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A LINGUA NACIONAL
NOTAS APROVEITAVEIS
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A LINGUA NACIONAL
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II
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ANTIGUIDADE dos BRASILEIRISMOS
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(1) A primeira compilação de Moraes é de 1789, mas não passa
de um resumo de Bluteau ; a segunda edição (1813) é que constitue a obra capital do
lexicographo. As edições de 1823 e a de 1831,
terceira e quarta, representam ainda a continuidade dos trabalhos que realizou e
deixou inéditos.
(2) Por exemplo a das — Composições viciosas — em que se
exemplificaram: amo-lhe, adoro-lhe (Capit. III) modo de frasear que
na parte da syntaxe § II condemna como “erros das colonias”.
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(1) Alencar sempre se defendeu das arguições gra mmaticaes
que l he fizeram alguns puri stas port ugueses. Gonçal ves Dias numa carta
inti ma e me moravel, infelizmente pouco divulgada, e escripta
em 1857 punha a questão em seus verdadeiros ter mos, reclamando
para o Brasil a independencia razoavel e discreta da sua linguagem.
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Mots Signification
Pabulo Fat, suffisant
Capéta Lutin
Quindins Minauderies, petits soins.
Yaiá Demoiselle
Chibio Polisson, vaurien
Balaio Espéce de panier
Quitutes Ragouts, fricots
Batuque Danse des nègres
Tapéra Terrain abandonné
Capim Gazon
Coivara Action de brûler des broussailles
Findinga )
Fille publique
Fadista )
Charquear Préparer la viande sèche
Cuchilar Sommeiller
Munheca Le poignet
Chingar Passer de sobriquets
Cangote Le drignon
Calanda Magnétisme, des vapeurs
Muxingueiro Celui qui est chargé de fouetter les esclaves
Presinganga Ponton, prison.
Carpina Charpentier de bâtiment
Caçula Cadat d’une famille
Dondon Vaudeville
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Mots Signification
Fado Bouderie
Fuxicar Chiffonner
Farofa Ostentation ridicule
Mocotó Pied de bœuf
Mungangas Grimaces
Muxoxo Action de faire la moue
Boquinha Petit baiser
Mideixe Noli me tangere
Mulambo Guenille
Mascate Marchand forain
Mascatear Faire le marchand forain
Mandinga Fétiche
Muquem Boucaner
Muquiar L’endroit ou l’on boucane
Muxiba Des peaux de viandre maigre
Nanica Naine
Nuello Sans plumes
Quitanda Marché de vivres
Pequira Criquet
Pimpão Ferrailleur, crâne
Sipoada Coup de badine
Saracutear Tournailler
Trapiche Magasin au bord de l’eau
Rossa Maison de campagne ou ferme
Chacra Maison de campagne
Senzala Case à négres
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(1) Effecti va mente, era de uso vulgar no seculo XVIII. E assim
o encontramos nas Obras Poeticas de Valladares Gambôa:
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(1) A definição de Candido de Figueiredo, de — mat o que
se destina a roçar — não é exacta.
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(1) Essa di stincção é um dos cavallos de batal ha dos neographos
portuguezes que entretanto aconsel havam escrever passeio e passear
que a meu ver só se explica m por espaciar de espaço e espaçar, (fare
spazzo, ital. e spassieren, all.) “Folga m de espaciar-se, escreveu M.
Bernardes. O M oraes donde tomamos o exemplo regi sta espaciar-se
e tambem espaçar com o sentido de espai recer.
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BEBER AGUA DE CHOCALHO
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e em outros lugares do norte ha um remedio popular, differente da
milagrosa agua de chocalho, e um pouco mais drastico, na verdade.
Consiste em dar na cabeça da criança, levando-a para junto do
fogão, com uma colhér de panella. Com a pancada da colhér de pau
sara a mudez, que se desentranha em eloquencia.
E’ uma inversão dos processos da idade adulta, pois consta que a
pau é que se emmudece muita rhetorica intempestiva, nas crianças de maior edade.
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(1) Ant oni o Maria do Amaral Ribeiro, no decennio de 1850-1860
e ai nda depois, collaborou no antigo Al manaque de Castilho. Os seus
pequenos escriptos são dos mais proveit osos d’aquelle velho annuario.
Hoje, e desde algum tempo já, o Almanaque luso-brasileiro, sal vo
algum rebento florido, é uma vergontea caquetica que deslustra sua
antiga prosapia.
