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Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – EMC

Disciplina de Pneumologia

Tuberculose
Através da História

Alunos: Gabriel Sardinha, João Wiltgen, João Schaum, Luccas Damiani e Thamyres
Coelho
História da Tuberculose
A tuberculose é a condição patológica que ocorre com a infecção do organismo
pelo Mycobacterium tuberculosis e se destaca como uma das doenças que mais causou
mortes humanas em toda a história.

Apesar de não ser possível afirmar com exata precisão o momento histórico em
que o bacilo surgiu, estima-se, através de pesquisa em biologia molecular, que há 3
milhões de anos uma variante primitiva do M. tuberculosis já infectava hominídeos na
África. O microorganismo, como conhecemos hoje, parece ter surgido entre 15 e 20 mil
anos atrás, tendo suas formas atuais mais prevalentes surgido há algo entre 250 e 1000
anos.

A doença em si foi vastamente documentada no Egito Antigo e pode ser


confirmada há pelo menos 5000 anos na região. Além de claramente representada na arte
egípcia da época, tem suas marcas eternizadas nas deformações características da Doença
de Pott causadas nos ossos de diversas múmias examinadas posteriormente.
Com as migrações realizadas pela humanidade ao longo do tempo, a doença,
altamente infecciosa, se espalhou pelo mundo. Há relatos escritos de sua presença na
Índia, há pelo menos 3300 anos, e na China, 2300 anos atrás. Nas Américas, estima-se
que o M. tuberculosis tenha chegado junto com as grandes migrações de 20.000 e 12.000
anos atrás. A tuberculose, porém, não parece ter gerado epidemias no continente
americano nesse período, mantendo-se em pequenas endemias de grupos populacionais
isolados.

Na Grécia Antiga, a tuberculose também era bem conhecida e tinha o nome de


phthisis, tendo sido estudada por Hipócrates, que escreveu, entre outras coisas, sobre a
maior prevalência da tuberculose ativa em adultos jovens. O termo, que por muito tempo
foi usado no português como tísica, se referia ao ato de definhar ou consumir-se.
Durante a Idade Média, a doença foi pouco documentada. Acredita-se, porém, que
esteve, sim, muito presente e que pode, inclusive, ter gerado epidemias das quais não se
tem registro adequado.

Foi durante o Renascimento que o entendimento da tuberculose, finalmente,


começou a avançar. René T. H. Laennec, conhecido principalmente pela invenção do
estetoscópio, foi o responsável por identificar a patogênese da doença e por descrever
métodos para seu diagnóstico pulmonar e extra-pulmonar. Na época, a tuberculose havia
alcançado uma epidemia gigantesca na Europa e na América do Norte. O alto número de
cadáveres em Paris foi, em parte, o que possibilitou o trabalho de Laennec.

Diante da absurda quantidade de casos, a doença foi romantizada e a aparência do


paciente tuberculoso passou a ser considerada atraente na sociedade. Diversas obras de
arte da época demonstram o fato, dentre as quais estão “O Morro dos Ventos Uivantes”,
de Emile Brontë, e “Nicholas Nickleby”, de Charles Dickens.
Até ali, apesar dos avanços com o trabalho de Laennec, ainda não se sabia a
etiologia da doença e poucos a consideravam contagiosa. O clima e fatores genéticos
eram, geralmente, considerados responsáveis. Foi Jean-Antoine Villemin que
demonstrou, ao inocular o líquido caseoso da cavidade tuberculosa em um coelho, que a
tuberculose podia ser considerada contagiosa.

Quem fora Robert Koch?


Os anos de 1800 foram marcados por um novo olhar para a doença da tuberculose,
sendo marcada pelo início da pesquisa moderna, novas atitudes, tratamentos e estratégias
de saúde pública. O mais importante homem desse momento fora Robert Koch.

Robert vinha de origens humildes, servindo como cirurgião na Guerra Franco-


prussiana. Conseguiu construir para si um centro médico, onde desenvolveria experimentos
e novas técnicas para isolar e crescer colônias bacterianas em culturas de seu laboratório.
Entre suas criações, conseguiu desenvolver um microscópio fotográfico, fazendo com que
cientistas não precisassem mais depender de desenhos para seus estudos. Além disso, foi o
responsável por confirmar a chamada “Teoria microbiana da doença”, ligando, pela
primeira vez, a presença de uma bactéria como causa de uma doença específica.

A descoberta do Bacilo
Berlim, 24 de março de 1882, Robert Koch faz sua famosa apresentação “Die
Aetiologie der Tuberculose”, revelando ao mundo que descobrira e isolara o bacilo da
tuberculose, a doença mais mortal da Europa de seu tempo.

Uma possível cura?


Em 1890, Koch, em frente a uma multidão de renomados doutores no 11°
Congresso Médico Internacional de Berlim, revelara ao mundo sua mais nova descoberta:
tuberculina, uma substância capaz de se difundir nos meios líquidos de cultura do bacilo
da tuberculose a qual "insensibilizaria animais de laboratório à inoculação de bacilos
tuberculosos, e seria capaz de deter o processo tuberculoso nos já infectados, sendo
provavelmente de utilidade no tratamento da tísica humana".

