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A revista que valoriza o fotógrafo e a fotografia

www.fotografemelhor.com.br | n0 279 | Ano 24

Fotografia
de natureza
Sensualidade
Fotógrafa
cadeirante
Autorretratos
Fotojornalismo

Fotografia
de rua
Confira as lições sobre
uma área apaixonante
que consagrou o mestre
Henri Cartier-Bresson

Grandes fotógrafos da edição: Alexandre Urch coletivo Cia. da Hebe David Gibson Fabio Hashimoto
Guillermo Franco Gustavo Minas Julius Dadalti Maria Paula Vieira Melvin Quaresma Susan Meiselas
Ano 24
20

Julius Dadalti
Edição 279
Dezembro/2019

Foto de capa:
Alex Linch

6 Grande Angular
Notícias e novidades

36
Guillermo Franco

12 Revele-se
Fotos dos leitores em destaque

16 Câmeras Clássicas

20
A pioneira Yashica Electro 35

Natureza
Um fotógrafo apaixonado pela África
62
28 Profissional cadeirante
A determinação de Maria Paula Vieira

36 FOTO DE RUA
Fabio Hashimoto

As dicas de quatro especialistas

62 Sensualidade
O estilo oriental de Fabio Hashimoto
Susan Meiselas

70 Fotojornalismo
As lições de Susan Meiselas

78 Retrato
Cia. da Hebe e seus autorretratos

84 Equipamento
Câmeras para todo momento

70 Fotografe Melhor no 279 3


Fundador
Aydano Roriz
Diretores
Luiz Siqueira
Tânia Roriz

Diretor Executivo: Luiz Siqueira


Diretor Editorial e Jornalista Responsável:
CARTA AO LEITOR

S
Roberto Araújo – MTb.10.766 – araujo@europanet.com.br
Sérgio Branco
air à rua para fotografar é sempre
REDAÇÃO
Diretor de Redação: Sérgio Branco (branco@europanet.com.br) um prazer, em qualquer cidade de
Editora de arte e capa: Izabel Donaire qualquer lugar do mundo. Quando
Editor convidado: Érico Elias viajamos e caminhamos por ruas que nunca
Colaboradores especiais: Diego Meneghetti e Livia Capeli
Colaboraram nesta edição: José de Almeida e Juan Esteves vimos antes, os olhos ficam mais aguçados.
Revisão de texto: Denise Camargo Tudo é novidade. E cenas incríveis podem
PUBLICIDADE surgir diante dos olhos, mas nem sempre
publicidade@europanet.com.br
é possível enquadrá-las no momento
São Paulo
Equipe de Publicidade: Angela Taddeo, Alessandro Donadio, certo, do jeito que imaginamos. Já perdi
Elisangela Xavier, Ligia Caetano, Renato Perón e Roberta Barricelli muitos desses “momentos decisivos” –
Outras Regiões conceito atribuído ao mestre Cartier-
Head de Publicidade Regional: Mauricio Dias (11) 98536 -1555
-Bresson, mas que ele nega solenemente
Bahia e Sergipe: Aura Bahia – (71) 3345-5600/9965-8133
Brasília: New Business – (61) 3326-0205 (leia na edição 240 de Fotografe a
Rio Grande do Sul: Semente Associados – (51) 8146-1010 “entrevista póstuma” que fiz com ele).
Santa Catarina: MC Representações – (48) 9983-2515
Outros estados: Mauricio Dias – (11) 3038-5093 Bresson, aliás, é a própria encarnação
Publicidade – EUA e Canadá: Global Media, +1 (650) 306-0880
da fotografia de rua, o eterno flâneur
ASSINATURAS E ATENDIMENTO AO LEITOR
Gerente: Fabiana Lopes (fabiana@europanet.com.br)
quase invisível com sua Leica a espreitar
Coordenadora: Tamar Biffi (tamar@europanet.com.br) os distraídos pela cidade. Como ele, são muitos os fotógrafos que passaram
Equipe: Josi Montanari, Camila Brogio, Regiane Rocha,
Gabriela Silva e Bia Moreira
a vida com os olhos no dia a dia urbano, alguns no total anonimato até
ATENDIMENTO LIVRARIAS E BANCAS – (11) 3038-5100
que suas obras fossem descobertas, caso da babá americana Vivian Maier,
Equipe: Paula Hanne (paula@europanet.com.br) exploradora das vias de Chicago com uma Rolleiflex a tiracolo (leia a incrível
EUROPA DIGITAL (www.europanet.com.br) história dela na edição 216 de Fotografe).
Gerente: Marco Clivati (marco.clivati@europanet.com.br)
Equipe: Anderson Ribeiro, Anderson Cleiton, Adriano Severo,
Mesmo quando não saímos às ruas para fotografar, muitas vezes a imagem
Fábio Molliet e Karine Ferreira se apresenta diante do olhar pedindo para ser registrada. Em outros tempos,
PRODUÇÃO, EVENTOS E MARKETING só me restava lamentar: “caramba, se tivesse com a câmera agora...”. Hoje, basta
Gerente: Aida Lima (aida@europanet.com.br)
Arte: Jeff Silva
sacar o smartphone do bolso e ter agilidade para que nenhuma cena seja perdida.
Equipe: Beth Macedo (produção) e Laura Araújo (arte) Essa é, na minha visão, a maior vantagem do aparelho: estar sempre disponível
DISTRIBUIÇÃO E LOGÍSTICA
para que o momento não seja perdido.
Coordenação: Henrique Guerche Aconteceu não faz muito tempo comigo passando pelas ruas do Brás, bairro
de comércio forte na cidade de São Paulo. De repente, ao virar uma esquina,
(henrique.moreira@europanet.com.br)
Equipe: Gabriel Silva e Edvaldo Santos
ADMINISTRAÇÃO
deparei-me com um carregamento enorme de manequins de loja (foto acima).
Gerente: Renata Kurosaki Não fosse o smartphone, a cena estaria apenas na memória, pois justamente
naquele dia a minha mochila não estava no carro – nela carrego sempre a
Equipe: Paula Orlandini e Gabriel Tadeu

compacta Canon G1X, minha companheira de (quase) todos os dias desde 2013.
DESENVOLVIMENTO DE PESSOAL
Tânia Roriz e Elisangela Harumi
Rua Alvarenga, 1.416 – São Paulo/SP, CEP: 05509-003
A matéria de capa desta edição, escrita pelo
Telefone: 0800-8888-508 (ligação gratuita) e jornalista Érico Elias, reúne quatro especialistas no que
os gringos chamam de street photography. Confira os
(11) 3038-5050 (cidade de São Paulo)
Pela Internet: www.europanet.com.br
E-mail: atendimento@europanet.com.br que eles têm a dizer sobre esta que é uma das mais
A Revista Fotografe Melhor é uma publicação da Editora Europa Ltda deliciosas áreas da fotografia. Boa leitura.
(ISSN 1413-7232). A Editora Europa não se responsabiliza pelo
conteúdo dos anúncios de terceiros.
DISTRIBUIDOR EXCLUSIVO PARA O BRASIL
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Juan Esteves

Rua Dr. Kenkiti Shimomoto, 1678, Osasco (SP), CEP 06045-390.


Sérgio Branco
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4 Fotografe Melhor no 279 fotografe@europanet.com.br fotografemelhor.com.br • Bookplay
GRANDE ANGULAR

Sarah Skinner
Comédia da vida selvagem
A imagem vencedora,
de Sarah Skinner,
mostra brincadeira
de um filhote com
um leão adulto em
A fotógrafa britânica Sarah
Skinner foi a grande
vencedora do Comedy Wildlife
Photography Awards 2019, concurso
voltado a fotografias engraçadas de vida
ganhou o prêmio Criaturas da Terra.
Já o prêmio do público foi para o
americano Harry Walker, por foto que
flagra uma lontra levemente confusa,
realizada no Alasca e intitulada “Oh My”.
Botsuana, África
selvagem. A imagem vencedora foi feita A imagem também ganhou o prêmio
em Botsuana e é intitulada “Agarre a vida Olympus Criaturas Aquáticas, provando ser
pelo ...!”. Mostra o momento em que um igualmente uma das favoritas do júri.
filhote e um leão adulto estão brincando, Entre as outras imagens vencedoras
deixando em suspense o que aconteceu está a do croata Vlado Pirsa, intitulada
depois – a imagem de Sarah também ‘Desacordo em Família’, feita na Croácia Harry Walker

Imagem de lontra
desajeitada que deu a
Harry Walker os prêmios
do público e Olympus
Criaturas Aquáticas

6 Fotografe Melhor no 279


Flagrante do que
parece uma discussão
acalorada deu a
Vlado Pirsa o prêmio
Criaturas do Ar

Relação amorosa
de esquilos na África
do Sul, em série
de Elaine Kruer,
Vlado Pirsa

vencedora do
prêmio Portfólio
Fotos: Elaine Kruer

e que retrata dois pássaros que Outros 11 fotógrafos tiveram Galitz e Txema Garcia Laseca.
parecem discutir, a melhor na imagens consideradas como O Comedy Wildlife Photography
categoria Criaturas do Ar. A fotógrafa altamente recomendadas: Tilakra Awards 2019 recebeu cerca de 4 mil
Elaine Kruer foi vencedora do prêmio Nagaraj, Corey Seeman, Geert inscrições de 68 países. O concurso
Portfólio, por conjunto de quatro Weggen, Tom Mangelsen, Mike é global, online e gratuito. Tem
imagens que retratam a relação Rowe, Alastair Marsh, Martina como principal meta fomentar a
amorosa de esquilos na África do Sul. Gebert, Eric Keller, Elmar Weiss, Roie conservação da vida selvagem.

Fotografe Melhor no 279 7


GRANDE ANGULAR

FOTO DO MÊS NA MIRA DO CHEFE


Encontros de autoridades estão e gestos dos personagens em enquanto Guedes olha para ele
sempre cercados de cerimônias e cena. Gabriela Biló, fotojornalista sorrindo. A cena dá a entender,
de contenções corporais. Para obter de O Estado de S. Paulo baseada simbolicamente, que o presidente
uma imagem com grande carga em Brasília, conseguiu esse feito faz um gesto de executar seu
informativa é preciso estar por ao registrar o encontro de Jair Ministro da Justiça. Foi realizada em
dentro dos acontecimentos e, ao Bolsonaro com dois de seus um momento em que comentaristas
mesmo tempo, ligado nas feições principais ministros, Sérgio Moro e políticos diziam que a relação entre
Paulo Guedes. os dois passava por alguns atritos e
Biló capturou o Bolsonaro fazia questão de afirmar
momento em que sua posição de mando.
Bolsonaro brincava A imagem viralizou de maneira
com Moro, apontando instantânea, gerando debates
para ele o dedo de entre apoiadores e opositores do
uma maneira que faz presidente e muitos aplausos para o
recordar sua tradicional trabalho da fotógrafa. “Logo depois
pose de arminha. Moro de fazer a sequência, liguei para a
está cabisbaixo, em redação avisando que acreditava ter
uma posição submissa, conseguido uma boa imagem para
o contexto político do momento.
Não imaginava que seria a foto de
Brincadeira entre capa, pois a gente nunca sabe o
presidente e ministro que os colegas estão fazendo e se a
gerou foto inusitada nossa foto é a melhor. Fiquei muito
de Gabriela Biló feliz com a repercussão”, relata Biló.
Gabriela Biló

ECOS DE UMA REVOLUÇÃO ESQUECIDA


Uma exposição do coletivo econômica e os rumos políticos
Coletivo Garapa

Garapa, em cartaz na Casa da do Brasil. Perdurou por 23 dias


Imagem, em São Paulo (SP), de bombardeios, que atingiram
permite revisitar um conflito principalmente a população civil.
ocorrido na capital paulista no Ao se apropriar de imagens
início do século 20. Intitulada “Sob desse conflito para retrabalhá-las
Ataque”, a exposição parte de e ao criar novas imagens baseadas
imagens da Revolução Paulista de em seus acontecimentos, o Garapa
1924, também conhecida como promove uma reflexão acerca do
Revolução Esquecida. A revolta presente. O conflito se deu em torno
foi iniciada no dia 5 de julho por da região próxima à Estação da Luz
militares descontentes com a crise hoje conhecida como Cracolândia,
que tem sido
alvo de bombas
reais e simbólicas,
utilizadas na
repressão dos
usuários de crack.
A mostra fica
aberta até o dia 12
de março de 2020.
A Casa da Imagem
fica na Rua
Roberto Simonsen,
Acima e ao lado imagens presentes em 136, no centro de
exposição sobre Revolução Esquecida São Paulo.
Gustavo Prugner

8 Fotografe Melhor no 279


Robert Freeman

MORRE ROBERT FREEMAN,


FOTÓGRAFO DOS BEATLES
Imagem que gerou a
capa do álbum With
the Beatles, de 1963

em um hotel, ele usou


apenas a luz lateral de
uma janela. Como todos

Divulgação
os integrantes vestiam
suéteres pretos, o
fotógrafo optou por fazer
Retrato de Robert
O fotógrafo britânico Robert Freeman, a captura com filme P&B. A luz lateral Freeman, que
conhecido como fotógrafo dos Beatles, criou sombras nos rostos, gerando uma morreu aos 82 anos
morreu aos 82 anos de idade em 7 de sensação sombria. A imagem ganhou
novembro de 2019. A história de sua o mundo junto com os Beatles. Depois
relação com a banda remonta o ano disso, Freeman trabalhou intensamente
de 1963, quando o grupo começava com a banda até 1965, gerando novas
a despontar. Freeman fez às pressas capas marcantes para os álbuns A Hard
a imagem de capa para o LP With the Day’s Night, Beatles for Sale, Help! e
Beatles, lançado no mesmo ano. Feita Rubber Soul.

Fotografe Melhor no 279 9


GRANDE ANGULAR

FUJI APRESENTA A
MIRRORLESS X-PRO3
A Fujifilm lançou a X-Pro3,
mirrorless com sensor CMOS de
26 megapixels dotada de um Modelo
visor híbrido, óptico e eletrônico, mantém o
visual retrô
projetado para funcionar como e tem corpo
um visor de telêmetro. O modelo vedado
tem corpo vedado contra contra
intempéries e está montado intempéries
sobre base de titânio.
Na parte traseira, a X-Pro3
conta com um monitor empresa, como Provia e Superia. valor de US$ 1.800 no mercado
basculante de 3 polegadas O modelo oferece também dos EUA, enquanto na versão
que, quando fechado, exibe as captura de vídeo em resolução DR, com acabamento resistente
regulagens e o tipo de “filme” 4k 30p, traz conexões Wi-Fi a arranhões, está disponível nas
selecionados – já que existem os e Bluetooth e está disponível cores preta e prata e custa US$
modos de captura baseados em em duas versões. Na versão 2.000. Não há previsão ainda de
filmes clássicos produzidos pela tradicional preta, chega com o venda no Brasil.