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(1) Ap. Romaguera — Vocab. 64. Cf. B. Rohan, e Coruja s. v.
A palavra bahiano indica o nortista, do Rio para além, pago é a
fazenda, estancia ou casa dos sertões do sul; passar buçal = enganar;
buçal, são arreios da cabeça do ani mal de mont aria.
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NA PINDAHYBA
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(1) Pindahyba e ibira accusam a mesma identidade entre al guns
botanicos. Veja Cami nho + Caminhoá í — Botanico, 1313, 1315.
ESTAR NA CHUMBERGA
Estar na chumberga. Chumbergar-se ou chumbregar-
se, tomar uma chumberga (embriagar-se).
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(1) Regi stra-a como termo de uso no Ri o Grande do Sul o Padre
C. Teschauer nas suas apostillas ao Vocabulario, Cf. Phrases de A.
Carval ho.
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(1) Alfredo de Carval ho — Phrases e palavras pag. 74 seg. Crei o
que não se trata do personagem indicado por A. Carvalho, segundo
as suas notas biographicas. V. Monstruosidade do tempo e da Fortuna
(1662-80) ed. de 1688, pag. 27, 99 e 150. O conde de Schomberg morreu em
Portugal.
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O’ quantos e quantos ha
De bigode fernandino
Que até de noite ás escravas
Pedem salarios indignos.
Obras, I, 88.
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POR DENTRO MULAMBO SO’
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(1) Entre port uguezes farofia é uma especie de doces de clara
de ovo, ovos nevados. Tambem se usa em sentido figurado e para
dizer de cousas vãs, sem peso, como espumas, fl ocos de neve etc.
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ou tambem:
Literalmente traduz-se:
Luxo de almofada, por dentro mulambos, isto
é, luxo de cobertura ou fronha e por dentro trapos
servidos, sujos ou rotos.
As variantes differem aqui apenas nas palavras
milambo (plural de mulambu) e isuta (plural de
kisuta); e ambos querem dizer farrapos ou trapos.
O sentido normal é o de trajes exteriores vistosos
e de luxo que encobrem as roupas menores ou
a miseria da camisa rota ou suja: por fora muita
farofa, por dentro mulambo só.
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JISABU’
Proverbios africanos e sua adaptação á linguagem
no Brasil: Papagaio come o milho e periquito leva a
fama. Macaco não olha o seu rabo.
Ou, portuguezmente:
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(1) E’ provavel erro a palavra rama em l ugar de fama. Esse
trecho foi publicado nos excerptos do Anatomico Jocoso da Bibl.
Univ. X, 40, pg. 124.
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(1)
Macaco não-vê rabo seu
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(1) As duas variantes quasi não differe m entre si. A pri mei ra foi dada pel o
Dr. Saturni no e Cast ro Francina e a mbas pelo autor do Jisabú.
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DITOS HISTORICOS
Para inglez ver. E outros modismos e expressões
hist oricas e politicas.
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(1) Os vocabularios de Baurepaire Rohan, Costa Rubi m. Coruja,
A. Taunay, C. Teschauer, Romanguera, R. Garcia, Chermont, R. Magalhães
Pereira da Costa, Ermelino Leão, Amadeu Amaral, representam a
bibliographia mais ordenada e systematica.
(2) Falta m-nos os lexicos da região central mi neira, do S. Francisco e do
extremo oest e Goyaz e M atto Grosso, que conhece mos por fragmentos
insufficientes e informações i ncompletas. Não menos sensivel é a ausencia
n’esses registros das vozes germanicas, slavas e
italianas, correntes na região meridi onal, e, (é possivel acredi tar), de
alguns vocabulos arabes da numerosa colonia syria esparsa pel o
Brasil.
No Paraná, mascates estrangeiros em seus negocios ambulantes
vendem dedaes sob o nome de pequerruchos; o vocabulo é evidente
mente allemão: — fingerhut. E como este deve haver outros exemplos de
nacionalização de vozes germanicas nas cidades do sul.
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Inhapa
Um de inhapa
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(1) Peruleros eram os espanhoes que voltavam das minas do Perú, gent e
rica e americanizada. O mesmo se deu em Port ugal que chamava
brasilei ros os portuguezes de t orna-viagem. E ai nda é uso actual,
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(1) O sentido vulgar de móta é o de aterro, achega de terra e n’esse caso
teria o seu signi fcado soffrido a mesma translação do latino exaggero
(Exaggerare, fazer montões de terra) com a idéa expressa de augmento.
