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Anais do 5º Encontro do Celsul, Curitiba-PR, 2003 (342-347)

A RETOMADA TEXTUAL - PRESSUPOSTOS E INFERÊNCIAS

Claudia de Faria BARBETA (UEL)

ABSTRACT: This study is part of a research project entitled AVALTEXT. carried out by the Letters
Department at Londrina State University. It also aimed at contributing to the development of a
diagnostic evaluation which could help teachers become more aware of certain narrative side-tracking
related to the structural and micro-structural organization of texts produced by students, taking into
consideration one of the most basic processes in textual coherence construction – the
recapitulation/recap.

KEYWORDS: recapitulation/recap; coherence; diagnostic evaluation

0. Introdução

Até os anos 60, muitas pesquisas que buscavam descrever o funcionamento da linguagem
humana e a estrutura da língua restringiam-se ao estudo da palavra ou da frase. Entretanto, essas
descrições não davam conta das características semânticas ou contextuais que surgiam nas diferentes
situações de comunicação. Dessa forma, nasceu no final da década de 60, a Lingüística Textual, que
segundo Fávero e Koch (1994), buscou tomar como objeto particular de investigação, não mais a palavra
ou a frase, mas sim o texto, por ser este a forma específica de manifestação da linguagem. A preocupação
seria, então, descrever os fenômenos lingüísticos que ocorriam além da frase.
Inicialmente, a Lingüística Textual ainda estava muito atrelada à gramática frasal. A preocupação
dos estudiosos da língua ainda era a investigação de relações interfrasais e transfrasais. O interesse
voltou-se para questões como a correferência, o emprego do artigo e a correlação entre os tempos
verbais. Fávero e Koch (op.cit) observam que, embora neste primeiro momento um passo importante
tenha sido dado para a superação dos limites da frase , ainda não se pode dizer que um novo tratamento
autônomo do texto havia sido incorporado. Neste tipo de análise, não se distinguiam nitidamente os
fenômenos ligados à coerência daqueles ligados à coesão textual.
Na década de 70, sob a influência da gramática gerativa, apreendeu-se uma gramática de texto.
Este não era visto apenas como uma seqüência de enunciados, mas um objeto que possuía significação em
seu todo. Baseado no conceito chomskyano de que todo falante possui uma competência textual que lhe
permite reconhecer e produzir textos coerentes, buscou-se construir uma gramática de texto. Costa Val
(2000) explica que essa gramática procurava definir o que faz com que um texto fosse um texto, e não
uma mera seqüência , ainda que coerente de enunciados, e descrever os fatores de coerência ou de
textualidade, bem como estabelecer critérios de tipologia textual.
Neste tempo, enquanto diversas teorias e pesquisas procuravam explicar os fenômenos lingüísticos
mais abrangentes que a frase, por meio de uma gramática de textos, o lingüista francês Michel Charolles
(1997), publicou o artigo Introcuciton aux problèmes de la coherence des textes. A importância desse
trabalho, segundo Costa Val (op.cit.), é atribuída ao fato de o autor explicitar o sistema implícito de regras
de coerência com o qual operamos na produção.
Preocupado com as estratégias de intervenção desenvolvidos por professores franceses frente a
certos textos escritos e julgados como incoerentes, Michel Charolles (1997) optou por pesquisar
alternativas pedagógicas que contribuíssem para uma avaliação sistemática, por meio de critérios que
proporcionassem intervenções pedagógicas mais rigorosas, ao avaliar-se a coerência de um texto.
O pesquisador francês percebeu que, geralmente, o professor, ao avaliar o texto de seus alunos,
não conseguia ultrapassar o nível de apercepção imediata, denunciando ingenuamente as malformações
textuais que encontra ("mal escrito", "incompreensível", "refazer") e conduzindo a intervenções
freqüentemente pouco eficazes.
Seu trabalho procurou desenvolver um modelo para análise de textos, enfocando justamente um
aspecto a respeito do qual dificilmente o professor pode ser preciso ao avaliar uma redação - a coerência
textual. Em geral, ele percebe "falhas" relativas ao encadeamento lógico das idéias do texto, mas não as
pode identificar com objetividade.
Charolles (op.cit) afirma que uma condição necessária para que um texto seja coerente é
associação de uma seqüência de micro e macroestruturas coerentes. A coerência microestrutural refere-se
ao nível local do texto, em que as relações de coerência se estabelecem ou não, entre as frases da
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seqüência textual. A coerência macroestrutural refere-se ao nível global, em que as relações se


