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Cuidados Paliativos

no final da vida

Rachel Duarte Moritz


Coordenadora
Lara Patrícia Kretzer
Eduardo Jardim Berbigier
Colaboradores
Conselho Federal de Medicina (CFM)
Conselho Regional de Medicina
do Estado de Santa Catarina (CRM-SC)

12º Corpo de Conselheiros - gestão 2013-2018

Efetivos

Dr. Anastácio Kotzias Neto


Dr. Antonio Silveira Sbissa
Dr. Armando José d’Acampora
Dra. Aurea Gomes Nogueira
Dr. Diogo Nei Ribeiro
Dr. Dorival Antônio Vitorello
Dra. Eulina Tokiko Shinzato R. da Cunha
Dr. José Eduardo Coutinho Góes
Dr. José Francisco Bernardes
Dr. Marcelino Osmar Vieira
Dr. Nelson Grisard
Dr. Odi José Oleiniscki
Dra. Rachel Duarte Moritz
Dr. Ricardo Polli
Dr. Rodrigo Jorge da Luz Bertoncini
Dr. Tanaro Pereira Bez
Dr. Vicente Pacheco Oliveira
Dr. Wilmar de Athayde Gerent
Dr. Ylmar Corrêa Neto
Dr. Zulmar Vieira Coutinho
Dr. Juliano Pereima de Oliveira Pinto (ACM)
Suplentes

Dr. Amauri Olivio Zanona


Dra. Andrea Antunes C. de Andrade Ferreira
Dra. Andrea Thives de Carvalho Hoepers
Dr. Arthur Koerich D’Ávila
Dr. Daniel Knabben Ortellado
Dr. Eduardo Porto Ribeiro
Dr. Fábio Firmino Lopes
Dr. Fábio May da Silva
Dr. Hélio Augusto Santos Machado
Dr. João Pedro Carreirão Neto
Dr. Luiz Fernando Soares
Dr. Marcelo Lemos dos Reis
Dr. Marcelo Neves Linhares
Dr. Mario Cesar Pereira da Silva
Dr. Milton Fiedler
Dr. Paulo de Tarso Freitas
Dr. Roberto Buechele
Dr. Saint Clair Vieira de Oliveira
Dra. Sheila Koettker Silveira
Dra. Teresa Cristina Nogueira dos Prazeres
Dr. Jovânio Fernandes da Rosa (ACM)
Câmara Técnica de Cuidados Paliativos

Dra. Rachel Duarte Moritz


Dra. Lara Patrícia Kretzer
Dr. Eduardo Jardim Berbigier
Dr. Rafael Barone de Medeiros
Dr. Gabriel Hahn Monteiro Lufchtiz
Dra. Lizana Arend Henrique
Dra. Maria Tereza Evangelista Schoeller
Apresentação

A Organização Mundial de Saúde, des-


de 1990, estabeleceu os conceitos sobre
Cuidados Paliativos, atualizados doze anos
após: “consistem na assistência promovida
por uma equipe multidisciplinar, que objetiva
a melhoria da qualidade de vida do paciente
e seus familiares, diante de uma doença que
ameace a vida, por meio da prevenção e alí-
vio do sofrimento, da identificação precoce,
avaliação impecável e tratamento de dor e
demais sintomas físicos, sociais, psicológi-
cos e espirituais”.
Nestes momentos de tanto sofrimento, o
alívio à dor física e ao sofrimento do pacien-
te e seus familiares são partes fundamentais
dos ideais da Medicina. Devem ser atendidos
os sofrimentos do paciente, com atenção e
compaixão e é necessário avaliar e controlar
de forma impecável, não somente a dor, mas
todos os sintomas de natureza física, social,
emocional e espiritual.
Certamente este sofrimento se estende
à família. Sintomas que ocorrem e a dor
necessitam a maior atenção. O médico e
demais profissionais da Saúde certamente
também sofrem com aqueles que atendem.
Nos dias atuais, os conceitos dos Cuidados
Paliativos são reconhecidos pela Medicina
e pela Sociedade.
O Conselho Regional de Medicina do
Estado de Santa Catarina (CRM-SC) tem
se empenhado no sentido de transmitir aos
médicos e demais profissionais envolvidos
nesta atividade princípios e meios para um
adequado atendimento. O presente traba-
lho da Conselheira Rachel Duarte Moritz e
colaboradores certamente traz dados per-
tinentes ao bom atendimento e enaltece
nossa instituição.

Antonio Silveira Sbissa


Conselheiro Presidente do CRM-SC
Cuidados Paliativos
Introdução

Definições

Cuidados Paliativos visam à melhoria da qua-


lidade de vida dos pacientes e de seus familiares,
através da prevenção e do tratamento precoces dos
sintomas do sofrimento físico, psíquico, espiritual
e social.
São indicados para o paciente que convive ou
está em risco de desenvolver uma doença que
ameaça a vida, independentemente do diagnóstico,
idade ou prognóstico.
Devem ser prestados a todos os pacientes com
doença ameaçadora da vida, de forma plena ou em
concomitância com os cuidados curativos, sendo
a intensidade individualizada de acordo com as
necessidades e com a evolução própria de cada
doença e também com os desejos dos pacientes e
de seus familiares.
Para que a opção terapêutica preferencial, se
curativa/restaurativa ou paliativa, seja adequada é
importante o estabelecimento de prognóstico.

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Estabelecimento de prognóstico é uma das
habilidades fundamentais da prática médica. É pri-
mordial em Cuidados Paliativos sendo imprescin-
dível para o processo de tomada de decisão, para
uma adequada comunicação e consequentemente
para a definição de plano de cuidados.
Instrumentos validados de prognóstico estão
relacionados à funcionalidade global, à doença de
base e às complicações agudas da doença de base.

A abordagem paliativa concomitante


com o tratamento curativo é necessária,
sendo que à medida em que a doença
progride e que o tratamento curativo
deixa de oferecer um controle razoá-
vel da mesma, os Cuidados Paliativos
crescem em significado, surgindo como
uma necessidade absoluta, na fase
em que a cura deixa de ser realidade.

