A Organização Mundial de Saúde inclui a sexualidade nos pilares mais importantes
para a nossa qualidade de vida, juntamente com a família, o trabalho e o lazer. Define- a como a energia que nos motiva a procurar o amor, o carinho, a ternura e a intimidade; que se integra no modo como nos sentimos, movemos, tocamos e somos tocados; que influencia os nossos pensamentos, sentimentos, ações e interações; e por isso influenciando também a nossa saúde física, mental e emocional. A sexualidade é um fenómeno que envolve a pessoa no seu todo e que abrange uma complexa interação de variáveis biológicas, psicológicas e sócio culturais. A sexualidade na velhice é um tema comumente negligenciado pela medicina e pela psicologia, pouco conhecido e pouco entendido pelos profissionais de saúde, pela sociedade em geral e pelos próprios idosos. A dificuldade para falar deste tema é frequente em todas as idades, especialmente nos mais velhos, formados numa época em que a educação sexual era inexistente e assuntos como homossexualidade, bissexualidade, masturbação e mesmo sexualidade em geral eram tabus. Fisiologicamente, envelhecemos com o passar do tempo. Este processo não é específico da terceira idade, em verdade começa logo após o nascimento. Faz parte do ciclo natural do desenvolvimento humano, estamos em constante transformação. O avanço da idade não é necessariamente sinónimo de diminuição da capacidade de se desenvolver como pessoa, muito pelo contrário. O envelhecimento pode ser muito produtivo se a pessoa for capaz de fazer algumas modificações no seu antigo modo de vida, incluindo a sua sexualidade, que pode continuar a ser interessante e estimulante na idade madura. O que acontece com o desejo sexual, será que envelhece também? Modifica-se? Ou somos nós que nos modificamos, que amadurecemos, que vamos alterando a forma como lidamos com a questão do desejo? Desejo pode ser definido como querer, aspiração, vontade. E a vontade não envelhece forçosamente. A sexualidade do idoso é em grande parte um reflexo da sua vida passada. Ser um idoso sexuado ou assexuado está relacionado com os modelos de referência que o indivíduo adquiriu ao longo da vida e baseia-se nas expectativas que estabeleceu em cada etapa do ciclo vital. A vivência da sexualidade nesta etapa da vida vai depender da escolha dos sujeitos e da construção dos seus valores. A sexualidade humana historicamente é um tema cercado de tabus, e particularmente na terceira idade constitui um assunto impregnado de preconceitos. Em qualquer idade o ser humano é capaz de sentir impulsos eróticos, desejo, ter pensamentos ou algum tipo de atividade sexual. A ideia de que o sexo é privilégio dos jovens e não pode fazer parte da idade madura é equivocada. Não podemos reduzir a sexualidade ao ato sexual propriamente dito. A sexualidade é intimidade, conexão, afeto, estima, vínculo, entrega, partilha, companheirismo. Alguns autores enfatizam também uma dimensão de lealdade. O afeto, o calor, a sensualidade não precisam deteriorar-se com o avanço da idade. A sexualidade é importante na construção e na perceção da nossa identidade, contribuindo igualmente para a autoestima e para a sensação de bem-estar. As alterações decorrentes do envelhecimento não se manifestam da mesma forma em todas as pessoas. Cada indivíduo tem o seu próprio ritmo, e para alguns essas mudanças não chegam a ser muito pronunciadas. Também o modo de viver estas alterações difere de pessoa para pessoa: Enquanto umas as encaram como naturais, outras podem sentir-se mais alarmadas e preocupadas. Entre os fatores que podem dificultar ou mesmo inibir o exercício da sexualidade entre os idosos encontramos a saúde física, os preconceitos sociais, a baixa autoestima, a falta de conhecimento acerca do tema, o estatuto conjugal – separação, viuvez – e a perda de privacidade – morar em casa de filhos ou num lar/residência para a terceira idade. As questões socio culturais constituirão a principal barreira. Observa- se, sobretudo no senso comum, uma visão limitada sobre a velhice. Um dos aspetos mais negligenciado relativamente ao idoso refere-se à sua sexualidade, temática imbuída ao longo do tempo de mitos e preconceitos responsáveis pela construção de uma conceção negativa e pela negação da sexualidade no idoso. Há uma tendência para considerar o idoso – e também a criança – como um ser assexuado, sem vontade própria, sem sentimentos, sem sensações, sem fantasias, sem expectativas e sem direitos. Esta perspetiva pode manifestar-se por parte dos familiares, dos profissionais que o tratam e cuidam, e mesmo por parte do próprio idoso. As disfunções sexuais, prevalentes em qualquer idade mas mais acentuadamente nesta fase da vida, podem ter origem em questões emocionais e crenças limitantes, passíveis de resolução através duma abordagem terapêutica, com um profissional e uma modalidade de terapia com a qual a pessoa mais se identifique e confie. Poderão existir também causas físicas, doenças como a diabetes que provoca impotência masculina, medicamentos como os antidepressivos que diminuem ou anulam o desejo feminino e masculino, entre outros. Neste caso por vezes o médico pode ajustar dosagens ou substituir o medicamento. Tem sido usada com muito sucesso a Terapia de Reposição Hormonal em mulheres e a prescrição de fármacos a homens, resolvendo problemas como a falta de lubrificação e de ereção. Apesar da maioria dos estudos nesta área considerar o sexo e a atividade sexual como uma necessidade básica e fundamental do ser humano, necessária para a realização plena do indivíduo, a energia e o impulso sexual podem ser sublimadas para as mais diversas realizações. O conceito de sublimação significa originalmente transformar uma pulsão em algo socialmente aceite. Quando trabalhamos, por exemplo, estaremos a transformar a nossa libido (pulsão sexual ou pulsão de vida) em algo produtivo, convertendo uma energia interna, individual, numa outra que vai ser útil para a sociedade na qual estamos inseridos. A sublimação também pode ser uma forma de ultrapassar uma doença e obter saúde, como uma mãe sofrendo uma depressão profunda devida à morte do seu único filho. Oferecendo-se como voluntária num hospital para trabalhar com crianças, mimando-as, acarinhando-as, alimentando- as, derramando sobre elas todo o amor que tinha represado dentro de si, esta mãe saiu do estado depressivo tornando-se uma pessoa alegre, feliz, radiante e livre. Sendo a energia sexual uma energia sagrada de vida da qual todos nascemos, através dum ato de cocriação entre os nossos progenitores e o próprio Criador, ela constitui-se simultaneamente na essência que utilizamos para a prossecução dos nossos sonhos, dos nossos trabalhos, dos nossos estudos, dos nossos diversos tipos de relacionamentos, das nossas obras. Por isso a ausência de atividade ou interesse sexual não carateriza necessariamente algum tipo de mal-estar ou adoecimento. Podemos estar simplesmente usando a mesma energia direcionada para um foco diverso, igualmente prazeroso e quiçá imensamente mais útil, independentemente da idade.