Você está na página 1de 116

1

JOACIR ARAUJO MACHADO JUNIOR

O MÉTODO DEMING DE ADMINISTRAÇÃO:


Uma Interpretação e Análise

MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO


1995
2

JOACIR ARAUJO MACHADO JUNIOR

O MÉTODO DEMING DE ADMINISTRAÇÃO:


Uma Interpretação e Análise

Dissertação apresentada à Banca


Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo como requisito parcial
para obtenção do título de MESTRE em
Administração de Empresas, sob a orientação do
Prof. Dr. Fernando Cláudio Prestes Motta.
3

_____________________________________

_____________________________________

_____________________________________
4

SUMÁRIO

O sucesso alcançado pela indústria japonesa, no panorama mundial, tem sido atribuído, entre

outros fatores, às técnicas de controle da qualidade ensinadas pelo Dr. Deming aos
japoneses, desde a década de 50. Este estudo é uma tentativa de interpretar a analisar o que
já se convencionou chamar de "O Método Deming de Administração". Deming desenvolveu

seu método entre os anos 40 e 80, quando atuou como consultor de empresas no Japão. A
metodologia a ser empregada é o Método Comparativo. O estudo procura identificar
semelhanças e diferenças entre o MDA e outras abordagens administrativas com o objetivo

de propor uma categoria em que se classifique o MDA, segundo as semelhanças ou


diferenças encontradas em relação às outras abordagens. Serão analisados também os
aspectos de cultura da qualidade e da ideologia do MDA.

Palavras Chaves: Administração da Qualidade, Qualidade, Método Deming de

Administração, Controle da Qualidade.


5

ii

Agradecimentos

Agradeço todas as pessoas que de algum modo contribuíram para a concepção deste
trabalho. Em especial agradeço ao Prof. Fernando Motta, meu orientador, pela orientação
segura, pelo interesse que dedicou a este trabalho, sem o que ele não se concretizaria. Às
funcionárias da Universidade; Mariza e Shirley, secretárias do Departamento de
Administração de Empresas, agradeço pela solicitude com que atenderam às minhas
demandas e a de outros colegas também, durante nossa vida acadêmica.

Agradeço a meus pais pelo incentivo e a Alice, a quem dedico este trabalho.
6

ii
Índice Geral

INTRODUÇÃO .............................................................................................. 1

CAPÍTULO I ............................................................................................................ 5

Conceitos, Método e Caracterização do Tema.

1.1 - Conceitos .......................................................................................................... 5

1.1.1 - O Conceito de Qualidade ............................................................................... 5


1.1.2 - A Organização Burocrática ............................................................................ 7
1.2 - O Método .......................................................................................................... 9

1.2.1 - A Sociologia da Administração .................................................................... 12


1.3 - Caracterização do Tema .................................................................................. 14
1.3.1 - Objetivo ........................................................................................................ 15

.
CAPÍTULO II .......................................................................................................... 17
O Método Deming da Administração

2.1 - A Organização .....................................................................................,........... 19


2.2 - A Forma de Gestão ......................................................................................... 25

2.2.1 - As Definições Operacionais ......................................................................... 25


2.2.2 - O Ciclo de Shewhart ..................................................................................... 27
2.2.3 - O Controle Estatístico do Processo .............................................................. 31

2.3 - A Liderança de Pessoas .................................................................................. 33


2.4 - Os 14 Princípios de Administração ................................................................ 37
2.5 - As Doenças Fatais .......................................................................................... 44

CAPÍTULO III ....................................................................................................... 47


7

iv

As Abordagens em Administração e o MDA

3.1 - As Abordagens em Administração .................................................................... 50

3.1.1 - A Abordagem Científica ou Clássica ............................................................. 50


3.1.2 - A Abordagem das Relações Humanas ............................................................ 55
3.1.3 - A Abordagem Behaviorista ............................................................................ 59

3.1.4 - A Abordagem Estrutural ou Burocrática ........................................................ 65


3.1.5 - A Abordagem Sistêmica ................................................................................. 66
3.2 - O MDA e as Abordagens em Administração .................................................... 69

CAPÍTULO IV............................................................................................................ 75
Cultura e Ideologia no MDA..

CAPÍTULO V ........................................................................................................... 95
Críticas ao MDA

CONCLUSÃO .......................................................................................................... 101


.

ANEXOS

Nota Biográfica - William Edwards Deming ......................................................... 102

Bibliografia.............................................................................................................. 108
1

INTRODUÇÃO

A economia mundial enfrenta uma crise sem precedentes, a


partir do esgotamento de um modelo econômico-tecnológico que
encontrou seus limites de crescimento. A globalização dos
sistemas produtivos, baseada na divisão internacional do
trabalho, está redefinindo os mercados mundiais e selecionando
as nações líderes destes mercados. Neste cenário, muitas
organizações vêm-se diante de desafios que não raro, ameaçam
sua própria existência.

O interesse deste trabalho é sobre uma das maneiras que


estas organizações têm buscado para enfrentar suas dificuldades
frente esta crise. Estamos nos referindo aos modelos de gestão
baseados no fator qualidade que têm se difundido nesta última
década. O mundo ocidental inicia os anos 80 experimentando
grave crise e nesse momento se buscam alternativas. Os modelos
de gestão baseados no fator qualidade surgem como resposta às
questões do momento.

O objeto desde estudo consiste no que já se convencionou


chamar de o Método Deming de Administração - MDA - um
particular método de gestão empresarial, voltando à busca e
aperfeiçoamento da qualidade, numa abordagem crítica que visa
compreender, interpretar e analisar.

O MDA é o resultado de uma prática vivenciado no Japão do


pós-guerra, derrotado e quase destruído pelo conflito. Ali,
Deming encontrou fértil terreno para experimentar e praticar
2

suas idéias sobre administração. Durante os 30 anos que se


seguiram, o MDA tomou forma, fruto da experiência de Deming
como consultor de empresas naquele país.

Muito se tem escrito sobre este tema, contudo, não há


nesta literatura recursos críticos que permitam uma análise do
tema face a um corpo teórico já sistematizado, o das abordagens
em administração, ou seja, a Teoria Geral as Organizações.

Este estudo tem como objetivo principal identificar no


MDA, características que o diferenciem das práticas
administrativas já vivenciadas em organizações. Esta abordagem
visa dar resposta à afirmativa de Deming e seus seguidores de
que o MDA constitui prática inédita de gestão, não guardando
semelhança com as práticas em uso.

Estruturamos o trabalho em capítulos cujos temas têm por


objetivo assegurar coerência lógica às nossas análises. Assim,
esperamos que a sequência apresentada, contribua para o melhor
entendimento de nossos propósitos. Os capítulos desta
dissertação tratarão basicamente do seguinte:

CAPÍTULO 1 : CONCEITOS, MÉTODO E CARACTERIZAÇÃO DO TEMA.

Neste capítulo estaremos descrevendo detalhadamente o


método a ser empregado, justificando-o inclusive. Ainda neste
capítulo definiremos a terminologia empregada, apresentaremos
um breve resumo conceitual da qualidade, sempre dentro do
enfoque a que nos propomos, ou seja: como forma de gestão de
organizações. Neste capítulo se fará também a delimitação do
objeto, seu escopo e abrangência e a proposição das questões
que pretendemos analisar.

CAPÍTULO 2 : O MÉTODO DEMING DE ADMINISTRAÇÃO


3

Este capítulo visa sistematizar o MDA, pesquisar o


fundamento da proposta de Deming, sua estrutura e a lógica
interna de funcionamento. É importante afirmar, que neste
capítulo estaremos apenas descrevendo o MDA, as análises e
críticas às questões serão apresentadas nos capítulos
seguintes.

CAPÍTULO 3 : AS ABORDAGENS EM ADMINISTRAÇÃO E O MDA.

Neste capítulo estaremos conceituando as diversas


abordagens de análise organizacional, apresentando um breve
histórico e sua evolução. Estaremos descrevendo a Administração
Científica ou Clássica, a Escola de Ralações Humanas, o
Estruturalismo, o Behaviorismo e a abordagem de Sistemas. O
objetivo deste capítulo é avaliar as semelhanças e diferenças
entre o MDA e as abordagens já sistematizadas, para analisarmos
as questões propostas neste trabalho.

CAPÍTULO 4 : CULTURA E IDEOLOGIA NO MDA

O objetivo deste capítulo é analisar o MDA segundo estes


temas - cultura e ideologia - que têm merecido ultimamente, a
atenção de diversos pesquisadores de organizações.
Apresentaremos uma conceituação de cultura e ideologia para
analisarmos o enfoque de uma "cultura da qualidade", que
decorre do aspecto ideológico fundamental do MDA.

CAPÍTULO 5 : CRÍTICAS AO MDA

Guardamos para este capítulo toda a crítica ao MDA. Neste


ponto do trabalho, já teremos observado o MDA sob diversas
perspectivas, o que nos permitirá maior clareza. O MDA
apresenta-se como proposta científica para gerenciamento de
4

organizações. Avaliaremos esta nova onda de "cientificismo",


que oculta o verdadeiro caráter do MDA, que é a conservação do
estado das relações de poder e a alienação nas organizações.
Neste capítulo estaremos analisando as questões propostas no
capítulo I.

Não pretendemos com este trabalho esgotar o assunto,


esperamos sim propor algumas questões que estimulem o debate
acerca destes modismos que infestam a literatura de
organizações e as próprias organizações.

--ooOoo--
5

CAPÍTULO I

CONCEITOS, MÉTODO E CARACTERIZAÇÃO DO TEMA.

1.1 - CONCEITOS

Neste capítulo estaremos apresentando conceitos sobre os


quais estaremos conduzindo nossas análises. Conceituaremos os
modelos de gestão pela qualidade, buscando uma abordagem ampla
que transcenda o que rotineiramente se entende pelo tema.
Analisaremos também modernos conceitos para as organizações
burocráticas. Em seguida apresentaremos o método com qual
pretendemos atingir nosso objetivo e finalmente, discutiremos
nossos objetivos.

1.1.1 - O Conceito de Qualidade

A partir da década de 80, uma nova palavra passou ao


jargão de administradores e executivos. Este conceito trouxe
consigo uma nova abordagem de gerenciamento, a gestão pelo
fator qualidade, qualidade total ou simplesmente, qualidade.
Não obstante a uma definição mais eclética, qualidade1 passou a
significar um estilo da administrar organizações.

Campos afirma que “é um sistema administrativo


aperfeiçoado no Japão, a partir de idéias americanas ali
introduzidas logo após a segunda Guerra Mundial. Este sistema é

1 “Característica de alguém ou algo; propriedade; caráter essencial ou natural; excelência; superioridade;


atributo; predicado; espécie; casta; título que habilita a exercer uma profissão, a praticar uns tantos atos;
natureza; aptidão; condições próprias de uma coisa;(..)”, In: NASCENTES, A., Dicionário da Língua
Portuguesa, Bloch Editores, Rio de Janeiro, 1988, p. 523.
6

conhecido no Japão pela sigla TQC - Total Quality Control


,(...). Hoje são necessários métodos que possam ser utilizados
por todos em direção aos objetivos de sobrevivência da
empresa.”2

Para Ishikawa qualidade total “é uma revolução da própria


filosofia administrativa, o que exige uma mudança de
mentalidade de todos os integrantes da companhia”3. Mais
adiante, Ishikawa especifica este sistema, como “o
desenvolvimento, projeto, produção e assistência de um produto
ou serviço que seja o mais econômico e o mais útil,
proporcionando satisfação ao usuário.”4

Toledo5 é um autor que tem se ocupado de forma contínua


sobre este tema. Sua preocupação é o completo entendimento
deste movimento que está tomando as organizações.

Para este autor, “existe pouco entendimento sobre o que é


qualidade. Os próprios teóricos da área reconhecem a
dificuldade de se definir, precisamente, o que seja o atributo
qualidade.(...) Não existe o que se poderia chamar de uma
teoria da Qualidade, ou seja, um conjunto de conhecimentos que
explique pôr que muda e como muda a qualidade, como se dão os
saltos em qualidade.”6

Toledo identifica em seu trabalho a crescente competição


entre organizações econômicas por mercados de consumo em
retração e exigentes, levando as organizações a buscarem
estratégias e formas de superarem estas dificuldades. Este

2 CAMPOS, V. F., Controle da Qualidade Total, Rio de Janeiro, Fundação Christiano Otoni, 1992, p. 13-15.
3 ISHIKAWA, K., Total Quality Control: Estratégia e Administração da Qualidade, IM & C International, São
Paulo, 1986, p. 35.
4 Idem, Ibdem, p. 42.
5 TOLEDO, J. C. De, Qualidade, Estrutura de Mercado e Mudança Tecnológica, Revista de Administração de
Empresas, São Paulo, vol. 30, nº 3, Jul./Set. 1990, p. 33-45.
7

autor aponta duas vertentes para esta busca. Primeiro, a


organização busca diferenciar-se no mercado em que atua,
adotando um modelo de gestão pela qualidade como estratégia
mercadológica. Segundo, adotando técnicas que conduzam a uma
drástica redução de custos; os modelos de gestão pela qualidade
atendem a este requisito.7

Decorre, como afirma Toledo, que existe pouco consenso do


que seja realmente uma definição para modelos de gestão pela
qualidade. Não obstante, neste trabalho estaremos conceituando
modelos de gestão pela qualidade como um modelo para gestão de
organizações burocráticas, composto por um conjunto de técnicas
e preceitos cujos objetivos são: preservar a existência da
organização, diferenciando-a de suas concorrentes; elevar os
níveis de produtividade; reduzir custos e diminuir os níveis de
incerteza acerca do futuro da organização. Não estaremos, neste
trabalho, abordando a origem destes modelos; é pressuposto
básico que eles já estão consolidados suficientemente.

1.1.2 - A Organização Burocrática

A sociedade moderna é inviável sem as organizações


burocráticas. Elas permeiam de tal forma a vida cotidiana, que
indivíduos menos atentos podem tomá-las como o fim em si dos
atos da vida e não como o meio destes atos. Nem sempre foi
assim, segundo Tragtenberg a burocracia consolida-se como poder
dominante nos antigos estados asiáticos, por volta do século
XIX A.C., quando prementes necessidades de controle e
administração dos meios produtivos se impõe. Para o autor,
desde aquela época, “a burocracia confunde-se com o Estado, é

6 Idem, Ibdem, p.34.


7 Idem, Ibdem, p 40-41.
8

composta pelos militares, elite intelectual e funcionários


públicos”8.

Embora a burocracia seja milenar, seu estudo metódico não


o é. Bresser Pereira & Motta apontam Max Weber como seu
primeiro estudioso. Não obstante, segundo os autores, Weber não
ocupou-se em definir uma organização burocrática, “preferiu
conceituá-la através da extensa enumeração de suas
características”9. Estaremos nos aprofundando na obra de Weber
no capítulo III, quando discutirmos as diversas abordagens
administrativas; por ora nos interessa um conceito formal de
organização burocrática.

Antes porém, de formalizarmos este conceito, cabe uma


análise da origem do termo burocracia. Segundo Lakatos10, o
termo francês do século XII bureau referia-se a um “pano
grosso de lã”, que se usava para cobrir mesas. Da denominação
do tecido de lã com que se forrava as mesas, passou-se para a
própria “mesa de escrever” no século XV. Já no século XVII
bureau estava significando “local de trabalho de quem
desenvolve atividade profissional em mesas”. É no século
seguinte, que Jean-Claude Marie Vicente, economista francês,
cria o hibridismo bureaucratie, juntando ao bureau a base
krátia, “poder, autoridade, lei” do grego kratós, “força,
domínio, poderio”.11

Modernamente, o termo burocracia passou a significar mais


do que poder ou dominação se determinados indivíduos. Para
Bresser Pereira & Motta, burocracia ou organização burocrática

8 TRAGTENBERG, M., Burocracia e Ideologia, Editora Atlas, São Paulo, 1974, p. 28.
9 BRESSER PEREIRA, L.C. & MOTTA, F.C.P., Introdução a Organização Burocrática, Editora Brasiliense,
São Paulo, 1986, p. 20.
10 LAKATOS, E.M., A Abordagem Burocrática e Outras Visões da Estrutura Organizacional, Revista IMES,
São Bernardo do Campo, s/d.
11 Idem, Ibdem, p.25.
9

é “um sistema social racional, ou um sistema social em que a


divisão do trabalho é racionalmente realizada tendo em vista os
fins visados.”12

A peculiaridade desta definição reside no aspecto que


fundamentalmente difere a organização burocrática de outros
tipos de organizações, a racionalidade; ou seja, qualquer
sistema social com fins determinados constitui uma organização;
entretanto, a racionalidade caracteriza a organização
burocrática. Por racionalidade os autores identificam a “crença
ilimitada na razão humana.”13. Portanto, para os autores, uma
adequada definição de organização burocrática será: “O sistema
social em que a divisão do trabalho é sistemática e
coerentemente realizada, tendo em vista os fins visados.”14.
Adotaremos para este trabalho esta última definição.

1.2 - O MÉTODO

A clara definição do método a ser empregado é o principal


fator de sucesso para uma pesquisa. Sem um adequado método, o
trabalho perde sua relevância científica.

Nagel distingue Ciência de senso comum, pelo fato de que


“a Ciência tem com sinal distintivo o de tentar deliberadamente
alcançar resultados total ou parcialmente livres das limitações
do senso comum.”15 Este Autor propõe uma abordagem para o
método científico como “um conjunto de normas-padrão que devem
ser satisfeitas caso se deseje que a pesquisa seja tida por

12 BRESSER PEREIRA & MOTTA, Op. Cit. p.21.


13 Idem, Ibdem, p. 22.
14 Idem, Ibdem, p. 23.
15 NAGEL, E., Ciência: Natureza e Objetivos, In: MORGENBESSER, S., org., Filosofia da Ciência, Editora
Cultrix, São Paulo, 1975, p. 16.
10

adequadamente conduzida e capaz de levar a conclusões


merecedoras de adesão racional.”16

Partilhamos deste conceito e o adotaremos para conduzir


nossa pesquisa. Estamos em busca de uma concepção metódica que
nos oriente a apreender nosso objeto de estudo, o Método Deming
de Administração - MDA.

Se lançarmos mão de uma metáfora, para melhor


descrevermos o objetivo de nosso estudo, esta será a do
trabalho do botânico. Este pesquisador, no intuito de
compreender seu objeto de estudo - as plantas - as disseca em
suas partes componentes; raízes, caule, folhas, frutos e
sementes. Em seguida, compara estas partes com espécimes já
sistematicamente estudadas, para obter uma classificação para
cada nova espécie.

Este é, grosso modo, nosso objetivo. Pretendemos, a


exemplo do botânico, apartar os elementos componentes de nosso
objeto - o MDA - e compará-los a abordagens e métodos
administrativos já exaustivamente estudados.

Esta concepção nos levou, formalmente, ao Método


Comparativo e o adotaremos para condução deste trabalho, como
proposto por Lakatos & Marconi17. Estes autores abordam a
questão do método científico do ponto de vista das Ciências
Sociais, o que nos parece muito adequado para nosso estudo;
compreender certos fenômenos sociais, as organizações
burocráticas.

“Considerando que o estudo das semelhanças e diferenças


entre diversos tipos de grupos, sociedades ou povos, contribui

16 Idem, Ibdem, p. 80.


17 LAKATOS, E.M. & MARCONI, M. De A., Metodologia Científica, Editora Atlas, São Paulo, 1986.
11

para melhor compreensão do comportamento humano; este método


realiza comparações com a finalidade de verificar similitudes e
explicar divergências. O método comparativo é usado tanto para
comparações de grupos no presente, no passado, ou entre os
existentes e os do passado, quanto entre sociedades de iguais
ou de diferentes estágios de desenvolvimento.”18

Este método fundamenta-se na explicação dos fenômenos


estudados a partir do conhecimento de fenômenos similares,
permitindo identificação de suas singularidades e propiciando a
oportunidade de classificação do objeto de estudo em categorias
existentes ou inéditas.

Esta é a empreitada a que nos propomos neste trabalho.


Comparar nosso objeto de estudo com abordagens administrativas
já suficientemente analisadas, com o objetivo de obter
respostas a questões que serão propostas a seguir - em outro
item deste capítulo - e também procurar uma classificação de
nosso objeto, quer em abordagens já sistematizadas ou em uma
abordagem inédita.

