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Boaventura de Sousa Santos

PELA MAO DE ALICE


O SOCIAL E O POLÍTICO NA PÒS.MODERNII)ADE
I.ediçio:Maiodc 1994
ecUço: Seembro de 1994
7
ediçäo
3,'cdiço: Novembro de 994 i

4' ediçãe: )unho de I 995


5.ediçäo: Março de 1996
6.' ediçäo: Outubro de 1997

7.'ediço:Jwthode 1999

TftuIo Pela Mo de Alice. O Social e o Político na Pd-Modernidede


Autori Boaventura de Sousa Samos
« 1994. Boaventura de Sousa Samos e Edç5es Afronameno
Ediçào: Ediçöes Afrontamejno I Rua Cesta CabraI. 859 / Po10
Co}eeço: Bthiiotecas das Cndas do Homem /Socioiogía, Epistemología /18

Gr*vura da capa: «Terracota» de Giuseppe Begonì


N'deediço4s9
ISBN 972-36-0330-6
Depdsito legal: 75177/94
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ImPFCS.SO: Litografia Ach, Ihiio of CVISION PDFCompressor
Ediçóes Afrontantento
Acabamento; Rainho & Ncv Lda. / Sama Maria da Fuira
INDICE

PREFAcIO. Il

PRIMEIEA PARm
REFERENCIAS

1. CINcO DFsAflOS A hvimrAçAo Sociouc


Olterna/NOVCnEL 19
Enbe a auo4cozia e a aurealidade ................................,...... .....,..

-..----..
perplexidades aos dcsafio 21
iDas
z.: m o QUE É S&wo s Dsz ro Mt: O Mxisiio TAMBtM' ............................. 25
: Umahistóriaparawdos . 26
18904920 ................

OanosiIItaequaTenta
Eos an ciriquenta ao
...-........
anos setenla
26
27

............
Oanosoitenta 30
Umuturoparatodos 33
Procsso de determnaço socias ....................................................................
Acçoco1ectivaeideiic1ade 39
Dizecçoda lTanIfOrmaçAO social ....,.............................,................................. 41

SEGUNDA PARTE
CONDIÇÖES DE INTELjGIBILIDADE

3.

4. OSoaAt.EoPothIcoN*ThMçAoPóS-MODERNA
O moderno e O -modemo f06
Opthneimperfodo........... .
.,.......
ONzE TESES Pose OCASIAG DE M*is UMA DESCOIJERTA

...........
castas centrais
PoRuii. .........................

.........................................-....
49

69

73
Oscgundoperodo . 76
OtCrCcimÍOdD 79
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Portugal e o desailo da pós-roodemidade
84
Para urna politica pómodema: as minirackalidadcs e a rcsitência . 91
Acxisedaidadaniasocial ..................................................................................................... 213
5. 0 FSTADO E os Moïios w PoDuçAo DE PODER SOCiAL 103
As duas 11111mM décadas: epenmentaço e con1rsdiço....................................................... 215
IdçAO 103
.
As respostas docapilal: difuso social da produço e isolamenw poUtico de tabaIho 216
A distinço EsmkWEx:kdadc cMi 105
.
osnovos movimentos socias ................................................................................................
As raízs cOU1k&t6S d disinçO .
Subjectividade e cidadania nos novos movimentos sociais .......................................
108 225
. Os NMSs e o sistema mundial: Brasil. Africa e Ponugal ......................................................
228
Pa* a cO4rUÇä° de urna alternativa conceptual . .. .
i 10
Asviassociedadc8civis 110
.
. . Paraurna nova teoria dc democracia .................................................................................--
110 232
AsførmasdepodersociaL. . _. ,. .
Paraumanova teoriadeemancipço ........................................................
238
Hip&escs scbr as fonnas dc poder oca1 ein Poitugal . .. .. .

1O.ONoaTa,oSvLAUTcw1* ................................................................................................. 243


' Mo1»:NmADE, IDENTmADE A Cuti i Fio,i'r
IntmdUÇO ...............................................................................................................................
119 243
1ntroduço .
Os problemas fundamentais nos difeientes espaços-iempo ................................................... 246
A 1CUUaliZacD da denIidade na modenidad Oespaço-tempo munaI
123
...................................................................................... 246
As contestaçöcs ronn1ii* e tna,usta Aexp1oso demogtflca ............................................................................................. 248
o egteSSO das identidades 126
Aglobaiização da economia ....................................................................................... 249
Os desalios na semipenfen . 130
Adegradaço ambiera1 ............................................................................................ 255
Acu1tura&fron1eu 132
Oespaço4empo dmésc ............................................................................
O espaçoIempo da produçAo ............... . .... 264
Oespaço4empo da cidadama 271
TERIRA PARTh ........................................................................................

Asdiflooldades #mdainentais ............................................................................ ............ 275


CWADAN1A EMANCIPAÇAO I UTOPIA Aí*opia e os conflitoa pamdigmáticos .................................................................................. 277
Conhecimento e subjeclividade ......................................................................................
7. A SOCiOLOGIA DOS TKIUNA!S A DEMOCL4T1ZAÇAO DA JUSTIÇA 141
Padtesde transfomiaço social ................................................................................ 289
Condìçcs sociais e tedTicas da sociologia dos tibwiais I 41
Podere 1oHIica 294
Temas da SOCiO1Oia dos tribunais. ................-..........-..............-.. .
................................................................................................................

Oacessoàjusuça 146
A admStraÇO4aJUSIÌÇaCflqULO uiçàopo1íticaePZT'fiSSiOTt11 150
Os conThios sociai e os mecanismos da sea resoluçäo ................... - ............................ 152
54

O
umnova ................................................................................................ I

& DA 11W4.4DEUNIVERSSDADEÀ UMSWDEDEL ...................................................... 163


Finssemfiin ........................................................................................................................... 163

Acrisedehegemonia ............................................................................................................. 16S


Altacuhua -cu1Liira pojMdar .......................................................................................... 168

Educaçäotrabalbo .......................................................................................................... 170


Teoia-ca .................................................................................................................
173
A univesidade e a pmdutividade .........................................
174
Aunivenidadee avonwnidad .......................................................................................
178
Acrisedelegilimidade............. - 182
Acrise inslitucional .............................................................................................................. 185
A avaliaçäo do desefnpenhO universithio .......................................................................
187
Para urna universidade de idcas ............................................................................................ 192
Teses paa umaunivetida1e pautada pela cnca pós-modema ........... 193
Dsposiçes iransiións e ilustxaçöes ..................................... - ....
I 96

9. SU3JcuvmAD CWADMA a EMAMIPAÇÂO ......................... ...... .... 203


lntroduçäo ...................................................................................................... 203
Subjectividade e cidadania na teoria politica liberal ..............................................................

mandsmo ............................................................................... 208

.--
Subjectividade e ekladania po
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A cmezg&cia 210 a watermarked evaluation copy of CVISION PDFCompressor
da cidadania social ..........................................................................................

Subjectividade e cidadania cm Marcuse e Foucault ...-...-............- .- 212


PREFACIO

Na. últimas páginas do liwo Jntroduço a urna Ciencia Pós-Moderna (Afron-


tamento, 1989) afinnava eu que a reflexâo nele fetta sobre a transiçäo entre
paradigmas epistemolôgicos - entre a ciência moderna e a clência pôs-moderna
-deveria sei completada por urna reflexao sobre a transiçâo entre paradigmas
societais, ¡Sto é, entre dferentes modos básicos de organizar e viver a vida em
sociedade. Dado que, como defendía nesse livra, as dferentesformas de conhe-
cimento têm urna vinculaçâo específica a dferenres práticas socials, a ideia era,
pois, que urna transformaço profunda nos modos de conhecer deveria estar
relôcionada. de urna maneira ou doutra, corn urna transformaçäo igualmente
profunda nos modos de organizar a sociedade.

Dizia ainda que, enguanto a transiçäo epistemológica me parecía relativa-


mente clara e a minha reflexäo sobre ela relativamente consolidada. a transiçäo
societal era muito mais problem4tica e a minha reflexäo sobre eta. incipiente.
Por outra !ado enquanto a transiçäo episternològica podia e devia ser discutida
em geral. a transiçäo societal, podendo igualmente ser discutida em gera!, Mo
poderla deixar de tomar em conta a extrema diversidade das sociedades nado-
nais e, espeficamen1e, a sociedade portuguesa.

Nos últimos cinco anos dediquel-me prioritariamente à reflexäi sobre a tran-


siçao entre paradigmas societais e sobre o lugar e as vicissitudes da sociedade
portuguesa em ta! wansiçâo Essa reflexâo está alada em curso, mas os resulta-
do: a que cheguel até agora. apesar de fragmentários. têm a!guma consistência
global e por isso decidi reuni-los neste livro. Tenho em preparaçào urna an4!ise
sistemática e integrada dos diferentes problemas suscitados pela transiçöo para-
digmática tanto societal como epistemológica. Contado. como tal an4lise dflcil-
mente se compreenderá tern a investigaçâo e a reflexäo que foram senda fritas
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(JO longos dos últimos mais urna razào para trazer a público os resultados
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provisó rias a que cheguei até agora.
Pela M&ì de Alice. O Social e o Político na Pós-Modernidade Prefácio I 3

malaria dos textos aqut reunidos foram escritos nos ultimos cinco anos.
A merguihado e enuncio alguns dos topo retóricos corn base nos quais é possivel
Dois deles ado inéditos (segundo e décimo cap(mlos) e os restantesforam publi- argumentar em favor de urna pós-modernidade inquietante ou de oposiçäo.
cados em PortuRal e no estrangeiro em revistas ou livras item sempre de fácil Senda certo que a socied,ade portuguesa é urna das sociedades europeias em que
acesSO Todos os textos já publicados forant extensamente revistos para inclusao menos promessas da modernidade foram cumpridas, interrogo-me airsda neste
neste livro. Escritos ao longo de vários anos, ado é de esperar que a consislên- capítulo sobre o sentido de discutir entre nôs a pós-modernidade.
cia entre eles seja total.Por um lado, dferentes vibraçôes socials ac tempo da
escrita diferentes auditórios e dVerentes contextos de escrita originaram, por No quinto capítulo apresento os traças gerais de urna proposta teórica sobre

certo. d4ferenças de esnio e de ênfase anaUtica. Por outro lado, as mm/zas preo- os modos de produçáo do poder social. Esta proposta. que teve urna primeira
cupaçöes mais permanentes. algumas de/as obsessivas, acabaram por se tradu- forrnulaçäo no texto «On Modes of Production ofSocial Power and Law» (Inter-
zir em rep etiçöes que nein sempre foi possivel eliminar. national Journal of Sociology of Law, 13 ¡1985J: 299-336). será objecto de um
Irafamento mais aprofundado em próximo trabalho. Neste cap(tulo. centro-me na
Este livro está dividido em três partes. Na primeira parte. foco urna reflexäo critica da ditinçäo entre Estado e sociedade civil e formulo. em esboço grosso.
sobre algumas das referências teóricas que tîm pautado a mm/za investigo çäo. unza alternativa teórica orientada para cztextualizar o poder estatal no con-
No primeiro cap(tulo formulo algumas das mm/zas perplexidades anaitticas junto dasfonnas de poder que circularn na sociedade. Apresenlo ainda algumas
peranté as transformaçöes sociais nestefinal de século e enuncio as Was por que hipóteses sobre as relaçöe entre as difrrentes formase de poder na sociedade
se podem traduzir em motivos de criatividade sociológica. portuguesa.

No segundo capítulo procedo a urna avaliaçdo do marxismo enquanto tradi.. No sexto capítulo anaiiso as identidades de raiz sexual, ¿mica e cultural â luz
cáo teórica da sociologia corn o objectiva de distinguir as áreas ou dimensóes do processo histórico que as pretendeu suprimir - aliá sein êxilo. corno agora
em que continua actual, e evenistalmente mais actual do que nunca daquelas em se vèrjfiea - referindo-me a propósito às contestaçöes romántica e marxista do
que está desactualizado e deve, por isso, ser profundamente revisto, se ado reducionismo operado pela modernidade na sua versäo hegemónica. Trato em
mesmo abandonado. esfrecialda questào da identidade da cultura portuguesa e propon/za urna hipó-
tese de trabo/ho sobre a sua caracteriza çâo.
Na segundo parte centro-me na anälise de alguns dos aspectos da crise da
modernidade enquanto paradigma societal. A referência à sciedode portuguesa Na terceira parte a análise combina-se corn a prospectiva. e quer nwna quer
tem nesta parte um lugar preponderante e as andlises sàofeitas à luz de um qua- foutra ¿ mlnimaa consideraçäo específicoda sociedade portuguesa. No sétimo
dro teórico suficientemente ampio para localizar a nossa sociedade. tanto no capítulo faço urna reten/za dûs estudos sociológicos sobre a adminislraçáo da
paradigma da modernidade, como na sua crise. Apresento algumas hipóteses de justiça e identflco o contributo possíiel destes estadospara a definiçäo de urna
trabal/u, sobrea sociedade portuguesa que entretanto foi-am objecto de investi- nova politica judiciária atenta ao imperativo politico de dernocratizaçào da jus-
gaçäo sistemática realizada por mim e por outros, e nomeadamente pelos inves- tiça e do acesso ao dire Ito.
tigadores do Centro de Estudos Sociais, cujo trabal/za mais recente pode ser
consultado em Portugal: Um Retrato Singular, Porto, Afrontamento 1993, por No oitavo capitulo procedo a urna análise crítica da posiçâo da Universidade
mim organizado, e também nos vários livros publicados na colecçáo Saber ¡ma- nos sociedades contemporáneas. Dupiamente destfiada pela sociedade e pelo
ginar o Social das Ediçôes Afrontamento. Estado, a Universidade confronta-se corn a evenlualidade, cada vez mais pró-
.tima, de profundas mudanças estruturais. Enlface da rigidezfuncional e organi-
No terceiro copiado apresento onzes teses sobre a sociedade portuguesa, em zacional que tern caracterizado a instituiçäo universitária, pergunto-me sobre
jeito de manifesto contra o discurso mitico que, em suas múltiplas versöes, tern como se irá adaptar às novas condiçöes. Proponho, como soluçáo radical, a
dominado a andlise da idenüdade nacional. passagem da ideia de universidade à universidade de ideias, para o que formulo
um conjunto de teses e respectivas disposiçôes transitôrias.
No quarto
cap/ado descrevo, muito em gera!, o paradigma sôclo-cultural da
rnodernjdade e a sua trajectória histórica ao longo dûs diferentes períodos do No nono capítulo retorno aigumas das questoes abordadas nos quarto e sexto
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a respeito docopy
capitalismo. Identifico os sinais mais inequívocos da crise final em que parece
capítulos ofdaCVISION
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modernidade. O excesso de regulaçào e o
14 - Pela Mao de Alice. O Social e o ¡'olluico na POs-Moderukiade Prefácio i 5

consequente deficit de emancipaçäo em que se ¡raduziu historicamenie o para- Sociologia e a Sodedade Portuguesa na Viragem do Sécuto, volume 2. Lisboa.
digma da modentidade truncaram de dferentes formas, a articula çäo entre sub- Editorial Fragmentos, 1990: 649-666). 0 sexto capítulo foi publicado em
jeetividade e cidadania e deixaram as sociedades capitalistas contemporôneas à Revista Critica de Ciéncias Socials, 38 (1993): 11-39. 0 sétimo capítulo foi
beira de uni bloqueio global das alternativas emancipatôrias. Dal o meu apelo à publicado na Revista de Processo, 37 (1985): ¡21-139; Revista Uruguaya de
fornudaçáo de urna nova teoria da democracia e da emancipaçäo social. Derecho Procesal, I (1985): 21-35; Revista Crítica de Ciencias Sociais. 21
(1986): lI-37; José E. Fana (org.). Direlio e Jusnça. São Paulo, Atica, ¡989:
No décimo capitulo a necessidade de ultrapassar o bloqucio das alternativas 39-65. 0 oltavo capítulo foi publicado em Revista Crítica de Cênciac Sociais,
e reforçada à ¡sa dos problemas globais corn que nos defrontamos neste fini de 27/28 (1989): 11-62. 0 nono capítulofoi publicado em Revista Crítica de Ciên-
século. da forne e da guerra à explosAc demográfica. das assirnetrias entre pal- cias Sociais, 32 (1991): 135-191. 0 décima capitulo é inédito e é urna versäo
ses ricos e países pobres â degradaçäo ambiental à escala pianetória. O excesso muito ampliada da comunicaçâo apresentada nas Primeiras Jornadas da Facul-
de regulaçâo modernistafaz coni que tat bloqueio sé possa ser ultrapassado por dade de Economia da Universidade de Coimbra realizadas em 28 e 29 de Abril
via do pensamento utópico, allás urna das tradiçôes suprimidas da modernidade de1993.
que urge recuperar, Dois agro4ecimentos mais e muito especiais. A Maria irene RamaTho, por
caja mesa de trabatho passou todo o manuscrito, partes deles, várias yeses,
docilmente sujeito a um inexcedivel rigor analítico e estilístico. Ao meu edíto,
em particular ao José Sousa Ribeiro, pelo incentivo que me deu à pubhcaçäo
o desenvolvirnento das minhas ideias beneficiou muito do debate corn os meus
desta colectônea. Sem ele este livro talvez nunca visse a luz do dia.
colegas do Centro de Estudos Soclais, a quern, por ¡sso, agradeço colectiva-
mente. A preparaçäo final do manuscrito deve-se a duos pessoas, ao meu assis-
tente de investigação, Hermes Augusto Costa, que revfu vezes seni conta e a
pente fino o manuscrito, e à Lassalete Simóes, que introduziu no computador as
sucessivas versóes dos diferentes capítulos. Cada um em seu dominio revelou
urna competencia profissional, um zelo e urna dedicaçâo que, sem me swpre-
ender, me dei.r.ou sensibitizado. Sáo, por ¡sso, credores de um agradecimento
multo especial.
Gostaria ainda de agradecer às editoras das revistas e livras onde foram
publicados, foutras versöes, a/guns dos capítulos, bern como às entidades que
organizaram os eventos onde forum apresentados os capítulas inéditos. Assim, o
publicado nos Actas do 2 Congresso da Associaçôo Portu-
prirneiro capítidofoi
guesa de Sociologia (Estruturas Socials e Desenvolvimento, P volume. Lisboa,
Editorial Fragmentos, ¡993: 62-68). 0 segundo capítulo, inédito, é baseado no
texto da comunicaçâo apresentada no 8 Encontro de Filosofia organizado pela
Assoeiaçâo de Frofessores de Filosofia, realizado em Coimbra de 10 a ¡2 de
Março de ¡992. 0 terceiro capítulo foi publicado ein Via Latina, 1991: 58-64;
r4ovos Estudos QBRAP. 34 (1992): 136-155; Luso-Braz1ian Review, 29(1992):
97-113. 0 quarto capítulo foi publicado em versôes muito dferentes em Oli-
cinas do CES, I (1988) e 8 (1989); OlIati Proceedings, J (1989): ¡13-123; Doxa,
6 (1989): 223-263; Revue d'Etudes Interdisciplinaires, 24 (1990): 77-liS;
Soioogia dei Diritto, ¡7 (1990), 3: 5-34; Austin Sarat and T. Kearns (orgs.)
The Fate of Law, Ann Harbor, University ofMichigan Press, 1991: 79-ilS; Lua
Nova, 31 (1993): ¡Si-207. O quinto capitulofoi publicado em Oficina do CES, 7
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(1989); Actas do 1 Congresso da Associaçâo Portuguesa de Sociologia (A
PRtMEILt PARTE

REFERENCIAS

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i
CINCO DESAFIOS À IMAGINAÇAO
SOCIOLÓG ICA

Os desahus, quaisquer que e'es sejarn, naseen sempre de perp1eidades


pruduuvas. Tal cuino Descures exerciou a ddvida scm a softer, julgo ser liuje
necesrio eXerciar a perplexidade scm a sotrer. Se quisermos, como devemos,
ser suci(lugos da nossa circunstnea, deveremos comear pelo coiflexo SúCio
iempoid de que emergein as iìossas perplexidades.

Oitenta/Noventa

Do porno de ViSta sociulógici). a década de oitenui seni urna década para


esquecer Está ria tradiço da sociologia preocupar-se corn a "questio socal',
corn as desigualdades sociais, Corn fl ordern/desordem autoriária e a opressiu
±,oLal que parecefli ir de par corn o desenvolvirnento capialisra. A luz desta
tradiçio, a década de niterna d seni dCivida urna dtcada para esquecer. Nu seo
decurso, aprotunduu-se, nos paises cer-urais, a crise do Estado-Pruvid&icia que
iI viiha da década anterior e corn cIa agravaram-se as desigualdades sudai

e os processus de eclusüo social (30% dos americanos estiu excluidos d


quakuer esquema de segurança social) e de tal modo que estes pu(ses assLimiram
algurnas características que pareciam ser típicas dus países periféricos. Dai o
lalarse do terceiro mundo interior. Nos países periféricos o agravamento da
coiìdiçes sociais, j de si tïo precírias, foi brutal. A dívida externa, a
dCSValUii7ilÇüU ìiiternaciona dus produtos que colocarn no mercado mundial e
u dccrsiiiio da ijuda externa, kvou alguns destes paises i beira do cohiso.
Na dt.cada de uircnlu inurrerani dc turne em Atrica mais pessoas qUe ein ludas
i décadas anteriores du século. Se as assimeirias suciais iwnentanoiytriur

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j_- HIda e1i u cujuntu d» pa(se du Ntire diliculdade em serein dilerentes da realidade que supostamente teurizatu. Esta
. du Su ruF
E!I:i iuiçìn. que agu
dos 1eterim uu .

condiçäo , no entanto, internamente contraditória. A rapkie e a intensdade


d dUE ieces.ri du J)I) de una ovdem económica Irilmeme
i F1c lFfl corn que tudo tein acontecido se, por um Iado orna a realidade Iiperreal,
FLF L \ 1dde{a i,R) & ieiberI denuncitdu pur uUIos cuuì UÌ ,
por Outro lado, trivializa-a, banalizaa, urna rea!dade scm capacidade para nos
dC'&udCFfl sel ser sbsitudi xr uniz novu urden econu1icu ecear surpreender ou empulgar. Urna realidade assim torna-se afinal fácil de teorizar,
1r}iLn1nW A primeirus e rttìca
npuênc dos segUndo5 pe täo fácil que a banalidade do referente quase nos faz crer que a teoria a t

t'}lil L]cdLdmeflte de avesj cuin a dcad de teuui cìdes própria realidade coin outro nome, isto é, que a teoria se auiorealiza.
I)ctJLì;Cti ainbn ¡cndicdiiiere? O ourru piFar Vivemos assitii urna cotidIÇan conipleta: um exceso de reulidade que se
u çR ILLLitU1 (CU1(!gZ1 ë a prencupaçu cufl rcìpaçiu sucia
i E I : JJ , e di grupos uc . ctn u dcsen vul vìnìe ìo c i uuniiu parece coin urn dtliee de remdidade; urna auto-teorizaçao da realidade que mal
se distingue da auto-realizaçâu da teoria. Numa condiçilo deste Upu dilicui
-. cçu ieva, Cl US iììovnieiiIus t)CIic- A hz dcsi ouna iiflçn, reivindicar um angulo de atiálise e tnulto mais, mantêlo. Nao está na tradiçao
pude c (Re J ddiI Jc iite se iehiu Jc iiiira da sociologia desistir dessa reìvindicação e. valha a verdade. alguns tactores
LJ )FC1JLflC fflCSR1U F() dccda d mivi nenlos cs e da Corrern a favor do sea sucesso. O cunilito Leste-Oeste loi um dos grandes
du (J) 1flRJflSFU{) ati&riu e du (1flfIlcif,
du hin du cìFIitu responsiveis por que durante todo o siculo XX a sociologia tivesse sido feìta
'ftt )& e de UE CeI-t&) abrandumenio Unnmeriiìrìeu!) da ameaç nuclear, corn os conceitos e teorías que nos foram Ieados pelo século XIX. O um
_i ce Jaro-seur da década precedente. Ternos cuni cia urna rekçmu du conilito LesteOeste cria urna oporiwildade única para a crialividade eúrica
LC LrjI4. Nut) idcnoç esquecer. I'iipuucu a querernos repcir. Evi- e para a trdnsgmessao metodulógica e epistemológica e essa oportitnidade sO
JCFel1C[C as deadas só exsepn na nosa ììaiiiaço leniporal. As será desperdìçadzm se nos esquecermos que o fini du cunlliio Lesie-Qeste corre
Il1't FÇe'
t.uiaI da década de ueurrkhis
entrarani de i in ante
n cefla de par corn o agravamenlo do confito Norte-Sol. E será igualmente desperdiçada
iia dcida dc 1I(}VCflI e C5iiU-iiUS agora eni casa. Que lazer dela Pur que se a liberdade criada pela ausência dos dogmas teörico»politicos tor astìiadzt
r]- iaye' a piÌsar as t e;ti
Que desalis cuucani i islriniçes? peins sempre velho e sempre novos dogunas insriiucioiiaìs4ácticos.
' u1 ia s eineia SiCais e humanidades ein
t eia? De que luKIn nus A tradiçao da sociologia neste dominio an3bígua. Tern oscilado entre
,_Lu aTci.u1 l)e que nudu a pudeinus ate etar? Iãcl respunder e estìs Ni a distûncia crítica em relaçäu min poder instituido e o cornprometiinerito ornieo
LtHu iiS que eh resipein cuini ii1u 1)iUblCiflien nina pHstLira corn ele, emutre o guiar e u servir Os des que nos sao colocados exigem
que u e cada CL I11WS. Piesupen a separaçu .'aieìto-uhjeciu; de nOs qi.Ie Suiallios deste pendolo. Nein guis oem servir. Em vez de distancia
aLul as 1i-ul1'1 uJu}açes 1i fiira. Quando. ia veidade, as ttaiislÚrrnaçöes
Critica, a prwimidade crítica. Ein vez de compromisso orgânico, o envolvitnento
ni ìu mil' ap nidmis. tmd&m o eenistas st1eia e ttmdim os nìo eiemuinms livre. Ein vez de serenidade autucomplacente, a capacidade de espanto e de
i]1L fluuild m rnnsmurmnaimnu-nuis.
re volta

amflo4eoria e a auto-redjdade Das perplexidades ats desailus

nutuduu, m
luI1PFRI da sociologia uCluì(flcaE uni iuuulo de uhscuvaçlo e Quais sao, puis, us desafius? Cuino disse no inicio, os desatios corneçain
dm uuuímu. milo uuuu[u que, uuío estando lumia do que nEusmfuva mua amnulisa. pií(i
sempre put se tiianilstar como perplexidades produtivas. Salietito as cinco
',.. ,,}l \ C cmIInIdCuauuueEde uuck Qual xuus. e'.se uruu10 e cuino uuuuìmio
,
seguintes, (lue. ouso prever, tiLlS VO ocupar nos próximos unos.
mnu c mmii çes l)1C pn mío uidluJade e a
senu es e [umiX i uias t ut ura! A ìupkk, a
u uuuu e vinhilidade dc aLunutus irauistuiuììaçíes cecines
au tempo presente cuuutemeuui 1. A pritueirt perplexidtde consiste no seguinte: um relance pelas
umuu};u c1ucucm suica Imivi: a ue;mUdade parece ter turnado derijilti van-meine a dianteira
agendas puUticas de dièrentes pa(ses revelanos que os problemas mais absor-
i_'ue a kill Fi Cumin istmi. a edidade turuizmse hiper-uezml e )1reCe teO1iZtr-5e a ventes sao, cu nunca. probleme natureza económica: ìnllaçäo. desemprego,
\1 uuueruu.i Eum atututemuuu/açi() da realidade é o imutmo lado da diticuldade das
taxas de juro, th.Jìt-U urçaniental, cise uitmanceira do Estado-ProvìuJncia, divida
lturiiL. cmii daueuum cuuuta du que se passa e, cui ii]tiuiia instancia, da
u

externa, política ectmdmica cui geral. E o mesmo se passa se, em vez de

8 I 19

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LLILL'.0 J ptthuca ac1. rcIar4ccmus I pL>1íiCa nernacitma: r1eraçiu tCLiULLierLt)Ogia, do lucro CUL dtnrneiiiu do inacro. Coiiudo, CLLI aparente
N.!fl iiil )F Sta, Sudeste Aiticu).
(T1, EUA, Canada, (\iìe co4n[adiçu COLLi islo. u ndvíduo parece hoje menos ndviduaI do que nunca,
iupid, tJguy
Eunpa), juda cxiccna, eic. Cnuido, Faeza a sua V1(1I (ntirna nunca ti() pública, a sua vda sexual nunca loi trio
.. eii ipieflle minìdiçio curn sio, i teona milise S)Ci)úgk dus úRimus coddicada, a sua tiberdade de cxpressäu nunca t Fio inaLidIvel e tu sujeIa
.

!lfl vndu a devorzar u económico, cm detumento du polilku,


jt'i
a crtthLS de cL)rrecçio puIítLca, a sua Iberdade de escollia nunca k
ili L]LII du nbcu. irn viudu a esvuorzir us uudos de produçu
1 t
derivada das escoJhas feiias por outros antes dele. Seni ios) aparente esia
ç. 1rm'-Etu dis mudo.. de vii. Pudeuius niesnìu dzer que cítca que contradiçìo? Será que a distkiçu individuo-suciedade é outra Jegadu OtOCeLLthla

kl V1[L[i tr Íct u asen1a. ein JrIe. na devIurizçüu du irinu de que nos deverno Jibertar? Será que. pelo contráro. nus Jibertarnos cedo

U1ICE Ser í eu
denials do conceitu de aJienaçUo? Corno taier vìngar a preocupaço
Ìth pens prente iiis tanìbin red E e lradiekrnat

.1l1 kF:-. i,'\tu-emu-' 'a1 aUT1 U dVU TIC) C .i CaVt a msa pipria da sticioJoa COrn a partídpaçäo e a crianvidade socais nurna si1uçiu em
1J1 JLL1I? ou peu cuiru, que esies diferentes kctute e ciceì (jLIC toda a espontanekiade do rnírLltO OW se transrrna, no rniiuto dois. ein

en que acsentanl (ecunoIna, puUtha, culiura), todas cadas artetacto medftco ou nicicantit de si mesma?
tuh XIX. eao huie superados e exìgem urna reconsruço teórica
;LjE_.1? F i'e eisu. CUOLu
4, A quarta perpkxdade pode sei- 1ornivada
Con] chvagens sÓck)-poIncas muito profundas, entre socialismo e captaJsL11o,
assirn nicìitLos u icuIo

2. A s'gunda er,cidade
pode ser 'oniiuIada assini: nus úIiuìus dei entre revoJuçäo e reftirnia, cvagens que, por thu LnportaIi1Cs, SC iIscteVciaLn
an 1nu a urna drarntiiica iitcnslcuçìu das prálleas tra1silaciufla. du na nadçäo das cìncas sociais.Chegmos, no entamo, au Jim du scuIo coin
unei um surpreendenie desaparecirnento ou atenuaçäo dessas cJvagens e corn a sua
da cL:1uIa rtarskca]izaçio nìaciç de pessuas cornu i

nftrnl1k nu urktus, ds eUes a1etras dc iiìriiiaçiu e de cnnuI1caÇäu substituço por um näo menos surpreendente consenso a respeilo de tun dus
,L I'U e nn-i çn da Úgca du cunsunìi nno irus1riçes A nìar des grandes paradigmas SóCio-JXdíticos da modernidade: a democracia, A década
i_lu iki couaI, a perda dii sua e da sun c1)aCdudC tuua arlicriur, I-dio SÓ viveu amitos processus de democrathaçío, curno nsntuiçöes

1k Onu du cun'.ideruda cunu crsequncia. (.unuidu, ricd insuspekus


Banco MundiaL
a esse respeitu abi-açararn publicamente o credo deinocrdicu, O

n 'M t]1IJU UO1]CflC 5(11US ()11rttd()' coin u s;sena iundFi] e. ,itravés du princpo da 'condço poJtca" (political ('uflhfif U)-
5uu)US l)eSSVnnCIUC :nnpadus coin u £stadu, que ocupa as naluv), faz detender a cuncesso de crédito da vigéncia da democraeFi LLO pues
rnu'us juFuals C O-5 das nussas radius e eIevïo, que nicrs creditzido, au LIICSIflO
dos EUA, prornove
tempo (JLLC a Agêncrn 1nternaconaJ para u DCSenvoJvIneL1to,
em targa escala 'Iniciativas para a deLnucraca"
uflu iiiiciva a ìsn vida I)n-a eguuncn1ar Conio para a desreguLaincnar. (th'rnoeracy
eInu u Fsuniu euna Luflu iijda(Jc de ise cui ias de exlnçio. ou ìLLüiafve5), corn o mesmo objectivo de vrncutar o desenvoIvnieruo L tteliiOCflica.

F)eu nc mas t'entrai do que nunca,


( que sub a turnia ìi Contudo, em aparente coIoradçkL coin isto, ocorrern dois fenómenos, urn inzds
nd oa 'u detnn uçu Qa as re.t sbd;ntes espeedic;s da vsíveJ do qUe Outro, Por um Judo. se a democracia é hoje menus quesooada
nina UcFjne1 que 1nesceu CnI u iliIcrveicnisniu ucial (JO do que nunca. todos us seos conceitos sattJjtes Eêin vindo a ser questionLdos

u
LLdL Se que u ir1tcrveuenuisniu suciaJ (h) Esiadu va assurn1r nus
a urrna de nuer; cncuiìFuiu
i
eSLtaI? Scr.î que u Estado vai criar a
pris e decJarados
du abstencionismo
em crise: a patologia da paiicipaço, sob a lornui do eunhorLnisnlo,
e da apatia polilka; a paoJogia da represeruaço, sub a

ft1CdiLLJC eviJ
forma da dstância entre eJeitores e eJetos, du ensìmesmarneno dus parlamentares,
uj. uagcrn e seuicUança Seni que a 'uca}JI)gn ( )UFtC da
da rnarginalzaçit> e governamentalizaçãu dus parlamentos, etc. Pur outro lado,
fl L LEh OLi du L que a perinte dcaLnur
se atentarmus na ldstórFi europeia desde nicados do sécuJo XIX, eriflcainos
3. A IerCdfLi perplexidade ou ksafïo i seguinte os ditinius dez que democracia e o Uberatisino económico foram sempre rni comparthia uni
a

decjdkla}nente para o OUtr(1 Quando o liberalismo económico prosperou a dernocacìa soircu


LiLi LLLICarLLLLI (L regIesS() ito LitJvÍdLItL C) esg()ILLtllefltO do
a rcvaI(JrizaçkL e vke-vcrsa. Coutudo, surpreendenteinente, boje a proinoçtu da deinocraca a
L'LLLLLL1LLLJÌ5LIÌ(L tIELLIXC C&LUSìg(} da J)IáItCLLS e dus pco-ccssu e,
FLLLFL C 1h}ULLO(. LL rCVLJl{LUZLLÇaU dus n1dvídLLus que LO )rOtLgtL1rn FiLLLUi1
nivel internacionaJ é tèu conjuntamente
corn o neoliberaJsrnt) C de tcto ein
O-, ,LLRJ tLL LiI1LhSe du vkJLI pLvadLJ. du CoLLNtunLl1O e du narciskLìio, dus dependênda dele, alguma incongruência ou urrnaddha'? AJtiéiii
Flaverá aqui

LLOdO' L' e\LdLL" (J1 VIdLL, do especuidur 1CIVO da teJevso. das hiogcaJas e estd a tramar aJguém? Serí que o Iriun da democracia. que lqwdou o coiifluo
LjL'CL 'I L Je LiLi. Ln;ihst' srvdi
petti regresso du uhieracciollismu, da l.,este-Oeste, se arikuta corn o triunfo do neoliberalismo de que resultarL o

2q 21
i

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a itutt çIR Mc-SuL Scr tue estes duis rutths cuujuRrus VI
ruvtr eptu Nuic-Su tanto Uentw du NoFte cuino dentro do Sui?
(uru aint iisar as ueiedades que o o Sul du Norte pur eempiu,
) un u Nnie du Sui tpor exemplo, u i.racdy

quinta e úitii]la perpIeidade pode forrnularse do seguinte rnodo


5 ,s
a k-açi{) Lia iIttVdCI)eiidCi1Ca tranuaciunai e das ¡nteracçöes globais, jf
fl ItiU i

ieh iLi, dL Coni (1Uc relaçies sociak paieçatn liuje cada vez nas deier-
hn a1iJi,
u[trapasziudu as irunteka até agora poiciada pelos custtItue,
u iiruFkni, a Httgua. a ideologia e, JitLiltas \eZe, pur tudu islo au mesmo z
t»n)u (' apatenteiflente ein ctiiiiadçiu corn
IUULk), C ea
teiidêtica, assiste-se TUDO O QUE É SÓLIDO SE DESFAZ NO
a ulU dcabruchar de novas identidades regiunais e locals ulicerçadas nunia
1c a[uiìaçiu du dreio ts raízes (em ctntratsço corn o diFeito à escuiha). AR: O MARXISMO TAMBÉM?
i.i.,1c ]ut;alstiiu, itnuIiancatiiettte uvu e antìi, Outmota considerado pri-inoderno
e em dia cclassdicado cutfl() pós-niudemno. é c{nn Imequncia adoptado
pur mupus de indivkiuus transIoca!ìzadu' (Sihks ein Londres, tundurnentalistas
]aiìiic ein Paris), titu pudendo pur issu ser explicado por um geni I(ni,
kto c, pur uni scntklu dc lugar espcctico. Contudu, assenta sempre na idela Coin a expressio "tudu o que sólido se destaz no at", usada mio
t

ten un u, seja ele iittatmuíriu ou srnbtiicu. real ou hiper-meal Semeihante- Manutèstu Comunista de 1848, Marx e Engels pretendiam caracterizar o canicter
meute, u atimentu (hi iihi hdade traiisnaciunal iiciui ienútnenus iiiuito ddereuies ievoluciomrìo das transiormaçöes operadas pela moderrildade e pelo capitalismo
eitridtunt): p)i WU I3O. a ifli.)bihdtdC de queiii tern a nicìativa dus nos uais ditèrentes sectores da vida social. O ârnbtto, u ritmo e a iritensidade
ptuce.-.us trusttaCiotiai5 que ctain a niobilidude, sea ele ou cia u exeCUtìVO de translurmaçòes abalavam a tal punto modos de vida ancestras. lealdades
lais

Ehi :inde tirma nni]tinacìunal. o cienhita entre congressos. ou o turista; pin até entho inqueslionadas. processus de reulaçOEo económica, social e política

otF- . Fnoi lidade de qiicin


.1 sre
essex processus, seja ele ou cia o me1utiadu, julgadus. niais que tegftìinus. insubstituiveis, pniticas suciais tidas por naturais
cluitT ;uitc, u Indio ou o nattvu desiucado do sen território ancestral. Acresee LIC tio coiflirinadas histiricu e vivencialmenie, que a sociedade
do século XIX
t]iC 11nui-) hdadc ansmiciuiia] e a acuIturaçiu ltibai de uiìs grupos sociais
it patecia perder toda a sua solidez, evaporada, juntamente coni os sens tundameiito.s,

val L'Le eurrer de par corn o aprisiunarnento e a hxaçüo de outros grupos sociais. nurna vefligem aerea. Tratava-se de afirmar a radicalidade do capitalismo, a
(). canq:iunese-s da Bolivia e da Colômbia connibuetn, au
cu1tvar a coca, paia mesina que levou Beriold Brecht a afirmar mais tarde que "o que é radical é
u de,cuvul vi1ieiit(3 da cultura tiansuaciunal da droga e dus nwdu dc vida o capitalismo, flk) u comunismo". A radicalidade do capitalismo residia ein
desten tu ialiia(it)s 1]tu lie siu prOprios, iiias eles, camponeses, esthu presos, que ele, longe de ser apenas um novo modo de pruduço. era a manufestaço
tLlve7 flaliS do iue nunca, aus sens lugares de nascimenlu e de trabaihu. epucal dc um nova e ruuito mais ampIo processo cvilizatório. a niudemnidade,
e, conio tal, significava urna niudança societal global, urna mudança paradig-
Serí que esta diaktica de luz esquecem
ii'. elha; upressôes! E seni ue a veiha opressiu de classe
., eu]ugia internacional corre u risco de se
esquecer prematuramente
-
dc que a
. porque
intica. O
uso abundante
testernunhu disso mesmo. A
do adjectivo "moderno" au lungo do Manitèsw é
grande complexidade, se nào mesmo ambiguidade,
do Manifesto estí em que miele se condena. apitalisnio na mesina estralégia
taz t'stIuccer, Cia prúpria, a presença ou até O aravainenIu
discursiva em que se celebra a
muodernidade. uanto capitalismo, a inudernidzide
dc velha r uuvu' upiessöes locais, de orietti sexual, rucaI ou étnica?
é urn prujectu necessariamente incompleto. A ejência e o progresso, a liberdade
U execíciu das nussas perplexidades é lundatneutal para identiricar us e a igualdade, a raciunalidade e a autonomia sO podern ser plenamente compridas
de,'afius a F1e merece a pena responder. Aimai toshts as perplexidades e para akiii do cajiitalisino, e todo o projectu poUtico. cìentí[ico e losólcu de t'i

tcatu resuineni-se nuni sú em citndiçes de acelerução da histúria corns> as Marx consiste coi cunceber e promover esse passo.
que luije vivemos pussívcl pût a realidade no sen lugar scm correr o risco
i
Por eSta razilo, Marx estava plenamente consciCnte de que. au mesmo
di' .i cunceitus e teurias ira du lugar?
- ,,

t,!) que a solidei ailtiga. pré-capitalista, se desfazia no am, urna outra solidez

23

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24 Pela Mâc de Alice. O Social e o Foi ñìco na Pós.-Modernjjade

Sers que esta dialctica de tethtoriaiizaço/desterritorializaçao faz esquccer as vethas


-
opiessöes? E sci que a vetha opresso de classe de que a sociologia internacional corre 2
o risco de se esquecer prematuramente porque transnacionaliávei, faz esquecer, ola
prôpria. a presença ou a o agravamento de vethas e novas opressòes locals, de origeni TUDO O QUE É SÓLIDO SE DESFAZ NO AR:
sexual radai ou etnica? O MARXISMO TAMI3ÉM?
O exerckio das nossas perplexidades ¿ fundamental para identificar os desafios a que
merece a pena xtsponder. Afinal todas as perplexidades e desafios resumem-se num s6
em condiç5cs dc aceteraço da história como as que boje vivemos é possivel pör a reali-
dade no sou lugar scm correr o risco de criar conceitos e teoiias fora do lugar?

Corn a expresso «tudo o que é sólido se desfaz no ar» usada no Manifesto Cornu-
nista dc 1848, Marx e Engels pretendiam caracterizar o carkter revolucionério das frass-
formaçöes operadas pela modemidade e pelo capitalismo nos mais diferentes sectores da
vida sociaL O mbito o ritmo e a intensidade de tais transformaçöes ahalavam a tal ponto
modos de vida ancesfrais, kaldades até entäo inquestionadas, processos dc regulaçäo eco-
n6mica social e polftica julgados. mais que legftimos. insubstituíveis, práticas sociais
tidas por naturals de tAo confirmadas histórica e vivencialmente. que a sociedade do
século XIX parecia perder toda a sua evaporada, juntamente corn os sous funda-
solidez1

mcnws, numa veitigem aérea. Tratava-se de afirmar a radicalidade do capitalismo, a


mesma que levou Bertold Brecht a afirmar mais tarde que «o que radical é o capita-
lismo, no o comunismo». A radicalidade do capitalismo residia em que ele. longe de ser
apenas um uovo modo de produçao. era a manifestaçAo epocal dc uni novo e multo mais
ampio pmcesso civilizatório a modemidade. e, como tali significava urna mudança socio-
tal global, urna mudança paradigmática. O uso abundante do adjectivo «moderno» ao
longo do Manifesto é testemunho disso mesmo. A grande complexidade, se nao mesmo
ambiguidade, do Manifesto está em que noie se condena o capitalismo na mesma estraté-
gia discursiva em que se celebra a modemidade. Enquanto capitalismo. a modemidade é
um projecto necessariamente incompleto. A ciência e o progresso, a Iiberdade a igual-
dade. a racionalidade e a autonomia s6 podem ser plenamente cumpridas para além do
capitalismo. e todo o projecto poiftico. científico e filosófico de Marx comiste em conce-
ber e promover esse passo.
Por esta rao Marx estava plenamente consciete de que, no mesmo tempo que a
solidez antiga. pré-capitalista. se desfazia no ar urna outra solidez se instalava. instanta-
ricamente rígida e resistente, a lei de ferro das reiaçöes de produço capitalista, cuja supe-
raçäo ou evaporaçäo estada a caigo do movimento operáiio, urn movimento, por sua vez,
suficientemente sólido e resistente para se medir eficazmente pela ordern que pretendia
suplastm
Marx sempre ùnaginou a sua produçäo teórica como parte integrante da solidez do
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movimentos e teorias socialistas, pela mesma razo, apodados de utópicos isto é, dissolú-
Pela Mao de Alice. O Socìai e o Político na PósModernidade Tudo o que é sôlido se desfaz o or: o marxismo zarabém? 27

veis no at pela força da lógica capitalista que ineptamente pretendiam afrontar. A simctxia para superar as suas crises e estas são cada vez menos severas, no contrário do que pm-
antagdnica da solidez do capitalismo e do marxismo e a história das esiratégias de cada vira Marx. Sendo estes os factor, o marxismo tern de ser profundamente revisto (Berna-

um deles para dissolver o outro no at constituem urna das nairativas centrais da modemi tein, l965. As respostas de Knuisky, Rosa Luxemburgo, Labriola. dos austro-marxistas e
dade no nosso século, e nela, a narrativa sociológica ó urna das mais apaixonantes. de Lenine so igualmente conhecidast21. Importante é reter que depois desta cisAo o pen-
aumento marxista nAo voltou a ser o mesmo.
A segunda cisäo, de recorte epistemológico, é a que acorre corn os austro-marxistas:
Urna história para todos Max Adler, Otto Bauer, Rudolf Hilferding e Karl Renner. inspirados pelo neokanlismo e
pelo positivismo de Ernst Mach. procuraram transformar o marxismo mima ciência empi-

1890-1920 rica, numa em termos multo


sociologia das sociedades capitalistas, concebida de resto
diferentes dos de Bernstein (este tiltimo, muito influenciado pelo marginalismo econó-
As duas primeiras décadas do sóculo XX, a culminar na RevoluçAo de Outubro, pare- mico). Combinando, como ninguém depois deles, o activismo político e a reflexAo ted-
ceram testernunhar que a força revolucionária do marxismo seria capaz de desfazer no sr, rica, os austro-marxistas produziram as anélises mais mayadoras das sociedades do seo
a curto pts.50, o capitalismo. No plano da produço teórica e sociológica. este período, tempo e algumas das suas reflexües, sobretudo no dominio do Estado e do dimito, do
iniciado, de facto na última dteath do sóculo XIX, pode ser considerado a idade de anm nacionalismo, da ideologia e da cultura, nilo foram até boje superarlas em agudeza e pm-
do marxismo(». A recepçào do marxismo nsa ciencias soclais ocorreu quase desde a pri. fundidade3. No catasto, sobretudo depois de 1917, esta concepçäo cientista e sociologi-
máa bora, e a tal ponto que Marx é justamente considerado um dos fundadores da socio- zante do marxismo foi fortemente contestada por teóricos tAo diversos corno Karl Korach
logia. Assiin, no primeiro congresso de sociologia de i 894. vxios sociólogos (Tönnies, (1923 vide 1966), Lukacs (1923 vide 1971) e Gramsci (1929-35 vide I97l)(».
Entri, etc.) discutiram as teorías de Marx, e o congresso de 1900 foi inteiramente dedi- Convergiam estes pensadores na ideia de que a converalio do marxismo mima ciência
cado à discussào do materialismo histórico. Na Última década do século XIX, o marxismo positiva desarrnava o seo potencial revolucionério. As mixes do marxismo cram hegelia-
começou a ser estudado em algumas universidades: na Universidade de Viena por Carl nsa e faziam dele urna filosofia crítica. urna filosofia da praxis. mais virada para a cons-
Grünberg, que viña mais tairle a ser o primeiro director do Institutfi2r Soziale Forschung truçào de urna visäo libertadora e emancipadora do mundo do que para urna analise siate-

onde se formou a celebrada Escola de Frankfurt, e também na Universidade de Roma por máticae objectiva da sociedade capitalista. A *ensào que assim se criou no interior do
Antonio Labriola. este o período de fundaço de importantes revistas marxistas de aM- pensamento marxista nao mais deixou dc o habitar, como o demonsiram alada haie, de
lise politica e reflexäo teórica, tais corno: Die Neue Zeit, dirigida por Karl Kautsky, Le modo antagónico, correntes to importantes como a Escala de Frankuìtrt. de um lado, e

Devenir Social, dirigido por Georges Sorci, Der Kampf, dirigido por Otto Bauer e o mais recentemente o chamado marxismo analítico, do outro.

Archiv fir die Geschichte des Sozialismus und der ATbeiterbewegung, dirigida pelo já
referido Carl Grünberg.
Inicia-se entäo um dos debates paradigmáticos da sociologia contemporánea, entre a os anos Irinta e quareata
teoría de Marx e a teoria de Max Weber, outra grande fundador da sociologia. um debate
sobre as origens do capitalismo, sobre o papel da economia na vida social e politica, As duas décadas seguintes os anos trima e quarenta, forain um período negro para o
sobre as classes sociais e nuiras formas de designnldade social, sobre as leis de transfor- marxismo. Desta vez, forain o capitalismo imperialista e o fascismo que parcoeram ter

maç10 social e, em suma, sobre o socialismo. A riqueza da ret1exo marxista tern obvia- força suficiente para desfazer o marxismo no at Por visa moita diversas, tanto a remicçAo
mente a ver corn a pujança do movimento socialista ueste período e esta é tambera res- do movimento socialista na Europa ocidental, como o pesadelo estalinista foram os smala
pons*vel por duas grandes cisöes nessa refiexäo, urna de carácter predommantemente disso mesmo. Quanto a este tiltimo, a reflexAo teórica terminati corn a liquidaçAo de Pie-
politico e outra de carácter predominanternente epistemológico. que Se prolongaram ató kanov, Bukharin, Riazanov, Trotsky para nunca mais renascer e, tiesta medida, pode
aos hUasos dias. A pnmeira, que podemos designar por «controvórsia revisionista», foi dizer-se que o estalinismo durou até so colapso final do regime soviético no fmal da
deflagrada pelos artigos de Eduard Bernstein em Die Neue Zeit a partir de 18%. 0 argo-
lTlCfltO de Bernstein ó por demais conhecido. Se o marxismo é urna cifncia tern de se sub- 2. Sobie o debale suscitado por Bernstein unsutu. entre cultos. Peter Gay (1952).
meter à prova das factos e os factos nüo vAo no sentido previsto por Marx: a miséria näo 3. SSo particulannenle impostantes as contribniçes de Max Adler para a noria do Estado publicada cm
aUmentado, antes pelo contrário; as classes nAo se têm polarizado e, pelo contrkio, 1922 (AdIar, 1922). dc Otto Bauer para a ieoda do nacionalismo publicada ero 1901 (Bauer. 1924), dc Hilferding

Crescern as clatses médias o capitalismo parece dispar de energias sempre renovadas pal's a teoria do taismo organizado, a que voltarei no quano capítulo. publicada em 1910 (Hdferdng, 1951)

e dc Kasi Rennerpara a sociologia do direito. publicada em 19G (Remer, 1976). Em gral, nitre a cornrThuiç5o
PDF compression,
5Cre
1,
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CsIC perfodo onuIte Bononiore t19t3: i lO) cm
PDFCompressor dus austmmarxistas ionsulte Bottosnore o Goode
4,
t 1978).

Entre as tadeacobenas recentes de austro-nuuxìstas consulte, panicular. Athen et al. (1979).


28 Pela Mäo de Alice, O Social e o Polltìco na Pós-Modernidade Twio o que é sólido se desfaz no ar' o marxismo zambérn? 29

última década. Na Europa ocidental, a reflexAo austro-marxista e a da Escola de Frankfurt à teoria critica6 por nutro lado, o marxismo estruturalista francês, devedor da reflexAo
sobreviveram a custo nus condiçes diffceis da clandesthidade e do exilio. filosófica de Althusser (1965; i970; 1972) e da antropologia de Levi-Strauss (1965;
1967), mas tambérn corn contributos importantes de Maurice Godelier (1974; 1984 e
Luden Geldmann (1970).
Dos anos cinquenla aos anos setenta
Foi perante um periodo de grande criatividade teórica, em que se produziram anélises
críticas sofisticadas do Estado Capitalista - Habemias (1973), Offe (1972; 1984; 1985).
A partir dos anos cinquenta o pensamento marxista renasce corn vigor, iniciando urna
C. W. Mills (1956), Ponlantzas (l%8; 1978) e Miliband (1977a; 197Th; 1983) ., das
fase brilhante que se prolonga até fmal da década de setenta. Profundamente transfor-
classes e conflitos sociais nos países capitalistas avançados - Poulantzas (1968), Touraine
mada a solidez radical do marxismo afmnase de uovo capaz de desfazer o capitalismo
(1965; 1973)e,nofimdadécadadesetenta,ErikO. Wright(1978)eTherbotn(1978)-,
no at, se nAo o capitalismo central, pelo menos o capitalismo periférico. Sustentain essa
e do papel crescente da cultura e da ideologia - Marcuse (1970). Bourdicu (1970). Ray-
anogância a revoluço chineas, os movimentos dc descolonizaço e a abrupta criaçäo de
mond Williams (1958; 1977), Therbom (1982). Desenvolveu-se, assim, urna sociologia
flavos países, rnuitos deles liderados por politicos cam fonnaço marxista, a revoluçäo
marxista de muitos matines e, an lado dela, urna historiografia biiThante de inspiraçäo
cubana e, j em países capitalistas centrais da Eumpa e da América do Norte, o movi-
marxista de Fernand Braudel (1983; 1992) a Eric Hobsbawm (1979; 1982) e E. P.
mento estudantil de fluais da década de sessenta. principios da década de setenta e ainda,
Thompson (1968). e entre ambas, urna investigaço sociológica histórica de grande etiati-
apenas nsa democracias europelas, a emergencia de fones partidos socialistas e comunis-
vidade, corno a de llanington Moore (1966) e Immanuel Walierstein (1974). Se, para
tas.
alguna autores, a obra de Marx, sujeita multas vexes a exercicios de exegese escolástica.
A diversissima natureza destes processos de transformaçäo social e a sua dispersao
era o ponto de partida e o ponto de chegada da anélise (Poulanizas e Wright. por exem-
pelos diferentes espaços do sistema mundial tinham por força de suscitar profundas revi-
pio). para outros. era apenas o ponto de partida (Bourdieu. Habennas, Gouldner, Oid-
söes no pensamento marxista. A partir da revoluçAo chinesa, o pensamento de Mao
dens) e para outros ainda nao era sequer o ponto de partida, embora a sua investigação só
corren os pafses peiiféricos e acabou por produzir urna ciso no movimento comunista
um pano de fundo em que abundava o marxismo, como é o caso.
fosse inteligivel contra
mundiaL Por sua vez, a siwaço pós-cotonial pouco se compaginava corn o marxismo
o mais notável, de Foucault. Travaram-se debates encarniçados (como. por exemplo,
europeu e, em verdade, coniradizia muito do que Marx tinha esciito sobre o colonialismo,
enlie aithusserianos e antialthnsserianos e entre estruniralistas e fenomenologistas), sos
nomeadamente sobre o colonialismo briinico na India5), A originalidade do contexto
quais subjaziam quase sempre divergencias estratégicas sobre o movimento socialista,
colonial suscitava a originalidade teórica e ninguém v'itt isso me1hOF que Frantz Fanon,
sobren sua composição e a sua viabilidade, sobre o papel nele desempenhado pela classe
Em Les damnés de la terre diz Fanon: «A originalidade do contexto colonial reside em
operéria, sobre a relevância dus novos actores sociais e das novas agendas emancipatórias
que a base económica também a superesinitura (. . .) E-se rico porque se é branco e é-se .. débates esses a que o movimento estudantil tinha conferido urna nova urgencia.
branco porque se é rico. E por esta razäo que a anélise marxista deveria ser um pouco
Pode dizer-se que neste período foi a solidez do marxismo que de algum modo se
alargada sempre que trata do problema colonial» (1974: 9). Por sua vez, o subdesenvolvi-
vfrou contra ele próprio e o desfez no at Os alunis de força cransmutaram-se cm sinais de
mento dos países há muito saldos do colonialismo, sobretudo na América Latina. e corn
relaçöes econdmicas cada vez mais intensas coni os países desenvolvidos, levou a urna
fraqueza. Um dos factores sociológicos de tal transformação foi, por certo, a crescente
discrepancia entre o vigor e a sofisticaçAo dos debates intelectuais e a mediocridade real
revisAo profunda da análise marxista da economia mundial e do imperialismo, de que são
do movimento socialista, desertado por urna classe operéria muito diferente da que fizera
meThores exemplos a teoria da dependencia desenvolvida por cientistas sociais latino-
a histétia do marxismo e estrangulado entre partidos comunistas que ad muitotanlia e
-amencanos (Femando Henrique Cardoso et ai. I 979) e a teoria do sistema mundial cia-
incompletamente descobriram as virtualidades dos regimes democráticos europeus e par-
borada por L Wallerstein (1974; 1979). Por último, na Europa, o renascimento do mar-
tidos socialistas que pieferiam a gestão do capitalismo à transfoiunaçào do capitalismo e,
xismo, em gessi designado por «marxismo ocidental», está ligado à descoberta
de manus. do mesmo passo e corn alguma coer&icia, dispensaarn, por anacrónica, a referencia
-
critos de Marx até entAo desconhecidos como, por exemplo, os Manuscritos Económi-
matricia! no marxismo.
cor e Filosóficos de 1844 e os Grundrisse de 1857-58 -e
assume duas grandes orienta- Se para quase todos os dentistas 5OClRS era claro que Marx se equivocara nus suas
çôes: por um lado, a teoria crítica da Escola de Frankfurt, de novo sediada em Frankfurt a
previsöes acerca da evoluçAo das sociedades capitalistas. o mais importante era, no
partir de 1953 sob a direcçäo de Adorno e Horkheimer, a que se foi juntando urna nova
entanto, reconhecer que estas sociedades se tinham iransfoimado a tal ponto desde mea-
geraçäo de teóricos ctfticos. o mais proeminente dos quais Jürgen Habermas, responsé-
ve!, aliés, por conferir mais consistencia sociológica - de urna sociologia
antipositivista - 6. Algwa dûs iios mais impor!anes Q debate inetodo1ógco nicctao pcla Escola de FranUun poden
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5. Consuhc o em Avith
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esciitos de Marx sobre o colonialismo I 1969r
ter-.e cm Horkheimer e Manic (t969), Ademo el aL (t972). em f1abemas (1971a 971b) e em Weitmer
(t971). Consulte tainbm 1(otakowki (t97: Vol. Ut)e Jay (1973).
Pela Mäo de Alice. O Social e o Polftico na PóaModernidade Tudo o que é sólido se desfaz no or: o marxismo também? 31

dos do s&ulo XIX que. qualquer que tivesse sido o mérito an1ítco de Marx no estudo da eles de recorte pós-marxisla, mas em que a berança de Marx 6 um factor estruturante
sociedade do seu tempo, as suas teorias só corn pmfundas revis5es teriam aguma uili decisivo.
dade anaiftica no piesente. Cada um à sua manefra, AIaÙI Tourame (1974) e EaneI Bell O pnmeiro debate sobre os processos de regu1aço social nsa sociedades capitalistas
(1965; 1973) viram neste presente urna nipura radical corn o passado; designaram-no por avançadas, os oclos de estabilidade e de crise na acumulaçilo de capital e na relaçäo
socedade p6sindustriaL unia nova so'idez que desfizera no ai tanto o cap*aIismo indus- salarial e os is que neles desempenhain os Interesses organizados do capital e do tra-

trial, como a sua methor consciencia crítica. o marxismo. Dessa leitura, retirou Bell, batho e, acima de tudo, o próprio Estado. A teoria da regulaçäo em lrança e a teoria da
corno consequéncia, o fim das ideoogias e Touraine, a necessidade dc repensar profunda- estrutura social da acnmulaçäo nos BIJA são os frutos mais interessantes dente debate
mente os actores e a acçäo sociaL A pailir de meados da década de setenta. as revisöes (Aglietta, 1976; Aglietta e Brender 1984; Boyer, 1988a e 1988b). O segunda debate
mais ou menos globais do marxismo no se fizeram esperar. Em 1978 Habermas publica prende-se corn os processos de forrnaçAo e de estruturaço das classes nsa sociedades
Para urna recoflsfruçäo do materiaisrno histórico (1978). E em 1981 vêin a lume Urna capitalistas. corn a teoria do valor-trabalbo em que Marx fez assentar a sua concepçäo da
Crin ca Contemporánea do Materialismo Histórico de Anthony Giddens (198» e A Crise exploraço corn as novas classes e os lugares coniraditörios de classe, um debate de que
do Materialismo Histórico de Stanley Aaronowitz (1981). Erik O. Wright tern sido urn dos animadores principais (Wright et aL. I 989). C) terceiro
debate sobre a pÑnazia ou nAo da economia, das relaçöes de produço ou das classes
na explicaço dos processos de transforniaço social. Tal ptimazia, anteriormente consi-
Os anos oiten4z derada intocável no campo marxista. vinha a ser questionada desde a decada anterior
sobretudo pOr aqueles que viam o papel do Estado e dos factotus politicos em geral como
A decada de oltenla & sob diferentes formas a década do pós-marxismo. Mais do que demasiado impOrtante para poder ser considerado um mero epifenómeno da economia.
em qualquer outro período anterior, a solidez e a radicalidade do capitalismo ganhou Offe (1984; 1985) na Alemanba, Michael Mann (1987) e Nicos Mouzelis (1986) na
Impeto para desfazer o marxismo no as e desta vez para o desfazer aparentemente corn Inglaterra e Theda Sckopol (1979) e Peter Evans (1979), cuire ouuros nos EUA anima-
grande facilidade e para sempre. A ascensão de partidos conservadores na Europa e nos ram este debatetk O quarto debate sobre a natureza das transfomiaçäes cuhurais do
BUA; o isolamento progressivo dos partidos comunistas e a descaractetizaçâo política capitalismo - da cultura de massas à cornunicaçäo multimediática, da rea)idade informa-
dos partidos socialistas; a transnacionalizaçâo da economia e a sujeiço ferrea dos países cional realidade virtual, dos fundarnentalismos manifestos e estigmatizados ans funda-
peiiféricos e semi-periféricos às exigências do capitalismo multinacional e das suas insti- mentalismos ocultos e estigmatizadores, de Roy Liclitenstein à arquitectura pós-moderna
tuiçôes de suporte, o Banco Mundial e o Fundo Monethrio nternaciona1; a consagraço -e o.áu impacto na tntnsíonnaçäo da modernidade ou na emergencia da pós-modemi-
mundial da lógica económica capitalista sob a forma neoliberal e a consequente apologia dade um debate em que Fredric Janieson tern sido a figura central (Jameson, 1988;
do mercado, da livre iniciativa. do Estado mínimo, e da mercani1izaço das relaçoes Kellner, 1989). 0 quinto debate, menos abstracto e mais político. tern a ver corn a avalia-
SOCiRiS; o fortalecimento scm precedentes da cultura de massas e a celebraçAo nela de çAo do desempenho político dos partidos socialistas e comunistas e do movimenit ope-
estilos de vida e dc imaginários socials individualistas, privatistas e consumistas, militan- rário em geral na Europa. Se para alguns a luta de classes democrática trouxe ganhos
teniente relapsos a pensar a possibilidade de urna sociedade allernativa ao capitalismo ou inestimáveis à classe operária (Walter Korpi, 1982), para outros ela tornou clara que unia
sequer a exercitar a sotidariedade, a compaixo ou a revolts perante a injustiça social; a verdadeira opçäo socialista, a ser possível seria muito pouco atractiva para o operariado.
queda consentida de governos de oiientaço socialista M mAos do jogo democrático antes já que significaria a trixa de urna perda certa e imediata por um ganho inoerto e mediato
mIgado buZBus na Nicargua, em Cabo Venle e outros países; e. finalmente. o rotundo e (Przeworski, 1985).
quase inacreditável colapso dos regimes comunistas no Leste europeu -- todos estes facto- Fora dos paises centrais, a dissoluçäo do marxismo no aï foi talvez menos pronunci-
res forain convergindo para transformar o marxismo, sos olhos de muitos, como pouco ada e a sociologia de inspiraço marxista continuou a produzir reflex&s e análises vaho-
mais que um anacronismo. sas. A título de exemple, refirarn-se os estudos sehr7 os novos moviinentos soclais e
E esta a condiçäo em que nos encontramos. Antes de a analisar corn mais detallie e ao sobre os pmcessos de iransiço democrática na América Latina e os estados de sociologia
futuro que eta condm ou nao, 6 necesadrio referir que a interface entre marxismo e socio- histórica sobre o contexto colonial e pós-colonial da india, sobretudo os que R. Goba tern
logia foi na ddcada de oitenta e, apesar de tudo, muito complexa. A medida que se multi- viudo a publicar na impressionante colecçäo de Subaltern Studies (Guha. org.. 1989).
plicaram, as «grandes revisöes» do marxismo perderam o aemen polémico. trivializa- o perfil pós-marxista da década de oitenta tern um traço fundamental: anti-reducio-
ram-se de algum modo e abriram espaço para cada um construir à sua maneira o seu nista, antkleterminista e processualista. A a1ribuiço da primazia explicativa ans factores
maxismo ou o scu pós-marxismo. As revisöes da tradiçAo marxista criaram a sua económicos (a economia, as classes sociais). o chamado reducionismo onomicista é
prépria tradiço e siguas dos debates em que se traduziram enriquecerarn decididamente
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o património da sociologi& Quatro desses debates merecem referencia
anibm
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esPeciaL todos
Rcsctemycre Skcpot 7. Cmsulte Evans. 1orgs. I95.
Pela Mao de Alice. O Socia! e o Político na PósModernidade Tudo o que é sólido se deafaz no or: o marxismo também? 33
32

cursivas que se arlicuhim de modos diferentes. O perfil da acçäo social deriva da articula-
foriemente criticado. quer porque se considera o determinismo em geta! insustentávet.
çAo específica que the subjaz e muda corn a mudança de articulaçäo. As prticas sociais
quer porque se considera errada a versäo marxista do determinsmo urna versào que
nAo tern, pois, a sustente-las nenhum esqueleto estrutural nem é possfvel distinguir adas
toma impossveI conceptualizar nos seus próprios termos, tanto os factores políticos.
como os factores culturais, a qie entretanto. se aUÎbUi crescente ÜTiPOItância nos pmces- compartimentos reificados como, por exemplo, a economia, a política, a cultura. Pela
Sos de eslrutuxaçâo e de transforznaçäo sociaL Por outm lado. o p6s-marismo da d6cada
mesma iuzäo, nAo há actores sociais privilegiados, sciant eles o operariado ou quaisquer
witeiior ¿ pés-estruturalista e ueste dominio foitemente tiibutário de Foucault e da retle- outros, Urna posiçAo, portanto, radicalmente pós-marxista.
xäo teórica na linguistica, na semiótica, na teoria litCrrÎa e mesmo na psicanálise. A década de oitenta foi, pois, urna decade em que o marxismo pareceu desfazer-se
Dura j h muito o debate no inteiior da teoria marxista sobre a tenso ou equilíbio definitivamente no ar, urna metMora que no final da decada adquiriu a vemsimilhança
prOpria da literalidade na evaporaçäo dos regimes comunistas do Leste eumpeu. Trata-se,
entre esirutura e acçäo, enlie. por um lado os constrangimentos e as possibilidades
sociais que preexistem à acçAo dos ¡ndiVMUOS e gupos sociais e a condicionam de modo pois, de saber se terminou al o futuro do marxismo. E disso que me ocuparei na segunda
mais ou menos decisivo; e por outro lado, a autonomia a criatividade e a capacidade dos parte deste capítulo.
mesmos individuos e grupos de, por via da sua acço e prática. mudarem as estruturas e
trasknnarem a sociedade. Esta tensäo no i obviamente específica do marxismo. Per-
cotie toda a tradiç.o sociológica, a qua] pode ser lida como urna comrovérsia continuada Um fUturo para todos

entre os que piivilegiam a acço e as prticas (a sociologia fenomenológca thteraio


nista) e os que privilegam as estruturas (a lradiço parsoniana). Mas no marxismo esta O breve excurso pela tradiçAo teórica marxista que acabei de fazer teve por ñmçAo
controvia assume urna tonalidade específica que the advni da necessidade de caracte- significar que, quando boje se avaliam as muitas. as poucas ou as nenhumas virtualidades
futuras do marxismo, tal avaliaçAo tern de ser feita no encaixe de um passado de reflcxäo
rizar a acç4o revoIucion.ria e especificamente de defmr a conposiçào e a estratégia do
movimento socialista Se o período anteriot sobretudo a década de sessenta, privilegiou te6rica e analise sociológica que d bem mais longo e bem mais rico do que vulgarmente
se julga. NAo estamos, pois, perante urna moda teórica dos anos sessenta que. como
urna letura estnitnra1 a década de oitenta privilegion urna leitura antiestruturaL Urna das
reconstruçIcs mais recentes e ambiciosas do marxismo. o marxismo analítico (Ester, multas outras modas do mesmo período, nAo moda estarem agora em moda. Estanios
antesperante um dos pilares das ciencias sociais da modemidade e tudo o que ade ocor-
1985)(), pûvilegia distintamente a acçào. e mesmo a acço individuai. em detrimentO das
esflftuas. ret no pode deixar de se repercutir no conjunto destas. E, reciprocamente, as transforma-
Independentemente de julgar se o marxismo analítico é realmente um pós-inarxisrno, çöes por que as ciencias ciis houverem de pasar nos prdximos anos nAo pode deixar

entre ou1ns, podem klentilìcarse ueste último dois modos distintos de questionar a arti- de produzir abalos mais ou menos profundos nos sens pilares.
culaço acço-estruftira tal como ea se loi constituindo e transformando na tradço mar- Tais transforrnaçöes decorrerAo, como sempre aconteceu no passado. da novidade dos
xsta. O primeiro questionamento é o dos que. scm contestarem. em principio, o quadro problemas e dus desaftos corn que se confrontam os cientistas sociais de urna dada epoca.

conceplual da dualidade acçào-estrutura, queslionam o modo como a acçâo foi concebida Em última instância, é a condiçAo do presente quem prie condiçòes ao pensamento pen-

na tradiço marxista. E neste dominio a crítica mais aguda e mais inovadora veio da sado do presente e o impele a despensar-se e a repensar-se. E à luz dela que devemos
sociologia feminista. Voliarei a cia adiante. Por agora basta referir que o feminismo vejo avaliar os limites e as virtualidades da tradiçào marxista. Tudo o que desta for avallado
questionar o piivilegiamento no marxismo da acçäo, das prticas, das identidades e do negativamente desfazer-se-á no ai.
poder de classe, em detrimento de outras fomias de construçäo da subjectividade social e Antes de passar a tal avaliaçAo duas notas gerais se imp&m. A primeira é que nAo ha
nomeadamente a assente na identidade e na disciiminaçäo sexuais. A chamada de atenço um cânon marxista. NAo M urna versAo ou interpretaçào autorizada do que Marx venia-
para a importância e a especificidade da exploraçAo do trabatho e da identidade femini- deiramente disse ou quis dizer. NAo M urna ortodoxia a que se tenha de prestar lealdade
incondicional, nern inversamente fazem multo
nas, nAo só no espaço da produçAo capitalista, como tambéni no espaço domdstico e na sentid? protestos de renegaçAo ou de abju-
esfera pública em gera], conslituiu o contributo mais importante para a sociologia dos raçäo. Marx deve no mesmo pé que os demais fundadores da sociologia
ser posto

anos oitenta. moderna, nomeadamente Max Weber e Durkheim. Nunca nenhum destes autores foi
O segundo questionamento da dualidade acçâo-estrutuca d, de algum modo, mais radi- objecto de canonizaçAo ou de ortodoxia nos mesmos termos em que o foi Marx. Numa
cal que o anterior, potque pöc em causa essa dualidade no ses todo. Urna das posiçöes pincelada de sociologia do marxismo pode direr-se que canonizaçAo e ortodoxia sAo prO-

mais influentes da ddcadaade Ernesto Laclauc Chantai de Mouffe (1985). Para eles, a prios de universos de conhecimento que se pretendem directamente conformadores da
sociedade nAo tern essncia, nAo tern identidade esliutural. E um conjunto de prticas dis- prática social como, o caso, por exemplo, da teologia ou da psicanálise. Na medida em
que Marx pretenden colocar, no mesmo plano gnoseolOgico, a compreensäo da sociedade
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Urna das mais fis
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onsmç&sdoxismepodenseremG, Cohen (!978. A.
como copy of CVISIONtomou-se
sua transformaço PDFCompressor
capitalista tal cia existe e a futura, vuinerável aos pro-
34 Pela Mäo de Alice, O Social e o Político na Pó-Modernidade Tudo o que é sólido se de3faz no at.- o marxismo tamj,ém ?

cessos de canonizaçäo e de ortodoxia e à consequente invero do processos de veriiica ampliando a mercadorizaçâo da vida, estendendo-a a novos bens e serviços e a novas
ço: em vez do tesse da pratica à teoria que, se fathado, condiz à falsificaçâo da teoria, o re1aç5es sociaja e fazendo-a chegar a pontos do globo até ento no integrados na econo-
leste da teoria à prálica que. se famado, conduz à condenaçäo e à ostracizaçäo da práLica. mia mundiaL Por urna e outra via, tal processo de expansào e ampliaçAo parece estar a
Marx teve um vislumbre dessa vulnerabilidade quando, como iefere Engels em carta a atingir limites inukrapassáveis. A mercadorizaçAo e mercantilizaço de bem e serviços
Bernstein confrontado corn a simphficaçäo das suas ideias pelos seus seguidores france. até agora livres começa boje a envolver, corn a biogenética, o próprio corpo humano, e
ses, pIOtCStOU que nào era marxista (Mani e Enge's, 1973: 388). quando isso suceder näo seri possvel ir mais longe, Quanto integraçao do planeta terra
A segunda nota, i1aionada corn a anterior, que o campo gnoseológico da coin- na economia capitalista mundiaL as duas diUrnas décadas de transnacionalizaço da eco-
preensäo e da explicaço da ociedade do presente é distinto do campo gnoseológico da nomia pareceni ter concluido definitivamente o processo histórico que se iniciou na ¿poca
dhecçAo da transformaçAo desta. As ciências sociais da modernidade sempre teuderam a das descobertas.
confundir os dois campos. Apesar de se guardarem de urna traduçäo organizada das suas Seudo este a traço multo gmssoo quadro gera da condiçäo do presente, o que tern o
¡dejas em pmcessos de transformaçâo socia1 Max Weber e Diirkheim no se coibirain de marxismo a contribuir para a sua compreensAo e superaçào? A primeira vista, muito
fazer previses e de apontar direcçäes desejáveis ou indesejáveis de iransformaçAo sociaL pouco. O marxismo é urna das mais brilhantes reflexes teóricas da modernidade, urn dos
o que os distingue de Marx , neste dominio, o hicto de as suas pivises se manterem seus pmdutos culturais e poifticos mais genuinos. Se a
modemidade se toma hoje mais do
dentro do quadro do capiaIismo, enquanto as de Ma pieenderam ir para al&n dele. que nunca problemática, o marxismo seth mais parte do problema que defrontamos do que
Porque se Jimitaram a prever vanaçöes do presente. Max Weber e Durkheim falliaram da soluçäo que pretendemos encontrar No entanto, M
que distinguit No p]ano epistemold-
menos estrondosamente que Mari nas suas previsöes. Mas, por outro lado. ao tentar gico,o marxismo pouco pode contribuir para nos ajudar a tiithar a lransiçäo paradigmática.
prever mais longe e mais radicalmente. Marx apresentou. talvei contra a sua vontade, Marx demonsUu urna fé incondiciona] na ciência moderna e no progresso e racionalidade
urna das (dtinias grandes utopias da modernidade: boje c'aro que todo o socialismo é que ela podia gerar. Penson mesmo que o governo e a evohiçac da sociedade podiam estar
utópico ou nAo é socialismo. E. pois. necessario assumir plenamente o carácter utópico da sujeitos a leis tAo rigorosas quanto as que supostamente regem a nalureza, numa antecipa-
proposta transformadora de Marx, e do que se trata agora é de saber se. em finais do ço do sonho, mais tarde articulado pelo positivismo, da clência unificada. A crftica episte-
século, podemos dispensar as utopian e, em caso negativo, se a utopia de Marx ainda nos molégica da ciência moderna no pode assim deixar de envolver o marxismo.
serve ou se a devemos substituir integral ou parcialmente por outra. N? plano sécio-político as coisas säo ou podem ser diferentes. A transiçäo paradigmá-
Qual é, a condiçäo do presente e que contributo podemos esperar do marxismo
pois7
tica tern vindo a ser entendida de dois modos antagónicos. Por um lado, há os que pensam
para a compreender e para a transformar? que, a transiçäo paradigmática reside numa dupla verificaçäo: em primeiro lugar, que as
Tenho viudo a afirmar que nos encontramos numa fase de iransiçâo paradigmática. promessas da moderthdade depois que esta deixou reduzir as suas possibiidades às do
entre o paradigma da modernidade, cujos sinais de crise me parecem evidentes, e um capitalismo,, näo foram nem podem ser cumpridas; e, em segundo lugar. que depths de
novo paradigma corn um perfil vagamente descortinável, ainda sem nome e cuja ausência dois séculos de poumiscuidade entre modemidade e capitalismo tais promessas, muitas
(le nome se designa por pósinodernidade. Tenho mantido que essa transiçAo é sobretudo delas emancipatórias, no podem ser rumpridas em termos modernos oem segundo os
evidente no domthio epistemológico: por de baixo de um britho aparente. a ciência mecanismos desenhados pela modernidade. O que é verdadeiramente característico do
moderna, que o prujecto da modemidade considerou ser a souçäo privilegiada para a tempo presente é que, pela primeira vez ueste século, a crise de regulaçAo social corre de
progressiva e global racionaiizaço da vida social e individual, Iem-se vindo a conveitei par corn a cuse de emancipaçäo sociaL Esta versäo da Iransiço paradigmtk é o que
cia propria, nom problema sem soluçäo. gerador de recorrentes inacionalidades. Penso designo por pós-modernismo inquietante ou de oposiçäo. A
segunda versäo da transiçAo é
boje que esta transiçäo paradigmáiica. longe de se confinar ao dominio epistemoksgico, a dos que pensara que o que está em crise final é precisamente a ideia moderna de que há
ocorre no plano societal globaL o processo civilizatótio instaurado corn a conjunço da promessas, objectivos traus-históricos a cumprit- e, ainda mais, a idela de que o capita-
modemidade corn o capilalismo e, portanto, corn a reduçäo das possibilidades da moder- lismo pode ser mn obstéculo a rea1izaço de algo quep transcende. As sociedades nAo tm
nidade s possibiidades do capitalismo entrou, tudo leva a crer num período final Volta- de cumprir nada que esteja para além delas, e as prútias sociais que as cornpòem nAo têm,
rei a este tema adiante. Por agora, referirei apenas dois dos smutomas do esgotamento oem podem ser avalladas pelo que n.o são. Esta versão da transi-
por natureza. alternativa
desse prcess civilizatójio. çäo paradigmáiica é o que designo por pós-modernismo reconfortante ou de ce1ebraço.
Por um lado a conveisào do progresso em acumu1aço capiialista transformou a nani- Para esta ditima versäo. que é hoje maioritária nos países centrais, o marxismo nada
reza em mera condiço de produço. Os limites desta tranSfOrmaÇAD começam boje a ser tem a contribuir. Já o mesmo uo sucede corn a prinieira versào, que é a que Eenho viudo
evidentes e os riscos e perversidades que acarreta, alarmantes, bem demonstrados nos a defender9. Para esta versâo, é essencial a ideia de urna alternativa radical à sociedade
perigos cada vez mais iminentes dc catástrofe ecológica. Por outro
lado. sempre que o
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capitalismo teve de confrontar-se corn as Suas endémicas crises de acumulaçäo,
fé-lo 9, Ver adiante o quarto capftuta.
Pela Mäo de Alice. O Social e o Pol (tko na Pós-Modermdade 1udo o que é Ólìdo se defaz no at: o marxismo zambém? 37

actuat e Marx formulou, mais coerentemente que ninguém, urna tal alternativa. A ques direcço na questäo da direcço necessária.É boje evidente que Marx fathou estrondosa-
tAo est& POS Cil saber em que medida a alternativa de Marx, que é täo radicalmente anti- mente no modo como pös esta questão e na resposta que Ihe den. A anldise do presente e
capitalista quanto moderna, pode contribuir para a consiniçäo de urna alternativa assu- do passade. por mais profunda que soja, nao pode fornecer mais do que um horizonte de

midamente pós-moderna. A resposta nao pode ser gen&ca. Genérica é apenas a preven- possibiUdades. urn leque de futuros possiveis; a conversäo de um deles em realidade é
çao, já feita acima, de que a coerência necessária entre a compreenso da condiçäo pre- fruto da utopia e da contingência. Mas se é assirn, em geral. é-o milito mais num perIodo

sente e a ideia de urna alternativa radical a eta näo implica que urna e outra ocorrarn no de transiçäo paradigmtica como o que atravessamos. Em tais perlodos. os processos
mesmo plano guoseológico. A sociologia de Marx , em geral. coerente corn a utopia de 1: sociais são täo fluidos e turbulentos que o que resulta das interacçäes entre eles é. em
Marx, mas näo se confunde corn cia. Procurarci determinar a seguir o contibuto de Marx grande medida, urna incógnita. Para utilizar o enaceito de Prigogine, estamos numa situa-

nas seguintes tres áreas temáticas: processos de determinaçào social e autonomia do poll- çäo de «biñivaçäo» em que a menor mudança no sistema pode produzir um desvio de
tico; acçäo colectiva e identidade; diTeCÇàO da transformaçäo social. largas proporçöcs. Estamos nurna época em que a contingência parece sobrepujar a deter-
minaçäo.
Isto nào significa, contado, que a sociedade seja totalmente contingente ou indetermi-
Processos de defrrminaçâo ocza1 nada, como queim Laciau e MoufTe. Entre um determinismo fechado e a total indetermi-
naçäo, vários autores tm vindo a propor versöes fracas do materialismo histórico corno,

Um dos grandes m&itos de Marx o ter-se centrado na análise de transfoimaçes por exemplo, E O. Wright, A. Levine e Sober (1992). por um lado, e Nicos Mouzelis
macro-sociais. Como diz um soci6logo nao-marxista, Anthony Giddens: «A análise dos (1990), por outm. A proposta de Wright, Levine e Sober é particulaimente sofisticada.

mecanismos da tiçao capitalista feita por Marx (. . . ) permanece o núcleo necessário Nos anda a correspondencia ou a contradiçAo entre forças produtivas e
seas termos, é

dc qualquer tentativa para compreender as transformaçöes maciças que têm varrido o reiaçes de pmduçào que cria as condiçöes necessárias e a direcçâo da transformaçäo
mundo desde o sécuto XVIII» (1981 : i). Mas Marx nAo se limitou a apresentar urna social, bem como os meios desta (a luta de classes); mas, no contrário do que reivindica o

macro-análise do capitalismo; forrnulou, ainda que de modo no sistemático, urna nova materialismo histórico ortodoxo, tal proposta nAo cria as condiçôca suficientes e por essa

teoria da história, o materialismo histórico, nos termos da quai as sociedades evoluem razäo, limita-se a definir um «mapa histórico» de possibilidades.
necessária e deterministicamente ao longo de várias fases segundo leis que muito suma- ET1 minha opiniAo, e tendo em conta o que disse atras sobre a tmnsiço paradigmá-

riamente em ser formuladas do seguiate modo: o nivel dc desenvolvimento das forças tica, Sta versäo faca do materialismo histórico é ainda demasiado forte. como resultará

produtivas (o nivel de desenvolvimento tecnológico e da produtividade do irabalho. etc.) clavo da minha posiçäo sobre o segundo traço da teoria da história de Marx, o reducio-

determina e explica o conjunto das relaç'es sociais de produço, ou seja, a estrutura eco- nismo económico. As máximas teóricas de Marx a este respeito -- nomeadamente a metá-
nómica da sociedade; por sua vez, a esüulina económica da sociedade, a chamada base fora base-superstrutura -so insustentáveis, e, de facto, nem Marx as sustentou integral-

económica», determina e explica as formas políticas. jurídicas e culturais que dominam mente nos seas estudos históricos. Tanto ele corno Engels, à medida que os anos passa-

na sociedade, ou seja, a «superesirutura». So poucos os qie hoje aceitam, nesia versAo, o tarn, forain dedicando um interesse crescente às interacç,cs recíprocas entre a base e a

materialismo histórico. As críticas que the têm sido feitas incidem, por um lado. no sea superstratura, mais do que à mnftuncia unilateral da primeira sobre a segunda.
determinismo e evolucionismo e, por outra, no sen reducionismo economicista. Tal corno A insustentabilidade do reducionismo económico assenta em duas razòes principals.
acontecerá corn as demais temáticas, avaliarei o materialismo histórico à luz da nossa A prirneira é que a explicaço pela estrutura económica tende a transformar os fenómenos
condiço presente. Deixo, por agora, de lado as objecçöes episternolégicas e metateóri- politicos e os fn6menos cuiterais em epifenómenos, scm vida nem dinâmica própiias. e
cas a urna concepçäo determinista e evolucionista da sociedade, já que o detenninismo como tal näo permite pensá-los, autonomamente, nos seus pröprios termos, e segundo
de Marx näo se pode analisar fora do contexto intelectual e epoca! em que ele viveu e categotias que identifiquem a sua especificidade e a especificidade da sua mteracçào corn

escre ven. processos sociais mais globais. Esta limìiaço tern-se viudo a agravar à medida que avan-
o determinismo possibilitou a Marx desenvolver urna série de conceitos (forças pro- çamos no nosso século em deconéncia da crescente lntervençäo do Estado na vida econó-
dutivas, relaçoes de produço, modo de produço) que the permitiram proceder a urna mica e social, da politizaçAo dos interesses sectoriais mais importantes e, sobretudo, nas

anlise global da sociedade capitalista e definir a dirceçílo da sua transfonnaço futura. últimas décadas, do desenvolvimento dramático da cultura de massas e das indüstrias cul-
Essa análise. apesar de incompleta, continua hoje a ser valiosa, e os conceitos que Marx tarais. Mas a insustentabilidade do reducionismo económico resulta acirna de tudo do
desenvolveu paia a efectuar continuam a ter um gande valor heurístico. O que no tern facto dc, à medida que avançamos na transiço paradigmática, ser cada vez mais difícil

boje validade éo facto de Marx, fie' às premissas cuiterais da modernidade no seu tempo, distinguir entre o económico, o político e o cultural. Cada vez mais, os fenómenos mais
no ter podido pôr a questlio da direcçäo da transformaçäo social fora de urn quadro importantes são simultaneamente económicos, politicos e cufturais, scm que scia fácil ou
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legal de necessidades evolucionistas, convertendo assim a questo da necessidade da
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dimensôes. Estas so produto das cienciastentar destrmnçar estas diferentes
38 Pela Mâo de Alice. O Social e o Político na Pós-Moderrndade
Tudo o que é sólido se deefaz no or: o nwrxìsmo tarnbém? 39

socials ottocentistas e revelamse hoje muito pouco adequadas, sendo t&efa urgente dos Acção colectiva e iden1dade
cientistas sociais descobrir outras categorias que as substituam.
Como vimos o mateÑlismo histórico fraco de Erik OE Wright Levine e Sober é ainda )á referí, embora isso seja controverso, que cui minha
opiniAo, a obra de Mai' no sen
demasiado reducionista, mesmo descontando que na análise metodoLOgica das exp1ica todo procura obter um equilibrio. embora instável, entre esirutura e acçâo: os homens e as
çòes causais tal reducionismo é subsiancialmente atenuado, um tema que aqui nAo posso muiheres nao são mais pmdutos da história do que são seus pmdutores.
Mais do que isso,
desenvolvei; ainda que a ele volte brevemente a seguir. A insustentabilidade do reducio Marx, ao contrário dos outros fundadores da sociologia, athbu aos homens e às muihe-
nismo económico nAo significa que a estrutura económica nao tenha um valor cniciaL res, enquanto classe operáiia, nAo sé o interesse, mas também a capacidade de transfor-
Signi&a apenas que ial valoi no pode se deteiminado aprioi e que, tendo de ser afeidC mar por intetro a socieiade capitalista através da acço revoIuconria. Constituidas no
empüicamente. pode variar dc processo histórico para processo hist6rico. Por outro lado, seo das relaçòcs sociais de pmduçk e, portante, na base econ6mca da Sociedade, as
signilka que a an1ise das interacçòes recípmcas entre o económico o politico e o cultu- classes e as lutas de classes têm, nAo só a prirnuia explicativa da sociedade capiaIista,
-
rai na medida em que continuar a ser possivel distinguir entre eles pissupôe que cada como a prirnazia da transformaçäo desta. A diviso da sociedade em classes coni interes-
um deles seja construido conceptualinente corn autonomia. Esta construçào no tern sido ses antagónicos, nao sendo origiadila de Marx, tern em Marx a fonnu!açào mais sofisti-
fácil no campo marxista, sendo por isso mesmo urna preocupaço central no campo dito cada e constitui um das patrimónios da sociologia contemporânea, marxista ou nAo-
pós-marista. As so1uçes apresentadas por Bourdien so particularmente inovadoras. -marxista. No entamo, os termos precisos desta IonnulaçAo sAo boje, cwiosamente, urn
Recentemente Ncos Mouzelis propöe o conceito de modo de dominaçäo política, de raiz dos pontos mais problemáticos da £radiçAo marxista.
webeijana, pai empailhar corn o conceito de modo de produçb económica. As tenaLi- :

Em prirnefro lugar. a evoluçAo das classes nas sociedades capitalistas nAo seguiu o
vas muttiplicarn-se Por rninha parte, tenbo vindo a desenvolver o conceito dc espaços tritho que Marx the traçou. Nos países centrais, a pmletarizaçâo foi muito mais sinuosa.
estruturais e de modos de produço do poder para dar conta das esiruturas mais importan- os carnponeses nAo desapareceram tAo rapidamente quanto previsto. a classe
operria
tes que estabelecem os parârnetros e, portanto. iarnbém os limites da contingencia, ou tornou-se mais heterogenea em vez de mais homogénea. o que de resto suceden tambérn
soja, os horizontes de possibilidades'° Se é verdade que o marxismo procura urn equili- corn a burguesia. surgiram significativas classes médias, tomaram-se evidentes outras
brio estâvel eifre estrutura e acçäo, penso que boje. sende incorrecto abandonar de todo a formas de opressäo nAo directamente anibuiveis a posiçöes de classe. Nos países periféñ-
idela de estrutura necessário pluralizar as estruturas a firn de desenvolver teorias que cos, í campesinato permaneccu por muito tempo um grande mar social ponteado por
privilegiem a abertura dos horizontes de possibilidades e a criatividade da acçäo.
algunias ilhas - os centros urbanos - de classes socinis propnarnente capitalistas, a inte-
A ptvmoço da Criatividade da acço urna tarefa crucial do tempo presente. Porque graçäo em relaçes soclais capitalistas foi multas vezes considerada menos opressiva do
na fase de transiçäo paradigmática o sistema socia! entra em desequihbrio acrescido, o
quea exclusAo deles e, finalmente, as formas de opressAo e dominaçào assentes na raça,
aumento da contingencia tende a criar situaçöes de caos. O caos, que a ordern e o pro-
gresso da modernidade parecerarn ter atirado para o hxo da história regressa hoje. tanto na
na ernia, na reigiAo e no sexo afirmaram-se pelo menos to importantes quanto as assen-
tes na classe.
epistemologia, como nos processos sociais. Longe de ser por essência negativo. o caos é Em segundo lugar, surgirarn, sobretudo nas duas últimas décadas, poderosas fracçöes
um horizonte drarnaticarnente ampliado de possibilidades e, como tal, compreende, como de classe scm urna base nacional determinada, classes trausnacionais que de aigum modo
nenhum outro, possiblidades progressivas e possibilidades igressivas. Pouco tempo antes inverterarn a previsAo de Marx: o capital está boje, mais do que nunca, unido a nivei
de moner, Felix Guatiari inctava-nos a distingwr entre o caos democrtco e o caos mundial, enquanto o trabaiho está cada vez mais sitiado, já que.
mesmo a chamada «livre
autoti*io. Para isso são necess.i'ias duas condiçöes: por um lado, a discriniinaç.o entre cfrculaçäo de pessoas» tende sempre a excluí-lo. Em terceiro lugar, as lutas de classe
váñas formas de poder, a ampliaçân do politico e a sua conceptualizaçäo autónoma e, assumirarn formas insuspeitadas por Marx. As revoluçöes operárias nAo ocorreram nos
por outro, urna reflexo centrada na promoção da criatividade da acçào individuai e colec- países centrais, e nos países periféiicos e semiperiféricos onde bouve revoluçoes de once-
iiva As deficiencias da tradiço mandsta em qualquer destas condiçäes são conhecidas.
Mas no que respeita à segunda condiço, a simação é hem mais complexa. Isto me
taçAo socialista, a participaçAo do operariado, quant
existente, foi problemática. Se o
operaniado teve forte panikipaçäo na revoluçAo russa, perdeu o controle desta pouco
conduz à segunda área temática em que a avaliaço do marxismo à luz da condiço do depois e logo em 9 8 falhou na tentativa revoludonánia na Alemanba para nunca mais
I 1
presente se impe corn particular acuidade: a questäo da acço colectiva e das identidades
recuperar. Na China, a classe revolucionthia foram os camponeses, na Africa forarn os
sodais.
movimenros de libertaçäo de composiçäo multo heterogénea. e na Ainéiica Latina os pro-
cessos revolucionnios, exemplarmente o- de Cuba, contararn quase sempre corn a oposi-
çAo dos partidos comunistas supostamente representantes do operaniado industriaL
Por outre lado, nos países centrais. as lutas de classe deram paulatinamente lugar a
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o quituo capftulo.
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concenaçäo ao compromisso
PDFCompressor classe, à social, histórico, à institucionali-
4) Pela Mao de Alice. O Social e o PolItico na PósModernidade Tudo o que é sólido se de.faz no ar: o marxismo também? 4j

zaçAo dûs conthtos, ao neocorporativsmo, enfun, M tonnas po1ítcas da social democra- mandsrno analítico a proposta mais saliente a de Erik Wright, Levine e Sober pariindo
ao Estado-Provid&lcia e à reguIaço social fordista. Por último, sobretudo nas úlii-
cias

do conceito de assimeirias causais. estes autores prop5ern que a pximazia explicativa das
mas três decadas, os movimentos e as lutas poifticas mais impoilantes nos países centrais classes só pode em presença e em funçAo das objectos de explicaçäo (os
ser eslabelecida
e mesmo nos paises 6iicos e semiperiféricos forain pmtagonizadas por grupos soclais explananda). Nao cabe aquí referir os problemas que esta proposta suscita. Limito-me a
congregados por identidades nAo directamente cIassisas, por esWdantes. por mullieres, referir a tumba pr6pria conclusAo do debate gerado por esta proposta. Em primeiro lugar.
por grupos étnicos e religiosos, po grupos pacifistas, por gnipos ecológicos. etc etc. as classes so um factor de pthneira impOrtância na explicaço dos processos sociais. mas
Em lace disto, nAo surpreende que tanto a prhnazia explicativa, como a primazia tal impOrtância só é aferível em anlises concretas e nAo necessita para se sustentar, da
transformadora das classes estejam hoje a ser radicalmente questionadas. As duas atiibui- estipulaçäo abstracta da primazia explicaÜvL Em segunda lugai cxrdneo reduzir a idea-
çöes de primazia são autónomas no plano teórico, ainda que interligadas. Por minha tificaçäo,fonnaçäo e estruturaçäo das classes à esinitura económica da sociedade. As
parte, penso que a prïmazia explicativa das classes é muito mais defcnsveI que a prima- classes so urna forma de poder e todo o poder é político. O valor explicativo das classes
zia transfonnadora Quanto a esta ilthna, a prova histórica parece ser por demais conclu- depende das constelaçöes de ditrentes formas de poder rias práucas soclais concretas.
dente quanto à sua indefensibilidade Dando de barato que é fácil definir e delimitar a Urna familia operáiia da periferia de Lisboa sofre simultaneamente o poder de classe, o
classe operária, d multo duvidoso que ela tenha interesse no tipo de fransfonnaço socia- poder sexual, o poder estatal e até, se forem imigrantes africanos, o poder étnico. Venla-
lista que Ihe oi atribuido pelo marxismo e, mesmo admitindo que tenha esse inteiesse, d deiramente, aS a constelaço desses poderes é política. Esta quesuão conduz-me a urna
ainda mais duvidoso que cia tenha capacidade para o concretizar. Esta verificaçâo, que referthcia breve e fmal sobre a terceira grande area temática através da quai a condiçäo
parece boje indiscutível, tern levado muitos a concluir pela impossibilidade ou pela lude- do presente interpela o marxismo: a direcção da iransformaço social.
sejabilidade de urna alternativa socialista. Voltarel a este tema adiante.
Quanto à primazia explicanva, a impotância causal privilegiada das classes e dos
conflitos de classe nos processos sociais capitalistas tern estado inthnamente ligada ao Dfrecçäo da frwzsformaçâo social
materialismo históricoz a formaço das classes tern lugar na esinnura económica e paru-
Iba, por isso, corn esa a eficácia determinante sobre os processus sociais. Formulada Um dos maiores méritos de Marx foi o de tentar articular urna anlise exigente da
assim, a priinazia explicativa foi na década de oitenta muito criticada. A crítica mais pro- sociedade capitalista corn a consthiçAo de urna vontade política radical de a transformar e
funda e consequente vejo da sociologia kminista. Nao cabe aquí dilucidar a grande varie- superar nuina sociedade mais livre, mais igual, mais justa e afinal mais humana. Refen já
dade de perspectivas que a sociologia feminista envolve. Em geral, o feminismo veio que a coerência entre a análise do presente e a construçäo da vontade do futuro nao urn
demonstrar que a opressào tern muitas faces, para usar urna expressAo de Iris Young acto científico, dado que os dois pmcedimentos têm lugar em planos gnoseológicos dis-
( 1990), urna das quais é a opressäo das mutheres por via da discriminaçäo sexual. Ao pri- tintos. É urn acto político que articula a análise científica corn o pensarnento utópico.
vilegiar a opressio de classe, o marxismo secundatzou e, no ñmdd, ocultou a opesso Referi também que Marx atuibuiu a construçäo da vontade de transforrnaçAo à classe ope-
sexual e, nessa medida, o seu projecto emancipatório fienu irrernediavelmente truncado. rária ern quem tarnbdrn viu capacidade para tal e que a história se recusou a confirmar a
Perante istO, flo admira que a relaçào entre o feminismo e o rnarxisrno tenha sido sobie- expectativa de Marx. Em vista disto, trata-se agora de saber se, urna vez que o sujeito his-
tudo desde o inicio da década de oitenta, muito problematizada -a
corneçar corn o livro tórico de Marx falhou à história, pelo menos até agora, faihou corn ele a utopia de trans-
de Michele Barren (1980) -, e que as feministas tenham buscado as suas referências teé- formaço que Hie era atribuida. Trata-se, além disso, e alada mais radicalmente, de saber
ricas foutras COITCnteS de pensamento no-rnarxista, nomeadamenle em Foucault, Denida se esta averiguaço tem boje algum interesse.
e Freud. Se para as frninistas marxistas, a primula explicativa das classes é admissível A esta segunda questo já respondi acima. Para quem. como eu, pense que estamos
desde que seja articulada corn o poder e a política sexual, para a maioria das con'entes a entrar nutri período de rxansiçäo paradigmática, a utopia é mais necessária do que
leministas no é posíve1 esiabetecer, em geral, a primazia das classes sobre o sexo ou A de um determinado
nunca. crise final sistema soial reside em que a crise de regula-
sobre outro factor de poder e de desigualdade e algumas feministas radicals airibuern çào social ocorre simultaneamente corn a crise de ernancipaçAo. A acumulaçâo das jura-
mesmo a pnmazia explicativa ao poder sexual. conalidades no perigo iminente de catastrofe ecológica, na miséria e na forne a que é
Se tivermos em mente o que disse acima sobre a ernergéncia nos fmais da decada de su_ urna grande parte da populaço mundial - quando há recursos disponveis para
setenta de análises sociológicas que conferem ao Estado e à pothica a primazia explica-
Ihes proporcionar urna vida decente e urna pequena minoria da populaço Vive numa
thea sobre as classes, pode concluir-se que a década de oltenia foi dominada pela concor- sociedade de desperdicio e mone de abundância(11 -. na desiruiço pela guerra de popu-
tflClß cntre classe. Estado e sexo enquanto facoetes explicativos das estruturas e das
laçöes e comunidades em nome de principios étnicos e teligiosos que a moderni-
Wáticas ociais, tendo nôs agora que acrescentar a ernia e a religiâo. Dentro do campo
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ainda que sob forma limitada.
1. Ver dianIeo décimo capítulo.
42 Pela Mäo de Alice. O Social e o Foiftico na Pós4lodernidade Tudo o que e sólido se deaz no or: o marxismo iamhém? 43

dade parecia ter descanado para sempre, na droga e na medicalizaço da vida como so!u lise socioliSgica do presente? Na resposta a esta questAo - que, corno se notars, é a inversa
ço para um quotidiano allendo, asfixiante e seni soluçäo - sodas estas e muitas outras da que Marx formulou - Mart volta a ser importante enquarno poderoso e imprescindível
irraconaiidades se acumulam ao mesmo tempo que se aprofunda a crise das soIuçes ponto de partida. A ideia de Mani de que a sociedade se transforma pelo desenvolvimento
que a modernidade pmpôs. entre cias o socialismo e o scu máximo de consciência teES- de contradiçöes essencial para compreender a sociedade contemporanea, e a anIise que
rica possíveL o marxismo. As irradonalidades parecem raconazadas pela mera repeti- fez da contradiço que assegura a exploraçäo do trabaTho nas sociedades capitalistas con-
çAo. tinua a ser genericamente válida. O que Marx näo viu foi a articulaçào enu'e a expIoraço
u1go. pois, que precisamos da utopia como do po para a boca. Marx ensinou-nos a do irabatho e a destruiço da natureza e, portanto. a articuLaçAo entre as contradiçöes que
1er o real existente segundo urna heimenéutica de suspeiço e ensinou-nos a 1er os sinais produzem urna e outra.
de fuluro segundo urna hermenéutica de adesäo. O primeiro ensinamento continua hoje a Inspirado em James O'Connor (1991a e 1991b) e Karl Polanyi (1944), considero que
ser precioso. o segundo tomou-se perigoso. Marx acreditou, sem reservas, no desenvolvi- o capitalismo constituido, no por urna, mas por duas contradiçoes. A prirneira contra-
mento neutro e infinito das forças produtivas, no progresso como processo de racionaliza- dição. formulada por Marx, e simbolizada na taxa de exploraçAo, exprime o poder social
ço científica e técnica da vida, na exp1oraço sem limites da natureza para atender às e político do capital sobre o trabaiho e também a tendencia do capital para as crises de
necessidades de urna sociedade de abundancia para todos. Em a utopia de Marx ,
sumas

sobre-produçäo. A segunda contradiço envove as chamadas condiçôes de produço, ou


em liudo, um pmduo da modemidade e, nessa medida. nao suficientemente radical para sein. tudo o que é tratado como mercadoria apesar de no ter sido produzido como merca-
nos guiar num odo de transiçäo paradigmática. Devido a mn desequilibrio, criado doria, por exemplo. a natureza. A segunda coniradiço consiste na tendencia do capital
pela ciência moderna entre a capacidade de acçäo, que é cada vez malor, e a capacidade para destruir as suas próprias condiçäes de produçAo sempre que. confrontado corn urna
dc previso, que d cada vez menor o futuro é boje para nôs, ao conráiio do que foi para crise de custos, procura reduzir estes Ultimos para sobreviver na concoivência. A luz desta
Marx, simultaneamente mais pr6ximo e mais imprescrutável. Nunca esteve tanto nas dupla confradição, o capital tende a apropriar-se de modo autodestrutivo, santo da força
nossas maos, mas as nossas mAos nunca foram to
ignorantes sobre se afagam urna do trabaiho, como do espaço, da natureza e do meio ambiente em geral. A impoitncia
pomba ou urna bomba. Por esta razo e tal como acontece em gera! corn a modernidade, desta i*onceprnalizaçäo do capitalismo, cujos detaihes näo é possível apresentar aqui,
devemos ir buscar a Marx muito para defrontar os nossos problemas - muito, excepto a reside em que ea torna c'aro que a suhjectivizaçAo do trabaTho pretendida pela utopia ndo
soluçAo. possível sem a subjectivizaçào da natureza.
No final do sdeulo a única utopia realista a utopia okigica e democrática. E rea- Esta reconceptualizaço ilustra hem como as mesmas condiçòes que, nas nossas
lista, porque asseina awn principio de realidade que crescenternente partithado e que, soc)edades de fun de século, reclarnam urna hermeneutica de suspeiço do tipo da que
portanto. tern as virtualidades que Gramsci achava imprescindíveis na construçäo de Marx empreendeu, reclamam igualmente urna profunda revisäo e transformação do mar-
ideias hegemónicas. Esse principio de realidade consiste na contradiçäo crescente entre o xisrno aI como o conhecemos. A solidez do marxismo reside essenciahnente em accessi-
ecossisterna do planeta terra, que é fmito. e a acumu1aço de capilal, que é tendencial- tarmos dessa hennenêutica dc suspeiço para decidir sobre o que do manismo deve ser
mente infinita. Por nutro lado, a utopia ecológica é utópica. porque a sua realizaçäo pres- desfeito no ai Exercê-k igualmente contra o marxismo corn o objectivo de agudizar. nilo
sup& a transformaçäo global, no só dos modos de produçäo, mas tambm do conheci- de obnubilar, a vontade de utopia é hoje talvez a methor maneira de honrar a brilhante
mento cieniífico, das quadros de vida, das formas de sociabilidade e dos universos simb6- que ele instauren. Sobreudo boje. quando. como já
tradiçilo dizia Walter Benjarnirn, a
Ucos e pressupe, acima de nido, urna nova re!aço paradigmtica corn a natureza, que
crise, a verdadeira crise, é continuar nido como está.
substitua a re1aço paradigmatica moderna. É urna utopia democrática porque a cransfor-
rnaçäo a que aspira pressupie a repo1itizaçio da realidade e o exercício radical da cidada-
nia individua] e colectiva, induindo nela a carta dos direitos humanos da natureza. E urna
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I
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Srnivalente.
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que
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dc coerência ou ariicu1aço
esta a utopia, tipo
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suscita a ans-
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3
ONZE TESES POR OCASIÁO DE MAIS UMA DESCOBERTA
DE PORTUGAL

1. Portugal é um país inteligível.

Portugal é geralmente considerado, tanto por estrangeiros como pelos piópros pomi-
gueses, um enigma urna sociedade paradoxaL Muda recentemente Hans Magnus Enzens-
: berger se perguntava como é que Portugal. sendo um dos paises menos desenvolvidos da
p
Europa, é capaz de tanta utopia (do sebastianismo à revo!uçào de 25 de Abril de 1974), a
tal ponto que seria certamente urna grande potência numa «Europa dos desejos» (1987).
Muito antes dele, há pouco mais de cern anos, Anem de Quental exciamava nuni tom
.'
aind mais pessimista: «Nunca poyo algum absorveu tantos tesouros, ficando ao mesmo
tempo to pobre» (1982: 254).
.

Apesar de ser um país europeu e de os portugueses serem tidos por um poyo afável,
aberto e sociável, é ?oitugal considerado um país relativamente desconhecido. Apesar de
-
ser um país corn longa história de fronteiras abertas e de «internacionalismo» das des-
cobeitas dos s&nlos XV e XVI à emgraçäo dos anos sessenta -. é consklerado um país
exótico, idossincrtico Desconhecimento e exotismo sao, pois, temas ons quando
se trata de pmpor urna apreciaçäo goba1 do país e do seu poyo. Geralmente crê-se que o
exoüsmo é a causa do desconhecimento. Eu avanço a hip&ese oposta, a de que o exo-
tismo é um efeito do desconhecmento. Por outras palavras. sabe-se pouco sobie Portugal
e, por se considera ser Portugal um pals relativamente exótico.
isso7

2. Enquanlo objectos de discursos eruditos, osmitos são as ideias gerals de um


... país sem tradiçäo filosófica nein cientdica. O excesso mtieo de nterpretaço é
1
° mecanismo de compensação do déflce de realidade, típico de elites culturais
restritas, fechadas (e niarginalizadas) no brilbo das suas kielas.

. I
A do século xvii, Portugal entrou num longo período históiico dominado pela
partir

repesso ideológica, a estagnaço científica e o obscurantismo cultural, um período que


teve a sua pnmeira (e longa) manifestaçAo na Inquisiçào e a última (assim esperamos)
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nos quase cinquenta anos de censura salazarista. A violaçâo recorrente das liberdades
Pela Mao de Alice. Q Sockil e o Político na PósModernidade Onze Teses por Oca5iâo de mais ¡ono Decoberra de Portugal 5

cívicas e a autude hostil à razào crítica fez corn que acabasse por dominar a crítica da semiperiféricos, como Portugal. Os começos exaltantes da geraço de Coimbra foram
razzo geradora dos mitos e esquecimentos corn que os portugueses teceram os seus asfixiados pela mesma (e sempre diversa) presso censOria
que, corn aigmuas interrap-
desenconirOs corn a história. O desconhecimento de Portugal & antes de mais. um auto çöes, havia de dominar os cern anos seguintes da nossa bloqueada modernidade. Os pri-
-desconhecimento. O Encoberto a imagem da ignorancia de nós mesmos reflectida num meiros e, durante muito tempo, os mnicos estados sociológicos empíricos sobre a sode-
espeiho comp1acente dade portuguesa forain realizados por sociólogos estrangeiros. Por sua vez. Salazar iden-
o excesso mItico da 'mterpreLaço sobre a socedade poiuguesa expticase cm grande
tificava sociologia corn socialismo, ao mesmo tempo que nos países desenvolvidos a
medida pela reproduçäo prolongada e no alargada de elites culturais de raiz litcráiia,
sociologia desenipenhava um papel crescente na consolidaçAo social do capitalismo.
muito redundas em número e quase sempre afastadas das areas de decsäo das politcas Terminada (defmitivamente?) a repressäo corn a revoluçäo de 25 de Abril de 1974,
educacionais e culturais. Tenderam, assim a t'uncionar em circuito techado, suspensas criaram-se algumas condiçôes para o desenvolvimento, tào tardlo quanto urgente, das
emre o poyo ignaro que nada tinha para thes dizer e o poder politico autoconvencido. clências sociais. Seria, no entanto, um começo difícil e de gestaçao lenta, sobredo para
que nada [hes quena dizer. Näo tiverain nunca urna burguesia ou urna classe média que as as ciências sociais. que faziam depender as suas análises de trabalbo empírico sempre
procurasse «trazer à reaildade», nunca puderaxn comparar ou verificar as suas idelas, e compkxo e quase sempre caro. Nestas ciitunstâncias, era de prever que tomasse a diari-
tâo-pouco foram responsabilizadas peto eventual impacto social delas. Scm termos de teü-a a ciencia social mais arbitrária, a psicanálise. urna ciência alias, duplamente arbitrá-
comparaço e sem campo de verfficaçäo acabaram por desconfiar das «ideias aplicadas» quando transposta (por culpa do próprio Freud) da análise do individuo
ria social para a
(como diña Tocqueville dos franceses) e de quem. déspota ou poyo. as pudesse aplicar. anflise da sociedade-enquanto-individuo. A an1ise arbitrâria duplica o mito, mesmo
A marginalidade sociat hresponsabthzouas. Puderam dizer Ludo impunemenie sobre Por- quando d sua intensäo desmontá-lo. Assim sucedeu corn os nossos psicana1istassociais,
nigal C OS portugueses e transformar o pie foi dito. numa dada geraçäo ou conjuntura, na
muitos e de vários maiizes.
eialidade socìal» sobre a quai se pôde discorrer na geraçäo ou na conjuntura seguinte. Nao obstante
o britho sedutor de algumas análises, o arbitrário que as habita reside em
A hiperlucidez nunca foi mais que urna cegueira iluminada, e a cegueira das elites cultu- que, nelas, Portugal d. por antonomásia. o analista. Este investe-se da qualidade de infor-
rais produñu a invisibilidade do país. mador privilegiado, único e universal. (um procedimento inaceitável nas ciencias sociais
menos arbitrárias). O que ele du de nôs só a ele respeita mas, an transformar-se em uni-
tharcianiza-nos, e d por isso que somos considerados loucos e a precisar de cura
3. A «Pátria» nao «está doente» nem «precisa de cura psiquîátrica».
psiquiátxica.

