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JOSÉ MARIA G. DE SOUZA NETO . KALINA VANDERLEI P.

DA SILVA

CAMINHOS DA APRENDIZAGEM
HISTÓRICA: TECNOLOGIAS DA
INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NO
ENSINO DE HISTÓRIA
Reitor
Ricardo Lodi Ribeiro

Vice-Reitor
Mario Sérgio Alves Carneiro

Chefe de Gabinete 2
Domenico Mandarino

Edições Especiais Sobre Ontens


Comissão Editorial & Científica
Dulceli Tonet Estacheski [UFMS]
Everton Crema [UNESPAR]
André Bueno [UERJ]
Carla Fernanda da Silva [UFPR]
Carlos Eduardo Costa Campos [UFMS]
Gustavo Durão [UFPI]
José Maria Neto [UPE]
Leandro Hecko [UFMS]
Luis Filipe Bantim [UFRJ]
Maria Elizabeth Bueno de Godoy [UEAP]
Maytê R. Vieira [UFPR]
Nathália Junqueira [UFMS]
Rodrigo Otávio dos Santos [UNINTER]
Thiago Zardini [Saberes]
Vanessa Cristina Chucailo [UNIRIO]
Washington Santos Nascimento [UERJ]

Rede:
www.revistasobreontes.site

Coordenador
José Maria Neto

Ficha Catalográfica

Neto, José Maria Gomes de Souza; Silva, Kalina Vanderlei de Paiva


(org.)
Caminhos da Aprendizagem Histórica: Tecnologias da informação
e comunicação no ensino de História. 1ª Ed. Rio de Janeiro:
Sobre Ontens/Leitorado Antiguo/UERJ, 2021.
ISBN: 978-65-00-24363-5
Ensino de História; Mídias; Novas Tecnologias de Comunicação;
Internet; Games; História em Quadrinhos; Mídias
Sumário
APRESENTAÇÃO............................................................................................................................. 7
O ENSINO REMOTO EM TEMPOS DE PANDEMIA: ESTRATÉGIAS DE ATUAÇÃO PARA O ENSINO
DE HISTÓRIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA
Agenor Leandro de Sousa Filho e Krisley Aparecida de Oliveira ................................................. 10 3

WATCHMEN: O USO DO QUADRINHO COMO RECURSO DIDÁTICO NO ENSINO DE HISTÓRIA


Alesy Soares Oliveira e Benigna Ingred Aurelia Bezerril
BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE PLURALIDADES E DIVERSIDADES IDENTITÁRIAS E SUAS
POSSIBILIDADES DE APLICAÇÃO NO ENSINO POR MEIO DA MÚSICA
Alexia Henning e Vanda Fortuna Serafim ................................................................................... 27
A MÚSICA COMO CONTRIBUIÇÃO PEDAGÓGICA PARA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM NO
ENSINO DE HISTÓRIA
Aline Karine Nunes e Tamar Cristina Ludwig .............................................................................. 34
LIVES PARA A HISTÓRIA: UM CYBERESPAÇO, NOVOS REFERENCIAIS DE PESQUISA
Andrisson Ferreira da Silva e Nedy Bianca Medeiros de Albuquerque....................................... 42
O CINEMA COMO RECURSO AO ENSINO DA HISTÓRIA: ALGUMAS NOTAS INTRODUTÓRIAS À
LUZ DA DIDÁTICA DA HISTÓRIA
Antonio Carlos Figueiredo Costa ................................................................................................. 53
NA PALMA DA MÃO: O USO DE APLICATIVOS DE SMARTPHONES PARA O ENSINO DE HISTÓRIA
Augusto Agostini Tonelli e Letícia da Silva Leite ......................................................................... 63
MEMES E ENSINO DE HISTÓRIA: EXPERIÊNCIAS E APRENDIZAGENS NO COLÉGIO ESTADUAL
ANTÔNIO CARLOS MAGALHÃES, EM TANHAÇU/BA
Auricharme Cardoso de Moura ................................................................................................... 69
O AUDIOVISUAL NO ENSINO DE HISTÓRIA: UMA ANÁLISE SOBRE NOVAS PERSPECTIVAS
PEDAGÓGICAS
Camila dos Santos da Costa e João Pedro da Silveira Guimarães ............................................... 77
REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO DOCENTE E O USO DAS TECNOLOGIAS DIGITAIS NO ENSINO
DE HISTÓRIA
Carlos Alexandre Souza Prado..................................................................................................... 85
“CINECLUBE” COM A HISTÓRIA E O ENSINO À DISTÂNCIA NO PROCESSO DE ENSINO
APRENDIZAGEM
Ivaneide Barbosa Ulisses e Celiana Maria da Silva...................................................................... 91

YOUTUBE, HISTORIADORES E A COLÔNIA: CONFIGURAÇÕES DE UM ESPAÇO


Cintia Venâncio e Leandra Hellen Assunção Santos ................................................................... 97
O ENSINO DE HISTÓRIA NAS SÉRIES INICIAIS EM TEMPOS PANDÊMICOS: UMA EXPERIÊNCIA NO
SUDESTE DO PARÁ
Davison Hugo Rocha Alves ........................................................................................................ 105
ENSINO DE HISTÓRIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA E O USO DE DOCUMENTÁRIOS: NARRATIVAS,
INTERPRETAÇÕES E A CONSCIÊNCIA HISTÓRICA 4
Fabiana Regina da Silva e Rodrigo Luis dos Santos ................................................................... 112
ENSINO DE HISTÓRIA E HISTÓRIAS EM QUADRINHOS: IMAGEM COMO EVIDÊNCIA HISTÓRICA
Fabian Filatow ........................................................................................................................... 120
HISTÓRIA: A NECESSIDADE DO MARKETING
Felipe Fagundes e Luíza Cozzani ............................................................................................... 131
APLICATIVOS EDUCACIONAIS PARA AULAS DE HISTÓRIA: HISTÓRIA LOCAL NA PALMA DA MÃO -
CAXIAS - MA
Francisco Lucas Gonçalves dos Reis e Jakson dos Santos Ribeiro ............................................. 143
CINEMA E HISTÓRIA: ANÁLISE ACERCA DA UTILIZAÇÃO DO CINEMA PARA A PESQUISA E O
ENSINO DE HISTÓRIA, CASO XICA DA SILVA (1976)
Frederico Renan Hilgenberg Gomes ......................................................................................... 151
POSSIBILIDADES NO ENSINO DE HISTÓRIA A PARTIR DO CINEMA: ESTUDOS INICIAIS ACERCA DA
PRODUÇÃO “BESOURO” (2009)
Gabriela Harumi Araki e Maria Rita Chaves Ayala Brenha ........................................................ 160
TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO: O USO DE PODCASTS E GAMES NO ENSINO
Henrique Saraiva Louvem e Luara Alencar Francisco ............................................................... 167
A VIRTUALIZAÇÃO DO LABORATÓRIO DE ENSINO DE HISTÓRIA E ESTÁGIO SUPERVISIONADO
(LEHES)
Ilana Peliciari Rocha e Anelise Martinelli Borges de Oliveira .................................................... 175
APONTAMENTOS SOBRE AS DIFERENTES DIMENSÕES DA CULTURA HISTÓRICA NO JOGO
ELETRÔNICO VALIANT HEARTS - THE GREAT WAR
Irineu João Luiz e Silveira Junior................................................................................................ 181
HISTÓRIA, CINEMA E EDUCAÇÃO: UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS DE REPRESSÃO DO REGIME
MILITAR NO BRASIL ÁTRAVES DO FILME “QUE BOM TE VER VIVA” (1989)
Jacqueline Ferreira Dias e Janaina Mendes da Silva ................................................................. 190
HISTÓRIA DA INDUMENTÁRIA E TEORIA DE MODA: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA DE DEBATE E
DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA ONLINE DURANTE A PANDEMIA, E OUTRAS CONSIDERAÇÕES
Jaqueline da Silva de Oliveira e Natália de Noronha Santucci .................................................. 198
PESQUISA CENSITÁRIA E FORMULÁRIOS ONLINE NO ENSINO DE HISTÓRIA NA EDUCAÇÃO
BÁSICA
João Gilberto Neves Saraiva ...................................................................................................... 207
HISTÓRIA & CINEMA: A II GUERRA MUNDIAL E OS FILMES
João Matheus Ramos e David Antônio de Castro Netto ........................................................... 213
A HISTÓRIA QUE SE APLICA E QUE SE JOGA: “SHOW DOS VARGAS” COMO MEIO
PARTICIPATIVO PARA INTERAÇÃO E APRENDIZADO DOS ALUNOS
José Victor Ferreira Rocha dos Santos e Ana Virginia de Andrade Lima ................................... 222 5

UM PROFESSOR DE HISTÓRIA EM TEMPOS PANDÊMICOS: RELATO DE EXPERIÊNCIA E


REFLEXÃO SOBRE O ENSINO BÁSICO REMOTO
José Ricardo Paulo de Lima ....................................................................................................... 232
INVESTIGANDO A HISTÓRIA: CULTURA HISTÓRICA E PRODUÇÃO AUDIOVISUAL
Josias José Freire Júnior e Vívian Silva de Medeiros ................................................................. 240
SEGUNDA GUERRA MUNDIAL: FILMES COMO ESTRATÉGIA PARA O ENSINO DE HISTÓRIA
Letícia da Silva Leite .................................................................................................................. 249
PLATAFORMAS DIGITAIS E ENSINO DE HISTÓRIA: POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS DO
APLICATIVO KAHOOT
Lorena Michelle Silva dos Santos e Thaís Vinhas ...................................................................... 256
O ENSINO DE HISTÓRIA E O USO DA TECNOLOGIA EM SALA DE AULA
Marcel Martins Guarezi............................................................................................................. 264
O USO DE MAPAS CONCEITUAIS E PODCASTS NA EDUCAÇÃO BÁSICA REMOTA PARA UMA
APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
Maria Luiza Vasconcelos Fernandes de Oliveira e Nadir Andrade Nascimento ....................... 270
CINEMA E EDUCAÇÃO: POSSIBILIDADES E LIMITES
Maria Talia Cordeiro e Ernando Brito Gonçalves Junior ........................................................... 278
UMA “BELA E HIGIENIZADA CIDADE”: ENSINO DA HISTÓRIA LOCAL DE PONTA GROSSA POR
MEIO DO ÁLBUM DA CIDADE DE 1936
Maristela Sant’Ana de Oliveira .................................................................................................. 286
CULTURA HISTÓRICA E A ARTE QUADRINIZADA: REFLEXÕES SOBRE O DIÁRIO DE ANNE FRANK
EM QUADRINHOS
Mirielen Machado Rodrigues .................................................................................................... 293
FÓRUM DE DIÁLOGO: UMA POSSIBILIDADE DE APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA NAS AULAS DE
HISTÓRIA
Priscielli do Carmo Rozo Cerdeira da Rosa e Ronualdo da Silva Gualiume ............................... 299

O PARADOXO HISTÓRICO DA TECNOLOGIA NA EDUCAÇÃO


Rafael de Jesus Pinheiro Privado............................................................................................... 305
O USO DO RAP “ATLÂNTICO” DE THIAGO ELNIÑO COMO UM RECURSO DIDÁTICO EM SALA DE
AULA
Reuther Henning Machado ....................................................................................................... 313
METODOLOGIAS ATIVAS: O USO DAS LINGUAGENS IMAGÉTICAS NAS CIÊNCIAS HUMANAS
Ronualdo da Silva Gualiume e Priscielli do Carmo Rozo Cerdeira da Rosa ............................... 320 6

MÍDIA DIGITAL E ENSINO DE HITÓRIA: USOS E POSSIBILIDADES A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO


PROJETO CONHECENDO “MEU” BAIRRO EM CAXIAS DO MARANHÃO
Ruan David Santos Almeida ...................................................................................................... 327
A AUDIODESCRIÇÃO COMO PROPOSTA DIDÁTICO-METODOLÓGICA NO ENSINO DE HISTÓRIA
PARA ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NO CONTEXTO EDUCACIONAL REMOTO
Sebastiana Valéria dos Santos Moraes ..................................................................................... 337
O BRASIL COLÔNIA EM IMAGENS: USO DE FERRAMENTAS DIGITAIS NA SALA DE AULA
Thiago Augusto dos Santos ....................................................................................................... 345
COMUNIDADES AFETIVAS EM TORNO DO ARTISTA TEIXEIRINHA E O ESPAÇO DIGITAL COMO
POSSIBILIDADE DE FONTE HISTÓRICA
Vitória Duarte Wingert e Jander Fernandes Martins ................................................................ 352
“ELE ESTÁ DE VOLTA”: NEOFASCISMO, ENSINO DE HISTÓRIA E AS REDES SOCIAIS
Ygor Klain Belchior .................................................................................................................... 360
APRESENTAÇÃO
Gostaria de começar esta apresentação olhando para duas imagens:

https://pbs.twimg.com/media/DyryHoyWkAAJOWM.jpg

https://www.inspirationclassic.com/img/lifestyle-2018/6-inventions-from-the-
jetsons-that-are-totally-thing-now.gif

Ambas são provenientes do desenho animados Os Jetsons, uma série de


televisão produzida pela Hanna Barbera entre os anos de 1962 e 1963. Sem
incorrer numa descrição exaustiva (afinal de contas, as reprises constantes
tornaram-na conhecida por gerações de inteiras), os episódios descreviam de
forma bem-humorada as pequenas aventuras quotidianas de uma típica família
(pai, mãe, filhos, cachorro) vivia no então distante ano de 2062 numa cidade
espacial, movendo-se em pequenas espaçonaves para cumprir as atividades
que uma típica família norte-americana dos anos 1960 deveria realizar: o pai o
trabalho; a filha mais velha a high school; o mais novo a escola; e a mãe,
auxiliada por engenhocas variadas e por uma empregada-robô, ficava em casa
cuidando de afazeres “eminentemente femininos”, como se embelezar, vigiar as
tarefas domésticas e conversar com as amigas.
Claro, em sua abordagem bem-humorada Os Jetsons idealizavam um modelo
familiar que não existia nem mesmo no próprio tempo em que era produzida.
Mas mais que isso, a ideia de futuro miraculoso, com veículos aéreos e máquinas
auxiliando o quotidiano parecia simplesmente absurda.

Ainda não chegamos em 2062 (distante de nós pouco mais de quatro décadas), 8
mas muito do mundo profetizado em Os Jetsons já nos cerca: conversamos com
amigos, familiares, alunos, chefes através de videoconferências; as telas nos
informam o que comer, como cozinhar, como andar, como corrigir a postura;
aparelhos esfriam ou esquentam nossos ambientes, aquecem nossas refeições,
avaliam nosso estado de saúde. Nesse ponto somos, de fato, muito parecidos
com os Jetsons.

Mas há um outro elemento no qual somos muito parecidos com eles: como
podemos observar no still número um, eles já tinham acesso até a consultas
médicas à distância (online, diríamos hoje), mas os filhos (como se vê no still
número dois) ainda saíam de casa para aprender: as carteiras hipermodernas e
flutuantes não escondem o fato de que os dois meninos estão em uma sala de
aula – um deles, ainda mais, com um livro aberto.

O cerne da apresentação que ora escrevo é: somos e não somos os Jetsons. A


pandemia nos empurrou violentamente para um mundo cada vez mais parecido
com a realidade em que eles viviam, conseguindo até mesmo romper (ou ao
menos tornar muito perigoso) um elo que nem mesmo a família futurista havia
abandonado: a sala de aula. Porque estudar não é somente deglutir informação,
mas sim, e talvez acima de tudo, é convivência. Estar entre outros seres
humanos, compartilhar experiências (de aprendizagem e outras) com eles, e
nesse processo crescer, intelectual e eticamente.

A pandemia nos levou a um ponto em que talvez só viéssemos a chegar, sem


ela, muito depois, mas os sinais de mudança já haviam sido escutados por
ouvidos mais atentos: as gerações que chegam à escola desejam (e precisam)
de maior interatividade, de um ensino de História que não se limite à enumeração
de fatos ou estruturas ou contextos ou análises. O nosso desafio como
profissionais de história (pela primeira vez reconhecidos oficialmente como
profissão) é trazer nossas ocupações e preocupações através de linguagens que
sejam mais bem compreensíveis pelo nosso público, os alunos. É tornar nossa
voz audível mesmo para quem estiver fora da escola, em trabalhos de extensão,
em atividades de historiadores públicos, em entrevistas nos meios de
comunicação de massa e nos canais da internet. Será necessário que todo
profissional de história se torne um Youtuber? Creio que não, até porque amanhã
ou depois surgirá uma outra plataforma, e outra em seguida. Mais do que fazer
ponto na plataforma do momento, nosso desafio será ocupar da melhor maneira
possível as vias que se abrirem diante de nós.

Os trabalhos reunidos nesse livro indicam que esse esforço já começou. Na


verdade, já tinham começado antes mesmo que a covid se espalhasse pelo
mundo. A doença nada mais foi que um catalisador para nossas ações. Os
vídeos, os jogos, as redes de conhecimento, as rodas de leitura, os filmes...
todas essas são válidas experiências da inserção de mídias e tecnologias em
sala de aula, provas do esforço contínuo que nós, profissionais de história,
precisamos estar sempre dispostos a fazer para exercer nossa profissão.
9
Mais cedo ou mais tarde, a pandemia irá passar, e retornaremos às salas de
aula, mas a experiência das aulas online, dos questionários, dos grupos à
distância, das pesquisas e chats via whatsapp ou qualquer outro meio não deve
ser perdida. Não moramos no céu, não temos pequenas espaçonaves privadas,
mas como o pequeno Elroy Jetson estaremos de volta às nossas salas e
carteiras, mas não ao século XX. Que as experiências aqui reunidas nos ajudem
a pensar nosso caminho daqui em diante.
José Maria Gomes de Souza Neto
O ENSINO REMOTO EM TEMPOS DE
PANDEMIA: ESTRATÉGIAS DE ATUAÇÃO
PARA O ENSINO DE HISTÓRIA NA
10
EDUCAÇÃO BÁSICA
Agenor Leandro de Sousa Filho e Krisley
Aparecida de Oliveira
O ano de 2020 foi marcado por inúmeras mudanças na sociedade brasileira,
mudanças essas que foram causadas por elementos externos à população,
ocasionando assim em transformações bruscas no mercado de trabalho em
diversos segmentos, em especial, no seguimento de educação. Tais mudanças
foram decorrentes da decretação de cenário de pandemia pela Organização
Mundial de Saúde (OMS) no dia 11 de março de 2020, pelo Novo Corona Vírus
causador da COVID-19. Destaca-se que essas modificações tinham por objetivo
promover o isolamento social em massa da população para mitigar os impactos
da pandemia no cenário econômico, bem como também evitar o colapso dos
sistemas de saúde locais.

Diante desse contexto, o setor de educação dos níveis básico ao superior,


esferas pública e privada, viram-se obrigadas a adotar “novas” estratégias para
continuar a promover suas atividades, bem como manter o contato entre
docentes e discentes. Após uma série de medidas adotadas pelo Estado via
edição de portarias, e resoluções dos Conselhos Nacional e Estaduais de
Educação, as instituições de ensino passaram a desenvolver atividades remotas,
fomentadas pelas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC),
disponibilizando aos discentes aulas no formato remoto, a fim de que estes não
saíssem prejudicados em termos de aprendizado.

A modalidade de ensino remoto tornou a transposição didática realizada pelos


docentes desafiadora, em especial, nas disciplinas cujo conteúdo possui cunho
mais teórico, como é o caso da disciplina de História. Neste sentido, o presente
estudo tem como meta responder o seguinte questionamento: Quais as ações
que o docente pode realizar para tornar o ensino de História via TIC, mais
dinâmico para os alunos? Para que tal questionamento fosse respondido a
contento, este estudo de forma teórica, pretende:

Esquematizar metodologias de ensino que o professor pode adotar no processo


de ensino/aprendizagem de conteúdo junto aos seus discentes, já de forma
específica pretende-se destacar como o uso das TIC podem contribuir para um
processo de democratização do ensino e debater como as tecnologias atuam
como forma de aproximação e ao mesmo tempo de distanciamento entre
docentes e estudantes.
Com característica exploratório descritiva, pretende-se proporcionar ao leitor,
maior quantidade de informações sobre a temática proposta, e, por conseguinte
gerar conhecimento. De cunho qualitativo, tem como procedimentos técnicos de
pesquisa a bibliográfica e documental, para tanto foram consultados materiais
com temática central voltada para: Metodologias de Ensino, Tecnologias de 11
Informação e Comunicação em Educação, Ensino de História e Ensino remoto.

O isolamento social decorrente da pandemia de COVID-19 causada pelo novo


Corona vírus, provocou mudanças significativas na sociedade brasileira. Setores
como: Serviços, Indústrias, Construção Civil, Agronegócio, e o Educacional, por
exemplo, tiveram que adotar um conjunto de medidas que garantissem a
segurança de seu quadro de funcionários, e, consequentemente, uma tentativa
de mitigação do número de infecções no país.

No setor educacional brasileiro, o primeiro documento normatizador que serviu


de base legal para a adoção do regime remoto de ensino, foi a medida provisória
nº: 934 de 1 de abril de 2020, posteriomente convertida em lei de número
14.040/2020, que dispõem de orientações excepcionais a serem adotadas pelos
sistemas de ensino, dos níveis básico ao superior, enquanto perdurar o estado
de emergência em saúde causado pela pandemia. Em razão disso, o documento
em questão determina que:

“Art. 2º Os estabelecimentos de ensino de educação básica, observadas as diretrizes


nacionais editadas pelo CNE, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e as normas
a serem editadas pelos respectivos sistemas de ensino, ficam dispensados, em caráter
excepcional:
I – na educação infantil, da obrigatoriedade de observância do mínimo de dias de
trabalho educacional e do cumprimento da carga horária mínima anual previstos no
inciso II do caput do art. 31 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996;
II – no ensino fundamental e no ensino médio, da obrigatoriedade de observância do
mínimo de dias de efetivo trabalho escolar, nos termos do inciso I do caput e do § 1º do
art. 24 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, desde que cumprida a carga horária
mínima anual estabelecida nos referidos dispositivos, sem prejuízo da qualidade do
ensino e da garantia dos direitos e objetivos de aprendizagem, observado o disposto no
§ 3º deste artigo.
§ 1º A dispensa de que trata o caput deste artigo aplicar-se-á ao ano letivo afetado pelo
estado de calamidade pública referido no art. 1º desta Lei.
§ 2º A reorganização do calendário escolar do ano letivo afetado pelo estado de
calamidade pública referido no art. 1º desta Lei obedecerá aos princípios dispostos no
art. 206 da Constituição Federal, notadamente a igualdade de condições para o acesso
e a permanência nas escolas, e contará com a participação das comunidades escolares
para sua definição.
[...]§ 4º A critério dos sistemas de ensino, no ano letivo afetado pelo estado de
calamidade pública referido no art. 1º desta Lei, poderão ser desenvolvidas atividades
pedagógicas não presenciais:
I – na educação infantil, de acordo com os objetivos de aprendizagem e
desenvolvimento dessa etapa da educação básica e com as orientações pediátricas
pertinentes quanto ao uso de tecnologias da informação e comunicação;
II – no ensino fundamental e no ensino médio, vinculadas aos conteúdos curriculares de
cada etapa e modalidade, inclusive por meio do uso de tecnologias da informação e
comunicação, cujo cômputo, para efeitos de integralização da carga horária mínima 12
anual, obedecerá a critérios objetivos estabelecidos pelo CNE.
§ 5º Os sistemas de ensino que optarem por adotar atividades pedagógicas não
presenciais como parte do cumprimento da carga horária anual deverão assegurar em
suas normas que os alunos e os professores tenham acesso aos meios necessários
para a realização dessas atividades.
§ 6º As diretrizes nacionais editadas pelo CNE e as normas dos sistemas de ensino, no
que se refere a atividades pedagógicas não presenciais, considerarão as
especificidades de cada faixa etária dos estudantes e de cada modalidade de ensino,
em especial quanto à adequação da utilização de tecnologias da informação e
comunicação, e a autonomia pedagógica das escolas assegurada pelos arts. 12 e 14
da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996” (BRASIL, 2020, grifos do autor).

A edição de documento normatizador em conjunto com os pareceres emitidos


pelo Conselho Nacional de Educação de números CNE/CP nº: 5 e 9/2020
possibilitaram que os sistemas de ensino definissem meios de atuação para o
desenvolvimento das atividades de ensino remoto via TIC. Considera-se o uso
das TIC para o desenvolvimento de atividades didáticas em sala de aula, como
um instrumento inovador, dado o fato de que o emprego dessas ferramentas,
indiretamente democratiza o acesso ao ensino. Porém, a transposição didática
de conteúdos nesta modalidade de ensino é algo desafiador, pois é necessário
que se estabeleça uma metodologia que vá de encontro com as necessidades
informacionais do estudante, ou seja, um ensino com equidade, que torne a
apresentação do conteúdo dinâmica, e que ao mesmo tempo instigue o discente
a participar das aulas.

“[…] muitos professores tiveram que fazer adaptações às atividades docentes,


por vezes fazendo uso da tecnologia para o ensino remoto, sem
necessariamente ter a garantia de que os alunos, ou eles próprios, teriam tais
ferramentas à disposição. Há que se destacar, ainda, que a formação docente,
em geral, não contempla reflexões (aprofundadas) sobre o ensino não-
presencial. Ainda, o contexto do ensino remoto parece intensificar as jornadas
de professores que dividem seu tempo entre trabalho, família, casa e outras
demandas. Finalmente, recortes de gênero, classe, raça, entre tantos outros
reforçam um cenário complexo e estrutural de desigualdades que já fazia parte
da realidade escolar [...]” (FARIAS, SILVA, 2020, p. 229).

A realidade complexa do sistema educacional brasileiro, torna a atuação docente


desafiadora, isto porque, é necessário que este primeiramente tenha acesso as
TIC, e, por conseguinte, passe por um processo de treinamento que possa
auxiliá-lo sobre como transpor didaticamente os conteúdos da disciplina no
ensino remoto. É importante ter em mente que no ensino remoto por ser mediado
pelas TIC rompe as barreiras de espaço, proporcionando um distanciamento
entre professor e aluno, fazendo com que este tenha maior dificuldade para
perceber qual o comportamento do estudante sobre o conteúdo apresentado.
Reforçando assim, a necessidade de se estabelecer metodologias de ensino que
instiguem o estudante a participar das aulas, ou seja, metodologias que aos
poucos possam tornar o estudante protagonista em seu processo de 13
aprendizado.

Conforme aponta Circe Fernandes Bittencourt (2018) o ensino de história passou


por diversas mudanças ao longo de sua trajetória escolar, o que, corroborando
com o fato de que apesar de as TIC já existirem, todavia, não eram tão utilizadas
como no formato adotado nesse momento de pandemia.

Ainda de acordo com Bittencourt, o ensino de história passa por uma


ressignificação que envolve a mudança de postura entre a perspectiva
mnemônica “sobre um passado criado para sedimentar uma origem branca e
cristã, apresentada por uma sucessão cronológica de realizações de ‘grandes
homens’” (2018, p. 127) para uma nova disciplina, com seus paradigmas
metodológicos, que tentam incorporar uma multiplicidade de outros sujeitos
construtores da nação, como é o caso do ensino de história da África e da cultura
afro-brasileira, dos povos indígenas e das mulheres.

Sendo assim, se a própria metodologia do ensino de história vem passando por


atualizações constantes em busca de melhor explicar e dar sentidos, o que já é
considerado um desafio em aulas presenciais, no contexto do ensino remoto,
este cenário que se coloca em relação ao ensino de história dentro da
perspectiva semelhante à modalidade de educação à distância, torna a missão
de ensinar ainda mais desafiadora.

Isléia Streit (2010), destaca que se o professor no decorrer de seu processo


formativo, no curso de licenciatura, tiver contato com as vantagens e
possibilidades que as TIC’s oferecem, ele certamente, em sua prática
pedagógica, enquanto docente, posteriormente, terá maiores condições de
estimular os alunos na construção de saberes em sala de aula, tornando esta
aula mais dinâmica, em relação não apenas em como utilizar as TIC’s em sala
de aula, mas no conteúdo que está sendo ministrado.

De acordo com a autora, em uma pesquisa feita tendo como base geográfica a
região Sul do país, onde é realizada uma investigação acerca das instituições de
ensino superior da região que ofertam cursos de licenciatura em História na
modalidade EaD, observou-se que nessas instituições é fomentada uma cultura
do EaD nos gestores, professores, pesquisadores e alunado, o que contribui
para propriciar novas e diversas práticas de ensino que são características dessa
modalidade: “Dessa forma, as ações de Educação a Distância implementadas,
devem criar o perfil docente e discente apto para ensinar e aprender com
qualidade nesse desafiante cenário educacional ao qual estamos inseridos”
(STREIT, 2010, p. 10).
Sendo assim, tomando como base o referido estudo para discussão sobre a
implementação do EaD, podemos pensar de maneira crítica a relação entre o
ensino de história, o contexto de pandemia e as TIC’s, uma vez que, o ensino à
distância está regulamentado no Brasil desde o fim da década de 1990 e os
esforços para que essa modalidade de ensino fosse cada vez mais difundida e 14
que os professores possuíssem formação específica para lidar com esse modelo
de ensino/aprendizagem já são antigos.

Todavia, apesar dessa modalidade de ensino não ser relativamente nova, é


necessário ponderarmos que, a educação presencial, em todos os níveis, do
básico ao superior, ainda é massiva. E por vezes, existe preconceito em relação
ao EaD, com noções e perspectivas de que o ensino à distância não possui a
mesma qualidade que o presencial.

Devemos levar em consideração ainda, que o momento de pandemia e medidas


como as citadas inicialmente, não estão dentro de uma matriz fundamentada do
EaD, mas sim dentro de um contexto de ensino remoto, não possuindo o mesmo
planejamento do EAD. Portanto, o ensino remoto, nos moldes aos quais se faz
presente, é uma adaptação da educação presencial para que professor e aluno
não sejam prejudicados no decorrer do ano letivo. Porém, é importante observar
que pelo fato de vivermos em uma sociedade marcada pela forte desigualdade
social, nem todos indivíduos possuem acesso as TIC’s, e, por conseguinte,
acesso à internet. Fato este que torna a imposição do ensino na modalidade
remota mesmo em tempos críticos para a Educação algo restritivo, pois desta
forma o acesso à educação acaba sendo destinado apenas para quem possui
acesso as TIC’s e à internet indo contra um dos preceitos da Constituição
Federal de 1988 que é o de equidade no acesso à educação.

É certo que muitas instituições de ensino, principalmente as da rede privada, já


conseguiram se adaptar melhor e preparar seu corpo docente para tais
atividades, todavia, não é o que ocorre na maior parte do país. De acordo com
uma pesquisa realizada pela Fundação Carlos Chagas, onde foram ouvidos
professores(as) da educação básica de todas as 27 unidades da federação entre
abril e maio de 2020, 65% dos entrevistados afirmam que o trabalho pedagógico
aumentou ou mudou, principalmente envolvendo interfaces e ferramentas
digitais.

Em meio ao contexto pandêmico, é fundamental ressaltar o papel do professor


enquanto agente de transmissão de informações, e, por conseguinte de
auxíliador ao estudante na construção de conhecimento. Não sendo aquele que
detém todas as respostas ou a “verdade absoluta”, mas um agente que precisa,
de antemão, se antecipar e preparar pressupostos e dinâmicas de
ensino/aprendizagem que deverão fomentar a aula no sentido de trazer
dinamicidade e interesse dos alunos.
Para isso, no ensino de História, podemos destacar ferramentas que podem ser
úteis, algumas que já eram exploradas no ensino no presencial, como é o caso
da utilização de filmes em sala, para tratar de temas históricos e marcantes. Com
ferramentas como o Google Meet, plataforma que está sendo amplamente
utilizada em reuniões e encontros síncronos, por permitir a transmissão de
vídeos e áudios em alta qualidade, quando utiliza-se a aba “Uma guia do 15
Chrome”. Ou até mesmo utilizar o aplicativo Rave, disponibilizado para
aparelhos celulares, que propicia a projeção de filmes em tempo real, em salas,
com possibilidade de debate e interação.

O Look História é um aplicativo que pode auxiliar os alunos para retirarem


dúvidas para além das aulas, nele os alunos encontram pequenos vídeos
explicativos, que dividem os períodos históricos permitindo ao estudante
consultar aquele que tiver interesse. Outro aplicativo também gratuito e muito
interessante é o Presidentes do Brasil, que disponibiliza informações sobre
todos os presidentes que o país já teve, anos de mandato e as principais
características do governo.

Outra ferramenta que vem sendo utilizada e pode dinamizar as aulas em relação
as atividades propostas pelo docente é o Kahoot, que permite o professor criar
seu próprio quiz em forma de jogo para que os alunos possam se divertir e, ao
mesmo tempo, fixar o conteúdo ministrado em aula, a ferramenta pode ser
utilizada pelo docente em uma aula síncrona, ou, de maneira assíncrona.

Seguindo essa mesma linha de ferramentas utilizadas para a verificação de


aprendizagem, temos o App Prova, que contém diversas provas do Enem e de
vestibulares de todo o país. Nele o estudante pode realizar testes, ver como está
seu desempenho diante dos demais concorrentes e, ainda oferece uma análise
acerca dos conteúdos que ele deverá ser estudar mais.

Uma maneira de diversificar o ensino/aprendizagem na disciplina de História


também, é utilizar as visitas guiadas aos locais patrimoniais, culturais e turísticos
do contexto local ou regional, apresentando aos estudantes a experiência do
conhecimento da história dos locais aos quais estão inseridos. Pode-se, por
exemplo, passar os links dos museus para que os estudantes conheçam as
instalações, mostras e etc., inúmeros museus disponibilizaram tours on-line em
360º, sendo possível escolher o cômodo e visualizar os objetos presentes. Em
relação ao ensino regional, também há a possibilidade do uso de imagens
históricas dos locais importantes nas cidades, disponibilizadas em acervos
públicos on-line e a comparação dos espaços atualmente, para instigar os alunos
a pensarem a questão espacial e a modernização.

Há outras ferramentas gratuitas que auxiliam o docente no processo de


preparação e disponibilização das aulas, como a ferramenta Google Meet, para
as aulas síncronas. O Google Classroom (ou, Google Sala de Aula) que
possibilita a disponibilização de matérias como textos, arquivos com slides,
vídeos e etc., permitindo também que o estudante responda e poste atividades,
facilitando a organização do professor. O Google Forms (ou, Google Fomulários)
que permite a criação de formulários, com possibilidade de perguntas com
múltipla escolha, escolha única e também respostas dissertativas.

Outra ferramenta que auxilia na organização e no preparo das aulas, bem como
no processo comunicativo é o ClassDojo, que possibilita a comunicação entre 16
professores, alunos, pais e gestores escolares. Nele o professor pode criar
comunidades com os alunos e registrar os bons momentos deles em sala de
aula, compartilhando essas experiências com os pais.

O que pode também ser utilizado tanto no auxílio para a comunicação mais
rápida com os alunos, quanto para encaminhar atividades, textos e vídeos não
tão longos, é o WhatsApp. A criação de grupos das turmas, seja com os alunos,
seja com os responsáveis, dinamiza a ação comunicativa entre docente e
discente permitindo melhor interação.

Sendo assim, existem ferramentas, desde as mais simples e popularizadas para


o uso em outras ocasiões, até as especializadas, que podem auxiliar o professor
nesse novo processo de ensino/aprendizagem, lembrando, claro, como já
exposto ao início do texto, que a educação está sempre em movimento e é
necessário que as práticas pedagógicas sejam sempre atualizadas. E
ponderando também que nesse contexto de pandemia, com inúmeras
dificuldades tanto para os alunos quanto para os professores, desde o acesso a
redes de internet de qualidade até o processo de capacitação dos profissionais
da educação, esse modelo de aulas remotas se coloca enquanto um desafio a
ser superado. Ou, se não superado, ao menos analisado com maior atenção e
cuidado, para que estudantes e professores não adoeçam na tentativa de
alcançar um padrão que ainda não está bem-posto no horizonte da educação.

Referências biográficas
Agenor Leandro de Sousa Filho, Mestre em Biblioteconomia pela Universidade
Federal do Cariri (UFCA), Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade
Federal do Ceará (UFC), graduando em Licenciatura em História pela
Universidade de Taubaté (Unitau) e em Ciências Sociais pela Universidade
Regional do Cariri (URCA).

Mestra Krisley Aparecida de Oliveira, Professora de História da Universidade


Estadual de Goiás – Campus Sudoeste (UEG), Doutoranda em História pela
Universidade Federal de Goiás (UFG), Mestra em História pela Universidade
Federal de Goiás (UFG), Especialista em História e Narrativas Audiovisuais pela
Universidade Federal de Goiás (UFG) e licenciada/bacharela em História pela
Universidade Federal de Goiás (UFG).

Referência bibliográficas
BITTENCOURT, Circe Fernandes. Reflexões sobre o ensino de
História. Estudos Avançados, São Paulo, v. 32, n. 93, p. 127-149, 2018.
Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/ea/v32n93/0103-4014-ea-32-93-
0127.pdf Acesso em: 20 fev. 2021

BRASIL, Lei 14.040 de 18 de Agosto de 2020. Estabelece normas


educacionais excepcionais a serem adotadas durante o estado de calamidade
pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020; e 17
altera a Lei nº 11.947, de 16 de junho de 2009. Brasília: Presidência da
República, 2020. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-
14.040-de-18-de-agosto-de-2020-272981525 Acesso em: 23 fev. 2021

BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. CONSELHO NACIONAL DE


EDUCAÇÃO. Parecer CNE/CP Nº:5/2020. Reorganização do Calendário
Escolar e da possibilidade de cômputo de atividades não presenciais para fins
de cumprimento da carga horária mínima anual, em razão da Pandemia da
COVID-19. Brasília, DF: Conselho Nacional de Educação, 2020. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias
=14511-pcp005-20&category_slud=marco-2020-pdf&Itemid=30192 Acesso em:
22 fev. 2021

BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. CONSELHO NACIONAL DE


EDUCAÇÃO. Parecer CNE/CP Nº:9/2020. Reexame do Parecer CNE/CP nº
5/2020, que tratou da reorganização do Calendário Escolar e da possibilidade
de cômputo de atividades não presenciais para fins de cumprimento da carga
horária mínima anual, em razão da Pandemia da COVID-19. Brasília, DF:
Conselho Nacional de Educação, 2020. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias
=147041-pcp009-20&category_slug=junho-2020-pdf&Itemid=30192 Acesso
em: 22 fev. 2021

FARIAS, P. F.; SILVA, L. Ensino em tempos críticos: a criação de um podcast


para a promoção do diálogo crítico docente no contexto da pandemia de
COVID-19. AtoZ: novas práticas em informação e conhecimento. Curitiba, v. 3,
n. 2, p. 229-233, 2020. Disponível em:
https://revistas.ufpr.br/atoz/article/download/76147/42602 Acesso em: 12 fev.
2021

STREIT, Isléia Rössler. A formação do professor de história e as tecnologias da


informação e da comunicação (TICS). In: X ENCONTRO ESTADUAL DE
HISTÓRIA: O BRASIL NO SUL, CRUZANDO FRONTEIRAS ENTRE O
NACIONAL E O REGIONAL. 2010, Santa Maria – RS. Anais eletrônicos do
Encontro Estadual de História. Disponível em: http://www.eeh2010.anpuh-
rs.org.br/resources/anais/9/1279112989_ARQUIVO_artigoXencontrodehistoria.
pdf Acesso em: 22 fev. 2021.

VILLAS BÔAS, Lúcia; UNBEHAUM, Sandra. Educação escolar em tempos de


pandemia. Fundação Carlos Chagas, 2020. Disponível em:
https://www.fcc.org.br/fcc/wp-content/uploads/2020/06/educacao-pandemia-
a4_16-06_final.pdf Acesso em: 22 fev. 2021.

18

WATCHMEN: O USO DO QUADRINHO COMO


RECURSO DIDÁTICO NO ENSINO DE
HISTÓRIA
Alesy Soares Oliveira e Benigna Ingred Aurelia
Bezerril
O presente trabalho tem como objetivo apresentar algumas potencialidades do
uso de história em quadrinhos no ensino-aprendizagem de História. Para isso,
apresentaremos algumas considerações sobre ensinar História em diálogo com
o recurso didático selecionado, assim como iremos apresentar algumas
possibilidades de assuntos que podem ser abordados a partir de Watchmen.
Este trabalho foi pensado a partir da experiência na disciplina de Seminário da
Linha de Pesquisa III do Programa de Pós-Graduação em História da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Na mencionada disciplina, vêm
sendo analisadas e discutidas as experiências históricas e artísticas na produção
de Alan Moore.

Embaixo do capuz de Alan Moore


Alan Moore nasceu na Inglaterra em 1953. Ele iniciou sua carreira com histórias
em quadrinhos no final dos anos 1970. Ele foi autor de obras como V de
Vingança, Monstro do Pântano, A Liga Extraordinária, Watchmen, Neonomicon,
Batman – A Piada Mortal dentre outras.

A narrativa da obra Watchmen se passa no ano de 1985. Os Estados Unidos se


encontram enquanto uma nação totalitária e fechada, isolada do resto do mundo,
como está referido em seu texto de apresentação. Com o avanço das forças
bélicas contidas nas figuras das armas nucleares, assim como também os super-
heróis, o jogo político será recheado entre as superpotências mundiais. A HQ
tem seu início com a visão de Rorschach, um outrora herói, que investiga a morte
do seu colega de profissão, o Comediante. A partir disso, a narrativa caminha
sobre as figuras das duas gerações de heróis mascarados que expressam suas
angústias e abstrações com o pano de fundo da Guerra Fria e conflitos
envolvendo seus lugares no mundo, que se mostra cru e inóspito pelas lentes de
Alan Moore.
Watchmen é uma História em quadrinhos, muitas vezes considerada como
novela gráfica numa pretensa tentativa de diferenciação, que em todos os casos,
foi arrebatadora para sua geração e mais ainda para a linguagem dos
quadrinhos. O seu texto aborda o país Estados Unidos, em situação de distopia,
com caminhos diferentes acerca da Guerra Fria, arranjado em um mundo de
super-heróis. Nesse ambiente, os heróis estão em decadência e seus papéis na 19
sociedade são questionados. A presença de subtextos dialogando com temas
do mais diversos é uma característica das obras de Alan Moore que consegue
em uma página tratar sobre discussões entre política, metafísica ou mesmo
esoterismo, com uso de linguagens auxiliares como contos, matérias de jornais
ou romance, tudo isso infundido em uma narrativa densa e adulta com temas
bastante caros à nossa sociedade atual e com um final apoteótico e clássico de
nascença.

Resumir a obra de Watchmen é uma tarefa difícil, pois seria quase inevitável
deixar de tratar pontos caros ao objetivo presente neste texto. Dessa forma,
assumindo essa característica, a direção do olhar será pautada nas
possibilidades de usos no ensino de História a partir das referências presentes
na obra supracitada.

Mediante o trabalho com as obras de Moore, aprofundamos especialmente os


estudos acerca de Watchmen, pois escolhemos tal obra para desenvolvermos
um trabalho na disciplina. A partir das discussões sobre Watchmen durante as
aulas, nasceu a ideia de pensar a presente proposta de ensino-aprendizagem
em História. Aqui, podemos ressaltar a importância da aproximação dos
conhecimentos produzidos na academia com o ensino básico. É pertinente
pensar, ainda, na importância da experiência que tivemos com o Programa
Residência Pedagógica nos anos de 2018 a 2020, quando ainda éramos
graduandos em História. Hoje, incentivados pelo professor da já mencionada
disciplina da pós-graduação e pela trajetória no Residência Pedagógica, damos
ênfase no objetivo de cada vez mais colaborar com a aproximação desses
espaços.

Os quadrinhos como recurso didático no ensino de História


Ao traçar a trajetória da aproximação das histórias em quadrinhos em sala de
aula, Douglas Lima indica que para além de iniciativas voltadas para a linguagem
dos quadrinhos do Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), as quais
não objetivamos adentrar no presente trabalho, mas que são de grande
importância para a aproximação, “cabe lembrar outros fatores que também
contribuíram para tal cenário. Primeiramente, a crescente presença dos
quadrinhos no meio acadêmico” (LIMA, 2017, p. 152). Podemos afirmar a
pertinência da colocação de Lima, pois, como já comentado, trabalhar história
em quadrinhos no meio acadêmico nos deu impulso para pensar a presente
proposta para a sala de aula do ensino básico e esperamos poder colocá-la em
prática em breve ou colaborar para que outros colegas possam utilizar tal recurso
didático.
Destacamos, também, a importância de pensar a faixa-etária do público o qual
pode-se destinar o uso de tal obra. Pensamos na utilização de Watchmen em
aulas do ensino médio ou na Educação para Jovens e Adultos (EJA).

Por que usar história em sala de aula? Como esse recurso didático pode
contribuir com a construção de saberes históricos? Quais são as suas 20
potencialidades? Primeiramente, é essencial pensarmos que ao elegermos um
recurso didático, é imprescindível que o professor domine o conteúdo sobre o
qual dará aula, pois:

“Os recursos didáticos são apenas auxiliares no processo de ensino-


aprendizagem [...] cabe salientar que os recursos em si não são eficientes ou
ineficientes, pois para atribuirmos essas características aos recursos, depende
da forma como eles serão utilizados pelo professor” (BRITO, 2003, p. 19).

Douglas Lima aponta que as histórias em quadrinhos possibilitam que os


estudantes demonstrem maior motivação em relação aos conteúdos de
determinada matéria escolar, ajudam no desenvolvimento do senso crítico e da
leitura de texto e imagem, contribuem para o aumento ou criação de um hábito
de leitura dentre outras potencialidades. No ensino de História, Lima indica que
nas últimas décadas a utilização das histórias em quadrinhos tem se efetivado
gradualmente. Para o autor, isso se deve, especialmente, devido à noção plural
de fontes no meio historiográfico e pela abertura de utilização de novas
linguagens no espaço escolar (LIMA, 2017).

Além das próprias HQs que são produzidas objetivando tratar de fatos históricos
e exercer papel educativo, há a possibilidade trabalhar os quadrinhos produzidos
para outros fins, mas que com o direcionamento e auxílio de outros materiais,
até mesmo do livro didático, podem ganhar forma de recurso didático em sala de
aula. Para isso, podemos lançar perguntas externas à narrativa da história em
quadrinhos: quem a escreveu? Quando foi lançada? Podemos traçar o perfil de
seu autor e levantar hipóteses das possíveis influências políticas e sociais e de
como tais elementos podem emergir em personagens e enredos ficcionais das
histórias em quadrinhos. É pertinente investigar e discutir com o estudante o
contexto externo das histórias em quadrinhos, pois, como indica Keliene Silva as
HQs são: “portadoras de discursos carregados de intencionalidades dos grupos
onde são produzidos, assim como buscam canal de diálogo com o público que
pretendem atingir” (SILVA, 2016, p. 148).

Acerca do fazer histórico e pedagógico em sala de aula, um dos desafios


apontados por Maria Schmidt é o de realizar a transposição didática dos
conteúdos e métodos históricos. A transposição didática do saber histórico,
dentre outros aspectos, indica

"procedimentos para que se trabalhe a compreensão e a explicação histórica.


[...] Destacam-se a problematização, o ensino e a construção de conceitos, a
análise causal, o contexto temporal e o privilégio da exploração do documento
histórico” (SCHMIDT, 2004, p. 59).

Considerando esses elementos da construção do saber histórico em sala de


aula, ao abordar Watchmen é pertinente problematizar a obra. A
problematização histórica pode ser dada pela pergunta mais simples lançada ao 21
objeto de estudo como, por exemplo, “onde?”, “quando?”, “por que?”. Além disso,
o contexto temporal indica pensar o momento no qual a obra em questão foi
criada, considerando até mesmo o perfil do autor. Essas buscas podem ser
auxiliadas com livro didático que tenha textos sobre o mundo após a Segunda
Guerra Mundial, assim como o professor pode trazer texto de apoio e pedir
pesquisas sobre determinados assuntos que possibilitem a apropriação da obra
por parte dos estudantes, sua análise e possibilidade de responder às perguntas
lançadas.

Coordenando essa discussão no ambiente escolar, Douglas Lima trata sobre a


ampliação do uso dos quadrinhos em sala de aula. Ele faz um pequeno balanço
do histórico que os quadrinhos enfrentaram com críticas e resistências
desenvolvidas ao longo do século XX, no qual conseguiram resistir, afastando-
se do ideário limitador que compreende essa linguagem como leitura exclusiva
de crianças para serem entendidos como forma de entretenimento de diversos
públicos. Quanto ao campo da educação, o movimento de aceitação e
incorporação dos quadrinhos foi consolidado ao final do século XX ganhando
mais força desde então (LIMA, 2017).

Lima, ao citar Vergueiro (2014), considera que na discussão em relação aos usos
dos quadrinhos em sala de aula existem muitas práticas fortuitas que possibilitam
uma boa condução da aula:

“As HQs aumentam a motivação dos estudantes para o conteúdo das aulas,
aguçando a curiosidade e desafiando seu senso crítico; a interligação do texto
com a imagem, presente nas HQs, amplia a compreensão de conceitos de uma
forma que qualquer um dos códigos, isoladamente, teria dificuldades para atingir;
as HQs versam sobre os mais diferentes temas, sendo facilmente aplicáveis em
qualquer área, além de apresentarem uma linguagem mais assimilável; a
inclusão dos quadrinhos na sala de aula possibilita ao estudante ampliar seu
leque de meios de comunicação, incorporando a linguagem gráfica à linguagem
oral e escrita, que normalmente utiliza; os quadrinhos auxiliam no
desenvolvimento do hábito de leitura; os quadrinhos enriquecem o vocabulário
dos estudantes; o caráter elíptico da linguagem dos quadrinhos obriga o leitor a
pensar e imaginar, tornando as HQs especialmente úteis para exercícios de
compreensão de leitura e como fontes para estimular os métodos de análise e
síntese de mensagens; os quadrinhos têm caráter globalizador, trazem
temáticas que têm condições de ser compreendidas sem necessidade de um
conhecimento prévio específico ou da familiaridade com o tema; os quadrinhos
podem ser utilizados em qualquer nível escolar e com qualquer tema” (apud
LIMA, 2017, p. 152).
Vilela considera que as HQs podem ser usadas como documentos históricos no
sentido de que elas são artefatos culturais. Sua característica funciona enquanto
uma narrativa, mais predominantemente visual e, embora também se utilizem de
textos:
22
“Devido a supremacia do texto, que ainda persiste no meio acadêmico, e
também no ensino de História na Educação Básica, ainda existe algum
preconceito em relação a linguagem imagética parte de alguns historiadores e
também certo receio por parte de professores de história, pois a formação da
maioria deles ainda não contempla uma educação do olhar e enfatiza ainda a
leitura de textos, sejam eles historiográficos, didáticos ou fontes escritas em
geral” (VILELA, 2012, p. 33).

A obra Watchmen, com os devidos apoios didáticos, pode também possibilitar a


construção de conceitos junto aos estudantes. A partir de análises considerando
os elementos citados anteriormente, conceitos podem ser abordados em sala de
aula com a devida participação do alunado na construção e na apropriação dos
tais. Por fim, também apontamos a análise causal como elemento pertinente e
possível ao trabalhar a obra de Alan Moore no ensino básico. Como aponta
Schmidt:

“Sem perder de vista a complexidade dessa questão [da análise causal], é


importante possibilitar aos alunos compreensão de que os acontecimentos
históricos não podem ser explicados de maneira simplista. [...] Muito mais que
as determinações causais, é importante levar o educando à compreensão das
mudanças e permanências, das continuidades e descontinuidades” (SCHMIDT,
2004, p. 60).

Partindo da análise causal e da consideração de relações de mudanças e


permanências e das continuidades e descontinuidades, ao eleger Watchmen
como recurso didático no ensino de História, faz-se importante buscar a
explicação de determinados contextos de forma plural, buscando compreender
determinados fatos históricos a partir de causalidades encadeadas. Além disso,
a obra possibilidade abordar contextos históricos sobre os quais rupturas e
continuidades, por exemplo, podem ser colocadas em análise, como é o caso do
papel feminino no século XX, considerando as ondas do movimento feminista, a
influência do contexto pós-guerra dentre outros elementos. E é sobre este
assunto que vamos nos deter brevemente a seguir.

Possibilidades Didáticas em Watchmen


Lançada entre os anos de 1986 e 1987, Watchmen se passa em uma realidade
alternativa do nosso planeta. Segundo Ícaro Silva, a HQ foi criada em um
contexto em que:

“Os Estados Unidos vivem um dos momentos mais tensos e conturbados de sua
história, decorrentes de uma política doméstica equivocada, nos tempos da
Guerra Fria, com pouca atenção aos ditos ‘problemas de casa’ e muito foco na
situação internacional” (SILVA, 2019, p. 31).

A realidade paralela da obra funde ficção e realidade, sendo sua narrativa


desdobrada tendo como pano de fundo eventos históricos, assim como tendo
personagens criados a partir de gatilhos históricos, “sendo assim, sob uma 23
constante ameaça de guerra nuclear e toda desordem durante o período da
Guerra Fria, diversas manifestações sociais protagonizadas por minorias
ocorreram no mundo”. (SILVA, 2019, p. 31)

Mediante tal contexto, apontamos aqui a presença dos movimentos sociais como
pano de fundo da obra. A exemplo disso, o movimento feminista pode ser
elencado para pensar algumas narrativas criadas por Moore.

Fonte: MOORE, Alan. Watchmen. São Paulo: Editora Abril, 1999.

O que uma cena, um cartaz e um diálogo aparentemente despretensiosos em


Watchmen podem nos contar? O período da Guerra Fria também foi perpassado
por construções da imagem feminina. Nos Estados Unidos da América, a
imagem da mulher dona de casa, do padrão de beleza e de comportamento
feminino e a exploração de seus corpos era valorizado e difundido pelos mais
diferentes meios de comunicação. Longe de ser o primeiro momento de
reivindicação dos direitos das mulheres, o pós-guerra trouxe manifestações
feministas que lutavam por direitos relacionados ao corpo, à sexualidade, à
inserção no mercado de trabalho dentre outras pautas.

Nesse contexto do pós-guerra, que também é quando Watchmen é criada, surge


a segunda onda dos movimentos feministas. Entre os anos de 1960 e 1980, dos
movimentos feministas começaram a emergir novas reivindicações.
Anteriormente, as demandas diziam respeito à desigualdade de direitos políticos
dentre outras desigualdades sociais, a partir de então, passou-se a questionar o
motivo pelo qual essas assimetrias de gênero ocorriam na sociedade. Com isso,
como indica Melanie Marques e Kella Xavier:
“Podemos perceber que o movimento feminista, na segunda onda, passa a
abordar pautas relacionadas à opressão da mulher, a sexualidade, a construção
cultural de gênero e dominação. O discurso agora estava focado nas relações
de poder entre homens e mulheres, debatendo sobre questões de discriminação,
desigualdades culturais e estruturas sexistas”. (MARQUES; XAVIER, 2018, p. 5)
24
Em relação a isso, o período de guerra era cheio de expectativas, sendo um país
cujas imagens mentais formadas ao longo do fim da década de 1940 e início da
década de 1950 eram exclusivamente masculinas, como aponta Ícaro Silva,
pensando na ótica da masculinidade presente no período histórico referenciado
em Watchmen:

“Aos homens, heróis no front europeu, todas as recompensas eram poucas.


Linhas de crédito para compra de imóveis e para estudos em universidades,
assim como a garantia de pleno emprego, pois os postos ocupados pelas
mulheres na ausência bélica masculina voltaram a ter seus antigos donos,
relegando às então independentes figuras femininas o retorno ao espaço
doméstico. Era natural, portanto, que os jovens das gerações seguintes fossem
educados para continuarem a ser a cidade sobre a colina que liderava o
progresso do mundo” (SILVA, 2019, p. 24).