Mavic lança UMA LENTE PLANA E


drone ultraleve ULTRAFINA
A DJI apresentou o novo drone
Uma equipe de pesquisadores
Mavic Mini, menor e mais leve modelo
da Universidade de Utah
produzido pela marca, com apenas
apresentou uma grande inovação
249 gramas. O peso do produto tem
em óptica ao desenvolver um novo
em vista a legislação americana, que,
tipo de lente plana com apenas dez
assim como a brasileira, dispensa
mícrons de espessura, tornando-a
o registro de drones com menos
mil vezes mais fina que as lentes
de 250 gramas junto à agência de
comuns – e, aparentemente,
aviação responsável.
sem sacrificar o desempenho. O
O Mavic Mini tem câmera com
avanço está sendo comemorado
sensor de 12 megapixels e grava
principalmente para aplicação
vídeos com resolução de até 2,7K Detalhe
em drones e fotografia móvel –
em 30p ou full HD em 60p. O da lente

Fotos: Divulgação
podem substituir a óptica atual dos
módulo da câmera é montado em ultrafina
smartphones, permitindo que os desenvolvida
base com três eixos, permitindo
fabricantes tenham um conjunto de nos EUA
grande mobilidade. A DJI garante
câmera e lentes ainda menores.
que o Mavic Mini oferecerá até 30
Comparado com os elementos
minutos de tempo de voo para o
milimétricos no interior do a luz em um sensor de imagem no
modelo, que conta com Wi-Fi e GPS
novo sistema de câmera tripla mesmo grau das lentes tradicionais
com alcance máximo de 4 km em
do iPhone 11 Pro, o professor maiores e mais grossas. “Você pode
áreas abertas.
Rajesh Menon diz que a lente pensar na microestrutura como
O Mavic Mini chega ao mercado
desenvolvida na universidade é pixels muito pequenos de uma
dos EUA custando US$ 400, apenas
“20 vezes mais fina que o cabelo lente”, explica o professor. A equipe
o drone, e US$ 500, quando
humano, mas o desempenho teve que desenvolver um processo
acompanhado dos acessórios e
pode ser tão bom quanto o das de fabricação com um novo tipo
de duas baterias sobressalentes.
lentes convencionais”. Menon e de polímero e algoritmos que
o restante da equipe chegaram à pudessem calcular a geometria das
nova lente usando microestruturas. microestruturas para que focalizassem
Em vez de um grande a luz adequadamente. O resultado
elemento curvo, há milhares de é uma lente que pode ser feita de
microestruturas que, juntas, focam plástico para reduzir os custos.

10
REVELE-SE

Ponte para as estrelas


O
Viaduto 13, também conhecido como Viaduto do
Exército, tem 143 metros de altura e 509 metros de
extensão. Inaugurado em 1978, é o mais alto viaduto
férreo da América Latina e o terceiro do mundo. Tem esse √ Autor: Gustavo Barreto
nome por ser o 130 na sequência de viadutos entre Muçum e √ Cidade: Porto Alegre (RS)
Vespasiano Correa, na rota da Ferrovia do Trigo, no Rio Grande √ Câmera: Canon EOS 6D
do Sul. Foi abaixo dessa obra gigantesca que Gustavo Barreto √ Objetiva: Canon 24-70 mm
focalizou o centro da Via Láctea para fazer a imagem acima. √ Exposição: f/2.8, 20s e ISO 3.200

12 Fotografe Melhor no 279


As brumas das Missões
F oi a partir de um voo de balão que Edegar Cavalheiro
captou a imagem do sítio arqueológico de São Miguel
das Missões coberto pela densa bruma da manhã. O local,
que faz parte do circuito turístico dos Sete Povos das Missões, fica √ Autor: Edegar Cavalheiro
próximo a Santo Ângelo (RS) e a 500 km de Porto Alegre (RS). √ Cidade: Santo Ângelo (RS)
Visitá-lo é mergulhar na história da ocupação da região pelos √ Câmera: Nikon D610
colonizadores espanhóis e portugueses e descobrir que ali foi o √ Objetiva: Nikkor 24-70 mm
ponto mais próspero da América Latina no século 18. √ Exposição: f/7.1, 1/100s e ISO 125

Fotografe Melhor no 279 13


REVELE-SE

Vermelho teatral
C
om a câmera no tripé, Théo Bortolin se posicionou
lateralmente ao Theatro Municipal de São Paulo,
um cartão-postal da cidade difícil de fotografar
devido ao grande movimento nos arredores da Praça Ramos √ Autor: Théo Bortolin
de Azevedo. Contudo, Théo conseguiu uma imagem criativa, √ Cidade: São Paulo (SP)
ajustando baixa velocidade para captar o rastro luminoso na √ Câmera: Canon EOS 5D Mark III
passagem de um ônibus. Depois, no Photoshop, converteu a √ Objetiva: Canon 50 mm
foto para P&B e deixou apenas os tons de vermelho. √ Exposição: f/6.3, 1,3s e ISO 125

14 Fotografe Melhor no 279


A bela da tarde
E
ra um fim de tarde, com uma iluminação natural
muito convidativa que entrava pela janela do estúdio.
Isso atiçou a vontade de Cadu Nickel de fotografar,
aproveitar aquela luz que logo iria diminuir até desaparecer. √ Autor: Cadu Nickel
Sugeriu à amiga e maquiadora Kelly Dias que tivesse seu dia √ Cidade: São Caetano do Sul (SP)
de modelo, posando para um ensaio sensual. Kelly topou, √ Câmera: Fujifilm X-Pro2
pois estava de folga naquele dia, e ambos se entregaram à √ Objetiva: Fujifilm 23 mm
luz do entardecer que clamava por fotografia. √ Exposição: f/2, 1/1.000s e ISO 6.400

Mande fotos e ganhe uma caneca da Coleção Câmeras Clássicas


Os autores das fotos selecionadas Especifique no e-mail: nome, endereço,
para publicação na revista receberão telefone, ficha da foto (equipamento,
pelo correio uma caneca da Coleção dados técnicos...) e um breve relato
Câmeras Clássicas. Para participar (local, data...) sobre as imagens que você
da seção “Revele-se”, envie até três enviar. Os arquivos devem ter, no mínimo,
fotos, no máximo, em arquivo digital tamanho de 13 x 18 cm (ou aproximado)
(formato JPEG), para o e-mail com resolução de 200 a 300 ppi. Evite
fotografe@europanet.com.br. arquivos muito pesados.

Fotografe Melhor no 279 15


CLÁSSICAS

Yashica Electro 35
Pioneira da era
eletrônica

Fotos: Mário Bock


Inovadora como
câmera básica, ela
oferecia exposição
automática,
obturador por
controle eletrônico,
acabamento
primoroso e um
design avançado
para a época

A Electro 35 vinha
acompanhada da
E m 1966, época em que a
Yashica lançou a Electro 35, não
havia computadores pessoais,
muito menos chips. Mas os japoneses já
ensaiavam alguns passos em direção ao
obturador. Em pouco tempo, ela se tornou
a melhor opção entre as câmeras voltadas
para iniciantes em fotografia, superior a
modelos parecidos da Canon. Atraente
por fora e excelente por dentro, ela tem o
lente fixa Yashinon
45 mm f/1.7 sistema computadorizado mérito de ser aclamada como a “mãe” das
ao equipar a câmera com modernas câmeras eletrônicas.
um “cérebro eletrônico”, Na Electro 35, a Yashica usou um
como eram chamados circuito integrado com transistores
os circuitos inteligentes encapsulados com silicone, muito
que controlavam a avançado para a época. Tão moderno
exposição automática que a câmera vinha com uma plaqueta
e o funcionamento do ornamentada com o desenho
esquemático de um átomo, uma
referência à avançada tecnologia nuclear,
em voga naquele período. O obturador
eletrônico permitia o disparo prolongado
de até 30 segundos, recurso que não
existia nas câmeras mecânicas.
Ela oferecia apenas a exposição
automática com prioridade de abertura,
recurso semelhante ao das câmeras atuais.

16 Fotografe Melhor no 279


A versão na cor preta
era direcionada a
profissionais, mas
tinha os mesmos
recursos que a outra

o brilho do aço escovado da


parte superior – era também
produzida na cor preta, modelo
destinado (sem recursos adicionais)
aos profissionais. Outro ponto
positivo era o rigor no processo
de fabricação, que garantia alta
resistência e durabilidade à câmera.

Um kit atraente
Um grande apelo de
consumo da Yashica era um kit
Selecionando-se uma abertura e com correção de paralaxe; a de filtros e lentes conversoras
de diafragma (na objetiva), a regulagem de sensibilidade IS0 (ASA feitos especialmente para
Electro ajustava automaticamente na época) de 25 a 1.000 (no modelo a Electro 35 G. Apesar de
significar pouco em termos de
a velocidade (que não podia ser GT). Isso sem contar a excelente
desempenho, a aquisição do kit
ajustada manualmente). Para orientar objetiva Yashinon DX de 45 mm era quase obrigatória, pois dava
o fotógrafo, o anel do diafragma f/1.7, com qualidade e luminosidade à câmera um porte de câmera
contava com os indicadores sol (f/11), pouco usual em câmeras básicas. reflex. Vinha com um jogo de
nuvem (f/4) e janela (f/1.7). Para ligar A Electro 35 também inovou no lentes conversoras tele e grande
a câmera e o fotômetro bastava tamanho e no design: era grande, angular, filtros azul e amarelo,
avançar o filme. Para não complicar com porte de câmera SLR, e o para-sol de borracha com anel
a vida do fotógrafo, na Electro visual era muito refinado, previsto de metal, um pequeno tripé de
35 não tinha regulagem manual para oferecer uma boa ergonomia mesa, cabo propulsor e uma
de velocidade. Mas era possível e facilitar os ajustes. Havia duas maleta para guardar tudo e com
espaço para a câmera. As lentes
acessar o modo “B” para exposição grandes “janelas” retangulares
conversoras, rosqueadas sobre
prolongada e flash (1/30s). na parte dianteira: uma para o a lente normal, tinham eficiência
visor com o telêmetro conjugado limitada: a de “teleobjetiva”
A FOTOGRAFIA EM e a outra para a pequena célula aumentava a distância focal de
QUATRO PASSOS fotoelétrica. O acabamento era 45 mm para 58,4 mm e a “grande
A receita vigente no começo dos de primeira, a ponto de se notar angular” diminuía para 37,7 mm.
anos 1960 para as melhores câmeras
era ter visor óptico direto e foco por
telêmetro, na esteira do sucesso da Kit opcional que
alemã Leica. Porém, eram câmeras era vendido com a
manuais com muitas regulagens a Yashica Electro 35
serem feitas, o que complicava a vida
do fotógrafo iniciante. A chegada da
Electro 35 mudou o panorama: com a
exposição automática, eram somente
quatro passos para garantir a foto:
avançar o filme, regular a abertura,
focalizar e disparar.
Dentre as muitas novidades
que ela introduziu, destacam-se a
exposição automática a partir de 30
segundos até 1/500s (modelo G); a
Divulgação

moldura para o enquadramento no


visor excepcionalmente brilhante

Fotografe Melhor no 279 17


CLÁSSICAS

io Bock
Fotos: Már
versões
A Yashica
Electro 35 foi
fabricada até 1975

O DESAFIO DO
e teve as versões
G, GS, GT, GSN
e GTN
TELÊMETRO
Apesar de ser uma câmera do contador de exposição, que
básica, a Electro 35 vinha com o acumulava também a função de
sistema de foco por telêmetro, usual indicador de carga da bateria.
nas rangefinder da época, visível no Após o lançamento, a Yashica
visor como uma “mancha” amarela. Electro 35 ganhou novas versões com
Quando a objetiva está desfocada, algumas mudanças em relação ao
enxerga-se uma imagem dupla. Deve- original, como os modelos G (1968),
-se então girar o anel de foco até que GS, GT (1970), GSN e GTN (1973).
as duas imagens coincidam, formando Ela durou até 1975, quando perdeu
uma só – o que indica foco perfeito. espaço e interesse no mercado com
Não é preciso dizer que os fotógrafos o surgimento das câmeras compactas
iniciantes tinham grande dificuldade eletrônicas com autofoco.
em regular o telêmetro, um sacrifício a
cada novo enquadramento.
Um pouco mais tarde, a Yashica Conheça a coleção
lançou o modelo Electro 35 MC
Até o final de 2019, a cada
(menor que a Electro 35) na qual edição de Fotografe, uma
o telêmetro foi substituído por um câmera que marcou época na
sistema por zona com três símbolos fotografia será destacada nesta
– busto, pessoas e montanha – seção com um breve histórico.
visíveis no visor. Bem mais prático, Ao mesmo tempo será lançada
mas nada que se pareça com a a caneca da Coleção Câmeras
eficiência do telêmetro, desde que Clássicas com o modelo do
corretamente usado. mês. Para adquirir esse produto
O foco por telêmetro era exclusivo, acesse: www.colecao
camerasclassicas.com.br.
operacional mesmo em situações
de baixas condições de luz e dava à
Electro 35 uma nitidez comparável a
das câmeras profissionais. Também
favorecia o uso com pouca luz a
excelente luminosidade da objetiva
f/1.7, os indicadores luminosos
de exposição, mais uma grande
novidade, a iluminação própria

18 Fotografe Melhor no 279


FOTOGRAFIA DE NATUREZA

Paixão pela
África
Conheça a história de Julius Dadalti,
ex-agente da Polícia Federal
que hoje se dedica totalmente a
registrar a vida selvagem
Fotos: Julius Dadalti

POR JOSÉ DE ALMEIDA

A limento para a alma. É assim que o


carioca Julius Dadalti, 48 anos, encara a
fotografia de natureza e vida selvagem,
à qual passou a se dedicar totalmente a partir de
2018. Essa “alimentação” começou na infância,
autoria do conterrâneo Luiz Claudio Marigo
(1950-2014), mestre a quem reverencia.
Mais do que nutrir a alma, a fotografia foi a
corda na qual ele se segurou firmemente para sair
do fundo do poço depois de um drama que marcou
pois, entre as referências que o fizeram escolher o sua vida, ocorrido em fevereiro de 2014: Dadalti era
segmento, lembra as imagens de animais silvestres agente de um grupo especial da Polícia Federal e
brasileiros que vinham em cartões do chocolate perdeu 100% da visão do olho esquerdo devido a
Surpresa, que, mais tarde, descobriria serem de um acidente durante uma operação. Depois disso,

20 Fotografe Melhor no 279


a PF decidiu aposentá-lo. Dias difíceis se mais complicado, pois perdi a visão periférica, Guepardo na caça
seguiram e Julius Dadalti, que já estudava e isso me causa alguns sustos às vezes, como de um antílope no
Parque Masai Mara, no
e praticava fotografia como hobby, se quando mergulhei com tubarões. Vez por
Quênia, um dos mais
entregou de corpo e alma a ela, que outra me surpreendia com um baita bicho do abundantes em vida
acredita ter sido a melhor terapia para meu lado esquerdo, vindo por trás”, conta. selvagem africana
superar o trauma. Por isso, hoje a atenção aos animais, quando
Passados quase seis anos, hoje ele está em campo, é maior. “Faz parte da
é capaz de fazer graça com o fato. “Sou adaptação, que é contínua. Mais um desafio a
fotógrafo de um olho só agora. Ficou superar na fotografia de natureza”, resigna-se.

