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A ESCOLA QUE TEMOS E A ESCOLA QUE QUEREMOS: UMA ANÁLISE SOBRE

AS TEORIAS CURRICULARES

O objetivo deste artigo é propor uma análise do filme “Escritores da Liberdade” (2007)
produção norte americana, buscando identificar as teorias curriculares envolvidas na prática dos
docentes, a partir das categorias: função da escola, conhecimentos, relações de poder, organização
curricular, postura do professor, aluno, relação professor e aluno, cultura, diversidade e o espaço
físico escolar. E a partir disso discutir sobre a escola que temos e a escola que queremos.

A função escolar apresentada no filme “Escritores da Liberdade” se apresenta de maneira


tradicional com relação à escola, a diferença encontra-se na prática docente exercida pela professora
Gruwell, incutida dos saberes da teoria critica curricular e aplicada no cotidiano da sala de aula,
mesmo sem o aval da direção ela busca uma emancipação do educando e a formação da criticidade
social, respeitando os saberes pré-existentes do aluno. Isto é visível, quando em uma cena, ela se
utiliza do gênero musical rap, apreciado pelos jovens retratados no filme, para ensinar poesia e o
conceito de rima interna.

Os conhecimentos explicitados são totalmente desvinculados do cotidiano dos alunos, os


saberes valorizados. Em “Escritores da Liberdade” isso isto também acontece, valorizando a cultura
branca norte americana, pois trata-se de uma escola tradicionalista preocupada em reproduzir os
ideais elitistas, mas ocorre uma quebra de paradigmas pela professora Gruwell. Percebendo os
grandes problemas sociais de seus alunos ela resolve adotar novos métodos de ensino; numa cena a
educadora utiliza-se de uma brincadeira de mau gosto criada pelos alunos, onde estes fizeram uma
caricatura representando um colega negro com lábios exageradamente volumosos, para suscitar uma
reflexão sobre a intolerância e preconceito contra os judeus na segunda guerra e ouve as realidades
brutais do dia a dia dos seus alunos, valorizando-os assim como pessoas e aos seus saberes. Os
conhecimentos são transmitidos de forma a levar a uma atitude reflexiva e ligados à realidade de
vida dos alunos.

Na visão de escolas tradicionais, o aluno é o objeto do ensino, cabe a ele somente ouvir,
memorizar e reproduzir aquilo que foi estudado em sala de aula, tendo um comportamento
adequado, quieto e submisso e só se posicionando se for solicitado. A relação professor e aluno é
vertical, este mantém um distanciamento do educando, detendo o poder decisório quanto a
metodologia, conteúdo, avaliação, forma de interação na aula, etc.
As relações de poder, dentro da escola, se apresentam de maneira hierárquica em “Escritores
da Liberdade”. O professor é o detentor do saber, e ainda encontramos as salas dos alunos
avançados, ou seja, a sala dos melhores. Mas esta não é a verdade vivenciada na sala da professora
Gruwell, formada por alunos infratores que vieram do reformatório e considerados casos perdidos, a
educadora se mostra construtivista na relação professor e aluno, aberta ao ponto de vista do
educando, propiciando uma troca de conhecimentos e reflexão dos conteúdos, criando desta forma
uma relação horizontal que mostra uma docente empenhada na prática transformadora, que busca
desmitificar e questionar, junto com os alunos, esta não é uma professora autoritária que obriga os
alunos a tirarem os capuzes quando entram em sala, ou proíbe que a aluna folheie uma revista em
sua aula, procura ser mais como uma mediadora, orientadora do conhecimento entre os educandos e
preocupando-se com a formação de um vinculo afetivo.

Outro aspecto percebido, que reforça a teoria critica, é a configuração da sala de aula, as
carteiras não estão posicionadas em fileiras umas atrás das outras, onde os alunos ficam de frente
para a professora e de costas uns para os outros, mas a sala é dividida em dois grupos, formando um
corredor no centro, onde a professora se movimenta e os alunos ficam de frente uns para os outros.

No contexto da professora Gruwell em “Escritores da Liberdade” o aluno é sujeito da sua


aprendizagem e não um ser ouvinte e mudo, ela participa, interroga, critica, reflete, e assim
desenvolve os seus conhecimentos, sempre vinculados a um processo de conscientização social que
estuda o ambiente de vida do educando, rompe com a visão do aluno objeto do ensino alienado da
sua realidade, este é um ser pensante e atuante em seu meio.