1.2.1 - A Sociologia da Administração

Consideramos apropriado abordar nosso objeto segundo o


ponto de vista de uma Sociologia Especial da Administração.
Esta sociologia foi, ainda que rudimentarmente, proposta por
Guerreiro Ramos19. Esta sociologia será o instrumento com o
qual estaremos apartando nosso objeto em elementos, os quais
estaremos comparando com diversas abordagens administrativas,
concretizando assim nosso propósito metodológico.

18 Idem, Ibdem, p. 80.


19 GUERREIRO RAMOS, A., Administração e Contexto Brasileiro, Editora da Fundação Getúlio Vargas, Rio
de Janeiro, 1983.
12

Este autor sustenta que “a Administração também tem sua


sociologia especial, como o fenômeno jurídico, o religioso, o
artístico e o econômico”20 e acrescenta “ tal disciplina é a
parte da sociologia geral que estuda a realidade social da
administração, suas expressões exteriormente observáveis como
fato, sistema e ação, sua tipologia qualitativa historicamente
condicionada, seus elementos componentes.”21

Para construir sua sociologia, o autor baseando-se no


fato social de Durkheim, propõe o fato administrativo, como o
“complexo de elementos e de suas relações entre si, resultante
e condicionante da ação de diversas pessoas, escalonados em
diferentes níveis de decisão, no desempenho de funções que
limitam e orientam atividades humanas associadas, tendo em
vista objetivos sistematicamente estabelecidos.”22

Entendemos que esta definição para o fato administrativo


completa a de organização burocrática que adotamos
anteriormente, uma vez que o fato administrativo avança no
esclarecimento da organização burocrática.

Passaremos a descrição dos elementos do fato


administrativo, como enumerados por Guerreiro Ramos. São estes
elementos que nos permitirão analisar nosso objeto de estudo o
MDA.
O fato administrativo é composto por três ordens de
elementos, a saber: aestruturais, estruturais e estruturantes:

1 - Elementos Aestruturais são os elementos fundamentais


sobre os quais atua a ação administrativa, são instáveis e

20 Idem, Ibdem, p. 2.
21 Idem, Ibdem, p. 3.
22 Idem, Ibdem, p. 7.
13

encontram-se em contínua variação, demandando contínua


interferência. Entre os elementos aestruturais estão:
1.1 - A morfologia material do fato administrativo, as
instalações, as máquinas e equipamentos, ferramentas e insumos.
1.2 - A força de trabalho, o conjunto de indivíduos,
enquanto que despojados de seus caracteres de personalidade.
1.3 - A atitudes individuais e coletivas, em razão das
preferências e necessidades individuais, suscitando diferentes
matizes de lealdade, hostilidade nas relações de trabalho.

2. - Elementos Estruturais, que dão forma aos elementos


aestruturais, que os combinam, formando com eles um sistema
coerente. Podem ser internos ou externos à situação
administrativa.
2.1 - Elementos configurativos internos, são a estrutura
organizacional, que determina as linhas de autoridade, as
competências, as hierarquias.
2.2 - Elementos configurativos externos de 1º grau, são
os sindicatos, as classes sociais. A situação administrativa
encontra-se em permanente influência destes elementos.
2.3 - Elementos configurativos externos de 2º grau, a
sociedade, a nação, no âmbito mais transcendente, onde se
verificam as relações sociais características de determinada
coletividade humana.
2.4 - Elementos configurativos externos de 3º grau, a
sociedade mundial; o mundo é hoje pela primeira vez na história
humana, categoria social.

3 - Elementos Estruturantes, são elementos dinâmicos,


intervencionistas, pois articulam os elementos aestruturais e
estruturais entre si, assegurando assim a forma da organização.
As decisões são os elementos estruturantes.23
14

1.3 - CARACTERIZAÇÃO DO TEMA

Os modelos de gestão pela qualidade, como os conceituamos


em tópico anterior deste capítulo, encontram-se em um momento
de afirmação. Como vimos em Toledo, não há, até o presente
momento, um modelo teórico formalizado. O que se observa é o
trabalho de alguns pioneiros. Um de nossos objetivos é
estimular esta discussão, através da tentativa de uma leitura
científica de um particular destes modelos.

Na pesquisa bibliográfica que empreendemos, identificamos


os seguintes autores; Philip B. Crosby, W. Edwards Deming,
Armand V. Feigenbaum, Kaoru Ishikawa e Joseph Juran como os
fundadores e divulgadores do movimento pela qualidade. Nosso
objeto de estudo é o que já se convencionou chamar, O Método
Deming de Administração - MDA - um particular modelo de gestão
pela Qualidade.

Deming ocupou-se em formalizar seu método em publicação


somente em 1982, quando publica pelo Massachusetts Institute of
Tecnology, o Out of Crisis24. Neste livro Deming consolida
todos os seus preceitos sobre administração e lança a base de
sua filosofia. Estaremos abordando a MDA como apresentado neste
livro. Estaremos nos valendo também de livros e artigos de
colaboradores diretos de Deming, sempre que estes trabalhos
puderem completar e estender os preceitos de Deming. No
apêndice deste trabalho, anexamos uma pequena nota biográfica
de Deming.

23 Modificado de Guerreiro Ramos, Op. Cit. P. 9-12.


24 A tradução em língua portuguesa do Out of Crisis foi pela Marques-Saraiva Editora, sob o título: Qualidade:
A Revolução da Administração, em 1990.
15

1.3.1 - Objetivo

Este estudo é uma tentativa de interpretar e analisar


o MDA, baseado no que Deming considera a base de sua filosofia,
seus princípios de Administração. Estaremos neste trabalho
buscando resposta a algumas questões; relacionadas entre si.
Primeiro, analisaremos a questão: É o MDA inédito em relação a
abordagens administrativas já sistematizadas ? Estaremos
analisando esta questão no âmbito das seguintes abordagens:
Científica ou Clássica, Relações Humanas, Behaviorista,
Estrutural ou Burocrática e Sistêmica.

Em segundo lugar, e de acordo com o resultado da primeira


questão, estaremos analisando a perspectiva de se classificar o
MDA. Se inédito, buscaremos uma nova categoria em abordagem de
administração para o MDA. Se não for considerado inédito,
estaremos então propondo uma classificação para o MDA, em uma
das categorias referenciadas acima, aquela com a qual o MDA
apresente maior afinidade.

Em seguida analisaremos a questão do âmbito e relevância


do MDA; isto é, analisaremos o momento histórico de que o MDA é
fruto, as questões que ele pretende resolver e sua inserção no
contexto atual.

--ooOoo--
16

CAPÍTULO II

O MÉTODO DEMING DE ADMINISTRAÇÃO

Neste capítulo estaremos apresentando uma descrição


detalhada do Método Deming de Administração, o MDA. O objetivo
é expor de forma organizada e dinâmica a proposta de Deming
para a gestão de organizações. Não caberá neste capítulo
qualquer enfoque crítico, esta tarefa será empreendida no
capítulo 5, quando já tivermos observado o MDA sob diversos
enfoques.

O objeto de estudo, o MDA será tomado como apresentado


por Deming em sua obra “Qualidade: A Revolução da
Administração”1. Para Deming este livro sintetiza toda a sua
proposta e é tido como um clássico do gênero na literatura.
Contudo, outros autores foram também pesquisados, sempre no
intuito de melhor apreender o MDA. Foram selecionados autores
cujos trabalhos são autorizados por Deming, que assina o
prefácio de todos. São os seguintes autores a quem estaremos
também nos referindo: Scholtes 2, Scherkenbach 3, Walton 4, e
Mann 5. Sobre o trabalho de Scherkenbach, por exemplo, Deming
comenta: “Para começar, seu livro suplementa e aperfeiçoa meus

1 DEMING, W.E. Qualidade: A Revolução da Administração, Rio de Janeiro, Editora Marques Saraiva, 1990. O
título original desta obra, publicada inicialmente em inglês é Out of Crisis, o título em português deve-se ao
editor.
2 SCHOLTES, P. R. Times da Qualidade, Rio de Janeiro, Qualitymark Editora, 1990
3 SCHERKENBACH, W. W. O Caminho de Deming para a Qualidade e Produtividade, Rio de Janeiro,
Qualitymark Editora, 1990.
4 WALTON, M. O Método Deming de Administração, Rio de Janeiro, Marques Saraiva Editora, 1989.
5 MANN, N. R. Deming: As Chaves da Excelência, Makron Books do Brasil Editora, 1992.
17

próprios trabalhos e ensinamentos “ 6. Assim, sempre que


necessário, estaremos recorrendo a estes autores para
completar o entendimento do nosso objeto de estudo, o MDA.

Para facilitar nossa pesquisa, direcionar o objetivo


deste capítulo e também atender ao requisito metodológico,
estaremos nos inspirando no trabalho de Guerreiro Ramos7.
Interessa-nos deste autor, a abordagem do fenômeno da
administração com fato e sistema8. Estaremos descrevendo o MDA
em categorias, que nos permitirão compreendê-lo como um fato e
sistema administrativos. Estaremos assim, apresentado
inicialmente o entendimento de Deming sobre a organização e
seu meio ambiente, em seguida apresentaremos a forma de gestão
e o estilo de decisão pelo MDA, depois descreveremos a visão
de Deming sobre as pessoas enquanto participante de uma
organização e sua relação com ela. Finalmente, apresentaremos
o que Deming considera o substrato mais refinado de seu
método, os “ 14 Princípios de Administração” e sua proposta
para diagnóstico organizacional, as “Doenças Fatais”.

A nosso ver, estas categorias satisfazem os requisitos


propostos por Guerreiro Ramos para o fato administrativo. E a
interação destas categorias é que irão caracterizar o MDA com
fato e sistema administrativo.

Antes de prosseguirmos na descrição do nosso objeto de


estudo, são necessárias algumas considerações acerca de sua
origem. Segundo Walton 9, Deming foi elaborando seu método ao
longo de sua carreira profissional, como consultor de
aplicações estatística para a indústria. Deming pode por em

6 DEMING, in: Scherkenbach, Op. Cit. Prefácio.


7 GUERREIRO RAMOS, A. Administração e Contexto Brasileiro, Rio de Janeiro, Instituto de Documentação
Editora da FGV, 1983.
8 Idem, Ibdem, p. 3.
18

prática suas idéias no Japão do pós-guerra. “ Já tinha novos


princípios a serem ensinados quando os japoneses o chamaram em
1950“10. “Os fundamentos desta filosofia consistem nas idéias
básicas originalmente ensinadas aos japoneses na década de
1950. Ela envolve, é claro, qualidade como evidente meta
principal, e da forma como existe atualmente, também leva em
conta a necessidade de se eliminar obstáculo que se interpõem
a um aumento da qualidade e da produtividade,...”11.

2.1 - A Organização

Para Deming a organização existe com um único propósito:


Servir seus clientes. Processos e serviços estão interligados
e se influenciam mutuamente. Uma organização deve melhorar
constantemente esses sistemas para superar as necessidades de
seus clientes 12. Seus princípios de administração “...
aplicam-se indistintamente a organizações grandes e pequenas,
tanto na industria de serviços quanto na de transformação.
Aplicam-se igualmente a qualquer divisão de uma empresa” 13.

No setor de serviços públicos há também fértil ambiente


para a gestão pelo MDA. “ Na maioria das repartições públicas
não há um mercado a ser buscado. Ao invés de conquistar um
mercado, uma agência governamental deveria prestar, de forma
econômica, o serviço prescrito pela lei vigente. O objetivo
deveria ser destacar-se pelo serviço bem prestado. Um

9 WALTON, Op. Cit.


10 Idem, Ibdem, p. 35.
11 MANN, Op. Cit. p. 26.
12 SCHOLTES, Op. Cit. p. 2-3.
13 DEMING, Op. Cit. p. 18.
19

aperfeiçoamento contínuo do serviço público mereceria a


aprovação do público... “ 14

Deming pretende portanto levar sua proposta a todo tipo


de organização, qualquer que seja seu tamanho, do setor
público ou privado, de transformação ou serviços. Enquadram-se
neste perfil, indústrias de manufatura, bancos, hospitais,
universidades e escolas, clubes, etc.15

O foco da organização deve ser o cliente, ele é a razão


do existir da organização e deve orientar toda sua concepção.
Torna-se fundamental compreender os clientes e suas
necessidades. “ Os produtos colocados no mercado hoje não
devem limitar-se a atrair clientes e vendas, devem permanecer
em serviço.”16

Deming sustenta que o cliente é parte integrante da linha


de produção. “ O consumidor é o elo mais importante da linha
de produção. A qualidade deve visar as necessidades do
consumidor, tanto atuais como futuras.”17. Esta visão é
relevante para o contexto do MDA e está representada pela
figura abaixo. A figura adquiriu tal importância no MDA e tem
sido sistematicamente divulgada como fundamental para sua
compreensão.

CUSTOS DIMINUEM, GRAÇAS AO


MELHOR MENOR RETRABALHO, MENOS ERROS MAIOR
QUALIDADE MELHOR USO DE TEMPO/MÁQUINA E PRODUTIVIDADE
INSUMOS

CAPTAÇÃO DE MERCADOS MANUTENÇÃO AMPLIAÇÃO DO


COM MELHOR QUALIDADE E DOS NEGÓCIOS MERCADO DE
PREÇOS MENORES TRABALHO

14 Idem, Ibdem, p. 5.
15 Idem, Ibdem, p. 147-148.
16 Idem, Ibdem, p. 126.
20

Figura Nº 1: A reação em cadeia, que levará a organização a manter-se no seu


mercado de atuação, aumentando seu lucro e gerando novos empregos.

Neste quadro Deming sintetiza sua visão da organização. “


A produção vista como sistema. A melhora da qualidade abrange
toda a linha de produção, desde os insumos até o consumidor,
bem como a revisão do projeto do produto ou serviço para o
futuro.”18

A adoção do MDA como estilo de gestão, sintetizada no


fluxo apresentado acima, leva a organização a realizar com
melhor qualidade seus produtos e serviços, diminuindo assim os
custos, através do menor retrabalho e conseqüente aumento da
produtividade. Esta situação alçará a organização a uma
posição privilegiada no segmento de mercado em que atua. Para
Deming esta cadeia de eventos leva a organização a manter-se
no seu negócio, expandindo seu mercado e gerando empregos. A
figura abaixo ilustra esta relação em cadeia.

17 Idem, Ibdem, p. 4.
18 Idem, Ibdem, p. 3.
21

PROJETO E PESQUISA DE
REPROJETO MERCADO
FORNECEDORES DE
INSUMOS E
EQUIPAMENTOS

RECEPÇÃO
E TESTE DOS
INSUMOS CONSUMIDORES

PRODUÇÃO
MONTAGEM
A INSPEÇÃO E
DISTRIBUIÇÃO

TESTE DOS PROCESSOS,


DAS MÁQUINAS, DOS MÉTODOS,
DOS CUSTOS

Figura Nº 2: A Produção vista como sistema. A melhora da Qualidade abrange


toda a linha de produção, desde os insumos até o consumidor, bem com a revisão do
projeto do produto/serviço para a futuro.

Esta figura evidencia a abordagem sistêmica para a


organização que Deming propõem. Ele a vê com um processador,
que recebe, de um lado, insumos; os transforma (em produtos ou
serviços) e entrega ao cliente. Decorre deste conceito a noção
de processo como um sistema aberto, onde toda etapa de
produção é cercada de um lado pelo fornecedor e de outro, o
cliente. Deste modo, a organização é o agrupamento de
processos e etapas, sucessivas, orientada para a satisfação
das necessidades do cliente.

Deming sugere uma estrutura organizacional a ser adotada


pelas organizações que pretendem seguir seu método. Esta
estrutura faz-se necessária pois “o problema central da
administração, da liderança e da produção, (...) é não
compreender a natureza da variação e saber interpretá-la.
(...) Esforços para a melhoria da qualidade e da
produtividade, estão fragmentadas, sem nenhuma diretriz geral
22

adequada, nenhum sistema integrado para o aperfeiçoamento


contínuo”19.

Assim, para Deming, deve haver na organização, “um líder


em metodologia estatística, que se reporte à direção. (...)
Ele terá permissão, concedida pelo topo da hierarquia, de
participar de qualquer atividade, que a seu ver seja benéfica
para a empresa.”20

As qualificações que este líder deve possuir, são


enumeradas por Deming: “ 1) o equivalente ao mestrado em
teoria estatística, 2) experiência na indústria ou no governo,
3) autor de trabalhos publicados sobre a teoria e prática da
estatística e 4) demonstre habilidade para ensinar e para
conduzir a direção pela trilha de uma constante melhoria da
qualidade e produtividade”21 A organização voltada à gestão
pela qualidade e seu líder de metodologia estatística estão
representados na figura a seguir.

19 Idem, Ibdem, p. 336


20 Idem, Ibdem, p. 337
21 Idem, Ibdem, p. 337
23

PRESIDENTE

STAFF DO LÍDER EM
MÉTODOS
PRESIDENTE
ESTATÍSTICOS

DEPTO DE
FÁBRICA 1 FÁBRICA 2 MONTAGEM
COMPRAS

VENDAS E PROJETO DE PESQUISA COM


DISTRIBUIÇÃO
SERVIÇOS PRODUTOS CONSUMIDOR

FINANÇAS E DEPTO DE DEPTO ASSISTÊNCIA A


CONTABILIDADE PESSOAL JURÍDICO FORNECEDORES

Figura Nº 3 : Esquema organizacional para a Qualidade e Produtividade. Este


organograma serve a qualquer organização, com as devidas adaptações. Este tipo de
organização, voltada para a Qualidade, teve sua origem no Bureau of the Census, nos
EUA, por volta de 1940, quando Deming ocupou a posição de Líder em Métodos
Estatísticos.
24

2.2 - A Forma de Gestão

O MDA como forma de gestão está fundamentado sobre três


aspectos que lhe dão conteúdo e identidade. São eles:
Definições Operacionais, o Ciclo de Shewhart e o Controle
Estatístico de Processo 22. Estes elementos dão a estrutura do
MDA e este, descaracteriza-se na ausência destes elementos.

O MDA é um estilo de gestão científico, por que está


baseado em fatos, dados e sua prática é metódica. “A única
finalidade da coleta de dados ou da realização de uma
experiência ou teste é formar a base de um prognóstico
racional”23, e portanto científico.

2.2.1 - As Definições Operacionais

Segundo Deming, “o significado de algo começa com o seu


conceito, o qual está na mente de alguém e apenas ali; é
inefável.”24. Qualquer ação ou ato caracteriza-se
necessariamente por um significado, um sentido. “A definição
Operacional confere significado comunicável a um conceito.”25 É
através da definição operacional que todos têm a mesma
compreensão acerca dos conceitos.

Uma organização é feita de definições operacionais. São


elas que permitem a todos compartilhar do mesmo entendimento
das coisas. Quando as pessoas se apresentam à organização para
a jornada de trabalho, estão partilhando de definições

22 O ciclo de Shewhart, assim como o Controle Estatístico de Processo, foram inicialmente propostos por Walter
Shewhart. Coube a Deming sua sistematização e divulgação sob a forma de um estilo de gestão organizacional.
23SCHERKENBACH, Op. Cit. p. 34.
24 DEMING, Op. Cit. p. 206.
25

operacionais de pertencer ou fazer parte da organização, e que


a jornada inicia-se, por exemplo, às 8 horas e encerra-se às
17 horas.

As definições operacionais têm sua máxima expressão nas


normas e regulamentos, nas especificações de engenharia e nas
clausulas de contratos. Deste modo, pode-se julgar se um
produto atende aos requisitos que se espera dele, se está de
acordo com suas especificações técnicas ou ainda, se um
serviço foi prestado conforme prescrito em contrato. As
definições operacionais determinam os parâmetros de um
processo ou procedimento, faz com que tenham o mesmo sentido
ou significado para todos os envolvidos. “ Um procedimento
preferido se distingue pelo fato de que supostamente dá ou
deveria dar, resultados o mais próximo possível daquilo que é
necessário para uma finalidade específica.”26

A Definição Operacional é a base de todas as relações na


organização. Um funcionário sabe que deve obediência a seu
superior porque isto foi posto como norma. A execução das
tarefas e atividades dentro da organização estão, ou deveriam
estar, regulamentadas e estabelecidas em definições
operacionais. Deming sintetiza a definição operacional como
“aquela através da qual os homens possam fazer negócios”27.

25 Idem, Ibdem, p. 206.


26 Idem, Ibdem, p. 209.
27 Idem, Ibdem, p. 205.
26

2.2.2 - O Ciclo de Shewhart

A contribuição de Walter Shewhart28 foi fundamental para


o desenvolvimento do MDA. É o aspecto que caracteriza
plenamente a abordagem de Deming e que a distingue com estilo
de gestão. Deming baseia todo o seu método neste ciclo; um
instrumento na verdade, e suas demais características e
instrumentos ( que estaremos descrevendo mais adiante ) são
decorrência e complemento deste ciclo, constituindo assim uma
forma integrada de gestão.

