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NEGROS DE GANHO, NEGROS DE ALUGUEL: OS TRABALHOS DOS

ESCRAVOS NAS CIDADES BRASILEIRAS DO XIX

Vanessa Cristina Chucailo

RESUMO: Esse texto irá abordar um tema pouco discutido dentro da


historiografia brasileira, a questão da escravidão nos centros urbanos.
Durante muito tempo a ideia de escravidão esteve diretamente
associada ao espaço rural das lavouras e dos engenhos. Mas a expansão
das cidades no Brasil requeria uma demanda de mão de obra
específica. Nesse contexto, os escravos apresentaram-se como a
solução para as várias atividades dentro das cidades seja como 1
escravos de aluguel ou escravos de ganho. O objetivo desse trabalho é
observar através de revisões bibliográficas de autores que abordam o
tema, bem como recortes de jornais e algumas representações
iconográficas, quais eram as principais atividades desempenhadas
pelos “escravos urbanos” e como a escravidão se apresentava dentro
das cidades, uma vez que esta possibilitava ao escravo desfrutar de um
“espaço de liberdade”, sem desprender-se totalmente do regime
escravista.

Palavras chave: escravidão, liberdade, cidades, trabalho.


INTRODUÇÃO

Durante muito tempo a escravidão no Brasil permaneceu


diretamente associada à ideia exclusiva do mundo rural. Porém com a
expansão e desenvolvimento das cidades em nosso país, a demanda
por trabalhadores - alguns especializados - exigiu que se empregasse
no meio urbano a mão de obra escrava.
Nas cidades, esses negros se deparavam com uma nova forma de
escravidão, mas que de certa maneira, lhe conferia um grau de
autonomia em relação ao seu trabalho se comparado com um escravo
rural. Os escravos urbanos, sejam de ganho ou de aluguel, exerciam as
mais variadas tarefas nas diferentes áreas do espaço que as cidades
ofereciam.
Este artigo buscará mostrar uma síntese das principais
2
atividades desenvolvidas por esses escravos urbanos, e como a ideia de
“liberdade” se conectava a esse mundo.

