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Observação e interpretação de microestruturas de ligas ferrosas

Mais de 90 wt % dos materiais metálicos empregues em todo o mundo correspondem a


ligas ferrosas. Isto representa uma enorme família de materiais estruturaIs, com uma
larguíssima gama de microestruturas e propriedades.

Esquema de uma unidade siderúrgica

Para uma breve resumo da história do fabrico do aço, consultar:


http://www.usinor.com/francais/lacier/FR_ACIER_P5.HTM
Diagramas de equilíbrio Fe-C e Fe- Fe3 C
Na prática, as ligas ferrosas correspondem quase todas a uma de duas categorias de
materiais do sistema ferro-carbono: os aços e as gusas ou ferros fundidos.
De entre os aços ( 0,05 – 2,0 wt % C ), podem distinguir-se, quanto à sua composição, os
aços ao carbono, os aços de baixa liga ( totalidade dos elementos de liga para além do
carbono inferior a 5 wt % C ) e os aços de alta liga.
Como o seu nome indica, os aços de liga ou aços ligados caracterizam-se por conterem na
sua composição quantidades significativas de um ou mais elementos de liga; estes são
elementos químicos ( p.e. , Cr, V, W, Mn ) adicionados com vista à obtenção de
características especiais.
Apesar de se classificarem apenas nestas três variedades, os aços possuem uma grande
diversidade de microestruturas e propriedades que podem assumir e que dependem
essencialmente da sua composição química ( teores em carbono e em elementos de liga ) e
dos tratamentos térmicos a que são submetidos.
Quanto ao teor em carbono, os aços dividem-se em hipoeutectóides (?0,77 wt%C)
eutectóides ( 0,77 wt%C ) e hiper eutectóides ( ? 0,77 wt%C ), o que se reflecte na
distribuição das suas fases de equilíbrio metaestável a baixa temperaturas ( 2 ). Estas são a
ferrite, clara, composta essencialmente por ferro, e a cementite, um carboneto de ferro de
estequeometria aproximada Fe 3 C, que é branca.

Microestruturas ferrito-perlíticas de aços com teores em carbono crescentes

Estas fases derivam da decomposição, durante a reacção eutectóide, que ocorre a 727 ?C,
da fase de equilíbrio de alta temperatura, a austenite. Quando aquela reacção não se
completa, pode surgir à temperatura ambiente austenite residual. A estrutura de equilíbrio
mais característica nos aços é a perlite, formadas por lamelas alternadas de ferrite e
cementite. Quando essas lamelas são discerníveis ao microscópio, a perlite apresenta um
aspecto tipíco, ilustrado na figura 5.1. A coloração negra evidenciada pelas lamelas de
cementite na perlite deve -se à sua espessura extremamente reduzida, que torna dificilmente
resolúveis em microscopia óptica as sua regiões limítrofes; a este facto vem juntar-se o
ataque preferencial dos limites de grão da cementite, com o seu consequente abaulamento,
que causa a difusão da luz em direcções que não são coincidentes com o eixo óptico do
microscópio.
A reacção da decomposição da austenite, por ser térmicamente activada requer tempo para
se completar. Se o arrefecimento for muito rápido, não há lugar para a ocorrência de ferrite
e cementite, formando-se em seu lugar martensite, uma fase de grande dureza e fragilidade
que surge a partir da austenite sem envolver o fenómeno de difusão. Através de tratamentos
térmicos adequados – têmpera – é possível obter martensite em detrimento da formação das
outras fases.
Martensite

No caso das gusas, que se situam normalmente entre 2,0 e 4,5 wt % C , e que possuem
também, geralmente, até 3 wt % Si ( destinado a contrariar a formação de carbonetos ), há
que distinguir entre gusas brancas, gusas cinzentas, gusas dúcteis e gusas maleáveis.
Esta gama de composições corresponde ao intervalo entre o limite de solubilidade do
carbono na austenite ( à temperatura eutéctica. Implica portanto que as gusas nestas
condições, que não são as mais comuns, sejam hipoeutécticas. Isto não impede que surjam
por vezes gusas hipereutécticas, com um teor de carbono superior a ? 4,5 wt %.
As gusas brancas, assim chamadas pela cor branca da sua superfície de fractura, podem ser
interpretadas recorrendo ao diagrama de equilíbrio metaestável Fe -Fe3 C ( o mesmo q que se
referem os aços ). Estas gusas, em geral frágeis, são formadas por ferrite ou cementite, quer
isoladas, quer na forma de perlite ou de ledeburite.
As gusas cinzentas, cuja designação é também devida à coloração da sua superfície de
fractura, correspondem por seu turno ao diagrama de equilíbrio metaestável Fe-C, e que
apresentam na sua estrutura ferrite e grafite lamelar, a qual é responsável pela sua
característica fragilidade. A ledeburite é, na realidade, um eutéctico formado a partir do
liquido e constituído por uma matriz de austenite, a qual contém no seu seio precipitados de
cementite. Uma vez que, com a diminuição da temperatura, a austenite se decompõe em
ferrite e cementite, a estrutura que se observa à temperatura ambiente já não é a ledeburite,
mas sim a que lhe sucedeu após a decomposição da austenite. Existem no entanto autores
que, a esta estrutura degenerada, continuam a atribuir a designação de ledeburite, o que não
é inteiramente correcto.