Deming apresenta o ciclo de Shewhart ou ciclo PDCA29 como


é também conhecido, em contrapartida ao que chama de “a
maneira antiga de gerenciar”. Antes da era indústrial, o
artesão conhecia seus clientes pelo nome. Com a expansão da
indústria perdeu-se este toque pessoal. Surgiram os
atacadistas e intermediários, que na verdade criaram uma
barreira entre o fabricante e o consumidor final. Os
fabricantes costumavam ver então três etapas no processo de
fabricação.

1 2 3

projeto o faça-o tente vendê-lo


produto

Este antigo modo gerencial apresenta problemas na etapa


3, quando o cliente rejeita os produtos por questões de
Qualidade e projeto. Na maneira “nova” a administração

28 SHEWHART, W. Statistical Method from the Viewpoint of Quality Control, Washington, Department of
Agriculture, 1939; Dover, 1985 in: DEMING, Op. Cit. p. 66.
29 Ciclo PDCA, em inglês: Plan, Do, Check, Act.
27

introduz, com o auxílio de técnicas de pesquisa de mercado,


uma quarta etapa, e passa a vê-las como um ciclo.

4 - Act 1 Plan

3 - Check 2 - Do

Figura Nº 4: O Ciclo de Shewhart

Deming estende o ciclo de Shewhart, inserindo novos


elementos:

4 - Teste-o em 1 - Projete o
serviço, Produto
descubra o
que o cliente
precisa dele

2 - Faça-o, teste-o em
3 - Coloque-o laboratório e na
no Mercado Produção

Figura Nº 5: O Ciclo de Shewhart sugerido por Deming para a administração


de organizações. Embora referindo-se a um provável produto manufaturado, Deming
assegura que este Ciclo é aplicável a qualquer organização, de qualquer ramo de
atividades.

A continuidade das 4 etapas levam a uma espiral de


melhora constante da satisfação do consumidor. A melhora da
qualidade, via satisfação das necessidades do cliente,
orientada pela pesquisa de mercado; gera, com resultado final,
não apenas melhor qualidade, mas, custos mais baixos e melhor
posição na concorrência.
28

“No ciclo de Shewhart, o motivo para estudar os


resultados de cada mudança é o de procurar verificar como
melhorar o produto amanhã, ... Evidentemente, os resultados
podem vir a indicar que nenhuma alteração deve ser feita, pelo
menos no momento.”30

Outros autores apresentam versões mais refinadas do ciclo


de Shewhart, sem contudo desfigurá-lo. Em Scherkenbach31, “o
processo de melhoria contínua move-se em espiral em direção a
um cliente-alvo,...O ciclo Deming32 é um procedimento para
melhoria de problemas analíticos ou identificar oportunidades.

4 - Agir sobre a 1 - Reconheça a


oportunidade oportunidade

3 - Observe os 2 - Teste a Teoria


resultados do para criar a
teste oportunidade

Figura Nº 6: O Ciclo de Shewhart na visão de Scherkenbach

“A oportunidade de melhoria nesse processo orientado para


o cliente, pode ser analisada como a lacuna entre as
necessidades do cliente, expressas através do circuito de
feedback do processo,...A oportunidade de melhoria se reduz (
ou a capacidade do processo aumenta ) a medida que os 2
circuitos se aproximam cada vez mais e a variabilidade do
processo se torna cada vez menor.”33

30 DEMING, Op. Cit. p. 66.


31 SCHERKENBACH, Op. Cit. p. 31.
32 Alguns autores denominam o ciclo de Shewhart por ciclo Deming.
33 SCHERKENBACH, Op. Cit. p. 31.
29

Na visão de Scholtes, o ciclo de Shewhart está mais


elaborado e é instrumento de gestão e resolução de problemas.
“O ponto crucial da abordagem científica consiste em criar
soluções que realmente resolvam os problemas. Ao longo de um
projeto, você deve efetuar mudanças óbvias, que sejam fáceis
de implantar e tenham poucos - ou mesmo nenhum - efeitos
colaterais. Mas serão necessárias mudanças substanciais para
resolver a maior parte dos problemas e o único modo de
realmente resolver problemas - agora e para sempre - é
eliminar suas causas.”34

“O objetivo (do Ciclo de Shewhart) é implantar de maneira


suave e aprender como fazer as futuras mudanças ocorrerem de
maneira ainda mais suave.”35

4 - Agir, revisar e 1 - Planejar a


padronizar a Mudança
mudança

3 - Verificar,
monitirar e 2 - Implementar
analisar a a Mudança
mudança

Figura Nº 7: Ciclo de Shewhart na visão de Scholtes

A gestão pelo MDA implica na utilização deste


instrumento, o ciclo de Shewhart, em todos as atividades da
organização. Na produção de bens, na prestação de serviços, na
gestão de recursos humanos, na administração de finanças, na
engenharia e projetos, em vendas.

A relativa simplicidade desta técnica permite abordá-la


no enfoque de qualquer organização, quaisquer que sejam seu

34 SCHOLTES, Op. Cit. p. 5-46.


35 Idem, Ibdem, p. 5-46.
30

tamanho e ramo de atividades. A leitura de suas etapas,


permite interpretações segundo diferentes abordagens como
proposto por Scherkenbach e Scholtes.

A adoção do ciclo de Shewhart implica difundí-lo através


da pirâmide organizacional. Assim, a alta direção, que planeja
a ação da organização, verá a execução do ciclo a longo prazo.
A média gerência terá um horizonte de médio prazo e finalmente
os trabalhadores de nível operacional, completarão o ciclo
diversas vezes em um mesmo dia. A perfeita integração dos
ciclos, pelos níveis hierárquicos da organização promove a
otimização dos recursos, aumentando a produtividade.

2.2.3 - O Controle Estatístico do Processo

O CEP - Controle Estatístico do Processo - é o principal


instrumento para a tomada de decisão no MDA. Foi proposta por
Shewhart36 e está baseado na Teoria Estatística. A principal
virtude desta técnica reside em poder separar os dois tipos de
variação (problemas) nos processos37, a que Deming classifica
de causas comuns e causas especiais de variação.

Cabe neste momento, o detalhamento destes conceitos. O


CEP é uma solução econômica para a questão do controle de
qualidade, principalmente nas indústrias de manufatura com
produção seriada de larga escala. Até por volta de 1930, estas
indústrias necessitavam inspecionar 100% de sua produção para
atender aos requisitos de qualidade; isto agregava custos aos
produtos. Shewhart, que nesta época trabalhava para a Bell
Telephone Laboratories, pesquisava uma maneira de reduzir ou

36 SHEWHART, W. Op. Cit. in: DEMING, Op. Cit.


37 GRANT, E. L. & LEAVENWORTH,R. S. Statistical Quality Control, New York, MacGraw Hill Book
Company, 1974.
31

mesmo eliminar estes custos. Baseando-se na Teoria das


Probabilidades Shewhart desenvolveu o CEP.

Através da aplicação de técnicas probabilísticas pode-se


inferir se o processo de manufatura produzirá, ou não, bens
que atendam aos requisitos de qualidade. Esta técnica
cristaliza-se no instrumento dos Gráficos de Controle. Estes
gráficos determinam limites de controle para os requisitos de
qualidade, que uma vez ultrapassados, devem desencadear ações
de correção sobre os processos, afim de trazê-los para dentro
dos limites de controle.

Medida do Requisito
da Qualidade

Limite Superior de Controle

Média

Limite Inferior de Controle

Tempo

Figura Nº 8 : O requisito de qualidade deve ser monitorado para asseguramo-


nos de que não sairá fora dos limites de controle. O processo que permanece dentro de
seus limites é dito estar em “estado de controle estatístico”.

O CEP admite um certo grau de variação na medida do


requisito de qualidade. Esta variação é classificada por
Deming em duas categorias. A variação que ocorre dentro dos
limites de controle, chamou de causa comum de variação; a
variação que leva a medida do requisito de qualidade para fora
32

dos limites de controle, Deming chamou de causa especial de


variação.

Estas duas categorias de variação têm papel fundamental


no MDA. Deming argumenta que a causa especial, aquela que leva
a medida para além dos limites de controle, é gerenciável
diretamente pelo operador do processo; enquanto que a causa
comum é de responsabilidade da administração. Estas causas de
variação, para serem removidas do processo, requerem
investimentos e mudanças substanciais nos processos, o que só
pode ser decidido nas instâncias mais altas da organização.

O CEP deve embasar todas as decisões acerca de processos


significativos da organização; de manufatura, na gestão de
recursos humanos, nas finanças, em vendas. Constitui portanto
critério determinístico e único para direcionar a decisão. A
decisão através do CEP elimina riscos e atende a uma das
características do MDA, as definições operacionais.

2.3 - A Liderança de Pessoas

Deming e Scherkenbach criticam duramente o estilo de


liderança de pessoas, comumente adotado pelas organizações
ocidentais. Principalmente a APO - Administração por Objetivos
- e a Avaliação de Desempenho.

A respeito da APO, Deming argumenta que o objetivo a ser


atingido, limita o potencial da organização, que virtualmente
pode superar - às vezes em muito - os objetivos estabelecidos.
“Este sistema ( o APO ) alimenta o desempenho a curto prazo,
33

aniquila o planejamento a longo prazo, introduz o medo, demole


o espírito de equipe, fomenta a rivalidade e a política.”38

“Algumas empresas propositadamente estabelecem objetivos


fáceis de serem atingidos porque desejam que todos se sintam
vencedores. Se você trabalha desta maneira e isso é tudo que
seu pessoal alcança, talvez ache difícil atender às
necessidades de seus clientes a um preço que eles estejam
dispostos a pagar.”39

Sobre a avaliação de desempenho, Deming diz: “O erro


básico é que a avaliação de desempenho ou classificação por
mérito concentra-se no produto final, e não na liderança que
ajuda as pessoas. É uma maneira de evitar a preocupação com os
problemas pessoais. (...) A classificação por mérito
recompensa os que se saem bem dentro do sistema. Não
recompensa tentativas para melhorar o sistema. Não altera
nada. (...) não tem sentido como previsão de desempenho,
exceto para pessoas que se situam fora dos limites das
diferenças devidas ao sistema em que trabalham.”40

No MDA abandonar a APO e a Avaliação de Desempenho,


significa ampliar o horizonte de possibilidades da organização
e do indivíduo. A organização terá a seu dispor, mais
criatividade e empenho, visto que não impõe limitadores a ação
do indivíduo, Este por sua vez, exercita a liberdade de
criação e expressão, ampliando sua potencialidade pessoal.

O MDA traz uma nova abordagem para a liderança e gestão


de pessoas. Para Deming, “o objetivo da liderança deve ser
melhorar o desempenho de homens e máquinas, melhorar a

38 DEMING, Op. Cit. p 76


39 Idem, Ibdem p. 77
40 SCHERKENBACH, Op. Cit. p. 48
34

qualidade, aumentar a produção e, simultaneamente, dar às


pessoas orgulho pelo trabalho que fazem,(...) o líder é
responsável também pela melhora do sistema, isto é;
possibilitar que todas as pessoas, em bases constantes, façam
um melhor trabalho, com mais satisfação.”41

Deming42 enumera três responsabilidades específicas do


líder: a)um líder deve descobrir através de cálculos, sempre
que os números existirem ou por julgamento, quando os números
não existirem, quem, se for o caso, dentre seus funcionários,
está fora do sistema, de um lado ou de outro43 e, portanto,
precisa de ajuda pessoal ou merece algum tipo de
reconhecimento; b) o líder também é responsável pela melhora
do sistema, isto é, possibilitar que todas as pessoas, em
bases constantes, façam um melhor trabalho com mais
satisfação; c) obter uma redução cada vez maior da
variabilidade dentro do sistema, para que as diferenças
perceptíveis entre as pessoas diminuam constantemente.

Scherkenbach compartilha desta proposta, para ele a


responsabilidade de um gerente é “desenvolver e direcionar um
grupo de pessoas de modo a que elas atendam as necessidades se
seus clientes com mais eficiência do que se trabalhassem
individualmente - em outras palavras - sinergia.”44

Deming45 sugere as regras para a nova liderança. Estas


regras devem ser analisadas sob a perspectiva de um Definição
Operacional.
1)Instituir a formação da liderança; obrigações,
princípios e métodos.

41 DEMING, Op. Cit. p. 184


42 DEMING, Op. Cit. p. 184
43 Referência a técnica do Controle Estatístico do Processo.
44 SCHERKENBACH, Op. Cit. p. 58
35

2)Fazer seleção mais cuidadosa de pessoas.


3)Após a seleção, treinar e formar as pessoas.
4)O líder deverá ser um colega, aconselhando e conduzindo
seus subordinados no dia a dia, aprendendo com elas.
5)O líder descobrirá através de cálculos simples, quem de
seus subordinados está: i) fora do sistema do lado bom, ii)
fora do sistema do lado ruim e iii) dentro do sistema. Para as
pessoas fora do sistema pelo lado ruim deve-se providenciar
treinamento. Se esta situação persistir, deve-se providenciar
a transferência da pessoa para outra atividade.
6)O líder deve fazer uma longa entrevista com seus
subordinados, pelo menos uma vez por ano, para ajudar ambos a
compreender melhor o papel de cada um.
7)Os números de desempenho não devem ser usados para
classificar as pessoas do grupo, mas sim para ajudar o líder a
melhorar o sistema.46

Esta proposta de gestão de pessoas substituirá, com o


passar do tempo, a Administração por Objetivos, pois o sistema
estará dimensionado para render o máximo possível e também a
Avaliação de Desempenho, pois todos estarão dentro do sistema,
o que quer dizer que não haverá diferenças significativas
entre as pessoas.

2.4 - Os 14 Princípios de Administração

Estes princípios constituem, segundo Deming, a estrutura


fundamental de seu método, lhe dão a forma. Todos os demais
aspectos do MDA decorrem destes princípios e são sua
manifestação prática. Existem diversas versões dos 14

45 DEMING, Op. Cit. p. 87-88, adaptado.


46 DEMING. Op. Cit. p. 88
36

princípios. Segundo Mann47, “das origens do controle


estatístico do processo desenvolveu-se uma filosofia para a
melhoria de produtividade que Deming,(...) tentou fazer com
que a indústria americana e do restante do mundo ocidental
entendesse,(...). O fundamento desta filosofia consiste nas
idéias básicas originalmente ensinadas aos japoneses na década
de 1950. (...) as versões de 1985 e 1986 mostram que a
comunicação da essência da filosofia está evoluindo com o
passar do tempo.”

Os demais autores pesquisados apresentam também versões


segundo sua própria concepção. Esta versões não
descaracterizam o MDA; contudo, por questões metodológicas e
pela coerência temática, estaremos utilizando os princípios
contidos no nosso objeto de estudo, o MDA apresentado no livro
de Deming, Qualidade: A Revolução da Administração.

Para Deming, “os 14 princípios constituem a base para a


transformação da indústria americana. A adoção destes 14
princípios, acompanhada da ação correspondente é um
indicativo de que a administração pretende manter a empresa em
atividade, e visa a proteger os investidores e os
empregados.”48

1. Crie constância de propósito para a melhora do produto


e do serviço. Em administração, há dois problemas, 1) os
problemas de hoje e, 2) os problemas de amanhã, para toda
empresa que deseja manter-se em atividade. Os problemas de
hoje englobam a manutenção do nível de qualidade dos produtos
atuais. Os problemas de amanhã referem-se primordialmente a
constância de propósitos e a dedicação à melhora competitiva a

47 MANN, Op. Cit. p.


48 DEMING, Op. Cit. p. 17
37

fim de manter a empresa viva e proporcionar empregos a seus


funcionários. A direção deve publicar uma resolução pela qual
ninguém perderá o emprego por motivo de contribuição à
qualidade e produtividade.

2. Adote a nova filosofia. Não podemos continuar


tolerando os níveis comumente aceitos de erros, falhas,
materiais inadequados, pessoas engajadas em um trabalho sem
saberem em que consiste e que têm medo de perguntar, métodos
antiquados de treinamento no serviço, chefia inadequada e
ineficiente, administração sem raízes na empresa, o pula-pula
de cargos na administração.

3. Cesse a dependência da inspeção em massa. Uma rotina


de inspeção de 100% para aprimorar a qualidade equivale a
planejar defeitos, reconhecendo que o processo não está
capacitado a satisfazer as especificações. A inspeção feito
com o sentido de melhorar a qualidade ocorre tarde demais, é
ineficaz e dispendiosa. A qualidade não deriva da inspeção, e
sim da melhora do processo produtivo, através do controle
estatístico do processo aplicado em conjunto com o ciclo de
Shewhart.

4. Acabe com a prática de aprovar orçamentos apenas com


base no preço. O preço não tem sentido sem uma medida da
qualidade que está sendo adquirida. Sem dispor de medidas
adequadas de qualidade, os negócios tendem a ser feitos com
quem oferecer o orçamento mais baixo, o resultado inevitável é
baixa qualidade e custo elevado. Empresas norte-americanas
acham difícil entender que o preço é de menor importância, na
tentativa de entabularem negócios com empresas japonesas. Mais
importante que o preço, no estilo japonês de fazer negócios, é
a melhora constante da qualidade, que somente pode ser
alcançada mediante um relacionamento de lealdade e confiança
38

alongo prazo, relacionamento este estranho ao estilo norte-


americano de fazer negócios.

5. Melhore constantemente o sistema de produção e de


serviços. A qualidade deve existir no produto já na etapa do
projeto. Depois que os planos já estão sendo executados, pode
ser tarde demais. Todo produto deve ser encarado como parte de
um todo, onde há uma única chance de sucesso total. Por
conseqüência, haverá uma redução contínua do desperdício e uma
melhora constante da qualidade em cada atividade; de
aquisição, transporte, engenharia, manutenção, localização de
atividades, vendas, distribuição, chefia, treinamento,
contabilidade, folha de pagamento, etc.

6. Institua o Treinamento. O treinamento tem que ser


remodelado. A administração necessita de treinamento para
aprender a conhecer empresa, desde o recebimento de materiais,
até o cliente. Um problema central, é a necessidade de
compreender e saber avaliar a variabilidade. O sistema
administrativo japonês tem, por natureza, grandes vantagens
sobre a sistemática norte-americana. Um gerente japonês inicia
sua carreira com um longo estágio no setor fabril,
desobrigando-se de diversas tarefas na empresa. Conhece os
problemas da produção. Trabalha nos setores de compras,
contabilidade, distribuição e vendas.

7. Adotar e instituir a liderança. A função da


administração não é supervisionar, e sim liderar. A
administração deve trabalhar as fontes de melhoria, o que se
tem de intenção de obter em termos de qualidade do produto ou
do serviço é a tradução para o projeto e o produto final. A
transformação de estilo ocidental de administração, que se faz
necessária, exige que os administradores se tornem líderes. O
enfoque nos resultados (administração por objetivos, avaliação
39

de desempenho) têm de ser abolidas e substituídos por


liderança.

8. Afaste o medo. O medo assume muitas facetas. Um


denominador comum do medo, sob qualquer forma e em qualquer
empresa, é a perda resultante de desempenho reprimido e cifras
arranjadas. Há uma resistência geral ao conhecimento. Os
avanços de que a indústria ocidental necessita conhecimento,
e, no entanto, as pessoas temem o conhecimento. O orgulho
talvez tenha um certo papel nesta resistência ao conhecimento.
Um conhecimento novo introduzido na empresa talvez revele
algumas de nossas fraquezas. Uma atitude melhor, naturalmente,
é afastar o medo e receber o conhecimento novo de braços
abertos, visto que pode nos ajudar a exercer um trabalho
superior.

9. Rompa as barreiras entre os diversos departamentos. O


pessoal de pesquisa, projetos, aquisição de insumos, vendas,
recebimento de materiais têm de conhecer os problemas
enfrentados com os diversos materiais e especificações na
produção e na montagem de bens. Caso contrário, haverá perdas
na produção provocadas pela necessidade de retrabalho
decorrente das tentativas de empregar materiais inadequados
para o fim pretendido. Todos os que trabalham na engenharia de
projetos, aquisição de insumos, etc., têm clientes: A pessoa
que tem que tentar fazer com o material adquirido, a coisa
projetada. Equipes compostas por pessoas de projetos,
engenharia, produção e vendas, poderiam contribuir para a
melhora dos projetos do futuro, e poderiam realizar
importantes melhorias no produto, no serviço e na qualidade de
hoje, se pudessem trabalhar sem medo de incorrerem em riscos.
O trabalho em equipe é uma necessidade crucial na empresa como
um todo. Infelizmente, a avaliação de desempenho, nos seus
moldes tradicionais, impede o trabalho em equipe. Aquele que
40

trabalha para ajudar outros, pode não ter tanta produção a


mostrar na avaliação de desempenho, quanto se estivesse
trabalhado sozinho.