Com o crescimento dos movimentos civis ao fim da década de 1950 e início da


década de 1960, um boom do grito de resistência dos marginalizados ecoa.
Assim, os movimentos sociais que apareceram de fundo em Watchmen podem
ser canalizados à prática de ensino pela sua característica de artefato cultural e
entre outros efeitos positivos citados acima correspondentes ao uso de
quadrinhos em sala de aula. Coben destaca sobre os movimentos:

“As características distintivas do Movimento emergem de uma preocupação


central com a autenticidade pessoal e com o corolário da convicção de que as
estruturas do poder social, o consenso ideológico liberal e o mecanismo cultural
formavam múltiplos obstáculos à auto-realização e à comunidade. A busca da
realização acentua variedades de desacordo e protesto - silenciosos e
veementes, públicos e privados, não violentos e violentos, pessoais e culturais,
reformistas e revolucionários” (COBEN, 1985, p.335 e 336).

Enquanto isso, as mulheres reagiram prontamente às novas oportunidades


disponíveis para elas no mercado de trabalho e também passaram a atuar com
mais voz na sociedade estadunidense, ocupando um espaço que antes não
estavam familiarizadas, possibilitando um contraponto a realidade estabelecida
na mesma no Brasil ou mesmo em tempos atuais.

Considerações Finais
Em Watchmen podemos considerar uma gama variada de temas, percorrendo
em um sentido mais histórico tanto pelos temas dos movimentos sociais e de
contracultura como a discussão dos papéis de gênero ou mesmo a temática da
violência nos grandes centros. As histórias em quadrinhos podem ser uma
importante ferramenta para o incentivo da leitura e também uma possibilidade
didática para o professor de História fortalecer o pensamento histórico e para o
desenvolvimento cognitivo dos estudantes. A partir da leitura das considerações
que fizemos neste texto, esperamos poder ter contribuído para as discussões
sobre o uso de histórias em quadrinhos em sala de aula, assim como a escolha
por trazer Watchmen possa colaborar com o desenvolvimento de propostas com 25
outras HQs enquanto recurso didático no ensino de História.

Referências
Alesy Soares Oliveira, graduado em História Licenciatura pela Universidade
Federal do Rio Grande do Norte. Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação
em História pela mesma universidade.

Benigna Ingred Aurelia Bezerril, graduada em História Licenciatura pela


Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Mestranda pelo Programa de
Pós-Graduação em História pela mesma universidade.

BRITO, Ana Lúcia Morais de. O ensino de história: outros recursos além do
livro didático. 2003. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal
de Pernambuco, Recife, 2003.

COBEN, Stanley. O desenvolvimento da cultura norte-americana. Rio de


Janeiro: Anima Produções Artísticas e Culturais, 1985.

LIMA, Douglas Mota Xavier de. História em quadrinhos e ensino de História.


Revista História Hoje, [S.L.], v. 6, n. 11, p. 1-344, 16 maio, 2017.

MARQUES, Melanie Cavalcante; XAVIER, Kella Rivetria Lucena. A gênese do


movimento feminista e sua trajetória no Brasil. In: VI Seminário CETROS Crise
e Mundo do trabalho no Brasil: desafios para a classe trabalhadora.
Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza, 2018.

SCHMIDT, Maria Auxiliadora. A formação do professor de História e o cotidiano


da sala de aula. In: BITTENCOURT, Circe (org.). O saber histórico na sala de
aula. 9 ed. São Paulo: Contexto, 2004.

SILVA, Ícaro Andriêr Soares da. A construção da ideia de masculinidade como


falha cultural na sociedade estadunidense em Watchmen. 2019. 50 f. TCC
(Graduação) - Curso de Licenciatura Plena em Letras/Inglês, Linguagens e
Ciências Humanas, Universidade Federal Rural do Semi-Árido, Caraúbas,
2019.

SILVA, Keliene Cristina da. História em quadrinhos e ensino de História:


diálogos e abordagens. XVII Encontro Estadual de História – ANPUH-PB, 2016.
e-ISSN: 2359-2796. Disponível em: <http:// www.ufpb.br/evento/index.
php/xviieeh/xviieeh/paper/ view/3229>. Acesso em: 24 de abr. de 2021.
VILELA, Marcos Túlio Rodrigo. A utilização dos quadrinhos no ensino de
história: avanços, desafios e limites. 2012. 322 f. Dissertação (Mestrado) -
Mestrado em Educação, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo
do Campo, 2012.

26
BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE
PLURALIDADES E DIVERSIDADES
IDENTITÁRIAS E SUAS POSSIBILIDADES DE
27
APLICAÇÃO NO ENSINO POR MEIO DA
MÚSICA
Alexia Henning e Vanda Fortuna Serafim
Este artigo analisa as discussões acerca das pluralidades religiosas,
secularização, assim como as crenças e descrenças na atualidade. Para tal
análise, utilizamos dos trabalhos de Kaique Cardoso e Donizete Rodrigues
[2019], que nos auxiliou com sua perspectiva introdutória sobre a religião. No
que diz respeito ao pluralismo e a modernidade usamos os trabalhos de Paula
Monteiro [2006] e de Danièle Hervieu-Léger [2008]. Para tanto, ao
mencionarmos as diferentes condições sociais de acesso que os indivíduos têm
aos recursos simbólicos, os trabalhos de Claude Revière [1997]; Émile Durkheim
[2003] e Mariza Peirano [2003] foram essenciais. Por tentarmos focar em uma
discussão da temática no que tange ao ensino de história das religiões e
religiosidades, mediante ao uso de metodologia musical utilizamos o trabalho de
Marcos Napolitano [2002] e Claudefranklin Monteiro Santos [2020]. Para tanto,
ao discutirmos uma temática pelo viés do ensino, situaremos os trabalhos de
Maria Auxiliadora Schimdt [2010] e Gabriella Bertrami Vieira [2020], trazendo
para a discussão suas contribuições com as ferramentas metodológicas e
experiencias em sala de aula.

Introdução – pluralidades e diversidades identitárias na atualidade


A história das religiões e religiosidades é um campo de estudos que já se
encontra consolidado no Brasil atualmente. Uma vez que a religião em si está
presente em todas as sociedades humanas, seja mediante as cosmologias, os
ritos e rituais, as práticas e crenças, ou seja, tudo o que é de extrema relevância
e possui uma grande influência no subsistema cultural e em suas formas de
organização do ser humano.

A mesma sofre mudanças constantes afim de atender as exigências dos


indivíduos, seja individual ou coletiva, logo, é notório a presença deste fenômeno
nos mais diversos contextos da modernidade [CARDOSO; RODRIGUES, 2019].
Dessa maneira, a força secularizadora da ética protestante promoveu uma forma
subjetivada de experiência religiosa, bem como aprofundou o processo de
diferenciação das esferas político-econômico-científicas em relação à religiosa.

Essa força é conhecida pelo paradigma weberiano da “secularização”, sendo ele,


responsável por essa interpretação a respeito da religião como uma esfera
diferenciada da vida social e, fruto de um movimento histórico inaugurado pela
modernidade sendo estimulado pelo ascetismo protestante [MONTEIRO, 2006].

Podemos afirmar que, dentre os elementos que condizem com um processo


histórico amplo, como o legado do protestantismo, é incluído essa emergência
de um mercado impessoal que Monteiro [2006] aborda, ou seja, uma vida 28
intelectual que dispensa a ideia de Deus.

Nota-se uma relativização representada pelas instituições religiosas, a qual faz parte do
deslocamento profundo que diz respeito ao eixo que passa das autoridades religiosas
fiadores da verdade da crença para o indivíduo a si mesmo, a quem confere a
autenticidade de sua própria perspectiva espiritual, ou seja, a busca pela conformidade
com as verdades moldadas pelas instituições religiosas fica em segundo plano
[HERVIEU-LÉGER, 2008]. O relaxamento de controles institucionais de crença
favorece a dispersão crenças individualistas, mas não se deve perder de vista, que estão
inscritos dentro de um dispositivo de limitações sociais e raízes culturais, as quais não
devem ser ignoradas.

É dessa forma que cada vez mais independente tornam-se os sistemas de


crenças, assim, correspondem às suas aspirações suas experiências. Estas são,
as características de que a Hervieu-Léger [2008] e sociólogos descrevem como
a "modernidade religiosa”, pois a mesma considera que enquanto a crença
prolifera na mesma proporção que a incerteza gerada pelas mudanças em todos
campos da vida social baseia-se cada vez menos, nas crenças oferecidas pelas
religiões institucionais.

As consequências ressaltadas por Weber [apud. CARDOSO; RODRIGUES,


2019] no que diz respeito a modernização e racionalização, é um processo de
desencantamento do mundo diante a religião, onde a ciência anula a existência
de forças misteriosas, tornando tudo inteligível e compreensível. Ao ampliar
essas discussões e analisar as múltiplas formas de correlação entre religião e
sociedade, nota-se no contexto da pós-modernidade um fortalecimento e
intensificação das crenças práticas e institucionalizações religiosas.

Em outras palavras, o que Monteiro [2006] enfatiza é que esse paradigma é


apenas um ponto de partida ao considerar as diversas manifestações que se
encontram no Brasil. Em nome do direito à liberdade de culto, passaram a se
constituir institucionalmente como religiões. Portanto, é a partir desses dados
que podemos identificar as configurações específicas que as formas religiosas
assumem em cada sociedade.

Para tanto, Cardoso e Rodrigues [2019], realçam que a religião, crenças e


práticas estão presentes em todas as sociedades, exercendo diferentes formas
de influência. É importante entender o papel da religião na sociedade, como
também é importante levar esse debate as escolas, pois a lógica e não o
simbólico-religioso da perspectiva de Weber, é essencial para uma compreensão
acerca dos fatos sociais.

29
Os indivíduos livremente formam sua "solução de fé" pessoal, mas fazem isso usando
aqueles recursos simbólicos cuja disponibilidade é limitada. Alguns usam os recursos
do meio cultural, já outros as possibilidades de acesso dos quais fornece o próprio
assunto. Essa reutilização de elementos retirados de diversas fontes é orientada, por
representações e interpretações, que o meio social tem sobre as diferentes tradições que
operacionaliza.

Hervieu-Léger [2008], para exemplicar bem essas interpretações, utiliza do budismo


que se apresenta reformulado por encontrar seu principal campo de expansão entre as
camadas sociais diretamente envolvidas pelos temas da cultura moderna do indivíduo,
ou seja, o contexto que ele está inserido. Da mesma maneira, é o que a autora
denomina de “bricolagens”, levando em consideração as diferentes condições sociais
de acesso que os indivíduos têm aos recursos simbólicos desigualmente disponíveis e
às condições de uso cultural desses recursos.

Podemos verificar eventos que são considerados especiais, como por exemplo:
formaturas, casamentos, copa do mundo, campanha eleitoral, etc. Portanto a
natureza desses eventos podem ser profanas, religiosas, festivos, formais,
informais, simples ou elaborados, desde que estabelecemos uma definição
etnográfica, o ritual não precisa necessariamente ser caracterizado pela
ausência entre uma relação instrumental entre meios e fins [PEIRANO, 2003].

Sendo assim, pontuamos as particularidades desse processo de diferenciação


no que diz respeito as religiões, religiosidades e crenças na atualidade, ou seja,
é notório uma superação do rito religioso como a expressão global da sociedade
[RIVIÉRE, 1997]. E, ao observarmos a obra de Durkheim [2003], podemos notar
que o autor reconhece os ritos como uma forma geral de expressão da sociedade
e da sua cultura e, por esse motivo busca uma forma de dessacralização dos
ritos e, consequentemente incita uma visão profana do mesmo. Com isso
podemos destacar também a pluralidade, os trânsitos religiosos assim como o
hibridismo que se perpetuam nos mais diversos discursos culturais que vivemos
ou presenciamos.

A falta de validação institucional das crenças, e o crescimento das reservas de


referências e símbolos colocados à disposição dos usos dos indivíduos, não indicam
apenas a fragmentação em pequenos sistemas de crenças que eles próprios produzem.
O mercado de bens simbólicos, sobre o qual os grandes operadores institucionais não
mais dominam, atribui uma tendência à homogeneização desses sistemas de crenças
em escala individual [HERVIEU-LÉGER, 2008]. Em outras palavras, isso possibilita,
em um contexto de globalização da cultura, sua conexão com redes globais.

30

Essa individualização ou como chama Hervieu-Léger [2008, p.22]: "redução


doutrinária" está ligada à expansão de uma religiosidade emocional que reivindica
explicitamente a diminuição da luz do intelecto e dos valores religiosos ligados à
instituição, como questão dogmáticas e crenças etc., em detrimento da experiência
afetiva da presença do Espírito. Essa vinculação em relação a transcendência à
proximidade afetiva e personalizada com o ser divino, permite um efetivo alinhamento
dos conteúdos da pregação com as buscas do individualismo moderno, em termos de
auto expansão e realização pessoal.

Esta “redução doutrinal” está ligada à expansão, nos grupos que fazem parte deste
movimento, de uma religiosidade emocional que reivindica explicitamente a
diminuição da luz do intelecto e dos valores sobretudo a experiência afetiva da
presença do Espírito. Esse minimalismo teológico - que vincula a relação com a
transcendência à proximidade afetiva e personalizada com o ser divino - permite um
efetivo alinhamento dos conteúdos da pregação com as buscas do individualismo
moderno em matéria de autoexpansão e realização pessoal. . Essa "religiosidade
reduzida a afetos" não constitui, no entanto, como se costuma sugerir, um produto
muito recente de uma suposta "pós-modernidade".

Dito isso, mantendo um olhar sobre a nossa atualidade, nota-se como tal
fenômeno é permeado de embates e disputas, tanto teóricos e metodológicos,
bem como políticos, sociais e culturais. Dessa forma, ao pensar essa temática
no âmbito escolar, no que concerne à questão da maneira em que a mesma é
analisada, também possibilita debates.

Portanto, visando uma discussão com o objetivo de refletir sobre o âmbito do


ensino de história das religiões e religiosidades, bem como ressaltar a
importância da temática para o ensino de história, consideramos, assim, que a
problemática central deve estar nas formas de abordagem dos conteúdos,
respeitando a diversidade e a liberdade religiosa.

Outro ponto que iremos abordar sucintamente nesta discussão, se constitui


como uma possibilidade metodológica para o Ensino de História das Religiões e
Religiosidades, a utilização da música na sala de aula.

Algumas reflexões sobre o ensino de história das religiões e religiosidades


É importante ressaltar a diferenciação e seus direcionamentos entre Ensino de
História das Religiões e Religiosidades e Ensino Religioso. Visto que o primeiro,
é sinônimo do segundo, o qual busca compreender o lugar da experiência
religiosa, do comportamento humano com o sagrado, das crenças e novas
mitologias, das instituições e manifestações religiosas no âmbito da sociedade,
ou seja, nos processos históricos [VIEIRA, 2020]. Já o Ensino Religioso, por Lei 31
Nº 9394, de 1996, condiz com a matrícula facultativa e “assegurado o respeito à
diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de
proselitismo” [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 1996].

Contudo, Vieira [2020] afirma que, a realidade nas escolas brasileiras é de um


ensino voltado para reafirmar as experiências religiosas da maioria dos alunos,
ou ainda, do professor. E ainda concluí para que de fato haja a compreensão
das crenças e práticas religiosas presentes nas sociedades históricas e
vivencias cotidianamente, é necessário um ensino sobre religiões e
religiosidades que não esteja no âmbito teológico, mas sim histórico, de
compreensão.

É notável que a historiografia brasileira vem se dedicando mais ao estudo das


religiões e religiosidades. Contudo, como trazer esses estudos para o ensino?
Mediante essa indagação, é que temos um choque de realidade, ao estarmos
cercados por um ambiente e, consequentemente uma linguagem acadêmica,
esquecemos que estamos situados em um curso de licenciatura, o qual sua
grade é composta por um viés teórico e metodológico que auxilia esse diálogo
para expor esse conhecimento produzido pela academia ao ensino básico.

Breves considerações sobre o uso da música como metodologia no Ensino


de História das Religiões e Religiosidades
O uso de fontes audiovisuais no Ensino de História no Brasil não é uma
novidade. Porém, as dificuldades de trabalhar com essa fonte é um tanto que
visível, as quais vão desde a infraestrutura das escolas até à formação dos
próprios professores, ou até mesmo no uso da metodologia correta.

Todavia, alguns fatores devem ser levados em conta ao trabalhar com


determinadas fontes, como sua análise contextual. Dentre elas destacamos a
sua criação, que dizem respeito as intenções e técnicas que influenciaram o
autor da mesma. Há também a produção; transformação da obra criada em
produto material e, no caso da canção comercial, em artefato industrial, ou seja,
a performance gravada em estúdio ou ao vivo, assim como o trabalho dos
técnicos e produtores, as estratégias empresariais que norteiam a cadeia de
produção musical.

Para além desses, há sua circulação em espaços sociais, culturais e comerciais


pelos quais passa uma canção. E por último, a recepção, enquanto a circulação
envolve os espaços e as mídias socialmente identificáveis, a recepção envolve
os processos culturais, seja de base sociológica, antropológica ou
psicossociológica, as quais norteiam as formas e sentidos da apropriação da
canção, ou produto cultural, em uma determinada época e sociedade
[NAPOLITANO, 2002].

Segundo Santos [2020], essa presença do religioso na MPB tem sido a partir de
várias iniciativas no campo científico, visto que, esse religioso tem se
manifestado de diversas formas e por outros matizes que não necessariamente 32
o cristão-católico. A Música Popular Brasileira, ao mesmo tempo em que traduz
isso em seu repertório, colabora de modo muito particular com a sua
disseminação e consolidação, não somente nos setores mais pobres da
sociedade, mas em todas as categorias.

Ao investigar essas representações do religioso na música popular, Santos


[2020] demonstrou como a prática da piedade popular romaria e/ou procissões
peregrinas, notadamente marianas, povoam não somente o imaginário popular,
mas também a saga criativa dos compositores brasileiros de norte a sul do país.

A música no seu sentido sociocultural, ideológico e, portanto, histórico, intrínseco


de uma canção é produto de um conjunto indissociável que compõe um artefato
cultural que auxilia o ser humano a estabelecer relações com o meio. Suas
formas e objetivos em como é utilizado ao longo de nossa trajetória histórica são
variáveis dependendo do seu contexto histórico e social. E no Brasil, a música é
um dos objetos da cultura mais presentes no cotidiano da sociedade, como
aponta Soares [2017].

Pontuado todos esses fatores e expondo aos alunos os cuidados e


possibilidades de compreender as crenças e as descrenças que o cercam
mediante a essa fonte que está ao seu alcance, permite aos mesmos o
reconhecimento do outro dentro de sua cultura, dos hibridismos presentes e o
entendimento do seu lugar como sujeito histórico inserido nessas trajetórias.

Considerações Finais
Usar tais ferramentas metodológicas em sala de aula podem ser vistas como um
grande desafio aos professores e as escolas, mas não podemos de deixar de
notar que, os alunos poderiam adquirir a capacidade de realizar análises,
inferências e interpretações acerca da sociedade atual, além de olhar para si e
ao redor com olhos históricos, resgatando, um conjunto de emoções, sonhos e
a vida cotidiana de cada um, no presente e no passado. [SCHMIDT, 2010].

Sendo assim, este trabalho buscou evidenciar algumas discussões acerca das
pluralidades religiosas, secularização, assim como as crenças e descrenças na
atualidade, buscou também expor contribuições do ensino de história das
religiões e religiosidades. Como a possibilidade do uso de músicas como fonte
para a abordagem da temática de pluralidades e diversidades identitárias na
atualidade.

Os alunos tem a possibilidade de perceber a existência de várias narrativas, as


quais compõe a realidade histórica e, é a partir daí que ocorre a desconstrução
de visões preconcebidas sobre questões contemporâneas e permite uma visão
dos processos nos quais os fenômenos culturais estão inseridos, trazendo para
eles uma abordagem mais tolerante das dinâmicas sociais.

A variedade de crenças não deve ser vista como uma necessidade de se


predominar uma delas em relação às demais, mas acreditamos que é preciso 33
entender como sociedades diversas e com crenças complexas podem interagir
e dialogar entre si sem ter que para isso alterar suas vivências e visões de
mundo. Ter consciência disso significa perceber as riquezas mitológicas e
culturais que permeiam o planeta Terra, assim como o Brasil, atentando para as
diversidades de pensamentos de modo que nos ajude a compreender porque
determinados povos e grupos sociais se organizam de formas diversas.

Referências:
Alexia Henning graduanda de Licenciatura em História pela Universidade
Estadual de Maringá. Membro do Laboratório de Estudos em Religiões e
Religiosidades (LERR/UEM) sob orientação da professora doutora Vanda
Fortuna Serafim. E-mail: alexiahenning330@gmail.com.

Vanda Fortuna Serafim é professora e doutora Adjunta na Universidade Estadual


de Maringá, atua nos cursos de graduação em História (presencial e EAD) e
Pedagogia (EAD); é docente do Programa de Pós-graduação em História (PPH-
UEM). Atua como pesquisadora/docente do Núcleo de Pesquisa em História
Religiosa e das Religiões (CNPQ), no Grupo de Trabalho em História das
Religiões e das Religiosidades (ANPUH) e no Laboratório de Estudos em
Religiões e Religiosidades (UEM). E-mail: vandaserafim@gmail.com.

CARDOSO, Kaique; RODRIGUES, Donizete. Durkheim e Weber: uma


perspectiva introdutória acerca da religião. Revista Relegens Thréskeia V.08,
N1(2019), p.01a12.

DURKHEIM, Émile. As formas elementares de vida religiosa. [s. l.]: Paulus, 2003.

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Versión 21, UAM-X, MÉXICO, 2008, p.15-29.

MONTEIRO, Paula. Religião, pluralismo e esfera pública no Brasil. Novos


Estudos, CEBRAP, 74, março 2006, p. 47-65.

NAPOLITANO, Marcos. História & música – história cultural da música popular.


Belo Horizonte: Autêntica, 2002. pp. 8-26.

PEIRANO, Mariza. Rituais ontem e hoje. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,
2003.

RIVIÈRE, Claude. Os ritos profanos. Rio de Janeiro: VOZES, 1997.


SANTOS, Claudefranklin Monteiro. As Romarias na Música Popular Brasileira.
Revista Brasileira de História das Religiões. ANPUH, [s. l.], 2020.

São Paulo: Saraiva, 1996. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação


Nacional, LDB. 9394/1996.
34
SCHIMDT, Maria Auxiliadora. A formação do professor de História e o cotidiano
da sala de aula. In: BITTENCOURT, Circe (Org.) O Saber Histórico na sala de
Aula. 11.ed., 4ªreimp. – São Paulo: Contexto, 2010. P. (54-65)

SOARES, Olavo Pereira. A música nas aulas de história: o debate teórico sobre
as metodologias de ensino. Revista História Hoje, São Paulo, v. 6, ed. 11, p. 78-
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VIEIRA, Gabriella Bertrami. o ensino de história das religiões e religiosidades:


possibilidades a partir do cinema. in: Bueno, André; Neto, José Maria. Ensino de
história: mídias e tecnologias. [s. l.]: sobre Ontens, 2020.

A MÚSICA COMO CONTRIBUIÇÃO


PEDAGÓGICA PARA O PROCESSO DE
APRENDIZAGEM NO ENSINO DE HISTÓRIA
Aline Karine Nunes e Tamar Cristina Ludwig
Desde a implementação do ensino de História no Brasil, “datada no ano de 1837,
com a fundação do Colégio D. Pedro II, na corte do Rio de Janeiro, e que
determinou a inserção da história no currículo” (SCHMIDT, 2012) até os dias
atuais, o ensino de História passou por inúmeras transformações e uso de
diferentes metodologias de ensino.

Para aperfeiçoar o ensino e a aprendizagem dos fatos e saberes históricos, é


possível utilizar informações contidas em diferentes suportes como: jornais,
livros, revistas, pesquisas em sites, visitas virtuais á feiras, museus, exposições,
vídeos, músicas, trechos de filmes, entre outros.

Como sabemos a importância do uso das metodologias integram estratégias,


técnicas e atividades voltadas a diferentes situações didáticas vividas em sala
de aula para que o aluno possa se apropriar de conhecimentos. Para este texto,
destaca-se a música como um método de ensino na disciplina de história.
Segundo Gasparin, todo processo de ensino-aprendizagem é encaminhado
para, explicitamente, confrontar os sujeitos da aprendizagem – os alunos – com
o objeto sistematizado do conhecimento – o conteúdo. (Gasparin, p. 49, 2007).
Vygotsky (1989, p. 74), diz que “os conceitos não espontâneos não são
aprendidos mecanicamente, mas evoluem com a ajuda de uma vigorosa
atividade mental por parte da própria criança”. Isso quer dizer que a
aprendizagem somente é significativa a partir do momento em que os educandos
introjetam, incorporam ou, em outras palavras, apropriam-se do objeto do
conhecimento em suas múltiplas determinações e relações, recriando-o e 35
tornando-o “seu”, realizando ao mesmo tempo a continuidade e a ruptura entre
o conhecimento e o científico. (Gasparin, p. 50, 2007).

As ações didático-pedagógicas e os recursos necessários para a realização do


processo de ensino e aprendizagem são definidos por alguns aspectos como a
experiência do professor, conteúdo, interesses e necessidades dos alunos,
concepção teórico-metodológica. O autor Gasparin diz que o professor auxilia o
aluno a elaborar a representação mental do objeto do conhecimento.

A tarefa do professor e dos alunos desenvolve-se por meio de ações didático-


pedagógicas necessárias à efetiva construção conjunta do conhecimento
escolar. [...] Os educandos e o professor efetivam, aos poucos, o processo
dialético de construção do conhecimento escolar que vai do empírico ao concreto
pela mediação do abstrato, realizando as operações mentais de analisar,
comparar, criticar, levantar hipóteses, julgar, classificar, deduzir explicar,
generalizar, conceituar, etc. (Gasparin, p. 51. 2007).

Segundo Vygotski, o processo de desenvolvimento dos conceitos científicos e


dos conceitos cotidianos são diferentes, a evolução não se repete. A relação da
experiência própria de cada indivíduo com os conceitos científicos é diferente da
mesma relação com os conceitos espontâneos. Surgem e se formam na
experiência pessoal da criança. (Gasparin, p. 59, 2007).

Gasparin (2007), diz que os educandos, como sujeitos aprendentes, ativos e


participantes, realizam sua aprendizagem – autoaprendizagem – a partir do que
já sabem e na interação com seu professor e com colegas, isto é, na
interaprendizagem. A interação constitui, uma corresponsabilidade de professor
e alunos no processo de aprendizagem. (Gasparin, p. 105, 2007).

Podem ser consideradas como metodologia de ensino de história o uso de aula


expositivo dialogada, leitura de mundo, leitura orientada de textos selecionados,
trabalhos em grupo, pesquisa sobre o tema, seminário, entrevistas, análise de
filmes e vídeos, discussões, debates, observação da realidade, trabalhos
individuais, trabalhos em laboratório, tarefas de assimilação de conteúdos com
outras disciplinas, recursos audiovisuais, ensino com pesquisa. (Gasparin, p.
108, 2007). Quanto ao uso de novas tecnologias como um recurso didático
usamos a informática, computados, multimídia, internet, pen-drive, hipermídia,
ferramentas para educação a distância como: chats ou bate-papo, listas de
discussão, webconferência, etc. Essas tecnologias auxiliam no processo de
ensino e aprendizagem, tanto em forma física quanto em forma virtual.
Na sala de aula, a ação do professor tem como objetivo criar as condições para
a atividade de análise necessárias para a realização do processo de
aprendizagem. Segundo a autora Bréscia (2003, p. 81) “ [...] o aprendizado de
música, além de favorecer o desenvolvimento afetivo da criança, amplia a
atividade cerebral, melhora o desempenho escolar dos alunos e contribui para
integrar socialmente o indivíduo”. A mediação do professor realiza-se de fora 36
para dentro quando o professor atua como um agente cultural externo e
possibilita aos educandos o contato com o conteúdo.

Segundo a autora Bréscia (2003), “ a música é uma linguagem universal, tendo


participado da história da humanidade desde as primeiras civilizações”. Para
Gainza (1988, p. 22) “A música e o som, enquanto energia estimula o movimento
interno e externo no homem; impulsionam-no a ação e promovem nele uma
multiplicidade de condutas de diferentes qualidade e grau”.

Nogueira (2003) expôs a música como um a experiência que “ [...] acompanha


os seres humanos em praticamente todos os momentos de sua trajetória neste
planeta. E, particularmente nos tempos atuais, deve ser vista como umas das
mais importantes formas de comunicação [...]. A experiência musical não pode
ser ignorada, mas sim compreendida, analisada e transformadas criticamente”
(NOGUEIRA, 2003).

Diante do que foi exposto pelos autores citados acima, ressaltamos o uso da
música em sala de aula como um recurso didático, têm ganhado destaque nas
aulas de História, com o intuito de contribuir para o processo de ensino
aprendizagem dos educandos. Conforme evidenciou a autora David (2012):
“Privilegiar a linguagem musical no ensino de História significa construir
conhecimento, por meio de um recurso didático motivador e prazeroso que
envolve larga possibilidade de trato metodológico. Para tanto, faz-se necessário,
principalmente, reconhecer que a música é arte e conhecimento sociocultural,
portanto, uma experiência cotidiana na vida do homem” (DAVID, 2012, p. 01).

De acordo com ABUD (2005. p. 316) “As letras de música se constituem em


evidências, registros de acontecimentos a serem compreendidos pelos alunos
em sua abrangência mais ampla, ou seja, em sua compreensão cronológica, na
elaboração e re-significação de conceitos próprios da disciplina. Mais ainda, a
utilização de tais registros colabora na formação dos conceitos espontâneos dos
alunos e na aproximação entre eles e os conceitos científicos. Permite que o
aluno se aproxime das pessoas que viveram no passado, elaborando a
compreensão histórica, que “vem da forma como sabemos como é que as
pessoas viram as coisas, o que tentaram fazer, o que sentiram em relação a
determinada situação.” (Apud DUARTE, 2005).

A música está presente no nosso dia-a-dia. Ela é capaz de prender a atenção


das pessoas quando a linguagem musical é do agrado dos ouvintes. Nos dias
atuais, com o avanço do uso da internet, a música é acessível a todos nos mais
diversos estilos musicais, esse acesso pode ocorrer pelo rádio, YouTube,
plataformas digitais, entre outros.

A música popular brasileira foi um dos instrumentos utilizados para criticar a


ditadura militar no Brasil, regime político instituído no Brasil no ano de 1964 e
que teve fim em 1985. Segundo Boris Fausto, “a implantação da ditadura militar, 37
tinha como intuito de livrar o país da corrupção e do comunismo e para restaurar
a democracia, porém o novo regime começou a mudar as instituições do país
através de decretos (chamados de atos institucionais- AI).” (FAUSTO, 2019, p.
397).

Muitos artistas brasileiros escreveram canções criticando o regime imposto no


Brasil. Porém, as letras eram analisadas pelo órgão responsável pela censura e
barradas de ser divulgadas por conter um conteúdo que expressava a
insatisfação da população perante o regime.

Um exemplo de música escrita neste período é a música: Cálice, composta por


Chico Buarque e Gilberto Gil em 1973. Segundo os relatos de Gilberto Gil, “ Na
semana santa de 1973, Gilberto Gil e Chico Buarque se reuniram no
apartamento De Chico para compor uma música. Devido ao período vivido no
país na época e por se tratar de uma sexta-feira santa, surgiu a ideia do Calvário
e do cálice de Cristo. No dia seguinte, Gil já havia escrito um trecho da música,
e quando Chico Buarque cantou o refrão, percebeu o sentido da palavra de
censura que Cálice representava, uma forma de expressar o sofrimento de um
ser divino e o cale-se representando o regime de censura. No decorrer da letra
da canção, foi abordado o silêncio e a censura.”. (GIL, [S.D.])

A música “Cálice” foi escrita pelos autores, com o intuito de posiciona-se contra
ao regime implantado no Brasil durante os anos de 1964-1985. Muitos
professores utilizam a música em sala de aula, justamente para mostrar aos
alunos as durezas vividas pela população e o silêncio, pois o direito de liberdade
de expressão havia sido retirado pelos atos institucionais. Os versos: “ Pai,
afasta de mim esse cálice”; e “ Tanta mentira, tanta força bruta”, transmite a ideia
do sofrimento que a população vivia, devido à violência e a tortura, praticada
pelos órgãos responsáveis.

A frase: “De vinho tinto de sangue”, transmite a ideia do sofrimento das pessoas
e das famílias que eram vítimas das torturas. Muitas pessoas eram presas,
torturadas e mortas pelo regime militar, por este motivo, os autores da música
utilizaram a frase “De vinho tinto de sangue”.

Cálice (1973)

Pai, afasta de mim esse cálice


Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Pai, afasta de mim esse cálice, pai
Afasta de mim esse cálice, pai
Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor, engolir a labuta 38
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta
Pai (Pai)
Afasta de mim esse cálice (Pai)
Afasta de mim esse cálice (Pai)
Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Como é difícil acordar calado
Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é uma maneira de ser escutado
Esse silêncio todo me atordoa…
(BUARQUE, C. GIL, G.)

Outra música que vale ressaltar é o hino ufanista: Eu te amo, composta pela
dupla Dom e Ravel, em 1970 e gravada pela banda: Os incríveis, ainda em 1970.
O objetivo da gravação da música era exaltar o regime militar e animar a
população para a competição da copa do mundo, o qual o Brasil participou e foi
o campeão da edição disputado no México. Durante o governo de Emilio
Garrastazu Médici, o governo lançou o Programa: “Milagre Brasileiro”, cujo
objetivo era melhorar a economia do Brasil. Aliado ao avanço das
telecomunicações no país, o governo de Médici utilizou a propaganda para
melhorar a visão que o povo tinha sobre a ditadura militar. (FAUSTO, 2019, p.
413).

Eu te amo meu Brasil (1970)

As praias do Brasil ensolaradas (Lá lá lá lá...)


O chão onde o país se elevou (Lá lá lá lá...)
A mão de Deus abençoou
Mulher que nasce aqui
Tem muito mais amor
O Céu do meu Brasil tem mais estrelas (Lá lá lá lá...)
O Sol do meu país, mais esplendor (Lá lá lá lá...)
A mão de Deus abençoou
Em terras brasileiras vou plantar amor (Todo mundo agora)
Eu te amo, meu Brasil, eu te amo
Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil
Eu te amo, meu Brasil, eu te amo
Ninguém segura a juventude do Brasil
As tardes do Brasil são mais douradas (Lá lá lá lá...)
Mulatas brotam cheias de calor (Lá lá lá lá...) 39
A mão de Deus abençoou
Eu vou ficar aqui
Porque existe amor
No carnaval, os gringos querem vê-las (Lá lá lá lá...)
Num colossal desfile multicor (Lá lá lá lá...)
A mão de Deus abençoou
Em terras brasileiras vou plantar amor (Todo mundo agora)
Eu te amo, meu Brasil, eu te amo
Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil
Eu te amo, meu Brasil, eu te amo
Ninguém segura a juventude do Brasil
Adoro meu Brasil de madrugada (Lá lá lá lá...)
Nas horas que eu estou com meu amor (Lá lá lá lá...)
A mão de Deus abençoou
A minha amada vai comigo aonde eu for
As noites do Brasil tem mais beleza (Lá lá lá lá...)
A hora chora de tristeza e dor (Lá lá lá lá...)
Porque a natureza sopra
E ela vai-se embora
Enquanto eu planto amor
Eu te amo meu Brasil, eu te amo
Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil
Eu te amo meu Brasil, eu te amo
Ninguém segura a juventude do Brasil (Outra vez)
Eu te amo meu Brasil, eu te amo
Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil
Eu te amo meu Brasil, eu te amo
Ninguém segura a juventude do Brasil (Pra terminar agora)
Eu te amo meu Brasil, eu te amo
Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil
(INCRÍVEIS, 1970).

Desta forma, é fundamental que o professor utilize metodologias diferenciadas


para favorecer o ensino e a aprendizagem dos seus alunos. E a música surge
neste processo como um importante instrumento que auxilia a aprendizagem dos
educandos e a formação do educando como um ser atuante e pensante na
sociedade atual.

Referências
Aline Karine Nunes, Graduada em História pela Universidade Paranaense-
UNIPAR.
Tamar Cristina Ludwig, Graduada em História pela Universidade Paranaense-
UNIPAR.

Referências bibliográficas
ABUD. K. Registro e representação do cotidiano: A música popular na aula de 40
História. Campinas: Vol. 25, n. 67, p. 309-317, 2005.

BRÉSCIA, V. L. P. Educação musical: Bases psicológicas e ação preventiva.


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DAVID, Célia Maria. Música e ensino de História: Uma proposta, 2012. Disponível em:
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41
LIVES PARA A HISTÓRIA: UM
CYBERESPAÇO, NOVOS REFERENCIAIS DE
PESQUISA
42
Andrisson Ferreira da Silva e Nedy Bianca
Medeiros de Albuquerque
O ano de 2020 não trouxe consigo somente uma pandemia, mas novos
aprendizados, caminhos e perspectivas. Circunstâncias impostas sobretudo
para educadores que tinham como ambiente de trabalho a sala de aula e
estudantado (em todos os segmentos educacionais). Em contextos anteriores à
crise sanitária eram priorizadas as rodas de conversas, os trabalhos dialogados,
o ensino presencial.

O descobrimento do “novo” foi um desafio aos educadores, alunos,


pesquisadores, pais e espaços de atuação, mormente aos segmentos da
educação pública. Ademais, apesar dos movimentos e protestos em oposição
ao uso da virtualização e do ensino a distância, a imposição do remoto frente ao
cenário crítico de crise mundial se tornou visivelmente a única alternativa para o
momento. Especialmente enquanto os números de mortes no Brasil se tornavam
crescentes, desde o primeiro caso confirmado em fevereiro de 2020, mostrando
o grande poder de disseminação do vírus causador da enfermidade Covid-19.

Em escala progressiva, as diversas áreas da sociedade tiveram de se readequar


constituindo o que se chamou de “novo normal”. O universo acadêmico que
devido a Educação a Distância (EAD) já flertava com o aulas on-line, tarefas
assíncronas e materiais digitalizados, teve ampliação dos usos de ferramentas
e ambientes virtuais. O emprego dessas equipagens assumiu uma nova
perspectiva devido ao aspecto do emergencial e temporário, sob a denominação
de “remota”. De tal maneira se configurando um hibridismo de legislação
educacional, reunindo traços do presencial e a distância debaixo dessa nova
nomenclatura de Ensino Remoto.

No amplo espectro observamos que aquilo anteriormente tangente ao ensino


presencial recebeu infiltração do virtual, desde às defesas de dissertações e
teses, a eventos científicos do âmbito da extensão, realização de pesquisas e
ações de ensino. Embora algumas atividades já acontecessem pela internet,
mas para o cenário, em níveis gerais de ações universitárias, esta tornou-se uma
saída quase exclusiva ao desenvolvimento das demandas fundamentais de
ensino, pesquisa e extensão.

Nesse imbróglio, os limites impostos pela Covid-19 às sociedades do globo


terrestre não originaram um escape alternativo simples e consensual. As
comunidades precisaram discutir sobre as novas possibilidades de se manter o
contato sem a presença física mútua – o resultante escape foi a virtualização das
relações sociais e utilização de ferramentas antes pouco conhecidas, ou
utilizadas pelos profissionais da educação e seus alcançados.

Mediante aos novos desafios, ao “Fique em casa”, ao isolamento social, se viu,


como nunca antes, os massivos intentos de virtualização dos métodos 43
pedagógicos, das reinvenções didáticas e adaptações de formas avaliativas.
Percebemos a necessidade de manter o legado da universidade pública e seu
acesso à comunidade interna e externa a ela, na divulgação do conhecimento
produzido – as ferramentas tecnológicas se tornaram recursos didáticos
significativos.

Contudo, mesmo nas universidades, ainda eram poucos os que sabiam sobre
as salas de aulas virtuais e o conhecimento de plataformas remotas de ensino
eram limitadas na operacionalização e acesso. A internet não era a fundação,
mas apenas um dos tantos suportes para pesquisas e envio de trabalhos. Isso
mudou. Hoje é o principal recurso para o desenrolar das tarefas que efetivam
ensinos não-presenciais emergenciais por todo o mundo e notadamente no
Brasil. O cotidiano foi ganhando núperos aspectos, palavras foram sendo
inseridas cada vez mais no vocabulário estudantil, tais como “assíncronas”,
“síncronas”, “delay”, “bug” “lives” etc.

Face ao cenário ocasionado pela pandemia do coronavírus propusemos neste


trabalho, historiar as reinvenções, adaptações, descobertas didáticas e
metodológicas desenvolvidas pela equipe de docentes e cursistas de
Licenciatura e Bacharelado em História da Universidade Federal do Acre (Ufac),
que durante o ano de 2020 trabalharam no fomento de lives como aulas públicas
inseridas nas metas do Planejamento Anual de Atividades das coordenações
daquelas graduações em consonância ao Plano de Desenvolvimento
Institucional vigente, acrescidas da experiência formativa dentro do periódico
discente Das Amazônias. Concomitantemente propiciando a efetivação de novos
referenciais de pesquisas, chegando tanto à comunidade interna, quanto
externa, propagando os diálogos e reflexões acerca dos diversos temas
estudados e desenvolvidos pelo corpo da área de História do Centro de Filosofia
e Ciências Humanas (CFCH) correlatos aos debates a respeito da Pesquisa em
História e Ensino de História.

Intensificando métodos de produzir ciência: Das Amazônias – Lives em


Ação
Em abril de 2020, enquanto a Ufac buscava discutir as possibilidades de
implantação e implementação de um Ensino Remoto Emergencial (ERE), alguns
proponentes inquietos, professores e alunos dos cursos de História, visualizaram
caminhos de interação ante ao isolamento social. Então, com a Revista “Das
Amazônias” – periódico discente de história da Ufac, se discutiu a proposta de
difusão do conhecimento por meio de lives. A priori, um “mundo às cegas”, sem
muito conhecimento didático e tecnológico, pois as utilizações destes recursos
eram muito limitadas ou aconteciam em situações esporádicas.
Desse modo, foram sendo organizadas as atividades e pensadas as plataformas
de transmissão. Nesse primeiro momento de experiências, a escolhida foi o
Instagram via perfil da própria revista “@dasamazonias”, até então, em nenhuma
ocasião manipulada em transmissões ao vivo, funcionando somente para
informes sobre o curso e revista, afora as chamadas à publicação. Era preciso 44
não temer a “novidade”. A incerteza de um retorno breve aos encontros
presenciais, às rodas de conversas, aos simpósios, debates acalorados eram
cada vez mais distantes e angustiantes, nos impelindo a pensar em formas de
contornar esses limitantes. Tudo isso foi sendo transmutado para o virtual. Mas,
nos idos de abril, não se cogitava num confinamento prolongado ao decorrer de
horas, dias, semanas...Mais de um ano!

Posto isso, a partir de linhas de pesquisas e discussões já desenvolvidas pelos


professores da área se efetivou o convite para lecionarem as aulas públicas em
um formato pouco experienciado. Foram convidados para “inaugurarem” um
“hodierno” momento e à aproximação entre alunos, egressos, simpatizantes da
História e seus conteúdos interdisciplinares. Uma vivência na busca da defesa
de disseminação do conhecimento e ciências humanas, mesmo levando em
consideração a utilização da internet como uma ferramenta não acessível a
muitos no Brasil.

Nesse ínterim, com o agendamento das apresentações e respectivas monitorias,


produziu-se cards de divulgação das lives, suas datas e seus horários. A
primeira, intitulada “Crise política e sanitária no Brasil: conflitos de poder e
pandemia do Coronavírus”, rendeu aprendizados enquanto operadores dos
instrumentos técnicos. Eis que a internet revelaria seus impasses às
transmissões ao vivo, impossibilitando o desenrolar de nossa atividade, que
seria remarcada e efetivada no dia 05 de maio de 2020. E, apesar de superado
óbice inicial, deveríamos nos ater a outras especificidades do momento,
dificuldades e potencialidade ainda não tão exploradas e por isso mesmo
indômitas, fossem em ruídos internos e externos expressos em latidos, miados,
barulhos de obras em construções e sons numerosos produzidos no cotidiano,
a vida “azafamando” em nosso home office.

Seguindo nosso cronograma, a segunda palestra on-line transcorreu no dia 05


de junho e abordou “O surgimento do ambientalismo como questão
contemporânea e seus reflexos na sociedade, cultura e economia”. Em 09 de
junho a conversa foi sobre “Comunismo: significados e os usos na
contemporaneidade”. E, encerrando o cronônimo de lives pelo Instagram, no dia
16 de junho de 2020 apresentamos “Compreendendo o simbolismo de nossa
desumanidade a partir dos filmes “O Poço” e “Distrito 9”.

Essa proposta de transmissões, via Instagram, foi planejada pela equipe


editorias da Revista Das Amazônias como projeto de extensão com certificação
dos palestrantes e mediadores, se inserindo em nova metodologia institucional
da Ufac, visando atender as demandas da conjuntura do dito “novo normal” e
empregando diferentes plataformas virtuais. Em específico, resultando a área de
História na demonstração de uma rota alternativa ao diálogo. Ante tal cenário se
delineou a propositura de “um circuito de lives”, visando a assistência na
apartação, denominado de “Historiando na Live”.

Presença na ausência: virtualmente sincronizados – “Historiando na Live” 45


O projeto “Historiando na Live” foi realizado entre os meses de junho a outubro
de 2020, contando com a participação de 23 docentes palestrando, com
audiência superior a uma centena de pessoas entre cursistas e comunidade
extra acadêmica, congregando diferentes códigos de endereçamento postal,
visando apresentar as linhas de pesquisa e trabalhos desenvolvidos pelos
professores da área de História. Este plano atendia a demanda compatível com
o Projeto Político Curricular (PPC) dos cursos de História da Ufac, observando o
desenvolver de competências e habilidades acerca de distintas “concepções
metodológicas que referenciam a construção de categoria para a investigação e
a análise das relações sócio-históricas” somando-se o “problematizar, nas
múltiplas dimensões das experiências dos sujeitos históricos, a constituição de
diferentes relações de tempo e espaço” aduzindo-se o “transitar pelas fronteiras
entre a História e outras áreas de conhecimento” (UFAC, HISTORIANDO NA
LIVE, 2020, n.p.).

Nesse sentido, as atividades anteriormente desenvolvidas pelo projeto “Lives em


Ação”, da Revista Das Amazônias, demonstraram a adesão positiva pela
comunidade, servindo como base das experiências acerca dos parâmetros
organizacionais de transmissões ao vivo. Desta forma se tentava levar e debater
a história para além das fronteiras do saber até então preconizadas, porquanto
isso remetesse ao ensino e a pesquisa pautados nos “regramentos dos Projetos
Pedagógicos de Licenciatura e Bacharelado em História”, configuradas em
“conteúdos das palestras do curso dentro do conjunto de ementas ministradas
em diferentes disciplinas das duas graduações, correlacionando-as com o
desenvolvimento de atividades de pesquisa em desenvolvimento ou já conclusas
e seus produtos” (idem, n.p.).

Assim, se elaborou um clico de lives como uma formação extensionista. Desta


vez, a possibilidade de certificação foi estendida desde os palestrantes aos
ouvintes de cada aula realizada, mediante a prévia matrícula via Google Forms,
perfazendo um montante de 130 inscrições online.

Para a certificação e maior participação dos inscritos, buscou-se o conhecimento


de algumas plataformas. O que nos levou a descartar a Conferência Web da
RNP graças “ao seu peso na rede de internet”, que rendia uma fraca conexão e
limitação de participantes. Nos fazendo adotar o Google Meet em lugar do
Instagram (como tínhamos feito no projeto “Lives em Ação”).

A aplicação do Google Meet nos compeliu a elaborar um roteiro de práticas de


convivências aos cursistas, pois era preciso se adequarem às peculiaridades do
procedimento: “Algumas dicas para que possamos ter bastante proveito nesse
nosso primeiro encontro, por favor, desligue seu microfone. Não ative a câmera.
As perguntas serão destinadas para o final da palestra. Utilizem o chat para
fazerem as perguntas. A sua presença está sendo verificada pelos monitores,
então, não se ausente!”.

Na primeira etapa, inseridos no google meet, tivemos como temáticas “A 46


ascensão do fascismo no século XXI na esteira da crise da Democracia liberal e
do neoliberalismo”; “Epidemias e mudanças: é possível aprender algo com a
História?”, “Identidade(s) e território(s) em movimento: Floresta Nacional do
Macauã”; “Santos do povo: um olhar sobre a América Latina”; “Historiografia pós-
moderna: oposições”, “O diálogo entre História e Imprensa: fontes e objetos”;
“Estudos migratórios e a história oral: sujeitos, trajetórias e perspectivas da
construção do conhecimento na história contemporânea”; “Escrevivências”:
relações entre lugar de fala e criação epistemológica”; “História e cultura africana
e afro-brasileira como forma de descolonizar o currículo de História”.

Entrementes, após o primeiro mês de realização, migramos para aulas síncronas


no YouTube por meio da plataforma de transmissão StreamYard. A mudança se
justificou porque os participantes solicitavam acesso a palestra gravadas,
situação inviabilizada por conta da modalidade gratuita de Google Meet
empregada. Outro receio ao corpo organizacional eram as possíveis
intromissões hackers que propalavam pornografias (invasões crescentes em
espaços acadêmicos virtuais ocorridas, inclusive, em eventos da própria Ufac).

Porém, antes da migração, os monitores buscaram instruções em tutorias,


identificando um programa gratuito para gravação das aulas, o OBS Studio.
Todavia, para a instalação deste, era necessária grande quantidade de
armazenamentos nos computadores dos monitores, situação restritiva frente ao
quantitativo de lives a serem gravadas, considerando a sobrecarga da Memória
Ram que impediria o bom funcionamento dos equipamentos.

Pacificando o problema, em julho de 2020 adotamos o YouTube por meio do


StreamYard. A plataforma beneficiava a ação pois não havia limitação de
participantes, somando-se ao diálogo assegurado por meio do chat e
armazenamento automático de gravação no canal do YouTube “Circuito Lives”.
Neste segundo momento, armazenamos as lives “Protagonismo indígena na
História do Acre”, "Caminhos de pesquisas sobre gênero e meio ambiente";
“Anexação do Acre ao Brasil: revisão historiográfica”; “A encruzilhada do rock:
politização e "indústria cultural" no panorama dos anos 1960”; “Diálogos sobre
doenças, saberes médicos e outras artes de curar nas Amazônias”; “Movimentos
migratórios: memórias dos imigrantes sírios e libaneses no vale do Acre e Juruá
- 1900 a 1975”; “Os escudos dos extrativistas: os corpos, a Igreja Católica
(Teologia da Libertação), os partidos clandestinos, os sindicatos e as ONGs”;
“Amazônia Acreana: um breve panorama da história do ensino rural no Acre do
início do XX aos dias atuais”; “Religião e religiosidades nas InterAmazônias”;
“Mundos indígenas e fronteiras nacionais na Amazônia Sul Ocidental; “Viver não
é preciso, narrar é preciso: o cinema aprendendo a contar histórias” e
“Distribuição dos sítios arqueológicos no estado do Acre: muito além das formas
geométricas”. Dentre este acervo, destacamos “40 anos de história: caminhos e
descaminhos do curso de história da Ufac” proferida como última palestra do
Prof. Dr. Carlos Alberto Alves de Souza, um dos fundadores do curso de História
da Ufac e ex-presidente da Associação Brasileira de História Oral (ABHO), que
fortaleceu nossa compreensão das lives para além da perspectiva de veículos 47
difusores de conhecimento, mas, igualmente como fontes e objetos de pesquisa.

Lives como novos referenciais de pesquisa em História


Face aos destaques pontuados até aqui, vale para aludirmos as lives enquanto
mananciais e motivador da pesquisa, nos reportarmos a autora Circe Bittencourt
no prelo de sua produção “Ensino de História: Fundamentos e Métodos”, a fim
de refletirmos sobre os atuais métodos de ensino, sem perder de vista que estes
devem estar articulados com as novas tecnologias, não obstante os problemas
entorno destas e do ensino. Nesse sentido, os computadores revolucionaram e
continuam a revolucionar as formas de “conhecimento escolar” (BITTENCOURT,
2004), tendo efeito análogo sob o conhecimento acadêmico.

Levando em consideração a análise da historiadora, podemos, apesar dos


obstáculos, seguir com um conhecimento científico disseminado que seja
primordial aos alunos e alunas, sem tornar-se suporte para prejuízos
pedagógicos e didáticos no Ensino de História e nos processos formativos dos
sujeitos abarcados pelos trâmites educacionais. Assim, não podemos descartar,
as tecnologias como grandes ferramentas na difusão científica, e isto inclui
amplamente o conhecimento das Ciências Humanas no cyberespaço em meio à
crise da Covid-19. Soares e Colares (2020) são pertinentes quando enfatizaram
que as Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC’s) podem ser
compreendidas

“Como um instrumento a serviço da formação humana e da produção e


expansão do conhecimento, contribuindo no amplo alcance de sujeitos
educacionais, possibilitando ainda a melhoria de tarefas e processos
desempenhados nas escolas e/ou instituições de ensino superior” (SOARES E
COLARES, 2020, p. 21)

As lives são assim inseridas no universo de novas fontes de pesquisas, se


fundem com a pós-modernidade e suas virtualizações, contemplando a
diversidade do Ensino de História. Os registros digitais saem de meros
compilados e se tornam documentos históricos, sem obliterarmos dos
ensinamentos de Le Goff ao enfatizar que:

“Devemos repudiar qualquer forma imperialista de historicismo – quer se


apresente como idealista, quer como materialista ou possa ser considerada
como tal –, mas reivindicar com força a necessidade da presença do saber
histórico em toda a ação científica” (LE GOFF, 2013, p.139).
É nessa ação científica e nessa concepção histórica de ensino, onde o físico
sucumbe a virtualização, que podemos nos ater, de maneira necessária, ao
elucidado pelo historiador Eric Hobsbawm quando nos advertiu:

“Os historiadores, cujo ofício é lembrar o que os outros esquecem, tornam-se


mais importantes que nunca [...]. Por esse mesmo motivo, porém, eles têm de 48
ser mais que simples cronistas, memorialistas e compiladores” (HOBSBAWM,
1995, p. 13).

Historiadores precisaram se reinventar! Os historiadores, seguindo a lógica da


contemporaneidade, estão e são desafiados frente aos reptos, mas em sua
prática pedagógica, apesar de árdua responsabilidade, não podem olvidar-se
dos eixos norteadores prezadores de uma história das margens. E foi citando
Déa Fenelon que o professor Carlos Alberto Alves de Souza imortalizou em sua
live “40 anos de história: caminhos e descaminhos do curso de história da Ufac”:
- “Historiador tem que ousar”! (CIRCUITO LIVES, 2020). O professor faleceu
meses depois de sua aula pública, no entanto, a apresentação ficou como
registro de suas concepções históricas e de memórias, nos trajetos do curso de
história da Ufac, nos seus caminhos de vida e fazeres pedagógicos, enfatizando:
“a documentação por si só não é movimento da história” (idem). Nós somos os
agentes capazes de movimentá-la. E as lives são um contemporâneo modelo de
documentação, que ganharão nupérrimas perspectivas frente aos tenros
pesquisadores.

Apontamentos reflexivos – o desafio continua


Historiadores são agentes da história e corroboram para a sua escrita, nuances,
subjetividades e registros. Esperamos pelo relato de nossas vivências recentes,
termos levantado algumas reflexões frente aos desafios atuais que confrontam
os educadores a partir das experiências dadas no período pandêmico. É preciso
não sucumbir ao cyberespaço e suas imposições, compreendendo suas
implicações, aproveitando seus recursos para aplicação de metodologias e
recursos didáticos necessários aos aprendizados dos estudos em História, bem
como de suas ramificações.

