Você está na página 1de 46

UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO

DO RIO GRANDE DO SUL


DHE – PEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO

SHEILA STOCK KOMMERS

LITERATURA INFANTO-JUVENIL: UMA POSSIBILIDADE PARA


DISSOLVER O PRECONCEITO

Ijuí - RS
2011
2

SHEILA STOCK KOMMERS

LITERATURA INFANTO-JUVENIL: UMA POSSIBILIDADE PARA


DISSOLVER O PRECONCEITO

Monografia apresentada ao curso de Letras


Português e suas respectivas Literaturas da
Universidade Regional do Noroeste do Estado do
Rio Grande do sul – UNIJUÍ, como requisito parcial
para obtenção do título de Licenciado em Letras.

Orientadora: Profª Me. Maristela Righi Lang

Ijuí
2011
3

Dedicatória: Eu dedico este trabalho às pessoas que me amam


e que torceram e ainda torcem pela minha realização pessoal e
profissional.
4

Agradecimentos:
Agradeço a todos que me incentivaram, que de uma forma ou
outra me ajudaram na construção e na realização deste trabalho e que
me apoiaram no decorrer de minha graduação, principalmente
agradeço a minha família e em especial ao meu esposo. Mas acima de
tudo, agradeço a Deus por me dar a vida e as condições para que eu
chegasse ao fim desta jornada e a realização deste sonho.
5

SUMÁRIO
Resumo.....................................................................................................................6
INTRODUÇÃO.........................................................................................................8

1 A LITERATURA INFANTIL.............................................................................10
1.1 Literatura infanto- juvenil...............................................................................10
1.2 Como tudo começou: breve histórico sobre a Literatura Infantil.........12
1.3 O novo perfil da literatura infantil......................................................................14
1.4 Literatura e a escola......................................................................................15

2 ADOLESCÊNCIA..............................................................................................19
2.1 Como as escolas têm trabalhado em seus currículos os temas
transversais sugeridos pelos PCN’s.................................................................23
2.2 Preconceito..................................................................................................25
2.3 Preconceito nas escolas.............................................................................26

3 LITERATURA INFANTO-JUVENIL: UMA POSSIBILIDADE PARA


DISSOLVER O PRECONCEITO.......................................................................31
3.1 Trabalhando o racismo, através da obra: Pretinha, eu?, de Júlio E.
Bráz...........................................................................................................................34
3.2 Usando o livro Ímpar, para debater sobre o tema discriminação/
inclusão de deficientes físicos............................................................................37
3.3 Trabalhando sobre o bullying: Todos Contra Dante, de Luís Dill.......40

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................43

REFERÊNCIAS....................................................................................................45
6

Resumo: Partindo do pressuposto que a literatura infantil e infanto-juvenil


têm fundamental importância na formação dos sujeitos e tendo em vista a sua
inserção no cotidiano escolar e a diferença que ela faz na vida dos alunos, pensou-
se em desenvolver pesquisa neste campo. Para isso foram trazidos alguns conceitos
e autores que tratam do tema. Foram levantadas também algumas problemáticas
enfrentadas pelo adolescente nesta faixa etária, seus conflitos, o preconceito e as
diferentes formas de violência e como a literatura infanto- juvenil pode ajudar neste
momento. Porém, foi abordado principalmente de que maneira o professor pode
trabalhar com a literatura infanto-juvenil como uma aliada na dissolução de tais
problemas dentro da comunidade escolar. Assim, foram analisadas três obras, uma
que trata sobre o tema racismo, intitulada Pretinha, eu?, do autor Júlio Emílio Braz,
outra que fala sobre a discriminação aos deficientes físicos, que é o livro Ímpar, de
Marcelo Carneiro da Cunha e um sobre o bullying, de Luis Dill sob o título Todos
Contra Dante.

Palavras chaves: literatura infanto-juvenil, escolas, preconceito


7

Abstract: Considering the prerogative that both infant and infant-juvenile literatures
have fundamental importance in the formation of individuals and considering also its
inclusion in the daily school activities and the difference it makes in students life, the
development of research in this field was thought. On this purpose, some concepts
and authors that deal with this subject were brought to. Some teen age issues,
conflicts, prejudices and the different forms of violence and how infant-juvenile
literature can help at this point have also been raised. However, it was mainly
addressed how the teacher can work with infant-juvenile literature as an ally to solve
uch issues inside the school community. Three literary works were then analyzed:
one about racism, entitled “Pretinha, eu?”, by Júlio Emílio Braz; one about
discrimination against the physically disabled, entitled “Ímpar”, by Marcelo Carneiro
da Cunha; and one about bullying, by Luis Dill and entitled “Todos Contra Dante”.
8

INTRODUÇÃO
Sabemos como é necessária a leitura, principalmente dentro da escola, em
função de sua importância, e igualmente importante também se torna o incentivo
dado a ela por parte dos professores para com seus alunos. Trabalhar com leitura
de literaturas com os alunos, principalmente adolescentes, já que é nesta fase que
se vivem conflitos próprios da idade, pode fazer diferença na vida deles. Sabemos
também que existe uma problemática vivenciada dentro da comunidade escolar
atual que é o preconceito e a violência e que está se propagando cada vez mais
dentro deste ambiente. Por este motivo desenvolverei neste trabalho, sugestões a
respeito de como o professor poderá usar exatamente esta literatura infanto-juvenil,
como uma possibilidade e uma tentativa de diluir com o preconceito nas escolas.
Sendo meu objeto de estudo a literatura infanto-juvenil, será feito um percurso
histórico da literatura infantil e juvenil em nosso país. Além disso, será realizada
reflexão sobre questões como que espaço as leituras estão tendo dentro das salas
de aula, que importância está sendo dada à leitura atualmente nas escolas de nosso
país e que tipos de literaturas estão sendo solicitadas aos alunos, pelos professores,
bem como a importância de se trabalhar com leituras de livros em sala de aula. É de
primordial importância o novo olhar que se pode dar para literaturas que tragam
assuntos vivenciados pelos nossos alunos no seudia-a-dia, pois uma das
abordagens que usarei é mostrar ao professor que, usando a literatura infanto-
juvenil mais especificamente, ele poderá trabalhar com seus alunos, assuntos que
mesmo não estando inseridos no currículo, são muito importantes, atuais e
relevantes para a comunidade escolar e que estão inseridos nos Parâmetros
Curriculares Nacionais, como temas transversais.
Tais assuntos falam sobre questões da ética, da Pluralidade Cultural, do Meio
Ambiente, da Saúde e da orientação sexual. Estes temas, se trabalhados com a
comunidade escolar, refletirão no ensino e na aprendizagem valores e atitudes dos
atuais alunos.
Como o público leitor de literatura infanto-juvenil, são na maioria, os
adolescentes, é conveniente debatermos sobre a temática da adolescência e os
conflitos vivenciados por eles, atualmente, bem como a forma como família e
sociedade estão encaminhando estes assuntos na vida dos adolescentes.
9

Mas, o foco maior que se dará a este trabalho é exatamente o uso de


literaturas que tragam assuntos questionadores para dentro da sala de aula,
assuntos que são poucos debatidos pela comunidade escolar. Pensando nisso foi
escolhido o tema preconceito já que é um dos assuntos ainda bem vivenciados na
sociedade e principalmente dentro da comunidade escolar e que tem trazido uma
certa preocupação por parte de pais e professores, já que mesmo com o passar dos
anos este comportamento discriminatório ainda não foi dissolvido e tem-se
propagado cada vez mais no meio escolar.
Sendo assim, serão feitas analises de três literaturas que tratam sobre os
seguintes assuntos: Racismo, através do livro: Pretinha, eu? de Julio Emílio Braz, a
discriminação contra portadores de deficiência física através da obra: Ímpar, de
Marcelo Carneiro da Cunha e sobre o bullying, usando a literatura: Todos contra
Dante, escrito por Luís Dill.
Ao trazer literaturas sobre estes temas questionadores para seus alunos, o
professor oportuniza ambientes de debates e estará efetuando um trabalho de
conscientização com alunos, lidando com o assunto, de uma maneira consciente,
preparando e posicionados bem seus alunos frente a isto.
Ao pensar sobre este tema: preconceito, foram escolhidas três obras
literárias que abordem a respeito de tal assunto e que serão analisadas sobre a ótica
de uma possível realização de um trabalho em sala de aula. Essa proposta
colaboraria e teria o objetivo de que o quadro preocupante, de comportamentos
preconceituosos dentro das escolas viesse a diminuir e assim, ajudando seus alunos
a formarem opiniões sobre o que se deve fazer para que se termine de vez,
qualquer tipo de discriminações dentro das escolas.
O bullying é um exemplo e uma consequência desses tipos de
comportamentos preconceituosos, e este problema, infelizmente, é a realidade da
grande maioria das escolas brasileiras. É grande a importância de se tratar sobre o
tema preconceito, pelo motivo de muitos alunos já terem sofrido e grande parte
deles ainda sofrerem, com este tipo de comportamento por parte de colegas de sala
de aula, ou de escola, isso nos prova que: este tema não é só atual, como é
infelizmente, real. Então, esta proposta caminharia ao encontro de ajudar os alunos
aprenderem a se posicionar em relação ao preconceito e que por meio dessas
leituras aprendam a repensar e a elaborar seus conceitos sobre problemáticas que
estão dentro de suas próprias realidades, fora e dentro das salas de aulas.
10

1 A LITERATURA INFANTIL

O que é literatura infantil? Não é apenas um livro de literatura destinado às


crianças. Ela é fundamental para o desenvolvimento pleno, linguístico, intelectual
e social na infância. A Literatura infantil é importante para a expressão verbal, o
lúdico, a imaginação e a abstração. (CADEMARTORI: 2006, p. 74) explicita que
“O papel da literatura nos primeiros anos é fundamental para que se processe
uma relação ativa entre falante e língua.”
O contato com textos recheados de encantamentos nos faz perceber quão
importante e cheia de responsabilidade é toda forma de literatura, e que este
papel, cheio de responsabilidade, desempenhamos também nós professores, ao
incentivar e trabalhar com essas literaturas em sala de aula, com nossos alunos.
Embora considerada por alguns, como arte “menor” por ter sua designação
voltada à criança e ao adolescente, a literatura infanto-juvenil começa a viver
uma nova etapa em sua história. A palavra literatura significa arte e deleite;
sendo assim, o termo infantil associado à literatura não significa que ela tenha
sido feita necessariamente para crianças. Na verdade, a literatura infantil acaba
sendo aquela que corresponde de alguma forma, aos anseios do leitor e
daqueles que se identifiquem com ele.
Como sendo uma arte, um deleite, esse tipo de literatura não deve ser
trabalhada como um instrumento moralizante, com intuito pedagógico, e sim
voltado para criança de hoje, a criança criativa, sonhadora, cheia de desejos,
sonhos, curiosidades e sentimentos. O grande segredo é usar essa literatura
para trabalhar o imaginário e a fantasia da criança, assim a leitura pode torna-se
prazerosa e atrativa para a atual infância.