10. Eliminar slogans, exortações e metas para os


trabalhadores. O que há de errado com cartazes e com
exortações? Dirigem-se às pessoas erradas. Derivam do
pressuposto da administração de que os trabalhadores poderiam,
caso tivessem maior zelo, atingir o índice de zero-defeito,
melhorar a qualidade, aprimorar a produtividade, e tudo o mais
desejável. Os quadros e cartazes não levam em conta o fato de
que a maior parte do problema provém do sistema. Exortações e
cartazes geram frustrações e ressentimentos. Anunciam aos
trabalhadores que a administração não tem consciência das
barreiras que se interpõem à realização profissional deles.

11. a) Suprima as quotas numéricas para a mão-de-obra. A


intenção da aplicar um padrão de trabalho é digna: prever
custos, definir um teto de custos, projetar vendas. O efeito
real é dobrar os custos da produção e sufocar a autorealização
das pessoas. O trabalho pago por peça é ainda mais devastador
do que padrões de trabalho. O pagamento de incentivo é por
peça produzida. O horista, trabalhando por peça produzida, não
demora, a aprender que ganha seu salário produzindo itens
defeituosos e rejeitados, quanto mais falhas produzir, maior
seu pagamento no fim do dia. Onde fica sua auto-realização e o
justo orgulho por um trabalho bem feito? Uma administração que
se interesse em aumentar os dividendos tomará medidas
imediatas e decisivas para acabar com os padrões de trabalho,
coeficientes de trabalho por peça, substituindo-os por uma
chefia inteligente.

11. b) Elimine objetivos numéricos para o pessoal de


administração. Metas internas colocadas na administração de
41

uma empresa, tornam-se, na ausência de um método49, tornam-se


meramente uma farsa. Exemplos: Reduzir os custos em 10% no
próximo ano, aumentar as vendas em 15%, melhorar a
produtividade em 3% no ano que vem. Quando se tem um sistema
estável, não adiantará nada especificar um objetivo. Só se
obtém o que o sistema é capaz de proporcionar. Um objetivo
fora de alcance do sistema, jamais será atingido. Se por outro
lado, o sistema não for estável, também de nada adiantará
estabelecer objetivos. Não há como se saber o que o sistema
poderá produzir, ele não tem capacidade definida. A
administração com base em objetivos numéricos representa uma
tentativa de administrar sem conhecimento sobre o que fazer, e
de fato, acaba geralmente constituindo-se em administração
pelo medo.

12. Remova as barreiras que privam as pessoas do justo


orgulho pelo trabalho bem executado. Estas barreiras devem ser
removidas para os dois grupos de pessoas, os horistas e os da
administração. Uma destas barreiras é constituída pela
avaliação de desempenho. As barreiras que se interpõem à
realização profissional podem com efeito estar constituindo um
dos obstáculos mais sensíveis à redução dos custos e melhoria
da qualidade. A possibilidade de realização profissional é
algo mais significativo para o trabalhador do que a existência
de quadras de esportes e áreas de lazer.

13. Estimule a formação e o auto-aprimoramento de todos.


Uma organização não precisa apenas de gente boa; precisa de
gente que vai se aprimorando sempre através da formação
adequada. No que tange ao auto-aprimoramento, é prudente
lembrar que não há falta de gente boa. Existe falta de níveis
mais elevados de conhecimento, e isto é verdade em qualquer
campo ou especialidade.

49 Referência ao Controle estatístico do Processo.


42

14. Tome a iniciativa para realizar a transformação. A


administração deverá assumir e enfrentar cada um dos 13
princípios acima. Os administradores deverão chegar a um
consenso relativamente ao significado de cada um deles e a
orientação a tomar. Deverão concordar em implantar a nova
filosofia. A administração deverá orgulhar-se de ter adotado a
nova filosofia e de suas novas responsabilidades. Terá então a
coragem de romper com a tradição, mesmo que enfrente a
rejeição de seus colegas.

2.5 - As Doenças Fatais.

Deming diagnosticou obstáculos e entraves à adoção dos 14


princípios, a que denominou Doenças Fatais. Para ele, “os 14
princípios constituem uma teoria administração. Sua aplicação
transformará o estilo ocidental de administração. Infelizmente
doenças mortais permanecem no caminho da transformação”50 Estas
doenças atingem a maioria das empresas ocidentais, sua remoção
é responsabilidade da administração e exige a reconstrução do
estilo de administração ocidental. Do mesmo modo que nos 14
princípios, estaremos nos baseando apenas no livro de Deming;
ainda que outros autores tenham interpretações próprias das
doenças, não as levaremos em consideração.

1. Falta de constância de propósito. Muitas empresas são


dirigidas em função dos dividendos trimestrais. É melhor
proteger os investimentos pelo trabalho contínuo, visando a
melhoria de processos, de produtos e serviços que tragam os
clientes de volta.

50 DEMING, Op. Cit. p. 73


43

2. Ênfase nos lucros a curto prazo. A busca de dividendos


trimestrais e do lucro a curto prazo anula a constância de
propósito. Um acionista que precise dos dividendos para se
sustentar estará mais interessado em dividendos futuros do que
simplesmente no seu valor atual. Para ele, é importante que
haja dividendos daqui a três, cinco ou oito anos. A ênfase no
lucro a curto prazo anula o crescimento a longo prazo da
empresa.

3. Avaliação de Desempenho, Classificação por Mérito ou


Revisão Anual. Muitas empresas adotam o sistema pelo qual
todas as áreas de administrativas ou de pesquisa são avaliadas
anualmente pelos seus superiores, recebendo uma classificação.
Este sistema alimenta o desempenho a curto prazo, aniquilando
a planejamento a longo prazo, introduz o medo, demole o
espirito de equipe, fomenta a rivalidade e a política. O erro
básico é que a avaliação de desempenho concentra-se no produto
final, e não na liderança que ajuda as pessoas.

4. Mobilidade da administração. Uma empresa cuja direção


esteja comprometida com a qualidade e produtividade, não sofre
de nenhuma incerteza e perplexidade. Mas, como uma pessoa pode
se comprometer com qualquer política quando sua permanência na
empresa é de apenas alguns anos? Sua mudança de uma empresa
para outra, cria prima-donas que buscam resultados rápidos.
Esta mobilidade aniquila o trabalho em equipe, vital para uma
existência contínua. O fracasso em conseguir uma boa
classificação na avaliação anual de desempenho leva uma pessoa
a buscar outras oportunidades. Não é raro uma pessoa altamente
competitiva deixar a empresa ao não receber uma promoção.

5. Administração da empresa simplesmente através de


números visíveis. Ninguém pode ser bem sucedido trabalhando
simplesmente com números. É claro que os números visíveis são
44

importantes, há a folha de pagamentos, fornecedores para


pagar, impostos a pagar. Na ausência de conhecimento dos
problemas da produção, o controller só consegue olhar para o
básico, cortando custos de materiais adquiridos, inclusive
ferramentas, máquinas, manutenção e suprimentos.

--ooOoo--
45

CAPÍTULO III

AS ABORDAGENS EM ADMINISTRAÇÃO E O MDA

Neste capítulo estaremos apresentando uma descrição das


abordagens de Administração, com as quais estaremos comparando
o MDA. Não pretendemos neste capítulo apresentar um enfoque
inédito do tema. Ao contrário, estaremos nos baseando em
autores que já analisaram e sistematizaram estas abordagens,
para que possamos compor um quadro de referência amplo e
imparcial.

Em nossa pesquisa bibliográfica procuramos identificar


autores cujos trabalhos fossem abrangentes, cobrindo boa parte
dos enfoques de administração, classificando-as inclusive.
Interessa-nos enfoques analíticos da evolução da Administração
em suas diferentes abordagens, para que possamos aprender o
significado e o contexto de cada uma delas; sempre orientados à
comparação com o MDA.

Nestes critérios para a escolha da bibliografia residem


nossa maior dificuldade. São escassas as obras que os atendam.
Poucos autores dedicam-se á pesquisa histórica-evolutiva das
abordagens administrativas.

Entre os autores selecionados há ainda significativas


diferenças de interpretação e classificação. Enquanto que para
certo autor, uma determinada abordagem ocupa uma escola ou
corrente; para outro esta mesma abordagem está categorizada em
outra escola. Em verdade não há classificações homogêneas e
46

determinísticas. Entendemos que estas divisões são fruto de


diferentes abordagens metodológicas e epstemológicas, adotadas
pelos diversos autores.

Para nossa sistematização, numa perspectiva histórica da


administração, adotaremos os seguintes autores: Lodi1
Chiavenato2 e Motta3.

Sob diferentes enfoques estes autores analisam as


abordagens da administração. Buscamos uma diversidade de
interpretações, para assegurarmo-nos de que observamos estas
abordagens da administração de modo pluralista.

Estaremos nos referindo às seguintes abordagens.


Científica ou Clássica, cujos precursores são notadamente F.
Taylor e H. Fayol. Relações Humanas, principalmente como
proposta por G. Elton Mayo. Behaviorismo, onde destacam-se
Douglas McGregor, Herbert Simon e Chester Barnard. Estrutural
ou Burocrática onde destacam-se os trabalhos de Max Weber e R.
Merton. E finalmente a abordagem de Sistemas de von Bertalanffy
e Katz & Kahn.

A lista das distintas abordagens selecionadas não é


exaustiva. Reflete, a nosso ver, os mais significativos
movimentos da administração. Os autores citados junto das
abordagens não são seus únicos difusores, senão seus principais
divulgadores.

Resta-nos afirmar que no decorrer deste trabalho,


estaremos nos valendo de muitos outros autores, não somente os
mencionados até aqui.

1 LODI, J.B., História da Administração, Livraria Pioneira Editora, São Paulo, 1987.
2 CHIAVENATO, I, Introdução à Teoria Geral da Administração, Makron Books do Brasil, São Paulo, 1993.
3 MOTTA, F.C.P, Teoria Geral da Administração, Livraria Pioneira Editora, São Paulo, 1991.
47

A história da abordagem sistemática da administração é


recente. Seu estudo científico, como concebemos atualmente é
ainda mais recente. Taylor é tido como o primeiro autor a
preocupar-se com a estruturação das práticas da administração.
Contudo, antes dele muitos pensadores já se ocupavam com este
tema.
Segundo Lodi4, na segunda metade do século XVIII, Adam
Smith já propunha a especialização dos trabalhadores, a
disciplina e a remuneração como custo do produto. Nesta mesma
época Morelly propõe formação e treinamento para os operários5.

Tragtenberg6, analisando a origem da burocracia como


forma de poder, identifica na Europa do século XVIII o
aparecimento de um pensador cujos trabalhos preconizavam a
ideologia da classe tecnoburocrata emergente. Saint-Simon é
este pensador. Para este autor, “a classe industrial deveria
ocupar o primeiro lugar por ser a mais importante de todas,
podendo prescindir das outras sem que estas possam fazer o
mesmo.”7

Saint-Simon é para Tragtenberg um pensador que busca


soluções globais, harmônicas, dirigidas pela classe dos
industriais, em quem identifica a competência necessária. A
abordagem da administração numa visão microindustrial dá-se
efetivamente com Taylor.

Tragtenberg argumenta que as diversas abordagens


administrativas são condicionadas histórica e socialmente,
através da mudança das condições de trabalho. Assim, a evolução
das tecnologias de produção, o surgimento e aperfeiçoamento das

4 LODI, Op. Cit. p 1-12.


5 MOTTA, F.C.P, Teoria das Organizações. Evolução e Crítica, Livraria Pioneira Editora, São Paulo, 1986, p-4.
6 TRAGTENBERG, M., Burocracia e Ideologia, Editora Ática, São Paulo, 1974.
48

máquinas, irá propiciar a conjuntura sócio-econômica, política


e histórica para o aparecimento e desenvolvimento das diversas
escolas ou abordagens administrativas.

Na segunda metade do século XIX consolidam-se grandes


corporações industriais, principalmente nos EUA8. Nesta época
surgem a linha de montagem e a produção em massa. A mão-de-obra
torna-se escassa e desqualificada.

É necessário discipliná-la e qualificá-la ao novo modo


produtivo. Estão criadas assim, as condições para o
aparecimento de Taylor e Fayol e a “Administração Científica”.

3.1 - AS ABORDAGENS EM ADMINISTRAÇÃO

3.1.1 - A abordagem Científica ou Clássica

Lodi em sua interessante “História da Administração”9


enumera diversos autores cujos trabalhos podem ser
classificados nesta abordagem. Muitos deles já estudavam
administração industrial mesmo antes de Taylor e Fayol. No
entanto estes autores estão praticamente esquecidos, sua
importância é relativa e suas obras não têm sido mais
publicadas. Dentre estes autores destacam Harrington Emerson,
Henry L. Gantt e Frank Gilbreth.

7 Idem, Ibdem, p.65.


8 Idem, Ibdem, p.70.
9 Lodi, Op. Cit., p.29-66
49

Para nossa análise estaremos nos baseando apenas nos


trabalhos de Taylor e Fayol, cujos pensamentos são os
fundamentos da Escola Científica ou Clássica e sua prática é
ainda corrente nas organizações contemporâneas.

Para Taylor, “a administração científica não constitui


elemento simples, mas uma combinação global que pode ser assim
sumariada.
- ciência, em lugar de empirismo;
- harmonia, em vez de discórdia;
- cooperação, não individualismo;
- rendimento máximo, em lugar de produção reduzida;
- desenvolvimento de cada homem, no sentido de alcançar
maior eficiência e prosperidade.”10

Para atingir estes objetivos, Taylor elaborou seus


“Princípios da Administração Científica” que foram resumidos
por Lodi.11

“A - Desenvolvimento de uma Ciência do Trabalho. Uma


investigação científica poderá dizer qual a capacidade total de
um dia típico de trabalho de modo que: a) os chefes não possam
se queixar da incapacidade de seus operários; b) estes saibam
exatamente o que se espera que eles façam.
B - Seleção e Desenvolvimento Científico do Empregado.
Para atingir o nível de remuneração prevista, o estudo de tempo
determina que o operário first-class-man precisa preencher
certos requisitos pela seleção.
C - Combinação da Ciência do Trabalho com a Seleção de
Pessoal. Taylor observou que os operários estão dispostos a
aprender a fazer um bom trabalho, mas que os velhos hábitos da
administração resistem à inovação de métodos.

10 TAYLOR, F.W., Princípios de Administração Científica, Editora Atlas, São Paulo, 1987.
11 LODI, Op. Cit., p.31
50

D - Cooperação entre Administração e Empregados. Somente


uma constante e íntima cooperação possibilitará a observação e
medida sistemática do trabalho, que permitirá a fixação de
níveis de produção e de incentivos financeiros.”12

Taylor formulou sua teoria a partir dos estudos de tempos


e movimentos dos operários. Constatou nesta fase o enorme
desperdício que o sistema produtivo de então apresentava. E
avançou seus estudos, propondo a estruturação geral da
organização. Seu argumento básico era aumentar o lucro do
capitalista e o salário do operário.

O Taylorismo pretendia, a seu modo, “conduzir a


humanidade a dias muito melhores, talvez a um estágio de
abundância, talvez à solução de todos os conflitos entre o
capital e o trabalho”.13

Contemporâneo de Taylor, Henry Fayol produziu um modelo


muito significativo para sua época. Sua preocupação central era
a forma de administração, baseada no conjunto de funções que
propôs para a organização.

“1 - Funções técnicas, relacionadas com a produção de


bens e serviços,
2 - Funções Comerciais, relacionadas com a compra e venda
de produtos e bens
3 - Funções financeiras relacionadas com a busca e
gerência de capitais,
4 - Funções de segurança, relacionadas com a proteção e
preservação dos bens.
5 - Funções contábeis, relacionadas com os inventários,
registros, balanços e estatísticas.

12 Idem, Ibdem
13 SILVA, B., Taylor e Fayol, Cadernos de Administração Pública - FGV, Rio de Janeiro, 1960. p.23.
51

6 - Funções administrativas, relacionadas com a


integração das outras cinco funções. Esta função coordena as
demais funções, no esforço de produção.”14

Para Fayol o exercício da função administração requer a


observação de alguns princípios, que desenvolveu para este fim.
Os Princípios Gerais da Administração.

“1 - Divisão do trabalho: consiste na especialização das


tarefas e das pessoas para aumentos a eficiência.
2 - Autoridade e Responsabilidade: Autoridade é o direito
de dar ordens e o poder de esperar obediência; a
responsabilidade é uma conseqüência natural da
responsabilidade. Ambas devem estar equilibradas entre si.
3 - Disciplina: depende da obediência, aplicação,
energia, comportamento e respeito aos acordos estabelecidos.
4 - Unidade de Comando: cada empregado deve receber
ordens de apenas um superior. É o princípio da autoridade
única.
5 - Unidade de direção: uma cabeça e um plano para cada
grupo de atividades que tenham o mesmo objetivo.
6 - Subordinação dos interesses individuais aos
interesses gerais: os interesses gerais devem sobrepor-se aos
interesses particulares.
7- Remuneração do pessoal: deve haver justa e garantida
satisfação para os empregados e para a organização em termos
de retribuição.
8 - Centralização: refere-se à concentração da autoridade
no topo da hierarquia da organização.
9 - Cadeia escalar: é a linha de autoridade que vai do
escalão mais alto ao mais baixo. É o princípio de comando.

14 CHIAVENATO, I, Introdução à Teoria Geral da Administração, Editora Mac Graw-Hill, São Paulo 1993,
p.110-111.
52

10 - Ordem: um lugar para cada coisa. A ordem material e


humana.
11 - Equidade: amabilidade e justiça para alcançar
lealdade do pessoal.
12 - Estabilidade e duração (num cargo) do pessoal: a
rotação tem um impacto negativo sobre a eficiência da
organização. Quanto mais tempo uma pessoa permanece num cargo,
tanto melhor.
13 - Iniciativa: a capacidade de visualizar um plano e
assegurar o sucesso.
14 - Espírito de equipe: harmonia e união entre as
pessoas são grandes forças para a organização.”15

Além dos princípios gerais, Fayol ainda esclarece que o


exercício da função administrar está fundamentado nas
atividades de previsão, organização, comando, coordenação e
controle.

Nota-se que a preocupação fundamental de Fayol é a


formalização da administração. Ele a pretende estruturada, onde
não há lugar para o incerto.

A escola da Administração Científica, aqui representada


pela visão de Taylor e Fayol, veio atender a uma necessidade
das organizações de sua época. No início do século XX surgem
grandes corporações e com elas a necessidade de
descentralização e delegação do poder. Por outro lado, o
aumento da produtividade e a redução do desperdício, de
materiais e trabalho, eram também necessidades emergentes face
ao gigantismo das organizações.

Os trabalhos de Taylor e Fayol vêm atender a essas


demandas. Suas abordagens são de certa forma, complementares.
53

Taylor ocupou-se com o universo das tarefas no ambiente


organizacional, no âmbito da execução propriamente dito. Por
sua vez, Fayol deteve-se na estruturação dos processos
administrativos, nas questões de ética e do poder na
organização.

3.1.2 - A abordagem das Relações Humanas

Este movimento teve como precursor e principal teórico


Elton G. Mayo, em decorrência do conhecido experimento de
Hawthorne. Outros importantes teóricos deste movimento foram
William F. Whyte.16 Douglas McGregor17. Contudo, segundo Lodi18,
Mary P. Follett já apresentava trabalhos sobre comportamento e
relações sociais nas organizações, algum tempo antes de Mayo.
Estaremos entretanto nos referenciando ao experimento de
Hawthorne e suas conclusões.

Este experimento deu-se numa instalação da Western


Electric onde se fabricavam equipamentos para telecomunicações,
no bairro de Hawthorne em Chicago. O objetivo do experimento
era “estudar a fadiga, os acidentes, o turn over, no trabalho e
o efeito das condições físicas do trabalho sobre a
produtividade,...”19, principalmente o efeito da luminosidade
ambiental. Corria o ano de 1927 e a experiência ficou a cargo
de Mayo e outros pesquisadores de Haward School of Business
Admnistration.