estabelecem entre as seqüências construtivas.
Para Costa Val (2000), o trabalho de Charolles é importante porque propõe a coerência e o sentido
do texto como dependentes da situação, o texto não é nem deixa de ser coerente em si mesmo, mas é
coerente ou não para alguém em determinada situação.

“A aplicabilidade das propostas de Charolles para a compreensão da natureza e do


funcionamento dos textos e para o ensino me parece considerável até hoje, porque o conceito de
coerência permanecia um tanto vago , intangível, e torna-se um pouco mais operacionalizável a
partir da postulação das quatro metarregras pelo autor”. (op.cit.,p.42)

Dessa forma, Charolles (1997) procurou desenvolver um modelo de análise de textos,


preocupando-se com o aspecto da coerência textual e, segundo Costa Val (op.cit.), procurou articular
elementos da constituição semântica de interlocução. O lingüista francês formulou quatro metarregras
fundamentadas de coerência, que subsumem a coesão:

- metarregra da relação: a coerência textual é estabelecida quando os elementos representados no


texto envcontram-se ligados entre si.

- metarregra da não-contradição: a coerência é atestada quando nenhum elemento semântico que


contradiga um conteúdo posto for introduzido ao texto.

- metarregra da progressão: para assegurar a coerência faz-se necessário que, no desenvolvimento


do texto, sejam introduzidas novas informações que garantam a progressão.

- metarregra de repetição: para que o texto seja coerente é preciso que, no seu desenvolvimento
linear, contenha elementos de recorrência estrita. Para assegurar esse equilíbrio, a língua possui
mecanismos variados como a pronominalização, a definitivação, referenciações contextuais, substituições
lexicais, recuperações pressuposicionais, retomadas de inferências. Esses mecanismos amarram as frases,
certificando a seqüência dos enunciados para que o texto não fique sem sentido, incoerente.

Costa Val (op.cit) ressalta que as metarregras se mostram úteis em sala de aula porque explicam
como se constitui a coerência, possibilitando ao professor orientações e avaliações mais objetivas. A
autora também enfatiza que o trabalho de Charolles (1997) não perde de vista que a coerência não é uma
questão que possa ser resolvida no âmbito do texto enquanto produto, mas, antes, é um processo
desenvolvido na relação de interlocução.
Esse estudo de Charolles (1997) vai ao encontro das pesquisas da Lingüística Textual , a partir
dos anos 80, quando surge a preocupação em construir “teorias de texto”, nas quais, conforme Fávero e
Koch (1994), assumem relevância primordial o tratamento dos textos no seu contexto pragmático, ou seja,
as preocupações com os fatores de produção, de recepção e de interpretação de textos. Conforme as
autoras citadas, o desenvolvimento das teorias de texto muito se deve, por um lado, à teoria dos atos de
fala e à lógica das ações, e, por outro lado, à pragmática lingüística, a qual se propõe estudar a linguagem
do ponto de vista de seu uso e de seus usuários. Fundamenta-se a lingüística textual na concepção da
linguagem como atuação sociocomunicativa, inserida numa situação específica de comunicação.

