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Tromboembolismo pulmonar

INTRODUÇÃO

O tromboembolismo pulmonar (TEP) é um distúrbio causado pela obstrução em graus variados


dos vasos da circulação pulmonar por fragmentos (êmbolos) originados de trombos presentes com maior
frequência em vasos venosos. A principal fonte desses êmbolos é a circulação venosa profunda dos
membros inferiores. A embolia pulmonar é um conceito mais amplo que inclui o TEP, podendo a
obstrução vascular pulmonar ocorrer por êmbolos de gordura e até mesmo por material não endógeno,
como o silicone.

FATORES DE RISCO

 Obesidade
 Tabagismo
 Uso de contraceptivos orais
 Terapia de reposição hormonal na pós-menopausa
 Imobilização prolongada
 Cirurgia recente
 Trauma
 Câncer
 Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)
 Hipertensão arterial sistêmica
 Cardiopatias crônicas
 Síndrome do anticorpo antifosfolipídio (SAF)
 Viagens de avião prolongadas
 Trombofilias

Cateteres venosos profundos empregados para nutrição parenteral ou quimioterapia aumentam a


probabilidade de TVP em membros superiores, que também podem causar TEP. Uma causa rara de
trombose de veia subclávia é a trombose induzida pelo esforço (síndrome de Paget-Schroetter). O uso de
muletas com apoio axilar é um fator de risco para trombose de veia axilar.

Lembrar da Tríade de Virchow: Lesão ao endotélio vascular + estase venosa + hipercoagulabilidade

FISIOPATOLOGIA

A maioria dos êmbolos pulmonares tem origem nas veias profundas dos membros inferiores e
nas veias pélvicas. Um êmbolo de grandes dimensões pode se alojar na bifurcação da artéria pulmonar
(êmbolo em sela), sendo comum a oclusão de um vaso pulmonar de maior calibre.

A hipoxemia ocorre em um número considerável de pacientes com embolia pulmonar. Qual o


mecanismo?

 O desequilíbrio entre a ventilação e a perfusão pulmonares: existem áreas ventiladas, porém não
perfundidas, devido à obstrução na circulação pelo evento embólico. Esse fenômeno passa a ter
uma maior importância nas embolias maciças.
 A isquemia dos ácinos promove a liberação de diversos mediadores humorais, com destaque para
a serotonina, responsável pela broncoconstrição e pela diminuição da produção de surfactante
pelos pneumócitos II, complicações que levam à atelectasia e formação de exsudato alveolar. As
áreas atelectásicas, com broncoconstrição intensa e presença de exsudato nos alvéolos, recebem
perfusão de sangue pobremente oxigenado que deveria ser oxigenado. Entretanto, os alvéolos se
encontram colapsados ou a ventilação é insuficiente devido à diminuição do lúmen do brônquio.
Dessa forma, o sangue passa da direita para esquerda (desvio ou shunt) sem receber oxigênio.
Esse mecanismo é o principal responsável pela hipoxemia observada na embolia pulmonar.

Qual o mecanismo principal da hiperventilação observada no TEP? Os mediadores humorais


estimulam os receptores J alveolares que levam à hiperventilação, o que justifica a alcalose
resporatória frequentemente encontrada. A taquipneia e a hiperpneia tão frequentemente
encontradas na embolia pulmonar são decorrentes desse mecanismo e não da hipoxemia.

Para guardar: As principais alterações encontradas na gasometria arterial são a alcalose


respiratória (hiperventilação) e a hipoxemia!

Outra consequência pulmonar importante é o cor pulmonale agudo, que ocorre quando mais de
40-50% da circulação pulmonar são obstruídos por êmbolos. Este quadro em geral se verifica na
embolia maciça, que também costuma cursar com instabilidade hemodinâmica.

Na ausência de doenças cardiopulmonares subjacentes, a oclusão de 25 a 30% do leito vascular


pulmonar se associa a elevação significativa da pressão arterial pulmonar. Como isso ocorre? A
serotonina liberada pela lesão isquêmica contribui com o efeito vasoconstritor. Com o aumento
progressivo da resistência vascular pulmonar (obstrução + serotonina) há piora da hipoxemia, o que
agrava ainda mais a vasoconstrição.