As pticas sociais tm sempre urna dimenso simbólica. repetiçäo e incul-


À força de
caçAo os mitos sobre a sociedade portuguesa so parte da nosa realidade social e como 4. Portugal é um país únko, integrado num sistema mundial constituido por
tal devem ser analisados. Na segunda metade do sculo X[X e nos principios do s&ulo muitos países, todos unicos. As cumndas sodais são
imprescindíveis na determi-
x_x nasceram nos países desenvolvidos da Europa as ciencias sociais Fundadas critica- naçâo de tal unicidade.
mente no pensamento social e politico iluminista do sdculo XVIII, tinham por vocaçäo
desmitificar e desmistificar as crenças socisis até entAo aceites como pensamento rigo- Como só há um sis*ema mundial, nAo é possivel fazer comparaçes corn outros siate-
roso de urna forma de pensar sem rigor (o senso comuni). E certo que cada teoria social mas que the sejain exteriores. Scudo assim, a unicidade dos diferentes países reside to-só
proposta era de per si algo arbitráiia, e nessa medida nAo podia deixar de criar algum
no modo diferente e específico corno cada um se integra no sistema mundial. Para além
novo mito no processo de desiruir os existentes. No entanto, esses novas mitos, fossem disto, nao e legítimo fular de originalidade. A originalidade d a diferença sem limites e,
eles a indústria de Saint Simon, o espfiito positivo de Comte, a consciência co1ectva de corno taL pode ser facilmente postulada. Ao contrário, a diferença é a oiiginalidade limi-
Durkheim, a racionalidade de Max Weber, o socialismo de Man ou o inconsciente de tada e, como tal, tern de ser determinada corn a possíve objectividade.
Freud, crani, tambdm, mitos novos, porque se aceitavam em concorrência corn outros análise das diferenças, ao contrário da análise das originalidades, dispensa a análise
mitos e nessa medida continham em si os sens contrarios. E tambdm porque, conservado- A
psicanalitica e exige a análise sociológica, no sentido ampio das anáilses produzidas pelo
res ou progressivos, no eram reaccionários: pressupunham e aceitavam a fervilhante conjunto das cìêncìas socials. Nesie dominio, as dificukiades corn que nos deparamos são
dinâmica social do tempo e nAo se coibiam de ser confrontados corn a realidade que thes enormes. Duas merecem referencias especial: urna institucional e outra teórica.
sobrasse. Tern sido escasso e mal orientado o apoio institucional ao desenvolvirnento das cien-
Verdadeiramente desmitificador e desmistificador foi o conjunto das cincías sociais e cias sociaisem Portugal nos diurnos quinze anos. Ternos urna comunidade jovem e actua-
nao nenbuma delas de per si. Esse conjunto evolulu organica e equilibradamente (ainda lizada de cientistiis sociais. Quando comparada corn a comunidade dos analistas muticos e
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mais
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que corn alguns sobressaltos) nos países centrais. No foi o caso nos países perif&icos ou
No
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psicanalíticos, é
multo menus apoio actualizada. entanto, tern tido institucional
52 Pela Mâo de Alice. O Social e o Foiftico na Pôs-Modernidade Onze Teses por Oca.ìáo de mais ama Descoberta de Ponugal 33

que esta iItima. Apoio insituciona! entendese aqul no scu sentido mais ampio, incluindo 5. Portugal é urna sociedade de desenvolvimento intermédlo. A sua aiálise é parti-
as pOIft1CS culturais e cienUficas do Estado, os meios de comuncaço sodal, a produçAo cularmente complexa e nao é possível sem ousada inovaçäo teórica.
de opìnio por paite de interesses organizados (associaç&s, partidos, etc). O briiho das
análises dos analistas mídcos e psicanaliticos consthui um capita' simboUco altamente
retável em democracia O modo especifico de o poder politico democrático nao levar a Para alám das dificuldades institcionais, as ciencias sociais defrontam em Poitugal
sério as suas elites culturais, sein se privar des dividendos que eas geram, consiste em algumas dificuldades teóricas. Portugal urna sociedade de desenvolvimento thtermdio.
neutralizá-las culturalmente através da cooptaçäo política. Porque näo tm o «peso da Alguinas características soclais (taxa de crescimento popidacional, leis e instituiçoes,
realidade social» (a pesar4hes, pelo menos na consciência), as elites cultwús de matriz algumas prticas de consumo, etc,) aproximam-na das sociedades mais desenvolvidas,
mítica e psicanailtica sào mais façilmente mobilizáveis para investimentos conjuniurais enquanto outras (infra-estruturas colectivas, políticas culturais. tipo de desenvolvimento
julgados importantes pelo poder político. Ao nivel dos meios de comuthcaçäo social e industrial, etc) a aproximam das sociedades menos desenvolvidas. Oras as teorias e as
dos interesses organizados a utilizaço destas elites deriva sobretudo da sua capacidade categorias analíticas utilizadas pelas ciências socials para caracterizar os processos e
para produzir conhecimento instantãneo e cumplicemente dissonane estruturas sociais forain criados tendo em vista, quer as sociedades centrais ou mais desert-
A comunidade dos cientistas socials tern Üdo muito menos apoio institucional e a volvidas (o chamado primeiro mundo). quer as sociedades periféricas (o chamado ter-
manifestaço mais clamorosa e mais escandalosa disso mesmo ém sklo os programas de ceiro mundo) e adequam-se mal a caracterizar sociedades intermÑlias, como Portugal.
desenvolvimento científico financiados pela comunidade europela, a começar pelo Pro- Se tomarmos em conta os indicadores sociais normalmente utikzados para conirastar o
graina Cinda. Tais programas, quando no excluem totalmente do seu ambito as cien- prirneiro e OF terceiro mundos (classes sociais e estratificaçAo social; relaçôes capital/
cias socias (como sucedeu corn o Programa Cncia) conferem-the um lugar secundarís- /trabatho; retaçöes Estado/sociedade civil; estaiísticas sociais; padroes de consumo ou de
siino, o que d particularmente grave no nosso caso pelo facto de as ciéncias soclais esta repmduço social, etc.) conclui-sc facilmente que Portugal nao pertence a nenhum desses
rem mima posço consolidada de take e portanto, em condçöes de garantxrem a mundos. -

m&liO prazo um conhecimento fivet, plural e complexo sobre a sociedade portiguesa. Na ancia de adequada inovaço teórica, corre-se o risco de analisar a sociedade
Mas alem de grave, esta excluso é insensata urna vez que. dada a qualidade dos recursos portuguesa pela negativa, por aquilo que cia ado tern quando comparada quer corn as
bumanos o seu baixo nivel etário e a sua sociaüzaçâo ainda domMane numa aitude de sociedades centrais, quer corn as sociedades periféricas. Tal negatividade urna outra
dedicação entusiasta pelo trabaiho cent1fico. o investmerno. mesmo moderado. nesta forma de desconhecimento e por isso tambm campo fértil de anáiises míticas e de esti-
cornunidade pmduziria certamente importantes e abundantes resultados científicos. pulaçes de exotismo, que são, nette caso, efekos da inadequaço dos instrumentos analí-
os mega-programas comunit.rios são, assifl1 tanto programas de conhecimento corno ticos. A inovaço teórica visa captar a especificidade das nossas práticas soclais, econó-
programas de desconhecimento. São, acima de tudo, programas de desconhecimento em potencialidades uthversalizantes
micas, políticas e culturais de molde a converté-las
social. Cabe, pois. perguntar a quem e porquê interessa a produçAo desta desconheci- num sistema mundial caracterizado pela concorrncia inter-Estados.
mento. As ciências físico-naturais aplicadas estAo especificamente apetrechadas para No se trata de insuflar nacionalismos reactivos ou reaccionários, mas de medir riscos
determinar diferenças quantitativas, por exemple. diferenças de desenvolvimento tecnoló- e identificar - -
se nao mesmo, inventar oportunidades numa dinâmica transnacional cada
gico. Ao contrário, as ciencias sociais estäo aperechadas tanto para determinar diferenças vez mais volátiL Em 1762, Rousseau criticava, em O Conirato Social, Pedro Grande da
quantitativas (níveis de rendimento, taxas de mortalidade. etc). como diferenças qualita- Thissia por näo respeitar a identidade nacional russa: «Quis fazer alemäes mgleses
tivas (estnitura de classes, padròes de consumo e suas relaçöes corn padröes de pmduço. quando era preciso começar a fazer russos; impediu os seus súbditos de se tornarem
características da sociedade civil. etc). Enquanto as diferenças quantitativas legitimam os alguma vez no que eles poderiam ser, persuadindo-os de que erare o que no sao»
modelos de desenvolvimento sócio-económico hegemónicos. as diferenças qualitativas (1968: 125). E conhecida a reacço encolerizada que esta apreciaço de Rousseau suscitou
podem ser indicativas da necessidade de buscar modelos alternativos de desenvolvi em 'kdtaire, Entre as posiçes destes dois ilustres phi,sophes necessário identificar a
mento. dialéctica do nacional e do transnacional, do local e do universal. Afmal Afonso Duarte
Ora' neste momento, dado o tipo de integraçAo na uniâo europeia que se adopteu, há vislumbrou-a em dois versos lapidares:
um interesse político em suprimir qualquer questionamenLo do modelo de desenvoivi-
mento hegemi5nico. Por isso, os mega-programas de desenvolvimento científico visam, «Quem ser europeu: quero ser europeu
por um lado, produzir conhecimentos sobre tudo aquilo em que somos diferentes, porque Nwn canto qualquer de Portugal».
somos menos em relaçAo aus países da comunidade. e, por outro lado, visam produzir
desconhecimentos sobre tudo aquilo em que somos diferentes. porque. mais ou menos,
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somos qualitauvamente distintos.
Pela Mao de Alice, O Social e o Político na Pós-Madenndade Onze Tesespor Ocasiäo de mais urna Descoberta de Portugal 55
54

(1971: 23). «0 espirito porthgus é avesso M grundes ilustraçòes, às grandes ideias que
,

o. Os porulgueses são portugueses. Nâo säo, por exemp10 espanhóis diferentes. O


que os portugueses são ou näo são é cada vez mais o produto de urna negoca- ultrapassam o sentido humano» 1971: 25). «0 fundo contemplativo da alma lusi-
(

ção de sentido de ámbito transnaconaI. tana compraz-se na repetiçäo ou na imobilidade da imagem» (197l 27). «E ainia essa
enorme capacidade de adaptaçäo urna das constantes da alma portuguesa» (1971 : 31).
E, fma1mente «é um poyo paradoxal e difícil de govemat Os sens defeitos podem ser
As trocas de bens materias e de bens simbólicos a nivel mundial intensificaram-se !

muito nos il*inos vinte anos devido a trés factores principais: a transnacionalizaçäo dos as suas virtudes e as suas virtudes os sens defekos, conforme a égide do momento»
sistemas utivos (um dado produto final pode ser constituIdo por n poiles produzidas (1971: 33).

ein n paises diferentes); a dissenûnaçäo planetaria de infomiaçöes e ünagens; e a translo- Duvido que o mesmo nAo possa ser dito a respeito de qualquer outro poyo, ou de um
,

calizaçáo maciça dc pessoas enquanto turistas. irabaihadores migrantes ou refugiados. No entanto,


qualquer grupo social adequadamente numeroso e estável. este tipo de carac-

Esta intenstficaçAo das interacçöes globais parece desenvo1verse segwdo urna dialéctica terizaçâo é quase consensual entre as nossas elites culturais e, à força de ser repetido.

de desterritorializaçAo-reterritOrializaÇäOE . constimi um autentico 1os portugueses. o «arquétipo do bomem porta-


Corn a intensificaço das interacçöes e das interdependências, as re1aç,es sociais des- .
guës» que. segundo AntOnio Quadros, nao deve ser confundido corn variantes regionais e

territorializam-se na medida em que passam a cruzar fronteiras que até M pouco estavam sociais e corresponde transtemporalidade de um projecto nacional transmitido através
policiadas por alfândegas, nacionalismos, línguas, ideologias e frequentemente por todos de geraçöes (1986: 78).

eles ao mesmo tempo. Corn isto, os direitos a opçöes multipikam-se indefinidamente e o Trata-se de um senso comum fabricado pelas elites culturais, que como qualquer outro
Estado naciona1 cuja principal característica é a tenitorialidade. deixa de ser urna uni
..
senso comuth, é evidente e por isso dispensa qualquer verificaçäo. E por isso hostil a
dade privilegiada de interacçào e soma-se mesmo relativamente obsoleto. Mas, por outm qualquer anáiise sociológica: «Dal que a aproximaçâo socio1ógica corn os sens inquéritos

lado. e em aparente contradiçäo corn este processo. esão a emergir novas identidades e as suas entrevistas, pouco ou nada nos rev&e» (A. Quadros, I986 79). Tal senso

locais e regionais construidas na base de novos e veihos direitos a ratzes. I c°inmn pode apenas ser ilustrado por infinitas instâncias de confirmaçáo, sejam cias o
Este novo-vetho 1ocalismo até há pouco considerado como um residuo da pré-moder-
nidade, é agora recodificado como pós-modemo e assume mesmo mua dimensäo episte-
, manuelino, os géneros literarios mais cuitivados, o sebastianismo, o tipo de colonialismo,
a estrutura da lingua. Em qualquer dos sens matizes é um senso comuni conservador, quer
mológica, corn a reivindicaço de um conbecfrnento local, desde a crítica dos cánones 'j porqueassenta fuina ViSAO naturalista da hist6ria quer porque reivindica para as elites a
literários e art1sticos hegemónicos até à revitalizaçáo de novos-veihos fundamentalismos '1 responsabilidade da sua reproduçäo. E a «paideia essencialmente portuguesa» de que fala
(islâmico, judaico neoliberal). Este localismo, que é por vezes pmtagonizado por poyos ! A. Qía&os «urna reivindicaço que ou começa pelas elites. pelas classes letradas, ou
translocalizados e são é. nessa medida, reconduzivel a um específico genius Jod, assenta ! nunçò mais será possivel» (1986: 61).
sempre na idem de território. seja ee imaginário ou simbólico, real ou hiper-real. As rda- Este senso comum assenta em tres topai retóricos fimdamentais. O primeiro é que
çes sociais em que se traduz são investidas de urna comp'exa tensan intema urna vez somos espanhóis diferentes. Somas-flics contrapostos a partir de um fundo de cuinplici-

que a sua desterritorializaçäo corre a par da sua reterritorializaçAo. Os discursos conven- dade. Para Joze Dias, a religiosidade portuguesa nAo tern o carácter abstracto, místico ou
cionais sobre a «identidade nacional» ou sobre o «carácter nacional» lêm sido construidos trágico prOprio da espanhola atem. . . um cunho humano, acoihedor e tranquilo». Por isso
a partir de um genius bd mitificado abstracto e mistificador e os mais recentes têm-nos ,«no se erguem uns aldelas portuguesas essas igrejas enormes e solenes, io caracteristi-
glosado (ou pouco mais) e tern ignorado sistematicamente a dialéctica acabada de refenr cas da paisagem espanhola» (1971: 19. 24). Para Unamuno, entrevistado por António
corn a excepçäo. nem sempre conseguida. dc Eduardo Lourenço. Ferro, «o porm um sew ossos». O castethano
casteihano tern algo de lagosta. O
Num «estado» sobre o «carácter nacional portugus» Jorge Dias traça assim. em português, ao contrério, é como um polvo (Ferro, l933a f75). Pidelino de Figueiredo
950, a «personalidade de base» dos portugueses. «O portugués é um misto de sonha- salienta os contrastes entre a literatura espanhola e a portuguesa: «a épica espanhola, ori-

dor e de homem de acçäo, ou, methor, é um sonhador activo, a que náo fatta certo fundo ginalmente casteihana é modieva popular e continenti$; a épica portuguesa é renascen-

prático e realista». «Há no português uma enorme capacidade de adaptaçAo a Iodas as -i,
tista, cuIta, oceánica, impregnada de lirismo e corre sempre no leito que The cavou o
coisas, ideias e seres scm que isso implique perda de carácter». «O portugués tern vivo génio de Camöes. O lirismo portugués ¿ constitucional originário; o lirismo espanhol é
sentido da Natureza e um fundo poético e contemplativo estático diferente do dos outros urna aquisiçäo erudita, laborosa, tardia» (1935:135). Para Natália Correia, Espanha e Per-
:

países latinos» (1971: 19). «0 português no degenerou». «No momento em que o poilu- 4 tugal so inseparáveis macho e fëmea (1988: 62).

guês é chamado a desempenhar qualquer papel importante, pöe em jogo todas as suas Neste jogo te espellios, ora se saiientam os contrasles, ora se salientam as cumplici-

qualidades de acçáo, abnegaçáo, sacrificio e coragem e eumpre como poucos» ( 197 : 20). 1 .i
dades. Se para Fidelino de Figueiredo a lileratura portuguesa tern um fulcro desiberi-

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(1971
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«Para o porruguês. o coraço é
tipo ideal» 21). medida de
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coisas»
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«Embora nao ihe false, por vezes, um fundo pr,tico e utilitário, o grande mObil é sempre
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Iodas as
CVISION
Jorge
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zante (1935: 43), para Natália

do «caos da penín- 3 1 ). Tal


Coneia «Portugal é o grande
antes partia
intérprete da Espanha das
étnico
56 Pela MOo de Alice. O Social e o Político îa Ps-Modernidade )n: Tes pr Ocasido de mais un:a Descoberra de Portugal

sula ibérica» para defender que, fora o amor à independência, «no mais somos hispanos, çäo presente é que neta domina o Veiho do Restelo sobre Gama: «o que parece dominar
hispana a terra, hispana a gente» ( f922: 5). Quase ao mesmo tempo, António Sardinha boje em Portugal é a face negativa, nocturna, decaída do arquétipo, do modelo ou da irna-
baseava a sua proposta do «supranacionaJismo hispânico» e da «internacional crista» no gern sublimatória que o Portugués já teve de si próprio» ( 1986: 62). Um pessimìsmo

facto de que os hispânicos, «nao *endo do 4homem' urna ideja de 'individuo' mas de 'pes- semelhante prepassa a psicanálise mítica de Eduardo Lourenço. enquanto Natália Coneja,
soa', a sua exparisO detemna-se por um irrepimíve instinto universalizador porque a mais optimista. athbui aos pornigueses a incumbência exagerada de cumprirem «caba!-
pessoa' se hes manifesta em inteira coincidencia corn a humanidade» (1924: VU). mente a Espanha das Espanbas».
Por outro lado. as comparaçies. ora nos favorecern (Jorge Dias Fìdelino de Figuei- o excesso mItico deste discurso, que ¿ um só apesar de múltiplo, manifesta-se na arbi-
redo) ora nos desfavorecern (Eduardo Lourenço). Para este ÚltimO, a Espanha. a!rn de iraiedade e selectividade corn que manipula a histOria do pals e na relaçao telescópica
ser «um dos grandes milagres deste fun de sécub». «urna das poucas culturas míticas que estabdece corn as transformaçoes sociais, políticas, económicas e cukurais do sis-
do ocidente» «nao é um poyo que se possa esquecer ou se deixe esquecer». Enquanto, «o tema mundial de que Porthgal faz parte. Decidido a sen bel-prazer o compromisso que
Dosso caso foi -é - um pouco diferente. Por natura! fragilidade nossa, em parle, por urna the convém corn a malidade sociológica passada e presente do país, -lhe fácil assumir
boa dose de incürla também» (1988: 79, 81, 84). um carácter geral e abstracto, dec!arar-se evidente e decretar o futuro. No pode, pois, ser
o segundo topos do senso comum elitìsta sobre os portugueses d que no carácter por- confrontado no seu terreno. Deve antes ser considerado um fenómeno sociológico em si

tuguês se misturam elementos contradit6rios o que Ihe confere urna ambiguidade e urna mesmo e ser analisado como tal.

plaslicidade especiais Segundo Jorge Dias, a saudade urn estado de alma ui generis Enquanto senso comum das elites culturais, o discurso mitico diz certamente muito
que deriva de urna «mentalidade complexa que resulta da combinação de factores dife- sobre cias e muito pouco sobre o cidadäo comum. No entanto, na medida em que é per-
rentes e às vezes opostos». combinaçâo de «três tipos mentais distintos: o lírico sonhador meável äs evidências do discurso mitico e as interioriza, o cidadäo comum integra-as na
- mais aparentado corn o temperamento céltico -o fáustico de tipo germânico e o fatafs- sua prática socia! e por essa via faz delas um senso comum de outro tipo, multo mais
tico de tipo oriental (1971 : 20). Para Agostinho da Silva, « de portugueses a uniAo de amplo, a suscitar urna análise sociológica diferente. A
minha hipótese de trabaTho d que.
contrários» ( I 988: 97), enquanto para Na1ia Correia a «plasticidade do homern portu- dada a distancia entre as elites culturais e o cidadäo comum, o nivel de interiorizaço
gués» decorre de nek confluircm três grandes in11uncias contraditórias. a mediterânica deve ser relativamente baixo.
a atiântica e a continenta' (198& 8). Francisco Cunha Leâo. citado por Aniónio Quadros, As ciências sociais devem centrar-se na análise do modo específico corno a dialéctica
atribui aos portugueses «urna sensibilidade contradìtória, ora afirmativa ora depressiva» da desterritorializaçAo/reterritorializaçäo das práticas sociais se desenrola em Portugal.
(1986: 80); e o próprio António Quadros conclui que «a aparente iiidefmiço do carácter Três hipóteses merecem especial atençAo: (I ) o fmi do longo processo de desterritoriali-
portugués, apontado por alguns estrangeiros, i no fundo o resuhado dessa tentativa inte- zaço colonial suscita diferentes movirnentos de retenitoria1izaço (o impacto múltiplo

tior de conci!iaço de contrários, evitando os radicalismos, conciliaçäo de opostos como do facto de o país retomar, depois de cinco séculos, os limites do seu território); (2) estes

terra e mar, c!cuIo e aventura, paciência e temeÑiade, sonho e matemática» (1986: 81). movimdntos (de que a produço recente do senso comum sobre Portugal pelas elites cul-
Finalmente, Eduardo Lourenço atribui au «surgimento tranmático» do Estado português o turais é um
exemplo) tenderào a assumir formas ambiguas e contraditóñas, dada a
apenas
sermos «um rebento incrivelniente frágil para ter podido aparecer e misteriosamente forte emergência quase ¡mediata de um novo processo de desterritorializaçio (a integraçäo na
para ousar substituir». Do que resulta a «conjugaçäo de um compkxo de inferioridade e comunidade europeia); (3) a deficiente maturaço dos movimentos de reterritorializaçào

de superioridade» (19S2: 20-21). dai decorrente pode conduzir à nao identificaço ou ao desperdicio das oportunidades

o terceiro topos consiste na osci1aço entre visées positivas e vises negativas da con- criadas pelo desterritório emergente da Europa.

diçiio do «homem portugues». Enquanto o pthneiro estudo de Jorge Dias sobre o carácter o objectivo nAo pode quedar-se pela criaçào de um conhecimento científico-socia!
naciontd, datado de 1950, optimista. o segundo estudo, datado de 1968, profunda- t
sobre a condìçâo de Portugal no sìsterna mundìal. E importante. acìma de tudo, transfor-
mente pessimista. Pergunta se «poderemos, contudo, pensar que o carácter nacional se vai mar esse conhecimento nurn novo senso comum sobnj os portugueses, menos mistifica-

manter indefinidamente igual. quando as circunstâncias ero que ele se formou se esto a dor mas mais proporcionado, menos celebratório mas' mais eficaz, menos glorioso mas
alterar rápida e profundamente?». Responde que nAo e entre as razöes inclui muitos dos mais emancipador. Um senso comuni autocrítica que nao tenha a veleidade de, corn a sua
factores de transnacionalizaçâo que referi acima: «a acço do emigrante, do turista, do generalidade. superar as multas clivagens económicas, socials, políticas e cuiterais que
cinema, da te1eviso, das leimras baratan. das revistas de capas eróticas tern de fata'mente atravessam a sociedade portuguesa.
afterar a personalidade
de base nacional». Por isso «a braudura dos costumes e o tempera-
mento cordial do nosso poyo vo sendo substituidos por dureza e grosseria» ( 197 1 43, :

44, 46 48). Para AntOnio Quadros. na esteira de Jorge Dias, «o homem portugus no
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degenerou, apenas está adormecido ou entorpecido» 986: 86). A negalividade da situa-
( I
58 Pela MOo de Alice. O Social e o ?olftÑ'o na Pôs-Modernidade On:e Teses por Ocas:äo de niws urna Descoer:a de Porzaga

7. Portugal é urna sociedade semipeilférica. Findo o ciclo do império estú a rene- do trabaiho português, an optar por privilegiar, entre os sectores de expoi-taçào. aqueles

godar a sua poslçäo no sistema mundial Nao é poss1eI que num futuro pro- que se enconuain em crescente processo de desva1orizaço internacional, como, por exem-
ximo seja promovido ao centro do sistema ou despromovido para a sua perile. pio, o sector têxtil. Em consequência, o padräo de especia1izaçio produtiva da nossa eco-
ria. E mais provável que a sua posiçâo intermédia se consolide em novas bases. nornia baixou nos últimos dez anos, enquanto o padro espanhol aumentou. Portugal tern
boje urna das taxas mais haìxas de desemprego da Europa, mas tern também urna das mais
Referi na tese S que o conjunto dos indicadores sociais (no seflido mais ampio) con- degradadas retaçöes salariais. Ou sea, piivilegiou-se a quantidade do emprego em detri-
fere à sociedade portuguesa o estatuto de sociedade de desenvolvimeno inermédio ou mento da qualidade do emprego, o que sucede multas vezes nos países periféricos.
semiperiférico no contexto curopeu. um estatuto que partilha corn a Grécia, a blanda e, Em suma, os sinais de despromoçao slo mais fortes que os sinais de promoço. Neste
até certo ponto, corn a Espanha. As sociedades de desenvolvirnento mteim&lio exercem contexto, as r&laçöes entre Portugal e a Espanha assumem urna acuidade especiaL Tal
urna ftrnçäo de intermediaço no sistema mundial, servindo simultaneamente de ponte e como a promoçâo do Brasil no sistema mundial conu de par corn a desprornoço da
de tampo enie os países centrais e os países periféricos. O seu padro de especializaçâo, Argentina. é de perguntar se a promoçào incontestável da Espanha, que alguns o socid-
por exemplo, tende a ser dominado pelas pmduçtes que se desvalorizam no plano huer- logo Salvador Giner, entre outros) já consideram um país centra!, nao acarretará a despro-
nacional e que portanto deixam de irueressar aos países centrais, como pode ser paradig- moço de Portugal. Resìde aqui certamente urna das bases sociológicas para o mais
maìcamcnte ilustrado corn o caso da produço tîxtil nos úlihnos cinqueita anos. recente surto de iberismo (Natália Coneia, Eduardo Lourenço. Vasco Pulido Valente
No caso de Portugal, a funçäo de intermediaçao assentou durante cinco séculos no Joo Palma Ferreira, entre outros). O «federalismo iWrico» está de factojá em curso. mas
império coloniaL Portugal era o centro em reIaço s suas colónias e a periferia em rda- no por via de renascidas crenças em hispanidades míticas. Decorre, outrossim. em boa
cao Inglaterra. Em sentìdo menos técnico, pode dizer-se que durante muito tempo foi medìda, da actuaçào das gandes mukinacionais, que estabelecem os seus quartéis gene-
um pals simultaneamente colonizador e colonizado. Em 25 de Abril de 1974 l'orugal era rais em Madrid ou Barcelona e tomam como unidade de acçâo a península ibérica.

o país menos desenvolvido da Europa e ao mesmo tempo o detentor único do major e E provávet que a integração na UE mantenha dentro de certos limites a despromoçâo
mais duradouro império colonial europeu. de Portugal, mas nào é menos provável que para isso a Europa se desenvolva a très veto-.
o fim do impérlo colonìal nAo determinou o firn do carácter intermédio da sociedade cidades: países centrais; Espanha; Irlanda, Portugal e Grécia. Se assim for, Portugal con-
pOrtuguesa pois este estava inscrito na matriz das estruturas e das práticas sociais dotadas solidará numa nova base a sua posiçäo semiperiférica no sistema mundial. E mesmo pos-
de forte resisténcia e inércia. Mas o fim da fiinçâo de intermediaçiio de base colonial fez sível que Iessa posiço façam parte certos elementos de continuidade corn a relaçäo colo-
corn que o carácter intermétho que nela em parte se apoiava ficasse de algum modo sus- nial: Portugal procurando consolidar, agora no inbito da UE, urna relaço privilegiada
penso à espera de urna base alternativa. Essa suspensäo social permitiu que no pós-25 de corn as suas antigas colOnias, actuando mais urna vez (embora de modo muito diferente)
Abril (entre 1974-1976) fosse socialmente credíve( a preenso de Portugal de se equipa- corno correia de transmissäo entre o centro europeu e a periferia africana de expresso
rar ans países centrais e, mesmo em alguns aspectos, de assumìr posiçöes mais avançadas oficial portuguesa. Os discursos míticos da vocaço atiântica bebern aqui algumas gotas
que as deles. Em 1978, o FMI destruiu a credibilidade dessa preensâo. Desde entào. Por- de credibilidade.
mgal entrou num peimodo de renegocìaço da sua posiçào no sistema mundial, procurando
para ela urna base que preenchesse o vazin deixado pela derrocada do impérie. No inIcio
da década de oftenta era já claro que essa base tena como elemento fundamental a integra- 8. Por via do tipo e da historicidade do seu nivel de desenvoivimento intermédio, a
çio na comunidade europeia. sociedade portuguesa é muito heterogénea. Caracteriza-se por articuiaçôes
Porque a UE é o centro de urna das trés grandes regiöes do sistema mundial os cen- - complexas entre práticas soclais e universos simbólicos discrepantes, que per-
tres das outras reies -a
so o apào e os EUA integraço na UE tende a criar a iusäo mitem a construção social, tanto de representaçöes do centro como de repre-
credivel de que Portugal, por se integrar no centro, passa a ser central, e o discurso político sentaçôes da periferia.
dominante tern sido o grande agente da inculcação social da imaginaço do cenmx estar
corn a Eunpa é ser corno a Europa. Cornudo, quando se analisa detaihadamente o interior O facto de Portugal ter sido, durante muitos séculos, simultaneamente o centro de urn
do centro. é fácil verificar que a realidade segue um caminho diferente do dos discursos. grande impérlo colonial e a periferia da Europa é o elemento esiniturante básico da fossa
Nos últimos dez anos, a diferença entre os rendimentos nacionais mxhno e mínimo no existéncia colectiva. Porlugal foi o único pals colonizador a ser considerado por outros
interior da comunidade no se atenuou e, corn respeito a alguns índices, aumentou mesmo países colonizadores como um pais nativo ou selvagem. Ao mesmo tempo que os nossos
a distância socia] entre as regies mais desenvolvidas e as menos desenvolvidas da cornu- viajantes diplornatas e militares descreviam os curiosos habitos e modos de vida dos
nidade. O modelo de desenvolvimetno seguido em Portugal nos últimos dez anos tern poyos selvagens corn quem tomavam contacto no processo de construçao do império. via-
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internacional jantes diplomatas e militares da Inglaterra ou da França descreviam, ora corn cunosídade
60 Pek Mao th' Alice. O Social e aPolítico na Pós-Modernidade On:e Teses por Ocasiäó de mais urna Descoherta de Portugal 6 t

ora corn desdm, os hábEos e modos de vida dos portugueses. para eles tao estranhos ao está na nossa condiçäo serniperiférica (que inclui politicos e gaYemos serniperjféricos)
ponto de parecerem pouce menos que sehragens. Se os mstérios do «caicter nacional» destruir este modelo por exigência (mal gerida) da integraço na UEno preciso momento
fossem suscepth'eis de desvendamento, seria de procurar nesta duplicidade de imagens e em que ele ganha credibilidade entre grupos emergentes cada vez mais numerosos, mas
de representaçòes a chave para a alegada plasticidade, ambiguktade e indefmìçäo que os por enquanto sern poder para influenciar decisivamente a política europela. Um dia tere-
discursos mitico e psicanalítico atribuem ao «carácter do hornem portugués». ff05 pateticamente de inventar, sempre corn atraso, o que j tivemos quando éramos
Devdo a um modo específico de formaçâo de renclirnentos e em particWar no peso «atrasados». Tal como já sucede boje corn o fomento da lingua portaguesa nos países por
dos rendimentos no-saaiìais das familias, as normas de consumo so na nossa sociedade onde andou o império e/ou a emigraçäo.
mais avariçadas que as normas de produçâo. EnquanLo aquelas nos aproximam dos países A heterogeneidade social própria da articulaçâo entre elementos pré-modernos,
centrais estas tm a:tgwnas perturbadoras serneihanças corn os países perif&icos Oraba- modernos e pós-modernos verifica-se muito para além des sectores da produçäo material
Ihn infantil, salários em atraso, repressio sndica na fibrica, etc.). A aiiiculaçAo entre No caso dos cuidados de saúde, por exemplo. a medicina popular desempenha um papel
ambas nas práticas quotidianas e nos mapas simbólicos de oiientaço da acço social d importante e é em muitas situaçöes a medicina de primeira instância. Tanto na sua versâo
origem a coditicaçôes surpreendentes e por vezes aberrantes da realidade, justificando, naturalista (chás. endireitas, etc.), corno na sua versâo sobrenaniralista (bruxas, promes-

corn igual credibilidad; representaç5es socials típicas das sociedades centrais, lado a sas, etc.). a medicina popular é usada, quer como primeira opçào, quer corno único
lado corn representaçöes sociais típicas das sociedades periféricas. Thlvez resida aqui o recurso em face da inacessibilidade (física
ou fmanceira) da medicina oficial. As deli-
«rnistério» da coexisÉéncia no «homem portugu&» do complexo de inferioridade perante ciéncias do serviço nacional de sadde, em processo de liquidaçäo, Lrn algo a ver corn a
os estrangeiros ao lado de urna hipertrofia mítica gerando megalomanias e quimeras «forte crença no rnilagre e nas soluçoes milagrosas» que Jorge Dias atribuiu ao «carácter
(Francisco Cunha Lao, António Quadros, Eduardo Lourenço). nacional». Como quer que seja, a produço de sadde em Portugal é o resultado de urna
A coexistencia de representaçôes sociais discrepantes e o seu accionamento diferenci- articulaçäo complexa entre trés tipos de produçâo médica a medicina oficial estatal, a
ado consoante os contextos da acçäo confere às práticas sociais urna certa instabilidade, medicina oficial privada e a medicina popular.
que se manifesta como subcodificaçäo e aberiura a novos sentidos. Daf, a ponta de verdade A coexistência, a muitos outros níveis, da modernidade, da pré-modemidade e da pós-
das leituras idealistas do «português como o polvo» (Unamuno). «corn capacidade de adap- -modernidade na sociedade portuguesa, urna coexistencia dinâmica e aparentemente
tação a todas as coisas» (Jorge Dias) «essencialmente cosmopolita» (Femando Pessea). duradoura, é talvea o factor mais determinante da nossa especificidade a merecer urna
A mesma articulaço entre elementos heterogeneos é detectável em múltiplos domi- análise sociológica cuidada, sobretodo no momento em que nos desterrilorializamos de
0h05. Apenas um exemplo. Portugal seguiu urn rnodelo de desenvolvimento agrícola e de novo, desta vez na direcço do continente.
relaç&s agricultura-indúslria muito diferente daquele que foi adoptado pelos países mais
desenvolvidos da Europa. Em consequência, Portugal em a mais elevada percentagem
europeia de populaço a viver em melo rural e o opei*io portugués típico é alada hoje 9* 0 Estado tern desempenhado em Portuga! um papel privilegiado na regulaçào
um semiproletário pluriactivo. isto é obtérn simuUaneamene rendimentos do trabatho social. Um papd desempenhado corn multa irieficiéncia e corn muita distância
industrial e da agricuftura. Será talvez por isso que «o portugués tern um vìvo sentido da entre representantes e representados. Dal a recorrência de fenúrnenos de cama-
natureza e um fundo poético e contemplativo estático difrente do dos outras poyos lati- valização da política.
nos» (Jorge Dias)?
A pequena agricukura familiar portuguesa no se modemizou como a europeia (meca- Nas sociedades de desenvolvimento intermédio o Estado tende a ser externamente
nizaço, quimificaçäo, gesto, comercializaçäo), pelo que frequentemente considerada fraco e internamente forte.A força do Estado reside menos na capacidade de governar
como pré-moderna, subsistindo através de complexas athculaçöes corn a agricultura e a por consenso (legitirnaço), corno sucede nos Estados democráticos centrais, e mais na
indústria modernas. Mas esta codificaço como pré-modema é ela prOpria instável e capacidade de mobilizar diferentes tipos e graus de rçäo social (autoritarismo. tanto
aberta a ouiras codilicaçes. A sobrepmduço, a dedicaçäo exclusiva e a degradaço do sob forma democrática do populismo e do clientismo, como sob a forma nAo democrática
mejo ambiente que caracterizarn a agricultura moderna têm vindo ultimamente a ser da ditadura). A história moderna do Estado porluguês caracteriza-se pur oscilaçöes mais
questionados. e a tal ponto que ji se fala de urna crise final desie modelo de agricultura. ou menos longas e acentuadas entre o predominio da legitimaço e o pmdomiio do auto-
Corn a crise da agricultura moderna. o dfice de modemidade da agricultura familiar por- ritarismo, em que este último, sob diferentes formas, tern, no conjunto, dominado.
luguesa tende a atenuar-se. Aliás a vingar a posíçào dos ecologistas. é bem possível que A centralidade do Estado é exercida corn grande dose de ineficiência. Entre muitos
este modelo agrícola Seja transcodificado e, de pré-modemo, passe a ser pós-moderno outros factores que a explicam, deve salientar-se o facto de entre nôs funcionarem, corn
pelas combinaçöes prátcas e simbólicas que proporciona entre o económico e o social, muito mais dificuldades que nos Estados dos países centrais, as dicotomias que esto na
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entre o produtivo e o ecológico, entre ritmos mecânicos e ritmos cíclicos. Curiosamente,
dicotomias: PDFCompressor
Estado/sociedade oficial/no tais as civil, ofi-
62 Pela Mao de Aiwe. (J Soctal C O P01111(0 1W POsModerIUdade Onze Teses por Oca,cläo de mais urna Descober:a de Portugal

cia!, formal/informaL público/privado. A preva1ncia de fenómenos de popuismo e de discrepância é tolerada, e at1 mesmo produzida, pelo prOprio Estado, um fenómeno que
c1íentsmo coniribi.ù em grande medida para que a lógica da acçâo do Estado (estatal, oli- neutro lugar designei por Estado paralelo: o Estado compromete-se formalmente corn um
cia1 formaL pública) seja a cada passo interpeneiada, ou mesmo subvertìda, por lógicas certo padr.o de legalidade e de regulaçäo social, mas descompromete-se dele, na prática.
societ4S particularisticas corn influ&ca suficene para orientar a seu favor e de modo por omissio ou por vins informais (Santos. 1990: 193 e ss.).
näo oficial, nforrnal e privado. a actuaçio do Esrndo. 11m fenómeno que, em geral, se o segundo exemplo diz respeito à sociedade política. A carnavalizaço e a descanoni-
pode designar por privatizaçAo do Estado (recursos estatais postos ao servço de grupos zaçâo dos processos ideoiógicos esto bem patentes no facto de o partido comunista por-
de individuos e para a prossecuçAo dos seus interesses paniculares) e que em períodos t-uguês e o partido «Os Verdes» terern formado, sem escândalo nem ridículo públicos,
democráticos transforma os partidos. sobretudo o govemante. em mecanismos prisrilegia- urna coligaçAo eleitoral, apesar de a estratgia de desenvolvimento sócio-económico
dos de mobilidade social. No será ousado pensar que reside aqui a facets do «carácter comunista, de raja estalinista, estar nos antípodas daquilo que o partido ecológico afirma
nacional» para «sobrepor a simpatia humana às prescriçöes gerais da lei», a quai «fez defender.
corn que durante muito rempo a vida social e publica girasse à volta do empenho ou do Perante o espectáculo da camavalizaçäo da política, nAo admira que «o Portugués» se
pedido de qualquer amigo. Podia-se para passar nos exames, para ficar livre do serviço tenha afeiçoado «a convicçôes negativisuts, nomeadamente an nivel político e educativo
militar para conseguir um emprego, para ganhar urna questo, enfim, para todas as dill- que o conduzem ao autenvenenamento mental» (Quadros. 1986: 84).
culdades da vida». E Jorge Dias acrescerna, mais ngenuamente do que the é usual: «hoje
em da (1950), tal hábito tradicional tern sido contrariado e já quase no existe» (1971:
3O) lo. A sociedade civil portuguesa parece fraca porque nao se organiza segundo os
Se a ineficiência clienielista cria intimidade enue o Esrado e os grupos corn poder modelos hegemónicos, os que têm predominado nos países centrais da Europa.
social para a mobilizar cria, por outro lado, disincia em relaçâo aos sectores sociais ConstiIui3 por exemplo urna forte sociedade-providéncia que tern colmatado,
menos poderosos, os quais tendem a ser a maloria. Dal, a distancia entre representantes e pelo menos pardalmente, as deficiências da providência estatal.
representados que tern conferido at aqui urna mstabilidade grande aos períodos dernocrá-
ticos ao mesmo tempo que ajudou à estabilidade de um regime nAo-dernoçrtico fundado É comuni considerar-se que em Portugal a sociedade civil ú fraca. Nos últimos anos
constitucionalmente na distnca, o Estado Novo. tern-se atribuido essa fraqueza à asfixiante força do Estado, pelo que se recomenda o
Aliás, esta distância ó urn fenómeno mais vasto e, como já referí na tese 2, caracteriza enfraquecimento deste para que a sociedade civil possa finalmente prosperai A concep-
também as relaçöes (ou melhor. a ausnca de relaçòes) entre as elites culturais e as ço da fraqueza da sociedade civil vem de longe, do pensainento libera! do século XIX, e
classes populares. Manifestaço disso mesmo, e para me limitar a um tema já mencia- at) longo dos últimos 150 anos servio, ora para justificar a força do Estado, ora para justi-
nado, a falta de repercussào social, bem assnalada por Femando Catroga, dos vários ticat o enfraquecimento deste. Corn maiores pretensöes sociológicas, Demolins classifi-
surtos de iberismo enquanto tópico de debate entre as elites ciilturais. Entre 1850 e 1880 cava em 1909 a sociedade portuguesa entre as «sociedades dominadas ou referenciadas
publicaram-se 150 títulos sobre a quesUio ibérica scm que o debate extravasasse para pela formaçäo comunitária» e caracterizava-a do seguinte modo: «A desorganizaçäo da
qualquer movimento social significativo (F. Catroga, I 985: 419 e ss.). comunidade deixa os indivíduos geralmente pouco capazes duma iniciativa pessoal enér-
A dstância entre representantes e representados toma pos.sivel a carnavalizaço da gica. o que assegura o predomInio dos poderes públicos corn um desenvolvimento exage-
política. Por camavalizaçâo da política entendo a assimì1aço mimIica de padrôes de rado do regime administrativo e da política. Influéncias estranhas multo activs» (1909:
actuaçio dos Estados e das sociedades políticas (em sentido gramsciano) dos países cen- I 8).
trais, scm que os agentes políticos os interiorizem nas orientaçöes operacionais da acçäo A ponta de verdade desta concepçäo está em que a sociedade portuguesa nao tern urna
política e os convertain em práticas políticas coerentes e duradoras. Este tipo de assimila- tradiçîlo de organizaçäo formal, centraliiada e autónoma de Interesses sociais sectoriais
ço produz um efeilo de descanonizaçíio dos processos ideológicos, urn distanciamento bern definidos (interesses dos empresários, interesses dos trabathadores, etc.), capaz de
lúdico perante os efeitos da govemaçäo e confere a esta um tom geral fársico. gerar parceiros sociais fortes em permanente diálogoonfiituai entre si e corn o Estado. E
São multas as manifestaçôes da camava1izaço da política. flou dois exernplos, um, este o modelo de organizaço da socìedade civil nos países centrais da Europa, sobretudo
do Estado, e outro. da sociedade política. O primeiro consiste na enorme discrepância depois da Segunda Guena Mundial e, como sabido, só nos áltimos quinze anos tern
t

entre o direito e a realidade social. No seguimento da revoluçäo de 25 dc AbrIl de 1974. vindo a ser ensaiado em Portugal. Dai, a hipetirofia da regulaçAo estatal mencionada na
foi pmrnuigada legislaço social semelbante à que vigora nos países centrais da Europa, tese anterior e também o facto de a dimensäo autoritiria ter sobrepujado a dirnensâo de
se nao mesmo mais avançada. Muita dessa legìslaçäo no foi até boje revogada e, no legitimaçâo. Expressão disso mesmo é o facto de o Estado portugues nâo ser urn Estado-
entamo, nao tern sido aplicada senflo maite selectivamente. pelo que as nossas práticas -Providencia em sentido t&nico e de nele no ser fácil destrinçar entre a componente
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64 Pela Mao de Alice. Q Social e o Político ria Pós-Modernidade
Onze Teses por (kasióo de mais urna Descoberza de Portugal 65

Uzadas (por exemplo. ciia-se um serviço nacional de saúde mas no se dota de recursos outras. Se o nacionalismo tern sido ora «tradicionalista» (quase sempre) ora «raciona
financeiros adequados), a dstribuiçäo dos beneficios sekctiva e autoritária, sujeita a lista» (a geraço de 70), o iberismo (unitarista ou federalista; político ou cultural) tern
critérios subjectivos de agentes ou servços que criam nos dlienes ou destinatários dessas sido, ora a «internacional cristA» (Sardütha), ora republicano e socializante (Amero e Oli-
políticas situaçòes de dependencia e de sujeiçâo, de puniçào ou de recompensa em sudo Dal que. sendo pólos do mesmo tipo de discurso, baja entre eles urna
veira Martins).
semethaures às que so Upicas do Estado repressvo grande cumplicidade e tenhammesmo sido frequentemente combinados no pensamento
Mas se Portugal nao tern um Estado-Providência, tern, no enumto, urna forte socie- do mesmo autor. Por um lado, o espantaiho iberista tern feito muitas vezes dançar o
dade-providência que colmata em parte as deficiências da providencia estata urna socie- No sdculo XIX, a exahaçäo iberista corre de par corn o culto do
espantalho nacionalista.
dade organizada informalmente segundo modelos tradicionais de solidariedade sociaL p de Dezembro (Cairoga, 1985: 437). Por outro lado, o iberismo surge multas vezes
Entendo por sociedade-providncia as redes de reIaçes de interconhecimento. de inter- corno forma de nacionalismo alargado (Antero, Oliveira Martins, Natália Correja). Na
-reconhecimento e de ajuda mútua baseadas em aços de parentesco, de vizinhança e segunda metade do sdeulo XIX. os federalistas ibdricos apresentavam-se como naciona-
comuntrios, atravs dos quais pequenos grupos sociais trocam bens e serviços numa listas defensores de urna posiçäo que permitiria a Portugal recuperar o prestIgio interna-
base no mercantil e segunda urna lógica de recipmcidade que se aproxima da reIaço de clonai, libertando-se do protectorado ingles (M. Mascarenhas, 1980: 1$). Sinibaldo Mas
dorn analisada por Marcel Mauss. propunha para capita' da Jbéria, Santardm, a salvo da influencia francesa e da esquerda
Basta observar -e comparar corn o que se passa nos países centrais da Europa - os inglesa (Catroga, 1985: 428).
milhares de pessoas que todos os fins-de-semana visitam os doentes inemados nos hospi- Mas por detis da «civi]izaçäo ibzica» está sempre o receio das pretensoes hcgemó-
tais centrais para aquilatar da presença e da força da sociedade-provid&icia entre nôs. A nicas da Espanha. Oliveira Martins, escrevendo a propósito do centenáño da descoberta
solidariedade social que cia exprime tern a ver em grande medida corn universos simbóii- da América, comenta em 1888, parecendo fazê-lo em 1988: «vemos a Espanha levando-
cos picos das sociedades rurais, os quais, no entanto se reproduzem. sob novas formas, -nos pela mao, convidar para Madrid as naçöes neo-peninsulares da América em scu e
em meios urbanos, sobretudo naqueles em que a articulaçäo enrre a componente ruraJ nosso nome, scm autorizaçio do nosso governo» 1923: 140
( ss.).
(passada ou presente) e a componente urbana das familias se maiu'm. A forte presença da A jeremiada nacional tern de ser confrontada corn argumentos proporcionados. E há
pequena agricultura familiar e a elevada percentagem da população pluriactiva a viver em condiçes para isso, urna vez que Portugal está finalmente reduzido às suas proporçöes.
mejo rural são outros tantos factores explicativos da sociedade-providência. Sam triunfalismo nem mìserabilismo (cada um traz o outro no seu bojo), d necessário
A extrapo1aço idealista a partir deste dado socio6gico transforma «o português» em analisar os riscos e as oportunidades, avahar os recursos e os modos de os rentabilizar
um homern «profundamente humano», que «nao gosta de fazer softer e evita conflitos», nurn sistema de in1eraCÇIeS transnacionais cada vez mais dinâmicas. Scm cair na tentaçäo
que «possui um grande fundo de solidariedade humana» e é «extraordinariamente so!idá- antropomorfizante do discurso mftico e psicanalitico, impe-se urna atitude cordial corn
rio corn os vizinhos» (J. Dias, 1971 19 e ss.). E a mesma extrapoaço idealista está na Portugal. Portugal nao pode estar constantemente na posiço de ter de prestar contas
base da «brandura dos nossos costumes» em que Sa'azar fazia assentar a diferença entre a perante os sens intelectuais, ainda por cima sabendo que nunca as prestará a contento. Os
sua ditadura e a de Mussolini (A. Ferro, 9331': 76) intelectuais, os diferentes grupos de cidados e de interesses e as diferentes classes
soclais é que têm de se habituar a fazer contas e a näo confiar em destinos nacionais ou
horóscopos colectivos. Uns e outros são sempre expresso de um dflce de presente que
11. Portugal nao tern destino. Tern passado, tern presente e em futuro. projecta nurn futuro excessivo o excesso de passado. Se algo caracteriza o tempo actual é
antes um excesso de presente que tern condiçes para deixar o passado ser passado e o
Urna das constantes do pensarnento mitico e do pensamento psicanalitico social que futuro, futuro.
Portugal tern um destino, urna razo teológica que ainda nao cumpriu ou que uS cumpriu A luta por argumentos proporcionados será contudo diffciL Em grande medida essa
no período áureo dos descobrimentos e que o déflce de cumprimento só pode ser supe- dificuidade reside em que o regresso â nossa territorialkpide ocorre no momento da emer-
rado por um reencontro do país consigo mesmo, a solo ou no contexto da Espanha das um novo
gência de desterritói-io, a Europa da UE e do Acto Unico Europeu. O discurso e
Espanhas ou no cofflexto da Europa ou, ainda, no contexto do Atlantico. O discurso pro- a prática da nossa integraço na Europa comunitáría e a reproduçäo de imagens de centro
duzido por este tipo de pensamento. embora internamente diferenciado, tern urna matriz que suscitam correm O risco de produzir novas desproporçöes na avaliaço da nossa con-
prOpria que designo porjerem(ada nacional. E urn discurso de decadência e de descrença temporaneidade. E será tanto mais assim quanto o Europacentrisrno for a outra face do
e quando projecta urna ideia positiva do país fá-lo de modo elitista e desfocado e por isso
lusomerdismo. Tern razäo Joîo Martins Pereira quando afirma que a integraçào na UE
está sempre à beira da frustraçAo, da queda e do ressentimeno. parte «da total desconfiança nas energias e capacidades nacionais» (1983: 52).
Sao duas as paologias principals da jeremkula naciona': o iberismo e o nacionalismo.
Enquanto produto/produtor da Europa. de encontr& o sau «nicho de
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mercado» que
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Ha obviamente diferentes versòes de urn e de outro, urnas mais conservadoras do que
permita valoriz& os seus
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humanos Ihe
Portugal tern
recursos materiais. e simbólicos.
Pela Mao de Alice. O Social e o Polítko na Pós-Modernidade Onze Teses por Ocasìöo de mais urna Descoberta de Portugal

PERErn.A João Mamns (1983), No Reino dos Falsos Avestruzes, Lisboa: Rega do Jugo.
Dessa contabi1izÇo farào certamente parte tanto o iberismo, como o nacionalismo, um e
QUADROS, Antonio (1986), Portugal: Razäo e Misi&io, Lisboa: Guimaes Editores.
outlo virados para o futuro. Nese coiflexto é sobretudo impoiiante que o Mercado Único
QUENTAL, Antere de (19S2), Prosas Sócio-Poluticas, Lisboa: hnprensa Nacional.
de I 992 näo seja a versäo de fim de scu10 do Ultimatum ingts de 890. Um auo-u1i-
I
ROUSSEAU, Jean Jacques (196S), Do Contrato Social. Lisboa Porrugalia.
matum. Mais urna descoberta de Portugal. pela negativa. SANTOS. Boavernura de Sousa (1990), 0 Estada e a Sociedade em Pornigal (l974I9&'),
A integraçào ibérica urna componente importante da integraçAo europeia. No se faz
Porto:
t
Afrontamenm.
hoje corn discursos miticos ou psicanaUticos nem tAo pouco corn os caminho de ferro' SARDINHA, Mtónio (1924), A Aliança Peninsular, Porto: Livraria Civilizaço.
como sucedeu na segunda metade do scWo )UX. Ests a fazer-se, como já referi, por SILVA, Agostinlio da (1988), Consìderaçöes e Outras Textos, Lisboa: Assírin e Alvim.
acçäO das multinacionais e terá de envolver muit negociaçäo e rnovaçAo para no acarre-
tar a despromoço da nossa economia e da nossa cultura. Por isso, errado pensar. como
pensa Joo Martins Pereira, que todo o naciona1smo é conservador (f983: 21). Nas condi-
çöes actuths de transformaço do sistema mundial. os processos de reterritotializaçào e de
identificaçào iocal e regional so demasiado diversos para poderem ser monoliticamente
avahados. No caso concreto da integraçäo europeia, ¿ já visível que o tipo de organizaçäo
de Interesses que tende a dominar (mais pluralista e menos corporativista) obriga a nego-
ciaçöes de Interesses naconais em que se combinam de modo diferente interesses do
capithi e Interesses do trabaiho. Há pois que avallar o diferente peso e a natureza de cada
um desses interesses antes de julgar o conteúdo político da defesa dos «Interesses nado-
nais».
Dada a dinâmica transnacional da epoca presente, no é possível postular futuro e
multo menos futuros nacionais. Apenas se poderlí direr que, para ser nosso. o futuro que
tivermos nio podará ser reduzido ao futuro dos outros.

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¡974 I9i), Porto: Airomamentu. urn scukprodígìo. reveouse urn jovem frágiL dado s rnaeitas e aos azares.
Aus catorze ans,s teve urna doença grave que, ta como a wberculose e a
S\Ri)NHA. Autnio (924). Peninsular Porto: Livraria CiviIizaçio.
A Aliariçci
sífilis de entîïo, demorou a curar e deixou para sempre um rekio. E tanto
'1 VA i\tini}u da )8). (unsidniçes e Outras 7eXUìS Lisboa: Asûio que aus nove anos teve uma fortissima recaída que o privon de gozar
trinta e
C AlviflL a pujança própria da mela idade. Apesar de dado por dinicarnente curado seis
anos depuis. lern lido desde ernäo urna sadde precária e mulLos ternern urna
terceira recaída. certamente mortaL Urna tal história dírdca ternnos vindo a
convencer - a nôs cuja inocencia e garantida por nio termos escohido
nascer nest« século - que, em vez de um scuIoprodfgio, nos coube urn
sécuo idiota, dependente dos pais, incapaz de montar casa própria e ter urna
vida autónoma

Multo mais pacientemente que Saint-Simon pura quern em 1#9 ----------

cuineçava jí a ser dernasido tarde para o sécuo XIX se libertar da herança


do sécuo XVUI e assurnir a sua especiicidade (1977: 212) ---rn ternos vindu
a esperar pek sentido do sculo XX. Nom livro, precisamente intitukido The
Meanìn afihe Twentieth Ceruury, Kenneth Bouding caracteriza inuito vagamente
o iiosso scuo como um período ìntermdio da segunda grande trasisiçio na
históriada hurnanidade (1964: ). E, mais recentemente, Ernest Geliner lamenta-se
1

que a coiicepçio de histéria própria do nosso século 'nio teriloi sido aliida
formulada filosoficamente de modo adequado" (1986: 93). Eu próprio escrevi
que o éculo XX corna u risco de nuio começar nunca ou, ein todo o caso,
de nio coiiieçar aittes dc terminar (Santos, 1987a: 6). Corn outras palavras e
rnetiloras a mesma convicçäo ou preocupaçüo tetTi estado preSente, cunsciciile

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ULI LI}CI1tIU nos rnuflus baanços do cuo que, um pouco por ioda modernidade cumprìu algumas das suas promessas e, de resto, cumpriu-as em
a }artC. se lêm vndo a zer. No
admira, pois, que mutos desses hilanços
excesso. É obsoiescência na medida em que a modernidade estd irremedia vet-
cflam skk) Cfl verdade balaiços du s&uo XIX e nio bahmços do scuIu
merite incapacitada de cumprir outras das suas promessas. Tanto o exccsw
xx iuo ¡rcamn.
no cumprimetuo de algumas das protnessas como a défice no cwnprimenta de
MLS COflÌU, iO Conhi-nu dO que quena Hegel, u históna esui para a razu outras Säo responsáveis pela situaçöo presente, que se aprcsetua superficialmente
:uaR1 a as1üca estí para esperteza aka, êm-se vndo a cumuar em co/no de azio ou de crise. mas que ¿, a nivel mais profundo. urna situa çäo
lfl])t1s rccflle! ifla:3 de que esta biogrIia du cuo está psovavemeiue de rwisiçdo. Como todas as iransiçöes são simultaneamente semicegas e
cflpeli e de que. poiamu, os baançus e os enterros kram quiç pemucus. semi-invis(veis, nilo é passive! iomear adequadamenie a presente situaçäo. Por
Alu-?tthdu para i urna condiçio cocd que torriuu psve pwa todos esta razäo lie tern sido dado o nome inadequado de pós-inoderuidade. Ma-r.
flu',. XX pnece t5th[ dtsposto a gozar
u stcu]o terceira dade em p'ena à fittia de mci/lar, é um naine aulêntico na suo inadeqnaçäa.
aCER dHLk e niak do que issu, a destazer, entre u sonho e o pesadelo, as
Passo agora a ustiticar os vrios momentos desta tese. O projecto
cFWRIe que se tinham po teias a seo respeto. Qual é no elitanto. o
nradu rta! dus snas que nus tern vindo a tkìr ultnamente nesse senddu? súcio-cultural da mudernidade é um projecto muito rica, capaz de infInitas
como
iaccfltaro wna adequada e teiUu consciricia du urgência das uussücs possibilidades e, tal, inuitu complexo e sujeito a deenvofvimentos
contruditórios, Assenta em dois pilares fundamentais, o pifar da regulaço e o
kft cabeni no pouco que Uie resta ou seto, pe'o contráriu. a
deeperada de
um sentimerno de ter chegudo demasiado tarde"
pilar da emancipaçäo. So pilares, eles próprios, complexos, cada um constituIdo

.LLe egmdo IJarok B'oom (973 e 98). atormelua a rukura corncinptnânea por trë principios. O pilar da regulaço constituido pelo principio do Estado,
e hetadu a pue.'a etempomnea? Adniiu que se rare da pFinicira hipóese cula ariicuIaçio se deve principalmente a Hobbes pelo princípio do increado,

e. aee cau. a qtLL'st:lu que se pOe é se u stctio XX erí anda tempo pura dominante sobretodo na obra de Locket e pelo principio da comunidade, cuja
e[ a,er. pff1 d s es1 haçus en que agora se collipraz, o que. doutro niodo.
r
formu1aço domina toda a filosofia politica de Rousseau. Por sua vez, o pilar

eh Je .er etu pein écu]o XXI. Apesar dc o iìosso sduu ua wn dus da emancipaçào t constituido por tres lógicas de racionalidade: a racionalidade
,e11'. e. iubui e surpteendeiìte 1er translormado o tempo ein taha ectdtico-expressiva da arte e da literatura; a racionalidade moral-prática da dtica
de tempu. a ìn]a ri'spu'au d que adinto que sni. E o que procuraie dcìutmsuar e do direito; e a racionalidade cognitivo-instrumental da ciencia e da t&nica.
a eeu. cula wua certa dusc de optniisrnu irgko que colbo de Heidegger. Conio CrU qualquer outra Cunstruçäo, estes dois pilares e sens respectivos
principios ou lógicas estiu por cflculos de correspondéncìa. Assim,
eap(lu Lu consta de irês pai-es. Na prneiru parte descreverei u perd ligados

de uw novo 1?uadiJìIa siìciu-euUura e aI)pesentarei as cundiçöes sociais da embora as Ióicas de einaricipaçäo racional visem, nu seo conjunto. oriencIr a

ua eF1ergncia nus suciedades capiaIistas. Na segunda parte. tentarci detiriir vida prática dos cidadïlos, cada urna delas tern um modo de inserçilo prìvilegiado
n', U[Hk'S C a. pussibilidades de mn lu paradigma emergente nus condiçöes no pilar da regulaço. A racionalidade esttico-espressiva articula-se privilegia-
',1Fc.t1., de tuna suciedade dependente, selniperirica. como é a portuguesa. Na daniciite corn o principio da comunidade, porque nela que se condensam as
erccira patic, procurai-ei deterinnar algumas das consequncìas do novo para- ideias de identidade e de cumunhäo scm as quais nao é pussivel a conteinpiuçuio
dtgua 10 dominio das prthicas poUticas. Cada parte inicia-se pela apresentaço esttìca. A racionalidade mural-prática liga-se preferertcialiiiente au principio du
de una tee principal a que se segue o desenvoivimeino analítico que a justifica. Estado na niedida ein que a este compete definir e fazer cumprir um mínimo
ético para o que i dotado do munopólio da produçio e du distribuiço do
direito. Finalmente, a racionalidude cugnitivo-instrumentul tern urna currespon-
U mudernu t u pûs-muderno nos países capitalistas centrais dncia o principio do mercado, nao só porque nele se condensain
específica corn
as ìdeias da individualidade e da concorréncia, centrais au desenvolvimento da
A tese principal desta primeira parie a seguirne: O porodgìiia cultur4 Ciência e da UCfliCa. como tambm porque j no século XVIII so visíveis us
da iillaIlinu/a(k CO'iS(IU'IU-SC rIIIfr.c de o iiiøcio de produçäu eopíEatísla se ter sinuis da eoiìversio da ciência numa força produtiva.
01I1(/U 1J(10II/!(1IJtr e ex!uigii-se-á cui/cs de ee último deixar de ser dornìnarue. Pela sua complexidade interna, pela riqueza e diversidade das ideias novas
.1 0111 (0lflÇ) comp'exa ¡)Orque é ein parte mn processo de superaçäo e
é
que comporta e pela maneira como procura a articulaçio entre cias, o projectu
l'fO rIo-te lI/il /n.o{rs.co de 1)!2S(lkSCêJi(iCI. E superaçào ou medida em que a
da modernidade é um projeclo ambicioso e revolucìonário. As suas possibilidades

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ìu infl:as mas, p.o u eein, corempaffl i.uuu u excesso dis pmiesas a emergência e a generaIizaçio de uni sistema de trocas caructerìiadamente
capitalista. Issu só ocurre a partir de finais do sécuo XVIII ou mesmo meados
I

CUFflU U dehee du su cwuprimento.


do século XX e, portanto, depois de estar constitukio, enquanto projecto
1. um cornu ouiro etio presentes nu horizime deste pnecto desde
1aflli)
sócio-cuIturaI, u paradigma da modernidade.
a euergêflCia a prUr do sécuk XVI. O ecesso esde no pnprk objecìvo
de vneukr o 1,ilar d regukçu ao p1ar d eniicpaçu e de us vincular a
A partir deste momento, o trajecto histórico da modernidade estd intrirr-
uinbu, cuflcrctiz;iÇ<) de objCCiv()5 pritcos de rìeionaizaçto dobaI da vida secamente ligado au desenvolvimento do capiralsmo nos países centrais. No
L)}çciva da vida individual. Esia dupth vincukçïu}
t
capaz dc assegurar o ácit periodizar o processo histórico deste desenvolvimento, quer porque os
dc&nv viento harnìuniosu de vakres tendencidinene cnradiliios, da usiça ditèrentes países (a kiglaterra, a França, a Atemanha. os Estados Unidos da

uuuFowia. da sdidariedade e da identidade, da eniancìpaçäo e da Ariurìca do Norte e a Suécia) ntio irriciajatn o processo de industriaizaçäo au
e d
jjheuvìdatJe. iguadade e da Uberdade. Ta é possveI pw a construçìo
da mesmo tempo, quer porque, at há pouco tempo pelo menos, as condiçöes
ahaca dus vakres nüo dar à parlida a prilliazia a neiìhuin deks e por as sacionais intertèriam decisivamente no processo interno de desenvotvirnentu de

eEk:e eIl-e des serem regu'adas pur prncípios complementareS Nesths cada país. Apesar disso, d possivel distinguir três grandes períodosr. O prirneiro
WLk a teusies possíveis sio positivas e uS provisúrias ncLanpa- período cobre todo o sécuto XIX, ainda que descaracteriadu nas duas tiltimas
ii[dade eiurc us va'ores irasíurrnam-c iurna coiupeiiçiio id i,fioi drkadas como corrsequêrrcia da fase descendente da curva de Kondratieit que
cgundo as regra-s de uni jugo de soma positiva. Mas é fcH ver que urn se iniciara ens riscados da década de setenta. É o período do capiwlismo ithe rat.
Luuiurrle CXCCSSjVO Ck)r1ti1r. Cflt Si InCPnU, U
tEìE IflCfl de urn dìce reparve. o segundo período irriciase no finat do s&uk XIX e atinge o scu pleno
Pur irin adu, a cuustruçio abstracta dos pikrre corriere a cada urn deles unla desenvolvimento no período entre as guerras e ruts primeirus décadas depuis
LH1 Ç) dc rdnitud, rrua vucaçíu nmxtina!isra, quer seja a máxirira reguhiçio da 2 Guerra Mundial. Seguindo a tradço alemä, que vetii de 1-lilferding

uu a rna errraricìaÇ, que lorria problemáticas, e rdio mesmo irnpensáveis. (l9tl) e se renova corn C. 011e (l95) e outros (Winckler, 1974). designo
'rtias de cornpatihilizaçao entre eles. as quais rìecessararnerire icräu de do capita/ismo organizado. O lerceiro período irtìca-se
este período pur período
,et ;oselrie' ein cedêrìcia inriluas e currlprurntssus pragmáticos. em geral ddcada de sessenta. nalguns países um punen mais
nos tinais da
cada urn desres piarcs assenta cui Ôgicas ou principios
r uLrtru Lado, cedo, nourros um pouco mais tarde, e nele que nos encontramos boje. Atguns
cEd urn ddcs durado dc urna aspiraçüo de arrt%rrioinia e de dièreiiciaçáo autores designamno por período do capitalismo financeiro. ou du capitalismo
uE1Ciull qa'. pur uffini via, acaba 1arnxm por gerar urna vocaçiu riiaxiriìalisur, rnrrIsc)polista de Estado. Seguindo a mesina tradiço alemì, agora adoptada
quer do Fsiado,do increado tambrn pelos cientistas sociais ingleses (Lash e Urry. 1987) designuo provi-
querseja, no ça dtpiar da enrancipaçáo, a esietriuçáo, soriaiflCnIe por período du capitalismo desorgwrizado. urna desìgnaçáu made-
uurJrhL L()_UU crcnrrtrrzaçau da rtJrdadt ocr il Ms a drinerao mars
J quadu, ruas que. r calta de methor, no é thu grosseira que nos impeçu de
p1u urrdzr do dicc parece residir precisaulenre na possibilidade dc estes principios ver a natureza prulunda das transfoi-maçöes em curso rias sociedades capitalistas
e }6gicas vireni Liurnildemente a dissu! ver-se nuni pnecIo tIuhr dc rucinaizaço avairçadas.
Lia vida sucia] prîrica e quotidiana.
Nao interessa aqui caracterizar cru detalbe cada um desEes períodos.
U projecru sñciu-cukural da riiodernidade constituiu-5e entre o sécu Eu XV interessa táo-sú ïaz-to enquanto neCessário para delinir a trajectôria du projectu
e irrars do scu]o XVU!. SU a partir dal se inicia verdadeirariienie u teste do sócio-cultural da rnodeniidade ens cada um deles. O men argumento que o
cì crrlflprirnefltr hi5tóriCL) e esse noniento coincide corn a emergência do prilneiro período tornou claro no plano social e político que o projectu da
crprrahsrno enquartur niodo de pruduçáu dupninatrre nos puises da Europa que inodernidade era demasiado ambicioso e internamente contraditòrio e que. pur
rrerrraIT1 a prirneira grande onda de irdtrstriaizaço. Se corrceberrntrs u issu,o excesso das prornessas se saldaria historicaiiierne nom deuce ralvez
.rpíta]i.'}nu couru sisleuur de trucas rriorietírias geiìeraizadas. corno faz, pur O segundo período. tentou que tussem cumpridas, e atr curupridas
irreparível.
cY.enr{)]u. Wrlleu:tcin, a data ria emergência du capiraisinu Ier de recuar em excesso, alguasas das promessas, ao rnesnto tempo que procurou compatibilizar
aLiwrs scuh aré io stcrIu XV peu ncmrs \VaUcnaein, i 974 9k«)). Niu
mì, pilece purr1ì. que ra curìccpçáu eja adequada para os rurssus prupóito5
arra1ítitus. pins a epecificidade histórica do capitaiisino reside rias relaçôes de t N caelr,çtu dt uCs do tIeenvotvirnepiro do cap(Eti5o sigo de perro t.a.th e

pitu.1uçiu que irrsraura cutre u capitat e o traha!ho e so etu que determinam UI trvs7

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cnm els iur prornessas eonradhôras n expeciaiva de que o dice
no no desenvolvimento scm precedentes do principio do mnercado, na atrofia quase
umpFimeI1it1 des, niesnio e irreparv, lusse o menor poss(vel. O tecerro total do prìncípio da comunidade e no desenvolvimento ambiguo du principio
ptF-tdu que esumio vver, represenla a consciência de que esse dttke, que do Estado sob a pressâo contraditéria dos dois movimenlos anteriores esta
aeio rreparee. é
de niiiur io
que se julgou anteriorrnene, e de modo ambiguidade vai de resto manter-se nos períodos seguirnes. ainda que sob outra
UL iaz sentido
) criInjr
espera que o proeco da modernidade se forma. O desenvolvimento do mercado está patente, por eempo, no Surto
cfflpR o que aré agora nio se cwnpriu. O projeclo da moderndade cumpiu vertiginoso da industm'ializaçâo, na crescente importância das cidades coinerciais,
i][LFIUS das suas pnnessas e ai is cumpru ein excesso, e por sso mesmo na primeira expansâo das novas cidades industriais. E esta ainda patente na
o ctlmprirnento de todas as tesarites. Esnis 1timas. na rnedkia em conversâo da complexa filosofia política liberal nom prìncpio unidimensional,
ue ua ]cgimidde deoúgca permanece. ou aid se ÍraIece, têm de se e mesmo assim contraditórìo, mas po'iticamente eficaz e aleito a grande

FCC5;tJil e mais do que sso, tm de ser remventads, o que só sera possíve divuIgaçio -oprincipio do kiissez faire. Por outro lado, a comunidade, que
L}U [hik) UC OU) OWro panthgma, cujos snais de emergthica começarn a era em Rousseau urna comunidade concreta de cidadâos tal como a soberania
era efectivamente do poyo, reduziu-se a um composto dc dois elementos
abstractos a sociedade civil, concebida corno agregaçâo competitiva de interesses
Procuraici, )OS denionsrar que à medida que se sucedem os Uês !xÍudos
itrcus do capaismu, o projectu d modeíndade, pur um kdoafunUase particulares. suporte da esfera póblica. e o individuo, formalmente livre e igual,
flu iuibu de redização e, pur outro 'ado, adqwre urna intensidade ota suporte da es'era privada e elemento constitutivo basico da sociedade civil.

L' ate eeessva nas reaizaçes em que se concernía, Etc processo pode ser Foi este conceito empobrecido dc sociedade civil que passou a ser oposto
hWzado na sequncia histórica e semântica de três conceitos, todos eks au Estado, dando assim origem ao que se considera ser
na riiz du projecto nioderno modernidade, modernismo, modernizaçâo2. pensamento político moderno, o dualismo Estado-sociedade civil. O modo conio

i5i orU]ado no séEXIX'eite duüffsriò e a sua articulaçâo corn o princ(pìo


1) prùaeiro períodu do laissez faire explica a ambiguidade da forma política e da actuaçîiri do
Estado nestc período. E que a }igaçäo orgânica - pressuposta pela rnatri

XIX, un seta, o periodo do eapitaismo Iibera,


sécuhr politica do Estado liberal -'- cutre
a lógica da dominaçâo política e as eìgêncìas
(__)
um sécuo
ae maniC. talvez niiu taub quantt> o sicuIu precedente, mas cerlaniente mais da acumulaçâo de capital. au longo do século XIX, concreEiase e tòrtutece-se
t]ae u sécukr seuinre. (j seu lascinlo reside em que nek cpfodein corn grande através de múltiplas e sucessivamerne mais profundas irltervençöes do Estado

Liuêueia cuntradiçöes do projecto da mudernidade: entre a sulidariedade e


as Paradoxalmente, muitas destas intervençoes do Estado são justificadas em nome
a UCundaLle. entre a Ustìça e a autonorrrìa, cutre a iguakiade e a hherdade.
do princ(pio do laissez faire, um principio que preconiza o mínimo de Estado
Purquc US deais se chocam seni medìaçóes, t pussíve ver neste período e (o Estado protector).

LUID cual c]areza tanto as tendências para u al'unihtrnento du


projeclu, coiru> () pilar da ernancipaçäo do projecto da mudernidade é ainda mais amnbiguu
r 'ara aspiraçân de gkrbahdade e de fruti'icaçiu nu quotidiano. durante o periodo do capitalismo mesmo
O at'unianiento liberai. ao temlipo que espelba, corn
C, r,,tantn. u dtìce de cuniprirnento está presente, ainda que desigualmente, grande clareza, as tensöes em efervescência no interior do paradigma. É certo
em cada rim dus prilielpius e lt')gica.s de racionalidade que constitucin os pikires que cada urna das três lógicas se desenvolve segundo processus de especìalizaço
da eLrFaçu e da enìuncipaçio. e de dit'erenciaçâu Ñncional, tao bem analisados por Weber (1978). processos
t\U nve! da cgulaçio. idci
du desenvolvirneriro harmonioso entre os
a que, au mnesrno tempo que garantem a rnaior autonomia a cada urna das esteras
lnuel)ios do Estado, do ner'cadu conurnidade e du
que, como rive ocasiâo
de de'ender nuotru lugar (Santos, 1985u: 302 e ss.) e contrariamente às upiiiiöes
- (arle/literatura.
ética/direìo, ciêncialtécnica), tornamu cada vez mais difícil a
articulaço entre cIas e sua irnerpenetraçâo na experiência do Leheuswelt. comiio
ruais divulgadas, estava bein presente na rilosolia política liberal do sécuo dina 1-lahermas (1982; 1985a). No dominio da racionalidade cugnitivo-instru-
XV Ill, de' Adam Smith e du iluminismo escocês culapsa e deconrpóese -- ocotal, estes processos traduzeTn-se no desermvolvimerno espectacular da cìêneia,

2 V Lfl,EEm u p3u[e1i ,muc L',I e entu . uoueiLidade. rLim'tFmmo


t IunL de.seavolvimneato obr doinçäo tibemat entre Estatrr e suciedìde civil, er qummiu

tl I 81

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a desta em iorça e no cequene rerço da
veisu gr-aduI pJuva mesmo modo. o romance reidista ¿ a represernaço de urna crasse. a burguesia,
iìercadu. Nu dominio da raciinaIjdaJe raprAca, osau que desperdiça o potencial de se transformar numa classe universal, capaz de
ruL:cs5u5 de e de especahzaçäu nianftestarn-se subrejudo na transformar globalmente a sociedade. um pouco mancira da classe universal
EabuE-aç) e cts)daçi() da microtica 1ibeaI a [esponsabiidude -.
de Hegel, a burocracia, ou da classe universal de Marx, a classe operária.
e i ck e cdu vunente au tìJ y iduo W--- no rrna1smo juríd ico levadu au
cxi lU) ekì /fldCkUfI.Chiile aIern e ransflrmado ein poUiea juñdca he A outra mnanìfestaçio, no dominio moral-práticu, assume outra forma
desviante, a da margìnalizaçäo, e é constituida pelos vtirios projectos socialistas
LL CJ 1V&S du -F
ovien de cdicaçu de que expíessau niais 1ídina t

radicais, tanto o chamado socialismo uiópico, como o chamado socialismo


cfIe cnll fla1)&de(flicu de ()4 nahjierne. nu di(iio ricuuadade
cienufico. Ainda que no primeiro estejam, por vezes, presentes aspiraçöes
t It)ltIç
epecaUzaçiu raUuzeiise nt crescente e a
reressivas e pr-modernas, tanto um como outro representam urna tentativa
cJkE du a]t CitUEa (a separaçïu da arte e da vida) Iegitiiiado socialmente
de reconstruir a partir da rais, mas da mesma raiz. o projecto da modernidade,
)LII tJi 1S,UCjÇ) ideia de "cumua naciunaY' rnmo prumnuvida pelo Istado
ou seja. a realizaçu terrena, mesmo que seja numa ferra ifflaginria -- como,
ri por exemplo. nus lalanstétios -
dus ideais da autonomia, da identidade, da
Nu mhutu. COI neu culender, u pi Lar da entancipaçäu loi tamnbéti neste solidariedade e da subjectividade. Vistos desta perspectiva, pode ati dizer-se
}I } i) rJiflt'ípu ) a gtza&li r dc sociais enìb n a dc Ìz1istaçcs tc (jue O soeiafismnu dito utópico é, nos semi objectivus, mitais radical que a
I1)L fl L-svi1ute t-ani lela tie imìtirlas
nhaLìdade e pela vs.çju sucìaljsmno dito científico, e precisamente porque Marx, au querer lorinulam o
. , a i Lç ia i lade rad e al da ex j sinciu i nsc taS itt pn eCtu da mu- j
scu projecto em termos de teoria cientrfica ---- a teoria da evo1uçiu da suciedade

i i i J - i\ e ir lt i uere u de j ii i du Cilnio
i t a de s nani lest açes se I I
semelbante à teoria da e'oluçïo das espécies de Darwin, a quem de tesla,
UIL «SC CICIn dejadu vcjcula atravts de IormiiIaçes que. iìiimn corno é sabido, Marx quis dedìca o primeiru volume de O Capita! de -
LIC ItUiijlaii1eiflui ilu critiiiu, da inudeinjdatje. pudjarn sei laeiliìienie algunt I(XIO cotreu o risco de reduzir a racionalidade mural-prática r-aciunalidide
Ci Ciiiii p-nodeuas, pensu que cbs perleucemn coni total cititiiidade citgnitivo-ìmtstt-umental já entiio hegemónica. Mesmo assim, ¿ justo que se diga
,LL pH)1c_'lo ita i1ipkilijdIdC C nudo, CpmCSCfltiiiU
de alguin a senaçio que a ciineia pretendida por Marx tern. cia própria, urna vocaço de globalidade
dL [DCi di iiiiili elii &Jt.t IC IIC CiJiiipFflflCEilii da pioinessas da mudernidade, transdisciplìnar que se perdera mais tarde na ciência marxista, tal como a
iiidFs Iii LIIC HJIVj]1IUIUI}, Ci)flsUiflido, Entre essas inanifesiaçôes, distingo duas, globalidade do projecto de Saint-Simon ou mesmo de Comte se perderii na
uÏii ii,) tfinitinic; da iacjunali(ladc esttic-ex1jrcssjv e utiii iio donimnio da sociologia de Durkheim. O importante é verificar que este primeiro perodu,
ao a contradiçäu flua e crua dos objectivas do
mesmo tempo que expeìencìa
A ])IIT}ICma asswnju iiii-ìa trnia elitista e ctnistjjuJa pelo ìJeuli.vino prolecto da modernidade, é capaz ainda de manifestar, mesmo que de tuma
I (llf,) ) C I)C(1 r((fi(1C /O(/iiiil' iiliX(L Nio e nata aqui de contrapur. desviante, a vocação de radicalidade do projecto e, nessa medida, recusa-se a
Loll}çi lai (hiu]dner (
ll)7l ii enenu c]i,siu ni pensainentu riimnûplieii, aceitar a irrepantbilidade do d1ice da stia realizaçãu histórica.
iic]}i, CiilTìii L97) ik tentar integrar iitlrmnati\amenle a efuca
t,i, l3itnikliiirt
I I ] I }l
CL OU iaeu nia siii i iundtrin
I I
tiata-se 1i>-5i de .ugerr que. à beira du I j

o segunda período
il ' ii ii i da i pi içiu FCaCCji it1jrj
, i ,
eu It tira ni derna, o ideal sino ii iiiiti ieu i

FL'lHe'iita, de unoa e1iIjs, celui, a vocaço utóica da realìziçiu pLena da .

01 LI. t V dade
iniideinjdide E assi ni pelo mneiu is
j t-isci-i a III I Jimujectii da ,
o
segundo per(odu é verdadeiramente a idade positiva de (2omte. Procura
distinguir mio projecto da ruodernidade o que t possível e o que é impossivel
,,-,l' uk' LitLi)ietir
imiEeïaçiL) du "puesia e da estitica nu Ceflhlo da iitCìiÇu a
de realizar numa sociedade capitalista em constante processo de expansäo, para
\I'CIE CIFutEUÇJa ia li}ru-ma titkl1iCa de urna mitologia da raziti (Flegel, 1-lolderlin,
SLIICUII' de seguida se concentrar no possível. como se tsse o ónicu. Para ser eficaz
(Brunkhurst, 9t7: 403 a ciitica du in\trumnentaljsmu ilunijiijsta e I )

Lía LCj j-icu a udide das origens. da natuieza e da cultura popular4. Do


I

s_ P;ira Lukacs, p+iiî cenaiiienti m Btzar. a catqona cntr.d thi liiem&iiì ritiO I)

Jfli dIIei,t ptciihar qi tgi orgiiiantetiti o genil i o pamcubr. iaiIo i coìiio


1lp4.).
-
i, EtiCiFLll th. iimjr,»O:aii,, ,k,ii,. pii1C. JO Í:,,t dc. i'i,. aiiiwi)eiC': a5d. a ddiiiçâti cJe reIisiio c,rno uitta iUrn.epÇ5O diakctiat coriec da riIaçito eiIic
i,-:_ ,I L- i-.iiuir iii!ll ciiic;i d,, i"'ic ci ;iit,,,ìi ,,,,ii,, e0ncrici (Ì972 tamari
Ctr Auelxict (196S e A. 5wpi5ewi)Od O97}.
.1 -,t, ,j, i,iii,' I ')7i}: I V.1 ., ii,,ii,, cL]di(E..
er e
'.iitretiJitt) O cap III
(,

ìiiiitutdti
I 19).

Reuii, Mìtkrmcnt
E,

irtii R,.tumi,ii

2 83
I

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ÍEUi' de Iijtíj,
{
cafllpu du p(ívei de nodo a iropenalista dus increados. na crescenteintervenço do Estado na reguaçio e
H n u nu
r r nu, enus vsrveI o o capita' e o traba}ho Por ouro lado,
I t ìi
déflçe de do ¡nsEítuciona1ìzaçio dus conílitos entre
l__:)_ Fc
prosso hstÓrc) de concerçïilexcu() parte da idela d Q adensamento da aruculaçäo do Estado corn a cornundade csu bern
patente
uFLersihdadc du délce para eimiriar, em momento poeiior, a própria deia na legìslaçäo social, no aumenio da partkpuço do Estado na gestio
do espaço
du JEfce. irajecto simboUzado na pssagem da ¡deja da modernidade formas de consumo colectivo, na satide e na educaçäo, nos transportes
e nas
L
du 1det-nisn). e na habtaço, entìn na craçio do Estado-Provd&tcia.
1RcT(7 ije CI)flCeflQaço/excfujj(} ()CUFIe lauro iio pdar da euçäo,
)
Todas estas transfonnaçöes au nivel da regufaçio uverain por objectivo
o r[h fl r rL e prod
])j
nimi e nouru e na -&açUe entre ou consequêncìa redefinir o projecto da tnoderndade cm termos do que era
ch:', iflaj
j
C()fl)paCUj e austamentus ns flìo, No campo da ptJSSÍVCJ na sociedade capahsta. airando para o hxo da
histOria todo o mais.
L'ilçu ;p lriiStòrinaçies de maneira dilerente de país pala puis ou de
protunda e 'ertigiiivai. O principio do Asimn. se definern, obviamente
igualdade
cuminua período para periodo, o grau e o tipo de justiça, de sohdariedade e de
irisitj
1cLd pujarfie do percudo ucror e para S() a
que é possível compatibilizar corn o grau e o tipo dc iiberdade, autonomia
e
LUfl '
e os LinJr
inites de acuiaçu criceríticos desse
pl'l Uth} a'JEfljfldU 1tva e abaçando-t a Iioiiotues mui trì subjectividade. Que esta kmrmna de comnpatibilização é unta entre outras, e upemias
) mlwariaj. tic-o
aflIJ)I(}S.
e c iuerc a t c nccntra-e e cemridizase; pr di cram pretèrida por ser a ue permite a consolidaçio das reJaçöes sociais da
pois crescente
a igçío eno-e a hmc e a ìdsria ci'ecc a Ncparaç(} simultaneamente evidente e trivial. a
i\ :ir1(F: ;ll4Jr1da-s produçio capitalista.
as demnais
fflr jredide JUdILa da cijte± e o cu]1roio ecunônico da ua
, FE hegemnonia social desta fúrma de cornpatìbilizaçäo torna todas

fu r1 indesejúveis ou mesmo imnpcnsiveis, comno bem


evidencia na socìal-demno
se
pr a ula lnperiahta peli
cri
; -. \C c u r k dus niejcado e das
rL-prnp. ; de escida zeni aulneJ1tr o thmanhu das unidades
cratìzaçäo dus partidos socialistas e na contenço. se näo mesmo rnarginalizaço.
Lit pruduço e a CCfl&)uga de tue dos partidos comunistas. Ê certo que este segundo período leve Umrm comneço
estas se servenT está ero COflsnte trans-
a Revolução Russa esteve à beira de mostrar a possibilidade e
a
1111)açu: ui-gcm as graudes cidads indusirlais convulso e
estbeecens os parmetros
tk k c1 O pu-a as regöcs ein ue esth superiomidade de outras lormas de compatibihzação. Mas a tentativa loi castrada
i
no herço corn o emmìi1ismo, corn o falbanço das revoluçes nus outros países
(u a ai i pri ut: (pit, da coni u i dude deen vi d y mcnt industriaî capua sta da Europa, paiticuLirmnente da revoluçio alema de 1918. e, flnalrnente, coin o
t

e i H 'Íuc it C iaíhL por un rado, e o a ua flento do


x1)aflso (j
t3e-a pesadeo estahalano.
ut ;i u a vc ra i scr h a ita abstracta da suiedad As transiormaçöes au muye! do pilar da emnancipaçâo aeste seguimdo período
t
ci y e d c ¡dad ïo
h ua]i enti' is re c pur nutro contribueni para a eu1aterìaflzaçì1) da sìo igualmente pnthmdas e upresentarn tendências de algum modo convergentes
c ru}daJc das prúticas dc dasse e da traduçio detada cnsêncj coin as que ocorreramn no pilar da regulaçäo. Como disse acinma, as transtrrnaçöes
elo ntiTjcn LC (.ds;c.
e as asuciaçes paironak. a SU
tgociaçiu siudicatu
podern ser simbolizadas pela passagern da cultura da modernidade ito modernismo
(' J.ti Va. os paitJ i X'r:r s a Lhsputar u n d it c ilfl1eioriusn te esjç culiura t) modernismo designa uqui a nova lógica da raciomialidade estéUco-
FR du s aitd burguc,es : uirquicos. tanto para a raciunalidade
fe processo de rena- espressiva e o pmocesso du seu extravasamento,
1.t1/dy Mcid e pu1í ka um dus asJ3cctu5 mais aracterjsi(5
dste peiíodo rrmord-pmiutica. como para a racionalidade cientíticotécnica, (.) mnuderrmisrno
(. u ':u diE1j)1( dev se. CW boa parte. ùs
trattsforntaçoes na Ct1posçsi representao culminar da tendncia para a especializaçiu e dfterenciaçu funcional
da, Uabalhaduris sua cecent èrenciaç r1Ierna, s iittdanças dos dilerentes campus de racionalidade. O processo de couceritraçìo/excluso
'f\uts secc- produtiv()s prvdegados pe!a ôgica du acumuIaçio do de que falci acima reside aqui na aíirmaçàu da autonomia da arle (a arte pela
capitaL lup(irtitcìa piogiessiv do sector do scrviços e t C()nsequente arte),na opuSiÇio irrecommcilivel entre a alta cultura e a cultura de massas e
na recusa do contexto social bem evidenciada na aruìtectura modernista da
FiiÇ e tJtdLCflflCflt() .s()(:d e po'ítico dusses itdias.
Por ú[wnu u siadu t L-k próprio, um agente activo das megapolis. E a "grande divisória' de que fala Andreas 1-luyssen, e ele tern
ucu j na comunidde e no mercado e. ao
mesmo
rado quando afirma que o que caracteriia mais profundamente o modernismo
tempo, iransfòrna-se
eUfla11tCiHeute íara se adaptar a esas a sua "ansiedade da contaminaçio", da contarninaçäo corn a política ou corn
transíoiniaçes A
sua artìcuIziçio cada
s CL Uaj s cuulpacta corn u riiercado evidencia-se a cultura popular ou de massas (l9S6 VII)6.
na progressiva reuatnct1açi
LItfr mercados ws igç dus apare!Itos do Estado aus rande8 inonopóhos,
na u dd, uerrz de uutias
e rflias de Iuta ptdírìca pelo contr()o 6. Vn-, t;pect, &) jI11) ìpnk dt to de Hystn-

4 85
I

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-flsu.
mtrflenIos
;icunadade
tue es .niedade da contaìinaço esui reefle nos
que ocotrern nus ouros crnpos (h raconadade. No caso
ra-prútca es presente, por um bdo, na brina poimnea do
-
que o ¡nodo de recuncilìaçtio entre a arte e a vida tentada pelo surrealismo
por ser urn mero momento de dessublimaçäo da arte moderna
inexequivel à partida (1973: 118 ss). Tern. pois. razäo Peter Ürer (1984)
era -
!do que u mesi-no tempo que penetra niais profundamente na occdade em salientar a vocaçOEo libertadora da vanguarda histórica dus anos vinte
Lu L1' dt MIUÇCS eisktivas, wtítudonis t burocráticas que o atiauì enquanto movimento que. pela primeira vez, adquire a plena autoeompreensio
])lgRsiviflnence dus cidados, aus quais. de resto, é pedida cada vez m a do modo como a arte (a sua autonomia, o seu sw1u social) funciona na
)cCF paiva col subsìuço da rnobhzaçüo acva. E ctd. por ouio sociedude capitalistatm. Por outras palavras, o seo significado reside na denúncia
IRJ1 11Ut eiierncia e consolidaçzìo de unia cìncia
1 jutídica. ogniúca do processo histórico de concentraçãolexclusäo scm a qual miio é possível
C fui iiiI. peudumen1e scnu de preeê1icas axokSgìcas e ftca, api compreender algumas das inquietaçöes mais recenles referidas adiante (terceira
rJoeHC u-iudu na ECUFUÌ pura do directo de 962). Esta arìebcle
Keen ( parte desie capítulo).
LL LflLl11ir)dÇLt) estz Ína1mene presente no campo da [acoI1ahdade conìt-
u.. I
11wFenta] pdo S%HgPfl(fltU das posìtivstas, pela I
'
(r {A---.o
cienjfjcu acdtico o lercewo periodo L
:iu'. uyu autóflwnO perane os valoFes e a
de in (/U)S e _;_'-_-__ c& Cki
p :i
IkLt ]uri eaçüu de um conhecimenro ecníflco toialnicnie stiiii do
o ierceiru período, que começa nus anos Sesselita, t urn período ditkil
..

t-Fl1c.:JncH1 du senso conuipo e uiu cntarniiado poi ele, e ainda pela


de analisar, nio só porque cui si mesmo complexo. cuino tumiihtm porque,
CICLLC das !sdpliias, nu eja. pela viênca da ansedade da
flu iuterka da prÓpa cênca7.
estando ainda a decorrer. no ternos o privilégio de yuan au crepúsculo. cuino
desejava Hegel para o mocho de Minerva. A designação de capitalismo
eXCeSO desias 1ransloniaçöes so u reverso do
j\ esdtde e u desorganizado dí, por sì mesma, conta da nossa perplexidade. Para almii de
dlke de oalidade em que assenlam e que pwcurum esquecer outras raöes que juntarei a seguir, m evidente que o capitalismo só pude ser
çe\t]ueeluelao du ser" hedeggedaia) atraVL du sou dinamismo e da sua dito desorganizado na medida ein que colapsaram no terceiro período muitas
hLhF15. () 1OOs a ttC flCSC processo é ie a representaçio luxuriaue
das formas de organizaçiu que timiham vigorado no período anterior. A medida
do cunpu ctnuscívcl e racional vai de pur corn urna thuidura das denuircaçöes, cui que o processo de descstruturaço é em si mesmo urna lova flrma de
ç- i l 4 C ut desp cI d as trnnte ras, et 00 a I ftUid açio su ìridr a da s urganiZaÇo. ou até de hiperorganizaçäo, como
l Ì

alguns querem, ou representa


u eses }, nesta nedda, o pilar da euianepaçiu toriiase cada vez niais urna lase de 1ransiço que cria u tempo e o espaço para urna nova ftnmua de
nelliante au lar da reilaçio. A eoiaucpaçki transtornia-se verdadeiramente oranização. é obviamente ivatrìa de debate mas que rujo cabe aqui prusseuir.
nu ]atlu .uflural da reulaçao, urn processo de conveigëncia e de imerpefletraçüo lnieressa, isso sim, caracterizar este terceiru período ein termos da dicotomia
llul iapcí cai Lceri?a eloqueuteiuente ai-avs du CUOCetU dc liceniuF1ia.
S
que tetiho vindo a adoptar entre pilar de rcgulaço e pilar de emnaiicipaçio
uodernjdade
( ) liCO assin em ccccsso l)1(Pe cui judo
dU emnhora, como adverti acimu, a distinçOEo entre eles se tenha viudo a estuimar.
i
lUe cccde jodas
s expeclativas (basta ver o Iuluraijte avançu do
LaIWC No campo da regu1açio, as transformaçöes tthn sido prolundas e vertiginosas
Li I1hCÇ OL'UjO eR.:j1!lcu) C em tudu n que ìio cunipre d sulicieriteinenie ou, pelo menos, assimu nos surgem dado o curro espaço de tempo ein que
I- I e
11 ra iear lu
',
lulL a 1go ainda a eu lipri [. E evidente que
1 e n
ocorreram. adquiriu pujança scm precedentes, e lamimo
jiidu InaFo 1-ujs neae pUOCe55() lUStÓIC(' da Ji reten quee'asíudoecunóniico procurouculonizar
e ntu o principio tin Estado,
v, piiLueahi(ladcs da Revoluçiu Russa. e au nivel esiiticu-exprcssivu devcr-se-iu
cuino kvtmpk[tide .- au ettremu pducremo
eu;Loua1 jt)d ti ljjtjviujeujos vatituardisiac du priiieipio do sculo: o ?j.EiP
mi1Thral.Nn plano económico, os desenvolvimeutus mais dramtìcus su os
Jadasiijij o conSliUIiVìSiflu russo. a pQkkIt. Mas,
(tLUiWII. U 5rjejhSIU). II
seguintes:o crescimento explosivo do increado mundial. prupulsionado por uni
cuino e siLbe. estes niuvinientus ou tonani liquidados pelo tascisino e pelo
e'aaLiniriio ou lurain ahsonvidus nu cânune modernista. Purém, u scu signilicado
hoyt) agente criado sua medida -..- as empresas multinacionais torna -,
possível contornar. se näo mesmo neutralizar, a capacidade de regu1açki nacional
en ìjniadu, cuino tu Ilahennas quando atirma, pur exemplo.
it Sobre o aib;me Uilerìna e Bügcr cmrntimn. akmm dos mxmo dmes ¡s wkudo.
7 .S1d'i, ii d:i ili¼:]l iiiiikiiii. i:r Siiiìjii; iW1 suae.ss t1954) a Jy iF55t.

I 87

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ecnt)ni; 11CCflSI1lO d(reguçño dus conflulos entre e ein parte a vontade politica para conìnuar a regular as esteras da produçk
pitiF e ]ho, eiheecdos nveI acrna no periodu anterior. eniraquecern (privatizaç'ies, desregulaço da economia) e da repro-duço social (reEracçio das
,. a eLçìu to-naSe niais piecna, ssuiiiindo tòrms que. ni parnca políticas sociais, crise do Estado-Providncia) a transnacìonalizaço da economia
p:ki icn'.
re11resenuun un certo regresso au período du capitahsmu liberaL e o capital político que eLi uWporta transformam o Estado mima unidade de
jciI)fl açiu e uur11atizaçt! Jus processus piudu1ivu. conibinadas corn o aniilise relativamente obsoleta, no só nos países periféricos e semiperitéricos,
wh aicbmcnu dus uansportes, pennitetti a indi.riuiizaço depenLiente do como quase sempre mas tambn, Crescentemente, nos países centrais;
sucedeu,
nundu
_Lei o deooem a colìguraçìu cpacial do apureiho produlivo nus eSta fraqueza externa do Estado é, no entamo, compensada pelo aumento do
pilkc i:etTais .um a desc.actei:açu das regiöes, a emergtncia de novos auloritarisrno do Estado, que produzido em parte pela própria congestio
WUSWt) luci',. i da indúsiria. a dcsindusrializaçk, a suhcon- instiWcìonal da burocracia do Estado e em parte, e um tanLo paradoxalmene.
FLÇ1U tiIacuna[ ctc, e1c.: u exj>msiu eoensiva du mercado cre paralela pelas próprias políticas do Estado no sentido de devolver à sociedade civil
t uR \pmSu iueasva co'o a resene dereciçu do produius de consuuo competencias e funçôes que assumiu no segundo período e que agora parece
um i.eUu Lhalunu (la urunde I)O(1UÇU cm massa corn o obectivo de !)I(11 Ver estrutural e irretnediavelmenLe incapaz de exercer e deseinpenhar. O aumento
J urizaçiu du' g1ts e o anniento das escullias: finalniente. a nierca- du autorilarisino, na turnia de ruicrodespotismos burocráticos da niais variada
e a liiuli aç ìo da inlurinaçu ahicin perspeclivas quase intinias à ordern, combinado corn a ineiciencía du Estado, tern urna cunsequncía
P&ilítìCa
ic dtàu aargadi dt capi tal ainda niais global E que a teoria do contrato social sígnìíicou setnre que'
lu!dade. mesnio
u i ncÍpu raìslruìaçes lIlela5 A ema-
da cuinutiidade aravessu relativa, devida au Estado se destinava a munter a libcidadcj
lc ;JI1açau da cuiuuuidade, ohiida no perludu anterior aravés do tòrtalecrnentt> e seguranças pessoais posslveis. Numa sítuaçio em que o Etudo parece taJ1lo

de clase. parece enraquecer de novo. pelo menus na tìuuiiu que


n1IiS classista quanto mais autónomo em
relaço às classes, os pressupostos
Rkj ira L1err uierìtc i\ classes irabalhaduras cunjinuam a dilerenciar-se da lealdade cuelo pela hase e os chamados novos uwvimentos sociais sün disso
n-iesmu Sintorna eloquente.
iL-Ifl1tuerO. em esOatus e tiaCÇC5 cada vez niais disUffla, tanio CIII leFinus
da ua b;c material cornu da sua lógica de vida; a classe dus serviços atinge Todas estas transformaçöe parecem apuntar para urna desregulaçu global
IP}LS seul precedentes as orgaFlizaçdes uperàrias deixam de poder contar du vida económica, social e política. 1a verdade, nenhum dos princIpios da
cum a kakiade arautida dus scus uenihrus (cuu ndnìero. alias, diminuì) e regulaçimo. quer seja o mercado. quer seja o Estado, quer seja a comunidade,
l)c dca ì)ude necocial lace capital e w Eado; as práica de classe deixani
;it parece capa?. de, pur sì a regulaçüo social em situaçiu de tanta
só, garantir
dc c u dLuLr cm Políticas dc cLasse e us partidos de cquerda vêcnse turçados vulatilidade, ìias o que a articulaçilo de todos eles no sentido
tuais trógico é
a iEU1 cuFitcddu deukgico dus seos progriinas e a abstraclizur u seo tie colivergirein nuina nova regulaçàu
parece ainda mais remota. No entanto,
la] em paaleIo corn tuna certa descentraçiu das priiicas de classe e conio bem flota Claus Ofe, esta atmosfera de
desregulaçàu, de convwlcìo-
l__ d; I)ulítua, Je liarihuiçiu de recursos em que se tiriliain cristalizado (de nulidade e de flexihilidade au nIvel de várius sectores da vida colectiva
coexiste
iUc d ìiáximu exeFllpL o Estadu-lrtwklência), sw.erìì iiuvas prúlicas de coIn unJa atiioslera, igualniente espessu, de rigidez e de
irnohilidade an nivel
LtN1lì/ai.ãu 1cía[, us nuvus nuviinertius suciais orientados para reivindicaçòcs gIO()aI da sociedade (Offe, 1987). ludo parece negucidvel e traiistrmível no
})u. i}atcria]itas (a ecultia, antinuclear, u l)actisr1t): au nesnio tempo. a nivel daempresa ou du familia, do partido ou do sindicato, nus au Inesino
tc'Lut)Lta teta nus dois per(udos untepnes de que u capialisino pruduL tempo nada de novo parece possivel an nivel da sociedade nu sen todo ou
du
I'L agora 1 u}l)lcmetttzda pela descuberta de que arnbni Pudt u fossa vida pessoul enquantu meinbros da sociedade.
d c caçi 'c011t C ddcrençu racial (dal u sexismo e os niuvinlentus leudnistas,
da( tn t

u racisulu e us olovimentos untirucktks). Cuino diz Huherinas,


distrihuiçàu cedeni lugar
o IflOdo dominante de assegurar material e inslilucionalrnente o aumento
das escolbas luz corn que, paralelamente ao aumento das
eculhas, se assista
a pulii JcL5 de às políticas sobre as grunidticas das à dilniOução da cupacidade de esculber. A criaçào de urna duda escolba cria
1L 1Ull5 tk '' ida ( l)- I : 33
u inlp()ssibilkla{ie de escullier nào a ter no nonlelilo seguinte. Por
nutro lado,
m]ac1u das traEìslurmaçues ou uieradu e na coinunidade subie u
( t no tilli dus ìIlolapólius de inlerpretaçiio (tin l'umilia, da Igreja un do
Estado,
1 du 'tado tein ssln enorme. embora se deva
ILt)R I
ulientar que as evado u cubo corn êxito pelt> puiadigrun da tnodernidade, nun
I
parece seguir-se
tEd]l[OE EÇ.'s du liado ucurleni. em parle, segundo urna lógica autónoma, u autonomia de ilnerprelaçào, nias antes a renúncia à inlerpretação. As suciedades
1H jWL du () F\tadu lacunal parece 1er perdido coi l)rle a capacidade capitalistas avuiçuslns parecem bloqueadas, condeisadas u viver
I .

do excesso

(
s9

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Lf EUF1} du cumpriinenlo (JO pojeCto da nudernìdde e u canizar 'ìun pretensamenic au sen serviço. No emano, a modei-nizaçu ciendficu4ecno!ógica
1occsu d: esquecrìentu ou de autotlagelaçao det e neoliberal paraduuimenie, na mesma medida ein que alasra a
alastra boje,
icI)rds sua crise, certilicada por aquila que parecem Ser as suas cunsequêneas inevitíveis

Eie cxcesu e este déI-ce est> bm presenIe Ik) mudo cuinu hoe c o agravamenLo da njustiça social aLravs do crescimemflo impamilvel e recíproco
flU, CEt U paar da elnancipação. Ao cunrrio du período uneritw. eni da concemiiraçio da riqueza e da exduso 1, tanto a nivel nacional como
a nivel mundìaI devaslaçäo ecológica e desruiço da qualidade
e dices, netc
a cIa a
que ntuU Urith cuniabUade paiguaduri entre eces
vv-e mesmo da vida no paneut. O inconforuismo pelaffle
susentabilidade da
pFRPtb curn igua' nensklade uns e uuros. e Mzìio de (8 é hem e

fEuu d'su u ìIrir, pe prinleira vez, que a nquezz da ocedades estas consequêncìascombinado cou urna crítka aprufunciada da cpisernoIogia
LXLR V çtI CUE1SfltU Ut1.I base inígU de CgPiiIÇãO. A cotncnçiu LIa ciência nmderna esni 1-moje a contribuir para a emergência de um uovo
du cuJmt sìbuJiza o princípu dc um prceu de egIaP1tnru paradigma. a que nonio lugar cham& clência pOs-moderna. ou melhor. o
1E dUS d erucipço iideur u qu vem cuImhr, nu
a
paradignia de um conhecirnemilu prudente para urna vida decente (Santos 1981a;

hn d-;,th dc uie11m, cum g1uba revuçäu UCI e 1989)


L crise kic de
-' n -c n deì nc a da i k sia da pl it ne h hris Nlzis An nivel da raciunalidade mural-pnftica, os dileiias do erceìru período
-,c_ J) tun ];RJu, u d e11t-cipaçiu parerc.ln huje idu
esota(hs
eIe íimdaiieinaImene quatro: ein primeiro lugar. os valores da niodernidade
n. é u lne'fl1(), itìccdus cm mçìu cxigêncas cada vez nuis conio autonomia e a subjectividade eso cada vez divorciados
vek da
lais a nais
LLFEL ucìaL pur eu1açu e da desegulaçu ecunómiu e latin das puiuicas pmmlíìcas. cono do nosso quotidiano, apesar de pareceremim
5JFU LFdu, linse aeuuìuando o sinai de que e nlio lui salda para essa e5ur aL) mosso alcance iniiniias escolhas em segundo lugar, a reguIamneuiaçio
lai. peIn mens, piusihilimiade ealisum de imaginar una sivaçimm m

jmir(dica dz vida social aIimeniase de si prOpria (urna regulaçio dainio sempre


ad a]mnemmte mmmva
miiciii a outra) au mesmo lenpo que o cidadão, esinagado pur urn conhecirnemito
la smuaçiu dúplice m lmmmtularnmem1e saliente au nivel da raciunalidude uridicu especializado e hermnmticu e pe'a sobrejuriditicaçilo da sua vida, é
em.amlJmm-msuelaL {_) LmmImpromnissu industrialmilitar do desemivulvimnenu levado a dispeimsar u bui senso ou o senso Connu Corn que a burguesia no
Liermm[icmmmec1ulmgicu e
us erigmms da prulifrmaçüu nuclear e da cthísrmmíe século XVH demnonsrou aristocracia que lambém sabia pensar. Em teiceiro
i

ctm]lliica daiesmItamies iu sintumna.s basummics dmi cumprisenLm excessivo e. lugar, e Culla> ben aponta KarJ-Ottu Apel, a mnodernidade conliiou-uos nria
Vmt1mm mr-actual da ameitmalidade ins1rumnenuI da miioderriidade. A hegeinunia éica individualista, una rnicroétìca que itos impede de pedir, ou sequer pensar,
dcta acimmalidade iracional signdica simiiulaiieamnerte u sen esguiamneno na responsabilidades pur acontecimentos globais, cornu a canistrole nuclear ou
medida cm mIte. euhimiada cop-n as eceilas neoliberais, se trwislòrma numna ecnkgica, ein que todos, mas nírguémn individuaIindamnente parece poder Ser
lmic de dmmEminmçiu e sk rcguIaçliu a uve] mundial. A ìdeia de ii de:iimaçn epsrnsahiIizadu (Apel, 1984) Este imnpasse ético reside em que se, por urn
m.tI)ta esa ambiguidade. Emn voga lus :mmn.s sessenta, cumnu mmlXr1e
hi'mi ladim. a microélica liberal é inadequada para responder adequadaimeme ms

ìtlsmm]e elm tIn ìiIl)e(ialnj1m) imule-amnericanu na Ammmrica laima, a sioderuizaçiu exigmmmcìas étiCaS da nova situaçuio em que nos encoitrarnos. pur nutro lado.
'. Ita ,Lemmr;
t ù hala, eu- segunda geraçimm. process! de 'recmstuçimi' da mmm ainda substituida por nina macroética capai de conceber a responsabilidude
mIiO tui
lammmmp (emnm]
Lesie. Ein amiibas as eraçlí-es mmmammuin imuaclu
e de sen mm da humanidade pelas comisequncias das acçöes colectivas ao nivel da escala
-aumcme] redummr e excludenre race ideia anleriur de mimudernismmnm na medida m
p h ne nu i a
cm ILmL elimnim salo da aulununila dus prucessus
mm
ciais e politicos nacimnais Mas amiib&mn aqui há sinais de luturo Do colapso das formats élimas e
mmm mummmdtm meims desemmvulvimls e us subjuga aus interesses dus países cefimais
u )emesm de mum laver ouru modelo de desemvmjIvimiem, scum u
jurídicas libemais perante ulguns du nuis .sdrios problemas cou que nos
lm

egtmmramm sit, uculia (sii


lacio decisivo de que quando este IU)delu
que
mm
curmlruntainos - da exclusún social Chernobyl e à Sida e do racismo a -
Cumneça a emergir un nova naiuralirnoassente num puva cuncepçio dos
f a:midm
mm ms luises ceurais miau ]mavia
m
cunar euifl ms dretus hurnan&m' do murcio dos poyos a autodttermmnaçio e unna nova
.

eLmnm1]mn. tIe aíse.s mais desemm,ulvimins du eles


ìdeii de solidariedade, simiuftaneamente conc ..pjaneuiia Cmriosanmemne,
.
li Em e a ms lice m mm ac ismami a e exelusi y sum i da mmuderniaçsm Ernia m
i55Í el estes sillais de nia itv8 ética e de urn jnovo direito ksuim relacionados coi
ILtmm mn values limdamiemitais mia niuderimidade ravés de processus de rack .mlgtmnias das 1raìmstumiaçes as nível do f5í1Ìi5í5iU d increado e do principio
Ieimimmadu em Immiçim.m mia mlirmnaçiiu desses vaisres C aceiuEiaduS ila cornunidude amis assimialamlas. Por nu lado, a explosìo du realidade uiedìúica

smmj
I

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desenvolvidos pela
e inunflUCiOfla torna possível urna cnçi. dicnmu- ma aiargda.
recurso
rdlZl7dade
9S instrumentos analíticos, políticos
penso que o que quer que
e culturais
da inodeniidade
laite concluir
adu, a retracçio simbólica da produço tace au consumo pode vr
9i5a). cit
ior uulro ( I

niI) pode ser concluido em termos modernos sob pena de nos inantermus
a trduth-e na reduçilo da semana de trabaho, aths cada vez mais rechmada
prisiuneiros da mega-armadilba que a inodernidade nos preparou: a translormuiçüu
peh; sndc1mo eurupeu. e de ta reduço pude resultar urna maio dpo
imicessunte das energias eunancipatórias em energias regulatörias
Dal a necessidade
hhUade para ciividades soc1rnenie úteis e para o eercíco da solidanedade
de pensar em desconilnuidades, em mudanças paradigmfticus e nao meramente
Put iiìo. reiiaìdde
eiEicoepressiva é talvez a que condeima su bpa rad ig n muí t ir a s
ier siluaçäo presente e ponanto. aqucia coi que so nis
anUflomRiS da
O novo começo dado pelo nome de pós-mudernidade e a anúlise de
tOe us nais do fuuru. A alta cuIiva iiiodenusi esgoouse e a aíirrnaçäo
alguinas das suas imnplicaçöes no plano politico conslituem o restante deste
tk que nio ucedcu é desnierìida diarinente pe'a dstracçio corn que é
tiLt

cumpiWlu Antes, ainda que brevemente, a questan de


purém, pretendo tratar,
cuFocrLpLada ou peu preço por que é comercializada A luga do mundo a que
saber em que urdida a sociedade portuguesa pode estar envolvida pur essas
AduHu eundenou ( 198 , por rni cornpreensveìs e honrosas que tenhwn
implìcaçöes, seudo cerro que a anlise precedente se conlinou as sociedades
du ts suas razöes, é insustentável nuiiia si(uaçio cultural de ceebraçio
centrais ou capitaIitas avançadas e Portugal nao é certamente urna delas
irmatva inda que supedicial. mas profunda na ua supertìcíaidade. de
ifliI1jt( ainda que de maus infiniios rio sentido hegeliano. Nas suas inehores
ei-öes uquìeCua pósrnoderna reve'a bein esta situaço
Portugal e o desailo da pós-rnodernidade
(_), sflas de luiwo eso
convicção de que esse dtíice de
na ciesceni
flhlffldu irremediável dentro do projeclo da rnodernìdade e de que, portalito wuu
A principal tese desta parte é a seguinte: a sociedude poittiuesm é
d )pLU [adic:a e cada vez mais inc()to[íve entre enfreniar a possibilidade
soeiedode semìperifrrìca. A espeeficidade
compk'ridade das suas cuiu/ìçòes e
dc etc ruccu estar exausto, incumpríve no que dele nio foi ewupridu alé
etuu,uùi. wìuìs, ¡lka
e culturais crian urna du1a exigê,iria: ( I) nu
i!,UhL UU ctiuIiuuar a eoniar na sua possihHdade de regeneraço e de continuar
/urnmulaçäo de a/guns das objecrivos de desenvolvimenki devE procedE'r cul
a esper pela sua cumletude corn a iiiesna detenninaçäo Coin que Samuel
se u projecw da modernidude nao esrivesse ainda campridu ou luìo lì m'esse
RLLkUlt TIOS ensilia a esperar pur Gudut. Esta upçio radical veai a ser desenhada.
I1U dUIflÎ() da rciuriaidade esréco-expressìva
seqz4er sido prw r',ri causa; (2) 1W coFmcrelìzaçdu des.ses oljectivus clerc ,ìat(ìr
desde finais da década dr
tie principio (para ria de agum modo mais itira/ do que para as sociedades
e-ima e orados da década de sctenIì sohreiudo nos Esu&dos Unidos da
¡\ca oiavs da er(ica radical do cìor modernista da norrnalizaçüu e do
cCnlrais) de que
que miau
r) prrjeclo da modetnidade estd historicamenie cunuprído e
ha a esperar Jete o que sO urn wvo paradìgma pode (anuo pats(veL
Fca]-o10 do expressmisrno abstracto na piiiura e do estilo inernacionaI
fl1 dojuilcc!0ÍLL (PUO hem nota Huysseii, esia erftica es'ava j preseroe na É sabido que a ordern económica mundial uni o sistema mundial de
/)iuJ ¿fU'ïü/i(Jfl de meados da deada de cinquena Uuyssen. I 946: 6). mas 1
Estados tern um centro (os países capitalistas avançados), orna periferia (os

\Lu ])-&}greiv-Hflefl(c a LSsuElIìr-se como expressüu da eXaUstZi() global e países do chamado rerceiro inundo) e, entre ambos, umna zona iriterruédia muito
1F e'ersvc] du cûLlun modernista nu cinemi, na usica, no teatro, na pnUii-a heteróclita onde coube a niaiorìa dus países socialistas de Estado da Europa
t uE rquirctura. Aliis. a iquilectura snodcrua exprime corn eloquncia de le,ie e os países capitalistas semniperiléricos, tal conio Portugal, a Grécia,

a exarniu imbó1ica du consumo lace à produçilo que tinba servido de Suporte a Irlanda, taivez ainda a Espanha. isto para inc limitar a semiperileria no
a tudu tuncioitalisruo da aquilecwra wodernisia.
ti
cIliltexti) ruropeu. A qtiesluío, puis, que se pe a nôs, portugueses, nao é apemuas
de saber se podemos pensar a pús-mnodernidade numna sociedade semniperilérica
turno Max Weber mustrou meltiur que ningum as antinomias do
Fai
mi-mas subretudo se podemiios pensar e agir pós-modermiarnermie A questuío é
pi iiiudcnddade no prirneiro e mesmo no seundu período do capitalismo
1tt.-Lu da
conipleuca. Por mn nós sobre u nuoderno e o pós-moderno
lado, a discussuío entre
I lihLT mas é sein dúvida qucimi niethur mustrou as do terceirti pemúmdo do
patece ser algo telescópica. discussau à distancia, guerra de miniaturas. Por
Nu etmiammiti enquanto Ilabennas aciedita que u projeclu da mutt-
(lutin lado. t». Tir leluictos da cultura pts-modernu entrain diumriumnmenuc ein nussuis
k n]jh t.._- 4t tilO PutmiLt_Ilt ncumnpktti podi_odo si_r cumnphJ ido coni
casas por múltiplos ruinais de inlormação e até se dirá que a muossa capacidade
pala gerir ou para atenuar a sua peneiraçuío é menor que a dus habitantes das
ti iiiiiti t-ttt:t
1t)57 L -t.T 1tttytctt itT5(: tS?J
sociedades centrais por nuío termos as resisréricias modernas täo desenvolvidas

I
93

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SCUdU cenu que
LU dseusso obre u eulapso do 1ridFfla da
ICS
naiscrucia doue nunca. Ein segundo krgar. porque internamente as reaçUes

Lth e!nergcia de um novo paadgnia surgu nos países capìaUas


dtrnid;ide e a
TiercaFUis capituhstas conhinuarn a ter de se articukir corn relaçes merenruis

a ançadu', e uu c(1t.0 (}ca prtpro desse paíe. nïo esiar iugaI simples, nilo capitaistas, típicas. por exernpk. da pequena agricu'tura larniliar.