1. A pesquisa

Nesse sentido, pretendemos apresentar alguns resultados obtidos na análise de textos narrativos
produzidos por alunos envolvidos no projeto AVALTEXT. Este projeto busca promover a avaliação dos
trabalhos de extensão relativos ao projeto Linguagem, texto e cidadania, detectando, nas produções
textuais dos sujeitos, índices comprobatórios da eficácia ou não de metodologias e recursos didáticos que
propiciem reflexão e a continuidade da intervenção ou possibilidade de superação. Além disso, pretende
levantar um perfil da escrita de textos narrativos dos alunos do Ensino Fundamental provenientes da
escola pública e elaborar materiais explicativos e de apoio dirigidos a professores do Ensino Fundamental
e do Ensino Médio.
Especificamente neste trabalho, os textos foram analisados sob o prisma da metarregra de
repetição de Michel Charolles (1997), que, como foi explicitado anteriormente, por meio de pesquisa de
caráter pedagógico, procurou definir critérios para a avaliação da coerência textual. Em uma primeira
etapa, foram estudados 100 textos narrativos produzidos pelos alunos da Guarda-mirim de Londrina.
Após uma intervenção pedagógica, foram analisados 72 deles que tratavam do mesmo tema e produzidos
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pelos mesmos autores. Nas duas etapas, o objetivo foi o de realizar um levantamento percentual da
ocorrência e pertinência de problemas referentes ao surgimento de retomadas. A produção dos alunos
seguiu a um padrão previamente fixado, com o mesmo encaminhamento didático-pedagógico, com o qual
se garantiu isolar, ao máximo, possíveis elementos de variação. Para cada elemento examinado nas
produções, foi levantado um quadro estimativo das ocorrências classificáveis sob o ponto de vista da
retomada. Neste momento, ateremo-nos apenas às ocorrências pertinentes as recuperações
pressuposicionais e inferências.
A coleta das produções textuais que compõem o corpus deste trabalho foi realizada em dois
momentos: nos meses de março e novembro do ano de 1999. Escolheu-se a produção de narrativas, por se
ter a crença de que esse gênero é bastante adequado à faixa etária e ao nível de escolaridade apresentados
pelos sujeitos. Além disso, Perfeito (1999), ao definir a narrativa como o ato discursivo que se
compromete, em essência, com o acontecimento, com a expressão da realidade em movimento, ressalta a
convergência entre lingüistas, psicolingüistas e psicólogos na atribuição da grande importância ao gênero
narrativo na psicologia popular e cognitiva, assim como no processo de aquisição e desenvolvimento da
linguagem oral e escrita.
No primeiro momento, no início do ano letivo de 1999, foram coletadas cem produções textuais
pelos diversos alunos-professores participantes do projeto de extensão Linguagem, Texto e Cidadania. No
primeiro dia do projeto, os estagiários solicitaram aos meninos que escrevessem um texto narrativo a
partir de um tema pré-estabelecido:

Escreva uma história sobre dois grandes amigos que na juventude têm que se separar em virtude
de um motivo. Depois de algum tempo, um deles arquiteta um plano para que possam se
reencontrar.

A intenção era, segundo os coordenadores do projeto, fazer uma avaliação diagnóstica do nível
lingüístico-textual em que esses alunos se encontravam e, ao mesmo tempo, coletar material para uma
comparação posterior, no final do ano letivo, a fim de mostrar (se houvesse) avanços na produção de
textos. Assim, os sujeitos escreveram sem terem tido uma preparação prévia, nem refacção textual.
Além disso, a produção dos alunos obedecendo ao padrão previamente fixado, ou seja, contendo o
mesmo tema, o mesmo encaminhamento pedagógico, garantiu isolar, ao máximo, possíveis elementos de
variação.
Então, após uma intervenção pedagógica em que se visou a um trabalho interativo com o texto, já
descrito anteriormente, foi pedido que os alunos escrevessem um segundo texto, com o mesmo padrão
estabelecido inicialmente.

2. Recuperações pressuposicionais e retomadas por inferências

Charolles (1997) afirma que para que um texto seja (micro e macroestruturalmente) coerente, é
preciso que contenha, no seu desenvolvimento linear, elementos de recorrência estrita enfatiza que, para
assegurar esse equilíbrio, a língua possui recursos variados que amarram as frases, certificando a
seqüência dos enunciados e tornando o texto coerente. Entre esses processos, o autor cita as recuperações
pressuposicionais e as retomadas de inferência –
As recuperações pressuposicionais incidem na retomada de conteúdos semânticos e pragmáticos
não manifestos que devem ser reconstruídos para que apareçam, explicitamente, as recorrências.
Charolles apresenta o seguinte exemplo:

(05) A) Será que Felipe vendeu seu carro?