O aumento importante e súbito nas pressões da artéria pulmonar provoca uma elevação
inesperada na pós-carga ventricular direita, levando à disfunção sistólica dessa câmara. A primeira
consequência é a redução do débito do VD e, por conseguinte, do retorno venoso para as cavidades
esquerda. A representação clínica desse fenômeno, denominado cor pulmonale agudo, varia de
hipotensão arterial até o choque cardiogênico e é o mecanismo principal de óbito da embolia
pulmonar.

A dilatação do VD também provoca um abaulamento do septo interventricular, que reduz o


tamanho do ventrículo esquerdo, contribuindo para a queda do seu enchimento (pré-carga). Com
isso, a perfusão coronariana encontra-se diminuída, o que pode levar à isquemia miocárdica grave e
diminuição do débito cardíaco (síncope, hipoperfusão visceral, etc.). Somado a esses eventos, a
elevação repentina na tensão da parede do miocárdio do VD provoca hipoperfusão coronariana dessa
cavidade. Este fenômeno pode levar ao infarto de VD e choque. Todas essas anormalidades se
perpetuam e podem culminar com o óbito.

QUADRO CLÍNICO

Devemos sempre suspeitar de embolia pulmonar em todos os pacientes com fatores de risco
que desenvolvem dispneia súbita e apresentam ausculta pulmonar inocente!
Entre os pacientes que não possuem doença cardiopulmonar prévia, a dispneia parece ser o
principal sintoma e a taquipneia o sinal mais frequentemente encontrado. Enquanto dispneia,
hipotensão, síncope e cianose nos indicam embolia pulmonar maciça, a presença de dor pleurítica, tosse
e hemoptise estão mais relacionadas à embolia pulmonar periférica, obstruindo vasos próximos à
superfície pleural.

Na maioria dos pacientes com embolia pulmonar a história e o exame físico possuem baixa
sensibilidade. Além disso, um considerável número de episódios ocorre em pacientes com doença
cardiopulmonar preexistente, cuja descompensação geralmente se assemelha às manifestações da
embolia pulmonar. Dessa forma o TEP sempre deve constar no diagnóstico diferencial dos portadores e
doenças cardiopulmonares que “descompensam” sem causa aparente.

O escore de Wells orienta a suspeita


de embolia pulmonar de acordo com
o escore do paciente.

Existe ainda uma maneira mais fácil de guardar o escore de Wells através do anagrama:

Episódio prévio
Malignidade
Batata inchada (suspeita de TVP)
Outro diagnóstico
Lung bleeding
Imobilização
Alta FC (>100 bpm)

Embolia Pulmonar maciça: pacientes possuem obstrução trombótica de pelo menos metade do sistema
arterial pulmonar. O coágulo se encontra presente bilateralmente. Existe risco elevado de choque
cardiogênico. Dispneia é o sintoma cardinal e hipotensão arterial que geralmente requer aminas, é o sinal
predominante. A terapia com trombolíticos ou embolectomia está formalmente indicada.

Embolia pulmonar moderada a grande: a cintilografia de perfusão revela que mais de 30% dos pulmões
não se encontram perfundidos. O ecocardiograma evidencia um VD dilatado e hipocinético, o paciente
apresenta pressão arterial normal. Estes indivíduos, mesmo anticoagulados, estão em risco de um novo e
possivelmente fatal episódio de embolia. Por essa razão, os pacientes se beneficiam mais do emprego de
trombolíticos ou de embolectomia, quando comparados à anticoagulação sistêmica isolada.

Embolia pulmonar pequena a moderada: encontramos função ventricular direita e pressão arterial
sistêmica normal! O prognóstico é favorável, empregando-se apenas a anticoagulação sistêmica.