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(1) Apud. — D. Granada — Vocabulario Rioplatense razonado, 61 — 262.
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Chacara
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(1) Não se entende e nada te mos que ver com a palavra tambem
conhecida e vulgar — chacara — esp. jácara, romance em verso, cantiga,
de origem i ncerta.
As chacaras ou quintas de recreio vergeis ou pomares correspondem a o
typo de habitação campestre a que na India os inglezes dão o nome de
compound. Este vocabulo anglo-i ndiano não est á bem averiguado quanto ás
origens a ha quem o supponha uma deturpação asiatica do port uguez campo,
campinho e campanha como se vê um pouco ad libitum. Veja-se o Hobson
Jobson 240—243, onde figuram varias etymol ogias propost as. Na Influencia
do Vocabulario portuguez em linguas asiaticas Monsenhor Dalgado fez
apenas um breve registro sem interesse especial.
Sob certos aspectos e em alguns casos a chacara do Rio de Janeiro
lembra tambem o bungalow angl o-india sem a sotéa ou terraço superior.
— 88 —
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(1) E’ possivel achar documentação mais antiga, mas não pesquizamos
neste sentido.
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Tocayo
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(1) Este xe ou chê apparece e m outros brasileirismos xe-rim-babo =
minha criação, isto é, aves do terreiro, ani maes domesticos. E’ usual no
extremo Norte.
Ahi, diz-se, chêro chêra; xará mais ao sul com a variante xarapim no
litoral e no interior. Não differe m essencialment e pela forma nem pel o
sentido. “João é meu xará ou xarapim”.
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Engambelar
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(1) Engabelar ou engambelar não figura no vocabulario riograndense ( o
mais complet o) de Romaguera, nem no Glossario paraense de Chermont de
Miranda. Parece t odavia que no ext remo-norte tambe m se diz engrambelar,
expressão provavelmente levada das regiões visinhas, onde a população
escrava foi mais numerosa.
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(1) O deus ou espirit o que revela ou adivinha segredos é em al guns
lugares o Ngombo por meio do seu servo ou sacerdote e feiticeiro Mukua-
Ngombo. Ta mbem se diz ku-zambula = adivinhar.
JAVEVO’
Javevó — é um nome que parece conter uma
frase inteira.
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MACACO VELHO...
Frase brasileira proverbial: Macaco velho não mette a
mão em combuca. Suas origens provavei s no folklore
americano e aryano.
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(1) Donde, a frase proverbial: cair na boca do lobo. E era ditado grego:
“Fóra da boca do lobo” (ék l ykou stómatos). Pertence innegavelment e á
tradição d’essa fabula a versão e hist orieta contada por Herodot o (II, 68) do
Ichneumon e (os dentes) do Crocodilo.
(2) Phedro (I, VIII).
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(1) O abacate goza na opinião popular de propriedades aphrodisiacas. Aba-catu
(assim como catu-aba, tambem preconisado de identicas virtudes) não passa de
suggestão verbal. Referimo-nos a interpretação e equivoco a que se prestaram
aquelles nomes. O abacate não passa por indigena, mas Rodrigues Ferreira
encontrou-o nativo no Rio Negro, no seculo XVIII. Tratamos déssa questão no livro
Folk lore.
— 111 —
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(1) Não é preciso recordar que ainda hoje o tupi é vul gar no Amazonas,
no tempo do autor da Poranduba era lingua popular no Maranhão, e em
seculos anteriores era-o em t odo o litoral do Brasil. No te mpo de Cardim a
capital da colonia tinha de população bra nca e negra menos da metade da
indiana.
TENHÊ=NHÊ
Tenhê-nhê. Parece uma onomatopeia.
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(1) Mysterios da Roça por Vicente Felix de Castro. Guaratinguetá, typ.
commercial de V. R. da Fonseca. 3 vols. 1861.
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(1) Communicado pessoal mente por R. Pombo.
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(1) Expressões que occorre m nos Mysterios da Roça: gurumi (moleque),
ajoelhar no capim, coxilar no capim (já explicado) a casa de Ignacio
(cadeia; ou ce miterio?) em ar de caiapiá (encolhido?); estar no apá (seguro)
bater guasca (fugir á redea solta), no cotucum (no bol so ou na unha),
mascar fumo (ficar irado, zangar-se). Estas expl anações que rapidamente
deduzi mos do texto necessitam mais ponderado exa me.