.f1LLdt a cusi uu a mporliìr os prndul()S inaieri e Esta acticulaçiio tern iinplicaçies sociais e políticas que nas condiçies prescrites

jUL' fi LJflIh) Lii) CU dee!Iudar e aU faz-Io seii auencdad, pois se


a su o Estado pode geni. Mas, por outro lado, o principio du increado aplescrita
)k' us prodnus niu pude Jtìrr o iexto sc da ua proUuçu? entre nós aIuriias características paralehis As que esti a asswnir iros países

Lr. tlrlu. n' 1rçar-se ó a intar uu centrais. corno. por eseInpu, a descaracterizaçìo das regiôes industrials tradi-
titihui un au de iuvu discuu
reai'e ia(
uIIF na aé a a e ciunais, a ruralizaçüo da indüstrin, a ernergncia dos dinainìsriios industriais
'ta dela [s ILCrUS IiIjCU tÌ>n C ncais, a epusr da economia intormal. ti CresciifletitO acelerado do seiFtw
qiJc C ])i',,ÍVC e»a )i5jY CSa tLiuia jerui1a.
a a dus serviçus.
Nu ce .41L aua[sar a v]uiu da succdade portuguesa au uiiu o principio da cuinunidade correspondenternente heterogdneo. A reina-
}eLíLlt; :crivtIvieni do cpIsnìu Iinkaí-nìc-e a eeri, e
terializaçilo da suciedade civil airavés das classes burguesia e openrrìaiìo
1UE ocìedade onuguesa aLgulis is raços da --- nunca teve entre ii(rs a mesma inteiisidadque teve nos países CCFflrais C
l¼'cR iar;i u que nie servirci du nienu
;) aIutco uifliadu para iado sido a razthr invocada para se aíirm. portuguesa
essa (Ciii e a suciedade cìví
. _ i /d M IL Cdk a]Jì t a i si a vai çadas Cunio suciedade se i peri éric a
L . i I
E o methor exeitrpo
tuta
L

e traca. disso seria o de re corporativo da organiziçkr


« ULUI. p }. é unia sociedade de decnvdvi!neu10 nieruìdiu. cuju
quer uperários. O proberiia
,L
dus interesses. quer prrtrouais, complexo Ixiis,
1I)c uu L'E1a nundia é de rea'izar, nu coniextu euïupeu cru t

por nutro lado, a sociedade civil portuguesa, quando analisada em lerriros uns
Lft rLra. iruerrncdiaçiiu errue us puises ceutruis e os países periricrrs
c?

e.sFruFtiias tainiliares e das redes de solidariedade constituIdas base do


-\ Nc uarcrial dcla puucu ro irurii>
im
ìUraçiir r e dere papel estuve ¿ìé
i

l)rceIitesco e da vizinhunça. parece rnuiu forte ou, cru todo n caso, ruais hirEe
c uia dc prcver que passc a cstar. nu tifiuru, nu nudu ile interaçíiu
t: t

L xrrit.d na curiurrridade europcia. E, a]iis, urna queso ein aber(u a de tIUC as sociedades centrais. Mas nu restarn uhividas de que u relativo délice
dc prttcas de classe riiu sO cunduzìu das políticas de classe,
Pur rur.aF vai c riadidar, ìuiiur nin:r urse, u eu carcier scruiperi Irico
volatilidade
'ahci i

errino tanibérn impedìu urina elicaz institucionalizaçio dus conilitos entre capital
c. c1 crr!ríritr. vai
tJ despruruovidu r perderia ou pruiìu»idu au reiriro
crrr auurceeu Lulu a ludia e esui a acontecer coni a Espaiìha. t) nais e trahalho. Os estrços teitos nus dltimos anos neste sentido lêm sido dilïceis.

}ríLi C IIL "C irrauteuha urrr suciedade serniperiIrrica1 ein boa parte porque ocorrern no contexto internacional de precarizaçio e de
t1exibilizaçÏo da relaço salarial nos países centrais. Duns urbservaçres devem
ru urna das caracrerí'aicas principais Ja sociedade xr!r1guesr
Lcrlre. ser leitas a este propüsito. A prirneira é que. sendo desigual e combinado o
L rrLr.LrTcir[adc rucinu rurrru du. principius de egrirçiu cuino das Iricu.
L

deseuvolviiiiento do capitalismo escala mundial, se veriticarn coni lreuiuêrrcia


dL criaucrpaçiu. () )nhIcípiu du ineicadu runca uiniu em 1rittia a hegernunia
ii

descoiticidências lemporais, como esta de Portugal apresentar urn certo movimento


qiic e rus paiscs ccnrrais. V veu sempre sub a tuea du principio do Estado.

urda te Lr5Lrrlriu íria tìrnìas aR au prescrite. Nus fltìnnrs anus tern-se


no sentido do capitalismo organizado' imm momento em que nus países
centrais o movimento inverso, no sentido do capitalismo 'desurganizado'. A
i taju a tenlat rierluar essa tut&a, mas curiosarriente a iliiciativa terii partido
segunda observaçiu é que, como agora se vê claramente. a inadequaçhr desta
hretudu du Esradu que. assirn, parece cuiidenak a eFurçar a sua lutehi nu
t

desigiraçio reside nu tacto de que Je


tu pr ru prucessu deserìcadcadtr para a eutraquecer Trutae dc urnu taretu de
as características jtistiíicarn a idem

desorganìzaço do capiuilisiiio central terem algumas setnelhunçus, ressalvadas


J1lLrucr r.IiÍCi] pur duns razes principais. En primeiro lugar. porque
ucurr rrLrrrìa si1uaçruirrteniaeìuua__deinundiaizaçiïo du rnercadorii que u
as proporçies, ìlS que desde sempre tm caracterizado a urgairiaçthi du
u Esradu, se, por um kidu, é desprurnovidu da regulaçilo do rirercado
capitulkino nus países periféricos ou mesmo semiperiléricos.

t
flIL n dj dLpinriUrua pur nutro ado torna e a
r R. novo rrrL1 ft Mas a heterugeneidade iliterna io princípio da cuniunidade deriva riiida

da exislência e coexisténcia de inuilas tracçöes de classe, de situaçies de dupla


perleriça de classe e de lugares cuntraditórios de classe corn forte peso social
I

L I Il Llr mIli F
nlmrILII Fl ililtlmk lnflrqnrnml, \II FII1 atriro. : iXOS çwrìrk
e que coritribuern para o descentramento da relaçân capital/trabaiho. conio sciant

1)4 1 95

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u c)efl.flu1 Us t11 us uricuUore i tempo parcd, s pequerios Jiiotiernìzaçi() é, 110 eIfltnt) laisa em inuitas instâncias, porque se queda n»
c)F!le1cantes UuCH}flrit>S pbicus, etc.. texus legais. urdinárius e constitucionas. e dilicilmente se iraduz em práicas
sociais adequadas. E, assim, particularmente desmesurada entre nós a discrepancia
Perante esta stuaçäo. no
surpreende que u Estado punuguês eja urna
entre quadrus Ieais (mais avançados) e prticas socinis (mais rerógradas),
p(}hìCZJ UìuIo Ct11peca. Tenhu tratado dente terna ewn agurna eteiìàu
numa situaÇäa a que nuutro lugar chainci Estado paralelo (Santos, 1993: 28
1flLiU'us ugarCS (Sito, 98b; 989 99) e vuRare a ek corn detaihe e ss).
u qimo cpíuiu. Mcnciunare qu apenas as ir caacerísIicas que juIti
capuio. As lógicas de racionulidade que cumpöem a emancipaço moderna con-
w' e1t:daiiva pu-a us ubjeciivus anI(icus du presente Em prniero
Fujr, heicrugenekiade uerrì dus prrncípio de mereadu e da coinunidade
t
tigurwn-se, entre ntis, de ¡nodo a aprolundar ainda mais a cornpiexidade da
uf 1íOVCl
CgUiaÇ) i1UtÓIR)fla dus ineresse. pelo que u soctedade ponuguea que resulta da breve descriçäo dus principios de regulaçàu.
Distingo dims características principals. A primeira a da dependencia e do
ft1ftL er unìi pFiIuazii total
) -
bre a sociedade cvii, No entan. essa
11]t'UO cerugenedade interpöe b1cuius de rnoiva à numai reaiiaçu da mimetismo, As vàrias lógicas da racionaHdade êm acoinpunhado, cow inaiur
du Ftado e ou menor atraso. os movimentos dominantes nos pa(ses cenirals, o que nao
ein parte. repunsvel pela grande ìneticácia deste. A
gi-auLle prwaza e auRnuIlIia du Esudo na urrnuIaço das poi(ticas coecisein exckii a irrupçao de momentos de grande coniernporaneidade e iiwvaço coino
oT a uandc ineiicácìa e dependncìa na execução deia. pur exemplo, wuitas das niciavas cukurais tornadas possveìs na crise revu-
lucionária tie 1974-75. A segunda caracterísÑa é que o padiào geral de
Em emdu lugar, poque nio em sido pu(vei üicorporar as ciaes
dependencia e de irnitaçäo se anicula ou se justapöe a racionalidades que o
t itrraduras io siteina puiftico atrav de Lranìzaçöe sindicas e puiíica
paradigma da modernidade convericonou chamar pré-niodernas e que %Au
tnrL e LuItúft)rna?, a denucraizaç) puiftica do ieina loi sempre restrita e
visíves, tanto nu dumnio da raciunalidade cugnitivo-instrumenlai (os saberes
C>p1Li v-ia? Mesmo nus períodos democráticos nu loi poível
VCZCS.
populares, Eradiçao oral, o riqussimo e resistente senso conluin, o artesaflflu
:i di:r ti CI1CTCIE1O C O Psiadu niu e compromeieu Corn O beITICStar da e as ecnulogias rradicionais), cornu nu domInio da rackmalidade muraI-prdica
-Lo\c, pL puiares a P"°
de se pudei cLmsìtuir rìuiii Eìado-Pruvidineìa. PL
direiws curnurtiidrios, a força social da redes de solidariedade baseadas
au,
F1iu turani atc agora resolvidos dois dus problemas que u prujeco
kus
no parentesco e ita vizinhança). cornu anda no dominio da racionalidade
da nEuderr}iJ-de Culflpiu. duraiue aigt.un tempu. flL ae centrais: us pnbierna estiico-expressiva (u aue e a literatura populares. as Istas e as jomarias. as
dd dtlhWÇ e pnhlenias da 1eïicrazaçio pulilica do siema ixiíticu.
procissñes e o turismo reliiuso).
IIW [lado u lado em uuuì acentuada caracterísca auoritára. a
qt.iai en wudu au lungo du tempos várias tòrrnas. A úUirna É a iu deste lUud que se deve, pois, deterrmriar a nseiçao de Portugal
hastaine
diva na iida en
iue ien seineihanças sìgiíicativi coin a que teiri
na discussao sobre u tuoderrudade e a pós-mudernidade Durante a

e.;idu a a,unir u .tadu nus países CenUas. Sluan Hail. tendu coi vista u revu1ucitmára que se seguiu au 25 dc Abril, torilou-se a certa ahora iilar
subdesenvolvido.
(islt1uua '1)upulilnu autuñiiiu", o quai consiste em u a ìdeia de que Portugal, apesar de ser unì país relativamente

I C ecei Liul ;der awuritíiiu qu convene deuiogicarnenie ein governo 1)odia escapar às várias lases por que pasaratn os pa(ses centrais e ttltrapassÎ-los
du poyo cuTura o itadu 1-1aii e Jacques, I93) De no 'e irna de iac, na caminhada para o sociaIsmo. Era urna versâu ngthiva da teoria do deseo-
ataL:u ladu
de dentro do E'tacl{), OlaS ost de alacar o ue no Estado vulvtetito dedgual e combinado que Trotskì tinha elaborado para explicar a

Revoluçan de 9{)5 e depuis a de 1917 num país atrasado conio era a


L' p(}Uticas soLiak de dsribuiçu i favui das classes populares nu
])t idu do ci)izLln1j riìganiadu. de efltàO. Em ace do tracasso dos vários projectus sucialisias em conmto
durante esse período, de 1976 cajo-se na ideia oposta de iiue PortugaL
a partir
erceira cai-aeedsìca du Estado resuiiame das arneriures é que, dada
A
sendo un-t país relaiivaiuerite subdesenvolvido, tinha de seguir, e com 1juat
a flWêpCde elementos arcaiiautes au nivel du mercado e da cotnunidzrde,
uleRos aulonomia meihor. as pegadas du desenvuIvinento dus países centrais.
a n inia aUlunu[na C o autorjtansrfl(} do Estudo tain idu hequenlenierne
Era urna versiu ìtigrtua da teoria da moderrdzaçao. numa dus suas verses
ados para promover o listado a agente de inodernizaçu da sociedade.
Essa mais populares, a da teoria de W. Rostow sobre as váras fases do desenvolvimentu
Ru5t)W, 960). Estas posiçöes extremas parecem-me ambas erradas. Em
sociologia e política o que acontece cedo nao acontece, tuas o que acontece
so te çv çs cn . uadui. r
e tarde tïo-puuco acontece. As diierenças qualitativas entre us vthias zonas do

9ô I
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díferene das sociedades centrais é sinai de atraso e deve ser
''tLU1 ud u ceiU-n, )tCJZ1 e SepeIi(eri) parecein huje reurse. poi1uUCSa é

C(t)CfiÇk) deieç erradicado no processo de desenvolvimento. A contabilidade pufunda da


1TI aS de grau su cadu ve mais chucnies. Na
eidçes dee flna du cuk, uet priìiordil da Sociologia
j sociedade portuguesa esta ainda por fazer No tempo da ditadura de Salazar
c iiosr
(IL d-euçts de gíu s.ia ;u1a1vas. habiruámonos a contar tudo a débito dela, ji que a contabiiídade dus créditos
Effi vk tUstu, pi,ce-iie ncei-io ciicir uiuu via iiteriitjzi ernte
imbu sido apropriada p&o ditador. No 25 dc Abri foi possível fazer. ainda
que amito à pressa e corn alguns erros de contas. urna contabilidade dernucrtica
eXRllH)S A iinli puçio é que u .)Ciedick tern aùula de
I)/! U Iiu us /)!J/flea.t da iriodernjdade, dos crtditos. Desde 1976 que ternos vindo a deIizar quase insensivelrnertte,
lfl:is (ein Ie -- (.umprir à
pata um novo pessimismo contabßístico corn a diferença que agora nio h&
/(/1U Ja Ieúiì« (Ja Ill(kIetfli:çù() t)eEi uço decortern duas ¡inplicaçies
cuino nu tempo de Salazar, e felizmente. urna instânca oficial de g}oritïcaçiu
JflL1JXU A que as ¡)t)1]esa d 1()JCtUkJde t cuiìprr ioni de
LLÍI}[1Ja. )nmess dos crédio F urna situaçàu que tende a reproduzir-se enquanto dominar o
CUfl emergencs d j)Ós-Inoder-
tJak ..A n, ctmn rás den. as dtia njs nporanIes proesz th
principio du modern izaçïio.
i th CUflIpiiF Sit) pfl- Ì1 JJo. teoço ptbetas d
&hH Para combater esse dornmnto necessario anabsar. corn objeciívdade e
d] F)Uçiu {lJ
-'j da'. JciuddjeN tUe dcxjni aFgu etiU da JJIkÇio scm complexos. as vantagens comparativas da sociedade portuguesa nurn mundo
i[(I&]1 da Ude UC uiiia vida decente ou sequer d sbrevic) em mudanç E preciso admitir, como hìp&ese de partida. que aluinas das
Jh }[E} )ÍUC do sen píco CuCrúucL) (UU características que distinguem a sociedade portuguesa siu inirinsecaniente boas
',c. i UtU LrU 1)t;ÍVCJ cises poJuHes J) e devem no processo de deserwolvimeno. E aqu que reside.
ser acauteiadas
IltflU puutku u que iip]e endcaçu du cieneUri, di perurndiìu, de reSto, a coiflribuçiu nova que a sociedade portuguesa pode trazer au
LJ c;rrtpçk e. rn gerJ. d prv4tticu da cIuçio do Estado paradigma emergente da pós-modernidade Tratase, no l.rndo, de ouar peiisar
pur pi î de ias uu ai pur pacte ds própis tcìítus do que a suciedade portuguesa tern algurnas caracLerísticus, por assiin dizer,

pré-pós-modernas Eis a seguir tdguns dos u5picos que podein vir a ser discutidos
-ique dest pt(1I1Cs deve, no çcr cuiuprid en cuiunçiu neste contexto.
utjIrneflo iuinenI veeiente, di pr1Iess
da ps-iterndzjde.
jìcsi
L J

Em prìmeìro lugar. a sociedade portuguesa é rica em tecnokqias


i ¼L i±iJ a drbuço deve er cuniptkk ein COjuiiçiu Coin
ainiliares, tanto materials. como
civil

simbólicas, e em formas de sociabilidade


p }i]t uiL 1uins de vkja (ihi ecukia paz, di satedde Como
1 1UC 1;na ¡L uukjde .exoa r a rtflei da eioctitzaç5 do
tacea-tace baseadas sobretudo no parentesco e na vizinhança. rthri no
poruiguesa é fraca, isto é. atomizada e
,,I 'cuìa po1íko deve ser cuinpd{ia em Cufljt1i1çti cOr1 ii11pzço radizd do
capítulo anterior. a sociedade civil

1ç_Cu )()ÍÇ tragmentada. se a julgarmos apenas pelos padròes e cormas de sranizaço


iC C, CÉJOI pruii}esss da den1Li.craiizaçìu
FadJCLl da \h 11esoa]
¡ncessunie d e Colectiva, do
cmpos de arrgent dominailies nos pulses centrais. Pude, ao inst*conceber-se que as suciedades
civis dus puises centrais siu fracas, quando julgadas segundo os padröes e as
t fl] Li)iÇ a
er cuinp-ítuLs podcni
)ICCU]ìeJ1je fl4 a concçr ¿i

L{ÇU CUlle 1 diiiicrc rinas de organizaçäo em tjue a sociedade portuguesa é torte. E fáci' construir
C)reseiitljvi e a (Ci1I()Crcji j)ItC1)av ()I1
:Li 1inçio ocidia peto fìflCpin da iiidernzaço, puis,
t
tetnio
o contraarumento de que se trata de arcaísmos pré-modernos, tradicionais e
retrógrados, uo admirando por issu que tenham tiuradu entre os créditos da
L.]1LJR1flU fltu (MeOh CS(iVj&)S os prublenias
niu 'z-z sentido ierndtde,
siqLFCt us jibJerna da JtS-t!der1dade. ste principio, qu
contabilidade salazarista. Admitindo que nein sempre é fácil distinguir urna
é buje
LtunnR.-U COtIC UáS C IC doptadu tJntt) ptIo Etado, corno petos pi:tidos posiçat) retrógrada de urna posiçàu progressista (au contrário do que pensum
JC c de csquerdi. s( poik-nI Cnndtzir os dogmáticos das várias cores), há pmcedimcntos analíticos e critérios políticos
ni bJoqueauiento d 5uCicthid
p H flFCUCS Rm CieSCCniemelIe ifled(oCre e estúpidi. Iiii que podem ajudar b distinço. Turnemos, por exempki. o caso da pequena
agricultura familiar ainda importante entre nôs e dita ineficiente, retnSgrada e
A segunda do da nuderitìdide revei du condenada au lixo da história pelos adeptos da modernízaçào, agora entrinchei
nnJ çìu é preciso coinbuier a dekL de que tudu o que nu uciedade rudos no poder. Scm dúvida que é retrógrada, pelo menos, em dois poI1IOS

em prirneiru lugar, representa dorninanternente urna estratégia de subrevivncia


- VL' LHe (rç-. er at. tVtt4 5t; et at. et il. t t992t.
que raramente chega para atingir um nivel de vida decente; etn segundo lugar.

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wu urgir-i.çiu St)Ca1 parcuamiente dorninad pe'o poder do pararcado
dus campos da acço sociai e politica (por etempio, a distinçäo entre o público
t_'_ pt(}U peEa dcsgudade sexua' e pela expkraçäo do trhaIho infanifi.
e o privado) e dus universos simbólicos criados pelas diferentes lógicas de
Scriz. nu erìanu. concebível que a pequena agiicultura familiar fosse rackrnaIdade nao sejarn tao vincadas nem to rígidas quanto nos pa(ses centrais.
enveWUa, a parth da que existe, e de modo nÌo sO a neuraliza a sua
ntakfaik -
transtormando-a nunla esratgia de afluência e de qualidade
dc vida c dcuiocraiiiandu as suas prtcas produtivas e reproduvas mas -
A cultura política pOs-moderna assenta, precisamente, nesse quebrar das de-
marcaçies, e ueste campo podemos, pois, er algurnas vantagens comparativas.

E1)m a iamiar
sua putenciid posivkJade: urna vida activa e dversìtìcada Fnalrnenle, u terceiro tópico reside no facto de a hegemonia mitigada
CFLL1/dL Cfl XItC tR) a hVPC e em co!11unho con a nawreza. urna deuIugra do principio do mercado, entre nôs, ter cornu consequência que a amplittide

Lk pruduço hse.i. ciahncne iti1 e iüu nu lucro e arunda ctrnlia os das escolhas é menor na nossa sociedade do que numa sociedade central. Este

;t e'us dc 1)-oduç) C de pdu1vdade. Para ue 'c no pense que se trata facto tern, obviamente, um aspecto negativo: cria monopólios de interpret aço
u;içu MThpSta, cui a ¡opóiio mcnconar a reenIe curiosdade dos (da igreja,do Estado e at da famíiia). Tern. no entanto, um potencial positivo:
tk Paridu dus VC-(k nu Parlamenio EuoI)CU pela pequena agricultura u de permitir urna política menos centrada na ampIiaço das esculhas e mais
1rucsa, elo
ucla alguns tiçus modelo dc agriculiura eles delendido l)r centrada no tortalecimento da capacidade de escoiher. Assim, talvez se evite
ct JC1 sk clorii gríria euru)ca. Segundu eles, as vm1agens que a anipiiaçäo das escoiltas redunde na trivìaiìzaçäo das escoihas e a destruiço
1( l]heida ua agricultura pur!ugucsa precisamente dS dus nionopóiios de interpretaçäo na renúncia à interpretação. conio tern viudo
Lfla nlhor t]lklflle dc viEla el cqulíhrio 1UO I)r()P()[CI CiU[C
a suceder nos países centrais.
il-]li LiflU C tr-ahalhu rural, ajudar a lixar a xpulaç nos campus e
lI1)edu a da cdadcs, ìu
slsrur u nicia ambiente e pruduzir É fícìl, dentro du paradigma da modernidade, desacreditar esta inha de

riii1L tlancutc eitara!u u prullcrna dus exeedeutes, arguinentaçäo. Habermas dira que cia esteve presente nos jovens inteiectuais

',rtu. lnììa ns u da dilcl tiar da República de Weimar (à irente de todos Carl Schmitt). que pouco depuis,

'.ntia eSte ju de rgtiieinaçu. e iinda nais eunvertla cn e cotti ntaior ou iienor cinismo, se entregaram nas mios do Nazisiiui (}iaberinas,
' etas A is u Pt dt ea grLt1la e n curs vd igressi vaine ute
I a c a e . I .
1985h), Penso comodo que, como dix 1. Arac, irnpoilante cunhecer a ittssa
I

-,t t dc dest ui a cquenLI agilen Itura laud ìat As d i 1icu1dade de pe n ur


L r I . histOria. mas igualmente importante conhecer a nossa dilerença da nussa
u ELUU lurLufl cuìpre grLuldCs etu Purivai. é hun que au tiiel1u. SC vi iis ltìst(ria (Aruc. 198(: XXXIV). É esta também a buse para pensa que esta

1LtL1LLtl0 t]LIC llcÌedade plIrluguesa d que l)esr.


I inha de argumentaçào rdo tern pejo de se atìrrnar nacionalista, porque conhece

( ) tú1)icti Lt (I Sc u! u ILL CL )ILtCXt u da l)1s- ritt Iticluidade


c ta nt i L a deia LS ILIZOCS que a distiriguem radicalmente do nacionalismo reacciotiírio dc direita.

IL tILLt LU purtrltztIesa
MC1e1ILKIC vai ser fleVi1hCl ttlC as prtìcas p(}iítLClS À luz desta linha de argumentaço e do quadro analítico de que cia
_\ t(lLl L\ iLL dellLucracia represcIltaUva e dus paludus) se Luflplìeflt e decorre, pode conduit-se que a discusso sobre o paradigma emergente da
.ULLI lllCLLL CLII liiditlgu C dO pLIruiha CollI LiS prttìcas políticas iiuvas' LlS da pós-modernidade nilo só interessa à sociedade portuguesa. como esta pude 1er
dtELlueracLa Ll1eq)LltVH e tILLS lutos Pfl()Vìmefltus -5()CJ5). u próprio Ais. um papel pnprìo e significativo nessa discussäo. Será scm dúvida para nús
tttLLttlLLefltU niterind(IRI StISCitLI t) CUPtu-CtlCLlitO entre a ILIU1 pelas levindL- urna discusso de oscilantes gesrahs. Por vezes. parecerí urna dìcussÌo toles-
lÇULs salLírius deceiiies e segurana SuCiLll e as rcivnidicaçes
lLLltClltli5 cúpica e att esutdrica. algo que se pode discutir desapaixunadamente, tiño
LE)lLLLL!CtlLS (a ecok1gLL, u arititiuclear, a guakiade SCXLULI e ILlepal. tudat elas, porque dominemos os termos da discussäo mas porque. beitt an cuntrrio, estes
llLj\, IL)LSLtI de L1ateriLus e pds-iiìalerizus}. Este curt()-circuilL) político, porque nîu nos dominata, iiio nos dìzem verdadeit-amente respeito. Outras vezes, a
t' 51CL' anipiti C(tlìSCflSO COIFC as lrças suciais e l)ltCLlS apostadas na
%llL
discussäo ter o sabor da intimidade, do déjà va, e gerará, até, urna certa
Il 110.1111 LtLlÇitl. paleceria reciitiientiar, entre outras coisas. a unidade orgânica
incredulidade sobre a necessidade de discutir e sobretudo entre nós. pois.
dilLIs centrais .SfldtCLLIS. a cohgLlçüu Jo partlu socialista e do partido
.

d,L-
urna situaçio líquida max que, scm dúvida, transborda para dentro.
CLLlLltllLl'LL C 1 itteraçiiu da agenda Pl1iC pls-niaterialista, lauto nas ccntpaìs
lILlieac CIlIflu uestes ])LlUdLLS. Passo entio a Liflalisar alguinas das implicaçöes no campo das prthicais
políticas decorrentes da concepçäo do tempo presente como período de transìçio
LLI etIlO Ci]CtliIU C IIÏILhI iavurechio lacto de a icterugeneidade e
cutre uni paradigma esgotado e outro cojos sinais de eiuergncia se vão
L]llL'xiteLde da ncedade puritIguesa lacrt'm CUIfl title nela as deinarcaçöes
multiplicando.

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I ara u ma pós in ode rua as mìn-raeiwialidades e a rcsistncin ineihor que o presente. A relaçio eiflrc o moderno e o pôsrnudcrno & pois.

urna rclaçäo contraditória. Nao e de ruptura ioal como quercia aiguns, oem
[lF1cpaJ que aqu Jeteiidere
A ese a seguinte: a ideia ¿nuderiui da t
de linear coittìnuìdade corno querem outros. E urna situaçio de transìço em
I th /(daF da VUI( )Ío/ pessa( acabau por se íIeiiueirar mima que h momentos de ruptura e momentos de coninuidade. A combmnaçâo
ui-iail de ao Nrl'jço de urna £rriwianalidade /ohaI, específica entre enes pode mesmo variar de período para período ou de pa(s
/)( eI I'(flIU')1veL E jxi-síve1 ici#neivar as da para país. Basta por eernplo, díserìmìnar as diferentes êníases do pOs-moderno
ThI d 'ii,du a (/UC e/a. (/exe/n de ser pci-te. de wn todo e pa.senT a ser como raz convìncenternente Andreas
na Atnríca, na França e na Alemanha.
f/IIüífi ¡i-exenÏe. en iiiíFFidas partes. E esta a lógica de i,,zo possiìe/
Huyssen (1986). To-pouco surpreende que sejam grandes as discrepancias
/(-H.1ïth/a(Iil Lie rcsirrnia,
entre os elencos das características do pOs-moderno proposws pelos prOprios
cic,hies esu a passa por rmiïorniaçùes pnundas autores. ihab Hassan apresenta uni dos mais sosticadus e amplos elencos em
'cIJ JLJC flu efflalflu. terilm dexdo de ser capitata. As ciêndas stcs que inclui: indeiermìnuçau, ou ruethor, ìndeterininaçöes íragmentaçäo; desea-
rìu 1Ffl I}1LiU Uc S.d)CI C(flU ou qUUdU o dexlk) de ser e, auito fllelR)s, noIìZaÇo descentraçao e superíiciaiizaçäo; irrepresentabiIidade ironia hibriiii-

.1 k iite riiuu idi tiJ uçjer, e suceder. Em terim de ciénca zaçao; carnavalizaçäo no sentido de Bakhtin; desempenho (pe:twiuwue) e
. Sll1\ òrçdus lIavegu à vsu. 1dllR participaçao; construcionismu; irnanncìa (Hassan. 1987: 167). Mas o prtiplio
[ -ctçiu dus ìmis. Ncie duínu. concIuão mu segura que
F

Hassan admite que este elenco soja coinraditórìo e, tialguns itens. mesmo
'L Uk ui-ar dc]c a du ciaisnìo produzìu dus cJeiti absurdo. Mas os elencos mais restritos e mais organizados tao-pouco nus
UllI}lues: um esgu(oU o I)Reetl) d.i iuxferiidade, pur uinru convencern. Por exeniplo. o de ScaR Lash e J. (Jrry. cui que se iliclui o
.RH. de j t+Iu qw se u[iiiicnta de'e esguamernu e e perpetua udc. seguitìle contra a unicidade e pela reproduçao mecanica ou mesmo elecIrOniei
v/u (lUd die 1)F'uhl' e ti Ibj (UC ÌÌU pude sr pieenc!ikki no cwnrxo
)
cuìilra os dualismos hienniuicos corno. por exciuplu, o da separaçio. leim pelo
d dei'iidade Itu cxIilca que a jujuuçi do capitilisniu. alto utodernìsmo entre u estético e o social pelo pasîkhe. a cul.tgeni e a
Iuu[fl
;

tciu curra de pr coin a íuqueza ieigic de uiuirus Ltieguria pela cultura de distracçäo contra a cultura de cornemplação; pelo
)FitdíI)s C 1[UC, qLklflI{} maiul t e-I Iraqueza, iIaS rracu (e no ifl1pÌCtO c()ntrLI a Coeréncia; pela cultura popular (Lash e lirry, 1987: 287).
}fl1 '.t1ld (k prdveJ u apdo idel)kgkU dus pi.iiiepios que se Pura aiim de cuntnado au dominio da arte, este elenco reduz o pOs-madrino
Uk hViilm uF)lu u )ldl5
-ULIaI51flU. Nu luz sentido cu1iir a a Liii] simples contririu do moderno.
iELJíuthL1L pHV C5h i1lçi, CuflIU ti i.)aiiicl t3eI, pois issu é poucu nais
JL}l() que u estorço cktssificaiörio seni sempre desmesurado em reiaçao
i FVCfleI rdFaçu
a ;lusa/dkto I Befl. 97(: 978 I Fein iizìÌo Albea
.

(UilFRlu de que aus resultados que obtrn°. Para além de que há aio de moderno na sua
hl.(I11]Il1 i fl(1 j)UIC -5C CiUCadtl por er
iFifld terflaliva de íisaçao da pós-modernidade. Trata-se de tixar em abstracto e
pìiicíps
LJ)
purque. u
tic[. tu 5CU,
e
Cir.
tepiin ray
u
Cfl
CI)taI5IflU
1()flI1aSC CU11 us
ialiuu precisamente u que
eus
segundo
moderno.
as regras
O
da separação entre a teoria e
paradigma emergente intersticial
a pratica

no modo
tha caras
COIflO
ato pensameuto
5e dflSa e
L'
uicdade humana e produzr urna
'k}uliE_ladc huni;uìa ncii.s icis
1l,rCVSíVC C Illais uudi-
pensa-se sempre alogado na realidade dus contexos
medida, parece-ute pretèrível tentar interpretar os seus sìiflomas através de oto
em que se pratica. Nesta
1uL1huuaJ" 77: 132) H. puis, ijui verificar mua sìtuaçiu, e esla bascarnene t

ER: U p ar da er1aP1elaç conjunto de seis guides para outras tantas histOrias das quais se poderia tirar
%e lrmslujinuu nu duplo do pilar da regulaç.
rnas CECU urna irtoralidade prftica ao jeito das topai da retórica arístoLlica e perelinaniana
i t! i
I)C15i!1eEO dO da ijeijidade. que cram
l
e u csuu i e vul iic uiri
ìslurpnnrausc coni o dlnío eIH Pistolas
as . ra
Estas histOrias poderu ser contadas e dramatizadas em comunidades educacionais-
qti. cuii.ìu a de \Voody Allen. se derreteiii Cada histOria parcelar. nu mesmo sentido em que. para William James o
chova qui.mdu Cupa cias i

LIi[CfflU. lurçar a m»sa luga (la pI-i5kL


AiirFflu que ti prujectu da iiokntìdade se esgotou signitcu, utiles de tt. N0 incanti MUlIdO. iufl.LOIII Rbciro I95tOi) que. iìo itanto. irna dtoì yjç5
u1\, (RFC C Cufltpriu em exeessos e dtIìce irrepaníveìs. Sth eles que
d(lnstflueln d1ri&aia ItLI. iüiha... Anlaniii Sui.a ROirro prtìerna nect testo tuna da iiiitsirii iOscuLìòec obii
a i'a muettt1)(lttneÌd±de e pwhkiiiOczi da dsti5
3 iitxkrno(pós-usxknio que eo ronheço. O qe nos spu äo as conci L.Òes
deles que ternos de partir para maginar o
qu chcaìiius !itI2 SOIiS tbiro. ludo o qui te de autentico no pmúctiriio eiui comido no
radcs
ji
W Lui L. ULILLL US tdCeSSdUde coja satìsaçäo u 1oniaro dì lèrente e
Li

iiiodcriio pJia inno. e quaLe o conIro. Crc. iLinititin RbeiO ( 1988b1.

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1

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WUl,h3 ChCh) dC hstóna parcehre. que curein praeks urnas As uUUaS A representaço crit, asm, distância e quanto major or a dstâiiciu mais
e qe cumeçam emiínum de vez em quindo' (f969: 98).
o eonhecimento. Au anaisar a pintura holandesa do séeWo XVII,
e
ubjectvo
(j princíu guiso chaina-se o saber e a ignorâncìa. O saber niodeuno Susan Sonnig salicina o modo corno o artista combina a thstância Coin
quando nda voava baixo parecía 1er duas asas guais e um you equiibrado esactdio: "O remoto corn a descriçäo exacth, a descriço dc urna greja real,
;\ nìethd que cresceu veìIcou-se que as duas isa cram desguais, iuna voaw de urna perspecftva real, mas nunca de urna perspectiva próxima" (1987:125)
aEu e dwrnavase vtcçio crítica e a outra voava bxo e chamwase vocaçio Efectivamente. para o conhecunento moderno, o real e O próximo so antagónicos.
ile ctiìcjde. E quanro mais baìt, voava csut sa rnii Itu voaw Ao contrárìo, u conheclinento pós-moderno prvi1egìa o próiino em detrimento
Esta úknia paisou voa io
iEio que tinha du niundo urna vsJo do real, Ser pragmático abordar a realidade a partir das "cuisas
significa
QNcic;a u men, tex
que Hie era ci e Cfl1FVe Sefli-e CIII
I
últimas" dc William James, isto das consequéncias. Quanto menor a dislncia
_u wuiju (uffl u ten1p. perdeu rnerno u noçãu do mundo e. pirtí>, entre actos e cunsequéIlCiaS, mais áci1 e mais necessírio se torna urn s,iher
di ug dele. Ni
SUIf)reeflcJe que n deequìhbrado psro
eìha encaUiadu edificante. Acresce que. sendo retórico, o corthecilnento pós-moderno aspira à
U\ flWj Ck'J d reflexvkkide. O eleito evidente desse oralidade, à comunícaçiu fuce-a-Eace, a qual, corno Walter Ong deinostra, é
1rc situçk) eJieIÌógic em que nos enc()ftrrnu e que se pude em suma, próxima (1982:36) Favorecendo a proxiwi-
situacional e contextual,
,umalar flu CgUifflC: a igIflcu cuda vez menus decupáve e algum
dade, u cunhecimento pósmodentu local. Trata-se, porérn, de tim Iucaliswu
flhCeiu1eflR cd Vtz tuerve 1pnsu, pur e3empIu. flI biu-tecnokga
relativamente desterriioria1iado e, oeste sentido, é tambérn urn localismo
t ua ieur gCflëca). O mudo pós-moderiiu de sjir detì iwaçiu ccrnse internacionalista au jeito da nova geraçio de artistas "ubjectisias' de Nova
Luru Iuir, desine ¡)W dupla ruplura epiternuIógica (Santu,
{fl
f989). lurque, a "new objectistics" no dizer de Bonito Oliva (1988:62).
A i.int-n fl1udLrfla )I)U pusíve a priìer fupur episIeiiìc
e coin
}ve nchi scpiiuu-se du sensu curnuin exkerue. urn accu revtiIucìouíru o ece1ro lupas do guìào sobre o saber e a ìgnorncia pude ormnulamsc
d. Lft{)J pudewus ibdicur. Nu enuiiuu, urna vez reahzada essa ruplura, o desta lutina: afir#aar SC!?I ser ernpUce, enjicar seni desertor. Cuino já deixei
ic( niais u1piUflie é lumper corn cia e fazer Corn que u dimo, a teoria critiCa moderna afirma-se pela uegaçào do nwndu e, quer o
ciiftc liwilu ccntflcu c rns!urie ium nuvu SCfl() CUITIUm. Paca so conliunle, quer se lie escape. age sempre possuída pela "ansiedade de conta-
p CUFII1I o ibcr, ciiar sabcre e, cuiui us saberes, c(iiIraabere!. niinaçio". Esta postura issenta em duas condiçöes: no efeito de disância 110e,
iH criiçc. dc sibere devcri obedecer aus egwiiIes rop(i: o prinleiru cuIno releiL é mordUe à represe' rmtaçào e na concepçào da realidade cuino tuna
)d_ urflI[ilar»,e do .scgtin1e modo: Nilo toque. (sto ë ¡1U/fl«/l1). Cornu icabc presença (e uni presente) monolítica. Ji procedi à crítica da primeira cundiçàu
cerir, a bieciidogìa e cieii1in.i ciIici exprilnein do mudo rnas Quanto à seundu, a sua iinplausibilidade é cada vez mais evideiite, à mnedkia
_li pioie u ddeiva CuIflCiiipoifleo. EIIi tice du avançu du que euitratnos na era do tempo social insmanthneo, da realidude virtual, da
('iiheLflti1li1 ciet1ficu netes diiiiii e di uientçu thi ipflcaçi que de experiéncia televisiva, enfirn, de irnagens goveniadas l)r urna es0tica de
C\Ui i cr pievisíe que a rehtivaiueiie cUflo prìzo u corpo huiniuti e desaparecimnento, cornu Ihe cliarna Paul Virilìu ( 1988: 57). Ein tal era tuina-se
ii F}'k)[ flC }Ufl IIiCICIdUi e iieiìo
mercadorii pu excehncia, desem-
mi claro que lu geraçües de realidades conio há geraçöes de imageas. Há u-calidades
tEfliu i-lu nuv regime de acuinuaçAu u niesinu papd chie zruioinóv& I)
emergentes cuino bá realidades tesremunhais, transplantadas, ou residuais. No
1LTIIIUU percudo du cipiaisino urganzado, u período da acuiìuikiçìu
i

em que
h&h'ia eiie
sto. UiRcz ea tempo de ¡iIerinos cui tavur do hujnarìu
contexto actual, a condíçào cspecítca das realidades eniergentes reside
um
du iftlIlU nidti que o gi.ird.i da eìçÌo
dc aile pósiiuderpia em Kise
us ultimos estratos
para além deles. Pur
da realidade tém
issu, as
excesso de sentido que
realidades emergentes no
transborda
pudern deixar de ser
íiflei cm 11vur da da arle quando o liiho de Huyssen unidvej-
idaineiic (iCuU iiuma da obrus epostas "Nichi alirmna(ivas antes de serein críticas. E ento poss(vel aflrmar scm continuar
berühren. Das ist Kunst'
'Nu fl1qLie C arle').
cumplicemnente? E ser crítico scm ser escapadiço ou desertor? A teoria crítica
pós-moderna é afirmativa na medida em que a busca incessante de alieriiatìvas
o sindu )/)OS pode furinuarse
assim: É uwi.s i7I/)OflCi/Z1C eslar priiaici se dà pela vía da reciclagern das realidades. Prelère correr u risco de ser
JH ¿/I O conhecjiiieni) moderno assenta nu represei1laç), ou seja,
absorvidzu e neutralizada a deixar de procurar fragmentos de genuinidade e de
lui cnuço e suthiI1eiìKi de urn LRItI-o, chafl]ad(, ubjeclo, que
descnro j)C) uportunidade nos imensos depósitos de rrnmnìpulaçu e iJe dominaçào que a
'LicJlu cuiun eXlT1do ndependenieiiieriie de qualquer iiìtervenço crativa desie,
mudeunidade fui acumulando.

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1 105

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() egtmdu guu intiujase capacidade pana a levar a cabo. De rnaneira lapidar. o Manifesto Comunista
Quandu o desejíveI
o deejáve/ e o 1,ossÍcL
l'Li !HI)ossívef eniFegue a Deus; ivando o desejável e tornou possível de 848. scm dúvida um dos grandes textos da modernidade afirma que a
eireu ji cênc; hoje. que muito do posívei é indesejável e agwn do cLisse opernia sé tern a perder as suas grilhetas e é precisamente
esta

Pu_sívc é deseve itmos de punir o meio tamo Deus como radicahdade que sustenta o seo papel histórico privilegiado.
cncia. I
u ifltiU, 110 C1WÇO OU flU flIOk) enconhíamonos, corn ou sera sorpresa, i Coin u passun dus anos, o homem e a mother modernos passaram-se )na
I], )rumE Pur esta rzo, quer quekamo. quer iiao, udu nos es emoegue. 0111 subúnbo euro-americano e al os pressupostos da equaço parecein ten
:
puquc wdo nus e-sth eulregue nilo e conipreene que eej3inos cada vez colapsado. Mesmo a classe opernia continua a ter interesse na
admitindo que
hfl' iresadu'; na il1guageni (dí, o segundo Wìugenseui), no poder do superaçûn do capitalismo. nio parece que tenha capacidade para a levar a
cubo
i-IlECfll}flU C da (dai, Nietzsche, Foucault e a reeniergêncì E se. por hipótese. se detende que ainda tern capacidade. parece erflo que j
Lh e 1imene coinurocaç) I1uinua e n ¡nteraeçìo daí, a iiio tern interesse. Entretanto, são cada vez mais numerosos
os grupos suciais
LdU'cohcm do rigniaInu nor1eamercano pela nio de Habernias). Para a iïiaililèstar veemente na resoluço de alguns poblernas. como
um interesso
c1lvLF c.t- nuvt meresse, ifliagino urna escoja pragmática. a quai cnssur seuin a catástrofe ecológica, o perigo da guerra nuclear. a paz, a dilerença
k dua c]a?seS Na prilneira. chamada concêncra do eccesso, aprcndetnu8 a sexual e racial. E. nu entantu. quanto maiar é o interesse dettes grupos, mais
J]dç kSCff ludo o que é psíve porque é possivel. Nu segunda ca%e, sentida s a sua ineapacidade para conseguir a sua resuluço. Na medida
em
Lh.wwda cuflscência do délke. aprendernos a deejar iarnbini o iuìpussível. que a res(Iluçio desies problemas se prende corn a superaçio do capitalisnio.
Os
ctdFe da !)-fl1UdeFflidade reaccftrnúrja s6 requenain a prineira cLisse. ericontrarnono5 nuiia siluaçäo quase diametialmente inversa du do Manifesto:
), e,Eudaiili da pós-moderiikbde de resislèncra frequentarn as duas au mesmo é grande o flusso interesse nessa transformØ mas au mesmo tempo
sentirnos
kFuu pfque sahein que só assim t poss(vel aprender a lorinular necessidades que ternos ifluito u perder corn cIa.
() Ljeci vo piiiicipu da coll1unicaç) promovida peLis duas cLisses
É esta, em suma. a razo do impasse a que chegou a discussäo sobre o
fli i.
p s, oher u cmscnsu, cino pretende tabermas, nus antes kmuIar
sujeito histórico du transttininaçìO social. A mioha proposta é que em vez de
UVL5 iicccssidadcs iadkais, cuino quer Agnes Heller
( 987). Coniudo, a disculirmos a queSlio abstracta do sujeito histórico ou era vez de a resulvermos
1r)1uJçì( di rìeccssdades radicaj n.iu suuiciene para disinguìr urna leona
abstractamente corno os estruturalistas e pós-estruturalistas passando o sujeito
tiea nudeina de urna Icona cnílica ps-moiJenni. Aiás, laib
Hahermas conio histónia. arialisernus concretamente a fossa história como sujeitos. sobretodo
I IH]ir, I)ei'i1han a
Ii

inirneiiu e desderihuin da segunda. O que distingue a teoria


Ia pis-inudcj-na a passagem do sujeito soberano au sujeitu deferente, pura dal tirarmus algo nus
ÇFfE
(JUC pana eLi as necessidades rudicaj lik) 5I) dedulíveìs liçöe quanto au rtosso futuro enqLlanto sujeitos. Vivemos nom atondo de
dc OW flìe-ii exeiccio iIosóíicu pur luais
radica' que seja emergem antes da
intiltiplus sujeitos. Embora Agites Heller afirme, e corn razÌo que a ditereitciaço
ilIogiriaçío sucìa e cstlica de que su capazes as pnfticas eruancipatörias
intenta do sujeilti urna variível (Heller. 1987: 15), a minhu proposta é que,
cul1ct-eis O reencaIl(anlcnlo dii nundo pressupüe a iflSerço
cniatjya da noviJide em termos geruis. todos iiós. cada um de ttis, é urna rede de sujeitos em que
Lilki1Ca no que nos CSLi lililis J)rúxiìno.
Se ciimbinuin vrijis subjectividudes correspondentes is v&ias hirmas hisic:is
U iceeiru guiiiíi olilula-se u ùift,ç.s e u co,;arjdacje.
(i iuiiiern e a de poder que circolata na sociedade. Somos urn arquipélago de subjectividades
combinant dilerenternerite sob inúltiplas circunstâncias pessnais t colec-
w-dFeT nudci nus si verain sempre nuina cidade
de Ioiileira coja llaiIsIurmaçiii, qe se
eitiprc rípida. assefliuva na e&uaço iflleres.sC capacidade. cedo privilegiadamente membros de tum(liat. duratite u
Quem tiuha interesse liviI_c. Suintas de inanh
1]r ]iRh1flçLS tiiihi capacidade para cias
e quarilo lllait)r cia o interesse major dia dc irabaUto oiiios classe, letiios o jornal como individuos e assistimos au
ei a a c-pacid;k. () pciisaiìieno ibera fui tundado no pi.esstipoto d jugo de fuiebol du equipa nacional cuino naço15 Nunca somos urna subjec-
que a
h-uzuia era a classe mais ititetessada nu desei]vI)]vjll]ento do jividade em exclusivo, toas atrìhurnos a cada urna deLis. consoante as condiçöes
capitaisino e,
CUF15C1]iIi1itfliCfllC,
Illais capacitada para o assegw-ar. Por seu Lido, o pensa -omito
a u privikgio de organizar a combinaçio corn as dernais, A medida que desaparece
w'-xìsta loi Fundado no plessuposto dc que a cJase operdnia o colectivismo grupul desenvolve-se, cada vez mais. t) colectivismo da subjec-
era quein tinha
ad-esse ia supelaçí} du capiiaflsinu tividade.
e. cunsequenternente. a maìor

ì110a0 i;iiadgti1ia. ver


1-1 a
liiia c Ekak+-
15 Stlre a kIlSlOiÇut ik.iac .ubcciividade io iniolor dt relaçiies
-Ii-' I 1141 i CaililillO CtIiI1it'.

I 07

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de mudo a criar mil cornu-
J}u niudu, dU iível coIectvu cada ociedade. íegio ou cornunkiade desmante!ameflO dos monopéhos seia conduikio
hisftco de renúncias t nterpretaÇO.
«u LdE período rende i piìvulegiar urna epecít1ca combinaço de rndades interpretalivas e nio redundar em m1höes
hjecvkiade ou, pek menos, a prìvegiáa no processo da sua à voka de discursos acgumentatvoS
ransxinaçäo As comunidades interpretativas organzarn-se
retóricos. Quando estude as
'uCjilJ tr exempiu, nu caso de Puriuga, se é ceflo que nas
d&adas rnas estridurados, sempre precathirnente. por wpoi
os coniThos na cornunidade em
cCcne a subjectividade agregzidoru toram o inthvíduo e a tni(lia, acredko, íaveas do Ro de Janeiro apei-cebi-rne de que
i;wtk anus prxìnos. que a cubjectjvkjadeS Lia c1ase e da que eu viVa cram resolvklos Mravés
de urna argumentaço tópicOretóflCa.
urn
do
IhÇ;-L cnhiu adii-r U1S pest) nu arqwpIago das ilussas subjccdvidades.
i
conjunto de ropu, que cram a
condensaço de coswrncs e expenêncaS
razoabilidade
L)c\ e;uRa que, a nivel guba, ctbnaçe so sempce quuìdiano que, a pouco e pouco, se convertiarn
em crflérk)S de
L: n enic pis vaFiufl se!tmUo rtpas
e flIpIcvsíveis circuflsncias, ina, desse mesmo quotidiano. Em suma, cram fhros criados no processo de tiltragein
u]fl: CZ ve-cadj um dado :ircustanckiljÌ1() pu1ítcn, espacial. Ieniporal etc., (Santos, t977).
, cumbaçìu 1raìase nele de niodo estuturado e deenninado. Por uutras Bakhtin, ternos de
Tal como os romances de Dotoiewsky. segunde
.1;i ;
1kbu cmvivc curn deer1uìnl]{lç evidente que potikn3ia a
oca.s.
aprender a ser potncos (t3akhtin, 98I; 1984).
) qlJaiu guii
ifltu[a-ce o i/ e baí,E'1 u o sIi.c c o co,u Da é contra as verdades tortes. E aindu bern, pots mais va'e urna
verdade na mio
,it[ :]tu
baixa euRura, das aha patentes às baìas patetes, du aFro c'ero
a
dernocrtìca que ditas a voar no vazo da apodíctica
da retórica prudente e
, fu\u CfcFu, da dta nni'aIaç(} baixa attiistraçí. -a cedadc inudrna terceiro lugar, a grande oporturtidude
Em criada pekis
rnpcudente e autoriLra.
] ma ', ciiLde dc a1ts e baxos. Segundu vndn
Max \Veber, a hìerarqkia' cso torrna/cunieìtdo tern a alterar-se
transturrnaçöes presentes é que a relaçao
1.LL}1' au ccss d pn'que c.e procede pe'a d1erenciaço em duplos das firrnas ou
i medida em que os conteúdos se translormam
d,L', L1çie e pca cccaaçãu
da cun1pciêrIcjs para us de.wiitpcnliar (Weber, recuperar lurinas degra
mesmo CUI outras lorinas. Torna-se, assrn, mais tácU
)7 )a ( ue a ' giu ítnìc sta e k1u ii
e j uiIi lique a esirali icaçïo
I

dadas, e quanto major (or o diálogo entre as turmas inas intormal e deinocráfleo
t:umu iuodo de egurr que as tmçöes de desjki culopiexidade earn Nas cdçes presentes de transiçio, a ateiìçio
deve ser
JC'L'LC!jIS pur quem sers esse dílogo.
inai cunipetente Paa o 'a-er e que, naturkilnente, e o intrmal no lormal
:d k: fl c(inccntrad na capacdade de ver o ftrrnal no informal
e ' h H]
be!IÇ} dccsa cw upe tnc a, deve er ad CkPa bue lie
7 è

ciuu unu pnnc(po da klaUe


L''t)eFafl. s eU)pcas as t'UflçÔL'i tilenLu u cu ni'nnero, o t1ujnt() guiño charnase as pcs%oaS e us oisa$. No
c haìxt tuj senipi-e ctinada a par da cantados nauguraltnente p°' Cames
. u-ij duC, aF
strìa d soJitas moderna lmva navegadores e adamastores,
C ('0mo quer que Só nio estavarn corn us adamastores
LJ
as Ilierarquias tetu estaJo sempre os navegadores estavarn à vontade entre si.

1eit.s,
nneadapueie às eci1gi du aber. e tên sido Ianìbrn o
adas
E us adatnastores cram cokas, e só o ponen à vontade que havia corn eles
pri Vegiado de unpn as lumias aus perU) du grito e do
(J
cunleddos. ubrìgava a personalz-los para os trazer pelo iTtelloS

entäo cr%ada era a natureza, A


é c3ência moderna
Ne'.n IEU, a suaço presenle
cuìnpkxa. Por urn 'ado, n aprouii- impropérlo. A supercosa
por sso se
W1Cfl!u das tecìJras e a prthteração da t5rrna um grande pru)ecto para nos porrnos vontade corn as cuisas, e
usckam a exdusvidade
da', hearquins; pur initru ado, u aceeraço necessidade de ter deias dsintas e claras acerca deJas, como
hstórca corn que o taef]i acaba corneçou pela
evoIur.un tanto que
,r UVEI- cada ve inas huidas a deInçe de a'to e haixo, e s coros, ensmou I)escartes. Corn o decorrer dos sécutos. as cusas
cUni domesiicmos e nus posemos
Crinùia HI!Qfla, actuani come se lossem -s)isWs As hkrarqtias, uo demos conta que, au mesnio tempo que as
pr un adu. aproiundam-se e, por wtio, trivaIizanì-se, e
em ambos casos ì votitade corn cias, perdernos o à-vontade corn as
pessoas Os mncrudespotkiIli}S

do consumo estäu ein parte hgados a


dr\Ieetin}am..se Esn siivaç cnitn aiguinas oportunidades que nio deveni do quotidiano, do trabatho, do tazer e
teenologias
'ici desperdçadas. Piinìeìm que (ado é o ciitm por exeiuplo, as
processual que 'eni de ser essa perda de à-vontade. Nu domino sexual,
a
Lcadu, ou seja, us processus de e5)eCiaìzaç( funcional. disponíveis mio mercado so cada vez mais solipsistas e ensinam-nos
infligir
Neste capiuJu, a
dccun'unçhi da proflss)es de nportância iundanienta, porque prazer a nôs mesmos mediante u uso
de coisas íntimas È por iso que Dens
inulas deas
CCÌÍau]cne porque seja urna coisa, mas porque
a-L'I,wl. iia protssjoi]aIzaça() das paavras (us iuristas so u aparece ressuscitado nesta cornputso Näo
L_,r,u Eni segUIdO 'ugar, a guerra contra os I11()nopóius de que se pode tratar cuino urna coisa
Dens é uni wdkinan
urna pessua
init lt'açu ei kinge dc ser ganha. E inìpornmte, puriì, que o pmcesu
de
é
iranscendental ttavez niais propriamente, um wulkgod). O crescente ù-vuntade

jng I
109

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ura-
H1 COPJ-S é, de retu, wna ds rzöe pelas quiii o ppeI da Jeologa. As miniracionalidades pós-modernas esto, pois, conscicOtes dessa
dur.fflte tfl1O lenipo suetnos. ej ta vez menor do que se juiga1. mas estio ambém conscuentes que só a podem combater
cionalidade global.
R1
localmente. Quanto mais giobal for o problema, mais Jocais e
mais mulLiplamente
1}1aa Marx
ilienaçth> asenIava subreiudo na 'esúpda CUrnpLÜO
a
k>cais devem ser as soluçòes. Ao arquuplago destas so!uçes chamo eu
t-..\ j
dU aeIlic mus do que n qualquer incukìç.io
.

Sio soluçöes movediças, radicaus no scu localismo. Nío interessa


_Qd Upda do consumo iubjç
Aids Is duds compuhöes
socialismo.
que Sejam portteis ou mesmo soluçòes de bolso. Desde que expludarn
nos
11)j iiIepenerds do que nunca. Dantes, o operário procurava
bolsos,
qft ;eu efllpu hype I'()sse O CUflt1áJ'i) du tratxdbo. Hoje. u tempo livre é
vez ms
emeUwnie au tcnipo de thatho. E nu mc refuo upens ao
tmpt tnéieu e abstracto que, tz coo o do irahho, dumina o tunsmo
Refer'ncius L5ibliugrátkas
H t1i/±(). Ieh1(fl1C eflp() du qII()tda11o. un jìgging. ao exerckïo tÍjCt)
ìIage
)

à parìca ftsk rada ve iuporiante cumo torças nis


piudffli do ih11iadur, subeiuk do trahhador de servços, que vende ABERCROMWE. N.; Stephen 1-lili e Bryan Turner (19g4), The Dominan!
J)u U l:)aUiu di pr&ncia I(sca cuno quaquer outru que tens de fazer. Ideology Londres: AUen and Unwin.
c,rçe
[
N
:
ww,
iLj
-flae
du ca,ìsuÌu dcraiizadu" ì ecah inundaI.
da cmLpuIsu du rabaHio COiflo da ctiipusiio do conswiìo,
pw versamente ,ubiI e pacífica e mesnio quase desejada quando
ADORNO. 'fheodur W. (l981),A.sfhe!ische Theorie Frankfurt: Suhrkamp Verlag.
ALMEIDA, Juüo Ferreura 986). Classes Sociuis nos Campos' Ca,nponeses
( I

Parr'ùiis na kegiäo do Noroeste. Lisboa: instituto dc Ciencias Sociais.


E.ux}q)a ada corn a vohneia da curnpu]su da futiìe e du guerra a que puputhçòes
cada vez nais Sujcitas. As cuniunidade ìnerpreativas tji1 de 1992), Exciusào Social: I'aczores e Tipos de
Ffflt ; ALMEIDA, Juiio Ferreira et al. (

'e Fl;1Zadas na CÍIiC dess cnipuOes e. au cwnrrio da crítica nioderna Pobreza ein Paliug!1, Oeíras: Celta Editora.
il :íiea -!1)CJ sabe que u ìar flflhìg() esul dentro de pió. as an Ethical Problem",
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u úRmu guo chainae as mììu-ìacianalidades nao sü r(Ui
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u/u;c n/ the of Europcau VuiId-Ecoeu;my in I/ic Sivreeiirh À inedda que nos aproximamos do tim do século XX s nosas concepçòes
Ay;-
( 'I/H_.y vuwae, Nava Joique Acadeniic 1'esc sobre a natureza do capitalismo, do Estado, do poder e d direito ornaInse

Y80), 1tui Modern Wo1d-Syteo:: MereantiIien


cada vez mais confusas e cornrwiitórias. fais dois eempIus, um, u respeiu du
\VAI I 1RSilN, hiinuweF (

df1 the (uii.u/ihithio o/. the Europeon lVoi/d-Econumv, !ñ(fl)- 75(). 2 nawreza do capicaiino e outro. respeito do Estado.

)1}C Nuva i]ue ,\cadeinìc Press. Nos últimos quinze arios roram apresentadas duas concepçhes radkalnieìne
\\ l:RR, Nli 1:c(fluimy and Sy-iety. Berkeley: Uiveiity uF Ca!iiornia dferentc sobre a natureza do desenvovimenLo capa1sta. Segundo urna deJas,
formulada poi' I. WaIJeFSEen, "o capitalismo nunca funeionou. nern pude. em
caso aigum, fundonar de acurdo corn a sua ideoJoga e, por issu, o tiunto
VJN(KLER, I I A (J 974), OrRouiziePier Kopiw/iwwv: Vmauezwpen
final dus valores cupiaJistas será u sinai da crise inuJ do cupaJsmo euquanto
/ OJ(, Ciuuingcn: V dcnhueek und KuprccI.
sistema" (1980:374). Ao contrrío, segundo a outra concepçio. törmulada por
A. HirwJuuan, e retendu no capítulo anterior, o capitalismo n5o pode ser
cnticado por ser repressivo, aJenante ou undimensionaI cru contraste coni os
seus valores básicos, porque o capitalismo realizou precisamente o que se
pretendia que se realizasse, noineadamente "reprimir certos impulsos e temJncias
e produzir Urna personalkiade huniana menos rnuJLifuceada. menos irnprevsíveI
e mais 'undmensionuI" (l977I32). Por outras palavras, "u capitalismo visou
desde u inicio u reaIizaçio du que rapidameate toi denunciado como a sua
pior caracter(stìca' (1977:132) Dese nwdo a sobrevivêiicia do capitalismo
assenla, para a primeira coucepçäo. na negaçio práca da sua ideologia e, para
a segunda, na incessante aIìrmaço desta.

o rnesmno grau de curitradiço pude ser detectado entre recentes concepçhes


do Estado. Enquanto muitos autores crilicamn a tendência crescente do Esadu

JJ4 I 115

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ohstcuo tanto rnaiur quanto o nosso objectivo é conhecer, nio urna suciedade
])LflÍ meino b(VI1 a S()CedadL civd e para u fazer de tonnas
U UU
central, desenvolvida. ruas urna suciedade serniperir&ìca, a sociedade purr trguesa.
CaLLi ve ioas auoruidas u que segundo as Iriiias. ou segundo os aulores,
o núcku central desse quadro conceptua' é constituido pela disIurçiu Esta-
[tfl

çrruivku-o",
EJFe1e1I1ene
'idn te,cdtu corno '%turiarsrno regutdor". 'deniocn.tcia vigiada", "neo-
outrus autores convergeni na deía,
Colli a anterior, de que o Estado
lascismo
cuiaraditória
crescentetnente
bevoo" - do/sociedade
entre
civil e pelos seos
o económico e o político.
viirios

a
eorohrios corno, pur exemplo, a seprraçïìo
reduçäo do poder po'ítico au poder estatal
e idenificaçao do direko corn o direito estatal, Procurarci mostrar aiui que a
__1c;L. caJa vez niais tiicapaz de desempenhai as unçes de que se incumbe.

Iic L:1rtu COO] eIu cunccpçio, o Estado ou carece de recursos financeiros (u


distinção Estado/sociedade civil e os seos coro1rios so buje tIna "uriodoxia
conceptual" e que, pur issu, a sua predominância no discurso lrrl(nC) é
JJilClUU ija crke tinauceira) ou de capacidade insiitucìona
1l (u argumento da
pertèitarnente compatível corn a sua faléncia teórica. Corneçarci pur riostrar
LUL 1(lJilte da burocracia du Estado para se adaptar au tcekrado nuno de
t1kì aicid e ou cuece aiitda Jus necanisinu ie na cinica) as ruizes contradkórias desta disrinçio e
seguida. apresentur. em traçu grosso. u perfil pussível de urna
as suas tunçòes laiente, parir,

alternativa
de

FccaLJc C vI uricjflam as acçes e gurautefli a sua eficácia o argtullellto da


conceptual cujas virtualidades para analisar a sociedade portuguesa str apenas
ah de iriais de iiercau ta acluaç1u du Estak). Nestas aníises. o Fsado
:

po nt ad a s
UlO 1ciaEu i[cvoradr. ora cornu nn cnt1reendedor ta!hadL.

uLh a FUI}IiCtU » cLtuI)to dc cceçÒe çuja coit-


l Rill Oi !1tL. IOU ]ineannme econduziveE at ditcrcnes ptiiìnia teóricos
A ds1nçäo Eslado/sociedade ci '41
J L L J) ft & tic q uc pa te n e parece an es radicar nanebu los idade do próprio
, -jc:t wd e Em ninhu pìnìo, sío tr, causas desta iiebulusidade.
:IU i1CiFU ttdiir us processus dc trans1uraçiu socid
eltLUuL a As rahzes confraditórias da dislinçäo
un (tu 'CLJU XX nì ecuru a quadrus cunceptuais desenvolvidos rio
''uç XIX c ao' processus suciais ctitu em curso. Eni segundo A
lxìdez e a evidncìa corn qUe as ortodoxias concepruais (ou quaisquer
1-].n'. u isLidi!-Naç1 continua a predominar enquarno unidade de ariilise e
LluiraS) nos apresentarn rendern a obscurecer os processos históricos. mais
se
LL[1 c iI.LLU da irrts!igaçitr, u que nos impede de captar eientiiicaiiienle a
11
(lu nenas longus e quase sempre coniraditörios. da sua coristiLuiço. A retlexao
I
g c &) 1 ur R no in na C re sceute. q nc r this c.st rut oras e dus processus
])1 i ;i
crítica sobre cIas nän pode, pois, deixar de corneçar pelo desvelarnentu da sua
HL (lpiet LtCiunidades de uriulise rirais peqrienzis (a lógica iutiaestaiaI). liistoricidade. Para issu lerernos de recorrer a alguns conceitos em relativo
p]cr ik s ru }V lic no s h u s. ar n ve dr sì .sieriia niund ial a ógìca su pra -esIrta L
r i i r r I desuso corn inegáveis virtualidades para analisar o período do deseivol-
iiias
:rFr kr LC u u;rr, e airesar dus espaços teóricos ipirivadores das tittiinas décadas, viruento capitalista que aqui nos interessa, o longo século XiX de Eric
rur r ueiri]ógiea coriirnira a ser basrcaiiiene dcivada rias experiêiicias suciais
1
I-Iohsbawm, que termina corn a primeira guerra mundial (Hobsbawm. 1987).
ii' 1L1LLtLdL5 crrt]aj\ e, ressa niedida, punen adequada aridise cunipzirada
Tern ìdo alirniadu que o dualismo Esiado/sociedade civil é o riais
,_. WL:l nada a iscílar gcrreraizaçOe.s espúlias. PUde liesmu dizer-se que. luanto
importante dualismo no moderno pensarnenro ocidental rmble, 1982: 45).
roi- cci at t r teoria sircirrtóttica, oluior a puhabilidade de ser haseada na NCSLr Concepçüo. O Estado é una realidade construida, urna criaço artificial
e s perrer}cia social e histórica dos países centrais e enviesada u lavor destes
e moderna quando comparada corri a sociedade civil. No nosso século, nìtiuéru
I1irnkls u LhS iO centrueernrismu). nielbor do que Hayek expressou essa ideia "As sociedades tmnarn-se, irras
tr causas. tratarci rar prescrite capítulo, da primera e da terceira. os Estados sit.i leitos" ( 1979: 140). A rnodernidade du Estado constitucional
eri, dc lacro. que n proNerna biicu da cuntraditoriedade das ctrrìcepçöes do século XiX é caracterizada pela sua urganizaçäo lanai, urridade interna e
1ecrrdLr C de tariras outras parde1as reside no quadro conceptual em que se soherania absoluta nom sistema de Estados e, principalmente, pelo seo sistema
rn vera . Esse quadro t constituIdo xrr um corijunn> de cunceitus que, a nico jurídico unificado e centralizado, convertido em linguagem universal por rucio
'er qtrakucr que tenha sido a sua tijitidade no i)a%Sadu, huje urn obstícuLo da qual o Estado comunica corn i sociedade civil. Esta. au contrário do Estado.
e FILO Fu asançIl do iosso conhecinientu subie o Estado e a sociedade, uni é concebida como o dominio da vida económica, das relaçöes sociais espontaneas
orientadas pelos interesses privados e particularísticos.

Cornudo, o dualismo Estado/sociedade civil nunca foi inequívoco e. de


F .\ uI jìojl 'iL ,OW u LLc-OttftIc d; tk r-F du d{
tacto, Inostrou-se, partida, prenhe de contradiçöes e sujeito a crises constates.
F .F { IL F1 LL J FLFLL I I')FFFI.
'a

[6 117
I

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Ir; ct)tneçn, o pdflcíp()
8e)aflÇU entre Esthdo e ocedade civiI eguba dL A ¡deja da separaçiu entre o e o político baseada na distinço
económico
iflIu kJciu de um Estado
a de uni Estado mixrno. e a ucço rnnimu conio Estado/sociedade no princIpio do laissez faire parece estar
civil e expressa
c,tad e sniukneajtienre cunsdcrada cuino urn iilimigo poiencaI da ibezdzde (crida de duas contradiçöes insolúveis. A primeira é que, dado o carácter
inWihwJ e Cornu a C(I1dìÇiu pani o seu execíco. O Esudo, enquuno realidade partìcularístico dos interesses na sociedade civil, o principio do laissez faire
cunsrukb, a condiço necesslrìa da realidade esponrnea da sociedade civil.
t
nuio pode ser igualmente válido para todos os Interesses. A sua coerncia
U penamcrìu setecenhista esti tohalinenbe imbuido desta contradição dado que interna baseiase numa hierarquia de interesses previamente aceite, candidamente
iu ber1ar a actividade económica das regras corporativas do wiceu rgìme expressa na máxima de John Stuart Mill: "Qualquer desvio do /iüsez faire, a
iu pleSSupöc. dc modu nenhum, que a economia moderna dispense urna acço menos que ditado por um grande bem, um mal indubitáveP' (1921: 950). A
clla] escLuecida. discussio do principio z-se sempre A sombra da discussäo dus interesses a

ltu luiculanieiIe evidente em Adam Smith. para quen a deia de


& u principio se aplicava. Assim, a mesma medida jurídica pöde ser objecto
CU1RC1u gera liberdudc e a cìviJizaçiu vai de par corn a delèsa das instituiçöes de inierpretaçöes upustas, mas igualmente coerenhes. Exemplo disto fui o caso
p ì.-d.,] 11garaniani mn Cflércio Ivre e ci vilizado. Au Estado cabe um ija legìslaçio de 1825-65 sobre as sociedades por acçöes, considerada por uns
t)q>c utiitu activo e, de lacto, crucial na criaçÌo de condiçôes inshitucionais
F
corno urn bum exemplo do laissez faire por eliminar as restriçöes mobilidade t

, Ful tFc,I íra a eansu du nicrcadu. (.'tullu 8Jlet inui betn aFirma, du do capital e, pur (nitros, conio urna nítida vioIaço desse mesmo Iassez fun'
;nhiicuu au Jtiitu capitulo dc Au Jipry ¡#uu ¡he Nuiie and por conceder is suciedades negados aos
comerciais priviigios que cram
(.au.es of t/e
lF'ei/rö u/ iVn/jons tjcunos empresários individuals (Ai Taylor, 1972: 12). Isto explica porque é que a
impreSsiOflhdus coin a ìdeia, tundamental no
]c1[rL'ntu dc Adam Smith. de que a nabureïa das iìrshihuiçiies e as pníticas inglaterra vitoriana foi considerada por uns a idade do laiuez faire e, pur
puFuca douta rç5u aleetani decisivamente a sua capacidade para urn desen- outros, u embriào do Welfare State4.
uFvuneutu ecuntiIico hirme. Comparando PurtugaF e Espanlin corn a GriBíe A segunda contradiço mecanismos que achivain socialmente
refere-se aus
: iuFi;ì, Adam Smith considera o carkier despótico dos dois printeiros Estados, o principio do laissez finire. s&ulo XIX ingles hestemunhou nilo sú um
O
vcu vioFenus e arbiirüriu", coiiu responsíveis pela sua eslagnaçio incremento da legislaçäo sobre politica económica e social, mas tambin o
.unilnLca e dativa pobreza: 'A indústria iìio é ali nern livre nern delendida aparecimento duma autiilgama de novas instituiçòes eslatais conio a "Factory
e cmos civis e eclesiösticos dc Espaiìlìa e Poitugul sun de uti ordein lnspecturaie", u 'Poor Law Board", o "General Board or Health", etc. E
11r Si F)5hWiZIP1
FL1'

an Pepetur u estado actual de I I 937: jbrea' interessante notar que algutnas dessas leis e dessas instituiçöes se destinav,im
\ais ainda é (FUC para Adam Smith o desxtisniu tanto a aplicar políticas d Iais,ez faire. Como Dicey sublinhau, "sincems adeptos
Pudc 'c rc\ukado de unì govelno whiiririu, 1F41e govcriie pela lrça, scm du lthrsez faire iceitavarn que. pura atingirem os seos tins. u aperleiçuainentu
un Fegais, conk, esuFtadu dc un goernu Iracu, noia
iFSt1tUciUUai' e u luttilecimento dus mecanismos governarnentais era urna necessidude absoluta"
;u i uiadc ivaivel, incapaz de 'iuuiler a ordern e a lei e de deseinpenliar (1948: 3{)ô). Isto significa que as pol(ticas do 1aisrez fluire rarn aplicadas,
is
F
ciuFadu-as ecigidas pela economia (l3illet, 1975: 439 V i 927: etn grande medida, atravs duma activa intervenção estatal. Por outras palavras,
u Estado leve de intervir para nito intervir.

Peranie todo iStu surge a pergunba se a distìnçio Estado/sociedade civil

: FIRu estava töu cheiu de cuntradiçöes cuino é que toi thu ampiamente aceite,
,
n it hiijs cvn&bn xiiwiu, ,i
c \Í\ itj lÇItFlHIÇ,ILÇ Jo fttfl(. S;ìbcju,, qtii ih ou (bUt! (1 I{tl*l por
considerada tti() óbvia e to do senso cornum? Antes de tentar responder a
rr. O '& uFIi rrj A ukio do Eutu rudi] An esta pergunta, gostaria de ilustrar resumidamente o pesti desta ortodoxia con-
'- Fl I L -'O oo hcn 'r1Er ihc rlooi nodeon ttijrn rcgu tie Euatho
'-''Jo LO }flCF[ ceptual no pröprin niurxismo. Pondu de lado a teoria politica liberal francesa
t; o po .IipI1OI n do Eiido
s, FOG)

Eje
i
-,ovcouo 5 epk roi teitr 'oFuÇh'; ptíEis qiic iib,iii
ciid,it
do séculu XVIII
e inglesa e considerando apenas os antecedentes mais próximo
k' pokr. d,:
F
k. Olflds oup &] uiiiO dc qu liko 11ltltu!rll. du pensaluemu de Marx .-
...... u contexto aletno -, deve sublinhar-se que,
-
lo,I' LJF} Jc1ce ur ito tpct .liEiipçl' widicw un
5ofli pJd5O rtin.ç
;
i .'ir
rrrIbFElte uIr (Viiirr. 927: 15JJri t)75
')7O h hrsdFl]n i'd ; ]1IjE. cc Nu rito tFt tlrprio cc»iitce iic. io 4 A tuIo l]O a QC dú E,i.ì do-Piiividiidi oi ¿i uì di ir1içZio oh
' r,'. SF1h dcii WE II;tO COU twiç':s'ç litno d qir um I5sti&to rtiji Qlo IOn docLiILb uo ÚhI[Ì)(r i1IIO, COI.'t.I3d pou ihgtiir coil ini i5Pe»11 t1
rIlKb(I a
''c Iid, lq77. [04j.
I

plIaI!]no do J,,l.rw' J,sr' ' po Qutro'. O1lO t ciUbrO(l dc uiiiii nova huriji de Coado

llF' 119

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As funçíJes l4Uentes da distsnçäo Es&zdofsociedade civil
sCuudo Fkgd, a sociedade civI ransìçäo da evo!uçio da
é urna fase de
ideia', sendo a íae tinai o Estado. A farnfla a tese. a sociedade civI ë
Como é possiv& ecpUcar a nawreza evidente da noço do ecunómico"
a uiítee e o Estado ë a síinese. A socedade civil é o "sistema dc necessdades",
Conio um dom(nio separado e autónomo e das correspondentes rroçöes do
des1l'uìçäo da unidade da farnflia e a atomização do seus membros, em
'po1ítico" e do "jurídico" como atributos exclusivos do Estado? Corno se
LflIa, durnírio dos mteresses particukirisilcos e do egofsmo, um egtádio que
cxpica a persistência da dicotomia Estado/sociedade civil apesar das suas
eR superado pek Estado. o supremo unihcadrdus imercses. a deia unvesaI,
contradiçöes internas e permanentes crises?
a ctceZaçu p'ena da cncência mora' (Hegel, 1981 : sec. 140). }L, de
mudu. em Hegel duas inhi de pensaniento sobre o Estado e a socedude Cupro acontece corn todas as teorias sociais, esta ortodoxia conceptual
eIi]_ (jifia, akamente ubsdiria do pensalneilto bera ngs e trancs, é a tern o scu qu dc verdade. No feudalismo, o irabalbo necessiu (isto & o
dinç;iu CthCpIUaI effire O Eiuk e a ocedade cívI enquamo einidades trabaflio requerido para a subsistencia dos servos) e o sobretrabaiho (isto é. o

U(Fdtri A uutra, hegchatia, é a ìdea de que o concetu trahalhu efectuado pelos servos para garantir a subsisténcia e a acumulaçiu
(k cedde civil nio nu ineinu pë (nu inesn,o nivel especuaIìvti) que dus serthores kudais) estavam separados iro tempo e no espaço Dado que os
u Ci(O dL' IsI.k) Crre)L)rJe a um esídio IflCIIUì decuvdvido da seirhores Ièudais niu deUnham a propriedade dus meìus de pwduço, tinham
:1:CCa a Se efecivtnnerue ubumido no I5ad%) e. Csse sentido, a de depender das iiistituiçöes políticas e jurídicas do Estado para se apropriarem

M1araçit) emi'e !stadu e suciedade cvi enqua!lto dns cunceitu8 OpOSos e au du sobretrabalho dus servos. De certo modo, como os senhores feudais rrìu
1flc]flu flívc] aIUaÇt). é teoricamente nsuseruveL Esta úkìma ctmcepçîio,
t
detinham a propriedade privada dos rneios de produçäo, o seo poder social
apL'u d1 cmcdu flìli1CadUr, é huje uiiduìientaL en minba upiniio, estava intimaineitte ligado t sua propriedade privada do Estado No capitalismo
]) a a ctmìpn.ensiu du prcesu hisirico sodedades capitalistas. Fui, no pelo conrrário, u irabalbu necessário e o sobretrabalho têin lugar numesmo
eL1U )USL de IJu ms dscusöes que se seguiraii a Hegel. A reiticaçio processo de trabaiho devido ao controle do capital sobre este último, emiquanto
di licuumia idu/sociedade cvi urgu scm deinoni em grande parie devdo atributo da sua propriedade dus meios de produçäo Desde que o Estado garanta
a -trubaflius de Lorenz von Stein. u cumnpriinento du direito de propriedade, as relaçöes ecoflúmilicas ocorremu e
ieproduzemn-se por na estera privada da fébrica. Parece, assim, que a
/\pL-fl-
WnIa1va qi.ie Max Adler èz para a Iìberar desse cunito ( 922),
J
si

extemiuridade do Estado e da política relativamente ùs rc!açöes de produção


çlcU qLR CuTtCpÇì() de Marx coreponde t vers5o [edcada da dstinçïu
It/ecdade civd Marx iiverieua, mas nio a upe-ou. J)escubnu que a deriva du concepçüo das reiaçöes de produçäu como uma questo económica
1FLath k "naturai da ecLmunlia ckica escundiaii relaçöes socai de e privadm entre individuos privados dentro da sociedade civil.

e\)llaçu que u Esadu, sO aparenlemelue neutro, inha como funçao garaiitr. Se retlecurnios mellmor, esta derivaçio nâu é logicanmenme necessaria. Seirt
n} du uciaI unieraL u Esadu representava u rnerese do iilestmlo pôr em causa a exterioridade das instituiçöes pu}ftica e jurídicas du
c;1l)l eri CunNeuir a ua repruduçu. Nu entwflo, einpenhudo cuino eavu Estado melamivanmeiime às relaçües de produçâo, seria igualmente lógico conceber
LIU dCUUF 1flfl(flj c1is-sca nu ieu 3ÓJ)r() teIeijo. Marx dexouse cair essas relaçües dentro da fábrica cornu urn conjunto de processus políticos e
nL ILdih da sepaI'açth) entre ecunumia e
1
e acabou pur reduìr a pica uthlicos, apenas corn a especiticidade de ocorrerem exteriormente au Estado,
puJ(liea e u direiu acçio esaia. No conseguìu apercebere em que enido
h.;11 {e iu apeuas 11eIaúrìcu) a reIaçies ecìôiiicas' cram anthéin reaçOes
ebvnioenie aI'000es; o eoìeeimo de obiedemeîiiioçao; o pricpo da demennimaç5u eeoìúiiika e
1-.Ldafflcnc puFític± e urídia a i1Ja cnnsiuiçin etruturaL A nietáíura i#n osl5ociO Apei th cio soisticaçto meónc. o eu vi ecunomieìtt, por demis evideole, t

Wi hase ecnì6inica LiLie sustenI a superesIIuwta puIica e ur(dica no é. FO ohi do ioie tn-iìbomae ttórieo d Esizdo, da poIítca e do dnio deaa escola. Nkoc.-
utua disrorçio cimpIeta du penamento de Marx, como se tern eìto Au oIjsr retaçSo de propmiedide. por ct comiecbda corno tIemenio d ¡mutiem eunSinie
ccr RLikoflzc sucet tue et perlence estriianiemiie .. er cmuiiiìenie
imnthacia econ6mcm e deve. por s'o
m

diintdi das 1ora urídicu de que nveida. ao da propnedade uridc t P97&: 26. Poukweco
,

QEK Mere (oiteIk po igor mue relaçöes de produçäo e ac kirç produmiv peiieiem
FIOO 'OPIbOÇ5O erlur:d do econSmnic enquuao propnethìde tjudC) do oeke de prothiç5u
.s
d Icifi cut. u drçra. m peneee S emereurnrì J97t- 67) Ea
for!ndzçôe de Poulantzas. ptthiieada pF prner ee
" itiI ' k trL[1 CJ)us. itO6va 94& olkenies. O penmannIo de Pouttniuo. conio
I;
E!nE-1 a clii de toige s mmw hkÌo. evtilw
jffl idQur tnmii. tL,. iúda. tb e:ok t-rì do ha'maioc flO'A óItìrie d sua ida. Cfr outuìtzam t1978b).
.III1.I IixiF; J sl pt iiei e id,!Pôtnc

121
2u I

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,
LUF Ii) iiu du cpi E, de cn n wrudcj kscobrir dcno mais ampia, onde esiäo inckiídas outras formas antdernocrákas
da
JUr(ch
Ej L C}r1\
tie reM)Itçiiil de
grupos de Ider ciçö rel1IcEç(s políLica e jurídica

de direito e de polftica.
C()flJjH pusvas e rngativas
eec. Porque que .
eia emcepçau i1tw-nauy da reaUdw.e
iia j-j riiu IÒ udpad' Porque é que e.tz etorrne vwiethjde Ie pucssos
ci;s fui ujj Para a coiistruçu de urna aItrnatíva conceptual
.,l
m} cm(cito amorío de 're.içòes eCóìicaf?
A mtu vci u euraçìu enie o pulifico c o ecurÔïcu penntiu, pur urn da dislinçkl Esiadolsociedade civil defronia-se corn ir
objecçíes
A
cxrçu
crftica
TJLIU. d ec;ìS Capitasui, e. por outFu a lundawentuis. A prirneira que no parece correcto que i
e ponlia em cziva
ucu1t : i dt i(efleu \UUCith ír da pík ì baraI d( ì que cia distinçio precisamente iio momento em que a sociedade civil parece clar,
tJrEUgir-lTfl p; fldaçk) d) mod(t) capia1a das rethçes por ioda a parte. a reernerJir do jugo do Esiado e a aulonomizar-se
em relaçiio
'( .
uuu c -ÍC E d agÙ açthi C uparanii S(}Cai U h ingo a e]e. capacilarido-Ne para o deeinpenho de íunçöes que antes estavarn coijlludas
L1
Cflflp(; iias eaçes puftiea, pública, a reçe ua etea au Esrado. A segunda ohjecço que. mesmo adinilindu que a disiinção
(1U CÌL.. ctpiiaiits niais inequi vucrncrne rcpzesentarn o criticúvel, dihcil encontrar urna alternativa concepival ou niesino logicaulenic

fuihh
I
)flill Vda ri v iia biÔiia, u onu Ved(JciraJ1cflIe fad tjli1)OSÍ\tel, pJ itienos enquanto vigorar a ordern social burguesa (Giner,
19$5).
ì'a dci x u de c n s i u r prt)pried(c pi-i vada dc qu alquef seiniperihricus
i
rupu A terceira objecço que. sobretudo nus sociedades perifrìcas e
l

Lf)Lc] A
dirciius cvicu e plíic iic lc jxuco organizada
Junino a nossa) caracterizadas por urna sociedade civil Iracu,
-

e a cuncquerne
UF \.i/Jç da ransl(un1r o Lado na csubtanciuç cidjja perigoso pôr em causa a disiiiiço Esia-
LJ (}J UcmucrãE cu di panicipaçat> igualj1rja no dominio social. Se,teúica pcJ
e puiaco autúnonlu, í poJiticarnerite
du/sociedade civil.
» sRkrarnu» a rL'laçÔc de produçio na Stciedudes capii
'
lisia
aJ ITO U c api a i lj hea I a ivate;n .serìi uegaií vo I .Sfll( , i

Lia ancr i u-- Rcc uìheceuius. As várìas .WCedildeS civLç


tthviauwrte O CflOrifl operado cui lerpuos
úc kra li de pu duçii quanio As velçs cai de prdtiçì suios
k li r c u u Meik n s Wi
, i Quanto prilneira ubjecçio, deve, aiiies de salieniar-se que a
inai,
que em nenluun ou uo sc na de i t il
ì
;i

H Uuç Fd sociedade civil' em mesina, urn tènúmeno complexo,


é aiipleia nei ic (lisCi pli oath e organi
k I l reetnergtncia da é, si
¿ado. e ncnlu nia A prirneira
Lu ur giiaçj1 da pi iltç respimde Iìu direciarnenle ù exigicia da ida seudo possivel dislinguir pelo menos irês lógic-as disiirflus7.

.iu pi uç,iti' ( 9 curnrul, scm preccdcme .obrc a produç


I I ') lie t
remete pura a concepçn (enquamo pluralidade
liberal ckssica da sociedade civil

qi-idu que lar chaniava u des1)j)ij1}o da


i
aIornúlica d interesseS económicos privados) e domina boje o discurso
político,
lúbrica i: I 970), e laYeniian
mt iIiiïe idu a pwrcssj va eradaço
do processo de irabalho subretudo coiiervador. nus sociedades capitalistas tanto centrais conio peri Jérìcu
A segunda suba aus novus movirneinos sociui (ecIlltSgiccl.
nu seuiìperifirìcas.
aruinucieajcs, pacìJkia, demarca-se mais ou nienos radiculuieiiic
Jeininisias) e
t 'J u quc a tJkolt mml ec(1r( iuiia/p d(i1 u nn u ei a s rilagcn da ctll1cepço lihej-aJ, apelando para a ideia de urna sociedade civil pös-burgtiesa
a'; i i n-
utFti]aei e SeJ)aroLJ- dc
e anlijauteriulisla (011e, 1984; 1985; Arato e Cohen, 1984). A
.'
!al iurnuj que a terceira lili a
pt
ouak nide se curidcìv u prores
i tJ;t icJiçt.
dLJ t a de jt dur
er u modelo da cunliguraçu ccmitSniic da
civìlizacioil, que dominnu a ret1exio teúrica dissidente na tase lirial dus reginles sociali.ias
t 't tu inzdt, elaçc ociai. de E.'iadu do lexie Ewopeu: a sociedude civil socialista, distinta dc quakucr
c.scra iWca t ideal deicrzict i ic u neut
tali zad iu jr lu i -

t- Feher. 1-IcUer. Markus, l9J4).


dd 11do nu scu l)t,ienuial cuancipadir das duas concepçies aliteriure (FicHer, 19144;
a de uhreavio. Por mn lacio,
tj; ¡úbIc't na edc ecuiva do dirci(> e da polilica Ita diainçUe devein pûr os cienhistas sticiais

uiçiu
eenipwili(u urna nern a sociedude civil pós-hurguesa ut' antimaterialistu, nern a sticiedude civil
Jcuiiinaiki-i lundallicrilal all ciicubrir o lcto de o direito e dc a puliúca Estado/suciedade civil tal corno esta
dt J ado (fumocl(ic(j M mcizlliaa Íòrrnn pensadas pela dìstínçio
ptiderem conio parle duma issu cousideraçio separada. Pot
l'Uucittflar
se constnuiu hisiuricarnenie e merecern por

t. tttitt XV] titt ptttkt. uìttt ttuttt;1 ptlllti+ iittt:t


II..t- tt.tI rt t çt)tttlt ttt . te k t'Jt.gt {4. ttl1att,S1II (
tI;IN
7 ttttt kttIlrt' ttttttQt&locrtt, tt1 Pt.l S O4ltil tiiiittut çjualrtt vtlttQtpött tk .IVI -

ltittl t] tI.k'tCt. JtLtJtttttt. lltEl ll'll Q[;it tlQttttOFXrli I 9115: 24)

J 22
123

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uuw ad(1 C tcìdu so em conI. deverno-nos hflerogar, nu que e esvaziou o poder poUtico»juñdico. e de tal modo que. au lado dele, o poder
repe ù "cenierncia di ucicdude dviI" nu discwso poIíLìco dominante, do Estado luoje apenas urna entre ouiras formas de poder e nein sequer a
t

sobre se se trata dS$o mesflio OU de outro fenúnieno. quiçl hem disinto, que mais iluportante. O problema desta coneepçäo é que, embora chame, e bern,
r)u Z}LS tu]()gco-poIíucas assume essa distinçio. a atençäo para a multiplicidade de fixrnas de poder em circulaçào tia sociedade,

A neu ver, o que esta vedaderamene em causa na "reemergncia da näo permite determinar a especificidade de cada urna delas nem a hierarquia
'ui'edade civi'" io discurso dominarne é urn reajustamento estrutura! das entre cias. Por outro lado, 11cl às suas convicçöes anarquistas, Foucauh leva

du Itadn por vm do quai o intervencionismo sociaL intercIasista, longe demais o aru1nent&) da proliferaçlïo das formas de poder. e a tal punto
úpicu Un Eca<hiProvìdnci, t parcianiente suhstnuído por um iiflervencìonismo que ele se torna reversível e autodestrutivo. E que se o poder esni em toda

)cak mais utoritirio lace au opeiariadu e a CCUOS sectores da classes a parte, n.o está em parte nenbunia.

eCrI)lU, a pequena burguesia acsaariuda) e iitais dilente no É, pois, necessario encontrar urna via interrnédia entre a concepçio libeiaI
T1di eu da cxigncis lnaCn-ec()nórnicas da acumulaçäu d capiial (s e a concepção loucaultiana. A minlia proposta que as sociedades capitalistas
ruth du ruìde calMtl) E neve que reeu1erêflCia da sociedade civiI são íormaç3es ou contiguraçöes poifticas constituidas por quatro modos blisicus

LI L1U uc1eu genuIno que se raduL ui reflrniaçu dus vulores du autuguverno, de prnduçäo de poder que se articulam de maneiras especificas. Esses modos
(LI eins
.la uhjecividade, do cttitarsmo e d.L organizaçäo autóunna de produçlo erarn quatro rurmas básicas de poder que, embora imnerrelacionadas.

LkP, nt ."'sc', c dus tniius dc vida. Mas esse núcleo tende a ser omitido no são estruturalmente autónomas ( ver quadro)5.
dkcciru LhHflinaule nu apenas subscritu medkla em que cwíesponde lis
nívn rrr'nio. MI/)a etrutura das sociedades cupiatistus

COMPO5TE5
Jirnias d. pnki uciI -.-...---.-

riuTARls UuuIdr de
Forma Mcuismu Fiuruna dv M,dcu d
iituutwj de pudrr diriitu rcwuuiIìdde
Esu'AÇos r:::
-\ ekF}ja ubjct-çliu i dc que e dileil uu iiosível
Íuniiular urna uaTuoffiruliAIs

dtL [.EI'± 1 ltidu!'ucicdadc civi -.. su pode ser reSpondRia aUaves Eapuiulia, . .
Mxiuuuiçau
LLI IL' II1 iltcinaiia. l
It quc taço a seguir, esuiipido ein {luliçu
-
e
csuuuucnio c
.

Plnarczudo . da tli'cun
e'
. -

jinistìco cxuçocs do luuE uro


ç1,. i ad t gi-i t I L OU t r- te xli e Fn ue aaltrinat i va ipesentada .
parcuuirseu

.
fe]hadiuieiiic Sau. 1) punu de paitida u conceitu E,pzuço du
Ckusse Enupeeu Euploraç5o
titirito da Mzuxpuui;ìç5o
dL JC1 1 H L' t' IC t L11U1O UC IhJaZ li dislinçliu Eiado/ociedade ci vi I)c F.
pnMtuçao JE5JO do tuero

L'',tl h'1FlÇilU \\,I Ct.ldU iLlIpu tulia ciic&'pçlio huniogética e Etruço da - . -. Drcito MiIEuiZaÇaO
c 1tte e Ll-i)l.11-..]c Hn ]tigar siílicu e exclusivo, A cuneepçlio
-

rudadnupa
. tuiutivtduio Esuado tlonìunaçao .

rmmuuiat da ktUad
' du poder po]íticojui-dicu e u lugar do cu
l
Conuralos.

cccio u ltalu a oulra, orinas de poder. im twn(Iia, na empresas, Espaço


N uc So
ucordû
Org
e Troca Dirtuo Maniuunzaç5o
totema slundco da eficica
ulu e-statai slio diluidas nu coliceito de relaçes privadas e iumundjal desguuaI

LL )J1CI Iia .'ti-e ¡fllereSSes particulares. ....

l\je )iidjglila c1l-1 ilo a cr uhjccto de iiilltipIa' crftica' A mus


Jc-cauc iuiical l)istingo nas sociedades capitalistas rluatro espaços (que tarubémir sIlo quatro
e nu,uu ,cuuu uiulvida, a dc luuuicai.ilt l975 197(u) Seguumudim
IULLcaULt a )ur du ccuulu XVIII. puecisauluenuc eni que a teoria
mu uumuumneuuto
tempos) estruturais: u espaço domtstico, o espaço da produçlio, o espaçu da

ul'ual identificar o poiler cidadania e o espaçu mundial. Cada urn deles constituí ui-n leixe de relaçes
icial coin u poder do lstado, surgìu uias
.dude nu tJc rlus lu soclais paradìgmticas. NIlo sIlo obviamente os umnicos espaços-tempo que
., L u s u %utra I riTia dc pu der be Eli nuais Ji sseui u i uiada e eica'
) udcu Icp11EEar. OU 'ca. u l)tullcr tla unlrunalitaçliuu das stui'ctividades
m t uadk pu'iset pelo ulcCulvOlviluel}tu e umstitucitmnaliaçliu das dì lereines ciricias
13 Ea;ì t'P° prneua louiootaçao kr-sr ruu Sauuluss tI55a). M. ra pairialuiuruule
Tcuu c uumntuuu. Imia huruucu de poder poder-saber das disciplinas cercou
'

tsEa tEll póxPEno rubitho

24
1 125

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lfl} UJ Cl rLILfl1 i uciedde rna tudux dems ijiiceìuiani, o (inha atiradu, jacobnameiite. para o Io das relaçoes privadas; permie colocar
\Lhl. CITÇCS VCrSS enhi-e OS lUaiiJ CtifljUfltS tit cehÇÚCS sc a sociedade naciornìl nurn espço mundial. mas de tal modo que este é concebido
.-tL{tkaS. Cada spçu estrutura! é urn lenúrneno cphti consliluldu como urna estrutura interna da própria sociedade nacional, ou seja, cuino matriz
1ur nti eeicnares urna unidalc de ac sociaL urna uma organizadora dus eleftos perlinentes que as condiçes. mundiais eercem sobre
tiuI p\ieglh1. um 111ecanis10 dc puder. uui unii de dcu e um cada urn dos espaços estruturais. Acima de Ludo. esta coneepçAo permite mostrar
que a mflureza política do poder nao ¿ um atributo exclusivo de urna determinada
Q &V)-u /meflUffi cittuIu petas reIaçes sucis
dre%us e (us forma de poder. E antes o efeioe global da combinaço en*re as diferentes
d- c c' cc meinbrus da tal. uomeadarneine entre u humem òrrnas de poder. Mas a tualidde prkcpal desta ottcepço ¿ que elz perrne
ím1h:- e cne ErÌ1b (uu qLIqUef de'es) e tilhus. Nee espaço, a responder adequadaineitte 'aterceird objecço contra a eliminaço da distinçio
lxmLdc ik ica \U us sexos C u gerçe. a urpna itiIeiuna t
Esiad&sociedade civil. ou seja. à idela de que tal eliminaçäo é particularmente
. um:ha e u u mecaiisinu du puder t u pararcadu. perioSa flas sociedades perif&icas e semiperifdricas dotadas de sociedades civis
L 1Iu}F dL JuI-RhcRade 1 U (iCU dcécu (as rinas partìlliadas uu iupuaas fracas e pouco autónomas.
w,. FcRItaffl as -cç11es É(idi;ma nu
rac,nahdade Ci(i Ja arnfla) e u fl1t)j) de
' '-1aç du O .J)UÇO du psuduçôo é ctsihsu peIS
d} )fl R:evu tIC U haUìu, tamu a eaçe de 1n-&iduçüu au nivel da empresa lUpóteses sobre o Estado e as formas de puder social em Portugal
:TF1 e JE ue
[fl' (h1CCUe C que e aprupriam da pur eae iivaa
.
e m}t! S reÇe' na pruduçiu entre tíahahudures e entre estes e Procurareì niostrar que esta proposta conceptual permite tbrmuiar uës
(L'U P, que tiU U pFUeC.c) dt rabahu. Neste etmtexn, .i uidade da qtmestôes ue considero fundamernais para compreender o Estado e a sociedade
',u, I a eac.
a Íibca uu en1prea. o a niia hislituciurial é cm Portugal. Em primeiru lugar, a questto de saber se a sociedade ciíI
FCj FUU tk} uridcdade é u dreu da
¡iudr ( a eXj)haÇÏiu. a hnna de portuguesa ¿ de tacto pouco autónoma. Em segundo lugar, se a
traca e
k)iaç:}u tu th ehu
hiea. u iegua1uett> da eirc, o ciSdgo Jeitóìco)
centralidade do Estado é igual ou diferente da centralidade dus Estados dus
e i de uetahdide d u do Lucro. O epço da .idudania iiçu países centrais. Ein rerceiro lugar, sob que condiçoes sociais a centralidade du
1&Li eiç sueaìs da eNiera pdhhca emre cUadüus e u Esudu.
Estado se combina corn a ineIcicia da sua actuaçao.
euiuextu a udade da ire sucia d u iìdi vduo, a lumia iitucima1
Antes de mais cabe perguntar se a sociedades civis setniperiférica
yt:idu u de puder d a dtìtiaç, a Iurna de juridicidide ¿
u u tirii Purtugsi.o caso que nos ìneressa particularmente) sAo de facto fracas e pouce
eU1? !en esata, o único extente paia u dgndica
1JTlhL L'U WUtIU de raciwìahdade é u maximz aç o da eakiade. Por únio. autónoìnas. Corno se sabe, a distiiìço Esado/sociedade civil IOi elahurada cnt
íJ 1 du mwifudidude ctI1ui a relaçöes ccuninicas iuiermcionais e as ïunçio das cundiçöes económicas sociais e políticas dus países centrais own
!)C I-stadu 1aemaìs na nìedda cnt que eres megrau o ssteina período hem definido da sua histOria. Ista distinçio ostentava em dui pre%-
ri;jt Nee euucxiu. i uiidade da rtca sued a açu. a Íorna suposlos. PilmIteirU, era fkì1 delimitar o Estado, pois, au contririo do que
IçtIg'i; as us aciirdus e- cwtrnus iiIeri1acitmaìs. o
sucedia rom a suciedade civil, era urna e dispanha de urna contruço artificial

e_ ULUU poder a tinca desguaI a Iua de jurdicdade u dreiio


estrutura formal. O
segundo presuposto era que o ltado fora, de iacui ciio
,OkEWLO (N UHI5 vCS fläu cariU e ni expcsa.s que reguam pela suciedade civil segundo as tiecessidades e interesses desta. deJa dependendo
para a sua reproduçki e cunsulidaçâo. As necessidades e os interesses cram
', L Lu. de gi a ' e a re I ados e en ie esas i j ui nc pict in: e
iC a iiiiaçu da etcea. fundamentalmente económicos e brarn eles que derarn mnaterialidade ideia
da suciedade civil t)r-te e autónoma.
me pusu deter aqu mo vinuahdades ara1ûiea e eÓrica dea
WeL IIiIJ \ a I)re 6 que: Fie hiIiia a rgdez esiuiurai piura- Uina vez convertida em teoria política dominante e eponada cornu Uil

/ukk o rtur sueias sein cuuiudu cair nu ueraccu1ìsmu u!uuri; para sociedades perifrìcas e semiperiféricas que entretanto se foratn formando

F3k IO1' ai menaces emi-e as c uthcinizintes cru1urais e as acçörs e transrnurndo. a distinçiu liberal nìu podia deixar de deinir estas suciedades
FCRIk ttma posvei regiesav au nivduu scm no enaoro o lazer
urna
de ua luTa indvidua]ta: repTc U CTÇU huudsticu que a tra cisscu
V tITO WI dinjc,m' ia eiii qi5o T aiotiothi uo lerceiru e.puiuit

12(T
I 127

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cumi ociedade Íîac puco utn()iia. Nekis o espaço
rehiçAo EsUidofo- via, criou-se um certo isomorfismo entre o espaço da produçiio,
e a
cedde cv ìflveflj-se por completo: conj o que se podera au mesmo tempo que para os países que
riis suciejaije doméstko B O espaço da cidadania,
desi pur ocedade civH era urn produtu oia do Estado coIonai e nas pnmeiro se indusfflaIzaram o espaço mundial no conslitui qualquer efeko
dcai socied;des pertérjcus e seiniperfér u 'subredesenvovmentu" do condicionante flCgaIVO (ou seja, no havia nessa altura pafses
desenvo'vidos
1::,tjtJo eu papeJ deìjvu euI1u1flia Iesternunhaya de gua modo a cuja dominnca era necessário defroniar).
Ub(rd1çiO da sucìedaJe clvii em eIaçio o Estado. A hegemona desta
Este somothsmo fo a base social da chamada racionalidade
tìrinal do
cuflctpçi() lUi tJ que pssuu i dominar rodo u discurso pOJÍtCD anda que dentro dos
exercer funçôes
corn iguu. !ìaze nnpoi-lajites, reve1adore, uHá, da rIdade teórica Estado. da sua cpacdade para efkazmente as suas
exemplo.
Imftes hegemoncamente esiabelecidos. O isomorfismo signiticou por
da
C(1flCLpÇiu ik he. Pur exernp(), eriqunlu o dieurso Conservador tendeu a
que as tr.s trinas de poder -o patñarcado. a expIuraço e a dominaçn
concehe a traqueza da ocedade civJ como um etèku da força do Estado, o e, au mesmo
thSCUNU u-c-dcpiiocrata tendeti pudessem ser funcionalmente muo diferenciadas e autónomas
cnnceber quea da socedade civil cuino
urna ca tht tirç do Esudo. iernpo, convergir substancialmente nos efelios do exercício
cada uma delas confirmando e potenciando a eficácia das
dessa
restantes.
autonomia,

É taitihtpii u qudru teórico e puIcn corn que se tern anilisado a


Na semiperferìa as coisas passaramse de modo muito diterente. Por
uni
ciedaie pur'ugue e as cnduôe nio podeni dex de ser s ine8rnas.
moderniaçio do espiço da cidadania precedeu a do espaço da produçio
No enramo. se len1ariins beiii, este quadm eóeo explica rnuio poucu da lado, a
restritivo. preceden o
sijade p()ruIJesj, e .e no ibetir,no dec chegaremos a concusöes (por esempio. o parlamentarismo, mesmo restrito ou
em a ele urna grande
manteve relaçâo
sigIicaIvaiienie dèrente. Asii, uz da pFupusla concepua que
grande surto de industriaIizaço) e
reproduzir sob iias
autonomia, um facto que, entre nós, se tern indo a
cinia, j -}ccdde cvU 1uruguea s$ fraca e puco autónoma se.
egundo au presente, Por nutro lado, o espaço da prOdLIÇäO Inanteve
sempre
u flI()Ldu tja' Mcedade centrs. a demicarruos lorinas aU
curn u espaço da pfl}duçk) na heteneneidade das
UIJ (ja cidadjpija. Se au c(}Itiárj() aieíltarinos no espaçu urna grande heterogeneidade interna bem sijnboizada
doinésco, actividades produtivas. na desartculaçio ou fraca complementaridade entre
vQTtica,i1(,s I]ue SUCìCddt civil poriiuesa
i
inuiio torte, ainónoina e
sectores. nos grandes desequilibrios de produtividade intersectorial e
intrasectorlal
iwt-reguada uu, in iodo u euo, i niais Iòrte, auóiioiiia e autoreguada que
u sudethide c vis CeÍ)iiai. e, finalmente. na coexistência domodo dc produçâo capitalista como outros
é c-ssa auttln()n-iía e auto-reguaçäo que torna
píve No espaço doméstIco verificouse a mesma
que o epaçt diéico
preerichu alguinas das kìcunas da providênca
iiiudos de pruduçio nao capitalista.
relativamente
¿ia1a e asin se constitua ciii scedade-pro'idêncjn cuino flt tenh() heterugeneidade, a qual Ihe proporcionou urna lógica de reproduçäo
chamado.
autónoma, tanto em rebço au espaço de produço, como em relaço au espaço
IoFiafl1u, prineiro argunleifl() a favor da allernaliva ConcepWa
t)
da cidadania, condicionada e, de algum modo, potenciada pela posiçäo
de
ain da sua iiiaor disci-iminaço anaUica, efa penrnie comparaçjcs que. ao dependencia da sociedade semìperifñca no espaço mundial.
envjezd contra as sociedades eniiperjfércas C) segundo
guiflento é niais con1pex() e corn ek pretendo iiiorar A grande heterogeneidade interna dus varios espaços estruttirais e a no
que a centrztlidade
do Estado no países cent-ms currespondéncia entre os sens ditrentes requisitos de repnmduço produziu oto
thlèrente da cCnirajdade do Esiado numa o
MlcicdatJe com a poiïuguea e que esse tacto, de délice de hegernonia ou, se preferirmos. um dfice de ubjectivos naciomlais.
mporinca capital. flo ou compensado pelo excesso" de autoritarismo do Estado.
puth s cxpcado ein lermos da dicotomia Esado/sociedaije quai )I coberto
civU. Cuino refeii
acnia, a auIunoiiia dä ociedade cviI nas ocedades Ein Portugal, este excesso' assumiu tanto formas demflocrIicas, corno l'urinas
centrs sgn1ica bai e continua a ser) exercido tanto directamente pelo Estado,
cJflIeflte que o epuço de produção ditaioriai.s fui (e
noldou. segundo as suas necesidades e
os cu ¡i(ei o espaçu da cdadauia e, purrantu, o corno pelas vûrias organizaçöes (rneios de comunìcaçio. partidos. empresas,
Estado. ManièsLaçt,
IJisli) iiieimi u hicto de a ndusinaIìzaço ter precedido o padanieinastio sindicatos, t'arnflias oIigrquìcas. etc.) que em qualquer dos espaços estruturais

eflquanlo regine político domnanie e de esle, tanto exercern, por delegaço ou subcontrataçäo. poderes esotmais ou paraesmatais.
na sua constiuiçäo, como
nu scu iiìconamerno, ter Correspondido aus interesses Dacluiresultaram (e conhinuam a resuhar) duas consequncias. Por um lado,
gerais da expanso do
Cd)th.çtflt, A1Ç, a pujauça do espaço da dada a sua heterogeneidade interna, cada urn dus espaços estruturais e sua
produçio manitèsou-s tambërn no se
mudo como ee translorinØu U espaço doméstico. e turma de poder é t'uncionalmente muito dependente dus restantes para
portanto a tamíia, em reproduzir; por outro {ado. a relativa autonomia entre eles e o correspondente
IEço da esgêocas da reproduç() da trça dc rabatho assaIarùda. Por esta instveis e
ddtìce de ìsumorhsmo faz corn que as relaçes entre eles sejarn

I 28
I 29

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nceiern. pa-i e UcÎilrein, da presença esruuranLe de urn vínculo auto- Ao contrário do que se passa nos países centrais, näo se trata de nt1uências
exercidas sobre o Estado e sua acçäo mas da contTìguraço interna do próprio
A cent.thdade do Eado porwgus pod er do Estado, O autoritarismo estatal, por ser relativamente inecaz, é no
enquanto Estado senhiperìtérico ds
!huese am e antes de rna
da dos Estados dus países centrais por ser só incompleto corno cornraditóro, o que. por sua vez, contñbui para a grtnde
Iflii auiorithria e menos hegernórca e pur ser mais dífícU determrnar mde o heterogeneidade e ragmentardade da actuaço do Estado. Tul beterogeneidade
Biadu acaba e o noEstado cumeça, Mas. para aItm disto, e uni tinto assume várias OrnraS, algurnas das quais j analisei ein trabaihos aineriores

pardoxa1rnente, este npo de entraade é urna cenralìdade que no e sabe Mencuno aqui urna raramente reIrda. Reside no modo cuino a iiCtUUÇO da
burocracia do Estado oscila entre a extrema rigidez disthncia e wrnalisnro
impor cíkaznìenie, ou sej, cu esutados de exerciclo hearn sempre aquérn
gic que hcc subzu. A decitraç> dete ;iparcnte paraduxu (o terceiro corn que obriga u cidadão anónimo e scm referências (a que charnu sociedade
estranha) a cansar-se aos balces de serviços inacessíveis, a preericher
w1k:rnu que aquí teceflo) et em que. na senipenteria. os tactures da civil

torinulrius ìninteligveis, e a pagar impostes injustos e a extrema flexhilidade,


cel1EIJdEh d, hsah .su ghnente Íadues da neflccia desie. A hetero
cidado
cikfad. ntern do epzço itko
e du espaço de produçiu e .i
intìmidade e inforrnalidade corn que
conhecido e corn boas reterências (a sociedade civil
trata, para os mesmos
nIima).
eleitos, o

-
F-s)(flçia eiUC us
1
IC(JUi5iU5 de reoduço crani auttmoiiiis
HkUivu'; cm cada uni riúdens estrffluri d iedde
pwtuuesa cujo Trata-se de urna oscilaçio entre o Estado predador e O Estado protector
tcthi ewcrgciIc c de subvercer, ianswrnar. apropriar, cui swna, bojuer seundu urna lógica de racionalidade totalmente oposta à do espaço de cidadania
1c1L[çi1 di Iwdu. Asnn. cuiurrio do que se passa nos países reiìtrms. (a nlio(imizaçãU da leuldade) porque se trata de urna lealdade interpessoal.
i mportinlc eterminar au mma relativa du espaçu de ckIadana (do anda que obtida à custa da prvatiaçio de recursos públicos, urna liSgica de
em e!açiu aus ccanIes espaçus estrwurais corno deteniìimrr a aurononna raciortalidade em todo u caso mais próxima da racionaiidade do espaçu doméstico
L]i11 Va C1I í'Iaçmu irquee. (a tnaxitnizaçO da alèctividade) do que da racionalidade du espaço de produçio
. *- (a riadmizaçio do lucru) Talvei por issu, estas e outrus iraniesEaçes dc
A priura'ia du putíticu. ou rriclhoi, do espaço de cidadaca sub a
particularisiTto C de heterogcneidade fazem corn que a actuaçãu do Estado ritlu
raLh1. cuexkre, dete iado. corn n uu dependiiicia cui relaçio aus uutros
trr
t
mereça sequer a contiança da classe dominante no espaço da produço o
epaçu\ C ìredkh a trma du 1oder du Estado, a drnivaço, exercese,
empresariado capitalista Para além de esta ser fragmentada enqualito classe, o
na prai(a. ein ctinqex as cLrIlbivaçÔes corri as toruus de podc
cucterstkas Estado só a ahe servir îragmentarìamente. Este pudran de actuaço do Estado
Ju' uiFr-u e1).ços eirrura, o que curilere
n:rnde parlicukrrsrrio aduaçìo é sìiirultaneaniente causa e eèito de as prátcas de classe, ao contrúro do que
d trad {1hCUrLJS!IIt), Ì1Cpotsfla r, cur rujçitr. ele). Ta prrticuarsnio pode
da itrpeuetraçr errire u eaço da cidadania e o e.spaço doméstico
sucede (ou sucedeu até hí pouco) nos países centrais, no se traduzirem
linearmente ein políticas de classe.
e. poi-I antu. riric domiiiaçiu e pairiarcado, pur exenipk, no caso em que a
hr sradtr e o execício da cidadarija skr t1ekados ijilorniajwerrle Procurel mostrar ueste capítulo que a distinçio Estado/sociedade civil,

: em r(li JgtLquica. aiuda huje pudensas em moitas zonas ou secttwcs


iaiì dr país e rrrcorru nu interior do prOprio Estado. Ou pude resuHar da
Ie1tEìetraçu Cfl!rc U espaÇu de cidadania e u espaço de pruduço e. purtauto,
para aléja do scu simplismo e reducionisino gerais, é partkularmentc inadequada
para analisar
portugueszL O
urna sociedade serniperìt'érka corno, por eemplu, a sociedade
descaso das condiçôes históricas, sociais. políticas e ecottôtnicas
erOri' e epIrrraçäo, eXCflrpk) nos casos ein que enipresrios ou
espeellicas de urna suciedadc deste tipo dá origem a urn efeito de ocultaç5o
rflI)resas adquirciu rendas pol(ticas dc uionopülio cobradas sobre os seus particularmente ampio.
Lrat,athad 'i-es ou subie a prt.nìa actuaçìu du s1aji ou ainda nos casos cur
tJue u tadu cm si, uni espaço de ruduço subredimensionado, de tal
.

niudo que uiia Iracçthr siguilicatva da classe média tenr a sua base Referências Bibliogrúlkas
social no
pr(rio 1stadu, islo é, no orçairreno du Estado. O particularismo da actuaço
d liadu pode ser 1-mal acule urna jòpma de inteipenetraçüo entre o espaço Ai)LER. Max 1922), Die SwusauJfrissu,i
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nos casos err que os países centrais ou as oranizaçÒes
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t98. as identidades aparentemente mais sólidas, como a de mubber, bomem, país africano, país
WALLERSTEIN, hsmanue1 (1980), «The Withering Away of the States», buernational Journal
latino-americano ou país europeo, escondem negociaçes de sentido, jogos de polissemia,
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choques de temporalidades em constanle processo de iransformaçâo, responsveis em
WOOD, E. Meiksins (1981), «The Separation of the Economic and the PolticaJ in Capta1isn1'>,
última instância pela sucessäo de configuraçôes hermenêuticas que de epoca para epoca
New Left Review, 127: 66.
däo corpo e vida a tais identidades. kbentidades sao, pois, identificaçöes em curso.
Sabemos tambm que as identificaçSes, além de plurais, so donthadas pela obsessão
da diferença e pela hierarquìa das distinçòes. Quem pergunta pela sua identidade ques-
tiona as referncias hegemónicas mas. ao fazê-bo, co'oca-se na posiçäo de outro e, simut-
taneamente, numa situaço de car6ncia e por isso de subordinaçâo. Os artistas europeus
raramenle tiveram de perguntar pela sua ideniidade, mas os artistas africanos e latino-
-ameiicanos, a trabathar na Europa viudos de países que, para a Europa, no cram mais
que fomecedores de matérias primas, forain forçados a suscitar a questäo da identidade.
A questo da dentidade assim semifictícia e seminecessária, Para quem a formula,
apresenta-se sempre como urna ficço necessária. Se a resposta é obtida, o seo éxito
mede-se pe'a intensidade da consciencia de que a questão fôra, desde o inicio, urna neces-
sidade fictícia. É, pois, crucial conhecer quem pergunta la identidade, em que candi-
çöes, conira quem, corn que propósitos e corn que resultados.
Sabernos, por úhimo, que a resposta, corn éxito, à questäo da identidade se traduz
sempre numa reintei:pretaçäo fundadora que converte o d6fice de sentido da pergunta no
excesso de sentido da resposta. Fá-lo, ins*aurando um começo radical que combina flilgu-
rantemente o ppiio e o aihelo, o individuai e o colectivo; a tradiço e a modernidade.
Ftdguraç&s deste tipo podem ser identificadas em criadores culturais e politicos como
Lu Xun na China, Tagore na India, Marietegui no Peru, Martí em Cuba. Cabrai na Guiné-
PDF compression, OCR, web optimization using a watermarked evaluation copy of CVISION PDFCompressor -Bissau e Cabo Veide, Femando Person em Portugal, Oswald de Andrade no Brasil. O
j O Pela Mäo de Alice. O Social e o Político PósModernidade Modernidade. Identidade e a Cultura de Front elpa
121

de Oswald de Andrade é, a este propósito, particularmente significavo. Ao declarar


jSO preocupaço em centrar a sua escrita sobre si proprio, a única subjectividade de que tinha
fl poemas reunidos na colectânea Pau-Brasil, publicada em 1924. como tendo sìdo escri- conhecixuento concreto e Intimo. A segunda concepçäo, te6rica desespaciaJija e des-
tos «por ocasio da descobeila do Brasil» Andrade propöe-nos um começo radical
que, temporalizada, tern em Descartes o seu representante paradigmatico,
Curiosamente, no
m vez de exdufr, devora canibalisticamente o tempo que o seja ele o tempo fai- Discurso do Método, e sobretudo na intrigante biografia intelectuai que nele se narra,
b
precedes