A notícia espalhou-se como rastilho de pólvora por toda a Europa e nos Estados
Unidos, sendo logo a tuberculina considerada o medicamento milagroso. Em toda a
história da medicina, não há exemplo de maior noticiário sensacionalista pela imprensa
mundial quanto foi o da tuberculina. Seu preço tornou-se altíssimo, e nos Estados Unidos
cobrava-se 1.000 dólares por centímetro cúbico.

Não tardou muito para que a euforia internacional se transformasse em cruel


desencanto. Com as elevadas doses de tuberculina, então usadas, desencadearam-se, nos
tísicos, intensas reações sistêmicas e graves progressões lesionais, com grandes
destruições pulmonares e generalização da doença, levando rapidamente à morte. A
substância funcionava necrosando o tecido afetado pelo bacilo, matando-o de forma
indireta ao matar sua fonte de alimento. O tecido morte desprendia-se, permitindo que os
pacientes expelissem o bacilo ao tossir. Mais tarde, estudos revelaram que matando o
tecido lesado não impedia o bacilo proliferar.

Embora não existam dados seguros, estimou-se que em Berlim morreram várias
centenas de doentes, os quais, somados com os vitimados em outros países, devem ter
totalizado milhares. Koch foi acerbamente criticado pela sua precipitação, inexplicável
num cientista do seu padrão. Desculpou-se por não ter resistido à pressão dos centros
médicos especializados e do governo alemão, para que divulgasse sua descoberta, sem
perda de tempo, aumentando o prestígio da ciência germânica na corrida internacional na
luta contra a epidemia tuberculosa. Pressionado, acabara por revelar os ingredientes da
tuberculina: bacilos mortos da tuberculose banhados em extrato de glicerina.

A tuberculina foi abandonada até 1908, quando Von Pirquet, demonstrou seu
valor diagnóstico na infecção tuberculosa, sendo hoje uma das mais importantes armas
para o estudo epidemiológico da tuberculose.

O capitão de todos esses homens da morte


A tuberculose no século XIX foi a principal causa de morte em NY e
representava 26% das mortes evitáveis em adultos nos países menos desenvolvidos.
Nessa época os mais acometidos pela doença eram os jovens de “colarinho azul” (mais
pobres). A partir de 1889, 50 anos antes da disponibilidade de agentes antituberculose,
Hermann Biggs propôs uma abordagem sistemática da doença que consiste em 5
elementos principais:
- Notificação obrigatória de todos os casos
- Expectoração grátis como exame disponível no Departamento de saúde
- Todos os casos infecciosos relatados deveriam ter acompanhamento da
enfermagem e os pacientes isolados se necessário (monitoramento em casa ou em
ambulatórios). Enfermeira agiu como agente de informação.
- Conscientização da comunicabilidade da tuberculose = educação pública

- Reforçou a vontade política de obter apoio financeiro e administrativo para seu


programa

Chamado DOTS: tratamento diretamente observado, curso curto


Em um primeiro momento a medida de notificação obrigatória foi muito
criticada porque muitos não acreditavam na comunicabilidade do vírus e achavam que
isso quebraria a relação de confiança médico-paciente. Até reduziram a autoridade do
Departamento de Saúde e ele ficou desacreditado em certa altura. Durante a primeira
década de notificação obrigatória alguns médicos chegaram a ser multados.
O exame grátis e estendido para médicos particulares levou a um diagnóstico
mais rápido da tuberculose. A oposição disse que ele estava ampliando indevidamente a
importância do departamento bacteriológico.

Sanatórios
Era necessário apenas levar os pacientes a um 'local imune', onde a doença
curaria por si só. Ele definiu um "lugar imune" como uma região onde não se conhecia.
Fundou um sanatório no Quirquistão e hoje essa e outras regiões da ásia estão entre as
regiões com mais incidência de tb. Outros sanatórios foram criados por seus alunos em
outros lugares.

Em seguida um ex-médico que sofria com a tuberculose disseminou o


tratamento através de um rigoroso regime de cura em repouso que foi rapidamente
adotado pelos sanatórios. Os pacientes tinham até escarradeira de bolso e as típicas
redes de sanatório.
Esse tratamento ajudava por retirar da sociedade e por forçar o paciente a ter um
regime saudável, repouso. A longo prazo, porém, não tem uma boa estimativa: 60% dos
casos que recebem alta morrem após 6 anos. Tratamento em sanatório era caro.

Terapia de Colapso: pneumotórax e toracopla


Em 1930 começou a ser implementado nos sanatórias a terapia de colapso que
levava a uma melhora dos resultados a longo prazo. Pacientes com derrame pleural ou
pneumtórax espontâneo melhoraram muito. Tal terapia tinha pouco efeito sob o
processo tuberculoso, porém levava a um desaparecimento de bacilos no escarro devido
a diminuição de volume do pulmão, união das paredes e muitas vezes torção do
brônquio.

