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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA

CASTANHA MECÂNICA
http://castanhamecanica.wordpress.com/

D. EVERSON
MARCONE SANTOS
ANE MONTARROYOS
FRED CAJU

Os Teimosos
e a Poesia do Contra

Castanha Mecânica

Poesia, 2012
TODA E QUALQUER REPRODUÇÃO, PARCIAL OU INTEGRAL DA OBRA É AUTORIZADA PELOS AUTORES, DESDE QUE A
AUTORIA SEJA DEVIDAMENTE ATRIBUÍDA. QUE TODA POESIA SEJA LIVRE!

Capa: FRED CAJU


Ilustrações: JIMMY (MARCONE SANTOS)
Revisão: A NE MONTARROYOS
Projeto gráfico e diagramação: FRED CAJU

PÁGINAS DOS AUTORES NA INTERNET:

CENÁRIO INVISÍVEL: http://cenarioinvisivel.blogspot.com/


CRONISIAS: http://cronisias.blogspot.com/
LACUNAS DO TEMPO: http://lacunasdotempo.blogspot.com/
POETAS DE MARTE: http://poetasdemarte.blogspot.com/
SÁBADOS DE CAJU: http://fredcaju.blogspot.com/
SIMULACRO POÉTICO: http://simulacropoetico.blogspot.com/

Catalogação na fonte: danielevrson@yahoo.com.br


T264
Os teimosos e a poesia do contra / Daniel Everson ... [et al.]. —
Paulista: Castanha Mecânica, 2012.
68 p.: il.

1. Poesia Brasileira. 2. Literatura Brasileira. 3. Poesia


Pernambucana. I. Santos, Marcone. II. Montarroyos, Ane. III. Caju,
Fred. IV Título.

CDU 869.0(81)

ESTA COMPILAÇÃO FAZ PARTE DO CATÁLOGO:

Castanha Mecânica
Projeto que visa a livre distribuição e divulgação da poesia
através da organização dos poemas em forma de e-book. A
central de distribuição gratuita da Castanha Mecânica está
na página: http://castanhamecanica.wordpress.com/.
Agradeço a todos aqueles que me leram por toda a década que passou e um
pouquinho da outra. Deus esteja conosco! – D. EVERSON.

“A ordem sem liberdade é tirania. A liberdade sem ordem é anarquia”. Sou


grato pelas pessoas que conheci nesta coletânea, e por permitirem minha
participação neste e-book, e sou grato a poesia que não se limita, que não se
basta, e a todos que lerem o e-book um obrigado e se divirtam com
interpretação das poesias, “Tirem a humanidade da miséria, plantem homens
e livros!”, a todos paz e poesia! – MARCONE SANTOS.

Queridos leitores e amigos, agradeço pela leitura do e-book e desejo que a


mais bela flor ofertada nos poemas também esteja presente no meio do
caminho de cada um de vocês – ANE MONTARROYOS.

FRED CAJU prefere usar a sua cota na sessão de agradecimentos para


perguntar ao proponente à leitura: por que você lê poesia? Sagaz que és,
poderias me indagar: e você, por que escreve poesia? No final, não importaria
nenhuma das duas respostas, uma vez que está claro que os nossos motivos
são iguais...
OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
9

OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA

D. EVERSON: Cheguei e Não Importa ........................................... 13


O excomungado poeta ..................................................................... 15
The man without a mustache .......................................................... 15
Recife concretista............................................................................... 16
Carro de boi........................................................................................ 17
Racinha mal querida .......................................................................... 18
Vingança ao molho Crespo.............................................................. 18
Vida de cachorro ............................................................................... 19
A libélula e a lâmpada incandescente ............................................. 19
Dois ..................................................................................................... 20
Onirismo ............................................................................................. 20

VÓRTEX DA TEIMOSIA: Sessão I ..................................................... 21

MARCONE SANTOS: Labirinto Ocular ........................................... 27


Postes .................................................................................................. 29
Acabo de desfazer ............................................................................. 30
Portas e portões ................................................................................. 30
Razão viciada ...................................................................................... 31
A estante ............................................................................................. 32
O prego ............................................................................................... 33
Tele transporte transitório do transtorno obsessivo induzido
compulsivo permanente irreversível, ou Televisão ...................... 35

VÓRTEX DA TEIMOSIA: Sessão II ................................................... 37

ANE MONTARROYOS: No Meio do Caminho Tem uma Flor .... 43


Borboleta ............................................................................................ 45
Flor amarela........................................................................................ 45

