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Versão 2
Escola Secundária Homem Cristo
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COTAÇÕES
Item
Grupo
Cotação (em pontos)
I 1. 2. 3.
Parte A 20 20 20 60
I 1. 2. 3.
Parte B 20 20 20 60
1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10.
II
8 8 8 8 8 8 8 8 8 8 80
TOTAL 200
Grupo I
A
Leia o texto.
Era uma hora, e estava Simão defronte do convento, contemplando uma a uma as
janelas. Em nenhuma vira o clarão de luz; luz, só a do lampadário do Sacramento se
coava baça e pálida na vidraça duma fresta do templo. Sentou-se nas escadarias da igreja,
e ouviu ali, imóvel, as quatro horas. Das mil visões que lhe relancearam no atribulado
5 espírito, a que mais a miúdo se repetia era a de Mariana suplicante, com as mãos postas;
mas, ao mesmo tempo, cria ele ouvir os gemidos de Teresa, torturada pela saudade,
pedindo ao Céu que a salvasse das mãos de seus algozes. O vulto de Tadeu de
Albuquerque, arrastando a filha a um convento, não lhe afogueava a sede de vingança;
mas cada vez que lhe acudia à mente a imagem odiosa de Baltasar Coutinho,
10 instintivamente as mãos do académico se asseguravam da posse das pistolas. […]
Momentos depois, viu Simão chegar à portaria Tadeu de Albuquerque, encostado ao
braço de Baltasar Coutinho. O velho denotava quebranto e desfalecimento. O de Castro
Daire, bem composto de figura e caprichosamente vestido à castelhana, gesticulava com
aprumo de quem dá as suas irrefutáveis razões, e consola tomando a riso a dor alheia.
15 – Nada de lamúrias, meu tio! – dizia ele. – Desgraça seria vê-la casada! Eu prometo-
-lhe antes de um ano restituir-lha curada. Um ano de convento é um ótimo vomitório do
coração. Não há nada como isso para limpar o sarro1 do vício em corações de meninas
criadas à discrição. Se meu tio a obrigasse, desde menina, a uma obediência cega, tê-la-
ia agora submissa, e ela não se julgaria autorizada a escolher marido.
20 – Era uma filha única, Baltasar! – dizia o velho, soluçando.
– Pois por isso mesmo – replicou o sobrinho. – Se tivesse outra, ser-lhe-ia menos
sensível a perda, e menos funesta a desobediência. Faria a sua casa na filha mais querida,
embora tivesse de impetrar2 uma licença régia para deserdar a primogénita. Assim, agora
não vejo outro remédio senão empregar o cautério3 à chaga; com emplastros3 é que não
25 se faz nada.
Abriu-se novamente a portaria, e saíram as três senhoras, e após elas Teresa.
Tadeu enxugou as lágrimas, e deu alguns passos a saudar a filha, que não ergueu do
chão os olhos.
– Teresa… – disse o velho.
30 – Aqui estou, senhor – respondeu a filha, sem o encarar.
– Ainda é tempo – tornou Albuquerque.
– Tempo de quê?
– Tempo de seres boa filha.
– Não me acusa a consciência de o não ser.
35 – Ainda mais?!... Queres ir para tua casa, e esquecer o maldito que nos faz a todos
desgraçados?
– Não, meu pai. O meu destino é o convento. Esquecê-lo nem por morte. Serei filha
desobediente, mas mentirosa é que nunca.
Camilo Castelo Branco, Amor de perdição (cap. X),Lisboa, Publicações Dom Quixote, 2006.
1
imundice; 2 requer, pedir; 3 cautério e emplastros: métodos curativos por meio de queima ou de pensos,
respetivamente (significando "matar o mal pela raiz").
1. Explicite as críticas às convicções sociais da época evidentes neste excerto.
2. Demonstre que o sentimento que une Teresa e Simão exemplifica o tema do “amor-paixão”.
CENA VIII
MADALENA – Jorge, meu irmão, meu bom Jorge, vós, que sois tão prudente e refletido, não dais nenhum peso
às minhas dúvidas?