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Recomendações
Privilegiar o tratamento visando os princípios da
Bioética: Autonomia, Beneficência, Não Maleficên-
cia e Justiça.
A qualidade da vida é a meta terapêutica, sendo
recomendável que sejam suspensos ou recusados
os tratamentos que prolonguem o morrer, o que tor-
na necessário o conhecimento sobre como prog-
nosticar e o estímulo à adequada comunicação.
O reconhecimento precoce e a avaliação siste-
mática dos sintomas são os “sinais vitais” do pa-
ciente com doença terminal.

Fases da assistência paliativa (Figura 1)


1ª Maior chance de recuperação – indicado o
tratamento curativo/restaurativo pleno com o trata-
mento paliativo enfocado no controle dos sintomas
e na boa comunicação;

2ª Evolução para irreversibilidade da doença –


priorização da qualidade da vida, com instituição de
tratamento curativo/restaurativo quando considera-
do proporcional;

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3ª Doença irreversível e morte iminente – os
Cuidados Paliativos devem ser exclusivos ou pre-
ferenciais.

Figura 1 – Fases da assistência paliativa

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Cuidados Paliativos
Aspectos ético-legais

A realidade tecnológica do mundo atual


tem levado muitas vezes à distanásia ou
obstinação terapêutica, considerada a ma-
nutenção de terapia fútil ou inútil, que so-
mente prolongará o morrer e aumentará o
sofrimento do doente e de seus familiares.
Surge então a luta pela ortotanásia, que
visa o fim da obstinação terapêutica pois
o esforço para que seja evitado o prolon-
gamento do morrer é um ato humano que
deve ser embasado em princípios éticos.

Definições
Os princípios fundamentais da bioética são a auto-
nomia, a beneficência, a não maleficência e a justiça.
Visando o respeito à autonomia foi publicada a
Resolução 1.995, aprovada pelo plenário do Conselho
Federal de Medicina (CFM) em 2012, que normatiza
as diretivas antecipadas de vontade, definindo que o
paciente poderá decidir, com a ajuda de seu médico,

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os procedimentos considerados pertinentes e aqueles
aos quais não quer ser submetido em caso de termi-
nalidade da vida.
Na ausência de diretivas antecipadas, a comunica-
ção é fundamental para que a autonomia do paciente
seja respeitada, mesmo que de forma presumida.
Embora possa parecer fácil a definição dos con-
ceitos da bioética, o avanço tecnológico do mundo
moderno tem motivado amplos questionamentos
a respeito dos mesmos. Até quando um paciente
com doença de Alzheimer tem preservada sua auto-
nomia? Quando ou até quando estaremos seguindo
a beneficência ou a não maleficência ao prescrever-
mos um tratamento restaurativo a um paciente com
doença terminal? Existe diferença ética entre a sus-
pensão e a recusa de tratamentos considerados fú-
teis ou inúteis? De forma pragmática, seria possível
responder a essas perguntas. Entretanto, são ques-
tões difíceis de serem escalonadas de forma coletiva.

As decisões terapêuticas são indivi-


duais, baseadas em amplo contexto que
envolve a avaliação de aspectos clínicos
e sociais, apoiada em critérios objetivos
e subjetivos.

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Amparo ético dos Cuidados Paliativos no
final da vida
Em respeito aos princípios bioéticos, o CFM
aprovou, em 2006, a Resolução 1.805. Nesta
resolução é descrito no Artigo 1º. “É permitido
ao médico limitar ou suspender procedimentos
e tratamentos que prolonguem a vida do doente,
em fase terminal, de enfermidade grave e incu-
rável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu
representante legal”.
Esse artigo é complementado por quatro
parágrafos: “1º. O médico tem a obrigação de
esclarecer ao doente ou representante legal as
modalidades terapêuticas adequadas para cada
situação”; “2º. A decisão referida no caput deve
ser fundamentada e registrada no prontuário”;
“3º. É assegurado ao doente ou representante
legal o direito de solicitar uma segunda opinião
médica”; e “4º. Em se tratando de doente inca-
paz, ausente o representante legal, incumbirá ao
médico decidir sobre as medidas mencionadas
no caput deste artigo.”
O artigo 2º dessa resolução determina: “O
doente continuará a receber todos os cuidados
necessários para aliviar os sintomas que levam
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ao sofrimento, assegurada a assistência integral,
o conforto físico, psíquico, social, espiritual, in-
clusive assegurando a ele o direito da alta hos-
pitalar”.
Em continuidade à regulamentação do tra-
tamento no final da vida foi definido no pará-
grafo único do artigo 41 do Código de Ética
Médica publicado no Diário Oficial da União de
24/09/2009: “Nos casos de doença incurável e
terminal, deve o médico oferecer todos os Cui-
dados Paliativos disponíveis sem empreender
ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou
obstinadas, levando sempre em consideração a
vontade expressa do paciente ou, na sua impos-
sibilidade, a de seu representante legal”.
Amparo jurídico para os Cuidados Paliati-
vos no final da vida
No que diz respeito às implicações legais da
ortotanásia, pode-se afirmar que o direito à vida
não implica uma obrigação de sobrevida.
Segundo o jurista José Henrique R. Torre: “Do
ponto de vista jurídico, pode-se questionar se a
ortotanásia pode ser considerada omissão. En-
tretanto, o médico, ao limitar ou suspender tera-
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pêutica, somente será considerado o causador
da morte do doente se a terapêutica tiver poten-
cial para evitar a morte. Portanto, a suspensão
ou a recusa de terapia fútil ou inútil não pode ser
enquadrada como homicídio. No caso do doente
terminal, em face de doença incurável, os apa-
relhos de suporte são ligados ou mantidos não
para evitar a morte, que é inevitável, irreversível
e inexorável, mas sim para manter a vida arti-
ficialmente. O médico não pode evitar a morte.
A situação é irreversível e não é transitória. Os
procedimentos e tratamentos não têm qualquer
sentido curativo. Portanto, não existe o dever de
manter esses procedimentos”.
O parecer final do processo judicial
2007.34.00.014809-3, assinado pelo Juiz federal
Roberto Luis Luchi Demo, julgou improcedente a
ação do Ministério Público que apontava a incons-
titucionalidade da Resolução do Conselho Federal
de Medicina número 1805/06, que permite a orto-
tanásia. No seu parecer, o Juiz escreveu que: “1)
o CFM tem competência para editar a Resolução
nº 1805/2006, que não versa sobre direito penal
e, sim, sobre ética médica e consequências dis-
ciplinares; 2) a ortotanásia não constitui crime de
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homicídio, interpretado o Código Penal à luz da
Constituição Federal; 3) a edição da Resolução
nº 1805/2006 não determinou modificação
significativa no dia-a-dia dos médicos que lidam
com pacientes terminais, não gerando, portanto,
os efeitos danosos propugnados pela inicial; a
Resolução nº 1805/2006 deve, ao contrário,
incentivar os médicos a descrever exatamente
os procedimentos que adotam e os que deixam
de adotar, em relação a pacientes terminais,
permitindo maior transparência e possibilitando
maior controle da atividade médica”.
Diante do relatado pode-se concluir que:

Existe definição ética e respaldo le-


gal para que os Cuidados Paliativos se-
jam exclusivos no tratamento do final da
vida e para que seja evitada a obstina-
ção terapêutica.

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Cuidados Paliativos
Comunicação em situações de conflito

Juntamente com saber controlar os sinto-


mas e saber prognosticar, o uso adequado de
habilidades de comunicação constitui a tríade
que alicerça e sustenta os Cuidados Paliativos.

Definições
O estresse gera um importante impacto na saúde
física e mental dos pacientes e de seus familiares
levando a uma diminuição da capacidade de com-
preensão das informações fornecidas e da capaci-
dade de tomada de decisões.
Saber se comunicar com o paciente e seus fa-
miliares é uma habilidade médica que permite mais
do que uma boa troca de informações entre estas
partes; acima de tudo é uma habilidade essencial
no processo de construção de uma relação de con-
fiança do paciente e familiares com a equipe. Essa
relação de confiança por sua vez vai facilitar o pla-
nejamento do final de vida do paciente, incluindo os
ajustes necessários nestes planos a partir dos desa-
fios que a evolução natural da doença venha a trazer.

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Enquanto habilidade médica, uma boa comuni-
cação é melhor adquirida através de treinamento ba-
seado em estratégias de comunicação que oferecem
as melhores evidências de sucesso medido através
de desfechos como melhores tomadas de decisões
de final de vida e maior satisfação de pacientes, fa-
miliares e equipe. Algumas das estratégias de comu-
nicação fundamentais em cuidados paliativos são:
comunicação empática, identificação das necessi-
dades específicas de informações e de envolvimento
em tomadas de decisão de pacientes e familiares e
condução de conferência estruturada sobre cuida-
dos de final de vida.

Comunicação Empática:
Empatia pode ser definida como a capacidade de
compreender a perspectiva e a dor do outro e de-
monstrar ativamente ao outro esta compreensão. É
esse processo de demonstração ativa da empatia
o que faz da comunicação empática uma estratégia
efetiva e passível de treinamento. Saber escutar, por
exemplo, é uma estratégia básica de boa comuni-
cação. Sob a ótica da comunicação empática, no
entanto, não basta ouvir o paciente e os seus fami-
liares; é preciso que os mesmos se sintam ouvidos.
Isto pode ser alcançado através de demonstrações
ativas de escuta tais como: olhar nos olhos de quem
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está falando, não interromper a fala do outro e usar
gestos tais como balançar a cabeça em sinal de en-
tendimento.
Outra estratégia de comunicação empática efe-
tiva é o bom uso da identificação das emoções
demonstradas pelo outro e responder às mesmas
com empatia. Expressões que veiculem mensagens
de empatia, apoio, parceria, validação e não julga-
mento são formas de responder adequadamente
às emoções. Diante de um paciente que demonstra
uma imensa tristeza e medo em decorrência de uma
fase difícil de sua doença o uso de expressões em-
páticas como “eu estou vendo como está sendo duro
para você passar por isso”, “é compreensível que você
sinta medo diante dos desafios que essa doença tem
lhe trazido”, “não se esqueça que você pode contar co-
migo durante todo esse processo” e “o que de mais
importante posso fazer por você neste momento?”
pode oferecer algum consolo ao paciente e contribuir
imensamente para a solidificação de uma relação de
confiança e que em si própria possa ser terapêutica.

Recomendação: identificar as necessidades espe-


cíficas de informação e de envolvimento em toma-
das de decisão de pacientes e familiares
Cada paciente e cada família são uma história.
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Cada núcleo apresenta as suas necessidades espe-
cíficas a serem respeitadas. Enquanto alguns prefe-
rem saber da verdade em seus mínimos detalhes,
outros preferem apenas a mensagem principal e há
ainda outros que preferem não enfrentá-la direta-
mente. Não existe, portanto, fórmula exata de comu-
nicar notícias sobre mau prognóstico que sirvam a
todos igualmente no que diz respeito ao volume de
informações e ao momento correto para prestá-las.
Fornecer informações detalhadas para quem não
deseja ou ainda não está preparado para recebê-las
pode fragilizar essas pessoas. Por outro lado, infor-
mações insuficientes podem levar a sentimentos de
alienação por parte de outras, gerando frustrações,
desconfianças e conflitos com a equipe.
O mesmo princípio se aplica ao grau de envolvi-
mento que as pessoas desejam ter em decisões de
final de vida tais como a opção por suspensão de
tratamentos. Enquanto algumas pessoas preferem
ser parte ativa desse processo, outras preferem con-
fiar que a equipe tome as decisões de acordo com
os melhores julgamentos profissionais. Envolver pa-
cientes e familiares em decisões de final de vida para
lidar com as quais os mesmos não tenham condição
emocional de reserva pode dificultar que decisões
apropriadas de final de vida sejam tomadas, gerar
conflitos entre equipe e paciente/família e aumentar o
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risco de desfechos tais como depressão, ansiedade
e luto complicado nessas pessoas.
A recomendação, portanto, é de que antes de
oferecer informações sobre a doença e o seu prog-
nóstico o profissional identifique o quanto o paciente
ou a família deseja saber a respeito e o quanto os
mesmos desejam fazer parte das tomadas de deci-
são de final de vida quando estas forem necessárias.
Perguntar diretamente aos mesmos sobre os graus
de preferência individuais pode ser uma boa estra-
tégia. São exemplos de perguntas para este fim: “a
senhora é o tipo de pessoa que gosta de saber da
verdade e seus detalhes ou a senhora prefere que a
gente converse melhor com os seus filhos?”, “hoje
é um bom dia para a gente conversar sobre como a
doença pode se comportar no futuro, ou o senhor
prefere conversar sobre isso um outro dia?” ou
“caso a doença avance a senhora gostaria de discu-
tir sobre os tratamentos que não venham a ser mais
apropriados?”.