Fotografe Melhor no 279 21


FOTOGRAFIA DE NATUREZA

profissão
Julius Dadalti
agora se dedica
à fotografia de
natureza como
profissional

Duna altíssima
no Deserto de
Sossusvlei, na
Namíbia, costa
oeste da África

22 Fotografe Melhor no 279


PAIXÃO AO PRIMEIRO SAFÁRI
Além de Marigo, do qual Darren Jew, o holandês Frans Lanting, o Acima, pôr do sol
acompanhava os artigos publicados nas neo-zelandês David Lloyd e o americano típico na savana
páginas de Fotografe, Dadalti ainda Art Wolfe, todos em plena atividade. africana com um
gnu em primeiro
cita o sergipano Príamo Melo, professor Contudo, Dadalti sabe que essa é
plano; abaixo,
de Química e de fotografia, especialista uma área que exige aperfeiçoamento detalhe de elefante
em paisagem, outro de seus mestres. constante, muita prática, doses no Parque Nacional
Também há referências estrangeiras, como paquidérmicas de paciência e paixão pelo Amboseli, no Quênia
o canadense Paul Nicklen, o australiano que se faz. “São muitas as referências, mas
Fotos: Julius Dadalti

23
FOTOGRAFIA DE NATUREZA

O fotógrafo
tem muitas é preciso criar um estilo próprio e ter uma leopardos, zebras e rinocerontes estavam
referências, mas postura de muito respeito pela natureza, ao alcance de um disparo certeiro no
prezar a ética acima de tudo, pois só assim foco da teleobjetiva. A experiência no
uma das mais o trabalho é pleno”, comenta. Parque Nacional Kruger, região nordeste
marcantes é Ainda longe do profissionalismo, sul-africana, foi muito marcante. “Veio
seu conterrâneo ele partiu para o primeiro safári em uma vontade louca de ficar por lá,
2011. Levava uma câmera compacta conhecer mais países africanos, estudar
Luiz Claudio Nikon com superzoom, equipamento o comportamento animal e, claro,
Marigo, um dos prático, leve, mas que logo notaria não fotografar muito”, recorda.
pioneiros na ser tão adequado quanto imaginava. Com a aposentadoria compulsória na
Era a realização de um sonho viajar PF em 2014, começou a pensar em ser
fotografia de pela África do Sul, naquele clima de um profissional de fotografia. Passou a se
natureza no País filme da sessão da tarde: veículos 4 x 4 dedicar muito, a praticar mais, a estudar
cruzando a savana, onde leões, elefantes, e a pesquisar e, claro, a viajar tanto pelo

24 Fotografe Melhor no 279


Um dos muitos jipes
4 x 4 que percorrem as
savanas da África em
safáris fotográficos
Fotos: Julius Dadalti

Brasil (Pantanal e Amazônia) quanto para


o exterior. Em 2016, rodou 4 mil km pela
Namíbia, costa oeste da África, tendo
fotografado no Parque Nacional de Etosha babuínos e girafas. Já em 2019, retornou No alto, ataque de
e na zona litorânea, “de onde Amyr Klink ao Quênia com um grupo de oito pessoas um crocodilo a uma
partiu em 1984 para atravessar o Atlântico para registrar um dos grandes espetáculos zebra na travessia do
Rio Mara, durante a
sozinho num barco a remo”, lembra ele. do planeta no Masai Mara: a migração de
grande migração de
Com os amigos fotógrafos Eduardo 1,2 milhão de mamíferos quadrúpedes animais da Tanzânia
Campos, Frederico Sotero e Stephano (gnus, zebras e antílopes) que se deslocam para o Quênia; acima,
Pirozi, fez uma expedição ao Quênia e à para a Tanzânia por causa do período de crianças da vila de
Tanzânia em 2018, explorando a região dos chuvas, uma jornada de cerca de 1.000 km. Kamanjab, na Namíbia
parques Masai Mara, Amboseli e Samburu. É a famosa travessia do Rio Mara, quando
Foram 20 dias percorrendo estradas e crocodilos, leões, leopardos, guepardos e
trilhas para fotografar guepardos, búfalos, hienas ficam à espreita para o banquete.

Fotografe Melhor no 279 25


FOTOGRAFIA DE NATUREZA

marinha
O fotógrafo é
também oficial da
marinha mercante
e mergulhador
certificado

ATÉ DEBAIXO D’ÁGUA


Formado pela Escola de Oficiais professor, dando dicas de composição,
da Marinha Mercante, em 1992, foi luz...”, recorda Dadalti, que é filho de
fazer faculdade de Oceanografia na jornalistas. A mãe, a mineira Solange
Universidade Estadual do Rio de Janeiro Dadalti, esteve por 50 anos em redações
(UERJ), mas deixou-a no sexto período ao como Jornal do Brasil, Rádio Roquete
ser aprovado no concurso da PF. “A água Pinto e Agência France Presse (AFP). O
tem uma presença forte na minha vida. pai, o alagoano Paulo Granja, começou
Então, me dedico também à fotografia na United Press International (UPI) e fez
subaquática”, explica ele, que, em 2018, carreira no Jornal do Brasil, onde chegou a
foi ao Havaí, EUA, mergulhar ao lado de editor-chefe.
tubarões e tartarugas marinhas. Mais Hoje, Julius Dadalti trabalha com duas
recentemente, em outubro de 2019, viajou Canon EOS, a 5D Mark IV e a 7D Mark II.
para o arquipélago de Tonga, também no No jogo de lentes, conta com a fish eye
Acima, tubarões Pacífico, para registrar as baleias jubarte 8-15 mm f/4, a zoom grande angular 16-
fotografados no
na ilha de Vava’u. -35 mm f/2.8, a versátil 24-70 mm f/2.8,
Havaí: Julius Dadalti
mergulhou em “Minha primeira câmera foi uma a telezoom 100-400 f/4.5-5.6, a tele fixa
apneia para fazer Pentax Spotmatic herdada do meu pai, 300 mm f/2.8 e a supertele 500 mm f/4
as imagens aos 15 anos. Ele também foi meu primeiro – além de um teleconversor 1.4x, filtros

26 Fotografe Melhor no 279


Acima, baleia jubarte
registrada na ilha de
Vava’u, em Tonga; ao
lado, águia africana
em ação no Lago
Naivasha, Quênia

polarizadores e de densidade neutra. Nononono nono no nono


nononono no nono nono
Ele trata as fotos no Lightroom e diz nononon nono nono no
gostar de clique único. “Não curto nono nononono no nono
fazer mesclagem de imagens, nem
mesmo de paisagens”, informa.
Para 2020, os planos são voltar
para o Quênia, depois seguir para
Ruanda, Uganda e Tanzânia, nessa
ordem. Botsuana, Zimbábue e
Zâmbia devem ficar para 2021 – e
ainda planeja retornar à Namíbia
e depois visitar Etiópia, Sudão,
Moçambique e Zanzibar. Mas o
Brasil também está no roteiro:
estava terminando o planejamento
para ir à Amazônia. O Pantanal Sul
está no roteiro de 2020, assim
como os sertões de Minas Gerais
e da Bahia. “Preciso manter a alma
bem alimentada”, diz.
Fotos: Julius Dadalti

Fotografe Melhor no 279 27


VIDA DE FOTÓGRAFO Fotos: Maria Paula Vieira

Maria Paula Vieira


realiza ensaios de
famílias, crianças
e mulheres

Foco na inclusão POR LIVIA CAPELI

Maria Paula
Vieira, profissional
cadeirante, supera
C adeirante desde os 13
anos, aos 18, Maria Paula
Vieira decidiu posar para
um ensaio fotográfico para elevar
a autoestima. A experiência mexeu
Hoje com 26 anos, há quatro ela
decidiu apostar na ideia de oferecer
ensaios para famílias, crianças e
mulheres com ou sem limitações
físicas, voltando seu olhar para a
as limitações com a cabeça da então caloura de diversidade e a inclusão, dedicando-
Jornalismo que praticava fotografia -se a um nicho ainda pouco explorado
físicas e encara na faculdade enquanto arquitetava no mercado. A força de vontade e a
a rotina de um olhar mais voltado à diversidade. perseverança foram fundamentais para
Entre os próprios medos e receios, que ela superasse barreiras na hora
registrar ensaios percebeu que poderia retratar pessoas de trabalhar profissionalmente com
de crianças e de que estavam em situação parecida fotografia, além de mostrar que pode
com a dela: cheias de insegurança, fora ser um incentivo para muita gente.
sensualidade com do padrão que a sociedade impõe e Maria Paula sai quase diariamente
viés inclusivo buscando o próprio espaço. dirigindo um carro adaptado pela

28 Fotografe Melhor no 279


parques
Para fotos de
família, gestantes
e crianças, ela
utiliza parques
como locação

região do Grande ABC paulista rumo a tem a função de ajudá-la na locomoção, Acima, uma criança
locações na cidade de São Paulo para transferindo-a da cadeira de rodas para cadeirante, público
atender a clientela. Os locais escolhidos o chão ou até de colocá-la nos ombros que interessa a
Maria Paula; abaixo,
geralmente contam com acesso fácil para que ela tenha um ângulo superior. a fotógrafa em ação
para cadeirantes e oferecem cenário O trabalho também engloba arrastar nas ruas de São Paulo
e iluminação ideais para o estilo dela. coisas, ajudar com a cadeira de rodas e a
São locações selecionadas conforme transportar a produção.
o trabalho: quando o ensaio é sensual
feminino, ela prefere a sala, a cozinha ou
o quarto de uma casa ou apartamento
alugado – muitas vezes nas regiões
centrais da capital paulista.
O clima intimista das locações internas
é trocado pelo gramado e sombra das
árvores dos parques do Ibirapuera ou Villa
Lobos para as produções com famílias,
gestantes e crianças. Quase sempre Maria
Paula conta com a ajuda de assistentes,
que a acompanham para ajudá-la na
locomoção pela cidade, com acessibilidade
ainda pouco amigável. Ela prefere a
presença de assistente feminina nas sessões
de fotografia sensual para preservar a
Arquivo Pessoal

intimidade da cliente e a descontração.


Mas, nos ensaios ao ar livre, a opção
é por um ajudante masculino, pois ele

Fotografe Melhor no 279 29


VIDA DE FOTÓGRAFO

Ensaio sensual
criativo com uso
de sobreposição
Para tirar
proveito de
diversos
ângulos, Maria
LIMITES SÃO SUPERADOS
Paula se deita Diferentemente de um fotógrafo sem Ela também usa muito as mãos para
limitações físicas, que pode mostrar a indicar comandos. “Quando fotografo
no chão ou pose à modelo usando o próprio corpo, pessoas cadeirantes, também necessito
então sobe nos Maria Paula conta que precisa ser muito entender as limitações físicas delas para
objetiva para transmitir verbalmente suas criar as poses e saber a forma como vou
ombros de seu ideias à cliente. Muitas vezes, o assistente dirigi-las”, explica. Maria Paula gosta de
assistente para também ajuda nisso, pois estudou tirar proveito de diversos ângulos: desde
ver de cima antecipadamente com a fotógrafa o o mais baixo, quando costuma ficar
conceito do trabalho para colaborar. deitada no chão, passando pela visão no
nível da cadeira, até o ângulo superior,
sobre os ombros do assistente.
Como usa a DSLR Canon EOS 6D Mark
II, que tem monitor articulado, consegue
brincar com os enquadramentos mais
rasantes e superiores com facilidade.
Com a objetiva 50 mm de f/1.4, aposta
nos efeitos de desfoques e dá preferência
para imagens subexpostas, depois
trabalhadas no Lightroom com presets de
tons criados por ela, finalizando tom de
pele e nitidez no Photoshop.
Em geral, Maria Paula prefere a
iluminação natural suave da manhã
ou do entardecer, e quando necessário
usa um LED ou flash com softbox como
A fotógrafa conta com
luz de preenchimento. Nos ensaios
assistente quando precisa
sair da cadeira de rodas sensuais, explora bastante a luz lateral
vinda da janela.

30 Fotografe Melhor no 279


Acima e abaixo, ensaio sensual com mulheres cadeirantes: para realizar esse tipo de trabalho, Maria Paula Vieira opta
pelo clima intimista de locações internas e explica que gosta de explorar bastante a luz lateral vinda de uma janela

Fotografe Melhor no 279 31


VIDA DE FOTÓGRAFO

A fotógrafa
também costuma
atender clientes
fora do padrão
físico estabelecido
pela sociedade

direção
Maria Paula
utiliza muito as

Fotos: Maria Paula Vieira


mãos para indicar
as poses que
deseja

LUTA CONTRA O PRECONCEITO


A fotógrafa avalia que ainda As crianças que têm limitações diferenças humanas desde a infância
existe um olhar preconceituoso físicas não se diferem de outras no e ver a beleza de tudo isso”, diz ela.
sobre as pessoas com necessidades comportamento, cada uma tem seu Caçula de três irmãos, a
especiais, seja no mercado de jeito, sua personalidade. A questão fotógrafa se viu envolvida com
trabalho, na mídia, na arte ou é saber conversar, ter paciência. a necessidade de celebrar a vida
na sociedade. “Procuro trazer a É preciso saber reconhecer as e a família. Quando tinha 3 anos
diversidade para o meu trabalho.
Quero abrir espaço para a inclusão
e mostrar do que nós, deficientes,
somos capazes”, comenta. Ela admite
que no início da carreira teve receio
sobre como os clientes poderiam
encará-la como profissional por
conta da condição de cadeirante.
Pouco a pouco entendeu que,
por estar no lugar de uma pessoa
fora do padrão imposto pela
sociedade, poderia proporcionar
um olhar único a um determinado
público. Assim, passou a oferecer
ensaios voltados para pessoas com
deficiência e, com isso, ganhou mais
visibilidade. “Infelizmente, muitos
adultos e crianças são excluídos
Criança clicada por
do mercado fotográfico e perdem Maria Paula: condição
momentos da vida. Meu projeto é de cadeirante confere
voltado para sessões com gestantes um olhar único
e crianças com ou sem deficiência.