Com as respostas:

B) Não, ele vendeu a bicicleta.


C) Não, roubaram-lhe.
D) Não, ele emagreceu.

Assim, o autor, afirma que as seqüências S1 ((A)+(B)) e S2 ((A)+(C)) parecem ser, a princípio,
mais coerentes, comparadas à S3 ((A)+(D)), das quais é improvável reestabelecer a continuidade. No
entanto, todas as seqüências (B), (C) e (D) retomam, assegurados pelo pronome “ele”, o termo “Felipe”
constatado no (A). Entende-se, portanto, que, em (D), a retomada pela pronominalização não foi
suficiente para garantir a coerência de uma seqüência. Isso se deve ao analisar o fato de (B) e (C)
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retomarem no seu posto uma das pressuposições da pergunta "Felipe vendeu alguma coisa" em (B),
"Aconteceu alguma coisa com o carro de Felipe" em (C), enquanto (D) não retoma nenhuma.
As retomadas de inferência são proposições tomadas de um enunciado, mesmo que não façam
parte inalienável dele. Ambas exigem uma articulação lógica de conhecimentos de mundo que,
eventualmente, o aluno pode não dominar, fato que por si já sugere a necessidade de cuidados por parte
do professor, ao propor exercícios de continuação de textos.
As retomadas de inferência são proposições tomadas de um enunciado, mesmo que não façam
parte inalienável dele. A ativação das inferências, tiradas do texto inicial, coloca sempre problemas aos
alunos, já que esta operação envolve conhecimentos de mundo (ou de mundos) aos quais as crianças
podem não ter acesso.

Por vezes, a (re)ativação de referentes, a partir de 'pistas"expressas no texto, se dá a partir de


uma ou de algumas partes; um conjunto a partir de um ou mais subconjuntos; enfim,
conhecimentos que fazem parte de um mesmo "frame" ou "script", a partir de um ou vários de
seus elementos explícitos na superfície textual. (Kock, 2000, p. 33)

Tanto a recuperação pressuposicional como as retomadas por inferências exigem uma articulação
lógica de conhecimentos de mundo que, eventualmente, o aluno pode não dominar. Segundo Charolles
(1997, p.57) “a incoerência ou a esquisitice de certos textos de alunos provêm, às vezes, do fato de que
algumas inferências que supomos poderem se efetuar legitimamente não são assumidas ou, pior, acham-
se contraditadas no próprio texto”.
Portanto, esses mecanismos remetem a um conhecimento de mundo ou às leis do discurso e
permitem ao texto apresentar um desenvolvimento temático contínuo, ao mesmo tempo em que os
elementos não se dissociam pela ausência de nexo entre eles.
O autor afirma, pois, que, quando o professor analisa certos exercícios de prolongamento de texto
(continuar a estruturação de um texto a partir de um início dado), os alunos são levados a veicular certas
informações pressupostas pelos professores.
Por exemplo, quando se apresenta um início de um texto do tipo: Três crianças passeiam num
bosque. Elas brincam aos detetives. Que vão eles fazer?A interrogação final permite-nos pressupor que as
crianças vão realmente fazer qualquer coisa.
Um aluno que ignore isso e que narre que os pássaros cantavam, enquanto as folhas eram levadas
pelo vento, será punido por ter apresentado uma narração incoerente, considerando-se a questão
apresentada.
No entanto, um professor terá que ter em conta que essas inferências ou essas pressuposições se
relacionam mais com o conhecimento do mundo do que com os elementos lingüísticos propriamente
ditos.
Assim, as dificuldades que os alunos apresentam neste tipo de exercícios, estão muitas vezes
relacionadas com um conhecimento de um mundo ao qual eles não tiveram acesso. Por exemplo, será
difícil a um aluno recriar o quotidiano de um multimilionário, senhor de um grande império industrial,
que vive numa luxuosa chácara.
Essa perspectiva sugere a necessidade de cuidados por parte do professor, ao propor exercícios de
continuação de textos.

