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Teologia

Sistemática:

Soteriologia

Pr. Kenneth Eagleton

(A apostila segue a exposição feita pelo livro Introdução à Teologia Sistemática


de Millard Erickson, Edições Vida Nova, com algumas modificações).

Escola Teológica Batista Livre


(ETBL)
Campinas, SP

2012
1

A SALVAÇÃO (Soteriologia)

Concepções de salvação
“Salvação é a aplicação da obra de Cristo na vida do indivíduo. Portanto, é de interesse e
importância especiais”1. Existem “concepções bem distintas do que se entende por
salvação. Antes de examinar as mais proeminentes, seria útil fazer um breve estudo dos
vários detalhes em que elas diferem”2.

Areas em que divergem as concepções de salvação:


 A salvação e a dimensão do tempo
o Uma ocorrência única no início da vida cristã (passado): a salvação completa
ocorreria no momento em que o indivíduo crê e se arrepende dos seus
pecados. “Fomos salvos.”
o Um processo contínuo ao longo de toda vida cristã: a salvação seria um
processo que começou no momento da conversão e se estende até a morte
do indivíduo. “Estamos sendo salvos”.
o Um evento futuro: a salvação não está assegurada e só ocorreria no
momento da morte do indivíduo. “Seremos salvos”.
o Uma combinação dos 3 anteriores: fomos salvos da escravidão do pecado
(justificação), estamos sendo salvos do poder do pecado dia a dia
(santificação) e esperamos pela salvação completa e definitiva na vida após a
morte (glorificação). Esta última alternativa nos parece ser a mais bíblica.

 A natureza da salvação e o lugar da sua necessidade


o 1ª concepção: “A nossa deficiência básica é de natureza vertical. O problema
básico do homem é a separação de Deus. A necessidade é de restaurar o
relacionamento rompido entre Deus e a criatura. Essa é a concepção
evangélica da salvação”3.
o 2ª concepção: “O problema básico do homem é horizontal. Existe falta de
harmonia entre indivíduos e na sociedade como um todo. [...] A salvação
implica na remoção de rupturas dentro da raça humana, a cura de
relacionamentos pessoais e sociais. A ‘teologia relacional’ ocupa-se desse
processo no nível dos desajustamentos individuais e dos problemas que
surgem em grupos pequenos. As teologias de libertação interessam-se pelos
conflitos entre classes raciais ou econômicas diferentes”4. Os que defendem
esta concepção vêem a salvação como reestabelecendo a harmonia entre as
pessoas.
o 3ª concepção: “O problema básico do homem é interno. O indivíduo está
contaminado por sentimentos que precisam ser erradicados – culpa,
inferioridade, insegurança” 5. A abordagem é mais de uma salvação
psicológica, de auto-aceitação ou de desenvolvimento da auto-estima.

1
ERICKSON, p. 369.
2
ERICKSON, p. 369.
3
ERICKSON, p. 370.
4
ERICKSON, p. 370.
5
ERICKSON, p. 370-371.

Teologia Sistemática 3 Prof.: Pr. Kenneth Eagleton


2

 O meio de salvação
o 1ª concepção: “A transmissão da salvação como um processo praticamente
físico”6 ou por atos visíveis praticados. Isto ocorre em alguns sistemas
sacramentais onde a graça da salvação é transmitida pelo batismo ou quando
o pão da comunhão é ingerido por uma pessoa que tem uma atitude
apropriada, como por exemplo, no catolicismo.
o 2ª concepção: “A salvação é transmitida por um ato moral. [...] É algo criado
pela alteração no estado das coisas”7. Moraliza-se um ambiente pela justiça
social e econômica, trazendo salvação às pessoas beneficiadas. Esta
concepção se encontra no movimento do evangelho social e nas teologias de
libertação.
o 3ª concepção: “A salvação é mediada pela fé. A fé toma posse da obra
realizada por Cristo”8. Esta é a concepção evangélica.

 A direção do movimento na salvação


“Será que Deus atua salvando indivíduos, efetuando uma transformação pessoal que
se volta para a sociedade e modifica o mundo do qual os redimidos fazem parte? Ou
será que Deus atua alterando as estruturas de nossa sociedade e, depois, usa essas
estruturas alteradas para mudar as pessoas que a compõem?”9
o 1ª concepção: “O problema básico do homem não está na natureza humana
pervertida, mas num ambiente social doente que nos infecta. Assim, em vez
de tentar curar os indivíduos, precisamos alterar as condições que os levam à
enfermidade”10. É a posição do evangelho social e das teologias de libertação.
o 2ª concepção: “A natureza humana é radicalmente corrupta. Os males da
sociedade resultam do fato de ser ela composta por indivíduos maus. Só
quando houver uma conversão e transformação desses indivíduos é que
haverá alguma esperança real de mudança na sociedade”11. Esta é a
concepção evangélica.

Na concepção evangélica, o problema básico do homem é nossa separação de Deus, a


Palavra de Deus é o meio pelo qual ele nos apresenta a salvação encontrada em Cristo
e a fé é o meio pelo qual aceitamos a salvação.

 A extensão da salvação – uma questão para os que entendem que a salvação se


aplica aos indivíduos e não a sociedade.
o Posição particularista: “a salvação é algo que se baseia em respostas
individuais à graça de Deus”12. Nem todos responderão afirmativamente a
Deus: alguns se perderão e outros serão salvos. Esta é a posição evangélica.
o Posição universalista: “Deus restaurará todos os homens ao relacionamento
com ele, segundo se pretendia desde o início. Ninguém se perderá”13.