2 UM PANORAMA DO TRABALHO NO CAMPO: O ESCRAVO RURAL

O trabalho escravo foi um marco na história brasileira,


constituindo-se um elemento fundamental para a movimentação da
vida econômica e social da colônia. A maioria desses escravos era
encaminhada para desenvolverem atividades nas zonas rurais,
especialmente nas atividades agrícolas.
A economia açucareira no nordeste do Brasil, com base na
exploração da terra e no desenvolvimento das grandes propriedades
de monocultura exigia o emprego de uma larga escala de mão de obra.
A solução encontrada foi a utilização de escravos negros nos canaviais
e engenhos de açúcar. Entretanto o trabalho no engenho exigia uma
combinação relativamente complexa de terra, capital, técnica, força e
equipamentos (ROBLES; QUEIROZ, 1987). Consequentemente exigia
um saber mais especializado no trabalho. Com isso, foi possível
observar dentro das unidades rurais não apenas a farta produção de
açúcar, mas toda uma sociedade que se construiu a partir desse
produto.
A sociedade nos engenhos era rigidamente hierarquizada e
estratificada. De caráter extremamente patriarcal, essa formação inicial
da colônia estava diretamente ligada a um sistema escravista. Muitas
vezes quando pensamos essa sociedade colonial escravista,
imaginamos apenas as relações entre Senhor e escravos. Mas essa
relação é um pouco mais extensa. Sobre a formação de uma sociedade
colonial constituída de grandes propriedades de engenhos observamos
que elas são movidas e mantidas não somente pelo trabalho escravo,
mais também por uma gama de trabalhadores livres que viviam na
colônia, além é claro da figura marcante dessa sociedade, os senhores
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de engenho. Se pensarmos os engenhos brasileiros na dinâmica da
representatividade na sociedade em que pertenciam, podemos
entender a relação entre senhor de engenho, seus subordinados e
cativos, e, destes próprios subordinados, sejam eles assalariados
diretos do engenho ou apenas lavradores de cana, com seus próprios
escravos. Sendo o senhor de engenho considerado a elite da
aristocracia colonial, podemos observar os lavradores de cana
(agricultores arrendatários das terras do engenho que produziam a
cana-de-açúcar) como uma elite de agricultores, e nas cidades
verificava-se uma grande quantidade de profissionais liberais (artesão,
comerciantes, advogados, dentre outros), enquanto a grande massa da
população permanecia cativa (SCHWARTZ, 1988).
As questões do trabalho escravo nas áreas rurais apresentaram-
se de diferentes modos. O senhor, como figura máxima desse cenário
sempre teve ampla autoridade para agir, seja com benevolência ou
com crueldade. Existiram aqueles preocupados com o bom rendimento
do trabalho cativo, fornecendo uma boa alimentação e condições
razoáveis de assistência sanitária. Mesmo aqueles senhores mais
benevolentes, buscavam se convencer de que o cativeiro era a melhor
“proteção” para o negro na condição de escravo, e que estes viviam
felizes e alegres, sempre cantando (COSTA, 1998).
Nos últimos anos da escravidão, principalmente no Oeste
paulista, onde predominou de 1850 em diante a lavoura cafeeira,
inicialmente com o emprego de mão de obra cativa, muitos senhores já
previam a substituição desses escravos por colonos. Alguns
fazendeiros mandaram que senzalas fossem derrubadas, para que em
seu lugar fossem construídas casas de três ou quatro cômodos e
cozinha para que futuramente esses trabalhadores livres fossem
abrigados (COSTA, 1998).
Alguns serviços feitos por escravos podiam ser remuneradas,
especialmente aqueles ligados a conservação da propriedade, como a
reparação de estradas, concerto de cercas, limpeza dos córregos. Em
4
outros casos, uma fonte de renda alternativa para os escravos rurais
era o cultivo de roças de subsistência. “Em certas fazendas, era
costume dar a alguns escravos, a título de recompensa, um lote de
terra, onde podiam cultivar gêneros de subsistência, cujo lucro lhes
pertencia” (COSTA, 1998, p. 295). O fato de um senhor ceder alguns
pedaços de terras para que o escravo cultivasse, demonstra a quebra
da hierarquia rigidamente imposta pelo sistema escravista. A
concessão de alguns “privilégios” aos escravos demonstra que era
necessário buscar um equilíbrio dentro dessa relação
fundamentalmente opressora. O senhor permitia as concessões desde
que o escravo seguisse as regras, principalmente a de submissão.
Mesmo que as atividades rurais concentrassem a maior parte dos
trabalhadores escravos, a vida nas cidades também necessitou do
trabalho cativo. Nesse contexto, se observou dois tipos de
estratificação escrava: uma rural, caracterizada pelos canaviais,
engenhos e lavouras de café e outra urbana, especialmente nas
maiores cidades portuárias (Rio de Janeiro, Salvador, Recife).
3 A ESCRAVIDÃO NA CIDADE: NEGROS DE ALUGUEL E DE GANHO

