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Resumo
O presente artigo tem por objetivo refletir sobre a articulação entre as categorias relações de
gênero e poder,
subordinação sendo atributos
feminina, necessários
o que pode para
contribuir o desvendamento
com da desigualdade
as análises e estudos de gênero
sobre a violência ea
contra
mulher e seu enfrentamento. Pensar as relações de gênero articuladas com as relações de poder
também nos fornece subsídios analíticos para o entendimento das identidades de gênero, estudos
que encampam grandes debates na contemporaneidade. Apesar das identidades de gênero não
serem foco principal do artigo, ao tocar nas relações de gênero e poder, encontramos caminhos
para pensá-las
pensá-las e problematizá
problematizá-las.
-las.
1 INTRODUÇÃO
O surgimento
surgimento das relações de gênero como conceito científico está intrinsecamente ligado
à história do movimento feminista, o qual vem pautando a condição da mulher nas sociedades
ocidentais desde o século XIX. Em seus primórdios, as reivindicações estavam ligadas ao
chamado sufragismo em prol do voto feminino. Já em meados de 1960 as feministas passam a
produzir livros e artigos
artigos de forma ma
mais
is contundente sobre a situaç
situação
ão de opressão
opressão da mulher.
No Brasil,
Brasil, apenas nos finais de 1980 as feministas brasileiras se apropriaram da discussão
de gênero. A referida categoria foi bastante debatida entre as francesas e as norte-americanas,
possuindo, com o passar dos debates e formulações teóricas, alguns direcionamentos em sua
conceituação
conceituação e utilização.
A compreensão das relações de gênero perpassa por várias conceituações e estudos, desde
a construção de papéis masculinos e femininos, do aprendizado destes que formam a identidade
dos sujeitos; da sexualidade; do enfoque na violência contra a mulher; das discussões sobre as
masculinidades, até as questões que conseguem relacionar gênero e poder, colocando em
evidência que a subordinação feminina não é natural, estática e imutável. Com o tramitar
histórico, percebe-se que as identidades não são fixas, mas mutáveis e transformáveis, além de
serem plurais e diversas. Assim, vai se gestand
gestandoo a concepçã
concepçãoo de gênero como relacional, ou seja,
pertencente às relações sociais entre os ssujeitos poder.
ujeitos e um modo ddee significar aass relações de poder.
1
Mestranda em Serviço Social, Trabalho e Questão Social pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), bolsista do
Programa de Demanda Social da CAPES, pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Afrobrasilidade,
Gênero e Família (NUAFRO) da Universidade Estadual do Ceará (UECE). renatagomesdc@yahoo.com.br
(UECE). renatagomesdc@yahoo.com.br
2
Assistente Social, mestranda em Políticas Públicas e Sociedade pela Universidade Estadual do Ceará.
3
Profa.. Dra. do mestrado acadêmico em Serviço Social, Trabalho e Questão Social e do curso de Serviço Social da
Universidade Estadual do Ceará 222
As primeiras concepções das relações de gênero fincavam as análises entre o binarismo
masculino e feminino, sob os polos dominantes e dominados, em que enfoca o sistema de
sexo/gênero
sexo/gênero e não consegue desnaturalizar os sujeitos, restringindo-se, assim, a distinções apenas
nas características biológicas. Quando se referiam ao poder, o abordavam como atributo único
dos homens, por vezes tratando o gênero como um destino2, vitimizando a mulher. Ao conceituar
rigidamente as relações de gênero tratava-se a temática de modo essencialista e fixa,
dicotomizar os sujeitos e as relações, não dando conta de entender as situações postas pela
desigualdade
desigualdade de gênero, a exemplo do machismo, homofobia e violência contra mulher.
Dessa maneira, o presente artigo tem por objetivo apresentar uma discussão articulando
as categorias relações de gênero e poder, a fim de compreender as desigualdades de gênero
presentes na contemporaneidade.
contemporaneidade. Para tal, fundamentamo-nos num aporte teórico que subsidia as
reflexões sobre a desnaturalização da subordinação da mulher, embasando-se para compreender
gênero em Grossi (1998), Scott (1990) e Saffioti (19992) e para o entendimento das relações de
poder dialogou-se,
dialogou-se, principalmente, com Louro (1997), Foucau
Foucault
lt (1999) e Deleuze (1992).
(1992).
A apreensão das relações de poder em suas variadas formas e manifestações nos
proporciona perceber que as relações de gênero não são dicotômicas e maniqueístas, entre
dominados e dominadas, mas mutáveis e transformáveis, pois ninguém é fixo numa posição e
a
muito menos detém unicamente o poder. De tal modo, que nos possibilita compreender que a
2
Saffioti (2001) explicita essa questão citando duas autoras que detiveram essa postura em seus estudos, assim
afirma: “[...] Chauí e Gregori [...] em ambos os textos em pauta há bastante ambiguidade, pois a mulher oscila entre
ser passivo, coisa e cúmplice do agressor. Em outros termos, tratava-se de responsabilizar as mulheres pelas
agressões sofridas. Em última instância, culpabilizavam-se as mulheres pela dominação e exploração de que
eram/são alvo por parte dos homens, mas se as tomavam como incapazes de agir/reagir. A rigor, confundia -se -se o
tratamento de coisa dispensado às mulheres com uma presuntiva incapacidade de ação/reação. Atualmente, é
possível avaliar como positivo o papel desempenhado por estas ppublicações,
ublicações, já que provocaram a emergência de
outras posições, com maior capacidade de discriminar entre a passividade e as estratégias calculadamente utilizadas
por mulheres vítimas de violência na relação
relação com seus agressores (p. 12-13)
3
Com destaque para Grossi (1998), Louro (1997), Saffioti (2001, 1999), em outros textos dessas autoras.