Não encontro essas expressões no excellente — O dialecto caipira — de
Amadeu Amaral. Gurumi deve ser uma variante de curumim. Nome de
planta rasteira é caiapiá, mas não percebo o sentido da frase. São
naturalmente expressi vas. — mascar fumo e bater guasca; me nos o é
cotucum no sentido que lhe dá o romancista.
CALUNDÚ E KIJILA.
Calundú. Frase: Estar com os seus calundús.
Variante: estar de lundú. E’ de origem africana.
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(1) Veja o Dicc. Kimbundu-port. de Cordeiro da Matta, s. v. Kilundu.
— 121 —
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(1) Costumes Angolenses, pag. 51. Veja tambem Baurepaire Rohan — Dicc. de
vocab. brasileiros, 28.
— 122 —
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MARAGATO
Maragato: hespanholismo da fronteira. Origens historicas na
peninsula iberica.
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(1) Vejam-se as interessantes notas de R ICHARD F ORT — Gatherings
from Spain, cap. VII.
Derivados: maragateria (na Espanha a região onde habita a parte
sedentaria da tribu), maragatear, maragatagem, maragatice. Al guns
etymol ogos assignalam á palavra uma origem celtica, mare’kat = cavalgar,
andar a cavallo ou montado.
— 125 —
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MOFINA
Mofina — obliteração de sentido que resulta de
elementos varios. Superstição ligada á significação do
vocabulo.
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(1) Documenta m o facto os artigos reunidos sob o titulo Camões e os
Portuguezes no Brasil. Reparos criticos pelo Dr. Figueiredo Magalhães.
Rio, 1880, passim.
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(1) Revista do Minho, XIII, 1 — 4. E’ um conto popular que por
brevidade não transcrevemos.
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(1) Lowenstimm — Superstição e direito penal, trad. port. de A. Ansur. Porto,
1905; pag. XIII e 98; 119.
NEM A GANCHO
Frase de orige m e indole portugueza: Nem a gancho.
Archaismo. Anti ga legi slação portugueza.
D’onde proveiu?
Como é muito usual no Brasil, pareceu-me a
principio exclusivamente nossa, desde a sua
etymologia.
Mas se é um brasileirismo de uso, não o é de
estirpe. Demos-lhe uma popularidade que não teve
na metropole e não transparece na sua literatura
burlesca e comica do outro tempo.
O Brasil poderia crial-a, não ha duvida.
Occorreu-me, á primeira vista, que se devia
achar a sua origem no costume de navegar a gancho
nos nossos grandes rios do norte, como é o caso e
unico recurso quando se sobe contra a corrente.
Então, só a gancho é que é possivel vingar o
impeto indomavel das aguas; e nada valem os
remos.
Em geral as embarcações que sobem aquelles
grandes rios evitam o canal e a força da corrente,
acostam-se ás margens e aos barrancos donde a
vegetação se debruça sobre as aguas; e os
barqueiros, em vez de remos, meneiam grandes
ganchos, forquilhas ou croques com que fazem
andar a embarcação.
E’ coisa sabida de todos.
Na sua Viagem pelo Tocantins attesta-o
— 137 —
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(1) Effectivamente existe caapora que corresponde a caipora, de moni o
da floresta, e expressão conhecida no folk lore brasilico, nada tem de
commum com canhembora.
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(1) Nas tri bus do norte canhemo = desapparecer, não parece termo geral.
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(1) Veja-se a ulti ma nota d’este capitulo.
(2) Cordeiro da Matta. Dicc. Kimbundu, s. v. Kilombo, 23.
(3) Mucamas (mul heres africanas) era m as escravas de cama
denominação port ugueza que “ passou á lingua de Angola, como o sordido
costume dos harens de escravas, introduzido pelos senhores brancos”.
Mucama traduz-se litteralmente: na cama (diz Cordeiro da Matta). Parece -
nos objeccionavel este modo de ver de pessôa aliás autorizada. Esse
costume pol ygamico era proprio dos negros e não foi importado e nem o
fora m as palavras que naturalmente o designam.
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(1) O mesmo — Op. Cit. 191. Não importa aqui o estudo historico dos
quilombos, já memorados por Bralœus, Marcgraf, e escript ores port uguezes
e brasileiros do tempo.