,amente primonlial do nativismo, ou o tempo falsamente universal do eurocentrismo. inclicaçöes preciosas sobre o contexto pessoal social e politico que permitiram a Descar-
1sta voracidade inicial e iniciitica funda um novo e mais ampio horizonte de reflexivi- tes criar urna filosofia sein contexto (Descartes, 1972).

dade, de diversidade e de diálogo donde ¿ possível ver a diferença abissal entre a ma- Estas duas tensöes -sulectividade individual/subjectjvjdade
coleciya subjectivi-
cumba para turistas e a tolerância raciaL Acima de tudo, Oswald de Andrade sabe que a dade contextuat/subjectjvjdade universal - estäo na base das duas grandes
tradiçöes da
unica venladeira descoberta é a autodescoberta e que esta implica presentiflear o outro e teoria social e política da modemidade. NAo cabe aqui refazer o viatico
do seu percurso
conhecer a posiçäo de poder a partir do quai é possívd a apropriaço selectiva e transfor- nos ltirnos trezentos e cinquenta anos. Referirci apenas as suas encruziihadas
pñncipais.
madora dele (Mdrade. 1990). 0 desenvolvimento da arte moderna europeia, de Gauguin Afirmei no quarto capítulo que o paradigma da modeniidade é um projecto
scio-cul1ijraj
ao fauvismo ao cubismo ao expressionismo e ao surrealismo, beneficiou de modo signi- muito ampio, prenhe de contradiçécs e de potencialidades que na sua mainz,
aspira a urn
ficativo, da apropriaçäo selectiva de culturas näo-europeias. nomeadamente africanas; no equilíbzio entre a regu1aço social e a emancipaçao social. A trajectória
sociai deste para-
entanto tal apropriaçAo leve lugar a partir de urna posìço de poder totalmente distinta digma nâo é linear, mas o que mais profmdamente a caracteriza é o processo histórico da
daquela que Ievou à decoraço. em tempos recentes, dos escudos usados nas guerras progressiva absorçâo ou colapso da ernancipaçao na regu1aço e portano da converso
iitergrupais na Guiné-Papua corn os logos de cervejas ocidentais. perversa das energias emancipatérias em em meu entender se
energías regu1atórias o que
o que sabemos de novo sobre os processos de identidade e de identificaço. näo deve crescente proniiscuiclade entre o projecto da modemidade e o desenvo1vjnto
sendo muito, é, contudo, precioso para avallar as transforniaçöes por que está a passai a histético do capitalismo particularmente evidente a partir de meados do século XIX. Para
teoria socia' em tinço da quase obsessiva preocupaçäo corn a questäo da identidade que o que aquí nos interessa,cabe referir que o posicionamento específico da teoria política
tern vindo a dominá-la nos últimos tempos e que, tudo leva a crer, continuará a dorniná-la liberal perante as duas tensöes acima referidas representa a proposta hegemónica da reso-
na década entrante. luçäo da quesiäo da identidade moderna. Na tenso entre subjectividade individual e
sujectividade colectjva a prioridade é dada à subjectividade individua!; na tensäo
etitre
subjectividade contextual e subjectividade abstracta a prioridade é dada à
subjectividade
A descontetualizaçäo da identidade na modernidade abstract& Trata-se de propostas hegemónicas mas nao nicas nem era todo
caso o está-
veis, O triunfo da subjectividade individual propulsionado pelo principio do mercado e da
A preocupaçào corn a identidade nao , obviarnente nova. Podemos dizer até que a propriedade individual, que se afisma de Locke a Adam Smith, acarreta consigo, pelas
modemidade nasce dela e corn aia. O primeiro nome moderno da identidade é a subject-i- antinomias próprias do principio do mercado, a exigência de um super-sujeito que
regule
vidade. O colapso da cosrnovisAo teocrltica medieva' trouxe consigo a questho da autoria e autorize a autoria socia! das individuos. Esse sujeito monumental é
o Estado liberal.
do mundo e o individuo constituiu a primeira resposta. O humanismo renascentista é a Seudo urna emanaço da sociedade civil, por via do contrato social, o Estado liberal tern
prirneira afIoraço paradigrnàtìca da individualidade como subjectividade. Trata-se de um poder de império sobre cia; sendo, ao contrário desta, urna criaçäo arttheia1 pode ser
arti-
paradigma emergente onde se crazan tensionaimente múltiplas linhas de consIruço da ficialmen manipulado ad fr/lnitum; scado ftrncionalmente específico, pode
mu]tip&ar
subjectividade moderna. Dims dessas tens&s merecem um relevo especial. A primeira as suas fimçöes; seudo uni Estado minimo, Ceifl potencialidades para se transformar em
ocoi-re entre a subjectiidade individual e a subjectividade colectiva. A ideia de um Istado máxino.
mundo produzido por acçâo humana postula a necessidade de conceber a communüas ein Desta polarizaçäo entre individuo e Estado quem sai perdedor é o princfpio da cornu-
que tal produço ocorre. O colapso da communixas medieval cria um vazio que vai ser nklade pmpugnaáo por Rousseau, que visava em vez da ntraposiço entre ìndivíduo e
conflitualmente e nunca plenamente preenchido pelo Estado moderno, cuja subjectivi- Estado urna sintese complexa e dinamica entre eles, um modo moderno de reconstituir a
dade é afirmada por todas as teorias da soberania posteriores ao tratado de VestefJia. ComnWnjas medieval agora destranscendentaljzada. A derrota de Rousseau aprofundon
Esta tensäo mantém-se irtesolvida att aos nossos dias e tern a sua meihor formu1aço te6- tilflm a derrota da subjectivjdade contextual perante a subjectividade abstracta, ou seja.
rica na dialéctica hegeliana da Ich-Individualität /Ich-Kollektivität. A segunda tensäo é a dermis de Montaigne perante Descartes. este processo histórico de polarizaço e de
entre urna concepçâo concreta e contextual da subjectividade e urna concepçäo abstracta descontextuajjçäo da identidade conhece urna série de desenvolviinentos paralelos. Um
scm tempo nein espaços definidos. A primeira concepçto está bern simbolizada na obra deles, crdaJ para interpenetraço da modernidade coin o capitalismo, ocurre na Penmn-
de Montaigne, Shakespeare, Erasmus e Rabelais. Montaigne é a este respeito particular-
so seus
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meflu eXvrnplar pelo seu combare teorìzaçào abstracta falsamente universal e pela sua
Janeiro de poucos meses de Colombo
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sua
Sula ibérica e

2
protagonistas Portugal e Espartha.
1492, antes iniciar a víagein, car
Pe/a Mao de A/we. O Social e o Poliuco na Pó3-Modernidade Modernidade, (dent/dade e a Cultura de Fronte/ra
122 23

Granada e corn ela terminam oitn scuos de dominio mourn na península. Logo depois direito natural perpetradas por eles pelos aztecas ao praticarem sacrificios humanos e
canibalismo; pelos incas ao aceitaxtrn a urania e a deificaçao do Inca (Vitoria,
mithares e mithares de 1vros escritos e preservados ao longo dc séculos por insignes geó- 1991). Do
grafos, matemáticos, astrónomos, cientistas, poetas, historiadores e filósofos mourns so mesmo modo, Grotius justificava a guerra justa contra os animais selvagens e contra «os
quetmados no fogo da Santa Inuisiçäo, a mesma que a partir de 31 dc Março de 1492 hornens que cram corno eles», au mesmo lempo que justificava a ocupaçäo dos tenitórios
cumpre o edito de Isabel de Castela, expulsando os judeus e confiscando-thes os bens do Novo Mundo pelo tacto de o direito natural abominar o vazio (Grotius, 1925).
corn que 4o ser fmanciadas logo a seguir as viagens de Colombe (Carew. 1988a: 15; Nâo devernos exagerar a coerència entre as construçes ideológicas do outro da ìden-
9S8b 51). E o fim do Iluminismo mourn e judaico sem o quai. ironicamente. a Renas- tidade moderna europeia e as práticas concretas da colonizaçan das Américas e da Afiica.
cenca nao seria possiveL Corn base na linguagern abstracta e rnanipulável da fé e nos näo Nem urnas nem outras tiveraui desenvolvimentos lineares e acm estes oram necessa-
menos manipuláveis crft&ios de irnpeza de sangue. é declarada urna guerra total nos riamente sincronizados, ainda que a pretensa sincronia fosse ein prépria objecto de cons-

grandes criadores culturais da península. os quais, no caso específico dos mourns, tinharn truçäo ideológica conseguida no scu methor por via da Imguagern rnetafôrica corno

sido parte integrante de urna ordern politica em que durante séculos puderam conviver. quando. por exemplo, a Companhia da Virginia justificava em 1610 o com&io corn os

em espirito de Loteiticia, cristos. judeus e moums e de urna ordern religiosa. o Powbatans declarando que «comprava deles as pérolas da tena. vendendo-Ihes em troca

que na sua fase inicial tinha recebido importantes influthcias das grandes civi!izaçöes as pérolas do céu» (Carew 1988b). No próprio espaço europeu. a descontextualizaçâo e
a
africanas do vale do Nilo, da Etiópia, da Núbia e do EgiptoO. Este iquíssirno processo po1arizaço das identidades hegemónicas, o indivIduo e o Estado, passaram por momen-

histórico de contextualizaçAo e de recontextuahzaçäo de identidades cufturais interrom- tos de forte contestaçäo. Refiro a titulo de exemplo, dois desses momentos, o romai-
pido vio'entamente por um acto de pilbagem poliüca e reIgiosa que iinpôe urna ordern tismo e o marxismo.

que, por se arrogar o monopólio regulador das consciencias e das práticas, dispensa a
intervençäo transfonnadora dos contextos, da negociaçäo e do diálogo. Assim se instaura
urna nova era de fanatsmo de racismo, e de centrocentrismo. As contestaçôes romántica e marxista
A concornilância temporal deste acto corn o inicio das viagens de Colombo no urna
mera coincidencia; estamos no prehídio do etnocídio dos poyos amerIndios, assistimos ao Sem grande detença, retenho da contestaçäo romântica da identidade moderna os

ensaio ideológico e linguistico que o vai legitimar. Aliás, este ensaio europeu da guerra seguintes traços gerais. Contra urna racionalidade descontextuaiizada e abstracta crescen-

Ro outro no urna especificidade dos países ibéricos. Alguém disse recentemente que a temente colonizada pelo insmenauismo cientifico e pelo cálculo económico. o roman-
invaso da An*ica do Norte começou corn a invaso da Irlanda (Rai, 1993 25), e pode tismo propee urna busca radical de klentithde que implica urna nova reaçao corn a naw-

mesmo afirmar-se corn segurança que os ingleses transferirarn para a Virginia e a Nova reza e á revalorizaço do irracional, do inconsciente, do mitico e do popu'ar e oteencon-
inglaterra os métodos e a ideologia de coIonizaçIo destrutiva que tinham aplicado contra ti'O corn o outro da modemidade, o homem natural, primitivo, espontâneo, dotado de

a Irlanda nos séculos XVI e XVII (Roiston. 1993: 7). Significativamente, em ambos os fornas prias de organizaçäo social. Contra a parelba indivlduoEstado e o juridicismo
casos, a subjectividade do outro negada pelo «facto» de näo corresponder a nenhurna
t
abstracto que a regula, o rnmartismo g'orifica a subjectividade individual pelo que há
das subjectividades hegemónicas da modernidade em construçâo: o individuo e o Estado. nela de oñgina!, irregular, imprevisível, excessivo, em suma pelo que h ne]a de fuga à
De Juan de Sepuveda no seu debate corn Bartolomeu de las Casas, no isabelino Humph- regulação estalal-kgal. Longe de ser urna proposta reaccionária, a contestaçao romântica
rey Gilbert, o carrasco da Irlanda, o outro nAo é urn verdadeiro individuo porque o seu é, como hoje comummente se reconhece, herdeira do reformismo iluminista que apenas

comportamento se desvia abissalmente das normas da fé e do mercado. TAopouco é critica pelo realismo estreitoem que deixou fechar as suas reformas, abrindo assim
detentor de subjectividade estatal, pois que no conhece a ideia do Estado nem a de lei espaça para a utopia social onde os projectos socialistas ocupam um lugar centrai pari

e vive segundo formas comunitárias, pejorativarnente designadas por bandos, tribos passu corn formas de religiosidade de recorte panteísta onde a herança rousseaunana é

hordas, que no se coadunam nem corn a subjectividade estatal. nem corn a subjectivi- visível (Aguiar e Silva, 1984 531 e ss.).
t
dade individual. A este propósito deve salientar-se que o discurso jurídico é um suporte A contestaço marxista da identidade moderna tern mais pontos de contacto corn a
crucial da linguagern abstracta que permite descontextualizar e consequentemente negar a contestaçäo romántica do que durante rnuito tempo quis admitir, mas a direcçAo que toma
subjectividade do onu-o no mesmo processo em que a designa e a avatia à luz de critérios é obviamente muito distinta. A recontextualizaço da identidade proposta pelo marxismo
pretensamente universais. Em 1532, o jurista de Salamanca. Francisco de Vitoria. argu- contra o individuatismo e o estatismo abstractos é feita atmavés do enfoque nas relaç&s
mentava que a conquista das aztecas e dos incas estava justificada pelas violaçöes do sociais de produço, no papel consntutivo destas, nas deias e nas práticas dos individuos
concretos e nas rebçes
assimétricas e diferenciadas destes corn o Estado. Por esta via, o
confuto da modernidade entre regulaçâo e emancipaçäo passa a ser definido
rnatricial
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tais
Marim
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Paralelamente. ras using a watermarked evaluation copy of CVISION PDFCompressor
Bcmal, enire outros, tern vinclo a chamar a

da cu1tuaocìc1enta1. e nomeadatnenie da Anìguìdade C1sslca (Bernal. 1987.


aenç5o para as dncanas e orlen-
segundo as classes que o protagonizam: a burguesia do lado da reguIaço e o operariado
124 Pela Mâo de Alice. O Social e o Politico na Pós-Modernklade Modernidade. ld -;:hade e a Cultura de l-ronteiìa

do 'ado da emancipaço. Trata-se de um avanço notável que recontextualiza a subjectivj- çado sobre todas as formas de «primordialismo» que näo correspondessem à base étnica
dade individual e desmonumentaliza o Estado. No cntarto ao deixar na obscuridade as do racismo domiaante e da sua absorçào no conceito de naço, urn conceito inventado ora
mediaçòes entre cada um deles e as classes, o marxismo tendeu a reproduzir, sob outra para legitimar a dorninaçäo de urna etnia sobre as demais, ora para criar urn denominador

forma, a polarizaçäo liberai entre o sujeio ndividua1 e o super-sujeto. sendo que esse socio-cultural conum suficientemente homogéneo para poder funcionar como base social

supersujefto agora a classe e no o Estado. Corn o lenirnsmo, esta polarizaçäo agud adequada à obrigào política geta! e universal exigida pelo Estado, autodesignado assim
zouSe por via da vinculaço abstracta da classe ao partido e deste ao Eslado. Corn isto, a como EstadNço Este processo de homogeneizaçîio foi tanto mais necessario quando

potenciaçâo do super-sujeito agora acumulando classe e Estado, no sO descontextuali- mais complexa eia a base étnica do Estado.
zou a subjectividade individual. corno a devorou antropofagicamente. O auloritarismo Quanto ao incu10 corn a natureza, a condição teórica da sua degradaçäo teve inicio
dal decorrente no mais do que levar ao paroxismo a descontextua!izaçäo da subjectivi nos flrn&diOS da mOdmidade corn a revoluço científica galilaica, newtoniana. As con-
foram múltiplas e corneçaram corn a expansao do capitalismo comercial e
dade e da identidade pressuposta pelo liberalismo. O fun do leninismo é, historicamente, diçöes sociais

o pnrneiro fim do liberalismo. os dSCObriflIflIUS. O conceito de res extensa, a que Descartes reduziu a natureza é iso-
-
Mas se a forma leninista da contestaçào marxista nilo conseguiu superar e, pe'o con- mérfico do cotxito de terra nullius desenvolvido pelos juristas europeus
para justificar a

trário, agravon -- a descontextualização liberal da subjectividade, tâo-pouco o conseguiu a ocupaçäo dos territérios do Novo Mundo. E é também por essa razAo que a concepçäo

como homo 1mL consigo a descontextualizaçäo da sua


forma no-!eninista, social-dernocr1ica. Ao contrrio do que anunciam as evidencias dos poyos amerindios nataralis

em diante, a natureza só poderá ter acesso à cidade por duas


vias.
superficiais, a crise da sociakiemocracia nos países centrais ocorte mais pelo que de libe subjectividade- Dal
ambas ditadas por esta: como jardirn botâthco jardim zoológico e rnuseu einográfico, por
ralismo há na social-democracia do que pe!o que da social-democracia há no liberalismo.
Para verificar isto mesmo d necessario recuar ao sentido original das conteslaçöes um lado; ou corno matdria-prima, por outro. O paper do Estado foi crucial por ter sido
romântica e marxista à deseontexWalizaço e polarizaço da identidade social e cultural indirecto ao criar e aplicar um regime jurídico de propriedade que simultaneamente legiti-
operada pela versäo hegemónica. liberai da modernidade. A contestaçäo rornâniica maya pelo meno princIpio e mantinha incomunicáveis dois processos históricos sirnbió-
ticos: a exp1oiçAo da natureza pelo homem e
a exploraço do homern pelo homem.
prop;e a recontextua1izaço da identidade por via de três vínculos principais: o vínculo
dtnico, o vínculo religioso e o vínculo corn a natureza. A contestaçâo marxista prop&, Por último. o vinculo da classe, que durante algumas décadas conseguiu alimeniar
urna enorme
como vimos a recontextualizaçâo atravs do vínculo da classe. corn êxito urna lealdade terminal alternativa à lealdade ao Estado, soften
partidos operários votaram a favor da concessâo de
Qualquer destes vínculos significava a construço de identidades alternativas à polari erosäo na Europa Central quando os
créditos para financiar a primeira guerra mundial- Corn
isto, a guerra, anterionnente con-
zaço individuo-Estado, portanto, a criaçäo de lealdades terminais inapmpriáveis pelo
nacionais, passou a ser concebida como urna
Estado. A verdade, potrn, que nenhum desses vínculos logrou fazer vingar, nos últimos cebida corno tendO lugar entre burguesias
cern anos, urna alternativa concreta, nein no plano político, nern mesmo no pIano sócio- guerra entre Estados-Naçâo. A incorporaÇäo do operariado no Estado-Naçäo tinha de
progressiva extenso aos trabaIhador dos direitos de
-culturaL Pelo conti*io, o vínculo individuo-Estado, assente no princfpio da obtigaço resto começado muito antes corn a
no período entre guerras e no pos-
política liberal. no cessou de afirmar a sua hegernonia e, por processos diferentes, foi-se cidadania, u.rn longo processo histórico que continuou
transforrnaçäo do
apropriando do potencial alternativo dos dernais vínculos que assim descaraeserizados -guerra e que vejo a implicar urna profunda transformaçäo do Estado: a

acabaram por ser postos ao serviço da lealdade tenninal ao Estado. Estado liberal no Estado-Providencia.
o vínculo reio foi progressivamente marginalizado por várias vias, pela repressâo ConcIno assirn que, sob a égide do capitalismo, a modernidade deixou que as mOlti-
habitavam fossem rdu-
viotenra (nas proibiçöes de culto e confisco dos hens da Igreja), pela substituiçAo de pias identidades e os respectivos contextos intersubjectivos que a

funç&s (nas diferentes formas de secularizaço prolagonizadas pelo Estado, dos ritos ¿idos à lealdade terminal au Estado, urna lealdade omnívora das possíveis lenidades alter-

funerários à educaçao) e pela acomodaço em posiço de subordinaçäo (nas leis de sepa- nativas. As cicncias sociais estiveram desde a sua génese implicadas neste processo. A
raço da Igreja e do Estado). A secularizaçäo das prúticas sodais foi particularmente globalizaçäo das múltiplas identidades na identidade global do Estado tornou
possivel

intensa, como demonstra Femando Catroga em estudo recerne sobre o papel do Estado pensar urna Identidade simétrica do Estado, global e idêiltica como ele -a sociedade-

Uurkheirn é quem. pela piirneira vez, concebe a sociedade no seu todo como a
unidade de
portugns no processo de secularizaçäo da morte no final do sculo XIX (Catroa. 1988).
o sen interesse analítico concentra-se na
Por seu lado. Neil Smelser analisou o debate político na nlaterra no virar do século anglise por excelência da sociologia e por isso

sobre a institucionalizaçäo da educaço pública, urn debate em que pouco se discutiu sociedade em si e nAo em qualquer das suas subunidades, sejam das a Igreja, a familia, a

sobre educaçäo. O verdadeim debele foi sobre as prerrogativas rivais da religiäo e do comunidade local. A questo central para Durkheim é precisamente como definir o ptin-
Es1dø sobre o controlo da educaçao dos cidados, um debate que foi perdido pela Igreja tinham
cfpioda solidariedade dessa unidade global, quando é certo que as solidariedades
(Snielser, 1991). sido tradicionalmente produzidas no scio das suas agora ditas subunidades. No fundo.

PDFQuanto
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vínculo étnico, a
sua dcscarac1erìzaço using a watermarked evaluation copy of CVISION PDFCompressor
do anátema teve lugar através Ian- Durkheìm pretende estabelecer urna lealdade à sociedade isomórfica da lealdade an
26 Pela ?Mo de Alice. O Sodal e o Político ta PósModernidade
Modernidade. Idernidade e a Cultura de Frorneira t27

Estadth É por demais conhecida a soluçäo por ele avançada: tais subunidades tinham pro-
Pelo contrário, a dramaticidade destes sa'tará facilmente aos olbos se o objecto do othar
duzido täo-só íormas primordìais. primitivas. mecanicas de soildariedade; a sua g'obali-
for concebido como de curia duraçào.
zação na sociedade tornava possível urna forma mais avançada, complexa e orgánica de
O clima geral das revisôes é que o processo histórico de descontextualizaçäo das iden-
soiidariedade. São também conhecidas as críticas e as correcçöes que foram feitas ao
tidades e de universa1izaço das práticas sociais muito menos homogéneo e inequívoco
evolucionismo eurocenirista de Durkbeim, desde Malinowski até aos nossos dias.
do que antes se pensou, já que corn ele concorrern veihos e novos processos de recontex-
Antes, porém. de referir a especificidade das releituras mais recentes de Durkheim,
tualizaçäo e de particularizaçäo das identidades e das práticas. Eis algumas das revisäes.
farei menço ao outro grande traço fundador do pensamento da sociedade no seu todo
A propósito da reemeincia da etnicidade, do racismo do sexismo e da religiosidade.
como midade de análise: o traço de Max Weber. Mais sensveI ao arbitrio da histOria do
fala-se do nova «prirnordialismo», do regresso da solidariedade mecánica. do direito às
que à necessidade da evoiuçäo, o problema de Weber é definir a identidade da moderni-
raIzes. A secularizaçäowebenana é confrontada, nao apenas corn o fundamentalismo reh-
dade capta1ista libera! europeia nào tanto porque esta seja inferior ou superior a ouros
gioso. mas tarnbém corn o facto de os factores que tradicionalmente foram tidos como
paradigmas de organizaçäo social, mas antes porque é excepcional. Aos othos esquizofr-
motores da secularizaço, como, por exemplo, o liberalismo e a democracia, se apresenta-
nicos de Weber a modernidade europela o outro de si mesma, um complexo processo
rem hoje em discursos e práticas muito próximos dos que s.o préprios do fundamenta-
de passagem de particularismos contextualizados a universalismos scm contexto pro-
hismo religioso e de a sua eficácia depender da incomensurabilidade e da opacidade red-
cesso designado, em suas múhiplas facetas, por racionalizaço, secularizaçäo. burocrati-
procas enwe os principios absolutos e as práticas realistas típicas da adesAo religiosa. Por
zaço formalização jurídica. democratizaçào, urbanizaçâo, globalizaçäo, etc. A meikta outro lado, a base &nica das naçöes modernas toma-se cada vez mais evidente e o
que se foi aprofundando este processo. a hegemonía histórica da modemidade europeia
Estado-Naçâo, longe de ser urna entidade estável. natural, começa a ser visto como a con-
*ransformou subrepticiamente a excepcionalidade em regra e a partir dal, todos os
densaçäo temporária dos movirnentos que verdadeiramente caracterizam a modernidade
denials paradigmas sócio-cuturais forain colocados na contingencia de quesiionarem a
política: Estados em busca de naçäes e naçôes em busca de Estados. Portugal talvez o
sua idenidade a partir de urna posiçâo de carencia e de subordinaçAo. A separaço disci-
único EStadO-NRÇäO uni-dtxüco da Europa e está a deixar de sê-lo à medida que aumen-
plinar entre a sociologia ( o estudo de «nós», «civilizados») e a antropoiogia (o estudo
tam a imigTaço africana e asiática e o fluxa de turistas residentes, reformados da vida
«deles», «primitivos») caucionou e, de facto, promoveu esta transíormaçäo. A paridade
activa, vindos da Europa do Norte ou mesmo do Japan. Por sua vez, tal como o Estado
epistemolégica entre as duas disciplinas passou a ocultar a assirnetria que Lévi-Strauss
nadional a cultura nacional é confrontada corn pressöes contraditórias. De um hado, a cul-
eloquentemente denunciou ao afirmar que mSs pudemos transformá-los em nossos selva-
tura global (consurnismo, Holywood, disco sound, fast food, cultura comercial, mass
gens. mas eles no podem transformar-nos em seus selvagens.
media globais); do outro, as culturas locais (movimentos comunitários indigenistas, afir-
maço de direitos ancestrais de lingeas e culturas até agora marginahizadas) e as culturas
regionais (por exemplo, na India, na Itáhia e, entre nós a ernergncia do regionalismo nor-
O regresso das identidades
tenho).

A recontextualizaçäo e reparticularii.açäo das identidades e das práticas está a condu-


Tudo parece ter começado a mudar nos últimos anos e as revises profundas por que
zìr a urna reformulaçAo das interrelaçes entre os diferentes vínculos atrás referidos,
esto a passar os discursos e as práticas identitárias deìxam no ax a dúvida sobre se a con-
nomeadamente entre o vínculo nacional classista, racial, &nico e sexual. Tal reformula-
cepço hegemónica da modernidade se equivocou na identificaçäo das tendencias dos
çäo exigida pela verificaçO de fenómenos convergentes ocorrendo nos mais dispares
processos sociais, ou se tais tendências se inverteram totalmente em tempos recentes, ou
lugares do sistema mundiaF o novo racismo na Europa o dedujo genti da politica de
ainda sobre se se está perante urna inversäo de tendencias ou antes perante cruzamentos
classe, sobrewdo evidente nos EUA, onde parece substitufda pela politica étnica do mu!-
m6hiplos de tendências opostas seni que seja possível identificar os vectores mais poten-
ticulturalismo ou pela política sexual dos moviinentos feministas; os movimentos dos
tes. Como se calcula, as dúvidas são acima de todo sobre se o que presenciamos real-
poyos indígenas em todo o continente americano, que,contestam a forma política do
mente uovo ou se apenas novo o olhar corn que o presenciamos. Estarnos numa epoca
Estado pós-colonial; o colapso dos Estados-Naçäo - aimai. multinacionais - e os canili-
em que é muito difícil ser-se linear. Porque estamos numa fase de revisào radical do para-
tos inicos no campo devastado do ex-imp&io sovidtico a transnacionalizaço do funda-
digma epistemoidgico da ciência moderna, é bem possível que seja sobretudo o othar que
mentahismo islâmico; a etnicizaçäo da força de trabalbo em todo o sistema mundial como
está a mudat Mas, por outro lado, no parece crível que essa mudança tivesse ocorrido
forma de a desvalorizar etc., etc.
scm nada ter mudado no objecto do olbar, ainda que, para maior complicaçäo. seja deba-
tivel at que ponto ta! objecto pode ser sequer pensado sem o othar que o olba. Se o nosso
Etienne Bahibar e Immanuel Wallerstein argumentam em trabaiho recente que o
racismo, knge de ser um residuo ou um anacronismo, está a progredir como parte inte-
olhar conceber o seu objecto corno parte de um processo histórico de longa duraçäo,
grante do desnvoIvimento do sistema mundial capitalista (Wahlerstein e Bahibar, 199!).
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bem possivel que as mudanças do presente no Sejan) mais que pequenos ajustaruentos.
sistema alimenta-se da contradiço sempre renovada o
Waflerstein. este entre univer-
128 Pela Mao de Alice. O Social e o Político na POs-Modernidade Modernidade, Identidade e a Cultura de Proníeira i 29

salismo e o paîticulañsmo, seja esie racista ou sexual. Enquanto o universalismo deriva logia do consumismo podem conviver sem grande risco político corn a retracção brutai
da própria forma do mercado da desconvextualizaçäo da subjectividade. do homo econo- do consumo entre camadas cada vez mais amplas da populaçAo mundial. vivendo em
micas, o racismo resulta da thviso entre força de trabaiho centrai e periférica, ou seja. da pobreza extrema. E assim também que a democracia liberal pode ser imposta como «con-
etnicizaçäo a força de trabaiho como estratégia para remunerar um grande sector da diÇAO política» da ajuda aos países do terceiro mundo, ao mesmo tempo que são desirul-
força de trabaiho abaixo dos saários capitalistas normais, scm corn isso correr riscos das as condiçöes económicas e soclais mínimas de urna vivência democrática credivel.
significativos de agitaçào politica. Por outro lado, o sexismo está intimamente ligado ao Para se poderem reforçar mutuamente, a lógica de circuiaçAo simbólica do capital e a
racismo. Os salários milito baixos que este Ultimo permite só säo socialmente possíveis lógica da circulaçAo material do capital säo cada vez mais independentes.
porque a rcproduçAo da força de trabaTho (cita em grande parte no espaço doméstico o que M de mais característico na actual crise de regu1aço social é que eta ocoire
através de relaçOes de trabaiho nAo-pago a caigo das mutheres. A invisibilidade social sem perda de hegemonia da dOminaÇAO capitalista. Por outras palavras. ao contrário do
deste trabaiho é tomada possível pelo sexismo (Wallerstein e Balibar, 1991: 29-36). que sucedeu em épocas anteriores, a crise de regulaçäo é também urna crise de emancipa-
Para Balibar, o neo-racismo europeu é novo na medida em que o seit tema dominante çäo. o que constitui afinal urna outra manifcstaçäo do colapso ou da perversào das ener-
nao é a superioridade biológica mas antes as insuperáveis diferenças cukurais. a conduta gins eniancipatórias da modemidade em energias regulatórias, acima referida. A dificut-
racial em vez da pertença racial (Wallerstein e Balibar. 99t: 17-28). 0 conceito de imi- dade em aceitar ou suportar as injustiças e as irracionalidades da sociedade capitalista
graçäo SUbStltUi O de raça e dissolve a consciencia de classe. Trata-se, pois, de um racismo dificulta. em vez de facilitar, a possibilidade de pensar urna sociedade totalmente distinta
de descolonizaçäo thferente do racismo de colonizaçäo esse, sim definitivamente bioló- e meihor que esta. Dal que seja profunda a crise de um pensamento estratégico de eman-
'gico. Em suma, trata-se de um fenómeno de etnicizaçAo da maioria mais do que de etnici- cipaçäo. Na medida em que existiu de facto, o processo de descontextualizaçäo e de
zaçäo das minorias. universalizaçAo das identidades e das práticas contnbuiu contraditoriamente para que as
Toma-se claro que a descontextualizaçäo e a recontextualizaço das identidades sAo classes dominadas pudessem formular projectos universais e globais de ernancipaçao. Ao
elementos contraditörios do mesmo processo hist6rico o que, mais urna vez poe floe s contrário, o novo contextualismo e particularismo tomam difícil pensar esirategicamente
veleidades evolucionistas da versAo libera! da modernidade. A coexistencia articulada a emancipaçAo. As lutas tendem a privilegiar o pensa-
locals e as identidades contextuais
destas contradiç'es nAo deve, no entanto ser entendida de modo funcionalista. Represen- mento tíctico em detrimento do pensamenta estratégico. A globalizaçAo do capital ocorre
tam relaçôes sociais conflituais pmtagonizadas por actores individuals e colectivos que se simultaneamente coin a locatizaçAo do operariado. Por outro ado, a crise do pensamento
constituem historicamente em processos de lutas cujos resultados nAo sAo determináveis à estratégico emancipatório, mais que urna crise de principios, é urna crise dos sujeitos
partida. O Estado e as lutas políticas que se desenrolam dentro e fora dele são o exemplo sociais interessados na aplicaçAo destes e também dos modelos de sociedade em que tais
paradigmático da votatilidade das condiçöcs presentes Assiste-se, em gera!, a um pro- principios se podem traduzir.
cesso de desmonumentalizaçäo do Estado scm que. no entanto, o vazio deixado por este A contingencia histórica da constituiçäo de sujèltos socials emancipatórios parece
supersujeito esteja a ser preenchido por urna outra subjectividade do mesmo niveL hoje irrecusável mas deve ser articulada corn a profunda intuiçAo de Marx de que a cons-
Ainda que nao esteja no horizonte nenhuma forma política alternativa an Estado, a truçAo das identidades sociais tern sempre lugar no interior de relaçies socials antagóni-
dup'a desfocagem do Estado e da cultura nacionais sAo sintomas de urna situaçAo de crise cas. A multiplicaçäo e sobreposição dos vfnculos de identificaçAo -a que hoje assisti-
de regulaçäo social mais geral. Depois da crise da regalaçAo fordista nos países cemrais, mba - particulariza as relaçôes e corn isso, faz proliferar os inintigos e. de algum modo.
estamos provavelmente numa fase de IransiçAo entre regimes de acurnulaçAo. Urna das triviaiith-los, por mais crael que seja a opressäo por eles exercida. Quanto mais incomu-
facetas centrais dessa transiçAo parece ser o facto de o capital, scm dispensar a funcíonali- nicáveis forum as identidades. mais difícil será concentrar as resistências emancipatórias
dade institucional do Estado, estar a criar um outro suporte institucional paralelo ao em projectos coerentes e globais. Ultimamente, a emergência do vinculo corn a natureza
Estado, constituido pelas agências financeiras e monetárias internacionais a dívida e, corn ele, o despertar de urna identidade ecológica transnacional parecem conferir a este
externa, a ¡ex meratoria, as firmas de advogados norte-americanas, um suporte institu- vinculo um Mesmo assity. o vínculo natural defronta-se
potencial globalizador promissor.
clonai que se distingue do suporte institucional estatal, quer porque é transnacional em si corn duas aporias de peso. A em vez de vincar o carácter antagónico
sua dìfUSAo global,
mesmo quer pon:iue nAo pretende manter qualquer exterioridade ou autonomia perante as da relaçâo social ecológica, dissolve-o, o inimigo perde contornos e parece estar em toda
relaçôes de produçAo. Por via desta ilUma característica, a nova regulaçAo económica, a parte e muito especiicaxnente dentro de nôs. E o problema é que. se está em toda a
que, face à anterior, assente no Estado. aparece como desreguiaçAo, arroga-se ser regula- parte nAo está em parte nenhuma. Em segunda lugar. é difícil pensar um modelo nAo-
çäo social e, de facto, a ilnica regulaçAo possível. E esta a miragem essencial do neolibe- -produtivista de sociedade quando o sistema mundial cada vez mais se polariza entre um
ralismo. Visa basicamente maurer e aprofundar a hegemonia da dominaçAo capitalista por minúsculo centro hegemónico pós-produtivista e hiperconsumista e urna imensa periferia
sobre o co'apso das condiçes que a tornaram POSSlYCI no Período anterior que no quarto
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organizado. E assim que using a watermarked evaluation copy of CVISION PDFCompressor
subeonsumisia.
a lógica e a ideo-
pré-produtivista e
130 Pela Mâo de Alice. O Socia! e o Político na Pós-.Madernidade Modernidade, !denìdade e a Cultura de Fronteira
i 31

Os desafios na semipedfera entäo em verdadeira cabeça do imperio, e a metrépole, em apéndice da colónia, o que
constitui urna autêntica «inversäo do pacto colonial» (Mota e Novaes, 1982). Nesse
Quais sào pois os desafios? A reconextualizaçio das identidades exige. nas condi- período final aprolundou-se o colonialismo informal a que Portugal foi sujeito pela Ingla-
çöes actuais, que o esfoiço anaiftico e teórico se concentre na diIncidaço das especifici- terra, urna dependéncia que se havia de prolongar no Brasil depois da independncja. E
dades dos campos de confrontaço e de negociação em que as identidades se formam e simbólico que, aquando do tratado de reconhecimento da independéncia
em 1825, a
dissolvem e na 1ocalizaço dessas especificidades nos movimentos de gIobalizaço do Inglaterra tenha empreslado so Brasil o montante da indemnizaçào
que este se compro-
capital e, pottanto no sistema mundial. Para a1m disto, toda a teorizaçäo g!oba seth metera pagar a Portugal, um montante estranbamente igual à dívida de Portugal
para corn
pouco esclarecedora. a Inglaterra. Esta teia de intermediaçäes dependentes foi mproduzida sob outras fonnas
As novas-vethas identidades constroem-se numa linha de £enso ernTe o demos e o em Africa, sobretudo depois da independéncia do Brasil, e aré aos nossos dias, como bem
ethnos e contra a identificaçäo entre ambos. a M pouco julgada nao problemática, e que o demonstrarn o caso da cultura do algodAo em Moçambique,, estudado por Carlos
o Estado nacional liberai levou a cabo. A crise desta forma de Estado acanta consigo a Fortuna (Fortuna. 1992), ou do movimento literrio cabo-verdiano, estudado
por Isabel
problematizaço de tal identificaçAo. Cabe pois, perguntar: quem sustenta a nova, ou Caldeira (CaJdeira 1993).

renovada, tensäo entre demos e ethnos? Julgo que a cultura. Dal a autoconcepço das Aliás, urna das mais significativas marcas da serniperifericidade da relaçäo colonial
kientidades contextuais como muftfculturalidades. dal o inovado interesse pela cultura tern a ver corn os processos da independência, tanto no Brasil, como em Africa. Em
nas ciencias soclais, e dai, finalmente. a crescente interdisciplìnaridade entre ciências ambos os casos, da relaçäo colonial ocorre no âmbito de transfonnaçòes pro-
o colapso
sociais e humanidades. em Portugal. as quais, entretanco, são afectadas pe'a rebe-
fundas, de sentido progressista.

Como ponto de partida, penso ser necessario re-analisar as culturas das naçöes ques- lìAo das colónias Ro mesmo tempo que se repercutem nestas de modo
diferenciado e
ionando as construçes oficiais da cultura nacional. Neste sentido, tres orientaçòes muito para além da mdependncia. No caso do Brasil, a independencia ocorre no segui-
metodológicas parecem essenciais. A pthneira nAo sendo nenhuma cultura auto-
quer
mento da revoluçäo liberal em Portugal. Em pane pelo radicalismo desta e em parte pela
contida, os seus limites nunca coincidem corn os limites do Estado; o principio da sobera- pretenso dos liberals de reconquistarem a begemonia na colOnia por via de
urna coloni-
nia do Estado nunca teve um correspondente no domInio da cultura. A segunda d que, nAo zaçAo efectiva, contrária aos Interesses de Inglatena, a independencia do Brasil fez-se
no
seudo autocontida, nethuma cultura é indiscriminadamente aberta. Tern aberturas esped- seguimentc do liberalismo mas, de algum modo, contra ele. Nao pôde assim beneficiar
prolongamentos interpenetraçöes. interviagens própiias, que afmal sAo o que de
ficas1
dos ventos progressistas que neste sopravam e, por isso, acaben por se acomodar num

mais próprio bá nela. Fmahnente, a terceira orientaçAo metodolögica é que a cultura de projectoambiguo e contradiório, nas palavras de Mota e Novaes, «o reformismo autori-
um dado grupo socia! nAo é nunca urna essência. E urna autocriaçäo. urna negociaço de triode urna monarquia escravocrata - inica excepçAo no mosaico das repúblicas amen-
sentidos que ocorre no sistema mundial e que como tal, nAo compreensívet sem a aná- canas» (Mo'a e Novaes, 1982).
lise da trajectória histórica e da posiçAo desse gmpo no sistema mundial. Aplicadas à cul- No caso de Africa, a situaçAo foi paralela em alguns dos sens traços e muio diferente
tura po1uguesa. estas orientaçöes significare muito sucintamente o seguinte. Em primeiro noutros. A independencia dos cinco países de lingua oficial portuguesa ocorreu no Ambito
lugar, a cultura portuguesa nAo se esgota na cultura dos portugueses e, vice-versa, a ctd- de outra grande 1ransformaço progressista na sociedade portuguesa, a revoluçAo do
25
tura dos portugueses nAo se esgota na cultura portuguesa. Em segundo lugar, as aberturas de Abril de 1974. Neste caso, a simbiose entre os dois processos foi ainda maior na
especificas da cultura portuguesa sAo, por um lado, a Europa e, por outro, o Brasil e, a medida em que a guerra colonial, a luta tenaz dos movimentos de libertaço contra o
certo ponto. a Africa. Em terceiro lugar. a cultura portuguesa é a cultura de um pals que colonialismo, os adeptos que estes forain conquistando entre aselites culturais,
políticas e
ocupa urna posiçäo semiperiférica no sistema mundial. militares portuguesas e o isolamento internacional a que sujeitarain o Estado
Novo foram
Corn excepço de urn perfodo de algumas décadas nos séculos XV-XVI, Portugal foi decisivos para a eclosAo do golpe militar que abriu o passo à revoluçAo democnftica.
Ao
durante todo o longo ciclo colonial urn país semiperiférico. actuando como correia de contrário do que aconteceu corn a revoluçAo liberal, a y,voluçAo de Abril, apesar de
transmissAo entre as colónias e os grandes centros de acumulaçAo, sobretudo a lnglaena a}guma hesitaçào inicial, adoptou como urna das suas principals bandeiras a descoloniza-
a partir do século XViII, e este facto teve urna rnportãncia decisiva para todos os poyos çAo. Corn isto pöde potenciar corn o seu préprio contetkto progressista o conteúdo pro-
envolvidos na relaçâo colonial, urna importAncia que, de resto, se manteve mesmo depois gressista das lutas de IibertaçAo e o própnio conteúdo da independencia. E ainda hoje
de essa re!açAo ter terminado e até aos nossos dias. Referirei brevemente alguna traços debatível se se tratou do resultado de um acto de poder semipeniférico ou antes o resut-
dessa marca. No plano político, um dos traços mais dramáticos da semiperifericidade de tacto de um acto de impotencia semiperifénica. Foi taiver ambas as coisas. E verdade que
Portugal reside no facto unico na histéria, como bern salientam Carlos Guitherme da o Portugal revolucionánio nAo pôde ou nAo quis controlar o processo da independência
Mots e Femando Novaes, de, corn a ida de D. JoAo VI para o Brasil, fugido de NapuicAu, como o tizeram as potências colonials centrais, mas tambérn duvidoso que o pudesse
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a colOnia ter caucionado por algum tempo a independência da metrOpole, convertendo-se
controlar mesmo que o quisesse. O of CVISION
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sernipeniférico inviabilizava à partida a
132 Pek MOo de Alice. O Social e o Potizico na Pós-Moderpüdade Modernidade, Identidade e a Cu!iura de Fronieira 133

manutenço de laços neocolonialìstas. Foi talvez por isso que este país, comforte passado papel do Estado dúplice: por um lado, diferencia a cultura do territôrjo nacional face ao
autoiitário, esteve envolvido na criaço dos Estados mais progressistas de Africa do pós- exterior; por outro lado, promove a hornogeneidade cultural no interior do território
-guerra, frutos de urna descoonizaçäo scm ónus neocolonialistas. Acontece porrn, que nacionaL A minha hipótese de trabaTho que, em Portugal, o Estado nunca desernpenhou
este sthal de força foi tambérn urn sinai de fraqueza que ìmpedìu Portugal de proteger as cabalmente nenhum destes papis, pelo que, corno consequência, a cultura portuguesa
suas exoelónias da competiçäo feroz entre os pa1es cenirais e entre os blocos de Leste e Leve sempi urna grande dificuldade em se diferenciar de outras culturas nacionais ou, se
Oeste num conlinente que no ththa sido partithado em Ya A auséncia de um neocolonla- pxeferirrnos urna grande capaeìdade para näo se diferenciar de outras culturas nacionais
lismo hegemónico portugth abilu o passo para urna Iuta aberta entre váiios neocolonia]is- e, por outre lado, manteve até hoje urna forte beterogeneidade interna. O facto de o
mos que levon os dOiS rnaiores pafses africanos (Angola e Moçambique) à guerra e a mina.
Poderi pergimtar-se corno é que Portugal, sendo um pais semperìfrìco. pode manIer
Estado portugués nAo ter desempenhado cabalmente nenhuma das duas Iunçöes diferen- -
ciaçAo face ao exteiior e homogeneizaçâo interna - teve um impacte decisivo na cultura
o seo imp&io colonial multo para além do tempo em que os paises centrais abriram mAo dos Portugueses, o quai consistiu em as espácio-temporalidades culturais local e trauma-
dos seus. A explicaçäo reside provavetmente nessa mesina caracLerística. Como notou clonai terem sido sempre mais fones do que a espkio-temporalidade nacional.
Hobsbawm I>oiiugal pôde manter as suas coónias depois da Confernda de Berlim. no Assiin por um lado, a nossa cultura nunca se conseguiu diferenciar totalmente pernote
flna do século XJX parque os países centrais nAo chegararn a acordo sobre o modo culturas exteriores, no que configurou wo ddíice de identidade pela diferenciaçào. Por
como partilliarem entre si o impérlo portugus (Hobsbawm, 1987: 18). No pós-guerra, o outro 1ado a nossa cultura manteve urna enorme heterogeneidade interna, no que confi-
colonialismo portugués, apesar de isolado ídeobgcamente. manteve-se porque garantía gurou um dfice de identidade pela homogeneidade. Note-se que esles défices são-no
aos países centrais o acesso à exploraçAo dos recursos naturais das cotónias ao mesmo apenas quando vistos da es$cio-temporalidade cultural nacional. Os espaços locals e
tempo que mantinha urna vasta área de Africa sob controlo politico pr6-ocidenii, fora do transnacionais da cultura portuguesa forain sempre muito ricos; o espaço interm&lio,
confronto Leste-Oeste, e actuando como escudo de proecço à Afiica cio Sul, e isto nido nacion4, foi e deficitário. Isto significa que. enquanto identidade nacional1 Portugal
scm que os paises centrais tivessem que arcar corn os custos político-miliuLres do colonia- nern foi nunca semethante às identífìcaçöes culturais positivas que eram as culturas curo-
lismo ..- que transferfram para Portugal .- nem corn os custos económicos do controlo, que peias, nem foi nunca suficienlemente diferente das identificaçòes negativas que crani.
dc algum modo paililharam corn Portugal. desde o século XV. os outrns os nAo europeus. A
maiüfestaçäo paradigmtica desta
matriz intennédni. semiperifirica, da cultura portuguesa esti no facto de os Portugueses
terem sido, a partir do sculo XVII, corno mieti no terceiro capítulo. o único poyo euro-
A cultura de frouteira peu que, ao mesmo tempo que observava e considerava os poyos das suas colónias como
primitivos ou selvagens, era, ele próprío. observado e considerado, por viajantes e estu-
As consequências para a reaçäo coloni& decorrentes do carácter semiperifrico de diosos dos países centrals da Europa do Norte, como primitivo e selvagem. Por outro
Portugal nAo se quedaram peios aspectos político-económicos nern limitararn o sen lado, enquanto os puritanos foram colonizadores na América do Norte. os Portugueses,
AmbIo ao Ambito dessa relaçAo. O decisivo foi a identidade cultural que engendraram e o al&n de colonizadores, forain emigrantes rias suas próprias colOnias. O trabalho portu-
¡nodo como esta foi interiorizada pela sociedade portuguesa an longo dos últimos cinco gums no Nordeste do Brasil no sdeulo XVIII chegou a ser mais barato que o trabatho
séculos. escravo. Portugal. no contthio dos outras poyos europeus. teve de ver-se em dois espe-
Manifestei-me no terceiro capítulo contra o discurso identitrio e contra o que podía- thos para se ver, no espeiho de Próspero e no espetho de Caliban, tendo a consciência de
mos designar por «excesso de inlerpretaçào mitica», por pensar que Portugal. sempre que que o sea rosto verdadeiro eslava algures entre
eles. Em
termos sinthólicos, Portugal
questionou a sua identidade. f-o corn uni certo distanciamento e nunca como expressâo estava demasiado próximo das suas colönias para ser plenamente europeu e, pernote
de qualquer crise profunde que só os mitos desvendam e ainda por pensar que o queslio- estas, estava demasiado longe da Europa para poder ser urn colonizador consequente.
nameno que hoje se observa tern identificáveis razöes, umas globais e outras, especificas Enquanto cultura eumpeia., a cultura portuguesa foi umperifefla que, como tal. assumiu
do momento histórico que esta sociedade atravessa.
ma! o papel de centro rias periferias nAo-europeias da Europa. Dal o acentrismo caracte-
Há, pois, que. por outras vias tentar definir o estatuto identitário da CUltUra POt1U-
rístico da cultura portuguesa que se traduz mima dificukiade de diferenciaçAo face an
guesa e analisar que ponto de contacto exisle entre ele e as identidades culturais dos
exterior e nimia diuiculdade dc identíficaçAo no interior de si mesma2. Face an exterior, o
poyos brasileiro e africanos, que para hem e para mal conviveram corn esta cultura
durante séculos. A minha hipólese de trabaiho 6 que a cultura portuguesa nAo tern con-
teddo. Tern apenas forma, e essa forma a fronteira, ou a zona fronteiriça. As culturas
t
2. Rcferndo-se à taCktade an que o escravus frwu asimatos na sociedade ponuucsa (e também c
nacionais, enquanto substAncias, sâo urna criaçAo do sdeulo XIX, sAo como o pro-
mouros e O5CLI5 que ficamn), Antôo José &raiva dl como ephcaçio cuma cern libenlade em eaç5o s fran-

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vimos1

diito histórico de urna ensAo entre universalismo e partícularismo geudo pelo teints cururais, urna cei omscudadc enlie o E e o Ouro, urna cetta fa'ta de precooceIo cuhuras. a ausêneia
Estado. O
cura do senUmento de supetiondade qte caracscza. de gera, os poyos da ocidentat» (Saraiva, 19S5: W3).
13$ Pela Mäo de Alice. Q Socia! e o Político na Pós-Moderuidade Modernidade, Ideuidade e a Cultura de Fronteira j 35

acentrismo revela-se na voracidade das apropriaçòes e incorporaçöes, na mimesis cutura de fora à cultura portuguesa. Durante séculos, a cultura portuguesa
sentiu-se anm centro
no sincretismo e no transkca]ismo. isto é, na capacidade de se mover entre o local e o tran&- apenas porque tinha urna periferia (as suas colOnias). Hoje, sente-se na
periferia apenas
nacionai scm passai pelo nacional No entanto, dada a heterogeneidade tais incor- internat

porque the é imposto ou recomendado um centro (a Europa). Para urna cultura que verda-
poiaçöes e apmpiaçòes tendem a só penetrar superficialmente e a serem sujeitas a foites deirainente nunca coube num espaço delco, as identiuicaçes cuUurais que daí derivarn
processos de vemacu1izaço. Esie fragmentarismo 6 simultaneamente causa e efeito de um tendem a autocanibalizar-se,
dcfi de hegemonia cultura! por parie das elites, do que resulta que os diferentes locatis- Para além do acentrismo e do cosmopolitismo a forma cultural da fronteira
apresenta
mos cithuziis dizem mais sobre a cultura portuguesa do que a cultura pozmguesa sobre cies. ainda urna outra característica; a dramatizaçäo e a carnavalizaçâo das formas.
Dado o
Este délice de diferenciaço e de identificaçAo, se, por um lado, criou um vazio subs- carácter babélico, assmncrone e superficial das incorporaçes e das apropiiaçöes
foraneas,
1antivo por outro, consolidou urna forma cultural multo especfficL a fronteira ou zona a forma fronteiriça tende a identificar-se, nessas incoiporaçòes e apropriaçoes.
corn as
fronteiriça. Nos termos da minha hip6cse de trabatho podemos assim dizer que nao formas mais do que corn os conteddos dos produtos culturais incorporados.
O substanti-
existe urna cultura portuguesa, existe aifles urna forma cuitural portuguesa: a fronteira, o vismo é residual e consiste no modo como tais formas são vemaculizadas. O desequili-
estar na fronteira. Este modo de estar cultural , no entanto, completamente distinto do brio entreforma e conteúdo que assim se da tern como efeito urna certa dramatizaçäo das
modo de estar cultural da fronteira norte-americana. A nossa fronteira nAo é frontier, é formas que é também urna certa camavalizaço das formas, IStO é, urna atitude
de distan-
border. A cultura portuguesa é urna cuhura de fronteira, no pwque para além de nós se ciaçâo mais lddica que pmfilctica, mais feita da consciéncia da inconsequência
do que
conceba o vazio, urna terra de ninguém, mas porque de atgum modo o vazo está do lado da consciéncia da superioridade. Nisto reside também o carácter barroco da forma cultu-
de c, do nosso lado. E é por isso que no nosso trajecto histórico cultural da modemidade rai portuguesa. A cultura portuguesa é menos urna questäo dc rafzes
do que urna questAo
fomos tanto o Europeu como o selvagem. tamo o colonizador como o emigrante. A zona de posiçäo. E ivela-se como pericia de extraterritorialidajie tanto nos espaços estranhos
fronteiriça é urna zona híbrida babélica. onde os contactos se pulveñzam e se ordenam como nos espaços origirdrios, As raízcs säo assim o artefacto de urna capacidade de nati-
segundo micro-hierarquias pouco susceptiveis de globalizaçäo. Em tal zona, sao imensas vi2açäo do alheio. Estãci sempre fora ou longe de onde se está. E por isso se podem
lina-
as possibilidades dc identificaçao dc criaçao cukural, iodas iguahnene superficiais e ginar maintes do que o que sâo. Como diz Femando Pessoa: «Nas faldas do
Hirnalaia, o
igualmente subvertíveis: a antropofagia que Oswald Andrade atribuía à cultura brasileira Hirnalala é só as faldas do Himalaja. E na distância ou na meméria ou na imaglnaçao que
e que eu penso caracterizar igualmente e por inteiro a cultura portuguesa. Isto, se, por um o Hirnalala é da suaaltura, ou talvez um penco mais alto» (Pessoa, 1923: 21).
lado, confere grande liberdade e até arbitrariedade à criaço cultural por parte das elites, A mmha segunda hip5tese de trabalbo é que esta forma cultural tern igualmente
por oulro, vota estas à inconsequéncia social, ao mesmo tempo que permite igualmente às vigência, simIa que de modo muito diferenciado, no Brasil, e de modo mais remoto,
nos
classes populares criar scm grandes tutelas a «sua» cultura portuguesa do momento. paises africanos de lfngua oficial portuguesa. Do ponto de vista cultural, o Brasil e
os
A fronteira confere à cultura portuguesa, por outro lado, um enorme cosmopoti- países africanos nunca foram colénias plenas. Fiel à sua natureza semiperiférica, a cultura
tismo3. Para as culturas dotadas de fones centros, as fronteiras sào pouco visiveis, e isso portuguesa estendeu a etas a zona fronteiriça que Ibas permitiu usar Portugal como passa-
é a causa tltìma do sea provincianismot4. Ao cornrrio, o acentrismo da cultura poilu- gem de acesso às culturas centrais, como aconteceu corn as elites culEnt-ais do Brasil a
guesa é o outro lado do sen cosmopolitismo, um universalismo scm universo feito da partir do século XVIII e corn as africanas sobretudo no nosso século. Dal que a forma
multiplicação intìniia dos localismos. Tanto o centro como a perìfeiia tern sido impostos da fronteira caracterize também, em
cultural do Brasil e da Africa porta-
parte. as culturas
conferindo a estas o acentrismo, o cosmopolitismo, a dramatizaçao e a camvali-
giiesa,
Nun euo d 1923, Fernando Pessoa definía meihor o arquélipo cutturat da fronteira do que eu o poderia
_s 3
fazer «O pos-o 1,oeu essenialmente cosmopo1ia. Nmca um vendeiro ponugods foi potugods
foi sempre tudo. Ova er tudo em urn individuo ser wdo ser sudo em urna cokciividade cada um dos indivi-
zaçäo das formas e o barroco que atribuimos à cultura portuguesa. Obviamente que tais
características se apresentam corn outras variaçöes e nern deve esquecer-se a assimettia
matricial entre o caso portugués e os casos brasileiro e africano. Estes últimos tiveram
duos näo er nada» Psoa, 1923: 18). Tamt'm Atmada Nereiros se espme mudo no mesmo sentido: «tini-
versal nao i esLanno & naçäo nern d ocicdade de iodas as naçöes. Mas aiitude hunsina que n5o cabe senSo ungern num acto de imposiçào violenta por parte
do primiro, urna imposiçao que corn o
em possea individual. 1so é o igniuicado de ponugus t)
sença univezal, psíquico universal» (Mrnda Negeios, 197l 14).
Em porThigus arle sinfica: espíñto umvemal, pre- tempo se passou a afirmar,
do ponto de vista cultural, mais pela omissao ou pela ausência
do que por acçào cultural efectiva, em suma, por um acto de força feito de fraqueza. O
4. Diacordo, pois. de Femando Pessea quando, nurn texto de 1928 declara o pronvncianismo «o mal superior
contexto global do regresso das identidades, do multiculturalisrno, da transnacionalizaço
porui», ainda qì icrescentc que esse facto, sendo msie. nSo nos ¿ peculiar «de igtzat doença enfenaam
mwtooulros países. que se cnsideram ilizan5es corn orguiho e erro». Segundo ?cssoa. «o provinciarnsrno
consiste em penenccr s orna civíiizaçSo sern tornar pane no desenvolvirnento superior deta - em segui-la pois
198 159). Embo eti concoade corn esta canictetìzaçlo em geral, dSCOrdO que no caso ponuguês. compo-
mimetìcamerne, corn u sLThordinaçSo inconsciente e 1etiz O sindroma provinciano compreende, pelo menos eta,
uha «o sindroma provinciano». Em neu entender, o elemento barroco da culiura portuguesa
faz corn que a
uíss sintomas
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sdrniraçSo pelo pro um PDFCompressor
o entusiasmo e a adrniraçSo pelos grandes meios e prias grandes cidades; o entusiasmo e
:so e pela modernidade; e na esfera mental superior. a incapacidade da ironia» (Pessoa.
mimesis da «cìvilìraçäo superior» scorra sempre corn urna distincia Indica e espirito de subveraSo, selectiva.
superlicial e ambiguamente combinados corn a dramatizaçAo do próprio. do vernaculo, do genuino.
I 36 Pela Mäo de Alice. O Social e o Político na Pós-Modernidade Modernidade. Identédade e a Cidrw-a de &onteira 37

CAREW, Jan ( 1988b), «Columbus and the Origins of Racism in the Amerìca: P Two», Race
e da 1oca1izaço parece ofeecer opomnidades únicas a urna forma cukura de fronteira
and Class. 30: 1.
precisamente porque essa se aJimenta dos thixos constantes que a airavessam. A leveza da
CATROGA, Femando (1985), «Nacionalismo e ecumenismo. A questho ibérica na 2 metade do
zona fronteinça toma-a milito sensível aos ventas. E urna porta de vai-vem, e corno tal
século X1X», Separata de Cultura - Ristórla e Filosofia. volume W: 419-463,
oem nunca está escancarada. nern nunca está fechada. CATROGA, Fernando (1988), A milizôncia laica e a descristianizaçäo da morte em Portugal
Sero estas oportunidades aproveitadas? Inniganternente, só muito recente e tardia- (1865-1911L Coimbra: Faculdade de Letras.
mente é que o Estado porwgus tern vindo por rneio da política de cultura e propaganda, DESCARTES. Reni (1972), Le dìcours de la méthode, Ed. J-M. Fatand. Paris: Bordas.
a tentar promover urna espcio-temporaJidade cu nacional bomogdnea, e tern vindo FORTtJNA, Carlos (1992). 0fb da meada. O alodâo de Moçam6íque, Portugal e a economia-
a fazê-lo por via do que. noutm lugar, designo por imaginaçäo do centro, ou seja, a con -mundo (1860-1960), Porto: Afrontamento.

cepçäo de Portugal como um país curopeu no mesmo p que os damais (Santos, 1993 GROTIUS, Hugo (1925), Dejure belli acpacis, Oxford: Clarendon Press.
49). Da a arrogâncìa em tentar fechar o mar aos brasileiros e aos africanos, erguendo HOBSBAWM, Eric (1987), The Age ofEmpire: 1875-1914. Londres: Weidenfeld .

estupidamente urna parede contra a história, para além de descurar desavisadamenie a LEAO, Duane Nunes (1983), Ortografia e orìem da línguaportuguesa, Ediçâo a cargo de Maria
evenwalidade de no fúturo ter de vir a trepi-la. Mas curiosamente a criaçäo do espaço Leonor Carvathäo Buescu, Lisboa: imprensa Nacional-Casa da Morda.

cultural nacional contraditória, parque ocorre no mesmo processo em que Portugal se MOlA, Carlos Guilherine e Fernando Novaes (j 982), 0 processo polítwo da ndependência do
Brasil, São Paulo: Editora Moderna.
transforma numa regiäo, mima localidade da Europa. No prazo de menos de vinte anos, a
PESSOA. Fernando (1923), Entrevista na Revista Portuguesa, 13 de Outubro.
transnacionalidade do espaça colonial iransfere-se para a transnacionalidade intereuro-
PESSOA, Femando (1980), Textos de crítica e de intervençáo, Lisboa: Ática.
paia, sem que Portugal deixe de ser urna localidade relativamente periférica. vertiginosa-
RAI, Milan (1993), «Columbus in Ireland», Race and Class. 34: 4.
mente parado na zona fronteiriça. Nisto se confuma a difkuldade histórica em configu- ROLSTON, Bili (1993), «The Training Ground: Ireland, Conquest and Decolonisation», Race and
rarmos de modo coerente urna espcio-ternporalidade cultural intermédia, nacionaL Nada Oass. 34: 4.

disto imp'ica urn juízo negativo sobre a cultura portuguesa. Negativo é o facto de a poli- SANTOS, Boaventura de Sousa (1993), «0 Estado, as Relaçöes Salariais e o Bem-Estai Social na
tica estatal de cultura e propaganda nâo reconhecer a riqueza e as virtualidades que se Semiperiferia: o Caso Pornigues», in Santos (org.): 15-56.

escondem sob essa suposta negatividade. A riqueza está, acima de tudo, na disponibili- SANTOS, Boavenlura de Sousa (org) ( 1993), Portugal: 11m Retrato Singular, Porto: Afronta-

dade multicultural da zona fronteiriça. mento,

A zona fronteiriça, tal como a descoberta, é urna metMora que ajuda o pensamento a SARAIVA. António Joni (1985), A cultura em Portngal, Lisboa: Bertrand.
transmutar-se em relaçíes socials e políticas. E no esqueçamos que a metafora é o forte S1ELSER, Neil (1991), Social Paralysis and Sockzl Change: British Working-Class Education
in the Nneieenz#j Centnry, Berkeley: University of California Press.
da cultura de fronteira e o forte da nossa lIngua. Reconbecia isso mesmo em 1606 o
VITORIA, Francisco (1991), Political Writings, Ed. Anthony Padgen and jeremy Lawrence, Cam-
insigne linguista portugus Duarte Nunes de Leo quando afirmava: «Estas maneiras de
bridge: Cambridge University Press.
falar que os latinos têm em multo, que se persevera rnuito nelas, näo se apartando do sen- WALLERSTEIN. 1mmanue e Etienne BaHbar (1991), Race, Naçion, ("lass: Ambiguous Identities,
tido metafórico em que começaram, tao frequenle aos Portugueses que alguns estaro Londres: Verso.
multo espaço de tempo falando sempre metaforicamente, scm mudar da mesma metá-
fora» (Leo, 1983:233).

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TERCEII(A PARTE

CIDADANIA, EMANCIPAÇAO E UTOPIA

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A SOCIOLOGIA DOS TRIBUNAlS
E A DEMOCRATIZAÇÁO DA JIJSTIÇA

Condçóes sociais e teóricas da sociologia dos tribunais

A sociologia do direito só se constituiu em ciência socia', na acepçâo contemporânea


do tenne, isto é. em ramo especializado da sociologia gera. depois da segunda guerra
mundiai. loi entäo que. mediante o uso de cnicas e metodos de investigaçAo empírica e
mediante a teorizaçäo própria feita sobre os resuftados dessa investigaçäo, a sociologia do
dimito verdadeiramente construiu sobre o threito um objecto teórico específico, aut&
nomo, quer em relaço à dogmatica jurídica, quer em relaçâo à filosofia do direito. No
entanto, antes deste período foi grande e rica a produção científica orientada por urna
perspectiva sociológica do direito, e a tal ponto que a sociologia do direito sem düvida,
de todos os ramos da sociologia aquele em que o peso dos precursores. das suas orienta
çôes e6ricas, das suas preferéncias de investigaçäo, das suas criaçöes conceptuais, mais
fortemente se em feito sentit Tal näo surpreende se tivermos em conta que, ao contthio
doutros ramos da sociologia, a sociologia do direito se ocupa de um fenómeno social, o
direito, sobre o quai incidem séculos de produço intelectual crsalizada na idade
moderna em disciplinas como a filosofia do diïeito, a dogmática juridica e a história do
dfreito.
Urna das ilustraçöes mais significativas deste peso dos percursores consiste no priviie
giarnento, sobretudo no período inicial, de urna viSo normativista do direito em detti-
mento de urna visâo institudona e organizacional e, denio daquda, no privilegiarnerno
do direito substantivo em detrimento do direito processuaL urna distinçio eta própria vin-
culada a tradiçöes teóricas importadas acriticarnente pela sociologia do direito. Sem
recuarmos aos precursores dos precursores, Giambattista Vico i953) e Montesquieu
(1950-1961), é notório que a visAo nonnativisa e substantivista do dixeito domina, no
s&ulo XIX, a produçâo e as discussôes teóricas, quer dejuristas. quer de cientistas sociais,
como hoje the chamariamos. interessados pelo diteito. Assim, e quanto aos primeiros, de
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todos os debates que na época são portadores de urna perspectiva sociológica do direito,
ou seja, de urna perspectiva que exphciamente temaiza as artìduaçes do direito corn as
42 Pela Mth, de Alice. O Social e o Político na POs-Modernidade A Sociologia das Tribwiais e a Democralizaçäo da Justiça t43

condiçöes e as esUuWras sociais em que opera, o debate sem dúvda po'arizador é o qtie juIz. Atente-se, no entanto, que este segundo tema e em geral a orieniação teórica da
opöe OS que defendem urna concepçäo de direko enquaitO variável dependente. nos escola do direito livre ou dajurisprudência sociológica (Pound, 191 l-I912)), ao deslocar
Lermos da quai o direito se deve lilnitar a acompanbar e a incorporar os valores soclais a questào da normatividade do direito dos enunciados abstractos da lei para as decises

e os padröes de conduta espontanea e paulatinamente constituidos na sociedade, e os particulares do julz criou as pré-condiçöes teóricas da transiçäo para urna nova viso
que defendem urna concepçâo do direfto enquanto variável independente, nos termos da sociológica centrada nas dimensöes processuais. institucionais e organizacionais do

quai o direito deve ser um activo promotor de mudança social tanto no dominio materiai direito. Nests mesma transiçäo e ainda no mesmo período (o primeiro quarte! do nosso

como no da cultura e das menta1idades um debate que, para lembrar posiçes extremas e século) se situa a obra de M. Weber (1964Y. A preocupaçäo de Weber em definir a espe-
subsidiárias de universos ineIecwais muito distintos, se pode simbolizar nos fornes cificidade e o lugar privilegiado do direito entre as damais fontes de normatividade em
de Savigny (1840) e de Benthamt1. circulaçäo nas relaçöes sociais no seio das sociedades capitalistas levou-o a centrar a sua

o mesmo se pode dizer quanto ao debate oitocentista sobre o direito no ambito da anélise no pessoal especializado encarregado da aplìcaçäo das normasjurídìcas, as pmtis-
sociologia emergente. Se é certo que se acorda em que o direito reflecte as condiçöes píe- sôes jurídicas, a burocracia estatal. Segundo ele, o que caracterizava o direito das socie-

valecentes e ao mesmo tempo actua confonnadoramente sobre cias, o debate polariza-se dadas capitalistas e o distingula do direito das sociedades anteriores era o construir um
entre os que concebem o direito como o indicador privilegiado dos padroes de solidarie- monopólio estatal adnthilstrado por funcionários especializados segundo crit&-ios dotados
dade social, garante da decomposìçâo harmoniosa dos conflitos por via da quai se maxi- de racionalidade fomial, assente em normas gerais e abstractas aplicadas a casos concre-
miza a integraçäo social e realiza o bem comum, e os que ccmcebem o direito como tos por via de processus lógicos controIveis. urna administraço em tudo integrável no
expresso última de Interesses de dasse, um instrumento de dominaçäo económica e poli- tipo ideal de burocracia por ee elaborado.
tica que por via da sua forma enunciativa (geral e abstracta) opera a transforinaço ideo- Esta tradiçäo intelectual diversificada mas em que domina a visão normativista e
lógica dos Interesses paiticularisticos da classe dominante ein interesse co'ectivo imiver- substantivista do direito teve urna infinência decisiva na constituiço
do objecto da socio-
sal, um debate que se pode simbolizar nos nomes de Durkeim (1977)) e de Marx(3). logia do no pds-guerra. Dentre os grandes temas deste periodo refiro dois a titulo
direito

No primeiro quartel do nosso sculo a viso normativista substantivista do direito de exempo: a discrepância entre o direito formalmente vigente e o direito socialmente
continuou a dominar, ainda que corn nuances, o pensamento sociológico sobre o diiito. eficaz. a célebre dicotomia law ¡n books/law in action da sociologia jurídica americana
E assirn exemparmente o caso de Ehrlich, para alguns o fundador da socio'ogia do as relaçesentre o o desenvolvimento sócio-económico e mais especificamente
direito e

direito, ein qualquer dos dois grandes temas da sua produço cienUfica: o direito vivo e a o papel do direito na transormaçäo modemizadora das sociedades tradicionais. Em quai-
criaço judiciária do direito ( 1929 e 1967). No que respeita ao primeiro. o direito vivo, é quer destes temas7 bastante distintos, um centrado preferentemente nas preocupaçöes
centrai a contraposiço entre o direito ofkialmente estatuido e formalmente vigente e a sociais dos países desenvolvidos e o outro rias das países em desenvolvimento so ¡titi-
normatividade emergente das relaçöes sodais pela qual se regem os comportamentos e se dos o privilegiamento das questòes normativas e substantivas do dimito e a relativa negli-
previne e resolve a esmagadora maioria dos conflitos. No que respeita ao segundo. a cria- gência das questes precessuais. institucionais e organizacionais.
çäo judiciáda do direito, é ainda a mesma visäo fundante que dá sentido à distinçio entre No entanto, esta conjuntura intelectual em breve se aileron. Contribufram para isso
a normatividade abstracta da lei e a aoimatividade concreta e conformadora da decisâo do duas ordens de condiçes, ambas emergentes no final da década de 50, inIcio da década
de 60: condiçôes teóricas e condiçoes sociais. Intre as primeiras, as condiçöes teóricas.

1. Fiel s suas posìçöes teóricas, Bentbam pmcurm influenciar as iranformaçôes jurídicas no inco do
saliento tres. Em primeiro lugar, o desenvolvimento da sociologia das organizaçöes. um

período ibera1 em Ponugal (cfr. Benthsm, 823). ramo da sociologia que tern em Weber um das principals inspiradores. dedicado em geral
2. Mum esnido de auoncimizaço e6rica em reaç5o cinca jr1dica. Dukheim acusa a disdnço ernte an estado dos agrupamentos sociais criados de modo mais ou menos deliberado para a
direito públko e dreito ivado. por consdeth-a irtsusienive no pno soçio6gíco, substiuindo-a p&a disth- obtenço de um tim especítìco corn enfoques diversos sobre a estrutura e a forma das
çäo CfltTedito íepresivo (o direio pena» e diteito restiunivo (diteito cvì, cftreio comercial. diteo peocea- organizaç&s, sobre o conjunto das interacçòes socials no su seio ou no impacto delas no
suai, direiw admioìstraivo e cortjtuciora». Cada um oestes ìpos de direito coneponde a urna fonna de so'i-
dariedade socaE O diicito repressivo corponde à solidariedade mecánica, assente nos vaotes da cosìcncia
comportamento des indivíduos(6. Este ramo da sociologia desenvolveu em breve um
cokcrva cuja violaçäo consùtiñ um crîme urna forma de sodariedade domiiarne nas sociedades do pasado. O interesse específico por urna das organizaçòes de larga escala dominante na nossa socie-
dìreio restìmtivo consponde à solidaedade orgânca, dominante nas socie4adea contempodaeas, aerne na dade, a organizaçäo judiciaria e particularmente os tribunals (Heydebrand. 1977 e 1979).
dvsao do irabaiho sociaL cuja vio1aço acarreta a sanç5o de simples reposiçtio das coisas.
3. Como se sabe, Ma no peuduzu tuna teoria socioIóica do diieiro. No ernanto, a sua vasia ots es 4. Foi, ai4.s, Roscoe Pound qoem apresentou Ehrlich à comunidade oientilhca anglo-saxónica em 1936.
repkta de rfcrncias no sistemáticas so diteto. Cfr., em especiaL A Contribuiçöo â Crítica da Filosofia do 5. A meh,r selecç5o do que nesta obta respeiu à sociologia do direiio ¿ a de Mas Rbeinstem (1967).
Direilo de 1-fege! (1843);
A Ideologia c!emä (1845-46); aitigos ro Neue Rheinische Zeìurng (848-49), O Dezoiw 6. Paia além des clássicos (M. Weber e R. Michels) as referencias básicas neste ramo da sociologia sso: P.

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de Brwnáyjo de Napoküo 8owpwie (1852); G«ndrisse (S57-55 O Capifol
França (187 ) e A Crítica do Pmgrorn de Gotha (1875).
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A Ggerra Civil em Selznjck (1949)
(1980).
P, Blau (1955); J. March e H. Simon (1958); M. Crozier (1963); S. Clegg e D. Dunkerky
44 Pela Máo de Alice. O Social e o Político na Pós-MQdernjdade A Sociología dos Tribunals e a Democranzaçuo ic suw, u

A segunda condiçäo teórica é constituida pelo desenvolvimento da ciência política e cionada corn a anterior. As lutas soclais a que liz referencia aceeraram a transformaçäo
pelo interesse que esta revelou pelos tribunais enquanto instancia de decisäo e de poder do Estado liberal no Estado-Providencia, um Estado activamente envolvido na gestäo dos
potfticos A teoria dos sistemas ui1izada na anIise do sistema político em geral(?) encor- conflitos e concertaçòes entre classes e grupos sociais, e apostado na minimizaço possi-
trou no sistema judiciário um ponto de aplicaçäo especifico e as acç&s dos acZores do ve! das desigualdades sociais no âinbito do modo de produçäo capitalista dominante nas
sistema partcuIarmente as dos juizes. passaram a ser anaHsadas em funço das suas relaçes económicas. A consolidaçào do Estado-Providênda sgnficou a expansAo dos
orientaçôes po1fticas. direitos soclais e, através deles, a integraçâo das classes trabaihadoras nos circuitos do
A tercefra condiço teórica constituida pelo desenvovimento da antropologia do consumo anteriormente fora do scu alcance11.
direito ou da ethok,gia jw'idica. ao tibertarse progressivamente do seu objecto priviIe Esta integraçäo por sua vez, implìcou que os conftitos emergentes dos novos dircitos
giado. as sociedades coloniais. virando-se para os novos países africanos e asiáticos e sociais fossem constitutivamente conflitos jurkilcos cuja dirìmiçäo caberia em princIpio
para os países em desenvolvimento da America Latina, até finalmente descobrir o seu aos tribunals, litigios sobre a relaçAo de trabaiho, sobre a segurança social sobre a habita-
objecto duplainente primitivo dentro de casa, nas sociedades capitalistas desenvolvidas. ço, sobre os bens dc consumo duradouros etc.. etc. Acresce que a integraço das
Ao cenrarse nos litigios e nos mecanismos da sua prevençäo e da sua rso1uçAo. a antro- classes irabaThadoras (operariado e nova pequena burguesia) nos circuitos do consumo
pooga do direito desviou a atenço analítica das normas e orientou-se para os processos foi acompanhada e em parte causada pela integraço da muiher no mercado de trabaiho,
e para as nsthuiçöes, seus gratis diferentes de forma!izaçäo e de especializaçAo e sua tomada posslvel pela expansIo da acumu!açäo que caracterizou este período. Em
eficacia estruturadora dos comportamentos9). consequência, o aumento do conjunto dos rendimentos familiares foi concomitante corn
Cabe agora iferir brevemente as condiçôes sociais que, juntamente corn as condiçôes mudanças radicals nos padröes do comportamento familiar (entre cônjuges e entre pais e
te6ricas, possibilitaram a orientaço do interesse sociológico para as thmensöes proces lithos) e nas próprias estratégias matrirnoniais, o que veio a constiruir a base de urna
suais insi:itucionais e organizacionais do direito. Distingo duas condiçies principals. A acrescida conflitualidade familiar tornada socialmente mais visive! e até mais aceite aira-
prinleira diz respeito às lutas sociais protagonizadas por gnipos soclais até entäo em tradi- vds das transfonnaçoes do direito de famifia que entretanto se forarn verificando. E esta
çlo bistôñca de acço co'ectiva de confrontaço. os negros, os estudantes amplos sectores foi mais urna causa do aumento des litigios judicials.

da pequena burguesía em luta por novos direitos socais no dominio da segurança sodal, De todo ian resultou urna explosäo de litigiosidade à quai a administraçâo da justiça
habitaçAo, educaçäo. transportes, meio ambiente e qualidade de vida, etc movthientos dificilmente poderla dar resposta. Acresce que esta explosäo velo a agravar-se no inicio
sociais que em conjugaçäo (por vezes difícil) corn o movimento operario procuraram da década de 7O ou seja num período em que a expanso económica terminava e se ini-

aprofundar o conteúdo democratico dos regimes saldos do pgj(lO) j neste con- ciava utnt iecesso para mais urna recesso corn carácter estrutural. Dal resultou a roda-
texto que as desigualdades sociais forain sendo recodificadas no imagnáño social e poll- çäo progressiva dos recursos fmanceiros do Estado e a sua crescente incapacidade para
lico e passaram a constituir urna arneaça à legitiinidade dos regimes poifticos assentes na dar cumprimento aos compromissos assistenclais e providenciais assumidos para corn as
igualdade de direilos. A igualdade dos ddadâos perante a Ici passou a ser confrontada corn classes populares na década anterior (Fano el aL, 1983). Urna situaçäo que dá pelo nome
a desigualdade da perante os cidadàos, urna confrontaço que em breve se transformou de crise financeira do Estado e que se foi manifestando nas mais diversas areas de acilvi-
num vasto campo de análise sociológica e de inovaçäo social centrado na questo do dade estatal e que. por isso se repercutlu também na incapacidade do Estado para expan-
acesso diferencial ao direito e à justiça por parte das diferentes classes e estratos socials. dir os seiviços de administraçào da justiça de modo a criar urna oferta de justiça compati-
A segunda condiçäo social do interesse da sociologia pelo processo e pelos tribunals é vel coin a procura entretanto verificada. Daqui resultou um factor adicional da crise da
constituida pela ec1oso, na década de 60, da chamada crise da adrninisiração da justiça, administtaço da justiça. A visibilidade social que The foi dada pelos meios de comunica-
urna crise de cuja persistencia somos boje testemunhas. Esta condiçâo está em parte rela- çäo iai e a vulnerabilidade política que ela engendrou para as elites dùigentes esteve
na base da criação de um novo e vasto campo de estados sociológicos sobre a administra-

7. Veja.se awn I 96), urna das obras mais mfluente.


ço da justiça, sobre a organização dos tribunals, sobre a formaço e o recnitamento dos
(

Groman e magistrados, sobre as rnotivaçöes das sentenças, sobre as Øleologias políticas e profiasio-
8. Para urna viso gend, eja-se J. R. Welts (org.) (1980: 3-76). Em espcca, cfr.: G. Schubert
U9O) A. Dicke! (1963): H. Jacob (org.) (1967); R. Dith (1967); urna anáhse crítica do artigQ precedente em I. da administraçäo dajustiça sobre o casto dajustiça, sobre os bIo-
nais des vários sectores
CasperU976); M. Shäpiro(1975). queamentos dos processos e sobre o ntmo do seu andamento em suas várias fases.
9. 4ette sentido, cfr. Sarno (1980) e bibliografia al cit
o. Sao muito numerosas as anlises enpftcaa doe diferemes movìmentc tocìaia. Dentre at auto que
meh 1eoiuem a emergencia e o sgnifcado godais detes m&vimenjos jusro aalientar, ra Ewpa. A. lou-
taiue (965 e 1973) e, nos EUA, A. Oberschajj (1973) e F. Piven (1977. Denn os awotea que meihor m anali-

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sado as relçöc
(1975).
entre ue movimentos sociais e o direift). destaco F. Pive e R. Cloward (197t) e i. Handler I I . As iransformaçöcs do poder do Estado
exemplo. Santos (1952a)
dal deconenes são importantes e complexas. CIr., a título 4e
146 Pela Máo de Alice. O Social e o Político na PósModernidade
A Sociologia dos Trbunaì e a Democrahzaçäo da Justiça ¡47

Temas da sociologia dos tribunais


soclais divergentes ou mesmo antagónicos (interesses de patries ou de operários, de
senhorios ou de inquilinos, de rendeiros ou de proprietrios fundiários, de consumidores
Urna vez analisados os antecedentes e as condiçôes da contribuiçäo da sociologia do
ou de produtores, de bomens ou de mulheres, de pais ou de lithos, de camponeses ou de
dieito paia o aprofimdarnento das complcxas interacç&s enue o direito processual e a
citadinos, etc., etc.)t13.
administraçäo da justiça, por um lado. e a realidade social e económica em que operam.
Neste dominio, a contribuiço da sociologia consistiu em investigar sistemática e
por OutfO, passarci agora a analisar de modo sistemático o âmbito diversificado dessa con-
empiricamente os obstáculos an acesso efectivo à justiça por parte das c'asses populares
fribuição corn vista a apontar corn base nela, na parte final deste capitulo, as linhas de
corn vista a propor as soluçôes que melbor os pudessem superat Multo em geral pode
investigaçäomais pmrnissonls eo perfil de urna novapoll:icajudïciái*z. Concentrar-me-ei
dizer-se que os resultados desta mvestigaçäo permitiram concluir que eram de
na máse das contribrnç&s no ânìbito da justça civil, embora multas destas tenham um Irês tipos
esses obstáculos: económicos, socials e culturaistt4. Quanto aos obst.culos económicos,
âmbito mais geral e abarquern tambérn a justiça penal, corno l'acilmerne se reconhecer&
veriticou-se que, nas sociedades capitalistas em gera os cuslos da litigaçAo erain muito
Distinguirci trés grandes grupos temáticos: o acesso à justiça a administraço da jus-
elevados e que a relaço entre o valor da causa e o custo da sua litigaçào aumentava à
tiça enquanto instituiçäo politica e organizaço profissional. dirigida à pmduçâo de servi-
medida que baixava o valor da causa. Assim, na AIemanha verificou-se que a
ços especializados; a liuigiosidade social e os mecanismos da sua resoluço existentes na litigaçäo
de urna causa de valor médio na primeira instância de recurso custaria cerca de metade do
sociedade.
valor da causa. Na Inglaterra verificou-se que em cerca de um terco das causas em que
houve contcstaçào os custos globais forain superiores aos do valor da causa. Na itália, os
podem atingir 8,4% do valor da causa nas causas corn valor elevado,
custos da litigaçao
O acesso 4 fusti ça
enquanto nan causas corn valor diminuto essa percentagem pode elevar-se a 170% (Cap-
pelletri e Garth, 1978: 10 e ss.). Estes estados revelarn que a justiça civil d cara para os
o tema do acesso à justiça aquele que suais directamente equaciona as relaçöes entre
o processo civil e a justiça social, entre iguakiade jurídico-formal e desigualdade sòcio-
cidadAos em genil. mas revelarn sobretudo que a justiça civil é proporcionalmente mais

-económica. No âmbito da justiça civil, muito mais propriamente do que no da justiça


cara para os cidadäos economicamente mais débeis. Ê que sao eles fundamentalmente os
protagonistas e os interessados nas acçöes de menor valor e é nessas acçöes que a justiça
penai. e falar-se de procura. real ou potencial, dajusûça02). Urna vez definidas as suas
é proporcionalmente mais cara, o que cordigura um fenómeno da dupla vitiinização das
características internas e medido o sen âmbi*o em tennos quantitativos, é possivel corn-
classes populares face à administraço da justiça
pará-la corn a oferta da justiça produzida pelo Estado. Nao se trata de um problema novo.
De
facto, verificon-se que essa VitimizaÇäO é tripla na medida em que urn dos outros
No principio do sculo, tanto na Austria como na Alernanha forain frequenter as dernn-
obstáculos investigados. a lentidâo dos processos, pode ser facilmente convenido nurn
cias da discrepancia entre a procura e a oferta da justiça e oram várias as tentativas para
custo económico adicional e este é proporcionalmente mais gravoso para os cidadàos de
a minimizar quer por parte do Estado (a reíorma do processo civil levada a cabo por
menos recursos. No final da década de 60, a duração média de um processo na
Franz Klein na Austria) (Klein, 1958; Denti i97 I) quer por parte dos interesses organi- civil Itália
era, para o percurso das tres insthncias, 6 anos e 5 meses (Resta, 1977, 80); alguns anos
¿ados das classes sociais mais débeis (por exemplo. os centros de consulta jurídica orga-
mais tarde, na Espanha. essa duraço era cerca de 5 anos e 3 meses (Cappefletti e Garth,
fizados pe'os sindicatos alernes) (Reifier. 1978). Foi' no entanto no pós-guerra que esta
1978: 14). No final da década de 60, as acçòes civis perante o tribunal de grande insthncia
questo exp]odiu. Por um lado, a consagraçào constitucional dos novos direitos económi-
cui França duravarn 1,9 anos e perante o tribunal de primeira insthncia na Bélgica 2,3
cos e sociais e a sua expansão paralela à do Esado-Providnda transfonnou o dfreito ao
acesso efectivo à justiça num direito charneira urn direito duja denegaçäo acanetaria a de anos (Cappelletti e Garth, 1978). A análise de duraçäo média dos processos civis e a con-

todos os demais. Urna vez destituidos de mecanismos que fizessern impor o seu respeito, sequente verificaço do aumento da ientidäo da justiça é um dos temas mais intrigantes
da investigaço sociológica sobre os tribunals nos nossos dias. Por um lado, verifica-se
os novos direitos sociais e económicos passariam a meras declaraçes politicas de con-
que a Iitigaçäo civil tern vindo a diminuir de volume n últimas décadas. Os estudos
teúdo e funçäo misfificadores. Dal a constataçao de que a organizaçâo da justiça civil e,
em particular, a tramitaçäo processual näo podiarn ser reduzidas à sua dimensäo técnica,
feitos na Thilia neste campo (Resta, ¡977: 83 e ss.) corroboram inteiramente os produzidos

socialmente neutra, como era comuni sereni concebidas pela teoria processualista,
devendo investigar-se as funçöes sociais por eas desempenhadas e em particuhtr, o modo 13. Na europa Continental a hegemonia da cina jnrdiea posvisa omou particularmente diffeil o reco-
nhecxo dos pressupoos poiftices e andais pur detrás das sotuçi5e tcnicaa prossuals. Nete
como as opçes técnicas no seri seio veiculavarn opçöes a favor ou contra Interesses sentido, ver
M. Capl1cui(i%9)eP. Calamandrei (1956).
14. 0 cntklo geral das estudo do peodo inicial está patezfle em Confrrence Proceedings (1964) e em L
Na jusiça Carlin e J. Howard (1965). Pode ainda ter-se urna visSo global e apmfundada do esiudos realizados nos vlro
12. penal 1á, por asim dier, urna pmcura forçada thjusuça, rwmcadamentc por parte do
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xu
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penal.
no
países, durante a década seguinte
cia hibtiogfica obrigatória neate doramnlo.
Cappe11e1i e B. Gaith (regs.) (197E), urna obra monurnenral e tuna mfethi-
148 Pela Mäo de Alice. O Social e o Político na POs-Modernidade A Sociologia dos Tribunals e a Democfatìuzçáo da Justiça I 49

em Espanha, onde Juan Toharia (1974: 190) condul que ao maor desenvolvimento soca dentes de viaçào, verificou-se que 27% dos inquiridos da classe baixa nada faziam em
e econóniico e ao consequente aumento da vida jurídica civil e da conflitualidade sia comparaçAo corn apenas 24% dos inquiridos da classe alta (citado em Carlin e Howard,
nesa área tern correspondido urn decréscimo das causas dvis nos thbunas de jusuç& A 1965), ou seja, quanto mais baixoé o status sócio-económico da pessoa acidentada menor
este fenómeno volEarei mais tarde. por agora basta referir o para1oxo denunciado por a probabilidade que interponha uma acçâo de indemnizaçao.
Vincenzo Fenañ (9S3: 338): apesar da carga do contendoso civil ter vmdo a diminuir e Dois factores parecem explicar esta desconfiança ou esta resignaçao: por um lado,
apesar das rnutas movaçöes introduzidas corn o objectivo de tornar a justiça civil mais experiências anteriores corn a justiça de que resultou urna aiienaço ém relaço ao mundo
expedita, o facto que se tern vindo a verificar urn aumento consantc da duraçäo midia jurídico (urnareacço compreensível à luz dos estudos que revelam ser grande a dife-
dos processos civis. E mais intrigante o facto de este aumento se revelar resistente, nao renca de qualidade entre os serviços advocaticios prestados às classes de maiores recursos
só às inovaçöes parciais que o procurarn controar mas também em relaçäo às restntura- e os prestados às classes de menores recursos); por outre lado, urna situaçao gera! de
çôes globais do processo tendentes a eliminar por completo a lentidão da justiça. Assim, dependência e de insegurança que produz o temor de represálias se se recorrer aos tribu-
o processo de trabaiho. que. no inicio da década de 70. constituiu juntamente corn o Sui. nais. Em terceiro e último lugar, verifica-se que o reconhecimento do problema como
uao dei lavoratori urna importante vi6ria das organizaçöes operärias italianas no sentido problema jurídico e o desejo de recorrer aos tribunals para o resolver nao são suficientes
de acelerar a administraçäo da justiça mais directamente relevante para os interesses das baho o estrato sócio-económico
para que a iniciativa seja de facto tomada. Quanto mais
classes iraba1hadoras tern-se vindo a reve1ar em tempos recentes. impotente para impedir do cidadao menos provável que conheça advogado ou que tenha amigos que conheçam
o aumento progressivo da dw'aço das causas laborais. advogados, menos provável é que saiba onde, como e quando pode contactar o advogado
Estas verificaçOes têm levado a sociologia judiciária a concluir que as reformas do e maior é a distância geogrMìca entre o lugar onde vive ou trabaiha e a zona da cidade
processo, embora importantes paia fazer baixar os custos ecoiúrncos decorrentes da len- onde se encontram os escritOrios de advocacia e os tribunais.
tidäo da justiça, nào são de modo nenhurn urna panaceia. E preciso tornar em conta e sub- o conjunto destes estudos revelou que a discriminaçAo social no acesso à justiça é mn
meter a anflise sistemática outios factores quiçá mais importantes. Por um 'ado, a organi- fenómeno muito mais complexo do que à primefra vista pode parecer, ja que, para a1rn
zaçAo judiciária e a racionalidade ou irracionalidade das crit6ños de disthbuiço territo- das condicionantes económicas, sempre mais Obvias, envoFve condicionantes sociais e
rial dos magistrados. Por outro, a distribuiçao dos custos ruas tarnbérn dos benefIcios culturais resultantes de processes de socializaçäo e de interiorizaçäo de valores dominan-
decorrentes da lentidao da justiça. Neste domInio, e a ítu!o de exemplo, é importante tes moite difíceis de transfonnar A riqueza dos resultados das investigaçôcs sociológicas
investigar em que medida largos estratos da advocacia organizam e rentabilizam a sua no dominio do acesso à justiça pôde deixar de se
fläO refleciir nasinovaçòes institucionais
actividade corn base na demora dos processos e näo apesar dela (Fenari, 1983: 339; e organizacionais que, um pouco por toda a pane, forain sendo levadas a cabo para mini-
Resta, 1977 87). mizar as escandalosas discrepancias verificadas entrejustiça civil ejustiça social.
Como comecei por referir, a sociologia da adminisftaçao da justiça tern-se ocupado No iinediato pós-guerra, vigorava na maioria dos países um sistema de assistência
tambérn dos obstícuos sociaìs e culturais an efectivo acesso à justiça por parte das advogados a
judiciária gratuita organizada pela ordern dus título de mimos honorificum
c'asses populares, e este constitui talvez um dos campos de estudo mais inovadores. (Cappelleni e Garth, 197& 22 e ss. l3lankenburg, 1980). Os inconvenientes deste sistema
Estudos revelam que a distância dos cidadâos em Macao à administraçân da jusüça é eram muitos e foram rapidamente denunciados. A qualidade dos serviços jurfdicos era
tanto maior quanto mais baixo do esirato social a que pertencem e que essa dist&cia tern baixíssima. urna vez que, ausente a motivaçäo económica, a distribuiçao acabava por
como causas pniximas nao apenas factores econ6rnicos mas também factores sociais e recair em advogados sem experiencia e por vezes ainda nao plenamente profissionaliza-
culturais, ainda que uns e outros possarn estar mais ou menos remotameite re'acionados des, em geta! sem qualquer dedicaçäo à causa. Os crit&ios de ehgibilidade cram em geral
corn as desigualdades econónücas Em pthneiro lugar, os cidados de menores recursos estritos e, muite importante. a assistncia limitava-se ans actos em juízo. estando excluida
tendem a conhecer pior os seas direitos e, poi-tanto. a ter mais dificuldades em reconhecer a consulta jurídica, a inforrnaçAo sobre os dimites. A denúncia das carências deste sis-
um problema que os afecta como seudo problema juridico. Podern ignorar os direitos em tema privado e caritativo levou a que, na maioria dos paísr, ele fosse sende substituido
jogo ou ignorar as possibilidades de reparaçäo jurídica. Capowitz (1963). por exemple, por um sistema público e assistencial organizado ou subsidiado pelo Estado. Na Ingla-
concluiu que quanto mais baixo é o estrato social do consumidor maior é a probabilidade terra, criou-se logo em 1949 um sistema de advocacia convencionada posteriormente
que desconbeça os seus dimites no caso de compra de um produto defeituoso. Em aperfeiçoado (1974), segundo o qual qualquer cithdäo elegível nos termos da lei para o
segunde lugar, mesmo reconhecendo o problema como jurídico, como violaçäo de um patrocInio judiciário gratuito escolbeo advogado dentre os que se inscreveram para a
direito, é necessarioque a pessoa se disponha a interpor a acço. Os dados mostram que prestaço des serviços e que constato de urna lista; urna lista sempre grande dado o atrae-
os individuos das classes baixas hesitain muito mais que os outres
em recorrer aos tribu- tivo da remuneraçAo adequada a cargo do Estado. Nas duas decadas seguintes muitos
nais, mesmo quando reconhecem estar perante urn
pmbema ega1. Numa investigaçâo
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que tinham using a watermarked
sido vftimas
de pequenos
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aci-
conhecidos nos
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esquemas semeihantes de
países introduziram

anglo-saxénicos
CVISION PDFCompressor services jurídicos gratuitos. Estes
esquemas,
designaçâo de Judicare, urna vez posies em
países pela
I
Pela Mao de Alice, O Social e o Político na POs-Modernidade A Sociologia das Tribunals e a Democratìzaçäo da Jusiça
151

prtìca, foam submetidos a estudos sociológicos que, apesar de assinaiarem as significa- que viram nos tribunais um subsisEema do sistema político global, partithando corn
este a
tivas vantagens do novo sistema em relaçäo ao anterior, nao deixaram contudo de revelar característica de processarem urna série de inputs estemos constituidos por
estímulos,
as suas limitaçes (Blankenburg, 1980; Abel-Smith et aL, 1973). Em primeiro sugar, pressôes, exìgências soclais e poiflicas e de, através de mecanismos de conversao, produ-
apesar de em teoria o sistema incluir a consuka jurídica independentemene da existência zirani oulputs (as decisòes) portadoras elas própnias de um impacto social e
político nos
de um litigio, o facto que, na prática. se concentrava na assistência judiciária. Em restantes subsistemas.

segundo lugar, este sistema limitava-se a tentar vencer os obsticu1os económicos au Urna tal concepço dos ttibunais leve duas consequências
muito importantes. Por um
accaso à justiça, mas nAo os obstáculos sociais e cuhurais. Nada fazia no dominio da edu- lado, colocou os juízes no centro do campo analítico, Os seas
comportamentos, as dcci-
caço jurídica dos cidados, da conscencializaçäo sobre as novos direitos sociais dos scies por eles proferidas e as motivaçoes delas constantes, passaram a
ser urna variável
trabaihadores, consumidoxs, inquilinos. jovens, mulberes, etc. Por últiino concebendo a dependente cuja aplicaçäo se procurou itas correlaçöes corn vaniveis
independenies,
assistência judiciria como um serviço prestado a cidadäus de menos recursos individual- fossem cias a ungern de classe, a formaçäo profissional. a idade ou
sobretudo a ideologia
mente considerados, este sistema excluía, à partida. a concepçào dus problemas desses politica e social dos jufacs. A segunda consequência consistiu em
desmentir por completo
cidados enquanto pmblemas colectivos das classes sociais subordinadas. Estas críticas a idela convencional da admirtistraçào da justiça como urna
funçâo neutra protagonizada
conduziram a algumas alteraçöes no sistema de serviços jurídicos gratuitos e, no caso dos por urn juli apostado apenas em fazer justiça acirna e equidistante dos interesses
das
Estados Unidos da América, conduziram mesmo à criaçäo de um sistema totalmente novo partes. São conhecidos os estados de Nagel (1969), &hubert 1965)('), Ulmen
( (1962 e
baseado em advogados contratados pelo Estado, traballiando em escritórios de advocacia 1979), Grossman6) e outros nos EUA. de Richter (1960) e Dahrendonf (1961), na
Ale-
localizados nos bairros mais pobres das cidades e seguindo urna estratégia advocatícia manha, de Pagani (1969), Di Federico (1968) e Monondo (1967), na Itália
e de Tobaria
orientada para os problemas jurídicos dos pobres enquanlo problemas de classe, urna (1975). na Espanha. Nos EUA. os estados iniciais ceniram-se no
Supremo TribUnal de
estratdgia privilegiando as acçöes colectivas, a criaço de novas correntes jurispruden- Jusliça. A título de exempo. &hubert, distinguindo entre
julien liberals e conservadores,
dais sobre problemas recurrentes das classes populares e, finalmente, a transformaço ou correlacionou as suas ideologias políticas corn as suas posiçoes nos relatórios
e declara-
reforma do direito substantivo (Cahn e Cahn, 1964; Note, 1967). çöes dc voto nas sentenças em vários dominios do dimito, desde as relaçöes económicas
No cabe aquí avahar em pormenor este movimento de inovaçäo institucional a até aus direitos cívicos, e obteve índices elevados de covariaçäoU7). Oijro
estados md-
que Portugal se rem, pouco honrosamente, hulado, um movimento cujas sucessivas eta- dindo sobreas decisöes dos tribunals de primeira instância, tanto nos
dominios penal
pas denotam urna consciéncia progressivamente mais aguda da necessidade de garantir o como no civil, mostraram em que medida as características soçiais,
políticas, familiares,
acesso efectivo à justiça por parte de todos os cidadäos Aoje, pode mesmo dizer-se que económicas e religiosas dos magistrados influenciaram a sua defmiçAo da situaçào
e dos
este movimento transborda dos interesses jurídicos das classes mais baixas e estende-se já emjogo no processo e consequentemente o sentido da deciso(').
interesses

aos interesses jurídicos das dasses medias, sobretudo aos chamados interesses difusos, Os estudos italianos sobre a ideologia da magistratura no assentam no comporta-
interesses protagonizados por grupos sociais pouco organizados e protegidos por direitos mento decisional mas antes nos documentos públicos, manifestos, discursos,
estatutos
soclais emergentes cuja titularidade individual é prob'emática. Os direitos das crianças organizativosem que os magistrados, individual ou colectivamente, definem o perfil
contra a violéncia nos programas de Televisiio e os brinquedos agressivos ou perigosos, óptimo da funço judicial e das suas interacçöes corn o poder político e corn
a sociedade
os direitos da muther contra a discríminaçio sexual no emprego e na comunicaçAo social, em gerat19. As investigaçöes realizadas sob a dfrecço de Renato Treves obnigam a
urna
os direitos dos consumidores contra a produçâo de bens de consumo perigosos ou defei- revisâo radical do mito do apoliticismo da íunçäo judicial e revelam haver gnsndcs
ten-
tuosos, os direitos dos cidadAus em geral contra a poluiçäo do mejo ambiente. A defesa
pública destes direitos deu ungern à instituiço da chamada advocacia de interesse 15. SChubert (ambrn o orgaiz.dor das melbois cokctaeas de estudos sobre o comportamento e as
atitu-
público subsidiada pelas comunidades, por fundaçes e pelo Estado (Trubek el aL, 1980). des dosjuizes nofle americanos (Sctwbefl. 1963 e 19M).

Deu também engem a algurnas reformas no processo civil, nomeadamente o alargamento 16. V,ja-se urna visSe geTJ sobrea suaperspectiva em J Grossman e RWe1l (orgs.) (19G).
17. Sthuben distìigue earejumne «conservadores» e «liberais» (dcsgiaçocs que tm nos EUA urn signifi-
do conceito de legitimidade processual e dc interesse em agir. cado político difente do que lhs anibuidO na Europa) e identifica nt atiunies diferentes consoatue o libera-
juno ou o conservdonisrnodosjuizes seja ecoflósnico, políticoou social,
18. tra tana panoramica geral dosestudos ein lt1ia, cfr. R. Treve
(1975 e l9OE 253 e sa.), As análisea das
A administraçäo dajustka enquanlo insiluiçâopo&ka e profissional ideologiasdos magisuadostrn nicididopersofreas ideologias pmflssionaisØ'agani.
1969),quersotas ide-
Ologias poittico-socisis (Metiendo. 1961), No dominio da justiça perntl, um dos methores estudos o de J.
Hoganh Os esnidos sobre os agentes da admniistraçlo da justiça nSa se cenmsam apenas nos magistra-
Passo ao segundo tema da sociologia judiciária. Trata-se de urn tema muìlo ampio nO t 1971).
(tos profissionais mas incidinun também solar osjwados, por exemplo. Cfr. o estudo clássico de H. Kalven Jr. e
quai se incluern objectes de análise muito diversos. A concepço da athnrnistraço da jus-
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tiça como urna instância política foi inicialmente propugnada pelos cientistas políticos
H. Zeise

19. Cfr.
t 1966),

rota ta.
152 Pela Môo de Alice. O Social e o Pol(tico ,a Pós-Modernidade A Sociologia dos Tribunais e a Democrarìzaçäo da Jusiiça t53

clências ideológicas no solo da magistratura taliana°. Em priniefro 'ugar. a tendencia de vida jurídica totalmente diferentes dos existentes nas sociedades ditas civilizadas;
dita «estruira1 funcionalista», corn a ênfase nos valores da ordern, do equilibrio e da direitos corn baixo grau de abstracçào, discerníveis apenas na so!uçäo concreta de litigios

segurança socia! e da certeza do direto, que agrupa os juzes e magistrados conservado- particu!ares; direitos corn em relaçäo s restantes activi-
pouca ou nula especializaçAo
res ou moderados, defensores da diviso das poderes, adeptos das soluçòes tradicionais, dades sociais; mecanismos de reso!uçäo dos litigios caracterizados pela informa!idade,
quer no piano sócio-econámico, quer no da orgauzaçâo judkiária. Em segunda lugar, rapidez, participaço activa da comunidade, conciliaço ou mediaçäo entre as panes
a tendência do chamado «conflitivismo pluralista» em que prevalecem as ideias de através de um discurso jurídico retórico, persuasivo, assente na linguagem comum.
mudança social e se defende o reformismo, tanto no interior da organização judiciária Acima de nido, estes estudos revelaram a existencia na mesma sociedade dc urna plurali-

como no da sociedade em geral, corn vista ao aproflindamento da democracia denim do dade de direitos convivendo e interagindo de diïerentes formas.
mareo jurídico-constitucional do Estado de direito. Em ¡erceiro lugar, a tendência mais No momento histórico em que a antropologia convergía teórica e metodologicarnente

radical do chamado «conflitivsrno dicot6mico de tipo marxista» que agrupa os juízes corn a sociologia, o impacto destes estudos na sociologia do direito foi enorme. Muitos
apostados nurn uso alternativo do direito, numa funçäo mais criadora da magistratura foram os estados que se seguiram, tendo por unidade de análise o litigio (e nao a norma)
enquanto contribuiçào do direito para a construço de urna sociedade verdadeiramente e por orlentaçäo teórica o pluralismo jurídico, orientados para a análise de mecanismos de

igualitkia. Estas tendências tiveram expressâo organizativa na Unione di Magistrati Ita- resoluçào jurídica informal de conflitos existentes nas sociedades contemporâneas e ope-

1juni, na Associazione di Magistrati italiani e na Magistratura Democrática respectiva- rando à margem do direito estatal e dos tribunals oficlais. Citarei dois exemplos. O estudo
mente. pioneiro de S Macauly (1966) sobre as práticas jurídicas e sobretodo os conflitos juridi.-

Ainda no inbito da administraçäo da justiça como organizaço profissional, säo de cas entre os produtores e os comerciantes de automóveis nos EUA, resolvidos de modo
salientar os estudos sobre o recrutamento dos magistrados e a sua distribuiço teriitoria informal àmargem das thsposiçes do direito comercial e da intervenção dos tribunals,
(Feraari, 1983: 312). Dentro do mesmo quadro teórico, mas de urna perspectiva multo orientados pelo objectiva de nAo criar rapturas nas relaçöes económicas e retirando destas

diferente, so os estudos dirigidos a conhecer as atitudes e as opiniöes dos cidados sobre poderosos dispositivos sancionários nao oficials. Em segundo lugar, os estudos por mim
a administtaçllo da justiça, sobre os tribunais e sobre os juizes. Urna tradlçAo de investi- realizados no inicio da decada de 70 nas favelas do Rio de Janeiro e onde me foi possfvel

gaçäo que teve em Podgorecki um pioneiro, corn os reus estados sobre a percepçäo socia! detectar e analisar a existencia no interior destes bairros urbanos de um direito informa!

do direito e da justiça na Polónia e que se tern vindo a prolongar em múltiplas investiga- no oficial, nAo profissionalizado, centrado na Associaçäo de moradores que funcionava

çoes (Podgorecki et aL, I973) Um estudo feito em ltá!ia reve!ava urna atitude moderada- como instancia de reso!uçào de litigios entre vizinhos, sobretudo nos dominios da habita-

mente desfavothvel perante a magistratura (Ferrari. 19S3 312). çao e da propriedade da terra (Santos 1974 e 1977).
Todos estes estudos têm vindo a chamar a atenço para urn ponto n-adicionalmente Estes e muitos outros estados que se seguiram corn objectivos anaiticos semethantes

negligenciado: a importancia crucial dos sistemas de formaço e de recrutamento dos permiliram concluir o seguinte. Em primeiro lugar, de um ponto de vista sociológico. o
magistrados e a necessidade urgente de os dotar de conhecimentos culturais, sociológicos Estado contemporâneo näo tern o monopólio da produçäo e distribuiço do dimito. Scado
e económicos que os esclareçam sobre as suas próprias opçôes pessoais e sobre o signifi- embora o direito estatal o modo de juridicidade dominante, ele coexiste na sociedade corn

cado político do corpo profissional a que pertencem, corn vista a possibilitar-thes um outras modos de juridicidade, outros direitos que corn ele se articulam de modos diversos
certo distanciamento crítico e urna atitude de pmdente vigilancia pessoal no exercício das (Santos. 1980: 64 e ss.; Ruivo e Marques, 1982). Este conjunto de articulaçôes e interre-

suas funçóes numa sociedade cada vez mais complexa e dinamica. laçes entre vários modos de pmduçAo do direito constitui o que designo por formaçäo
jurídica. Em segundo lugar, o relativo declinio da litigiosidade civil, londe de ser inicio

de diminuiçAo da conflitualidade social e jurídica. é antes o resultado do desvio dessa


Os conflitos sodais e os mecanismos da rizo resolztçäo conflitualidade para outros mecanismos de resoluçio, informais, mais baratos e expedi-
tos, existentes na sociedade.
Este tema constitui a ¡erceira contribuição da sociologia para a administraçAo da jus- Estas concluses no deixaram de influenciar algumas das reformas de adrninistraço
tica. A1iás ueste dominio a contribuiçäo inicia! pertenceu à antropologia ou etnologia dajustiça nos tkimos anos. Distinguirel dois tipos de reformas: as reformas no interior da
sociaL Os estudos de Evans-Pritchard (1969) no Sudão de Gulliver (1963) e Sally Moore jusliça civil tradicional e a criaçâo de alternativas. Quanto às primeiras so de salidntar as
(1970) na Africa Oriental, de G!uckman (1955) e Wn Velsen (19M) na Africa Centrai/ seguintes:O reforço dos poderes do juiz na apreciaço da prova e na conduçAo do pro-
/Austral e de Bohannan ( 1957) na Africa Ocidental tiveram um impacto decisivo no cesso segundo os principios da oralidade, da concentraçào e da imediço, um tipo de
desenvolvimenio da sociologia do direito Deram a conhecer formas de direito e padròes reformas corn longa tradiço na teoria processualista europeia iniciada pela obra pioneira
de Franz a criação de um novo tipo de relacionamento entre os vários participantes
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a caracterizaçäo proposu por no
E. Diaz (1978:
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mais
43 emais
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um processamento mais e processo,
Klein;
informal, horizontal, inteligívc!
54 Pela Mdo de Alice. O Social e o Político na PóModernidade A Sociologia do. Tribwais e a Democrarzaçäo da Justiça i

urna participaço mais activa das partes e tesiemunhas. Como exemplo deste tipo de a igualdade do acesso à justiça das partes das diferentes classes ou estratos soclais. Este
reforma citare o chamado Stu#gart Modell na Alemanha e os tribunais de grande thstãn serviço näo se deve limitar a eliminar os obstáculos económicos ao consumo da justiça
cia criados em 1967 nos departamentos perifericos da regio parisiense (Ba11 et aL, por parte dos gnipos sociais de pequenos recursos. Deve tentar tambdm eliminar os obstá-
I 98 1 ); por último, e relacionado corn as anteriores, as refonnas no sentido de ampliar o culos sociais e culturais, esciarecendo os cidadàos sobie os seus dfreitos, sobretudo os de

âmbho e incentivar o uso da conciliaço entre as partes sob o controle do juiz(2». recente aquisiçäo. aravs de consultas individuais e colectivas e atravs de acçôes educa-
As reformas que visam a criaço de alternativas constituern hoje urna das áreas de tivas nos meios de comunicaço, nos locals de trabaiho, nas escolar, etc.
maior rnovaçäo na po1ítca judiciÑia. Elas visam criar. em paralelo t adininistraçao ia
justiça convencional, novos mecanismos de resohiçäo de litígk,s eujos aços constituti- medidas de democratizaçäo, apesar de amplas. têm limites óbvios. A desi-
2. Estas

vos tm grandes semethanças corn os originalmente estudados peta antropo'ogia e pela gualdade da protecçâo dos interesses sociais dos diferentes grapos sociais está crista-

sociologia do thnto. ou seja. thsiiiuiçöes leves, relativa ou totalmente desprofzssionaliza- lizada no próprio substantivo. pelo que a democratizaçao da administraçào da justiça,
das, por vezes impedindo mesmo a presença de advogados, de utiluzaço barata. se nao mesmo se plenamente realizada, nao conseguirá mais do que igualizar os mecanismos
mesmo grauita localizados de modo a maximizar o acesso aos seus serviços. operando de repmduçao da desigualdade. Durante o regime de Pinochet um jurista chileno defen-

por via expedita e pouco regulada, corn vista obtençäo de soluçôes mediadas entre as deu que nao fazia sentido lutar no seu país pelo acesso à justiça por parte das classes

partes). Neste domfnio é de mencionar a cñaço experimental dos ceniros de Justiça de populares já que o direito substantivo era thu discriminatório em re1aço a elas que a ati-
bairro nos EUA e os conciliateurs em França). lm Portugal, algumas iniciativas no tude política democrática consistia exactamente em minimizar o acesso. Nos EUA. os
mesmo sentido no pós-25 de Abril näo fiveram qualquer concretizaçäo (Sindicaio dus serviços jurídicos para os pobres acabarain muitas vezes por propor reformas no direito

Magistrados do M. P.. 1982). Hoje, o florescimento internacional da arbitragem e dos substantivo que dessem maior satisfaçào sos interesses dos seus clientes enquanto classe

mecanismos conhecidas, em gera. por Alternative Dispute Resoiuticrn (ADR) so a mani- social.