223
equidade de gênero é possível e que a desigualdade foi construída, senso passível de
transformação.
No período entre 1970-1980, a questão da mulher era referenciada nos estudos sobre a
mulher enfocando a dimensão contestadora e política, tratada pelo movimento feminista que se
articulava com a esquerda brasileira na luta contra a ditadura militar. De acordo com Queiroz
(2008), Stoller foi o primeiro estudioso a utilizar a terminologia gênero, isto em 1968, porém o
termo não foi adotado amplamente, tendo maior difusão a partir de 1975 com o clássico texto de
Gayle Rubin intitulado The traffic in women: notes on the political economy of sex , o qual
abordou o sistema sexo/gênero.
As mulheres engajadas no movimento feminista e na luta nos anos de Ditadura Militar
enfrentaram repressão, perseguição e violência do regime, tendo, muitas, buscado exílio em
outros países, principalmente nos europeus. No período da reabertura democrática, em meados
dos anos 1970, algumas dessas mulheres retornam ao Brasil trazendo a experiência do
movimento feminista europeu, especialmente das feministas francesas e italianas, que se
aproximavam das teorias socialistas e marxistas. Esse período demarca a primeira fase do
feminismo no Brasil e de sua produção teórica (MORAES, 2000).
Posteriormente, temos a influência do feminismo norte-americano que se articulava com
os movimentos de “insubordinação civil [...] a luta libertária incluía as questões relacionadas à
autoridade dos mais velhos e ao conservadorismo do american way of life [...]” (MORAES,
2000, p. 95).
Dessa maneira, o surgimento dos estudos de gênero foram demarcados e antecedidos
pelos estudos sobre a mulher. No Brasil em 1980 surge e legitima-se, sobretudo no meio
acadêmico, os chamados estudos de gênero que realizou outras análises conceituais da condição
da mulher, fazendo com que o movimento feminista de então repensasse questões primordiais,
principalmente aqueles referenciais
referenciais que tratavam a temática feminista na pperspectiva
erspectiva biológica –
sexuais (BENOIT, 2000).
As investigações passaram a considerar a cultura e o simbólico para entender as
denominadas relações de gênero entre mulheres e homens. Conforme Benoit (2000), as
pesquisas acadêmic
acadêmicas
as sobre o assunto contribuíram para um avanço teórico dos temas
trabalhados pelo movimento feminista de outrora. Passaram a utilizar teóricas como Joan Scott
que trata a categoria gênero em seu aspecto relacional, analisando o caráter social das diferenças
entre mulheres e homens. Considera-se, dessa maneira, de suma importância “a superação de um
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[...] um primeiro campo no seio do qual ou por meio do qual, o poder é articulado. O
gênero não é o único campo, mas ele parece ter constituído um meio persistente e
recorrente de dar eficácia á significação do poder no Ocidente, nas tradições judaico-
cristãs e islâmicas. [...] O gênero é então um meio de codificar o sentido e de
compreender as relações complexas entre diversas formas de interação humana. Quando
as (os) historiadoras(es) buscam encontrar as maneiras pelas quais o conceito de gênero
legitima e constrói as relações sociais, elas (eles) começam a compreender a natureza
recíproca do gênero e da sociedade e as maneiras particulares e situadas dentro de
contextos específicos, pelas quais a política constrói o gênero, e o gênero constrói a
política (p. 16-17).
225
Isso significa que “sexo e gênero são noções construídas e transformadas em relações de
poder nos processo
processoss sociais” (ibidem, p. 186). Dizer o que é ser homem, o que é ser mulher,
atribuir significados, papéis e funções diferenciadas a partir dessa identidade vai estabelecer
relações de poder que por vezes colocará os sujeitos em polos opostos e desiguais.
Esse campo cultural perpassa a construção do ser homem e do ser mulher, bem como as
trajetórias culturais dos sujeitos que não são unívocas, nem homogêneas, mas sim “[...] campo de
confrontos atravessados
atravessados por fluxos multidirecionais” (JÚNIOR, 2003, p. 26).
Dessa maneira os sujeitos vão se construindo e se reconstruindo no decorrer de seus
processos e relações sociais, o que nos faz perceber que a leitura das relações de gênero e das
relações de poder deve “[...] explorar as complexidades tanto das construções de masculinidade
quanto as de feminilidade, percebendo como essas construções são utilizadas como operadores
metafóricos para o poder e a diferenciação em diversos aspectos do social (PISCITELLI, 1998,
p. 150).
As relações de gênero, como categoria histórica analítica, oferece reflexões e
explicitações sobre as práticas culturais e sociais que condiciona as formações identitárias dos
sujeitos, no caso de ser homem e ser mulher. De tal modo, que ser homem ou mulher não é
definido pelo sexo biológico de cada um/a, mas a partir de relações sociais e culturais que
determinam lugares, deveres
deveres e direitos disti
distintos
ntos conforme a identidade de gênero atribuída.
