Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Gonzalez Mario O Romance Picaresco Fragmento PDF
Gonzalez Mario O Romance Picaresco Fragmento PDF
( (
(
i,
\
-..t1)irl'¡tl!tt-'r¡¡x:á-" (
(
rrr r'irrntlli
t lrtoltlt$I0s RñffiS (
( 1
I
( r!rtr'r,i ¡/ó cñ, ,r! Crrr.. (
1r,,tr'n,r' 1 .1. I
I
^ñ¡r¡d. (
( l
( a2
I
I
I
:
Mario Gonz'á,Lez
Profossor da Unlyorsldade de Sáo Paulo
(
(
( I
( I
I
( a -., ¡ ¡ l'.'rxrio d! sf/,r
I
rL o á0
( q ü
0 i f
(
ü
i\ \1 ¿!E¡rrdto n.0,.
'.rir lr.trd ,1.É
Áo gru¡
ú, Oueiót I
I
I
( o I
( 4\ CAV l .,,, ,L ,,.':¡. suo¡¡
I (
I uCÁo. d. Ún9u¡!¡ñ I
( f
(
( .
I i¡q?¡r!6 ¡ E.l.!ñ!rlr. .
I I
PTÜAMMSOC
1,,J,'i. no¡r lor o &.ril i
( k
I
( f
( lIri'rñ¡r,ñ o,o.on4¡rq i
(
rn;¡' n.l{./ cu:rir!¡o I
I
( 1
( Lr-,',-JtrrC.{a!t (
I C-l
¡,,¡ ¡¡¡rr,,ü.rl!ñ.1¡lo (.}r-
( ^t|
¡;'!r' (,rlorr¡, a. ¡¡ór.r
I
,o (
(
,
$, b"
Á. tlr,¡rr
f
I
"i" tri¡ o¡oró¡o (
I
(
f I
,,.'.r..¡f.ll¡rL$rri
( (
( (
( (
( (
( (
,(
(
I
(
(
( ,---\
(
(
(
( Sumário
DlrBqáo
( BBnlamln Abdsla Junlor
( Samlra Youssef Campedelll 1. Trés ternpos para um texto 5
Propsrrgáo d€ lcxlo
( lvany Plcasso Batlsta - 2. Quando o ¡mperador entrou em foledo 1
(
Coo¡doná9áo do composle¡o
(Produc¡olP6glnaglo om vf d6o) A história - 1
Nel¿e HlromlToyota A caminho do roma¡cc 9
I . capa O na¡rador 10
Ary Normanha O anti-herói 11
Anlon¡o Ublralara DomlBnclo Uma estrutura 12
A sátira social t4 (
A história de uma co¡rupgáo 16
( (
lttilllillll'llfillffi il]lfiil 3. Remándo na galé t7
( 1flfl tca
039330
» O pfJro Mateo Alemán t1
( O plcaro Guzmán de Alfa¡achc 18 (
Uma nova modalidade na¡rativa z0
( A estrutura 22 (
( ConversAo? t3
UNIC€NTR9 O sentido do Guzmdn u 1
( (
Foc, de Educ. Ci0nc 4. O cavalelro que calu do cavalo 27
( o Lctrcs d€ l¡oti Uma editáo pirata (
( Eibl¡oteco Quevedo (
. ."ei'. .§ A históriá de-Pablos 29
"
(
-\§ 05. ,_qa A originalidade
A ficaáo na fic4áo
3l
33
(
(
A sátira social 35 (
ISBN 85 08 03043 0
O acerto de Quevedo 36
( (
( 5. O que é um romance plcaresco 38
(
( 1988
Definir é que neo é fácil 38
Alguns pressupostos 40 (
Todos os d¡reltos les€rvados
( Edltora Atlca S.A- - Rua BEráo de louape, 110 Vamos por partes 41 (
(
Tel.: (PABx) 278'9922 - Calxa Poslal 8656 Talvez assim - a
End- Telegrállco "Bomllvro'' Sáo Paulo
- E os corolá¡ios 43 (
( (
( (
( (
( (
(
:1
I a
(
(
(
(
(
("
(
(
(
(
6, Quando os pícaros salram da Espanha +s (
( - 45
(
A Europa toda é uma Picardia
No México, anos mai§ tarde 4',1 1 (
A bistória deste pfcaro 48 (
( Uma liÉo de burguesia 49
( O que mudou 50 Trés tempos, para um texto (
No tempo do rei 51
( As armas do malandro 52 f
O discurso da malandragem 53 (
( A sociedade de malanüos 54
I
( .! -(
t
(
( '1.), '-" (
( 1r'..
(
(
(
(
(
(
(
( (
( (
(
I
(
( I (
6
-\.5 5q - ".[-,-,'.t c\,. J. . ,, .", I
( (
' C a-a L'
( Sob o ponto de visra da história que nos é narrada, ca- (
da um dos lrés tcxlos é um passo no caminho da evolucao
i
r_?- iL'"t,, -,*s i
(
(
do seu protagonista do simples papel dc vÍtima, passando pela
integra9áo e pcla menüa dessa integragáo, até se mostrar co-
mo apenes um delinqüente irrecuperável.
2 i
(
(
Quando o Imperador
(
As t¡es nafrativas podem ser lidas também como a pro- f (
I gfessáo em tr& tcmpos dc uma rlnica maneira de narrar: A i (
simplicidadc da carta ou confissao de Lázaro segue-se a com-
plexidade do Orzmdn onde se superp6em diversas categorias
entrou ern Toledo I
I (
de digressóes ao longo de uma história bem mais lonSa e o (
rebuscamento ba¡roco de O Buscaot em que o autor retoma
(
conscientemente os textos anteriores para construir uma rea-
lidede purünentc verbal e paródica. \ I (
O que nos importa aqui náo é apenas o volor dcsses tex- lt I
(
tos em si mesmos. Interessa também quc essc complcxo in.
I
(
No a¡o de 1554 um mesmo e pequeno üwo fói editado :
( tertexto queeles constituem se prolongará depois. E neo ape- quase que simultane¿mente em tr$ cidades naqucla époc¿ sob I (
nas na Europa do século XVIU, Mas, media¡do o sécu.lo XIX o domfnio da coroa espanhola: Burgos, Antuérpia e Atcalá.
l (
século de heróis posit.ivos onde, salvo erceqóes, náo há es- Talvcz o fato possa ser expücado pelo hipotéüca exisrencja
-
paqo púa os anti-heróis picarescos no século XX p¡oli- (
-,
fe¡a¡áo os textos em que é posslvel sentir G eco do modelo
de uma edigáo aaterior que, em todo caso, náo chegou até ;
rio Tormes, perto de Salamanca, fdho de um moleiro ¡adráo mo diz, se v€ "em traje de homem de bem" devolve o burro
que mor¡e sem glória numa expedigáo milita¡; sua r¡áe, já ao capeláo, pois dccide náo mais trabElbar naquilo. Passa (
viúva, juntase a um moreno que rouba para sustentá-los; am- a servir a um aguazil, oficio que abandona por achá-lo peri- (
bos sáo punidos e ela acabará po¡ entfegar o filho a um cego goso demais. Pensando, no enlanto, em assegurar-se um fu-
para que lhe sirva de guia. Com o cego, Lázato passa fome turo uanqúilo, procura um ofício real. Mediairte favorcs de (
(
e deve recorrer á própria astúcia, único recurso com que conta Lerceiros consegue ser pregoelo, com o que, assim como (
( para sobreviver, face á. avareza do cego, As felacoes termi- anuncia vinhos A veuda, também dev€ p¡eceder os condens-
nanl com a brutal vingansá de Lázaro que, a seguir, fogc até dos anulciando seus delitos c sentcngas. Tern sucesso no ofí- (
(
chegar a um luga: chamado Maqueda, onde se emprega co- cio, e aele conhece um arcipreste cujos vinhos apregoa e que (
mo criado de um clérigo. Mas este acaba sendo n¡ais avaro acaba por casá-lo cofu uma criada sua. No entanto, hca cla-
ainda do que o cego e Lázaro é forgado a se valer de novos l'o para o leitor que o casamento nlo é senáo a mareira de (
( I
recursos para ma¿ar a fome; descoberto.nas suas pilhagcns, cncobrir as relagóes clandestinas do arcipreste com sua cria- (
dg, embora Lázaro jure sob¡e a inocencis desta. O relato te¡-
I
leva uma surra c é despedido. Segue depois até Toledo, on- l
de, deslumbrado pela apar¿ncia tidalga de um escgdeiro, pas, i rnina em seguida, com Lázaro cxplic¡tando que isto sucedeu I (
sa a set criado deste, No entaoto, aos poucos {cscobre que no ano em que o Imperador (CaJlos 9
cotrou cm Tol€do,
I
(
o novo amo nada tcm além da roupa que veste- Passa fome lcz ncla Cortes havendo assim grandes festas. E diz por últi-
I
flovamente, pede eJmola para Sobrevivc¡ e acaba alimertafI- . ¡no: "Pois a este tempo estava cu em minha prosperidadc c
I
do com els o próprio amo cujo orgulho o imdede de traba-l 1)O Cume dc toda boa ventura".
Ihar. Láz¡¡o Ecaba¡á sozinho quando o escudejro fugir acua.
I (
do pelos seus credorcs. I
O seguinte eoo de Lázaro será um frade da MercC, cu- A caminho do romance i (
( ja couduta pouco exemptar parece ter [uangas que 6 narra- I
(
( dor neo explicita claramente e quc leva¡n o criado a se afas-
O Lazar¡lho de To¡¡n¿s é inovador náo epenas por dife-
ta¡ delc. O quinto amo é um buleiro que, a fim de vender (
( rir tematicamente da narrative ide¿lista da época, que sc ocu.
a bula que prega, é capaz das maiotes trapagas, as quaÍs Lá-
pava preFerentemente dc aventu¡as de cavalei¡os andantes
zá¡o descobre e nos co[ta. Após quat¡o mescs, mesmo que
I alheios á realidade histórica imediata oü de pastores cuja fal. I
com olcjÁ náo passe forne, Lázaro procura óutro amo. Ser.,
sidade encobria-se de apaixonadas histórias. nar¡sgáo em
vc 8s§im a um mestre de pintar pandeiros. Nesta altura, já
primeira pessoa el¡mina o usual ¡ntermediário^que era entáo i (
mo9o, Lázaro conhcce um iapelao, que lhe cede um bu¡ro
o narrado¡ onisciente, E nos coloca no interio¡ da experien-
e quatro cantsros para que com eles distribua água pe¡a ci- (
ciat do próprio proratonista. Dessa Jnancira, já náo estamos j
dade. Todo dia Lázaro deve ent¡egar ao capelao t¡inta ma- I
perante a reite¡asáo de um estereótipo na¡¡ativo que neo
ravedis; o que passasse dos r.rinta ficava paJa Lázaro, como
pode sofrer maiores variagóes, como era o caso do hcrói das
também o que ele conseguisse r¡abalhando aos sábados. Com
o que consegue poupar ao longo dc quatro anos, Lázro com-
pra uma roupa velha e uma espada; assim que, como ele mcs- t Cf. crsrno, A. Ho¿¡o Cedontes- Msdrid, Taurus, 19J7. p, 107
(
(
10 11
noyelas de cavala(ia, O rexto neo mais será a expressáo do cepseo será sempre fixo e central. No entaJrto, há falas que
que a-contece a alguém, mas do homem existindo no que acon- : Dodcm ser isoladas como pertencenfes ivisdo a poslerio do
tece.'E a série de acontecimentos nao fica abcrta como narrador e que esteo neo,iro tempo do cnunciado, mas, da
nas oovelas mas se fecha na conclusáo de um orocesso ex- I
-
( - cnunciagao, Elas servem para definir melhor o que separa,
plicado no universo cxistencial do protagonisra. Ou seja, ro I
cm cada momento, o narrador da personagem. I§to impo¡ta
( nosso entender, estsmos ás pOnas do ¡omance. i por duas razoes: primeiro. porqúe nesse dislanciamento se
A caminho do romance nos coloca também um out¡o i
npóia a ambigüdade do tcxto; e, segundo, porque a última
aspeclo do Lazorilho. O autor deixaclaro que há mais de uma
lcitura possívcl da obra, quando afirma no "Prólogo" oCáo de Lázaro é na¡ra¡ e nestc ato o julgamos, para conhe-
-
que alguns poderáo concordar c¡m o ter(to, que deleitará apc- - cer ñelhor a sua evolugáo como personagem. As vezes, tais
nas aos que náo se aprofundarem nele. Tal necess¡dade de I
lnterferencias do narrador sao irfelevantes, como nos casos
se aprofundar para cheSar ao vcrdadeiro sentido da narrari- ,' cm que selimila ao verbo "digo". Mas ás vezes servem para
va implica que o lcitor deve assumi¡ um papel ativo, diicren- \ comproYar alé que ponto o narrador é o Lpzarilho jÁ eor'
te do de simples rcceptor da narrativa quc até cntáo lhe cra I rompido ou se é posslvel se ver no autor implícito um crftico
reservado; cabeJhe agora "ler", isto é, optar por um sen- Í da personagem. Assim, quando no episódio do cscudeiro o (
( üdo do texto dentro daqueles possfveis a parfir dessa am- l narrador reproduz a reflexáo da personagem criticando aque- I
( bigüidade. Poder-se.á le¡ ¡o Lozarilho apenas uma série lcs que vivem de apa¡entaf o que nao seo, está ignorando que
de hisrórias engragadas; mas também poder-se-á pensar que . i
ole também finge ser horuado. Mais ainda, quando a propó'
a obra é porladora de uma denúncia neo explfcita. A paJ- '
tir do "Prólogo" pode-se deduzir ciue essa dcnúncia está cen- i sito dos delitos do padrasto de Lázaro o narrador cfitica a
trada nos meiós que fazem possfvel subir na soc.icdade da épo- : corrupcáo de clérigos e frades, fica clara a hipocrisia do pró- I
ca. Nela o autor divide os que triunfaram em aqucles que I prio que, p'or sua vez, vive com a aiuda indigaa de um cclc- ¡
"herdarün flobres estados" e aqueles que "com forga e ma- | sifuaico corrompido,
nha remando chegaram a bom porto". Forga e msnha sao i
os caminhos de ascensáo social válidos na éDoca face ao ca- |
rátcr estamcntal que a socicdadc espanhola tcima entAo em I O anli-herói
conseruar. E sáo os caminhos que o pÍcafo parodia já nesta 1 I
sua primeira e, mcsmo que lnfima, significativa existEncia.' O protagonista do Lozorilho podc se¡ definido a pajti¡
aventureira. i do fato de apoiar-se na subversáo dos valorcs normativos da
I
( protagonista; tudo aparece como fala deste e o angu.lo de pe¡- uuado no "Prólogo") qu€ comeqa a ser executado de§de o
início do romancc: ¿s pretensóes Benealógicas da nobreza se
(
CÍ. C¡sr¡o, A, Apud Rooxrcuez Pre¡Lrot-rj. Lilaroturo, ttisto¡io, olie- opóe a antigenealoEia de Lá2arc, filho de pais elónimos e
'
r'ocióD- BEt..lonB, Labor, 1976. p. l?r. desonrados. Nesse scnlido anti-heróico se apóia, Para A.
