essa forma sugerida pelo
Ministro Carlos Velloso. Perfeito, conheço do conflito para determinar o retorno dos
autos ao egrégio Tribunal Superior do Trabalho a fim de que proceda ao julgamento do
recurso.
VOTO
O Senhor Ministro Cezar Peluso — Senhor Presidente, peço vênia aos eminen­
tes Ministros, especialmente aos que me antecedem, tendo em conta que, no julga­
mento do Recurso Extraordinário n. 438.639/MG, julgado no dia 9 de março último,
insisti muito sobre a conclusão que, afinal, foi adotada pela Corte, contra os votos dos
eminentes Ministros Relator e Marco Aurélio.
Recebi, depois, um trabalho muito bem fundamentado e muito bem documentado
de um juiz do TRT de Minas Gerais, Dr. Sebastião Geraldo de Oliveira, cujas conside­
rações levaram-me a rever aquela posição. E tal posição, que teve modesta influência
no teor do acórdão, baseou-se no princípio fundamental da chamada unidade de con­
vicção, segundo o qual, por conta dos graves riscos de decisões contraditórias, sem­
pre ininteligíveis para os jurisdicionados e depreciativas para a Justiça, não convém
562 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

que causas, com pedidos e qualificações jurídicos diversos, mas fundadas no mesmo
fato histórico, sejam decididas por juízos diferentes. O princípio, a meu ver, é irretocá-
vel e ainda é o que deve presidir a solução da questão da competência neste caso.
Mas parece-me que, conforme propôs o eminente Ministro-Relator, deva ser ou­
tra a resposta que promana daquele princípio.
É que a revisão do tema me convenceu de que tanto as ações acidentárias,
evidentemente oriundas de relação de trabalho, como, sem exceção, todas as demais
ações resultantes de relação de trabalho, devam, em nome do mesmo princípio, ser
atribuídas à Justiça do Trabalho. A especialização e a universalidade desta já reco­
mendariam, quando menos em teoria, tal solução, por razões mais que óbvias, como
acabou de demonstrar o voto do eminente Ministro Carlos Britto.
Pesaram-me, sobretudo, duas outras ordens de consideração.
A primeira, porque o que dava suporte constitucional à jurisprudência da Corte
quanto à competência da Justiça estadual para as ações de acidente do trabalho, à
luz da Constituição atual, era menos o fato de nesta já não constar norma expressa
equivalente às prescrições do art. 123, § 1s, da Constituição de 1946, e do art. 142, §
2-, da Constituição de 1967, os quais atribuíam aquelas causas à Justiça ordinária dos
Estados, do que o fato de tirar-se do artigo 109, caput, da Constituição vigente, por
exclusão hermenêutica, igual consequência normativa.
Antes da Emenda n. 45, parecia deveras consistente a leitura de que, se estavam
excetuadas da competência da Justiça Federal as causas de acidente do trabalho, em
que sempre é interessada autarquia federal, só podiam elas caber na competência da
Justiça dos Estados, porque a mesma norma as excluía das que eram, por outras
regras, sujeitas à Justiça do Trabalho.
Mas, de lá para cá, a evolução da legislação acidentária, sobretudo com a equi­
paração dos valores dos benefícios acidentários e previdenciários, e a disseminação
dos órgãos da Justiça trabalhista, competentes para tantas outras causas ligadas à
própria segurança do trabalho, desenharam nova realidade judiciária, que as próprias
exigências da unidade de convicção e da especialização de conhecimentos não pode­
riam deixar de considerar nas perspectivas da revisão daquela exceção constitucional.
Isso, sem cogitar da necessidade de coerência axiológica que impunha a vigente Cons­
tituição da República, ao conceber a indenização acidentária como direito típico da
condição jurídica do empregado e, portanto, como irradiação da relação de trabalho,
como se vê ao art. 7-, inc. XXVIII, da mesma Constituição.
É, portanto, dentro desse quadro, que há de interpretar-se a Emenda n. 45, quan­
do, explicitando, no inc. I do art. 114, o caráter geral da competência da Justiça do
Trabalho, nela incluiu todas as ações oriundas da relação de trabalho.
Suposto não tenha sido essa a intenção do constituinte derivado, a cujo olhar
atento não poderia escapar a necessidade de, para guardar congruência com o even­
tual propósito de submissão das causas de acidente de trabalho àquela Justiça espe­
cializada, dar nova redação ao artigo 109, caput— para evitar dúvidas — , de modo
algum pode esquivar-se, diante do papel precário e relativo do material histórico e das
correlatas intenções do legislador, a conclusão de que outra há de ser a leitura da
norma que excepciona as ações acidentárias da competência da Justiça Federal.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 563

O que com isso pretendo dizer é que, perante a novidade representada pelos
termos da Emenda n. 45, em particular pela redação introduzida no inc. I do art. 114,
deve o art. 109, caput, significar apenas que as ações de acidente do trabalho não são
da competência da Justiça Federal e, por conseguinte, que a sede dessa competência
deve buscar-se alhures, agora designadamente no próprio art. 114, queaaçambarcou.
Essa interpretação acomoda ambas as cláusulas constitucionais, reverencia a
especialização e a funcionalidade da Justiça do Trabalho, alivia a Justiça estadual e
sustenta-se na necessária unidade de convicção, sem esvaziar o disposto no inc. VI,
onde apenas se divisa a positivação, mediante relevo destinado a superar todas as
dúvidas, da jurisprudência desta Corte, que, sob a redação original do art. 114, caput,
entendia — a meu ver, com indiscutível acerto — que, para efeito dessa competência
distribuída com apoio em vários princípios, entre os quais o da unidade de convicção,
era e é irrelevante a província taxinômica das normas aplicáveis ao caso, se direito
trabalhista ou civil, e, pois, também a natureza mesma da responsabilidade, se nego­
cial ou aquiliana.
Essa conjugação conduz, portanto, a meu ver, ao seguinte resultado prático:
são, agora, da competência exclusiva da Justiça do Trabalho todas as ações oriundas
da relação de trabalho, sem exceção alguma, trate-se de ações acidentárias típicas
ou de indenização de outra espécie e de outro título.
Senhor Presidente, a única objeção que me ocorreria, na hipótese, é que tal
exegese poderia, eventualmente, implicar sobrecarga à Justiça do Trabalho. Mas as
considerações daquele eminente Juiz trabalhista mineiro provaram que, sobretudo
depois da equiparação dos valores dos benefícios acidentários e dos benefícios previ­
denciários, cuja diferença justificava que os empregados recorressem às ações aciden­
tárias, estas são hoje raras, e a sua transferência não vai agravar a Justiça do Trabalho.
Com essa proposta, acompanho o voto do eminente Relator, para declarar que
todas as ações de indenização resultantes de relação do trabalho, inclusive as aciden­
tárias típicas, são da competência da Justiça do Trabalho.
VOTO
DEBATE
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — Gostaria de trazer ao Tribunal uma
preocupação. No mérito também me convenci da necessidade da revisão do entendi­
mento majoritário do RE 438639: o Ministro Cezar Peluso mesmo acaba de nobremen­
te reconhecer que as razões do seu voto naquele precedente — que pelo menos a mim
haviam convencido efetivamente — não procediam: seja sob prisma da unidade de
convicção, seja sob aquele de política judiciária, ao qual nos referimos.
O excelente trabalho de amicus curiae do ilustre magistrado Sebastião Geraldo
de Oliveira me fez despertar para que, há muitos anos, não ouvia falar, aqui no Distrito
Federal — das minhas origens forenses — , sobre a Vara de Acidentes de Trabalho.
Simplesmente porque ela desapareceu, em razão deste fato econômico que S.Exa.
realça: a equiparação do benefício previdenciário à indenização tarifada do acidente de
trabalho. Isso fez com que a ação acidentária contra o INSS sirva hoje, na maioria das
vezes, apenas ao trabalhador informal, porque o trabalhador formal terá igual cobertura
do sistema previdenciário.
564 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