Gênero é uma categoria que não trata de diferença sexual, mas
ma s sim de relação social entre
mulheres e homens, homem/homem, mulher/mulher 4 entendendo como se constrói enquanto
4
Com o passar dos estudos sobre as relações de gênero muitas teóricas, com destaque para Judith Bather, passaram
a questionar
definição a matriz
a partir heterossexual
da relação social (heteronormativa) que regimentava
entre homens e mulheres, a categorização
desconsiderando desse
as outras conceito, de
identidades baseavam
gênero ea
identidades sexuais que também compõe as discussões de gênero. Deve-se obervar que: “[...] A dicotomia marca,
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sujeitos sociais. Tal categoria não se caracteriza apenas como analítica e descritiva, é também
histórica. Dessa forma, a categoria gênero surge a fim de dar conta da discussão acerca da
subordinação da mulher, sua reprodução e as várias e diversas formas que sustentam a
supremacia masculina na sociedade, através da desigualdade de gênero.
De acordo com Grossi (1998) devemos identificar as devidas distinções entre identidade
de gênero5 e práticas afetivo-sexuais, pois a sexualidade é uma das variáveis do gênero e não a
única, de tal modo que sexo, gênero, identidade de gênero e sexualidade não são sinônimos. Ao
referirmos ao sexo estamos elencando as diferenciações biológicas entre mulheres e homens,
todavia ao tratarmos de gênero estamos situando as construções culturais em relação a
masculinidade e feminilidade. Dessa maneira, temos que “[...] identidade de gênero é uma
categoria pertinente para pensar o lugar do indivíduo no interior de uma cultura determinada e
que sexualidade é um conceito contemporâneo para se referir ao campo das práticas e
sentimentos ligados à atividade sexual dos indivíduos” (idem, p.12).
Conforme Grossi, refletir sobre identidade é referir-se aos processos de socialização dos
sujeitos percebendo que ao depara-se com um conjunto de convicções do que se concebe
socialmente como masculino e feminino, define, dessa maneira, a forma de ser e agir no mundo.
Ao sinalizarmos as características masculinas e femininas, perceberemos que atributos de
delicadeza, doçura, paciência, dedicação, cuidado compõe o ser mulher, já em relação ao ser
homem temos a virilidade, a força, coragem, autoconfiança, a agressividade, assim “[...] o
feminino é constantemente associado nesses discursos, à horizontalidade. A mulher, no próprio
ato sexual, representaria esta posição, enquanto o homem, o poder, o domínio, o ativo,
representaria a verticalidade, a ordem hierárquica que não deveria ser ameaçada” (JÚNIOR,
2003, p. 33).
A constatação dessas características da feminilidade e da masculinidade não podem ser
compreendidas fixamente, aparentando que todos os sujeitos obedecem as regras desses códigos
culturais, sem levar em conta as múltiplas formas dos indivíduos exercerem suas identidades e
que estas são historicamente construídas, ou seja, passíveis de transformações. Desejamos
salientar nessa assertiva que os códigos culturais legitimados socialmente embasam-se nessas
também, a superioridade do primeiro elemento. Aprendemos a pensar e a nos pensar dentro dessa lógica e
abandoná-la não pode ser tarefa simples. A proposição de desconstrução das dicotomias – problematizando a
constituição de cada polo, demonstrando que cada um na verdade supõe e contém o outro, evidenciando que cada
polo não é uno, mas plural, mostrando que cada polo é, internamente, fraturado e dividido – pode
pode se constituir numa
estratégia subversiva e fértil para o pensamento” (LOURO, 1997, p. 31).
5
Em complementação as ideias de Grossi (1998) vale destacar as reflexões de Louro (1997) concernente a
identidade de gênero e identidade sexual. Dessa maneira, “ [...] identidades sexuais se constituíram, pois, através das
formas como vivem sua sexualidade, com parceiros/as do mesmo sexo, do sexo oposto, de ambos os sexos ou sem
parceiros/as. Por outro lado, os sujeitos também se identificam, social e historicamente, como masculinos ou
femininos
estão e assim constroem
profundamente suas identidades
inter-relacionadas: nossadelinguagem
gênero. Ora, é evidente
e nossas que essas
práticas muitoidentidades (sexuais
frequentemente as econfundem,
de gênero)
tornando difícil pensá-las distintivamente ” (p. 26-27).
227
caracterizações dos sujeitos, os quais são frutos das transformações socioeconômicas e políticas
de cada período histórico.
As sociedades contemporâneas foram definindo papéis e funções diferenciadas aos
sujeitos conforme a identidade de gênero. A posição da mulher em outras organizações sociais,
como o período colonial e imperial brasileiro, era resguardada a condição de propriedade do pai
e, por conseguinte do marido, sem direitos políticos, econômicos e sociais. Essa desigualdade foi
se afirmando em nosso país, e mulheres e homens ocupando diferentes lugares sociais, fato que,
como sinalizamos anteriormente, tornou-se bandeira de luta do movimento feminista e de
mulheres.