As novas metodologias implicam em registro que se tornam imprescindíveis


referenciais. A história aplica-se ao espaço virtual, não obstante os delays, bugs,
perdas de conexões, crises. Os confrontos enfrentados pelo ensino de história,
da universidade pública e seus pilares - ensino, pesquisa e extensão -
corroboram para nos lembrar: as adversidades e embates continuam!

Esses novos desafios foram e estão sendo enfrentados em meio a um cenário


deplorável, cuja crise sanitária tomou proporções drásticas no Brasil, levando já
na metade do ano de 2020 a morte de mais de sessenta mil pessoas, revelando
também o desequilíbrio do sistema neoliberal e a decadência política na qual
estava e, está ainda, instaurado o país. No entanto, apesar das vicissitudes
rotineiras de isolamento social, as lives foram promotoras de conhecimento
científico para dentro e fora da comunidade acadêmica. Era inescusável suprir a
carência da presença física e prosseguir na defesa da educação para todos,
mesmo que no bojo da desigualdade realçada pela pandemia do novo
coronavírus.

Referências biográficas 49
Andrisson Ferreira da Silva é acadêmico do curso de Licenciatura em História
pela Universidade Federal do Acre (Ufac), integrante do Grupo de Pesquisa “O
processo de construção do docente em história”, e do Núcleo de Estudos Afro-
Brasileiros e Indígenas (Neabi/Ufac); atua no projeto “Representações dos povos
indígenas do Acre nas plataformas digitais brasileiras” e colaborou nos projetos
“Lives em ação” e “HISTORIANDO NA LIVE - ciclo de palestras sobre linhas de
pesquisa, temas e trabalhos desenvolvidos pelos professores da área de História
do CFCH/UFAC”. Já foi pesquisador de iniciação científica do projeto “Práticas
Pedagógicas em Educação das Relações Étnico-Raciais em Escolas de
Educação Básica do Estado do Acre, atualmente é residente pedagógico da área
de História da Ufac, membro das equipes editorias da Revista Das Amazônias e
Revista em Favor da Igualdade Racial.

Dra. Nedy Bianca Medeiros de Albuquerque é professora Associada Nível 02,


regime de dedicação exclusiva, lotada no Centro de Filosofia e Ciências
Humanas da Universidade Federal do Acre, associada da ANPUH AC/RO e
ABPN. Graduada em História pela Universidade Federal do Acre (1999) e em
Direito pela União Educacional do Norte (2008). Mestra em História pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002). Doutora em História Social
pela USP (2015). Vice-lider do grupo de pesquisa “Núcleo de Estudos Afro-
brasileiros e índigenas (NEABI/Ufac)”, integrante dos grupos de pesquisa
“Gênero, Decolonialidade, Culturas Indígenas e Afro-Brasileira” e “O processo
de construção do docente em História: possibilidades e desafios da formação
inicial e da formação continuada do fazer-se historiador em sala de aula”. Foi
professora formadora do PARFOR de História da Ufac e das especializações
UNIAFRO: política de promoção da igualdade racial e História e Cultura Africana
e Afro-brasileira. É atualmente subcoordenadora do programa de ensino
Residência Pedagógica, coordenadora do Curso de Bacharelado em História da
Ufac, editora-chefe da Revista Das Amazônias – periódico científico dos
discentes da área de História, editora adjunta da Revista em Favor da Igualdade
Racial (REFIR/Ufac). Coordenou os projetos “Lives em ação” e “Historiando na
live - ciclo de palestras sobre linhas de pesquisa, temas e trabalhos
desenvolvidos pelos professores da área de História do CFCH/UFAC”.

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São Paulo: Cortez, 2004.
HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991.
Tradução: Marcos Santarrita; revisão técnica Maria Célia Paoli. – São Paulo:
Companhia das Letras, 1995.

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pandemia no Brasil. Revista Debates em Educação. v. 12, n. 28. p. 19-41
(2020). Disponível em:
https://www.seer.ufal.br/index.php/debateseducacao/article/view/10157. Acesso
em: 27 de abr. de 2021.

UFAC. HISTORIANDO NA LIVE: ciclo de palestras sobre linhas de pesquisa,


temas e trabalhos desenvolvidos pelos professores da área de História do
CFCH/UFAC, 2020.

LIVES DO PROJETO “LIVES EM AÇÃO”

COMPREENDENDO o simbolismo de nossa desumanidade a partir dos filmes “O


Poço” e “Distrito 9”. Palestrante: Renis Ramos da Silva. Das Amazônias. Instagram. 16
de jun. de 2020. 52min17s. Disponível em:
https://www.instagram.com/tv/CBg_LRJC5jd/. Acesso em: 26 de abr. de 2021.

COMUNISMO: significados e os usos na contemporaneidade. Palestrante: José Sávio


da Costa Maia. Das Amazônias. Instagram. 09 de jun. de 2020. 30min9s. Disponível
em: https://www.instagram.com/tv/CBN6Cp9Bn-0/. Acesso em: 26 de abr. de 2021.

O SURGIMENTO do ambientalismo como questão contemporânea e seus reflexos na


sociedade, cultura e economia. Das Amazônias. Palestrante: Wlisses James Farias da
Silva. Instagram. 05 de jun. de 2020. 47min46s. Disponível em:
https://www.instagram.com/tv/CBDq9IKBRoU/. Acesso em: 26 de abr. de 2021.

LIVES DO PROJETO “HISTORIANDO NA LIVE”

40 ANOS de história: caminhos e descaminhos do curso de história da Ufac.


Circuito Lives. Palestrante: Carlos Alberto Alves de Souza. YouTube. 29 de jul.
de 2020. 1h25min58s. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=7-
TJMDHG9gA&t=4098s. Acesso em 26 de abr. de 2021.

A ENCRUZILHADA do rock: politização e “indústria cultural” no panorama dos


anos 60. Palestrante: Wlisses James de Farias Silva. Circuito Lives. YouTube.
26 de ago. de 2020. 1h39min. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=8PZmVP-r4vQ&t=5251s. Acesso em 26 de
abr. de 2021.

AMAZÔNIA Acreana: um breve panorama da história do ensino rural no Acre


do início do XX aos dias atuais. Palestrante: Euzébio de Oliveira Monte. 51
Circuito Lives. YouTube. 23 de set. de 2020. 1h43min18s. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=oipOsKy_Gko. Acesso em 26 de abr. de
2021.

ANEXAÇÃO do Acre ao Brasil: revisão historiográfica. Palestrante: Eduardo de


Araújo Carneiro. Circuito Lives. YouTube. 19 de ago. de 2020. 2h20min16s.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Xld7-VM2AW8&t=10s.
Acesso em 26 de abr. de 2021.

CAMINHOS de pesquisa sobre gênero e meio ambiente. Palestrante: Teresa


Almeida Cruz. Circuito Lives. YouTube. 12 de ago. de 2020. 1h29min18s.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=wSfuLmDcbgk&t=178s.
Acesso em 26 de abr. de 2021.

DIÁLOGOS sobre doenças, saberes médicos e outras doenças na arte de


curar nas Amazônias. Palestrante: Sérgio Roberto Gomes de Souza. Circuito
Lives. YouTube. 2 de set. de 2020. 1h41min41s. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=xErrdOjbZSw&t=91s. Acesso em 26 de abr.
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DISTRIBUIÇÃO dos sítios arqueológicos no estado do Acre: muito além das


formas geométricas. Palestrante: Fernando Ferreira. Circuito Lives. YouTube.
21 de out. de 2020. 1h46min40s. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=UufTUBspN5k. Acesso em 26 de abr. de
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MOVIMENTOS migratórios: memórias dos imigrantes sírios e libaneses no vale


do Acre e Juruá - 1900 a 1975. Palestrante: Valmir de Freitas Araújo. Circuito
Lives. YouTube. 9 de set. de 2020. 1h35min58s. Disponível em:
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MUNDOS indígenas e fronteiras nacionais na Amazônia Sul Ocidental.


Palestrante: Maria Ariadina Cidade Almeida. Circuito Lives. YouTube. 7 de out.
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OS ESCUDOS dos extrativistas: os corpos, a Igreja Católica (Teologia da


Libertação), os partidos clandestinos, os sindicatos e as ONGs”. Palestrante:
José Sávio da Costa Maia. Circuito Lives. YouTube. 16 de set. de 2020.
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https://www.youtube.com/watch?v=cT3uJowYpSY. Acesso em 26 de abr. de
2021.

PROTAGONISMO Indígena na história do Acre. Palestrante: Airton Chaves da


Rocha. Circuito Lives. YouTube. 05 de ago. de 2020. 1h47min10s. Disponível 52
em: https://www.youtube.com/watch?v=8-5aXGavv3Q&t=2618s. Acesso em 26
de abr. de 2021.

RELIGIÃO e religiosidades nas InterAmazônias. Palestrante: Geórgia Pereira


de Lima. Circuito Lives. YouTube. 30 de set. de 2020. 1h52min56s. Disponível
em: https://youtu.be/vgnjhGCF648. Acesso em 26 de abr. de 2021.

VIVER não é preciso, narrar é preciso: o cinema aprendendo a contar histórias.


Palestrante: Hélio Moreira da Costa Júnior. Circuito Lives. YouTube. 14 de out.
de 2020. 1h45min50s. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=rM8k8wMpMUE. Acesso em 26 de abr. de
2021.
O CINEMA COMO RECURSO AO ENSINO DA
HISTÓRIA: ALGUMAS NOTAS
INTRODUTÓRIAS À LUZ DA DIDÁTICA DA
53
HISTÓRIA
Antonio Carlos Figueiredo Costa

Introdução
Há algumas décadas o tema do cinema no aprendizado da História adentrou ao
atelier de muitos historiadores, além de se apresentar como uma sedutora
estratégia às aulas de História. A intenção do presente trabalho é oferecer alguns
recursos tanto teóricos, quanto didático-pedagógicos que permitam a utilização,
no ensino de História, das imensas possibilidades ao ambiente escolar contidas
nas obras de natureza cinematográfica. Em razão desse objetivo, partiremos de
algumas contribuições que vieram a lume pela lavra de historiadores que se
debruçaram na seara da ‘Sétima Arte’, com vistas a demarcar o cânon sob o qual
iremos assentar nossas próprias observações de caráter teórico-metodológico.

Não obstante à tarefa inicial de esboçar esse corpus teórico, nosso interesse é
que sejam possibilitados, nos marcos conceituais da teoria da consciência
histórica, que o aprendizado histórico promovido por produções historiográficas
strictu sensu possam ser articuladas aos efeitos externos que transitam pela
sociedade sob a forma de bens culturais, entre os quais elegemos no presente
trabalho, o cinema, dado à sua popularidade e comprovado poder de impacto na
realidade social.

Nesse sentido, passa a ser defendido que as produções cinematográficas, ao


serem apropriadas pelo aparelho escolar, e utilizadas como parte do currículo
nas escolas, poderão auxiliar a que jovens alunos entendam que o conhecimento
histórico se encontra presente das formas mais inusitadas nas suas vidas, o que
consequentemente contribui a que também os filmes venham a facilitar as
conexões dos operadores hermenêuticos atenção, expectação e memória,
reputados conforme se sabe, de extrema necessidade à alteridade e empatia
históricas, permitindo que registros fílmicos sejam elencados como agentes
promotores da cultura histórica, no que passam a atuar em benefício de uma
autorreflexão acerca do passado.

História e Cinema, nem ‘precisão histórica’, nem ‘ressurreição do


passado’: um breve excurso
História e Cinema desenvolveram, ao longo de todo o século XX, uma relação
de proximidade – apesar de nem sempre tão amistosa – que envolveu
incompreensões de ambas as partes, e façamos o mea culpa, certos
posicionamentos atávicos da legião dos ‘servos’ de Clio. No decorrer dessa
secção nosso compromisso será evidenciar, ainda que sem pretensão exaustiva,
alguns trabalhos que contribuíram para que contemplemos um certo ‘estado da 54

arte’ que nos situe na perspectiva de alguns avanços a serem propostos, ainda
que na forma de um esboço deveras pálido e inconclusivo, mas que indique
algumas vias de acesso possíveis à problemática História e Cinema ao ensino
da História.

Dessa forma, convém elencar algumas obras que pudemos recensear, no que
as alinhamos sob duas categorias: 1. Trabalhos seminais voltados a teorizar
História e Cinema; e, 2. A produção dos comentaristas. Nossa proposta será
apresentar os núcleos componentes do pensamento de cada autor, agregando
quando oportuno, a fala dos comentaristas. Convém ainda esclarecer que não
tentaremos, face à exiguidade do espaço desse trabalho, solucionar questões
referentes a acusações seja da parte de historiadores profissionais, quanto de
cineastas, a respeito de pretensas domesticações dos registros fílmicos, sendo
o nosso intuito puramente o de mapear aquilo que permita prover intervenções
no espaço escolar mediante uma fundamentação de caráter minimamente
teoriforme. Na chave dos trabalhos considerados fundadores aos cogitos que
articulam a História, enquanto ciência, e a produção cinematográfica, convém
destacar o ensaio da lavra de Marc Ferro (1995), bem como os artigos de Pierre
Sorlin (1974); Robert Rosenstone (1988) e Hayden White (1988).

O texto assinado por Marc Ferro representa uma referência obrigatória aos que
desejam teorizar a relação entre a história e o cinema. O autor passa em revista
a reação dos intelectuais – entre esses os historiadores – que haviam
considerado o cinematógrafo uma máquina de embrutecimento, dissolução,
passatempo de iletrados, criaturas miseráveis, enfim, no relato de Marc Ferro, o
filme fora recebido pelas elites como uma espécie de ‘atração de feira’.

Alguns (trágicos) anos agitados por guerras e revoluções obrigaram, segundo


M.Ferro, que o instituto da censura mobilizado pelos governos e o status quo
reconhecessem que o cinema fascina e inquieta, e que em decorrência disso,
pode desempenhar um efeito de natureza corrosiva e desestruturar o edifício
ideológico montado por veneráveis instituições que vieram contribuindo ao longo
de incontáveis gerações nos campos da teoria do Estado, da ciência jurídica, e
da Educação. Tudo que afinal era sólido, “podia se desmanchar no ar” (K.Marx),
pela simples projeção pública de uma película em uma sala escura, pois os
registros fílmicos insistiam em revelar bem além daquilo que seus exibidores
pretendiam mostrar.
A tese de Marc Ferro sobre o uso do cinema para o conhecimento histórico não
considera fatores semiológicos, nem incursiona pela estética ou pela história do
cinema, e muito menos se propõe a abordar o produto cinematográfico como
obra de arte. Assim, o registro cinematográfico se apresenta como uma imagem-
objeto, cujas significações não são somente cinematográficas, mas que valem
por aquilo que testemunham. Dessa forma, seguimos ao autor: 55

“A crítica não se limita somente ao filme, integra-o no mundo que o rodeia e com
o qual se comunica necessariamente. Nessas condições, empreender a análise
de filmes, de fragmentos de filme, de planos, de temas, levando em conta,
segundo a necessidade, o saber e o modo de abordagem das diferentes ciências
humanas, não poderia bastar. É necessário aplicar esses métodos a cada
substância do filme (imagens, imagens sonoras, imagens não sonorizadas), às
relações entre os componentes dessas substâncias; analisar no filme
principalmente a narrativa, o cenário, o texto, as relações do filme com o que não
é o filme: o autor, a produção, o público, a crítica, o regime. Pode-se assim
esperar compreender não somente a obra como também a realidade que
representa”. (FERRO, 1995, p. 203).

Marc Ferro identifica nos imprevistos do cotidiano aspectos que produzem


testemunhos involuntários da realidade, proporcionando aos registros fílmicos
uma riqueza muitas vezes não percebida por seus próprios realizadores. Para o
autor, essa observação é patente para os chamados ‘filmes de atualidades’, ou
‘cinejornais’, porém não menos verdadeira para os filmes de ficção. Assim, é do
aparente e do não visível, das ausências e do não-revelado que o historiador
constitui seus materiais de trabalho, os testemunhos obtidos mediante o lapso
tantas vezes involuntário do criador ou de uma ideologia.

Da lavra de Pierre Sorlin (1974) veio a lume, na prestigiada Revue d’histoire


moderne et contemporaine, uma meticulosa análise dos chamados filmes
históricos, tendo sido privilegiados aspectos hermenêuticos contidos nas obras
cinematográficas. Para Sorlin, enquadramentos, sinais, contrastes, montagens,
sons e movimentos ternários de enredo se constituem em objeto de análise, sob
a luz da semiótica, e devem ser priorizados, cabendo ao historiador adentrar à
“linguagem” que é própria aos filmes. Com efeito, Sorlin percorre as obras que
analisa com olhar arguto, talvez menos focado nas reconstruções de época,
aprovando tacitamente trajes, cenários e costumem que parecem satisfazê-lo
enquanto indicativos ao espectador que se trata de uma outra época. Mas frisa
que os filmes históricos devem ser considerados, ainda que tentem reconstruir
eventos, como a expressão da realidade possível em uma obra que ele
considera afinal, de ficção.

Fazendo coro a Kornis (1990), nos inclinamos a concordar que, enquanto Marc
Ferro fica muito concentrado na análise contextual do filme, propondo que os
registros dessa natureza tratam-se de imagens-objeto, e interessando-se
inclusive por fatores como produção e distribuição dos filmes, Pierre Sorlin parte
em uma direção oposta, renunciando a abordar tais questões, chamando mesmo
atenção, conforme observou Miskell (2011) a que os historiadores não se
detenham tanto nos erros cometidos em filmes históricos, e que realizem um
esforço para retirar-se definitivamente do empirismo nas análises fílmicas.

Robert Rosenstone (1988) e Hayden White (1988) consideraram em seus artigos


estampados na The American Historical Review que o cinema permite ao 56
historiador libertar-se daquilo que seria a profundeza solitária das bibliotecas –
expressão de Rosenstone – para integrar-se a um público potencialmente
elevado.

A metáfora de Rosenstone é compartilhada por Hayden White, que expressou a


opinião de que os historiadores também devem reconhecer que a representação
de eventos históricos, agentes e processos em imagens visuais pressupõe o
domínio de um léxico, de uma gramática, de uma sintaxe, enfim, de uma
linguagem e um discurso radicalmente diferente daquele utilizado para a
representação sumamente verbal. Para White (1988), tem sido frequente os
historiadores tratarem de registros fotográficos, cinematográficos e dados de
vídeo como se pudessem ser lidos da mesma forma que um documento escrito.

Exibindo a experiência de participação ativa na produção de obras


cinematográficas norte-americanas, Robert A.Rosenstone defende a seriedade
dos cineastas, mas revela que algo acontece entre o sinuoso caminho da
páginas dos livros de história para as telas. Haveria assim, segundo o autor, um
aparentemente incontornável desencontro entre aqueles que trabalham com
palavras, em relação àqueles que fazem das imagens – e das emoções – em
movimento, o seu ofício. Enfim, se os filmes costumam violar a noção que os
historiadores fazem da história, não caberia insistir em um preciosismo dos
eventos históricos quando levados à filmagem. Afinal, popularizar a História
corresponde a negar que o conhecimento histórico não venha a se tornar,
conforme alhures já disseram, um conhecimento sob o risco da super
especialização, circulante apenas entre historiadores, tornados uma espécie de
sacerdotes de uma misteriosa religião, voltados a comentar ‘textos sagrados’.

A ‘Metáfora do Teatro’ também vale para as ‘telonas’? O ato cognitivo da


empatia histórica
O fato de pesquisadores do porte de Marc Ferro, Pierre Sorlin, Hayden White e
Robert Rosenstone, com variados fundamentos, afiançarem a utilização do
cinema para uso da História transmite certa segurança aos historiadores para
avançar em seu emprego didático. Contudo, precisar o ‘estado da arte’ na tensa
relação entre o cinema e a História, apenas resolve parte do problema que
formulamos no caminho a que o cinema venha a desempenhar um papel
proeminente no tocante à orientação histórica em momentos da vida prática,
assumindo com isso, relevância social, e contribuindo com o aprendizado
histórico junto ao público escolar, cimentando identidades, atribuindo sentido à
experiência temporal, estabelecendo salvaguardas enfim, na perspectiva da
didática da História, para que não ocorram descolamentos entre os interesses 57

daqueles que pesquisam a ciência da História, e as carências de orientação no


tempo (RÜSEN, 2001; RÜSEN, 2014), ou ainda, nas palavras de Luís Fernando
Cerri, ao atendimento das ‘necessidades sociais’, condição impeditiva a que a
História venha a tomar “o caminho que leva a um conhecimento definido como
uma ‘especialização esotérica’” (CERRI, 2011, p. 53).

Parte das ações que envolvem o processo de ensino e aprendizagem da História


mediante a contribuição de registros fílmicos no ambiente escolar foi oferecida
por Circe Maria Bittencourt (2008) e Carlos Alberto Vesentini (2009). A proposta
de Vesentini é presidida por dois grandes eixos de tarefas a serem executadas
pelos docentes: a primeira diz respeito à escolha dos filmes, e encontra-se ligada
à relação da temática a ser tratada, obviamente imbricada ao currículo da
disciplina escolar; a segunda exige uma operação que o autor denominou por
‘desmontagem’, tratando-se de um trabalho prévio à projeção em sala de aula.
Circe Bittencourt avançou suas observações associando os filmes a um grande
rol de possibilidades didático-pedagógicas, conjunto ao qual a autora denominou
por ‘documentos não escritos na sala de aula’, entre os quais inclui objetos de
museus, música, rádio, fotografia e televisão. Tratam-se de contribuições
relevantes, que oferecem recursos metodológicos aos professores, e que por
isso, valem ser consultadas.

Porém, entendemos ser necessário ir mais além da elaboração de fichas


técnicas sobre os filmes ou fazer nossos alunos refletir sobre a forma com que
captam imagens fílmicas, e então, nos debruçarmos sobre uma questão que
Peter Miskell (2011, p.287) denominou por desafio pós-modernista lançado aos
historiadores. Segundo Miskell:

“No centro [da questão entre a História e o Cinema] está a afirmação de que não
existe verdade histórica. A tarefa do historiador não é descobrir uma única versão
(‘verdadeira’) de eventos passados que constituem a ‘história’; pelo contrário, os
estudos do passado que os historiadores fazem são influenciados
fundamentalmente pela perspectiva política/intelectual a partir da qual são
escritos. A história, portanto, é ‘criada’ para se adequar às necessidades
daqueles que desejam usá-la; não é algo que ‘está aí’, esperando para ser
descoberto. Sendo assim, é impossível afirmar que qualquer visão histórica seja
mais verdadeira ou confiável do que outra” (2011, p. 287)

Conforme observaram Cardoso e Mauad (1997), as obras cinematográficas, via-


de-regra, são intrinsecamente narrativas, e cabe privilegiar a análise dos seus 58

aspectos narrativos. Ora, a História é basicamente narrativa, e o historiador


Hayden White (1995) afirmou em obra emblemática, que a História é
basicamente uma estrutura verbal na forma de um discurso narrativa em prosa,
posta no formato de um enredo. Por seu turno, José Carlos Reis nos diz que:

“Há uma tradição da narração, que não é uma forma morta, mas um jogo de
inovação e sedimentação. Nossa cultura ocidental é herdeira de diversas
tradições narrativas: hebraica, cristã, anglo-saxônica, germânica, ibérica. São
paradigmas. Há também as obras-modelo: Ilíada, Édipo, Histórias. Esses
paradigmas fornecem as regras para a experiência narrativa posterior”. (2003,
p.142)

Jörn Rüsen (2001) entende que a narrativa histórica é um ato de fala – de


universalidade antropológica tanto incontestável, quanto determinante do
pensamento histórico – onde ficam sintetizadas, sob a forma de unidade
estrutural as operações mentais constitutivas da consciência histórica. Em outras
palavras, a consciência histórica fica realizada sob a narrativa histórica.

Talvez possamos considerar o valor assumido pela narrativa no cinema, para


aproximar a análise fílmica a ser conduzida pelo professor em similaridade a
outra arte cênica: o teatro. Conforme se sabe, tendo surgido na Antiguidade, uma
das funções da “2ª arte” na polis grega era a produção da catarse. O teatro visava
a instruir os cidadãos nos seus deveres, interpelar sobre suas potenciais
fraquezas, e estimular, pela catarse, a inspirar “pena e temor” (ARISTÓTELES,
1936, p. 36) para que as tradições fossem mantidas, afastada a harmatia, ou
falha trágica.

Aristóteles valorizava a tragédia, e obviamente inferimos, as lições colhidas por


Prometeu, Édipo ou Medeia. Na contemporaneidade surgiram novas poéticas, e
com essas, outras possibilidades que ao invés da catarse, prezam pela
conscientização, tal como formulado na dramaturgia de Bertolt Brecht.
Esse exercício de conscientização consistiria em que os alunos, ‘transportados’
para as cenas dos filmes (históricos) se aproximem dos personagens, e sejam
capazes de internalizarem de modo subjetivo, a experiência do outro, estimulada
a alteridade histórica, entendendo o personagem histórico como alguém de outro
tempo, e com o auxílio da imaginação, da fantasia e da estética propiciadas pela
‘magia’ do cinema, tornem-se capazes de realizar julgamentos históricos. 59

Em cartaz...
A escolha das obras cinematográficas é um capítulo à parte. Convém lembrar
que quando tratamos de cinema, pisamos em território estrangeiro, com vistos
de ‘turista’ em nossos passaportes de historiadores. Algumas possibilidades
alheias ao universo dos blockbusters se apresentam: a ‘montagem soviética (A
greve, O encouraçado Potemkin, Outubro); e o neorrealismo italiano (Roma,
cidade aberta; Vítimas da tormenta; Ladrões de bicicleta) podem ser opções
surpreendentes nos aspectos referentes a uma formação histórica de sentido, o
que significa, “interpretar a experiência temporal de uma maneira bem
determinada, a saber, mediante recurso à experiência do passado” (RÜSEN,
2014, p. 181).

Alguns filmes de Chaplin continuam atraentes. Como viviam os operários na


sociedade industrial mais “portentosa” da primeira metade do século XX? O
espectador encontra pontos de contato entre o personagem e a sua vida familiar,
e se conscientiza, encontrando motivação para pensar de maneira realista a sua
própria condição objetiva de subsistência (Marx). É isso que deve ser buscado
nas mensagens que Eisenstein, De Sica, Rosselini ou Chaplin nos oferecem. Em
‘Tempos Modernos’, observemos a icônica cena da ovelha negra, a bandeira
vermelha que acena para algum balizamento, mas que também alude à
Revolução, o posicionamento dos agentes do Estado, funcionários
do bureau executivo a serviço de uma classe: a burguesia (Marx), que se espraia
tanto nos aparelhos ideológicos estatais, mas também em seus aparelhos
repressores, pela ação de forças policiais (L. Althusser).
60

Fig. 1. Fonte: http://fatosociologico.blogspot.com/2010/05/blog-post.html

Quando escolhido adequadamente entre várias versões disponíveis, o cartaz


pode reforçar a mensagem contida na obra. Tomemos a figura 1, referente ao
cartaz original de ‘Tempos Modernos’. Carlitos, em seu uniforme de operário,
está no controle da situação. Os disjuntores da indústria foram desligados, o que
significa que as máquinas pararam por falta de energia. Ao espectador a
mensagem seria que ao proletariado cabe, no coletivo, decidir, parando a
produção se preciso, organizando-se com vistas às demandas da sua classe. No
decorrer do filme essa necessidade aparece sobejamente reiterada: no
monumental relógio, desnaturalizador do tempo, na multidão transformada em
rebanho de ovelhas – onde como alerta, uma delas difere pela cor negra – ou
ainda na imensidão do maquinário, apequenando quem ali trabalha, com
engrenagens que, aliás, acabam por absorver o próprio Carlitos.

À guisa de conclusão
A Didática da História mantém compromissos com a ciência histórica, mantendo
estreito contato com a dinâmica social, com vistas a evitar possíveis
descolamentos entre as ‘carências de orientação no tempo’ e os interesses de
avanço nas pesquisas. Não é de se estranhar, portanto, que as práticas da
Didática da História tenham que se fundamentar de maneira consistente nas
questões propriamente epistemológicas entre a História e o Cinema, que aqui
nos demoramos.
Enfim, se o cinema pode oferecer, sob a ótica da Didática da História, uma
espécie de veículo para o ato cognitivo da empatia histórica, a exigir conforme
sabemos, a internalização da experiência do outro, caberá aos professores de
História estimular a que seus alunos lancem mão da imaginação, da fantasia e
da estética oferecidas pelos recursos da ‘Sétima Arte’.
61

O cinema pode, sob tais parâmetros, dar testemunho que as produções


cinematográficas não pretendem ressuscitar o passado, mas disponibilizar uma
narrativa que oriente os momentos da vida prática, demonstrando que no vivido
humano, os homens “comuns”, também ‘escrevem’ seus roteiros, ‘dirigem’ suas
cenas, e consequentemente interpretam os atos que – orientados pela
consciência histórica – ‘escreveram’ com suas escolhas e ações pretéritas.
Nessa comparação entre os filmes e a realidade humana, caberia lembrar que
se a vida pode afigurar-se a um ‘jogo’ de cena, devemos ter em mente que só
jogamos uma vez, continuamente e sem camarins, que não há ‘cortes’,
‘montagens fílmicas’, ‘saídas’ de cena, e nem ‘reecenações’ do mesmo ato.
Afinal, a vida é um ‘jogo’, jogado ‘para valer’.

Referências biográficas
Prof. Dr. Antonio Carlos Figueiredo Costa, é docente efetivo (História) na
Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), líder do Grupo de Pesquisa
José Carlos Mariátegui e autor de livros e artigos na imprensa universitária.

Referências bibliográficas
ARISTÓTELES. Poética in: Aristóteles. São Paulo: Nova Cultural, 1996.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. 2.ed. Ensino de História: fundamentos


e métodos. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2008.

CARDOSO, Ciro Flamarion; MAUAD, Ana Maria. História e imagem: os


exemplos da fotografia e do cinema in: CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS,
Ronaldo (orgs.). Domínios da História: ensaios de teoria e metodologia. Rio de
Janeiro: Campus, 1997, p. 401 – 417.

FERRO, Marc. O filme: uma contra-análise da sociedade? in: LE GOFF,


Jacques; NORA, Pierre (dir.). História: novos objetos. 4.ed. Rio de Janeiro:
Francisco Alves, 1995, p. 199 - 215.

KORNIS, Mônica Almeida. História e cinema: um debate metodológico in:


Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 5, n. 10, 1992, p. 237-250.

MISKELL, Peter. Os historiadores e o cinema in: LAMBERT, Peter; SCHOFIELD,


Phillipp (orgs.). História: introdução ao ensino e à prática. Porto Alegre: Penso,
2011, p.282 – 293.
REIS, José Carlos. História&Teoria: historicismo, modernidade, temporalidade e
verdade. Rio de Janeiro: FGV, 2003.

ROSENSTONE, Robert A. History in Images/History in words: reflections on the


possibility of really putting history onto film in:The American Historical Review, v. 62
93, n.5, dec. 1988, pp. 1173 – 1185.

SORLIN, Pierre. Clio a L’ecran ou L’Historien dans Le noir in: Revue d’histoire
moderne et contemporaine, T. XXI, n.2., avril – juin, 1974, PP. 252 – 278.

VESENTINI, Carlos Alberto. História e ensino: o tema do sistema de fábrica visto


através dos filmes in: BITTENCOURT, Circe (org.). O saber histórico na sala de
aula. 11. ed. São Paulo: Contexto, 2009, p. 163 – 175.

WHITE, Hayden. Historiography and Historiophoty in: The American Historical


Review, v.93, n. 5, dec. 1988, pp. 1193 – 1199.

WHITE, Hayden. Meta-História: a imaginação histórica do século XIX. 2.ed. São


Paulo: Edusp, 1995.
NA PALMA DA MÃO: O USO DE
APLICATIVOS DE SMARTPHONES PARA O
ENSINO DE HISTÓRIA
63
Augusto Agostini Tonelli e Letícia da Silva Leite

A 31ª Pesquisa Anual do FGVcia, estudo coordenado pelo professor Fernando


Meirelles da FGV EAESP, aponta que em junho de 2020 a quantidade de
smartphones ultrapassa a marca de 1 aparelho em uso por habitante no Brasil.
Enquanto o Brasil, de acordo com o IBGE, possuía 211,8 milhões de habitantes,
ao todo a pesquisa quantificou 234 milhões de celulares inteligentes. Vendo as
pesquisas anteriores, o número parece ser uma crescente. Neste cenário,
consideramos importante que o ensino de história utilize desse recurso para se
beneficiar, tanto por ser algo que faz parte do cotidiano, quanto por esse recurso
atrair a atenção dos jovens. Entretanto, para um bom funcionamento desta
dinâmica de uso de celulares como ferramenta para o aprendizado, é necessário
que o professor esteja munido de estratégias que permitam que ele seja um
mediador do processo de construção do conhecimento.

No presente texto intencionamos propor uma série de aplicativos grátis para


celular, que abordam conteúdos históricos das mais diversas formas,
buscaremos apresentar suas abordagens e sugerir formas de utilizá-los com os
alunos, pois para um bom funcionamento desta dinâmica de uso de celulares
para o ensino, é necessário haver certa disciplina que conduza o aluno à
separação entre utilizar o celular para fins comuns e utilizá-lo como ferramenta
de construção de conhecimento, desenvolvendo assim sua criticidade. Destarte,
temos que considerar o professor como mediador de conhecimento, “o professor
de História pode ensinar o aluno a adquirir as ferramentas de trabalho
necessárias; o saber-fazer, o saber-fazer-bem, lançar os germes do histórico.
Ele é o responsável por ensinar o aluno a captar e a valorizar a diversidade dos
pontos de vista. Ao professor cabe ensinar o aluno a levantar problemas e a
reintegrá-los num conjunto mais vasto de outros problemas em problemáticas.”
(SCHMIDT, 2004, p.57). Nesse sentido, como escreve Levy “a principal função
do professor não pode mais ser uma difusão dos conhecimentos, que agora é
feita de forma mais eficaz por outros meios. Sua competência deve deslocar-se
no sentido de incentivar a aprendizagem e o pensamento. O professor tornar-se
um animador da inteligência coletiva dos grupos que estão ao seu encargo.
(LÉVY, 1999 p. 173)

De acordo com Santaella, as linguagens “(...) viraram aparições, presenças


fugidias que emergem e desaparecem ao toque delicado da pontinha do dedo
em minúsculas teclas. Voam pelos ares a velocidades que competem com a luz”
(Santaella, 2007, p. 24-25), e é justamente neste novo espaço que surge a
necessidade do professor adaptar suas formas de ensino para acompanhar os
jovens alunos. Concordamos com Bonilla no sentido de que:

“O que não foi percebido ainda pela comunidade escolar é que o acesso é uma
condição necessária, mas insuficiente para as transformações que se fazem
necessárias na educação, que os professores tenham condições de criar 64
ambientes de trabalho que conduzam a uma inserção da escola no mundo dos
alunos, um mundo cada vez mais marcado pela presença das tecnologias
digitais. Para isso, faz-se necessário também que os professores compreendam
as características e potencialidades das tecnologias, tendo claro que
compreender significa mais do que ser capaz de fazer funcionar, significa inseri-
las no contexto contemporâneo, penetrar nessa nova linguagem, nessa nova
lógica, nesse novo modo de ser, pensar e agir. E que é só fazendo essa imersão
que os professores terão condições de entender um pouco mais seus jovens
alunos.” (BONILLA, 2005, p.100)

Segundo Lemos (2005), a era da conexão implica na amplificação das


modalidades de interação entre pessoas, prática permitida pela mobilidade dada
pelos smartphones somada às tecnologias de dados sem fio, em concordância
com o autor, hoje se pode fazer tudo por meio dos celulares: pedir comida, fazer
compras, conversar com pessoas, procurar emprego, pedir transporte,
pesquisar, estudar. E neste sentido, Silva e Conceição (2013, p. 144) defendem
uma simultaneidade entre métodos tradicionais e as ferramentas tecnológicas,
amplificando a diversidade das ferramentas à disposição da educação,
marcando, contextualmente, a época e a cultura atualmente vivida da mobilidade
e da conectividade. De modo que “a bagagem tecnológica que o aluno traz para
a escola deve ser considerada, já que ele passa a maior parte de seu tempo
navegando na internet, usando MP3 e iPods, falando no celular, obtendo
informações por todos esses suportes.” Junquer e Cortez (2010, p. 64)

Após apresentar a relação atual das pessoas, e, principalmente, dos alunos para
com os aparelhos de smartphone e a internet, propomos discorrer sobre alguns
aplicativos disponíveis nos sistemas Android (celulares das marcas Samsung,
LG e Motorola) e IOS (celulares da marca IPhone) que podem auxiliar no ensino
e fixação dos conteúdos de História estudados em sala de aula.

Os aplicativos desenvolvem as mais diversas funções, temos os de revisão, os


de consulta a conteúdos, os de fixação com questões e os de curiosidades
históricas. Para iniciar apresentaremos três aplicativos: “Neste Dia”, “Hoje na
História” e “Calendário Histórico”. Eles são um tanto quanto parecidos e
apresentam fatos ocorridos no dia atual do acesso, porém em anos anteriores e
durante a história mundial, além disso, mostram os eventos históricos daquela
data, os nascimentos e falecimentos de figuras históricas de relevância, os
feriados e eventos cíclicos mundiais, mostram ainda como é vista essa mesma
data em calendários de outras culturas e permitem a navegação pelos dias do
ano com o intuito de expor todas essas informações, podendo ser vistos como
recurso para instigar a curiosidade em sala de aula.
Outro aplicativo muito interessante e funcional na intenção de auxiliar o ensino
de História é o “Presidentes do Brasil”, nele é possível escolher entre quatro
períodos: 1889-1930, 1930-1964, 1964-1985 e 1985-2019 e consultar todos os
presidentes em cada período de tempo, ademais é possível saber os anos de
mandato, os partidos políticos e as características de governo de cada 65
presidente da República. O aplicativo contém um conteúdo bastante resumido,
porém é bem atualizado e já possui dados do atual presidente.

O “Guia da História” pode ser considerado um dos aplicativos mais funcionais,


ele exerce uma função parecida com a de um dicionário histórico, pois apresenta
em ordem alfabética alguns períodos, conceitos, biografias e definições de
palavras e eventos significantes para a História. Ele ainda possui um quiz que
pode ser jogado com o objetivo de adquirir novos conhecimentos e experiência
com as áreas da História. Nessa mesma vertente temos um dos aplicativos que
ajudam na memorização de conteúdos e aprendizado que é o “Jogos de Quiz de
História do Mundo”. Ele é basicamente um quiz historiográfico, porém, após
acertar a resposta correta ele gera automaticamente uma informação ou
definição importante sobre o acontecimento ou pessoa referenciados.

O “LookHistória” contém um teor um pouco parecido com o do “Guia da História”,


porém apresenta seus conteúdos de forma diferente. Nele é possível acessar os
ícones: Estudos Históricos, Antiguidade, Idade Média, Idade Moderna, Idade
Contemporânea, Atualidades, Brasil Colônia, Brasil Império e Brasil República,
e a partir daí se torna viável o aprofundamento maior em cada período através
dos tópicos que trazem descrição histórica sobre todos os temas. O mais
interessante desse aplicativo é a existência da parte de Estudos Históricos, pois
nela o aluno pode ter acesso e compreender o que são fontes históricas e
conhecer um pouco mais sobre as escolas historiográficas.

Um dos aplicativos que poderia ser destinado para os alunos dos anos finais do
ensino médio é o “MS! Questões”, nele encontra-se mais de 9.000 questões
divididas entre as matérias que são avaliadas no Exame Nacional do Ensino
Médio (ENEM), e, de forma fácil, pode-se escolher apenas as questões de
História que aparecem em 19 tópicos de temas diferentes com inúmeras
questões para quem deseja se preparar para concursos como o próprio ENEM,
além de ser muito atualizado e conter questões das mais variadas universidades
do Brasil. Nessa mesma direção temos o “Prepara Enem”, onde o aluno é capaz
de fazer simulados preparatórios para o ENEM, podendo escolher pelas áreas e
matérias que possui mais dificuldades ou que deseja se aperfeiçoar e adquirir
conhecimento, visto que o aplicativo possibilita a verificação da questão logo
após respondê-la, sem contar que ele ainda possui simulados prontos de anos
anteriores, incluindo até um contador de tempo para o estudante ter o controle
do seu tempo de estudo.

E, por fim, apresentamos o “RevisApp” que pode ser considerado um dos mais
completos, se não o mais completo de todos. Ele é um aplicativo de revisão que
contempla muitas matérias e conteúdos. A parte de História é separada por:
Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna, Idade Contemporânea, Brasil
Colônia, Brasil Império e Brasil República, parecido com a organização do
“LookHistória”, porém apresenta os conteúdos de forma mais completa, além de
oferecer ao final de cada revisão cinco questões referentes aos temas para
exercer a fixação do que foi revisado. 66

Os aplicativos cumprem funções diferentes entre si e alguns seriam bastante


funcionais em sala de aula, ao mesmo tempo em que outros poderiam ser
utilizados também em casa com intuito de um aprendizado mais digital. O
professor pode se utilizar dos aplicativos para incentivar os alunos a buscarem
a definição de determinado contexto histórico antes de introduzir o conteúdo,
para que assim, o mesmo faça parte da construção da aula, para estimular a
resposta de quizes, até mesmo criando uma competição entre os alunos em sala
após a ministração dos conteúdos, motivando-os a saber mais, para trabalhar
questões de fixação e questões de ENEMs dos anos anteriores, ou
simplesmente para aguçar a curiosidade dos alunos ao comentar sobre o que
estava acontecendo em algum lugar do mundo naquela mesma data, porém há
muitos anos, tornando assim, a história mais palpável e as aulas mais
interessantes.

Depois de apresentar dez aplicativos e suas utilidades, faz-se necessária uma


discussão sobre o acesso dos alunos a esses aplicativos. Mesmo com o
aumento do número de pessoas com acesso à smartphones e com um número
maior de celulares ativos do que de pessoas no país, como vimos anteriormente,
é impossível assegurar que todos os alunos dentro de uma sala de aula terão
acesso a um celular. Uma outra questão importante é o acesso à internet muito
defasado no Brasil, internet essa que seria utilizada para baixar e utilizar os
aplicativos de forma completa. “Houve melhorias na ampliação de acesso e uso
das redes nas escolas nas mais diversas regiões do país. Estas, no entanto,
estão aquém do necessário e desejável para elevar o patamar educacional
brasileiro.” (KENSKI, 2015, p. 139)

“Ainda há muito a ser feito em relação ao uso mais intensivo da internet e redes
nas salas de aula. Antes de tudo, há necessidade urgente de que o sistema
educacional brasileiro se prepare para oferecer condições de aprendizado de
acordo com as exigências do mundo digital.” (KENSKI, 2015, p. 140). Portanto,
apesar de sugerir a inclusão do mundo digital em sala de aula através do celular,
reconhecemos as dificuldades na utilização e manutenção desse sistema digital,
principalmente nas escolas com menos recursos. Destarte, enquanto mudanças
estruturais não sejam executadas por parte do governo, o que está ao alcance
dos professores, é, antes de sugerir atividades com esses aplicativos, avaliar a
realidade de sua turma, às vezes nem todos os alunos têm celular, mas a
proposição de que a atividade seja feita em dupla, talvez, já seria o suficiente
para sanar esse problema, avaliar também o aplicativo que irá utilizar, selecionar
aplicativos que se enquadrem às necessidades da escola, como por exemplo,
se funciona offline ou necessita de acesso em tempo integral à internet, caso
funcione offline, averiguar se há a possibilidade de os alunos baixarem antes da
aula, em suas casas.

Para além dessas dificuldades estruturais, é de extrema importância ressaltar


que o professor deve planejar o uso dos aplicativos para que eles sirvam como
ferramenta para construção do conhecimento e não só como ilustração dos 67
temas abordados. Assim, podemos concluir que o uso de aplicativos no ensino
de história se transformará em um instrumento para superar o conteudismo que
dificulta o interesse dos alunos pela história, pois a torna muito distante e
desligada de sua realidade. O uso adequado desses aplicativos auxiliará na
aproximação entre os alunos e o estudo da história, pois valorizará a
problematização, a análise, a comparação, a formulação de hipóteses,
desenvolvendo assim o senso crítico do estudante, cumprindo assim a principal
função da história: “a história tem como papel central a formação da consciência
histórica dos homens, possibilitando a construção de identidades, a elucidação
do vivido, a intervenção social e práxis individual e coletiva.” (FONSECA, 2003,
p, 89).

Referências biográficas
Augusto Agostini Tonelli, estudante de História da Universidade Estadual de
Maringá.

Letícia da Silva Leite, estudante de História da Universidade Estadual de


Maringá.

Referências bibliográficas
BONILLA, M. H. S. Escola aprendente: para além da sociedade da informação.
Rio de Janeiro: Quartet, 2005.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares


nacionais: história. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC /SEF,
1998.

FONSECA, S. G.. Didática e Prática de Ensino de História: experiências,


reflexões e aprendizados. 7 ed. São Paulo: Papirus, 2003.

JUNQUER, A. C. L.; CORTEZ, E. D. S.. As diversas mídias e o uso do celular


na sala de aula. Oficina ocorrida no V Seminário Nacional o professor e a
leitura do jornal. Unicamp, 2010. Disponível em:
<https://ltp.emnuvens.com.br/ltp/article/view/58>. Acesso em: 30 de abril de
2021.

KENSKI, Vani Moreira. Educação e internet no Brasil. Cad Adenauer, v. 16, n.


3, p. 133-150, 2015.

LEMOS, André. Cibercultura e mobilidade: a era da conexão. In: Intercom.


XXVII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2005.
LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.

SANTAELLA, Lucia. Linguagem líquida na era da mobilidade. São Paulo:


Paulus, 2007.
68
SCHMIDT, M. A. A formação do professor de história e o cotidiano da sala de
aula. In: BITTENCOURT, Circe. O saber histórico na sala de aula. 9.ed. São
Paulo: Contexto, 2004.

SILVA, Bento Duarte da; CONCEIÇÃO, Silvia Carla. Desafios do b-learning em


tempos da cibercultura. In: Cenários de inovação para a educação na
sociedade digital. São Paulo: Edições Loyola, 2013.
MEMES E ENSINO DE HISTÓRIA:
EXPERIÊNCIAS E APRENDIZAGENS NO
COLÉGIO ESTADUAL ANTÔNIO CARLOS
69
MAGALHÃES, EM TANHAÇU/BA
Auricharme Cardoso de Moura
Os memes estão espalhados no mundo digital. “Virar” meme tornou-se
expressão comum nas redes sociais, em programas televisivos, no grupo de
amigos, nas conversas presenciais e virtuais de diversas gerações. Os memes,
para além de uma brincadeira, uma representação da realidade, uma forma de
lazer e entretenimento, vem sendo usado como conteúdo educativo. Professores
usam este gênero em sala de aula, páginas e perfis são criados na internet com
memes voltados para a educação, seu uso é recomendado por documentos
diversos (como a própria Base Nacional Comum Curricular) e questões de
vestibular exploram este recurso de maneiras diversas.

De acordo com CADENA (2008), o meme teve seu conceito elaborado pelo
pesquisador inglês Richard Dawkins, na obra “O Gene Egoísta”, de 1979. Seu
conceito estabelece um parâmetro analógico ao gene, como uma unidade de
transmissão cultural. Meme, que está relacionado à memória, seria uma
imitação, uma cópia, sendo que sua terminologia deriva da palavra “Mimeme”.
Assim, a partir de tal relação, o meme teria influência na constituição de
identidades.

Os memes aparecem nas formas de vídeos, imagens, palavras, frases ou


hashtag, sendo muito comum em redes sociais, como o Twitter, Facebook,
Instagram e WhatsApp. Pode “viralizar” em poucos minutos, assim como pode
ser esquecido com uma semana. Sua popularização ocorreu a partir do ano de
2010, momento em que se transformou em um código, símbolo e idioma que
transmite mensagens e conteúdos diversos a milhões de pessoas.

Os memes podem trazer discussões políticas, econômicas, sociais, culturais,


filosóficas e éticas para a sala de aula. Desta forma, os memes são temas
geradores de debates e interações dentro de um processo comunicativo que
envolve diálogos entre professor e alunos.

Seja crítico, satírico, mordaz, engraçado, cômico, persuasivo, lúdico, divertido,


reflexivo, contemplativo, polêmico ou debochado, o meme é uma forma de
comunicação que conecta diversos indivíduos, percepções e interesses. Para se
tornar uma prática pedagógica significativa, o uso do meme deve se articular
com outros materiais didáticos e outros instrumentos teóricos e metodológicos
(conceitos, processos e contextos históricos, etc.).
Memes são usados nas salas de aula como forma de interação social,
construção de saberes, debates, criatividade, participação e inclusão dos alunos
que sentem-se atraídos por novidades em sala de aula. De acordo com a Base
Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018, p.479), a construção dos currículos
escolares deve-se levar em consideração a seleção e aplicação de
“metodologias e estratégias didático-pedagógicas diversificadas” no sentido de 70
atender “as necessidades de diferentes grupos de alunos, suas famílias e cultura
de origem, suas comunidades, seus grupos de socialização etc.”

Além ler e interpretar diversos documentos, o aluno pode passar de simples


reprodutor/consumidor de conhecimentos para produtor em potencial dentro de
um processo que requer orientação do professor e conhecimento prévio sobre
determinado tema. O saber é compreendido como algo aberto, múltiplo e flexível,
nos distanciando de ideias e teorias que o abordam como pronto, acabado e
imutável.

O meme nunca será trabalhado de forma individual ou isolada. Uma análise mais
profunda, contextualizada, sistematizada e interdisciplinar se faz a partir da
interação de diversas linguagens e áreas do conhecimento humano. Ao
professor, cabe mediar este processo no sentido de oportunizar aos discentes
ler, interpretar e compreender como diversos gêneros e recursos textuais se
completam, se opõem ou divergem acerca de um mesmo tema.

Os memes atualmente são usados na pesquisa e ensino de história. Não se trata


de uma mera ilustração, mas sim de um material didático subordinado a
procedimentos comuns a qualquer fonte. A “operação historiográfica” serve para
qualquer fonte, inclusive para os memes. Perguntas como quem produziu,
quando produziu, quais interesses, porque produziu, onde produziu, discursos,
narrativas e representações etc. são essenciais para o trabalho de qualquer
professor/pesquisador. É dever moral e de ofício defender o estatuto
epistemológico da história e seu compromisso com a verdade, com a
objetividade, com a crítica e com rígidos métodos, procedimentos e técnicas de
pesquisa.

O mundo digital e as práticas da cultura digital devem ser apropriadas pelos


docentes como meios de preparar os estudantes para o mundo do trabalho,
promoção da autonomia, formas de atuação social e desenvolvimento de redes
sociais e éticas. Dessa feita, a prática de “curtir”, “seguir”, “compartilhar” e
produzir conteúdos digitais não pode ser um processo aleatório, irresponsável
ou que fira a ética e os direitos humanos. A escola do século XXI também tem o
dever de orientar seus estudantes a como se posicionar, comportar e lidar com
as tecnologias e mídias sociais.

Os memes não devem ser escolhidos de maneira aleatória, mas sim de forma a
apresentar uma reflexão ou compreensão acerca de determinado tema. Memes
não são uma “tábua de salvação” para o ensino de história, são apenas fontes
que devem ser articuladas com outros documentos históricos, a exemplo de
livros didáticos, músicas, imagens, filmes, etc. A partir dos memes, o aluno deve
ser capaz de ler personagens, tempos, paisagens, textos, contextos, referências
culturais, representações, símbolos, entre outras possibilidades que aguçam a
curiosidade, criatividade e interesse pelo conhecimento.

Articular o meme à consciência histórica do aluno é um passo importante para 71


diagnosticar saberes, níveis de aprendizado e noções históricas que estão
superadas. O meme é apresentado, refletido e discutido de forma livre e coletiva
sendo que, posteriormente, cabe ao professor apresentar outros recursos e
materiais didáticos que aprofundem a compreensão do fato histórico em
questão. Inicialmente discutida de forma descontraída e leve, a história passa a
ser tratada por um viés crítico, compreendendo processos, tempos e espaços,
conceitos, etc.

A nossa experiência com os memes foi desenvolvida durante aulas remotas no


Colégio Estadual Antônio Carlos Magalhães, que está localizado em Tanhaçu,
um pequeno município do sudoeste baiano. O Colégio oferece o ensino médio,
atendendo alunos da zona rural e da zona urbana nos três turnos. No início de
2020, foram matriculados 477 alunos.

Em um contexto de pandemia provocado pelo coronavírus, as orientações foram


dadas pelo “Google Meet” e pelos grupos de whatsApp. A ideia de um “Concurso
de Memes” surgiu por ocasião da comemoração do Dia da Independência (07
de setembro) e da possibilidade de transformar uma data histórica em uma
estratégia para promover a criatividade, entretenimento e interação dos alunos
que estavam em isolamento social.

Os discentes tiveram liberdade para criar memes de acordo com sua a


criatividade e conhecimento prévio. Neste sentido, tomamos como pressuposto
as considerações de Marcos Silva quando salienta que “no lugar do meme como
obra acabada, há seus elementos plásticos dispostos à manipulação, como
campo de possibilidades capaz de garantir a emergência de significações livres
e plurais” (PIMENTEL, 2019, p. 236).

Os alunos deveriam fazer um meme onde a famosa frase “Independência ou


Morte” seria substituída por outra qualquer, desde que respeitasse os direitos
humanos. As produções foram enviadas para o professor organizador que, por
sua vez, as encaminhavam para os professores do próprio colégio que atuaram
como jurados.

Antes da produção dos memes, divulgamos nos grupos de cada turma


elementos sobre a Independência do Brasil. Abordamos alguns de seus
personagens, motivos e conseqüências, a participação popular, a construção de
mitos, a ideia de nação e nacionalismo, a permanência de certas estruturas
sociais (como a escravidão e o latifúndio), algumas representações, símbolos e
imagens da independência, principalmente o famoso quadro “Independência ou
Morte”, de Pedro Américo, entre outros aspectos. Problematizar a
independência tornou-se uma tarefa importante para que os alunos não
naturalizassem ou reproduzissem conteúdos e imagens sem uma análise crítica.

Durante uma semana, os alunos foram orientados a realizar pesquisas no


objetivo de aprofundar seus conhecimentos sobre a Independência do Brasil.
Neste período, foram realizados esclarecimentos sobre a dinâmica do concurso 72
virtual e de alguns pontos que ele eles tinham dúvidas quando liam ou assistiam
vídeos sobre o tema proposto.

Analisando a produção dos discentes, é importante salientar que nenhuma delas


apresentou um discurso de ódio, intolerância ou preconceito. O contexto social,
econômico, cultural, político e epidemiológico vivido pelos alunos foi amplamente
abordado. As produções destacaram a inflação, o futebol, a corrupção, novelas,
músicas, a escola, entretenimento e, principalmente, a pandemia. O campo de
experiência, horizontes e possibilidades explorado pelos alunos abriu um leque
para pensar como vivem e interpretam o mundo contemporâneo.

As “significações livres e plurais” propostas pelos memes estiveram dentro de


um processo de ensino e aprendizagem que foi além de debater uma data
histórica, mas abordou anseios, sentimentos, significados, vivências, angústias
e ideias dos alunos. O meme construído pelos alunos estabeleceu conexões e
diálogos com o momento vivido pelo mundo, pelo Brasil e por cada sujeito em
sua individualidade e subjetividade.

Selecionamos dois memes que são representativas do universo social e cultural


dos alunos. O primeiro diz respeito ao preço elevado do arroz que virou alvo de
crítica e sátira em todo o país

Imagem 01

Fonte: Acervo do Autor


O dólar alto e o aumento da procura pelo arroz devido ao auxílio emergencial fez
com que houvesse um aumento de 19,2% do preço do grão em 2020 (SALATI;
RIKARDY, 2020), contribuindo para que houvesse uma pressão no custo de vida
das famílias mais pobres, realidade essa vivida por muitos tanhaçuenses.

