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Genética Básica

Bruno Lassmar Bueno Valadares


Edilson Divino de Araujo
Silmara de Moraes Pantaleão

São Cristóvão/SE
2011
Genética Básica
Elaboração de Conteúdo
Bruno Lassmar Bueno Valadares
Edilson Divino de Araujo
Silmara de Moraes Pantaleão

Projeto Gráfico e Capa


Hermeson Alves de Menezes

Diagramação
Nycolas Menezes Melo

Ilustração
Bruno Lassmar Bueno Valadares
Edilson Divino de Araujo
Silmara de Moraes Pantaleão

Copyright © 2011, Universidade Federal de Sergipe / CESAD.


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autorização por escrito da UFS.

FICHA CATALOGRÁFICA PRODUZIDA PELA BIBLIOTECA CENTRAL


UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

V136g Valadares, Bruno Lassmar Bueno.


Genética Básica/ Bruno Lassmar Bueno Valadares,
Edilson Divino de Araújo, Silmara de Moraes Pantaleão.
- São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe,
CESAD, 2011.

1. Genética. 2. Hereditariedade. 3. Genética de


populações. I. Araújo, Edilson Divino de. II. Pantaleão,
Silmara de Moraes. III. Título.

CDU 575
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Sumário
AULA 1
Bases cromossômicas da hereditariedade ............................................07

AULA 2
Leis básicas da hereditariedade e extensões das leis de Mendel .. .......17

AULA 3
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos ............................... 33

AULA 4
Herança ligada ao sexo e mecanismos de determinação sexual ... 51

AULA 5
Estrutura dos ácidos nucleicos . ........................................................ 65

AULA 6
Replicação do DNA e transcrição ...................................................................79

AULA 7
Código genético e tradução..............................................................113

AULA 8
Mutação e reparo do DNA.... ........................................................... 133

AULA 9
Regulação da expressão gênica ...... .............................................. 151

AULA 10
Princípios de Genética de Populações............................................ 167
Aula

BASES CROMOSSÔMICAS DA
1
HEREDITARIEDADE

META
Demonstrar a estruturação cromossômica e a organização do material genético durante o ciclo celular.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
conhecer a constituição do material de preenchimento do núcleo celular, a forma como a cromatina
se organiza durante a interfase e o processo de compactação do DNA e o comportamento dos
cromossomos durante as divisões mitóticas e meióticas.

PRÉ-REQUISITO
Biologia celular.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
Nesta aula iniciaremos o estudo da genética com as bases cromossômi-
cas da hereditariedade. Vamos discutir como os cromossomos são consti-
tuídos e sua relação com a molécula de DNA e os genes. Os conceitos aqui
estudados serão importantes para os conteúdos seguintes de hereditariedade.

CROMATINA

O núcleo das células é preenchido por material genético (DNA) as-


sociado a proteínas responsáveis pela compactação e organização dos cro-
mossomos, e RNA produzido na atividade de expressão dos genes. Esse
material que preenche o núcleo é denominado cromatina.
As moléculas de DNA (que serão estudadas mais detalhadamente na
aula de estrutura dos ácidos nucléicos) constituem, cada uma, um cromos-
somo da célula. Os cromossomos são visualizados apenas durante o período
de divisão celular. Durante a interfase, o DNA se encontra disperso no
núcleo, não sendo possível individualizar os cromossomos.
A cromatina apresenta diferentes níveis de compactação, dependente da
atividade genética da região do DNA. Regiões com maior atividade (síntese
de RNA para tradução de proteínas) encontram-se mais dispersas e, por
esse motivo, menos coradas nas observações microscópicas. Essas regiões
recebem o nome de eucromatina. As regiões de menor atividade encontram-
se mais compactadas, e por isso, também mais coradas, recebendo o nome
de heterocromatina. Essas diferenças de compactação devido à atividade
de expressão genética podem ser visualizadas na Figura 1.

Figura 1. Eletromicrografia destacando núcleo celular interfásico com regiões mais coradas de
heterocromatina e menos coradas, com eucromatina (Fonte: adaptado de: http://www.biologia.
edu.ar/cel_euca/images/01541a.jpg).

8
Bases cromossômicas da hereditariedade
Aula

Algumas regiões da heterocromatina permanecem sempre compactadas


e sem atividade genética. Essas regiões recebem o nome de heterocromatina
1
constitutiva. Outras regiões podem ser encontradas tanto sem atividade
como em atividade de expressão gênica, recebendo o nome de heterocro-
matina facultativa.
Genes localizados nas regiões de eucromatina são responsáveis por
codificar proteínas importantes em todo o ciclo de vida da célula, como
exemplo, as enzimas envolvidas no metabolismo energético. Na hetero-
cromatina constitutiva não encontramos genes em expressão. Esse mate-
rial genético está relacionado à história evolutiva do organismo e ainda é
fonte de inspiração para muitas pesquisas. As regiões de heterocromatina
facultativa apresentam genes responsáveis por diferenciar uma célula da
outra. Todas as células apresentam os mesmos genes, mas diferem pelos
genes que se encontram em expressão e os que se encontram inativados.
Na Figura 2 temos o exemplo de células do tecido conjuntivo responsáveis
pela síntese de colágeno. Quando estão em atividade são denominadas
fibroblastos e apresentam núcleos grandes e pouco compactados (devido
a alta atividade genética). Quando não estão mais em atividade, estas célu-
las são denominadas fibrócitos e apresentam núcleo menor e mais denso
(pouca atividade de síntese).

Figura 2. Fibroblastos (A) e fibócitos (B) (Fonte: http://ht.org.ar/histologia/NUEVAS%20UNI-


DADES/unidades/unidad3/imagenes/hetm1.jpg).

9
Genética Básica

COMPACTAÇÃO DO DNA
Durante a divisão celular, a cromatina que preenche o núcleo reduz
sua atividade de síntese e sofre um processo intensificado de compactação.
A compactação do DNA e individualização dos cromossomos serve para
organizar o material genético, facilitando a segregação na divisão da célula.
A compactação tem início com o enovelamento do DNA em uma estrutura
composta por 8 proteínas, um octâmero de histonas (H2A, H2B, H3 e H4, cada
uma em dose dupla). O DNA dá duas voltas em torno do octâmero e, por fora, é
acoplada a histona H1 (Figura 3). A esse complexo é dado o nome de nucleossomo.

Figura 3. Representação de um nucleossomo, composto pelo octâmero de histonas, DNA em duas


voltas e a histona H1 (Fonte: http://scienceblogs.com/transcript/upload/2006/08/nucleosome.gif).

A histona H1 tem um papel importante na compactação do DNA, ela é


responsável por fixar o DNA ao octâmero de histonas e ainda, de aproximar
um nucleossomo do nucleossomo seguinte. Esta aproximação faz com que
o DNA adquira agora a forma de um solenóide (aspiral) (Figura 4).

Figura 4. Aproximação dos nucleossomos pela histona H1 formando o solenóide (Fonte: http://3.
bp.blogspot.com/).

10
Bases cromossômicas da hereditariedade
Aula

Alguns pontos do solenóide vão se associar a proteínas não histônicas,


formando um filamento em espiral com “alças” do solenóide presas ao
1
mesmo. Essa estrutura de proteínas não histônicas vão formar uma “es-
queleto” que determina a estrutura do cromossomo. A eletromicrografia
de um cromossomo na Figura 5 mostra sua superfície irregular devido à
presença dessas alças.

Figura 5. Eletromicrografia de cromossomo. Observar as alças em sua superfície irregular (Fonte:


www.biomania.com.br/bio/Imagens/50122/Fig01.GIF).

ESTRUTURA DO CROMOSSOMO

A visualização dos cromossomos ocorre no período de divisão celular.


Nesta faze o cromossomo é visualizado com cromátides duplicadas, pois, já
ocorreu a duplicação do DNA durante a fase S da interfase. As cromátides
de um mesmo cromossomo são chamadas cromátides irmãs.
As duas cromátides são unidas por um ponto de constrição primária,
denominado centrômero. O centrômero tem um papel importante na
divisão celular, pois, é nessa região onde se encontra uma estrutura de pro-
teínas denominada cinetócoro, onde se ligam as fibras do fuso. Porções de
cromossomos sem centrômero, originadas a partir de quebras, se perdem
durante a divisão celular por não sofrerem direcionamento.
O centrômero divide cada cromátide em braço curto (p) e braço longo
(q). Ainda podemos encontrar em alguns cromossomos regiões de con-
strição secundária. Estas regiões apresentam genes que sintetizam RNA
ribossomal (que será estudado na aula de transcrição e tradução) e que, no
núcleo interfásico, correspondem à região organizadora do nucléolo. As
porções terminais, após a constrição secundária, são denominadas de satélite.
As extremidades de cada cromátide também são muito importantes
para o cromossomo, pois também estão relacionadas à manutenção de sua
estabilidade. Estas, recebem o nome de telômeros. A Figura 6 apresenta
esquematicamente essas estruturas citadas.

11
Genética Básica

Figura 6. Estrutura cromossômica (http://www.mundovestibular.com.br/materias/biologia/


citogenetica02.jpg).

DIVISÃO CELULAR
Existem dois tipos de divisão celular que, conseqüentemente, originam
cada um, um tipo de célula. A mitose é o tipo de divisão que origina as
células somáticas que compõem o corpo de um organismo, mantendo suas
características genéticas como o mesmo número de cromossomos (2n) da
célula mãe para as células filhas; e a meiose, por sua vez, origina as células
reprodutivas com metade do número de cromossomos da célula mãe (n).

MITOSE

A mitose tem grande importância para os seres vivos por possibilitar


a multiplicação celular que leva ao crescimento, reposição de células perdi-
das e também na reprodução assexuada de alguns organismos. A mitose é
subdividida nas seguintes fases:

Prófase – condensação dos cromossomos de forma que os mesmos


possam ser Individualizados. Formação das fibras do fuso mitótico e de-
saparecimento da membrana nuclear (carioteca).
Prometáfase – Organização dos cromossomos entre as fibrilas do fuso
mitótico e acentuação da compactação da cromatina.
Metáfase – Maior grau de condensação dos cromossomos e disposição
destes na placa equatorial da célula devido à tração das fibras do fuso.

12
Bases cromossômicas da hereditariedade
Aula

Anáfase – Separação das cromátides e migração dos cromossomos


para os pólos da célula.
Telófase – Descondensação da cromatina e reconstituição dos núcleos.
1
Citocinese – Divisão do citoplasma e separação das células filhas.
As fases da mitose poder ser visualizadas na Figura 7.

Figura 7. Representação do ciclo mitótico (http://www.virtual.epm.br/cursos/biomol/ciclo/gif/


ciclo.gif).

MEIOSE

Importante na formação dos gametas para os organismos que se repro-


duzem sexuadamente, assim, mantendo a quantidade de material genético
na fusão dos gametas e possibilitando diversidade entre os organismos. Este
processo se constitui por duas etapas de divisão celular:

1ª Divisão Meiótica - Uma célula com 2n cromossomos (diplóide)


origina duas células com n cromossomos, devido à separação dos cromos-
somos homólogos.
Prófase I:
Leptóteno: início da condensação da cromatina.
Zigóteno: maior grau de condensação, possibilitando individualizar os
cromossomos com o início de aproximação dos homólogos.
Paquíteno: cromossomos homólogos pareados, formando as tétrades.
Diplóteno: visualização dos quiasmas onde ocorre a recombinação de
partes das cromátides homólogas.
Diacinese: desaparecimento da membrana nuclear (carioteca) e dis-
posição dos cromossomos entre as fibrilas do fuso mitótico.

13
Genética Básica

Metáfase I:
Organização dos cromossomos na placa equatorial onde os homólogos
se encontram, desta vez, pareados.
Anáfase I:
Separação dos cromossomos homólogos que migram para os pólos
da célula orientados pelos centríolos.
Telófase I:
Reorganização do núcleo nos pólos e divisão do citoplasma.
2ª Divisão Meiótica - Das duas células-filhas haplóides resultarão 4
células também haplóides por separação, agora, das cromátides irmãs.
Prófase II:
Corresponde ao final da telófase I com o desaparecimento da mem-
brana nuclear.
Metáfase II:
Posicionamento dos cromossomos na região equatorial da célula.
Anáfase II:
Separação das cromátides irmãs e migração para os pólos da célula.
Telófase II:
Reconstituição dos núcleos e divisão citoplasmática (citocinese), com
a formação de 4 células filhas haplóides e geneticamente diferentes entre
si devido à recombinação de partes dos cromossomos homólogos ocor-
ridas na prófase I.
As fases da meiose estão representadas resumidamente na Figura 8.

Figura 8. Representação das fases da meiose (Fonte: http://4.bp.blogspot.com/).

14
Bases cromossômicas da hereditariedade
Aula

RECOMBINAÇÃO GÊNICA 1
A recombinação genética que ocorre durante a Prófase I da meiose tem
um importante papel evolutivo e adaptativo para as espécies. A recombina-
ção durante a formação de gametas possibilita uma maior diversidade de
arranjos alélicos. Alguns livros didáticos ainda denominam a recombinação
meiótica como “crossing over” (Figura 9). A recombinação meiótica será
estudada novamente na aula de ligação gênica e mapeamento cromossômico.

Figura 9. Recombinação genética entre cromátides de cromossomos homólogos, promovendo diver-


sidade na formação de gametas (Fonte: http://www.accessexcellence.org/AB/GG/crossing.php).

CONCLUSÃO
Nesta aula é importante ressaltar a idéia da constituição cromossômica
e como ocorre a compactação do DNA para sua formação. Compare o que
ocorre na mitose e na meiose, veja as diferenças entre as células formadas
em cada um desses tipos de divisão celular.
O entendimento da hereditariedade estudada nas próximas aulas será
mais fácil com uma boa compreensão dos conceitos aqui abordados.

15
Genética Básica

RESUMO
Os cromossomos são resultado da compactação do DNA. Durante a
interfase, a cromatina se encontra dispersa preenchendo o núcleo da célula de
eucariontes. Durante a divisão celular, a cromatina sofre a compactação, o que
torna possível a individualização dos cromossomos. Na divisão mitótica, o numero
cromossômico e as características genéticas da célula são mantidas, enquanto na
meiose, ocorre a redução do número de cromossomos para formação de gametas.

ATIVIDADES

1. Explique as etapas da compactação do DNA e relacione aos elementos


envolvidos na mesma:
2. Compare a divisão celular meiótica e mitótica quando ao resultado cro-
mossômico nas céluas filhas:

AUTOAVALIAÇÃO

Após estudar esta aula, consigo.


1. Definir eucromatina, heterocromatina constitutiva e heterocromatina
facultativa?
2. Descrever a morfologia dos cromossomos?
3. Explicar o processo de compactação do DNA?
4. Descrever as fases da mitose?
5. Descrever as fases da meiose?
6. Explicar a importância da recombinação meiótica?

PRÓXIMA AULA
Na próxima aula iremos falar sobre princípios básicos da hereditar-
iedade propostos por Mendel e as variações de mecanismos de herança.
.

REFERÊNCIAS
GRIFFITHS AJF, MILLER JH, SUZUKI DT, LEWONTIN RC, GEL-
BART WM. 2009. Introdução à Genética. 8 ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 794p.
PIERCE BA. 2004. Genética: um enfoque conceitual. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 758p.
SNUSTAD DP, SIMMONS MJ. 2008. Fundamentos de Genética. 4ª ed.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 903p.

16
Aula

2
LEIS BÁSICAS DA HEREDITARIEDADE
E EXTENSÕES DAS LEIS DE MENDEL

META
Explicitar os princípios básicos da hereditariedade propostos por Mendel e as variações de
mecanismos de herança.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
compreender os princípios da segregação de alelos (1ª lei) e segregação independente (2ª lei);
compreender a relação de dominância e recessividade entre alelos; definir conceitos de homozigose e
heterozigose, genótipo, fenótipo e sua relação com o ambiente; interpretar as proporções genotípicas
e fenotípicas de descendentes obtidos em um cruzamento; aplicar as regras de proporção e
probabilidade nos cruzamentos; conhecer um cruzamento teste; compreender casos de ausência de
dominância, alelos múltiplos, herança quantitativa, alelos letais e interação gênica.

PRÉ-REQUISITO
Bases cromossômicas da hereditariedade e noções matemáticas de proporção e probabilidade.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
Nesta aula muitos conceitos de Genética deverão ser observados para
que você tenha um melhor aproveitamento, como conceitos de genes,
alelos, dominância, recessividade, genótipo e fenótipo. A base desta aula é a
realização de cruzamentos onde serão observados os genótipos e fenótipos
dos descendentes. Para tanto, é importante que você tenha compreendido
bem os conceitos de segregação na aula anterior sobre bases cromossômicas
da hereditariedade.
A compreensão dos diferentes mecanismos de herança vai lhe propor-
cionar uma interpretação matemática da Genética. Primeiramente é impor-
tante compreender os mecanismos propostos por Mendel de segregação
dos alelos na formação dos gametas e a segregação independente de alelos
localizados em cromossomos distintos.
Os cruzamentos descritos por Mendel apresentam uma proporção
fenotípica de descendentes que caracterizam os princípios básicos da he-
reditariedade. Os demais mecanismos de herança que serão estudados a
seguir (nesta e em outras aulas) poderão obedecer a esses princípios, ou,
apresentar variações nessas proporções.

Figura 1. Representação dos cruzamentos realizados por Mendel, observando as proporções entre
os fenótipos de cor verde ou amarela das sementes.

Assim, verificou a existência de fatores hereditários que determinavam


essas características, sendo que estes fatores existiam aos pares nos organis-
mos, segregando na formação dos gametas. Assim, na fecundação, o novo
organismo recebia um desses fatores vindo de dada um dos parentais.
Entre esses fatores, um deles era dominante sobre o outro, definindo
com isso a dominância e a recessividade. Mais tarde, esses fatores foram
denominados “genes”. Observe o esquema do primeiro cruzamento onde
são originadas apenas ervilhas amarelas na Figura 2:

18
Leis básicas da hereditariedade e extensões das leis de Mendel
Aula

Figura 2. Diagrama representando o cruzamento entre ervilhas verdes


puras e ervilhas amarelas puras, resultando em 100% de descendentes
híbridos com fenótipo amarelo.

Neste caso, as ervilhas verdes (vv) e amarelas (VV) cruzadas eram puras
e, nos cruzamentos, foram produzidos os híbridos (Vv) que apresentavam
a cor amarela devido a seu fator de hereditariedade ser dominante para
esta característica.
Em seguida, em um auto-cruzamento dos descendentes da primeira
geração (F1) originou a segunda geração de descendentes (F2) com ervil-
has amarelas e verdes, respectivamente, na proporção 3:1 (Figura 3). Neste
cruzamento temos a demonstração dos princípios da primeira lei de Mendel
que postula a segregação dos alelos na formação dos gametas.

Como podemos observar, para a manifestação da característica da cor


verde das ervilhas, é necessário que estejam presentes os dois genes reces-
sivos (vv), enquanto para a característica amarela existem ervilhas puras
(VV) e híbridas (Vv), devido a dominância do gene para cor amarela. Na
genética, o indivíduo híbrido é conhecidos como heterozigotos, e os indi-
víduos puros, homozigoto dominante e homozigoto recessivo.
Em um segundo momento, Mendel observou o comportamento de
duas características nos cruzamentos (Figura 4). Neste cruzamento são
obtidas as proporções 9:3:3:1. A observação de duas características indepen-
dentes em um mesmo cruzamento demonstra os princípios da segunda lei
de Mendel que propõe a segregação independente dos alelos na formação
dos gametas.

19
Genética Básica

Figura 4. Cruzamento entre ervilhas amarelas/lisas com ervilhas verde/rugosas.

A constituição genética de um indivíduo é denominada genótipo, ou


seja, os genes que ele possui, dominantes ou recessivos, em homozigose
(puros) ou heterozigose (híbridos). Este genótipo produz um resultado
de expressão que é denominado fenótipo, sendo este, dependente das
condições ambientais e podendo ter sua manifestação alterada pelo ambi-
ente, por exemplo, a cor da pele de um indivíduo claro que se torna mais
escura pela exposição ao sol.
Os genes estão localizados nos cromossomos e ocupam posições es-
pecíficas determinadas lócus. As variações de um gene são denominadas
alelos e estes ocorrem aos pares nos indivíduos, ocupando o mesmo lócus
no par de cromossomos homólogos.
Recordando a divisão celular, os cromossomos homólogos são aqueles que
se separam na formação dos gametas e que, na fecundação, o indivíduo recebe
um lote de cada um dos pais que formarão novamente os pares de homólogos.

CRUZAMENTO TESTE

Um individuo que apresenta fenótipo dominante para uma deter-


minada característica pode ser tanto um homozigoto recessivo quanto

20
Leis básicas da hereditariedade e extensões das leis de Mendel
Aula

um heterozigoto. Assim, para determinarmos seu genótipo é necessário


realizar o que chamamos de cruzamento teste que consiste em cruzar um
indivíduo de fenótipo dominante com outro de fenótipo recessivo para a
2
mesma característica.
O indivíduo de fenótipo recessivo só pode apresentar um genótipo
homozigoto recessivo, portanto, os descendentes deste cruzamento serão
100% com fenótipo dominante e genótipos heterozigotos se o indivíduo
em questão for um homozigoto dominante. Sendo um heterozigoto, o cru-
zamento resultará 50% de indivíduos com fenótipo recessivo e 50% com
fenótipo dominante (sendo estes, heterozigotos). Observe os exemplos de
diagrama de cruzamentos teste na Figura 5.

Figura 5. Cruzamentos teste.

PROBABILIDADE NOS CRUZAMENTOS

Utilizando os conhecimentos da genética é possível estimar a proba-


bilidade de um determinado evento acontecer, por exemplo, a freqüência
esperada de indivíduos com determinada característica, descendentes de
um dado cruzamento, ou então, a possibilidade de nascimento de um ou
mais indivíduo que apresente uma característica em questão.
No cruzamento entre dois indivíduos, ambos heterozigotos, as chances
de nascer um que apresente fenótipo com a característica recessiva é de ¼
ou 25% (Figura 6).

Figura 6. Proporções observadas no cruzamento entre indivíduos heterozigotos.

21
Genética Básica

DETERMINAÇÃO DA PROBABILIDADE DE MAIS


DE UM EVENTO INDEPENDENTE

Regra do “ou”
Ocorrência de um ou outro evento: somam-se as frações
Ex.: No cruzamento entre dois indivíduos heterozigotos, qual a proba-
bilidade de gerar um indivíduo de fenótipo dominante, seja ele homozigoto
ou heterozigoto?
Genótipo homozigoto (AA) = ¼
Genótipo heterozigoto (Aa) = ¼ + ¼ = ½ → ¼ + ½ = ¾
As chances de gerar um indivíduo de fenótipo dominante, seja ele
homozigoto ou heterozigoto, são de ¾.
Regra do “e”
Ocorrência de um evento e outro, necessariamente: multiplicam-se as frações.
Ex.: Considerando o cruzamento de heterozigotos, qual a probabili-
dade de gerar um indivíduo de característica recessiva e outro dominante?
Fenótipo recessivo (aa) = ¼
Fenótipo dominante (AA + Aa) = ¾ → ¼ x ¾ = 3/16
As chances de gerar um indivíduo com característica dominante e outra
com característica recessiva, são de 3/16.

AUSÊNCIA DE DOMINÂNCIA

Dominância incompleta: É um tipo de ausência de dominância onde


o indivíduo heterozigoto apresenta fenótipo intermediário ao dominante
e ao recessivo.
Ex.: Flor de Mirabilis jalapa (conhecida como boca de leão) (Figura 7).
VV – flor vermelha
Vv – flor rósea
vv – flor branca

Figura 7. Flor boca de leão (Mirabilis jalapa) (Fonte: http://www.theora.com/).

22
Leis básicas da hereditariedade e extensões das leis de Mendel
Aula

Co-dominância: Outro tipo de ausência de dominância. Neste caso, o


indivíduo heterozigoto manifesta as duas características.
Ex.: Pelagem do gado da raça Shorthorn
2
VV – pelagem avermelhada
Vv – tipo ruão (pelos brancos e avermelhados)
Vv – pelagem branca

Figura 8. Gado da raça Shortorn apresentando a pelagem do tipo ruão (Fonte:


http://www.infoescola.com/pecuaria/gado-shorthorn/).

ALELOS MÚLTIPLOS

Considera-se alelos múltiplos a ocorrência de mais de dois alelos para


um mesmo gene.
Ex.: determinação da cor da pelagem de coelhos onde existem 4 alelos
diferentes na espécie, mas, o indivíduo possui apenas um par desses alelos
(Figura 9).
Nesta situação, os alelos ainda apresentam uma ordem de dominância:

C+ > cch > ch > c

Fenótipo Genótipo
Aguti C C , C+cch, C+ch, C+c
+ +

Chinchila cch cch, cchch, cchc


Himalaia chch, chc
Albino Cc

23
Genética Básica

Figura 9. Coelhos com pelagem aguti, chinchilla, himalaia e albino (Fonte: http://crv.educacao.
mg.gov.br/sistema_crv/index).

GRUPOS SANGUÍNEOS

Um caso de alelos múltiplos na espécie humana é a herança do sistema


ABO, onde existem os genes IA, IB, i. Sendo que entre os alelos IA e IB
também existe uma co-dominância, pois ambos se expressam.
As células apresentam mecanismos de identificação em suas membra-
nas por meio dos antígenos que são expressos nas mesmas. Quando uma
célula em um organismo apresenta um antígeno estranho ao mesmo são
produzidos anticorpos de defesa que consideram estes elementos como
um corpo estranho.
Estes alelos IA e IB produzem antígenos que se expressam nas mem-
branas das hemácias, enquanto o alelo i não produz esses antígenos de
membrana.

24
Leis básicas da hereditariedade e extensões das leis de Mendel
Aula

Fenótipo Genótipos
Antígeno de
membrana
Anticorpo Doa para Recebe de
2
A IAIA, IAi A Anti-B A e AB AeO
B B B
B I I ,I i B Anti-A B e AB BeO
AB IAIB AeB - AB A, B e O
O Ii - Anti-A e Anti-B A, B e AB O

O fator Rh nos grupos sanguíneos é determinado por um outro gene


localizado em cromossomo diferente e, portanto, independente do lócus
de determinação do fator ABO.

Antígeno de
Fenótipo Genótipos Anticorpo Doa para Recebe de
membrana
Rh+ RR, Rr Rh - Rh+ Rh+ e Rh -
Rh - RR - Anti-Rh Rh+ e Rh - Rh -

Heritroblastose fetal: mulheres que apresentam fator Rh – quando


casadas com homem Rh+ devem ficar atentas para essa questão. Tendo
um filho Rh+ ocorre o contato de sangue durante o parto fazendo com
que a mulher inicie a produção de anticorpos anti-Rh. Esses anticorpos são
capazes de atravessar a placenta, e no caso de outra gravidez seguinte com
filho Rh+, este seria espontaneamente abortado por rejeição do corpo da
mãe. Ciente dessa condição, estas mulheres devem procurar um médico que
iniciará o tratamento para evitar que ocorra a heritroblastose fetal.

“Falso O”
Existe um gene que é precursor da expressão dos antígenos de mem-
brana do fator ABO. Para que o indivíduo expresse esses antígenos é
importante que o indivíduo tenha genótipo HH ou Hh. Indivíduos com
genótipo hh não apresentam antígenos do fator ABO e pertencendo ao
grupo O, mesmo tendo os genes para antígenos A ou B. Este fenômeno é
conhecido como “efeito Bombaim”.

INTERAÇÃO GÊNICA
Existem vários casos onde os genes se interagem, havendo mais de um
par de alelos determinando uma única característica. Um exemplo clássico
de interação gênica é encontrado na determinação do formato da crista de
galinhas (Figura 10).

25
Genética Básica

Fenótipo Genótipos
Noz RREE, RrEE, RREe, RrEe
Rosa RRee, Rree
Ervilha rrEE, rrEe
Simples Rree

Figura 10. Diferentes fenótipos para cristas de galinhas (Fonte: http://www.iped.com.br/sie/


uploads/18609.jpg).

PLEIOTROPIA
Ao contrário da interação gênica, alguns alelos são responsáveis
por mais de uma característica, ocasionando assim casos de pleiotropia, que
ocorre algumas vezes devido aos genes para estas características estarem
localizados muito próximos em um mesmo cromossomo, ou então por
uma característica ser conseqüência da outra, como é o caso do albinismo
(indivíduos com ausência de pigmentação na pele) que também determina
outras características como hipersensibilidade à luz e maior predisposição
ao câncer de pele (Figura 11).

26
Leis básicas da hereditariedade e extensões das leis de Mendel
Aula

Figura 11. Indivíduo albino (Fonte: http://www.cecillethestoryteller.files.wordpress.com).

Outro exemplo clássico de pleiotropia é o caso da cebola arroxeada,


que é resistente à infecção de um fungo, enquanto a cebola branca é sus-
cetível (Figura 12).

Figura 12. Cebolas roxas e brancas (Fonte: http://www.saude.abril.com.br/imagens/0312/20-


trocas-14.jpg).

27
Genética Básica

HERANÇA QUANTITATIVA
Para uma mesma característica existem dois ou mais pares de genes
situados em cromossomos de pares distintos. Cada alelo dominante apre-
senta um efeito aditivo sobre o fenótipo.
É o tipo de herança observada em características como a cor da pele
(Figura 13), altura e cor dos olhos. Nesse tipo de herança cada caracter-
ística apresenta mais de dois fenótipos. A relação entre alelos e fenótipos
é expressa pela fórmula a seguir:

Nº de fenótipos = Nº de alelos + 1

Figura 13. Diferença quantitativa na pigmentação da pele (Fonte: http://www.citasimundoevari-


ascaras.blogspot.com).

Vejamos o exemplo da cor da pele:

Negros: AABB. Onde temos:


Mulatos escuros: AABb, AaBB.
Mulatos médios: AAbb, AaBb, aaBB. Nº de classes = 5
Mulatos claros: Aabb, aaBb. Nº de alelos = 4
Brancos: aabb.

28
Leis básicas da hereditariedade e extensões das leis de Mendel
Aula

As proporções para cada classe podem ser calculadas construindo-se


o triângulo de pascal.
2
Havendo 5 classes fenotípicas, temos as
1 seguintes proporções:
1 1
1 2 1 Negros: 1
1 3 3 1 Mulatos escuros: 4
1 4 6 4 1 Mulatos médios: 6
1 5 10 10 5 1 Mulatos claros: 4
1 6 15 20 15 6 1 Brancos: 1

GENES LETAIS

Em alguns casos, determinados genótipos são letais para o indivíduo,


alterando a freqüência esperada de descendentes para determinada carac-
terística.
Ex.: foi detectado em alguns camundongos que no cruzamento entre
indivíduos de pelagem preta, 100% dos descendentes eram pretos, enquanto
no cruzamento entre indivíduos marrons, sempre encontravam em torno
de 33% de indivíduos pretos, nunca havendo uma descendência exclusiva
de indivíduos marrons.
O gene A determina a cor marrom da pelagem nesses indivíduos,
enquanto a, determina a cor preta. Os resultados observados nesses cru-
zamentos mostraram que não existiam indivíduos marrons homozigotos
(AA), mas apenas heterozigotos (Aa).
Estudos posteriores mostraram que os indivíduos de genótipo AA
morriam ainda no útero, mostrando que este genótipo era legal para os
camundongos. Assim, a freqüência esperada de descendentes nos cruza-
mentos entre camundongos marrons era de 1/3 de indivíduos pretos para
2/3 com pelagem marrom (Figura 14).

29
Genética Básica

Figura 14. Diagrama representando o cruzamento para alelos letais.

CONCLUSÃO

Ao final desta aula podemos concluir que as interpretações matemáticas


dos resultados obtidos nos cruzamentos facilitaram a compreensão dos
diversos mecanismos de herança. Será muito importante essa compreensão
das proporções de fenótipos e genótipos entre os descendentes nos cru-
zamentos para que o conteúdo das próximas aulas (Ligação gênica e ma-
peamento cromossômico e herança ligada ao sexo) sejam bem assimilados.

RESUMO
Com a observação de cruzamentos realizados com ervilhas, Mendel
descreveu os princípios básicos da hereditariedade, postulados como 1ª Lei
de Mendel: segregação dos alelos na formação dos gametas, e 2ª Lei de
Mendel: segregação independente dos alelos. Conceitos muito importantes
para a Genética também foram descritos por Mendel, como a relação de
dominância e recessividade. Variações das leis de Mendel podem ser ob-
servadas diversas características em diferentes organismos, que não obede-
cem as proporções descritas por Mendel, como nos casos de ausência de
dominância, alelos letais, alelos múltiplos, herança quantitativa e interação
gênica. Em alguns desses outros mecanismos a proporção de descendentes
encontrada nos cruzamentos pode diferir do que foi proposto por Mendel,
como no caso dos alelos letais onde um tipo de genótipo é eliminado e
na ausência de dominância onde um terceiro fenótipo é determinado pelo
indivíduo hibrido.