6
ERICKSON, p. 371.
7
ERICKSON, p. 371.
8
ERICKSON, p. 371.
9
ERICKSON, p. 371.
10
ERICKSON, p. 371-372.
11
ERICKSON, p. 372.
12
ERICKSON, p. 372.
13
ERICKSON, p. 372.

Teologia Sistemática 3 Prof.: Pr. Kenneth Eagleton


3

Concepções correntes de salvação:


 Teologias de libertação: Existem várias correntes diferentes da teologia da
libertação (negra, feminista, Terceiro Mundo – esta, mais ativa na América Latina,
etc.). “O problema básico da sociedade é a opressão e a exploração das classes
fracas pelas poderosas. A salvação consiste em livramento (ou libertação) de tal
opressão. O método de libertação deve ser adequado à natureza da situação
específica”14, podendo, inclusive, passar pela violência e luta armada. Acreditam que
“a abordagem capitalista e desenvolvimentista”15 é inerentemente errada e incapaz.
Usam muito as idéias marxistas de economia e sociedade. A teologia da libertação é
também tendenciosa quanto ao enfoque da Bíblia. Vêem-na como fazendo opção
pelos pobres e pelos fracos e que foi escrita desta perspectiva. Preocupam-se muito
mais com o estabelecimento do Reino de Deus na terra na era presente. “A vida
eterna é em geral colocada no contexto de uma nova ordem social e se considera
que consiste em ser participante em sua culminação. A salvação de todas as pessoas,
tirando-as das forças opressoras, é o alvo da obra de Deus na história e deve,
portanto, ser a tarefa dos que crêem nele, ...por todos os meios possíveis, incluindo-
se o esforço político e até uma revolução, caso necessário”16.

 Teologia existencialista: baseada na filosofia existencialista de Martin Heidegger e


desenvolvida pelo teólogo Rudolf Bultmann. A filosofia existencialista diz que existe
uma existência inautêntica e uma autêntica. Exemplos de inautenticidade: “fracasso
no exercício da capacidade de fazer escolhas e agir livremente, fazer algo só porque
todos os outros fazem”17 e recusa de aceitar responsabilidade pelos seus atos.
Autenticidade seria passar a fazer boas escolhas, agir sem se conformar com a
sociedade e assumir responsabilidade por seus atos. Bultmann aplica esta filosofia à
religião. Em vez de sermos egoístas, seguindo a tendência de realizar nossos desejos
de felicidade, segurança, utilidade e lucro (sermos inautênticos), seguiríamos o
chamado de Deus ao nosso verdadeiro ego, interpretado como obedecer a Deus
abandonando o nosso egoísmo e toda segurança. Esta seria a verdadeira vida
autêntica (a salvação). Seria essencialmente uma mudança de nossa perspectiva e
conduta de vida.

 Teologia secular: “A teologia secular rejeita a idéia tradicional de que a salvação


consiste em ser retirado do mundo e receber uma graça sobrenatural de Deus.
Antes, a salvação não é obtida tanto por meio da religião, mas pelo afastamento
dela. Ter consciência da própria capacidade e utilizá-la, tornar-se independente de
Deus, emancipar-se, afirmar-se e se envolver com o mundo – esse é o verdadeiro
significado da salvação”18.

 Teologia católica romana contemporânea: “A posição católica oficial há muito é de


que a igreja é o único canal da graça de Deus. Essa graça é transmitida por meio dos
sacramentos da igreja. Os que estão fora da igreja oficial ou organizada não podem
recebê-la. A igreja considera-se detentora exclusiva do privilégio de distribuir a graça

14
ERICKSON, p. 373.
15
ERICKSON, p. 373.
16
ERICKSON, p. 373.
17
ERICKSON, p. 374.
18
ERICKSON, p. 375.

Teologia Sistemática 3 Prof.: Pr. Kenneth Eagleton


4

divina”19. O Concílio Vaticano II modificou um pouco este conceito afirmando que o


povo de Deus não está limitado à igreja hierárquica. “O povo de Deus estaria dividido
em três categorias, de acordo com seu grau de envolvimento com a igreja”20:
o Católicos “incorporados” à igreja;
o Cristãos não-católicos “ligados” à igreja, embora a situação deles não seja tão
segura.
o Não-cristãos “relacionados” com a igreja, ou “cristãos anônimos”.

 Teologia evangélica: “Os evangélicos entendem que as Escrituras indicam que há


dois aspectos principais no problema do pecado humano: o pecado é um
relacionamento quebrado com Deus” (a transgressão da Lei resulta em culpa) e “a
própria natureza da pessoa é maculada em razão do afastamento da lei. Agora,
existe uma inclinação para o mal, uma propensão para o pecado. Em geral,
denominada corrupção, muitas vezes ela também se apresenta em forma de
desorientação e conflitos internos” 21 e distúrbios em nosso relacionamento com
outras pessoas.

A salvação tem dois aspectos principais:


1. Mudança da posição do indivíduo perante A salvação tanto restabelece
Deus: nosso relacionamento com
o Situação legal: mudança de culpado para Deus como transforma a
não culpado: justificação. natureza radicalmente
o Restabelecimento de um relacionamento corrupta de nosso coração.
íntimo com Deus através da adoção.