1.1 Literatura infanto- juvenil

“O que separa a literatura infantil da juvenil?” precisa perguntar-se de vez


em quando o professor, depois, é claro, de perguntar-se o que é que caracteriza
um texto, como literatura, outro como literatura infantil, e outro como literatura
juvenil. Marisa Lajolo, ao refletir sobre a questão afirma:
11

Tanto a criança à qual se destina a literatura infantil é uma construção,


quanto o jovem ao qual se destina a literatura juvenil é outra construção,
igualmente social. E, como construção social resultante, tanto o infantil de
uma quanto o juvenil de outra são conceitos móveis: o que é literatura infantil,
para um determinado contexto, pode ser juvenil para outro, e vice-versa,
infinitamente, incluindo-se, na espiral, também a literatura sem adjetivos.
(LAJOLO, 1988, Pg. 33)

Para a autora supracitada, existe uma linha divisória muito próxima entre a
literatura infantil e a infanto-juvenil, pois assim como a infantil trabalha com o
universo lúdico da criança, a juvenil também vai trabalhar com a criatividade, com os
sentimentos, com o ideal de herói do pré-adolescente, até mesmo colaborando com
uma parte bem significativa da formação de seu caráter e de seus ideais.
Infelizmente a literatura infanto-juvenil foi, muitas vezes, marginalizada, não
recebendo o devido incentivo que merece.
É algo relativamente recente o destaque que se está dando para a literatura
infanto-juvenil. Cerca de dois séculos se passaram e, hoje, já bem estabelecido, o
mercado editorial brasileiro cresce consideravelmente e, com isso, a literatura
infanto-juvenil ganha cada vez mais espaço dentro do setor; diversos são os
autores, grande é a diversidade de obras destinadas a esse público.
Atualmente o mundo da literatura infanto-juvenil é um lugar de destaque, pois
com seus diversos livros publicados, uns mais interessantes que outros, tornam-se
cada vez mais atraentes para qualquer leitor infanto-juvenil.
As dificuldades que existiam séculos atrás, como a falta de tipografias e a
não-profissionalização do escritor, já não existem mais. O que se vê no quadro da
literatura infanto-juvenil brasileira, atualmente, é que há uma maior conscientização
da importância desse gênero literário, até por uma questão de cidadania, pois é
inegável o fato de que, por meio de livros, são trabalhadas diversas questões
importantes para a constituição de um cidadão no futuro. No entanto, ainda é
necessário mais incentivo à questão da literatura infanto-juvenil, a fim de cada vez
mais manter crianças e jovens ligados aos livros.
Deve-se prestar mais atenção ao leitor, que pode descobrir no livro um
grande instrumento de cidadania e educação. Então, podemos e devemos usar este
potencial da literatura infanto-juvenil para trabalhar na vida da criança e do
12

adolescente um espírito investigativo, descobridor seja do seu próprio mundo ou do


mundo em sua volta.

1.2 Como tudo começou: breve histórico sobre a Literatura


Infantil1

Hoje, existem muitos autores e pesquisadores da área de literatura infanto-


juvenil. O Brasil e o mundo evoluíram consideravelmente em relação a este assunto,
pois até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não
tentava representá-la. Isso nos leva a pensar que não existia lugar para infância
naquele mundo, ou que existia um mundo separado para ela.
As crianças eram vistas como adultos em miniatura, a infância era tratada
como um período de transição, cuja lembrança era logo perdida, uma fase da vida
sem importância. Os estudos apontam que tudo indica, de fato, que a representação
realista da criança, ou a idealização da infância, de sua graça, de sua redondeza de
formas, tenham sido próprias da arte grega.
Ao longo dos séculos, a criança ganha seu espaço. A descoberta da infância
começou no século XIII e sua evolução pôde se acompanhar através dos séculos,
mas sem dúvida os sinais de seu desenvolvimento tornaram-se numerosos e
significativos somente a partir do final do século XVI e durante o século XVII. Isso
significa que começava a apontar para uma consideração dos desejos e fantasias
das crianças, o que possibilitava um lugar singular para elas.
É aqui que se dá e que se conquista, ou que se começa a conquistar um
espaço para a literatura infantil. A autora e pesquisadora da área, de L.I, Maria
Alexandre de Oliveira (2008) relata-nos a trajetória e a história da literatura infantil,
como essa literatura chegou ao Brasil e de que modo é tratada, também nos tempos
de hoje.
Segundo os estudos dessa autora e de outros pesquisadores da área, a
literatura infanto-juvenil, iniciou-se, aqui no Brasil, originalmente com a
oralidade.Não foram encontrados registros históricos de literatura escrita, voltada

1
Daqui em diante será usada a sigla L.I. para designar a literatura infantil.
13

para crianças nas primeiras décadas do Brasil colônia, mas sim, nos foi trazido pelos
colonizadores, acervos de contos orais populares.
Foi por volta de 1575, somente, que histórias infantis foram publicadas em
Portugal e chegaram ao Brasil nesta mesma época, mas literaturas de nossa terra,
com escritores brasileiros, demoraram a nascer por aqui. É como diz Oliveira (2008,
p. 52) “A Literatura Infantil– autêntica, genuína, da cor da terra, com cheiro das
matas e sabor de fruta tropical, ao gosto da criança brasileira – ainda esperaria mais
um século para florescer e criar sua própria história”.
Em meados da República Velha, os livros eram apenas usados por aqueles
poucos privilegiados da elite, que tinham acesso à educação escolar. Desse modo, a
existência da L.I, só se justificava para fins didáticos.
No séc. XIX foram resgatados contos populares franceses e com os irmãos
Grimm, na Alemanha, tais histórias começaram a ser difundidas no Brasil. Portanto é
no final do séc. XIX que surge a L.I no Brasil. Esta literatura, porém, ainda não
surgiria com ideais de criança, como um ser de desejos e pensamentos
próprios.Segundo Oliveira (2008, p. 57) “A Literatura infantil era considerada um
excelente meio para induzir o leitor à obediência das normas consagradas.”
De acordo com Zilberman e Lajolo (1987 apud OLIVEIRA, 2008, p.57), “A
falta de qualidade artística e o excesso de intenções moralizantes vêm juntos, e
aliados, contribuem para o descrédito da literatura nacional para a infância e para a
atrofia do gosto de ler.”
Este fato é lamentável, pois demorara tanto até chegar às crianças brasileiras
e quando chega não dá conta do verdadeiro significado de uma L.I, de uma literatura
que respeita o mundo do brincar e do faz de conta, que é o campo no qual as
crianças estruturam seus saberes sobre o mundo e sobre si.
Pesquisas realizadas por vários autores como: Nelly Novaes Coelho (1991),
Regina Zilberman (1987), Ligia Cademartori Magalhães (1987), Marisa Lajolo
(1985), Laura Sandroni (1987), Eliana Yunes (1988), Bárbara Vasconcelos (1985) –
sobre obras de L.I., publicadas a partir das primeiras décadas do séc. XX até
aproximadamente os anos 1970, no Brasil, demonstraram essa tendência
moralizante nas primeiras literaturas infantis no Brasil.
Eram literaturas voltadas para o publico infantil, porém sem nenhuma
atratividade para as crianças, sem cativar e atrair o interesse de seu público,
portanto, sem oportunizar uma leitura atrativa e prazerosa para as crianças.
14

Leonardo Arroyo (apud OLIVEIRA, 2008, p.58) afirma: “Tais leituras eram
quase sempre pesadas, de um espírito moralista acentuado na sua falsidade ou
precariedade, obrigacionais, sem o menor interesse pelo entretenimento, como o
compreendemos hoje”.

1.3 O novo perfil da literatura infantil

Ao passar dos anos, veio a iniciativa de construir uma biblioteca endereçada


às crianças brasileiras, e foi através do senhor Quaresma, editor e dono da Livraria
Quaresma, que encomendou de seu amigo jornalista, Figueiredo Pimentel, livros
que possibilitassem o seu sonho de abrasileirar os livros infantis.
O jornalista, em 1894, publicou: Os contos da carochinha. 1896: Contos de
fadas. Histórias da avozinha e Histórias da baratinha. Seus livros eram norteados
pelo viés do popular, não estavam comprometidos com a metodologia educacional,
não eram feitos para os bancos das escolas e sim dedicados à infância brasileira.
Posteriormente surgiram autores que reuniram em seus livros, cantiga de
roda, provérbios, poesias, jogos, cirandas, parlendas, adivinhas, brincadeiras,
tiradas do folclore brasileiro. Para o público infantil, esses livros, tinham a
preocupação de reintegrá-los, na verdade, da terra e sua cultura oriunda da
confraternização do português com o índio e com o negro.
Mas o grande nome que marcaria o surgimento da L.I é o do Monteiro Lobato,
com a publicação de Narizinho arrebitado. Com uma literatura alicerçada em uma
nova concepção de infância, que visualiza uma criança que sente medo, que tem
conflitos, afetos, contradições, que faz perguntas, que descobre as coisas, ele é o
primeiro escritor brasileiro a acreditar na inteligência da criança, pois possibilita a
ela, estabelecer uma relação prazerosa com o texto literário, tanto no sentido lúdico
como no afetivo. COELHO, (1985, pg. 185) afirma:

A Monteiro Lobato coube a fortuna de ser, na área de Literatura Infantil e


Juvenil, o divisor de águas que separa o Brasil de ontem e o Brasil de hoje.
Fazendo a herança do passado, imergir no presente, Lobato encontrou o
caminho criador que a Literatura Infantil estava necessitando. Rompe, pela
15

raiz,com as convenções esteriotipadas e abre as portas para as idéias que o


nosso século exigia.

Acabada a era do formalismo na L.I, onde ela aparece e chega às mãos das
crianças, através dos livros, unicamente no momento da recepção, como um produto
pronto, acabado e oriundo do adulto, não interferindo no fenômeno da criação,
podendo influenciá-lo, mas não atuando diretamente nele. Há uma ruptura e uma
renovação na postura do leitor, focando no saber emancipatório, enxergando o leitor
não como um ente passivo. Assim, a obra dirige-se a ele e a seus valores, sob a
forma de um questionamento.
Conforme ZILBERMAN e CADEMARTORI (1987, p. 77) “Supõe também uma
tomada de posição por parte do sujeito, na medida em que o conhecimento terá
como meta a ampliação deste horizonte, observando a tradição do saber e visando a
emancipação individual”
Reforçando esta ideia, as autoras afirmam na página 79 “De uma maneira ou
de outra, impondo novos padrões ou suplantando a norma vigente, este saber é
necessariamente emancipatório, concedendo ao processo de leitura uma
legitimação de ordem existencial.”
A L.I converte-se numa das responsáveis diretas pela configuração de um
horizonte de expectativas na criança e é assim que deve ser, por isso, a L.I é
necessariamente formadora e cabe-lhe uma formação especial, que antes de tudo,
interrogue a circunstância social de onde provém o destinatário e seu lugar dentro
dela.