Agora, preocupa-me o problema intertemporal. Vamos decidir assim, em recurso


extraordinário, mesmo em casos anteriores à emenda constitucional?
Vejam bem: alguns Tribunais de Alçada mudaram a sua orientação em face da
nossa jurisprudência anterior, que afirmava, na hipótese, a competência da Justiça
comum estadual. Realmente me angustia, em ações do tipo “acidente de trabalho”,
destruir, em recurso extraordinário, todo um processo feito para fazer tudo recomeçar,
quando se seguira a orientação jurisprudencial do Supremo ao tempo.
Então, embora não tenha objeções — aqui, revendo a minha convicção anterior-
de que, mesmo anteriormente à EC 45, caberia decidir pela competência da Justiça do
Trabalho, estou em que se há de evitar que a nossa viragem jurisprudencial de hoje atinja
os processos anteriores em que se haja observado o nosso entendimento de então.
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — O meu voto é nesse sentido.
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — Creio que, pelo menos na jurisdição
do recurso extraordinário, deveríamos deixar claro que aplicaremos a jurisprudência
anterior.
Coloco o problema para o Tribunal.
O Sr. Ministro Carlos Velloso — Esta decisão tomada aqui terá efeito ex nunc,
não é verdade?
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — Sim, o que já temos firmado em maté­
ria de competência.
O Senhor Ministro Gilmar Mendes — De certa forma, em outros casos muda-se
de orientação.
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — Lembro o caso do cancelamento da
Súmula n. 394 (Inq. 687), quando o Tribunal ressalvou da nova orientação os proces­
sos anteriormente julgados, numericamente, muito menos do que os de acidentes
de trabalho.
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — Então aplicaremos o efeito ex nunc a
nossa decisão?
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente) — Ressalvam-se os atos praticados. O
que foi praticado perante a Justiça comum segue valendo.
O Sr. Ministro Carlos Velloso - Devem existir dezenas de recursos extraordinários.
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence - O que está nas instâncias ordinárias,
temos de decidir— e estou de acordo com o eminente Relator— que a nova orientação,
reforçada pela Emenda Constitucional n. 45, é de aplicar-se imediatamente. Agora, na
instância extraordinária, aplicaremos a jurisprudência antiga sobre os casos pendentes.
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente) — Há ainda o problema, Ministro Sepúlve­
da Pertence, de termos súmula a esse respeito, teria de ser proposta a revisão da Súmula
n. 235. Seria o caso de o eminente Relator, desde logo, propor o seu cancelamento.
Gostaria de colher o voto do Ministro Eros Grau, até porque Sua Excelência é
Relator do precedente exatamente em sentido contrário, o RE n. 394.943.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 565

O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — A Súmula é anterior. Vossa Excelên­


cia citou a mudança a partir de quando a Constituição deixou de ser explícita no
estabelecer que competia à Justiça estadual, como nos textos de 1946 e 1967. Ela
está prejudicada, é apenas anotar nas novas edições.
O Senhor Ministro Gilmar Mendes — Mas é bom dizer.
VOTO
O Senhor Ministro Eros Grau — Senhora Presidente, também fiquei extrema­
mente impressionado com esse trabalho, que chegou às minhas mãos de um juiz do
Trabalho, e desejo reformular a minha posição para, a exemplo do que fez o Ministro
Carlos Velloso, acompanhar o Ministro Carlos Britto.
Quero, ainda, relembrar o fato de que na Primeira Turma, quando se decidiu esse
caso, havia uma preocupação muito grande no sentido de não tornar nulo um longuís-
simo processo. De modo que estou muito sensibilizado pela preocupação do Ministro
Sepúlveda Pertence com relação aos efeitos.
Acompanho o voto do Ministro-Relator.
VOTO
O Senhor Ministro Gilmar Mendes — Senhor Presidente, na assentada em que
se proferiu a decisão no outro sentido, eu tinha me manifestado, a priori, preocupado
com o esvaziamento do texto constitucional ex novo, uma vez que estávamos a dizer,
de certa forma, que, a despeito da mudança constitucional, haveria de se fazer, pelo
menos, uma interpretação e, talvez, uma redução teleológica. Isso foi até observado
no voto do Ministro Marco Aurélio.
Agora, gostaria de fazer um outro registro da importância da abertura processual
no âmbito da jurisdição constitucional. Antes de receber esse trabalho, tive oportuni­
dade de conversar com o Dr. Sebastião de Oliveira e ele fez uma série de considera­
ções que, a meu ver, invalidavam as premissas fático-jurídicas daquela decisão. À
época, tive oportunidade de dizer-lhe: lamentavelmente o senhor não apresentou um
memorial ou não se habilitou como amicus curiae perante o Tribunal. Por isso, gosta­
ria de ressaltar a importância dessas considerações sobre aquilo que hoje chamamos
os fatos, nome iurí generícus, legislativos no âmbito da jurisdição constitucional. Já o
disse o Ministro Cezar Peluso quanto às premissas equivocadas, o Ministro Sepúlve­
da Pertence também tinha feito considerações a propósito de política judiciária como
um instrumento decisivo para a formulação de um juízo sobre competência. Na época,
o Dr. Sebastião de Oliveira até observava que também o Ministro Carlos Velloso labo­
rara em equívoco ao considerar que não havia varas trabalhistas suficientes. Até mes­
mo em relação ao Estado de Minas Gerais, o Ministro Carlos Velloso se equivocou,
porque hoje há, sem dúvida, uma maior democratização.
Portanto, essa relação fatos e normas, essa relação intrincada, é extremamente
relevante e mostra a necessidade dessa abertura processual e procedimental, em
sede de ADI.
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — É um caso em que devíamos ter aberto
uma instrução, pelo menos, estatística.
566 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

O Senhor Ministro Gilmar Mendes — Isso já foi destacado no belíssimo voto do


Ministro Celso de Mello, em outra oportunidade, sobre a importância do amicus curiae,
mas gostaria de fazer esse registro porque este caso me parece emblemático, por
todas as considerações feitas naquele caso da importância de um julgamento devida­
mente informado, que pode levar a resultados outros. Isso é célebre nos Estados
Unidos, a partir do chamado Brandeis Bríef, em 1908, que focava exatamente esses
fatos. Na Alemanha, tem também sido objeto de tanta consideração.
Só gostaria, portanto, de fazer esse breve e pequeno registro, essa nota de pé de
página, tendo em vista o prosseguimento dessas nossas cogitações em torno dos
chamados fatos e prognoses legislativos.
O Senhor Ministro Marco Aurélio — Senhora Presidenta, quando do pronuncia­
mento anterior, tivemos um escore que poderia enquadrar como acachapante. E ouvi
vozes cogitando, até mesmo, da edição da primeira súmula vinculante a versar a ópti­
ca da maioria.
Talvez a evolução que ocorre hoje, em um espaço de tempo que diria até diminu­
to, sirva a uma reflexão maior quanto à necessidade de se marchar com absoluta
segurança na edição de verbetes que venham a compor a súmula vinculante da juris­
prudência predominante do Supremo Tribunal Federal.
Defrontamo-nos com um conflito de competência negativo a envolver processo
subjetivo, e não processo objetivo. Devemos atuar, consideradas as balizas desse
mesmo processo, nos limites do conflito de competência, já que não nos cabe, aqui,
proceder como se fôssemos órgão consultivo, pretendendo solucionar pendências não
compreendidas, sob os ângulos objetivo e subjetivo, neste processo.
É certo que, para emitir entendimento a respeito, devemos levar em conta outros
dispositivos da Constituição Federal, em uma interpretação sistemática da Lei Fundamen­
tal - aí está o ponto, e quero deixar muito claro o meu pensamento — , sem chegarmos
à definição da competência para julgamento de ações de segurados contra o Instituto
Nacional do Seguro Social, ações que surjam em virtude de acidente do trabalho.
Somos convocados a dirimir a competência quanto à ação ajuizada por um ex-empre-
gado — creio — contra um ex-empregador, que se diz ter origem na relação emprega-
tícia, revelando, como causa de pedir, dano moral e, como pedido, a correspondente
indenização.
Circunscrevo, portanto, o âmbito de atuação a essa matéria e reafirmo a óptica
exteriorizada — acompanhei, no caso, o Ministro Carlos Ayres Britto — no processo
anterior, quando o Plenário assentou que a competência para julgar a ação movida
pelo ex-empregado contra o ex-empregador, considerado o dano moral, seria da Justi­
ça comum e não da Justiça do Trabalho.
Diria que antes mesmo da Emenda Constitucional n. 45/2004 já se tinha a defini­
ção da competência da Justiça do Trabalho para julgar essas ações. Por que assim
afirmo? Porque o artigo 114 da Constituição Federal, na redação primitiva, previa a
competência da Justiça do Trabalho para conciliar e julgar os dissídios individuais e
coletivos. Por que a alusão aqui a dissídio? Esse vocábulo vem de uma época em que
a Justiça do Trabalho não integrava o Judiciário. Ela veio a integrá-lo em 1946. Antes,
era um apêndice do Ministério do Trabalho, e aí se tem, na Consolidação das Leis do
Trabalho, a referência, não a ação, mas a dissídio. Eis o antigo teor do art. 114:
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 567

