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Antero

de Quental

“Poesia da Jus,ça: fui eu, com efeito, quem, entre nós, abriu
caminho dessa poesia social e filosófica, que tem de ser a poesia
revolucionária do futuro.”
Antero de Quental
Vida e obra

•  Nasce em Ponta Delgada a 18 de abril de 1842.


•  Frequenta o curso de Direito em Coimbra, de 1858 a 1864.
•  Intervém a,vamente na vida cultural e polí,ca: dirige o jornal O Académico;
par,cipa numa sociedade secreta designada Sociedade do Raio.
•  Em 1865, publica as Odes Modernas.
•  Desempenha um papel determinante na Questão Coimbrã.
•  Em 1869, organiza as Conferências Democrá<cas do Casino com
condiscípulos de Coimbra.
•  Em 1871, profere a conferência inaugural: Causas da Decadência dos Povos
Peninsulares.
•  Em 1886, são publicados os Sonetos Completos.
•  Em 1889, Columbano pinta-lhe o retrato que está no Museu do Chiado, em
Lisboa.
•  Suicida-se em 1891, num banco de jardim, em Ponta Delgada
Sonetos

Para Antero, o soneto é a forma lírica por excelência. Este género permite a conjugação
perfeita entre sen2mento e ideia, aspeto que caracteriza o discurso conceptual
anteriano. Assim, para Antero, o soneto cons,tui “uma unidade perfeita”, que se adequa
à expressão de sen2mentos, ao raciocínio matemá2co, mas também à ânsia de
Absoluto do poeta.

Soneto Composição poé,ca cons,tuída por 14 versos, geralmente


decassilábicos, distribuídos por duas quadras e dois tercetos.

Trata-se de uma A rima do soneto tende a seguir o esquema ABBA ABBA, nas quadras,
forma poé,ca de e CDC CDC , CDE CDE (entre outros esquemas), nos tercetos.
origem clássica
que obedece a O úl,mo verso de um soneto é considerado a chave de ouro, quando
regras rígidas de apresenta uma conclusão para o tema desenvolvido.
construção.
Sonetos

Cinco fases (segundo Oliveira Mar,ns):


•  1.ª: Rompimento com a fé e insa,sfação
•  2.ª: Grande crise sen,mental e aba,mento da frustração
•  3.ª: Fase solar, de empenho comba,vo; hino à Razão
•  4.ª: Reinado do pessimismo
•  5.ª: Reconciliação mís,ca
Adaptado de LOPES, Óscar, e SARAIVA, António José, 2005. História da Literatura Portuguesa. Porto: Porto Editora (17.ª ed.)
A tendência luminosa, apolínea ou diurna
•  Sonetos o,mistas
•  Presença da Razão
•  Racionalidade confiante
•  Roman,smo humanitarista
•  Crença na luta por uma sociedade melhor, enquanto “soldado do Futuro”

A tendência obscura, român,ca ou noturna

•  Sonetos pessimistas
•  Presença do desencanto, da angús,a, da dor, da morbidez, da frustração e do
cansaço
•  Interiorização reflexiva
•  Inquietação filosófica e desassossego
•  Desilusão e incredulidade face à luta
•  Refúgio na desistência, no sonho e na transcendência religiosa
Angús,a existencial

• Inquietação espiritual e desassossego;


• Insa,sfação perante o real;
• Desencanto, angús,a, dor, morbidez, frustração e cansaço;
• Insa,sfação face ao amor e à vida;
• Interiorização reflexiva;
• Inquietação filosófica;
• Incessante procura de um sen,mento para a existência;
• Desilusão e incredulidade face à luta.

Refúgio no sonho e na transcendência religiosa


Angús,a existencial - poemas exemplo:
“O Palácio da Ventura” (e “Despondency”)

Palácio da Ventura Sonho do sujeito poé,co, em que ele


procura “o palácio encantado da
Sonho que sou um cavaleiro andante. Ventura”, alegoria do ideal desejado.
Por desertos, por sóis, por noite escura,
Paladino do amor, busco anelante 1ª estrofe – apresentação do sonho
O palácio encantado da Ventura!

Mas já desmaio, exausto e vacilante, Versos 5 e 6–expressão do cansaço e do
Quebrada a espada já, rota a armadura... desalento do sujeito poé,co na sua busca
E eis que súbito o avisto, fulgurante
Na sua pompa e aérea formosura!