32 Fotografe Melhor no 279


VIDA DE FOTÓGRAFO
Maria Paula Vieira

Ensaio de família realizado em


parque: fotógrafa prefere a luz de idade, seus pais descobriram estudar, ir ao shopping, trabalhar
suave da manhã ou do entardecer que ela era portadora de uma e se formar em Jornalismo pela
doença genética rara que atingia Universidade Metodista, em São
as extremidades do corpo, mais Bernardo do Campo (SP), e seguir o
fortemente os pés, causando dores principal sonho, o de ser fotógrafa
fortes e impedindo-a principalmente profissional. De clique em clique,
de caminhar. A dependência de com a ajuda dos pais carinhosos,
ajuda para se locomover acabou conseguiu se estabelecer na carreira
quando ela começou a usar a e se destacar no mercado.
cadeira de rodas, aos 13 anos. Maria Paula, que foi até modelo,
Nessa fase, ela diz ter criado participando de comerciais de TV
“asas” para poder ter uma rotina e clipes musicais, diz que as únicas
independente. Dali em diante pôde limitações envolvem apenas a
acessibilidade nas ruas da cidade. “A
sociedade, as empresas, as cidades
é que são deficientes e dificultam
o acesso. A sociedade ainda coloca
as pessoas com deficiência como
incapazes, e, ao contrário, somos
muito capazes e eficientes, desde
que nos sejam oferecidos espaço e
oportunidades iguais”, afirma ela.

Making of de ensaios
realizados por Maria Paula
mostra sua forma de
dirigir as poses e sua busca
por um ângulo diferente
Fotos: Arquivo Pessoal

34 Fotografe Melhor no 279


MATÉRIA DE CAPA

No olho
Descubra o dinâmico
universo da street
photography com
as dicas de quatro

da rua
feras: David Gibson,
Alexandre Urch,
Guillermo Franco e
Melvin Quaresma
POR ÉRICO ELIAS

C
om o desenvolvimento recente também que nem sempre as pessoas são
dos smartphones, criou-se uma o principal foco. Há fotógrafos de rua que
legião de potenciais fotógrafos de trabalham com texturas, grafites, cartazes,
rua. Milhões de imagens são feitas anúncios, vitrines, elementos arquitetônicos,
diariamente nas cidades ao redor do mundo placas e sinalizações de trânsito.
e compartilhadas via redes sociais. Mas não A paisagem urbana é densamente
basta sair disparando por aí para praticar o que povoada não apenas de pessoas, mas também
é internacionalmente conhecido como street de elementos visuais. Alguns trabalhos se
photography. Segundo o inglês David Gibson, concentram exatamente na interação entre
criador do Manual do Fotógrafo de Rua, a o elemento humano e a paisagem urbana,
especialidade não é um conceito ou um campo explica Gibson. E, na relação entre fotógrafo e
definido, mas uma atitude. ambiente urbano, o equipamento entra como
Diz respeito essencialmente à relação do um elemento fundamental. Não é preciso
fotógrafo com o ambiente urbano – e muitas o melhor, ao contrário, diz ele. Muitas vezes
iniciativas são possíveis nesse contexto. Gibson o mais simples, compacto e leve tem larga
afirma que o fotógrafo pode optar por passar vantagem. O importante é ter velocidade no
despercebido, “roubando” imagens de forma foco e no disparo. Já a intimidade com a câmera,
sorrateira, ou pode interagir com as pessoas e a ponto de usá-la com rapidez instintiva, só se
chamá-las a participar, criando ambiguidades conquista com a prática constante e sistemática,
entre o espontâneo e o encenado. Ensina complementa o especialista inglês.

Cena de rua
registrada por
Alexandre Urch
em São Paulo (SP)

36 Fotografe Melhor no 279


leve
A fotografia
de rua pede
equipamento
leve e calçados
confortáveis e
resistentes

Alexandre Urch

Fotografe Melhor no 279 37


MATÉRIA DE CAPA

David Gibson
Flagrante nas
ruas de Londres
realizado por David
O ATO DE SABER ESPERAR
Gibson explora
relação entre as Não há outra forma de se desenvolver engraçados e até violentos. “Para mim, a
crianças e o aviso na fotografia de rua senão andar muito, fotografia de rua é qualquer tipo de imagem
escrito no muro bater muita perna em busca de imagens. É feita em um espaço público. Em geral,
preciso se perder pelas vias para encontrar envolve pessoas comuns em suas vidas
cenas únicas, instigantes, engraçadas ou cotidianas. A importância fundamentral é
inusitadas. Ao descobrir um cenário de que ela nunca é encenada, é real”, defende.
interesse, é o momento de parar e observar A fotografia de rua também envolve
o movimento ao redor, buscar se antecipar questões éticas. A princípio, não é
aos acontecimentos, saber esperar. necessário solicitar autorização para uso
As saídas a campo devem ser de imagem de pessoas fotografadas em
intercaladas com uma constante busca por espaços públicos. Porém, o fotógrafo estará
referências, tanto no universo da fotografia suscetível a ações judiciais caso haja algum
de rua como provenientes de outras áreas tipo de dano à imagem do cidadão, que
e mesmo de outras artes. É essencial não deve ser fotografado em uma situação
possuir uma cultura visual para conseguir constrangedora ou degradante.
Para obter boas encontrar um caminho próprio. As boas Gibson já sofreu críticas por fotos que
fotografias de rua imagens não surgem apenas do acaso e fez, como a de um velhinho que caminha
é preciso andar da sorte, mas principalmente de um olhar arquejado, escorado por uma bengala,
muito, perder-se treinado e educado para captar o “algo a diante de uma vitrine onde se lê “last few
mais” no cotidiano. days”, ou “últimos dias”,em português (veja a
pela cidade e, ao Para Gibson, a receita para um bom foto na página 44). “Não fiz o flagrante com
encontrar um fotógrafo de rua reúne ingredientes como intenção de ser engraçado, de me divertir à
cenário propício, técnica, faro, paciência e sorte. Lembra custa do personagem, mas de provocar um
ainda que a própria palavra “rua” inspira reflexão sobre a finitude da vida, pois todos
parar e saber malícia, astúcia e atitude, e que os espaço vamos envelhecer e morrer. Porém, algumas
esperar pelo públicos também podem ser repletos pessoas me criticaram, dizendo que fui cruel
momento ideal de momentos humanos comoventes, ou coisa parecida”, afirma ele.

38 Fotografe Melhor no 279


Alexandre Urch

O fotógrafo pode explorar as linhas e formas encontradas na paisagem urbana, como nesta imagem de Alexandre Urch

Fotografe Melhor no 279 39


MATÉRIA DE CAPA

Augusto Malta
Paul Strand
Clássicos dos
primórdios da
street photography:
imagens do brasileiro
Augusto Malta
(acima, à esq.) e
do americano Paul
Strand (acima, à dir.)

Henri Cartier-Bresson
Ao lado, flagrante
do francês Henri
Cartier-Bresson, o
grande mestre da
fotografia de rua

O COTIDIANO NO VISOR
Consagrada pelo grande mestre Augusto Malta, grande cronista da vida
A fotografia francês Henri Cartier-Bresson (1908-2004), carioca na virada do século passado, e
começou a a fotografia de rua ganhou impulso a partir Vincenzo Pastore, que saiu do ambiente
ganhar as ruas do início do século 20, quando as câmeras controlado do estúdio e ganhou as ruas de
com a chegada passaram a ser menores e portáteis. O São Paulo na década de 1910, revelando
movimento Photo-Secession, nos Estados o rosto dos transeuntes com uma
das câmeras Unidos, foi um dos primeiros a voltar espontaneidade inédita.
compactas e dos a atenção para as cenas do cotidiano, Visto pelo viés histórico, a fotografia é
filmes em rolo. O transitando do pictorialismo para a filha da revolução industrial, assim como as
fotografia direta por meio das imagens grandes cidades. Mas foram necessárias
grande inspirador de Alfred Stieglitz e Paul Strand realizadas algumas décadas de desenvolvimento
foi o francês nas ruas de Nova York. tecnológico para que a fotografia chegasse
Cartier-Bresson No Brasil, destacaram-se nesse período realmente às ruas. Isso realmente ocorreu

40 Fotografe Melhor no 279


Vivian Maier
German Lorca

Acima, imagens de
German Lorca (esq.)
e Vivian Maier (dir.)
captam a dinâmica
e o inusitado do
ambiente urbano

Ao lado, o olhar
bem-humorado de
Elliott Erwitt, que
Elliott Erwitt

tem uma série de


fotos de rua com
cães e seus donos

com o lançamento da Leica I em 1925, primeira foi o primeiro grande nome a encarnar essa
câmera para rolos de filme de 35 mm. A transformação, assumindo-se como fotógrafo
câmera alemã trouxe duas características da espontaneidade, aquele que perambula na
fundamentais para a especialidade: leveza e busca de captar instantes únicos pelas ruas de
agilidade. Com ela em punho, Cartier-Bresson Paris ou de qualquer lugar do mundo.

Fotografe Melhor no 279 41


MATÉRIA DE CAPA
Fotos: Gustavo Minas

Acima e ao lado, imagens


feitas em Brasília (DF) por
Gustavo Minas, fotógrafo
faz parte do coletivo
internacional Burn my Eye

No rastro dessa ampliação


de interesse vieram coletivos e
comunidades de fotógrafos de rua,
tanto internacionais como locais, que
se multiplicaram. Observe, Burn my
Eye, Full Frontal, The Street Collective
e Slow Light são alguns exemplos
de coletivos internacionais que
emergiram em anos recentes.
O premiado fotógrafo Gustavo
Minas, de Cássia (MG), faz parte do
Burn my Eye desde 2018 a partir do
convite de alguns membros. Conta
que não conhece nenhum deles
pessoalmente, mas troca ideias
constantemente por meio de um
chat no Facebook e um grupo no
Flickr. “Como em todos os coletivos
desse tipo, a maior dificuldade é
fazer as coisas acontecerem fora
do mundo virtual. Publicações de
São inúmeros os fotógrafos que Lee Friedlander, Elliott Erwitt, Bruce zines, exposições e encontros têm
seguiram o caminho aberto por ele. Gilden, Daido Moriyama, Garry sido discutidos desde que entrei,
Dentre os nomes mais conhecidos Winogrand e Vivian Maier. No mas ainda não saíram do papel.
da fotografia de rua estão Robert Brasil, destacaram-se fotógrafos Há membros na Europa, Ásia,
Doisneau, Walker Evans, Robert como German Lorca, Hildegard EUA e aqui. Tem sido uma boa
Frank, William Klein, Helen Levitt, Rosenthal e Carlos Moreira. experiência”, comenta.

42 Fotografe Melhor no 279


Helen Levitt

Acima, cena captada por Helen Levitt feita em Nova York, em 1972: ela foi pioneira no uso da cor para registrar
cenas de rua; abaixo, foto feita em São Paulo por Carlos Moreira, um dos expoentes da fotografia de rua no Brasil
Carlos Moreira

Fotografe Melhor no 279 43


MATÉRIA DE CAPA

Fotos: David Gibson


DAVID GIBSON:
INSPIRAÇÃO NOS LIVROS
A fotografia de rua invadiu
a vida do inglês David Gibson
quando ele entrou em contato com
o trabalho de fotógrafos como
Henri Cartier-Bresson e Elliott Erwitt
durante um curso superior em
Fotografia de Publicidade e Editorial,
em 1988. Mas a descoberta dessa
denominação só viria mais tarde,
ao longo dos anos 1990, quando
passou a diferenciar a fotografia de
rua como um gênero circunscrito
dentro do universo mais amplo da
fotografia documental.
Gibson conta que seu trabalho
não segue uma proposta específica.
“Ao longo dos últimos 30 anos,
venho fazendo fotografias sem
Cenas cotidianas um intuito preciso. Talvez minha
engraçadas conexão com a fotografia de rua
flagradas por esteja ligada à ideia do flâneur,
David Gibson aquele que flana pelas ruas na busca
em Brighton
das próprias imagens. Algumas fotos
(acima) e Henley
(ao lado), na minhas podem ser reunidas em
Inglaterra, torno de temas ou sentimentos, mas
ambas em 1998 no geral vejo meu trabalho como

Fotografe Melhor no 279


David Gibson
Duas imagens captadas em Londres por David Gibson: para o fotógrafo britânico,
o equipamento deve ser pequeno, para não chamar a atenção, e simples de usar recomenda aos
interessados em
uma grande bagunça”, comenta. Pinkhassov. A fotografia abstrata é um se especializar
Gibson ainda não “organizou” o escape e uma experimentação”, avalia.
próprio trabalho em livros autorais ou na fotografia de
exposições. A dimensão comercial de CÂMERA COMPACTA rua que tirem
sua atividade está ligada à curadoria e Atualmente, a câmera que David Gibson
ao ensino. Ele dá cursos sobre fotografia usa com mais frequência é a compacta
os olhos dos
de rua e tem publicações paradidáticas Fuji X100T. Ele iniciou na fotografia com monitores e
sobre o tema. Também auxilia fotógrafos a uma Nikon FM2 e, com a chegada do busquem por
editarem seus trabalhos. digital, migrou para câmeras DSLR da
Seu estilo e sua abordagem mudaram Canon. “Acho que as câmeras digitais
referências
bastante ao longo dos anos. “Estou trazem muitas regulagens. Às vezes parece impressas
sempre buscando escapar do que já que estou na cabine de controle de uma
fiz, tento experimentar novas formas. aeronave, tamanha a quantidade de botões
Atualmente tenho me envolvido bastante e alavancas. Para mim o equipamento tem
com a abstração, inspirado por fotógrafos de ser simples de usar. Migrei para a X100T
como Ernst Haas, Mario Giacomelli e, por ser uma câmera menor, que não chama
mais recentemente, Saul Leiter e Gueorgui muito a atenção. Mas nenhuma câmera é

Fotografe Melhor no 279 45


ética
Ao fotografar
na rua é preciso
tomar cuidado
para não expor
as pessoas
retratadas
Pernas de manequim e
outros elementos em
loja de antiguidades de
Londres, em 2006