É inegável as desigualdades entre mulheres e homens, a exemplo no mercado de trabalho
que ainda hoje apresente salários diferenciados conforme o gênero, e as teóricas feministas
trataram de desvendar esse processo desigual e denunciar através de suas reivindicações que as
condições de vida e trabalho das mulheres são inferiores as dos homens. Todavia, o que
desejamos problematizar é que mesmo em situações opostas e desiguais, homens e mulheres não
podem ser identificados como dominadore
dominadoress e dominados, uma vez que gênero e poder são
relações historicamente construídas, podem ser questionada
questionadas,
s, mudadas e transformadas.
Dessa maneira, não se consegue compreender mais aprofundadamente as relações de
gênero senão tratar de apreender as relações de poder, necessitando de uma conceituação que
compreenda o poder em suas múltiplas e variadas formas e não reduzindo a questão
dicotomicamente em que o masculino sempre terá prioridade nas relações, lócus onde se
concentra o poder, inviabilizando o entendimento das relações de poder como exercido de
diversas maneiras. A proposta dessa análise é sinalizar que as relações de poder entre os sujeitos
não são fixas e determinadas. Articular gênero e poder nos estudos é de suma importância para
não se dicotomizar, nem naturalizar os indivíduos e muito menos as relações.
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e desnaturalizar a subordinação feminina. Por isso, a referida autora utiliza Foucault para
compreender o poder expresso nas relações de gênero, uma vez que para tal estudioso o poder
possui ramificações
ramificações e entrelaçamentos,
entrelaçamentos, ass
assim
im temos que:
[...] nem a arqueologia, nem, sobretudo, a genealogia têm por objetivo fundar uma
ciência, construir uma teoria ou se constituir como sistema: o programa que elas
formulam é o de realizar análises fragmentárias e transformáveis. [...] as análises
genealógicas do poder [...] produziram um importante deslocamento com relação à
ciência política, que limita ao Estado o fundamental de sua investigação sobre o poder
[...] Foucault, a partir de uma evidência fornecida pelo próprio material de pesquisa, viu
delinear-se claramente uma não sinonímia entre Estado e poder (MACHADO, 1979, p.
11).
O Estado não seria o aparelho único e central do poder, pois há exercício do poder para
além do aparelho estatal, acontecendo de maneiras variadas e heterogêneas. A existência de
outras relações de poder não interligadas diretamente e nem emanadas do Estado, significa dizer
que tal ente não funda todas as formas e manifestação de poder, uma vez que este ocorre por
níveis variados em nexos distintos do tecido social, assim “os micro-poderes existem integrados
ou não ao Estado [...]”, mesmo porque o poder “[...] intervém materialmente, atingindo a
realidade mais concreta dos indivíduos – o
o seu corpo- e que se situa ao nível do próprio corpo
social, e não acima dele, penetrando na vida cotidiana e por isso podendo ser caracterizado como
micro-poder ou sub-poder” (MACHADO, 1979, p. 12).
Para Queiroz (2008), as feministas pautaram como uma das hipóteses da subordinação da
mulher o poder distribuído diferentemente a homens e mulheres. Porém, não seria um poder
centrado na figura do Estado e nos aparatos burocráticos, mas o expresso nas diversas relações e
espaços sociais, que se propaga não apenas em comportamentos e atitudes autoritárias, mas
também nas afetivas e amorosas.
Embasar-se em Foucault para compreender o poder nas relações de gênero ocasionou
inúmeros debates no movimento feminista e entre estudiosas de gênero, uma vez que tal autor
retrata em suas análises uma nova concepção de poder, desvencilhada daquela que defende que
apenas uma parcela da população o possui ou mesmo um ente, no caso o Estado. O estudioso
não parte de uma teoria geral do poder, mas o compreende como relação que se esparrama como
teia na vida cotidiana, ninguém está destituído dele, daí a compreensão de uma microfisica do
poder. Neste sentido, torna-se valiosa sua contribuição quando tratamos da violência contra a
mulher, mediante o convite para compreendermos a gama de fatores que perpassam as relações
permeadas por violência, as mulheres não se encontram destituídas de poder, mas fazem uso dos
mecanismos que detém naquele momento.
Em uma pesquisa realizada por Costa (2011) na Casa de Privação Provisória de
Liberdade (CPPL III), localizada em Itaitinga/Ceará, junto aos homens que cumpriam pena por
229
Dessa maneira, não se pode desconsiderar essa concepção de poder até mesmo quando se
pondera sobre a sociabilidade do capital. Concordando com Saffioti (1992), uma análise das
relações de gênero requer retomar esse conceito de Foucault, principalmente quando se estuda
violência contra mulher.
Foucault (1979) desenvolve uma arqueologia do saber e uma genealogia do poder
descrevendo sua constituição a partir da sociedade capitalista, soberana e disciplinar. Ele não
despreza o poder centrado na economia, mas vai além ao elencar as diversas formas de poder,
conforme a organização da sociedade. O poder para o autor é uma constatação que perpassa
todas as relações em variados níveis, assim:
No contexto desse referencial teórico, fica extremamente problemático aceitar que um
polo tem poder – estavelmente
estavelmente – ee outro, não. Em vez disso, deve-se supor que o poder
é exercido pelos sujeitos e tem efeitos sobre suas ações. Torna-se central pensar no
exercício do poder; exercício que se constitui por manobras, técnicas, disposições, as
quais são por sua vez, resistidas e contestadas, respondidas, absorvidas, aceitas ou
transformadas.
sempre É importante
se dá entre notar
sujeitos que são que, na concepção
capazes de Foucault,
de resistir [...] (LOURO,o1997,
exercício do poder
p. 39).