Com grandes golpes bato à porta e brado: Versos 7 a 12 – manifestação da
Eu sou o Vagabundo, o Deserdado... recuperação da energia do “eu” e da sua
Abri-vos, portas de ouro, ante meus ais! aproximação ao palácio

Abrem-se as portas d'ouro com fragor...
Mas dentro encontro só, cheio de dor, Versos 13 e 14 – revelação da frustração do
Silêncio e escuridão - e nada mais! sujeito poé,co ao conhecer o interior do
palácio
Angús,a existencial - poemas exemplo:
“O Palácio da Ventura” (e “Despondency”)
Palácio da Ventura Estado de espírito do sujeito poé,co

Sonho que sou um cavaleiro andante. Ansioso e forte, ultrapassando “desertos”,
Por desertos, por sóis, por noite escura, “sóis”, e a “noite escura” pala alcançar o
Paladino do amor, busco anelante “palácio”.
O palácio encantado da Ventura!

Mas já desmaio, exausto e vacilante,
Quebrada a espada já, rota a armadura... “exausto e vacilante”; vulnerável
E eis que súbito o avisto, fulgurante
Na sua pompa e aérea formosura!

Com grandes golpes bato à porta e brado:
Eu sou o Vagabundo, o Deserdado... Novamente vigoroso
Abri-vos, portas de ouro, ante meus ais!

Abrem-se as portas d'ouro com fragor...
Mas dentro encontro só, cheio de dor,
Silêncio e escuridão - e nada mais! Contaminado pela “dor” do espaço e
frustrado
Angús,a existencial - poemas exemplo:
“O Palácio da Ventura” (e “Despondency”)
Palácio da Ventura
Síntese
Sonho que sou um cavaleiro andante.
Por desertos, por sóis, por noite escura,
Paladino do amor, busco anelante
A felicidade é ina2ngível
O palácio encantado da Ventura!

Mas já desmaio, exausto e vacilante,
Quebrada a espada já, rota a armadura... A busca do absoluto conduz ao vazio e à morte
E eis que súbito o avisto, fulgurante
Na sua pompa e aérea formosura!

Com grandes golpes bato à porta e brado: Na vida há miragens – o palácio que se
Eu sou o Vagabundo, o Deserdado...
Abri-vos, portas de ouro, ante meus ais! desenha na sua pompa aérea -, há lutas e
entusiasmos – cavalgada -, desânimos –
Abrem-se as portas d'ouro com fragor... espada quebrada e armadura rota – e
Mas dentro encontro só, cheio de dor, deceções – silêncio e escuridão.
Silêncio e escuridão - e nada mais!
Configurações do Ideal

A angús2a existencial leva ao refúgio no sonho e na transcendência religiosa e estes às


configurações do ideal.

Configurações do Ideal – Perfeição e plenitude das realizações (imaginárias ou reais) do


“eu”.Busca de um sen,do para a vida. Aspiração a um ideal superior.

Racionalidade o2mista e de luta:

Razão, Jus,ça, Amor / Fraternidade / Solidariedade

Ex.: “Hino à Razão”

Amor espiritualizado (“visão”)

Ex.: “Ideal”

Poeta como “voz da Revolução”

Ex.: “A um Poeta”
Poesia de Antero de Quental

Configurações do Ideal Angús,a Existencial

•  Inquietação espiritual.
•  Procura de algo que dê um sen,do ou uma finalidade à existência humana.
•  Aceitação de uma en,dade que aparece, quase sempre, sob contornos
vagos ou indefinidos e que pode assumir o nome de Deus (Ex.: “Ignoto
Deo”).
•  Desejo de sonhar.
•  Insa,sfação perante o real sen,do como demasiado frustrante ou
limitado.
Poesia de Antero de Quental

Configurações do Ideal Angús,a Existencial

Segundo o crí,co literário António Sérgio, há uma dualidade na


personalidade do poeta, dominada pelo:

espírito crí,co do filósofo (lucidez do intelecto; espírito apostólico;


autodomínio; consciência plena; concentração da a,vidade pensante;
exaltação do amor e da razão);

temperamento mórbido do homem (canto da noite, do sonho, da


submersão, da morte, dissolução da personalidade; repouso da alma no
Deus transcendente).
Configurações do Ideal – poemas exemplo
“A um poeta”
Tu, que dormes, espírito sereno, a
Posto à sombra dos cedros seculares, b
Como um levita à sombra dos altares, a
Soneto Longe da luta e do fragor terreno, b