O meme reflete um posicionamento político do autor que se mostrou incomodado 73


com a inflação em uma época de pandemia na qual milhões de trabalhadores
perderam o emprego e a renda. Assim, o meme abre precedentes para se
questionar o desenvolvimento do capitalismo no campo brasileiro ao transformar
o valor, usos e finalidades da terra com a substituição de um atendimento voltado
para as necessidades humanas para um atendimento que prioriza o lucro e a
acumulação. Nesta nova dinâmica, a fruta, a verdura, o legume, o grão ou
qualquer outro cultivo agrícola passam a ser mercadorias antes de serem
alimentos que muitas vezes servem ao mercado internacional.

Se, em um primeiro momento, o meme pode parecer cômico ou engraçado, uma


análise mais profunda revela que o autor usou de um recurso mimético para
criticar a política econômica do país que não vinha atendendo aos interesses dos
brasileiros e sim do “mercado”, assim como expor sua indignação diante das
dificuldades em comprar alimentos considerados essenciais.

O meme seguinte trata da situação social e epidemiológica do país em um


contexto de pandemia

Imagem 02:

Fonte: Acervo do Autor

O sete de setembro de 2020 é usado para uma nova declaração: “Quarentena


ou morte”. Naquele mês, o Brasil já tinha perdido mais de 100 mil pessoas devido
à doença e aparecia em segundo lugar como país com maior número de mortes
(o primeiro era os Estados Unidos). As regras e campanhas para manter o
distanciamento social, uso de máscara e álcool em geral não eram seguidas por
muitas pessoas, o que contribuía para agravar a situação epidemiológica.

Adolescentes e jovens tiveram suas emoções e comportamentos alterados


devido à necessidade de permanecer em casa. Preocupações, nervosismo,
irritabilidade, ansiedade e mau-humor foram sentimentos comuns em 48.7% dos 74
adolescentes brasileiros, sendo que esse percentual sobe para 61,6% quando
se considera apenas as meninas (AGÊNCIA BRASIL, 2020). O fim da pandemia
significa a retomada de sonhos e projetos, o fim do horror e da morte exibidos
cotidianamente nos meios de comunicação e mídias sociais, um pensamento
que pode se voltar para o futuro e não apenas para o presente. Significa, ainda,
a possibilidade de poder abraçar parentes e amigos, estudar, trabalhar, andar,
festar, socializar, brincar, etc.

O processo de ler e produzir um meme revela resistências e aceitações do


sujeito produtor, seus valores, atitudes, posicionamentos, leitura e compreensão
do mundo social. A análise intertextual do meme (articulação de imagem,
paisagem, personagens e texto) revela uma analogia e relação entre passado e
presente, processos antigos e contemporâneos. Se antes a declaração era de
independência, o grito de 2020, feito pela ciência e pelos profissionais de saúde,
estava voltado para a necessidade de prevenção e distanciamento social. Neste
sentido, autores salientam que “memes são capazes de “problematizar questões
ligadas à dimensão social e histórica, transformando a leitura em uma atividade
constitutiva de sujeitos capazes de estabelecer relações com o mundo e nele
atuar como cidadãos.” (Ferreira, 2019, p.131).

Ao ser socializado em diversas redes sociais, o meme em questão também


cumpre um papel de educar e conscientizar um grande número de pessoas para
a dimensão e tragédia em curso no Brasil e no mundo. A produção de memes
revela subjetividades e processos de identificação que, ao serem compartilhados
por outras pessoas, revelam uma rede de intenções e interações que permeiam
o mundo virtual e o mundo real.

Esse caráter multifacetado dos memes indica seu potencial para o ensino e
pesquisa de história por abarcar diversas esferas da vida contemporânea, criar
uma relação entre aluno e professor, interação entre diversos sujeitos sociais,
população do saber acadêmico, além de confrontar experiências, identidades e
comportamentos diversos. O mundo digital se apresenta como um campo de
múltiplas aprendizagens, sendo que, neste caso, os alunos aparecem, também,
como sujeitos que podem produzir e compartilhar conteúdos.

A relação passado-presente e presente-passado foi explorada dentro de uma


dinâmica na qual a história transformou-se em uma disciplina lúdica e divertida,
mas sem perder de vista sua função social e seu estatuto epistemológico. Os
gritos na atualidade são muitos e feitos de diferentes formas, lugares,
circunstâncias e intensidade. Grita-se pela descolonização dos saberes, pela
independência econômica, pela dignidade humana, pela volta às aulas, pelo fim
da corrupção, por oportunidades, pelo respeito ao próximo, pela justiça social,
etc.

O uso da linguagem (memes) contribui para assegurar a autoria e autonomia, a


interação crítica e a criativa dos discentes, ao produzir representações históricas
que manifestam o exercício de uma educação cidadã para o existir em uma 75
sociedade democrática. Ressaltamos que não se trata de pensar os memes
como “tábua de salvação” para o ensino de história, mas sim de compreendê-los
como um gênero que, planejado e articulado com outras linguagens, abre um
campo de possibilidades didáticas e pedagógicas em relação à fabricação de
novos conhecimentos históricos.

Considerações finais
Na contemporaneidade, não podemos falar em conhecimento, mas em
conhecimentos. No plural, significa existem saberes diversos, assim como são
múltiplas as formas de apreendê-los e aprendê-los. Muitas vezes, o aluno tem
uma noção ou uma ideia prévia do tema a ser discutido em sala de aula.
Documentários, filmes, séries, redes sociais, etc. são algumas das ferramentas
utilizadas para aquisição de conhecimentos. Ou seja, o processo de ensino e
aprendizagem no século XXI não passa apenas pela leitura e pelos livros, ainda
que esses meios sejam essenciais e jamais podem ser considerados
ultrapassados.

O uso sem nenhum critério, seleção ou planejamento do meme traz o risco de


torná-lo uma mera ilustração e linguagem sem significado crítico e
contextualizado por parte dos alunos. O trabalho de analisar, contextualizar,
relacionar, criticar, comparar e compreender faz parte de uma “operação
historiográfica” que deve nortear o trabalho com qualquer fonte no processo de
ensino e pesquisa na área de história.

A experiência com o uso dos memes no Colégio Estadual Antônio Carlos


Magalhães mostrou que sua produção pelos alunos esteve intimamente
relacionado ao momento social, político, cultural e epidemiológico do país. Por
intermédio do gênero, foi possível observar parte do universo vivido pelos
estudantes, como vivem e interpretam a realidade, alguns de seus anseios,
desejos, angústias, comportamentos e identidades. A compreensão da realidade
dos alunos é um passo importante na busca de práticas e intervenções
pedagógicas que promovam a formação humana e ética dos indivíduos, para
além de sua formação cognitiva, profissional e acadêmica.

De nada adianta o aluno aprender tudo sobre guerras mundiais, feudalismo,


ditaduras, escravidão, etc. se não lhe for ensinado a aplicação de conceitos
como direitos humanos, empatia, cidadania, respeito e resiliência em sua vida
cotidiana. Pensar a educação no século XXI, e especificamente o ensino de
história, significa pensar em novos métodos, ideias, recursos, ferramentas e
projetos capazes de satisfazer as necessidades de um mundo dinâmico, flexível
e plural.
Referências bibliográficas
Auricharme Cardoso de Moura. Doutor em História pela Universidade Federal de
Uberlândia (UFU). Professor da Rede Estadual de Ensino em Tanhaçua/BA.

Referências bibliográficas 76
AGÊNCIA BRASIL. Jovens relatam mudança de rotina e de humor em estudo
sobre pandemia. Disponível em: <<
https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-12/jovens-relatam-
mudancas-de-rotina-e-de-humor-em-estudo-sobre-pandemia>> Acesso em
fevereiro de 2021.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília,


2018.

CADENA, Sílvio Ricardo Gouveia. Novos objetos para o ensino de história: os


memes na sala de aula. In: Anais do XII Encontro Estadual de História da
ANPUH/Pernambuco. Recife: ANPUH, 2008.

FERREIRA, Helena Maria et al. Memes em sala de aula: possibilidades para a


leitura das múltiplas semioses. In: Revista Periferia: Educação, Cultura e
Comunicação. Rio de Janeiro: Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 2019,
p.131.

PIMENTEL, Mariano. Meme, Educação e Interatividade: Entrevista com Marcos


Silva. In: Revista Periferia: Educação, Cultura e Comunicação. Rio de Janeiro:
Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 2019.

SALATI, Paula; TOOGE, RIKARDY. Arroz e óleo mais caros: entenda porque a
inflação dos alimentos disparou no país. Disponível em <<
https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2020/09/09/arroz-e-oleo-
mais-caros-entenda-por-que-a-inflacao-dos-alimentos-disparou-no-
pais.ghtml>> Acesso em 22 de fevereiro de 2021.
O AUDIOVISUAL NO ENSINO DE HISTÓRIA:
UMA ANÁLISE SOBRE NOVAS
PERSPECTIVAS PEDAGÓGICAS
77
Camila dos Santos da Costa e João Pedro da
Silveira Guimarães

Introdução
O homem, como um ser racional, desenvolveu inúmeras tecnologias para se
integrar ao seu hábitat e transformar a natureza e o meio em que vive (ARAUJO
et. al., 2017, p. 921-922). Por milênios, instrumentos tecnológicos possibilitaram
a comunicação, o agrupamento e a sedentarização destes seres humanos e,
consequentemente, as diferentes mudanças em seu modo de viver e de se
reproduzir. No contexto vigente, as conhecidas TICs - tecnologias da informação
e da comunicação - fazem parte do cotidiano das pessoas no que tange à
realização de múltiplas tarefas importantes, por exemplo, no trabalho, no lazer e
no entretenimento. Uma criança hoje já nasce um nativo digital, vivendo em um
mundo de rápidas e repentinas transformações tecnológicas. Por isso, o perfil do
aluno no mundo contemporâneo passa a ser inteiramente distinto em relação
aos anos anteriores, sendo necessário, para os profissionais da educação,
pensar em novas práticas pedagógicas e novas maneiras de ensinar.
Contemplando a imprescindibilidade do debate, as TICs podem ser excelentes
aliadas neste processo de inovação, já que os estudantes convivem com elas
naturalmente em seu dia a dia para variados fins. Neste artigo, contemplamos o
uso do audiovisual no ambiente da sala de aula, focando, sobretudo, em sua
utilização no ensino de História. Por fim, trouxemos reflexões sobre as suas
aplicabilidades e seus benefícios para o ensino, além, obviamente, de
comentarmos alguns entraves que podem surgir neste transcurso.

A tecnologia e a educação como mecanismos de transformação social


Em todos os períodos históricos, o ser humano produziu tecnologia a partir de
sua capacidade de racionalização e adaptabilidade ao meio em que vive. Deste
modo, com o intuito de facilitar o cotidiano de sua espécie, de suprir as suas
necessidades e de proporcionar condições oportunas de permanência neste
planeta, o homem desenvolveu diferentes recursos tecnológicos de base
concreta, como obras arquitetônicas, ou imaterial, a exemplo da linguagem
(ARAUJO et. al., 2017, p. 921-922). Para isso, o controle da natureza foi
essencial, visto que permitiu aos indivíduos uma usabilidade de seus recursos
para confeccionar simples objetos defensivos ou ornamentais até meios de
transporte e tecnologias da comunicação (ARAUJO et. al., 2017, p. 922). Ao
passar do tempo, fabricaram-se constituintes imprescindíveis à realidade
contemporânea, sem os quais não haveria toda a comodidade e conforto
presentes nos âmbitos públicos e privados dos centros urbanos e rurais. Em
outras palavras, na ausência de toda a tecnologia produzida e descoberta em
tempos passados, falando-se das mais triviais às mais complexas, a vida
humana seria completamente diferente, sendo, possível, inclusive, que já tivesse
findado. Apesar de todos os benefícios, os recursos tecnológicos são
multifacetados e ambivalentes, em virtude da sua utilização tanto para a melhoria
da qualidade da vida humana quanto para a destruição em massa de grupos ou 78
territórios. Isto posto, esses componentes perpassam por diversas áreas da
presencialidade humana, incorporando-se às funcionalidades concernentes ao
bem-comum, ao enriquecimento e à manipulação da realidade e das
perspectivas de poder (ARAUJO et. al., 2017, p. 923-924). Como demonstra os
pesquisadores Araujo et. al. (2017, p. 924), a tecnologia pode ser também um
recurso de poder, pois os entes que controlam esses meios conseguem dominar
os seus semelhantes e prosperar econômica e politicamente.

Após todo o debate sobre as dimensões da tecnologia no âmbito social, é


perceptível a sua importância como uma ferramenta para suprir as necessidades
do próprio ser humano e de sua coletividade. Nesta perspectiva, os autores
Sandra Aparecida Batista e Carlos Cesar G. Freitas (2018, p. 123) propõem um
novo olhar acerca dos recursos tecnológicos, estabelecendo-os como
facilitadores na redução das desigualdades sociais e na transformação do ser
humano. Essa faceta da tecnologia interliga-se claramente ao princípio da
educação como um direito “inalienável de todo cidadão, com a finalidade de
promover o exercício da cidadania” (BATISTA; FREITAS, 2018, p. 123). Em
contrapartida, a educação também pode ser um mecanismo antitético
dependendo do contexto em que se insere, dado a sua oportunidade de
construção discursiva voltada a dois vieses distintos: a manutenção do status
quo ou a promoção de uma transformação social autêntica e significativa
(BATISTA; FREITAS, 2018, p. 124). Portanto, deve-se ter em mente a
necessidade de se refletir a inserção dos mecanismos tecnológicos na escola,
compreendendo a participação de todos, professores, alunos, pais, comunidade
e equipe escolar, inclusive na promoção de reuniões para debates sobre a
usabilidade destes recursos nas salas de aula e em outros espaços da
instituição, fazendo valer a dimensão democrática do contexto educacional
público. Nesta perspectiva, a educação e a tecnologia precisam ser vistas como
atos políticos, já que “envolvem escolhas, posicionamentos, visões de mundo e
compromissos éticos” (BATISTA; FREITAS, 2018, p. 124-125), mas também
como aparatos alinhados na construção de um mundo mais acolhedor e justo
para as futuras gerações.

Com a entrada das tecnologias da informação e da comunicação - TIC’s - no


contexto educacional, o processo pedagógico e o planejamento escolar
precisam ser repensados em conjunto, inclusive no entendimento de que as
tradicionais práticas de ensino não podem ser simplesmente excluídas do
espaço da sala de aula e nem se antagonizar às novas tecnologias, mas é crucial
que se proponha um diálogo entre esses dois paralelos, que não precisam ser
descoincidentes (BATISTA; FREITAS, 2018, p. 126). Portanto, coadunar a
educação e as TIC’s não deve ser somente sobre discutir se o aluno pode ou
não utilizar o celular em um espaço acadêmico, assim sendo, compreender que
o perfil atual do alunado está se modificando e que novas técnicas de ensino são
necessárias é o primeiro passo para uma educação mais democrática e
inclusiva. Pensando por outra perspectiva, a internet possibilita um amplo acesso
a informações de diferentes matizes teóricas e conceituais, sendo o homem
contemporâneo mergulhado em uma corrente de discursos esparsos e 79
desconexos, o que contribui para algumas peripécias conhecidas hoje em dia,
por exemplo, a confusão teórica sobre determinados temas, as fake-news e os
vazios metodológicos em relação à pesquisa e à leitura. Desta forma, a escola
seria um espaço frutífero para a impulsão de um diálogo consciente sobre o
conhecimento e suas estruturas constituintes, além de possibilitar um estudo
mais amplo sobre o manejo da informação e sobre as nuances do discurso
empreendidas em amplos canais de comunicação.

Ensino de história
Em sua obra História e Ensino de História (2003, p.7), a pesquisadora Thais Nivia
de Lima e Fonseca aponta que muito se espera do historiador no que tange ao
conhecimento sobre as fontes, a historiografia e os métodos da História; e do
professor, na ciência dos conteúdos, das propostas pedagógicas e da didática.
Porém, o que, na maioria das vezes, o professor de História deixa de se atentar,
até mesmo por sua formação, é que pode apontar caminhos possíveis para
compor o ensino de História. Com isso, “pensar o Ensino de História na sua
historicidade significa buscar, se não soluções definitivas, ao menos uma
compreensão mais clara sobre o que significa, hoje, ensinar História nas escolas”
(FONSECA, 2003, p.7).

Fonseca (2003, p.8-9) aponta que as pesquisas mais recentes relacionadas ao


Ensino de História dialogam com a história do ensino e com a história curricular,
ademais conversam ainda com a trajetória de métodos disciplinares, didáticos e
das composições políticas e ideológicas dos currículos e sua aplicação social.
Estes estudos, ao se relacionarem com a história das múltiplas disciplinas,
possibilitam a composição de saberes mais amplos e concernentes ao cotidiano
do alunado. A autora Circe Fernandes Bittencourt (2018, p.127) vai destacar que
a concepção de Ensino de História tem íntima relação com o modelo de História
valorizado pela sociedade e ambiente acadêmico. Se há a pregação de uma
História voltada para o crescimento econômico, por exemplo, as propostas de
ensino precisam estar alinhadas a isto.

Quando a História foi sistematizada no século XIX, consoante Bittencourt (2018,


p.127-128), inserindo-se dentro dos ambientes das escolas, a disciplina foi mais
valorizada, porque buscou atribuir grandeza às personagens históricas
consideradas importantes. Dessa forma, a História desempenhou um papel
basilar na constituição de um sentimento individual de pertencimento à nação
através do conhecimento sobre os grandes feitos destas figuras. Já ao longo do
século XX, com o desenvolvimento da democracia, o Ensino de História passou
à construção da cidadania, assim como os currículos e os métodos utilizados
nas disciplinas. Por vezes, esse ensino à cidadania conflituou e, ainda o faz, com
o ensino tecnicista, dirigido para a formação da mão-de-obra, castrando as
individualidades ao direcionar as pessoas para o campo do trabalho. No Brasil,
as questões envolvendo o ensino e o Ensino de História são ainda mais
complexas, porquanto, além do conflito entre o ensino mais progressista e o mais
mecânico, ainda se deve considerar a conjuntura política do país, seu passado
autoritário e a construção de múltiplas nacionalidades e regionalidades, visto que 80
o Brasil é uma nação de dimensões continentais. Além disso, devido à trajetória
social brasileira, as desigualdades são muito grandes e se acentuam ainda mais,
portanto, direcionar o Ensino de História ao objetivo de burlar as disparidades de
classe, etnia, gênero e cor, se constrói como um desafio.

O filme como recurso didático no ensino de história


A proposta deste tópico perpassa pela investigação da usabilidade de recursos
audiovisuais, como filmes, séries e documentários, no ensino de História.
Primeiramente, a percepção desses componentes como fontes de pesquisa e
estudo constitui-se como passo importante, uma vez que retratam uma época,
uma cultura e uma ambientação social e política característica de um dado
momento. É preciso considerar que a sociedade contemporânea possui uma
ampla adaptabilidade à utilização da imagem e do som, visto a constante
presença desses mecanismos em suas mais diferentes tarefas diárias (SOUZA;
SOARES, 2013, p. 4). Em seu cotidiano, portanto, o estudante já se utiliza de
filmes, séries, documentários e videoaulas, por exemplo, para o seu
entretenimento ou para conhecer mais sobre um determinado assunto ou
contexto específico. Assim, a usabilidade dos recursos audiovisuais viabilizaria
uma aproximação maior dos educandos dos conteúdos ensinados nas aulas de
História, além de propiciar um ensino mais lúdico, crítico, democrático e
participativo. Ou seja, com a composição de um planejamento mais diversificado
que abarque diferentes estratégias pedagógicas, faz-se possível que, mesmo
em uma classe tão heterogênea, todos os alunos compreendam o conteúdo e
adquiram a habilidade de pensá-lo criticamente. Sintetizando o que foi dito, a
História pode se utilizar desses instrumentos para “possibilitar reflexões sobre o
conhecimento histórico, uma vez que estamos inseridos nesse contexto de
ambiência tecnológica, onde o uso da imagem está cada vez mais comum”
(SOUZA; SOARES, 2013, p. 4). Por isso, a equipe escolar, os alunos, os pais e
os docentes, visto que o trabalho educativo é conjunto, precisam iniciar um
debate sobre a importância da aplicação tecnológica, principalmente das
produções audiovisuais, na sala de aula, ademais refletir sobre as suas nuances
e limites no que concerne ao ensino. Alguns temas devem ser discutidos, por
exemplo, as maneiras de se utilizar esses recursos, pois em diferentes
instituições são somente tapa-buracos na falta de professores ou em uma
determinada aula ociosa; as atividades programadas para acompanhar a
aplicação desses instrumentos, vendo-se a necessidade de os alunos
analisarem o filme, por exemplo, e debatê-lo, de maneira crítica e conjunta, com
os colegas, entre outros assuntos (LUCHETTI; AMARO, 2014, p. 6-7). À vista
disso, o docente, ao escolher um determinado audiovisual, deve, em primeira
instância, conversar com os alunos e discutir o tema que será transmitido,
reconhecer se aquele determinado filme ou série é adequado para a faixa etária
de sua turma, além de propor atividades, em sequência, para que os alunos
possam trabalhar as ideias e os conhecimentos que adquiriram, sendo essencial
a proposição de atividades individuais e coletivas (LUCHETTI; AMARO, 2014,
p.8).

Desde as últimas décadas do século XX, discute-se, na área da educação, o uso 81


de produções fílmicas como instrumento didático. Isso porque, após a
reafirmação da Escola dos Annales na Europa e em outros continentes, procura-
se o manuseio de outras fontes de estudo para a História, sendo estas
investigações adaptadas por professores em seu ofício (ABUD, 2003, p.185).
Outro fator que auxiliou na utilização de filmes em metodologias educacionais foi
a aprovação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394) de
1996. Este documento foi responsável por instigar o trabalho com mecanismos
tecnológicos, visando ampliar o contato disciplinar com o cotidiano do alunado.
Já no início dos anos 2000, muitas escolas passaram a se equipar com
televisores e aparelhos que reproduziam fitas cacetes, aspirando a transmissão
de filmes, primeiramente relacionados ao gênero documentário, mas depois se
estendendo para outros, já que diferentes produções fílmicas podem trabalhar
com fundos históricos e levantar debates sociais (ABUD, 2003, p.183-184).

Nos últimos anos, tem-se espalhado para todas as camadas da sociedade a


utilização de plataformas streaming, desta forma, o acesso a produções
cinematográficas se tornou muito mais dinâmico. Esse fator demonstra a
imprescindibilidade dos professores de manterem o contato com esse universo,
visando o debate acerca destes temas em sala de aula. Com o desenvolvimento
desenfreado da tecnologia, avultaram-se variadas mudanças em diferentes
profissões, inclusive, na forma do professor pensar seus aparatos
metodológicos. Adequação, esta, essencial, justamente na busca de relacionar
criticamente os conteúdos às novas demandas da sociedade. De acordo com a
pesquisadora Abud (2003, p.186-187), aos poucos, as concepções da Escola
dos Annales foram sendo acopladas à docência, com isso, as ideias de
interdisciplinaridade, problematização e crítica das fontes foram se adequando à
realidade da sala de aula.

Segundo Abud (2003, p.189), “(...) o filme é mais utilizado como um substituto do texto
didático ou da aula expositiva, ou é ainda considerado uma ilustração que dá
credibilidade ao tema que se está estudando”. Ou seja, os filmes, documentários e
séries podem ser utilizados para substituir textos mais densos sobre determinado
assunto, levando o alunado a compreender de forma mais palatável o conteúdo; por
outro lado, estas produções permitem também ser usadas para dar credibilidade a uma
discussão já realizada em sala de aula. Consoante o professor Luiz Araújo Ramos Neto
(2016, p.138), vários docentes possuem um contato maior com os conteúdos
disseminados pelas atuais plataformas streaming, porém, o manuseio destes nas
escolas faz-se como algo bem mais complexo e desafiador, mesmo no século XXI. Esta
dificuldade que o professor enfrenta possui diversas causas, entre elas estão: a falta de
equipamentos em algumas instituições; a precariedade no acesso a livros didáticos; o
preconceito de algumas escolas e pais com relação ao manuseio de ferramentas lúdicas
e outras.

Para tentar driblar estes impasses, diversos livros de qualidade têm sido lançados,
buscando auxiliar os professores na composição de seus aparatos didáticos. Um 82
exemplo destas obras é o livro “História e Didática” (2010), da Editora Vozes, que
oferece alternativas ao docente de História no trabalho com elementos tecnológicos,
como os filmes e a gamificação. A revolução tecnológica acelerada que os brasileiros
têm vivenciado nos últimos tempos, em certa medida, também tem sido acompanhada
pelas transformações dos livros didáticos, observando-se os novos materiais
distribuídos pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Outrossim, isto é
percebido também nas novas propostas de atividades trazidas pelos livros, que
envolvem a utilização de outras fontes há muito tempo manuseadas pelas pesquisas
acadêmicas de História, como filmes, literatura, jornais, revistas e outras. A nova cartilha
de livros disponível, desde 2018, no site do programa, apresenta, principalmente, as
obras das editoras Saraiva e Ática, que já trabalham com prerrogativas da BNCC (2017),
inclusive no manuseio de conteúdos digitais (CONCEIÇÃO, 2019, p.143-148).

Conclusão
É através da educação que se molda os cidadãos do amanhã, por isso, a união
entre professores, familiares e toda a sociedade, para auxiliar os alunos em sua
jornada até a vida adulta, torna-se essencial. De acordo com Jorge Larrosa
Bondía (2002, p.21), nos tempos atuais, vive-se em um mundo cada vez mais
precário quando o quesito é a troca de experiências, sendo estas responsáveis
por gerar ensinamentos para a vida prática dos sujeitos, com relação a si
mesmos e ao outro. Neste caso, a disseminação de informações diversas e
deslocadas vem acelerando o processo, tornando o ser humano ainda mais
alheio a reflexões. Enxerga-se como é importante o diálogo entre as novas
tecnologias e os conteúdos escolares formais, visto que a sociedade atual
possui, cada vez mais, acesso a ferramentas tecnológicas, sendo primordial a
problematização delas, por parte do professor, na prerrogativa de estabelecer o
uso crítico e significativo destes meios. Na contemporaneidade, observa-se que
as informações estão soltas na web e em uma quantidade muito grande, a ponto
de as pessoas terem bastante dificuldade na atribuição de sentido ao conteúdo
que acessam. Dentro deste contexto, o docente precisa intervir na realidade
social como um facilitador, auxiliando seus alunos e toda a comunidade escolar
a utilizarem os aparelhos tecnológicos de forma benéfica. Assim, o
direcionamento na formação de professores e o acesso aos suportes
necessários são prerrogativas ímpares para que aja o manuseio correto dos
conteúdos digitais, algo que deve partir não só de uma iniciativa dos docentes,
mas de uma cobrança da sociedade perante os órgãos públicos. Por fim,
somente deste jeito serão cumpridos os planos de educação responsáveis por
relacionar as vivências do alunado às disciplinas escolares, formando-os
adequadamente para a vida em sociedade.

Referências biográficas
Camila dos Santos da Costa: Licencianda de História pela Universidade
Católica de Petrópolis (UCP).
João Pedro da Silveira Guimarães: Formado em Letras. Pós-graduado em
Leitura e Literatura Infantil e Juvenil. Licenciando de História pela Universidade
Católica de Petrópolis (UCP).
83
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REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO
DOCENTE E O USO DAS TECNOLOGIAS
DIGITAIS NO ENSINO DE HISTÓRIA
85
Carlos Alexandre Souza Prado
A formação docente e as Tecnologias Digitais
Com o avanço tecnológico que vivenciamos fica praticamente impossível
mantermos as Tecnologias Digitais fora da sala de aula e da nossa prática
pedagógica. Diálogos e reflexões vêm sendo abordadas no meio docente, os
professores se depararam com a seguinte questão: como inserir essas
tecnologias dentro do processo de ensino? Nesse contexto fica evidente a
necessidade de se promover uma mudança estrutural no sistema educacional
brasileiro, o processo de inserção das tecnologias digitais no ensino não se dar
apenas na entrega de laboratórios e equipamentos tecnológicos, mas
principalmente, na formação inicial e continuada dos professores nessa área.

Desde os primeiros programas para a inserção das tecnologias digitais dentro


do sistema educacional, uma das principais preocupações sempre foi a da
qualificação dos professores para trabalharem com essas novas tecnologias
dentro das escolas, assim com a criação do Programa Nacional de Informática
na Educação (PROINFO) em 1997 o Governo definiu o papel que o professor do
novo século deveria desempenhar:

“A capacitação de professores para o uso das novas tecnologias de informação


e comunicação implica redimensionar o papel que o professor deverá
desempenhar na formação do cidadão do século XXI. É, de fato, um desafio à
pedagogia tradicional, porque significa introduzir mudanças no processo de
ensino-aprendizagem e, ainda, nos modos de estruturação e funcionamento da
escola e de suas relações com a comunidade.” (BRASIL, 1997, p. 11).

Assim o professor tem um papel fundamental na inserção das tecnologias dentro


da educação, mesmo que o Governo instale laboratórios dentro das escolas com
computadores, programas e jogos educacionais, mas cabe ao professor utilizar
e preparar suas aulas com o uso desses laboratórios, senão teremos escolas
aparelhadas com recursos tecnológicos, porém sem uso pedagógico.

Mas desde as primeiras tentativas de inserção dessas tecnologias digitais nas


escolas, um dos principais problemas sempre foi à rejeição dos professores em
utilizar essas tecnologias em suas aulas, a grande maioria ainda prefere utilizar
aquele velho paradigma e modelo tradicional, onde apenas seu conhecimento e
o livro didático são necessários para ensinar os alunos. Muitos ainda não aceitam
essa mudança dentro da sua metodologia de ensino e isso tem provocado
segundo Amaral (2004, p. 58) “resistência dos professores a novos modelos de
ensino-aprendizagem [...] muitos professores ainda não se conscientizaram que
sua função como fonte única, direta e primaria de informação desapareceu”.
Essa falta de interesse dos professores acrescido do pouco investimento do
Governo na qualificação dos educadores tem sido umas das principais barreiras
enfrentadas pela utilização das tecnologias digitais na educação. Mas não
adianta o Governo proporcionar cursos de qualificação, preparar esses
educadores, investir em laboratórios, se os professores não estiverem dispostos 86
a romper com esse paradigma e utilizar essas novas tecnologias em suas aulas,
o uso dessas só tem a colaborar e enriquecer as aulas e principalmente torná-
las mais didáticas e atrativas aos estudantes. Segundo Correa (2002, p. 44):

“As inovações tecnológicas não significam inovações pedagógicas. Por meio de


recursos considerados inovadores, reproduzem as mesmas atitudes, o mesmo
paradigma educacional pelo qual fomos formados. Não basta trocar de
metodologia, sem antes de reformular a sua própria prática, porque senão
estaremos repetindo os mesmos erros. Devemos [...] compreender a tecnologia
para além do artefato, recuperando sua dimensão humana e social.”

O professor precisa estar preparado para saber lidar com essas tecnologias e
como as utilizarem para ajudar no processo de aprendizagem, pois senão corre
o risco de em vez de amiga, fazê-la se tornar uma inimiga no processo de ensino.
Podemos dizer que as novas tecnologias são como uma espada de dois gumes,
com a mesma intensidade com que elas ajudam no processo do conhecimento,
elas também podem prejudicar esse processo. Existem muitas informações na
internet e muitas delas não são verdadeiras, se o aluno não souber como e onde
pesquisar corre o risco de adquirir informações equivocadas, nesse ponto que
entra o professor como um orientador. Sabendo-se como utilizar, as
contribuições das tecnologias digitais para a educação são inúmeras:

“As TIC trazem o mundo para o ambiente educativo, de forma interativa. Os


alunos e os professores são agentes a interagir com estes recursos, despertando
o interesse e a vontade de aprender sempre, funcionando como um agente
motivador. Não há limite(s) para o que pode ser feito na área educativa e da
história.” (FERREIRA, 1999, p. 148).

Um ponto importante e essencial dentro desse processo de inserção das


tecnologias dentro da educação é a qualificação do professor e um bom
conhecimento na área tecnológica associada à educativa para conseguir
articular o uso das tecnologias digitais dentro de suas aulas de uma forma que
enriqueça os conteúdos, sendo assim o uso das tecnologias:

“Só será concretizado, porém, na medida em que o professor dominar o saber


relativo ás tecnologias, tanto em termos de valorização e conscientização de sua
real utilização. A formação tecnológica do professor tem influência direta no
processo de desenvolvimento tecnológico social. Por isso o professor deverá
atuar numa ação reflexiva sobre sua prática pedagógica e a partir daí construir
novos paradigmas.” (SAMPAIO; LEITE, 1999, p. 25)
Mas será que só cursos de capacitação dará conta de todo esse desafio?
Estamos falando aqui de milhões de professores espalhados pelo Brasil, fora os
que estão se formando no momento, então todos terão acesso aos cursos?
Quantos cursos os professores terão que fazer para se sentirem realmente
preparados para essa nova realidade digital? São questionamentos que nos
levam a uma resposta que é ao mesmo tempo simples e complexa, suponhamos 87
um professor que iniciou sua vida docente há vinte anos, naquele período os
computadores eram caros e de difícil acesso, nem todo mundo tinha aparelho
celular e os que tinham só utilizavam para realizar ligações. As tecnologias
digitais estavam ainda distantes da realidade escolar, ou seja, esse professor
não teve uma formação adequada na utilização das novas tecnologias no meio
educacional. Mas hoje a realidade é totalmente diferente, as tecnologias digitais
tomaram conta das nossas vidas e os jovens de hoje já nascem nesse meio,
conectados com esse novo mundo. Então o ideal é que esse professor tenha
formação continuada de qualidade para que consiga conciliar essa novas
tecnologias com as suas práticas pedagógicas.

Nesse sentido os cursos de capacitação são necessários, preparam os


professores para essa nova demanda que surge no meio educacional. Mas
esses cursos não são o suficiente e nem a solução final para resolvermos o
problema da formação dos professores em relação às novas tecnologias, a
principal mudança deve ocorrer dentro das Universidades nos cursos de
Licenciaturas. É nesse ambiente onde esse professor do século XXI está em
formação que devemos levantar essa discussão, é ali onde o futuro docente que
já está familiarizado e cresceu nesse meio tecnológico vai passar a enxergar
essas tecnologias não mais como algo instrumental, mas sim como um novo
material didático em potencial. Os cursos de Licenciaturas têm o objetivo de
formar futuros professores, ensinam teorias, métodos, práticas educativas,
buscando preparar esse profissional para o ambiente escolar. Mas a principal
questão é, se o objetivo das Licenciaturas é preparar o professor para esse
sistema educacional e sabemos que a nova sociedade da informação está
impondo uma mudança nesse sistema, por que não qualificar os professores
ainda na graduação para utilizar as tecnologias digitais na sua prática
pedagógica? Por que deixar apenas para os cursos de capacitação? Temos mais
indagações do que respostas e o objetivo aqui não é resolver criar uma solução
definitiva para tudo, até porque isso seria impossível, faz parte dessa nova “Era
Digital” levantar questionamentos ao mesmo passo que novas tecnologias
surgem. Creio que o ponto de partida realmente se encontre na formação inicial
dos professores nas Universidades e que não fique apenas ali, esse novo
professor do século XXI precisa está sempre se atualizando, mas claro que
apenas os cursos de capacitação ou atualização não são suficientes para dar
conta desse desafio é preciso mais investimento na formação inicial e
continuada.

Cabe ao professor não apenas conhecer as tecnologias e suas potencialidades,


mas junto com a escola preparar novos métodos e práticas pedagógicas que as
englobem, é de fato utilizar as tecnologias digitais ao seu favor. Mas formar
professores para essa tarefa não é algo simples, exige um esforço tanto dos
próprios professores em querer aprender, quanto do Governo em oferecer mais
oportunidades de qualificação.

“Formar professores, neste contexto, exige:


· mudanças na forma de conceber o trabalho docente, flexibilização dos 88
currículos nas escolas e as responsabilidades da escola no processo de
formação do cidadão;
· socialização do acesso à informação e produção de conhecimento para todos;
· mudança de concepção do ato de ensinar em relação com os novos modos de
conceber o processo de aprender e de acessar e adquirir conhecimento;
· mudança nos modelos/marcos interpretativos de aprendizagem, passando do
modelo educacional predominante instrucionista, isto é, que o ensino se constrói
a partir da aplicação do conhecimento teórico formulado a partir das ciências
humanas e sociais que dariam fundamentos para a educação;
· construção de uma nova configuração educacional que integre novos espaços
de conhecimentos em uma proposta de inovação da escola, na qual o
conhecimento não está centrado no professor e nem no espaço físico e no tempo
escolar, mas visto como processo permanente de transição, progressivamente
construído, conforme os novos paradigmas;
· desenvolvimento dos processos interativos que ocorrem no ambiente
telemático, sob a perspectiva do trabalho cooperativo.” (MERCADO, 1998, p.4)

Quanto mais preparado e qualificado o professor estiver na área mais a vontade


ele vai se sentir para utilizar as tecnologias em sua prática pedagógica. Sabemos
que não é uma tarefa fácil a inserção de novas tecnologias dentro das escolas,
isso gera um impacto e mudanças estruturais dentro de todo o sistema
educacional, mas são mudanças necessárias para a formação de uma
sociedade informatizada. Não deixa dúvida que o uso dessas tecnologias tornou-
se importante dentro do processo de aprendizagem, mas é preciso ter cautela e
saber como utilizá-la “é necessário que professores e alunos conheçam,
interpretem, utilizem, reflitam e dominem criticamente a tecnologia para não
serem por ela dominados”. (SAMPAIO; LEITE, 1999, p. 19). Enfim cabe ao
professor do século XXI romper com o modelo tradicional de ensino, quebrar
com esse paradigma e rejeição, entender que os usos das tecnologias digitais
vão ser de grande contribuição em suas aulas e que elas não vieram tornar seu
papel de professor obsoleto, mas sim de auxiliar sua prática pedagógica
melhorando a relação aluno e professor e, consequentemente, melhorando todo
o processo de ensino e aprendizagem.

O professor e o ensino de História


Umas das disciplinas que mais vem sofrendo nessa nova “Era Digital” é a
disciplina de História, isso ocorre por dois motivos: o primeiro é que os alunos
possuem uma visão distorcida do que realmente é a disciplina de História,
chegam com o pensamento de que História é apenas contar sobre o passado,
decorar datas e nomes, algo distante do seu cotidiano e, consequentemente, se
torna desinteressante para eles. O segundo motivo é a perpetuação do velho
modelo tradicional, onde os professores não procuram usar métodos e práticas
que busquem mudar essa percepção dos alunos. O ensino de História ainda
continua predominantemente com um caráter factual, narrativo e positivista e
isso tem desestimulado tanto alunos, quanto professores. (FERREIRA, 1999).

Sendo assim, a inserção das tecnologias digitais dentro não só das escolas como 89
da prática pedagógica se torna uma solução interessante para procurarmos
reverter esse cenário caótico que vivenciamos dentro das escolas,
principalmente com relação à disciplina de História. Mas o professor precisa
primeiramente saber como utilizar essas tecnologias com finalidades
pedagógicas, não apenas inserir a qualquer custo e esperar que tenha um
resultado satisfatório, precisa conhecer, saber como utilizar e planejar com essas
tecnologias. Faz-se interessante também compreender as tecnologias não
apenas no campo instrumental, mas sim educacional e social. As tecnologias
digitais não são apenas novos instrumentos que vieram para auxiliar o professor
e animar suas aulas, deixando mais criativo, elas fazem parte de uma nova
cultura, de uma nova forma de pensar e agir, assim como afirma Pretto (1996,
p.114) “[...] o uso como instrumentalidade esvazia esses recursos de suas
características fundamentais, transformando-os apenas num animador da velha
educação, que se desfaz velozmente uma vez que o encanto da novidade
também deixa de existir.”.

Uma das principais dificuldades que os professores de História têm enfrentado


ultimamente é justamente em relação ao desinteresse que os alunos possuem
em relação à disciplina. Os jovens nascidos nessa era digital estão acostumados
com uma noção de tempo diferente, onde tudo tem que ser dinâmico, rápido, de
fácil acesso. Eles não apenas vivem cercados pelas tecnologias, eles nasceram
nelas, ou seja, possuem uma visão de mundo diferente de quem nasceu há duas
décadas por exemplo. Então como fazer com que esses jovens se interessem
pelo ensino de História?

“Constitui-se hoje, para os educadores do ensino fundamental e médio, um


desafio muito grande ensinar alunos que têm contato cada vez maior com os
meios de comunicação e sofrem a influência da televisão, rádio, jornal, vídeo-
games, fax, computador, redes de informações e etc. Como produzir uma boa
aula? Como sair do tradicional giz e “cuspe”? Como romper com as imposições
de um ensino que parou no tempo?” (FERREIRA, 1999, p.144)

De fato é um desafio, mas não impossível, a chave para mudar esse processo
se encontra em utilizar as próprias tecnologias digitais como suporte para o
ensino da disciplina. O primeiro passo é desconstruir esse conceito distorcido e
negativo que os jovens possuem sobre a história, apresentar aos alunos sobre
o que de fato é a história e a importância para contemporaneidade nos estudos
históricos. As tecnologias digitais permitem que os professores possam
trabalhar com vários tipos de métodos e fontes que “enriquecem” a compreensão
do conteúdo, temos acesso hoje a filmes, músicas, jogos digitais, livros digitais,
documentos digitalizados que antes nem mesmo os próprios professores tinham
acesso.

Mudanças sempre ocasionam medo e incertezas, mas no ritmo que o mundo


tem hoje, com esse avanço tecnológico, com acesso a informações quase que
ilimitadas, não se pode mais querer perpetuar aquele velho modelo tradicional e 90
positivista nas escolas, esse já não se “encaixa” mais nesse novo mundo que
vivemos e os professores é a chave para mudar esse processo, promovendo
mudanças em suas práticas pedagógicas e melhorando assim o ensino e
aprendizagem dos alunos.

Referências biográficas
Carlos Prado é graduado em Licenciatura em História pela Universidade do
Estado da Bahia (UNEB) e pós-graduado em Metodologias para Educação a
Distância pela faculdade Mantenense dos Vales Gerais (INTERVALE)

Referências bibliográficas
AMARAL, Sérgio F. et al. Serviço de apoio a distância ao professor em sala de
aula pela TV interativa, Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da
Informação, Campinas, v. 1, n. 2, p. 53-70, jan../jun. 2004. Disponível em: <
http://eprints.rclis.org/6278/1/RDBCI-2004-17%5B1%5D_-_Sergio_et_al.pdf>.
Acesso em: 07 de abr. de 2021.

BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Diretrizes – Programa Nacional


de Informática na educação PROINFO. Brasília: 1997.

CORREA, Juliane. Novas tecnologias da informação e da comunicação: novas


estratégias de ensino/aprendizagem. In: COSCARELLI, Carla Viana (Org.)
Novas Tecnologias, novos textos, novas formas de pensar. Belo Horizonte:
Autêntica, 2002, p.43-50.

FERREIRA, Carlos Augusto Lima. Ensino de história e a incorporação das novas


tecnologias da informação e comunicação: uma reflexão. Revista da História
Regional. v.4, n.2, 1999. Disponível em:
<http://www.revistas.uepg.br/index.php/rhr/article/download/142/78> Acesso em
07 de abr. de 2021.

MERCADO, Luís Paulo Leopoldo. Formação docente e novas tecnologias. IV


Congresso RIBIE, Brasilia 1998.

PRETTO, Nelson de Luca. Uma escola sem; com futuro: educação e multimídia. São
Paulo: Papirus, 1996.

SAMPAIO, Marisa Narcizo; LEITE, Lígia Silva. Alfabetização tecnológica do


professor. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.
“CINECLUBE” COM A HISTÓRIA E O ENSINO
À DISTÂNCIA NO PROCESSO DE ENSINO
APRENDIZAGEM
91
Ivaneide Barbosa Ulisses e Celiana Maria da
Silva

O “Cineclube” com a História e o Ensino à Distância” é uma proposta de extensão


universitária ideado e coordenado pela professora Ivaneide Ulisses, docente do
curso de História da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos/FAFIDAM.
Desse projeto, nasce o convite para os acadêmicos aderirem à proposta e
efetivarem o “Cineclube”. A proposta, portanto, envolve os discentes do curso de
História da modalidade a distância da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano
Matos - FAFIDAM/UECE.

O “Cineclube” teve início em março do ano de 2018, como o próprio nome


sugere, “Cineclube” é um grupo que se forma e se reúne para debater e refletir
sobre cinema, no caso, os clubistas utilizam o Ambiente Virtual de Aprendizagem
(AVA), no espaço “ACC- Atividades Acadêmicas Complementares/ História” para
realizar suas atividades (fóruns e chats) esses, organizados e mediados pela
professora Ivaneide e pelos graduandos bolsistas de iniciação artística
PROEX/UECE.

O “Cineclube” tem como pretensão debater temas ligados à história, temas transversais,
temas atuais, que ajudam, através da visão de filmes, a abrir os horizontes das
prospectivas individuais dos alunos, tanto em relação aos temas em si como de uma
construção da experiência de se aprender por meio da linguagem da arte, no caso,
através dos filmes. A hipótese do projeto é que os filmes nos “convidam” a sermos
abertos, também, ao diálogo e ao ponto de vista do outro, desenvolvendo uma visão
clara da realidade que rodeia o futuro historiador e, posteriormente, do seu campo de
atuação. Vale ressaltar que o cinema se ocupa da História antes mesmo dela considerá-
lo como fonte histórica. As questões históricas foram, desde o início, tratadas pelas
produções cinematográficas. De acordo com o prof. Marcos Napolitano, História e
cinema podem ser compreendidos a partir de três abordagens:

“O cinema na História; a História no cinema e a História do cinema. Cada uma das três
abordagens implica uma delimitação específica: O cinema na História é o cinema visto
como fonte primária para a investigação historiográfica; a história no cinema é o cinema
abordado como produtor de ‘discurso histórico’ e como ‘intérprete do passado’; e,
finalmente, a História do cinema enfatiza o estudo dos ‘avanços técnicos’, da linguagem
cinematográfica e condições sociais de produção e recepção de filmes” (NAPOLITANO,
2008, p. 40-41).
Na sala de aula, o filme vem utilizado, particularmente, na primeira abordagem feita pelo
professor, dado que o objetivo de usar filmes no ensino de História é o de compreendê-
lo como fonte histórica; e o seu uso como objeto de aprendizagem, como recurso
didático válido, relacionado ao conteúdo que esteja sendo trabalhado e assim, ser
entendido como objeto de problematização, crítica, reflexão, avaliação. O audiovisual 92

sendo apresentado como documento de uma determinada época e a esse ponto,


podemos dizer que temos um leque de representações cinematográficas que vão,
digamos, para além da função simbólica, estética, ideológica. O filme como objeto de
análise permite a docentes e discentes, fazerem dele uma ferramenta eficaz para a
construção de um ensino contextualizado, dialogado, problematizado, debatido e
direcionado ao desenvolvimento crítico dos alunos.

O “Cineclube” cabe ressaltar, é um projeto de extensão universitária, extensão


pode ser entendida como aquela ação que vai além “dos muros” da instituição
em termos de ensino e pesquisa, ou seja, a extensão “armada” desses dois
elementos quer uma aproximação com a comunidade e interagir com a mesma
a fim de criar laços que contribuam para a transformação social, unindo assim,
os saberes acadêmicos e os conhecimentos, saberes e fazeres da população e,
através dessa articulação, garantir melhorias em termos de valores e melhores
condições em prol de uma sociedade mais justa e igualitária. Essa extensão
como concretização dos conhecimentos apreendidos como teoria e colocados
em prática através de projetos que venham contribuir para a melhoria e
desenvolvimento social. A respeito da importância da extensão e sua relação
com a comunidade, no documento de submissão do projeto, a professora
Ivaneide Ulisses (2018, p.3) afirma:

“A universidade brasileira tem a responsabilidade nesse momento conjuntural de


dificuldades econômicas e acirramentos ideológicos com procedimentos comuns
de violência de formentar debates que melhorem os diálogos entre os grupos
sociais”.

Portanto, em termos de extensão, a experiência do “Cineclube” permite aos


graduandos de História dos polos da UECE, estarem reunidos em um único
espaço (fóruns e chats) para debaterem e trocarem ideias sobre os diversos
temas propostos. Constata-se que é uma oportunidade para alargar ainda mais
os horizontes de aprendizagem de cada participante.

Cabe-nos aqui, a partir da experiência feita, pensar e lançar reflexões sobre o


que, enquanto ferramenta didática e pedagógica, o “Cineclube” fomenta para a
melhoria da prática educativa. Constatamos que o professor é desafiado
constantemente a inovar as suas aulas, lançando mãos dos mais variados
recursos a fim de envolver os alunos de maneira concreta nos conteúdos
propostos e assim, motivados, eles vão desenvolvendo um “sentimento de
pertença”, pertença essa que faz com que os discentes sentindo-se envolvidos
no seu próprio processo de ensino-aprendizagem, sentindo-se participantes e
pertencentes a essa história em seu contínuo processo de construção,
participará com maior interesse. Envolvidos, hipótese nossa, eles aprendem
mais facilmente porque se sentem motivados a participarem da própria
aprendizagem e, consequentemente, aprendem a ter uma visão crítica do mundo
que os rodeia.
93
Em certo ponto da nossa proposta, sentimos a “necessidade” de nos “adequarmos” ao
momento presente, o mundo atingido pelo Pandemia do Coronavírus e então, propor
debates em torno do isolamento social e como a sociedade está vivenciando este
momento. De início, apresentamos dois curtas para os clubistas terem uma visão do
material que estava sendo produzido pelos outros setores da sociedade e irmos
adequando à nossa realidade de interior e de interior do país. O vídeo da Débora
Falabella era somente um trecho do filme “Depois a louca sou eu” que até então não
tinha sido lançado. E outro curta intitulado “Pandemia”, e assim, podemos partilhar
também as vivências de cada um.

As reflexões foram muitas e todos foram concordes em afirmar que: Vivemos em um


período que, sem dúvidas, “marca a história da humanidade”. Cada um de nós, com a
sua própria sensibilidade, vive esse período de maneira muito particular. Alguns com
medo, outros com esperança, outros sofrendo por a perda de algum ente querido, outros
agradecidos por terem vencido o contágio e, enfim.

Existem elementos reais e pontos de vista diferentes, pois cada sujeito tem uma maneira
particular de ver e vivenciar determinada situação, e isso faz parte da unicidade que é
particular em cada um de nós. Pensando no fato que daqui a algum tempo, teremos “a
tarefa” de contar o que estamos vivendo, pois somos testemunhas da História do Tempo
Presente. O debate que propomos foi, também, um convite para a construção de
narrativas e, no caso, nos inspiramos no “Museo da Pessoa”, plataforma de onde
“tiramos” alguns pequenos e ricos depoimentos. Lembrando aos participantes que as
narrativas se encaixam na ideia de documentário. Lembrando também que filme é
representação. Na parte da apresentação da plataforma (https://museudapessoa.org/),
tem escrito que:

“Nossa visão é ter um museu em cada mão para que as histórias de vida se tornem um
antídoto contra a intolerância. Ouvir é o primeiro passo para transformar seu jeito de ver
o mundo. Colabore. Participe. Cada história importa!”

Conhecer a história do outro, nos ajuda a refletirmos sobre a nossa história e nos dar a
força para continuarmos nessa constante “luta” de nos "transformarmos" em pessoas
melhores. E, quem sabe? a nossa história pode ser motivo de inspiração para outras
histórias. Todos somos importantes, todos temos uma história para contar, todos
fazemos parte dessa linda construção chamada História.
A professora em planejamento com a equipe organizadora teve a ideia de que cada
clubista gravasse com os seus próprios celulares, depoimentos de como estavam
vivendo esse momento de isolamento social e então, relatassem em três ou quatro
minutos como estava sendo a experiência com a Pandemia do Coronavírus. A proposta
foi aceita pelos participantes. A equipe preparou a carta de cessão de direitos autorais, 94

os clubistas gravaram os vídeos, enviaram para a equipe organizadora que


“transformou” os vinte depoimentos nos conhecidos “curtíssimos”
(https://www.youtube.com/watch?v=VbNgOAboNe4). Relatos onde podemos perceber,
das mais diversas maneiras, as lições que essa Pandemia está deixando.

No semestre 2020.2, abrimos um canal no youtube (www. cinehistory0 extensão.


youtube.com), nele postamos os vídeos produzidos pelos clubistas. O primeiro
fórum que realizamos nesse semestre foi a apresentação do trabalho realizado.
Tais produções mostram que para além de apreciar filmes, estudar as fontes de
audiovisuais podemos e devemos, nos apropriar como produtores de uma
memória audiovisual. Tivemos através do Google Meet, uma mesa cujo tema foi:
“Produção de memórias em audiovisual e acervo digital”, com a professora
Cintya Chaves, do curso de História da FAFIDAM/UECE, refletindo conosco
sobre o tema e sobre as produções realizadas.

É pertinente refletir, mesmo que rapidamente, a “busca pela “verdade”, ou pelo menos
a tentativa de chegar o mais próximo dela, pois somente através dos olhos de quem se
detêm em determinado objeto de estudo possui. Portanto, torna-se pessoal e quase
indizível, uma vez que encaminha-se para o lado do subjetivo e então, individual de
cada pessoa. O trabalho em sala de aula de forma crítica deve seguir os critérios
daquela “busca pela verdade” que é individual e inatingível, uma vez que há sempre as
questões de tendencionamentos, pontos de vista multi e intermináveis. A professora
Vavy Pacheco Borges, diz que:

“A História se faz com documentos e fontes, com ideias e imaginação. Assim o


conhecimento histórico mergulha cada vez mais nas formas de sua própria produção,
em como foi e em como pode e deve ser escrito, isto é, sua própria história e nas formas
de procedimento que lhe são próprias como forma de conhecimento” (BORGES, 1993,
p. 46).

Diante dessas palavras, pode-se concluir que a posição do historiador “deve” ser lúcida,
objetiva e clara, favorecendo assim, a conquista de uma consciência crítica, aderindo a
essa constante luta em favor de uma sociedade mais justa, mais livre, mais igualitária.
São tantas as prisões que dilaceram o coração do homem, a História é contínua e
contínua “deve” ser a luta, sempre na esperança de que dias melhores virão.
Mais uma vez, vemos a possibilidade que o audiovisual apresenta. As emoções, as
sensações e percepções que brotam em quem os apreendem e que os aproximam
quanto à temática e sugere o diálogo para melhor interpretação, amplitude das ideias e
firmeza nas concepções. São mensagens que propiciam um debate bastante sugestivo
em sala, quando abre espaço para que os alunos exponham, até mesmo suas histórias
de vida, e através destas, o docente tem possibilidade de entendê-los melhor. Os filmes 95
como podem observar, trazem representações sobre diferentes temas, ao mesmo
tempo em que envolvem sentimentos, sensações e emoções.

A História enquanto “a ciência que estuda o homem e sua ação no tempo”, como
sugere Marc Bloch (2002), ao ser proposta também, pelo uso das ferramentas
que o “cineclube” propõe, será melhor recebida por nossos educandos, que com
a devida orientação chegará a perceper como perseguir a construção de sua
análise e interpretação dos fatos para assim, desenvolverem sua concepção
histórica.

Por fim, trazemos ainda a postura de dinamicidade que também é percepctível, já que
o “cineclube” é composto pela demonstração de como muitas mãos desenvolveram um
projeto que culmina com o crescimento pessoal e coletivo, promovendo calorosas
discussões, debates e possibilidades, que tornaram possíveis a melhoria na formação
intelectual, profissional, humana, social e cidadã dos envolvidos, o que nos faz enxergar
com clareza a execução do que se propõe a educação no Brasil conforme a Lei n°
9.394/96 no Art. 2°: “[...] o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Referências biográficas
Ivaneide Barbosa Ulisses. Profa. Dra. do curso de História. Faculdade de Filosofia Dom
Aureliano Matos- Universidade Estadual do Ceará.

