Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
“Na complexidade da vida contemporânea, cada pessoa está exposta a riscos e a ser
responsabilizada por atos seus ou das pessoas cujos atos lhe determinem a
responsabilidade. Tanto se pode segurar o risco de se ser ofendido como o risco de se
ofender”[1]
É inequívoca a omissão danosa cometida pela Ré, uma vez que diante das
conclusões técnicas contidas nos documentos acostados a essa petição inicial, está claro
que a Ré jamais instalou na área na qual o imóvel sinistrado pertence qualquer
equipamento de estabilização ou dispositivo de segurança capazes de impedir a variação
de tensão na rede, de modo a evitar danos aos consumidores.
Sendo assim, considerando que parte dos prejuízos foram suportados pela
segurado e não foram objeto de sub-rogação pela Autora (CCB 786 e STF 188), bem
como considerando os limites de indenização que constam da apólice, observa-se que a
expressão pecuniária da pretensão processual contida na presente demanda é de R$
5.757,42 (cinco mil, setecentos e cinquenta e sete reais e quarenta e dois centavos),
que foi efetivamente prestada em 05.11.2013,consoante comprovante de pagamento
anexo (vide Doc. 09).
Insta ressaltar, por fim, que a Autora entrou em contato com a Ré diversas
vezes, no intuito de transacionar a situação litigiosa pendente e resolver a questão
extrajudicialmente, tentativas estas que, infelizmente, restaram infrutíferas.
“A omissão é causa do dano sempre que haja o dever jurídico de praticar um acto
que, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação desse dano.
Existe nexo de causalidade entre uma omissão e certo evento quando, dadas as regras
de experiência, e as circunstâncias conhecidas ou cognoscíveis pelo sujeito, a prática
a prática do acto omitido teria, segura ou muito provavelmente, evitado esse evento,
previsto ou previsível pelo sujeito”.[8]
A aplicação do CDC in casu encontra sólido fundamento em nosso ordenamento
jurídico e respeita o quanto dispõe a CF 5º XXXII, que garante especial proteção ao
consumidor frente aos vícios e defeitos na prestação dos serviços pelo fornecedor.
Como se não bastasse – conforme propõe a teoria do diálogo das fontes[9] –
a coexistência com outros diplomas legais não diminui a força das normas protetivas do
CDC ou abala as prerrogativas do consumidor, razão pela qual mesmo diante das
disposições do CCB, igualmente aplicáveis ao presente caso, o dever desse D. Juízo é
realizar a subsunção legal com vistas à garantir ampla proteção ao consumidor dos
serviços prestados, de forma defeituosa, pela Ré (que, como verificar-se-á, aproveita a
Autora por força expressa de lei).
“O diálogo das fontes, expressão criada por Erik Jayme, em seu curso de Haia
(Jayme, Recueil des Cours, 251, p. 259), significa a atual aplicação simultânea,
coerente e coordenada das plúrimas fontes legislativas, leis especiais (como o CDC, a
lei de seguro-saúde) e gerais (como o CC/2002), com campos de aplicação
convergentes, mas não mais iguais”.[10](Nossos grifos).
Na situação exposta a esse D. Juízo, cumpre destacar que é patente a relação
de consumo originariamente articulada entre a Ré (i.e. fornecedora de serviço público
de energia elétrica) e o segurado da Autora (i.e. consumidor de energia elétrica),
restando caracterizadas, por conseguinte, as figuras do “fornecedor” e do “consumidor”
(essências ao surgimento da relação de consumo), tal como previsto no CDC 2º e 3º:
“Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou
serviço como destinatário final”.
No ponto em destaque, Ricardo Bechara dos Santos ensina:
“(...) o segurador, ao cumprir sua obrigação indenizando o segurado pelo dano que o
sinistro lhe fez experimentar, nos termos estipulados no contrato, extingue-a perante o
segurado e assume o polo ativo do direito a ser exercido contra o terceiro causador do
dano. [13]” (Nossos grifos).
E não é por outra razão Exa., que o C. STJ – ao enfrentar a questão –
consolidou o seu entendimento nos seguintes termos:
Exa., a situação que impera no setor de serviços públicos básicos – como
v.g. o fornecimento de água e luz – é vexatória! Há um descaso generalizado e um
déficit de investimentos que alimenta um circulo vicioso extremamente prejudicial para
os administrados, que permanecem arcando com elevados preços a titulo de
contraprestação sem, contudo, receber a correspondente (e devida!) prestação! Em
outras palavras: o administrado paga muito e paga sempre. A administração (in casu
concessionária de serviço público) entrega de forma desproporcional com o valor
cobrado e não garante a regularidade do fornecimento e a qualifade mínima do serviço!
