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Fevereiro

2020

FORMAÇÃO

Atualização Fiscal em IRS


– Aspetos práticos

DIS1020

Luís Filipe Esteves

www.occ.pt
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

FICHA TÉCNICA

Título: Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos

Autor: Luís Filipe Esteves

Capa e paginação: DCI - Departamento de Comunicação e Imagem da OCC

© Ordem dos Contabilistas Certificados, 2020

Não é permitida a utilização deste Manual, para qualquer outro fim que não
o indicado, sem autorização prévia e por escrito da Ordem dos Contabilistas
Certificados, entidade que detém os direitos de autor.

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LISTA DE SIGLAS

AIMI – Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis


AT – Autoridade Tributária e Aduaneira
CA – Contribuição Autárquica
CDT – Convenção sobre Dupla Tributação
CEE – Comunidade Económica Europeia
CIMI – Código do Imposto Municipal sobre Imóveis
CIRC – Código do Imposto sobre o Rendimento das pessoas Coletivas
CIRS – Código do Imposto sobre o Rendimento das pessoas Singulares
CRP – Constituição da República Portuguesa
CSC – Código das Sociedades Comerciais
CIS – Código do Imposto do Selo
CIVA – Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado
DAICF – Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal
DG – Diretor-Geral
DGCI – Direção-Geral das Contribuições e Impostos
DL – Decreto-lei
DMR – Declaração Mensal de Remunerações
DP – Declaração Periódica
DSIRS – Direção de Serviços de IRS
EBF – Estatuto dos Benefícios Fiscais
FII – Fundo de Investimento Imobiliário
IAS – Indexante de Apoios Sociais
IES – Informação Empresarial Simplificada
IMI – Imposto Municipal sobre Imóveis
IMT – Imposto Municipal sobre as Transmissões onerosas de imóveis
IRC – Imposto sobre o Rendimento das pessoas Coletivas
IRS – Imposto sobre o Rendimento das pessoas Singulares
IVA – Imposto sobre o Valor Acrescentado
LGT – Lei Geral Tributária
NIF – Número de Identificação Fiscal
OCC – Ordem dos Contabilistas Certificados
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
OE – Orçamento do Estado
OIC – Organismo de Investimento Coletivo
PCO – Processo de Contra-Ordenação
PDM – Plano Diretor Municipal
PMRG – Pensão Mínima do Regime Geral
RMMG – Remuneração Mínima Mensal Garantida
SDG – Subdiretor-Geral
SEAF – Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais
UE – União Europeia
VPT – Valor Patrimonial Tributário

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ÍNDICE

TEMAS ABORDADOS NOS CASOS PRÁTICOS

INTRODUÇÃO

1. CARATERIZAÇÃO DO IRS / ASPETOS GENÉRICOS

2. CASOS PRÁTICOS

2.1. CATEGORIA A – RENDIMENTOS DO TRABALHO DEPENDENTE


- N.º 1: Ajudas de custo, “quilómetros” e curso formação
- N.º 2: Contribuinte deficiente, quotizações sindicais e deduções à coleta
- N.º 3: Pré-reforma e pagamentos por conta
- N.º 4: Rendimentos obtidos na parte final do ano
- N.º 5: Remunerações acessórias – várias
- N.º 6: Gratificações por conta de resultados
- N.º 7: Remuneração auferida por jovem nas férias escolares
- N.º 8: Remunerações acessórias – várias (outras)
- N.º 9: Remunerações não fixas
- N.º 10: “Compensação pecuniária de natureza global”
- N.º 11: Indemnização por despedimento

2.2. CATEGORIA B – RENDIMENTOS EMPRESARIAIS E PROFISSIONAIS


- N.º 12: Regime da contabilidade, mudanças de regime
- N.º 13: Regime simplificado, atividade acessória
- N.º 14: Novas regras do regime simplificado (8 exemplos)
- N.º 15: Regime da transparência fiscal
- N.º 16: Direitos de autor e prémio literário
- N.º 17: Opções no caso de rendimentos prediais

2.3. CATEGORIA E – RENDIMENTOS DE CAPITAIS


- N.º 18: Juros de depósitos e dividendos
- N.º 19: Juros de depósitos e juros certificados de aforro
- N.º 20: Lucros distribuídos (transparência fiscal) e dividendos
- N.º 21: Rendimentos distribuídos por OIC (FII)
- N.º 22: Resultado da partilha de sociedade (continua)

2.4. CATEGORIA F – RENDIMENTOS PREDIAIS


- N.º 23: Moradia de férias, despesas dedutíveis

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- N.º 24: Várias frações autónomas, despesas dedutíveis


- N.º 25: Partes comuns de prédio em propriedade horizontal
- N.º 26: Apartamento mobilado, alojamento local
- N.º 27: Prédios de herança indivisa

2.5. CATEGORIA G – INCREMENTOS PATRIMONIAIS


- N.º 28: Venda de habitação própria e permanente, reinvestimento
- N.º 29: Venda de habitação própria e permanente, amortização de crédito
- N.º 30: Venda de apartamento de férias
- N.º 31: Indemnização e venda de jóia anteriormente doada
- N.º 32: Venda de terreno rústico para construção urbana
- N.º 33: Venda de terreno (aquisição gratuita, partilha com tornas)
- N.º 34: Venda de vários lotes de ações e quotas
- N.º 35: Venda de ações adquiridas antes de 1989 (incorporação de reservas)
- N.º 22 Resultado da partilha de sociedade (continuação)

2.6. CATEGORIA H – PENSÕES


- N.º 36: Segurança Social
- N.º 37: CGA, contribuinte deficiente, quotizações sindicais
- N.º 38: Segurança social e Fundo PPR (pagamentos por conta)
- N.º 39: Pensão de alimentos, dedução à coleta
- N.º 40: Rendimentos litigiosos produzidos em anos anteriores

BIBLIOGRAFIA

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TEMAS ABORDADOS NOS CASOS PRÁTICOS

2.1. CATEGORIA A
✓ Caso prático n.º 1: Remuneração principal e remunerações acessórias, subsídio de
refeição (tabela com limites legais), ajudas de custo (tabelas com limites legais e
condições para a sua atribuição), “quilómetros” (limite legal), curso de formação
profissional, dedução específica (Segurança Social e quotizações sindicais), retenção na
fonte (substituição tributária e responsabilidade tributária), referência à DMR,
liquidação de IRS.
✓ Caso prático n.º 2: Contribuinte deficiente, dedução específica (quotizações sindicais),
retenção na fonte, benefícios fiscais aplicáveis a deficientes, liquidação de IRS,
deduções à coleta.
✓ Caso prático n.º 3: Pré-reforma, dedução específica, retenções na fonte, pagamentos
por conta.
✓ Caso prático n.º 4: Rendimentos obtidos na parte final do ano, subsídio de refeição,
dedução específica, retenções na fonte.
✓ Caso prático n.º 5: Remunerações acessórias (fringe benefits), remunerações em
espécie, adiantamento para despesas de deslocação e estadas, atribuição de casa,
atribuição de viatura para uso total, contribuições para PPR, MBA em Universidade,
retenção na fonte, referências ao IRC.
✓ Caso prático n.º 6: Gratificações por conta de resultados atribuídas a sócio-gerente,
retenção na fonte, referências ao IRC.
✓ Caso prático n.º 7: Remuneração auferida por jovem estudante no período de férias,
proposta de lei do OE/2018.
✓ Caso prático n.º 8: Remunerações acessórias (fringe benefits), remunerações em
espécie, indemnização por mudança do local de trabalho, viagem de férias, curso de
inglês a dependente, “quilómetros” em deslocações de casa para o trabalho, aquisição de
viatura, retenção na fonte, referências ao IRC.
✓ Caso prático n.º 9: Rendimentos constituídos, exclusivamente, por remunerações não
fixas, retenção na fonte.
✓ Caso prático n.º 10: Indemnização por despedimento denominada “compensação
pecuniária de natureza global”, exclusão tributária, retenção na fonte.

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✓ Caso prático n.º 11: Indemnização por despedimento paga a gerente em anos
diferentes, referência ao IRC, exclusão tributária, retenção na fonte.

2.2. CATEGORIA B
✓ Caso prático n.º 12: Mudanças de regime (simplificado / contabilidade), regime da
contabilidade, correções fiscais, tributação autónoma, referências ao IRC, retenções na
fonte, pagamentos por conta, liquidação de IRS, Anexo C.
✓ Caso prático n.º 13: Rendimentos acessórios (atividade independente secundária de
trabalhador dependente), regime simplificado, opção pelas regras Categoria A, “falsos”
recibos verdes, dispensa de retenção na fonte, coeficientes do regime simplificado,
Anexo B.
✓ Caso prático n.º 14: Novas regras aplicáveis no regime simplificado a partir de 2018 –
explicação detalhada do novo normativo, imputação de despesas no Portal das Finanças,
oito exemplos práticos com várias hipóteses.
✓ Caso prático n.º 15: Regime da transparência fiscal (referências ao IRC),
contitularidade de rendimentos, imputação especial, distribuição de lucros, dupla
tributação económica, referências ao IRC, Anexo D, liquidação de IRS.
✓ Caso prático n.º 16: Direitos de autor, regime da contabilidade, benefícios fiscais,
prémio literário (exclusão tributária).
✓ Caso prático n.º 17: Opção pela tributação de rendimentos prediais no âmbito da
Categoria B, nova opção pela tributação na Categoria F, afetação e desafetação de bens
imóveis à atividade (mais-valias), alterações legislativas recentes (2017 e 2018),
Categoria B versus Categoria F, retenção na fonte, notas sobre a Lei do OE/2019, Leis
n.º 3/2019 e n.º 119/2019 e Proposta de Lei do OE/2020.

2.3. CATEGORIA E
✓ Caso prático n.º 18: Trabalhadora dependente com juros de depósitos bancários,
dividendos, atenuação da dupla tributação económica, retenção na fonte, opção pelo
englobamento, liquidações de IRS (com e sem englobamento).
✓ Caso prático n.º 19: Pensionista com juros de depósitos bancários e juros de
certificados de aforro, retenção na fonte, opção pelo englobamento, liquidações de IRS
(com e sem englobamento).
✓ Caso prático n.º 20: Lucros distribuídos e dividendos, atenuação da dupla tributação
económica, transparência fiscal, imputação de lucros, retenção na fonte.

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✓ Caso prático n.º 21: Rendimentos distribuídos por FII (OIC), benefícios fiscais, dupla
tributação económica, retenção na fonte, opção pelo englobamento, liquidações de IRS.
✓ Caso prático n.º 22 (continua): Rendimentos obtidos em resultado da partilha de
sociedade, liquidação de sociedades, regras vigentes desde 01-01-2014, referências ao
CIRC, incompleto (remissão para o capítulo 2.5, Categoria G).

2.4. CATEGORIA F
✓ Caso prático n.º 23: Arrendamento de moradia de férias, despesas conservação e
manutenção, alterações em vigor desde 01-01-2015 ao nível da dedutibilidade dos
gastos e do reporte de perdas, Anexo F.
✓ Caso prático n.º 24: Arrendamento de frações autónomas, vários tipos de despesas
(dedutíveis e não dedutíveis), repartição de despesas por fração, opção pelo
englobamento, recibo de renda eletrónico, declaração modelo 44, opção pelas regras da
Categoria B (regime simplificado e regime da contabilidade), notas sobre as Leis n.º
3/2019 e n.º 119/2019.
✓ Caso prático n.º 25: Rendas recebidas por condomínio, arrendamento de partes
comuns, contitularidade de rendimentos, referência ao Código Civil, retenção na fonte,
recibo de renda eletrónico.
✓ Caso prático n.º 26: Arrendamento de apartamento mobilado, arrendatário com
atividade de alojamento local, opção pelo englobamento, opção pela Categoria B,
enquadramento em IRS do alojamento local, opção pela Categoria F.
✓ Caso prático n.º 27: Arrendamento de prédios que fazem parte de herança indivisa,
contitularidade de rendimentos, referências ao Código Civil, situação em que apenas um
herdeiro recebe as rendas, recibo de renda eletrónico, Anexos D e I.

2.5. CATEGORIA G
✓ Caso prático n.º 28: Venda habitação própria e permanente, despesas inerentes à
aquisição, correção monetária, exclusão tributária, reinvestimento parcial em habitação
própria e permanente, amortização de créditos bancários, regime transitório de
“reinvestimento” (amortização de crédito bancário), Anexo G.
✓ Caso prático n.º 29: Venda habitação própria e permanente, despesas inerentes à
alienação, exclusão tributária, regime transitório de “reinvestimento” (amortização de
crédito bancário para aquisição e obras), momento da ocorrência do facto tributário na
Categoria G.

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✓ Caso prático n.º 30: Venda apartamento de férias, aquisição anterior a 01-01-1989,
exclusão tributária, Anexo G1.
✓ Caso prático n.º 31: Indemnização paga por seguradora, delimitação negativa de
incidência, venda de jóia adquirida a título gratuito (doação).
✓ Caso prático n.º 32: Venda de terreno adquirido a título gratuito (escritura de
partilhas), terreno rústico adquirido antes de 1989, venda em 2019 para construção
urbana, exclusão tributária, referências à jurisprudência, Anexo G1.
✓ Caso prático n.º 33: Venda de terreno adquirido em partilha hereditária, pagamento de
tornas, referências ao Código Civil, discriminação de valores no Anexo G (várias datas
de aquisição).
✓ Caso prático n.º 34: Alienação de vários lotes de ações e quotas, regra do “FIFO”,
ações adquiridas em aumento de capital por incorporação de reservas, inclusão no
cálculo das menos-valias, quota adquirida antes de 01-01-1989, transformação de
sociedades, opção pelo englobamento, liquidação de IRS, Anexo G.
✓ Caso prático n.º 35: Venda de ações adquiridas antes e depois de 01-01-1989, aumento
de capital por incorporação de reservas, Anexo G1.
✓ Caso prático n.º 22 (continuação): Rendimentos auferidos em resultado da partilha de
sociedade, liquidação de sociedades, regras vigentes desde 01-01-2014, referências ao
CIRC, hipótese de se tratar de pequena empresa (exclusão tributária), opção pelo
englobamento (continuação da resolução de caso prático da Categoria E).

2.6. CATEGORIA H
✓ Caso prático n.º 36: Pensão paga pela Segurança Social, dedução específica, retenção
na fonte, liquidação de IRS.
✓ Caso prático n.º 37: Contribuinte deficiente, dedução específica (quotizações
sindicais), retenção na fonte, benefícios fiscais aplicáveis a deficientes, liquidação de
IRS.
✓ Caso prático n.º 38: Pensões pagas pela Segurança Social e por Fundo PPR, benefícios
fiscais, opções nas retenções na fonte, pagamentos por conta.
✓ Caso prático n.º 39: Pensão de alimentos auferida por dependente, dedução à coleta.
✓ Caso prático n.º 40: Rendimentos litigiosos, rendimentos de anos anteriores, modo de
declarar, evolução da lei desde 2001, várias liquidações de IRS, retenção na fonte, notas
sobre a Lei do OE/2019 e sobre a Lei n.º 119/2019.

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INTRODUÇÃO

O manual que se apresenta, intitulado “Atualização fiscal em IRS – Aspetos práticos” (3.ª
versão) (1), visa realizar uma abordagem prática ao IRS, baseada na resolução de casos que
envolvem situações ficcionadas mas com total aderência à realidade, algumas das quais já
vivenciadas por grande parte dos destinatários, Contabilistas Certificados.

Intenta-se, assim, uma metodologia de ensino/aprendizagem baseada no estudo de caso,


partindo-se de uma situação concreta para a teoria que lhe subjaz e, fundamentalmente,
para o normativo legal aplicável (especialmente o Código do IRS), procurando encontrar-
se a solução mais adequada, tal qual sucede na vida real.

Tratando-se de um Manual que servirá dois propósitos, a formação através da plataforma


de e-learning da OCC e a formação (eventual) presencial em sala (8 horas), será possível,
pelo menos na segunda modalidade, a acrescer ao tradicional método expositivo, introduzir
aquilo que poderemos denominar de método aditivo, bastante eficaz de acordo com a nossa
experiência, na medida em que os conhecimentos vão sendo adquiridos pelos formandos
durante a resolução de questões práticas, proporcionando-lhes o chamado “saber fazer”.

Naturalmente que, na resolução dos casos apresentados, procurar-se-á não descurar os


aspetos teóricos mais relevantes e, sobretudo, a fundamentação legal adequada, colocando-
se, assim, as referências legais necessárias. Naturalmente que as referências ao normativo

(1) A 1.ª versão foi concluída em outubro de 2018 e a 2.ª versão em janeiro de 2019, não existido alterações
substanciais entre ambas, com exceção da incorporação, na 2.ª versão, das alterações, pouco substanciais,
decorrentes da Lei do OE/2019 (com impacto apenas nos casos práticos n.º 17 e 40). Na presente atualização,
para além de se ter procedido a uma revisão, incluíram-se as alterações legislativas mais recentes, decorrentes
de legislação que entrou em vigor ao longo do ano de 2019 (descrita mais adiante no texto), procedendo-se
igualmente a algumas alusões às alterações constantes da Proposta de Lei do OE/2020 (cujo texto foi
conhecido em dezembro de 2019). Importa sublinhar que, na presente versão, os casos práticos se reportam a
situações ocorridas durante o ano de 2019, geradoras de rendimentos que deverão constar na declaração
modelo 3 a apresentar em 2020, ou seja, trabalhando-se com a lei vigente no momento da sua elaboração,
constituindo esta uma importante alteração em relação às duas versões anteriores. Quanto às alterações
legislativas que irão vigorar após a entrada em vigor da Lei do OE/2020 (que deverá ocorrer lá para o final de
fevereiro de 2020), face à informação disponível em função da Proposta de Lei, pode concluir-se que são
praticamente insignificantes, ressalvando-se apenas a questão da atualização dos escalões das taxas gerais,
alteração esta que tem impacto na resolução dos casos práticos, especialmente naqueles em que são
apresentadas liquidações, embora se trate de diferenças quantitativas muito pouco expressivas em função da
parca atualização dos escalões (de apenas 0,3%).

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tornam o texto mais extenso, dificultando também um pouco a leitura, mas, em nossa
opinião, são indispensáveis, permitindo aos destinatários melhorar o seu conhecimento do
Código do IRS, principal instrumento ao nosso dispor quando se trata de resolver situações
reais neste domínio.

Procurar-se-á, também, sempre que tal se afigure necessário, chamar à colação os anexos
da declaração modelo 3, cujo correto preenchimento assume, na vida real, como é sabido,
uma importância vital, pois é com base na declaração apresentada pelo sujeito passivo que
a AT irá proceder à liquidação, ou seja, ao apuramento do imposto a pagar (2).

Por outro lado, como o próprio título do Manual indica, o mesmo visa também proceder a
uma atualização fiscal em sede de IRS dos Contabilistas Certificados envolvidos na
formação. Para tal, procurámos nele incluir as principais alterações legislativas mais
recentes efetuadas ao Código do IRS, especialmente as alterações vigentes a partir de 01-
01-2015, incluindo, obviamente, as processadas pelas Leis dos OE/2018 e 2019, bem como
as processadas ao longo do ano de 2019, nomeadamente as decorrentes da entrada em
vigor da Lei n.º 3/2019, de 09-01, do DL n.º 28/2019, de 15-02, bem como da Lei n.º
119/2019, de 18-09.

Ao nível das alterações processadas ao Código do IRS, destacam-se, inevitavelmente, as


variadíssimas alterações decorrentes da Lei n.º 82-E/2014 (Lei da Reforma do IRS),
vigentes a partir de 01-01-2015, embora tenham existido algumas alterações legislativas
posteriores tidas como relevantes, nomeadamente as alterações relacionadas com o regime
simplificado da Categoria B (Lei do OE/2018), com a afetação/desafetação de imóveis no
âmbito das opções pelas categorias B e F quanto a rendimentos prediais (Leis dos OE/2017
e 2018) e com a opção pela Categoria F no âmbito da atividade de alojamento local (Lei do
OE/2017), entre outras.

Quanto às referências à Lei da Reforma do IRS, revelam-se absolutamente inevitáveis,


tendo em conta a extensão das alterações processadas pela mesma, sendo tais alterações,
para se ter uma ideia do seu impacto, mencionadas expressamente em 17 dos 40 casos
práticos, sem incluir na contagem todas as restantes situações em que aplicamos as normas
alteradas no âmbito de tal Reforma sem que se faça expressa alusão às mesmas.

(2) Quanto ao preenchimento da declaração, Marília Fernandes (2018), “Preenchimento da declaração


modelo 3” (Coleção Essencial), OCC.

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No que concerne aos temas abordados nos casos práticos, tendo em conta a duração da
formação (8 horas presenciais em sala ou em regime de e-learning), foi necessário
proceder a uma seleção, incidindo-se, fundamentalmente, nas regras de determinação do
rendimento líquido aplicáveis a cada categoria de rendimentos.

Foram, assim, deixadas de lado, salvo meras referências pontuais, todas as questões que
envolvem a incidência pessoal, nomeadamente aspetos ligados ao agregado familiar (sua
composição e alterações ao mesmo), ao conceito de dependente, à tributação conjunta e
separada, às uniões de facto, entre outros (3).

Outra das matérias que não é devidamente aprofundada prende-se com as deduções à
coleta, assunto que apenas é desenvolvido no caso prático n.º 2, sem prejuízo de as mesmas
serem referenciadas no capítulo 1 e frequentemente mencionadas na resolução dos casos
práticos, algo, aliás, inevitável, especialmente naqueles em que se procede à demonstração
da liquidação.

Finalmente, ao nível dos grandes temas arredados do presente Manual, importa destacar as
matérias que se prendem com a Fiscalidade Internacional, não constando no mesmo
quaisquer situações envolvendo a residência fiscal, nem exemplos que envolvam
rendimentos obtidos no estrangeiro por residentes, incluindo residentes não habituais, nem,
ainda, quaisquer casos práticos abrangendo rendimentos obtidos em território nacional por
não residentes.

Na verdade, trata-se de uma área tão vasta e relativamente à qual se colocam tantas
questões interessantes e atuais, grande parte delas de elevada complexidade, que seria
impraticável a sua inclusão no presente Manual, daí que a opção tenha passado pela
elaboração de um outro Manual, específico, intitulado “IRS – Casos práticos de
Fiscalidade Internacional” (4).

O presente Manual encontra-se estruturado em dois capítulos, inserindo-se no segundo seis


subcapítulos, um por cada categoria de rendimentos.

No primeiro capítulo serão abordados aspetos genéricos, que não se relacionam


especificamente com nenhuma categoria de rendimentos em concreto, designadamente, a

(3) Para maiores desenvolvimentos, Liliana Pereira (2015a), “IRS – Revisão ao Código”, OCC, e da mesma
autora (2015b), “Alterações fundamentais ao Código do IRS”, OCC.
(4) Cuja 1.ª versão remonta a abril de 2019, estando já agendada a sua atualização a concluir até meados de
março de 2020.

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génese do imposto, suas principais caraterísticas e respetivo enquadramento constitucional,


focando-se, também, as alterações mais relevantes ocorridas desde a sua criação, com
especial enfoque na Reforma do IRS.

Seguidamente, ainda no Capítulo 1, explica-se o modo de apuramento do imposto,


questiona-se a dualidade do sistema instituído, abordam-se as taxas gerais e o modo como
operam, as deduções à coleta e a territorialidade do imposto. Termina-se com uma visão
sistemática do Código, na parte respeitante às regras de incidência real e de determinação
do rendimento líquido aplicáveis a cada categoria de rendimentos (deduções específicas e
regras de cálculo), recorrendo-se, para o efeito, a um quadro-síntese onde se encontram
referenciados os principais artigos do CIRS aplicáveis a cada categoria.

O segundo capítulo será dedicado à resolução de casos práticos envolvendo cada uma das
seis categorias de rendimentos, apresentando-se, por esta ordem, onze casos práticos
envolvendo a Categoria A (capítulo 2.1), seis a Categoria B, um deles incluindo oito
exemplos (capítulo 2.2), cinco casos práticos respeitantes a cada uma das Categorias E e F
(capítulos 2.3 e 2.4), oito à Categoria G (capítulo 2.5) e, finalmente, mais cinco referentes à
Categoria H (capítulo 2.6), perfazendo um total de 40 casos práticos.

Tais capítulos, por sua vez, estão agrupados em dois grandes módulos (componente de e-
learning), o primeiro dos quais incluindo o capítulo 1 e os subcapítulos 2.1 e 2.2 (aspetos
genéricos e casos práticos das Categorias A e B), inserindo-se no segundo módulo os
subcapítulos 2.3 a 2.6 (casos práticos das Categorias E, F, G e H).

A estruturação em módulos prende-se, essencialmente, com a vertente e-learning da


formação, embora possa servir também como orientação para a formação em sala,
abordando-se os temas do primeiro módulo na parte da manhã (ou na primeira sessão pós-
laboral) e os do segundo módulo na parte da tarde (ou na segunda sessão pós-laboral).

Tendo em vista auxiliar a consulta do Manual, tornando-o mais apto a ser utilizado no dia-
a-dia dos colegas Contabilistas Certificados, procedeu-se à elaboração de uma lista com os
vários casos práticos, que consta na parte inicial, contendo uma súmula do respetivo
conteúdo, isto é, os principais temas abordados em cada um deles.

Espera-se que o presente Manual vá ao encontro das expectativas dos colegas inscritos na
presente ação de formação e que o mesmo possa vir a constituir um elemento de estudo e,
especialmente, uma ferramenta útil de trabalho.

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1. CARATERIZAÇÃO DO IRS /
ASPETOS GENÉRICOS

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1. CARATERIZAÇÃO DO IRS / ASPETOS GENÉRICOS

O Código do IRS entrou em vigor em 01-01-1989, aprovado pelo DL n.º 442-A/88,


inserindo-se a sua criação no âmbito de uma verdadeira reforma ao nível da tributação
direta, a qual incluiu também o IRC e a CA, cujos Códigos foram aprovados,
respetivamente, pelo DL n.º 442-B/88 e pelo DL n.º 442-C/88 (todos de 30 de novembro).

Recorde-se que Portugal havia entrado para a então CEE (atual UE) três anos antes, em 01-
01-1986, data em que entrou em vigor o IVA, cujo Código, aprovado pelo DL n.º 394-
B/84, de 26 de dezembro, transpôs para o nosso ordenamento jurídico a Diretiva n.º
77/388/CEE (6.ª Diretiva). O IVA, imposto geral sobre o consumo, veio substituir o
Imposto de Transações e um conjunto de outros impostos indiretos menos relevantes,
constituindo uma importante reforma em sede de tributação indireta, precedendo a supra
referida reforma da tributação direta.

O surgimento do IRS resultou de um desajustamento do anterior sistema de tributação


dualista, baseado em vários impostos parcelares ou cedulares, nomeadamente o Imposto
Profissional, Imposto de Capitais, Contribuição Industrial, Contribuição Predial, Imposto
sobre a Indústria Agrícola, Imposto Complementar e Imposto de Mais-Valias (5).

Todos estes impostos foram abolidos com a entrada em vigor do IRS, o qual passou a
abarcar a generalidade dos rendimentos abrangidos pelos impostos abolidos, para além de
ter procedido ao alargamento da base tributável, nomeadamente ao nível das mais-valias,
mobiliárias e imobiliárias.

Na tentativa de tributar de acordo com a capacidade contributiva (enquanto fundamento e


pressuposto da tributação), adotou-se uma conceção de rendimento-acréscimo (rendimento
em sentido lato), baseada na teoria do incremento patrimonial, que alarga a base de
incidência a todo o aumento do poder aquisitivo, incluindo as mais-valias, as receitas
irregulares e os ganhos fortuitos (incluindo os ganhos forçados, não voluntários).

(5) Tais impostos haviam sido criados no âmbito da “Reforma fiscal dos anos 60” levada a cabo entre 1962 e
1965, sob a orientação de Teixeira Ribeiro. Segundo o preâmbulo do Código do IRS (redigido em 1988, em
plena fase de integração na então CEE), no seu ponto 4, Portugal era, ao tempo, o único país da OCDE a
manter a compartimentação como caraterística dominante do seu esquema de tributação do rendimento. Para
maiores desenvolvimentos, Teixeira Ribeiro (1989), “Reforma dos anos sessenta” (A reforma fiscal).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Contrapõe-se uma conceção baseada no rendimento-produto (rendimento em sentido


estrito), baseada na teoria da fonte, segundo a qual apenas são tributáveis os rendimentos
que sejam imputáveis a uma fonte produtora, geradora de um fluxo regular de rendimentos,
de que o sujeito passivo seja titular, excluindo-se de tributação, especialmente, as mais-
valias (esta conceção estava subjacente ao regime vigente até 31-12-1988).

A reforma da tributação do rendimento, ocorrida em 1989 (6), resultou também de um


imperativo constitucional, uma vez que, face ao disposto no n.º 1, artigo 104.º, CRP, “O
imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e
progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar”.

Assim, exigindo a CRP um imposto único, a reformulação do sistema de tributação do


rendimento, concretizada ao nível das pessoas físicas pelo IRS, constituiu uma verdadeira
recondução do nosso sistema fiscal às diretrizes emanadas pela Lei Fundamental.

É nesta ordem de ideias e princípios que surge o IRS, substituindo a tributação


anteriormente vigente de tipo plural, baseada em vários impostos parcelares de índole real,
diversificados segundo a natureza ou a fonte dos rendimentos, e ainda num imposto global
de natureza pessoal (Imposto Complementar), incidente sobre os rendimentos já
abrangidos pela tributação parcelar.

Tendo em conta as respetivas caraterísticas e modo de funcionamento, pode afirmar-se que


o IRS é um imposto direto, sobre o rendimento, pessoal, progressivo, global (único),
periódico e estadual.

Embora não se pretenda desenvolver cada uma das caraterísticas supra assinaladas (algo
que pode facilmente ser encontrado em qualquer manual de direito fiscal), deverá, ainda
assim, sublinhar-se o caráter meramente tendencial de algumas delas, nomeadamente a
progressividade e a unicidade, tendo em conta a existência de taxas liberatórias e especiais
(assunto desenvolvido mais adiante), bem como da própria estatalidade, dado que 5% da
receita do imposto reverte para os municípios (que poderão prescindir da receita, no todo
ou em parte, em favor dos munícipes) (7).

(6) Para maiores desenvolvimentos, entre outros, Pitta e Cunha (1989), “A reforma fiscal dos anos 80” (A
reforma fiscal) e Xavier de Basto (2005), “O IRS na Reforma Fiscal de 88/89” e, ainda, Manuel Faustino
(2005), “Tendências recentes da evolução do imposto sobre o rendimento pessoal”.
(7) A existência de tributações autónomas, no âmbito da Categoria B, permite também questionarmo-nos
sobre outras caraterísticas do imposto, nomeadamente a de que o mesmo é um imposto sobre o rendimento,

18
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Quanto à unicidade do imposto, Paula Rosado Pereira (2018, p.41-42) considera que o
imposto é único, por ser o único imposto a tributar o rendimento das pessoas singulares,
mas o mesmo não consagra uma tributação unitária, na medida em que os rendimentos não
são todos tributados da mesma forma, coexistindo a tributação por via do englobamento
com a tributação por via da aplicação de taxas liberatórias ou especiais.

Desde a sua aprovação que o Código tem vindo a sofrer sucessivas alterações, sendo
seguramente aquele que mais é alterado todos os anos, com as sucessivas Leis do OE,
destacando-se, no entanto, pela sua relevância, as alterações processadas pela Lei n.º 30-
G/2000, a qual, entre muitas outras alterações, extinguiu as anteriores Categoria C e D (8).

Recentemente, em 2015, o IRS foi objeto de uma importante reforma (9), processada pela
Lei n.º 82-E/2014, a qual, em termos quantitativos, para se ter uma melhor perceção,
incluiu alterações a várias dezenas de artigos (conforme artigo 2.º da Lei, algumas delas
com natureza interpretativa, conforme artigo 14.º), o aditamento de 23 artigos (artigo 3.º da
Lei) e variadíssimas revogações (artigo 16.º da Lei).

De entre as várias alterações propostas pela Comissão da Reforma do IRS, talvez as mais
significativas, por terem uma natureza transversal/estrutural, tenham sido as que se
prendem com a:

i) Tributação separada com opção pela tributação conjunta;

ii) Adoção do chamado “quociente familiar”;

iii) Consagração de uma dedução à coleta fixa sem necessidade de comprovação


documental.

direto e periódico, sendo que esta última caraterística pode também ser posta em causa em face da existência
de taxas liberatórias de retenção na fonte em que o imposto se comporta como sendo de obrigação única.
(8) Esta Lei, no seu artigo 17.º, autorizou o Governo a rever globalmente os Códigos do IRS e IRC (e EBF),
tendo sido publicado, no ano seguinte, o DL n.º 198/2001, o qual procedeu a uma renumeração dos respetivos
articulados e à republicação dos Códigos.
(9) Para maiores desenvolvimentos consultar o “Projeto da Reforma do IRS – Uma reforma orientada para a
simplificação, a família e a mobilidade social”, da autoria da Comissão para a reforma do IRS, presidida por
Rui Morais, datado de setembro de 2014.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Entretanto, constata-se que, das três alterações mencionadas, subsiste atualmente apenas a
primeira, relacionada com a tributação separada (10), tendo a segunda sido revertida com a
Lei do OE/2016 (regressando-se ao anterior “quociente conjugal”) e a terceira, relacionada
com a simplificação das deduções à coleta, nem sequer chegou a entrar em vigor, uma vez
que se instituiu, logo em 2015, um regime de deduções à coleta inovador, baseado no
sistema e-fatura, o qual ainda hoje perdura, não obstante as várias alterações pontuais que
lhe foram sendo introduzidas nos últimos anos tendentes ao seu aperfeiçoamento.

Subsistem, no entanto, ainda assim, muitas outras alterações extremamente relevantes do


ponto de vista da vida prática, abrangendo todas as categorias de rendimentos, alterações
que nos abstemos de enunciar pela sua extensão, mas que inevitavelmente serão
mencionadas ao longo do presente manual no âmbito da resolução dos casos práticos.

Efetivamente, tratou-se, do nosso ponto de vista, tendo em conta a sua abrangência e


relevância, para além da assertividade da generalidade das alterações, de uma verdadeira
Reforma do IRS, a única digna desse nome implementada desde 1989.

Ao nível da definição legal de rendimento tributável, constata-se que a mesma é inexistente


no CIRS, contrariamente àquilo que é habitual nos restantes códigos. Tal sucede porque,
verdadeiramente, não existe um rendimento tributável, mas sim várias categorias de
rendimentos tributáveis, donde resulta que o rendimento tributável em IRS corresponde ao
conjunto dos rendimentos que se integram nas várias categorias.

Segundo Glória Teixeira (2018, p.69), “Em consonância com outros sistemas fiscais, o
rendimento dos contribuintes aparece agrupado segundo categorias às quais
correspondem uma racionalidade e regimes específicos.”.

Segundo o n.º 1, artigo 1.º (base do imposto) (11), o IRS incide sobre o valor anual dos
rendimentos das seguintes categorias, depois de efetuadas as respetivas deduções e
abatimentos:

(10) Embora se deva sublinhar que, apesar de a regra ser a tributação separada (n.º 2, artigo 13.º), na prática
quase todos os contribuintes casados ou unidos de facto optam pela tributação conjunta por ser mais
favorável (ou por produzir resultados idênticos). Com a Lei do OE/2018, minimizou-se uma das situações em
que poderia haver vantagem na tributação separada, que era nos casos de contribuintes com baixos
rendimentos aos quais se aplica o “mínimo de existência”, previsto no artigo 70.º, assunto a ser retomado
posteriormente.
(11) As referências a artigos sem menção expressa do diploma a que pertencem devem considerar-se
reportadas ao Código do IRS.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

✓ Categoria A – Rendimentos do trabalho dependente

✓ Categoria B – Rendimentos empresariais e profissionais

✓ Categoria E – Rendimentos de capitais

✓ Categoria F – Rendimentos prediais

✓ Categoria G – Incrementos patrimoniais

✓ Categoria H – Pensões

Assim, o IRS encontra-se dividido em seis categorias de rendimentos, as quais, pese


embora a unicidade do imposto, são objeto de tratamento diferenciado, considerando-se
diferentes deduções, atendendo às especificidades próprias de cada uma (deduções
específicas).

No fundo, instituiu-se uma tributação unitária e global mas com um tratamento analítico
prévio, aquilo que Rui Morais denomina, apropriadamente, por fase analítica (12).

Com efeito, assim é, uma vez que, relativamente a cada categoria de rendimentos, ao
rendimento bruto abatem-se as respetivas deduções específicas, determinando-se o
rendimento líquido de cada uma delas.

Os rendimentos líquidos são depois agregados através de um processo de englobamento


(n.º 1, artigo 22.º), determinando-se o rendimento líquido total, que irá corresponder, na
ausência de abatimentos (artigo 56.º, revogado pela Lei do OE/2009), ao rendimento
coletável, iniciando-se seguidamente a fase sintética (13).

Ao rendimento coletável irá ser aplicada uma tabela única de taxas (progressivas, previstas
no n.º 1, artigo 68.º), obtendo-se a coleta bruta, à qual serão abatidas as deduções à coleta
(n.º 1, artigo 78.º), as retenções na fonte e os pagamentos por conta (n.º 2, artigo 78:ª),
sendo que apenas as retenções na fonte e os pagamentos por conta conferem direito a um
eventual reembolso de IRS (n.º 3, artigo 78.º).

(12) Rui Morais (2008), “Sobre o IRS”. Segundo este autor, a vertente analítica manifesta-se na
autonomização das diferentes categorias de rendimentos, no apuramento do rendimento líquido por categoria
e nas regras de (não) comunicabilidade de perdas, traços que, a nosso ver, fazem lembrar a tributação
parcelar do passado, corporizada agora em vários impostos dentro de um mesmo imposto.
(13) Segundo o mesmo autor (Rui Morais), a fase sintética traduz-se no percurso que se inicia com a
determinação do rendimento líquido global e termina com a liquidação e a determinação de uma só dívida de
imposto. É na fase sintética que o IRS passa de um simples imposto real sobre o rendimento para um imposto
pessoal sobre o rendimento, mediante a consagração de elementos de pessoalização no imposto.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

A liquidação do imposto, nos moldes anteriormente descritos, é feita pela AT, com base
nas declarações eletrónicas (14) apresentadas pelos sujeitos passivos (princípio da verdade
declarativa), sendo os cálculos notificados aos sujeitos passivos através da denominada
“nota de liquidação”.

O apuramento do IRS é feito através de um conjunto de operações aritméticas, sendo certo


que há um “travão”, muito importante para contribuintes com rendimentos mais baixos, o
denominado de “mínimo de existência”, previsto no artigo 70.º (15), algo que,
acompanhando Rui Morais (2008), constitui um importante elemento de pessoalização do
imposto.

Quanto ao englobamento dos rendimentos, mecanismo fundamental num imposto único e


progressivo, encontra-se previsto no n.º 1, artigo 22.º, de acordo com o qual, “O
rendimento coletável em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias
categorias auferidos em cada ano, depois de feitas as deduções e abatimentos (…)”.

(14) O que constitui uma grande inovação ao nível da simplificação das obrigações declarativas, sobretudo
após o aperfeiçoamento do pré-preenchimento da declaração e do sistema de alertas, a tal ponto que hoje
nenhum de nós conceberia voltar a entregar declarações em papel. Mesmo os mais resistentes deixaram, em
2018, de poder apresentar a declaração em papel, de acordo com o estipulado na Portaria n.º 385-H/2017, que
aprovou os novos modelos de impressos da declaração modelo 3 (a este propósito ver o Ofício-circulado n.º
20199, de 07-03-2018). Com a Lei do OE/2017 foi aditado ao CIRS o artigo 58.º-A, prevendo-se aí
declaração automática de rendimentos, cujo universo de aplicação, nos termos do n.º 8, é fixado por decreto
regulamentar.
(15) Quanto ao n.º 1 deste artigo, a Lei do OE/2018 procedeu ao alargamento do seu âmbito de aplicação,
passando a ser aplicável aos prestadores de serviços cuja atividade conste na lista a que se refere o artigo
151.º, com exceção do código 1519 - Outros prestadores de serviços (anteriormente era aplicável apenas a
sujeitos passivos com rendimentos predominantes das Categorias A e H); por outro lado, foi atualizado o
valor do mínimo de existência que passou a estar indexado ao IAS: 435,76 x 14 x 1,5 = 9.150,96
(anteriormente era um valor fixo de 8.500). A forma de aplicação desta norma, poderá tornar vantajosa a
opção pela tributação separada. De facto, o mínimo de existência previsto no n.º 1, artigo 70.º, é aplicável por
agregado familiar, por declaração, o que significa que se um casal entregar uma única declaração (tributação
conjunta) terá direito ao valor consagrado na lei (em 2019, 9.150,96), mas se entregarem duas declarações o
limite duplica, o que se pode revelar favorável. Com o aditamento do n.º 4 ao artigo 70.º (Lei do OE/2018),
passou a consagrar-se que o valor de rendimento líquido de imposto a que se refere o n.º 1, artigo 70.º não
pode, por titular, ser inferior ao valor anual da RMMG (em 2019: 600 x 14 = 8.400), o que significa que, a
partir de 2018, em caso de tributação conjunta, aumentou substancialmente o mínimo de existência aplicável
ao agregado nos casos de opção pela tributação conjunta.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

No entanto, segundo o n.º 3 do mesmo artigo, “Não são englobados, para efeitos da sua
tributação: (…) b) Os rendimentos referidos nos artigos 71º e 72º auferidos por residentes
em território português, sem prejuízo da opção pelo englobamento neles prevista.”.

Tal significa que nem todos os rendimentos estão sujeitos a englobamento obrigatório,
logo, à aplicação de taxas progressivas, como é o caso dos rendimentos de capitais (n.º 1,
artigo 71.º), de algumas mais-valias (n.º 1, artigo 72.º), bem como, mais recentemente, dos
rendimentos prediais (n.º 1, artigo 72.º), rendimentos estes que, por maiores que sejam,
estão sujeitos a uma taxa fixa de 28% (taxa de retenção na fonte do tipo liberatório ou taxa
de tributação a final especial ou autónoma).

Ora, nestes casos, contrariamente ao determinado na CRP, e contrariamente também à


própria lógica intrínseca do imposto, o IRS é proporcional e não progressivo,
questionando-se também a própria unicidade do mesmo face à dualidade supra descrita,
algo que poderia suscitar questões ao nível da conformidade constitucional do imposto,
face à exigência de um imposto único e progressivo (16).

Não obstante, a doutrina mais recente, cremos que maioritária, considera que tais desvios à
unicidade e à progressividade do IRS acabam por ser inevitáveis, tendo em conta a elevada
mobilidade de certos tipos de rendimentos, entre outras razões, nomeadamente razões que
se prendem com a neutralidade do imposto, com a simplificação do sistema e com a
praticabilidade das soluções adotadas.

Ainda quanto ao englobamento e à sua importância em sede de IRS, cita-se em seguida o


ponto 3 do preâmbulo do CIRS, onde se refere, além do mais, o seguinte: “Na verdade, só
a perspectiva unitária permite a distribuição da carga fiscal segundo um esquema
racional de progressividade, em consonância com a capacidade contributiva.”.

A elevada progressividade das taxas gerais, especialmente desde 2011, aplicáveis aos
rendimentos do trabalho (Categorias A e B), às pensões (Categoria H) e às mais-valias
imobiliárias (Categoria G), encontra-se bem patente na tabela de taxas constante do n.º 1,
artigo 68.º.

Tal tabela foi bastante alterada com a Lei do OE/2018, tendo-se acrescentado mais dois
escalões aos cinco anteriormente existentes, conforme se pode verificar do confronto das
duas tabelas:

(16) A inconstitucionalidade do IRS foi suscitada, entre outros, por Teixeira Ribeiro.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Tabela vigente em 2017

Tabela vigente em 2018 e 2019

Confrontando as duas tabelas, verifica-se que:

✓ Não houve qualquer alteração no primeiro escalão;

✓ O antigo 2.º escalão (28,5%) deu origem aos novos 2.º e 3.º escalões (23,5% e
28,5%, respetivamente);

✓ O antigo 3.º escalão (37%) deu lugar aos novos 4.º e 5.º escalões (35% e 37%,
respetivamente);

✓ O antigo 4.º escalão (45%) corresponde, aproximadamente, ao novo 6.º escalão


(45%);

✓ O antigo 5.º escalão (48%) coincide, exatamente, com o novo 7.º escalão (48%).

Conclui-se que, fruto da cisão do 2.º e 3.º antigos escalões, mantendo-se a taxa anterior
apenas para o nível superior de cada um dos escalões, e baixando a taxa para o nível

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

inferior, há obrigatoriamente uma redução de IRS para contribuintes com rendimentos


inseridos em tais escalões.

Porém, quando o rendimento coletável é superior a 40.522 (limite superior do antigo 3.º
escalão), não há qualquer diminuição no IRS a pagar em 2018 e 2019 face a 2017
(conforme se demonstrará mais adiante), salvo por via da eliminação da sobretaxa, o que,
refira-se, não é propriamente despiciendo, uma vez que a mesma era mais gravosa,
precisamente, para contribuintes com estes níveis de rendimentos ou superiores (17).

As tabelas anteriores funcionam por escalões de rendimento, inferindo-se que um


contribuinte cujo rendimento se situe, por exemplo, no 5.º escalão, vai beneficiar das taxas
normais (marginais) de todos os escalões anteriores, relativamente às várias “camadas” de
rendimentos que neles se inserem.

Com efeito, de acordo como o n.º 2, artigo 68.º, quando o quantitativo do rendimento
coletável for superior a 7.091 é dividido em duas partes: uma, igual ao limite do maior dos
escalões que nele couber, à qual se aplica a taxa média correspondente a esse escalão;
outra, igual ao excedente, a que se aplica a taxa normal respeitante ao escalão
imediatamente superior.

Exemplificando, para um rendimento coletável de 40.522 (ponto crítico a partir do qual


não ocorreu uma baixa de IRS em 2018), o cálculo da coleta faz-se da seguinte forma:

✓ Tabela antiga: 40.522,00*30,300% = 12.278,17


✓ Tabela nova: 36.856,00*28,838% = 10.628,53
3.666,00*45,000% = 1.649,70
12.278,23

Importa assinalar que, em caso de tributação conjunta, como não poderia deixar de ser, sob
pena de um insustentável agravamento da tributação, será aplicável o “quociente conjugal”
[regulado no artigo 69.º, cuja epígrafe, desde 2015, é “quociente familiar” (?)], mecanismo
que permite dividir o rendimento coletável do agregado familiar por dois, para efeitos de
aplicação de taxas, multiplicando-se o resultado novamente por dois para efeitos de
determinação da coleta do agregado.