30
Leis básicas da hereditariedade e extensões das leis de Mendel
Aula

ATIVIDADES
1. Esta atividade consiste em um jogo que aborda a determinação genética
2
dos grupos sanguíneos. Acesse o jogo pelo endereço a seguir, imprima,
leia as informações, monte as peças e jogue com pessoas da sua família ou
até mesmo sozinho.
http://www.geneticanaescola.com.br/ano4vol1/MS11_004.pdf

2. Faça uma listagem relacionando diferentes mecanismos de herança abor-


dados na aula que você encontra no jogo da atividade 1:

COMENTÁRIO SOBRE AS ATIVIDADES

1. O aprendizado de conteúdos de genética pode ser facilitado por


meio da utilização de recursos como jogos e modelos didáticos. Essa
atividade lúdica é bastante útil para rever conceitos e fixar grande parte
do conteúdo estudado.
2. Esta atividade aborda diferentes conteúdos da aula de bases da
hereditariedade. Alem de rever, exercitar e fixar o conteúdo de
determinação genética dos grupos sanguíneos você poderá encontrar
exemplos de segregação independente, ausência de dominância, alelos
multiplos e interação gênica.

AUTOAVALIAÇÃO

Após, estudar esta aula, consigo:


1. Explicar a relação alélica de dominância e recessividade?
2. Explicar como o ambiente pode influenciar em um fenótipo?
3. Conhecer a base citológica para explicar a 1ª e a 2ª lei de mendel?
4. Descrever como são realizados cruzamentos testes e explique qual sua
finalidade?
5. Conhecer qual aspecto diferencia um caso de co-dominância de outro
com dominância incompleta?
6. Saber qual a influencia de um alelo letal dominante na proporção espe-
rada de descendentes?
7. Conhecer no cruzamento de um casal de coelhos chinchila, no qual
foi gerado um coelho albino, qual o genótipo para esta característica dos
parentais?
8. Defina o conceito de pleiotropia?

31
Genética Básica

PRÓXIMA AULA
Na próxima aula, serão estudados genes localizados em um mesmo
cromossomo, diferente, do que estudamos nessa aula (genes de segrega-
ção independente). Tenha como base os conhecimentos desta aula de
cruzamentos e segregação de alelos e da aula anterior, da segregação de
cromossomos homólogos na meiose.

REFERÊNCIAS

GRIFFITHS AJF, MILLER JH, SUZUKI DT, LEWONTIN RC, GEL-


BART WM. 2009. Introdução à Genética. 8 ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 794p.
PIERCE BA. 2004. Genética: um enfoque conceitual. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 758p.
SNUSTAD DP, SIMMONS MJ. 2008. Fundamentos de Genética. 4ª ed.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 903p.

32
Aula

LIGAÇÃO, RECOMBINAÇÃO E
3
MAPEAMENTO GÊNICOS

META
Discutir a importância dos princípios que regem a origem da diversidade genética a cada geração
celular e a construção de mapas físicos para a localização de genes em cada cromossomo do
genoma.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
compreender a importância dos mecanismos de ligação gênica e recombinação para a origem da
diversidade genética nas populações naturais;
construir mapas genéticos.

PRÉ-REQUISITOS
Antes de iniciar o estudo da Recombinação Genética, o aluno deverá fazer uma leitura sobre a As
Leis de Mendel em um livro de genética Genética consultando a bibliografia recomendada.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
A diversidade biológica de determinada espécie é o conjunto de car-
acterísticas morfológicas e fisiológicas que a torna capaz de responder ás
mudanças ambientais. Essa diversidade é originada pelos diferentes con-
juntos de alelos estocados nos diferentes indivíduos de uma população. As-
sim, quanto mais diversificada for esta população, maior a variabilidade de
respostas ás mudanças ambientais e, consequentemente a sua sobrevivência.
Os mecanismos genéticos que dão origem a essa diversidade, a seg-
regação independente e a recombinação gênica, ocorrem durante a divisão
celular meiótica, gerando os gametas.
Na segregação independente dos cromossomos (Fig. 1), ou 2ª Lei
de Mendel, os cromossomos e seus genes podem combinar-se ao acaso,
gerando gametas com diferentes arranjos, como em um sorteio. As com-
binações mais freqüentes são as parentais; as menos freqüentes são a de
gametas recombinantes, ou seja, com novas combinações. As proporções
esperadas serão 1:1:1:1.

No entanto, nem todos os genes se comportam de maneira indepen-


dente, pois quanto mais próximos estiverem no cromossomo maior a
probabilidade de serem herdados juntos. A única maneira de separá-los é por
meio do crossing-over ou recombinação gênica, que ocorre durante a prófase
da meiose I, permitindo que genes muito próximos no cromossomo possam
ser re-arrumados a cada divisão celular, gerando gametas com diferentes
combinações. Mas, diferente da segregação independente de Mendel, na
recombinação gênica a proporção de recombinantes é maior e a análise dos
cruzamentos mostra uma proporção maior dessas combinações.
Pode-se relacionar a freqüência de recombinantes produzida pelo
crossing over á distancia entre os genes, mostrando o rearranjo de genes
ao longo de um cromossomo e permitindo construir mapas físicos dos
cromossomos antes dos mapas moleculares, como veremos neste capitulo

34
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos
Aula

Cada espécie de organismo deve conter de centenas a milhares de genes


e, geralmente, um número menor de cromossomos. Para entender essa
desigualdade as analises genéticas mostram que cada cromossomo é um
3
pedaço de DNA, que carrega centenas ou poucas centenas de diferentes
genes que estão dispostos ao longo dele como contas em um colar
Os cromossomos são, por isso, chamados grupos de ligação, pois con-
têm um grupo de genes que são ligados juntos. O número de grupos de
ligação corresponde ao número de tipos de cromossomo de dada espécie.

Figura 2 – Estrutura de um cromossomo evidenciando cromossomos ligados

P. exemplo, em humanos

Figura 3- Cariograma humano

35
Genética Básica

- 22 grupos autossômicos de ligação


- Um grupo de ligação do cromossomo X
- Um grupo de ligação do cromossomo Y

O termo ligação (linkage) tem dois significados relacionados:


1. Dois ou mais genes podem estar localizados no mesmo cromossomo.
2. Genes que são muito próximos tendem a ser transmitidos juntos.

BREVE HISTÓRICO DOS ESTUDOS DE


RECOMBINAÇÃO

Logo após a descoberta dos trabalhos de Mendel, em 1900, seus ex-


perimentos foram repetidos por vários cientistas, utilizando-se de diferentes
modelos, animais e vegetais, para corroborar seus estudos. Assim, em 1905,
William Bateson e Reginald Punnett conduziram um cruzamento em ervilha
de cheiro envolvendo 2 traços diferentes:
- Cor da flor e forma do grão.
- Esperavam uma proporção fenotípica de 1:1:1:1 na geração F2.
- Encontraram resultados surpreendentes que não souberam explicar.

Figura 4 – Experimento envolvendo ligação gênica em ervilhas

36
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos
Aula

Entre os anos de 1910 e 1915, porém, os estudos de Thomas Hunt


Morgan e seus colaboradores em Drosophila melanogaster, mostraram
também, desvios da 2ª lei de Mendel. Seus estudos associariam genes e
3
cromossomos definitivamente. A escolha desse organismo foi essencial
para os estudos de Morgan, uma vez que essas moscas são de pequeno
tamanho (3 a 4 mm), de fácil manuseio, têm um ciclo de vida muito
curto (aproximadamente 12 dias), além de serem extraordinariamente
fecundas (cada fêmea pode originar 200 a 300 descendentes ao longo
da sua vida), terem sexos facilmente distinguíveis, apresentam grande
diversidade de formas e o seu cariótipo possui apenas quatro pares de
cromossomas (três autossômicos e um par de cromossomas sexuais).
Nesses estudos, Morgan e col. analisaram cruzamentos envolvendo 2
caracteres autossômicos: cor do olho e tamanho das asas em Drosophila.
Sabia-se que a cor do olho era determinada por um gene (vermelho ou púr-
pura), e o tamanho da asa (normal ou vestigial). O cruzamento de indivíduos
de olhos vermelhos e asa normais com outro de olhos púrpura com outro
de asas vestigiais gerava só indivíduos com olhos vermelhos e asas normais:
Cor dos olhos: Vermelho- pr+ (dominante), pr- púrpura (recessivo)
Forma das asas: normal- vg+ (dominante), vg- vestigial (recessivo)

P pr/pr. vg/vg X pr+ / pr+. vg+/ vg+

Gametas pr. vg pr+ vg+

Diíbrido de F1 pr+/ pr . vg+/ vg

Cruzamento-teste ♀ pr+/ pr . vg+/ vg X ♂ pr/pr. vg/vg (testador)

O cruzamento teste, que serve para testar a segregação do geni-


tor diíbrido em relação ao genitor recessivo (testador), mostrou uma
proporção diferente da mendeliana (1:1:1:1), revelando números dife-
rentes de descendentes com combinações parentais e recombinantes,
como segue:

pr+. vg+ 1.339


pr . vg 1.195
pr+ . vg 151
pr . vg+ 154
2.839
Esse desvio mostra que as 2 primeiras combinações de genes es-
tão ligadas. Observando-se o percentual de recombinantes na prole,
Morgan percebeu que o numero de indivíduos era aproximadamente
igual (151 ~ 154), gerando um total de 305, que é uma freqüência de
10,7 ou (305/2839) X 100.

37
Genética Básica

Com esses dados Morgan postulou que os genes estavam fisica-


mente ligados no mesmo cromossomo e as combinações são mantidas
juntas na prole.
Desse modo ficou comprovado que os genes que estão juntos no
mesmo cromossomo não segregam de modo independente;
Mas se os genes estão ligados como mostra a alta proporção de
combinações parentais, como aparecem as combinações novas, re-
combinantes?
Morgan sugeriu que, durante a meiose, quando há o pareamento de
homólogos, os cromossomos podem trocar pedaços, em um processo
chamado crossing-over.
Esse processo permite a recombinação gênica. O crossing-over
ocorre durante a prófase I da meiose no estágio bivalente, onde
cromátides não-irmãs de cromossomos homólogos trocam pedaços
de DNA. Essa troca pode ocorrer em qualquer local entre 2 moléculas
complementares de DNA, mas não é constante.

Figura 5 – Crossing-over e recombinação durante a meiose

A evidência citológica do crossing-over são os quiasmas-pontos de união


entre as cromátides não-irmãs de cromossomos homólogos que trocaram
pedaços durante a meiose.

38
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos
Aula

Não há alteração nas seqüências de nucleotídeos no sítio de troca; a


quebra e os eventos de religação ocorrem de uma forma tão precisa que
não há perda, ganho ou alteração de um único nucleotídeo.
3
O crossing-over ocorre no estagio de quatro cromátides, podendo ocorrer
de um a vários crossing a cada divisão, por cromossomo.
A freqüência de recombinação não é constante ao longo de todo o
genoma e é influenciada por efeitos tanto globais quanto locais. Ela pode
medir a força da ligação entre os genes. Quanto mais próximos, mais rara
a separação e a recombinação, ou vice-versa. Para qualquer 2 genes, a
freqüência de recombinação nunca ultrapassa 50%; pois essa só é alcançada
quando os genes estão muito distantes em um cromossomo ou estiverem
em cromossomos diferentes e se distribuem independentemente. Ou seja,
não estão ligados.

Figura 6- Distribuição cromossômica envolvendo diíbridos com genes ligados

Quanto ao arranjo dos alelos dominantes e recessivos, há duas con-


figurações possíveis: cis, quando os alelos dominantes estão no mesmo
cromossomo e trans quando em cada cromossomo localiza-se um domi-
nante e um recessivo.

Figura 7 – Configurações de ligação entre genes ligados

39
Genética Básica

FREQÜÊNCIA DE RECOMBINAÇÃO E MAPA


GENÉTICO
A contribuição mais importante dos estudos de Morgan e seus colabora-
dores foi relacionar a freqüência de recombinantes produzida pelo crossing
over á distancia entre os genes, mostrando o rearranjo de genes ao longo
de um cromossomo, permitindo construir mapas físicos dos cromossomos
antes dos mapas moleculares.
A distância entre os genes determina a probabilidade da ocorrência de
crossing. As freqüências de recombinantes para genes ligados variam de 0
a 50%, dependendo da distancia entre eles. Como já vimos, quanto mais
distantes mais suas freqüências se aproximam de 50%, o que dificulta saber
de os genes estão ligados ou em cromossomos diferentes.
O método básico de mapeamento gênico foi desenvolvido por Alfred
Sturtevant, aluno de Morgan, que associou a distancia de genes a distancia
real entre eles nos cromossomos.
Usando a freqüência de recombinante encontrada por Morgan de 10,7 %
(ver acima) Sturtevant propôs utilizá-la como um índice quantitativo da distancia
linear entre os genes pr e vg em um mapa de ligação.
Ele então definiu uma unidade de mapa (u.m.) como a distancia entre
genes para a qual um produto de meiose em 100 é recombinante. Ex: a
freqüência de recombinação (FR) de 10,7 será 10,7 u.m. A unidade de ficou
também conhecida como centimorgan (cM), em homenagem a Morgan.
O mapa geralmente é representado de maneira linear, onde os locus
gênicos delimitam as distancias entre os genes.
Ex:
Porcentagem de recombinação entre genes A e B: 19%
Porcentagem de recombinação entre A e C: 2%
Porcentagem de recombinação entre B e C: 17%
A distância entre A e B será de 19 centimorgans, A e C, de 2 centim-
organs e B e C, de 17 centimorgans:

CRUZAMENTO –TESTE DE 3 PONTOS

Pode-se calcular a freqüência de recombinantes e, conseqüentemente,


a as distancias entre os genes por meio do cruzamento-teste diíbrido, como
mostrado nos cruzamentos entre os genes pr e vg , e, de maneira mais

40
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos
Aula

complexa, utilizando o cruzamento teste de 3 pontos. Essa metodologia


utiliza um cruzamento entre um triíbrido e um testador triplo recessivo.
3

41
Genética Básica

Figura 8- Recombinação e formação de gametas em cruzamento-teste de 3 pontos.

A detecção de classes recombinantes duplas mostra que podem ocor-


rer crossing-over duplos. Um crossing-over em uma determinada região
do cromossomo afeta a probabilidade de ocorrência de outro crossing em
uma região adjacente, ou seja, esses fenômenos não são independentes. Essa
interação é chamada de interferência. Se os crossings em duas regiões são
independentes, então, a frequência de recombinantes duplos seria igual ao
produto das frequências de recombinantes nas regiões adjacentes
Interferência (I): um crossing reduz a probabilidade de outro crossing
em uma região adjacente

Coincidência (C): proporção de recombinantes duplos observados em


relação ao esperado

42
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos
Aula

Assim:
I = 1 – C, em que:
C = (nº observado de recombinantes duplos - FRDO/ nº esperado de
3
recombinantes duplos - FRDE)
No exemplo de Drosophila:
FRDO = 8
FRDE = 0,064 x 0,132 = 0,0084 (8% de 1448 = 12)
I = 1 – 8/12 = 4/12 = 1/3 = 33%
C = 0 (interferência completa, I = 1)
Nesse caso não são observados duplo recombinantes
C = 1 (ausência de interferência, I = 0)
Nesse caso o número de duplo recombinantes observado é igual ao
número esperado de duplos recombinantes

CONCLUSÃO

O mapeamento de genes através de analise ligação serve para estimar


a posição relativa dos genes através da freqüência de crossing. Mas ainda
é incompleto, pois não estabelece distancias em relação ao centrômero ou
telômeros, os marcos citológicos de um cromossômico, para associar um
dado gene a um cromossomo. No entanto a analise conjunta de um gene
ligado a determinado cromossomo e seu mapa cromossômico ampliam a
analise genética. Com o emprego das metodologias moleculares, os mapas
de ligação são associados a dados de mapas físicos e tem fornecido infor-
mações valiosas sobre doenças e seus genes defeituosos. Essas associações
permitiram construir um “mapa mórbido” (Figura 9))

43
Genética Básica

Mapa genético humana, representando a associação entre genes e


doenças

Figura 9- Mapa genético humano representando a associação entre genes e doenças (Fonte: www.educarchile.cl).

44
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos
Aula

do genoma humano que tem ajudado muitas famílias com doenças


genéticas raras a rastrear genes de doenças em suas famílias, auxiliando no
aconselhamento genético e no prognóstico dessas doenças. Além dessa
3
aplicação, os mapas de ligação associados a outros tem auxiliado nos estudos
de filogenia, na compreensão da diversidade entre espécies próximas, no
melhoramento genético animal e vegetal e, em seu sentido mais amplo, na
compreensão da diversidade genômica de populações naturais.

RESUMO

A formulação da teoria cromossômica da herança, associando genes a


cromossomos, foi um marco na Genética que possibilitou o grande avanço
que vemos hoje nas mais diversas áreas biológicas. A construção dos mapas
genéticos, através da freqüência de recombinantes em cruzamentos utili-
zando diferentes espécies, nos ajudou a associar genes a locais específicos.
Essa grande estratégia associada a metodologias citogenéticas e moleculares
atuais têm revelado uma gama enorme de diversidade, tanto visível (fenóti-
pos) quanto oculta, nos genomas de diferentes espécies.
Para a espécie humana, essa compreensão tem fornecido dados e met-
odologias essenciais que podem ajudar a pesquisa medica a fornecer dados
mais diretos a sociedade e impulsionado a construção de metodologias que,
em breve tempo, salvarão vidas.

EXERCÍCIO RESOLVIDO

Ex: Calculo de recombinação em cruzamento – teste de 3 pontos (3


genes) em Drosophila:

- v: olhos vermilion.
- cv: ausência de nervuras nas asas.
- ct: margens das asas cortadas.
P. v+v+ cvcv ctct x v v cv+cv+ ct+ct+

F.1 v+v cv+cv ct+ct x vv cvcv ctct

Distância entre os 1º e 2º genes v e cv (crossing simples)


v cv+ ct+ 580
v+ cv ct 592
v cv ct+ 45 FR = (45+40+89+94)/1448
v+ cv+ ct 40 FR = 268/1448
v cv ct 89 FR = 0,1850 x 100
94 FR = 18,5 cM
v+ cv+ ct+ 3
v cv+ ct 5
v+ cv ct+ Total 1448

45
Genética Básica

Distância entre os 1º e 3º genes v e ct (crossing simples)

v cv+ ct+ 580


v+ cv ct 592
v cv ct+ 45 FR = (89+94+3+5)/1448
v+ cv+ ct 40 FR = 191/1448
v cv ct 89 FR = 0,1320 x 100
94 FR = 13,2 cM
v+ cv+ ct+ 3
v cv+ ct 5
v+ cv ct+ Total 1448
D
Distância entre os 2º e 3º genes v e ct (crossing duplos)
v cv+ ct+ 580
v+ cv ct 592
v cv ct+ 45 FR = (45+40+3+5)/1448
v+ cv+ ct 40 FR = 93/1448
v cv ct 89 FR = 0,0640 x 100
94 FR = 6,4 cM
v+ cv+ ct+ 3
v cv+ ct 5
v+ cv ct+ Total 1448

Conclusão: Todos os locos estão ligados (situados no mesmo cromos-


somo), pois os valores de FR são menores que 50%.
Teste de três pontos:
Locos FR (cM)
v e cv 18,5
v e ct 13,2
cv e ct 6,4

Observe que a soma de 13,2 e 6,4= 18,2 refere-se a soma entre os 1o


e o 2º genes e entre o 2º e o 3º.

v ct cv

13,2 6,4

Com o cruzamento teste foi possível determinar a ordem dos três


genes no cromossomo.
As duas distâncias no mapa, 13,2 cM e 6,4cM, somam 19,6 cM, que é
maior que 18,5 cM (distância calculada para v e cv) As duas classes mais
raras de genótipos correspondem a duplos recombinantes que surgem de
dois crossings.

46
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos
Aula

A detecção de classes recombinantes duplas mostra que podem ocor-


rer crossing-over duplos.
- Um crossing-over em uma determinada região do cromossomo afeta a
probabilidade de ocorrência de outro crossing em uma região adjacente,
ou seja, esses fenômenos não são independentes. Essa interação é chamada
de interferência.
- Se os crossings em duas regiões são independentes, então, a frequência
de recombinantes duplos seria igual ao produto das frequências de recom-
binantes nas regiões adjacentes.

Interferência (I): um crossing reduz a probabilidade de outro crossing


em uma região adjacente.
Coincidência (C): proporção de recombinantes duplos observados em
relação ao esperado.
Assim:
- I = 1 – C, em que:
- C = (nº observado de recombinantes duplos - FRDO/ nº esperado de
recombinantes uplos - FRDE).
- No exemplo de Drosophila:
- FRDO = 8.
- FRDE = 0,064 x 0,132 = 0,0084 (8% de 1448 = 12).
- I = 1 – 8/12 = 4/12 = 1/3 = 33%.

47
Genética Básica

C = 0 (interferência completa, I = 1).


- Nesse caso não são observados duplo recombinantes
- C = 1 (ausência de interferência, I = 0).
- Nesse caso o número de duplo recombinantes observado é igual ao número
esperado de duplos recombinantes.

ATIVIDADES

1. Analisando-se dois pares de genes em ligamento fatorial (linkage) rep-


resentados pelo híbrido BR/br, uma certa espécie apresentou a seguinte
proporção de gametas:

48,5% BR
48,5% br
1,5% Br
1,5% bR

Pela análise dos resultados, pode-se concluir que a distância entre os


genes B e R é de:

a. 48,5 cM
b. 97 cM
c. 1,5 cM
d. 3 cM.
e. 50 cM

2. O daltonismo deutan é um caráter determinado por gene recessivo ligado ao sexo.


A doença retinitis pigmentosum (cegueira completa ou parcial) é determinada por gene
dominante parcialmente ligado ao sexo. Uma mulher não daltônica e com retinite,
cuja mãe é daltônica e sem retinite e o pai não daltônico e com retinite, homozigoto,
casa-se com um homem daltônico e sem retinite. Considerando que a distância
entre os dois locos, no X, é de 10 unidades de mapa? Responda:
a) Qual a proporção genotípica esperada na descendência?
b) Qual a proporção fenotípica esperada na descendência?
c) Se o casal deseja ter dois filhos, qual a probabilidade de ocorrer um me-
nino normal e uma menina normal, para as duas características?

48
Ligação, recombinação e mapeamento gênicos
Aula

AUTOAVALIAÇÃO
Após estudar esta aula, consigo saber:
3
1. O que caracteriza um gene ligado?
2. Quantos e quais arranjos um gene ligado pode ter?
3. Qual a função do percentual de recombinação em um cruzamento para
a construção de um mapa genético?
4. O que significa Interferência?
5. O que significa Coincidência?

PRÓXIMA AULA

Trataremos da herança ligada ao sexo e dos mecanismos de determi-


nação sexual

REFERÊNCIAS

GRIFFITHS AJF, MILLER JH, SUZUKI DT, LEWONTIN RC, GEL-


BART WM. 2009. Introdução à Genética. 8 ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 794p.
PIERCE BA. 2004. Genética: um enfoque conceitual. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 758p.
SNUSTAD DP, SIMMONS MJ. 2008. Fundamentos de Genética. 4ª ed.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 903p.
Vídeos sugeridos
http://www.youtube.com/watch?v=f18U__0nBxQ&feature=PlayList&p
=36C97B9652CDB3E9&index=32

49
Aula

HERANÇA LIGADA AO SEXO E


4
MECANISMOS DE DETERMINAÇÃO
SEXUAL

META
Apresentar o mecanismo de herança de genes localizados nos cromossomos sexuais e os diferentes
mecanismos de determinação do sexo.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
compreender o mecanismo de herança dos genes estruturais localizados nos cromossomos
sexuais e conhecer exemplos de características determinadas por genes localizados no
cromossomo X; compreender o mecanismo de compensação de doses e explicar diferentes
mecanismos de determinação do sexo.

PRÉ-REQUISITOS
Conteúdo das aulas de mecanismos de herança e bases cromossômicas da hereditariedade.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
Na natureza, a maioria dos animais e muitas plantas, apresentam
diferença sexual, onde encontramos organismos masculinos e femininos.
Geralmente, essa diferenciação é determinada por cromossomos especiais,
denominados cromossomos sexuais. As características determinadas pelos
genes presentes nesses cromossomos também terão padrão de herança
diferente dos genes localizados nos demais cromossomos (autossomos).
Nesta aula vamos estudar a herança de caracteres genéticos determi-
nados por genes localizados nos cromossomos sexuais, algumas variações
e também os diferentes padrões de determinação genética do sexo.

HERANÇA DE CARACTERÍSTICAS
RELACIONADAS AO SEXO

A diferença cromossômica entre machos e fêmeas promove também


a ocorrência de um mecanismo de herança característico para os genes lo-
calizados nestes cromossomos. Havendo uma diferença morfológica entre
os cromossomos sexuais, regiões homólogas e não homólogas serão en-
contradas nos mesmos (Figura 1). As regiões não homólogas são chamadas
de regiões diferenciais, pois apresentarão genes presentes apenas naquele
tipo de cromossomo, assim, esses genes não terão homólogos no outro
cromossomo sexual.

Figura 1. Representação dos cromossomos X e Y humanos, destacando as regiões de homologia


e região não homóloga.

52
Herança ligada ao sexo e mecanismos de determinação sexual
Aula

A região homóloga entre X e Y são importantes por promover um


pareamento parcial entre esses cromossomos durante a divisão meiótica,
o que garante sua segregação na formação dos gametas. Nas regiões não
4
homólogas do cromossomo X, encontram-se genes de importância estru-
tural, inclusive genes para algumas doenças que serão estudadas a seguir.
No cromossomo Y, em sua porção não homóloga, encontramos genes
masculinizantes e de características exclusivas para o sexo masculino. Esses
genes são denominados holândricos.

HERANÇA LIGADA AO CROMOSSOMO X


Também conhecida como “herança ligada ao sexo”, engloba o estudo
de genes presentes no cromossomo X. Estes genes apresentam padrão de
herança diferente do convencional, descrito pelas leis mendelianas, pois, nos
machos, se encontram em hemizigose. Como no cromossomo Y não existe
a região de homologia para esses genes, os machos apresentam apenas um
alelo e vão expressar a característica determinada por ele. Características
de expressão recessiva, basta um alelo presente no X para que a mesma se
expresse em indivíduos do sexo masculino.
Nesses casos dizemos que a característica foi transmitida pela mãe,
pois, o alelo responsável está presente no cromossomo X herdado dela.
Vejamos alguns exemplos:

DALTONISMO

A percepção de cores pelo olho humano ocorre em células dos cones


que revestem a retina. Estas células detectam três tipos de cores específicas:
azul, verde e vermelho (as demais cores são resultado da combinação real-
izada em nosso cérebro). O tipo mais comum de daltonismo em humanos é
o que não distingue as cores vermelho e verde. Os genes que determinam a
capacidade para a percepção destas cores estão localizados no cromossomo
X. Um exemplo de teste para daltonismo está na Figura 2.
Observação: O gene para detecção da cor azul está localizado no cro-
mossomo 7, portanto, tem padrão de herança autossômica.

53
Genética Básica

Figura 2. Exemplo de teste para daltonismo. Indivíduos daltônicos não conseguem visualizar o
número na figura.

Mulheres que apresentam um alelo Xd para o daltonismo tem fenótipo


normal e são consideradas apenas portadoras, pois apresentam um alelo
normal XD que mascara a caracaterística. Homens portadores de um alelo
Xd para o daltonismo já apresentam o fenótipo daltônico, pois, seu outro
cromossomo sexual não apresenta a região de homologia com a possibi-
lidade de haver um alelo normal para mascarar o daltonismo. Para uma
mulher ser daltônica, precisa possuir os dois alelos para esta característica,
sendo o daltonismo uma característica recessiva.
Veja o cruzamento (Figura 3) apresentando um casal formado por uma
mulher portadora (XDXd) e um homem normal (XDY). A possibilidade
de descendentes é de 25% para mulher normal (XDXD), 25% para mulher
portadora (XDXd), 25% para homem normal (XDY) e 25% para homem
daltônico (XdY). Neste cruzamento é possível visualizar que, para carac-
terísticas ligadas ao cromossomo X, é a mãe portadora quem transmite o
alelo defeituoso ao filho.

Figura 3. Cruzamento entre um homem normal XDY e uma mulher portadora do alelo para o
daltonismo XDXd. Os descendentes

54
Herança ligada ao sexo e mecanismos de determinação sexual
Aula

Nos heredogramas para características ligadas ao sexo usa-se represen-


tar o indivíduo portador com um sinal diferente ao do indivíduo normal.
Veja a representação deste padrão de herança na Figura 4. Observe também
4
que homens que apresentam a característica não a transmitem para seus
filhos do sexo masculino, mas, suas filhas serão todas portadoras do alelo
para a característica.

Figura 4. Heredograma para representação de característica ligada ao sexo (Fonte: http://www.


infoescola.com/ciencias/genetica/exercicios/).

HEMOFILIA

A hemofilia é uma doença caracterizada pela deficiência na produção


de fatores de coagulação do sangue. Esta característica é determinada por
um gene presente no cromossomo X. Indivíduos portadores do alelo XH
são capazes de produzir a proteína responsável pela coagulação do sangue,
enquanto o alelo Hh não produz essa proteína.

DISTROFIA MUSCULAR DE DUCHENNE

Doença caracterizada pelo enfraquecimento e atrofia progressiva dos


músculos, manifesta-se por volta dos quatro anos de idade, quando os
meninos começam a apresentar dificuldades em movimentos comuns do
cotidiano como se levantar de uma cadeira ou subir uma escada. A doença
progride lentamente até comprometer funções vitais, causando insuficiência
cardíaca e respiratória. Geralmente os indivíduos com esta característica
sobrevivem até por volta dos vinte anos de idade. Como estes pacientes
ao atingirem a idade fértil já se encontram muito comprometidos pela
doença, não chegam a se reproduzir e por esse motivo, não são encontradas
mulheres com distrofia muscular, pois, para estas apresentarem a doença,
seria necessário herdar um par de alelos defeituosos (Xd) do pai e da mãe.

55
Genética Básica

HERANÇA LIGADA AO CROMOSSOMO Y


Na porção diferencial do cromossomo Y não vamos encontrar genes
estruturais como encontramos no cromossomo X. Nesse cromossomo
encontramos apenas genes ligados a características exclusivas ao sexo mas-
culino, como o gene SRY que produz o fator de diferenciação testicular
(TDF), responsável pela diferenciação embrionária do testículo.
Outra característica também ligada ao cromossomo Y é a ocorrência
de pêlos nas bordas das orelhas (Figura 5), característica não muito comum,
mas, exclusiva a indivíduos do sexo masculino. Um homem que apresente
essa característica vai transmiti-la a todos os seus descendentes do sexo
masculino.

Figura 5. Indivíduo normal e indivíduo com pêlos nas bordas das orelhas.

HERANÇA INFLUENCIADA PELO SEXO


Alguns genes localizados em autossomos tem comportamento dife-
rente dependendo do sexo do individuo, comportando a característica,
hora como dominante, hora como recessiva, se o individuo for do sexo
masculino ou feminino.
Um exemplo para esse tipo de herança é a calvície, que no homem é
uma característica dominante, enquanto na mulher, é recessiva (Figura 6).

56
Herança ligada ao sexo e mecanismos de determinação sexual
Aula

4
Figura 6. Calvície – característica dominante no sexo masculino e recessiva no sexo feminino.

MECANISMO DE COMPENSAÇÃO DE DOSES

No início do período embrionário das fêmeas de mamíferos ocorre a


inativação aleatória de um dos cromossomos X em cada célula. Essa inati-
vação ocorre por meio da compactação do material genético que fica visível
como uma pequena região de coloração mais densa no núcleo.
Essa inativação persiste por todas as mitoses, sendo transmitida às célu-
las filhas seguintes e, dessa forma, uma célula que anulou um cromossomo
X herdado do pai, vai gerar toda uma linhagem de células com este mesmo
cromossomo compactado. Por esse motivo de apresentarem linhagens uma
de células com inativação do cromossomo X paterno, e outra do X materno,
as fêmeas são consideradas mosaicos de células.
Na visualização microscópica, esse ponto do material genético cor-
respondente ao cromossomo X anulado por compactação é denominado
cromatina sexual ou corpúsculo de Barr (Figura 7) e fica localizado próximo
à membrana do núcleo. A cromatina sexual está presente apenas em células
femininas, pois, os machos apresentam apenas um cromossomo X não
sofrem inativação desse cromossomo.

Figura 7. Cromatina sexual presente em células femininas (Fonte: http://evolucionarios.blogalia.


com/historias/28254)

57
Genética Básica

Um exemplo do mecanismo de compensação de doses pode ser obser-


vado na pelagem de gatas (fêmeas). A cor preta ou marrom das manchas
é determinada por um gene localizado no cromossomo X e, dependendo
de qual cromossomo foi inativado em uma fêmea heterozigota, a mancha
terá a cor determinada pelo alelo presente no X que permaneceu funcio-
nal. Apenas fêmeas heterozigotas apresentarão as duas cores de manchas
(Figura 8), machos, por possuírem apenas um cromossomo X e fêmeas
homozigotas, apresentarão manchas de apenas uma cor.

Figura 8. Gatas apresentando o padrão de colocação das manchas determinado pela inativação do
X (Fonte: http://www.infoescola.com/genetica/cromatina-sexual/).

DETERMINAÇÃO DO SEXO

Existem diferentes sistemas para determinação do sexo, entre eles,


podemos citar os que serão estudados a seguir:

SISTEMAS CROMOSSÔMICOS

A determinação do sexo por sistemas cromossômicos é baseada na


ocorrência de variações de morfologia ou número nos cromossomos sexuais,
onde podem existir machos heterogaméticos ou fêmeas heterogaméticas.

MACHOS HETEROGAMÉTICOS
Nestes sistemas de determinação sexual, os machos (heterogaméticos)
formam gametas distintos, por tanto, é quem determina o sexo do descen-
dente. As fêmeas formam apenas um tipo de gameta.