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
10

Incêndio .............................................................................................. 46
Girassol ............................................................................................... 46
Inverno ................................................................................................ 46
Rosa dilacerada .................................................................................. 47
Sol escarlate ........................................................................................ 48
Sorrisos despedaçados ...................................................................... 48
Orvalho em flor ................................................................................. 49
Sonhos de menino ............................................................................. 49
Teus olhos .......................................................................................... 50

VÓRTEX DA TEIMOSIA: Sessão III .................................................. 53

FRED CAJU: Indesculpavelmente Sujo............................................ 59


Hippie’s new age: perfumados e limpinhos .................................. 61
Poder absoluto ................................................................................... 62
Hollywood, without you................................................................... 63
Olepartnoc a ....................................................................................... 63
A desenfreada hemorragia da existência ........................................ 64
Cadê o poema que escrevi? .............................................................. 65
Vivaovivo ............................................................................................ 66

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA

(2010)
CHEGUEI E NÃO IMPORTA

D. EVERSON
OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
15

O EXCOMUNGADO POETA

No mínimo, quando você afirma: POETA SIM!


A primeira coisa que eles militarmente dizem:
É gay ou sapatão! Que vem hermeticamente seguido
De: vagabundo, doido, etc., etc., etc. e tal.
Mas a mim, a nós, só resta dizer-lhes:
Atire a primeira pedra quem nunca
Foi um pouco poeta:
Na hora de observar as estrelas,
Na hora de dizer eu te amo,
Na hora de proferir eu te odeio,
Na hora do seio da mãe
E/ou
Do peito da morte,
Quem nunca foi poeta?!

06.06.2010

THE MAN WITHOUT A MUSTACHE

Acordou pela manhã, retirou o bigode,


Deveras não teve uma noite de sonhos
Inspirantes.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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Tomou seu café da manhã e caiu na rotina,


Como os pedreiros, marceneiros e garis:
Que tentam omitir a sujeira externa que produzimos.

Engolido pelas horas logo esteve outra vez em casa,


Numa casa que não era sua: porque as pessoas
Nas cidades grandes vivem aglomeradas em grandes
Caixas de concreto: se aparentado mais aos pombos,
Em caixas de tomates.

Sem nem ter tempo de mastigar algum jantar.


Cai outra vez na rotina do PC:
E redige feito louco um futuro que não é o seu.

Quando pega, enfim, a baixinha de quatro


Esquece até de rezar: porque não tem mais o que pedir:
A não ser para o relógio sanar.

Abril, 2010.

RECIFE CONCRETISTA

Cidade
Concreto
Ladrão
Tensão
Tesão
Inundação

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
17

Pega: Ladrão
Pega: Ladrão
Pega: Ladrão

CARRO DE BOI

Um ônibus no Recife é um carro de boi,


E cada boi dependendo do transporte
Tem preço: R$ 2,85 e/ou R$ 1,85.
Também tem boi integrado, que para no matadouro:
Estação Joana Bezerra.

Tem até boi que fala:


— Eu tenho vinte ano
To disimpregado, e to pidino
Que é mai bunito du que roba.
Sai de casa de sete da manhã e
To na rua até essa hora...
Minha gente aceito vale A & B,
25¢, 50¢... O que me deri ta bom,
Por que meus filhos num tem o que
Cumer em casa uma hora dessa...
— E desce na próxima parada já pronto
Para desferir o texto para a próxima boiada.

Tem boi que sobe armado e


Rouba os outros bois, esse é
O boi vilão, boy, que ganha a vida tirando
O couro dos outros.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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E por fim tem os bezerros:


Esses pagam metade mas
Sofrem inteira a viagem.
E o carro de boi prossegue:
Caxangá para cá,
Caxangá para lá.

14.05.2009

RACINHA MAL QUERIDA

— Eo tap!
— Top ae?!
— Po -e-ta?
— Ta peo?

VINGANÇA AO MOLHO CRESPO


(Ao amigo poeta B. Crespo)

A vingança é um prato
Que se oferece dormido.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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VIDA DE CACHORRO

Algumas pessoas me viram aspirar,


Inclusive a mais apessoada delas:
O meu cachorro Paio.
Ele sim derramava verdadeiramente
Uma lágrima, porque sabia que
Sua vida de cachorro tornar-se-ia
Mais rabugenta com a partida do seu
Melhor amigo: o homem.
Por causa do choro do vira-lata
Tornei-me coadjuvante da minha própria morte.
Ele já sofria mais, de uma solidão antecipada,
Do que eu, que confuso imaginava rostos ao redor
Do leito que já não eram mais que esqueletos.