Condução de conferência sobre cuidados de


final de vida
O desenho apropriado de uma plano de cuidados
de final de vida que seja apropriado para as especifi-
cidades de cada núcleo paciente-família depende de
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uma boa comunicação de prognóstico e da identifi-
cação dos valores das pessoas envolvidas. A reali-
zação de uma reunião formal com o paciente e/ou
familiares de pacientes que não podem decidir por si
próprios oferece a oportunidade para que esses ob-
jetivos sejam alcançados. Chamamos essa reunião
de conferência e a maneira como ela é estruturada
pode conduzir a melhores resultados.
A estruturação da conferência em etapas sequen-
ciais em que decisões de final de vida só venham a
ser discutidas após etapas de identificação de enten-
dimento sobre a doença e de status emocional dos
presentes, por exemplo, facilita que informações e
decisões sejam tituladas de acordo com as neces-
sidades específicas de cada núcleo. Evita-se dessa
maneira, que informações indesejadas sejam ofere-
cidas precocemente e que sentimentos de antago-
nismo em direção à equipe se desenvolvam a partir
de propostas de suspensão de medidas terapêuticas
sejam propostas em momento em que os participan-
tes ainda não estejam preparados para tal (Tabela 1).
Ao longo de todas as etapas da conferência o
uso de estratégias de comunicação empática devem
ser empregadas. Além disso, o uso de linguagem
clara e livre de siglas e jargões médicos também é
fortemente recomendado.
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Tabela 1 – Estrutura da conferência com pa-
ciente e/ou familiares:
Preparo
• Definir local adequado
• Reservar tempo apropriado para a reunião (apro-
ximadamente 30 minutos)
• Estar atualizado em relação a quadro clínico do
paciente
• Definir membros da equipe que estarão presentes
e definir com a equipe os objetivos específicos da
conferência
Introdução
• Apresentar os profissionais e pedir que os familia-
res se apresentem
• Agradecer a presença de todos
• Brevemente informar a razão da reunião

Percepção e identificação de necessidades


• Perguntar como os presentes estão emocional-
mente e como estão lidando lidando com a situação
Utilizar perguntas abertas (“o que vocês já sabem
sobre a doença?’)
• Escutar ativamente, identificando: o conhecimen-

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to sobre a doença e sua evolução, expectativas,
dúvidas, potenciais fontes de conflito, dificuldades
enfrentadas e emoções demonstradas pelos fami-
liares
• Responder empaticamente as emoções de-
monstradas

Informação
• Informar em linguagem clara e sem excesso de
detalhes: diagnóstico, tratamento e prognóstico
• Fracionar e titular o volume de informações de
acordo com as preferências dos presentes
• Avaliar se houve compreensão das informações
oferecidas
• Responder com empatia às emoções demons-
tradas
• Incentivar perguntas

Tomada de decisões
• Demonstrar interesse nos valores dos envolvidos,
expressões de desejos prévios, presença de direti-
vas antecipadas de vontade
• Tomar decisões se apropriado e de acordo
com o grau de envolvimento que os presentes
desejam ter e status emocional dos mesmos

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• Oferecer uma recomendação sobre o melhor
caminho
• Focar nos cuidados que serão prestados e não
no que será suspenso
• Verbalizar compromisso com a dignidade e o
não sofrimento do paciente
• Assegurar a continuidade dos cuidados até a
morte
• Verbalizar apoio à decisão tomada pelos pre-
sentes e dissipar sentimentos de culpa
• Encerramento
• Breve resumo dos pontos mais importantes da
conferência
• Agradecer presença de todos novamente e
valorizar a importância da participação dos mes-
mos
• Agendar nova conferência se necessário e co-
locar a equipe a disposição para novos esclare-
cimentos.
• Registrar a conferência em prontuário (data,
participantes, assuntos discutidos e decisões
tomadas.

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Cuidados Paliativos
Definição do Status de Terminalidade

AVALIAÇÃO PROGNÓSTICA

→ É um processo probabilístico e não deter-


minístico
→ Predições probabilísticas são instrumentos
relacionados: à doença de base e à compli-
cação aguda dessa doença
→ Fatores importantes a serem considerados
no curso da doença: Funcionalidade prévia
+ Evolução da doença de base + Padrão
da resposta à intercorrência aguda.

Pacientes nas últimas horas ou dias de vida frequen-


temente não tem seus sofrimentos físico, emocional e
espiritual aliviados. Saber reconhecer quando a vida de
alguém se aproxima do final é habilidade fundamental a
ser dominada por todo o médico. Somente dessa forma
o paciente e sua família não serão privados das interven-
ções adequadas para este momento.
Uma adequada avaliação prognóstica permite a
identificação do processo ativo de morte, devendo

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ser considerada tanto a natureza dinâmica e complexa
do corpo humano quanto a sua resposta particular a
cada um dos diferentes eventos clínicos enfrentados
ao longo do tempo.
Dessa forma pode-se deduzir que os prognósticos
não são expressões de certeza absoluta, atribuíveis a
este ou àquele paciente, mas sim estimativas obtidas
através do método científico das probabilidades de
desfechos, entre eles, a morte.
Predições clínicas de morte são tão mais acuradas,
quanto mais próximo o paciente se encontra do evento,
especialmente ao longo das últimas 3 semanas de vida.
Existem indicadores gerais de declínio que são ob-
servados em pacientes com curta expectativa de vida:
 Queda do status funcional, maior dependência,
marcha lenta;
 Doença crônica avançada, com piora no padrão
de resposta ao tratamento; (internações/exacerba-
ções mais longas e mais frequentes);
 Perda não intencional de peso (>10%) nos últi-
mos seis meses;
 Presença de eventos sentinela: quedas, luto,
transferência para casas de repouso.
No caso de doenças crônico-degenerativas e cân-
cer, a constatação de que a vida se aproxima do final,

