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DOENÇA RENAL CRÔNICA

A doença renal é insidiosa, silenciosa e, em suas fases iniciais, costuma ter poucos sinais e sintomas,
a menos que seja uma doença renal que se exteriorize, como a síndrome nefrótica e nefrítica. Muitas vezes,
há doença renal relacionada à hipertensão ou diabetes, mas não há sintomas. Essa falta de sintomas se
deve à capacidade de adaptação do rim, com o aumento de função dos néfrons não afetados, permitindo a
compensação da perda de função dos néfrons esclerosados. A doença progride silenciosamente.

A falta de sintomas atrapalha a adesão ao tratamento, já que o paciente não se percebe como
doente.

Até pouco tempo, falava-se em insuficiência renal crônica, que era classificada como leve,
moderada e grave.

Dentro da história natural da doença renal, é necessário identificar os grupos de risco, diagnosticar
a doença renal e estadiar a doença renal, evitando a chegada ao estágio 5 da DRC, que é a falência renal.

A doença renal é inexorável, incurável, objetiva-se preveni-la e retardar sua progressão, evitando
chegar ao estágio 5. Busca-se manter a taxa de filtração glomerular, em vez de deixa-la cair. A chegada no
estágio 5 pode ser inevitável, mas se faz com que o paciente chegue lá nas melhores condições clínicas
possíveis e com menos complicações, o que diminui a mortalidade.

Estágio 5 (falência renal): Diálise: terapia renal substitutiva: hemodiálise ou diálise peritoneal. Outra
opção: transplante renal. Transplante pré-emptivo: logo antes de o paciente chegar ao estágio de
necessitar a diálise, faz-se o transplante renal. Para isso, o paciente precisa ter um doador vivo. Rins de
doadores cadáveres vão para os pacientes que já estão em terapia renal substitutiva. Pacientes que fazem
diálise acabam sendo encaminhados para o transplante. Pacientes transplantados ainda são considerados
doentes renais crônicos, e podem voltar a ter a necessidade de fazer diálise. Faz-se o estadiamento do
paciente transplantado e ele volta a ser inserido na linha de cuidado.

Linha de cuidado: vai do grupo de risco, ao tratamento conservador, para o ambulatório de uremia
ou pré-falência renal e o estágio de falência renal.

Pacientes com condições de risco para o surgimento e agravo da doença renal crônica: hipertensão
arterial, envelhecimento, diabetes, obesidade e doenças cardiovasculares. As duas principais causas de DRC
são hipertensão e diabetes. Mundialmente, ganha o diabetes; no Brasil, é a hipertensão.
Observa-se aumento da prevalência de DRC na população mundial e brasileira nos últimos anos.
Isso se deve principalmente ao envelhecimento da população, associado às altas prevalências de diabetes e
hipertensão. A cada ano, há perda de função renal. Quando um paciente tem mais comorbidades, a
tendência é que o paciente tenha uma taxa de filtração glomerular mais baixa do que a prevista para sua
idade. Prevalência maior de homens fazendo diálise do que mulheres.

A definição de DRC é baseada em três componentes: 1. Componente anatômico ou estrutural, que


depende dos marcadores de dano renal (exemplo: biópsia dando diagnóstico de glomerulonefrite;
hidronefrose; cálculo renal; obstrução; doença renal policística: dano estrutural subjacente à DRC). 2.
Componente funcional: taxa de filtração glomerular (ou clearence de creatinina). 3. Componente temporal:
taxa de filtração glomerular menor do que 60 ml/min/1,73 m² há pelo menos três meses (três dosagens),
mesmo sem sintomas, OU TFG > 60 mL/min/1,73 m², associada a pelo menos um marcador de dano renal
parenquimatoso (por exemplo, proteinúria, cilindrúria, etc.) (componente anatômico ou estrutural),
presente há pelo menos 3 meses. Para definir que um paciente tem DRC, basta a presença de um
componente.

O risco tratado na tabela acima é o risco de evolução e agravamento da doença renal.

Supondo que um paciente é hipertenso e sua razão albumina/creatinina seja < 30 mg/g. Esse
paciente tem um risco baixo, mesmo que sua taxa de filtração glomerular seja 60. Se esse paciente tiver
uma razão albumina/creatinina entre 30 e 300, seu risco será moderado para progressão da DRC, mesmo
que a TFG seja acima de 60. O risco muito alto aparece no estágio 3A, dependendo da razão
albumina/creatinina. Os riscos ajudam a definir a conduta: mudança de hábitos de vida X encaminhamento
para nefrologia.