Prevenção por vacina


No início do século XX os franceses mostram que depois de um extenso
processo de atenuação do bacilo, a cepa de Mycobacterium bovis não podia mais
produzir lesões tuberculosas progressivas em animais de laboratório. O primeiro
sucesso de imunização contra tuberculose foi chamado BCG. Viu-se que a vacinação
abouliu as formas mais perigosas da doença, como tuberculose miliar e meningite.

Tratamento moderno
Até então todas as medidas visavam fortalecer e apoiar o corpo em sua
resistência aos bacilos da tuberculose. Durante a segunda guerra mundial, em 1943,
conseguiram desenvolver um antibiótico - estreptomicina - que combinava inibição
máxima do bacilo tubérculo com toxicidade relativamente baixa em animais de
laboratório. Só em 1994 foi testado em humanos. Diversos antibióticos para tuberculose
começaram a ser criados, o que foi bom porque em alguns meses cepas resistentes do
bacilo começaram a aparecer. Logo viu-se, que a esse problema poderia ser superado
com o uso de 3 ou mais medicamentos. São medicamentos com atividade
antimicrobiana e capazes de inibir o desenvolvimento de resistência.

Perspectivas futuras: a resistência

A World Health Organization (WHO) realizou em 2017 um relatório mostrando


o panorama da Tuberculose no mundo. Nele, constou que, em 2016, ocorreram 10,4
milhões de novos casos de TB e 490 mil novos casos de TB-MR. Esse número se revela
como um verdadeiro perigo para a saúde, pois não existem novas drogas
comprovadamente eficazes.
A resistência do BK pode ser dividida em primária e secundária. A secundária
normalmente ocorre durante o tratamento, após a exposição/infecção por um bacilo
sensível. Resulta do incompleto ou inadequado regime de tratamento, com seleção de
bacilos mutantes resistentes. Pode ser consequência de monoterapia real ou encoberta por
medicamentos ineficientes para a cepa que o paciente apresenta. Por outro lado, a
resistência primária resulta da exposição direta à um BK droga-resistente, em pessoas
nunca antes tratadas para a tuberculose.
Podemos classificar o tipo de resistência em algumas categorias: monorresistente,
polirresistente, multirresistente e TB com resistência extensiva.
- Monorresistência: resistência a apenas um fármaco.
- Polirresistência: resistência a dois ou mais fármaco, exceto à associação rifampicina
e isoniazida. Uma das mais frequentes no Brasil envolve isoniazida e estreptomicina
devido ao longo tempo de uso de ambos os fármacos no país.
- Multirresistência (TB MDR): resistência a pelo menos rifampicina e isoniazida.
- Resistência extensiva (TB XDR): resistência à rifampicina e isoniazida acrescida de
fluoroquinolonas (qualquer uma delas) e aos injetáveis de 2ª linha (amicacina, canamicina
ou capreomicina)

Como prevenir?
Para prevenir a progressão da TB-DR, precisamos ser assertivos: diagnóstico
precoce, tratamento de alta qualidade, efetividade na implementação do controle da
doença, abordagem aos fatores de risco individuais e determinantes sociais e, claro, usar
racionalmente os medicamentos, com esquema padronizado e adesão ao tratamento.
Conclusão
A história do Mycoplasma tuberculosis acompanha a do Homo sapiens há muito
tempo. Inclusive, as micobacterias existiam antes mesmo de nossos ancestrais
caminharem pela Terra. Ao longo de gerações, o BK causou sequelas e mortes nos
homens sem ser descoberto como causador do quadro. No século XIX, finalmente
descobriram sua existência com Robert Koch. A partir disso, foram sugeridas diversas
formas de tratamento, porém nem todas eficazes. Até que chegamos ao atual tratamento
2RHZE4RH e a criação da vacina BCG.
Entretanto, com o uso inadequado e incompleto dos fármacos, diversos BK estão
desenvolvendo resistência aos atuais fármacos. Um novo desafio surge: resolver o
problema da resistência. Quem sabe novas drogas surgiram para o futuro com o intuito
de tratar a TB-MR? Antes de resolvermos isso, afinal, precisamos prevenir a seleção dos
bacilos resistentes e a disseminação dos mesmos.

Bibliografia
Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil
Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância
Epidemiológica, Brasília (2011)
World Health Organization. Global Tuberculosis Report, 2017. Geneva: WHO;
2017
Thomas M. Daniel, The history of tuberculosis, Respiratory Medicine, Volume 100, Issue 11,
2006, Pages 1862-1870, ISSN 0954-6111, https://doi.org/10.1016/j.rmed.2006.08.006.
Daniel, T. M. the origins and precolonial epidemiology of tuberculosis in the Americas:
can we figure them out? The International Journal of Tuberculosis and Lung Disease,
Volume 4, Number 5, May 2000, pp. 395-400(6)
Rosemberg J, Tuberculose - Aspectos históricos, realidades, seu romantismo e
transculturação, Boletim de Pneumologia Sanitária, 1999 vol: 7 (2)
Daniel T , The history of tuberculosis, Respiratory Medicine, 2006 vol: 100 (11) pp:
1862-1870

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