09.06.2010

A LIBÉLULA E A LÂMPADA INCANDESCENTE

Ser teimoso é qualquer coisa de lâmpada,


Sem produzir luz ou sacudir as âncoras.
Ser teimoso é navegar na cruz da ânsia.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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DOIS

Depois da tempestade vem o beijo.


Depois de toda chuva o aconchego.
Depois de nós ficam as raízes:
E intactos permaneceremos alicerçados
No amor.

ONIRISMO

Sonhando que eu sonhava no colo da Carol


Descobri: a gente precisa de mais carinho e atenção,
Como já falava o poeta do Morro de São Carlos.
Precisamos dividir a mar nossa canção,
E não apenas repetir um LADO A
Há muito tempo na ponta da língua.
Mas do que ensaiar é preciso tocar a vida!
Mas lembrando: música é muito mais sinfônica
Quando tocada em grupo.

Bezerros, 22.07.2010

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VÓRTEX DA TEIMOSIA

SESSÃO I
LABIRINTO OCULAR

MARCONE SANTOS
OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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POSTES

O peso do tempo, da luz, o olho.


Já tive tantos olhos,
E tantos vaga-lumes,
Tantos cães e placas.
Já vi diversas pessoas,
Seus afazeres, seus descendentes.
Loucos, mendigos e bêbados,
(São os mais sensíveis!)
Casos de morte,
Transgressões.

Conheço bem essa rua,


Todos os modelos de automóveis
Que por aqui transitaram
Seus anos, suas evoluções, faróis,
Seus acidentes.

Quando retirado
O conhecimento é repassado
Através de
Milhões e milhões de quilômetros
De conexões, os fios
nos une numa só energia.

Na madrugada fazemos contato


Com a terra, quando não há movimento.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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Esse planeta usa nossos olhos


Como aterramento,
E lançam suas descargas
E fotografam a superfície.

ACABO DE DESFAZER

O que resolvi
Contrariei o contrário
Resumi o absurdo fiquei surdo
Não suportei
Arriei
Amei

PORTAS E PORTÕES

Do outro lado
Teimei
Abri o portão
Escorreguei das nuvens
Desci no horizonte
Quebrei todos os dentes
E os dedos
Parei lá em ‘caixa-prego’
Passei a fabricar portas
Agora todos querem uma saída.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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RAZÃO VICIADA

Olho nos olhos


E não vejo nada,
Apenas a parte introduzida
Que dentro da retina
A imagem refletida
É a minha, ilusória.
Sendo côncavo ou convexo
Considero-o alhures.
Tua menina Íris
Conserva-se calada
Arredia a superfície
E se exibe à dor alada.

E como fetiche
Íris sem o arco
Atravanca o desejo
Arranca-lhe a roupa
Corre nua
A imagem refletida
Escorre como água.

Porque moras no olho,


Porque não sais do olhar
É que se zangam
Os pensamentos
A locução.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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A ESTANTE

Tudo vazio
Só o silêncio
Mofa alegre.

Mas o vazio
Não é de livros,
É dos leitores.

O mofo alegre
Não é dos livros
Nem dos autores,

O mofo, intrinsecamente,
É da mente
Dos causadores,

Causadores da ausência
Diálogo intermitente
Da eterna falta.

A demência
Análoga a carência
Da semente.

Plante um livro
Para ver nascer
A árvore da ciência,

Ciência ignóbil
Da poesia
Que nunca extravia.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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O PREGO

Fui onde pudesse me sentir distante


Saí para me sentir livre
Adentrei no mato
No alto da serra,
O vento se esfregava na vegetação,
Como quando alguém
Passa a mão sobre a pele
De um bebê
E esse som produzido era vivo.

Subi mais alto...


Ainda queria-me sentir mais livre,
Mais alto, queria mais desse supremo.
Parecia que nunca havia respirado assim,
Enxergado assim,
Sentido isso que era assim!

Não se consegue pintar,


Não se consegue reproduzir esse som
Não se consegue transmitir essas coisas
Não se consegue entender essas coisas.

O movimento é segredo
Não se sabe identificar a natureza
Ela é todo segredo.
O vento e a luz são mães gêmeas
Educando e instruindo sua vasta cria
Nada comete erros
Tudo é paz...

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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A essa altura subi mais


Que o entendimento.
Já estava torpe
Como todo bom homem de um planeta
Com a humanidade degenerada,
Tentando violar o desconhecido...

Senti como se estivesse


Recebido uma violenta pancada sobre a cabeça.
Aqui todos se calam para ouvir
Tudo é evoluído.