58
Herança ligada ao sexo e mecanismos de determinação sexual
Aula

- Sistema XY/XX
Os machos formam gametas que apresentam, além do lote de autos-
somos, cromossomos sexuais distintos, uns contendo o cromossomo Y
4
que determinara o sexo masculino, outros contendo o cromossomo X, que
determina o sexo feminino.
Este sistema é encontrado em humanos e outros mamíferos.

Células somáticas Gametas


1 lote de autossomos + X
Macho 2 lotes de autossomos + XY
ou 1 lote de autossomos + Y
Fêmea 2 lotes de autossomos + XX 1 lote de autossomos + X

- Sistema X0/XX
Os machos formam gametas que apresentam numero distinto de cro-
mossomos. A presença de um cromossomo X no gameta do macho, além
dos autossomos, determina a formação de uma fêmea e, sua ausência, a
formação de um organismo macho. Ocorre em percevejos, gafanhotos e
baratas.

Células somáticas Gametas


1 lote de autossomos + X
Macho 2 lotes de autossomos + X
ou 1 lote de autossomos
Fêmea 2 lotes de autossomos + XX 1 lote de autossomos + X

FÊMEAS HETEROGAMÉTICAS
Agora, são as fêmeas quem vão formar gametas distintos e determinar
o sexo dos descendentes. Para diferenciar dos sistemas de machos het-
erogaméticos, os cromossomos sexuais nesta condição são denominados
como Z e W.

- Sistema ZW/ZZ
As fêmeas formam gametas contendo ou o cromossomo Z, que deter-
minará a formação de um macho, ou o cromossomo W, que determina a
formação de uma fêmea. Os machos formam apenas gametas portadores
do cromossomo Z, alem do lote de autossomos. Ocorre em borboletas,
mariposas, alguns peixes e aves.

59
Genética Básica

Células somáticas Gametas


Macho 2 lotes de autossomos + ZZ 1 lote de autossomos + Z
1 lote de autossomos + Z
Fêmea 2 lotes de autossomos + ZW
ou 1 lote de autossomos + W

- Sistema Z0/ZZ
Gametas das fêmeas contendo o lote de autossomos mais o cromos-
somo Z determina a formação de um macho. Se o gameta da fêmea, apre-
senta apenas o lote de autossomos, o organismo formado será uma fêmea.
Os gametas dos machos, todos apresentam o cromossomo Z alem do lote
de autossomos. Encontrado em galinha e alguns répteis.

Células somáticas Gametas


Macho 2 lotes de autossomos + ZZ 1 lote de autossomos + Z
1 lote de autossomos + Z
Fêmea 2 lotes de autossomos + Z
ou 1 lote de autossomos

Também existem outras variações nos sistemas de determinação do


sexo como exemplo:

SISTEMA HAPLOIDE-DIPLOIDE

É o tipo de determinação de sexo comum em himenópteros (abelhas,


vespas, cupins). Nesse sistema, as fêmeas são diplóides, originadas de fe-
cundação da rainha (fêmea fértil da colônia) pelo macho. Já, os machos, se
desenvolvem por partenogênese, a partir de ovos não fertilizados, sendo
estes, haplóides.

Figura 9. Abelha rainha e operária (diplóides), zangão (haplóide).

60
Herança ligada ao sexo e mecanismos de determinação sexual
Aula

SISTEMA DE BALANÇO GÊNICO EM


DROSOPHILA
4
No gênero Drosophila (Figura 10), encontramos um sistema peculiar
de determinação do sexo. Mesmo havendo a presença de cromossomos
sexuais X e Y (machos heterogaméticos), vão ocorrer variações de sexo
relacionadas à proporção entre cromossomos X e autossomos.

Figura 10. Mosca das frutas, gênero Drosophila (Fonte: http://www.iayork.com/Images/10-24-07/


Drosophila.jpg).

Os machos apresentam 2 lotes de autossomos mais os cromossomos


sexuais XY. As fêmeas, 2 lotes de autossomos mais XX. O índice sexual (IS)
é determinado pela razão entre o número de cromossomos X e o número
de lotes de autossomos. Assim, as fêmeas apresentam IS = 1,0 e os machos,
IS = 0,5. Qualquer IS entre 0,5 e 1,0 determina um indivíduo intersexo. IS
maiores que 1,0 determinam metafêmeas e menores que 0,5, metamachos.

Machos: 2A + XY
Fêmeas: 2A + XX

Índice Sexual (IS) = no. de cromossomos X


no. de conjuntos autossomicos

Índice Sexual em Drosophila

Índice Sexual (IS) Sexo


< 0,5 Metamacho
0,5 Macho
(0,5 - 1,0) Intersexo
1,0 Fêmea
> 1,0 Metafêmea

61
Genética Básica

DETERMINAÇÃO GENÉTICA DO SEXO EM


HUMANOS
Em humanos, apesar da existência de cromossomos morfologicamente
distintos, a determinação do sexo ocorre devido à presença de um gene
especifico no cromossomo Y, o gene SRY. Este gene é responsável por pro-
duzir no período de diferenciação embrionária uma proteína denominada
fator de diferenciação testicular (TDF), que promove a diferenciação dos
tecidos embrionários da gônada indiferenciada em testículo. Na ausência
deste gene e, consequentemente do TDF, a gônada embrionária se dife-
rencia em ovário. Também é o testículo que produzirá fatores específicos
que diferenciarão os demais tecidos do aparelho genital masculino e sua
ausência determina o desenvolvimento de estruturas femininas.

CONCLUSÃO

Ao final desta aula você deve conhecer exemplos de características


determinadas por genes localizados nos cromossomos sexuais, sabendo
explicar seu mecanismo de herança e diferenciar em que diferem da herança
autossômica mendeliana.
Também é importante que tenha compreendido os diferentes sistemas
cromossomicos de determinação sexual.

RESUMO

Os genes localizados nos cromossomos sexuais apresentam um padrão


de herança diferente dos autossomos devido ao macho apresentar apenas
um cromossomo X. Alelos recessivos no cromossomo X manifestam-se
em dose única nos machos por não haver homologia no par sexual. Na
fêmeas de mamíferos a presença de dois cromossomos X é compensada pela
anulação aleatória de um desses cromossomos por compactação, tornando
as fêmeas mosaicos. Nos sistemas de determinação de sexo, encontramos
sistemas de machos heterogaméticos (XX/XY, XX/X0) e de fêmeas he-
torgaméticas (ZZ/ZW, ZZ/Z0).

62
Herança ligada ao sexo e mecanismos de determinação sexual
Aula

ATIVIDADES
1. Assista ao filme Óleo de Lorenzo e explique o mecanismo de herança
4
da doença adenoleucodistrofia apresentada nessa história.
2. Uma mulher, em um exame oftalmológico, foi diagnosticada com dalton-
ismo, mas, esta característica se manifestava apenas em seu olho direito. Do
olho esquerdo, essa mulher apresentava visão normal. Com base nos con-
hecimentos estudados nessa aula, explique como esse fenômeno é possível:

COMENTÁRIO SOBRE AS ATIVIDADES


1. O filme Óleo de Lorenzo apresenta uma doença genética (a
adrenoleucodistrofia) ligada ao sexo. Todo o drama relacionado
ao contexto familiar desde a descoberta e progressão da doença é
abordado de forma que sensibiliza a todos os que assistem. Neste
filme também são abordadas questões relacionadas à ética e à pesquisa
científica.
2. Esta atividade estimulará ao estudante a habilidade de contextualizar
o conhecimento estudado, exigindo o estabelecimento de relações
conceituais estudadas nessa aula com o problema proposto.

AUTOAVALIAÇÃO

Após ter estudado esta aula, consigo:


1. Montar o heredograma de família cujo casal de indivíduos não daltônicos
tiveram 1 filho daltônico e uma filha normal, e determinar o genótipo do casal?
2. Saber se uma filha daltônica de um pai daltônico, tem que, obrigatoria-
mente, ter uma mãe também daltônica?
3. Saber qual a probabilidade de um casal normal que tem um filho hemofí-
lico ter um filho do sexo masculino normal?
4. Explicar o que são genes holândricos?
5. Explicar por qual motivo as fêmeas de mamíferos são consideradas
mosaicos em relação à inativação do cromossomo X?
6. Definir a diferença entre os sistemas de determinação do sexo de machos
heterogaméticos e fêmeas heterogaméticas?
7. Explicar o que diferencia os gametas nos sistemas de determinação do
sexo XX/XY e XX/X0?

63
Genética Básica

PRÓXIMA AULA
A partir da próxima aula, iniciaremos o estudo da Genética molecular.
Será entendida a estrutura do material genético e todo o funcionamento
dos genes. É muito importante ter a idéia da estrutura cromossômica e dos
mecanismos de herança, para que esses novos conceitos venham completar
efetivamente a compreensão da Genética.

REFERÊNCIAS

GRIFFITHS AJF, MILLER JH, SUZUKI DT, LEWONTIN RC, GEL-


BART WM. 2009. Introdução à Genética. 8 ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 794p.
PIERCE BA. 2004. Genética: um enfoque conceitual. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 758p.
SNUSTAD DP, SIMMONS MJ. 2008. Fundamentos de Genética. 4ª ed.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 903p.

64
Aula

ESTRUTURA DOS ÁCIDOS


5
NUCLEICOS

META
Apresentar a estrutura molecular do DNA e RNA.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
conhecer as estrutura de um nucleotídeo; compreender as propriedades dos ácidos nucléicos
relacionadas à sua constituição molecular; compreender o sentido 5’-3’ na estrutura dos ácidos
nucléicos; conhecer as diferentes bases nitrogenadas e a forma como interagem entre si;
diferenciar estruturalmente DNA e RNA.

PRÉ-REQUISITOS
Conceitos de biologia celular e química de ensino médio.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
Bem vindo ao maravilhoso mundo da Genética Molecular. A partir
desse capítulo, você vai conhecer detalhadamente a constituição molecular
dos ácidos nucléicos (DNA e RNA) e assim, poderá compreender suas
propriedades, como o comportamento destas moléculas, a natureza da
informação genética e a estrutura de um gene, conhecimentos de extrema
importância para a compreensão de todo o funcionamento gênico e também
para o desenvolvimento das novas tecnologias da genética.
Será estudada a constituição dos nucleotídeos e a forma como se
“encaixam” e interagem entre si para compor as moléculas dos ácidos
nucléicos. Em seguida, serão apresentadas as diferenças estruturais entre
DNA e RNA, estendendo às suas propriedades funcionais relacionadas à
sua estruturação molecular.
As informações desta aula são a base para a compreensão de todo
o conteúdo de genética molecular que será estudado. Assim, será muito
importante que dedique atenção especial a essa aula e que também faça
revisões dos conceitos aqui apresentados sempre que for necessário nas
aulas posteriores.

CONHECENDO O NUCLEOTÍDEO

Os ácidos nucléicos são moléculas orgânicas constituídas por polímeros,


uma cadeia de subunidades determinadas nucleotídeos. Assim, para com-
preender os ácidos nucléicos, é de suma importância conhecer antes a
estrutura desses componentes que compõem estas moléculas.
Os nucleotídeos são compostos por fosfato (ou ácido fosfórico), um
açúcar do tipo pentose (constituído por seis átomos de carbono), e uma
base nitrogenada, como mostra a Figura 1. Os diversos tipos de nucleotídeos
são determinados por variações nos açúcares e nas bases nitrogenadas.
Vejamos detalhadamente cada um desses componentes dessas subunidades
dos ácidos nucléicos:

Figura 1. Exemplo de estrutura molecular de um nucleotídeo, evidenciando seus componentes:


fosfato (ácidos fosfórico), pentose e base nitrogenada (Fonte: www.biomol.org/.../images/nucleo-
tideo1.jpg).

66
Estrutura dos ácidos nucleicos
Aula

Fosfato (ou ácido fosfórico): responsável por conferir a característica


ácida aos ácidos nucléicos, liberando H+ e adquirindo carga negativa (Figura
2). Antes de serem adicionados à cadeia dos ácidos nucléicos, os nucleo-
5
tídeos se encontram trifosratados. As ligações entre os fosfatos liberam
grande quantidade de energia quando quebradas. Essa energia é utilizada
na síntese dos ácidos nucléicos que será estudada mais detalhadamente na
aula de replicação do DNA.

Figura 2. Grupamento fosfato ou ácido fosfórico.

Acúcar: do tipo pentose, é constituído por uma cadeia de forma cí-


clica de 5 átomos de carbono. Estes carbonos são numerados de 1’ a 5’,
como mostram os exemplos na Figura 3. No carbono da posição 1’ de um
nucleotídeo vamos encontrar a base nitrogenada e no carbono da posição
5’, o fosfato. No carbono 2’ vamos encontrar uma distinção entre dois tipos
de açucares, a presença de um radical do tipo hidroxila (-OH) nos açucares
do tipo ribose, ou a ausência desse radical na posição 2’ dos açucares do
tipo desoxirribose. Esta diferença entre os açucares ribose e desoxirribose
também podem ser visualizados ainda na Figura 3.
Observação: a apóstrofe na numeração dos carbonos do açúcar serve
para diferenciar da numeração dos átomos da base nitrogenada (que não
apresentam a apóstrofe)
Os açucares do tipo ribose fazem parte da constituição dos ácidos
ribunocleicos (RNA), enquanto os do tipo desoxirribose vão constituir os
ácidos desoxirribunocleicos (DNA).

Figura 3. Estrutura molecular das pentoses (Fonte: adaptado de http://bioblogbiologia.blogspot.


com/2009_10_01_archive.html).

67
Genética Básica

O “encaixe” entre um nucleotídeo e outro acontece pela posição 3’ de


um nucleotídeo com o fosfato da posição 5’ do nucleotídeo seguinte, numa
ligação fosfodiester. Portanto, numa cadeia de um ácido nucléico, dizemos
que estas apresentam duas extremidades denominadas pelas posições de
carbonos dos açucares como extremidade 5’ e extremidade 3’. Observe na
Figura 4 as ligações fosfodiester entre os nucleotídeos e as extremidades
5’ e 3’.

Figura 4. Ligações fosfodiester entre os nucleotídoeos constituindo a cadeia de um ácido nucléico


(Fonte: http://www.enq.ufsc.br/.../genetica/dna022.gif).

Bases nitrogenadas: Compostas por Carbono, Nitrogênio, Oxigênio e


Hidrogênio, as bases nitrogenadas apresentam duas classes, as bases púri-
cas (derivadas de purina) e as bases pirimídicas, derivadas de pirimidina
(Figura 5).

Figura 5. Bases nitrogenadas purina e pirimidina.

68
Estrutura dos ácidos nucleicos
Aula

Entre as bases púricas, encontramos na constituição dos ácidos nu-


cléicos dois tipos principais de bases nitrogenadas, adenina (A) e guanina
(G). As bases púricas apresentam maior peso molecular, constituídas por
5
dois anéis em sua estrutura (Figura 6). As bases adenina e guanina são
constituintes tanto de DNA quanto de RNA.

Figura 6. Bases púricas: adenina e guanina.

Entre as bases pirimídicas, encontramos na constituição dos ácidos


nucléicos a citosina (C), comum tanto para DNA e RNA, a timina (T), pre-
sente apenas no DNA e a uracila (U), presente apenas no RNA. As bases
pirimídicas apresentam menor peso molecular e são constituídas apenas
por um anel em sua estrutura (Figura 7). Observe que a diferença entre a
timina e a uracila é de apenas um radical metil (-CH3) presente no carbono

Figura 7. Bases pirimídicas: citosina, timina e uracila

ESTRUTURA DO DNA E RNA

Tanto o DNA quanto o RNA são polímeros, cadeias de nucleotídeos.


Sua síntese será estudada posteriormente nas aulas de replicação e tran-
scrição e, para um aprendizado mais eficiente, é importante conhecer desde
já sua estrutura.
O RNA é uma cadeia linear simples de nucleotídeos. O DNA, por sua
vez, é uma cadeia dupla, tendo duas sequências lineares paralelas e em sen-
tido oposto (antiparalelas). Esse sentido oposto é determinado exatamente
pela direção das extremidades 5’ e 3’ da cadeia como mostra a Figura 8.

69
Genética Básica

Figura 8. Representação da estrutura de cadeia dupla com fitas antiparalelas do DNA e da fita simples
de RNA (Fonte: adaptado de www.accessexcellence.org/AB/GG/nucleic.php).

No DNA as bases nitrogenadas de uma fita formam uma interação do


tipo pontes de hidrogênio com as bases da fita paralela, conferindo à molécula
de DNA um aspecto de escada retorcida, onde os degraus são formados pelos
pares de bases e os corrimãos, pelas cadeias de fosfato e açúcar.
A estrutura de dupla hélice do DNA foi proposta em 1953 por James
Watson e Francis Crick (Figura 9) com base em estudos de difração de
raios X realizados por Rosalind Franklin e Maurice Wilkins e em estudos
químicos da molécula.

Figura 9. James Watson e Francis Crick com o modelo de estrutura proposto para o DNA em 1953
(Fonte: http://www.reproductive-revolution.com/watson_crick.html).

70
Estrutura dos ácidos nucleicos
Aula

As duas fitas do DNA se torcem em torno de um eixo central, deixando


externamente as cadeias de fosfato e açucar (desoxirribose), expostas ao
meio aquoso devido à sua hidrofilia, e internamente, as porções hidrofóbicas
5
constituidas pelos pares de bases nitrogenadas, orientadas perpendicular-
mente ao eixo da fita.
Os pares de bases nitrogenadas formas estruturas praticamente planas
(achatadas) que se empilham internamente na estrutura retorcida da dupla
hélice de DNA, o que garante maior estabilidade à molécula. Este empil-
hamento resulta em dois sulcos denominados sulco maior e sulco menor,
como demonstra a Figura 10. Cada seguimento do DNA que compreende
um sulco maior e um sulco menor é constituído por 10 pares de bases ni-
trogenadas e apresenta uma medida de 34Å (1Å = 0,1nm), de forma que a
distancia entre um par de bases e outro é de 3,4Å e a dupla hélice apresenta
um raio de 10Å.

Figura 10. Modelo tridimensional da dupla hélice de DNA (Fonte: adaptado de: http://commons.
wikimedia.org/wiki/File:A-DNA,_B-DNA_and_Z-DNA.png).

As bases nitrogenadas, como já foi apresentado, apresentam dois


tamanhos, sendo as pirimídicas menores que as púricas. No entanto, os
pareamentos ocorrem sempre entre uma base púrica e uma base pirimídica,
e assim, os pares apresentam dimensões semelhantes, ocupando o mesmo
espaço e permitindo uma uniformidade no raio da cadeia de DNA.

71
Genética Básica

COMPLEMENTARIDADE ENTRE AS BASESES


NITROGENADAS
Além do tamanho das bases nitrogenadas, existe outra característica
que garante a especificidade de pareamento entre as Timinas (T) com as
Adeninas (A) e das Citosinas (C) com as Guaninas (G), a formação das
pontes de Hidrogênio.
As pontes de Hidrogênio são interações químicas bastante resis-
tentes formadas por polaridades na molécula, envolvendo átomos muito
eletronegativos (O e N, presentes nas bases nitrogenadas) e outro, muito
eletropositivo (H). Consulte uma tabela periódica e veja a posição desses
elementos em relação à eletronegatividade e eletropositividade.
A formação das pontes de Hidrogênio entre às bases nitrogenadas
se deve à presença de grupamentos ceto (C=O) e amino (C-NH2). Os
oxigênios formando dupla ligação com o carbono no grupo ceto apresenta
uma polaridade negativa, devido à presença de elétrons nessa posição,
enquanto os Hidrogênios (mais eletropositivo), nos grupamentos amino,
têm seu elétron atraído fortemente pelo núcleo do Nitrogênio (mais eletro-
negativo), ficando assim com polaridade positiva. Atomos de nitrogênio
presentes nas bases nitrogenadas (como na adenina e guanina) também
formam pólos negativos.
A formação das pontes de Hidrogênio ocorre sempre entre essas
regiões, onde um Hidrogênio com polaridade positiva é atraído por um
pólo negativo da base complementar.
O numero de pondes de Hidrogênio é especifico entre as bases nitro-
genadas, ocorrendo a formação de duas pontes entre adenina e timina, e
três pontes entre citosina e guanina. Mas, além no numero de pontes, ainda
há outra característica muito importante que torna ainda mais específico
o pareamento complementar entre as bases nitrogenadas, que é o sentido
das pontes de Hidrogênio. Consideramos os grupamentos amino, como
doadores de Hidrogênio, e os Nitrogênios e Oxigênios (pólos negativos),
como regiões receptoras de Hidrogênio. Observe na Figura 11 a presença
desses grupamentos que formam as polaridades e o sentido das pontes de
Hidrogênio.

72
Estrutura dos ácidos nucleicos
Aula

Figura 11. Estrutura molecular das bases nitrogenadas demonstrando a formação específica de
pontes de Hidrogênio (Fonte: http://www.enq.ufsc.br/.../genetica/dna042.png).

Havendo essa especificidade de ligação entre as bases nitrogenadas,


podemos afirmar que existe uma relação de proporções entre as mesmas.
O numero de timinas será sempre igual ao de adeninas, e o numero de
guaninas, sempre igual ao de citosinas no DNA.

COMPARAÇÃO ESTRUTURAL E FUNCIONAL


ENTRE DNA E RNA

Podemos comparar os ácidos nucléicos de DNA e RNA por três dife-


renças estruturais:
O tipo de cadeia: o DNA apresenta cadeia dupla e é uma molécula de
maior extensão, enquanto o RNA tem cadeia simples e apresentam cadeias
bem menores que as do DNA;
O tipo de açúcar: o DNA é constituído por desoxirribose, enquanto
o RNA, por desoxirribose.

73
Genética Básica

As bases nitrogenadas: Há variação entre as bases pirimídicas de timina


(T) para o DNA e uracila (U) para o RNA. A citosina e as bases púricas
não sofrem variações entre os dois tipos de ácidos nucléicos.
Estas diferenças podem ser visualizadas na Figura 12.

Figura 12. Diferenças estruturais entre DNA e RNA (Fonte: adaptado de www.ibb.unesp.br/.../imagens/dna_rna.jpg)

Funcionalmente, o DNA desenvolve o papel de armazenamento da


informação genética, sendo uma molécula muito estável, enquanto o RNA,
com papel de expressão de genes estruturais e reguladores (que serão es-
tudados em aulas posteriores), são moléculas mais instáveis e com tempo
de vida curto dentro da célula.
A informação genética é armazenada, transmitida e expressa por meio
da sequência das bases nitrogenadas na cadeia dos ácidos nucléicos. Estas
sequências vão determinar a informação genética que codifica todas as
características do organismo. O conceito de gene e a forma como ele se
manifesta serão estudados nas próximas aulas.

CONCLUSÃO
Ao final desta aula, é importante que você verifique se os objetivos
propostos realmente foram atingidos em seu aprendizado, pois, estas infor-
mações são fundamentais para a compreensão das próximas aulas.
Você deve conhecer bem a estrutura dos nucleotídeos, especialmente
compreender a numeração dos carbonos do açúcar e em quais desses car-
bonos vamos encontrar a base nitrogenada, o ácido fosfórico, onde teremos
a diferença entre uma ribose e uma desoxirribose e os pontos de ligação
entre um nucleotídeo e outro na cadeia.

74
Estrutura dos ácidos nucleicos
Aula

A compreensão do sentido 5’-3’ também é fundamental, pois o estudo


de toda atividade de síntese de ácidos nucléicos dependerá de um bom
entendimento desse conceito.
5
Outra informação de extrema importância que você deverá com-
preender é a forma de interação específica entre as bases nitrogenadas,
a formação das pontes de Hidrogênio. Este conhecimento facilitará sua
compreensão das alterações genéticas moleculares (mutações) que também
serão estudadas em breve.
Com estas informações bem definidas, você terá um bom aproveita-
mento do conteúdo da genética molecular.

RESUMO
A estrutura dos ácidos nucléicos é definida a partir da polimerização de
nucleotídeos formando cadeias lineares. Os nucleotídeos são constituídos por
fosfato, açúcar e base nitrogenada. Os açúcares são do tipo ribose para RNA e
desoxirribose para o DNA. As bases nitrogenadas são classificadas como púricas
(adenina e guanina) e pirimídicas (citosina, timina e uracila). A base nitrogenada
timina é especifica de DNA e a uracila, para RNA. O DNA é uma cadeia dupla
e o RNA, uma cadeia simples. No DNA as bases nitrogenadas interagem entre
si, formando pares específicos de timina com adenina, e citosina com guanina.
Esta especificidade entre as bases é dada por sua conformação estrutural e
pelas pontes de hidrogênio formadas entre as mesmas. A sequência de bases
nitrogenadas é o que determina o código genético.

ATIVIDADES
1. Extração caseira de DNA.
Uma atividade prática de fácil realização é a extração caseira de DNA
vegetal. Esta atividade pode ser realizada em sua própria cozinha, utilizando
material comum do seu uso diário, como água, detergente, sal, álcool, fru-
tos macios (banana, mamão ou morango), copo, funil, filtro de café e saco
plástico e palito de churrasco.
Primeiramente, faça uma solução em um copo de água, com duas
colheres cheias de sal e quatro colheres de detergente. Amasse bem o
fruto dentro do saco plástico, adicione a solução de água, sal e detergente
e misture para homogeneizar. Com auxilio de um funil, filtre a solução e
recolha o material liquido (filtrado) em um copo.
Adicione lentamente, deixando escorrer pela parede do copo, o álcool
(que deve ser utilizado gelado para obter melhor resultado).
Com o palito de churrasco, mecha lentamente a solução em movimentos
circulares e verá a formação de uma “nuvem” esbranquiçada na solução
em torno do palito.

75
Genética Básica

Consulte o material disponível nos endereços eletrônicos a seguir:


http://www.bioinfo.ufpb.br/difusao/pdf/extracaodednademorango.pdf
http://www.moderna.com.br/pnlem2009/fazendo/atividades/
ativ_bio3_amabis.pdf
Explique a função de cada componente utilizado na solução de extração
de DNA (água, detergente, sal e álcool):

2. Observe na Figura 7 do texto que a timina, em sua estrutura molecular,


apresenta 3 regiões possíveis para a formação de pontes de hidrogênio,
sendo dois grupos ceto (C=O), que funcionam como receptores de Hi-
drogênio e um hidrogênio ligado à um Nitrogênio, o que confere aí uma
polaridade positiva, funcionando como um ponto doador de H.
Explique por qual motivo, não é possível a interação por pontes de
Hidrogênio entre uma timina e uma guanina:

COMENTÁRIO SOBRE AS ATIVIDADES

1. Veja como é importante conhecer a estrutura do DNA, estudada


nessa aula, para saber explicar propriedades bioquímicas como a
solubilidade e precipitação. Esta prática não é muito diferente do que
é realizado nos laboratórios de genética molecular, apenas é tomado
o cuidado com a utilização de soluções de reagentes mais específicos
para a obtenção de resultados mais puros e quantificáveis.

2. Respondendo a esta questão, você poderá observar o quanto é


importante o conhecimento da estrutura química dos componentes
dos ácidos nucléicos, assim, com a observação das estruturas das
bases nitrogenadas, terá maior percepção de suas diferenças e poderá
relacioná-las a suas propriedades.

AUTOAVALIAÇÃO
Após estudar esta aula, consigo:
1. Descrever a estrutura comum dos nucleotídeos?
2. Explicar o motivo estrutural do DNA apresentar cargas negativas e ter
caráter ácido?
3. Explicar como é determinado na estrutura molecular dos ácidos nucléicos
o sentido 5’-3’?
4. Diferenciar estruturalmente os dois grupos de bases nitrogenadas?
5. Explicar o que determina a especificidade no pareamento entre as bases
nitrogenadas?

76
Estrutura dos ácidos nucleicos
Aula

6. Explicar por qual motivo em uma molécula de DNA as bases púricas


aparecem na mesma proporção que as bases pirimídicas, e ainda, por qual
motivo, as proporções entre adenina e timina com as proporções de citosina
5
e guanina, podem variar dependendo do seguimento do DNA?
7. Preencher o quadro a seguir com as características estruturais encontra-
das no DNA e no RNA, apontando em quais dessas características não há
distinção entre eles?
DNA RNA
Tipo de cadeia
Tipo de açúcar
Bases pirimídicas
Bases púricas

PRÓXIMA AULA
Na próxima aula será abordada a replicação do material genético. Os
conceitos aqui estudados sobre a estrutura do DNA serão de extrema im-
portância para a compreensão do novo conteúdo, especialmente a estrutura
dos nucleotídeos, com ênfase no sentido 5’-3’.

REFERÊNCIAS

GRIFFITHS AJF, MILLER JH, SUZUKI DT, LEWONTIN RC, GEL-


BART WM. 2009. Introdução à Genética. 8 ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 794p.
PIERCE BA. 2004. Genética: um enfoque conceitual. Rio de Janeiro: Gua-
nabara Koogan, 758p.
SNUSTAD DP, SIMMONS MJ. 2008. Fundamentos de Genética. 4ª ed.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 903p.

77
Aula

REPLICAÇÃO DO DNA E
6
TRANSCRIÇÃO

META
Apresentar os processos de replicação e transcrição do material genético e fornecer as informações
necessárias para o estudante compreender a base molecular da hereditariedade e da expressão
gênica.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
saber como ocorre o processo de replicação do DNA ao nível molecular e relacionar esse evento
aos mecanismos de reprodução e formação de organismos multicelulares;
compreender como se dá a passagem da informação contida no DNA para as moléculas de RNA
pelo processo de transcrição;
entender a relação entre a transcrição e a expressão gênica;
conhecer a base comum da replicação e da transcrição em procariotos e eucariotos, bem como
entender as particularidades relacionadas a esses dois grupos.

PRÉ-REQUISITOS
Conhecimento sobre a estrutura do material genético.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
Prezado estudante, nas aulas da disciplina de Biologia Celular certa-
mente você deve ter estudado as características celulares, bem como a mitose
e a meiose, mecanismos de divisão celular. Também dever ter visto que
existe desde organismos que são formados por uma única célula, tal como
as bactérias, até organismos multicelulares, como o próprio homem. Estima-
se que um homem adulto tenha cerca de 65.000.000.000.000 (sessenta e
cinco trilhões) de células, sendo a maior parte delas, células somáticas que
formam juntas os diversos tecidos e órgãos que compõem o organismo.
Nessa aula veremos os mecanismos básicos moleculares pelos quais uma
célula gera linhagens inteiras de células geneticamente idênticas, por meio
de um processo de replicação altamente preciso, ou então como utiliza esse
mesmo mecanismo para gerar descendentes, tanto de forma assexuada
quando por mecanismos de reprodução sexuada. Entretanto, mesmo sendo
geneticamente idênticas, os nossos trilhões de células somáticas não são
funcionalmente, nem morfologicamente, idênticas. Então, como é possível
gerar diversidade e especificidade utilizando o mesmo material genético
obtido por meio da replicação? Parte dessa resposta está no processo
de transcrição, que diz respeito ao modo pelo qual as células transmitem
às moléculas de mRNA informações específicas que serão utilizadas em
um processo posterior que dirige a produção das proteínas, mecanismos
associados ao código genético e ao processo de tradução que serão abor-
dados no próximo capítulo. Em resumo, veremos como os genomas são
conservados por meio da replicação que cria novas cópias genéticas e como
as informações genéticas contidas no genoma são utilizadas por meio da
transcrição do genes.

REPLICAÇÃO

A replicação do material genético, em procariontes e eucariontes, é


realizada com grande precisão e velocidade. Uma bactéria consegue adicio-
nar 30.000 nucleotídeos por minuto quando produz um novo filamento de
DNA, com uma margem média de um nucleotídeo adicionado errado para
cada bilhão de nucleotídeos incorporados. Desse modo, quando dizemos
que gêmeos univitelinos são geneticamente idênticos, de fato eles devem
ser idênticos, uma vez que a sua formação utilizou exatamente os mesmos
conjuntos haploides, paterno e materno, excetuando apenas as células que
poderão ter mudado devido a erros de replicação ou outras mutações (que
você verá na aula 09).

80
Replicação do DNA e transcrição
Aula

Figura 1- Gêmeos univitelinos: as gêmeas idênticas Betty Richards e Jenny Pelmore numa foto de
infância e, à direita, comemorando seus 101 anos de vida em Manchester, na Inglaterra.
(Fonte: http://www.telegraph.co.uk).

Os mecanismos básicos da replicação são atualmente bem conhecidos,


mas alguns detalhes ainda precisam ser elucidados, como quase tudo em
Biologia. Iniciaremos essa aula, examinando como o DNA se replica, en-
fatizando os mecanismos que garantem a precisão desse processo.