“Art. 114. C om pete à Justiça do Trabalho conciliar e ju lg a r dissídios individuais e


coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito públi­
co externo e da adm inistração pública direta e indireta dos M unicípios, do Distrito
Federal, dos Estados e da União, e, na form a da lei, outras controvérsias decorren­
tes da relação de trabalho, (...)”

Essa cláusula ficou jungida a outras controvérsias decorrentes da relação de


trabalho, mas sem o envolvimento, a meu ver — porque a premissa para a competên­
cia da Justiça do Trabalho já estava na primeira parte do art. 114 — , de trabalhadores
e empregadores. Veio a Emenda n. 45 e, em bom vernáculo, de forma clara e precisa,
explicitou competir à Justiça do Trabalho e não à Justiça comum processar e julgar as
ações de indenização por dano moral ou patrimonial decorrentes da relação de trabalho,
envolvendo, evidentemente — porque aí temos de partir para a interpretação sistemática,
e não podemos desprezar o artigo 109, § 3S, da Carta — , empregado e empregador.
Não vou adiante para definir se, com a emenda aludida, cessou a competência
da Justiça comum para julgar ações de segurados, empregados, ou não — não importa — ,
contra o Instituto, tendo em conta acidente de trabalho.
Não adentro essa matéria — se o fizesse, concluiria de forma diversa da lançada
pelo Ministro Cezar Peluso — para definir pelo menos, para explicitar a conclusão
quanto ao conflito negativo. A emenda não versou sobre o deslocamento da competên­
cia para processar e julgar essas ações da Justiça comum para a Justiça do Trabalho.
A Emenda não trouxe qualquer preceito derrogando a Lei Fundamental quanto ao art.
109, inciso I, que, relativamente à competência da Justiça Federal stricto sensu —
porque a do Trabalho também é uma Justiça Federal — , prevê:
“Art. 109. Aos juizes federais compete processar e julgar:

I — as causas em que a União, entidade a utárquica” — portanto instituto — “ou


em presa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assisten­
tes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à
Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;”

Poderíamos concluir que, antes da Emenda n. 45, as ações excepcionadas sob


o ângulo dos acidentes, contra o Instituto, estariam compreendidas na competência
da Justiça do Trabalho? A resposta desta Corte foi negativa, revelando a competên­
cia da Justiça comum, presente o § 39 do art. 109:
“§ 3e Serão processadas e julgadas” — e esse parágrafo continua a compor o arca­
bouço normativo constitucional — “na justiça estadual, no foro do domicílio dos segu­
rados ou beneficiários, as causas em que forem parte instituição de previdência social
e segurado, (...)”

Ocorrido o acidente, buscada a verba devida em face do seguro existente, tem-


se ação ajuizada contra o Instituto. E ajuizada no foro próprio, definido pela Lei Funda­
mental, que é a Justiça Federal. Mas fica essa parte do voto apenas como lastro para
solucionar o conflito em mesa, para julgamento, e concluir ser extremo de dúvidas —
muito embora assim não tenha parecido e, aí, vejo que a primeira instância, o juiz que
preparou o trabalho encaminhado a todos nós e nesta assentada muito elogiado, é
mais convincente do que por vezes integrantes do próprio Tribunal — competência da
Justiça do Trabalho.
568 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Concluo que competente, no caso, reafirmando a óptica anterior, é a Justiça do


Trabalho. Talvez, houvesse à época do julgamento no Tribunal Superior do Trabalho o que
contido na Emenda n. 45, o julgamento da minha ex e eterna Corte tivesse sido outro.
O Senhor Ministro Cezar Peluso - Peço permissão aos eminentes Ministros para
tornar a manifestar-me. Como foi chamada à colação a minha nova postura sobre a
competência das ações típicas de acidente do trabalho, e para que não pareça seja só
por gosto de exercício intelectual ou falta de assunto que Ministro do Supremo Tribunal
Federal faz certas considerações, quero dizer, em primeiro lugar, que o art. 109, I, da
Constituição da República, como qualquer outra disposição constitucional ou legal, é
sujeito a interpretação. Em segundo lugar, que a questão da competência para as ações
acidentárias típicas está umbilicalmente ligada ao objeto deste conflito. E está por quê?
Porque, conforme já acentuei no julgamento anterior e torno agora a acentuar, o critério
último para responder a ambas as questões é o da unidade de convicção. Se o fato
jurídico pode, ao mesmo tempo, ser qualificado por normas de duas taxinomias, uma de
caráter acidentário e outra concernente a responsabilidade aquiliana ou negocial, as
ações processuais que se irradiam de ambas essas qualificações jurídicas não podem
ser atribuídas a Justiças diferentes e, pois, a órgãos jurisdicionais diversos. Doutro modo,
teremos uma consequência prática gravíssima, que é a possibilidade de decisões con­
traditórias baseadas na apreciação retórica e na valoração jurídica do mesmo fato histó­
rico. Noutras palavras, se o mesmo fato pode ser tomado como acidente do trabalho e,
ao mesmo tempo, como fonte de responsabilidade contratual ou aquiliana, não vejo
como, atribuindo-se a Justiças diferentes ambas as causas, não se corra o risco de,
numa, o órgão jurisdicional reconhecer que o fato em si não existiu e, na outra, o juízo
declarar que o mesmíssimofato existiu. Tal contradição lógica-em bora não jurídica —
é absolutamente ininteligível para os jurisdicionados e altamente depreciativa para o
Judiciário. Como entender-se que a Justiça, por dois órgãos distintos, proclame que
o fato existiu e que não existiu? E esta preocupação com a absorção social das decisões
jurisdicionais e com a necessidade de evitar — já estamos, por conta de outras causas,
sujeitos a isso — o desprestígio da função jurisdicional que me obriga a sustentar que a
competência para as ações de indenização por dano moral ou material, fundadas em
fato que pode também caracterizar acidente do trabalho, deva ser da mesma Justiça que
a tenha para as ações de indenização acidentária típica.
É o que eu gostaria de deixar registrado, Senhora Presidente.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso — Senhora Presidente, os eminentes Ministros
Carlos Britto e Cezar Peluso já disseram tudo. Assim, direi apenas duas palavras.
Primeiro, para louvar o trabalho do Juiz Sebastião Geraldo de Oliveira, meu coestaduano.
No seu trabalho, Sua Excelência, autêntico amicus curíae, trouxe-nos esclarecimen­
tos valiosos. Na condição de um juiz diligente, trabalhador, ele quer ver cada vez maior
a sua justiça.
Confesso até que votei — e o disse ao meu eminente Colega Ministro Sepúlveda
Pertence — mais tendo em consideração um motivo de política judiciária. Temia man­
dar para a Justiça do Trabalho milhares de ações; a carga brutal de processos resulta­
ria em detrimento dos trabalhadores. Laborava, de outro lado, em engano, pois não
sabia que a Justiça trabalhista havia se expandido tanto no Brasil, especialmente no
meu Estado natal, a minha Minas.
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 569