29
é facilitada quando são avaliados dados referentes a
três momentos distintos do curso da doença, inde-
pendente do diagnóstico de base.
1. Funcionalidade prévia  verificada pela capa-
cidade do paciente realizar suas atividades de vida
diária (deambulação, trabalho, hobbies, higiene, ali-
mentação) de maneira autônoma, não dependendo de
especificidades das doenças.
Existem diversas escalas clínicas já validadas
e amplamente utilizadas que conferem ao paciente
maior chance de mortalidade em curto prazo, quanto
menor sua pontuação. Dentre elas, destaca-se a Es-
cala de Performance de Karnofsky (Figura 1) e a Escala
de Performance Paliativa (Figura 2).

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Escala de Performance Paliativa (PPS)
% Deambulação Atividade e evidência Autocuidado Ingesta Nível de consciência
da doença

100 Completa Atividade normal e Completo Normal Completo


trabalho, sem evidência
de doença

90 Completa Atividade normal e tra- Completo Normal Completo


balho, alguma evidência
de doença

80 Completa Atividade com esforço, Completo Normal ou reduzida Completo


alguma evidência de
doença

70 Reduzida Incapaz para o trabalho; Completo Normalou reduzida Completo


doença significativa

60 Reduzida Incapaz para hobbies/ Assistência Normal ou reduzida Completo ou períodos de


trabalho doméstico, ocasional confusão
doença significativa

50 Maior parte do Incapacitado para Assietência Normal ou reduzida Completo ou período de


tempo sentado qualquer trabalho, considerável confusão
ou deitado doença extensa

40 Maior Incapaz para a maioria Assistência quase Normal ou reduzida Completo ou sonolência, +
parte do tempo das atividades, doença completa ou - confusão
acamado extensa

30 Totalmente Incapaz para qualquer Dependência Normal ou reduzida Completo ou sonolência,


acamado atividade, doença extensa completa +/- confusão

20 Totalmente Incapaz para qualquer Dependência Mínima e pequenos Completo ou sonolência,


acamado atividade, doença extensa completa goles +/- confusão

10 Totalmente Dependência completa Cuidados com Sonolência


acamado a boca ou coma +/-
Incapaz para confusão
qualquer ativ-
idade, doença
extensa

0 Morte - - - -

http://www.victoriahospice.org/sites/default/files/pps_portugese_0.pdf

2. Evolução da doença de base  Onde são avaliados o pa-


drão de comportamento da enfermidade ao longo do tempo
e a reserva orgânica que ainda resta ao paciente (Figura 3).
Doenças oncológicas geralmente apresentam manuten-
ção da funcionalidade num período inicial que pode ser de
poucos meses até anos. Em caso de refratariedade, recor-

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rência ou recidiva, o câncer rapidamente determina queda
funcional abrupta e esgotamento das reservas fisiológicas.
Doenças crônicas, especialmente cardíacas e respira-
tórias, apresentam evolução marcada por piora clínica pro-
gressiva alternada com períodos de exacerbação, até que
haja esgotamento e falência orgânica, não mais responsiva
ao tratamento.
O último padrão a ser analisado é o das doenças neuro-
lógicas de evolução lenta, como demências, mal de Alzhei-
mer e Parkinson. Eventos infecciosos, ou cardiovasculares
geralmente acometem os pacientes quando já marcada-
mente debilitados, levando-os à morte.

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3. Padrão de resposta ao tratamento da exacerbação
aguda  avaliação do efeito que o tratamento proposto
alcançou ou não, e análise concomitante das reservas fi-
siológicas do organismo, para que possa haver ajuste de
expectativas quanto ao prognóstico.
É importante o conhecimento de que estabelecer um
mau prognóstico (de morte provável nos próximos dias
ou horas) não deve ser interpretado como sinônimo de
desesperança e tampouco desistência ou abandono, mas
como um meio de permitir o ajuste do plano de cuidados
com enfoque especial na busca pelo conforto, proporcio-
nando assim, uma morte sem sofrimento com consequente
maior satisfação familiar. A pergunta principal não deve ser:
“Quanto tempo o paciente tem de vida?” e sim, “Diante da
probabilidade de que o paciente tenha pouco tempo de
vida, o que deve ser feito a fim de beneficiá-lo?”.

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Identificação do paciente em processo de morte

Fraqueza profunda e progressiva


Limitação ao leito
Dormir a maior parte do dia
Indiferença a comidas e bebidas
Dificuldade de deglutição
Desorientação no tempo e perda de atenção
Hipotensão não relacionada a hipovolemia
Retenção urinária por fraqueza ou incontinência
Oligúria
Incapacidade de fechar os olhos
Alucinações envolvendo pessoas já falecidas
Referência a ir para casa ou temas similares
Alterações no ritmo e padrão respiratório
Respiração ruidosa e retenção de secreções
Livedo e esfriamento da pele
Pulso fraco
Alterações do estado mental

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Cuidados Paliativos
Cuidados no final da vida

Definições
Os últimos dias/horas da vida são momentos
cheios de dúvidas, tristeza, medo. O paciente e seus
familiares estão sofrendo e, mais do que nunca, ne-
cessitam de um atendimento integral.
O melhor lugar para morrer é aquele onde o pa-
ciente e seus familiares estejam tranquilos e recebam
a assistência necessária.
O reconhecimento do morrer torna-se primordial
para que seja administrado o tratamento adequado ao
paciente no final da vida e aos seus familiares.
Nos dias/horas que precedem a morte é essen-
cial o controle adequado dos sintomas e a aceitação,
por parte dos profissionais da saúde, da futilidade e
consequentemente da necessidade da recusa ou sus-
pensão de alguns tipos de procedimentos ou terapias.