2. Mudanças nas condições do coração do indivíduo:


o “Mudança básica na direção da vida da pessoa de uma inclinação para o
pecado para um desejo positivo de viver em retidão”22: regeneração ou novo
nascimento.
o Mudança progressiva no caráter da pessoa e na sua condição espiritual: a
santificação.
o A santificação... chega à sua plenitude na vida após a morte, quando a
natureza espiritual do crente será aperfeiçoada” 23: a glorificação.

“A Palavra de Deus desempenha um papel indispensável em toda a questão da


salvação” (1 Pe 1:23, 25). “A Palavra de Deus, quer lida quer pregada, é o meio pelo
qual Deus nos apresenta a salvação encontrada em Cristo; a fé é nosso meio de
aceitar essa salvação”24 – Ef 2:8-9. A visão evangélica é particularista, isto é, alguns
serão salvos e outros se perderão.

19
ERICKSON, p. 376.
20
ERICKSON, p. 376.
21
ERICKSON, p. 377-378.
22
ERICKSON, p. 378.
23
ERICKSON, p. 378.
24
ERICKSON, p. 379.

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5

Predestinação
Predestinação no Novo Testamento significa que alguma coisa A predestinação é
determinada vai acontecer. Quando usado em relação à salvação quanto às
(Rm 8:29-30; Ef 1:5, 11), observamos que Deus nos predestinou conseqüências das
para sermos conforme a imagem do seu Filho (Rm 8:29), nos escolhas de seres
predestinou para a adoção por Ele (Ef 1:5) e nos predestinou para morais que exercem
sermos sua herança (Ef 1:11). O evangelho nos diz que Deus o livre arbítrio
predestinou à salvação todos os que crêem em Jesus Cristo e ele relativo ao convite
predestinou todos os que não crêem nele a serem condenados à universal de Deus à
morte eterna (Jo3:16, 18, 36; 5:24; 14:6; At 4:12; 16:31; Rm 6:23; salvação.
Ap 21:8, etc.).

A predestinação é quanto às conseqüências das escolhas de seres morais que exercem o


livre arbítrio relativo ao convite universal de Deus à salvação. Deus não se compraz com a
morte do pecador (2 Pe 3:9). Ele deseja a salvação de todos (1 Tm 2:3-4; Ez 33:11; At 17:30-
31). Ele convida a todos (Is 55:1; Mt 11:28). Alguns aceitam, outros não. Deus conhece de
antemão aqueles que irão aceitar ou rejeitar, mas esta presciência não determina o
resultado da decisão do ser livre. O ser humano escolhe aceitar ou rejeitar o convite de
Deus, mas as conseqüências de sua escolha já estão determinadas: aceitar leva a salvação e
à vida eterna, rejeitar leva a condenação e à morte eterna. Este é o nosso entendimento
(como Batistas Livres) da predestinação bíblica.

Os calvinistas têm outro entendimento da predestinação. Eles dizem que Deus, na sua
soberania, escolheu salvar alguns e não outros. Antes de qualquer pessoa nascer, Deus já
tinha determinado quem seria salvo e quem não seria. Não há nada que uma pessoa possa
fazer para mudar este propósito de Deus. Quando Deus decide, ele chega com a sua graça
especial à pessoa e ela não pode resistir (graça irresistível). Existem duas abordagens dos
calvinistas quanto à predestinação. Um grupo crê que Deus não só escolheu os que ele irá
agraciar com a salvação (eleição), mas também escolheu os que irão se perder (reprovação)
– conhecido como predestinação dupla (escolheu uns para a salvação e outros para a
perdição). Outra abordagem calvinista é que Deus escolheu somente os que irão ser salvos,
passando ao largo dos que não foram escolhidos – estes se perderão por já serem
condenados pelo seu pecado.

Ação do Espírito Santo no antecedente da salvação


O ser humano na sua condição natural se encontra perdido, cego e incapaz de se salvar (Rm
3). Ele é incapaz de reconhecer a sua real condição por estar acometido de cegueira
espiritual (Rm 1:18-23; 2 Co 4:3-4). O Espírito Santo, uma pessoa, age na vida dos seres
humanos que também são pessoas. É um relacionamento entre pessoas. O papel do Espírito
Santo é de exercer influência sobre a vida dos indivíduos, convencendo-os do pecado, do
juízo e da justiça (Jo 16:8). Esta influência do Espírito Santo capacita o individuo a tomar
uma decisão de exercer uma fé salvadora e aceitar ou rejeitar a oferta de salvação. A
escolha é livre e resistível. As conseqüências da decisão final da pessoa já estão
determinadas (predestinação). Deus nos convida, nos chama e nos atrai para junto de si (Jo
6:44) através do seu Espírito Santo e da sua Palavra.

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6

Salvação: conversão e regeneração


“A conversão e a regeneração são aspectos subjetivos do início da vida cristã; são mudanças
em nossa natureza interna, nossa condição espiritual. A conversão é a mudança conforme
vista da perspectiva humana; a regeneração é essa mudança conforme vista da perspectiva
de Deus”25.

A condição da salvação
Qual é a condição para a salvação? A condição é a fé (Jo 1:12; 3:16, 18, 36; At 16:31; Rm
3:22, 28; 4:1-25; 5:1; Gl 2:16; 3:1-18; Ef 2:8-9; 1 Jo 5:13). Mas e o arrependimento? Várias
vezes vemos no Novo Testamento a condição do arrependimento para a salvação sem a
menção da fé (Lc 24:47; At 2:38; 3:19; 5:31; 11:18; 17:30; 26:20; 2 Tm 2:25; Hb 6:6; 2 Pe
3:9). São duas condições ou uma?