(17) Cumpre aqui assinalar a chamada “taxa adicional de solidariedade”, regulada no artigo 68.º-A, com
apenas dois escalões: para rendimentos coletáveis entre 80.000 e 250.000 – 2,5%; para rendimentos
superiores a 250.000 – 5%. Se adicionarmos estas taxas à taxa máxima de 48%, conclui-se que determinadas
parcelas de rendimentos podem ser tributadas às taxas de 50,5% ou até de 53%.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

A taxa normal é uma taxa marginal, pois corresponde ao incremento do IRS para um
incremento unitário do rendimento coletável, isto é, a taxa em causa representa o acréscimo
de IRS por cada euro a mais de rendimento coletável, tratando-se de um referencial muito
importante em casos de ponderação da opção pelo englobamento, como veremos.

A taxa média, por seu turno, resulta de uma ponderação das taxas normais, incluindo a taxa
normal do próprio escalão, ponderação essa que tem em conta o peso em valor de cada
escalão. Pode assim concluir-se que, para rendimentos situados exatamente no limite
superior de cada escalão, a coleta bruta corresponderá à aplicação direta da taxa média do
próprio escalão ao valor do rendimento.

Quanto ao modo de cálculo da taxa média, deixamos em seguida a sua demonstração,


dando-se como exemplo a taxa média do 3.º escalão (22,621%):

Em matéria de taxas gerais, não poderíamos deixar de referenciar a chamada “tabela


prática”, a qual simplifica bastante o apuramento da coleta bruta (embora a mesma não seja
utilizada na resolução dos casos práticos).

Tal tabela, que constitui um desenvolvimento da tabela prevista no n.º 1, artigo 68.º,
permite aplicar diretamente à matéria coletável a taxa normal do escalão em que a mesma
se insere, deduzindo-se ao resultado assim obtido um valor fixo, a chamada “parcela a
abater”.

Como calcular a parcela a abater?

Imagine-se um rendimento coletável de 15.000 (sensivelmente a meio do 3.º escalão,


podendo ser usado qualquer valor dentro do escalão).

Usando a tabela do artigo 68.º, a coleta bruta seria igual a: (10.700 x 17.367%) + [(15.000 -
10.700) x 28,5%] = 3.083,76.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Se aplicarmos diretamente ao valor do rendimento coletável a taxa normal em que o


mesmo se insere (3.º escalão) virá que: 15.000 x 28,5% = 4.275.

A diferença em relação à coleta apurada anteriormente é de 1.191,24 (4.275 - 3.083,76),


correspondendo este valor à parcela a abater que deve figurar no 3.º escalão, aplicando-se a
todos os rendimentos que se insiram dentro dos limites deste escalão (de mais de 10.700
até 20.261).

Este método de cálculo poderia ser aplicado a todos os restantes escalões (com exceção do
1.º), permitindo alcançar-se a tabela que se apresenta em seguida:

Tabela prática 2018 e 2019

Após o apuramento da coleta bruta, por aplicação das taxas previstas no artigo 68.º (e
eventualmente das taxas autónomas do artigo 72.º), será possível efetuar um conjunto de
deduções à mesma, as quais constituem um importante elemento de pessoalização do
imposto, deduções essas que estão consagradas no n.º 1, artigo 78.º.

As deduções à coleta atualmente previstas, que na sua maioria estão indexadas ao sistema
e-fatura, são relativas:

a) Aos dependentes do agregado familiar e aos ascendentes que vivam em comunhão de


habitação com o sujeito passivo (artigo 78.º-A);

b) Às despesas gerais familiares (artigo 78.º-B);

c) Às despesas de saúde e com seguros de saúde (artigo 78.º-C);

d) Às despesas de educação e formação (artigo 78.º-D);

e) Aos encargos com imóveis (artigo 78.º-E);

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

f) Às importâncias respeitantes a pensões de alimentos (artigo 83.º-A);

g) À exigência de fatura (artigo 78.º-F);

h) Aos encargos com lares (artigo 84.º);

i) Às pessoas com deficiência (artigo 87.º);

j) À dupla tributação internacional (artigo 81.º);

k) Aos benefícios fiscais (EBF).

l) Ao adicional ao imposto municipal sobre imóveis (artigo 135.º-I, CIMI).

Por se tratar de uma disposição legal transversal e que assume grande relevância em sede
de IRS, pese embora no presente manual não sejam abordadas questões relacionadas com a
fiscalidade internacional (rendimentos obtidos no estrangeiro por residentes e rendimentos
obtidos em território nacional por não residentes), não poderíamos deixar de fazer uma
alusão ao artigo 15.º, respeitante ao âmbito da sujeição, segundo o qual:

“1 - Sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade


dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.

2 - Tratando-se de não residentes, o IRS incide unicamente sobre os rendimentos obtidos


em território português.

3 - O disposto nos números anteriores aplica-se aos casos de residência parcial previstos
nos n.os 3 e 4 do artigo seguinte, relativamente a cada um dos estatutos de residência.”

Deixam-se em seguida algumas às notas relativamente às normas citadas:

✓ Os n.os 1 e 2 consagram, respetivamente, os denominados princípios da residência (ou


da universalidade, worldwide income principle) e da fonte (source principle),
consagrados nas legislações de grande parte dos países a nível mundial (18);

✓ A aplicação simultânea dos dois princípios mencionados em dois Estados diferentes


(Estado da residência e Estado da fonte), em situações plurilocalizadas, pode conduzir a

(18) Matéria que se encontra desenvolvida em várias obras, destacando-se Alberto Xavier (2007), “Direito
tributário Internacional”.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

fenómenos de dupla tributação jurídica, o que configura algo que se pode designar por
concurso de normas (19);

✓ A mencionada dupla tributação poderá ser eliminada através das CDT (tratados
internacionais) ou de normas de direito interno, já que também os Estados
unilateralmente dispõem de normas que permitem corrigir os efeitos nefastos da dupla
tributação (no caso Português, o artigo 81.º, crédito de imposto por dupla tributação
jurídica internacional);

✓ No âmbito destas temáticas assume particular relevância o disposto no artigo 16.º


(residência), por motivos óbvios, bem como o artigo 18.º (rendimentos obtidos em
território português), disposição legal que elenca taxativamente, nas suas várias alíneas,
os elementos de conexão (20) relevantes para efeitos de tributação de não residentes
relativamente a cada tipo de rendimento;

✓ Quanto n.º 3 do artigo 15.º, supra citado, foi aditado pela Lei da Reforma do IRS e
insere-se no âmbito da introdução da denominada residência fiscal parcial, regulada no
artigo 16.º, aplicando-se a norma no ano de chegada a Portugal (de alguém que residia
no estrangeiro e passou a residir no nosso país) ou no ano de partida de Portugal (de
alguém que aqui residia e que passou a residir no estrangeiro), casos em que, existindo
dois estatutos no mesmo ano (residente e não residente), os contribuintes ficarão
vinculados ao princípio da residência (n.º 1) e ao princípio da fonte (n.º 2).

Reitera-se que nos casos práticos que se apresentam no presente Manual não foram
incluídos estes temas, apresentando-se, exclusivamente, situações envolvendo rendimentos
obtidos em território nacional por pessoas aqui residentes, rendimentos estes que se
encontrarão sempre, inevitavelmente e por motivos óbvios, sujeitos a IRS.

(19) Segundo Casalta Nabais (2017), “Direito Fiscal”, trata-se de situações em que o mesmo facto tributário
se integra na hipótese de incidência de duas normas tributárias distintas. Ora, tratando-se de dupla tributação
internacional, as normas em concurso serão normas vigentes em Estados diferentes, no âmbito da adoção
simultânea dos princípios da residência e da fonte em cada um dos Estados (competências tributárias
cumulativas).
(20) De acordo com Alberto Xavier: “O elemento de conexão é o elemento da previsão normativa que,
fixando a localização de uma situação da vida num certo ordenamento tributário, tem como efeito típico
determinar o âmbito de aplicação das leis desse ordenamento a essa mesma situação.”. Elementos de
conexão serão, no fundo, os pressupostos de incidência territorial, podendo ser subjetivos, se se reportarem às
pessoas (residência, nacionalidade), ou objetivos se tiverem em conta as coisas ou os factos (fonte física,
fonte financeira, fonte económica).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Por se revelar importante para os próximos capítulos, onde constam casos práticos
respeitantes às várias categorias de rendimentos, apresenta-se seguidamente um quadro
onde se procura transmitir uma visão sistemática do Código do IRS, ao nível das regras
aplicáveis às várias categorias de rendimentos (fase analítica), assinalando-se, em duas
colunas, os artigos do CIRS respeitantes:

✓ À tipificação dos rendimentos inseridos em cada categoria (incidência real);

✓ Às deduções específicas e restantes regras de determinação do rendimento líquido de


cada categoria.

Termina-se com alguns valores de referência vigentes em 2019:

✓ DL n.º 117/2018, de 27-12: RMMG = 600,00

✓ Portaria n.º 24/2019, de 17-01: IAS = 435,76

✓ Portaria n.º 25/2019, de 17-01: PMRG = 273,39

Quanto ao IAS, referenciado em vários artigos do CIRS, importa ter presente que o artigo
98.º, Lei n.º 55-A/2010 (Lei do OE/2011), estipula que até que o valor do IAS atinja o
valor da RMMG em vigor para o ano de 2010 (475,00), mantém-se aplicável este último
valor para efeito das indexações previstas nos artigos 12.º, 17.º-A, 25.º, 79.º, 83.º, 84.º e
87.º do Código do IRS. (21)

(21) No âmbito do presente manual tal disposição legal transitória apenas terá influência na resolução dos
casos práticos n.os 2 e 13, uma vez que nos mesmos aplicar-se-á a dedução à coleta prevista no artigo 87.º,
respeitante a sujeitos passivos deficientes, norma abrangida pela disposição transitória.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

2. CASOS PRÁTICOS

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

2.1. CATEGORIA A
RENDIMENTOS DO TRABALHO DEPENDENTE

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 1

Fernando auferiu remunerações, no montante de 49.550, enquanto diretor comercial


da empresa ALFA, com sede em Esposende, tendo-lhe sido efetuadas retenções na
fonte no montante de 14.900, descontos para a Segurança Social de 5.451 e para o
sindicato de 495. O valor dos rendimentos atrás mencionado não inclui as seguintes
importâncias pagas pela empresa ALFA:

i) Subsídio de refeição auferido ao longo do ano no montante de 2.200 (10 x 220 dias);

ii) Ajudas de custo em virtude de uma deslocação a Lisboa (em serviço) no montante
de 1.500 (100 x 15 dias);

iii) Compensação pela utilização de automóvel próprio (ida a Lisboa e deslocações


durante a estadia) no valor de 300 (1.000 kms x 0,30);

iv) Curso de formação profissional no montante 2.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Resolução proposta

As remunerações em causa revestem a natureza de rendimentos do trabalho dependente


(por conta de outrem), sendo resultantes de um contrato individual de trabalho (ou outro a
ele legalmente equipado), inserindo-se, assim, na Categoria A, ao abrigo do disposto na
alínea a), n.º 1, artigo 2.º.

A sujeição a IRS decorre do disposto no n.º 1, artigo 1.º, o qual estipula que o IRS incide
sobre os rendimentos das diversas categorias, entre as quais se encontra a Categoria A.

Em sede de incidência do imposto, haverá que ter em conta não apenas as remunerações do
trabalho dependente propriamente ditas, no montante de 49.550, mas também as
remunerações acessórias que lhe foram pagas pela entidade patronal, conforme decorre dos
n.os 2 e seguintes, artigo 2.º.

Assim,

i) Subsídio de refeição: Apenas será considerado como rendimento tributável a parte que
excede o limite legal – ponto 2), n.º 3, alínea b), artigo 2.º. Em 2019, de acordo com o

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

artigo 21.º da Lei do OE/2018, o limite legal é de 4,77 (limite aplicável à função
pública, n.º 14, artigo 2.º), resultando que o valor a tributar no âmbito da Categoria A
será de 1.150,60 [(10 - 4,77) x 220]. A parte restante, no valor de 1.049,40 (4,77x 220)
estará excluída de tributação, não sendo sequer considerada rendimento, uma vez que só
constitui rendimento a parte que excede o limite, nos termos da norma supra
mencionada.

✓ Limites do valor do subsídio de refeição aplicáveis entre 2016 e 2019:

ii) Ajudas de custo: Apenas será considerado como rendimento tributável a parte que
excede o limite legal fixado para os servidores do Estado (n.º 14, artigo 2.º), no valor de
50,20 (limite que vigora desde 2011), ficando a parte restante, até ao valor do limite
legal, não sujeita a tributação em sede de IRS (e Segurança Social). Tal sucede porque
Fernando se deslocou, em serviço, do seu domicílio necessário, constituindo o valor
atribuído a título de ajudas de custo uma compensação para despesas e não uma
verdadeira remuneração, verificando-se, assim, os pressupostos legais necessários (22) –
alínea d), n.º 3, artigo 2.º.

Assim, o valor a considerar como rendimento tributável no âmbito da Categoria A


ascende a 747,00 [(100,00 - 50,20) x 15].

(22) De facto, a alínea d), n.º 3, artigo 2.º refere expressamente que as ajudas de custo serão consideradas
rendimento tributável quando ultrapassem os limites legais “ou quando não sejam observados os
pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado”. Ora, um dos pressupostos da atribuição de ajudas
de custo aos funcionários públicos é precisamente a necessidade de deslocação do domicílio necessário, ou
seja, situações em que o trabalhador é deslocado, em serviço, do local onde aceitou exercer funções (e onde
normalmente as mesmas são exercidas). Não se verificando este pressuposto (deslocação do domicílio
necessário), as importâncias atribuídas não têm natureza compensatória, mas sim remuneratória, devendo,
como tal, ser tributadas em IRS na totalidade. Tais importâncias constituirão também remunerações, sendo
tributadas enquanto tal, se a entidade patronal proporcionar as refeições e alojamento, suportando os
respetivos gastos.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

✓ Valores a diários considerar a título de ajudas de custo (100%), relativamente a


deslocações em território nacional ou ao estrangeiro:

Os limites legais das ajudas de custo foram fixados pela Portaria n.º 1553-D/2008, tendo
posteriormente sido reduzidos (entre 15% e 20%) pelo DL n.º 137/2010, mantendo-se
inalterado apenas o limite aplicável a membros do Governo no caso de deslocações em
Portugal.

Posteriormente, de acordo com o disposto no artigo 42.º da Lei n.º 66-B/2012 (Lei do
OE/2013), procedeu-se a uma nova redução abrangendo apenas as deslocações para fora de
Portugal, sendo a redução de 40% nos dois primeiros escalões (ao invés de 20%) e de 35%
(ao invés de 15%) nos dois últimos escalões.

A tabela anterior contém os valores atualmente aplicáveis, incorporando, portanto, todas as


alterações (reduções) supramencionadas.

Quanto aos pressupostos para a atribuição de ajudas de custo encontram definidos no DL


n.º 106/98 e também no DL n.º 192/95, ambos alterados pelo DL n.º 137/2010 e pela Lei
n.º 66-B/2012.

Considerando a doutrina administrativa veiculada na Circular n.º 12/91 da DGCI e no


Ofício-circulado n.º 34931/95 da DGCI, nas ajudas de custo abonadas por entidades não
públicas (empresas privadas) aos seus trabalhadores e membros dos órgãos societários,
deve tomar-se por referência o valor mais elevado (critério utilizado na resolução).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Segundo a mesma Circular e Ofício-circulado, é admissível tomar-se como referência o


valor das ajudas de custo atribuídas a membros do Governo, nos casos em que as funções
exercidas e/ou o nível das respetivas remunerações dos trabalhadores e membros de órgãos
societários não sejam comparáveis ou reportáveis à das categorias e/ou remunerações dos
funcionários públicos.

Na prática, como para os trabalhadores em geral é considerado o limite superior de 50,20


ou de 89,35 (valores atribuídos a funcionários públicos com remunerações base superiores
ao nível remuneratório 18 nos casos de deslocações em Portugal ou ao estrangeiro,
respetivamente), sem qualquer distinção em função do nível remuneratório, tem vindo a
entender-se que aos diretores de empresas se devem aplicar os limites respeitantes aos
membros do Governo, ou seja, 69,19 ou 100,24 (deslocações em Portugal ou ao
estrangeiro, respetivamente).

✓ Percentagens a considerar a título de ajudas de custo (a aplicar ao valor diário).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

iii) Deslocações em automóvel próprio (“quilómetros”): Não haverá qualquer tributação


uma vez que o valor pago (0,30/km) não ultrapassa o limite legal em vigor, o qual, em
2019 (desde 2011), corresponde a 0,36/km – alínea d), n.º 3, artigo 2.º, Portaria n.º
1153-D/2008 e Decreto-Lei n.º 137/2010 (redução de 10%).

iv) Curso de formação profissional: Conforme decorre da alínea c), n.º 1, artigo 2.º-A, o
montante relativo a um curso de formação profissional pago pela entidade patronal não
constitui rendimento tributável (sendo aceite como gasto em sede de IRC), desde que a
entidade formadora seja reconhecida como tendo competência nos domínios da
formação, o que se pressupõe ser o caso, pelo que tais rendimentos, não sendo
tributáveis, não serão incluídos no cálculo do rendimento líquido.

Face ao exposto anteriormente, o valor global do rendimento (bruto) da Categoria A a


considerar para efeitos de englobamento será de 51.447,60 (49.550,00 + 1.150,60 +
747,00).

As retenções na fonte (14.900), com a natureza de pagamentos por conta (matéria a


desenvolver na parte final da resolução), deverão ser deduzidas à coleta do IRS (artigo
78.º, n.º 2), conferindo direito a reembolso se se verificar existir um excesso em relação ao
imposto liquidado a final (artigo 78.º, n.º 3).

Quanto aos descontos para a Segurança Social (5.451) e às quotizações sindicais (495),
serão deduzidos ao rendimento bruto da Categoria A, a título de dedução específica,
conforme se refere em seguida.

Dedução Específica

Em condições normais, de acordo com a alínea a), n.º 1, artigo 25.º, ao rendimento da
Categoria A será deduzido, a título de dedução específica, o montante de 4.104. Porém,
neste caso, como as contribuições obrigatórias para regimes de proteção social (descontos
para a Segurança Social) excedem aquele montante, o valor a considerar corresponderá,
por esta via, àquelas contribuições (artigo 25.º, n.º 2), pelo que a dedução específica a
considerar será de 5.451.

Por outro lado, Fernando suportou quotizações sindicais, no valor de 495, as quais serão
também dedutíveis ao abrigo da alínea c), n.º 1, artigo 25.º, desde que não ultrapassem 1%
do rendimento bruto (o que é o caso), com o benefício da majoração da dedução em 50%,
donde o valor a deduzir será de 742,50 (495 x 1,5).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Assim, o valor da dedução específica ascende a 6.193,50 (5.451 + 742,50), logo, o


rendimento líquido da Categoria A ascende a 45.254,10 (51.447,60 - 6.193,50).

Tal rendimento será englobado aos rendimentos líquidos das restantes categorias, caso
existam, nos termos do n.º 1, artigo 22.º (englobamento), sendo tributado através da
aplicação de taxas progressivas previstas na tabela constante do n.º 1, artigo 68.º.

Retenção na Fonte

Os valores a tributar ao nível das remunerações acessórias (subsídio de refeição, ajudas de


custo e “quilómetros”) foram calculados numa base anual, quando, na prática, tais valores
deverão ser apurados mensalmente, conjuntamente com a remuneração principal, para
efeitos de retenção na fonte (artigo 99.º-C, n.os 1 e 2), uma vez que, não se tratando de
rendimentos em espécie, mas sim de remunerações acessórias pagas em dinheiro, não estão
dispensadas de retenção de acordo com o disposto na alínea a), n.º 1, artigo 99.º.

A retenção na fonte é obrigatória, devendo ser efetuada no momento do pagamento ou da


colocação à disposição dos rendimentos (corpo do n.º 1, artigo 99.º), aplicando-se as taxas
previstas nas tabelas aprovadas anualmente por Despacho do SEAF, de acordo com a
situação pessoal e familiar do titular do rendimento, a qual deverá ser comunicada pelo
trabalhador à entidade patronal (n.º 2, artigo 99.º).

As tabelas de retenção na fonte de IRS aplicáveis aos titulares de rendimentos do trabalho


dependente (e de pensões) residentes em território nacional (com exceção de Açores e
Madeira), vigentes para o ano de 2019, foram divulgadas pela Circular n.º 1/2019, do
Gabinete do DG da AT, tendo sido aprovadas pelo Despacho n.º 791-A/2019, do SEAF.

Quando falamos de retenção na fonte, estamos perante uma situação de substituição


tributária, definida no artigo 20.º da LGT, uma vez que, por imposição da lei, a prestação
tributária é exigida a pessoa diferente do contribuinte, envolvendo dois sujeitos: o
substituto, entidade obrigada a efetuar a retenção na fonte, e o substituído, titular dos
rendimentos, sendo este o contribuinte, e não o substituto, uma vez que é este que sofre o
desfalque patrimonial inerente ao pagamento do imposto através da dedução ao seu
rendimento.

Em matéria de responsabilidade tributária em caso de substituição tributária (retenção na


fonte), rege o artigo 103.º, o qual, após a revogação dos seus n.os 2 e 3 (operada pela Lei da
Reforma do IRS), se limita a remeter, quanto a esta matéria, para o artigo 28.º da LGT.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Todavia, os n.os 4 e 5 do artigo 103.º mantêm-se em vigor, tratando-se de normas especiais


em relação às da LGT, prevalecendo aquelas sobre estas (23).

Regressando ao caso prático, dir-se-á que Fernando sofreu o impacto da retenção na fonte,
uma vez que o seu valor foi deduzido ao rendimento, ou seja, a retenção foi efetuada pela
empresa ALFA, significando que, ao abrigo do n.º 1, artigo 28.º, LGT, a empresa ALFA,
enquanto substituto, é a única responsável pela entrega das importâncias retidas, ficando
Fernando (substituído) desonerado de qualquer responsabilidade.

De referir, finalmente, e a propósito, que Fernando terá direito à dedução à coleta das
retenções na fonte, independentemente de a empresa ALFA ter, ou não, entregado
atempadamente os impostos retidos.

Terminamos com uma referência à DMR, uma importante declaração que se encontra
prevista no ponto i), alínea c), n.º 1, artigo 119.º, a qual deverá ser apresentada, até ao dia
10 do mês seguinte, pelas pessoas ou entidades que tenham pago ou colocado à disposição
rendimentos do trabalho dependente a pessoas singulares residentes em território
português, aplicando-se tal obrigatoriedade, no caso em apreço, à empresa ALFA, entidade
patronal de Fernando.

(23) Ao nível da Categoria A, é especialmente importante o disposto no n.º 4 do artigo 103.º, o qual visa as
situações em que não há retenção na fonte (com a natureza de pagamento por conta) relativamente a
rendimentos sujeitos a essa retenção, quando os mesmos não foram contabilizados nem comunicados como
tal aos respetivos beneficiários, atribuindo a lei, nestes casos, uma responsabilidade solidária ao substituto
pelo imposto não retido. Estamos perante uma situação excecional, porquanto, em regra, nos casos em que a
retenção na fonte (com natureza de pagamento por conta) não é efetuada, a responsabilidade do substituto
pelo pagamento do imposto não retido é meramente subsidiária (sem prejuízo da responsabilidade pelo
pagamento de juros compensatórios), ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 28.º da LGT. A norma em
apreço (n.º 4, artigo 103.º) aplica-se, por exemplo, nas situações em que são detetadas pela AT remunerações
pagas aos trabalhadores não declaradas para efeitos de IRS, ou remunerações pagas sob a forma de ajudas de
custo. Muitas vezes estão em causa várias dezenas de trabalhadores e a norma em causa permite (?!) que a
AT exija os impostos não retidos diretamente ao substituto (uma única liquidação ao invés de dezenas ou até
centenas de liquidações). Quanto à possibilidade de a liquidação ser feita diretamente ao substituto (ou,
alternativamente, a responsabilidade operar apenas em sede de execução fiscal), ao abrigo do n.º 4 do artigo
103.º, embora a jurisprudência, especialmente do CAAD, seja contraditória [por exemplo: Acórdãos
proferidos nos processos n.º 118/2015 (improcedente), n.º 119/2015 (procedente) e n.º 120/2015
(procedente)], a verdade é que, segundo o TC, a norma não é inconstitucional, quando interpretada dessa
forma (liquidação direta ao substituto), conforme Acórdão n.º 231/2016, proferido no Processo n.º 1085/15.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Trata-se de uma obrigação declarativa fundamental em sede de IRS, que é imposta às


entidades pagadoras de rendimentos, maioritariamente sociedades, e da qual (entre outras
obrigações declarativas) depende o próprio funcionamento do sistema atualmente
implementado, baseado num sistema de pré-preenchimento automático das declarações de
rendimentos e em processos de controlo automatizados (alertas e divergências).

Tal declaração destina-se a revelar à AT os rendimentos do trabalho dependente (Categoria


A) auferidos por sujeitos passivos residentes em território português, incluindo os
rendimentos dispensados de retenção na fonte, os rendimentos isentos e ainda os excluídos
nos termos dos artigos 2.º, 2.º-A e 12.º do Código do IRS, desde que pagos ou colocados à
disposição do seu titular.

De acordo com as instruções da DMR deverão ser declarados os seguintes rendimentos:

- Sujeitos a retenção na fonte, ainda que lhes corresponda a taxa de 0% nas tabelas de
retenção (artigos 99.º e 100.º);

– Não sujeitos a retenção na fonte (alínea a), n.º 1, artigo 99.º);

– Isentos sujeitos a englobamento (artigos 18.º, 33.º, 37.º, 38.º, 39.º e 39.º-A, EBF);

– Não sujeitos a IRS (n.os 3 e 4, artigo 2º, artigo 2.º-A e n.os 1, 4, 5 e 7, artigo 12º).

No caso concreto, no tocante ao subsídio de refeição e às ajudas de custo, deverá ser


declarada a parte sujeita (código A), bem como a parte não sujeita (códigos A21 e A22,
respetivamente); quanto ao curso MBA, não sujeito a IRS, deverá também constar na
DMR (código A23).

Devem ainda aí ser declaradas as retenções na fonte de IRS, as contribuições obrigatórias


para regimes de proteção social e subsistemas legais de saúde e ainda as quotizações
sindicais.

Termina-se com a demonstração da liquidação do IRS, pressupondo que Fernando é


solteiro, sem dependentes a seu cargo, e considerando apenas a dedução à coleta
relacionada com “despesas gerais familiares”, prevista na alínea b), n.º 1, artigo 78.º e
artigo 78.º-B, bem como as retenções na fonte no valor de 14.900 (os descontos para a
Segurança Social e as quotizações sindicais serão consideradas a título de dedução
específica).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Constata-se, assim, que Fernando terá direito a receber um reembolso de IRS no valor de
742,32.

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Caso prático n.º 2

António, solteiro, possui um grau de invalidez permanente de 75% e obteve


rendimentos do trabalho, por conta de outrem, no montante de 25.000, tendo sofrido
os seguintes descontos: segurança social – 2.750, retenções na fonte – 1.700 e
quotizações sindicais – 300.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Resolução proposta

O António é considerado deficiente para efeitos de IRS, ao abrigo do n.º 5, artigo 87.º,
uma vez que o seu grau de invalidez é superior a 60%, aplicando-se todos os benefícios
fiscais inerentes a tal estatuto, os quais se resumem, atualmente, àqueles que se encontram
previstos no artigo supra mencionado (87.º) e no artigo 56.º-A, este último aditado pela Lei
da Reforma do IRS (Lei n.º 82-E/2014) e recentemente alterado (no sentido do aumento do
benefício) pela Lei do OE/2017 (Lei n.º 42/2016).

Pressupõe-se que o grau de invalidez do António se encontra devidamente comprovado,


através de atestado médico de incapacidade multiuso, emitido nos termos da legislação
aplicável, e, também, que tal estatuto se encontra devidamente averbado no cadastro da AT
permitindo evitar divergências na declaração modelo 3 de IRS.

Quanto aos rendimentos do trabalho por conta de outrem, são considerados rendimentos
da Categoria A, rendimentos do trabalho dependente (alínea a), n.º 1, artigo 2.º). No
entanto, face à condição de deficiente de António, de acordo com a alínea a), n.º 1, artigo
56.º-A, os mesmos serão apenas considerados em 85% do seu valor, desde que, nos termos
do n.º 2, artigo 56.º-A, a importância excluída de tributação não exceda o limite de 2.500
(por categoria de rendimentos).

No nosso caso, a parte excluída de tributação ascende a 2.500 (benefício máximo), uma
vez que 15% do valor do rendimento (3.750) é superior ao referido limite (24), resultando
que o valor a tributar será de 22.500 (25.000 - 2.500).

(24) Até 2017, a parte excluída de tributação era de apenas 10% do valor dos rendimentos em cada uma das
Categorias A, B e H, sendo, atualmente, excluídos de tributação 15% dos rendimentos das categorias A e B,
mantendo-se a percentagem de 10% quanto a rendimentos da Categoria H. Até ao aditamento, com efeitos a

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Relativamente à dedução específica, ascenderia, na falta de outras deduções, ao valor de


4.104 (alínea a), n.º 1, artigo 25.º).

No entanto, as quotizações sindicais serão também dedutíveis ao rendimento bruto desta


categoria, com o limite de 1% do rendimento bruto, sendo acrescidas de 50% para efeitos
de dedução (alínea c), n.º 1, artigo 25.º), o que constitui um incentivo à sindicalização dos
trabalhadores (“pagam 100 e deduzem ao rendimento 150”).

Atendendo a que os descontos efetuados para o sindicato, no valor de 300, excedem o


limite de 1% do rendimento (25.000 x 1% = 250), será considerado o valor do limite
acrescido de 50%, pelo que, a dedução a considerar será de 375 (250 x 1,5) – o excesso
não releva para efeitos fiscais.

Face ao exposto, o rendimento líquido da categoria A será: 22.500 - 4.104 - 375 = 18.021.

As retenções na fonte, no valor de 1.700, como não poderia deixar de ser, serão dedutíveis
à coleta (artigo 78.º, n.º 2), podendo, se for caso disso, gerar direito a receber reembolso
(artigo 78.º, n.º 3).

De referir que há tabelas de retenção específicas para contribuintes deficientes, devendo as


mesmas ser aplicadas de acordo com a situação pessoal e familiar. Tais tabelas contêm
taxas de retenção mais reduzidas visando uma aproximação entre o imposto retido e o
imposto devido a final, tendo em conta os benefícios fiscais aplicáveis.

Embora sem influência na determinação do rendimento líquido, cumpre assinalar que


António terá direito a um outro benefício fiscal suplementar, de maior magnitude, ao
abrigo do n.º 1, artigo 86.º (entre outros, menos relevantes, previstos nos números
seguintes do mesmo artigo), que consiste numa dedução à coleta correspondente a quatro
vezes o valor do IAS, o que, em 2019, equivaleria a 1.743,04 (435,76 x 4).

No entanto, o artigo 98.º, Lei n.º 55-A/2010 (Lei do OE/2011), estipula que até que o valor
do IAS atinja o valor da RMMG garantida em vigor para o ano de 2010 (475,00), mantém-

partir de 2015, do artigo 56.º-A, o benefício fiscal em causa era concedido anualmente nas sucessivas Leis do
OE, desde a Lei do OE/2007 que procedeu à revogação do artigo 16.º do EBF, disposição legal que era
aplicável a contribuintes com deficiência e cujos benefícios fiscais eram mais favoráveis do que os previstos
atualmente, e desde então, no artigo 87.º (sobretudo para contribuintes deficientes com rendimentos mais
elevados), tendo sido esta a razão que, a nosso ver, justificou a criação do benefício previsto no artigo 56.º-A
(atenuação dos efeitos decorrentes da diminuição de benefícios fiscais ocorrida em 2007).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

se aplicável este último valor para efeito das indexações previstas em vários artigos,
nomeadamente no artigo 87.º, resultando que o valor da dedução à coleta ascende em 2019
a 1.900 (475 x 4).

Relativamente ao cálculo do imposto a pagar, tratando-se de contribuinte solteiro


(presumindo-se que sem dependentes e ascendentes a seu cargo), considerando apenas a
dedução à coleta relacionada com “despesas gerais familiares”, prevista na alínea b), n.º 1,
artigo 78.º e artigo 78.º-B (25), bem como as retenções na fonte no valor de 1.700 (os
descontos obrigatórios de 2.750 são irrelevantes), virá que:

António será notificado, em 2019, para pagar o montante de 94,75, pagamento que poderia
ser evitado caso o mesmo tivesse fornecido o seu NIF aos fornecedores / prestadores de
serviços, podendo, desse modo, beneficiar de várias deduções à coleta, especialmente
tendo em conta a sua condição de deficiente, destacando-se, entre outras, as relacionadas
com:

- Despesas de saúde (alínea c), n.º 1, artigo 78.º e n.º 1, artigo 78.º-C): dedução de 10% do
valor das despesas sem limite, sem qualquer especificidade para deficientes;

- Despesas de educação e reabilitação (alínea i), n.º 1, artigo 78.º e 1.ª parte, n.º 2, artigo
87.º): dedução de 30% do valor das despesas, com a particularidade de, quanto às despesas

(25) Até porque, previsivelmente, não haveria muitas outras deduções a considerar, sem prejuízo, obviamente,
de António poder aproveitar as restantes deduções legalmente previstas, parte delas, refira-se, concedidas
exclusivamente a sujeitos passivos deficientes ou então aplicáveis a todos os contribuintes mas com
especificidades relativamente a este tipo de sujeitos passivos, no sentido da ampliação do benefício,
conforme se indica na parte final da resolução.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

de educação, não se aplicar qualquer limite, no caso de António, por ser deficiente (ao
contrário do que sucede com a generalidade dos contribuintes), sendo que, quanto às
despesas de reabilitação, se trata de um benefício exclusivamente concedido a deficientes;

- Prémios de seguros de vida (alínea i), n.º 1, artigo 78.º e 2.ª parte, n.º 2, artigo 87.º):
dedução de 25% do valor dos prémios sem qualquer limite, benefício apenas aplicável a
deficientes.

António deveria proceder à apresentação do Anexo A da declaração modelo 3, não


carecendo de ser declarada Anexo H a importância não sujeita, no valor de 2.500 (dado
não se tratar de um rendimento isento mas sim não sujeito), sendo a mesma considerada
automaticamente na liquidação.

António deverá, no rosto da declaração modelo 3, no respetivo Quadro 3, declarar a sua


condição de deficiente, mediante a colocação da sua percentagem de deficiência, conforme
a imagem seguinte:

Nota: A quadrícula do lado direito destina-se a ser preenchida no caso de sujeitos passivos
deficientes das Forças Armadas.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 3

Manuela auferiu, a título de pré-reforma (sem prestação de trabalho), o valor de


8.000, não tendo sofrido quaisquer descontos em sede de IRS. Efetuou pagamentos
por conta no valor de 500.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e determinação do rendimento líquido.

Resolução proposta

Os rendimentos auferidos por Manuela, a título de pré-reforma, enquadram-se na


Categoria A (trabalho dependente) e não na Categoria H (pensões) como poderia parecer à
primeira vista, conforme dispõe a alínea d), n.º 1, artigo 2.º.

Embora neste caso os rendimentos tenham sido auferidos sem a correspondente prestação
de trabalho, é de realçar que o enquadramento na Categoria A não depende de tal
circunstância, sendo, portanto, indiferente se a situação de pré-reforma ocorre com ou sem
prestação de trabalho (26).

Nestas situações, em que estão envolvidos rendimentos auferidos a título de pré-reforma


(código 407, conforme imagem infra), será necessário colocar informação adicional no
Anexo A da declaração modelo 3, nomeadamente o NIF da entidade pagadora, a data do
contrato de pré-reforma, bem como a data em que ocorreu o primeiro pagamento,
conforme se pode verificar na imagem seguinte:

Assim, deverá ser deduzido, a título de dedução específica, o montante de 4.104, conforme
se encontra previsto na alínea a), n.º 1, artigo 25.º, gerando um rendimento líquido da
Categoria A no montante de 3.896 (8.000 - 4.104).

(26) A norma abarca ainda “quaisquer outras prestações atribuídas antes de se verificarem as condições
legais para a passagem à situação de reforma”.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Não tendo existido quaisquer retenções na fonte, de acordo com a tabela de retenção
aplicável, em princípio Manuela não teria direito a qualquer reembolso por maiores que
fossem as suas deduções à coleta (n.º 3 do artigo 78.º).

Caso não existissem outros rendimentos, Manuela acabaria por não pagar qualquer
imposto face à aplicação do mínimo de existência previsto no n.º 1, artigo 70.º, dado que o
valor do rendimento auferido, mesmo sem ter em conta eventuais impostos, é inferior ao
limite aí previsto que atualmente (em 2019) se situa em 9.150,96 (435,76 x 14 x 1,5).

No entanto, tudo indica que Manuela terá outros rendimentos sujeitos a englobamento
obrigatório, não mencionados no enunciado (nomeadamente pensões pagas por sistemas
paralelos ou uma eventual mais-valia imobiliária), uma vez que de outra forma não faria
qualquer sentido ter efetuado pagamentos por conta, tendo em conta o seu caráter
voluntário, no âmbito da Categoria A.

Estamos perante uma solução legal totalmente inovadora (que é extensível à Categoria H,
pensões), a qual apenas se encontra instituída desde 2015, com o aditamento do n.º 8 ao
artigo 102.º, alteração esta processada pela Lei da Reforma do IRS (27).

Tais importâncias, pagas por conta, são indicadas no Quadro 4-B do Anexo A da
declaração modelo 3, conforme se pode verificar na imagem seguinte:

Até à consagração desta solução legal, que se compreende e se aplaude (tendo em conta o
seu caráter voluntário), apenas se encontrava prevista a possibilidade de efetuar
pagamentos por conta no âmbito da Categoria B (rendimentos empresariais e
profissionais), embora neste caso com diferenças muito significativas em relação ao regime
instituído relativamente às Categorias A e H.

(27) A antecipação do pagamento através de pagamentos por conta, sendo evidentemente benéfica para o
Estado, na perspetiva do contribuinte permitirá evitar dissabores no momento da liquidação, situações já
vivenciadas por grande parte de nós, sobretudo quando existem rendimentos de outras categorias (tendo em
conta o englobamento e a aplicação de taxas progressivas), embora tais surpresas possam também ser
facilmente evitadas optando por retenção na fonte a taxa superior (se existirem outros rendimentos sujeitos a
retenção), possibilidade que se encontra prevista no n.º 6 do artigo 98.º. Outra alternativa, mais racional, mas
talvez menos praticável, será reservar o dinheiro numa conta bancária para o pagamento do imposto.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

De facto, entre outras diferenças menos substanciais, na Categoria B os pagamentos por


conta são obrigatórios, e não facultativos, e o modo de pagamento não se encontra ao livre
arbítrio do contribuinte, encontrando-se perfeitamente circunscrito pela lei: três prestações,
a efetuar em períodos concretamente definidos (julho, setembro e dezembro).

Em sede da Categoria B, a lei estabelece ainda a fórmula de cálculo dos pagamentos por
conta (sendo o resultado obtido dividido por 3), fórmula essa, um pouco complexa, que se
encontra prevista no n.º 1, artigo 102.º.

Na prática os cálculos são efetuados pela AT, com base nos rendimentos do penúltimo ano
àquele em que são devidos os pagamentos, sendo o seu valor comunicado ao contribuinte,
primeiro aquando da notificação da liquidação do penúltimo ano (no ano anterior), bem
como no próprio ano em que há obrigatoriedade de efetuar os pagamentos, sendo neste
caso o sujeito passivo notificado previamente ao início do prazo de cada uma das
prestações, situação esta que contrasta com a que se encontra prevista em sede de IRC
(autoliquidação…).

Uma última nota para mencionar que a importância dos pagamentos por conta é
incomparavelmente superior na Categoria B, comparativamente com a importância que
têm nas Categorias A e H (em que são praticamente residuais tendo em conta a
obrigatoriedade de retenção na fonte nestes tipos de rendimentos), dado que naquela
categoria de rendimentos (B) podem mesmo assumir a única forma de adiantamento de
imposto por conta do imposto devido a final, bastando pensar nos sujeitos passivos cujos
rendimentos empresariais resultam de vendas de mercadorias e não de prestações de
serviços.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 4

Fernanda, licenciada em direito, é solteira e não tem filhos. Trabalha desde


novembro de 2019 no Município de Braga, ao abrigo de um contrato de trabalho,
tendo auferido rendimentos no montante ilíquido de 3.100, sobre os quais incidiram
os respetivos descontos obrigatórios (SS + ADSE) no montante de 449,50 e retenções
na fonte de IRS no montante de 380. O valor do subsídio de refeição auferido nos 40
dias de trabalho ascendeu a 190,8.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e determinação do rendimento líquido.

Resolução proposta

Fernanda é funcionária pública, tendo em conta que o Município faz parte da


Administração Autónoma (do Estado), tratando-se de uma pessoa coletiva de direito
público. Está em causa o exercício de funções públicas, trabalho subordinado, cujos
rendimentos daí decorrentes se enquadram na Categoria A, nos termos da alínea c), n.º 1,
artigo 2.º, e, como tal, encontram-se sujeitos a IRS por força do n.º 1, artigo 1.º.

O valor do subsídio de refeição não será tributado, não constituindo rendimento tributável,
ao abrigo do ponto 2), alínea b), n.º 3, artigo 2.º, uma vez que o valor diário não excede o
limite legal (190,8 / 40 = 4,77).

Ao rendimento em causa, no valor de 3.100, deverá abater-se o valor da dedução específica


prevista na alínea a), n.º 1, artigo 25.º, no valor de 4.104, o que, na falta de disposição em
contrário, permitiria alcançar um valor negativo (perda na Categoria A).

No entanto, conforme se encontra estipulado no corpo do n.º 1, artigo 25.º, a dedução é


apenas efetuada até à concorrência do valor dos rendimentos, resultando, assim, uma
dedução no valor de 3.100 (igual ao valor do rendimento), logo, o rendimento líquido da
Categoria A será nulo.