15 Idem, Ibdem, p.108-109.


16 WHYTE, W. F., Relações Humanas - Um Relatório sobre o Progreso; in: ETZIONI, A. Organizações
Complexas, São Paulo, Atlas, 1973. p.107-118.
17 MOTTA, F. C. P, Teoria Geral da Administração, São Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1991 p.22.
18 LODI, op. Cit. p.79-84.
19 LODI, Op. Cit., p.67.
54

O experimento é categorizado em três fases, que


correspondem à evolução dos trabalhos de pesquisa e suas
conseqüências. Na primeira fase, alguns operários foram
apartadas da linha de produção, instaladas em uma sala onde as
condições do experimento eram controladas. Os resultados desta
primeira fase não foram os esperados pelos pesquisadores.
Verificaram existência de outras variáveis, difíceis de serem
isoladas e que não foram levadas em consideração no desenho do
experimento original. Um dos fatores descobertos foi o fator
psicológico os operários reagiram à experiência de acordo com
suas suposições pessoais, (...)”.20

A segunda fase do experimento de Hawthorne inicia-se com


o interesse dos pesquisadores pela nova variável descoberta.
Para estudá-la, separaram algumas operárias da produção e as
puseram em ambiente separado onde as variáveis pudessem ser
controladas. Os fatores avaliados nesta fase não era mais
efeitos do ambiente sobre a produtividade mas; a interação e as
relações entre as operárias e sua reação às mudanças no estilo
de supervisão.

Esta segunda fase é o momento fundamental do experimento.


Neste momento Mayo descobre o aspecto principal de sua teoria e
da abordagem de Relações Humanas: a interação social entre os
trabalhadores a que denominou organização informal. Pela
primeira vez, trabalhadores eram observados com um grupo
social, que harmoniza os interesses particulares de seus
membros, os interesses do grupo a que cada um pertence e aos
interesses da organização.

Na terceira fase do experimento, os pesquisadores


ocuparam-se em melhor compreender as relações dos trabalhadores
com a supervisão, seus sentimentos com relação a organização,

20 CHIAVENATO, Op. Cit. P.139.


55

suas atitudes. Nesta fase, planejou-se um esquema de


entrevistas onde todos os operários seriam analisados.
Entretanto, em 1932 o experimento foi suspenso, sem contudo
invalidar suas conclusões.

As principais conclusões de Mayo e seus seguidores acerca


do experimento podem ser assim enumeradas:

“a) A empresa passou a ser visualizada como uma


organização social, composta por diversos grupos sociais
informais. Estes grupos constituem a organização humana da
empresa. Os indivíduos dentro da organização participam de
grupos sociais e mantêm-se em constante interação social.
b)O comportamento do indivíduo se apoia totalmente no
grupo. Em geral os trabalhadores não agem ou reagem
isoladamente como indivíduos, mas como membros de grupos.
c) O comportamento dos trabalhadores está condicionado a
normas e padrões sociais. As pessoas passam a ser avaliadas
pelo grupo em confronto com essas normas e padrões de
comportamento. O nível de produção não é determinado pela
aptidão física do trabalhador, mas por normas sociais e
expectativas que o envolvam, e quanto mais integrado
socialmente ao grupo de trabalho, maior será sua disposição de
produzir”.21

O enfoque das Relações Humanas surge em um momento que


grande parte das questões da Administração haviam sido
equacionadas pelos modelos da Escola Clássica ou Científica.
Haviam, não obstante, alguns paradoxos: Por que as coisas não
ocorriam como planejadas pelos engenheiros, já que segundo o
modelo clássico/científico, sabia-se exatamente o que deveria
acontecer?
56

Mayo veio responder esta questão, daí sua forte crítica


ao modelo científico/clássico22. A nosso ver, a abordagem das
Relações Humanas preenche a lacuna deixada por Taylor e Fayol,
que em seu tempo não dispunham de conhecimentos e recursos para
preenchê-la. A Escola das Relações Humanas abre o caminho para
o próximo movimento da Administração: o Behaviorismo.

3.1.3 - A abordagem Behavorista

O Behaviorismo surge como decorrência da Escola de


Relações Humanas, mas não como resultado de abordagens
empíricas e sim como fruto de concepção intelectual. Esta
abordagem muda o seu foco de interesse das atividades de
operações e produção, centrando sua abordagem na estrutura dos
processos decisórios e suas decorrências. Entre os principais
autores desta abordagens destacamos: Chester Barnard, Herbert
Simon e Douglas McGregor.

Barnard23 centra seu estudo na decisão, abordando-a como


a energia que move a organização. Inicia sua obra com uma
definição para organização e seus elementos, de onde constrói
sua teoria. “Organização, simples ou complexa, é sempre um
sistema impessoal de coordenação de esforços humanos”24.

A partir desta definição, discorre sobre


departamentalização, organização informal, especialização,
incentivos e motivação, autoridade; para culminar com as
funções do executivo. É para este autor, o executivo que move a

21 Idem, Ibdem, p.145-149.


22 WHYTE, Op. Cit., p. 108-109.
23 BARNARD, C. As funções do Executivo, Editora Atlas, São Paulo, 1971.
24 Idem, Ibdem, p.112.
57

organização, servindo como elemento catalisador entre energias


e necessidades da organização.

“Pode-se dizer, então que a função do executivo é a de


servir como canal de comunicação”25. “A segunda função do
executivo é a de promover o asseguramento de serviços pessoais
que constituem o material das organizações”26. “A terceira
função executiva é formular e definir os propósitos, objetivos
e fins da organização”27

Herbert Simon28 aborda a organização de maneira


semelhante a de Barnard. Do trabalho de Simon & March29, temos
as seguintes definições.

“1. Uma organização é um sistema de comportamentos


sociais entreligados de numerosas pessoas a que denominaremos
participantes da organização.
2. Cada participante e cada grupo de participantes recebe
incentivos, em troco dos quais faz contribuições à organização.
3. Todo participante somente manterá sua participação na
organização enquanto os incentivos que lhe são oferecidos forem
iguais ou maiores (medidos em termos dos valores que
representam para o participante e das alternativas que se lhe
oferecem) do que as contribuições que lhe são exigidas
4. As contribuições trazidas pelos vários grupos de
participantes constituem a fonte na qual a organização se supre
de incentivos que oferece aos participantes.
5. Donde; a organização será solvente e continuará
existindo - somente enquanto as contribuições forem suficientes

25 Idem, Ibdem, p.213.


26 Idem, Ibdem, p.223.
27 Idem, Ibdem, p.226.
28 MARCH, J. G. & SIMON, H. A., Teoria das Organizações, Editora da Fundação Getúlio Vargas, Rio de
Janeiro, 1975.
29 Idem, Ibdem, p.123.
58

para proporcionar incentivos em quantidade bastante para


induzir à prestação de contribuições.”30

Convém salientar que Simon & March abordam a organização


de forma ampla; assim quando dizem participante de organização,
referem-se aos empregados e membros, aos clientes e usuários e
a acionistas e patrocinadores da organização.

Estes autores avaliam o conflito nas organizações, como a


incompatibilidade quanto a alternativas de decisão. Decorre que
estes conflitos produzem novos fenômenos organizacionais, as
negociações e lutas. Finalmente os autores comentam a
racionalidade na organização, concretizada através do
planejamento das atividades na organização.

O fundamental da visão de Simon & March é que abordam a


organização como fruto da atividade humana, ou de seu
comportamento, como já convencionou dizer desta abordagem. As
organizações são portanto, resultado do conjunto de atividades
de seus membros. Estas atividades dizem respeito a escolhas,
motivos, conflitos e expectativas. Postulam pois a existência
de um homem organizacional.31

Outro notável autor da abordagem behaviorista é Douglas


McGregor. De maneira diferenciada dos autores behavioristas até
aqui analisados, McGregor propõe diretamente um modelo de
administração que se opõe a velha prática, representada
principalmente pela abordagem da Administração Científica de
Taylor, com uma nova prática a que chamou de Teoria Y. McGregor
traça então um perfil da velha prática, a Teoria X, oposta a
seu modelo , a Teoria Y.

30 Idem, Ibdem, p.190-191.


31 LODI, Op. Cit., p. 120.
59

Lodi32 descreve a conclusão de McGregor a respeito da


condição do homem face a organização, caracterizando a Teoria
X.

“A. O ser humano não gosta de trabalhar e evitará o


trabalho o quanto for possível. A administração precisa
pressionar para obter produtividade e criar incentivos
materiais.
B. Por causa desta aversão ao trabalho, a maioria das
pessoas precisa ser coagida, controlada, dirigida e ameaçada
para que possa fazer um esforço.
C. O ser humano comum prefere ser dirigido, deseja evitar
responsabilidades, tem pouca ambição e procura segurança
sobretudo.”33

A esta concepção humana, atribuída a Administração


Científica e em parte a Relações Humanas, McGregor opõe a
Teoria Y.

“A. O esforço físico e mental para trabalhar é tão


natural quanto a diversão e o repouso. A pessoa comum não tem
aversão ao trabalho, pelo contrário, este pode ser uma fonte de
satisfação.
B. O controle externo não é a única forma de conseguir
esforço. A pessoa exercerá autodireção a serviço de objetivos
com os quais esteja comprometida.
C. A recompensa mais significativa para se obter este
comprometimento é a satisfação da necessidade de auto-
realização.
D. O ser humano comum aprende não só a aceitar, como
a procurar responsabilidades.

32 Idem, Ibdem, p. 120-121, adaptado.


33 McGREGOR, D., O Lado Humano da Empresa, In: HAMPTON, D. R., Conceitos de Comportamento na
Administração, Editora Pedagógica e Universitária, São Paulo, 1973, p.9.
60

E. Há muito mais pessoas que podem contribuir


criativamente para a solução de problemas da organização.
F. As potencialidades das pessoas não estão sendo
empregadas na sua totalidade.”34

Abordando a organização, McGregor refere-se à Teoria X:

“A. A administração é responsável pela organização dos


elementos produtivos de empresa - dinheiro, materiais,
equipamentos, pessoal - para a realização de fins econômicos.
B. Com relação ao pessoal, esse é um processo de dirigir
seus esforços, motivando-o, controlando suas ações, modificando
seu comportamento, tendo-se em vista as necessidades da
organização.
C. Sem essa intervenção ativa por parte da administração,
o pessoal seria passivo - ou mesmo resistente - às necessidades
da organização”35

A essa visão do modelo da escola Científica, representada


pela Teoria X, McGregor apresenta sua abordagem.

“A. A administração é responsável pela organização dos


elementos produtivos da empresa - dinheiro, materiais,
equipamentos, pessoal - e busca atingir os objetivos
econômicos.
B. As pessoas não são passivas ou resistentes às
necessidades da organização por natureza. Ficaram assim como
resultado de experiência em outras organizações.
C. A motivação, o potencial de desenvolvimento, a
capacidade para assumir responsabilidades, a rapidez para
dirigir o comportamento em direção aos objetivos da
organização, estão presentes nas pessoas. Não é a administração

34 Idem, Ibdem, p. 17-19.


35 Idem, Ibdem, p. 19. Grifo nosso.
61

que os faz aparecer. É responsabilidade da administração fazer


com que as pessoas reconheçam e desenvolvam essas
características humanas para si.
D. A tarefa principal da administração é oferecer
condições orgânicas e métodos de operação em que as pessoas
possam atingir melhor seus próprios fins, orientando seus
próprios esforços em direção aos objetivos da organização.36

Se pudéssemos resumir a abordagem de McGregor em uma


única frase; esta seria : “A Teoria X tem confiança somente no
controle externo do comportamento humano, enquanto que a Teoria
Y conta completamente com o autocontrole e com a auto
direção”37. Esta frase nos orienta na interpretação de
McGregor. A organização deve abandonar antigas práticas e criar
condições para que as pessoas possam por sua livre iniciativa e
escolha, conduzir a organização a seus objetivos.

O Behaviorismo traz uma abordagem da organização centrada


no homem, que agrupa-se ou associa-se para satisfazer
necessidades próprias. A maneira com que pode atingir estes
objetivos, é através da organização burocrática. Decorre que
para o Behaviorismo os objetivos da organização confundem-se
com os objetivos de seus membros, a organização deve apenas
canaliza-los.

3.1.4 - A Abordagem Burocrática ou Estrutural

36 PEREIRA, L. C. B. & MOTTA, F. C. P., Introdução à Organização Burocrática, Editora Brasiliense, São
Paulo, 1986, p. 222-227.
37 LAKATOS, E. M., A Abordagem Burocrática e Outras Visões da Estrutura Organizacional, Revista IMES,
São Bernardo do Campo, s/d, p. 22-38.
62

O estudo da burocracia teve início com Max Weber. Este


sociólogo aborda a burocracia como instrumento de dominação,
que justifica-se através de uma certa racionalidade. Para sua
análise, Weber constrói um modelo ideal e sobre ele, fundamenta
sua teoria.38

Lakatos descreve este tipo ideal de burocracia de Weber.


“O tipo ideal não expressa a totalidade da realidade, nos seus
aspectos significativos, os caracteres mais gerais, os que se
encontram regularmente no fenômeno estudado.39 Constituem
características da organização burocrática de Weber:

“A. Uma organização constituída de cargos, delimitados


por normas: a burocracia é uma associação que se caracteriza
pela sistemática divisão do trabalho, do direito e do poder. A
divisão atende a uma racionalidade, isto é; ela é adequada aos
objetivos a serem atingidos,(...)
B. Uma área específica de competência, implicando: uma
esfera de obrigações no desempenho de funções (decorrente da
divisão do trabalho); atribuição, a cada responsável por uma
função, da autoridade necessária para seu desempenho,(...).
Desta maneira, cada participante da associação passa a ter o
seu cargo específico, as suas funções específicas, áreas de
competência e responsabilidade.
C. A organização dos cargos obedece aos princípios da
hierarquia; cada cargo inferior encontra-se sob a supervisão e
o controle de um que lhe é superior.
D. O exercício de um cargo é estabelecido por meio de
regras técnicas ou normas: o funcionário - ocupante de um cargo
- não pode fazer o que quiser, mas o que as regras internas
impõem.

38 Idem, Ibdem, p. 28.


39 Idem, Ibdem.
63

E. A completa separação dos membros do quadro


administrativo, da propriedade dos meios de produção e
administração. Em outras palavras, os administradores de uma
organização burocrática não são seus proprietários.

Alguns autores atribuem a Weber a formalização, sob o


rótulo de sua teoria, dos modelos das Escolas Científica ou
Clássica, Relações Humanas e Behaviorismo. Estas abordagens
“visam especificamente operacionalizar a teoria da organização
burocrática formulada por Weber.”40 Estes autores argumentam
que “enquanto Max Weber estudava a organização de um ponto de
vista estritamente sociológico e histórico, Taylor, Fayol, Mayo
e Barnard estudavam o mesmo problema com o objetivo explicito
de estabelecer uma série de princípios ou de recomendações
sobre como planejar, organizar e controlar.”41

3.1.5 - A Abordagem Sistêmica

Esta abordagem surge a partir do trabalho de Bertalanffy,


com a publicação de seu livro Teoria Geral de Sistemas. Para
este autor, “há uma tendência geral no sentido de integração
nas várias ciências, naturais e sociais.”42. Deste modo, está
claro que para Bertalanffy a abordagem de Sistemas é
convergente a todas as Ciências.

Para o Autor, “um sistema pode ser definido como um


complexo de elementos em interação.”43. Com esta definição
Bertalanffy constrói um conjunto teórico que tem servido ao
propósito de análise e referência a diversos propósitos

40 PEREIRA, L.C.B. & MOTTA, F.C.P., Op. Cit., p. 168.


41 Idem, Ibdem, p. 168.
42 BERTALANFFY, L. Von, Teoria Geral dos Sistemas, Editora Vozes, Petrópolis, 1977, p. 62.
64

científicos. Interessa-nos o conceito de sistema aberto, com o


qual se pode estudar organizações burocráticas. Um sistema é
dito aberto se há importação e exportação de matérias ou
energia.44

Dentre os autores que têm trabalhado com a abordagem de


sistemas em organizações burocráticas estão Daniel Katz &
Robert Kahn45. Estes autores abordam a organização burocrática
como um sistema aberto, segundo a perspectiva de Bertalanffy.

“A organização como sistema, tem uma entrada, um


resultado ou produto, mas este, no entanto não é
necessariamente idêntico às finalidades individuais dos membros
do grupo”46. “Nosso modelo teórico para a compreensão de
organizações é de um sistema de energia entrada-saída, no qual
o retorno da energia da saída reativa o sistema. As
organizações sociais são flagrantemente sistemas abertos,
porque a entrada de energias e a conversão do produto em nova
entrada de energia consiste em transações entre a organização e
seu meio ambiente.”47

“Nossos dois critérios básicos para identificar sistemas


sociais e determinar suas funções são: 1) traçar o padrão de
intercâmbio de energia ou atividade das pessoas, a medida em
que ele resulta em alguma espécie de saída, e 2) verificar como
a saída é transladada em energia que reativa o padrão.(...)
Esse modelo de um sistema de entrada-saída de energia é tirado
da teoria de sistema aberto, pela maneira exposta por von
Bertalanffy.”48

43 Idem, Ibdem, p. 84.


44 Idem, Ibdem, p. 167.
45 KATZ, D. & KAHN, R.L., Psicologia Social das Organizações, Editora Atlas, São Paulo, 1978.
46 Idem, Ibdem, p. 31.
47 Idem, Ibdem, p. 32.
48 Idem, Ibdem, p. 33.
65

Katz e Kahn analisam o tema segundo o modelo teórico que


propuseram e desta análise é importante destacar as
características que enumeram para as organizações sociais. “1)
As organizações possuem estruturas de manutenção, de produção e
apoio de produção. 2) As organizações têm um padrão elaborado e
formal de papéis, no qual a divisão de trabalho resulta em um
especificidade de papéis. 3) Existe na organização uma clara
estrutura de autoridade, que reflete o modo pelo qual são
exercidos o controle e a função gerencial. 4) Como parte da
estrutura gerencial existem mecanismos regulatórios bem
desenvolvidos e estruturas adaptativas. 5) Há uma formulação
explicita de ideologia, a fim de prover o sistema com normas
que fortificam a estrutura de autoridade.49

Os autores apresentam algumas propostas que pretendem


tornar mais ágil a abordagem de sistemas abertos para
organizações.

1) A maioria das organizações pode deslocar-se


proveitosamente para um certo grau de descentralização da
tomada de decisões nas subestruturas.
2) As formas democráticas podem ser introduzidas, não
tanto através de consultoria entre líderes e seguidores, mas
através de uma mudança na fonte de autoridade, dos dirigentes
para os membros.
3) As distinções entre classes de cidadania podem ser
desmanteladas.
4) O feedback do funcionamento organizacional pode
incluir comunicação sistemática a partir dos membros da
organização.

49 Idem, Ibdem, p. 65.


66

5) A responsabilidade de grupo para um conjunto de


tarefas pode assegurar maior envolvimento psicológico dos
indivíduos nas organizações.
6) É necessário haver reconhecimento mais explicito sobre
a natureza dos sistemas burocráticos. Por natureza, eles são
sistemas abertos e a tendência para ação como se fossem
fechados, estruturas rígidas, faz com que as pessoas sejam suas
servas e não seus chefes.”50

3.2 - O MDA E AS ABORDAGENS EM ADMINISTRAÇÃO

Encontramos notável semelhança entre o MDA e a abordagem


Científica ou Clássica, de Taylor e Fayol. Estas semelhanças
iniciam-se na própria forma de estruturar as abordagens, em que
Taylor, Fayol e Deming adotam princípios de administração, e
vão além, manifestando-se nas preocupações mais fundamentais
destes autores.

Para Taylor Cooperação íntima e cordial entre a direção e


os trabalhadores, encontra seu paralelo em Deming, com os
princípios Afaste o Medo e Remova as barreiras que privam as
pessoas do justo orgulho pelo trabalho bem executado. Estes
princípios manifestam a preocupação dos autores com as relações
entre administradores ou patrões e empregados.

Taylor ocupa-se em caracterizar as atribuições do


supervisor, que lida diretamente com os níveis mais elementares
da hierarquia. Deming também manifesta esta preocupação. Ambos
preocupam-se com o adestramento da mão-de-obra fundamental, o

50 Idem, Ibdem, p. 526-527.


67

operário. Identifica-se em ambos a preocupação com o controle e


o máximo aproveitamento do trabalhador.