Fiquei sentado
Depois de desistir ir adiante.
Norteado, passei a meditar
A minha distância
A minha liberdade
Baixei os olhos a minha frente,
Olhei pro lado, extasiado
Parei a meditação...

Vi um prego
Enferrujado,
Peguei-o,
Parei tudo pra pensar:
Por que danado um prego tava ali?

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
35

TELE TRANSPORTE TRANSITÓRIO DO


TRANSTORNO OBSESSIVO INDUZIDO
COMPULSIVO PERMANENTE IRREVERSÍVEL,
OU TELEVISÃO

Horário: vinte quatro horas por dia.


Programação:
Incitação
Violência
Incitação
Violência

Conceito formado
Conceito forçado
Conceito formado
Conceito forçado

Sensacionalismo
Objeto
Sensacionalismo
Objeto

Anomalia
Prazer
Anomalia
Prazer

Prosopopeia
Catalepsia
Prosopopeia
Catalepsia

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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Ausência
Conformismo
Ausência
Conformismo

Mentira
Adestramento
Mentira
Adestramento

Má formação
Mau exemplo
Má formação
Mau exemplo

Macaco
Ursinho Puff
Macaco
Ursinho Puff

Você
Comédia
Você
Comédia

Plin! Plin!

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VÓRTEX DA TEIMOSIA

SESSÃO II
NO MEIO DO CAMINHO TEM UMA FLOR

ANE MONTARROYOS
OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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BORBOLETA

A paz
é uma borboleta:
pousa
nas músicas
do dia;
nos girassóis
do jardim;
nos galhos
da árvore
seca;
voa ao redor
de mim.
Talvez,
repousará
algum dia
enfim.

FLOR AMARELA

Olha teu jardim, as respostas estão lá...


— disse-me uma flor de amarelada certeza.
Olhei. E meu olhar respirou o orvalho de perguntas no ar...
Embora eu olhasse com firmeza.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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INCÊNDIO

o fogo destruiu
a bela árvore de emoções
o verde mudou de cor
cinzas
mas a semente ali germinada
permanece
sobrevive escondida
nesta terra fértil
de sentimentos vastos
cujas chamas reacendem
a cada reencontro.

GIRASSOL

gira flor
nasce sol
reluz jardim.

INVERNO

Frio.
Neve.
Tristeza,
sem fim.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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Eis que
um caminho
florido
emerge
diante de
mim.

ROSA DILACERADA
(para Elisangela Montarroyos)

Tu és esta bela rosa


dilacerada.
Estou a regar tuas raízes
que também são
minhas,
pois não podes morrer
sozinha.
Contigo pereceria,
flor
de estonteante beleza
atormentada.
Te regarei dia após dia;
cuidarei de cada pétala com
amor.
Até você reflorescer
e sorrir comigo.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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SOL ESCARLATE

A muralha gélida
construída outrora em minh'alma
hoje, dissolve-se em flocos de neve
derretidos pelo sol escarlate de dezembro
inundando o jardim quase morto em mim
donde, agora, nascem lírios de alegria
girassóis de paixão
e violetas perfumadas
de suave saudade.

SORRISOS DESPEDAÇADOS

A alegria evaporou
por entre
sorrisos
despedaçados
Tristeza?...
Talvez,
sensação de
pétala no ar
ausente da rosa
e do espinho.
Talvez,
excesso de
poeira
no porta-retrato.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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Talvez,
pedaços de
fotografia
a redesenhar o chão
do quarto:
este pequeno
espaço
a abrigar
angústias e ausências.

ORVALHO EM FLOR

Como gotas d’orvalho em flor


as lágrimas deslizam em tua face-pétala
e revelam que, dentre as efemeridades da vida,
a felicidade morre a cada noite,
mas renasce a cada manhã.

SONHOS DE MENINO

Os sonhos
de menino
são fluidos
como
as ondas
do mar.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
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Ele,
homem
tardio e
perdido,
segue no azul
seu destino
como alguém
que caminha
entre
o oceano
e o céu
em busca
dos sonhos
de menino.

TEUS OLHOS

No botão das rosas


do meu jardim
e de todos os jardins
e nuvens
onde meus passos
vagam;
nas sombras das árvores
do bairro
e do campus
universitário;
nas janelas dos ônibus
e dos carros

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
51

dos estacionamentos
sem carros;
nas calçadas
de Recife
e Olinda;
na rua da Moeda e
Tomazina;
na avenida Guararapes
e na esquina
sem avenida
nem gente;
vejo teus olhos
no reflexo
de cada
pensamento
meu.