Gusa branca hipoeutéctica Gusa branca hipereutéctica

As gusas dúcteis diferem das anteriores porque, devido à adição de pequenos teores de
magnésio, a grafite lamelar é substituída por grafite esferoidal, o que lhes confere
propriedades mecânicas bastante melhoradas, sobretudo ao nível da ductibilidade.
Finalmente, as gusas maleáveis são obtidas, através de um recozimento de maleabilização
(o qual provoca a precipitação de parte do carbono contido na cementite), a partir de gusas
brancas. A grafite resultante, pela sua morfologia, é designada grafite nodular. As
propriedades mecânicas das gusas maleáveis, embora inferiores às das gusas dúcteis, são
ainda assim bastante melhores do que as dos restantes tipos de gusas.

Grafite lamelar Grafite nodular Grafite esferoidal

Dada a importância prática das ligas de ferro-carbono, é útil a familiarização com algumas
das microestruturas mais características dessas ligas. Assim, neste trabalho deverá estudar a
morfologia e distribuição de algumas das fases mais importantes dos aços e ferros fundidos
em função da composição e do tratamento térmico imposto. Os resultados da sua
observação deverão posteriormente ser completados através do estudo do diagrama de
equilíbrio do sistema ferro-carbono, de onde poderá retirar informações relativas as gamas
de composição e às condições em que cada uma das microestruturas observadas é
susceptível de ocorrer.
MATERIAL NECESSÁRIO

Bancada de microscopia óptica do Laboratório de Metalografia

Lâmina de suporte
Plasticina
Prensa manual
Amostras metalográficas Struers : 2111; 2112 ; 2113; 2113a; 2113b; 2113d; 2113e; 2115;
2121; 2211; 2212; 2213; 2214; 2221; 2222; 2231; 2241; 2242;

Operação do microscópio metalográfico

1. Retire a cobertura plástica do microscópio


2. Ligue a fonte de alimentação à rede, não sem antes verificar se o botão de regulação da
intensidade luminosa está na posição de desligado (totalmente rodado no sentido
contrário ao do movimento dos ponteiros do relógio).
3. Regule a tensão para 9 V.
Atenção: Não regule a tensão para um valor situado dentro do sector vermelho do
mostrador.
4. Coloque um pouco de plasticina sobre a lâmina de suporte de amostras. Ponha a
amostra sobre a plasticina e utilize a prensa manual para, carregando suavemente,
assegurar a horizontalidade da superfície a observar.
5. Fixe a lâmina de suporte na platina porta-amostras do microscópio.
6. Coloque na vertical da amostra a objectiva de menor ampliação.
7. Ajuste à sua medida a distância entre as oculares de modo a realizar a observação em
condições confortáveis para a vista.
8. Com o auxílio dos botões recartilhados de focagem, aproxime a objectiva o mais
possível amostra, acompanhando aquela visualmente, para evitar qualquer contacto, a
fim de não danificar as objectivas.
9. Proceda à focagem afastando lentamente a objectiva da amostra. Os botões
recartilhados de maiores dimensões imprimem um movimento grosseiro ao bloco
óptico móvel. A focagem fina é conseguida através de botões recartilhados de menores
dimensões
10. Para mover a amostra sob a objectiva recorra aos dois parafusos micrométricos
existentes sob a platina.
11. Para mudar a escala de ampliação, rode o revólver porta-objectivas, assegurando-se
visualmente de que a nova objectiva não colide com a superfície da amostra. Em
princípio, apenas deverá necessitar de ajustar ligeiramente as condições de observação,
com o auxílio dos botões de focagem fina.
12. Terminada a utilização do microscópio, retire a plasticina de montagem com a amostra,
corte a alimentação da lâmpada, desligue da rede a fonte de alimentação e coloque a
cobertura plástica sobre o microscópio.

