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Halptmann Egon Albrecht

Curiosamente, caso permanecesse por mais alguns meses no Front da


Normandia, Clostermann poderia muito bem ter enfrentado um outro ás da
Segunda Guerra Mundial natural de Curitiba, mas que lutava pela Luftwaffe, o
Halptmann Egon Albrecht, titular da Ritterkreuz, a Cruz de Cavaleiro da
Ordem da Cruz de Ferro, a mais almejada condecoração alemã daquele
conflito.
Ao contrário de muitos outros grandes pilotos alemães, quase nada se sabe
sobre sua vida e as poucas informações existentes foram, na sua maioria,
garimpadas pelo historiador aeronáutico Sérgio Luis dos Santos, do Rio de
Janeiro, um dos maiores conhecedores das influencias alemãs na aviação
brasileira nos anos 1930 e 1940, aqui complementadas por minhas próprias
investigações, as quais, devo acrescentar, trouxeram apenas algumas
informações adicionais.
Egon Albrecht nasceu nesta capital, aos 19 de março de 1918, com o nome
de Egon Friedrich Kurt e foi registrado como filho de Frederico Albrecht e
Hedwig Elditt Albrecht, ambos alemães ou descendentes. O fato de seu
sobrenome ser diferente do usado por seus pais é um mistério, embora
provavelmente se trate de um caso de adoção, já que ele mais tarde adotaria
o mesmo nome do casal.
Em um primeiro momento, pode parecer estranho que alguem nascido em
nosso país tenha optado por lutar pela Alemanha na Segunda Guerra
Mundial; mas, tal situação, segundo trabalhos recentes de pesquisa, ocorreu
com razoável frequência. Na literatura existente sobre a participação brasileira
no conflito, podem ser encontradas algumas referências a encontros entre
militares brasileiros prisioneiros dos alemães e oficiais da Luftwaffe e da
Wermacht aqui nascidos e, no ano de 2008, o professor Dennison de Oliveira,
do Departamento de História da Universidade Federal do Paraná (UFPR)
publicou o livro "Os Soldados Brasileiros de Hitler", onde descreve a história
de alguns ex-combatentes brasileiros do exército alemão e dois membros da
Juventude Hitlerista, incumbidos de tarefas auxiliares durante a guerra. De
acordo com esta e outras fontes documentais, quando as Divisões Panzer
cruzaram a fronteira polonesa, dando início ao conflito mundial, entre 700 e
800 descendentes de alemães nascidos no Brasil estavam na Alemanha,
embora esse número provavelmente não inclua os muitos filhos de alemães e
austríacos que retornaram à Europa nos anos da decada de 1930,
incentivados pelas políticas raciais do nacional-socialismo, que pregava aos
chamados "Volksdeutsch" - ou os alemães étnicos que viviam no exterior - o
retorno à nova Alemanha. Não se sabe quando Egon Albrecht teria chegado à
Alemanha, mas este parece ter sido o caso de sua família. Outra hipótese é
que ele tenha ido para a Alemanha justo em idade para o serviço militar, o
qual, a partir de 1938, tornou-se compulsório. Deve-se recordar que, em
1942, como lembra Dennison de Oliveira, médicos alemães residentes no sul
do Brasil, foram acusados pelas autoridades do Estado Novo de realizarem
exames que habilitavam jovens prestes a embarcarem rumo à Alemanha, a
servirem nas forças armadas nazistas. O certo é que ele fez parte da
Juventude Hitlerista, organização juvenil do partido nazista, de participação
obrigatória para todos os jovens alemães entre 14 e 18 anos. O que não quer
dizer que esteve na Alemanha neste período de sua vida, uma vez que, na
segunda metade da década 1930, o Brasil tinha o maior número de
simpatizantes das ideias deturpadas de Hitler fora da Alemanha, grande parte
dos quais em Curitiba, onde os primeiros alemães chegaram já em 1829. O
certo é que ele certamente abraçou o nazismo, pois o Bundesarchiv, o
arquivo federal alemão, ainda possui seus papéis de filiação ao partido
nacional-socialista em 1 de maio de 1937 (sob o número 5084707).