Celiana Maria da Silva. Graduanda do curso de História. Faculdade de Filosofia Dom


Aureliano Matos- Universidade Estadual do Ceará.

Referências bibliográficas
BLOCH, Marc. Apologia da História ou O Ofício de historiador. Rio de Janeiro: Zahar,
2002.

BORGES, Vavy Pacheco. O que é história. 2.ed. São Paulo: Brasiliense, 1993.
(Col. Primeiros passos, v. 17).

NAPOLITANO, Marcos. Fontes audiovisuais: A História depois do papel. In: PINSKY,


Carla Bassanezi (org.). Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2008.

ULISSES, Ivaneide Barbosa. Projeto de Extensão “Cineclube” com a história e o


ensino à distância. Fortaleza: PROEX- UECE, 2018.
96
YOUTUBE, HISTORIADORES E A COLÔNIA:
CONFIGURAÇÕES DE UM ESPAÇO
Cintia Venâncio e Leandra Hellen Assunção
97
Santos

Introdução

Vivemos uma verdadeira "revolução tecnológica", isto é, cada vez mais a internet tem
adquirido espaço no cotidiano da população. A web 2.0 é atualmente um ambiente de
comunicação, diálogo, de intrução e, principalmente, de acesso à informação. Assim
sendo, o Youtube enquanto plataforma de streaming, criada em 2005 com a função de
compartilhamento de vídeos, tem alcançado uma relevância a nível global pois
disponibiliza material-audiovisual sobre vários conteúdos. Essa perspectiva de uso das
Tecnológias da Informação e Comunicação (TIC’s), no caso Youtube, faz parte do
conceito de Revolução Digital, dessa maneira, os historiadores enquanto profissionais
não podem se abster dos debates. Ademais, essa característica de acesso à informação
abre espaço para discussões sobre o material produzido, no que tange, principalmente
o conteúdo histórico e o uso que as pessoas fazem dessas informações na sociedade.

O Youtube é o segundo site mais acessado com 2 bilhões de usuários mundialmente.


Assim, os discursos nele veiculados tem influenciado a sociedade, seja, positiva ou
negativamente, sendo o profissional de história um dos responsáveis por explicar os
fenômenos sociais, políticos, econômicos e culturais da coletividade ele necessita está
inserido nessa discurssão. Para compreender esses discursos, como eles são
produzidos, por quem, em qual contexto, com qual finalidade surge a Didática da
história (RÜSEN, 2015), essa abordagem teórica busca entender o conhecimento
histórico seus usos e funções dentro da sociedade. Essa concepção é vista como parte da
ciência histórica, e ajudar na análise de todos os tipos de histórias produzidos sejam em
quaisquer ambientes. A Didática da história é portanto uma,

“disciplina da ciência histórica que tem a responsabilidade de estabelecer a


‘Gênese’, a ‘Morfologia’ e a ‘Função’ da ‘Consciência Histórica’ na sociedade,
debruçando-se sobre todos os tipos de história, sejam elas produzidas no interior
da instituição escolar (ensino escolar da história), nos meios públicos (nos
discursos políticos, nas grandes revistas, na televisão, nos museus, no cinema
etc.) ou nas universidades (história dos historiadores ou Ciência Histórica).”
(SADDI, 2012, p.2)
Tendo em vista o interesse do público pela plataforma, bem como o
entendimento que a aprendizagem história acontece em diversos espaços. Essa
pesquisa debruça-se a responder aos seguintes questionamentos: os
historiadores têm-se apropriado do espaço do Youtube? No que tange ao Brasil
colônia, como esses profissionais têm-se apropriado desse conteúdo? Se sim de 98
que forma? Essas perguntas permitem questionar outras coisas, entre elas, se
existe um diálogo estabelecido por parte dos historiadores com a sociedade, se
há preocupação em refutar as notícias falsas sobre a ciência histórica, e qual o
papel social dado por estes profissionais ao conhecimento histórico e, por fim,
quais retornos têm sido obtidos a partir desse contexto.

Metodologia

Com o objetivo de sistematizar à pesquisa foram elaborados critérios para seleção dos
canais são eles: primeiro, o canal deve ser organizado por historiadores profissionais,
segundo prevalece aqueles com os maiores números de inscritos, terceiro o canal pode ser
destinado ao enem ou a outros fins, como a divugação cientifica e indicações bibliográficas. O
resultado dessa triagem foi a seleção de cincos canais no Youtube são eles: Se liga nessa
história (professor Walter Solla), Débora Aladim, Parabólica (professor Pedro Rennó),
Leitura ObrigHistória (Icles Rodrigues) e o Xadrez Verbal (Filipe Figueiredo).

Logo após o apanhado inicial voltamos a pergunta central da pesquisa, como os


historiadores estão se apropriando do espaço do Youtube. Para responder o
questionamento buscamos analisar os vídeos concernentes a temática do Brasil Colônia,
são uma totalidade de 55 produções. Com o objetivo de orientar as reflexões
elaboramos uma ferramenta de análise no programação excel, baseada no processo de
categorização simples

A obra Análise de Conteúdo sistematizada por Laurence Bardin (1970), é o principal


referencial metodológico desta pesquisa. A escolha do método se justifica por permitir
uma análise mais aguçada e detalhada do que está sendo dito em um determinado
discurso, seja escrito ou audiovisual. A metodologia de análise de conteúdo exige uma
leitura — ou assistência, no caso dos vídeos do YouTube — atenta e crítica do que está
sendo exposto no canal.

A Análise de Conteúdo é uma abordagem quantitativa e qualitativa, a primeira ênfase


observa a frequência com que surgem certos aspectos no discurso, já a segunda procura
mapear a presença ou ausência desses aspectos. Essa metodologia atende o objetivo da
pesquisa, pois aqui, o vídeo é tratado como um discurso construído socialmente que
expressa uma mentalidade sobre o fazer histórico e a atuação dos profissionais de
história no ambiente cibernético.

Outro conceito importante para a pesquisa é o de Cultura Participativa (JENKINS in 99


BURGESS e GREEN, 2011), partimos do pressuposto que a plataforma do Youtube é um
espaço de interação, comunicação e divulgação sendo seus usuários pessoas produtoras e
consumidoras de informações em tempo real. O conceito de Cultura Participativa
pressupõe a idéia de reciprocidade de troca, reverberando a concepção que as redes
sociais, inclusive o Youtube, permitem ao sujeito ser ativo e não passivo na criação e
disseminação de informações. No espaço do Youtube os usuários interagem por meio
dos comentários, likes e deslikes com a indústria audiovisual.

Dessa maneira, o termo cultura participativa lança um novo olhar sobre o Youtube, pois
procura explicar como o advento da internet na sociedade contemporânea têm
modificado as relações sociais, transformando o sujeito receptor e inativo e um
indivíduo ativo, crítico e responsável pelas notícias. Nessa plataforma de streaming os
frequentadores têm experiências com a criação de um roteiro para o vídeo, gravação e
edição com software e, principalmente, com o marketing digital, ou seja, existe a
preocupação com os meios de divulgação.

“Como todas as mídias, o YouTube só adquire sentido real quando


compreendido como algo que as pessoas usam em seu cotidiano. Bruns (2007)
nota que a cultura participativa e as ferramentas digitais significam que as
audiências não precisam mais lançar mão de formas de mídia auxiliares para
interagir com a cultura a sua volta, sugerindo que a experiência cotidiana de
audiência da mídia pode precisar ser repensada para incluir novas formas de
produção que derivam do uso ordinário da mídia. Os participantes do YouTube
se envolvem claramente em novas formas de “publicação” em parte como uma
maneira de narrar e comunicar suas próprias experiências culturais, incluindo
suas experiências como “cidadãos-consumidores” associadas à mídia comercial
popular”. (JENKINS in BURGESS e GREEN, 2011, p.73).

A cultura participativa empodera o indivíduo, uma vez que, permite a esse


interagir (chat, bate-papo e comentários) com objeto midiático e criar conteúdo
próprio. Os Youtubers e os usuários buscam uma nova maneira de divulgar suas
experiências culturais, no caso dos historiadores coloniais a procura pela relação
passado presente serve para explicar a construção da sociedade, a
concentração de terra, de riquezas e o preconceito com as minorias como os
negros e indígenas.
Outro referencial teórico importante nessa pesquisa é o conceito de História
Pública (LIDDINGTON in ALMEIDA E ROVAL, 2011), nessa abordagem o
conhecimento histórico é investigado e entendido em outros espaços de saber,
além das universidades, escolas, museus e acervos. Sob essa perspectiva a
didática da história procura concretiza no indivíduo a consciência que existe
outros lugares de atuação e debate para a história. 100

“A história pública é uma possibilidade não apenas de conservação e divulgação


da história, mas de construção de um conhecimento pluridisciplinar atento aos
processos sociais, às suas mudanças e tensões. Num esforço colaborativo, ela
pode valorizar o passado para além da academia; pode democratizar a história
sem perder a seriedade ou o poder de análise. Nesse sentido, a história pública
pode ser definida como um ato de “abrir portas e não de construir muros”, nas
palavras de Benjamin Filene. (ALMEIDA; ROVAI, 2011 apud CARVALHO, 2016,
p.7)

Com base no pensamento anterior a atuação dos historiadores estendem-se


para além dos limites acadêmicos, tornado o conhecimento histórico
pluridisplinar pois engloba diversos saberes e espaços de debates. Se
considerarmos os usos e funções do passado conforme a didática história,
percebemos que o processo de valorização do passado pode democratizar a
atuação do profissional. Assim, a História Pública funciona nessa pesquisa como
perspectiva de análise do Youtube, enquanto mais uma área para a divulgação
do saber histórico.

Esse quadro é sustentado por dois princípios básicos o primeiro, existe uma
maior aceitação dos conhecimentos históricos, se estes estiverem vinculados
aos meios de comunicação. A afirmação anterior foi formúlada com base na
visibilidade dos canais utilizados como objeto de estudo. O segundo princípio, diz
respeito, aos lugares de ocupação dos historiadores, ou seja, se levarmos em
conta a ampliação que o conceito de História Pública trás vamos perceber que
cada vez mais os historiadores estão se debruçando sobre outros lugares de
atuação.

Resultados
No que concerne à temática de Brasil Colônia 55 vídeos foram analisados ao
total, configurando uma discrepância se comparado com outros temas como
escravidão e ditadura. Essa diferença pode ser explicada por aspectos
organizacionais do ensino, como as provas do Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM), e dos principais vestibulares das universidades, uma vez que, a ênfase
no período colonial se dar pela cobrança que esses exames trazem sobre o
indivíduo. Para enfatizar esse processo muitos profissionais de história têm
investido na produção de conteúdo sobre essa temática, no entanto, tal buscar
por espaço público pode acarretar preferência por tópicos , como por exemplo,
no canal Se liga nessa história 67% das revoltas nativistas acontecem na região
sul-sudeste, e apenas 33% no restante do país. Esse fato é observado também
no canal Parabólica, nesse 70% dos conflitos se concentram na mesma região.

Entre os 55 vídeos analisados sobre a história do Brasil colônia, 19 eram do


canal Se Liga Nessa História, 14 pertencem ao canal da Débora Aladim, 17
vídeos são do canal Parabólica, o Xadrez Verbal possui 3 vídeos, e por fim, o 101
canal Leitura ObrigaHistória com 2 produções. Notamos a configuração de
campos distintos nos canais são eles: os canais destinados ao ENEM com
conteúdo substantivos, e os canais de discussão histórica. Esse dado aponta
que os historiadores estão se apropriando do Youtube, é que seus vídeos muitas
vezes respondem a demandas sociais como a concentração de terra e de
riquezas.

No canal da Débora Aladim existe uma playlist específica para esses vídeos,
intitulada “História do Brasil pelo Brasil” sendo cada vídeo com duração de 10 a
25 minutos, já no canal Se Liga Nessa História os vídeos têm uma duração bem
menor com cerca 5 a 15 minutos, e quase sempre se iniciam com um
questionamento pontual que liga o tema ao tempo presente. O critério do tempo
de duração demonstra o nível de profissionalismo desses canais, as produções
geralmente procuram estabelecer um começo, meio e fim para a narrativa.
Ademais, os canais possuem vinheta (são chamadas curtas para aberturas e
encerramentos dos vídeos), cenário próprio, proposta de edição e pessoal de
apoio.

Notamos nos canais de discussão histórica como o Xadrez Verbal e Leitura


ObrigaHistória a ausência de temas e conteúdos substantivos específicos do
Brasil Colônia como: administração colonial, chegada da Família Real e as
Revoltas Nativistas. Podemos entender que o objetivo desses canais são as
discussões próprias da história, como a memória, o tempo e a consciência
histórica.
Esse aspecto agrupa um público preocupado com questões historiográficas como
o debate sobre o conceito de colônia de exploração e colônia de povoamento.
No canal Leitura Obrighistória do historiador Icles Rodrigues existe um vídeo
intitulado “O Brasil "deu ERRADO" por ser "colônia de EXPLORAÇÃO"?”, neste
o historiador buscar compreender como o discurso sobre a hegemonia norte- 102
americana foi estruturado mediante o conceito de colônia de explaração e de
povoamento, e repassado até os dias de hoje. Esse resultado demonstra que
boa parte dos Youtubers têm se detido na questão do revisionismo histórico,
quebrando paradigmas sobre a historiografia tradicional. Nos canais do ENEM,
no entanto, prevalece a discussão dos conceitos pontuais como regionalidade,
união Ibérica, escravidão indígena e negra, escambo, exportação, sesmaria e
pacto colonial.

Outro ponto observado foi o método histórico esse parte de um questionamento,


essa questão não é formulada ingenuamente pelo historiador. Dessa maneira,
procurar entender como esses profissionais elaboram seus questionamentos no
Youtube é algo extremamente relevante, pois corrobora para a compreensão do
que o profissional considera ser história, também diz muito sobre sua formação
e referencial teórico usado. Assim sendo, dos 55 vídeos assistidos 23 possuíam
um questionamento (cerca de 42%) que suscita outros debates. Destas 23
produções 18 partem de uma problemática da atualidade (cerca de 78%),
relacionando passado e presente, demonstrando assim, que o historiador
procura elabora uma questão de forma consciente.

“A questão do historiador não é ingênua. [...] Com a questão o historiador - e eis


por que ela permite construir os fatos - ele tem uma ideia das fontes e dos
documentos que lhe permitirão resolvê-la, ou seja, também uma primeira ideia
do procedimento a adotar. [...] O historiador não se limita a formular um “simples
questão” - até mesmo quando se trata de uma questão simples - porque, em seu
bojo, traz uma ideia das fontes documentais e dos possíveis procedimentos de
pesquisa [...] é necessário ser já historiador para ser capaz de formular uma
questão histórica”. (PROST, 2008, p.76)

Dessa forma, a questão do historiador desempenha a função de organizar o


conhecimento e de responder a uma demanda da sociedade. É importante
observar, também, que muitos dos vídeos utilizam fontes ou referencial
bibliográfico entre as indicações teóricas estão: Caio Prado Júnior; Sérgio
Buarque de Holanda, Luís Felipe Alencastro; Stuart Schwartz, Boris Fausto, Ciro
Flamarion Cardoso, Hectór Perez Brignoli, Erick Hobsbawn, Tony Ludt, José
Murilo de Carvalho e March Bloch.

Conclusão
Logo após a análise do material audiovisual percebemos que os historiadores
estão sim fazendo uso do espaço do Youtube, como ambiente de divulgação do
conhecimento histórico e interação com os usuários, entretanto em escala menor
se comparamos com outros espaços de atuação desse profissional.

Dentro da plataforma os Youtubers dividem o conteúdo em dois segmentos são 103


eles: os canais do ENEM com narrativas pautadas no conteúdo substantivo, e os
canais de discussão historiográficas e atualidades. Nesse ambiente a temática
da colônia tem se concretizado enquanto campo de discussão com ênfase nos
debates historiográficos, até mesmo os canais do ENEM, a grosso modo,
destinado a auxiliar os alunos nas provas têm se preocupado com a narrativas
expostas, buscando problematizar os assuntos tratados.

Outro fator que torna essa pesquisa relevante são os usos do passado,
principalmente, do tempo colonial notamos que os historiadores têm buscado
ressignificar figuras históricas desse período, entre eles está o personagem
Tiradentes. Esse último é frequentemente associado a construção identitária do
período republicano.

Por fim, os conteúdos sobre colônia estão sendo debatidos no Youtube de forma
concreta, por canais de historiadores do sul-sudeste, isso não quer dizer que as
outras regiões não tenham pesquisadores voltados a esse campo, mas que se
consideramos a visibilidade dos canais a região sul ainda prevalece.

Referências biográficas
Cintia Venâncio, estudante do curso de Licenciatura em História pela
Universidade Federal do Rio Grande do norte, bolsista remunerada do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).

Leandra Hellen Assunção Santos, estudante do curso de Licenciatura em


História pela Universidade Federal do Rio Grande do norte, bolsista remunerada
do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).

Referências bibliográficas
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70,2016.

BURGESS, Jean; GREEN, Joshua. Youtube e a Revolução Digital: como o maior


fenômeno da cultura participativa transformou a mídia e a sociedade. São Paulo: Aleph,
2009.

CARVALHO, Bruno Leal Pastor de. História pública e redes sociais na internet:
elementos iniciais para um debate contemporâneo. Transversos: Revista de
história, v.07, n.07, p.35-52, set., 2016.
LIDDINGTON, Jill. O que é história pública? Os públicos e seus passados. In:
ALMEIDA, J; ROVAI, M. G. de O. (Org.). Introdução à História Pública. São Paulo:
Letra e Voz, 2011, p. 31-52.
104

PROST, Antonie. Doze lições sobre a história. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
p.75-94.

RÜSEN, Jörn. Teoria da história: uma teoria da história como ciência. Curitiba:
Editora UFPR, 2015.

SADDI, Rafael. O parafuso da didática da história: o objeto de pesquisa e o campo de


investigação de uma didática da história ampliada. Acta Scientarum. Maringá, v.34, n.2,
p.211- 220, jul/dez, 2012.
O ENSINO DE HISTÓRIA NAS SÉRIES
INICIAIS EM TEMPOS PANDÊMICOS: UMA
EXPERIÊNCIA NO SUDESTE DO PARÁ
105
Davison Hugo Rocha Alves
A Educação superior sofreu com a questão pandêmica desde março de 2020,
quando se começou uma devastação na saúde e na vida milhares de brasileiros
(FALCÃO, 2020, p. 272), podemos afirmar que foi um ano desafiador para a
educação brasileira. No entanto, houve a estimulação de novas experiências em
todos os sentidos, sejam elas, científicas, educacionais, políticas e econômicas.
O mundo de um dia para outro virou de ponta-a-cabeça.

A Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) durante o segundo


semestre do ano de 2020, apresentou a comunidade universitária (docentes,
discentes e técnicos-administrativos), o seu período letivo emergencial (PLE)
para o período compreendido entre 15 de setembro de 2020 a 22 de dezembro
de 2020. Adequamos nossos planos de ensino e Projeto Político de Curso de
ensino de graduação ao contexto pandêmico.

A presente comunicação pretende apresentar o relato de experiência ocorrido


na disciplina Conteúdo e Ensino de História, ela foi ministrada no período de 15
de setembro de 2020 a 02 de outubro de 2020, em formato remoto na
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) no curso de
Licenciatura em Pedagogia na cidade de marabá, localizada no estado do Pará.

O ensino remoto foi debatido como forma de amenizar as atividades acadêmicas


de ensino, pesquisa e extensão na Universidade Federal do Sul e Sudeste do
Pará (Unifesspa). Neste contexto, houve a sensibilidade desta instituição
amazônica em buscar alternativas para minimizar as perdas dos semestres
letivos sejam dentro do corpo docente e técnicos administrativos, bem como
entre os discentes de nossa instituição.

Segundo Joaquim Falcão (2020, p. 273) o ensino superior mostrou, em grande


parte, inédita capacidade de reposta ao vírus (...) a aula presencial ainda era um
Muro de Berlim para a aula virtual. Agora, ambas são pontes recíprocas. O uso
das tecnologias ajudariam os discentes e docentes a fazerem uma reflexão sobre
o papel educativo das mídias digitais no processo de ensino-aprendizagem.

No mês de agosto de 2020 os docentes da Universidade Federal Sul e Sudeste


do Pará (Unifesspa) já de forma remota participaram de um curso de capacitação
promovido pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) em
parceria com a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). As
docentes que ministraram o curso on-line apresentaram suas experiências de
ensino remoto nesta instituição nordestina, bem como possibilidades de ensino
e aprendizagem que poderíamos desenvolver no período letivo emergencial que
estava em construção na nossa instituição.

O curso foi realizado em 4 módulos. A diferenciação entre o ensino remoto e a


educação à distância foi bastante ressaltado. Aprendemos a readequar nossas
ementas das disciplinas e a tornar mais flexíveis, nem por isso, menos atraentes 106
e interessantes dentro do contexto pandêmico. O ensino remoto possui uma
plasticidade, ele é mais dinâmico, mais flexível diante do nosso contexto,
permite-nos fazer uma com outras formas de ver, aprender e compreender
determinado conteúdo.

O ensino remoto construí novas pontes de conhecimento, outras abordagens de


transformar o conhecimento passivo em conhecimento ativo. O discente que
estava acostumado a uma educação bancária como destaca Paulo Freire em
sua Pedagogia do Oprimido (2011), de repente tornou-se um discente ágil, tendo
que aprender e se reinventar em tempos adversos como o nosso.

“Em pouquíssimo tempo, um número expressivo de faculdades adotou a


mediação tecnológica através de múltiplas experiências. Múltiplos Currículos.
Múltiplas didáticas. Seja no âmbito sincrônico ou assincrônico. Usando já a
inteligência artificial ou não. Aumentará com o 5G” (FALCÃO, 2020, p.274).

Dentro do Projeto Político do Curso de Ciências da Educação, aprovado em


2018, a disciplina Conteúdo e Ensino de História foi ministrada para os
licenciados em Pedagogia. Teve-se a preocupação de adequar os debates
teóricos-metodológicos ao momento pandêmico que estamos vivenciando.

A disciplina Conteúdo e Ensino de História teve a participação de 35 discentes


de Pedagogia. A disciplina faz parte do Núcleo de Aprofundamento e
Diversificação de Estudos (NADES). Devido ao período letivo emergencial como
foi exposto acima, tivemos que nos adequar a realidade educacional no sudeste
do Pará. Por exemplo, usamos as tecnologias como aliada no processo de
ensino e aprendizagem. Foi mesclado os debates teóricos e metodológicos
dentro da referida disciplina com os recursos tecnológicos. A disciplina Conteúdo
e Ensino de História possui uma especificidade, ela é voltada para os alunos de
Pedagogia que não possuem uma formação inicial em licenciatura da área de
História. Portanto, a disciplina conteúdo e Ensino de História contou com dois
blocos de textos.

O objetivo geral da disciplina era compreender os pressupostos teóricos e


metodológicos do ensino de história, articulando-os aos processos do ensinar e
aprender história nos iniciais do ensino fundamental. Por isso, houve a
necessidade de realizarmos reflexões sobre a história do ensino de história, para
que os alunos de Pedagogia conhecessem o debate historiográfico deste campo
de pesquisa, foi apresentado reflexões a partir dos textos historiográficos de
Circe Bittencourt (2008).
Posteriormente, o debate sobre a construção do conhecimento históricos nos
anos iniciais do ensino fundamental, a partir das reflexões historiográficas de
Eliane Candoti (2013). Nessa mesma linha de perspectiva histórica conhecer os
desafios conceituais e metodológicos dos anos iniciais a partir das reflexões feita
por Patrícia Dorotéio (2016). No intervalo de discussões diárias feitas pelo
whatsapp e leituras assíncronas desenvolvidos pelos discentes de Pedagogia, 107
realizamos um encontro síncrono através da plataforma digital Google Meet para
conversamos sobre a dinâmica da disciplina e perceber as impressões dos
discentes sobre a didática adota no ensino remoto emergencial.

Estávamos nos adaptando ao novo contexto. Tudo era novo. O uso das
tecnologias tornou-se um elemento fundamental para tornar os conteúdos mais
atrativo e dinâmico, não que fosse fácil diante da nova realidade, mas um desafio
a prática docente diante do contexto pandêmico. A didática também sofreu
alterações, com atividades mais flexíveis e com ações mais curtas e que geram
aprendizado em tempo real. O professor tinha que ir adaptando-se diante do
cenário que se advinha. Para que o ensino público não ficasse prejudicado, e
que os discentes não se sentissem desmotivados diante do cenário de crise
sanitária.

Realizamos reflexões sobre a formação do pedagogo e as perspectivas do


ensino de História. A primeira impressão constatada pelos discentes foi a
mudança de perspectiva sobre o passado, a História e a aula de História. São
três perspectivas de ver o conhecimento histórico e como ele é construído pela
ótica acadêmica. A desconstrução foi perceptível, os alunos ficaram
impressionados com a forma de olhar o passado e as reflexões que eles podem
fazer a partir da aulas de História. Os textos historiográficos possibilitaram esse
novo olhar sobre o saber histórico escolar.

O papel da aprendizagem no processo de ensino formativo dos discentes de


Pedagogia da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará possibilitou neste
contexto uma dinamização das aulas de ensino de História, pois, houve a
necessidade de uma ressignificação da aprendizagem dentro do ambiente
universitário. A pandemia permitiu a construção de uma sala de aula invertida,
conceito usado pelos teóricos da área, é a maneira de aprendizagem que os
docentes e os gestores educacionais encontraram para preparar os materiais
didáticos, em formato de vídeo ou áudio, e eles interagem com os discentes
através de plataformas digitais ou aplicativos de fácil acesso.

Por exemplo, a metodologia utilizada na disciplina Conteúdo & Ensino de História


foi o uso dentro da disciplina do aplicativo whatsapp. No início da disciplina foi
explicado a dinâmica das aulas. Havia um tempo estipulado para a leitura dos
textos, o professor usava o whatsapp e fazia algumas intervenções em áudio
curtos com a finalidade de auxiliar os estudantes da compreensão do texto.
Posteriormente, era lançado no Google Chat uma pergunta problematizadora
sobre o texto debatido de forma on-line.
A discussão com a Educação de Jovens e Adultos também esteve presente na
disciplina. O discente em Pedagogia também atua com esse público. Segundo
Andréa Silva (2020, p. 7) o ensino de história possibilita reforçar a importância
da presença da História como disciplina independente no currículo da educação
básica, especialmente nos anos iniciais do ensino fundamental. A Educação de
Jovens e Adultos precisa ser construído a partir de um viés significativo, 108
colocando alguns sujeitos como protagonistas do saber histórico escolar.

Segundo Andréa Silva (2020, p. 9) é urgente repensar a inserção de outros


sujeitos – negros, indígenas e mulheres nas aulas de História. O papel formativo
da Educação de Jovens e Adultos é de construir pontes entre o vivido e o saber
escolar. A disciplina História tem um potencial enorme dentro para desmistificar
e apresentar outros valores e princípios, que podem conduzir a existência e a
convivência humana.

Segundo José Valente (2014, p. 81) a sala de aula tradicional é um subproduto


do industrialismo, idealizada na concepção da linha de montagem. Esse modelo
de espaço de aprendizagem está superado. A sociedade da economia global
requer do espaço escolar, dos docentes e dos discentes novas habilidades para
atender as necessidades da geração pós-moderna.

Conforme expressa Tapscott & Williams (2010, p. 18-19) quando eles afirmam
que “o atual modelo pedagógico, que constitui o coração da universidade
moderna, está se tornando obsoleto. No modelo industrial de produção em
massa de estudantes, o professor é o transmissor. [...]. A aprendizagem
baseada na transmissão pode ter sido apropriada para uma economia e uma
geração anterior, mas cada vez mais ela está deixando de atender às
necessidades de uma nova geração de estudantes que estão prestes a entrar
na economia global do conhecimento.

A importância de explicar a dinâmica com os textos da disciplina a serem lidos e


debatidos possibilitou um olhar invertido para o processo de ensino e
aprendizagem, percebemos que a disciplina foi no primeiro momento um desafio
para o docente e os discentes. A turma foi dividida em duas com 20 alunos cada.
Haviam sido matriculados 40 alunos na disciplina conteúdo e Ensino de História.

Um modelo de ensino e aprendizagem que colocamos a internet, os aplicativos


e os meios educacionais disponíveis na rede mundial de computadores como
youtube no processo formativo. A avaliação não poderia ser diferente, por
exemplo, a primeira avaliação da disciplina foi a construção de um podcast, foi
solicitado que os discentes construíssem a partir de aplicativos específicos de
criação de podcast como o CastBox, o Google Play Music, Podcast Addict,
Sound Cloud, Stitcher Radio.

Foi disponibilizado aos discentes dicas de como fazer um podcast e apresentar


o trabalho da primeira avaliação da disciplina. Os encontros síncronos serviram
para uma conversa com os discentes sobre a metodologia adotada, bem como
tirar algumas dúvidas sobre a construção do podcast. O trabalho teve êxito na
disciplina. Não somente com o que o conteúdo do artigo a ser explorado poderia
conter no áudio, mas com algumas intervenções dos alunos no que se refere a
construção de um ensino de história que leve o aluno das séries iniciais ter uma
reflexão crítica sobre a realidade em que ele está inserido.
109
A segunda avaliação da disciplina foi a aplicação de um questionário a ser
respondido pelo SIGAA (Sistema Integrado de Gestões de Atividades
Acadêmicas) da Unifesspa, eram questões de múltiplas escolhas sobre o
conteúdo ministrado e as reflexões desenvolvidas nos encontros síncronos por
meio do whatsapp. Foi um espaço de debates e intervenções que os alunos não
estavam acostumados a realizar, haja vista é um aplicativo de baixo custo e que
muitas operadoras oferecem o seu uso grátis, então, é uma forma de uso que
não depende de uma rede de internet em determinado local para acesso.

Como forma de construir um conhecimento científico e não ficar somente no uso


das tecnologias e do questionário aplicado pelo SIGAA, a terceira avaliação da
disciplina foi a construção de uma resenha crítica. A resenha crítica deveria ser
entregue até o final do período letivo, não no final da disciplina Conteúdo e
Ensino de História, pois, dessa forma os alunos poderiam amadurecer as
reflexões feitas na disciplina e apresentar um trabalho científico que fosse
prazeroso para os discentes.

No final da disciplina os discentes realizaram uma avaliação da disciplina pelo


site menti.com. As impressão dos mesmos foram as seguintes sobre a disciplina
ministrada no período letivo emergencial. Foi realiza a seguinte pergunta
sentimento do trabalho realizado? As duas turmas responderam.

Fonte: Autor (2020)

Sobre a disciplina conteúdo e Ensino de História


110

Fonte: Autor (2020)

O período pandêmico tornou-se um espaço para a reflexão sobre o fazer


docente. As tecnologias são aliadas do processo formativo. A disciplina
Conteúdo e Ensino de História precisa dessa dinamização. O professor da
educação básica em formação, o pesquisador do ensino de história precisa
compreender a importância e a necessidade de mudar a sua práxis, para que o
ensino seja significativo, proveitoso e prazeroso. Foi um desafio.

Referências biográficas
Me. Davison Hugo Rocha Alves, professor da Universidade Federal do Sul e
Sudeste do Pará. Faculdade de Ciências da Educação.

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desafios conceituais e metodológicos. História &Ensino, v. 22, n. 2, p. 207-228,
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mundo pós-pandemia: reflexões sobre uma nova vida. Rio de Janeiro: Editora Nova
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VALENTE, José. Blended learning e as mudanças no ensino superior: a proposta da


sala de aula invertida. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, Edição Especial n. 4/2014,
p. 79-97. Editora UFPR.
ENSINO DE HISTÓRIA NA EDUCAÇÃO
BÁSICA E O USO DE DOCUMENTÁRIOS:
NARRATIVAS, INTERPRETAÇÕES E A
112
CONSCIÊNCIA HISTÓRICA
Fabiana Regina da Silva e Rodrigo Luis dos
Santos

Introdução
O presente texto situa-se no campo da educação histórica e objetiva emergir
breves reflexões sobre o Ensino de História e a construção de conhecimento
histórico e consciência histórica na educação básica, articulado a narrativas e
interpretações históricas no uso didático-pedagógico de documentários. Embora,
do ponto de vista didático e pedagógico, os documentários também podem ser
importantes recursos docentes, é imperativo refletir sobre as perspectivas do uso
destes produtos culturais por parte dos professores de História, em relação à
construção de consciência histórica como preocupação da didática da História e
necessidade de orientação dos sujeitos e a experiência no tempo (RÜSEN,
2001a)

No contexto da educação escolar básica e no Ensino de História, com o aumento


do uso de tecnologias digitais, os documentários tem ganhado um espaço
significativo de difusão de acontecimentos históricos e narrativas históricas que
incitam a construção de novas narrativas. Porém, por conta disso, determinadas
visões sobre os fatos são repassadas, podendo ser assimiladas pelo público
como verdades absolutas. Cabe ao historiador perceber os processos de
produção, as intencionalidades e os enquadramentos embutidos nessas
construções fílmicas e estratégias didático-pedagógicas nas quais pode se aliar
para melhor efetivar os objetivos do Ensino de História, dentre eles, a construção
de consciência histórica.

Ao iniciar este trabalho, devemos justificar a escolha da abordagem deste tema.


Como professores de História, compreendemos a relevância cada vez maior da
necessidade do professor e pesquisador interagir de forma significativa com os
mais diversos recursos didáticos. Recursos esses que, além de instrumentos
para o exercício da docência, também devem se tornar interessantes e profícuos
objetos de análise. A partir dessa consideração, devemos ressaltar que esse é
um exercício de reflexão sobre a práxis, amparado no uso de referenciais
teóricos e metodológicos sobre o Ensino de História e de documentários, dentro
de um panorama já bastante difundido, que é a relação entre História e Cinema.
Ensino de História, consciência histórica e o uso de documentários:
Tecendo reflexões
A relação entre historiadores e o campo cinematográfico no Brasil, de uma forma
geral, se inicia com mais vigor, praticamente no final dos anos 1980, ou seja,
ainda recente, assim como, os estudos no campo do Ensino de História,
principalmente articulados as construções teóricas de Jörn Rüsen e a teoria e 113
didática da História. Desde a década de 1920 tem sido impetrado, por parte dos
historiadores, análises importantes sobre questões teóricas e metodológicas
engendradas com a produção de conhecimentos e narrativas de cunho histórico
– de forma direta ou indireta – através de filmes e, mais recentemente, de
documentários. Porém, não necessariamente essa reflexão sobre estas
narrativas e produções culturais que também passam a ser vistas como fontes
históricas, estiveram relacionadas ao seu uso no Ensino de História, o que
carece muito de se ampliar a pesquisa e análise crítica.

Em relação aos estudos no campo do Ensino de História e a teoria rüseniana,


conforme Barom (2015, p. 233): “Podemos propor que as traduções de Rüsen
no Brasil, com especial destaque às obras Razão Histórica (2001), Reconstrução
do Passado (2007a) e História Viva (2007b), traduzidas por Estevão de Rezende
Martins e Asta-Rose Alcaide, foram a porta de entrada para as discussões
alemãs acerca da ampliação do conceito de Didática da História, que ocorreram
no final da década de 1960”. Antes disso, alinhando-se a um formato geral e
alinhado a um paradigma tradicional de educação escolar, a perspectiva da
didática da História era pouco explorada e, como afirmamos acima, ainda temos
um caminho a desbravar.

Mesmo estando mais acessível nos dias atuais, o uso de produções fílmicas e
documentários, um dos grandes gêneros cinematográficos, ainda é limitado,
muitos jovens estudantes nunca tiveram acesso, inclusive devido as condições
sociais e vulnerabilidades. Além disso, muitas vezes, articular-se a este produto
cultural em sua prática de Ensino de História, é mal compreendido pelos próprios
docentes, cuja concepção é expressa através do uso de termos como “perca de
aula” ou “matação”, o que desvela fraturas de formação de graduação e de
formação docente continuada, para compreender o gênero e sua complexidade,
diversidade de classificação e contribuição e, assim, utilizar-se de produções
como esta, estabelecendo uma relação não meramente contemplativa e
transmissora acrítica, mas, de aproximação com os conteúdos escolares,
diversificação de experiências, problematização e atribuição de sentido, na
relação com a cultura histórica da sociedade em que vive.

Os documentários, estão vinculados tanto ao mundo do cinema como também


ao televisivo. Porém, podemos afirmar que, se o cinema já vem a um tempo
considerável sendo analisado, os documentários passaram a ser objetos de
estudo mais recentemente, o que, aliando-se as demais questões acima
mencionadas, também fortalece a falta de preparo para que tais produções
sejam compreendidas como efetivos recursos didáticos. Neste interim, cabe
algumas considerações do ponto de vista conceitual e metodológico. Conforme
Bill Nichols “a definição de documentário não é mais fácil do que a de amor ou
de cultura. Seu significado não pode ser reduzido a um verbete de dicionário,
como temperatura ou sal de cozinha, por exemplo, diga tratar-se do composto
químico de um átomo de sódio e um de cloro. A definição de documentário é
sempre relativa ou comparativa. Assim como amor adquire significado em
comparação com indiferença ou ódio, e cultura adquire significado quando 114
contrastada com barbárie ou caos, o documentário define-se pelo contraste com
filme de ficção ou filme experimental e de vanguarda” (NICHOLS, 2005, p.47).

A conceituação deste crítico de cinema e teórico estadunidense nos fornece, em


um primeiro momento, muito mais um sentido de advertência do que
efetivamente de definição clara e objetiva sobre o que é um documentário. A
assertiva de Nichols objetiva, justamente, demonstrar a complexidade incrustada
no bojo elementar da constituição de um documentário e de todo o seu aparato
produtivo, desde as ideias iniciais até a difusão do produto final, propriamente
dito. Adensando esse panorama, podemos chamar a atenção para os tipos de
classificação cabíveis aos documentários: expositivo, observativo, participativo,
reflexivo, performático e poético. Se nos determos apenas neste elemento, o
tipológico, já podemos adentrar em um campo vasto de investigação e reflexão.
Por conta desta variedade de caminhos, podemos perceber diferenças nítidas
na forma de produção e condução de documentários, conforme elementos
sociais e culturais daqueles que o produzem, a quem se direcionam e conforme
o ambiente em que estão inseridos. Conforme o próprio Nichols, “os
documentaristas europeus e latino-americanos, por exemplo, favorecem formas
subjetivas e abertamente retóricas, [...] ao passo que os cineastas britânicos e
norte-americanos enfatizam mais as formas objetivas e observativas, no mesmo
diapasão de “os dois lados de cada argumento, bem ao gosto da reportagem
jornalística” (NICHOLS, 2005, p. 60).

Não podemos deixar de levar em conta que, como produto cultural humano, os
documentários são frutos de uma gama de fatores, sejam intrínsecos ou
externos, atendendo objetivos delimitados. Contudo, nem sempre a intenção
inicial permanecerá a mesma. Um documentário, assim como qualquer outra
produção fílmica ou televisiva, apresenta uma narrativa possibilitadora de
interação subjetiva com o público, que pode recebê-lo e ressignificá-lo de forma
diferente daquela prevista pelos que elaboraram o artefato cultural, interferindo
e permeando as construções biográficas dos estudantes.

Outro aspecto salutar que deve ser considerado, está no diferencial que se
atribui ao documentário em relação às obras ficcionais de cinema e televisão.
Comumente, o elemento demarcador de uma identidade dos documentários está
no sentido de que estes buscam a verdade de forma mais determinada, incisiva.
Entretanto, é necessário cuidado para não cair neste terreno escorregadio entre
os conceitos de verdade e mentira, de realidade e invenção. Guy Gauthier
relativiza essa questão, destacando que:
“ambos podem vir da ficção (portanto da invenção, portando da imaginação,
portando do engodo, e até mesmo da impostura). Poderíamos esboçar uma
escala de ficcionalização, com o 'documentário-plus' em um extremo e o
'romanesco-plus' no outro. Abandonemos os esquemas rígidos, mantendo
apenas essa graduação imaginária na memória” (GAUTHIER, 2011, p. 119).
115
Deste modo, o que pretendemos afirmar é que tanto uma obra ficcional quanto
um documentário são embasados por uma sistematização idealizada por
alguém, com intencionalidades e verdades, com aquilo que se diz, o que se
esconde, e aquilo que se deixa por falar. Mesmo quando se procura uma
proximidade com a verdade, sabemos que isso está articulado com um projeto,
com recortes, com ênfases, com enquadramentos que definem o objeto e a
direção do produto final. Deste modo, também encontramos na produção de um
documentário cargas significativas de subjetividade, algo que, erroneamente, é
atrelado apenas com as obras de ficção. Quanto a esse ponto, concordamos e
nos apropriamos das colocações de Marcos Napolitano, quando expõe que

“por um lado, as fontes audiovisuais (cinema, televisão e registros sonoros em


geral) são considerados por alguns, tradicional e erroneamente, testemunhos
quase diretos e objetivos da história, de alto poder ilustrativo, sobretudo quando
possuem um caráter estritamente documental, qual seja, o registro direto de
eventos e personagens históricos. Por outro lado, as fontes audiovisuais de
natureza assumidamente artística (filmes de ficção, teledramaturgia, canções e
peças musicais) são percebidas muitas vezes sob o estigma de subjetividade
absoluta, impressões estéticas de fatos sociais objetivos que lhe são exteriores”
(NAPOLITANO, 2005, p. 235-236).

Somando-se a esse prospecto, cabe avultar novamente que existe uma


interação entre quem produz o documentário e aqueles que recebem o mesmo,
que não se caracteriza pela sistemática pura e simples de imposição de
percepções e significados. Desta forma, a verdade ora transmitida pela produção
pode não ser a mesma construída pelo público. Assim, uma produção intencional
passa a ser também um produto mais introspectivo, recebendo o crivo cultural e
subjetivo da assistência, seja de forma individual, seja coletiva.

Sobre as questões teóricas e metodológicas engendradas com a produção de


conhecimentos e narrativas de cunho histórico – de forma direta ou indireta –
através de filmes e, mais recentemente, documentários, um dos nomes mais
emblemáticos nos estudos históricos e sua relação com o cinema é o francês
Marc Ferro, integrante da chamada Terceira Geração da Escola dos Annales.
Para este pesquisador, há um elemento de suma importância que fundamenta a
necessidade dos pesquisadores se debruçarem sobre este campo cultural:
através do cinema e do seu processo de produção, é possível vislumbrar o
repertório de atos, pensamentos, intenções, ideologias, visibilidades e
silenciamentos decorrentes da ação humana. Sendo assim, por se tratar de uma
construção cultural, a criação cinematográfica fornece subsídios para ampliar o
leque de compreensão sobre a complexidade social e todos os elementos a ela
associados, assim como, possibilidades da orientação da vida prática. Ou seja,
importantes dimensões para o Ensino de História e a consciência Histórica.

Os documentários como narrativas e produtos culturais, com suas imagens,


estéticas, expressões, demarcações e intencionalidades, embora seja um
produto elaborado com interesses também e, principalmente, comerciais, hoje 116
mais facilmente acessados em ambientes escolares através da web e
dispositivos, entre eles, o celular, desde que não usados somente a teor
ilustrativo, mas sim, apreciados criticamente em sua recepção, vistos como uma
representação, um olhar sobre o passado ou sobre o presente e, na percepção
das diferenças culturais e recepção positiva destas, podem ser importantes
aliados ao Ensino de História.

A construção do conhecimento histórico passa por processos inerentes a


História, como o uso de fontes históricas (seleção e uso das mesmas), com a
preocupação de que tais fontes tenham um tratamento apropriado, de acordo
com sua especificidade. “Ciente de que o conhecimento é provisório, o aluno terá
condições de exercitar nos procedimentos próprios da História: problematização
das questões propostas, delimitação do objeto, exame do estado da questão,
busca de informações, levantamento e tratamento adequado das fontes,
percepção dos sujeitos históricos envolvidos (indivíduos e grupos sociais),
estratégias de verificação e comprovação de hipóteses, organização de dados
coletados, refinamento dos conceitos (historicidade), proposta de explicação
para os fenômenos estudados, elaboração da exposição, redação de textos”
(BEZERRA, 2016. p. 42).

Neste sentido, o professor se articula ao papel da mediação e estimula a apreciação


crítica e contextualizada, articulado ao documentário como material didático, propondo
formas de aprendizagem histórica, por vezes mais potentes do que aquela de uma aula
tradicional, com o aporte do livro didático. “A aprendizagem de metodologias
apropriadas para a construção do conhecimento histórico, seja no âmbito da pesquisa
cientifica seja no saber histórico escolar, torna-se um mecanismo essencial para que o
aluno possa apropriar-se de um olhar consciente para a sua própria sociedade e para
si mesmo” (BEZERRA, 2016. p. 42).

Assim, a aprendizagem ocorre estimulando interpretações e questionamentos,


operações do pensamento histórico, situando-se historicamente, suas
experiências, expectativas de futuro e visões de mundo, o que, por sua vez,
conduzem à constituição da consciência histórica. “Somente quando a História
deixar de ser aprendida como mera absorção de um bloco de conhecimentos
positivos, e surgir diretamente da elaboração de respostas a perguntas que se
façam ao acervo de conhecimentos acumulados, é que se poderá ela ser
apropriada produtivamente pelo aprendizado e se tornar fator de terminação
cultural da vida prática humana” (RÜSEN, 2001. p. 44). Ao que corrobora Barom
(2015, p.236), quando afirma que:

“Não se trata mais de transferir conteúdos, como diriam os slogans “formar


alunos críticos”, “torná-los conscientes”, “ser cidadão”, mas parece que a
pesquisa sobre o ensino da história no Brasil, com base em nossa amostragem,
vem compreendendo que a criticidade e a consciência não são posicionamentos
diretamente resultantes dos conteúdos curriculares, mas modos de operação da
consciência histórica. Assim, as pesquisas não buscam ensinar a “ser crítico”,
ou a “ter consciência”, mas buscam analisar e entender como os jovens operam
a utilização do passado (conhecimento comum e científico) na orientação prática 117
de suas vidas. Essa operação só pode ser evidenciada por sua exteriorização
mediante linguagem, na qual, contida e mergulhada em subjetividades e
interpretações, é possível demonstrar o pensamento e o entendimento do
mundo”.

As dimensões anteriormente evidenciadas emergem em narrativas históricas


destes produtos culturais e por isso, desde que de maneira adequada e didático-
estrategicamente pensado, podem ser usados como materiais didáticos,
atuando como importantes aliados e possibilitadores de processos de
construção de conhecimento histórico. Assim, contemplando e colaborando com
o intuito de que a Didática da História considere em sua operação, entre outras
questões, na perspectiva de Jörn Rüsen, as concepções teóricas e
metodológicas, a orientação, o sentido, a construção de identidades históricas e
o conhecimento prévio dos estudantes, uma vez que ao escolher um
documentário para ser trabalhado, esta é uma questão muito importante.

Há que se ter a compreensão da História enquanto conhecimento não somente


definida com o olhar daquela que lida com o passado morto, mas, conforme
Koselleck (2013, p. 190), como espaço de experiência e meio da unidade de
ação social e política que se tem em vista, como consciência de si mesmos e
compreensão de si, o entendimento de que “aquilo que acontece ao nosso redor
e conosco não é outra coisa que o presente da História, a História do presente”.
Assim, “A consciência histórica mistura “ser” e “dever” em uma narração
significativa que refere acontecimentos passados com o objetivo de fazer
inteligível o presente, e conferir uma perspectiva futura a essa atividade atual.
Desta forma, a consciência histórica traz uma contribuição essencial a
consciência ética moral (RÜSEN, 2010, p.57)”. “A “história”, como passado
tornado presente assume por princípio, a forma de uma narrativa. O pensamento
histórico obedece, pois, igualmente por princípio, a lógica narrativa” (RÜSEN,
2001a, p.149).

O documentário como recurso didático no Ensino de História, pode vir a colaborar com
uma perspectiva problematizadora e possibilitadora de estranhamentos e leituras de
entrelinhas, colaborando também na percepção das distintas realidades e culturas e
cimentando identidades através da dimensão da diferença. Assim, conduzindo maneiras
de elaborar respostas e construções culturais e históricas significativas. Pois, para
Cunha (2019, p. 96) “ensinar História a partir da transmissão de conteúdo, informações
e opiniões é um desserviço alienante que afeta todos os envolvidos e, entre outras
coisas, cria “fraturas” na convivência coletiva, um fato que vivenciamos no tempo
presente, no mundo e em nosso país”.
“Estar historicamente consciente da interconexão entre indivíduos e sociedades,
entre ontem, hoje e amanhã e entre experiências e expectativas é um fator
indispensável da existência humana, a ser levado em conta em todos os
processos de ensino e aprendizagem - na escolha de conteúdos como nas
táticas de informação, apropriação e utilização de conteúdos e narrativas”
(MARTINS, 2019b, p. 23-24). É preciso, para Cunha (2019, p. 96) “Recuperar o 118
papel libertador da educação como um todo e do ensino de História como
estratégia é necessário e significativo para recuperar não somente a expectativa
de futuro, mas sua realização”. No Ensino de História, o documentário como um
produto histórico e cultural, contempla imenso potencial de estimular narrativas
e sentidos, de reflexividade e de projetar-se.

Considerações finais
Cientes de que o papel da História como disciplina escolar não seja a formação de
pequenos historiadores, e de que este conhecimento histórico precisa sair do repasse
mecânico de conteúdos e atravessar, fazer sentido, compreendemos que o
imprescindível é a significação para a vida prática, a ampliação da visão de mundo, a
compreensão e operação de conceitos, a orientação e a produção de consciência
histórica, processo para o qual, as metodologias, as didáticas são aspectos
importantíssimos.

Para tanto, os documentários podem ser positivamente articulados ao propósito de


estimular novas práticas em Ensino de História e educação histórica, articuladas a
intencionalidade de novos sujeitos sociais, conscientes, críticos, capazes de
compreender-se e compreender a sociedade em que vivem e sua complexidade. Para
que isso ocorra, também é fundamental que os estudantes compreendam como a
obtenção destes conhecimentos acontece, assim, desfazendo possíveis compreensões
de que os conhecimentos históricos são definitivos ou acabados, sendo assim expostos
e narrados inalteravelmente.

Referências biográficas
Dra. Fabiana Regina da Silva, Mestre em Educação e Dra. Em História –
Universidade Federal de Santa Maria, Professora de História e Gestora da EMEF
Santa Catarina.

Dr. Rodrigo Luis dos Santos – Mestre e Doutor em História – Universidade do


Vale do Rio dos Sinos - Unisinos.

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seus principais comentadores. Revista História Hoje, vol. 4, n.8, p.223-246,
2015. Disponível em: <https://rhhj.anpuh.org/RHHJ/article/view/200>. Acesso
em: 19 mar. 2021.

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História na Escolaridade Básica. São Paulo: Editora Contexto, 2016. p. 42.

CUNHA, Jorge Luiz da. Aprendizagem histórica: narrativas autobiográficas como


dispositivos de formação. Educar em Revista, n. 60, p. 93-105. 2016.
GAUTHIER, Guy. O documentário: um outro cinema. Tradução: Eloísa Araújo
Ribeiro – Campinas - SP: Papirus, 2011. (Coleção Campo Imagético).

KOSELLECK, Reinhart; MEIER, Christian; GÜNTHER, Horst; ENGELS, Odilo.


O conceito de História. Trad. René E. Gertz. Belo Horizonte: Autêntica, 119
2013.230 p.

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Contexto, 2001.

NAPOLITANO, M. A História depois do papel. In: PINSKY, Carla Bassanezi


(Org.). Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2005, p. 235-289.

NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. Campinas, SP: Papirus, 2005


(Campo Imagético).

MARTINS, Estevão de Rezende. História, historiografia e pesquisa em


educação histórica. Educar em Revista. Curitiba, Brasil, v. 35, n. 74, p. 17-33,
mar./abr. 2019b.

RÜSEN, Jörn. Razão histórica. Teoria da história: os fundamentos da ciência


histórica. Brasília: Editora da UnB, 2001ª.

RÜSEN, Jörn. O desenvolvimento da competência narrativa na aprendizagem


histórica: uma hipótese ontogenética relativa à consciência moral. In:
SCHMIDT, Maria; BARCA, Isabel; MARTINS, Estevão (Org.). Jörn Rüsen e o
Ensino de História. Curitiba: Editora UFPR, 2010, p. 51-77.
ENSINO DE HISTÓRIA E HISTÓRIAS EM
QUADRINHOS: IMAGEM COMO EVIDÊNCIA
HISTÓRICA
120
Fabian Filatow

Introdução
O presente texto busca construir um espaço de diálogo entre Ensino de História
e histórias em quadrinhos. Diálogo que terá como ponto de intersecção as
possibilidades dos usos das imagens como evidências históricas. Tal proposta
tem como referências teóricas as obras de Peter Burke (2017), onde o autor
propõe reflexões sobre os usos das imagens como evidências históricas; a obra
de Eduardo França Paiva (2006), na qual é oferecida uma análise entre História
e imagens e na qual o autor demonstra a renovação historiográfica sobre as
potencialidades e os cuidados com o uso da imagem como fonte histórica. Por
fim, utilizamos o capítulo escrito por LIMA e CARVALHO (2009) no qual as
autoras realizaram um estudo específico abordando a fotografia e seus usos
sociais e historiográficos. Nesta seleção, acreditamos ter uma melhor
compreensão sobre o uso das imagens como evidências históricas, uma
aproximação entre História e imagem e, por fim, um olhar mais acurado sobre a
fotografia.

A justificativa desta reflexão impõe-se pela intensa presença das imagens na


sociedade contemporânea. Estamos cientes da presença da imagem na história
da humanidade. Porém, nem sempre este recurso visual recebeu as devidas
análises no ambiente escolar, e mais especificamente, nas aulas de História.
Podemos identificar em diversos materiais didáticos ou paradidáticos disponíveis
na Educação Básica que a imagem ocupa, muitas vezes, um lugar de ilustração,
ou quando muito, inserida como forma de corroborar informações contidas no
texto escrito. Esta forma de utilização limita o potencial desta fonte visual.

Antes de avançarmos na discussão, acreditamos ser necessário evidenciar


como compreendemos histórias em quadrinhos, objeto que terá neste estudo
papel de referência, bem como seus usos. De maneira preliminar podemos
definir as histórias em quadrinhos como o resultado de duas formas de
linguagens: imagética e escrita. Neste estudo, gostaríamos de refletir sobre as
possibilidades oriundas das histórias em quadrinhos que buscam ser um canal
de contato com fatos do passado histórico. No caso aqui analisado temos a
fotografia como registro dos crimes e atrocidades cometidas pelos nazistas
durante o Terceiro Reich (1933-1945) e tendo como recorte espacial o campo de
concentração de Mauthausen, localizado na Áustria, então sob domínio nazista.
Para dar conta desta proposta analisaremos a história em quadrinho intitulada
El fotógrafo de Mauthausen, publicada em Barcelona pela Norma Editorial em
abril de 2018 e, até o momento, sem tradução para o português. A novela gráfica
Le Photographe de Mauthausen foi publicada originalmente em 2017 pela
editora belga Le Lombard, escrita por Salva Rubio, com desenhos de Pedro J.
Colombo e colorida por Aintzane Landa. Neste estudo utilizamos a edição
espanhola. Obra que conta a experiência vivida pelo fotógrafo espanhol
Francisco Boix. Como resultado da Guerra Civil Espanhola (1936-1939), Boix
atravessou a fronteira da Espanha com a França, local onde ficou retido num 121
campo e, com a ocupação da França pelos nazistas, foi enviado para o campo
de concentração de Mauthausen, juntamente com outros espanhóis.

Ensino de História e Histórias em Quadrinhos


Antes de avançarmos na análise, acreditamos ser prudente evidenciar como
compreendemos o Ensino de História e histórias em quadrinhos, com um pouco
mais de atenção. E, de posse dessa compreensão, daremos seguimento ao
estudo das imagens como evidências históricas.