Enfim, um verdadeiro caos!
No caso em apreço, a falha da Ré é inequívoca, uma vez que a sua omissão
foi a causa necessária, direta e imediata para que ocorressem as variações no
fornecimento da energia elétrica ao imóvel assegurado pela Autora, e em razão da
consequências oscilações da tensão elétrica – que, como já dito,são eventos
totalmente previsíveis e evitáveis – sobrevieram os danos expostos nessa demanda.
“Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem
impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes
da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária,
podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha.
O serviço defeituoso – apto a ensejar a responsabilidade civil objetiva do
prestador – caracteriza-se quando executado em desacordo com a qualidade que dele
legitimamente se espera e apresenta-se na medida em que não atende à finalidade para a
qual se propõe. Por conseguinte, torna-se inconteste que o fornecimento de energia
elétrica de forma irregular e a falta de estabilização da tensão elétrica são provas, por
excelência, da prestação defeituosa realizada pela Ré, motivo pelo qual essa deve ser
condenada a arcar com o ressarcimento dos prejuízos que deu causa.
“(...) quem tem o bônus deve suportar o ônus. Aquele que participa da Administração
Pública, que presta serviços públicos, usufruindo os benefícios dessa atividade, deve
suportar os seus riscos, deve responder em igualdade de condição com o Estado em
nome de quem atua.(...)”[20]
Cumpre destacar – como não poderia deixar de ser – que na medida em que
a Administração Pública concede à iniciativa privada a possibilidade de executar um
serviço público, também a transfere a incumbência de realizar a prestação desse serviço
com a máxima excelência, de modo quea concessionária assume o risco da atividade
que se dispõe a exercer. Isso significa que, caso haja qualquer dano ao
administrado, propagado pela atividade exercida pela concessionária, essa deve
prestar indenização independentemente da investigação do elemento subjetivo de
sua conduta (i.e. culpa).
(...)
No caso em apreço Exa., é fato fora de discussão que a conduta da Ré foi a
causa necessária, direta e imediata para a ocorrência dos danos suportados pela Autora
(CCB 403), razão pela qual inequívoco o seu dever de indenizar.
A subsunção do fato à norma Exa., não deixa dúvida que a responsabilidade civil da Ré
está perfeitamente caracterizada in casu:
Conduta negligente calcada na omissão
danosa da Ré ao não realizar a prevenção
Ato dos riscos inerentes à atividade que explora
e a isentar-se de reparar, investir, trocar,
gerir e instalar equipamentos que
proporcionem um fornecimento de energia
elétrica seguro, constante e sem perigo aos
consumidores.
Comprometimento do bem assegurado pela
Autora que não suportou a impropriedade
Dano de tensão do fornecimento de energia
elétrica.
Os danos suportados pela Autora
decorreram direta e imediatamente da
postura da Ré, i.e. da falha na prestação dos
serviços públicos que explora.
Nexo Causal
O Estado causa danos a particulares por ação ou por omissão. Quando o fato
administrativo é comissivo, podem ser gerados por conduta culposa ou não. A
responsabilidade objetiva do Estado se dará pela presença dos seus pressupostos - o
fato administrativo, o dano e o nexo causal."[22](Nossos grifos).
Com efeito, havendo dano e nexo de causalidade – como no caso em apreço
– inafastavel a caracterização da responsabilidade da Ré e respectivo dever de indenizar,
conforme bem frisa Savatier:
“Um dano só produz responsabilidade, quando ele tem por causa uma falta cometida
ou um risco legalmente sancionado”. [23]
E como se não bastasse, vejamos a interpretação jurisprudencial do tema:
“CIVIL E ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL - AÇÃO DE REPARAÇÃO
DE DANOS CAUSADOS POR SOBRECARGA NA REDE DE ENERGIA ELÉTRICA –
“SEGURADORA - INDENIZAÇÃO - SUBROGAÇÃO NOS DIREITOS DA SEGURADA -
CELESC - RESPONSABILIDADE CONFIGURADA - DEVER DE PAGAR. Verificada a
responsabilidade da Celesc Distribuição S/A por danos decorrentes de
sobrecarga na rede de energia elétrica, deve a concessionária
indenizar a empresa seguradora em ação regressiva.”[24] (Nossos
grifos.)