1.4 Literatura e a escola

Sabemos que muitos alunos vêm de lares onde a leitura não faz parte de
seus cotidianos, de suas vidas, principalmente a leitura de livros. Com pais muitas
vezes analfabetos ou com pouca escolaridade, não exercem a devida influência
sobre a importância da leitura na vida de seus filhos. Esta é uma realidade bastante
presente em nosso país. Alguém tem que fazer o papel de elo entre o aluno e o livro,
e como já falamos, a escola tem fundamental papel nisso.
16

Interessante as colocações sobre leitura feitas por Hercílio Quevedo (2005: p.


44):

Uma das características da leitura é permitir-nos o acesso a mundos


fisicamente distantes, possibilitando a presentificação de informações e
conhecimentos não inseridos em nosso contexto mais imediato. Ler
também significa viajar por universos infinitos, percebendo realidades
que o homem foi desvendando no decorrer de sua história.

Especialmente com relação ao livro, tantas vezes mitificado e visto como


objeto quase litúrgico, começou-se a assistir a uma súbita desconfiança que ele
estaria em vias de desaparição, em virtudes, principalmente dos saltos da evolução
eletrônica dos últimos tempos. Mas dada a sua importância, acredito que as
tecnologias vieram apenas para auxiliar a leitura. Hoje, podemos baixar livros
gratuitamente pela internet.
É claro também que com tantas opções de jogos e outros entretenimentos
que chegaram com a internet, as crianças e os adolescentes têm mais opções de
escolha, mas, acredito que nenhuma substituiria o lugar do prazer de folhear um
livro e se deliciar no seu mundo de fantasia e imaginação. Este gosto pela leitura,
não nasce junto com a criança, num primeiro momento, é tarefa dos pais incentivá-
lo, depois naturalmente a criança entra em escolinhas ou escolas, daí esta função é
repassada também para os professores. Segundo MAGNANI ( 1994, p. 101):

Comecemos pelas obviedades: aprende-se a ler e a gostar de ler;


aprende-se a ter satisfação com a leitura; aprende-se a acompanhar
modismos de leitura; aprende-se a ter critérios e opiniões de leitura;
aprende-se a julgar valores estéticos. A tudo isso se aprende lendo.
Dentro e fora da escola.

Tudo isto se aprende, é claro se alguém ensinar, por isso o importante papel
de incentivo a leitura é principalmente da escola. Temos consciência do que a
literatura infanto-juvenil representa na formação da vida das crianças e dos
adolescentes, ela é fundamental como já dissemos, para o desenvolvimento pleno,
linguístico, intelectual e social na infância e na adolescência. Portanto, temos que
analisar o foco que está sendo dado à leitura dessas literaturas nas escolas.
17

Acredito que a escola deveria trabalhar a leitura de diversos textos e textos


específicos de cada área do conhecimento, porém especialmente deveria ser
trabalhado com literatura infanto-juvenil, pois esta literatura desenvolve e estimula
nos alunos a compreensão sobre a vida, em seu sentido mais amplo e humano.
Conforme Bordini (1993 apud QUEVEDO: 2005, p. 46):

Todos os livros favorecem a descoberta de sentidos, mas são os literários


que o fazem de modo mais abrangente. Enquanto os textos informativos
atêm-se aos fatos particulares, a literatura dá conta da totalidade do real,
pois, representando o particular, logra atingir uma significação mais ampla.

Considerando-se a quase inexistência de políticas de leitura em nosso país,


em consequência do descaso para com a educação, a escola ainda exerce, quase
que solitariamente um papel de incentivo à leitura, e não podíamos esperar outro
papel desta instituição, ainda que venha a ter bastantes obstáculos a serem
vencidos até que esta atividade de leitura seja plenamente desenvolvida nas escolas
do Brasil, principalmente no que diz respeito ao incentivo à leitura e especificamente
na área de literatura infanto-juvenil.
Foi somente agora, nas escolas, que o livro didático, mais aperfeiçoado, deu
outra forma ao ensino, também à parte da literatura infanto-juvenil, uma vez que
contos, crônicas e poemas são trabalhados em sua integra e em seu aspecto
literário, valorizando estes gêneros e as praticas de leituras nas salas de aulas.
Vale dizer que, até então, as crianças e os jovens não podiam se valer de
uma literatura dedicada totalmente a eles, o que fazia com que lessem obras
endereçadas aos adultos ou, na maioria das vezes, nada lessem. Agora o mundo da
literatura infanto-juvenil é outro, cada vez mais autores se dedicam a esta literatura e
cada vez mais os livros desta área estão sendo aperfeiçoadso, temos literaturas hoje
em dia, maravilhosas, cheias de atrativos para as crianças, fazendo com que a
criança e os adolescentes que leem, embarquem num mundo criado especialmente
para eles.
Neste sentido, cabe ao professor explorar este mundo. Os livros de literatura
infelizmente, ainda estão sendo pouco usados pelos professores, dentro das salas
de aulas. Reiteramos que o livro não pode ser somente um instrumento para passar
o conteúdo, como percebemos que acontece em muitas escolas atualmente, mas
18

sim ele tem que ser usado para dar criatividade a imaginação das crianças fazendo
com que estimule sua criatividade e que isto venha a contribuir e a interferir na
formação de sua concepção de mundo real.
Por isso, não podemos “deixar a peteca cair” e buscar alternativas para que a
escola realize com êxito a sua função de incentivadora da leitura e que nós,
professores, e profissionais da área da educação, possamos servir de veículos,
meios que levam as atividades de leitura e leituras de literaturas para os alunos. A
julgar pelo estado em que se encontra o incentivo à leitura em nosso país, cabe a
nós, educadores, tomar frente a este papel de formar leitores.
Segundo BARCO et all. (2001, p 7 );

Como a sociedade brasileira, dadas as suas dificuldades, atribui à escola a


responsabilidade maior de formação de leitores, temos em vista esse espaço
quando nos propomos a contribuir para o incremento do ato de ler. Move-nos
a certeza de que o domínio da cultura letrada abre a cada sujeito um leque
maior de possibilidades de compreensão do real e de exercício da cidadania.

Segundo QUEVEDO (2005, p. 53): “É dos educadores o papel social de


animadores constantes, entusiastas e apaixonados, facilitando aos alunos
descobertas fundamentais mais ou menos fascinantes a respeito do mundo”. Nós,
professores, devemos estar cientes do compromisso assumido de desenvolver
habilidades, o gosto e o prazer de ler, uma vez que assim estaremos contribuindo na
formação de bons leitores, capazes de intervir criticamente nas diferentes situações,
sem deixar de encantar-se com a arte da palavra e da imagem.
19

2 ADOLESCÊNCIA

Atualmente, existem diversos autores da área de literatura infanto-juvenil,


como vimos anteriormente, que se dedicam a escrever livros com valores
significativos para o público adolescente. São literaturas atraentes e com assuntos
pertinentes a idade de seus leitores.
E se o público de leitores deste tipo de literatura são os adolescentes, falar
um pouco deles também nos interessa. É como diz CALLIGARIS ( 2000, p. 8):

Nossos adolescentes amam, estudam, brigam, trabalham. Batalham


com seus corpos, que se esticam e se transformam. Lidam com as
dificuldades de crescer no quadro complicado da família moderna.
Como se diz hoje, eles se procuram e eventualmente se acham. Mas,
alem disso, eles precisam lutar com a adolescência, que é uma
criatura um pouco monstruosa, sustentada pela imaginação de todos,
adolescentes e pais.

Sabemos que a adolescência é uma etapa intermediária do desenvolvimento


humano, entre a infância e a fase adulta. São muitos os estudiosos que se
debruçam a pesquisas sobre esta fase da vida, conscientes de que este período é
marcado por diversas transformações corporais, hormonais e até mesmo
comportamentais.
Não se pode definir com exatidão o início e o fim da adolescência, ela varia
de pessoa para pessoa, porém, na maioria dos indivíduos, ela ocorre entre os 10 e
20 anos de idade, período definido pela Organização Mundial da Saúde. Como
nessa etapa inicia-se também uma fase de maior cobrança com o meio
social.Segundo os estudiosos sobre o assunto, é importante inserir o jovem nesse
contexto de socialização de uma maneira tranquila.
Porém é neste período em que acontece a maioria das transformações
comportamentais, que vêm acompanhadas de muitos conflitos, durante os quais, os
adolescentes tornam-se mais vulneráveis a problemas como: abandono dos
estudos, o uso de drogas, prostituição, violência, brigas, pequenos crimes, gravidez
precoce, etc.
20

Como lidar com isso? Os pais estão cada vez mais preocupados a respeito do
futuro de seus filhos. O mundo oferece, principalmente para jovens e adolescentes,
uma infinidade de atrativos, tanto positivos quanto negativos. Hoje, as famílias não
mais se sentem autossuficientes para administrar a educação de seus filhos, é
comum que busquem ajuda em programas de TV, no ciclo social, e principalmente,
encarem a escola como uma parceira na formação dos filhos em todos os aspectos
educacionais.
As expectativas que os pais têm da escola são inúmeras, mas pode-se
resumir dizendo que os pais esperam que a escola reforce aquilo que eles ensinam
em casa, ainda preencha as lacunas que eles, pais, não se sentem capazes, e
talvez realmente não sejam, de preencher.
A entrada da adolescência, é marcada por um período em que o futuro parece
ter chegado, mudam os interesses, mudam as exigências, mudam as relações. O
que há de especial em todos esses conflitos durante a adolescência é que eles
mostram que os adolescentes estão crescendo, amadurecendo, é um processo
normal desta etapa da vida. Administrar esses conflitos, tanto para os adolescentes
quanto para os adultos que os cercam, é outra aprendizagem importante. Pois à
medida que eles se compreendem melhor e percebem com mais clareza as suas
dificuldades, suas relações com as outras pessoas se tornam mais fáceis, e a
sensação de incompreensão diminui. Segundo OSORIO ( 1989, p. 35) que define
muito bem as mudanças nesta fase da vida que leva para os motivos da crise da
adolescência:
Redefinição da imagem corporal substanciada na perda do corpo
infantil e aquisição do corpo adulto./ Culminação do processo de
separação – individuação e substituição do vinculo de dependência
simbiótica com os pais da infância por relações objetais de autonomia
plena. / Elaboração do luto referente à perda da condição infantil. /
Estabelecimento de uma escala de valores ou códigos de ética
próprio. / Busca de pautas de identificação no grupo de iguais.