3. Dois exemplos

A seguir, apresentaremos dois exemplos de textos. No primeiro, a recuperação pressupocional


parece estar adequanda. No segundo exemplo, percebe-se que o aluno produtor do texto cometeu desvios
quanto à proposta inical. Vale lembrar que o texto foi produzido diante da seguinte tema:

Escreva uma história sobre dois grandes amigos que na juventude têm que se separar em virtude
de um motivo. Depois de algum tempo, um deles arquiteta um plano para que possam se
reencontrar.

Texto 1

Renato e Reginaldo eram dois amigos da juventude, e não se separavam de jeito algum, mas por
um motivo tão forte os dois tiveram que se separar rapidamente, cada um tinha que procurar um
lugar longe do outro e, também tinham que esquecer de tudo o que tinha acontecido naquele
tempo.
- Querem sabaer qual é esse motivo tão medonho que os separou.
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O motivo é que quando eles eram jovens eles mexiam com drogas. Um dia eles não tinham
mais como comprar ou trocar alguma coisa pó aquela porcaria.
Foi num dia de quarta-feira que tudo aconteceu.Reginal e Renato pegaram seus revolveres
sairam nesta madrugada, ou até a ultima noite dos dois juntos, Reginaldo e Renato sairam atrás
da droga e nada conseguiram encontrar.
Foi quando eles tiveram que matar alguém para conseguir drogas. Isso foi que os
separaram, depois de muitos anos passados Reginaldo tenta reencontrar. Renato. E tudo da certo,
os dois se encontram, mais graças a deus eles esqueceram da droga e com isso, hoje eles são
muito felizes e pagam pelo crime que cometeram no passado.

Neste texto, o mecanismo de retomada pressuposicional parece estar empregado de forma


adequada e efetiva. A narração veicula informações pressupostas que o aluno é obrigado a aceitar e,
portanto, reconhecer.
Ao propor, portanto, a produção de uma narrativa partindo do pressuposto que os personagens do
texto se separaram por algum motivo e, posteriormente, vieram a se reencontrar, o aluno foi capaz de
organizar as idéias a partir de elementos que fazem parte do mundo que conhecemos. Conseqüentemente,
ele foi capaz de recuperar as pressuposições necessárias.
Outro aspecto pertinente a ser observado está em Naquele tempo, no final do primeiro parágrafo.
Há, aí, a retomada de elementos do contexto situacional. O interlocutor, ao ler o texto, recuperará o
elemento referido através da inferência. O espaço temporal ali indicado não é o mesmo de quando a
história é contada e sim de quando os personagens centrais da história eram jovens. Um tempo distante,
embora indeterminado. Aliás, o pronome demonstrativo naquele já indica o distanciamento desse tempo.
A retomada por inferência também parece ocorrer em nesta madrugada, em que há a retomada de
a última noite dos dois.

Foi quando eles tiveram que matar alguém para conseguir drogas. Isso foi que os separaram,
depois de muitos anos passados Reginaldo tenta reencontrar. Renato. E tudo da certo, os dois se
encontram, mais graças a deus eles esqueceram da droga e com isso, hoje eles são muito felizes e
pagam pelo crime que cometeram no passado.

No trecho destacado acima, o termo grifado, tudo, permanece vago, sem especificar o que
exatamente foi feito e o que deu certo. O leitor ficará, por certo, refém de suas hipóteses ao tentar
imaginar o que teria contribuído para o reencontro dos amigos e de que maneira, mesmo felizes, pagam
pelo crime que cometeram.
Enfim, em pagam pelo crime que cometeram no passado, pode-se inferir que os amigos passaram
algum tempo na prisão, pois é estabelecido no mundo conhecido que pessoas que cometem homicídio
“pagam pelo crime” ficando em prisões ou presídios, após serem julgados.