Na falta de outros rendimentos, Fernanda seria reembolsada da totalidade do imposto


retido, no valor de 380, ao abrigo do disposto no n.º 3, artigo 78.º, situação esta, diga-se,
inevitável, uma vez que os rendimentos respeitam a apenas dois meses, a retenção foi feita
sem ter em conta esse facto e o valor da dedução específica mantém-se, isto é, é o mesmo
que seria aplicável caso existissem rendimentos auferidos durante todo o ano.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 5

Tiago, residente no Porto, é auditor sénior numa multinacional de auditoria,


atividade por conta de outrem que exerce em Lisboa desde há 10 anos, ao abrigo de
um contrato individual de trabalho. Durante o ano de 2019, verificou-se o seguinte:

i) Foi-lhe atribuída a importância de 2.500, em janeiro, para despesas de deslocação e


viagens, não tendo, até ao final do ano, apresentado quaisquer documentos
justificativos das despesas;

ii) Foi-lhe atribuída uma casa, arrendada pela entidade patronal, suportando esta a
renda no valor de 800/mês;

iii) Foi-lhe atribuída uma viatura para uso total, adquirida pela entidade patronal em
dezembro de 2017 por 50.000, conforme acordo escrito celebrado;

iv) A entidade patronal despendeu 500/mês em contribuições para um PPR, cujos


benefícios revertem para o Tiago independentemente da manutenção do vínculo
laboral (regalia de que beneficiam apenas alguns funcionários da empresa);

v) A entidade patronal suportou os custos com realização de um MBA, realizado


numa Universidade, cuja propina ascendeu a 10.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Tiago trabalha por conta de outrem numa empresa, sabendo-se que ao abrigo de um
contrato individual de trabalho. Assim sendo, aufere rendimentos da Categoria A, ao
abrigo da alínea a), n.º 1, artigo 2.º, sujeitos a IRS pelo n.º 1, artigo 1.º.

i) Quanto à importância em dinheiro que lhe foi entregue no início do ano para fazer face
a despesas com deslocações e viagens (2.500), relativamente às quais não foram
prestadas contas até ao final do ano, estamos perante uma remuneração, tributada em
IRS, no âmbito da Categoria A, situação expressamente regulada na 2.ª parte da alínea
d), n.º 3, artigo 3.º (a 1.ª parte da norma refere-se a “quilómetros” e ajudas de custo).
Tendo em conta a redação da norma, o rendimento deverá considerar-se obtido em 31-
12-2019, dado que Tiago poderia prestar contas até este dia e, caso tal sucedesse, não

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

haveria lugar a tributação (no todo ou em parte). Para evitar a tributação, Tiago deveria
ter comprovado as despesas em causa, realizadas em serviço, através de faturas emitidas
em nome da entidade patronal (28). Tratando-se de dinheiro entregue em janeiro, para
fazer face a despesas futuras, num momento em que, à partida, não estávamos perante
um rendimento, e tendo em conta que a aferição enquanto tal apenas pôde ser feita em
31 de dezembro, muito tempo após o pagamento, salvo melhor opinião, não haverá
lugar a retenção na fonte por tal não ser exequível (reter na fonte implica efetuar uma
dedução ao valor a pagar), sem prejuízo, naturalmente, da tributação a final do montante
em causa.

ii) Uma vez que a entidade patronal suporta a renda da casa, estamos perante uma
remuneração acessória, atribuída em espécie, enquadrada na Categoria A, ao abrigo do
ponto 2), alínea b), n.º 3, artigo 3.º. O valor a tributar ascenderá a 9.600 (800 x 12),
correspondente à renda paga pela entidade patronal, conforme dispõe a alínea a), n.º 2,
artigo 24.º (se Tiago suportasse uma parte da renda seria tributada apenas a diferença).
De referir que a tributação deste rendimento irá ocorrer apenas em 2019, sem qualquer
tipo de adiantamento ao longo do ano de 2019, uma vez que, tratando-se de rendimento
em espécie, está dispensado de retenção na fonte pela alínea a), n.º 1, artigo 99.º (29).

iii) Quanto à viatura que lhe foi atribuída para uso total (depreende-se que ao longo de todo
o ano), situação devidamente contratualizada com a entidade patronal, constitui também
uma remuneração acessória, sujeita a IRS em sede da Categoria A, ao abrigo do ponto
9), alínea b), n.º 3, artigo 2.º. O valor anual a tributar, nos termos do n.º 5, artigo 24.º,
corresponde ao produto de 0,75% do valor de mercado (30) reportado a 01-01-2019, pelo

(28) Constituindo tais importâncias, justificadas documentalmente, gastos com deslocações e estadas (conta
62) na ótica da entidade patronal, os quais serão aceites fiscalmente em sede de IRC à luz do n.º 1, artigo
23.º, CIRC, e sem qualquer tributação autónoma, desde que, claro, não assumam a natureza de despesas de
representação, cujo conceito se encontra previsto no n.º 7, artigo 88.º, CIRC (e no n.º 4, artigo 73.º, CIRS).
Naturalmente que o montante de 2.500, não documentado, será também dedutível em sede de IRC, enquanto
remunerações, gastos com pessoal (até porque tal montante está a ser tributado em sede de IRS).
(29) Até à alteração da norma, processada pela Lei da Reforma do IRS, a lei tipificava as situações de
dispensa de retenção na fonte, algo que por vezes gerava dúvidas porquanto existiam situações em que a
retenção na fonte parecia não ser exequível, mas não existia uma norma que a dispensasse expressamente.
Com esta alteração, passou a ficar consagrada uma dispensa de retenção na fonte de caráter genérico quanto a
rendimentos atribuídos em espécie, ou seja, rendimentos que não são pagos em dinheiro.
(30) Até à alteração da norma, processada pela Lei da Reforma do IRS, a lei remetia para o valor de aquisição
da viatura e não para o seu valor de mercado, alteração que se nos afigura totalmente acertada. Quanto ao

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

número de meses de utilização, donde: 0,75% x 40.000 x 12 = 3.600. Uma vez mais,
por se tratar de um rendimento em espécie, não sofre qualquer tipo de retenção na fonte,
ao abrigo da alínea a), n.º 1, artigo 99.º (31).

iv) Tratando-se de contribuições para um PPR, cujos benefícios revertem em exclusivo para
o Tiago, constituindo para si direitos adquiridos (cujo conceito se encontra no n.º 9,
artigo 2.º, consistindo em direitos cujo exercício não depende da manutenção do vínculo
laboral) e individualizados, estão sujeitos a IRS (Categoria A), ao abrigo do subponto i),
ponto 3, alínea b), n.º 3, artigo 2.º, ascendendo o valor tributável a 6.000 (500 x 12), não
sendo aplicável a não sujeição prevista na alínea b), n.º 1, artigo 2.º-A, norma que
remete para o artigo 43.º do CIRC (32).

v) Relativamente às propinas do curso MBA, suportadas pela entidade patronal,


constituem remunerações acessórias, sujeitas a IRS, tendo em conta o (amplo) conceito
que consta na alínea b), n.º 3, artigo 2.º. O facto de a situação em causa não se encontrar
expressamente regulada nas (11) subalíneas da alínea b), n.º 3, artigo 2.º, é irrelevante

valor de mercado, deverá ser determinado com recurso à tabela aprovada pela Portaria n.º 383/2003, a qual
contém as percentagens de desvalorização anual das viaturas: 20% após o primeiro ano, 15% após o 2.º ano,
10% após o 3.º, 4.º e 5.º ano e 5% daí em diante até ao 9.º ano, restando sempre um valor residual de 10%.
No nosso exemplo, uma vez que a idade da viatura em 01-01-2019 é de um ano, a percentagem de
desvalorização é 20%, o que significa que a viatura tem, nesta data, o valor de mercado (valor fiscal) de
40.000 [50.000 - (50.000 x 20%)].
(31) Em sede de IRC, o gasto será aceite fiscalmente (enquanto remunerações), permitindo evitar a tributação
autónoma sobre todas as despesas incidentes sobre a viatura, cuja taxa aplicável seria, neste caso,
pressupondo que se trata de viatura movida a gasóleo, de 35% (alínea c), n.º 3, artigo 88.º, CIRC),
conduzindo a valores de imposto (IRC), em condições normais, bastante superiores ao valor suportado em
sede de IRS por Tiago.
(32) Em sede de IRC, o gasto será aceite fiscalmente, uma vez que se trata de remunerações, não sendo
aplicável o disposto no artigo 43.º, CIRC, por força, desde logo, da alínea g), n.º 4, uma vez que estamos
perante rendimentos do trabalho dependente. Os gastos abrangidos pelo n.º 2, artigo 43.º, CIRC, são aceites
fiscalmente (embora com o limite de 15% dos gastos com pessoal) e não estão sujeitos a tributação em sede
de IRS na esfera dos trabalhadores, devendo, no entanto, tais gastos respeitar, especialmente, o caráter de
generalidade (atribuição a todos os trabalhadores permanentes) e de objetividade (fixação segundo critérios
objetivos e idênticos para todos os trabalhadores), o que não sucede no caso em apreço. Os gastos com
realizações de utilidade social, previstos no artigo 43.º, CIRC, são, na perspetiva do trabalhador, meras
expectativas, uma vez que não há um direito efetivo ao benefício futuro, que não se sabe se virá a ser
usufruído, verificando-se que, no nosso caso, falha também este pressuposto, uma vez que se trata de direitos
adquiridos por Tiago, de acordo com os dados do enunciado.

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uma vez que se trata uma enumeração meramente exemplificativa (e não taxativa).
Todavia, tratando-se de um curso que se poderá enquadrar no conceito de “formação
profissional” (tendo em conta que se trata de um MBA) (33), tal como previsto na lei,
ministrado por uma entidade com competência no domínio da formação (Universidade),
a situação terá, salvo melhor opinião, enquadramento na alínea c), n.º 1, artigo 2.º-A.

Por conseguinte, a quantia despendida pela entidade patronal no valor de 10.000 não
estará sujeita a IRS, por força da norma de exclusão tributária supra invocada (e será
aceite fiscalmente, em sede de IRC, enquanto gastos com pessoal, encargos com
remunerações).

O valor a englobar aos restantes rendimentos da Categoria A (e outros, caso existam)


ascenderá a 18.700 (2.500 + 9.600 + 3.600 + 3000).

(33) O mesmo entendimento deverá aplicar-se a um curso de pós-graduação ou a um curso de especialização


(desde que no âmbito da atividade profissional) realizados em Universidades ou em Institutos Politécnicos.
No entanto, talvez já não seja assim, tendo em conta a letra da lei, caso se trate de propinas suportadas pela
entidade patronal com cursos de licenciatura, de mestrado ou de doutoramento dos seus trabalhadores, uma
vez que tais cursos conferem grau académico, não tendo uma natureza eminentemente profissionalizante de
modo a poderem ser enquadráveis no conceito de “formação profissional”, expressamente mencionado na lei,
matéria que se encontra perfeitamente regulada em termos legais, nomeadamente e, fundamentalmente, no
Código do Trabalho. Na busca de um conceito, passa a citar-se, a título exemplificativo, o n.º 1, artigo 2.º,
Regulamento Geral da Formação, aplicável aos funcionários parlamentares (Regulamento n.º 32/2006, de 03-
05, publicado no DR, II Série, n.º 85, de 03-05-2006), segundo o qual: “Entende‐se por “formação
profissional" o processo através do qual os funcionários parlamentares adquirem e desenvolvem
capacidades e competências adequadas ao seu desempenho profissional e à sua valorização profissional e
pessoal e actualizam os conhecimentos detidos no exercício da sua actividade.”. a este respeito,
questionamo-nos sobre se não deveria ser efetuada uma alteração legislativa, passando a incluir-se,
expressamente, as propinas de cursos de licenciatura, mestrado e doutoramento.

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Caso prático n.º 6

Joaquim é sócio-gerente de uma sociedade por quotas (possuindo uma quota


representativa de 5% do capital social), tendo recebido, em 2019, entre outras
remunerações, gratificações por conta de resultados do ano de 2018, no valor de
10.000, situação que tem vindo a repetir-se ao longo dos últimos anos.

Joaquim auferiu nos úlimos 12 meses anteriores à atribuição das gratificações uma
remuneração média mensal no montante de 2.500/mês.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Joaquim, embora seja sócio da sociedade em causa (titular do capital), é também gerente
da mesma, logo, é um trabalhador, embora com um estatuto especial inerente ao exercício
do cargo, o qual pressupõe o exercício de poderes de decisão e de representação.

Os rendimentos auferidos, nomeadamente as remunerações no valor de 2.500/mês,


integram-se na Categoria A (alínea a), n.º 1, artigo 2.º), beneficiando das deduções
específicas respetivas (nomeadamente a dedução prevista na alínea a), n.º 1, artigo 25.º) e
estando sujeitos mensalmente a retenções na fonte (n.º 1, artigo 99.º).

Quanto às gratificações por conta de resultados que lhe foram pagas em 2019, na qualidade
de gerente, assumem também a natureza de remunerações, inseridas na Categoria A, nos
termos do n.º 2, artigo 2.º, onde as mesmas se encontram especificamente previstas.

Com efeito, embora, em substância, se trate de distribuição de lucros, não estamos perante
lucros distribuídos aos sócios enquadráveis na Categoria E (rendimentos de capitais, alínea
h), n.º 2, artigo. 5.º), embora, naturalmente, a sua condição de sócio, titular de 5% do
capital social, lhe permita auferir também este tipo de rendimentos, bem como outros,
nomeadamente, juros de suprimentos.

Digamos que são lucros distribuídos a Joaquim, mas na sua qualidade de gerente
(trabalhador) e não na sua qualidade de sócio (titular do capital), tratando-se de situações
totalmente distintas do ponto de vista jurídico, desde logo porque as gratificações de
gerência (ou de balanço, por conta de resultados) não estão sujeitas aos mesmos
condicionalismos que são aplicáveis à distribuição de lucros aos sócios, previstos no CSC,
nem, ainda, talvez este o elemento mais diferenciador, dependem do nível de participação

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

no capital social, mas sim do fator trabalho (sendo estas gratificações muitas vezes
atribuídas a trabalhadores).

Tais rendimentos serão somados aos restantes rendimentos da Categoria A, para efeitos de
tributação a final, após englobamento aos rendimentos das restantes categorias (artigo 22.º,
n.º 1), bem como, nota muito importante, deverão ser somados aos restantes rendimentos
do mês para efeitos de retenção na fonte.

De facto, no momento do pagamento ou da colocação à disposição deverá ser efetuada a


devida retenção na fonte sobre estes rendimentos (artigo 99.º, n.º 1), conjuntamente com os
restantes rendimentos do mês, de acordo com a tabela que for aplicável tendo em conta a
situação pessoal e familiar de Joaquim.

Tal significa que, se as gratificações em causa forem pagas de uma só vez, num só mês, a
consequência inevitável será a aplicação de uma taxa de retenção, nesse mês, muito
elevada, muito provavelmente superior à taxa que será aplicável a final, sendo certo que
um eventual excesso será reembolsado por se tratar de retenções com uma natureza
provisória e não definitiva (n.º 3, artigo 78.º).

De referir que, não obstante a tributação em sede de IRS ocorrer apenas em 2019, o
reconhecimento fiscal do gasto em sede de IRC terá ocorrido, em princípio, em 2018,
embora a dedutibilidade fiscal tenha sido apenas parcial (34).

(34) Efetivamente, quanto à sociedade, verá reconhecido fiscalmente, em 2018, parte do gasto contabilístico
inerente às gratificações, as quais, em princípio, terão sido reconhecidas contabilisticamente como gasto na
totalidade neste ano, dado que, face aos dados do enunciado, parecem verificar-se as condições da NCRF n.º
28 (Benefícios aos Empregados). A dedutibilidade fiscal em sede de IRC, no caso concreto, advém do facto
de as gratificações terem sido pagas até ao final do ano seguinte (2019), condição imposta pela alínea n), n.º
1, artigo 23.º-A, CIRC, pois, caso contrário, teria que se repor, na declaração modelo 22 respeitante a 2019, o
IRC que deixou de ser pago em 2018 por força da dedução fiscal neste ano, bem como os respetivos juros
compensatórios, penalizações que se encontram previstas no n.º 5, artigo 23.º-A, CIRC. No entanto, na
situação em apreço, dispondo Joaquim de mais de 1% do capital social, aplica-se também a limitação prevista
na alínea o), n.º 1, artigo 23.º-A, CIRC, sendo necessário efetuar as respetivas correções fiscais, neste caso,
na declaração modelo 22 do próprio ano de 2018 (ano em que o lucro foi gerado e em que o gasto foi
contabilizado). Assim, a parte que excede o dobro da remuneração média mensal, não terá sido aceite
fiscalmente em sede de IRC, tratando-se de um mero exemplo de um dos muitos gastos contabilísticos que
não são aceites como gastos fiscais. No caso em apreço, o valor da correção fiscal efetuada no quadro 07 da
declaração modelo 22 de 2018 terá sido: [(2.500 x 14) / 12] x 2 = 5.833,33, logo, 10.000 - 5.833,33 =
4.166,67 → valor a acrescer no campo 735.

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Caso prático n.º 7

Joana, estudante do ensino superior, com 21 anos, auferiu 1.500 a título de


remuneração paga por uma empresa que organiza um festival de verão, tendo
celebrado um contrato de trabalho com a duração de 1 mês.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e determinação do rendimento líquido.

Resolução proposta

As remunerações auferidas enquadram-se na Categoria A (alínea a), n.º 1, artigo 2.º), uma
vez que se trata de trabalho subordinado, sem caráter de independência, tendo sido
celebrado um contrato de trabalho para o efeito.

Joana beneficiará da dedução específica prevista na alínea a), n.º 1, artigo 25.º, a qual tem
um valor de 4.104, dedutível até à concorrência do rendimento bruto, significando que o
rendimento líquido da Categoria A será nulo (1.500 - 1.500 = 0).

Uma vez que Joana integra o conceito de dependente, previsto na alínea b), n.º 5, artigo
13.º, dado que não tem mais de 25 anos e não aufere, de acordo com os dados do
enunciado, rendimentos de valor superior ao valor anual da RMMG (em 2019: 600 x 14 =
8.400), fará parte do agregado familiar dos pais, sendo os rendimentos tributados em
conjunto através da aplicação de taxas progressivas.

Em todo o caso, embora em abstrato tal situação possa ocorrer, em concreto, na situação de
Joana, poder-se-á concluir que a obtenção do rendimento em causa não agravará a
tributação dos pais em função da inexistência de rendimento líquido suscetível de ser
englobado e tributado.

A título de mera curiosidade, por nos parecer oportuno, é de referir que na proposta de
OE/2018 (Proposta de Lei n.º 100/XIII), constava o aditamento do n.º 5 ao artigo 71.º do
Código do IRS, prevendo-se a aplicação de uma retenção na fonte à taxa liberatória de
10% relativamente a:

“(…) importâncias auferidas ao abrigo do contrato de trabalho por estudante dependente


matriculado no ensino secundário, no ensino pós-secundário não superior e no ensino
superior, incluindo as auferidas por menor em espetáculo ou outra atividade de natureza
cultural, durante as férias escolares, até ao limite anual de 5 vezes o IAS.”.

58
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Contudo, tal alteração, não obstante ter sido bastante debatida em sede de discussão na
especialidade na AR, tanto quanto é do nosso conhecimento, acabou por não ser aprovada
pela AR.

Segundo veio noticiado na imprensa, o Governo terá sido alertado pela AT, na fase final da
discussão na AR (em finais de novembro de 2017), que o regime atualmente vigente não
agrava a tributação dos pais (agravamento esse que alegadamente teria motivado a
proposta de alteração ao CIRS), não obstante o englobamento, uma vez que, em geral, o
rendimento em causa é totalmente consumido pela dedução específica da categoria A, tal
como sucedeu no caso analisado.

Conclui-se que as alterações propostas, nos termos em que estavam delineadas (taxa
liberatória de 10%) iriam gerar efetivamente um agravamento da tributação, pelo menos na
esmagadora maioria dos casos (35).

(35) Obviamente que se os rendimentos em causa forem elevados (superiores ao valor da dedução específica),
acabarão por ser tributados a taxas marginais que poderão ser elevadas, fruto do englobamento aos
rendimentos dos pais, situação hipotética em que teria sido benéfica a alteração, caso a mesma tivesse sido
aprovada. Relembremos que, segundo a redação que constava na proposta de lei, a alteração apenas se
aplicaria a remunerações auferidas no período das férias escolares, logo, o valor auferido dificilmente
ultrapassará o montante de 4.104. Assim, caso a medida fosse avante, existiria efetivamente agravamento da
tributação na esmagadora maioria dos casos, tal como se refere no texto, não obstante a taxa prevista ser
moderada, devendo assinalar-se a recomendação da AT ao Governo, uma vez que a letra da lei, tal como
estava projetada, iria trair o seu espírito.

59
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 8

Vicente, residente em Braga, é diretor comercial de uma sociedade sedeada no Porto,


com estabelecimentos em Braga e Guimarães, atividade que exerce desde há 5 anos,
por conta de outrem. Durante o ano de 2019 ocorreram os seguintes factos com
relevância tributária:

a) Recebeu 10.000 de indemnização pela mudança de local de trabalho, ocorrido em 1


de setembro, de Braga para o Porto, imposta pela entidade patronal;

b) Recebeu da entidade patronal uma viagem de férias ao Brasil no valor de 2.500;

c) A entidade patronal pagou um curso de inglês ao filho, estudante, com 21 anos, no


valor de 850;

d) Mensalmente, desde 1 de setembro, é-lhe paga uma quantia fixa a título de


compensação pela deslocação diária em viatura própria de casa para o trabalho (e
vice versa), no valor de 720 (100 km x 20 dias x 0,36 euros).

e) Adquiriu em agosto uma viatura automóvel que pertencia à entidade patronal. A


viatura tinha sido adquirida nova pela empresa, em 1 de maio de 2018, por 60.000;
Vicente pagou 25.000 pela viatura e registou-a em nome do filho.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS das situações descritas.

Resolução proposta

Vicente trabalha por conta de outrem numa empresa, depreendendo-se que ao abrigo de um
contrato individual de trabalho. Assim sendo, aufere rendimentos do trabalho dependente,
Categoria A, ao abrigo da alínea a), n.º 1, artigo 2.º, sujeitos a tributação em sede de IRS
por força do disposto no n.º 1, artigo 1.º.

Quanto às remunerações acessórias (fringe beneficts) descritas no enunciado, o seu


enquadramento legal será o seguinte:

a) Relativamente à indemnização pela alteração do local de trabalho, estará sujeita a IRS,


uma vez que se trata de uma remuneração acessória (alínea b), n.º 3, artigo 2.º). Poderia,
contudo, não estar sujeita a IRS, ao abrigo da alínea a), n.º 1, artigo 2.º-A, se a
deslocação se tivesse efetuado para um local situado a uma distância superior a 100 Km

60
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

(e desde que não excedesse 10% da remuneração anual, com o limite de 4.200 por ano),
o que não é o caso. Assim, o valor em causa não beneficia da norma de exclusão
tributária, devendo ser tributado nos termos gerais, incluindo em sede de retenção na
fonte, no momento em que é pago ou colocado à disposição (n.º 1, artigo 99.º).

b) Quanto à viagem de férias ao Brasil, não conexa com as funções exercidas (por ser de
férias), constitui um rendimento em espécie, não sujeito a retenção na fonte (n.º 1, artigo
99.º), mas tributado a final, devendo fazer parte dos rendimentos englobados, uma vez
que se encontra sujeito a IRS, nos termos do disposto no ponto 6, alínea b), n.º 3, artigo
2.º, norma especificamente aplicável a estas situações de atribuição a trabalhadores de
viagens e estadas (de turismo e similares) não conexas com as funções exercidas ao
serviço da entidade patronal (36).

c) O curso de inglês pago ao filho constitui igualmente uma remuneração acessória, uma
vez que se insere no conceito previsto na alínea b), n.º 3, artigo 2.º, não beneficiando da
exclusão tributária prevista na alínea c), n.º 1, artigo 2.º-A, porquanto não se trata de
formação profissional proporcionada pela entidade patronal a Vicente. O facto de o
beneficiário direto ser filho de Vicente não interfere na resolução, tendo em conta o
disposto no n.º 11, artigo 2.º, que equipara a remunerações pagas ao sujeito passivo
todas aquelas que forem atribuídas a qualquer pessoa do seu agregado familiar (bem
como a familiares até ao 3.º grau da linha colateral). Sendo uma remuneração acessória
atribuída em espécie, estará forçosamente dispensada de retenção na fonte (n.º 1, artigo
99.º), sem prejuízo da sua tributação a final conjuntamente com os restantes
rendimentos da Categoria A (37).

d) Relativamente à compensação pela deslocação em viatura própria, embora o montante


atribuído coincida com o limite legal, e, por esta via, não fosse objeto de tributação (a
alínea d), n.º 3, artigo 2.º, apenas considera como rendimento a parte que excede o
limite legal), a verdade é que as deslocações de casa para o trabalho e vice-versa não
preenchem os pressupostos que se aplicam aos servidores do Estado, mesmo sabendo-se
que ocorreu uma mudança do local de trabalho. A nosso ver, a partir do momento em
que Vicente aceitou alterar o seu domicílio necessário para o Porto, tendo sido até sido
compensado por isso (10.000), passou a ser esse o seu domicílio necessário, o que

(36) Sendo o gasto dedutível em sede de IRC, enquanto remunerações, isto é, gastos com pessoal (alínea d),
n.º 2, artigo 23.º, CIRC).
(37) Idem nota anterior.

61
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

inviabiliza a aplicação do regime tributário aplicável (exclusão tributária até ao limite


legal). Por conseguinte, a quantia de 2.880 (720 x 4 meses) será tributado na totalidade
conjuntamente com os restantes rendimentos auferidos, devendo ser objeto de retenção
na fonte (38).

No entanto, caso não tivesse existido a indemnização pela alteração do local de


trabalho, e a inerente aceitação por parte de Vicente da alteração do seu domicílio
necessário para efeitos contratuais, é nosso entendimento, salvo melhor opinião, que já
se aplicaria a exclusão tributária, uma vez que, nessas circunstâncias, verificar-se-ia que
diariamente, em serviço, Vicente era sistematicamente afastado do seu domicílio
necessário (Braga).

e) A aquisição da viatura poderá constituir uma remuneração acessória, nos termos do


ponto 10), alínea b), n.º 3, artigo 2.º, se o preço de aquisição for inferior ao valor de
mercado, determinado de acordo com a tabela constante da Portaria n.º 383/2003. O
valor a tributar, no caso em apreço, corresponderá à diferença entre esses valores, isto é,
à diferença entre o valor de mercado e o valor de aquisição, conforme dispõe o n.º 6,
artigo 24.º (caso Vicente tivesse sido tributado anteriormente em função do uso, o que
não se verifica, tais montantes, já tributados, atenuariam a diferença).

Quanto ao valor de mercado, tendo passado 16 meses desde a data da matrícula, será de
48.000 [60.000 - (60.000 x 20%)], donde, o valor a tributar será de 23.000 (48.000 -
25.000). Tratando-se de rendimento em espécie está dispensado de retenção na fonte
(n.º 1, artigo 99.º), sem prejuízo da sua tributação a final conjuntamente com os
restantes rendimentos da Categoria A.

Relativamente ao facto de a viatura ter sido registada em nome do filho, não influencia a
resolução, tendo em conta, não apenas o disposto no n.º 11, artigo 2.º, anteriormente
citado na alínea c) supra (que se afigura, salvo melhor opinião, ser aplicável), como
também, especialmente, o n.º 13, uma vez que se trata de uma norma que visa
precisamente esta situação, estabelecendo a lei uma presunção legal de que a viatura foi
adquirida pelo trabalhador quando venha a ser registada no seu nome, no de qualquer

(38) Idem nota anterior.

62
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

pessoa que integre o agregado familiar (39) ou em nome de outrem por si indicada (no
prazo de dois anos).

Do exposto, decorre que o montante das várias remunerações acessórias a englobar aos
restantes rendimentos ascenderá a 39.230 [10.000 (a) + 2.500 (b) + 850 (c) + (2.880) (d) +
23.000 (e)].

Tendo em conta que apenas as importâncias mencionadas nas alíneas a) e d) sofreram


retenção na fonte, será expectável, de modo seguro, a existência de imposto a pagar, em
2019, numa quantia que será bastante avultada, mesmo desconhecendo-se o valor da
remuneração principal de Vicente, desde logo face aos elevados valores da indemnização
(10.000) e do valor a tributar decorrente da aquisição da viatura abaixo do valor de
mercado (valor fiscal).

(39) Agregado familiar cuja delimitação se encontra perfeitamente definida no n.º 4 do artigo 13.º, fazendo o
filho de Vicente parte do seu agregado familiar, uma vez que se trata de um dependente, presumindo-se que a
seu cargo, ao abrigo do disposto na alínea b), n.º 5, artigo 13.º. Apesar de maior de idade, o filho de Vicente
tem menos de 25 anos, pressupondo-se que não obteve rendimentos de valor superior ao valor anual da
retribuição mínima mensal garantida (em 2019: 600 x 14 = 8.400), sendo, como tal, dependente para efeitos
fiscais. A condição de estudante, desde 2015, deixou de ser relevante para a qualificação como dependente, o
que constitui mais uma alteração processada pela Lei da Reforma do IRS.

63
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 9

Mariana aufere, no âmbito de um contrato de trabalho, exclusivamente comissões,


apuradas e pagas trimestralmente, fixadas em 3% do valor das vendas a clientes por
si angariados.

Os montantes auferidos ascenderam a 6.000 no 1.º trimestre, 9.000 no 2.º trimestre,


20.000 no 3.º trimestre, 10.000 no 4.º trimestre. Auferiu, ainda, ajudas de custo por
deslocação em viatura própria, no valor de 14.400 referentes a 40.000 quilómetros
percorridos em serviço.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

As remunerações auferidas têm a natureza de rendimentos do trabalho dependente, ao


abrigo da alínea a), n.º 1, artigo 2.º, uma vez que as mesmas, pese embora a sua especial
peculiaridade (que advém de serem totalmente variáveis, sem componente fixa, e também
do facto de não terem periodicidade mensal), têm subjacente um contrato individual de
trabalho, com caráter de dependência, isto é, com vínculo de subordinação.

Ao nível da tributação a final, não há qualquer particularidade a ter em conta no


enquadramento deste tipo de rendimentos, uma vez que, em regra, a tributação processa-se
numa base anual, sendo indiferente a periodicidade com que são auferidos os rendimentos,
desde que tais flutuações ocorram no próprio ano.

Deste modo, Mariana beneficiará das deduções específicas previstas no artigo 25.º, sendo o
rendimento líquido englobado aos restantes rendimentos sujeitos a englobamento auferidos
no ano de 2019, caso existam, conforme dispõe o n.º 1, artigo 22.º.

No entanto, para efeitos de retenção na fonte, qual será a taxa aplicável? Retenção na fonte
mensal com base nas tabelas e nos rendimentos estimados? Retenção na fonte trimestral
com base nas tabelas (normais) e nos rendimentos efetivamente auferidos? Não haverá
retenção na fonte?

A terceira hipótese é desde logo de rejeitar por motivos óbvios, tendo em conta a
obrigatoriedade de ser efetuada a retenção na fonte em caso de rendimentos pagos ou
colocados à disposição que não sejam atribuídos em espécie (n.º 1, artigo 99.º).

64
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

A segunda também, em defesa de Mariana, uma vez que a aplicação das tabelas normais de
retenção na fonte, iriam conduzir a montantes de retenção muito superiores ao imposto
devido a final (as tabelas estão construídas numa base mensal e os rendimentos são
auferidos trimestralmente).

Por fim, a primeira hipótese também será de rejeitar, uma vez que é impraticável uma
retenção na fonte, numa base mensal, sem que os rendimentos sejam pagos ou colocados à
disposição.

A solução encontrada pelo legislador, consagrada no artigo 100.º, consiste na aplicação de


uma taxa de retenção, apurada com base no rendimento anual estimado (eventualmente
com correções ao longo do ano, se for caso disso), aplicada aquando do pagamento ou da
colocação à disposição dos rendimentos, ou seja, no caso concreto, trimestralmente.

Com efeito, o artigo 100.º, cuja epígrafe é “Retenção na fonte – Remunerações não fixas”,
contém uma tabela de retenção (sem diferenciação em função da situação pessoal e
familiar), aplicando-se às entidades que paguem ou coloquem à disposição remunerações
que compreendam exclusivamente remunerações variáveis, o que é o caso.

Aplicando à situação em apreço, admitindo que foi estimado, no início do ano de 2019, um
montante anual de rendimentos de 50.000, a taxa de retenção na fonte aplicável
trimestralmente (de acordo com o enunciado, ou seja, à medida que os rendimentos forem
pagos,) será de 27%, correspondente ao 12.º escalão (“De 41.415 até 54.705”).

Para se ter uma melhor perceção do resultado alcançado ao nível da taxa de retenção na
fonte, será importante confrontar esta taxa com a que seria numa situação normal, digamos
assim, em que os rendimentos são pagos mensalmente.

Assim, caso o rendimento bruto de 45.000 fosse pago por uma única entidade (incluindo
subsídios de férias e de Natal), admitindo que Mariana é solteira e sem filhos, de acordo
com a tabela de retenções na fonte (divulgada pela Circular n.º 1/2019), aplicável a sujeitos
passivos “não casados” (Tabela I, 1.ª coluna, “0 (zero) dependentes”), a taxa seria de
29,5%, aplicável a uma remuneração mensal de 3.214 (45.000/14), correspondente ao
escalão “até 3.523”, como tal um pouco superior à que resulta da aplicação do artigo
100.º.

Resta acrescentar que o valor atribuído a título de “quilómetros” não será tributado pois
não excede o limite legal (14.400 / 40.000 = 0,36).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 10

Pedro recebeu da entidade patronal, em novembro de 2019, uma indemnização por


despedimento, por mútuo acordo, denominada “compensação pecuniária de natureza
global”, incluindo os créditos laborais devidos e exigíveis por Pedro a título de férias
não gozadas, subsídio de férias, subsídio de Natal e horas de formação profissional
não proporcionadas (ascendendo esta parte a 3.000). O valor da “compensação
global” ascendeu a 15.000.

Pedro auferiu, nos últimos 12 meses, a quantia de 18.000, tendo iniciado funções na
empresa em causa em março de 2013.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Está em causa o enquadramento legal, em sede de IRS, de uma indemnização por


despedimento denominada de “compensação pecuniária de natureza global”, atribuída
aquando da cessação do contrato de trabalho por mútuo acordo, sabendo-se que a mesma
inclui os créditos laborais devidos ao trabalhador (40).

Em princípio, este tipo de compensação (indemnização) relacionada com a cessação do


contrato de trabalho (extinção da relação jurídica de emprego) estará sujeito a IRS, em
sede de Categoria A, de acordo com o disposto na alínea e), n.º 3, artigo 2.º.

Contudo, a citada norma legal aplicar-se-á, conforme aí consta expressamente, “sem


prejuízo do disposto no número seguinte”, o que significa que uma parte da compensação
poderá efetivamente não estar sujeita a IRS, nas condições legalmente previstas,
mormente, no n.º 4 do mesmo artigo.

De facto, ao abrigo da alínea b), n.º 4, artigo 2.º, as referidas compensações apenas ficam
sujeitas a tributação “Na parte que excede o valor correspondente ao valor médio das
remunerações regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos

(40) O valor atribuído é um valor global, sem especificação dos valores atribuídos a título de direitos
vencidos, embora esta componente conte no enunciado de modo a possibilitar os cálculos a efetuar
posteriormente, na parte final da resolução.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fração de antiguidade ou de


exercício de funções na entidade devedora (…)”.

Importa referir, a este propósito, desfazendo um equívoco frequente, que o valor a tributar
corresponde atualmente, desde 2012, ao montante que excede o “valor médio das
remunerações” e não ao montante que excede “uma vez e meia o valor médio das
remunerações”, tendo em conta a alteração da norma processada pela Lei n.º 64-B/2011,
de 30/12 (Lei do OE/2012), inferindo-se que é como se a lei nova dissesse “uma vez o
valor médio das remunerações”.

Acresce a ressalva constante na parte final da alínea b), n.º 4, artigo 2.º [tributação na
totalidade no caso de vir a ser celebrado um novo vínculo empresarial ou profissional (na
aceção do n.º 5) com a mesma entidade (na aceção do n.º 10) nos 24 meses seguintes], bem
como a restrição contida no n.º 7 do mesmo artigo (tributação na totalidade no caso de o
trabalhador ter beneficiado do regime nos 5 anos anteriores).

Importa aludir igualmente, por ser relevante na situação em apreço, ao disposto no n.º 6,
artigo 2.º, que estipula que o regime de exclusão tributária não é aplicável às importâncias
relativas aos direitos vencidos durante a vigência do contrato, designadamente
remunerações por trabalho prestado, férias, subsídios de férias e de Natal.

Conclui-se que o regime de exclusão não se aplica às importâncias respeitantes aos direitos
vencidos, direitos adquiridos pelo trabalhador, nomeadamente subsídios de férias e de
Natal, as quais deverão ser tributadas tal qual seriam caso não tivesse cessado o contrato de
trabalho.

Isto é, as importâncias supra descritas deverão forçosamente ser expurgadas para efeitos de
determinação da compensação a excluir de tributação em sede de IRS, ao abrigo do
disposto na alínea b), n.º 4, artigo 2.º, sob pena de poder vir a ser imposta a sua tributação
integral.

Assim, ainda que a legislação laboral, nomeadamente o Código do Trabalho e restante


legislação aplicável, permita a fixação de uma compensação pecuniária de natureza global
(matéria muito específica em que não ousamos entrar), tal não significa que, para efeitos
fiscais, não seja necessário efetuar a desagregação das várias componentes, uma vez que o

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

regime fiscal é diferenciado, nomeadamente em sede de IRS e também em sede de


Segurança Social (41).

Sabendo-se que, no caso de Pedro, de acordo com os dados do enunciado, o valor inerente
aos direitos vencidos ascende a 3.000 (incluídos nos 15.000), o valor da compensação
(indemnização) a considerar, para efeitos de cálculo do valor a tributar em sede de IRS,
será 12.000 (15.000 - 3.000).

- Remuneração dos últimos 12 meses: 18.000

- Valor médio mensal: 18.000 / 12 = 1.500

- N.º anos ou fração: 6 anos e 8 meses, logo, 7 anos para efeitos de cálculo (42).

Assim,

- Valor não sujeito: 1500 x 7 = 10.500

- Valor a tributar: 1.500 (12.000 - 10.500)

Este valor será englobado aos restantes rendimentos auferidos de janeiro até novembro,
incluindo os 3.000 que fazem parte da compensação respeitantes a créditos laborais
vencidos e exigíveis pelo Pedro.

Em sede de retenção na fonte, aplicar-se-á a tabela aplicável à situação pessoal e familiar


de Pedro, sendo que a concentração de rendimentos no mês de novembro irá incrementar
substancialmente a taxa, mesmo sabendo-se que grande parte da indemnização (10.500)
ficou excluída de tributação ao abrigo do n.º 4 do artigo 2.º.

(41) Com efeito, relativamente a incidência contributiva (Segurança Social) aplicar-se-ão regras semelhantes
uma vez que, de acordo com o prescrito no n.º 3, artigo 46.º, Código Contributivo, este tipo de compensação
está sujeita a incidência contributiva, nos mesmos termos previstos no Código do IRS (na prática, a parte não
sujeita a IRS, conforme descrito anteriormente, também não estará sujeita a Segurança Social). No entanto,
há uma particularidade importante a ter em conta, uma vez que, ao abrigo da alínea v) do n.º 2 do mesmo
artigo, a compensação por cessação do contrato de trabalho por acordo apenas integra a base de incidência
contributiva nas situações com direito a prestações de desemprego. Assim, deverá distinguir-se, para este
efeito (e já não para efeito de IRS), se há ou não direito à atribuição de subsídio de desemprego, havendo
incidência contributiva apenas no primeiro caso.
(42) A fração do ano conta como se se tratasse de um ano completo, mesmo que inferior a 6 meses.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

O rendimento a ter em conta para efeito de retenção na fonte, no mês de novembro


(admitindo que trabalhou durante todo o mês) será: 1500 (rendimento de novembro) +
3.000 (créditos laborais) + 1.500 (parte tributável da indemnização) = 6.000.

Ora, admitindo que Pedro é solteiro, sem dependentes ou ascendentes a seu cargo, a taxa
de retenção que será aplicável em novembro será de 36,5%, quando normalmente, tendo
em conta o seu rendimento mensal normal de 1.500, a taxa de retenção seria de apenas
18% (conforme tabela divulgadas pela Circular n.º 1/2019, do Gabinete do DG da AT), ou
seja, menos de metade.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 11

Bernardo recebeu da entidade patronal 60.000 em novembro de 2018 e mais 40.000


em fevereiro de 2019, a título de indemnização por despedimento, reportado à data de
30 de novembro de 2018.

Bernardo auferiu nos últimos 12 meses anteriores ao despedimento 40.000 de


remunerações, pelo exercício do cargo de gerente, cargo que exerce desde 2011,
embora tenha iniciado funções na empresa em janeiro de 1996.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

A indemnização em causa, sendo resultante da extinção de uma relação jurídica que


originou rendimentos do trabalho dependente (enquanto perdurou a relação jurídica de
emprego), está sujeita a IRS, inserindo-se no âmbito da Categoria A, de acordo com a
alínea e), n.º 3, artigo 2.º.

Neste caso, uma vez que Bernardo era gerente da entidade que paga a indemnização, a
mesma é tributada na sua globalidade, ao abrigo da alínea a), n.º 4, artigo 2.º, aplicando-se
a norma igualmente a administradores e a gestores.

Assim, não sendo aplicável a exclusão tributária prevista na alínea b), n.º 4, artigo 2.º, não
há quaisquer cálculos a efetuar, sendo irrelevante para efeitos de tributação, quer o valor
das remunerações auferidas nos últimos 12 meses, quer também o tempo de antiguidade na
entidade patronal.

As importâncias em causa serão consideradas como rendimento da Categoria A na


totalidade, estando sujeitas a IRS enquanto tal, mas apenas nos anos em que são pagas ou
colocadas à disposição, conforme o disposto no n.º 1, artigo 2.º, momento esse em que se
verifica também a obrigação, por parte do substituto tributário, de efetuar a retenção na
fonte, nos termos do n.º 1, artigo 99.º, embora a título meramente provisório, tendo em
conta a obrigatoriedade de englobamento dos rendimentos em cada um dos anos de 2018 e
2019.

Deste modo, uma parte da indemnização terá sido tributada no ano de 2018 (presume-se) e
a parte restante será tributada em 2019, situação que, do ponto de vista do imposto a pagar,

70
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

é favorável a Bernardo, pois permite amortecer o efeito da progressividade das taxas


(tabela do n.º 1, artigo 68.º), tendo, no entanto, consequências em sede de IRC para a
entidade patronal (43)

Caso Bernardo não fosse gerente (nem gestor ou administrador), aplicar-se-ia a alínea b),
n.º 4, artigo 2.º, sendo o valor a tributar, calculado da seguinte forma:

- Remuneração dos últimos 12 meses: 40.000

- Valor médio mensal: 42.000 / 12 = 3.500

- N.º anos ou fração: 22 anos e 10 meses, logo, 23 anos para efeitos de cálculo (44)

Assim,

- Valor não sujeito: 3.500 x 23 = 80.500

- Valor a tributar: 19.500 (100.000 - 80.500)

Em nosso entendimento, a periodização do rendimento a tributar (parte sujeita) deverá ser


feita de modo proporcional ao quantitativo colocado à disposição, pelo que, 60%
(60.000/100.000) do valor a tributar (11.700) deveria ter sido imputado ao ano de 2018 e
os restantes 40% (7.800) deverão ser imputados ao ano de 2019.

(43) Aplicar-se-á o disposto no n.º 9, artigo 18.º, CIRC, pelo que o gasto apenas será aceite fiscalmente no
período de tributação em que as importâncias sejam pagas ou colocadas à disposição. No entanto, em termos
contabilísticos o gasto deve ser reconhecido na totalidade em 2018, uma vez que a relação laboral se
extingue, deixando de proporcionar à entidade quaisquer benefícios futuros, originando, assim, um
desfasamento temporal entre o reconhecimento contabilístico e o reconhecimento fiscal (devendo ser
reconhecido um ativo por impostos diferidos, uma vez que se trata de uma diferença temporária). Assim,
deveria ser acrescido no quadro 07 da declaração modelo 22 referente a 2018 o montante de 40.000 (gasto
contabilístico que não é gasto fiscal) e deduzido esse montante no quadro 07 da declaração modelo 22
respeitante a 2019 (gasto fiscal que não é gasto contabilístico). No fundo, a consideração do gasto em IRC
acompanha a tributação do rendimento em sede de IRS.
(44) A fração do ano conta como se se tratasse de um ano completo, mesmo que inferior a 6 meses.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

2.2. CATEGORIA B
RENDIMENTOS EMPRESARIAIS E PROFISSIONAIS

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 12

Sofia, economista, encontra-se enquadrada no regime simplificado desde 2017, ano


em que prestou serviços no valor de 160.000. Em 2018, não optou pelo regime da
contabilidade, tendo prestado serviços no valor de 260.000. Relativamente a 2019 a
sua contabilidade evidencia serviços prestados no montante de 95.000 e gastos da
atividade no montante de 35.000, nos quais estão incluídos:

i) 10.000 relativos a deslocações e estadas;

ii) 6.000 respeitantes a encargos relacionados com uma viatura ligeira de passageiros
movida a gasolina, adquirida por 19.000;

iii) 500 referentes a despesas de representação;

iv) 3.600 relativos a remunerações (part time) pagas ao seu filho Miguel;

v) 5.000 a título de juros compensatórios, coima e custas de PCO, por atraso na


entrega de DP do IVA e do imposto nela apurado.

As retenções na fonte que lhe foram efetuadas pelos seus clientes ascenderam a 23.750
e os pagamentos por conta realizados durante o ano de 2019 ascenderam a 2.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto.

Resolução proposta

Sofia é economista, aplicando-se-lhe o código 4014, previsto na Portaria n.º 1011/2001


(conforme o artigo 151.º), pelo que os rendimentos auferidos, a título de prestações de
serviços, integram-se na Categoria B (rendimentos empresariais e profissionais), tratando-
se, neste caso, de rendimentos profissionais, ao abrigo da alínea b), n.º 1 do artigo 3.º,
estando sujeitos a IRS de acordo com as regras aplicáveis a essa categoria, por força do
disposto no n.º 1, artigo 1.º.

Tais rendimentos, conforme dispõe o n.º 1, artigo 28.º, poderão ser tributados de duas
formas: pelo regime simplificado de tributação ou com base na contabilidade (regime da
contabilidade), sendo de referir que o facto de Sofia possuir contabilidade não impede a
sua tributação pelo regime simplificado.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

No caso em apreço, verifica-se o seguinte:

a) Em 2017, Sofia foi tributada segundo as regras do regime simplificado, devendo, em


princípio, permanecer nesse regime nos anos seguintes, a não ser que venha a optar pelo
regime da contabilidade (artigo 28.º, n.º 1, alínea a) e n.os 3 e 5) ou ultrapasse o limite de
200.000 nos termos descritos no n.º 6;

b) Em 2018, de acordo com os elementos disponibilizados, foi também tributada pelas


regras do regime simplificado de tributação, apesar do elevado volume de negócios
realizado neste ano (260.000), dado que não optou até ao final de março deste ano pelo
regime da contabilidade e o valor dos serviços prestados no ano anterior (2017) não
implicar a mudança para o regime da contabilidade (n.º 6, artigo 28.º);

c) No ano de 2019, embora a Sofia estivesse enquadrada no regime simplificado e não


tivesse optado pelo regime da contabilidade, o seu rendimento coletável será
obrigatoriamente determinado pelo regime da contabilidade, dado que ultrapassou no
ano anterior (2018) o limite dos 200.000 em mais de 25% [260.000 > (200.000 x 1,25)],
cessando automaticamente a aplicação do regime simplificado (n.º 6, artigo 28.º).

O facto de o volume de serviços prestados em 2019 (95.000) não ultrapassar o limite


previsto no artigo 28.º, n.º 2 (200.000), não tem implicações ao nível do enquadramento
relativo a 2019, que é no regime da contabilidade.

No entanto, tal facto irá condicionar o seu enquadramento no ano de 2020, uma vez que, se
Sofia não optar até ao fim de março desse ano pelo regime da contabilidade, voltará, nesse
ano, a ficar enquadrada no regime simplificado de tributação, face ao nível de rendimentos
auferidos em 2019, uma vez que os mesmos são inferiores ao limite e não existiu uma
opção expressa pelo regime da contabilidade, pois caso tivesse existido ficaria nesse
regime daí em diante, independentemente das flutuações ocorridas no volume de
rendimentos (artigo 28.º, n.º 5).

Assim sendo, relativamente a 2019, tendo em conta o volume de negócios do ano anterior
(como referido na alínea c) supra) o enquadramento (oficioso) é no regime da
contabilidade, sendo tidos em conta, para efeitos de determinação do rendimento líquido da
Categoria B, os valores constantes da contabilidade (rendimentos e gastos), corrigidos nos
termos do artigo 33.º e do CIRC, aplicável ao IRS por força da remissão contida no artigo
32.º, donde resulta:

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

- Prestação de Serviços: 95.000


- Custos da atividade: (35.000)
- Resultado contabilístico: 60.000

Quanto a eventuais correções fiscais:

i) Deslocações e estadas: Trata-se de um tipo de gasto que não sofre atualmente, desde
as alterações operadas pela Lei da Reforma do IRS, qualquer tipo de restrição, no
pressuposto de as despesas serem conexas com a atividade, pelo que não há qualquer
correção fiscal a efetuar (45).

ii) Viaturas: Como apenas tem afeta à atividade uma viatura ligeira de passageiros, não
haverá quaisquer limitações em termos de número de viaturas (n.º 2, artigo 33.º, sendo
o limite de uma viatura por titular de rendimentos / trabalhador), nem qualquer
limitação específica em sede IRS, nem em sede de IRC (46), relativamente a tais
despesas, sem prejuízo da sua tributação autónoma à taxa de 10% (valor de aquisição
inferior a 20.000) – alínea a), n.º 2, artigo 73.º (6.000 x 10% = 600; Campo 1002,
Quadro 10, Anexo C, declaração modelo 3).

iii) Despesas de representação: Tais despesas serão aceites na totalidade como gasto, uma
vez que não há qualquer limite, nem no CIRS, nem no CIRC, embora sejam tributadas
autonomamente à taxa de 10%, nos termos da 1.ª parte, alínea a), n.º 2, artigo 73.º (500
x 5% = 50; Campo 1002, Quadro 10, Anexo C, declaração modelo 3).

iv) Remunerações pagas ao Miguel: Estes gastos, no valor de 3.600, são aceites
fiscalmente na totalidade em sede de IRS, uma vez que atualmente não existe qualquer

(45) Até à entrada em vigor da Lei da Reforma do IRS (2015) e desde o início da vigência do CIRS, existia
uma limitação (antiga redação do n.º 1, artigo 33.º) para este tipo de gastos, correspondente a 10% “do valor
dos proveitos contabilizados”. No nosso exemplo, de acordo com as regras antigas, como o valor
contabilizado (10.000) ultrapassaria o limite referido, a diferença não seria aceite fiscalmente, tendo que ser
acrescida no quadro 4, Anexo C, declaração modelo 3: 10.000 - (95.000 x 10%) = 500 (valor a acrescer ao
resultado contabilístico).
(46) Note-se que, conforme referido no texto, se aplicam também as limitações previstas no CIRC (por força
da remissão contida no artigo 32.º, CIRS), sendo que, no caso de viaturas, em sede de IRC, e por inerência
em IRS, não são aceites como gasto as depreciações de viaturas ligeiras de passageiros na parte
correspondente ao valor de aquisição superior a 25.000, o que não é o caso (artigo 33.º, n.º 1, alínea e),
CIRC). Tenha-se presente também que, por força do artigo 32.º, CIRS, sendo aplicadas as regras do CIRC
relativas à determinação do lucro tributável, poderiam existir muitas outras limitações (correções fiscais) a ter
em conta, de que é exemplo a situação constante da alínea v) do presente caso prático.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

limitação à dedutibilidade do gasto, face à revogação do n.º 8 do artigo 33.º processada


pela Lei da Reforma do IRS (47).

v) Juros compensatórios, coima e custas de PCO por atraso na entrega de DP do IVA e


do imposto: Não há qualquer limitação prevista no CIRS. No entanto, de acordo com o
disposto no artigo 32.º, na determinação dos rendimentos profissionais não abrangidos
pelo regime simplificado (o que é o caso), aplicam-se as regras do CIRC, segundo o
qual, nos termos da alínea e), n.º 1, artigo 23.º-A, este tipo de gastos, todos eles, não
são aceites fiscalmente. Assim, deverá ser acrescido o montante de 5.000 ao resultado
contabilístico (Campo 418, Quadro 04, Anexo C, declaração modelo 3).