Reconhecimento do morrer
Como foi descrito no capítulo anterior, nos últimos
dias/horas da vida a atenção fica cada vez mais limi-

35
tada e o doente dorme a maior parte do tempo, em
especial quando os sintomas estão bem controlados
e quando a família e o ambiente se mantêm serenos.
Nesse momento, podem ocorrer quadros de de-
lirium. A imobilidade é crescente e a dor é presente.
O doente depende integralmente de cuidados, não se
vira no leito, praticamente não consegue ingerir ali-
mentos ou fluidos e a medicação por via oral se torna
inviável.
Surgem os problemas relacionados ao acúmulo
de saliva e secreções brônquicas (ronco da morte), o
ritmo respiratório pode ser irregular, com longos perío-
dos de apnéia e respiração superficial.
São frequentes sinais de desconforto como in-
quietude, gemência, fácies de dor e mioclonia.
Podem surgir também: eventos tromboembólicos
causando dispneia súbita, edema agudo pulmonar,
hemorragias, estridor laríngeo, dor aguda, delirium
agitado, vômitos por estase ou de conteúdo fecal, etc.
Recomendações
Na fase final da vida os Cuidados Paliativos devem
ser fornecidos de forma exclusiva e/ou preferencial.
O plano de cuidados deve ser readequado, sendo
indicada a suspensão de medidas fúteis e geradoras

36
de desconforto como: coletas de exames cujo resul-
tado não irá interferir no plano terapêutico, controle de
glicemias, monitoração de sinais vitais, medicações
que não contribuem com conforto.
Os controles de enfermagem e o tratamento mul-
tidisciplinar (fisioterapia, psicologia, assistente social)
devem intervir com ações que visem o conforto do
paciente e de seus familiares.
Devem ser suspensas as medicações que não
estejam controlando os sintomas, ou que tenham um
objetivo de prevenção/controle de doenças à longo
prazo como: anti-hipertensivos, vitaminas, antide-
pressivos, anticoagulantes, albumina, antibióticos por
longa permanência, etc.
São medicamentos essenciais àqueles que pro-
movem o conforto do paciente como analgésicos,
anti-eméticos, sedativos, ansiolíticos.
Quando conveniente, é aconselhável a implanta-
ção de metas terapêuticas. Por exemplo, a prescrição
de antimicrobianos por 72 horas, seguida da reavalia-
ção e suspensão caso haja falha terapêutica.
É sugerida a adaptação das vias de administração
de medicamentos. Preferir a via oral e, quando esta
não é possível, a via subcutânea.
É imprescindível que seja disponibilizado suporte
37
emocional ao paciente e seus familiares; que seja oti-
mizada a informação e que seja checada a compreen-
são da informação prestada.
São essenciais a avaliação sistemática (escala de
ESAS) e o controle dos sintomas.

ESAS – Escala de Avaliação de Sintomas de Edmonton

38
Cuidados Paliativos
Controle dos principais sintomas

O controle adequado dos sinto-


mas é primordial e exige uma abor-
dagem multiprofissional com ações
farmacológicas e não farmacológicas.

Recomendações:
Ações Não Farmacológicas
→ Otimizar a comunicação: Informar aos familiares
sobre as especificidades do morrer e incentivar acom-
panhamento permanente;
→ Manter ambiente tranquilo e adequá-lo conforme
as preferências prévias do paciente (som / iluminação
/ etc.);
→ Em casos de dispneia – adequar a ventilação
com janelas abertas e/ ou ventilador;
→ Adequar a posição no leito e a mobilização do
paciente, evitando insistências e tentativas desneces-
sárias;

39
→ Avaliar ajustes de higiene e umidificação oral.
Umedecer os lábios e oferecer pedacinhos de gelo.
Providenciar cuidado oral mecânico para remoção
da placa dentária por escovação (escova pequena de
cerdas macias) e/ou enxague com swab oral.

Ações farmacológicas
D o r  5º Sinal Vital

Definições
É importante o adequado reconhecimento do tipo
de dor para que seja escolhida a terapêutica adequada.
A dor aguda ou crônica, de origem neoplásica ou não,
de acordo com mecanismos fisiopatológicos pode ser
classificada em:
→ Nociceptiva: somática (metástese óssea) ou vis-
ceral (obstrução, cólica renal),
→ Neuropática: por lesão das vias nociceptivas: cen-
tral (doença de Parkinson, pós acidente vascular
cerebral) ou periférica (polineuropatia diabética)
→ Mista – frequente na dor oncológica (crescimento
do tumor e compressão em estruturas neurais)

40
Pontos Chave no tratamento da dor
1. Identificar as causas potencialmente reversíveis (in-
fecção aguda, retenção urinária, fecalomas, úlcera de
pressão, imobilismo, mau posicionamento no leito);
2. Identificar fatores reversíveis que possam contribuir
para o aumento da dor (emocionais, sociais, espiri-
tuais)
3. Usar opióides corretamente;
4. Usar adjuvantes analgésicos;
5. Prescrever doses resgate;
6. Ajustar diariamente a dose somando com a dose
resgate;
7. Associar drogas com mecanismos de ação dife-
rentes;
8. Ao trocar um opióide diminuir 30% da dose;
9. Avaliar o rodízio dos opióides principalmente no
caso de náuseas, sintomas mau controlados ou alu-
cinação.
10. Monitorar e pautar o tratamento de forma indivi-
dualizada avaliando o tipo e a intensidade da dor.

41
Princípios do tratamento analgésico
Pela Boca
Pelo relógio
Para o indivíduo
Com adjuvantes
Pela escada analgésica
Com atenção para os detalhes

Recomendações:

Os opióides são os fármacos de pri-


meira escolha para o tratamento da dor
na fase final da vida.

42
Dor Leve - Para o controle da dor de fraca intensi-
dade tanto de origem visceral (cólica), quanto óssea
(metástese), muscular ou articular, são indicados os
salicilatos, a dipirona ou o paracetamol.
No final da vida a dor geralmente aumenta de intensi-
dade, tornando-se necessária a prescrição de analgé-
sicos mais potentes.