46 Fotografe Melhor no 279


Fotos: David Gibson

Rima visual registrada


por David Gibson em
Madri, em 2019

perfeita. Essa, por exemplo, me faz perder estendido à arte em geral, ao cinema e até Quem é ele
algumas fotos por causa do sistema de foco à literatura. A mente e os olhos precisam
automático e do modo macro, que às vezes de estímulos. Por fim, não fique muito Com 62 anos, David Gibson é
são difíceis de usar”, explica. preocupado com regras e definições. britânico e vive em Kent, próximo
Como dica aos interessados na área, Somente se deixe inspirar pelo trabalho a Londres, onde realiza a maioria
Gibson recomenda tirar um pouco os dos outros”, indica. de suas fotografias de rua. Gibson
olhos do monitor e buscar por referências Gibson conta que já houve casos de começou a se interessar pela
impressas. Os livros de fotografia são pessoas que se identificaram com suas fotografia de rua nos anos 1990.
importantes por trazerem uma edição fotos. “Na maioria das vezes, a reação foi Além de fotógrafo e membro
coerente. “Você pode julgar um fotógrafo positiva. Gosto de pensar que a minha fundador do coletivo In-Public,
por seu trabalho, mas também pelos livros fotografia de rua nunca é cruel ou injusta atua como curador e já escreveu
que já publicou. Esse interesse pode ser de maneira alguma”, afirma. três livros paradidáticos sobre o
tema, dentre eles o Manual do
Fotógrafo de Rua, publicado no
Brasil pela editora Gustavo Gili.
Site: www.gibsonstreet.com /
@davidgibsonstreetphotography.
Arquivo pessoal

Londres, 2019: uso de


longa exposição para
explorar a abstração

Fotografe Melhor no 279 47


Acima, mulher flagrada enquanto fazia
selfie; abaixo, o vidro estilhaçado se
sobrepõe ao rosto de usuária do metrô ALEXANDRE URCH:
A RUA COMO ELA É
Paulistano da gema, Alexandre Urch
cresceu na “selva de pedra” da megalópole
brasileira. Desde o início de sua trajetória
na fotografia, em meados dos anos 1990,
ele busca na rua a matéria-prima para
sua criação. Seu principal objetivo é o
de mostrar a rua como ela realmente
é. “A rua é um ambiente hostil, duro e
sujo, mas também humano, para quem
abre seus olhos para ela. Gosto de tornar
visível aquilo que passa por invisível para a
maioria das pessoas”, explica Urch.
Seu trabalho é composto por séries,
a maioria delas surgidas do embate com
o ambiente urbano. A série Everyday
People, ganhadora da categoria Ensaio do
Concurso Leica-Fotografe, em 2012, foi
totalmente feita com um iPhone 3GS no
metrô de São Paulo, em uma época em
que poucos pensavam ser possível realizar
um trabalho fotográfico profissional
usando um smartphone. Dentre outras
séries urbanas que ele destaca estão
Babilônia Zero Onze, com imagens do dia
a dia de São Paulo, e O Cheiro da Rua, na
qual busca exprimir os odores da cidade
por meio de imagens.
As grandes referências para Urch são
os fotógrafos americanos Bruce Davidson
e Bruce Gilden, que fotografaram as ruas

48
Cena de rua
explora jogo de
luz e sombras
e contrapõe os
humanos ao
manequim

Para Alexandre
Urch, o fotógrafo
tem que se
fazer invisível e
o equipamento
é apenas uma
extensão de seu
corpo, seja ele
um smartphone
ou uma DSLR
Aqui a moça da full frame
loja se confunde
com os manequins
Fotos: Alexandre Urch

de forma “nua e crua”, e os brasileiros FOTÓGRAFO INVISÍVEL uma ‘regra’ na fotografia de rua
German Lorca e Carlos Moreira, que Para Urch, a discrição é a principal que diz que o equipamento tem
se enveredaram na busca de mostrar característica de um fotógrafo de de ser pequeno e discreto, mas
“algo mais além da fotografia rua, e isso passa pela forma como o principal fator para o resultado
para turista ver”. Atualmente, as o equipamento é utilizado. “Se tem final é o fotógrafo, que tem de
referências que mais influenciam seu uma coisa que não define meu passar praticamente invisível. O
trabalho são provenientes de outras trabalho é equipamento. Utilizo equipamento é só uma extensão do
artes, como a colagem, a pintura, o desde um celular até uma DSLR fotógrafo”, esclarece.
grafite e a música. full frame de última geração. Existe Ele não concorda com a ideia

Fotografe Melhor no 279 49


Fotos: Alexandre Urch
Cenas registradas em
São Paulo por Alexandre
Urch: a rua não é um
playground, ensina ele

Quem é ele
Alexandre Urch, 42 anos,
nasceu e foi criado em São Paulo,
onde realiza a maior parte de
seu trabalho. Utiliza a rua como
matéria-prima criativa desde
que começou a levar a fotografia
mais a sério, em 1996. Ficou
em primeiro lugar na categoria
Ensaio do 9o Concurso Leica-
-Fotografe em 2012, com uma
série realizada no metrô da capital
paulista. www.alexandreurch.
com.br / @aurch.
de que a fotografia de rua teria menor Muitas fotos e séries que fiz também
viabilidade comercial do que outras foram comercializadas em galerias ou
áreas de atuação. “O grande magazine diretamente por mim”, informa.
de roupas, a marca de tênis famosa, a As dicas de Alexandre Urch para quem
modelo para o editorial da revista, o filme quer se aventurar nessa área passam
no cinema, a marca de carro, todos esses pela segurança e pela necessidade de
produtos geram suas imagens tendo o se deslocar. “Primeiro, coloque seu
ambiente urbano como pano de fundo. equipamento e celular no seguro, a rua
Quando um fotógrafo de rua cria uma não é um playground. Em segundo lugar,
identidade em seu trabalho, aquilo que ande, ande muito, respeite a rua e a rua
seria apenas uma documentação do respeitará você. Ande sempre no sentido
Arquivo pessoal

dia a dia urbano acaba sendo alvo de contrário dos turistas e da maioria das
marcas que o contratam para campanhas pessoas, pois é nesse sentido contrário que
publicitárias, como já aconteceu comigo. a fotografia de rua se encontra”, aposta.

50 Fotografe Melhor no 279


Qualquer dia,
inclusive os chuvosos,
pode oferecer boas
oportunidades para
fotografia de rua

seguro
Antes de se
aventurar pelas
ruas é indicado
fazer seguro do
equipamento

Fotografe Melhor no 279 51


MATÉRIA DE CAPA

Guillermo Franco
só fotografa
GUILLERMO FRANCO:
com filme P&B O REAL COMO FICÇÃO
e sua Nikon No primeiro dia do ano de 2009, Nikon FM2, sem se importar muito com
FM2. Para ele, Guillermo Franco carregou sua Nikon a qualidade óptica da objetiva, sem uma
há uma espécie FM2 com um rolo de filme P&B ISO 400 distância focal predileta e utilizando, segundo
e saiu para fotografar algo que sempre o suas próprias palavras, “o rolo de filme mais
de mágica na maravilhou: a vida cotidiana de Córdoba, barato que encontrar”. Sua escolha tem a ver
imagem latente, região centro-oeste da Argentina. Foi assim com o suspense criado pela imagem latente.
no suspense que nasceu a série Allí mis Pequeños Ojos, “Gosto da fotografia analógica porque
formada por imagens capturadas nas ruas ela mantém a chama do segredo acesa.
entre o clique e e repletas de graça, ironia, sensibilidade e Faz perdurar o instante e a emoção da
o resultado final afeto. A série segue até hoje em aberto e já tomada, do clique. Centenas de instantes
gerou diversas exposições. inacreditáveis pululam pelo labirinto de
Franco é dono de um estilo poético minha memória. Talvez alguns jamais
e descontraído. Suas fotos de rua quase virão à luz. Quanto mais demoro a revelar
sempre contam a história de uma interação e a ampliar um negativo, mais duradouro
inesperada e ambígua. “O real se revela é meu prazer”, brinca.
ficção. O invisível pode ser apreciado graças Quando solicitado a dar dicas para
à imaginação. O trivial, o banal, o supérfluo quem quer seguir na fotografia de rua,
se tornam válidos quando há uma surpresa. Franco responde de maneira evasiva e
São tomadas diretas, espontâneas, vívidas. poética, com algumas citações, terminando
O agora se transforma em para sempre e o por uma frase de sua própria autoria:
Acima, a curiosidade do
menino flagrado por efêmero se torna eterno”, define ele acerca “O real é inapreensível tanto quanto
Franco quando olhava do seu trabalho. o essencial é invisível. E, no entanto, a
para dentro de um bueiro Até hoje, Franco só utiliza sua mesma fotografia é verdadeira, como a vida”.

52 Fotografe Melhor no 279


A busca pela interação entre seres vivos e as inscrições encontradas no espaço urbano está
no cerne do trabalho de Guillermo Franco: acima, exemplo do humor que desestabiliza;
ao lado e abaixo, as relações inusitadas entre um gato e um homem com grafite nos muros
Fotos: Guillermo Franco

Fotografe Melhor no 279 53


MATÉRIA DE CAPA

ficção
Por seu caráter
inusitado, cenas
banais de rua se
transformam
em peças de
ficção

Fotos: Guillermo Franco

O real como
ficção expresso na
desproporção entre o
menino e a garagem

54 Fotografe Melhor no 279


Quem é ele
Guillermo Franco nasceu em
Córdoba, Argentina, e tem 52
anos. Formou-se em Comunicação
e Fotografia. Trabalha desde
2000 como programador do
Cineclube Municipal Hugo del
Carril, na cidade onde vive, dá
aulas e escreve sobre cinema.
Pratica a fotografia de rua desde
2009 por paixão. Avesso às novas
tecnologias, nunca fotografou com
celular, não tem site nem perfil em
redes sociais.

Fotógrafo de rua deve


estar atento às rimas
visuais do cotidiano

FOTÓGRAFO POR AMOR favorita é a de Jorge Aguirre.


O uso do analógico e o prazer sentido Suas referências vão muito além da
em postergar a revelação dos negativos fotografia. Bastam algumas menções para se
se tornam viáveis na medida em que ter uma ideia. “O que leio de John Berger, a
Guillermo Franco não desenvolve seu tipografia das máquinas de escrever, o som
trabalho tendo em vista a difusão nas redes das caixinhas de música, algum verso de
sociais ou a comercialização. Seu sustento Garcia Lorca, o humor cordovês, uma estrofe

Arquivo pessoal
vem do trabalho como programador no de Alfredo Le Pera, o enquadramento nas
Cineclube Municipal de Córdoba, como pinturas de Edgar Degas, algum desfoque
crítico e professor de cinema. Assim, o de William Klein, recordar do meu pai, os
tempo está do seu lado. romances de John Fante, as mentiras de
“Vivo da fotografia no melhor sentido Federico Fellini...” A declinação termina com
O argentino Guillermo
da expressão ‘viver de’. É a fotografia que uma referência bastante pessoal: “também, Franco faz suas fotos
me anima, que funciona como uma pulsão é claro, o que façam e digam Julieta e principalmente em
de vida, e não os retornos monetários. Joaquim, meus filhos”. Córdoba, onde vive
Não busco me inserir no mercado
editorial, pois não me considero
documentarista, muito menos no
mercado de arte, pois tampouco me
vejo como artista. Sou feliz por ser um
simples fotógrafo, não profissional,
mas literalmente amador, pois pratico
por amor”, conta Franco, que esteve
no Brasil em 2017 para apresentar
seu trabalho no Festival de Fotografia
Paraty em Foco.
Quando se trata de referências,
Guillermo Franco é generoso e
menciona uma série de fotógrafos que
admira e estuda: Helen Levitt, Robert
Frank, Willy Ronis, Sabine Weiss, Ed
van der Elsken, Garry Winogrand,
André Kertész, Tony Ray-Jones, Jacques
Henri Lartigue, Ramón Masats, Sergio
Larrain, Shirley Baker, Tish Murtha,
Elliott Erwitt, Lisette Model, Izis, Martine
Franck, Édouard Boubat, Viktor Kolar
e Diane Arbus em sua primeira fase.
Dentre os argentinos, sua obra

Fotografe Melhor no 279 55


MATÉRIA DE CAPA
Fotos: Melvin Quaresma

Cena de estilo
bressoniano
captada por
Quaresma

MELVIN QUARESMA:
A IMPORTÂNCIA DOS COLETIVOS
A fotografia de rua surgiu como algo
natural na vida de Melvin Quaresma.
Na infância, ele morou em Florianópolis
(SC) e se divertia quando ia ao centro da
cidade olhar o movimento. Na época em
que começou a fotografar, já morando
em Curitiba (PR), o primeiro impulso foi
o de pegar a câmera e sair pelas ruas do
centro da cidade.
“Sou muito tímido. Para mim,
começar a fotografar na rua foi um
desafio, uma forma de superar a timidez.
Com o tempo, fui me sentido cada vez
mais à vontade para experimentar e
comecei a fazer algumas coisas mais

Meninos conversam no
interior de um ônibus: o
cotidiano é o combustível
da fotografia de rua

56 Fotografe Melhor no 279


Melvin Quaresma
chama esse tipo
de produção de
fotografia do
cotidiano: são
imagens feitas no
dia a dia, sem a
pretensão de se
transformar em
algo aprofundado

Ao lado, cena
captada no interior
de um comércio;
abaixo, senhora e seu
guarda-chuva em
composição dinâmica

segmentadas. Costumo chamar esse


tipo de produção de fotografia do
cotidiano, pois é realizada no dia a
dia e sem a pretensão imediata de
se tornar uma série ou algo mais
aprofundado”, conta Quaresma.
Das suas incursões pelas ruas da
capital paranaense, surgiu a ideia de
fazer uma série de retratos, intitulada
Centrais. Os personagens são
retratados com luz artificial – um flash
compacto dedicado utilizado com
sombrinha, fora da câmera. Todos
os retratados foram encontrados,
abordados e fotografados na rua.
Dentre os fotógrafos de rua cujo
trabalho Quaresma mais admira
estão os brasileiros Carlos Moreira
e Gustavo Minas e a americana
Vivian Maier, que trabalhava como
babá em Chicago e fotografava
nas horas vagas, tendo deixado um
enorme acervo de cenas de rua e
autorretratos, “descoberto” apenas
depois de sua morte.