Infarto pulmonar: é considerado uma embolia pulmonar pequena. O êmbolo se aloja na árvore arterial
distal, próximo à superfície pleural. Os achados clínicos mais frequentes são dor torácica contínua e,
eventualmente, hemoptise, somados a febre e leucocitose.

DIAGNÓSTICO

5 REGRAS BÁSICAS DO DIAGNÓSTICO DE TEP

 O D-dímero não deve ser utilizado em pacientes internados


 O D-dímero não deve ser utilizado em pacientes com alta probabilidade clínica de TEP (> 4 pontos
no escore de Wells). Nesse grupo de pacientes um exame normal não é capaz de excluir o
diagnóstico com segurança
 A angio-TC é, atualmente, o exame de escolha para o diagnóstico
 A cintilografia pulmonar é, atualmente, exame de segunda linha, sendo útil especialmente
naqueles pacientes que não toleram contraste venoso
 A arteriografia pulmonar é o exame padrão-ouro para o diagnóstico de TEP, porém é necessária
em poucos casos

D-dímero

A quantificação do D-dímero plasmático pelo método ELISA é um teste de elevada sensibilidade


para triagem de pacientes com suspeita de TEP. Quando encontramos níveis ≥ 500 ng/ml, a sensibilidade
se aproxima de 96,4% para diagnóstico de TEP. O exame, porém, não é específico, razão pela qual serve
para triagem e não para diagnóstico. Em pacientes internados, ele perde muito em especificidade, pois
sepse, IAM, câncer e qualquer doença sistêmica grave podem aumentar o D-dímero.

Ou seja: D-dímero aumentado = pode ser TEP – necessários outros exames complementares. D-
dímero normal = muito provavelmente não é TEP.

Eletrocardiograma

O ECG é importante para afastar a possibilidade de IAM. Uma alteração frequentemente


encontrada, porém, pouco específica, é a taquicardia sinusal. Um outro achado que pode ser mais comum
que a taquicardia sinusal é a inversão de onda T em V1 a V4. Essa alteração é uma das diversas que
representam sobrecarga do VD. O padrão S1Q3T3 é patognomônico de TEP.

Radiografia de tórax
Radiografia de tórax geralmente apresenta-se sem alterações ou com uma importante
desproporção clínica-radiológica. Embora sejam frequentes achados inespecíficos (derrame pleural,
atelectasia, infiltrado pulmonar) os achados mais específicos são raros.

Os achados mais específicos são: Sinal de Westermark (oligoemia localizada) é mais bem vista
quando comparamos esta hipertransparência com o pulmão contralateral. Essa alteração é ocasionada
pela oclusão de uma artéria pulmonar segmentar ou lobar e é mais comum nas embolias maciças.

Outro sinal específico é o da Corcova de Hampton, uma imagem hipotransparente, em forma de


cunha que se apresenta sobre o diafragma e representa o infarto pulmonar. Uma artéria pulmonar direita
descendente dilatada corresponde ao Sinal de Palla, que pode ser encontrado em alguns pacientes com
TEP.

Corcova de Hampton

Angio-TC

É o melhor método radiológico no diagnóstico de embolia pulmonar. A sensibilidade do exame é


de 90% e a especificidade 95% para o diagnóstico de TEP. Além disso, o imageamento detalhado do tórax
permite a identificação de outras doenças pulmonares que fazem o diagnóstico diferencial ou coexistem
com TEP, como pneumonia, fibrose pulmonar, DPOC e etc.
Cintilografia ventilação-perfusão (V/Q) dos pulmões

Uma cintilografia normal ou quase normal torna o diagnóstico de TEP muito pouco provável. Uma
cintilografia de alta probabilidade apresenta duas ou mais áreas no pulmão com defeitos de perfusão
segmentares que são ventiladas normalmente ou um defeito de perfusão substancialmente maior do
que um infiltrado observado na radiografia de tórax em região correspondente do parênquima.

Duplex-scan de membros inferiores

Melhor exame não invasivo para o diagnóstico da TVP no território ileofemoral. Um paciente com
suspeita de TEP e duplex-scan positivo já deve ser tratado.