(
(
(
( (
( (
( (
tii (
(
I2 l3
( (
( CastroJ o infclo cla picaresca, A palir da "desonra" pessoal, Ilnt¡e elas cabem duas séries complotas de seqüenciag: o lpl¿ñ- (
Lázaro se langa a desmit¡ficar uma sociedadc baseada no con- dizado, com os tres primeiros amos, e a Prúgreisdo, com o bu-
( (
l ceito de honra. A própria obra estaria justificada segur- lci¡o e o capeleo. scpar¿das por um fato-chave: o fim da fome
do o "Prólogo"
-
po¡ ter nascido do desejo de obter a hon- (Deixamos de lado os episódios do frade da Merce, do pintor e (
(
{ -
¡a devida aos escritores. Mas isto é contraditório, já que a do aguazjl, já qug náo esbndo mds desenvolvidos no livro,
( (
I
narragáo desvenda um passado nada honroso para o prota- náo é posslvel outorgarJhes o mesrno peso do que aos ouuos.)
( goniste-"auto¡" que, na verdade, aparece muito mais co- A primeira série comploa, o Aprcndizado, ca¡acte¡iza-se po¡ (
mo alguém levado a confessar as suls culpas,a Que a pre- uma evolutáo no "passár fomd' que é, iqesperÉdamente, cada
( I (
tensáo de hoffa é fictfcia fica mais clúo e torna-se ítoru- vez maio¡ e uma cYolugáo na cápacidade para rcmediar a fo-
{
,t) ca até
-
quando advertimos que o autor reaj do Lazailho rne, ao ponto de que o plcaro acaba remediando támbém a do (
( -
preferiu um seguro anonimato, A alusáo á hoDra no "Pró- [mo. Há também u.Ea evolugáo na rclagáo fi¡al amo-criado; do
( logo" é, pois, satírica. O quc sc evidencia na imediata refe-
(
nbandoriar em fuge o crgo passa-se A ruplurá verbal do aco[do
( ñ r€ocia a tr€s categorias soci¿is movidas pelo impulso de se- com o clérigo e ao ser aba¡rdo¡ado sem mais pelo escudeio, Na (
t(r rem hon¡adas: o soldado, o cl.érigo e o senhor, exatamenfe scgunda série complo<4 t-ázarq já livre do fantasma da fomg (
( aquelas em que poderiam se inscrever a toElidade dos amos Dassa da passividade do ser enganado pelo buleiro d aüvidadc
( de Lázaro, com exceq¿o do cego. A "honra" fica, assim, de (lo oiicio, Dc outr¿ partg é lázaro quem agom opta pelo ñm da (
it
,.]ü a¡temáo reduzida a um discurso vazio, do qual o pfcaro se rclagáo: impücitamente com o buleiro, o(plicitarn€nte com o
( apodera para defendeÍ a sua comprometedora situagáo final
Iti capeláo. No todq bá uma progressáo dB fome á capacidadc
( e que agóra uüliza como razAo maiot da na¡rativa dc uma de subsistj¡ de ser uma e(tsnsáo do s,mo (guia do cego) á relati- (
It trajetória pessoal de corrupgáo. O que temos neo é pois a va autonomie do e8uazil e da fuga ao diálogo, 'Ibdos estes tra-
(
( história de um he¡ói personagem cujas agóes se dcsenvol- gos sdo marcas do caminho paJa a integasáo gue 5e processa-
(
-
yem no senlido do bcm comum mas da sua antftese que rá na seqüencia final. Bta sc inicia no ponto final da série pre- (
{r -
protagoniza uma série de aventutas em qu9 aprende a procu- cedente, quando L¿lza¡o sente gue pode se confundir no uni.
( (
it) rar, antes de mais nada, scrr prÓprio provcito e apcnas isso. verso dos seus antiSos amos: após comprar uma roupa velha
( c umE espada, sente-se "em traje de'homem de bem" e decide (
lr
j atuar de acordo com o Dovo nivel obtido mediaue a apa¡en-
( (
Uma estrutura cia. Agora, Lázaro se incorpora ao universo dos seus antigos
( amos e nele enffenta a soc¡edade de igual para igual para por (
ii
fim ao falatório com relasáo I sua mulher Desse modo, a se- (
( O Lqzarilho de Tormes eslí estruturado cntre uma se- qütncia final fecha o üvro sem que caiba pensar na possibili-
lli:
qüencia inicial (,¡¡¡lárcr'a) e uma següéncia filal (lntegraFdo). (
( dade de uma verdadeira conlinuageo do mesmo. O único jeito
lr
de sg lwar adiante a história de l-{zaro seria fazendo-o tomar-se (
(
¡ Op. cit. p. 65 agora o amo de um criado que fosse um oütrc plcafo.
l:'l (
( No nfvel das agóes, o esquema é simples e confirma o
' Cf. OóME¿ M9RIA}rA, AnroDio. I¡ subvcrsión dcl dkcurso ritual. U:ra )é§-
tú^ dcl La2oi o de Tomes. Iirp¡évrre, , : ór.69.. 2 : 37.6?,'1980. di(o antcr.iormcritc.. Lázaro, ao Ioogo do Iivro, eDfrenta seus (
(
( (
( (
( (
( (
( (
I (
(
T¿ I
I 15
_o-ceg_o, no f_, o prigo.,io"# tu, os clérigos, setao o alvo principal contra quem sc dirige
i
za¡o prcceda condenados á forca
pe ridade no concubinaro
e apói" u." p*i aáiru ,fii r:tlc[ primeira sátira picaresca. {
da propr¡o mrlrlerlio; ;;T#I
( o l-azarilho. de Tbrmes est¿ íture al¡lOa Os clérigos, ¡o Lazo¡ilho, aparecem todos eles desvalo- 1
P_9".lógif
"o-o c brevementq
imposta pela narragao
s;ñ;;ie. I
-
c cste, perto do clérigo pareceJbc a Lézaro üm Alcxand¡e
I
ressartc sá.lien¿eJ que, na medida
em que o protagonisla
se in_ Magno. O frade que se setue ao episódio do cscudeiro é vio- I
de nao perceuii quJ l lunis mordaz cscá dirigida ao buleiro corrupto e ignora¡le e I
quardo ele se define como homem
de b"*;;r";;;;;r:; j [o clero que o recebe. Sob a aparOncia de debate religioso
I
I
lc de amos-clérigos e náo scm segundas lntengóes te-
ao mesmo uma
- ascensáo na da hierarquia
- f
t I
( Mas o clero neo é seneo o
seSmento apontado como I (
domir¡ante numa sociedade de plcaros. Nessa sociedade tem
(
ügencia uma inversao de yalores explicitada por Lázaro.nu-
I
( rador quando, dirigindose ao destinatá¡io expllcito da obra, (
( üz: "Apraz-me cont¡.r a Vossa Merc¡ estas ninharias para (
mostrar quenta virtude há em s¿berem os homens subir serij
( do baixos e quanto vfcio em se deixaJem baixar sendo altos". (
A reflex¡o, introduzida quando sc está nafiando o inlcío do XVI, em 1599' um escrito¡ sevilha- I
Já no fim do século
descendente de iudeus con-
aprendizado de f.ázaro, tem cor¡espondéncia com o conselho ." at-""í"'üii." Áe-a" -
dado pelo arcipreste a IAwo já, no irm do livro e que Lá- Madri Primeiru P0 e de Guzmdn (
('náo i -'",iri.""a em cnamado
^ no texto da aprovacáo
( zaro segue ao pé da letra: olhes para o que oulros pos- ;;";ir;;;;.4\i;J"'a
"iI'.}-. -
de o Pbaro ouzmdn al- (
sam dizer senao ao que tc toca, isto é, ao teu proveito". Es- I !"r*'ie"[" "",L.brigatória -
conheceu um su.esso
-d-e
excepcro- (
( ta inve¡sáo de valo¡es slgtrifica mostrar o vazio dos mitos vi- ;;ñ.lt;bt,á o P'karo' nesse mesmo aoo c um total
( gcnres na época e alertar para o materialismo que ñasc¿uam,
I '.:iil:;; ü;;'-tás eaiEo"'
r^ ''< ;rÁ rán§ o Fxito ¡cvou alguém a publicar' em 1602 e
(
Lázaro, que iaicia scu rclato por um pomposo "eu", é a pro-
( va dos efeitos dese sislema sobre o indivlduo que, na rea. I h' ¿ ;:"#áil"'i' lüii* r'¡ r" de avavedra' um a'se'
s (
AIe-
üdade, já náo existe, a náo ser como apoio para a socieda- eundd Parre frulldtllenta com base no projeto que Mateo (
(
de scu rivro Q roubo revou
de aliemnte e pala o Estado todo-poderoso. Os ve¡dadei¡os iííi'iri,i, ,l;l;;oiiinu'§'ep
a sua Segunds Pd e'
que foi edi- (
( valores dessa sociedade e desse Estado estáo implícitos na apro. ilii;'Áieá*. oublicar
ximagáo que o n:urador faz quando, no flm da sua histó- tada em Lisboa em 1604' (
ria de corrupto, menciona a sua boa situas¿o e a localiza tem-
poralmcnte relaciona¡do.a com a entrada do lmperador em I (
Toledo, a¡ Cortcs e as grandes festas haüdas, Náo se trata O pícaro Mateo Alemán (
de querer localizar sua história ¡a cronologia, mas de iden-
nascido em Sevilha em 154? (
üficá'la com o contexto.? A vida de Mateo Alemán -
picuesca' Ma¡sinali?¡do como des-
ú ñt,;;;;;iória
-..J"nia seus Ürtepas'
(
' cf. Bu¡¡co Aour¡¡o^, C¡rtos c( alii. IúJto tio social de lo l¡teratu¡d es-
ár:ua"ut conversos rnorto um dos
-
:ffi;;;;;;;Ja e§creve o Guzmdn' que (
pañola (eñ lentuo casle año). Mz¿rid, Castal¡tr, l9?8. p. 234.12, v. L lnquisicao -
(
( (
üi
( (
( (
( (
( (
(
(
(
t8
( ;
19
mu¡¿as ve?-es foi lido como
( uma slDtese da id€ologia da
rra-Xetorma, mas que pode Con_ tloze anos, seu pai morre e a família acába arruinada. En-
(
l |,j1,cria9io,
nunas
i;;; il ;;i:Íil',ii,?',1#,llli
escr
(
rotado cm negócios pouco orlilr."í¡""!i-
do i para Madri, No cami¡io sof¡e cruéis experi€ncias por conta
(
claro, o, ¡^"..rupüo-ü
( que se desempenh, uo dos donos das pousadas. Quando seu dilheLo acaba, deve
(
I^"_-,:Tt" ol
como juiz ^li_
i"i"r¿rf.,I".
I
(
;trffili
casou-se com ,_;;¡;;."#
:r'* náo
X,n'"T&'#.0f;;#' pa¡a :ezes
es,eia
pagar ";;;;";;
uma divida
Chegando a Madri, trabalha como ajuda¡te dc cozinha ou
I
"pícaro" e comega a joga¡ a dinheiroi rouba para jogar e
p¡111ir"r','.","a.*il#:il'rl[rJ"1l",,ill",jli,,;?,i- é despedido; trabalha como carregador e foge com um di
I
nhciro que lhe confiam. Fogc para Toledo, compra roupas
íi. jñ,;-
rha, vr¡á com ele á América
lao urexico¡
nca estava proibido aos criitaos e, i608. I
e pcrde parce do dinhei¡o. Vai aré Almagro, onde encont¡a
r¡ac¿ssaranoseui;,;;;;.ñ;r1"J."I j,Y,ili?#.iTÍ1"13 uma companhia dc soldados que viaja para a Itália. Decide (
roma-r¡¡r o cuidado dc prcsencear i i¡ com cles e enquaDto tem dinheifo maDlém amizade
qy. porrrt. em
previamente com uf¡ras
ca-
- -
com o capitáo. Depois ú criado deste c rouba pa-ra lhe dar (
Mad¡i o secret¿¡io ao Ri¡,
(
lT
üagem, o mesmo a quem clc
;i,"ii"
q,].t I dg comer. Chegam assim a Cénova, onde os parentes se ne- (
::,:iirl " ucedido
auroriza pa.rq im- gam a reconhec6Jo A vista de sua apa¡éncia pouco recomen- L
(
z0
71
a cumplicidade de Sayavedra. Váo para Miláo onde ¡oubarn tável, além da maior extenseo do relato e do iünerário do pro-
magistÉ]mente um c¡mcrciante Chegando a Oenova, engana tagonista, consiste na itrtrodugao de g¡ande quantidade de
os seus piuentes, rouba,os q cheio de dinheiro e jóias,
embar- narra96es secundárias (nárrativas curtas, contos, fábulas ou
ca para a Bpanha, Na viagem, Sayavedra cnlouquece
e se jo- exemplos) e di8fessócs de rodo üpo: principais (aurocrftica
ga ao mar Cuzmán chega a Ba¡celona e segué para
Sara. ou críüca social) ou secundá¡iar (ensinan§[to§, senten§ast co- I
g09A Alcalá e Madri, Nerta, envolve-se com uma prbstitura mentários ou definigóes).2 As digressóes, em geral, apontam (
e perde dinheiro. TFafica, enriquecc, comp¡a uma para um tom moralizante que pareceria ser a realizasáo do
casa. casa_se
com uma muJher que o deixa na ruína. Separam_se e ela (
mor- objetivo propósto para o livro em dois dos quatro prólo8os
ra Q.uzmán decide ser padre, vai par¿ Alc¿.lá estudar e já no que precedem á Primeira Pdrle, bem corío significañ o apa-
lim dos estudos con¡ece Cncia, Apaixonr _r" a *ru¡n-r" Ea I
recimertto da autocrítica c o ¡ecrudescimento da c¡ltica so-
Maúj, Cuzmán nada faz senáo comer, beber e do¡mü. Na rui (
bial introduzida pelo Lozarilhoi esta última ago¡a náo ape-
úa outi¿ vei, Guzmán cedc a outros sua mulher por
Váo para Sevilha, o¡de Grzm¿í¡ encont¡a sua máe Gr¿cia
dinheiro-
fo.
nas abrange todas as categorias sociais
clero
- deixando fora o
mas também se carrega dc um enorme pessimismo
(
(
(
(
(
(
( 2L
7X
( A estrutura Gonversáo?
(
( O Guzmtín obedece a uma clu.a simclria dc Pa¡ece-nos, entao, que a leitura do Guzmdn depende
seqüen_
cias que pefmitem supor que se t¡ata de
( sado para se fechar na conclusáo a"
,.