O EXPERIMENTO DE MESELSON E STAHL (1958)


Quanto James Watson e Francis Crick publicaram seu trabalho na
Nature em 1953 elucidando a estrutura do DNA, já havia nesse artigo
alguma indicação de que a replicação do DNA seria semi-conservativa,
onde a molécula de DNA de fita dupla seria formada por uma fita molde
antiga e uma fita nova complementar mas existiam duas outras hipóteses
que tratavam do modelo de replicação da molécula de DNA. No modelo
conservativo a molécula antiga de fita dupla originaria uma fita dupla
completamente nova e no modelo dispersivo, este menos consistente,
argumentava-se sobre a possibilidade da fita dupla de DNA ser formada
por segmentos de fita antiga e de fita nova intercalados em ambas as fitas
que formam a dupla hélice. Esses modelos precisavam ser cientificamente
testados e a comprovação de qual modelo estaria correto representou um
dos principais desafios científicos imediatamente após a publicação de
Watson e Crick sobre a estrutura da dupla hélice.
No ano de 1958 os pesquisadores Matthew Meselson e Franklin Stahl
elucidaram a questão por meio de um dos experimentos mais elegantes ao
longo da história da biologia. Inicialmente esses pesquisadores precisavam
de um modo para distinguir o DNA velho do DNA novo. Para desenvolver
esse experimento eles utilizaram linhagens da bactéria E. coli cultivadas
em meio de cultura. O meio de cultura para o crescimento de bactérias
possui nitrogênio como um dos componentes básicos sob a forma de
14N (nitrogênio leve, normal). Meselson e Stahl então cultivaram durante
muitas gerações uma linhagem de bactérias E.coli utilizando um tipo raro
de nitrogênio pesado, o isótopo 15N. Como o DNA apresenta bases ni-

81
Genética Básica

trogenadas, a produção de novas moléculas de DNA durante o crescimento


bacteriano em meio de cultura, utilizaria necessariamente o 15N como única fonte
de nitrogênio e, como consequência após muitas gerações, todo o DNA bacte-
riano teria 15N na sua composição. Quando comparadas a moléculas de DNA
normais, provenientes de bactérias cultivadas em meio contendo 14N utilizando
uma técnica de gradiente de densidade em cloreto de césio (CsCl2) obtido por
centrifugação em alta velocidade, com DNA bacteriano contendo 15N, é pos-
sível visualizar facilmente a diferença entre as moléculas das duas linhagens em
função da diferença na posição de equilíbrio dos dois tipos após a centrifugação,
em que as moléculas contendo 15N formam uma faixa de DNA mais próxima
do fundo do tubo de ensaio em função do maior peso molecular do isótopo de
nitrogênio (15N), enquanto o DNA contendo nitrogênio normal (14N) após a
centrifugação em gradiente de CsCl2 fica depositado em um ponto de equilíbrio
superior ao do obtido pelo nitrogênio pesado. Portanto, a técnica de centrifugação
em gradiente de CsCl2 permite diferenciar facilmente as moléculas de DNA que
contenham 14N ou 15N pela diferença de peso molecular.

Figura 2- Centrifugação em gradiente de cloreto de césio utilizando DNA pesado e leve.

Após a obtenção da linhagem de E.coli com DNA contendo 15N,


Meselson & Stahl reservaram uma amostra dessa linhagem e transferiam o
restante das bactérias do meio de cultura com 15N para um meio contendo
14N, e separando uma nova amostra de bactérias a cada nova geração,
crescida em 14N, a cada 20 minutos. A amostras controle contendo bac-
térias criadas em 14N e as amostras obtidas do experimento (15N, 14N
20’, 14N40’, etc) foram separadas e, após a extração de DNA, as amostras
foram submetidas ao gradiente de centrifugação em CsCl2. Como seria de
se esperar as amostras controle com DNA 14N apresentaram e as amostras
contendo 15N apresentaram faixas distintas nas posições esperadas, con-
forme já demonstrado na figura 2. A amostra da primeira geração nascida
em meio de cultura contendo 14N (20’) apresentou uma faixa intermediária
no gradiente de cloreto de césio e na amostra obtida após 40’, existiam duas
faixas, uma na posição intermediária e outra na posição referente a faixa
14N, como demonstra a figura 3.

82
Replicação do DNA e transcrição
Aula

Figura 3- Experimento de Meselson e Stahl (1958)

83
Genética Básica

O experimento de Meselson e Stahl (1958), portanto, comprovou que


a replicação do DNA é semi-conservativa. Esse resultado abriu novos
desafios na área de pesquisa, especialmente relacionados a elucidação dos
mecanismos moleculares relacionados ao processo de replicação. Algumas
perguntas ainda estavam sem resposta naquele momento: Como é iniciado
o processo de replicação da fita dupla de DNA? Existe um ponto específico
para a origem da replicação? Existe diferença no processo de replicação
entre eucariotos e procariotos? Quais são as moléculas envolvidas nesse
processo e com elas participam desse processo? Os tópicos a seguir pro-
curam responder a cada uma dessas questões.

ORIGENS DA REPLICAÇÃO
No ano de 1963, estudos auto-radiográficos do cromossomo de
E.coli mostraram que o cromossomo bacteriano é uma estrutura circular
e que o processo de deselicoidização da molécula de DNA e a replicação
semi-conservativa eram processos que ocorrem de forma acoplada, quase
simultaneamente interpretação dos pesquisadores paras as auto-radiografias
indicaram também que a replicação tem início em um sítio específico,
chamado de origem e ocorre de forma bidirecional ao redor do cromos-
somo circular, em um modelo denominado círculo rolante.

Figura 4- Auto-radiografia de um cromossomo bacteriano em processo de replicação. (a) Uma auto-radiografia do clássico
trabalho de Cairns (1963), com seu diagrama interpretativo acima à direita. Os filamentos radioativos são mostrados com
linhas sólidas e os filamentos novos são ilustrados como linhas tracejadas. (b) interpretação do processo de replicação
bidirecional chamado círculo rolante
(Fonte: http://schaechter.asmblog.org).

84
Replicação do DNA e transcrição
Aula

REPLICAÇÃO BIDIRECIONAL
Cairns em seus estudos considerou que a replicação teria uma única
6
origem e formaria uma única forquilha de replicação em movimento unidi-
recional ao redor do cromossomo circular. No entanto sabe-se atualmente
que a replicação em procariontes pode ter a formação de duas forquilhas
a partir de uma única origem, com as duas forquilhas movendo-se em
sentidos opostos, ou seja, a replicação realiza um movimento bidirecional.
A replicação bidirecional foi descoberta em experimentos realizados
com vírus bacterianos da E. coli, denominados de fago lambda. O cromos-
somo do bacteriófago lambda apresenta regiões ricas em A:T onde ocorrem
as diferenciações. Experimentos de Schnos e Inman (1960) demonstraram
que a replicação do cromossomo lambda parte de uma mesma origem em
movimento bidirecional.
No processo de desnaturação do DNA as pontes de hidrogênio e as
ligações hidrofóbicas são quebradas quando expostas a altas temperaturas ou
pH ácido por exemplo. Nessa quebra os filamentos do DNA são separados,
mas os pares de A:T são rapidamente desnaturados por possuírem apenas
duas pontes de hidrogênio, enquanto que os pares G:C são ligados por três
pontes. As bolhas da desnaturação dos pares A:T podem ser vistas através de
microscopia eletrônica e assim utilizados como marcadores. Schnos e Inman
observaram as posições dessas bolhas em vários réplicons e puderam demon-
strar as forquilhas em sentidos opostos ao redor do cromossomo circular.
A replicação bidirecional foi comprovada em outros organismos incluindo
eucariontes, mas a replicação bidirecional não se aplica a todas as espécies,
apesar de ocorrer na maioria, em colifagos, por exemplo, ela é unidirecional.
Nos cromossomos eucarióticos, que apresentam vários sítios de origem
de replicação existem diversos réplicons. O réplicon é, portanto, o produto
da replicação gerado a partir de um sítio de origem de replicação.

Figura 5a – Diversas origens de replicação e diversos réplicons em eucariotos

85
Genética Básica

A origem da replicação em E.coli foi denominada de OriC. Foi obser-


vado detalhadamente que o OriC possui 245 pares de nucleotídeos em duas
diferentes seqüências conservadas repetidas. Assim uma seqüência de 13pb
está repetida três vezes em tandem. As repetições são ricas em pares de A:T,
o que possibilita a formação da bolha de replicação, que é uma região
de separação do filamento. Uma zona de desnaturação é a primeira etapa
essencial para a replicação de todo DNA bifilamentar. Outro componente
do OriC conservado que entra em ação agora é uma seqüência de 9pb com
quatro repetições intercaladas por outras sequências. Estas sequências são
na verdade sítios de ligação a uma proteína, denominada dna A, que dá
inicio ao processo de formação da bolha de replicação.

Figura 5b – Ilustração do sítio OriC em E. coli (ORIC)


(Fonte: www.ufrgs.br/depbiot/blaber/section2/img00004.gif).

Acredita-se que nos eucariontes as origens de replicação são seqüências


específicas de DNA.

DNA POLIMERASES

A síntese in vitro de DNA foi realizada primeiramente em 1952 por


Arthur Kornberg, que também acabou por identificar o que mais tarde seria
denominada de DNA polimerase I . A enzima DNA polimerase I entra em
ação somente na presença de íons Mg²+ e da fita molde de DNA. De modo
geral as DNA polimerases são enzimas que auxiliam na síntese de qualquer
fita nova de DNA, sendo os novos filamentos produzidos no sentido de
5’ → 3’. Em bactérias, tanto a enzima DNA polimerase I quanto as DNA
polimerase II e III realizam polimerização (adição de novos nucleotídeos)

86
Replicação do DNA e transcrição
Aula

e também função exonucleásica (atividade de correção de erros), embora a


função a DNA polimerase I seja mais especializada na função exonucleásica,
fazendo a revisão tanto no sentido 5’ → 3’ quando no sentido 3’ → 5’. A
6
remoção dos primers parece ser a principal função da DNA polimerase I,
enquanto e a síntese precisa de DNA é a principal função da DNA polim-
erase III. O que pode ser observado pela tabela a seguir:

Tabela. – Funções das DNA polimerases em E. coli (PIERCE, 2004).


DNA Polimeralização Exonuclease Exonucle Principais Funções
Polimerase Æ3’
5’Æ 3’Æ5’ ase
5’Æ3’
I Sim Sim Sim remove e substitui
primers.
II Sim Sim Não reparo do DNA:
reinicia a replicação
em DNA danificado,
parar a síntese.
III Sim Sim Não alonga o DNA

A DNA polimerase III adiciona um nucleotídeo ao grupo 3’-OH do primer.

REPLICAÇÃO EM EUCARIONTES
A replicação em eucariontes ainda não tem todos seus mecanismos
completamente elucidados, mas sabe-se que apresentam algumas diferenças
quando comparados à replicação dos procariontes. As principais diferenças
são: origens múltiplas de replicação, maior número de polimerases, maior
diversidade de funções para DNA polimerases, montagem de nucleossomos
após a replicação.
Como visto anteriormente em leveduras, algumas seqüências de DNA
(ARS) possuem a habilidade de se auto-reaplicar, o que possibilita a repli-
cação de qualquer filamento de DNA, uma vez que estejam ligados a uma
destas ARS. O complexo de reconhecimento de origem (ORC) liga-se a
ARS desenrolando o DNA. O DNA eucariótico possui muitas origens de
replicação e cada origem possui um ORC. O genoma precisa ser replicado
de forma a não repetir nenhum gene nem deixar que algum gene não seja
replicado. Assim em células eucarióticas o inicio da replicação se dá em
duas fases para maior controle do processo de replicação.
Na primeira fase as origens são aceitas para replicação por meio de um
fator de permissão da replicação que se liga a estas origens. Na fase seguinte
as proteínas iniciadoras se ligam somente às origens “permitidas” ou ligadas
a seu fator de permissão, a partir de então se tem a separação dos filamen-

87
Genética Básica

tos de DNA e o inicio da replicação nas origens “permitidas”. Ao passo


que a replicação se distancia da origem perde-se os fatores de permissão,
que só serão reativados depois da mitose ter sido completada e antecede a
reativação das proteínas iniciadoras, evitando assim a replicação de trechos
que já foram replicados ou que se deixe de replicar algum fragmento.
Foram identificadas em células eucarióticas aproximadamente 13 tipos
diferentes de DNA polimerases que atuam na replicação, recombinação e
no reparo do DNA. As DNA polimerases alfa iniciam a síntese ao reali-
zar atividade de primase, e a DNA polimerase delta atua completando os
filamentos de replicação contínua e descontínua. A DNA polimerase beta
está relacionada ao reparo e a recombinação de DNA nuclear. A DNA
polimerase gama atua na replicação do DNA mitocondrial e também na
replicação do DNA dos cloroplastos. A DNA polimerase épsilon participa
do processo de replicação continua e descontínua, mas suas funções em
maiores detalhes ainda não são bem conhecidas. Ainda que seus papéis não
estejam totalmente esclarecidos, acredita-se que as demais DNA polimerases
possibilitem a replicação translesão, que é uma replicação que ultrapassa o
DNA danificado, além de outras funções no reparo do DNA bem como
nos processos de replicação como um todo.

Tabela. – Funções das DNA polimerases em eucariontes (PIERCE, 2004).

DNA Polimerase Atividade de Atividade de Funções


polimerase Exonuclease 3’Æ5’
Æ3’
5’Æ
Alfa Sim Não Inicio da síntese nuclear
e reparo do DNA.
Beta Sim Não Reparo de DNA e
Recombinação de DNA
nuclear.
Gama Sim Sim Replicação de DNA
mitocondrial.
Delta Sim Sim Síntese de filamentos
leading e lagging,
reparo do DNA e
síntese translesão de
DNA.
Épsilon Sim Sim Reparo e replicação de
DNA nuclear.
Zeta Sim Não Síntese de DNA
translesão.
Eta Sim Não Síntese de DNA
translesão.

88
Replicação do DNA e transcrição
Aula

Teta
Ioda
Sim
Sim
Não
Não
Reparo do DNA.
Síntese de DNA
translesão.
6
Kapa Sim Não Síntese de DNA
translesão.
Lambda Sim Não Reparo do DNA.
Mi Sim Não Reparo do DNA.
Sigma Sim Não Replicação do DNA
nuclear, reparo do
DNA,e coesão de
cromátides irmãs.

EFEITO DE OKAZAKI
É do conhecimento de vocês que a molécula de DNA é formada por
uma hélice dupla, constituída de duas fitas complementares que apresentam
polaridades opostas e por isso, são denominadas antiparalelas. Enquanto
uma tem sentido 3’→5’, a fita complementar encontra-se no sentido 5’→3’.
Para que um novo nucleotídeo seja adicionado durante a polimerização a
DNA polimerase cliva o nucleotídeo trifosfatado (utilizado como matéria
prima), liberando duas moléculas de fósforo inorgânico, o que fornece a
energia necessária para a catálise da formação de uma ligação fosfodiester
entre a ligação livre, do único fosfato restante no nucleotídeo, e a extremi-
dade 3’-OH livre da desoxirribose da fita nascente. Assim, cada nucleotídeo
novo deixa uma extremidade 3’-OH livre para os próximos nucleotídeos,
repetindo esse passo sucessivamente, enquanto estiverem na presença
da fita molde. Como as DNA polimerases iniciam a síntese a partir do
fragmento 3’OH livre fornecido pelo primer, a fita nova 5’→3’ apresenta
uma síntese contínua dando origem ao filamento denominado leading, e
a fita nova no sentido 3’→5’ apresenta síntese descontínua originando o
filamento lagging. Quando a fita molde está no sentido 5’→3’ não é pos-
sível fornecer à DNA polimerase uma extremidade livre 3’OH de forma
simultânea ao fornecimento da fita molde, uma vez que a extremidade livre
3’OH encontra-se na extremidade oposta à fita molde.
A síntese do filamento lagging tem sentido contrário ao da deselicoidização,
indo de encontro à forquilha de replicação, o que faz a síntese desse filamento
ocorrer de forma fragmentada, já que o primer é adicionado à distância de
algumas centenas de nucleotídeos da forquilha de replicação (para solucionar
a falta de fita molde) e a polimerização se estende até voltar à parte já replicada,
sendo necessários vários primers, sendo um para cada fragmento da fita lagging.
Assim a síntese do filamento lagging se dá de forma descontínua em fragmen-
tos curtos que são denominados de fragmentos de Okazaki. A figura a seguir
ilustra a formação das fitas lagging e leading durante o processo de replicação.

89
Genética Básica

Figura 6 – Formação das fitas lagging e leading durante o processo de replicação


(Fonte: HTTP:\\www.peleteiro.es).

O MECANISMO DE REPLICAÇÃO
O complexo de replicação pode ser resumido ao que ocorre durante
a formação de um réplicon.

A ABERTURA DA FITA DUPLA DE DNA

O passo inicial do processo de replicação é a abertura da fita dupla de


DNA para que as fitas de DNA unifilamentares fiquem expostas para que
possam servir de molde para a produção das fitas complementares. No
entanto, como a fita dupla de DNA está disposta em forma de hélice, a
replicação do DNA requer um mecanismo de deselicoidização. A abertura
da fita é catalisada por enzimas chamadas DNA helicases, sendo que a

90
Replicação do DNA e transcrição
Aula

principal helicase é decodificada pelo produto do gene dnaB. As helicases


utilizam moléculas de ATP para catalisar a reação de quebra das pontes de
hidrogênio que mantém unidas as bases nitrogenadas. Entretanto, as bases
6
nitrogenadas tendem a refazer as pontes de hidrogênio, em função da afini-
dade de ligação entre elas, forçando a renaturação do DNA. Então para a
manutenção da forma distendida, proteínas de ligação denominadas SSB
são ligadas às fitas de DNA unifilamentar, formando diversos monômeros
da proteína ligados cooperativamente ao longo da forquilha de replicação,
impedindo temporariamente o fechamento da molécula de fita dupla. As
proteínas SSB que revestem as fitas unifilamentares de DNA, impedindo
a renaturação da molécula de DNA, são codificadas pelo gene ssb.

Figura 7- Esquema representativo da abertura da fita de DNA evidenciando as funções das proteínas
SSB e das helicases.
(Fonte:www.ufsm.br).

Relembrando a estrutura da molécula de DNA, estudada na aula an-


terior, observe que trata-se de uma dupla hélice onde cada volta completa
tem cerca de 10 pares de nucleotídeos de tamanho, isso faz com que du-
rante a abertura da molécula o DNA precise realizar um giro de 360º (uma
volta completa) a cada 10 nucleotídeos, sendo a velocidade de replicação
em torno de 30000 nucleotídeos por minuto. Rapidamente é gerada uma
superelicoidização em função da velocidade de cerca de 3000rpm, gerando
uma força contrária à abertura da fita. Para impedir que a força contrária de
superelicoidização impeça a abertura da molécula a enzimas, denominadas
topoisomerases, catalisam quebras transitórias nas ligações fosfodiester
ao longo do eixo principal da molécula de DNA. Existem duas classes de
topoisomerases: tipo I e tipo II. As topoisomerases do tipo I são caracter-

91
Genética Básica

izadas por clivar apenas uma das duas fitas de DNA. Essa quebra unifilamentar
permite que a fita clivada gire em torno do eixo da molécula, desfazendo a
superélice e, consequentemente, permitindo que a abertura da fita dupla de
DNA possa continuar. A clivagem realizada pelas topoisomerases tipo I são
energeticamente mais eficientes. As topoisomerases do tipo II apresentam como
principal diferença a clivagem bifilamentar do DNA, podendo remover ou até
mesmo introduzir superélices utilizando um mecanismo que requer energia.
A topoisomerase do tipo II mais bem caracterizada é a enzima DNA girase.

SÍNTESE DE NOVOS FILAMENTOS DE DNA

Uma vez iniciada a formação da forquilha de replicação, a síntese de novos


filamentos é imediatamente iniciada. As DNA polimerases formam o principal
grupo de enzimas no processo de replicação. Como detalhado anteriormente,
as DNA polimerases desempenham funções exonucleásicas (de revisão) e
funções polimerásicas (geração das novas fitas complementares de DNA a
partir das fitas molde). Para a realização da função de polimerização sabemos
que as DNA polimerases precisam basicamente de fitas molde unifilamen-
tares, de nucleotídeos trifosfatados (desoxirribonucleosídeo 5’ trifosfato),
que são as unidades básicas para a produção do polímero e, finalmente, de
uma extremidade 3’OH livre para que possam adicionar novos nucleotídeos.

Figura 8 – Adição de novos nucleotídeos pela DNA polimerase na extremidade 3’OH livre da fita nova.

92
Replicação do DNA e transcrição
Aula

As fitas molde tornam-se disponíveis com a desnaturação da fita dupla que


expõe as duas fitas unifilamentares, os nucleotídeos trifosfatados são encontrados
livremente no citoplasma, mas a extremidade 3’OH livre precisa ser fornecida
6
pela formação de uma pequena seqüência inicial complementar à fita molde,
denominada primer. O primer é um pequeno segmento de RNA produzido
por uma enzima da classe das RNA polimerases denominada Primase. Essa
enzima liga-se às fitas molde utilizando-as para a ligação de ribonucleotídeos
complementares em um curto segmento iniciador de 10 a 12 nucleotídeos de
tamanho. No entanto, a polimerização ocorre de forma diferente em relação às
duas fitas molde complementares, em função delas serem antiparalelas. Quando
a fita molde encontra-se no sentido 3’→5’, a polimerização ocorrerá de forma
contínua (como anteriormente descrito), uma vez que todos os pré-requisitos
para a ação da DNA polimerase são atendidos. No entanto, com relação à fita
complementar, na orientação 5’→3’, a extremidade 3’OH do primer está orien-
tada no sentido contrário ao filamento molde. Para solucionar esse problema,
o primer é inserido algumas centenas de nucleotídeos adiante, permitindo que
tanto a extremidade 3’OH do primer, quanto um segmento da fita molde, estejam
simultaneamente disponíveis à DNA polimerase, permitindo a polimerização no
único sentido possível de polimerização dessa enzima, o sentido 5’→3’ da fita
nova. Nas bactérias a DNA polimerase III é a principal responsável pelo processo
de polimerização e isso ocorre de forma simultânea nas duas fitas, ainda que a
mecânica de polimerização exiga da DNA polimerase a formação de alças em
função da formação dos fragmentos de Okazaki na fita lagging. A DNA polim-
erase I, por sua vez, é a principal enzima responsável nas bactérias pela função
exonucleásica, realizando essa função de revisão, tanto no sentido 5’→3’ quanto
no sentido 3’→5’. A DNA polimerase I substitui os fragmentos de RNA (prim-
ers) durante a revisão, substituindo-o por um filamento adequado de DNA. No
entanto, as ligações fosfodiester entre os fragmentos precisam ser estabelecidas
e isso é realizado pela enzima DNA ligase. Após o processo de revisão e ligação
dos fragmentos, os dois réplicons produzidos de forma semi-conservativa são
geneticamente idênticos.

93
Genética Básica

Figura 9 – Principais etapas do processo de replicação

TRANSCRIÇÃO E PROCESSAMENTO DO RNA

OS TIPOS DE RNA

Apesar da existência de diversos tipos de moléculas de RNA e da verda-


deira revolução que as moléculas de RNA vem fazendo na área de genética,
especialmente em função do desenvolvimento recente da epigenética, nessa
aula vamos tratar das quatro classes de RNAs especialmente relacionadas à
expressão gênica. 1- O RNA mensageiro (mRNA), intermediário que porta
a informação genética levando-a aos ribossomos; 2- RNA de transferência
(tRNA), pequenos RNA’s dobrados sob a forma de trevo, cuja principal
função é o transporte de um aminoácido para a síntese proteica no ri-
bossomo, servindo de intermediário entre a informação genética do mRNA
e o ribossomo; 3- RNA ribossomal (rRNA), componente estrutural dos
ribossomos, a estrutura complexa formada por rRNA e proteínas e execu-
tam a tradução das proteínas e; 4- RNA’s nucleares (snRNA), componentes
estruturais do aparelho de processamento do mRNA, o spliceossomo.

94
Replicação do DNA e transcrição
Aula

RNA MENSAGEIRO 6
O RNA mensageiro ou mRNA foi descoberto na década de 1950 por
François Gros em estudos com bacteriófagos da E. coli, por meio de uma
experimento conhecido como pulso-caça, nesse experimento Góis marcou a
uracila radioativamente e observou seus movimentos na síntese, e percebeu
que o RNA do fago tinha curta duração e estava associado aos ribossomos,
interpretou que esse RNA fosse um de transferência de informações entre
o DNA e os ribossomos, cunhando-o de mensageiro. O mRNA codifica e
carreia as informações genéticas do DNA para os ribossomos. O mRNA
divide-se em três regiões: a região5’ que não codifica a seqüência de aminoá-
cidos da proteína; a região codificante onde são encontrados os códons, for-
mados por três nucleotídeos que, em conjunto, determinam um aminoácido
a ser incluído na síntese e a região 3’ não traduzida em proteína. Os RNAs
heterogêneos nucleares (htRNA) são os produtos primários da transcrição em
eucariotos. Vale lembrar que as células de bactérias não possuem htRNA já
que nestas a transcrição ocorre simultaneamente a tradução. O RNA heterogê-
neo nuclear é um precursor do mRNA maduro que está restrito ao núcleo
das células eucarióticas e geralmente é muito maior que o mRNA maduro,
em função de ser formado por uma fita de RNA exatamente complementar
à fita molde do DNA de origem, incluindo regiões codificantes (Exons) e
regiões não codificantes (introns). Voltaremos a esse tema quando tratarmos
do processamento do mRNA em eucariontes.

Figura 10- RNA heterogêneo Nuclear (htRNA) precursor do mRNA em eucariotos

95
Genética Básica

RNA DE TRANSFERÊNCIA (TRNA)


O RNA de transferência ou tRNA tem como função fornecer aminoá-
cidos ao ribossomo para a produção de polipeptídeos segundo a leitura das
informações genéticas do mRNA. Cada tRNA possui afinidade com um
único tipo de aminoácido ao qual se liga por intermédio da catálise pela
enzima Aminoacil Sintetase e o transporta do citoplasma ao ribossomo.
Os tRNAs apresentam sua estrutura tridimensional e em forma de trevo
com pontes de hidrogênio intramoleculares contendo cerca de 70 a 90
nucleotídeos, portanto, bem menores que os mRNA’s. Os tRNAs apre-
sentam também bases modificadas como a ribotinina, além das famosas
(adenina, citosina, guanina e uracila). Essas bases modificadas tem origem
nas bases padrão na transcrição por enzimas modificadoras de tRNA.
Esses nucleotídeos diferentes são geralmente derivados metilados dos
nucleotídeos comuns. Esses nucleotídeos metilados impedem a formação
de pares de bases, afetando a forma tridimensional da molécula. Existem
algumas características comuns na configuração tridimensional dos tRNA’s.
A extremindade 3’ apresenta sempre uma sequência terminal CCA, que
pode se ligar covalentemente a um aminoácido numa reação catalisada pela
enzima aminoacil sintetase. A alça do anticódon, por sua vez, é umas das
estruturas encontradas no tRNA, nela encontra-se o anticódon formado
por uma trinca de nucleotídeos relacionado de forma complementar com
o códon do mRNA e permite que o aminoácido correto seja adicionado a
sua posição na síntese proteica.

Figura 11- Modelo estrutural do RNA de transferência


(Fonte: www.emc.maricopa.edu).

96
Replicação do DNA e transcrição
Aula

RNA RIBOSSOMAL
O RNA ribossomal ou rRNA faz parte da constituição dos ribossomos
6
compondo suas unidades e subunidades e conjunto com diversas proteínas.
Nos ribossomos encontra-se aproximadamente 80% de todo o RNA con-
tido na célula e neles é que são montadas as proteínas. Nos procariontes os
rRNA’s interagem com mais de 50 proteínas ribossômicas diferentes para
formar a complexa estrutura tridimensional do ribossomo. As classes de
rRNA procarióticas são chamadas: 5S, 16S e 23S. Essa nomenclatura se dá
em função de sua densidade em gradiente de sedimentação em sucrose.
Nos ribossomos eucarióticos os rRNA interagem com cerca de 80 proteínas
diferentes, sendo as classes de rRNA eucarióticos designados 5S, 5,8S, 18S
e 28S. O rRNA é obtido por transcrição e o produto final dos genes são
moléculas de RNA.

Figura 12- Moléculas de rRNA em ribossomos de procariontes e eucariontes


(Fonte: www.compbio.pbworks.com).

RNA’S NUCLEARES (SNRNA)


Como componentes estruturais dos spliceossomos, esses pequenos
RNA’s excisam os introns durante o processamento dos precursores de
RNA durante a fase de processamento.

97
Genética Básica

RIBOZIMAS

O RNA também pode desempenhar função catalítica como as enzi-


mas, ou seja, nem toda enzima é uma proteína como pensávamos. Esse
fato foi descoberto por Thomas Cech (1981) em um estudo envolvendo
RNA ribossomal de protozoários, desde então, diversas ribozimas têm sido
descobertas e estudadas, com destaque para os estudos de Sidney Altman,
o que levou Cech e Altman ao prêmio Nobel em 1989. A descoberta das
habilidades catalisadoras de moléculas de RNA sugere que o primeiro ma-
terial genético tenha sido o RNA e não o DNA.

Figura 13 – Modelos tridimensional de uma molécula de RNA catalítico (ribozima), evidenciando


o sítio de catálise (1)
(Fonte: www.science.ca).

98
Replicação do DNA e transcrição
Aula

SÍNTESE DE RNA 6
A transcrição é o mecanismo pelo quais todas as categorias de RNA,
vistas anteriormente, são sintetizadas. A transcrição utiliza uma fita de DNA
como molde e assemelha-se à replicação, no entanto são copiados apenas
alguns trechos do DNA, como um gene ou alguns poucos genes. Pois seria
demasiadamente desnecessário que a todo tempo que uma célula neces-
sitasse de uma proteína especifica tivesse que transcrever todo o genoma.
Assim a transcrição proporciona à célula a oportunidade de selecionar quais
proteínas serão produzidas segundo sua necessidade.
Para a transcrição são necessários três elementos básicos:
1. O filamento molde de DNA – que consiste em uma única fita de DNA,
diferentemente da replicação que ocorre em ambas as fitas da dupla hélice,
pois em qualquer trecho do DNA uma única fita possui a informação a ser
transcrita, que é a unidade de transcrição;
2. O substrato (nucleotídeos) – o RNA é constituído de trifosfatos de ribo-
nucleosídeos (rNTPs) que são adicionados molécula por molécula ao grupo
3’-OH somado ao fósforo orgânico, constituindo-se a como a matéria prima
da transcrição (RNAn + rNTP → RNAn+1 +PPi, onde PPi é o fósforo);
3. O aparelho de transcrição – é constituído de por uma gama de enzimas
e proteínas que auxiliam, sintetizam e regulam o processo de transcrição.

AS RNA POLIMERASES

As RNA polimerases são enzimas semelhantes as DNA polimerases


da replicação. As bactérias possuem apenas um tipo de RNA polimerase.
A RNA polimerase bacteriana é uma grande enzima constituída por
várias cadeias polipeptídicas, ou seja, uma enzima multimérica. A RNA
polimerase bacteriana subdivide-se em quatro unidades (as cadeias polipep-
tídicas individuais, duas cópias da unidade alfa, uma cópia da unidade beta,
e uma cópia da unidade beta-primo) que compõem o cerne da enzima. Ao
cerne da enzima ligam-se outras subunidades como os fatores sigma, for-
mando uma holoenzima, possibilitando que a RNA polimerase bacteriana
atue nas diferentes etapas da transcrição.

TRANSCRIÇÃO EM PROCARIONTES

Nos procariotos uma unidade de transcrição pode conter um ou vários


genes que são transcritos simultaneamente (transcrição policistrônica). O
processo de transcrição pode ser dividido didaticamente em três etapas:
(1) início, (2) elongamento e (3) término e liberação da molécula de RNA.
Assim como na replicação, a síntese de RNA ocorre sempre no sentido

99
Genética Básica

5’→3’ da fita de RNA nascente. Considerando um ponto de referência e


sabendo que a transcrição é unidirecional.

INÍCIO

Na iniciação primeiramente o promotor é reconhecido, depois há a


formação da bolha com separação dos filamentos do DNA, o promotor
determina o trecho do molde que deve ser transcrito e a freqüência dessa
transcrição, nessas etapas o promotor tem afinidades específicas com a
RNA polimerase que varia com o tempo. O promotores bacterianos são
seqüências de DNA que são identificados pelo aparelho de transcrição e que
determinam o sítio onde terá inicio a transcrição, qual dos dois filamento de
DNA são utilizados como molde, e qual o sentido da RNA polimerase. Nos
promotores são encontrados seqüências comuns que são denominadas de
seqüências de consenso, essas seqüências normalmente implicam em uma
função importante. Alguns promotores bacterianos apresentam também
um elemento antecedente (upstream) que seria uma seqüência de consenso
a mais, estas geralmente catalisam o processo de transcrição.
Duas regiões promotoras parecem estar conservadas em todos os
procariontes, denominada TATA box, que antecede a região codificante
em 10 bases (-10) e outra na região -35, ou seja, localizada a cerca de 35
pares de bases acima da região codificante, caracterizada pelo sequência de
consenso TTGACA e consiste numa região relativa ao local de ligação da
RNA polimerase.

Figura 14- Região promotora em procariontes

A holoenzima RNA polimerase utiliza a subunidade Fator Sigma


apenas no início da transcrição. O fator sigma não executa nenhum papel
no elongamento da cadeia de RNA, sendo liberado do Cerne (complexo
formado pela holoenzima RNA polimerase sem o fator sigma). A principal
função desempenhada pelo fator sigma é a localização dos sítios promo-
tores e identificação da fita molde. Sem o fator sigma a transcrição torna-se
um evento aleatório . Após a identificação do promotor e da fita molde, a
holoenzima é acoplada ao promotor, onde a RNA polimerase dá inicio a
transcrição e desenrola o DNA.

100
Replicação do DNA e transcrição
Aula

ELONGAMENTO
O elongamento da cadeia de RNA é catalisado pelo cerne da enzima
6
RNA polimerase após a liberação da subunidade sigma, dentro da bolha de
transcrição, que é um segmento de RNA que permanece aberto durante a
catálise da transcrição, tanto a abertura quanto o fechamento temporário da
bolha é catalisado pela RNA polimerase, além da adição de ribonucleosídeos
trifosfatados complementares a fita de DNA molde.