Arrependimento significa remorso (ou profunda tristeza) pelo pecado e uma mudança no
pensamento, no coração e na vontade. É um retorno; trocar um ponto de vista por outro.
Arrependimento “é o abandono ou o repúdio do pecado” 26. Inclui também uma mudança de
atitude e de comportamento junto com a mudança de ponto de vista. Sempre que há uma
mudança, ela se dá de alguma coisa para alguma coisa. O arrependimento para salvação
pode se dar de descrença, idolatria, egoísmo e tantos outros pontos de vista para a fé em
Cristo.
Fé e arrependimento
Fé e arrependimento andam de mãos dadas como uma só
condição para a salvação. São duas faces da mesma moeda. andam de mãos dadas
Enquanto que arrependimento enfatiza a mudança como uma só condição
necessária, a fé enfatiza o ponto de chegada. para a salvação.

Fé é mais do que crer intelectualmente (acreditar). A fé salvadora também inclui entrega,


renuncia de si (Lc 9:23). É abandonar a crença em si mesmo ou em qualquer outro meio
para colocar a nossa confiança inteiramente em Jesus Cristo para a nossa salvação. A fé
inclui a aceitação da verdade da redenção em Cristo e confiança nele. A fé é um dom de
Deus no sentido de que sem a atuação de Deus através do seu Espírito, não haveria fé. Mas
a fé é a fé do homem, não de Deus. Ela é exercida pelo homem em resposta a convicção
trazida pelo Espírito Santo.

A conversão A conversão é o
“A vida cristã, por sua própria natureza e definição, representa ato de deixar o
algo bem diferente da vida que tínhamos anteriormente. Em pecado em
contraste com estar morto no pecado e nas transgressões, é uma
arrependimento
nova vida. [...] O primeiro passo da vida cristã é chamado
conversão. É o ato de deixar o pecado em arrependimento e e voltar-se para
voltar-se para Cristo em fé” 27 (Ez 18:30-32; At 3:19). A conversão Cristo em fé.
diz respeito à nossa resposta à salvação e à aproximação que Deus
oferece à humanidade”28.

25
ERICKSON, p. 391.
26
ERICKSON, p. 395.
27
ERICKSON, p. 393.
28
ERICKSON, p. 398.

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7

A conversão pode ocorrer de forma diferente de uma pessoa para a outra, dependendo das
circunstâncias, da personalidade e de muitos outros fatores. Em algumas pessoas a
conversão se dá repentinamente em um momento de crise. Para outras pessoas é um
processo sem um momento de crise. Gradativamente se convencem e deixam seu ponto de
vista e se voltam para Jesus em fé. Para algumas pessoas a conversão é um momento de
emoções profundas (culpa, alívio, alegria) com demonstração de choro, enquanto que para
outras pessoas a conversão é vivida com mais naturalidade e racionalidade, sem grandes
emoções. Nenhum é mais genuíno ou mais espiritual do que o outro.

“Só existe um grande ponto na vida em que o indivídio volta-se para Cristo em resposta à
sua oferta de salvação. Pode haver outros ponto em que os crentes precisem abandonar
determinada prática ou crença para não retornar à vida de pecado. Esses eventos, porém,
são secundários, reafirmações daquele grande passo já dado” 29.

A regeneração
A regeneração é o primeiro passo na santificação. Ela é
A regeneração é a
totalmente uma obra de Deus através do Espírito Santo. “É a
transformação que Deus opera nos indivíduos que crêem; seu transformação que
ato de conceder uma nova vitalidade e direção espiritual à vida o Espírito Santo
deles quando aceitam a Cristo. [...] O ser humano está opera nos indivíduos
espiritualmente morto e, portanto, precisa do novo nascimento que crêem,
ou do nascimento espiritual. Os incrédulos são incapazes de concedendo uma
perceber verdades espirituais e de fazer qualquer coisa que nova vitalidade e
possa alterar sua condição de cegueira e sua tendência natural
direção espiritual.
para o pecado (Rm 3:9-20) ”30.

A regeneração é uma transformação (Ez 11:19-20); é um novo nascimento (Tt 3:5; Jo 3:3-7).
1. “A regeneração implica em algo novo, uma reversão total das tendências naturais da
pessoa”31 (2 Co 5:17; Gl 5:24-25; Rm 6:1-11; Gl 2:20; 6:14). Há uma mortificação para
si mesmo (a carne) e uma vivificação para o Espírito de Deus.
2. “O novo nascimento implica uma neutralização dos efeitos do pecado. [...] É a
restauração da natureza humana ao que se desejava originalmente e ao que era de
fato antes de o pecado entrar na raça humana por ocasião da queda”32 (Ef 2:1-10).
3. O novo nascimento (regeneração) é instantâneo. A conversão pode ser um processo,
mas em algum momento culmina na regeneração.
4. “A regeneração é o início de um processo de crescimento que continua ao longo da
vida. Esse processo de maturação espiritual é a santificação”33 (Ef 2:10).
5. “O novo nascimento é uma ocorrência sobrenatural. Não é algo alcançado pelo
esforço humano”34. Ela é produzida pela atuação do Espírito Santo sobre a vida do
indivíduo. Desta forma, temos uma salvação planejada pelo Pai, cumprida por Jesus
Cristo e aplicada pelo Espírito Santo.

