O documento presta homenagem a Joaquim Levy e deseja boa sorte a seu substituto Nelson Barbosa. Apesar das diferenças ideológicas percebidas entre eles, ambos reconhecem a importância de políticas econômicas pragmáticas dadas as condições políticas. A contribuição de Kalecki foi importante, mas seus modelos tiveram limitações empíricas e não levaram a melhores resultados quando aplicados na Polônia.
Descrição original:
Título original
Delfim Netto - Keynes e Kalecki caem no Samba no Carnaval da economia brasileira
O documento presta homenagem a Joaquim Levy e deseja boa sorte a seu substituto Nelson Barbosa. Apesar das diferenças ideológicas percebidas entre eles, ambos reconhecem a importância de políticas econômicas pragmáticas dadas as condições políticas. A contribuição de Kalecki foi importante, mas seus modelos tiveram limitações empíricas e não levaram a melhores resultados quando aplicados na Polônia.
O documento presta homenagem a Joaquim Levy e deseja boa sorte a seu substituto Nelson Barbosa. Apesar das diferenças ideológicas percebidas entre eles, ambos reconhecem a importância de políticas econômicas pragmáticas dadas as condições políticas. A contribuição de Kalecki foi importante, mas seus modelos tiveram limitações empíricas e não levaram a melhores resultados quando aplicados na Polônia.
Neste primeiro "suelto" de 2016 desejo prestar uma homenagem ao bem
apetrechado economista Joaquim Levy. Por motivos internos do governo e pela falta de apoio da sua base parlamentar, ele não pode levar a cabo o bom programa de devolver o Brasil aos trilhos do desenvolvimento social e econômico. E aproveitar para desejar ao seu substituto, tão bem preparado quanto ele, Nelson Barbosa, que encontre um ambiente interno mais amigável e externo politicamente mais pacificado, para que sua ação possa ser frutuosa. Os seus respectivos asseclas insistem em proclamar suas diferenças brandindo as fontes ideológicas da "alma mater" de cada um. Levy seria fruto da fonte do virtuoso neoliberalismo que vive na Universidade de Chicago. Barbosa seria uma ameaçadora semente fértil da New School University, de New York. Segundo nossa "elite cientificista" - com apoio no ignorante mercado -, trata-se de um perigoso gueto "heterodoxo" onde se pratica uma estranha mistura da kaleckianismo e desvios pós-keynesianos temperados por um marxismo "prêt-à-porter"... É preciso superar tão indigente preconceito. Para os dois, a economia é um conhecimento empírico cujo uso tem de se submeter às condições institucionais sob as quais se vive. Quando a "revolução" está excluída, a solução "ótima" é executar as melhores medidas econômicas selecionadas dentro do espaço politicamente factível, como fizeram os países hoje desenvolvidos. Afinal, o que separa Keynes de Kalecki? A contribuição de Kalecki é importante e transcende o fato que antecipou Keynes em alguns aspectos, o que é superdimensionado por seus admiradores. Para os dois, a determinação do nível de demanda efetiva depende do nível de investimento. A diferença reside nos estímulos ao investimento. Um aspecto interessante em alguns modelos de Kalecki é que ele introduz, explicitamente, a distribuição de renda, como fizeram Malthus, Ricardo, Stuart Mill e Marx. Não é possível esquecer, entretanto, que são proposições axiomáticas com modesto conteúdo empírico e resultam da manipulação das identidades da contabilidade nacional numa economia verticalmente integrada. A despeito do que afirmam alguns economistas, renomados, é preciso muito cuidado com tais ilusionismos. Num deles Kalecki deduz que o lucro total é igual à soma do investimento bruto + déficit fiscal do governo + saldo em conta corrente. Mal interpretado (tudo o mais não permanece igual), ele pode nos levar ao céu (mais déficit aumenta o lucro que estimula mais investimento...), ou, mais provavelmente, a um jogo "Ponzi" (mais déficit para financiar o déficit já feito...). Empiricamente, os dois caminhos parecem ter o mesmo fim: o inferno! Mas, afinal, o que separa Keynes de Kalecki? Nada mais simples: Keynes trabalhou para salvar o capitalismo; Kalecki para provar que ele não pode ser salvo! O realmente importante é que, para ambos, o maior pecado de uma organização social é ser incapaz de proporcionar emprego para todos que querem e podem trabalhar, oferecendo-lhes salários decentes proporcionais às suas habilidades e bastante para dar-lhes identidade e recepcioná-los na cidadania. Ambos sabiam que o nível de atividade da economia (enquanto existem fatores de produção disponíveis) é função da demanda efetiva, cujo nível, por sua vez, depende - fundamentalmente - do volume do investimento (público + privado). Para Keynes, o investimento privado é função do "espírito animal" do empresário. Se está desativado, o governo pode emitir dívida pública, capturar a poupança privada e investi-la em projetos de infraestrutura que terão efeitos duradouros sobre a produtividade do sistema. Acabarão modificando a "expectativa" dos empresários e levando-os a voltar a investir, recuperando a renda e o emprego. Num famoso e revelador artigo de 1943 ("Political Aspects of Full Employment") Kalecki, implicitamente, considerou ingênuo o argumento anterior. Afirma que a "hipótese que um governo manterá o pleno emprego numa economia capitalista, mesmo se soubesse como fazê-lo, é uma falácia", por três motivos. Os empresários: 1º) "se oporão ao pleno emprego produzido pelo governo, porque isso amplia a área de sua intervenção"; 2º) "não apreciam os investimentos públicos e são contra os subsídios ao consumo", e, principalmente, 3º) "não gostam das consequências do pleno emprego porque ele destrói o instrumento que disciplina o trabalhador: o desemprego". Logo, pleno emprego e capitalismo se excluem. Se desejamos o primeiro, temos de acabar com o segundo. O fato é que Kalecki, no auge do seu prestígio intelectual e poder (1955-1965), e seus modelos, não produziram um desenvolvimento da Polônia muito diferente dos demais satélites da URSS. Apenas o mesmo "pleno emprego" com baixa produtividade que parasitou todo socialismo "real" e que custou a liberdade de duas gerações de poloneses... O leitor deve estar se perguntando: o que essa pedante peroração tem a ver com o Nelson Barbosa? A boa notícia é: nada! Por que, então negar-lhe um voto de confiança? Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.
A Inegociável Dependência Externa No Planejamento Brasileiro - A Atuação Do Capital Internacional No Plano de Metas (1956-1961) e No Ii Plano Nacionalde Desenvolvimento (1975-1979)