Penitencio-me pelo engano e fico muito contente pela salutar expansão da Jus­
tiça do Trabalho.
Eliminado o motivo de política judiciária, estou plenamente à vontade para, diante
do disposto na Emenda n. 45/2004, art. 114, dizer que a competência, no caso, é da
Justiça do Trabalho, a partir da Emenda n. 45, não só para as ações de indenização
por dano moral ou patrimonial decorrente da relação de trabalho — art. 114, inciso VI — ,
mas, como bem acentuou o Senhor Ministro Cezar Peluso, para as ações de acidente
do trabalho.
Com efeito, a exceção inscrita no inciso I do art. 109 da Constituição, que dispõe
sobre a competência dos juizes federais, “exceto as de acidente do trabalho”, não
estabelece competência da Justiça comum, só diz que essas causas não são da
competência dos juizes federais.
Posta assim a questão, com o advento da Emenda n. 45, a ampliar sobremanei­
ra a competência da Justiça do Trabalho, — “compete à Justiça do Trabalho processar
e julgar as ações oriundas da relação de trabalho” — , observa-se a exceção que retira
da competência dos juizes federais o julgamento dessas ações de acidente do traba­
lho, tendo, de um lado, uma autarquia federal, e reconhece-se que a competência é, a
partir da Emenda n.45, da Justiça do Trabalho.
Com essas breves considerações, Senhora Presidente, louvando mais uma vez
o trabalho do meu eminente colega, Juiz Sebastião Geraldo de Oliveira, do Tribunal
Regional do Trabalho da 3SRegião, acompanho o voto do eminente Ministro-Relator.
VOTO
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence - Senhora Presidente, evito sempre uma
citação de Hughes quanto ao papel de cortes como esta: a de que a Constituição seria
o que a Suprema Corte diz que ela é. Sempre preferi, por razões até de modéstia, outra
definição: aquela de termos a grave e às vezes triste responsabilidade de errar por últi­
mo. Por isso estou muito à vontade, passados três meses da nossa decisão no RE n.
438.639, para voltar atrás como os demais Colegas que então compuseram a maioria.
Também fui impressionado com o tema e levado a nova reflexão e convencido ao
final do equívoco da decisão anterior por este exemplar trabalho de amicus curiae do
ilustre Juiz Sebastião Geraldo de Oliveira, do TRT de Minas.
E, com o Ministro Marco Aurélio, penso até não estar em causa, aqui, o problema
das ações acidentárias propriamente ditas. Mas, para a minha convicção, na linha do
voto do Ministro Cezar Peluso, esse ponto é essencial, pois, ao que entendi do voto de
Sua Excelência — que também me levou, naquela ocasião, a acompanhá-lo — ao
argumento da unidade de cognição era essencial a interpretação do art. 1 0 9 ,1, como
determinante da competência da Justiça comum ordinária estadual para a ação acidentá­
ria, hoje sempre proposta contra o INSS, detentor do monopólio de seguros de acidente.
Acontece que essa interpretação era tipicamente o que Barbosa Moreira chama
de “interpretação retrospectiva”, que não observou que, quando se firmou, por exem­
plo, a Súmula n. 235, não havia apenas a regra excludente da competência da Justiça
Federal, mas, também, o art. 123 da Constituição de 1946, o art. 134, § 2- da Consti­
tuição de 1967, e o art. 142, § 2e da Carta de 1969, isto é, havia também uma outra
570 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

norma excludente, no capítulo da Justiça do Trabalho, para deixar explícito que a ela
não competiria, mas, sim, à Justiça comum dos Estados e do Distrito Federal o julga­
mento das ações de acidente de trabalho.
Só por isso é que, na verdade, na minha linha de convicção, estamos sendo
obrigados a avançar e dizer que as ações acidentárias comuns já eram, sob a Consti­
tuição vigente, da competência da Justiça do Trabalho. No entanto, persisto na opinião
de que, na instância extraordinária, só a partir de agora devemos aplicar esse entendi­
mento aos casos novos.
Com isso, Senhora Presidente, acompanho o voto do eminente Ministro Carlos
Britto, com escusas pelo erro anterior, e declaro a competência, neste conflito, do
Tribunal Superior do Trabalho.
EXPLICAÇÃO
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) - Senhora Presidente, não falei, por equívo­
co, e agora penitencio-me por isso, o nome do eminente Doutor Sebastião. Mas quero
dizer que a visita que recebi dele em grande parte me honra, confirmando o meu
primeiro voto proferido, em 12.02.2005, no RE n. 394.943, na Primeira Turma. Essa
visita alentou-me sobremodo e levou-me a reelaborar o voto, claro que mantendo o
núcleo do primeiro, de 12de fevereiro de 2005, mas com um ânimo novo no sentido de
convencer Vossas Excelências de que, efetivamente, quando se trata não de ação
acidentária, propriamente dita, perante o INSS, mas de indenização por danos morais
resultantes de acidente do trabalho, nas ações propostas pelos empregados contra os
seus empregadores, a Justiça é, cristalinamente, a do Trabalho.
O Doutor Sebastião homenageou-me com sua visita e muito me animou a pros­
seguir na luta. De sorte que é muito bonito ver-se num Plenário como este um voto
vencido tornar-se um voto vencedor, todos de espírito aberto para a rediscussão do
tema. O Direito só tem a ganhar com isso e, certamente, a Justiça também.
Quero fazer o registro, portanto, da valiosa contribuição recebida do eminente
magistrado de Minas Gerais.
VOTO
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence - Senhora Presidente, penso que a me­
lhor fórmula é essa mesmo. Direito intertemporal é isso: só a partir da Emenda; fica o
resto como obter dictum.
O Senhor Ministro Marco Aurélio - Senhora Presidenta, peço a Vossa Excelên­
cia para registrar o meu entendimento sobre o alcance do artigo 114, considerada a
redação primitiva: já entendia competente a Justiça do Trabalho.
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente) — Ministro Marco Aurélio, Vossa
Excelência vai declarar voto?
O Senhor Ministro Marco Aurélio — Sim. Fico vencido. Não adotarei a prática de
cancelar as notas taquigráficas, vou declarar o voto. Apenas pediria para consignar
que fico vencido quanto ao termo iniciai da competência.
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente) — Vossa Excelência retroage essa
competência?
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 571

