A verdade pode ser estabelecida com base em uma única perspectiva?
Em ''1984'', distopia de autoria do romancista George Orwell, o protagonista,
Winston Smith, funcionário do contraditório Ministério da Verdade, altera e falsifica registros históricos com a finalidade de moldar o passado à luz do presente tirânico. Assim, a obra propõe a reflexão, aos leitores, de como a verdade pode ser manipulada a fim de obter certos efeitos. A verdade, porém, como ressaltado por Aristóteles, filósofo grego, deve ser obtida por meio da Dialética, isto é, da construção de uma tese e uma antítese, que geram uma síntese: a verdade. Nesse sentido, o debate, o confronto e o diálogo devem permear o discurso para que se atinja, ao menos, um consenso sobre certos assuntos. É relevante enfatizar, a princípio, que a verdade, por ser imprescindível à democracia - já que é com base nela que são tomadas as decisões -, deve ser sempre buscada. Nesse sentido, o método científico, nascido da Dialética, consistido na observação, elaboração do problema, formulação de hipóteses, experimentação e seguido da conclusão, nesta ordem, é o mais seguro método para que a verdade seja preservada. Ao contrário disso, durante grande parte da História, a verdade foi um instrumento da oligarquia. Evidenciou-se isso, por exemplo, durante a Era Vargas, período em que o DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda – era utilizado para moldar o comportamento público a favor do ditador Getúlio Vargas. Ora, se, à época, apenas uma perspectiva – a do governo – era apresentada ao indivíduo; este, por sua vez, acuava-se, sem conseguir debater e nem construir seu pensamento acerca do governante. Deve-se ressaltar, também, que, aliada à verdade, está a democracia. Para Jürgen Habermas, filósofo alemão, a legitimidade democrática é atingida, apenas, por meio da ampla discussão pública, configurando, assim, um processo coletivo de ponderação e análise, permeado pelo discurso, que antecede a decisão. A certeza da verdade, portanto, está intrinsecamente ligada à democracia deliberativa. Em contrapartida a isso, o Estado, buscando atender aos anseios de grupos privilegiados que os mantêm no poder – como poderosas empresas multinacionais – se omite em relação à população, indo de encontro aos anseios desta, ignorando-a e adotando uma postura estóica diante da manipulação pregada. Em outros termos, é comum, mas não correto, que, no caso do uso de agrotóxicos, os deputados, elegidos com a ajuda de empresas poderosas do agronegócio, acelerem a liberação destes, muitos, porém, sem a segurança necessária à população, como demonstrou, a título de exemplo, uma pesquisa do jornal Estadão, em que diz que os defensivos agrícolas ‘’glifosatos”, banidos na União Europeia, porém legalizados no Brasil, estão associados no aumento de câncer de estômago. Em suma, a falta de reflexão, diálogo e conflito, bem como o passado manipulador dos países, são os principais entraves à busca pela verdade, ou seja, o consenso entre as partes. Somente com a instauração da democracia deliberativa, defendida por Habermas, e a busca da Dialética aristotélica, a sociedade não ficará à mercê de oportunistas que, na tentativa de obter certos efeitos, manipulam o corpo social, como ocorrera no romance de Orwell e na realidade, em Vargas.