Quando aprendemos a lidar com as incertezas, ficamos mais fortes para fazer
as mudanças necessárias, todo o ser humano é assim, e é exatamente sobre isso
que os adolescentes têm que refletir, pois, apesar de incômodos, os conflitos são
importantes. Mas, diante de tudo isso, eles se indagam: como não se sentir
perdido?É comum que os adolescentes se sintam meio perdidos, durante esta fase
21

da vida, pois além de o corpo estar passando por um verdadeiro rebuliço hormonal,
eles enfrentam nesse período o dolorido processo de construção da individualidade
e do caráter. Junto com este período de conflitos, aparecem as dúvidas e os
questionamentos.
Podemos nos perguntar como as escolas podem colaborar neste fase tão
complicada da vida dos adolescentes, se nem mesmo os pais estão sabendo lidar
com a adolescência na vida de seus filhos? Eles se preocupam com questões que
antes podiam resolver simplesmente ocultando dos filhos, ou impondo-lhes uma dita
“verdade” ou simplesmente proibindo-os. Tais questões como de religião, etnia,
ideologia, classe, sexualidade, preconceito, etc. que hoje passaram a ser tema de
debate, não pode ser mantido fora do diálogo entre pais e filhos, bem como da sala
de aula. Temas que obrigam os pais a “saberem” tratar, fazendo os pais se
preocuparem em como a escola vai tratar isso também.
Será que a escola se questiona e avalia sobre qual o tratamento que está
dando para estes assuntos, junto aos seus alunos, no meio escolar? Já que o perfil
da família de hoje mudou, a sociedade mudou e continua mudando sempre, a
relação entre os pais e filhos mudou, tomando novas formas através de divórcios e
segundos casamentos, madrastas e padrastos, meio-irmãos, irmãos dos irmãos e
primos que não tem relação consanguínea, “pais de fins-de-semana”, mães que
trabalham fora de casa, e por isso não podem manter a mesma dedicação à
educação dos filhos como anos atrás, além de diversas outras “novidades” que
atualmente são corriqueiras na vida das crianças e dos adolescentes.
Aumentou o nível de preocupações dos pais e também das escolas sobre o
número de coisas que eles têm de considerar, pois os jovens hoje estão expostos a
uma diversidade de informações e de “perigos” que antes não existiam.
No tocante à escola, os valores e as tradições educacionais estão em
contínuo processo de transformação, porque a sociedade é dinâmica. Não se pode
mais acreditar numa solução unívoca que atenda a todas as demandas
educacionais que se tem hoje em dia. Os pais e as escolas agora têm de se adaptar
ao movimento da sociedade, o que circula o mundo de seus filhos adolescentes,
buscando encontrar caminhos para preparar as crianças e os jovens para um
futuro.Não importa o quão tradicional seja a educação que se pretende dar aos
alunos, não há como ignorar os processos de formação da personalidade individual,
bem como os mecanismos afetivos deles.
22

O que podemos observar é que após os 11 anos, o pensamento do


adolescente, já atinge um certo nível de abstração, então a percepção passa a ser
também subjetiva, o que o permite fazer uma reflexão crítica das coisas.
Os adolescentes sofrem com as mudanças que ocorrem nesta fase do
desenvolvimento humano, a tarefa de saber como se educar já não é fácil, aliás, é
uma proposição suficientemente difícil em qualquer idade, nesta as dificuldades são
ainda maiores, mas exatamente por ser um período de grandes mudanças é que ele
se torna muito fértil e criativo, e as escolas, juntamente com os professores, podem e
devem tirar proveito disso.
Durante essa fase, definem-se os caracteres sexuais secundários, avivam-se
os processos intelectuais e a sensibilidade. É toda uma fase de mudanças
complexas. Em seu início, a adolescência se apresenta como um estado de
inquietação em que o jovem, já de posse dos mecanismos biológicos que se
estruturam durante a infância, começa a inquirir sobre o mundo que o cerca e assim
busca construir sua identidade e caráter.
É nesta fase da adolescência que a escola pode muito bem colaborar,
ajudando nessa construção de identidade, fase na qual os adolescentes estão
formando seus conceitos sobre o mundo e sobre assuntos de seu cotidiano. O papel
da escola nesta construção de identidade é colocar em questão, em debate e ao
alcance dos alunos, dentro da sala de aula, por exemplo, temas que os levem a
pensar, a desenvolver o seu senso crítico e a formar sua opinião. O sujeito se
constitui num processo interativo, com os outros e com os objetos, leia-se “questões
instigadoras”, que a partir da discussão e da reflexão, permitem construir diferentes
visões de mundo.
Esta postura propõe transformar a sala de aula numa experiência de
questionamento, reflexão e diálogo sobre os valores, assuntos, temas e problemas
do campo da ética, do preconceito, da sexualidade e outras áreas e assuntos que
possam interessar aos alunos adolescentes. Como mediador deste processo, o
professor deve orientar o diálogo com questionamentos que auxiliem os alunos a
desenvolver as habilidades e competências de pensamento na formação destes
conceitos.
23

2.1 Como as escolas têm trabalhado em seus currículos os temas


transversais sugeridos pelos PCN’s2

Como já dito, são muitos os assuntos que persuadem os adolescentes nesta


faixa etária e que são motivos de preocupações não somente dos pais, mas também
da escola. A comunidade escolar se preocupa sobre que posicionamentos os
adolescentes têm frente a estas questões polêmicas, como a violência e o
preconceito por exemplo, que é o que mais assombra as escolas e também ao
restante da sociedade.
Tal a importância de se tratar de assuntos como estes em salas de aulas,
que os Parâmetros Curriculares Nacionais sugerem inseri-los nos currículos. Foram
incorporados aos temas transversais, sugeridos pelos PCNs, questões da ética, da
Pluralidade Cultural, do Meio Ambiente, da Saúde e da orientação sexual. São
questões sociais que são apresentadas para a aprendizagem e a reflexão dos
alunos, assuntos que estão fora do currículo, mas, que devem ser incorporados nas
áreas já existentes e no trabalho educativo da escola. Estes temas, se trabalhados
com a comunidade escolar, refletirão no ensino e na aprendizagem de valores e
atitudes.
Segundo os PCN´s ( 1997 p. 39), os objetivos dos Temas Transversais são:

Ao lado do conhecimento de fatos e situações marcantes da realidade


brasileira, de informações e práticas que lhe possibilitem participar
ativa e construtivamente dessa sociedade, os objetivos do ensino
fundamental apontam à necessidade de que os alunos se tornem
capazes de eleger critérios de ação pautados na justiça, detectando e
rejeitando a injustiça quando ela se fizer presente, assim como criar
formas não-violentas de atuação nas diferentes situações da vida.
Tomando essa idéia central como meta, cada um dos temas traz
objetivos específicos que os norteiam.

O tema Ética, por exemplo, traz a proposta de que a escola realize um


trabalho que possibilite o desenvolvimento da autonomia moral, que é condição para
a reflexão ética. Para isso foram eleitos como eixos do trabalho quatro blocos de

2
Parâmetros Curriculares Nacionais, daqui para frente será usada apenas a sigla
24

conteúdo: Respeito Mútuo, Justiça, Diálogo e Solidariedade, que também englobam


os temas transversais.
Atualmente, um dos grandes desafios da escola é investir na superação da
discriminação, é dar a conhecer a riqueza representada pela diversidade etnocultural
que compõe o patrimônio sociocultural brasileiro, valorizando a trajetória particular
dos grupos que formam a sociedade. Nesse sentido, a escola deve ser local de
diálogo, de aprender a conviver, vivenciando a própria cultura e respeitando as
diferentes formas de expressão cultural e também as diferenças individuais de cada
cidadão.
Um dos assuntos que assombram a sociedade e que está incluso como uma
das problemáticas encontradas também dentro das escolas com bastante
regularidade, é a questão do bullying, que se caracteriza por ser uma situação de
atos agressivos verbais ou físicos de maneira repetitiva por parte de um ou mais
alunos contra um ou mais colegas. O termo inglês refere-se ao verbo "ameaçar,
intimidar", estão inclusos no bullying os apelidos pejorativos criados para humilhar os
colegas. São atitudes, infelizmente, muito presentes dentro das escolas do mundo
todo, carregados de preconceito. Este tipo de comportamento tem sido uma
realidade na vida das crianças e dos adolescentes atualmente.
Tais comportamentos, com certeza, podem ser trabalhados nas escolas, junto
aos alunos, é por este motivo que foram sugeridos pelos PCN`s, principalmente
quando esses alunos são crianças e adolescentes, já que é neste período que eles
estão construindo seus conceitos e buscando suas identidades.
Penso que a literatura infanto-juvenil poderia ser uma importante aliada para
desenvolver um trabalho com adolescentes, voltado para esta conscientização e
salientando a importância destes temas dentro das escolas e também dentro da
sociedade. Temas, que como já falamos, tratem da sexualidade, das drogas, e
outros assuntos como: violência, aborto, racismo e também, de todos os tipos de
preconceitos, já que ainda nos dias de hoje os alunos continuam sendo vítimas
destes comportamentos dentro das escolas. Assim, a escola, poderia ser uma aliada
no que se refere ao combate ou a conscientização por parte dos adolescentes sobre
estes perigosos assuntos.
Apresentando a literatura como uma maneira do aluno se comunicar com o
mundo a sua volta e lhe dando sustentabilidade para posicionar-se diante destes
25

tipos de problemas, já seria um passo grande que a escola daria em direção a


resolução destes conflitos vivenciados pelos alunos adolescentes.
A partir dessa perspectiva, investimos em uma prática pedagógica, na qual os
temas que causam incômodos precisam estar presentes na literatura lida por
crianças e jovens, propiciando por meio da literatura a reflexão e quem sabe a
mudança de postura frente a problemas presentes no cotidiano, além de a leitura ser
o ponto de partida para uma vida adulta normal.

2.2 Preconceito

Preconceito, segundo o dicionário significa: julgamento ou opinião concebida


previamente/ opinião formada sem fundamento justo ou conhecimento
suficiente.Não precisamos nos basear somente em uma definição do dicionário para
saber o que é o preconceito, pois conhecemos muito bem este comportamento. Não
é de agora que a sociedade sofre com este tipo de atitude e sentimento, ela já
carrega há muitos séculos este peso e esta má experiência.
Preconceito é uma postura ou ideia pré-concebida, uma atitude de alienação
a tudo aquilo que foge dos “padrões” de uma sociedade. As principais formas de
preconceito são: preconceito racial, social e sexual. O preconceito leva à
discriminação, à marginalização e à violência, uma vez que é baseado unicamente
nas aparências e na empatia.
Acredito que com uma sociedade tão problemática, em que atualmente
vivemos, uma sociedade doente, sofrendo de uma carência de todos os sentimentos
nobres como o amor, o perdão, solidariedade, e tantos outros bons
sentimentos.Tudo o que não devemos fazer, é praticar a discriminação injusta e
precipitada, contra o nosso próximo, o que é uma forma de preconceito, seja ele
quem for ou quem quer que aparente ser, e também não deixar que este preconceito
tome conta da escola, pois lá só deveria ter lugar para a educação, ou seja, para o
aprendizado e para a construção de bons princípios.
26

2.3 Preconceito nas escolas

Não podemos ignorar o fato de que, infelizmente, o preconceito está inserido


fortemente dentro da comunidade escolar sim. É como afirma Lígia Assunpção de
Amaral ( 1998, p. 11)

Se pensássemos nos costumeiros apelidos que circulam nos lábios


infantis: “rolha de poço,” “ azeitona no palito”, “ pau-de-sebo”,
“nanico”, “criolo doido”, “quatro olho”, “surdinho”, tadinho”, “cegueta”,
“mula manca”, ... ... ... presença de preconceitos e a decorrente
descriminação vivida, ainda com mais intensidade, pelos
significativamente diferentes, impedindo-os, muitas vezes, de
vivenciar não só seus direitos de cidadãos, mas de vivenciar
plenamente sua própria infância.