TÉRMINO E LIBERAÇÃO

O término ocorre quando a RNA polimerase transcreve um sinalizador


de término ou finalizador que antecedem o ponto de término. Um dos
sinalizadores de término são denominado alças em grampo, em função do
dobramento do transcrito sobre si mesmo em função de uma região rica
em CG de cerca de 40 nucleotídeos de extensão, reconhecida pela RNA
polimerase.

Figura 15 – Sinal de término de transcrição denominado alça em grampo

Alguns eventos ocorrem durante a transcrição na região finalizadora: a


RNA polimerase paralisa a síntese de RNA, a molécula de RNA liberta-se
da RNA polimerase, a molécula de RNA separa-se da fita de DNA e a RNA
polimerase separa-se da fita molde de DNA. Quando a RNA polimerase
para, uma proteína com atividade de helicase desenrola o híbrido RNA-
DNA da bolha de transcrição dando fim ao processo de transcrição, essa
proteína é conhecida como proteína rô.

101
Genética Básica

Figura 16- Processo de transcrição em procariotos

O PROCESSO DE TRANSCRIÇÃO EM
EUCARIOTOS

Em linhas gerais a transcrição em eucariotos segue o mesmo padrão


do processo de transcrição em procariotos, mas diversos detalhes são dife-
rentes, como é o caso das sequências promotoras e das moléculas de RNA
polimerase envolvidas. As RNA polimerases eucarióticas dividem-se em
três categorias diferentes (RNA plimerases I., RNA polimerase II, e RNA
plimerase III), responsáveis por transcrever categorias diferentes de RNA,
como ilustrado na tabela a seguir.

Tabela 1 – Funções das RNA polimerases eucarióticas (PIERCE, 2004).


ç p ( , )
Tipo de RNA polimerase Tipo de RNA transcrito

RNA polimerase I Grandes rRNA

RNA polimerase II Pré-mRNA, alguns snRNA, e snoRNA

RNA polimeras III tRNA, pequeno rRNA, e snRNA

Ao contrário da RNA polimerase procariótica, as RNA polimerases


eucarióticas não podem iniciar a transcrição de forma autônoma. Todas as
três RNA polimerases necessitam de fatores proteicos de transcrição para
iniciar a síntese de RNA. Esse fatores de transcrição devem se ligar de forma
apropriada a sítios que se ligam a região promotora do DNA, permitindo
o início da transcrição. Cada uma dos tipos de RNA polimerase eucariótica
envolve diferentes fatores de transcrição. Os promotores reconhecidos pela
RNA polimerase II são formados por segmentos curtos e muito conser-
vados caracterizados pela sequência TATAAAA, denominada TATA box,
localizada na posição -30pb. Esse promotor tem um importante papel no

102
Replicação do DNA e transcrição
Aula

posicionamento da RNA polimerase para o início da transcrição. A segunda


região promotora conservada é o CAAT box, localizado geralmente próximo
à região -80pb, possuindo uma sequência de consenso GGCCAATCT.
6
Além dessas duas sequências promotoras, existem ainda outras regiões
conservadas relacionadas ao promotor em eucariotos, envolvendo ainda
diversos fatores basais de transcrição.
Complexos de transcrição envolvendo fator de transcrição e regiões
promotoras também são necessários para iniciar a transcrição pelas RNA
polimerases I e III. Os promotores dos genes transcritos por essas duas RNA
polimerases são bastante diferentes daqueles utilizados pela RNA polimerase II.

ELONGAMENTO

Inicialmente as RNA polimerases são liberadas de seus complexos de


iniciação e catalisam o elongamento da cadeia de RNA ao longo da região
codificante utilizando os mesmos mecanismos já descritos para a transcrição
em procariontes. No início do processo de elongamento dos precursores
dos mRNA eucarióticos são modificadas pela adição de revestimentos de
7 metil guanosina, adicionados quando a cadei de RNA está com cerca de
30 nucleotídeos de comprimento, esse revestimento é metilado e possui
uma rara ligação 5’5’ trifosfato. Esse caput de Guanosina metilada na ex-
tremidade 5’ é importante para o início do processo de tradução e como
proteção contra a degradação do RNA por nucleases.

TÉRMINO

As pontas 3’ dos RNA transcritos pela RNA polimerase II são geradas


por clivagem endonucleolítica dos transcritos primários e não pelo término
da transcrição. Os eventos de término de transcrição ocorre em vários
sítios que estão situados de 1000 a 2000 nucleotídeos após o sítio que será
posteriormente pós a clivagem a ponta 3’.

PROCESSAMENTO DE RNA

Os RNAs pré-mensageiro, ou RNA heterogêneo nuclear, são os produ-


tos da transcrição. Vale lembrar que as células de bactérias não possuem
pré-mRNA já que nestas a transcrição ocorre simultaneamente a tradução.

103
Genética Básica

REVISANDO O CONCEITO DE GENE

Em geral o gene é definido como um fator que determina nossas carac-


terísticas hereditárias, mas esse conceito não é exatamente o que o gene é, e
sim o que ele faz. O gene em sua estrutura é um conjunto de nucleotídeos.
Como os genes codificam as proteínas, e estas são feitas de aminoácidos,
o conceito de gene também pode ser definido como uma seqüência de
nucleotídeos que determina uma seqüência de aminoácidos. Assim é de se
esperar afinidades entre esses nucleotídeos e aminoácidos, pensando nisso
Francis Crick (1958) afirmou que as proteínas e os genes seriam colineares,
ou seja, o número de nucleotídeos em um gene seria proporcional ao número
de aminoácidos que compõem a proteína sintetizada. A colinealidade é
verdadeira para a maioria de bactérias e vírus, ainda que esses genes sejam
ligeiramente maiores que as proteínas por causa das seqüências de suas
extremidades que codificam o início e o término da transcrição. No entanto
o mesmo não pode ser aplicado aos genes eucarióticos, inicialmente foram
sido considerados colineares, mas ao passo que a estrutura do DNA foi
sendo mais estudada, percebeu-se que o DNA de eucariontes era muito
maior do que o necessário aparentemente.
Somente na década de 1970 foi realmente comprovado que o DNA
de eucariotos é intercalado por seqüências que não codificam proteínas.
Percebeu-se por microscopia eletrônica que o filamento de DNA a ser tran-
scrito é muito maior que seu mRNA, e que o DNA apresentava seqüências
de nucleotídeos em forma de alças que não são transcritas, não possuindo
correspondentes no mRNA.
Assim a maioria dos genes eucarióticos e alguns genes procarióticos
apresentam além das seqüências codificantes chamadas éxons, seqüências
não-codificantes chamadas íntrons. Os íntrons e éxons são transcritos em
RNA, mas ao final da transcrição os íntrons são removidos por um me-
canismo chamado splicing e os éxons são fundidos num RNA final.

Figura 17- RNA heterogêneo nuclear o o processo de splicing para a obtenção do mRNA maduro
(Fonte: http://www.emc.maricopa.edu).

104
Replicação do DNA e transcrição
Aula

O número e o tamanho de íntrons variam bastante de organismo para


organismo e de gene para gene, e está relacionado com complexidade do
organismo ou da célula. Bactérias possuem poucos e curtos íntrons enquanto
6
os genes da maioria dos animais são intercalados por vários e longos íntrons.
O íntron pode ter de 200 a 50.000 nucleotídeos. Os tipos de íntrons mais
conhecidos atualmente, são:

Tabela 2. Tipos de íntrons (PIERCE, 2004).

Tipo de íntron Localização Tipo de recomposição


Grupo I Alguns genes de rRNA Auto remoção
Grupo II Genes codificantes de Auto remoção
proteínas em mitocôndrias e
cloroplastos
Pré-mRNA nuclear Genes codificantes de Spliceossômico
proteínas no núcleo
tRNA Genes de rRNA Enzimático

Os íntron auto-recompostos do grupo I e IIpodem realizar sua própria


remoção se a ajuda de enzimas ou proteinas, mas os íntrons do grupo I e
II realizam sua própria remoção por mecanismos diferentes. Os íntrons do
grupo I dobram-se em nove hastes em conjunto com reações de transesteri-
ficações para a recomposição. Enquanto que os íntrons do grupo II realizam
reações de transesterificação formando uma estrutura em laço. Os íntrons
do pré-mRNA são os mais conhecidos e possuem mecanismos de remoção
semelhantes ao do grupo II, porém não conseguem se auto remover. Os
íntrons tRNA são encontrados nos genes de tRNA e seu mecanismo de
recomposição está relacionado a enzimas que cortam e ligam o RNA.
Após a descoberta dos íntrons e maior detalhamento da estrutura do
DNA o conceito de gene já não pode ser o mesmo, visto que este não se
resume a codificação de proteínas. O gene passa a ser definido como a
seqüência de DNA que codifica uma molécula de RNA, e inclui toda a
unidade de transcrição ( como o promotor, seqüência codificante de RNA
e o finalizador).

O RNA HETEROGÊNEO NUCLEAR


A transcrição em células de procariotos ocorre paralelamente à tradução,
enquanto que em células de eucariotos a transcrição e a tradução ocorrem
em tempo e espaço diferentes. Essa separação da transcrição e da tradução
em estágios diferentes nos eucariontes dá às suas células a oportunidade de
modificar o mRNA, para só depois traduzi-lo. Assim o transcrito inicial em

105
Genética Básica

células eucarióticas passa por muitas modificações, e é denominado de htRNA.


A maioria dos htRNA eucarióticos sofre adições e modificações em
suas extremidades. Como a adição da cap5’ na extremidade 5’ e a adição
da cauda Poli A na extremidade 3’. Essas adições ocorrem imediatamente
após a transcrição, e consiste no caso da cap 5’ na adição de um nucleo-
tídeo e metilação do nucleotídeo pela adição de um grupo metil (CH3), o
ribossomo então reconhece a cap 5’ e a ela se liga dando inicio a tradução.
O cap5’ torna o mRNA mais estável, sendo a sua formação iniciada an-
tes mesmo do término da transcrição, como descrito anteriormente. Na
extremidade 3’ de genes eucarióticos a RNA polimerase II transcreve se-
qüências depois da região codificante, para reparar esse efeito, corta-se o
material codificado em excesso e adiciona-se a cauda poli A em seu lugar
num mecanismo chamado de poliadenilação. A cauda poli A assim como a
cap5’ proporciona ao mRNA maior estabilidade durante o período em que
está disponível para a tradução. Os mRNA eucarióticos que não passam
pela poliadenilação e não recebem a adição da cauda poli A utilizam outra
estratégia para obter maior estabilidade auxilio de uma ribonucleoproteina
(snRNP) conhecida por U7.

PROCESSO DE RECOMPOSIÇÃO DE RNA

O processo de recomposição de RNA é a remoção dos íntrons vistos


anteriormente quando discutimos sobre o conceito de gene. Para a recom-
posição são necessárias três estruturas dos íntrons:

1. Sítio de corte 5’ – extremidade do íntron;


2. Sítio de corte 3’- extremidade do íntron;
3. Ponto de ramificação – é um nucleotídeo adnina localizado a 18 ou 40
nucleotídeos do sítio de corte 3’.

Para o processo de recomposição ocorrer é necessária à formação de


um complexo de proteínas e moléculas de RNA (snRNPs e RNA nucleares),
a esse complexo dá-se o nome de spliceossomo. Inicialmente os éxons
anteriores e posteriores são separados por um íntron onde o mRNA é
cortado liberando os éxons, a extremidade 5’ do intron é ligada ao ponto de
ramificação, dobrando o íntron em forma de laço e um nucleotídeo guanina
da sequência de consenso do sítio de corte se liga por transesterificação ao
ponto de ramificação por um nucleotídeo adenina. A próxima fase consiste
ligar no corte do sítio de corte 3’ e uma ligação covalente entre à ponta
3’ do éxon 1 e a ponta 5’. O íntro então é liberado e volta a conformação
linear rompendo-se do ponto de ramificação e em seguida digerido por
enzimas nucleares.

106
Replicação do DNA e transcrição
Aula

Figura 18- Spliceossomo


(Fonte http://www.phschool.com/science/biology_place/biocoach/images/transcription).

A recomposição ocorre no núcleo celular antes que esse atinja o cito-


plasma. No núcleo mecanismos como a transcrição e recomposição ocorrem
provavelmente nos mesmos sítios, de forma bastante ordenada. É impor-
tante ressaltar que no spliceossomo ocorrem interações que dependem do
pareamento de bases entre moléculas diferentes de RNA, mRNA, snRNA
imprescindíveis à recomposição.

Tabela. Tipos de interações que ocorrem no spliceossomo (PIERCE, 2004).

Interação Ação
U1 + sítio de corte 5’ Induz íntron a remoção, sempapel direto na
recomposição.
U2 + ponto de ramificação Formação do laço.
U2 + U6 Mantém a ponta 5’ do íntron próxima do
ponto de ramificação.
U6 + ponto de corte 5’ Posiciona a ponta 5’ do íntron próxima ao
ponto de ramificação.

107
Genética Básica

U5 + ponta 3’do primeiro éxon Ancora o éxon ao spliceossomo e justapõe as


pontas do éxon para a recomposição.
U5 + ponta 3’ de um éxon e ponta 5’ do outro Justapõe as pontas do éxon para a
recomposição.
U4 + U6 Libera U6 para o íntron, sem papel direto.

Existem ainda processos alternativos de recomposição, que possibilitam


as células produzir mRNA diferentes a partir da mesma seqüência, podemos
citar como exemplos: a recomposição alternativa que recompõe o pré-mRNA
em mais de um modo resultando em mRNAs com seqüências diferentes; e o
multiplos sítios de corte 3’, no qual dois ou mais sítios de corte e poliadenilação
estão presentes produzindo mRNAs de tamanhos diferentes.
Vale ressaltar que além dos processos de recomposição o mRNA ainda
pode ser alterado de edição do RNA que também ocorre após a transcrição
e altera a seqüência de aminoácidos codificada pelo gene pela ação de
RNA guias ou gRNAs que por possuírem similaridades com a seqüência
do mRNA acabam pareando-se as suas bases, adicionando cortando ou
deletando o mRNA segundo o molde do gRNA.

CONCLUSÃO
A molécula de DNA passa pelo processo de replicação para garantir a
hereditariedade das células, possibilitando o desenvolvimento de organismos
pluricelulares e as diversas formas de reprodução, utilizando um processo
muito preciso envolvendo diversas moléculas que garantem a replicação
semi-conservativa do DNA. Por outro lado, podemos concluir que é no
processo de transcrição que o DNA realmente inicia a realização de sua
função de fornecimento de informações genéticas que determinam as car-
acterísticas das proteínas e, participando efetivamente do material genético
na formação do organismo.

RESUMO
A estrutura do DNA proposta por Watson e Crick levou-os a propor um
modelo para a replicação do DNA. Em 1958 os pesquisadores Meselson e
Stahl conseguiram comprovar que a replicação ocorre realmente de forma
semi-conservativa. A replicação envolve sempre um sítio inicial chamado
origem de replicação, sendo o produto da replicação iniciado pelo sítio de
origem denominado réplicon. Bactérias possuem geralmente apenas um
sítio de origem de replicação, tendo apenas um réplicon. No entanto, em
eucariotos existem diversos pontos de origem e, consequentemente, vários
réplicons. Em termos moleculares, a abertura da fita de DNA é realizada

108
Replicação do DNA e transcrição
Aula

por enzimas que catalisam o rompimento das pontes de hidrogênio, de-


nominadas DNA helicases. Essas enzimas iniciam, portanto, uma bolha de
replicação, que é estabilizada temporariamente pela adição cooperativa de
6
proteínas SSB nos filamentos simples, permitindo a exposição física das
moléculas unifilamentares para o processo de replicação. À medida que se
processa a abertura da fita, é gerada uma grande força contrária de torção
em função do movimento giratório da fita, resultando em superelicoidização.
As topoisomerases resolvem o problema da superelicoidização promovendo
clivagens nas molécula de DNA que passa a girar livremente e elimina a ten-
são de torção. Diversas moléculas estão envolvidas no processo de replica-
ção, mas as enzimas DNA-polimerases são principais moléculas envolvidas,
desempenhando as funções de exonucleolítica e de polimerização. Existem
diferentes tipos de DNA polimerases, no entanto, todas necessitam de uma
extremidade 3’OH livre, de nucleotídeos trifosfatados como matéria prima
e de uma fita molde unifilamentar de DNA para que possam desempenhar
a função de polimerização no sentido 5’ 3’. Para o fornecimento das ex-
tremidades iniciais 3’OH livre, uma enzima denominada primase produz
uma pequena molécula de RNA iniciador denominado Primer e, em função
das fitas de DNA serem antiparalelas, uma das fitas precisa de apenas um
primer (Fita leading), enquanto a fita, cujo molde unifilamentar de DNA
está no sentido 5’ 3’, é produzida de forma fragmentada, necessitando de
diversos primers, formando os fragmentos de Okazaki (Fita Lagging). Após
o processo de revisão da fita, os fragmentos são unidos covalentemente pela
enzima DNA ligase. Esse processo garante que as fitas de DNA repliquem
de forma semi-conservativa gerando moléculas de fita dupla geneticamente
idênticas de forma muito precisa. A expressão gênica, por outro lado,
diz respeito a função decodificador de proteínas realizadas pelos genes.
Para iniciar esse processo, os genes presentes no DNA são transcritos em
moléculas de RNA de diversos tipos pelas enzimas RNA polimerases. A
transcrição é dirigida por regiões específicas de sinalização do DNA de-
nominadas promotores, utilizadas pelas RNA polimerazes para delimitar
o início da região codificante. As etapas de transcrição são denominadas:
início, elongamento e término. Nos procariontes geralmente as moléculas
de RNA não são processadas e os mecanismo de transcrição e tradução
são praticamente simultâneos. Nos eucariontes existe o processamento
de moléculas de RNA precursoras, como é o caso do RNA heterogêneo
nuclear, que recebe um caput de Guanosina metilada na extremidade 5’, uma
calda de poliadenina e a retirada dos introns e reunião do exons, realizada
em um complexo sistema de processamento denominado splicing.

109
Genética Básica

ATIVIDADES
1. A replicação do DNA é um mecanismo enzimaticamente muito rigoroso,
pois um número muito pequeno de erros é condição básica da sobrevivência
da espécie. Por que são adicionados erros na replicação?
a) porque a enzima incorpora bases trocadas com baixa freqüência;
b) porque as bases são quimicamente modificadas por enzimas celulares
e transformam-se assim umas nas outras logo depois do processo de rep-
licação;
c) porque a tautomeria de bases confunde a enzima na hora da síntese;
d) porque o mecanismo de revisão induz mutações;
e) porque radicais livres na célula modificam quimicamente as bases recém-
incorporadas, antes que sejam metiladas.
2. Complete: Cada aminoácido é levado aos ribossomos para a síntese
de polipeptídeos pelo pareamento de bases entre o __________ de uma
molécula de aminoacil-RNAt e o __________ de um RNAm.
3. Com base nos eventos ocorridos na replicação do DNA, relacione a
segunda coluna de acordo com a primeira:
DNA pol I ( ) Junta os fragmentos de Okasaki
Forquilha de replicação ( ) Curtos segmentos de RNA
5´- 3 ( ) Remove os primers e substitui por DNA
DNA ligase ( ) Desenrola o DNA
Primer ( ) Direção da replicação
Fragmentos de Okasaki ( ) Sintetiza DNA na fita contínua e
descontínua
Helicase ( ) região onde está ocorrendo a replicação
DNA pol III ( ) Curtos fragmentos de DNA na
fita descontínua

AUTOAVALIAÇÃO

Após estudar esta aula, consigo:


1. Comparar eucariotos e procariotos em relação a organização gênica, o
transcrito primário e o RNAm maduro.
2. Explicar porque numa família de genes a estrutura de introns e exons
dos genes (como é o caso da globina) está preservada para todas as cópias
funcionais. Entretanto, observa-se muito mais conservação entre seqüências
de exons do que de introns ente os mesmos genes?
3. Explicar porque noventa e cinco por cento das proteínas humanas têm
entre 150 e 800 aminoácidos, mas seus genes têm entre 10 e 100 kb?
4. Explicar porque as moléculas de RNAt devem ter, concomitantemente,
características estruturais particulares e comuns.

110
Replicação do DNA e transcrição
Aula

PRÓXIMA AULA
Na próxima aula você vai acompanhar o mecanismo de tradução da
6
informação contida no DNA e as propriedades do código genético.

REFERÊNCIAS
EMERSON A. CASTILHO MARTINS, E.A.C., MACIEL-FILHO, P.R.
Mecanismos de expressão gênica em eucariotos, Revista da Biologia –
www.ib.usp.br/revista – volume 4 – junho de 2010.
GRIFFITS, A. J. F. e Col – Introdução à genética – Editora Guanabara
Koogan, 9a edição, Rio de Janeiro, RJ, 2008.
SNUSTAD, D. P. – Fudamentos à Genética - Editora Guanabara Koogan,
6a edição, Rio de Janeiro, RJ, 2008.

111
Aula

CÓDIGO GENÉTICO E TRADUÇÃO


7
META
Descrever o código genético envolvendo suas características gerais e mecanismos de funcionamento.
Apresentar o processo de tradução, demonstrando como as sequências de nucleotídeos são
decodificadas em sequências de aminoácidos nos ribossomos.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
entender como foi decifrado e qual a função desempenhada pelo código genético no processo de
expressão gênica;
identificar as principais características do código genético;
entender o processo de tradução e sua relação com a informação genética de um organismo.

PRÉ-REQUISITO
Conhecimento sobre a estrutura do material genético, noções básicas de bioquímica.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
Prezado estudante, o assunto dessa aula representa um dos mais fasci-
nantes capítulos da genética por decifrar um dos grandes enigmas da bio-
logia, que explica como a informação genética armazenada no DNA, por
meio da sequência de pares de nucleotídeos, pode determinar o fenótipo de
um organismo, ou seja, nessa aula você vai concluir a ideia da colinearidade
entre genes e proteínas. Portanto, essa é a continuidade da história iniciada
nas aulas anteriores, que trataram da estrutura do material genético e da
estratégia utilizada pela célula para produzir moléculas intermediárias de
RNA por meio da transcrição. Nessa aula entenderemos o código gené-
tico, uma vez que a linguagem química entre ácidos nucleicos e proteínas
é diferente. Enquanto as unidades formadoras dos ácidos nucleicos são
os nucleotídeos, nas proteínas tais unidades são os aminoácidos. Depois
de entendermos o código genético, podemos passar para o mecanismo de
tradução propriamente dito. Nessa etapa veremos como as proteínas são
formadas a partir das informações provenientes das moléculas de RNA
mensageiro, bem como se dá a participação de outros tipos de RNA nesse
processo que ocorre nos ribossomos envolvendo diversas macromoléculas.

AS PROTEÍNAS E O MATERIAL GENÉTICO

Antes de passar ao código genético vamos nos aprofundar um pouco


mais o nosso conhecimento sobre as proteínas. Cerca de 15% do peso do
conteúdo celular é formado por proteínas. Lembrando que a água representa
em média outros 70% do peso corporal dos organismos, logo podemos
concluir que, excetuando a água, as proteínas formam os componentes
mais abundantes da massa corporal, desempenhando funções vitais para
os seres vivos. Desempenham papel estrutural, enzimático, de transporte,
hormonais, dentre outros. Isso explica em parte a ideia dos cientistas do
início do século XX, até a década de 1940, que pensavam que as proteínas
eram o material genético e não o DNA, como sabemos hoje.
As proteínas estavam associadas a maioria dos erros inatos do me-
tabolismo, diversas doenças eram reconhecidas pela ausência ou modifica-
ções em proteínas. Em indivíduos albinos falta a melanina, enquanto nos
pacientes com anemia falciforme a molécula de hemoglobina é diferente,
na fenilcetonúria o organismo não consegue metabolizar a fenilalanina
por falta de uma enzima. Isso sem falar na cor da pele, dos olhos, tipo de
cabelo. Todas essas características fenotípicas nos remetem às proteínas.
Além disso, sendo as proteínas tão diversificadas com seus 20 tipos de
aminoácidos e sendo tão importantes para todos os seres vivos, parecia
muito lógico que as proteínas fossem mesmo o material genético. Por
outro lado, os ácidos nucleicos nessa época representavam um candidato

114
Código genético e tradução
Aula

sem votos. Como uma estrutura tão simples, contendo apenas 4 tipos de
unidades (os nucleotídeos) poderia gerar toda a informação necessária para
dar conta de toda a diversidade genética dentro e entre as espécies? Então,
7
quando na década de 1950 ficou comprovado, sem nenhuma sombra de
dúvida, que candidato “azarão” – O DNA – era o material genético, mas
sobrou uma grande dúvida para a comunidade científica: uma vez que são
os ácidos nucleicos que contêm as informações genéticas, como eles estão
relacionados à sequência de aminoácidos das proteínas?
Vamos entender melhor esse questionamento, vejam a estrutura química
de um nucleotídeo e compare-o com a estrutura de um aminoácido padrão.

Figura 1

Lembre-se como as unidades dos nucleotídeos se ajustavam facilmente


entre si, como visto na aula de replicação e transcrição, mas agora quando
observamos um aminoácido, sua estrutura química é diferente, sendo for-
mada por um carbono assimétrico, um grupo carboxila, um grupo amino,
um hidreto e um grupo lateral R, que varia de aminoácido para aminoácido
como veremos adiante. Outro aspecto a ser analisado é o número de uni-
dades diferentes na formação de proteínas e nos ácidos nucleicos. Enquanto
nos ácidos nucleicos existem apenas quatro tipos de nucleotídeos (A,C,T,G
no DNA e A,U,G,C no RNA), as proteínas são formadas comumente por
20 diferentes tipos de aminoácidos. Então, se os ácidos nucleicos portam as
informações genéticas e as proteínas são formadas a partir das instruções
provenientes do material genético, como essa informação é repassada?
Vem daí a analogia com um código, o código genético. Entretanto, antes
de falar do código genético vamos saber um pouco mais sobre a estrutura
das proteínas.

ESTRUTURA PROTEICA

As sequências de aminoácidos ligadas covalentemente são denominadas


polipeptídeos. Essas estruturas são formadas por até 20 tipos diferentes de
aminoácidos, que são mostrados na figura 2.

115
Genética Básica

Figura 2.

Como você pode perceber nas figuras anteriores, os aminoácidos dife-


rem entre si apenas quanto aos grupos laterais (R). Essa única diferença
é bastante significativa, uma vez que as bioquímicas são completamente
alteradas a depender do tipo de grupamento R está presente em cada ami-
noácido. Essas cadeias laterais podem ser classificadas em quatro tipos:
1- hidrofóbicos ou apolares; 2- hidrofílicos ou polares; 3- ácidos ou nega-
tivos; e 4- básicos ou de carga positiva. Essa diversidade estrutural explica
a enorme diversidade funcional das proteínas.
Em termos estruturais, quando dois ou mais aminoácidos são ligados
eles formam uma estrutura denominada peptídeo. Essa ligação covalente,
denominada de ligação peptídica, ocorre por meio de uma reação de desid-
ratação. A figura 3 ilustra a formação de uma ligação peptídica para a for-
mação de um dipeptídeo. Estruturas envolvendo menos de 10 aminoácidos
são denominadas oligopeptídeos e estruturas maiores que podem chegar a
milhares de aminoácidos, com o fio da seda, são denominados polipeptídeos.

116
Código genético e tradução
Aula

Figura 3 – Ligação peptídica entre 4 aminoácidos.


(Fonte: http://allchemy.iq.usp.br/).

Então, como observado na figura 3, as proteínas são polímeros forma-


dos pela reação de condensação entre aminoácidos: o grupo amino de um
dos aminoácidos se liga ao carboxila do outro, havendo eliminação de uma
molécula de água e a formação de uma ligação peptídica (grupo amida).
Considerando os 20 aminoácidos, numa proteína formada por um pep-
tídeo com 50 unidades, teríamos 2050 combinações possíveis. Observem
que mesmo em oligopeptídeos podemos ter bilhões de combinações dife-
rentes. Isso equivale mais ou menos a dizer: quantas palavras diferentes
você pode inventar utilizando o alfabeto inteiro?
A sequência de aminoácidos representa apenas a chamada estrutura
primária das proteínas. Um proteína pode ter ainda outros níveis estruturais:
a estrutura secundária, diz respeito às relações espaciais entre os aminoáci-
dos; a estrutura terciária refere-se a forma de dobramento tridimensional
das proteínas, enquanto a estrutura quaternária está relacionada a junção
de dois ou mais polipeptídeos para formar uma estrutura complexa multi-
mérica. A figura 4 ilustra os níveis estruturais das proteínas.

117
Genética Básica

Figura 4- Níveis estruturais das proteínas.


(Fonte: http://www.cientic.com).

A estrutura primária de um polipeptídeo é determinada genetica-


mente durante o processo de tradução que veremos a diante nessa aula. A
maioria das moléculas de polipeptídeos se dobrará espontaneamente em
função das características bioquímicas estabelecidas em suas estruturas
primárias, de tal modo que o pH, a temperatura, sais e outros compostos
também podem mudar a estrutura proteica levando a desnaturação da
proteína. Não é o nosso objetivos aqui nos aprofundar nessas questões
estruturais das proteínas, mas caso você queira se aprofundar no tema,
você pode utilizar o seguinte endereço da revista eletrônica do depar-
tamento de química da UFSC na internet:http://www.qmc.ufsc.br/
qmcweb/artigos/proteinas.html.

O CÓDIGO GENÉTICO

A simples lógica nos diz que, se os pares de nucleotídeos são “letras”


de um código, então a combinação das letras poderia formar “palavras” que
representariam os diferentes aminoácidos. Desde o final da década de 1950
vários pesquisadores reconheceram que, apesar de estar claro que o material

118
Código genético e tradução
Aula

genético é formado pelos ácidos nucleicos, existiria uma colinearidade entre


DNA e proteínas (ou seja, de que as proteínas tivessem suas sequências
de aminoácidos determinadas pelos genes) ainda era muito difícil decifrar
7
como seria possível um sistema com 4 unidades básicas no DNA poderia
decodificar 20 tipos diferentes de aminoácidos. Com a descoberta do RNA
mensageiro intermediário, a pergunta passou a ser: como a sequencia de
4 nucleotídeos do mRNA poderia especificar a sequência de aminoácidos
de um polipeptídeo?
A descoberta do código genético foi uma tarefa árdua de dezenas de
pesquisadores, iniciada na década de 1960. Uma das primeiras perguntas a
serem respondidas seria a de quantos nucleotídeos seriam necessários no
mRNA para decodificar um aminoácido, ou seja, quantos nucleotídeos teria
um códon e que códons especificam quais aminoácidos?
Essas perguntas levaram a uma onda frenética de pesquisas, comparada
a uma corrida, entre pesquisadores. Em 1966 grupos de pesquisa liderados
por Marshall Nirenberg e pelo indiano Har Gobind Khorana decifraram,
com outros pesquisadores dos EUA, da Inglaterra e da França, a série
completa de "palavras" do código genético. Também foge ao nosso objetivo
aqui detalhar todos os passos que levaram a decifração do código genético,
mas caso você esteja interessado em maiores detalhes sobre esse assunto,
navegue para o seguinte endereço: http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/
por-dentro-das-celulas/vida-e-informacao

AS CARACTERÍSTICAS DO CÓDIGO GENÉTICO

1. Cada códon no mRNA é formado por 3 nucleotídeos


Desde 1954 os cientistas especulavam que os códons deveriam conter
um mínimo de três nucleotídeos, uma vez que cada posição do mRNA só
pode ser ocupada por um nucleotídeo e considerando que temos apenas
quatro nucleotídeos (A,U,C,G), teríamos apenas quatro códons para os 20
aminoácidos diferentes. Se o códon fosse uma combinação de dois nucleo-
tídeos (por ex., AU, CG, etc.), teríamos 42=16 códons possíveis, número
insuficiente para codificar os 20 tipos de aminoácidos. Com três nucleotídeos
por códon teríamos 43=64 códons possíveis, número mais que suficiente
para codificar os 20 aminoácidos diferentes. A expectativa teórica logo se
confirmou quando em 1961 Francis Crick, usando mutações em bactérias,
confirmou que cada códon é representado por uma trinca de nucleotídeos.
2. O código genético é redundante
Essa foi uma constatação obvia logo que se confirmou o códon em
trincas, umas vez que 64 combinações excedia o número de 20 aminoácidos,
o que fortalecia a hipótese de que mais de um códon poderia ser utilizado
para decodificar o mesmo aminoácido. Francis Crick em seus trabalhos
sugeriu que o código gênico seria redundante. Pelo menos alguns dos ami-

119
Genética Básica

noácidos deveriam ser especificados por duas ou mais trincas diferentes.