230
Foucault historiciza a categoria poder, apresenta suas formas a partir dos contextos
históricos específicos, como, por exemplo, ao abordar as mudanças trazidas pela Revolução
Francesa para a medicina, psiquiatria e sistema penal, salientando como os saberes e os poderes
transformam e são transformados. Isso não quer dizer que o estudioso partiu de um método
específico para o entendimento do poder, pelo contrário, deixa bem claro em seus escritos que
não parte de um método inflexível e nem cria uma teoria geral do poder, mas se orienta por suas
pesquisas, seus estudos e investigaçõe
investigaçõess bem delimitadas pelos seus objetos de estudos, o que
concedeu-lhe possibilidade para o entendimento do poder em três grandes eixos: soberano,
disciplinar e biopoder.
Em relação ao poder soberano, Foucault (1999) parte da teoria clássica da soberania para
compreendê-lo, asseverando a concepção de direito à vida e direito a morte que envolvia esse
tipo de poder. O soberano tinha em suas mãos o poder de deixar viver e morrer, assim “[...] a
vida e a morte dos súditos só se tornam direitos pelo efeito da vontade do sobera no” (p. 286). Se
o poder que o soberano exercia sobre a vida de seus súditos só fazia sentido pelo poder que
detinha sobre a morte de tais, “[...] é porque o soberano pode matar que ele exerce seu direito
sobre a vida” (p. 287). Esse poder soberano teve grande expressão no período dos reis e
monarcas.
Com as transformações do século XVIII e XIX, surgem em cena o poder disciplinar, que
não substituiu em sua completude o soberano, mas se destacou e ganhou ênfase nesse período.
Foucault (1999) esclarece que as transformações relacionadas ao poder de que trata não segue
uma análise a partir da política, mas sim dos mecanismos, técnicas e tecnologias do poder que
demarcaram
demarcaram certos períodos, nas palavras do autor:
[...] é que nos séculos XVII e XVIII, viram-se aparecer técnicas de poder que eram
essencialmente centradas no corpo, no corpo individual. Eram todos aqueles
procedimentos
(sua separação,pelos
seu quais se assegurava
alinhamento, sua acolocação
distribuição
emespacial
esp acialedos
série emcorpos individuais
vigilância) e a
organização, em torno desses corpos individuais, de todo um campo de visibilidade.
Eram também as técnicas pelas quais se incumbiam desses corpos, tentavam aumentar-
lhes a força útil através do exercício, do treinamento, etc. Eram igualmente técnicas de
racionalização e de economia estrita de um poder que devia se exercer, da maneira
menos onerosa possível, mediante todo um sistema de vigilância, de hierarquias, de
inspeções, de escriturações, de relatórios: toda essa tecnologia, que podemos chamar de
tecnologia disciplinar do trabalho. Ela se instala já no final do século XVII e no decorrer
do século XVIII (p. 288).
231
Era uma relação de poder com suas especificidades, destinada ao controle dos corpos dos
indivíduos, por meio de mecanismos de controle. A esse poder Foucault denomina de poder
disciplinar. Conforme Machado, é “[...] um poder que não atua do exterior, mas trabalha o corpo
dos homens, manipula seus elementos, produz seu comportamento, enfim, fabrica o tipo de
homem necessário ao funcionamento e manutenção da sociedade industrial capitalista” (1979, p.
18).
Ao tratar o poder a partir de sua positividade no sentido de produzir, criar e não somente
como negatividade, perceberemos que nesse estágio da sociedade capitalista se produz seres
adestrados, disciplinados, úteis economicamente e dóceis politicamente. As mulheres não estão
somente fadadas ou determinadas ao julgo do outro, pois elas, num misto de relações, podem
também exercer micro poderes expressos nas práticas
prát icas cotidianas.
O principal mecanismo de controle do poder disciplinar é a vigilância, tanto que os
hospitais, as fábricas, as prisões são instituições disciplinares exemplares para a compreensão
compreensão do
poder pautado no controle dos corpos, buscando tornar o indivíduo dócil e útil. No caso da
família, a partir dessa definição e historização do poder disciplinar, podemos problematizar que
os homens dirigiam-se às suas companheiras como objeto-propriedade e buscavam controlar
seus corpos, disciplinando-as e vigiando-as.
Todavia, assim como o poder soberano foi perdendo centralidade para o disciplinar, este
vai perdendo espaço para o que Foucault denomina de biopoder, baseado num poder exercido
não sobre um individ
individuo
uo ou seu corpo, mas sobre uma população. Nas palavras de Deleuze “[...]
as disciplinas por sua vez, também conheceriam uma crise, em favor de novas forças que se
instalavam lentamente e que se precipitariam depois da Segunda Guerra Mundial: sociedade
disciplinares é o que já não éramos mais, o que deixávamos de ser (1992, p. 220). Dessa
maneira, temos uma transformação do poder soberano e disciplinar:
Aquém, portanto, do grande poder absoluto, dramático, sombrio que era o poder da
soberania, e que consistia em poder fazer morrer, eis que aparece agora, com essa
tecnologia do biopoder, com essa tecnologia do poder sobre a “ população” enquanto tal,
sobre o homem enquanto ser vivo, um poder contínuo, científico, que é o poder de
“fazer viver ”.