Sabendo que Egon já estava numa unidade operacional em meados de
1940 e tendo em vista que o treinamento de um piloto de combate da
Luftwaffe era extremamente esmerado, podendo durar quase dois anos,
acredito que ele deva ter ingressado na Aviação Alemã em algum momento
de 1938. Novamente, é impossível conhecer pormenores de seu treinamento,
embora não deva ter fugido desta sequencia: Após um rápido período de
formação militar em um Fliegerausbildungsregiment (Regimento de
treinamento) os cadetes seguiam a uma Flugzeugfüherschule A/B, onde
completavam duas fases de instrução de voo, a elementar e a básica. Em
seguida, dependendo de suas potencialidades ou preferência, eram dirigidos
para uma escola de voo avançado; no caso de Albrecht, isso significou o
ingresso em uma C Schüle, onde foi instruído em multimotores, voando um
grande número de aeronaves de dois e quatro motores. Ainda passaria por
uma especialização em voo por instrumentos, antes de ser designado para o
treinamento em caças pesados bimotores (Zerstörer) na Zerstörerschule, em
Schleissbeim, próximo a Munique, sendo treinado para pilotar caças
bimotores Messerschmitt Bf-110, em sua versão aperfeiçoada "Cäsar".
Como dito anteriormente, em 1940, o Leutnant (segundo tenente) Albrecht
foi designado como piloto do 6./ZG 1 (6. Staffel da Zerstörergeschwader 1;
ou seja, Esquadrão 6 da Ala de Caças Pesados 1) - depois redesignado 9./ZG
1 - e como tal participou, pelo menos em parte, das avazaladoras vitórias da
Britzkrieg nazista na Europa Ocidental e da Batalha da Inglaterra, quando o
badalado Bf-110 Zerstörer, chamado por Hermann Göring de o "Cavalo de
Batalha" da Lutwaffe, demonstrou não ser páreo para os caças monomotores
britânicos. Operando na escolta de bombardeiros e depois em missões de
caça-bombardeiro armado com bombas, os Bf-110C sofreram tamanhas
baixas contra a RAF que, ao final da Batalha da Inglaterra, a aviação de caças
pesados simplesmente deixara de existir por um tempo. Não há registros de
vitórias aéreas creditadas ao Leutnant Albrecht neste difícil período, mas, até
onde se sabe, ele parece ter passado incólume pelo mesmo.
Em abril de 1941, o 9./ZG 1 foi transferido ao Schnellkampfgeschwadet
210, como 6./SKG 210 e enviado à Alemanha para ser retreinado como
unidade de ataque, visando sua participação na "Operação Barbarossa", a
invasão da Rússia. Neste novo teatro de operações, Egon Albrecht participou
principalmente de missões de caça-bombardeio contra os aeródromos da
Aviação Vermelha e operações de apoio direto às divisões da Wermacht,
também atacando unidades inimigas, comboios de abastecimento, trens e
blindados.
Em janeiro de 1942 seu esquadrão foi novamente rebatizado, agora como
6./ZG 1. Ele, no entanto, permaneceria somente por mais alguns meses na
unidade; pois, em 12 de junho, foi nomeado Staffelkapitän (comandante de
esquadrão) do 1./ZG 1. A prioridade continuava sendo as operações contra
objetivos terrestres. Isto, no entanto, não significou que Albrecht não
obtivesse vários exitos contra os caças soviéticos, como os logrados na tarde
de 4 de julho de 1942, quando abateu dois Yakovlev Yak-1 em apenas 11
minutos. Há indícios que tenha ainda comandado o 4. Staffel do ZG 1, já que,
no dia 19 de dezembro, teria saído ileso da queda, devido ao mal tempo, de
um Bf-110 pertencente justo a tal esquadrão, em Krasnodar, no sudeste da
Rússia. Na ocasião, o acompanhavam o Unteroffizier Kurt Urban (operador de
rádio) e Feldwebel Hans Steckmann (metralhador), que igualmente nada
sofreram.
Já detentor da Cruz de Ferro (Eisenerskreuz) de 1ª e 2ª Classes, Egon
Albrecht foi condecorado com o Troféu de Honra da Luftwaffe (Ehrenpokal),
em 21 de setembro de 1942. Na sequencia, em 21 de dezembro do mesmo
ano, recebeu a Cruz Germânica em Ouro (Deutsches Kreuz im Gold); por fim,
aos 22 de maio de 1943, quando estava à frente do 9./ZG 76, o já
Oberleutnant (primeiro-tenente) Egon Albrecht foi agraciado com a Cruz de
Cavaleiro da Cruz de Ferro (Ritterkreuz). Por esta época, somava
aproximadamente 250 saídas individuais de combate e pelo menos 15 vitórias
aéreas, ademais de uma impressionante coleção de êxitos contra objetivos
terrestres, que incluíam a destruição de 11 aviões em aeródromos inimigos,
162 veículos motorizados, 254 veículos de tração animal, 3 locomotivas, 8
canhões anti-aéreos, 12 canhões anti-tanque, 10 canhões de campanha e 8
bunkers fortificados.