29
ERICKSON, p. 394-395.
30
ERICKSON, p. 398-399.
31
ERICKSON, p. 400.
32
ERICKSON, p. 400.
33
ERICKSON, p. 401.
34
ERICKSON, p. 401.

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8

Salvação: justificação, união com Cristo e adoção


União com Cristo, justificação e adoção são aspectos objetivos do início da vida cristã;
referem-se primeiramente ao relacionamento entre o indivíduo e Deus. Aqui vamos tratar
das mudanças “no estado ou na condição da pessoa em relação a Deus”35.

União com Cristo


“Em um sentido, a união com Cristo é um termo abrangente para toda a salvação... É
instrutivo notar o grande número de referencias à unidade entre Cristo e o cristão. As
referencias mais básicas nesse sentido retratam o crente “em” Cristo e vice-versa. Por um
lado, temos muitas referencias específicas ao fato de o crente estar em Cristo”36 – 2 Co
5:17; Ef 1:3-4, 6-8; 2:10; 1 Co 1:4-5; 15:22; 1 Ts 4:16.

“O outro lado deste relacionamento é que se diz que Cristo está no crente”37: Cl 1:27; Gl
2:20; Jo 15:4-5. “Outras passagens que podemos mencionar incluem as promessas de Jesus
de estar presente com o que crê – Mt 28:20; Jo 14:23. Por fim, há toda uma lista de
experiências que... o crente compartilha “com Cristo”: sofrimento (Rm 8:17); crucificação (Gl
2:20); morte (Cl 2:2); sepultamento (Rm 6:4); revitalização (Ef 2:5); ressurreição (Cl 3:1);
glorificação e herança (Rm 8:17)”38.

Implicações da união com Cristo:


o A união tem natureza judicial. Quando estamos em Cristo, somos considerados
justos. Quando Deus olha para nós ele vê a justiça de Cristo (Rm 8:1).
o A união tem natureza espiritual. “Isto tem dois significados. Por um lado, a união é
efetuada pelo Espírito Santo. Existe uma ligação estreita entre Cristo e o Espírito”39
(Rm 8:9-10). “O Espírito Santo é o vínculo desta união”40. Por outro lado esta união é
uma união de espíritos.
o “Nossa união com Cristo é vital. Sua vida de fato flui para dentro de nós renovando
nossa natureza interior (Rm 12:2; 2 Co 4:16)”41 e produzindo força espiritual.
Vivemos agora no poder de Cristo – Fp 4:13; Gl 2:20; 2 Co 12:9.
o A união com Cristo significa também que vamos sofrer – Mc 10:39; Jo 15:20; Fp 3:8-
10.
o Iremos também reinar com Cristo – Lc 22:30; 2 Tm 2:12.

Justificação
“A humanidade tem um duplo problema conseqüente do pecado A justificação é o
e da queda. Por um lado, existe uma corrupção básica da ato de Deus
natureza humana; nosso caráter moral foi maculado pelo
declarar que, aos
pecado. Esse aspecto da maldição é anulado pela regeneração,
que reverte a direção e as tendências gerais da natureza seus olhos, os
humana. O outro problema, no entanto, permanece: nossa culpa pecadores são
ou passibilidade de punição por não termos cumprido as justos.

35
ERICKSON, p. 403.
36
ERICKSON, p. 404.
37
ERICKSON, p. 404.
38
ERICKSON, p. 404.
39
ERICKSON, p. 406.
40
ERICKSON, p. 406.
41
ERICKSON, p. 406.

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9

expectativas de Deus. É desse problema que trata a justificação. A justificação é o ato de


Deus declarar que, aos seus olhos, os pecadores são justos. É uma questão de sermos
perdoados e recebermos a declaração de que cumprimos tudo o que a lei exige de nós”42. A
justificação é uma restauração do indivíduo ao estado de justiça. É um termo jurídico.

“A justiça exige que os ímpios sejam condenados... No Novo Testamento, a justificação é o


ato declaratório de Deus, pelo qual, em razão da suficiência da morte expiatória de Cristo,
ele afirma que os crentes cumpriram todos os requisitos da lei que lhes diz respeito. A
justificação é um ato forense de imputação da justiça de Cristo ao crente”43. As Escrituras
são claras de que é pela união com Cristo que os benefícios da expiação de Cristo, pelo qual
somos justificados, são imputados a nós. Rm 6:11; 8:1, 33-34. Em Rm 6:3-11 Paulo está
usando a analogia do batismo nas águas para explicar o que aconteceu conosco quando
fomos batizados pelo Espírito em uma união com Cristo.

A justificação, portanto, é um ato de Deus (como juiz), baseado na obra de Jesus Cristo e na
nossa fé que nos une a Cristo. Por causa do perdão que recebemos dos nossos pecados, não
existe mais nenhum débito para com Deus. A justificação é uma questão do nosso
posicionamento diante de Deus. Por um lado ela tira a nossa condenação e por outro lado
ela nos restaura ao favor de Deus; isso é, nos reconcilia com Deus. A justificação resolve as
conseqüências eternas do pecado, mas não necessariamente as conseqüências temporais
do pecado. Pode ainda haver conseqüências físicas (enfermidades e morte) e judiciais
(pagamento judicial, como prisão, por atos cometidos) dos nossos pecados aqui neste
mundo.