,orun."!.n_ do papel que seja aribuldo nele á "convcrsáo". A gran-
I
cialmentc, escr€ve su¿ui memórias com urna enorme dose de
O sentido do Guzmán pessimismo, de falta de esperenqa e de nogáo mais profunda I
I
( I
da relatividade que o cristianismo outorga á vida tempora.l (
I ,.id.o, com relaqlo A ete¡nidade. Nesse contexto, a alusáo ao dog-
I ,,_ .f:iTde crltjc¿ neo hó tugar para s e ve¡ o Guzmdn como
um-texto ma do pecado original nos pdmeiros capitulos do ¡omarr-
(
I morÁlizarte u parfi, au, ,"n"iOJr'a-."u,i
plca-ro arrependido; nem cc
-
podc ser cotcndida, como quer Brancaforte,¡ como a
ia* os"o,i,
como r -
(
r
GL-o;ili;
',".
rno a vistó i¡onica da sua socjedade
¿T;, ;:ñ'j*i:: Ji:"JX
alusáo a um outro tipo de mancha original, que condena o
individuo á insuperável marginalizagáo social: o sanguc do
o plc¿ro se integta através dos
cor,;;;;.á"";, ;;"0;; converso. E assim como náo há na obra nada que possa ser
{ (
( .iia,a. *iooÉo-u
"converso,', aponta
:H
o caminho
mÉ
li#?lh'ff ,*jff ::ff :" ,]I
entendido como autendco c¡istianismo, achamos que pode-
se falar nela de um predomfnio do que chamarlamos a "ideo-
(
,lri.o o" .n,.rj"'"'or-u
"tI."l i
{ ciedade: a acelracáó formal
dos princlpt;;;;;ilfi;"#_ logia do converso", que se contagia em muitos detalhes, in- (
mento dominante. E mais ¿inda. f I clüsivc em tlasos estilfstjcos do texto, Detrás dela está, sem
( (
;;;j;,;il..ffi";,i#:Iyr:H
':derara,',
;:Xlfiil::, dúvida, o crjstáo-novo que escrevc a parür da ambigüidade
( para_colaborarra prxervagáo a quc foi proscrito: Mateo Alemán conheceu a experiéncia (
do imp+r" 0."*
ol,r"roiJll l
é mais lógico tet o Guzmdn;_" ,,;;; de "saber subir" ao pre9o corrupto que a sociedade "cr¡s.
( Íll-Ti._*i*.,
oanga cána_va¡cscá em votta
i
tÁ" Ihe cobrava. E muito diffci!, senáo imgossivel, separar, (
( 1
como que¡ Branc¿forte.ó
da é¿ica e dá i.iioi"'*¡ra.;: ns obra, Mateo A.lemán do autor implfcito e cste do narra- (
Guzmá
t
.ra,am*rari,ñ;;;;:#Ll.l-"Tii:fi :ilff ...":x1l:
dor; e este ütimo nAo passa de um pfcaro que chegou a'¡a-
(.
Ambos denuncíam quais sáo os dráo, foi condcnado A galcra, dclatoü e ficou livre e agora
caminh",
cender socialmente. As farnosas ,.reflexóes
,;[;;;';;;"
*,;r. cscreve suas memórias com um sentido que parece morali- (
{ _;;i;;;::,
lidas com_cúdado e nesse contexao, zantc; mas que acaba nüma critica social impregnada de pes-
o"aa te_ ¿e sermao. éol (
mo quer Braacafonc, é posslvel ie-lr, simismo e resser¡timento. Estaftlos perante a paródia dos me-
*rn"'oi.i¡r,n" i,,jl, canismos de ascensáo social dessa época na Espanha, onde (
I
i' (
( i (
I
( i (
):
( O cavaleiro que caiu do cavalo ¡ll (
I
( ; (
( (
t;i
r, I
( (
lr
( l: (
( tl (
( Uma edigáo p¡rata l'
i. (
( 1626: é impresso ern Saragoga, sem a autorizagÁo do seu (
i
(
autor, Francisco de Quevedo, um livro que ¿ste escrcvere e
(
comecos do século. A primeira rodageo, de 1603 ou 1604, re- I
( ria sido re¿ocada entre 1609 e I614 e até entáo circula¡a em l;'
i'
(
( manuscritos dos quais tr€s chegaram até nós. O seu lílulo em I
(
espan]¡ol (I*.s¿o¡ra de lo t¡do del Buscén) tem sido reduzido i
( para El Buscén qre, na mais recente trsdugeo ao portuguas, I
aparece como O Goluno, Da nossa parte preferiremos fazer i
{ i (
I ¡efer0ncia a ele como O Bltstdot consciegtes do acologismo
( que, no entánto, achanos traduz melhor o seirtido do origi- I (
( ia1. Cofi O Buscdo, fecha-sc o t¡ipé das obras que compoem (
o que chamamos dc "núcteo" originário da plcaresca clássi-
( ca espanhola. (
( I
(
( I
Ouev€do (
( (
F¡áncisco de Quevedo y Villegas nascera de familia no.
( brc, em Madri, no ano de 1580. Foi educado no padreó da I
( (
( (
( (
( (
( (
I I
ft¡f, trrt r;r'iirrl¡ '¡¡'¡1¡¡, Iltrfl.flfir¡(
t
l1
30
tc, Pablos consegue havcr do scu tio 300 dos 400 ducados gas dos quais Pablos lcva a rneior das surras'
Vende entao
:i
deüados por seu paí e,decide partir para a Corte, isto é, ".1* Á",
irtJ faz-se mcndigo prorrssions'l e ganha o ba§-
:l I
la elegante aparéncia, julga ser um distinto fidalgo. Logo a*ro, plr" u ararever as pcgas fePresenta¡n e a ganhar
quem rou-
,l
descobre que o companheiro nada tem, a náo ser os seg- áio-u.irá ¡ro. cofeja depois uma freira' de :t,l
"o, itii, (
mentos da roupa necessários para parecer vestido. Assim ürl p*üp*" stvilha.'Pelo caminho, vive graqas üs rra¡a' lr:
jó: de A-lca- t,.,
flagrado, dom Torfbio confessa pertencer a uma comuni- üi "iá Ao chegat, encontra um artiso colega (
pfcaros e rufióe§ Beba'
dade de fidalgos quc, em Madri, fingem ter para assim so- lá oue o apreseRta a outros amlgos
dois g-uardas' viro rufiáo e decide
iii (
b¡eviverem as custss dos amigos que fazem, Já em Madri, :i";, ;#;;;;ioando sotte Mas'aca'
( Pablos se integra ao grupo até que sao descobertos e veo nassar-se A América para ver se mudava sua tll (
quen:
(
todos para¡ na cadeia. Pablos suborna o carcereiro e o es- ;;áL;;, "foi pioi, pois nunca melhora seu estado
o
(
1
criváo e, ao costrário dos seus colegas, ve-sc livre. lnstala- rn"¿rl.iátü a'" Iuiar e nao de vide e costümes"' ilii
( ,t
se nums i'ousada e aparcnta se¡ um rico senhor, tentsndo (
( aisim conqústar a filha dos pousadciros. Mas uma noite, i|l
I
tentúdo ch€gar onde ela estava,. ca¡ fi9 telhado da casa dc A originalidade ril
( um escriváo viziuho e acaba levando uma violents sufia e
vista da d¿ma. Depois, J]¡ge ser práo pcla lnquisigáo e, a partir dos dois textos an' rl
O BuJcAo é uma obra esclita
na sfntese
assim, consegue deixar a pousada sem nada pagar e levan- ,*. Mas Quevedo conscgue ser original
do os seus peñences. Decide entáo irivcstir na procura de i. "n-rlir"a*.
,-bos. Do Lazarilho ¡oma a fo¡ma condensada'
o oesrl- iii (
digressóes e certos tipor co-
um casa¡¡ento proyei¿oso. Arrums roupas e a.luga um ca- i"t¿rio tlorr.¡*, auscncia de
(
" de Maqueda e os tloar-
valo. Finge ser rico, conhece dois cavaleiros e depois duas mo Cabra - inspirado no clérigo - i
( mogas mais a máe e a üa destes, e convida todos para me- ;;. ;;á* - ;"IüplicaÉo e pa¡ódia do fídalso toledano' .l
renda¡em no dia seguinte na Casa de Campo, nos arredores ";; á;;;;
'r.áánárt poáe'seientii o peso no internato de cabra - i
I ds surras'
de Madri. Nisso estando, aparece dom Diego, seu artigo ui, a. alcalá -'as pousadas'! 8§ cena¡ :l
muitos
( i arnot que é primo das mocas e que'o julga parecido com ;;;;;; ;;'.;;anta, os ralsos pobres'. bem como
nobre' Jaz'
o sem-vergonha colega da infálcia. Voltando para casa com ."iiot ¿.,rri.r.t O próprio Pablos' fingindo'se
os dois aEigos,'joga trapacciramente c gan¡a deJtes coisa ;.1il;;;;;;{Ñ'o a" Guzmán' o caráter autobio-
é possjvel
de 3Q0 reales, Mais tafde, na casa de um vizinho, finge ser oot textos auteriores persiste' Mes agora (
um fradc c depena outros no jogo. No dia seguinte, náo ".¿i,"i.ttii"iaiar¿c expl(cin do rcct[so' na medida em que
i"t'u
achando cayalo para alugaJ, toma uñ emprestado para se á-ni*J"ita" .. de contar fetos que o protagonista
exibir peante uma das damas, doua Ana, mas é derruba- "uida (
do pelo.animal diante desta e de dom Diego. Para pior,
logo descobre ter sido ¡oubado de tudo o que ganha¡a. E ñIfiliIn*o o.r,a h.rsnca dc o r¿ic¿o DodE 5r v'r 'm ctos' E Ir- (
acaba descoberto po¡ dom Diego que contrata uns capan- H+Hn.jI:"#ffi :r"l',i"f;:u'J,'"u,1fl ;§!:í'Y;":'u^' (
(
I (
( (
{ I
(
(
I
I
I
I
]') (
37
I (
obra construida apc- !
isto, pode-sedizer que O B!ócrioé.uma I
náo conheceu ou p¡esenciou. A maior identidade dos tr& tcx. onde ela própria elabora os refe- (
tos cstá, sem dúvida, na figura do picaro e, particularmente,
n^ Ll, .iru ¿u li"á'agem, I
I
rentes neccssários para sua leitura' I
em que ¿s tres estabelecem um mome[to pata a conscienti- I
I
ffi ,";;il:,,r."-.*rñ..,-".:rfi I
rinha dc aristocracia presente na figua de dom Diego. O
Euma co¡sa (o dinhciro
gsnro em ü1i".:ffi"'.:",$"; I
através dos "tipos" --
resto é uma imensa canalha cujo p¡otótipo é Pablos. E da' trc' ;t
:;'i,#;i;, é i;i"*'i'i'u ,
tanta sádra flcám claros quaudo vemos a preocupagáo de que o introduz na comunidade
mcstre dessa fic§áo, o tidal8o
Quevcdo em caractériza.r Pablos como um descendente de
cristeos-novos que tem prcten§des de cavalei¡o.
:i:fi l"i** il*i,*e' Á:
$:^1:l?óIXIB:H.""tJtr
outra maneira: tcndo alguma cots (
O rccurso satl¡ico de QueVedo é basicamente a cari-
catura- A mesma deriva da hcorporagáo dos recursos es- ;;i'ri##;1.;;;;¿ry*:::TIIi:?á^*T:J,':':1"1
al (
rlllsficos do conccptismo A sátira pica¡esca. Destes recur-
A esla sc.segue
falsi ficcdo. - finge ser nobre;
verdadeira qua¡do Pablos
I
( ¡ tuen"i" da r.goo (
sos, o mais notável e freqüente talvez seja a hipérbole, que tc' mu'ro pa'a obler mais' Paralelamcnte
cria a desmesura ea despropo¡9áo básicas do grotesco: Com
;#;;"*á'-l;;t (
(
(
( (
(
I I
(
l
34 ti I (
l5 ¡l
i I
a anbas, pablos passa de
ter reálmente alguma coisa lr I
cessivamenre tanhando e perdendo.aré a ir su- nesta obra de Quevedo um dos seus pootos culminantes. Ne-
#;;;;*-", (
sJgru_Ica, em oukos tcrmos, passar
de u, a.rto poOr, ,á "pui-j
,* la, um universo de falsificag6es se superpóe permaoentemente
il,
oe v¡fJm8 maior. á realidade. (
Talvczé nestc anticlÍnax (
_.-
rram ser jogados
que euevedo acharja que
dcvc-
¿odos os que indeyiOu..ot, pr*"]iiJr"- A sátira soc¡al li (
subir._¡vlas parece fazer questáo
caírnho
de
ascensional posslvel para
mos;;;"i*j#iliJ; li (
um efcffo;;;;;;;u:j;
'. nao aponta para os pe,s:rmentos O texto de Quevedo prescinde das reflexóes do Guz-
(
de cavajeiro üri.ilrl;:; mdn, Mss, ao reduzir-se A fórmula lazarilhesca, náo fica
para a concreüzeÉo ti
do propósito dc s€r
orriT, seqüencia seguinre _ " il;; d* ;*.i,.h..*
a.
em tipos sociais. Assim, a sátira náo tendc e abstragáo mas (
..,_. o final ao ¡iuro _lo]r_ decorre dos fatos nerrados e dos seus pfotagonistas, sem
rem a evolugáo da personagem
( a¡ravés de rr".rri"* ¡l,l_ formulaqoes explÍcims, a náo se¡ pelo toque da caric¿tura {
l¡cado prcjíssional aié o estágio d.fi;;;tr"'l;
1as -d.e que 'em
-tcaao, é, úlüma
*_r_ onipresente. E ao leito¡ a qucm se encomenda agora expli- (
instár citarnente a tarefa de avaliar o universo de Pablos pelo co-
!¡.o1arque,ir;';;';,#iXl"'f;.""T',#'j,0,,"",'ff :",.: Dhecimento das suas picardias. Este universo abrangc uma {
! rra tcr Dretendiao sair, Neta
l vcmos o plcaro
O;" ,;;;;;, enorme quantidadc e variedade de personagens, algumas
s_e,. baseando.se na sua própria
ra:so mendigo,. depois como
re¿Lia'ade. l
das quais ganham especial relevo, talvez devido for¡e ca-
"l*"ji".i"ril'
ator (ou seja, fiü;;ri,-:;:
p:.,? (auroi de ficgdes), como
ricatura que em si mesmas constitucm. Nessa gale¡ia no-
tarnos mals uma vez a ¡elativa auséncia dos clérigos, co- (
l :1to
ra). até chetar bandido, -nao 8ará!i;;;,f;.
fingiao ,;;- mo no Guzmdn, Neo há
+
g]r: é, agora, pára
qua-nao ¡á il,.;;; - como havia no Lazo¡ilho -
personagens quc encarnem a classe daqueles em si mesma; I
euevedo, o que sempre [oi. Ao mesnro
tempo, passa dp nada ter a ncm a formageo de Quevedo nem a ideologia dominante (
a.sirr¿u, ¿i-uhu'i;;;ü.6e;:
já, nada precisa da Cont¡a-Reforma permiririam isso agora. Mas a classc
:1.j,.-" l.fiág fazer para sob¡eyivc¡; e aso-
(
[ ?rjfl'#ii:o;l j""j ;,il ;; ; il ;i*#;: dos fidalgos e as suas preténsóes ascensionais já
- sati-
I ll ?i.í. ¡lzadas no Lozarilho
- sáo agora um dos alvos melhor atin- (
fi.9Aq denrro da ficgá-o, que permire gidos mediante a multiplic¡9áo
,^-_:1:
oesmascar& em sua pe¡-sonagem a euevedo
dos scus membros
- inte- (
os indevidos ,,il.;;.;: grados nurna comunidade
- e meüánte a sua ba¡¡oca re-
f.os de cavaleiro,,, é um
mecinisn dugAo a serem apenas a apar?ncia da aparéncia, quando (
rexto rircrário . i;;;;;..á;;ilfi J:' ;:11',rJX: :::: j nao ap€oas fingem, mas fingem ter com que fingir. Mais
t
ainda, o próprio pfcaro que nada tem de frttalgo po-
;:l,H:ü'ff :1'Í?t11"::1lT:'J:i:i#,*lt*iyi-'f* -
de sc confundi¡ com eles.