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno, a
Afugentou as larvas tumulares… b
ESTRUTURA
Para surgir do seio desses mares, a
RIMÁTICA
Um mundo novo espera só um aceno… b

O esquema Escuta! É a grande voz das mul,dões!
rimá,co pode não c
São teus irmãos, que se erguem! são canções…
ser totalmente c
Mas de guerra… e são vozes de rebate!
convencional. d

Ergue-te, pois, soldado do Futuro, e
E dos raios de luz do sonho puro, e
Sonhador, faze espada de combate. d

ESTRUTURA MÉTRICA Versos


Soneto
decassilábicos

Tu, que dor mes, es pí ri to se reno

Pos to à som bra dos ce dros se cu lares


Configurações do Ideal – poemas exemplo
“A um poeta”

Surge et ambula Expressão la,na – “levanta-te e anda”



Tu, que dormes, espírito sereno,
Posto à sombra dos cedros seculares, Marca o tom
Como um levita à sombra dos altares, apela,vo do poema
Longe da luta e do fragor terreno,

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno, Voca,vo
Afugentou as larvas tumulares…
Para surgir do seio desses mares, Outras marcas
Um mundo novo espera só um aceno… linguís,cas
associadas ao
Escuta! É a grande voz das mul,dões! Impera,vo tom apela,vo do
São teus irmãos, que se erguem! são canções… poema
Mas de guerra… e são vozes de rebate!

Ergue-te, pois, soldado do Futuro,
O wtulo do poema – “A um poeta”:
E dos raios de luz do sonho puro, •  indicia uma forma de intervenção,
Sonhador, faze espada de combate. potenciadora de mudança na sociedade;
•  o eu lírico dirige-se ao poeta para chamar
a atenção para o seu papel
Configurações do Ideal – poemas exemplo
“A um poeta”

Surge et ambula Des,natário do soneto – o poeta:


•  tem um “espírito sereno”;
Tu, que dormes, espírito sereno,
Posto à sombra dos cedros seculares, •  vive/encontra-se acomodado, “à sombra
Como um levita à sombra dos altares, dos cedros seculares”, “como um levita à
Longe da luta e do fragor terreno, sombra dos altares”, “longe da luta e do

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno, fragor terreno”, ou seja, o des,natário
Afugentou as larvas tumulares… está longe da realidade e não é um
Para surgir do seio desses mares,
potencial agente de mudança.
Um mundo novo espera só um aceno…

Escuta! É a grande voz das mul,dões!
São teus irmãos, que se erguem! são canções… Incen,vo à ação, incen,vo à mudança, na
Mas de guerra… e são vozes de rebate! perspec,va de envolver o des,natário na

Ergue-te, pois, soldado do Futuro, construção de “um mundo novo”
E dos raios de luz do sonho puro,
Sonhador, faze espada de combate.
Configurações do Ideal – poemas exemplo
“A um poeta”

Surge et ambula Apelo direto à ação – incita o “soldado do futuro”



Tu, que dormes, espírito sereno, a:
Posto à sombra dos cedros seculares, •  tornar-se a,vo, por isso u,liza o impera,vo
Como um levita à sombra dos altares,
Longe da luta e do fragor terreno, “Ergue-te”;

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno, •  intervir na concre,zação do “mundo novo”;
Afugentou as larvas tumulares…
•  Aspetos vincados pela u,lização do
Para surgir do seio desses mares,
Um mundo novo espera só um aceno… campo lexical de guerra – “soldado”,

Escuta! É a grande voz das mul,dões! “espada”e “combate”
São teus irmãos, que se erguem! são canções…
•  Tudo será possível depois do “tu”
Mas de guerra… e são vozes de rebate!
perceber a necessidade de mudança:
Ergue-te, pois, soldado do Futuro,
E dos raios de luz do sonho puro, primeiro terá que “[acordar]” e
Sonhador, faze espada de combate.
“[escutar]” o que o sujeito poé,co tem
para dizer.
Configurações do Ideal – poemas exemplo
“A um poeta”

Surge et ambula

Tu, que dormes, espírito sereno,
Posto à sombra dos cedros seculares,
Como um levita à sombra dos altares, Comparação – realça a a,tude de passividade do
Longe da luta e do fragor terreno, poeta.