No nosso país, nos últimos vinte anos promulgada legislaçào que de modo mais
festaço mais concludente das transformaçoes em curso nos pmcessos convencionais de foi

reso1uço de conthtos. ou menos afoio pretende ir ao encontro dos interesses sociais das classes trabathadoras e
também dos interesses emergentes nos dominios da segurança social e da qualidade de
vida, porexemplo, a que são particularmente sensfveis as classes mêdias. Sucede, porém,

Para urna nova política judiciárla que muita déssa 1egislaço tern permanecido letra morta. Pode mesmo avançar-se como
hipótcse de lei sociológica que quanto mais caracterizadamente urna lei protege os inte-

Passarei agora a mencionar as linhas de investigaço mais promissoras no domínio da resses populaTes e emergentes maior é a probabilidade de que eta nao seja aplicada.

sociologia da administração da jusliça e o seu possível impacto na criaçilo do que desig- Sende assim, a luta democrática pelo direito deve ser.no nusso país, urna luta pela aplica-
narei por uma «nova política judiciária», urna po'ítica judiciaria comprometida corn o ço do direito vigente. tanto quanto urna luta pela mudança do direito. A1iás mesmo corn
processo de democratizaçäo do direito e da sociedade. base no direito substantivo mais sedimentado na ordern jurídica portuguesa é possível
mediante interprelaçöes inovadoras da lei, obter novas protecçöes para os interesses
I. A democratizaçäo da administraçio da justiça urna dimenso fundamental da
i soclais até agora menos protegidos. Foi esta, afinal, a aposta do movimento que na Italia

dernocratizaçäo da vida social, económica e poMica. Esta democratizaçâo tern duas ver- licou conhecido pelo uso alternativo do direito (Barcellona, 1973; Lalem et aL, l978).

tenuts. A primeira diz respeito à constituiço interna do processo e mcmi urna série de Neste campo sào vrias as experiencias um pouco por toda a parte. Referirei, a título de

orientaç&s tais como: o major envolvimento e participaçäo dos cidados, individual- exemplo, o estudo que, corn outros, realizei no Recife sobre os conflitos urbanos, sobre-

mente ou em grupos organizados, na adminisiraçao da justiça: a simpiiticaço dos actos nido conflitos de propriedade da tena nos bainos marginais onde vive metade da popula-

processuais e o incentivo à conciliaçâo das pa1es; o aumento dos poderes do juiz; a çäo da cidade. Esta investigaçào revela que os habitantes dos bairros t&m conseguido
ampliaço dos conceitos de legiiimidade das partes e do interesse em agir. A segunda ver- algumas vitOrias nos tribunais, ainda que à partida os seu' argumenoes sejam relativa-
tente diz respeito à democratizaço do acesso à justiça. E necessário criar urn Serviço mente frágeis em termos estritamente jurídicos. Estas vìtórias configuram um autêntico
Nacional dc Justiça um sistema de serviços jurídico-sociais, gerido pelo Estado e pelas uso alternativo do direito, tomado possível pela argumentaçäo tecnicamente sofisticada

autarquias locals corn a colaboraço das organizaçöes profissionais e sociais, que garants de advogados altamente competentes. postos, gratuitamente, à disposiçào das classes
populares pela COniiSSâO de Justiça e Paz da diocese de Olinda e Recife por iniciativa do
hispo D. Heider Câmara (Santos, 1982b e 1983; Falco, 1984). Mas também aqui a inter-
proposta defendida ernre nòs po Pcssoa Vz (J 976)
21 . Urna
pretaçâo inovadora do direito substantivo passa pelo aumento das poderes dos jufzes na
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22. Wja-se a caracerìzaç5o geral destas a]temalvs em (1982 e 19Sc)
cunduçào do
23. A mehorcokcnea d sudos obre cstasexpenências é a de R. Abet (org.) (1982).
processo.
156 Pela Mao de Alice. O Socia! e o Político na Pó-Modernidade A Socìoloia dos TriMrnaìs e a Dernocratizaçäo da .Iutiça 57

3. A diminuiçAo relaiiva do contencioso civil detectada em váiios paises tern sido con.. rem entre cidados ou grupos de poder sOcio-económico parificável (litigios entre vizi-
siderada dsfuncionaI, ou seja, como negativa em relaçâo ao processo de dernocranzaçao nhos, entre operários, entre camponeses. entre estudantes etc.) a informalizaçâo da jus-
da justiça. A análise sociológica da persstthca desse fenómeno revela que ela pode ser tiça pode ser um gennno factor de &mocratizaço. Ao contrário. nos litigios entre cida-
funcional para a prossecuçäo de certos üiteresses priviIegados a quem a visibilidade pro.. dAos ou grupos corn posiç&s de poder esiruturalmente desiguais (litigios entre patres e
pria da justiça civil prejudicaria. Se é certo que as classes de menores recursos tendem a operários, entre consumidores e produtores, entre inquilinos e senhorios) bem passive!
nao utilizar a justiça petas razes que expusernos, a verdade que as classes de maiores que a informalizaçäo acarrete consigo a deterioraçào da posiçAo jurídica da parte mais
recursos tendem igualmente a resolver os seus litigios fora do campo judkiário. isto tern fraca, decorrente da perda das garantias processuais1 e contribua assim para a consolida-
sido observado em muitos países. Na Itália e nos EUA, por exemplo. parece daro serem ço das desigualdades soclais; a menos que os axnplos poderes do juíz profissional ou
as classes intcrmédias (pequenos e rndios credores e proprietários, etc.) quem mais leigo possam ser utilizados para compensar a perda das garantias o que será sempre difí-

recorre aos tribunais (Resta, 1977)). Estudos realizados na B1gica verificain igual- cil urna vez que estes tribunals infonnais tendem a estar desprovidos de meios sanciona-
mente a crescente marginalizaçäo das magistraturas econ6micas nurna epoca de crise em tóños eficazes. A título de exemplo retiro que após a criaçAo do nibunal de habitaçäo em
que, sobretudo ao nivel dos grmdes grupos económicos e financeiros, as consideraçöes Nova bique destinado a resolver de modo expedito, informa! e desprofissionalizado, os

de oporlunidade económica sobrepujain largamente as considemçóes de legalidade eco- conilitos entre inquilinos e senhorios, o número de despejos aumentou (Lazerson, i982).
nómica (Jacquemin e Remiche, i 984). A composiço particularista e secreta de interesses os inquilinos tinham deixado de contar corn os expedientes processuais utilizados petos
económicos que, pela envergadura destes, afecta significativamente os Interesses soclais advogados para suster ou desencorajar o despejo. Aliás, a sirnaço que no futuro meihor e
globais, é feita multas vezes corn a conveniência e a ra1ificaço dos apareihos políticos e mais perigosarnente simbolizará a dissociaçäo entre justiça célere e justiça democrática
administrativos do Estado, mas fora do escrutinio pubLico a que a jusuça civil os exporia. decorrerá, em meu entender, das reformas hoje em curso corn vista, nao à informalizaço.
Este particularismo , alias, um dos factores de ernergência de novas fonnas de pIura- mas antes à inforrnafizaçäo da justiça, urna questão que nao abordarei aqul.

lismo jurídico rias sociedades capitalistas avançadas, formas que constituem a expressAo
socio-jurídica de que em sede de ci&icia política se tern vindo a designar por neocorpora- 4. A contribuiço maior da sociologia para a democratizaçio da administraç.o da jus..

tivismo. tiça consisteem mostrar empiricamente que as reformas do processo ou mesmo do direito
Nestas condiçes no me parece possfvel que o Estado possa, através de medidas de substantivo nao terào muito significado se näo forem complementadas corn outras dois
dinamizaçäo da adrninistraço da jusuça, absorver em futuro próximo estas formas de tipos de reformas. Por um lado, a reforma da organizaç.o judiciária. a quai nao pode con-
justiça privada, corno por vezes se designam. Quando muito, d possíve que os grupos tribuir para a democratizaçäo da justiça se ela própria no for internamente democrática.
neocorporativistas mais organizados venharn a ter poder político suficiente para impos- E ueste caso a democratizaçào deve correr em paralelo coin a racionalizaç.o da divisão
tute'as jurisdicionais diferenciadas mais afeitas à dinâmica interna dos seus interesses. do traballio e corn urna nova gestäo dos recursos de tempo e de capacidade técnica. Por
Nao me parece to pouco que estes mecanismos de resouço dos litigios à margem do outra lado, a reforma da formaçäo e dos processos de recrutamento dos magistrados, sem
controlo do Estado sejarn intrinsecarnente negativos ou atent&ios da democracia. Podem. a quai a ampIiaço dos poderes do juiz propostas em muitas das reformas aquí referidas
pelo contrario, ser agentes de dernocrutizaçâo da sociedade. Tudo depende do conteúdo carecerá de sentido e poderá eventualmente ser contraproducente para a dernocrafizaço
dos interesses em jogo e do seu comércio privado no processo de desenvolvimento demo- da administraçao da justiça que se pretende. As novas geraçoes de juízes e magistrados
crático da sociedade no seu todo. deveräo ser equipadas corn conhecimentos vastos e diversificados (económicos, soçio!ó-
No dntanto é certo que mukas das reformas recentes da administraçäo da justiça gicos políticos) sobre a sociedade em gera! e sobre a administraço da justiça em particu-
visam reduzir a sua marginalidade ou residualidade. &to uestes casos as reformas de lar. Esses conhecimentos têm de ser tornados disponíveis e, sobretudo no que respeita aos
inforrnalizaçAo da jusiiça a que fia refethcia. As alternativas infbrmais são urna criaçäo conhecimentos sobre administraçAo da justiça no nosso país, esses conhecimentos têm
jurídica complexa cujas re1açies corn o poder do Estado devem ser anaIisadas urna aná- ainda de ser criados.
tise que fix noutro lugar e que nAo repetirei aqui (Santos, 1982a). Bastará dizer que ma E necessário aceitar os riscos de urna magistratura cutturatmente esclarecida. Por um
experiências em curso o controlo ou supervisão do Estado varia muito e que nelas a ques- aumento de poderes decisórios, mas
lado, cia reivindicará o issu como se viu vai no sen-
tuo do acesso nAo tern a ver corn a assistncia judiciária mas antes corn a capaci1aço das lido de multas propostas e no apresenta perigos de maior se houver um adequado sis-

partes em 1irnço das posiçes estruturais que ocupam. Nos casos em que os litigios ocor- tema de recursos. Por outro lado, ela tenderá a subordinar a coesão corporativa a lealdade

a ideals sociais e politicos disponíveis na sociedade. Daqui resultará urna certa fractura
ideológica que pode ter repercuss'es organizativas. Tal nao deve ser visto corno patoló-
24. Nos EUA. o estudo mais recente e sotistcdo foi 'evado a cabo ia Utiversidade de Wsccms-Madison.
gico mas sim como fisiotógico. Essas fracturas e os contlkos a que elas derem lugar serio
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Veja-se urna panorlmica geral dos
«Specia issue on
rsubado em Law and
Procssrng and Civil Uiigttion».
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do processo of CVISION
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8

DA IDEIA DE UNI VERSIDADE À UNI VERSIDADE DE IDEIAS

Um pouco por todo o lado a universidade confrontase coni urna situaço complexa:
sAo4he fritas exigências cada vez maiores por parte da sociedade ao mesmo tempo que se
tornam cada vez mais esthUvas as políticas dc financiamento das suas actividades por
parte do Estado. Duplamente desafiada pela sociedade e pelo Estado, a uthversìdade no
parece preparada para defrontar os desafios tanto mais que estes apontam para iransfor
maçòes profundas e no para simples reformas parcelares. Miás, al impreparaçAo, mais
do que conjwuraL parece ser estmturaI na medida em que a perenidade da instituiçào
universixìa, sobreftido no mundo ocidenaI, ests associada à rigidez funcional e organi-
zanional, relativa impermeabilidade s pressöes externas, enfim, à aveno à mudança.
Começarel por identificar os principais parametros da complexa simaço em que se
encontra a universidade para, de seguida, construir n ponto de vista a partir do quai a uni-
versidade deve defrontar os desafios que the säo pastos.

Fins sein Fim

A notável continuidade institucional da universidade sobretudo no mundo ocideital


sugere que os seas objectivos sejam permanentes. Em tom joco-stirio Clark Keir afirma
que das nitenta e cinco instituiçies actuais que já existiam em I 520, corn funçSes simila-
res its que desempenham boje, setenta são universidades (J(eff, 1982:152)'. Ein 1946,
repetindo o que afirmava já em 1923, Karl Jaspers, bem dntm da tradiço do idealismo
alemäo, defmia assim a misso eterna da universidade: é o lugar onde por concessào do
Estado e da sociedade urna determinada época pode cultivar a mais hicith consciencia de
si prOpria. Os scm membres congregam-se nela corn o único objectivo de procurar,
incondicionalmente, a vendada e apenas por amor à verdade (Jaspers, 1965:19). Daqui
decorreriam, por ordern decrescente de importância. os três grandes objectivos da univer-

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. unvesdade,
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mto
Sobre a tUSIÓÑIas
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ctr. nnre uayeii (1975).
Pe/a Mäo de A/ice. O Socia/ e o Poiftico na Pt5s-Modernidade Da Ide/a de Universidade à ¿Jnìersìdade de Ide/as 65

skiade: porqe a verdade só acess1ve a quem a procura sistematicamente, a investiga


t no entanto, argumentar-se que esta contradiço, mesmo qua boje exacerbada, existiu
çäo é o principa' objectwo da universidade; porque o âmbito da verdade muüo major sempre. dado o carácter utópico e ucrúnico da ideia de universidade (Bienaymé, 198& 3).
que O da ciencia, a universidade deve ser um centro de cultura, djsponível para a educa- Ja o mesmo se nao pode dizer das contradiçôes entre as diferentes funçes que a univer-
ço do homem no seu todo; fma1mente porque a verdade deve ser transmitida. a universi- sidade tern viudo a acumular nas tíltimas três décadas. Pela sua novidade e importáncia e
dade ensina e mesmo o ensmo das aptìdôes protissionais deve ser orientado para a forma- pelas estratdgias de ocultaçao e de compatibilizaçäo que susciram, estas contradiçôca
ço inegra1 (Jaspers 1965:51 e ss.). No seu conjunto. estes objectivos - cada um deles constimein boje o tema central da sociologia das universidades.
-
inseparveI dos resanes consifliiriam a ìdeia perene da universidade, urna ideia una A funçäo da investigaço colide frequentemente corn a funçäo de ensino, urna vez que
porque vinculada à Unidade do conhecìmenio. Esta ideja que, além de una, tambm a criaçäo do coahecimento implica a mobilizaço de recursos financeiros, humanos e
dnica na civilizaçào ocidentai, exigiria para sua realizaçâo (aliás, nunca plena), um dis- institucionais dificilmente Eransfetheis para as tarefas de transmisso e utiJizaçäo do
positivo ¡flStitUCiOflal igualmente único. conhecimento No dominio da investigaçao. os interesses científicos dos investigadores
Tendo certamente presente a iradiçào em que se integra Jaspers (Schelling, Humboldt podem ser insensvejs ao interesse em fortalecer a competitividade da economia. No
e SchIeiennacber) Ortega y Gasset insurgia-se em t930 contra a «beataria idealista» que dominio do ensitio, os olectivos da educaçAo geral e da preparaçao cultural colidem, no
atribuía à escola urna força criadora «que ela nAo tern nem pode ter» e considerava a uni- interior da mesma instituiço, corn os da fonnaçäo profissional ou da educaçäo especia-
versidade alemA, enquanto innituiçAo. «urna coisa deplorável», para logo concluir que se lizada, urna contradiçäo detectáve! na formulaçAo dos planos de estudos da graduaçao e
«a ci&icia a1em tivesse que nascer exclusivamente das virtudes institucionais da uthver- na tensäo entre esta e a pós-graduaço. O accionameflo de mecanismos de selecção social-
sidade seria bem pouca colsa» (Ortega y Gasset, f982: 28 e ss.). Apesat disto, ao enume- ¡nanEe legitimados tende a colidir corn a mobulidade social dos fithos e flubas das familias
rar as funçies da univeraidade Gasset näo a rnuito além de Jaspers: transmisso da cul- operárias tal como a formaçao de dirigentes nacionais pode colidir corn a ênfase na pres
turn; ensino das pmfisses; investigaço científica e educaço dos novos borneos de ciên- taçäo de serviços à comunidade local.
cia (Ortega y Gasset, t9824l). Qualquer destas contradiçöes e quaisquer outras facilmente imagiiniveis criam pontos
Esta (aparente?) perenidade de objectivos só foi abalada na década de sessenta de tensan, tanto no relacionamento das universidades corn o Estado e a sociedade, como
perante as presses e as fransformaçôes a que foi ento sujeita a universidade. Mesmo no interior das próprias universidades enquanto instituiçôca e organizaçôes. Dado que nao
assim au nivel mais abstracto, a formulaçäo des objectivos manteve urna noável conti- parece possivel uns condiçies macro-sociais presentes superar estas conrradiçäes, o
nuidade. Os três fins principals da universidade passaram a ser a investigaçäo o ensino e objectivo das reformas da universidade pmposias mn pouco por toda a parte nos últimos
a preslaçilo de serviços. Apesar de a inflexäo ser, em si mesma, significativa e de se Ear anos tern sido fundamentalmente o de manter as contradiçóes sob controlo através da
dado no sentido do atrofiamento da dirnenso cultural da universidade e do privilegia- gesto das tenses que eins provocam, recorrendo para isso a expedientes que neutro
mento do scu conteúdo utìlitário, produtivista. foi sobretudo au nivel das políticas univer- lugar designai por mecanismos de dispersAo (Santos, 1982).
sitárias concretas que a unicidade dos Fins abstractos explodiu numa multìplicidade de Esta gestao de tensöes tern sido particulannente problemática em tres dominios: a
funçöes por vezas contraditórias entre si. A exp1osio das funçöes foi, afmal, o correlato contradiço entre a produçâo de de conbecirnentos exemplares necessários à
alta cultura e

da explosäo da universidade, do aumento dramático da populaço estudantil e do corpo formaçäo das elites de que a universidade se tern viudo a ocupar desde a Idade Média, e a
docente, da proliferaço das universidades, da expansäo do ensiro e da investigaçäo uni- produçao de padrees culturais médios e de conhecimentos úteis para as tarefas de trans-
versitja a novas ateas do saber. t'ormaçäo social e nomeadamente para a formaçao da força de trabaiho qualificada exi-
Em 1987, o relatório da OCDE sobre as universidades atribuía a estas dez funçöes gida pelo desenvolvimento industrial (Moscati. l983 22); a contradiçâo entre a hierarqui-
principais educaço garaI pós-secundria; investigaçäo; fomecimento de mao-de-obra zaçao dos saberes especializados através das restriçes do acamo e da credencializaçao
qualificada; educaço e treinamento altamente especializados; fortalecimento da competi- das competéncias e as exig&icias sócio-políticas da democratizaçäo e da igualdade de
Eividade da economia mecanismo de selecçao para empregos de alto nve1 através da cre- oportunidades; e, finalmente, a coruradiçäo entre a reivindcaçäo da autonomia na defi-
dencìalizaçao; mobilidade social para os flihos e filhas das familias operârias: prestaçO nìçäo dos valores e dos objectives instìtucionais e a submisso crescente a critérios de
de serviços à regiäo e à comunklade local; paradigmas de aplicaçao de poliuicas naclonais eficácia e de pmdutividade de ongem e natureza empresarial.
(ex. igualdade de oportunidades para mulberes e minoñas raciais); preparaço para os Porque é de sua natureza no intervir ao nivel das causas profundas das contradíçöes,
papisdeliderançasociaI(OCDl3, l987 t6ess.). a gesEo das tensöes tende a ser sintomática e representa sempre a reproduço controlada
Uma tal multiplicidade de funçies nao pode deìxar de levantar a quesLäo da compati- de urna dada crise da universidade. A primeira contradiçAo, entre conhecimentos exam-
bilidade entre alas. Aliás, a um nivel mais básico, a conn-adiçäo será entre algurnas desEas pIares e conbecimentos funcionais, manifesta-se como crise de hegemonía. Há urna crise
funçoes (nomeadamente as que lêm merecido mais atençäo nos últimos anos) e a idela da
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universidade fundada na investigaçao livre e desinteressada e na unidatie do saber. Pode,
de begemonia na medida em que
de hegernonia sempre que urna dada condiçao social deixa de ser considerada necessúria,
única e exclusiva. universidade sofre urna crise a sua
Pela Mâo de Alice. O Social e o Po/frico na POs-Modernidade Da Idea de Unwersidade à Universìdade de Ideìas 167

incapacidade para desempenhar cabalmente 1mçÔes contraditóiias leva os gnipos socials trajectórias pessoais. formas de sociabilidade e redes de interconhecimento que acompa-
mais atingidos pelo seu délice funcional ou o Estado em nome deles a procurar meio nham os estudantes maito depois da universidade e muito para além do mercado de traba-
aItemaVOS de atingir os seus objectivos. A segunda contradiço, entre hierarquizaçäo e tho, interpretaçôes da realidade que tornam consensuais os modelos dominantes de desen-
democratizaçO, manifesta-se como crise de legitimidade. Há urna crise de legitimidade volvimento e os sistemas sociais e políticos que os suportam.
sempre que urna dada condiço social dexa de ser consensualmente aceite. A universi- Tanto Bourdieu e Passeron (1970) como Offe (1977) demonstraram que o sistema
dade sofre urna crise de legitimidade na medida em que se toma socialmente visveI a educativo funciona de modo a que a contradiçäo entre o principio da igualdade de oportu-
falência dos objectivos coeciivamente assumidos. Finalmente. a terceira contradiçäo, nidades e da mobilidade social airavs da escola, por um lado, e a continuaço, a consoli-

entre autonomia institucional e produtividade social. manifesta-se como crise insiituco- daço e at o aprofundamento das desigualdades sociais, por outm, no seja socialmente
nal. H urna crise institucional sempre que urna dada condiço social esiâvel e auto-sas- visfvel, dessa forma conüibuindo para perpetuar e legitimar urna ordern social estruturai
tentada deixa de poder garantir os presupostos que asseguram a sua iproduço. A uni- mente incoerente, «obrigada» a desmentir na prätica as premissas igualitárias em que se
versidade sofre urna crise institucional na medida em que a sua especificidade oianiza- diz fundada. Dal que a análise das contradiçôes e das crises de um dado subsistema, por
tiva é posta em causa e se the pretende impor modelos organizativos vigentes noutras exemplo, da universidade, deva ser sempre contextualizada no nivel sisténiico em que
instituiçòes fidas por mais eficientes. tem lugar. As contradiçies a um dado nivel são congru&icias a um outro, a ecloso ou o
A gestAo das tensôes produzidas por esta tiipla crise da universidade tanto mais agravarnento das crises num dado subsistema pode ser compensada pela eliminaço ou
comp'exa quanto certo que as contradiçòes entre as funçöes manifestas da universidade
t atenuaçAo das crises noutro sistema. Talvea por isso a rigidez global do sistema socia!
«sofrem» a inteiferncia das funçes latentes da universidade. Esta distinço ene fun- possa conviver sem problemas corn as maltas turbulências sectoriais; talvez por isso a
çes manifesias e unçöes latentes, corn longa tradiçâo na sociologia. é sobretudo Útil proliferação das crises raramente conduza à polarizaço cumulativa dos factores de crise;
para analisar relaçöes intersistémicas, flO C5SO, entre o sistema universitario e O sistema de talvez por isso os mecanismos de disperso das contradiçóes passent to facilmente por
ensino superior, ou entre este e o sistema educativo ou ainda entre este e o sistema social mecanismos de resoluçâo das contradiçes.
global. Por exemplo. numa situaçäo de estagnaço económica, o dfice de desempenho Tanto a crise de hegemonia como a cuse de legitimidade e a crise institucional eclodi-
da Ñnço manifesta de fnrmaçâo da força de trabaiho pode ser compensado como de tam nos últimos vinte anos e conthuam boje em aberlo. No entamo, so diferentes os
facto tern vindo a suceder. pela funço latente de «parque de estacionamento». A univer- tempos históricos das factores que as condicionam, tal como so diferentes as lógicas das
sidade desempenha esta funço ao acoiher e au deixar permanecer no sen seio por um acçôes que visam controlá-las. A crise de hegemoma é a mais ampia porque nela end
período mais ou menos prolongado gente que no se arrisca a entrar no mercado de traba- em causa a exciusividade des conhecimentos que a universidade produz e transmite. E
Iho corn credenciais de pouco valor e que se serve da universidade como compasso de tambdm aquela cujos factores condicionantes tm maior profundidade histórica. Se acei-
espera effire conjunturaS usando-a produtivamente para acumular tulos e quaficaçes tarmos a diviso do desenvoivimento do capitalismo em tres períodos -o período do
que fortaleçam num momento posterior a sua posiçäo no mercado. Por outro lado, perante capitalismo liberal (até finais do século XIX); o período do capitalismo organizado
urna forte pressäo social no sentido da expanso do sistema urnversitário, a universidade (de fluais do século XIX at aos anos sessenta); e o período do capitalismo desorganizado
pode responder a essa presso mediante o desempenho da funço latente de «arrefeci- (de finals dos anos sessenta at hoje$2 - os factores da crise de hegemonia configuram-se
mento das aspiraçöes dos frihos e fithas das classes populares». ou seja reestruturando-se logo no primeiro período. De facto, a pmclamaço da ideia da universidade de algum
de modo a dissimular, sob a capa de urna falsa democratizaço, a continuaço de um sis- modo reactiva, surge no momento em que a sociedade liberai começa a etigir formas de
tema selectivo elitista. conhecrniento (nomeadamente conhecimentos tecnicos) que a universidade tern dificul-

A um nivel mais geraE a socio'ogia tern vindo a mostrar como as aparentes contradi- dade em incorporar.Na crise de legitimidade está em causa o espectro social dus destina-
çöes entre funçöes no seio do sistema educativo podem esconder articulaçöes mais pro- tirios dos conbecimentos produzidos e, portanto, a democraticidade da transmissäo
indas entre este e os outros subsistemas sociais, articulaçes detectÚveis nas distinçöes destes. Os factores desta crise configurare-se no per1odolo capitalismo organizado por
entre funçes económicas e funçöes sociais, ou entre funçoes instrumentais e funçöes via das lutas pelos direitos sociais (entre os quais. o direito à educaço) e económicos
simbólicas. As dificaldades boje comurnmente reconhecidas de p'anificar adequadamente cujo éxitO conduziu ao Estado-Providencia. FinalinenEe, na crise institucional está em
o sistema educativo em funçAo das necessidades previsíveis da mAo-de-obra no mercado causa a autonomia e a especificidade organizacional da instituiçäo universitaria. Os
de trabaiho dos próximos anos e, portanto o deficiente desempenho das funçôes econó- factores desta crise configuram-se no período do capitalismo desorganizado e deconem,
micas e instrumentais da universidade nao impedem esta, antes pelo contthrio, de desem- em gera!, da crise do Estado-Providencia.
penhar adequadamente funç&s sociais e simbólicas, como, por exempo, a funçäo de Passarei agora a tratar com alguma eXtenSäO a crise de hegemonia, por ser a mais
inculcar nos estudantes valores positivos perante o trabatho e perante a organizaço eco-
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nómica e social de produç;lo, regras de comportamento que facilitern a inserçäo social das 2. Sobre tras perto&sdo capitalismo, consulteoqu&tocapítfflo.
Pela Mào de Alice. O Social e o Político no Pós-Modernidade Da ldeia de Universidade Universidade de ldeias
168

ampia e por estar, assim, presente mis demais, Far-se-â apenas urna breve referência à
so ao longo dos últimos trrnta anos. Os anos sessenta forain dominados pela tentativa de
confrontar a caltura de massas no sen próprio terreno, rnassificando a própria alta cultura.
crise de legitimidade e à crise institucional.
Foi este, sam dúvida, urn des efeitos, nem sempre assumido, do processo de democratiza-
ço da universidade A exploslo da populaçào universitâria, a aIreraço significativa da
cornposiçäo de classe do corpo estudantil e a ainpliação dos quadros de docentes e inves-
A crise de hegemonia
tigadores possibiEtaram a massificaçäo da universidade e corn ela a venigeni da distrìbui-

A ceniralidade da universidade enquanto lugar priviIeiado da produçllo de alta cW- ço (se no mesmo da produçâo) em massa da alta cultura universitiia. No limite, admi-
tutti e conhecimento científico avançado um fenómeno do scu!o XIX, do período do tiu-se que a escolarizaçäo universal acabaria por atenuar consideravelinente a dicotomia
capitalismo liberal, e o modelo de universidade que methor o raduz o modelo a1cmo, a entre aDa cultura e cultura de massas. Nao foi, contudo, ¡sto o que suceden. A massifica-
universidade de Humboldt. A exigência posta no rabalho universftário, a exceneia dos çâo da universidade no atenuou a dicotomia, apenas a deslocou para dentro da universi-
seus produtos cukurais e cientfficos, a criatividade da actividade intelectuaL a liberdade dade pelo dualismo que inlroduziu entre universidade de elite e universidade de massas.
de discusso, o espirito crítico, a autonomia e o univeta1ìsrno dos objectivos fizeram da Tal corno teve lugar, a democratizaçAo da universidade traduziu-se na diferenciaçäo-hie-
universidade urna inütuiço dnica, re'ativamente isolada das restantes instituiçöes rarquizaçào entre universidades e entre estas e outras instituiçes de ensino superior. A
sociais, dotada de grande prestigio social e considerada imprescindive! para a formaço _uçAo da permanecea em grande medida controlath pelas universidades
alta cultura

das elites. Esta concepçào da universidade, que já no periodo do capitalismo liberal mais prestigiadas, enquanto as universidades de massas se lixnitaram à distribuiçào da

estava em re'atiVa dessintonia corn as «exigências sociais» emergentes. entrou ein crise alta-cultura ou, quando a produziram, baixararn o nivel de exigência e degradaram a qua-
o preço que a universidade tuve de pagar para tentar manrer a sua centrali-
no pós-gueffa e sobretudo a partir dos anos sessenta0. Esta concepço repousa mima lidade. Fste foi

série de pressupostos cuja vigência se rem viudo a mostrar cada vez mais problemática à dade na produçao de cultura-sujeito. Nos anos setenta este preço corneçou a revelar-se
demasiado alto. A atenuaço da tensâo entre alta cultura e cultura de massas provocata
medida que nos aproximamos dos nossos dias Estes pressupostos podem formular-se nas
seguintes dicotornias alta cultura - cultura popular educaço - trabalbo; teoria prâtica. - urna outra tensAo que. Mo fora a coniradictio in adjecto. se poderia designar entre alta
cultura alta e alta cultura de massas. A dernlncia insistentemente repetida da degradaço
da produço cultural na esmagadora maioria das universidades veio a dar origem, nos
anos oitenta, à reafirmaçäo do elitismo da alta cultura e à legitimaço das políticas educa-
Altu cullura - cultura poputar
tivas destinadas a promovê-lo.

-
A dicotomia alta cuiwni cultura popular constitui o núcleo central do ideário moder- A última e mais dramática apologia do elitismo da alta cultura é. sem dúvida, o livro

nista. A alta cultura urna cultura-sujeito enquanto a cultura-popular é urna cultura- de Allan Bloom, A Cultura Inculta (l988)), pelo que merece urna referência mais deta-

-objecto, objecto das ciências emergentes, da etnokgia, do folclore, da aiuropologia cul- ihada. Segundo Bloom, a universidade tal corno hoje a conhecernos é um produto do pro-

turaI, rapidamente convertidas em ciencias universitárias. A ceturalidade da universidade jecto iluminista e este 6 um projecto elitista, um projecto que implica a liberdade «para os

advem-Ihe de ser o centro da cultura-sujeito. A crise desta dicotomia no pós-guerra raros horneas teóricos se ocuparem da invcstigaçâo racionaL no pequeno número de dìsci-

resulta da 'emergencia da cultura de massas, urna nova forma cultural corn urna distinta plinas que tralam os piimeiros principios de todas as colsas» (1988: 256). A universidade
vocaçào para cultura-sujeito e assirn disposta a questionar o monopólio até entäo detido e, assini, urna instituiçâo aristocrática destinada a «encorajar o uso näo instrumental da
pela alta cultura. A culture de massas tern urna lógica de produço. de distribuiço e ra.zo por ai prOpria, proporcionar urna atmosfera onde a superioñdade moral e fisica do
de consumo comple*arnente distinta e milito mais dinâmica da que propria da cultura dominante nao intimide a dúvida filosófica, preservar o tesouro dos grandes feitos, dos
universitária e os sens produtos vão apertando o cerco à alta cultura universitâria, quer grandes homens e dus grandes pensamentos que se exige para alimentar essa dúvida»

porque reciclarn constantemente os produtos desta, quer porque concorrern corn ela na (1988: 244). Nestas condiç&s, a universidade no pode seiuma instituìço democrática e
formaçAo do universo cultural dos estudantes. Incapaz de transformar esta nova forma convive mai corn a democracia, sobretudo porque nesta «nao hí urna classe nao democrá-

cultural mima cultura-objecto, a universidade deixa de ser o produtor central de cultura- rica» (198S: 245). É, pois. necessariamente urna instituiçäo iinpopuar que «deve resìstir à
-sujeito e nessa medida perde centralidade. tentaçào de querer fazes nido pela sociedade» (1988: 249). A luz desta concepçâo, os

A gesto da tenso daqui decorrente foi obtida por diferentes mecanismos de disper- anos sessetua forera «um desastre»; liquidararn por completo o que ainda restava da uni-
versidade: «ado sei de nada de positivo que esse período nos tivesse trazido» ( 1988: 312).

A crise de hegemoÑ & sem díud, a mais profunda ds qne inivesìda1 airavessa. A eI e qucEe1
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3_

provavlmenic
durdo referir
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Lourenço quando FIa da crise da wiivcrsidade que «ulrapssa o ciJenta e IJliIiz.o a erstu portuguesa porque a mais oes1vei os leitores e porque nos passos aqui seleccionto

!fve1 estado de trniversidide em cnse» 19tt lduçû


74).
tm pom, i t4 mais ou menos correcta. gera, i trduçáo ìnecorosmenie desctdada.
(
7() Pela Mao de Alice. O Social e o Política na Pós-Moderndade Da Ideia de Universida4e à íjniversidade de ldeias t 7i

Aliás, a devaslaçâo foi tao completa que «é difícil imaginar que baja quer os meos quer a A resposta da universidade a esta transformaço consistiu em tentai compatibilizar no
energia dentro da universidade para constituir ou reconstituir a deia de um ser humano seu seio a educaço humanística ea formaço profissional e assim compenrn a perda de
culto e estabelecer de uovo urna educaço liberal» ( I 9S8: 369). centralidade cultural provocada pela emergéncia da cultura de massas corn o reforço da
No aqui o lugar de proceder a urna apreciaçäo gobaI do manfesrn bloomiano, centralidade na formaço da força de trabalbo especializada. Esta resposta, pienamente
Apenas desejo saUenta que a divugaço e repercussäo que ee tern tdo reveladora de assurnida nos anos sessenta, trouxe consigo, corno j referi, a diferenciaço interna do
um certo regresso aos anos cinquenta e à kientificaço, con-eme neste período. da alta ensino superior e da própria universidade. Ao lado das universidades «tradicionais» sur-
cultura corn as humanidades e destas corn a grande tradiço oddental. Deste modo, a dis- giram ou desenvolverain-se outras insütuiçes especificamente vocacionadas para a for-
perso da connadiço entre alta cultura e cuftura de massas, que nos anos sessenta fora maço profissional, mantendo gram diversos de articu!açAo corn as universidades: Coin-
Eentada no terreno desta última, atravs da massificaço da universidade passa agora, nos munity and Junior Colleges nos fiJA, Fachhochschule na Alemanha, institutes Universi-
anos oitenta, a ser tentada no terreno da alta cultura, atravs da consagraçAo dos privil- (airer de Technokgie na França. Polytechnics na Inglaterra. Por seu lado, as universida-
gios que a esta so devidos. Este novo mecanismo de dispemo aponta para um certo des, que entretanto se muhiplicaram, passaram a conhecer novas formas de diferenciaçâo
regresso à condiço que dominau até nos anos cinquenta, mas tern agora urn significado e de estratificaçäo: entre as faculdades profissionais tradicionais (Dfreito e Medicina), as
soca1 e político muito distinto porque, ao cornrrio de entAo, a afirrnaçäo da inevitabili- novas ou ampliadas faculdades de especializaço profissional (Engenharias, Ciencias e
dade do eliuisrno implica agora a tiquidaço das aspiraçies democthticas que acompanha- Tecnologia, Economia, Administraço). e as faculdades «cukurais» (Letras e Ciencias
ram nos anos sessenta as políticas de massificaçâo. Entre os anos sessenta e os anos Sociais). A diferenciaçäo e a estratificaço no interior do sistema universitârio no deixon
oitenta pois, accionados dois mecanismos de dispersào de sinai contrrio. Através de de perturbar a unidade do saber subjacente à «mìssAo» e à forma institucional tradicional
ambos a universidade procura marner a sua centralidade enquanto produtora de cultura- da universidade, mas garantlu, dumme algurn tempo, a centrahdade desta num mundo
-sujeito, nurn caso diluindo-se mas correndo o risco de descaractenzaçAo, no outro, con- tecnológico em mudança acelerada. No entanto, porque tal garantia assentava na dicoto-
centrando-se mas assumindo o risco do isolamento. mia educaço-trabaiho, o questionamento desta no período do capitalismo desorganiaado
näo poderia debuts de revelar a fragilidade desta estratégia de cenu-alizaçAo.
o questionamenlo da dicotomia educaçäo-irabalho processe-se hoje a dois níveis. Em
Educaço - rabatho primait-o lugar, a re1aço sequencial entre educaçäo e trabaTho pressupôe urna conespon-
dncia esthe!, entre a oferta de edacaço e a okrta de irabaiho, entre tituiaço e ocupa-
A hegemonía da universidade no é pensvel fora da dicotomia educaçäo-trabalbo. ço. A estagnaço dos anos setenta e as saldas que se tm vindo a procurar para ela (tais
Esta dicotomia começou por significar a existência de dois mundos corn multo pouca corno as novas fonnas de indusirializaço, o terciário de ponta, a industria do conheci-
ou nenhuma comunicaçäo entre si o mundo ilustrado e o mundo do trabalbo. Quem per- metuo e da informaço) tam, no seu conjunto. mostrado a crescente mnviabilidade de tal
tencia ao primeiro estava dispensado do segundo; quem pertencia an segundo eslava conespondéncia estáveL A duraço do ciclo de forrnaço universitária de um dado perfil
excluido do primeiro. Esta dicotomia atravessou corn este sgnìficado, todo o primeiro profissional é cada vez maior que a do ciclo de consumo produtivo deste. Esta descoinci-
período do desenvolvimento capitalista, o período do capitalismo liberal, mas já no fina! dncia agravada pela rigidez institucional da univet-sidade e pela consequente dificul-
deste período começou a transformar-se e a assumir um outro significado que se vina a dade em captar alempadamente os smala do mercado de trabatho e de agir em conformi-
tornar dominante no período do capitalismo organizado. A thcotomia passau ento a signi- dade. Dai que a universidade seja constantemente confrontada, ora corn a produço de
ficar a sepuraço temporal de dois mundos intercomunicáveis, a sequéncìa oducaço- excesso, ora corn a produçAo deficiente de perfis profissionais, scm que as solicitaçòes de
4rabalho. Esta transformaço da re1aço entre os termos da dicotomia acarretou inevitavel- profissionalizaçäo tenbain o mínimo de estabiidade que permita esboçar urna resposta.
mente a transformaço interna de cada um dos termos. De algum modo, a dicotomia ins- Quando esta tentada, o mais provável é que no atinja os seus objectivas ou até atinja os
lalou-se no interior de cada um deles. Assim, a educaçào, que fora inicialmente transmis- objectivos contrários.
sào da alta cultura, formaço do cathcter, modo de aculturaço e de socializaço adequado Mas a dicotomia educaço-trahalho boje questionada a um nivel mais profundo, o
ao desempenho da direcçäo da sociedade, passau a ser tambm educaçAo para o trabatho, questionamento da própria sequ&tcia educaç.o-trabatho. Em prinieiro lugar, a acelerada
ensini de conhecimentos uti1iários. de aptidoes t&nicas especializadas capazes de respon- transformaçAo dos processos produtivos faz corn que a educaço deixe de ser anterior ao
der ans desafios do desenvo!vimento tecnoiógico no espaço da produçäo. Por sea lado, o trabaiho para ser concomitante deste. A formaço e o desempenho profissional tendero a
trabalho,que fora inicialinenie desempenho de força fisica no manuscio dos meios de pro- fundir-se num só processo produtivo, sendo disso sintomas as exigências da educaço
duço, passau a ser tamb& irabaiho intelectual, qualificado, produto de urna formaço permanente, da reciclagem. da reconversâo profissional, bem como o aumento da percen-
prulïssional mais ou menos prolongada. A educação cindlu-se entre a cultura gera! e a for-
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de
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populaçäo
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;iço profissional e o trabaiho. entre o trabatho näo qualificado e o trabaiho qualificado.
concepço de no
Em segundo
Lagern

de tomar mais
adultos e
lugar, a própria
trabathadores-estudanies entre a
trabaiho tern a alterar-se
estudarnil.

sentido
j72 Pela Mâo de Alice. O Social e o Político na Pós-Modernidade Da ldeia de Universidade Universidade de Idelas i 73

tenue a ligaço emre u-abalho e emprego, fazendo corn que o investimento na formaço pronta a ser reactivada nomomento em que for nesse sentido a pressäo social dominante.
deixe de ter sentìdo enquanto investimento num dado einprego. Acresce ainda que a A perrnanncia e estabilidade da universidade sao, para isso, um recurso inesiimável e
miragem «pós-industrial» acena corn ganhos de produtividade que farâo diminuiT signifi- mesmo a rigidez institucional de que frequentemente é criticada funcionará por vezes a
cativamente o tempo de trabatho produtivo e corn isso, a centralidade do trabatho na vida favore S nao da sua centralidade pelo menos da sua sobreviv&ìcia. Mas a contradiçao de
das pessoas Sendo certo que os conhecimentos adequados à formaço de produtores nao base permanece e nAo deixarà de se manifestar em novas tens&s. É que urna coisa a
-
se adequam à formaçâo de consumidores nurn caso sao necessários conhecimentos reivindicaçao da hegemonía por via da autonomia funcional (o desempenho de urna
específicos, no outro sao necessários conhecirnentos gerais -, a tend&icia para privilegiar funço que Ihe prOpria e que. por isso, the airibufda em exclusivo) e outrai a reivindi-
a formaçao de consumidores acabará por se rq,ercutir no nlc1eo curricular, caçao da begemonia por via da dependência funcional (a tentativa de manter a exciusivi-
Mas o quesionamenoe da dicotomia educaço4rabatho tern ainda duas implicaçes, dade por via da icopoiaçao das funçSes em dado momento impoilantes). Esta diferença
de algum modo contraditörias, para a posiçao da universidade no mercado do trabatho. está particularmente hem documentada na dicotomia que se segue.
Por uni Iado boje evidente que a universidade nAo consegue manter sob o scu contmlo
a educaço profissional. A seu lado, multiplicam-se insthiiiçöes de menores diinens&s,
malor Ilexibilidade e maior proximidade ao espaço da produçäo corn ofeiia maleável de Teoria -prôtica
formaçao pmftssiona} cada vez mais volátil. Aliás, o proprio espaço da produçäo trans-
forma-se por yeses numa «comunidade educativa» onde as necessidades de formaçao, Desde o scuIo XIX a universidade pretende ser o lugar por exceência da produçäo
sempre em mutaço, so satisfeitas no interior do processo produlivo. Por nutro lado, e de conhecimento científico, No admira, pois, que a sua reputaçao reja tradicionalmente
em aparente contradiço corn isto, a mutaçao constante dos perfis profissionais em vindo medida pela sua pmdutividade no dominio da investigaçAo. E passive! que alguns tipos
a recuperar o valor da educaçao geral e mesmo da formaçan cultural de tipo humanista. de unìversidades conquistem reputhAo apesar de predominantemente dedicadas an
Em face das incertezas do mercado de trabaiho e da volatilidade das formaçoes profissio.- ensillo, como, por exemplo, alguns Liberai Arr: Colleges americanos ou as Grander
nais que ele reclama, considera-se que é cada vez mais importante fornecer ans estudan- Écoles francesas, mas sao excepçôes que confirmam a regra.A busca desinteressada da
les urna formaçao cultural sólida e ampia, quadros teóricos e analíticos gerais, urna visâo verdade a escoffia autónoma de mdtodos e temas de investigaço, a paix.o pelo avanço
global do mundo e das suas transfonnaçes de modo a desenvolver neles o espirito crí- da ci&icia constituem a marca ideológica da universidade moderna. So a justificaçao
tico, a criatividade, a disponibilidade para inovaçâo. a ambiçao pessoal, a atinide positiva ultima da autonomia e da especificidade institucional da universidade. Subjazem às
perante o irabatho árduo e em equipo, e a capacidade de negociaçäo que os preparem para regras e ans critérios pmmoç.o na caneira, tanto dos investigadores,
de conlrataçào e de
enfrentar corn éxito as exigencias cada vez mais sofisticadas do processo produtivo. o que nao surpreenderia,como dos docentes. De facto, os docentes sao sempre conside-
Verifica-se, assìm, um certo regresso an generalismo. ainda que agora concebido, nao radosinvestigadores-docentes. Se verdade que o objectivo da forrnaçao profissional
como saber universalista e desinteressado próprio das elites, mas antes como formaçao apesar de toda a aiençao que tern merecido desde a decada de sessenta, nAo conseguiu
nao-pmïiioni para um desempenho pluriprofissionalizado. O relatório da OCDE sobre eliminar o objectivo educacional gera! da universidade. nAo é menos verdade que este.
a universidade a que já liz referência privilegia «a preparaçao ampIa para urna grande apesar de inerente à ideia da universidade, näo conseguiu nunca suplantar o objectivo
variedade de condiçäes subsequentes imprevisiveis» em detrimento de «um treinainento primordial da investigaço. Aliás, a investigaçäo foi sempre considerada o fundamento e a
específico para urna tarefa que daqui a cinco ou dez ou vinte anos pode j näo existir» justifrcaçäo da educaçào de «nivel universitário» e a «atmosfera de investigaçAo», o con-
(OCDE, 1987: 12). E a propósito cita os resultados de um inqu&ito recente a empresarios texto ideal para o florescimento dos valores morals essenclais à formaçao do Carkt&(.
ingleses sobre as suas expectativas a respeito da formaçao universitária. Sem surpresa o A marca ideológica do desinteresse e da autonomia na busca da verdade fez corn que
inqurito revela que se espera que a universidade seleccione os jovens mais capazes e o prestigio se concentrasse na mnvestigaçAo pura, fundamental ou básica e que inclufsse
Ihes forneça alguns conhecimentos específicos. Mas, curiosamente, espera-se acima de nesta as humanidades e as ciencias sociais. Dal a dicoton$a entre teoria e prática e a prio-
tudo que a universidade os submeta a experlências pedagógicas que, independentemente ridade absoluta da pthneira. Qualquer que tenha sido a sua traduçAo real no período do
do curso escoihido, criem flexibilidade, promovam o desenvolvimento pessoal e agucem capitalismo liberal e na primeira fase do período do capitalismo organizado esta ideolo-
a moEivaço individual (OCDE, 1987: 66). gia universitária entranem crise no pOs-guerra e nos anos sessenta vin-se frontalmente
Colocada perante transfonnaçöes que nao controa e pressionada por exigencias con- confrontada corn a reivindicaço do envolvimento da universidade e do conhecirnenlo por
fradtôrias, a universidade procura gerir a sua posiçan ameaçada através de urna contabili.- cia produzido na resoluçao de problemas económicos e sociais prernentes. Foi assim
dade de ganhos e perdas de desempenho funcional. Confrontada corn as antimonias da
formaçäo prolissional a que, sob pressão social, pretendeu vincular a sua hegemonia, nao
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deixa de manier em segunda linha, e ainda que marginalizada. a educaçäo humanfstica
ge gnpo
PDFCompressor 5. é por acaso que na ciassiticço (Iiierarquço)
Fotrndation as universidades mths prcsiigiadas âo nduídar no
cias univenìdades ameiean elaborada pela Carne-
Research Uaivos1is i»
74 Pela Mäo de Alice. O Social e o Político na Pós-Modernidade Da ldeia de Universidade à (iniversidade de ldeìas 175

posm em questo a dicotomia enire a teoria e a práica, e as tensoes dal decorrentes têm tinçào entre invesligaçäo talsica e aplicada. A questào dos custos agravou-se nos anos
vindo a ser geridas corn recurso a diferentes mecanismos de dsperso. A vertente princi setenta corn a crise fmanceira do Estado e corn a mu1tiplicaço dos centros uthversitrios
pa do apeO à pratica foram as exigências do desenvovimeno tecno6gico, da crescen de inves1igaço resultante da exp!osào universitria da década anterior. Em consequência,
trausformaçào da ciênca em força produtiva. da competithidade internadonal das econo- a centia!idade e, nalguns países, a exclusividade da universidade na investigaçäo basica,
mias feita de ganhos de produnvidade cientificamente fundados. As mesmas condiç&s que fora at enUlo pensada como soluçào e contabilizada como beneficio, passou a ser
que' no dominio da educaço, redainaram mais formaço profission&, reclamaram, no pensada corno problema e contabilizada como custo. As manifestaçöes desta invcrsâo
dominio da nvestiaço. o privilegiameno da investigaço aplicada. Mas o apelo à pr- t'oram vázias. Em primeiro lugar, as grandes empresas rnultinacionais, transformadas em
tica teve urna outra veriente, mais sócio-politica, que se raduziu na crítica do isoiamento agentes económicos privilegiados da nova ordern económica internacional, criaram os
da universidade, da torre de marfim insensível aos prob'emas do mundo contemporâneo, seus próprios centros de invesigaço basica e aplicada e a excelência dos sens resultados
apesar de sobre eles ter acumulado conhecimenrns sofisficados e certamente uilizáveis na pôde rivalizar corn os dos centros universitários. Em segundo lugar. o prOprio Estado
sua reso1uçAo cijou Centros de investigaço nân universitários, dotados de mabí flexibilidade e isentos
Posia perante a questAo da sua relevâneia económica, social e politica, a universidade dos «vicios da uthversidade», especializados em áreas de ponta (novos materiais, biotec-
procurou mais urna vez usar expedientes que savaguardassem a sua ceutralidade scm, no nologia, inteigência artificial. robótica, energia) e disponiveis para articulaçôes dc due-
entanto, comprometer a sua identidade funcional e insimciona1 ti-adicional. E mais urna rentes Upos e graus corn os centros universitários. Em terceiro lugai o Estado procurou
vez os resuhdos ficaram aqinirn das promessas. mas no santo que tenham feito perigar, seleccionar as universidades e os centros de invesligaçäo corn maior capacidade de inves-

pelo menos até agora, a permanência da universidade. Neste caso, a razào talvez resida no tigaço e concentrar rieles os recursos financeiros disponfveis.
facw de os apelos à prútica decorxrem de interesses muito disUntos e até aniagónicos. Enquanto os dois pnmeiros tipos de medidas afectaram a centraiidade da universidade
susientados por gnipos ou classes socials corn desigual poder socia!, e de a universidade, a partir de fora, o diUrno tipo afectou-a a partir de dentro. Tal corno já sucedera no con-
scm deixar de privilegiar os inieresses e os gnipos sociais dorninaines, ter procurado dar texto das dicotomias alta cultura-cultura de massas e educaçào-trabalho, produziu-se a
alguma resposta (mesmo que apenas cosrntica) ans interesses e aos grupos sociais domi- diferenciaçäo e estratificaçào entre universidades. Neste caso, o processo foi facilitado

nados. Convocada em direcçes oposas, a universidade p&te tomar cada urna delas scm pela convicço de que a expanso da universidade nos anos sessenta relaxara os cÑtrios
mudar de lugar. de contrataçào e de promoço, fazendo entrar para o corpo docente pessoas abaixo do
A iuz disto, deve ser-se presente que. no conirário do que fazem crer os relatóiios ofi- nfvel de exlncia e scm rnotivaçâo para a investigaço. Este processo esul de resto em
dais, nacionais e intemacionais, a questo da relevância económica socia] e politica da curso e as propostas vo no sentido de concentrar a rnaioria dos recursos nalgumas uni-
universidade, tal como foi levantada a partir dos anos sessenta, incluiu vertenLes muilo versidades, financiando nas restantes as tarefas de smntese e de disseminaço do conheci-
diversas e discrepantes. O amalgamento destas em palavras de ordern absnacas, como, mento e os programas de actualizaço dos docentest6. A execuçào de tais propostas está,

por exemplo, o apelo à «inserço da universidade na comunidade», facilitou todos os no entanto, a debater-se corn mdltip!as difleuldades e resistências. E que, apesar de

reducionismos, e a verdade que esta palavra de ordern significa, nos relatórios de hoje, apenas urna &acço dos docentes de urna fracçAo das universidades fazer efectivamente
pouco mais que as relaçöes entre a universidade e a indústria ou entre a universidade e a investigaçAo e contribuir para o avança do conhecimento, a verdade é que o universo sim-
economia. Ao conErrio. procurarci distinguir no que se segue entre o papel da universi- bólico da vida universitária continua povoado pela prioridade da investigação e a defmi-
dade no aciscirno de produtividade industrial e o pape' da uriiversidade na valonzaço ção do prestigio, tanto institucional, como pessoal. continua vinculada à realidade ott à

socia! e cultural da comunidade envolvente. ficçAo verosímil da performance cientUka. A concenhraç.o dos recursos para a investiga-
cao cria nas instituiçes excluidas urna marginalizaço muito mais ampia que a que
decorre do fecho de centros de hwestigaço, corn repercussöes dificilinente previsíveis
A universidade e a produtivi4ade tanto no corpo docente corno no corpo discente.
Apolítica de concentraço de recursos tern vindo a ser c&nplementada por urna outra,

A interpeaço da universidade no sentido de participar activamente no desenvolvi- a do incitamento à procura de recursos externos, no estatais. Esta iltima implica urna
mento tecnológico do sistema produtivo nacional tern vindo a ser formu!ada corn cada vez presso no sentido do privilegiamento da investigaço aplicada e é responsável pela
maior insistência e traduz-se em duas problemáticas principals: a da natureza da investiga- grande actualidade da queStO das relaçóes entre a universidade e a indústria. Os factores

ção básica e a das virtualidades e limites da investigaçäo aplicada nas universidades. macro-económicos determinantes desEe processo so a relativa estagnaçAo económica dos
A natureza da inves1ìgaço básica tornou-se prob!emftica nos últimos trima anos,
quer porque os seus custos aurnentaram expunencialmenle, quer porque a conversan pro-
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nesga-
gressiva da cìência em força produtiva acabou por pôr em causa a própria validade da dis-
6. Por ecmpto. no

çto«)cDE, 1957: 3».


26 das li universidades absorvem dos fwutos disponíveis para
176 - Pela Mâo de Alice. O Social e o Politico tw Pós-Modernidade Da Ideia de Unìversida4e à (Jniversidade de ldeias 177

países centrais no inicio da decada de setenta, corn prolongamentos até ao presente. e a O imaginário unìversitário é dominado pela ideia de que os avanços de ecohecimento
convicção hoje generalizada, de que estagnaço se licou a dever menos aos choques cìentffico são propnedade da comunidade científica, ainda que a sua autorin possa ser
do petróleo do que ao declfnio absoluto e relativo da produtividade da inthistria (OCDe, individualizada. A discussào livre dos pmcedimentos e etapas da invesiiaçào e a publici-
1984 I 1), declmnio esse que, tambin consensualmente, é ati-ibuklo à desace1eraço da dade dos resultados são considerados impreseindiveis para sustentar o dinamismo e a
inovaçâo tecnológica. Este fenómeno t partcu1arinente evidente nos EUA onde, no iníeo competitividade da comunìdade científica. A «comunidade» industrial tern outra concep-
da década de oitenta. a inddsuia as1ava em investigaçAo e desenvolvimento urna percen- cao de dinamismo, assente nas perspectivas de lucro. e outra concepço de competithi-
tagern dos seus lucros inferior à que gastava em meados da d&ada de sessena e o hives- dade, assente nos ganhos de produtividade. Se as suas concepçies se sobrepuserem às da
tirnento incidia mais em transfonnaçoes parcelares dos produtos existenEes do que em comunidade científica, tesemos, em vez da publicidade dos resultados, o secretismo, em
inovaçòes estrnturais (BOIÇ, 1982: 137). vez da discussäo enriquecedora, o mutismo sobre tudo o que é verdadeiramente impar-
o consenso sobre a re1aço entre o declmnio da produtividade e a desaceleraço da tante no trabaiho em curso, em vez da livre circulaçAo, as patentes. As investigaçes mais
mudança tecnológica coloca no centro da salda da crise a quesUo da veocidade e eftcin- interessantes e as dados mais importantes serão mantidos em segredo para nän destruir
cia corn que se pode traduzir o conhecirnento cienUfleo em produtos e processus úteis e as vantagens competitivas da empresa fmanciadora e os resultados só seráo revelados
consequenternente, no centro da questAo, a universklade e a investigaçäo científica que quando forum patenteáveis. Os sinais de urna tal «perversão» têm vindo a acumular-se e a
neta tern 1uga Senda certo que a universidade sempre se imaginou vocacionada para a perturbaçAo que estão a causar em alguns sectores da comunidade científica está já pre-
invesiigaçAo basica e organiiada em funço das exigências desta, no será difícil irnagi- sente, e até corn hisistência, nos relatóiios oficiais (OCDE, 1984; OCDE. 1987: 58 e ss.).
nar a turbulência simbólica e instituciona' produzida pelo incitamerno cada vez mais Urna lógica de investigaçäo e de thvulgação dominada pelas patentes acarreta um outra
Insistente à mnves1igaço aplicada e petas medidas em que se vai traduzindo. Expresso risco, o das vantagens «deslcais» confeildas às empresas fmanciadoras decorrentes do
disso éo facto de a discusso sobre este tema estar a incidir primordialmente na anälise accaso privilegiado à informaçáo para alrn do que respeita estritamente ao projecto de
dos cusios e dos beneficios para a universidade decorrentes de urna ligaço mais intensa à investigaçáo financiada Este risco convene-se por vezes anm terna de discussào pdblìca
indústria E shitomtico também que os beneficios mais convictamdnte reconhecidos como, por exemplo, no caso do contrato no valor de 23 im1bIeS de dólares entre a empresa
sejam Os fmanceiros, quer os que decorrem directamente dus projectos de invesEigaço Monsanto e a Faculdade de Medicina de Harvard. Trata-se de urna questão complexa que
c

-
fmanciados pela indústria, quer os que indirectamente podem resultar do aumento da obriga a dstingufr (corn que criterios, é o que se discute) entre vantagens merecidas em
competitividade internacional da economia (mais fundos estauüs e no estaais disponi- fiinçilo do esforço de financiamento e vantagens nAo merecidas. Urna das suas repercus-
veis para a universidade). söca tern lugar na politica de licenciamento de patentes quando estas pertencem à universi-
Pelo conlrário, os cuscos e os riscos sâo muhos e variados. Em primeiro lugar, o risco dade (licenciamento em regime de exciusividade ou em regime de näo exciusividade?).
de alieraçäo degenerativa das prioridades científicas. Até agora. os investigadores univer- Embora a seriedade de muitos desEes riscos só reja avaliável a longo pinzo, a discus-
sith-ios imaginaram-se a decidir os temas de investigaço em funçäo do seu interesse são a scu respeilo tende a ser feita em função dos impactos imediatos. E estes so sobre-
intrínseco, do desafio que colocarn às leonas consagradas, das pmmissoras descobertas ludo visíveis a dois níveis. Ao nivel do corpo docente, pela acentuaçâo das diferenças de
que sugerem. O privilegiamenoe da investigaçào aplicada pode perturbar estes critérios de salários entre os docentes cujas temas de invcstigaçâo são economicamente exploráveis e
prioiidade e, tendencialmente, substituí-los por outros relevância económica e penìpecti- os restantes decentes, diferenças que se repercutem nos investigadores e docentes mais
vas de lucros dos lemas de investigação; virtualidade destes para criarem novos produtos jovens quando tm de optar entre vários objectas possíveis de investigaço. A esta dife-
e processos probabilidade de serem financiados por empresas sediadas na regio da uni- renciaçào corresponde um alargamento, que alguna consideram perigoso, do que se deve
versidade. Se estas se permitirem impor a investigaçào de temas intrinsecamente pouco entender por «actividade aceitável ou legítima» de um investigador universitário (predo-
importantes mas economicamente muito relevantes, o resultado será provavelmente o de minância do trabalbo de consultoria de empresas; formaçâo e gestão de empresas. etc.)
investigadores capazes serem «desviados» para a investigaço de rotina empreendida (OCDE, 1987 &3). A «distorçáo comercial» acaba por tymsformar-se numa «distorçáo
apenas em razào da sua rentabilidade, Este risco está relacionado com um outro, o do institecional»7. O segundo nivel diz respeito ao dedlinio as humanidades e das ciências
pacto fáustico. Os investigadores que aceitam ou promovem o financiamento industrial soejais, áreas de menor comerciabilidade, tradicionalmente prestìgiadas, corn grande
das suas invesfigaçôes podem ficar na dependência da empresa fmancìadora As remune- expansão nos anos sessenta e que agora correm o risco de marginalìzaçAo. apesar de
raçes vultuosas que recebem e os melbores equipamentos e outras infraestruturas de reclamadas pelo novo generalismo a que acima fia referéncia.
investigaçäo de que passam a dispor são obtidos à cesta da perda de autonomia, de confli-
tos constantes entre as press'es do curto prazo da empresa e as perspectivas de longo
pfazo préprias dos cri1rios científicos de investìgaçäo e de inevitáveis cedncìas na ava- 7. Os pergos deccwnas desta disturç5o sSE> hoje ekteite e apareccm corn cath vez mais inzsIência em
pbtìeçes kie cTgaasmeI intemathmìz qat and h pouco vian scthteudo beae[ícis na ìgç5 anversidade-
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-th(huua.
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lìaçáo da mamridade, representatividade ou fiabilidade dos resultados.
por óltmo. OCDE (1988). Cte..
178 Pela Mäo de Alice Q Social e o Político na PO.c-Modernidade Da ¡deja de (Jnìrersidade à liniversidade de Jdeias I 79

A preocupaçäo corn os impactos imediatos tern vindo a impedir urna reflexAo mais classes dominantes, era social e politicamente condenáveL Por outro lado, se para alguns
cuidada sobre as consequências a m&io e a longo prazo. Por ounx lado, em contribuido a universidade devia comprometer-se corn os problemas mundlais em gera! e onde quer
para ocultar o facto de que a situaço emergenle nao significa urna alleraç& de quali que ocorressem (a forne no terceiro mundo. o desastre ecológico, o annamentismo, o
dade, mas to-só de grau ein relaço à situaço anterior. Os valores da tica cientifica -o apartheid. etc.), para outras, o compromisso era corn os problemas nacionais (a criminali-

comunismo. O desinteresse, o universalismo, o cepticismo oîgamzado, para usar o elenco dade, o desemprego, a degradaçào das cidades, o problema da habitaçào, etcj oumesmo
de Merton (Merton, f968: 604 e $54 Santos. 1978) ..... so parte integrante do universo sim- corn os problemas regionais ou locais da comunidade irnediaramente envolvente (a deli-
bólico universitário e so importantes enquanto taL mas a prática wiiversitária esteve ciente assistência jurídica e assistência rn&lica, a falta de tdenicos de planeamento regio-

sempre mais ou menos longe de os respeitar. As relaçôes corn a indústria começaram ja nal e urbano, a necessidade de educaçào de adultos, de programas de cukura gera! e de

no século XIX e, corn a indústria da guerra, no inicio dos anos quarenla; as lutas de pres- formaço profissional, etc.).
tígio e de prioridade entre departamentos e entre centros de investigaço vm de h O movimento estudantil dos anos sessenta foi, sem dúvida, o porta-voz das reivindica-

multo; a cobiça dos prnlios (Nobel e outros) b muito esponsável pelo secretismo e çòes mais radicals no sentido da intervençäo social da universidade. Entre estas reivindi-

pelo «individualismo possessivo»; os critérios de avaliaço e as exigências burocráticas caçôes e as reìvindicaçöes dos conservadores e tradicionalistas que recusavam, por
das instituiçöes estaw.is e no estatais de financiamento sempre obrigarm a «distorçöes» corruptor do ideário universitário, quaiquer tipo de intervencionismo, foi emergindo ao

variadas na avaliaço e na apresentaço dos resultados e esses mesmos fmanciamentos, longo da década um tipo de intervencionismo moderado, reformista, que teve a sua

atravs dos sens critérios de prioridade dos temas a investigar. sempre esiabeleceram meihor fonnulação na ideia da multiversidade americana teorizada por Clark Kerr (1982)
diferenças entre áreas e entre remuneraçöes dos docentes. Estamos, pois, perante urna a partir de 1963. Ancorada nimia longa iradiço que remonta às «land-grant universities»,

aiteraçâo de grau, que, de resto, no por isso menos signi&ativa. a muluversidade é, multo sucintamente, urna universidade funcionalizada, disponivel
Como se verá melbor adiante ao analisar a crise institucional, o modo como tern vindo para o desempenho de senriços públicos e a satisfação de necessidades sociais conforme
a ser discutida esta questão é reveladora de urna estrategia de disperso das contradi*s as solicitaçöes das agencias fmanciadoras, estatais e nao estatais. Trata-se de urna «insti-

por parte da universidade. Fragilizada por urna crise financeira e incapaz, por isso, de tuiçäo no centro das acontecimentos» (Ken. 1982: 42) e estes tanto podem ser a coabo-
resistir ao impacto da luta pela produtividade ou de definir soberanamente os termos desta raçào corn as forças armadas e a CIA a ligaçAo à indúsiria ou às associaçöes de agriculto-

luta, a universidade procura adaptar-se criativarnente às novas condiçôes, tentando maxi- rea, como a assistência tcthca aos países do terceiro mundo, o apolo às escolas das zonas
mizar os beneficios financeiros e exorcizando os riscos atravs de um apelo ao «equilibrio urbanas degradadas a organizaçäo de «cUbicas de vizinhança» para as classes poptdares,
de funçôes» e à prevenço contra a «sobrecarga funcional» (OCDE, 1984: 12). a assistência jurídica e judiciáiia aos pobres.
A ideia e a prática da muftiversidad.e foi sujeita a um fogo cruzado. Os tradicionalistas

fizeram duas críticas principais. A primeira era que o intervencionismo sujeilaria a uni-

A universidade e a cQmunidade versidade a pressôes e tentaçes descaracterizadoras: muitos dos programas de extensäo
nao estariam baseados em conhecimentos sólìdos; os professores envolvidos em activida-

Corno referi atrás, para a1m da vertente economicista e produtivista, o apelo à pri- des de consultoria e de extenso dedicariam menos tempo ao casino e à investigaçao e,

tice, teve, a partir dos anos sessenta, urna outra vertente, de orien1aço social e política, corn o decorrer do lempo, perdenam a lealdade à universidade e aos seus verdadeiros

que consistiu na invocaço da «responsabilidade social da universidade» peranie os pm- objectivos; os programas socialmente relevantes expandir-se-iarn à custa do deftnba-
blernas do mundo contemporáneo, urna responsabilidade raramente assuinida no passado mento dos departamentos de filosofia, de cultura clássica ou de histôria medieval. A
apesar da premncia crescente desses problemas e apesar de a uthversidaIe ter acumu segunda crítica era que o crescimento precipitado da universidade conduziria à ampliaçäo
lado sobre eles conhecimenos preciosos. Esta veriente leve, assini, um cunho marcada desmesurada dos serviços administrativos e à criaçào de burocracias poderosas, asftxia-

mente critico. A universidade foi criticada, quer por raramente ter cuidado de mobilizar doras da iniciativa e da liberdade dos docentes. Em suma, ponto de vista conservador,
os conhecimentos acumulados a favor de soluçöes dos problemas sociais, quer por nao ter a vocaço da universidade seria o investimento intelectual de longo prazo, a investigaçào
sabido ou querido pôr a sua autonomia institucional e a sua tradiçào de espirito critico e básica, científica e humanislica, urna vocaço por natureza isolacionista e elitists.

de discussáo livre e desinteressada an serviço dos grupos sociais dominados e reus mie- Mas a multiversidade foi tambérn atacada pelo movimento estudantil e em geral pela

resses. esquerda intelectoal (Wallerstein e Starrt 1971). A critica fundamental foi que a universi-

A reivindicaço da responsabilidade social da universidade assumiu tonalidades dis- dade, corn a sua total disponibilidade para ser funcionalizada e fïnanciada, acabava por se
tintas. Se para alguns se tratava de criticar o iso'amento da universidade e de a pôr ao ser- tornar dependente dos interesses e grupos sociais corn capacidade de linanciamento, ou
vico da sociedade em geral, para outres tralava-se de denunciar que o isolamento lora da classe dominante, do establishment. Recusando-se a estabelecer as suas prìorida-
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täo-só aparente e que o envolvimento que ele ocuUara, em favor dos interesses e das
seja,

des sociais, e a propor definiçôes alternativas para os problemas e as necessidades sociai


t 80 Pela Mäo de Mice. O Soja1 e o Politico na Pós-Modernidade Ba ¡deia de Univ«rsidade à Universidade de !deia.

selecionados pelo governo e outras instìtuiçòes, a urnversidade capitulava à subservinca scm antagonizar outras. Esta última orientaço revela bern em que medida a uthversidade
e à passividade, ainda que sob a capa de frenéLico activismo. Num nothe texto de refle-. pretende controlar o seu desenvolvime'uo comunitário e exerc-lo de modo a manter um
,lao escrito no mek da nwbulência estudanti!, Wallerstein afirmava que «a questo no clisanciamento calculado perane conflirns sociais. Incapaz de se isolar completamente
estg em decidir se a universidade deve ou no deve ser politizada, mas sim em decidir das pressöes que Ihe so feitas, a universidade procura gen-las de modo a reproduiir, ero
sobre a politica preferida. E as pteJerências variam» (Wallersin, 1969: 29). condiçöes sempre novas, a sua ceniralidade simbólica e priica sem comprometer dama-
A crítica conservadora passou a ouvir-se corn mais insisEncia nos anos setenta e nos siado a sua es*abilidade institucional.
anos oitenta. Um born exempo o debate actual sobie as teses de Allan Bloom, ja anali- Na Europa, tanto o modelo alemào da universidade, como o modelo ingles, como
sadas. Muitos dos programas orientados para a minoraçäo dos problemas sociais das ainda as diferentes combinaçes entre eles, criaram urna ideia de universidade que. à par-.
ctasses desprivilegiaths e das minorias 4tnicas e rcicas foram cancelados. Outros. mais tìda, oferece a esta mathores condiç&s para se manter resguardada das presses sociais e
vinculados au establishmern (sobretudo militar), que tinham sido cancelados nos anos para fazer desse isolamento a razo de ser da sua centralidade. Em última análise. essa
sessenta sob pressAo da crítica estudantil, voltavam a ser activados. Em mukas universi- ideia consiste em fazer esgotar as responsabilidades socials da universidade na investiga-
dades, a responsabilidade social da universidade foi sendo reduzida às ligaçoes corn a cao e no ensino. Mostrei atrás que o isolamento obtido por esta via será sempre muito
mndstria. No etanto, no caso americano, a tradiçfto de reformismo universitrio e a espe- relativo, pois que o questionamento. recorrente nas últimas décadas, sobre o que se deve
cificidade das relaçäes jurídicas (sobretudo fiscais) e institucionais das universidades corn investigar (investigaço basica ou aplicada) ou sobre o que se deve ensinar (cultura geral
as chiades e as comunidades onde esto instaladas fez corn que a ideia da mukiversidade ou formaço profissional) tern vindo a ser accionado por presses sociais a que a univer-
mantivesse o seu apelo ideológico e se continuasse a traduzir em programas de oñentaço salade de urna ou de outra forma vai dando resposta. Deve, no entanto, salientar-se a cfi-
sociai sobremdo de âmbito comuniaiuio. Das iniciativas exaltantes dos anos sessenta - cácia selectiva desta idela europeia de universidade. Se certo que cia contribuiu para
escritOrios de advocacia granuLa e clínicas medicas e dentáiias instalados no ghetto por resguardar relativamente a universidade (sobretudo no continente europeu) das reivindi-
iniciativa das facuktades de direito e de rnedcina. respectivamente; programas de investi- caçes mais radicals dos anos sessenta no sentido do envolylinento da universidade no
gaço e de consultoria sobre problemas urbanos organizados de coaboraço entre os equacionarnento ou mesmo na soluçào dos problemas mundiais, nacionais ou locals, nao
departamentos de socio'ogia e de urbanismo por um 'ado, e as agencias administrativas imiu que as universidades, a braços corn urna grave crise financeira, se lançassem na
locais, por outro; acçes de educaço continua e de educaço de aduhos a cargo dos luta pela produtividade e na abertura à «comunidade» industriaL E de tal modo que hoje a
&paitarnentos de educaço; abertura das bibliotecas universitárias à populaçäo; miítipIas responsabilidade social da universidade está virtualmente reduzida aos termos da sua coo-
-
iniciativas do tipo «universidade aberta»; etc., etc. algurnas sobreviveram aé aos nossos peraçAo corn a iiidústria.
dias e outras têm-se mesmo expandido. Por exempo, em muias faeudades de direito, os No entanto, a concepçào mais ampIa de responsabilidade social, de participaçào na
serviços de assist&cia jurídica e judiciária gratuita, que cram extracurriculares nos anos valorizaçao das comunidades e de intervençao reformista nos problemas sociais continua
sesSenta for irflegrados no plano de estudos enquanto forma de «ensino aplicado» (cii- vigente no imaginário simWlico de muitas universidades e de muitos universitarios e
nical education), isto ë. de irabaiho pr1tico de estudantes sob a orienaço dos professo-
tende a reforçar-se em periodos históricos de transiçao ou de aprofundamento democráti-
res. Thm-se tamb&n mantido algims dos programas de apoio t&rnico à renovaçäo urbana, cos. Na América Latina, por exemplo, tern vindo a concretizar-se de forma irtovadora em
sobretudo das zonas degradadas, tal como os programas para grupos especialmente caren- países em processo de transiçäo democrática. Entre ociros exemplos possiveis, o mais
ciados (crianças abandonadas, veihos, cegos, deficientes) e os programas de reciclageni importante foi talvez o da universidade de Brasflia sob o reitorado de Cristovam Buar-
(a chamada midcareer educarion) para quadras médios e superiores da administraço
que, acima de tudo pelo modo como pmcurou articular a tradiço elitista da universidade
pública e: privada. corn o aprofundamento do seu compromisso social. Num notável texto programático mii-
A teorizaço boje dominante des programas de exIenso é reveladora dos limites da talado Urna !deia de Universidade. Buarque afirma que «a politica da universidade deve
abertura da universidade à comunidade e das objectivos que lhe subjazem. Em primeiro combinar o mgximo de qualidade académica corn o maximole compromisso social... O
lugar, a abertura desempenha um importante papel de relaçöes públicas em comunidades
que caracierizani o produto, pertanto, a sua qualidade, sua condiçào de elite, mas o que
corn longo rol de qucixas e ressentimentos contra a universidade, desde as isençôes fis-
caracterizará o seu uso o seu compromisso ampio - a sua condiçao antielitista» (1986:
cais ao expansionismo das infraestruturas em detrimento de outras actividades locais e ao
22). Corn base nestas premissas formulada urna pol1ica de cxtensao multo avançada:
desassossego provocado pela boemia estudantiL Ein segundo lugar. considera-se que os
«Considera-se que o conhecirnento científico, tecnológico e aitistico gerado na Universi-
sevços de exlensäo Comunitjja devem Lcr urna forte componente tecnica de modo a
dade e Institutos de pesquisa no so únicos. Existem outras formas de conhecimento sur-
CYitar que a universidade
se substitua ilegitimamente a outras instituiçöes ou se descai'ac- gidas da pratica de pensar e de agir dos imimeros segmentos da sociedade ao longo de
crIc desempenho das funçöes. Por ultimo, devem ser privilegiados os programas que
que por no serum
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(sobretudo humanos) e que vìsaiì ajudar um dado grupo local
dade esto Scado de
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são desprovidas de
geraçöcs
institucionaL Essas pniticas
caracterizadas científicas,

recuperadas à luz
legitimi-

urna actividade orgâ-


Pefa Mao de Alice. O Social e o Politico na Fós-Modernidade Do Idela de (Jaiversidade à Uni versidade de Ideias 183
S2

nica corn a maloria da populaçäo» (Buarque, 1986: 63). Do ambicioso Programa Penna- tthcìa institucional. No entanto, os factores que conduziram à crise de hegemonia no pós-
nene de Participaço Colectiva elaborado pelo Decanato de Extenso, destaco o pmjecto -guerra e que foram referidos na secço anterior s6 parcialmente explicam a crise de legi-
Ceilándia constituido por dois subprojectos: «O subprojecto de históría popular que visa timidade tal como cia se veio a configurer, e é por liso que se devem distinguir as duas
resgatar a Iuta dOS moradores da .rea pelos lotes residenciais, conteúdo que será incorpo crises, apesar de a crise de hegemonie estar presente na crise de legitimidade.
rado ao sistema escolar como maeriaI básico de ensino no local; e o subprojecto de sakJe Na sociedade moderna o carácter consensual de urna dada condìçAo social tende a ser

popular, baseado no trabatho corn plantas medicinais, corn a implantaçAo de hortas medi- medido pelo sen conteodo democrático; o consenso a seu respeito será tanto mami quanto
cinais e fannácia verde e corn grande partieipaço de raizeiros. benzedoras, curandeiros, minor for a sua consonância corn os principios filosófico-políticos que regem a sociedade

profissionais de saúde, estudantes, agrónomos, eec». De saJentar ainda o prajecto do democrática. Há-de ser este também o critézio de legitimidade da universidade moderna

Direito Achado ia Rua que visa recoiher e valorizar todos os direitos comunitários, E à luz dele no admìraria que a tegitimidade da universidade fosse, à partida, bastante

locais, populares, e mobilizá-los em favor das hitas das ctasses populares. confrontadas precária. A universidade moderna propunha-se produzir um conbecimento superior, eli-

tanto no mein rura' como no meio urbano, corn um direito oficia' hostil ou ineficaz(8. tiste, para o ministrar a urna pequena minoria, igualmente superior e elitista, de jovens,

o espaço concedido a esta proposta da Universidade de Brasilia tern por objectivo nurn contexto institucional classista (a universidade é urna sociedade de classes) pontifi-

mostrar a extrema ductilidade do apelo prática e da concepçäo de responsabilidade cando do alto do sau isolamento sobre a sociedade.
social da universidade em que se traduziu. Na ddcada de oîtenta, a mesma concepço Apesar disto, a legitimidadeda universidade nAo foi seriamente questionada durante o

pôde, em áreas diferentes do globo e em condiç&s sodais e politicas distintas, circuns- periodo do capitalismo liberal e para isso contribuiu decisivamente o facto de o Estado

crever-se à cooperaço corn a indUstria ou, pelo contrário, abranger um ampio programa liberal, que foi a forma política da sociedade moderna tueste periodo, nao ter, ele próprio,

de reforma sociai Tat ductiidade, servida pela estabilidade e pela especificidade institu- um forte conteodo democrático, Este, de resto, começou por ser mesmo muito débil e sé

cional da universidade, toma possível que esta continue a reclamar urna centralidade se foi forialecendo à medida que forera tundo éxito as lutas dos trabalbadores pelo sufrá-

social que a cada momento vé escapar-se-the mas que, a cada momento, procura recupe- gin universal, pelos direitos civis e políticos, pela organizaço autonénoma dos interes-

rar corn recurso a diferentes mecanismos de disperso, um imenso arsenal de esti-atdgias ses, pela negociaçäo sobre a distribuiço da riqueza nacional. O éxito destas lutas provo-

de ampliaço e de retracço, de inovaçäo ou de regressäo, de abertura e de fechamento, cou alteraçes tilo profundas que veio a configurar, a partir de finals do século XIX. urn

que estAo inscritas na sua longa memória institucionaL novo período de desenvolvirnenlo capitalista o período do capitalismo organizado. em
Dado O modo como se reproduzem as coniradiçòes e as tensöes nas dicotomias alta cujo decurso a forma política do Estado liberai foi subsumida, nas sociedades eurnpeias

cultura-cultura popular, educaçäo-trabalho, teoria-prática, em processos socials cada vez desenvolvidas, pelo Estado-Providencia, ou Estado social de direito, urna fonna poiftica

mais complexos e acelerados, a universidade nao pode deixar de perder a centralidade, multo mais democrática apostada em compatibilizar, dentro do marco das relaçôca socials

quer porque a seu lado vo surgindo outras instituiçes que Ihe disputam corn sucesso capitalistas, as exigencias do desenvolvirnento económico corn os principios filosófico-

aigurnas das f\inçies, quer porque, pressionada pela «sohrecarga funcional», d obrigada a -políticos da igualdade. da liberdade e da solidariedade que subjazem an projecto social
diferenciar-se internamente corn o risco permanente de descaracteruzaço. Da a etise de e político da modernidade. Compreende-se, pois, que a legitimidade da universidade

hegemonia que tenho vindo a analisar. Os recursos de que a universidade díspöe so ma- moderna, apesar de sempre precária, sé tenha entrado em crise no período do capitalismo

dequados pare resolver a crise, uma vez que os parmetros desta transcendem em multo o organizado e de resto, tal como a crise da hegemonia, sé no fmal do periodo, na década

âmhito universitario, mas tm sido at agora suficientes para impedir que a crise se apio- de ressente- A cuise da legitimidade é em grande medida o resultado do êxitu das lutas

funde descontroladameme. Corno resulta da anáilse precedente, a cuse de hegernonia é a pelos direitos sociais e económicos, os direitos humanos da segunda geraço, entre os

mais ampia de todas as crises que a universidade atravessa, e de tal modo que está pre- quaìs pontifica o direito à educaçáo (Sanios,1989a).

sente nas restantes. Por esta razäo, limito-me, a seguir, a urna breve referéncia à crise de A crise de legitimidade nenne, assim, no momento em que se torna socialmente visi-

legitimidade e à crise institucional. vel que a educaço superior e a alta cultura sáo prerrogativas das classes superiores,
altas. Quando a procure de educaçAo deixa de ser urna reivinicaçäo utópica e passa a ser
urna aspiraço socialmente legitimada, a universidade ni pode legitimar-se, satisfazendo-
A crise de legitimidade -a. Por isso, a sua funço tradicional de produzir conhecimenios e de os transmitir a um
grupo homogéneo. quer em termos das suas origens socials, quer em ter-
social resu-go e
Enquanto no foi posta em causa, a hegemonia da universidade constitulu fundamento
mos dos seos destinos pmfissionais e de unodo a impedir a sua queda de status, passa a
bastante da legitimidade da universidade e, portento, da aceftaço consensual da sua exis-
ser duplicada por estoutra de produzir conhecimentos a camadas sociais multo amples e

heterogéneas e corn vista a promover a sua ascençäo social. Dal, a implicaçào mútua da
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crise e crise legitimidade: tipo (quei-
i Pela Mao de Alice. O Social e o Político ¡w Pós-Modernidade Da idela de (Jniversidade a lJniversidade de ldeias 185

to de hegemonia) tende a afterar-se corn a aiteraço do grupo social a que se destine lias opei*ias a frequentar o ensino superior nAo universi*io (OCDE. 1987: 35). C) facto
(questo de egitimidade). Por isso, as resposias da unversidade à eÑe de hegemonja de o direito à educaço ter vindo a significar, para os (llhos das familias operárias, o
analisada acima -incorporaço Iimit&Ia da cuftum de massas da formaçao profissional, direito à fonnaço técnica profissional é revelador do modo corno a reivindicaço demo-
da mnvestigaçäo aplicada e da exienso à comunidade -- só so plenamente compreensí-
crática da educaço foi subordinada, no marco das relaçes soclais capitalistas, Its exig&i-
veis se tivermos em mente que corn elas a univeisidade pretende incorporar, de modo cias do desenvolvimenio tecnológico da produçào industrial fortemente sentidas a partir
igualmente limitado, grupos sociais até ento excluidos (filbos da classe opethia, da da década de sessenta91.
pequena burguesia e de imigrantes, muUieres, rninoiias étnicas). Perante a reivindicaço social de um modelo de desenvohimento mais igealitário, a
No momento em que a procura da universidade deixeu dc ser apenas a procura de universidade expandlu-se segundo urna lei de desenvolvimento desigual (Moscati, i 983:
excelência e passou a ser também a procura de democracia e de iguadade. os limites da
66). Para aqueles que sempre estiveram contra a expanso, corno, por exemplo, A.
congruéncìa entre os principios da universidade e os principios da democracia e da igual- Bloom, a universidade descaracierizou-se de modo irremediável. l'ara os que promove-
(lade tornaram-se mais visiveis: como compatibilizar a democratizaçäo do acesso corn os
rara o desenvolvimento desigual, a universidade, apesar de todas as transformaçes para
citéños de selecçAo interna? Como fazes interiorizar numa instituiço que é, ela propria, quebrar o seu isolamento ancestral, no mudou no essencial, pois manteve sempre urn
urna «sociedade de classes» os ideais de democracia e de igualdade? Como fornecer aos
núcleo duro capaz de impar os critérios de exceléncia e os objectivas de educaçân inte-
govemados urna educaço semeihante à que até agora foi fornecida aos govemantes scm
gral. Para os adeptos da expansão democrática, a universidade deixou-se funcionalizar
provocar um «excesso de democracia» e, corn isso, a sobrecarga do sistema político para do desenvolvimento capitalista (mio-de-obra qualificada) e defraudou as
pelas exigencias
além do que é tolerávefl Como é possíveí. em vez disso adaptar os padröes de educaço
expectativas de prornoçn social das classes trabathadoras através de expedientes de falsa
às novas cireunstâncias scm promover a rnediOCJ-ida& e descaractenzar a universidade?
democratizaço°. A diversidade de opiniöes é, ueste caso reveladora da ambiguidade
Posta peraine tais questäes, a universidade mais urna vez se prestau a soluçoes de prOpria da lei do desenvolvimento desiguaL E de crer que esta continue em vigor no
compromisso que the permitiram continuar a reclamar a sua legiUmidade sem abrir mio,
ftturo próximo, e, de resto, scm grandes sobressaltos, quer porque a pressäo demográfica
no essencial, do seu elitismo. Em resumo, pode dizer-se que se procurou desvincular na
terminou quer parque está a aumentar o número de estudanies corn expectativas mais
práEica, e à reveia do discurso ideológico a procura da universidade da procura de demo-
limitadas (adultos", estudantes trabaihadores, estudanies financiados pnias empresas),
cracia e de igualdade, de ial modo que a satisfaço razoável da piimeira no acarretasse a
etc.). Pesante estas condiç&ies diininuem os custos de urna política de discriminaçAo social
saiisfaço exagerada da segunda. Isto Ibi possivel sobrepondo à thferenciaço e estratili- e por isso no admira que em muitos países a prioridade em garantir o acesso à universi-
caço da umversidade segundo o tipo de conhecimentos produzidos, analisadas acima, a dade aes grupos sociais desprivilegiados seja boje menor do que era nos anos sessenta e
diferenciaço e estratificaço segundo a origem social do corpo estudantil. Os md1iìpos setenta (OCDE, 1987: 21).
dualismos referidos, entre ensino superior universirio e no universitário entre univer-
sidades de elite e universidades de massas, entre cursos de grande presUgio e cursos
desvalorizados, entre estudos serios e cultura geral, defmiram-se, entre outras coisas,
A crise institucional
segundo a composiço social da popu1aço esco1ar
A partir da década de sessenia, os esudos sociológicos foram revelando que a massi-
De todas as crises da universidade, a crise institucional é, scm thívida, a que tern
ficaço da aducaço no alterava significativamente os padrôes de desigualdade social. vindo a assumir maior acuidade nos últimos dez anos. Ern parte, porque nela se repercu-
Hoje, so us relatórios oflciais a atest-1o. Em jeito de balanço à «ênfase ignalitária» dos
tern, tanto a crise de hegemonia, como a crise de legitimidade, em parte, parque os facto-
últimos vinte anos, o relatório da OCDE a que me tenho vindo a rerir afirma: «Apesar
res mais mareantes do scu agravamento pertencem efectivamente ao terceiro periodo do
de a expanso do ensino superior que leve lugar na maioria dos países nos anos sessenta e
principios das anos setenta ter melhorado ao que parece, as oportunidades dos grupos
socialmente desprivilegiados, a verdade é que a posiçäo relaliva destes grupos nao meiho- 9Cfr,iambm,Cunois(1988).
roh significativamente sobreEudo depois de meados dos anos setenia» lo. Num pequeno livro publicado em 975, já eu denurciva a falsa dcmocaiaç5o d.a universidade ao
(OCDE, 1987: 34). que mncuía a democTaizaç5o admins-
mesmo Icmpo que defendia urna demcnnisaç5o global da unìversìdade
doe mesmo relatório, a percentagem de filhos de familias operérias a frequentar as
trativa grA35rfka, curricular, pedagogica, insucmaIprefissioai e sicio-ecm6mica(Saatos, 1975).
universidades alemas aumentou significativamente nos anos sessenta, mas mantém-se i 1. 0 Centerfor Edacation Statìstìc do EUA previu que. em 1990, 47% dua stu1ancs d ensino superior
entre 12% e 15% desde 1970. SemeIhantemenie em França essa percentagem era de 8% ameTicalo 1afl ma de 25 anos de Jadc.
em 1962 e de apenas 12% em 1982, apesar de a papu1aço estudantil esiSo disposias a [inanciar parte da educaç5o dos seus em,regadoa mas a maio-
ter aumentado nesse 12. Cada vez mais empresas
PCFI(XIo de 282.(XjO para 773000. Pelo cornrírio,
ainda segundo o mesmo relatório, em ria esabciec restriçles quanro ao po dc cursos qw nnaiiam cwsos curtos; cursos re1acioiacloS corn o

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emp'ego).como um iserç5o de impotos do floanciameoto da
jT1CfltvO podemso. Cfr Mitchell (1989)
educaçk dos empïegados rem
I 86 Pela Mào de Alice. O Social e o Politico na POS-Modernidade Da ldeia de tJridade à Universidade de Ideìas 187

desenvovimento capitalista, o período do capiudismo desorganizado. O valor que estä ço da universidade na luta pela produtividade acabou por virai essa luta contra a propria
em causa na crise institucional é a autonomia unverstkia e os factores que tm vüido a universidade e o impacto institucional daf decorrente nao se fez esperar. Conformada por
lomar cada vez mais prob1emca a sua afinnaçâo sâo a crise do EsIado-Providnca e a estes factores, a crise institucional da universidade assume variadissimos aspectos. Refe-
desaceleraçâo da pmdutividade industrial nos ses centrais. Os dois factores, ambos nt-me-ei brevemente a um de1es em meu entender o mais importante: a avaliaçâo do
caracterizadores do periodo do capitalismo desorganizado, esto ner1igados, mas é pos- desempeuho universitário.
sivel, e conveniente, analisá-Ios em separado.
A crise do Esiado-Provjdncja é multo complexa e trat& dela corn algum detalbe
noutro lugar (Sanios, 1990). Bastará aquí mencionar que essa cuse se em vindo a mani- A ava!iaçäo do desempenho unìversitário
festar atravs da deerioraço progressiva das polificas socaís, da política da habiaçao e
da poiftica da saúde à politica da educaço. invocando a crise fmanceira - nem semprn A pretensän hegemónica da universidade como centro de produço de conhecimenios
comprovada e quase nunca causa suficiente -o Estado tern vindo a proceder a reestmtu- científicos e de educaço superior, combinada corn a sua especificidade organizativa e a
raçòes profundas no scu orçamento e sempre no sentido de desace'erar, estagnar e mesmo natureza difusa dos serviços que produz, fez corn que a ideia da avaiiaç.o do desempenho
contrair o orçamento sociaL Mas mais dramática que a evoiuço do nivel das despesas a funcional da universidade fosse olhada corn estranheza e até bostilidade. A primeira vista,
evoluçäo do scu conteido. Rapidamente o Esiado tem viudo a passai da condliço de pro- compreende-se mal urna tal atitude, pois a universidade O urna sociedade compulsiva-
dutor de hens e serviços (esco!as ensino) para a de comprador de bens e servços produ- mente virada para a avaliaçAo, da avaliaço do uabalho escolar dos estudantes à avaliaçAo
zidos no sector privado. Em consequéncia. a universidade pública, que na Europa tern um dos docentes e investigadores para efeitos de pmmoço na caieira. Mas, por outra lado, é
predomfruo absoluto no sistema de ensino superior, tern vindo a sofrer cortes orçamentais compreenshrel que a compu1so da avaliaço interna desenvolva por si urna certa rejeiçâo
mais ou menos significativos, sobretudo na área das ciências sociais e humanidades, an da avaiiaçäo externa, pois é disso que se trata quando se fala da avaliaço do desempenho
mesmo tempo que i obrigada a defrnivar-se corn a crescente concorrênth da universi- da universidade. Mesmo que seja efectuada pela prOpria universidade, tal avaliaço seth
dade privada. ftrtemene financiada pelo Estado. sempre externa, quer parque coloca a utilidade social da universidade num conjunto mais
Os cortes orçamentais provocam trés efeitos principals na vida institucional da univer- ampio de utilidades sociais, quer porque envolve, mesmo que implicitamente, urna corn-
sidade Porque sIo selectivos, alteram as sçes relativas das diferentes areas do saber paraçäo entre modelos institucionais e sens desempenhos.
universitário e das faculdades, departamentos ou unidades onde so investigadas e (ou) Seja como for, a exigência da avaliaço é concomitante da crise de hegemonia. A
ensinadas, e, corn isto, desestniuiram as rdaçôes de poder em que assenta a estabilidade medida que a universidade perde centralidade toma-se mais fácil justificar e até Impar a
institucioaI. Porque so sempre acompanhados do dscutso da produtividade, obrigam a ava1iaçio do sen desempenbo. No admira, pois, que esta exigncìa tenha crescido muito
universidade a questionar-se em termos que the so pouco familiares e a submeter-se a nas dues últimas décadas. Confrontada corn cia, a universidade nao encontrau até hoje
critérios de avaliação que tendem a dar do seu pmduio, qwdquer que ele seja, urna avalìa- urna via prOpria e inequfvoca de the dar resposta. Se, por urn lado, a exigéncia da avalia-
çào negativa. Por 6ltimo, porque no restrìngem as funçöes da universidade na medida çäo parece estar em contradiço corn a autonomia universitéria, por nutro lado, parece ser
das nstriçöes orçamentais, os cortes tendem a induzir a universidade a procurar mejas desta o correlato natural. A universidade tern tendido a ver sobremdo a contradiçAo e a
altemalivos de fmanciamento, para o que se socorsern de um discurso aparentemente con- assumir urna posiço defensiva, lraduzida no accionamento de vários mecanismos de dis-
lradjtório que salienta simultaneamente a autonomia da universidade e a sua responsabili- perso. Por sua vez, urna tal posiçäo tern impedido a universidade de assumir um papel
dade social. mais activo na fixaço do sentido e dos critérios de avaliaço. So reconhecidas as mdlii-
Este último efeito liga-se corn o segundo factor da crise institucional da universidade: pias dificuldades da avaliaço do desempenho funcional da universidade. Podem agrupar-
a desaceleraço da produtividade industrial. Qualquer que tenha sido o
diagnóstico deste -se em três grandes problernéticas: a definiçâo do produto uaiversitrio, os eritérios da
fenómeno, a terapéutica centrou-se desde cedo na investigaço cientifica e tecnológica, e avaliaço e a titularidade da avaliaço.
a pailir desse momento a universidade viu-se convocada a urna participaço so
mais activa Quanto à definiçïo do produto da nniverxidade, as dìficuldades o correlato da
fia luta peia produtividade industrial. Vimos
ars que a universìdade reagiu a essa convo- rnuliiplicidade de fms que a universidade tern viudo a incorporar e a que acima fia refe-
caço seguindo urna estratégia de rninimizaço do risco de perda de hegemonia. Em face rancia. Pesante tal multiplicidade perguntar-se- qual é o produto da universidade ou
dos coites orçamentais no admira que entre os beneffcios esperados dessa pai1icipaço sequer se iaz sentido falar em produto. Corno afirma Bienaymé, a variedade de produtos
os financeiros tenham sido os mais acarinhados. No entanto, os fluxas provindos das esperados da universidade é tal que torna io difícil exigir que a universidade os produza
ernpreas porque subordinados ans critérios de rentabilidade do investimento próprios da todos corn a mesma efithcia corno estabelecer entre eles urna hierarquia inequ!voca
indUstria, acaharam por exercer urna presso, convergente corn a dos cortes A
orçamentais. (Bienayrné. I986 produçan e transmissäo do conhecimerno cienrifico, a produ-
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no sentido da avalìaço do desempenho da universidade. Por outras palavras, do CVISION PDFCompressor
a participa-
da formaçäo
106).
Irabalbadores qualificados, a nivel cultural sociedade, a
18 Pela Mao de Alice. O Socéal e o Político ,a PósModernidade Da ¡deja de Universìdade à (J,iìversidade de ¡dejas I 89

du carácter, a ¡dentificaçào de lalenios, a partcipaço na resoiuçAo dos problemas sociais ainda que de tipo especial, e consequentemente em conceber a univenddade como urna
são produos, nâo sO mule variados, como dfkeis de definir. Aths, como deixe djo organizaçAo empresarial. Este viás está boje muito difundido e a sua vig&icia incontro-
atrS a pmduço de um deks colide frequentemene corn a de um outro, pdo que, se no 'ada representa um perigo importante pana a autonomia institucional da universidade.
for estabdecida urna hierarquia. a universdade esarI sempre aqum do desempertho ade- O go deriva basicamente de dois vectores: o ciclo do produto e o processo da sua
quado em alguns desees produto.s. Questionve! aiiìda se se pode aIar de «produtos» em produçAo. Quanto an primeiro vector, o ciclo do produzo, o peiigo resufta de o produto
aguns dos desempenhos, como, por exempb, a formaço do caracter ou a e1evaço do industrial terum ciclo muito mais curto do que o do produto universitrio. A 1óica da
níve culturaL Pode mesmo entender-se que o uso do termo «produto» e produçk» rentabilidade do invesiimento Lende a favorecer o curto prazo em detriniento do longo
envolve a opço por urna meulfora economicista e materialis!a que introduz um enviesa- prazo e por isso só wn número reduzido de empresas faz investimento estratégico, mien-
mento de base na avaliaço do desempenho da universidade. lado para o módio ou longo prazo. A aplicaçan desta lógica ao desempenbo da universi-
Esta questo prende-se corn a dos critérios de avaliaçäo. Neste dominio, a dificukJade dade tende a fávorecer utilidades de curto pnazo, sejarn elas cursos curios em deiÑnento
maior está em estabelecer medidas para a avaliaçäo da qualidade e da eficácia. Mesmo de cursos 1ongos formaçes unidireccionadas em deinmento de formaçies complexas,
aceitando que a univeisidade produz «pmduos». é reconhecido que mullos deles nao so investigaço competitiva em detrimento de investigaçäo prd-competiEiva. reciclagem pro-
susceptíveis de mensuraçào directa. Como medir a formaço do cancter ou mesmo o pro- fissionalem detrimento de e1evaço do nIvel cultural, etc., etc. E isto é tanto mais pen-
gresso científico? No M medidas directas, e mesmo o recurso a medidas indirectas nao goso quanto é Cerio que, como rderirei adiante, a universidade é urna das poucas instiwi-
deixa de levaivar alguns problemas. Mencionarei dois. o quunthativismo e o economi- çòes da sociedade contemporánea onde é ainda possível pensar a longo prazo e agir em
cismo. funçao dele.
Peranoe a inefabthdade das qualidades inscritas nos pmdutos a avaliar os agentes e A presslo do curto prazo tern um impacto institucional muito específico, pois conduz
instituiçôes avaliadoras tendem a pnviiegiar as medidas quantitativas, um procedimeluo a reestruturaçôes que visam adequar a actividade universitária às exigencias da lógica
bastante familiar aus cientisus sociais, desde há multo confrontados corn a necessidade empresarial. É este, de resto, um dos impactos da ligaçao da univensidade indústnia que

de operacionaÍiar os conceios e esEabeecer indicadores do comporlamento das variveis mais atençao merece. Tal ligaçäo nada tern de negativo, antes pelo contrário3, se a
seleccionadas. E no enIanto hoje reconhecido que a qualidade transborda sempre das lógica institucional da universidade for respeitada. Acontece, porm. que o discurso
quantidades em que operacionaizada. Tomemos um exernpo. Perante a verificaço de dominante sobre os beneficios de tal ligaçao tende a pôr em confronto as duas lógicas ins-
que a França produz mais dpIomas universitários que a Alemanha. apesar de possuir urna tiwcionais e a desvalorizar a lógica universitária naquilo em que cia no coincide corn a
taxa de enquadramento (número de ajunos por docente) muito inferior (23 na França; 9 lógica empresarial. É. aliás, ilustrativo da perda de hegernonia da universidade o facto de
na Alemanha) (Bienaymé, f986: 3 17). fci será concluir que o sistema universiário o discurso da ligaçào universidade-indústria propor a submissao da lógica da universi-
francês é mais eficaz que o aemao. No entanto tal condusäo nada diz sob a qualidade dade à lógica da indUstria, e nao o Contrário, como seria pensáve! noutro contexto4.
dos dip'omas, o nivel de exceRncia exigido ou o impacto do tipo de formaçan no desem- O perigo da desvalonizaçäo da especiticidade da universidade torna-se ainda mais cvi-
penho profissiona dos diplomados. I certo que qualquer destes factores pode ser, por sua dente quando se tern em conta o segundo vector, o processo de prodaçäo. A universìdade
VC4 operacionalizado em indicadores quantiathos. mas, pelos mesmos motivos, acabará é urna organizaçâo trabaiho-intensiva, isto é, exige urna mobilizaçao relativamente grande
por reproduzir, no seu âmbìto, a irredutibilidade da qualidede à quanidade. de força de tnabalho (docentes, funcionánios e estudantes) quando comparada corn a
o problema do quantitalivismo nao se pe apenas ao nIvel da fa1bilidade dos indica- mohilizaçAo de outros faetones de produçao. Isto significa que. à luz dos critórios de.pro-
dores. O recurso à operacionaiizaçäo quanitaiva eva inconscientemente a privilegiar na dutividade vigentes na sociedade capitalista, a produtividade da universidade sera sempre
avaliaçäo os objectivos ou produtos mais facilmente quantificáveis (Simpson, 1985: 535). inferior à de urna organizaçäo capital-intensiva, como tendem a ser as empresas mais
Por exemplo, por essa razao, pode fazer-se ncidir a avaliaçao na produçao de conheci- directamente interessadas na ligaçäo corn a universidade. Se a universidade nao puder
montos científicos (medida pelo número dc publicaçòes) em detrimento da formaçao do impon, como pressuposto de base, o principio de que a su produtividade, enquanto orga-
carácter dos eswdanes. Por nutro 'ado, a interioriaçao, no sein da comunidade universi- rnzaçao, será sempre inferior It produtividade que cia pode gerar noutras onganizaçes
tiria, da avaliaçâo quaniitaiva pode distorcer as prioridades científicas dus docentes e
nveMigadores. Como afirma Giannoni se Frederico o kande tìvesse exigido quarenta I 3. Nesle sernido. denrificando as a]ernaLvas entre d1eJ(CS suemas dc ligaç5o à idûstria e suas

«papers» para recontratar Kant para a cadeira de Filosofia, em Königsberg, Kant nao tena dades pant enfraquccer ou, pelo conmo, fortaer a posiço da urnversdade, cfr. Connor, Wylie. Yoeng

tido tempo para escrever a «Crítica da Razo Pura» (Chaui e Giannotti, 987: A 21). 0 (9S6).
A omparaçRo et'Turas orgnuzacionai das universidades e das empresas começa hoje a ser m
quanttativismo esta huimamente Jigado corn o economidamo. Na sociedade contemporâ- 14. entre

tema de inveIìgçRo. So,re a comparaçRo da pr1icas e paearneno CStragiCO. cfr. Xey e Shaw
nea, o arqu&ico do produto social definido quantitativamente o produto industrial. O
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Mkit
economicismo consiste em conceber o pn,duto universitárìo como um pmduto industñal,
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Sobt a especifìcidde s*ruIuras or5anizatìvas da rnivesdade, c ( 1977). ('fr. anda Gokisthmidi

I9R4 Etzkow (f983).


' Pela Mäo de Alice, O Social e o Pôlltico na PósModer,idade Da !dek de Universidade à Universidade de Idelas

'rre o r1S de se deixar descaracterizar ao ponto de a ligaçäo universidadeindústa se res condçOes para negociar participativamente os objectos, os critdrios e a titularidade da
u'ansorrnr numa ligaçäo ìndiisrja-indústrja. avaliaçäo. Se é certo que a perda de hegemonia da universidade contribuiu para justificar
Este I'tSCO OfldUZ-flOS direciamenie an terceiro grupo de dificuldades na avaIiaço do junto das agências fnianceiras, e sobretudo do Estado, a exigência da ava1iaço. nao é
desernpetthn da universidade, as que decorrem da definiço da thularidade da avallo çáo menos certo que. perante o público em geral, tal exigéncia ests vinculada à crise de legiti-
Estas são ti1vei as di&ukiades mais dificilmente contornveis e, tainbm pot issu, aque- midade da universidade. Efectivamente, numa sociedade democrática parece evidente
as em que a atitude defensiva da universdade mais se tern evdencjado. De facto, a qucs- que a universidade dê conta dos fundos ptlb!icos, apesar de tudo significativos, que
tào da inilaxidade da avaliaçäo é a que mais directamente confronta a autonomia da uni- abSOTVe, fundos, cfi grande medida, provindos dos impostos pagos pelos cidadäos. Em
versidade. Hoje mais do que nunca, seri fácil à universidade pública reconhecer que, se a vez de enfrentar esta exigência, a universidade pública, SObretUdO europela, tern v'mdo a
dependéncia exclusiva do orçamento do Estado a onerou corn subordinaçöes e submis- evitá-la sob múltiplos pretextos e recorrendu a formas variadas de resistência passiva. O
sôes gravosas e hwnimantes, sobremdo em épocas de crise social ou politica, por outro perigo desta atitude ests, entre outras coisas. na oportunidade que pode dar às universida-
1ado grangeou-the aguns espaços de autonomia que agora, em perigo de perd-1os se des privadas para justificarem, sob os mesmos pretextos, a recusa a sereni avalladas. Num
the afiguram preciosos(5). Por outras paavras, a recente autonomia em reaçAo ao Estado, período em que as universidades privadas se multiplicam e absorvem fundos públicos
decorrente da liberdade pais procurar e gerir recursos doutras provenlências, redunda em cada vez mais importantes, a falta de transparência neste sector da educaço universitifria
dependencia em relaçäo Ros novos fmanciadores. Acresce que o vetho fmanciador, o pode dar origem a formas de concorrncia desleal de que as universidades públicas aca-
Estado ao mesmo tempo que procura desonerar-se da responsabuidade de financiar em baro por ser as maiores vftimas.
exdusvo o orçamento da universidade, tern viido a tomar-se mais vigilante e intromissor A posiçäo defensiva, «dispersiva», da universidade ueste dominio tern urna justifica-
no que respeita à aplicaço e gesto dus financiainentos que ainda mantm. çäo plausivel: a universidade no tern boje poder social e político para impor condiçöes
Por todas estas razöes, a universidade *se confrontada corn urna crescente presso que garanLam urna avaliaço equilibrada e despreconceituosa do sen desempenho. Tal
para se deixar avaliar, ao mesmo tempo que se acumulam as condiçöes para que the impot&tcia é. como vimos, a outra Ñce da perda de hegemonía. Mas, tal como referi, a
escape a fitularidade da avaliaçào. A titulatidade da avaIiaço pöe-se sobretudo quando se gestào da crise de hegemonia deixa alguma rnargern para lutar contra tal impotencia.
trata de avaliaç6es g1obais avallaç5es de departamentos, de faculdades ou mesmo de uni- Trata-se, dc facio, de urna questo política, por mais que as exigências da avaliaço sejarn
versidades no seu todo. Nestes casos, a auto-avaiiaçäo, embora possível e desejve1, nio formuladas em termos tecnocniuicos (eficiencia; conhecimento do produto universitério;
satisfath certamente quem tern mais interesse na avaliaçâo, os fmanciadores, sejam eles gesto racional), e é como questo politica que deve ser enfrentada pela universidade.
plb1ieos ou puyados. Atis, dadas as dependências recíprocas que se criain no inteiior A1ÌáS as abordagens tecnocraticas da problemática da avaliaço escondem a fraqueza
das unidades sob avaliaçào, duvidoso que a auto-avaiaço possa ser mais do que jnstii- politica da universidade, sobretudo da universidade pública Permite isto, a universidade
caçäo das roinas estabeleddas. Dal, a figura do avaliador externo e a ambiva1ncia corn só p0(1cM resolver a crise institucional se decidfr enfrentar a exigência da avaliaço e,
que os departamentos e as universidades a têm ac&tado. para que tal possa ser feito corn sucesso, a universidade tern de procurar coligaçes poifti-

Mas a questäo da tmIaridade nio se levanta apenas a respeito da pessoa ou da filiaçào cast no seu interior e no seu exterior, que fortaleçam a sua posiço na negociaçäo dos ter-

do avaliador mas também a respeito do conole dos cÑérios de avaliaçäo e dos oectos inns da avaliaçuio'6. Se tal suceder, a universidade terá provavelinente condiçes de fazer
de avaliaçäo. Quanto a estes ditimos, o que está em causa é saber se a universidade pode duas exigências que a meu ver o fundamentals. Em primeiro lugar, que seja eh, em diá-
reivindicar ser avahada exclusivamente em funço dos «produtos» que se propôs produ- logo corn as comunidades que the so mais próximas (internacionais, nacionais, locals), a
zrn Se a universidade for avahada à luz de objecivos que nio se propös. ter pedido a em funçào dos quais deve ser avallada. Em segundo lugar, qtìe a
decidir dos objectives
titularidade da avaliaço mesmo que os avaliadores sejarn internos. A referência que avaliaçào externa seja sempre înierpares isto é, seja feita «por sente da comunidade aca-'

acabel de fazer aos diferentes tipos de dificuldades da avaliaço do desempenho fundo-' démica capaz de distanciar-se do clientelismo de cada centro» (Giannotti 1987: 91).
nal da universidade mostra que tais dificutdades são obviamente reals e algumas at insu- Contudo. a autonomia e a especificidade institucional da universidade tern viudo a
peráveìs, mas mostra taxnbém que algumas dehss se devem ao modo como a universidade impedir a busca de tais coligaçôes. No que respeita às coligçes no interior, a «sociedade
tern vindo a enfrentar a questo da avaliaçAo. E, mais urna vez, ë fácil concluir que a nadicionalmente no facilita a consIituiço de
de classes» que a universidade tern sido
universidade se tern Iimtado a dispersar a contradiçâo que v existir entre a avaliaço e a urna comunidade universitria certamente a várias vozes, mas que inclua docentes e
autonomia entre autonomia e produtividade. investigadores em diferentes fases da carreira. estudantes e funcionrios. Tal dificuldade é
Teramos um quadro bern diferente se, em vez de contradço, a uniersidade visse na hoje particularmente gravosa, pois a universidade só pode ser urna força para o exterior se
avaiaçâo a sdvaguarda da sua autonomia. Nesse caso, a universidade estaria em metho-

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dr. Price
mesmo qe amrra's.
(l9ß).
t6. o sentido, ainda corn rcferncia epecí!ica s univesidaks fr. Benveniste
Pela Mao de Alice. O Soci«l e o Politico na PÓs-Modernjdade Da ¡deìa de Unìversidade à Universidade de Ideia 193

posMth urna força interior, e a democi-atizaçAo interna da unversidade é a pr&ondjç falar de crise da universidade mesmo admitindo que tal caracterizaçâo pelo scu uso
dd CtflÇ desta força No que respeita às co1igaçes exteriores, a «torre de marf» indiscrirninado, no seja talvez a meihot Mostrei também que a universidad; longe de
qu 8 universidade também fo durante s&ulos é ainda urna memória simbólica demasja poder resolver as suas crises. tern vindo a gen-las de molde a evitar que das se apmfun-
damcC frnte para pctniith à universidade a procura de aliados externos sern ver nisso dem descontroladamente recorrendo para issu sua tonga mem&ia institucional e às
um perda de presliglo ou urna perda de autonomia. Por estas razôes, iem sido dificil à ambiguidades do seu perfil administrativo. Tern-se tratado de urna actuaço an sabor das
unversdade resolver esia dimensào marcante da sua crise institucional. E porque assim presses (reactiva), corn incorporação acrftica de lógicas socais e institucionais exte-
tern sido, ternse refugiado em mecanismos de disperso que, no caso desta crise, dificil- tiores (dependente) e scm perspectivas de m&iio ou longo prazo (imedialista).
mente poder'o manter contro3ados durante multo tempo os factores que a vào agravando. Penso que tal modelo de gesto das contradiçòes nAo pode continuar a vigorar por
multo mais tempo. As press&s tendem a ser cada vez mais fortes, as lógicas ettemas,
cada vez mais contraditórias, o curto prazo, cada vez mais tirânico. Corn lato, a universi-
Para urna un1versdade de ideias dade seri urna instimiço cada vez mais instável e os scm membros cada vez mais força-
dos a desviar energias das tarefas intelectuals e sociais da universidade para as tardas
Neste capítulo ocupo-me da tmiversídade em gera, tendo sobretudo em mente a unì- organizativas e institucionais. A crise institucional tenderá a absorver as atençöes da
versidade dos países centrais. No me ocupo especificamente da universidade potmguesa. comunidade universiultia e, para além de certo limite, tal conceniraçäo lath corn que as
Adianto, no entanto, que a análise das crises da universídade feita na primeira parte deste outras duas crises se resolvam pela negativa: a crise de hegemonia, pela crescente desea-
capíttilo se aplica em termos gerais e corn adaptaçes à uthvenidade portuguesa. apesar raCteñzaço intelectual da universidade; a crise de legitirnidade, pela crescente desvaloti-
de a modernizaçào desta ter ocorrìdo mais tarde que a das restantes universidades euro- iaçäo dos diplomas universithos. E, pois. uecesthio pensar noutro modelo de actuaço
peiast7. Quanto à crise de hegemonia, pode dizer-se que ela nào assumlu at agora as universitria perante os factores de crise identificados, urna actuaçäo «activa». autónoma.
proporçöes que assumiu nos países mais desenvolvidos, o que tern a ver fundamental- e estrategicantente orientada para o média e longo prazo. Apresento a seguir as teses que,
mente corn o estado intermédìo do nosso desenvolvímento e corn a estrutura do nosso sis- em meu entender, devem servir de brissola nwna tal actuaçâo.
tema industrial. Quanto à crise de egitimidade. cia sé velo a eclodir depois do 25 de
Abtil de 1974 no seguimento da exploso socia', e tarnbém escolar, em que se traduilu.
Por ter eclodido mais tarde que nos países centrais e também por ser suportada por urna Teses para urna umversdade pautada pela clência pôs-moderna
estrutura demografica re'ativamente específica, a crise de legitimidade tern hoje urna
acuidade entre nôs inuito superior à que tern nos países centrais. Quanto à crise institu- 1. A idela da universidade moderna faz parte integrante do paradigma da moderni-
clonai, ela é scm dúvida a que mais atençôes suscita neste momento. A estagnaço ou dade. As rrnthiplas crises da universidade sào afloramentos da crise do paradigma da
mesmo a contracçâo do orçamento estatal da educço tern vindo a submeter a universi- modemidade e sé são, por isso, resohíveis no contexto da resoluço desta 1ltima.
dade a urna austeridade tanto mais difícil de suportar quanto a situaçAo anterior fora
sempre de evidente mediocridade em relaço à das restantes universidades europeias. Tal 2. A universidade constituiu-se em sede privilegiada e unificada de um saber privile-
austeridade, combinada corn um discurso de privatizaço que incita a universidade a pro- giado e unificado feito dos sabetus produzidos pelas três racionalidades da modernidade:
curar fontes alternativas de financiamento que, entretanto, dado o nosso nivel de desert- a racionalidade cognitivo-insirumental das ciências, a racionalidade moral-práxica do
volvimento IndUStriaI são dUlceis de encontrar, coktca a universidade portuguesa perante dimito e da ética e a racionalidade est&ico-expressiva das artes e da literatura. As cien-
dilemas multo mais s&ios do que os que sào enfrentados pelas restantes universidades cias da natureza apropriaram a racionalidade cognitivo-instrurnental e as humanidades
europelas. Talvez. por ¡aso, a universidade pormguesa necessite, mais que a universidade distribuiram-se pelas outras ditas racionalidades. As eincias sociais estiveram desde o
dos paises centrais, de reflectir sobre urna estratégia de longo prazo. É disso que trato inicio fracturadas entre a racionalìdade cognhiivo-instrumentl e a racionalidade moral-
nesta segunda parte. Ciente de que me refiro à universidade em geral, tenho sobretudo -prática. A ideia da Unidade do saber universitrio foi scado progressivamentesubstituida
presente a universidade portuguesa. pela da hegemonia da racionalidade cognitivo-instrumental e portanto, das ciencias da
Na primeira parte deste capítulo, procurei mostrar que o questionamento da wilver- nalureza. Estas representarn, por excelencia, o desenvolvimento do paradigma da ci&icia
sidade. sendo urn fenómeno talvez tilo antigo quanto a própria universidade, tern-sc moderna. A crise deste paradigma n10 pode deixar de acarretar a crise da ideia da univer-
ampliado e intensificado significativamente nos t]timos anos, razo por que é legStimO sidade moderna.

t7- p1%Çeo
Iicìaç5o rnivridde ponuguesa (ao tempo. apcna Uriiversidade Coii
cte 3. Estamos mima fase de transiçäo paradigmática, da ciência moderna para urna ción-
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Caroga 1955).
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(Santos, 1988; 1989b). Trata-se urna fase e resultados
94 Pela Mao de Alice. O Social e o Politico na PÓsMode,püdc4e Da ¡deja de Universidade lJniversjdade dc ¡dejas
I 9

visves. A universdade só sobreviveth se assurnir plenamente esta condiçäo epistem. 7. A aplicaçAo edificante da ciéncia éo lado prático da dupla ruptura
epistemológica.
lógica. Refugiando-se no exercício da «ciência-normal», para usar a terminologia de A revalorizaçáo dos saberes nao científicos e a revaiorizaço do proprio
saber científico
Thomas Kuhn (1970), num momento histórico em que a ciência futurante a «ciencia pelo sun papel na criaçao ou aprofundamento de outros saberes no científicos
implicam
revotucionária», a universidade seth em breve urna rnstituiçâo do passado. Só o longo urn modelo de aplicaço da ciencia alternativo ao modelo de aplicaçäo
tcnica um
prazo justifica a universidade no curto prazo. modelo que subordine o know-how tecnico ao know.how ético e comprometa
a comuni-
dade científica existencial, &ica e profissionalmente corn o impacto
da aplicaçao. A uni-
4. A universidade que se quiser pautada pela ciência pós.modema deverá transformar versidade compete organizar esse compromisso, congregando os
cidadaos e os universitá-
os seos processos de investigaçao, de ensino e de extensäo segundo tres principios: a nos em auténticas comunidades interpretativas que superem as muais interacçòes, em
prioridade da racionalidade moral-prática e da racionalidade est&ico-expressiva sobre a que os cidadàos sáo sempre forçados a renunciar à interpretaçäo da realidade
social que
racionaHdade cognitivo-instrumental; a dupla ruptura epistemológica e a cûaçAo de um ihes dix respeito.
novo senso comum; a aplicaçäo editicante da ciéncia no seio de comunidades interpretati-
vasUt). 8. A universidade talvez a daica instituiçäo nas sociedades contemporaoeas
que
pode pensar até às raizes as raz&s por que no pode agir em conformidade
corn o seu
5. A pnondade da racionalidade moral-pthtica e da racionalidade esi&ico-expressiva pensamento. E este excesso de lucidez que coloca a universidade mima
posiçao privile-
sobre a racionalidade cognitivo-instrumental significa antes de mais que as humanidades giada para ciar e fazer proliferar comunidades interpretativas. A «abertura ao outro» do
e as ciéncias sociais, urna vez transformadas à luz dos principios referidos, devem ter pre- sentido profundo da democratizaçao da universidade, urna dernocraiizaçáo que vai muito
cedéncia na produço e distribuiçáo dos saberes universitários. Isto nAo implica a margi- para alem da dernocratizaçao do acesso à universidade e da pennanéncia
nesta. Numa
nalizaço das ciéncias naturais mas to-s6 a recusa da posiçäo dominante que hoje ocu- sociedade cuja quantidade e qualidade de vida assenta em configuraçes
cada vez mais
pam. A namreza é cada vez mais um fenómeno social e, enquanto tal, cada vez mais complexas de saberes, a legitimidade da universidade só será cumprida quando as activi-
importante. Correspondentemente. o comportamento anti-social mais perigoso tende a ser dades, hoje ditas de extensäo, se aprofundarern tanto que desapareçam enquanto tais e
o que viola as normas sociais da natureza. A investigaçào destas normas e a formaçäo de passem a ser parte integrante das actividades de investìgaço e de ensino.
urna «personalidade de base» socializada rielas deve ser a funçAo prioritária da universi-
dade. 9. Na fase de Eransiçáo paradigrnítica, a universidade tern de ser tambdm a alternativa
à universidade, O grau de dissidéncia mede o grau de inovaço. As novas geraçes
de
6. A dupla raptera epistemológica a atitude epistemolögica recomendada nesta fase tecnologias nán podem ser pensadas em separado das novas geraç5es de prÑicas e imagi-
de transiço paradigmática. A cléncia moderna constituiu-se contra o senso comum. Esta nários socials. Por isso, a universidade, so aumentar a sua capacidade
de resposta, ni'o
ruptura, feita fim de si mesma, possihilitou um assombroso desenvolvimento científico. pode perder a sua capacidade de questionamento.
Mas, por outro lado, expropriou a pessoa humana da capacidade de participar, enquanlo
actividade cívica, no desvendamento do mundo e na construçäo de regras práticas para lo. A diluição da universidade em tudo o que no presente aponta
para o futuro da
viver sabiamente. Dal a necessidade de se conceber essa ruptura como meio e nao como sociedade exige que a universidade reivindique a autonomia institucional
e a especilici-
tim, de modo a recoiher deJa os seus incornestáveis beneficios, sem renunciar à exigéncia dade organizacional. A universidade no podará promover a criaçao de comunidades inter-
de romper corn ela em favor da construçäo de um novo senso comuni. As resisténcias à pretalivas na sociedade se náo as sauber criar no scu interior, entre docentes, estudantes e
dupla ruptura epistemológica seräo enormes, tanto mais que a comunidade entífica nao funcionários. Para isso d necessário submeter as barreiras disciplinares e organizalivas a
foi ireinada para cIa. Compete à universidade criar as condiçöes para que a comunidade urna pressáo constante. A universidade sí resniverá a sua crise instituciOnal na medida em
científica possa reflectir nos pesados custos sociais que o seu eiriquucimento pessoal e que for urna anarquia organizada, fèita de bierarquias suales e nunca sobrepostas. Por
científico acarretou para comunidades soclais bem mais amplas. A primeira condiçäo exemplo, se os mais jovens, por falta de experiéncia, náo podem dominar as hierarquias
consiste em promover o reconbecimento de outras formas de saber e o confronto comuni- científicas, devem poder, pelo scu dinamismo, dominar as hierarquias administrativas.
catìvo entre elas. A universidade deve ser um ponto privilegiado de encontro entre sabe- As comunidades interpretativas internas s6 são possíveis mediante o reconhecimento
tek A hegemonia da universidade deixa de residir no carácter único e exclusivo do saber de múltiplos curricula em circulaçAo no interior da universidade. No se trata de oficiali-
que produx e transmite para passar a residir no carácter único e exclusivo da configuraçäo zar ou de formalizar os curricula informais, mas táo-só de os reconhecer enquanto tais.
de saberes que proporciona. Um reconhecìmento obriga a reconceptualizar a identidade dos docentes, dos estudan-
ial

tes e dos funcionários no rejo da universidade. Sao todos docentes de saberes diferentes.
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is. As
Sobre estes principios. dr. Saraos (19891,).
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argumentativo. hierarquias entre eles ser estabelecidas
196 Pela Mao de Alice. O Social e o Político na PósMo4e,-nidade Da Mela de U,tiversidade d Universidade de Idelas I 97

11. A universidade deve disporse esraegicamente para compensar o mevitavel decI1 PIO, as universidades procuraro celebrar contratos de prestaçao de serviços corn as
nb das suas funçes materials corn o fonalecimento das suas funçes smb6Iicas. Nunia empresas de televiso a serern pagos através da concesso de tempo de aniena). Ao lado
ocjedade de c1asses a universidade deve promover transgresses intemlassstas. Numa das prérnios de investigaçäo no campo da «ciência normai» devem instituir-se prémios de
sociedade à beira do desastre ecoiógico, a univeisìdade deve desenvolver urna apurada investigaçäo no campo da «ciencia revolucionária».
consciencia ecológica. Numa sociedade de festas e prazeres indusüializados, a universi
dade deve pósmodernizar os saberes festivos da pr&modernidade O verdadeiro nercado Para a tese S. A universidade deve garantir o desenvolvimento equilibrado das cien-
para o saber universiirio reside sempre no futuro. cias nalurais, das ciencias sociais e das hurnanidades o que pode envolver, no curto
prazo urna política de favorecimento activo, tanto das ciências sociais. corno das humani-
dadas. No é viável urna universidade que no disponha de aniplas oportunidades de

Disposköes lransitórws e ilurtraçöes investigaçAo e de ensino nestas .reas ou as nào saiba integrar na investigaçao e ensino das
ciencias naturals. A ecologia e as belas artes podem ser catalizadores privilegiados de tal
Pesante um longo prazo que pode ser exaltante, o curto prazo só será mediocre se se integraço. Mas a integraço näo implica a negaço de conflitos. O couffito entre as cien-
deixar medir por si mesmo. Para que tal no suceda, aponto. a seguir. scm qualquer preo. cias e ashumanidades é um des conflitos eulturais mais mareantes do flesso tempo e a
cupaço de exaustividade, algumas disposiçöes transitOrias corn as respectivas i1ustra universidade nAo tern querido até gora enfreniá-Io até às últimas consequênciasU9).
çes. Algumas das disposiçâes so verdadeiramente de cuita prazo, outras só o seräo apa Activistas raclais (sobretudo os activistas sociais da natureza), artistas e escritores
rentemente. O sen carácter prograrnático e, por vezes, provocatóno. visa apenas Suscitar o devem ser urna presença constante nas actividades curriculares de investigaço e de
debate sobre os problemas que me parecem mais impar1antes Por isso, as soluçöes ou omino, pois que as normas sociais da natureza nilo so dedutíveis da «ciencia normal».
ilusiraçöes aqui pmposas devem ser entendidas como ficçöes que ajudam a formular a Seudo certo que as actividades ditas «circum-escolares» dos estudantes tendem a privi-
realidade dos problemas. legiar a intervenço social, humanística, artística e literria, a universidade deve deixar de
as fazes- girar lì sua volta e, pelo contrário, tomar medidas para girar em volta dalas. Para

Para as em geral. O grande perigo para a universidade uns próximas dcadaS é


leser, isso, a universidade considerará os estudantes nelas envolvidos como docentes e investiga-

o de os dirigentes universitrios se limitarem a liderar inércias. As grandes transforma- dores de tipo novo (animadores culturais) e valorizará adequadamento, no plano escolar,

çòes näo podem ser postas de paiie só porque a universidade criou a sen respeito o mito os seas desempenhos. Em multas áreas, será possivel substituir as formas de avaliaço

da formabilidade E de prever que a curto prazo a crise institucional monopolize o normal pela avaliaço do aproveitamento social ou artístico dos conhecimentos adquiridos.
esforço reformista. A discusso em anos recentes, dos estatutos das universidades poitOE Deve promover-se o envolvimento de docentes, investigadores e funcionários nas

guesas é disso exemplo. O impoitante é que tais estatutos sejam concebidos como «dispo- actividades escolares de tipo cinum-escolat A atribuiço de beneffcios profissionais liga-

siçles transitérias», como soluçoes facilitadoras dos objectivos aciina enunciados. dos a tal envolvimento deve depender da avaliaço dos desempenhos.