Adoção
“Não apenas somos libertos da sujeição ao castigo, como Adoção é o ato de
também somos restaurados a uma posição de favor em
Deus Pai nos
relação a Deus. Essa transferência de um estado de alienação
e hostilidade para um estado de aceitação e favor é chamada tornarmos seus filhos
adoção”44: Jo 1:12; Ef 1:5; Gl 4:4-5; 1 Jo 3:1. A adoção “ocorre no momento da nossa
ao mesmo tempo que a conversão, regeneração, justificação conversão, com todos
e união com Cristo. É, além disso, a condição em que o cristão os privilégios e
passa a viver e a agir desse ponto em diante... Somente os responsabilidades.
que são justificados e regenerados são adotados, e vice-
versa”45.

A adoção é uma reconciliação com o Pai, “nos restaurando ao relacionamento que o homem
já teve com Deus mas perdeu” 46. Ela também nos traz liberdade, pois agora somos filhos e
não escravos. Esta liberdade não deve levar a libertinagem. Com o privilégio de sermos
filhos vem também uma responsabilidade e a disciplina de filhos quando não cumprimos
com esta responsabilidade: Hb 12:5-11. Na adoção temos também uma herança: Rm 8:16-
17.

42
ERICKSON, p. 408.
43
ERICKSON, p. 409.
44
ERICKSON, p. 413.
45
ERICKSON, p. 413.
46
ERICKSON, p. 413.

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10

A continuação e a complementação da salvação


Os conceitos que vimos até agora de conversão, regeneração, união com Cristo, justificação
e adoção são aspectos de um único acontecimento, o momento em que uma pessoa
entrega a sua vida a Cristo. São todos concomitantes e marcam o início da vida cristã. Mas
isso “não é o fim da obra especial de Deus para restaurar em seus filhos a sua imagem,
como era a intenção original. Tendo iniciado essa obra de transformação, ele continua e a
completa”47.

Santificação
“A santificação é a obra contínua de Deus na vida do crente, A santificação é a
tornando-o realmente santo. Por ‘santo’ entende-se aqui
obra contínua de
‘portador de uma verdadeira semelhança de Deus’. A
santificação é um processo pelo qual a condição moral da pessoa Deus na vida do
é moldada. É a continuação do que foi iniciado na regeneração, crente, tornando-o
quando uma novidade de vida foi conferida ao crente e sobre ele realmente santo,
instilada. Em particular, a santificação é o Espírito Santo isto é, semelhante
aplicando na vida do cristão a obra realizada por Jesus Cristo. A a Cristo.
palavra ‘santificação’ tem dois sentidos básicos”48:
1. “Um estado de ser separado, desligado do ordinário ou mundano e dedicado a um
propósito ou uso particular” 49; no caso, dedicado a Deus. No Antigo Testamento,
certos lugares (Templo, Santo dos Santos), objetos (vestes de Arão) e pessoas
(sacerdotes e levitas) eram especialmente separados ou santificados para o Senhor.
No Novo Testamento, o termo “santo(s)” é usado par designar os cristãos, apesar de
não serem perfeitos: 1 Pe 2:9.
2. “Uma qualidade moral ou valor espiritual”50 – é um processo que exige toda uma
vida para se completar (Fp 1:6). É um processo de reorientação dos nossos
pensamentos, valores, atitudes, desejos e objetivos para alinhá-los aos propósitos de
Deus para a nossa vida. A santificação, sendo progressiva, tem diferentes graus.

A santificação é uma obra sobrenatural de Deus, não algo que fazemos por nós mesmos: 1
Ts 5:23; Ef 5:26; Tt 2:14; Hb 13:20-21. “O alvo dessa atuação divina é a semelhança do
próprio Cristo”51: Rm 8:29. “A santificação é obra do Espírito Santo” 52 (Rm 8; Gl 5).

“Embora a santificação seja exclusivamente de Deus, ou seja, seu poder repousa


inteiramente em sua santidade, o crente é constantemente exortado a trabalhar e a crescer
nas questões que dizem respeito à salvação”53: Fp 2:13-14; Rm 12:1-2, 9, 16, 17; 8:13; 2 Pe
1:5-8.

47
ERICKSON, p. 417.
48
ERICKSON, p. 417-418.
49
ERICKSON, p. 418.
50
ERICKSON, p. 418.
51
ERICKSON, p. 419.
52
ERICKSON, p. 419.
53
ERICKSON, p. 419.