Da exi stencia dos quilombos derivou a dos Capitães do Mato, suj eitos
que com licença do governo, podia m andar armados e constituir bandos de
caça aos escravos. Ao capitão-do-mato cabia, entre out ras vantagens, a
propriedade de crianças nascidas no quilombo.
Derivações: quilombo, quilombola calhambola, canhambora; mocambo,
amaca mbar (verbo); no sertão de S. Francisco tambe m se diz quilombeiro e
assim o registra James Wells — 3.000 Miles through Brazil (II, 161) e
defini-o como outlaw (i bid. II, 383).
(2) Do sertão de Libollo. Publicada na Revista do Minho, vol. XVIII pg.
18.
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(1) Veja Heli Chatelain — Folk Tales of Angola, pag. 267, sob a nota
176.
PICA=PAO
Frase: Tem penna de picapáo. Variantes. A lenda do picapáo
no folk lore europeu. O irapurú indigena.
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(1) Rev. da Acad. Cearense; tomo XV pag. 56.
— 151 —
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(1) E’ informação de Gualter R. Silva (do Ceará); é tambe m a que
registra E. GOELDI nas Aves do Brasil, pag. 150, e a do pri ncipe de Wied, o
naturali sta; e é a que encerra a variante citada —tem folha de picapáo.
O influxo exercido pelos vegetaes tanto serve para abrir coi sas fechadas
(e este é o caso) como para fechar o corpo contra feitiços e maleficios de
origem. Essa virt ude, te m-n’a, por exe mplo o ra mo do pinhão de purga
(Jatropha curcas) que convem ter e m casa para neutralizar mandingas e
quebrantos, como diz Pereira da Cost a no seu Folk lore pernambucano, 108.
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Penica-páo é marinheiro
Ninguem póde duvidá,
Com seu barrete vermelho,
Sua camiza de zungá...
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(1) Uipieu em GABRIEL S OARES , Ipecu em M ONTO YA e em G RANADA,
Vocab. Rioplatense. O nome mais geral na America espanhola é carpinteiro,
pelo habito de picar os troncos velhos das arvores com o que a ave procura a
alimentação em caça aos insectos.
A cantiga popular a que me refiro acima está entre as do cancioneiro de
M ELLO M ORAES .
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(1) E’ o que diz G RANADA — Supersticiones del Rio de la Plata. “E’ o
portador de la muerte e otras desventuras” pag. 260. Confirma -o tambem o
PADRE C. T ESCHAUER na sua monographia — As aves no Folklore brazilico
(separata, 157).
(2) P LINIO, Hist. nat. 1. X citado e m Wied, Goeldi, e out ros nat urali stas.
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*
A lenda do pica-páo embora de formação e
migração européa, confundiu-se com a do Irapurú,
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(1) “Schon in einen Gediehte Meister Altshwerts, wird der Zugang zu dem Berge
durch ei n Kraut gefunden... Kau m hat es der Dichter gebrochen, so kommt ein
Martiusvoegelchen geflogen, das guter Vorbedeutung zu sein pfle gt; diesem folgt er
und begegnet e inem Zwerge, der in deu Berg zu Frau Venus führt ” — S IM - ROCK . ap.
Gubernatis — Myth Zool. II 281.
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(1) H. W. Bates no seu admiravel livro The Naturalist on the river Amazons pg.
358, cap. XII) conta varias anecdotas sobre o mythico Uíra-pará (Irápurú); a ave era
tão procurada pelas suas virtudes de talisman erotico que lhe não foi possivel obter
qualquer exemplar authentico d’essa mentirosa phenix. O desenvolvimento d’esse
mytho nos povos aryanos nas remotas edades do Deus Picus, acha-se tratado no
livro do Folklore que escrevemos.
IDIOTISMOS
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DOIS MODISMOS
I
Tibi! tibi-vôte! vôte-tibi! são expressões obcenas.
— Von-te ao tibi.
— Ao tibi vou-te.
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(1) No Canc. do Norte de Rodr. de Carvalho apparece a forma i solada:
Vôte!
(2) Veja a nota s. v. no Indice final deste livro.
— 163 —
II
ANDAR AO ATA’
Um dos mai s anti gos modi smos brasileiros.
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(1) Havia mos registrado no Dicc. gramm. (s.v.) e na Selecta classica.
Diz-me um correspondente que existe a variante — ao tatá — na região do
S. Franci sco.
AMANHAN E’ DIA SANTO
Uma frase do folk lore infantil: amanhã é dia santo. E’
brasileira de arraigado uso mas européa quanto á
derivação hi storica. Conj ecturas acerca de sua orige m
medieval.