Arteriografia (angiografia) pulmonar

É o padrão-ouro para TEP. O emprego desse exame se encontra reservado para as seguintes
situações:

 Pacientes com alta probabilidade de TEP após angio-TC, cintilografia e duplex scan de MMII
negativos
 Pacientes que vão se submeter a embolectomia ou trombólise guiada por cateter.

Algoritmo diagnóstico de TEP


TRATAMENTO

A terapia primária para o TEP inclui trombólise ou remoção do êmbolo através de embolectomia,
sendo reservada para pacientes críticos e instáveis hemodinamicamente.

A terapia secundária para o TEP baseia-se no uso de anticoagulantes, estando indicada em todos
os pacientes diagnosticados. Os anticoagulantes não dissolvem o trombo formado, porém evitam sua
propagação, permitindo que o sistema fibrinolítico endógeno atue para a resolução do trombo. Além
disso, previne a recorrência do TEP. Nos pacientes com contraindicação à anticoagulação ou com
episódios recorrentes de TEP a despeito da mesma, indicamos a instalação de um filtro de veia cava
inferior.

Terapia primária

Trombólise: A trombólise quando bem-sucedida, dissolve a maior parte dos trombos que estão
ocasionando obstrução anatômica da árvore arterial pulmonar, previne a liberação continuada de
serotonina e dissolve os trombos em membros inferiores e veias pélvicas evitando, dessa forma, novos
episódios embólicos.

O trombolítico de escolha é o ativador do plasminogênio tecidual recombinante (rtPA) na dose


de 100 mg a ser infundido em 2 horas em veia periférica. A estreptoquinase também pode ser prescrita
com 250.000 U IV infundidas em 30 minutos e depois 100.000 U/h durante 24 horas.

Terapia intervencionista: Pode ser feita através de: (1) trombolítico intra-arterial; (2)
embolectomia succional; (3) embolectomia por fragmentação; (4) outros métodos. Os pacientes com
embolia maciça, instáveis hemodinamicamente e que apresentam contraindicação ou refratariedade ao
trombolítico devem ser submetidos à embolectomia cirúrgica.

Terapia secundária

Anticoagulação

 Heparina não fracionada (HNF) empregada via intravenosa é um tratamento bastante tradicional
e eficaz no TEP. A droga age acelerando a ligação da enzima antitrombina III com fatores da via
intrínseca e via comum da coagulação, inativando-os. A dose inicial da HNF é de 80 U/kg de ataque
seguida de 18 U/kg em bomba infusora.
 Heparina de baixo peso molecular (HBPM) via subcutânea pode ser empregada no tratamento
do TEP associado à TVP. Enoxaparina na dose de 1 mg/kg a cada 12 horas; outra droga bastante
usada é a dalteparina 200 U kg/dia em 1 ou 2 aplicações.

A HNF é a heparina de escolha em pacientes instáveis hemodinamicamente, candidatos à


trombólise, obesos mórbidos e portadores de IRC com ClCr < 30 ml/min. Em todos os demais casos, a
escolha é a HBPM.

Existe uma opção ao uso das heparinas que é o fondaparinux. A dose é de 5 mg/dia, 7,5 mg/dia
ou 10 mg/dia. Não requer monitorização.

Para uso oral desses pacientes em seguimento ambulatorial podem ser usados o warfarin 5 a 10
mg ao dia ou o dabigatran (mais utilizado na TVP do que na TEP).

Filtro de veia cava inferior

As duas principais indicações de filtro de veia cava inferior (VCI) são embolia pulmonar na
presença de sangramento ativo e trombose venosa recorrente a despeito de anticoagulação. A maioria
dos filtros é posicionada abaixo das veias renais, através de punção na veia femoral direita.

Mesmo após a colocação do VCI, nos 2 primeiros anos os pacientes devem continuar recebendo
anticoagulantes, com exceção dos pacientes com sangramento ativo, pois o VCI aumenta o risco de TVP
nos 2 primeiros anos de sua colocação.

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