-
{
Neste unive¡so de plcaros a que Quevedo reduz a ¡ea-
-lidade inferior á ajistocrecia podemos assinalar dois aspec. (
de Dosto¡evski, Rio dc r.rciro,
i,::{;l';.'ar:i{: Forcns. univc¡sirá. tos dorninantes nas personagens e que sáo o alvo funda- (
mental da sátira quevedesca. Tais sáo o poder do dinhei-
{
(
( (
( (
(
(
I i
(
(
( ,,
l 31
j (
( lú
obras
(
( o seu cllmax. A§ :l
ro e a vaidade. Pelo primeiro, a, maioria das personagens o lomance pica-resco tr6s nar- (
E com cste atin8e su perá -las, as
( podem ser catalogadas como ¡adróes, avaros! cor¡uptosr as imitariam, sem
posteriofes esPan hol de tr& Perspec tivas
diferen-
(
c onta,
{
trapacei¡os, estelionatários, falsilicadores, inescrupulosos tivas eú que o plcaro que qucr subir a
ou gananciosos; pelo segundo, temos falsos, mentirosos, his iória de marginai (
tes , a srla anti-heróica
hipócritas etc, E !evc-se em conra que os üpos mais freqüen- qualquer Preco (
tes sáo aqu€les vinculados jusLiga, do carrasco ao escriváo,
A
I
passando pelos guardas, carce¡eiros e oficiais de justiga, to- (
(
dos corruptos, (
( Em síntese, para Qucvedo, fóra a aristocracja, o mun- I
ciada-s
- a enorme qu¿ntidade e dispersáo das obras que po- t: {
( -,
( 5 dem ser aproximadas desse modelo dificulta reuniJas sob o
mesmo ¡ótulo. Mesmo que nos limitássemos aos dez€ssete rex-
I
fi:
tr
I
t,
( tos clássicos espanhóis, as sensí\'eis diferengas ex¡stentes en.
(
O
que eum tre eles provocariam diverg€ncix.
Em segundo lugar, náo é fácil estabelecer os critérios a
II
I
t,'
(
40
¡ (
soma de ob¡es , [las algunaJ obras iublicadas oesse século e no seguinte na Amé-
deve ser v¡sta c omo
b) é imprescind fvel esfabelecer um intertcxto (
p erJodos pa¡a rica espanhola. Em fins do século XVII e durante o XVIII, ,1
I
(
( num cefro ,ipo a. air.rr-rr]'w uE um ce¡lo tipo de hisrória
i (
rá se reservar a designacáo de pora-picarescos o\i pora- -
(
( {2 :
(
Por out¡o lado, deixamos fora, conscientememe, duas E os corolário
( áreas nas quais caberia estudar a presenga do pic¿resco. Por
(
em relaqao 8o ¡¡¿¿'
( um Iado, a picaresca populaJ que, na verdade, é o preceden- Convém que amplitT::,:'1:ifttt'o
le da picaresca culta que aqui nos ocupa, e que continua a
( I
prolongar-se no folclore. E, por outro lado, as fo¡mas ¡ela- ::::j-JxixiÍr::;,t'j'#ñ:i:iiTlilLx":H""'l'"":"
( cionadas com e picaresca e detectáveis em outras artes, co- ',,#JLfu
(
mo o teatro, o cinema, a pintu¡a etc. ',',.üli"l""*'ü:.:llilHtilr:fl?t t
J
(
( :"";":r,?# (
( Talvez assim (
ililx,1l*"ii$ü,1¡- tq"H::*.i"i*"
( Como defi¡ir o núcleo lmerleitual originário? Nós o ü"ü"ü1i"3i[: (
( enLeudemos como scndo a pseudo-outobiogrqfia de um an- :ft i,lit;-"'#i:i'*g:*:";f (
ti-herói que aparece deJinido comb morginat'á soc¡edode; 1".::"".1:X"j,"Ti{ff"Titi,lT.',;;!i,l,Ti.'.'iig::I,ü
( o narragdo das suas aventuras é o slntue crílic,o do pro- (
( cesso'de lenlali\a de ascensdo sociol péla tropdla; e nessq (
(
nsrrugño é tragada uml sdlira dd sociedade conteüpord- ll,'trí?.tJtiii'Joa"iu'u'ooo,"'n!'ui:l"J#:JT; (
nea do plcero,
( Tome-se isto, se asaim se áuiscr, como uma l.entativa de "''?'o,uoo r"'"1Ti':,i.?::::'"^?,""X ÍiXiX iHil"i: (
definislo, apl¡cável e totalididc dos romances pi'carescos e
( neopicarescos. A. principal observagao a ser feila será a de
(
(
(
que a evolutáo de lioguagcm nar¡ativa levafá a que nem sem-
pre seja mantida:a forma autobiográf¡ca que, muitas vezes,
poderá ser substituida por out¡os lecurcos naffadyos, sem que
r*$triiqss:*l¡#*iH; (
(
( islo leve a rejcitar o caráter picaresco ou neopicaresco do 1,.
(
(
texto.2 1
f"J"':{'3:i;:#l"x]r,,'i¿t:fuff
:h{lit*'""'u"; (
(
i
rut*:*kiü:li*::::"::",::',:ri*',.r"'[ i (
: Lcvc.sc cm conta quc dan¡ra os qu¡aor¿e ¡omancas quc cosrumañ sc! in.
( a¡uld03 no quc chsmaño, erpcñ¡do cldsslcd eJpor,ro,lo oads manos do quc
jl
(
c¡nco .sldo !¡n tlrcc¡ra ptr!os; ou¡ros (rés apra!htanr a priñlirÁ pcssoa
( no mErco dc umq (arcaira: c um dc)cs utiliz.o a forfnE dialogada. Assirn srn, (
(
do. c para rÁo cxcluir da picerarc¿ o quc scñprc foi cntcndido cornb parre
in¿gdvcl da ¡nrt¡¡B, podar-sc-is ai¡da sc pcns¡r r¡a rr¡bdivis¡lo cm piÉr.sca
:l§ii""=ffi üü:llil'i{}ll;;iig3¡':";i"'r"i (
(
dc primlira c dc tarc.ira p6so¡, scndo qú! cabüia cat8log¡r como de p¡i-
mcira plJsoa rqucl$ rerto3 cm qlc é r$an¡ido o Donlo dc visr¿ do picaro j"*I:mn"u : s; (
(
n¡ nar¡aliva. **t'r***hxlx';J# (
( (
( (
( (
( (
( (
I
I
I
41
(
outra parte, no século XVI, a maneira de se ttansgredir a fó¡-
mula do na¡rador onisciente. Mais tarde, quando o romance
vier a dcscob¡ir outras maneiras de se apresentar o testemu-
6
n]Io da realidade, a própria forma auLobiográfica será trans-
grcdida. De fato, dentro do próp¡io núclco n¿o há um trata-
mento homogeseo da forma autobiográfica: enqua-nto no La-
Quand o os pícaros saÍram
za lho a molivaiáo final do texl.o (o prolagonista nara a sua da Espanha (
vida para explicar a sua situagáo presente) faz com que haja
um pe¡manen¿e e unico ponto de vista para uma única fábu- (
la, em O Buscdo há vários momrntos em que o protagon¡sla (
narrá o que neo podcria saber. No meio, temos o Guunán
com váriás histórias intercoladas, que integram na¡rado¡es (
de terceirá pessba. (
Outros aspectos da história na¡rada no n tícleo incidem A Europa loda ó uma Picardia
( no discurso utilizado. Assim, a aven¡ura impóe a tend€ncia
O fenOmcno do romance picafqsco náo se liñiul ia
á Es-
( ao folhetirn e faci)ita a conexáo com o rapsódico. Por suR (
panha, onde suns ñanifcstag6cs clássisas tqrminam com 0
vez, a trapasa atinge o leitor ua med;da em quc a motivaseo
* auter'
real¡sta da ficaáo prc¡cndc lcvá-lo a ler o texto como um do- Ip"r..lt."a á. Eboniuo Aonzdlez talvez uma
- me-
cumcnto verld¡co. De outra parte, o fecho das avenlufas ¿ tica autobiografia, em ) 646. Fora algurnas manifesta§ócs
col6nias e§panho'as na
tarnbém uma trapaqa: Lázaro, no fim, neo é menos picaro nos significátivas na literatura das
e que náo podem §er catdogadas como roman-
do quc quando furtava pees; agora é um "homem de bem" arn¿tiLu
-
durante os séculos XVII e XVIII, vários paise§
euro-
- ou seja, parccc se{o - mas é teo desoncsto quaDto os seus
imtigos amos. Quanto a Cuzmán, bem pouco sério parece
ces
-
oeus veráo su¡gir alguns textos que significam claraflente
a
ser o scu arrepcndimonto final como já vimos. Se¡á Pa- imitacáo da fórmulá narrativa o¡iginá¡ia da Espanha'
-
blos o único sincero; ele conúnua sendo pÍcaroi os outros dois ó primeiro dcstes texlos aparece na Alcmanha' Trata-
estendem sua picardia até essa menti¡a final. t ," ¿"b[, iuiii"r"rliche simPticissimtls (o aventureiro
Sint',
Christo.llel
Quanto i sátira social - permalente nas trfu obras -
publicsdo pelo seu Eutor, Hans
Dl¡ciss¡rn ns),
(ló21?-¡6?6) cm 'acob
Nurembcrg' em roo>'
cabe insistir em que o pícaró é a paródia do pfocesso de as- von Grimmeishausen
censáo dentro de uma sociedade que rejeita os valores da bur- ü; ;;;;;;.;";c"ie c'im-eishausen, Publicado em r670
guesia e onde o parecer tinha prevalencia sobrc o ser, Assim
( sendo, o picaro finge do comego ao [im scr o que neo é; e I A rcspsito do sirrPlic¡§itnxJ, b.m como da5 restanles obrar Quq inclulmos
denuncia com isto uma sociedade cujo comurn (lenominador no ouc chamBrnos Plt¿¡escd ¿x ád¡¿. ¡odc+<
consultar o livro d' Parxt'-¡'
( dit¡nqne,¡t Edt¡bul2h, Xd inbu¡ 8lr Uruvc¡5tL)'
é a hipocrisia. AJeta¡dc¡ A Lteraure o¡d thc
( Pr€ss, 196?-
(
(
{
(
(
(
t
(
(
(
( ,tl
(
Á6 (
a burguesia já apar:c: (
( com o tflulo d€ ¿,¿ Londslórtzer¡n Courosche (A viyandeira senrada como contexto do Plcaro'
' ;;;;; entre o p11t--'
Courasche), é também um ¡omance que deve ser catalogado classe social que ocupa o espa§o (
( um mlr-
como picaresco; com a particulsridade de que, ao ser uma o pt*ro aparece'¡ normalmente' como
mulher a protagonista, inscreve-se na l.inha iniciada por ou- "iiiiorru.la. l¡" orerece caminhos de integra- (
( ;il";ü;ilu-ü;'úó' ascensionais por'ela
(
lro romance picaresco clássico espanhol contcmporaneo do cáo social próprios dos mecanismos plcaros selam
(
Guzmdn: La plcara Justind, de Francisco Lópcz de IJbeda, ffi";#t:^;';:;ideta'ucm norma quc os
( que inicia uma conside¡ável gerageo de pícaras. i."rp"ruo*sua marginalidade' Com
isto''parece- (
em re'
Como na Alemqnh4 a influ€ncia das radug6es de roman- "iri* rrü-",auelecida uña diferenca substancial (
( c€s picarescos espanhóis provocaria na lnglatcrra o aparecimen- ;;1r' ;
"a"'ir" ;i;,;;. clássica esparhol4
" #fi Í"rl;: ;"ji J ::; (
( to de obras do mesmo ginero. Assirn, eDtrq 1665 e 16?1, Ri- gável o Parentesco que, em mat I
( Methor consideragáo merece The liJe snd death of Mr Bod- No Méxieo, anos rna¡s tarde (
ñan (1680), de John Bunyan 0628-1688). Porém, o [e\ro qug
náo se escreveriam (
( na liter¿tura inglesa desses anos, melhor se aproxima dos mo- Na Amé¡ic¿ de lingua espanhola no
( delos espanhóis .da picaresca é Motl Flanders, publicado em ,r*"*.t áiJ'o.eculo ilx' o primeiro deles aParcceu por
em I8l6' (
1722 por Danicl Defoe (16601731). O mesmo auto¡ publica no ü;;;;:;;t*.s trés primeiros volumes -
( de Lizardi c lcva o tílu- (
mesmo ano um segundo romance que deve cilar-se no rol da iil?'0". :"ii1""Áuin fernánd-cz volumc só vcria a
(
picaresca inglesa: Colonel Jock. Ma.is tarde, um outro aütor ii'i. ói"rin",tti ss iento' o quano
lsto rez com que o
(
de todos picarescos na Inglalerra é'Ibbias SmoUett (l?21.1?71) i;r';r" lE;rl;* runs¿o da censura notas (
( s.aot de Roder¡ck Rdndom 11148) e dc The ldyentures oJ Fer- .á,.t, st in'o'po'ust" ao texto mediante
dinond Count Fathom (1751). Coutemporánco scu é Henry *" "*r"'¿t",
de rodaPé. (
(
Flefding (1707-¡754) auto! de The lde oJ Mr. lonathan W¡ld
'-ilrir.tru .trtcza quesc tem na leitüa
de o Periquillo
( modelo
q" ób'u se filia claramente ao diferen- (
the Oreot (1743) e de Tbñ Jones (1749). srrn'¡"i,i' i-i'Ái " mcsmo que com-as (
( Já na Franga, o impacto das muiaas tradugóes dos tex. iílrt*táá .llirü espar¡hola' desde o apogeL:
tos espa[hóis, bem como o fato de a.lguns deles terem sido Il.ffit;;t;;1f,¡f!¿gv¡s5 tra"scorridos
tanto é possÍvelsentir aimi- (
( editados originalmente nesse pafs faráo com que, apesar da :::#ffi;;;.Ñisse senti¿o'
do-Guzm rÍn (
rejeigáo do romance como genero ütcrário próp¡ia do reo. ii¡o,-.* *ui,o,
(
classicismo, surja um lexro bastánte próximo dos modelos "specros'
oerceber que o universo do roma
1!r{í{{"t:;;:\Z
( se aproxima daquele ex- (
espanhóis. Trsta-se de Histoire de Gil Blqs de Sontillone, pu- íilrr" ]iv'lli J' ,n¡s concrelamente'
blicado por Alain René Lesage cm tr¿s par¿es nos anos 1715, oosro no Gi/ B/¿s de Lesage
uma outra obra de Lizardi' Doz (
( alguns' as'
1724 e 1735. ii"
'áiir,, rrii"n¿a (íat», rccupera também uma tmt- (
( que haja nela
O que talvez mais impor¿e advertir sobre os romances ;#; ;; p]á,ttt"
"t¿,,it"'
mcsmo
(
( acima rcferidos é o fato de que, na sociedadc por eles apre- iagao ctará do Auixote de Ccrvantes'
(
(
( (
( (
( (
(
(
I
( (
( (
( (
( (
( (
49
( I
,]l
(
( A história deste pícaro moíc do Aguilucho *chefe do bando e antigo contecido (
( seu num assalfo, leva-o á reflexáo. Depois encontra Ja-
Pedro.Sa_rmienro - (
(
, _
de Periqui.llo Sarnienro-_que na escola iria receber o apelido
é o filho de uma famíliu;;'"-1";
nuário
- que anos atrás o iniciara na picardia - enforcado
por ladrá0. Entáo, Periquillo dccide confessar-se. AJrepen- (
média.mexicana, que teria nascido po, voltá áe i;;;i;;";
( dido, consegue trabalho como administrador de uma pousa-
que.iria- morrer em l8l3. Narra sua (
vida numas .emOr¡as da e comega a tentar rcparar os prcjulzos ocasionados ao lon-
( desünadas ¿ educaqeo dos seus filhos. N"l;,
;;;:;;; go da sua vida. Casa e tem dois filhos, Adoece e entrega os (
Periquillo- vai scndo desviado da condute qr.'lf,i"¿
( pela sua classe, gragas á influ8ncia
..ii"ál cadernos das suai memórias ao "Pensador"
- personagem (
de amigós j¿ ma¡giJizal que idcntificamos com Lizardi, o autor do liv¡o, Este narra
( dos e que, nesse senrido, sáo autanticos
cs¡uda e acaba ingrcssando num convento para
;i*'.;;:;;;; a morte e o enterro de Periquillo e publica as suas memórias. (
( náo traba_
lha¡ uem ser sotdado. Mas, á morte do pai,;ai (
ao .onr.ot
( e csbanja¿ hcranca. Após a moñe
da sua mae, c¡ em ct eio Uma ligáo de .burguesia (
t=icaraia até dar na cadeia, da qual é liberaáo por um
( ]l
cnvao cor¡upto. periquillo passa a servi.lo.