Para as teses J. 2 3 & A universidade deve promover a discusso transdisciplinar Para a tese 6. No curto prazo, a dupla ruptura epistemolégica sera sempre assimétrica

sobre a crise do paradigma da modernidade e, em especial. da ciéncia moderna. sobre a e a universidade estará multo mais à vontade na execuço da primeñ ruptura («ciéncia
transiço paradigmtica e sobre os possiveis perfis da ciência pös-modema. Deve procu- normal») do que na execuço da segunda ruptura («ciencia revolueionria»). Nas socieda-
mr-se que a discusso inclua desde o infcio, dentistas naturais, cientistas sociais. e inves- des corn menor nivel de desenvolvimento científico, como é o caso de Portugal, admite-se

tigadores de estudos humanísticos. Por se tratar de urna discussAo de iniportância vital mesmo que as universidades déem temporariamente prioridade à primeira rapture, desde
para o futuro da universidade, deve ser contabilizada como actividade cunicular nOrma! que o façam tondo sempre em vista que se trata da primeira ruptura e no da única ruptura.
(tempo de investigaço e de ensino) dos docentes e dos investigadores que nela se envOi-
I
verem. 9. No mesmo sentido, cfr. Graft, que acrscenta que apes-ar da sua imponencia o confitu eure cências e
Esta discussio deve corneçar no seio de cada universidade e servir de estúmlo à cons- bumanidadcs nao faz pane dos tcmas de investígaçAo rem das rincìas rem das humaidadcs O confitu ao
tituiço de vrias comunidades interpretativas corn posiçôes diferentes, e at antagónicaS esflkdado ponIuc flSO especiadade de ningum -ou entAo estudado (por uns pouces) porque espcaìdade
sobre o tema em discusso. Deverll, posteriormente, envolver outras universidadeS insti dc lodos* (Graff, 985: 70) tIm desses estudoa icizo pIo 'ado das humanidades, podc ter-se em Hatmaa
(1979). Reconhecei c assumir rsse cunfliw deve. couudo. ser cncndido como pimeiro pasao dc una aütude
tuiç5es de ensino, associaçöes científicas. culturais e protissionais.
eetnolÓgica muito mais ambiciosa. a dupla nipnua episeinoôgica. de cujós laboies Iano a ciencia moderna
Os primeiros resultados das discussöes devero ser ampiamente divulgados para sei- como aa hwnanidade. aflna. igua1mene modernas, emergitão profuodmeite tmosfonuadaa Näo admira. pois.
vjrem de premissas para novas discussies ainda mais amplas. A divulgaçao seri multi- qoe a coocepç5o de humanidades defndo defeodida por Aflan Bkiom
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média. Os custos de tal divulgaço podem ser cobertos por meios ¡novadores (por exem
um prmtrabaho (1958), conrase qoe será lemade
ue eu esteja nos antípodas da que
98 ' Pela Mao de Alice. O Social e a Político 'w Pós-Modernidade Da Jdeia de Universidade à Uoìver4dde e Ll'ias 199

A dupla ruptura epstemo1ógica deverá pautar-se pdo princfpo da equiva1&ja dcj grupos sociais sera capacidade de remuneraçàn. Deve evitar-se a todo o custo que os
saberes às kas sociais em que sâo oñgnados. A prática social que produz e se serve «servicos à cornunidade» se reduzam a serviços à indtistria. A universidade deverá criar
do saber cienUfico é urna prática entre outras. A universidade deve participar na defmiçc espaços de interacçAo corn a comunidade envolvente, onde seja possível identificar even-
das virtualidades e das limites desta prática no contexto doutras prticas soclais onde se tuais actuaçôes e definir prioridades. Sempre que possível, as actividades de extensäo

gerani outras formas de conhecimerno: téCflCQ quotidiano, artístìco religioso, onírico, devem inchiir estudantes e mesmo funcionáños. Devem ser pensadas novas ftn-mas de
itergrio, eec., etc. «seTviço cívico» em associaçöes cooperativas e comunidades. etc., etc. A avaliaço
As configuraç5es de saberes sAo sempre, em útthna insthnca, configuraç&s de práU- destas actividades deve dar atençAo privilegiada au desempenho do know-how ético, à
cas soclais. A democratzaço da universidade mede-se pelo respeito do piincfpio da anlise dos impactos e dos efeitos perversos e sobreludo à aprendizagem concreta de
equivalência dos saberes e peto âmbäo das prátcas que convoca em con1îuraçes moya- outros saberes no processo de «extensão».
doras de sentido. A universidade será democrfica se souber usar o seu saber hegemónico oaprofundamento deste conteódo edificante numa aplicaçao ainda predominante-
para recuperar e possibilitar o desenvolvimento autónomo de saberes nao-hegemónicos, mente técnica deve prosseguir corn a abertura preferencial da universidade (das suas salas
gerados nas práticas das dasses sociais oprimidas e dos grupos ou estratos sociainente de aula e dus sens laboratórios, das suas bibliotecas e das suas instalaçôes de recreio) aus
discriminados. membros ou participantes das associaçes ou acçôes sociais em que a universidade tenha
Um novo senso comum estare em gesaçào quando essas classes e grupos se sentirem decidìdo envolver-se. A avaliaçào desta abertura deverá ser feita de modo a premiar tanto
competentes para dialogar corn o saber hegemónico e, vice-versa, quando os universitá- os processos em que a competência em saberes no cientificos se sabe enriquecer
ños começarem a ter consciêncía que a sua sabedoria de vida no malor peto facto de enquantO tal no contacto comuflicatìvo e argumentativo corn a competência em saber
saberem mats sobre a vida, urna consciencia que se adquire em práticas situadas iias fron- cìentffico, como os processos em que a competência em saberes científicos se sabe enti-
teiras da competência profissional. Para tais situaçôes-limite nAo hâ receitas nem iiner- quecer enquanto ta! no contacto comunicativo e argumentativo corn a competência em
ríos. Cada um constrói os seusk sabores nAo cient(ficos.

Para as teses 7 e 8. As chamadas actividades de extenslto que a universidade assumlu Para as teses 9 e W. A universidade d a instituiçào que Ras sociedades contemporâ-
sobretudo a partir dos anos sessenta constituem a reaiizaçiio trastada de um objectivo neas nielhor pode assumir o papel de empreslrio schumpeteriano, u ernpreendedor cujo
genufno. NAo devem ser, portanto. pura e simplesmente eliminadas. Devem ser transfor- sucesso reside na «capacidade de razer as coitas diferentemente». (Schumpeter, 1981;
madas. As actividades de extensAo procuraram «extender» a universidade scm a transfor- 131 e SS.). Corn o aumento da complexidade social e da interdependência entre os dife-
mar; iraduziram-se em aplicaçöes cnicas e nAo em aplicaç&s edificantes da ciência a rentes subsistemas sociais, os riscos e os custos da inovaçAo social (industrial ou outra)
prestaço de serviços a outrem nunca foi concebida como prestaço de serviços à pnípiia serâo cada vez malores e cada vez mais incomportáveis para as organizaçôes sociais e
universidade. Tais actividades estíveram, no cutanEo, ao serviço de um objectivo gennino. politicas que a têm promovido. sejam das os partidos, os sindicatos ou as empresas.

o de cumprir a «responsabilidade social da universidade», um objectivo cuja genuinidade, A autonomía institucional da universidade, o facto de dispor de urna populaçào signifi-
de resto, reside no reconhecimento da tradicional «irresponsabilidade social da universi- cativa relativamente distanciada das pressöes do mercado, das prestaçôes sociais e polti-
dade». cas, e anideo facto de essa população estar sujeita a critórios de eficiência muito especfi-
Deste núcleo genuino, e por pequenos passos. se deve partir para transformar as acti- cus e relativamente flexveis. fazem corn que a universidade tenha potencialidades para ser
vidades de extensäo at que eas transformem a universidade. O envoivimento da uthver- um dos equivalentes funcionais do empreendedor liquidado pela crescente rigidez social.
sidade corn a indústria na luta pelos acréscimos de produtividade nAo deve ser enjeitado, Para que tal potencialidade seja concretizada. a universidade tern de fazer co1igaç.es
mas os serviços a prestar devem ter sempre um conteúdo de investigaçAo forte e os bene- políticas corn os grupos e as organiraçies em que a memória da inovaçào esteja alada
ficios financeiros que eles proporcionain só em pequena medida devem ser atribuidos aus presente. A promoçào das comunidades internas e o reconhecimento dos curricala infor-

decentes ou investigadores directamente envolvidos e, pelo contrário, devem engrossar maIs visa formar urna universidade a varias vozes e corn mlltiplas aberturas para coliga-
um funde comum corn que a universidade Imancia prestaçoes de serviços em ureas ou a çòes alternativas. Sem estasi a autonomia da universidade pode ser o veículo da sua sub-
missAo a interesses sectorials dominantes. e, como tal, afeitos au que existe e hostis à
20. Pa mm.
siwças-lmift mais thsmaìvas foram as do periodo (t970) em que passei eure os inovaçAo social. O medo que isto possa estar a ocorrer na universidade portuguesa no d
t)S (b RìodcJejro(Sanios. 95fl, a
injustificado.
çñe corn o Movimento ds Forças Azrnadas &risc o periodode 1974-75 (San1O, 1955), operfo10 em qc par-
ns alde e baims das haS de Catx' Verde, a sabedorìa jurtdica popular das triburais de zona (SamOS.
It4) e de rudo, a minha prca de ìntc anos enqusuo sócio fIe urna cooperativa de pcqenos agiicU1O Pafa Li tese ¡I. A mora permanência institucional da universidade f corn que a sua
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Produçto Agro-Pecuriade
a de Barcouço (COBAR). using a watermarked evaluation copy of CVISION PDFCompressor
existenCia material tenha urna dirnensào simbólica particularmente densa. Esta dirnensão
PiIa Mao de Alke. O Social e o Político na Pó$-Modernidcde Da ldeia de Universidade . Universidade de Ideias i

um recurso rnesflmávei. mesmo que os sfmboks em que se em traduzido devam ser KELLY, Noel e Robin Shaw (1987), «Strategie planning by academic insitutions-following the
.,ijbsttudos. Numa sociedade desencarnada, o re-encanamento da universdade pode ser corporate path», Higher Education, 16: 319.

tirna das vias para smbo1izar o futuro. vida quotidiana unversitáiia tern um torte corn- KERR. clark (1982), The tsex ofthe Universfty, Cambridge, Masa.: Harvard University Press.
qr
neflte hdco que favorece a transgressäo simbólica do que existe e racional só porque KUHN. Thomas 970). The Srruciare Scientific Revolutions, Chicago University of Chicago
( I

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9
SUBJECTIVIDADE, CIDADANIA E EMANCIPAÇAO

Introduçao

Se complexa a relaçio enta subjectividade e ckadania, i-ø ainda mais a reaçâo


entre qualquer delas e a emancipaçAo. Porque a conste1aço ideo1ógca-cuUura hegem
nica do fun do sécido parece apontar para a reafìrmaçAo da subjectividade(» em detti-
mento da cidadania e para a eafirmaçâo desigual de ambas em detrimento da emancipa-
çäo, toma-se urgente subnieter a urna anise crftica as relaçöes entre estes fl-ês marcos da
histéria da modernidade. Urna tarefa particularmente urgente para aqueles que se identifi-
cam corn o que nesta conste1aço é a&mado scm contudo se poderem identificar corn o
que nela é negado ou neigenciado.
Foucault tern certamente razo ao denunciar o excesso de controle socja produzido
pek poder disciplinar e pela nonnalizaçAo técnico-científica corn que a modernidade
domestica os corpas e regula as popuaçôes de modo a maximizar a sua utilidade social e
a reduzir, ao mais baixo custo o seu potencial po'ítico. A denúncia de Foucau1t corn toda
a sua originalidade, insere-se numa tradiçäo de reflexAo crítica sobte a modemidade que
se esiende da «lei de ferro» da racionalidade bumerática de Max Weber aé «sociedade
administrada» de Adorno e à «co1onizaç do mundo da vida» de ilabermas. Penso, no
-
entanto, que Foucauh e, de certo modo, também Adorno e Horkheimer, ainda que corn
urna argumentaçAo e urn diagnóstico muito distirnos - exagera ao thscrever esse excesso
de regulaçAo na matriz do projecto da modernidade. a ponp de fazer dele nao s6 o dnico
resukado, mas também o único resultado possfvel deste projecto. No quano capítulo pro-
curei mostrar que o projecLo da modemidade . caracterizado, em sua matriz. por um equi-
Iíbrio entre regu1aço e emancipaçäo. convertidos nos dois pilares sobre os quais se sus-
tenta a transforniaçäo radical da sociedade pré-modenia. O pilar da regu1aço é consti-
tuldo po tres principios: o principio do Estado (Hobbes), o princípio do mercado (Locke)

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a subjectividade airavessa
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cutttwa, da fiIosofa tFrtnk.
d t955; Fk
RIet, van ejen. t988) s artes (Kuspit. 98
Pela Mao de Alice. O Sociai e o Politico na P6-Modernidade Subjectividade, Ckladania e Emancipaço 205

e o princIpio da comunidade (Rousseau). O pilar da emancipaçAo é constituIdo pela aiii parte deste, do principio do Estado e do principIo da cornunidade, de que a reaganomics e
culaçäo enire rês dimensöes da racionalizaçAo e secu1arizaço da vida colectiva: a rado- O thatcherismo so chocantes manifestaçÖest2.
nalidade moral-piitica do direio moderno; a racionatidade cognitivo-experimenta da A teoria politica liberal a expsso mais sofisticada deste desequilibrio. Lia repre-
ciencia e da cnica modernas; e a racionalidade est&ico-expressiva das artes e da litera- senta, no plano politico. a emergencia da constelaço da subjectividade e como bem nota
tura modernas. O equilibrio pretendido entre a regulaço e a emancipaço obtém-se pelo Uegel, confronta-se desde o início corn a necessidade de compatibilizar duas subjectivi-
desenvolvimento harmonioso de cana um dos pilares e das relaçies dinämicas entre eles. dades apare1temente antag6nicas: a subjectividade colec*iva do Estado centralizado (Ich-
Mostrei tambm que este equilibrio, que aparece ainda como aspiraçâo deca1da, na KoIIektivitït) e a subjectividade atomizada dos cidados autónomos e livres (kh-Jndivi-
máxima positivisia da «ordern e progresso». no foi nunca conseguido. A medida que a dualität). A compatibilizaço ¿ obtida por via da distinço entre Estado e sociedade civil
trajeciória da modemidade se identificou corn a trajectória do capitalismo. o pilar da e do conceito-ficço do contrato social. O Estado sendo embora um sujeito monumental,
rngutaço vejo a fortalecer-se à custa do pilar da emancipaçAo num processo histórico no visa to-só garantir a segurança da vida (ilobbes) e da prapriedade (Locke) dos indivi-
linear e contraditório, corn osciIaç4es recorrentes entre um e outro, nos mais diversos duos na pmssecuço privada dos seas interesses particulares segundo as regras próprias e
campos da vida colectiva e sob diferentes formas: entre cientismo e utopismo, entre libe- naturais da propriedade e do mercado, isto da sociedade civil. Sende os cidados livres
ralismo e marxismo, entre modernismo e vanguarda, entre reforma e revolução. entre e aut6noinos o poder do Estado só pode assentar no consentimento deles e a obediència
corporativismo e Iuta de classes. entre capitalismo e socialismo, entre fascismo e demo- que the é devida só pode resultar de urna obrigação auto-assumida, isto do contrato
cracia paiticipativa, entre doutrina social da Igreja e teologia da libertaçäo. social. Transformada por múltiplas metarnorfoses -- do anarco-liberalismo de Nozick

Como vimos, o desequilibrio entre reulaço e emancipaço e o consequente excesso ( 1 974) quase social-democracia de Rawis (1972) -a
teoria política liberal tern vindo a
de regulaçAo em que veio a saldar-se resultou de desequilibrios, tanto no seio do pilar da vigorar at nos nossos dias e pode mesmo direr-se que, no período do capitalismo desor-
regulaçäo como no da emandipaço. For um lado, no pilar da ernancipaçAo, a racionali- ganizado em que nos encontramos, conhece um novo aIento sustentado pela reernergn-
dade cognitivo-instrumental da ciência e da tecnica desenvolveu-se em detrimento das cia do liberalismo económico. Dal a importância dc desocultar alguns dos seus pressupos-
demais racionalidades e acabau por colonizá-las, urn processo corn maltiplas manifesta- tos pelo rnenos daqueles que se me afiguram mais importantes para a argumentaçäo
çôes, desde a raduço It ciencia jurídica dogmática da riquíssima tradiçâo de reflexo filo- deste capítulo.
söfica, sociológica e política sobre o direito at s várias oficiaUzaçes do modernismo Em primeiro lugar, o piincípio da subjectividade muito mais ampio que o principio
nas artes, de que so exemplos sa!iente na arquitectura, o estilo internacional e Brasilia, da cidadania. A teoria liberal começa por teorizar urna sociedade onde muitos -- no inicio,
reduçöes grosseiras das pesquisas utópicas de Le Corbusier, democracia de massas e ao
t -
a maioria dos individuos livres e autónomos que prosseguem os seus interesses na
poder abstracto da tecnocracia. A hipertrofia da racionalidade cognitivo-instrumenta sociedade civil no são cidadaos, pela simples razo de que nAo podem participar polin-
acarretou a propria transformaço da ciencia moderna atravs da progressiva hegemonia camente na actividade do Estado. As sociedades liberais níio podem ser consideradas
das epistemologias posi-tivistas, urna transformaçäo que. se nao foi determinada pela democthticas serdlo depois de termo adoptado o sufrágio universal, o que nao acontece
converso da ciencia em força produtiva no capitalismo. leve corn eta fortissimas afinida- senlO no nosso scu10 e, na maioria dos casos, já corn o sculo bem adentrado (scm

des electivas. Tratei desta causa do excesso de regulaço noutro lugar, pelo que no me esquecer O caso da Suíça, onde as mutheres sé adquiriram o diremo de voto em 1971)().
.

deterel nela aqui (Santos. 1989; 1991). Neste capítulo, darci atenço privilegiada ao dese- Em segundo lugar, o principio da cidadania abrange exclusivamente a cidadania civil
quilíbrio que ocorreu no pilar da regulaço. e política e o set' exercício reside exclusivamente no voto. Quaisquer outras formas de
participaçao política so excluidas ou, pelo menos, desencorajadas, urna restriço que é
elaborada corn sofisticação particular na teoria schumpeteriana da democracia. A reduço
Subjectividade e cidadania na teoria política liberal da participaço política au exercício do direito de voto levanta a questäo da representa-
çAo. A rcpresentaço democnftica assenta na disthncia, n diferencíaço e mesmo na ope-
o desequilibrio no pilar da regulaçâo consistiu globalmente no desenvolvimento cidade entre representante e representado. Kant, no Projecto de Paz Perpétua, de 1795
hipertrofiado do principio do mercado em detrimento do principio do Estado e de ambos (l97O:l artigo deuinitivo) defrniu meihor que ninguém o carkter paradoxal da represen-
em detrimento do principio da comtmidade. Trata-se de um processo histórico no linear
que, nas sociedades capitalistas avançadas, inclui urna fase inicial de hipertrofia total do 2. como rcfcn no quarto cpttuIo, esta peìodzaço diz respeto excluswamente so dcsevotvimento do
mercado. no pertodo do capitalismo liberal; urna segunda fase. de maior equilibrio entre o ;jsmo nos paIses centrais. Só resLe paises posivet faJar hojc. por ccntxaposìçäo a u passado recentc. de

principio do mercado e o principio do Estado sob presso do principio da comunidade O ..capIaJìsmo desMBanizado». No paises percos o capiiahsmo nunca foi organizado ou. aciaivamene,
tioje organizado do qe ruic.
período do capitalìsmo organizado e sua forma política propria (o Estado-Providência); e
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cainamne em
Por u1tìmo, urna fase de re-hegemonizaçlo do principio do mercado e de colonizaço, por
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t98,
3. Cl. a este pmpósìlo PaImar (1955).
imponante pofcto.
livio foi pubhcado I97 e tern, ra ediç5c. dc
206 Pela Mäo de Alice. O Social e o Político na FO-Modernidode Subjectivìdade Cidadania e Emancipaçáo

açAo democrática ao afIrmar que a representatividade dos represenanies é santo maior vado, a teoria liberal esquece o dominio doméstico das relaçòes familiares, um dominio
quanto menor for o scu número e quanio maior for o nthnero dos representados. Pela pró- perimte o qual tanto o dominio privado da sociedade civil como o dominio público do
pria naureza desta teoría da representaçAo e também pela iiiterferêncìa dos Interesses Estado são, de facto, dominios ptblicos. Apesar da sua importância fundamental na
próprios dos representantes, como é boje comummente reconhecido pela teoria política, o reproduçAo social e, muito especificamente na reproduçào da força do Erabalho, o domi-
interesse gera! nAo pode coincidir, quase que por definiçäo. corn o interesse de rodos. nb doméstico é otalmenIe ignorado, é relegado para a esfera da intimidade pessoal.
Por via do carácter no probtemático da representaçäo e th obiìgaçäo pothica em que insusceptivel de ser politizado (fora de qualquer contrato social ou obngaçao política) e
ela assenta, a base convencional do contrato social acaba por conduzir à nauralizaço da as desigualdades que nele tm lugar. além de naturals, sAo irrelevantes ao nivel da relaçäo
política. conversan do mundo numa entidade onde é natural haver Estado e individuos e aiaI Estado-idivlduo.
natural eles relacionarem-se segundo o credo liberal. A natunUizaço do Estado i o A sociedade liberal é caracterizada por urna tenso entre a subjeciividade individual
ouro lado da passividade politica dos cidados a naEuralizaço dos Individuos ¿ o fluida- dos agentes na sociedade civil e a subjeciividade monumental do Estado. O mecanismo
meiflO da igualdade formal dos cidados, o que levou Uegel a afirmar que «o individual ¿ regulador dessa tenso é o principio da cidadania que, por um lado, limita os poderes do
o gera1» concebidos de modo abstracto, os Individuos sAo fungiveis, recipientes indue- Estado e, por outre, universaliza e igualiza as particularidades dos sujeitos de modo a
renciados de urna categorIa universaL facilitar o controle social das suas actividades e, consequentemente. a regulaço social.
Este ponto conduz-me à teeira característica da teoria liberal que pntendo aqul real- No pÑneii período de desenvolvimento do capitalismo, o periodo do capitalismo libe-
car. Esta teoria representa a1ta marginalização do principio da cornonidade tal corno é ra!, que cobre todo o século XIX, esta tenso é decidida a favor do principio do mercado,
definido por Rousseau. An contrário do liberalismo dássico, Rousseau nao ve soluçäo que governa a sociedade civiL e os direitos civis e políticos, que constituem entAo o con-
para a anLlnomia entre a 1berda& e autonomia dos cidadaos e o poder de comando do teúdo da cidadania, ndo so incompativeis, antes pelo contrrio, corn o principio do mer-
Estado e, por isso, a sua verso do connato social é multo diferente da do contrato social -J cado.
liberal. Para Rousseau, a vontade genti tern de Ser construida corn a participaçäo efectiva A relaço entre cidadania e subjectividade é ainda mais complexa. Para além das
dos cidadäos, de modo autónomo e solidário, scm delegaçöes que retirern transparência à idelas de autonomia e de liberdade, a subjectividade envolve as idelas de auto-reflexivi-
relaçäo entre «soberana» e «governo». Por esta razo, o contrato social assenta, no dade e de auto-responsabiidade, a materialidade de um corpo (real ou ficticio, no caso da
numa ohrigaço política vertical cidado-Estado, como sucede no mode'o liberal, mas subjectividade jurídica das «pessoas colectivas»). e as particularidades potencialmente

antes mima obñgaço politica horiiontal cidado-cidado na base da qua! é possível infinitas que conferem o cunho próprio e tmico à personalidade. Ao consistir em direitos

fundar urna associaço politica participativa. E, para isso, a igualdade formal entre os e deveres, a cidadania enriquece a subjectividade e abre-Ihe novos horizontes de auto-sea-
cidados no chega, é necesséria a igualdade substantiva, o que implica urna crítica da lizaço, mas, por nutro lado, ao faz-lo por via de direitos e deveres gerais e abstractos
propriedade privada, como, de resto, Rousseau faz no seu Discurso sobre a Origem das que reduzem a individualidade no que nela M de universal, transforma os sujeitos em uni-
Desigualdades. dades iguais e intercanthiáveis no interior de administraçöes burocráticas pdblicas e pri-
A quarta caracterfstica da teoria liberal é que ela concebe a sociedade civil de fonna vadas, receptáculos passivos de estratégias de produço. enquanto força de trabaiho, de

monolítica. A sociedade civil é o mundo do associativismo vohintário e todas as associa- estratégias de consumo, enquanto consumidores, e de estratégias de dominaçào, enquanlo
çòes representarn de igual modo o exercício da lberdade, da autonomia dos individuos e cidadàos da democracia de massas. A igualdade da cidadania colide, assim, corn a dife-

seus Interesses. Clubes, associaçòes. empresas säo asslm manifesiaçôes equivalentes de rença da subjectividade, tanto mais que no masco da regulaçào liberal essa igualdade é
cooperaço, de participaçào e de voluntarismQ. Esta indiferenciaço produz urna dupla profundamente selectiva e deixa intocadas diferenças, sobretodo as da prepriedade, mas
ocultaçäo, urna das faces da quai foi cedo denunciada pelo pensarnento socialista, enquano também as da raça e do sexo que mais iarde vo ser os objectos centrais das lutas igualitá-
a outra só na última década, corn o apmfundamento dos movirnentos feministas, viti reco- rias.

nhecida a sua imponncia. Esta iensào entre urna subjectividade individual e idividualista e urna cidadania
A primeira ocuhaçAo reside em que no capìtahsrno há urna forma de associaçAo directa ou indirectamente reguladora e estatizante perc!orre ioda a modemidade. Sob
«especial» que só cinicamente pode conceber-se como voIuntria e onde a formaço da diversas faunas e corn diferentes consequéndias, da est& na raiz do movimento socia-
vontade assenta na exclusão da participaçâo da esmagadora maioria dos que neta «partid- lista, do pessimismo cultural, de Max Weber, da morte do sujeito em Nietzsche, do pós-
pain», isto é. a empresa enquanto unidade básica da organização económica da produço -perspectivismo do construtivismo russo e da desconslruçäo cubista e, mais recentemente,
capitalista. Porque a empresa esté fora do palítco, a teoria liberal nunca se pôs o pro- na mia das geneologias de Foucault e da reivindicaço feminista de urna forma de igual-
blema de a fonnaço da vontade no lugar do trabalho no se fazer através do voto, corno dade scm mesmidade, compativel corn a afirmaçäo da diferença original da htunanidade
acontece em multas das outras associaçöes da sociedade civil. entre masculino e feminino. Trata-se, pois, de urna iensäo radical que. em meo entender e
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A segunda ocultaço reside em que. an converter a socìedade civil cm dominio pri-CVISIONno caso de PDFCompressor
relaço defenderei adiante, é susceptivel a entre a
20S .' Pckt Mäû Jc 1i-e O Soeiízl e Piilífío PMo/r,i(fd(JC Sbjcctividade, Cidadatua e Eowmipaço 209

subjecuvidade e a cìdadana ocorrer no marco da emancipaçao e nao, como aé aqui, no Acontece. porém. que. do pomo de vista das relaçöes entre as particularidades dnìcas
marco da reguaço. das subjectividades individualse a abstracçäo e universalidade das categorias da socie-

dade política, a eficácia subjectiva da classe operria é, ao nivel da emancipaço. seme-


lhante à da cidadania liberal. ao nivel da regulaçäo. Ou seja, a subjectividade colectiva da
Subjechvidade e cdadana no mardsmo classe tende igualmente a reduzir à equivalência e à inditerença as especilicidades e as
diferenças que fundam a personalidade, a autonomia e a liberdade des sujeitos mdlvi-
A ahemativa marxista. formulada ainda no período do capitalismo libera! mas corn duais. Marx reconhecen isso mesmo mas pensou que tinha a evoluçào histórica do capita-
urna eficáca que se prolonga por lodo o período do capalismo organizado e mesmo. lismo do sen lado. O desenvolvimento das forças produtivas conduiria à proletariaço
rnas matizada, a ao periodo do capitalismo desorganizado em que nos encontramos (ou da esmagadora maloria da populaçlo e à homogeneizaço total do trabalbo, da vida e,

se encontrafli os paSeS cemrais), merece urna refernca especiaL Como referi no quarto portartlo, da consciência dos trabaihadores. O conceito de classe visava precisamente con-
capítulo, o período do capitaìsmo bera é aquele em que se manifesta de forma brutaJ a trapor à homogeneìzaçào reguladora do capitalismo a homogeneizacan emancipadora da
Uquidaçâo do potencia' emanciparôno da modernidade peia va dupla da hegemonzaço subjectividade colectiva dos produtores directos.
da racionalidade técnicocientífica, no egumento da segunda revoIuço industnal, e da Sabemos lioje que o capitalismo no proletarizou as populaçôes nos termos previstos
hipertrofia do princ1po do mercado em detrimento do pdncípio do Estado e corn o por Marx e que, em vez de homogeneìar globalmente os trabalbadores, se alimentou das
esquecimBntO» tota' do pnncpIo da comundade rousseauiana. Mas a verdade que é diferenças existentes ou, quando as destntìu, criou outras em seu lugat Mas a verdade é
também ueste período que e forjant a mais bnthantes consu-uçöes emancipatórias da que. mesmo que se tivessem cumprido rodas as prevìsöes de Marx, restaría sempre a Irre-

modernidade, sejam cias o movimentos socialistas, os movimentos anarquistas, o mutua dutibilidade da subjectividade individual à subjectividade colectiva e consequentemente
lismo e o coopera(ivsmo operários ou. enfim, o marxismo. E. pois, um período de contxa faltariam sempre à teoria marxista as instâncias de mediaço entre ambas.
diçes exp1oivas entre regulaçào e ernartcipaçäo, e a expressäo mais Ildima de tais con- Corn Lenine e no seguimento lógico de Marx, a classe operária d origem a um nutro
tradiçòes sern dtivìda o marxismo, pelo que ele foi na obra e no tempo de Marx e pelo sujeito monumental, o partido operário. Se, nos termos em que foi formulada. a subecti-
que foi feito dele pelos Bolcheviques e a Jérceira internacional até ao colapso recente dos vidade colectiva da classe tendeu a destruir a subjectividade individual des seus mern-
regimes do Leste Enropeu. bros, a titularidade politica do partido, nos termos em que foi formulada, tendeu a destruir
É conhecida a crítica de Marx à democracia liberd e portanto às ideìas de subjectivi- a titularidade política individual da cidadania. Isto significa que a tensào acima referida
dade e de cidadania que a constituem. Porque a organizaçäo social da produço determina entre subjectividade individual e cidadania Ibi falsamente resolvida pela destruìço de
a organizaçäo política e cultural, a separaçâo entre a igualdade política e a desigualdade ambas. Em vez de superaçes, supressòes; em vez de mediaçö.es, que só podiam ser bus-
económica operada pelo capitalismo é pouco mais que ilusOria. Porque o ser social deter- cadas no principio rousseauiano da comunidade, o recurso exclusivo a sujeitos monumen-
mina a consciencia. a autonomia e a hberdade atribuidas à subjectividade individual no tais afins do dnico sujeito monumental já historicamente constiwído, o Estado. No
capitalismo so ilusôes necessárias para a rcproduço das relaçöes capitalistas. Ao decla- admira. pois. que o modelo marxista-leninista viesse a redundar numa hiperirofia total do
rar nio-polítìcas as distinç'es de nascimento. classe social, educaçäo e ocupaço, o principio do Estado. Se o liberalismo capitalista pretendeu expurgar a subjectividade e a

Estado capitalista permite que cIas operern Uvrernente na sociedade, intocadas pelo prin- cidadania do seu potencial emancìpatório - corn o consequente excesso de regulaçào,
cípio da igualdade da cidadania política que, por essa razäo. é meramente formal (Marx simbolizado. nos países centrais, na democracia de massas o marxismo, ao conurio.
18431, 1975:219). E também sabido que a posìço de Marx a respeito da democracia é, procurou construir a emancipaçào à custa da subjectividade e da cidadania e, corn isso,
apesar disto, complexa, que admite a possibilidade da conquista do socialismo por via arriscou-se a sufragar o deapotismo, o que vein de facto a acontecer, Se é verdade que o
eleitoral, que salienta a eficácia das lutas democráticas do operariado inglés na redução leninismo nao é um desvio espthio do marxismo, no é, contudo, menos verdade que o
do horádo de trabaiho e que. se teve algwn modelo de democracia, ele foi certamente o marxismo caucionou modelos de trmsformaçào socialista ue procuraram compatibilizar
da democracia participativa que subjaz an principio da coinunidade rousseauiana. emancìpaço corn subjectividade e cidadania, das posiçöes de Kautsky à de Bernstein,
Nada disEo. porérn, é muito relevante para a argumentaçäo deste capítulo. O que me das posiçöes dos austro-marxistas (os grandes esquecidos) às dos eumcomunislas, o que
interessa reaiçar é que, para criticar radtcalmente a democracia liberal. Marx contrapôe ao afirtalabona em favor da complexidade das posiçoes de Marx.
Sujeito monumental que é o Estado liberal um outro sujeito monumental, a classe operi- No segundo capítulo procedi a um balanço genil da proposta de Marx. Agora pretendo
na. A classe operria é urna suhjectivdade colectiva, capaz de autoconsciência (a casse- apenas relevar alguns das méritos dela para a discusso que se segue. Em primeiro lugar.
-para-sil, que sukume em si as subjec1\ dades individuais dos produtores directos. Tal a crítica marxista da democracia liberal é basicamente correcta, ainda que a alternativa
como em Flegel a burocracia é a classe cnal e a autoconselência do Estado moderno. a que lhe propöc nilo o sela. Em segundo lugar, an afirmar o primado das relaçôes sociais
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clase opertiria em Marx a classe un '-.i] e a autoconsciéncia da emancipaçìo socialista. na constìluiçío subjectividade e la política, oferece a contestaçíu dos
lo ¡'ifa di fkc. C) Saia1 a a ia PósMQifrmnfdaiIr Suhjaitvidudi. (IIfdadama e Emanipai)a

proceas de narura1zação e de reificaço do soda de que se alimentam os excessos de eontnirio. lia periodo do capitalismo organizado. a cidadania social, porque e ancurou
reguLço em que se ve'o a iraduzir a modernidade nas sociedades captaUsas. Em ter socialmente nos Interesses das clacs irabalhadoras e porque serviu estes em grande
ce-o ]uia, Marx estabelece. na tradço hegeana. que näo há suhjectvdade scm anra medida através de transferências de pagamentos. colidiu significativamente corn o princ-

gonisn e que o conceito dc classe social é o aicuador nuclear do antagonismo nas pio do mercado. conduzindo a urna relação mais equilibrada entre o principio do Estado e

soced-des captaUstas. ainda que. paradoxalmente. e ao conirrio de Marx, possa näo ser o principio do mercado e, corn eta, a urna nova estrutura da exploraço capitalista, prcc-

o articu'ador nucIear da superação desse antagomsmo. Nese domímo, o erro de Marx fo amente o capitalismo organizado
pensar que o capialismo. por via do desenvovìmento ecno1ógico das forças produìvas Este major equilibrio entre Estado e mercado foi obtido por pressão do principio da
possNIitaria ou mesmo tornaria necessthia a transiçäo para o ocia1ismo. (0m0 se vejo a omunidade enquanto campo e lógica das lutas soclais de classe que estiveram na base da

veriflcar. ernreue a si próprio, o capita'ismo no transita para nada seno para mais capi- conquista dos direilos sociais. A cornunidade assenta na ohrigaçäo política horizontal entre

talisma. A equaçäo automiica entre progresso tecno'ógico e progresso socia' desradica- individuos ou grupos sociais e na solidariedade que deJa decorre. urna solìdariedade parti-
liza a oroposta emancipadora de Marx e torna-a, de facto, perversamente gmea da reg u- cipativa e concreth, isto é, socialmente contextualizada Ora a classe operária foi precisa-
laÇû capitalista. mente o motor e o conteddo desse contexto social e a articuladora da obrigaçäo polítka

que Se traduziu nas múltiplas formas organizativas da solidariedade operria. dos partidas
operários e dus sindicatos às cooperativas, aus clubes operários, à cultura operria. etc., etc.

A emergência da cidadania socia' Se a classe operária nao foi o sujeilo monumental da emancipaçäo pos-capitalista. oi

sein dtívida o agente das transforrnaçöes progressistas (emancipatórias, neste sentido) io


segundo período do capitalismo nos países cemrais, o capitalismo organizado,
o interior do capitalismo. Embora seja ainda hoje debatível em que medida a cidadania
caractenza-se pela passagem da cidadania cívica e política para o que foi designado por social é urna conquista do movimento operário ou urna concessão do Estado capitalista.
«cidadania s()ciah, isto é, a conquista de significativos direitos sociais, no dommnìo das nao parece restar ddvida de que, pelo menos, sem as lutas sociais do movimento operdrio.
relaçöes de trabaiho, da segurança social, da saúde, da educaço e da habitaço por parte tais concessães nao seriam feitas. Mesmo que, corn Brian Turner, neto e deva esquecer a

das classes trabaihadoras das sociedades centxais e, de um modo muito menos caracterís contrihuição de outros factores para a expaiisäo e o aprofundamento da cidadania social.
tìCO e intenso. por parte de aguns sectores das classes trabaihadoras em alguns países como a guerra e as migraÇeS.
periféricos e semiperiféncos. Meihor que ninguém, T. H. Marshall caracterizou este proW Para a compreensäo do tempo presente é, no entanto, importante ter em conta que as
cesso em Cìtíeashìp wid Socíal Class pub'icado pela primeira vez em I 950. lutas opertirias pela cidadania social liveram lugar no marco da democracia liberal e que
Seundo N1arshal, na linha da tradiço liberal, a cidadania é o conteúdo da pertença pot isso a obrigação política horizontal do princípio da comunidade sO foi eflca na

igualitzria a urna dada comunidade política e afere-se pelos direitos e deveres que o cons- medida em que se submetcu à obrigação política vertical entre cidadão e Estado. A con-

tituem e pelas instimiçöes a que dá aro para ser social e politicamente efica7. A cidadania cessäo dus direitos sociais e das insiìtuiçies que os disti-ibuiram socialmente são expres-
no por isso. mono1ítica constituIda por diferentes tipos de direitos e instituiçöes; é
- t1 são da expansão e do aprotundatnento dessa obrìgação política. Politicamente, este lr-
produto de histórias sociais diferenciadas protagonizadas por grupos sociais diferentes- cesso significou a integraçío política das classes trabalhadoras no Estado capitalista e.

Os diretos cívicos correspondem ao primeiro momento do desenvolvimento da cidada- portanto. o aprofundamenlo da regutação em detrimento da emancipação. Dal que as
nia so os mais universais em termos da base social que atingem e apoiam-se nas insti- lutas pela cidadania social tenbam culminado na maior legitìmação do Estado
capitalista.

tuiçôe do direito moderno e do sistema judicial que o aplica. Os direitos políticos são Dai que o capitalismo se tenha transformado profundamente para, no «fini» do processo
mais tardios e de universalização mais difícil e traduzem-se institucionajmente nus parla- da sua transformaçâo, estar mais hegemónico do que nunca.
mento. nos sistemas eleitorais e nos sistemas políticos em geral. Por dUímo, os direitos Em lace disto, nào surpreende que neste período se tenha agravado a tenstio entre sub-

sociais só se desenvolvem no nosso século e, corn plenitude, só depois da Segunda jectividade e cidadania. Por um lado. o alargamento da ciddania ahriu novos horizontes
Guerra Mundial: têm como referência social as classes trabaihadoras e são aplicados au desenvolvimenlo da subjectividade. A segurança da existência quotidiana propiciada
através de rrtiiluplas instiluiçoes que, no conjunto, constituem o Estado-Prov idência. pelos direitos sociais tornou possivcis vivências de autonomia e de liberdade, de pronlo-
Um dos prkndpaìs méritos da anlise de Marshall consiste na articulação que opera cao educacional e de programação das trajectórias familiares que até entäo tinharn estado
entre cidadania e classe social e nas consequêncìas que dela retira para caracterizar as vedadas às classes trabalhadoras. Mas, por outro lado, os direitos sociais e as insiituiçôes
relaçÓe' tensionais entre cidadania e capitalismo. Transferida para o quadro analítico que estatais a que eles denim aro foram partes integrantes dr um desenvolvimento
societal

aqui proponho. essa articu]açào significa que no período do capitalismo liberal a cidada-
nia Ci\ it e poliuca, enquanto parte integrante do principio do Estado. ntio só nito colidiu
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luma m
corn o princípo do mercado corno possibititon o dcscnvolvimento hipertrofiado desEe. Au
Ltv1
-t. Cf. r

e
icnptn. o ehni aire
titatei(t9t5}. iw kL
56I. privitt
irlç)o an pu)el do Esudu.
o pa das tuiss sociis cnaçmo da aJ-
2 2 Pela Mio dc Alie. O Socia! e o Po1íti na Pít-Modcrnidade Suhjcctividadc Cidadania e Erna?ulpaçiio 2 3

que aumentou o peso burocrábco e a viginca cornroadora sobre os individuos; sujeitou porque a cidadania. na medida em que consistiu na institucionalizaçäo das disciplinas.
estes mais do que nunca às rotinas da produçâo e do consumo: criou um espaço urbano criou a subjectividade il sua imagem e semelbança. A subjectividade é a face individual
desagregador e titømizaiite. destruidor das solidariedades das redes sociais de interconhe do processo de nonnalìaaçìo e nao tern existencia fora desse processo. O sujeito e o cida-
CimCnto C de entreajuda; promoveu urna cultura meditica e urna indúsiria de tempos dáo são produtos manufacturados pelos poderes-saberes das disciplinas. É corn base nesra
livres que transfoirnou o azer nurn gozo programado, passivo e heterónomo, muito seme- ideia que Foucault se recusa a atribuir ao Estado um lugar central no processo histórico de
hante ao trabaho. Enfim, um mode'o de desenvovìrnento que transfortnou a subjectivi- domìnaço moderna. De facto. segundo ele, o poder jurídico-político sediado no Estado e
dade nurri processo de indivìduaçäo e numeraço burocráticas e subordinou a Lehensweh rtas instituiçòes náo tern cessado de perder importância em favor do poder disciplinar. A
ils exigencias de urna razáo tecnológica que converte u o suje ita em objecta de sì próprio. cidadania é. pois, para Foucault. um artefacto deste poder mais do que do conjunto dos
direitos cívicos. políticos. e sociais concedidos pelo Estado ou a ele conquistados.
Em meo entender, o processo histórico da cidadania e o processo histórico da subjecri-
Subjectividade e cidadania em Marcuse e Foucault vidade sáo autónomos ainda que. como tenho vindo a defender. intimamente relaciona-
dos. O capitalismo tern sabido conviver corn diferentes soluçöes em cada um destes pro-
A relação entre a hipertrofia da cidadania estatizante e consumista e o definhamento cessas e as que consisliram na major amplitude dada à cidadania politica e social nao SO
da subjeclividade foì denunciada pela primeira vez por Marcuse (outro grande esque- certamente as piores para o desenvolvimento da subjectividade. Urna das reivindicaçòes
cido). Inspirado em Heidegger e Freud. Marcuse hisroriciza o marxismo 'a luz das reaìda- centrais do feminismo radical, a de que a esfera pessoal ó política, nao é. ros cand içöcs
des do capitalismo avançado (Marcuse, 1964; l966 1969). A integraço política social e actuais, susceptivel de satisfaÇio senáo airarás da repolitizaçäo dessa esfera corn base em
cuUural do operariado na reproduçâo do capitalismo toi-na inviável qualquer processo de estratlgìas de cidadania.
emancipaçâo de base classista. A emancìpaço a conquistar a do individuo e da sua sub- Acresce que. do ponto de vista da emancipação. d possível pensar em novas formas de
jectividade. A soluço proposta por Marcuse, a da emancìpaço pelo Eros. é pouco con- cidadania (colectivas e no individuais; menas assentes em direitos e deveres do que em
Vincente, sobrerodo porque se pcopòe sustentar urna negatividade pOs-social (e pés-capi- founas e critérios de participaçào), näo-liberais e nio-estatizantes, em que seja possivel
talista) por via de urna regresso naturahsta ao pré-social. mas a sua crítica do capitalismo urna relaçâo mais equilibrada corn a subjectividade. Mesmo assim, estas novas formas de
avançado näo cessou de ganhar actualidade desde que foi elaborada, a partir dos anos cidadania náo nos devem fazer esquecer que o Estado ocupa urna posiçâo central (porque
quarenta e cinquenla. Nos termos dea. a raaäo tecno'ógica que preside ao desenvolvi- exterior) na configuraçilo das retaçöes socias de produçáo capìtalista e que essa posiçáo.
mento do capitalismo conduz inelutaveirnente an sacrificio da subjectividade individual ao contrário do que afirma Foucault, tern vindo a fortalecer-se corn o desenvolvirnento do
na medida em que incapaz de satisfazer todas as necessidades psíquicas e somáticas do capitalismo. A tendência foucaultiana para homogeneizar as diferentes formas de poder
individuo e de desenvolver em pleno as capacidades emocìonaìs deste. Por isso, a docili- sob o conceito-chave do poder disciplinar. para se furtar à formulaço de critrios que
dade e a passividade dos individuos e. sobretudo. dos trabaihadores so obtidas através perrnitam hierarquizá-los e para ver em todas as tentativas de resistencia a emergência
das formas repressivas de felicidade «oferecidas» à esmagadora maioria da populaçäo por insidiosa de novas poderes contra os quais preciso organizar novas resistências, acaba
via do consumo compulsivo de niercadorias. por conduzir a urna concepço panóptica do panóptico benthamiano, ou seja. a urna con-
Apesar de importante e a precisar de reapreciaço nos anos noventa, a teoria crítica de cepço da opresso onde nâo é possivel pensar a emancipaçio.
Marcuse d menos consistente do que a que vejo a formular mais tarde Foucault, sobretodo
no que respeila ao desenvolvirnento antinómico da subjectividade e da cidadania no capi-
talismo(Foucaull. 1975: 1976; 1980). Melhorque nìnguém, Foucaultanalisou o processo A crise da cidadania social
histórico do desenvolvimento da cidadania em detrimento do da subjectividade, para nos
permitir a conclusáo de que cidadania scm subjectividade conduz à normalizaçâo, ou No final dos anos sessenta, nos países centrais. o prcesso histórico do desenvolvi-
seja, à forma moderna de dominaçáo coja eficácia reside na ìdentificaçáo dos sujeitos transfonnação coja verdadeira dìmenso sO velo
mento da cidadania social sofre urna a
corn os poderes-saberes que oeles (mais do que sobre eles) siso exercidos. Trata-se de urn d&ada fenómenos marcarn essa transformaçäa: a crise do
revelar-se na seguinte. l)oìs
processo tolalizante de que as ciências humanas são peça central e que opera por múlti-
Estado-Providência e o movimento estudantil.
pbs fraccionamentos da subjectividade (na familia. na escala, no hospital, nas profissôes, Näo á este o lugar para tratar detalhadarnertie nenburn destes fenórnenos51. Basta
na prìso) para depois ser reconslitthda. corn base neles. a unidade do indivIduo identifi-
reler. para o que aqui nos interessa, que a Crise do ES!QdO-PrOvidênCiQ assenta basica-
cado corn as exiencias da dominaçito dkciplìnar. as quais. por isso. nada impäcrn.
niente na crise do regime de acumulaço consolidado no pós-guerra, o «recime fordista».
Concordando corn tflUitø da crítica de Foucault. nán partilbo da radictiidade da con-
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c1uio a que ele chega. Para louciult. riáo há tensiio cOtre cidadania e subjeclividade
s. Qri-io Cr1Se do c1 Srnlo 1990: 93 e
4 Peía Mao Ji -ffc. O .
o Poíftko no PasModernidade Çithjc( //O1(. ('tIakoria e Eoia,ìepaçäo 2 5

como é boje conhecido. Este egme de acumuaço caracteriza-se por urna organizaço democrítica perdeu o contacto com os anseios e as necessidades da populaço repre sen-
taytorkta da produçio (total separaço entre concepçäo e execuço no processo de traba- tada e fez-se refém dos interesses corporativos poderosos. Corn isto. os eidados albea-
iba) acoplada irnegração macça dos trahathadores na sociedade de consumo através de ram-se cia representaçào scm. no entanto, terem desenvolvido novas formas de parlicipa-
unia cena ndexação do aunìenos de hrios aos ganho de produvdade. Esta parttha çiio política. exercitveis em areas políticas novas e mais amplas. As organizaçöes políti-
dos ganhos da produtividade obtida por duas vas fundameutais: petos aumentos dos cas do operariado, longe de serem v(timas deste processo, foram um dos seus artífices
saros drectos e pesa criaço e expansäo de saános indirectos, ou seja, os benefícos principais, no admirando, pois. que as suas energias emancipatórías tenham sido desvia-
sociais em que se trdui a cidadana social e. em úJma nsânca, o Esado-Providancia. das para a gestào zelosa do capìtalìsmo por mais transformado que este tenha saldo dessa
Como referi. a classe operra, aravés dos sindicatos e parndos operth'ios, 'eve um gestio.
papel central na configuraço deste compromsso. ambm conhecido por compromsso Como sabemos, o movimento estudantil dos anos sesen/a foi o grande articulador da
soda-democrftco para dar corna que as transformaçäes socalizarues do captaismo Crise político-cultural do fordismo e a presença nele, bem visível, dc resto, da crítica mar-
neste período (o «capitalismo oramzado») oram obtidas custa da transformaço soda- cusiana expresso da radicalidade da confrontaço que protagonizavaí6. So três as
é
1sta da sociedade, rdvindicada no n(do desie segundo período do captaismo como a facetas principais dessa confrontaço. Em primeiro lugar, opöe an pnxlu[ivisrno e an con-
grande mcta do movimento operro. Reside nisto verdadeiramente a mtegraço socia' e sumismo urna ideologia antiprodutivista e pós-materialista. Em segundo lugar. identifica
po'ítica do operariado no capiasmo. um processo enro de desradcazaçäo ths reivnd- as mdltiplas opressöes do quotidiano, tanto ao nivel da produçio (trabalho alienado),
caçôes operárias obtido em grande medida atravs da crescerne pariìdpaçäo das organiza- como da reproduço social (familia burguesa, autoritarismo da educaçäo, monotonia do
çòes operárias na concertaço social nas políticas de rendüììernos e preços e mesmo na lazer, dependência burocrática) e propôe-se alargar a cIas o debae e a partìcipaço puliti-
gestto das empresas, um processo cuja dìmensão po!(tica boje conheckla por neocorpo- cas. Em terceiro lugar, declara o (im da hegemunia operthia oes lutas pela emancipaço
rativismo. social e legitima a criação de novos sujeitos sociais de base transelassista.
A crise do regime fordista e das ìnstìiuiçöes sociais e pofticas em que ele se raduziu o triunfo ideológico da subjectividade sobre a cidadanìa teve obviamente os seus
assentou, em pumeira linha. numa dup'a crise de natureza econOmico-politica, na crise de custos. O afä na busca de novas formas de cidadania nío hostia à subjectividade levou
reniabilidade do capita' perante a rdaço produtividade-salários e a rdaço sairios direc- a negìigencìar quase totalmente a única forma de cidadania histuricamente constituida, a
tos-sahirios indirectos. e na crise da regulaçao nacional. que geria eficazmente até ento cidadania de origern liberal. Esta negligência revelou-se fatal para o movimento estudan-
essas relaçòes, perante a intemacionaIizaçlo dos mercados e a transnacìonalizaço da pro- iii, eiìquanto movimento organizado. e esu talvez na ungern da facilidade relativa corn
duçäo. Como esta regulaço estava centrada no Estado nacional, a sua crise foì tamb& que foi desarmado. No entanto. dialecticamente, esse desarme organizacional facilitou a
a crise do Estado nacional perartle a dobalização da economia e as instìtuiçöes que se expansâo capilar da nova cultura política instituida pelo movimento estudantil, e scm esta
desenvolveram corn cIa (as empresas mu]tinacionai. o Fundo Monetário Internacional, o no é possivel entender os novos movimentos sociais dos anos setenta e dus anos oìtenta
Banco Mundial). oem serl possivel entender os dos anos noventa. Alias. a herança nao reside apenas na
Mas a crise do firdismo ou do capitalismo organizado leve tambm urna dimenso cultura política, reside também cas formas organizativas e na base social destas. A partir
cultural ou político-culiural e, em incu entender, a reavaliaço e a revahdaçào desta daí os partidos e os sindicatos jiveram de confrontar-se permanentemente corn as formas
dimensäo é de crucial imponância para definir as alternativas emancipatórias dos anos organizativas dus novos movimentos sociais, tal como a partir dai o complexo marshal li-
noventa. A crise é, em pane, a revolta da subjectividade contra a cidadania. da subectivi- ano cidadania social-classe social rto mais se pode reput corno anteriormente.
dade pessoat e solídária contra a cidadania atOmizante e estatizante. O compromisso
socia-dernocrático aman'ou de tal modo os trabalhadores e a populaço em geniI à obses-
sio e às rotina.s da pmduçâo e do consumo que no cleixon nenhurn espaço para o exercí- As duas últimas décadas: experimentação e contradiçäo
do da autonomia e da criatividade. corn as manifestaçoes dal decorrenres, desde o absen-
I
tismo Ìaboral à psiquiatrizaço do quotidiano. Por outra lado, a cidadania social e o scu Asdms últimas décadas foram, mais do que quaisqtter outras, dscadas experimentais.
Estado-Proyìdêncja transformarani a solidariedade social numa prestaçäo abstracta de Por um lado, foi um período em que o capital começou a definir urna resposta aus desa-
scrvços burocráticos benevolentemente repressivos, concebidos para dar resposta à cres- fios dus anos sessenta. Trata-se de urna resposta que au nivel do sistema mun-
tern Jugar
ctiiu atomizaçäo da vida social mas. de fitcto. alimentando-se dela e reproduzindo-a de no seu todo e que. de
dial facto, assenta niais do que nunca na conversäo do «sistema
iflndo alargado. Por tiltimo, o compromisso socìal-democnico,
j de si assente numa mundial» em espaço global de acumulaçào. () perfil geral desta respústa é corthec ido.
tUhÌcpção restnta (liberaD do político. acabou. apesar das aparências em sentido contní-
nias o scu alcance estí ainda por definir. Por esempio, o Estado-Providencia sofreu e esta
Uil. por reduzir ainda
mais o campo poUtico. A diferença qualitativa entre as diferentes
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\Vn
políticas em presença loi reduzida att quase à irretevância. A represcntaçäo
dni. - S*«t- a rnpar.10 gtoh ttn ct. 1959: 4
-'
1fá de 4/1(9. 0 Social e û Po//rico na Subjeeriidade. Cidadanio e ErnarI(-ipação 217

i sofrer profundas alieraçòes nos países centrais. mas no to profundas que nos perrnia posiçO de ter de competir entre si pelas contrapartidas. quase sempre leoninas. suscepU-
(alar do seu co'apso próximo ou da sua suhstuwçäo próxma por urna outra forma poftica veis de atrair o investimento das empresas multinacionais. A despolitizaçäo das opçòes
quaÌtativamen1e dfererne. Por outro lado, as dua úhimas décadas foram anos de grande ¡leste dornnío -o
tínico nacionalismo possvel é o da luta pelas condiçes de desnaciona-
cxperimentaçäo sociaL de tbrmuaço de akernatvas mais ou menos radcas ao noddo lizaç/to da regulaçào económica e social - envolve também a sua naturaiizaço. ou seja, a
de desenvo1vmento económico e soca1 do capitasmo e de afirmaço polfika de novos ideia de que as opçôes opiam entre fluito pouco, dado que os imperativos muftinacionais
sujcflQs socias, hem simbolizada nos novos movimentos sociais, obretudo nos países 5g0 categóricos, pertencem à natureza própria da acumulaçäo neste período e nenhuma
centrais. e nos movmentos populares em toda a Am&ica Latina. E dscutíveI se estes economia nacional pode ter a veleidade de se furtar a cIa e ficar de fora. A única margina-
movmeflEOS esäo boje mima fase de expanso ou mima fase de recessâo, mas, euaquer Iìzaço tolerável é a que ocorre dentro do sistema.
que Seja o caso, o seu possív& mpacto sodaL ia como anteriormente o do movmeno Para além da fragrnentaço e globalizaçäo da produço e da despolitizaçäo e da naIn-
estudaniI. anda thfícd de determinai-. ra1izaço dos imperativos económicos. a dìfuso social da produçäo tern ainda um ter-

Por limo, a ú1ima d&ada estemunhou o colapso das sociedades comunistas do Ceiro aspecto, mais complexo mas talvea de maìor importância no futuro próximo: a cres-

Leste Europeu, um processo cujo desenv&vimerno é dtïcì1 de prever. Ao contrárìo do cette confusäo ou indiferenciaço entre produçîo e reproduçAo. Este é um fenómeno
que se passa corn os novos movimentos sociais. este processo sgnfka, pe'o menos na complexo porque nalgumas das suas vertentes corresponde, na aparncia pelo menos, a
aparncia, a revalidaço do rnodeo capitalista de desenvolvimerno económico e socaI e a algumas das reivindicaçôes do movimento estudantil dos anos sessenta e mesmo dos
sua afîrmaçâo como o único mod&o váve da modernidade. Mas tambérn nesle caso é novos movimentos sociais dos anos setenta e aitenta.

ainda cedo para conhecer o tipo de formaçôes sociais que esta na pratica a emergr doo As lutas pela cidadania social no segundo periodo (capitalismo organizado) tiveram
rosamente no Leste Enropeu e qua' o seu impacto na Europa e no mundo. Por todas estas por objectivo explicito vincar que entre produç.o e reproduço havia urna conexäo eco-
raiöes, parece correcto afirmar que as dias úItirna décadas s/io décadas expermentais e nómica íntima mas que, para além dela, a desconexo era total. Aliás, mais especifica-
que os anos noventa dardo testemunho das diferentes lnhas de transformaço soca1 por mente, a ideia era que só a conexo económica tornava possível a desconexào a todos os
cias apontadas. Referirrneei brevemente às respostas do capital e às alternativas propos outios níveis. A conexilo económica residia em que a partilha nos ganhos de produtivi-
tas pelos novos movimentos sociais. dade, os sa!rios indirectos e o Estado-Providencia deveriam garantir por si a reproduço
social (a alimentaçäo. o vestuiio, a habitaço, a educaço, a saóde, a segurança social, os

transportes, o lazer, etc., etc.). Esta conexo permitia aos trabalhadores planear a sua
As respostas do capita!: difuso socia' da produçâo e isolamento politico do trabaiho reproduçäo social e a da sua familia em total liberdade e segurança. scm qualquer sujei-

ço aos ciclos económicos, ou às exigências empresariais.


Os dltimos vinte anos foram multo ricos em soiuçôes capitalistas novas para respon- Embora este objectivo tenha sido obtido durante algum tempo por largos sectores das
der eficazmente aos desafios dos anos 60. E posvel agrnpar essas soiuçes em dois classes trabaihadoras dos países centrais, foi precisamente contra ele que se insurgin o
grandes conjuntos: a difus/io social da produçâo e o isolamento político das classes iraha- movimento estudantil. Segundo este, o objectivo foi falsamente atingido, urna vez que,
lhadoras enquanto classes produtoras. como já referi, os ganhos em cidadania se converieram em perdas de subjectividade. A
A difusno social da produçäo assume vrias formas. E. antes de mais. a descentraiiza- conexão económica, longe de criar autênrica autonomia e liberdade, crìou dependencia
ço da produçân atxavés da transnacionalização da produçäo (a «fábrica difusa»), a frag- em consumo (agravadas pela genei-alizaço
relação an Estado burocrático e às ratinas do
mentaçäo geográfica e social do processo de rabaiho. corn a transferência para a periferia do crédito ao consumo). Nestes termos, aproduço e a repmduçuio mantiveram-se mate-
do sistema mundìal das fases produtivas mais n-abalho-intensivas, do que resultou urna rialmente distintas mas passaram a ser simbolicamente isomórficas. A submisso real ao
certa desindustrializaço dos países centraiS e a industt-ìa!izaço ou re-industriaiizaço capital no espaço da produção foi secundada pela submisso formal no espaço da repro-
dos países periféricos. Este processo, para ajém de permitir urna aniplìaçäo scm prece- duçäo social. Em convergência corn isto, o movimento femìyista das duas últimas décadas
lentes do mercado de traballo, permiciu também a sua segmentaço e dualizaço, dando vcio salieniar a dimensto do trabaiho (o trabaiho doméstico e, portanto, a dimenso pro-
origem ì heterogeneizaçtio da relaçulo salariai e à concorrêncìa entre mercados de traha- dutiva da reprodução social, até então submersa na distinçéo entre produçào e reproduço
ihn locais, regionais e nacionais em luta pelas condç/es e oportunidades de investimento. e na cOnexo meramente económica entre cias. Corn isto, a categoria do trabaiho trans-
A conduçäo deste processo pelas empresas mRinacionais - os grandes agentes da rees- bai-don da categoria de classe social.
truturaçto .- possihilitnu a despolitizaço e até naturaiizaçIo dos novos imperativos da A reestruturaçäo do capital ueste período aproveitou-se, de algum modo, desta crítica

prt)duçin. As guerras económicas deixararn de ter lutzar entre Estados nacionais para pas- para alterar, em seu lavor. a relaçâo entre produço e reproduço social. Por um lado,
'ncIt a Ici- lugar entre h]ocos Oil entre dcvedore nacionais e credores internacionais. Os quebra da indexaço entre
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no orçamento
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I\th(IO' flacionais. sobretudo os perìtérico e rrniperìfricos. furam scndo postos na
produividade procio:
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corn os cortes
concxio económica. e sakírio.
social do Estado-Providência e
riirninar ou. pelo
a

atenuar a
Pe/a MäodeA/iee, OS'eia/ eü Po/It ona POs-Modernidade 5uhje(t/idOde Lido/aula e Eìnancpaçdo 219

Por outro lado. aravés da diusäo social da produço, procurou aproiwidar outras cone ariOvel. A síndroma de insegurança que ele gera entre as familias trabaihadoras e a con-

x5es entre pfl)duço e reproduçAo. Por exemplo, a fragmeniaçAo dos processos prndui vos corrncìa que cria entre cIas tém-se revelado poderosos instrumentos de neutralizaçäo
possbilitou a generaUzaçao do trabatho ao domkiio (quase sempre femmina) e este politicado movimento operário.
transformou o espaço doméstico de mwtas faffihlias irahathadoras num campo de trabatho A coexisténcia de várias relaçöes salariais e a segrnenlaçào do mercados de trabatho
onde a produção e a reproduçäo convivem até à quase indilèrenciaçäo. Por outra lado, a têm vindo a produñr urna grande fragmentação e heterogeneìaçäo do operariado, o que
generalzaçâo das formas de pluriactivdade tornau mais complexa e difícil a distnç toma mais difícil a macro-negociaço colectiva e coloca as organizaçòes sindicais mima
entre tempo vital e tempo de trabaiho e o mesmo scedeu através da degradaçao da segu- posiçào de fraqueza estrutural. urna fraqueza agravada pelo ahaixamento das taxas de sin-
rança social, que tornou mais problemárica a fase pós-produtiva da vkla. Acresce que, em dicalizaçio em quase todos os paises. Para isso térn também contribuido as transforma-
muitas pmfissöes ou ocupaçöes, o corpo (a aparênda corporal, o visual, o vigor físico, o çuies operadas no próprìo processo de trahaiho: técnicas de enriquecimento do trabaiho, as
vestuário, a maquilbagem) passou a ser a segunda força produiva do trahalhador ao lado politicas de classificaço e de qualificaçào, as aheraçöes no controlo do processo de tra-

da força de trabalho propriamente dita. haiho, a generalizaç/io do trabaiho pago à No seu


peça e dos prémios de produtividade.
Nessas situaçôes, parte do tempo vital da reproduço é de facto um segundo fumo do conjunto, estas transformaçóes retiram sentido à unidade dos trabalhadores e promovern a
trabaiho produtivo, ocupado em jogging, ginástica, massagens, musculaçäo, etc. Este ìntegraçao individual e individualmente negociada dos trabalhadores na empresa. Por
segundo turno de trabatho produtivo tende mesmo a aumentar corn a diminuiçäo do tempo todas estas vias, a integraçäo cada vez mais intensa dos trahalhadores na produçào corre
de trabalbo assalariado ou de primeiro turno. Neste contexto de indiferenciaço progres- de par corn a progressiva desintegraço politica do movimento opertirio. Isolados, os tra-

siva entre produçào e repmduçào, deve ser feita urna referencia aos códigos de conduta balbadores nâo SO classe operária. são força de trabaiho. Talvez isto expliqueem parte a
elaborados pelas empresas (quase sempre multinacionais) para sereni seguidos pelos seus pouca resistencia ou a pouca efictícia da resìstncìa das organizaçes sindicais perante o
empregados fora do tempo de trabaiho e onde se impöem os lugares de Iazer a frequentac processo de degradaçào da relaçào salarial.

ou a evitar, o tipo de relaç/3es pessoais a privilegiar ou a recusar, as fomas de comporta- A degradaçào geral da relaçào salarial é, no entanto, apenas um aspecto do isolamento
mento recomendáveis ou condenveis, o vestuário a usar, etc. A «lealdade à empresa político das classes trabaihadoras. Outra aspecto nao menos importante é a degradaçào
durante 24 horas» é um slogan gmtesco que. levado à risca, faz corn que mesmo a ténue dos saládos indirectos e. consequentemente, das prestaçöes e serviços do Estado-Provi-
distìnçäo entre submisso real e submissão formal desapareça. dencia. o retrocesso mis políticas sociais tern a.ssumido várias formas: cones nos progra-
A promiscuidade entre produçào e reproduçäo social tira razio ao argumento de mas sociais; esquemas de co-participaçào nos custos dos serviços prestados por parte dos
Habermas (1982) e de Offe (1987) segundo o qual as sociedades capitalistas passaram de utentes; privalìzaçäo capitalista de cerios sectores da providéncia estatal no dominio da
um paradigma de trabaiho para um paradigma de interacçào. E verdade que o trabaiho sadde, da hahitaçào. da educaçào. dos transportes e das pensóes de reforma transferência
assalariado, enquanto unidade homogénea e autónoma do tempo vital, tern vindo a ser de serviços e preslaçòes para o sector privado de solidariedade social mediante convthios
descaracterizado, mas, por outro lado. isso sO tern sido possivel na medida em que o corn o Estado rnohilização da familia e das redes de interconhecimento e de entreajuda
tempo fonnalmente näo produtivo tern adquirido características de tempo de trabaiho o que em geral podemos designar por socìedade-providência - para o desernpenho de
assalariado ao ponto de se transformar na continuaçào deste sob outra forma. Tern, pois. funçäes de segurança social até agora desempenhadas pelo Estado.
razän Schwengel quando afirma que a sociedade contemporánea ascua entre a utopia do A difuso socia] da produçäo e o isolamento político das classes trabaihadoras nestas
trabalho concreto e a experiéncia do «fim da sociedade do trabaiho» ( l98& 345). ditas idtimas décadas tém sido acompanhados no plano político-cultural por urna conste-
o isolamento polli/co das classes /rabaThadoras na produçäo está obviamente ligado laçào ideológica em que se misturam o renascimento do mercado e da subjectividade
aos processos que acabei de descrever e constitui, de facto, a outra face da difusào social corno articuladores nucleares da prática social. A ideia de mercado e as que gravitare na
da produçäo. As vtirìas dirnenthes da dìfusio social da produço contribuiram, cada urna sua órbita (autonomia. liberdade. iniciativa privada, concorréncia, mérito, lucro) tém
a seu modo, para a transformaçào do operariado em mera força de trahalbo. Sào particu- desempenhado urn papel decisivo na desartículação da rigitez da relaçäo salarial herdada
larmente importantes ueste dominio as diferentes estratégias de llexibilizaçâo ou, methor. do período anterior e no desrnantelamento relativo do Estado-Providéncia. Assistimos à

de precarìzaçâo da reiaçào salarial que um pouco por toda a parte térn viudo a ser adopta- colonizacän do principio do Estado por parte do princípio do mercado. urna colonizaçào
das: declmnio dos contratos de trabalho por tempo indeterminado, substituidos por contra- que envolve por veres a introduço da concorrência entre ìnstì1uiçes do Estado na pres-
tos a prazo e de irabalho temporário, pelo trabaiho falsamente autónomo e pela subcon- taçào de serviços a outras instituiç&s do Estado como, por esempIo. a que. segundo a
Irataçío. pelo trahaiho ao domicilio e pela feminizaçäo da Iorça de trabaiho (associada nova lei do Serviço Nacional de Saúde inglesa, deve ocorrer entre diferentes hospitais
em gera! a urna major degradaçio da relaçäo salarial) Todas estas formas de re!açào sala- estatais Im prctaçào dc serviços hospitalares a esse Serviço. Tratase dc urna sìtuaçào
rial visam sujeitar os ritmos da reproduço social aos ritmos da produçäo («há trahatho muilo diferente da do período do capitalisnio liberal, ainda que. iaiìilti como cIa, carac-
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quando há cncomend,s», um processo que podenios designar por #rgtro do capitalof CVISION
do mercado o do PDFCompressor
terizada pelo prcdoniirio principio sobre principio Estado. Diferente
Pela 4áo dr Alke. O Social e o Pollico na Sithtitidadc (:iici(l:.. ¿ 1ììiunt.u5.âø

poFqILe. no periodo do capìraIimo 1ibera, nio foi neccssáno privatizar o


sector socia do de regulaçäo social em sibtituiçäo do modo fordista tern levado a que as soluçôes expe-
Eado. apenas fo necessrìo no deixar que ee emergsse;
difererne porque. no -or rmentadas, aldm de eniprícas (o adhocismo) e instáves (o stop and go, nilo s6 no domI-
do capitalismo desorganizado, o predomírno do principio do mercado ¡em urna forte nio económico. corno ta!nbdm nos dominios social e cultural), sejam contraditóras. Näo
dimenäo deokgica que ajuda a Iegtìmar a reaiva retirada do Esiado da preslação da admira. pois. que o exce-so de regulaço acabado de referir tenh-a convivido nos Ultimos
providência sociaL ao nierno tempo que ocufta o foialecimenio, apaentemerne con trdi- vinte anos corn movìtnetos emancipatórios poderosos, testernunhos de emergênci-a de
tói-io, da rnervenço do Estado na area económca a «pt-orecçAo» e vahilizaçäo de empre- nov05 protagonistas itum renovado espectro de inovação e transformaçâo sociais. A con-
sas os incentivos fiscais, o proteccionismo, ou a cobertura de sìtuaçöes de fanda técnica tradiçäo reside em que a hegemonia do mercado e seus atributos e exigéncias atingiu um
muitas vezes engendradas por meos fraudulentos, em suma. o «Etado-Provìdêncja das nivel tal de nawralìaaç±o sociaJ que. embora o quotidiano seja ìmpensvel scm ele, nao se
empresas». Por thimo, o predomno do prmncpio do mercado é agora thferente porque. ao lhe deve, por isso mesmo, qualquer lealdade cultural específica. É assim socialmente
contrário do que sucedeu no período do capitalismo lthera, faz apelo ao princIpio da posslvel viver sem duplicidade e corn igual intensidade a hegemonia do mercado e a luta
comunidade e s ideias que ele envolve. como, por exempto, as de particìpaço, soìdarie- contra cia. A concretizaço desta possibilidade depende de mulos factores. É, por exem-
dade e autogovet-no, para obLer a sua cumpìcdade idecdógica na 1egitimaço da transie- plo_ seguro dtzer que a dtÏuso social da produçäo contrihuiu para desocultar novas
rência dos serviços da providéncia socias estatal para o sector privado nao uc-ativo. formas de opresso e que o isolamento político do movimento operário facilitou a emer-
Apesar de todas as diferenças, o regresso do princfpo do mercado nos últimos vinse gncìa de nov05 sujeito sociais e de novas prdticas de mobi]izaço social.
anos representa a reva1daço sodal e política do ideádo 1ibera e, consecuentemente. a A sociologia da década de oìtenta foi dominada pela temtìca dos noves sujeitos
revaorizaçäo da subjetividade em detrimento da cidadania. Tambm neste domInio a sociais e dos novos mo\imentos sociais (NMS5). Mesmo aqueles que no partilham a
resposta do capital aprove1a e distorce sabiamente a1umas das rewindkaçòes dos mori- posiçio de Touraine ( i 97g), para quem o objecto da sociologia é o estudo dos movimen-
mentos contestatários dos iltimos trnta anos. A aspiraço de autonomia. criatividade e tos sociais, reconhecern que a última década impôs esta temática corn urna força scm
reflexvkiade transmutada em prvatsmo, dessociahzaçâo e narcisismo, os quais, aco- precedentes. sendo apenas objecto de debate o elenco e a hierarquìzaço das razUes expli-
piados à vertigem produdvisia, servem pat-a integrar, como nunca, os individuos na corn- cativas desse fenómeno. Trata-se. pois, de um terna sobre o quai se acumulou urna biblio-
pu1sio consumista. Tal integraço, longe de sìgniflcar urna cedência materialista, é vivida grafia irnensa, tanto nos paises centrais. como na América Latina, e que no cabe aqui
como expresso de um novo ideahsmo, um idealismo objectístico. A natureza do con- rever5. Interessa apenas referi4o brevemente na rnedda em que intersecta os dois pélos
sumo metamorfoseia-se. Para al&n de que alguns objectos de consumo nao tm quatquer eStflhItTaflteS do presente texto: a relaço entre regulaço e emancipaço e a relaço entre
existencia matetial (as magens digitais, por exemplo), a retracço da produço em massa subjectividade e cidadania.
e a sua gradual substituiço pela clientelizaçAo e personalizaçäo dos objectos transforma
A identiiicaçäo da intersecço dos novos movimentos sociais tiesta dupla relaço é
estes em características da personalidade de quem os usa e, nessa medida. os objectos tarda difícil. quanto mais no seja porque é grande a diversidade destes movimentos e ¿

iransitam da esfera do ter para a esfera do ser. O novo suhjectvismo é objectístico e o debatível se essa diversidade pode ser reconduaível a um conceito ou a urna teoria socio-
culto dos objectos d o ersaIZ da ìntersuhjectvidade. Estas transformaçöes são de tal modo Idica únicos. Urna definiçilo genérica corno a que. por Ultimo, nos é proposta por Dalton
profundas e arquetípicas que, para dar adequadamente conta delas, é necessíño proceder e Kuechler- <um sector significativo da populaço que desenvolve e define interesses
a transfonnaç5es também profundas e arquetípicas na teoria sociológica. Nas condiçes incompaliveis corn a ordern política e social existente e que os prossegue por vias no
Soclais dos anos noventa, o idealismo scr pruvavelmente a forma mais consequente de institucìonaliadas, in ocando potencialmente o uso da força física ou da coerção» (Dalton
materialismo. e Kuechier, 99O: 227 t - abrange realidades sociológicas tao diversas que o que destas se
Nesta nova confìguraçäo simbólica, a hipertrofia do prìncípo do mercado assinala um diz nela é aUna! muito pouco. Se nos paises centrais a enurneraço dos novos moví-
novo desequilíbro entre regulaçäo e emancpaço. Desta vez, o excesso de regulaço memos sociais inclui tipicamente os movimenlos ecológicos, feministas, pacifistas,
reskle em que subjectividade sem cidadanaconduz an nardsismo e ao autismo. antiracistas. de consumidores e de auto-ajuda, a enurnerac4o na América Latina - onde
também é corrente a designaçäo dc rnovímentos popu!ard ou novos movimentos popu-
s novos movmentos socias lares para diferenciar a sua hase social da que é característica dos movimentos nos países
centrais (a nova classe rnédia» -ë bastante mais heterogénea. fendo em vista o caso
Defenth acma que as duas tilftmas décadas foram experimcntas. Foram tambm con- brasileiro, Scherer-Warren e Krischke destacam a parcela dos movimentos sociais urba-

traditónas. O facto de até agora no se ter estah!izado nos parses centrais um novo modo

s. Entre b1tÌh.jfl1. cf- LO1) liVEOS recCntc mix'runtes ir&s doc quaj, co]ectieas). dois cm-
.- PcE aiim aF-li5es de Baudrard. consu]e eo]oa comuñcço leu
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da di 1-kh- nos MS- ¼i1çldOi tScott t99i. Da]on e Kcech]cr. 1990) e dois cenirados no
Raub s. 19S5 53 e
Am&: 52ocr\Vagc '.ls' da LFin c Krc1ie. 957: Larojcra.
Pela Mì de Ali&e. () S al e o Po/ituo na P(SMOdernlc/ad' Suh/e(tiidade (iUlOiUQ e E.rnaneipaçâo 223

:o% proprimCfl[e ditos. os CEBs (Comurndades Edesiais de Base organizaths a parir de nutro lado. porque as novas formas de opresso são reveladas discursivanienie nos pro-
idepos da Igreja Católica), o nova sndca1ismo urbano e, mais recenlemence, tam bén, cessos sociais onde se fonja a idemidade das vítimas, nïo há urna pr-constituiçio esImIo-
rural, o movimen(o feminista, o movmento ecokSgko, o movimento pacUista em fase de rai dos grupos e movimentos de emancipaçio, pelo que o movimento operario e a classe

r2am7aço sectores do movimento de jovens e ouros» e (rischke (SchererWan-en


operánia nílo têm orna posiço privilegiada nos processos sociais de ernancipaçâo. Aliás.
i97: 4) A enumeraço de Kämer. para o conjunto da América Latina. ainda mais o facto de o movinlento operánio dos países centrais ter estado muito envolvido na regula-
heterogénea e indui «o poderoso movimerno operário democthtico e popuku- surgido no cáo social fordista do segundo período do desenvolviutento capitalista tende a fazer dele

&asiL liderado por Luís Igncio da Silva (Lula), e que logo derivou no Partido dos Tra- um travão, mais do que um motor de emancìpaçäo neste terceiro período. Por último,
balhadores o Sandinismo, que surgìu na Nicarágua como um grande movimento social. mesmo que as novas opressôes no devam fazer perder de vista as veihas opresses, a
Je carícier pluriclassista e pluriideológico as formas diferentes que assumem a luta luta contra cIas nílo pode ser feita em nome de um futuro melhor mima sodedade a cons-
popular no Peru. tanto ao nivel dos hairros (Pueblos Jóvenes') como ao níve regional muir. Pelo contránio, a emancipação por que se luta visa transformaï o quotidiano das viti-

Frentes Regionais para a Defesa dos Interesses do Povo) as novas experiéncias de 'ere- mas da opresso aqoi e agora e no nuni future longínquo. A emancipaçáo ou corneça
\ es cívicas naciOnaiS, corn a particìpaço de sindicatos. partidos políticos e organizaçòes boje ou náo conieça nunca. Dal, que os NMSs. corn a excepçio parcia' do movimento
populares (grupos ecIesiÍstìcos de base. comitês de muflieres, grupos estudantis, cultu- ecológico, nào se mohilizem por responsabilidades ìntergeracionais.
rais, etc.) no Equador, na Colômbia e no Peru; os movimernos de ocupaçoes ilegaìs de As enumeraçòes dos diferentes movimentos citadas acima mostram por si mesmas
terrenos em So Paulo; as ìnvasôes maciças de terras pelos camponeses do Mexico e que esta nova relaçáo entre regulaçan e emancipaçäo sob o impacto dos NMSs é apenas
ouli-os países as tentativas de autogesto nas favelas das grandes cidades como Caracas. manifestaçio de urna constdlaçio político-cultural dominante, diversamente presente ou
Lima e Sào Paulo; os comités de defesa das Direiros Humanos e as Associaçes de Fami- ausente nos diferentes rnovimentos concretos. O que a caracteriza verdadeiramente é um
liares de Presos e Desaparecidos, sendo estas ditas dhimas iniciativas surgidas basica- fenómeno aparentemente contraditónio de glohaIizaçio-locaIizaço, tanto ao nivel da
mente dos movimentos sociais» (Kämer. 1987 26). regulaçáo, como ao iiível da emancipaçáo. A glohalizaço ao nivel da regulaçào tornada
Estas enumeraçòes sao. em si mesmas, reveladoras da identidade to-só parcial entre possivel pela crescente prorniscuidade entre produçilo e reproduçäo social atrás assina-
oc movimentos sociais dos países centrais e da America Latina, um tema a que voltarci lada. Se o tempo vital e o ternpo de trabalho produtivo se confundem cada vez mais, as
adiante Por agora, servem-nos para identificar aguns dos factores novos que os movi- relaçöes sociais da produçáo descaractenizarn-se enquanto campo privilegiado de domina-
mentos sociais das dms últimas décadas vieran, introduzir na relaçäo reguiaçio-emanci- ço e hierarquizaçäo social e o relative vazio simbólico assi, criado é preenchido pelas
paço e na relaçäo subjectividade-cidadania e para mostrar que esses factores näo estilo reiaçöes sociais de reproduçäo social (na familia e nos espaços públicos) e pelas reiaçòes
presenteS do mesmo modo em todos os NMSs em todas as regìoes do globo. sociaìs na produçâo (reiaçes no processo de trabaiho produtivo assalw-iado entre n-aba-
A novidade maíor dos NMSs reside em que constituem tanto urna crítica da regulaçio Ihadores, homens e mulheres, brancos e pretos, jovens e adultos, católicos e protestantes.
ocial capitalista. como urna crítica da emancìpação social socialista tal como cIa foi defi- hindus e muçulmanos, xiitas e sunitas).
iida pelo marxismo. Ao ídentificar novas formas de opressio que extravasan, das rda- Qualquer destes dois últimos tipos de relaçòes sociais tern vindo a adquirir crescente
es de produçâo e oem sequer Silo específicas dejas, como sejam a guerra, a poluiço, o visihilidade social nos últimos vinte anos Mas, coniraditoniamettte, este processo de visi-
:nachismo. o racismo ou o produtivismo. e ao advogar um novo paradigma social menos bìlizaçâo social só possivel ancorado na lógica (que no na forma) e na histonicidade da
assente na rìqueaa e no bern-estar material do que na cultura e na qualklade de vida. os dominaçilo pthpnia das relaçiles de produção.Ou seja, a difuso social da produçäo ao
\MSs denunciam, corn urna radicalidade scm precedentes, os excessos de regulaçäo da mesmo tempo que conduz ao despnivilegiamento relativo da forma de dominaçáo especi-
modemidade Tais ecessos atingem, nilo só o modo como se trabaiha e produz. mas flea das reiaçòes de produçAo (a exploraçio arravés da extracço da mais-valia econó-
arnbérn o modo conio se descansa e vive a pobreza e as assirnetrias das relaçöes soclais mica), possihilita que a lógica desta (extracço de mais-valia numa relaçáo social que nao
o a outra face da alienaçio e do desequilibrio interior dos individuos; e, finalmente, tern por 11m explícito tal extracçäo) se difunda socìaFmenteem todos os sectores da vida
'as k,rmas de opressio nao atingern especificarnente urna classe social e sim grupos social e, pon esta via, se giobabze. Quanto mais foie foi no passado a vivência social da
-'\iais iransclassistas ou mesmo a sociedade no scu todo dominaçan rias relaçöes de produçâo, mais intensa será agora a sua difusao social. A
Nestes termos. a demíncia de novas ormas de opressäo implica a denúncia das leonas mais-valia pode Ser sexual étnica. religiosa, elária, política. cultural; pode ter lugar no
.
dos movimenlos emancipatónios que as passaram em claro, que as negligenciaram hábito (que nän no acto) de consumo; pode ter lugar nas relaçôes desiguais entre grupos
u.udo nâo pactuaram mesmo corn cIas. Implica. pois, a crítica do marxismo e do movi- de pressio. partidos ou movirnentos políticos que decidem o armamento e o desarma-
uulo operario tradicional, bem conio a crítica do chamado «socialismo real» O que por mento. a guerra e a paz: pode ainda ter lugar nas retaçöes sociais de destruìçáo entre a
''te\ C visto corno factor de ernancipaçio (o bein--estar nuenial, o desenvolvirnenlo teC sociedade e a ìaturea, ou rne]hor entre os recursos Wios «humanos» e os recursos dito
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íactor de regu]açio. «natunhis» da
24 Pe/a .'fâo de A!jee O Soc/a! e o Potlüca na Suhjectividad' Cidadania e Eìnancipaço

Sem querer entrar no debate sobre a contnudade ou a ruptura entre os veihos e os senso comuni e o dia-a-dia vulgar, tanto píblico como privado, tanto produtivo como
nov05 movmenos socas9, pareceme irrccusve! que, scm a expenènca hsióñca d reprodutivo. desvulgarizam-se e passam a ser oportunidades dnicas de
investimento e
dominaço na esfera da proditçAo. no seria hoje soeia e cuftw-almente possível pensai a protagonismo pessoal e grupal. Dal a nova re!açao entre subjectividade e cìdadania.
reproduçO social em imnos de reaçöes de domnaço. E a verdade que os corn país
fortes NMSs tendem a ser países onde forarn e. quiçá, anda säo fortes os vebos rnov
mentos sociais. E por sso tamb& que, no dominio dos NMSs, a América Latina sohçes Subjectividade e cidadania nos novos movimentos sociais
sa destacadamente do resto dos países periféricos e semiperifércos.
o processo de globalizaçào no campo da reguaçâo ambém um processo de 1ocaI Um dos mais acesos debates sobre os NMSs incide no impacto destes na relaçäo sub-
aaço. A razzo ests em que, enquanlo formas de intersubjectvidade. as relaçòes sociais jectividade-cidadania. Segundo uns, os NMSs representam a afirmaçan da subjectividade
de reproduço e as relaçöes sociais na produçAo so muito mais concreuis e imediaas que perante a cidadania. A emancipaço por que lutam no politica mas antes pessoal,
as relaçòes sociais de produção. Enquanto estas imas se podem esconder e abstractizar socia' e cultural. As em que se
traduzem pautarn-se por formas organizativas (demo-
lutas

facilmente a1rs de máquinas, ñtmos de produço. normas de fabrico, regulamentos de cracia participativa) diferentes das que presidiram 'as lutas pela cidadania
(democracia
ftbrica, aquelas no so senflo vivências de relaçoes entre pessoas, entre grupos, entre Os protagonistas dessas lutas no sdo as classes sociais, ao contth-io do
representativa).

pessoas ou grupos e o ar, os dos. as florestas ou os animais, entre a vida e a morte. É que se deu corn o duo rnarshalliano cidadania-classe social no período do capitalìsmo
certo que tamb& aqui há mediaçöes abstractizantes, sejam elas as leis, os costumes, a organizado: são grupos sociais, ora maiorca, ora menores que classes, corn contornos
religiäo, o discurso político, a puhicìdade ou a ideia de progresso, mas quase nunca dis- mais ou menos definidos em vista de interesses colectivos por vexes muito localizados
pensam, quer a relação face-a-face entre opressor e oprimido, quer a relaço face-a-face mas potencialmente universalizâveis. As formas de opresso e de exciusdo conti-a as
entre a vítima e a causa da sua vitimizaço. Dal que o quotidiano - que ¿, por excelência, quais lutam nän podem, em gera!, ser abolidas corn a rnera concessAo de direitos, como
o mundo da intersubjectividade - seja a dimenso esplcio-tempora da vivência dos típicoda cidadania exigem urna reconverso global dos processos de socializaçäo e de
excessos de regu1aço e das opressocs concretas em que eles se desdobram. inculcação cultural e dos modelos de desenvolvirnento, ou exigem transfonnaçes con-
Ao nivel da emancipaçulo, ocorre também um fcnómeno correspondente de gobaliza- cretas irnediatas e locais (por exemplo. o cacen-amento de urna central nucleai a constm-
ç/io-localizaço. Urna vez libertada do encaixe estrutural que lhe conferiarn as relaçôes çäo de urna creche ou de urna escola, proibiço de publicidade televisiva violenta), cxi-
a

sociais de produço -o
Estado capitalista e o movimento operário - a tarefa de desoculta- gências que. em ambos os casos, exn-avasain da mcta concesso de direitos abstractos e
çäo das opressöes e da luta contra cias d potencialmente urna tarefa scm fini, tern um universals. Por último, os NMSs ocorrem no marco da sociedade civil e nào no marco do
sujeito social especificamente titular dela e sera I6gica de curnulatividade que pennita Estado e em relaçâo an Estado mantêm urna distância calculada, simdti-jca da que mantêm
distinguir entre ticica e estratéia. Os valores, a cuhura e a qualidade de vida em nome em reiaçäo ans partidos e ans sindicatos tradicionais.
dos quais se luta sao. por si mesmos. maximalistas e glohalizantes. insusceptiveis de fina- Esta concepçäo, que faz assentar a novidade dûs movirnentos sociais na afu-maçäo da
lizaçäo, e pouco inclinados para a negociação e o pragmatismo. Por outro lado, se na!- subjecrividade sobre a cidadania, tern sido ampiamente criticada. A crítica ruais frontal
guns movimentos discerolvel um interesse epccffico de urn grupo social (as mutheres. prnvtm daqueles que contestani precisamente a novidade dos NMSs. Segundo eles, os
as minorias étnicas, os favelados, os jovens), noutros, o interesse colectivo e o sujeito NMSs sdo. de facto, vethos (os movimentos ecológicos, pacifistas, feminìstas do século
social que os titula é potencialmente a hurnanidade no scu todo (movimento ecológico, xi_x e o movimento anti-racial dessa epoca e dus anos cinquenta e sessenta); ou so por-
movimento pacifista). Por último. a luta emancipatória, senda maximalista, dispöc de tadores de reivindicaçòes que forain parte integrante dos vethos movimentos sociais (o
urna temporalidade absorvente que compromete em cada momento todos os fins e todos movimento operário e o movimento agrário ou camponês); ou, por tUtimo, correspondem
os meios, sendo dificil o planeamento e a cumulatividade e mais provlvel a descontinui- a ciclos da vida social e económica e, por isso, a sua novidade, porque recorrente, é tao-

dade. Porque os momentos säo «locais» de tempo e de espaça, a fixaço momentânea da -só aparente. os modos de mobilizaçäo de recursos organiztivos e outros, e no a ideolo-
globalidade da luta tambm urna fixaçio localizada e por isso que o quotidiano deixa
ti gia, devem 5cr. para estes autores, o ponto fuicral da anális dos NMSs. Para esta segunda
de ser urna fase menor ou um hábito descartável para passar a ser o campo privilegiado concepço. o impacto procurado pelos NMSs é, em última instância, politico e a sua
de luta por um mundo e urna vida meihores. Perante a 1ransfoamaçio do quotidiano numa lógica prolonga a da cidadania que orientou os movimentos sociaìs do passarlo. A distAn-
rede de smnteses rnomentâneas e localizadas de deterrninaçòes globais e maximalistas, o cia dos NMSs ao Estado é mais aparente do que real pois as reivindicaçôes globais-locais

acabam sempre por se traduzir numa exigência feita an Estado e nos reamas em que o
Estado se sima na contingéncia política de ter de lhe dar respostat10. Aliás, a prova diso
- A iírto dc esempk. t. as ¡oçò d (.r&r Lnk t-a{199) te t3rmd (]99O 1vor1as leses

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u_ a no BF-1'ii]. por exempfr. ]'t3 e Pedro JaLØti


Subjecihidade, Cidadania e Emancipaçäo
Pela Mäo de Alice. O Social e û Polít ko na Pós-Modernidade 227

cidadäos, e a ideia da particìpaçäo e da solidariedade concretas na formwaçao da vontade


mesmo que os NMSs nâo raro jogam o jogo da democracia representativa. mesmo
que seja pelo lobbying e pela va extraparamentar. e entram em alianças mais ou menos
geral so as únicas susceptiveis de fundar urna nova cultura política e, em última insiân-
oficais corn sindicatos e partidos quando no se uansformani eks proprios em partidos. nova qualidade de vida pessoal e colectiva assentes na autonomia e no autogo-
cia, urna

yerno, na descentralizaçAo e na dernocracia participativa, no cooperativismo e na produ-


Em minha opinião. no preciso recusar a novidade dos NMSs para criticar as ilaçöes
çao socialmente útil, A polilìzaçâo do social, do cultural e, mesmo, do pessoal abre um
que dela retira a priineira concepço. A novidade dos NMSs, arno no dominio da ideoo-
campo imenso para o exercício da cidadania e revela, no mesmo passo, as lirnitaçòes da
gia como no das formas organizativas, parece-me evidentc, ainda que no deva ser defen-
dida em termos absolutos. Ta como Sco« (1990), duvido que os NMSs possarn na sua
cidadania de extracçäo liberal, inclusive da cidadania social, cireunscrita ao mareo do
Estado e do político por ele constituido. Sern postergar as conquistas da cidadania
tota1idde ser explicados por urna teoria unit&ia. Basia ter em mente as diíerenças signi.. social,

ticativas em tennos de objectivos de ideologia e de base socia! emre os NMSs dos países como pretende afinal o liberalismo político-económico, é possvel pensar e organizar
novos exerccios de cidadania - porque as conquistas da cidadania civil, política e social
centrais e os da América Latina. Entre os valores pós-materialistas e as necessidades bási
cas, entre as críticas so consumo e as críticas à auséncia de consumo, entre o hiperdesen..
nâo so irreversíveis e esto longe de ser Ienas -e novas formas de cidadania - co]ecti-
voh'imento e o sub ou anarco-) desenvohimento, entre a aiienaço e a forne, entre a
vas e no meramente individuals; assentes em formas político-jurídicas que. no contrário
dos direitos gerais e abstractos, incentivem a autonomia e combatain a dependência buro-
nova classe m&ia e as (pouco esclarecedoias) classes populares, enlie o Estado.Provi-
déncia e o Estado autoritário, vo naturalmente importantes diferenças. No se excluí, por
crtica personalizem e localizern as competencias interpessoaìs e colectivas em vez de as
sujeitar a padries abstractos; atentas às novas formas de excluso social haseadas no
outro lado, que aguns dos NMSs da América Latina ienham grandes afinidades corn o
sexo, na raça, na perda de qualidade de vida, no consumo, na guerra, que ora ocultam ou
tipo dominante de NMSs nos países centrais, mas, em geral. estäo correctos Femando
Calderon e Elizabeth Jeun quando aftrmam que. em contraste corn o que se passa nos paí. legitimarn ora complementam e aprofundain a excluso baseada na classe social.
ses centrais, «urna das características préprias da Amñca Latina é que nao há movimen No surpreende que, so regressar politicamente, o principio da comunidade se traduza

tos soclais puros ou claramente definidos, dada a multidimensionalidade, no somente em estrutunis organizacionais e estilos de acçAo política diferentes daqueles que forim
das relaçes sociais. mas também dos próprios senlidos da acço colectiva. Por exemplo, responsáveis pelo sen eclipse. Da! a preterêncìa por estruturas descentralizadas, no hie-

é prováve que um movimento de orientaço classista seja acompanhado de jufzos étnicos rárquicas e fluidas, em violaçAo da racionalidade burocrática de Max Weber ou da «lei de
ferro da olìgarquia» de Roben Michels. Dai
e sexuais, que o diferenciam e o assimilam a ouuos movimentos de orientaçào cu1tura tartibént a preferência pela acçäo politica näo

lista corn conteddos etassistas. Assim, os movimentos sociais so nutridos por inúmeras institucional, fora do compromisso neocorporath'ista, dirigida à opinio pública, corn
dos meios de comunicaço
energias, que incluem em sua constituiço desde formas orgânicas de acçäo social pelo forte utilìzaçAo social. envolvendo quase sempre actividades

conirole do sistema político e cultural até modos de transformaçâo e participaço quoti- de protesto e confiando na mobilizaçâo de recursos que eas proporcionare. Dialectica-

diana de auto-reproduçäo societária» (in Ponte, 199 28 ). A men ver, reside tiesta
1
mente, esta novidade nas estruturas organizativas e no estilo de acção política éo ein que
liga os NMSs aus veihos movimentos sociais. Através dala continuam e aprofundam a
cimpureZa» a verdadeira novidade dus NMSs na América Latina, e o seu alastrainento
aos NMSs dûs países centrais é urna das condiçoes da revitahxaço da energia emancipa- luta pela cidadania, nilo senda por isso correcto justificar corn cia urn pretenso desinte-

tóña destes movimentos em gerai A medida que isso suceder, será mais verosímil a resse pelas questöes da cidadania nos NMSs, como fazem Melucci (1988) e outros.

teoria unitaria. Para já. sé é possve1 falar de tendências e de opçôes em aberto. Näo enjeito urna certa normatividade tiesta análise e, num campo de opçes em
A novidade dos NMSs no reside na recusa da política mas, ao contrário, no alarga- aberto, a p[efer.nda pela opçäo mais optimista ou proinissora. São conhecidas as limita-
mento da política para além do marco liberal da distinço entre Estado e sociedade civil. çöes dos NMSs e começa hoje a ser comum afirmar-se que o sen momento de apogeu já

os NMSs partent do psssuposto de que as conftadiçies e as oscilaçes periddicas entre o passou. E debatível se a relação tensa ou de distância calculada entre a democracia repre-
principio do Estado e o princípio do mercado so mais aparentes do que reais, na medida sentaliva e os NMSs tern sido benéfica ou prejudicial para estes últimos. Segundo uns,

em que o trânsito hLs6rico do capitalismo é feito de urna interpenetraço sempre cres- essa tensão ou distância é responsével pela instabilidae, pela descontinuidade e pela
incapacidade de universalização de que os NMSs tm enf geniI padecido e que são afinal
cente entre os dois pincípìos. urna interpenetraço que subverte e oculta a exterioridade
formal do Estado e da política perante as reaçöes sociais de produçào. Nestas condiçöes, responsáveis pelo impacto relativamente resUlto dos movimentos na transforrnaçäo poll-
invocar o principio do Estado contra o principio do mercado mir na armaditha da radi- tieR dos paises onde tm ocurrido. Por exemplo, Tullo Vigevanì aponta os riscos de
calidade fácil de ransfonnar o que existe no que j existe, como é próprio do discurso assembleismo, plebiscitarìsmo e messianismo, decurrentes de no existir «nenhurn tipo
político oficial. de institucionalizaçâo», de nao existirern «os mecanismos necesslrios à construçäo da

ApeNar de estar el próprio tnuìto colonizado pelo principio do Estado e pelo principio vontade colectiva», e é levado a perguntar-se pela «abrangência quantitativa dos movi-
do niercado, o principio da comunidade rousseauiana o que tern mais virtualidades para mentes Sociais» ( 1989: 108). Mas, por outro lado, coni urn sucesso muito diferenciado,

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1UrKlu evaluation copy ofconvertendo-se
alguns movimentos tam-se
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novas energias emancipatórias. A ideia da obrigaço politica horizontal, entre em PDFCompressor
disputando «institucionalizado», partidos e
-. Pela Mao de Alice. Q Social e o Po/Inca na Pós-Modernidade Subjec$ividade, Cidadania e Emaîcipaçäo 229

Iítìca partidárìa, corn o que correm, neste caso, o risco oposto de a esnutura organiza Na Africa de lingua oficial portuguesa os NMSs so os movimentos de libertaçio que
a

tva dO p1tidO do movimento subverLe a do


movimento que onduziu ao partido e de essa conduzìram os reus países a independancia. Sâo moviinentos dos anos sessenta, passaram
bvCrSO atingir a pft5pria ideologia e os objectivos do movimento. um risco bem expresso por vrias fases e nao admira que estejam boje a enveLbecer Deixando de lado as muitas

n,' lorma de facconismo própria destes partidos, entre pragmatismo e fundameatalismo. diferenças entre eles, pode dizer-se que numa prirneira fase, até independencia, foram
Dada a grande diversklade dos NMSs, impossA'el fajar de um padro inìco de rela- movimentos políticos de guenitha, corn apoio popular de tipo plebiscitario informal ou de

çös entre democracia representativa (quando esta existe, pois. na Amdrica Latina a hita ratificaçâo e que nas zonas libertadas implantaram por vezes formas de democracia parti-
do NMSS em sido muitas vezes por ela) e a democracia partcípadva O facto de essas cipativa que, nas condiçöes dìfceís em que ocorreram, se podem corniderar avançadas,
rehiçöes quaisquer que sejam. sereni sempre caractenzadas pela tenso e pela convivên- corno terá sido particularmente o caso do PAIGC na Guiné-Bissau. Numa segunda fase,

cia difícil enire as duas formas de democracia no me parece em si mesmo negativo, urna entre a independência e o final dos anos oitent.a, esses movimentos corneçaram por insti-

vez que é dessa tenSO que Se im libertado muitas vezes as energías emancipatórias tucionalizar-se em partidos de movimento e gradualmente. e corn diferenças entre eles,
necesslhias à arnpliaçäo e redefinição do campo pof1ico. Acresce que. mesmo quando as evoluiram para partidos de vanguarda de tipo leninista. A memOria democrática cedeu
formas de institucionahzação são mais ténues, a descontínudnde das NMSs pode ser ento an autoritarismo. Hoje esto a passai- por urna nova fase de institucionalizaço,
mais aparente que real, pois, corno afirma Paulo Krischke, é necesso tomar em conta as dolorosa, radical e promissora: a conversâo em partidos democráticos no emergente sis-
contribuiçes positivas das movimentos «tamo para a memOria coectìva da socedade tema de democracia representativa. O PAIOC de Cabo Verde e o MLSTP de São Tomé e
como para a reforma das instituiçöes» (1987 2S7). Semethanremente, para Inglehart Príncipe säo j hoje partidos da oposiçäo.
(1990: 43) e Dalton e Kuechier (99O: 227), os NMSs são sinai de transfûrmaçôes globais Portugal é tu país semiperiférico no contexto europeu, pelo que no espaço mundial
no contexto politico, social e cukural da nossa contemporaneidade e, por isso, os seas de lingua oficial portuguesa no é possível verificar o contraste, em termos de NMSs,

objectivos serâo pane permanente da agenda politica dos próximos anos, independente- enu países centrais e perif&icos. Se a tradiçAo dos velhos movirnentos sociais (partidos,

mente do sucesso, necessariamente diverso, dos diferentes movimentos concretos. sindicatos, movirnentos agrários) é, no Brasil, acidentada, nAo o é menos em Portugal, e
os quarenta e nito anos de ditadura salazarista foram mesmo neste domûiio um «acidente»
mortaIt'. Dal que o que caracteriza verdadeiramente Portugal nestes últimos vinte anos
Os NMSs e o sistema mundial: Brasil, Africa e Portugal é o facto de os veihos rnovimentos sociais serern novos e os NMSs, no sentido político
corrente, serem muito fracos, caiguas casos, mesmo inexistentes. A longevidade do
Estas transformaçies ocorrem desiguabnente no sistema mundial, peto que a identi- interregno salazajista no impedìu que subsistissem na clandestinidade o Partido Cornu-

dade dos NMSs no pode deixar de ser parcial. Se nos paises centrais combinam demo- nirta e, nos últimos anos da ditadura, o Partido Socialista; täo-pouco impediu a existencia
cracia paiticipativa e valores ou reivindìcaçöes pós-materìalistas. na América Latina corn- de um movimento sindical clandestino, autónomo em relaçäo ao credo corporativo mas
binant, na mamila das situaçôes, democracia parlicipativa corn valores ou reivindicaçes sob a tutela do Partido Comunista. A verdade, porém, t que, uns condiçôes da clandestini-

de necessidades básicas. To importante quanto a análise da idemidade parcial dos NMSs dade, nem partidos nern sindicatos podiam ter impacto alargado na vìda política e sociaL
é a an1ise da desigualdade da sua ocorrncia de país para pais e a diversidade entre des A revoiuço de 25 de Abril de 1974 permitiu finalmente aos velbos movirnentos
dentro de cada país. Isto mesmo se confirma se nos detivermos um pouco no espaço do sociais da democracia representativa assumirem urna presença ampliada e nova na aneje-
sistema mundial culturalmente definido pela lingua portuguesa. dade portuguesa. Mas porque o fez num contexto revolucionario. durante um curto
o Brasil, corn urna tradiço acidentada de velbos movimentos sociais, conheceu na período (1974-76) emergirain, paralelamente aos velhos-novos movimentos sociais,

década de setenta e de oitenta um notável florescimento de NMSs ou de movimentos NMSs norteados pelos piincípios da democracia parlicipativa e corn objectivos ora pOs-

populares de que dá fiel testemunho abundaste bibliografia, à quai, sués, tenho vindo a -materialistas e cuiturais, ora de satisfaçâo de necessidades b&sicas (movimento pacifista
recorrer ao longo deste capítulo. Provaveimente devido ao carácter semiperifdrico da contra o envio de tropas para as ainda colOnias, movimerto ecológico, movimento fend-
sociedade brasìleira, combinam-se nela movimentos serneihantes aos que so típicos dos nista, movimento de autoconstruço, movimento de ecuaçao de casas, movimento de
países centrais (movimento ecológico, movimento feminista -- ainda que as reivmndica- ecupaço de tenas, movimento de creches e clínicas populares, movimento de educaçao
çòes concretas sejam distintas), corn movimentos próprios orientados para a reiviadicaço de base e de dinamizaçäo cultural etc., etc.). Devido à revoluço, os velhos e os novas
da democracia e das necessidades básicas (comunidades eciesiaìs de base, movimentos movirnentos sociais nasceram, por a.ssim dizer, ao mesmo tempo e, durante um curto
dos sam-terra, rnovimenios de favelados). Mas tanto as semeihanças como as diferencas período, conviveram em regime de grande tenso e contradiço social, em disputa pela

têm de ser especificadas. Em Cubatio um movimento ecológico nada tima de pOs-mate- forma de democracia a privilegiar. democracia representativa ou democracia parlicipativa.
ñaIist seria a reivindicaço de urna necessidade bsìca. E. pelo comrário, entre «ecu-
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panfrs%Clvgens»de Berlim e dc São Paulo näohaverásódiíerenças
A t t- anise comparada desta tradçto esu por razen e clama pani ser 1ea.
Pela Mo de AJie. O Sockil e o Poilico na Pós-Modernklade Subjeiividade, Cidadania e Emancipaçâo
23!