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno, Metáfora e personificação – reforça a nega,vidade
Afugentou as larvas tumulares… do tempo que termina.
Para surgir do seio desses mares,
Um mundo novo espera só um aceno…

Escuta! É a grande voz das mul,dões!
São teus irmãos, que se erguem! são canções…
Mas de guerra… e são vozes de rebate!

Ergue-te, pois, soldado do Futuro,
E dos raios de luz do sonho puro, Apóstrofe – iden,fica o des,natário do poema;
Sonhador, faze espada de combate. confere um tom coloquial e reforça o caráter
apela,vo do poema.
“Tormento do ideal”

Conheci a Beleza que não morre A “Beleza” não morre e caracteriza-se


E fiquei triste. Como quem da serra por ser uma “ideia pura”.
Mais alta que haja, olhando aos pés a terra
E o mar, vê tudo, a maior nau ou torre,

Minguar, fundir-se, sob a luz que jorre;
Assim eu vi o mundo e o que ele encerra Estado de espírito do sujeito poé,co:
Perder a cor, bem como a nuvem que erra
•  Estado de tristeza e desilusão.
Ao pôr-do-sol e sobre o mar discorre.

Pedindo à forma, em vão, a ideia pura,
Tropeço, em sombras, na matéria dura,
E encontro a imperfeição de quanto existe. Vocabulário indutor de “tormento”, dor,
desilusão, frustração.
Recebi o ba,smo dos poetas,
E assentado entre as formas incompletas
Para sempre fiquei pálido e triste.
“Tormento do ideal”

“Conheci” “Vi”

“a Beleza” “o mundo e o que ele encerra”


Conheci a Beleza que não morre § Característica apresentada na § Elementos constitutivos referidos nas 3ª e 4ª
E fiquei triste. Como quem da serra
Mais alta que haja, olhando aos pés a terra 1ªestrofe: “não morre” (v.1) estrofes:
E o mar, vê tudo, a maior nau ou torre,
§ Expressão sinónima usada na 3ª - “sombras” - “imperfeição”

Minguar, fundir-se, sob a luz que jorre; estrofe: “a ideia pura” (v.9) - “matéria dura” - “formas incompletas”
Assim eu vi o mundo e o que ele encerra
Perder a cor, bem como a nuvem que erra
Ao pôr-do-sol e sobre o mar discorre. “Recebi o batismo dos poetas” (v.12)

Pedindo à forma, em vão, a ideia pura,
Tropeço, em sombras, na matéria dura,
Consequências para o “eu”:
E encontro a imperfeição de quanto existe.
§ Alteração da sua visão do mundo – verso(s) comprovativo(s): “Assim eu vi o mundo e o que
Recebi o ba,smo dos poetas,
E assentado entre as formas incompletas ele encerra/Perder a cor, bem como a nuvem que erra/Ao pôr do sol e sobre o mar discorre.”
Para sempre fiquei pálido e triste. (vv.6-8)
§ Transformação do seu estado de espírito – verso(s) comprovativo(s): “E fiquei triste.” (v.2) e
“Para sempre fiquei pálido e triste” (vv.14)


O “tormento” do “eu” decorre da sua busca pelo “ideal” , que anteviu,
e do seu confronto com o mundo real imperfeito.
Síntese

Preocupações sociais, as ideias revolucionárias



A degeneração da burguesia num capitalismo de especulação que nada produzia faz com
que Antero apele para:
•  a Jus,ça;
•  o Pensamento;
•  a Ideia (que será a luz do mundo);
•  a revolta e a luta (até tudo estar no seu lugar);
•  o trabalho (de que alguma coisa ficará);
•  o Cristo (avô da plebe);
•  a liberdade (sob o império da Razão).

Sob esta égide encontram-se os sonetos «A um poeta», «Hino à Razão», «A Ideia».