A grande questão quando se trata da escravidão urbana é


compreender as necessidades e as características próprias que essa
forma de trabalho adquiriu na dinâmica das atividades econômicas e
sociais dos centros urbanos. Segundo Leila M. Algranti (1988, p. 47)
“Nesses estudos, as comparações entre o mundo rural e o urbano são
inevitáveis e produtivas, pois permitem a compreensão do sistema
escravista como um todo, acentuam sua amplidão e estabelecem seus
limites”.
O que se destaca nessa abordagem é entender que dentro desse
sistema predominantemente agrário e escravista, “a cidade funciona
como um suporte para o campo” (ROBLES; QUEIROZ, 1987, p. 32),
tornando-se elementar dentro desse pólo administrativo, e nada mais
5
do que um desdobramento do escravismo e não um contraponto, “[...] a
escravidão urbana não é um fenômeno que se contrapõe à escravidão
rural, mas sim um desdobramento do escravismo colonial típico, isto é,
do escravismo rural. Trata-se de um desdobramento lógico e histórico”
(ALGRANTI, 1988, p. 69).
Ao se discutir as características ou as diferenças entre escravidão
rural e urbana, o foco quase sempre acaba sendo o caráter libertador e
flexível que esta segunda representava. A possibilidade que esse
escravo tinha de circular dentro do ambiente urbano levava ao
enfraquecimento da estrutura rigidamente hierárquica da relação
senhor/escravo, uma vez que esse escravo passava a maior parte do
tempo desempenhando suas atividades de forma autônoma, na
maioria das vezes fora de casa e longe do controle senhorial direto.
Essa forma típica de escravidão urbana permitia a esses grupos um
maior contato com outros grupos sociais, possibilitando a troca de
informações, um acesso mais fácil sobre os acontecimentos da colônia.
Mas boa parte deles “usufruindo de momentos de liberdade roubados
aqui e ali, [...] acabavam por se acomodar à escravidão” (ALGRANTI,
1998, p. 51).
Sabendo que dentro do espaço urbano da sociedade colonial o
trabalho manual era considerado desprezível e degradante, muitos
senhores acreditavam que só podiam ser exercidos pelos negros,
libertos ou escravos. “Os libertos, repelidos para as esferas marginais
da sociedade, dividiam com os escravos não só o estigma da cor e a
segregação social, mas também os trabalhos recusados pelos brancos”
(ALGRANTI, 1998, p. 48).
O que se observou nas cidades é que diferente dos espaços
rurais, a propriedade escrava era bastante reduzida. O espaço de
liberdade (tanto do campo quanto da cidade) altera o sentido de
escravidão. Mesmo com um número mais reduzido da propriedade
escrava, o seu emprego era amplamente difundido, uma vez que se
tinha um grande número de proprietários de escravos. Num contexto
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geral da história da escravidão no Brasil, a realidade que se tinha era
essa: um número considerável de senhores com poucos escravos. Mas
a sua concentração em relação ao campo/cidade era variável, tendo o
campo um número reduzido de senhores com muitos escravos, uma
vez que a propriedade agrícola exigia uma demanda muito maior de
trabalhadores, e na cidade, devido ao seu espaço físico reduzido e das
necessidades específicas dos trabalhos, tem-se um número muito
grande de senhores, mas que mantinham um grupo pequeno de
escravos.
Quando um senhor dispunha de um número maior de escravos
do que o necessário, duas possibilidades rentáveis de utilização dessa
mão de obra na cidade são apresentadas, a primeira é alugá-los, e a
outra é o sistema de ganho (ROBLES; QUEIROZ, 1987).
O aluguel de escravos era uma forma comum de escravidão e um
negócio bastante lucrativo, empregado não apenas na cidade, mas
também no campo, em pequenas propriedades principalmente nas
épocas de colheitas (ALGRANTI, 1988). Muitos escravos eram
comprados justamente com o objetivo de alugá-los e para aumentar a
sua valorização, os senhores ensinavam algum tipo de ofício.
Muitos dos jornais do XIX estavam cheios de anúncios de venda e
aluguel de escravos. A imprensa periódica foi um mecanismo de
divulgação da escravidão bastante comum à época.

Imagem 01: Recortes de venda e aluguel de escravos, publicados no


Jornal Província de São Paulo. Fonte: <
http://blogs.estadao.com.br/reclames-do-
estadao/category/escravidao/> (Acesso em abril/2012).

Aqueles que não dispunham de dinheiro suficiente para comprar,


tinham a possibilidade de alugar escravos, de acordo com a
necessidade. Ao analisar esses anúncios, é possível reconhecer:
[...] uma lista pormenorizada de todas as funções
exercidas pelos escravos, o que nos permite ver que
não somente para serviços caseiros se empregavam
os alugados, mas também no artesanato e nas
pequenas indústrias. (COSTA, 1998, p. 280).

Os anúncios de publicidade ressaltavam tanto as qualidades


profissionais do escravo, quanto as suas características físicas.
Paralelo ao sistema de aluguel, o sistema de escravo de ganho
desenvolveu-se de forma abundante nas cidades. Nessa forma de
exploração de trabalho escravo a principal figura, o escravo de ganho,
ia às ruas em busca de trabalho, devendo ao final de um determinado
período, pagar aos seus senhores a soma de uma quantia estabelecida
(ALGRANTI, 1988). 8
Os ganhadores iam à rua encontrar eles próprios
trabalho. Era comum, embora não fosse
generalizado, que os senhores permitissem que
seus escravos até morassem fora de casa, em
quartos alugados às vezes de ex-escravos. Eles só
voltavam à casa para ‘pagar a semanada’, ou seja, a
soma semanal (que podia ser também diária)
contratada com seus senhores; o que mais
ganhassem podiam embolsar. Escravos que desse
duro, em condições favoráveis de mercado,
chegavam a poupar o suficiente para comprar
alforria após anos de suor (REIS, 1993, p. 9 – 10).

Nas cidades alguns trabalhos, principalmente os manuais como


já dito anteriormente, eram desprezados pelos brancos. Logo a
prestação de serviço oferecida pelos escravos de ganho, se mostrava
bastante variada e eficiente. Era comum contratar seus serviços por
um dia, ou por algumas horas. Mas afinal, que tipos de serviços esses
escravos ofereciam?