Passado poém, esse breve periodo, os vehos-novos inovimentos soçiais conquista- Esta breve referência aos NMSs no espaço de Hngua oficial portuguesa do sistema
am gradualmente plena hegemonia; em contrapartida, os NMSs esto1aram, dcsaparece mundial Leve por objectivo ilustrar a extrema diversidade de situaçóes que se esconde por
ram e no reemergiram aé boje (ainda que, nos ltimos tempos, tenbam começado a dar detras da «nova era política» (Kuechier e Dalton, 1990: 285) instaurada pelos NMSs. Do
alguns sinais de vida, nomeadamente o movimento ecológico). A anátise deste fenómeno que nao resiam dóvidas, poróm, que os NMSs, nos países onde ocorreram corn mais
estâ OF fazer e nAo pode obviamente ser feita aqui. O dfice de movimento social na intensidade, significaram urna ruptura corn as formas organizativas e os estilos politicos
sociedade portuguesa de hoje no certamente reconduthel a um sé factor Entre as
&
hegemónicos e o seu impacto na cultura e na agenda política desses países transcende em
pistas de investigaçäo a prosseguir, as seguntes parecem de privilegiar. A memória exal- muito as vicissitudes de trajectória dos movimentos em si mesmos. O impacto residiu
tante mas tambm cafarnanica do periodo revoucionrio investiu a democracia repre- especificamente numa tentativa de inverter o trânsito da modernidade para a regu1aço e
sentativa, a sua estabilidade e as suas mtinas, de um especia' capital político e simbólico. para o excesso de regulaçAo, corn o esquecirnento essencial da emancipaçào, ao ponto de
Acresce que, sendo nova, a democracia representativa näo esgoiou ainda a sua capaci- fazer passai- por emancipaço o que no era, afinal, senäo regulaço sob outra forma. A
dade de mobìlizaçäo, tanto mais que, num curto espaço de tempo -- e, de facto, em curto- emancipaço pôde, assim, regressar aos dizeres e fazeres da intersubjectividade, da socia-
-circuito histórico - a cidadania civica e poiftica e a cidadania social ampliarain-se lizaçào, da inculcaçäo cultural e da prática politica. O impacto residiu tambdm mima ten-
extraordinariamente, ainda que a última bastante limitadamente e hoje, mesmo assim, em tativa de procurar um novo equilibrio entre subjectividade e cidadania. Se na aparência
fase de recesso. Poderd, pois, admiûr-se como hipótese de trabalbo, que a produtividade alguns NMSs se afirmaram contra a cidadania, foi em nome de urna cidadania de nivel
social e polftica dos vethos-novos movimentos soclais foi suficiente para dispensar a superior capaz de compatibilizar o desenvolvimento pessoal corn o colectivo e fazer da
emerg&lCia forte dos NMSs. «sociedade civil» urna sociedade politica onde o Estado reja um autor privilegiado mas
Urna outra pista de investigaço tern a ver corn a possivel ligaço. acima anotada, entre a no único. Por todas estas razes, os NMSs n.o podem deixar de ser urna referencia centrai
lógica dos velbos movimentos e a dus NMSs. A falta de tradiçAo em Portugal de urna forte quando se trata de imaginar os caniinhos da subjectividade, da cidadania e da emmcipaço
acço classista abre o carninbo, quer para a acçäo anarco-basisia em perlòdos de convulsâo nos anos noventa.
social, quer para a acçào hiperpoitizada de cúpula em períodos de estabilidade democritica-
Zermeño, citado por Paulo Krisebke, refere como parrcu1aridade da história mexicana o
facto de os movimentos socais gerarem muito cedo a sua «superpolitizaçäo» (Kriscbke, Os anos noventa
1987: 799). Curiosamente, e por certo por razôes diferentes, Lipietz refere a «tendência
especificarnente fnmcesa» de os movimentos sociais «se politizarern demasiado rapida- Se as dens últimas décadas foram experimentais, natural que os anos noventa tragam
mente» a fmi de conquistarern representaço politica e medi(tica (Lipietz, 198& 91). Por o aprofundamento de algumas das experiências, a menos que a sociedade do futuro passe
razôes também diferentes destas, seria de propor, como hipótese de trabatho. que a forma de a dispensar um modo específico e dominante de se autopmduzir e faça da instabilidade
superpolitizaço em Portugal consiste em os gérmens de NMSs se desviarem facilmente das experiências novas a única forma vivel de estabilidade. E tambm possível pensar,
para o político constituido antes mesmo de conduzirem à criaçào dos movimentos. lima como quer algum pós-modemismo, que o que houve de uovo nestes últimos vinte anos
ilustraçio disto mesmo estaria na ligaç otesca que urna fracçào do movimento ecoló- nào cessará de serepetir, como novo, nos anos vindouros, nào nos restando outra atitude
gico tern mantido a nivel parlamentar corn o Partido Comunista, misturando por convenién- senào perder o hgbito de imaginar outras possibilidades para alérn do que existe e cele-
cia deste 1ltimo, o aniipmdutivismo ecológico e o hiperprodulivismo de rau 'eninista. brai o que existe como sende o conjunto de todas as possibilidades irnagináveis. Esta -

Urna ti1tirna pista de investigaçAo, relacionada corn as anteriores, consistida na averi- que
teoria, tern a peculiaridade de ser indeterminista em relaço ao presente e deteimi-
guaçào do impacto da falta de «agenten externos» que se dediquern aos movimentos e nista em rehço an futuro, no nos impede contudo de imaginar outras teorías possíveis
invistam neles o capìtal profissional. ideológico, cultural ou politico de que dìspöem. O onde caiba a diferença do futuro e a nossa diferenca em relaço a ele.
papel dos agenteS externos tern sido salientado por diversos autores, ainda que tal papel Se fosse conecto falar de «patologias da modemidadej. diilanios que cias consistiram
seja objecta de debate. No Brasil, por exemplo, tern sido referido o papel de pro fissionais até agora em subsinteses entre subjectividade, cidadania e emancipaço que resukaram
e da Igreja Católica e mesmo de alguns partidos politicos na organizaçäo dos movimentos em excessos de regulaçào, os quais. alis, se insivaram por vezes sob a forma de aman-
Soclais (Jacobi. 1987: 264). A hipótese de trabalho seria, oeste caso: a) que em Portugal cipaçöes, posteriormente denunciadas como falsas. Nas secçöes anteriores referimos ais
os partidos politicos «nasceram» em 1974 contra os movimentos sociais; b) que a Igreja excessos em suas diferentes formas e o Quadro apresenta-o de modo sinóptico.
Católica é conservadora e tern sabido esmagar ou cooptar quaisquer veleidades de mili-
täncia progressista de padres ou leigos; c) que, finalmente, os profissionais têm sido aî6
'gura eficarmenie cooptados pelos partidos corn o aliciante da participaçäo cientel1stica
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1ts beneficios da govemaçào ou mesmo da oposiçào.
232 Pe/a Mâo de A/ice. O Social e o Poiftico iw POs-Modernidade Sbjeaiidade. Cidadania e Emancipaçäo 233

QUADRO formas mais complexas de democracia pode conduzir à elasticizaço e aumento do


Excessos de Reßu/açäo máximo de consciencia possfvel, caso em que o capitalismo encontrará um modo de con-
ViVenCia corn a nova configuraçâo democrática, ou pode conduzir perante a rigidificaço
desse máximo, a urna ruptura ou, melbor, a urna sacesso histórica de micro-rupturas que
apontem para urna ordern social pós-capitalista. No possivel determinar quai sers o
resultado mais provável. A transforrnaçäo sociai ocorre sem teleologia nern garantia. E
esta indeterminaçäo que faz o flimm ser fumro.
A renovaçäo da teoria democrática assenta, antes de mais, na fonnulaçAo de critérios
democraticos de participaçâo poiftica que no confinem esta au acto de votat Implica,
pois, urna ariiculaço entre democracia representativa e democracia participativa. Para
que tal articuIaço seja possfvel é, contudo, necessário que o campo do político seja radi-
cairnente redefinido e ampliado. A teoria política liberal transformou o político numa
diinenso sectorial e especializada da prtica social -o espaço da cidadania -.- e confmou-
Seria descabido analisar aqui cada um deles. Concebo-os como &feentes subsuifleses -o au Estado. Do mesmo passo, todas as outras dimensöes da prática social foram despo-
via, ficaram
da modemidade isto é, constclaçöes sócìo-politicas que, por urna ou outra litizadas e, corn isso, mantidas imunes au ezercício da cidadania. O autoritarismo e
aquin de urna sintese conseguida cntr subjectividade, cidadania e crnancipaçäo, daido mesmo o despotismo das relaç5es sociais «não-polfticas» (económicas, sociais, fami-
dela urna verso truncada desfigurada perversa. Perante os fracassas da teoria crítica
liares, profissionais, culturais, religiosas) pôde assim conviver sern contradiçäo corn a
moderna, que está, aliás, por detras de algurnas das formas de falsa ernancipaço, a tarefa democratizaço das relaçôcs sociais «políticas» e sem qualquer perda de Iegitirnaço para
da teoria crítica pós-modenia consiste em apontar de novo os caminhos da síntese, estas últimas.
mmando como método, por um ado, a citaçäo de tudo o que de positivo existiu na expe- A nova teoria democrática deverá proceder à repolitizaço global da prática social e o
riência histórica da nossa contemporaneidade, por mais negativa que tenba ocasional- campo político imenso que dal rnsultará permitirá desocultar formas novas de opressfto e
mente sido, e, por ouro lado, a disponìbilidade para identificar o que de novo caracteriza de dominaçAo, au mesmo tempo que criard novas oportunidades para o exercício de
a em-
o tempo presente e dele faz verdadeiramente o nosso tempe. O esiorço teórico novas formas de democracia e de cithdania. Esse uovo campo politico näo é, contudo,
preender deve induir urna nova teoria da democracia que permita reconstruir o conceito
um campo amorfo. Politizar significa identificar relaçòes de poder e imaginar formas pth-
de cidadania, urna nova teoria de subjectividade que permita reconstruir o conceito de ticas de as transformar em relaçöes de autoridade partilhada. As diferenças entre as rda-

sujeito e urna nova teoria da emancipaçäo que nAo seja mais que o efeito teórico das duas çöes de poder silo o princípio da diferenciaçäo e estraiiticaço do político. Enquanto
primeiras teoras na j-sfonnaço da prática social levada a cabo pein campo social da tarefa analítìca e pressuposto de acçäo prática, d thu importante a globalizaçâo do político
emancipaçdo. Abordarei neste capítulo apenas a questho da nova teoria democrática
e dus
como a sua diferenciaçAo.
seus coolários para urna nova teoria da emancipaçäo O tratamento da teoria da subjecti-
Como referi no quinto capitulo, distingo quatro espaços políticos estruturais: o espaÇo
vidade será feìto noutro lugar. da cidadania, ou seis, o espaço político segundo a teoria liberal; o espaça domestico; o

espaço da produço; e o espaço mundiaL Todos estes espaços configuram relaçöcs de


poder, embora sé as que so próprias do espaço da cidadania liberal sejam consideradas
Para urna nova teoria da democracia políticas e, portanto, susceptíveis de democratizaçäo política. Cada um deles um espaço
político específico a suscitar urna luta democratica específica adequada a transformar as
O capitalismo no é criticável por nao ser democrático, mas por no ser suficiente- relaçoes de poder próprías desse espaço itas i-elaçes de ailturidade partilbada.
mente democrático. Sempre que o princIpio do Estado e o principio do mercado encontra- O espaço doménico continua a ser o espaço privilegiado de reproduço social e a
ram um modus vivendi na democracia representativa, esta significou urna conquista
das
forma de poder que nele domma é o patriarcado. Entre os NMSs, o movimento feminista
classes trabaihadoras, mesmo que apresentada socialmente como concessäo que lhes foi
tern desempenhado um papel crucial na politizaço do espaço domestico, u seja, na
feita pelas classes dominantes. A democracia representativa é. pois, urna positividade e desocuitaço do despotismo em que se traduzem as relaçôca que o constituem e na for-
como tal deve ser apropriada pelo campo social da emancipação. mulaçio das lutas adequadas a democratizá-]as. Obviamente, a discriminaço sexual nao
A democraciz representativa consiituiu at agora O máximo de consciencia política se limita au espaço doméstico nero é sempre resultado do exercício do poder patriarcal;
possível do capitalismo Este máximo nio urna quantidade fixa urna relaçäo social A
t
mas este como que estabelece a matriz a partir da qual outras formas de poder sao socia'-
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complementaço ou o aprofundamento da democracia representativa através de outras legitimadas para dìscriminaçào sexual.
234 Pela Mäo de Ahce. O Social e o Polinco na Pós-Modernidade Sabjectividade, Cidadania e Emancipaçáo 235

o capitalismo no mnvenou o patriarcado e pode mesmo diier-se que tern em reIaço sente derìvam de estarmos a entrar num periodo em que a negociaçäo sindical e a repro-
a ele urna trajec6ña histórica ambivalente. Se, por um lado, se aproveilou dele para se sentaçAo politica n-adicionais perdem eficácia e at legifimidade junto dos trabaihadores
apropriar do i:rabalho no pago das muffiees, levando este a participar -a outra rno thvi- sem que, corfludo, as relaçes sociais de produçào se desnaturalizern, se destrivializem e,
síve a fazes par corn a do mercado - nos custos da reproduço da força de u-abatho que em suma, se repolirizem. Pe'o contrário, a eficcìa passada do movimento operário trans-
devam, foutras circunstâncias, ser integralmente cobertos peto sa1rio, por outro lado. formoii-se perversamente no maier obstcu10 à sua sobrevvência nas novas condiçes de
libertou parcaImente a muTher de submissôes ancestrais, mesmo se sé para a submeer à acumulaçào de capital.
submissäo moderna do trabaiho assaaiado. Apesar de dcbatíve ¿, no entano, aluuuente Nestas condiçöes, urna das tarefas centrais da nova teoria democrática consiste na
improvável que o m,xtmo de consciencia possivel do capitalismo possa vir a integrar o poliEização do espaço da produço. Numa tradiço que vem de Marx, de Karl Renner e de
Íim da dscriminaço sexual. Em quaiquer caso. a politizaçào do espaça domsüco -.- e, Michael Burawoy, defendi noutro lugar (Santos, l985)(2) que a fábrica 6 urn micro-
poi-tanto, o movimento feminista - é um componente fundamental da nova teoña da -Estado onde é posrivel detectar instituiçôes isom6rficas do campo politico 1bera1, só que
democracia. muito mais despóticas (o direito da pmduço, a lealdade à empresa, a distinçAo entre o
o espaço da produçäo o espaça das relaçöes soclais de produço e a forma de poder público e o privado a representaço das -abalhadores, as coligaçes, etc.). A evoluço
que Ihe própria é a exporaçio (extracço de mais-vaia). A dfuso social da produçào recente tern sido, contudo, no sentido de heterogencizar e descaracterizar cada vez mais
e o isolamento politico do operariado na pmduçâo ajudaram. nos ultimos vinte anos, a as relaçôes de produço. No p610 benevolente, so detectheis relaçôes de produço rela-
tomar social e politicamente meoos importante o quotidiano do trabatho assalariado, urna tivamente horizontalizadas, corn urna convivência entre capital-trabalbo que mais parece
evoluço para que de resto coniribuiram os centistas soclais ao desviarem a sua atenço organizada segundo o principio da comunidade do quo segundo o principio do mercado;
analfiica, anLo da brutalidade das reIaçies concretas de pmduçào (a violência dos ritmos so as empresas-comunidade. onde trabaiha a nova aristocracia do operariado. No polo
de produço; a violentaço física e psco16gica dos irabathadores; a degradaçäo das con despótico, pululam as sweat shops do 11m do século e a exploraçäo do trabatho infantil,
diçes do local de rabalho, nomeadamente das condiçoes dc segurança e de sa1ubridade) caracterizados por relaçöes de produçäo cuja violência as aproxima da pithagem típica da
como da brutalidade das relaçôes na produço (as rivalidades e a concorrência, a delaçäo acumulaçn primitiva; são as empresas-campos de concentraçäo onde trabaiham os hilo-
e os furios entre trabaihadores; a degradaço moral das relaçies face-a-face e o iso'a- tas do nosso tempo. Entre os dois pOlos so imensas as gradaçöes e as variaçes.
mento autístico como exigencia de sobrevivncia). Esta heterogeneidade das relaçôes soclais de produçào. que, obviamente, sempre exis-
Por esta razão, o espaço da produçäo perdeu pmtagonismo social e cultural e os sujei- tiri mas é hoje mais descaracterizadora do que nunca, torna a relaçao social entre capital e
tos sociais nele constituidos, sobretudo o operariado, peso político. Mas enquanto espaço trabalho menos específica e a reIaço económica entre lucros e salarios menas definida.
de organizaço multmoda da força de iabatho assaiariado, o espaço da produço hoje A mais-valia económica é cada vez mais to-s6 urn dos componentes de urna relaço de
mais central do que nunca e a sua hegemonie aumenta corn a difuso social da produção poder onde se misrurarn, para além dola, rnais-valias étnicas, sexuais, culturais e políticas.
corn a ideologia do produtivismo e do mercado, corn a compulso do consumo A articu- Se esta nova impureza das relaçöes de produço contribui para a crescente ineficácia e
1aço entre o isolamento político do operariado e a difuso social da força de trabalbo desactualização do movimento operário tradicional, por outra lado, cria oportunidades
assalariada é responsáve! pela siaço paradoxal de a força de trabaiho assalariada ser insuspeitas para cidadanizar o espaça da produØo. Quanto menos o trabaihador for só
cada vez mais crucial para exp'icar a sociedade contemporânea e o operarìado ser cada trabalhador, mais viável se toma o trânsito político e simbólico entre o n-abaffiador-cida-
vez menos importante e menos capaz de organizar a uansfommçäo nào-capitalista desta. doo e o cidado-trabalhador.
Se tal transforrnaçâo no pode ser feta só corn o operatiado. tâo-pouco pode ser A politizaçAo do espaça da produçào multidimensional. Envolve, em primeiro lugar,
scm ele ou contra ek. Para isso. porém, preciso alterar as estrat#gias e as práticas dos a relaçäo capital-trabaiho. independentemente da sua qualidade, a quantidade desta reiz-
velbos movimentos soclais do operariado. dos partidos operários e dos sindicatos. O çäo continua a ser a sua característica mais específica mesrno apesar de nos últimos tern-
movimento operthìo obteve conquistas notáves - sobretudo no segundo período. o do pos se ter de algum modo informalizado, Dal que as iutis pela diminuição da jornada de
capitalismo organizado, e nos países centrals - no sentido de integrar sodal e potìca- trabaiho tenham um forte conteddo político. E o mesmo sucede corn as lutas que visem o
mente os trahaihadores mediante urna partitha mais justa da riqueza por eles criada. Tais aumento da participaçào e da codeterminaçân nas decises da empresa. Em segundo
conquistas forain, no entanto, obtidas, entre outras coisas, à custa da total sepataçâo entre lugar, a politizaçäo do espaça da produço envolve as relaçoes na produçào. O que distin-
o espaço da ckladania e o espaça da produçäo por via do quai o oper&ío-cidadào renun- gue as mais-valias émicas, sexuais, culturais e políticas é que olas, ao contrário da mais-
ciou possibulidade de vir a ser um cidadão-operário. A negociaçäo sindical e a represen-
'a
-valia económica, podem existir nas reIaçes entre irabaihadores. O «operrio de massa»
açäo política do movimento operário, que lorarn tAo importantes para meihorar as candi- ou o operário colectivo» terminau (se alguma vez exislìu) e preciso tirar disso todas as
coes de vida des trabaihadores, oram tambtm decisivas para naturalizar, trivializar e em
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Suma,
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de produçäo. Neste dominio,
despolitizar as relaçôes dilemas da
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os sìtuaçäo pre-
12. Csu ambérn oqin10 apít]o.
236 Pela Mo de Alice. O Social e o Político a P6sModernidade SubjecEividade. Cidadania e Emancipaçäo
237

consequências. As relaçäes de poder entre trabaihadores na produço podem viokntar o importantes factores. O primeiro são, como já referi, os imperativos económicos impostos
quotidiano do trabatho assalariado tanto ou mais que a rebição entre capital e trabatho. A pdas empresas multinacionais no processo de transnacionalizaço da pmduçâo. Trata-se
ocuaçfto desea forma de poder em nome de míticas solidariedades constitui um acto de das decisòes de investimento das empresas multinacionais feitas à escala mundial articu-
despoliiizaçAo e de desarme potico. ladas corn condiçöes e exigencias localizadas postas às diferentes economias nacionais e
Em tercem lugar, a poliizaçäo do espaço da pmduçäo envove os pocessos de traba seas Estados. Tais decis&s e condiçes investern-se de tal necessidade e inevitabilidade
Iho e de produço e nomeadamente a componente tecnológica e a das chamadas matérìas que se furtarn a quaquer controle ou internacional, E, por nao poderem
político nacional

-primas. Vivemos num tempo de automatismo tecnológico que leva ao parothmo a assi ser tratadas politicamente, tendern a deixar de ser consìderadas políticas. O segundo
metria entre capacidade de acço e capacidade de previsAo. Decorrem dal iscos e danos factor consiste no que Leslie Sklar designa por «cultura-ideologia do consumismo»
possves toais, insocializáves e nsegurveis demasiado grandes para poderem ser por (1991: 41). Trata-se da estratégia simbólica do capitalismo transnacional no
sentido de
eles responsabilizados os indvíduos, como consta do paradigma liberal da responsabili- integrar na lógica do consumo todas as classes sociais do sistema mundial e
multo espe-
dade e obviamente ünpunes se a humandade for responsabilizada no scu todo. Neste cialmenie as classes populares dos países periféricos e semiperifricos.É um processo
dominio, a politizaçäo do espaço da produçAo consiste na desocuhaço das reaçies antigo mas que nos dltimos anos assumiu urna qualidade diferente corn a nova ordern da
socìais de poder que consthuem o automatismo tecnológico -o quai. por essa via, deixa informaço mundial e corn o controle global dos mercados mediáticos e da publicidade.
de ser automático - e na imaginaçäo de alternativas tecnológicas que possibilitem o ree- Pressup& urna separaçAo grande entre a prática do consumismo e o consumo de pro-
quilíbrio entre capacidade de acçâo e capacidade de previso. datos, ou seja. entre o consumismo, enquanro prtica cultural-ideológica, e os produtos
A pcditizaçäo da tecnologia no possve1 sein a das chamadas mat&ias-primas, ou em que ele na maieria dos casos nAo se pode concretizat Os dois factores esto interli-

seja, scm a poliizaço da reaço natureza-sociedade no espaço da produçAo. A thstinçäo gados, corno seria de esperar As empresas muliinacionais so os grandes velculos da cul-
narureza-sociedade faz boje pouco sentklo, urna vez que a namreza cada vez mais a tura-ìdeologia do consurnismo e térn desemperihado urn papel crucial ern aumentar
segunda nawreza da sociedade- A narureza urna rdaço socias que se oculta atras de si expectativas consurnistas que no podem ser satisfeitas, anm futuro previsível, pela
própria e que por isso dup1arnene difícil de politizar. Contudo, perane os riscos çia
t massa da populaço do chamado Terceiro Mundo.
catástrofe ecológica, tal politizaçäo estg já a impor-se e as civagens politicas do futum A polithaço das práticas transnacionais é urna condiçäo sine qua non da desoculta-
assentro crescenternente nas diferentes percepçôes destes riscos. A po1itizaço da nafti- ço das relaçes de poder que se escondem por detras das necessidades «naturais» de pro-
reza envove a extenso a esta do conceito de cidadania, o que signì&a urna transfor- duçAo e de consumo e da transfonnaçäo de tais relaçes de poder em relaçôes de autori-

maço radical da ¿tica política da responsabilidade berat, assente na reciprocidade entre dade parliThada. Neste campo, a prtica transformadora assentar na criaço de obriga-
dkeitos e deveres. Serl entho possíve airthuir direitos à natureza sem. em contrapartkia, çóes polfticas horixontais de âmbito transnacional, entre cidados e grupos sociais das

er de the exigir deveres. A ecologia e o movimento ecológico sao. assim, partes jute- diferentes regiöes do sistema mundial. E no devem ser escamoteadas as dificuldades de

grantes do processo de poltizaçio do espaço da produço, embora os seus objectivos se tal empreendiinento, pois é sabido corno, no passado, o desenvolvimento da cidadania
estendarn por quaquer dos outros espaços estruturas. Nas condiçoes do firn du século. a nos países centrais foi obtido à custa da exc!uso das populaçöes coloniais e pós-coloniais
forma de polltizaço mais conseguida do espaço da produço o antiprodutivismo.
t nas periferias e serniperiferias do sistema mundial.
o espaço mundial é o conjunto dos impactos em cada formaçäo socia' concreta decor- A nova leona de democracia - que tarnbdaì poderfarnos designar por teoria democra-
renies da posiçAo que ea ocupa no sistema mundial. A forma dominaine de poder no tica pés-moderna para significar a sua ruptura corn a teoria democrática liberal - tern,
espaço mundial a tinca desigua' entendida em termos sociológicos, mais ampos que os pois, por objectivo alargar e aprofundar o campo político em todos os espaços estruturais
termos económicos em que a teoria da troca desigua' foi originalmente desenvolvida. As da interacço social. No processo, o prOprio espaço politico liberal, o espaço da cidada-
relaçies de troca desigual entre países centrais, perif&icos e serniperiféricos sempre tive- nìa, sofre urna transformaço profunda. A diferenciaçäo das lutas democráticas pressupöe
ram urna forte dimensAo política, como o atestam as guerras, o direito internacional a imaginaçâo social de novos exercícios de democracia ¿de novos critérios democráticos
pUblico e as organizaçòes poifticas internacionais. Em tempos recernes, esta dimenso, para avahar as diferentes formas de participaçáo política. E as transforrnaçöes prolon-
que sempre conviveu corn outras, económicas, culturais e religiosas. tern vindo a perder garn-se no conceito de cidadania, no sentido de eliminar os noves mecanismos de exclu-
terreno face às Outras dimensòes e tern-se mesmo deixado nterpenetrar por cias ao ponto säo da cidadania, de combinar formas individuais corn formas colectivas de cidadania e,

de ser difícil determinar o que especificarnente político nas relaçòes entre Estados. Em finalmente, no sentido de ampliar esse conceito para além do principio da reciprocidade e
meu entender. esta tendencia parece irre'ersível e só poder ser eentualmente contra- simetria entre direitos e deveresJ Aqui entronca a necessidade de urna nova teoria da sub-
riada atravs da politizaçäo da diferentes pniticas transnacionais, ernte as quais se devem jectividade que será tratada noutra ocasián.

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de
Trata-se
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incluir as relaçöes entre Estados.

devido nos
urna larefa difícÌ
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anos de A últimos vinte dois
Subjectividade. Cidadania e Emancipaçao
238 Pek Mo de Alice. O Soiai e o Polírio na POs-Modernidade 239

renciaçâo da prática social tern como corolário a descentraçao relativa do Estado e


Para urna nova teoria da emancipaço do prm-
cípio do Estado. A nova cjdjcJaja tanto se constitui na obrìgaçao politica vertical entt os
A nova teoria da emancipação -
paiie da deia de que do porno de vista do politico, cidadäos e o Estado, corno na obrigaçäo política horizontal entre cidadãos. Corn
loriza-se o principio da cornunidade e, corn ele, a ideia da igualdade sem mesmidade, a
ìsto, reva-

alargado e aprofmdado pela nova teoria dernocráìca - os anos sessenta apenas começa-
ideìa de autonomia e a ideia de solidariedade. Enb o Estado e o mercado abre-se um
ram e continuaro a sei urna referência centrai nos anos noventa. Isto porque, corn todas as
campo imenso - que o capitalismo só descobriu na eso-ita medida em que o pode utiliz&
Iimitaçöes e fracassos atrás assinalados, os movimentos sociais dos anos sessena tentaram
para seu beneficio - nao nao mercaitil onde é possível criar utilidade social
pela primeira vez combater os excessos de regulaçào da modernidade atravs de urna nova
estatal e

atravs de trabaiho auto-valorizado (trabaiho negativo, do ponto de vista da extracçào da


equaçäo entre subjetividade, cidadania e emancipaçAo. E certo que o nAo conseguiram
rnais-valia) uma sociedade-providéncia transfigurada que, soro dispensar o Estado das
eficazmente, mas provaratfl pelo seu fracasso a necessidade de continuar esse combate.
prestaçles sociais a que o obriga a reivindicaçâo da cidadania sociaJ, sabe abrir caminhos
o colapso dos regimes totalitárìos do Leste Europeu teve, entre muitas outras, duas
prOprios de emancipaçào e nao se resigna à tarefa de colmatar as lacunas do Estado
consequências que aqui interessa Feaiçar. Por um lado, fez corn que perdesse sentido a e,

deste modo. participar, de forma benévola, na oculiaçao da oprnssào e do excesso de


distinçäo entre industrialismo e capitalismo de que se alirnentaram as teorías do pós- regu-

-industrialismo e do pós-capitalismo. O sistema rnundìa é um sistema industi-ia capita-


laçAo. O cultivo desse campo imenso, que tern viudo a ser tentado corn êxito diferenciado
pelos NMSs, será o produto-produtor de urna nova cultura. Nao «cultura polítka porque
lista transoacional que integra em si tanto sectores pré-indusiriais, como sectores pos-
-indusirlais. Por outro lado, a ideìa do socialismo foi libertada da caricatura grotesca do
toda a cultura ¿ política. Cabe recordar aqui, a terminar, o mabí teórico africano deste
sculo, Amílcar Cabrai, para guem a cultera e o renascimento cultural constituem, por
«socialismo real» e está, assim, dìspnnível para voltar a ser o que sernpn foi a utopia de
exceléncia, a pedagogia da emancipaçAo.
urna sociedade mais justa e de urna vida melbor, urna ideia que, enquanto utopia, ¿ tao
necesslria quanto O pÓpriO capitalismo.
Designar-se o conjunto das praticas emancipatórias po socialismo nao tern outra legi-
Referáncias Bibliográficas
tirnidade enAo a que Ihe adv&n da historia, urna histOria de claros-escuros que, por nao
termos outra, nâo deve ser enjeitada. sob pena de ficarmos suspensos sobre um montao
ALMEJDA. M. H. e B. Sorj (orgs) (1988), Sociedade e Política zw Brasil Pós-64, Sao PaWn:
imenso de lixo histórico corn a ilusao de nao sermos nôs prOprios a parte vazia da clepsi-
Brasiliense.
dra donde escorreu esse lixo. Porque a transforrnaçao ernaucipatória nao tern teleologia BARBELEI. J. M. (1988), Citizenship, Milton Keynes: Open University Press.
oem garantia, o socialismo nâo é, à partida, nern mais nem menos provävel que qualqueí BRAND. Karl-Werner (1990), «Cyclical Aspects of New Social Movements: Waves of Cultural
outro futuro. Criticism and Mobilization Cycles of New Middle-Class Radicalism», in Dalton e Kuechier
Mas, enquanto futuro, o ocialìsmo nao será nunca mais do que urna qualidade (orgs): 23.
ausente. Isto é. serí um principio que regula a transformaçao emancipatória do que existe CARDOSO, Ruth (1988), «Movimentos Soclais Urbanos: um balanço crítico», in Almeida e Son
scm, cornudo, nunca se transformar em algo existente. Dada a acumulaço de riscos inso- (orgs.).

cializáveis e inseguíeis. da caustrofe nuclear à catástrnfe ecológica, a transformaçào CARRILHO. Manuel M. (org.) (1991), Dicionôrlo do Pensameuto Contemporáneo. Lisboa: D.

ernancipatória será cada vez mais investida de negatividade. Sabemos methor o que nao Quixote.

queremos do que o que queremos. Nestas condiçäes, a emancipaçao nao ¿ mais que um DALTON. Russel e M. Kuechler (orgs.) (1990), Challenging the Poliilcal Order: 1kw Social and
Politica! Movementr in Western Democracies, Oxford: Polity Press.
conjurno de lutas processuais scm fim definido. O que a distingue de outros conjuntos de
FOUCAtJLT, Michel (1975), Surveiller et Punir, Paris: Ciallirnard.
lutas é ø sentido político da processualidade das lutas. Esse sentido é, para o campo social
FOUCAULT, Michel (1976), La Volonié de Savoir. Paiis: Gaflirnard.
da emancipaçAo. a ampliaçao e o aprofundamento das lutas democráticas em todos os FOUCAJLT, Michel (1980), Power/Xnowledge, Nova lorque:/antheon.
espaços estruturais da prática social conforme estabelecido na nova teoria democrática FR/NK, Andrd G. e M. Fuentes (1989), Dez Teses Acerca ds Movimentos Sociais», Lue Nova.
acima abordada O socialismo é a democracia ,cemfim. 17: 19.
Porque é urna qualidade ausente. o socialismo será tao adjectivado quanto for exigido FRANK. Manfred (1985), Dar individuelle Allgemeine, Frankfurt/M.: Snhrkamp.
pelas lutas democxtìcas. Neste momento, o socialismo será ecológico, feminista, antìpro- FRANK. Manfred; G. Raulet e W. van Reijen (orgs) (1988). Die Frage nach dem Subjekt, Frank-
dutivista, pacifista e anti-racista. Quanto mais profunda for a desocultaçao das opressöes furi/M.: Suhrkamp.
e das exclusöes. maior será o ndmero de adjectivos. O socialismo o conjunto dos seus HABERMAS, Jtirgen (1982). Theorie des Konvnunikaiiven Handelns. 2 volumes, Franldun/M.:

adjectivos em equilibrio dinârnico. socialmente dinamizados pela democracia seni um. Suhrkamp.

Urna ta concepcio da emancipaçào implica a criaçao de um nova senso cornum poll- New1NGLHART, Ronald 1990), «Values, Ideology, and Cognitive Mobilization in
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Movements»,
tico. A conversào da diferenciaçao do político no modo privilegiado de estruturaç5o e due-
in
(

Dalton e Kuechler (oras): 43.


Social
240 Pela Mäo dc Alice. O Social e o Poilhico na POS-Mc4ernidade Sthjectiidade, Cidadania e Emancipaçäo 24

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lo

O NORTE, O SUL E A UTOPIA

Introdução

Em 1841 , Charles Fourier, o grande pensador da utopia, nvech'ava os cienistas


socais -
que ele desgrava como «os fi1ósofo das ciências incerta» por sisematca-
mente se esquecerem dos problemas fundamentals das ciéncas de que se ocupaxn. Assim,
dìzia se tratam da economia industrial, esquecem-se de estudar a associação entre os
homens que a base de toda a economia; se tnuam da política, esquecemse de tratar da
taxa de popu1aço cuja medida justa está na base do bem-esuìr do mundo; se tratam da
adrninisraçäo nao especulam sobre os meios de operar a unklade administrativa do globo
scm a quai nao pode existir nem ordern fixa nem garantia do futuro dos imperios; se
tratam da indústria prática, esqueceni-se de investigar as medidas oprssivas da burla, do
açambarcameflo e da agiotagem que so a espoliaço dos proprietários e os entraves
directos circulaçâo; se traam da moral, esquecemse de reconhecer e de -eclamar os
threitos da muiher coja opresso destrói as bases da jusiça e, fina1mente se ratai dos
direitos do homem. esquecem-se de reonhecer o direito ao trabaiho que, em verdade,
nao possível na sociedade actual, mas seni o quai todos os ouros din,itos so iníteis
(Fourier. 11841], 1967: 181). Concluía assim que os cientistas socials tinhain essa «pro
priedade bizarra», essa «&ourderie méthodique». de se esquecerem dos problemas fiinda
mentais, das questSes primordiais.
Em rerospecto, as razöes e os exemplos invocados r Fourier so bastante convin-
cenes, pelo que cabe perguntar se boje. ceurn e cinquenta anos depois, a sìniaçâo mudou
significativamente ou nâo, Será que as ci&icias sociais esio hoje mais bem equipadas
para no se esquecerem dos problemas fundamentais ou, pelo contrario, continuam a
esquecê-Ios sistematicametfle? Será que sAo boje menos ou mais incertas que o eram há
cento e cinquenta anos? E verdade que alguns des problemas que Fourier considerava
enäO flrndamentais foram mais tarde reconhecidos e tratados pelas cincas sociais, mas
será que os problemas fundamentais corn que hoje nos defroriamos são diferentes desses
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e continuam a ser esquecidos por nós'! Formulada assim, esta pergunta contém urna dupla
244 Pela Mao de Alice. O Social e o Político aa PósModernidade O Norte. o Sul e a Utopia 245

arxnadi1ha Se os prob'emas contnuam a ser os mesmos, isso sgniftca que nâo tm tismo deslegitimou, à partida, a ideia de alternativas globais e. sempre que o nào conse-
provavehiiente so1uço e nessa medida no há que culpar por isso as cncias sociaìs; se. guiu, deslegitimou a voniade colectiva de lutar por elas. Talvez por isso, o nosso século
ao coflUáriO OS prob'emas fundamentals so boje diferentes. o facto de nos embrarmos tenha sido tao pobreem pensamento utópico. Mesmo o socialismo, sempre que se preten-
de os ter esquecdo significa que no esto de todo em todo esquecidos, pelo que algum deu como urna alternativa global apresentou-se como científico.
progresso ocorreu neste domfro. Em ambos os casos, as ciências sodais surgem a urna E notOrio que a ciéncia moderna em geral e as ciéncias sodais em particular atraves-
lui mais favorve do que aquela que Fourier ihes dirgiu. sam boje urna profunda crise de conflança epistemológica. Paradoxalmente, urna major
Neste capítulo parto de très pressuposLos. O prixnero pressuposto ¿ que as ciências consciencia dos limites do conhecimento científico vejo criar urna major disponibilidade
sociais são boje mais incertas que o cram ao tempo de Fourier. Por um 'ado, a certeza a para a abordagem dos problemas fundamentais, das questies primordiais. Os antoihos
que ele aspirava no foi obtivel atravt5s de refinarnentos t&nicos e rnaternticos e multo que antes orientavam o othar científico tern viudo a perder opacidade e progressivamente
menos quando estes se an'og&am, pela irnaginaçAo de Fourler conferir preciso e rigor tudo o que dantes ficava na obscuridade ilumina-se agora e revela-se afinal como possi-
aos prodigios da utopia e as exravagâncias do deejo e da paixo. Por outro lado, a incer- velmente multo importante. Esta perda de conflança epistemolögica ests certamente rela-

teza decorreu da extrema diversidade e da contlitualidade internas das correntes cien- cionada coin processos de transformaço social que nào só cessaram de agravar os pro-

ficas, que aum& exponenciamente de Fourier até aos nossos dias. O segunda pres- blemas fundainentais identificados por Fourier. como derarn orìgem a muitos outras cuja
suposto ¿ que, em resultado dessa diversidade e conflitualidade, se é verdade que algumas turbulência nos processos societais é cada vez mais sentida e sofrida, se no por toda a
comntes cientificas continuarn a esquecer-se dos problemas fundamentals, outras prirnam hurnanidade, pelo menos pda esmagadora maioria dela.
em CntaT identificá-los. Os cientistas sociais que omitem tratar dos problemas fundarnen- Desta convergéncia entre dmndmicas epistemológicas e societais resulta nào só a major

tais fazem-no quase sempre corn a justiñcaço de que a clência tern um campo cognitivo visibulidade dos problemas fundamentals, corno também a maior urgência no encon-
prOprio e privilegiado e que tudo o que no cabe nele, longe de ser fundamental, no é trar sokiçöes para eles. E por esta razo que alguns, entre os quais me incluo, entendem
sequer relevante. Pelo contrário, os cientisas socìais que se afadigam mt identificaç& dos que estamos a entrar num período de transiçäo paradigmática, tanto no plano epistemoló-

problemas fundamentals partem da ideia de que a dificuldade desies, longe de thes ser gico - da ciencia moderna para um conhecimento pOs-moderno - como no plano societa'

imputada, deve ser impunida à inadequaçäo dos melos científicos e politicos que têm sido - da sociedade capitalista para outra forma societal que tanto pode ser methor como pior.
adoptados para a sua ideinificaçâo ou soluço. Entre eles, é grande a divisio quanto à Para quem assim pense. a época em que entramos é urna época de grande turbuléncia, de

identificaço dos problemas julgados fundarnentas e ainda maior quanto às so1uçes para equilibrios particularmente instáveis e regulaçes particularmente precárias, urna época
eles propostas O terceiro pressuposto deste capítulo ë que hoje, em final do século, os de bifurcaçoes prigoginianas em que pequenas alteraçöes de estado podem dai origern a
cientisas soclais nào podem deixar de se posicionar nurn ou noutro campo Pela minha convulses incomioléveis. em suma, urna época fractal corn mudanças de escala impre-
parte, coloco-me no campo daqueles que seinem urna dupla obrigaço científica e política visíveis e irregularidades difíceis de conceber dentro dos nossos parämetros ainda euch-
de no se furtarem ao traarnento dos problemas fundamentais, de o fazerern conhecendo dianos. No entanto, como já referi nos capítulos anteriores. se é verdade que as formas de
os limites do conhecimento que mobilizarn e aceitando a diversìdade e a conflitualidade regulaçäo socìa da modemidade - sejarn cIas o direìto estatal, o ordismo, o Estado-
de opiniôes como seado a um ernpo reflexo desses limites e melo da sua sempre incoin- -Provklêncìa, a familia heterossexual excluida da prnduço, o sistema educativo oficial, a

pleta superaçAo. democracia representativa, o sistema ctime-represso, a religiäo institucional, o canone


o que são problemas fundamenais? Como se pode ver pelos exemplos dados por 1iterrio, a dualidade entre a cultura oficial baixa e a cultura oficial alta, a identidade

Fourier, so problemas que esto na raiz das nossas ins1ituiçes e das nossas préticas. nacional - parecein hoje cada vez mais precrias e questionáveis, nAo é menos verdade
modos profundamente arreigados de estruturaçio e de acçäo sociais considerados por que esto igualmente fragilhzadas e desacreditadas as formas de emancipaço socia! que
alguns corno fontes de conradiçôes, antinomias, incoerèncias, injustiças que se reper- Ihes corresponderam até agora, sejam etas o socialismo e o comunismo, os partidos
Cuem corn intensidade variável nos mais diversos sectores da vida social. Tais repercus- operérios e os sindicatos, os direitos cívicos, políticos sociais, a democracia parlici-
sôes são cumulativas, pelo que são vistas em processo de agravamento continuo e coni a pativa, a cultura popular, a filosofia crítica, os modos de vida alternativos, a cultura

possibilidade de desenlaçes mais ou menos graves a médio ou a longo prazo. A profundì- de resisténcia e de protesto. Perante isto, perfile-se urna dupla responsabilidade e urna

dade e a amplitude deste tipo de problemas suscitain soluçöes também profundas e amplas dupla urgência. Por um lado, ir às raizes da crise da regulaçäo social e, por outro, inventar
e ai reside a dificuldade específica deste tipo de problemas. As apanas que eles levantam ou reinventar ndo sO o pensamento emancipatório como também a vontade de emanci-
às cinçias socials resultam em boa medida do lacto de estas, na sua veiào hegemónica paçio.

moderna. se terem especializado na produçào do conhecimento adequado engenharia de É nests postura que me proponho analisar de seguida alguns des vectores dos proble-
soluçòes de curto prazo, estreitas no âmbito e superficiais na espessura. Este tipo de mas que, em minha opinio, são j hoje undamentais e sê-lo-ío, e multo mais. nas prOu-
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mais do que web optimization
científico, e dominada using
de
isso,
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urna cultura por este tipo cien- mas décadas para, na última pane, traçar o mapa do terreno onde podem ser quetidas e
O Norte, o Sul e a Utopia 247
Pela Mo de Alice. O Socgal e o Político na Pósfodernìdade

outros como capitalista, reside no esgolarnento das virtualidades de desenvolvimento


buscadas algumas a1emathas emancpatórias em nada envergonhadas ou ofendidas por
societal. Assiste-se, por um lado, à eroso dramática dos mecanismos institucionais e cul-
scram ditas utópicas.
tarais que at agora corrigiarn e compensavam os excessos e os defices sociais do desen-
volvimento capitalista do que resulta urna sensaço de desregulaço global - e, por
outre lado, é visível um total bloqueamento de sohiçöes para o impasse, no apenas de
Os problemas rundamentais nos diferentes espaços-tempo
soluçöes mais radicals corno de soluçöes relativamente moderadas. Dal que os cientistas
sociais incluidos neste grnpo tentem combinar a análise do bloqueamento coin o desenho,
a discussâo ou a especulaço de possveis alternativas. Alguns autores ou correntes cen-
O espaço-tempo mundial
tram-se em alternativas ecológicas (entre matos exemplos. as correntes de ecologia radi-

da revista Capitalism, Nature, and Socialism ou Lester Brown e o grupo do


Entre os cientistas sociais que se no tém furtado i abordagem dos problemas funda-
cal à volta

State of the World), outras em alternativas sOcio-políticas. como Alain Tourarne, Andre
mentais da sociedade contemporanea so muitas as diferenças e, corn algum risco de sim-
Gorz, Ernest Laclau, Chantai de Mouffe, Joshua Cohen. JouE Rogers, e outros ainda em
plificaço, so discerníveis as seguintes posiçes principais, apresentadas scm qualquer
alternativas sócio-económicas, como Alain Lipiet. Michel Aglietta, John Roemer, e
ordern de bierarquia. A primeira é a dos que reconhecem que a sociedade liberal moderna
finalmente outros, em alternativas de governo transnacional, como Richard Falk e Saul
tern vindo a defrontar-se corn alguns probtemas fundamentals, o mais fundamental dos
Mendlowitz.
quais tern sido a oposiço radical que nos últimos cern anos the foi movida pelos movì-
Estas diferentes posiçöes. diferem, entre outras coisas, quanto ao elenco dos proble-
mantos socialista e comunista. Concluem que, no enianto, a sociedade liberal moderna
mas fundamentals que estabelecem. ainda que sejam muitas e, por vezes, fastidiosas as
no só acabou por neutralizar esta oposiço como resolveu todos os grandes probernas sobreposiçôes. Por outra lado, diferentes diagnósticos suscitam diferentes ênfases anali-
que the foram postos. Por essa razAo é legítimo admitir que estamos perante o fim da his-
ticas e interesses prospectivos.Como se tornará claro adiante, a anlise e a pmspectiva
tória, urna posiçâo a que Fukuyama (1992) deu recentemente grande notoriedade.
que apresentarei a seguir esto próximas das duas últimas posiçes. ou soja, da posiçäo
Segundo outra posiçO, se a sociedade contemporânea, sobretudo a capitalista avan-
das que procedern a urna crítica epistemológica da modernidade e dos que se centram no
çada, defronta algum problema fundamental, ele é antes de todos o proHema de no ser
bloqueamento e na busca de alternativas.
passive! pensar OS probkmas fundamentais. A sociedade de consumo a cultura de
societal

Parto de um modelo analitico que identifica os principals processos de estruturaço e da


massas e a revoluçäo da informaçio e da comunicaço superficializou tanto as condi-
prática social, constelaç&s de relaç&s sociais que asseguram no conjunto o sentido e o
çÖes de exiS1flCia como os modos de a pensar. ¡sto no necessariamente um maL E um
ritmo da transfcumaçâo social ou o bloqueamento desta. Ao contthio de outros modelos,
facto. e pode até ser mais auspicioso que o contráño. Muitas das concepçöes ditas pós-
como por esempIo, o que distingue entre o Estado e a sociedade civil, este modelo pode apli-
-modemas que eu designo por pós-modernismo reconfortante, perfilbam esta posiçäo, e
car-se tanto a sociedades nacionais como a sociedades subnacionais e sociedades transna-
nela cabem BaudriUard, Lyotard, Vatlirno, etc.
cionais. Como referi no quinto capítulo, distingo qualm coastelaçes de relaçòes sociais que
Um terceiro grupo de cientistas sociais tern vindo a privilegiar o questionamento dos
designo por espaços-tempo estruturais: o espaço-tempo dorndstico, o espaço-tempo da pro-
pressupostos epistemológicos da modernidade mantendo que forain eles. hem como o
duço, o espaço-tempo da cìdadania e o espaço-tempo mundial. lm relaçAo a cada um deles,
tipo de racionalidade cognitivo-instrumental e de conhecimento t&nico-cienilfico em que
me afiguram fundamentais, advettindo, no entanto,
passo a identificar os problemas que se
desembocararn, os grandes responsáveis pelo abandono da reflexAo sobre os protdernas
desde já, que a probematicidade do tempo presente e a das próximas d&adas (digamos at
fundamentals. A distinço sujeito-objecto, a separaço total entre meios e fins, a concep-
2025) no advm de nenhum desses problemas em separado, mas da conjunção entre eles.
ço mecanicista da natureza e da sociedade, o cisma entre factos e valores e a objectivi- Começarei pelo espaço-tempo mundial, o espaça-tempo das relaçöes sociais entre
dade concebida como neutralidade, urna ideia do rigor quantitativo e euclidiano iniiniga
sociedades nomeadamenie enire Estado-Naçäoo do sistema mundial
da complexidade e insensvel à fractalidade dos fenómenos, urna teorizaço pretensa-
territoriais, interior

A
mente universalista, mas na realidade androcêntrica e etnocêntrìca - tudo isto conspirou
e da economia-mundo. intensificaço da globalizaçâo da economia e das interacçöes
transnacìonais em geral nas duas últimas dtcadas tern viudo a conferìr a este espaça-
para crìar um buraco negro episiernolégico volta dus grandes problemas da vida colec-
-tempo urna relevâncìa crescente em virmde do poder conformador das suas vibraç&s no
tiva e das relaçoes interculturais. Trata-se de um grupo muito heterogéneo onde é possível
incluir }labermas, Touhnìn. Hirschman, Murray, Bookehin, Wallerstein e (iiddens, por
interior de cada um dos restantes espaças-tempo. O problema fundamental do espaça-
-tempo mundial é a crescente e presumivelmente ineversivel polarizaçäo entre o Norte e
urn lado, loucault e Dart-ida e a epistemologia feminista, por outro, e talvei um terceiro
o Sul, entre países centrais e países periféricos no sistema mundial. Este problema cam-
grupo. f1CkìC Jameson. Edward Said e G. Spivak.
Por ñtlinjo, o grupo de longe mais hetemgneo é O dos cientistas para quem o pro-
porta urna grande plw-alidade de vectores. Salientarei apenas tres deles: a explosào demo-
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globafttaço da economia copy
blcp' hìidamenta1 da sociedade contemporanea. que uns concebem como jiidustrial e
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degradaço gráfica, a e a ambiental.
O Norte, o Sul e a Utopia 249
248 Pela Mao de Alice. O Social e o Político na POs-Modernidade

debare corn o problema da expioso demográfica, o Norte começa a preocupar-se corn o


A explosäo demográfica
crescimento negativo da populaçan e corn o enveihecimento desta.
Em pthneiro 1ugar o vector da exptosâo demográflca Entre 1825 e 1925 a popuIaço
Estas disparidades ilustram urn fenómeno mais vasto, que consiste no facto de o
mundial duplicou de I biliäo de pessoas para 2 biliöes Nos cinquenui anos seguintes ambito trausnacional de alguns problemas emergentes nao eliminare C fltS pela contthiu
vûltou a duplicar para 4 biliäes e entre 1975 e 1990 passou de 4 bilies para 5,3 biliäes de
agravar, a polarizaçao entre o Norte e o Sul. Disse acirna que das três vias históricas de
pessoas. As projecçôes para as próximas décadas variam, mas. a fazer jus a urna projec-
soluço positiva da explosio demogrìca, os países do Sul têm à sua disposiçào apenas a
çao modeiada, em 2025 a popu1aço mundia' seri de L5 biliocs de pessoas. O facto mais
emigraçao. A verdade é que, na prrica, essa via ests quase totalmente bloqueada. Entre
decisivo desta exposo é que eta terá lugar em esmagadoa medida nos pafses perifé-
1820 e I 930, 50 mithöes de Europeus emigrararn para o Ultramar e quase sempre (corn
icos. A nidia do crescimento popnaciona1 mundial esconde diferenças abssais e é por excepção das LUA) para palses rnenos desenvolvidos e sujeitos au dominio colonial ou
isso que a populaçäo de Africa, que era em 1985 cerca de metade da populaçAc da pós-colonial. Hoje nenhurn movimento de xnbito proporcional poderá ocorrer. Nào
Europa, será provavelmente em 2025 tres vezes maior que a populaçäo da Europa. Noia-
esqueçamos que o movimento é agora do Sul para o Norte, para a Europa, a América do
tras partes do Sul o crescimento popuaciona1 será do mesmo teor. A India poderá passai
Norte e a Austrália. e os países centrals thu meios eficazes para se defender da emigraçao
no mesmo período dos 853 mìthôes actuais para I ,5 biliôes, urna populaçao semeihante à
rnaciça. É certo que ha mithoes de pessoas em processo de deslocaçào e cerca de I 5
que CIá ento a China; o Mexico poderá passar de 88 mith&S para 150 milhes; o bao
rnilhes aguardarn em campos de internamento a opoitunidade de poderum vir a refazer
de 56 mithes para 122 milhòes; e o Brasil de 154 milhöes para 245 mithes. Acresce que
foutra lugar a sua vida, mas o controlo das fronteiras, o proteccionismo, o racismo e a
mais de 50% desta populaçào viver em cidades congestionadas, sam habitaçao nem
xenofobia sero obstáculos poderosos à busca de urna vida meihor. Thdo leva, pois, a crer
saneamento adequados, sem serviços soclais mínimos, a braços corn a forne e o desem-
que os elevados padröes de vida e de consumo vigentes no Norte nAo seräo partithados
prego de vastas massas de populaçào. corn o colapso ecológico e provavelmente a vio-
corn o SuL
1ncia- Segundo as methores projecç&s no frnai do scuIo, I I das 20 maiores cidades do
Por outra lado, é hoje generalizado o consenso de que esses padrôes no podem ser
mundo (corn I I mi1hes ou mais de pessoas) sarao cidades dos países periféricos ou
alargados à populaçào mundìal no sou conjunto. sob pena de os recursos naturals e os
seniiperifiricos: Cidade do M&ico corn 24,4 milhöes, Sao Paulo corn 23,6 miihoes, Cal-
equilibrios ecológicos sofrerern a cuxto prazo desgastes fatals para a sobrevivncia da
cutá corn 16 rnithes, Xangai corn 14,7 miIhÔCS.
vida na terra tal como a conhecemos. Isto sera assim, mesmo que a população nAo
A explosílo dernogrfica torna-se um probkma quando produz um desequilibrio entre
aumente tanto quanto se prevê. Apesar de urna desaceeraçAo goba1 no crescimento anual
a populaçào e os recursos naturals e SOCaiS pata a sustentar adequadarnente e um pro-
da populaçAo desde 1970 no período 1965-70 o crescimento era de 2O6. no
blema tanto mais sério quanto mais grave for esse desequUíbrio Sendo assim, cabe per-
período 1985-90 era de 1,73 -- as disparidades entre o Norte e o Sul agravaram-se (Derlu-
gunar se ao fazer prev-isôes tendencialmente desastrosas nao estaremos no final do scuki gian 1992a). Só um exemplo: no período de 1965-70 o crescimento anual em Africa era
x_x a cometer o mesmo erro que Thomas Maithus cometeu no final do século XVIII au
de 2,63 e na Europa de O67. enquanto no período 1955-90 a cifra africana disparou para
prever que o poder da populaçAo da Inglaterra, da França e da America seria cada vez
3,00 e a europeia baixou para 0.22. Combinadas corn o aumento global da populaçào, o
inaior que O poder da terra para a assegurar a sua subsisOEncìa e que, em consequência
qual, apesar de desacelerado, continua ekvado, estas disparidades entre o Norte e o Sul
disso, a intei-vençao da natureza para reduzir a populaçao envolveria fatahuente a forne. a
tornaili aida mais questionävel a universalizaçAo do modelo de desenvolvimento capita-
guerra e a doença.
lista. Este modelo parece de facto confrontar-se corn urna situaçào dilemática: por- um
Provou-se que ele eslava enganado; a populaçao continuou a aumentar mas os recur-
lado, ele pretende-se boje. sobretudo depuis do colapso do regime comunista, universal-
sos para assegurar a sua subsisEncia aurnentaram ambm. Nao se poderá boje voftar a
mente vAlido; por outro lado, é cada vez mais claro que ele nAo pode ser aplicado univer-
repetir a hsória? Thdo leva a crer que nao. Segundo Paul Kennedy. trés factores piinci-
salmente ou, o que é amda mais dilemático, quanto mais universal for a sua aplicaçäo,
pais contribufrarn para infirmar a previsao pessimista de Ma1thus a emigraço maciça
maior desigualdade cñar entre os poucos que ganham cory isso e os muilos que perdem,
dus ingleses e dos europeus em gera1 o aùmento da produlividade da terra corn a revalu-
isto é, entre o Norte e o Sul.
çAo agricola; e o aumento da produtividade do trabalho corn a revoluçào industrial (1993:
6 e ss). Ora, destes factores, só o primeiro parece estar hoje au alcance dos paises perifé-
ricos. O aumento da produtividade da terra ou do trabalho parece estar-Ihes em grande
A gio&a!izaçáo da economia
medida vedado e em qualquer caso tudo indica que nao poder acornpanhar o aumenta da
Isto me conduz au segundo vector da- desigualdade Norte/Sial no espaço-tempo muri-
populaçäo. A diferença entre o tempo de Maithus e o nosso reside em que no séefilo
dial: a globalìzaçäo da economía. Mesmo adrnitindo que existe urna economia-mundo
XVIII e XiX a exploso demográfica e a explosao tecnológica iveram lugar na mesma
desde o sécula XVI, é inegAvel que os processus de globalìzaçäo se intensificaram enor-
rcgiao do sistema mundial, enquanto hoje a primeira ocurre no Sul e a segunda ocorre no
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por aqueles que
Norte. Aliás, a disparidade entre o Norte e a Sul é tao grande que, enquanto o SuI se
pensam que nas últimas décadas. Isto é reconhecido a
P-Modcr,iidade ONorte,oSnlea Utopia
Pela Mao de A/ice. Q Social e o Político na

ecOflGma internacional no ainda urna economia goba1, em vìrtude da continuada


total do comércio mundial; número de filiais no estrangeiro -é evidente o aumento da
importância das empresas multinacionais. Entre as minias causas deste facto, duas são de
mpOÍtflCia dos mecanismos nacionais de gesto macro-económica e da formaço de
salientar: a desreguIaço dos mercados fmanceiros e a revokiçâo nas comunicaçes
bocos cømercais Enue 1945 e 1973 a economia munda1 teve urna enorme expanso: trans-
Continentais (Kennedy, 1993: 50). Por vias diferentes, funcionaram ambas corn um grande
urna taxa de crescimento anua' do produto industrial de cerca de 6%. A parifr de 973
incentivo à ìntemacionalizaçAo das empresas ao mesmo tempo que contribufram para
esse crescmento abrandou signWicalivamente, o que para os adepoes dos ciclos de a
separaçAo entre fluxos financeiros, por um lado, e comércio de mercadorias e serviços.
Kondratieff significou o inco da fase B do ciclo que se tinha iniciado em 1945. Mesmo
pelo outro. Calcula-se, por exemplo, que os fluxos mundiais de moeda estrangeira - tian-
assim, a ecOnomia mundial cresceu mais do pósguerra até hoje do que em toda a histOria
sacçoes, de resto, exclusivamente electrónicas - rondarn um niliAo de dólares por dia.
mundial anterior (Kennedy, 1993 48).
E difícil determinar o número exacto de empresas multinacionais, mas apesar de serem
Dos traços desta evo1uço sobretudo nas duas diurnas decadas selecciono os mais
certamente largos milhares, é notvel o grau de concentraçäo que faz corn que o valor
importantes para a minha tese. O primeiro traço ¿ a deslocação da produçâo mundial
anual das vendas de algumas destas empresas seja superior no pmduto domésiico bruto de
para a Asia consolidando-se esta como urna das grandes reiöes do sistema mundial,
consttuída como todas as outras regiöes por um centro (o JaØo), urna semiperiferia (os muitos países periféricos. A título de exemplo, as 10 minores empresas do sector químico
forum responsveis por 21 % do das vendas de predutos químicos em 1990 e as 5
tota!
nov05 países industriais: a Coreia do Sul, Taiwan. Hong Kong e Singapura) e urna peri- i

maìores empresas do sector fannacutico concentraram cerca de 30% do comércio resin-


feria (o resto da Asia). Esta desIocaço tanto maior quanto mais elevado o tear tecno-
dial de produtos farmacêuticos (Ikeda, 1992).
lógico da pmdução medida pelo investimento em investigaço e desenvovimento. Assim.
Conconiitantemente coin a primazia das multinacionais, dois outros traços de globali-
no dominio da inddstria de alta tecnologia, dois exempos são particularmente
zaçâo da economia devem ser mencionados pela importância que tm para a polarizaço
siguificathos a produço de transfstores e a produço de televisòes (frwan, 1992). No
que respeita à produço de transistores, incluindo semicondutores, a distribuiço regional
da desigualdade entre o Norte e o SuL O priineiro é a emtho da eficácia do Estado na ges-
da percentagem da pmduço mundial teve urna alteraçäo dramática entre 1965 e 1989.
tâo macro-económica. A transnacionalizaço da economia significa. entre outras coisas,

A quota da Asia. que era em 1965 dc 288%, passou em 1989 para 95%; a quota da Amé-
precisamente tal eroso e nio seria possível scm ela. A desregulaçäo dos mercados fman-
ceuros e a revoluçäo das comunicaçoes reduziram a muìto pouco o privilégio que até há
ricadoNorle,queera. namesmaalmra,de643%, passonpara 1,1%; e aquotadaEuropa.
pouco o Estado detinha sobre dois aspectos da vida nacional -a moeda e a comunicaço -
que era de 6%, passou para 3.9%. No que respeita à produço de televisores, a quota da
Asia era em 1965 de 14,2% (quase sO o Japo) e passou em 1989 para 58,2%. enquanto a
considerados atributos da soberania nacional e vistos como peças estratégicas da segurança

quota da América do Norte passou no mesmo período de 37,2% da produço mundial para
nacional. Por Outro lado, as multinacionais, dotadas de um poder de intervençAo global e
beneficiando da mobilidade crescente dos processos de produço podem
16,4% e a quota da Europa passou de 34,5 para 16,1%. facilmente por

No dominio da indUstria de média tecnologia como, por exemplo, na indústria auto- em concorréncia dois ou mais Estados ou duas ou mais regiocs dentro do mesmo Estado
sobre as condiçOes que decidiräo da localizaçäo do investimento por parte da empresa mu!-
móvel, a deslocaço foi também significativa: a Asia, que produzia 14,2% dos automó-
veis cm 1965 passou a produzir 28,6% em 1989, enquanto a América do Norte que pro-
tinacional. Entre países corn poder trio desigual - actores globais, por um lado, e actores
nacionais ou subnacionais por outro -a negociaçáo nao pode deixar de
duzia 54,3% em 1965 passou a produzir apenas 25,8% em 1989 e a Europa manteve e ser desigual.

mesmo meihorou ligeiramente a sua quota (de 39,5% cm 1965 para 41 2% em 1989). A
o outro traço de g!obalizaçAo da economia fortemente vinculado à proeminéncia das

importância desta deslocaço no pode ser subestimada. Pela primeira vez, depois de multinacionais é o avança tecnológico das últimas décadas quer na agricultura om a
bioternologia, quer na indds:ria corn a robótica, a
automaçäo e também a biotecnologia.
cinco sécuos, O motor do capitalismo parece ter passado do Ocidente para o Oriente. As
Os aumentos de produtividade corn que são propagandeadas estas novas tecno!ogias
condiç,es dnicas do Ocidente, que segundo Weber explicaram a emerg&icia do capita-
escondem frequentemente o facto de que elas contribuem para a polarizaçäo entre o Norte
ismo, deixaram de ter grande significado, urna vez consolidado este modo de produço e
e o Sui, dados os investimentos de capita!, os recursos cintíÍìcos. a mIlo-de-obra qua!it-
quando muito haveria agora de averiguar as condiçes ilnicas do Oriente para o desenvol-
cada e a escassez de máo-de-obra que pressup.iem. Aliás, contribuem igualmente para o
vimento pujmte do capitalismo no final do século.
aprofundamento das assirnetrias dentro do Norte, entre as suas várias regiôes. Em 1988,
o segunda traço da globalizaço da economia é a primazia total das empresas multi-
dos 280.000 robots industriais existentes no mundo, 27.00O estavam concentrados no
nacion.ai$, enquanto agentes do «mercado glabah. A propria evo1uço do nome por que

sào conhecidas assinala a constante expansâo das actividades destas empresas com activi- EUA. Mas o mais notável é que. desses, o JapAo detinha
Japáo, na Europa ocidenta] e nos

dades em mais que um Estado nacional: de empresas multinacionais para empresas tians- do dobro da soma dos robots da Europa e dos LUA, cerca de 70%
176.000. ou seja, mais
da populaçio mundial de robots industriais (Kennedy, 1993: 88). As condiçôes que leva-
nacionais e, maìs recentemente, para empresas globais. Quaisquer que sejam os indica-
ram o Japáo a esta liderança tornam difícil a competíçäo dos outros países centrais e
dores utilizados investimento destas empresas enquanto percentagem do ìnvestirnefltø
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mundial percentagem
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do comércio mira-empresas nO a watermarked evaluation copy of CVISION PDFCompressor
impossível a dos países periféricos e semiperiféricos do sistema mundial.
25a Pela Mao de Alice. O Social e o Poiltico na Pôs-Modernidade O Norte. o Sut e a Utopia 253

No que respeta à hìotecnologia. o quadro seme1hante pelo menos quaim as Todos estes traços da globalizaçào da economia ajudain a compreender as razöes por
çöes Notte/Sul. Entre 1950 e 1984, a produço agrícola mundial cresceu mais rapida- que nas últimas décadas as desigualdades entre o Norte e o Sul aurnentararn significativa-
mente que em quaquer período anterior e a produçAo de cereais cresceu mais que a popu- mente. E já um lugar comum afirmar que a d&ada de oitenta foi urna década negra para
Iaçäo. Desde t9S4. urna s&ie de factois, desde a degradaço das solos, ao abuso dos fer- os países perif&icos. E menos commumente conhecido que as agências internacionais

tilizaffles e à mercadorizaço crescente da alimentaço, convergiram para que esse cresci- nào esperarn que a decade de noventa seja methor. Segundo a South Commission, «a
mento desacelerasse. Ê difciI de prever se estamos peranie o inicio de urna tend&cia de década de noventa trar ainda mais pñvaçes para os poyos do Sul, ainda major instabili-

longo prazo. E de qualquer modo significativo que, apesar de, segundo as previses do dade para estes países» (Ibonvbere, 1992: 999). Os dados sao efectivamente alarmantes.

Work/watch Instiulie, ser necessario aumentar anuaimene a produço de cereais de 28 Enquanto a Africa está a atingirum ponto de colapso, na América Latina o nivel de vida
miihoes de tone}adas para acompanhar o aumento da populaço nos anos mais recentes o no inicio da d&ada
de noventa era mais baixo que o da decada de setenta. Dos 84 países

crescimento flO tenha sido superior a 15 mi1hes de tone1adas (Brown et al., 1990: 65). menos desenvolvidos, 54 tiverarn quebras no indirnento nacional per capita na década de
As explicaçòes naturalistas desta discrepância nAo sAo convincentes, pois, doutro modo, aitenta, Em 14 países, o rendimento per rapita caiu cerca de 35% (Thonvbere, 1992: 989).

ma se jusificaria que o Norte estivesse a braços corn urna crise de sobreproduço e o Sul Em treze anos, a dívida externa dos países do Sul passou de 170 biUöeS de dólares em
corn urna crise de subproduço. 1975 para 1200 biliôes em 1988.

Que as razôes devem ser outras i!ustra-o a bioecnoogia agrfcoa que nos ú'timos Perante isto no admira que o cisma global entre os ricos e os pobres se tenha apro-

anos tern vindo a ser promovida como a grande souço para o problema alimentar mun- fundado. Calcula-se que I biliao de pessoas - mais de Ii da populaço mundial - viva
dial. Enquanto anteriormenre a methoria da produçäo agrícola se bascou em boa medida em pobreza absoluta. ou seja, dispondo de um rendimento inferior a cerca de 365 dolares
na selecço de sementes e de castas do que se trata agora, na era da biotecnologia, de por ano. Do outra lado do abismo, I 5% da popuIaço mundial produziu e consumiu 70%
recorrer a t&fliCaS que usam organismos e processos vivos corn vista a fazer ou modificar do rendimento mundial. Enquanto a ajuda externa dos países centrais aos países perif.

produtos ou a meihorar plantas ou animais. Ests ainda por avaliar cabalmente o impacto ricos caiu de 0,37% do PNB em 1980 para 0,33% em 1989, as taxas de juro da divide
da biotecnologia agrfcola na sande ou no melo ambiente. Se a produço pode aumentar externa des países do Sul subirarn 172% entre 1970 (3,7%) e 1987 (10%), o que leva
exponencialmente, fa-b-â à custa da biodiversidade. Se pbntas e animais podem ser alguns autores a calcular em 40 bibóes de dólares o montante anua' de transferencias
sujeitos à engenbaiia gen&ica para se tornarem mais resistentes às doenças, à seca. ou aos líquidas do Sul para o Norte, seudo esse pois literalmente o valor da conIribuiço de um
herbicidas issu no fundo urn incentivo a tolerar e at a promover a degradaço ecoló- Sul mirrado de forne para a abastança do Norte. O aumento da dívida externa, combinado
gica. Mas o aspecto mais saliente da biotecnologia agrícola do ponlo de vista das reaçôes corn a queda do preço mundial de alguns dos produtos exportveis pelo Sul, levou aiguns

Norte/Su que ela certamente agravará tanto a sobreproduço do Norte como a subpro-
t países an colapso. Devido à continuada quebra do preço do cobre, o serviço da dívida
duçan do SuL A grande novidade da biotecnologia que ela é levada a cabo por grandes externa da Zambia correspondia a 95% do total das exportaçoes (Thonvbere, 1992: 994).
empresas mukinacionais que sujeilam as patentes às descobertas biot&nicas e que, por o programa da Nova Ordern Económica Internacional lançado pela ONU em 1975,
¡SSO, privam dos seus beneficios todos os que no puderern pagar os direitos autorais corn vista a criar urna maior solidariedade entre o Norte e o Sul, redunden num total fra-

(royaliies). Corno diz Paul Kennedy, o DNA o novo recurso industrial das grandes casso, sobretudo depois que os países do Norte conseguiram reciclar os excedentes de
ernpresas que nao só pode vir a substituir matrias primas usualmente fornecidas pelos petrodólares e, por essa via, absorver a ameaça que inicialmente ihes pôs a OPEP, e
países perifsicos corno pode conduth à integraçäo vertica' da produçào agrncola colo- depois também que os govemos conservadores chegarun so poder nos EUA, na Ingla-
cande vastas regiôes do mundo sob a aiçada de urnas poucas empresas multinacionais do terra e na Alemanba, inflamados do fogo neoliberaJ da desregu1amentaço, do corte da

ramo agroqulmico e biotecnológico (Kennedy, 1993: 73). Tal como sucede corn a robótica ajuda externa e dos subsidios, da abertura das economias do Sul empurradas para a expor-.

e a automaçäo, SO também visiveis confluios entre os países centrais neste dominio, dado tação a 6m de cumprir corn os encargos da divida externa em que entretanto forain anna-.

o diferente peso que neles têm a agriculmra e sobretudo os agricultores (enquanto o Japäo dilbados.

importa produtos alimentares, a Europa e os EUA tém grandes excedentes). Mas é no Para alem dus poucos países do Sul que nesta décaAa conseguirain t,eneficiar das

dominio das relaçôes Norte/Sul que o impacto da biotecnologia mais se fará senrir- ¿ que transformaçòes da economia mundial, a esmagadora maìoria perdeu, e urna pane dela

se, por um lado, o uso de patentes visa criar rendas que funcionam como transferências atingin urna situaçfto de colapso que se manifesta de múltiplas formas: na perda da pouca
líquidas do Sul para o Norte, por outra lado, essas transferências ocorrem desde logo na soberania efectiva dos Estados periférìcos, que ficararn mais e mais sujeitos aos progra-

própria engenhaña dos pmdutos. pois, corno bern salienta Kloppenbw, dado que a maloria mas de ajustarnento estruEural do Banco Mundial e do FMI; na conturbaçao interna, na
dos recursos genéticos se encontrarn nos países do Sul, estes estao jâ a ser espoliados violCucia urbana, nos motins dos esfomeados, na m nutriçao; e finalmente na degrada-

pelas grandes empresas multinacionais, o que já se designa por «impeñalismo biológico» çAo do ambiente que, se nao foi originada pela dívida externa, foi quase sempre agravada

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(Kloppenburg, 1988) evaluation
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encargos da as a fazer face
254 Pek Mao de At¡ce. O Social e o Polftko 'a Pó.çModer,idade ONorte. oSulea Utopia
255

dMda. A forne e a má nutriçào aumentaram signiÍicaivamente nas duas úftìmas décadas A exportaço agrícola para fazer face à dívida assumlu proporçôes dramáticas
nalguns
e a eCOnOnÜa política intemaciona da alimentaçäo é talvez, mais que nenhuma outra países. No Brasil, por exemplo, a produçäo de feijan preto, base da alimentaço brasi-
eve1adora das trocas desiguals entre o Norte e o SuL leìra, foi negligenciada em favor da produço de soja. O aumento da produçao de carne
Antes de 945, o chamado terceiro mundo exportava cereais e nos anos cinquenta era nos países da América Latina tão-pouco significou a melhoria da alimentaçao
dos sens
aiio-suficienie em produlos alimentares, apesar de a seca e outros factores produzim habitantes. Apesar de a Costa Rica ter aumentado rnuito a produçAo de carne entre 1950 e
períodos de forne, como, por exemplo, na India, nos anos cinquenta e sessenta e em I 970, o consumo de carne per rapita baixou nesse período de 49 libras
para 33 libras
Africa (Pelizzon, 1992 7). Em 1954 os EUA iniciaram o programa de vendas subsidiadas (Pelizzon. 1992: 20). Num contexto internacional cada vez mais dominado pelas empre-
de produtos alimentares designado Alimentaçäo para a Paz. Senda conhecido do pbIico sas agro-alimentares, a prnduço alimentar está cada vez mais vinculada procura efec-
como um programa para combater a forne no mundo, a verdade é que, na lei que o estabe- tiva. A queda do rendimento dos países periféricos, sobretudo a partir da década de
1eceu esse objectivo é referido em quarto lugar. senda os três outros vincuhidos aos hue- Setenta, contribuiu fortemente para que na década seguinte a produçfto mundial de pro-
resses econóimcos dos EUA: aliviar os excedentes agrícolas. desenvo'ver mercados de dutos agrícolas começasse a desacelerar Ê esta a siuiaço presente e por isso no
sur-
exportaçäo para as mercadorias agrícolas americanas e expandir o mercado internacional. preende que as estimativas da má nuiriçäo no mundo estejam constantemente a ser corri-
No restam dévidas que esse programa foi eficaz como mecanismo de desemprego: entre gidas e sempre para pior.
1954 e l9&, a ajuda alimentar constituiu 34% do total das exportaçäes de cereals dos o que há de mais novo na situaçäo presente é que a má nuthço e a forne aumentararn
EUA e 57% das hupoitaçes totais de cereals pelos países do Terceiro Mundo (Pelizzon. nos proprios países centrais e muito particularmente nos EUA. O que prova à saciedade
1992: 8). E muito mais duvidoso que este programa tenha efectivamente beneficiado os que a forne e a m nutriçAo no dependem tanto do nivel de produçäo agrícola ou do nivel
países do Sul e muitos dados convergem no sentido de que, ao connurio, os prejudicou geral da prosperidade do país, como das assirnetrias sociais, do abismo crescente enrie
pelos menos no longo prazo. Muìtas das culturas tradicionais foram negligenciadas ou ricos e pobres. EstaM certamente relacionada corn ism a .nfase recente por parte das ins-
substituidas e estes países passaram a depender cada vez mais da importaço de cercais, tituiçöes internacionais na recuperaço da agricultura tradicional. Reconhece-se que urna
para além de as suas populaçöes se terem de reduzir a urna dieta menos vaiiada e estranba parte significativa da populaçäo mundial estará nsa próximas geraçöes abaixo do nivel de
em relaçAo aos seus háhilos alimentares ancestrais. Este processo foi pariicularmente solvéncia que flies permita serern consumidores da agricultura comercial.
Mas há ambérn
no6rmo em Africa, mas neon-eu noutras regiöes, como por exemplo na Coreia do Sui, que -
quern suspeite corn algurna razo, em vista do que mencionei acima - que o interesse na
no tma1 da década de sesserna tinba passado de um país consumidor de arroz para um recuperaç.o da agricultura tradicional pode estar tambérn relacionado corn a rnanutenço
país consumidor de trigo. O mesmo enviesainento de objectivos a favor do aumento do da biodiversidade e do germ plasm de que os países do Sul säo o grande depósito. Como
comércio inernaciona1 e em detrimento do consumo real de alimentos por parte dos já aconteceu no passade noutras circunstneias, no é absurdo pensar que os agriculEores
poixes verificou-se igualmente na india corn a revoluçân verde, amnda que esta tenha per- do Terceiro Mundo venharn a fornecer às empresas de biotecnologia recursos genéticos
mitido à India transformar-se mim país exportador de cereais. a partir dos quais estas produzarn hin-produtos a que os agricultores do Terceiro Mundo
Nas dms úhimas décadas a condiçio alimentar das massas empobrecidas do Sul agra- só terâo acesso se tiverern recursos para pagar os elevados preços que cias cobraräo
por
you-se significativamente. A dependência alimentar que o Poodfor Peace tinha criado eles.
nos países periféricos revelou toda a sua negatividade quando a partir de 1972 os EUA
eliminaram quase totalmente esse programa e o substituiram por vendas comerciais
(Pelizzon, 992 15). Esta mudança de poiftica surgiu num momeino particulannente dill- A degradaçdo ambiental
cil para o terceiro mundo. A India e os paises do Norte de Africa viviarn períodos de Disse anima que os factores da transnacionalizaçAo do empobrecimento, da forne e da
grande seca, a produçao mundial de cereais abrandou e os preços de fertilizantes subio má nutrìçäo tiveram entre muitas consequncias adversas a da degraço ambiental. A
em resultado da crise do petróleo. Se, por um lado, os preços dos produtos alimeiflares presso para intensificaçäo das culturas de exportaço conbinada corn técnicas deficien-
subiu, por outro lado, os países do Sul viram-se forçados a prosseguir o abandono das tes de gestão de solos levararn à desertìficaçao, i salinizaçao e à erosIo. A destruiço das
culteras de subsistência a fim de promover as culturas de expor1aço corno soluçäo par- florestas tropicais, sobretudo no Brasi] e na América Latina mas também na Indonésia e
cial para a crise produzida pela dívida externa. A subida dos preços das produtos alimen- nas Filipinas, é apenas o exempta mais dramatico. Em cada década. desde 1950, perde-
tares foi ainda provocada pela expansào para o terceiro mundo do mercado de produtos
rain-se 30 milhöes de heciares de floresta na Africa tropical, 40 rnilhöes na América
aUmentares processados e enlatados controlado por grandes empresas muhinacionais, Latina e 25 milbes na Asia meridonal (Pelìzzon, 1992: 2). Em Africa é plantada apenas
urna subida de preços articulada corn a perda de valor nutritivo dramaicamente ilustrada 1991
I Irvore por cada 29 que são cortadas (Kennedy, 1 15). Mas a degradaço ambiental
pela promoçäo dos substitutos da amamenutção materna por parte da Nestlé corn as con- provocada por esta via é apenas um aspecto muito parcial de um fenómeno maite mais

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sequnciasque sso conhecidas.
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em men crise ecológica -- que, entender, constitui terceiro vector,
- Pela Mäo de Alicc, O Social e o Político na POs-Modernidade (_) Norte, o Sd e a Utopia 257

juntamente corn a exp1oso demográfica e a globalização da economia, do espaço-empo poluernes por ser ai menor a conscincìa ecológica e serern menos eficazes se de rodo
mundia1 Far-the-ei de seguida urna breve i-efer&icia. existentes) os controlos antipoluição. De todos os efeitos da poluição e da degradaçio

De todas os problemas enfreniados pek sistema mundial, a derradaçäo ambiental em geral, os mais ameaçadores são hoje em dia o efeito esrufa e
ambiental e a degradação
tavel o mais tIanSI1aCiOIIa e portanto aquele que, consoante O modo da carnada de ono. corn consequências para o ecossisiema da terra difíceis de prever

como for ethenado tan*o pode redundar num confito g!oba entre o Norte e o Sul, em toda a sua erensào. As emissòes de CO2, os clorofluorocarbonejos, a destlorestação e
como pode ser a platafonna para um exercício de solidaxiedade ransnaciona e intergera- acidificaçâo das florestas, a poluiçäo dos rina, tado isso tern contribuido para o efeito
donai. O futuro estL por assirn dzer aberto a ambas as possibilidades embora só seja estufa. Neste sculo a concentração atmosfirica de CO2 aumentou de 7G partes por

f0550 na medida em que a segunda preva!ece sobre a primeira. As


perspectivas no são. milhâo para cerca de 350 partes por rnithAo. Actualmente são lançados na atmosfera 6

no entaMo, animadoras. Por um lado, o Norte nao parece disposto a abandonar os seus biliöes de toneladas de carbono. Os Estados Unidos säo o major emissor mundial de
menos contribuir. na medida dos seus recursos e responsabi-
hábitos poluidores e muito a gases que produzem o efeito estufa corn 17,6% do total de ernissores, seguidos pela
lidades, para urna mundança dos hábitos poluidores do Sul, que são mais urna quesão de ex-União Soviética corn 12% e o Brasil corn 10,5%, a China corn 6,6%, a Índia corn
necessidade que urna questäo de opção. Por outro lado, os paises do Sul tendem a ão 3,9% e o Japo corn 3,9%. Se nenhuma correcçâo for introduzida começar nos EUA. -a
favor do equilibrio ecológico o pouco espaça de manobra que neste dominio onde 4% da população mundial consorne 1/4 do petróleo mundial -. o ecossisterna mun-
exercer a
do colapso
flies resta. Para alérn de muitas outras razes, e por absurdo que pareça, depois dial dificilmente se poderá continuar a renovar na forma que nos é conhecida.
credivel corn que os
do cornunismo a capacidade de poluiçäo talvez a única arneaça Qual o impacto da degradação ambiental mss relaçöes Norte/Sul? O facto de esse

países do Sul podem confrontar os países do Norte e exirair deles algurnas concessôes. impacto ser crescenternente global parece indicar que nao h face a ele a possihilidade de
Cerca de urn terço do solo do planeta ¿ constituido por desertas e cidades em que uns SO retirarem vantagens e outros só desvantagens, pelo que será «natural» a solidarie-
pouca acthidade biológica gerada, um terço é constituido por florestas e savanas e urn dade internacional para o enfrentar. Na verdade, nada parece mais difícil que a construção
terço por terrenos de agricultura e pastoricia (Brown et aL. 1990: 5). Os dois lfimos Em
ter- prirneiro lugar, a gravidade do problema ambiental
da solidariedade neste dominio.
cos 6rn, por assirn dizer, viudo a diminuir e obviamente que nao apenas por razes direc- reside antes de mais no modo corno afectará as próximas geraçöes, pelo que a sua reso-
tamente ligadas, no caso dos países do Sul, à divida externa. Entre 1950 e 98O perde- luçân assenta forçosarnente nurn principio de responsahilidade intergeracional e nurna
ram-se 50% das reservas florestais dos Himalaias devido à duplicaçäo da populaçäo e à temporalidade de médio e longo prazo. Sucede, pordm, que tanto os processos políticos
procura que ela gerau. quer de solo agrícola, quer de paslos. quer de lenha (Kennedy, nacionais, corno os processos políticos inremacionais são hoje. talvez mais do que nunca
dos
1993: 99)- A verdad; porérn, que a destruição maciça das florestas dos sopes ueste século, dominados pelas exigencias a curto prazo. Acresce que no Norte a pmemi-
principios do século XX,
Himaaias corneçou corn o colonialismo no fuud do século XIX. nência dos mercados financeiros e de capitais actua no mesmo sentido. penalizando qual-

corn O corte de madeira para exportação e para consiniçân dos caminhos de ferro (Rao, quer estTatgia empresarial, assumida ou imposta, que diminua a lucratividade no pre-
1991 : 14). Trata-se, pois, de urna agrCSSäO que, apoiada em vkios cálcWos
económicos, sente, mesmo que em nome de urna lucratividade rnaior. mas necessariamente incerta, no
dirigido ans presidentes das
tern-se mantido décadas a lb. Em Julho de 1991, num apelo futuro. Nos países do Sul os processos político-económicos são ainda mais complexos.
repíblicas da América Latina, denunciava-se que, ao ritmo da destruiçäo actual, no ano Por um lado, a industrializaçiio de muitos países periféricos e semiperiféricos rias duns
2.000 3/4 das florestas tropicais da América Latina - que detm 60% do total mundial
de íltimas décadas ocorreu na mira de força de trabalho abundante e barata e de urna maior
florestas tropicais - leían sido destruidos e corn eles O% das espécies perdidas para tolethncia social e política da poluição. Nestas condiçöes, qualquer medida prO-ambiente
a
sempre. Enti muitos outros efeitos, a desflorestaço e a erosão do solo traz consigo seria contra a lógica do investimento efectuado corn as consequêncìas previsíveis.
rarificação da água pouivel o que sucede tanto nos países centrais corno nos periféricos. O dilema do México face an tratado dc comircio livre corn os EUA eo Canadá é bern
Calcula-se que 40 rnilhöes de camponeses chineses sofrern de escassez de água potável ilustrativo. A posiçîio do México no tratado pressupôs sempre que a industrializaço a sul

devido à poluição agrícola e, por nutro lado, os residuos de fertilizantes tern sido detecta- do Rio Grande estaria sujeita a muito pouco controlo ecógico. Era sabido que o México
Dina-
dos nas resetvas de água da Fmança, da Alernanha, da l-loktnda, da Inglaterra e da tinha excelentes de protecço do mein ambiente mas sabia-se igualmente que nän
leis

marca (Pelizzon, 1992: 26) Em trinta anos, o mar Arai transformou-se num mar fantasma havia nem condiçòes técnicas oem vontade política para as aplicar eficazmente. Antes
urna decade, a
corn menos 40% de área e corn menos 60% de volume e, em menos de pelo contrário. Hoja. corn urna nova adrnìnistraçâo na Casa B[anca, mais preocupada corn
Arábia Saudita reduziu em 1/5 os lençóis aquaticos acumWados em miLbares de anos as questöes ambientais mas acima de tudo preocupada corn o aumento do desemprego no
(WorldResourCeS, 199 171-177). país. o governo mexicano v corn preocupação a possibilidade de o tratado nao trazar as

Os países do Norte «especializaram-se» na poluiçäo industrial e em tempos mais «vantagens» esperadas por falta de salvaguardas ambientais na indústria mexicana. De
recames têm conseguido exporlar parte dessa poluiçào para os países do Sul, quer sob
a
indo, a lógica desta e do investimento estrangeiro que a criou assentou desde o inicio
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da degradaço próximasPDFCompressor
indístrias Mas os
na transferírncia custos ambiental para as geraçòes.
258 -..' Pela Mâo de A Q Scu1 e Po/íko na Ps-M4ernidade o ivoire, C) Sul e a Utopia 259

países periféricos argumentam por vezes ao conu-áno, sto é, em nome do bem-esar da prazo, avessos, por natureza, a objectìvos intergeracionais ou de longo prazo. Acresce que

próximas eraçS para justficar as pomnca pohuidoras do presente. A India e a China. a própria glohaiìzaço da economia e dos problemas que cia gerou minou a eflcácia das
por exemplo, no admLem ser privados de ternar pant as suas geraçòes fuivas um nIvel disposilivos insìuicionaís que the poderiam faer face e nisto reside o terceiro dilema do
de vida semelhaifle ao que hoje usufruem os habitantes dos países centras mesmo que espaço-tempo mundial.
para SSO seja necesSiio agravar O efeito de estula. Por sua vez, o Bíasl, apesar de esiar a A perda de centralidade ìnstiwcionai e de eficácia reguladora dos Estados nacionais,
mudar de polídca no que respelta Amazénia. ressente que ihe sejam postas restriçoes à por todos reconhecida, boje um dos obstácu'os mais resistentes à busca de soluçôes gb-
desfloesiaçäo por paIses cujos habitantes gasaxn I 5 vezes mais energia que os brasileims bais. E que a erosäo do poder dos Estados nacionais nào foi compensada pelo aumento de
e scm que sejam evidenres as contrapartidas para compensar os custos de tais restriçôes poder de qualquer instância transnacionab corn capacidade, vocaço e cultura institucional
no caso de cIas serem levadas a cabo. Por seu lado, a Indonsìa propòesc eliminar 2O viradas para a resoluçào solidária dos problemas gbobais. De facto, o carácter dilemtico

das suas florestas para que, nos termos dûs antincios govemamernais, «os seus 170 da sìtuaçào reside precisamente no facto de a perda de eficicia das Estados nacionais se

milhöes de habitantes tenham as mesmas aspiraçoes que os habitantes dos EUA» (World manifestar antes de mais na incapacidade destes para construirem instituiçôes internacio-

Resources 1990: 106). nais que colmarem e compensem essa perda de eficácìa.
Perante isto omou-se dìícil imaginar medidas preventivas gkbais, apesar de reco- o
quarto e último dilema do espaça-tempo mundial reside em que, no momento em

nhecida a sua urgênca. Mas mesmo que algumas sejam adoptadas, são muiio desiguais que os paises centrais e as instituiçoes intemacionais sob seu controle impem aos países
os recursos dos difereines paises para que possam ser levadas a cabo coerernemente e de periféricos e semiperiféricos a adopçto de regimes de democracia representativa e de
modo globaL Acresce que, perante a concreizaçäo de um desastre ambiental, as medidas defesa das direitos humanos, as relaçöes entre Estados no interior do sistema interestatal
de protecçào ou de contenço adequadas envolverào evernualmente custos que só alguns so cada vez menos democráticas, na medida em que os países do Sul tm cada vez
paises podem assumir. Se, em consequência do efeito de estufa, aumentar ligeiramente o menos autonomia interna e estáo sujeitos a irnposiç&s externas de toda a ordern, por

nivel das guas do mar, tanto a Holanda como o Bangladesh deveräo tomar medidas vezes indiciadoras do inicio de um novo ciclo dc colonialismo ou, pelo menos, de neoco-
protectivas contra o avanço do mar, mas obviamente o Estado de Bangladesh nao disporá lonialismo. Paradoxalmente, o colapso do «grande inirnigo» da democracia ocidentab, o
para isso de recursos comparveis aos do Estado holaridês. comunìsmo, traduz-se nilo em maior nias antes em menor poder democrático internacio-
Analisado à luz dûs rês sectores seleccionados -. o aumento da populaçào. a globali- nal por parte dos paires periféricos e semiperiféricos,
As próprias Naçòes Unidas, que
zaço da economia e a degradaçAo ambienai - o espaço-empo mundial parece defron- foram durante décadas urna das plataformas de concorrência entre as duas superpotências

tar-se corn urna situaçäo dilemática a vários niveis. Em primeiro lugar, o modelo de e corn isso grangearam urn certo poder de arbitragem e urna cultura de imparcialidade,
desenvolvimeno capitalisia assume urna hegemonia global no momento em que se torna estäo hoje crescentemente prisioneiras dos interesses geo-estratgicos dos Estados Unidos

evidente que os beneficios que pode gerar cominuaro confmados a urna pequena minoria da Am&ica, (scm, no entanto, serem capares de os servir de acordo corn as «expeeta-

da populaçao mundial, enquanlo os seus cusios se disiribuirào por urna maiorìa sempre tivas» norte-americanas).

crescente. Se bem que a lógica e a ideologia do consumismo se globalizará. cada vez Perante urna siluaçào mubtiplamente dìlerntica, hí quem nao cruze os braços e pro-
mais, a prática do consumo continuará inacessivel a vastas massas populacionais As cure saldas. Nao ti fácil porque, corno já refen, a eroso recente das processos de regu-
desigualdades sociais entre o centro e a periferia do sisiema mundial enderào, pois, a baçäo ociai, quer a nivel nacional, quer a ulveb transnacional, acarretou consigo a erosäo

agravar-se. -e nào O fortalecimento, corno muitos esperavarn - dos projeetos emancipatórios e da


Em segundo lugar, e em aparente contradiçào corn isto. os problemas mais séños corn vontade politica de transforrnaço social. Mesmo assim, ternos vindo a assistir à amer-
que se confronta o sistema mundial sio globais e como tal exigem soIuçes globais mar- gência de lutas que pretendem ser como que a negaçäo dialéctica das dilemas acima tele-
cadas no só pela solidariedade dos ricos para corn os pobres do sistema mundial, corno ridas. Os reus promotores so sociobogicameme muito heterogéneos, tanto quanto o so
pela solidariedade das geraçôes presentes para corn as geraçöes futuras. No entanto os os seus modos de organìzaçäo e os seus objectivas. Säoos movimentos ecológicos, os
recursos económicos, sociaìs políticos e culturais que tais medidas pressupôem no pare- movimenlos dos direitos humanos, os movimemos dos pavos indígenas, os movimentos
cern disponíveis no sistema mundial e, em verdade, parecem boje menos disponiveis que de muiheres, os movirnentos de opethrios de vários países a trabaihar em diferentes huais
antes. Por um lado, a globalìzação da economia deu urna proerninência scm precedemes a da mesma empresa multinacional, etc., etc. O que há da cornum entre estes grupos ¿ a
sujeitos económicos poderosíssìmos que no se sentem devedores de lealdade ou de res- tentativa de dar espessum polItica transnacionab a problemas transnacionais por natureza
ponsabilidade para corn nenhurn país, regiâo ou localidade do sìsema mundial. Lealdade (como, por exempbo, o buraco de ozona) ou a problemas transnacionalizáveis por via das
C responsahilidade, só as assumern perante Os accionistas e, mesmo assim. dentro de bigaçoes entre as suas múltiplas manifestaçöes locais em diferentes partes do globo
alguns limites. Por outra lado, os processos polincos dus E:tados que compôem o sistema (corno, por exemplo, os movimentos de operrios das vários países onde opera a mesma
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inieresatal esio cada vez mais dominados por lógicas. cálculos e compromisos de curto multinacional. ou os rnovirnentos dos poyos indígenas pelo controlo das recursos naturaS
260 ' PeI. Pi4äo de Alice. O Socii e o Po//lOo na PósModern/dade O Noite o Su/ e a U/opio
.

261

exiStefleS nos seus terri6rios ancestra de que foram espoliados no período coIonafl. mulher no mercado de trabaiho. sendo apropriada tanto pelo capital
no espaço-tempo da
Muios deste5 movmefltOS dei-am origem ou estäo ligados a organizaçöes no-govema produçáo, como pelo Estado no espaça-tempo da cidadania que a
institucionaliza, nomea-
mentais Irausnaci011ais. Tambm no podem d&xar de er mencionados os esforços da damente no dominio do direiro penal, direito de familia e da segurança
social. Como de
comunidade intemacoua1 no sentido de dar urna resposta transnacìond a alguns probk resto noutros dominios. a distinçáo entre o espaço-tempo
domestico e o espaço-tempo da
mas do espaço-tempo muntha!, procurando renovar o drefto internacional corn doutrnas produção, por exemplo, é to
importante quanto as profundas articulaçóes entre eles. Por
como a do património comum da humanidade e tratados como a ei do mar ou o tratado ecemplo, L Wallerstein e outros lêm chamado a atençäo para a importancia
crucial do
da Antártida. trabalho näo pago realizado pelas mutheres no espaço-tempo doméstico,
na determina-
Dilse acinia que a pránca social está estruturada em quatro espaços-tenìpo. At agora çäo capitalista dos custos do trabalbo produtivo e. poi-tanto. na
rentabilidade do capital
debrucci-me exckisivamente sobre o espaço4empo mundial, mas näo porque e1 deteriha (Wallerstein, l983 hase-Dunn. 1991: 233). Trata-se de urna forma nao-salarial de expIo-

alguma primazia apriorística na expicaçäo das processUs socias da nossa contempora- raçáo do trabalho feminino que indirectamente facilita a exploraçäo salarial do
ti-abaiho
neidade. E, scm dtívida, um espaço-tempo corn crescente poder conformador, mas a sua masculino. Este mecanismo funciona amplamente quando a mulber entra no
mercado do
eficácia depende em tikirna instância das articuIaçes que entretece corn os restantes trabatho, o que vem a acontecer corn cada vez mais intensidade nas últimas décadas.
espaÇOs-ternpO Por sua vez, estes têm urna autonomia própria que Ihes advérn das rela- A articulaçâo das relaçòes sociais do espaço-tempo doméstico corn o
espaço-tempo
çòes sociaìs de ârnbìio local ou nacìona que os constituern. Referirei a seguir muito bi-e- mundial é complexa. Refui-o alguns dos seas aspectos tendo em mente os txs
grandes sec-
vernente os probernas fundarnentas corn que cada urn destes espaços-ternpo se debate no toi-es analisados o aumento populacional, a glohalizaçao
da economia e a degradaço do
presente e provavelmente se debater nas próximas d&adas e o modo corno tais proble- meìo ambiente. Dado o papel primacial das mulheres na reproduçAo biológica
da humani-
mas se articulam corn os problemas dilemáticos do espaço-tempo mundial que acabei de dade, a posiço deJas na familia e na sociedade, a sua maior ou menor
autonomia para
mencionar tomar decises, a sua educaçäo e os seus valores, as suas atitudes pci-ante o controlo
da
natalidade e a educaçáo dos filhos são facwres cruciais em qualquer política coerente de
controlo populacional. Por exemplo. as estatísticas das Naçôes Unidas
mostram que,
O espaço4empo doméstico salvo algumas excepçö.es, a taxa de fertilidade está intimamente relacionada
corn o nivel
educacional das mulheres, haixando à medida que este aumenta. Assim,
segundo o World
o espaço-tempo domestico espaça-tempo das relaçies familiares, nomeadamente
é o Resources Institute, a fertilidade das mulheres analfabetas em Portugal é de 3,5 enquanto
entre cônjuges e entre paìs e filhos. As relaçoes sociais familiares estäo dominadas por a das mulberes corn sete ou mais anos de escolaridade é de 1 8 (World Resources, 199O
urna ftwma de poder, o patriarcado, que está na origem da discriminaçäo sexual de que 266). Em gera!, a taxa total de fertilidade varia na razão directa da taxa de analfabetismo
so vítimas as mulheres. Obviamente, tal dìscriminaçäo nao existe apenas no espaço- das mulhei-es. A explìcaçao desta correlaçao é complexa. Entre outros factores é de men-
-tempo doméstico e é aliás visível no espaço-tempo da produço ou no espaço-tempo da cionar o facto de o aumento do nivel educacional tornar mais amplas e exigentes
as pet-s-
cidadania. como terei ocasìo de referir. Mas o patriarcado familiar á em meu entender a peclivas de vida activa, profissional ou nao, das muflieres e de. poi-tanto, o
seu comporta-
matriz das discriminaçôes que as mulheres sofrem mesmo fora da familia, ainda que mento reproduivo tender a ser urna i-esposta à falta de condiçóes sociais de apoio
à
actue sempre em artìculaço corn outros factores. Esse caráctei- matricial manifesta-se maternidade que Ihe permitarn compatibilizar a maternidade corn outros aspectos
da vida
por exemplo, no facto, frequentemente notado, de que a divisáo sexual do trabaiho no activa. A maior ou menor realizaçâo destas condiçies explica
diferenças de comporta-
espaço-tempo doméstico tende a ser homogénea e relativamente estável em formaçes mento reprodutivo das muiheres em diferentes países centraìs, por exemplo, na Suécia e

sociais corn diferentes divìsöes sexuais do trabalho noutros espaços-tempo. no Japáo.