Síntese

O pessimismo e a evasão

•  O pessimismo manifesta-se em 1874 e desenvolve-se desde 1876 a 1882; ex,ngue-se
nos anos imediatos e em 1886 deixava o poeta, sem nostalgia, numa região espiritual
já percorrida.
•  Nos sonetos deste ciclo vê-se a dor em todo o lado e ouve-se con,nuamente dizer que
é preferível o «não ser» ao «ser como é». Vêem-se já influências do budismo.
•  É o pessimismo que leva Antero a evadir-se, a fugir para-além de tudo o que existe e o
faz sofrer. Procura refugiar-se num mundo indefinido, longínquo e vago, na ação
material, absorvente e enérgica, num sono no colo da mãe, no desprendimento do
sensível, na aspiração a um Deus clemente, que o leve para o Céu.

Estes conteúdos são visíveis nas composições poé,cas «O Palácio da Ventura»,
«Despondency», «Nox».

Síntese

A metaZsica, Deus e a morte



A leitura de Proudhon e Hegel, o falecimento de pessoas queridas e a sua
enfermidade levaram-no a meditar na morte, que é considerada sob vários
aspetos:
•  morte ‑ liberdade;
•  morte ‑ fim de todos os sofrimentos;
•  morte ‑ irmã do amor e da verdade;
•  morte ‑ consoladora das tribulações;
•  morte ‑ berço onde se pode dormir;
•  morte ‑ paz santa e inefável.

Reportado a esta quarta linha temá,ca encontra-se, por exemplo, o soneto «Na
mão de Deus».
Síntese

• Antero exprime a revolta e o inconformismo da sua geração perante uma situação


social, polí2ca e cultural conservadora e retrógrada, fomentada por um roman,smo que
não conseguiu concre,zar os ideais que defendera.
• Mestre e mentor, inspirador e símbolo da Geração de 70, a sua personalidade está
in2mamente ligada à vida cultural e social em que, a2vamente, par2cipou.
• A poesia de Antero exprime as preocupações do ser humano que reconhece a sua
condição e a sua fragilidade, que sente esperanças e sofre os desalentos, que duvida
perante os mistérios da criação, da morte e de Deus.
• António Sérgio considera a existência de dois Anteros: o apolíneo e o noturno. O
primeiro exprime a Luz, a Razão e o Amor; o segundo canta a noite, a morte e o
pessimismo.
• Pode dividir-se a obra anteriana em quatro fases: a lírica ou de expressão do amor;
a do apostolado social e das ideias revolucionárias; a do pessimismo; e a da metaZsica e
regresso a Deus.
Síntese

• Para Antero, "a poesia é a voz da revolução". Ele foi um verdadeiro apóstolo social,
solidário e defensor da jus2ça, da fraternidade e da liberdade.
• As dúvidas, as deceções e a doença conduziram-no a um estado de pessimismo.
• Antero nunca conseguiu separar a poesia da vida, da sua ânsia de transformar o
mundo, da sua angús2a perante a dificuldade de explicar Deus, a vida e a morte.
• Antero luta por ideais feitos de amor, de jus2ça e de liberdade. Esperança e
desilusão são duas forças constantes no seu pensamento e na sua vida, entre as quais
tudo oscila.
• Idealista, acaba por considerar empobrecedoras as concre,zações da Ideia. Daí as
deceções constantes, sen,ndo que a sua luta não está a conseguir os resultados
projetados.
• Com dificuldade em libertar-se das adversidades, Antero dirige o seu pensamento
para o divino, embora sem abandonar o seu racionalismo.
• O pensamento de Deus surge, frequentemente, associado à morte, considerada
como a verdadeira libertação.
Evolução Ideológica da poesia de Antero de Quental

Posicionamento ideológico do autor sofre transformações. Evolução diacrónica:



Abandono do catolicismo /Dúvida e incerteza
A crença no catolicismo é abalada durante a vida universitária. Estado de dúvida e
incerteza que o faz sen,r uma angus2ante aspiração pelo Absoluto.