es-
(
Depois, é criado O autor de O Periquillo leva ás últimas conseqüéncias
( 0c um barbel¡o, de um boticár¡o e de um
médico, aginOo 5s¡¡- a sua intencionalidadc didática. \4ermo que af ¡esidam algu- (
( l:,llTi*il^.""fe. euando fica na maiór mtseiia, ganha mas das maiores contradigócs do livro. Asslm, por mais que
no Jogo e cala-se. Sua mulhe¡ mo¡re periquillo (
e virá ipren. o autor se esforcc cm mostrar a maldade do Pe¡iquillo, este,
( diz de sacristeo. Expulso, integra_se ouma
companhia de fal- na verdade, Suarda escnipulos e sentimentos quc sao do nar- (
sos pedn¿es, E descoberto como falso
( cego; mas ganha um rador, ou seja, do plcaro arrependido. Vemos que o autor
emprego público c age corruptamente até (
ser co¡üenado a diz como sáo as coisas, mas náo as mostra sendo dessa ma-
( scrvrr como s-oldado nas Filipinas. Após (
as Feripécias da via_ neira; ou as mosúa sendo o oposto.
( 8em, passa oito anos em Manila a se¡vigo d" um coronel que
Estc didaüsmo a qua.lqucr preco vem do enciclopedis- (
o ret€nera, ao mcnos tempotariamente. periquillo
(
enrique- mo que informa a ideologia de Lizardi e da idéia de utiliza¡
cc no comércio e, tendo herdado parte da foriuna (
do céro- o modelo picarcsco basicamentc ó O,rz¡n lz lido como texto
( n€I, in¡cia a viagem de volta para o ¡ul¿¡co. f"la,
i*iraá -
moralizanle. Desse modelo, Lizardi toma algüns aspectos bá-
e chega a uma das ilhas das Velas ou dos (
( faarOes, on¿il sicos, como: a auaobiotral¡a¡ o anti.herói; as reflcxóes críti-
proteSido pelo irmáo do vicc_¡ei. Na
c*tr;;;;;
ith", o,
coT os curopeus. Den(e estes, a re¡eigao ao traUa-
cas; a inscrgáo dc histórias
- quanto ao diseurso. B
-
quanto (
( llast_am A históda o papel de criado: a rejeiqao do trabalho; o mi' (
lho é especialmlnte criticada peto vice.rei, É".i;;ill".;;; -
to da apar0ncia c o arrepcndimento do picaro, que, em Li-
( passar por conde e volra ao México (
com o seu protetor. Este zardi, náo apresenta contradicóes. O modeto gue se oferece
( fica ¡ico no México e descob¡e a menrira Oe pcriquillo.
dele o adminisuador dos seus bens. que periquilio
iaz ao picaro como a sua antltcse é também o do "homem de (
( esbanja bem". Periquillo quer ser um "homem de bem" sem traba-
até acabar roubado e surrado na rua. Tenta
o suicídio sem lhar. E o romance está escrito para provar que isso é impo§'
(
( consegui-lo e termina r¡nindo_sc a um bando
de ladrócs. A sÍvel. Esse "homem de bcm", contudo, aparece agora vilt' (
( (
( (
( (
( (
I I
(
(
( i
( 5l
I I
50
I
(
culado já nao á robreza, mas é o cixo da burguesia oposta ¡ ra este venha a sef um corolário do liberalismo - a ponto I
(
i. a¡istoc¡acia que é menosprezada *
e á pobreza "píca- de rejeitar a guerra da independéncia por set uma guerra - I
(
-
ra", Periquillo atinBe, após seu arrcpendimenlo, o que cha- I ou talvez por medo da repressáo. Lizardi, como seja' lern as
raizes na Éspanha, e assim, ao escrever o primeiro romance
I
ma de "mediania honrada", na qual náo deseja a sorte dos
hispano-amJricano imita claramenle uma das mais tipicas for'
(
senhores ricos e poderosos, O "homem de bem" tem agora, I
(
maiores rnudangas em relasáo ao modelo clássico. O Peri- No tempo do rei l
(
quillo náo é tanto u¡n ñafginal á sociedade quanto um mar- it;
Alguns anos dePois d o mexicaro Periquillo, uma ourra
I
( ¡iinal á burguesia cujos mcios de ascensáo social elc rcjcita.
pcfsonagem se prestaria a ser lida como parte da galeria dos
lr
Essá burguesia que aparesá se apropriendo de mui-
( -.mesmo o Lco-
tos dos valores da aristoc¡acia propóe um modelo antia- pícaros que povoam a liter atura Referi
(
-
rislo$ático, no qual o rrabalho seria recurso fundameDtal e nardo, o protagonista d
lir
(
válido, Talvez, como mDito bem aponta Nóel Salomon,2 I ciar, de Manusl Antonio de AI meida, obra publicada como
a maior originalidade de O Periquillo esteja na crftica náo folhetim no "Pacotilha", o su plemento dominical do Co¡-
( já das class€s de indivfduos, mas do sistema; sistema €ste vi- reio Mercanril, do Rio de Janeiro, entre 1852 e 1853' (
gente no México a partir da extcüsao á América do modelo A catalogaqdo de Leonardo como picaro vem de Mário (
(
espanhol antiburgués. de Andrade e seria ¡etomada por divetsos críticos até ser con-
( Talvez ai esteja o sentido ma¡s independentista do livro, iestada pelo mestr" Antonio candido no seu rnagist¡al arti' (
sentido que nao apa¡'cce, no entanto! expllcito, quigá cm ra- qo "Dialética da malandragem (Caracterizacáo das Memó'
(
I záo da ame:ga que a censura significava. O Periquillo, co- ;ios de um sarcento de milíciai)" . Nele' com toda razáo' An'
( mo texro, está si[uado num México que ajnda é Espanha, nas tonio Candido aponta que nem o Lazarilho de Tormes \em (
(
suas instituigócs e como col6nia, O protagonista se vé a si o Estebonillo Gónútez influlram diretame^Le cm Meñórias rl
(
mesmo como espanhol, E o romance é ponador da ideolo- e aceila corno posslvcis as "sugestóe§ marginais
de algum ou'
rro romance espanhol ou feito a maneira dos cspanhóis, co-
I
( gia liberal que, na época, info¡mava a oposigáo ao rci Fcr- I
(
ao o.orrau poi toda Europa no século l? e parte do 18"'
I
(
(
(
I
I
53
( (
(
(
( (
( (
(
(
(
g ss
If
dc ca.¡alaria, E Me¡nórias se inscreve numa tendencia que,
disgregando-se do romantismo, aponta para o reslismo, isLo
é, o romance de costumes; da mesma forma qoe o Lo4rilho
em comum que plcaro e ma.landro
aventuras
-
e a narragáo de suas
-
possuem; e elas, em geral, se explicam em fun-
qáo do diverso momento histórico em que ambos apareeem.
il
li,l
inaugurava uma nova manei¡a de na¡rar. Assim, a primcira difcrenga claramente visÍvel é a narra-
gÁo d,e Memó¡¡ds em terceira pessoa. Além de que esta forma
jáaparec€ denüo da própria picaresca clássica, parece-nos que
il (
esle esú defiDido como seado incapaz de refletir sobre seus til (
Tal discu¡so é ponador náo apcnas da biografia do ma- próprios atos, seria ilógico sup6Jo capaz de poduzir o dis-
landro- Este aparecc situado num universo de personagens curso a.linhavador de suas aventums. O pícaro chega aqui a va- [if (
igualmente halandfas e quc, sem dúvida, superam LcoDar- dio absoluto e c¡¡cnte de toda conscitncia discursive. Antonio (
do nesse sentido. Toda a sociedade aparecc apoiada na astri- Cándido vC csta inconsci€ncia da persoDagem como sendo fa'
cia e na trapaca, ao pon(o de sü posslvel uma sjntese da or- (
ciliiada pclo n¿rrador dc ¡erceira pessoa, precisamcnte
dem e da desordem, como n¡agistralmente demons¿rou An- Dessa mesma incapacidade crftica da personagem, que (
tonio Candído. Nesse sentido, quigá nenhurna petsonagem a impede de se narra¡ a si mcsma, derivaria a sua náo rcjei-
dc Memór¡as se sat'lc de poder ser visla como um pÍcaro, Cria. 9áo da sociedade. Por sua vcz, a incapacidade crític¿ de l.eo-
se assim náo apenas um ambiente picaresco. mas uma socie- nardo de¡iva do fato d€ náo ser como malandro pro-
dade picaresca onde, ao lado de Leonardo, outros aparccem duto dc um conflito social como
-
o pícaro', ele nascc
-n¡alau-
melhor definidos como malandros; assim TeotOnio, o Toma- dro numa sociedade onde a malandragem produz a sintese
:
Largura, o Caboclo etc. em qüe os confljtos sAo diluldos face á auséncie de va]orcs (
;
Nessa redugáo da sociedade a um universo picaresco cs. absolutos que possam levat a colocaqóe§ maniqueístas; daÍ
ú a melhor sátira social quc nos permite estabelecer mais uma i que também náo haja a ficAáo dencro da ficcáo como ¡la llil (
coincidéncia de Memór¡os com a picarcsca. Náo há uma re- picarcsca mas apenas a ficaáo da ficsao
-
a transcriqáo lliil (
jeig5o crftica dessa sociedade porque o malandro neo a en- I - -
do que um out¡o narrou; neste caso náo é possivel fingir den- lltl (
frenta de fora; apenas procu¡a se manter nela o melhor pos, tro da ficaáo porque nela a o¡dem e a desordem se encon-
sfvel, ao menor prego. Mas há um desnudamento da reladvi- tram e anulami na picaresca clássica, no enhlto, a ñcaáo é (
dade dos valo¡es tidos como consagrados e da esperteza co- a maneira de sc salvar o que separa o mal do bem. lliI
ilil) (
mo o denominador comum da pequena burguesia. A aproximas¿o entre Leonardo e certos plcaros (como llrl
( Láza¡o ou Pablos) é possível como quer fultonio Candi-
do
-
pelo cornum caráter amável, risonho e esponlan€o dc-
As diferengas com o píüaro -
rivado da causalidade externa que os impulsiona a todos; en-
li!r,
rilr
tretanto, deve-se ressalvar que, se essE caráter é real em Leo-
Mas, sem dúvida, é possivel apontar difcrencas enrre a naJdo, náo passa de aparenc¡a nos p(cáros; enquaDto essa cau-
picaresca clássica e Memórias. Contudo, tais difcrengas po. salidade extcrna é ci¡cunstancial em Leonardo e produz um
dem ser estabclecidas graqas a que elgs sc opóiam nos pontos riso limpo, nos pícaros há um determinlsmo social e até sócio-
(
(
(
(
(
(
(
(
( 51
56 I (
I
(
( religioso -¡acial que-os lcva a serem máscá¡as apcnas; o leitor Talyez Memórios lomado isoladamente Iembrasse me'
mais agüdo descobre por baixo do riso a traSédia de toda uma
I
nos a pica¡csca clá§sica. Mas scu papel de primciro malan- I
(
sociedade condicionada por mitos. áiá titerário uratueiro coloca'o no rumo náo apenas do he- i (
Náo sendo l¿onardo um ser essencielmeDte confliüvo rói sem nenhum caráter de Mário de Andrade, mas dos mui-
(elc só quer ñcar ondc está) define-se pela ausencia do p¡oje- tos que, no século XX, constituem o que denominamos '¡¿o- I (
to que subjaz ao pfcaro; assim sendo, seus projetos sáo ml picaiesca. Leoila¡do, mesmo na sua simples vadiagem e no (
scu conflito mínimo -- o de preservar-se - é o
preccdente
nimos e imediatos como a fuga pela fuga ou sentimen-
-
tais. Pela mesma razáo -
c porque o pfcaro se fee e o ma. áos anti-heróis que üráo depois c dos quols pode scr aprod' (
la¡dro nasc¿ feito
-
náo há a nccessidade do aprendizado mado'por um t;aQo c¡mum também ao picaro clássico: o (
-
próprio do píero, e a aventura possui uma dimensEo me- amor jela Iiberdade. Mesmo gue esse añor náo telha conse-
nor, prop¡rcíonal ao risco mfnimo a que o malerdro qügncias além do plano pessoal' tanto nos plcaros como cm (
- -
se expÓc. E sintomáüco que Leonardo náo seja o jogador pro. ieona.do. Porque depois viráo aqueles que, de uma ou ou- i
(
I
fissional qrre o pfcaro chega a ser e que possa pe¡der o auto. lra forma, perfiitiráo que nesse amo¡ pcla liberdadc encon-
I
Com efeito, a autora diz nele, a respeito d.e Mocunsi mo dlspendldo e a lnslgnlflcáncla dos obsláoulos tr¡terDostos I (
(
r¡a, que pretende demons¡far que .,independentcmente dos Em Már¡o d6 Andrade. ao conlrárlo, a calnaval¡zacáo der¡va da i
(
(
( :
:l
60 6l li I
( I
ftlacunalma á domlnado pelo mBdo e as suas fuOas conslan. a paródia do cavalei¡o através do Quixole, mas uma forma I
( tss esláo em d6spropor0áo com a r6altd8d6 dos pe¿Oos; ele de paródia de romance arturiano muito semelhante daquela
é, por congegulnt€, o av€sso do Cavalolro da Trlste Flgura, re- que os picaro¡ tragam antes mesmo de se escrever o plifole, I
( I
Numa hfstória, duas paródias urir von cldo.!oncedoa, quo lsz da fraqu62a a sua lofga, do m€.