Fotografe Melhor no 279 57


MATÉRIA DE CAPA
flash
A fotografia
de rua também
pode envolver luz
artificial e retratos
posados e
dirigidos

Fotos: Melvin Quaresma

Quem é ele Acima e ao lado,


retratos da série
O jovem Melvin Quaresma, Centrais, feita
de 24 anos, vive em Curitiba (PR). nas ruas de
Começou a fotografar há sete Curitiba (PR) com
flash compacto
anos e foi revelado pelo Concurso dedicado usado
Universitário de Fotografia, fora da câmera
promovido por Fotografe, do qual
foi vencedor em 2013. Desde o
início se interessou pela fotografia
de rua, pois sempre gostou muito
de frequentar o centro da cidade.
Também realiza séries documentais ABORDAGEM DISCRETA bastante e de interferir pouco”, explica. Ele
sobre temas diversos. Melvin Quaresma fotografa com uma utiliza o Instagram como principal ferramenta
www.melvinquaresma.com / Fujifilm X100F, compacta premium com para dar vazão a essas imagens do dia a
@melvinquaresma. objetiva fixa de 35 mm, e uma Panasonic dia e deixa o site para publicar as séries
GX7, mirrorless que costuma usar em documentais mais elaboradas.
conjunto com uma objetiva de 40 mm. Quaresma destaca a importância das
“Prefiro usar equipamentos pequenos, comunidades e dos coletivos de fotógrafos
justamente por conta da abordagem de rua surgidos em anos recentes. “No
discreta. Não gosto de chamar a atenção Flickr tem uma comunidade que reflete
quando estou fotografando”, relata. muito do que é a fotografia de rua
Para Quaresma, a fotografia de rua é algo contemporânea para mim. Há referências
que surge por paixão, pela pura vontade de muito boas, grupos muito fortes, com
fazer, distinta de seu trabalho documental, uma boa curadoria. O meu preferido é o
que é mais elaborado e aprofundado, e de Hardcore Street Photography. Existe um
Arquivo pessoal

sua atuação comercial. “Comercialmente, movimento de globalização que acho


faço fotografia para empresas. Tem um muito interessante, coletivos que reúnem
pouco de fotografia de rua nisso, de tudo o fotógrafos de várias nacionalidades, como o
que aprendi na rua, essa coisa de observar Burn my Eye”, aponta.

58 Fotografe Melhor no 279


Para Quaresma, a principal atitude para dos padrões mais praticados hoje em dia. Contraste entre dois
se tornar um fotógrafo de rua é pegar o Trabalho bastante em P&B, não costumo personagens que
equipamento e sair a campo, na busca de fazer composições complexas nem jogos dividem o mesmo
banco no centro de
descobrir, por conta própria e na prática, de luz e sombra, fotografo muito em dias
Curitiba (PR)
qual é a abordagem. “Minha abordagem nublados e gosto de fazer fotos simples,
é discreta. Interajo pouco com as pessoas. de fazer o mínimo, enquadramentos com
O meu trabalho na fotografia de rua foge poucos elementos”, afirma.

Fotografe Melhor no 279 59


FOTOGRAFIA DE SENSUALIDADE

Com jeitinho
oriental
O especialista
Fabio Hashimoto
mostra de maneira
descomplicada
como planeja, POR LIVIA CAPELI

H
ilumina e dirige ouve tempo em que a fotografia no início, não se sentia muito satisfeito
os ensaios com sensual era artigo exclusivo com os resultados obtidos. Foi então
suas clientes de revista masculina, coisa que ele percebeu a necessidade de fazer
apenas para modelo profissional ou uma “despoluição cultural”, abandonando
celebridade. Atualmente, o segmento vem alguns hábitos. “Parei de ver televisão
se popularizando e cada vez mais mulheres e de acompanhar grupos de fotógrafos
comuns desejam ser personagens de em redes sociais. Me isolei um pouco e
produções com poses mais calientes, explica passei a acompanhar o trabalho de alguns
o fotógrafo paulista Fabio Hashimoto, 38 estrangeiros. Percebi que precisava focar a
anos, que atende a esse público. Ele usa sensualidade das mulheres evidenciando
A pose e a atitude sua habilidade para encontrar a iluminação expressões e sentimentos, e não por meio
(acima) podem gerar
natural ideal que evidencie a beleza de de nudez explícita”, diz.
um efeito melhor em
fotos sensuais do que todos os tipos de mulher. As principais inspirações na fotografia
apenas mostrar o Hashimoto começou na fotografia de sensual vêm de fotógrafos como o alemão
corpo nu da mulher sensualidade em 2009 e confessa que, Stefan Beutler, o austríaco Ingo Kremmel,

62 Fotografe Melhor no 279


Fotos: Fabio Hashimoto

A direção da
modelo deve ser
baseada na leveza e
na confiança para a
fluência do ensaio

o australiano Peter Coulson, o belga aspectos menos emocionais e mais então a se perguntar três coisas antes
Frank de Mulder e o teuto-australiano racionais. Apostou no que define de acionar o disparador: “por quê,
Helmut Newton (1920-2004). Além como uma “direção sentimental”, para quê e para quem”. Segundo ele,
disso, a fonte de estudos de Hashimoto ou seja, ajudar as clientes a se toda luz, todo gesto e toda expressão
é baseada em livros e obras do período enxergarem poderosas sob a luz que gerada por meio de uma direção
barroco e renascentista, como as dos ele escolhe para registrá-las. fotográfica correta deve ter um “por
pintores holandeses Rembrandt e Algo que ele aprendeu por meio quê”, um “para quê” e um “para quem”.
Johannes Vermeer. do veterano fotógrafo Haruo Oki, da Ele acredita que dessa maneira a
Depois da mudança radical de revista National Geographic, quando imagem terá um sentido, uma “alma”,
referências visuais, o especialista morou no Japão, é ser mais ponderado um significado implícito, e não será
começou a fotografar considerando na hora de clicar. Hashimoto passou apenas mais uma simples foto posada.

Fotografe Melhor no 279 63


FOTOGRAFIA DE SENSUALIDADE

LUZ NATURAL
ACIMA DE TUDO
Luz indoor ou outdoor, de janela ou
porta, filtrada por cortinas, direcionada
por frestas, luz indireta e suavizada. Essas
são apenas algumas das maneiras como
Hashimoto usa os recursos da iluminação
natural nos ensaios sensuais que produz.
Ele confessa que se transformou em
um “escravo da luz” por se tornar muito
dependente de locais em que haja
somente iluminação natural: “por diversas
vezes, a composição da cena renderia
bons cliques, mas, devido à luz atender
à minha expectativa, acabo optando

Fabio Hashimoto (ao


lado com uma modelo)
prefere usar a luz do sol
ao produzir ensaios de
sensualidade (acima)

64 Fotografe Melhor no 279


Fotos: Fabio Hashimoto

Corredores (foto ao
lado) e banheiros são
alguns dos lugares
com luz natural usados
pelo fotógrafo

por locais não convencionais, como 70-200 mm f/2.8. A preferência por lentes
corredores, cantos ou banheiros”, diz ele. luminosas é pela vantagem de poder
Para obter bons resultados com a isolar as modelos com enquadramentos Com luz
iluminação natural, ele usa algumas mais fechados e conseguir um efeito de natural, uso sempre
ferramentas importantes, como o tripé desfoque mais acentuado em ambientes a câmera no tripé e
e o disparador por controle remoto sem “visualmente poluídos”, possibilitando
fio. Isso garante estabilidade na hora de assim que nada tire a atenção do assunto disparo via controle
fotografar em baixa velocidade – recurso principal em ambientes com muitos remoto sem fio. Isso
muito usado por ele, que costuma clicar elementos na composição. me garante poder
os ensaios com ajustes no obturador “Testei flashes e rebatedores muitas
variando entre 1/10s e 1/60s. vezes e percebi que esses recursos não
usar velocidade e
Além disso, o uso do tripé leva a atendem à minha expectativa quanto sensibilidade ISO
enquadramentos equilibrados e mais ao tipo e à qualidade de iluminação em mais baixos
bem pensados, além de assegurar mais comparação com a luz natural. São raros
nitidez, principalmente porque ele usa os casos em que uso um softbox caseiro
Fabio Hashimoto
sensibilidades de ISO baixas para não para simular uma luz de corredor quando
gerar ruído digital. O especialista explica não há luz disponível. Porém, procuro
que trabalha com basicamente três sempre prezar apenas a iluminação
lentes: a 50 mm f/1.4, a 85 mm f/1.4 e a natural”, comenta.

Fotografe Melhor no 279 65


FOTOGRAFIA DE SENSUALIDADE

A antiga vila de
Paranapiacaba, na
Grande São Paulo,
é uma das locações
prediletas do fotógrafo

em áreas como a gastronomia, em


sensualidade também é importante
conhecer um pouco sobre a
psicologia das cores e decidir qual se
encaixa melhor com a personalidade
de cada modelo”, explica ele.
Por exemplo, se a cliente tem um
estilo delicado, o fotógrafo costuma
optar por cores mais neutras e
tons pastel na produção (lingerie,
maquiagem, objetos de cena). Já
LOCAÇÃO TAMBÉM mulheres com personalidade mais
forte, o uso de cores como preto, azul-

É IMPORTANTE -escuro ou até mesmo um tom pastel


de cor escura, como bege ou cinza,
é bem-vindo. O alerta fica apenas
A maioria das produções de para que amigas a acompanhem. para cores como roxo, vermelho,
Fabio Hashimoto é feita na vila de Segundo ele, pessoas muito verde-limão, amarelo, laranja ou
Paranapiacaba, distrito de Santo próximas acabam quebrando a rosa-choque. “Esses tons devem
André, na Grande São Paulo, local conexão da modelo com o fotógrafo ser evitados, pois são carregados e
histórico com uma arquitetura – na prática, a cliente não consegue cansam facilmente”, diz o especialista.
diferenciada. A escolha pela locação agir naturalmente na companhia Outra ideia bastante usada por
é por ter poucos habitantes e delas, ficando muito inibida. Hashimoto é fazer muitas fotos com
baixa frequência de visitação em Além de todos os cuidados a modelo molhada. Segundo ele, isso
certas épocas do ano. Além de ser na locação e execução da luz, um costuma remeter um pouco a caos,
seguro, conta com alguns imóveis outro segredo de Fabio Hashimoto entrega e loucura. Então, o plano é
abandonados com boa qualidade de é cuidar da cor que será abordada colocado em prática sempre no final
iluminação natural. Há moradores nas produções do ensaio sensual. do ensaio, para não comprometer a
que também são muito receptivos e “Assim como é comum esse estudo maquiagem e a produção.
costumam indicar a ele as melhores
edificações da vila construída
pela companhia inglesa São Paulo No final do ensaio,
Hashimoto costuma
Railway no fim do século 19. fazer imagens com
O fotógrafo também realiza a modelo molhada
os ensaios no apartamento onde
mora, em São Bernardo do Campo
(SP). Apesar de considerar o local
pequeno, é confortável e seguro para
as modelos, além de proporcionar
uma iluminação mais intimista,
pois ele trabalha de maneira muito
reservada e conta apenas com a
ajuda de maquiadora, contratada
para executar o trabalho estético.
Na maioria dos casos, a pessoa
prefere apenas o fotógrafo e alguém
conhecido dela no set. O especialista
explica que evita ao máximo manter
no set pessoas muito próximas da
cliente, como pai, mãe, namorado ou
marido, dando sempre preferência

66 Fotografe Melhor no 279


Nos ensaios, além da
maquiadora, há sempre
alguém de confiança da
modelo no local, desde
que não seja muito
próximo a ela, como
marido ou namorado

cores
O fotógrafo
se baseia na
psicologia das
cores para
escolher os
figurinos
Fotos: Fabio Hashimoto

Fotografe Melhor no 279 67


FOTOGRAFIA DE SENSUALIDADE

direção
O gesto, a
expressão e o
olhar fazem
muita diferença
nesse tipo de
ensaio

Aqui o olhar e a posição


das mãos geram uma
sensualidade descontraída

PSICOLOGIA
NA DIREÇÃO
A parte mais importante na hora de fotografar
uma modelo em um estilo sensual sentimental,
segundo Hashimoto, é ser o principal protetor dos
interesses dela e sempre mostrar profissionalismo:
esse é o pilar fundamental para que a cliente se
desenvolva bem e se entregue ao trabalho. “É
essencial considerar sempre o ensaio sensual
como algo delicado e ao mesmo tempo muito
difícil para a modelo, pois é o momento em que
ela se encontra mais vulnerável. É de extrema
importância passar segurança e conforto para que
a modelo se sinta especial, consiga se entregar e
entrar no clima do estilo do ensaio”, ensina.
Para Hashimoto um dos aspectos mais
importantes na hora de fotografar uma mulher
é induzi-la indiretamente a ter expressões e
representar sentimentos com técnica de respiração,
tom de voz apropriado, gestos com as mãos e as
pernas para que isso transpareça nas imagens. Ele
acredita que o corpo, as curvas e a pele devem ser
apenas uma extensão da expressão da modelo,
e que a sensualidade deve partir do que ela está
sentindo no momento. Segundo o especialista, é
Fotos: Fabio Hashimoto

muito mais sensual uma modelo de lingerie com


uma expressão de desejo ou entrega do que uma
totalmente nua sem expressar nada.
“A técnica consiste em fazer com que a
modelo se expresse sem que o fotógrafo precise
dar um comando verbal, como pedir um sorriso
A modelo deve se sentir confortável e segura, ensina Hashimoto ou um olhar sensual. As expressões, os gestos, os

68 Fotografe Melhor no 279


Os olhos
fechados e a
posição das
mãos passam
ideia de algo
mais íntimo

olhares e as poses são pedidos de no rosto e no colo remetem ao


forma subjetiva, como solicitar que sentimento de desejo, já cabeça
a modelo respire fundo, devagar e baixa olhando para a câmera
de olhos fechados, massageando remete a ideia de personalidade
o rosto e o colo, caracterizando forte desejando alguém. Outro
uma expressão de entrega”, exemplo estudado por ele são os
explica Hashimoto, que estudou o lábios úmidos. Fisiologicamente,
comportamento e a fisiologia que segundo o fotógrafo, isso remete ao
caracterizam uma mulher no auge período fértil da mulher, quando os
de sua sensualidade. lábios e a pele tendem a ficar mais
Para ele, as características úmidos, fazendo com que ela seja
de desejo e de sensualidade são reconhecida pelo sexo oposto como
representadas de forma visual sendo mais “atraente”.
indireta, sem que o observador Para quem deseja produzir fotos
perceba, porém, tudo transparece de sensualidade, Fabio Hashimoto
nas imagens: olhos fechados podem lembra que é importante nunca
significar entrega assim como mãos induzir a modelo a entrar em um
personagem, como se fosse uma
atriz, pedindo para que expresse um
sentimento. O sucesso consiste em
saber o tom de voz e a velocidade
certa para dirigir a modelo, o
que irá interferir diretamente no
ritmo e no clima mais sensual do
ensaio. Para quem quer aprender
mais, o especialista também
ministra cursos sobre o assunto.
Informações podem ser encontradas
no site dele: https://500px.com/
fabiohashimoto777.