Se apenas 20 trincas fossem usadas e sendo as outras 44 sem sentido por
não codificarem nenhum aminoácido, então a maioria das mudanças na
matriz de leitura deveria produzir palavras sem sentido para o processo de
síntese de proteínas. Se fosse este o caso, então a supressão das mudanças
de matriz de leitura do RNA mensageiro raramente, ou nunca, funcionaria.
Entretanto, se todas as trincas, ou combinações de nucleotídeos, especificas-
sem aminoácidos, então as palavras mudadas resultariam simplesmente na
alteração de aminoácidos nas proteínas. Assim Crick percebeu que muitos
aminoácidos devem ser codificados por mais de um códon, caracterizando
assim a redundância do código genético. Apenas o triptofano e a metionina
são codificados por um só códon. Os demais são especificados por dois,
três ou até mesmo por seis códons, como é o caso de alguns aminoácidos,
tal como a leucina. Códons que especifica mais de um aminoácido são ditos
sinônimos, ou seja, são códigos diferentes que tem o mesmo significado.
3. O código genético não tem superposição
Cada nucleotídeo no mRNA pertence a apenas um códon, mas existem
algumas raras exceções de superposição em microrganismos.
4. O código genético não tem pontuação
Não existem vírgulas ou outra forma de pontuação dentro das regiões
codificantes nas moléculas de mRNA que forneçam informações específi-
cas que diferenciem um códon de outro adjacente. Durante a tradução os
códons são “lidos” sequencialmente. Isso faz com que mutações gênicas,
como a adição ou deleção possam mudar a matriz de leitura do mRNA,
podendo mudar completamente a sequência de aminoácidos da proteína
ou mesmo determinar a formação de uma proteína truncada (parcial). Em
função do código genético ser em trincas, mutações que deletem ou insiram
3 ou múltiplos de 3 nucleotídeos, geralmente geram danos apenas pontuais
na proteína formada, enquanto uma única deleção de um nucleotídeo levará
a completa mudança de matriz de leitura do ponto mutado em diante.
5. O código genético é ordenado
Essa informação implica em dizer que o os códons que determinam
o mesmo aminoácido ou aminoácidos com propriedades químicas semel-
hantes geralmente são muito parecidos, diferindo entre si geralmente por
apenas um nucleotídeo. Muitas vezes o nucleotídeo diferentes é o último da
trinca, o que levou a formulação da hipótese de oscilação. Essa hipótese foi
sugerida por Crick e diz que o terceiro nucleotídeo da trinca se liga durante
o pareamento de bases de forma menos rígida e isso está relacionado tanto
a redundância, quanto a ordenação, além de limitar a relação entre códons
e tRNAs específicos.
6. O código genético é quase universal
Essa é uma característica muito importante e diz respeito a conservação
do código genético, ou seja, o seu significado é o mesmo na maioria dos

120
Código genético e tradução
Aula

seres vivos, salvo algumas poucas exceções no código das mitocôndrias,


leveduras e em alguns microrganismos. Essa universalidade é um dos prin-
cipais argumentos a favor da hipótese de uma única filogenia para os seres
7
vivos, ou seja, todos somos parentes em maior ou menor grau, uma vez
que todos os seres vivos compartilham o mesmo código genético.
7. O código genético possui códon de início e códons de finalização
Toda tradução começa e termina com códons específicos de sinalização.
O aminoácido iniciador no processo de tradução é a N-formilmetionina.
Os códons finalizadores não decodificam aminoácidos e indicam o final
do processo de tradução tanto em procariontes quanto em eucariontes.
Uma das primeiras indicações da existência de códons finalizadores veio
em 1965 do trabalho de Brennet com fago T4. Bennet analisou algumas
mutações (m1-m6) em um único gene que controla a proteína do capsídeo
do fago. Estes mutantes tinham duas coisas em comum. Primeiro, a proteína
do capsídeo de cada mutante era uma cadeia polipeptídica mais curta que
a do tipo selvagem. Segundo, a presença de uma mutação supressora (su)
no cromossomo hospedeiro faria com que um fago desenvolvesse uma
proteína de capsídeo do comprimento de cadeia normal (tipo selvagem),
a despeito da presença da mutação m. Brenner examinou as extremidades
das proteínas encurtadas e compassou-as com a proteína tipo selvagem,
registrando para cada mutante o aminoácido seguinte que seria inserido para
continuar a cadeia tipo selvagem. Estes aminoácidos para seis mutações
eram glutamina, lisina, ácido glutâmico, tirosina, triptofano e serina. Não
há um padrão imediatamente óbvio para estes resultados, mas Brenner de-
duziu brilhantemente que alguns códons para cada um destes aminoácidos
são similares, pois cada um pode mutar para o códon UAG por uma única
mudança em um par de nucleotídeos do DNA. Ele postulou, portanto,
que UAG é o códon finalizador (de término), um sinal para o mecanismo
traducional de que a proteína agora está completa. UGA foi o primeiro
códon finalizador a ser decifrado. Os códons UAG e UAA também são
códons finalizadores e, em geral, são chamados de códons sem sentido,
porque não determinam nenhum aminoácido.

O CÓDIGO COMPLETO

A figura a seguir mostra a relação dos 64 codons aos seus respectivos


aminoácidos ou sinais de término.

121
Genética Básica

Figura 5- Código genético


(Fonte: http://www.ufpe.br/biolmol/Genetica-Medicina/sintese_proteica.htm).

O RNA TRANSPORTADOR (TRNA)

Os tRNA’s são formados por sequências pequenas, com 70 a 90


nucleotídeos. Existe de um a quatro moléculas de tRNA para cada um dos
aminoácidos e, como o nome sugere, o RNA transportador é o responsável
direto pelo transporte de aminoácidos para a síntese proteica. A sequência
completa de nucleotídeos do tRNA de uma espécie de levedura foi publi-
cada ainda em 1965. Isso foi possível em função do pequeno tamanho da
molécula, quando comparado aos outros polímeros de ácidos nucleicos. As
moléculas de tRNA precisam atender a três características fundamentais: 1.
possuir uma região denominada anticódon para se parear ao códon espe-
cífico do mRNA; 2. possuir um sítio de ligação para a enzima aminoacil-
tRNA sintetase correta para poder ser ativado pelo aminoácido correto e;
3. cumprir sua função de adaptador, ligando-se aos sítios apropriados no
ribossomo.

122
Código genético e tradução
Aula

O TRNA RECONHECE O CÓDON


É o RNA Transportador ou seria o próprio aminoácido que reconhece-
7
ria o mRNA que codifica um aminoácido? Um experimento muito convin-
cente respondeu a esta pergunta. No experimento, um aminoacil- tRNA
(AA-tRNA), o cisteinil- tRNA (tRNAcis, o tRNA específico para cisteína)
“carregado” com cisteína foi tratado com hidreto de níquel, que converteu a
cisteína (enquanto ainda ligada ao tRNACis) em outro aminoácido, a alanina,
sem afetar o tRNA: Cisteína-tRNACis-hidreto de níquel alanina-tRNACis.
A proteína sintetizada com esta espécie híbrida sempre tinha alanina
onde esperávamos cisteína. Assim, o experimento demonstrou que os ami-
noácidos não reconhecem o códon. Eles são inseridos na posição adequada
porque os tRNA funcionam como “adaptadores’ que conhecem os códons
de mRNA e inserem seus aminoácidos apropriadamente. Esperaríamos
portanto, encontrar algum sítio no tRNA que reconhecesse o código do
mRNA por pareamento complementar de bases. Esse sítio é denominado
anticódon. A ligação do anticódon do tRNA ao códon do mRNA segue as
regras da ligação complementar e antiparalela, ou seja, o códon do mRNA
é lido de 5' para 3' por um anticódon pareado em orientação invertida (3'-5'
). O mRNA, portanto, especifica a sequência de aminoácidos agindo por
intermediação do tRNA.

Figura 6- Ajuste entre um códon do mRNA e o anticódon do tRNA

123
Genética Básica

A LIGAÇÃO DO AMINOÁCIDO AO TRNA


Para que seja possível a ocorrência da tradução, os ribossomos precisam
receber os aminoácidos específicos carreados pelo RNA transportador (ou
RNA de transferência). A relação entre o códon do mRNA e o anticódon
do tRNA mediada pelo ribossomo é uma etapa fundamental da tradução. O
tRNA pode estar sob duas formas, descarregado, ou seja, sem estar ligado ao
seu aminoácido específico ou sob a forma carregada, pronto para participar
do processo de tradução. Para o tRNA sair do estado descarregado para o
estado carregado, é necessário que a ligação com o aminoácido seja catalisada
por uma enzima específica denominada Aminoacil tRNA Sintetase. Uma cé-
lula normal tem em média de 30 a 50 moléculas diferentes de tRNA. Apesar
de cada tRNA poder se associar a apenas um dos 20 tipos de aminoácido,
todo tRNA apresenta na sua extremidade 3’ a sequência CCA de nucleo-
tídeos, sendo que a ligação do grupo carboxila do aminoácido se dará com
a extremidade 3’do tRNa no grupo hidroxila do nucleotídeo Adenina. Essa
ligação será catalisada por uma dos 20 tipos de Aminoacil tRNA Sintetase
presentes na célula, cada uma específica para um determinado aminoácido e
para os tRNAs que decodificam esse mesmo aminoácido (Figura 7).

Figura 7 – Ligação do tRNA ao aminoácido numa reação catalisada pela enzima Aminoacil tRNA
sintetase.

124
Código genético e tradução
Aula

RIBOSSOMOS
Os ribossomos são estruturas complexas encontradas geralmente associadas
7
às membranas internas celulares formadas na proporção aproximada de 50% de
RNA ribossomal e 50% proteínas. Os ribossomos durante o processo de tradução
do mRNA possuem duas subunidades de tamanhos diferentes, chamadas sub-
unidade maior subunidade menor, ligadas entre, mas que se dissociam ao final
do processo de tradução. Esta organização básica é comum entre procariontes
e eucariontes, entretanto, as moléculas de rRNA e proteínas significativamente
diferentes, o que possibilita diferenciar os ribossomos dos dois grupos. O RNA
ribossomal é produzido a partir da transcrição do DNA; nos eucariontes esse
processo ocorre no nucléolo, que é uma região especializada do núcleo para a
produção de moléculas de rRNA. Essas moléculas são produzidas na forma de
precursores bem maiores que, de forma parecida com o que o ocorre com o
mRNA, são processadas em rRNA que ainda sofrem metilações, processo que
parece proteger o rRNA da degradação pelas ribonucleases no citoplasma. Os
genes que decodificam o rRNA geralmente estão presentes em muitas cópias
nos genomas de todos os organismos estudados até hoje. Essa redundância é
importante em função da grande quantidade de ribossomos nas células.
Os ribossomos presentes em células procarióticas possuem uma sub-
unidade maior com coeficiente de sedimentação em gradiente de densidade
de 50S (Svedberg) e outra menor com 30S. A estrutura completa, com o
arranjo das duas subunidades nos procariontes apresenta coeficiente de
sedimentação 70S. Nos eucariontes, a subunidade maior tem coeficiente
60S e a menor 40S, formando uma estrutura de 80S quando as duas partes
encontram-se associadas. A figura a seguir mostra em detalhes os compo-
nentes que formam os ribossomos de células procarióticas e eucarióticas.

Figura 8 – Ligação do tRNA ao aminoácido numa reação catalisada pela enzima Aminoacil tRNA sintetase.

125
Genética Básica

Como pode ser observado na figura seguinte, os ribossomos possuem


três importantes sítios de ligação. O sítio A, ou sítio aminoacil, liga o tRNA
que chega carregado com um aminoácido (Aminoacil-tRNA), enquanto o
sítio P ou sítio peptidil, liga o tRNA que está associado à cadeia crescente
de aminoácidos. O sítio E, ou sítio de saída liga-se ao tRNA descarregado,
que parte.

Figura 9- Sítios ribossômicos

TRADUÇÃO

Diversos componentes são requeridos para a síntese de proteínas me-


diada pelos ribossomos. Estes incluem todos os aminoácidos, o mRNA a
ser traduzido, os tRNA, ribossomos, moléculas fornecedoras de energia e
fatores proteicos necessários à iniciação, alongamento e término da cadeia
polipeptídica. A tradução é o processo pelo qual o mRNA fornece um
molde para a síntese de um polipeptídeo.
Podemos separar didaticamente o processo de tradução de proteínas
em três etapas distintas. Iniciação, alongamento e término. Examinemos
cada uma destas etapas em detalhes, usando os procariontes como exemplo.

INICIAÇÃO

Além do mRNA, dos ribossomos e das moléculas específicas de tRNA,


o processo requer a participação de vários fatores, chamados de fatores de
iniciação IF1, IF2 e IF3. em E. coli e na maior parte dos outros organismos
procariontes, o primeiro aminoácido em qualquer novo polipeptídio sintetiza-
do é a N-formilmetionina. Ele é inserido por um tRNA iniciador chamado de
tRNAfMet. Este tRNA iniciador tem o anticódon normal de metionina, mas
insere N-formilmetionina ao invés de metionina (Em eucariontes o aminoá-
cido iniciador é a metionina). Em E. coli, AUG e GUG, e em raras ocasiões
UUG, servem como códons iniciadores. Quando uma destas trincas esta
presente na posição iniciadora, ela é reconhecida pelo N-formilMet-tRNA,
e a metionina aparece como o primeiro aminoácido da cadeia.

126
Código genético e tradução
Aula

SÍTIO DE LIGAÇÃO DO RIBOSSOMO


Como o códon correto de iniciação é selecionado dentre os códons
7
AUG e GUG em uma molécula de mRNA? John Shine e Lynn Dalgarno
foram os primeiros a observar que os verdadeiros códons de iniciação eram
precedidos da sequência que se pareava bem como a ponta 3’ do rRNA 16s
S presente na subunidade menor do ribossomo. Essa sequência de ajuste
inicial do ribossomo ao primeiro códon é denominada Shine-Delgarno em
homenagem aos dois pesquisadores.

Figura 10 – Ajuste inicial do mRNA à subunidade menor do ribossomo através da sequência de


Shine-Delgarno (shine-delgarno.jpg)

1. A primeira etapa da iniciação é a ligação do mRNA à subunidade 30S.


A ligação é estimulada pelo fator de iniciação IF3. Quando não estão par-
ticipando da síntese de proteínas, as subunidades ribossomais existem sob
a forma livre. Elas se juntam em ribossomos completos como resultado
do processo de tradução.
2. O fator de iniciação IF2 liga-se a GTP e ao fator de iniciação fMet-tRNA
ao complexo de iniciação, levando o fMet-tRNA para o sítio P (peptidil)
do ribossomo.
3. Uma proteína ribossomal quebra o GTP ligado a IF2, ajudando a ativar
a montagem das duas subunidades ribossomais. Neste estágio, os fatores
IF2 e IF3 são liberados.

ALONGAMENTO

As etapas do alongamento são auxiliadas por três fatores protéicos:


EF-TU, EF-TS e EF-G, as etapas são as seguintes:
1.O fator do alongamento EF-TU serve de mediador da entrada do ami-
noacil-tRNA no sítio A. Para isto, o EF-TU-GTP ativado se liga ao tRNA.
Em seguida, a hidrólise de GTP do complexo para GDP ajuda a ativar a
ligação do aminoacil-tRNA ao sítio A, quando EF-TU é liberado, deixando
o novo tRNA no sítio A.

127
Genética Básica

2.O fator de alongamento EF-Ts é o mediador da liberação de EF-Tu-GDP


do ribossomo e a regeneração de EF-Tu-GTP.
3.Na etapa de translocação, a cadeia polipeptídica do peptidil-tRNA
é transferida para o aminoacil-tRNA na sítio A, em uma reação catalisada
pela enzima peptidiltransferase. O ribossomo então se move um códon
mais adiante ao longo do mRNA (na verdade é o mRNA que se move pelo
ribossomo que geralmente está ancorado a alguma membrana), indo no
sentido 5’—3’. Esta etapa é medida pelo fator de alongamento EF-G e é
ativada pela quebra de um GTP em GDP. Esta ação libera o tRNA descar-
regado do sítio P e transfere o peptídil-tRNA recém-formado do Sítio A para
o sítio P, deixando o sítio P livre para a ligação do novo tRNA carregado
com outro aminoácido. Essa etapa se repete sucessivamente, envolvendo a
formação da ligação peptídica pela enzima peptidil transferase e a liberação
do tRNA do sítio A para o sítio P, até que o sítio a seja ocupado por uma
trinca que determine um sinal de término.

TÉRMINO

Na discussão inicial do código genético, descrevemos os três códons de


término da cadeia UAG, AUU ou UGA. Curiosamente estas três trincas não
são reconhecidas por um tRNA, mais por fatores proteicos, chamados de
fatores de liberação, que são abreviados por RF1 e RF2. O RF1 reconhece as
trincas UAA e UAG, e o RF2 reconhece UAA e o UGA. Um terceiro fator
RF3, também ajuda a catalisar o término da cadeia. Quando o peptidil-tRNA
esta no sítio P, os fatores de liberação, em resposta aos códons de término
de cadeia, ligam-se ao sítio A. O polipeptídio é então liberado do sítio P, e
os ribossomos se dissociam em duas subunidades, em uma reação ativada
pela hidrólise de uma molécula de GTP. As etapas da tradução podem ser
observadas na figura a seguir. No entanto, paara você entender o processo
de tradução com maior facilidade, sugerimos que você procure algumas
animações que podem ser encontradas facilmente na internet. Uma dessas
animações pode observada seguindo a url: http://www.brookscole.com/
chemistry_d/templates/student_resources/shared_resources/animations/
Quando entrar na página, escolha a guia Protein Synthesis Animation and
Exercise.

128
Código genético e tradução
Aula

Figura 11- Etapas do processo de tradução

129
Genética Básica

CONCLUSÃO
O código genético explica como quatro nucleotídeos controlam a
informação para determinar a sequência de aminoácidos no processo de
formação das proteínas. Existe uma colinearidade entre genes e proteínas e
a tradução é a efetivação dessa relação, quando a informação genética levada
pelo RNA mensageiro é decodificada na forma de um polipeptídeo, ou seja,
a ligação entre genótipo e fenótipo é uma proteína: a maioria dos genes afeta
o fenótipo codificando proteínas. A corrida científica iniciada na década de
1950 levou a total decifração do código genético, ao conhecimento de suas
propriedades e ao reconhecimento dos fatores envolvidos no processo de
tradução. Nessa aula foi possível observar o papel desempenhado pelos
ribossomos, pelo mRNA, tRNA e rRNA, suas características e como es-
sas unidades estão envolvidas com a produção de proteínas. Porém, uma
importante propriedade do código genético, sua universalidade, deve ser
lembrada. Essa propriedade gera um importante registro do elo que liga
todos os seres vivos e nos remete a uma origem ancestral comum, uma
vez que não é por acaso que compartilhamos um mesmo sistema, sendo o
código genético algo tão específico, deixando claro que pertencemos todos,
das bactérias às plantas e animais, à mesma árvore da vida.

RESUMO
O código genético e a tradução mostram como a informação genética
armazenada no RNA mensageiro que foi transcrito pelo DNA, pode deter-
minar a sequência de aminoácidos de uma proteína e participar na formação
do fenótipo de um organismo. Cerca de 15% do peso do conteúdo celular
é formado por proteínas, que por sua vez, desempenham funções vitais
para os seres vivos. A unidade formadora das proteínas é o aminoácido,
sua estrutura química é formada por um carbono assimétrico, um grupo
carboxila, um grupo amino, um hidreto e um grupo lateral R, que varia de
aminoácido para aminoácido, conferindo a eles diferentes propriedades
bioquímicas. As sequências de aminoácidos ligadas covalentemente são
denominadas polipeptídeos. Essas estruturas são formadas por até 20
tipos diferentes de aminoácidos e possuem uma enorme diversidade nos
seres vivos. O código genético é o modo pelo qual a informação genética
é armazenada na sequência de nucleotídeos de um gene. As características
do código genético podem ser resumidas em algumas propriedades: o có-
digo genético é formado por trincas de nucleotídeos no mRNA , ou seja, 3
nucleotídeos decodificam um aminoácido específico; é redundante porque
mais de um códon pode especificar o mesmo aminoácido e a relação entre
o códon e o aminoácido se dá pelo tRNA que carrega um aminoácido es-
pecífico adequado ao seu anticódon; o código genético é quase universal,

130
Código genético e tradução
Aula

ou seja, serve para todos os seres vivos, com exceção de alguns códons;
não é sobreposto, ou seja, possui apenas uma matriz de leitura que é estab-
elecida pelo códon de iniciação, que geralmente recebe a n-formil metionina
7
em bactérias (ou a metionina em eucariontes). O processo de tradução
compreende as fases de início, alongamento e término e cada mRNA pode
ser simultaneamente traduzido por vários ribossomos e muitas proteínas
ainda não estão prontas ao final da tradução, existindo a possibilidade de
que sejam modificadas por mecanismos pós-traducionais.

ATIVIDADES
1. Baseando-se na lista de códons e aminoácidos abaixo, quais das seguintes
afirmações são corretas?
AGU = serina AGC = serina
AAU = asparagina AAC = asparagina
AUG = metionina AUA = isoleucina
a) o código genético é degenerado
b) a alteração de um único nucleotídeo no DNA que dirige a síntese destes
códons poderia levar à substituição de uma serina por uma asparagina no
polipeptídeo.
c) a alteração de um único nucleotídeo no DNA que dirige a síntese destes
códons necessariamente levaria à substituição de um aminoácido no poli-
peptídeo codificado.
d) um tRNA com o anticódon ACU se ligaria a um ribossomo na presença
de um destes códons.
2. Responda:
a) Em procariotos, a maioria da cadeias polipeptídicas são iniciadas com o
aminoácido ______, cujo códon é ______.
b) Num sistema de síntese de proteínas in vitro, que permita o início e
término da síntese em qualquer sequência de RNA, que peptídeo seria
produzido pelo poli-ribonucleotídeo 5'-UUUGUUUUUGUU-3' ? Indique
qual o aminoácido N-terminal e o C-terminal do polipeptídeo obtido.
c) O códon AUG funciona tanto para iniciar uma cadeia polipeptídica
quanto para dirigir a incorporação de uma metionina em posições internas
de uma proteína. Quais os mecanismos de seleção do códon AUG para a
iniciação da tradução em procariotos?
3. O antibiótico Cloranfenicol se liga ao ribossomo 50S e inibe a atividade
da peptidil-transferase, enquanto o Ácido fusídico se liga ao fator de elon-
gação G (EF-G) e inibe a liberação de EF-G do complexo EF-G/GDP;
as Quinolonas se ligam à subunidade A da DNA girase (topoisomerase) e
impede o superenrolamento do DNA, impedindo assim a síntese de DNA.
Que efeito (s) você esperaria em um tratamento anti-bacteriano, usando
cada um destes antibióticos?

131
Genética Básica

AUTOAVALIAÇÃO

Após estudar esta aula, consigo:


Explicar
1.Como algumas aminoacil-tRNA sintetases podem atingir elevado grau de
precisão nas reações, mesmo sem ter um mecanismo hidrolítico de revisão ?
2. Explicar porque as moléculas de tRNA devem ter, ao mesmo tempo,
características estruturais comuns aos outros RNAs e particulares?

PRÓXIMA AULA

Na próxima aula compreenderemos os mecanismos geradores de mu-


tações no material genético e suas conseqüências

REFERÊNCIAS

GRIFFITHS AJF, MILLER JH, SUZUKI DT, LEWONTIN RC, GEL-


BART WM. 2009. Introdução à Genética. 8 ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 794p.
PIERCE BA. 2004. Genética: um enfoque conceitual. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 758p.
SNUSTAD DP, SIMMONS MJ. 2008. Fundamentos de Genética. 4ª ed.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 903p.

132
Aula

MUTAÇÃO E REPARO DO DNA


8
META
Discutir os principais mecanismos geradores de mutação e suas conseqüências, assim como o papel
dos mecanismos de reparo do DNA na manutenção da estabilidade e sobrevivência dos organismos.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
compreender a importância da precisão dos processos biológicos para a sobrevivência dos
organismos;
compreender a função e importância das mutações gênicas na geração da variabilidade,
entender a origem e efeito das mutações sobre o funcionamento celular;
dompreender o funcionamento dos diversos sistemas de reparo do DNA para a manutenção da
estabilidade do material genético.

PRÉ-REQUISITOS
Para alcançar os objetivos propostos o aluno deverá recorrer aos seus conhecimentos de sobre
estrutura e funcionamento do DNA, comsultando as aulas anteriores e a bibliografia indicada.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
A continuidade, precisão e fidelidade dos processos biológicos são essen-
ciais para a manutenção da vida. No entanto, o material biológico está inserido
no meio ambiente onde os indivíduos sobrevivem e precisam responder a ele.
As respostas geradas pelos organismos ao meio podem causar danos
ao material genético e ao funcionamento dos processos biológicos. No en-
tanto, os erros no material genético gerados sejam de maneira espontânea
ou induzida, tornam-se o motor da evolução, uma vez que fornecem novas
combinações ao genoma das espécies.

Mutações são alterações herdáveis na seqüência no material genético, que


fornecem grande variabilidade ao conjunto gênico de uma população.
O termo mutação tem 2 significados, pois tanto é o processo quanto o
efeito. Como processo descreve os mecanismos geradores de alterações no
material genético, como o efeito dessas alterações no organismo afetado.

IMPORTÂNCIA

Durante o ciclo de vida tanto de células quanto de organismos, a diversi-


dade genética e seus fenótipos são geradas por 2 mecanismos: a recombinação
gênica e a mutação. Os dois processos são essenciais para a sua sobrevivência,
mas, cada um deles representa um papel na geração da diversidade.
A recombinação é um processo mais ou menos constante durante a
formação dos gametas (Meiose) e tem o papel de “rearranjar” o conjunto
gênico de um organismo, gerando novas combinações a partir de um mate-
rial pré-existente, fornecido pelos conjuntos gênicos dos genitores.
Com a mutação, o “repertório” de genes pode ser alterado, gerando
novas versões do material pré-existente. Do ponto de vista evolutivo, novas
versões gênicas geram novos fenótipos (ou opções), e , consequentemente,
no numero de respostas que um organismo possa dar ao seu meio. Por isso
as mutações são o motor da evolução!
É importante lembrar que as mutações são raras e o são por um bom
motivo: os processos biológicos, especialmente o funcionamento do ma-
terial genético, deve ser preciso. Seus efeitos vão depender do período de
desenvolvimento, do tipo de célula e de sua dominância.
As mutações podem ocorrer em qualquer célula, somática ou germi-
nativa; a diferença, no entanto, está no efeito a longo prazo. As mutações
somáticas ocorrem em células somáticas e o efeito vai depender do período
de desenvolvimento: quanto mais cedo, mais divisões essas células sofrerão,
levando o defeito para um numero maior de células. Se o defeito ocorre em
uma célula germinativa, seus efeitos refletem diretamente na prole.

134
Mutação e reparo do DNA
Aula

As alterações no material genético podem se dar tanto no numero como


na estrutura dos cromossomos (cromossômicas), bem como na estrutura
de genes individuais (gênicas). Quando as mutações ocorrem em sítios
8
específicos de genes são denominadas

MUTAÇÕES DE PONTO (INSERÇÕES E


DELEÇÕES DE NUCLEOTÍDEOS)

Atualmente, o termo mutação é utilizado apenas para mutações de


ponto ou gênicas.
No Quadro 1 estão resumidos os principais tipos de mutação.

Tipos de Mutações de ponto

Figura 2- Deleção

135
Genética Básica

Figura 3- Inserção

Todas essas mutações de ponto resultam em erros na matriz de leitura


das trincas de nucleotídeos no RNAm e seus aminoácidos. Observem que o
erro na matriz ocorre a partir da deleção ou inserção do nucleotídeo errado.

Figura 4- Mutação na Matriz de Leitura

136
Mutação e reparo do DNA
Aula

Em relação aos seus efeitos, a mutação pode ser 1) positiva do ponto de


vista evolutivo, quando gera novas combinações gênicas; 2) Neutra, quando
altera a seqüência de regiões não codificantes não alterando a função gênica;
8
3) Silenciosa, quando ocorre sobre genes inativos; 4) Negativa, quando
prejudica a função de genes ativos; 5) Letal, quando leva a morte celular.

BASE MOLECULAR DAS MUTAÇÕES

A eficiência na passagem da informação genética durante a replicação


do DNA depende do correto pareamento de bases, onde A pareia com T
e G com C. Quando ocorrem alterações nesse pareamento, a replicação
pode conter erros que alteram a seqüência de nucleotídeos.

Varias formas de Mutações espontâneas que podem ocorrer no DNA:

1. Tautomerização, um processo espontâneo e na maioria das vezes re-


versível, onde os átomos de hidrogênio se movem de sua posição nas
bases, gerando pareamentos incorretos. Quando mudanças tautoméricas
envolvem a substituição de uma purina (A ou G) por outra purina na fita
complementar, ocorre uma transição; quando a substituição envolve uma
purina por uma pirimidina (T ou C) temos uma transversão (ver figura 5)

Figura 5 - Tautomerização

137
Genética Básica

EX: Figura 6 – tautômeros

Embora os tautômeros sejam reversíveis, seus efeitos se refletem nas


próximas replicações, como mostra a figura abaixo:

Figura 7 – Conseqüências do uso de tautômeros

2. Desaminação das bases, são alterações nas bases do DNA por substi-
tuir um grupamento amina (- NH2) por uma hidroxila (-OH). Da mesma
forma que na tautomerização, as bases desaminadas comportam-se como
bases não usuais e fazem pareamentos errôneos (ex: H – C), como mostra
a figura 8 ao lado:

138
Mutação e reparo do DNA
Aula

3. Depurinação: erro na replicação do DNA forma sítios sem a presença


purinas. Essas lesões são resultantes de radiação ionizante, radicais livres
ou ação de agentes alquilantes que desestabilizam a ligação N-glycosidica,
causando mutagênese e carcinogênese.

Figura 9 - depurinação

DANO OXIDATIVO NO DNA


Espécies reativas de oxigênio (EROs) são formadas e degradadas por
organismos aeróbicos. No entanto, quantidades excessivas levam ao au-
mento do estresse oxidativo.
As EROs incluem um grande número de moléculas quimicamente
reativas e derivadas do oxigênio, como exemplo o ânion radical super-
óxido (O2.-), o peróxido de hidrogênio (H2O2) e o radical hidroxil (.OH).
Figura 10.

139
Genética Básica

MUTAÇÕES INDUZIDAS
O efeito do meio ambiente sobre os organismos pode ser avaliado
por aumentos nas taxas de mutações em organismos expostos a agentes
mutagênicos ambientais, tanto físicos (Raios X e radiação UV) quanto
químicos (drogas, poluentes ambientais, xenobióticos etc).
Sua ação se dá geralmente por mimetizar a estrutura de bases nitroge-
nadas, gerando deleções ou inserções, por alteração na estrutura tridimen-
sional do DNA ou por transposição de elementos moveis (Transposons)
para diferentes locais no DNA.

AÇÃO DAS DROGAS SOBRE O DNA

1. Análogo de bases:

Ex: 5- Bromouracila (análogo de Timina)

Figura 11

140
Mutação e reparo do DNA
Aula

Efeitos sobre a replicação 8

Figura 12

2. Agentes alquilantes: adiciona grupos Etil ou Metil ás bases.

Figura 13

141
Genética Básica

3. Agentes desaminantes: Ex: Acido Nitroso

Figura 14

4. Corantes Acridínicos : intercala entre as bases.

São compostos com estruturas planas que se intercalam entre as bases


nitrogenadas do DNA, produzindo adições ou deleções de um par de
nucleotídeos.

Figura 15

142
Mutação e reparo do DNA
Aula

EFEITO: MUDANÇA NO QUADRO DE LEITURA,


POR INSERÇÃO NO DNA
8
AÇÃO DE AGENTES FÍSICOS SOBRE O DNA

1. Radiações ionizantes: raios X, ,β, γ.


Induzem a formação de íons reativos e radicais livres, bem como pro-
vocam alterações nas bases e quebras na cadeia do DNA (de uma ou ambas
as fitas) podendo originar aberrações cromossômicas.

Figura 16

2. Radiações não-ionizantes: raios ultravioleta.

Embora não possuam energia suficiente para ionizar o DNA, carregam


energia suficiente para alterar a molécula. A mais conhecida ação da radiação
UV no DNA é a indução de dímeros de pirimidina. Trata-se da indução
de ligações carbono-carbono entre pirimidinas adjacentes, sendo mais co-
mum com a timina. Isto resulta na distorção da molécula ou ligações entre
moléculas adjacentes, o que temporariamente pára a replicação do DNA.

143
Genética Básica

AÇÃO DE ELEMENTOS GENÉTICOS DE


TRANSPOSIÇÃO (TRANSPOSONS)

Transposons são seqüências de DNA que tem a propriedade de mover-


se de um local para outro dentro do genoma, e são por isso denominados
Elementos geneticos moveis. Sua inserção na estrutura de um gene pode
causar deleção ou perda de bases. Se o transposons se retira do interior de
um gene, este pode recuperar sua função. Do mesmo modo, se ele insere
em um gene, nucleotídeos são adicionados a ele tendo como conseqüência
a perda de função. Devido a esse modo de ação, os transposons são con-
siderados agentes mutagênicos.
Já foram descritos em bactérias, plantas e em mamíferos. Sua origem,
no entanto, ainda é objeto de discussão.

Ex: Figura 18.

144
Mutação e reparo do DNA
Aula

Em humanos, todos os tipos de mutações descritas aqui são possíveis.


No entanto, há outros tipos associados especificamente a doenças humanas;
uma delas, que tem recebido atenção especial nos últimos anos, é a repetição
8
expandida de trinucleotídeos.
As seqüências repetidas de um a seis vezes são conhecidas como
repetições simples em tandem (essas são definidas como uma sequência
de DNA que se repete uma atrás da outra, p. ex. AACT pode se repetir
várias vezes: AACTAACTAACTAACTAACT...) e estão dispersas por todo
o genoma humano.
As seqüência repetidas três vezes, ou repetições de trinucleotideos, estão
associadas a doenças herdadas e podem se expandir. Já foram encontradas
na Síndrome do X frágil e em doenças neurológicas como a Doença de
Huntington, Distrofia Miotõnica e outras. O numero de repetições está as-
sociada a gravidade destas, e sua instabilidade em células somáticas e entre
gerações, causa o fenômeno da antecipação, onde há aumento da gravidade
quanto mais cedo aparecem as repetições em gerações sucessivas.
O mecanismo de expansão ainda é desconhecido.