Dor moderada - Opióides fracos


1. Codeina
É 10 vezes menos potente que a morfina. A dose má-
xima é de 360mg/dia. Quando são necessárias doses
maiores está indicada a substituição pela morfina.
A dose analgésica da codeína é através da
metabolização hepática em morfina e pode estar di-
minuída na ausência do citocromo p-450. Seu efeito
analgésico é cerca de 20min após administração oral
e o efeito máximo ocorre em 1-2 horas.
É mais constipante que outros opióides.
Forma de apresentação - Codeina 7.5 ou 30mg + Pa-
racetamol 500mg
Dose - 15 a 30 mg cada 4 a 6 horas - Máximo
240mg dia de Codeina e 4000mg de Paracetamol

43
2. Tramadol (opióide like)
Aumenta a liberação da serotonina e inibe a recep-
tação da noradrenalina. É mais nauseante e menos
constipante que os opióides. Tem boa absorção por
via oral, com meia vida plasmática de 6-7 horas. Sua
potência analgésica é 10 vezes menor que morfina.
Dose- 50 a 100 mg cada 4 a 6 horas. A dose máxima
diária é de 400mg/dia (efeito teto).

Dor grave – Opióides Fortes


1. Morfina : fármaco de escolha.
A dose inicial deve ser de 2.5 a 10 mg cada 4 horas,
podendo ser aumentada conforme a necessidade de
cada paciente. Não possui efeito teto.
Geralmente a dose de 10-30mg cada 4 horas é sufi-
ciente para o controle da dor.
2. Metadona
Age nos u receptores e antagoniza o NMDA. Sua ad-
ministração é prejudicada pela dificuldade de titulação.
É positivo seu efeito em dor neuropática. Tem excre-
ção fecal e não possui metabólito ativo o que a quali-
fica para o uso em pacientes com insuficiência renal.
44
Dose: 2.5 a 10mg cada 12 horas. No início do trata-
mento, para a adequação da dose, podem ser admi-
nistradas doses resgate de morfina a cada 4 horas,
que podem ser ajustadas conforme equivalência:
10mg morfina SC/IV = 20 mg de metadona VO e
10mg morfina VO = 6.7 mg de metadona VO.
Causa - Menos tolerância que a morfina e abstinência
mais leve e prolongada que esse fármaco. Pode tam-
bém causar obstipação, sedação, delirium.

Controle dos principais efeitos colaterais dos opiói-


des.
 Obstipação – laxantes e quando possível:
dieta rica em fibras ou alimentos funcionais (probió-
ticos).
 Náuseas – prometazina quando pela sensi-
bilização vestibular, metroclorpramida quando por
redução do esvaziamento gástrico.
 Prurido – anti-histamínicos
Fármacos Adjuvantes
Devem ser escolhidos de acordo com a necessidade
de cada paciente. Podendo ser prescritos para dores
de qualquer etiologia e gravidade.
45
Antidepressivos e Anticonvulsivantes
Recomendados para o controle da dor neuropática
(lancinante, paroxística, em queimação, choque ou
formigamento).
Ex: Amitriptilina – iniciar 25mg (10 mg idoso) ou Ga-
bapentina (primeira linha) – de 300 a 900mg/dia
Corticóides (dexametazona – 4 a 20 mg/dia)
Indicados para doentes com dor por compressão tu-
moral ou metástese. Podem causar aumento do apeti-
te e melhora da qualidade de vida por um curto prazo.
Alfa 2 agonistas (clonidina 100-300ug/dia)
Tem efeito sedativo e analgésico. Induz sedação clíni-
ca comparável com a Fase 2 do Sono não REM. Existe
uma correlação linear, negativa e significante, entre a
concentração da clonidina e a atividade em determina-
das regiões cerebrais sendo os achados comparáveis
com os observados durante anestesia geral ou estado
vegetativo, fato denominado de Ataraxia.
Neurolépticos (haloperidol 2-5mg via oral, 2 vezes/dia)
Podem trazer benefícios em pacientes com insônia ou
alto risco de delirium.
Baclofeno (30 a 90mg/dia) - Adequado em pacientes
com contração muscular ou soluços.
46
Dispneia

Sintoma frequente no final da vida. Para seu controle é


importante a avaliação da causa e a possibilidade ou
não de sua reversão.
São causas com possível correção: congestão pul-
monar onde estaria indicada ventilação não invasiva
(VNI); derrame pleural, quando, dependendo do mo-
mento da doença, poderia ser indicada drenagem;
linfangite carcinomatosa que seria parcialmente con-
trolada com a administração de corticoides.
Na fase final da vida existe pequena chance de respos-
ta às medidas específicas para o controle da causa da
dispneia, sendo indicado tratamento exclusivamente
paliativo. Nesse cenário, sugere-se manter o paciente
hipohidratado.

Medicações propostas:
Opióides
A morfina é o fármaco de primeira escolha neste
contexto. Em casos de dispneia leve pode ser indicada
a administração de codeína na dose de 30mg via oral
a cada 4 horas.
Para a dispneia grave pode-se iniciar, para pacientes vir-
47
gens de tratamento, 2,5 a 5 mg de morfina a cada 4 horas.
Devendo-se prescrever doses resgate se necessário.
Benzodiazepínicos
O uso de Midazolam na dose inicial de 5 a 10 mg nas
24 horas pode ser benéfico para os pacientes com
componente emocional importante.
Oxigênio
Existem poucas evidências do benefício do uso de oxi-
gênio na fase final da vida.
A melhora da sintomatologia ocorre pelo estímulo do
fluxo aéreo em receptores na região da face. Esse estí-
mulo pode também ocorrer pelo fluxo de ar gerado por
ventiladores ou vento oriundo de uma janela.
Ventilação não invasiva
Não é estabelecida sua eficácia para o controle sinto-
mático da dispneia. Indicada somente nos casos de
dispneia como processo reversível, como por exem-
plo, em edema pulmonar, num quadro infeccioso ou
em intoxicação por drogas.
Nos casos de VNI paliativa é inadequado que seja
setada frequência mínima no aparelho, a monitora-
ção de oximetria não é necessária, devendo sim ser
avaliado o conforto do paciente. Deve-se também
48
permitir intervalos para alimentação, ingesta hídrica, e
comunicação, conforme o desejo do paciente.
Se for indicada a VNI paliativa e houver sensação de
sufocamento do paciente está indicada a prescrição
concomitante de ansiolítico em dose baixa.