O papel da escola frente a isso deve ser de combate a qualquer tipo de


preconceito que, com certeza, afeta a vida dos alunos. Se em casa não se trabalha
a postura que se deve ter sobre comportamentos deste tipo com os filhos, e a
sociedade deixa a desejar no tratamento de tais comportamentos, que seja a escola
então a mediadora da reflexão deste assunto dentro das salas de aula.
Acredito que seja por um destes motivos da inserção de assuntos
transversais nos currículos escolares hoje em dia, e um desses temas transversais
indicados pelos PCN`s é a ética, a qual envolve, com certeza, a questão do
preconceito. Portanto, este comportamento pode ser trabalhado dentro deste tema,
pois, no que se refere à ética, segundo os PCN´s ( p 26):

A Ética diz respeito às reflexões sobre as condutas humanas. A pergunta


ética por excelência é: “Como agir perante os outros? A questão central
das preocupações éticas é a da justiça entendida como inspirada pelos
valores de igualdade e eqüidade. Na escola, o tema Ética encontra-se, em
primeiro lugar, nas próprias relações entre os agentes que constituem essa
instituição: alunos, professores, funcionários e pais. Em segundo lugar, o
tema Ética encontra-se nas disciplinas do currículo. Finalmente, encontra-
se nos demais Temas Transversais, já que, de uma forma ou de outra,
tratam de valores e normas.
27

O tema preconceito também se encaixa como tema transversal segundo os


PCN´s, no que se refere à Pluralidade cultural ( p. 27) :

Para viver democraticamente em uma sociedade plural é preciso respeitar


os diferentes grupos e culturas que a constituem. A sociedade brasileira é
formada não só por diferentes etnias, como por imigrantes de diferentes
países. Sabe-se que as regiões brasileiras têm características culturais
bastante diversas e a convivência entre grupos diferenciados nos planos
sociais e culturais, muitas vezes é marcada pelo preconceito e pela
discriminação.

Saber driblar as diferenças e abolir o preconceito é o resultado que


gostaríamos de ter com os alunos com a proposta de leituras de literaturas que
tratem sobre o preconceito, pois a leitura transforma o indivíduo e a função da
literatura com esta nova prática passa também a formar a criança e o adolescente,
em um adulto capaz de enfrentar conflitos e temas polêmicos de sua vida. É na
infância que a criança aprende a fazer suas escolhas, e uma boa literatura vai lhe
dar subsídios para estas escolhas.
Atividades de leituras destas literaturas ajudariam a cumprir a finalidade do
critério adotado para a eleição dos temas transversais, que é favorecer a
compreensão da realidade e a participação social. Que os alunos possam
desenvolver a capacidade de posicionar-se diante das questões que interferem na
vida coletiva, superar a indiferença e intervir de forma responsável.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9394/96, conhecida
como LDB/96 em suas disposições gerais, artigo 22, afirma: “A educação básica tem
por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum
indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no
trabalho e em estudos posteriores.” Portanto a função da escola não é somente
levar o conhecimento para o aluno, mas também ajudar o aluno na construção da
cidadania.
Essa lei não é explícita no que diz respeito a Ética, mas podemos entender
que ensinar o educando implica necessariamente também em desenvolver o seu ser
moral. Outra referência é o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que ao
tratar do direito à liberdade, respeito e dignidade, afirma, explicitamente, no artigo
17: “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e
28

moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da


identidade, da autonomia, dos valores, das idéias e crenças, dos espaços e objetos
pessoais.”
Este artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente traz um grande desafio
para qualquer trabalho de ética e consequentemente do preconceito com as
crianças e adolescentes: como respeitar a inviolabilidade moral e preservar a
identidade, autonomia, os valores, as ideias e crenças das crianças e adolescentes.
E como fazer isso se não trabalharmos esses assuntos com eles? Assim, os
temas eleitos, em seu conjunto, devem possibilitar uma visão ampla e consistente da
realidade brasileira e sua inserção no mundo, além de desenvolver um trabalho
educativo que possibilite a participação social dos alunos.
Um dos assuntos já mencionados neste trabalho como uma forma de
preconceito é o bullying, que além de ser um ato preconceituoso, é violento. Uma
das formas mais visíveis de violência na sociedade é a chamada violência juvenil,
assim denominada por ser cometida por pessoas com idades entre 10 e 21
anos.Quando trazemos a questão da violência, podemos vincular aos ambientes em
que ela ocorre e as escolas surgem como um espaço ainda pouco explorado,
principalmente com relação aos comportamentos agressivos e preconceituosos
existentes entre os próprios estudantes.
A violência nas escolas é um problema social grave e complexo e,
provavelmente, o tipo mais frequente e visível da violência juvenil. Como diz Ana
Maria Eyng ( 2011, p. 107):

Os agressores, os bullies, se formam a partir da infância, em


contextos familiares e escolares nos quais não tenha intervenção
diante de reações, atitudes agressivas, ou quando o tipo de
intervenção não seja adequado, com limites, valores, regras
arbitrarias, difusas ou mesmo inexistentes. Desse modo, esses
contextos atuam fortalecendo e enraizando sentimentos e
comportamentos desajustados que podem se manter até a idade
adulta.

Os comportamentos violentos e preconceituosos, que causam tanta


preocupação e temor, resultam da interação entre o desenvolvimento individual e os
contextos sociais, como a família, a escola e a comunidade. Infelizmente o modelo
29

do mundo exterior é reproduzido nas escolas, fazendo com que estas instituições de
ensino deixem de ser um ambiente seguro, modulado pela disciplina, amizade e
cooperação. Não podemos deixar que as escolas se transformem em espaços onde
há violência, discriminação e medo.
O bullying diz respeito a uma forma de afirmação de poder interpessoal
através da agressão, que traz consequências negativas, imediatas e tardias sobre
todos os envolvidos: agressores, vítimas e observadores. O bullying compreende
todas as atitudes agressivas e preconceituosas, intencionais e repetitivas, que
ocorrem sem motivação evidente, adotadas por um ou mais estudante contra
outro(s), seja por que a vítima é gorda, negra, magra, muito inteligente, muito burra e
por aí vai. Isso causa angustia e dor, para as vítimas.
O bullying é classificado como direto: quando as vítimas são atacadas
diretamente, ou indireto: quando estão ausentes. São considerado bullying direto os
apelidos, agressões físicas, ameaças, roubos, ofensas verbais ou expressões e
gestos que geram mal estar aos alvos. São atos geralmente utilizados na maioria
das vezes por meninos, o bullying indireto compreende atitudes de indiferença,
isolamento, difamação e negação aos desejos, sendo geralmente mais adotados
pelas meninas.
Há ainda uma nova forma de bullying que é o cyberbullying, que tem sido
observada com uma frequência cada vez maior no mundo. Trata-se do uso de
tecnologia de informação e comunicação (e-mails, telefones celulares, mensagens
por pagers ou celulares, fotos digitais, sites pessoais difamatórios, ações
difamatórias online) como recurso para adoção de comportamentos deliberados,
repetitivos e hostis, de um indivíduo ou grupo, que pretende causar dano a outro(s).
Esses tipos de comportamentos que estão presentes nas escolas, não podem
correr o risco de serem admitidos como naturais, serem ignorados ou não
valorizados, tanto pelos professores como pelos pais.
Devemos lutar para que a escola continue sendo vista como um local de
aprendizado, avaliando-se o desempenho dos alunos com base nas notas e
cumprimento de tarefas acadêmicas. Todos desejamos que as escolas sejam
ambientes seguros e saudáveis, onde crianças e adolescentes possam desenvolver,
ao máximo seus potenciais intelectuais e sociais. Portanto não devemos admitir que
sofram violência e sejam alvos de discriminações e preconceitos que lhes tragam
danos físicos, psicológicos e morais, que testemunhem tais fatos e se calem para
30

que não sejam também agredidos e acabem por achá-los banais ou, pior ainda, que
diante da falta de diálogo sobre o assunto nas escolas, diante da omissão ou
tolerância por parte dos adultos, principalmente pais e professores, venham adotar
tais comportamentos agressivos.
31

3 LITERATURA INFANTO-JUVENIL: UMA POSSIBILIDADE PARA


DISSOLVER O PRECONCEITO

São múltiplos os fatores que poderiam fazer da literatura para crianças e


jovens uma presença cada vez mais forte na sala de aula, principalmente porque,
atualmente, a qualidade das obras é reconhecida mundialmente. Além disso, há a
aplicação de organismos públicos e privados na divulgação de títulos e autores, as
políticas públicas preocupadas com a formação do leitor, as recomendações de
práticas de leitura em todos os níveis de ensino, pelos Parâmetros Curriculares
Nacionais e, ainda, o próprio empenho de inúmeros educadores em levar a leitura
para suas práticas docentes.
Já nos é conhecida a importância da literatura em sala de aula. A leitura do
texto literário é, sem dúvida, muito importante para o aluno nesta fase da
adolescência e de sua formação escolar. O texto literário promove um encontro
especial com a leitura, pois através do contato com a literatura, o aluno descobre as
múltiplas faces da linguagem, entra em contato com diferentes aspectos da Língua
Portuguesa, e vai além, pois quanto maior for a diversificação dos textos literários
apresentados aos alunos, maior será a experiência que ele terá com este universo
de singular beleza, magia e emoção.
Trabalhar a literatura em sala de aula é, antes de tudo, mergulhar num
mundo de subjetividade e encantamento, um lugar mágico onde o aluno encontra a
possibilidade de se descobrir, de se reconhecer, de se encontrar. Neste sentido, a
literatura passa a ser um convite à liberdade de expressão, por meio da qual os
alunos possam expressar seus sentimentos, descobrir e compreender melhor suas
próprias emoções e conflitos.
E é aí que temos que enxergar uma possibilidade enorme de inserir no dia a
dia do adolescente, literaturas que vêm ao encontro e que tratem dos conflitos que
eles estão vivendo, de assuntos vivenciados por eles e do mundo em que os
circunda.
Essas questões fundamentais da existência atingem crianças e jovens com
intensidade semelhante à que atinge os adultos, mas os temas que expressam a
angústia frente a essas questões são considerados polêmicos, e obras que tratem
do mal, da morte, da violência na escola, do preconceito, da sexualidade, são,
32

algumas vezes, consideradas ousadas, perigosas, inadequadas pela maioria dos


docentes e costumam passar longe da sala de aula, quando se sabe que nelas
reside a possibilidade de, por meio da ficção, reconhecer e discutir os enigmas da
existência humana e a problemática das relações sociais e, ainda, alcançar a
construção de respostas existenciais necessárias dessa realidade vivida pelos
adolescentes.
Estamos vivendo um momento novo na literatura infanto-juvenil, já que ela se
adaptou, moldou-se ao perfil do adolescente contemporâneo, trazendo exatamente
questionamentos que ajudem aos alunos na solução de conflitos pelos quais é
comum estarem passando nesta época de suas vidas. Portanto, o professor deve
oportunizar estas literaturas para seus alunos e trabalhá-las abordando tais
assuntos, que tornam-se pertinentes no cotidiano dos adolescentes.
A literatura brasileira destinada às crianças a aos adolescentes, felizmente,
adquiriu com o passar dos anos, uma dimensão artística e tornou-se um instrumento
preocupado, de uma maneira geral, não só com a formação intelectual, mas também
com a formação moral e afetiva dos jovens leitores.
COELHO, (1985, pg. 259), diz:

A par de inúmeros continuadores que seguem nas trilhas batidas, surgiram


dezenas de escritores e escritoras, obedecendo a uma nova palavra de
ordem: experimentalismo com a linguagem, com a estruturação narrativa e
com a visualização do texto; substituição da literatura confiante/segura por
uma literatura inquieta, questionadora, que põem em causa as relações
convencionais existentes entre a criança e o mundo em que ela vive,
questionando também os valores sobre os quais nossa sociedade está
assentada.

Fazendo o uso desta literatura infanto-juvenil em sala de aula para se tratar


exatamente das problemáticas que nossa sociedade vivencia e que
consequentemente afeta a vida dos adolescentes, os alunos podem discutir os
conceitos básicos, especialmente os da ética, em que estão implícito o preconceito,
desenvolvendo a capacidade de produzir bons argumentos e de fazer julgamentos
morais, vivenciando um processo investigativo que lhes servirá de referência pela
vida toda. Mais do que isso, a sala de aula deve ser um ambiente de confiança,
33

respeito, cooperação, diálogo, sensibilidade para com os aspectos problemáticos da


vida e o professor tem que ser o mediador disso.
Nessa prática, a criança pode aprimorar as capacidades do seu ser moral e
ser cidadão. Nessa experiência de liberdade e responsabilidade, a criança pode
pensar por si mesma sobre os valores que orientam sua conduta. A criança participa
como um sujeito ativo e atua como protagonista do processo de conhecer e fazer-se
a si mesma.
Logo, o desenvolvimento dessas leituras em sala de aula depende de um
trabalho pedagógico exigente e sistemático, trabalho que possibilite a formação do
caráter e a construção do sujeito virtuoso. O professor não pode negligenciar o
compromisso da filosofia com a vida. Portanto, deve privilegiar perguntas e reflexão
sobre questões de interesse do grupo através dos temas escolhidos e abordados
através destas literaturas.
O professor também deve acolher com empatia os questionamentos dos
alunos, elaborar seus próprios questionamentos, utilizar a criatividade e a didática
para envolver os alunos em diálogos reflexivos, aguçando a sua curiosidade para
descobrir novos significados sobre o assunto abordado na literatura, adotando, como
orientação para a educação ética, oportunizar o desenvolvimento da autonomia
moral da criança, num processo que aprimore as capacidades de pensamento
crítico, criativo e cuidadoso.
Numa prática de questionamento, diálogo e investigação, é possível ampliar a
compreensão dos significados dos valores, princípios e problemas éticos e, desta
forma, oferecer bases e opções para as escolhas pessoais. A reflexão crítica,
criativa e cuidadosa, já citada, a qual o aluno adquire com a leitura destes livros,
tende a reorientar significativamente a conduta humana para agir com mais
coerência, responsabilidade e respeito.
Se as escolas se utilizarem da literatura, que é vasta, para o crescimento
cultural e na formação de um cidadão, com certeza terão muito menos adolescentes
problemáticos dentro de suas escolas. Um simples gesto transformador, que é o de
contar uma história, mostrar o caminho da literatura e transformá-lo num leitor, pode
ser crucial na formação do aluno. Vejo na literatura um remédio para uma sociedade
doente como é a nossa. Um remédio natural, e sem contra-indicações, que deve ser
oferecido às crianças e aos adolescentes com prazer e dedicação. Jamais como
34

obrigação, pois como já dito, a literatura é indispensável para seus


desenvolvimentos.
E como usaríamos essa literatura transformadora para fazer este trabalho de
conscientização com os alunos? Propondo aos alunos leituras e trazendo para eles
literaturas que abordem exatamente estes tipos de assuntos.

3.1 Trabalhando o racismo por meio da obra: Pretinha, eu?, de


Júlio E. Bráz

A obra Pretinha, eu? Foi escrita por Júlio Emilio Braz e publicada em 2008
pela editora Scipione. Este autor já publicou vários livros infantis e infanto-juvenis
que contam sobre a vida e os conflitos de personagens que sofrem com algum tipo
de preconceito ou tem dificuldade de aceitação. Júlio Emílio Bráz é negro e diz que
se vê um pouco em suas personagens, já que na maioria das vezes são negros e
sofrem com o racismo, relata que em sua vida teve também estas experiências com
o preconceito, por ser negro e ter sido gordinho. O interessante neste autor é que
ele fez disso uma lição de vida, em cada uma de suas obras escritas, como por
exemplo em Pretinha, eu? que conta a história de uma adolescente negra chamada
Vânia. Ela é bolsista em uma escola particular em que só estudam alunos brancos,
por ser negra e de classe social não tão elevada quanto a dos colegas, sofre
perseguições e discriminações, principalmente por parte de um grupinho de meninas
ricas, em que, a líder é uma adolescente chamada Carmita. Esta é rebelde e
mimada, mas ao mesmo tempo sem a atenção e a participação dos pais em sua
vida.
A história é narrada pelo ponto de vista de uma adolescente do grupo ofensor,
chamada Bel, a qual também é negra, ou se poderia dizer, mulata. Ela assume sua
identidade somente após observar a vida de Vânia, que, segura de si, inteligente,
auto-confiante e feliz consigo mesma, não se deixa vencer pelas perseguições.
Vânia e Bel ficam amigas e lutam juntas para acabar com o racismo e o preconceito
dentro da escola onde estudam. Conseguem não eliminar completamente o
preconceito, mas conquistam uma grande melhora sobre este assunto.
O ambiente onde ocorre a história deste livro é a escola, e quanto às
personagens, a principal é Vânia, que apesar de ser discriminada, sofrer
35

perseguições, ser “esculachada”, principalmente por Carmita, é muito segura de si,


não dá se preocupa com estas afrontas e segue sua vida com muito jogo de cintura.
Esta segurança toda chama a atenção de Bel, outra personagem e narradora
da história. Ela também é pretinha, como se denomina mais tarde, o que dá o nome
ao livro. Bel, por não se reconhecer negra, e também ter uma família racista, de um
pai negro que igualmente não se reconhece como negro, anda com o grupinho de
meninas racistas e até mesmo pratica tal discriminação contra Vânia, até se dar
conta de que ela gostaria de ser como Vânia, assumir sua verdadeira identidade, e
ser feliz com sua cor.
Mais tarde, Bel se aproxima de Vânia e vê que a menina, apesar de não
parecer, sofre com todas estas ofensas e pela imposição do pai que quer que a filha
se dê bem na vida, por isso ela tem que se esforçar tanto no colégio.Unidas, as duas
meninas conseguem um primeiro passo rumo ao combate ao racismo e outras
discriminações na escola.
Esta literatura, apesar de ser uma história de ficção, ao mesmo tempo,
apresenta um enredo que é o retrato do que realmente acontece nas nossas
escolas. É uma história que está em um livro e também dentro do mundo
real.Infelizmente, neste mundo real, o ambiente escolhido para tais atitudes é o
ambiente escolar, bem como na historia do livro Pretinha, eu?, de Júlio Emílio Bráz.
É curioso pensar que tal ambiente, onde acontecem estas discriminações
seja a escola, lugar onde só caberia a propagação de conhecimento, e não atitudes
preconceituosas como estas, mas infelizmente estes tipos de atitudes ainda estão
bastante presentes dentro do colégio e não somente nas literaturas que tratam deste
tema.
Esta obra de Júlio Emílio Bráz trata exatamente sobre o racismo, colocando
de uma maneira explícita o sofrimento que uma pessoa passa só por ser de cor
diferente dos demais. A história também caminha para um tema conscientizador, de
que é estúpido ter este tipo de sentimentos em relação ao próximo. E não pára por
aí, pois o autor aborda o preconceito racial de uma maneira muito interessante, se
analisarmos do ponto de vista da personagem Vânia, a adolescente perseguida. O
autor constrói tal personagem negra que é segura de si e apesar de sentir todas
estas perseguições, ela se aceita como ela é, e é feliz com sua cor.
Por meio da personagem Vânia, o autor passa um recadinho para aqueles
leitores que têm dificuldade de aceitação, seja ela qual for, aqui nesta obra, mais
36

especificamente, a aceitação racial. Analisando ainda a personagem Vânia, o autor