Um pouco por ioda a parte a nìulher tern a seu cargo, para alám da reproduçäu bioló- A globalìzaçao da economia tern vindo a ter urn impacto significativo e
multifacetado
gica, a prcparaÇäo dos alimentos, as compras para consumo domástico e o trahaiho de no espaço-teinpo doméstico e. também neste caso, a posiço das muiheres neste espaço é
organizaçäo e de execuço que permite a reproduçio funcional da uriidade familiar. De um ngulo privilegiado de análise. () impacto tern a ver corn o crescente emprego da
urna outra perspectiva, essa hornogeneidade e estahilidade da divisän sexual do ti-abalbo mulher no sector industrial, corn os efeitos do investimento multinacional no trahalbo das

doméstico foi recentemente defendida por E-O. Wright ao demonstrar que, entre as famí- muiheres, corn a forte participaço do trabaiho feminino no Sector desregulamentado
ou
lias norte americanas e suecas, o montante de trabaiho domdstico realizado por homens informal da economia e. finalmente. corn a intensificaçAo do trahaiho doméstico
a modida
nào variava significativamente segundo a classe social (Wright et at, I 992)- Fourier que a dívida externa de muitos países do SuI provoca a queda dos salários reais e do nivel
eslava provavelmente a ser born sociólogo ao afirmar que a igualdade dos sexos sO seria de vida da grande nuiioria da populaçáo.
possível numa sociedade que abolisse a familia e perinitisse o amor livre. A ideologia Worneas Ra/e Sobretudo depois do trahalho de Boserup intitulado &onomic
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Estliet- in

patriarcal do espaço-lempo doméstico tende, de facto, a influenciar a subordinaçào da


em publicado I 970. teill prevalecido a tendtneia para distinguir entre as
262 ,. Pta Mo k Q Sock/ e o Polfko oa óc-Mode,ndade o Noire. o Sul e a Uroplo

posiçôes das muiheres .


tanto no espaçoempo domstìco, como no espaço1empo da 1977, de 500.000 e para a Tailandia em geral de 700M00. Estes ntímeros näo cessaram de

produçâø - nos pafses do Norte e nos paises do Sul. So trés os argumentos prìncpais crescer na última década.

apresentados por Boserup Em primero Iuar, a transiçäo da chamada socedade tradicio- Como em muitos países periféricos a globalizaço da economia e a crise da dívida
na para a chamada sociedade moderna em envolvido sempre a queda do status social externa so dois fenómenos gémeos, a proletarizaçào da famflia corre de par corn a queda
das muiheres- Em segundo lugar, o aumeino do nIvel tecnológico da produçäo agrícola e dos rendimentos reais da familia e o impacto negativo disso no espaça-tempo doméstIco

da prodiço industrial afecta negativamente a taxa de empego das muiheres re1ativa tende a ser suportado maìorìtariamente pelas mulberes. As múltiplas estratégias de sobre-

mente à dos homens. Em terceiro ugar. em toda a pane há certas arefas. nomeadamerne vivência exercitadas pelas mulheres tm
urna aura de irnaginação desesperada e muìtas

as relacionadas corn a subsìstncia, que são quase exclusivameine desempenhadas por veLes transbordam do espaço-tempo doméstico para a comunidade corno, por exemplo,

mulheres nos «comedores populares» dos baimas de lata de Lìma no Peru ou nas «oleas comunes»

Apesar da validade geral destes argumentos, eles çonem o risco de criar urna imagem da Bolivia (cozinbas comunitárias sediadas na vizinhança).

abstracta da «mulher do Terceiro Mundo». perdendo de vista as diferenças da suaço As transformaçòes do espaça-tempo doméstico sob o impacto da intemacionalizaçäo
das muiheres em diferentes países do Terceiro Mundo e as dìferenças de classe das dos processos produtivos podem vir a ser no futuro ainda mais profundas, tanto no Norte,

muiheres no interior de cada país. Para alem disso. aìs argumentos podem estar parcial- como no SuL Como se sabe, urna das transformaçôes históricas da familia por parre do
metC desacWalizados pelos processos de globalização da economia nas duas ftimas capitalismo consistiu na conversiki da familia numa unidade de reproduçâo social (habi-

décadas os quais fìzeram convergir em alguns aspectos significativos a situaçto das taço, aimentaçAo socìalização, reproduço hol6gica) separada da unidade de produçäo

mulheres operárias do Norte e do Sul°. É cerio que a grande maioria das muiheres que, corn a primeira revoluço industrial. passou a ser a fábrica, urn fenómeno analisado

activas no Terceiro Mundo trahaiham na agricutum, urna percenagern que ronda os 70% corn particular detalbe por Max Weber. Hoje em dia as novas teenologias da ínformaçio,
na Asìa na Africa e no M&lio Oriente. Mas, em geral, iem-se verificado urna feminì- da comunicaçAn, da automaço estäo a actuar no sentido de superar esta distinçào e fazer
zação da ftrça de trabaho assaariado e a presença das muiheres tende a ser particular- de novo convergir na familia as funçöes de produço e de reproduçâo. Sob diferentes for-

mente forte nas dreas e secrnres de exportaçao onde o investimento mu1tmaciona se tern mas, que, mais urna vez, tendem a reproduzir as hierarqulas do sistema mundial, este

concentrado, ainda que, segundo Lourdes Benaria, tais áreas e sectores nAo represeniem fenómeno está a ocorrer tamo no Norte como no Sul, e de tal modo que muitos rnilhares
mais que 3% do emprego multinacional global. No entanto, esta percenagem oculta as de pessoas trabaiham hoje em casa. No Norte, Irala-se sobretudo de traballiadores alta-

extremas desigualdades de dìstrìbuiçâo. Em certos países, as mutheres chegam atingir mente qualificados que, muflidos do sea computador pessoal integrado em múltiplas
go% a 90% da força de trahalho nas zonas e sectores de exportaçio Por outro lado, esta redes, fazem em casa e corn relativa autonomia o trabalho que antes os fazia deslocar-se

percentagem subestima o total do irabalho feminino para as empresas rnultnacmonais, à empresa, perder horas nos congestionarnentos de trânsito e trabalhar segundo horá-

urna vez que muito desse trabalho é indirecto. realizado através das empresas locais por nos mecânicos e estandardizados. No Sul, o trahaiho em casa é quase sempre feito por

cIas suhcontratadas. mulheres e crianças; é o trahaiho realizado à peça, em geral nas indéstrias trabalhointen-

Mais importante ainda o facto de as muiheres sereni sistematicamente vítimas de


t
sivas do sector têxtil e do caiçado. Em conclusäo, o problema fundamental do espaço-

dìscriminaçäo salarial, sendo-Ihes na prica negada a fruìço do principio do salário -tempo doméstico em condiçôes da crescente globalizaço da economia reside em que,

igual para trabaiho igual consagrado na legislaço da maior parte dos países. A segmenta- por urn lado, a entrada no mercado permite às mutheres transcender a dominaço paLriar-

ço do mercado do trabdho ocorre por outros factores que nao o sexo, por exemplo, pela cal do espaço-ternpo doméstico. por nutro lado, esta domknaçâo transborda deste- espaço
raça C pela etncidade. Mas a segmentaçao pelo sexo é talvez um dos factores mais uni- para o espaço-ternpo da produço e, por essa via, reproduz, se nao mesmo amplia, a dis-

versais e a globalizaçao da economia em nada tern contribuido para o atenuar. Pelo con- crirninaçulo sexual contra as mulheres.

trrio, a existência de um vasto potencial de força de trabalho frminino a nivel mundial o impacto da degradaçäo ambiental no espaço-tempo doméstico faz-se sentir corn

torna prática da discriminaço mais fácil. Aliás, a crescente internacionalizaço do capi-


a mais intensidade no Sul, onde as tarefas domésticas s feitas em íntima relaço corn a

tal contribuì por urna outra via para a iransferência, para o espaço-tmpo da prnduço, da nalureza. É sabido que a «modernizaço» e comercialização da agricultura na periferia e

dominação patriarcal organizada no espaço-tempo doméstico. Trata-se da prosiituiçao e semiperiferia do sistema mundial foi em garaI leita em prejuzo dos camponeses e em
do chamado turismo sexual, de que principal cliente a classe executiva internacional especial das mulheres camponesas. Para a]ém da expulso dos camponenes das terras

Nas Filipinas, as «hospedeiras» (hospüaUr girls) registadas no Ministério do Trabalbo e mais férteis, seleccionadas para culturas cornerciais e de exportaçào, os projectos de

do Emprego ascendern a I00.0()0. enquamo os cálculos para Banguecoque cram, em desenvolvimento agrícola (grandes barragens, projectos de irrigaço) térn vindo a pro-

duzir múltiplos desequilibrios ecológicos, tais conto desenificaço e salinizaçäo. que


tornam mais domstìca dos camponeses. A
B' m f- rarfnç socs ocorrìds is de anos
difíceis a sobrevivéncia diária e a vida desflo-

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prec]açäo cr11ca do das
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Sn 195F). ecrnplo. tém produzido de restaçäo e a comercializaçäo da floresta, a escassez lenha


seuntcs sua pub[caç5o pode e-ss Bcnaria
" Pe'a MOo de A/ice O Social e o Político na Pás-Modernidade (1 Norte. o Su! e a Utopia

pnra COZflhff OS ahmentos nos campos. Apanhar a lenha em quase iodas as panes do naturais. Por dIurno. importancia deste espaça-tempo advém-Ihe por 1er sìdo neie que
a

sistema mundia' urna tarefa feminna e os dados reveam que o tempo despendido nessa se geraram as lutas sociais que durante décadas no nosso sculo ameaçaram pôr fïm à
taefa no em parado de aumentar (Rao. 991: 13). Segundo Agarwal, na Gâmbia as (des)ordem social capitalista, o movimento operário comunista e socialista.
nn1hercs despendem mas de meio dia a apanhar enha (Agacwat. 1988). Por outro lado. a A importância estrutural do espaço-tempo da produçào tern vindo a ser questionada
exploíaçiiø desordenada dos lenços aqucos e a desertficaço omam mais dfíci1 a nas três últimas décadas. Trê argumentos principais de algum modo contraditórios. 1cm
ohtençâo da água. outra tarefa que está em geral a cargo da muflier no Terceiro Mundo. sido apresentados. O primeiro argumento ¿ que a sociedade capitalista evoluìu gradual-

Em conclusäo. pode dizer-se que espaça-tempo doméstico ests a passar por profundas mente para urna sociedade de lazer. O desenvolvimento tecnolögico tern permitido
transformaçòes sob o impacto do espaço-tempo mundial Como deñ atths, o problema ganhos tais de produtividade que o nivel de vida e o tempo livre podem aumentar conjun-
- -
fundamental em verdade dilemndco que as transformaçòes suscitam é que se, por lamente. A robótica e autornaço representam talvez a fase mais avançada deste desen-

um lado. cias enam condiçòes para urna rnaor emaricipaço da muflier. por exempo. volvimento e eventualmente libertaro o homem do trabalho produtivo. O segundo argo-
atravs da entrada desta no mercado de trabaiho, o quai em alguma medkia a liberia da mento, de alguffi modo ligado ao anterior, é que a pauta de valores e os dispositivos cuitu-
dominaçäo paumrcal domestica, por outro lado, permem que a lógica desta dorninaçâo rais que orìentaxn a acçào e constituem a subjectividade já nao sao, como cram dantes,
transborde do espaça-tempo domésUco para o espaço-tempo da produço, por vas täo determinados pela experimncia operária. São cada vez mais determinados por práticas
variadas quanto a discrimnaço sexual e o assédlo sexuaL reproduzindo assim e at sociais fora do espaça-tempo da produçäo na esfera privada ou esfera pública e corn isto a

ampando a discriminaçäo contra as muflieres. Acresce que. como ao entrar no espaço da categoria matricial da sociabilidade deixa de ser o trabalbo para passai a ser a interacçäo.

produçäo nao so aliviadas das arefas no espaço-empo doméstico, as mutheres tendem a o terceiro argumento, fotmulado pela primeira vez pelo movimento estudantil no final da
ser duphirnente vitimizadas corn os efeitos negativos da globalizaçâo da economia. A década de sessenta, ¿ que a importncìa do espaço-tempo da produço para a transforma-
conscnda dese problema, apesar da sua natureza dilemätica, no em impedido e, peto çäo social decaiu a partir do momento em que o movimento operário, os sindicaos e os
contrário, em motivado a emergéncia de mponantes movimentos de muiheres em luta partidos operàrios se renderam à lógica capitalista a troco de aumentos salariais, segu-
por melhores condiçòes de igualdade e de digndade, tanto no espaço-lempo dom6sico. rança no emprego e de outros beneficios sociaìs, os quais se, por um lado, representaram

como no espaço-tempo da produço. Nada mais erróneo que minsformar as mulberes em concessöes importantes por parte do capital, por outra lado, consolidaram a hegemonia
vutìmas abstracias e irrecuperáveis nas teias que a domnaço sexual e a dominaçäo de deste, transformando-o no dnico horizonte possivel de transformaçäo social. Este argo-

classe entre s tecem. Os movhnenos de mWheres, quer autónomos, quer integrados nou- mento Convergiu cam outros nas décadas de setenta e de Oitetita no sentido de relativizar
tfl)s movimentos populares, como, por esempio. o movimento operário e o movimento o valor explicativo das classes sociais e das lutas de classe nas prticas sociais e, em espe-
ecológico, do tesiemunho das possibilidades de reconsrruçäo da subjectividade. tanto cial, nos processos de transformaçAo social.

individual, como colectiva. Como facilmente se vê, estes argumentos tiveram sempre em mente mais as realida-
des dûs países do Norte do que as reaJidades dos países do Sui, onde afinal vive 4/5 da
popuiaçào mundial. Faz. pois, sentido, antes de avahar estes argumentos, passar em

O espaço4empo da produçäo revista brevemente as transformaçoes do espaço-tempo da produçào nas duas últimas
décadas em resultado da giobalizaçâo da economia. Aliás, algumas delas já foram men-
o espaça-tempo da produçäo é o espaço-tempo das relaçôes sociais através das quais cionadas acima no anaiisar as articulaçôes entre o espaço-tempo doméstìco e o espaço-

se produzem hens e serviços que satisfazem as necessidades tal como cias se manifestam -tempo mundial. A perda da lucratividade capital a partir da década de setenta foi um dos
no mercado enquanto procura efectiva. Caracteriza-se por urna dupla desigualdade de factores da transnacionalizaço da produçäo. A agudizaçào da concorrncia criou urna
podcr entre capitalistas e trabaihadores, por um lado, e entre ambos e a natureza, por dupla exigencia cm impacto directo na relaçâo salariai. Por um lado, a busca da redução
outro. Esta dupla desigualdade assenta numa dupla relaço de exploraço: do homem dos costos do trabaiho e. por outro, o aumento da discipna sobre o trabaiho. Esta dupla
pelo homem e da natureza pelo homern. A importância do espaça-tempo da produçäo exigencia conduziu à maciça industrìalizaçio de aiguns países peñfóricos e a urna certa
reside em que nele se gera a divisäo de classes que juntamente com a divisâo seuai e a desindustrializaçào, corn a consequente perda de postos de trabalho, nos países centrais
diviso &nica constitui um dus grandes factores de desigualdade social e de confito onde, entretanto, o crescimento dos serviços aumentou significativamente.
social. É tainbem nele que se constituem as reaiaçòes socials básicas que gerain, legitimain o pt-ocessq de globalízaçào da economia afectou assim tanto o centro como a periferia
e tornum inevitvel a degradaçào do meio ambiente. A conversäo instrumentalizadora da do sistema mundial. Afectou-os de modo diferente, certo, mas a hierarquìa entre o
brç.i dc trabalho em factor de produçäo e a converso da natureza em condiço da produ- centro e a periferia no se alterou mato. Mesmo assim, as transformaçòes são impar-
çao 'au processos concomitantes que conjuntamente tornararn possívei urna expioraço tanteS C legitirnam que as «quesröes do desenvolvimento» tenham deixado de ser um
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ctii nccedentes na história da huinanidade. utnio da energia humana, cuino dos recursos «privilégia» Sul para se aplicarern tambirn, ainda que dc forma iiiodificada, no None
PCIQ M() ch -cce, O e o Político na Pós..Modeniidade (j Norte. cc Sui e a Uropia
266

enùgrou para o SuL, ambm verdade que, cdicuio os países da semipeniferia europeia. como Portugal, Espanha, Gr&ìa e irlao
Em primeìo lugar, se é verdade que o cipitaI
Mas o mais importante a reler é que as reduçiies do tempo de trabaiho que foram scc"
pelo menos a Amé#ca houve aguma emigraçào do trabaiho do Su para o Norte, onde
obtidas destes meados do scuio XIX at à segunda guerra mundial so reduçôes dc
se instaaram indústria explorando mào-<le-obra barata e dócil. em modos muito seme-
longuissimo tempo de trabaiho, imposto, pela primenia vez, corn primeira revolu.
hantes aos que dommarani a indusirialização do Sui A emergencia em Nova torque de
a

industrial. e que representa urna ruptura total corn o tempo de trabalho e de laici
fábilças de vestuário empmgaido u-abalhadores imgran1es clandestinos evou a falar-se
distìnço entre trahaiho e lazen é hem mais
da «periferização do centro» (Chase-Dunn, 199 : 80). Por outra 'ado, tanto na periferia,
sociedades pr&capitaiistas, onde, aliás, a fc-

como no centro, a1asrMam a subcontrataço e a ìnformalizaçäo da reaço saaria mar- cil de fazer. A investìgaço reCente sobre o tempo medieval europeu ou sobre o tcill\

cokcüva da 1egislaçio abora (quaMo existentes) corn justificaçöes nas sociedades ditas primitivas pe em causa a ideologia da lihentaço do trabaiho. v"t'1
gem da negociaço e
semeihanles: tiexibilidade, adaptaço ao mercado e reduço de custos. Por último, o cres- lada pelo capitalismo. Em verdade, nao só o ritmo, o tempo e a monotonia do truh,lh¼
aumentaram. como aumentou a disciplina sobre o trabalbo. Hoje em dia, se a1arganììc t
cimento acelerado dos serviços nos países centrais esconde enormes assimerìas inemas:
aim da comparaçio entre países do Norte, e tivermos cut
serviços aliamente remunerados ao 'ado de novas serviços multo mal pagos, sem quai-
110550 ângulo de visão para

conta a duraço do trabaiho nos países da periferia e da semiperifenia do sistema muiidc.ii.


quer segurança nein perspectiva de promoçäo.
industnia1izaço das duas iMtimas décadas ocorreu, estou certo de que a concllc.t1
Scm dúvida que a g!obaiizaçäo da economia representou major prosperidade para
onde a

tambmum significativo aumento do trabaiho e do controlo sobre o trals'th.


alguns países. mas no só manteve intactas, se nâo mesmo agravou, as assimetrias gbbais
seri al de
E, à luz do que disse acima sobre o espaça-tempo doméstico, este aumento foi, por cc'ck.
no sistema mundial, como agravou claramente as desigualdades sociais. tmto nos pafses
particularmente pronunciado no caso do trabaiho feminino.
do centro. como nos paises do SuL O que este processo suscita do ponto de visla anaiftico
c a necessidade de pensannos globalmente as transformaçöes soclais sem contudo perder-
Em vista disto, a ceniralidade do trabaiho e da produço, ao invés de diminuir. tcill tic

na crescente mercadonizaço da satisfaço


mos de vista as especificidades locais e nacionais corn que se articuiam. E d à luz desta
facto aumentado. E a razäo para isto reside tI.i

necessidades e na cultura que Ihe esta associada e a legilima -o consumismo. Atincs


exigencia que devemos confrontar os argumentos acima referidos sob a perda de centrali-
delas, o crescimento infinito da pmduço ocon'e simetnicamente corn o crescimenlo titi'
dade do espaço-tempo da produço. An faz-Io, procurarei dar conta dos problemas fun-
nilo do consuma e cada um deles alimenta-se do outra. Taivez, por isto, o segundo iiii'
damentais das re1açfes sociais dete espaça-tempo.
mento sobre a perda da cemralidade do espaça-tempo da produçio tenha urna patita de
Quanto an argumento da produtividade enquanto geradora de lazer, os dados estäo
verdade. A major presença da pratica do irabaiho na vida das pessoas pode, em cc' ttS
longe de o confirmar. Pelo contrário, Juliet Schor, num Jivro recente e importante, signifi-
citI-
condiçäes, acorrer de par corn a inculcaçto de formas de sociaJizaço e de universos
cativamente intitulado The Overworked American: The Unexpected Decline of Leisure, tu
tarais e éticos em que o Irabaiho e a experiência opertlria têrn muito panca importância
vem demonstrar que. ao contrlrìo do senso comum dos economistas e sociólogos, o lazer
dos trabathadores americanos tem vindo a diminuir consistentemente nos diurnos trinta
so at substituidos pela cultura do consumo e da cidadania.

anos (Sabor. 1991). E evidente que neste periodo a produtividade aumentou dramatica- Como jí refeni no nono capítulo, a dìsperso social do trabatho obtida nas dua tilt -

mente, mas o contexto social em que cia ocorreu fez corn que, em vez de reduzir as horas mas ddcadas por processos io diferentes como a transnacìonalizaço dos sistemas pic tciti-
o aumento do Erabaiho
de trabalho. as aumentasse. Esse contexto foi. segundo a autora. caracterizado pela
;iiilO-
tivos, a precarizaçäo e ìnformalizaço da relação salarial,

mesmo tempo que dificulta a mobilização sindical, marginilii;i


grande fraqueza do movimento sindical, incapaz de lutar pela reduço do tempo de traba-
nomo e act domicilio, ao
expeniéncia do trabatho nos pmcessos de construçâo da subjectividade, quer do no
Ihn, e pela compulso do consumo, que transformou os americanos em escravos de um
lt;ilca-

do No que diz respeito a este último, cs-


ciclo infernal ganhar-gasLar e os levou a aceitar como natural que os ganhos da produtivi- Ihador, quer trabaihador. tal marginalizaçäo ccci

dade se traduzissem sempre em aumentos de rendimento, e no em menores horas de tra- ponde a urn processo de supresso e de silenciarnento ideohSgicos semethanie uit ijite

ocorre na experiéncia prisiotial. Especulo mesmo para a esmagadora maioria ciO


baiho, como tena sido possivel. Assim, segundo os scus cálculos, os trabaihadores amen-
se,

trahaihadores nao qualificados do sistema mundial, o ryeifle e crescente aumenic



canos trabaihavam em 1987 mais 163 haras por ano do que em 1969, ou seja. o equiva-
t

lente a um ms adicional de trabaiho (Schar, 1991: 79 e ss.). Este aumento nao foi distni- ritmo e controlo sobre o trabalho no aproxime arquetipicamente, pela sua penosiduclt. O

buido igualmente pelos sexos: enquanto o aumento de horas de trabalho dos horneas foi tempo produtivo do tempo pnisional.
a
Estes processos de dispersio social e de disjunçuio entre prátícas e ideologias ajuduifl
de 98 horas, o das muiheres foi de 305.
da importância do espaça-tempo da prodtid)
A autora contrasta a situação das trabaihadores americanos corn a des trabaihadores
situar o lerceiro argumento sobre a peixla

de alguns países da Europa, ande os aumentos da produtividade levaram de facto a urna ou seja. a ideia de que o operai-iado deixou de ser uma força privilegiada de translcccjlt
Ç() social. Esta ideia parece hoe ampiamente confirmada. O colapso do regime 5oviIPLO
diminuiço do tempo de trahaiho. facto que cia atribui predominantemente à força do
que e1e contraste resultan atenuado se analisamios e dos partidos comunistas, o abandono de alcernativas socialistas por parse dos pattidtits
movimento sindical. Julgo. contudo,
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do tempo real de trahaiho de I97 web
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sobretudo, se jnciuirrnosusing
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socialistas. a ìntegraço das sindicatos nos sislemas neocorpontivos de concedt,c,iO
'68 ' Pe/a Mo dc Aflce O Socia! e o Poiíio pîa Pó4odernidade O Norte, o Su! e a Utopia 269

soca1. a queda dos niveis de sindvaizaço e o enfraquecimento globa' do movimento çäo de passons físicas e de tftulos, decisoes e documentos. Se os empresérios e seus

sindical no controlo efectivo das condiçes de tibalho. tudo isto aponta no sentido de representantes passatam a mobilizar-se multo mais faci'mente corn o desenvoivimento dos
retirar ao operariado quaquer priviIgio nos processos de transformaçïìo social. No transportes aéreos, os titsilos, as decisúes e os documentos passaram a mohilizar-se instanta-
eiflatflo. litz do que disse atrás, no se pode deduzir daqui que o trahatho. a produço e neamente coin a revoluço electrónica. Dada esta assimettia estnturaj, quanto mais fácil é

as c'asses sociais que nees se geram tenham deixado de ser centrais para compreender e ao capital organizar transnacionalmente o trabaiho a sen favor, mais difícil é ao trabaiho
organizar-se iransnacionabnente contra o capital.
explicar a socedade ta quai cia existe. Pelo vontrário, o que é preciso é compreender ou
explicar po que que esta centaiidade mis práticas sociais dominantes näo se tradui em o espaço4empo da produçäo compreende ainda, como urna djmensäo relativamente

capacidade colectiva para as transfoimar. Este & pat-a mini, um dos problemas fundamen- autónoma, o núcleo das relaçôes sociais de troca niercantilt2). Abrange, ponanto, as tela-

tais com que se confronta o epaço-tempo da produção. çöes soçiais de consumo. Na todas, como está bem de vet Há, pelo menos, dois tipos de

Quando vistas de urna perspectiva do sistema mundial, as concessöes do capital relaçies sociais de consumo que no so feitas através do mercado. Por um lado, os bens

-
petante a força do movimento sindical designadas em ge'aI por fordismo. compromisso e serviços fornecidos pelo Estado no âmbito das suas poblicas redistribuitivas (o Estado-
histórico, Estado-Providencia, social-democracia, etc. -- cot-respondem a um perkxlo tela- -Providéncia); por outro lado, os bans e setviços transaccionados nas redes de solidarie-

tivamente limitado do desenvolvimenfo do capitalismo e abrangem um pequeno número dade, de ajuda méma, de reciprocidade, o que em peral designamos por sociedade-provi-

de países e uma pequena percentagem da força do trabaiho global. Tais concessòes foram déncia. Em suma, cabem no nosso ambito anaiftico to-s6 as relaçöes socials de consumo
mercadorizado, isto
muito importantes e, à luz delas, é compreensível, em retrospecto. que eas tenham con- é, as relaçöes mediadas pelo mercado.

duzido cooptaçäo e à desradicaiizaço do movimento sindical. O que ¿ talvez menos Nas sociedades capitalistas este espaço-tempo é habitado por urna forma de poder, o

compreensivel que a eroso actual dessas concepçôes decorrente da crise do fordismo,


t
feiticismo das mercadorias. que estabe!eee urna desiguaidade estrutural entre pmdutores e
do Estado-Providência e do enfraquecimento dos sindicatos no esteja a provocar nenhuma distribuidores, poi' um lado, e consumidores, pelo outro. Esta forma de poder consiste no
reanìmaço da capacidade emancípatóra do operariado. De aigum modo, a cooptaço e a processo pelo quai a satisfaçAo das necessidades por via do mercado se transforma numa
desradicaliaaço prosseguem por inércia muito para a1m dos factores que as orignaram. dependência em reiaço a necessidades que só existem como antecipaço do consumo
o dilema reside em que, rium contexto ideológico, saturado pelo consumìsmo, a eroso mercantil e que, como tal, so a um tempo plenamente satisfeitas por este e infinitamente

das concessôes e o aumento da disciplina e dos ritmos de irabatho que a acompatham recriadas por ele. Resulta das análises precedentes que o espaço-tempo do mercado tern

eliminam, em vez de promover, a vontade de lutar por urna vida diferente e mesmo a vindo a adquirir urna importhncia crescente. O problema da saturaço do mercado corn

capacidade de a imaginar.
que o capitalismo mconentemente se confronta tern sido resolvido pelo desenvolvimento
Inconformados corn este problema dilemático, um pouco por toda a parte surgem de novos produtos, pela abertura de nov05 mercados, pela promoçäo do consumo ligada
à publicidade e ao crédito an consumo.
movimentos, organizaçôes, redes operárias mitito diferentes entre si, mas partithando a
característica de assumirern plenamente as condiçoes pós-fordistas. Por exempio, erner- E debativel a medida em que a globaiizaço da economia das últimas décadas contri-

gem redes de trabaihadores trahaihando para a mesma empresa multinacional em dife- buiu para a expansäo do consumo na periferia do sistema mundial. O aumento da pobreza

rentes paises corn o objectivo de farer frente comurn a problemas commis. Por nutro lado, e a permanencia de formas de subsistência tradicional revelam que urna larga maioria da

aiguns sindicatos e movimenlos operários começam a ecpandir o horizonte das suas populaço mundial tern ainda muito pouco contacto corn o consumo mercadorizado e

expectativas, das suas exigencias e também das suas solidariedades para além do espaço- que, pertanto, a rnaior parte da produço multinacional nos países periféricos no se dea-

-tempo da produç.o, para o consumo e para a qualidade de vida, pa


a habiiaço e para a tina obviamente ao mercado interno. E difícil generalizar neste dominio, mas as dispari-

degradaçäo ambiental, para a forne e para os desempregados. para os scm abrigo, etc., dades de consumo entre o centro e a perifetia estäo certamente relacionadas corn o facto

etc. As dificuidades destas iniciativas que procurarn romper o bloqucio so enormes. de a expanso do Consumo dos trahathadores do centro ter sido feita à custa da expio.-

Duas delas merecem especial referencia. Em pritneiro lugar, se so multo diferentes as raçAo e da contracçáo do consumo dos trabaihadores da periferia. Sidney Mintz, no sen

condiçoes de produçio de país para país, sao-no ainda mais as condiçöes de vida, pelo irabalbo sobre o consumo do açúcar no século XIX, nostra como o açécar produzido
que urna acção concertada e transnacionai é difícil de organizar e muito mais de manter. pelo trabatho escravo nas Carafbas permitiu ans trabaihadores ingleses o accaso a um
Em segundo lugar, urna das ironia.c dette fim de século é o ter invertido as expectativas produto alimentar e fonte de calotins que antes era considerado de luxo e privilegio das

de internacionalizaçäo formuladas no scu in1cio em vez da internacionalizaçäo do opera- elites (Mima, 1985). E de algum modo aconteccu o mesmo corn o consumo do ch e de
ñado. deu-se a ìnternacionalização do capital. Apesar de alguma migraço. o trabaiho é
hoje urna realiclade sìtada às ordens de um capital que circula globa' e incessantemente. 2. 0 mctta10 £onsti um ctmjwito de relaçoes sociais ruja autonom em riaç5o ao espaço-tmpo da pm-
A equaçio abstracta entre trahalho e capital esconde urna profunda assimetria: é que duçäo riSo cessa de cre-scr. E possívet que. em fisuras revisöe desk modelo antftico, o mercado passe a cons-

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ahstracço
trabaiho é urna o using a watermarked
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pessoas físicas. capital é urna abstrac- Iwir cpaço-Icmpo eumturI cspecítco.
ONorte, oSujea Utopia 27!
270 - Pela Máo de Aiwe. O Social e o Politico oa Pós-Moderiidade

em grande medida bloqueada pela próprìa lógica consumista que privatiza u energias
Outros produtos, hoje de consumo corrente. No dominio da produço de carnes, o
tra

de auto-realìzaçâa e as desvia das relaçôes interpessoais para as relaçôes entn pessoas e


aumento da produço na Costa Rica fo de par corn a diminuço do consumo interno de
objectos.
carne.
o que parece ser novo neste domírno o aumento exponencia' da exporiação da cui-
Eura de massas produzida no centro para a periferia e corn eta das «estrumras de prefethi-
o espaço4empo da thiadarna
cias» pelos objectos de consumo ocidental. Está-se a criar assim urna ideologia global
consumista que se propaga corn relativa independencia em relaçAo às práticas concmtas
Finalmente, o espaça-tempo da cidadania
de consumo de que continuam arredadas as grandes massas populacionais da periferia. constituido pesas relaçôes soci.tis entre o
Estado e os cidados, e nele se gera urna forma de poder, a dorninaçaa, que estabelece a
Estas são duplamene vtimzadas por este dispositivo ideológico: pela privaço do con-
desigualdade entre cidadäos e Estado e entre grupos e interesses politicamente organi-
sumo efectivo e pelo aprisionamento no desejo de o ter. Po que sduzfr o desejo ao con-
zados. Muito do que fican dito atrás tern implicaçòes directas corn as transfonuaçOes por
sumo reduzir o consumo ao desejo do consumo.
que tern passado nas tres últimas to
Esta dupla vitimizaço é iambém urna dupla aimaditha. Por um lado, nem o desenvol- décadas este espaça-tempo que crucütl fOi para a
implantaço social e política da modernidade.
vimento desigual do capitalismo, nem os Ilmiles do eco-sistema pianetádo permitem a
o
generalizaçäo a toda a popuJaço mundial dos padres de consumo que so típicos dos
Estado
tern sido desde o sécujo XVII e sobretudo desde o século XIX a unidade

fundamental do sistema mundiaL e o sen impacto nos demais espaças-tempo foi


politica
países centrais. Por isso, a gIobalizaço da ideologia consumista oculta o facto de que o
único consumo que essa ideoioga soma possivel o consumo de si propria. Por outra
sempre decisivo. O
espaça mundial, se é espaça da economia mundial, t também o
espaça do sistema interestatal, assente na soberania absoluta dos Estados e nos consensos
lado, essa ideologia verdadeiramente urna consteiaçäo de ideologias onde se incluem a
perda da auto-estima pela subjectividade no alienada pelas mercadorias, a deslegiti-
entre eles obtidas como meio de prevenir a guerra. O espaço-tempo doméstico corneçou a
ser fortemente regulado pelo Estado a partir
do século XIX num crescendo ue atingiu
maço das produtos e das processos tradicionais de satisfaçiio das necessidades, o priva-
o sen clíniax no Estado-Provjdncìa. Por sua vez, o espaça-tempo da produçäo viven
tismo e o desinteresse pelas formas de solidariedade e de ajuda mútua ou o sen uso instni-
sempre dependente da «mio visível» do Estado e a regularnentaçäo cresceu corn o cresci-
mentalist. Por esta via, a alienaçAo capita1isa pode chegar muito mais longe que o feiti-
mento das relaçes mercantis.
cismo das mercadorias. Processos de incu1caço deo6gica aparentemente os mesmos e
-
recotTendo a dispositivos semethantes os mesmos anúncios Coca Cota ou da Pepsi mos-
Este estado de coisas tern, no entanto, vindo a mudar desde a d&ada de scssenta, e de

trados em todas as televisles do mundo, 600 milbes segundo os cálculos podem estar.- algumas das mudanças j dei conta atrás. Tanta no piano internacional conio no plano

em contextos diferentes, ita serviço de práticas de dominaçilo tambm diferentes. Esta


iutemo multas dessas mudanças so o reverso das que tm acorrido nos outras espaças.
No plano interno, tanto as privatizaçôes e a desregulamentaçâo do mercado, corno a ree-
dup'a armadilha coloca urna grande parte da popuiaço mundial nurna situaçAo dilema-
mergência das identidades étnicas e religiosas suo, cada urna a seu moda, niuiifestaçäes
tca: nao este dentro da sociedade de consumo e tao pouco está fora dela.
de urna certa retracçäo do Estado. A mesma retracço se observa cam a crìe da funço
Aigumas inriatvas e movimentos populares nos países perikricos tém vindo a tentar
providencial cam a devaluço ans espaças doméstico
romper este dilema reinventando processes e conhecimentos locais para a satisfaço de e da produço das serviços sociais,
antes prestados pela Estado. Tal retracçâo é ainda abservável quando o Estado perde o
necessidades, transformando-os e adaptando-os a novas necessidades, relegitimando soli-
monopólio da violência legítima que durante dois séculas foi considerada a sua caracte-
dariedades e produtos tradicionais, tudo isto corn o objectivo de criarnm espaças de auto-
nomia prática kleológica onde sja possivel pensar formas de transfonnaçilo social alter- em cada 3 polícias é privado; no
ristica mais distintiva. Calcula-se que boje. nos EUA, i

nativas à do consumismo capitalism, assente na desigualdade, no desperdíco e na destrui-


ano 2000 a proporçâo será de I em cada 2 (Deluigian, l992a 18). Em geral os Estados
nunca atingìram na o monopólio da
ço do meio ambiente. No entanto, esnts iniciativas e movimentos, para serem verdadei- periféricos prática mas parecern cstar boje
vìalência,
mais longe de o conseguirem do que nunca. So multas os países em que partes do tetti-
ramente eficazes, deveriam estabelecer urna ligaçäo entre o son âmbitó local e o âmbito
tôrio rda controladas por forças paralelas an EstadoPEntre eles, as Filipinas, o Camboja, o
global em que se desenrola a ideologia do consumismo. Essa ligaço exigiria, por um
Myanmar, a Tailândia, a Sri Lanka, a tndia, o Afeganistän, a Líbano, o Chad. o Uganda,
lado, a articulaçäo corn outras iniciativas e movimentos locais noutras partes da periferia
Moçambique, Angola, a Samájia, a Libéria, o Sudao, a EtiOpia, a Coiômbìa, lii Saivadoi
do sistema mundial e, por outra lado, a articulaço corn as iniciativas e movimentos de
a Guatemala, o México e agora, na Europa, os Estados que resultaram do colapso da
consumidores nos paises centrais. No entanto, se a primeira ariiculaçäo é difícil, ainda o é
Uniäo Soviética e da Jugosiávia.
mais a segunda. Esta ultima seria de importância parricular porque. de todas as dispari-
Mas se no plano interno o Estado está a ser cada vez mais confrontada corn forças
dades entre o Norte e o Sul, as disparidades no consumo são. scm ddvida, as mais cvi-
subestatais, no plano internacional confronta-se corn as forças supra-estatais que j acima
dentes e, como tal. potencialmente as mais adequadas a traduzirem-se em representaçòes
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assinalci
emsio da ohcrania de
sociais de injustiça e em energias solidaristas. A verdade é que tal possihilidade se encon-
falar nas trarisformaçöes mundial.
- Pela Máo de Alice. O Social e o Politico na Pôs-Modernidade O Worte, oSulea Utopia 273

Ao contrário, tern caracterizado substituirla a comunidade etnica; enquanto Estado secular, assente num principio de sepa-
que tanto boje se fala nAo ¿ de facto um fenómeno novo.
desde sempre a experiência dos Estados
perif&icos e semiperifricos nas suas interacçcs raço ent a igreja e o Estado, criava urna cultura pública específica. o seculansmo, que
que é nOVO é O facto de essa erOSäO e de essa
O permeabilidade d.a a prazo tornaria a identidade religiosa obsoleta. A verdade é que nas últimas décadas este
corn ESIadOS centrais.
soberania estar hoje a ocorrer nos Estados centrais. (projecto modernista foì posto drasticamente em causa quando, para sui-presa de muitos, as
absoluto do que identidades e as lealdades prìmordiais da ernia e da reiigiäo ganharam nova força, ao
Este processo de erosão da soberanía, que faz desth menos um valor
negociveI apesar de ocorrer gIobaimente nAo elimina, e, pelo contrário mesmo tempo que o carácter nacional do Estado e o secularismo entravam em crise.
LUfl tftuo

disparidades e as hierarquias no sistema mundiaL Como referi acima, este facto A reemergncia das identidades ¿micas estii a ocorrer um pouco por toda a parte e
agaVa as
condiçes, a quai, no certamente incorrecto atribui-la a urna sO causa. No entanto, urna das mais importantes
torna urgente urna nova ordern transnacional adaptada a novas
condiçies que a ornarn urgente:
entanto, parece estar a ser bloqueada precisamente pelas
certamente o próprio processo histórico da constituiçäo de muitos dos Estados modernos,
do Estado em face de forças tanto na Europa, como no contexto pós-colonial. Apesar de assentes na equaçäo entre
a eEOSAO da soberanía do Estado e a perda de centralidade
das rdaçöes entre os Estados parece Estado e naço, rnuitos desses Estados so multi-micos e assentam na imposiço de urna
subestatais e pra-estatais E se a democratizaçäo
apesar das pro- dada etnia sobre as restantes existentes no rnesmo espaço geopolítico. Num momento em
estar longe, täo-.pouco ests petto da democratizaçäo interna dos Estados
contrário A perda de eficácia dos Estados, combinada que as promesses de progresso e bern-estar fritas pelos Estados mais e mais se descum-
clainaçôes e injunç5es em sentido
interior de um sistema interestatai muito hiethquico, e a prem à medida que a globalizaço da economia elimina todas as veleidades de autonontia
corn a eroso da soberania no
efectiva a democracia na grande maioria dos países do por parte dos paises perifericos, talvez de esperar que as massas populares voltem a
ausêncìa de condiçes que turnern
no augura um futuro risonho para o sistema interestatal tal corno o revalorizar e a recriar identidades ancestrais que afinal asseguraram a sobrevivência e a
sistema mundiaL
dignidade colectivas durante sêculos, as «comunidades humanas, naturais e imediatas» de
-
conhecemos.
f o espaço-tempo da cidadania compreende ainda, como urna dimensAo relativamente que fata Ernest Wamba Dia Warnba(1991: 221).
via das quais se
autónoma, a comunidade, ou seja, o conjunto das relaçôes sociais por
Se as fronteiras nacionais tém sempre algo de artificial, em alguns casos esse artificia-
de raca, de ernia, de re1igio, que mesmo
criare identidades colectivas de vizinhança, de regito, lismo d particularmente acentuado. sto acontece na Europa, no caso da Europa
simbólicos e a temporalidades partilhadas do onde as fronteiras foram marcadas e desmarcadas recorrentemente ao longo de
vinculam os individuos a teifitóriOs físicos ou
Leste,

sociais que constituem este espaço-tempo urna história muito conturbada. Os acontecimentos recentes e al em
passadas, presentes ou futuras3. As relaçOes curso säo indicativos
produz desigual-
gefam urna forma de poder que designo por diferenciaço desigual e que
de que só agora se ests a pôr fim, e de maneira novamente dolorosa, aos tres diurnos

grupo ou comunidade, como nas relaçies intergrupais ou inter- impdrios da Europa: o Otomano, o dos Habsburgos e o Russo. Fora da Europa o pro-
dadas, tanto no interior do
desigualdades podem ser abissais ou mínimas; correspondenteiflente o blema acentua-se ainda mais em virtude da imposiçio colonial que está na base de muitas
comunitárias. Tais
diversidade-
espaço-tempo comunitário pode ser despótico ou convivencaL E enorme a fronteiras estatais. Aliás, aiguns dos Estados da periferia mundial sAo quase imperiaìs, na
em vista a perspectiva
de relaçöes sociais que compreendem este espaço-tempo. Tendo
medida cui que incluem grupos populacionais importantes corn identidades diferentes da
fundamentais deste espaço- que é oficialmente reconhecida, como, por exemplo, a India, o Paquisto, a China, a
analitica aqui adoptada de tentar identificar os problemas
duas últimas d6cadas, em articu- Mas
-tempo a partir das transformaç5es por que passaram nas
Nigétia ou a Etiópia. para alrn deles existern muitos outros e para tanto basta ver a

mundial e, em especial, corn a g'obali- lista de Estados corn «minorias multo aanpias» organizada por Anthony Smith (1988).
laçO corn as transformaçôes do espaço-tempo
breve a dois tipos de relaçes soclais as relaçòes A do Estado e das ideoloias desenvolvimentistas abre neste dominio urna caixa
zaçào da economia, farei urna mençäo crise

de Pandora donde podem lado a lado, e às vezes misturados, o racismo, o chauvi-


éthicas e as relaçöes religiosas. sair,

Curiosamente, qualquer destas relaçöes socials e, em verdade todas as que constituem nismo ¿tnico e mesmo o etnocfdio, por um lado, e a criatividade cultural, a autodetermi-

o espaço-tempo cornunitário, foram declaradas em declfnio


jrîeversve1 pela moderni- naço, a toierncia pela diferença e a solidariedade, por outro. A dificuidade dilemática

dade. O racionalismo luminista em conexâo corn o capìtalismo liberal e individualista, neste dominio reside precisamente em que à partida é difícil prever quai destes processos

por um 1ado e o Estado moderno, democrático, por outre, pareceram capases de destro- prevalecerà ou sequer se qualquer deles pode em nadas circunstâncias transmutar-se no
colonizado, as identidades Outro. Os termos em que se deu e continua a dar a g1obaiizaço do sistema mundial ori-
nar para sempre, tanto na Europa, como no mundo por cIa
ditas tradicionais retrégadas, primitivas que sustentavam tais relaçöes, e o Estado foi o gifla recorrenternente processus de fragmentaço e de localização. Nas condiçes presen-

dispositivo privilegiado para levar a cabo essa tarefa. Enquanto Estado nacionaL assente tes, a articu1aço entre estes fundamental para potenciar o que M de progressivo e

nova comunidade a comunidade nacional, que emancipatório neles e para neutralizar o que há neles de retrógado e mesmo
num principio de cidadania, crìava urna reaccionárío.
No entanto, dado que tal articuiaçäo implica em si mesmo um processo de g1obalizaço,

espaço-lempo da ekiada- como é que se podem globalizar as diferenças scm esmagar, no processo, algumas delas?
3. A comurúdade 1cm vado a conqwsiar urna atuurîomi crrsnie em i1aço ao
tm vindo
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nia. É poaafvet que em fuiuros irabahos a »mundade passe atonsIiiu um cspaço-IemPO
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um ressurgimento so
eairuturat autónomo. As identidades e lealdades religiosas a ter paralelo das
274 . Pela Mao de Alice. O Social e o Poluiico na Pi5-Modernidade
O Norte, o Sul e a Utopia
275

kienUdades e 1ea1dadis étnicas e, em algumas suaçôes. as duas sobrepemse. A partir baseia na possibilidade de um projecto social, politico e cultural autónomo. Nos países
da RevohiçO Francesa. o Estado moderno assumiu graduahnente muitas das tarefas e centrais, alguns movimentos protagonizados por rninorias ¿tnicas partilham alguns dos
posiçes socais que eram antes ocupadas pela Igreja. um processo que se designou em traços desta postura cultural corn o objectivo de denunciarem o colonialismo interno de
gera! por secu1arìzaço e que. peio scu papel crucial. passou a ser considerado como um que so vftimas, enquanto OUtrOS, corn forte composiço de classe média, assumem a pos-
doe traços principais da modernidade. Se no espaça colonial a relaçào entre o Estado e a tura de autonomia e separaço a partir do pólo oposto, traduzindo-a em retórica e pthicas
reIigiO foi mais complexa devido à coexistência de religiöes europeias, nAo europeias e racistas e xenofóbicas dirigidas sobretudo contra imigrantes do Terceiro Mundo.
de novas re1gies smncrticas e devido tambin à relaçAo de suporte mutuo entre o Tal como sucede corn as identidades e lealdades &thcas e, como vimos, muitas vezes
Estado eoloniai e a regio europela, no período pös-cOlonial. os novos Estados assumi- interpenetradas por cias, as identidades e lealdades religiosas constituem urna caixa de
tam O mesmo papel de modernìzadores colocando, também e1es a religiAo numa posiçäo Pandora de que podem jorrar tanto energias destrutivas, corno energias construtivas. O
defensiva de resistência e de adaptaço semethante à que ela assumiu no quadro europeu. dilema reside em que a crítica radical que, sobretudo os países perifericos dirigem às pro-
A verdade que, durante estes quase dois séculos. nenhuma das grandes re1igies messas da modernidade e do capitalismo eurocêntricos, ocorre num momento de crise
colapsou e agumaS delas expandirain-se enormemente como o caso do Islào, cuja profunda do paradigma da modemidade e, portanto, num momento em que se começa a
expansAo depois de correr a Africa e o Sudeste Asiático, alastrou à Europa Ocidental e à reconhecer que essas promessas täo-pouco foram cumpridas nos países centrais e tao-
América do Norte. I-U hoje 1,5 mithöes de muçulmanos em Inglaterra, mais que os meto- -pouco podem vir a se-lo dentro deste paradigma. Este reconbecimento, na medida em
distas e baptistas juntos e na França esse número añnge cerca de 7 milhòes (Delurgian. que relatìviza e questiona as realizaçes do paradigma ocidental, cria condiçôes para urna
992b: 7). Por outro lado, as prirneiras décadas do s&ulo XX presenciaram. tanto no nova tolerância discursiva, para urna interacção mais horizontal entre alternativas episte-
centro, como na periferia do sistema mundial, um surto de fundamentalismo religioso. mológicas, culturais e sociais No entanto, este potencial de tolerância manifesta-se para-
Movimentos evangélicos nos EUA. o integralismo e a Opus Dei na Europa, o culto dos doxamente e, por agora, pelo separatismo e pela incomunicaço afmal, pela intole-
milagres em Fátima e mais tarde em Medjugorie. na Cmácia, so manifestaçes de funda-
e,
rância
mentalismo no centro e na semperiferia que ocorrem quase simultaneamente corn movi-
mentos paraclos e igualmente fundamenta!istas na periferia, como, por exemplo, a
Irinandade isâmica fundada no Egipto em 1988 (De1uigan, 1992b: As dificuldades fundamentals
Apesar disto, durante os anos cinquenta e sessenta. o secularismo parecía haver triun-
fado e O fundamentalismo parecia ter sido reduzido à fttfima expresso. A partir da Os problemas corn que as sociedades contemporaneas e o sistema mundial se confron-
década de setenta. no entanto, o secularismo começou a regredir ou, pelo menos, assim tam no fun do sdculo so complexos e difíceis de resolver. So fundamentals, na desig-
foì interpretado o revivalismo religioso que entâo emergiu e que em boa verdade tern naço de Fourier, a exigir soluçes fundamenraìs. Eis um breve resumo des prob'emas
vindo a crescer até ao presente sob múhiplas formas: novas re1igies, movimentos funda- que identifiquei na anlise precedente. Emergiram ou agravaram-se rias duas últimas
mentalistas dentro das religiöes históricas, aumento da prática religiosa de camadas décadas urna série de problemas transnacionaìs, alguns trarsnacionais por natureza e
socials anteriormente tides por secularizadas (por exempo, os jovens). Trata-se de um outres transnacionais pela natureza do scu impacto. So os problemas da degradaço
fenómeno internamenie muito diferenciado em termos de composiçAo socia' e da orien- ambiental, do aumento da populaçäo e do agravamento das disparidades de bern-estar
taço politica. De um lado, a leologia da 1ibertaço dos baums da lata e da selva indígena entre o centro e a periferia, tanto ao nivel do sistema mundial, como ao nfvel de cada um
na América Latina, do ourro, a direita religiosa nos EUA. Em gera este renascimento dos Estados que o cornpôem. Uá quem prefira. como Paul Kennedy, conceber estes pro-
religioso tern provocado alguma perturbaçäo no interior das hierarquias das religiäes biemas como grandes desalios e especule sobre os países que, corn base soluçôes téc-
históricas, sobretudo quando se traduz em práticas e objectivos no sancionados pelas
rias

ficas disponiveis, mais ou menos hem preparados para os defrontar (os vencedores e os
instituiçôes religiosas. vencidos). A verdade que em relaço a mIÜtOS dstes desafios ternos razes de sobra
Longe de significar um regresso au passado, o novo surto da religiosidade exprime, para suspeitar que as chamadas soJuçes ucnicas nao produzirâo seno vencidos e em
acima de tudo, um ressentimento perante as promessas modernizadoras e progressistas relaçäo a outros desafias, aceitar a ideia de que inevitavelmente uns países venceräo e
nao cumpridas e, portanto, urna grande desconfiança face M instituiçes que se proclama- outros serio vencidos equivale a subscrever urna soIuço malthusiana, o que, nas condi-
ram arautos dessas promessas. sobretudo o Estado e o mercado. Na periferia do sistema çöes presentes e perante os riscos em jogo, pode significar abrir mo de preciosos recur-
mundial, o revivalismo fundamentalista, sobretudo do fundamentalismo islâmico, deve sos naturals, humanos e morais em todo o sistema mundial.
ser visto em geral como urna resposta ao fracasso do nacionalismo e do socialismo, e Os desafios sso, de facto, problemas fundamentals a reclamar soluçôes fundamentais,
como urna alternativa que, ao contrário do que suceden corn estes dois últimos, näo no fundo. urna nova ordern Iransnacional e urna nova ordern nacìonal cam as linhas entre
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assenta na ìmitaçO do Ocidente e na rendiço au imperialismo cultural deste, e antes se ambas cada vez mais difíceis de estabelecer. Como vimos, as dificuldades de urna tal
-

r;;LÌ -(.tt -4L


2Th Pela Mao de Alice. O Social e o Politico na Póy-Moderrndade O Norte, o Sul e a Utopia 277

nova ordern so enoDnes. Em resumo, são tre.s as principais. Ein piimeiro lugar, a diticul- nào torna os seus causadores mais visíveis ou mais facilmente identificáveis. De algum
dade do sujeito. Nas condiçes presentes, os Estados nacionais eräo de ser forçosamente modo, a globalizaçao dos problemas globaliza o inimigo e se o inimigo está em toda a
um sujeito pivilegiado ainda que complementado por movirnenoes socias e organiza- patte, no está em parte nenhuma. Esta é urna dificuldade verdadeiramente dilemtica,
çöe no governamentais transnacionais e organizaçôes internacionais etc. Vimos, parque as coligaçöes revoluciothias ou reformistas forum sempre organizadas contra urn
porém, que a crise de Estado, que potencia a urgencia d urna nova ordern internacional, inimigo bem definido. Se, como disse acima, h certos problemas em relaço aos quais
atina a crise do sujeito dessa ordern. No plano interno, parece que essa crise se vat tradu- ninguém poder a prazo ganhar corn a sua irresouço, pareec ser ìmpossível, nesses casos
zì nos próximos anos no aumento das convulsöes soclais, no fundamentalismo religioso, pelo menos, determinar o inìmigo contra o quai seja preciso organizar urna soluçäo do
na criminalidade, nos motins motivados pelas iniquidades do consumo, na guerra civil e, problema. É certo que mencionei acima o papel das empresas multinacionais na criaço
nalguns casos na perda de con1roe poiftico sobre paree do território nacional. Esta crise dos nossos problemas pelo simples facto de serum cIas boje os únicos titulares de pensa-
do sujeito significa que o sistema mundial capitalista, ao mesmo tempo que transnacio- mento estratégico no sistema mundial. Mas evidente que no so o único inimigo identi-
naliza os problemas, localiza as souçÖes e, efectivamente, dada a crise do Estado, faz ficvei nern to-pouco me pance que o inimigo possa ser identificado apenas ou sobretudo
baixar O patarnar de Iocalizaçào para o nivel subnathonal. Miss, possível argumentar an nivel institucional. Os nossos problemas são mais fundes, e as instituiçòes só podem

que, SObtUdo nos países centrais, o horizonte social das soluçies, mais do que localizado, resolve-los depois de transformadas e reinventadas ao nivel a que os problemas ocorrem.
está privatizado. O capitalismo hoje menos um modo de pmduço que um modo de vida. Quatro axiomas fundamentals da modemidade esto, em meu entender, na base dos
.

o individualismo e o consumismo transferiram para a esfera privada a equaçäo entre inte- problemas corn que nos confrontamos. O primeiro, deriva da begemonia que a racionali-
resse e capacidade. E nessa esfera que hoje os individuos identificam methor os seus inte- dade científica veio a assumir e Consiste na transformaço dos problemas éticos e poll-
resses e as capacidades para Ihes dar satisfaço. A reduço à esfera privada desta equaçâo ticos em problemas técnicos. Sempre que tal transformaçAo nao é possível, urna sotuçäo
faz corn que muitas das desigualdades e opresss que ocorrem em cada um dos espaços- intennédia é buscada: a transfornuiçAo dos problemas éticos e politicos em problemas
-tempo estruturais sejam invisfveis ou, se visveis, trivializadas jurídicos. O segundo axioma é o da legitimidade da propriedade privada independente-
A segunda dificuldade dia respeito à temporalidade própria de urna soluço funda- mente da legitimidade do uso da propriedade. Este axioma gera ou promove urna postura
mental. Essa temporalidade é ntergeracional portanto, de médio e longo prazo. Mas, psicológica e ética - o individualismo possessivo - que, articulada corn a cultura cossu-
como vimos, ftido parece conspirar contra tal temporalidade. Durante décadas, o cornu- mista, induz o desvio das energias sociais da interacçao corn pessoas humanas para a
nismo manteve viva essa temporalidade, anda que a prática dos regimes comunistas a intracço corn objectos porque mais facilmente apropriáveis que as pessoas humanas. C)
negasse grosseirarnente sobretudo no dominio ecol6gico Hoje, a classe política vive atas- terceiro axioma é o axioma da soberania dos Estados e da obrigaçâo política vertical das
cada nos problemas e nas soluçes de curto prazo, segundo a temporalidade pipria dos cidados perante o Estado. Por via deste axioma, tanto a segurança internacional, corno a
ciclos eleitorais, nos países centrais, ou dos golpes e contra-golpes, nos paises periféricos. segurança nacional, adquirem «natural» preoedência sobre a democracia entre Estados e a
Por outro lado, urna parte significativa da populaçäo nos países centrais vive dominada democracia interna, respectivamente. O quarto e último axioma é a crença no progresso
pela temporalidade cada vez mais curta e obsolescente do consumo, enquanto urna grande entendido como um desenvolvimento infinito alimentado pelo crescimenco económico,
maioria da populaço dos países periféricos vive dominada pelo prazo ¡mediato e pela pela ampliaçao das relaçöes e pelo desenvolvimento tecnológico.
urgéncia da sobrevivéncia diri. As condiçòes e os sujeitos do pensamento estratégico, Estes axiomas rnoldaram a sociedade e a subjeclividade, criaram urna episternologia e
de longo pram, parecern cada vez menos presentes no sistema mundial De facto, boje em urna psicologia, desenvolveram urna ordern de regulaço social e, à imagem desta, urna
dia apenas um sujeito tern condiçöes para pensar estrategicamente um grapo reduzido de vontade de desordem e de emancipaçâo. Dal que o inimigo das solues fundamentals
empresas multinacionais dominantes. Mais do que os Estados hegemónicos, é este grupo Lenha de ser buscado em múltiplos lugares, inclusivamente em nos mesmos. Dal
que amarla os países periféricos e semiperiféricos à urgencia dos ajustameñtos estruturais que a crise da ordern social torne mais difícil, e no mais fácil, pensar a desordem verdit-
(que tam, em verdade, muito pouco de estruturafl e as classes poltticas. an cmb prazo deiramente emancipadora.
politico que em pa1e deles decorre. Mais do que os Estados hegemónicos. é este grupo Perante isto, que fazer?
que amarra urna parte do mundo à compulso do consumo imediaiista e outra ao imedia-
tismo da luta pela sobrevivncia.
o problema das soluçöes intergeracionais é que elas têm de ser executadas inhragera- A utopia e os confitas paradigrnticos
cionalmente. Por isso, os problemas que cIas criam no presente em nome do futuro
tendem a ser mais visiveis e cortos que os problemas futuros que cIas pretendem resolver «o futuro jé nilo é o que era», diz um graffitto numa rua de Buenos Aires. O futuro
no presente. Isto me conduz à terceira e tíUima difìculdade das soluçoes fundamentais: a prometido pela modernidade näo tern, dc facto, futuro. Descrê dele, vencida pelos desa-
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quesâo do inimigo. Ao contririo do que se poderìa pensas a glohalizaçâo dos problemas fios, a malaria dos poyos da periferia do sistema mundial, porque em nome dele negli-
' Pela Mao de Alice. O Social e o Poiftico na PósModernìdade
O Norte. o Sul e a Utopia

genCram ou recusaram nuEros futuros, quiçá menos brilhantes e mais próximos do seu evidente, ainda que de modo muiLo dit.iIc. no pensamento de Fourier e no pensarnento
passado, mas que ao menos asseguravam a subsistnca comurútria e urna rehtçào equili.. de Marx. No caso deste último, a diiiwn utópica da sociedade comunista é suprimida
brada corn a natweza, que agora se thes deparam täo precárias. Descrem dele largos sec- sob o determinismo científico, corno .'e ' evoluço da sociedade pudessem prever
«,res das poyos do centro do sistema mundaI, porque os riscos que ele envove - sobre- um futum radicalmente diferente do pi.cidc. Nø caso de Fourier. o impacrn do cientismo
tudo os ecok5gicos - começam a ser mais ilimitados que ele prôpño. No admira que em é mais complexo, pois em vez de ncgn uiopa por via da ciência procura criar urna
;'

face disto muitos tenham assumido urna atitude futuûcida assumir a morte do futuro para utpia científica. Dal que, para ele, as kis le Newton sejam apenas urna aplicaço 1OCa de
linalmente celebrar o presente, como sucede em cerio pós-modernìsmo. ou mesmo para um ¡uracçàO passional, de que se pretende arauto;
principio multo vasto, o principio tl

ce'ebrar o passado. como sucede corn o pensamento reaccionario. A verdade que, também matemdtscos, as simetrias e as analogias, pela
dai a sua compulsan pelos cIc"I
depois de s&ulos de modernidade, o vario do futuro no pode ser preenchido nem pelo determinaço do número preciso de pcoem cada falanstério ou do número preciso de
passado nem pelo presente. O vario do futuro tAo-sé um futuro vaño. anos de vida dos harmonìanos.
Penso, pois, que. perante isto, só h urna salda: reinventar o futuro. abrir um uovo Ì° paupérrimo em pensafflento utópico. o que
Por esta razo, o nosso século cin
horizonte de possibllidades cartografado por aUemativas radcais às que deixaram de o um efeito normal do progresso da ciencia e
durante muito tempo foi pensado cornu
ser.Com iso assume-se que estamos a entrar numa fase de crise paradigmátk.a, e portanto, do processo de racionalização global d Ia sOcial por ela tornada possfveL No entanto.
de iransiçAo entre paradigmas episEemolóicos. sociais,, politicos e culturais. Assume- a crise da ciência moderna, boje bern cvJdCflLe, obriga a questionar esta avaliaço e esta
-se iambm que näo basta continuar a crfticar o paradigma ainda dominante, o que, aI.S, explicaço. lIl° que boje tememos foì anunciada há muito
NAo sera que a morte do
esft feito já a saciedade. E necessário, além disso, definir o paradigma emergente. Esta
pela morte da utopia? que No da inquietaço e busca de urna vida methor
seth
úthma tarera, que é de longe a mais importante, é tambm de longe a mais difícil. E-o contribuí para a emergencia da subjecHvulade conformista que considera methor, ou pelo
sobretudo parque o paradigma dominante. a modernidade. tern um modo própiio, ainda
menos inevitivel, nido o que for ocnrr0 56 POfllU OCOflC e por pior que reja? Dia
hoje hegemónico, de combinar a grandeza do futuro corn a sua rnhiiamrizaçao. Consiste rciiIií;Ila se parece esranhamente corn a utopia. Seth
Sartre que «urna idela antes de ser
na classificaço e fragmernaçäo das grandes objectivas em soluçÔs técnicas que térn de dundar na recusa das ideias por realiza?? A
que a recusa da utopia no acabeu por ver-
caractistico O serem credíveis para aém do que é tecnicamente necessário. Este exeesso dade é que. como tern sido frequentemUte a.ssinalado, as utopias antecipain, por vezes
de credibilidade das soluçes técnicas, que parte ntrfnseca da cultura instrumental da
periodo 1iai1iculrfllente fértil em ulopias, o século XVU,
t
em séculos, a anti-utopia. Num
modenildade, oculta e neutraliza o defice de futuro delas. Por isso, tais soluçôes no irno das tábuas postas a flutuar num regato se
Fontenelle, depois de divagar sobre
deixam pensar o futuro, mesmo quando elas próprias já deixararn de o pensar. v1 ao mundo, acrecenta num dos seus célebres
chegou Ros grandes navios que dito i

Perante isto, como proceder? Penso que sO há urna solução; a utopia. A utopia é a em 1686, o da segunda noite, «e a arte de
Entretiens corn a Marquise de G. pubJu.J°5
exploraçào de novas possibilidades e vontades humanas, por via da oposiço da rnagi- C um dia o homem im à lua» 1955: 92).
voar stS agora está a nascer aperfeiçoa (

naçäo à necessidade do que existe, só porque existe, em nome de algo radicalmente meThor /f eventualrnente realizadas nao é da natureza
Apesar de algurnas ideias utópíca
que a hunianidade tern direto de desejar e por que merece a pena lutar. A utopia é, assim,
da utopia ser realizada. Pelo contthriù. 1PR é a metafora de urna hìpercarncia forum-
duplarnente relativa. Por urn lado, é urna chamada de atençäo para o que nto existe como (') que é importarne nela no éo que diz sobre
lada ao nivel a que nâo pode ser satìfr
(contra)parte inLegrante mas silenciada, do que existe. Pertence à época pelo modo como prtt que a torna possível. Paradoxalmente, o que
futuro, mas a arqueologia virtual do
se apalia dala. Por nuim lado, a utopia é sempre desigualmente utópica, na medkla em que
é importante nela é o que nela nao é uT(YcO. As duns condiçöes de possibilidade de uto-
a imaginaçAo do novo composta em parte por novas combinaçöes e novas escaas do que psicologia. Enquanto nova epistemología. a
pia são urna nova epistemologia e umi
existe. Urna compreenso profunda da realidade é assim essencial ao exercício da utopia,
utopia recusa o fechamento do horizor' 4e expectativas e de possibilidades e cria alter-
condìçäo para que a radicalidade da imagiiiaçAo nao couda corn o seo realismo. Na fron-
nativas; enquanto nova psicologia, a V)Pa recusa a subjectividade do conformismo e
tejía entre dentro e fora, a utopia tao possuida pelo Zeiteíst corno pela WeIt5ch?flerz. -
ciìa a vontade de lutar por alternativas 'Jffl0 ETist Cassirer mostron magisfla]rnente no
Niio é fácil hoje defender ou propor a utopia. apesar dc o pensainento u6pico ser urna transiçäo paradigmática implica sempre urna
caso da Renascença e do Iluminismo.
constante da cultura ocidental, se no mesmo de outras culturas. A dificuldade no deixa,
-

nova psicologia e urna nova epistemo(1- Cassirer, 1960; L963). O conhecimento sem
no cutanEo, de ser, à primeira vista, surpreendente, pois a modernidade é urna época fértil
reconhecimento nern a si mesmo se ccir.
em utopias, a começar corn a Uiopia que criou a designaçAo comuni. a de Thomas More, anunciadas e testemunhadas pela utopia
A
nova epistemologia e a nova p
escrita em 15 15 e 1516, e a culminar nas utopias socialistas do século XIX. A verdade é
assentani na arqueelogia virtual prev-: .
CtSC de urna arqucologia virtual porque só
que a expansäo da r4cìonalidade científica e da ideologia cientista a partir de meados do porque é que as
interessa escavar sobre o que nào fo f )rque flO foi feito, ou seja.
século XIX e a sua expanso do estudo da nalureza para o estudo da sociedade foram
-

escavaçào é orientada para os silencios e


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crando um ambiente intelectual cada vez mais hosiil so pensamento utópico, e isso é bem
-;nidas,
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experìncias
alternativas deixaram de o
para os silenciamentos, para as trad:
Ser. Nesie -

-
-

para as subalternas.
280 Pela Mao de Alice, O Social e o Poftico na PósModernidade ONorte,oSulea Utopia 281

para a perspectiva das vítìmas, para os oprimidos. para as margens, para a peiifeiia. para paradigmáilca. Pardrgada 2 é, para já, apenas uifl;1 comunidade educacional: os estud.antes
as fronteiras para o SUI do Norte, para a forne da fartura, para a mséria da opalncia. so todos os cidados enquanto trabatharn. 1''' e estUthifi. E pautada por um duplo
para a tradiçào do que nao foi deixadO existir, para os começos antes de serem fms, para a ohjectivo ampliar o conhecimento dos parat8lZ em presença e promover a competiço
inteigibilidade que nunca fo compreendida, para as Iínguas e estilos de vida probidos, entre e'es de modo a expandir as ahemati' d prática social e pessoal e as possibili-

para o 11x0 intratáve do bern-estar inercanW, para o suor inscrito no pronto'avestir dades de !utar por elas. Ao contrgrio das oii U10P' Pasárgada 2 nAo está organizada
avado, para a natureza nas toneladas de CO2 imponderavelmente leves os nossos em delathe, pelo que no cabe aqui senilo n'ielìt OS set's principios de organizaçäo e o
ombros. Pela mudança de perspectiva e de escaia, a utopia subverte as combinaçöes hege- perfil geral dos paradigmas em competiço.
ménicas do que existe, destotaliza os sentidos. desuniversaliza os universos, desonenta os Quanto à organizaço, o principio ifl5ti1%h'lI mais importante ¿ a constituiço de
mapas. Thdo isto corn um único objectivo de descompor a cama onde as subjectividades urna Câmara Paradigmálica em que esto iglhflCnte representados os diferentes paradig-
donnern um sono injusto. mas em competiço atravds dus reus adept icitos pela comunidade educacional. Con-
o que proponho a seguir nao urna utopia. E täo-só urna heterotopia. Em vez da vérn dizer urna palavra sobre a origem desti ( 'ìmara. Convencida peios argumentos de
ìnvenço de urn lugar totalmente outro, proponho urna deslocaçan radical dentro de um alguns filósofos, cientistas e humanistas de ltiC O paradigma da modernidade estava a
mesmo lugar, o nosso. Urna deskcaço da ortotopia para a heterotopia, do centro para a entrar numa crise fmal e que a competiço cfl'fl um paradigma emergente estava de facto
margem. O objectivo desta desIocaço é tornar possk'e urna visäo telescópica do ceruro aberta. a comunidade educacional de PardriuId 2 verilicou que as suas inSitUiÇÖeS edu-
e. do mesmo passo, urna viso microscópica do que ele exclui para poder ser centro. cacionais no davarn qualquer sinai de qiir C5S diSC existia e suprimiam de v.rios
Trata-se, tambérn, de viver a fronteira da sociabilidade como forma de sociabilidade. modos, uns mais subtis que outros, a ideìafr qUC um novo paradigma poderia estar no
A heterotopia que proponbo chama-se Pasárgada 2. No é um lugar inventado é o horizonte e de que era do interesse dos CUI)SC5t1ante5 conhec-lo. A simples hipó-
nome inventado de urn lugar da nossa sociedade, de qualquer sociedade onde vivamos, a tese de urna alternativa radical deixava-os I1(íVOSOS C escondiam os nervos silenciando
urna distncia subjectivarnente varivel do lugar onde vivemos. Ern Pathgada 2 vigota a ou ridicularizando os que admitiam tal hìpótre. OS nervos e a sua ocuitaço cram tanto
ideia de que estamos efectivamente nurn período de iransiço paradigmática e que é pre- maiores quanto maiores eram as responsabilidades profissionais das instituiçies. Por
ciso tirar todas as consequncias disso. Todas ou algumas, pois tambtm se reconhece que exemple, ao nivel universitário, as Facu1datk de Econonia, Direito, Medicina e Enge-
este período de transiçAo está ainda no começo e portanto näo apresenta ainda todos os nharia eram particularmente notadas por eti tIitd
sens traços. Em Pasárgada 2 estada-se corn multa atenço o século XVII porque foi um Perante isto, a comunidade de cidadose4(udante5 decidiu formar urna Cámara Para-
sculo em que CirCuaram v&ios paradigmas cientificos. Por exemplo, conviveram a par e digmática corn o objective de criar urn forwil alternativo de discusso sobre os paradig-
par o paradigma ptolomaico e o paradigma copemicano-galilaico. Talvez por ¡sso se acei- mas. Esta Cârnara no tern quaquer poder cIr11ari'0 sobre os processus e conteúdos de
tou neste siculo a relativizaço do conhecimento. a distancia hidica em relaçäo às verda- ensino nas instituiçöes, mas está em perfll'' diálogo corn eles. A dnica deliberaço
des adquiridas e se viven o fascmnio por outros mundos, outras formas de pensar e agir, que tornou oi suspender temporariamenle ;
UflCCSSO de diplomas. Como as instituiçes
enfim, outras formas de vida. contirniarn, por agora, a ensinar apenas u 1Iligfl até agora vigente. a Cámara enten-
FonteneHe, já citado, é um born exemplo disto mesmo. A sua obra mais conhecida deu que, como os diplomas certificarn cunll'(ímeflto apenas desse paradigma, do ponto
intitula-se significativamente En:retiens rur la Pluralité des Mondes e nela disserta o de vista do paradigma emergente os diploni;1 corresPondem a diplomas de ignorância.
autor sobre a possibilidade de a ua e de outres planetas serem habitados. Segundo ele, se Como embaraçoso que no futuro os -IadâOS-StUdaflteS tivessem um diploma de
seria
a diferença de costumes e de aparência fisica silo tIlo grandes entre a Europa e a China, ignorância, e como de pouco Ihes servia um diploma que tanto podia ser considerado de
nAo nos devemos surpreender que sejam ajada maiores entre os habitantes da terra e os conhecirnento como de ignorância, a Cârara decidio suspendê-los temporariamente.
habitantes da hrn. Como exercício, convida-nos a entrar na pele dos Indios Americanos, admitindo mesmo poder aboi-los mais tarde e para sempre. A suspensâo dos diplomas
os quais, ao verem Colombo, devem ter lido a mesma surpresa que nós terfamos se den muito mais liberdade sos cidadâos-estu'i 1
CflOU um incentivo para as ifl5titUi-

contactássemos os habitantes da tua. E sobre o nosso conhecimetno afirma que ele tern çí5es se abrirem à discussäo paradigmthica. 'providas do privilégio de certìfìcaçâo, se
limites para além dos quais nunca poderá conhecer e que de outros planetas ou perspec- nao se abrirem à discussAo, correm o risco J' perder os estudantes.
tivas possivel ver coisas que nao vemos do nosso planeta ou das nossas perspectivas. Procurarei agora anaflsar, em traços largl' O conteúdo das discussöes paradigmâticas
AIiás, especula que as nossas peculiaridades nao serâo menores que as dos lunares e con- que a Câmara Paradigmática está a protno/C. Nao falo como sociólogo independente,
clui, corn a distância hudica que nos recomenda, «estarmos reduzidos a dizer que os pois que isso, do ponto de vista da Cânm d'difl1ática. corresponderia a falar como
deuses estavam bêhados quando fizeram os homens e que quando olbaram a sua obra, jl ignorante diplomado. Falo como sociólogo f':.'Tbro da Cämara que nela defende o para-
sóbrios, nän puderam deixar de nr-» (1955: 90). Dai que, no que se segue, eu analise
PDF
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que Pasárgada 2
inspirado nesta atitudewebadoptar
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o da
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decidiu evaluation
termos da
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principio transição
da compeliçâo
digma emergente
os scm
tal

txansiçäo e
qual ele, e outros, o
tal qual a vejo e, portanto,
O Norte, o Sul e a Utopia
282 Pela Mlo de Alke. O Social e a Político na Pcs-Modernidade

urna entidade cinica. totalmente distinta de outras práticas ""'k' O '


COIflO S artes
que sso vincu'e a Crnara. Apenas espero que as análises e os argumentos que apreseno
ou as humanidades.
sejain perSuasivOS e nessa medida conqusLem adeptos.
o diagnóstico da condço presente que apresente na primeira parte deste capm10 d o novo paradigma constitul urna alternativa a cada tim J'i' Em primeiro
.1ìdo. l-la muitas
lugar, nos seus termos nAo há urna única forma de '
indicaçes bastantes sobre o modo como vejo a transço paadgmática e sobre a concep- as sustentam.
fonuas de conhecimento, tantas quantas as práticas sociais que U
ço que tenho e a ava1açAo que faço do paradigma ahida dominante. embora decadente -o A clência moderna é sustentada por urna pnitica de divisÌo Iitil idiSMOfl e social
paradigTna da modernidade. Concentrar-meeí agora no paradigma emergente. Em boa ver 1iiIivas de que o
do trabatho e pelo desenvolvimento tecnológico
dade no h1 um paradigma emergente. llá antes um conjunto de «vibraçôes ascendentes», ¡iifinito 1as
tinmas de conhe-
capitalismo exempai Práticas sociais a1ternativa
boje tinico
como diria Fourier, de fragmentos prpamdigmáticos que têm em comuni a idela de que o
cimento alternativas. NAo reconhecer estas formas de 0I1eiii.1a 11)lica deslegitimar
paradigma da modernidade exauriu a sua capacidade de regeneração e desenvolviinento e social das que
as práticas sociais que as sustentam e, nesse sentido, pruiuover °
-
que, ao contrário do que ele proclama modemidade ou barbárie , possivel (e urgente)
t
também um
imaginar alternativas progressivas.Têm também em comum o saberem que só é possivel
as promovam. O genocidio que pontuou tantas veres a expiflsi
coflbecimento
episteinicídio eliminaram-se poyos estranhos porque tinlflufl J'""
pensar para além da modemidade a partir dda, ainda que na forma das suas vftimas ou das sustentadas por
estranho e elìminanun-se formas de conhecimento estranho 1Nlqu' ,aii'
nadiç&s que ea própria gerou e depois suprimiu ou marginalizou. Neste sentido, pode v.'tO que o geno-
práticas socials e pavos estranhos. Mas o epistemicídio Fi J11W111 I'
dizer-se que a modernidade fornece multas dos maieriais para a construçäo do novo para- in5trnaliZ, ou
cídio porque ocorreu Ihj1
digma. Só no fornece o plano de arquitectura oem a energia necessária para o concretizar; sempre que se pretendeu subaltemizar.
XPflSO capita-
ilegalizar práiicas e grupos sociais que podiam constituir un
se, por hpótese, visitasse o edfido, näo saberla como entrar e, se entrasse, morrena instan- tuste domínio tho
lista ou, durante boa parte do nosso século, à expansâii CflhIÇIII°
taneamente corn as correntes de a ixu-ifdríco, extra-
moderna quanto a capit1ista); e também porque ocorreu tautn IH
os fragmentos pr&paradigmáticos so por enquanto um paradigma vktual e nem LÇfl euroeu e
-europeu e extra-norte-americano do sistema mundial. cnníl 0"
sequer é Seguro que à modernklade se seguirá um outra paradigma corn a mesma coern- 1jiIIìtres e as minorias
norte-americano, contra os trabathadores, os Indios, os negros.
cia gobaI e pretenso totalizadora que ela teve. Pode ser que os parathgmas emergentes
em geral (étnicas, religiosas, sexuais).
sejam varios permaneçam vários e conflituem tanto entre s como, em conjunto, confli- crimes Contra a
tuanl cam a modernidade. Considero que so hoje identificáveis tres grandes areas de
o
novo paradigma considera o epistemicídio como um J'
JulKJuziu nos poYos,
humanidade. Para além do sofrimento e da devastaço indiívei
confliwalidade paradigiMtica: conhecimento e subjectividade, padrôes de transformaçao Wfl empobreci-
nos grupos e nas prdticas sociais que foram por ele alveuIo.
social, poder e politica. Em relaço a cada urna destas áreas identifico a seguir os traços
mento irreversível do horizonte e das possibilidades de eordir iflI ° SC hoje se instala
em meu entender mais característicos do paradigma emergente. 14tilhI' ° ifiOdO como a
um sentimento de bloqucamento pela ausência de alterruthva
JUC a modemidade
sociedade esta organizada, d porque durante séculos, sohreiud' «'
uuIica das alterna-
se reduziu à modernidade capitalista, se procedeu à iquid;ic
Conhecimeno e cubjeclivtdade
Out O flIO SC compati-
tivas, quando elas. tanto no plano epistemolégico, como r1t $

Nesta área o confito ¿ bem evidente e tern lugar entre a ciencia moderna - bilizaram corn as práticas hegemónicas.
rcvJU!""
W çonhecmentos e
laica, cartesiana, newtoniana, durkheimiana, weberiaia, marxista -e o que tenho vindo a Contra o epistetnicídio, o nova paradigma prope-se
1,rgticas de vida e
as pniuicas nao hegemónicas que são afinal a esmagadora zuU"
designar por clência pés-moderna e que outras desigeam por nova ciencia». E porque 1i1ória prope que
de conhecirnento no interior do sistema mundial. Como rfJ/
todo o conhecimento autoconhecimento, o confito epistemológico desdobra-se num
t
ignar os oprimidos
aprendamos corn o SuL sendo ueste caso o Sul urna metil'd»
confito psicológico entre a subjectividade moderna e a subjectividade pós-modema. ïaçostemPO estro-
Analisei noutro lugar as diferentes dimensöes do confito epistemológico, pelo que me
pelas diferentes formas de poder, sobretudo pelas qut% con1i' '
4ades semiPerifé-
limitarci a breve mferncias. detendo-me um pouco mais nas que representam desenvol-
turaìs acima descritos, tanto nas sociedades perif&icas, corw' t" "
uentos e práticas
ricas, corno ainda nas sociedades centrais. Esta opçâo
vimentos posteriores ao que j ests publicado (Santos, 1990; 199m; 1991b). Para o velho ' ,nuseológico. Pelo
paradigma, a ciência urna pthtica social muilo específica e privilegiada porque produz a oprimidas, maiinalizadas, subordinadas, no tern qualqucr ''t' «
tCflflOS, mas
?i/)PflOS
contrário, crucial conhecer o Sul para conhecer o Sui r'r
dnica forma de conhecimento vá'ido. Essa vaUdade pode ser demonstrada e a verdade a SCI'VO que se
tambëm para conhecer o None. É itas margens que se ai jtflf" °
que aspira intemporal, o que permite fixar determinismos e formular previsoes. Este
faz o senhor.
conhecimento é cumulativo e o progresso científico assegura, por via do desenvolvimento conhecimentos
tecnológico que torna possivel. o progresso da sociedade. A racionalidade cognitiva e ins- o que se pretende d, pois. urna concornincia cpisiemû]i.c ' ' «'
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.

drecemos ou que
como de .. processo reinventar as alternativas de prática
trLllnental e a busca permanente da realidade para alem das apar&cias farem da ciencia .
284 ' Pela MOo de Alice. O Social e o Político na PósModernìdade O Norte. o Sul e a Utopia 285

afinal apenas ignoramos ou no ousamos dcsejar. Esta concorrncia nao significa relati- futuro sé existe enquano presente, enquanto argumento a favor ou coiura conhecimentos
vismo no sentido que a episemokgia moderna em dele. Segundo eta, re'ativismo - e prticas presentes. Esta radical contemporaneìdade dos conhecimentos tern consequén-
e portanto fonte de obscurantismo - toda a atitude epistemológica que recuse reconhecer cias fundamentais para o diJogo e a concon-ência entre eles. E que se todos os conheci-

o acesso privilegiado à verdade que cia julga possuir por direìto prOprio. A possibilidade mentas so contemporâneos, rêo igualmente contemporâneas as prticas sociais e os
de urna relaçAo horizoinal entre conhecimentos é-the totalmente absurda. Ora o novo sujeitos ou grupos sociais que nelas mntervm. Nào h primitivos nem subdesenvolvidos,
paradigma propòe ta-1 horizontalidade como porno de partida. e nao necessariamente há, sim, opressores e oprimidos. E porque o exercício do poder sempre relacional. rodos
como ponto de chegada. En*endida assim, a horizontalidade a condiço cine qua non da somos contemporâneos. Para dar um exemplo caseiro, o conhecimento dos camponeses
concorrncia entre conhecimentos. Só haveria relathismo se o resuhado da concorrência portugueses nAo d menos desenvolvido que o dos engenheiros agrónomos do Ministério
fosse indiferente para a comparaçäo dos conhecimentos, o qie no é o caso, dado haver da Agricultura; ¿-Ihe contemporáneo. ainda que subordinado. Do mesmo modo que a
um ponio de chegada que no é totalmente determinado pelas condiçôes do ponto de agricultura familiar portuguesa nao ¿ mais primitiva que a agm-indúsiria. l-the contern-
partida. porânea, mas subordinada.
Esse ponto de chegada depende do processo argumentativo no interior das comuni- A intemporalidade da verdade científica permitiu à ciência moderna autoproclamar-se
dades interpretativas. O conhecimento do novo paradigma nao é validävel por principios contemporânea de si mesma e, do mesmo passo, descontemporaneizar todos os outres
demonstrativos de verdades intemporais. E, pelo contrário, um coniecimento retórico conhecìmentos, norneadamente os que dominaram na periferia do Sistema mundia' no
cuja validade depende do poder de convicço dos argumentos em que é traduzido. Da! momento do contacte corn a expanso europeia. Assim nasceram os selvagens, pelo
que o novo paradigma preste panicular atenço à constituiço das comunidades interpre- mesmo processo por que boje se confinuam a reproduzir comportamentos racistas e xenó-
tativas e considere seu objectivo principal garantir e expandir a democraticidade interna fobos. A idela da supenoridade biológica da raça ariana no teria sido possível sern a
dessas comunidades, isto , a iva1dade do acesso no discurso argumentativo. Dal ideia da superioridade temporal da atitude e do comportamento racistas.
tamb&n a preferéncia pdo Sul como urna espócie de discriminaçào positiva que aumenta Corn a mesma prevenço antitotalitária, o novo paradigma suspeita da distinçäo entre
o ambito da diversidade e da alguma garantia de que o silenciamento, ou seja, a expulsto aparência e realidade. Nos termos em que ela foi feita pela ciência moderna, trata-se
das comunidades argumentativas, que foi o timbre da ciência moderna, nao ocorra ou multo mais de urna hierarquizaçâo do que de urna distinçAo. A aparência a no-reali-
ocorra o menos possíveL Por isso o novo conhecimento, seudo argumentativo, tern um dade, a iIuso que cria obstkulos à inteligibilidade do real existente. Dal que a ciência
interesse especial pelo silêncio para averiguar até que ponto ele é um siléncio genuino, ou tenha por objective identificar-denunciar a aparêncìa, e ultrapassá-la para atingir a reali-
seja, o resultado de urna opço argumentativa e até que ponto ele ¿ um silenciamento, ou dade, a verdade sobre a realidade. Esta pretensão de saber distinguir e hierarquizar entre
seja, o resultado de urna imposiçäo nilo argumentativa. Porque o Sul d o campo privile- aparência e realidade e o facto de a distinçäo ser necessária em todos os processes de
giado do silêncio e do silenciamento, é esta outra das raespor que o novo paradigma conhecimento tornaram possível o epistemicídio, a desclassificaço de todas as formas de
the confere urna atenço particular. cunhecirnento esiranhas ao paradigma da ciêncìa moderna sob o pretexto de serem conhe-
Um dûs principios reguladores da validaçäo & pois. a democraticidade interna da cimento tho-só de aparências. A distribuiçäo da aparência aos conhecimenios do Sul e da
comunidade interpretativa. O outro principio é um va'or ético intercultural. o valor da realidade ao conhecirnento científico do Norte está na base do eurocentrismo. E dada a
dignidade humana. O novo paradigma no distingue entre meios e fins, entre cogniçâo e vincukiço mútua de conhecimentos e práticas, esta mesma distribuiçäo permìtiu eliminar
edificaço. O conhecimento, estando vinculado a urna prática e a urna cultura, tern urn ou rnarginalizar, por ilusórias e mistificatórias, as práticas do Sul que discrepavam corn as
conteddo ético próprio. Esse coniedo assume diferentes formas em diferentes tipos de práticas do Norte, ditas mais por coincidirem, aos ethos de quem as olhava, corn as apa-
conhecimento mas entre das d possfvel a comunicabilidade e a permeabilidade, na me- rências familiares.
dida em que todas as culturas acitam um principio de dignidade humana. Por exemplo, Para o novo paradigma. a distribuiçâo entre aparência e realid.ade nem sempre faz sen-
na cultura ocidental tal principio hoje expresso atravs do principio de direitos huma- tido e quando faz é sempre relativa e a aparência ni é necessariamente o lado inferior do
nos. Outras culturas exprimem-se noutros termos, mas a traduço recíproca d possível a pal-. O novo paradigma prevalece-se neste dominio de Schiller e da sua defesa da aparên-
partir da inteligibilidade intercultural assegurada pelo principio da dignidade humana. cia estética (dar aesthetiche Schein) nas Cartas sobre a Educaçáu Estética do Homern,
Senda um conhecirnento argumentativo, o uovo paradigma recusa totalmente duas publicadas em 1795 (Schiller, 1967). A1is, Schiller representa, para o novo paradigma,
outras características da ciência moderna -a intemporalìdade das verdades científicas e a urna das tradiçöes suprimidas da rnodemidade e, como tal, susceptive! de contribuir para
dìstinço absoluta entre aparência e realidade - por achar que cada urna delas, a seu a configuraço da nova intelegibilidade. Schiller faz urna crítica radical da ciència e da
modo, tern urna vocaço totalitária. O conhecimento no novo paradigma é tâo temporal desumanizaçäo administrativa e especialiaaço profissional que ela promove, urna crítica,
corno as práticas e a cultura a que se vincula. Assume plenamente a sua incompletude, de resto, bastante semelhante à feita por Rousseau. E tal come acontece corn Rousseau,
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pois que sendo um conhecimeno presente só permite a inteligibilidade do presente. O
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o de nito Schiller veleidade passadista. antes desejo reconstruir a
286 " Pela Mäo de Alice. O Social e aPolítico na Pós-Modernidade
O Norte. o Sul e a Uopia 287

otaIk1ade da personalidade nas novas condiçöes criadas pela modernkiade 'rai totalidade dessa capacidade e dessa vontade é, em fmais do século XX, muito mais urgente do que era
nao obtíve1 nem pelo domInio das forças da natureza que a ciencia ssibi1ft, nem
em finais do século XVIII. De resto, para alérn de Schiller, outros criadores culturais, cujas
petas ks ou a moral que o Esiado pmmuIga mas por urna rnediaço entre eles, por urna ideias e utopias foram ainda mais suprimidas ou maginalizadas que as de Scialler, podem
terceira enidade, a fonna estétka o Estado estético: «no meio do terrivel reino das forças ser convocados para 'evar a cabo tal tarefa. Retiro-me muito particulamientc a Fourier, ao
da natureza e do reino sagrado das o impulso estético da forma irabatha para criar o
remo do lúdico e da aparência» (Carta 27 §8). Mas Schiller está conscknte que a apa-
-
lugar central que as paixes ocupam no sau pensamento ele que na vida pratica foi, tal
corno Fernando Pessoa. um fiel servidor da monótona vida comercial -- e au principio da
rência estética só será universa' quando a cultura tomar o seu abuso impossível. Por atracçäo apaixonada por ele concebido como o grande motor do movimento universal.
enquanrn, dia Schiller, «a maloria das pessoas bumanas está demasiado cansada e exausta Como referì acirna, o novo paradigma epistemolégico aspira igualmente a urna
pela Iuta pela existencia poder envolver-se numa luta nova e mais dura çontra o
nova psicologia, à construço de urna nova subjectividade. No basta criar um novo
CITO» (Caîta S 6). E por isso que, corn tantas razics, que ele enumera, para a sociedade
conhecimento, é preciso que aiguém se reconheça oele. De nada valerá inventar alterna-
se considerar iluminada, faz sentido perguntar: «porque ento ainda permanecemos 1*- tivas de realizaçao pessoal e co'ectiva, se das nao säo aproprhveis por aqueles a quem se
haros?». destinarn. Se o novo paradigma epistemológico aspira a um conbecimento complexo.
A importância de SchWer para o aovo paradigma dup'a. Em primeiro 'ugar, ao afir-
permeável a outros conhecimentos, local e articulável em rede corn outros coithecirnen-
mar a centralidade da forma estttica enquanto transformaço radical da matéria que, no
tos locals, a subjectividade que the faz jus deve ter características similares ou compa-
entanto. tern urna dimenso hdica e no está sujeita ao ídolo da udlidade, Schiller propöe tíveis.
urna nova re1aço entre a ciencia a arte, urna combinaçAo dinâmica de géneros, em que
A subjectividade engendrada pelo veiho paradigma é o indivIduo unidirnensional,
a realizaçäo plena da ciência é tamharn a sua dissohiçâo no reino mais vasto da arte, do
maximìzador da utilidade que escolbe racionalmente segundo o modelo arquetfpico do
sentimento est&ico e da vivência hdica. Sernethanternente segundo o novo paradigma, a
homo econoniicur. As alternativas credh'eis perante urna tal subjectividade tm de se
ciencia ¿ um conhecirnento discursivo, cimplice de outros conhecirnentos discursivos, medir por ela e por isso no supreende que a equaçào entre interesse e capacidade tenba
literarios nomeadamente A ciéncia fai parte das humanidades. Enquaino narrativa ado
sido completamente privatizada à medida que se aprofundou o enlaço ente modernidade
ficcional, tern um grau de criatividade menor, mas, precisamente. é apenas urna questo
e capitalismo. Ao contrrio, o novo paradigma aspira a urna ressocia1izaço da equaço
de grau o que a distingue da ficçäo criativa. Nestas condiçöes, está precludida qualquer
interesse-capacidade e, portanto, a urna subjectividade que seja capaz dela. A multidi-
possibilidade de demarcaçöes rígidas entre disciplinas ou entre generos, entre ciências
mensionalidade da subjectividade no novo paradigma está já indicada no modelo dos
naturals, sociais e humanidades, entre arte e literatura, entre ciencia e ficço.
quatro espaços-tempo estruturais descrito no quinto capftulo. Efectivamente, cada espaço-
Mas Schiller rem importância para o novo paradigma por urna outra razo. Peto modo
-tempo cria urna forma ou dimenso de subjectividade, pelo que os indivIduos e os
corno reabilita os sentimentos e as paixies enquanto forças mobilizadoras da transfor-
grupos sociais sao, de facto, constelaçöes de subjectividades, articulaçöes paniculares,
maço social. Corno vimos, urna das preocupaçòes centrais do aovo paradigma 6 criar varilveis de contexto para contexto, entre as diferentes formas ou dimensöes. Isto signi-
alternativas e a concorrência entre cias. A outra preocupaçào 6 a de criar urna subjectivi-
fica que a construço da vontade das alternativas e da concorrncia entre cias tern de ser
dade que qucira lutar por cIas. Efectivamente, a smndroma de hioquearnenteo goba] que
feita ern relaçäo a cada urna das dimensôes e, portanto, em cada um dus espaços-tenipo
boje se vive tidvez ado se deva tanto falta de alternativas (porque elas existern) como à
estruturais. No 6, pois, tarefa fácil, urna vez que a fricçäo é igualmente multìdimen-
falta de vontade individual e colectiva para lutar por cias.
sional os obstaculos à construçào de urna tal subjectividade nao esto localizados num
A incredibilidade das a'ternativas o reverso da indolnda da vontade. Escrevendo no
dado espaço-tempo, mas estAo antes disseminados por todos eles. Tals obstaculos consti-
fuial do século xvm, sner teme que o ídolo da utilidade venha a matar a vontade de
tuem quaLm habitases de regulaço, subordinaçäo, e conformismo, nos quais é necessário
realizaçAo pessoal e colectiva. Por issu afirma no § 3 da Carta & «LAI razo realizou nido
opor quatro habituses de ernancipaçào, insubordinaçào e revolta.
o que pode realizar ari descobrir e au apresentar a 'ei. A sua execuçio pressupöc urna von-
Esta multidimensionalidade exige que as energi emancipatórias sejam simultanea-
lade resoluta e o ardor do sentimento. Para a verdade vencer as forças que conflituam corn
mente muito amplas e muito concretas. No paradigma da modernidade, foi, ao contrario,
cia, tern cia prOpria de tomar-se urna força (.) pois os instintos sio a única força motiva-
a unidimensionalidade que tomba possivel tornar amplitude por absiracço: o individuo
dora no mundo sensívei». E conciui no §7 da mesma carta: «o desenvolvirnento da capa-
abstracto pode aspirar a urna amplitude universal, mas obtida à custa do esvaziamento
cidade do homem para sentir é, ponanto, a necessidade mais urgente da nossa época».
total de atributos contextuais. A amplitude no novo paradigma significa, antes de mais,
o novo paradigma entende que o racionalismo estreito, mecanicista, utilitarista e ins-
o alargamento das razöes corn que se podem justificar as condutas, um alargamento da
trumental da ciencia moderna, combinado corn a expansän da sociedade de consumo,
racionaiídade cognitivo-instrumentai para urna racionalidade mais ampia onde caiba.
ohnuhìlou, muito para aiém do que previra Schiller, a capacidade de revo!la e de surpresa,
além debt, a racionalidade moral-prática e a racionalidade estético-expressiva. urn alarga-
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de reconstruço
pessoal e colectiva e que,
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para a argumentaço racional, em PDFCompressor
suma, um alargamento
288 Pel'i Mâo de Alice. O Social e o Político ìa PósModernidade O None. o Sul e a Utopia 289

da racionalidade para a razoabilidade, do conhecimento epidítíco para a fronese. Parado. Padröes de lransfonnaçâo social
xa1menLe quanto mais ampia ¿, melhot a racionalidade conhece os seus limites. Neste
dominio, as paixôes de Schilier e dos românticos e a aEracço apaixonada de Fourier sàu A conflitualidade paradìgmálica DO dtllìUniO dos padríes de transfomiaço social é
dois campos pnvegados de escavaç.o arqueokSgìca da modemidade. talvez mais recente que a que ocorre na epistemologia e na subjectividade. mas adquiriu
Mas esta ampliaçào das energias emancipatérias sO faz sentido se a sua extensAo for nas duns ilkimas décaths urna enorme aicidade. Neste dominio, a conflitualidade tern
guaada pela sua intensidade, se a energia emancipatóÑ se souber condensar nos actos lugar entre dois grandes paradigmas de desenvolvimento social, que designo simples-

concretos de emancipaçäo protagonizados por individuos ou grupos sociais A descon- mento por paradigma capital-expansionista e paradigma eco-socialista. Duas notas preli-

fiança das absEraçôes é fundamental no novo paradigma. No que cias no possam ser minares sobre este cOfltlilO. A primeira é que, tal como sucede no caso da conflitualidade
aceites, mas que sO o sejam quando os contextos da sua rea1izaçio flies fazem jus. Por epistemoldgica, cada um dos paradigmas cm confUto é internamente muito diferenciado,
exemplo, o conceito abMracto de direitos humanos começa hoje, dois séculos depos da e tanto que algumas das versöes de cada um deles se aproximam de tal modo que pare-

sua formu!aço, a fazer verdadeiro sentido na medida em que por todo o sistema mundial cern constituir urna zona cinzenta, iflterm(liR, mista. No entanto, defendo que esta zona,
grupos sociais estäo a organizar lutas de emancipaçäo guiadas por ele. londe de negar a exisncia do confito paradigmático. é pressuposta por ele e é por issu
Para a construço da amplitude concreta da subjecilvidade, dois outros campos de que pe limites à própria possibilidade dc combinaço e inlerrnediaçâo entre os paradig-
escavaçäo arqueológica se me afiguram fundamentals: Montaigne e Kropotkin. ouiros mas. São as diferenças inegociáveis que lornam O confito paradigmático.
dois criadores culturais cujas ideias forain suprimidas ou marginakzadas pela concepço A segunda nota é que o confuto paradigmático nAo é apenas lerçado a nivel intelec-
hegemónica da modemidade capitalista. A importância de Montaigne reside em 1er tua!, como tern acontecido, pelo menos até agDra corn o confUto epistemológìco; é, além
desenvolvido um dispositivo intelectual que combinava a inteligibilidade mais concreta disso, e cada vez mais, um confuto social e político sustentado por grupos e Interesses
-
a dele próprio enquanto ser humano com a problemathaço mais ampia do sentido da organizados, ainda que corn poder e orgaflilacO multo desiguais. De aigum modo, este

vida e da sociedade, Montaigne esereveu sobre si próprio porque, como costumava dìzer. confuto paradigmático funciona como cliarneira entre os dois outros conflitos: porque se
esse era o tema de que tinha algum conhecimento seguro e concreto. Mas no o fez de traduz em práticas sociais alcemadvas, aspira tainbém a práticas epistemológicas alterna-

modo narcisista. fechado sobre si próprio; pelo contrário, soube, a paiir do mais pro- tivas e está por issu profundamente interlaçado corn o paradigma epistemológico; ponue
findo de si buscar a intelegibilidade do mais ampio e tambm mais profundo da vida essas práticas sociais tm lugar num campo político e, de facto, aspirare a urna redefiniçäo
colectiva. Para isso rompeu radicalmente com a distinçAo sujeito/objecto em que assenta global desse campo, o confuto entre o paradigma capital-expansionista e o paradigma
a ciência moderna, antecipando assim de nìuitos sdculos o que hoje pretendido pelo eco-socialista tern profundas vinculaçöes a° confito paradigmético sobre o poder e a poll-
novo paradigma. Como Montaigne viu muito bein, o probletha da disünço sujeitof tica, descrito brevemente a seguir.

/objecto é que induz a abstracçäo nAo só do objecto como também do próprio sujeito. A o paradigma capital-expansionista é o paradigma dominante e tern as seguinies caracte-

arrogflcia epistemológica deste ltimo o resultado de um auto-esquecimento. Esse o desenvoivimento social d medido essencialmente pelo crescimento econo-
rfsticas gerais:

auto-esquecimento, oculto no esquecimento do antro, foi eloquentemente denunciado por mico; o Crescimento económico é contíflUU C assenta na industrializaçäo e no desenvolvi-
Frantz Fanon quando, num dos seus deaahafos irónicos, se perguntava porque 6 que os mento tecnológico virtualmente ìnfinitos total a descontinuidade entre a natureza e a

europens falavam tanto do individuo em garai e no eram capaz de o reconhecer quando sociedade: a nalureza é matéria, vaJorizávc! apenas enquanto condiço de produço; a pro-

oencontravam (1974: 230). duçAo que garante a continuidade da tranioflflaçâO SOCUt1 assenta na propriedade privada e
Se Montaigne insistiu na necessidade de näo perder de vista o individuo concreto, especificamente na propriedade privada dos bens de pmduço. a qual justifica que o con-

Kropotkin insisrin na solidariedade concreta, nos laças de ajuda miftua que ligam os indi- trolo sobre a foia de trabalho nilo tenha cJe estar Sujeito a regras democráticas. O modelo
vfrluos uns aes outros e scm os quais a vida individual, e nao apenas a colectiva, no seria de iransfor-rnaço social proposto por Marx partitha as trés primeiras características, pelo

possível. Contra o individualismo possessivo e o darwinismo social da época, Kropotkin que sepode considerar um modelo subpanuligmáticolsimado na zona cinzenta, intermédia.
procurou reivindicar a evid&icia que as pessoas são capares de solidariedade e, na ptiu- o paradigma eco-socialista é o paradigma emergente e, tal como eu o concebo, tern as
rica, tém-na vindo a exercer atravs da história (l9021 1955). Nào procurou sequer seguintes características: o desenvolvimenft) sOCial afere-se pelo modo como so salisfeicas

abstraclizar essa capacidade como de algum modo o fei Marx ao centrá-la na classe ope- as necessidades humanas fundamentais e é tafltù rnaior, a nivel global, quanto mais diverso

rria. Procurou antes dai-the voz onde quer que a vin e a viu violentada pelo paradigma e menos desigual; a natureza é a segunda natWZa da sociedade e como taL sem se confun-

psicológico dominance. dir corn cIa, täo-puuco the é descontfnua deve haver urn estrito equilibrio entre três formas
principals de propriedade: a individual. eomunìtária, e a estatal; cada urna delas deve

modo objccJ/OS do de corn o mínimo de controlo trabaiho


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operar
outrem.
a atingir os seus
Máo de Alice. O Social e o Polla co na Pôs-Modernidade O Norte, o Sul e a JWpia 291
290

o paradigma eco-socia'ista enquanto constmço intelectuat decorre de um diálogo divisáo sexual patriarcal do traballio e a comunidade eco-feminista doméstica, entre a
niercultural mullo anipo e. tanto quanto possível, horizontal. A base desse diálogo familia reprodutiva da força do trabatho e a familia produtora de satisfactores de necessi-
dupla Por um lado, as necessidades humanas fundamenais nâo variam muito no sistema
dades, oiganhzadora do Iazer e do convívio corn a nalureza. A segurança social prestada

mundial. o que varia so os meins para as satisfazer (os satsfactores). Dal que se deva pelo Estado s familias deve ser prestada. em igualdade de circunsrâncìas, às duas organi
zaçôes da domesticidade.
partir de urna inteligibilidade intenulwral das necessidades para, através dela, se atingir a
inteligibilidade intercultural dos satisfactores. Por outra ado, todas as cuhuras têm um No espaço-tempo da produço. o confito e a concorrência será entre unidades capita-
listas de produçäo e unidades eco-socia'iStaS de produço. Nestas ÚHimaS cabem organi-
valor de dignidade humana, o quai, sendo ánico, permite urna herrnen&itica transvalora-
uva e multiculturaL Tal hermenuüca constitui o desafio central do paradigma emer- zaçôes de muito diferente tipo. mas que partilham o tacto de nAo serein orientadas. nem
exclusivamente, nern primordialmente, para a obtenço de lucros: unidades de produçäo
gente.
cooperativa, pequena agricultura familiar, serviços comunitários, nstimìçäes particubres
o paradigma eco-sociaIisa assenta em tradiçôes multo vaiiadas. No que respeita às
social, organizaçoes no governamentais, produção auto-gestionária,
tradiçöes europeias, so de mencionar a tradiço comunitarista, o organicismo leibni- de solidariedade

iiano, o movimento romântico. o socialismo utópico, o majismo, e, no que respeita às etc., etc. A segunda dimensäo providencial do Estado reside em apoiar em igualdade de

tradiçöes no-europeias, as culturas indus, chinesas e africanas, a cultura islâmica e as circunstâncias unidades produtivas de ambos os tipos para que possam em igualdade de
circunsthncias mostrar o que valem, quer pelo resultado da produço, quer pelos valores
culturas dos poyos nativos americanos. O paradigma eco-socialista alimenta-se das mar-
gens e do Sul e, como se calcula, elas sAo muitas, muio plurais e mesmo babelicas. So da subjectividade que suscitam e promovem.
como que o outro do cenfro eurocêntrico, moderno, capitalista, o quai faz profiferar as Neste espaço-4empo promove-se ainda um outro conflito: o confuto entre o paradigma
consumista, individualista e o paradigma das necessidades humanas e do consumo solida-
margeas e o Sul na exacta medida do scu auoriiañsmo e do scu carácter exeludente. Esta
iìsta. Beste espaço-tempo que verdadeiraiflente se moldam modos de vida
os estilos e os
babe' de raizes convocada e activada por urna enoime diversidade, igualmente babelica,
de movimentos soclais e organizaçöes nào govemamentais kcais e lransnacionais, ecoló- porque é flete que a equaço entre necessidades e satisfactores é decidida. Enquanto no
primeiru paradigma as necessidades estáo ao serviço dos satisfactores, no segundo para-
gicos, feministas, operários, pacifistas, de defesa dos direiLos humanos, dos direitos dos
digma os satisfactores estâo an serviço das necessidades. Enquanto para o primeiro para-
consumidores, e dos thretos históricos dos poyos indígenas, de luta contra o ajustamento
digma o mercado é a Única instituiçäo organizadora do consumo e as necessid.ades são
estrutural ou a violencia urbana, de luta pelos direitos dos imigrantes ilegais, dos retgia-
dos, das minorías, das sexuaìdades alternativas, etc., etc. Muitos destes movimentos têm convertidas em preferências objectivadas em objectos, para o segundo, o mercado urna
mufto pouco ou mesmo nada a ver corn as características que acima atribuí ao paradigma instituiçAo entre outras e as necessidades são experiências subjectivas que podem expres-
sar-se de muitos modos diferentes, consoante os ConteMos e as culturas, urnas vezes atra-
eco-socia'ista. Têm de comum serem um campo de experimentaço social vastísssimo
vds de objectas desejados, outras yeses atrav&s de desejos de intersubjectividade. Final-
onde se v&, temperando as energias e a subjectividade necessária para urna iuta civiliza-
ciona como aquela que o paradigma emergente propöc. A experimentaçäo tern de ser a mente, para o primeiro paradigma as necessidades são urna prívaçäo, énquanto para o
mais vasta, to vasta quanto a tradìçâo em que assenta, para que o paradigma, que d segundo são simultaneamente urna prìvaçáo e um potencial. A terceira dimensão provi-
dencial do Estado consiste em promover e assegurar a conthtualidade intelectual e social
apenas emergente, se vá consn-uindo numa base sólida, mas em permanente rcctitìcaço,
destes dois paradigmas dando a anilx;s iguais condiçöes para testarern as suas virtuali-
à medida que vai sendo credível para grupos sociais cada vez mais ampios. Pela mesma
dadas e conquistarem adeptos.
razào, o paradigma emergente busca a competiço e a concurrência corn o paradigma
capital-expansionista. O ohjeciivo fundamental é, de facto, desenhar várias formas de Ao nivel do espaço-tempo da cidadania, a confrontaçäo entre os paradigmas panicu-

sociabilidade em que a conconência entre os paradigmas seja prática, controlável e ava- larmente crucial e difícil de manter, urna vez que, sendo o Estado a corma institucional

liável. deste espaço-tempo, tern de promover o ConfutO paradìgmático no interior de si mesmo e


Na transiçáo paradìgmática. o Estado será dito Estado-Providéncia quando assegurar a é por isso que a quarta dimensâo providencial do Jstado em Pasárgada 2 d a autoprovi-
concorrência em iguadade de circunsthncias entre os paradigmas rivais. A concorrência dência do Estado para consigo mesmo. Neste espaço-tempo, o confito paradigmático

entre os paradigmas tern urna dimenso de contradìço e urna dimenso de competiço. A OcoiTe entre o paradigma da obrigaçäo política vertical e o paradigma da obrigação poll-

primeira Visa esclarecer analítica e normativamenle o que separa os paradigmas; a tica horizontal. O prizneiro preside à constituicáo do Estado liberal, e tern as seguintes
segunda dirige-se à articulaçäo dos paradigmas corn a experìência subjectiva dos indiví- caracterlslicas: o Estado tern o monopó]iO da violência legítima e do direito, para o que
duos e dos grupos e visa, por isso, criar a subjectividade adequada a cada um deks, a dispe de urna olganizaçäo burocrática de larga escala, centralizada e centralizadora; a

energia e a paixio necessárìas para hitar por eks. A concorrência entïe os paradigmas cidadania ê atribuida a indivIduos pelo Estado de que são nacionais, pelo que em prin-
ter de ter lugar no interior de cada um dos quafto espaços-tempo estruturais C em cada cípio nao há cidadania scm nacionalidade e vice-versa os cidadiios so formalmente
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um deles asmme urna fomia panicular. No espaço-tempo doméstico, o conflio é entn a iguais e estêo todos igualmente sujeìto' au poder de império do Estado.
292 " Pela Mao de Aüce. O Social e o Polluco na Pós-Modernidade O Worte. o Sul e a Utopia 293

Para o paradigma emergence. o objectivo central lutar contra o apartheid identitário


o paradigma da obrigaçao horizonta' confere ao Estado o monopólio da violência
legítima, mas no o monopóho da piodução do direio. Peto conn-árìo, existe na socie- e cultural que o paradigma dominante pressup& e tern vindo a desenvolver constante-
dade urna phiralidade de ordens jurídicas, corn diferernes centros de poder a sustentá-los, mente. A quinta dimensâo providencial do Estado em Pasárgada 2 consiste em promover

e diferentes lógicas morniativas. Na constituiço da cidadania, é to iinpoiiante a obri a pluralidade e a penneabilidade das identidades pelo incentivo confrontaçâo entre os

gaço vertical como a obrigaçAo horizonta' e por essa razo a cidadania no tern de ser dois paradigmas, corn base na ideia de que o apartheid se reproduz incessantemente na

nem individual, oem nacional; pode ser individual ou colectiva, nacional, oca1 ou trans sociedade, e a muitos mais niveis do que vulgarmente se julga, sendo, de resto, um dos
nacionaL A eficácia interna do Estado reside no modo como negoceia e perde o poder de recursos estrategicos do paradigma capital-expansionista.
Por ÚltimO, flO espaço-tempo mundial o confito paradigmático o paradigma do
império interno a favor de outras organizaçöes sociais. Para essa negociaçäo e essa parii entre

ha é funcional a targa escala e o centralismo organizativos do Esmdo, mas a fiinço que desenvolvimento desigual e da soberania exciudente e o paradigma do desenvolvimento
desempenbam consiste na criaço, na promoço de estruturas organizativas de menor democnuticamente sustentvel e da soberania reciprocamente permeável. O prirneiru para-
esca'a, desceniralizadas, locals. O carácter providencial e redistributivo do Estado reside digma. dominante, foi acirna descrito com algum detaihe, pelo que me dispenso de o
aInes de mais no modo como redistribui as suas próprias prerrogativas. e um dos vefu1os caracterizar aqui O segundo paradigma, emergente, convoca um novo sistema mundial

privilegiados é, como tenho vindo a defender, a promoço da competiço entre os para- organizado segundo principios eco-socialistas. E, de algum modo, um sistema mais gb-
digmas em cada um dos espaços-tempo estruturais. E esta a quarta dimensào providencial balizador que o actual, porque a globabizaçAo ocorre sob o signo da idenUficço liansna-
humanas fundamentais e do princípio da dignidade humana.
do Estado na transiçäo paradigm&ica. cionai das necessidades

No espaço4empo da cidadania, a contradiço e a concorrência paradigmáticas ocor- Depois de sécubos de modernidade capitalista, a hierarquia Norte/Sul tornon-se urna
mm ainda a uni outro nivel, ao nivel da diinenso comunitária do espaço público. Aqui a mega-fricço, urna marca profunda das experiências sociais no interior do sistema man-
concorrência é enlie o paradigma das comunidades-fortaleza e o paradigma das comuni- dial, ecomo tal näo pode ser erradicada de um momento para o outro. Mas deve, a partir
dades de fronteira. O paradigma capita1-expansionisa sempre que nao destruiu os espa- de agora. ser posta sob suspeita sistemática.
cos identitários colectivos privilegion a constituiço de comunidades idernitárias exclu- O principio da acço socia' oeste espaço-tempo passa a ser que nido o que contribui
dentes, quer exciudentes-agressivas, quer exciudentes-defensivas. As pthneiraa. as exclu- para aumentar a hierarquia Norte/Su! é urna prática de lesa-humanidade, como tal
dentes-agressivas, de que o exemplo arquetípico é a «sociedade colonial», so constituí- devendo ser avallada. O sistema interestatal tern um papel importante na promoço dessa
das por grupos sociais dominantes que se fecharam na ua supeÑ»idade para no serem suspeita sistemática, mas para o exercer cabalmente tern ele próprio que se transformar
conspurcados pelas comunidades Inferiores. As segundas, excudentes-defensivas, são o profundamente. Dal, o princípio das soberanias recíproca e democraticamente permeá-
reverso das primeiras. Historicamente, emergiram do contacto com as comunidades veis. O principio da soberania exclusiva, tal como foi desenvolvido pelo paradigma domi-

excludeines-agressivas, fechando-se para defender o pouco de dinidade que pôde esca- nante, toma na prática possível que os Estados mais fortes, invocando Interesses nacio-
par à pithagem colonial. O exemplo arquetípico destas últimas so as comunidades indí- nais, norneadamente de segurança nacional, possam exercer as suas prerrogativas de
genas. A consequéncia deste ptocesso de fechamento recíproco que as comunidades- soberania custa da soberania dus Estados mais fracos. Efectivamente a soberania dos

-fortaleza tendem a ser internamente milito hierárquicas, ou seja. sào exciudentes para o Estados perifdricos e semiperif&icos tern sido tradicionalmente multo permeáveb s pre-
exterior, mas também no interior. tenôes dos Estados hegemónicos O que ê necessário assumir a permeabilidadc como
Para o paradigma das comunidades de fronteira, a identidade ¿ sempre multímoda, um processo reciproco e democrático por via do quai os Estados negocciam a perda da
inacabada, em processo de reconstruço e de reinvençäo, é, em verdade, um processo de sua soberania a favor de organìmçes intemacionais e de organizaçes no
governamen-

tais transnacionaìs mais bem equipadas que o Estado para realizar as tarefas eco-socia-
identificaço em curso. Por isso, a comunidade para que aponta ¿ vorazmente inclusiva,
como no espaça-tempo da cidadania o Estado negoceia demo-
penneável, alimentando-se das fontes que lança para outras comunidades, buscando na listas transnacionais. Tal

craticamente a perda de soberania interna a favor$le grupos e organizaçies


que passarn,
comparaço e na traduço inercukural o sentido mais profundo da dignidade humana que
de autogoverno, no espaço-tempo
a habita e os modos de estabelecer coligaçi5es de dignidade humana corn outras comuni- por transferência, a exercer algumas prerrogativas

dades identitárìas. Os movimentos populares da América Latina, as comunidades ecle- mundial os Estados negocciam entre si e organizaçes intemacionais e transflacioflais a

perda de soberania externa de modo a que estas disponham de um conjunto


de prerroga-
siais de base, os movimentos dos direitos humanos em todo o sistema mundial, alguns
formas de governaçáo transnacional para os
movimentos ecológicos e feministas, tendem a estar habitados pelo paradigma das cornu- tivas de soberania que Ihes permita criar

temas e problemas que nio podem ser adequadainenle resolvidos, nem a nivel estatal,
nidades de frònteira. Ao contrário, o movimento sindical tradicional no Norte, algumas
con-entes do movimento feminista e multas movimentos de homossexuais e liusbicas nem sequer a nivel interetatul
tendem a prefigurar o paradigma das comunidades-fortaleza. Sobretudo estes 1t irnos
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tandem a constituir comunidades excludentes-defensiva.
24 Pela Mao de Alice. U Social e o Político na P6sModernjdade
o Norte, o Sal e a Wopia 295

Fader e política dos paradigmas dominantes em cada urna das áreas de sociabilidade. ¡sto explica que,
corno flOtei acima, sejam fracos, fragmentados e localizados os gnpos e as lutas que urn
A terceira grande área de contradiço e competço paradigmtica o poder e a poli- pouco por toda a parte tentam romper corn os dilemas que descrevi e propor urna salda
ika. Esta área é ta!vei ñais importante que as demais na medida em que nela se canee- civilizacional. O que lhes falta nao é tanto a capacidade organizativa ou recursos -
embats estes tambérn escasseiern - mas antes a legitirnidade e muitas veaes a autolegii-
bem e forjam as coigaçöes capazes de conduzir a nmsiçào paradigmática. A dificuldade
de aI tarefa está em que a transiço paradigmática redama, muito mais que urna luta de rnid.ade para a partir de espaças sociais tAo circunscritos propor transfonnaçes que só
c1asses urna luta de civilizaçöes, e reclama-o num momento em que nem sequer a luta de so efKazes se forem globais. O objectiva central da Câmara Paradigmáuca de Pasárgada
classes parece estar na agenda política. No entamo, do ponto de vista do paradigma eme- em elevar o nivel crítico de legiti-
2 na area do poder e da política consiste precisamente

gdnte tal situaço kmge de ser paradoxal au di1emáca, exprime a um nve1 muito pro- midade dos grupos em luta pelo paradigma emergente. atravs da explicitaçäo das media-
fundo as potencialidades paradigmáLicas que o tempo presente enceiTa e que é preciso çes entre o local e a globaL
fazer desabrochat o confito paradigmático nesta area é entre o paradigma da democracia autarit.ria e a

Na verdade o definhamento da luta de classes ou, para sermos mais exactos, a derrata paradigma da democracia eco-socialista. O paradigma da democracia autaritária está ins-

global do movimento operrìo organizado significa. no que os objectivas desta luta esse- crita na matriz do Estado moderno liberal e já referi algumas das suas características.
-
jam cumpridos provavehnente nunca estiveram to longe de o estar - mas antes que Acrescentarei agora apenas as que tern directamente a ver corn a seu carácter autoiitária.
eles só são obtíveis dentro de um contexto mais ampio, civilizacional, em que efectiva- Tat catheter consiste, em primeiro 'ugar, em conceber como politica apenas urna das far-

mente estiverain integradOs na sua origem. mas que. a pouco e pouco. foi perdido. Se mas de poder que circulam na sociedade e limitar a ela o dispositivo democratico. Con-
analisarmos o movimento operário revolucionário desde o inicio do sculo XIX até à siste, em segundo lugar, em limitar este dispositivo democrático a um principio mono-
.-organizativo, a democracia representativa. supostarnente o
Comuna de Paris, verificamos que os seus objectivos, mais que urna luta de classes, thtico isomórfico corn a forma
implicavam urna luta civilizacional. Assim, as suas lutas nAo tinharn por objectivo urna de poder que pretende democratizat Consiste, em terceiro lugar, em conferh aa Estado o
mcta mudança das relaçes de produçAo. Aspiravarn a urna nova sociabilidade, à trans- manopólio de poder político atravs do principio da obrigaçäo política vertical entre
formaço radical da educaçAo e do consumo, à eliminaçAo da familia, à emancipaço da Estado e cidadâo. Consiste, fmahnente, em esse monopólio estatai ser exercido na depen-
muflier e ao amor livre. E so no último quand do siculo Xlix. e em boa medida devido à dência financeira e ideológica dos interesses económicos hegemónicos que. na sociedade

ascendência do marxismo no movimento opeth-io. que os objectivos civilizacionais vo capitalista, são os que se afirmam como tal à luz da principio do mercado.
ceder o passo aos meros objectivas de classe. E nesse processo que o movimento operrio Do ponto de vista do paradigma da democracia eco-socialista, estas características so
passa a ser integrado na modernidade capitalista, no mesmo processo em que Marx autoritärias porque a sua eficacia social confere aos poderosos. aos grupos e classes

desenha a estratégia para a superar. Urna estratéga que, à partida. estava votada ao dominantes, urna enorme legitimidade, que nao só reproduz, como aprofunda a bierarquia

fracasso, urna vez que, nesse mornenlo, a modernidade estava jI reduzida, enquanto e a injustiça social. Assim, ao considerar coma apenas política urna das formas de poder,
projecto social, à rnodernidade capitalista e nio era, por isso, possivel eliminar a ditirna a do espaça-tempo da cidadania, a paradigma dominante demite-se da exigéncia de
salvaguardando a pñrneira. democratizaçäa das restantes formas do poder. Em segundo lugar, esta demisso acai-reta

o objectiva de um pensamento heterotópico exactamente o de repor, no 1mal do o fechamenia do potencial democrático nurn modelo institucional e organizativo (a demo-

scu10 XX e em moldes radicalmente diferentes, a ]uta civilizacional por que mereceu a erada representativa) especiflearnente vocacionado para funcionar sectorial e proíissia-

pena lutar no princIpio do sécuo XIX. Esta luta civilizacional é rem dúvida urna luta nalmente rem perturbar o despotismo corn que outras fonnas de poder s.o socialmente

episternoidgica e psicológica e urna luta por padroes alternativos de sociabilidade e de exercidas e scm também se deixar perrarbar por elas. Em terceiro lugar. a democracia
transfonnaçâo social, mas acima de do urna luta entre paradinas de poder e de polE- representativa assenta num desequilibrio estrutural entre o seu eixo vertical (a relaçâo

tica. As lutas estâo obviamen*e interligadas porque, em cada urna delas, tanta o para- Estado-cidadas) e a sau eixo horiwntal (a relaçâo cidadilo-cidadàos) nos termos
do quai
digma dominante, como o paradigma emergente recebem o apoio etimplice dos paradig- a fraqueza deste segundo eixa potencia em geralo autoritarismo da cixo vertical, ao
mas correspondentes em compeiiçäo nas outras lutas. E esta sobreposiço de lutas que mesmo tempo que permite que ele se exerça desigualmente em relaçào a diferentes
confere o xnbìto e a intensidade específicos de urna luta civilizacionaL L se esta sobrepo- grupos de cidadAos, tanto mais autoritariamente quanto socialmente mais vulneráveis
siço cria o potencial de urna transfonnaço radical, toma tanibém particularmente dilïcil, forem tais gthpos. Por último, e ligado ao que acabei de dizer, o autoritarismo deste para-
sobretudo numa fase inicial de transiçäo paradigmática, a eriaçào e a consolidaçEo das digma reside em que o Estado moderno, senda o Estado que hisaricamente malar exte-
coligaçöes e das organizaçôes portadoras de urna nova equaço entre interesses e capaci- rioridade em relaçäo no poder económico revela, é, de facto, muito mais dependente dele,
dades. quer porque os governantes deixaram de ter fortuna pessoal, quer porque o Estado assu-
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tais coligaçöes e organizaçöes militaweb optimization using a watermarked
a eficácia multiplicadora da sobreposiçäo
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funçôesDal necessidade de o
exigern a rnobilizaçào vastos recursos. a
Pela Mao de Alice, O Social e o Politico na POs-Modernidade O Norte, o Sul e a Utopia 297

Estado ter de mainer urna re1aç.o de diálogo cimp1ice corn o poder económico ou em natural» de inSÜtUCiOnaIiZaÇäO da democracia. Trata-se efectivamentu de urna rVdUÇO
casos extremos, er de romper o diálogo para garantir a sua sobrevivncia (as nacionaJiza- arbitrâiia porque, um lado, cxistiu sempre urna tradiÇãO de democracia local que a
por

ç5es). modemidade teve de suprimir para poder instaurar a sua originalidade. E porquc por
o potencial auEoritriO do paradigma dominante é enorme e os regimes thsunguem-se oulro lado, corn o conceito de soberanía impemieável. suprimiu preventivamente um

pelo maior ou menor grau corn que O realizam. Dai que os regimes ditas autoritários ou futuro de reiaçSes dernocrticas internacionais que cia tornava contraditoiamente urgente

mesmo tota1itrios nâo sejam urna aberraçAo total. estranha ao paradigma. Pelo contrá- e impossível.

rio, pertencem-the genuinamente e apenas representam as formas extremas que ele pode O igzna da democracia eco-socialista expande a democracia ainda numa terceira

assumii O fascismo, por um !ado e o comunismo por outro, são, cada um a seu modo, direcçäo a duraço intertemporal e intergeracional. Segundo este paradigma, a pmximi-
f'onnas exireiflas do Estado liberal moderno e da democracia autoritária que the consti- dade do fituro d boje to grande que nenbum presente d democratico rem ele. Por assim
tutiva, Este auioiitarismo reproduz-se hoje sob novas fonnas, menos visiveis e por isso direr, as geraçes futuras votam corn igual peso que as geraçöes presentes. Aliás, a demo-
a1vez mais perigosas e dificeis de enadicar. sob a forma da destruiço do melo ambiente, tracia das relaçes interestaLais visa sobretudo a democracia das reiaçöes inteigeradOnais

do consumismo compuIsivo da divida externa e da bierarquia do sistema mundia', do eé nome desta que a cooperaçäo entre os Estados é mais irnprescindfvel e urgente.

ajustamento estrutUfa e das leis de imigraço e do imperialismo cultural. Esta tripla expansAo da democracia - esimtural, escalar e intergeracional - pDcsSUp&
o paradigma emergente, o paradigma da democracia eco-socialista. radicalmente
t um enorme investimento de inovaço institucional. Como todas as formas estruturais de

democrático, no sentido em que visa instaurar a democracia a partir das diferentes raizes poder so políticas e como em todas eins a transformaço paradigmtica visa constituir, a

do autoritarismo e sob as múltiplas formas por que ele se manifesta. Para este paradigma partir dolas, formas de partilha de autoridade, a democracia eco-socialista internamente

säo quatro as fouies principals de autoritarismo na mossa sociedade, correspondendo aos muito diversa. Na sua definiçAo mais simples, o eco-socialismo d democracia scm fim.

quatro espacos-tempo esimturais que tenho viada a referit Como notci a sen tempo, as Tal objectiva utópico pode funcionar eficazmente como critfrio dos limites da demo-

relaçôes sociais de1es espaços-tempo so relaçôcs de poder e de desigualdade e como tal cracia na modernidade capitalista. NAo se trata de obter a transparência total nas reIaÇeS

fontes de autoritarismo O projecto democrático tern, pois, para ser consequente, de alve- sociais, mas antes de luter scm limites contra a opacidade que as despolitiza e dCSingU

jar cada urna destas formas dc poder no sentido de o democratizar. E deve faz4o de .

lariza

modo a maximizar o uso eficaz de processos de democratizaço especificainente adequa- i


Urna luta democratica corn esta amplitude nao pode confiar num sujeito piivilegiado

dos à forma de poder em causa Ou seja, para o paradigma emeigente. näo bá urna, mas , nem contentar-se coin um conceito unívoco de direitos. So quatro as posiçôes subjec-

quatro tbrmas esimturais de democracia e cada urna permite variaçâo interna. tivas estruturais que se combinam e articulam de diferente forma na prática social dOS
A concentraçdo exclusiva do paradigma dominante apenas numa forma. a democracia sujeitos, tanto individuals, como colectivos. A familia, a classe a cidadania e a nacionali-

representativa, adequada ao espaça-tempo da cidadania. significou um empobrecimento dade säo dimenses ou posiçôes de subjectividade que se combinam nos indivíduo$ e nos
dramático do potencial democrático que a modeniidade traria no scu projecto inkial. E. i
grupos sociais de modos diferentes segundo os contextos e as culturas, segundo aß prá-
pois, necessário reinventar esse potencial, o que pressupíe inaugurar dispositivos institu- titas e as tradiçies, segundo os objectivas e os obstáculos. Dada esta multiplicidade de

cionais adequados a transformar as relaçôes de poder em relaçôes de autoridade parti- posiçes subjectivas e das combinaçôes a que dAo azo, so reconentes as constc1aceCs

ihada. Nisso consiste o processo global de democratizaço. Este paradigma envolve urna contraditórias de subjectividades parciais ou reja, a articulaço no mesmo indi4dU0 ou
enorme expanso do conceito da democracia e em várias direcçôes, urna delas está j grupo social de posiçöes de subjectividade incongruentes. do que resultain padrôCs de
explicitada no que acabei de descrever. Como vimos. a democracia deve ser expandida do acçAo que a racionalidade moderna considera tortuosos ineficazes, contraditórios OU
-
;

espaço-tempo da cidadania onde aliás vigora corn fortes limitaçöes, corno vimos - aos !

mesmo absurdos. So precisos critéiios de racionalidade mais amplos para comprecnde a

restantes espaços4empo estniturais. Isto significa que a democracia no d urna especifici- :

complexidade de tais const.eIaçes de subjeclividades e os obstáculos à sua mobilZacO


dade nonnativa da instituiçäo do Estado nacional. Pelo contrário, a democracia é. por no sentido da transiçäo paradigmática. paradigma emergente avança tanto
A luta pel

assiffi dizer, específica de iodos os espaços eslruturais e de todos os níveis de sociabili- mais quanto mais dhnensòes da subjectividade o Jloptam como principio de ra2-O Prá-
dade. A especificdade reside no modo variado como ela ins&uconalizada. Em cada tica Tram-se de um objectivo difícil, pois o mais nonna! t que, numa situaçiO
de traii
algumas das
um dos espaços-tempo, o paradigma emergente ests vinculado à transformaço das rela- siçao paradigmática o individuo, tal como a sociedade, esteja dividido, corn

çes sociais, de !Iaçôes de poder em relaçes de paililba da autoridade, mas tal transfor- suas dimensoes de subjectividade próximas do paradigma dominante e outraS
posS(5 tUt
rnaço asswne necessariamente formas diferentes rias unidades eco-socialistas de con- .
do paradigma emergente. As coligaçöes a favor do paradigma emergente são
sumo e nas unidades eco-socialistas de produçäo, por esempio. exacta medida em que a ele aderem, urna a urna, as diferentes dimensöts da subjeCtLVI'

A expanso estrumral da democracia envolve Lambém urna diversificaço da escala. O dade dos individuos e dos grupos sociais.
frontaçaO
pensamento democrático da modernidade concebeu a escala nacional como a «escala Concluo assim um percurso telescópico sobre as formas que assume a con
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298 Pela Mao de Alice. O Social e o PolItico na Fós-Moder,ddade
ONorte,oSuleaUtopia 299

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