Texto 2

Eu acho que o rapaz pensou que ele descobriu que o ele que viajar um para a casa do outro.
Depois de algum tempo o outro viajo para a casa dele.
E depois de algum tempo o um o outro ir embora para cidade do outro.
Quando o rapaz viajou para São Paulo, ele viajou de madrugada, ele foi dormingo quando, o
rapaz, acordou já estavam em São Paulo aí ele foi direto para a casa do rapaz.
Chegando lá o outro amigo dele já estava casado tinha uma filha.
Aí o rapaz foi apresentar a sua esposa.
Depois eles almoçaram foram passear, e depois vinheram embora.

Esse texto apresenta, de início, desvios quanto à estrutura dos padrões do texto narrativo. Na
verdade, parece que o aluno não compreendeu a sugestão apresentada (contar a história a partir de uma
situação proposta) e construiu o texto como se fosse uma resposta a uma pergunta formulada, embora,
depois, ele tente contar uma história. O aluno produtor do texto não conseguiu, portanto, recuperar
informações pressupostas do tema inicial.
Ocorrem problemas de retomada que interferem na coerência textual e que tornam,
evidentemente, o texto confuso. Primeiramente, torna-se difícil identificar individualmente cada um dos
personagens, impossibilitando saber a quem o autor está se referindo.
Segundo Charolles (1997) “no exercício escolar, que consiste imaginar a continuação de um
texto, os professores esperam dos alunos sobretudo que forneçam expansões que sejam pelo menos
coerentes com a seqüência introdutória”.(p..57)
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Neste caso, o professor poderia intervir no processo de reconstrução de textos que apresentam
inadequações já citadas, apontando ao aluno alternativas diversas para a retomada de palavras ou frases
dentro do texto, conseguindo, dessa forma, o efeito esperado

4. Considerações finais

Charolles (1997) insiste que a ativação de inferências e as recuperações pressuposicionais tiradas


de um tema proposto pelo professor envolve conhecimentos de mundo, ou de mundos, a que nem sempre
os alunos tem acesso. Saber desse fato pode prover o professor de estratégias que o auxiliem na avaliação
do processo de produção textual de seus alunos.
Dessa forma, ao avaliar tais textos, esse professor poderá perceber as falhas no estabelecimento da
coerência textual. E, nesse contexto, situa-se esta pesquisa, no que se refere especificamente, à retomada
em narrativas textuais escritas de alunos do ensino fundamental.

RESUMO: O presente trabalho está vinculado ao projeto de pesquisa AVALTEXT, do departamento de


Letras Vernáculas da Universidade Estadual de Londrina, e busca, especificamente, contribuir para a
avaliação diagnóstica que possa auxiliar os professores a perceber determinados desvios relacionados à
estrutura e à organização microestrutural em textos narrativos produzidos pelos alunos.

PALAVRAS-CHAVE: retomada, coerência, avaliação diagnóstica

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHAROLLES, Michel. Introdução aos problemas da coerência dos textos (abordagem teórica e estudos
das práticas pedagógicas). In: GALVES, Charlotte et alii. O Texto: leitura e escrita. Campinas:
Pontes, 1997
COSTA VAL, Maria da Graça. Repensando a textualidade. In: AZEREDO, José Carlos de (org.). Língua
portuguesa em debate: conhecimento e ensino. Petrópolis: Vozes, 2000
FÁVERO, Leonor Lopes. Coesão e Coerência Textuais. 8.ed. São Paulo: Ática: São Paulo, 2000.
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KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. A coesão textual. 12.ed. São Paulo: Contexto, 1999
PERFEITO, Alba Maria. Leitura e produção de textos: maneiras de ver...maneiras de dizer... 1999, Tese
(Doutorado em Semiótica e Lingüística Geral). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciencias Humanas –
USP, São Paulo
SOARES, Maria Elias. Continuidade temática e referencial na produção de narrativas por crianças.
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