quebra aquele pensamento racista de que o negro tem que se acomodar e se
conformar com uma tal situação dentro da sociedade, seja por ser negro, ou por ser
excluído ou até mesmo por ser pobre, ao mostrar Vânia, que apesar de ser pobre e
não ter dinheiro para estudar em escola particular, consegue uma bolsa de estudos
e vai à luta. Impulsionada pelo seu pai, aproveita a oportunidade que lhe dão e não
se acomoda.Vânia demonstra-se muito esforçada e muito inteligente, aliás.
Ao mesmo tempo que esta obra trabalha com o tema racismo, mostra
também o preconceito de classe social, pois Vânia era negra e pobre, por isso não
foi bem aceita pelo grupinho de meninas ricas. Bel também era negra, mas de
classe social favorecida, por isso era aceita pelo mesmo grupinho. Aqui demonstra-
se claramente que certos alunos não só tinham preconceito com Vânia por ela ser
negra, mas também por ela ser pobre.
Agora, se analisarmos do ponto de vista da personagem Bel, que é quem
conta a história, podemos observar nesta personagem um conflito interior, pois ela
não se dá conta de que é negra, ou não quer se dar. Por isso ela vê em Vânia uma
ameaça, chega até mesmo se questionar, uma que antes de Vânia entrar no colégio,
ninguém tinha reparado em sua própria cor, agora tendo uma menina parecida
consigo, na escola, no que diz respeito à cor, as pessoas iriam reparar na
semelhança. Porém ao observar Vânia, auto-confiante e satisfeita consigo, Bel
gostaria de ter também toda esta aceitação. Ela acaba se aproximando de Vânia e
reconhecendo suas semelhanças e aprendendo com a menina negra. Assim, Bel
acaba aceitando e reconhecendo sua verdadeira identidade.
Além do autor abordar o assunto “racismo” nesta literatura, dentro da história,
narrada, ele sugere também maneiras de se trabalhar com essa questão com a
comunidade escolar, pois Vânia e Bel, juntas, não se conformam com a existência
do racismo dentro do colégio. Assim a obra pode ser um recado de que não
podemos banalizar o racismo e ficar sem tomar atitudes frente a isso, elas
conseguem que os professores tomem uma postura de combate a tais
comportamentos, fazendo com que seja aberto o diálogo com os alunos sobre este
tema, conversando com as turmas sobre tais discriminações, realizando palestras e
conscientizações sobre o combate ao preconceito.
Esta obra é muito rica no que diz respeito a este assunto, infelizmente, ainda
muito presente e tão vivenciado pela sociedade. Os professores, como já
37

mencionamos neste trabalho, levando para seus alunos em sala de aula este tipo de
literatura, estariam fazendo um trabalho rico sobre, por exemplo, neste caso, o que é
o racismo, onde ele atua, como reagir, quem são as vítimas, de que maneira
podemos combatê-lo, bem como reiterar a importância de se trabalhar sobre este
assunto em suas vidas e mais inúmeras possibilidades de conscientizações e
possibilidades de debates e questões esclarecedoras levantadas pelos próprios
alunos sobre este tema.
Desse modo, ao lerem esta obra, os alunos estariam sendo ajudados na
construção de opiniões sobre o racismo, preparando-os, assim, para saber como
proceder diante do preconceito, não só dentro das escolas, como na sociedade em
que vivem.

3.2 Usando o livro Ímpar, para debater sobre o tema discriminação/


inclusão de deficientes físicos

O livro Ímpar, escrito por Marcelo Carneiro da Cunha, publicado em 2002


pela editora Projeto, conta a história de um grupo de adolescentes portadores de
necessidades especiais. O personagem principal da história é um adolescente, José
Luiz, mas todos o chamam pelo apelido, Zóli. Este, personagem e narrador da
história, conta sobre sua vida após sofrer um acidente de carro, quando estava com
sua mãe, o qual resulta na perda de um braço.
Zóli muda de cidade com sua família, na obra não é citada para qual cidade
ele se muda, nem para qual ele vai, apenas salienta-se que essa mudança é para
frequentar uma das melhores clínicas de reabilitação.No começo, é difícil para ele
aceitar sua nova condição física, mas após conhecer um grupinho de amigos, que
frequentam a clínica e que também possuem parecidas condições físicas que ele,
Zóli percebe que existem diversas maneiras de poder tocar sua vida adiante e ser
feliz. Seus novos amigos não deixaram de viver por causa de suas diferentes
condições físicas e além disso, lutam, fazem ações contra o preconceito e para que
a comunidade se adapte e se molde às necessidades especiais das pessoas
portadoras de deficiências físicas, facilitando suas vidas e construindo um mundo
para todos.
38

No final da história, Zóli supera o trauma de seu acidente, volta a jogar tênis e
até mesmo começa a namorar a Bibi, que é integrante da turma de seus novos
amigos da clínica que reabilitação. A história acaba com José Luiz contando como é
legal ter um braço mecânico e vira os centro das atenções na escola com o seu
braço novo.
Esta obra, do autor Marcelo Carneiro da Cunha, também é uma possibilidade
de leitura em sala de aula para se tratar sobre a discriminação e a exclusão de
alunos portadores de deficiência física, já que se trata de uma obra diferente das
outras literaturas infanto-juvenis que estamos acostumados a ler, a começar pelos
personagens, pois todos em destaque, apresentam alguma necessidade especial: a
Bibi tem problema em uma das pernas, o Pê quase não escuta com um dos ouvidos,
o Máqui não enxerga de um olho e a Tula é cadeirante. Também o personagem
principal que é o Zóli, só tem um dos braços.
Por esses motivos, podemos entender o porquê de o nome do livro ser Ímpar,
pois este adjetivo nos remete à ideia de que todos somos pares, com nosso corpo
funcionando em harmonia com nossos dois olhos, por exemplo, dois braços, duas
pernas e assim por diante, e os personagens do livro se denominam ímpares, pelo
fato de que nem todos os pares de seus membros funcionarem harmoniosamente
como de costume.
O título da obra também pode ser explorado de uma maneira a se pensar que
ninguém é igual a ninguém, todos somos seres únicos, ou ímpares, cada cidadão
com suas características próprias, suas opiniões e suas individualidades. Acredito
que o livro aborda um assunto interessante que é o respeito mútuo, ou seja, que
devemos respeitar o próximo com suas características individuais, sejam elas físicas
ou não, respeitando a individualidade de cada ser humano.
O que percebemos fortemente na história do livro Ímpar, é que o grupinho de
adolescentes com deficiência física destaca-se pela marca de personalidade que
cada um demonstrou ter, a Bibi por exemplo, era forte e decidida, além de ter que
lidar com seus problemas físicos ajudava os demais do grupo também a se
superarem. A obra está cheia de exemplos de superação e salienta até que os
outros adolescentes ao observarem como era legal e unido o grupinho ímpar,
mostraram interesse de fazer parte desta turma, ou seja a história nos conscientiza e
nos dá uma lição, de que não devem existir discriminações e que todos devem
pertencer a um mesmo grupo, ou seja, de cidadãos que não demonstrem qualquer
39

tipo de preconceito e atitudes discriminatória, que lutem junto para que acabe
qualquer tipo de discriminação em nossa sociedade.
Interessante também é o projeto gráfico desta literatura, com ilustrações que
nos fazem imaginar como seriam estes personagens. Já na capa, conseguimos
perceber que é um livro que aborda sobre o assunto deficiência física. Há um
desenho de um menino lendo um gibi e podemos perceber que ele está segurando-o
só com uma mão, assim deduzimos que seja o personagem principal do livro, Zóli,
que não tem um braço.
No decorrer das outras páginas, vamos acompanhando com desenhos, outros
meninos e meninas em cadeiras de rodas ou usando óculos, etc. A obra, Ímpar,
aborda este assunto, mostrando também o desafio do adolescente Zóli no seu
processo de reabilitação e a importância dos portadores de necessidades especiais
não desistirem, adaptarem-se a suas novas realidades e lutarem por seus direitos
dentro da sociedade.
Esta literatura também é rica, como o exemplo do livro Pretinha, eu? Só que
nesta, aborda-se sobre o racismo e no livro Ímpar, pode-se trabalhar sobre o
preconceito no que diz respeito à deficiência física. É uma leitura que se pode fazer
em sala de aula com os alunos e ao mesmo tempo um trabalho, um diálogo sobre a
exclusão, que é um tipo de preconceito, pode-se levantar questões relevantes sobre
a deficiência física e até mesmo salientar de que qualquer tipo de preconceito é
errado e não deve ter aceitação dentro da sociedade em que vivemos. Este livro
trata sobre a discriminação e sobre a exclusão de portadores de deficiência física
dentro do meio escolar e também da comunidade, pode-se trabalhar com os alunos
através da leitura desta literatura, as discriminações sofridas pelos deficientes
físicos, seja na escola ou na sociedade, sabemos que atualmente existe uma política
de inclusão de deficientes físicos no ensino regular, portanto objetivando preparar os
alunos, para que se tornem cidadãos participantes de uma sociedade que ofereça
oportunidade para todos igualmente, sejam deficientes físicos ou não. Enfim, dentro
ou fora das escolas, é uma possibilidade de trabalho com esta literatura em favor da
tentativa da dissolução de preconceitos, da discriminação e uma conscientização em
busca da inclusão.
40

3.3 Trabalhando sobre o bullying: Todos Contra Dante, de Luís Dill

Também o livro Todos contra Dante, escrito por Luís Augusto Campello Dill,
publicada em 2008 pela editora Cia das Letras, traz-nos mais um assunto
questionador de que também os alunos precisam tomar conhecimento, pois aborda
de forma realista e chocante um dos temas bastante discutido atualmente, isto é , o
bullying. A história é narrada de modo não convencional, uma vez que há trechos
de narração normal e outras em que são usados links, diálogos, estrutura de blog, o
que é característica de ambiente virtual, em redes sociais.
Essa é a história de Dante, um adolescente, novo na escola que vem de um
bairro mais pobre, bom leitor, e gosta de ler “A divina Comédia”, de Dante Alighieri,
pois se identifica com ele e até mesmo o chama de “meu xará”. Sua aparência e sua
classe social viram alvo de perseguição de seus novos colegas. Essa perseguição
se torna sistemática e ganha espaço em redes sociais na internet, onde o
ridicularizam e o hostilizam, já que o anonimato da comunidade da internet os
protegem. O que era para ser apenas “brincadeira” ganha dimensões trágicas, com
todas estas perseguições, implicâncias e até mesmo humilhações contra Dante. Um
grupinho de colegas, ao querer dar uma lição em Dante, o agridem tanto, que o
acabam matando.
O escritor desta obra, Luís Dill, também jornalista, diz que este livro tenta
relatar de modo ficcional, a tragédia real que aconteceu com a estudante de treze
anos de idade que, ao bater boca com uma das colegas e chamá-la de “piolhenta”,
foi morta depois da aula, de uma maneira covarde e brutal, também vítima de
covardia e agressões físicas. Esta história, na época, circulou na mídia e chocou a
população.
Portanto, a história do adolescente Dante não só foi uma realidade que
impactou a população, mas também entrou no universo ficcional e continua a
chamar a atenção e a conscientização de todos os leitores para a violência,
principalmente a violência dentro das escolas, onde infelizmente ela ainda é
bastante propagada, deixando claro que a violência existe dentro dos muros das
escolas, motivo pelo qual temos que estar atentos.
Todos contra Dante é uma obra bem criativa no que se refere a sua
estrutura gráfica, já que nos dá uma ideia de que a narrativa se passa com
41