Delirium

Em pacientes na fase terminal, o delirium é um predi-


tor confiável da morte em dias a semanas.
Importante a Prevenção
→ Controle adequado dos sintomas
→ Ambiente adequado - Sono noturno
→ Luz natural
→ Presença de familiares
→ Retirada de contenção física

Indicada avaliação sistemática do delirium


(Escala de CAM)
Característica 1: Início agudo com estado mental
flutuante +
Característica 2: Falta de Atenção +
Característica 3: Pensamento desorganizado ou
49
Característica 4: Nível de Consciência alterado
Tratamento
Haloperidol 0.5 a 2.5 mg cada 2-12 horas
Clorpromazina 12.5 a 50 mg cada 6 horas (maior
sedação)
Novas Estratégias para evitar/tratar sintomas:
Metadona: 10mg 4x/dia
Clonidina : 100µg 4x/dia

Ansiedade

Sintoma definido como humor desconfortável com


sentimentos de medo e apreensão. Pode estar pre-
sente no final da vida, quando é recomendada a pres-
crição de:
1. Midazolam (SC/Oral ou IV) - 0,5 - 0.1 mg/kg (efeito
dura até 6 h);
2. Clonazepam (Oral) – iniciar 0.25 a 0.5mg até 1 mg,
preferencial noite (efeito + prolongado até 12 h adulto).

Hipersecreção (ronco da morte)

Sintoma muito angustiante, principalmente para os fa-


miliares e cuidadores.
50
Pode ser controlado com: Hioscina 10 mg (Ex: busco-
pan 30 gotas VO ou 1 ampola SC cada 4 ou 6 h) ou
atropina colírio 1% 1-2 gotas na cavidade oral a cada
6 a 8 horas

Soluços

Avaliar a causa e indicar o tratamento apropriado. Fár-


macos utilizados:
→ Metroclorpramida 10-20mg VO ou SC 3 a 4
vezes ao dia
→ Haloperidol 1 a 2.5 mg 1 vez ao dia
→ Baclofeno 5 a 10 mg cada 8-12 horas
→ Gabapentina 300 mg até 3 vezes ao dia

Tosse

Avaliar estado de hidratação, umidificação do ar, e


rever as medicações repscritas.
Fármacos utilizados:
→ Broncodilatadores se broncoespasmo
→ Codeína 10-20mg até de 4-4h
→ Anestésicos locais – xilocaína 2% 5 ml/ 6/6h

51
Sedação Paliativa

Sofrimento extremo é urgência


médica e humanitária.

A Sedação paliativa não é medida de primeira esco-


lha no controle de sintomas, está indicada apenas em
sintomas refratários, quando todas as demais alterna-
tivas de tratamento são exauridas.
A administração proporcionada de sedativos não obri-
gatoriamente encurta a vida.
As situações mais comuns que levam a necessidade
desta prática são: dor incontrolável, dispneia refratária,
delirium agitado.

Recomendações de boa prática:


→ Documentação sistemática do processo de
decisão, incluindo tentativas prévias de controle do
sintoma e pareceres de especialistas;
→ Comunicação adequada com equipe, pa-
ciente e família sobre: razões, consentimento, efei-
tos adversos;
→ Familiarização do médico com as drogas uti-
lizadas e titulação cautelosa das mesmas;
52
→ Monitoração dos efeitos dos fármacos
→ Lembrar que a associação com opióides qua-
se sempre é necessária pois a dor é presente no final da
vida e os sedativos não tem poder analgésico.
Drogas de escolha:
→ Benzodiazepínicos: Midazolam – (dose bolus
0,02 – 1mg/kg, seguida por infusão contínua 1 -5mg/h)
→ Fármacos alternativos e raramente indicados:
Propofol (sedação temporária) e Barbitúricos (convul-
sões refratárias ou tolerância aos demais sedativos).

Vias de administração

No final da vida geralmente o paciente tem incapa-


cidade de ingesta oral ou uso do trato digestório (vômi-
tos, diarreias, obstrução intestinal, confusão mental) ou
impossibilidade de acesso venoso. Dessa forma a via
sub- cutânea (Hipodermóclise) passa a ser a preferencial
para a administração de fluidos ou medicações, que têm
sua absorção por meio do mecanismo da difusão capilar.
Pacientes que apresentam edema e hematomas podem
ter sua terapia prejudicada.
A farmacocinética dos medicamentos é seme-
lhante a da administração pela via intramuscular, com
um tempo de ação mais prolongado.
53
Os locais preferenciais para os sítios de punção são
as regiões deltoide, anterior do tórax, escapular, abdomi-
nal, e faces anterior e lateral das coxas. A punção pode
ser realizada com cateter agulhado (escalpe) ou não
(abocath), sendo indicado o calibre de 18 a 25G. O tem-
po de permanência do cateter pode ser de até 7 dias.
Se indicado pode ser feita hidratação com soro fisio-
lógico (SF) ou soro glico-fisiológico, em bomba de infu-
são, numa quantidade de até 1000ml em 6 horas. Se
for necessário, alguns antibióticos (ceftriaxona, cefepime,
amicacina, ampicilina) podem ser administrados.
Na tabela abaixo são descritos os principais medi-
camentos administrados no final da vida.

Medicamento Diluente 1ml de me- Detalhes


dicação para 1ml de
solução
Morfina SF 0.9%
Tramadol SF 0.9%
Midazolam SF 0.9% Diluir em SF
Hioscina SF 0.9%
Dexametazona SG 5% Incompatível com
maioria das drogas
Haloperidol H2O Precipita com SF
Furosemida SF 0.9%
Metroclorpramida H2O Diluir por ser irritante

(http://www.ebserh.gov.br/documents/147715/393018/hipodermoclise_artigo.pdf).

54
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