O currículo é flexível em “Escritores da Liberdade” as aulas não se limitam apenas as


exposições mas também são externas. Ocorrem passeios, um deles ao Museu da Tolerância onde os
alunos aprendem sobre o sofrimento dos judeus durante a segunda guerra e ainda tem a
oportunidade de jantarem com os sobreviventes do holocausto num restaurante; a professora
promove debates, aulas onde eles assistem a documentários e trabalhos em grupo, desenvolve
projetos como o da leitura e escrita baseado no modelo do diário extraído do livro “o Diário de
Anne Frank”, que leva os alunos a escreverem seus próprios diários para que depois, caso eles
queiram, a professora leia, esta é uma forma de participar da vida do aluno e de seus conflitos, ela
não invade a liberdade do educando, não avalia e nem pede para o aluno expor em sala a sua
privacidade, ela deseja apenas conhecê-los e entende-los. Este projeto além de trabalhar com os
conteúdos da língua materna também abordou questões históricas se tornando interdisciplinar É
interessante ressaltar que esta também é uma técnica utilizada no filme francês “Entre os Muros da
Escola” pelo professor Marin, mas naquele caso o educador está mais preocupado com a gramática,
oralização e avaliação dos alunos do que em conhecê-los.
Outro aspecto não valorizado neste mesmo filme é a cultura trazida pelos alunos, sendo estes
africanos, árabes, asiáticos e europeus, havia um choque racial dentro da sala de aula devido a
diversidade, que se manifestava em conflitos, preconceitos com jovens afrodescendentes do
continente e outros das ilhas, como na cena em que um dos alunos diz que quem nasce no Caribe
não é francês e sim caribenho, causando um atrito em sala de aula com um aluno que nasceu no
Caribe e se considera francês, intolerância com as religiões como, por exemplo, o islamismo, ou
com relação ao garoto gótico da sala ou com o garoto chinês, nada disso era percebido. A única
cultura importante e que interessava era a cultura francesa.

Também encontramos varias culturas étnicas descritas no filme “Escritores da Liberdade”,


temos os latinos, os cambojanos, os negros e os brancos e os choques culturais são constantes; de
maneira geral a professora não se foca em nenhuma etnia especialmente, mas procura mostrar que
todos ao mesmo tempo em que são diferentes, com culturas diferentes, são iguais como vitimas dos
preconceitos, intolerância ou da violência das gangues. Para se trabalhar com essa diversidade em
uma cena a professora Gruwell aplica uma dinâmica, que consiste em uma linha no chão onde os
alunos deverão pisar após uma questão proposta pela educadora, caso seja afirmativa, assim ela
quebra com as diferenças mostrando que tantos latinos, negros, cambojanos e brancos gostam das
mesmas musicas, tem os mesmos discos e enfrentam todos os dias os mesmos problemas
independente da raça.

O espaço físico do colégio é excelente, abrigando um grande número de alunos. A estrutura é


ampla, com muitos espaços externos, armários para os alunos guardarem seus pertences, salas de
aula grandes e bem iluminadas, mas sem presença de quadras para atividades ao ar livre.

Quando analisamos os modelos curriculares retratados em alguns filmes e o resultado destes


no cotidiano escolar, torna-se evidente a ineficácia da teoria tradicional.

A prática docente exercida por determinados professores tradicionais, demonstra ser inútil
para a vida dos educandos, pois não aborda elementos de suas realidades nem de seus interesses. A
rigidez autoritária do educador e a falta de flexibilização curricular levam a indisciplina na sala de
aula e o distanciamento afetivo do aluno para com o professor.

Em “Escritores da Liberdade” a prática do educador é a inversa. Apesar do tradicionalismo da


instituição, a professora Gruwell associa os conteúdos pedagógicos à realidade social dos alunos e
aos saberes preexistentes trazidos por eles, se apropria assim da teoria critica como modelo de
transformação da identidade individual. Diante dessa percepção curricular a sala de aula que no
inicio do filme apresentava-se violenta e indisciplinada, tornou-se participativa e unida, integrada
em torno da figura da professora que representava o modelo de orientadora e mediadora dos
conhecimentos adquiridos pelos alunos.
Atualmente algumas escolas transmitem uma educação que não deixa explicito o método
seguido, um hora é construtivista, outra é tradicional, depois montessoriana. Ainda encontramos o
currículo tradicional, em muitas escolas, seguido por um regime onde a educação é voltada tão
somente para a formação profissional do aluno. A teoria tradicional demonstra um ensino neutro,
seu objetivo é formar o cidadão para a sociedade, ou seja, um currículo tecnicista.

Nas últimas décadas escolas estão aderindo a teoria crítica curricular, onde o objetivo é
formar indivíduos críticos e reflexivos dentro da sociedade, a partir das linhas construtivistas e
interacionaistas.

A escola que queremos promover é aquela pautada na formação de um sujeito ativo e atuante,
lutando pelos seus ideais e buscando uma formação melhor dentro da sociedade, a partir da teoria
critica. A escola é o local que leva o aluno a refletir sobre a diversidade cultural, promovendo o
respeito mutuo e a igualdade entre todos os cidadãos, faz questionar os padrões sociais e políticos
que formam o nosso país.

Para chegarmos à escola que queremos é preciso deixar de lado o preconceito, comodismo e o
medo da mudança, ter a iniciativa de formar uma escola disposta a mudar a sociedade, voltada com
o olhar para emancipação do indivíduo, uma escola que vai além das experiências dos educando
dentro de suas aprendizagens.

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