As histórias em quadrinhos podem ser identificadas como uma mídia global e


estão na ordem do dia a um longo tempo. Não é de hoje que nos deparamos
com reflexões sobre os múltiplos usos dos quadrinhos no ambiente escolar. Mas
é necessário estar ciente de que esta mídia apresenta peculiaridades, ou seja,
agregam diferentes aspectos da comunicação, tanto visual quanto verbal. Para
Will Eisner:

“A configuração geral da revista de quadrinhos apresenta uma sobreposição de


palavra e imagem e, assim, é preciso que o leitor exerça as suas habilidades
interpretativas visuais e verbais. As regências da arte (por exemplo, perspectiva,
simetria, pincelada) e as regências da literatura (por exemplo, gramática, enredo,
sintaxe) superpõem-se mutuamente. A leitura da revista em quadrinhos é um ato
de percepção estética e de esforço intelectual.” (EISNER, 2001, p. 8).

Neste sentido, as histórias em quadrinhos têm muito a contribuir com o


desenvolvimento das competências e habilidades que fazem parte das
exigências do Ensino de História na Educação Básica. Sua compreensão exige
dos leitores(as) decifrar imagens, compreender “sons”, perceber os diferentes
tempos e espaços que podem estar presentes numa única história ou mesmo
em uma única página da obra. Compreender o antes, o depois, os tempos
simultâneos, os diferentes espaços mencionados na narrativa. Ou seja, é
necessário compreender a presença do múltiplo numa história em quadrinho.
Como argumentou Vergueiro: “a alfabetização na linguagem específica dos
quadrinhos é indispensável para que o aluno decodifique as múltiplas
mensagens neles presentes e, também, para que o professor obtenha melhores
resultados em sua utilização.” (VERGUEIRO, 2016, p. 31). Neste sentido,
concordamos com a necessidade de uma alfabetização no que diz respeito aos
quadrinhos, pois:

“(...) nota-se que as histórias em quadrinhos constituem um sistema narrativo


composto por dois códigos que atuam em constante interação: o visual e o
verbal. Cada um desses ocupa, dentro dos quadrinhos, um papel especial,
reforçando um ao outro e garantindo que a mensagem seja entendida em
plenitude. Alguns elementos da mensagem são passados exclusivamente pelo
texto, outros têm na linguagem pictórica a sua fonte de transmissão. A grande
maioria das mensagens dos quadrinhos, no entanto, é percebida pelos leitores
por intermédio da interação entre os dois códigos. Assim, a análise separada de
cada um deles obedece a uma necessidade puramente didática, pois, dentro do 122
ambiente das HQ's, eles não podem ser pensados separadamente.”
(VERGUEIRO, 2016, p. 31).

As histórias em quadrinhos também são produtos fabricados pela sociedade e,


como toda fonte histórica utilizada em sala de aula, também oferece uma
significativa contribuição para o desenvolvimento do conhecimento histórico.
Contribuição que poderá ser potencializada se a proposta pedagógica estiver
embasada numa concepção interdisciplinar.

Segundo Fazenda, “o que caracteriza a atitude interdisciplinar é a ousadia da


busca, da pesquisa: é a transformação da insegurança num exercício do pensar,
num construir.” (FAZENDA, 1991, p. 18). Certamente esta abordagem pode
contribuir para o ensino de História. Pois,

“(…) ensinar História é estabelecer relações interativas que possibilitem ao


educando elaborar representações sobre os saberes, objetos de ensino e da
aprendizagem. O ensino se articula em torno dos alunos e dos conhecimentos,
e as aprendizagens dependem desse conjunto de interações. Assim, como nós
sabemos, ensino e aprendizagem fazem parte de um processo de construção
compartilhada de diversos significados, orientado para a progressiva autonomia
do aluno.” (GUIMARÃES, 2012, p. 166-167)

Para contribuir com esta perspectiva de transformação, de exercício do pensar


e do construir, as histórias em quadrinhos se oferecem como um recurso de
ensino importante. Exigem dos estudantes uma atitude ativa. Permite a
formulação de diversos questionamentos e a possibilidade de serem abordadas
diferentes temáticas pertinentes à disciplina. O grande desafio da educação é,
no nosso entender, contribuir para a formação de indivíduos autônomos do ponto
de vista da capacidade de construir conhecimento e saberes, principalmente, de
saber utilizá-los na vida cotidiana. No passado, o importante era dominar o
conhecido, hoje, o foco está em dominar o desconhecido. A educação visa
contribuir para que o sujeito consiga desenvolver habilidades e competências
para serem aplicadas diante de situações que lhe são impostas. Entre estes
desafios estão inseridos os usos das imagens.

Na sequência, iremos analisar trechos selecionados da obra El fotógrafo de


Mauthausen objetivando demonstrar algumas das possibilidades da sua
utilização para o Ensino de História, principalmente no uso das imagens como
evidências históricas.

El fotógrafo de Mauthausen e a fotografia como evidência histórica


A obra narra a trajetória de Francisco Boix, fotógrafo e militante comunista
espanhol, nascido em Barcelona no dia 31 de agosto de 1920 e falecido na
capital francesa em 7 de julho de 1951, com a idade de 31 anos. Boix lutou no
Exército Republicano durante a Guerra Civil Espanhola. Durante a Segunda
Guerra Mundial (1939-1945) e na companhia de outros compatriotas foi
deportado para o campo de concentração e de trabalho forçado de Mauthausen. 123
O campo ficava localizado a 20 km de distância da cidade de Linz, na Áustria,
país anexado ao Terceiro Reich em março de 1938. Com o desenrolar da guerra
o campo foi ampliado e transformou-se em campo de extermínio, com uma
câmara de gás construída em 1942. Havia três categorias para os campos.
Mauthausen era o único de 3ª categoria, a mais dura (Auschwitz era categoria
1). Essa 3ª categoria era para os irrecuperáveis que deveriam ser exterminados
por meio do trabalho. Em Mauthausen prestavam serviços aproximadamente
5.000 soldados da SS. Teriam passado pelo campo aproximadamente 15 mil
prisioneiros.

Boix chegou a Mauthausen no dia 27 de janeiro de 1941. Como prisioneiro


recebeu o número 5185. Usava um triângulo azul com um S de Spanier
(espanhol). Deixou o campo somente após a libertação do campo em 1944.
Como o retorno à Espanha era impossível, acabou indo para a França.

Devido ao seu conhecimento prévio sobre fotografia, Boix foi recrutado como
ajudante do comandante Paul Ricken (1892-1964) que fotografava o horror do
extermínio. Como fotógrafo presenciou os crimes cometidos pelos nazistas em
Mauthausen, porém quando estas fotos eram reveladas ficavam registradas
como tentativas de fuga, o que adulterava a realidade.

Boix percebeu que as fotografias eram os testemunhos dos crimes nazistas e


que deveriam ser de conhecimento público. Orquestrando um plano ousado,
conseguiu transpor algumas fotografias para fora do campo e com o fim do
conflito foram utilizadas como documentos nos Julgamentos de Nuremberg,
sendo Boix o único espanhol presente. A história em quadrinho retrata a luta de
Boix para que a verdade sobre o que ocorreu em Mauthausen seja conhecida.

A seguir, analisaremos algumas cenas selecionadas da história em quadrinho,


privilegiando aquelas que demonstram a fotografia como evidência histórica.
Informamos que as páginas da HQ não estão paginadas, inserimos números de
páginas nas imagens selecionadas para fins de localização na obra. Iniciamos a
contagem a partir da folha de rosto. Por fim, ainda queremos fazer uma
referência ao Dossiê Histórico que completa a obra e está no final da mesma.
Um estudo realizado por renomados historiadores e pesquisadores do complexo
de Mauthausen e questões correlatas, iniciando na página 113 e encerrando na
página 168. Neste dossiê está disponibilizado documentos, biografias,
fotografias e outras informações.

Nas três cenas selecionadas a seguir temos uma sequência importante. A


chegada de Francisco Boix no campo Mauthausen. Importante para destacar a
identidade do personagem/sujeito histórico, sua vestimenta de prisioneiro e o
número que recebe (signos, perda da identidade). Destacar que através destes
vestígios, nome, número e local de prisão, por exemplo, é possível reconstruir
as trajetórias destes sujeitos históricos que viveram nos campos sob o horror
nazista.
124

RUBIO, 2018, p. 17.

Na segunda cena, à direita e acima, temos a topografia do local, a pedreira de


onde eram retiradas as pedras de granito através do trabalho dos prisioneiros.
Local de tormento para estes trabalhadores forçados. É possível identificar o
ambiente no qual o campo estava inserido. Perceber a geografia ao redor do
campo. Por fim, a terceira cena, à esquerda e abaixo, nos remonta a difícil subida
dos prisioneiros com as pedras nas costas e os crimes ou suicídios que ocorriam
na beira do penhasco.
Na seleção seguinte temos a fotografia como documento de
falsificação/adulteração, ou seja, as fotos que eram tiradas no campo eram
utilizadas como material de propaganda nazista. Um cenário fictício era criado e
retratado pelas fotos.

125

RUBIO, 2018, p. 23.

Na imagem abaixo temos outra referência ao uso da fotografia como documento


forjado/alterado. Depois do assassinato de algum prisioneiro criava-se uma cena
fictícia para fins de “arte” segundo Paul Ricken. Após serem reveladas estas
fotografias eram arquivadas como tentativa de fuga.

RUBIO, 2018, p. 37.

Na sequência temos a representação das visitas que ocorriam no campo, tanto


de oficiais nazistas quanto de civis da vizinhança. As quais também eram
registradas pelas lentes da máquina fotográfica.
126

RUBIO, 2018, p. 50.

Fotos que no futuro, no Julgamento de Nuremberg, serviram como provas para


condenar vários criminosos nazistas, sendo Boix o único espanhol a depor.
Evento que foi retratado nas cenas da HQ.
127

RUBIO, 2018, p. 85

Das imagens acima, surgem possibilidades. A primeira é a presença de um


sobrevivente do campo de concentração, o seu testemunho, sua oralidade, sua
voz e mais, o uso das fotografias como provas da verdade, provas dos crimes
ocorridos no passado que ainda não passaram. Seu uso como evidências
históricas das atrocidades cometidas. A segunda referência que destaco são as
quatro bandeiras, representando os vencedores da guerra: URSS, Inglaterra,
Estados Unidos e França. Por fim, chamar a atenção dos estudantes para o
ambiente do julgamento, vestimentas, a formalidade, os documentos.

Na próxima cena selecionada temos a exibição das fotografias no julgamento.


Elas estão postas como provas contra os acusados. Francisco Boix é chamado
a explicar e identificar as fotografias, os documentos visuais, as evidências.
128

RUBIO, 2018, p. 87

Através das imagens projetadas temos a memória do horror. Porém, Boix choca-
se com a pressa e com a falta de interesse por parte dos juízes em conhecerem
os muitos detalhes que ele tem para testemunhar. O que pode ser um ponto de
discussão importante na sala de aula: a importância do testemunho, da história
oral, ou como argumentou Verena Alberti (2018) “histórias dentro da História”.

Partindo das imagens selecionadas, concordamos com a proposição de


Meneses, quando defende “que no campo dos estudos visuais, como em
qualquer campo dos estudos históricos, o importante é a construção de
problemas históricos que poderão vir a ser resolvidos através das fontes eleitas”
(MENESES, 2003, p. 28, In: VASQUES; PIRES, 2017, p. 151). Neste caso, as
imagens da história em quadrinho nos provocam reflexões sobre os usos das
fotografias, especialmente no caso dos crimes do Terceiro Reich, tanto como
propaganda quanto como evidências de acusação. São os diferentes usos das
imagens.

“Essa é uma proposição que considera o papel que as imagens têm na


construção cultural de uma determinada sociedade e de um contexto histórico,
colocando-as como evidências históricas importantes e se afastando, enfim, do
seu emprego meramente ilustrativo.” (VASQUES; PIRES, 2017, p. 151) Aqui nos
distanciamos do uso da imagem como mera ilustração. Estamos concebendo-as
como fontes históricas, mesmo inseridas numa narrativa de história em
quadrinho.
Enfim, podemos indicar que os quadrinhos podem contribuir para refletirmos
sobre determinadas realidades históricas, casos de violência, ataques aos
Direitos Humanos etc.

Apontamentos finais
Visando um fechamento da reflexão aqui desenvolvida, acredito ser possível 129
afirmar que as histórias em quadrinhos se oferecem como um rico material a ser
explorado pelos historiadores(as), tanto no âmbito da pesquisa quanto no uso do
Ensino de História na Educação Básica.

É um material que torna o estudante ativo na interpretação, no seu aprendizado.


Exige deste habilidades e competências múltiplas para destrinchar a narrativa,
tanto com elementos imagéticos quanto elementos da escrita. No caso da obra
aqui analisada, exige o conhecimento prévio, ou proporciona o desafio de buscar
as informações, sobre o período da Segunda Guerra Mundial. Ao longo da
narrativa diversas informações sobre o contexto são exigidos do leitor(a), sendo
mencionados ao longo da história. A obra faz uso de difentes temporalidades.
Insere informações que serão retomadas no decorrer da narrativa, como no caso
demonstrado das visitas dos oficiais, estes foram fotografados no momento em
que estavam no controle, no domínio da situação, porém, com o fim da guerra e
posterior julgamento, estas fotos serviram como evidências históricas de suas
participações nos crimes cometidos durante o conflito, especialmente no caso
do campo de Mauthausen.

Encerrando, Ensino de História e histórias em quadrinhos podem fomentar uma


discussão importante nos estudantes, principalmente quando este debate parte
de uma perspectiva interdisciplinar e promovendo o estudante em ator ativo da
construção do seu conhecimento.

Referências
Pós-Doutorado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul (PUCRS). Mestre, Bacharel e Licenciado em História pela
UFRGS. Professor de História na Rede Municipal de Educação da Prefeitura de
Esteio (RS), Ensino Fundamental II. Professor de História na Rede Estadual de
Ensino do Rio Grande do Sul, Ensino Médio.

ALBERTI, Verena. Histórias dentro da História. In: PINSKY, Carla Bassanezi


(org.). 3ª ed. São Paulo: Fontes históricas. Contexto, 2018, p. 155-202.

BARROS, José D'Assunção. Interdisciplinaridade na História e em outros


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BURKE, Peter. Testemunha ocular: o uso de imagens como evidência


histórica. São Paulo: Editora Unesp, 2017.
DIDI-HUBERMAN, Georges. Imagens apesar de tudo. São Paulo: Editora 34,
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FONSECA, Thais Nivia de Lima. História & Ensino de História. Belo Horizonte:
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130
LIMA, Solange Ferraz de; CARVALHO, Vânia Carneiro de. Fotografias: usos
sociais e historiográficos. In: PINSKY, Carla Bassanezi; LUCA, Tania Regina
de (orgs.). O Historiador e suas fontes. São Paulo: Contexto, 2009, p. 29- 60.

LOPES, Arsiteu Machado; RODRIGO FILHOS, Artur; COLLARES, Marco


Antonio (orgs.). A História através das mídias: representações, personagens,
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OLIVEIRA-SILVA, Geral Magela de. A arte sequêncial como possibilidade,


produção de conhecimento e saberes no Ensino de História. In: PEREIRA, Ana
Carolina Costa; ALCÂNTARA, Cláudia Sales de. História em quadrinhos:
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PAIVA, Eduardo França. História & Imagens. 2ª Ed. Belo Horizonte: Autêntica,
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PEREIRA, Ana Carolina Costa; ALCÂNTARA, Cláudia Sales de. História em


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RUBIO, Salva; COLOMBO, Pedro J.; LANDA, Aintzane. El fotógrafo de


Mauthausen. 2ª ed. Barcelona: Norma Editorial, 2018.

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estudos sobre Hqs na Argentina e Brasil. In: ROFRIGUES, Rogério Rosa.
(org.). Possibilidades de pesquisa em História. São Paulo: Editora Contexto,
2017, p. 137-170.
HISTÓRIA: A NECESSIDADE DO
MARKETING
Felipe Fagundes e Luíza Cozzani
131

Introdução
O presente projeto divide-se em três momentos. Primeiramente, será
desenvolvida a parte teórica, que tem por objetivo a produção do título do projeto,
a problemática referente a pouca divulgação do curso e a consequente falta de
alunos, a organização estrutural, o slogan, a imagem do curso com a finalidade
de atingir o público alvo interessado. O segundo momento, pretende formular
questões referentes a existência ou não do interesse ao curso. O questionário
será aplicado em escolas de ensino médio da rede pública e privada na cidade
de Bagé e região.

Tem por finalidade a procura de possíveis soluções para despertar atenção e


interesse da comunidade. As escolas selecionadas, todas situadas no município
de Bagé foram: Auxiliadora, Bradesco, escola estadual Carlos Kluwe, Colégio
Franciscano Espírito Santo, Justino Quintana e o Instituto Federal do Rio Grande
do Sul. O terceiro momento terá como objetivo o desenvolvimento de alternativas
que possibilitem a propagação da imagem do curso. Através do desenvolvimento
de um aplicativo pelos acadêmicos deste. Acredita-se que o uso de mídias
digitais favoreça a repercussão da imagem em diversas plataformas, tornando-
se assim acessível para todos os públicos.

Com isso, visa-se a possibilidade de compreender e solucionar as questões que


envolvem a problemática da baixa demanda de alunos, do curso de História, da
URCAMP, que afeta além do mesmo, toda a sociedade bajeense, todos aqueles
que são dependentes dos projetos desenvolvidos

Metodologia

O presente projeto divide-se em três momentos. Primeiramente, será desenvolvida a


parte teórica, que tem por objetivo a produção do título do projeto, a problemática
referente a pouca divulgação do curso e a consequente falta de alunos, a organização
estrutural, o slogan, a imagem do curso com a finalidade de atingir o público alvo
interessado.

O segundo momento, pretende formular questões referentes a existência ou não do


interesse ao curso. O questionário será aplicado em escolas de ensino médio da rede
pública e privada na cidade de Bagé e região. Tem por finalidade a procura de possíveis
soluções para despertar atenção e interesse da comunidade. As escolas selecionadas,
foram: Auxiliadora, Bradesco, Carlos Kluwe, Espírito Santo, Justino Quintana e o
Instituto Federal (IFsul).

132

O terceiro momento, terá como objetivo o desenvolvimento de alternativas que


possibilitem a propagação da imagem do curso. Através do desenvolvimento de um
aplicativo pelos acadêmicos deste. Acredita-se que o uso de mídias digitais favoreça a
repercussão da imagem em diversas plataformas, tornando-se assim acessível para todos
os públicos.

Com isso, visa-se a possibilidade de compreender e solucionar as questões que


envolvem a problemática da baixa demanda de alunos do curso de História que, afeta
além do curso, toda a sociedade bajeense, todos aqueles que são dependentes do curso
como, os frequentadores dos museus, dentre outros beneficiários de projetos referentes a
temática.

Referencial teórico

Faz-se necessário apresentar alguns conceitos relacionados ao desenvolvimento do


projeto integrador. Para que se realize o objetivo deste, é preciso que se compreenda a
relação entre marketing e história. É de fundamental importância que se leve em
consideração fatores que influenciam o processo natural de inovação e revolução que as
sociedades vivenciam. Pode- se afirmar que o mundo está em constante transformação e
readaptação nas mais diversas esferas. Para tal, é necessário que haja ações que
possibilitem melhor afinidade com determinado período.

O projeto integrador tem o objetivo de suprir a necessidade de readaptação para novas


demandas. Visa proporcionar métodos para satisfazer o mercado atual de consumidores
que vivem seu tempo cada vez mais exigentes e competitivos. A questão que permeia a
necessidade deste, está relacionada com a exigência de atualização e inovação
decorrentes do processo de globalização. A utilização do marketing como ferramenta de
apoio é indispensável para a realização do mesmo.

Segundo Nobre, grande parte dos cientistas diz que o marketing na forma como
conhecemos o teve a sua origem no início dos anos 1900, no século XIX, mas a própria
definição do conceito diz que: Marketing envolve a identificação e a satisfação das
necessidades humanas e sociais. Tomando a forma que conhecemos hoje.
De acordo com Shimoyama, o marketing é fruto de um estudo baseado em diversas
ciências (sociologia, psicologia, matemática, antropologia, estatística, filosofia, entre
outras), tem como objetivo conhecer o comportamento das pessoas e, a partir disso,
satisfazer às necessidades e desejos de cada uma. O marketing tornou-se uma força 133
difundida e influente em todos os setores da economia. Em poucos anos despojou-se de
sua antiga imagem de algo antiético e desnecessário e passou a ser visto como um
instrumento essencial para a formação e manutenção de diversos negócios, tendo
inclusive seus conceitos aplicados nos mais variados tipos de organização.

O marketing é um conjunto de ações, estratégias, usadas para ofertar um produto e


consequentemente transmitir uma ideia sobre o mesmo, como está relatada na gramatica
de língua inglesa, oxford, “The action or business of promoting and selling products or
services, including market research and advertising.”a frase pode ser traduzida com, “a
ação ou negócio de promover e vender produtos ou serviços, incluindo pesquisa de
mercado e publicidade”. Assim assumindo diferentes perspectivas a partir de um
produto, uma ideia, uma marca.

No decorrer da história o marketing foi muito utilizado, por grandes nações objetivando
a visibilidade, um bom exemplo seriam as bandeiras e símbolos, cujos eram usados
como identidade, na Alemanha nazista, como dito pelo escritor, Roberto Catelli Junior,
“A propaganda e os filmes não apenas criticavam os inimigos, mas também criavam
modelos de comportamento a serem seguidos pelos alemães, como serem comedidos
economicamente e evitar o luxo”, pode-se perceber que o marketing foi um grande
aliado no convencimento e orientação do povo alemão na época.

A Ética no Marketing

O marketing é uma grande ferramenta, utilizada por líderes, para reger um povo,
governar, demonstrar suas convicções e manter a ordem e serenidade na sociedade, isso
pode provir desde uma propaganda física como uma hereditariedade sanguínea, como
dito no livro “O Príncipe” de Maquiavel, “(…) não se deve recear outra coisa senão a
dinastia do príncipe; uma vez extinta esta, os demais não gozam de prestígio junto ao
povo (...)”. A partir desse ponto de vista, é possível perceber que o líder, com um bom
marketing, com um apresso do povo, tem um poder de convencimento e um controle
maior sobre os mesmo, porem como dito pelo escritor, assim podemos perceber que a
responsabilidade que acompanha o poder, muitas vezes é uma incumbência
demasiadamente grande para determinados lideres, que perecem em seu posto.
O marketing pode ser retratado também como uma notícias, fazendo propaganda,
contra ou a favor de ideais, e ou retratando fatos como por exemplo a primeira
manifestação de marketing, escrita por Herodoto (apud Nobre 2017), no século V, “Os
Lídios foram os primeiros a introduzir o uso de ouro e prata da moeda e os primeiros a
estabelecer lojas de varejo em locais permanentes.”. Em formato de anuncio, a primeira
aparição está gravada em um papiro, no museu de Londres, como descrito por 134
SIMÕES, 1980, p. 8 está escrito:

“O escravo Shen fugiu de seu amo, Hapu, o tecelão. Todos os bons cidadãos de Tebas
estão convidados a ajudar em seu retorno. Ele é Hitita, tem 1,60 m de altura, de
constituição forte, avermelhado e de olhos castanhos. Oferece-se a metade de uma
moeda de ouro por notícias de seu paradeiro. E pelo seu retorno à loja Hapu, o tecelão,
onde a melhor roupa é tecida conforme você deseja, uma moeda inteira de ouro é
oferecida.”

Além disso a propaganda, de um determinado ideal e ou produto, gera por parte de seu
difusor, uma questão de obrigatoriedade para com seus consumidores, de suas propostas
serem devidamente executadas, porem devemos ter um enfoque nas morais
empresariais, cujas existe uma ambiguidade em relação ao certo e o errado, conforme
exposto por Srour.

Em uma economia competitiva, os empresários não têm como deixar de


considerar os interesses díspares de seus stakeholders. Porque mercados
abertos, aliados a regimes políticos liberais, conferem enorme poder de fogo
àqueles que se organizam[...] A mesma coisa se aplica aos acionistas
minoritários, gestores, trabalhadores sindicalizados, associações de moradores,
organizações não- governamentais, movimentos ambientalistas. Todos eles
podem valer- se desses e de outros instrumentos de pressão... (SROUR, 2003,
p. 274).

Assim a ética no marketing torna-se algo notoriamente ambíguo, não tendo uma
determinação simples e objetiva, tendo uma interpretação diretamente atrelada ao
governo e ou local onde for imposto como dito no texto de Miguel Arantes, "o
marketing possui seu plano de ação atrelado ao planejamento estratégico da empresa".
Por essa abstração do ato, é praticamente impossível ter uma classificação definitiva
sobre a ética no marketing como dito por Laczniak em 1983, "“problema relacionado
com influências éticas é a falta de padrão universal simples para julgar se uma ação em
particular é ética”.
Muitos líderes, tanto na antiguidade, quanto em momentos mais contemporâneos, criam
normas e regramentos, para manipular e controlar a população, sem que a mesma
encontre-se acossada e coagida e ou oprimida, como por exemplo a etiqueta real
francesa, na época de Luiz XV, descrito no livro a “sociedade da corte”, de Elias
(2005), “Eis o sentido da etiqueta para o próprio Luís XIV. Não se trata de mera
cerimônia, mas de um instrumento de dominação dos súditos”. Então pode-se ser 135
compreendido que o marketing, como forma de controle, é utilizado amplamente por
líderes, no mundo inteiro desde de épocas remotas.

Com isso, pode-se afirmar que o marketing se faz indispensável como instrumento
social desde as mais remotas épocas. Está diretamente ligado com a necessidade de
propagação da visibilidade do produto. O marketing propiciará alternativas para a
viabilidade do projeto integrador que tem como objetivo, neste semestre, a elaboração de
um Plano de Marketing que detecte as razões da baixa procura pelo curso, aponte formas
de divulgação e ampliação da clientela.

Plano de marketing é uma ferramenta de gestão que auxilia empreendedores a se


adaptarem às mudanças de mercado, identificarem tendências e criarem vantagens
competitivas em relação aos concorrentes.

O plano de marketing é composto basicamente por três etapas que possibilitam aos
empreendedores a tomada de decisão segura para o alcance dos objetivos e metas
definidas.

Planejamento: após a análise do ambiente, na qual são revisadas todas as


informações sobre o negócio, são estabelecidos o público-alvo, o
posicionamento de mercado, objetivos e metas, marca e estratégias de
marketing.

Implementação: é a etapa na qual as estratégias de marketing são executadas


para assegurar a realização dos objetivos e das metas. O plano de ação é
desenvolvido de acordo com os dados obtidos na etapa de planejamento.

Avaliação: nessa etapa verifica-se se as ações executadas estavam de acordo


com o planejado.

Resultados e discussões
Nessa etapa serão apresentados alguns gráficos provenientes de uma pesquisa de
campo. O questionário foi aplicado à 337 alunos do ensino médio, de instituições
privadas, filantrópica e federal. A primeira questão tinha o objetivo de identificar a faixa
etária dos entrevistados. A pergunta foi feita da seguinte maneira “Qual a sua idade? ( )
Até 20 anos, ( ) De 21 à 30 anos e ( ) Acima de 30 anos”. O gráfico 1 representa as
informações coletadas, pela questão: 136

Gráfico 1

Fonte: Os autores, 2019.

É possível observar que a grande maioria dos entrevistados, alunos do ensino médio de
algumas das principais instituições de ensino da nossa cidade, tem idade inferior a vinte
e um anos.

Posteriormente em nossa pesquisa, havia a seguinte incógnita, “Como você define a sua
formação escolar na disciplina de história? ( ) Indiferente, ( ) Ruim, ( ) boa e ( ) Ótima”,
obtivemos o seguinte resultado, conforme demonstrado no gráfico 2:
137

Gráfico 2
Fonte: Os autores, 2019.

Podemos perceber que a grande maioria dos alunos está satisfeito com as aulas história
na escola, determinando-a como boa. Porém, a porcentagem que julga como ruim, as
suas aulas de história, é maior do que a porcentagem das pessoas que julgaram como
ótima.

A Próxima questão, foi uma das mais importantes para o trabalho, para a compreensão
do conhecimento do público-alvo sobre a existência do curso de História na URCAMP
e para a elaboração de estratégias de marketing para corrigir possíveis distorções. A
pergunta é a seguinte: “Você sabe da existência do curso de História da URCAMP? ( )
sim ( )não”, como apresenta-se no gráfico 3 a seguir:

Gráfico 3
Fonte: Os autores, 2019.
Podemos perceber que, o curso de História da URCAMP, é pouco conhecido pela
sociedade, esse fenômeno pode ser ocasionado por inúmeros motivos, sendo os
principais a falta de um marketing adequado para a nossa área, como também pelo curso
ser muito recente. Esses empecilhos devem ser analisados com uma boa equipe em
cooperação com a coordenação, a reitoria e o corpo estudantil juntos, para ter a
oportunidade de superar tal barreira. 138

Posteriormente a pergunta feita tinha o objetivo de medir o interesse dos alunos em


algum dia cursar história, a pergunta era a seguinte, “Você teria interesse em cursar
História, na URCAMP? Em uma escala de 0 à 10”, o resultado obtido foi o seguinte:

Gráfico 4
Fonte: Os autores, 2019.

O resultado obtido foi claramente um desinteresse muito grande pelo curso, isso pode
ser proveniente de um preconceito com a área, de um estereotipo da baixa remuneração
dos professores ou somente pelo desconhecimento da área de atuação no formando do
curso de história.
139

Gráfico 5
Fonte: Os autores, 2019.

Analisando o Gráfico 5, é possível identificar que os pesquisados têm conhecimento da


abrangência da área de atuação do historiador.

Gráfico 6
Fonte: Os autores, 2019.

O Gráfico 6 demonstra que o dinheiro (32%) e outros motivos (47%) são os maiores
fatores para não cursarem história, mas tendo também por base os gráficos apresentados
anteriormente, pode-se inferir que as respostas “Outros” ( 47%) pode estar relacionada
ao baixo interesse neste curso.
140

Gráfico 7
Fonte: Os autores, 2019.

A análise do Gráfico 7 aponta para a necessidade de maior investimento institucional em


marketing para divulgação e esclarecimento da população a respeito dos diferenciais da
Graduação I. Pela pesquisa, identifica-se que 63% dos estudantes não tem conhecimento
de que o currículo da Graduação I é inovador, criativo e alinhado com as tendências do
mercado de trabalho.

Como é possível verificar, a publicidade sobre o novo currículo não atingiu e esclareceu
o público-alvo e apresenta uma lacuna, apenas mencionando um currículo inovador, ou
graduação I, mas não apresentando nem esclarecendo o que são essas inovações do
novo currículo.

Considerações finais

Pode-se verificar que este trabalho foi necessário diante da escassez de alunos no curso
de história e revelou possibilidades de análise para essa situação.

A investigação ocorreu através da aplicação de questionário em algumas escolas da


cidade, com isto foi possível identificar que muitos não sabiam da existência do curso e
também detectamos que existe uma falta de interesse da maioria das pessoas em cursar
História.
Foi possível identificar também o desconhecimento sobre as características da
Graduação I, o que mostra que ainda falta informação nas campanhas de marketing da
instituição e que as únicas pessoas que estão vendo isto são aquelas que já estão dentro
da instituição, tendo isto também afetando na divulgação do curso de História. 141

Conclui-se que é necessário existir uma mudança nas campanhas de marketing da


instituição para que o público-alvo tenha informações suficientes para optar por um dos
cursos disponíveis. Essa mudança além de mostrar a inovação na metodologia de ensino
reforçará as ações de divulgação que serão sugeridas pelo grupo para o curso de
História.

Referências biográficas
Felipe Lucas Fagundes, estudante do curso de história da universidade da região
da campanha (URCAMP).

Luiza Cozzani, bacharel e licenciada em história e pós graduanda em Educação.

Referências bibliográficas
ARANTES, Miguel. Ética No Marketing É Uma Abordagem Restrita. Devemos
Praticar Ética Nos Negócios. II Simpósio de Excelência em Gestão e Tecnologia,
2005. Disponível e:

<https://www.aedb.br/seget/arquivos/artigos05/4_Artigo_SEGET_Marketing_Eti
ca_2005_1_Miguel%20Arantes.pdf>. Acesso em: 13/06/2019.

D’ANGELO, André. A Ética No Marketing. Scielo, 2003. Disponível em:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-
65552003000400004>. Acesso em: 13/06/2019.

ELIAS, Norbert. A Sociedade Da Corte. Editora: Jorge Zahar, Disponível em:

<http://www.cahis.ufpel.com.br/wp-content/uploads/2015/08/A-Sociedade-da- Corte-
Norbert-Elias.pdf>. Acesso em: 13/06/2019.

KOTLER, Philip. Administração de Marketing. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1998.


KOTLER, Philip. Princípios de Marketing. São Paulo: Prentice Hall, 2000.

MALHOTRA, Naresh. Pesquisa de Marketing. 3. ed. Porto Alegre: Bookman,


2001.

142

RIO, Puc. Evolução do conceito de marketing. Editora: Puc Rio, Disponível em:
<https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/17977/17977_3.PDF>. Acesso em:
13/06/2019.
APLICATIVOS EDUCACIONAIS PARA AULAS
DE HISTÓRIA: HISTÓRIA LOCAL NA PALMA
DA MÃO - CAXIAS - MA
143
Francisco Lucas Gonçalves dos Reis e Jakson
dos Santos Ribeiro
Introdução
O contexto de pandemia em que vivemos atualmente nos revelou o quão
presente as tecnologias estão na vida dos indivíduos. Em especial, no campo
educacional, o que vimos foi a continuação das aulas (de forma remota) com o
intermédio das tecnologias. As escolas passaram a utilizar algumas plataformas
para a continuação das atividades, tais como: Google meet; Zoom; Microsoft
Teams; etc, por onde professores e estudantes interagem em salas de aula
virtuais.

No entanto, para além da visão das tecnologias como simples intermediadoras,


é importante pensá-las enquanto ferramentas pedagógicas e que oportunizem o
aprendizado. Neste contexto, os smartphones assumem a centralidade quando
se trata do principal meio de acesso aos conhecimentos em geral, uma vez que
o aluno com o acesso à internet pode estar em contato com culturas dos mais
longínquos lugares. Em relação à este ponto, o Ensino de História é quem mais
se beneficia, tendo em vista a possibilidade de hoje os estudantes poderem
visitar museus virtualmente, ter acesso aos documentos históricos digitalizados,
e os conhecimentos históricos que apresentam-se em diferentes formatos, em
plataformas diversas, desde uma rede social, um documentário, um blog, um
curta-metragem, etc. Os estudantes ficam desta forma imersos no mundo da
internet que os torna sem exagero algum, cidadãos globais.

Partindo das considerações feitas anteriormente, é preciso que as tecnologias


estejam aliadas também para que seja possível ao aluno ter acesso ao
conhecimento do seu lugar, do local em que vive, para que a partir dali possa
compreender os contextos mais amplos. Assim, atentar para a aprendizagem da
História Local constitui-se uma forma de valorizar a própria identidade do lugar
e das pessoas que pertencem a ele, uma vez que a própria BNCC ressalta a
necessidade de criar vetores para que o Ensino de História Local possa se
estabelecer no cotidiano dos alunos.

Considerando o contexto acima descrito, este artigo apresenta a fase inicial do


desenvolvimento de uma pesquisa acadêmica de iniciação científica no âmbito
do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento
Tecnológico e Inovação - PIBIT. O título do projeto consiste na proposta “O
desenvolvimento de aplicativos educacionais para aulas de História geral e
História do Maranhão na Educação Básica”; e o plano de trabalho em
desenvolvimento é “Jogo da memória: história local na palma da mão”. Objetiva-
se a elaboração de um aplicativo que forneça apoio aos professores da Rede de
Educação Básica de Caxias- Ma no que diz respeito ao ensino de história local.

Desenvolvimento
Para o início do desenvolvimento da presente pesquisa (em andamento) foi 144
imprescindível buscar um referencial teórico a respeito da importância das
tecnologias aplicadas ao Ensino de História; o conceito de mobile learning
(aprendizagem móvel); e a relação Ensino de História e história local.

É importante considerar primeiramente que o Ensino de História, diante das


tecnologias, se depara com muitas possibilidades que podem tornar este ensino
cada vez mais dinâmico e atrativo para os alunos.

No entanto, é necessário o cuidado por parte dos profissionais da educação,


para que as tecnologias, quando utilizadas, não sirvam apenas como
intermediadoras do processo educativo, elas devem ter propósito pedagógico e
possibilitar aos alunos a interação com o conhecimento. Deste modo:

“A utilização da tecnologia com intenções educativas necessita de uma


sustentação pedagógica ao nível das estruturas, dos intervenientes e das
estratégias de ensino e de aprendizagem, porque mais importante que centrar a
discussão no tipo de tecnologia a utilizar é identificar que propósito pedagógico
se pretende atingir [...]” (TRINDADE & MOREIRA, 2017, p. 100).

Desta forma, o uso de aplicativos no Ensino de História também está relacionado


ao estudo sobre o mobile learning (aprendizagem móvel), que mostra-se mais
que necessário no campo educacional, pois se deve considerar o potencial das
aplicações móveis no processo de ensino e aprendizagem por possibilitarem a
elaboração de um conjunto ilimitado de ações pedagógicas, independentemente
do espaço da sala de aula, uma vez que:

“O acesso ao conteúdo de multimídias deixou de estar limitado a um computador


pessoal (PC) e estendeu-se também ás tecnologias móveis (telemóvel, PDA,
Pocket PC, tablet, PC, Netbook), proporcionando um novo paradigma
educacional, o mobile learning ou aprendizagem móvel, através de dispositivos
móveis.” (MOURA, 2012, p.50).

Esta aprendizagem móvel traz a vantagem de conectar aluno e professor, e


estes ao conteúdo estudado mesmo estando geograficamente distantes. Porém,
o uso destas aplicações deve receber atenção especial pois existem alguns
desafios no caminho justamente por ser ainda um tema muito debatido no campo
educacional.

Considerando ainda a formação dos professores que geralmente não contempla


uma capacitação em relação às tecnologias é importante fazer a seguinte
consideração:
“Devemos utilizar metodologias adequadas do contexto na qual se inserem. O
professor precisa se apropriar das questões teóricas na vinculação com as
especificidades da tecnologia. Nesse sentido, o professor poderá ser capaz de
identificar os limites e potencialidades dessa situação.” (LEITE, 2014, p.59).
145
A questão do contexto é um ponto que deve ser priorizado na utilização de
aplicações móveis em escolas municipais, levando em consideração a
heterogeneidade presente na sala de aula em que o professor deverá elaborar
atividades que incluam todos os alunos. É preciso que o professor saiba
manusear e principalmente utilizar as aplicações móveis como um recurso
pedagógico vinculando as questões teóricas.

Cabe destacar que as aplicações são ferramentas auxiliares e não substituem


os recursos já utilizados pelo professor. Para um melhor aproveitamento ao
ministrar o conteúdo é interessante que sejam utilizadas todas as maneiras
possíveis, integrando as diferentes tecnologias para obter os resultados
esperados no processo de ensino e aprendizagem.

“É importante neste processo dinâmico de aprender pesquisando, utilizar todos


os recursos, todas as técnicas possíveis por cada professor, por cada instituição,
por cada classe: integrar as dinâmicas tradicionais com as inovadoras, a escrita
com o audiovisual, o texto sequencial com o hipertexto, o encontro presencial
com o virtual.” (MORAN, 2000, p. 140).

Desse modo em relação ao uso das aplicações móveis no ensino de História o


mobile learning mostra-se:

“[...] como um processo igualmente capaz de potencializar a educação da


História num contexto de educação formal, mas fora do espaço tradicional de
sala de aula, em contexto de visitas de estudo, acreditando que a aprendizagem
da História e o desenvolvimento da consciência histórica não se restringem
apenas ao espaço de sala de aula, mas podem ser concretizados em qualquer
lugar, desde que devidamente pensados e executados em termos didáticos.”
(VIEIRA, H. I. A., & FERREIRA, C. A. F, 2016, p.209).

É este o ponto central sobre o uso das aplicações móveis no Ensino de História,
pois não consiste apenas na aprendizagem fora da sala de aula, mas
principalmente a vantagem do desenvolvimento da consciência histórica além do
espaço escolar. Aqui é importante atentar para o cuidado que deve ser tomado
pelo professor ao propor estas atividades que devem ser pensadas com fins
didáticos, pois caso contrário as aplicações móveis não se mostrarão como
ferramentas auxiliadoras no processo de ensino e aprendizagem.

A discussão sobre desenvolvimento da consciência histórica dos alunos deve


sempre levar em consideração o momento que os mesmos estão vivenciando.
Ao considerar que este é um momento de avanços tecnológicos e discussões
sobre o melhor uso dos mesmos, faz-se necessário uma articulação e
complementaridade com o objetivo de aliar os recursos que os alunos
frequentemente utilizam, mas que só agora estão sendo pensados como
ferramentas pedagógicas auxiliadoras no processo de ensino e aprendizagem.

Temos ainda o fato de que, entre todas as disciplinas a História tem papel de 146
destaque, pois credita-se á ela a responsabilidade principal na formação de uma
consciência histórica na construção de valores culturais e também sociais. Daí a
importância dos estudos sobre história local neste processo uma vez que fazem
frente aos processos de homogeneização cultural, observado facilmente nos
livros didáticos de História quando se constata uma quantidade considerável de
páginas dedicadas a história das potências europeias. Os estudos da história
local trazem ao conhecimento dos alunos os diferentes modos de viver no
presente e em outros tempos, que existem ou que existiram no mesmo espaço.
O conhecimento da história do seu lugar, da sua cidade, dos fatos importantes
que constituem a história daquele lugar favorecem o desenvolvimento das
capacidades de diferenciação e identificação, permitindo identificar as
permanências e mudanças nos costumes e nas relações sociais, as
semelhanças e diferenças de vivências coletivas, não julgando grupos sociais
como mais “evoluídos” ou “atrasados” (BRASIL, 1997, p. 52).

O aplicativo
Para chegar ao produto final aqui pretendido (o aplicativo sobre história local de
Caxias - MA), a presente pesquisa passará por algumas etapas descritas adiante,
algumas delas já em andamento.

Primeiro, foi realizado um levantamento de trabalhos que abordam sobre a


história da cidade de Caxias- MA, ou aspectos específicos que possam contribuir
para a pesquisa, tais como o patrimônio, suas igrejas e praças, seus escritores,
etc.

Dentre as leituras realizadas, podemos apontar alguns trabalhos importantes


que contribuem para a elaboração do conteúdo do aplicativo a respeito da
história de Caxias- Ma. Temos inicialmente a tese de Mariângela Santana
Guimarães Santos, com o título “Fragmentos da memória: contribuições à
história da cidade de Caxias do Maranhão”. Neste trabalho, a autora traz uma
história da cidade a partir do diálogo com a memória de alguns moradores e
também de professores acadêmicos. Em seu trabalho temos a história de alguns
bairros; relatos sobre as festas religiosas; sobre as fábricas têxteis; as igrejas;
praças; estação ferroviária; as ruínas da Balaiada; etc. A tese constitui-se como
um trabalho imprescindível por ser repleta de imagens sobre os mais variados
lugares da cidade, e que serão necessários ao aplicativo.

Outro trabalho importante é a dissertação de Joana Batista de Souza, intitulada


“Educação Patrimonial: passados possíveis de se preservar em Caxias - MA”.
Neste trabalho, a autora discute sobre a metodologia da Educação Patrimonial
no contexto das escolas públicas de Caxias - MA, de modo a gerar um diálogo
entre os indivíduos e o patrimônio cultural; e questiona qual a relação da
metodologia da Educação patrimonial com a preservação do patrimônio local. A
autora trabalha a relação do Ensino de História e a Consciência Histórica, além
do conceito de educação patrimonial, em especial o Patrimônio Histórico e
cultural em Caxias.
147
Nestes e outros trabalhos que não serão aqui citados, encontra-se muitos
conteúdos relevantes a respeito da história da cidade e que certamente ajudarão
para a elaboração do conteúdo do aplicativo.

Após este primeiro momento, segue-se à leitura dos trabalhos com objetivo de
retirar imagens e conteúdos relevantes à respeito da história de Caxias- Ma, e
que serão trabalhados para uma linguagem voltada para os alunos da educação
básica. Estes dados estão sendo organizados em tabela, e serão inseridos no
banco de dados do aplicativo que será criado dentro da plataforma de criação de
App Adalo, como é possível ver nas imagens a seguir:

Fonte: Elaborada pelo autor deste artigo, Relatório parcial PIBIT, 2021.
Fonte: Elaborada pelo autor deste artigo, Relatório parcial PIBIT, 2021.

Como é possível observar nas imagens acima, a primeira refere-se ao layout


inicial do aplicativo, onde já constam algumas telas e o seu possível design,
enquanto a segunda mostra uma das seções que fará parte do App e que será
intitulada patrimônio, onde já constam algumas imagens para fins de teste sobre 148
como ficará a apresentação das informações na tela.

Além disso, foram aplicados 2 (dois) questionários online à professores de


História da Rede Pública Municipal de Caxias. Um questionário voltado para a
temática do uso de aplicativos no Ensino de História; e outro que apresenta
questões concernentes ao Ensino de História local em Caxias.

Dentre as respostas obtidas acerca do questionamento “Você considera


importante que a história da cidade seja trabalhada em sala de aula? Por quê?”,
é interessante ressaltar a resposta do Professor 4, que destacou a relevância da
história local, de forma mais elaborada:

“Sim, porque temos que mostrar como se deu todo esse processo de construção
da cidade, e os discentes devem aprender a história local, para entender melhor
a história contada por alguns estudiosos, mas vemos ainda uma grande lacuna,
no que se refere a esse ensino, sendo que a nossa cidade é histórica que se
desenvolveu muito no XVIII por conta da indústria têxtil que gerava um
desenvolvimento econômico, proporcionando lucros, tanto para o setor de
empregados, como também para muitas famílias que sustentavam seus filhos a
partir do trabalho desenvolvido no interior das fábricas , tem também os
escritores que se destacaram nessa época, a culinária, os pontos turísticos, o rio
Itapecuru que facilitava as viagens para importação dos produtos, na verdade a
história local do nosso município é riquíssima.” (RESPOSTA, PROFESSOR 4,
2021).

As respostas obtidas nos ajudam a entender, ainda que parcialmente, como está
o Ensino de História em Caxias no que diz respeito às principais temáticas desta
pesquisa: as tecnologias no Ensino de História (o uso de aplicativos); e história
local (História de Caxias- Ma) na sala de aula. A partir do que apontam os
professores a respeito da realidade dos alunos já foi possível pensar quais
aspectos deverão ser priorizados na elaboração do aplicativo.

Considerações parciais
A pesquisa aqui desenvolvida encontra-se em andamento, visto que a leitura dos
trabalhos sobre a história de Caxias, de modo a separar os conteúdos e colocá-
los numa linguagem mais acessível aos alunos da educação básica é um
processo que deve ser bem trabalhado.

Até o presente momento, foram levantados trabalhos que tratam da história de


Caxias, conforme orienta o plano de trabalho. Foram retiradas inúmeras imagens
que constam nestes trabalhos, e que farão parte do aplicativo, com as suas
devidas referências. Os dados até agora retirados estão organizados em tabela
que constitui-se com a fonte de dados para a posterior elaboração do App.

Além disto, por meio da aplicação de 2 (dois) questionários à 4 (quatro)


professores de História do município, foi possível ter uma noção da realidade do
Ensino de História local em Caxias, assim como a realidade do Ensino de 149
História diante do uso das tecnologias, em especial o uso de aplicativos. As
respostas nos ajudam a pensar na elaboração de um aplicativo que possa, ao
menos em parte, superar os empecilhos apontados pelos professores, como o
não acesso à internet por grande parte dos alunos.

Conforme o prosseguimento das leituras, a tabela onde constam os dados


contemplará mais conteúdo para compor o aplicativo, e que posteriormente
estarão em organizados em seções como, igrejas; praças; escritores; pontos
turísticos; etc.

Referências biográficas
Francisco Lucas Gonçalves dos Reis é Graduando do Curso de História –
Licenciatura, da Universidade Estadual do Maranhão, campus Caxias (CESC-
UEMA). Atualmente Bolsista PIBITI 2020/2021 em projeto que consiste no
desenvolvimento de aplicativo para o Ensino de história local.
Email: franciscolucas075@gmail.com.

Jakson dos Santos Ribeiro é Professor Adjunto I da Universidade Estadual do


Maranhão (CESC/UEMA), Doutor em História Social da Amazônia (UFPA),
Mestre em História Social (UFMA) e Graduado em História (UEMA).
Email: noskcajzaionnel@gmail.com.

Referências bibliográficas
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares
nacionais: história, geografia. Brasília: MEC/SEF, 1997.

DIAS-TRINDADE, Sara; MOREIRA, J. António. Competências de


aprendizagem e tecnologias digitais. In: MOREIRA, J. António; VIEIRA, Cristina
Pereira (coord.). eLearning no ensino superior. Vol 4. Coleção Estratégias de
Ensino e Sucesso Académico: Boas Práticas no Ensino Superior. Coimbra,
2017. Disponível em:
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CINEMA E HISTÓRIA: ANÁLISE ACERCA DA
UTILIZAÇÃO DO CINEMA PARA A PESQUISA
E O ENSINO DE HISTÓRIA, CASO XICA DA
151
SILVA (1976)
Frederico Renan Hilgenberg Gomes
Desde a primeira exibição pública realizada pelos irmãos Lumière através do
cinematógrafo a partir de 1895, passando pelas salas de cinema, a
popularização com a ascensão da televisão, até mais recentemente com os
serviços de streaming de filmes, o cinema vem representando e significando o
mundo que o cerca, e com o tempo a linha que separa a vida real e arte se tornou
ainda mais tênue, onde se torna mais difícil decidir se a arte imita a vida, ou o
contrário.

A sétima arte significou uma verdadeira revolução no quesito representação e


leitura do mundo, pois, segundo Carrière (2014, p. 13), o cinema criou uma
linguagem totalmente nova “que poucos espectadores poderiam absorver sem
esforço ou ajuda”. O autor ainda aponta que “Não surgiu uma linguagem
autenticamente nova até que os cineastas começassem a cortar o filme em
cenas, até o nascimento da montagem, da edição. Foi aí, na relação invisível de
uma cena com a outra, que o cinema realmente gerou uma nova linguagem.”
(CARRIÈRE, 2014, p. 14).

Percebendo esse potencial do cinema, Marc Ferro, introduziu os filmes como


uma das possíveis fontes para o trabalho do historiador em seu clássico ensaio
“O filme: uma contra-análise da sociedade?”, acompanhando a abertura
temática-metodológica realizada pela nova história francesa na década de 1970.
(SANTIAGO JÚNIOR, 2012, p. 152). Contudo essa inserção dos filmes como
objetos-fontes na oficina do historiador não foi tão descomplicado quanto possa
parecer, pois “As fontes que o historiador consagrado utiliza formam, no
presente, um corpus que é tão cuidadosamente hierarquizado como a sociedade
à qual destina sua obra” (FERRO, 1975, p. 3).

Como apontou Ferro (1975), as fontes eram hierarquizadas, os documentos


escritos eram preteridos em relação aos outros, pois “que utilidade poderia ter
para a História esse primeiro pequeno fragmento de filme que represente Um
train entrant en gare de La Ciotat?”. (FERRO, 1975, p. 3). Ferro (1975, p. 5),
aponta que é necessário pensar o filme como algo que mesmo censurado,
testemunha, pois essas imagens constituem uma história sem H maiúsculo,
fazem uma “contra-análise da sociedade”, uma história a contrapelo, ao rés do
chão, pois:
“Partir da imagem, das imagens. Não procurar somente nelas exemplificações,
confirmação ou desmentido de um outro saber, aquele da tradição escrita.
Considerar as imagens tais como são, com a possibilidade de apelar para outros
saberes para melhor compreendê-las. Assim o método que lembraria o de
Febvre, o de Francastel, de Goldmann, desses historiadores da Nova História,
da qual se definiu a vocação. Eles reconduziram a seu legitimo lugar as fontes 152
de origem popular, escritas de início, depois não escritas: folclore, artes e
tradições populares etc. Resta estudar o filme, associá-lo ao mundo que o
produz. A hipótese? Que o filme, imagem ou não da realidade, documento ou
ficção, intriga autêntica ou pura invenção, é História; o postulado? Que aquilo
que não se realizou, as crenças, as intenções, o imaginário do homem, é tanto
a História quanto a História.” (FERRO, 1975, p. 5).

O campo aberto por Marc Ferro associaria a película ao seu contexto de


produção, essa foi uma das fortes tradições que inseriram o cinema no tempo,
as principais ideias de Ferro sobre a relação cinema-história seriam: “o filme
como agente da história, a ação de um filme num contexto social, o filme como
arma de combate ideológico, a leitura histórica do filme e a leitura
cinematográfica da história.” (SANTIAGO JÚNIOR, 2012, p. 158).

A outra tradição é a liderada por Pierre Sorlin, definia que o “filme deveria ser
lido por sua lógica interna, não como reflexo do contexto.” (SANTIAGO JÚNIOR,
2012, p. 156). Contudo, Santiago Júnior (2012, p. 156) escreve, que mesmo
conflituosas, ambas as teorias “convergiam na centralização do filme como
objeto central de uma dupla preocupação: película como documento ou como
representação da história.” E a “Tensão entre subjetividade e objetividade,
impressão e testemunho, intervenção estética e registro documental, marca as
fontes históricas de natureza audiovisual e musical.” (NAPOLITANO, 2008, p.
237).

O cinema se encontra no meio dessas visões. Seu caráter ficcional e linguagem


artística lhe conferindo uma identidade de documento estético, logo, subjetivo.
Já a capacidade de técnica e de registrar e criar realidades objetivas, encenadas
num determinado “tempo e espaço remetem a certo fetiche de objetividade e
realismo”, pois as imagens, mesmo que ficcionais, têm o poder de “criar” a
realidade.

Napolitano (2008), apresenta que podemos pensar a relação entre cinema e


história de três maneiras diversas: o cinema NA história; a história NO cinema;
e a história DO cinema. A primeira relação, demonstra a utilização do cinema
como objeto para a história, como fonte. Já a segunda, estabelece o cinema
como construtor de um discurso histórico. Por fim, a terceira relação, versa sobre
a recepção de determinada obra, como foi realizado e o contexto de produção,
os avanços técnicos da linguagem cinematográfica, que como aponta Carrière
(2014), está em constante autodescoberta.
Contudo, é importante lembrar que, mesmo que os historiadores utilizem esse
material, o filme que foi tomado como objeto de análise não foi produzido para
ser fonte dos historiadores. Um longa-metragem pode ser uma representação
daquilo que se foi, mas não é o passado em si, é somente mais uma das formas
de se ler e representar o mundo. Funcionando muito mais como retrato da época
em que foi produzido. 153

Napolitano (2008), escreve que o Cinema descobriu a história antes da História


descobrir o cinema. Exemplificando isso, temos o primeiro filme a ganhar o
Oscar de melhor filme, intitulado Asas (1927), o filme de William A. Wellman e
Harry d'Abbadie d'Arrast ganham o prêmio em 1929, narrando a história de dois
amigos que se apaixonam pela mesma mulher, mas ambos acabam se tornando
pilotos de guerra pelos Estado Unidos no contexto da Grande Guerra.