Deve a Ré, portanto, ser condenada a ressarcir os danos suportados pela Autora.
Com efeito, boa-fé objetiva impõe aos contratantes determinados padrões
de condutas, os quais devem ser respeitados e garantidos a qualquer custo, sob pena de
desestabilização das bases do negócio jurídico e consequente frustração da utilidade do
contrato.
Ora Exa., quem contrata serviço de fornecimento de energia elétrica espera
que esse seja prestado de forma segura, constante e – principalmente – que não seja
causa de danos aos equipamentos que são alimentados pela eletricidade fornecida.
Dessa ótica, o principal padrão de conduta esperado da Ré é justamente esse, que pode
ser resumido em uma única expressão: qualidade.
Ademais, como assente na mais refinada doutrina, CCB 422 tem o condão
de criar deveres anexos de condutas aos contratantes – independentemente da
manifestação volitiva de vontade de qualquer delas – dos quais se destacam os deveres
de proteção e segurança, que são inexoravelmente imputados à Ré sobretudo
porquanto concentrar o MONOPÓLIO pelo fornecimento de energia elétrica à
população da área que explora.
De qualquer modo, não se olvide que eventos da natureza do ora em
discussão – conquanto evitáveis – são intrínsecos e indiciáveis à atividade empresarial
da Ré, motivo pelo qual caracterizam-se como verdadeiros riscos assumidos pela Ré no
momento em que se dispôs a exercer a concessão em comento.
Portanto, aplicável in casu o velho adágio romano “ubi emolumentum, ibi
onus; ubi commoda, ibi incommoda”, ou seja:por ser a atividade da Ré de risco – que,
inclusive, lhe propicia lucro – por aferir os cômodos da atividade também deve suportar
os incômodos, que, no presente caso, traduz-se na responsabilidade pelas perdas
sofridas pela Autora.
Por conseguinte, outra saída não socorre à Ré senão indenizar os danos que
causou.
Conforme já tivemos a oportunidade de sustentar doutrinariamente, sabe-se
que “a noção de responsabilidade carrega a ideia de garantia e segurança de
recomposição ou restituição do sacrifício suportado por quem quer que seja (pessoa
natural ou jurídica). Traduz, definitivamente, o sentimento embrionário de justiça,
consistente na busca pela reparação completa da vitima a situação anterior ao dano.
Define-se, assim, a responsabilidade civil como sendo a obrigação de reparar os danos
materiais e morais que, direta ou indiretamente, causar a outrem ou pela qual responde
em razão de lei ou contrato. Consiste no dever de, na medida do possível, tornar indene
(sem dano – dai a ideia de indenizar) os prejuízos acarretados por determinado fato
jurídico.”[30]
E, de fato, a oscilação da rede elétrica e a ausência dos dispositivos de
segurança (ou o seu não funcionamento correto quando dos fatos) revelam a manifesta
indolência da Ré no desempenhar de suas funções como concessionária de serviços
públicos.
“Em síntese: se o Estado, devendo agir, por imposição legal, não agiu ou fez
deficientemente, comportando-se abaixo dos padrões legais que normalmente deveriam
caracterizá-lo, responde por esta incúria, negligência ou deficiência, que traduzem um
ilícito ensejador do dano não evitado quando, de direito, deveria sê-lo.”[34](Nossos
grifos.)
”RESPONSABILIDADE CIVIL. ELETROCUÇÃO DE PESSOA, CAUSADA POR
DEFEITO EM LINHA PARTICULAR DE TRANSMISSAO DE ENERGIA
ELETRICA. SOLIDARIEDADE DA CONCESSIONARIA QUE DESCUROU O
DEVER DE FISCALIZAÇÃO. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS NÃO
CONHECIDOS”.[36](Nossos grifos)
DOS PEDIDOS
Ante ao todo exposto, é a presente para requerer a Vossa Excelência:
e) a oitiva das testemunhas constante do rol a seguir, que deverão ser regularmente
intimadas;
f) a produção de todas as provas em direito admitidas, na amplitude dos artigos
369 e seguintes do NCPC, em especial as provas: documental, pericial,
testemunhal e depoimento pessoal da parte ré.
Cidade, data
Nesses termos,
pede deferimento.