Deming atribui a administração a tarefa de melhorar o


sistema produtivo, através de técnicas como o CEP. Taylor
separa as atividades de planejamento e execução das operações
entre administradores e operários. Para Taylor e Deming, o
operário deve ocupar-se unicamente em produzir o máximo.

Outra semelhança entre Deming e Taylor encontra-se entre


o Princípio da Exceção de Taylor e o CEP, adotado por Deming
como modelo de decisão. O Princípio da Exceção diz que “a
direção não deve receber senão relatórios condensados,
resumidos,(...) os quais apontarão todas as exceções notáveis,
boas ou más, ...”51 O que é o CEP - Controle Estatístico do
Processo - senão a formalização através de fórmulas matemáticas
da exceções boas e más ?. Deming encontrou uma forma
determinística para avaliar se os resultados das operações na
organização são exceções boas ou más.

Com o trabalho de Fayol, Deming também apresenta muitas


semelhanças, ambos estruturam seus modelos sob a forma de
princípios; e mais do que isto está a clara formalização do
divisão do trabalho entre coordenação e execução. Estes autores
atribuem unicamente a administração a responsabilidade pelo
planejamento das atividades, restando ao trabalhador de baixo
nível hierárquico a operação.

Pelo menos um princípio administrativo destes autores são


semelhantes; para Fayol, o princípio número 14 diz: Espírito de
Equipe, harmonia e união entre as pessoas são grandes forças
para a organização. Em Deming encontramos o princípio número 9:
Rompa as barreiras entre os diversos departamentos. Estes
68

princípios decorrem da observação empírica dos conflitos


internos das organizações. Estes autores idealizam uma
organização sem conflitos, onde a harmonia esteja presente.

Na comparação do MDA com a abordagem de Relações Humanas,


há que se registrar uma notável coincidência: Deming trabalhava
na companhia Western Electric em Hawthorne, como engenheiro de
transmissores, quando a equipe liderado por Elton Mayo ali
realizou seu experimento. Walton em sua nota biográfica de
Deming afirma que “algumas de suas idéias sobre administração
estavam calcadas em sua experiência em Hawthorne, (...)”52 .
Entretanto não encontramos registro do envolvimento de Deming
com o experimento de Mayo.

A semelhança entre o MDA e a Escola de Relações Humanas


não reside, como nas abordagens Científica ou Clássica, em
aspectos diretamente enumeráveis, reside na principal conclusão
de Mayo, a existência de grupos informais dentro da
organização. A partir desta constatação, muitos trabalhos foram
desenvolvidos, procurando aproveitar a energia do grupo
informal em favor da organização. O MDA não se furta a este
fim, Scholtes, colaborador de Deming, desenvolveu este aspecto.
Scholtes diz em seu livro, “incluímos métodos para formação e
manutenção de grupos, planejamento e gerenciamento de projetos
e realização de reuniões.”53

Vimos que a abordagem Behaviorista centra-se no homem,


que agrupa-se ou associa-se para satisfazer necessidades
próprias. É uma proposta que fundamenta-se na auto determinação
e auto controle dos indivíduos. Analisando o MDA frente ao
Behaviorismo, chegamos a seguinte constatação:

51 Taylor, Op. Cit, p.120. Grifo nosso.


52 WALTON, M., O Método Deming de Administração, Editora Marques-Saraiva, Rio de Janeiro, 1989, p.5.
53 SCHOLTES, P.R., Times da Qualidade, Qualitymark Editora, Rio de Janeiro, 1992, p I-2.
69

O MDA baseia-se justamente no oposto, isto é, vimos que o


MDA propõe o controle sobre as pessoas. Não um controle
disciplinar, como nas abordagens Científica ou Clássica, nas em
um controle sobre seu desempenho dentro da organização. Deming
sugere o uso de técnicas como o Controle Estatístico do
Processo - CEP - para se medir a produtividade das pessoas e
assim orienta-las a produzir cada vez mais. Em suas próprias
palavras, “ o objetivo da liderança deve ser melhorar o
desempenho de homens e máquinas, melhorar a qualidade, aumentar
a produção, (...) possibilitar que todas as pessoas em bases
constantes, façam um melhor trabalho, com mais satisfação.”54

Comparado com o trabalho de Douglas McGregor, o MDA


encontra paralelo com a Teoria X; estando portanto no mesmo
nível que as abordagens Científica ou Clássica. Consideramos
que o MDA não apresenta similaridades significativas com o
Behaviorismo.

Com a abordagem Burocrática ou Estrutural, o MDA


apresenta muita semelhança, isto é, insere-se no seu contexto.
Identificamos no MDA os principais componentes da teoria
burocrática de Weber; aliás, o modelo weberiano nos permite uma
completa leitura do MDA. Este, apresenta as regras (definições
operacionais), a rigorosa divisão hierárquica, a separação
entre administradores e operários da produção, a racionalidade
organizacional.

Segundo Pereira & Motta55 as abordagens de Taylor, Fayol,


Mayo e de alguns behavioristas, operacionalizam a organização
burocrática de Weber. Partilhamos desta visão e incluímos o

54 DEMING, W.E., Qualidade: A Revolução da Administração, Editora Marques-Saraiva, Rio de Janeiro, 1986,
p.184.
70

trabalho de Deming nesta lista. Ou seja, a nosso ver, o MDA


também contribui para operacionalizar a burocracia de Weber.

Deming tem conhecimento da Teoria Geral dos Sistemas de


Bertalanffy. Embora não tenhamos encontrado na obra de Deming
nenhuma referência a Bertalanffy e outros autores da abordagem
Sistêmica.

O MDA propõe a organização como um sistema aberto, que


tem uma entrada, um processamento e uma saída. Identificamos
também no MDA a visão de Katz & Kahn, onde, neste modelo, há o
retorno da energia de saída que reativa o sistema. Isto para
Deming é fundamental para a sobrevivência da organização.
Deming entende que a organização existe com o propósito de
atender a necessidades dos consumidores e a contínua avaliação
do atingimento deste propósito, deve reorientar a organização.

Outras características enumeradas por Katz & Kahn


encontram evidente similaridade com o MDA; a) as estruturas de
manutenção, produção e apoio a produção; b) padrões formais de
papéis, resultantes da divisão do trabalho; c) clara estrutura
de autoridade e d) explícita formulação de uma ideologia, a fim
de promover o sistema e fortificar a autoridade. O MDA
Apresenta similaridade com esta abordagem.

Este capítulo teve como objetivo identificar semelhanças


e diferenças entre o MDA e diversas abordagens em
Administração, que serão devidamente analisadas no Capítulo V.

--ooOoo--

55 PEREIRA, L.C.B. & MOTTA, F.C.P., Introdução a Organização Burocrática, Editora Brasiliense, São
Paulo, 1986, p. 186.
71
72

CAPÍTULO IV

CULTURA E IDEOLOGIA NO MDA

“Por ora, é suficiente definir cultura como a maneira de


viver de uma sociedade. Esta maneira de viver compreende
inúmeros pormenores referentes ao comportamento, mas entre eles
há sempre fatores em comum. Representam todos a atitude normal
e previsível de qualquer dos membros da sociedade diante de uma
dada situação. Em conseqüência, apesar do número infinito de
pequenas variantes que podem ser encontradas na atitude de
alguns indivíduos, ou mesmo nas atitudes de um mesmo indivíduo
em momentos diferentes, verificar-se-á que a maior parte das
pessoas, em uma sociedade, reagirá geralmente da mesma forma a
uma dada situação”1. Esta definição de Ralph Linton poderia nos
conduzir ao seguinte raciocínio: não importa em que ambiente
estiver, o indivíduo reagirá a uma determinada situação de uma
forma conhecida, independentemente das sutis influências
externas.

Este raciocínio teria efeito deletério, pois implicaria a


não-evolução dos métodos de administração e, por consequência,
a estagnação das organizações burocráticas. No entanto, o
próprio Linton indica a saída para esse pensamento tortuoso ao
afirmar que “os padrões culturais característicos de qualquer
sociedade vêm-se ajustando uns aos outros estreitamente”2. Diz

1 LINTON, R., The Cultural Background of Personality, Routledge & Kegan Paul Ltd., London, 1952. In:
CARDOSO, F.H. & IANNI, O., Homem e Sociedade, Cia. Editora Nacional, São Paulo, 1980.
2 Idem, Ibdem, p.
73

também que “o sistema de organização de uma sociedade é, em si,


um aspecto da cultura”3.

Dessa forma, pode-se agora passar à definição de cultura


organizacional. Considerando-se uma organização como um
microcosmo que reproduz a estrutura de uma sociedade, a
definição de cultura organizacional que nos parece caber melhor
é a de Edgar Henry Schein: “o termo cultura deve ser reservado
para o nível mais profundo das suposições básicas e crenças que
são compartilhadas pelos membros de uma organização, que as
operam inconscientemente, e que definem de forma ad hoc a visão
que uma organização tem de si mesma e do seu ambiente”4. Em
outras palavras, cultura é uma propriedade de uma unidade
social, no caso em questão, de uma organização.

Essa “propriedade” só pode se estabelecer, na opinião de


Schein, quando um grupo de pessoas partilha um número
significante de experiências na solução de problemas da
organização, internos e externos. Essas experiências comuns
levariam o grupo, ainda segundo Schein, a estabelecer uma visão
única do mundo ao seu redor e de sua posição dentro dele. Nesse
sentido, cultura seria “o produto de um aprendizado prático,
somente encontrável em grupos com históricos significativos”5.

Aqui surge a seguinte questão: uma dada organização


possui uma única cultura ou várias subculturas? Analisando os
diversos grupos que se formam dentro da organização, pode-se
encontrar diferentes subculturas - uma subcultura nascida no
nível gerencial, uma outra gerada no chão da fábrica, uma
terceira, criada dentro dos escritórios. Nesses casos, para que

3 Idem, Ibdem, p.
4 SCHEIN, E. H., Organizacional Culture and Leadership, Jossey-Bass Publishers, São Francisco, 1985.
74

a cultura da organização possa ser vista como única, as


experiências vividas em conjunto pelos grupos internos devem
ser significativas e de longa data.

A introdução de um novo indivíduo em um grupo traz novas


experiências, na verdade uma nova subcultura que passará a
influenciar todo o grupo e ser influenciada pela cultura pré-
existente. Seu grau de influência será tanto maior quanto seu
posto na hierarquia do grupo. Ora, se a cultura é “aprendida”
através de experiências, esse indivíduo pode transformá-la a
partir do instante em que passa a entender a dinâmica do
processo de aprendizado.

Assim, chegamos a uma definição de cultura ainda mais


completa, formulada pelo próprio Schein, e que se encaixa com
maior precisão em nosso objeto de estudo, o MDA: A cultura
organizacional como “um padrão de suposições básicas -
inventadas, descobertas ou desenvolvidas por um dado grupo à
medida em que ele aprende a lidar com problemas de adaptação
externa e integração interna - que funcionam bem a ponto de
serem consideradas válidas e, assim, passíveis de serem
ensinadas aos novos membros como a maneira correta de perceber,
pensar e sentir-se em relação àqueles problemas”6.

É preciso lembrar que, ao chegar ao Japão, Deming


encontrou uma cultura muito diferente da sua. Social e
organizacionalmente, os japoneses tinham valores culturais
cristalizados por milhares de anos de história. Para aplicar
seu método - e desenvolvê-lo -, Deming obrigou-se a penetrar
nesses valores, tarefa que exige grande esforço para um

5 Idem, Ibdem, p.
6 Idem, Ibdem, p.
75

estrangeiro. Pois, diferentemente de uma coisa, um valor possui


conteúdo e significado. Pelo conteúdo, o valor se distingue
como objeto empírico de outros objetos; pelo significado, o
valor sugere outros objetos com os quais foi associado no
passado7. Por exemplo, uma palavra tem um conteúdo composto de
elementos auditivos e visuais e um significado que sugere o
objeto que foi feita para designar. Uma estátua sagrada
utilizada em cultos possui para determinada religião, além do
seu conteúdo visual e táctil, um significado decorrente do fato
de ela ter sido relacionada com palavras, ritos, mitos etc. Por
outro lado, uma pedra, enquanto coisa, não tem significado,
apenas conteúdo. A compreensão de um significado exige preparo
ou aprendizado: o indivíduo deve ser colocado em condições
definidas e ensinado no uso de um dado valor.

O desenvolvimento japonês do pós-guerra até nossos dias


surpreende por não ter destruído completamente alguns dos
valores fundamentais da cultura do país: o trabalho em equipe,
o consenso, a devoção à empresa. Como já havia demonstrado
Emile Durkheim, o desenvolvimento de sociedades organizadas vem
sempre acompanhado da desintegração dos padrões tradicionais da
ordem social, como crenças, ideais e valores, que dão lugar a
uma série de crenças diferenciadas, baseadas na estrutura
ocupacional da nova sociedade8.

Especialista em cultura e história japonesas, o


australiano Murray Sayle construiu uma teoria que explica em
boa medida a sobrevivência daqueles valores. De acordo com
Sayle, as corporações japonesas combinam os valores culturais
da cultura do arroz e o espírito do samurai. O primeiro ajuda a

7 ZNANIECKI, F., Values as Cultural Objects. In: The Methods of Sociology, Reinhart & Farrar, New York,
1934.
8 MORGAN, G. Images of Organizations, Sage Publications, Newbury Park, 1986.
76

compreender a solidariedade e o trabalho em equipe, enquanto o


último revela a origem de muitas das características
administrativas e dos padrões dos relacionamentos
interempresariais, relações estas que desempenham até hoje um
papel fundamental no sucesso japonês.

A teoria de Sayle lembra que a cultura do arroz no Japão


sempre foi uma atividade precária, graças às difíceis condições
climáticas e à escassez de terra. Por isso, cultivar arroz
tornou-se no país um trabalho cooperativo. Não havia
fazendeiros independentes e esperava-se de cada família o
melhor desempenho, de forma a que toda a coletividade
progredisse. Se uma família não conseguisse cumprir sua meta de
produção, toda a comunidade era prejudicada. O respeito e a
dependência mútuas eram a única forma conhecida de
sobrevivência. É esta “cultura do arroz” que vemos hoje nas
fábricas japonesas.

Os fazendeiros estavam sempre dividindo sua produção com


indivíduos que cuidavam de suas vidas e propriedades, os
samurais. Estes dependiam dos seus senhores, os fazendeiros, e
de todo o sistema produtivo. Essa dependência pode ser
observada hoje no Japão no relacionamento entre as corporações
e a sociedade: aquelas existem para servir esta. É o mesmo tipo
de relação entre o sistema bancário e as empresas. Enquanto no
Ocidente os bancos administram investimentos privados, no Japão
eles assumem a responsabilidade de ajudar quem precisa.

Tais valores culturais, entre outros fatores, construíram


o sucesso do Japão. A divisão do trabalho nas sociedades
industriais criou um certo “gerenciamento cultural”, na opinião
de Gareth Morgan. Segundo ele, pessoas que trabalham em
77

fábricas ou escritórios em Detroit, São Petersburgo, Nova


Delhi, Tóquio ou São Paulo pertencem todas à mesma cultura
industrial. Seu trabalho e vida social seriam muito diferentes
daqueles dos indivíduos que vivem em sociedades dominadas por
sistemas de produção artesanais ou domésticos.

Com efeito, pode-se demonstrar a proposta de Morgan


comparando-se os valores culturais assumidos por um trabalhador
rural após ter migrado para uma cidade grande. Fato comum no
Brasil, a migração das áreas rurais para as urbanas traz novos
valores culturais aos que chegam, forçando-os à integração
rápida ao modo de produção capitalista, inexistente na roça.

Similaridades e diferenças culturais entre indivíduos


estão hoje mais associadas ao tipo de trabalho e organização a
que eles se dedicam do que a fatores como origem e
nacionalidade. Pode-se argumentar que parte desse novo
comportamento deve-se à ação dos meios de comunicação. Mas é
importante lembrar que o trabalhador passa mais de cinqüenta
horas semanais em atividades relacionadas ao seu emprego - o
próprio trabalho, transporte, refeições com os colegas -, tempo
muito superior ao gasto com atividades de lazer.

No Japão, com seu sistema de organização feudal, essa


realidade é ainda mais aparente. Os valores culturais
relacionados à cultura do arroz e aos antigos samurais moldaram
uma sociedade capitalista muito diversa das que existem no
Ocidente. É comum o trabalhador japonês devotar sua vida
inteira a um único emprego, submisso ao chefe e orgulhoso de
seu cargo, por mais humilde que seja. Para o japonês, isso não
é humilhação, mas respeito à hierarquia e reconhecimento da
autoridade.
78

O Japão talvez seja apenas o exemplo mais ilustrativo do


que Morgan chama de gerenciamento cultural. “O ponto é que a
cultura, seja árabe, britânica, canadense, chinesa, francesa ou
americana, molda o caráter da organização”9.

A influência de uma cultura externa não é homogênea. Da


mesma forma como os indivíduos, os grupos e as organizações
também têm características diferentes, mesmo partilhando coisas
em comum. É o que chamamos hoje de cultura organizacional, ou
seja, a cultura ou sub-cultura própria de uma organização
burocrática. É essa cultura organizacional, na visão de Morgan,
que terá influência decisiva na capacidade da organização de
lidar com os desafios que lhe aparecem.

Traduzida em rotinas, rituais e comportamentos, a cultura


organizacional determina se uma determinada empresa trabalha
como uma família ou estimula a competição feroz dentro de suas
fileiras; se ela buscará a todo custo a liderança em seu
segmento ou se contentará em ganhar pouco a pouco o mercado.
Morgan entende que “não estaríamos exagerando se afirmássemos
que a cultura corporativa é o fator isolado mais importante na
determinação do fracasso ou sucesso de uma empresa”10.

Já sabemos que a cultura organizacional garante a


sobrevivência do grupo diante do ambiente externo e promove
internamente a integração aos processos que aumentam a
capacidade do grupo de continuar sobrevivendo e se adaptando.
Nesse momento, surge então uma nova pergunta: Por que é tão

9 Idem, Ibdem. p.
10 Idem, Ibdem, p.
79

difícil mudar uma cultura? Para respondê-la, recorremos


novamente a Edgar Schein.

Vimos que a cultura corporativa é “propriedade” de uma


organização e se desenvolve a partir de um número razoável de
experiências comuns partilhadas pelo grupo. É razoável supor
que, a partir de certo momento, quando a empresa já vivenciou
todos os tipos de situações possíveis, ela passe a agir sempre
da mesma maneira. Não o faz, e a explicação está no conceito de
“ideologia”, assim definido por Schein: “às vezes, ideologia é
o componente consciente do conjunto de hipóteses que constituem
uma cultura corporativa. Outras, é o conjunto de
racionalizações feitas para explicar comportamentos estranhos
ou supersticiosos. E outras vezes ainda, a ideologia exprime
ideais e aspirações futuras bem como realidades presentes e
funciona como um guia e como incentivo aos membros do grupo. A
ideologia muitas vezes carrega discursos sobre a missão
principal da empresa, seus objetivos, os meios preferidos para
atingi-los e a forma de relacionamento desejada para os
membros”11.

Entre as várias formas de se definir ideologia, a que nos


parece mais lógica é a seguinte, proposta por Chauí: “Ideologia
é o sistema ordenado de idéias ou representações e das normas e
regras como algo separado e independente das condições
materiais, visto que seus produtores - os teóricos, os
ideólogos, os intelectuais - não estão diretamente vinculados à
produção material das condições de existência”12. Por “produção
material das condições de existência” entenda-se “trabalho não-
intelectual”.

11 SCHEIN, Op. Cit.


80

Em outras palavras, as idéias parecem produzidas apenas


pelo pensamento, posto que os pensadores estão distantes da
produção material. Ao invés de parecer que os pensadores estão
distantes do mundo material e por isso suas idéias refletem
essa separação, o que aparece é que as idéias estão separadas
do mundo, são entidades autônomas e o explicam.

Tal raciocínio, conduzido por Marilena Chauí, baseia-se


no trabalho de Marx e Engels, mais precisamente em A Ideologia
Alemã. Ainda seguindo os dois autores alemães, Chauí nos leva a
uma formulação mais pragmática de ideologia, que seria “um
conjunto lógico, sistemático e coerente de representações
(idéias e valores) e de normas ou regras de conduta que indicam
e prescrevem aos membros de uma sociedade o que devem pensar e
como devem pensar, o que devem valorizar e como devem
valorizar, o que devem sentir e como devem sentir, o que devem
fazer e como devem fazer. Ela é, portanto, um corpo explicativo
e prático de caráter prescritivo, normativo e regulador cuja
função é dar aos membros de uma sociedade dividida em classes
uma explicação racional para as diferenças sociais, políticas e
culturais, sem jamais atribuir tais diferenças à divisão da
sociedade em classes, divisão esta feita a partir da esfera de
produção”13.