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11

A perseverança do crente A perseverança


A questão da perseverança do crente diz respeito à possibilidade
condicional do
do crente perder a sua salvação. Os calvinistas sustentam que
uma pessoa verdadeiramente convertida nunca perderá sua crente é baseada
salvação. Mas a Bíblia ensina a perseverança condicional. na fé. Se o crente
abandonar a sua fé
O Novo Testamento contém muitas advertências aos cristãos ele perde a sua
quanto ao perigo da apostasia (perder a salvação): salvação.
1. Jesus alertou seus discípulos contra o perigo de serem
desviados – Mt 24:3-14; Jo 15:6.
2. Paulo dá a entender que existe um caráter condicional à salvação (Cl 1:21-23a) e fala
de decair da graça (Gl 5:4).
3. O autor de Hebreus em várias passagens enfatiza este perigo – Hb 2:1-4; 3:7- 4:11;
6:1-12; 10:19-39; 12:12-17.
4. Pedro chama a atenção para os falsos mestres que levam os cristãos a se
apostatarem – 2 Pe 2:1-2.
5. O ensino direto da apostasia:
a. Hb 6:4-6 – nestes versos existem 5 frases coordenativas (nas primeiras 4
experimentaram 4 coisas positivas e depois na 5ª, caíram) exatamente iguais.
As 4 primeiras frases são expressões que descrevem um verdadeiro
convertido que em seguida cai e não pode mais ser restaurado.
b. 2 Pe 2:18-22 – versos 18 e 19 falam da tentativa de falsos mestres em desviar
os cristãos e depois os versos 20 e 21 falam claramente da apostasia que
promovem. Fala-se realmente de pessoas convertidas, pois “escaparam das
contaminações do mundo” e tiverem “conhecimento do Senhor e Salvador
Jesus Cristo” e do “caminho da justiça”. Mesmo assim alguns “se deixaram
enredar de novo [pelas contaminações do mundo] e são vencidos” e
voltaram “para trás, apartando-se do santo mandamento que lhes fora
dado”. O perigo é real, não só hipotético. O estado destas últimas pessoas é
pior do que antes da sua conversão, pois agora não existe mais perdão (Hb
6:6).
6. Casos específicos de apostasia – Judas (At 1:25), Himeneu e Alexandre (1 Tm 1:19-
20); Himeneu e Fileto (2 Tm 2:16-18); Demas (2 Tm 4:10), etc.

Considerações quanto à doutrina da perseverança condicional do crente:


1. A salvação é pela graça, mediante a fé e não de obras. A condição da salvação é a fé
(com arrependimento). A fé é necessária para entrar em um relacionamento com
Deus e ela também é necessária para continuar nesse relacionamento (“o justo
viverá pela fé”). A perseverança do cristão com relação a sua salvação final é
condicionada na fé. Entenda-se neste caso a fé salvadora, aquela que leva o pecador
arrependido a aceitar a oferta de salvação que Jesus nos oferece. Isso não significa
que o cristão não tenha dúvidas ou deixe de confiar plenamente em Deus em alguma
circunstância ou outra. Mas estas dúvidas ou incertezas não colocam em risco a
nossa aceitação do sacrifício de Jesus Cristo como sendo suficiente para a nossa
justificação e regeneração.

2. A salvação é condicional. Através da Bíblia vemos a condicionalidade da salvação. No


Antigo Testamento, as bençãos de Deus e a salvação do povo de Israel dependiam de

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sua submissão e obediência a Deus (Ex 19:5; Lv 26:3, 14, 15, 18, 21 e 23; 2 Cr 15:2,
etc.). No Novo Testamento também observamos que a oferta de salvação e
permanência com Deus (ou Cristo) é sempre condicional (Lc 14:33; Jo 8:51; Rm 8:13;
11:22; 1 Jo 2:24; 2 Jo 9).

3. Todo cristão pode ter certeza da sua salvação presente e futura. A certeza é baseada
na obra de Cristo no Calvário e na presença do Espírito Santo que vive no cristão e
não nas emoções humanas. Em 1 Jo 5:13, o apóstolo João diz que podemos ter
certeza da nossa salvação.

4. A comissão de um pecado pelo crente não é o que o tira a salvação, pois esse pode
ser perdoado. Aliás, Cristo já morreu pelos nossos pecados, tanto os passados
quanto os futuros. Perder a salvação (apostasia) é quando se chega ao ponto de
renunciar a fé salvadora em Jesus Cristo. É renunciar a sua oferta de salvação e
perdão dos nossos pecados. É desistir da morte de Jesus Cristo na cruz como sendo
suficiente para a nossa justificação e regeneração.

5. A apostasia é uma possibilidade séria e real. As Escrituras falam na possibilidade de


“naufragar na fé” (1 Tm 1:19), decair da graça (Gl 5:4) e se afastar do Deus vivo (Hb
3:12).

6. Uma vez cometido a apostasia, é impossível a restauração, pois é impossível se


converter mais de uma vez (Hb 6:6). Isso seria equivalente a crucificar novamente a
Cristo.

7. Caminhos para a apostasia:


a. Aceitar ensino falso (heresias) – Gl 1:9. A heresia pode confundir a mente da
pessoa, levando-a a crer ensinamentos contrários a Palavra de Deus e desistir
da sua fé original.
b. Não levar o pecado a sério. Quando o cristão permite que o pecado domine a
sua vida, fica fraco, desencorajado e é tentado a abandonar a sua fé (1 Tm
5:12; Hb 10:26).
c. Negligenciar o desenvolvimento espiritual. Na segunda carta de Pedro, ele
adverte o cristão a crescer na graça (1:5-11).

A doutrina da perseverança do crente, como exposta acima, é conhecida como a posição


arminiana. Nem todos os cristãos a entendem desta forma. A posição calvinista ensina que
uma vez que o crente se converte, ele sempre perseverará até a morte e não pode perder a
sua salvação (portanto, seria mais correto falar em preservação do crente). Cremos que a
posição arminiana é mais fiel ao ensino bíblico deste assunto.

Alguns argumentos usados pelos calvinistas para defender a impossibilidade da perda da


salvação:
1. A Bíblia promete a vida eterna aos crentes – Jo 10:27-29. A promessa de vida eterna
é para as suas ovelhas e estas são as pessoas que crêem nele. Jo 3:36 diz
essencialmente a mesma coisa, mas a promessa novamente é para os que crêem. É
bom compararmos Jo 5:24 “...quem ouve... e crê... tem a vida eterna” com Jo 3:36 “o
que se mantém rebelde contra o Filho (não crê) não verá a vida...”. A promessa de

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vida eterna é feita aos que crêem e condicionada a essa fé. Da mesma forma que
alguém que é “rebelde e não verá a vida” pode se arrepender e passar a ter vida
eterna, uma pessoa que possui a vida eterna pode se arrepender e perdê-la. Vida
eterna é muito mais do que tempo cronológico de vida; é principalmente qualidade
de vida – vida com o Eterno.