O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — Entendi assim desde o meu primeiro
voto, porém acompanho o Ministro Sepúlveda Pertence quanto a esse marco temporal
necessário.
O Senhor Ministro Gilmar Mendes — Quando do julgamento anterior, falamos
logo na eventual edição de uma súmula.
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — Digo, apenas para registro histórico,
que antes de nos chegar o trabalho do Juiz mineiro, eu quis propô-la. Parei, porque a
edição da Súmula exige “reiteradas decisões sobre a mesma questão”.
O Senhor Ministro Gilmar Mendes — Sim, mas logo teremos decisões que não
chegarão ao Plenário, porque teremos decisões monocráticas e, depois, os tradicio­
nais agravos regimentais, como conhecemos nas Turmas.
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — A primeira súmula tem de ter pelo
menos umas três decisões, com relatório lido.
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente) — Bem discutidas.
O Senhor Ministro Gilmar Mendes — Estaríamos pelo menos em processo de
elaboração. Eu estava concitando o Ministro Carlos Britto a pensar alto, uma vez que
ele é o autor do voto.
O Senhor Ministro Cezar Peluso — Até porque é um mecanismo novo que deve
ser aplicado.
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — Está sugerido.
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente) — Gostaria que a Taquigrafia apenas
incluísse na proclamação a observação de que o Ministro Marco Aurélio, no caso, fica
parcialmente vencido, na medida em que não estabelecia a edição da Emenda Cons­
titucional n. 45 como marco temporal para a competência da Justiça trabalhista. É
isso Ministro Marco Aurélio?
O Senhor Ministro Marco Aurélio — Sim, Excelência.
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — Veja bem, aí é atribuir efeitos à nossa
decisão a partir da Emenda n. 45. Isso não implica deixar de reconhecer que a compe­
tência já existisse anteriormente à Emenda n. 45. Não é isso, Ministro Sepúlveda
Pertence?
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — A Justiça não é uma academia. Adoto,
por razões de política judiciária, a fórmula proposta no enunciado pela Senhora Presi­
dente, da Emenda Constitucional n. 45.
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — Simplesmente como um imperativo de
política judiciária.
O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence — Pouco importa esteja eu a confessar
que, desde 1988, descobri que estava errado. Mas essa era a orientação do Tribunal e
aí não me animo a dar provimento a recurso extraordinário para desfazer processos de
acidentes de trabalho em razão da minha nova visão do problema.
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator) — Então, em se tratando de imperativo de
política judiciária, concordo inteiramente.
572 S e b a s t iã o G e r ald o de O l iv e ir a

Extrato de ata: Conflito de Competência 7.204-1 Minas Gerais


Relator: Min. Carlos Britto
Suscitante(s): Tribunal Superior do Trabalho
Suscitado(a/s): Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais
lnteressado(a/s): Vicente Giacomini Peron
Advogado(a/s): Hélcio de Oliveira Fernandes e Outro(a/s)
lnteressado(a/s): Banco BEMGE S/A
Advogado(a/s): José Maria Riemma e Outro(a/s)
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu do conflito e, por maioria,
definiu a competência da justiça trabalhista, a partir da Emenda Constitucional n.
45/2004, para julgamento das ações de indenização por danos morais e patrimoniais
decorrentes de acidente do trabalho, vencido, no caso, o Senhor Ministro Marco
Aurélio, na medida em que não estabelecia a edição da emenda constitucional como
marco temporal para competência da justiça trabalhista. Votou a Presidente. Ausente,
justificadamente, o Senhor Ministro Nelson Jobim (Presidente). Presidiu o julgamento a
Senhora Ministra Ellen Gracie (Vice-Presidente). Plenário, 29.06.2005.
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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

________ . Direito civil: responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

________ . Direito civil: sucessões. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Direito público, direito privado: sob o prisma das
relações jurídicas. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.
ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO
(A numeração indica a página)

AÇÃO REVISIONAL
— alteração antes do trânsito em ju lg a d o ............................................................................ 406
— alteração após celebração de a c o rd o .............................................................................. 410
— alteração após indenização de uma só v e z ......................................................................408
— cláusula rebus sic s ta n tib u s.................................................................................... 398, 403
— com petência para ju lg a m e n to ............................................................................... 401, 435
— efeitos ex n u n c ........................................................................................................................ 404
— hipóteses de c a b im e n to .......................................................................................................398
— inexistência de afronta à coisa ju lg a d a ............................................................................ 402
— ju ris p ru d ê n c ia .......................................................................................................................... 401
— lim ite s ........................................................................................................................................ 402
— morte do a c id e n ta d o .............................................................................................................. 411
— mudança na capacidade la b o ra tiv a ............................................................. 397, 403, 410
— p re scriçã o ................................................................................................................................. 406
ACIDENTE DE TRAJETO
— desvio ou alteração do tr a je to ............................................................................................... 60
— e s ta tís tic a .................................................................................................................................... 35
— nexo cronológico e topográfico..............................................................................................60
— previsão le g a l............................................................................................................................. 60
ACIDENTE DO TRABALHO
— acidente auto p ro voca d o ........................................................................................................154
— acidente c o m u m ....................................................................................................................... 68
— acidente de qualquer n atu re za ....................................................................................... 47, 68
— acidente “do” e “no” tra b a lh o ...................................................................................... 49, 440
— acidente por e q u ip a ra çã o ...................................................................................... 56, 60, 61
— acidente típ ic o ............................................................................................................................45
— Brasil cam peão m u n d ia l......................................................................................................... 31
— comunicação v. COMUNICAÇÃO DO ACIDENTE DO TRABALHO
— conceito d o u trin á rio ..................................................................................................................46
— conceito le g a l.......................................................................................................................45, 51
586 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

— custo no B ra s il...........................................................................................................................32
— dia nacional em mem ória das v ítim a s ............................................................................... 33
— enquadram ento le g a l.............................................................................................................. 42
— estatística no B ra s il..................................................................................................................35
— estatística no m u n d o ............................................................................................................... 34
— histórico das leis a c id e n tá ria s ..............................................................................................38
— im portância do p ro b le m a ........................................................................................................ 31
— in itinerev. ACIDENTE DE TRAJETO
— mortes por d ia ............................................................................................................................37
— nexo c a u s a l...............................................................................................................................151

— recurso contra enq u a d ra m e n to .............................................................................................69


— trabalhador a v u ls o .................................................................................................................... 43

— trabalhador d o m é s tic o ................................................................................................. 43, 440


— trabalhador sem vínculo de e m p re g o ...................................................................... 44, 440
CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR
— art. 501 da C L T ..................................................................................................................... 173

— exclui o nexo c a u s a l..................................................................................................... 168, 171


— fortuito in te rn o ..........................................................................................................................175
— indenização p a rc ia l.................................................................................................................173
— ju ris p ru d ê n c ia .......................................................................................................................... 171
— quando o c o rre .......................................................................................................................... 171
COMPETÊNCIA

— ação ajuizada por pessoa diversa do a cid e nta d o ........................................................ 427


— ação contra enquadramento do IN S S ................................................................................. 72
— ação do acidentado em face do IN S S ............................................................................... 437
— ação do acidentado não em pregado.................................................................................431
— ação rescisória de julgado da Justiça C o m u m ............................................................. 433
— ação revisio n a l............................................................................................................. 401, 435
— consolidação da com petência tra b a lh is ta ...................................................................... 420
— controvérsia sobre imposto de re n d a ............................................................................... 459
— danos em rico ch e te ............................................................................................................... 427
— Emenda Constitucional n. 4 5 /2 0 0 4 ................................................................................... 420
— histórico das d is c u s s õ e s .................................................................................................... 413
— inteiro teor do CC n. 7 .2 0 4 /S T F .......................................................................................... 556
— julgam ento do RE n. 4 3 8 .6 3 9 ..............................................................................................422
— mudança na Constituição de 1 9 8 8 ................................................................................... 415
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 587

— processos em andam ento na Justiça C o m u m ...............................................................425


— revisão do entendimento pelo S T F .................................................................................... 423
— Súmula n. 366 do S T J ..........................................................................................................428
— Súmula n. 736 do S T F ..........................................................................................................419
C OM UNICAÇÃO DO ACIDENTE DO TRABALHO
— ausência de e m is s ã o .....................................................................................................63, 76
— CATs não emitidas de 2007 a 2011 ...........................................................................36, 37
— destinatários da C A T ................................................................................................................64
— obrigação do e m p re g a d o r......................................................................................................62
— prazo de e m iss ã o ..................................................................................................................... 62
— previsão le g a l........................................... ................................................................................. 62
— quem pode e m itir ..................................................................................................................... 63
— su b n o tifica çã o ........................................................................................................... 36, 66, 68
— suspeita d ia g n o s tic a ................................................................................................................65
— trabalhador d e se m p reg a d o ................................................................................................... 63
CONCAUSAS
— c o n c e ito ............................................................................................................................. 56, 162

— m o d a lid a d e s .....................................................................................................................58, 163