I
(
(
(
(
( 6) 6l
(
te¡jal, entáo, da mu¡raqu¡É, mas já neo mais do scu signifi- gundo a teoria de Bakhtin,: pata quem essa carnavalizagáo
( cado, o que fica explícito na frase final do capitülo XIV: passa cJaramcnte pelo romance picaresco:
( "Muiraquitá, muiraquitá da minha bela, vejo voc€ mas náo
vejo ela !,.. ". Ou seja, Macuna{ma é agora apenas unr herói O romance plcalesco relratava a v¡da desviada dg seu curso
iil
comum e, pof agsim dlzer, ¡egltlmado, de§tlonava as pessoas
( sem caráter, despojado que foi daquilo que o definia: a subs- de tadas as suag poslgóe9 hierá.qu¡ca3, jo§ava com €ssas po_
( táncja de um projcto, agora dcvorado psla colonizagao. Náo s19Óes, era lmgregnado de bluscBs mudangas, tlan§lofmagoes
há mais império no Uraricoera porque nao há mais impera. e mistrflcag6es, inlsrpretava todo ó ¡nundo .eprBsentável no (
( dor. Macunaíma rerá a sua última balalha, como Dom Qüi- camPo do conlBlo lanl¡l¡8r,8
(
( xote, e nela será, como Donr Quixote, dcspojado do seu so- A carnavalizagao dircta da litcraturs, isto é, devida á iiil
nho; e só lhe festará ser consrelaC¿o, brilho que guia, exist6ncia do carnaval como ''uma forma da própria vida" (
( O quc quer dizer quc, cmbora ráo scja paródia mas pa. duraria, segundo Bakhtin, "até a §egunda mctadc do século (
( ralelo do Quixót¿, Macunaíma supera nisso o p(caro clássico XVlI",'ou seja, o fim do fen6meno coincidiria com o fim lli;
que se opóe diametralmenté ao herói cervanlino. Nos pÍca- da picaresca cláss¡ca cspanhola. A p¡rtir daf, diz Bakhtin' t!t (
( ros clássicos, embora alguma vcz haja consci€ncia de se apoia- "o carnaval deixa quase totalmente de ser fonte imediata de (
( rem na libe¡dade, náo há um projeto social. O pícaro que¡ carnavalizagáo, cedendo lugar á influéncia da )iteral.ura an-
t0 Na picalcsca temos que, a p3r- (
se integrar na sociedade cuja corrupgao dcnuncia, mesmo em teriofmente carnavalizada".
( troca de se coromper. Macunaima é, pelo contrário, porta- tir dessa data, surge o quc nó§ ch amamos dc ptcarcsco euro' illir (
( do¡ dc uma utopia, E essa dose de quixolismo, ao conv¡ver péia, es$ila sob a influÉncia dos modelos espanbóis; nela,
(
corn o anti.herolsmo picaresco o faz ser uma sfntcsc complc. a carnavalizagáo já é apenas lradi§áo literária.
( xa própria dos nossos dias e precursora dos pfcaros-quixotes Mas, parcce-nos sintomático que, quando vcnha a po- (
( que sintomaticamente vem sufgindo na Iiteratura b¡asileira der ser apontado o rcna§cer de uma modalidade tipicalnente
(
dos últimos anos. carnavalizada, como a picaresca, is!o ocorra peculiarmente
( num contexto social o Brasil onde o carnaval é par(c (
da
-
organizagáo
-social; ao ponto dc que ca-
( ¡mportanlfssima
Macunaíma e a picafesca beiia aplicar á nossa so¿iedade o que Bakhtin diz sobre a lda-
(
( de Média, quando, §egundo elc, o hom€m levava duas vidas' (
( Após esta longa ressalva, convém que analiscmos as uma oficial e outra público-carnavalesca. (
várias coincidencias de Macunalmd com a picaresca clás- A picaresca tessurge em Macunoímo náo por tradigáo
( sica, assim como a transgrsssao de outras caracterlsticas lilerária, mas por identico proce§so dc carnaYaliza§eo' E, eñ (
da modalidade
( - além da incorporagáo da ulopia quixotes-
ca, O que nos permitirá ver na rapsódia um claro exem- Sáo
(
' Vcja*c: C,rvarco, Maria Su?¡no, Macuñohno: ¡uPturu e
( plo de neopicarcsca, ao menos numa das leiruras possfveis Pa¡Jto. Massao Ohno/Joáo Farkas. 1977.
'¡odildo (
( do [exto. iÁeiitia.U. p¡obtenosdd po¿tico de DottolevJtri. Rio
s¿ Univcrsitária. 198!-
d. JEnciro, For'n' Iti (
Em primeiro lugar, deve.se considerar o laro de r/ac[- o ld.m, ibidcm, p. I l!-
( ¿a¡iza se insc¡ever no embito da literarura carnavalizada, sc. ¡o ibidrm,
ld.r¡, P. ! )1. (
lill
( (
i
( (
I
( (
( (
( (
( (
I
I
(
( I
i
61
65
fungáo disso, a rapsódia repel.e certos tragos tipicos do ro- em comum com o pícaro o lato de que,
a maioria das vezcs,
mance picaresco clássico, que analisaremos a seguir. estecaráter lhe advém da necessidadi d. frgi, pa."
s.
Em primeiro lugar, o subltulo genérico cscolbido por
Pf tatveida "jüi.
paródia, do carárer piotiico e fugirivo
M¡i¡io dc Andrade para sua ob¡a já -,-
- "rapsódia" - é
um ponto de partida para o estabelecimento de anelogias
cda ajtúcia, em síntese, Macunaíma é, como os pí"aroi,
grandc fingidor dent¡o da ficcao,
um
Ao ponto que d-essa sua re_
cafc Mocuna(ñd c o romauce picaresco, especialmcnre em duqáo possível ¿ pura representag¡o lh" nas"",
no nosso ,er,
relagEo ao Lazarilho de To¡mes. O sentido em que o tcr. a "falra de caráter', com que o autor o dennodosa.
( o ,r¡il_
mo pode ser aElicado á obra de Má¡io de A¡drade foi es- tulo da obra,
tudado por Gilda de Mello c Souz¡ no scu livro já cita- Há também analogias ao nível da fábula descnvolvida:
do. Nos cabe apenas fazer consta¡ que jÁ ¡o Lazorilho te- na origem do '.herói,,, na sua partida, no projeto que
o ani-
mos dois elementos básicos da rapsódia: um estrutural, ou ma c no scu choque com a sociedade u¡bana.
seja, a composiqáo por um proccdimento de suite musical; I
Assinr, temos que, se o pfcro degrada suas próDrias ori_ (
c outro cultr¡ral, ou scja, a origem popular das narrativas in- gens desqualificando os próprios pais,
Macunaíma nasce de (
tegradas no texto maior. uma clara paródia do processo mítico da partenog6nese.
E (
( Em segundo lugar, lemos.que a rapsóüa. Macunalmo é se, após isto, o pícaro renega a famllia e parte
em-bus"a dc I
paródica como o romalce picaresco: E DA,o apenas da lon- outros ho¡izonres, muito disso está simb;üzado no fato (
( Je I
gínqua novela de cavalariai mas também do mais próximo Macu^¡aíma matar á viada parida que é sua própria
mle, (
indis¡ismo romantico. Por outro lado, se o pfcaro é o con- Os plcaros c!ássicos partem com um projeto de ascen-
traponto paródico do "homem de bcm"; Macunaíma, espe- -
sao social como único rotciro. Como já disscmos, a procura
I
(
cialmente na cidade gralde, é a caricaturá da bu¡guesia emer- da muiraquitá por Macunalma simboliza um pró¡.t"
,".i¿ (
Betrte, possívcl equivalente atual daquele tipo social. l¡tellativo, que, no cntanto, confundc_sc cambém com o pro-
Nsste DJvel, temos que, oa picarcsca clássica, o "he¡ói" jcto indiyidual do ..herói,,. (
devia mudar ffeqüentemente de aparCricia como meio para Ao longo do iüoerário em que ambos realizam sua aven_
(
se liv¡a¡ das conseqf¡éncias da trapaga ou para perpcrar ou- tura rDúltipla, tanto Macunaíma como o pícaro sáo perma. I
t¡as novas. Semelhante cáráter protéico é pcrmanente em Ma- ncntes violadores de códigos. Isto levará ao.choque
com a (
cutraJma, cujas constantes mudang¿s o levam de crianga in- sociedade, que se inlensifica quando o plcaro _ ou
Macu_ I (
dígena a constelacáo celeste. naima
Po¡ outro lado, Macunalma parece te¡ já na etimo- - chegam á cidade grande. Daf derivará a mais in_
tensa sátira social qúe, em MaannoÍma, se inicia
l (
-
logia do seu nome, "o grande mau", no sentido de "astu-
com a atitu_
de do protagonista de se dirigir á toz ao rio fVegro para
I
áti- I (
to" a esprrteze como seu principal atributo, trago facil-
- xar sua consciéncia na iJha de Marapatá antes di paitir para
I
( menre comprovável no§ pfcaros. Essa astúcia, porém, náo o Sáo Paulo. (
como náo salvava os pfcaros de acabar preferen- E será tendo Sáo peulo como centro _ ao longo de dez
i
salva
( -
temente como vÍtima das situacdcs.
- dos dezessere capÍfulos da obra que as agóes de Macunal_
(
Uma outra característicá do pícaro o seu caráter iti- -
ma mais nos lembraráo o romancc picaresco. possivelmen!€ (
(
nerante
-
é permaaentc cm Macunal¡¡a. Mais ainda, tem pelo fato de ve-lo se chocar a¡mado apenas da sua astúcl.a
!
( - - (
(
t l
(
I
I (
(
(
(
(
( (
(
l1
66
il (
com a sociedadc hostil; e pela sátira social que desse cn- Já ¡o nivel do discurso, uma outra caracteristica da pi- (
-frentamento se deriva. Neste caso, a denúncia da sociedade carcsca clfusica ora superada é a do autobiografismo. A gran-
(
de maiorja dos c¡Íticos fez da forma autobiográfica o primeiro
dc consumo produz as mclhoreJ páginas, paraicularmcnre
quando o protatoni§ta assume explicitamente a narratáo, traeo definido¡ da modalidade; enlcndemos que isso é váli- (
ria "Carta prás icamiabas". Mas a sáti¡a social está, sem do para o núcleo da picaresca clássica c para umo prirneira (
fasc, quando a autobiografia era a inovaqio contestatária da
dúvida, na totalidade do texto' e para con§ideráJa scrá ne- I
onisci€ncia do nar¡ador de tercei¡a pessoa da novela de ca- (
cessário nos detetmos, mais abaixo, no desenlace da rapsódia
( valaria e dos demais gCneros narrativos da época. O anti- (
heróí, entáo, se rarra a si mcsmo na impossibilidade de se
( atribuir um histo¡iado¡ para as suas inglórias travessias, E (
A transgressáo P¡carescá também porque elc é, antes do que protagonista narrado do (
inverossimil, testemunha nanadora da quotidiancidade, Mas,
( Até aqui teríamos algumas analogiái de Macu naíma com (
I no decorrer do lempo, a forma autobiográfica iria perdendo
a picaresca, Mas é na transgressáo da modalidade onde cn-
consistencia (iá vimos cono cm O Buscdo comega a se ion- (
contramos afirma9áo da raPsódia como texto recriador da
a
tradizer) e ganhando artificialidade. Mais tarde, haveria lu-
fórrnula clássica,'sendo que a própria transgressáo já identi- gar pa¡a outras fórmulas narrativas que a substituem, já quc, (
fica a obra de Mfuio de Andrade com o processo de evolu- em iütima jnstencia, mais importante do que a primeira pes-
cáo próprio da picaresca. soa na¡radora é o ponto de vista da narragáo.
llr f:
A transgressáo sc inicia, como já virnos, com a incor- Macunafma éum exemplo muito intercssante dessa trars- (
pora9eo da utopia quixotesca paralelamente ao projeto Pi- i
ca¡esco. Convém salientar, mais uma vcz, que isso equivalc
formaqáo cvolutiva do discurso picaresco. No capÍLulo Xlr'II
il' (
tenros que o herói narra
- "na fala impura da tribo" - sua.s
a anula¡ na rec¡iagáo da modalidade clássica
-
a barrei¡a
- av€nluras a urn papagaio que depois as repete para o narrador (
Darcada por alguns crltico§ entre o romance cervaDtino ea
picaresca.