2. A fidelidade de Deus levará até o fim o que ele começou no crente – Fp 1:6; 2 Ts 3:3;
2 Tm 1:12; 4:18. Mais uma vez, esta promessa é condicional e feita aos que crêem.
Comparar com Hb 10:31.

3. O cristão não pode ser separado do amor de Deus – Rm 8:31-39. Este trecho só nos
confirma que nenhuma força externa pode nos separar de Deus. A apostasia é uma
negação interna da nossa fé, não uma força externa.

4. A Bíblia afirma que Deus é quem nos guarda – 1 Pe 1:5. O próprio versículo nos diz
que somos guardados por Deus para a salvação mediante a fé.

5. Quem nasceu de novo espiritualmente não pode “des-nascer”. É verdade; mas pode
morrer espiritualmente. Quem antes era morto espiritualmente pode nascer; e
quem está vivo espiritualmente pode morrer.

A glorificação
“O estágio final do processo de salvação é denominado Glorificação é o estágio
glorificação [Rm 8:29-30]... A glorificação é o ponto em que final do processo de
a doutrina da salvação e a doutrina das últimas coisas se salvação em que somos
entrelaçam, pois olha para além desta vida, para o mundo restaurados espiritual,
vindouro”54. moral e fisicamente ao
estado original que foi
“A glorificação tem muitas dimensões”, abrangindo o
aperfeiçoamento: 1) “da natureza espiritual do crente como planejado para a
indivíduo, que ocorre na morte física, quando o cristão humanidade na criação.
passa para a presença do Senhor”; 2) “do corpo de todos os
crentes, que ocorrerá no memento da ressurreição, juntamente com a segunda vinda de
Cristo” e 3) “toda a criação (Rm 8:18-25)”55.

A palavra “glória” no grego do Novo Testamento tem o sentido de “brilho, esplendor,


grandiosidade e fama... É especialmente na ressurreição de cristo que vemos usa glória (At
3:13-14; 1 Pe 1:21; Mt 24:30)”56. Jesus Cristo também será glorificado na sua segunda vinda,
como também todos os verdadeiros cristãos.

A glorificação do crente inclui os seguintes aspectos:


1. A justificação plena e final do crente (Rm 5:9-10).

54
ERICKSON, p. 430.
55
ERICKSON, p. 430.
56
ERICKSON, p. 431.

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2. Um aperfeiçoamento moral e espiritual do indivíduo (Cl 1:22; Ef 1:4; Fp 1:9-11; Jd


24).

3. Não haverá mais tentação e o mal será vencido de maneira conclusiva (Ap 20:7-10).

4. Haverá plenitude de conhecimento (1 Co 13:12; 1 Jo 3:2).

5. O corpo do cristão será glorificado no momento da sua ressurreição.

“Na segunda vinda de Cristo, todos os que tiverem morrido no Senhor serão [ressurretos] e
transformados instantaneamente junto com os crentes que estiverem vivos”57 (Fp 3:20-21;
1 Co 5:1-5; 15:38-50).
1. “O corpo atual é perecível, sujeito a doenças e à morte; o corpo ressurreto é
incorruptível, imune a doenças e à deterioração;

2. O corpo atual é semeado em desonra; o corpo ressurreto será glorioso;

3. O corpo atual é fraco; o corpo ressurreto é forte;

4. O corpo atual é físico; o corpo ressurreto será espiritual”58.

A entrada do pecado no mundo trouxe conseqüências para toda a criação (Gn 3:14-19). “No
presente, a criação está sujeita à futilidade (Rm 8:18-25)”59, mas ela será redimida (v. 21).
Encontramos esta descrição em Ap 21:1, 2, 5.

Teologia sistemática é uma tentativa de sistematizar o ensino bíblico de um assunto que não
aparece sistematizado nas páginas das Escrituras, mas se encontra espalhado em diversos
lugares. A tentativa de harmonização desses ensinos dispersos leva a formulação de
esquemas que sistematizam o ensino da doutrina de forma a mais coerente possível. Abaixo
temos um esquema de comparação das principais divergências entre o sistema calvinista e o
arminiano no que concerne a doutrina da salvação.

Calvinismo Arminianismo
Depravação do Depravação total: o homem não Depravação total: o homem pode responder a
homem pode responder a Deus. Deus Deus por causa da Sua graça e não da capacidade
faz tudo. do homem.
Eleição Eleição incondicional Eleição condicionada à fé
Propiciação (sacrifício Limitada, só para os eleitos Ilimitada, universal
de Cristo)
Possibilidade de Graça irresistível: aqueles que Graça resistível: a graça de Deus está ao alcance
resistir à graça de Deus elegeu não podem resistir de cada indivíduo e este tem a possibilidades de
Deus a sua graça. aceitar ou rejeitá-la.
Possibilidade de Impossível retroceder e perder a Perseverança do crente: a salvação passada,
apostasia (perda da salvação presente e futura depende da fé; é possível perder
salvação) a salvação com a renúncia da fé.

57
ERICKSON, p. 432.
58
ERICKSON, p. 432.
59
ERICKSON, p. 432.

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