Face ao exposto o rendimento líquido da Categoria B será de 65.000 (60.000 + 5.000) (48).

As retenções na fonte, no valor de 23.750 (49), e os pagamentos por conta, na importância


de 2.000 (50), serão deduzidos à coleta (ao imposto) nos termos do n.º 2, artigo 78.º,
conferindo direito a um eventual reembolso (n.º 3, artigo 78.º).

(47) Até 2014 tal gasto deveria ser acrescido ao resultado contabilístico, acabando o rendimento em causa por
ser tributado no âmbito desta Categoria (B) e não na Categoria A. Caso existissem remunerações auferidas
pela Sofia também não seriam consideradas como gasto na Categoria B de acordo com a lei antiga.
(48) Se o regime simplificado fosse aplicável no ano de 2019, o rendimento líquido da Categoria B seria de
71.250 (95.000 x 75%), como tal superior, embora não fossem exigíveis as tributações autónomas relativas a
despesas com viaturas e a despesas de representação (n.º 8, artigo 73.º). De referir, no entanto, que em caso
de aplicação do regime simplificado é aplicável a tributação autónoma incidente sobre as despesas não
documentadas (50%, n.º 1, artigo 73.º), uma vez que Sofia possui contabilidade, aplicando-se igualmente a
tributação autónoma das importâncias pagas a residentes em “paraísos fiscais” (35%, n.º 6, artigo 73.º).
(49) O valor de 23.750, resulta da aplicação da taxa de retenção na fonte de 25%, prevista na alínea b), n.º 1,
artigo 101.º, ao valor bruto dos serviços prestados no ano de 2019, no montante de 95.000. Tal significa que
Sofia apenas prestou serviços a entidades que dispõem de contabilidade organizada, pois apenas estas estão
obrigadas a fazer a retenção na fonte no momento do pagamento ou da colocação à disposição dos
rendimentos da Categoria B (n.º 1, artigo 101.º). De notar que é possível a dispensa de retenção na fonte na
Categoria B (e F), se o titular dos rendimentos previr auferir rendimentos anuais de valor inferior ao limite
previsto para o Regime Especial de Isenção do IVA, de 10.000, nos termos do n.º 1, artigo 53.º, CIVA (alínea
a), n.º 1, artigo 101.º-B), o que não é o caso.
(50) Segundo o disposto no artigo 102.º, n.º 1, os pagamentos por conta são obrigatórios (sem prejuízo do
disposto nos n.os 4 e 5, artigo 102.º) e deverão ser efetuados até ao dia 20 dos meses de julho, setembro e
dezembro do próprio ano a que se refere o imposto. O valor dos pagamentos por conta a efetuar em 2019 é
apurado pela AT com base nos rendimentos da Categoria B auferidos em 2017 (penúltimo ano), de acordo
com a fórmula prevista no artigo 102.º, n.º 2, sendo tal valor comunicado aos sujeito passivo, primeiro em

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

As tributações autónomas no valor de 650 (600 + 50) serão acrescidas à coleta de IRS que
vier a ser apurada, após o processo de englobamento dos rendimentos da Categoria B com
os rendimentos das restantes categorias, caso existam (artigo 22.º, n.º 1).

Passamos a demonstrar o cálculo do imposto, pressupondo que Sofia é solteira e sem


dependentes, que não aufere outros rendimentos e considerando apenas a dedução à coleta
relacionada com “despesas gerais familiares”, prevista no alínea b), n.º1, artigo 78.º e
artigo 78.º-B, bem como as retenções na fonte no valor de 23.750 e os pagamentos por
conta na quantia de 2.000.

Segue-se uma imagem com o Quadro 04 do Anexo C da declaração modelo 3 (Categoria


B, regime da contabilidade):

2017 juntamente com a liquidação de IRS relativa ao ano de 2017 e, posteriormente, em 2019, nos meses
anteriores ao termo do prazo de cada pagamento (artigo 102.º, n.º 3).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 13

Natália, advogada, é trabalhadora por conta de outrem a título principal numa


empresa. Paralelamente exerce uma atividade liberal, a título independente, desde
2014, tendo recebido em 2019 o montante de 4.000, relativamente a vários serviços de
apoio jurídico prestados a uma outra empresa, tendo suportado custos dessa
atividade no montante de 500.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e determinação do rendimento líquido.

Resolução proposta

Quanto aos rendimentos que advêm de serviços jurídicos prestados a título independente,
são rendimentos profissionais que se inserem na Categoria B, ao abrigo da alínea b), n.º 1,
artigo 3.º, sujeitos a IRS pelo n.º 1, artigo 1.º.

Tais rendimentos serão tributados, tudo indica, face à não alusão no enunciado a uma
eventual opção pelo regime da contabilidade (e à reduzida dimensão da atividade), pelo
regime simplificado, previsto na alínea a), n.º 1, artigo 28.º.

Assim, tratando-se rendimentos de atividade profissional especificamente prevista na


tabela a que se refere o artigo 151.º (Portaria n.º 1011), o rendimento líquido será o que
resulta da aplicação do coeficiente previsto na alínea b), n.º 1, artigo 31.º.

Por conseguinte, ao valor do rendimento bruto será aplicado o coeficiente de 75%, ou seja,
o rendimento líquido ascenderá a 3.000 (4.000 x 75%), sendo os gastos incorridos (que até
são inferiores à dedução automática de 25%) irrelevantes.

De referir que o aditamento do n.º 13 (e dos n.os 14 e 15) ao artigo 31.º, alteração
processada pela Lei do OE/2018, norma que condiciona a parcialmente a dedução dos 25%
à verificação de despesas e encargos efetivamente suportados (assunto a desenvolver no
caso prático seguinte), não interfere na resolução, pois, para este efeito, Natália beneficia
da dedução automática de 4.104 (alínea a), n.º 13, artigo 31.º), para além de a mesma ter
incorrido em despesas no valor de 500, conforme é referido no enunciado (embora as
mesmas não sejam necessárias, como se verá no próximo caso prático, para beneficiar da
dedução máxima de 25% prevista na lei).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Nestas circunstâncias, em que os serviços são prestados a uma única entidade, o n.º 8,
artigo 28.º, possibilita a opção pela tributação de acordo com as regras da Categoria A,
opção que será de afastar, sem necessidade de efetuar quaisquer cálculos, dado que, sendo
trabalhadora por conta de outrem, a título principal, os respetivos rendimentos consumirão
certamente a totalidade da dedução específica desta Categoria, não restando qualquer valor
para ser deduzido ao rendimento da Categoria B (51).

A melhor solução é, pois, ser tributada pelos 3.000 que resultam da aplicação do regime
simplificado, beneficiando, assim, de uma dedução automática na importância de 1.000,
correspondente a 25% do valor do rendimento.

Ainda quanto à opção pelas regras da Categoria A, importa frisar que a mesma não foi
criada para as situações do tipo da Sofia (trabalhador dependente que tem um part-time
como trabalhador independente), não sendo claramente essa a ratio da norma, mas sim
para os denominados “falsos recibos verdes”, que exercem a atividade “independente” a
título principal, sobretudo aqueles que têm rendimentos mais reduzidos (52), alcançando-se,
por esta via, uma equiparação, ao nível da carga fiscal, aos trabalhadores dependentes.

Finalmente, importa sublinhar que Sofia beneficiou da dispensa de retenção na fonte


prevista na alínea a), n.º 1, artigo 101.º-B, uma vez que não ultrapassou (nem previu
ultrapassar) o limite de 10.000 previsto para o Regime Especial de Isenção do IVA (artigo
53.º do Código) (53).

(51) De notar que, desde 2015, com a entrada em vigor das alterações processadas pela Lei da Reforma do
IRS, terminou a obrigatoriedade de manutenção da opção nas declarações respeitantes aos dois anos
seguintes. A opção é formulada no Anexo B da declaração modelo 3.
(52) Uma vez que os que têm rendimentos elevados, têm, em princípio, uma maior dedução no regime
simplificado. Quantificando, no caso de aplicação do coeficiente de 0,75, virá: 4.104 / 0,25 = 16.416, logo, é
este o ponto crítico, ou seja, na ausência de rendimentos da Categoria A, para montantes de rendimentos
ilíquidos da Categoria B até 16.416 valerá a pena optar pela tributação segundo as regras da Categoria A; no
caso de o volume de rendimentos ser superior, a dedução será mais favorável (superior) aplicando-se as
regras do regime simplificado.
(53) Há, no entanto, diferenças entre o IRS e o IVA, quando o limite de 10.000 é ultrapassado durante o ano.
Enquanto no IRS a dispensa de retenção deixa de se aplicar de imediato, o mais tardar na fatura cujo valor
implique a ultrapassagem do limite, no IVA a alteração para o regime normal apenas surte efeito a partir de 1
de fevereiro do ano seguinte, devendo a declaração de alterações ser apresentada durante o mês anterior
(alínea a), n.º 2 e n.º 5, artigo 58.º, CIVA).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Tal possibilidade (54), no entanto, tendo em conta que obtém rendimentos da Categoria A,
tem como consequência a aplicação de taxas marginais elevadas sobre os rendimentos da
Categoria B, algo que, por vezes, gera surpresas desagradáveis aos contribuintes, mesmo
quando os rendimentos não são muito elevados, como é o caso de Natália.

Bastará pensar no cenário de Natália, sem estes rendimentos, se situar no 5.º escalão (de
mais de 25.000 até 36.000), ao qual corresponde a taxa normal (marginal) de 37%, para
alcançarmos imposto a pagar inerente à Categoria B de 1.110 (3.000 x 37%).

Terminamos a presente resolução com duas referências genéricas no âmbito do regime


simplificado: o elenco dos coeficientes aplicáveis e uma imagem com o Quadro 4 do
Anexo B da declaração modelo 3.

No âmbito do regime simplificado, a determinação do rendimento tributável obtém-se


através da aplicação dos seguintes coeficientes:

a) 0,15 às vendas de mercadorias e produtos, bem como às prestações de serviços


efetuadas no âmbito de atividades de restauração e bebidas e de atividades hoteleiras e
similares, com exceção daquelas que se desenvolvam no âmbito da atividade de
exploração de estabelecimentos de alojamento local na modalidade de moradia ou
apartamento;

b) 0,75 aos rendimentos das atividades profissionais especificamente previstas na tabela a


que se refere o artigo 151.º;

c) 0,35 aos rendimentos de prestações de serviços não previstos nas alíneas anteriores;

d) 0,95 aos rendimentos provenientes de contratos que tenham por objeto a cessão ou
utilização temporária da propriedade intelectual ou industrial ou a prestação de
informações respeitantes a uma experiência adquirida no setor industrial, comercial ou
científico, aos rendimentos de capitais imputáveis a atividades geradoras de
rendimentos empresariais e profissionais, ao resultado positivo de rendimentos prediais,
ao saldo positivo das mais e menos-valias e aos restantes incrementos patrimoniais;

e) 0,30 aos subsídios ou subvenções não destinados à exploração;

(54) Possibilidade que, no fundo, configura uma opção, pois, na verdade, o titular dos rendimentos, na fatura,
tando pode assinalar a dispensa como pode colocar a referência à retenção na fonte.

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f) 0,10 aos subsídios destinados à exploração e restantes rendimentos da categoria B não


previstos nas alíneas anteriores;

g) 1 aos rendimentos decorrentes de prestações de serviços efetuadas a:

i) Sociedades abrangidas pelo regime da transparência fiscal, nos termos da alínea b)


do n.º 1 do artigo 6.º do Código do IRC, de que o sujeito passivo seja sócio; ou

ii) Sociedades nas quais, durante mais de 183 dias do período de tributação: (aditada
pela Lei do OE/2018)

1) O sujeito passivo detenha, direta ou indiretamente, pelo menos 5 % das


respetivas partes de capital ou direitos de voto;

2) O sujeito passivo, o cônjuge ou unido de facto e os ascendentes e descendentes


destes detenham no seu conjunto, direta ou indiretamente, pelo menos 25 % das
respetivas partes de capital ou direitos de voto.

Em seguida consta uma imagem do Quadro 4-A do Anexo B da declaração modelo 3


(Categoria B, regime simplificado):

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Caso prático n.º 14

Regime simplificado – demonstração das novas regras aplicáveis a partir de 2018.

Após uma detalhada explicação das alterações, serão apresentados oito exemplos.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e determinação do rendimento líquido.

A lei do OE/2018 aditou os n.os 13, 14 e 15 ao artigo 31.º, passando a condicionar


parcialmente as deduções decorrentes da aplicação dos coeficientes previstos nas alíneas b)
e c), n.º 1, artigo 31.º.

Mais concretamente, estão em causa os coeficientes de 75% (dedução automática de 25%),


aplicável aos rendimentos das atividades profissionais especificamente previstas na tabela
a que se refere o artigo 151.º, e de 35% (dedução automática de 65%) aplicável a
rendimentos de prestações de serviços não previstas nas alíneas anteriores.

De facto, a dedução ao rendimento decorrente da aplicação dos coeficientes previstos nas


alíneas b) e c), n.º 1, artigo 31.º, passou a estar parcialmente condicionada à verificação de
despesas e encargos efetivamente suportados de acordo com a informação constante no
Portal e-fatura, demais informação ao dispor da AT e com base, ainda, em valores
declarados pelo sujeito passivo (apenas no caso de aquisições intracomunitárias de bens e
importações, como veremos).

De acordo com o n.º 13, artigo 14.º, ao rendimento tributável apurado com base na
aplicação dos coeficientes, deve acrescer a diferença positiva entre 15% dos rendimentos
brutos das prestações de serviços e o somatório das seguintes importâncias:

a) O montante de 4.104 (remissão para a alínea a), n.º 1, art.º 25.º) ou, quando superior, os
montantes comprovadamente suportados com contribuições obrigatórias…, que não
sejam já dedutíveis no âmbito deste regime (55);

(55) Pensamos que esta referência na parte final da norma está relacionada com o disposto no n.º 2 do artigo
31.º, aditado pela Lei da Reforma do IRS, que estipula que “Os sujeitos passivos que obtenham os
rendimentos previstos nas alíneas b) e c) do número anterior, após aplicação dos coeficientes aí previstos,
podem deduzir, até à concorrência do rendimento líquido assim obtido, os montantes comprovadamente
suportados com contribuições obrigatórias para regimes de proteção social, conexas com as atividades em

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b) Despesas com pessoal e encargos a título de remunerações (ordenados / salários)


comunicados à AT;

c) Rendas de imóveis afetos à atividade que constem de faturas e outros documentos,


comunicados à AT;

d) 1,5% do VPT dos imóveis afetos à atividade ou, quanto aos imóveis afetos a atividades
hoteleiras ou de alojamento local, 4% do respetivo VPT, de que o sujeito passivo seja o
proprietário, usufrutuário ou superficiário;

e) Outras despesas com a aquisição de bens e prestações de serviços relacionadas com a


atividade, que constem de faturas comunicadas à AT ou emitidas no Portal das
Finanças;

f) Importações ou aquisições intracomunitárias de bens e serviços relacionados com a


atividade.

Ao abrigo do n.º 14, as despesas e encargos previstos nas alíneas c), d) e e) do número
anterior, quando apenas parcialmente afetos à atividade empresarial e profissional são
considerados em apenas 25% (despesas com natureza mista) (56).

Finalmente, segundo o n.º 15, para efeitos da afetação à atividade das despesas e encargos,
o sujeito passivo deve identificar:

a) As faturas e outros documentos que titulam despesas e encargos relacionados exclusiva


ou parcialmente com a sua atividade, através do Portal das Finanças;

b) Os imóveis afetos exclusiva/parcialmente à atividade e, de entre estas, a afetação a


atividades hoteleiras ou de alojamento local, através do Portal das Finanças;

c) As importações e AIB efetuadas, específica e exclusivamente, no âmbito da sua


actividade, tendo em conta que a informação em causa não está à disposição da AT de

causa, na parte em que excedam 10 % dos rendimentos brutos, quando não tenham sido deduzidas a outro
título.”.
(56) Denota-se alguma similitude com o disposto no n.º 5, artigo 33.º, aplicável no regime da contabilidade,
segundo o qual “Quando o sujeito passivo afete à sua atividade empresarial e profissional parte do imóvel
destinado à sua habitação, os encargos dedutíveis com ela conexos referentes a amortizações ou rendas,
energia, água e telefone fixo não podem ultrapassar 25 % das respetivas despesas devidamente
comprovadas.”.

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uma forma que permita a criação de um automatismo, são indicadas na declaração de


rendimentos.

A propósito da imputação de despesas à atividade no Portal das Finanças e das implicações


das alterações legislativas supra descritas, importa frisar que a atual pergunta que consta no
Portal é a seguinte:

Alerta-se que, anteriormente, para imputar despesas à atividade a resposta deveria ser
“Não”, pois a pergunta era formulada ao contrário, questionando-se, ao tempo, se a fatura
em causa estava “Fora do âmbito da atividade profissional?”.

Esmiuçando um pouco as normas em causa (n.os 13 a 15, artigo 31.º), constata-se que a
letra da lei manda acrescer ao rendimento líquido, que resulta da aplicação normal dos
coeficientes de 75% ou 35%, a diferença positiva entre 15% do rendimento bruto e o valor
das despesas.

Se a diferença em causa é positiva, tal significa que o valor das despesas ficou aquém
daquilo que seria necessário (15%) para ter a dedução máxima, daí a correção. Se, ao
invés, a diferença for negativa, então o valor das despesas foi mais do que suficiente para
obter a dedução máxima, não havendo quaisquer correções a fazer.

Assim, uma das conclusões a retirar é a de que, para obter a dedução máxima (de 25% ou
de 65%), o nível de despesas a imputar à atividade deverá ascender no mínimo a 15% do
valor dos rendimentos brutos (ponto crítico).

No entanto, não será exatamente assim, pois nos 15% exigíveis para obter a dedução
máxima, a lei inclui de modo automático (sem carecer de comprovação), o montante de
4.104, ao remeter para a dedução contida na alínea a), n.º 1, artigo 25.º (dedução específica
da Categoria A).

Da conjugação do exposto anteriormente resulta uma outra conclusão muito importante,


simplificadora na vida prática, que é a de que a validação/imputação de despesas à

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

atividade apenas é relevante para rendimentos brutos superiores a 27.360 (4.104 / 0,15),
tendo em conta a referida consideração automática de despesas no valor de 4.104.

No fundo, nos rendimentos de valor superior a 27.360, importa assegurar, para obter a
dedução máxima (de 25% ou de 65%, consoante se aplique, respetivamente, o coeficiente
de 75% ou de 35%,), que as despesas imputadas à atividade superem 15% do valor dos
rendimentos brutos, sendo certo que nestas despesas o montante de 4.104 estará sempre
assegurado.

Da leitura das normas pode concluir-se que a lei dá, de forma automática, 10% de dedução
no caso de aplicação do coeficiente de 75% (dedução máxima de 25%) e 50% no caso de
aplicação do coeficiente de 35% (dedução máxima de 65%).

Tal constatação permite-nos conceber uma forma alternativa de efetuar o cálculo do


rendimento líquido, diferente da que resulta da letra da lei, a qual se pode revelar
interessante se pretendermos saber qual a dedução a que um determinado contribuinte terá
direito. Assim, para determinar o valor a deduzir poderemos considerar:

❖ No caso do coeficiente de 75%: 10% + despesas,

❖ No caso do coeficiente de 35%: 50% + despesas,

Sem, contudo, a dedução poder ultrapassar o limite máximo que resulta da aplicação do
coeficiente aplicável (25% ou 65%, respetivamente).

✓ Iremos seguir esta linha de raciocínio na parte final da resolução dos (8) exemplos que
se apresentam em seguida.

Exemplo 1 (57): Médico, enquadrado no regime simplificado do IRS, que obteve


rendimentos da atividade no montante de 32.000.

Resolução proposta

Até 2017, o rendimento líquido sujeito a IRS ascendia a 24.000 (32.000 x 75%), não sendo
necessário documentar e arquivar quaisquer gastos.

No entanto, com a nova lei, aplicável a rendimentos auferidos a partir do ano de 2018, já
poderá não ser assim, pois à quantia de 24.000 poderá ter que ser acrescido montante

(57) Adaptado de Pinheiro Pinto e Cristina Pinto (2018), “Orçamento do Estado para 2018”, OCC.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

correspondente à diferença positiva entre 15% do valor do rendimento e o valor das


despesas.

No nosso exemplo, se 15% do valor do rendimento corresponde a 4.800, então são


necessárias despesas iguais ou superiores a este valor, sendo certo que o montante de 4.104
não carece de estar documentado.

Se dispuser de faturas relacionadas com a atividade no montante de 1.000, virá: (32.000 x


15%) - (4.104 + 1.000) = -304. Sendo este valor negativo, nada haverá a acrescer, sendo o
rendimento líquido de 24.000.

✓ Dedução a considerar: (32.000 x 10%) + 4.104 + 1.000 = 8.304 > 8.000 (dedução
máxima, 32.000 x 25%), logo, rendimento líquido = 32.000 - 8000 = 24.000.

Se não dispuser de faturas, virá: (32.000 x 15%) - 4.104 = 696. Sendo este valor positivo,
deverá ser acrescido ao rendimento líquido, logo, 24.000 + 696 = 24.696.

✓ Dedução a considerar: (32.000 x 10%) + 4.104 = 7.304 < 8.000 (dedução máxima,
32.000 x 25%), logo, rendimento líquido = 32.000 - 7.304 = 24.696.

Exemplo 2 (58): Consultor, enquadrado no regime simplificado, que obteve rendimentos da


atividade de 180.000 e que suportou as seguintes despesas relacionadas com a mesma
(devidamente documentadas): Gastos com pessoal – 20.000; Material de escritório – 500;
Mobiliário – 700; Telecomunicações e internet – 600.

Resolução proposta

Até 2017, o rendimento coletável seria de 135.000 (180.000 x 75%). Em 2018 e 2019, a
este valor terá que se acrescer a diferença entre 15% do rendimento bruto e as despesas
referidas no n.º 13, artigo 31.º, caso tal diferença seja positiva.

No nosso exemplo, se 15% do valor do rendimento corresponde a 27.000, então são


necessárias despesas iguais ou superiores a este valor.

Se não tivesse quaisquer deduções relevantes a efetuar, o rendimento líquido seria de


157.896 [135.000 + (15% x 180.000) - 4.104], ou seja, um montante equivalente ao que
seria obtido se, mantendo-se o modo de cálculo anterior, o coeficiente aplicável ao
rendimento bruto, em vez de 75%, fosse de 88%.

(58) Adaptado de Pinheiro Pinto e Cristina Pinto (2018), “Orçamento do Estado para 2018”, OCC.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Tendo em conta os dados do exemplo, temos: 15% x 180.000 = 27.000

Deduções relevantes: 4.104 (dedução específica da categoria A) + 20.000 (pessoal) + 500


(material de escritório) + 700 (mobiliário) + 600 (telecomunicações e internet) = 25.904

Diferença positiva: 1.096 (27.000 - 25.904)

Rendimento líquido: 136.096 (135.000 + 1.096).

Seguindo o raciocínio anterior, o montante obtido é equivalente ao que seria obtido se,
mantendo-se o modo de cálculo aplicável em 2017, o coeficiente aplicável ao rendimento
bruto, em vez de 75%, fosse de 75,6%.

Estamos perante uma diferença relativamente insignificante, comparativamente com o


regime vigente até 2017, tendo em conta que este consultor conseguiu atingir quase o nível
ótimo de despesas.

✓ Dedução a considerar: (180.000 x 10%) + 4.104 + 21.800 = 43.904 < 45.000 (180.000 x
25%), logo, rendimento líquido = 180.000 - 43.904 = 136.096.

Exemplo 3: Contabilista Certificado, enquadrado no regime simplificado, que obteve


rendimentos da atividade no valor de 20.000, não tendo efetuado qualquer imputação de
despesas à atividade no portal das finanças (ou não possui despesas).

Resolução proposta

Cálculo do rendimento líquido da categoria B: 20.000 x 75% = 15.000 (dedução máxima =


5.000).

Nível óptimo de despesas = 20.000 x 15% = 3.000

(20.000 x 15%) - 4.104 = -1.104 – como a diferença é negativa não releva para o cálculo
do rendimento líquido, logo, 15.000.

✓ Dedução a considerar: (20.000 x 10%) + 4.104 = 6.104 > 5.000, logo, rendimento
líquido = 20.000 - 5000 = 15.000.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Exemplo 4: Advogada, enquadrada no regime simplificado, que auferiu rendimentos da


atividade no valor de 60.000, não tendo efetuado qualquer imputação de despesas à
atividade (ou não possui despesas).

Resolução proposta

Cálculo do rendimento líquido da Categoria B: 60.000 x 75% = 45.000 (dedução máxima =


15.000).

Nível óptimo de despesas = 60.000 x 15% = 9.000

60.000 x 15% - 4.104 = 4.896 – diferença positiva a acrescer aos 45.000, pelo que o
rendimento líquido será de 49.896.

✓ Dedução a considerar: (60.000 x 10%) + 4.104 = 10.104 < 15.000, logo, rendimento
líquido = 60.000 - 10.104 = 49.896.

Exemplo 5: Engenheiro, enquadrado no regime simplificado, que auferiu rendimentos da


atividade no valor de 60.000, tendo efetuado imputação de despesas à atividade no valor de
1.100.

Resolução proposta

Cálculo do rendimento líquido da Categoria B: 60.000 x 75% = 45.000 (dedução máxima =


15.000).

Nível óptimo de despesas = 60.000 x 15% = 9.000

60.000 x 15% - 4.104 - 1.100 = 3.796 – diferença positiva a acrescer aos 45.000, pelo que
o rendimento líquido será de 48.796.

✓ Dedução a considerar: (60.000 x 10%) + 4.104 + 1.100 = 11.204 < 15.000, logo,
rendimento líquido = 60.000 - 11.204 = 48.796.

Exemplo 6: Esteticista, enquadrada no regime simplificado, obteve rendimentos da


atividade no valor de 60.000, tendo efetuado imputação de despesas à atividade no valor de
9.100.

Resolução proposta

Cálculo do rendimento líquido da categoria B: 60.000 x 75% = 45.000 (dedução máxima =


15.000).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Nível óptimo de despesas = 60.000 x 15% = 9.000

60.000 x 15% - 4.104 - 9.100 = -4.204 – como a diferença é negativa não releva para o
cálculo do rendimento líquido, logo, 45.000.

✓ Dedução a considerar: (60.000 x 10%) + 4.104 + 9.100 = 19.204 > 15.000, logo,
rendimento líquido = 60.000 - 15.000 = 45.000.

Exemplo 7: Cabeleireira, enquadrada no regime simplificado, que obteve rendimentos da


atividade no valor de 60.000, tendo efetuado imputação de despesas à atividade no valor de
9.100.

Resolução proposta

Cálculo do Rendimento líquido da Categoria B: 60.000 x 35% = 21.000 (dedução máxima


= 39.000).

Nível óptimo de despesas = 60.000 x 15% = 9.000

60.000 x 15% - 4.104 - 9.100 = -4.204 – como a diferença é negativa não releva para o
cálculo do rendimento líquido, logo, 21.000.

✓ Dedução a considerar: (60.000 x 50%) + 4.104 + 9.100 = 43.204 > 39.000, logo,
rendimento líquido = 60.000 - 39.000 = 21.000.

Exemplo 8: Empresária na área do alojamento local, enquadrada no regime simplificado,


que obteve rendimentos da atividade no valor de 50.000, tendo efetuado imputação de
despesas à atividade no valor de 2.000.

Resolução proposta

Cálculo do Rendimento líquido da Categoria B: 50.000 x 35% = 17.500 (dedução máxima


= 32.500).

Nível óptimo de despesas = 50.000 x 15% = 7.500

50.000 x 15% - 4.104 - 2.000 = 1.396 – diferença positiva a acrescer aos 17.500, pelo que
o rendimento líquido será de 18.896.

✓ Dedução a considerar: (50.000 x 50%) + 4.104 + 2.000 = 31.104 < 32.500, logo,
rendimento líquido = 50.000 - 31.104 = 18.896.

91
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 15

Eduardo, advogado, é sócio de uma sociedade de advogados, conjuntamente com mais


três colegas de profissão, em partes iguais, a qual apurou, em 2019, um lucro
tributável no valor de 500.000, tendo distribuído lucros, também em 2019, no valor de
400.000, os quais foram gerados no ano anterior.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Resolução proposta

A sociedade de advogados é considerada uma sociedade de profissionais, ao abrigo do


ponto 1), alínea a), n.º 4, artigo 6.º, CIRC, uma vez que todos os sócios são profissionais de
uma atividade profissional especificamente prevista na lista de atividades a que se refere o
artigo 151.º, CIRS.

Tais sociedades constam expressamente na alínea b), n.º 1, artigo 6.º, CIRC, aplicando-se o
chamado regime da transparência fiscal, logo, os seus rendimentos (matéria coletável)
deverão ser imputados aos sócios, integrando-se no seu rendimento tributável. Em sede de
IRC, verificam-se os pressupostos de incidência (real e pessoal), estando os rendimentos
sujeitos a imposto, mas é aplicável uma isenção (técnica), ao abrigo do artigo 12.º, CIRC,
visando, especialmente, a eliminação da dupla tributação económica (59).

(59) Uma isenção que, conforme se refere no texto, visa evitar um fenómeno de dupla tributação económica,
em sede de impostos sobre o rendimento, incidente sobre os lucros gerados pela sociedade, em sede de IRC e
em sede de IRS. Dupla tributação económica porque o mesmo rendimento (lucro gerado pela sociedade),
seria duplamente tributado em sede de impostos do mesmo tipo (sobre o rendimento), relativamente ao
mesmo período de tributação (coincidente com o ano civil), mas em sede de pessoas distintas (sociedade e
respetivos sócios): tributação da sociedade, em primeira linha, em sede de IRC e posteriormente dos sócios,
pela imputação dos rendimentos da sociedade, em sede de IRS. A solução encontrada pelo legislador consiste
em não tributar a sociedade transparente e tributar apenas os sócios (em sede de IRS ou IRC) pela imputação
(e não distribuição) dos lucros, tratando-se de uma metodologia sui generis, que apenas ocorre neste tipo de
sociedades em que o elemento “pessoas” é fundamental. Como é sabido, relativamente às restantes
sociedades (não transparentes, digamos assim), o método de eliminação da dupla tributação económica é o
inverso, ou seja, em regra a sociedade detida é tributada em IRC e os sócios detentores do seu capital poderão
não ser tributados pelos lucros que lhes são distribuídos, no todo ou em parte, consoante se aplique o artigo
51.º, CIRC ou o artigo 40.º-A, CIRS, respetivamente. Na prática, no caso de entidades abrangidas pelo n.º 1,
artigo 6.º, CIRC, aquilo que é imputado aos sócios é a matéria coletável de IRC (que corresponde ao lucro

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Em sede de IRS, dispõe o artigo 20.º, n.º 1, que constitui rendimento dos sócios o resultado
da imputação prevista no artigo 6.º, CIRC (60).

Sendo assim, o lucro gerado pela sociedade detida por Eduardo e restantes colegas,
abrangida pelo regime da transparência fiscal, independentemente da sua distribuição aos
sócios, será imputado aos mesmos em função das respetivas quotas (que se presumem
iguais quando indeterminadas) ao abrigo do artigo 19.º, norma que regula as situações de
contitularidade de rendimentos (aplicando-se igualmente a alínea a), n.º 2, artigo 22.º).

Tais rendimentos deverão ser considerados, nos termos do disposto no n.º 2, artigo 20.º,
como rendimento líquido da Categoria B, o que significa que não são admissíveis
quaisquer deduções.

Quanto aos rendimentos resultantes de lucros distribuídos em 2019, gerados pela sociedade
em 2018, embora, em abstrato, devam ser considerados como rendimentos de capitais, ao
abrigo do n.º 1 e da alínea h), n.º 2, artigo 5.º, a verdade é que a 2.ª parte desta alínea,
exclui expressamente os lucros “a que se refere o artigo 20.º”, tratando-se de uma exceção
contida na própria norma de incidência, logo, estamos perante uma norma de exclusão
tributária ou, no mesmo sentido, perante uma não sujeição.

Não poderia ser de outra forma, sob pena da ocorrência de fenómenos de dupla tributação
jurídica (61), na medida em que o lucro que agora (em 2019) está a ser distribuído, já terá
sido tributado na esfera dos sócios relativamente a ano de 2018, fruto da imputação que foi
feita nesse ano, tal qual está a suceder em 2019, relativamente ao lucro tributável gerado

tributável deduzido dos prejuízos fiscais) e não o lucro tributável/prejuízo fiscal (já será assim no caso dos
agrupamentos previstos no n.º 2, artigo 6.º, CIRC).
(60) Nos termos da 2.ª parte do n.º 1, artigo 20.º, deverão ser tributadas as importâncias retiradas (pagas ou
colocadas à disposição) no mesmo ano, a título de adiantamento por conta de lucros, caso sejam de valor
superior ao resultado da imputação.
(61) Na ausência da exceção, ocorreria um fenómeno de dupla tributação jurídica na medida em que o mesmo
rendimento (lucro gerado pela sociedade), seria duplamente tributado em sede de IRS, embora em categorias
de rendimentos distintas (Categoria B pela imputação e Categoria E pela distribuição), na esfera da mesma
pessoa jurídica (sócio de sociedade abrangida pelo regime da transparência fiscal), embora em anos
diferentes. A situação descrita é meramente hipotética, pois, na prática, a dupla tributação jurídica é um
fenómeno eminentemente internacional, implicando a existência de duas ou mais jurisdições, ocorrendo nas
situações em que se verifica a obtenção de rendimentos, por parte de uma pessoa (singular ou coletiva), num
Estado diferente do seu Estado da residência (competências tributárias cumulativas do Estado da fonte e do
Estado da residência, o que configura uma situação que poderá ser apelidada de “concurso de normas”).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

pela sociedade neste ano (que quando vier a ser distribuído, em 2020 ou nos anos
seguintes, também não será tributado na esfera dos sócios).

Assim, o rendimento líquido da Categoria B de Eduardo ascenderá a 125.000, com a


particularidade de ser declarado no Anexo D da declaração modelo 3 (62).

Uma última nota para referir que o imposto a pagar será elevado, conforme a demonstração
seguinte, embora deva referir-se que, não sendo aplicável o regime da transparência fiscal,
a sociedade teria suportado 21% de IRC e a derrama (até 1,5% do lucro tributável) e o
sócio 28% de IRS sob a forma de retenção na fonte a título definitivo (alínea a), n.º 1,
artigo 71.º), sem prejuízo da opção pelo englobamento.

Em seguida procede-se ao cálculo do imposto, pressupondo que Eduardo é solteiro e sem


dependentes e considerando apenas a dedução à coleta relacionada com “despesas gerais
familiares”, prevista na alínea b), n.º 1, artigo 78.º e artigo 78.º-B.

Desconsiderámos qualquer adiantamento a título de pagamentos por conta (artigo 102.º),


embora numa situação real eles fossem devidos (três pagamentos em 2019), com base no
rendimento imputado no penúltimo ano (2017).

(62) O Anexo D serve, não apenas para a imputação de rendimentos aos sócios no âmbito da transparência
fiscal, como também para a imputação de lucros ou rendimentos aos sócios obtidos por entidades não
residentes em território português sujeitas a um regime fiscal claramente mais favorável, bem como para a
imputação de rendimentos aos herdeiros (contitulares de herança indivisa) nas heranças indivisas que
produzam rendimentos da categoria B (situações também abrangidas pelos artigos 19.º e 20.º).

94
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 16

José, escritor, enquadrado no regime da contabilidade, recebeu em 2019 direitos de


autor, no valor de 100.000, pagos por uma empresa editora respeitantes à venda
livros da sua autoria. Os gastos da atividade ascenderam a 40.000.

Recebeu também um prémio literário, pago por uma instituição portuguesa, no valor
de 50.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e determinação do rendimento líquido.

Resolução proposta

Os direitos de autor, constituindo rendimentos provenientes da propriedade intelectual,


encontram-se abrangidos pela Categoria B, ao abrigo da alínea c), n.º 1, artigo 3.º, uma vez
que José é o titular originário dos direitos por ser o próprio autor das obras literárias às
quais subjazem os rendimentos, independentemente de se tratar da cessão temporária dos
direitos, como é o caso, ou da sua alienação onerosa, a título definitivo (63).

Tal enquadramento legal determina a sujeição a IRS do rendimento (100.000), ao abrigo


do artigo 1.º, n.º 1.

Sendo José o titular originário dos direitos geradores dos rendimentos, aplicar-se-á o
benefício fiscal previsto no n.º 1, artigo 58.º, EBF, segundo o qual tais rendimentos são
considerados no englobamento em apenas 50%, sem contudo a exclusão poder exceder o
montante de 10.000 (limite que consta no n.º 3 deste artigo).

Assim, dado que 50% do montante dos rendimentos (50.000) é muito superior ao limite,
ficará excluído de tributação somente o montante de 10.000 (o qual deverá ser declarado
no quadro 5, Anexo H), sendo considerado para efeitos de tributação o montante de
90.000.

(63) Caso os rendimentos da propriedade intelectual fossem auferidos por alguém que não fosse o titular
originário (um herdeiro do autor ou alguém que tenha adquirido os direitos em causa), os rendimentos
poderiam ser enquadráveis nas Categorias E ou G. Se se tratasse da cessão temporária dos direitos de autor,
constituiriam rendimentos de capitais, ao abrigo da alínea m), n.º 2, artigo 5.º. Caso se tratasse da transmissão
onerosa (definitiva) dos direitos, os rendimentos deveriam ser qualificados como incrementos patrimoniais,
mais concretamente como mais-valias, ao abrigo da alínea c), n.º 1, artigo 10.º.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Tendo em conta os gastos contabilizados (40.000), e admitindo a inexistência de quaisquer


correções fiscais (decorrentes da remissão para o CIRC que é feita no artigo 32.º, CIRS), o
rendimento líquido da Categoria B, ascenderá a 50.000 (90.000 - 40.000).

De referir que José deverá deduzir o montante de 10.000 no campo 460, quadro 4 do
Anexo C (parte isenta, declarada no Anexo H, que está a influenciar o resultado
contabilístico), devendo preencher também o campo 471 (com os rendimentos totais, não
isentos e isentos, no valor de 100.000).

Quanto ao prémio literário, no valor de 50.000, trata-se de um rendimento que, em


princípio, não está sujeito a IRS, ao abrigo do n.º 2, artigo 12.º (delimitação negativa da
incidência), pressupondo-se que a importância auferida não envolveu a cedência
temporária ou definitiva de direitos de autor e que se verificam as restantes condições
previstas na 2.ª parte da norma (atribuição em concurso, mediante anúncio público…).

Deste modo, tratando-se de rendimentos não sujeitos, não deverão ser declarados para
efeitos de IRS.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 17

Afonso possui vários imóveis destinados à habitação arrendados. Em 2016 optou pela
tributação dos rendimentos prediais no âmbito da Categoria B, pretendendo, no
próximo ano (2020), voltar a ser tributado em sede da Categoria F.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Desde 2015, com as alterações processadas pela Lei da Reforma do IRS, passou a ser
possível aos titulares de rendimentos da Categoria F optar pela tributação dos rendimentos
prediais no âmbito da Categoria B, podendo, em caso de exercício da opção, aplicar-se o
regime simplificado ou o regime da contabilidade.

Tal significa, na prática, que os contribuintes passaram a poder optar pela tributação dos
rendimentos prediais no âmbito da categoria B ou F, podendo, no limite, tal decisão
alterar-se todos os anos, uma vez que não há qualquer impedimento legal.

Tal alteração legislativa, totalmente inovadora, consistiu no aditamento de uma ressalva na


parte final do n.º 1, artigo 8.º, que estabelece o conceito de rendimentos prediais (rendas
dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respetivos
titulares), com o seguinte teor: “quando estes não optarem pela sua tributação no âmbito
da categoria B.”.

Por outro lado, aditou-se uma nova alínea ao n.º 1, artigo 4.º, que determina o que se
entende por “Atividades comerciais e industriais, agrícolas, silvícolas e pecuárias”,
passando a ser considerado como tal, nos termos da nova alínea n), o “Arrendamento,
quando haja opção pela tributação no âmbito da categoria B.”, bem como foi igualmente
aditado ao mesmo artigo o n.º 5 que estipula que a opção deve ser exercida em declaração
de início de actividade ou em declaração de alterações.

Segundo a Comissão da Reforma do IRS (Relatório de 2013, p. 25) “Para aqueles sujeitos
passivos que exercem a locação imobiliária num contexto verdadeiramente empresarial,
fica aberta a possibilidade de serem tributados segundo as regras da categoria B.”.

Contudo, situação porventura não totalmente prevista pela Comissão, esta opção não se
limitava a determinar o imposto a pagar sobre os rendimentos prediais, dado que, tendo em

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

conta o restante normativo vigente no momento da alteração (apenas alterado em 2017 e


2018, como veremos), a mesma obrigava a transferir o imóvel do património particular
(Categoria F) para o património empresarial (Categoria B) e no caso de regresso ao regime
fiscal anterior, obrigava a nova reafetação ao património particular (Categoria F), com
todas as consequências daí resultantes, nomeadamente a ocorrência de dois tipos de mais-
valias tributáveis, conforme se refere mais adiante de modo mais detalhado.

Quanto obrigatoriedade de afetação dos imóveis ao património empresarial, decorre, desde


logo, do disposto no artigo 29.º, n.º 1, segundo o qual na determinação do rendimento da
Categoria B só são considerados proveitos (rendimentos) e custos (gastos) os relativos a
bens ou valores que façam parte do ativo da empresa individual do sujeito passivo ou que
estejam afetos às atividades empresariais e profissionais por ele desenvolvidas.

Assim, o início de atividade (opção pela Categoria B) implica a afetação do(s) imóvel(eis)
à atividade que passa a ser desenvolvida por conta própria no âmbito dessa categoria,
devendo tal atividade ser qualificada como de natureza comercial ou industrial (alínea n),
n.º 1, artigo 4.º).

Relativamente a tal afetação à atividade empresarial, na sequência de opção pela Categoria


B, dispõe a alínea a), n.º 1, artigo 10.º (Categoria G – Mais-valias), que a mesma dá lugar
ao apuramento de mais-valias, referindo-se a lei à “afetação de quaisquer bens do
património particular a atividade empresarial e profissional exercida em nome individual
pelo seu proprietário.”, incluindo, portanto, e especialmente, bens imóveis.

Tais mais-valias irão corresponder à diferença entre o valor de realização e o valor de


aquisição dos bens, considerando-se como valor de realização, não existindo uma
verdadeira transmissão, o valor de mercado à data da afetação, nos termos da alínea c), n.º
1, artigo 44.º (que constituirá o valor de aquisição no âmbito empresarial, ao abrigo do n.º
2, artigo 29.º).

A referida mais-valia, como é bom de ver, será tanto maior quanto menor for o valor de
aquisição, sendo que este poderá ser bastante no caso de imóveis adquiridos há vários anos,
especialmente se adquiridos a título gratuito (mesmo tendo presente a aplicação dos
coeficientes de desvalorização monetária).

De notar, no entanto, que, de acordo com o disposto na alínea b), n.º 3, artigo 10.º, nestas
situações, em que está em causa a afetação de bens do património particular a atividade
empresarial exercida pelo seu proprietário, o ganho só se considera obtido no momento da

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

ulterior alienação onerosa dos bens em causa ou da ocorrência de outro facto que
determine o apuramento de resultados em condições análogas (nomeadamente a reafetação
à esfera privada, não empresarial), existindo aqui um diferimento da tributação no âmbito
da Categoria G (podendo dizer-se que a tributação da mais-valia fica suspensa).

Revertendo para o caso em apreço, de acordo com a lei vigente até 2017, dir-se-ia que, em
2016, aquando da opção pela tributação na Categoria B, gerou-se uma mais-valia no
âmbito da Categoria G, embora a mesma apenas fosse tributada aquando de uma eventual
transmissão no âmbito da Categoria B ou caso os bens reingressassem ao património
particular, o que, de acordo com o enunciado, terá sucededido em 31/12/2019 dado que a
intenção é voltar a ser tributado em 2020 no âmbito da Categoria F.

Contudo, a Lei do OE/2018, introduziu uma exceção na parte final da referida alínea b), n.º
3, artigo 10.º, aplicável aos casos de “de restituição ao património particular de imóvel
habitacional que seja afeto à obtenção de rendimentos da categoria F, mantendo-se o
diferimento (…) enquanto o imóvel mantiver aquela afetação.” (64).