Em 9 de outubro de 1943, Albrecht foi promovido a Hauptmann (capitão),
sendo nomeado Gruppenkommandeur do II./ZG 1, em substituição ao Hptm
Karl-Heinrich Matern (12 vitórias, RK), morto em combate contra
monomotores Spitfires no dia anterior. O Gruppe havia sido retirado do Front
Russo e, após um rápido período na costa da França, foi posicionado em
Wels, na Áustria, onde permaneceu até a chegada do verão seguinte - exceto
por um mês que ficou baseado na Romênia - combatendo as incursões dos
quadrimotores Consolidated B-24 Liberator da 15th Air Force, procedentes de
suas bases na Itália, contra o setor sul do Reich. Nos primeiros meses de
1944, os Bf-110G-2 do II./ZG 1 lograram alguns susessos iniciais; em 2 de
abril, por exemplo, derrubaram seis "dicke autos" (carros gordos -
bombardeiros pesados) durante os ataques da 15th AF à Steyr e Graz. No
entanto, suas baixas para os P-51 Mustang e P-47 Thunderbolt de escolta
cresciam em igual ou maior proporção, atingindo o ponto mais clítico em 29
de maio, quando onze Bf-110 foram perdidos e outros três acabaram
danificados em combate contra os caças norte-americanos nas proximidades
de Viena, sem que nenhum bombardeiro fosse derrubado. O Hptm. Albrecht
somou pelo menos seis vitórias neste período sobre os quadrimotores Aliados,
incluindo os dois B-24 derrubados, na manhã de 26 de julho de 1944, entre
09:32 e 09:52, sobre a área da fronteira com a Húngria. O nível das perdas
que sua unidade vinha sofrendo, entretanto, não poderiam ser suportadas por
muito tempo e o fim viria efetivamente apenas alguns dias depois, com mais
dez zerstörer perdidos e quatro danificados. No início de julho de 1944, o
Zerstörergeschwader 1 deixou de existir e os sobreviventes do II. Gruppe
retornaram à Alemanha para uma rápida conversão para voar caças
monomotores Messerschmitt Bf-109G-14, ganhando a nova denominação de
III./JG 76.
Em agosto, a nova unidade, ainda com Albrecht à frente, foi então
transferida ao norte da França para se opor à força de invasão Aliada na
Normandia, ficando baseada no aeródromo de Athis, proximo a Reims, na
região das Ardenas.
Na manhã de 25 de agosto de 1944, quando pilotava o Messerschmitt Bf-
109 G-14 W.Nr. 460593, "preto" 21+|, o Hptm. Egon Albrecht levou 30 de
suas aeronaves para uma patrulha ofensiva, acompanhados por doze Fw-190
do I./JG 76. No decorrer, porém, teve que abortar por um problema em seu
motor e, ao retornar sozinho, foi surpreendido por caças norte americanos,
provavelmente ágeis bimotores Lockheed P-38 Lightning. No combate
desigual, acabou derrubado nas proximidades da localidade de St. Claude, a
noroeste da cidade de Creil. Ele conseguiu deixar o avião ainda no ar, mas já
chegou morto ao solo, sendo impossível dizer se foi mortalmente ferido ainda
na cabine ou alvejado quando descia de paraquedas, algo bastante comum
de ocorrer nos combates contra pilotos da USAAF.
Seja como for, seu corpo acabou saqueado por civis franceses, mas depois
recuperado pelos alemães e encontra-se enterrado no Cemitério Alemão de
Beauvais, no norte da França. Seus comandados não tiveram melhor sorte,
sofrendo 21 baixas em combate contra os Lightning e Mustangs.
Seu falecimento foi oficialmente registrado pelo Ofício de Registro em
Spandau, em 7 de fevereiro de 1945, sob o número 398/45. Algo curioso é
que em sua lápide aparece o nome Egon Albrecht-Lenke, embora isso não se
repita em nenhuma outra fonte. Ao falecer em combate, Albrecht havia
somado cerca de 25 vitórias aéreas, na maioria contra a Aviação Vermelha.

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