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Lei nº 9.613/98
Sumário
Introdução. 1. As dificuldades no combate.
2. A delinqüência dourada no Brasil – um esbo-
ço histórico. 2.1. Brasil-Colônia. 2.2. Brasil-Impé-
rio. 2.3. Brasil-República. 3. Admirável crime
novo. 4. Criminalidade dourada e nova ética –
perspectivas doutrinárias. 5. Lavagem de dinhei-
ro – conceitos e fases. 5.1. Conceito. 5.2. Fases.
5.3 Ilustração das fases. 6. Antecedentes históri-
cos. 7. A lei de lavagem de dinheiro. 7.1 Aspec-
tos gerais. 7.2. Aspectos específicos – posiciona-
mento crítico. 7.3. Aspectos processuais penais.
8. Responsabilidade administrativa, o COAF e a
questão do sigilo bancário. Conclusão.
Introdução
O presente estudo tentará mostrar a cri-
minalidade dourada como um mecanismo
propulsor das diferenças de classes, tão co-
muns nas sociedades capitalistas, e assim
também o seu alto poder lesivo à economia.
Pela sua natureza, esse tipo de manifes-
tação criminosa requer respostas diferentes
daquelas oferecidas à criminalidade tradi-
cional. Ainda, se tentará mostrar que tal cri-
minalidade foi desvendada pela criminolo-
gia da reação social.
Aliando-se a isso, ficará evidente, por um
termo cunhado pela sociologia crítica: a ci-
fra oculta, que o Sistema Penal (policial, ju-
rídico e penitenciário) é seletivo e desigual
Hekelson Bitencourt Viana da Costa é Ba- em especial nessa criminalidade em relação
charel em Direito pelo Centro Universitário à tradicional, tendo em vista a posição de
de Brasília – CEUB. seus agentes na sociedade de classes.
Brasília a. 38 n. 150 abr./jun. 2001 121
O termo em tela não é unânime como con- forma contrária, não ocorre com a macrocri-
ceito uno ou nomenclatura entre os autores. minalidade (criminalidade dourada), pois
Ora alguns tratam como macrocriminalida- a sua veiculação nos meios de comunica-
de, ora criminalidade não-convencional, ção vem em tiragens parciais e isoladas, o
crime de colarinho branco (white collar cri- que pode levar a uma interpretação de que
me), delinqüência dourada ou ainda hiper- se é impossível apurá-los em toda a sua ex-
criminalidade. tensão. O que não é verdade, haja vista, por
Mas como significado, como substância exemplo, as grandes operações já realiza-
não há tanta distinção entre os autores. Esse das para combatê-los:
tipo de criminalidade abarca algo diferente • a operação Mãos Limpas na Itália, in-
da microcriminalidade ou criminalidade clusive com o processo penal do ex-primei-
tradicional. Nele se encontram os atos que ro ministro Andreothi;
violam a Lei Penal, mas que são praticados • a operação ABSCAM, promovida pelo
por pessoas de elevado padrão social e eco- FBI, nos Estados Unidos, na qual se consta-
nômico, dentro de uma profissão lícita, mas tou a corrupção de legisladores e altos fun-
com um evidente exercício abusivo. cionários estatais;
A violência física direta é praticamente • a tentativa, pelo Ministério Público de
inexistente, pois seus agentes atingem a seus São Paulo, em resolver a máfia da prefeitura
objetivos por meio da astúcia, da fraude e daquele Estado;
da simulação. Esses agentes ancoram-se em • a tentativa, em tese, de no Brasil, de
suas posições sociais e, conquanto têm po- acordo com a ABIN (Agência Brasileira de
der econômico e corolário político, desfrutam Informação), ocorrerem situações análogas
da respeitabilidade social que possuem. às experiências italiana e americana.
Ainda que a violência física seja quase Diante desses exemplos, torna-se eviden-
que inexistente, essa criminalidade, pelas te que a microcriminalidade coexiste em
cifras que faz acumular, ocasiona prejuízos tempo e espaço com a criminalidade doura-
enormes à economia dos países, o que cor- da, porém a microcriminalidade é de natu-
responde a um entrave ao desenvolvimento reza conjuntural, praticada quase que de
e à própria cidadania, visto que outros mem- forma aleatória, salvo pequenas organiza-
bros da sociedade são excluídos da partici- ções. Mas o mais importante é que o micro-
pação dos bens resultantes dessas ações. criminoso é encarado como um indivíduo à
Como bem se depreende da lição de Ro- parte, um marginal. Tem aqui o Sistema Pe-
berto Lyra, essa criminalidade é praticada nal forte influência da Teoria pura do direi-
pelos “inacessíveis e incapturáveis”. Daí to (crime e o tipificado) que leva, ainda hoje,
que esses crimes, ao serem objeto de estu- muitos a enxergarem a criminalidade tradi-
dos, devem ter em conta as observações cri- cional como a única forma de delinqüência
minológicas sobre a cifra oculta da crimina- existente, e tendo em vista que muitos cri-
lidade – outro grande marco nas investiga- mes (da criminalidade dourada) não são ti-
ções da criminologia da reação social. Tra- pificados, pois o seu leque é grande ou ain-
ta-se daqueles crimes que não estão nas es- da nem são conhecidos. Isso favorece a conti-
tatísticas oficiais, nem mesmo tendo chega- nuação da criminalidade dourada, e como
do a registro pela atividade policial. conseqüência a impunidade de seus agentes.
No mais das vezes, a microcriminalida- A macrocriminalidade – criminalidade
de (tradicional), como os pequenos assal- dourada – é de natureza sistemática e estru-
tos, homicídios entre as pessoas pobres, fur- tural. Sistemática porque se envolve no
tos de pouca monta, acidentes de trânsito, Sistema Jurídico Penal, possuindo dois fato-
ocupa longos espaços e tempo nos meios de res: o lucro e a impunidade. É, pois, uma de-
comunicação de forma detalhada. O que, de linqüência em bloco, conexo e compacto den-