”. A soberania fazia morrer e deixava viver. E eis que agora aparece um
poder que eu chamaria de regulamentação e que
q ue consiste, ao contrário, em fazer viver e
em deixar morrer (FOUCAULT, 1999, p. 294).
Foucault (1999) esclarece que na segunda metade do século XVIII surge outra tecnologia
t ecnologia
de poder diferente da disciplinar, porém não exclui esta, mas a integra, a modifica parcialmente,
contudo não é a mesma disciplina, se incrusta naquela, porém tendo outro suporte, contanto com
diferentes elementos e instrumentos que auxiliam seu exercício, além de ser “diferentemente da
disciplina, que se dirige ao corpo [...] ela se dirige não ao homem corpo, mas [...] ao homem
espécie” (ibidem, p. 289).
232
De acordo com Deleuze (1992), generaliza-se uma crise dos meios de confinamento,
prisão, hospital, fábrica, escola, família. Nesse período muitas autoridades governamentais
governamentais
passaram a propor reformas nessas instituições, pois não estavam respondendo ao que se
propunham, todavia “[...] trata-se apenas de gerir sua agonia e ocupar as pessoas, até a instalação
das novas forças que se anunciam. São as sociedade de controle que estão substituindo as
sociedadess disciplinares” (p. 220). Vale ressaltar que essas sociedades de controle tratadas por
sociedade
Deleuze não são fechadas, voltadas ao disciplinamento do individuo, mas são abertas, exercem o
controle em uma gama de indivíduos:
Ao contrário de Deleuze, Foucault não aponta para o fim das sociedades disciplinares,
seu desaparecimento em prol das sociedades de controle, mas sim esclarece que ainda existem
elementos disciplinares, mas partem de outros suportes e de outras técnicas, em vez de tratar pela
nomenclatura sociedade de controle, compreende ser “uma biopolítica da espécie humana ”
(FOUCAULT, 1999, p. 289).
No início do século XIX, momento de fortalecimento
fort alecimento do processo industrial, a biopolítica
passa a inserir outros mecanismos de assistência, diferentemen
diferentemente
te das instituições assistenciais
assistenciais
clássicas e da igreja, incidindo diretamente em grandes populações e exercendo poder sobre tais.
Para Foucault (ibidem), seria a seguridade, os seguros individuais e coletivos, sendo mecanismos
mais sutis e racionais. Assim, o campo de intervenção da biopolítica vai se delineando,
destacando-se como primeiro campo de saber e poder, a natalidade, a morbidade, as
incapacidades biológicas “[...] é disso tudo que a biopolítica vai extrair seu saber e definir o
campo de intervenção de seu poder” (p. 292).
Para a compreensão do biopoder, Foucault (ibidem) traça três elementos importantes no
entendimento da biopolítica. Primeiramente afirma que ela lida com a população como problema
científico, político, biológico e de poder. Em segundo lugar, os problemas tratados pela
biopolítica só são pertinente em nível de massa, sendo imprevisíveis e aleatórios, só fazendo
sentindo na coletividade, ocorrendo
ocorrendo em um período relativamente longo. Por fim, os mecanismos
utilizados pela biopolítica referem-se a previsões, estimativas, estatísticas, medições globais “[...]
vai se tratar [...] não de modificar tal fenômeno em especial [...] tal individuo, mas [...] intervir
[...] nas determinações desses fenômenos [...] no que eles têm de global [...] baixar a morbidade
[...] encompridar a vida [...] estimular a natalidade (ibidem, p. 293).
233
Para Louro (1997) o biopoder é o poder de controlar as populações, baseado num
conjunto de disposições e práticas; no caso do gênero, empregaram dispositivos diferentes para
regular homens e mulheres, uma vez que:
O bipoder, assim como o poder disciplinar, irá condicionar o que é ser homem e mulher
na sociedade, ao centrar-se nas populações e busca regulamentar e controlar as taxas de
natalidade, mortalidade, as condições de saúde, expectativa de vida “ [...] a normalização da
conduta dos meninos e meninas, a produção dos saberes sobre a sexualidade e os corpos, as
táticas e as tecnologias que garantem o ‘governo’ e o ‘auto-governo’ dos su jeitos” (p. 42).
As transformações das tecnologias do poder estudadas e analisadas por Foucault nos
ajudam a compreender o que é ser homem e mulher nas sociedades, bem como os mecanismos
oprimido, mas embasando-se na premissa de que todo poder gera resistência, e que seu exercício
também, e até principalmente, ancora-se na premissa de que seu exercício está ligado ao saber,
pois “[...] foi a introdução nas análises históricas da questão do poder como um instrumento de
análise capaz de explicar a produção dos saberes” (MACHADO, 1979,p. 10).
Foucault não desenvolveu uma teoria geral do poder, seu objetivo não era considerar o
poder por sua natureza e essência, para, assim, definir suas características universais, pois “[...]
não existe algo unitário e global chamado poder, mas unicamente formas díspares, heterogêneas,
em constante transformação. O poder não é um objeto natural, uma coisa; é uma prática social e,
como tal, constituída historicamente” (ibidem, p. 10).