— nexo c o n ca u sa l..................................................................................................................... 162
— previsão le g a l................................................................................................................... 56, 162
CORREÇÃO MONETÁRIA
— danos e m e rg e n te s .................................................................................................... 454, 467
— danos morais e e s té tic o s ........................................................................................ 455, 467
— discipiinam ento le g a l............................................................................................................ 453
— fin a lid a d e .................................................................................................................................. 452
— ju ris p ru d ê n c ia ......................................................................................................................... 452
— lucros cessantes ou pe n sion a m e n to ................................................................... 454, 467
— pagamento de uma só v e z ....................................................................................... 454, 467
— parcelas v in c e n d a s ................................................................................................... 454, 467
— quadro s in ó p tic o .....................................................................................................................467
— Súmula n. 3 6 2 /S T J .................................................................................................................455
— Súmula n. 4 3 9 /T S T ................................................................................................................ 456
CULPA
— agrava a indenização por dano m o ra l................................................................. 182, 251
— análise técnica do acidente do tra b a lh o ...........................................................................216
— avaliação no acidente do não e m p re gad o ...................................................................... 444
588 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

— avaliação no acidente d o m é stico ....................................................................................... 444


— c o n c e ito ..................................................................................................................................... 183
— concorrente v. CULPA CONCORRENTE
— contra a le g a lid a d e ................................................................................................................. 186
— desproporção entre culpa e d a n o ........................................................................... 209, 211
— distinção do d o lo .....................................................................................................................182
— exclusiva v. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA
— grave, leve, le v ís s im a ............................................................................................................ 208
— ju ris p ru d ê n c ia .................................................................................. 199, 202, 205, 217, 225
— norm ativa...................................................................................................................................208
— pressuposto da in d e n iz a ç ã o ................................................................... 96, 149, 182, 228
— presumida v. CULPA PRESUMIDA
— p s ic o ló g ic a ............................................................................................................................... 208
— quando o c o rre ..........................................................................................................................184
— violação da C L T ...................................................................................................................... 190
— violação das Convenções da O IT ....................................................................................... 189
— violação das normas regulam entares.............................................................................. 196
— violação de leis d ive rsa s.......................................................................................................195
— violação do dever geral de c a u te la .....................................................................................203
CULPA CONCORRENTE DA VÍTIMA
— indenização prop o rcion a l..................................................................................................... 213
— ju ris p ru d ê n c ia ......................................................................................................................... 217
— quando o c o rre ......................................................................................................................... 212
— requisitos para a co lh im en to ............. ..................................................................................213
— tendência de culpabilizar a v ítim a ......................................................................................215
CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA
— exclui o nexo c a u s a i.............................................................................................................. 168
— hipóteses previstas em l e i .................................................................................................. 169
— ju ris p ru d ê n c ia ..........................................................................................................................170
— quando o c o rre ......................................................................................................................... 169
CULPA PRESUMIDA DO EMPREGADOR
— distribuição dinâm ica do ônus da p ro v a ......................................................................... 224
— inversão do ônus da p ro v a ......................................................................................... 219, 225
— ju ris p ru d ê n c ia .............................................................................................................. 221, 225
— no Código do C o n s u m id o r.................................................................................................. 221
— princípio da aptidão para a p ro v a ...................................................................................... 220
— razões para seu a colhim ento..............................................................................................221
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 589

DANO
— enfoque trabalhista e p e n a l.................................................................................................. 229
— estético v. DANO ESTÉTICO
— material v. DANO MATERIAL
— moral v. DANO MORAL
— na invalidez perm a n en te ........................................................................................................334
— no acidente com ó b ito ............................................................................................................ 268
— por perda de uma c h a n c e ..................................................................................................... 260
— pressuposto da in d e n iz a ç ã o .................................................................................... 228, 268
— quando a vítim a so b re vive ..................................................................................................... 325
— quando é indenizável ............................................................................................................. 230
DANO ESTÉTICO
— conceito e a bran g ê n cia ..........................................................................................................256
— cum ulação com dano m o ra l.................................................................................................257
— ju ris p ru d ê n c ia ...........................................................................................................................258
DANO MATERIAL
— a b ra n g ê n c ia .............................................................................................................................. 231
— c o m p ro v a n te s ...........................................................................................................................270
— dano e m e rg e n te .......................................................................................................... 232, 269
— lucros c e s s a n te s ................................................................................................. 233, 270, 339
— na invalidez pe rm a n en te ....................................................................................................... 334
— na invalidez te m p o rá ria ..........................................................................................................355
— na redução de c a p a c id a d e ................................................................................................... 342
— no acidente com ó b ito ............................................................................................................268
— opção pelo pagam ento in te g ra l.............................................................................. 271, 349
— pensão v. PENSIONAMENTO
DANO MORAL
— caráter com pensatório e p u n itiv o .................................................................... 242, 251, 273
— c o n c e ito ..................................................................................................................................... 236
— critérios de a rb itra m e n to ....................................................................................251, 252, 322
— cum ulação com o dano material ........................................................................................ 241
— dispensa p ro v a ........................................................................................................................ 245
— e dignidade da pessoa h u m a n a .........................................................................................238
— evolução e abra n g ê n cia ........................................................................................................ 234
— finalidade da in d e n iz a ç ã o ..................................................................................................... 242
— fundam entos c o n s titu c io n a is .............................................................................................. 238
— isenção do imposto de re n d a ............................................................................................. 464
590 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

— ju ris p ru d ê n c ia .............................................................. 247, 252, 253, 258, 313, 315, 321


— legitim idade ativa do e s p ó lio ...................................................................................... 281, 314
— legitim idade para p o s tu la r.............................................................................. 310, 321, 427
— na incapacidade te m p o rá ria .................................................................................................357
— na responsabilidade o b je tiv a ...............................................................................................254
— no acidente com ó b ito ............................................................................................................ 272
— pago de uma só v e z ............................................................................................................... 250
— revisão do valor pelo T S T ...................................................................................................... 252
— Súmula n. 3 6 2 /S T J ..................................................................................................................455
— Súmula n. 4 3 9 /T S T ..................................................................................................................456
— titulares do d ire ito ....................................................................................................................318
:— tra n s m is s ib ilid a d e .................................................................................................................. 311
DOENÇAS OCUPACIONAIS
— agentes c a u s a d o re s .............................................................................................................. 469
— conceito le g a l.............................................................................................................................. 51
— dia para emissão da C A T ..............................................................................................62, 66
— distorção das e sta tís tic a s ....................................................................................................... 36
— doenças do grupo e tá rio ..........................................................................................................54
— doenças do tra b a lh o ................................................................................................................. 51
— doenças não in c a p a c ita n te s ..................................................................................................54
— doenças d e g e n e ra tiv a s ...........................................................................................................54
— doenças não incluídas na lis t a ............................................................................................. 54
— doenças não o c u p a c io n a is .......................................................................................... 54, 159
— doenças p ro fis s io n a is ............................................................................................................. 51
— doenças relacionadas ao tra b a lh o .................................................................. 53, 159, 167
— equiparação ao a c id e n te ........................................................................................................ 50
— Lista A das d o e n ça s................................................................................................ 478
— Lista B das d o e n ç a s ............................................................................................... 495
— Lista C das d o e n ç a s ................................................................................................528
— Lista dos agentes e tio ló g ic o s ..........................................................................................478
— nexo causal v. NEXO CAUSAL
— passivo p a to ló g ic o .................................................................................................................267
— relação das d o e n ç a s ...............................................................................................................52
— Tabela de S h illing ................................................................................................................... 166
ENQUADRAMENTO DO ACIDENTE PELO INSS
— ação contra o enqua d ra m e n to ...............................................................................................71
— análise técnica do a c id e n te ....................................................................................................67
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 591