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(1) Nas frases feitas — passim.
— 170 —
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(1) Sermones et exempla Jacobi Vitricencis (que precederam os de Etiene
de Bourbon (Stephanus...) de que damos abaixo o texto de Vitry os Exempla
vulgaria e o de Pedro Aphonso a Di sciplina clericalis foram os mais lidos,
até os te mpos modernos entre pregadores e t heologos, e eram livros
indispensavei s nas livrarias dos eruditos.
— 171 —
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(1) E’ o n. 325 do Tractatus de divers’s materiis, prœdicabilibus de St.
(Etienne) de Bourbon (ed. mod. 1877) e é tambe m de Vitry; ambo s do
seculo XIII.
— 172 —
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ALARIFE
Alarife. Palavra arabe de uso especial na America.
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(1) Foi registrada moderna mente por Dozy e Engelmann (2.ª ed.) e
Eguilaz y Yanguas — nos seus vocabularios que seguiram a P. de Alcalá.
Desde este antigo vocabulist a castelhano a palavra alarife é defini da mais
exacta e precisamente como juiz alvanel, juiz de edificios.
Com a duvida bem fundada na inexistencia de textos portuguezes não se
comprehende que da palavra proble matica Domi ngos Vieira, tão mal a
proposito, tirasse a conclusão de “influxo arabe sobre o geni o architectonico
portuguez”. Entretant o, ella exi ste no Brasil.
Não foram os portuguezes que no-la herdaram. Apenas é corrent e na
frontei ra meridional do paiz, onde se entre meiam as gentes plati nas e a
nossa.
— 176 —
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(1) Voc. criollo-espanol sud-americano por Ciro Bayo — Madrid, 1911.
— 177 —
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MURICI
Murici. Frase: E’ tempo de murici, cada um cuide
em si. Valor da expressão. O antigo nome do
choleramorbus na India portugueza. Origem provavel do
proverbio.
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(1) G. Soares II, cap. 54. Tambe m a descrevem Piso I, 79, e Marcgrav,
118.
— 181 —
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OLHOS DE SAPIRANGA
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(1) E’ caso para outra opportunidade, no estudo da frase pôr-se na pi ra.
EREJUPE’
Ere jupé? tu vieste? formula de saudação entre os indios.
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(1) Ed da Rev. do Instituto, tomo LXV.
— 192 —
(1)
“Vieste? que o seu Deus venha comvosco”.
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VASA =BARRIS
Dar em Vasa-barris...
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ant es da conquista defini tiva dos port uguezes, foi frequentada pelos
francezes que commerciava m com o gent io, fazendo o pau brasil.
Irapiranga (pau vermel ho) e Ubi ratiba (abundancia de pau) t ornaram-se
os nome s ent ão mai s vulgares.
(1) V. Ayres do Casal, 2. ª ed. II, 127: Cf. o rot eiro antigo de Pimentel.
Art e de navegar, que ainda assignala o risco daquellas paragens. Era
grande o numero das náos que vinha m á capital da col oni a e demandava m
a costa naquella altura.
— 199 —
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NORUEGA
Noruega no Brasil é o terreno que por sua orientação e m
meio de outros não póde quasi receber sol.
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(1) Lições de Philologia de Leite de Vasconcellos.
— 203 —
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(1) Repertorio, sec. XVI, fol. 57 e fol. 127 v. da edição de 1594.
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(1) Na Arte de Caça de Ferreira (sec. XVI); na Fastigimia (seculo XVII) pg. 38.
— 205 —
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(1) E a op. cit. de Antonio Henriquez Gomez, apud o commentario
oppost o ao Diablo Cojuelo de Guevara na edição moderna dos Bibliophilos
espanhoes, pg. 174, a proposit o da expressão gerigonza critica, applicada ao
culteranismo.
Nas suas viagens pel o i nterior do Brasil o capitão Burt on, fundado
provavelmente em i nformação das localidades assignala as Catas Altas de
Matto Dentro por opposição as Catas Altas de Noroega — Richard Burton — The
Highlands of the Brasil, I, 312 nota.
— 209 —
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(1) O text o do capitulo foi um fragment o dedicado ao nosso phil ologo
Mario Barreto.
