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(Para)Textos– Português – 8.

º ano

Teste de Educação Literária

Nome ______________________________________ N.º _____ Turma _______

Avaliação _______________________________ Professor ___________________

Lê o seguinte texto e consulta as notas, se necessário.

A inaudita guerra da Avenida Gago Coutinho


Os automobilistas que nessa manhã de setembro entravam em Lisboa
pela Avenida Gago Coutinho, direitos ao Areeiro, começaram por apanhar um
grande susto, e, por instantes, foi, em toda aquela área, um estridente rumor de
motores desmultiplicados, travões aplicados a fundo, e uma sarabanda 1 de
5 buzinas ensurdecedora. Tudo isto de mistura com retinir2 de metais, relinchos
de cavalos e imprecações3 guturais4 em alta grita.
É que, nessa ocasião mesma, a tropa do almóada 5 lbn-el-Muftar,
composta de berberes, azenegues6 e árabes em número para cima de dez mil,
vinha sorrateira pelo valado, quase à beira do esteiro 7 de rio que ali então
10 desembocava, com o propósito de pôr cerco às muralhas de Lixbuna 8, um ano
atrás assediada e tomada por hordas9 de nazarenos10 odiosos.
Viu-se de repente o exército envolvido por milhares de carros de metal, de
cores faiscantes, no meio de um fragor11 estrondoso – que veio substituir o
suave pipilar dos pássaros e o doce zunido dos moscardos –, e flanqueado12
15 por paredes descomunais que por toda a parte se erguiam, cobertas de janelas
brilhantes. Assustaram-se os beduínos13, volteando assarapantados14 os
cavalos, no estreito espaço de manobra que lhes era deixado, e Ali-ben-
-Yussuf, lugar-tenente de Muftar, homem piedoso e temente a Deus, quis ali
mesmo apear-se para orar, depois de ter alçado as mãos ao céu e bradado
20 que Alá era grande.
[...] E el-Muftar, cofiando a barbicha afilada, e dando um jeito ao turbante,
considerava, com ar perspicaz, o pandemónio em volta: – Teriam tombado
todos no inferno corânico15? Teriam feito algum agravo16 a Alá? Seriam antes
vítimas de um passe da feitiçaria cristã? Ou tratar-se-ia de uma partida de
25 jinns17 encabriolados18?
Enquanto o árabe refletia, do alto do seu puro-sangue, o agente de
segunda classe da PSP Manuel Reis Tobias, em serviço à entrada da Avenida
Gago Coutinho, meio escondido por detrás das colunas de um prédio, no
propósito sábio e louvável de surpreender contraventores 19 aos semáforos,
30 entendeu que aquilo não estava certo e que havia que proceder.
Sentindo-se muito desacompanhado para tomar conta da ocorrência,
transmitiu para o posto de comando, pelo intercomunicador da mota, uma
complicada mensagem [...].
[...] De lá lhe disseram que iriam providenciar e que se limitasse a
35 presenciar as ocorrências, mas sem intervir por enquanto.
Um imediato telefonema para o governador civil e deste para o ministro
confirmou que não se encontravam previstos desfiles, de forma que a máquina
policial se viu movida a ingerir-se no caso. [...]

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Entretanto, lbn-el-Muftar via pela frente uma grande multidão apeada que
40 apostrofava os seus soldados. Eram os automobilistas que haviam saído dos
carros e que, entre irritados e divertidos, se empenhavam numa ruidosa
assuada20. Que devia ser algum reclame, diziam uns; que era mas era para um
filme, diziam outros.
Mário de Carvalho, in A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho e Outras Histórias.
Porto: Porto Editora, 2013 (pp. 11-14)

Notas
1. sarabanda: confusão, balbúrdia. 2. retinir: emitir um som muito agudo. 3. imprecações:
súplicas. 4. guturais: que saem da garganta. 5. almóada: relativo aos Almóadas (dinastia de
Marrocos). 6. berberes e azenegues: povo da antiga Pérsia e povo que habitava a Região do
Ouro até ao Senegal. 7. esteiro: braço estreito do rio ou mar que se estende pela terra dentro.
8. Lixbuna: Lisboa. 9. hordas: bandos indisciplinados. 10. nazarenos: cristãos. 11. fragor:
estrondo forte. 12. flanqueado: ladeado. 13. beduínos: árabes nómadas. 14.
assarapantados: atrapalhados. 15. corânico: relativo ao Corão. 16. agravo: ofensa. 17.
jinns: génios capazes de assumir a forma humana. 18. encabriolados: endiabrados. 19.
contraventores: infratores. 20. assuada: algazarra.

1. Neste excerto, é referido que, naquela manhã, os automobilistas que


entravam em Lisboa apanharam um grande susto.
1.1. Explicita, por palavras tuas, o que sucedeu.
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2. Perante a confusão e a desordem instaladas, como reagem os soldados


árabes e o polícia português?
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2.1. Tendo em conta as reações que descreveste, escolhe os adjetivos que


melhor caracterizam cada uma das personagens, associando corretamente a
coluna A à coluna B.

Coluna A Coluna B
Ali-ben-Yussuf  A – Inseguro
B – Corajoso
lbn-el-Muftar  C – Prudente
D – Imprudente
Manuel Reis Tobias  E – Religioso

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3. Assinala, em cada alínea, a opção que completa corretamente cada frase,


de acordo com o texto.
3.1. Nas linhas 5 e 6, o narrador usa uma enumeração para, com vivacidade,
A. reproduzir os sons emitidos naquele momento.
B. destacar o barulho e o caos existentes.
C. descrever o espaço em que decorre a ação.

3.2. Para demonstrar que lbn-el-Muftar não tem a certeza do que se passa, o
narrador, nas linhas 22 a 25, recorre a
A. metáforas.
B. hipérboles.
C. interrogações retóricas.

3.3. Ao afirmar que Manuel Reis Tobias estava escondido com o “propósito
sábio e louvável de surpreender contraventores aos semáforos”, o narrador
A. conta a história de forma objetiva.
B. conta a história de forma subjetiva.
C. demonstra que conhece bem aquela personagem.

4. Face à confusão que se instalou em Lisboa, os automobilistas estavam


“entre irritados e divertidos”. Na tua opinião, por que motivo uns ficaram
irritados e outros divertidos?
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5. Este excerto narra um acontecimento estranho que envolve portugueses e


árabes provenientes de diferentes épocas.
5.1. Comprova a afirmação anterior e demonstra que as personagens
pertencem a épocas distintas, recorrendo a excertos do texto.
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Cotações
Item 1.1. 2. 2.1. 3.1. 3.2. 3.3. 4. 5.1.
Cotação 15 15 10 10 10 10 15 15
Total 100 pontos

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