No caso de Afonso, estando em causa imóveis destinados à habitação, conclui-se que, com
a alteração legislativa supra mencionada, uma vez que os imóveis regressam ao património
particular, para efeitos de tributação em sede da Categoria F, não haverá tributação em
2019, no âmbito da Categoria G, quanto às mais-valias geradas em 2016 (cuja tributação
ficou suspensa).

No entanto, subsiste uma outra contingência que se prende com o apuramento de mais-
valias em sede da Categoria B, nos termos da alínea c), n.º 2, artigo 3.º.

De facto, no caso em apreço, os imóveis estiveram afetos ao património empresarial entre


2016 e 2019, e a lei vigente até 2016 considerava como rendimentos da Categoria B
(princípio da atração), sem qualquer exceção, as mais-valias apuradas no âmbito de
atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais, designadamente as

(64) A Proposta de Lei do OE/2020 prevê o aditamento do n.º 15 ao artigo 10.º com o seguinte teor: “Em caso
de restituição ao património particular de imóvel habitacional que seja afeto à obtenção de rendimentos da
categoria F, não há lugar à tributação de qualquer ganho, se em resultado dessa afetação o imóvel gerar
rendimentos durante cinco anos consecutivos.”. Ou seja, nestes casos, deixa de existir um mero diferimento
da tributação, previsto na parte final da alínea b), n.º 3, artigo 10.º (transcrita no texto), passando, de acordo
com a Proposta de Lei do OE/2020, a não existir tributação da mais-valia nas circunstâncias previstas na
norma (assunto desenvolvido na parte final da resolução do presente caso prático).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

resultantes da transferência para o património particular dos empresários de quaisquer bens


afetos ao ativo da empresa.

Tal mais-valia, a apurar no âmbito da Categoria B, é dada pela diferença entre o valor de
aquisição (valor de mercado à data da afetação, conforme determina o n.º 2, artigo 29.º,
que corresponde ao valor de realização no âmbito da categoria G) e o valor de realização,
correspondendo este ao valor de mercado à data da transferência para o património
particular, nos termos do disposto no n.º 3, artigo 29.º (65).

Todavia, com a Lei do OE/2017, foi aditado o n.º 9, artigo 3.º, segundo o qual:

“Para efeitos da alínea c) do n.º 2, não configura uma transferência para o património
particular do empresário a afetação de bem imóvel habitacional à obtenção de
rendimentos da categoria F.” (66) (67).

Tal significa, transpondo novamente para o nosso caso, em que estão envolvidos imóveis
destinados a habitação, que não existirá qualquer mais-valia sujeita a tributação no âmbito
da Categoria B, no ano de 2019, por força do reingresso do bem imóvel na esfera privada,
face à alteração legislativa anteriormente descrita.

(65) Note-se que, mesmo não ocorrendo qualquer variação no valor de mercado, poderá haver lugar a mais-
valias tendo em conta as depreciações praticadas (aceites fiscalmente) sobre o valor do imóvel, mesmo no
caso de aplicação do regime simplificado, uma vez que no cálculo da mais-valia deverão ser consideradas as
depreciações calculadas à taxa mínima. De acordo com o disposto no n.º 4, artigo 29.º, “O valor de mercado
a que se referem os números anteriores, atribuído pelo sujeito passivo no momento da afetação ou da
transferência dos bens, pode ser objeto de correção sempre que a AT considere, fundamentadamente, que o
mesmo não corresponde ao que seria praticado entre pessoas independentes.”.
(66) Não existindo qualquer limitação quanto à origem do imóvel na Categoria B, afigura-se que a norma
citada se aplica a imóveis habitacionais adquiridos a título oneroso, construídos pelo próprio empresário, ou,
como no nosso caso, a imóveis provenientes da afetação do património particular à atividade empresarial. A
norma aplica-se, por exemplo, a imóveis que foram explorados no âmbito da atividade de alojamento local e
que depois são afetos a arrendamento no âmbito da Categoria F.
(67) De acordo com a Proposta de Lei do OE/2020 a redação do n.º 9, artigo 3.º passará a ser a seguinte:
“Para efeitos da alínea c) do n.º 2, não é considerada mais-valia a transferência para o património
particular do empresário de bem imóvel habitacional que seja imediatamente afeto à obtenção de
rendimentos da categoria F.”. Afigura-se que, não obstante as várias alterações efetuadas no texto da norma,
o mais substantivo será o facto de a lei passar a estipular que a afetação ao arrendamento deverá ocorrer
imediatamente após a transferência do património empresarial para o património particular.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Assim, com as alterações legislativas processadas em 2017 e em 2018, afigura-se estarem


resolvidos os principais problemas decorrentes das alterações operadas em 2015,
permitindo-se uma maior flexibilidade no exercício das opções, embora se trate de uma
solução parcial, digamos assim, uma vez que apenas se aplica a imóveis habitacionais,
ficando de fora, por exemplo, as rendas decorrentes do arrendamento de um armazém, de
uma loja ou de um terreno.

No caso de Afonso, como referido, não haverá lugar, em 2019, nem à tributação da mais-
valia no âmbito da Categoria G (que ficou suspensa), nem à tributação da mais-valia em
sede da Categoria B.

De modo esquemático, quanto às afetações/desafetações da atividade, temos:

Fonte: Liliana Pereira (2015b)

De modo a facilitar a ponderação pela tributação segundo as regras das Categorias B ou F,


importa descrever a forma de tributação dos rendimentos prediais no âmbito das duas
categorias de rendimentos, sendo certo que na Categoria B é possível a aplicação de
qualquer um dos regimes previstos no n.º 1, artigo 28.º, isto é, o regime simplificado ou o
regime da contabilidade.

Tributação das rendas pelas categorias B ou F?

✓ Categoria F: Aplicação de taxa especial / autónoma de 28% (alínea e), n.º 1, artigo 72.º),
sem prejuízo das reduções de taxa previstas nos n.os 2 a 5, no caso de imóveis atetos a
habitação permanente (68), com opção pelo englobamento (taxas progressivas previstas

(68) Com a entrada em vigor da Lei n.º 3/2019, de 09-01, foram aditados os n.os 2 a 5 ao artigo 72.º, passando
a ficar consagradas reduções de taxa significativas, tanto maiores quanto maior for a duração do contrato de
arrendamento, sem prejuízo da possibilidade de opção pelo englobamento, nos termos do disposto no n.º 12,

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

no n.º 1, artigo 68.º); o rendimento tributável é constituído pelo valor das rendas
deduzido das despesas previstas no artigo 41.º (deduções específicas da Categoria F,
matéria a desenvolver no capítulo respeitante a esta categoria); possibilidade de reporte
de perdas para os seis anos seguintes.

✓ Categoria B – Regime simplificado: Englobamento obrigatório com a inerente aplicação


de taxas progressivas (n.º 1, artigo 68.º); o rendimento tributável apurado mediante a
aplicação do coeficiente de 95% ao valor bruto dos rendimentos prediais deduzido das
despesas previstas no artigo 41.º (deduções específicas da Categoria F, matéria a
desenvolver no respetivo capítulo); impossibilidade de reporte de perdas uma vez que o
coeficiente se aplica ao resultado positivo, impedindo o apuramento de perdas.

✓ Categoria B – Regime da contabilidade: Englobamento obrigatório com aplicação taxas


progressivas (n.º 1, artigo 68.º); o rendimento tributável corresponde ao valor bruto dos
rendimentos, deduzido dos gastos imputáveis, não se aplicando as exceções contidas no
n.º 1, artigo 41.º (assunto a desenvolver no capítulo respeitante à Categoria F);
possibilidade de reporte de perdas para os doze anos seguintes (com o limite de 70% do
lucro tributável, nos termos do n.º 2, artigo 52.º, CIRC).

Constata-se que a opção pela Categoria B, regime simplificado, tem a vantagem,


comparativamente com a Categoria F, de permitir uma dedução adicional correspondente a
5% do valor dos rendimentos, mas o englobamento é obrigatório, enquanto na Categoria F
é facultativo, o que pode ter efeitos relevantes ao nível do aumento da carga fiscal
(dependendo do volume de rendimentos englobados).

Quanto à opção pelo regime da contabilidade, dependerá, sobretudo, do nível de gastos


imputáveis à atividade, podendo ser vantajosa se a atividade tiver alguma envergadura ou
se, por exemplo, existirem gastos de financiamento significativos (não dedutíveis nos
termos do n.º 1, artigo 41.º), sendo certo que tal opção implicará suportar os gastos
inerentes à avença de um Contabilista Certificado.

Relativamente a retenções na fonte, em nosso entendimento, não haverá diferenças


relevantes a assinalar, quer os rendimentos sejam tributados na Categoria B, quer na

artigo 72.º. A Lei n.º 119/2019, de 18-09, alterou os referidos n.os 2 a 5, artigo 72.º, passando a aludir “Aos
rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento para habitação permanente com duração
igual ou superior (…)” (aditamento da parte sublinhada), ficando dissipadas todas as dúvidas sobre o âmbito
de aplicação das normas aditadas pela Lei n.º 3/2019 (assunto desenvolvido no caso prático n.º 24).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Categoria F, aplicando-se, em ambos os casos, uma retenção na fonte, com natureza de


imposto por conta, à taxa de 25%, a qual se encontra prevista na alínea e), n.º 1, artigo
101.º, sendo a mesma obrigatória nos casos em que o arrendatário disponha ou deva dispor
de contabilidade.

Todavia, a norma supra mencionada refere-se a “rendimentos da Categoria F” e não a


“rendimentos prediais”, levantando-se a dúvida, totalmente legítima, tendo em conta o
elemento gramatical, sobre se será aplicável a retenção na fonte em caso de opção pela
tributação segundo as regras da Categoria B, interrogação suscitada, nomeadamente, por
Liliana Pereira (2015b) (69).

Ainda assim, a não ser aplicável a retenção na fonte neste tipo de rendimentos (prediais
com opção pela Categoria B), haveria sempre lugar a pagamentos por conta, obrigatórios
nos termos do artigo 102.º, calculados com base no penúltimo ano, o que significa que, a
valer o entendimento de que não haveria retenção na fonte, apenas poderiam não existir
adiantamentos ao longo do ano, por conta do imposto devido a final, nos dois primeiros
anos de aplicação das regras da Categoria B.

Sendo aplicável a retenção na fonte na Categoria B, tese que preconizamos e que resulta,
aliás, do Ofício-circulado n.º 20180/2015, de 19/08, do Gabinete da SDG do IR e das
Relações Internacionais, sancionado por despacho da DG da AT, de 16-06-2015 (70), é de

(69) Da nossa parte, embora com algumas dúvidas, por nos estarmos a afastar da letra da lei, afigura-se ser
aplicável a retenção na fonte dado que, anteriormente às alterações da Lei da Reforma do IRS, a lei também
já falava em “rendimentos da Categoria F” e, pensamos que sem qualquer tipo de dúvida, aplicava-se (e
aplica-se) a retenção na fonte aos rendimentos prediais imputáveis à atividade empresarial, rendimentos estes
que também são rendimentos da Categoria B, nos termos do disposto na alínea a), n.º 2, artigo 3.º (princípio
da atração). Por outro lado, não nos podemos esquecer que a natureza intrínseca dos rendimentos é predial,
daí também ser para nós difícil conceber que não seja aplicável a retenção na fonte a esta tipologia de
rendimentos, mesmo sabendo-se que a lei se refere a “rendimentos da Categoria F” e não a “rendimentos
prediais”, sendo esta porventura a redação mais adequada pois dissiparia todas as dúvidas.
(70) Este Ofício-circulado é importante em matéria de opção pela tributação na Categoria B no caso de
rendimentos prediais, bem como em matéria de alojamento local, rendimentos que se inserem no âmbito da
Categoria B (alínea h), n.º 1, artigo 4.º, atividades hoteleiras e similares, isto é, prestações de serviços de
alojamento). No entanto, o mesmo encontra-se um pouco desatualizado uma vez que após a sua publicação
ocorreram várias alterações legislativas, nomeadamente a criação de mais um coeficiente no regime
simplificado (0,35) em caso de alojamento local nas modalidades de apartamento ou moradia (aplicando-se
0,15 na modalidade de quarto), bem como passou a ser dada a possibilidade de opção pelas regras da
Categoria F no caso de alojamento local, também nas modalidades de apartamento ou moradia. Este assunto

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

referir que, em ambas as hipóteses (Categorias B ou F), será possível a dispensa de


retenção na fonte, conforme se encontra previsto na alínea a), n.º 1, artigo 101.º-A, quando
os sujeitos passivos prevejam auferir rendimentos de valor inferior a 10.000 anuais
(remissão para o artigo 53.º, CIVA).

Também em ambas as hipóteses, o momento de efetuar a retenção na fonte corresponde


àquele em que ocorrer o pagamento ou a colocação à disposição dos rendimentos, nos
termos do n.º 8, artigo 101.º.

Quanto ao momento de declarar (inclusão dos rendimentos na declaração modelo 3), até
31-12-2019, poderia ser coincidente, pois na Categoria F são declaradas as rendas no ano
em que são recebidas sendo também assim na Categoria B, caso se aplicasse o regime
simplificado, nos termos do n.º 6, artigo 3.º, uma vez que, em princípio, não haveria
obrigação de emissão de fatura por ser aplicável uma isenção de IVA (alínea 29), artigo 9.º
e alínea a), n.º 3, artigo 29.º, ambos do CIVA), salvo renúncia à isenção.

Porém, com a entrada em vigor em 01-01-2020 das alterações ao artigo 29.º do CIVA,
processadas pelo DL n.º 28/2019, passando a ser obrigatória a emissão de fatura do caso de
atividades isentas pelo artigo 9.º do CIVA, a obrigação de declarar as rendas ocorrerá no
momento em que for obrigatória a emissão da fatura (e não no momento do recebimento).

Acresce que, caso se aplique o regime da contabilidade, prevalecerá o princípio do


acréscimo ou da especialização dos exercícios (plasmado no n.º 1, artigo 18.º, CIRC,
aplicável ao IRS por força da remissão contida no artigo 32.º).

Tal significa que as rendas deverão ser declaradas, independentemente do recebimento,


algo que poderá gerar um desfasamento entre o momento de declarar e o momento de reter,
ou seja, se estivermos em anos diferentes, os rendimentos e as retenções correspondentes
poderão constar em declarações distintas.

Notas finais sobre a Lei do OE/2019 e sobre a Proposta de Lei do OE/2020:

Relativamente à afetação de bens à atividade profissional ou empresarial (mais-valia suspensa),


constava no artigo 262.º da Lei do OE/2019 uma autorização legislativa segundo a qual o Governo
ficava legitimado a rever o regime de mais-valias em sede de IRS nos casos de afetação de

será retomado no caso prático n.º 26 (capítulo 2.4, rendimentos prediais), onde consta uma situação que
envolve o alojamento local e onde se procurou atualizar o quadro, com as várias tipologias de situações
possíveis de ocorrer, que consta no referido Ofício-circulado n.º 20180/2015.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

quaisquer bens do património particular à atividade empresarial e profissional exercida pelo seu
proprietário. O sentido e a extensão da autorização legislativa consistiam em sujeitar as mais-valias
a tributação no momento da alienação do bem.

Vislumbravam-se, pois, importantes alterações neste domínio, passando a prever-se, ao que


parecia, uma exclusão de tributação das mais-valias em sede de IRS nos casos de afetação de
quaisquer bens do património particular ao património empresarial e não um mero diferimento.

Verifica-se, contudo, que tal autorização legislativa não chegou a ser utilizada pelo Governo.

Ainda assim, importa referir que a Proposta de Lei do OE/2020 prevê o aditamento do n.º 15 ao
artigo 10.º com o seguinte teor: “Em caso de restituição ao património particular de imóvel
habitacional que seja afeto à obtenção de rendimentos da categoria F, não há lugar à tributação
de qualquer ganho, se em resultado dessa afetação o imóvel gerar rendimentos durante cinco anos
consecutivos.”.

Ou seja, de acordo com a parte final da alínea b), n.º 3, artigo 10.º (anteriormente transcrita, aditada
pela Lei do OE/2018) prolonga-se o diferimento da tributação da mais-valia enquanto o imóvel
habitacional mantiver a afetação à obtenção de rendimentos prediais, passando, de acordo com a
Proposta de Lei do OE/2020, a não existir tributação da mais-valia se o imóvel gerar rendimentos
prediais durante 5 anos consecutivos (isto é, o diferimento da tributação da mais-valia converte-se,
após 5 anos, numa não tributação em definitivo da mesma).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

2.3. CATEGORIA E
RENDIMENTOS DE CAPITAIS

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 18

Sofia, solteira, é enfermeira num hospital público, tendo auferido em 2019


rendimentos ilíquidos de 25.000 e sofrido retenções na fonte no valor de 5.225.

A mesma possui duas contas bancárias, tendo-lhe sido creditada a conta de depósitos
à ordem pelo montante de 360, em dezembro de 2019, relativamente a juros de
depósitos a prazo.

Sofia recebeu também dividendos pagos por uma sociedade anónima, com sede em
Aveiro, no valor de 50.400 (valor líquido recebido).

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Resolução proposta

O conceito de rendimentos de capitais está previsto no n.º 1, artigo 5.º, considerando-se


como tal os frutos e demais vantagens económicas, procedentes, direta ou indiretamente,
de elementos patrimoniais (bens, direitos ou situações jurídicas) de natureza mobiliária,
com exceção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.

Os juros de depósitos bancários inserem-se em tal conceito, constituindo rendimentos da


Categoria E, sujeitos a IRS pelo n.º 1, artigo 1.º.

Tendo em conta o princípio da tipicidade em matéria fiscal, enquanto dimensão material do


princípio da legalidade (71), o n.º 2, artigo 5.º, contém uma extensa enumeração,
exemplificativa, figurando os juros de depósitos a prazo em instituições financeiras
expressamente na alínea b).

Estes rendimentos são tributados através de retenção na fonte a título definitivo, à taxa
liberatória de 28%, prevista na alínea a), n.º 1, artigo 71.º. Tal significa que o banco
(substituto tributário) reteve na fonte a título definitivo o montante correspondente a 28%
do valor bruto dos juros, concluindo-se que o valor recebido (360) creditado na conta de

(71) A dimensão formal de tal princípio traduz-se na reserva (relativa) de competência legislativa em matéria
fiscal, consagrada na CRP, de acordo com a qual os elementos essenciais dos impostos são aprovados por Lei
da AR ou DL autorizado do Governo.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

depósitos à ordem é já um valor líquido de IRS, ascendendo o valor bruto dos juros à
quantia de 500 [360 / (1 - 0,28)] (72).

Tais rendimentos, tributados à taxa liberatória, em princípio não serão objeto de


englobamento, salvo se for exercida tal opção nos termos do n.º 6 do artigo 71.º, situação
que se encontra devidamente salvaguardada na parte final da alínea b), n.º 3, artigo 22.º.

Sendo exercida a opção, deverão ser englobados todos os rendimentos inseridos na mesma
categoria de rendimentos, nomeadamente, no caso em apreço, os juros de depósitos e os
dividendos (uma vez que ambos se inserem na Categoria E), sendo de referir, a este
propósito, que até às alterações processadas pela Lei da Reforma do IRS, esta opção
obrigava a declarar todos os rendimentos relativamente aos quais se encontra prevista tal
possibilidade, mesmo que inseridos noutras categorias (entre outras restrições que
constavam, ao tempo, nos n.os 3 a 5 do artigo 119.º).

Contudo, apenas será de optar pelo englobamento se a taxa marginal que incide sobre estes
rendimentos (taxas progressivas previstas na tabela do n.º 1, artigo 68.º) for inferior aos
28% já retidos pelo banco, situação que, no caso em apreço, não se verifica, tendo em
conta os rendimentos da Categoria A que advêm da profissão de enfermeira (73),
concluindo-se que não deverá ser exercida a opção pelo englobamento.

Caso fosse exercida a opção pelo englobamento, a retenção na fonte a título definitivo, na
quantia de 140, assumiria a natureza de retenção na fonte com natureza de imposto pago
por conta (n.º 7, artigo 71.º), devendo ser levada em consideração a favor de Sofia no
apuramento final do IRS. Em todo o caso, a melhor opção, sem ter em conta outros dados,
nomeadamente a existência de dividendos, seria não englobar este rendimento.

Relativamente aos dividendos (74), são considerados também como rendimentos da


Categoria E, nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea h), sendo igualmente tributados, tal
como os restantes rendimentos de capitais, através do mecanismo da retenção na fonte a

(72) O que configura uma situação de substituição fiscal total, nas palavras de Rui Morais (2008), tendo em
conta que a aplicação deste tipo de retenções na fonte libera o titular dos rendimentos do cumprimento das
principais obrigações fiscais, nomeadamente da obrigação declarativa e de pagamento.
(73) Note-se que o terceiro escalão, cuja taxa marginal é de 28,5%, se aplica a rendimentos coletáveis a partir
de 10.700, sendo que a partir de 20.261 (situação aplicável a Sofia) se aplica a taxa de 35%.
(74) O enquadramento legal descrito no texto aplica-se igualmente (e integralmente) a lucros distribuídos por
sociedades por quotas.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

título definitivo, efetuada pelo substituto tributário (em princípio a própria sociedade
detida), ficando Sofia liberada da obrigação declarativa e de pagamento.

O valor recebido ascendeu a 50.400, no entanto, como referido anteriormente, tal quantia
tem subjacente uma prévia retenção na fonte de IRS a taxa liberatória de 28% (alínea a), n.º
1, artigo 71.º), donde, o valor a considerar deverá ser o valor bruto dos dividendos, logo,
70.000 [50.400 / (1 - 0,28)], ascendendo a retenção na fonte a 19.600.

Também aqui se coloca a possibilidade de opção pelo englobamento, ao abrigo do n.º 6,


artigo 71.º, sendo que, neste caso, o direito de opção deverá ser exercido, conforme se
procurará demonstrar, embora possa não parecer à primeira vista tendo em conta o volume
de rendimentos a englobar.

Com efeito, embora o valor ilíquido dos rendimentos ascenda a 70.000, tendo em conta
que tais rendimentos já foram tributados em sede de IRC na esfera da entidade que
distribui os dividendos (o lucro distribuído pelas sociedades é um lucro depois de
impostos, ou seja, o resultado líquido do período), os mesmos apenas serão englobados em
50% do seu valor (ou seja, 35.000), conforme dispõe o n.º 1, artigo 40.º-A, norma que visa
a atenuação da dupla tributação económica sobre os lucros distribuídos.

É certo que tal opção terá como consequência a obrigatoriedade de englobar também os
restantes rendimentos da mesma categoria (n.º 5, artigo 22.º), o que é o caso dos juros de
depósitos a prazo, mas a verdade é que tal obrigatoriedade não condiciona a solução supra
aventada no sentido de ser favorável a opção pelo englobamento.

Com efeito, iremos concluir que aquilo que Sofia ganha com o englobamento dos
dividendos supera largamente aquilo que perde com o englobamento dos juros, conforme
se demonstrará.

De facto, no caso em apreço, tendo a retenção na fonte sido efectuada pelo substituto
tributário, à taxa de 28%, sobre 100% do rendimento (70.000), a qual, em caso de
englobamento, passa a ter a natureza de pagamento por conta, e sendo englobado apenas
50% do rendimento (35.000), é forçoso concluir que a opção pelo englobamento seja
favorável.

Na verdade, com o englobamento, o adiantamento efetuado por via da retenção na fonte à


taxa de 28% passa a representar 56% do rendimento englobado (19.600 / 35.000 = 0,56),

111
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

taxa muito superior à maior das taxas progressivas previstas no n.º 1, artigo 68.º, que
atualmente é de 48%.

Por conseguinte,

Valor bruto dos dividendos – 70.000

Retenção na fonte de IRS – 70.000 x 28% = 19.600 (dedução à coleta – n.º 7, artigo 71.º e
n.º 2, artigo 78.º)

Valor a englobar (Anexo E) – 70.000 x 50% = 35.000 (artigo 40.º-A)

Sabendo-se que o rendimento bruto da Categoria A é de 25.000 e que as retenções na fonte


nesta categoria ascenderam a 5.225 (taxa de retenção de 20,9%, escalão “Até 1.864”, de
acordo com a Tabela I, divulgada pela Circular n.º 1/2019), passamos a demonstrar a
liquidação, com e sem opção pelo englobamento dos juros e dos dividendos, considerando
que Sofia é solteira, sem dependentes, e considerando apenas a dedução à coleta
relacionada com “despesas gerais familiares”, prevista na alínea b), n.º 1, artigo 78.º e
artigo 78.º-B.

✓ Valor dos rendimentos = 60.500 → 25.000 (remunerações - Categoria A) + 500 (juros -


Categoria E) + 35.000 (dividendos - Categoria E)

✓ Valor das retenções na fonte = 24.965 → 5.225 (remunerações - Categoria A) + 140


(juros - Categoria E) + 19.600 (dividendos - Categoria E)

Liquidação com englobamento de juros e dividendos

112
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Liquidação sem englobamento

Fica demonstrada a vantagem da opção pelo englobamento, a qual permite uma poupança
fiscal muito significativa, no montante de 5.123,96 (aumento do valor do reembolso).

Pressupondo a inexistência de dividendos, demonstra-se em seguida o resultado da opção


pelo englobamento dos juros de depósitos a prazo no valor de 500, a qual será desfavorável
como já anteriormente havia sido mencionado, mesmo sem efetuar quaisquer cálculos.

Liquidação com englobamento de juros

O valor do reembolso a que Sofia teria direito seria inferior em 35, ou seja, verifica-se uma
diminuição do imposto a reembolsar correspondente a este valor, diferença esta que não é
muito expressiva tendo em conta o reduzido valor dos rendimentos envolvidos (e da
retenção na fonte), mas será o suficiente para ilustrar a ideia principal que se pretende
transmitir, que é basicamente a seguinte:

113
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

✓ Quando estão em causa outros rendimentos médios ou elevados de englobamento


obrigatório, em princípio só é favorável a opção pelo englobamento no caso de
dividendos (lucros distribuídos), tendo em conta o benefício previsto no artigo 40.º-
A (atenuação da dupla tributação económica sobre lucros distribuídos).

Dado que o Anexo E da declaração de rendimentos modelo 3 e respetivas instruções não


são totalmente explícitos e tratando-se de algo muitíssimo relevante, importa elucidar que o
montante dos dividendos (lucros distribuídos) que deverá constar no Quadro 4-B, Anexo E,
declaração modelo 3, será o correspondente a 50% do valor do rendimento ilíquido (e a
totalidade da retenção).

Tal situação poderá gerar uma eventual divergência na declaração, a qual será facilmente
ultrapassável se devidamente explicada e comprovada, referindo-se, a propósito da
necessidade de comprovação, que a mesma até poderá ser dispensada tendo em conta que a
AT dispõe da informação na modelo 39 entregue pela entidade que procedeu ao pagamento
ou à colocação à disposição dos dividendos / lucros.

114
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 19

Luís, pensionista, com 70 anos, auferiu em 2019 pensões no valor de 11.200 (800/mês).
No mesmo ano, recebeu juros de depósitos bancários no montante de 3.000 e juros de
certificados de aforro na quantia de 15.000 (valores ilíquidos).

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Resolução proposta

Luís auferiu rendimentos da Categoria H (alínea a), n.º 1, artigo 11.º), de englobamento
obrigatório (n.º 1, artigo 22.º), sendo o rendimento líquido, após a dedução específica (n.º
1, artigo 53.º), no montante de 7.096 (11.200 - 4.104).

Relativamente aos juros de depósitos bancários (à ordem ou a prazo), constituem


rendimentos de aplicação de capitais, inserindo-se, como tal, na Categoria E (alínea b), n.º
2, artigo 5.º), estando sujeitos a IRS pelo n.º 1, artigo 1.º.

A este tipo de rendimentos aplica-se uma taxa liberatória de 28% (retenção na fonte a título
definitivo), prevista na alínea a), n.º 1, do artigo 71.º, a efetuar pela instituição bancária,
nos termos da alínea a), n.º 2, artigo 101.º, o que significa que o rendimento líquido, após a
retenção na fonte, ascendeu a 2.160 (3.000 - 840).

Quanto aos juros de certificados de aforro (títulos da dívida pública), constituem também
rendimentos da Categoria E (alínea c), n.º 2, artigo 5.º), aplicando-se a taxa liberatória de
28% (alínea a), n.º 1, do artigo 71.º), o que significa que o rendimento líquido, após a
retenção na fonte, ascendeu a 10.800 (15.000 - 4.200).

Em princípio, estes rendimentos não são declarados para efeitos de IRS, dado ter-se
aplicado uma taxa liberatória que, como o próprio nome indica, liberou Luís do
cumprimento da obrigação declarativa (e de pagamento) quanto a tais rendimentos.

No entanto, ambos os rendimentos (juros de depósitos e juros de certificados de aforro),


podem ser englobados por opção dos titulares, ao abrigo do n.º 6, artigo 71.º, sendo que,
em caso de exercício da opção, as retenções na fonte (definitivas) passam a ter a natureza
de pagamentos por conta (n.º 7, artigo 71.º).

115
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Tal direito de opção pelo englobamento é confirmado através da ressalva que consta na
parte final da alínea b), n.º 3, artigo 22.º, alínea segundo a qual, em regra, não são
englobados os rendimentos referidos no artigo 71.º (e 72.º), se auferidos por residentes,
“sem prejuízo da opção pelo englobamento neles prevista”.

A opção terá necessariamente que ser feita em relação a ambos os tipos de juros, uma vez
que se trata de rendimentos que se inserem na mesma categoria de rendimentos (n.º 5,
artigo 22.º), algo que poderá condicionar o exercício do direito de opção.

Em seguida procede-se à demonstração da liquidação sem opção pelo englobamento dos


rendimentos de capitais:

Caso Luís apenas tivesse auferido os juros de depósitos bancários, a opção mais favorável
seria o respetivo englobamento, tendo em conta que a taxa marginal que incidiria sobre tais
rendimentos (de 23%), seria inferior à aplicada pelo banco (28%), o que permitiria alcançar
uma poupança fiscal no valor de 150, conforme se demonstra:

116
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Contudo, a situação anterior não é admissível, tendo que ser declarados também os juros
dos certificados de aforro, tornando a opção desfavorável, como se demonstra:

Assim, Luís não deveria exercer a opção pelo englobamento, pois isso provocaria um
acréscimo no imposto a pagar de 207,93 (987,27 - 779,35).

Finalmente, uma nota para observar que se Luís, ao invés de ter aplicado as suas poupanças
em certificados de aforro, tivesse adquirido um imóvel para arrendamento que gerasse o
mesmo nível de rendimentos, já poderia optar pelo englobamento dos juros de depósitos
bancários (poupando 150) (75), sem ter que englobar os rendimentos prediais por serem de
rendimentos que se inserem noutra categoria (Categoria F).

Acresce que a taxa aplicável seria também de 28% (taxa autónoma prevista na alínea e), n.º
1, artigo 72.º), mas iria incidir sobre um rendimento em princípio inferior, fruto das
deduções legalmente previstas para esta Categoria (algo inexistente na Categoria E).

(75) A poupança de 150 (779,35 - 629,35) advém da diferença das taxas aplicáveis aos 3.000, sem e com
opção pelo englobamento (28% - 23% = 5% → 3.000 x 5% = 150).

117
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 20

Gonçalo, recebeu em 2019 lucros e dividendos distribuídos por várias sociedades, no


valor (ilíquido) global de 500.000, onde se incluem 100.000 distribuídos por uma
sociedade de simples administração de bens sujeita ao regime da transparência fiscal,
relativamente a resultados gerados no ano de 2018. Esta sociedade é detida em 10%
por Gonçalo, tendo apurado um lucro tributável, em 2019, no valor de 600.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Os lucros distribuídos aos sócios por sociedades constituem rendimentos da categoria E,


nos termos da alínea h), n.º 2, artigo 5.º, estando sujeitos a IRS enquanto rendimentos da
Categoria E.

Tratando-se de lucros que, em princípio, foram tributados em sede de IRC, a norma citada
do CIRS provoca aquilo que se denomina por dupla tributação económica, fenómeno que,
em sede de IRS, apenas pode ser atenuado (ao abrigo do artigo 40.º-A) e não eliminado tal
como sucede em sede de IRC (por via da aplicação do artigo 51.º do respetivo Código, se
verificadas as condições cumulativas aí previstas).

No entanto, a referida alínea h) exclui os lucros a que se refere o artigo 20.º, ou seja, os
lucros distribuídos por sociedades sujeitas ao regime da transparência fiscal, o que é o caso
das sociedades de simples administração de bens que constam expressamente na alínea c),
n.º 1, artigo 6.º, CIRC.

Por conseguinte, dos 500.000 apenas 400.000 serão considerados como rendimentos de
capitais, ficando a diferença de 100.000 excluída de tributação em 2019, embora em rigor
se trate de uma exclusão de tributação meramente aparente uma vez que os rendimentos já
terão sido alvo de tributação no ano de 2018, por via da imputação, tal como irá suceder
em 2019, relativamente aos lucros gerados neste ano, como veremos (76).

(76) A tributação destes rendimentos, efetivamente, já terá ocorrido no ano em que os lucros foram gerados
(2018), tal como referido no texto, sendo apenas de acrescentar que relativamente a esta parte (100.000) não
ocorreu qualquer fenómeno de dupla tributação económica, fruto da isenção prevista no artigo 12.º, CIRC.

118
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Os rendimentos em causa, no valor de 400.000, foram tributados através de retenção na


fonte a título definitivo (alínea a), n.º 1, artigo 71.º), efetuada no momento do pagamento
pelas empresas detidas por Gonçalo (alínea a), n.º 2, artigo 101.º), ascendendo a retenção
na fonte a 112.000 (400.000 x 28%).

Será possível a Gonçalo optar pelo englobamento dos lucros que lhe foram distribuídos (n.º
6, artigo 71.º), o que implicará o englobamento dos restantes rendimentos inseridos na
mesma categoria (n.º 5, artigo 22.º).

No caso em apreço, mesmo tratando-se de um valor a englobar muito elevado, e


independentemente da existência de outros rendimentos a englobar, será de exercer a opção
pelo englobamento dado ser aplicável o disposto no n.º 1, artigo 40.º-A, que permite que o
englobamento se faça em apenas metade do valor (200.000), sendo a retenção na fonte,
com natureza de imposto por conta, considerada na totalidade (112.000).

Quanto ao lucro tributável gerado no ano de 2019 pela sociedade de simples administração
de bens (sociedade transparente), deverá ser imputado aos sócios, nomeadamente a
Gonçalo, em função da sua quota-parte (10%), constituindo tal importância (60.000)
rendimento líquido da categoria B, ao abrigo do n.º 1, artigo 6.º, CIRC e do n.º 1, artigo
20.º, CIRS (e artigo 19.º, CIRS), a declarar no Anexo D da declaração modelo 3.

Digamos que a poupança conseguida com o englobamento dos dividendos (lucros


distribuídos) servirá para pagar o imposto referente aos lucros imputados gerados pela
sociedade de simples administração de bens, pese embora, em princípio, Gonçalo estivesse
obrigado a efetuar pagamentos por conta relativamente a estes rendimentos (n.º 1, artigo
102.º), por se tratar de rendimentos da Categoria B e também porque tal obrigação não se
verifica relativamente à sociedade detida, nem de efetuar pagamentos por conta de IRS,
como é bom de ver, nem de proceder a pagamentos por conta de IRC, em função da
isenção de que beneficia.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 21

Ana auferiu, em 2019, rendimentos de Unidades de Participação distribuídos por um


Fundo de Investimento Imobiliário, no valor de 45.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Resolução proposta

Estamos perante rendimentos de capitais, expressamente previstos na alínea j), n.º 2, artigo
5.º, que se refere expressamente aos rendimentos distribuídos das unidades de participação
em fundos de investimento, o que é o caso, estando por isso sujeitos a IRS por força do n.º
1, artigo 1.º.

Importa, contudo, contextualizar o regime de tributação aplicável a este tipo de


rendimentos.

O regime de tributação dos Organismos de Investimento Coletivo (OIC), onde se inclui o


Fundo de Investimento Imobiliário (FII) em apreço, foi profundamente alterado pelo DL
n.º 7/2015, de 13 de janeiro. De entre as várias alterações processadas por este diploma,
com entrada em vigor em 01-07-2015, destacam-se as efetuadas ao artigo 22.º, EBF.

A este respeito, pela sua clareza, importa aludir à doutrina administrativa veiculada pela
Circular n.º 6/2015, de 17-06-2015, do Gabinete do Diretor-Geral da AT.

Assim, a tributação dos rendimentos distribuídos pelos OIC, incluindo FII, ocorre “à
saída", em sede de IRS ou IRC, na esfera dos participantes, matéria que se encontra
regulada no artigo 22.º-A, EBF, constituindo este modo de tributação uma verdadeira
alteração de paradigma em relação ao regime anteriormente vigente (até 30-06-2015).

De facto, nos termos do n.º 3, artigo 22.º, EBF, os rendimentos referidos nos artigos 5.º, 8.º
e 10.º do Código do IRS, isto é, rendimentos de capitais, prediais e mais-valias, não
concorrem para a determinação do lucro tributável dos OIC (FII), não sendo, como tal,
tributados em sede de IRC.

Por norma, os FII distribuem periodicamente rendimentos aos seus participantes,


detentores das Unidades de Participação (UP), como resultado da sua atividade, que
consiste precisamente da obtenção de mais-valias e de rendimentos prediais, ou seja,

120
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

rendimentos excluídos de tributação em sede de IRC ao abrigo do n.º 3, artigo 22.º, EBF, o
que significa que os lucros gerados pelos FII não são tributados em sede de IRC.

Por tal motivo, conclui-se que não é aplicável o mecanismo de atenuação da dupla
tributação económica aos rendimentos distribuídos por FII, previsto no artigo 40.º-A, o
qual visa, em abstrato, minimizar os efeitos da dupla tributação (económica) dos lucros
distribuídos na esfera do sócio detentor das partes de capital, no pressuposto de tais lucros
terem sido anteriormente tributados na esfera da entidade detida.

Por outras palavras, só poderá ser atenuada a dupla tributação económica quando os lucros
distribuídos já tenham sido objeto de tributação em momento anterior na entidade que os
gerou, em sede de IRC, permitindo-se, nesse caso, o englobamento de tais rendimentos,
para efeitos de IRS, em apenas metade do seu valor.

O texto do n.º 1, artigo 40.º-A, é totalmente claro a este respeito uma vez que se refere a
“lucros devidos por pessoas coletivas sujeitas e não isentas do IRC”, o que não é o caso
dos rendimentos distribuídos por OIC / FII.

Do exposto decorre que os rendimentos distribuídos pelos FII aos seus participantes, não
poderão beneficiar do disposto no artigo 40.º-A (nem de qualquer outro dispositivo
similar), uma vez que tais rendimentos não foram tributados em sede do FII, por força da
isenção aplicável, não ocorrendo, por isso, qualquer fenómeno de dupla tributação
económica que careça de ser atenuado.

Os rendimentos em causa serão tributados através da aplicação de uma taxa liberatória de


28%, por força do ponto i), alínea a), n.º 1, artigo 22.º-A, EBF que remete para a taxa
prevista no n.º 1, artigo 71.º, CIRS, assumindo o FII a qualidade de substituto tributário
(alínea a), n.º 2, artigo 101.º). O valor da retenção na fonte ascenderá a 12.600 (45.000 x
28%).

Tendo em conta a inaplicabilidade do artigo 40.º-A, como acima referido, conclui-se que
não deverá ser exercido o direito de opção pelo englobamento previsto no n.º 2, artigo 22.º-
A, EBF, independentemente da existência de outros rendimentos sujeitos a englobamento
obrigatório auferidos por Ana.

Com efeito, bastará ter em conta o valor dos rendimentos distribuídos pelo FII por si só
(45.000) e observar atentamente a tabela de taxas prevista no n.º 1, artigo 68.º, para
perceber que a taxa efetiva aplicável aos rendimentos (45.000) será superior a 28%.

121
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Neste caso, a ilação é fácil de retirar porquanto a taxa média correspondente ao escalão
anterior àquele em que se insere o rendimento em causa (até 36.856) é superior a 28%
(28,838%), sendo o remanescente tributado a 45%.

Ainda assim, fica a demonstração:

Caso optasse pelo englobamento, Ana teria que pagar 1.443,33, a acrescer ao valor que já
pagou através da retenção na fonte (12.600), confirmando-se que o direito de opção não
deverá ser exercido.

Uma nota para referir que, por vezes, a leitura não é assim tão óbvia, bastando pensar num
rendimento de englobamento obrigatório que se insira no 4.º ou no 5.º escalão.

A título de exemplo, pensemos no valor de 22.500, situado sensivelmente a meio do 4.º


escalão. Seria, neste caso, de exercer a opção pelo englobamento? Segundo a tabela das
taxas, até 20.261 o rendimento é tributado à taxa de 22,621%, sendo o remanescente será
tributado a 35%. Sem fazer quaisquer cálculos tudo indica que sim dado que a parte que é
tributada a 35% é muito pequena.

Outro exemplo, seria um rendimento no valor de 36.000, situado sensivelmente no topo do


5.º escalão. Seria de exercer a opção pelo englobamento? Observando a tabela das taxas
sabemos que até 25.000 o rendimento é tributado a 24,967% e o remanescente (11.000)
será tributado a 37%. Neste caso, sem fazer cálculos não será fácil...

Deixamos em seguida a demonstração das liquidações resultantes dos dois exemplos


apresentados:

122
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Mesmo com o montante de rendimento de 36.000 seria favorável a opção pelo


englobamento, originando um reembolso de (apenas) 18,25, ou seja, os 36.000
correspondem sensivelmente ao ponto crítico a partir do qual não deve ser exercida a
opção pelo englobamento.

Caso existissem outros rendimentos de englobamento obrigatório a leitura poderia ser um


pouco mais óbvia, devendo pensar-se mais numa lógica de taxas marginais (taxas
normais), dando-se apenas mais um exemplo: Imaginemos alguém que tem um rendimento
coletável de 20.261 gerado em rendimentos de englobamento obrigatório e que obteve
também 4.000 de rendimentos de capitais. Como o rendimento de 20.261 corresponde ao
limite superior o 3.º escalão, não há quaisquer dúvidas que os 4.000, caso sejam
englobados, serão tributados a uma taxa superior a 28% (no caso 28,5%).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
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Caso prático n.º 22 (continua)

Raúl possui 20% do capital social de uma sociedade por quotas que foi dissolvida,
cabendo-lhe o montante de 70.000, a título de resultado da partilha. Raúl adquiriu as
quotas em causa em 2010, pelo valor de 20.000, embora o seu valor nominal
ascendesse a 30.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Até à entrada em vigor, em 2014, da Lei da Reforma do IRC, que procedeu à alteração da
alínea a), n.º 1, artigo 81.º, CIRC, os resultados da partilha poderiam ser qualificados como
rendimentos de capitais (Categoria E) ou como mais-valias (Categoria G).

Ao tempo, tais rendimentos constavam, quer na alínea i), n.º 2, artigo 5.º, respeitante à
Categoria E, quer na 2.ª parte, alínea b), n.º 1, artigo 10.º, referente à Categoria G, mais-
valias.

O valor a tributar, tal como ainda hoje, e como não poderia deixar de ser, correspondia à
diferença entre o valor atribuído em resultado da partilha e o valor de aquisição das
participações, nos termos do n.º 1, artigo 81.º, CIRC, ou seja, no caso em apreço, a 50.000
(70.000 - 20.000).

No entanto, a diferença entre o valor da partilha e o valor nominal das quotas (70.000 -
30.000 = 40.000) era considerada como rendimento de capitais, enquanto o diferencial
entre o valor nominal e o valor de aquisição (30.000 - 20.000 = 10.000) era tributado na
Categoria G, enquanto mais-valias, aplicando-se as regras, diferenciadas, inerentes às
respetivas categorias.

Atualmente, porém, desde 2014 (Lei da Reforma do IRC), a alínea i), n.º 2, artigo 5.º, não
inclui tais rendimentos, mantendo-se os mesmos apenas na alínea b), n.º 1, artigo 10.º
(mais concretamente no ponto 3), em resultado das alterações processadas pela Lei da
Reforma do IRS), o que significa que o rendimento que deriva de valores atribuídos em
resultado de partilha é de qualificar na sua globalidade, atualmente, como Mais-valia
(Categoria G).

124
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Mantém-se obviamente o valor a tributar, consistindo este na diferença entre o valor


atribuído em resultado da partilha e o valor de aquisição das participações, nos termos do
disposto no n.º 1, artigo 81.º, CIRC.

Naturalmente que a principal alteração legislativa (a alteração de fundo que motivou as


alterações ao CIRS) ocorreu no CIRC, fruto da Reforma de 2014, mais concretamente à
alínea a), n.º 2, artigo 81.º (cuja epígrafe é “resultado da partilha”), pois era esta alínea
que impunha uma qualificação diferenciada dos rendimentos resultantes de partilha de
sociedade (como mais-valias ou rendimentos de capitais).

Tratando-se de matéria que envolve a Categoria G, este caso prático será retomado no
capítulo 2.5 (último caso prático).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

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2.4. CATEGORIA F
RENDIMENTOS PREDIAIS

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Caso prático n.º 23

Carolina recebeu em 2019 rendas no montante de 18.000 pelo arrendamento de uma


moradia de férias situada no Algarve, tendo incorrido em despesas com a
recuperação desse imóvel do montante de 25.000 (pintura e carpintaria). Em 2019 foi
pago o IMI no montante de 250 relativo ao ano de 2018.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e apuramento do rendimento líquido.

Resolução proposta

As rendas obtidas com o arrendamento da moradia são consideradas rendimentos da


Categoria F, rendimentos prediais, conforme estipula o n.º 1, artigo 8.º, estando sujeitos a
IRS enquanto tal.

Aos rendimentos brutos desta categoria (18.000), para efeitos de determinação do


rendimento líquido, poderão abater-se os gastos com a recuperação do imóvel
(conservação e manutenção), no montante de 25.000, e o IMI no montante de 250, uma vez
que tais despesas têm enquadramento no n.º 1, artigo 41.º, embora atualmente as mesmas
não se encontrem especificamente mencionadas na norma (77).

A redação atual do n.º 1, artigo 41.º, dada pela Lei da Reforma do IRS, é bastante
abrangente, dispondo que:

“Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º deduzem-se, relativamente a cada prédio
ou parte de prédio, todos os gastos efetivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo
para obter ou garantir tais rendimentos, com exceção dos gastos de natureza financeira,
dos relativos a depreciações e dos relativos a mobiliário, eletrodomésticos e artigos de
conforto ou decoração, bem como do adicional ao imposto municipal sobre imóveis.”.