da rapsódia, Este, longe de ser autónomq conf€ssa que herda (
o discurso de Macunalma. Ou seja, além de que o Donto de
Mas náo é esta a única sintcse de coorár¡os que se pro- vista é quase permanentemelte o do "hcrói", é a personagem (
cessaem Mqcuna{ma' A picare§ca clássica se apóia na oposi-
9áo do bem e do mal como eotidade¡ ir¡econciliáveis, mes'
quem emprEsta seu djscufso ao namdor e náo ao contrário, (
como vinha acontece¡¡do habitualmente no romance Em con-
mo que a picaresca süva para denuncia¡ que uñ e ou[ro po- seqüencia, temos que o artiflcio da primeira pessoa é substi- (
diam scr ¡cduzidos a meras apar?ncias. MacunaÍma stpcra
esse dualismo mmo reflexo da ioexist€ncia do mesmo nos con-
ruído por um outro cgulvalentq porém renovador e de acordo
corn a transfo¡mecáo da ünguagem narrativa,
lll (
ros indfgenas americanos, segundo aponla Haroldo dc Cam- Outro trago da picaresca clássica que vemos renovado (
pos.¡r Macunaima, por cima do bem e do mal, é o grande cm Macuna/md é a tendencia, naquela, á concatenacáo do iit
já na etimologia do (
Lsluto, seu nome'
discurso como produto da linea¡idade da aventura. Para o !l' (
picaro clássico neo há grandes digressóes ra agáo. Já oa rap-
tr Moúolot¡a do Macuñol:¡r¿ sáo Pdulo, Pcrlpcc¡lva, i 9'3 p' I l3_4' sódia, embora se complctc o clrculo lfpico da p¡caresca clás- 'i (
( (
(
(
(
(
I
I (
(
( (
t
ÚE
69 I (
( sica, há vri¡ios momentos cm que o "herói", de acordo com (á
na incorporasáo do humor, €sse recurso próprio (
sua falta de caráter, perdc de victa o projeto ñaior e introduz da mo_ I
derDidade, que Schopenhauer,r defin" como
deJloc&nentos laterais sem objetivo cla¡o, ou corn objetivo ape- iroria ao con_ I (
trário, ou seja, a arte dc se ocultaf, por trás da burla,
nas imediatq que geram averuuras maJginais, Isto coincide com algo (
dc profundamente sé o. Macuno(mo e,stá
a relaüüdade que as d¡mcns6cs de tempo c espaqo tém na rap- longe ae ser á ouiu
(
apenas de divertimento que alguns que¡cm
ve¡ cm cer¡os ro.
f (
sódia quc assume o univcrso mágico dos mitos, cortra a rigi-
mances pica¡escos clá.:sicos, como O Buscio.
( dez cronológica e geográfica da picarcsca clásica. e f,lexibiiida- (
do humor decor¡e
Nesse sentido, Macunoímo stpe¡a a na¡ragáo ¡'rcalista" 9e.própria da quebra do maniqueísmo e
é típica do maland¡o lite¡ário, do neoplcaro (
em que a picaresca clássica se insc¡eve. Tan(o as leis tempo-
rais ou espaciais qua¡to a causalidade óbedccem a uma lógi-
b¡asi¡eiro,
Outra inovasao macuoaJmica cncontta-se no terrcno
do
ti (
crotismo. O pfcaro clásgico padece no¡malmcntc
ca mltica. Assim scndo, piua csse universo rnágico Mário de de uma auto.
repressáo se<ual, própría do seu conto(ro histó¡ico, que (
Andrade deve se valer da totalidade da linguagem. De acor. para a misoginia ou para formas implicitas
cvolui
do com Coseriu,12 entendemos que essa dimensáo total da
proxenetismo suscntado¡ do mais tra,diciona_l
ou orpiíciras do f,l (
linguagcm náo é outra coisa do que a poesia. Macuno[mo é, macLismo. Na
(
T
nio Candido já diz do Leohardo de Methór¡ole do malan. os tracos renovadores do profagonista até aqui (
( apontados. I
dro literáfio brasileiro em tcráI, oü scia, na prática da "as- mesma linha de superaqóes, t€mos, por último, que
.Na I (
nicia pela as¿úcia (mesmo quar:do ela tcm por finalidadc safá- os pícaros clássicos do núcleo evollem do moio de
cego, pas. I
lo dc uma cnrascada), manifestando um amor pelo jogo-cm- sando por dive¡sos subcmpregos o de criado, especiálmente (
-
aLé a relatiya autonomia do delinqücntc. Em
si que o atasta do pragmatismo dos pícaros, cuja malandra- - última ins_
táncia, em rodos cles prcdomina a rejeicio do trabalho, (
gem visa quase sempre ao provejlo ou a um problcma con- haja
creto, lesando freqüentemente tercekos na sua solugáo".r3 visla que o mesmo de nada servc como mEcanismo de ascen- (
Esle tipo de astúcla, scgundo Antonio Candido, parecc mais sdo social. Macuoaima leva isto mais longe e proclama
o ócio
como princfpio. Seu já clássico .,ai que preguigal', longc de
(
próprio de heróis populares do que de modelos crudilos. Nes-
sa linia, Macunalma possü um grau docriaüvidade ner¡ sem- §e¡ apenas um traco negativo significa 8 co.locagáO
daS bases
(
pre atingido pelo plcaro. de um tipo de organizagáo social (uma.,utopi¿,, aos olhos I
(
( (
( 77 (
( (
I
amostras se¡iafi: ¿¿ canción de f;achel (1970), do cubano Mi-
( guet Barnei; Auío de pecadores (1972), do argentino Oudiño (
Kieffer; Los ovenluras, desventuros y sueños de Adonis Car- (
(
cfo, el vampiro de la Colonio Romo (197 9), do mexicano Luis
( Zapatai e, por úlúmo. a tetralogia do ar8endno Jorge Asfs: (
I Apenas sobe quem pula Flores robadas en los jardines de Qu,i/zes (1980); Carne p¡-
cada (1981)i Lo colle de los cdballos muertos (1982) e Cdn-
(
( (
curos (1983).
Já na Iiteraturs. b¡asileira, o fcn6meno pode ser corsta- (
(
tado com facilidadc a parl¡r dos anos 70 e aprcsenta, ao mes.
( mo tempo, uma heteroge¡leidade qual¡to aos autores, e á pre. (
( senga de alguns tragos que outorgam alguma homogeneida- (
dc ao conjunto.
( (
( . Ao Ioogo do século XX, podemos constatar que uma (
série de romanccs Iatino-amcricanos respondem, em maior A epopéia do pícaro (
( ou menor grau, ao conceito de neopicaresca por nós apre-
{ sentado. O primeiro dos fomances quc chamam nossa atcngeo é (
Neo pretcndemos nos dctcr agui na anáLise de todos eles. A pedro do rei¡¡o, de A¡iano Suassuna, public¿do em t9?l
( e que o próprio autor teria rotülado como "picaresco", O
(
. Apenas teceremos algumas consideragóes em relagáo aos tex-
( tos aparecidos no Brasil, onde o fenómeno é mais lardio (exto constitui a autobiografia ñcciona.l de um anti-herói que (
se deixarmos de lado Macuñoinro
-
e concentrado nos últi- apa¡ece como marginal á socicdade. O protsgonista ñarra-
(
mos vinte anos.
- dor é portador de um projeto picaresco de ascensáo social, (
( Na América de lingua espanhola, no entanto, é fácil ¡e- cmbo¡a ele mesmo prefira transferi-¡o para o campo pura- (
lacionar uma série de romanccs neopicarescos a partir de co- mente ficcional, onde, por sua vez, ele encontraria sua afir-
( mqgdo corno escritor. E este malandro aspi¡ante a autor de
(
megos do século. Assim, tcmos, dentre os mais conhecidos
( ou per¿inentes, náo menos de duas das obras do argentino uma epopéia possui apenas como arrnas para se defroutar conr (
Robeno Payró: .6/ casomienlo de Laucha (1906) e Las d¡ve¡- a sociedade hostil aquelas do pÍcaro: a astúcia e a trapaca. (
(
. lidds dvenluros del nielo de.Iuan Moreira (1910). Dc Rober. Por outra parte, a narrativa incorpora ume abran8entc
( to Arlt sátira da sociedade brasileira da qua.l o protagonista, atra- (
- também argentino e hoje felizmente redescoberto
deve se¡ incluldo o sel,l El juguete rabioso (1926). Do me- vés dos seus sincrctismos,
- sátira es"
acaba sendo a sfntese
( -xicano Juan Rubén Romero, temos ¿a vida inúl¡l de P¡to Pé- -
ta que se processa mediante a paródia das dive¡sas ideolo-
(
( ¡ez (1938). Hijo de ladrón (1951), do chileno Manuel Rojas, gias em pugna dentro dessa sociedade. (
pode também ser rclacionado, bem como ¡lasfo,?o verrc Je- Nos defrontamos, também mesmo que colocados cri-
(
sús mío (1969), dq mexicana Elcna Foniatorvska. Outras ticamentc e de forma implicita
-
com uma série dc tópicos
(
(
- (
( (
( (
( (
( (
I
I
(
(.
( 1n
l5
( próprios da picaresca clássica, tais como a rejeigao do traba. origens, Nelas, este novo picaro esteve integrado
na classe
qual marginalizado graqas á rui' I
( lho, a determinagáo de um modelo ' 'aristocrático' ' d€finido doÁinante, dá encon!ra-se
(
( "fingidor dentro da Iicqáo"
pelas exrerioridades, o caráter de na econÓmica da familia'
do protagonista e a primazia do parecer sobre o se¡. Tbdo o percurso aventuÉiro de Galvez aparece marcado
( Quanto ao discurso utilizado, além do autobiografismo, peta trapa§a ; dá tugar a uma pelmanente §átira social que cul-
de ope-
( dá-se a transgrcssdo cxpllcita de formas na-rrativas tradicio- mina com a pa.ód¡a da sociedade br¿sileira, no império
nais e contempofáneas, a seriacáo das aventuras que sub- reta que cle monta no Acre c quc ¿ derrubado por um tenente
( jaz á ruptura com a cronologia -
a qual leva á apresenf.agáo que se faz eco dos protestos de grupos conservadores'
(
(
-
folhetincsca, a cooexáo com o rapsódico e a moÉvagáo rea-
lista do relato, aspectos todos que mar. cara¡n o romance pi-
car€sco clássico.
No entanto, nos apressaremos a náo reduÁt A pedro do
-
O p,otugoni,t" de Gah'ez é Pfcaro até na falsif-rcaEáo
-fatos que nalra, o que lcva a que üm narrador de terce¡ra
p"ssoa interfira, em notas de rodapé, para dcsmenti-lo'
Por último, cabe salicntar a presenga de uma contrapar-
dos
lt (
(
(
( a freira (
rein o a umá imilagáo do modelo clfusico. A aprodmaÉo náo : tida quixotesca do pÍcaro, na personagem de Joana'
(
(
significa a rcdugáó. E a eÉroximagáo é váüda a partir do anti-
herói que aqui realiza suas asliiragoEs metall¡gr.üsticamente,
9-
1ü
seduzida oor Galvez e que o acompanha
nu, pot¿m, vé no projeto do companheiro
na
a
aventura
possibilidade
Joa-
de til (
já que ao ñesño tempo que narra o seu projeto anti-heróico it intciferir na sociedadc: transforma-se em revolucionária e (
( de escrever a epopéia em que ele ocuparia o luga! central, i B u""t , tombando em defesa dos seus ideais'
( esrá escrevendo o roinance que o rea.liza como escritor.
o¿
Cabe, por úliimo, mencionar q:ua A pedra do reino já -co
(
(,
inclui
-
termina
g¡asas so projeto épico que o malandro ie autode-
(
tagiará todos os textos que neste capltulo corrsideraremos-
i
'
hudlpd, do sergipano Paulo
ginuii.^"nte Jm espanhol,
de
no
Carvalho
Méúco,
NeLo,
em
^'leu
publicado
1972' A trad!§áo
ori-
tI I
O pícaro imperador i.""il"itu ao texto ápareceria apenas em l9?8 A hisLÓria es'
(
( Em 1976, o a¡nazonense MÁrcio Souza publica o seu mc-
tá ambientada no Equador' Um índio conta a
u.i., ii", que foi um "{ndio sgcana" ou -
vida picaresca
seja' traidor da
latino-
lili
lhor romance; Calve4, imperador do.,4c¡¿. O texto, mais do sua classe e que esteve ao servi9o de um embaixador
{ que roma¡ceaf os fatos históricos que lcvaram á incorpOra-
-
americario. O iclato mostra, além da picardia do tio' a cor-
(
que dominam na embaixada' ApÓs a morte
( 9áo do Acre pelo Brasil, apresenta a fictlcia autobiografia de rupgáo e alienagáo
L[:is Galvez de AJia, espanhol que, em fins do século passa. ao iio, o ,ourint o narrador herda o cargoi mas é capaz de
( se transforma
t
do, cslcvc envo¡vido nesses fatos. Calvcz é basicamente um
anti-herói aventrrreiro que, apesar de certos relances idealis-
se subievar, salva-se
num ¡evolucionário,
dc ser mais um sacana e
lfil (
tas, !ogo aparece voltado para um projeto de motivaQao apei A narraqeo da vida pícara do tio é leita pelo sobrinho'
lil
1
( perma-
nas pccuniária que o levaria, teoricamen[e, a recuperaf suas em tcrceira pessoai mas o ponlo de visla é colocado (
(
(
It
(
(
(
¡
(
t
I
( i {
-76 77
I nentemcnte na personagem narradar o qus Substitui a or¡gi- gralia pa¡eQa dista¡ciar-nos um pouco da picaresca, logo dcs.
nal pseudo-&utobiogra[¡a da pica¡esca clássica. Já o sob¡i cobrimos que o picaro narrador está clararnente presente ao
I I
nfvel do autor implfcilo do romance, que freqüentementc in-
nho narra sua própria avencura em primsira pessoa. E e sua
narrativa significa, rrais uma vez, a superagáo do pícaro pc- terferc na na¡rativa.
( lo quixote quc denuncia a corrupCáo das classes dominaDtes Já o "herói" do texto precnche, nos momentos iniciais
e que se desdobra em Pedro anteriormente "PÍter", o gcn- da sua história, os requisitos básicos do picaro clássico. Num
ro do embaüador
-
que parlc para a luta na guerrilha. segundo mom€nto após a sua cxpulsáo do seminário
- Viramundo aparece-a cami-nho da sua loucura, que nós en- -
(
lendemos como sendo uma automarginalizageo em relacáo
N¡¡nra rua do sul á sociedade de consumo, cujas instituisóes ele rejeita. Num il;
tcÍce¡ro tempo, temos s culminagÁo do processo de quixoti.
Um outro t¿xto recente em que também o esquema Dco- zagáo do protaBonista, que leva i rebeliáo na cidade grande.