234
em vítima e agressor, como se fossem lugares estáticos ocupados pelos sujeitos, sem
possibilidade de mudança nas relações, bem como de ausência de resistência por aquela que
sofre a violência. Tais nomenclaturas encaixotam os sujeitos como se não vivessem em
relações sociais históricas e mutáveis:
Homens e mulheres certamente não são construídos apenas através de mecanismos de
repressão ou censura, eles e elas se fazem, também, através de práticas e relações que
instituem gestos, modos de ser e de estar no mundo, formas de falar e de agir,condutas
e posturas apropriadas (e, usualmente, diversas). Os gêneros se produzem, portanto, nas
e pelas relações de poder (LOURO, 1997, p.41).
A partir dessa concepção o poder é exercido, podendo ele ser contestado, aceito resistido
e absorvido. Dessa maneira, essa concepção contraria aquelas que acreditam ser apenas o
Estado único detentor de poder e sinaliza que o exercício do poder pressupõe que ele
circula nas relações sociais penetra
penetrando-as
ndo-as sutilmente (QUEIROZ, 2008).
2008).
Essa definição de poder permite pensar que as mulheres em situação de violência
doméstica, não são subordinadas totalmente, sendo incapazes de oferecer resistência aos seus
autores de violência, pois “[...] a resistência, ou melhor, a multiplicidade de pontos de
resistência seria inerente ao exercício do poder. [...] jamais podemos ser inteiramente
aprisionados (as) pelo poder [...] há sempre a possibilidades de modificarem sua dominação em
condições determinadas e segundo estratégias precisas” (ibidem, p. 83).
No seio das relações de poder se apresentam desigua
desigualdades
ldades e diferenças, expressas nas
análises das categorias de gênero, classe social, sexualidade e raça/etnia, que são demarcadas
historicamente por hierarquias, violências, discriminação e desigualdades, já que o poder pode
se manifestar de maneira sutil e invisível, e no caso das relações de gênero acarreta
malefícios a algumas mulheres quando expresso pelas várias manifestações
manifestações da violência.
Conforme Foucault, o poder se apresenta nas dimensões macro e micro, adequando-se
mais esse conceito para se analisar as relações de gênero, pois a mulher mesmo obtendo uma
pequena parcela do poder conferido socialmente em maior escala aos homens, não deixa de
exercer poder:
Lembremos a célebre frase de Foucault: “o poder se exerce, não se possui. Não
se guarda numa caixinha”, ou em um armário. Ele produz verdades, disciplinas e
ordem, mas também está sempre em perigo e ameaçado de perder-se. Por isso, não são
suficientes leis e normas, ameaças cumpridas e castigos exemplares. As (os) dominadas
(os) têm um campo de possibilidades de readequação de obediência aparente, mas
desobediência real, resistência, manipulação da subordinação. Daí então é que os
lugares de controle sobre as mulheres – em nossas sociedades- o desempenho
dos papéis das mães-esposas-donas de casa – sejam também espaços de poder das
mulheres: o reprodutivo, o acesso ao corpo e a sedução, a organização da vida
doméstica. [...] Tornam-se então espaços contraditórios inseguros. Sempre em tensão.
As mulheres podem, por exemplo, ter filhos que não sejam do marido, aparentar
esterilidade
inoportunos, ouseserelacionar
negar simplesmente
sexualmente coma outras
tê-los,
ou engravidar
tras e outros, seduzirem
seduzir com momentos
diferentes
objetivos, se negar a trabalhar no lar impedindo a sobrevivência de seus integrantes,
incluindo-se aí as crianças recém- nascidas, etc (BARBIERI, 1993, p. 12).
235
Retomar esse conceito de Barbieri (ibidem), fundamentada em Foucault (1987), nos faz
compreender que a mulher não é por natureza dominada, pois oferece resistências às situações
impostas, nos estimula a perceber que a mulher possui seu campo de poder e o exerce também,
mesmo em graus menores. Dessa forma, o silenciamento e o segredo podem ser âmbitos do
poder, uma vez
vez que:
[...] os discursos, como os silêncios, nem são submetidos de uma vez por todas
ao poder, nem opostos a ele. É preciso admitir um jogo complexo e instável em que o
discurso pode ser, ao mesmo tempo, instrumento e efeito de poder, e também
obstáculo, escora, ponto de resistência e ponto de estratégia oposta. O discurso veicula
e produz poder; reforça-o também o mina, expõe, debilita e permite barrá-lo. Da
mesma forma, o silêncio e o segredo dão guarita ao poder, fixam suas interdições; mas,
também, afrouxam seus laços e dão margem a tolerâncias mais ou menos
obscuras (FOUCAULT, 1988, p. 96).