características de um ambiente virtual, principalmente quando mostra a parte da


comunidade “ EU SACANEIO O DANTE” criada pelos colegas de Dante, também em
forma de links ao contar o que se passa com os demais personagens e forma de
blog, ao mostrar o blog de Dante, que é onde ele faz seus desabafos, com seu xará,
sobre todas as perseguições sofridas. Talvez com essa estrutura, o autor tentou
demonstrar as características do cyber bullying, ou seja, as intimidações e as
discriminações saem do ambiente real e avançam para o mundo virtual, onde, por
acreditarem estar protegidos pelo anonimato, os discriminadores estão livres para
partir para as intimidações, sem nenhuma punição.
Mas o que mais chama a atenção nesta obra, e o que mais nos choca, é a
malícia, a maldade e a crueldade com que os adolescentes tratam o Dante, criando
uma comunidade com o intuito de persegui-lo e discriminá-lo. Colocam o apelido de
“Koisafeia” no Dante e criam fóruns como:
- “Defina o nariz do Dante”; ( p.19)
- “Doença ou feiúra mesmo?” ( p.27)
- “Você já sacaneou o koisafeia esta semana?” (p.35)
- “Jeitos pro Koiafeia sair do colégio”; (p.59)
- “Qual a melhor maneira de torturar o koisafeia?” (p.75)
E assim por diante. Comentários que nos indignam como: - “Amarrar o
koisafeia com arame farpado no mastro do colégio, depois hastear e deixar ele lá em
exposição” (p.75). São agressões verbais públicas que posteriormente se tornam
agressões físicas, até ter o desfecho que teve, a morte de Dante por espancamento.
Em mais um aspecto esta história nos surpreende, pois no grupinho de
agressores de Dante, que eram quatro, uma era menina, ou seja, a agressividade
que geralmente se caracteriza como atitudes masculinas, aqui mostra, e na
realidade também, que as meninas estão se envolvendo nesses tipos de
comportamentos. A agressividade, na realidade, assim como na ficção, já não segue
nenhum perfil, ela é realizada por quem menos esperamos e está avançando cada
vez mais.
O escritor desta obra é também jornalista, no final de sua literatura diz que os
diálogos usados para perseguir o personagem Dante nesta história, essas falas que
nos assustam, cheias de maldade, são conversas reais que ele escutou em suas
idas e vindas de escolas, para escrever seus livros. O que nos deixa ainda mais
indignados e o que deixa esta narrativa mais realista.
42

Esta obra nos traz uma história, que baseada em fatos reais, nos dá
informações sobre o bullying, o que é, como se caracteriza, quais são os efeitos
desse tipo de violência e suas consequências. Ao lermos uma história como esta,
não tem como não nos chocarmos, pois é exatamente a realidade dentro dos
portões dos colégios. Mostra também se como professores, pudermos trabalhar esta
obra com nossos alunos, estaremos contribuindo para um trabalho de
conscientização e prevenção do bullying, assim será possível mostrar aos alunos as
consequências de atitudes violentas. Também estaremos tratando sobre um assunto
grave, de uma maneira igualmente preventiva.
Muito interessante o trabalho deste autor em escrever um livro que contribua
para o conhecimento de todos e coloque-nos a par dos acontecimentos violentos
dentro das escolas e da sociedade, para que não somente nos impactemos com a
história, mas para que trabalhemos junto com a comunidade escolar assuntos de
grande relevância relacionados a este tema.
São leituras como estas que preparam nossos alunos adolescentes a refletir e
a buscar transformar uma sociedade carregada de preconceitos, em uma sociedade
que sabe respeitar cada cidadão, suas individualidades, suas condições físicas e
sua cor de pele. A escola e o professor podem muito bem ter participação nisso,
trabalhando com leituras que venham a contribuir para este objetivo, que são
exatamente os objetivos abordados dentro destas literaturas que tratam sobre o
racismo, a discriminação e o bullying.
43

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acreditar que o preconceito, a discriminação e o bullying não estejam


inseridos no espaço escolar é, no mínimo, ingenuidade. Portanto, já está mais do
que na hora de nos posicionarmos diante disso e usar a literatura infanto-juvenil para
desenvolver um trabalho preventivo e de conscientização, assim dar um novo foco
às leituras solicitadas em sala de aula pode ser uma boa medida.
Sabemos e trouxemos neste trabalho, a importância da leitura para o
desenvolvimento educacional, emocional, cultural e até lúdico, das crianças e dos
adolescentes, sabemos que a leitura de livros pode ser até mesmo considerado um
importante remédio para muitos conflitos vivenciados pelos alunos, principalmente
na fase da adolescência, temos conhecimento que através da leitura os alunos
desenvolvem muito mais sua capacidade de imaginação e criatividade, dentre outros
aspectos positivos.
Portanto, não só deve ser trabalhado o incentivo à leitura de livros, como
também o incentivo à leitura de obras literárias que tratem exatamente de temas
vivenciados pelos estudantes na fase da adolescência, seja conflitos vivenciados na
família, na escola e até mesmo pela sociedade ou comunidade em que vivem.
Além disso, há uma possibilidade de se realizar uma análise de possibilidades
de leituras que poderiam ser trabalhadas pelos professores na comunidade escolar,
que abordaram temas como: racismo, discriminação e bullying, ou seja, assuntos
que poderiam ser debatidos com os alunos, inserindo ainda a questão do
preconceito duma maneira geral e a violência nas escolas, já que o bullying além de
se tratar de atitudes preconceituosas, é também uma forma de violência, logo,
trabalhar com tais literaturas, abre um leque de possibilidades de inserir nos
currículos escolares assuntos que são atuais, problemáticos e vividos pelos
estudantes adolescentes, uma vez que temas como esses, não estão sendo
devidamente explorados nas escolas atuais.
Para isso, foram escolhidos os livros: Pretinha, eu?, de Júlio Emílio Bráz, que
nos dá uma rica possibilidade de se trazer para dentro da escola o tema racismo. A
literatura Ímpar, de Marcelo Carneiro da Cunha, sugere levantar questões sobre a
discriminação e a exclusão de portadores de deficiência física e a obra Todos
44

contra Dante, do autor Luis Dill, com a qual de uma maneira bastante chocante, os
professores trabalhariam sobre o bullying nas escolas.
Foram analisadas estas obras neste trabalho, mencionadas anteriormente,
porém há outras dos mesmos autores ou até mesmo diversos outros autores que
escreveram literaturas infantis e juvenis direcionados a temas polêmicos, atuais,
reais e questionadores, que os professores poderiam tomar como suporte para
propor um belíssimo trabalho de conscientização com seus alunos sobre o racismo
e a discriminação, e quem sabe também outras problemáticas vivenciadas pelos
alunos.
Portanto, solicitar aos estudantes tais leituras e usar a literatura infanto-juvenil
para se trabalhar tais temas, problemas e valores, com os quais vão se deparar no
decorrer da vida, é uma maneira de estarmos colaborando na construção do caráter
do estudante, pois se os mesmos tiverem oportunidade e contato desde cedo com
determinados temas, tendo a liberdade de debater em sala de aula, e esclarecer
suas dúvidas sobre isso, de não ter medo de colocar seus posicionamentos frente a
tais assuntos, construindo opiniões sobre tais problemáticas, mais cedo estarão
preparados para se posicionarem diante de tais situações por eles vivenciadas, e
mais cedo estarão aptos a dar um bom exemplo como bons cidadãos em uma
sociedade violenta, preconceituosa e carente de boas atitudes, como é nossa atual
sociedade.
Acredito que trabalhar com literatura infanto-juvenil com os alunos,
principalmente explorando o tema preconceito é de fundamental importância
atualmente nas escolas. Portanto, penso em continuar a pesquisar e a estudar sobre
essa temática em trabalhos futuros.
45

REFERÊNCIAS

AMARAL, Lígia A. Sobre crocodilos e avestruzes: falando de diferenças físicas,


preconceitos e sua superação. In:________ Diferenças e Preconceito na
Escola:alternativas teóricas e práticas. 9. ed. São Paulo: Sumus editorial, 1998.
BRÁZ, Júlio E. Pretinha, eu?. Ed. Scipione. São Paulo: 2008. Série diálogo.
CADEMARTORI, Lígia. O que literatura infantil. 4. ed.. São Paulo: Brasiliense,
2006.
CALLIGARIS, Contardo. A Adolescência. São Paulo. Publifolhas, 2000.
COELHO, Nelly N. Panorama histórico da literatura infantil-juvenil:das origens
indoeuropéias ao Brasil contemporâneo. São Paulo: Quíron, 1985.
CUNHA, Marcelo C. Ímpar. Porto Alegre:Ed. Projeto, 2004;
DILL, Luis. Todos contra Dante. São Paulo: Companhia das Letras, 2008
Estatuto da criança e do adolescente: art. 17.Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm. acesso em 10 de outubro de
2011.
EYNG, Ana Maria. Convivência e violência nas escolas: a dinâmica dos sujeitos e
contextos na configuração do bullying. In: GISI, Maria Lourdes; ENS, Romilda
Teodora(org.) Bullying nas Escolas: Estratégias de Intervenção e formação de
professores. Ijuí:Editora Unijuí, 2011. (p. 97-133)
LAJOLO, Marisa. A formação do professor e a literatura infanto-juvenil. Série
Ideias n.5. São Paulo: FDE, 1988. Disponível em:
http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_05_p029-034_c.pdf. Acesso em 20 de
setembro de 2011.
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n 9394/96, conhecida como
LDB/96 em suas disposições gerais, art 22. Disponível em:
http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/2762/ldb_5ed.pdf. Acesso
em: 02 de Abril de 2011.
MAGNANI Maria do R. M. Leitura e formação do gosto: por uma pedagogia do
desafio do desejo. Série Idéias n.13. São Paulo:FDE, 1994. p.101 Disponível em:
http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_05_p029-034_c.pdf. Acesso em 20 de
setembro de 2011.
OLIVEIRA, Maria de. A literatura para crianças e jovens no Brasil de ontem e de
hoje. Caminhos do ensino, São Paulo, 2008. coleção literatura e ensino.
46

OSORIO, Luiz C. Adolescente Hoje. Porto Alegre: Artes médicas, 1989.


QUEVEDO, Hercílio F. Leitura e animação Cultural: Ler é nossa função essencial
(ou não?). In: Repensando a escola e a biblioteca 2 ed. Passo Fundo, UPF 2005.
PCN´s Parmetros curriculares Nacionais. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf. Acesso em 15 de Novembro de
2010.
Pesquisa sobro o bullying HYPERLINK
http://www.revistaescola.com.brwww.revistaescola.com.br Acesso em Abril de 2011.
ZILBERMAN, Regina.A Literatura Infantil na Escola.São Paulo: Global Editora, 4.
Ed. 1985.
ZILBERMAN, Regina. MAGALHES, Ligia C. Literatura infantil: Autoritarismo e
Emancipação. São Paulo: Ática, 1987
ZILBERMAN, Regina, LAJOLO, Marisa. Literatura infantil: historias e historias. São
Paulo: Ática, 1984
Zilberman e Lajolo (1987 apud OLIVEIRA, Maria de. A literatura para crianças e
jovens no Brasil de ontem e de hoje. Caminhos do ensino, São Paulo, 2008.
coleção literatura e ensino.

Você também pode gostar