Na opinião de Chauí - e da maioria dos pensadores


marxistas - a função da ideologia é de mascarar as diferenças,
de forma a fazer com que pareçam não ter origem na divisão da
sociedade em classes, divisão esta criada pelo modo de
produção. A ideologia teria também a função de fornecer aos
membros da sociedade um sentimento de identidade social através

12 CHAUÍ, M., O Que É Ideologia, Editora Brasiliense, São Paulo, 1980.


13 Idem, Ibdem, p.
81

de referenciais comuns a todos, como humanidade, liberdade,


igualdade, nação e estado.

Ainda segundo Chauí, como explicação teórica do real


(através da ciência, da filosofia e da religião), a ideologia
nunca pode mostrar sua própria origem. Do contrário, revelaria
o caráter classista da sociedade e perderia sua razão de ser,
qual seja a de dar explicações racionais e universais que
escondem as diferenças entre os homens. “Ou seja, nascida por
causa da luta de classes, a ideologia não pode pensar realmente
a luta de classes que lhe deu origem”14.

Todo corpo teórico deve possuir uma coerência racional,


sob pena de deixar de existir. Assim, a ideologia possui
lacunas que nunca poderão ser preenchidas. O discurso
ideológico é coerente porque entre suas “partes” existem certos
vazios. Ele é coerente por causa das lacunas.

Por isso, é errado acreditar ser possível substituir uma


ideologia “falsa”, que omite e que pertenceria aos dominantes,
por uma “verdadeira”, que diz tudo e seria a dos dominados. É
errado porque uma ideologia que tudo revelasse já não seria
mais uma ideologia e também porque falar em “ideologia dos
dominados” é um contra-senso, já que toda ideologia é um
instrumento de dominação. Se determinada classe social dominada
consegue impor às outras sua ideologia, ela passa a ser
dominante.

Um dos instrumentos de imposição da ideologia é


constituído pelas organizações. Gareth Morgan afirma:

14 Idem, Ibdem, p.
82

“costumamos ver as organizações como empresas cujos objetivos


são satisfazer os interesses de todos, mas existem muitas
evidências que sugerem ser esta afirmação mais uma ideologia
que a realidade: organizações são frequentemente usadas como
instrumentos de dominação das elites”15.

Para Max Weber, a dominação acontece de várias formas. As


mais sutis ocorrem através da imposição de leis e regras, que
são percebidas pelos dominantes como um direito que lhes cabe -
direito de dominar através desses instrumentos - e pelos
dominados como um dever - dever de obedecê-las.

Os estudos de Weber o levaram a identificar três tipos de


dominação social que se tornariam formas de autoridade e poder.
Ele as denominou dominação carismática (um líder controla uma
comunidade através de suas virtudes ou qualidades pessoais),
tradicional (quando a classe que domina o faz sustentada em
tradições, como numa monarquia, por exemplo) e racional-legal
(baseada em leis, normas e regras de conduta). Segundo Weber, a
capacidade dos dominantes de bem utilizar qualquer uma dessas
formas de autoridade depende de sua habilidade em encontrar a
legitimação do seu poder em uma ideologia ou nas crenças dos
dominados. O pensador alemão acredita ainda que cada forma de
dominação tem o seu próprio corpo teórico que a legitima e sua
própria forma de organização administrativa.

Ainda de acordo com Weber e também com o sociólogo


francês Robert Michels, a burocracia representa importante
papel na dominação. “Para Weber, o processo de burocratização
traz uma séria ameaça à liberdade de espírito e aos valores da

15 MORGAN, Op. Cit., p.


83

democracia, pois os que estão no controle detêm os meios para


subordinar os interesses e o bem-estar das massas”16.

Já Michels vê na burocracia tendências oligárquicas. De


acordo com o pensador francês, as organizações modernas acabam
sempre sob o domínio de pequenos grupos, mesmo contra o desejo
de seus líderes. Em estudos sobre organizações supostamente
democráticas, como partidos políticos e sindicatos, Michels
encontrou grupos dirigentes que monopolizavam o poder. Mesmo
entre líderes eleitos democraticamente, munidos das melhores
intenções e preocupados com os interesses dos demais membros da
organização, Michels descobriu tendências para a elitização,
para a defesa de interesses próprios e para uma vontade extrema
de se agarrar ao poder a qualquer custo.

Nesse ponto, as idéias acima encontram as de Karl Marx.


Para Weber, a condução da sociedade moderna é fundamentada num
processo de dominação através do racionalismo. Para Marx, ela
se fundamenta na dominação gerada pela mais-valia e pela
acumulação de capital. (É importante lembrar que a mais-valia,
ou a quantidade de trabalho que o capitalista deixa de pagar ao
trabalhador, é que permite a acumulação de capital.) Nos
últimos anos, vários autores marxistas buscaram traçar ligações
entre esses diferentes pontos de vista e a maneira como o
processo de racionalização serve aos interesses da acumulação
de capital ou, em outras palavras, tentaram, baseados em Weber
e Marx, como a organização moderna se fundamenta em processos
de dominação e exploração de muitos matizes.

Relembrando Marx e seu “motor da história”, a luta de


classes, fica mais fácil perceber como as corporações

16 Idem, Ibdem, p.
84

construiram seu arcabouço de exploração e domínio. Gareth


Morgan nos dá um excelente exemplo ao afirmar que a dualidade
entre capital e trabalho acabou por criar dois mercados de
trabalho distintos, chamados “primário” e “secundário”. O
mercado “primário” é formado, de acordo com Morgan, pelos
empregos de carreira, nos quais um alto grau de especialização
e conhecimentos específicos são requisitos indispensáveis aos
profissionais. Já o “secundário” é constituído pelos
profissionais com baixo grau de especialização e baixos
salários.

Os primeiros são fruto da proliferação de organizações


burocráticas e tecnocráticas, cujos empregados são estimulados
a trabalhar não apenas por salário, mas também pela satisfação
profissional, pelos planos de carreira e pela garantia do
emprego. Espera-se desses profissionais um compromisso e
lealdade para com a empresa, já que seu treinamento e
preparação custam muito caro.

Dos trabalhadores que pertencem ao mercado secundário não


se exige nada disso. Eles são admitidos e despedidos ao sabor
da conjuntura econômica, não requerem grandes investimentos no
seu treinamento e servem como uma espécie de “contrapeso”:
quando os negócios vão bem, contrata-se; quando vão mal,
despede-se essa massa pouco qualificada, preservando-se a
elite, ou seja, os funcionários que pertencem ao mercado
primário.

Mas, mesmo dentro desses dois grandes mercados existem


subdivisões. Cada categoria está submetida a diferentes
controles, explica Morgan. Com o aperfeiçoamento da burocracia
e da tecnologia, os trabalhadores do mercado primário estão
85

cada vez mais sujeitos aos instrumentos de controle


originariamente criados para os trabalhadores do mercado
secundário. “Para aumentar a previsibilidade das suas operações
internas, as organizações consideram necessário tornar as
características de cada ocupação ainda mais específicas bem
como ampliar os requisitos mínimos de cada função. Dessa forma,
criam diferentes oportunidades para os diversos grupos de
trabalhadores”17.

A crescente segmentação do mercado de trabalho tem sido


decisiva na criação ou pelo menos na manutenção da sociedade
dividida em classes. Portanto, a segmentação do mercado de
trabalho contribui enormemente para a perpetuação da luta de
classes. Na verdade, o microcosmo de uma organização espelha a
sociedade em que ela subsiste. Os trabalhadores estão
frequentemente competindo entre si para proteger seus próprios
interesses ao invés de se perceberem como produtos de um
sistema que os coloca em oposição.

Marx e Engels já demonstraram que a relação do indivíduo


com sua classe é alienada. “Assim como a natureza, a sociedade
e o estado aparecem para a consciência imediata dos indivíduos
com poderes separados e estranhos que os dominam e governam,
também a relação dos indivíduos com sua classe lhes aparece
imediatamente como uma relação com algo já dado e que os
determina a ser, agir e pensar de uma forma fixa e determinada.
A classe ganha autonomia em relação aos indivíduos de modo que,
em lugar de aparecer como resultante da ação deles, aparece
como sua causadora”18.

17 Idem, Ibdem, p.
18 CHAUÍ, Op. Cit., p.
86

Analogamente, a organização aparece ao trabalhador com


poderes que o dominam e controlam. Também a relação desse
trabalhador com sua “categoria” determina seu comportamento,
por lhe aparecer definitiva e imutável. Assim, os “inimigos” a
serem “combatidos” seriam as outras categorias profissionais e
a organização, ficando o sistema, o real poder dominante, imune
à reflexão e à consciência do trabalhador.

Neste capítulo, vimos até aqui que cultura e ideologia


são instrumentos eficientes no estabelecimento de um método
administrativo, na medida em que desenvolvem e propagam
valores. Como lembra Gareth Morgan, “os grupos mais coesos são
aqueles que crescem ao redor de um único e compartilhado
discurso, enquanto que os grupos mais fragmentados se
caracterizam por possuir múltiplas realidades”19. Ora, grupos
ou organizações que se solidificam em torno de um conjunto de
valores e os impõem, interna e externamente, estão criando
ideologia, as condições para perpetuá-la e também o ambiente
onde exercerão sua dominação.

O conceito de “conjunto de valores” é vasto, já que todo


corpo teórico é em última análise um conjunto de valores. No
âmbito deste trabalho, a Teoria Geral da Administração deve ser
encarada como um conjunto tal e, por isso, ser considerada
ideológica. Para comprovar essa afirmação, recorremos a
Maurício Tragtenberg. Em seu artigo A teoria Geral da
Administração é uma Ideologia?; este autor enuncia as
determinações histórico-sociais que geraram as teorias macro e
micro-industriais desde as Revoluções Industriais inglesa,
francesa e alemã. Analisando as teorias globais de Saint-Simon,
Fourier e Marx e as teorias micro-industriais de Taylor, Fayol
e Elton Mayo, Tragtenberg responde a questão propostas em seu
87

artigo, afirmando que a “Teoria Geral da Administração é


ideológica, na medida em que traz em si a ambiguidade básica do
processo ideológico, que consiste no seguinte: vincula-se ela
às determinações sociais reais, enquanto técnica (de trabalho
industrial, administrativo, comercial) por mediação do
trabalho; e afasta-se dessas determinações sociais reais,
compondo-se num universo sistemático, organizado, refletindo
deformadamente o real, enquanto ideologia”20.

Conclui o autor: “as teorias administrativas são


dinâmicas, elas mudam com a transição das formações sócio-
econômicas, representando os interesses de determinados setores
da sociedade que possuem o poder econômico-político, sob o
capitalismo ocidental (...) No sentido operativo, elas cumprem
a função de elemento mediador entre a macrossociedade e a
microorganização pelo agente, o administrador. No sentido
genético, constituem-se em repositório organizado de
experiências, cuja herança cumulativa é uma condicionante das
novas teorias, por exemplo, a persistência de aspectos
tayloristas em Elton Mayo e na Escola Estruturalista”21.

O MDA encerra uma proposta de cultura organizacional que


pretende constituir o fundamento de uma cultura da qualidade.
Esta doutrina manifesta-se, é claro, através de seus princípios
de administração; mas, não somente nisto. O MDA pretende uma
cultura baseada numa racionalidade, que Deming fundamenta em
dois aspectos:

19 MORGAN, Op. Cit., p.


20 TRAGTENBERG, M., A Teoria Geral da Administração é uma Ideologia ?, Revista de Administração de
Empresas, Rio de Janeiro, out./dez 1971.
21 Idem, Ibdem, p.
88

O primeiro é o que chama raciocínio estatístico22, a


interpretação dos fenômenos organizacionais de uma forma
quantitativa; isto é, todo o fenômeno pode ser medido e
avaliado através de números. Esta proposição revela a
preocupação em remover toda possibilidade de incerteza e
dúvida. No MDA não há espaço para o talvez.

O segundo aspecto desta cultura da qualidade é o


conhecimento profundo23. Este aspecto foi introduzido na edição
em português do Out of Crisis, em 1990 e não está presente nas
edições anteriores em inglês. O conhecimento profundo está
dividido em 4 partes:

A) Uma visão geral do que é um sistema

B) Elementos de Teoria da Variação

C) Elementos da Teoria do Conhecimento

D) Elementos de Psicologia

Estes quatro elementos são para Deming inseparáveis; é


sua interação que fornece ao administrador o discernimento
necessário para aplicar os 14 princípios. Vemos aqui uma
cultura organizacional; valores e mitos a serviço de uma
racionalidade.

Esta cultura organizacional insere-se em um contexto mais


amplo, o das ideologias. Como vimos em Tragtenberg, as teorias
e abordagens administrativas constituem-se ideologias, sistemas
explicativos da realidade vivida pelos membros da organização.

22 DEMING,W.E., Qualidade: A Revolução da Administração, Editora Marques-Saraiva, Rio de Janeiro, 1990.


p. 247
23 Idem, Ibdem, Prefácio, p. XVII-XXV.
89

Deming explicita a ideologia do MDA nos princípios de


número 8- Afaste o Medo e 12- Remova as barreiras que privam as
pessoas do justo orgulho pelo trabalho bem realizado 24.

Segundo estes princípios, o trabalhador está interessado , além


de um bom salário, na sua realização profissional. Ora, numa
organização os interesses particulares de seus membros vão
muito além disto.

O MDA apresenta-se como científico; portanto válido e


inquestionável, cuja finalidade básica é justificar-se enquanto
prática administrativa, sacramentada pela Ciência. Deste modo o
MDA oculta o seu objetivo, maximizar a mais valia e manter a
alienação do trabalho. Esta alienação decorre dos métodos e
técnicas que retiram do trabalhador a oportunidade de
participar das decisões acerca dos meios e formas de produção.
Toda a decisão está baseada em métodos científicos.

A manutenção e a propagação desta doutrina dá-se através


dos valores de sua cultura, o conhecimento profundo e o
raciocínio estatístico (que é o próprio exercício de sua
racionalidade) e cujo propósito é orientar, limitar e moldar os
indivíduos à organização.

Portanto, o MDA é uma doutrina ideológica, fundamentada


nos valores de uma certa cultura da qualidade, e que pretende
através de uma pseudo ciência, ocultar as contradições que
encerra.

24 Vide Capítulo II.


90

--ooOoo--
91

CAPÍTULO V

CRÍTICAS AO MDA

Neste capítulo estaremos traçando um perfil do MDA,


baseado nos estudos e análises que conduzimos nos capítulos
anteriores. A partir deste perfil, vamos analisar as questões
propostas no capítulo I, para finalmente passarmos à crítica do
que foi exposto. Vimos no capítulo III que o MDA guarda
semelhanças e diferenças com as diversas abordagens em
Administração que enumeramos. Estaremos resumindo estes
aspectos.

A semelhança do MDA com a abordagem Científica ou


Clássica é a mais notável. Não somente pela forma de
apresentação; princípios, quase proverbiais, de Administração,
mas pelo contexto em que insere o homem e trata de suas
relações sociais. A crença numa racionalidade, que se apoia em
técnicas e métodos de gestão, reduzem o homem a mais um insumo
de produção, um instrumento desprovido de qualquer sentimento,
guiado somente pela razão.

Em relação a abordagem de Relações Humanas o MDA


apresenta uma semelhança; não diretamente com a abordagem
desenvolvida por Mayo a partir dos experimentos de Hawthorne,
mas com uma degeneração dela. Aquela que a partir das
conclusões de Mayo desenvolveu técnicas e métodos manipuladores
para canalizar a energia dos grupos informais em proveito da
organização somente. Deming incentiva a formação de grupos e
equipes de trabalho. Estes grupos devem ser compostos por
92

pessoas que detêm algum conhecimento acerca do assunto a ser


tratado e estes assuntos versam, via de regra, à otimização dos
processos produtivos. Há de se questionar quem é ou são os
maiores beneficiários destes grupos.

Com a abordagem Estrutural ou Burocrática, o MDA tem


profunda relação. Como dissemos na capítulo III, o MDA é de
fato mais uma proposta para operacionalizar o burocracia de Max
Weber. Identifica-se no MDA todas as características enumeradas
por Weber.

Deming faz uso da abordagem Sistêmica em seu método. Ele


reconhece a utilidade a abordagem para avaliar o meio ambiente
da organização. O conceito de sistema aberto, como analisado
por Katz & Kahn é de grande valia para o MDA; sua importância
reside no aspecto da retroalimentação de parte da energia de
saída, no próprio sistema. Deming faz largo uso deste conceito.

Disto resulta o perfil que propomos para o MDA; o método


é uma edição revisada da abordagem Científica ou Clássica,
acrescida de conceitos que não existiam à época de Taylor e
Fayol, e que surgiram portanto posteriormente. Estes conceitos,
emprestados às abordagens de Relações Humanas e Sistêmica, têm
a missão de suprir lacunas deixadas pela abordagem Científica
ou Clássica e são de uma conveniência funcional para o MDA.
Isto é, os conceitos agregados ao modelo científico ou clássico
pelo MDA visam maximizar o aproveitamento dos recursos da
organização, contribuindo para o aprofundamento da exploração
de força de trabalho.”

De posse deste perfil do MDA, podemos passara análise das


questões que propusemos no capítulo I. A primeira questão é
acerca do ineditismo do MDA em relação a abordagens
administrativas já estudadas. As análises que empreendemos
93

evidenciam que o MDA muito pouco, ou mesmo nada, apresenta de


novo, ele não propõe uma abordagem que seja diferente do que já
é conhecido para organizações e administração.

A segunda questão que propusemos tem relação com a


primeira, visto que sua formulação depende do resultado da
questão anterior. Analisaremos nesta questão a classificação do
MDA em alguma abordagem com a qual o comparamos, Científica ou
Clássica, Relações Humanas, Behaviorismo, Estrutural ou
Burocrática e Sistêmica.

A nosso ver o MDA deve ocupar lugar nas abordagens


administrativas ditas prescritivas, ao lado das abordagens
Científica ou Clássica e Relações Humanas. Entendemos que o MDA
é um modelo administrativo que engloba as demais abordagens
prescritivas, possibilitando que estas abordagens complementem-
se mutuamente.

Esta classificação nos possibilita desenvolver críticas


ao MDA; posto que toda crítica dirigida às abordagens
Científica ou Clássica, Relações Humanas ou Sistêmica pode ser
dirigida ao MDA. Estaremos nos orientando para esta crítica no
trabalho de Morgan1. Este autor enfoca as abordagens de
administração sob a luz de metáforas. A abordagem Científica ou
Clássica é vista sob o enfoque mecânico, a metáfora da máquina.
As abordagens de Relações Humanas e Sistêmica são analisadas
sob a metáfora do organismo biológico, seres vivos portanto.

A abordagem Científica ou Clássica pressupõe certas


condições para que funcione bem; a) quando há uma bem definida
tarefa a ser realizada; b) quando o meio ambiente em que a
organização se insere é estável; c) quando se produz sempre o
mesmo bem ou serviço e d) quando a máquina humana é complacente
94

e comportada. Esta abordagem apresenta contudo severas


restrições; a) as organizações têm grande dificuldade de
adaptarem-se a novas situações e a ambientes em evolução; b)
resulta em burocracias sem questionamentos; c) tendem a desviar
as organizações dos objetivos a que forem propostas e d)
baseia-se na alienação dos trabalhadores.

Em suma, esta abordagem e o MDA, fundamentam-se num


indivíduo unidimensional, movido apenas pelos ganhos
financeiros. Em decorrência, a abordagem resulta em
organizações extremamente rígidas, excessivamente
burocratizadas e alienantes.

As abordagens de Relações Humanas e Sistêmica apresentam


como vantagens em relação ao modelo Científico ou Clássico,
segundo Morgan, os seguintes aspectos; a) melhor entendimento
das relações entre as organizações e meio ambiente; b) melhor
compreensão do ambiente interno a organização; c) possibilidade
de reorientação dos objetivos organizacionais, aumentando as
possibilidades de sobrevivência da organização. Quanto as
críticas de Morgan a estas abordagens compreendem; a) falta de
visão da própria organização, privilegiando aspectos externos
à organização; b) abordagem excessivamente funcional,
encorajando a crença que isto resulta em harmonia
organizacional; c) a possibilidade de se fazer uso ideológico
das abordagens administrativas. Este aspecto é mais evidente na
de Relações Humanas, onde o reconhecimento da existência dos
grupos informais pode levar a sua utilização em benefício da
organização somente.