Em pacientes ainda em estágios iniciais, com proteinúria discreta, quando o tratamento é bem
feito, inclusive o tratamento das comorbidades, é possível até ter algum ganho de função glomerular.
Principais etiologias: diabetes, hipertensão e glomerulonefrite. Outras: nefrite intersticial, pielonefrite,
doenças císticas, vasculites, neoplasias, doenças autoimunes, malformações congênitas, anti-inflamatórios não
esteroidais, necrose cortical bilateral, IRA prolongada, outras.

Antigamente, entendia-se a IRA como tendo resolução completa após o caso. Porém, alguns pacientes
com IRA, principalmente quando ela dura muito tempo (prolongada), podem desenvolver DRC. Por isso, alguns
pacientes após IRA devem ser acompanhados.

Fatores de risco da DRC: Iniciais: hipertensão, diabetes mellitus, história familiar de DRC, adultos > 60
anos (17% apresentam TFG <60mL/min/1,73m2), pacientes em uso de medicação nefrotóxica, pacientes com
doença cardiovascular, IRA prolongada. Outros: enfermidades sistêmicas, infecções urinárias de repetição, litíase
urinária repetida, uropatias, crianças com < 5anos (principalmente prematuros, que tem maiores chances de
desenvolver hipertensão e DRC) e mulheres grávidas. Fatores que devem ser investigados na consulta.

Com a idade, o grau de esclerose glomerular aumenta, o volume cortical diminui e o número de néfrons
diminui. Isso é normal com o aumento da idade.

Fatores de risco iniciais: hipertensão arterial, diabetes mellitus, doença cardiovascular, dislipidemia,
obesidade, hiperuricemia, fumo, baixo nível sócio econômico e drogas nefrotóxicas. Relacionados à progressão:
idade, gênero (masculino), cor, predisposição genética, pobre controle da PA, pobre controle da glicemia,
proteinúria, doença cardiovascular, dislipidemia, fumo, obesidade, hiperuricemia, baixo nível sócio econômico,
álcool, nefrotoxicidade e insuficiência renal aguda. O tratamento da diabetes de pacientes com doença renal ou
da pressão arterial em pacientes hipertensos pode diminuir a proteinúria. Pacientes que tiveram um infarto do
miocárdio devem ter a função renal avaliada, pois o infarto é uma condição de risco para o início e para a
progressão da doença renal crônica. Dislipidemia, fumo, obesidade e álcool também devem ser combatidos no
tratamento da doença renal crônica.

A redução da massa renal leva à vasodilatação renal crônica, aumentando a pressão hidráulica
transcapilar e o ritmo do fluxo plasmático glomerular, causando alterações seletivas da permeabilidade e
hipertensão e hiperfiltração glomerulares, o que aumenta o fluxo proteico e causa a albuminúria. Quanto maior
o fluxo proteico, maior a lesão da célula mesangial, maior a produção de matriz e a esclerose, diminuindo a taxa
de filtração glomerular. Além disso, há uma lesão celular direta, causando proliferação celular, que lesa as
células mesangiais, levando à produção de matriz e causando a esclerose glomerular.
Diagnóstico: anamnese, achados no exame físico (são muito poucos, presentes quando há doença
associada, como síndrome nefrótica. Na doença renal crônica, em fases avançadas, pode haver anemia e
edema, mas, em geral, o exame físico é pouco vasto) (uremia: flapping, encefalopatia, hálito urêmico,
acidose), ultrassonografia renal (componente estrutural: rim diminuído, afilamento da cortical, aumento da
ecogenicidade, perda da relação córtico-medular) (pode ter DRC com rim normal), dosagem da creatinina e
taxa de filtração glomerular, relação proteína/creatinina ou albumina/creatinina na amostra de urina ou
urina de 24 horas ou spot urinário, EAS e proteinúria.

Busca de sintomas de doenças associadas: revisão de sintomas: queixas relativas a litíase, obstrução
renal, infecção, GNDA, infecção associada ao HIV, sinais de doença autoimune, risco de exposição ao HCV,
HBV ou HIV. Buscar doenças crônicas: ICC, cirrose, hipertensão, diabetes, perda de líquido pelo trato
gastrointestinal. História de proteinúria, gravidez, outros problemas urológicos. Histórico familiar de
doença renal policística, doença de Alport.

Conforme o tempo passa, a creatinina aumenta e a função renal diminui. A creatinina sérica pode
estar normal, mas o clearence estar prejudicado. Sempre investigar ambos. A creatinina depende da massa
muscular.

Cálculos para o clearence de creatinina: Cockroft-Gault: (140-idade) X peso X 0,85 (se for mulher) /
72 X Creatinina sérica. Usa-se, preferencialmente, a fórmula CKD-EPI, e, para crianças, Schwartz ou equação
de Counahan-Barratt.