Foucault em suas análises sobre o poder não partiu do centro para a periferia, do marco
para o micro. As relações de gênero, a desigualdade entre homens e mulheres no plano da
família, do mercado de trabalho, da política, não são extensões apenas e unicamente do poder do
Estado, outras práticas culturais e sociais também determinam esse contexto. Conforme
[...] partir da especificidade da questão colocada, que para a genealogia que ele tem
realizado é a dos mecanismos e técnicas infinitesimais de poder que estão intimamente
relacionados com a produção de determinados saberes – sobre o criminoso, a
sexualidade, a doença, a loucura, etc – e analisar como esses micro-poderes, que
possuem tecnologia e história especificas, se relacionam com o nível mais geral
do poder constituído pelo aparelho de Estado [...] Foucault [...] estuda o poder não
como uma dominação global e centralizada que se pluraliza, se difunde e repercute nos
outros setores da vida social de modo homogêneo, mas como tendo uma existência
própria e formas especificas ao nível mais elementar
elementar (MACHADO, 1979, p. 13-14).
De tal modo, quando refletimos sobre a desigualdade de gênero expressa, por exemplo,
pela violência contra mulher, não podemos considerar que a mulher é uma vítima passiva da
situação e que não possui capacidade de resistência. Saffioti (2001) é uma das estudiosas que
contesta essa posição de vitimizada, pois afirma a impossibilidade de ressiginificarem
ressiginificarem as relações
de poder, e como bem coloca Foucault (1999) o poder não é algo estático, sem dinamicidade
e mutabilidade, existindo sim uma possibilidade de subversão.
Dessa maneira, observamos que as relações de poder não passam apenas pelo nível do
direito, nem somente da violência, muito menos contratuais e unicamente repressivas, mas
sim
Os sujeitos e suas identidades de gênero perpassam por processos sociais complexos, não
podendo considerá-los
considerá-los como processos naturalizados, sendo o sexo socialmen
socialmente
te moldado. Como
define a autora:
Dito isto, entendemos que as relações de gêneros são dialéticas, refletindo contradições e
concepções diferenciadas de gênero internalizadas por diferentes atores sociais de ambos os
sexos. Quando se trabalha com a categoria relações de gênero deve-se entender que mulheres
e homens vivenciam relações e experiências distintas, haja vista que na sociedade
que se deseja evidenciar não é uma leitura mecanicista da história, mas que ao pautar outra
ordem societal deve-se articular que as desiguais de cclasse
lasse soc
social,
ial, etnia, gênero e orientação
sexual sejam suplantadas
suplantadas..
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
funções sociais diferenciadas, distinção esta que coloca tais sujeitos, conforme sua identidade
de gênero, em processos desiguais nas suas condições de vida, no trabalho e nas relações afetivas
e sexuais.
237
A compreensão dessas questões não é de fácil apreensão correndo-se o risco em recair
nas análises vitimistas, essencialistas e biologizantes. De tal modo que, ao adentramos nessa
capciosa teia analítica faz-se necessário uma abordagem das relações de poder, oferecendo
elementos críticos e dialéticos para o entendimento da disparidade entre homens e mulheres.
As relações de poder são expressas através das relações de gênero, interpondo as relações
sociais, sejam de classe, orientação sexual e/ou etnia. Esses fenômenos se inserem nas estruturas
de poder, não sendo sinalizados apenas como ideologia, pois até mesmo esta é compreendida
como algo material por ter experiências e práticas vivenciadas cotidianamente pelos sujeitos de
uma dada realidade social.
Problematizar as relações de poder nos faz perceber que existe desigualdade,
desigualdade, a qual pode
ser transformada mediante a luta e resistência dos sujeitos tanto no âmbito individual como
coletivo. Todavia, a real superação dessas desigualdades em prol da equidade requer
uma sociedade com bases socioeconôm
socioeconômicas
icas diferent
diferentes
es da contemporânea.
contemporân ea. O
desvendamento das relações de ggênero
ênero e poder, além de descorti
descortinar
nar a subordinação das
mulheres e as relações entre os sujeitos sociais, nos faz pautar sobre tais desigualdades, dando-
nos ânsia e fôlego para pensar em uma sociedade em que os sujeitos detenham de iguais
condições.
Todavia, mesmo que a ordem econômica mude muito se precisará lutar e pautar para
que essas relações sejam suplantadas na nova sociedade. As lutas e reivindicações
reivindi cações
permanecerão,
permanecerão, porém, espera-se que, em bases sociais igualitárias, e não num sistema baseado
na desigualdad
desigualdadee como no capitalismo.
As mudanças nas relações econômicas e produtivas deverá se conectar com as relações
sociais, culturais e políticas, pois o nascimento de outro sistema produtivo igualitário, sem
dominação de classe não pode se sustentar com as desigualdades de gênero, etnia e orientação
sexual. Não se fala em outro sistema sem contradições, não se pensa aqui em um sistema puro
sem limites a serem superados, mas que se garanta que as desigualdades vivenciadas na
sociedade atual não sejam os pilares e não coexistam em outra ordem societal.
Abstract: This article aims to reflect on the relationship between the categories of gender
and power relations, because are attributes required for the unveiling of gender inequality
i nequality
and subordination of women, which may contribute to analyze analyzess and studies on violence
against women and face it. Thinking about gender relations with articulated power
relations also provides us sub
subsidies
sidies for analytical understa
understanding
nding of gender identities, studies
that are budding big debates in contemporary times. Despite gender identities are not the main
focus of the article, to touch on gender and power relations, we find ways to think them and
problematize them.
Keywords: Gender relations. Power relations. Gender identities. Violence against women.
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REFERÊNCIAS
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