Pensando nesse sentido os filmes com roupagem histórica poderiam se referir a


duas temporalidades distintas, filmes históricos que tratam sobre temas que
foram atuais no seu contexto de produção, como Pra Frente, Brasil (1982) de
Roberto Farias; ou Cabra Marcado para Morrer (1984) de Eduardo Coutinho.
Filmes que mostram o contexto político da época da Ditadura Militar no Brasil.
Contudo, outros filmes como Asas (1927) são mais frequentes, isto é, que são
produzidos em um tempo distinto daquele que a sua história se passa. Nesse
sentido, Silva (2009, p. 152), pontua que “No caso dos filmes, considero de
fundamental importância levar em conta suas múltiplas temporalidades, em
especial, o tempo referido tematicamente no filme e o tempo de sua realização
material. (SILVA, NÓVOA, 2008)”. Para exemplificar isso, analisaremos o filme
Xica da Silva (1976) de Cacá Diegues.

O filme do diretor Cacá Diegues, Xica da Silva, gravado em 35mm no período de


1975-1976, possui 107 minutos de duração. Roteiro de Antônio Callado e Carlos
Diegues baseado no livro homônimo de João Felício dos Santos. O longa conta
a história de Xica da Silva (Zezé Motta) que saí da posição de escrava para ser
conhecida como Rainha dos Diamantes no Arraial do Tijuco, atual Diamantina,
na segunda metade do século XVIII, pois se torna mulher do contratador de
diamantes, o comendador João Fernandes (Walmor Chagas). Mesmo Xica
ocupando posição de prestígio social ela não é bem aceita na elite mineradora,
que fica claro com os desapontamentos das personagens do Intendente (Altair
Lima) e de sua esposa Hortência (Elke Maravilha), por causa dos mandos e
desmandos da personagem principal.

Xica da Silva (1976) é uma comédia misturada com drama, pois ao mesmo
tempo em que apresenta a figura irreverente e solar de Xica, também escancara
as mazelas da sociedade escravista, pois não bastava a personagem principal
ser a pessoa mais rica do Arraial, mas a sua cor de pele não condizia com essa
classe social. Mas engana-se quem pensa que o filme é um retrato fiel daquilo
que foi o Tijuco, ou até mesmo Francisca da Silva, o longa fala muito mais sobre
o seu contexto de produção e recepção do que a época retratada nas telonas.
O filme foi rodado em 1975-1976, período onde o país ainda estava sob o jugo
da Ditadura Militar (1964-1985) e num cenário ainda de censura e vigor do AI-5,
que só foi revogado em 1978. Para escapar da censura, o diretor se vale da
carnavalização, isto é, a inversão social, já que Xica realiza isso, pois sai do
papel de escrava para a mulher mais rica de do Arraial. E também porque o filme
teve como inspiração o samba enredo da escola de samba do Salgueiro de 1963, 154
algo que o próprio diretor relatou que esse desfile de 1963 foi o que deu a
inspiração para contar a história de Xica. (MELLO, 2013, p. 26). E essa estética
vai seguir por todo o filme, principalmente onde há a presença de Xica. Inclusive
em uma entrevista ao mesmo jornal, só que em setembro de 1978, com diretor,
produtor e atriz principal, Cacá revela que essa festa tinha um quê político: "A
festa é uma característica dos bárbaros, e são os bárbaros que transformam a
História. É por isso que no final, o jovem revolucionário Inconfidente, diz à Xica
que ela é "o sol e a festa do povo".” (O GLOBO, 1978, p. 33). O diretor:

“escolheu o enredo de Xica como uma “fábula política”, enquanto os


personagens representavam alguns atores sociais daquele momento: o
imperialismo brutal no conde português, a burguesia nacionalista e covarde no
contratador, as classes médias serviçais no sargento, no tendente e no pároco,
o intelectual revolucionário no jovem inconfidente, e por último, o povo em Xica.”
(ADAMATTI, 2016, p. 2).

Como aponta o próprio diretor: “Xica da Silva was made during the most difficult
period of military rule. We lived in a very difficult military situation, and Xica is a
metaphor about survival” (DIEGUES apud GORDON, 2005, s. p.). Ainda, “Ao
representar a resistência da protagonista ao colonialismo, o filme tem como
esperança criar, para os espectadores do Brasil em 1976, um modelo de
resistência a outro sistema de opressão: a ditadura militar brasileira.” (GORDON,
2005, s. p.). O filme tinha como objetivo ser esse sol, o diretor ainda conta que:

“Eu andava muito triste, pessimista, até tinha feito um filme como “Joana
Francesa”, que era um filme sobre a morte, o fim de uma civilização. Como eu,
assim também andava a minha geração. Então eu achei que estava na hora de
alguém fazer um filme que “dessemburrasse” a gente, que desse alguma
esperança e fé no povo. O mistério poético do galo não é o de que ele pensa
que faz nascer o sol; mas o do que ele anuncia a existência do sol.” (DIEGUES
in O Globo, 1978, p. 33).

A trilha sonora, principalmente a música tema da personagem principal


composta por Jorge Ben, apontam o também caráter político do filme, “Aqui, Xica
da Silva desvela explicitamente sua natureza alegórica com uma referência
intertextual à MPB: a canção convida o espectador a associar a história de Xica
às lutas de uma nação que, em 1976, ainda vivia sob a ditadura.” (GORDON,
2005, s. p.). E a música tema sempre retorna quando Xica faz algo que muda a
ordem então vigente.
Pensando no material finalizado, isto é, o filme que o público assiste, podemos
realizar algumas análises. Como já apontado, o filme tenta criar uma ligação
entre o mito do que teria sido Xica da Silva e o que estava sendo o Brasil de
1970. Um aspecto, também já apontado, que vai ser usado como estética do
filme é a carnavalização. Principalmente nas cenas onde aparece Xica já como
a mulher mais rica do arraial, isto através das joias, roupas, perucas e 155
instalações onde foram gravadas as cenas. Uma das cenas que se pode
visualizar isso é quando Xica recebe a sua carta de alforria e saí as ruas com as
suas mucamas, lembrando em muito as baianas das escolas de samba.

A roupa vai ser muito utilizada para ajudar a contar a história, como por exemplo,
a entrada de Xica nessa elite, com um vestido branco e que ela está utilizando
quando ela ordena que uma escrava a limpe. Uma contraposição ao momento
que o contratador deve voltar para prestar contas à Coroa e ela traja um vestido
preto, mostrando a morte de Xica rica e seu momento onde ela caiu em desgraça
por toda a sociedade do arraial.

Figura 2 – Primeira cena onde Xica é introduzida ao patamar mais alto da


sociedade do Arraial do Tijuco e a segunda onde ela perde tudo.

Fonte: Xica da Silva (1976) de Cacá Diegues.

Para ainda aumentar a sua noção de poder a protagonista é constantemente


retratada no centro da cena, pois ela é a Xica que manda, como escreveu Cecília
Meireles. Uma das cenas onde isso é bastante visível é quando a protagonista
se apresenta ao contratador. Xica invade a sala onde se encontra o sargento-
mor (seu amo), o intendente e o novo contratador, ela alega que foi violentada
pelo filho de seu amo, por causa dos seus dotes, ela enumera outros, mas fica
evidente que se trata de práticas sexuais. Em seguida ela fala que sofreu
agressões e mostra onde ocorreram, nessa hora Xica ocupa o centro da sala e 156
a câmera faz vários close-ups nas partes que ela aponta, primeiro um seio,
depois o outro, logo ela está toda desnuda e com as mãos espalmadas,
mostrando que ela não tem nada para usar em seu favor, além do seu corpo.

Essa cena pode ser lida como uma releitura da gravura “Allegory of America” de
Johannes Stradanus (1575), que apresenta o descobridor europeu em pé e
vestido se aproximando de uma nativa indígena, nua e com a mão num gesto de
convite e submissão. Na cena do filme há uma inversão desse papel, pois Xica
apresenta o seu corpo, que antes era usado como objeto por terceiros, como a
sua única arma. Aqui ela se apresenta como superior a todos na sala, invertendo
a lógica de poder da sociedade mineradora, e que ela usaria de seus dotes
sexuais para sair de sua condição de subalternidade para a de superioridade.
Aqui é Xica quem conquista o conquistador, o europeu assume a posição de
convite e submissão. (GORDON, 2005).

Figura 3 – Cena onde Xica conquista o contratador de diamantes tendo como


referência a obra de Johannes Stradanus.

Fonte: Allegory of America (1575) de Johannes Stradanus; Xica da Silva (1976)


de Cacá Diegues.
Utilizando esses exemplos e a presente análise, mostra como o filme é uma fonte
rica para a pesquisa em história, bem como para o ensino de história, indo é
claro para além da mera ilustração e mais como um objeto gerador de debate
como propõem Silva (2009).
157
E pensando na afirmação de Napolitano (2008), que o cinema descobriu a
história antes da história descobrir o cinema, é reveladora no sentido que o
cinema cria e recria o passado com bem deseja, e um dos papéis do professor
em sala de aula é o de justamente ensinar os alunos a como interpretar tal
linguagem. Como aponta Mocellin (2009):

“O fato é que, quer o professor de História utilize filmes em sala de aula, quer
não, o cinema "ensina" versões muitas vezes deturpadas e carregadas de
ideologias capazes de modificar seu modo de perceber o passado, a realidade,
as sociedades e suas crenças e conflitos. É necessário aprofundar o estudo das
ideias e influências que moldam a cultura de todos os membros da sociedade,
inclusive as "apreendidas" por meio do cinema.” (MOCELLIN, 2009, p. 11).

E quando o professor de história for utilizar filme em aula, mostrar realmente um


trabalho de historiador, levantando com os alunos o contexto de produção da
obra, quem é o diretor e que mensagem ele quer passar, recursos utilizados,
roteiro, recepção da obra, entre outros (NAPOLITANO, 2008). A utilização do
filme deve ser algo planejado e coordenado. “Para que o cinema não perca sua
efetiva dimensão de fonte histórica, é importante identificar o discurso que a obra
cinematográfica constrói sobre a sociedade na qual se insere, com todas as
implicações ideológicas e culturais que isso representa.” (MOCELLIN, 2009, p.
19).

Pensando nas lições que ficam nesse processo de tentar compreender a relação
entre cinema e história. Primeiro, de que é um campo muito profícuo para
pesquisa, pois todos os anos novos filmes são produzidos e novas questões são
colocadas. Bem como é importante avaliar o filme sobre a sua parte estética, sua
lógica interna, também é necessário analisar o filme em seu meio de produção,
na sua história de feitura, sem deixar de esquecer que o cinema é um Indústria
de Entretenimento. Nada o que se vê ou percebe em um filme está ali por acaso,
inclusive a sua ideologia. E como lembra o historiador Marcos Silva:

“Trazer filmes, textos ficcionais e outros produtos artísticos para a cena da


Pesquisa e do Ensino de história, portanto, é fazê-los dialogarem com o trabalho
dos historiadores, ao invés de os tratar como parceiros menores e ignorantes, a
serem corrigidos pela ciência. E descobrir que muitas são as vozes com direito
à fala reflexiva (no plano do conceito ou no plano do sensível) sobre história.
Uma delas é a voz dos filmes.” (SILVA, 2009, p. 156).

E o filme de Cacá Diegues, Xica da Silva (1976), serviria como um grande


exemplo para trabalhar em sala de aula com os alunos, tanto para retratar a
sociedade mineradora do Tijuco do século XVIII, como o Brasil sob o jugo da
Ditadura Militar. Cabendo aos professores mediar esse processo para identificar
as intenções dos produtores, referências, ligações com o contexto de produção
e pontes com a atualidade.

Referências biográficas 158


Frederico Renan Hilgenberg Gomes, estudante do curso de Licenciatura em
História da Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG.

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FERRO, M. O Filme: uma contra-análise da sociedade? In: NORA, Pierre


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MELLO, M. A modernidade que surgiu há 50 anos. O Globo, Rio de Janeiro, p.


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SANTIAGO JÚNIOR, F. C. F. Cinema e historiografia: trajetória de um objeto


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Um olhar sobre a História. 1ed. São Paulo/Salvador: EDUNESP/EDUFBA, v. 1,
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XICA da Silva. Direção de Carlos Diegues. Rio de Janeiro: Embrafilme –
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2020.
159
POSSIBILIDADES NO ENSINO DE HISTÓRIA
A PARTIR DO CINEMA: ESTUDOS INICIAIS
ACERCA DA PRODUÇÃO “BESOURO” (2009)
160
Gabriela Harumi Araki e Maria Rita Chaves
Ayala Brenha

Introdução
O cinema constitui-se, há mais de um século, como um agente produtor e
produto da criação de representações sociais, artísticas e culturais. Através das
representações audiovisuais, como o filme, é possível ao espectador perceber
particularidades do presente sob novas interpretações do passado. Além de
constituir-se como documento histórico, as produções audiovisuais são aliadas
no processo de ensino e aprendizagem a fim de destacar a historicidade e
transformações do olhar que a sociedade remete ao passado. No sentido do que
indicou Abud (2003, p. 183), sobre a utilização dos filmes em sala de aula,
podemos destacar que:

“[...] o filme em sala de aula mobiliza operações mentais que conduzem o aluno
a elaborar a consciência histórica, forma de consciência humana relacionada
imediatamente com a vida humana prática, e que se constitui, em última
instância, no objetivo maior do ensino de História”.

Ressalta-se, neste sentido, que o cinema, como produção cultural, atrai a


atenção dos estudantes, por vezes ainda mais que as exposições orais
realizadas pelo professor. Todavia, o filme, com suas particularidades, para ser
interpretado e utilizado enquanto uma fonte histórica em sala de aula, demanda
também a necessidade de orientações metodológicas para dar suporte à análise
objetivada, com o propósito de ser “um instrumento de reflexão sobre a
sociedade e seus modos de ser e não se transforme simplesmente num
complemento para preencher algumas horas do calendário escolar”
(MEIRELLES, 2004, p. 78).

Neste sentido, levamos em conta que as representações imagéticas e


audiovisuais, não têm o compromisso de serem fiéis à realidade. A ficcionalidade
reproduzida no formato da linguagem e representações destacam o caráter de
um discurso presente que visa apresentar o passado em uma sequência
intencional de cenas – linear, ou não – ao espectador. Desta forma, acerca das
possibilidades metodológicas no que corresponde às fontes audiovisuais,
Napolitano (2008, p. 240-241) elencou três encaminhamentos que são
importantes de serem delimitados:
“O cinema na História; a história no cinema e a História do cinema. [...] O cinema
na História é o cinema visto como fonte primária para a investigação
historiográfica; a história no cinema é o cinema abordado como produtor de
‘discurso histórico’ e como ‘intérprete do passado’; e, finalmente, a História do
cinema enfatiza o estudo dos ‘avanços técnicos’, da linguagem cinematográfica
e condições sociais de produção e recepção de filmes”. 161

Compreendemos que a segunda abordagem distinguida por Napolitano (2008),


nos orienta a pensar esta articulação imagética entre os discursos presentes no
documento fílmico e os conhecimentos históricos do passado, de modo a
destacar mudanças, transformações e continuidades, isto é, a historicidade dos
eventos. Elencamos, deste modo, o filme “Besouro”, dirigido por João Daniel
Tikhomiroff, estreado em 2009, com o propósito de refletir sobre a cultura e
religiões na Bahia, durante a segunda década do século XX. Salientamos o
reconhecimento desta produção, que conta com premiações nacionais e
internacionais: no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro de 2010, conquistou as
categorias de Melhores Direção de Artes e Efeitos Visuais; bem como Melhor
Filme Internacional no ReelWorld Film, do Canadá.

Considerações acerca do contexto e a narrativa Besouro, de João


Tikhomiroff (2009)
Nosso objetivo consistiu em perceber a narrativa de Tikhomiroff (2009) como
uma fonte histórica para as aulas de História do Ensino Básico. Tendo em vista
o que propõem os materiais didáticos para o nono ano, a Primeira República
Brasileira é elencada enquanto um dos conteúdos obrigatórios da referida
disciplina.

A partir de diferentes nuances interpretativas, a produção cultural “Besouro” nos


permite refletir sobre as relações sócio-históricas entre os povos e a cultura de
matriz africana na Bahia da década de 1920. Embora o contexto referido trata-
se de um momento pós-abolição, isto não implicou que os ex-escravos e seus
descendentes ocuparam um mesmo lugar social com relação aos brancos e
também aos católicos, religião oficial do Brasil até o código penal de 1890. Além
disso, ressaltamos que a violência operada pelas autoridades regionais
destacadas na narrativa de Tikhomiroff (2009) denunciam também um processo
de marginalização das práticas e cultura de matriz africana.

Em “Besouro”, o protagonista Manoel, morador do Recôncavo Baiano, ainda


criança, foi apresentado à capoeira por Mestre Alípio, que buscava ensinar-lhe
não apenas a luta, mas as virtudes da justiça e concentração. Durante a sua vida
adulta, após a morte de Mestre Alípio, Besouro assumiu a função de defender a
manutenção de sua cultura, combatendo o preconceito e a opressão existentes.
O besouro, como a narrativa nos apresenta, é negro e embora suas asas sejam
finas e seu corpo pesado, este é um animal que desafia a crença determinante
de que ele não poderia voar, e, portanto, voa. Esta relação simbólica já anuncia
as vontades e desejos do personagem principal de não ser limitado pelas
amarras dos aparatos utilizados na repressão do negro em território brasileiro,
mesmo após a abolição do sistema escravista.

Isto posto, propomos uma análise do filme de Tikhomiroff (2009) a fim de


conciliar o conteúdo da Primeira República Brasileira, destacando as
regionalidades e a configuração da cultura de matriz africana em sala de aula. 162
Para além disso, compreendemos que “Besouro” também abre a possibilidade
de diferentes interpretações, porque destaca a importância da cultura na
configuração da identidade do negro no início do século XX no Brasil. A partir
das representações de deuses africanos nesta narrativa de Tikhomiroff (2009) e
da capoeira como uma prática sociocultural para a comunidade de ex-escravos
na Bahia, pode-se também verificar as formas com as quais as crenças religiosas
operaram durante a Primeira República brasileira, a fim de contextualizar a
configuração das religiões afro-brasileiras.

Acerca do contexto histórico, o contexto da Primeira República Brasileira, mais


especificamente na década de 1920, que constitui o cenário que ambientou a
narrativa “Besouro”. A respeito desta conjuntura, Patto afirmou que:

“A proclamação da República não trouxe transformações econômicas, sociais ou


políticas radicais, nem marcou o ingresso do Brasil no concerto das nações
civilizadas. Ela não foi, como freqüentemente se afirma, o desfecho das questões
religiosa e militar do fim do Império, dos excessos cometidos pela Coroa ou da
insatisfação dos fazendeiros com a abolição da escravatura; não foi também
fruto de uma antiga e irreprimível aspiração republicana nacional, que se teria
manifestado desde os movimentos revolucionários ocorridos depois da
Independência; muito menos, expressão do desejo libertário de segmentos
oprimidos das classes populares [...]” (PATTO, 1999, p. 167).

Tendo em vista que o Brasil foi o último país da América Latina a extinguir o
sistema escravista, por meio da Lei Áurea de 13 de maio de 1888, consideramos
que a produção fílmica de Tikhomiroff (2009) levanta questões acerca deste
processo em que os negros escravizados foram libertados na esfera civil da
constituição, mas continuaram a sofrer com repressões e violências
principalmente pelas autoridades regionais ainda durante o século XX.

Neste sentido, a ruptura com o sistema de escravidão não se deu de maneira


rápida e definitiva. Podemos, portanto, problematizar os resquícios presentes no
pensamento e no imaginário social, principalmente com relação às autoridades
policiais emergentes. A narrativa de Tikhomiroff (2009), que buscou representar
a década de 1920, apresenta cenas em que os negros eram tratados com
violência e sob um regime de trabalho desumano e forçado.

Ao fugir do Coronel Venâncio, Besouro pulou em um rio e, pela altura ser


significativa, acreditaram que o capoeirista estava morto. O que segue, todavia,
são cenas dos Orixás cuidando de Besouro, principalmente Oxum, a mãe das
águas doces, representada como amorosa e maternal. As representações das
deidades africanas se fazem presente por toda a narrativa de Tikhomiroff (2009),
bem como da mediunidade de uma feirante, chamada de Zulmira, que além de
ver e perceber a presença de Exu, também realiza procedimentos de cura e
proteção no corpo de Besouro para que nenhum mal aconteça com este e,
também lhe entrega um amuleto para ser carregado em forma de colar. Quando
a narrativa chega em seu clímax, Zulmira, que havia cuidado de Besouro, acaba 163
sendo levada pelos policiais por ter ajudado o capoeirista. Mesmo sem ter
cometido crime algum, a repressão e a violência transpareceram na narrativa de
forma bastante interessante e provocativas, nos levando a refletir como os
negros do Recôncavo Bahiano eram tratados e como se deu o processo de
criminalização das práticas religiosas africanas e afro-brasileiras.

Desta maneira, a narrativa fílmica demonstrou algumas nuances acerca das


relações entre brancos e negros, entre trabalhadores, feirantes, capoeiristas e
membros do corpo policial. Há, também, representações dos Orixás, sendo Exu
o que mais aparece nas cenas decorrentes, por ser o Orixá de Mestre Alípio,
quem ensinou Besouro a capoeira e quem o instruiu a quebrar as correntes
impostas aos negros neste período de pós-abolição. A capoeira, portanto, é um
elemento cultural de extrema importância social na vida dos negros vindos da
África e seus descendentes. Percebe-se, a partir de “Besouro”, que além de um
momento de socialização, as rodas de capoeira era o momento no qual os
negros podiam vivenciar e experienciar as tradições e cultura de seus ancestrais,
que são de suma importância para o Candomblé, como destacou Reginaldo
Prandi (2001).

A problemática central que transcorreu o filme trata-se da proibição das rodas de


capoeira e da religião de matriz africana pelo Artigo 157, do Código Penal
Brasileiro de 1890, vigente até 1940, quando foi promulgado um novo Código
Penal sob o regime de Getúlio Vargas (GOMES; SERAFIM, 2019). O Artigo 157
do Código Penal de 1890 determinava que as práticas do Espiritismo, magia,
cartomancia e talismãs que poderiam despertar sentimento de ódio e amor, bem
como subjugar a credulidade pública, seriam ilegais, porque colocavam em risco
a segurança pública e perturbavam a ordem social. Neste sentido, as religiões
afro-brasileiras foram amplamente repreendidas com base nas leis federais, que
retificaram o preconceito e o olhar racista para as práticas religiosas espíritas e
afro-brasileiras.

A articulação do Artigo 157 durante a Primeira República gerou uma série de


processos, julgamentos e apreensões de praticantes de diferentes crenças que
não se vinculavam à Igreja Católica. Embora o catolicismo tenha sido a religião
oficial do Brasil até 1890, percebemos que mesmo os debates anticlericais que
cresciam nos grandes centros, como na cidade de São Paulo e Rio de Janeiro,
esta religião ainda continuava sendo privilegiada pelas autoridades policiais e
legais do Brasil. Além disso, não poderíamos de deixar de mencionar o trabalho
do médico Raimundo Nina Rodrigues, estudado pela historiadora Vanda Fortuna
Serafim (2010; 2013) e a visão que este médico apresenta sobre os candomblés
bahianos. A partir da perspectiva de Serafim, compreendemos que houve,
inclusive, um esforço da ciência brasileira para olhar as práticas religiosas dos
negros e também para classifica-las de acordo com os moldes médico-
científicos.

Ao levarmos em consideração estes apontamentos acerca da narrativa e do


contexto, compreendemos também a importância, para a prática do Ensino de 164
História, operar a partir de metodologias apropriadas para as fontes históricas
que se busca trabalhar em sala de aula. Com relação às fontes audiovisuais,
destacamos que a partir da década de 1970 o historiador Marc Ferro foi um dos
principais expoentes que tratou de desenvolver metodologias específicas ao
tratamento de fontes fílmicas (DAVSON, 2017). O cinema, neste sentido, passou
a ser incluído como fonte histórica aos historiadores, uma vez que constitui
representações do imaginário social acerca de assuntos e temáticas das quais
podemos trabalhar em sala de aula e na produção e pesquisa historiográfica.

Segundo Davson (2017), para Ferro, o cinema se transformou em “uma imagem-


objeto” dotada de significados para o momento de produção e também sobre as
narrativas do passado que busca-se representar na narrativa fílmica. Neste
sentido, os apontamentos de Napolitano (2008) e Katia Abud (2003) contribuem
para pensarmos como pode ser executado este exercício prático de levar as
fontes fílmicas para a sala de aula e emprega-las no Ensino de História.

De acordo com Abud (2003), a produção fílmica é reconhecida por desempenhar


um importante papel na construção do conhecimento histórico e do saber escolar
através de seu poder de representação que traz vida às épocas existentes
apenas nos livros. Esta linguagem específica da imagem auxilia na construção
do conhecimento histórico, que passa pela elaboração de operações mentais e
resulta em efeitos sociais, sendo estes:

“• Transmitir uma memória coletiva, revista e corrigida a cada geração, que


coloca o aluno diante de uma consciência coletiva;
• Formar a capacidade de julgar — comparando sociedades em épocas
diferentes, e a existência delas ao mesmo tempo em locais diferentes — que tem
como efeito social o desenvolvimento do espírito crítico e da tolerância;
• Analisar uma situação — aprendendo a isolar os componentes e as relações
de força de um acontecimento ou de uma situação — que leva ao refinamento
do espírito, antídoto ao simplismo de pensamento;
• Formar a consciência política como instrumento de coesão social, memória de
um grupo que toma consciência de um destino comum” (ABUD, 2003, p. 190).

Com base nos apontamentos dos autores elencados acima, percebemos que a
utilização de fontes fílmicas estimula a reflexão crítica dos alunos. A partir da
visualização das produções audiovisuais, como o filme, pode-se interpretar as
imagens, os sons, a composição do ambiente que é enquadrado na câmera, as
cenas e fala dos personagens. No entanto, o filme enquanto fonte histórica no
Ensino de História deve passar por uma estreita análise prévia do professor, a
fim de delimitar que a narrativa fílmica não tem como objetivo a realidade, tendo
liberdade para desenvolver enredos ficcionais, por isto, devemos nos atentar a
estas particularidades.

Também consideramos, com base em Abud (2003), que os filmes auxiliam na


construção de uma consciência política e histórica que proporciona reflexões
acerca do mundo e da sociedade. Neste sentido, o trabalho com fontes históricas 165
no Ensino de História possibilita o processo de ensino-aprendizagem com base
no desenvolvimento desta consciência histórica que os filmes nos proporcionam,
quando analisados historicamente.

Deve-se ter em mente que as produções culturais falam tanto do momento em


que são produzidas, mas também representam vivências e experiências vividas
em um tempo passado – ou futuro –, e a partir disto, pode-se enfocar a
historicidade da produção e os olhares que podem ser destacados acerca destas
narrativas. Como pontuou Sandra Pesavento (2005), o trabalho com o passado
exige a sensibilidade de perceber como era a sociedade e a cultura em outros
tempos e compreendê-los a medida que é estabelecido o contato com diferentes
visões e concepções sobre o momento do qual se busca analisar.

Assim, consideramos de suma importância situar que o trabalho com a narrativa


construída por Tikhomiroff (2009) auxilia a promover o debate acerca das
diversas culturas que compõem a identidade brasileira. Destacamos, ademais,
que a diversidade cultural e religiosa trabalhada no Ensino de História auxilia na
construção de indivíduos mais tolerantes e com mais respeito pelas práticas e
crenças do outro. Vale destacar, ainda, que este trabalho contribui para a
aplicação das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008 acerca da necessidade de se
trabalhar com a cultura afro-brasileira e africana nos conteúdos e disciplinas
referentes ao Ensino Básico, que complementam a Lei 9.934/1996 que
estabeleceu as diretrizes da Base Nacional Curricular Comum.

Considerações finais
O notável desenvolvimento tecnológico dos últimos anos trouxe consigo
inúmeras possibilidades a serem utilizadas por professores como verdadeiros
aliados no processo de ensino-aprendizagem histórico. Além disso, ressalta-se
que a utilização de fontes históricas no Ensino de História privilegia a construção
de uma consciência histórica e plural acerca da sociedade do presente e também
sobre as sociedades do passado. A fim de destacar a historicidade das
produções culturais, os filmes tornaram-se meios privilegiados de análise pela
sua constituição audiovisual e imagética.

Nesta perspectiva, compreendemos que através das produções fílmicas pode-


se observar nos personagens a distribuição dos papéis sociais e os esquemas
culturais, bem como as lutas, desafios e organização das relações sociais
reivindicações presentes no enredo (MEIRELLES, 2004). De modo a demonstrar
que os processos históricos se desenvolvem a partir de transformações,
mudanças, ressignificações e também das continuidades, concentramo-nos em
perceber na narrativa de Tikhomiroff (2009) os olhares possíveis sobre as
práticas religiosas e culturais na Bahia dos anos 1920.

Isto posto, pretendemos com este estudo inicial apreender a produção


cinematográfica de Tikhomiroff, “Besouro”, enquanto fonte histórica para as
aulas de História do Ensino Básico, do nono ano, mantendo em vista a proposta 166
da BNCC de estudo da Primeira República Brasileira. Por fim, consideramos que
esta perspectiva suscita reflexões necessárias para uma sociedade plural e
tolerante acerca das diferentes culturas, religiões, práticas e pensamentos que
compõem a história de nosso país.

Referências biográficas
Gabriela Harumi Araki é graduada em Licenciatura em História, pela
Universidade Estadual de Maringá (2020) e mestranda no Programa de Pós-
Graduação em História na linha de História, Cultura e Narrativas, pela mesma
Universidade. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5860416005664175.

Maria Rita Chaves Ayala Brenha é graduanda em Licenciatura plena em


História, pela Universidade Estadual de Maringá. Currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/0232864016772545.

Fonte
BESOURO. Direção de João Daniel Tikhomiroff. Rio de Janeiro, Globo
Filmes/Mixer/Teleimage, 2009, 90 min.

Referências bibliográficas
ABUD, Kátia Maria. A construção de uma Didática da História: algumas ideias
sobre a utilização de filmes no ensino. História, São Paulo, v. 22, n. 1, p. 183-
193, 2003.

DAVSON, Felipe Pereira da Silva. O cinema como fonte histórica e como


representação social. História Unicap, Recife, v. 4, n. 8, p. 263-271, jul./dez.
2017.

GOMES, Adriana; SERAFIM, Vanda Fortuna. O Artigo Penal 157 sob o olhar da
Antropologia Crminal: As aproximações entre o juiz Francisco José Viveiros de
Castro e o médico Raimundo Nina Rodrigues. In: GOMES, Adriana; CUNHA,
André Victor Cavalcanti Seal da; PIMENTEL, Marcelo Gulão. Espiritismo em
Perspectivas. Salvador, BA: Sagga, 2019.

MEIRELLES, William Reis. O cinema na história. O uso do filme como recurso


didático no ensino de história. História & Ensino, Londrina, v. 10, p. 77-88, out.
2004.

NAPOLITANO, Marcos. História depois do papel. In: PINSKY, Carla Bassanezi


(Org.). Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2008, p. 235-289.
PATTO, Maria Helena Souza. Estado, ciência e política na Primeira República:
a desqualificação dos pobres. Estudos avançados, São Paulo, v. 13, n. 35, p.
167-198, jan./abr., 1999.

PESAVENTO, Sandra. Sensibilidades no tempo, tempo das sensibilidades.


Nuevo Mundo Mundos Nuevos, 2005, p. 1-7. Disponível em: 167
<http://nuevomundo.revues.org/229>. Acesso em: 03/05/2021.

TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO: O USO DE


PODCASTS E GAMES NO ENSINO
Henrique Saraiva Louvem e Luara Alencar
Francisco

Inicialmente, este artigo busca contextualizar e entender a importância do uso


das tecnologias digitais para a educação, sobretudo o podcast e os games.
Diante disso, será abordado como essas ferramentas podem agregar o
aprendizado e otimizar a dinâmica em sala de aula.

Atualmente a internet e suas ferramentas constituem boa parte de nosso dia.


Desde o momento em que acordamos até a hora de dormir estamos conectados
com nossos aparelhos tecnológicos. Não obstante, o cenário provocado pela
pandemia do COVID19 fez com que crescesse a relação de dependência desses
recursos.

Nesse sentido, diversos eixos da sociedade são afetados por essas novas
tecnologias, sobretudo no que diz respeito à educação. A Base Nacional
Curricular Comum (BNCC) reconhece o papel fundamental da tecnologia para o
aprendizado, desde que seja utilizado de modo responsável e crítico, tal como
descreve a Competência 5:

“Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação


de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais
(incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações,
produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria
na vida pessoal e coletiva.” (BNCC, 2018. p. 9)

Assim, é imprescindível para os atuais e futuros professores o conhecimento das


tecnologias digitais. De maneira que o uso em sala de aula produza
conhecimento, pensamento analítico e autonomia nos alunos. Além de integrar
no aprendizado elementos diferentes dos tradicionais, gerando entusiasmo nos
educandos com o processo de estudar.

Além da competência 5 da BNCC, são relevantes os seguintes aspectos:


“Selecionar e aplicar metodologias e estratégias didático-pedagógicas
diversificadas.” (BNCC, 2018. p. 19)

“Conceber e pôr em prática situações e procedimentos para motivar e engajar


os alunos nas aprendizagens. (BNCC, 2018. p. 19) 168

“Selecionar, produzir, aplicar e avaliar recursos didáticos e tecnológicos para


apoiar o processo de ensinar e aprender” (BNCC, 2018. p. 19)

A relevância destes aspectos se deve ao interesse do mercado educacional -


grupos privados - na implantação de metodologias mais modernas e alinhadas
com práticas e interesses do mercado, deixando em segundo plano as críticas a
um modelo de educação bancária, individualista e nitidamente com um viés
capitalista.

Neste aspecto, não é abordado o risco inerente do aumento da desigualdade


digital, com acessos diferenciados às plataformas, aplicativos e redes dos alunos
da rede pública e particular, ou dos alunos dos grandes centros urbanos e de
cidades com menos recursos técnicos.

O fator de interação social presencial entre os alunos e docentes é um eixo


importante do aprendizado, e que precisa ser levado em conta quando falamos
do processo de formação do discente.

Essa interação tem sido alterada em virtude de um sistema de ensino remoto,


de caráter virtual/digital, que tende a ser uma constante para um modelo híbrido,
na medida que as restrições sanitárias de isolamento social foram reduzidas em
virtude da Covid-19. Sendo assim, o que vemos é um discurso que prega a
migração do sistema tradicional, em que as aulas se realizam apenas no âmbito
do espaço escolar, para um sistema híbrido, na qual parte das aulas é dada de
forma virtual.

As mudanças abruptas para esse novo sistema de ensino trouxeram em voga


termos e expressões pouco usuais ao público. Mas é preciso distinguirmos o
ensino híbrido do ensino remoto. Segundo Clayton Christensen Institute, o
ensino híbrido se define por:

“O ensino híbrido é um programa de educação formal no qual um aluno aprende,


pelo menos em parte, por meio do ensino online, com algum elemento de
controle do estudante sobre o tempo, lugar, modo e/ou ritmo do estudo, e pelo
menos em parte em uma localidade física supervisionada, fora de sua residência
(…) As modalidades ao longo do caminho de aprendizado de cada estudante em
um curso ou matéria são conectadas para oferecer uma experiência de
educação integrada (CHRISTENSEN, 2013, p.7)
Já o ensino remoto é a transmissão em tempo real das aulas. Professor e aluno
de uma turma têm interações nos mesmos horários em que as aulas da disciplina
ocorrem no modelo presencial. Significa manter a rotina de sala de aula em um
ambiente virtual acessado de forma conjunta, entretanto mantendo o
distanciamento físico entre ambos. Neste caso, a interação não é requisito de
conclusão, mas os professores sempre podem solicitar alguma colaboração dos 169
alunos. Ainda, os estudantes também podem surgir com alguma dúvida e
apresentá-las ao educador em tempo real. Essas ações são denominadas de
síncrona ou assíncronas.

As atividades sincrônicas são aquelas em que é necessária a participação do


aluno e professor no mesmo instante e no mesmo ambiente – nesse caso, virtual.
Assim sendo, ambos devem se conectar de forma simultânea e interagir entre
si.

Já as atividades assincrônicas são atividades propostas para serem realizadas


fora do período de aula como complementos a carga horária demandada pelo
MEC. Podem incluir a visualização de vídeos elaborados pelo docente, leitura de
livros, fichamentos de textos, filmes e documentários.

O uso das tecnologias no âmbito educacional tem sido matéria de estudo pela
Unesco, para identificar os avanços e melhorias nos sistemas de ensino, em
especial dos países mais pobres ou em desenvolvimento. De acordo com o
relatório apresentado em 2015, Tecnologias para a transformação da educação:
experiências bem-sucedidas e expectativas, há alguns pontos de consenso
sobre o uso da tecnologia em sala de aula e são identificáveis:

“O conceito do ensino como mera transmissão de conteúdos deve ceder lugar


para novas metodologias que possibilitem o desenvolvimento das competências
dos estudantes para operar sobre os conteúdos." (OREALC UNESCO, 2015. p.
13)

O relatório da UNESCO traz dados muito relevantes sobre as condições de


acesso e dificuldades dos docentes em compreender o potencial de uma
educação digital com o uso de metodologias ativas, dentre eles o volume de
apps e plataformas voltadas para educação que tiveram um crescimento
exponencial, Google for Education, Khan Academy, Microsoft Educação, e que
não existiam cinco anos atrás, nas versões espanhol ou português.

As áreas periféricas das grandes cidades latino-americanas ainda padecem de


uma cobertura de internet deficiente e muitas escolas em áreas rurais não
contam com internet em banda larga, a conexão mais adequada para aulas
remotas. Conforme aponta o citado relatório,

“O pilar fundamental da qualidade educativa são as competências profissionais


docentes: se os estudantes não se encontram em suas classes com docentes
capazes de gerar maiores oportunidades de aprendizagem, não se produzirá
uma genuína melhora da qualidade educativa…. Dado o caráter sistêmico de
todos esses processos, é difícil avançar em um deles sem avançar nos demais.
O desenvolvimento docente é, portanto, o requisito básico caso se queira
conseguir uma verdadeira transformação da escola.” (OREALC UNESCO, 2015.
p. 13)
170
Outro aspecto relevante do relatório da UNESCO é a ausência de políticas
públicas para treinamento de docentes para atuar em uma “sala de aula” digital
e remota. Essa ausência foi evidenciada durante o período da pandemia, no
qual professores de norte a sul do país encontraram enormes dificuldades para
orientar os alunos, ministrar aulas e lidar com as tecnologias ligadas às aulas
remotas.

O uso de Podcast para o ensino


Entre os recursos tecnológicos que podem ser utilizados em aula se encontra o
podcast. Este consiste em uma gravação áudio, na qual pode ser acessada por
arquivo ou streaming. Conforme Primo (2005), “o podcast é um processo que
emerge a partir da publicação de arquivos de áudio na internet”. Ademais, a
ferramenta se insere na nova geração de internet, denominada Web 2.0.

Em questão, o podcast pode servir como uma ferramenta na aprendizagem,


englobando desde o ensino presencial até o remoto. Por se tratar de uma
gravação de áudio na qual contém variados temas, o professor pode
disponibilizar entrevistas, documentários, leituras e conteúdos didáticos neste
formato. Além disso, ainda que pouco estudado, o uso de podcasts pode ser um
aliado para alunos com deficiências visuais.

Com efeito, o recurso possui uma série de vantagens para o aprendizado. O


aluno tem a vantagem de poder escutar em qualquer momento do dia e quantas
vezes desejar, englobando os diferentes ritmos de estudo. Dessa maneira, o
podcast é uma ferramenta didática que pode ser utilizada com maior liberdade
de espaço e tempo, como também é descomplicado de manusear.

Entretanto, por mais que o recurso tenha se popularizado nos últimos anos, o
seu uso em sala de aula ainda é escasso se comparado com outras ferramentas
tecnológicas. De exemplo, a pesquisa realizada pela Iniciação Científica
Tecnologias e Metodologias Ativas no Ensino de História no curso de licenciatura
em História da Universidade Federal da Paraíba tem feito um levantamento de
dados sobre os usos da tecnologia na educação.

A pesquisa teve seu foco nos alunos e professores da rede pública de ensino de
João Pessoa no estado da Paraíba. Foram entrevistados 41 alunos, nos quais
apenas 2,4% afirmaram utilizar podcasts para o estudo. Este número se mostra
pequeno, sobretudo se comparado com os estudantes que alegaram utilizar
videoaulas correspondendo a 80,5% dos entrevistados.
Contudo, o baixo uso de podcasts como ferramenta auxiliar nos estudos pelos
alunos não é de total responsabilidade destes. Dos 6 professores consultados
na mesma pesquisa, apenas 16,7% afirmaram utilizar os podcasts na
preparação ou durante suas aulas, este número, entra em contraste se
relacionado com o uso das videoaulas, na qual totalizou 100%.
171
Destarte, o podcast se mostra como um recurso tecnológico ainda pouco
explorado no sentido didático. Por outro lado, este fator não retira os benefícios
de seu uso, mas sim indica que precisa ser mais explorado. Ademais, é
necessário que os professores compartilhem as ferramentas tecnológicas de
maneira crítica e responsável. Assim, projetando uma educação para além dos
livros didáticos e das metodologias tradicionais de ensino.

O Uso de Games para o Ensino de História


O uso de games para o ensino de História é recente no Brasil, teve início de
forma introdutória e experimental o uso de metodologias ativas e jogos para o
ensino de História, sobretudo na rede de ensino particular e em escolas públicas.

Em geral, com a criação de multiplataformas, tais como: Canais no youtube,


redes de TV regionais e portais de internet, o discente pode ter acesso a aulas
pré-gravadas, atividades sincrônicas e links para recursos interativos.

Uma plataforma que tem grande potencial para que o docente o construa um
jogo, é o Google Forms. A criação dos jogos, pode ser realizada em qualquer
temática específica, abordando desde a Revolução Industrial ao papel da Mulher
na História. A facilidade de uso tanto para o discente como para o docente é uma
grande vantagem, pois não é necessário um grande conhecimento da
tecnologia, para elaborar um jogo ou jogá-lo.

Na pesquisa realizada pelo projeto Tecnologias e Metodologias Ativas no Ensino


de História (UFPB/PROPESQ), foram levantadas algumas questões sobre a
interação discente-docente no ambiente remoto e uso de recursos tecnológicos
e tecnologias aplicadas em sala de aula. Para tanto, aplicou-se um questionário
on-line em uma escola pública do município de João Pessoa, a qual discentes e
docentes do 7o. ano responderam perguntas sobre o uso das tecnologias na
prática do ensino e aprendizagem, diante das restrições sanitárias e do ensino
remoto.

Quando questionados aos professores e alunos sobre o uso de recursos


tecnológicos nas atividades escolares, o resultado foi que tanto os professores
como os alunos não estavam preparados para interagirem em um ambiente
remoto, sendo que, a desvantagem maior da parte dos professores que precisam
elaborar as aulas levando em conta as dificuldades tecnologias de acesso e de
conhecimento dos alunos, enquanto lidam com suas próprias dificuldades.
Sendo assim fica evidente a falta de planejamento por parte do governo e o baixo
uso de jogos tanto por docentes, como forma de aumentar o interesse dos
alunos, como dos discentes e em compreender algum tema aplicado em sala de
aula.

Em uma amostra de 41 alunos, foi evidenciado que menos de 3% deles fazem


uso de jogos para fixar algum conteúdo dado em sala de aula, 78% deles
buscam, por conta própria, algum recurso didático extra, seja para responder 172
alguma atividade proposta pelo docente ou para compreender algum tema
complexo.

Na amostra de 6 professores, os dados não são diferentes. A ampla maioria,


66%, não faz uso de jogos ou quaisquer outros recursos além do livro didático
para ministrar suas aulas, o que evidencia a dificuldade de adaptação às aulas
remotas.

Entretanto, as falhas dos governos em oferecer recursos para prática docente,


também são evidentes, antes da pandemia, que nenhum dos professores tinha
acesso a plataformas, canais ou qualquer contra tecnologia de suporte às aulas
remotas, nem eram treinados para planejar e ministrar tais aulas.

É interessante ressaltar que, em ambos os casos, foi informado a facilidade no


uso de tecnologias em sala de aula e para pesquisa, entretanto, a baixa
aplicação de podcasts e jogos em sala de aula, deixa evidente que o uso se deu
sobretudo na visualização de vídeos, ou seja, o grau de interação do discente
com o objeto em estudo, em um sentido de mão única, não houve de forma
efetiva uma interação do discente com o docente.

Conclusões
Devido a pandemia da Covid-19, projetos que estavam em um horizonte de
médio e longo prazo, foram adiantados e colocados em prática de forma
emergencial. Os docentes além de lidar com dificuldades técnicas e
instrumentais, da prática de docência online, precisaram criar estratégias para
tornarem as aulas remotas interativas ao gosto da geração Z, uma geração que
já nasceu e cresceu em um ambiente digital.

Logo, durante a pandemia de Covid-19, com o uso do ensino remoto, essas


desigualdades tornaram-se mais evidentes e são necessárias ações para mitigá-
las e o uso de podcast e jogos interativos durante as aulas de História, podem
auxiliar o docente a aumentar o engajamento dos estudantes.

O uso de games é uma ferramenta fundamental para gerar engajamento e


interesse dos discentes na disciplina de História. Devido a facilidade na
construção de jogos, nas mais diferentes temáticas e plataformas, o docente
deve considerar seu uso para mobilizar os alunos a participar das atividades,
sobretudo em condições de aulas remotas e ou híbridas.

Diante disso, o podcast pode ser uma ferramenta auxiliar nesse processo. O seu
uso gera maior interesse no conteúdo, engloba diferentes ritmos de
aprendizagem e é fácil de utilizar. Não obstante, o aluno tem a vantagem de
poder escutar em qualquer momento de seu dia, e os temas podem variar
conforme o conteúdo abordado pelo professor. Contudo, é necessário que o
educador faça o uso de modo crítico e significativo, assim englobando
efetivamente o aprendizado do educando
173
Portanto, compreendendo a sociedade atual e a urgência de se pensar o ensino
por vias tecnológicas impulsionado pela pandemia, o uso de ferramentas
tecnológicas na educação é fundamental. De modo a estimular as diferentes
formas de aprender, criando espaços de trocas de informações significativas.

Referências Biográficas
Henrique Saraiva Louvem - Graduando do curso de Licenciatura em História pela
Universidade Federal da Paraíba;

Luara Alencar Francisco - Graduanda do curso de Licenciatura em História pela


Universidade Federal da Paraíba;

Referências bibliográficas
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. 2017.

BRASIL. BNC-Formação. Portaria n. 2, de 20 de dezembro de 2019.

CHRISTENSEN, Clayton et al. Ensino Híbrido: uma inovação disruptiva?


Clayton Christensen Institute, 2013. Disponível em:
https://portalrevistas.ucb.br/index.php/raead/article/view/7517/4651 . Acesso
em: 18 mar. 2018.

Introdução à História dos Jogos Eletrônicos. Disponível em:


https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/8600/8600_3.PDF. Acesso em
20/04/2021.

JUNIOR, João Batista; COUTINHO, Clara Pereira. Podcast em educação: Um


contributo para o estado da arte. Revista Galego Portuguesa de Psicoloxía e
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OREALC UNESCO. (2013). Situación Educativa de América Latina y el


Caribe: Hacia la educación de calidad para todos al 2015. Santiago de Chile:
OREALC/UNESCO Santiago.

PRIMO, A.F.T. .Para além da emissão sonora: as interações no podcast.


Intexto, Porto Alegre, n.13, 2005.

ROCHA, Julci. Game design, gamificação e games na educação: será que


estamos falando da mesma coisa? Disponível em:
https://www2.geekie.com.br/blog/gamificacao-game-design. Acesso em
20/04/2021.
174
A VIRTUALIZAÇÃO DO LABORATÓRIO DE
ENSINO DE HISTÓRIA E ESTÁGIO
SUPERVISIONADO (LEHES)
175
Ilana Peliciari Rocha e Anelise Martinelli Borges
de Oliveira

O Laboratório de Ensino de História e Estágio Supervisionado (LEHES):


Breve Histórico
O curso de licenciatura em História da Universidade Federal do Triângulo Mineiro
(UFTM) foi criado em 2009 e conjuntamente seu laboratório de ensino.
Inicialmente, a proposta era apenas um laboratório de Educação para todos os
cursos de licenciatura, com um espaço comum. Mas, com a criação dos
Departamentos a proposta não vingou e ficou definido que cada curso teria seu
próprio laboratório. A Universidade alugou uma casa, chamada “Casa Terra”,
que foi o primeiro espaço físico do Laboratório de Ensino e Estágio
Supervisionado. Além de uma sala do Laboratório, a “Casa Terra” também
contemplava outros laboratórios de cursos variados. No primeiro momento, era
um quarto com um armário e nada mais. Aos poucos, o espaço começou a se
estruturar com doações e solicitações à Universidade. Assim, com o
envolvimento do corpo docente e discente do curso, o LEHES estruturou-se ao
longo do tempo.

A partir de 2019 o espaço físico passou para outro local, o Centro Educacional,
onde funciona o curso de História. Agora é uma sala compartilhada com os
Laboratórios de Ensino do curso de Letras, Geografia e Serviço Social que conta
com um espaço específico do LEHES, espaços compartilhados para guarda de
materiais didáticos e um espaço de reunião e estudos. Após a transferência do
espaço, foi realizada uma catalogação do material didático do laboratório com
apoio dos monitores das disciplinas de Estágio Supervisionado e surgiu a
necessidade de um espaço virtual para a divulgação do acervo e das atividades
desenvolvidas. Trataremos nesse trabalho sobre o processo inicial de
virtualização do Laboratório de Ensino de História e Estágio Supervisionado,
resultado do desenvolvimento de projeto de extensão.

O LEHES e sua Virtualização: aspectos teóricos


O Laboratório de Ensino de História e Estágio Supervisionado, segundo seu
regulamento, apresenta entre seus objetivos: “Desenvolver e apoiar atividades
de ensino, pesquisa e extensão relacionados à Educação Básica, à área de
Didática da História, Ensino de História e Estágios Curriculares Supervisionados”
(UFTM). Para atender seus objetivos mostra-se fundamental ampliar sua
comunicação com a comunidade acadêmica, mas também uma conexão com a
comunidade externa. Assim, a criação de um espaço virtual serviu como
mecanismo de integração universidade-comunidade virtual.

Como nos apresentam Rafael Dias de Castro e Iara de Oliveira Maia,


responsáveis pelo Laboratório de Ensino de História, da UNIMONTES:
176
“Diversas instituições, em diferentes estados, oferecem ambientes virtuais de
apresentação de seus laboratórios, espaços (virtual e físico), propostas e
organização, tais como, por exemplo, os Laboratórios de Ensino de História da:
Universidade Estadual de Londrina [UEL], Universidade Federal de Uberlândia
[UFU], Fundação Getúlio Vargas [FCV/CPDOC], Universidade de São Paulo
[USP], Universidade Federal do Recôncavo Baiano [UFRB], Universidade
Federal de Goiás [UFG], Universidade Federal do Ceará [UFC], Universidade
Federal do Rio Grande do Sul [UFRGS], dentre tantas outras” (CASTRO & MAIA,
2020).

O LEHES vem somar a esses outros laboratórios enquanto espaço de exposição


e discussões relacionadas às questões teóricas e práticas que envolvem o ofício
do professor-historiador. O atual contexto de pandemia também reforçou essa
necessidade do LEHES ser igualmente um espaço virtual.

As ações e materiais desenvolvidos em algumas disciplinas vinculadas ao


LEHES já contavam com um espaço de divulgação. Um exemplo seria o canal
no youtube ‘Didática da História’. O canal é desenvolvido pelos alunos da
disciplina Didática da História, do curso de História, em que os mesmos
produzem vídeos e podcasts sobre variados temas relacionados à História.
Tendo como objetivo a difusão do conhecimento histórico, o canal traz
discussões acessíveis a toda comunidade, sem perder, contudo, a essência da
ciência histórica.
(Link: https://www.youtube.com/channel/UCIq32NXP23W1e4RLiP2BjfA/
featured).

Optou-se como ambiente virtual o blog. O blog, que recebeu o nome de Portal
LEHES, apresenta-se como um canal de comunicação com a comunidade
acadêmica como também egressos do curso e professores da rede básica de
ensino de Uberaba. Esse projeto promove à sociedade as ações de pesquisa,
ensino e extensão na área de ensino de História buscando contribuir para
desenvolver e ampliar a relação universidade-sociedade.
(Link: https://lehesuftm2020.wixsite.com/portallehes)

A formação dos professores de História contou ao longo do tempo de


Laboratórios de Ensino de História (LEH) nas Instituições de Ensino Superior
(IES) públicas. Marin coloca que esses ambientes se constituíram a partir da
década de 1980 para servirem como conexão entre os docentes do ensino
superior, do fundamental e médio e os acadêmicos em formação e foram
fundamentais para que “repensassem e debatessem questões sobre o
significado de ensinar e de aprender história” (MARIN, 2015, p. 508).
O LEHES, enquanto espaço que congrega ensino, pesquisa e extensão,
constitui um ambiente privilegiado para aproveitar as possibilidades do mundo
virtual. Atualmente, as mídias correspondem ambientes importantes para
conectar a comunidade acadêmica-científica com a comunidade virtual.
Segundo Levy: “Interconexão geral, comunidades virtuais e inteligência coletiva 177
são aspectos de um universal por contato, um universal que cresce como uma
população, que faz crescer aqui e ali seus filamentos, um universal que se
expande como a hera” (LEVY, 1999, p. 133).

A experiência com mídias sociais já se faz presente no curso de História.


Conforme Cláudia Bovo:

“usamos a carga horária da PCC para orientar/tutoriar os estudantes na


produção de conteúdos para diferentes plataformas de mídias sociais (canais de
YouTube, páginas de Facebook, perfis no Instagram, perfis no Twitter e blogs),
com foco exclusivo nos temas relacionados aos debates historiográficos
propostos pela disciplina obrigatória ministrada, no caso História Medieval”
(BOVO & PINHEIRO, 2019, p. 129).

Assim, a perspectiva do uso de mídias no ensino de História já estava em ação


no curso e o projeto de virtualização do LEHES possibilitou agregar nessas
ações. O objetivo foi construir um apoio virtual para as atividades do LEHES com
a criação de um blog. Amaral, Reuero e Montardo identificam várias definições
para blogs. A partir de várias pesquisas relacionam três opções conceituais:
concepção estrutural, funcional e artefato cultural. Segundo as autoras:

“Essas três opções conceituais auxiliam-nos a compreender como os weblogs


são, atualmente, compreendidos pela literatura especializada. Como artefatos
culturais, eles são apropriados pelos usuários e constituídos através de
marcações e motivações. Além disso, perceber os blogs como artefatos indica
sua também a sua percepção como virtual settlement (JONES, 1997), uma vez
que são eles o repositório das marcações culturais de determinados grupos e
populações no ciberespaço, nas quais é possível, também, recuperar seus
traçados culturais. Como meios de comunicação, os weblogs são
compreendidos através de sua função comunicativa e dos elementos que dela
decorrem. (...) A percepção dos blogs como espaços de sociabilidade, como
constituintes de redes sociais está presente nesta vertente. Blogs como meios
de comunicação implicam também sua visibilidade enquanto meios de práticas
jornalísticas, seja através de relatos opinativos, seja através de relatos
informativos. O conceito estrutural, por outro lado, permite apreender-se o blog
enquanto formato, abrindo-se para múltiplos usos e apropriações” (AMARA,
RECUERO & MONTARDO, 2008).

A partir dessas conceituações pode-se perceber o potencial dos blogs enquanto


“suportes para a comunicação mediada por computador, ou seja, permite a
socialização on-line de acordo com os mais variados interesses” (AMARA,
RECUERO & MONTARDO, 2008). O blog, ferramenta para a virtualização do
LEHES, apoiou a interlocução do LEHES com a comunidade virtual. Dessa
forma, a virtualização criou “espaços móveis, que podem ser acessados e
constituídos independente do espaço físico e que podem, ainda, auxiliar nas
reconstruções desses espaços” (AMARA, RECUERO & MONTARDO, 2008).
Assim, é uma via de mão dupla, o Laboratório apresenta no blog suas ações e 178
seu espaço, mas também pode receber contribuições para o desenvolvimento
de suas atividades.