Rastreamento com base na dosagem de creatinina:

Com base na albuminúria: sempre que houver proteinúria e TFG < 60 em um paciente de grupo de
risco, deve ser feita avaliação para DRC e acompanhamento. Se não, solicitar retorno em 1 ano caso o
paciente for de grupo de risco.
Obesidade: quanto maior o IMC, maior o risco relativo de desenvolver DRC. Está relacionada ao
HAS, DM e GN, levando à DRC.

Principais complicações: anemia, acidose metabólica, alterações no metabolismo mineral e


desnutrição. Principal desfecho que leva ao óbito: doença cardiovascular.

Na história natural da doença, a presença de proteinúria indica que há disfunção endotelial; é a


fase de injúria renal. À medida que a doença progride, há queda da taxa de filtração glomerular no rim e,
nos vasos, ocorre aterogênese. Se a progressão continua e atinge o estado de falência, há doença renal
crônica terminal (falência renal) e, como complicação cardiovascular, pode haver ICC, IAM ou AVC. Os
fatores de risco para doenças cardiovasculares e doença renal crônica são os mesmos: obesidade, HAS, DM,
tabagismo... e elas progridem juntas.

O tratamento é ligado à prevenção. Batalhar contra a incidência, progressão, morbidade e


mortalidade.

A mortalidade anual hoje de um paciente em diálise é em torno de 15%. Diálise: 4 horas, 3 vezes
por semana.

Tratamento da pressão arterial: alvo: menor do que 140/90 mmHg. Controle da proteinúria
controla a progressão, assim como a glicemia nos diabéticos. Mudança de hábitos de vida: melhora da
dieta, atividades físicas. Prevenção das complicações: anemia, doença óssea, dislipidemia, acidose, nutrição
e doença cardiovascular.

Doença mineral óssea: à medida que a TFG diminui, há aumento dos níveis séricos de fósforo,
devido à menor filtração. Isso leva à diminuição do cálcio sérico e diminuição a absorção do mesmo pelo
intestino. Forma-se um produto cálcio-fósforo pode se depositar nos órgãos. Frente a esse desequilíbrio, o
organismo aumenta a homeostase, aumenta o PTH, restaurando os níveis de base de fósforo e cálcio. No
entanto, a doença continua a progredir, bem como a perda de função renal, que causa o desequilíbrio de
fósforo e cálcio, que será restaurado pelo aumento de PTH. É o chamado hiperparatireoidismo secundário à
doença renal. Como consequência, há deformações ósseas e aumento do depósito do produto cálcio-
fósforo nos órgãos, o que agrava a doença cardiovascular. Trade off: para compensar uma situação adversa,
o organismo faz alguns mecanismos para tentar compensar, o que, a partir de certo momento, pode ter
consequências. Tratamento: controlar fósforo e cálcio por meio da dieta ou com quelantes de fósforo à
base de cálcio. Esse processo começa, em média, quanto a TFG chega a 30-40% de seu valor inicial.
Alterações ósseas: osteodistrofia.

Causas de anemia na DRC: deficiência de eritropoietina, deficiência de ferro (perda da vontade de


comer, anorexia), estado inflamatório, perda sanguínea, hiperparatireoidismo, diminuição da meia vida das
hemácias, deficiência de ácido fólico e vitamina B12.
Meta de tratamento da hipertensão: menor do que 140/90 mmHg. Droga de escolha inicial: iECA e
BRA.

Medidas para retardar a progressão da DRC/Tratamento conservador: inibidor da ECA, controle da


hipertensão arterial, controle da glicemia, redução da proteinúria, redução protéica, controle da
dislipidemia. Diminuir proteínas, fósforo, álcool, sal e diuréticos. Programas de conscientização,
monitorização do sódio urinário, definir alvo (6 gramas ao dia), recomendações específicas. Indivíduos que
ingerem muito sal têm progressão muito mais rápida da semana. O fumo idem.

A principal alteração de eletrólito é de potássio; hiperpotassemia. Se isso ocorrer, pode ser


necessário suspender o uso de iECA e BRA. Outra condição que merece atenção em pacientes com doença
renal crônica é a acidose metabólica.

Indicações absolutas para diálise: pericardite, hipervolemia refratária a diuréticos, hipertensão


arterial refratária às drogas hipotensoras, sinais e sintomas de encefalopatia, sangramentos atribuíveis à
uremia, náuseas e vômitos persistentes, hiperpotassemia não controlada, acidose metabólica não
controlada.

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