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VÓRTEX DA TEIMOSIA

SESSÃO III
INDESCULPAVELMENTE SUJO

FRED CAJU
OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
61

HIPPIE’S NEW AGE:


PERFUMADOS E LIMPINHOS

Eles dizem ser alternativos


com rastafári nos cabelos
e pulseiras nos tornozelos,

mas são só filhinhos de papai:


eles só compram tênis Nike,
mas preferem andar de bike.

Eles jamais comem carne,


pois querem salvar o planeta,
livrando o mundo dos caretas;

através de grupos de e-mails,


ficam todos bem informados,
espertos e politizados,

e ainda escutam um bom som,


mas não do rádio, pois aliena…
Quanto a mim, resta apenas pena.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
62

PODER ABSOLUTO

Eu fui o vício da tua vida,


do teu bolo, fui a cereja;
mas não vais me merecer:
você não tem amor próprio,
logo, sempre vai perder.

Você fez papel ridículo,


fiz você mudar de igreja;
demonizei o teu sagrado:
você não tem amor próprio,
por isso ficou ao meu lado.

Eu fui o tudo do seu todo


eu sou o que você deseja;
você não se valoriza,
você não tem amor próprio,
e só me causa ojeriza.

Fiz você andar de quatro,


só por mim você rasteja;
te fiz de gato e sapato:
você não tem amor próprio,
mereceu pagar o pato.

Eu fiz você me entregar


a sua vida na bandeja;
sem mim, ficarás de luto:
você não tem amor próprio,
e meu poder é absoluto.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
63

HOLLYWOOD, WITHOUT YOU

Olhe para você:


flagelo do flagelo.
Hollywood não te quer,
não és bom, não és belo,
nem nunca vais brilhar;
teu tudo não é nada,
tua cova te espera,
estrela condenada.

OLEPARTNOC A

Contra? Contra quem?


Os pelos, os rios,
os ventos, o chão,
os rastros, os fios?

Contra? Contra quem?


A ordem, a lei,
toda exploração,
os nobres, o rei?

Contra? Contra quem?


O deus, o sistema,
a voz do patrão,
os signos, o lema?

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
64

Contra? Contra quem?


Os mesmos, os outros,
a cor, a exclusão,
os “ismos”, os rótulos?

Contra? Contra quem?


A modernidade,
a luz, a razão,
o sim, a verdade?

Contra? Contra quem?


o som, a grafia,
a lâmina à mão,
a prosa, a poesia?

A DESENFREADA HEMORRAGIA
DA EXISTÊNCIA

Sangra, querida Sandra,


e provas que tens vida;
mancha-me de vermelho.
Sandra, sangra querida,
lava teu sofrimento
pelo útero também,
querida Sandra, sangra
ao filho que não vem.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
65

CADÊ O POEMA QUE ESCREVI?

Escrever não traz mulher,


tão pouco promiscuidade;
com carinho e com capricho,
escrevi mais um poema
para alguém jogar no lixo.

Jamais minta que me leu,


saberei se for verdade;
será melhor que me deixe:
escrevi mais um poema
pra ser embrulho de peixe.

Escrever não traz dinheiro,


tão pouco felicidade;
dessa vida vagabunda,
escrevi mais um poema
para alguém limpar a bunda.

Jamais prometa me ler


se não tiveres vontade;
e nesse queira-ou-não-queira,
escrevi mais um poema
pra ser coberto de poeira.

Escrever não traz prestígio,


tão pouco eternidade;
ó, traças do esquecimento,
escrevi mais um poema
para servir de alimento.

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OS TEIMOSOS E A POESIA DO CONTRA
66

VIVAOVIVO

Pluga-te! Joga-te na rede


e baixe tudo que veneras
em bits, megas, gigas ou teras,

mas fuja do vírus da vida:


ele corrompe solidão,
disco rígido e coração;

pode transformar o binário


em uma linguagem plural,
e lhe jogar no mundo real.

Se tiver a vontade louca


de desligar essa tomada,
a sua máquina foi infectada…

Prepare-se para sangrar


e será melhor estar pronto,
pois a vida vem ao seu encontro.

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CONTATOS

D. EVERSON MARCONE SANTOS

Foto: Walter Pezão

Foto: D.Everson

danielevrson@yahoo.com.br marconeeorock@yahoo.com.br

ANE MONTARROYOS FRED CAJU


Foto: Giula Tamborine

Foto: Camille van den Broek

ane.montarroyos@gmail.com caju.fred@gmail.com
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Castanha Mecânica, 2012.

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