Fabio Hashimoto
trabalha na área
desde 2009 e dá
cursos sobre o tema

Fotografe Melhor no 279 69


FOTOJORNALISMO

Soldados revistam
passageiros de ônibus
na Estrada Norte,
perto de Suchitoto,
El Salvador, em 1980

As lições de
Susan Meiselas POR JUAN ESTEVES

Exposição
retrospectiva da
grande fotógrafa
V er o trabalho de um grande
fotógrafo internacional
exposto no Brasil é sempre
uma oportunidade de aprender
anos de carreira resumidos na mostra
retrospectiva Susan Meiselas: mediações,
com cerca de 180 imagens.
Na noite de abertura da exposição,
da Magnum, que algo. Com o trabalho da americana em outubro de 2019, Susan Meiselas,
Susan Meiselas, a maior lição está na 71 anos, mostrou ao público o que é
vai até março de forma como ela documenta questões o envolvimento de um fotógrafo com
2020 em São humanitárias e trata de suas narrativas seus temas, principalmente quando
fotográficas, seja em regiões de conflito a questão humanitária está mais
Paulo, é uma aula ou acompanhando mulheres em shows próxima, caso do trabalho que ela fez
sobre como contar de striptease. Esse material pode ser no Curdistão, nome dado à região
visto no Instituto Moreira Salles (IMS) histórico-cultural habitada de forma
histórias por meio da Avenida Paulista, em São Paulo (SP), majoritária pelos curdos, com cerca de
de imagens até dia 1o de março de 2020. São 40 500 mil km², compreendendo territórios

70 Fotografe Melhor no 279


Acima, passeando
na rua Baxter,
Little Italy, Nova
York, EUA, em
1978, imagem
da série As
meninas da rua
Prince; ao lado,
Myra e amigas
fotografadas
em Greenville,
Carolina do Sul,
EUA, em 1974,
para a série
Retratos na
varanda
Fotos: Susan Meiselas

na Turquia, no Irã, na Síria e no a fotógrafa da lendária agência history (Chicago Press, 2008).
Iraque. Na primeira fala, ela mal Magnum entrou no Iraque para Ela diz que o conteúdo de sua
conteve as lágrimas ao dizer que, registrar as aldeias destruídas pelo mostra certamente não tem um
no momento em que estava ali, os ditador Saddam Hussein na ofensiva impacto profundo na situação dos
americanos haviam retirado suas de Anfal, em 1988. Ao retornar ao curdos, mas com a disseminação
forças militares da fronteira entre Iraque em dezembro de 1997 com da informação sobre eles sendo
Síria e Turquia, abrindo caminho o antropólogo forense Clyde Snow, mais ampla, ajuda as pessoas a ter
para uma ofensiva dos turcos, que ela documentou a exumação dos uma compreensão geral sobre suas
querem dominar à força a região restos mortais de curdos enterrados reivindicações. “O povo do Curdistão
controlada pelos curdos. em massa (muitos, vítimas de armas hoje entende melhor as coisas, mas
Esse envolvimento com a causa químicas). É dessa viagem que surge não vai parar de cair bombas em
curda começou em 1991, quando o livro Kurdistan, in the shadow of cima deles”, comenta.

Fotografe Melhor no 279 71


Jovens praticam o O FOTOJORNALISMO HOJE
arremesso de bombas
de contato na floresta Na contrapartida do esvaziamento força de Robert Capa e Cartier-Bresson
ao redor de Monimbo, comercial do fotojornalismo, o alcance no fotojornalismo”. Mas ela alerta que a
Nicarágua, em foto das imagens hoje é muito maior que nos cooperativa vem mudando seu espectro
de junho de 1978 anos 1970. “Pensávamos que a fotografia desde o princípio, com diferentes pontos
fazia uma ponte com o mundo, mas de vista de trabalho e de plataformas.
temos imensas limitações. Ainda assim “Em 1976, quando o trabalho da
a fotografia pode ser valiosa. Acredito Nicarágua estreou em revistas, penso que
Em 1976, que agora podemos assimilar com mais ilustrávamos os textos. Hoje é diferente,
penso que nós complexidade o mundo. Eu questiono mas ainda tem gente trabalhando assim.
ilustrávamos textos. todo o tempo. Não é um tempo fácil que É mais difícil achar maneiras de sobreviver
Hoje é diferente, estamos vivendo, temos que achar novos para os jovens fotógrafos atualmente”.
mas ainda tem meios de tocar as pessoas, é um desafio Com apenas dois anos de Magnum,
em movimento”, avalia Meiselas. Susan Meiselas embarcou para a
gente trabalhando O fotógrafo alemão Thomas Hoepker Nicarágua para cobrir a chamada
assim. Também disse no Festival Paraty em Foco de 2008 Revolução Sandinista, que depôs o ditador
está mais difícil que, naquela ocasião, via a Magnum Anastacio Somoza (morto em 1980
para os jovens querendo produzir “imagens para a quando um projétil de bazuca acertou seu
fotógrafos parede”, voltadas para arte e decoração. carro durante o exílio no Paraguai). Fez
Ela comenta: “Meu sentimento olhando imagens que correram o mundo e que
Susan Meiselas para a Magnum hoje é que ainda vejo a catapultaram sua carreira definitivamente.

72 Fotografe Melhor no 279


Fotos: Susan Meiselas
Acima, o homem-molotov em foto
icônica de Meiselas feita em Estelí,
Nicarágua, 16 de julho de 1979; ao
lado, imagem da série Curdistão,
feita no norte do Iraque em 1991

As fotos produzidas durante a


Revolução Sandinista estão sendo exibidas
em uma espécie de instalação, Nicarágua:
mediações (1978-1982). A obra inclui
também páginas de revistas onde as
imagens foram publicadas. Ao lado, há
uma projeção do vídeo Reenquadrando a
história, que documenta uma intervenção
realizada por Meiselas e Alfred Guzzetti
em 2004, no aniversário de 25 anos da
insurreição do país, que desde julho de
1979 tem o ex-guerrilheiro Daniel Ortega
como presidente. Na sequência, ela foi
para El Salvador, que em 1979 sofreu um
golpe de estado.

Fotografe Melhor no 279 73


FOTOJORNALISMO

causas
A fotógrafa
tem como marca
o envolvimento
com as causas

Fotos: Susan Meiselas


humanitárias

Acima, foto da série


Carnival Strippers, feita
em Fryeburg, EUA, em
NA ESTRADA COM STRIPERS
1975; abaixo, Susan Susan Meiselas também é reconhecida Nascida em 1948, em Baltimore,
Meiselas no Brasil, em por trabalhos anteriores ao de coberturas Maryland, ela se graduou em Educação
retrato de Juan Esteves
de conflitos, como Carnival Stripers, de Visual na Harvard University School
1976, ano em que ingressa na Magnum of Education. Foi nessa escola, em
Photos. Essa é uma de suas séries mais Cambridge, que ela começou a fazer
conhecidas, e ganhou uma sala no retratos em negativos 4 x 5 polegadas dos
IMS. É o primeiro documentário que já colegas, cada um deles acompanhado de
adiantava o longo envolvimento com um texto que explicava como eles se viam
seus projetos: nos verões de 1972 a nas imagens. Simultaneamente também
1975, ela acompanhou um grupo de foi assistente do documentarista Frederick
mulheres em shows de striptease na Nova Wiseman no filme Basic Training, de 1971.
Inglaterra, região nordeste dos Estados Na mostra em São Paulo estão os
Unidos que abrange os estados de Maine, principais trabalhos antigos de Susan
Vermont, Nova Hampshire, Massachusetts, Meiselas e alguns mais recentes, como
Connecticut e Rhode Island. o sobre violência doméstica e de
Além de fotografar, gravou adolescentes de rua. Antes de chegar
depoimentos com as mulheres stripers, ao IMS Paulista, a exposição passou
com clientes e gerentes dos eventos. pelas cidades de Barcelona, Paris e São
“Interessava-me observar como elas eram Francisco. A curadoria é da catalã Marta
vistas dentro daquele mundo e ouvir o Gili, nova diretora da École Nationale
que elas tinham a dizer sobre si próprias Supérieur de la Photographie, em Arles,
Foto: Juan Esteves

em vez do que as pessoas falavam delas. França; da zimbabuense Pia Viewing,


Um processo de identificação consigo curadora do Jeu de Paume, de Paris; e do
mesma no sentido dos desafios que a vida catalão Carles Guerra, diretor da Fundació
impõe”, explica a fotógrafa. Antoni Tàpies, de Barcelona.

74 Fotografe Melhor no 279


Autorretrato de
Susan Meiselas feito
em Cambridge,
EUA, em 1971

Fotografe Melhor no 279 75


RETRATO Tika Tiritilli

Autorretrato de
Tika Tiritilli, que
atua como um dos
coordenadores do
coletivo paulista

Criação coletiva e
expressão pessoal
POR ÉRICO ELIAS

C
O coletivo Cia. om 42 mil habitantes, Espírito coletivo, cujo nome é uma homenagem
da Hebe vem Santo do Pinhal é uma pequena a Hebe Sucupira, mãe de Monica, ilustre
transformando cidade do interior paulista na cidade por sua produção artística nas
situada na Serra da Mantiqueira, a 200 áreas da poesia e da pintura. “Uma mulher
vidas numa km da capital. Desde 2015, a morna cena que viveu mais de noventa anos e que
pequena cidade artística local começou a se transformar sempre teve atitudes, pensamentos, ideias
graças à ação do coletivo Cia. da Hebe, ousadas e criativas que fugiam ao padrão
do interior uma associação cultural sem fins lucrativos da sua geração. Ela inspirava coragem em
paulista por que promove cursos de formação em uma sociedade carente de liberdade. Mais
fotografia e eventos culturais, como que uma homenagem, é uma inspiração”,
meio do estudo projeções, ocupações, encontros com explica Monica.
e da prática profissionais e lançamento de livros. Em 2016, o fotógrafo e publicitário
Essa história começou quando a João Barim se juntou às duas fundadoras
fotográfica. diretora teatral Monica Sucupira se juntou na coordenação do projeto. “Quando
Saiba mais à fotógrafa Tika Tiritilli para fundar o ingressei no Cia. da Hebe, em 2016, passei

78 Fotografe Melhor no 279


Maria José Benassi
Acima, autorretrato de Maria José Benassi, que gosta de interferir em suas imagens com uso de pintura e costura;
abaixo, imagem do ensaio (Re)flexões de Gênero, dos irmãos João e Tamara Barim e autorretrato de Fernanda Poli

João e Tamara Barim

a deixar um pouco de lado a cabe aqui. Essas são as palavras


linguagem publicitária para abrir que nos denominam. O Cia. da
espaço à fotografia autoral, num Hebe abriga pessoas de todos
movimento intenso de expansão os tipos, sem nenhuma restrição
e de desconstrução do olhar”, de gênero, origem, ideias,
ressalta Barim. conhecimento, formação ou idade.
Apesar de a maioria dos O bonito é que o aprendizado
integrantes do coletivo ser de vem desse coletivo formado da
mulheres, não há restrições para diferença, que não fala a mesma
participação. “O mundo inteiro língua”, diz Monica.
Fernanda Poli

Fotografe Melhor no 279 79


RETRATO

arte
Os encontros
do coletivo
estimulam nos
participantes
a expressão
pessoal

Aline Inácio
Autorretrato de Aline
NA BASE DOS ENCONTROS
Inácio: gênero é um dos Anualmente, o Cia. da Hebe realiza aprofundar os trabalhos individuais. Ao
mais praticados pelos os Encontros de Criação Fotográfica, final, retornam com as produções para
integrantes do coletivo
que são 24 ao longo do ano. Durante debater e finalizar. João Barim ensina
o processo, os participantes partem a técnica enquanto Monica Sucupira
de reflexões coletivas para depois e Tika Tiritilli trabalham o processo

Transformação de vidas
O Cia. da Hebe vem outro, o ângulo, a iluminação. Não o grupo e os demais participantes estão
transformando vidas, conforme sabia nada disso. Outro dia fiquei interessados em ouvir e compartilhar,
é possível perceber pelo relato muito feliz quando pude realizar pensar, repensar, ver de novo… é
de alguns participantes. Rita um exercício de cor, prestando quando realmente acredito que a arte
Maia, de 57 anos, entrou para o atenção no ônibus circular que me transforma”, afirma.
coletivo em 2017 e sequer sabia levava para a casa”, conta Rita.
fotografar. Com o tempo, além Leticia Lunga, de 22 anos,
João Barim

de fazer fotos, passou a realizar entrou no coletivo em 2018. Foto do grupo em


colagens e intervenções com o Ela, que gostava de fotografar frente ao casarão da
uso de panos, linhas, impressões, natureza e pássaros, diz que a família Sucupira, em
xerox, palavras e desenhos. experiência no grupo mudou seu Espírito Santo do
“O coletivo me encorajou estilo e abriu sua percepção para Pinhal (SP)
a desenvolver uma maneira de as pequenas coisas do dia a dia.
trabalhar a fotocolagem. Aprendi “Descobri muito nos autorretratos,
que fotografia não é somente olhar descobri a fotografia e a mim
e apertar o botãozinho. Tem tantas mesma. É bonito quando você
coisas envolvidas, o contato com o mostra um trabalho pessoal para

80 Fotografe Melhor no 279


Rita Maia
João e Tamara Barim

Acima, foto do ensaio (Re)flexões de Gênero, que brinca com


ambiguidades visuais; ao lado, autorretrato de Rita Maia

criativo. Os três coordenadores visitas guiadas com estudantes e trata de um coletivo de fotógrafos
também orientam os participantes conversas com o público em geral já formados, mas em formação.
individualmente para ajudá- acerca das obras expostas e da “Nossa motivação está sempre
-los a desenvolver os projetos e a proposta estética. Além de envolver no ‘não artista’, o participante
transformar as ideias em imagens. a população local, as exposições que não sabe nada, o curioso ou
Depois de todos os encontros, o também atraem turistas, que se ainda o que sempre teve vontade
resultado é uma exposição coletiva, surpreendem com uma mostra de de ser fotógrafo. Ao passarem
realizada em um casarão centenário arte contemporânea em uma cidade pelos encontros, eles se motivam,
da família Sucupira, no centro da do interior voltada ao ecoturismo. adquirem formação e informação,
cidade. Já foram realizadas três A proposta dos encontros é não somente na área da fotografia,
edições do evento: 175 Ocupação despertar o impulso criativo nos mas nas artes de maneira geral.
Fotográfica, em 2017; Deslimites, participantes. Durante o processo, Acima de tudo, experimentam um
em 2018; e TRANSAções, em 2019, eles percebem que todos os pouco sobre o processo artístico
programada para ficar em cartaz seres humanos são dotados em fotografia por meio da imersão,
até o dia 10 de janeiro de 2020. Os da capacidade de se exprimir da convivência e do diálogo com os
integrantes do coletivo promovem artisticamente. Por isso, não se colegas”, relata Monica.