— ju ris p ru d ê n c ia ..........................................................................................................................72
— justiça c o m p e te n te ....................................................................................................... 72, 437
— recurso a d m in istra tivo ............................................................................................................. 69
— reflexos do en q u adram ento................................................................................................... 73
FATO DE TERCEI RO
— assalto à mão a rm a d a .......................................................................................................... 178
— exclui o nexo c a u s a l..................................................................................................... 168, 176
— ju ris p ru d ê n c ia ................................................................................................................ 177, 180
— quando o c o rre .......................................................................................................................... 176
— teoria do risco c o n e x o ........................................................................................................... 179
IMPOSTO DE RENDA
— com petência para dirim ir a co n tro v é rs ia ......................................................................... 459
— danos e m e rg e n te s .............................................................................................. 460, 466, 467
— danos m o ra is ............................................................................................................... 466, 467
— isenção nas in d e n iza çõ e s....................................................................................................461
— ju ris p ru d ê n c ia .............................................................................................................. 464, 465
— lucros c e s s a n te s ................................................................................................. 461, 466, 467
— quadro sinóptico das in c id ê n c ia s ......................................................................................467
— Súmula n. 4 9 8 /S T J .................................................................................................................466
INCAPACIDADE TEMPORÁRIA
— dano e sté tico ............................................................................................................................357
— dano m o ra l............................................................................................................................... 357
— fim da convalescença............................................................................................................ 356
— lucros c e s s a n te s .................................................................................................................... 356
— quando o c o rre ..........................................................................................................................355
INDENIZAÇÃO
— cum ulação com benefício a c id e n tá rio .................................................... 80, 84, 291, 341
— na incapacidade te m p o rá ria ................................................................................................355
— na invalidez permanente p a rc ia l............................................................................. 343, 346
— na invalidez permanente to ta l............................................................................................ 339
— na perda de uma c h a n c e ....................................................................................................260
— no acidente do dom éstico................................................................................................... 443
— no acidente do não e m p re g a d o .............................................................................. 443, 446
— no acidente sem a fa s ta m e n to .......................................................................................... 358
— no caso de m o rte .................................................................................................................. 268
— pagamento de uma só v e z .................................................................................250, 271, 349
— pensão v. PENSIONAMENTO
— p re s s u p o s to s ............................................................................................... 96, 151, 228, 268
— princípio da restitutio in in te g ru m ............................ 232, 269, 270, 289, 339, 341, 345
592 S e b a s t iã o G er ald o de O l iv e ir a

INVALIDEZ PERMANENTE PARCIAL


— análise do caso co n c re to ..................................................................................................... 345
— nos seguros p riv a d o s ...........................................................................................................344
— opção pelo pagam ento in te g ra l......................................................................................... 349
— pensionam ento p ro p o rc io n a l............................................................................................. 347
— quando gera a u xílio -a cid e n te ............................................................................................. 343
— quando o c o rre ......................................................................................................................... 343
— revisão do p e n s io n a m e n to ...................................................................................... 347, 397
— tabela da S U S E P ........................................................................................................ 344, 540
— tabelas in te rn a c io n a is ...........................................................................................................345
INVALIDEZ PERMANENTE TOTAL
— análise do caso c o n c re to ..................................................................................................... 336
— despesas de tra ta m e n to ...................................................................................................... 339
— grande in va lid e z ...................................................................................................................... 338
— grau de incapacidade............................................................................................................ 335
— ju ris p ru d ê n c ia ......................................................................................................................... 337
— lucros c e s s a n te s .................................................................................................................... 339
— na responsabilidade c iv il..................................................................................................... 335
— no Direito P re vid e nciá rio ...................................................................................................... 334
— opção pelo pagamento in te g ra l......................................................................................... 349
— p e n s io n a m e n to .................................................................. ....................................................340
— revisão do pe n sion am e n to ....................................................................................... 347, 397
— termo final da p e n s ã o ............................................................................................................341
JUROS DE MORA
— danos morais ou e s té tic o s ....................................................................................... 458, 467
— disciplinam ento le g a l............................................................................................................ 456
— fin a lid a d e .................................................................................................................................. 456
— início de flu ê n c ia .....................................................................................................................457
— lucros cessantes ou p e n sion a m e n to ............................................................................... 458
— parcelas v in c e n d a s .................................................................................................... 458, 467
— quadro s in ó p tic o ..................................................................................................................... 467
— Súmula n. 4 3 9 /T S T .................................................................................................................458
LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA
— correção m o n e tá ria .................................................................................................... 452, 467
— imposto de renda na fo n te ........................................................................................ 459, 467
— incidência do IN S S .................................................................................................................452
— juros de m o ra ............................................................................................................... 456, 467
— quadro das in c id ê n c ia s ........................................................................................................467
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 593

NEXO CAUSAL
— c o n c a u s a ...................................................................................................................... 153, 162
— c o n c e ito .................................................................................................................................. 151
— e p id e m io ló g ic o .................................................................................... 52, 68, 135, 157, 222
— e xclu d e n te s ............................................................................................................................168
— fle x ib iliz a ç ã o ...........................................................................................................................155
— in d ire to ...........................................................................................................................153, 168
— na lei a c id e n tá ria ........................................................................................................153, 168
— na responsabilidade c iv il......................................................................................... 152, 154
— nas doenças o c u p a c io n a is ...............................................................................................158
— no acidente do tra b a lh o ........................................................................................... 153, 158
— p re s u m id o .............................................................................................................................. 157
— Resolução CFM n. 1.488/1998......................................................................................... 160
— Resolução INSS n. 10/1999 .............................................................................................. 161
NORMAS DE SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHADOR
— delegação normativa — art. 2 0 0 /C L T ................................................................................197
— em leis e s p a rs a s ................................................................................................................... 195
— Estatuto Nacional de S S T .....................................................................................................187
— na C L T ....................................................................................................................................... 190
— na Constituição da R e p ú b lic a .............................................................................................188
— na Portaria n. 3.214/1978.................................................................................................... 196
— nas Convenções da O IT ........................................................................................................ 189
— no Código do C o n s u m id o r...................................................................................................194
— quadro das N R s ..................................................................................................................... 197
— validade das delegações n o rm a tiva s................................................................................201
PENSIONAMENTO
— alcance da “prestação de alimentos” ............................................................................... 275
— alim entos p ro v is io n a is ..........................................................................................................278
— base de c á lc u lo .....................................................................................................................288
— correção do v a lo r ................................................................................................................... 291
— direito de a cre sce r..................................................................................................................307
— da concubina............................................................................................................................282
— do cônjuge ou com p an h e iro .................................................................................... 281, 282
— dos filh o s .................................................................................................................................. 285
— dos p a is .....................................................................................................................................286
— e lucros c e s s a n te s ............................................................................................................... 270
— expectativa de sobrevida da v ítim a .....................................................................................300
594 S e b a s t iã o G eraldo de O l iv e ir a

— garantia do p a g a m e n to .........................................................................................................294
— legitim idade ativa do e s p ó lio ..........................................................................269, 281, 314
— na invalidez perm anente p a rc ia l...................................................................................... 346
— na invalidez permanente to ta l........................................................................................... 339
— natureza ju ríd ic a ................................................................................................................... 274

— novas núpcias do b e n e fic iá rio ................................................................................. 278, 283

— opção pelo pagamento in te g ra l.............................................................................. 271, 349


— outros be n e ficiá rio s............................................................................................................. 287
— rateio entre os bene ficiá rio s..............................................................................................281
— revisão do v a lo r........................................................................................ 278, 298, 347, 397
— termo final da p e n s ã o ................................................................................................ 299, 341
— titulares do d ire ito .................................................................................................................279
PERDA DE UMA CHANCE
— cabimento da inde niza çã o ................................................................................................. 260
— cálculo da in denização........................................................................................................264
— ca ra cteriza ção ....................................................................................................................... 262
— hipótese do art. 129 Código C iv il.....................................................................................263
— ju ris p ru d ê n c ia ....................................................................................................................... 264
PRESCRIÇÃO
— ação ajuizada antes da EC n. 4 5 /2 0 0 4 ...........................................................................371
— ação ajuizada após a EC n. 45/2004 .............................................................................. 376
— ação ajuizada por d o m é s tic o ........................................................................................... 387
— ação ajuizada por não e m p re g a d o ................................................................................. 389