4 ALGUMAS CATEGORIAS DOS ESCRAVOS DE GANHO

Os escravos de ganho realizavam diversas atividades nos espaços


urbanos. Desde trabalhos simples como ir às compras, transportar
objetos, pessoas, entregar recados, até aquelas tarefas e ofícios mais
elaborados, como os mascates, vendedores, quitandeiras, lavadeiras, e
outros que requeriam certo grau de especialização, como os serviços
de sapataria, alfaiataria, carpintaria, cirurgião-barbeiro, pedreiro.
A imagem do escravo de ganho era bastante comum à paisagem 9
urbana, e surpreendia, especialmente nas cidades portuárias, os
viajantes que aqui chegavam vindos da Europa.

Desembarcado, o estrangeiro deparava com o


espetáculo de uma multidão de escravos, ruidosa e
colorida. Ao longo dos cais, junto ao Mercado,
oferecendo doces ou frutas, angu ou feijão, uma
tigela de café quente e batatas-doces fumegantes,
sardinhas fritas e milho assado, por toda parte
estava o escravo. Eram vendedores ambulantes
aglomerados às esquinas e praças, junto aos
chafarizes, carregadores à espera de serviço, oficiais
de vários ofícios que se ofereciam a quem os
alugasse (COSTA, 1998, p. 278).

Muitos desses viajantes estrangeiros destacavam em seus relatos


a presença dos escravos em bares, praças, mercados, e oficinas. E
quase sempre o negro foi representado realizando ou exercendo algum
tipo de trabalho.

4.1 “GANHADORES DE CESTO OU TINA” E “GANHADORES DE PAU E


CORDA”

Esta categoria de escravos encaixa-se no perfil dos carregadores


de objetos sólidos, líquidos, de pequenos volumes no caso dos
carregadores de cesto (ver imagens 02 e 03), e de grandes volumes no
caso de carregadores de pau e corda. Esta segunda categoria,
geralmente operava em grupos (ver imagem 04) ou em duplas (ver
imagem 05), e também eram conhecidos como negros cangueiros.
Possuíam grande força física e transportavam fardos pesados utilizado
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varas longas e cordas. (REIS, 1993, p. 8)

Imagem 02 (esq.): Preto de ganho. Gravura de Joaquim Lopes de


Barros, Costumes do Brasil. pr.8, 1840. Imagem 03 (dir,): Walter-
carriers (Pretos d’agua). Gravura publicada entre 1846 e 1849 em
Brazilian souvenir. pr.[22]. Fonte: Fundação Biblioteca Nacional.
Disponível em: <http://consorcio.bn.br/>
11

Imagem 04 (esq.): Negros cangueiros trabalhando em grupo. Imagem


5 (dir.): Pretos Cangueiros. Gravura de Joquim Lopes Barros. Costumes
do Brasil. pr. 43. 1841. Fonte: Fundação Biblioteca Nacional.
Disponível em: <http://consorcio.bn.br/>

Os negros carregadores pareciam tomar conta de todo o sistema


de transporte nas cidades. Correndo, caminhando ou marchando,
passavam transportavam de tudo; praticamente substituíam outros
sistemas de transportes de cargas dentro dos espaços da cidade
(COSTA, 1998).
4.2 OS VENDEDORES

Essa categoria de ganho era bastante comum, mas requeria uma


saber um pouco mais aprimorado. No caso dos vendedores, os
produtos comercializados poderiam ser produzidos por eles mesmos,
por exemplo, comidas (angu, bolinhos, café, pães) e objetos de palha
que não demandavam de um conhecimento técnico altamente
elaborado (ROBLES; QUEIROZ, 1987), ou de produtos vindos do
campo, como frutas, legumes, aves, leite, ovos (ver imagens 06 e 07).

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Imagem 06: Nègre vendeurs de volaille. Gravura de Jean Baptiste


Debret. Publicado em Voyage pittoresque et historique au Brésil. t.2,
pl.14. 1835.
Fonte: Fundação Biblioteca Nacional. Disponível em:
<http://consorcio.bn.br/>
Imagem 07: Vendeusr de lait et de capim. Gravura de Jean Baptiste
Debret. Publicada em Voyage pittoresque et historique au Brésil. t.2,
pl.20. 1835.
13
Fonte: Fundação Biblioteca Nacional. Disponível em:
<http://consorcio.bn.br/>

Os vendedores localizavam-se sempre em locais estratégicos da


cidade, permanecendo ali por horas, ou circulando dentro do espaço
urbano, como vendedores ambulantes (COSTA, 1998).