Até à alteração, ou seja, até 31-12-2014, a formulação do artigo era totalmente diferente,
uma vez que elencava expressamente as (poucas) despesas dedutíveis no âmbito desta
categoria, resumindo-se as deduções previstas no n.º 1, às despesas de conservação e
manutenção (desde que incumbissem ao sujeito passivo, por ele fossem suportadas e se

(77) Estaremos, quanto às despesas com pintura e carpintaria, perante aquilo que o Código Civil denomina de
benfeitorias necessárias, matéria regulada no n.º 1, artigo 1273.º (norma que alude igualmente a benfeitorias
úteis, prevendo o artigo 1275.º as designadas benfeitorias voluptuárias).

129
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

encontrassem documentalmente provadas), ao IMI e à verba 28 da Tabela do CIS (78),


constando no n.º 2 a possibilidade de dedução das despesas de condomínio (no caso de
prédios em propriedade horizontal).

Embora este tema volte a ser retomado nos casos práticos seguintes, dir-se-á que a
alteração ao n.º 1, artigo 41.º, é, à primeira vista, bastante substancial.

De facto, a lei deixa de determinar quais os gastos dedutíveis no âmbito da Categoria F,


para passar a elencar apenas os gastos não dedutíveis, recorrendo a exceções à regra geral,
a qual consiste na dedutibilidade de todos os gastos “efetivamente suportados e pagos (…)
para obter ou garantir os rendimentos” (79), aos quais acresce, ainda, nos termos da parte
final da norma, o Adicional ao IMI.

Para se ter uma melhor perceção da amplitude das alterações vigentes desde 01-01-2015,
bastará referir que o artigo 41.º continha apenas três números, passando a ter oito,
correspondendo os anteriores números 2 e 3 aos novos n.os 2 e 6. Quanto à introdução dos
novos n.os 3, 4, 5 diremos apenas que permitiu clarificar determinadas matérias, sendo o
disposto no (novo) n.º 7 absolutamente inovador, permitindo a dedução de despesas de

(78) Verba atualmente revogada e que, durante a sua curta vigência, gerou uma verdadeira saga em termos de
contencioso, sobretudo ao nível da sua aplicação aos terrenos para construção e aos prédios em propriedade
vertical. Simultaneamente à revogação da verba 28 entrou em vigor o AIMI, com efeitos a partir de 01-01-
2017, regulado nos artigos 135.º-A a 135.º-K do CIMI, o qual, contrariamente à verba 28, não é dedutível ao
rendimento no âmbito da Categoria F, sendo, ao invés, dedutível à coleta, nos termos da alínea a), n.º 1,
artigo 135.º-I, até à concorrência da coleta do IRS proporcional àquela que é gerada pelos rendimentos da
Categoria F, em caso de englobamento, ou até à concorrência da coleta obtida através da aplicação da taxa de
28%, prevista na alínea e), n.º 1, artigo 72.º.
(79) Uma redação a fazer lembrar a do n.º 1, artigo 23.º, CIRC, introduzida pela Lei da Reforma do IRC,
segundo o qual “São dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para
obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.”. Note-se, porém, que na redação do n.º 1, artigo 41.º,
CIRS, os gastos terão que ser “suportados e pagos”, enquanto em sede de IRC bastará que os gastos tenham
sido “incorridos ou suportados” (e não “pagos”). Apesar da abrangência da nova redação da norma, é de
realçar que continuam a inserir-se na categoria G, e não na Categoria F, “Os encargos com a valorização dos
bens realizados nos últimos 12 anos”, conforme dispõe a alínea a), artigo 51.º, aplicando-se, grosso modo, às
chamadas benfeitorias úteis e voluptuárias a que se referem os artigos 1273.º e 1275.º, ambos do Código
Civil, sendo que o prazo previsto na norma, antes das alterações da Lei da Reforma do IRS, era de apenas 5
anos, tratando-se de mais uma importante alteração processada pela Lei da Reforma do IRS.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

conservação e/ou manutenção realizadas nos 24 meses anteriores ao início do


arrendamento (80).

Estas alterações, como referido no caso prático n.º 17 respeitante à Categoria B, foram
acompanhadas de outras alterações legislativas (nomeadamente ao n.º 1, artigo 4.º e n.º 1,
artigo 8.º) que visaram conferir o direito de opção pela tributação dos rendimentos prediais
de acordo com as regras da Categoria B (o que implica a afetação do imóvel à atividade,
com as consequências daí decorrentes, nomeadamente ao nível das mais-valias…).

Em suma, de entre as alterações mais relevantes processadas pela Lei da Reforma do IRS
consta a consagração do arrendamento como uma verdadeira atividade económica e,
consequentemente, a possibilidade de dedução da maioria dos gastos que sejam
efetivamente suportados e pagos pelos titulares de rendimentos prediais, bem como a
possibilidade de opção pela Categoria B.

Retomando o exemplo, e deixando de lado a opção pela Categoria B, pressupondo que as


despesas com a recuperação do imóvel se encontram devidamente documentadas,
exigência esta prevista no n.º 8, artigo 41.º, o rendimento líquido da Categoria F ascenderá
a -7.250, ou seja, uma perda (18.000 - 25.000 - 250).

Tal perda não poderá ser englobada aos restantes rendimentos (não comunicabilidade),
pois as perdas apuradas nesta categoria apenas poderão ser reportadas aos 6 anos seguintes
dentro da mesma categoria, ou seja, poderão abater-se apenas aos rendimentos positivos
futuros apurados nesta categoria, conforme a alínea b), n.º 1, artigo 55.º (81).

(80) Quanto ao n.º 8 refere-se à comprovação dos gastos, dispondo a norma que “Os gastos referidos nos
números anteriores devem ser documentalmente comprovados.”, algo que anteriormente constava no n.º 1,
aplicável, ao tempo, apenas às despesas de conservação e manutenção.
(81) Segundo esta disposição legal “O resultado líquido negativo apurado em determinado ano na categoria
F só pode ser reportado aos seis anos seguintes àquele a que respeita;”. De acordo com a interpretação da
AT apenas será possível deduzir as perdas nos anos seguintes se vier a ser exercida a opção pelo
englobamento, interpretação que não se sufraga por não resultar minimamente nem da letra nem do espírito
da lei. A este propósito ver o acórdão do STA, de 20-03-2019, proferido no processo n.º 0968/14.0BELLE
01411/15, em que estava em causa a interpretação do n.º 2, artigo 55.º (disposição com uma redação idêntica
à da atual alínea b), n.º 1, artigo 55.º), cujo sumário tem o seguinte teor: “A dedução de perdas aos
rendimentos líquidos positivos da categoria F, prevista no art. 55º, nº 2 CIRS (na redacção dada pela Lei n.º
64-B/2011, de 30 de Dezembro), não depende de opção pelo englobamento a que alude o 72º, nº 8 do mesmo
diploma legal.”. Acresce, ainda, a jurisprudência do CAAD proferida nos processos 96/2015-T, 338/2016-T,
314/2017-T, 360/2017-T, 399/2017-T, 481/2017-T, 206/2018-T, 351/2018-T e 595/2018-T, estando em

131
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Deste modo, o rendimento a tributar relativo à Categoria F será nulo.

Por outro lado, tudo indica que não terão ocorrido retenções na fonte, dado tratar-se de um
imóvel habitacional, no entanto, caso tenham existido (alínea e), n.º 1, artigo 101.º), na
falta de outros rendimentos tributáveis, seriam reembolsadas na totalidade perante a
obtenção de um prejuízo.

Uma nota final quanto ao reporte de perdas, para referir que também aqui existiram
importantes alterações levadas a cabo pela Lei da Reforma do IRS, uma vez que até 31-12-
2014 (desde 01-01-1999) o Código dispunha, no n.º 1, artigo 55.º, que era dedutível ao
conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação o resultado líquido negativo
apurado em qualquer categoria de rendimentos (consagração legal da regra de
comunicabilidade).

Contudo, o n.º 2 do mesmo artigo estabelecia restrições à comunicabilidade das perdas,


relativamente a todas as categorias de rendimentos, com exceção das categorias A, E e H,
ou seja, apenas não existiam restrições precisamente nas categorias de rendimentos em que
não é possível apurar perdas.

No fundo, teoricamente vigorava a regra da total comunicabilidade de perdas (expoente


máximo de um imposto único), mas, na prática, o que existia era um mero reporte de
perdas a rendimentos futuros da mesma Categoria. A Comissão fez o óbvio, digamos
assim, retirando a regra da comunicabilidade do n.º 1 uma vez que a mesma nunca era
aplicável (pura teoria).

Duas observações adicionais, tidas como relevantes, relacionadas com as alterações


legislativas processadas pela Lei da Reforma do IRS e com o reporte de perdas no âmbito
da Categoria F:

✓ Passou a ficar consagrado no n.º 1, artigo 54.º (extensível às restantes categorias),


que o reporte de perdas deve ser feito em relação a cada titular de rendimentos
(aplicável a situações de opção pela tributação conjunta);

✓ Foi aditado o n.º 8 ao artigo 55.º que refere o seguinte: “O direito ao reporte do
resultado líquido negativo previsto na alínea b) do n.º 1 fica sem efeito quando os
prédios a que os gastos digam respeito não gerem rendimentos da categoria F em

causa na maioria dos processos a interpretação da alínea b), n.º 1, artigo 72.º com a redação que tem
atualmente.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

pelo menos 36 meses, seguidos ou interpolados, dos cinco anos subsequentes


àquele em que os gastos foram incorridos.”.

Quanto a esta última alteração, cuja aplicação prática é geradora de dúvidas, importa
salientar que a sua exequibilidade depende, em primeira linha, da forma como se declaram
os rendimentos e os gastos no Anexo F da declaração de rendimentos modelo 3.

Na verdade, atualmente, com base na informação que consta na declaração, é possível o


controlo automatizado, por parte da AT, dado que, desde 2012, as despesas inerentes aos
imóveis são indicadas no Quadro 4 do Anexo F separadamente por artigo ou fração
autónoma, quando antigamente as despesas eram declaradas em conjunto.

Finalmente, a propósito da necessidade de repartição das despesas, seguem-se algumas


imagens do Anexo F (versão 2018):

Em seguida, a imagem do Quadro 4 na versão anterior do Anexo F:

Finalmente, deixamos a imagem do Quadro 4 na versão vigente até 2011:

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 24

Rafael possui 4 frações autónomas, destinadas à habitação, de um prédio em Lisboa


arrendadas (frações A, B, C e D), tendo auferido em 2019 rendas no montante de
34.500, 9.000 de cada uma das frações, com exceção da fração B, uma vez que o
arrendatário não pagou até 31-12-2019 as rendas referentes a outubro e novembro
(no valor de 750/cada), tendo-as pago somente em fevereiro de 2020 conjuntamente
com as rendas de dezembro de 2019 e de janeiro de 2020.

Rafael incorreu nas seguintes despesas ao longo do ano de 2019:

a) 3.000 de despesas de carpintaria pela renovação dos pavimentos em madeira das


frações A e C;

b) 3.800 de juros pagos ao banco pelo financiamento da compra das frações B e D;

c) 2.500 pela compra de mobiliário destinado à fração A;

d) 10.000 pela colocação de duas marquises nas varandas das frações A e C;

e) 2.000 pela substituição de um aparelho de ar-condicionado na fração A;

f) 500 pela colocação de um novo esquentador na fração C;

g) 3.000 de despesas relacionadas com a limpeza e manutenção das partes comuns do


prédio.

Sabe-se, ainda, que cada um dos imóveis possui um VPT de 150.000 e que a
permilagem de cada um é de 250 (25%).

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e apuramento do rendimento líquido.

Resolução proposta

Os rendimentos auferidos em 2019 constituem rendimentos prediais, ao abrigo do n.º 1,


artigo 8.º, por se tratar de rendas de frações autónomas de prédios urbanos, estando sujeitas
a IRS pelo n.º 1, artigo 1.º, enquanto rendimentos da Categoria F.

Todavia, nos termos do n.º 1, artigo 8.º, só é rendimento a parte paga ou colocada à
disposição do titular dos rendimentos (sujeito passivo), donde, o rendimento a considerar
serão os 34.500, sem ter em conta as rendas não pagas pelo inquilino da fração B (esta

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

parte, no valor de 1.500, tendo sido recebida em 2020, será declarada neste ano
conjuntamente com as rendas recebidas no mesmo ano).

Assim, o rendimento a declarar no anexo F será: 9.000 relativamente às frações A, C e D e


7.500 referentes à fração B.

No que concerne às despesas, caso sejam dedutíveis, o que implicará necessariamente a sua
comprovação (n.º 8, artigo 41.º), deverão também ser repartidas pelas várias frações,
procedendo-se em seguida ao seu enquadramento legal tendo como pano de fundo o
disposto no artigo 41.º:

a) Despesas de renovação dos pavimentos das frações A e C (3.000): Estas despesas


enquadram-se no n.º 1, por serem necessárias à obtenção dos rendimentos tributáveis
(inserindo-se no conceito de despesas de conservação e manutenção que constava na lei
antiga ou de benfeitorias necessárias previstas na lei civil), devendo ser imputadas às
frações, nos termos do n.º 3, em função da permilagem de cada uma (informação
constante na escritura de propriedade horizontal), logo, no caso em apreço, assumindo
que foram faturadas em conjunto sem discriminação por fração (82), os gastos
ascenderão a 1.500 em cada uma das frações.

b) Juros pelo financiamento da compra das frações B e D (3.800): Estes encargos


financeiros inerentes à aquisição não são dedutíveis ao abrigo do n.º 1, estando
expressamente excecionados.

c) Mobiliário destinado à fração A (2.500): A resposta é idêntica à anterior, não sendo os


gastos dedutíveis por se encontrarem excecionados pelo n.º 1 (já não seria assim, a
nosso ver, se se tratasse, por exemplo, da substituição dos módulos dos móveis de
cozinha por se tratar de algo essencial à habitação (benfeitorias necessárias), tratando-se
inclusivamente, neste caso, de bens móveis que se “incorporam” no imóvel.

d) Marquises nas varandas das frações A e C (10.000): Estas despesas também não serão
dedutíveis uma vez que, em princípio, não se destinam a manter ou conservar o imóvel,
mas sim a valorizá-lo (benfeitorias úteis), o que significa que não são dedutíveis na

(82) A não discriminação na fatura ocorreu, muito provavelmente, porque os trabalhos executados em cada
uma das frações foi idêntico. Caso existissem duas faturas, uma para cada fração, ou apenas uma fatura com
valores discriminados por cada fração, prevaleceriam os valores constantes nas faturas, em detrimento do
disposto no n.º 3, desde logo porque o tipo de intervenção efetuada ao nível dos pavimentos em cada uma das
frações (ou a própria área de intervenção) poderia ser completamente diferente.

136
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Categoria F, podendo, no entanto, virem a ser considerados no futuro, enquanto


despesas dedutíveis para efeitos de cálculo de mais-valias, caso as frações venham a ser
vendidas num prazo não superior a 12 anos (alínea a), artigo 51.º, encargos com a
valorização dos bens).

e) Esquentador na fração C (500): Neste caso, trata-se de um aparelho de aquecimento de


águas, essencial à habitabilidade do imóvel, não se tratando, sequer, de um
eletrodoméstico ou de um artigo de conforto, naquele que é o espírito da lei, o que
significa que este gasto é dedutível.

f) Aparelho de ar-condicionado na fração A (2.000): Segundo a doutrina da AT, produzida


antes da alteração de 2015, tais despesas não eram dedutíveis, devendo manter-se, salvo
melhor opinião, o mesmo entendimento, uma vez que o n.º 1, artigo 41.º, bem ou mal,
exceciona expressamente os gastos relacionados com “eletrodomésticos e artigos de
conforto”, o que nos parece ser o caso (83).

g) Limpeza e manutenção das partes comuns do prédio (3.000): Estes gastos serão
integralmente dedutíveis para efeitos de cálculo do rendimento líquido, correspondendo
às normais despesas de condomínio relacionadas com a manutenção e conservação das
partes comuns do prédio constituído em propriedade horizontal; dado que todos os
imóveis têm a mesma permilagem (n.º 3), deverá ser imputada a quantia de 750 a cada
fração.

Tendo em conta os gastos dedutíveis, passamos a demonstrar o cálculo rendimento líquido


da Categoria F:

(83) Quanto à distinção efetuada entre o esquentador (dedutível) e o aparelho de ar-condicionado (não
dedutível), reconhecemos a existência de alguma subjetividade. Será que a mesma lógica de aplica aos
equipamentos de aquecimento (caldeiras, bombas de calor, recuperadores de calor, painéis solares, etc.),
necessários, por exemplo, para aquecimento das águas? Estes equipamentos servem simultaneamente para
aquecer águas e o ambiente (radiadores), sendo esta última função idêntica à do ar-condicionado. Por outro
lado, há locais onde dificilmente se consegue habitar, com um mínimo de qualidade, sem arrefecimento ou
aquecimento, não se tratando, assim, na linguagem do Código Civil, mde benfeitorias úteis mas sim
necessárias. A questão do ar-condicionado é efetivamente bastante discutível, bastando pensar, por exemplo,
numa situação em que a casa foi arrendada com ar-condicionado e dois ou três depois torna-se necessário
substituir os aparelhos por exigência do inquilino tendo em conta o seu mau funcionamento. No entanto,
segundo esta lógica, o que dizer em relação ao frigorífico e ao sofá da sala… Talvez tenha sido esta a razão
pela qual o legislador estabeleceu várias exceções, onde se incluem o ar-condicionado, o frigorífico e o sofá.

137
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

O rendimento líquido da Categoria F, ascenderá a 28.000, sendo tributado, em princípio,


através da aplicação da taxa especial de 28%, prevista na alínea e), n.º 1, artigo 72.º, sem
prejuízo da possibilidade de opção pelo englobamento, nos termos do n.º 12, artigo 72.º
(remetendo-se, a este propósito, para as considerações tecidas a propósito da Categoria E),
e sem prejuízo, também, tratando-se de imóveis habitacionais, das reduções de taxa
previstas nos n.os 2 a 5, artigo 72.º.

Quanto às referidas reduções de taxa foram criadas pela Lei n.º 3/2019, de 09-01, diploma
que procedeu ao aditamento dos n.os 2 a 5 ao artigo 72.º, sendo tais reduções tanto maiores
quanto maior for a duração do contrato de arrendamento, podendo atingir uma redução
máxima de 18 pontos percentuais, ou seja, uma taxa efetiva de 10%, se o contrato tiver
uma duração igual ou superior a vinte anos, nos termos do disposto no n.º 5 (poderá
sempre ser exercida a opção pelo englobamento, ao abrigo do n.º 12, artigo 72.º).

Na redação dada pela Lei n.º 3/2019, a lei (n.os 2 a 5, artigo 72.º) referia-se “Aos
rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento com duração igual ou
superior a (…)”, suscitando-se a dúvida sobre se seria aplicável a quaisquer imóveis ou
apenas a imóveis habitacionais, interpretação esta que não decorria propriamente do
elemento gramatical das normas, mas sim do recurso ao elemento histórico (contexto em
que a norma foi criada, nomeadamente a publicação em simultâneo com esta lei da Lei n.º
2/2019 visando a criação de um Programa de Arrendamento Acessível) e teleológico (a
razão de ser da lei, implícita, de resto, no preâmbulo da própria Lei n.º 3/2019).

Entretanto, a Lei n.º 119/2019, de 18-09, alterou os referidos n.os 2 a 5, artigo 72.º,
passando a aludir “Aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento
para habitação permanente com duração igual ou superior (…)”, ficando dissipadas todas
as dúvidas que porventura existissem quanto ao âmbito de aplicação das normas (84).

(84) Sem prejuízo de se poderem colocar questões relacionadas com a aplicação da lei no tempo, tendo em
conta que se trata de uma lei que, quanto a esta parte, entrou em vigor em 01-10-2019, podendo existir

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Quanto à opção pelo englobamento, diremos apenas que, se Rafael dispuser de outros
rendimentos de englobamento obrigatório, não será, em princípio, de optar pelo
englobamento (e ainda menos se forem aplicáveis as reduções de taxa).

Tratando-se de imóveis habitacionais (frações autónomas) cujos inquilinos, a priori, não


estão obrigados a dispor de contabilidade organizada, não terá ocorrido a retenção na fonte
à taxa de 25% prevista na e), n.º 1, artigo 101.º, aplicável aos rendimentos da Categoria F.

De referir, por fim, que Rafael está obrigado a emitir recibos de renda eletrónicos, matéria
que se encontra regulada na alínea a), n.º 5, artigo 115.º (e na Portaria n.º 98-A/2015) (85),
segundo a qual os titulares dos rendimentos da categoria F são obrigados:

“A passar recibo de quitação, em modelo oficial, de todas as importâncias recebidas dos


seus inquilinos, pelo pagamento das rendas referidas nas alíneas a) a e) do n.º 2 do artigo
8.º, ainda que a título de caução, adiantamento ou reembolso de despesas;”.

contratos celebrados, tendo como objeto imóveis com outro destino que não a habitação permanente, entre a
data da entrada em vigor da Lei n.º 3/2019 e a data da entrada em vigor da lei nova (Lei n.º 119/2019). Sendo
o IRS um imposto periódico, cujo facto tributário ocorre no último dia do ano, afigura-se que a lei nova se
aplica aos rendimentos obtidos ao longo de todo o ano de 2019 (e aos rendimentos obtidos em anos
posteriores), apesar de, obviamente, se verificar uma certa retroatividade da lei fiscal (em matéria de taxas),
situação que deveria ter sido evitada pelo legislador aquando da elaboração da Lei n.º 3/2019. Esta lei foi
publicada com vários erros, daí a publicação da Declaração de Retificação n.º 7-A/2019, de 08-03, estando os
mesmos relacionados com remissões que eram feitas nos n.os 12, 13 e 17 do artigo 72.º para a anterior
numeração do artigo 72.º (ainda assim, continuam a subsistir erros, nomeadamente no n.º 3 do artigo 22.º,
que continua a remeter para os n.os 8 e 9 do artigo 72.º, quando a remissão deveria ser feita para os n.os 13 e
14 do mesmo artigo).
(85) Esta Portaria regula o recibo de renda electrónico, a declaração Modelo 44, bem como a comunicação
eletrónica dos contratos de arrendamento (Modelo 2 do IS), aprovando os modelos em causa e respetivas
instruções de preenchimento.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Alternativamente, caso esteja dispensado da emissão de recibo de renda eletrónico (por


exemplo, por ter mais de 65 anos no ano anterior ao da obtenção dos rendimentos) (86),
deverá entregar até 30 de janeiro de 2019 a declaração modelo 44, nos termos do disposto
na alínea b), n.º 5, artigo 115.º (87), segundo a qual, os titulares de rendimentos da categoria
F são obrigados:

(86) As situações de dispensa de emissão de recibo de renda eletrónico constam no n.º 2, artigo 5.º, Portaria
n.º 98-A/2015, de acordo com o qual ficam dispensados da obrigação de emissão de recibo de renda
eletrónico os sujeitos passivos que, cumulativamente: a) Não possuam, nem estejam obrigados a possuir,
caixa postal eletrónica, nos termos do artigo 19.º da LGT; b) Não tenham auferido, no ano anterior,
rendimentos da categoria F em montante superior a duas vezes o valor do IAS (2 x 428,90 = 857,80) ou, não
tendo auferido naquele ano qualquer rendimento desta categoria, prevejam que lhes sejam pagas ou colocadas
à disposição rendas em montante não superior àquele limite. Ao abrigo do n.º 3 do mesmo artigo, ficam
também dispensados da obrigação de emissão de recibo de renda eletrónico: a) As rendas correspondentes
aos contratos abrangidos pelo Regime do Arrendamento Rural, estabelecido no Decreto-Lei n.º 294/2009; b)
Os sujeitos passivos que sejam titulares de rendimentos da categoria F e que tenham, a 31 de dezembro do
ano anterior ao da obtenção dos rendimentos, idade igual ou superior a 65 anos.
(87) Segundo a Portaria n.º 98-A/2015, nas situações de dispensa de emissão de recibo de renda eletrónico,
caso não haja opção pela sua emissão, os senhorios ficam obrigados à entrega de uma declaração anual de
rendas (Modelo 44), com exceção para as rendas correspondentes aos contratos abrangidos pelo Regime do
Arrendamento Rural.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

“A entregar à Autoridade Tributária e Aduaneira uma declaração de modelo oficial que


descrimine os rendimentos mencionados na alínea anterior até ao fim do mês de janeiro de
cada ano, por referência ao ano anterior.”.

De referir que, não obstante a previsão legal de algumas situações de dispensa de emissão
de recibos de renda eletrónicos, é claramente aconselhável a sua utilização, desde logo por
ser muito mais prático (pré-preenchimento), para além de a sua emissão dispensar a
entrega da declaração modelo 44, cujo preenchimento pode exigir algum trabalho.

Rafael deveria ponderar a opção pela Categoria B, tendo em conta que a “atividade” de
arrendamento que vem desenvolvendo tem alguma dimensão, opção que, a consumar-se,
implicará a entrega de uma declaração de início de atividade, bem como a afetação dos
imóveis da esfera particular à esfera empresarial (conforme exposto no caso prático n.º 17
respeitante à Categoria B).

Caso seja exercida a opção pela Categoria B, embora tal conclusão possa não resultar de
forma clara diretamente da leitura do n.º 5, artigo 115.º [a lei estipula que “Os titulares de
rendimentos da categoria F são obrigados: (…)”], Rafael não estará obrigado à emissão
de recibo de renda eletrónico, mas sim à emissão de fatura-recibo, conforme determinado
no n.º 1, artigo 115.º, obrigação à qual se encontram adstritos os titulares de rendimentos
da Categoria B.

Efetivamente, segundo o n.º 1, artigo 5.º, Portaria n.º 98-A/2015, os sujeitos passivos de
IRS, titulares de rendimentos da categoria F são obrigados à emissão do recibo de renda
eletrónico, pelas rendas recebidas ou colocadas à disposição, “quando não optem pela sua
tributação no âmbito da categoria B”.

Estando enquadrado na Categoria B, Rafael poderá ficar abrangido pelo regime


simplificado, sendo neste caso as despesas dedutíveis nos mesmos termos que na Categoria

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

F, conforme anteriormente explicitado, aplicando-se ao rendimento líquido o coeficiente de


95% (alínea a), n.º 1, artigo 28.º e alínea d), n.º 1, artigo 31.º).

Se optar pelo regime da contabilidade, serão dedutíveis todos os gastos imputáveis à


“atividade” de arrendamento, incluindo aqueles que se encontram expressamente
mencionados no n.º 1, artigo 41.º, donde, no nosso caso, passariam a ser dedutíveis os juros
de financiamento, bem como as depreciações do mobiliário, das marquises e do aparelho
de ar-condicionado, gastos aos quais acresceriam ainda as depreciações dos próprios
imóveis, bem como quaisquer outros gastos conexos com a atividade, incluindo gastos de
natureza administrativa.

Resta salientar que a opção pela Categoria B implicará o englobamento obrigatório do


rendimento líquido (lucro tributável) aos restantes rendimentos englobáveis, enquanto a
tributação na Categoria F processa-se, como referido, em princípio, à taxa especial
(autónoma) de 28% prevista na alínea e), n.º 1, artigo 72.º (com opção pelo englobamento),
sem prejuízo das reduções de taxa previstas nos n.os 2 a 5, artigo 72.º (que tornam ainda
mais desfavorável o englobamento), algo muito importante a ter em conta na ponderação
da opção pela Categoria B.

142
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 25

O condomínio de um prédio situado em Lisboa recebeu em 2019 rendas derivadas do


arrendamento do terraço do referido prédio, local onde se encontra instalada uma
antena retransmissora, pagas por uma operadora de telecomunicações (24.000), bem
como auferiu rendimentos pela cedência da parede lateral do prédio para publicidade
a uma marca de automóveis (12.000). O prédio, constituído em propriedade
horizontal, tem 40 frações destinadas à habitação com idêntica permilagem.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Estamos perante rendimentos de natureza predial, ao abrigo da alínea e), n.º 2, artigo 8.º,
uma vez que está em causa a cedência do uso de partes comuns de prédio em regime de
propriedade horizontal, sujeitos a IRS ao abrigo do n.º 1, artigo 1.º.

Caso se tratasse de um prédio em regime de propriedade total, quanto ao rendimento que


deriva do arrendamento de um espaço no telhado do prédio onde está colocada uma antena,
enquadrar-se-ia na alínea a), dado tratar-se de importâncias recebidas pela cedência do uso
de uma parte de um prédio, podendo, no entanto, entender-se ser aplicável a alínea d), uma
vez que está em causa uma cedência que pode considerar-se “para fins especiais”. A
cedência do uso da parede do prédio enquadrar-se-ia, indubitavelmente, na alínea d), uma
vez que a publicidade é precisamente o único “fim especial” a que se refere a norma (a
título exemplificativo).

No caso concreto, estamos perante rendimentos auferidos por uma entidade sem
personalidade jurídica, um condomínio, que não é sujeito passivo de IRC, nos termos da
alínea b), n.º 1, artigo 2.º, CIRC, uma vez que a norma em causa, quanto às entidades
desprovidas de personalidade jurídica, subordina a sujeição a imposto à condição de os
rendimentos não serem tributados diretamente, em sede de IRS ou IRC, na titularidade das
pessoas singulares ou coletivas, respetivamente.

Na verdade, os rendimentos auferidos por um condomínio, pelo arrendamento de partes


comuns de prédio em propriedade horizontal, consideram-se, para efeitos de tributação em
sede de impostos sobre o rendimento, como obtidos diretamente pelos condóminos,

143
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

aplicando-se o disposto no artigo 19.º, uma vez que se trata de rendimentos obtidos em
contitularidade (ou seja, rendimentos que pertencem em comum a várias pessoas).

Dispõe a alínea b), n.º 2, artigo 22.º, que cada contitular deverá englobar os rendimentos
ilíquidos e as deduções legalmente admitidas, na proporção das respetivas quotas.

A este respeito, importa mencionar a doutrina constante do Ofício-circulado n.º 12/90,


reiterada numa Informação Vinculativa da DSIRS (processo n.º 2210/2010, com despacho
concordante da SDG do IR, de 2010-05-05), de acordo com a qual:

“(…) sendo os diversos condóminos do edifício, comproprietários das partes comuns do


mesmo, de acordo com o estatuído no artigo 1420.º do Código Civil, deverão tais
rendimentos ser-lhes imputados na proporção do valor relativo das respectivas fracções
autónomas (percentagem ou permilagem), de acordo com o regime estabelecido no artigo
19.º do CIRS. Nesta conformidade, deverão os montantes recebidos a título de rendas e
advenientes da cedência do uso da parte comum do prédio, no caso, as paredes do imóvel
para efeitos de publicidade, ser, proporcionalmente, indicados no respectivo anexo F da
declaração de rendimentos a apresentar por cada dos comproprietários do imóvel em
causa.”

A imputação aos 40 condóminos será feita na proporção das quotas dos contitulares, que se
presumem iguais quando indeterminadas (artigo 19.º). No caso em apreço, a imputação
deverá ser feita em partes iguais, não por força da presunção, mas por ser o que resulta da
escritura de propriedade horizontal, tal como refere o enunciado (permilagem de cada
fração igual a 25, equivalente a uma percentagem de 2,5) (88).

Cada um dos condóminos deverá entregar o Anexo F da declaração modelo 3, onde


deverão ser declaradas a respetivas quotas parte do rendimento (permilagem), no valor de
900 [(24.000 + 12.000)/40], bem como dos gastos dedutíveis, caso existam, e as quotas
parte das retenções na fonte, as quais deverão certamente ter ocorrido, embora nada conste
no enunciado a este respeito.

(88) Situação hipotética, por uma questão de simplificação, mas que não corresponde minimamente à
realidade de um prédio com 40 frações habitacionais. Em princípio, na prática, as frações terão diferentes
permilagens, devendo ser elaborada uma folha excel de modo a permitir a imputação dos rendimentos
comuns por todos os proprietários, bem como para possibilitar a repartição por todos dos gastos imputáveis
aos rendimentos e, ainda, das retenções na fonte que forem efetuadas pelas empresas
arrendatárias/cessionárias.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Com efeito, no momento do pagamento ou da colocação à disposição deverá ser feita pelas
duas empresas arrendatárias a devida retenção na fonte, à taxa de 25%, por força do
disposto na alínea e), n.º 1 e n.º 8, artigo 101.º, retenções que serão imputadas aos
condóminos em função das respetivas permilagens. De referir que, a nosso ver, não será
aplicável a dispensa de retenção na fonte prevista na alínea a), n.º 1, artigo 101.º, não
obstante cada um dos condóminos auferir rendimentos de valor bem inferior aos 10.000 aí
previstos (por remissão para o artigo 53.º, CIVA).

Acrescenta-se que o rendimento líquido de cada condómino será tributado à taxa especial
de 28% (alínea e), n.º 1, artigo 72.º), sem prejuízo da opção (individual) pelo
englobamento (n.º 8, artigo 72.º), não sendo aplicáveis as reduções de taxa previstas nos
n.os 2 a 5, artigo 72.º (por não se tratar de rendimentos prediais derivados de “contratos de
arrendamento para habitação permanente”).

Uma questão que pode colocar-se na vida prática: O recibo de renda eletrónico deve ser
emitido pelo condomínio, pelo administrador ou por cada um dos condóminos?

Sendo obrigatória a emissão de recibo de renda eletrónico (89), tal pressupõe


necessariamente a prévia comunicação eletrónica do contrato de arrendamento, através da
declaração modelo 2 do IS, a qual contém, no Quadro II, o campo 17 destinado
precisamente a partes comuns, devendo identificar-se posteriormente, no Quadro III, os
vários contitulares e, no campo 24, a respetiva quota-parte.

De acordo com o Ofício-circulado n.º 20167, de 30-04-2015, do Gabinete da SDG do IR e


das Relações Internacionais, que contém em anexo algumas FAQ relacionadas com esta
temática, deve ser o administrador do condomínio, eleito em assembleia-geral, nos termos
da lei civil, a emitir os recibos.

Para tal, deve dirigir-se a qualquer Serviço de Finanças acompanhado da ata em que foi
nomeado administrador e que lhe confere os poderes bastantes para que os Serviços
verifiquem e registem a autorização em causa, possibilitando, assim, o cumprimento da

(89) Nos casos em que não é obrigatória a emissão de recibo de renda eletrónico, o Quadro 5 da declaração
modelo 44, inclui o campo 10 (parte comum), precisamente para as situações em que seja arrendada uma
parte comum de um prédio em propriedade horizontal, ou seja, uma parte de prédio que não é objeto de
inscrição matricial autónoma, devendo utilizar-se os códigos S (sim) ou N (não), não devendo, caso tenha
sido colocado o código S (sim), ou seja, caso se trate de parte comum, não deverão ser preenchidos os
campos 8 (destinado à identificação do prédio) e 9 (destinado identificação os comproprietários).

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

obrigação de apresentação da modelo 2 do IS e a emissão do recibo de renda eletrónico


(FAQ 25).

Não existe, nestes casos que envolvem rendimentos prediais derivados do arrendamento de
partes comuns de prédios em propriedade horizontal, dispensa de emissão de recibo de
renda eletrónico (FAQ 26).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 26

Teresa, cansada de morar no centro de Lisboa, decidiu comprar um apartamento em


Oeiras, tendo optado por arrendar o seu apartamento em Lisboa, totalmente
mobilado, tal como se encontrava enquanto lá viveu, pela importância de 2.500/mês.

A arrendatária é uma sociedade que vai explorar o imóvel na atividade de alojamento


local, tendo sido celebrado, para o efeito, um contrato de arrendamento, devidamente
comunicado à AT.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Os rendimentos que Teresa passou a obter constituem rendas de prédios urbanos, sendo,
como tal, rendimentos prediais enquadráveis na Categoria F, ao abrigo do n.º 1, artigo 8.º.

Quanto ao facto de o apartamento ter sido arrendado mobilado, a nosso ver, não interfere
com a solução exposta, dado que estamos claramente perante um “rendimento passivo”
que, neste caso, até é fixo e com uma periodicidade mensal, ou seja, uma comum renda
imobiliária (90).

(90) A propósito de uma situação em que estava envolvida a locação de imóveis mobilados (apetrechados)
para serem explorados por terceiros na atividade de alojamento local por parte de sociedades, foi proferida
uma informação vinculativa, em sede de IVA, processo nº 2570 [com despacho do SDG dos Impostos,
substituto-legal do DG, de 2011-10-20 (sob o assunto: Locação de Imóveis - Alojamento local temporário –
“Paredes nuas” - Estabelecimento hoteleiro e estabelecimento de tipo hoteleiro)], na qual, após uma extensa
fundamentação, se veicula o entendimento que neste tipo de locação imobiliária não se aplica a isenção de
IVA prevista na alínea 29), artigo 9.º, CIVA. Duas particularidades importantes para uma melhor
compreensão: i) O CIVA exceciona da isenção aplicável à locação de imóveis as situações em que se
verifique a transferência onerosa da exploração de estabelecimento (bem como as prestações de serviços de
alojamento, exclusão esta aplicável à empresa exploradora do imóvel); ii) Na situação em apreciação na
informação vinculativa, uma parte das rendas era variável em função da faturação (o que talvez lhe retire a
natureza de “rendimento passivo” a que nos referimos no texto). Resta transcrever o último ponto da
informação vinculativa: “60. Quanto à questão relacionada com a confirmação de que "os rendimentos
colocados à disposição dos proprietários dos imóveis, pessoas singulares, a título de pagamento da renda,
configuram, na esfera individual destes, rendimentos da Categoria F em sede de IRS", bem como
relativamente "à respectiva retenção na fonte", tratando-se de matéria que extrapola a área de competências
da Gestão do IVA, deve ser colocada em sede da Área de Gestão do IRS.”.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Acresce que a alínea b), n.º 2, artigo 8.º, estipula que se consideram rendas “As
importâncias relativas ao aluguer de maquinismos e mobiliários instalados no imóvel
locado;”, o que significa que, também por esta via, será de considerar que a totalidade da
quantia recebida (2.500/mês) se refere a rendas enquadráveis na Categoria F.

Acresce, ainda, que Teresa nunca anteriormente explorou o imóvel na atividade de


alojamento local, arrendando-o à empresa em causa nas mesmas condições em que, muito
provavelmente, o arrendaria também a um particular, uma vez que é relativamente
frequente serem arrendados imóveis mobilados.

A tributação dos rendimentos será feita à taxa autónoma de 28%, prevista na alínea e), n.º
1, artigo 72.º (não sendo aplicáveis as reduções de taxa previstas nos n.os 2 a 5, artigo 72.º),
a incidir sobre o rendimento predial auferido depois de efetuadas as deduções previstas no
artigo 41.º.

A sociedade inquilina deverá obrigatoriamente proceder a uma retenção na fonte, à taxa de


25%, nos termos da alínea e), n.º 1, artigo 101.º, a qual terá a natureza de imposto por
conta, sendo dedutível à coleta do IRS (n.º 2, artigo 78.º) que resultar da liquidação a
efetuar pela AT, entidade que, refira-se, detém tal competência (artigo 75.º), com base nos
rendimentos declarados (alínea a), n.º 1, artigo 76.º).

Teresa poderia efetuar dois tipos de opções (mutuamente exclusivas):

✓ Optar pelo englobamento, ao abrigo do n.º 8, artigo 72.º, colocando-se aqui as


mesmas condicionantes que foram referidas a propósito da opção pelo
englobamento na Categoria E;

✓ Optar pela tributação na Categoria B, nos termos anteriormente explanados,


podendo aqui aplicar-se o regime simplificado ou o regime da contabilidade
(englobamento obrigatório).

De referir que, se Teresa explorasse o imóvel diretamente em atividade de alojamento local


(o que implicaria necessariamente a afetação do imóvel à actividade, nos termos descritos
na resolução do caso prático n.º 17 referente à Categoria B), os rendimentos obtidos
deveriam ser qualificados como empresariais, enquanto prestação de serviços de
alojamento (alínea h), n.º 1, artigo 4.º) inserindo-se, assim, na Categoria B.

Nesta hipótese, seria possível, caso a exploração do imóvel fosse feita na modalidade de
apartamento (e não de quarto), optar pelas regras da Categoria F, tendo esta possibilidade

148
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

sido introduzia pela Lei do OE/2017, com o aditamento do n.º 14, artigo 28.º (91), alteração
que, segundo o Ofício-Circulado n.º 20199/2018, de 07-03, da DSIRS (em que se pretende
dar a conhecer as alterações ocorridas em 2018 na declaração modelo 3 e respetivos
anexos), obrigou a que fossem efetuadas “alterações transversais a vários anexos, por
forma a contemplar campos para indicação da opção e demais informação necessária”.

De acordo com o Ofício-circulado n.º 20180/2016, de 19/08, do Gabinete da SDG do IR e


das Relações Internacionais, sancionado por despacho da DG da AT, de 16-06-2015, neste
âmbito do alojamento local as situações possíveis de ocorrer poderão revestir três
tipologias, conforme a imagem que se insere em seguida:

Fonte: Ofício-circulado n.º 20180/2016

Naturalmente que o quadro supra tem que ser atualizado em função do aditamento
posterior do n.º 14, artigo 28.º, nos casos em que a exploração do imóvel seja feita na
modalidade de apartamento ou moradia.

Assim, no 1.º tipo, no 2.º tipo (Titular da exploração) e no 3.º tipo [Cessionário (Titular da
exploração)], quando se trate de alojamento local na modalidade de apartamento ou
moradia, deverá ler-se: “Categoria B, salvo opção categoria F”.

(91) Segundo o n.º 14, artigo 28.º: “Os titulares de rendimentos da exploração de estabelecimentos de
alojamento local na modalidade de moradia ou apartamento podem, a cada ano, optar pela tributação de
acordo com as regras estabelecidas para a categoria F.”.

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Caso prático n.º 27

Manuel, casado em comunhão de bens, faleceu em 2016, tendo deixado como


herdeiros a mulher e três filhos. Na data do óbito Manuel possuía vários prédios
arrendados, tendo as rendas geradas por tais imóveis ascendido a 100.000 no ano de
2019.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Os rendimentos em causa são prediais, uma vez que estamos perante rendas de prédios,
rendimentos que se enquadram no n.º 1, artigo 8.º, estando, por isso, sujeitos a IRS por
força do n.º 1, artigo 1.º.

Tais rendimentos respeitam a um património que faz parte de uma herança indivisa,
presumindo-se, em função dos dados do enunciado, que assim seja dado não ser feita no
enunciado qualquer referência a uma eventual partilha pelos herdeiros dos bens que
integram a herança.

Estamos perante uma massa patrimonial, perfeitamente identificável, que é geradora de


rendimentos, no caso rendimentos prediais, os quais dizem respeito a várias pessoas
(herdeiros), podendo pensar-se, eventualmente, na possibilidade de tributação dos
rendimentos em causa em sede de IRC.

No entanto, uma herança indivisa não é sujeito passivo de IRC, nos termos da alínea b), n.º
1, artigo 2.º, uma vez que os rendimentos são tributados diretamente, em sede de IRS, na
titularidade dos herdeiros.

De facto, os rendimentos respeitantes a bens e direitos que integram uma herança indivisa,
consideram-se, para efeitos de IRS, como obtidos diretamente pelos herdeiros, sendo
tributados na sua esfera pessoal, aplicando-se o disposto no artigo 19.º, uma vez que se
trata de rendimentos obtidos em contitularidade (por pertencerem em comum a várias
pessoas), bem como o disposto na alínea b), n.º 2, artigo 22.º (englobamento nas situações
de contitularidade de rendimentos).

A imputação dos rendimentos deverá ser feita nos termos do referido artigo 19.º, ou seja,
na proporção das quotas dos contitulares, que se presumem iguais quando indeterminadas.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

No nosso caso, a imputação deverá ser feita de acordo com a quota ideal de cada herdeiro
na herança, aplicando-se, uma vez que os herdeiros são apenas o cônjuge e os
descendentes, o disposto no n.º 1, artigo 2139.º, Código Civil.

Sabendo-se que o cônjuge tem direito à meação (1/2 ou 4/8), haverá que repartir a parte
restante por todos os herdeiros, o que significa que a viúva tem uma quota equivalente a
5/8 (62,5%) e cada um dos três filhos 1/8 (12,5%) (92).

Cada um dos herdeiros deverá entregar o Anexo F da declaração modelo 3, com a sua
quota-parte do rendimento, ou seja, a viúva deverá declarar 62.500 e cada um dos filhos
12.500.

De notar que a atual versão do anexo F, contrariamente às versões anteriores, não contém
um campo para indicação da quota-parte de cada herdeiro contitular de rendimentos (nem
para a quota-parte de cada comproprietário, nas situações de compropriedade).

Nas versões anteriores constava no Quadro 4 do Anexo F:

As despesas dedutíveis ao abrigo do artigo 41.º, devidamente faturadas à herança (NIF


7xx.xxx.xxx), deverão ser imputadas a cada um dos herdeiros na mesma proporção e
declaradas no anexo F.

Caso tenham existido retenções na fonte, efetuadas pelos inquilinos, ao abrigo da alínea e),
n.º 1, artigo 101.º, seriam igualmente imputadas a cada um dos herdeiros em função das
quotas ideais e declaradas no mesmo anexo.

A tributação de cada um dos contitulares ocorrerá, a final (em 2019), à taxa autónoma ou
especial de 28% (alínea e), n.º 1, artigo 72.º), sem prejuízo da opção pelo englobamento
(n.º 8, artigo 72.º), a exercer individualmente por cada um, em função da sua situação em
concreto, e sem prejuízo das reduções de taxa previstas nos n.os 2 a 5, artigo 72.º (o

(92) Segundo o n.º 1, artigo 2139.º do Código civil: “A partilha entre o cônjuge e os filhos faz-se por cabeça,
dividindo-se a herança em tantas partes quantos forem os herdeiros: a quota do cônjuge, porém, não pode
ser inferior a uma quarta parte da herança.”

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

enunciado é omisso quanto ao tipo de imóveis geradores dos rendimentos prediais, sendo
que, caso fossem aplicáveis as referidas reduções, seria ainda mais desfavorável o
englobamento).

Uma questão pertinente que pode colocar-se na vida prática, é saber como proceder quanto
apenas um dos contitulares (herdeiros), normalmente o(a) viúvo(a), recebe a totalidade das
rendas.

A este respeito foi muito recentemente, em 05-09-2018, produzida uma informação pela
DSIRS sobre o enquadramento dos rendimentos prediais obtidos por heranças indivisas, na
qual se veicula o entendimento que, verificando-se uma situação, documentalmente
suportada, em que, de entre os herdeiros, só um é titular efetivo dos rendimentos prediais,
ou seja, em que as rendas são pagas ou colocadas à disposição de um só herdeiro, poder-se-
á considerar que o mesmo será o titular efetivo da totalidade de tais rendimentos.