— ação re visional...................................................................................................................... 406


— analogia com o Código do C o n s u m id o r....................................................................... 382
— ciência inequívoca da in ca p acid a d e ....................................................................... 381, 384
— civil ou tra b a lh is ta .................................................................................................................360

— decorre do dever jurídico v io la d o .....................................................................................363


— divergência ju ris p ru d e n c ia l...............................................................................................378
— início da flu ê n c ia ................................................................................................................... 380

— prazo de exercício da p re te n s ã o ...................................................................................... 359


— pronunciamento de o fíc io .................................................................................................. 390
— regra especial do art. 9 1 6 /C L T ......................................................................................... 369

— regras de transição do Direito C iv il................................................................................. 368


— Súmula n. 230 do S T F .........................................................................................................384
— Súmula n. 278 do S T J .........................................................................................................384
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e d o T r abalh o ou D oença O c u p a c io n a l 595

PROVA PERICIAL
— acom panham ento por te rc e iro s .......................................................................................... 329
— conteúdo do la u d o .............................................................................................327, 330, 333
— Instrução do IN S S ..........................................................................................................161, 332
— ju ris p ru d ê n c ia ...........................................................................................................................328
— nom eação de mais de um p e rito .........................................................................................331
— objeto da p ro v a .................................................................................................. 326, 330, 333
— profissional in d ic a d o .............................................................................................................. 328
— quesitos do ju íz o .......................................................................................................................331
— Resolução CFM n. 1.488 /1 9 9 8 ........................................................................................... 160
— Resolução CFM n. 1 .8 1 0 /2 0 0 6 ............................................................................................ 329
— Resolução INSS n. 10/1999 ..................................................................................... 161,332
RESPONSABILIDADE CIVIL
— cum ulação com benefício a c id e n tá rio .................................................... 84, 87, 291, 341
— diferença da indenização a c id e n tá ria .................................................................................. 77
— e s p é c ie s ....................................................................................................................................... 94
— evolução quanto ao acidente do tra b a lh o ...........................................................................80
— histórico do texto c o n stitu cio n a l.............................................................................................82
— noção a re sp e ito ........................................................................................................................ 78
— objetiva v. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA
— p re s s u p o s to s ...............................................................................................96, 151, 228, 268
— previsão Constitucional ........................................................................................................... 83
— previsão na Lei n. 8.213/1991 ................................................................................................84
— previsão no Código C iv il.......................................................................................................... 80
— quadro das te n d ê n c ia s ..........................................................................................................150
— sem c u lp a ...................................................................................................................................113
— s u b je tiv a ....................................................................................................................................... 96
— Súmula n. 736 S T F ................................................................................................................. 419
RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA
— amplitude do art. 927 do Código C iv il................................................................................ 126
— atividades lesivas ao meio a m b ie n te ................................................................................ 113
— desenvolvimento da teoria do r is c o ........................................................................109, 122
— desenvolvimento no B ra s il.................................................................................................... 110
— do p o lu id o r................................................................................................................................ 113
— Enunciado n. 3 7 ....................................................................................................................... 123
— Enunciado n. 3 8 .............................................................................................................114, 131
— Enunciado n. 4 0 ....................................................................................................................... 126
596 S e b a s t iã o G e r a l d o de O l iv e ir a

— Enunciado n, 3 7 7 .................................................................................................................. 122


— Enunciado n. 4 4 6 ....................................................................................................................132
— Enunciado n. 4 4 8 ....................................................................................................................133
— Enunciado n. 4 5 9 .................................................................................................................. 133
•— fator acidentário de p re v e n ç ã o ........................................................................................... 135
— hipóteses legais de a p lic a ç ã o ........................................................................................... 112
— ju ris p ru d ê n c ia ......................................................................................................................... 123
— m odalidades das teorias do ris c o .................................................................................... 115
— na indenização por acidente do tra b a lh o ........................................................................ 119
— no art. 927 do Código C iv il...................................................................................................118
— no art. 932, III, do Código C iv il.............................................................................................. 98
— no Código do C o n s u m id o r..................................................................................................115
— no direito co m p a ra d o ............................................................................................................128
— no trabalho do a u tônom o..................................................................................................... 444
— no trabalho do d o m é s tic o ....................................................................................................447
— o p o s ito re s ................................................................................................................................110
— perspectivas no acidente do tra b a lh o ............................................................................... 141
— por atos dos empregados e p re p o sto s..............................................................................97
— prognóstico dos d o u trin a d o re s .......................................................................................... 143
— proposição o rig in á ria ............................................................................................................110
— quadro das te n d ê n c ia s ........................................................................................................ 150
— responsabilidade sem c u lp a ............................................................................................. 113
— seguro de acidente do tra b a lh o ......................................................................................... 138
— técnica de socialização dos ris c o s ................................................................................... 150
SEGURO DE ACIDENTE DO TRABALHO
— integração na Previdência S o c ia l.......................................................................................139
— não afasta a responsabilidade c iv il......................................................... 84, 87, 291, 341
— não tem natureza de se g u ro ................................................................................................139
TABELAS
— Agentes etiológicos das d o e n ç a s ..................................................................................... 478
— Agentes patogênicos das d o e n ç a s .................................................................................. 469
— Estatística dos acidentes do tra b a lh o ................................................................................ 35
— Expectativa de sobrevida 2 0 0 7 ......................................................................................... 544
— Expectativa de sobrevida 2 0 0 8 ......................................................................................... 547
— Expectativa de sobrevida 2 0 0 9 ......................................................................................... 550
— Expectativa de sobrevida 2 0 1 0 ......................................................................................... 553
I n d e n iz a ç õ e s por A c id e n t e do T rabalh o ou D oença O c u p a c io n a l 597

— Expectativa de sobrevida 2011 ............................................................................... 302, 304


— Indenizações do Seguro D P V A T ...................................................................................... 542
— Lista A — Doenças o cu p a cio n a is...................................................................................... 478
— Lista B — Doenças ocu p a cio n a is...................................................................................... 495
— Lista C — Nexo técnico epidem iológico...........................................................................528
— S h illin g ....................................................................................................................................... 167
— Situações que geram o a u xílio -a cid e n te ..........................................................................535
— SUSEP de invalidez p e rm a n e n te ....................................................................................... 540
TERCEIRIZAÇÃO
— fundam entos da re s p o n s a b iliz a ç ã o ..................................................................................103
— ju ris p ru d ê n c ia .......................................................................................................................... 106
— re sp onsab ilid ade s u b s id iá ria .............................................................................................105
ste livro elabora com
INDENIZAÇÕES
POR ACIDENTE DO
E profundidade e clareza a
slstem atização d o com plexo
TRABALHO OU tem a das indenizações decor­
DOENÇA OCUPACIONAL rentes dos ac-denies do trabalho
ou das doenças ocupactonais
Iodas as questões contioverlldas
sãò aprooadas. tais como: as
doenças ocupaclonais e as
concausas, os oressupostos da
reparação, o valor aas indeniza­
ções nos ocidentes do trabalho
com ou sem óbito, os beneficia
fios da pensão, a legitimidade
pard pleitear os danos morais, o
cabimento ou não da responsa­
Sebastião G erald o dc O lh eira
bilidade civil objetiva e aa cuipa
^semc-aigactot cn In&jYil presumida ao empregador, as
&Gpr.r»ai do Tn3ba«io ao .1° Rogtio
tuteir-s em Dioflo DOii UfMG hipóteses de exclusão do nexo
Pnjieaor do Caso 69 EjDrootrnçõ^
<m Dvoifo Oo l>at>cmo da causal, a prescrição aplicável, o
focüdaife oe Dteito Wirari Caaiooi cabimento da ação revisional. a
llqutaação da sentença, dentre
várias outras Trota so de obra
indispensável para todos os que
atuam na área.

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