Figura 19.

145
Genética Básica

Ex: Figura 20.

MECANISMOS DE REPARO DO DNA

Como já dito no inicio deste capitulo, a sobrevivência dos organismos


depende da estabilidade do seu material genético. Estando os organismos
mergulhados em seu meio ambiente, as respostas a ele dependerá de me-
canismos que os proteja de danos irreversíveis. Nesse contexto, os mecanis-
mos de reparo têm a função de reparar danos espontâneos ou induzidos,
sofridos pelo DNA para que a informação genética seja passada para as
próximas gerações de células e de organismos.
Durante a replicação do DNA, as polimerases têm um papel funda-
mental no reparo de lesões, mas alem desse mecanismo geral, inúmeros
outros estão presentes na maquinaria celular de bactérias até humanos. São
altamente conservados evolutivamente, o que demonstra sua importância
na sobrevivência dos organismos. Entre os mecanismos conhecidos, há
aqueles dependentes de luz (fotorreativos) existentes somente em bactérias
e aqueles existentes também em humanos, como reparo por excisão, reparo
pos-replicação e outros.
Reparo por fotorreativação – feito pela enzima DNA-fotoliase, que age
quando a luz UV gera dímeros de Timina no DNA de bactérias. A enzima
se une ao dímero no escuro e quando a molécula se expõe a luz ( por meio
de um fóton), desfaz o dímero.

146
Mutação e reparo do DNA
Aula

8
Figura 21.

REPARO POR EXCISÃO


Nesse caso, o reparo acontece em 3 etapas:

1. uma endonuclease (DNA glicosilases) de reparo reconhece a (s) base (s)


danificada, liga-se a ele e a excisa;
2. uma DNA polimerase preenche o espaço usando a fita complementar
integra como molde;
3. a enzima DNA ligase fecha a falha deixada pela DNA polimerase para
completar o processo.

Ex: Figura 22.

147
Genética Básica

REPARO PÓS-REPLICAÇÃO
Aqui o reparo de pareamentos incorretos se dá depois da replicação e requer
a existência de um sistema que seja capaz de reconhecer as bases mal pareadas,
determinar quais das bases é a incorreta e, por fim, eliminar a base incorreta e
sintetizar o novo segmento sem erro. As enzimas responsáveis por esse tipo
de reparo são produtos dos genes mutH, mutL, mutS e mutU. Pra distinguir
a hélice com erro da integra o sistema reconhece a Adenina (A) da seqüência
GATC da fita integra pela presença de metilação (Metilase de Adenina).

Figura 23.

CONSEQÜÊNCIA DAS MUTAÇÕES

A maioria das mutações são deletérias e em razão disso nenhuma


espécie pode permitir que elas se acumulem em uma freqüência alta nas
células germinativas. Embora a freqüência de mutação observada seja
baixa, imagina-se que o numero basico de proteinas essenciais que qualquer
organismo pode codificar esteja em torno 60.000. Assim, uma freqüência
de mutação dez vezes maior limitaria um organismo a cerca de 6000 genes
essenciais. Neste caso, a evolução provavelmente pararia em um organismo
menos complexo que uma mosca de frutas.
A taxa de mutação (aproximadamente 1 mudança de nucleotideo
por 109 nucleotideos a cada replicação), é exatamente a mesma seja em
bactérias ou em humanos. Devido a esta precisão, a sequencia do genoma
humano (aproximadamente 3 × 109 pares de nucleotídeos) é alterada por

148
Mutação e reparo do DNA
Aula

cerca de 3 nucleotideos a cada ciclo celular, permitindo que a informação


genética passe corretamente de uma geração para a outra, evitando também
mudanças nas células somáticas que levem ao câncer.
8
Ainda assim, as mutações ocorrem, assumindo seu papel no processo
evolutivo, amplificando a variabilidade genômica e as chances de adaptação
das espécies ao seu meio. No seu lado negativo elas estão envolvidas na
geração de muitas doenças, entre elas o câncer.

CONCLUSÃO

As respostas geradas pelos organismos ao meio podem causar danos


ao material genético e ao funcionamento dos processos biológicos. No en-
tanto, os erros no material genético gerados sejam de maneira espontânea
ou induzida, tornam-se o motor da evolução, uma vez que fornecem novas
combinações ao genoma das espécies.

RESUMO

Mutações são alterações herdáveis na seqüência no material genético,


que fornecem grande variabilidade ao conjunto gênico de uma população.
O termo mutação tem 2 significados, pois tanto é o processo quanto o
efeito. Como processo descreve os mecanismos geradores de alterações no
material genético, como efeito mostra as alterações no organismo afetado.
A sobrevivência dos organismos depende da estabilidade do seu mate-
rial genético. Estando os organismos mergulhados em seu meio ambiente, as
respostas a ele dependerão de mecanismos que os proteja de danos irrever-
síveis. Nesse contexto, os mecanismos de reparo têm a função de reparar
danos espontâneos ou induzidos, sofridos pelo DNA para que a informação
genética seja passada para as próximas gerações de células e de organismos.

ATIVIDADES
1. Use a tabela do código genético para encontrar a seqüência do pequeno
polipeptídio codificado nesta mensagem:
5'- AUGUUCAAGAUGGUGACUUGGUAAAUC-3'
a) Qual a seqüencia aminoácidos resultante se o 1°G nesta mensagem
mudar para A?
b) Qual seria a seqüência aminoácidos se o 1 ° C fosse mudado para U ?
c) E se o 1° C fosse mudado para G?
d) E se o último G fosse mudado para A ?
2. Assinale a alternativa correta, levando em conta os ácidos nucléicos, a ocor-
rência de mutações e as conseqüentes mudanças do ciclo de vida da célula.
a) O DNA é constituído por códons, que determinam a seqüência de bases

149
Genética Básica

do RNA mensageiro, necessária à formação dos anticódons, responsáveis


pela produção das proteínas.
b) No caso de uma mutação acarretar a transformação de um códon em
outro relacionado ao mesmo aminoácido, não haverá alteração na molécula
protéica formada, nem no metabolismo celular.
c) A mutação altera a seqüência de aminoácidos do DNA, acarretando al-
terações na seqüência de bases do RNA mensageiro e, conseqüentemente,
na produção das proteínas.
d) As mutações atuam diretamente sobre as proteínas, provocando a des-
naturação dessas moléculas e, conseqüentemente, a inativação delas.
e) Quando algumas proteínas são alteradas por mutações, suas funções no
metabolismo celular passam a ser realizadas pelos aminoácidos.

AUTOAVALIAÇÃO
Após estudar esta aula, consigo:
Definir
1. O que é mutação?
2. Diferenciar a transição e a transversão de bases nitrogenadas.
3. Distinguir as atividades mutagênicas dos seguintes agentes: 5-bromoura-
cila brometo de etídio, calor, e radiação ultravioleta.
4. Descrever as diferenças e as semelhanças entre o reparo por excisão de
bases e o mecanismo de fotoreativação.
5. Explicar por que a mutação é um importante mecanismo evolutivo.

PRÓXIMA AULA

Na próxima aula, o aluno compreenderá os mecanismos que controlam


a expressão gênica em eucariotos e procariotos.

REFERÊNCIAS

ALBERTS B, JOHNSON A, LEWIS J, et al - Molecular Biology of the


Cell. 4th edition. New York: Garland Science; 2002.
GRIFFITS, A. J. F. e Col – Introdução à genética – Editora Guanabara
Koogan, 9a edição, Rio de Janeiro, RJ, 2008.
SNUSTAD, D. P. – Fundamentos de Genética - Editora Guanabara Koogan,
6a edição, Rio de Janeiro, RJ, 2008.
Mutações Gênicas- Eduardo Dias. http://genetica.ufcspa.edu.br/biomedic/
conteudo/genetica_molecular/mutacgen.PDF. Texto acessado em 23/01/2010

150
Aula

REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO
9
GÊNICA

META
Apresentar dos principais mecanismos reguladores da expressão gênica em Eucariotos e Procariotos.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
conhecer os mecanismos gerais de regulação utilizados por Procariotos e Eucariotos;
relacionar as diferenças entre os mecanismos utilizados pelas duas categorias de organismos;
entender a importância dos mecanismos apresentados para a sobrevivência dos organismos.

PRÉ-REQUISITOS
Para alcançar os objetivos propostos o aluno deverá rever as aulas de estrutura e funcionamento
do DNA (Transcrição e tradução), como também utilizar a bibliografia indicada para aprofundar seus
conhecimentos.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
Cada célula que compõe nossos órgãos e tecidos contém o mesmo
complemento de DNA – conhecido como genoma pessoal. Para nossas
células tornarem-se célula da pele ao invés de célula capilar, certos genes
tem que ser ligados ou desligados. Este processo de comutação da expressão
gênica é denominado regulação gênica. Alguns genes, como os das proteínas
ribossomiais, devem ser continuamente expressos em todas as células para
manter a produção de proteínas. Outros genes, no entanto, estão ativos
somente em células ou tecidos específicos. P. ex. o gene da opcina, o qual
codifica a proteína que ajuda a recepção de cor no olho, só está expressão
nas células da retina do olho.
Todos esses processos são precisamente regulados separadamente e
em conjunto para que os organismos se desenvolvam obedecendo suas
necessidades diárias e temporais.
O controle da expressão gênica em organismos cujo material genético
é o DNA é um processo coordenado e muito preciso. O metabolismo
celular, as respostas dos indivíduos ao ambiente, a expressão dos genes
responsáveis por cada período do desenvolvimento, todos dependem de
uma regulação conjunta e orquestrada.
Cada organismo vivo tem a capacidade de ligar e desligar seus genes
em momentos diferentes do seu ciclo de vida e sob certas condições. Isto
ocorre continuamente em nossos corpos sem a nossa interferência e,
mesmo, consciência. Este processo de regulação gênica é similar em todos
os organismos, aumentando em complexidade à medida que subimos na
cadeia evolutiva. Na maioria dos organismos esta regulação ocorre no nível
da transcrição do DNA, durante a síntese do RNAm.
Para compreender a regulação precisamos primeiro entender a estrutura
dos genes em Procariotos e Eucariotos.

ESTRUTURA DO GENE
A estrutura geral dos genes de Procariotos e Eucariotos é muito semel-
hante, uma vez que nos dois casos há seqüências reguladoras que antecedem
a região codificante e seqüências terminadoras que delimitam o final do
gene. Assim um gene, seja qual for sua origem, tem inicio e fim (figura1).

152
Regulação da Expressão Gênica
Aula

Figura1.

Nos Procariotos, a estrutura é mais simples e contém uma região codifi-


cante inteira, sem interrupção. Evolutivamente, essa estrutura mostrou-se
a mais eficiente para um grupo de organismos que não tem divisão entre
núcleo e citoplasma, e seu DNA está mergulhado em seu citoplasma, em
um local denominado Nucleóide (figura 2).

Figura 2.

153
Genética Básica

Nesse ambiente, a expressão gênica (transcrição e tradução) ocorre ao


mesmo tempo, já que esse organismo unicelular está mergulhado em seu
meio e precisa dar respostas rápidas para sua sobrevivência (ver figura 3).

Figura 3.

Nos eucariotos, havendo 2 compartimentos separados, há divisão de


trabalho entre núcleo e citoplasma. Figura 4

Figura 4.

Além disso, um mesmo DNA está presente em diversos tipos celula-


res, tornando a expressão dos genes tecido-especifico. Não se espera, em
indivíduos normais, que uma proteína essencial ao sistema nervoso seja
produzida no fígado! Figura 5

154
Regulação da Expressão Gênica
Aula

Figura 5.

Diferentes categorias de genes se expressam durante a vida de um


organismo eucarioto. As principais são:

- Genes de manutenção (housekeeping) Expressos em todas as células. São


responsáveis pela rotina metabólica comum a todas as células.
- Outros genes se expressam à medida que a célula entra em um período
de diferenciação.
- Alguns são expressos todo o tempo em células diferenciadas. P. ex. Uma
célula do plasma expressa continuamente os genes para anticorpos.
- Alguns são expressos somente em condições de mudança do ambiente
extracelular. P. ex., a chegada de um hormônio pode ligar ou desligar certos
genes.
A expressão gênica ocorre, então, em vários níveis. (Figura 6).

Figura 6.

155
Genética Básica

Geralmente, na maioria dos organismos o controle da expressão gênica


se dá na transcrição, o que é compreensível, pois é melhor parar o processo
antes da produção da mensagem que depois!

CATEGORIAS DE MECANISMOS REGULADORES


I. Ligação e Repressão da ação gênica em resposta a mudanças ambientais-
Procariotos.
- Funcionam como interruptores, pois ligam e desligam genes de acordo
com as respostas dos procariotos as mudanças ambientais, ajustando seu
metabolismo rapidamente ao crescimento e reprodução.
II. Circuitos Pré-programados de expressão gênica - Eucariotos.

Em eucariotos, a expressão de genes funciona de maneira semelhante


aos procariotos, mas devido aos diferentes tipos celulares e as diferentes
fases do desenvolvimento o ligar e desligar de genes obedece a uma pro-
gramação, que se inicia no zigoto, continua durante a vida dos indivíduos
e, mesmo na morte, o circuito tem seu papel.

REGULAÇÃO GÊNICA EM PROCARIOTOS:


CONSTITUTIVA, INDUZÍVEL E REPRESSÍVEL

Como todos os organismos, procariotos como as bactérias, possuem


genes constitutivos, ou de manutenção, que produzem proteínas ribossômi-
cas, RNAt, e outros, que mantém o metabolismo ativo. Outros genes são
“sazonais”, ou seja, só são ligados quando em resposta a condições am-
bientais.
Em seu metabolismo elas sintetizam aminoácidos, vitaminas, carboi-
dratos etc. Durante seu crescimento elas podem usar qualquer carboidrato:
glicose, sacarose, galactose ou lactose como fonte de energia. Se há glicose,
ela a usa em seu metabolismo sem ligar ou ativar nenhum gene temporário.
Mas se a lactose for a única fonte de carbono, ela sintetiza 3 enzimas, a
β-galactosideo permease e a β-galactosidase, que metabolizam a lactose.
A β-galactosideo permease carreia lactose do meio externo para dentro
da bactéria.
A β-galactosidase cataliza a quebra da lactose em glicose e galactose,
açucares de maior energia.
β-galactosideo transacetilase, função ainda desconhecida.

Para quebrar a lactose, a bactéria utiliza um sistema de indução e re-


pressão gênicas, ou seja, quando não há glicose, o açúcar de maior energia,
ela utiliza lactose que esteja disponível, ligando genes para quebrá-lo e,
quando o açúcar não estiver mais disponível, desligando-os. A presença

156
Regulação da Expressão Gênica
Aula

da lactose induz a célula bacteriana a produzir as enzimas necessárias para


quebrá-la; então a lactose é o Indutor da expressão gênica. Os genes das
enzimas são induzíveis.
9
A indução ocorre no nível da transcrição. Ela altera a taxa da síntese
de enzimas, mas não a atividade delas.
A regulação da expressão gênica (indução, ou ativação de genes e a
repressão, ou o desligamento de genes) é feita por genes reguladores, que
atuam por meio de mecanismos de controle positivo e negativo (ver figura 7).
Nos mecanismos de controle positivo, o produto do gene regulador
é necessário para ligar a expressão de um ou mais genes estruturais (que
produzem proteínas).
Nos mecanismos de controle negativo, o produto do gene regulador é
necessário para desligar a expressão dos genes estruturais.
Os produtos do gene regulador são chamados de ativadores, ligando genes
no controle positivo, e repressores desligando genes no controle negativo.

Figura 7.

157
Genética Básica

O MODELO DO OPERON
Em 1961, dois cientistas, François Jacob e Jacques Monod propuseram
um modelo, para explicar a utilização de lactose por E. coli: o Modelo do
Operon. Nesse modelo, um conjunto de genes reguladores e estruturais,
agindo coordenados, controla a produção de enzimas responsáveis pela
degradação da Lactose.
Os genes que constituem o Operon são:

IPOZYA

I (produz uma proteína repressora) – na ausência de Lactose, o operon


está desligado por tal proteína. A proteína repressora produzida pelo gene
I se liga ao operador, impedindo a ligação da RNA polimerase.
Obs: Lembre que, em qualquer gene, a expressão gênica começa quando
a RNA polimerase se liga ao promotor do gene e sintetiza um RNA que
contem a região a região codificante do gene (ver Aula de transcrição)
P (Promotor) – o promotor é a seqüência que é reconhecida pela RNA
polimerase, onde se inicia a transcrição. Ela antecede a região codificante
dos genes.
O (Operador) – Seqüência que faz parte da região promotora e é respon-
sável pela ligação da proteína repressora, impedindo a transcrição. Quando
o operador está desreprimido, a RNA polimerase passa por ele em direção
ao genes estruturais (ZYA).
Z - produz enzima B-galactosidase, que quebra a lactose em glicose e
galactose.
Y - produz a enzima β-galactosideo Permease, transporta via membrana,
a lactose do meio externo para dentro da célula bacteriana.
A - produz a enzima β-galactosideo transacetilase – participa do controle
positivo do operon.

CONTROLE DA EXPRESSÃO GÊNICA EM


PROCARIOTOS: O PAPEL DO PROMOTOR

A região promotora de qualquer gene localiza-se a 5´, antes da região


codificante, controlando a ligação da RNA polimerase, quando os genes
precisam ser transcritos. Numa analogia, se a RNA polimerase fosse um
carteiro, o promotor é o endereço do gene!
Por convenção, os nucleotídeos que vêem antes da região codificante
são enumerados com sinal negativo e a partir da região codificante com
sinal positivo (figura 8).

158
Regulação da Expressão Gênica
Aula

Figura 8.

Em procariotos, o promotor possui duas regiões conservadas evoluti-


vamente (que estão presentes em diferentes espécies e chamadas seqüências
de consenso), que precedem a região codificante: a seqüência a cerca de 10
nucleotídeos da região codificante (-10) chamada TATA Box e a seqüência
-35 (TTGACA). Essas seqüências podem variar de gene para gene, mas
alguns nucleotídeos se repetem em diferentes genes.
A subunidade sigma da RNA polimerase reconhece primeiro a região
-35 e depois desliza em direção a -10.
A seqüência -10 é rica em A-T e facilita o desenrolamento localizado
do DNA, necessário para a síntese de uma nova cadeia de RNA.
No modelo operon, o indutor da transcrição de seus genes é a Alo-
lactose derivada da lactose em uma relação catalizada pela B-galactosidase,
o qual se associa ao repressor e inibe-o, deixando o promotor livre para a
interação com a RNA polimerase e conseqüente transcrição do gene (Jacob
e Monod, 1961).
Veja vídeos sobre o funcionamento do Operon Lac no link indicado
nas referencias bibliograficas

AÇÃO DO OPERON POR CONTROLE NEGATIVO


Como já dito, o Operon Lac é induzível, pois seus genes só são tran-
scritos na presença de Lactose. Na sua ausência, a proteína reguladora de
I deixa o sitio O reprimido.
Quando a Lactose está presente, ela liga-se ao repressor, muda sua
conformação e ele sai do operador. A liberação deste sítio faz com que a
RNA polimerase se ligue ao operador e inicie a transcrição dos genes Z,
Y e A, que serão em seguida traduzidos nas 3 enzimas: B-galactosidase,
B-galactosideo permease e B-galactosideo transacetilase.

159
Genética Básica

Figura 9.

AÇÃO DO OPERON LAC POR CONTROLE


POSITIVO

Pode acontecer de estarem presentes na célula bacteriana tanto Glicose


quanto Lactose, e a glicose é degradada preferencialmente. A presença da
glicose impede a indução do Operon Lac, ou outros operons envolvidos
no catabolismo dos carboidratos. Esse fenômeno é chamado repressão
catabólica e assegura que a glicose seja metabolizada quando presente,
preferencialmente a outras fontes de energia menos eficientes.
A repressão catabólica do operon Lac e outros são mediadas por uma
proteína reguladora, chamada CAP (proteína ativadora de catabólito) e uma
pequena molécula de AMP cíclico (AMPc), que só funcionam juntas, em
um complexo:CAP-AMPc.
O promotor Lac contém dois sítios de ligação separados, um para
RNA-pol e outro para o complexo CAP-AMPc.
A glicose em grandes impede a formação do AMPc, por que ela im-
pede a adenilciclase de formá-lo, Mas, a medida que a glicose é degradada,
a concentração de AMPc vai aumentando e ele pode então se ligar a CAP,
formando o complexo. Esse complexo se liga então ao promotor Lac e
amplia o numero de RNAm e, conseqüentemente enzimas para degradar
a lactose.

160
Regulação da Expressão Gênica
Aula

Uma pergunta comum é: se a lactose está presente, o operon está


desreprimido e está produzindo as enzimas; então, porque precisa do
complexo CAP-AMPc?
9
A resposta é que o promotor Lac é dito “fraco”, pois ele não se liga (ou
encaixa) eficientemente a RNApol, e a produção de enzimas quando só a
lactose está presente é de cerca de 2%. Quando o complexo CAP-AMPc se
liga ao operador ele aumenta a eficiência de ligação do promotor fazendo
com que o encaixe seja perfeito e a produção de proteínas aumente muito.
Alem do Operon Lac, outros operons estão presentes em E. coli
(Arabinose, Trptofano e outros). O modelo do Operon Lac foi essencial
para compreendermos como genes são ligados e desligados. Essa com-
preensão ajudou a entender mecanismos similares em Eucariotos, como
veremos em seguida.

REGULAÇÃO GÊNICA EM EUCARIOTOS


Vimos anteriormente que a expressão de genes eucariotos é regulada
por circuitos pré-programados, onde toda as células de organismos multi-
celulares tem o mesmo DNA mas, com exceção dos genes constitutivos,
cada gene atua de maneira espacial e temporal. P. ex. as Hemoglobinas do
adulto humano só são produzidas depois que a hemoglobina fetal diminui
sua quantidade, aos 6 meses de vida.
Em humanos, dos 25.000 a 30.000 genes codificados pelo Projeto
Genoma, cerca de 3% codifica proteínas. No entanto, o número de pro-
teínas produzidas excede largamente o número de genes. Este fato pode
ser explicado tendo em consideração o seguinte:
Os genes de eucariotos são interrompidos! Em um segmento de
DNA correspondente a um gene que codifica uma determinada proteína,
encontra-se regiões codificadoras (chamadas Exons) alternando-se com
regiões não-codificadoras- os introns (figura 10).

Figura 10.

161
Genética Básica

O transcrito resultante não é funcional e só poderá ser traduzido se for


devidamente “montado”, descartando-se os introns e unindo-se os exons
em seqüência ordenada. Este tipo de modificação do transcrito primário
é denominado "splicing" (cortar e colar; montagem) e ocorre dentro do
núcleo. O transcrito processado e pronto para migrar para o citoplasma
recebe o nome de RNA mensageiro.
Os exons codificam sequências de aminoácidos, designadas domínios,
que podem fazer parte de mais do que uma proteína. Diferentes combina-
ções de exons formam diferentes proteínas.
A regulação em eucariotos tem várias características a considerar:
1. Núcleo e citoplasma em eucariotos estão separados por membrana, sendo
o trabalho compartimentalizado também. No núcleo produz-se RNA, que
é montado na maneira de um RNAm ; este vai para o citoplasma (reticulo
endoplasmático) para ser traduzido;
2. Como já visto na aula de transcrição, eucariotos têm 3 tipos de RNA
polimerase: I, II e III, para cada tipo de RNA;
3. Há modificações pós-transcricionais: retirada dos introns e modificação
das extremidades 5´e 3´do RNAm;
4. A regulação da expressão gênica sofre a ação de sinais intra e extrace-
lulares.
5. As proteínas reguladoras que controlam a transcrição são os fatores de
transcrição, muitos deles com domínios característicos para interagir com
o DNA.

MONTAGEM ALTERNATIVA DE RNA

A maioria dos genes eucarióticos tem introns. Cada um deles precisa


ser removido para que o RNAm contenha apenas a seqüência codificante
que será traduzida em aminoácidos.
A formação do RNAm é feita por enzimas especificas (Spliceossomos),
que corta os introns separadamente ou em conjunto. Quando um corte de
introns leva um exon junto, a recomposição forma uma proteína diferente,
ampliando o leque das alternativas que um RNAm pode formar, como
mostra a figura 11 ao lado:

162
Regulação da Expressão Gênica
Aula

Figura 11.

O controle da expressão gênica em eucariotos é mais complexo do


que em bactéria, pois a passagem do núcleo para o citoplasma, a resposta
a sinais ambientais internos e externos e a comunicação celular impõem a
ação coordenada de todos os elementos envolvidos.

CONTROLE DO PROMOTOR E ELEMENTOS


PRÓXIMOS

Boa parte desse controle se dá no promotor e nas regiões proximais a


ele. Uma vez que em diferentes tipos celulares diferentes genes se expres-
sam, a estrutura do promotor tem que refletir esse critério espacial.
Como em baterias o promotor tem que sinalizar o inicio do gene
para a RNA polimerase, assim como a regulação a distância, por meio de
elementos proximais a ele.

PROMOTOR

Como já visto em bactérias, contém seqüências de consenso (-35 e -10)


que sinalizam o inicio da transcrição para a RNA pol. Aqui, no entanto, a
seqüência -35 assume diferentes arranjos, pois é mais tecido especifica, ou
seja, cada gene em cada tecido pode ter uma seqüência um pouco diferente
para identificar onde ele está (coração, pele, etc).

ENHANCER (AMPLIFICADOR)

Seqüência que está acima (upstream) do promotor, a milhares de nucleo-


tídeos distante dele e que tem a função de ser a região onde os fatores de
transcrição se ligam para ampliar a produção de RNA. Por isso, os fatores
de transcrição que se ligam a ele são chamados ativadores de transcrição.

163
Genética Básica

SILENCIADOR
Outra seqüência de nucleotídeos que age a distancia do promotor e,
ligando-se a fatores de transcrição, silenciando genes. Os fatores de tran-
scrição que se ligam ao silenciador são chamados repressores.

As figuras 12 e 13 ilustram esses elementos.

164
Regulação da Expressão Gênica
Aula

REGULAÇÃO GÊNICA POR HORMÔNIOS

Duas categorias de hormônios são importantes na regulação gênica


9
em eucariotos:
1. Hormônios esteróides (progesterona e estrogênio) – moléculas pequenas
lipossolúveis, que atravessam a membranas celulares.
Quando entram na célula interagem com receptores hormonais, no
citoplasma ou núcleo, formando um complexo, e interage com o DNA, se
comportando como fatores de transcrição. (figura 14).

Figura 14

CONCLUSÃO

Os mecanismos apresentados nesse capitulo demonstram as diferentes


estratégias utilizadas por organismos pro e eucariotos para expressar ou
reprimir genes ou conjuntos de genes em resposta ao seu ciclo de vida e
as exigências do ambiente.
Embora os mecanismos em cada categoria de organismo sigam os
mesmos princípios, o nível de complexidade de cada um deles obedece as
relações de cada organismo com seu meio, como vimos no uso da lactose
por bactérias e o papel dos hormônios em eucariotos.

RESUMO

Os mecanismos citados neste capitulo são representativos de uma gama


de outros existentes em Procariotos e Eucariotos. A compreensão desses
mecanismos tem ajudado a entender a complexidade de estratégias utilizadas
pelos organismos para responder as diferentes demandas do seu ambiente.

165
Genética Básica

ATIVIDADES
1. A célula muscular cardíaca e a esquelética têm a mesma origem porém
são diferentes, tanto do ponto de vista estrutural como funcional. Ao longo
do processo de diferenciação das células do mesmo organismo ocorre
a) duplicação de alguns genes.
b) perda dos genes não expressos.
c) expressão diferencial dos genes.
d) indução de mutações específicas.
e) recombinação entre genes ativados.
2. No operon LAC de E. coli, qual é a função de cada um dos seguintes
genes ou sítios:
a) regulador b) operador c) promotor d) gene estrutural Z e )
gene estrutural Y?

AUTOAVALIAÇÃO

Após estudar esta aula, consigo:


1. Explicar qual (is) as diferença(s) entre a regulação gênica de procariotos
e eucariotos?
2. Em relação ao Operon LAC, responda:
a) Qual a diferença repressores e indutores;
b) Como se diferencia controle positivo e controle negativo na regulação
gênica?;
3. Foi demonstrado experimentalmente que a maioria das sequências alta-
mente repetitivas de DNA de cromossomos eucariotos não são transcritas.
O que isto indica a respeito da função deste tipo de DNA?

REFERÊNCIAS

ALBERTS B, JOHNSON A, LEWIS J, et al - Molecular Biology of the


Cell. 4th edition. New York: Garland Science; 2002.
GRIFFITS, A. J. F. e Col – Introdução à genética – Editora Guanabara
Koogan, 9a edição, Rio de Janeiro, RJ, 2008.
SNUSTAD, D. P. – Fundamentos de Genética - Editora Guanabara
Koogan, 6a edição, Rio de Janeiro, RJ, 2008.

166
Aula

PRINCÍPIOS DE GENÉTICA DE
10
POPULAÇÕES

META
Mostrar ao aluno que a dinâmica dos genes nas populações pode ser compreendida por meio do
estudo das suas frequências gênicas e genotípicas. Pretende-se fornecer os requisitos básicos
para que o aluno possa entender os mecanismos relacionados a variação genética das populações
biológicas ao longo do espaço e do tempo. Discutiremos os mecanismos básicos sobre os quais agem
os fatores evolutivos.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
saber identificar os principais mecanismos que afetam as frequências gênicas das populações
no espaço e no tempo. Deverá saber calcular as frequências gênicas e genotípicas e entender a
dinâmica dessas frequências e suas implicações numa população biológica.

PRÉ-REQUISITOS
Noções de genética mendeliana, Binômio de Newton e noções de álgebra.
Genética Básica

INTRODUÇÃO
Prezado aluno, até agora os assuntos tratados em genética diziam
respeito às características individuais e familiares e as análises utilizavam
heredogramas e cruzamentos entre indivíduos. Nesse momento temos
um novo desafio, como estudar uma população? Seria possível entender
a dinâmica dos genes e dos genótipos em escala populacional? A resposta
é positiva, mas muitos estudantes de biologia têm imensa dificuldade em
entender os princípios básicos de genética de populações, principalmente
em função dos cálculos envolvidos e por ser uma área da genética pouco
trabalhada no ensino médio. No entanto, é possível contornar essa dificul-
dade inicial por meio de ilustrações e simulações disponíveis na internet.
Nesse ponto o ensino a distância é facilitado pelo desenvolvimento da
informática e da disponibilidade de softwares e sites especializados nessa
área que serão comentados ao longo desse capítulo.
Uma população natural é formada por um conjunto de indivíduos de
uma espécie contendo diversas famílias com muitos genótipos diferentes.
Desse modo, a estrutura da população é definida pela frequência dos
alelos que compõem os diferentes genótipos das diferentes famílias. Uma
população natural é formada por todos os indivíduos que, ao se reproduzir
uns com os outros, compartilham de um pool gênico, que é formado pelo
conjunto total de informações genéticas compartilhadas pelos membros
reprodutivos da população.
Iniciaremos a aula descrevendo a variação genética populacional, o que
determina essa variação genética e quais suas implicações. Depois iremos
entender como seria a dinâmica dos genes e dos genótipos numa população
ideal – População em equilíbrio de Hardy& Weinberg – Tal qual o zero na
matemática, ou um ponto de referência na física, essa população ideal for-
nece um parâmetro básico para que possamos entender o perfil genético das
populações e verificar como cada fator evolutivo pode interferir na variação
populacional ao longo do tempo.A genética de populações estuda a origem
da variação, a transmissão dos genes ao longo das gerações e a dinâmica da
mudança na composição genética das populações ao longo do tempo por ação
das forças evolutivas sistemáticas (determinísticas) e aleatórias (estocásticas).

DEFINIÇÃO DE POPULAÇÃO

A população é formada por um grupo de indivíduos pertencentes a


uma mesma espécie biológica. Em genética de populações, entretanto, é
preciso especificar melhor este conceito. A palavra população não se refere
a espécie como um todo, mas apenas a um grupo de organismos de uma
mesma espécie que vive em uma determinada área geográfica suficiente-
mente restrita para que qualquer membro possa se casalar com qualquer
outro do sexo oposto.