De acordo com a mesma informação, a forma de comprovar o não recebimento de qualquer


montante a título de rendas poderá consistir, por exemplo, num documento assinado por
todos os herdeiros. Neste caso, não se encontrarão os demais herdeiros obrigados ao
cumprimento de qualquer obrigação declarativa, designadamente, à apresentação do anexo
F, declaração modelo 3 de IRS, atendendo a que, ainda que herdeiros, não são titulares
efetivos de um qualquer rendimento predial. (93)

Uma outra questão relevante que pode colocar-se na prática: O recibo de renda eletrónico
deve ser emitido pela herança indivisa, pelo cabeça de casal ou por cada um dos herdeiros?

Tal como referido na resolução do caso prático anterior, a emissão de recibo de renda
eletrónico pressupõe a prévia comunicação eletrónica do contrato de arrendamento
(declaração modelo 2 do IS), onde deverão estar identificados todos os herdeiros e as
respetivas quotas-partes, sendo a responsabilidade pela submissão do contrato, de acordo

(93) O mesmo entendimento é aplicável aos rendimentos prediais obtidos por vários comproprietários (outra
situação de contitularidade de rendimentos) em que só um dos comproprietários é que é locador, auferindo,
assim, na íntegra o valor da renda. Nestes casos deverá o mesmo, na qualidade de declarante, emitir o recibo
de renda eletrónico e apresentar o anexo F, declaração modelo 3, declarando a totalidade das rendas. Em
ambos os casos (heranças indivisas e compropriedade) os rendimentos prediais são imputados aos titulares
efetivos de tais rendimentos, o que nos parece bem, uma vez que está em consonância com a norma de
incidência, segundo a qual (apenas) se consideram rendimentos prediais as rendas dos prédios pagas ou
colocadas à disposição dos respetivos titulares (n.º 1, artigo 9.º).

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com o Ofício-circulado n.º 20167/2015, de 30-04, do Gabinete da SDG do IR e das


Relações Internacionais (que contém em anexo as FAQ relacionadas com este tema), do
cabeça-de-casal em nome da herança indivisa (FAQ 21).

Nestes casos, o declarante (cabeça de casal) pode emitir o recibo de renda eletrónico (ou
quem ele tenha autorizado na modelo 2 do IS), em nome da herança indivisa, constando no
recibo como locadores os herdeiros que foram identificados na modelo 2 (FAQ 22).

Uma nota final para referir que os Anexos D e I da declaração de rendimentos modelo 3
são também aplicáveis aos rendimentos de heranças indivisas, mas apenas quando esta
produza rendimentos da Categoria B (rendimentos empresariais e profissionais), o que não
sucede no caso em apreço.

Ainda assim, porque estamos a falar de heranças indivisas, deixam-se em seguida algumas
considerações quanto aos referidos anexos:

✓ Anexo D: Deve ser apresentado por cada um dos contitulares de herança indivisa
(herdeiros) que produza rendimentos da Categoria B, declarando aí a sua quota-parte
dos rendimentos; a soma dos valores declarados por cada um dos herdeiros deverá
coincidir com os valores globais declarados no anexo I.

✓ Anexo I: Deve ser presentado pelo administrador da herança indivisa (cabeça de casal)
que produza rendimentos da Categoria B, sendo de apresentação obrigatória sempre que
a declaração modelo 3 integre um anexo B ou C respeitante a herança indivisa; neste
anexo deve constar o NIF do autor da herança, o NIF da herança indivisa e o NIF do
cabeça de casal ou administrador da herança; no Quadro 8 deverá constar a informação
respeitante aos contitulares (herdeiros), conforme a imagem seguinte:

Naturalmente que o cabeça de casal, para além dos anexos D (apresentado enquanto
herdeiro) e I (apresentado enquanto cabeça de casal), deverá também apresentar os anexos
B ou C respeitantes à herança indivisa, consoante o enquadramento no regime simplificado
ou no regime da contabilidade, respetivamente, onde deverão constar todos os dados e
valores respeitantes à atividade da Categoria B no âmbito da herança indivisa.

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A título ilustrativo deixa-se em seguida a imagem do quadro 3-A do anexo B, a qual é


idêntica à do quadro 3-A do anexo C:

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2.5. CATEGORIA G
INCREMENTOS PATRIMONIAIS (MAIS-VALIAS)

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Caso prático n.º 28

Raquel vendeu, em janeiro de 2019, por 150.000 (valor superior ao VPT) a casa onde
habitava, adquirida em 2004 por 80.000 (mais despesas de escritura e de registos no
montante global de 3.000), tendo reinvestido, em setembro de 2019, o montante de
110.000 (valor igual ao VPT) na aquisição da sua nova casa.

Ambas as aquisições foram feitas por Raquel com recurso ao crédito: i) no momento
da venda amortizou o valor em dívida inerente ao empréstimo contraído em 2004 no
montante de 50.000; ii) relativamente à aquisição da nova casa, pediu um novo
empréstimo do montante de 80.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo da mais-valia.

Resolução proposta

O ganho obtido por Raquel com a venda da casa onde habitava é considerado um
rendimento da Categoria G, incrementos patrimoniais (alínea a), n.º 1, artigo 9.º),
concretamente como mais-valias (artigo 10.º), dado estar em causa a alienação onerosa de
direitos reais sobre bens imóveis (alínea a), n.º 1 do artigo 10.º), no caso concreto a
transmissão onerosa do direito de propriedade.

O ganho a tributar é constituído pela diferença entre o valor de realização (artigo 44.º) e o
valor de aquisição (artigo 46.º), nos termos da alínea a), n.º 4, artigo 10.º. No caso em
apreço, como o valor de venda (realização) declarado é superior ao VPT (valor
considerado para efeitos de IMT), será aquele o valor a considerar (n.º 2, artigo 44.º,
interpretado a contrario).

O valor de aquisição será atualizado em função dos coeficientes de desvalorização da


moeda (correção monetária), de acordo com o n.º 1, artigo 50.º, anualmente fixados por
Portaria (Portaria n.º 362/2019) (94), acrescendo-se as despesas e encargos inerentes à
aquisição (alínea a), artigo 51.º), para efeitos de cálculo da mais-valia tributável.

Por conseguinte, nos termos da alínea a), n.º 4, artigo 10.º e artigo 51.º, a mais-valia a
tributar será a seguinte: 150.000 - [(80.000 x 1,22) + 3.000] = 49.400

(94) Portaria n.º 362/2019, de 09-10, aplicável a bens e direitos alienados durante o ano de 2019.

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Dado tratar-se de uma mais-valia inerente à alienação de um imóvel destinado a habitação


própria e permanente, em que há reinvestimento do valor de realização noutro imóvel com
o mesmo destino, no próprio ano, ou seja, dentro do prazo de 36 meses referido na lei, o
ganho poderá ser excluído de tributação ao abrigo da alínea a), n.º 5, artigo 10.º.

Porém, temos a questão dos empréstimos, uma vez que, por um lado, a lei só considera
como reinvestimento válido aquele que é feito sem recurso ao crédito (o valor reinvestido
será o valor de aquisição do imóvel adquirido deduzido do empréstimo contraído para a
sua aquisição), se bem que, por outro lado, a lei também só imponha o reinvestimento do
valor de realização deduzido da amortização do empréstimo contraído para aquisição do
imóvel alienado (o valor a reinvestir será o valor de realização deduzido do empréstimo
contraído para a aquisição do imóvel vendido).

Na determinação do valor de realização a reinvestir deverá ter-se em conta a amortização


do empréstimo contraído em 2004, pelo que apenas terá que ser reinvestido (valor a
reinvestir) o montante de 100.000 (150.000 - 50.000). Por outro lado, pela aquisição da
nova casa, não será considerado reinvestimento fiscalmente relevante a parte em que houve
recurso ao crédito, logo, apenas será considerado reinvestido (valor reinvestido) o
montante de 30.000 (110.000 - 80.000), o que configura uma situação de reinvestimento
parcial, dado que o valor reinvestido é inferior ao valor a reinvestir.

Assim, de acordo com o n.º 7 do artigo 10.º, virá:

✓ Mais-valia = 49.400

✓ Valor a reinvestir = 100.000

✓ Valor reinvestido = 30.000

✓ Proporção do valor de realização reinvestido = 30.000 / 100.000 = 0,3 = 30%


(percentagem de reinvestimento).

✓ Mais-valia excluída de tributação = 49.400 x 30% = 14.820

✓ Mais-valia a tributar = 49.400 - 14.820 = 34.580

Concluindo, como apenas será considerado no cálculo do valor a tributar 50% da mais-
valia, conforme o disposto no n.º 2, artigo 43.º (o qual é aplicável a todas as mais-valias
imobiliárias), o rendimento líquido da Categoria G a englobar ascenderá a 17.290 (34.580
x 50%).

158
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Não existindo retenção na fonte, nem qualquer outro tipo de adiantamento por conta do
imposto devido a final, Raquel deverá preparar-se para pagar em 2019 um valor bastante
considerável a título de IRS, o qual será tanto maior quanto maiores forem os restantes
rendimentos sujeitos a englobamento obrigatório.

Nestes casos, em que está em causa o reinvestimento do valor de realização de imóvel


destinado a habitação própria e permanente, é necessário preencher adequadamente o
Quadro 5-A, o qual tem a seguinte configuração:

Face ao disposto no CIRS, o caso prático estaria resolvido. No entanto, deverá ter-se
presente que o artigo 11.º da Lei n.º 82-E/2014 (Lei da Reforma do IRS) criou um regime
especial aplicável às mais-valias imobiliárias obtidas com a alienação de habitação própria
permanente, de acordo com o qual:

“1 - A exclusão de tributação prevista no n.º 5 do artigo 10.º do Código do IRS é


extensível às situações em que o valor de realização seja aplicado na amortização de
eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel alienado.

2 - Nas situações referidas no número anterior em que o valor de realização seja apenas
parcialmente aplicado na finalidade aí prevista, a exclusão de tributação abrange somente
a parte proporcional dos ganhos correspondentes àquela aplicação.

3 - O regime previsto no n.º 1 não é aplicável se, à data da alienação, o sujeito passivo for
proprietário de outro imóvel habitacional.

4 - O disposto nos números anteriores aplica-se às alienações de imóveis ocorridas nos


anos de 2015 a 2020, em que os contratos de empréstimo tenham sido celebrados até 31
de dezembro de 2014.”.

159
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Apesar de a intenção que presidiu à criação do artigo supra transcrito poder não
corresponder à situação de Raquel (95), a nosso ver, tendo em conta a redação das normas,
e não nos parecendo minimamente admissível efetuar uma interpretação restritiva do
normativo aplicável (96), pois tal significaria estar a comprimir um benefício fiscal
consagrado na lei, o regime aplicar-se-á, salvo melhor opinião, ao caso em apreço.

De facto, apesar de o valor da amortização do empréstimo corresponder a apenas a 1/3 do


valor de realização, apesar de não se vislumbrar, à partida, nenhuma situação de asfixia
financeira, e apesar, também, de Raquel até ter concretizado um verdadeiro reinvestimento
no próprio ano em que realizou a venda (talvez a situação que mais choca com o espírito da
lei, embora no caso de Raquel com recurso ao crédito), a verdade é que se encontram
preenchidas todas as condições que constam expressamente na letra da lei, a saber:

- O valor de realização foi aplicado na amortização do crédito bancário (verificando-se a


condição do n.º 1);

- O facto de a amortização corresponder apenas a 1/3 do valor de realização, não impede a


aplicação do regime, devendo ser aplicada uma regra de proporcionalidade (de acordo com
o n.º 2);

(95) A ratio da norma encontra-se claramente explicitada no Relatório elaborado pela Comissão para a
Reforma do IRS, presidida por Rui Morais, datado de setembro de 2014, intitulado “Projeto da Reforma do
IRS – Uma reforma orientada para a simplificação, a família e a mobilidade social”. Segundo este
documento “Tendo presente a atual conjuntura em que um número significativo de contribuintes, em
situação de estrangulamento financeiro, se vê obrigado a proceder à alienação da sua habitação própria e
permanente para solver compromissos financeiros associados aos empréstimos contraídos com a respetiva
aquisição e em que, consequentemente, o produto das venda é exclusivamente utilizado para esse efeito (não
havendo, pois, aquisição de nova habitação e, portanto, reinvestimento), a Comissão entende ser de propor o
alargamento, com caráter temporário, por um período de cinco anos, da exclusão de tributação prevista no
n.º 5 do artigo 10.º, a qual passará a abranger também os casos em que o valor de realização seja utilizado
para o efeito antes mencionado, sem exigência da condição de reinvestimento. Para obviar à ocorrência de
comportamento abusivos, circunscreve-se a aplicação do regime ora proposto aos contratos de empréstimo
que tenham sido celebrados até 31 de dezembro de 2014.”.
(96) Segundo Baptista Machado (1982), “Introdução ao direito e ao discurso legitimador”, deve existir uma
interpretação restritiva quando o intérprete conclui que o legislador adotou um texto que atraiçoa o seu
pensamento, na medida em que diz mais do que aquilo que se pretendia a dizer. Assim, o intérprete não deve
deixar-se arrastar pelo alcance aparente do texto, devendo restringi-lo de forma a torná-lo compatível com o
pensamento legislativo (ratio), podendo utilizar-se o seguinte argumento: “Lá onde termina a razão de ser da
lei termina o seu alcance”.

160
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

- Nada nos leva a supor que Raquel fosse proprietária, à data da alienação, de outro imóvel
habitacional (condição do n.º 3);

- A alienação ocorreu no período mediado entre os anos de 2015 e 2020 (1.ª condição do
n.º 4);

- O crédito amortizado foi contraído antes de 2014 (2.ª condição do n.º 4).

Transpondo para o caso em apreço, uma vez que o valor de realização ascendeu a 150.000
e a amortização do empréstimo contraído para a aquisição do imóvel alienado a 50.000,
estamos perante uma situação de “reinvestimento” parcial, passando a demonstrar-se o
valor da mais-valia a tributar:

✓ Mais-valia = 49.400

✓ Valor a reinvestir = 150.000

✓ Valor “reinvestido” = 50.000

✓ Proporção do valor de realização “reinvestido” = 50.000 / 150.000 = 0,3333 =


33,33% (percentagem de “reinvestimento”)

✓ Mais-valia excluída de tributação = 49.400 x 33,33% = 16.465,02

✓ Mais-valia a tributar = 49.400 - 16.465,02 = 32.934,98

Tendo em conta que apenas será tributada 50% da mais-valia (n.º 2, artigo 43.º), o
rendimento líquido da Categoria G a englobar será de 16.467,49 (32.934,98 x 50%).

Conclui-se que é mais favorável Raquel utilizar o mecanismo temporário previsto no artigo
11.º da Lei n.º 82-E/2014, uma vez que o valor a englobar é menor 822,51 (17.290,00 -
16.467,49).

Em termos declarativos deveria ser preenchido o Quadro 5-B do Anexo G.

161
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 29

Hugo esteve desempregado durante vários meses, recebendo atualmente um salário


que corresponde a menos de metade daquele que auferia em 2014. Por tais motivos
deixou de pagar várias prestações do empréstimo do apartamento onde vivia, tendo
optado por vendê-lo e ir morar para casa dos pais.

Em 2019 vendeu por 150.000 o referido apartamento, adquirido em 2012 por 120.000,
não tendo qualquer intenção de reinvestir o produto da venda (pagou 4.500 a uma
imobiliária que intermediou a venda).

Quase todo o valor de realização serviu para amortizar a dívida ao banco: 115.000
para amortizar o financiamento da aquisição e 30.000 para amortizar um empréstimo
contraído na mesma altura para obras.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo da mais-valia.

Resolução proposta

O ganho gerado pela venda da habitação própria e permanente, constitui uma mais-valia,
enquadrável na alínea a), n.º 1, artigo 10.º, sujeita a IRS ao abrigo do n.º 1, artigo 1.º,
conjugado com a alínea a), n.º 1, artigo 9.º.

Tal mais-valia corresponderá à diferença entre o valor de realização e o valor de


adquisição, nos termos da alínea a), n.º 4, artigo 10.º.

O valor de aquisição deverá ser atualizado com os coeficientes de desvalorização da


moeda, conforme o n.º 1, artigo 50.º, fixados pela Portaria n.º 362/2019, de 09-10.

Por outro lado, deverá ser considerada a comissão paga à imobiliária (pressupondo que está
documentada), no valor de 4.500, ao abrigo da alínea a), artigo 51.º, por se tratar de
despesa necessária inerente à alienação (97).

(97) Segundo a informação vinculativa proferida no processo n.º 12/2008, com despacho concordante do
Substituto Legal do DG, de 12-08, as despesas indissociáveis da operação de venda de um imóvel que o
alienante comprovadamente suportou para a sua realização, deverão, em princípio, ser tidas em conta na
determinação das mais-valias, desde que se demonstre de forma inequívoca a conexão do montante pago ao
mediador imobiliário com a transação concreta que originou a mais-valia tributável.

162
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Assim, a mais-valia a tributar será de: 150.000 - [(120.000 x 1,03) + 4.500) = 21.900.

Uma vez que Hugo preenche todas as condições previstas no artigo 11.º da Lei n.º 82-
E/2014 (Lei da Reforma do IRS) que criou um regime especial aplicável às mais-valias
imobiliárias obtidas com a alienação de habitação própria permanente, que manda aplicar o
regime previsto no n.º 5, artigo 10.º (reinvestimento) nas situações em que há amortização
do financiamento contraído para a aquisição do imóvel alienado, resulta o seguinte:

✓ Mais-valia = 21.900

✓ Valor a reinvestir = 150.000

✓ Valor “reinvestido” = 115.000

✓ Proporção do valor de realização “reinvestido” = 115.000 / 150.000 = 0,7667 =


76,67% (percentagem de “reinvestimento”)

✓ Mais-valia excluída de tributação = 21.900 x 76,67% = 16.790,73

✓ Mais-valia a tributar = 21.900 - 16.790,73 = 5.109,27

Quanto ao valor da amortização do empréstimo para obras, não será considerado como
“reinvestimento” por não se tratar “empréstimo contraído para a aquisição do imóvel
alienado", mesmo sabendo-se que foi contraído na mesma altura do empréstimo para a
aquisição do imóvel, mesmo tendo em conta que, muito provavelmente, existiria uma
hipoteca do imóvel como garantia deste financiamento e mesmo sabendo-se que terá sido
contraído alegadamente para obras.

Uma última nota, extensível aos restantes casos práticos deste capítulo, para referir que o
facto tributário, em sede de mais-valias, nos termos do disposto no n.º 3, artigo 10.º, ocorre
no momento da prática dos atos previstos no n.º 1 do mesmo artigo, correspondendo em
princípio à data dos contratos de compra e venda (de imóveis, de ações, de quotas, etc.),
independentemente da data do pagamento ou da colocação à disposição.

No nosso caso, tendo a escritura de venda sido celebrada em 2019, será obviamente neste
ano que deverão ser declarados e tributados os rendimentos.

163
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 30

Fátima vendeu um apartamento de férias pelo valor de 100.000 (VPT de 70.000), o


qual havia sido adquirido em 1986 pelo valor de 20.000 (VPT 3.000).

Pedido: Enquadramento em sede IRS e cálculo da mais-valia.

Resolução proposta

Os ganhos obtidos com a alienação de imóveis (mais-valias imobiliárias) constituem


rendimentos a ser tributados na categoria G, conforme decorre do artigo 9.º, n.º 1, alínea a),
conjugado com o artigo 10.º, n.º 1, alínea a).

Não se tratando de habitação própria e permanente, não será aplicável o benefício contante
do n.º 5, artigo 10.º, mesmo que, por hipótese, com o produto da venda Fátima viesse a
adquirir um imóvel com esse destino, uma vez que é necessário que, quer o imóvel
alienado, quer o imóvel adquirido, tenham como destino a habitação própria e permanente
do sujeito passivo.

O valor a tributar é determinado de acordo com as regras constantes da alínea a), n.º 4,
artigo 10.º, e dos artigos 43.º e seguintes, resultando o seguinte: 100.000 - [(20.000 x 3,46)
+ 0) = 30.800 (mais-valia calculada).

De referir que os VPT à data da compra e da venda não interferem por serem inferiores aos
valores das escrituras, não se aplicando o disposto no n.º 2, artigo 44.º.

Em condições normais seria tributado metade deste valor (n.º 2, artigo 43.º), ou seja,
15.400 (mais-valia a tributar), o qual seria obrigatoriamente englobado aos restantes
rendimentos (n.º 1, artigo 22.º).

Contudo, no caso em apreço, verifica-se que o imóvel alienado foi adquirido anteriormente
à entrada em vigor do CIRS (01/01/1989), pelo que, o ganho obtido não será tributado em
sede deste imposto (não sujeição), conforme determina o n.º 1, artigo 5.º, DL n.º 442-A/88
(diploma legal que aprovou o CIRS) (98).

(98) No caso de mais-valias relacionadas com bens e direitos adquiridos antes de 1989, apenas seriam
tributadas em IRS se já fossem tributadas em sede do extinto Imposto de Mais-Valias, o que não é o caso da
mais-valia constante do caso prático e da generalidade das mais-valias, porquanto esse imposto,

164
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Não obstante, deverá ser declarada a operação realizada (venda do imóvel) no Anexo G1
(mais-valias não tributadas), devendo colocar-se como valor de realização 100.000 e como
valor de aquisição 20.000 (bem como deverá ser inscrita a data da compra), para além,
obviamente, dos dados respeitantes ao imóvel vendido (gerador das mais-valias).

Deixa-se em seguida uma imagem do quadro 5 do Anexo G1 da declaração modelo 3:

De acordo com as instruções do anexo G1, o mesmo destina-se a declarar: (99)

i) A alienação onerosa de partes sociais (quotas e ações) e outros valores mobiliários


cuja titularidade o alienante tenha adquirido antes de 1 de janeiro de 1989;

ii) A alienação onerosa de imóveis não sujeita a tributação, nos termos do n.º 4 do
artigo 4.º e do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88.

relativamente às mais-valias agora tributadas na Categoria G de IRS, apenas tributava as mais-valias obtidas
em terrenos para construção.
(99) Segundo as instruções do Anexo G1, o mesmo destina-se também a declarar a “A alienação de imóveis a
fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH) e a sociedades de investimento
imobiliário para arrendamento habitacional (SIIAH) abrangidos pelo regime especial aprovado pelo artigo
102.º e seguintes da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro.”.

165
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 31

Maria auferiu os seguintes rendimentos em 2019:

a) Indemnização, no montante de 10.000, paga por uma seguradora ao abrigo de um


contrato de seguro, devido a um acidente de viação que lhe provocou danos corporais.

b) Ganho derivado da venda, por 15.000, de um colar em ouro com pedras preciosas
que lhe havia sido doado pela sua avó há mais de 40 anos

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Relativamente à indemnização paga a Helena pela seguradora, tal montante não será
tributado face ao disposto no n.º 1, artigo 12.º, norma que procede a uma “delimitação
negativa da incidência”, ou seja, contempla situações não sujeitas a IRS, verificando-se
que a situação descrita fica abrangida pela alínea b) (indemnização por lesão corporal paga
por companhia de seguros).

Na falta desta norma, a indemnização em causa estaria sujeita a IRS, enquanto incremento
patrimonial, de acordo com a alínea b), n.º 1, artigo 9.º, uma vez que se trata de uma
indemnização por danos não patrimoniais.

Quanto à venda do colar por 15.000, mesmo tendo originado um forte ganho (uma vez que
foi adquirida a título gratuito), não terá quaisquer implicações em sede de IRS, dado que só
são tributadas as mais-valias que constam taxativamente no n.º 1, artigo 10.º, o que não é o
caso da presente.

Acresce que não há qualquer intenção comercial, digamos assim (falta o animus
negociandi), desde logo porque é evidente que o colar não foi adquirido por Maria para
revenda, afastando-se, assim, igualmente a inclusão na Categoria B, mesmo enquanto ato
isolado.

Conclui-se que a mais-valia obtida por Maria não se encontra sujeita a IRS, não carecendo
de ser declarada à AT.

166
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 32

João vendeu em 2019, por 500.000, um terreno que adquiriu a título gratuito, através
de escritura de partilha celebrada em 1992, na sequência da morte do seu pai, em
1985, e da sua mãe, em 1987 (o VPT ao tempo era de 2.000). Aos seus três irmãos
foram adjudicados outros bens, de valor superior, tendo na escritura de partilha
ficado consignado que João terá recebido tornas.

O terreno em causa, desde que foi adquirido pelos seus pais, em 1971, sempre foi um
terreno rústico, mantendo-se assim até à atualidade, pese embora, desde 1995, por
força da aprovação do PDM, o mesmo tenha passado a ter aptidão construtiva,
constando, aliás, na escritura de venda celebrada em 2018 que o terreno em causa se
destina a construção urbana.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo da mais-valia.

Resolução proposta

A transmissão realizada por João em 2019 configura um facto tributário previsto na alínea
a), n.º 1, artigo 10.º, uma vez que está em causa a alienação do direito de propriedade sobre
um bem imóvel.

Neste caso, importa começar por averiguar se é aplicável o disposto no n.º 1, artigo 5.º, DL
n.º 442-A/88 (diploma que aprovou o CIRS), segundo o qual:

“Os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias, criado pelo código
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 373, de 9 de Junho de 1965, bem como os derivados da
alienação a título oneroso de prédios rústicos afectos ao exercício de uma actividade
agrícola ou da afectação destes a uma actividade comercial ou industrial, exercida pelo
respectivo proprietário, só ficam sujeitos ao IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que
respeitam tiver sido efectuada depois da entrada em vigor deste Código.”.

De acordo com o disposto nesta norma, caso os bens alienados, na vigência do CIRS,
tenham sido adquiridos antes de 01-01-1989 (data da entrada em vigor do CIRS), os
respetivos ganhos apenas estarão sujeitos a este imposto caso já se encontrassem sujeitos
ao extinto imposto de mais-valias, o que não é o caso dos prédios rústicos (e urbanos), mas
apenas dos terrenos para construção.

167
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Trata-se de uma norma que restringe o âmbito de aplicação da alínea a), n.º 1, artigo 10.º,
percebendo-se perfeitamente o alcance da mesma: se os bens foram adquiridos num
momento em que os ganhos com a sua ulterior alienação não eram tributados (antes de
1989), então, caso os mesmos venham a gerar ganhos num momento em que os mesmos já
são tributados (depois de 1989), continuarão a não estar sujeitos a imposto (esta norma,
aplica-se, aos prédios rústicos e urbanos, mas não se aplica aos terrenos para construção,
uma vez que estavam sujeitos ao Imposto de Mais-Valias, se adquiridos depois de junho de
1965).

Por outras palavras, em face do alargamento da base de tributação do IRS, na componente


de mais-valias, a ganhos não sujeitos ao anterior Imposto de Mais-Valias, consagrou o
legislador, no n.º 1, artigo 5.º, DL n.º 442-A/88, um regime transitório relativo à Categoria
G, nos termos da qual os ganhos que não eram sujeitos ao antigo imposto, só ficam sujeitos
ao novo imposto se a aquisição dos bens a que respeitam tiver sido efetuada depois da
entrada em vigor do IRS.

Porém, no caso em apreço temos duas questões prévias que importa dirimir:

- Qual a data de aquisição do terreno, quando se sabe que os pais faleceram em 1985 e em
1987, mas a escritura de partilha apenas foi celebrada apenas em 1992?

- Será que o imóvel em causa cai na previsão da norma, sabendo-se que foi adquirido pelos
pais como rústico, foi herdado por João como rústico, mas foi vendido por este tendo como
destino a construção urbana?

Começando pela primeira questão, a resposta certa é que a data de aquisição da


propriedade ocorreu em parte em 1985, com a morte do pai, e a parte restante em 1987
com a morte da mãe. Na verdade, a data que releva para este efeito, não é a data da
escritura de partilha, mas a data da abertura das heranças, que corresponde à data dos
óbitos dos pais.

Note-se que na escritura de partilha foi adjudicado a João o presente bem imóvel, o qual
teria um valor inferior ao valor correspondente à sua quota hereditária no total da herança,
tanto é que recebeu tornas dos irmãos, significando que João nada adquiriu em 1992.

Por conseguinte, a data de aquisição mais recente a considerar para efeitos de mais-valias
será 1987, caindo a situação em apreço, por esta via, no n.º 1, artigo 5.º, DL n.º 442-A/88.

168
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Quanto à segunda questão, relacionada com a qualificação do terreno como rústico ou


como terreno para construção, para efeitos de mais-valias, o nosso entendimento, apoiado
na jurisprudência totalmente consolidada produzida a este respeito, é que o que releva é a
sua qualificação no momento da aquisição ou, pensamos que de forma mais apropriada, a
sua qualificação na data de entrada em vigor do CIRS.

De facto, para aferir se a alienação está sujeita a tributação em sede de IRS releva a
qualidade que o bem detinha no momento da entrada em vigor do CIRS e não à data em
que esse bem foi alienado (Acórdão do STA, proferido em 27-01-2010, no processo n.º
0969/09), ou seja, o que importa aferir é se, em 01-01-1989, o terreno em causa se
encontrava em zonas urbanizadas, estava compreendido em planos de urbanização já
aprovados ou havia sido assim declarado no título aquisitivo.

O que releva para efeitos de tributação é saber se o terreno adquirido já era um terreno para
construção para efeitos de Imposto de Mais-Valias à data em que o respetivo Código
cessou a sua vigência e não se o terreno só adquire as correspondentes potencialidades
construtivas na vigência do Código do IRS (Acórdão do TCA Norte, proferido em 15-12-
2011, no processo n.º 00224/07).

Ora, face aos dados do enunciado é indubitável que em 1971, em 1985, em 1987 e também
em 01-01-1989, o terreno em causa era um terreno rústico, sendo irrelevante para efeitos
de aplicação da norma de exclusão tributária o facto de o mesmo ter passado a ter aptidão
construtiva num momento em que já vigorava o CIRS, fruto da aprovação do PDM local,
bem como o facto de ter sido declarado na escritura que o mesmo se destina a construção.

Assim sendo, a mais-valia obtida com a venda do terreno em causa, não obstante o seu
elevado valor (tendo em conta a grandeza do valor de realização e o reduzido valor de
aquisição), não está sujeita a IRS, ao abrigo do n.º 1, artigo 5.º, DL n.º 442-A/88.

Não obstante, deverá apresentado o Anexo G1 (mais valias não sujeitas), cujo
preenchimento será feito conforme se indica:

Nota: A percentagem de 9,375%, equivalente a 6/64, correspondente à quota ideal de João por morte do pai
(viúva – 40/64; restantes três irmãos – 6/64 cada um), nos termos do n.º 1, artigo 2139.º, Código Civil.

169
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 33

Carla vendeu em 2019, por 90.000, um imóvel cujo VPT à data da venda ascendia a
60.000. Tal imóvel foi adquirido (propriedade plena) através de escritura de partilha,
celebrada em 2017, tendo nesse âmbito pago tornas aos seus dois irmãos, no valor de
20.000 a cada um.

O imóvel em causa foi adquirido pelos pais de Carla, casados em comunhão de


adquiridos, tendo o pai falecido em 2010 e a mãe em 2015. O VPT do prédio era de
20.000 em 2010, de 58.000 em 2015 e de 60.000 em 2017.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo da mais-valia.

Resolução proposta

De harmonia com o disposto no n.º 1, artigo 1.º, o IRS incide sobre os rendimentos das
várias categorias, incluindo, portanto, os rendimentos da Categoria G, tipificados no artigo
9.º, nomeadamente sobre as mais-valias previstas na alínea a), n.º 1.

No caso em apreço, estamos perante a alienação onerosa de direitos reais sobre um bem
imóvel, mais concretamente a alienação onerosa de um direito real integral que consiste no
direito de propriedade, situação prevista na alínea), n.º 1, artigo 10.º (100).

A mais-valia em causa será dada pela diferença entre o valor de realização e o valor de
aquisição, nos termos do disposto na alínea a), n.º 4, artigo 10.º, sendo certo que não se
aplica a exclusão de tributação prevista no n.º 5, artigo 10.º por não haver qualquer
indicação de que o imóvel alienado constituía a habitação própria e permanente de Carla.

Quanto ao valor de realização ascenderá a 90.000, correspondente ao valor da


contraprestação obtida do comprador (valor que consta na escritura), nos termos da alínea
f), n.º 1, artigo 44.º, não sendo aplicável o disposto no n.º 2, uma vez que o referido valor é
superior ao VPT.

Relativamente ao valor de aquisição (parte), aplicar-se-á o disposto no artigo 45.º, uma vez
que uma parte do imóvel vendido foi adquirida a título gratuito, por morte do pai e depois

(100) A transmissão deste tipo de direitos é efetuada por via de um contrato de compra e venda (artigo 1316.º,
Código Civil), com a particularidade de o mesmo só ser válido se for celebrado por escritura pública ou por
documento particular autenticado (artigo 875.º, Código Civil).

170
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

outra parte por morte da mãe, devendo considerar-se como valor de aquisição aquele que
tenha sido considerado para efeitos de liquidação do IS, que no caso são os VPT constantes
na matriz predial à data dos óbitos do pai e da mãe.

Sucede que Carla adquiriu através de escritura de partilha, aos dois irmãos, a parte que lhes
cabia na herança, tendo procedido ao pagamento de tornas, donde, uma parte da aquisição
foi efetuada a título oneroso, aplicando-se o disposto no n.º 1, artigo 46.º, que estipula que
deveremos considerar o valor para efeitos de IMT, ou seja, o VPT na data da partilha.

Para efeitos de cálculo, deverá aplicar-se o disposto no n.º 1, artigo 2139.º, Código Civil,
relativamente a 2010 (uma vez que os herdeiros são o cônjuge e descendentes), sendo
aplicável o n.º 2 do mesmo artigo em 2015 (dado que os herdeiros são apenas os
descendentes).

Ora, em 2010, data do óbito do pai, Carla adquiriu a título gratuito uma parte do imóvel
correspondente à sua quota ideal, ou seja, 1/8 (12,5%), tendo os dois irmãos adquirido duas
partes iguais à de Carla e a mãe os restantes 5/8 (62,5%). Daqui resulta que 12,5% do
prédio foi adquirido a título gratuito em 2015 por 2.500 (20.000 x 12,5%).

Em 2015, faleceu a mãe de Carla, o que significa que a parte respeitante à mãe (62.5%),
transmitiu-se em partes iguais para os três irmãos (que já dispunham de 12,5% cada um),
passando cada um deles a deter 1/3 do prédio (33,33%). Assim, Carla adquiriu a título
gratuito, em 2015, por morte da mãe, uma percentagem de 20,83% do prédio (33,33% -
12,5%), que aplicada ao valor do VPT nesta data perfaz o montante de 12.081,40 (58.000 x
20,83%).

Em 2017, é celebrada escritura de partilha, tendo Carla adquirido a totalidade do prédio,


pagando tornas aos irmãos, de 20.000 a cada um, valor que corresponde precisamente a 1/3
do VPT nesta data (60.000).

Tal pagamento de tornas implica forçosamente que a aquisição dos restantes 2/3 por parte
de Carla tenha de ser considerada, para efeitos fiscais, como efetuada a título oneroso,
aplicando-se o disposto no n.º 1, artigo 46.º, logo, a quantia de 40.000 constituirá também
valor de aquisição para efeitos de cálculo das mais-valias, a apurar em 2019, inerentes à
venda do imóvel em causa.

171
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Os vários valores de aquisição, em 2010 (gratuita), em 2015 (gratuita) e em 2017


(onerosa), deverão ser atualizados através da aplicação dos coeficientes de desvalorização
da moeda, conforme dispõe o n.º 1, artigo 50.º, fixados pela Portaria n.º 362/2019.

Assim, a mais-valia será calculada da seguinte forma: 90.000 - [(2.500 x 1,10) +


(12.081,40 x 1,03) + (40.000 x 1,01)] = 34.406,16. Este valor será considerado para efeitos
de tributação em apenas 50%, donde o valor a englobar aos restantes rendimentos
ascenderá a 17.203,08.

No Quadro 4 do Anexo G da declaração modelo 3, Carla deverá separar em três linhas


diferentes os valores, uma vez que adquiriu em três momentos diferentes (2010, 2015 e
2017), o que implicará repartir também (proporcionalmente) por três linhas o valor de
realização (os coeficientes de correção monetária serão considerados automaticamente na
liquidação a efetuar pela AT), conforme se indica:

Uma nota final para referir que os dois irmãos deveriam ter apresentado o Anexo G no ano
de 2017, uma vez que, se Carla adquiriu através de partilha os 2/3 do prédio nesse ano,
então, forçosamente, terá de considerar-se que os irmãos terão realizado uma venda
(transmissão onerosa) das suas quotas-partes, negócio jurídico enquadrável na alínea a), n.º
1, artigo 10.º, logo, tais transmissões estão sujeitas a IRS.

Os valores de aquisição a considerar em cada um dos Anexos G apresentados pelos irmãos


de Carla, serão idênticos aos valores considerados em 2010 e 2015 para a Carla, ou seja,
2.500 e 12.081,40, respetivamente, e o valor de realização a considerar em 2017 será de
20.000 (porque corresponde ao VPT do imóvel neste ano). O ganho apurado seria tributado
em apenas 50%, acrescendo esta parte aos restantes rendimentos englobados auferidos
pelos mesmos.

172
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 34

Adolfo vendeu durante o ano de 2019 os seguintes valores mobiliários:

a) 10.000 ações da sociedade A por 100.000; adquiriu as 5.000 ações em 2012 por
25.000 e mais 10.000 ações em 2015 por 60.000;

b) 5.000 ações da sociedade B por 60.000; adquiriu 2.500 ações em 2010 por 25.000 e
mais 2.500 ações em 2012 por incorporação de reservas;

c) 100.000 ações da sociedade C, por 75.000; adquiriu as 100.000 ações em 2008 por
100.000;

d) 1 quota da sociedade D, por 80.000; adquiriu a quota em 1985 por 2.000;

e) 1.000 ações da sociedade E, por 10.000; as ações resultaram da transformação de


sociedade por quotas em sociedade anónima, em 2016, tendo as quotas em causa, que
deram lugar a 2.000 ações, sido adquiridas em 2014 por 10.000.

As sociedades C, D e E são qualificáveis como pequenas empresas, enquanto as


sociedades A e B são médias empresas

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo da mais-valia.

Resolução proposta

Os ganhos gerados com a venda de ações e de quotas enquadram-se na alínea b), n.º 1,
artigo 10.º, constituindo mais-valias, rendimentos que se integram na Categoria G (alínea
a), n.º 1, artigo 9.º) e que estão sujeitos a IRS nos termos do n.º 1, artigo 1.º.

As mais-valias em causa serão dadas pela diferença entre o valor de realização e o valor de
aquisição, ao abrigo da alínea a), n.º 4, artigo 10.º.

Relativamente aos valores de realização a considerar para efeitos de cálculo deverão


corresponder aos valores das contraprestações recebidas pela venda de cada conjunto (lote)
de partes de capital (na resolução serão considerados os valores de venda indicados no
enunciado), nos termos da alínea f), n.º 1, artigo 44.º.

No que toca ao valor de aquisição, deverão considerar-se os custos documentalmente


comprovados, ou seja, os vários valores de aquisição constantes do enunciado

173
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

(pressupondo-se que os mesmos estão comprovados), aplicando-se a alínea b), artigo 48.º,
uma vez que nada nos indica de que se trate de empresas cotadas em bolsa.

Tratando-se de mais-valias geradas com a venda de partes sociais, o valor de aquisição


deverá ser atualizado com os coeficientes de desvalorização da moeda, conforme o n.º 1,
artigo 50.º, fixados pela Portaria n.º 362/2019, de 09-10.

De referir que nas mais-valias respeitantes à venda de ações e quotas representativas do


capital de micro ou pequenas empresas (caso das sociedades C, D e E), nos termos do DL
n.º 372/2007 (101), a tributação, caso exista, incidirá apenas sobre metade do valor da mais-
valia apurada, conforme estatui o n.º 3, artigo 43.º (conjugado com o n.º 4 do mesmo
artigo) (102).

Importa mencionar, também, que o facto tributário, em sede de mais-valias de partes


sociais, tal como nas mais-valias imobiliárias, nos termos do disposto no n.º 3, artigo 10.º,
ocorre no momento da prática dos atos previstos no n.º 1 do mesmo artigo,
correspondendo, no caso em apreço, à data dos contratos de compra e venda de ações e de
quotas, presume-se que celebrados em 2019, independentemente do momento em que os
adquirentes paguem o respetivo preço.

Assim, tendo em conta os dados do enunciado, virá:

(101) Pequenas empresas, nos termos do Anexo do referido DL, são aquelas que empregam menos de 50
trabalhadores e com um volume de negócios anual ou balanço total anual inferior a 10 milhões de euros.
Médias empresas são aquelas que empregam menos de 250 trabalhadores e com um volume de negócios
anual inferior a 50 milhões de euros ou balanço total anual inferior a 43 milhões de euros.
(102) Quanto ao documento comprovativo de tal estatuto (certificação emitida pelo IAPMEI), para efeitos de
comprovação dos valores inscritos no Anexo G da declaração modelo 3, é recomendável que os contribuintes
disponham do mesmo, dado que, embora tal comprovação não seja obrigatória, uma vez que a lei não impõe
tal exigência, a declaração fará presumir a verificação dos requisitos para a qualificação como micro ou
pequena empresa (a declaração constituirá, assim, prova bastante da verificação dos requisitos para a
aplicação do benefício fiscal). A própria AT reconhece não ser exigível tal documento dado que, como é bom
de ver, a mesma dispõe de informação suficiente para confirmar tal estatuto (IES/DAICF/Anexo A),
conforme Despacho do DG da AT, de 24-04-2014, proferido no processo n.º 1159/14, de 01-04-2014, da
DSIRS, significando que não é admissível a AT desconsiderar o benefício fiscal simplesmente porque não se
possui o documento de Certificação emitido com data anterior à da transmissão das ações/quotas, como
sucedeu por várias vezes no passado.

174
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Notas relevantes relativas a cada uma das operações:

a) Considerou-se que das 10.000 ações vendidas, 5.000 foram adquiridas em 2012 e as
restantes 5.000 em 2015 (permanecendo 5.000 adquiridas em 2015 em carteira), ou seja,
aplicou-se a regra do FIFO (first in first out), prevista na alínea d), n.º 6, artigo 43.º,
segundo a qual, tratando-se de valores mobiliários idênticos, os alienados são os
adquiridos há mais tempo.

b) O mais relevante a assinalar é que a data de aquisição das ações adquiridas por
incorporação de reservas é a data das ações que geraram o direito a recebê-las (ações
originárias), ou seja, a data de aquisição da totalidade das ações é 2010 (e não 2010 e
2012), de acordo com o disposto na alínea a), n.º 6, artigo 43.º; Quanto ao valor de
aquisição da totalidade das ações corresponde ao valor de aquisição das ações
originárias, único valor efetivamente despendido por Adolfo (103).

c) A primeira nota relevante, tendo ocorrido uma menos-valia, é chamar à colação o


disposto no n.º 1, artigo 43.º, que nos diz que o valor tributável é o saldo apurado entre
as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, daí que as mesmas estejam a
ser consideradas (a deduzir) no cálculo da “mais-valia tributável”; Acresce referir,
quanto ao valor da menos-valia, que a mesma é considerada em apenas 50% do seu
valor por se tratar de ações de uma pequena empresa, nos termos do DL n.º 372/2007,

(103) Caso contrário, ou seja, se se considerasse como valor de aquisição o valor nominal das ações atribuídas
em 2012 por incorporação de reservas, estaríamos a deixar de tributar em sede de IRS ganhos com origem
em lucros retidos, quando os lucros distribuídos são tributados, embora em apenas metade do seu valor, nos
termos do artigo 40.º-A, caso haja opção pelo englobamento. De notar que a referida exclusão parcial
(atenuação da dupla tributação económica) aplica-se aos lucros distribuídos aos sócios por todas as empresas,
independentemente da sua dimensão, enquanto a exclusão parcial prevista no n.º 3, artigo 43.º, se aplica
apenas a mais-valias geradas com a alienação de partes de capital de micro ou pequenas empresas, o que
configura um tratamento discrepante. Ainda assim, a taxa aplicável é idêntica, de 28%, embora seja
liberatória no caso de dividendos (alínea a), n.º 1, artigo 71.º) e especial no caso de mais-valias (alínea c), n.º
1, artigo 72.º).

175
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

tal como prescreve o n.º 3, artigo 43.º, daí a consideração do valor de 17.500 e não de
35.000 (totalidade da menos-valia fiscal).

d) Esta mais-valia faz parte da “mais-valia bruta”, mas não faz parte da “mais-valia
tributável”, uma vez que a mesma se encontra excluída de tributação por força do n.º 1,
artigo 5.º, DL n.º 442-A/88, dado que a aquisição ocorreu anteriormente à data da
entrada em vigor do CIRS (01-01-1989), num momento em que estes ganhos não eram
tributados em sede do extinto Imposto de Mais-valias.

e) i) A principal particularidade desta operação prende-se com o facto de Adolfo ter


comprado quotas em 2014 e vendido ações em 2019, em resultado da transformação da
sociedade detida, de sociedade por quotas em sociedade anónima, aplicando-se o
disposto na alínea b), n.º 6, artigo 43.º, que estipula que a data de aquisição das ações é
a data de aquisição das quotas que lhes deram origem; ii) Outra nota relevante prende-se
com o facto de as quotas adquiridas pelo valor de 10.000, terem dado origem a 2.000
ações, logo, se estão a ser vendidas apenas metade das ações, o respetivo valor de
aquisição corresponderá a necessariamente metade do valor de aquisição das quotas
(5.000); iii) Finalmente, tratando-se de mais-valias de ações de uma empresa qualificada
como pequena, a mesma é considerada em apenas 50% do seu valor, tal como dispõe o
n.º 3, artigo 43.º, daí a consideração do valor de 2.425 e não de 4.850 (totalidade da
mais-valia fiscal), para efeitos de apuramento da mais-valia tributável.

Quanto ao modo de apuramento da mais-valia tributável seguido na resolução, importa


aludir à Informação Vinculativa proferida no processo n.º 3339/2017, com Despacho de
04-12-2017, da SDG do IR, segundo a qual:

“De notar que o saldo das mais ou menos valias é determinado, numa primeira fase,
operação a operação - apurando-se todas as condições que podem influir, positiva ou
negativamente na operação em causa -, e, numa segunda fase, pela junção de todos os
saldos das operações geradoras de rendimentos de mais-valias mobiliários para efeitos de
apuramento do montante que será sujeito a tributação (seja ela autónoma ou determinada
pela aplicação das taxas previstas no art.º 68º do CIRS).