Idealismo hegeliano
As suas leituras levam-no a imbuir-se no hegelianismo e a preencher a sua produção
poé,ca com meditações metaZsicas radicadas no evolucionismo idealista de Hegel.
Segundo o idealismo, as coisas só se entendem como manifestações da ideia. Ora, os
seres não têm existência inteligível fora da ideia, que é a única realidade inteligível e da
qual o mundo é produto, evolução e manifestação.
Hegel diz que a Ideia é movida por uma necessidade intrínseca para a sua determinação,
para a sua manifestação. Mas, ao determinar-se, cada manifestação da Ideia (Tese)
esbarra na sua contrária (Anwtese) e logo se transforma numa nova (Síntese). Esta tríade
não pára até se consciencializar no indivíduo e no estado.
Evolução Ideológica da poesia de Antero de Quental

Socialismo utópico
Se o hegelianismo explica a origem e a realidade do Universo em Evolução, não resolveu o
problema do homem na terra, por isso surge a questão «Para que nos criastes?». Antero
vai agora à procura do sen,do prá,co da vida que lhe será indicado por Michelet e
Proudhon.

Apostolado social
Antero lançou-se na ação social e labutou afincadamente pela implantação de uma ordem
na sociedade portuguesa. O seu socialismo nada teve de revolucionário ou de anárquico.
O bem-estar social devia provir não de uma revolta armada mas da evolução pacífica,
baseada na moralidade, na instrução e na autopromoção da classe trabalhadora.

Evolução Ideológica da poesia de Antero de Quental

Pessimismo e budismo
Gorada a ação social, vi,mado pela doença e outras contrariedades, encheu-se-Ihe a alma
de pessimismo, sob influência de Schopenhauer para quem tudo no mundo é impulso
(vontade) que ao agir só encontra obstáculos. Assim, na terra, tudo é obstáculos, tudo é
dor.
Antero convenceu-se que o Universo era um sofrimento sem finalidade e que tudo
caminhava inevitavelmente para o nada. Só a consciência não fazia esse percurso porque
devia esforçar-se para a,ngir o Nirvana, onde havia um repouso completo, o impulso não
depararia com obstáculos, e vigoraria o desejo do não-ser, posição a que chegou por
leituras de Hartmann que, em A Religião do Futuro, combate o catolicismo e o
protestan,smo, propondo uma religião que seria uma síntese de panteísmo hindu e de
maome,smo judeo-cristão.
“Hino à razão”

Discurso conceptual

Razão, irmã do Amor e da Jus,ça, É marcado por um elevado grau de


Mais uma vez escuta a minha prece.
elaboração formal.
É a voz dum coração que te apetece,
Duma alma livre só a , submissa.
Recorre a conceitos (noções), muitas
Por , é que a poeira movediça delas filosóficas. Materialização do
De astros, sóis e mundos permanece; conceito em palavra, muitas vezes
E é por , que a virtude prevalece,
E a flor do heroísmo medra e viça.
maiusculada.

Por ,, na arena trágica, as nações Trata-se de uma poesia de ideias e
buscam a liberdade entre clarões; ques,onação.
e os que olham o futuro e cismam, mudos,
O sujeito poé,co transforma a ideia
Por , podem sofrer e não se abatem,
abstrata (elogio da razão) numa imagem
Mãe de filhos robustos que combatem
Tendo o teu nome escrito em seus escudos! concreta (através, por exemplo, da
personificação e apóstrofe) que se
desenvolve ao longo do soneto.
“Hino à razão”

Paradoxo – o sujeito poé,co declara-se livre, mas


assume a submissão à Razão, que deve nortear os
Razão, irmã do Amor e da Jus,ça,
Homens.
Mais uma vez escuta a minha prece.
É a voz dum coração que te apetece,
Duma alma livre só a , submissa.
Apóstrofe – indica o des,natário do poema a
Por , é que a poeira movediça “Razão”- A apóstrofe humaniza a Razão,
De astros, sóis e mundos permanece; tornando-a um interlocutor “real” para o
E é por , que a virtude prevalece, sujeito poé,co.
E a flor do heroísmo medra e viça.

Por ,, na arena trágica, as nações Personificação da Razão – é “irmã do Amor e
buscam a liberdade entre clarões; da Jus,ça”, cria harmonia, garante a moral e o
e os que olham o futuro e cismam, mudos,
“heroísmo” dos homens e mo,va a procura da
Por , podem sofrer e não se abatem, liberdade e a resiliência.
Mãe de filhos robustos que combatem •  humanização da Razão, o que contribui para
Tendo o teu nome escrito em seus escudos!
a aproximar do sujeito poé,co, havendo,
deste modo, um tom de cumplicidade.

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