MANUEL – Madalena… senhora! Todas estas coisas são já indignas de nós. Até ontem, a nossa desculpa, para
com Deus e para com os homens, estava na boa fé e seguridade de nossas consciências. Essa acabou. Para nós
já não há senão estas mortalhas (tomando os hábitos de cima da banca) e a sepultura de um claustro. A resolução
10 que tomámos é a única possível; e já não há que voltar atrás… Ainda ontem falávamos dos condes de Vimioso...
Quem nos diria... oh! Incompreensíveis mistérios de Deus!... Ânimo, e ponhamos os olhos naquela cruz! – Pela
última vez, Madalena... pela derradeira vez neste mundo, querida... (Vai para a abraçar e recua). Adeus, adeus!
(Foge precipitadamente pela porta da esquerda.)
CENA IX
15
MADALENA, JORGE; coro dos frades dentro
MADALENA – Ouve, espera; uma s., uma s. palavra, Manuel de Sousa!... (Toca o órgão dentro.)
CORO (dentro) – De profundis clamavi ad te, Domine; Domine, exaudi vocem meam1.
MADALENA (indo abraçar-se com a cruz) – Oh, Deus, Senhor meu! pois já, já? Nem mais um instante, meu
Deus? – Cruz do meu Redentor, ó cruz preciosa, refúgio de infelizes, ampara-me tu, que me abandonaram
20 todos neste mundo, e já não posso com as minhas desgraças... e estou feita um espetáculo de dor e de espanto
para o céu e para a terra! – Tomai, Senhor, tomai tudo...
A minha filha também?... Oh! a minha filha, a minha filha... também essa vos dou, meu Deus. E, agora, que
mais quereis de mim, Senhor? (Toca o órgão outra vez.)
25 JORGE – Vinde, minha irmã, é a voz do Senhor que vos chama. Vai começar a santa cerimónia.
Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa (ato III), Porto, Edições Caixotim, 2004, pp. 144-146.
1 do mais profundo do ser clamo a ti, Senhor; Senhor, ouve a minha voz
2 estejam os teus ouvidos atentos à voz da minha súplica
1. Estabeleça uma comparação entre o ponto de vista de D. Madalena e de Manuel de Sousa Coutinho face à
situação que estão a viver.
3. Complete as afirmações abaixo apresentadas, selecionando da tabela a opção adequada a cada espaço.
Neste excerto, estão presentes algumas características estilísticas e linguísticas recorrentes em Frei Luís de Sousa,
como, por exemplo, em: «...e estou feita um espetáculo de dor e de espanto para o céu e para a terra! – Tomai,
Senhor, tomai tudo...» (linhas 20 e 21). Nesta citação ocorrem ____a)____ para enfatizar ____b)____.
a) b)
Grupo II
3. Do ponto de vista do autor, o leitor afeiçoa-se à obra de Camilo Castelo Branco pela
(A) visão pessimista e derrotista que transpõe para a abordagem dos temas.
(B) forma como dá a conhecer formas de agir muito diferentes da sua.
(C) diversidade temática e de abordagens que a aproximam da atualidade.
(D) constância no tratamento dos temas, mesmo nos mais incomodativos.
5. A expressão «...e não deixa de nos lembrar que a vida não corre num sentido apenas, mas nos atinge como um
turbilhão.» (ll. 10 e 11) está presente a coesão
(A) gramatical frásica.
(B) gramatical referencial.
(C) gramatical interfrásica.
(D) gramatical temporal.
9. Indique a função sintática do pronome presente no seguinte segmento “...e sai-me uma coisa um pouco ininteligível,”
(l. 35).
10. Identifique e classifique as orações presentes na seguinte frase: “...nem os estribilhos que se usam para dar o grito
de partida, mas algumas que nos sacudam da ressaca, ...” (l. 13 e 14).