Assim, na situação identificada pelo Requerente, nos termos do artigo 43º do Código do
IRS, o saldo final entre as mais-valias e as menos-valias é o resultante do somatório entre
50% da mais-valia relativa à participação social numa micro entidade com 100% da
mais-valia decorrente da alienação das demais participações.”

176
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

A mais-valia sujeita a IRS, no montante de 60.775, será tributada à taxa especial


(autónoma) de 28%, prevista na alínea c), n.º 1, artigo 72.º, estando prevista a possibilidade
de opção pelo englobamento no n.º 8 do mesmo artigo (faculdade prevista também na
alínea b), n.º 3, artigo 22.º).

Face ao valor dos rendimentos, por si só, e independentemente da existência de outros


rendimentos englobáveis, conclui-se que não deverá ser exercida a opção pelo
englobamento, dado que a taxa progressiva aplicável será superior à taxa autónoma de 28%
(tributação proporcional).

Não obstante, no sentido de quantificar a diferença ao nível do montante de imposto a


pagar em cada uma das hipóteses, procedeu-se à liquidação com opção por englobamento,
cuja demonstração consta na imagem seguinte:

Constata-se que o imposto a pagar ascende 21.142,08.

Ao invés, caso não opte pelo englobamento, o imposto a pagar será de 16.767 [(60.775 x
28%) - 250], ou seja, menos 4.375,08.

O efeito bastante prejudicial provocado pelo englobamento resulta da aplicação aos


rendimentos de uma taxa (efetiva) muito superior a 28%, mais concretamente de
35,198815% (21.392,08 / 60.775).

Na verdade, a diferença no valor apurado corresponde precisamente à diferença das taxas


aplicada ao valor do rendimento, isto é, (0,35198815 - 0,28) x 60.775 = 4.375,08.

177
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Em termos declarativos, importa sublinhar que a mais-valia decorrente da operação


mencionada na alínea d) deverá constar no Anexo G1 (mais-valias não tributadas), cuja
imagem do Quadro 4 consta em seguida:

As restantes operações deverão ser declaradas no Anexo G, cuja imagem do respetivo


Quadro 9 se apresenta em seguida:

178
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 35

Vera alienou em 2019 a totalidade das ações que detinha desde há vários anos na
Sociedade A (100.000 ações), qualificável como uma pequena empresa, pelo valor de
500.000.

As ações alienadas foram adquiridas da seguinte forma: 50.000 ações, em 1987, por
entradas em dinheiro no valor de 50.000; as restantes 50.000 ações foram-lhe
atribuídas em 2012 na sequência de um aumento de capital por incorporação de
reservas.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo da mais-valia.

Resolução proposta

O ganho gerado com a venda de ações enquadra-se na alínea b), n.º 1, artigo 10.º,
constituindo mais-valias, as quais que se inserem no âmbito da Categoria G (incrementos
patrimoniais), ao abrigo da alínea a), n.º1, artigo 9.º, sujeitas a IRS por força do disposto no
n.º 1, artigo 1.º.

Tais mais-valias serão dadas pela diferença entre o valor de realização e o valor de
aquisição, ao abrigo da alínea a), n.º 4, artigo 10.º.

Quanto ao valor de realização a considerar será de 500.000 por corresponder ao valor da


contraprestação, nos termos da alínea f), n.º 1, artigo 44.º.

Relativamente ao valor de aquisição, deverá considerar-se o custo documentalmente


comprovado, ou seja, a quantia de 50.000, de acordo com a alínea b), artigo 48.º, não se
aplicando a alínea a) dado que não há não há qualquer indicação de que se trate de uma
empresa cotada em bolsa.

De facto, o valor efetivamente despendido por Vera foi de 50.000, sendo certo que tal valor
serviu para a aquisição de apenas metade das ações transacionadas. As ações adquiridas
por via do aumento de capital não implicaram qualquer dispêndio por parte de Vera,
tratando-se de reservas acumuladas (lucros retidos) pela empresa que foram convertidas em
capital social, fruto da não distribuição de lucros aos sócios.

179
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

No caso em apreço, metade das ações vendidas foram adquiridas antes de 01-01-1989,
como tal, antes da entrada em vigor do Código do IRS, significando que a mais-valia
inerente às mesmas estará sempre excluída de tributação pelo n.º 1, artigo 5.º, DL n.º 442-
B/88, dado que tais mais-valias não eram tributadas no âmbito do extinto Imposto de Mais-
Valias.

No entanto, as restantes 50.000 ações vendidas foram adquiridas somente em 2012, ano em
que a sociedade detida realizou um aumento de capital por incorporação de reservas, que
deu origem à emissão de novas ações.

A este respeito, prescreve a alínea a), n.º 6, artigo 43.º que a data de aquisição dos valores
mobiliários cuja propriedade tenha sido adquirida pelo sujeito passivo por incorporação de
reservas (o que é o caso) ou por substituição daquelas (104) é a data de aquisição dos
valores mobiliários que lhes deram origem.

Revertendo para o caso em apreço, deverá considerar-se que o ano de aquisição das 50.000
ações adquiridas por incorporação de reservas é 1987 e não 2012, por ter sido naquele ano
que foram adquiridas as ações que deram direito a receber posteriormente as novas ações
emitidas no âmbito do aumento de capital.

Por conseguinte, a totalidade da mais-valia estará excluída de tributação, devendo ser


declarada no Quadro 4 do Anexo G1 da declaração modelo 3 (cuja imagem consta no caso
prático anterior), da seguinte forma:

✓ Aquisição: Mês/ano - xx/1987; Valor - 50.000;

✓ Realização: Mês - xx; Valor - 500.000.

Terminamos com a seguinte reflexão: se ao invés de a sociedade ter aumentado o capital


por incorporação de reservas, tivesse distribuído aos sócios os lucros retidos, os mesmos
seriam tributados em IRS (embora em apenas 50% caso fosse exercida a opção pelo
englobamento), enquanto como mais-valias os rendimentos estão totalmente excluídos de
tributação.

(104) Alternativamente à situação ocorrida (aumento de capital com emissão de novas ações, mantendo-se o
valor nominal das mesmas), poderia ter sido aumentado o capital social sem emissão de novas ações, o que
implicaria o aumento correspondente do valor nominal das ações existentes e, consequentemente, a sua
substituição por novas ações.

180
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

De facto, as mais-valias e os dividendos constituem duas formas alternativas de aportação


de valor aos acionistas, sendo substitutos próximos, em função da sua inerente
substituibilidade relativa, pelo que o tratamento fiscal discrepante é suscetível de
influenciar a decisão fundamental de detenção de capital nas empresas, modificando, desta
forma, o comportamento “natural” dos agentes económicos.

No caso de Vera, fez toda a diferença, em termos fiscais, não ter retirado lucros da
sociedade ao longo dos anos e ter beneficiado de tais lucros retidos sob a forma de mais-
valias, totalmente não tributadas.

Mesmo no caso de as mais-valias serem tributadas (na hipótese de ações adquiridas após
01-01-1989), aplicar-se-ia o disposto no n.º 3, artigo 43.º (pequena empresa), o que faria
com que a tributação incidisse sobre apenas metade do valor da mais-valia, redundando
numa tributação da mais-valia a uma taxa de 14% (metade da taxa especial de 28%
prevista na alínea c), n.º 1, artigo 72.º), para além da aplicação dos coeficientes de correção
monetária (atualização do valor de aquisição), aspeto também relevante se a aquisição,
embora posterior a 01-01-1989, tiver sido efetuada há vários anos.

A forma de tributação supra mencionada (mais-valias) é claramente mais favorável do que


a que se aplica aos dividendos em que a tributação é feita à taxa liberatória de 28%
(retenção na fonte a título definitivo), mesmo tendo em conta a possibilidade de opção pelo
englobamento em metade do valor, especialmente nos casos em que estamos a falar de
montantes relativamente elevados (em que se aplicam taxas marginais superiores a 28%,
recordando-se que a taxa marginal é de 28,5% logo a partir de 10.700).

181
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 22 (continuação)

Raúl possui 20% do capital social de uma sociedade por quotas que foi dissolvida,
cabendo-lhe o montante de 70.000, a título de resultado da partilha. Raúl adquiriu as
quotas em causa em 2010, pelo valor de 20.000, embora o seu valor nominal
ascendesse a 30.000.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS.

Resolução proposta

Nota prévia: O presente caso prático é idêntico ao que consta, com o mesmo número, no
Capítulo 2.3 respeitante à Categoria E, completando-se agora a respetiva resolução.

Conforme já referido, até à entrada em vigor, em 2014, da Lei da Reforma do IRC, que
procedeu à alteração da alínea a), n.º 1, artigo 81.º, CIRC, os resultados da partilha
poderiam ser qualificados como rendimentos de capitais (Categoria E) ou como mais-
valias (Categoria G).

O valor a tributar, tal como ainda hoje, corresponde à diferença entre o valor atribuído em
resultado da partilha e o valor de aquisição das participações, nos termos do n.º 1, artigo
81.º, CIRC, ou seja, no caso em apreço, a 50.000 (70.000 - 20.000), sem ter em conta, para
já, a aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda, caso sejam aplicáveis.

No entanto, a diferença entre o valor da partilha e o valor nominal das quotas (70.000 -
30.000 = 40.000) era considerada como rendimento de capitais, enquanto o diferencial
entre o valor nominal e o valor de aquisição (30.000 - 20.000 = 10.000) era tributado na
Categoria G, enquanto mais-valias, aplicando-se as regras diferenciadas.

Atualmente o artigo 5.º não inclui tais rendimentos, constando os mesmos apenas no ponto
3, alínea b), n.º 1, artigo 10.º, donde se conclui que o presente rendimento, resultante de
partilha do património de sociedade, é de qualificar na sua globalidade como mais-valia
(Categoria G).

A principal alteração legislativa (a alteração de fundo que motivou as alterações ao CIRS)


ocorreu no CIRC, fruto da Reforma de 2014, mais concretamente à alínea a), n.º 2, artigo
81.º (cuja epígrafe é “resultado da partilha”), pois era esta alínea que impunha uma

182
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

qualificação diferenciada dos rendimentos resultantes de partilha de sociedade (como mais-


valias ou rendimentos de capitais).

Na situação em apreço, não se sabendo se a sociedade dissolvida é pequena, média ou


grande empresa, iremos colocar as duas possibilidades.

Assim, caso a sociedade dissolvida não seja de qualificar como uma pequena empresa, nos
termos do DL n.º 272/2007, tais rendimentos serão tributados na sua globalidade a uma
taxa especial de 28% prevista no artigo 72.º, n.º 1, alínea c), uma vez que se trata de mais-
valia resultante de uma operação prevista no ponto 3, alínea b), n.º 1, artigo 10.º.

No nosso caso, embora não se trate de uma mais-valia gerada com a alienação de partes de
capital, mas sim resultante de partilha do património de sociedade, aplicam-se também os
coeficientes de desvalorização da moeda, nos termos do n.º 1, artigo 51.º (Portaria n.º
362/2019), uma vez que os mesmos são aplicáveis, desde as alterações processadas pela
Lei da Reforma do IRS, ao valor de aquisição de partes sociais (operações previstas na
alínea b), n.º 1, artigo 10.º), o que se verifica.

Assim, o valor da mais-valia será de 48.000 [70.000 - (20.000 x 1,10)] e o IRS a pagar, por
via destes rendimentos, ascenderá a 13.440 (48.000 x 28%).

No caso de a sociedade dissolvida ser qualificada como pequena empresa (DL n.º
272/2007), aplicar-se-á o disposto no n.º 3, artigo 43.º (conjugado com o n.º 4), sendo o
ganho em causa considerado em apenas 50% do seu valor, ou seja, será tributado o
montante de 24.000 (48.000 x 50%), ascendendo o IRS em causa a 6.720 (24.000 x 28%).

De referir que será sempre possível exercer o direito de opção pelo englobamento, nos
termos do n.º 8, artigo 72.º, remetendo-se, a este propósito, para as considerações tecidas a
propósito da Categoria E (e F).

Diremos apenas que se Raúl dispuser de outros rendimentos de englobamento obrigatório,


de valor médio/alto não será, em princípio, de optar pelo englobamento, especialmente no
caso da 1.ª hipótese (sociedade dissolvida não qualificável como pequena empresa).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

2.6. CATEGORIA H
PENSÕES

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 36

Miguel, viúvo, com 80 anos, recebeu em 2019 uma pensão paga pela Segurança
Social, no valor de 26.600, sobre a qual incidiram as devidas retenções na fonte
efetuadas nos termos da lei.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Resolução proposta

Os rendimentos auferidos por Miguel enquadram-se na Categoria H, ao abrigo da alínea a),


n.º 1, artigo 53.º, estando como tal sujeitos a IRS pelo n.º 1, artigo 1.º. Beneficiarão da
dedução específica prevista no n.º 1, artigo 53.º, no valor de 4.104 (idêntica à da categoria
A). Assim, o rendimento líquido ascenderá a 22.496 (26.600 - 4.104).

Quanto a retenções na fonte, aplicar-se-ão as tabelas divulgadas pela Circular n.º 1/2019 –
Tabela VII – Pensões, coluna “não casado”, escalão “Até 1.937”.

✓ 26.600 / 14 = 1.900 → taxa de 20,0%, logo, 5.320 (26.600 x 20,0%)

Considerando apenas a dedução à coleta relacionada com “despesas gerais familiares”,


prevista na alínea b), n.º 1, artigo 78.º e artigo 78.º-B (105), bem como as retenções na fonte
(5.320), conclui-se que Miguel terá direito a um reembolso, conforme se demonstra:

(105) Até porque, previsivelmente, não haverá muitas outras deduções a considerar, com exceção, no caso de
Miguel, tendo em conta a idade, de despesas de saúde (alínea c), n.º 1, artigo 78.º e artigo 78.º-C), cuja
dedução, atualmente, desde 2015, ascende a 15% do valor das despesas, com o limite de 1.000 (entre 2012 e
2014 era de apenas 10%, sendo de 30%, sem qualquer limite durante longos anos, até 2011).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 37

Joaquim tem um grau de invalidez permanente de 75% e auferiu em 2019 uma


pensão de invalidez do montante de 18.200, não lhe tendo sido feita qualquer retenção
na fonte pela Caixa Geral de Aposentações. Efetuou descontos para o Sindicato, no
valor de 182.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Resolução proposta

Joaquim é considerado deficiente para efeitos de IRS, ao abrigo do n.º 5, artigo 87.º, uma
vez que o seu grau de invalidez é superior a 60%, aplicando-se todos os benefícios fiscais
inerentes a tal condição, os quais se encontram previstos no artigo supra mencionado (87.º)
e no artigo 56.º-A, aditado pela Lei da Reforma do IRS.

Pressupõe-se que o grau de invalidez de Joaquim se encontra devidamente comprovado


(certificado de incapacidade) e que tal estatuto se encontra averbado no cadastro da AT
(conforme exposto a propósito da Categoria A no caso prático n.º 3).

Relativamente à pensão de invalidez, constitui um rendimento da Categoria H – Pensões,


nos termos da alínea a), n.º 1, artigo 11.º (que inclui, entre outras, as pensões de invalidez),
sujeito, enquanto tal, a IRS por força do disposto no n.º 1, artigo 1.º.

Todavia, face à condição de deficiente, de acordo com a alínea a), n.º 1, artigo 56.º-A, os
mesmos serão apenas considerados em 90% do seu valor, desde que, nos termos do n.º 2,
artigo 56.º-A, a importância excluída de tributação não exceda o limite de 2.500 (por
categoria de rendimentos).

No caso em apreço, a parte excluída de tributação ascende a 1.820, que corresponde a 10%
do valor do rendimento, por ser inferior ao limite legal (2.500), resultando que o valor a
tributar será de 16.380 (18.200 - 1.820).

Joaquim beneficiará, ainda, da dedução específica no valor de 4.104 (n.º 1, artigo 53.º),
resultando um rendimento líquido da Categoria H no montante de 12.276.

Quanto a retenções na fonte, aplicam-se as tabelas divulgadas pela Circular n.º 1/2019 –
Tabela VIII – Pensões titulares deficientes, coluna “não casado”, escalão “Até 1.409”.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

✓ 18.200 / 14 = 1.300 → taxa de 0%, logo, sem retenção na fonte.

Cumpre salientar que Joaquim terá direito a um outro benefício fiscal muito importante, ao
abrigo do n.º 1, artigo 87.º (entre outros, menos relevantes, previstos nos números
seguintes do mesmo artigo), que consiste numa dedução à coleta correspondente a quatro
vezes o valor do IAS, o que, em 2019, equivaleria a 1.743,04 (435,76 x 4), não fosse a
disposição transitória contida na Lei do OE/2011 (coincidente com o período da Troika),
que manda aplicar o valor da RMMG vigente em 2010 enquanto o valor do IAS não atingir
aquele valor (conforme referido no caso prático n.º 2, no âmbito da Categoria A), logo o
valor da dedução é de 1.900 (475,00 x 4).

Considerando apenas uma outra dedução à coleta relacionada com “despesas gerais
familiares”, prevista na alínea b), n.º 1, artigo 78.º e artigo 78.º-B, bem como as retenções
na fonte (5.320), virá que:

Tendo em conta a desconsideração de quaisquer outras deduções à coleta, para além


daquelas que são inevitáveis, digamos assim, uma por ser relativamente fácil de obter e a
outra porque decorre diretamente da lei, o valor a pagar seria de 157,43.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 38

Roberto, com 70 anos, auferiu em 2019, para além de uma pensão paga pela
Segurança Social, no valor de 8.400, uma outra pensão paga por um Fundo (PPR), no
valor de 9.000 (a qual tem subjacente entregas efetuadas por Roberto ao longo de 20
anos).

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e determinação do rendimento líquido.

Resolução proposta

Relativamente à pensão paga pela Segurança Social constitui um rendimento da Categoria


H, ao abrigo da alínea a), n.º 1, artigo 11.º, sujeita a IRS pelo n.º 1, artigo 1.º.

Relativamente à pensão paga pelo Fundo PPR, constitui igualmente um rendimento da


Categoria H, nos termos do disposto na alínea b), n.º 1, artigo 11.º, havendo, no entanto,
que ter em conta algumas particularidades, primeiro quanto ao valor a tributar e depois
quanto à forma de tributação.

Tratando-se de uma pensão que tem subjacente entregas efetuadas pelo próprio Roberto,
não faria grande sentido tributar a totalidade da pensão, uma vez que uma parte não
constitui rendimento, mas antes reembolso do capital investido ao longo de vários anos.

Segundo o artigo 54.º (distinção entre capital e renda), deverá deduzir-se, para efeitos de
tributação, o valor correspondente ao capital (n.º 1), sendo que, não sendo possível tal
discriminação, deverá abater-se ao valor total da renda uma importância igual a 85%,
presumindo-se que no caso em apreço ocorre esta situação (106).

De referir que, segundo o n.º 4, artigo 99.º, cabe ao titular do direito aos rendimentos
comprovar junto da entidade devedora que a prestação que lhe é devida comporta
reembolso de capital por si pago

(106) Já não seria assim se as contribuições constitutivas do direito tivessem sido suportadas por pessoa ou
entidade diferente do beneficiário (salvo se tivessem sido objeto de tributação na sua esfera, de acordo como
o n.º 3, artigo 54.º), como por exemplo se as entregas tivessem sido efetuadas pela anterior entidade patronal
e não tivessem, ao tempo, sido tributadas em sede de IRS (artigo 43.º, CIRC). Caso tais entregas tivessem
sido tributadas em sede de IRS (ao abrigo do ponto 3, alínea b), n.º 3, artigo 2.º, por constituírem direitos
adquiridos e individualizados), mesmo que efetuadas por terceiro, já beneficiariam da exclusão dos 85%.

190
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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

No caso em apreço, o valor a tributar será de 1.350 [9.000 - (9.000 x 85%)].

Por outro lado, tratando-se de uma pensão mensal paga por um fundo, ou seja, uma
situação em que a perceção dos montantes ocorre sob a forma de prestações regulares e
periódicas, aplica-se o disposto na alínea a), n.º 3, artigo 21.º, EBF, que nos remete para as
regras da Categoria H, incluindo para efeitos de retenção na fonte (107).

Tal significa que o rendimento bruto da Categoria H ascende a 9.750 (8.400 + 1.350), e o
rendimento líquido a 5.646 (9.750 - 4.104).

De referir que ao longo do ano não terão existido quaisquer retenções na fonte, uma vez
que os rendimentos em causa, individualmente considerados, situam-se ambos no 1.º
escalão da Tabela VII (não casado), logo, sem retenção na fonte.

Contudo, caso as pensões fossem pagas pela mesma entidade, já haveria retenção [8.400 +
1.350 = 9.750 / 14 = 696], à taxa de 4,5% (escalão “Até 750”), o que significa que, muito
provavelmente, na falta de deduções à coleta em montante suficiente, haverá imposto a
pagar apurado na liquidação a efetuar em 2019 (108).

Para obviar a esta situação, dispõe o n.º 3, artigo 99.º-D que o titular do rendimento pode
solicitar à entidade que paga o complemento de pensão, diferente da que paga a pensão
principal, que seja tida em conta, para efeito de retenção na fonte, o valor da pensão
principal. Sem prejuízo, ainda, da possibilidade de retenção a taxa superior (n.º 6, artigo
98.º), a qual poderá ser solicitada pelo titular dos rendimentos à entidade pagadora da
pensão principal.

Acresce também a possibilidade de realizar pagamentos por conta, prevista, desde 2015, no
n.º 8, artigo 102.º (cada entrega deverá ser superior a 50).

(107) Outra possibilidade seria a opção pelo reembolso total (ou parcial), ao invés da obtenção de rendas
regulares e periódicas, aplicando-se, nesse caso, a alínea b), n.º 3, artigo 21.º, EBF, que manda aplicar as
regras da Categoria E (rendimentos de capitais), incluindo em matéria de retenções na fonte, sendo a matéria
coletável constituída por 2/5 do rendimento e tributada à taxa autónoma de 20%, o que significa a aplicação
de uma taxa efetiva sobre o valor resgatado de 8% (até 2005 era tributado apenas 1/5 do valor, também à taxa
autónoma de 20%, logo, a taxa efetiva era de apenas 4%).
(108) Resultado este, aliás, muito frequente nos casos de obtenção de rendimentos das categorias A ou H
quando os mesmos são pagos por várias entidades, uma vez que as mesmas, para efeitos de retenção na fonte
(aplicação das tabelas), consideram apenas os rendimentos de que elas próprias são devedoras, salvo opção
em contrário formulada pelo titular dos rendimentos.

191
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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 39

Daniel, 21 anos, faz parte do agregado familiar da mãe, divorciada, tendo recebido
em 2019 uma pensão de alimentos paga pelo pai no valor de 3.600.

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e determinação do rendimento líquido.

Resolução proposta

As pensões de alimentos estão sujeitas a IRS pelo n.º 1, artigo 1.º, uma vez que constituem
rendimentos que se inserem na Categoria H, nos termos da parte final da alínea a), n.º 1,
artigo 11.º [“(…) e ainda as pensões de alimentos.”]

Tratando-se de uma pensão de valor reduzido (3.600), será totalmente absorvida pela
dedução específica prevista no n.º 1 do artigo 53.º (4.104), pelo que o rendimento líquido
da Categoria H será nulo.

Caso o rendimento líquido fosse positivo, por ser superior ao valor da dedução específica,
não existiria englobamento aos restantes rendimentos da mãe, dado aplicar-se uma taxa
especial de 20%, prevista no n.º 5, artigo 72.º.

De referir que as pensões de alimentos estão dispensadas de retenção na fonte, ao abrigo da


exceção contida na alínea b), n.º 1, artigo 99.º, dispensa que, aliás, operaria também, no
caso em apreço, mesmo na falta desta disposição legal, tendo em conta o reduzido valor
mensal da pensão, por via da aplicação das tabelas de retenção.

Quanto ao pai, que suporta a pensão de alimentos, terá direito a uma dedução à coleta
correspondente a 20% das importâncias pagas, ao abrigo do n.º 1, artigo 83.º-A, desde que
se trate de pensão que tenha sido fixada em sentença judicial ou em acordo homologado
nos termos da lei civil.

Verifica-se aqui uma certa neutralidade, uma vez que a tributação do titular do rendimento
é efetuada à taxa de 20% e a dedução à coleta de quem paga é feita na mesma
percentagem.

192
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso prático n.º 40

David, após um litígio judicial que se arrastou no Tribunal do Trabalho com a sua
entidade patronal (instituição bancária), viu reconhecido pelo Tribunal o direito a
receber uma pensão de reforma, no valor de 2.100 mês, desde janeiro de 2016, tendo
recebido em 31 de dezembro de 2018 o montante global de 88.200 (2.100 x 14 meses x
3 anos).

Pedido: Enquadramento em sede de IRS e cálculo do imposto a pagar.

Notas prévias

A matéria objeto do presente caso prático foi objeto de importantes alterações fruto da
entrada em vigor, em 01-10-2019, da Lei n.º 119/2019, de 18-09, alterações que serão
comentadas na parte final (“Notas Finais – DL n.º 119/2019”).

Ainda assim, optou-se por continuar a reportar o caso prático ao ano de 2018, de modo a
manter-se a resolução tal como se encontrava na 1.ª versão do presente manual (elaborada
em outubro de 2018).

Optou-se igualmente por manter, na parte final da resolução, as notas aí introduzidas


(“Notas sobre a Lei do OE/2019”) aquando da elaboração da 2.ª versão do Manual (em
janeiro de 2019).

Com efeito, anteriormente às alterações legislativas processadas pela Lei n.º 119/2019,
existiam várias lacunas e incongruências na lei quanto a rendimentos de anos anteriores,
geradoras de injustiças, para as quais se procurou alertar e que foram (parcialmente)
colmatadas com a publicação da referida lei, daí o interesse em manter a resolução tal
como se encontrava nas versões anteriores.

Resolução proposta (redação de outubro de 2018)

Estão em causa rendimentos respeitantes a pensões de reforma, enquadráveis na alínea a),


n.º 1, artigo 11.º (pensões), sujeitas como tal a IRS (n.º 1, artigo 1.º), devendo aplicar-se as
regras de tributação previstas para a Categoria H.

193
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

No entanto, tratando-se de rendimentos litigiosos, auferidos de uma só vez, mas


respeitantes a três anos, colocam-se aqui várias questões prévias.

Desde logo, sendo rendimentos litigiosos, dado que o valor a declarar estava dependente de
decisão judicial, importa chamar à colação o artigo 62.º que dispõe que o englobamento só
se faz depois de transitada em julgado a decisão judicial e opera na declaração de
rendimentos do ano do trânsito.

Acresce que, tendo em conta que David recebeu a totalidade do valor em 31-12-2018, só a
partir deste momento é que os rendimentos ficam sujeitos a tributação, nos termos do n.º 3,
artigo 11.º, norma que corporiza de modo muito evidente o princípio da capacidade
contributiva, enquanto pressuposto e fundamento da tributação.

Mas, neste caso, os rendimentos respeitam comprovadamente a três anos, levantando-se a


questão de saber como declarar os rendimentos? Entregar três declarações de IRS, uma
para cada ano (2016, 2017 e 2018)? Ou entregar apenas uma declaração com a globalidade
dos rendimentos?

Se a resposta fosse entregar três declarações, a tributação operaria como se David tivesse
auferido normalmente as pensões, ou seja, as taxas (progressivas) seriam as
correspondentes a 1/3 do rendimento e teria direito às deduções específicas em cada um
dos três anos (bem como às respectivas deduções à coleta), solução que, embora se afigure
acertada e justa, não tem atualmente cobertura legal, embora a mesma tenha vigorado
desde o início da vigência do Código do IRS até ao ano 2000, na falta de disposição
especial em contrário que regulasse expressamente a questão dos rendimentos produzidos
em anos anteriores (109).

Na verdade, a resposta correta será entregar apenas uma declaração, respeitante a 2018,
uma vez que foi neste ano que os rendimentos foram pagos (e que transitou em julgado a
decisão), devendo David mencionar, no Anexo A da declaração modelo 3, que se trata de
rendimentos produzidos em anos anteriores.

(109) Tempos esses em que as declarações eram entregues, na sua esmagadora maioria, em formato de papel,
o que acarretava muito trabalho administrativo à então DGCI [receção das declarações, loteamento, recolha
de dados no sistema informático, novas liquidações para vários anos (reliquidações, feitas pelos serviços
centrais, incluindo anos caducos) e, finalmente, o arquivo físico das declarações]. Já em seguida abordaremos
a solução legal vigente atualmente, prevista no artigo 74.º (rendimentos produzidos em anos anteriores),
desde a sua génese em 2001.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Caso não o faça, a tributação será exageradíssima, uma vez que os rendimentos se
concentram num só ano e sobre os mesmos incidem taxas progressivas (n.º 1, artigo 68.º).

De acordo com o n.º 1, artigo 74.º (rendimentos produzidos em anos anteriores): “Se forem
englobados rendimentos que comprovadamente tenham sido produzidos em anos
anteriores àquele em que foram pagos ou colocados à disposição do sujeito passivo e este
fizer a correspondente imputação na declaração de rendimentos, o respetivo valor é
dividido pela soma do número de anos ou fração a que respeitem, incluindo o ano do
recebimento, aplicando-se à globalidade dos rendimentos a taxa correspondente à soma
daquele quociente com os rendimentos produzidos no próprio ano.” (110).

Verifica-se que os rendimentos produzidos em anos anteriores são englobados aos restantes
rendimentos gerados no próprio ano do recebimento, embora a lei permita a sua imputação
aos respetivos anos em que os mesmos foram produzidos na declaração do ano em que
ocorre o recebimento, estabelecendo regras precisas de cálculo.

Aplicando ao caso em apreço, pressupondo-se que David é solteiro e sem dependentes a


seu cargo, resulta que a parte do rendimento produzida em anos anteriores (88.200 x 2/3 =
58.800), será dividida por três (58.800 / 3 = 19.600), sendo esta parte somada ao
rendimento (líquido) do próprio ano (29.400 - 4.104 = 25.296), para efeitos de aplicação de
taxas.

(110) O artigo 74.º foi aditado pela Lei n.º 85/2001, de 4 de agosto (OE retificativo para 2011), embora a sua
redação não fosse totalmente coincidente com a que vigora atualmente. Na redação originária era previsto o
número máximo de quatro anos ao nível do denominador da fração (a lei dizia “(…) o respetivo valor é
dividido pelo número de anos ou fração a que respeitam, com o máximo de quatro, (…)”, número esse que
depois foi alargado para seis (alteração da Lei do OE/2006). Posteriormente, com a Lei do OE/2009, foi
acrescentada, logo a seguir à parte anteriormente transcrita, a expressão “(…), incluindo o ano do
recebimento, (…)”, sem a qual sucedia que se os rendimentos respeitassem apenas a um ano anterior a
divisão era feita por um, algo totalmente incompreensível e incongruente. Finalmente, a Lei da Reforma do
IRS, retirou da norma o limite ao número de anos máximo a incluir no denominador da fração. Conclui-se
que o sistema tem vindo a ser aperfeiçoado, contudo tais ajustamentos, a nosso ver, são insuficientes,
conforme se procurará demonstrar.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Assim,

✓ 19.600 + 25.296 = 44.896, logo, (36.856 x 28,838%) + [(44.896 - 36.856) x 45%] =


14.246,50; 14.246,50 / 44.896 = 31,732%.

Donde,

✓ Coleta total = (88.200 - 4.104) x 31,732% = 26.685,60 (111).

Admitindo deduções à coleta no valor de 250 (dedução à coleta relacionada com “despesas
gerais familiares”, prevista na alínea b), n.º 1, artigo 78.º e artigo 78.º-B), a coleta líquida
seria de 26.435,60, que corresponde a 29,97% do rendimento (26.435,60 / 88.200,00).

Mesmo sem fazer cálculos, afigura-se que o mecanismo previsto na lei não permite que a
tributação de David se faça tal qual sucederia se a imputação fosse feita em três
declarações de rendimentos distintas, por três motivos principais:

- Apenas beneficiou da dedução específica uma vez (admitindo que não auferiu quaisquer
outras pensões em anos anteriores);

- As taxas aplicadas (progressivas) são mais elevadas, uma vez que o quociente foi somado
aos rendimentos do próprio ano;

- Não tirou partido de quaisquer deduções à coleta em 2016 e 2017 (assumindo que não
auferiu outros rendimentos nesses anos e que não colocou as despesas desses anos no
anexo H da declaração modelo 3 do ano de 2018).

Acresce que, embora se trate de uma inevitabilidade, sendo tributado na globalidade em


2018, tendo ocorrido neste ano uma redução de taxas, nem sequer beneficia de tal redução,
o que até poderia contrabalançar com os efeitos negativos anteriores, uma vez que o
rendimento coletável, determinado nos termos do n.º 1, artigo 74.º (44.896), se insere no
antigo quarto escalão (anterior penúltimo escalão, para rendimentos superiores a 40.522), o
qual ficou arredado deste benefício, tal como o antigo quinto escalão (rendimentos
superiores a 80.640).

Como referido, caso os rendimentos tivessem sido auferidos mensalmente, como sucede
normalmente, sendo declarados nos três anos a que respeitam, em três declarações, a

(111) Estamos a ignorar a sobretaxa de IRS, que vigorou até 30-11-2017, por razões de simplificação, sendo
certo que a AT irá considerá-la relativamente ao ano de 2017, o que aumentará o valor a pagar.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

tributação seria efetivamente bastante inferior por não se verificarem os efeitos nefastos
supra descritos.

Antes de procedermos à liquidação individualizada relativamente a 2016, 2017 e 2018,


para se ter um elemento de comparação, colocaremos ainda a hipótese de, em sede de
liquidação, a AT considerar a dedução específica a triplicar, ou seja, 4.104 por cada um dos
anos, por nos parecer uma situação de tal modo flagrante, nas circunstâncias do caso em
apreço, que deveria ser tida em conta pela AT (embora muito provavelmente não fosse
considerada por falta de base legal).

Assim, a parte do rendimento produzida em anos anteriores, (88.200 x 2/3 = 58.800),


abatida da dedução específica (4.104 x 2), será dividida por três [(58.800 - 8.208) / 3 =
16.864], sendo esta parte somada ao rendimento (líquido) do próprio ano (29.400 - 4.104)
= 25.296), para efeitos de aplicação de taxas.

Por conseguinte,

16.864 + 25.296 = 42.160, logo, (36.856 x 28,838%) + [(42.160 - 36.856) x 45%] =


13.015,33; 13.015,33 / 42.160 = 30,871%.

Donde,

Coleta total = [88.200 - (4.104 + 4.104 + 4.104)] x 30,871% = 23.427,38

Admitindo deduções à coleta no valor de 250 (dedução à coleta relacionada com “despesas
gerais familiares”, prevista na alínea b), n.º 1, artigo 78.º e artigo 78.º-B), a coleta líquida
seria de 23.177,38, que corresponde a 26,28% do rendimento (23.177,60 / 88.200,00).

Deste modo, refazendo as contas em função das várias deduções específicas, o imposto a
pagar diminui na quantia de 3.258,22 (26.685,60 - 23.427,38), face ao valor anteriormente
apurado, embora se anteveja, mesmo assim, um agravamento da tributação
comparativamente com a que seria obtida caso fossem apresentadas três declarações.

Tendo em conta a condição de solteiro, sem dependentes, e considerando apenas a dedução


à coleta relacionada com “despesas gerais familiares”, prevista na alínea b), n.º 1, artigo
78.º e artigo 78.º-B, a liquidação em cada um dos anos seria (112):

(112) Estamos a ignorar a sobretaxa de IRS, vigente até 30-11-2017, por razões de simplificação.

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

O valor a pagar no conjunto dos três anos ascende a 18.319,52, representando uma taxa de
tributação sobre os rendimentos de 20,77% (18.319,52 / 88.200), bastante inferior à
inicialmente apurada de 29,97% e também inferior à posteriormente atingida de 26,28%,
sendo o imposto a pagar inferior em 8.116,08 (26.435,60 - 18.319,52), comparativamente

198
Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

com a primeira hipótese (a mais provável), e inferior em 4.857,86 (23.177,38 - 18.319,52),


se compararmos com o imposto apurado na segunda hipótese.

Embora em termos legais, do ponto de vista do direito tributário, nada se possa fazer
quanto a este acréscimo na tributação, dado que, bem ou mal, são as regras que se
encontram consagradas na lei, admitimos que David poderia, no âmbito de uma ação
judicial cível, exigir que o acréscimo nos impostos a que ficou sujeito, fruto do não
pagamento atempado das pensões a que tinha direito por parte da entidade patronal, fosse
suportado pela mesma.

Quanto a retenções na fonte, tendo em conta as circunstâncias especiais que envolvem a


situação em apreço (rendimentos respeitantes a três anos que se concentram num só mês),
suscitam-se também algumas questões.

No que concerne aos rendimentos respeitantes a 2018, auferidos no próprio ano, mas em
mês diferente, aplica-se, a nosso ver, o disposto no n.º 2, artigo 99.º-E (113), ou seja, é
possível o recálculo mensal, para efeitos de retenção na fonte.

Quanto aos rendimentos respeitantes aos anos de 2016 e 2017, face à letra da lei, não
poderá ser aplicada a norma anteriormente referenciada, uma vez que não se trata de
rendimentos gerados no próprio ano.

Assim, face à obrigatoriedade imposta ao substituto tributário de efetuar a retenção na


fonte no momento em que o rendimento é pago ou colocado à disposição, nos termos do
disposto no n.º 1, artigo 99.º, e na ausência de qualquer disposição legal que permita
atenuar a taxa retenção na fonte, deverá obrigatoriamente ser aplicada uma taxa de
retenção normal, digamos assim, a efetuar em dezembro de 2018, como se o rendimento
dos dois anos fosse rendimento de um só mês.

Trata-se de uma solução legal completamente desfasada da realidade, uma vez que, no caso
em apreciação, é mais do que sabido que se trata efetivamente de um rendimento mensal,
recebido de uma só vez, tendo existido um litígio judicial onde se discutiu o direito ao
recebimento das pensões, mas, ainda assim, é a única interpretação que poderá ser
defendida em face do normativo vigente.

(113) Cuja redação tem o seguinte teor: “Quando forem pagos ou colocados à disposição do respetivo titular
rendimentos das categorias A ou H em mês, do mesmo ano, diferente daquele a que respeitam, recalcula-se o
imposto e retém-se apenas a diferença entre a importância assim determinada e aquela que, com referência
ao mesmo período, tenha eventualmente sido retida.”.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

Obviamente que foi por nós ponderada a possibilidade de aplicar ao rendimento global a
taxa de retenção na fonte mensal, fazendo-se uma interpretação extensiva do disposto no
n.º 2, artigo 99.º-E, mas tal solução envolve riscos de incumprimento na medida em que
não se encontra legalmente consagrada, sendo certo que o imposto acabaria sempre por ser
arrecadado depois, em 2019, aquando da liquidação, estando em causa apenas juros
compensatórios (calculados à taxa de 4% ao ano).

Naturalmente que a retenção na fonte aplicada nos estritos termos da lei será excessiva em
função do imposto que será devido a final (liquidado em 2019), mesmo sabendo-se que o
mecanismo de tributação previsto para os rendimentos de anos anteriores, conforme
referido, não é neutral, agravando (muito) a tributação comparativamente com a que
resultaria se os rendimentos tivessem sido auferidos mensalmente ao longo dos três anos e
imputados em três declarações distintas.

A propósito do excesso de retenção na fonte, refira-se que se trata de algo que pode ocorrer
também noutras circunstâncias que não as que envolvem David, nomeadamente, no âmbito
da Categoria A, situação porventura mais frequente, nomeadamente quando há salários ou
outras remunerações em atraso, pagas ou colocadas à disposição nos anos seguintes.

Por fim, quanto ao aludido excesso de tributação (a final) a que poderão estar sujeitos os
sujeitos passivos que auferem rendimentos produzidos em anos anteriores, em nossa
modesta opinião, deveria voltar-se ao regime anterior, vigente até 2001, dado que, com os
atuais sistemas informáticos, contrariamente ao que sucedia antigamente, proceder à
reliquidação dos impostos relativamente a cada um dos anos a que os rendimentos
respeitam não constitui, a nosso ver, um obstáculo de tal forma intransponível que
justifique tamanha injustiça, pelo menos em alguns casos, como é o presente.

Naturalmente que o problema não está propriamente na AT, uma vez que a mesma se
limita a aplicar o normativo vigente.

Deveria, portanto, a nosso ver, ser pensada uma eventual alteração legislativa, a qual
poderia passar pela revogação do artigo 74.º, regressando-se à situação vigente até ao ano
2000, ou por uma alteração da sua redação.

Notas sobre a Lei do OE/2019 (redação de janeiro de 2019)

Quanto às desconformidades apontadas em matéria de retenção na fonte, tal como referido,


são extensíveis a situações que envolvam remunerações (Categoria A) de anos anteriores

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(rendimentos litigiosos ou, simplesmente, salários em atraso), tendo, neste caso, sido
solucionadas com a Lei do OE/2019, face às alterações efetuadas ao artigo 99.º-C,
conforme se passa a indicar:

✓ Remunerações de anos anteriores (bem como as horas extraordinárias), passam a ter


taxa de retenção na fonte autónoma, alargando-se o regime aplicável aos subsídios de
férias e de natal, pelo que não poderão, para cálculo do imposto a reter, ser adicionados
às remunerações dos meses em que são pagos ou colocados à disposição (alteração do
n.º 5).

✓ Os subsídios de férias e de natal respeitantes a anos anteriores são objeto de retenção na


fonte autónoma por cada ano a que respeitam (aditamento do n.º 7).

✓ A taxa de retenção na fonte a aplicar às remunerações de anos anteriores é determinada


pelo valor obtido em resultado da divisão pelo número de meses a que respeitam
(aditamento do n.º 9).

Naturalmente que o descrito não se aplica ao nosso caso dado que o mesmo se reporta a
pensões e não a remunerações.

Deveriam, portanto, a nosso ver, ser efetuadas as necessárias alterações ao artigo 99.º-D,
respeitante à Categoria H, idênticas às que foram realizadas ao artigo 99.º-C, pela Lei do
OE/2019, corrigindo-se a situação anómala descrita na resolução do caso prático.

Notas Finais – Lei n.º 119/2019 (redação de janeiro de 2020)

A lei em apreço, vigente, quanto a esta parte, a partir de 01-10-2019, veio resolver parte
dos problemas apontados ao longo da resolução do caso prático, nomeadamente em
matéria de retenção na fonte, no âmbito da Categoria H, bem como a questão relacionada
com a impossibilidade de apresentação de declarações relativas a anos anteriores.

Quanto à primeira questão, relacionada com a retenção na fonte, procedeu-se, tal como
proposto na parte final do tópico anterior, a alterações ao artigo 99.º-D, nos mesmos
moldes das alterações processadas ao artigo 99.º-C, passando a dispor-se que:

✓ Pensões de anos anteriores passam a ter taxa de retenção na fonte autónoma, alargando-
se o regime aplicável aos 13.º e 14.º meses, pelo que não poderão, para cálculo do
imposto a reter, ser adicionados às pensões dos meses em que são pagas ou colocadas à
disposição (alteração do n.º 4).

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

✓ As prestações adicionais correspondentes ao 13.º e 14.º meses referentes a anos


anteriores são objeto de retenção na fonte autónoma por cada ano a que respeitam
(aditamento do n.º 6).

✓ A taxa de retenção na fonte a aplicar às pensões de anos anteriores é determinada pelo


valor obtido em resultado da divisão pelo número de meses a que respeitam (aditamento
do n.º 7).

Face às alterações processadas ao artigo 99.º-D, a partir de 01-10-2019 está totalmente


resolvida a questão do excesso na retenção na fonte.

Relativamente à questão principal, relacionada com o cálculo do imposto devido a final e


com a impossibilidade de apresentação de novas declarações relativamente a anos
anteriores (o que acarreta um acréscimo na tributação), verifica-se que a Lei n.º 119/2019
operou importantes alterações ao artigo 74.º, com o aditamento dos n.os 3 a 6, passando a
possibilitar-se, por opção (em alternativa ao regime previsto no n.º 1) a entrega de
declarações de substituição relativas a anos anteriores, o que se afigura bastante positivo
(no fundo um regresso à situação vigente até ao ano 2000, tal como se preconizava nas
versões anteriores do presente manual).

De acordo, com os novos números aditados ao referido artigo:

“3 — Sempre que seja possível imputar os rendimentos a que se refere o n.º 1 a anos
anteriores em concreto, pode o sujeito passivo, em alternativa, proceder à entrega de
declarações de substituição relativamente aos anos em causa, com o limite do quinto ano
imediatamente anterior ao do pagamento ou colocação à disposição dos rendimentos, sem
prejuízo da aplicação do disposto naquele número quanto aos restantes rendimentos,
sendo caso disso.

4 — A opção a que se refere o número anterior não é aplicável aos rendimentos previstos
no artigo 62.º

5 — Para efeitos do cumprimento do previsto no presente artigo, as entidades


processadoras dos pagamentos devem efetuar a discriminação dos montantes respeitantes
a cada um dos anos.

6 — O exercício da opção prevista no n.º 3 não prejudica que, para efeitos de contagem do
prazo de caducidade previsto no artigo 45.º da Lei Geral Tributária, o facto tributário se
considere verificado no ano do pagamento ou colocação à disposição dos rendimentos.”

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

A título de comentário final, dir-se-á que se aplaudem as alterações efetuadas, permitindo


resolver a maioria das situações que envolvem rendimentos de anos anteriores.

Fica, no entanto, por resolver a situação específica exposta no caso prático dado tratar-se
de rendimentos litigiosos (situações em que a determinação do valor dos rendimentos
depende de decisão judicial), face à exclusão prevista no n.º 4 do artigo 74.º, a qual impede
que a opção seja exercida relativamente a rendimentos previstos no artigo 62.º, ou seja,
precisamente os rendimentos litigiosos.

Quanto à exclusão contida no referido n.º 4, confessa-se alguma dificuldade em


compreendê-la, especialmente quando se trata de situações com os contornos da situação
em apreço, dado que se trata, comprovadamente, de um rendimento mensal, recebido de
uma só vez, apenas com a nuance de ter existido um litígio judicial onde se discutiu o
direito ao recebimento das pensões, particularidade esta que, a nosso ver, não justifica a
impossibilidade de exercício do direito de opção previsto no n.º 3.

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ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS

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Atualização fiscal em IRS – aspetos práticos
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A informação contida neste trabalho, assim como as opiniões nele expressas, vinculam
exclusivamente o autor, sendo que os casos práticos apresentados deverão ser devidamente
contextualizados, carecendo a sua aplicação prática de uma análise casuística.

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