Condução da experiência
As fichas que acompanham as amostras contêm diversas informações úteis para a
compreensão das microestruturas que irá observar. o seu formato é o seguinte :

Metallographic sample collection


? . Elemento-base
? .? Tipo de material
? .?? Descrição pormenorizada do tipo de material;
Designação DIN; Origem da amostra; Tratamento térmico.

Composição: Teores dos elementos de liga em percentagens ponderais


Propriedades: Propriedades mecânicas mais importantes
Aplicações: Empregos mais usuais.
Preparação: Meios de corte e polimento empregues.
Ataque: Reagente utilizado.
Estrutura: Descrição sumária das fases presentes e a sua distribuição
Amostra N. : ???????

Atenção: Evite misturar as amostras no seu mostruário, retire apenas uma de cada vez.

- Observe as amostras pela ordem indicada. Para cada caso deverá tomar notas e desenhar
um esboço da microestrutura observada. Procure identificar ao microscópio cada fase
descrita, tomando nota dos seus atributos mais característicos.
- Não se limite a observar apenas uma zona restrita da amostra; percorra-a completamente a
fim de detectar eventuais heterogeneidades.
- Dedique algum tempo à observação da amostra com cada ampliação, em vez de recorrer
apenas à maior ampliação. De facto, pela maior largura do campo, as ampliações mais
baixas permitem formar uma ideia de conjunto relativamente à microestrutura, enquanto as
mais elevadas se destinam à observação de determinados pormenores mais significativos da
mesma. Além disso, certas fases e estruturas ( a perlite, com a maior ou menor espessura
das suas lamelas, constitui um caso tipíco ) podem mudar radicalmente de aspecto
consoante a escala de observação.
- Tente identificar as semelhanças e diferenças existentes entre as diversas amostras ( fases
presentes, sua distribuição e tamanho de grão, etc. ) e interpretá-las de acordo com o que
conhece da composição e/ou de tratamento térmico.
- Comece por observar as amostras 2111, 2112, 2113 e 2115 ( aços de carbono ), bem como
2121 ( aço de baixa liga ). Todas estas amostras correspondem a aços submetidos a um
tratamento térmico de normalização, i.e., arrefecidos lentamente ao ar após um
aquecimento à temperatura de austenitização. A sua microestrutura corresponde à que é
previsível de acordo com o diagrama de equilíbrio metaestável. Poderá ver como essa
microestrutura evolui desde os aços hipoeutécticos ( microestrutura ferrito-perlitíca ) aos
hipereutectóides ( cuja microestrutura é constituída por cementite e perlite ), passando pelos
eutectóides ( com microestrutura perlítica).
- Observe agora as amostras 2113, 2113a, 2113b, 2113d e 2113e, todas com mesma
composição mas sujeitas a tratamentos térmicos distintos. Repare qual o efeito das
diferentes taxas de arrefecimento, bem como da história térmica anterior do material, sobre
a microestrutura.
- Seguidamente compare entre si as amostras de gusas brancas 2211, 2212 e 2213 ( esta
última uma gusa hipereutéctica ). Identifique também as diferenças microestruturais das
gusas brancas relativamente aos aços anteriormente observados.
- Observe então as gusas cinzentas representadas pelas amostras 2221 e 2222. Note as
diferenças existentes entre as duas amostras, bem como entre estas e as gusas brancas já
examinadas.
- A amostra 2214 ilustra a possibilidade de, numa mesma peça, devido às diferentes
velocidades de arrefecimento, zonas distintas reagirem segundo condições de equilíbrio
diferentes: numa zona, o equilíbrio metaestável Fe-Fe3 C, originando uma gusa branca;
noutra zona o equilíbrio estável Fe-C, dando lugar à formação de uma gusa cinzenta.
- As gusas cinzentas dúcteis estão representadas pelas amostras 2241 e 2242. Repare como
a gusa normalizada apresenta descarbonação da matriz perlítica dando origem a halos
ferríticos em torno dos nódulos de grafite esferoidal.
- A última amostra corresponde a uma gusa maleável. Observe a morfologia da grafite e
compare-a com a que ocorria nos casos anteriores.
- Durante a elaboração do rela tório, procure também explicar a influência que as diversas
fases e as suas diferentes morfologias poderão ter no desempenho dos vários materiais
estudados, do ponto de vista mecânico.

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