4.3 ESCRAVAS DE GANHO: OS TRABALHOS DAS MULHERES NEGRAS

Mesmo sendo uma minoria, as mulheres também fizeram parte


do cenário da escravidão, tanto rural quanto urbana. Nas cidades, as
escravas negras também eram empregadas tanto no trabalho de ganho
para venda de mercadorias quanto alugadas para serviços domésticos,
como arrumadeiras, lavadeiras, amas de leite.
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Imagem 08 (esq.): A Market scene (Quitandeira). Gravura publicada


ente 1846 e 1849 em Brasilian souvenir. pr.[20]. Imagem 09 (dir.):
Wacher-women (Lavadeiras). Gravura publicada ente 1846 e 1849 em
Brasilian souvenir. pr.[25]. Fontes: Fundação Biblioteca Nacional.
Disponível em: <http://consorcio.bn.br/>
Para o trabalho de venda de venda de mercadorias nas ruas,
geralmente eram escolhidas as negras com melhor aparência.
“Caminhavam de cabeça erguida, o busto empinado, os braços em
ânfora, sustentados à cabeça tabuleiros ou as cestas, meneando os
quadris de maneira ritmada” (COSTA, 1998, p. 278). Entre essas negras
era comum levar as criancinhas consigo quando saiam trabalhar.
Amarradas as costas da mãe, a criança permanecia com os braços e
pernas abertos, enquanto esta desempenha habilmente suas funções
como escravas de ganho.

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Imagem 10 (acima esq.): Preta vendendo bonecras. Gravura de


Joaquim Lopes de Barros. Publicada em Costumes do Brasil. pr.2. 1840.
Imagens 11 e 12 (acima centro e a dir..): Quitandeiras. Gravuras de
Frederico Guilherme. Publicadas ente 1832 e 1836. Fontes: Fundação
Biblioteca Nacional. Disponível em: <http://consorcio.bn.br/>
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Imagem 13 (abaixo): A market stall. Gravura de John Heaviside Clark.
Publicada em 1822. Fontes: Fundação Biblioteca Nacional. Disponível
em: <http://consorcio.bn.br/>

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tanto o escravo de ganho quanto o de aluguel, permaneciam


dependentes do senhor. A diferença é que a possibilidade de um
escravo de ganho adquirir pecúlio para compra de sua alforria era
maior do que a de um escravo de aluguel. Geralmente o escravo de
aluguel, não recebia os lucros de seus serviços, uma vez que isto era
negociado e repassado diretamente para o seu senhor. Já os escravos
de ganho, não prestavam contas do seu trabalho para o senhor,
dispondo do seu tempo da forma que bem entendessem. “O controle do
trabalho era feito através da diária paga pelo escravo” (ALGRANTI,
1988, p. 61).
É fundamental destacar que mesmo que o escravo de ganho
desfrutasse da possibilidade de controlar seu próprio tempo e
trabalho, sem a interferência direta do senhor, ele continuaria ligado
ao sistema através do direito de propriedade. “Ele não podia mudar de
cidade, ou sair a qualquer momento, nem viver onde lhe aprouvesse”
(ALGRANTI, 1988, p. 61). E se caso deixasse de trabalhar, ou de
entregar diariamente a soma estabelecida pelo seu senhor, esse
escravo estaria sujeito à punição. A visão de liberdade para o negro foi
forjada essencialmente na experiência do cativeiro (CHALHOUB,
1998). Mesmo que os espaços urbanos representassem a possibilidade
de uma movimentação mais “livre” do escravo, ela não estaria
desvinculada do sistema de trabalho compulsório da sociedade
escravista.
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REFERÊNCIAS
ALGRANTI, Leila Mezan. O Feitor Ausente: estudo sobre a escravidão
urbana no Rio de Janeiro. Petrópolis: Vozes, 1988.
CHALHOUB, Sidney. Introdução: Zadig e a história. In: Visões da
liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na corte.
São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
COSTA, Emília Viotti da. Aspectos da vida do escravo nas zonas urbana
e rural. In: Da senzala à colônia. São Paulo: Fundação Editora da
UNESP, 1998.
REIS, João José. A greve negra de 1857 na Bahia. Revista USP. São
Paulo, n. 18, p. 7 – 29, jun/jul/ago, 1993.
ROBLES, Suely; QUEIROZ, Reis de. Desenvolvimento do escravismo. In:
Escravidão negra no Brasil. São Paulo: Ática, 1987.
SCHAWARTZ, Stuart B. Segredos Internos: Engenhos e escravos na
sociedade colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.

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