168
Princípios de Genética de Populações
Aula

VARIAÇÃO GENÉTICA POPULACIONAL


A variação é uma propriedade natural das populações biológicas. No
10
entanto, essa concepção nem sempre foi assim. Antigamente pensava-se
que cada espécie era formada por uma essência perfeita e que as diferenças
entre os indivíduos de uma mesma espécie eram apenas erros, uma vez que
a essência pertencia a um mundo perfeito, que seria o mundo das ideias
para uns ou o mundo divino para outros. Esse pensamento que colocava
a variação como erro persistiu por cerca de 2000 anos, desde Platão (na
Grécia antiga) até meados do século XIX. Felizmente Charles Darwin
revolucionou o mundo científico quando a defendeu que a variação é uma
propriedade natural das espécies e não defeitos que afastam os meros
mortais da essência perfeita. O reconhecimento da amplitude da variação
fenotípica e de sua base hereditária levou Darwin à ideia da evolução por
meio da Seleção Natural.
Para melhor compreender isso, vamos observar as pessoas ao nosso
redor: parentes, vizinhos, conhecidos do bairro ou de outras regiões. Ob-
serve que todos variam entre si em relação à cor dos olhos, peso, cor da
pele, altura, características faciais, tipos sanguíneos. É fascinante pensar que
essa variação nos garante que nenhum indivíduo, excetuando os gêmeos
univitelinos, é geneticamente igual ao outro e que não exista, dentre os
mais de 6,5 bilhões de habitantes do nosso planeta, outro indivíduo igual
a você e mais, que provavelmente nunca tenha existido outro e que nunca
existirá outro igual a você no futuro. Portanto, a variação é uma realidade
muito presente, não só na espécie humana, mas na maioria dos seres vivos.
Por exemplo, as abelhas variam em tamanho, forma, padrões de coloração;
camundongos variam em cor da pelagem; caramujos apresentam conchas
com diferentes padrões de cores e listas e as plantas variam em relação à
susceptibilidade diferencial a parasitas.
A nossa observação das espécies em nível fenotípico dá uma dimensão
prática da existência de variação. No entanto, a variação genética é ainda
maior que aquela que pode ser observada na comparação dos fenótipos.
Ao nível molecular a variação existente é ainda maior, um fato comprovado
com o avanço das técnicas moleculares desenvolvidas a partir da segunda
metade do século XX e ainda em desenvolvimento. Uma boa parte da
variação genética molecular não aparece no fenótipo em função de estar em
regiões neutras do DNA, em outras áreas não codificantes ou em função
da redundância do código genético que possibilita que códons diferentes
decodifiquem um mesmo aminoácido. Desse modo, dois indivíduos podem
produzir uma mesma proteína mesmo que suas sequências de DNA sejam
diferentes.
A quantidade de variação genética dentro de populações naturais e a
dinâmica das forças limitantes e/ou moldadoras ao longo do tempo e do
espaço formam a base de interesse do geneticista de populações. A vari-

169
Genética Básica

abilidade genética, portanto, está diretamente relacionada à evolução das


espécies e o grau de variabilidade dentro da espécie afeta diretamente o seu
potencial de se adaptar a mudanças ambientais.

O SURGIMENTO DA GENÉTICA DE POPULAÇÕES

Em 1900, com o redescobrimento dos trabalhos de Mendel, ficou


cada vez mais claro que as características são determinadas por genes, que
se segregam durante a formação de gametas que são transmitidos para a
prole. A análise da transmissão genética em cruzamentos experimentais
e heredogramas rapidamente deu origem a um novo tipo de análise que
envolvia populações inteiras. Em 1930 a genética de populações já estava
se estabelecendo como disciplina, contando com a grande contribuição de
pesquisadores como Sewall Wright, R.A. Fisher e J.B.S. Haldane, passando
a representar um alicerce fundamental para a teoria evolutiva e para estudos
de variação genética populacional na área de ecologia. Não podemos negli-
genciar a influência do contínuo avanço tecnológico da biologia molecular,
a partir da década de 1950 até os dias atuais, que permitiu a decifração de
genomas inteiros, bem como com os avanços da bioinformática, no desen-
volvimento da genética de populações, que se tornou uma disciplina com
ampla sustentação teórica e uma enorme variedade de ferramentas práticas
que permitem analisar as características genéticas das populações tanto em
nível fenotípico, quanto ao nível molecular.

FREQUÊNCIAS DE ALELOS E GENÓTIPOS

A princípio os termos frequências gênicas e frequências genotípicas


parecem se tratar da mesma coisa, mas isso não é verdade, sendo de fun-
damental importância que o estudante saiba facilmente diferenciá-los.
Tomemos como base um locus qualquer, por exemplo: o locus A.
Considerando que esse locus tenha apenas dois alelos diferentes (A e a),
podemos concluir que os indivíduos diploides só poderão apresentar os
genótipos AA, Aa e aa para esse locus.
Podemos concluir então que para se calcular a frequência genotípica,
simplesmente somamos o número de indivíduos de um determinado genóti-
po na população e dividimos pelo número total de indivíduos (N). Então
para o locus com três genótipos mencionado (AA, Aa e aa), a frequência
(f) de cada genótipo é:

170
Princípios de Genética de Populações
Aula

10
Dizer 0,5 ou ½ ou 50% é exatamente a mesma coisa, sendo
apenas a escala diferente. 0,5 representa a metade do con-
junto inteiro igual a 1, enquanto ½ é o mesmo que a metade
de um conjunto inteiro de 2, ou seja, uma parte num total
de duas partes. Do mesmo modo, utilizando uma escala de
100 partes (percentagem), 50% representa a metade de 100.
É, portanto, apenas uma questão de escala.

Quando estamos falando de uma população de 100 indivíduos e veri-


ficamos que a metade deles é heterozigota para o locus A, ou seja, que
50 indivíduos sejam Aa, podemos dizer que a frequência genotípica dos
heterozigotos é:

Considerando ainda que nessa população, 25 indivíduos sejam de


genótipo aa e outros 25 de genótipo AA, podemos igualmente concluir
que a frequência genotípica dos homozigotos recessivos é:

171
Genética Básica

Observe que se somarmos as frequências de todos os genótipos teremos:

AA+Aa+aa=1

ou seja, esses genótipos juntos englobam todos os indivíduos dessa


população (100%). Podemos então concluir que as frequências genotípicas
estão relacionadas à forma em que os alelos estão distribuídos aos pares
nos indivíduos que formam a população.
Utilizando o mesmo exemplo anterior, então como seriam as frequên-
cias alélicas (também frequentemente chamadas de frequências gênicas)?
Caso não tenhamos a necessidade de saber como os alelos estão distribuídos
aos pares nos indivíduos, mas apenas querendo saber quais as suas frequên-
cias populacionais, podemos dizer que nessa população de 100 indivíduos,
a soma de todos os alelos A e alelos a representam o conjunto de todos
os alelos da população para esse locus. Então, podemos definir frequência
alélica como a proporção de cópias gênicas de um determinado tipo alélico
numa determinada população. A frequência alélica pode variar entre zero
(0) e um (1), sendo zero quando o alelo está ausente e, em outro extremo,
a frequência alélica é 1 quando o locus é monomórfico, ou seja, quando
existe apenas um tipo alélico para o locus em questão na população.
Considerando que cada locus possui uma representação específica
de seus alelos, convencionou-se representar as frequências de alelos pelos
símbolos p e q (substituindo A e a, no nosso exemplo). As frequências dos
alelos podem ser calculadas pelas seguintes fórmulas gerais:

Em que nAA, nAae naa representam o número de indivíduos para


cada um dos genótipos (AA, Aa e aa) e N representa o número total de
indivíduos de todos os genótipos. Divide-se por 2N porque cada indivíduo
diploide possui dois alelos em um locus (exceto os hemizigotos). Como
apresentado anteriormente, a soma de todos os alelos é sempre igual a 1,
ou seja, p+q=1. Considerando um locus com dois alelos, uma vez que
tenhamos obtido p, podemos obter q por subtração: q=1-p
Voltando ao exemplo inicial em que as frequências alélicas de A e
aforam calculadas a partir das frequências genotípicas, utilizando a fórmula
geral temos:

172
Princípios de Genética de Populações
Aula

10
Considerando as frequências genotípicas exemplificadas acima
(AA=0,25; Aa=0,5; aa=0,25), podemos dizer que a frequência alélica de A
nessa população é igual ao total dos homozigotos somado à metade dos
heterozigotos, logo:
Utilizando o número de indivíduos, temos:

Ou, alternativamente, podemos utilizaras frequências genotípicas para


chegarmos ao mesmo resultado:

Podemos dizer então que nessa população a frequência alélica de e,


por correspondência a frequência alélica do alelo a pode ser obtida por
diferença, considerando que:

Se
p+q=1→A+a=1
Então sendo

Dessa forma também podemos descrever o pool gênico de uma


população por meio de suas frequências alélicas. Lembrando que em uma
população biológica de reprodução sexuada, os genótipos são apenas
reuniões temporárias de alelos nos indivíduos, que se desfazem a cada ge-
ração quando os alelos individuais são passados aos descendentes através
dos gametas. Portanto, são os tipos de alelos, e não os genótipos, que têm
uma real continuidade de uma geração para a outra, e que constituem o
conjunto gênico de uma população.

173
Genética Básica

O PRINCÍPIO DE HARDY-WEINBERG
Há mais de 100 anos atrás, em 1908, G. H. Hardy, um matemático
inglês e W. Weinberg, um médico alemão, desenvolveram independente-
mente um conceito matemático relativamente simples, hoje denominado
princípio de Hardy-Weinberg, considerado o fundamento básico da gené-
tica de populações. Esse princípio diz que numa população panmítica (de
reprodução ao acaso), infinita e na ausência de fatores evolutivos, como
o fluxo gênico, mutação, seleção e deriva genética, as frequências alélicas
e genotípicas permanecem constantes ao longo do tempo. O princípio de
Hardy-Weinberg pode ser utilizado para determinar a frequência de cada
alelo de um par ou de uma série, bem como frequências genotípicas de
homozigotos e heterozigotos na população.
Vamos considerar novamente o nosso conhecido locus A, com os
genótipos AA, Aa e aa, que serão aqui tratados como, respectivamente D, H
e R, uma alusão para genótipo dominante, heterozigoto e recessivo, mesmo
considerando que nem todos os loci apresentam essa forma de dominância.
Do mesmo modo, as frequências alélicas de A e a serão tratadas como p e
q. Essas letras (D, H e R para genótipos e p e q para alelos) são utilizadas
pelos livros convencionalmente para que seja possível desenvolver fórmulas
gerais que possam ser utilizadas para qualquer locus com dois alelos.
Hardy& Weinberg perceberam que a distribuição dos alelos numa
população, considerando um locus uma população mendeliana, pode ser
ajustada perfeitamente ao binômio de Newton, estudado por todos nós
ainda no ensino fundamental, quem se lembra de (p+q)2 ? Então, pelos
produtos notáveis sabemos que o cálculo fica simples, apenas relembrando
“o quadrado do primeiro mais duas vezes o primeiro pelo segundo mais o
quadrado do segundo” = (p+q)2=p2 +2pq+q2 , mas como reunir isso que
eu aprendi em matemática à genética de populações?

Figura 1: Binômio de Newton ajustado ao quadrado de Punnet.

174
Princípios de Genética de Populações
Aula

É surpreendente o quanto essa distribuição binomial se ajusta perfeita-


mente à distribuição dos alelos e dos genótipos numa população, vejamos:
um locus autossômico eu um indivíduo diploide apresenta dois alelos, que
10
podem ser iguais (quando o indivíduo é homozigoto) ou diferentes (nos
heterozigotos). De qualquer modo, eles estão aos pares e durante a forma-
ção dos gametas eles se separam e são distribuídos de forma independente
para os descendentes, então voltando ao nosso velho exemplo, o locus A,
numa população onde esse locus apresenta dois alelos (A+a). A distribuição
desses alelos se dá aos pares, uma vez que os indivíduos são diploides, logo
(A+a)2; Os indivíduos, por sua vez, podem ser homozigotos dominantes
(AA), heterozigotos (Aa) e homozigotos recessivos (aa), os quais podemos
chamar, respectivamente de D, H e R.

Figura 2: Cálculo das freqüências genotípicas para o locus A.

Suponha que cada genótipo seja igualmente representado por machos e


fêmeas, e que os cruzamentos ocorram inteiramente ao acaso na população.
Nesse caso não estamos mais preocupados em saber quais indivíduos estão
sendo cruzados, como fazíamos nos cruzamentos encontrados nos exercícios
de genética mendeliana elementar, uma vez que o foco é populacional, quere-
mos apenas estimar quais as frequências genotípicas populacionais baseados
nas frequências gênicas, ou vice-versa, quais são as frequências gênicas da
população quando já sabemos a priori suas frequências genotípicas.
Para compreender melhor esse ajuste entre a distribuição binomial e a
genética de populações, vamos utilizar uma população humana hipotética
de 1000 indivíduos, igualmente distribuídos entre homens e mulheres. Uti-
lizaremos o grupo sanguíneo MN, que é controlado por dois alelos, Lme
Ln. Cada alelo codifica uma molécula de polissacarídeo na superfície das
hemácias e pode ser distinguido por meio de reagentes químicos apropria-
dos. Os tipos de moléculas são designados M e N respectivamente e os

175
Genética Básica

alelos LmeLn são codominantes, o que quer dizer que se expressam nos
heterozigotos. Um exame para o grupo sanguíneo MN constatou que nessa
população a frequência do alelo Lm é 0,4. Utilizando o que já aprendemos
anteriormente para calcular frequências alélicas, podemos deduzir facilmente
que a frequência do alelo Ln pode ser obtida por diferença, já que Lm+
Ln=1 (p+q=1), então qual seria o número esperado de indivíduos do tipo
M (genótipo LmLm), MN (genótipo LmLn) e do tipo N (genótipo LnLn)
nessa população? Considerando que essa população está em equilíbrio de
Hardy-Weinberg, podemos calcular facilmente esses valores utilizando o
binômio de Newton (p+q)2, vejamos:

Considerando que são 1000 indivíduos e que 0,16 são do tipo M (ho-
mozigotos, D), então basta multiplicar o número total de indivíduos pela
sua frequência:

Para calcular o número estimado de heterozigotos procedemos assim:

176
Princípios de Genética de Populações
Aula

Considerando que são 1000 indivíduos e que 0,48 são do tipo MN


(heterozigotos, H), então basta multiplicar o número total de indivíduos
pela frequência de heterozigotos:
10
D=f(LmLn)=0,48x1000=480 indivíduos

Finalmente, para calcular o número esperado de indivíduos homozigo-


tos do tipo N, basta calcular:

R= f(LmLn)=q2
R= f(LmLn)=0,62=0,36

Considerando que são 1000 indivíduos e que 0,48 são do tipo MN


(heterozigotos, H), então basta multiplicar o número total de indivíduos
pela respectiva frequência:

R=f(LmLn)=0,36x1000=360 indivíduos

Portanto:
p2+2pq+q2=1, assim como D+H+R=1
Nesse exemplo:
160M+ 480MN+360N=1000 indivíduos
Também podemos calcular as frequências gênicas quando temos ap-
enas as frequências genotípicas, utilizando o inverso do raciocínio anterior.
Utilizando os resultados da questão anterior, vejamos como conseguimos
chegar às frequências alélicas:

Se considerarmos a frequência do alelo Lm como p e a frequência de Ln


como q, então podemos estimar as frequências alélicas da seguinte forma:

177
Genética Básica

É fácil perceber, portanto que existe uma relação direta entre as


frequências alélicas e genotípicas. De tal modo que sabendo as frequências
genotípicas é possível estimar as frequências alélicas e vice-versa, desde que
a população considerada esteja em equilíbrio de Hardy-Weinberg.
No entanto, algumas vezes não temos como saber a priori as frequências
de todos os genótipos, como é o caso onde existe relação de dominância
entre os alelos em que não é possível diferenciar homozigotos dominantes
de heterozigotos. Nesse caso, temos como saber estimar esses valores partin-
doda frequência do homozigoto recessivo. Para exemplificar essa situação,
vamos imaginar uma população em equilíbrio em que a frequência de indi-
víduos albinos seja de 0,1 (aa=0,1). Nesse caso quais seriam as frequências
alélicas de a e A? e quais seriam as frequências genotípicas de AA e Aa?

Figura 3: Individuo albino em uma população.


(Fonte: http://www.mun.ca/biology/scarr/Albinisim_in_Humans.html).

Então, se sabemos a frequência genotípica do homozigoto recessivo e


sabendo que essa frequência é igual a , basta raciocinar: “como obter q a
partir de q2?”. Caso você tenha pensado na raiz quadrada, é isso mesmo,
então vejamos:

178
Princípios de Genética de Populações
Aula

10
Agora basta seguir o mesmo princípio utilizado anteriormente:
Se
q=001
Então

Sabendo as frequências alélicas podemos calcular facilmente as frequên-


cias genotípicas esperadas pelo equilíbrio de Hardy-Weinberg:

Esses resultados indicam que se essa população tivesse 10.000 in-


divíduos, poderíamos estimar, multiplicando as frequências genotípicas
calculadas pelo total de indivíduos, que de um indivíduo seria albino (aa),
198 indivíduos seriam heterozigotos para albinismo (Aa) e 9801 indivíduos
seriam homozigotos normais (AA).
A figura a seguir ilustra a relação entre frequências gênicas e genotípi-
cas para um locus autossômico com dois alelos em populações diploides;

Figura 4: Equilíbrio de Hardy-Weinberg

179
Genética Básica

Note que quando a frequência alélica no eixo x atinge 0,5 a frequência


de genótipos heterozigotos atinge o ponto máximo. Portanto, populações
em equilíbrio nunca terão taxas de heterozigotos significativamente acima de
50%. Para as frequências de homozigotos (AA e aa) veja que a distribuição
é inversamente proporcional. Quando a frequência de alelos A atinge seu
nível máximo (1,0) a frequência de alelos recessivos é zero. Nesse caso houve
a fixação de alelos A e todos os indivíduos da população teriam genótipo
AA. No outro extremo, temos a situação inversa com a fixação do alelo
recessivo em que todos os indivíduos da população seriam de genótipo aa.
Entre esses dois extremos existem todos os valores possíveis de frequências
alélicas, sempre obedecendo a equação p+q=1 .
Uma grande parte das populações biológicas, as frequências genotípi-
cas na maioria dos loci se adequam muito bem na distribuição de Hardy-
Weinberg. No entanto, o princípio de Hardy-Weinberg apresenta diversos
pressupostos para que seja válido:

PRESSUPOSTOS PARA O PRINCÍPIO DE


HARDY-WEINBERG

1. População Panmítica
São populações de acasalamento ao acaso, ou seja, nesse caso a proba-
bilidade de um determinado alelo participar do processo reprodutivo é uma
questão inerente apenas à sua frequência populacional. Um dos fatores que
alteram esse pressuposto é a endogamia, que está associada ao acasalamento
preferencial entre indivíduos aparentados.
2. População infinita
É impossível que uma população biológica seja efetivamente infinita,
mas populações muito grandes se comportam praticamente como se fossem
infinitas. No entanto, quanto menor for o tamanho efetivo da população,
maior serão os desvios ao acaso em suas frequências gênicas e genotípicas
ao longo do tempo. Esse efeito é consequência da deriva genética, que causa
variações ao acaso (estocásticas) em populações finitas, sendo tanto mais
forte sua influência quanto menor for a população;
3. Que não exista fluxo gênico entre populações
O equilíbrio de Hardy-Weinberg pressupõe que as populações sejam
fechadas, ou seja, que não haja intercâmbio de genes em função da migração.
A saída e/ou entrada de indivíduos, portanto, pode afetar as frequências
genéticas populacionais.
4. Genes não mudam de um estado alélico para outro
Essa alteração é chamada de mutação e está associada a entrada de
variação genética na população, que por consequência alteraria as suas
frequências genéticas;

180
Princípios de Genética de Populações
Aula

5. Todos os indivíduos possuem probabilidades iguais de sobrevivência e/


ou reprodução
Esse pressuposto diz respeito à completa ausência de qualquer tipo
10
de seleção. Caso haja diferença de probabilidade de sobrevivência e/ou
reprodução as frequências dos genótipos e dos alelos podem se alterar ao
longo das gerações.

Caso todos os pressupostos mencionados anteriormente sejam aten-


didos, as frequências gênicas e genotípicas populacionais permanecerão
constantes ao longo do tempo, como afirma o princípio de Hardy-Weinberg.
Imagino que você deva estar pensando a essa altura que esse princípio
de Hardy-Weinberg é extremamente teórico e não possui qualquer apli-
cação prática. Entretanto, esse princípio é verdadeiramente o principal
alicerce para o estudo da genética de populações. Isso é possível porque o
princípio de Hardy-Weinberg permite gerar parâmetros genéticos básicos
de uma população. Numa população ideal que atenda a todos os pressup-
ostos mencionados não existe qualquer influência da evolução e, por isso,
as condições genéticas da população continuariam constantes ao longo do
tempo. Por se tratar de uma super simplificação da realidade, o Principio
de Hardy-Weinberg pode ser considerado como um modelo de referencia
para uma população ideal e quando verificamos se uma população biológica
encontra-se ou não em equilíbrio, isso nos dá uma idéia clara sobre o grau de
influência do processo evolutivo sobre essa população. Portanto, a distância
de uma população ideal em relação a uma população biológica formada
pelos ingredientes da evolução. É importante ressaltar que as suposições
do equilíbrio de Hardy-Weinberg se aplicam a apenas um locus. Nenhuma
população natural se reproduz aleatoriamente para todas as características;
nem a população está livre dos fatores evolutivos para todas as característi-
cas. O princípio de Hardy-Weinberg, portanto não exige que a população
seja panmítica, ausência de seleção, migração, deriva genética e mutações
para todos os loci. Ela exige essa condição apenas para o locus que está
sendo considerado na análise. Uma população pode estar em equilíbrio
para um locus e não para outros.

AVALIAÇÃO DO EQUILÍBRIO POPULACIONAL


Utilizando as informações anteriores é possível agora avançar para as
populações naturais e verificar se tais populações estariam ou não em equilí-
brio de Hardy-Weinberg.Com as frequências alélicas de uma população real
construímos uma população teórica e comparamos as duas distribuições
de frequências genotípicas. Esse passo é fundamental porque a distribuição
teórica tem propriedades matemáticas que nos possibilitam tirar conclusões
de grande importância. Se ao analisarmos a população real se apresentar
estatisticamente semelhante à população teórica, poderemos estender as

181
Genética Básica

conclusões para a população real e compreender seu comportamento


genético. Para compararmos duas populações iniciamos verificando suas
diferenças quanto as frequências genotípicas.
Utilizando novamente como exemplo os grupos sanguíneos do sistema
MN nos seres humanos, vamos considerar os dados de Race e Sanger (1975)
que realizaram amostras de sangue em 1000 ingleses e encontraram:298 M,
489 MN e 213 N. Essa população estaria em equilíbrio de Hardy-Weinberg?
Para responder a essa pergunta precisamos comparar os dados dessa popu-
lação real com os valores que seriam esperados em uma população ideal,
então vejamos:
Fenótipos Genótipos Número observado de Frequências
indivíduos na população real genotípicas esperadas
m m
M L L 298 D=p2
MN LmLn 489 H=2pq
n n
N LL 213 R=q2

A tabela acima resume as informações necessárias para a comparação


entre a população real e a população ideal. A estatística apropriada para
essa comparação é o teste de qui-quadrado, que permite avaliar os desvios
entre frequências observadas (fo) e frequências esperadas (fe). A frequência
esperada é a distribuição de frequências genotípicas da população teórica e
frequência observada é a distribuição de frequências genotípicas da popu-
lação real. A fórmula do qui-quadrado é a seguinte:

Para calcular febasta voltar ao conteúdo anterior que nos ensina a


calcular as frequências alélicas:

Agora sabendo as frequências alélicas, podemos estimar as frequências


esperadas de indivíduos do tipo M:

182
Princípios de Genética de Populações
Aula

Onde fe(M) é a frequência esperada de indivíduos de fenótipo M e é


o número total de indivíduos, então:
10
Para a frequências esperada de indivíduos MN temos:

Logo:

Finalmente, para a frequência esperada de N, temos:

Então, resumindo a tabela anterior:

Aplicando a fórmula de qui-quadrado teremos:

183
Genética Básica

Os resultados desta fórmula são comparados com os resultados de uma


tabela de qui-quadrado de referência, levando-se em conta a margem de
erro considerada no cálculo estatístico (geralmente e o número de graus
de liberdade, que para populações é igual ao número de classes fenotípicas
menos 2 (GL=NC-2). Se o valor do qui-quadrado calculado for menor que
o valor correspondente de qui-quadrado da tabela podemosdizer que as
diferenças entre as duas distribuições não são significativas e podemos con-
siderar que a população real comporta-se como uma população teórica em
equilíbrio. O valor de qui-quadrado de referência, na tabela de qui-quadrado
nesse caso é3,841. Podemos concluir, portanto, que a população estudada
por Race e Sanger está em equilíbrio de Hardy-Weinberg para o locus MN.
Você deve estar se perguntando como é possível que um locus esteja
em equilíbrio numa população humana, já que sabemos que as pessoas de-
finitivamente não escolhem seus parceiros ao acaso. O que ocorre é que as
pessoas de fato escolhem seus parceiros por diversos caracteres fenotípicos,
com altura, peso, cor da pele, nível social, etc. No entanto, ninguém escolhe
o parceiro pelo tipo sanguíneo. Com isso, pelo menos para o locus MN os
acasalamentos são de fato aleatórios nessa população.

CRUZAMENTOS NÃO ALEATÓRIOS

Existem diversos motivos pelos quais o princípio de HW pode ser


afetado em uma população em particular. A não atenção a qualquer um dos
pressupostos mencionados anteriormente podem influenciar na variação
das frequências gênicas e genotípicas ao longo do tempo, como é o caso
dos cruzamentos não aleatórios.
A relação entre as frequências alélicas e genotípicas se desfaz se o cruza-
mento entre os indivíduos da população não ocorre ao acaso. Portanto, um
dos principais fatores que pode afetar o equilíbrio de HW ocorre quando a
população não é panmítica. A endogamia e a reprodução preferencial são
os principais fatores associados aos cruzamentos não aleatórios. A endo-
gamia ocorre quando temos acasalamento entre indivíduos aparentados, o
que aumenta a probabilidade de que os descendentes tenham dois alelos
idênticos por descendência. A endogamia resulta no aumento da frequên-
cia de genótipos homozigotos e redução no número de heterozigotos em
relação ao que seria esperado por acasalamentos aleatórios. O efeito da
endogamia é tanto maior quando mais próximos geneticamente forem os
indivíduos acasalados. Se em uma determinada população o acasalamento
entre indivíduos aparentados for comum, isso resultará na probabilidade de
encontrar um indivíduo que tenha dois alelos idênticos por descendência
quando fazemos uma amostragem aleatória da população. Esta probabili-
dade é chamada de F, ou coeficiente de endogamia. Se voltarmos o suficiente
no tempo, muitos alelos provavelmente serão idênticos por descendência,

184
Princípios de Genética de Populações
Aula

mas, para calcular os efeitos da endogamia consideramos a identidade por


descendência levando em conta apenas algumas gerações. O ponto mais
importante que deve ser observado é que a endogamia altera as frequências
10
genotípicas, mas as frequências gênicas permanecem inalteradas. O coefi-
ciente de endogamia (F) pode variar de 0 a 1. Um valor de 0 indica que a
reprodução em uma população é totalmente aleatória, enquanto um valor
de 1 indica que todos os alelos são idênticos por descendência. Uma das
formas mais fortes de endogamia ocorrem na auto-fecundação, fenômeno
comum em plantas, que reduz em 50% o número de heterozigotos por ge-
ração, até que todos os genótipos na população sejam homozigotos. Para a
maioria das espécies panmíticas, a endogamia é prejudicial porque aumenta
a probabilidade de alelos deletérios e letais recessivos se manifestarem na
população em função do aumento do número de homozigotos.
No caso dos cruzamentos preferenciais, eles ocorrem quando os mem-
bros da população preferem se reproduzir com parceiros fenotipicamente
parecidos (cruzamento preferencial positivo), como exemplo, indivíduos
de estatura alta procuram outros de mesma estatura para se relacionar e
o mesmo pode ocorrer com a cor da pele e outros caracteres fenotípicos.
Apesar de serem diferentes, a endogamia e os cruzamentos preferenciais
positivos resultam no mesmo efeito qualitativo. Elas reduzem a frequência de
heterozigotos e aumentam a frequência de homozigotos em comparação ao
que seria esperado pelo equilíbrio de Hardy-Weinberg. No entanto, também
existem cruzamentos preferenciais negativos onde existe uma tendência de
reprodução entre indivíduos diferentes, o que pode aumentar a frequência
de heterozigotos e reduzir o número de homozigotos.

CONCLUSÃO
Conforme afirmado anteriormente, a evolução pode ser definida de
forma simplificada como a alteração nas frequências genéticas em uma
população ao longo do tempo. Para compreender um cenário onde as
frequências gênicas mudam, é imprescindível que o estudante de biologia
entenda um cenário um pouco mais simples, no qual as frequências genéticas
simplesmente não mudam, sendo essa compreensão a principal contribuição
dessa aula. A genética de populações forma o alicerce básico para o estudo
da evolução e também vem sendo muitíssimo utilizada na área de ecologia
e no estudo de populações humanas e estudos epidemiológicos. Diante do
que foi visto nessa aula, você pode concluir que uma população pode ser
caracterizada geneticamente por suas frequências gênicas e genotípicas e
que tais frequências se ajustam bem ao modelo matemático do binômio de
Newton por meio do princípio de Hardy-Weinberg, que por sua vez nos
fornece um parâmetro básico para reconhecer o grau de influência dos
fatores evolutivos numa população biológica.

185
Genética Básica

RESUMO
A genética de populações estuda a origem da variação, a transmissão
dos genes ao longo das gerações e a dinâmica da mudança na composição
genética das populações ao longo do tempo por ação das forças evolutivas.
A variação é uma propriedade natural das populações biológicas. O reconhe-
cimento da amplitude da variação fenotípica e de sua base hereditária levou
Darwin à idéia da evolução por meio da Seleção Natural.A nossa observação
das espécies em nível fenotípico dá uma dimensão prática da existência
de variação. No entanto, a variação genética é ainda maior que aquela que
pode ser observada na comparação dos fenótipos. Ao nível molecular a
variação existente é ainda maior.A quantidade de variação genética dentro
de populações naturais e a dinâmica das forças limitantes e/ou moldadoras
ao longo do tempo e do espaço formam a base de interesse do geneticista
de populações. A variabilidade genética, portanto, está diretamente rela-
cionada à evolução das espécies e o grau de variabilidade dentro da espécie
afeta diretamente o seu potencial de se adaptar a mudanças ambientais. As
frequências genotípicas populacionais estão relacionadas à forma em que
os alelos estão distribuídos aos pares nos indivíduos que formam a popu-
lação, enquanto a frequência alélica está relacionada à proporção de cópias
gênicas de um determinado tipo alélico numa determinada população. em
1908, Hardy e Weinberg desenvolveram,independentemente, um conceito
matemático relativamente simples, hoje denominado princípio de Hardy-
Weinberg, considerado o fundamento básico da genética de populações.
Esse princípio diz que numa população de reprodução ao acaso, infinita e
na ausência de fatores evolutivos, as frequências alélicas e genotípicas per-
manecem constantes ao longo do tempo. O princípio de Hardy-Weinberg
pode ser utilizado para determinar a frequência de cada alelo de um par
ou de uma série, bem como frequências genotípicas de homozigotos e
heterozigotos na população.

ATIVIDADES
1. Considere essas 5 populações. Calcule as frequências alélicas de cada uma
delas e verifique quais estão em equilíbrio de Hardy-Weinberg utilizando
um teste de qui-quadrado.

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Princípios de Genética de Populações
Aula

a. População 1
AA Aa
320 480 200
aa 10
b. População 2 380 460 160
c. População 3 45 300 665
d. População 4 184 432 384
e. População 5 351 418 230

COMENTÁRIO SOBRE AS ATIVIDADE


1. Para facilitar o seu trabalho, utilize o simulador offline gratuito
que você poderá encontrar no site do Evotutor (nesse link: http://
www.evotutor.org). Na página do Evotutor, que é um simulador para
genética de populações e processos evolutivos, você pode escolher
entrar em “Offlineapplication” para instalar o simulador no seu
computador. Na página você escolherá o sistema operacional da sua
máquina (provavelmente Windows) e fará o download do programa
numa versão compactada (é bem pequeno, 1.3Mb). Basta descompactá-
lo numa pasta do seu computador e executar o arquivo evotutor.bat.
Quando abrir o programa entre em “calculators” na parte de cima da
página e escolha o ítem “Chi-Square”, que é uma calculadora para o
teste de qui-quadrado. Da mesma forma na guia “calculators” você
pode entrar em HW-equilibrium que calcula as frequências esperadas
para o equilíbrio de Hardy-Weinberg. Com essas ferramentas você fará
todos os cálculos rapidamente, mas eu sugiro que você faça ao menos
dois exercícios utilizando as fórmulas estudas na aula para que você
possa obter maior domínio sobre o assunto.

AUTOAVALIAÇÃO
Após estudar esta aula, consigo:
1. Definir o que são frequências alélicas?
2. Definir o que são frequências genotípicas?
3. Definir quais são os pressupostos para que uma população esteja em
equilíbrio de Hardy-Weinberg?
4. Explicar e Justificar ma população em equilíbrio pode ter uma frequência
de heterozigotos maior que 50% no locus analisado? Justifique.

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Genética Básica

5. Explicar se uma população humana de uma determinada localidade


possui 5000 habitantes e desses 10 são albinos (aa), quantos indivíduos
heterozigotos para o albinismo (Aa) seriam esperados nessa população
se considerarmos que esse locus esteja em equilíbrio de Hardy-Weinberg?
6. Definir o que é endogamia e como ela pode afetar as frequências
genotípicas?
7. Definir o que são cruzamentos preferenciais?
8. Explicar quando consideramos que houve fixação de um alelo na popu-
lação e qual a consequência direta disso?

REFERÊNCIAS
GRIFFITS, A. J. F. e Col – Introdução à genética – Editora Guanabara
Koogan, 9a edição, Rio de Janeiro, RJ, 2008.
SNUSTAD, D. P. – Fundamentos à Genética - Editora Guanabara
Koogan, 6a edição, Rio de Janeiro, RJ, 2008.
FUTUYMA, D. Biologia evolutiva – Editora Funpec, 3ª edição, Ribeirão
Preto, SP, 2009

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