Outras críticas que cabem à abordagem de Relações Humanas


são que suas conclusões são de certa forma um tanto óbvias, sem
aprofundar-se nos problemas. Outra acusação a esta abordagem é

1 MORGAN, G, Images of Organizations, Sage Publications, Newbury Park, 1989.


95

a do favorecimento da administração da Western Electric


Company, já que foi a companhia que financiou o experimento.

Finalmente passamos a análise da questão proposta no


capítulo I, acerca do âmbito e relevância do MDA e as questões
que ele se propõe a resolver.

O âmbito do MDA é o âmbito das próprias abordagens que


reproduz, notadamente a Científica ou Clássica. Ou seja o MDA é
tipicamente uma abordagem micro-industrial, limitando-se
somente a esta esfera, o MDA não se propõe a abordar a
sociedade em um contexto mais amplo.

Disto resulta sua própria relevância. O MDA como


abordagem prescritiva não encara questões mais amplas, no
contexto da Teoria Geral das Organizações. Deming passa ao
largo de questões como o poder e sua representação dentro das
organizações. Aliás, este é um aspecto que ele pretende
ocultar.

Por outro lado, Deming tece severas críticas aos estilos


gerenciais diferentes do seu. Sua crítica é dirigida a aspectos
desses modelos que não contribuem diretamente para o aumento da
produtividade e melhoria da qualidade. Entre estes modelos está
a Administração por Objetivos - APO. Para Deming este modelo
limita o desempenho da organização posto que quando atingir seu
objetivo, a organização cessa seu esforço. Deming sustenta que
ao não se impor objetivos para a organização, esta terá a
oportunidade de atingir objetivos mais significativos do que
com a APO. Percebe-se que a crítica de Deming aos demais
modelos não se fundamenta em uma lógica, que contribua para a
compreensão das organizações. Tem sim o objetivo desmerecer
outros modelos, em benefício do MDA.
96

Em suma, Deming não vê a organização como um universo


social, com suas peculiaridades, os seus conflitos, a contínua
transformação e recriação deste universo. Deming pretende uma
organização previsível e portanto estática. Desta forma, não
contribui para o aprofundamento das questões da Teoria Geral
das Organizações, esta sim, científica, em busca da compreensão
de seu objeto, a organização, enquanto um fenômeno social.
97

CONCLUSÃO

Analisamos nos capítulos anteriores o MDA como uma abordagem de


gestão de organizações. Esta análise fundamentou-se na comparação do MDA
com diversas abordagens de análise organizacional que já foram
criteriosamente analisada e sistematizadas. Avaliamos também alguns aspectos
da cultura organizacional que está implícita em seus princípios e discurso.
Analisamos também alguns pontos fortes e críticas que podem ser consideradas
para a compreensão do MDA. Nesta fase do trabalho estaremos sumarizando
todos os resultados de nossas análises e apresentando nossa conclusão sobre os
estudos que realizamos.

O MDA é fruto de um peculiar momento histórico-econômico, numa


nação devastada pela guerra e com premente necessidade de reconstrução.
Neste contexto o MDA representa a resposta ao anseio da nação, aumentar a
produção, reduzir o desperdício dos insumos produtivos e reconstruir o pais. O
MDA teve larga aceitação no Japão a partir da década de 50 e apesar de
adotada e praticada no oriente, o MDA é tipicamente uma abordagem
ocidental.
98

Deming orienta-se em práticas Taylorista, agregando-lhe outras que


visam suprir suas deficiências. A Escola Científica ou Clássica carece de uma
visão mais ampla, inserindo a organização no contexto mais global da
sociedade. A abordagem de Sistemas atende a este requisito e Deming faz largo
uso do conceito de sistema aberto aplicado à organização. Assim, o limite
micro-industrial da Escola Científica ou Clássica é ampliado pela visão
Sistêmica de organização.

Outra deficiência do modelo Científico/Clássico é a suposição de que o


homem move-se somente pelos interesses financeiros. Esta suposição decorre da
visão de Taylor, de sua própria formação cultural. Não obstante, o modelo de
Taylor resolveu a questão imediata do aumento da produção.

A questão que emerge neste momento vai de encontro com o modelo


taylorista; uma vez que se projetou e planejou a produção, por que então as
coisas não ocorriam exatamente como planejado ? Mayo responde a esta
questão, o trabalhador tem outros interesses além do econômico-financeiro.
Surgem então práticas que pretendem atender, ou fazer parecer que atendem a
estas outras necessidades. Deming agrega às práticas tayloristas este fator, o
conhecimento da existência dos grupos informais, completando-as em suas
deficiências. Esta é a contribuição da escola de Relações Humanas ao modelo
de Deming.

Estão lançadas as bases do MDA, que é um misto de fatores positivos, e


que deram certo, das abordagens Científica ou Clássica, de Relações Humanas
e Sistêmica. A estes aspectos Deming soma algumas tecnologias recentes, que
viabilizaram-se através de modernas máquinas, os computadores, são técnicas
estatísticas e matemáticas. Não obstante a esta roupagem moderna, o MDA não
99

oculta seu verdadeiro caráter, a reedição de conhecidos preceitos


administrativos.

No mundo ocidental o MDA e as demais abordagens que se baseiam no


fator qualidade encontraram grande receptividade. O modelo econômico-
produtivo ocidental encontra-se em momento de crise institucional, há
desequilíbrio entre oferta e demanda de bens, concentração de renda o que
limita as oportunidades de consumo, e que requerem senão encaminhamento,
ocultação. Estas abordagens de administração surgem em resposta a este
momento. Trazem discursos positivos, prometendo a redenção das
organizações.

O MDA pretende fundar uma nova cultura nas organizações, a cultura


da qualidade. Esta cultura aparece sob a forma de uma obstinada busca de
melhorias nos processos produtivos, aumento da produção e redução dos
desperdícios. O discurso desta cultura assume a prerrogativa de “ciência”,
como forma de legitimação. Deste modo, ocultando-se sob a aparência de uma
proposta científica, o MDA resulta em ganhos de produção para a organização,
isto é, aumento da mais-valia. Seu discurso é portanto a manifestação de uma
ideologia, a ideologia da burocracia, sua prática é uma afirmação desta
burocracia, segundo a abordagem weberiana.

Enquanto um modelo de gestão para organizações, o MDA pode


proporcionar algum ganho para as organizações, principalmente naquelas com
baixos níveis de burocratização. Mas pode-se prever que este modelo, levado às
suas últimas consequências, desgastará a organização e seus membros pois a
conquista de novos ganhos e melhorias custará mais e mais esforços.
100

Uma deficiência do MDA reside na característica de seu modelo


decisório, baseado em funções matemáticos e estatísticas, e que não deixa
oportunidade para o exercício da criatividade. Esta deficiência poderá levar a
organização a não evoluir, a não adaptar-se a situações que apresentem em um
futuro e então, ameaçar sua existência.

Ademais, as soluções propostas pelo MDA estão unicamente no âmbito


de uma abordagem prescritiva o que limita sua abrangência como uma
proposta ampla, que encaminhe questões no contexto da própria sociedade. A
contribuição de Deming ao corpo teórico da Teoria das Organizações limita-se
a reafirmação da burocracia de Weber, pois encontramos no MDA toda a
caracterização que Weber apontou para as organizações.

O sucesso da administração oriental é mitificado no ocidente,


aproveitando-se deste mito o MDA apresenta-se como solução aos problemas
da organização; em um ambiente em crise, a procura de salvação, encontrou
fácil aceitação. Contudo, o MDA está longe de equacionar os problemas da
administração, e nem dispõe de instrumentos e recursos para isto. A própria
administração, enquanto gerado de soluções, está também longe de sua
resolução definitiva por isso, apega-se a modelos míticos. A administração
deve ser tratada em um enfoque mais amplo, com soluções de certa forma
globais, que atendam a rica tipologia das organizações, tendo com centro seu
principal componente, o ser humano.
101

A N E X O S
102

NOTA BIOGRÁFICA - William Edwards Deming

William Edwards Deming nasceu a 14 de outubro de 1900,


numa pequena propriedade rural do Estado de Wyoming, EUA.
Concluiu o ensino básico em 1917, seguindo para Laramie onde
cursou engenharia na Universidade de Wyoming. Chegou com vários
dias de antecedência para poder encontrar emprego. De família
pobre, Deming sempre trabalhou, foi faxineiro, removeu neve,
cortou gelo, trabalhou como balconista. Formado em 1921,
lecionou engenharia e física na Colorado School of Mines, tendo
matriculado-se no curso de Mestrado em Matemática e Física na
Colorado University.

Em 1924, continuou seus estudos em Yale, onde obteve o


Ph. D. em Física. Nos verões trabalhava no laboratório de
transmissores, nas instalações de Hawthorne, da Western
Electric, em Chicago, local onde Elton Mayo, pesquisador de
Harvard, condizia suas experiências sobre a relação entre
condições de trabalho e produtividade. Nesta unidade, 46 mil
operários - na sua maioria mulheres - montavam equipamentos
telefônicos, trabalhando demais e recebendo pouco. Algumas de
suas idéias sobre administração estão calcadas em sua
experiência em Hawthorne.

Em 1927, Deming foi trabalhar no Ministério da Agri-


cultura dos EUA, no Laboratório Permanente de Nitrogênio. Nessa
época Deming foi apresentado a Walter A. Shewhart, um
estatístico da Bell Laboratories, de Nova Iorque. Shewhart
tinha desenvolvido técnicas para introduzir o que chamava de
"controle estatístico nos processos industriais". Deming passou
muitos anos indo regularmente a Nova Iorque estudar com
103

Shewhart. As teorias de controle estatístico da qualidade de


Shewhart tornar-se-iam a base do trabalho de Deming. Ele tinha
também estudado Teoria Estatística com um famoso professor
inglês, Sir Ronald Fisher, cujo trabalho constitui a base da
moderna Teoria Estatística.

Durante o censo americano de 1940 Deming desenvolveu os


procedimentos amostrais para a execução do censo. Aplicando o
que tinha aprendido com Shewhart, Deming conseguiu demonstrar
que se poderia aplicar Controle Estatístico tanto no trabalho
de escritório, como em processos de manufatura, embora o método
tenha sido desenvolvido para estes últimos processos.

Em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, um professor


da Universidade de Stanford, W. Allen Wallis, procurou os
serviços de Deming. Perguntou, em carta a Deming, se Stanford
poderia contribuir de alguma forma para o esforço de guerra.
Deming respondeu com uma proposta para ensinar os métodos de
Controle Estatístico do Processo (CEP) de Shewhart a
engenheiros, inspetores e outros profissionais que trabalhassem
em empresas dedicadas à produção voltada para a guerra. Deming
montou com colegas estatísticos da Bell Laboratories um
programa que treinou, durante os anos da guerra, mais de 30 mil
pessoas, inclusive funcionários do Governo Americano.

Deming afastou-se do serviço público em 1946 para


estabelecer-se como consultor de Métodos Estatísticos; também
entrou para o corpo docente da Universidade de Nova Iorque,
como professor da Escola de Administração de Empresas, onde
lecionou Amostragem e Controle da Qualidade.

Em 1947, Deming foi recrutado pelo Comando Supremo das


Potências Aliadas (Scap), das Forças de Ocupação no Japão para
preparar o censo japonês de 1951. A partir de então e nos anos
104

que se seguiram, ele não se fechou na colônia americana que


surgiu no Japão do pós-guerra. Tinha prazer em aceitar os
convites dos anfitriões japoneses e procurou familiarizar-se
com a cultura, visitando mercados e lojas, templos e
santuários. "Meu método de aprendizado é tornar-me o máximo
possível, japonês", disse certa vez.

Desconhecido de Deming naquela época, um grupo chamado


União dos Cientistas e Engenheiros Japoneses (JUSE), tinha-se
organizado para ajudar a reconstruir o país, devastado pela
guerra. Mas eles tinham pouca noção de como dariam início ao
trabalho a que se tinham proposto. Naquela época qualquer
instituição precisava de autorização do Comando Militar para
funcionar. Assim, os estatísticos da Bell Laboratories,
emprestados ao Comando Militar, acharam aconselhável a JUSE
estudar as técnicas de Controle Estatístico do Processo,
empregadas pelas empresas americanas durante a guerra, desen-
volvidas na Bell, por Shewhart.

Dentre o material enviado pelos americanos à JUSE, estava


o livro de Shewhart, The Economic Control of Quality of
Manufactured Product, publicado pela McGraw Hill em 1931. Os
membros da JUSE gostaram das teorias de Shewhart. Em seus
estudos, leram também sobre Deming, que tinha trabalhado como
Shewhart. Alguns já conheciam Deming, que mantinha contato
social com os japoneses desde 1947. Em março de 1950, Kenichi
Koyanagi, Diretor Administrativo da JUSE, escreveu a Deming
pedindo-lhe que desse um curso para pesquisadores, gerentes de
fábrica e engenheiros japoneses sobre os métodos de controle
estatístico da qualidade. Deming aceitou de imediato e na sua
resposta escreveu: "Quanto à remuneração, nada cobrarei. Será
um prazer ajuda-los."
105

No dia 19 de junho de 1950, diante de uma platéia de 500


pessoas em pé, Deming fez a primeira de uma série de 12
palestras. A estas palestras, seguiram-se outras pronunciadas
para a Kei-dan-ren, uma associação de executivos e empresários
japoneses. Em agosto do mesmo ano, Deming foi convidado pela
Associação Comercial de Tóquio para uma palestra a 50
fabricantes. No fim do verão, Deming tinha falado à
administração de quase todas as grandes empresas japonesas. Os
japoneses abraçaram a filosofia de Deming, canalizando a
energia que os tinha tornado um temido inimigo militar para a
tarefa de transforma-los num formidável oponente econômico.

Para mostrar como deram valor a tudo isso, em 1951, os


japoneses instituíram o Prêmio Deming - uma medalha de prata
onde está gravado o perfil de Deming - que seria dada a duas
grandes categorias; a uma pessoa, por sua contribuição em
teoria estatística e às empresas, por seus feitos em aplicação
da teoria estatística. O prêmio foi instituído com a receita
das conferências públicas de Deming, receita que ele tinha
aberto mão e que foi doada para os prêmios. Hoje este prêmio é
prestigiado e muito disputado pelas empresas japonesas. Deming
voltou ao Japão em 1951 para assistir às cerimônias de premia-
ção. Em 1960 recebeu a comenda Ordem Segunda do Tesouro
Sagrado, oferecida pela Casa Imperial Japonesa, em
reconhecimento aos serviços prestados àquela nação.

Deming foi "descoberto" nos EUA em 1980, quando um


documentário para a TV americana intitulado "Se o Japão Pode...
Por Que Não Podemos?", foi ao ar na noite de 24 de junho de
1980 e os últimos quinze minutos foram dedicados a Deming e seu
trabalho no Japão. A partir de então Deming tem atuado como
consultor, não só no Japão e EUA, mas para empresas de diversos
países, inclusive do Brasil. Deming faleceu em 19 de dezembro
106

de 1993, de causas naturais, na sua residência em Washington,


DC.
107

BIBLIOGRAFIA

BARNARD, C., As Funções do Executivo, Editora Atlas, São Paulo,


1971.
BERTALANFFY, L. von, Teoria Geral dos Sistemas, Editora Vozes,
Petrópolis, 1977.
BERTERO, C. O., Algumas observações Sobre a Obra de G. Elton
Mayo, Revista de Administração de Empresas, Rio de
Janeiro, 1968.
BRESSER PEREIRA, L. C. & MOTTA, F. C. P., Introdução a
Organização Burocrática, Editora Brasiliense, São Paulo,
1986.
CAMPOS, V. F., Controle da Qualidade Total, Fundação Christiano
Otoni, Rio de Janeiro, 1986.
CARDOSO, F. H. & IANNI, O., Homem e Sociedade, Cia. Editora
Nacional, São Paulo, 1980.
CHAUÍ, M., O Que é Ideologia?, Editora Brasiliense, São Paulo,
1980.
CHIAVENATO, I., Introdução à Teoria Geral da Administração,
Makron Books do Brasil, São Paulo, 1993.
DEMING, W. E., Qualidade: A Revolução da Administração, Editora
Marques-Saraiva, Rio de Janeiro, 1990.
ETZIONI, A., Organizações Complexas, Editora Atlas, São Paulo,
1973.
GRANT, E. L. & LEAVENWORTH, R. S., Statistical Quality Control,
MacGraw Hill Books, New York, 1974.
GUERREIRO RAMOS, A., Administração e Contexto Brasileiro,
Editora da Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 1983.
HARRINGTON, H. J., O Processo do Aperfeiçoamento, Editora
McGraw Hill, São Paulo, 1988.
ISHIKAWA, K., Total Quality Control: Estratégia e Administração
da Qualidade, IM&C International, São Paulo, 1986.
KATZ, D. & KAHN, R. L., Psicologia Social das Organizações,
Editora Atlas, 1978.
108

LAKATOS, E. M. & MARCONI, M. de A., Metodologia Científica,


Editora Atlas, São Paulo, 1986.
LAKATOS, E. M., A Abordagem Burocrática e Outras Visões da
Estrutura Organizacional, Revista IMES, São Bernardo do
Campo, s/d.
LINTON, R., The Cultural Background of Personality, Routledge &
Kegan Paul Ltd., London, 1952, In: CARDOSO & IANNI, Homem
e Sociedade, Cia Editora Nacional, São Paulo, 1980.
LODI, J. B., História da Administração, Livraria Pioneira
Editora, São Paulo, 1987.
MANN, N. R., Deming: As Chaves da Excelência, Makron Books do
Brasil Editora, são Paulo, 1992.
MARCH, J. G. & SIMON, H. A., Teoria das Organizações, Editora
da Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 1975.
McGREGOR, D., O Lado Humano da Empresa, In: HAMPTON, D. R.,
Conceitos de Comportamento na Adminstração, Editora
Pedagógica e Universitária, São Paulo, 1973.
MOTTA, F. C. P., Teoria Geral da Administração, Livraria
Pioneira Editora, São Paulo, 1991.
_________ , Teoria das Organizações, Evolução e Crítica,
Livraria Pioneira Editora, São Paulo, 1986.
NAGEL, E., Ciência: Natureza e Objetivos, In: MORGENBESSER, S.
(org.), Filosofia da Ciência, Editora Cultrix, São Paulo,
1975.
NASCENTES, A., Dicionário da Língua Portuguesa, Bloch Editores,
Rio de Janeiro, 1988.
SCHEIN, E. H., Organizational Culture and Leadership, Tossey-
Bass Publishers, San Francisco, 1985.
SCHERKENBACH, W. W., O Caminho de Deming para a Qualidade e
Produtividade, Qualitymark Editora, Rio de Janeiro, 1990.
SCHOLTES, P. R., Times da Qualidade, Qualitymark Editora, Rio
de Janeiro, 1990.
SHEWHART, W., Statistical Method from the Viewpoint of Quality
Control, Dover, Washington, 1939.
109

SILVA, B., Taylor e Fayol, Cadernos de administração Pública -


FGV, Rio de Janeiro, 1960.
TAYLOR, F. W., Princípios de Administração Científica, Editora
Atlas, São Paulo, 1987.
TOLEDO, J. C. de, Qualidade, Estrutura de Mercado e Mudança
Tecnológica, Revista de Administração de Empresas, São
Paulo, vol. 30, nº 3, jul/set, 1990.
_______ , J. C., Qualidade Industrial: Conceitos, Sistemas e
Estratégias, Editora Atlas, São Paulo. 1987.
TRAGTENBERG, M., Administração, Poder e Ideologia, Editora
Atlas, São Paulo, 1980.
_______ , Burocracia e Ideologia, Editora Ática, São Paulo,
1974.
_______ , A Teoria Geral da Administração é uma Ideologia?,
Revista de Administração de Empresas, Rio de Janeiro,
1971.
WALTON, M., O Método Demig de Administração, Editora Marques-
Saraiva, Rio de Janeiro, 1989.
WHYTE, W. F., Relações Humanas - Um Relatório sobre o
Progresso, In: ETZIONI, Organizações Complexas, Editora
Atlas, São Paulo, 1973.
ZNANIECKI, F., Values as Cultural Objects, In: Methods of
Sociology, Renhart & Farrar, New York, 1934.

Você também pode gostar