Fotografe Melhor no 279 81


RETRATO

COM FOCO NOS


AUTORRETRATOS
O movimento de descoberta pessoal Na edição de 2019 do festival, o Cia.
O trabalho por intermédio da fotografia acaba da Hebe se destacou na chamada Selfie
gerando muitas produções no campo em Foco, voltada aos autorretratos. Sete
coletivo no dos autorretratos. É o caso da série participantes do coletivo tiveram imagens
Cia. da Hebe (Re)flexões de Gênero, produzida pelos pré-selecionadas e duas participaram
irmãos João e Tamara Bardim, que da exposição, Maria José Benassi e Tika
permite aos explora a semelhança entre os dois Tirikilli. A variedade de abordagens
participantes para criar uma confusão visual e um dentro de um mesmo gênero demonstra
desenvolverem questionamento do espectador. O que o grupo de Espírito Santo do Pinhal
trabalho esteve entre os finalistas da conseguiu criar um espaço em que os
uma relação Convocatória Portfólio em Foco 2018, participantes produzem de maneira
particular com a realizada pelo Festival Paraty em Foco. coletiva dando vazão a visões individuais.
fotografia, que
comporta muitas
descobertas

Autorretrato de Dani
Cavalheri representa o
movimento de descoberta
propiciado pelo coletivo

Dani Cavalheri

82 Fotografe Melhor no 279


Autorretrato de
Roberta Sucupira

Roberta Sucupira
Mesmo os coordenadores do para despertar um outro olhar nos
coletivo Cia. da Hebe estão em participantes, tanto para consigo
constante aprendizado, como mesmo quanto para o mundo. O
testemunha Tika Tiritilli. “Aprendo coletivo é sempre um desafio e uma
diariamente a conviver, a falar a conquista, minúsculo e gigante,
mesma língua, a pensar no outro, não é trabalho, mas pensamento de
a pensar junto, a exercitar a criação vida”, avalia a fotógrafa.
Letícia Lunga

Outro autorretrato de integrante do Cia. da Hebe, realizado por Letícia Lunga

Fotografe Melhor no 279 83


EQUIPAMENTO

p
Câmeras para
todo momento POR SÉRGIO BRANCO

Conheça três
compactas
premium
A conversa começou de
forma banal, com um “estão
demorando para chamar para
o embarque, né?”. Minutos depois, eu
sabia que ele era um engenheiro civil
dia seguinte, ele respondeu, agradeceu
e disse que passaria as dicas para um
amigo, que tinha as mesmas dúvidas. Aí
me dei conta de que muita gente pode
ter esse tipo de questionamento, pois,
versáteis, com uruguaio, e ele, que eu era um jornalista. dias antes, uma colega de trabalho, de
muitos recursos, Mas, quando o companheiro de viagem outra revista da Editora Europa, havia
que podem foi informado de que eu editava uma perguntado a mesma coisa.
revista especializada em fotografia, Portanto, se você quer dicas de
ser excelentes não se conteve: “Puxa, você caiu do câmeras de alta qualidade e práticas
companheiras de céu. Gosto de fotografar quando viajo e para levar em viagens, para ter ao seu
preciso de uma câmera nova. O que me lado a todo momento ou como reserva
viagem e estar sugere?”. Quando eu ia começar a falar do equipamento principal em caso de
na bolsa para as sobre o assunto, nos chamaram para o emergência, saiba que os modelos que
embarque. Trocamos cartões de visita sugeri são os seguintes: Canon PowerShot
mais variadas e, depois, com calma, enviei dicas para G5 X Mark II, Sony Cyber-shot DSC-RX100
situações o engenheiro Alejandro por e-mail. No VII e Panasonic Lumix DC-FZ1000 II.

84 Fotografe Melhor no 279


Shutterstock
A Canon G5X Mark II e
a Sony RX100 VII são
compactas com perfil
profissional e contam com
visor eletrônico pop-up

A Panasonic Lumix
FZ1000 II é uma
compacta com zoom
Leica de até 400 mm f/4

na primeira semana de novembro


de 2019. E a razão é simples: com
os impostos e as taxas absurdas
Fotos: Divulgação

aqui cobradas, o preço delas seria


assustador. Pego como exemplo
a Lumix DC-FZ1000 II, já que a
Panasonic há muito deixou de vender
câmeras no Brasil justamente porque
não conseguia oferecer preços
competitivos: ela custa US$ 898 na
famosa loja BH, de Nova York. Com
o dólar a uma média de R$ 4, já
representaria um preço de R$ 3.592.
As duas primeiras são menores, que eles podem resolver em muitas Numa conta simples, com impostos e
compactas no sentido mais amplo, ocasiões, mas não em todas. Não taxas (o mais alto é o de importação,
e a última um pouco maior, quase largo meu iPhone e faço muitas de 60%), o preço final varia de 2,5 a 3
do tamanho de uma DSLR, mas imagens com ele, mas, quando vezes o valor em dólar (depende da
ainda bem portátil e com uma penso em fotografia mais elaborada, margem de lucro de quem vende).
série de virtudes. Não são câmeras ainda prefiro a câmera. As três, aliás, Isso faria o preço da câmera saltar
baratas, pois são modelos premium, são avançadas e conectadas, por isso para algo entre R$ 8.980 e R$ 10.775!
e em comum têm o sensor de bom acho que qualquer uma delas e um Assustador, não?
tamanho (uma polegada) e lentes smartphone de qualidade formam O preço em dólar me parece
luminosas de alta qualidade. uma dupla perfeita. justo para as virtudes das três
Mas você pode perguntar: os O único senão das três câmeras comparando com modelos
smartphones avançados de hoje indicações é que você não as concorrentes. Veja a seguir um
não dão conta do recado? Posso encontra à venda no Brasil – pelo resumo dos principais recursos que
assegurar por experiência própria menos enquanto escrevia este texto, esses modelos oferecem.

Fotografe Melhor no 279 85


EQUIPAMENTO

Ela é pequena,
robusta e tem
monitor móvel
sensível ao toque

CANON G5 X MARK II
O que pode ser destacado da G5 X segundo no disparo contínuo e faz vídeos
Mark II é a lente zoom equivalente a 24- em UHD 4K 30p. A luminosidade da lente
-120 mm f/1.8-2.8, o sensor CMOS de 1 permite fotografar em condições de baixa
Modelo mais polegada (13,2 x 8,3 mm) com resolução luz (além de controle sobre a profundidade
recente da série de 20,2 megapixels e o processador DIGIC de campo para trabalhar com foco seletivo)
G da Canon, a 8. É modelo recente da excelente linha e a amplitude do zoom serve para a maioria
G, que começou com a G1 em 2000 e das situações do cotidiano de fotografia.
câmera oferece passou a ter versões com uma pegada Ela tem um interessante visor eletrônico
uma ótima lente mais profissional a partir da G1 X, de 2012 pop-up com resolução de 2,36 milhões
zoom 24-120 mm (tenho uma, comprada no Japão em 2013, de pixels, embora o melhor para esse tipo
que me acompanha até hoje em viagens). de câmera seja enquadrar e fotografar
f/1.8-2.8 e tem A G5 X Mark II tem desempenho rápido via monitor, que tem 3 polegadas, é
conectividade de de autofoco, oferece gravação rápida em sensível ao toque e conta com ótima
última geração resolução total de até 20 imagens por mobilidade, podendo ser inclinado para
cima em ângulo de até 180°. Há botão de
compensação de exposição, anéis e botões
de controle manual, o que lhe dá um
aspecto mais profissional.
Em conectividade, oferece Bluetooth
e Wi-Fi integrados para transferência de
imagens sem fio para um dispositivo móvel
e também torna possível o controle remoto
da câmera por meio do aplicativo Canon
Camera Connect. Uma novidade são os
modos dedicados a imagens de estrelas,
algo que está na moda: Star Nightscape,
Fotos: Divulgação

Star Trails e Star Time-Lapse, que podem


ser usados com configurações automáticas
ou manuais, e funções de suporte, como
exibição noturna, ajuste de cores e ênfase
em estrelas para melhorar o resultado final.
A G5 X Mark II dispara à velocidade de 20 imagens por segundo Preço nos EUA: US$ 899.

86 Fotografe Melhor no 279


SONY RX100 VII
Um dos grandes trunfos da Sony
Cyber-shot DSC-RX100 VII é agregar
qualidade óptica, velocidade de operação,
alcance do zoom e portabilidade. Produto
da sétima geração da série RX100, iniciada
em 2012, o modelo mais recente mantém
a lente produzida pela grife alemã Carl
Zeiss. É uma Vario-Sonnar T*, equivalente
a 24-200 mm f/2.8-4.5, que oferece
anel de controle manual. Tem ótima
luminosidade em todas as distâncias focais,
de grande angular a tele, e estabilização de
imagem eficiente. O conjunto se completa
com um sensor CMOS Exmor RS BSI de
1 polegada de 20,1 megapixels e um
processador de imagem Bionz X.
A pequena câmera dispara à velocidade
de até 20 imagens por segundo (ims) e
permite uma configuração extrema de até
90 ims para captar temas muito rápidos.
A lente Carl Zeiss 24-200 mm
Essa novidade é fruto da função Single Burst f/2.8-4.5 é uma das principais
Shooting, que permite capturas também virtudes da RX100 VII
nas velocidades de 60 ims e 30 ims. Para
esse desempenho, o obturador eletrônico
pode trabalhar em velocidades de até
1/32.000s, e o autofoco é baseado em um
sistema híbrido, bastante ágil (ação em até
0,02s), com 357 pontos de focagem no visor,
detecção de fase e 425 áreas de detecção
de contraste. É o que a Sony chama de
Rastreamento em Tempo Real baseado
em inteligência artificial para objetos em
movimento e o AF ocular em tempo real,
adequado para animais e humanos, que visa
assegurar nitidez em retratos.
Em vídeo, a alta taxa de disparo permite
ainda gravar até 960 frames por segundo
(fps) para reprodução em câmera lenta. precisão
E há também uma função de captura O autofoco da
de foto incorporada diretamente à câmera é baseado
câmera, permitindo que o fotógrafo salve em 357 pontos
rapidamente uma imagem estática de e 425 áreas de
8 MP de um filme em UHD 4K. contraste
A RX100 VII tem ainda visor pop-up
eletrônico OLED de 2,36 milhões pixels,
além de um monitor sensível ao toque
de 3 polegadas, móvel em ângulo de até
180° para cima, com as funções Touch
Focus, Touch Pad AF e Touch Shutter.
Ela tem conectividade Wi-Fi e Bluetooth
para compartilhar imagens, incorporar
informações de localização no smartphone
ou, por meio do Smart Remote Control,
controlar remotamente o disparador. Todos
esses recursos têm um preço: US$ 1.298. O monitor de 3 polegadas também é móvel e sensível ao toque

Fotografe Melhor no 279 87


A lente zoom Leica
25-400 mm f/2.8-4
é uma dos grandes
PANASONIC trunfos da FZ1000 II,
que agora tem monitor

FZ1000 II sensível ao toque

Além de ser uma câmera sob chega com poucas mudanças e obter imagens estáticas de 8 MP
medida para viagens, muitos mantém a excelente lente Leica DC à velocidade de 30 ims de três
fotógrafos que gostam de fazer Vario-Elmarit equivalente a 25-400 maneiras: o 4K Burst, que grava
imagens de animais silvestres, mm f/2.8-4, o seu grande destaque. continuamente imagens por minutos,
observação de pássaros e de E, como nas duas câmeras anteriores, opção ideal para casos em que o
paisagens já haviam descoberto o o sensor é CMOS de 1 polegada com fotógrafo precisa de uma taxa de
primeiro modelo, a Lumix FZ1000, 20,1 megapixels de resolução. disparos ultrarrápida; o Pré-Burst
lançada em 2014, como alternativa A combinação de uma grande 4K, que grava imagens um segundo
relativamente barata para um angular ampla com uma supertele antes e um segundo depois para
zoom potente com alta qualidade de abertura máxima f/4 transforma quando não há certeza do momento
e luminosidade. A nova FZ1000 II a FZ1000 II em uma câmera única crítico do disparo (haverá 60 fotos
no quesito custo-benefício. Ela para escolher); e o 4K Burst (S/S),
trabalha em até 12 imagens por que segue mais de perto o processo
segundo em disparo contínuo na de gravação de vídeo 4K e permite
resolução máxima e chega a 30 ims reproduzir o vídeo, pausar no
na resolução de 8 MP (novidade em momento escolhido e usar o botão
relação ao modelo anterior). Conta disparador para marcar um quadro e
Fotos: Divulgação

com um estabilizador óptico de salvá-lo como uma foto de 8 MP.


imagem de 5 eixos para minimizar a Na FZ1000 II, uma nova função
trepidação no uso da tele. de marcação automática facilita a
Como filma em UHD 4K a 30p, seleção de centenas de quadros
a FZ 1000 II mescla fotografia e capturados nos modos 4K Photo
vídeo de maneira muito e permite ir para o quadro mais
prática: a função 4K próximo com diferenças mais
Photo possibilita notáveis entre os consecutivos, o
que minimiza o tempo gasto na
revisão de imagens. O novo modelo
ganhou ainda o modo Sequence
O porte da Composition, usado para mesclar
FZ1000 II é imagens gravadas sequencialmente
próximo ao
de uma DSLR nos modos 4K Photo e compô-las
em uma única foto (stromotion),
mostrando o movimento do assunto
com um fundo estático.

88 Fotografe Melhor no 279


O recurso 4K Photo da FZ1000 II surpreende,
caso do modo Sequence Composition (acima)

Outra novidade para as imagens região específica da imagem que se Como tem porte de DSLR, a
dos modos 4K Photo é o Pós-foco, deseja focar e um arquivo JPEG de FZ1000 II incorpora um visor eletrônico
que trabalha em conjunto com o 8MP será gerado. Com isso, vários OLED, além do monitor articulado de
sistema de detecção por contraste arquivos individuais com diferentes 3 polegadas e com 1,24 milhão de
e o modo inteligente Profundidade pontos de foco podem ser criados pontos (resolução pouco maior que o
de Desfocagem. Assim, é possível a partir da sequência original. Essa anterior). Além disso, Wi-Fi e Bluetooth
mudar o ponto de foco específico tecnologia também permite produzir integrados permitem compartilhar
após o disparo em sequência para empilhamento de foco na própria imagens sem fio ou controlar
ter faixas distintas a escolher. Durante câmera para obter uma maior remotamente a câmera a partir de um
a reprodução no monitor, agora profundidade de campo na imagem, smartphone ou um tablet. O preço é
sensível ao toque, basta tocar na especialmente para temas em close. bem atraente: US$ 898.

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