O epllogo éo reencont¡o do mcsmo com as suas origcns, que (
picarcsco culmina na transigao ao plano quüotesco é Os vo-
lunld os (1979), do gaúcho Moacyr Scliar. A narragáo au- culmina na sua morte. (
tobiográfica e a evocagáo do mundo infantil e adolcscente Nessa trr,ietória, Vi¡a¡nundo é o anti-herói portadof da
(
( do protagonista *
co¡ocado ü margem da socicdade burgue. sátira que desvenda as convengóes da sociedade que percorre
( sa *
sáo a base da aproximáseo'do texto e picarcscá. Pouco Tbqr tudo do pfcaro tEdiciona.l (a na¡r¿tive rapsódica, seu c¡- (
a pouco sáo incorporadas outras cinco personagens cujas his. ráter enti.heróico, sua origem "baixá', as picardias infafltis, a
{ tórias fazem deles outros tantos pícaros com p¡ojefos p€s- opsao por deixar a famllia, a sátira encóberta pela apa¡ente- I
soais frustrados por neo caberem no pragmatismo da socie- mcnte pura com¡cidadg o ca-rátc. de ayenturcim iünerante que
dade em que cles sc movimcntam. Até quc uma circunslán- tcm inftnitos nomes etc). Mas, ao mesmo tempo, Viramundo
st:pcra o plcaro quando parte a cañinho do heroÍsmo, mesmo (
cia rcúne as scis personagens pícaras num projeto quixotcs-
que inconscientemeDte Assume assim seu parEnte§co com Dom (
co:-chegar de Porlo AleBre a!é Je¡usa.lém (sic.) num reboca-
dor. O violento fracasso da empresa no seu inlcio devolve o Qul\otg num esquema semelhan(e ao de algumas das perso-
protagonista A medlocre realidade onde acaba¡n tanLo as es- nagens do roma¡ce de Paulo de Carvalho Neto acima refcfi- lll (
perangas do pícaro quanto o s'onho do qüixote. do. E, mesmo que fique epcn¡$ na denúnci4 scm nada ter con- (
seguido mudar, a sua morle pelo frat¡icidio faz com que essa
dcnúncia nos aparega como mais vibrante e trágica do quc il[ (
( ii, (
{ ii t
( (
(
(
(
(
( I
( (
18 19
( I
é Truvessios, pubücado por Edward Lopes em 19t0. Temos tutues€s. As suas aveniufas nos sáo contadas por um narra.
( dor de terceira p€ssoa, rnas o ponto de vista predomi¡ante (
nele um narrador-protagonistar c¡iado de sucessivos amos,
que lcm em comum com estes a c¡racterístice básica de se- scrá o dO protagoÚsta: em alguns momentos, a palavra es!a- I
(
(cm itinerantes. No entanto, o Rarrador-protagonista lembra, rA com este, espccificameute oas carhs á amada, nas quais
( (
mais do que nada, o Laza¡ilho na sua etapa de aprendiado, I ele se encarrege de falsifica¡ o yerdadc antcs contada pelo nar.
já que cle aparccc fundamenklmeote como tlm sujeito pas- rqdor o!.iscientc. Náo temos nesLe texto o clássico projeto pes- {
( I
sivo dos acontecimentos, AssiB, os verdadci¡os pfcaros 6c' I soal do pícaro, a nü,o scr a fuga das conseqüéncias das aven-
(
( ¡iam os amos, aven[ureiros e trapaceiros ao nfvel do melhor ruras eróücas do protagonists, fuga que o marginaliza socid-
( dagueles. mente Isngs.ndo-o num unive¡so de ambiente picaresco, qua.l (
A aplicagáo intencional de uma va¡iante da fórmula pi' seja o dos seus companheiros na avenlura colonizadora,
(
( caresca clássica é evidenrc nos primetos capJtulos, quando I Ncssa aventura, aparece a sátira do valor das exteriorida-
( o menino-protagonista é entregue pela sua mae I um cego co' des e a conquisla do Brasil é parodiada numa compedcáo (
. mo criado e este se propóe a educá-lo; e mais ainda a cviden' sexual com os indlgenas, terreno onde o nosso malandro ¿em
( , cia se patentiza quándo a fomc se faz presente Comegam aí tudo pa¡a vencer.
( as andáncas por uma gcografia brasileira indefinida, denlro O Torto. porém, acabará sendo prisionciro dos indlge.
de uma cronologia nada realista. A mstade do ¡omancq o "p! nas e, com isto. passa a correr o risco permanente de ser por
( caro" muda de amq passivamente lambém: o cego o perde estes devorado, a exemplo de ou¡ros cxpedicionfuios. A an.
no jogo par¿ o ltlho mais novo a ovclha negra de urira ' rropofagia, no entanto, se dá em outro ¡¡fvel, quando ele pos. I (
( -beberiao, jogador e
-
muJhc- sui sexualmente Muira-Ubi, filha do chefe da rribo, e é por
família de fazcndei¡os, "famoso
I
( rengo'', a quem o "pícaro" chamará de "amo brabo", em opo- ela possuído. A pa¡tir dBí, há um processo de integrasáo do
( sisao ao anterior, o "amo cego", Ambos os amos se reencon- Torto numa nova realidade que é o produto mais claro dessc (
traráo uo final do livrq quando ficam e beir¿ da morte Nes- rclacionanento, Essa nova realidade se delire no fina¡ do ro- (
( se final, aparece a menCeo expliciu do comego de outra coi- mance, quando Muira-Ubi que, batizada, passa a ser Ma-
sa. Essa oulrs coisa parsce-¡ros podef ser interpretada como
-
parte junlo corn o To¡to e es demais cativos (
( ria
- - menos
a supemcáo do csquema do picaro, csquema que o autor su- o padre, que foi comido p€los na¿ivos, rumo a dois povoa-
I
( (
peraria no seu segundo romance, de dimensáo Plenamenle qui- dos de que tCm noÍcia: Olinds e Rec¡fe.
( xotesca, ¿oDos e cordeiros, publicado em 1983. Entendemos poder fa.laf em neopicaresca em relagEo a I
O le¡ranelo del-rei, na medida em que eslamos perante üm il
(
( anti-herói que sobrevive pela sua astúcia e que pcrmeia uma
( Voio de Portugal sálira da colonizagáo na paródia desse processo histórico. Tu- I
do acon@ce em meio a um submundo de plcaros, onde é da- (
( De l9E2 dataO teironeto det-t;i de Haroldo Ma.ranháo. do ás aparéncias um valor que, acabamos comprovando, náo
(
( Nele temos novaEente um anti.herói de nome Jeronimo possuem. Náo deixa de haver um toque de pica¡dia na falsi-
(t'Albuquerque, apelidado o Torto
-envolvido
na paródia hcagáo dos latos pelo protagonista, bem como uma fone dose
I
¡l
( -
do processo da conquista e colonizacáo do Brasil pelos por- de erorismo, inovaqáo típica da neopicaresca brasilei¡a. E o t (
(
( I I
J
(
( (
( I
(
(
I
( I
I
80 8l
projeto guixote§co, nao apenas pafece-no§ presente nos §o- vira "Exceptional Professor" da ReaJ Academia de Lqtras I
I
nhos do Torto, mas especialmente no projcto de uma nova para éguas "au pajr" de St. Columbia Gaelic.
socicdade colocado no final do romance. O cogitdr¡o é :oma teliz arnostra da neopicaresca que que- I
tanre atcngao As peculiaridades semanticas, si¡táticas e léxi- sileira. Eotcndemos que essa neopicaresca é própr.ia de um (
cas nordestinas. A linguagem é a base da permanentc carna- contexto em que a burgues¡a *após se firmar como a cul-
valizagáo da rcalidade, cujo ponl.o alto é o dito Jegue que rninaqáo da cscala socioecon6mica produz uma zona de I
- (
(
I
(
I
(.
(
I
(
(
82 8l
vazio intermediá¡io nessa escala. Essc vazio equivaleria Aqucle temporeneos e os libera de qualque¡ possibilidadc dc serer.
produzido pela rejeigáo ideológica da burguesia por parte da vistos numa fungáo didática.
aristocracia na Espanha dos séculos XVI e XVII e que tem Nesse contexto de liberacáo, o erotismo - ausentc por
a ver com o eparecimento do romance pictresco clássico. Ho.
je, esse vazio esfá determinado pela reduseo das possibilida.
completo na picüesca clássica
- ganha forga e se faz inÍen-
samente p¡esente nos textos neOpicafescos-
( des de ascensáo social, ¡edugeo que se agrava drasticamente Já no plano do discurso, a ncopicaresca impae claras
( em proporcSo inversa ao grau de desenvolvimento económi- rupturas com a relativamente maio¡ uniforrnidade dos tex-
co de cada pals. Assim, no Tcrceiro Mundo, onde é cada vez tos clássicos; iá ndo é indispensável a autobiografia, que mui'
( mais notório o privilégio do capital sobre o tr8balho quanto tas vez€s será parcial ol] totalílenle substiluida pot outros
á sua remuneragáo, chega-se tr toraI eliminagáo das possibili- recursos nar¡ativos descnvolvidos pelo romance do século
dades ascensionais po¡ meio dcste último, (
XX. Da mesma maneira, o t¡atamento do ternpo deixa mui' I
( Parece-nos que os textos apontados psIodiam os fteios tas vezes de ser [inear, adrnitindo a complexidade própria do (
de ascensáo social eficazes nesse contexto socioecon6mico; seu uso pe.lo romance coDtemporáneo. E há lugar ¡ambém I
nessa paródia, mais uma vcz, a aventura e a trapasa sáo as (
para o fantástico e para o mágico, o que leva a ruPruras no
i
únicas armas do anti.herói rnarginalizado. tratamemo do espago e a uma maior aproximagáo com o ro- !
Contudo, nesscs ¡elatos contcmporáneos aparece, em al- mauesco.
gurna medida, a consci0ncia dc um projeto social oposto ao Quanto ao protagonista, na neopicaresca ele pode apa- I
da burguesia, cujo pofador pode ser o própr¡o plcaro ou ur¡a recer dolado dc uma maior gratuidade nas suas a90es e de
outra pcrsonagem, e que tem como bese e libcrdade. Na fo¡- uma maior capacidade de humo¡ cm relagáo ao §cü prcde' i
mulagáo desse projeto, a.Jguma ou algumas personagens as- cessor clássico, Consc¡va deste, porém, e até acentua, a rc' i
,,
I vig€ncia de uma vida socia.l paralela onde é possfveL se que- recursos que parodiam aqucles utilizados pela classe domi'
brar as rígidas hierarquias do cotidiano institucional. Essa nante para chegar lá e se marttcr nessa situagáo: apenas sobe
(
estrutura paralela se reflete em textos aJsim carnavatizados. quem pula. A maior novidade dos neopícaros qtrigá esteja
( Repetc-se, deJtc modo, o fenomeno da Europa em fins da em quc eles sáo capazes de formular um projcto social alter' (
Idade Média e da Espanha que,,ness€ contexto, p¡oduz a pri. nativo, em lugar dc como o pícaro clássico simplesmente
(
mcira picaresca.
-
procurarem a integrasáo na classe dominante.
- (
(
(
(
(
(
( 85
(
viráo de bloqueio ás doutrinas protesta¡tes. Tcm na Es-
panha sua ponta de lansa, com graves repercuss6es inter- (
nas para a nagEo.
(
9 Díscurso: no nosso estudo assim denominamos o conjuDto
dos recursos narraüvos utilizados na construg¡.o da r¡lstd-
na que nos é oarrada, e cuja alteragÉo sigpificari¿, neces-
Vocabulário crítico sa¡iamente. a narragáo de,¿ma histór¡a diferente.
Füolgo: individuo do estrato infe¡ior da nobreza, Os fidal-
gos, eru gcral, quando náo conscguiram sobreviver na a¡is-
tocracia, integraram-se na bruguesia em ascensáo. Na Es-
panha, durante os séculos XVI e XVII, o gra¡de nú¡nero
de fidalgos, a permanéncia de uma sociedadc estamcntá- (
ria e a rejeiqáo ideológica da burguesia e do trabalho dei- (
xaram muitos delcs em peno.sas situaqóRs satir;zadas fre-
( qüentemente pela Iiteratura. (
Anlíheréii pcrsona8cm que, numa nar¡Btiva, embora
( Folhetim'. narrativa seriada que era publicada com periodi- (
equiparando-se funcionalmente a um hcrói, desenvolve
cidade fixa em jornais e que acolhia nov€las ou formas nar-
suas agóes em funCeo de si mesmo, constituindo.se na an- (
rativas que pcrmitissem a seriagáo pmiódica.
tltese daquelc.
Históúa (ou F.ibula): entcndemos aqui como tal s succsseo (
Autor impl{ciloi imagcm do autor rcal.que se depreende da
de acontccimentos que nos sáo narrados como evocacao (
existencia do texto.
de uma ¡ealidade ficcional, e quc existe em si mesma ape-
Coma»alizacAoi influencia do cáJnave¡ na litcratura, que nas da maneira como nos é contada, sendo, assim, indis- (
tra¡spóe para esta diversos tragos dcssa festa, rais como sociáyel do d¿srurso urilizado. No enta¡to, a dislingáo pode
(
a supressáo das hierarquias, a profanagEo, as misturas de se¡ fcita como no nosso estudo em fungáo da análi-
todo tipo, a relatividade dos valorcs sociais, o sentido pa- -
se do texto.
- (
ródico etc. Scgundo Bakhrin * que descnvolve os aspec:
¡Ior¡a: estima e bom nome que o ind.ividuo merece pelas suas
tos bfuicos dessa teoria em Problemos da poético de Dos-
agócs. O conceito vem da Idadc Média e sobrevive com
toiewki
-, esse cotrtágio se dá ao longo da Idade Média
c até meedos do século XVll, quando a literarura passa
panicular forsa ne Espania, onde, com o tempo, ser hon-
(
( {
(
(
I
I
I'
(
(
8ó
(
( Íntertexlualidade: relaqáo que pode ser estabelecida enue do¡s Ropsódia: composisáo que, nos dominios da música conju.
ou mais textos de ourores dife¡entes, de modo a coosiderá" gada com a poesia épica, se apoiava na concatcnagáo dc
(
los como uma entidade literária maior. fragñentos de base popular. O ñodelo original da Crécia
( Msniqueismo. doutrina que se apóia na existcncia de dois clássica foi adolado pe]os músicos eruditos eu¡opcus do
principios irredutfveis: o Mal absoluto e o Bem.absoluto. século XIX e se tra¡sfe¡iu á na¡rativa que acumula hisró- (
(
Naffador: sujeito abshato que narra um tcxlo ficcional, rias folclóricas num texto maior.
( Utop¡a (da obra d€ Thomas Morus, escrito¡ ingles, t480.
Novela de cavslario: primeira manifestagáo do g3nero "no- (
( vela" devida prosiricacáo dos poemas épicos medievais. 1535): lugar ideal em que a organizagáo polftica permiti-
ü.
Apóia-se na série cie aventuras dc um hc¡ói cxemplar ria a harmónica e feliz convivéncia dos indivlduos. Habi- (
(
o cavalelfo dentro de um contcxto idealizado da aris-
- tualmente, usa-se com o sentido de projefo irrealizávet.
( -
tocracia feudal, Tem sua rlltima manifestagáo no ressur-
(