A PALAVRA MARANHÃO
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(1) Nã o mui to fre que nte me nte. Le mbra e ssa ori ge m Herbe rt Smit h
sob a forma aceita vel — paranã — no se u li vro Brazil-Amazons and t he
Coast — Cap. I, 21.
— 216 —
— Isso agora, é que tem mais que se lhe diga! Que lingua
vem a ser essa Marinhinhos e Marinhões, e o que mais, que
mais.
— E’ um boi, é boi, respondeu a rapariga a quem faltava
paciencia para vêr estar a pensar muito tempo.
— Um boi? sempre queria saber como isso é um boi.
— Mil marinhinhos são os pellos.
— Ah!... e mil marinhões ?
— São os pellos maiores, respondeu o pae.
Dois parafusos são as gaitas continuou a filha.
— E então, provavelmente os quatro chantões... ia a dizer
Daniel.
—Pois essa de todas é a mais bonita, — disse Daniel, e
que effectivamente no estado de espirito em que se achava
encontrou certo sainete de originalidade no desparatado
anigma tão popular no Minho”.
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————
VARIA
Frases varias. Nota bibliographi ca aproveitavel.
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UMA SUPERSTIÇÃO POPULAR
— Signaes de mentira nas unhas.
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INDICE DE COISAS
————
Alencar, José, (pg. 216, nota) — “Alencar sempre se
defendeu das arguições de alguns puristas”.
Sempre: embora algumas vezes sem exito apreciavel. O
sentido principal das suas palavras era, entretanto, o da
necessidade imperiosa da independencia literaria:
“Como as cousas litterarias esquecem depressa entre nós, não
vem fóra de sasão recordar os termos desta controversia
litteraria, que sem animo deliberado acha-se travada de mundo a
mundo, atravez do oceano, e em condições as mais desfavoraveis
para mim.
“Meu verdadeiro contendor não é o senhor Dr.... mas a
litteratura portugueza, que tomada de um zelo excessivo
pretende por todos os meios impôr -se ao imperio americano.
Infelizmente vae-lhe á colla grande parte dos escriptores deste
Brasil, ainda tão pouco nosso, os quaes sacrificam o sentimento
nacional por alguns fofos e poidos elogios da imprensa,
transatlantica.
“Contra essa cohorte formidavel pelo talento, pelo numero e
pela intolerancia, arco eu e só; um simples curioso em litteratura,
e esse unico. Ha talvez por ahi, na mocidade que desponta
exuberando melhor seiva, alguns talentos bafejados pelas auras
americanas, a quem vibram no intimo os assomos de nossa
independencia litteraria, como outrora a idea da emancipação
politica fazia palpitar a geragão de 1822”.
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Pags.
Advertencia .............................................................. 5
A lingua nacional....................................................... 7
Antiguidade dos brasileirismos ..............................23
Beber agua de chocalho ..........................................39
Na pindahyba ...........................................................47
Estar na chumberga .................................................53
Por dentro mulambo só ...........................................61
Jisabú........................................................................67
Ditos historicos ........................................................75
Sul-americanos ........................................................79
Javevó.....................................................................101
Macaco velho.........................................................107
Tenhê-nhê ..............................................................113
Cahendú e kijila.....................................................117
Maragato ................................................................123
Mofina ....................................................................127
Nem a gancho ........................................................135
Quilombo-mocambo..............................................141
Pica-páo..................................................................149
Idiotismos...............................................................157
Dois modismos ......................................................161
Andar ao atá ...........................................................163
Amanhã e dia santo ...............................................167
XXII
Pags.
Alarife ....................................................................173
Murici (é tempo de...)............................................179
Olhos de sapiranga ................................................185
Erejupé ...................................................................189
Vasa-barris .............................................................195
Noruega..................................................................201
Maranhão ...............................................................211
Varia.......................................................................231
Superstição — Mentiras........................................237
Indice das Coisas .................................................243
Epilogo ...................................................................261
Indice dos capitulo ................................................263
PARA CITAR ESTA OBRA:
RIBEIRO, João. A Língua Nacional: Notas Aproveitáveis. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1933, 2ª edição, 262 pp.
Consultada na bvCLB - Biblioteca Virtual das Ciências da Linguagem no Brasil
http://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/obr018
[Fonte: Biblioteca do Instituto de Estudos da Linguagem – IEL, UNICAMP]
Endereço:
Rua Caio Graco Prado, 70
Cidade Universitária “Zeferino Vaz” – Barão Geraldo
13083-892 – Campinas-SP – Brasil
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