A Virtualização de um Laboratório de Ensino: o caso do LEHES


O Laboratório de Ensino de História e Estágio Supervisionado (LEHES) “é um
espaço de integração entre ensino, pesquisa e extensão, destinado ao
desenvolvimento do Curso de Licenciatura em História” (UFTM, 2019). Conta
com espaço físico onde “mantem acervo bibliográfico para o desenvolvimento de
pesquisas e atividades práticas acadêmicas relacionadas às disciplinas do curso
de Licenciatura em História e a documentação referente às disciplinas
Orientação e Estágio Curricular Supervisionado” (UFTM, 2019). Em agosto de
2020 iniciou-se o desenvolvimento do projeto de extensão “Laboratório de
Ensino de História e Estágio Supervisionado (LEHES) e o espaço virtual” que
contemplou a criação, manutenção e atualização de um espaço virtual para esse
laboratório. O espaço escolhido foi o blog que passou a funcionar como um canal
de comunicação com a comunidade virtual interessada nas questões
relacionadas ao ensino de História, como discentes e egressos do curso de
História-UFTM e de outras instituições; além de professores da Educação Básica
e outros interessados.

O projeto se desenvolveu com as seguintes etapas:

1. Reuniões de estudo e planejamento para execução das ações do projeto:


esse momento contou com bibliografia específica para discussão entre os
participantes e forneceu subsídios para a estruturação das atividades;
2. Seleção, preparação e correção das postagens do blog: a partir da
escolha das postagens e apoiados na base teórica-metodológica sobre o
uso de blogs os(as) discentes voluntários(as) partiram para a escrita e
correção dos textos que foram compondo as postagens;
3. Divulgação das postagens realizadas: logo que as postagens foram
inseridas foi imprescindível a divulgação nos e-mails do curso de História
e do IELACHS, canais institucionais de comunicação, além de páginas de
outras redes sociais do curso;
4. Avaliações periódicas e final sobre o andamento do projeto.

Como primeira ação ocorreu a escolha de um logo para o blog através de uma
enquete nas redes sociais do curso (facebook e instagram). Dessa forma,
iniciamos com pesquisa para a comunidade acadêmica de escolha de duas
propostas para o design virtual do LEHES realizadas pela equipe discente
vinculada à extensão. A iniciativa inicial além de criar a identidade visual do
laboratório buscou também criar um envolvimento como o espaço virtual a ser
criado.

Após a criação do blog iniciaram as primeiras postagens. O projeto contou com


uma equipe de quatro discentes e duas coordenadoras docentes. A estrutura
adotada foi a divisão do tripé: ensino, pesquisa e extensão; além de ícone com 179
o acervo e divulgação de eventos e editais.

As primeiras postagens procuraram situar os três pilares do Laboratório: “O


Ensino de História e o curso de História-UFTM”, “A Pesquisa e o Curso de
História-UFTM”, “LEHES e o compromisso com a extensão”. Depois partimos
para a apresentação do Acervo do Laboratório: “O LEHES e a construção
constante de um acervo”. Entre outras postagens estavam: regulamento do
LEHES e lista de livros didáticos que fazem parte do laboratório e a divulgação
das ações, eventos e atividades desenvolvidas pelo Laboratório, curso de
História-UFTM e também de outras instituições que possibilitem o
aprofundamento nas reflexões relacionadas à área.

Uma postagem comentou sobre a Coleção “As várias faces da pandemia”. Essa
coleção integra lives do Canal Oráculo da História (https://www.youtube.
com/channel/UCYXcueUaz7P8WLCVHgy3gGQ), canal desenvolvido pelo curso
no período da pandemia; Fotografia e História Pública, resultado de uma
disciplina eletiva do curso (https://www.instagram.com/
historiapublicaefotografia/?igshid=13xtlp9lit3f6) e a pesquisa de opinião
“Narrativa do ensino de História na Pandemia”. Além do aspecto relacionado ao
ensino de História no contexto da pandemia de Covid-19, a pesquisa de opinião
mostrou-se como um espaço de integração com a comunidade virtual. A equipe
discente fez um mapeamento de diversas instituições de ensino para a
divulgação da pesquisa e também do Portal. Considerando os indicadores
digitais, o Portal apresentou aproximadamente 1400 visualizações, com uma
média variada para cada publicação.

Considerações Finais
O projeto representou uma iniciativa de ampliar as ações do LEHES com a
criação de um espaço virtual para possibilitar o envolvimento com as atividades
e o acervo pelos nossos alunos e público interessado em geral. As ações e
produção do LEHES são constantes, pois relaciona-se com a parte prática do
curso (Estágios Supervisionados e PCC das disciplinas obrigatórias). Mostra-se
a necessidade de ambiente virtual que compartilhe essas produções e ações.

Nesse sentido, o ambiente virtual do blog constituiu num espaço de integração


entre as atividades docentes, discentes e da comunidade em geral, visando um
diálogo com os diferentes atores interessados nas temáticas do Ensino de
História. Além disso, promoveu o desenvolvimento de habilidades para atuação
com TICs entre os(as) futuros(as) professores de História.
O projeto relaciona o tripé da Universidade Pública, ensino, pesquisa e extensão.
Seu objetivo específico é produzir e dialogar com a perspectiva do Ensino de
História. Dessa forma, a virtualização buscou divulgar as produções acadêmicas
ou recursos disponíveis nesse espaço para o ofício do professor-historiador,
além de criar um espaço interacionista com a comunidade virtual.
180
Referências biográficas
Dra. Anelise Martineli Borges de Oliveira, docente do curso de História da UFTM.
Dra. Ilana Peliciari Rocha, docente do curso de História da UFTM.

Bibliografia
AMARAL, A. RECUERO, R. MONTARDO, S. P. Blogs: mapeando um objeto.
VI Congresso Nacional de História da Mídia, UFF, 13 a 16 de maio de 2008
(Disponível em: http://www.ufrgs.br/alcar/encontros-nacionais-1/encontros-
nacionais/6o-encontro-2008-1/Blogs%20Mapeando%20um%20objeto.pdf –
Acesso em 24/04/2020).

BOVO, C. PINHEIRO, M. S. História pública e virtualidade: experiências de


aprendizagem híbrida no ensino de História. Revista História Hoje, v. 8, n.16, p.
113-134, 2019.

CASTRO, Rafael Dias de. MAIA, Iara de Oliveira. Entre ensino, pesquisa e
extensão: propostas para um laboratório de ensino de História. 6º Simpósio
Eletrônico Internacional de Ensino de História, 18-22 de maio, 2020 (Disponível
em: https://simpohis2020aprendizagem.blogspot.com/p/entre-ensino-pesquisa-
e-extensao.html - Acesso em: 17/05/2020).

LEVY, P. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999.

MARIN, Marilú Favarin. A relação teoria e prática na formação de professores


de História: a experiência de laboratórios de ensino de História. Revista
Educação, Santa Maria, v. 40, p. 503-516, set./dez. 2015.

Portal LEHES - Laboratório de Ensino de História e Estágio Supervisionado.


(Disponível em: https://lehesuftm2020.wixsite.com/portallehes - Acesso em:
19/03/2021).

UFTM, Regulamento do Laboratório de Ensino de História e Estágio


Supervisionado, curso de História, 2019.
APONTAMENTOS SOBRE AS DIFERENTES
DIMENSÕES DA CULTURA HISTÓRICA NO
JOGO ELETRÔNICO VALIANT HEARTS -
181
THE GREAT WAR
Irineu João Luiz e Silveira Junior

Desde o seu surgimento em meados do século XX, o fenômeno cultural dos


jogos eletrônicos vem ocupando espaço não só em meio ao público aficionado,
mas também entre os/as pesquisadores/as que se dedicam a investigar os
possíveis impactos desses artefatos em nossas sociedades. Para os/as
historiadores/as, destacam-se como objeto de estudo os jogos ambientados em
acontecimentos do passado. Como observado por Christiano Britto Monteiro dos
Santos e Rafael Zamorano Bezerra (2019, p. 16), esses jogos eletrônicos, na
condição de representações históricas, são dispositivos de apreensão e
divulgação da história pautados em uma narrativa audiovisual e em um espaço
de jogabilidade, os quais trabalham em conjunto para elaborar discursos e
imagens acerca do passado. Nesse processo, tais jogos mobilizam a cultura
histórica do tempo e do espaço em que são produzidos, de forma que o/a
historiador/a, ao empreender uma análise da narrativa que está sendo ali
construída, desnuda também os valores e crenças de uma dada sociedade e a
relação dela com o tempo histórico que se almejava retratar.

Nesse trabalho, apontaremos caminhos para se analisar como a cultura histórica


é mobilizada para a construção narrativa do jogo eletrônico Valiant Hearts: The
Great War, que é ambientado na Primeira Guerra Mundial. Para tanto, nos
ancoraremos nas proposições de Jörn Rüsen (2016, p. 56), o qual afirma que a
cultura histórica contempla as diversas estratégias pelas quais os grupos
humanos elaboram as experiências do passado a partir do tempo presente, seja
nas criações artísticas, na educação escolar e extraescolar, nas investigações
científico acadêmicas, na luta política pelo poder, no ócio e em outros
inumeráveis procedimentos. Rüsen (2016, p. 64-65) identifica, então, três
dimensões pelas quais a cultura histórica fornece orientação temporal aos
sujeitos, a saber: a dimensão cognitiva, a política e a estética. Ainda de acordo
com o autor, os procedimentos da memória histórica manifestam-se de
diferentes formas em cada uma das dimensões, ainda que elas funcionem de
maneira interrelacionada.
Verifiquemos, então, como Valiant Hearts pode ser analisado à luz de cada uma
das dimensões da cultura histórica. Partindo da dimensão cognitiva, Rüsen
(2009, p. 173) explica que ela está relacionada à interpretação de experiências
sobre o passado, visando obter orientação temporal para as problemáticas do
presente e, quiçá, do futuro. Tal dimensão, ainda conforme o autor, manifesta-
se no elemento do conhecimento, o qual pode ser observado, por exemplo, na 182

História produzida por historiadores/as profissionais – ou seja, nos trabalhos que


interpretam a experiência histórica por meio do método científico. Valiant Hearts,
apesar de ter sido desenvolvido pela Ubisoft – uma empresa do ramo de jogos
eletrônicos –, também recebeu consultoria histórica da entidade Mission du
centenaire, que é responsável por organizar e implementar um programa
nacional francês de comemorações pelo centenário da Grande Guerra (Cf.
Anexo 1). De acordo com Alexandre Lafon, historiador e assessor educacional
da Mission du centenaire, a parceria com a entidade possibilitou que fossem
inseridos em Valiant Hearts cinquenta e cinco cartões enciclopédicos, os quais
são compostos por fotografias captadas durante a Primeira Guerra e por
legendas explicativas (Cf. Anexo 2).

Além da busca pela expertise dos/as historiadores/as da Mission du centenaire,


outro elemento que aponta para a dimensão cognitiva da cultura histórica em
Valiant Hearts são os próprios cartões enciclopédicos produzidos a partir da
parceria com a entidade. Para compreendermos o papel desses cartões no jogo,
contudo, convém recorrermos ao conceito de autenticidade seletiva, proposto
por Andrew J. Salvati e Jonathan M. Bullinger em análise das franquias de jogos
eletrônicos Call of Duty e Medal of Honor. Conforme os autores (2013, p. 154),
a autenticidade seletiva manifesta-se em experiências interativas sobre o
passado e pode ser compreendida como a mistura entre a representação
histórica, as convenções narrativas genéricas – ou seja, as referências
iconográficas de outras obras sobre a mesma temática – e a expectativa da
audiência. Um dos elementos desse realismo histórico pautado por uma
autenticidade seletiva, ainda de acordo com Salvati e Bullinger, é a autoridade
documental. Os autores observam que (2013, p. 160), por meio da apresentação
de mapas, fotografias e documentos, há uma tentativa de emular nos jogos
eletrônicos os suportes tecnológicos do período histórico representado –
objetivando proporcionar imersão ao/à jogador/a. Uma das facetas dessa
autoridade documental, no caso dos jogos analisados por Salvati e Bullinger
(2013, p. 161), é a utilização de citações de conhecidas personalidades como
Napoleão Bonaparte, Winston Churchill e Joseph Stalin para contextualizar a
prática da guerra.

Em Valiant Hearts, um papel semelhante é exercido pelos cartões


enciclopédicos, que surgem em momentos pré-determinados do jogo por meio
de janelas interativas – funcionando à maneira de uma nota de rodapé em
ambiente virtual. Neles, a autoridade documental é exercida tanto pela
apresentação de fotografias captadas ao longo da Primeira Guerra – que
retratam desde combatentes até crianças impactadas pelo conflito – quanto
pelas legendas que fornecem informações complementares ao/à jogador/a.
Nesse processo, a narrativa histórica construída em Valiant Hearts passa a ser 183

auxiliada por uma espécie de noção de verdade, a qual é proporcionada não só


pelas fotografias reais da Grande Guerra – que ainda são apresentadas de forma
colorizada para aproximar o/a jogador/a ao período (Cf. Anexo 3) –, mas também
pelas legendas explicativas que buscam contextualizar e descrever certos
aspectos do passado ali reconstituído.

No que concerne à dimensão política da cultura histórica, Rüsen (2009, p. 172)


aponta que ela pode ser entendida como o processo de legitimação histórica de
certas ordens políticas, a qual impacta a construção dos indivíduos e,
consequentemente, das sociedades, pautando identidades e influenciando a
forma com que se atua politicamente. Tal dimensão política manifesta-se em
Valiant Hearts a partir das camadas discursivas do jogo eletrônico, que
apresentam ênfases e omissões sobre a Primeira Guerra. Cabe destacar que
Valiant Hearts foi lançado no ano de 2014, em ocasião do centenário de eclosão
do conflito, contando ainda em sua produção com a parceria da Mission du
centenaire, uma entidade ligada ao Estado francês e responsável por promover
a rememoração da Primeira Guerra no país. Esses elementos colocam à mesa
a possibilidade de alusão a uma memória pautada pela História oficial, concebida
com a intenção de enaltecer os feitos da França e justificar o seu papel no
conflito. Uma característica que afasta o jogo dessa perspectiva é a presença de
quatro personagens jogáveis de diferentes nacionalidades, a saber: Emile, um
fazendeiro recrutado pelo exército francês; Karl, genro alemão de Emile que é
separado da família por conta de sua nacionalidade; Freddie, um estadunidense
que se voluntariou para atuar na Legião Estrangeira Francesa; e Anna, uma
enfermeira belga. A partir de cada uma dessas personagens ficcionais, Valiant
Hearts realiza um esforço para expor os impactos da guerra na vida de pessoas
em diferentes lados do conflito, afastando-se de uma História oficial francesa –
malgrado a presença de um oficial do exército alemão como antagonista da
trama.

Outros excertos do jogo eletrônico, contudo, apontam para essa perspectiva e


aproximam a sua dimensão política do nacionalismo francês. O historiador
Romain Vincent (Cf. Anexo 4), por exemplo, destaca a cena de abertura de
Valiant Hearts, a qual se inspira na fotografia de um discurso do socialista Jean
Léon Jaurès a fim de retratar o início da mobilização francesa para o conflito.
Ocorre que Jean Jaurès não estava incitando seus ouvintes a pegarem em
armas, mas, sim, se opondo a uma lei que previa três anos de serviço militar (Cf.
Anexo 5).

Figura 1 – Comparativo entre a cena de Valiant Hearts e a fotografia retratando


Jean Jaurès. 184

Fonte: Composição do autor a partir da cena de abertura de Valiant Hearts (à


esquerda) e da fotografia captada por Maurice-Louis Branger em 1913 (à direita).

Conforme Romain Vincent, apesar do nome de Jean Jaurès não ser mencionado
na cena de abertura de Valiant Hearts, a inspiração na fotografia é constatada
por conta da estética: não só a postura de Jean Jaurès e as bandeiras ao fundo
são reproduzidas, como também alguns personagens circundantes são
retratados em posições idênticas e com trajes similares. A cena do jogo, por
outro lado, adiciona a imagem da Torre Eiffel ao fundo – um símbolo nacional
francês –, troca as bandeiras da internacional socialista por bandeiras da França
e insere um cartaz de recrutamento para a guerra na mão de Jean Jaurès, que
originalmente era um militante pacifista. Dessa forma, apesar do esforço em
escapar de uma narrativa pautada pela história oficial francesa – verificável em
elementos como a presença de personagens de diversas nacionalidades –,
Valiant Hearts também expõe ao/à jogador/a uma camada discursava que pende
para a perspectiva nacionalista do conflito.

Já sobre a dimensão estética da cultura histórica, Rüsen (2009, p. 172-173)


afirma que ela está relacionada com o impacto das interpretações históricas nos
sentidos humanos – ou seja, com a eficácia psicológica dessas interpretações.
Tal dimensão da cultura histórica manifesta-se, sobretudo, nas expressões
artísticas, a exemplo da literatura, do cinema, da música, do teatro e de tantas
outras – entre elas os jogos eletrônicos. Em Valiant Hearts, a significação do
passado a partir da dimensão estética pode ser identificada, por exemplo, na
construção e caracterização das personagens e na composição dos cenários –
ou seja, nos elementos visuais do mundo virtual ali construído. Nesse aspecto, 185

convém destacar os traços cartunescos das personagens e cenários, que se


assemelham a uma história em quadrinhos animada. De acordo com Adam
Chapman (2016, p. 48), essa estética – mais leve se comparada a uma
representação realista – é um exemplo dos recursos utilizados pelos/as
desenvolvedores/as para que um jogo eletrônico evite controvérsias ao abordar
tópicos históricos sensíveis. No caso de Valiant Hearts, a Grande Guerra,
mesmo com seus horrores sendo expostos nas fotografias dos cartões
enciclopédicos, é abordada em traços amigáveis que poupam visualmente o/a
jogador/a da carnificina. Como explicado em entrevista por um dos diretores do
jogo, a estética cartunesca foi pensada como “uma forma original de lidar com
um assunto tão difícil e torná-lo acessível àqueles que não estão familiarizados
com a Primeira Guerra Mundial ou que nunca viram nada sobre ela” (Cf. Anexo
6). Convém nos questionarmos, contudo, se o esforço em tornar a estética do
jogo mais leve – além dos traços cartunescos, os olhos das personagens e seus
semblantes estão sempre cobertos pelos cabelos ou por um chapéu, por
exemplo – não seria responsável por esvaziar a carga traumática do evento. Ao
evitar expor o horror da guerra – afastando-se de seu uso para fins de
entretenimento –, também há a possibilidade de incorrer em uma espécie de
embelezamento do conflito, o que prejudicaria o ato reflexivo por parte do/a
jogador e, consequentemente, comprometeria a eficácia psicológica da
dimensão estética da cultura histórica.

Uma possível resposta para essa problemática é fornecida no artigo “El


videojuego histórico como memoria literal y memoria ejemplar”, de autoria de
Alberto Venegas Ramos. O autor (2019, p. 31-33), a partir das discussões de
Tzvetan Todorov, afirma que os jogos eletrônicos com ambientação histórica se
constituem como uma forma de memória que, dependendo de suas intenções,
pode recordar o passado de maneira “literal” – o passado como um fim em si
mesmo – ou “exemplar” – a rememoração a fim de se extrair lições para o tempo
presente e futuro. No que concerne à forma de memória literal, Venegas Ramos
(2019, p. 33-35) utiliza como exemplo o jogo Red Dead Redemption 2, o qual
busca representar o Velho Oeste a partir de uma estética fotorealista embebida
por referências provenientes de outras mídias. O resultado disso, ainda
conforme o autor, é a criação de um “teatro da memória” que reproduz o mito do
Oeste selvagem de forma literal, afastando-se de uma perspectiva reflexiva e
produzindo uma espécie de homenagem a esse passado estereotipado. Já com
relação à forma de memória exemplar, Venegas Ramos (2019, p. 45-46) discute
o caso do jogo eletrônico This War of Mine, o qual é ambientado no Cerco de
Saravejo durante a Guerra da Bósnia e, em detrimento da utilização de
representações populares entre o grande público, busca inspiração em fontes
primárias acerca do conflito. Ainda conforme o autor, diferente do que ocorre em
outros jogos bélicos, This War of Mine enquadra-se na categoria de memória
exemplar por apresentar personagens civis que são afetados pela fome, pelo 186

frio, pela tristeza e pelas doenças, além de estarem sujeitos ao peso de seus
próprios atos durante o conflito – oferecendo, assim, um leque de decisões éticas
ao/à jogador/a.

Vemos, então, que a memória literal e a memória exemplar em um jogo


eletrônico não são constituídas apenas pela dimensão estética da cultura
histórica, mas também por aspectos da dimensão cognitiva e política de maneira
interrelacionada. No caso de Valiant Hearts, Venegas Ramos também tece
algumas considerações sobre a memória para a qual o jogo faz alusão (Cf.
Anexo 7). De acordo com o autor, o jogo aproxima-se de uma memória literal da
Primeira Guerra por conta de seus cartões enciclopédicos, sobretudo no que se
refere às legendas das fotografias – conforme Venegas Ramos, há uma pretensa
literalidade do conflito por meio da apresentação dos textos descritivos. Esses
cartões, como já mencionado, são fruto de uma parceria com a entidade francesa
Mission du centenaire, responsável por organizar e implementar o centenário da
Primeira Guerra na França. Venegas Ramos observa que, apesar de Valiant
Hearts ter sido desenvolvido a partir de uma memória histórica oficial – que se
manifesta na narrativa em cenas como a de abertura, na qual o militante pacifista
é apresentado como um belicista francês –, o passado ainda assim tende a ser
apresentado de forma reflexiva ao/à jogador/a. O autor cita como exemplo a cena
em que os personagens do jogo são introduzidos, a qual rompe com a imagem
estabelecida pelos jogos bélicos hegemônicos ao retratar o cotidiano idílico de
uma família prestes a ser tragada pelo conflito. Dessa forma, ao invés de
apresentar uma Primeira Guerra pautada unicamente pelo espetáculo e pela
literalidade de uma História oficial, Valiant Hearts realiza um esforço para que
o/a jogador/a, no tempo presente, reflita sobre as consequências de um conflito
a partir de uma narrativa marcada pela memória exemplar.

Para encerrar, convém recorrer às proposições de Jacques Le Goff em “História


e Memória” (1996, p. 462-463), no qual o autor explica que o século XIX
testemunhou uma explosão do espírito comemorativo, cujas marcas mais
proeminentes foram a laicização das festas e a instrumentalização da memória
por parte dos estados nacionais. Ainda de acordo com o autor (1988, p. 465-
466), uma das reverberações desse processo foi o fenômeno dos monumentos
aos mortos, sobretudo após a Primeira Guerra Mundial – o chamado “Túmulo ao
Soldado Desconhecido” –, no qual se realiza um esforço de coesão nacional ao
redor dos cadáveres sem nome. Em Valiant Hearts, mesmo com sua narrativa
inserindo-se numa memória delineada pelo programa nacional francês de
comemorações em prol centenário do conflito – característica que, vale frisar, é
manifestada em certos trechos do jogo –, parece haver um esforço para substituir
o tom comemorativo do centenário por um ato rememorativo. Conforme Jeanne
Marie Gagnebin (2014, p. 232), enquanto a comemoração é ligada a uma 187
memória oficial promovida pelo Estado, a rememoração afasta-se de um furor
triunfalista e tende à necessidade do “não esquecer” – o passado, então, é
rememorado a fim de promover a elaboração das identidades dos sujeitos no
tempo presente. Tal perspectiva, que entra em diálogo com a noção de memória
exemplar apresentada por Venegas Ramos, parece explicar a forma com que as
dimensões da cultura histórica são mobilizadas por Valiant Hearts. Apesar do
tom comemorativo surgir em certos aspectos e excertos do jogo, o ato
rememorativo, o qual é pautado em uma reflexão acerca do passado com vias a
empreender uma transformação no tempo presente, também se manifesta como
uma das premissas da narrativa ali construída. Tal como um túmulo ao soldado
desconhecido, Valiant Hearts procura em diversos momentos rememorar o
conflito a partir de suas vítimas – as quais são representadas pelas personagens
e buscam simbolizar todos/as aqueles e aquelas que foram tragados pelo
conflito. Contudo, diferentemente do “túmulo ao soldado desconhecido”, a
memória para a qual se faz alusão nessa camada discursiva de Valiant Hearts
não é pautada por uma ideia de coesão nacional, mas, sim, pela noção da
própria guerra como o inimigo a ser combatido.

Referências biográficas
Irineu João Luiz e Silveira Junior é bacharel em História pela Universidade do
Estado de Santa Catarina (UDESC). Atualmente, cursa mestrado acadêmico no
Programa de Pós-Graduação em História do Tempo Presente (PPGH-UDESC).
É bolsista CAPES. Endereço do currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/9224989324319610/.

Referências bibliográficas
CHAPMAN, Adam. Digital games as history: how videogames represent the
past and offer access to historical practice. Nova York: Routledge, 2016.

GAGNEBIN, Jeanne Marie. O trabalho de rememoração de Penélope. In:


Limiar, Aura e Rememoração: ensaios sobre Walter Benjamin. São Paulo: Ed.
34, 2014, p. 217-249.

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história. Revista História da Historiografia, n. 2, 2009, p. 163-209. Disponível
em: https://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/12. Acesso
em: 24 dez. 2020.

188

RÜSEN, Jörn. O que é a Cultura Histórica? Reflexões sobre uma nova maneira
de abordar a História. In: SCHMIDT, Maria Auxiliadora; MARTINS, Estevão de
Rezende (Orgs.). Jörn Rüsen: Contribuições para uma Teoria da Didática da
História. Curitiba: W & A Editores, 2016, p. 54-81.

SALVATI, Andrew J. BULLINGER, Jonathan M. Selective Authenticity and the


Playable Past. In: KAPPEL, Matthew Wilhelm; ELLIOTT, Andrew B. R. (Orgs.).
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e História: monumentos digitais. In: ALVES, Lynn Rosalina Gama; TELLES,
Helyom Viana; MATTA, Alfredo (Orgs.). Museus Virtuais e Jogos Digitais:
Novas linguagens para o estudo da história. Salvador: EDUFBA - Editora da
Universidade Federal da Bahia, 2019, p. 15-37.

VALIANT Hearts - The Great War [jogo eletrônico]. Direção: Yoan Fanise; Paul
Tumelaire. Montpellier: Ubisoft, 2014.

VENEGAS RAMOS, Alberto. El videojuego histórico como memoria literal y


memoria ejemplar. Historiografías, n. 18, 2019, p. 30-54. Disponível em:
https://papiro.unizar.es/ojs/index.php/historiografias/article/view/4177. Acesso
em: 26 dez. 2020.

Anexos
[1] A parceria entre Valiant Hearts e a Mission du centenaire pode ser
verificada na página 109 do documento Le programme du Centenaire – volume
1, disponível no website da entidade. Para ver mais: MISSION DU
CENTENAIRE. Le programme du Centenaire – volume 1. Mission du
centenaire. Disponível em:
https://www.centenaire.org/sites/default/files/references-
files/centenaire_bible_web_double_0.pdf. Acesso em: 17 nov. 2020.
[2] As observações de Alexandre Lafon estão disponíveis no seguinte
endereço: SOLDATS inconnus, un jeu pour connaître la Grande Guerre. France
Info, 24 jun. 2014. Disponível em: https://www.francetvinfo.fr/societe/soldats-
inconnus-un-jeu-pour-connaitre-la-grande-guerre_1691677.html. Acesso em:
21 dez. 2020. 189

[3] As referidas fotografias colorizadas foram fornecidas pela equipe do


documentário Apocalypse, la Première Guerre mondiale. Para ver mais:
MISSION DU CENTENAIRE. Autour du jeu vidéo "Soldats inconnus": le carnet
de développeurs "Histoire". Mission du centenaire. Disponível em:
https://www.centenaire.org/fr/autour-de-la-grande-guerre/jeu-
video/reportage/autour-du-jeu-video-soldats-inconnus-le-carnet-de-1. Acesso
em: 17 nov. 2020.

[4] As observações de Romain Vincent estão disponíveis no seguinte endereço:


JVH - JEUX VIDÉO ET HISTOIRE. JVH#4 - La Première Guerre Mondiale.
2014. (20m23s). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=AxEBDG3HkKk/. Acesso em: 22 fev. 2021.

[5] As informações sobre a participação de Jean Jaurès na manifestação contra


a loi des Trois ans estão disponíveis no website da Assembleia Nacional
Francesa. Cf. FRANCE. Lois des trois ans, [20--?]. Assemblée Nationale.
Disponível em: http://www.assemblee-nationale.fr/histoire/guerre_14-
18/loi_3_ans/index.asp. Acesso em: 23 dez. 2020.

[6] Tradução nossa. No original: “Nous pensions que c'était un moyen original
de traiter un sujet aussi difficile, et de le rendre accessible à ceux qui ne
connaissent pas bien la Première Guerre mondiale ou qui n'ont jamais rien vu
dessus”. Para ver mais: MISSION DU CENTENAIRE. Autour du jeu vidéo
"Soldats inconnus": le carnet de développeurs "Art et émotion". Mission du
centenaire. Disponível em: https://www.centenaire.org/fr/autour-de-la-grande-
guerre/jeu-video/reportage/autour-du-jeu-video-soldats-inconnus-le-carnet-de.
Acesso em: 23 dez. 2020.

[7] O artigo completo de Alberto Venegas Ramos está disponível no seguinte


endereço: VENEGAS RAMOS, Alberto. El videojuego histórico como forma de
memoria. Presura, 2019. Disponível em:
http://www.presura.es/blog/2019/09/22/videojuego-historico-como-forma-de-
memoria.
HISTÓRIA, CINEMA E EDUCAÇÃO: UMA
ANÁLISE DAS PRÁTICAS DE REPRESSÃO
DO REGIME MILITAR NO BRASIL ÁTRAVES
190
DO FILME “QUE BOM TE VER VIVA” (1989)
Jacqueline Ferreira Dias e Janaina Mendes da
Silva

Introdução
Ao longo do século XX, a relação entre cinema e História ganha cada vez mais
espaço na pesquisa histórica e em consequência o cinema adentrou as aulas de
história. Na medida em que, é utilizado como fonte histórica ao expressar através
das imagens em movimento a representação da realidade de uma determinada
época. Como afirma Nóvoa (2013): “A história enquanto processo produziu o
cinema que reproduz o processo real (ainda que às vezes surrealisticamente).
Esta memória passa a ser fonte de conhecimento sobre a vida, um manancial
inesgotável para o estudo de inúmeros aspectos do processo histórico de há um
século”. (NÓVOA, 2013, p 01)

Sendo assim, o filme de ficção são documentos importantes para a história e


consequentemente, são estudados por muitos historiadores. Dentre vários
assuntos tratados na indústria cinematográfica, recorremos ao período ditatorial
do Brasil, ocorrido entre os anos de 1964-1985, período marcado pelo regime
político que prezava por “discursos de valores democráticos e liberais, a defesa
da autoridade e da pátria “una e indivisa” e a exaltação da família e da ordem
social tradicional.” (INOCENCIO, 2017, p 05).

Retratado nos livros de História, o período ditatorial adotava uma postura de


repressão, usando a violência para resolver os embates e oposição ao governo.
A prática repressiva teve um dos seus auges em 1968 com a instauração do AI-
5, na qual houve censura da impressa, da própria indústria cinematográfica,
musical e de movimentos sociais. A lógica do regime militar era impedir qualquer
movimentação que fossem contrários a sua ideologia pautada na ideia de ordem
e bons costumes. Estes agentes reprimiam quaisquer representações
ideológicas, políticas ou estéticas elaboradas por tropicalistas de vanguarda,
comunistas atrelados ao cenário nacional-popular e revolucionários ligados a
luta armada, isso através de torturas físicas, psicológicas, morais e até a morte.

A indústria do cinema dos anos posteriores ao período militar se ateve a


representar nos filmes e documentários inúmeros pontos de vista face as
mudanças na sociedade ocorridas naquele período. Tendo como principais
temáticas a violência contra a mulher que sofriam com danos físicos,
psicológicos e de gênero. Essas produções produzem conteúdos baseados nas
memórias das pessoas que sofreram direta ou indiretamente as repressões,
criando material de análise historiográfica.

O documentário de 1989, Que bom te ver de viva, é um desses filmes, sendo


dirigido pela jornalista e cineasta Lucia Maria Murat de Vasconcelos (ex- 191
integrante da luta armada contra a ditadura militar no Brasil, sendo presa e
torturada em função disto), sua obra apresenta uma relação entre a ficção e
realidade ao trazer sob a ótica da personagem fictícia e depoimentos de oito
mulheres esse período ditatorial no Brasil.

Com isso, teceremos uma análise de como o documentário pode ser trabalhado
em sala de aula a partir dos testemunhos dessas mulheres. E mostrar que, com
problematização, podendo-se refletir o período do regime militar no Brasil e as
práticas de repressão considerando a temporalidade de 1964 até a estreia do
filme em 1989. Desse modo, estabelecemos a relação entre cinema e história a
fim de mostrar que, essa junção é uma ferramenta poderosa para o ensino de
História.

O cinema como fonte histórica: A importância da memoria para a


Educação
As transformações no Brasil causada pelo regime ditatorial (1964-1985) não se
reduziram apenas o âmbito político e econômico, mas social e cultural,
interferindo de forma direta e indireta na vida das pessoas e principalmente nas
que participavam ativamente nas questões políticas. A repressão aos
movimentos de oposição corroboraram em uma série de violações dos direitos
humanos com crimes como: homicídios, sequestros, torturas e ainda
desaparecimentos de pessoas.

Que bom te ver de viva trata justamente das modificações sociais causadas na
vida das mulheres do período. A única personagem fictícia, ou seja, criada pela
roteiro é interpretada por Irene Ravache que está incumbida de apresentar as
mulheres não fictícias e levantar indagações voltadas diretamente para o
telespectador sobre a temática. E sob esse enredo o documentário /filme traz o
depoimento das mulheres torturadas durante o regime militar e mostra como elas
lidam com os traumas pós-ditatura.

Desse modo, utiliza da memória dessas mulheres para construir a discussão em


torno da violência sofrida e externalizar acontecimentos do período. Com isso,
utilizaremos do conceito de memória para captamos os depoimentos com intuito
de estabelecer um paralelo entre os relatos e a historiografia. Nesse sentindo,
Le Goff, nos explica que:

“A memória, como propriedade de conservar certas informações, remete-nos em


primeiro lugar a um conjunto de funções psíquicas, graças as quais o homem
pode atualizar impressões ou informações passadas, ou que ele representa
como passadas” ( LE GOFF, 1990, p.423)
Partindo dessa definição, os depoimentos são o resgate das impressões e
informações de determinado período ou assunto, no qual o historiador pode
problematizar essas informações, extraindo temáticas relevantes a serem
estudados. Neste caso, assuntos como : governo ditatorial , mulheres na política
e práticas de repressão, bem como os tipos de violência sofridos e as estratégias 192
adotadas pelo regime para repressão. São assuntos que o filme /documentário
trata e podem receber um olhar historiográfico. Contudo , buscamos evidenciar
a participação feminina na política brasileira na sala de aula, temática muita
vezes esquecida nos livros de história.

O documentário nos apresentada oito depoentes: Maria do Carmo Brito


educadora, na época participante da organização Guerrilheira VPR, foi presa e
torturada em 1970; Maria Luiza G. Rosa Médica sanitária, na época era militante
ligada ao movimento estudantil, foi quatro vezes presa e torturada em 1970;
Rosalinda Santa Cruz professora universitária, no período militante de esquerda
que foi presa e torturada duas vezes e teve o irmão desaparecido; Crimeia de
Almeida, educadora, foi membra da organização da guerrilha MR-8, presa e
torturada em 1970; Jessie Jane, Historiadora , foi presa durante o sequestro de
um avião em 1970 ficando nove anos presa; Estrela A. Bahadana, filosófa,
militante da organização clandestina POC, foi presa e torturada em 1969 no Rio
de Janeiro, e em São Paulo em 197; e temos a depoente anônima que participou
da guerrilha por quatro anos na clandestinidade, ficando presa por quatro anos.

As oito tiveram partição ativa na política brasileira nos anos de 1964 á 1985, ao
ocuparem espaços não “destinados” a elas, participando de grupos sindicais,
estudantis e de guerrilhas, ou seja, na vida pública. Segundo Silva e Souza:

“Sabemos que, em sociedades patriarcais como a nossa, o lugar das mulheres


ao longo dos séculos, oficialmente, tem sido o espaço privado – o espaço
doméstico da casa, da cozinha, do quarto etc. Espaço marcado pela
invisibilidade e pelo silêncio.” (ROSA, 2013, p. 45) Espaço que foi extrapolado
por mulheres que não aceitaram essa delimitação, que a elas foi imposta, de
onde poderiam atuar; e que não compactuaram com o Regime Militar” (SILVA e
SOUZA, 2017, p 03)

Desse modo, as mulheres estavam presentes e ocupando espaços que não


eram vistos como de mulher, o que aumentava a repressão contra elas, taxando-
as de “criminosa” , e inferiorizando sua condição de “mulher”. No filme, as
depoentes relatam suas vivencias de oposição ao governo sendo que por muito
tempo tentaram silencia-las e não só na época, mas até os dias atuais.

Podemos notar nos livros didáticos, o esquecimento da participação feminina na


luta contra o poder ditatorial, e é isso que á diretora do filme busca refutar, a
noção das pessoas de negar ou fingir que não existiu opressões e torturas no
Brasil contra a mulher. E reforça a narrativa ao mostrar imagens de jornais com
noticiais sobre as repressões, pessoas assassinadas e desaparecidas.
O cinema como fonte histórica apresenta ao professor uma multiplicidade de
ferramentas para usar em sala de aula. Essa fonte já apresenta um ponto
positivo de modo que o aluno já esta familiarizado com o formato adotado, o que
faz com que as aulas consigam sair da rotina dita como monótona -com apenas
a utilização dos livros como fonte e traga um novo e enriquecedor método de 193
ensino.

Uma das principais dificuldades dos professores de história atualmente é a busca


de atenção e participação dos alunos, ou seja, trazer algo que seja inovador para
a sala de aula. O filme acaba sendo uma das ferramentas que os professores
utilizam nos dias atuais e que proporciona isso.
Sobre isso Beli diz:

“O que favorece o uso do cinema em sala de aula é familiaridade do aluno com


a televisão. A maior materialidade do cinema possibilita ao aluno uma
compreensão de conceitos, hábitos costumes e fatos históricos e culturalmente
distantes no espaço e no tempo, rompendo com a dificuldade de abstração”
(BELI, 2016, p.5)

Os educadores ao adotarem o cinema como fonte histórica para a sala de aula


além do dinamismo e da quebra de ideia de que a história é algo apenas escrito,
possibilita fazer com que o aluno se questione a respeito do que esta sendo
mostrado, bem como refletir e problematizar a época e conteúdo que é mostrado
por documentários e outras obras audiovisuais.

Por isso é necessário que ao utilizar o cinema como fonte histórica o professor
tenha conhecimento de que não é apenas utilizar despretensiosamente o filme
ou documentário. É necessário que haja uma problematização, a busca de
conhecimento e um objetivo para tal.

“Na questão metodológica, o uso do cinema na sala de aula, deve considerar


potencialidade como documento histórico, passível de contextualização,
problematização, indagação, ressignificação. Trata-se de mostrar as diferenças
entre a abordagem do filme e a pesquisa histórica, apontando possíveis
incompatibilidades“.(BELI, N.B, 2016, P-5)

É necessário que se explique ao aluno que dentro de uma produção


historiográfica seja audiovisual, escrita ou outra fonte, há sempre uma visão ou
discurso, pois nenhum tipo de narrativa é imparcial, havendo problemáticas
construídas dentro das narrativas que não foram criadas por acaso. Assim, o
cinema dentro da sala abre um leque de possibilidades metodológicas para os
professores, exemplificado com o documentário Que bom te ver viva (1989) que
abre espaço para o debate e pesquisa sobre a ditadura, sendo uma fonte
riquíssima para ser trabalhada em sala de aula se problematizada além de uma
visão não convencional sobre o período.
Eu falo, logo existo: Vozes do passado e seus testemunhos no ensino de
História
As mulheres por muito tempo foram silenciadas da história mundial. No entanto,
após o advento do movimento feministas nos anos 60 e 70, essa história foi
“redescoberta “ em pesquisas, conferências, congressos e no cinema. No Brasil 194
ditatorial de 1964-1985, as mulheres lutaram na linha de frente contra o governo,
tendo presença ativa na política brasileira e principalmente nos movimentos de
oposição ao governo ditatorial, motivo pelo qual foram presas e torturadas.

Nesse período as mulheres sofreram violências devido as desigualdades de


gênero. Na qual tinham um tratamento “diferenciado” nesse processo. No
decorrer dos testemunhos no documentário Que bom te ver viva, nome que nos
sugere o privilégio de ser sobrevivente, mesmo opositora ao governo na época.
Desse modo as mulheres estavam sendo submetidas além da violência física á
violência psicológica, sexual e de gênero. No depoimento de Regina Toscano,
ex-combatente do movimento da guerrilha, ao falar sobre o momento de sua
prisão:

”Eu fui presa no dia 6 de março, né de 1970 acabando de fazer uma panfletagem
numa fábrica ali no jacarezinho, e houve uma perseguição, né, nós éramos 7
pessoas em dois carros diferentes, né, e houve uma perseguição de várias
viaturas né da polícia inclusive na nossa fuga a gente subiu pra uma pedreira e
o próprio corpo de bombeiros ajudou a polícia a nos tirar lá né. A violência
começou desde dessa pedreira, né onde eu fui despida e procuraram até dentro
da minha ( pausa )xoxota, mesmo para ver se tinha alguma arma coisa que eles
sabiam que não teria mesmo, acho que era uma coisa mais pra me degradar, ne
e a partir dali fui pro DOI CODI ne, ( suspiro longo).”(QUE BOM TE VER VIVA
,1989, trecho: 37;14 38:10)

Analisando a experiência de Regina Toscano, podemos atentar para temática


da: violência com corpo feminino, que era tido como objeto de tortura de
satisfação dos torturadores. Pois, os casos de estupro e violações sexuais eram
bastante comuns ao tratar de torturas de presas políticas. Uma vez que, os
soldados estavam numa posição de superioridade, por serem do exército e
homens, enquanto as mulheres eram acusadas como criminosas.

A violência era assegurado pela lei, sendo esta o AI-5 que foi “editado em 13 de
dezembro de 1968, reeditou os princípios do AI-1, suspendeu o princípio do
habeas corpus e instituiu, de forma clara e objetiva, a tortura e a violência física
contra os opositores do regime.”(PIOR, 2012, p. 201), sendo assim os atos
institucionais do poder militar dava proteção aos atos de repressão contra os
opositores. Com isso, foi criado vários órgãos de repressão o SNI, os DOI-CODI,
o CIEX, o CENIMAR, a CISA, além do fortalecimento dos DOPS em todos os
Estados, sendo o DOI-CODI o mais citado nos depoimentos, como no caso da
Regina Toscano.
Vale salientar que o fato dos agentes do governo praticarem qualquer tipo de
violência contra elas, não representava crime para época, uma vez que, estavam
acobertados pela lei. Sobre a violência contra a mulher Zacchi diz:

“Essas violências eram constituídas, portanto, de práticas perversas: golpes nos


seios e úteros; introdução de objetos nos corpos, aparelhos de choque e animais 195
nos corpos e órgãos sexuais das vítimas; sexo oral sem consentimento;
humilhação moral xingamentos de caráter sexual, exposição dos corpos nus;
assédio sexual, privação de produtos básicos de higiene pessoal, entre
outros”(ZACHI, 2014, p. 419)

Além da violência com o corpo feminino, a tortura psicológica era um trunfo dos
torturadores. No depoimento de Criméia de Almeida ela diz que: “era mostrado
as imagens decapitadas dos guerrilheiros”, que os aterrorizava em busca de
informações. Apresentamos o depoimento de Maria Luiza, narrando
detalhadamente sobre a violência psicológica:

(...)É muita tortura psicológica, né, de interrogatórios, de não poder sentar, de


não poder beber(respiro)... beber água por exemplo, do jogo com .... com os
amigos que iam chegando, né, de você vê as pessoas torturadas é... jogo com
tua moral mesmo, de entrevistas muitos longas. Os caras iam alternando né...o
torturador que é o torturador explicito, com o torturador que é bonzinho que vai
conversar com você que vai te ajudar (...)” (QUE BOM TE VER VIVA, 1985,
trechos:46:20-47:21)

Essas mulheres no regime militar eram vistas não só como criminosas, mas
como mulheres que transgrediram:

“Elizabeth Ferreira salienta que as mulheres não eram acusadas somente por
serem terroristas, mas acusadas duplamente por serem “terroristas” e
“mulheres”: uma combinação infame para a repressão. (ROSA, 2013, p. 59,
Apud SILVA e SOUZA, p 03)

Desse modo, as mães, filhas, irmãs e esposas eram vistas como mulheres que
largaram seu estado “natural” de passiva cuidadora do lar, para se envolverem
com política. Vemos portanto, que a produção audiovisual quer evidenciar, neste
caso, a posição da mulher na sociedade como militante, politizada e também
vítima das torturas, machismo etc.

A exibição desse documentário aos alunos pode salientar o que muitas vezes é
esquecido pela própria sociedade, que á história é feita também por gente
comum, e que todos nós somos agentes históricos, construindo a narrativa da
nossa sociedade.

Através da parceria do cinema e da história retornarmos a memórias esquecida


por muitos, mas lembradas por essas mulheres. Com isso, propomos que
saibamos e analisemos as transformações não só políticas, mas culturais,
econômicas e principalmente as transformações sociais do Brasil.

Dentro de sala de aula o professor pode utilizar dessas informações para


construir uma aula mais dinâmica, na qual ao usar esse documentário pode tratar
sobre a violência política, como estava a política no Brasil no período. Bem como, 196
o fato das mulheres estarem envolvidas politicamente.

Tais assuntos podem ser explorados para o ensino de História, com auxílio do
livro didático. As possibilidades de atividades usando este documentário são
inúmeras. Neste sentido, ressaltamos como o uso de temáticas/atividades que
podem ser abordadas levam o aluno a identificar pontos importantes no
documentário tendo em vista que essas mulheres citam aspectos cruciais da
estrutura do regime no Brasil, tais como; presença feminina em manifestações
e movimentos sociais; como a sociedade enxergavam as mulheres que
participavam de manifestações; órgãos do governo que zelavam pela
manutenção do poder, violência como doutrina de manutenção do poder e
também pode-se analisar o porquê da exclusão da participação das mulheres
nos livros didáticos através de seminários ou redações sobre essas temáticas .

Esses trabalhos além de fomentar nos alunos a pesquisa histórica poderia abrir
novos questionamentos e pontos de vistas, fazendo com que os alunos possam
fazer reflexões pertinentes e problematizar esses temas, valorizando ainda mais
a dignidade humana, durante muito tempo, violentada pela ditadura militar.

Conclusão
A trama Que bom te ver Viva contribuiu nesta pesquisa ao apresentar um novo
olhar para a temática e para análise da mesma na sala de aula. Pois através do
uso da arte cinematográfica podemos, interagimos melhor com o aluno e
ampliamos as ferramentas educacionais.

Nesta discussão, apresentamos uma nova forma de tratar á ditadura militar na


sala de aula. Evidenciando a participação das mulheres na política brasileira e
como o governo agia na representação dos opositores. Além de desmitificar o
ideal pregado na época de que a mulher estava designada aos afazeres
domésticos e alheia as questões políticas. Com isso, essas guerrilheiras,
estudantes e ativistas representam a parcela de mulheres engajadas
politicamente, mas que foram torturadas e presas face disto.

As contribuições que as produções audiovisuais trazem para a história e


educação são inegáveis ao propor uma ligação com os fatos ocorridos durante
o período da ditadura militar no Brasil, valorizando ainda mais os testemunhos
femininos. O diálogo estabelecido entre cinema e História leva-nos, portanto, a
teorizar e praticar esta metodológica de análise na sala de aula. Com isso, as
contribuições da produção audiovisual para a história são notórias ao
estabelecemos uma ligação entre os depoimentos e a historiografia da época.
Referências das autoras
Jacqueline Ferreira Dias é graduada de Licenciatura em História na Universidade
de Pernambuco –UPE (Campus Petrolina).

Janaina Mendes da Silva é graduada de Licenciatura em História na


Universidade de Pernambuco- UPE ( Campus Petrolina). 197

Fonte
QUE bom te ver viva. Direção: Lucia Murad. Rio de Janeiro. Produção: Taiga
produções visuais Ltda, e FCB-fundação de cinema Brasileiro. 1989. 1 vídeo.
Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=zqpybT37k9A> , Acesso
em: 03 de Abril de 2021.

Bibliografia
BELI, N.B. os desafios da escola pública paranormal na perspectiva do
professor PDE.:2016. p. 31.

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brasileira. Universidade Federal de Juiz de Fora. Juiz de Fora, 2017. P 13.

LE GOFF, J. História e memória. Trad. Bernardo Leitão et al. Campinas,


Editora UNICAMP, 1990.

NÓVOA, J. Apologia da relação cinema-história. Olho da História No. 1. 2013 ,


p 09

PRIORI, A., A Ditadura Militar e a violência contra os movimentos sociais,


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[online]. Maringá: Eduem, 2012. Available from SciELO Books
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da ditadura civil-militar no Brasil e a sua ausência no livro didático na
contemporaneidade. 2017, p 11. Disponível em:
http://uece.br/eventos/gthpanpuh/anais/trabalhos_completos/. Acesso em: 16
de Abril de 2020.
HISTÓRIA DA INDUMENTÁRIA E TEORIA DE
MODA: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA DE
DEBATE E DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA
198
ONLINE DURANTE A PANDEMIA, E OUTRAS
CONSIDERAÇÕES
Jaqueline da Silva de Oliveira e Natália de
Noronha Santucci

O presente texto reúne os princípios norteadores do Costura & Texto, um espaço


virtual de aprimoramento acadêmico relacionado à História da Indumentária e à
Teoria de Moda. O projeto tem como condição de existência a intersecção entre
pesquisa histórica, domínio técnico de recursos digitais e desafios impostos pelo
momento. Elaboramos um balanço de nossa experiência com divulgação
científica e com atividades abertas ao público nos primeiros sete meses desde a
inauguração da iniciativa.

Contexto
Embora seja um meio já estabelecido, presente direta ou indiretamente no
cotidiano de pessoas de diferentes estratos, e em diferentes esferas da vida
social contemporânea, a internet, assim como os recursos digitais, ainda causam
controvérsias entre historiadores e educadores em geral.

Contudo, com sucessivas e diversas medidas sanitárias adotadas por um


número considerável de países, a partir do primeiro trimestre de 2020, a
transição de inúmeras atividades para o ambiente virtual foi acelerada, inclusive
entre grupos que anteriormente esboçavam resistência a este universo. A atual
coexistência entre analógico e digital, entretanto, não se tornou completamente
pacífica e colaborativa diante da situação emergencial.

No que concerne à História, a ampliação da demanda popular é também notada


há anos, por meio do aumento de produções audiovisuais, literatura e de páginas
na internet com fundo histórico. A dinamização das comunicações ainda foi
acompanhada pelo surgimento de “diversos espaços de formação de opinião
fora das universidades, novos lugares de exercício da profissão [de historiador]”
(MALERBA, 2014).

Dentro da chamada “economia da atenção”, a atenção dos indivíduos é vista


como um recurso escasso, constantemente em disputa por demandas dentro e 199

fora da internet (ZAGO; SILVA, 2014). Tal competição aparenta ter sido
acentuada diante da imperativa digitalização de espaços acadêmicos e do
confinamento doméstico causados pela pandemia de Covid-19.

Assim, presenciamos o surgimento ou aprimoramento de espaços virtuais


dedicados ao ensino e à divulgação histórica, e os limites entre a produção
acadêmica, leiga e ficcional se tornarem bastante turvos.

Experiências anteriores e o Costura & Texto


Em meio a um cenário de incerteza, agravado pelo fato de sermos ambas
imigrantes ainda não totalmente integradas em seus novos países, em abril de
2020 buscamos refúgio na leitura e discussão de um tema compartilhado, tanto
profissionalmente quanto por gosto pessoal: a Moda.

Enquanto refletíamos sobre os textos de História e Teoria de Moda lidos, era


inevitável fazermos conexões com a difusão contemporânea, nem sempre da
maneira mais adequada, de informações em geral e particularmente quanto aos
aspectos culturais do vestuário. Aos poucos, percebemos que nossas
discussões, realizadas entre Vilnius, na Lituânia, e Berlim, na Alemanha, por
meio de chamadas de vídeo e mensagens de texto, poderiam interessar a mais
pessoas, então começamos a nos organizar para compartilhá-las.

Havia implicações como a ausência de uma base prévia e a acirrada


concorrência pela atenção de leitores, a falta de subsídios de qualquer espécie
ou vínculos institucionais. Por outro lado, os resultados positivos obtidos em
outras circunstâncias, quando assumimos a divulgação via redes sociais de
publicações e atividades acadêmicas do Programa de Pós-Graduação em
História da PUCRS, entre 2014 e 2017, nos indicava que o teste era válido, e
que poderia trazer benefícios para pessoas que, de outra forma, não teriam
acesso ao conteúdo e às discussões da natureza das que desejávamos propor.

Para muitos professores a falta de domínio técnico e estratégico de mídias


sociais, assim como de conhecimento em design, são fatores determinantes
para recuar diante da produção de conteúdo para a internet. Nesse ponto, nosso
conhecimento prévio nos possibilitou inaugurar despretensiosamente o perfil de
nosso projeto no Instagram, em outubro de 2020. Dessa forma, experimentamos
nossa hipótese de que haveria interesse público no aprofundamento do tema.
Com a reação positiva de nossos primeiros leitores, tivemos a confirmação
necessária e planejamos as ações seguintes.
Cabe destacar que, desde o início, aderimos à proposta do chamado “slow
content”, que define uma série de princípios para a produção de um “conteúdo
lento”, em ritmo mais humanizado e com propósitos distintos dos das grandes
empresas que controlam a distribuição de informações nas comunidades digitais 200
(SLOWCONTENT, s.d.).

Ainda como forma de resistência a nos tornarmos força de trabalho não-


remunerada para os conglomerados de mídia, em dezembro de 2020
inauguramos nosso próprio site, por meio do qual passamos a oferecer serviços
de suporte a estudantes e pesquisadores, como forma de atuação profissional e
manutenção do projeto no ar, preservando os objetivos de divulgação científica
e de aprimoramento acadêmico.

Fontes virtuais, História Pública e História da Moda


Os primeiros recursos de comunicação eletrônica, que seriam os primórdios da
internet, já estavam sendo utilizados em universidades no final da década de
1960, segundo Briggs e Burke (2006). Nos anos 1990, existiriam ainda “muito
mais sinais de euforia do que de alarme” quanto à conversão da rede em um
meio de comunicação em massa (BRIGGS; BURKE, 2006, p.302). O debate
sobre os usos da internet se ampliou em muitas direções desde então, e algumas
delas são bastante relevantes para nosso recorte de ensino e pesquisa.

Em 2006, José D’Assunção Barros já previa que, em breve, os historiadores


estudariam o “espaço virtual”, “produzido através da comunicação virtual ou da
tecnologia artificial” e que conheceríamos

[...] uma modalidade de História Virtual na qual poderão ser examinadas as


relações que se estabelecem nos espaços sociais artificialmente criados nos
chats da Internet, na espacialidade imaginária das webpages ou das simulações
informáticas, ou mesmo no espaço de comunicação quase instantânea dos
correios eletrônicos – estas futuras fontes históricas com as quais também terão
de lidar os historiadores do futuro (BARROS, 2006, p.462).

Alguns anos depois, as fontes digitais estariam em observação, como a realizada


por Fábio Chang de Almeida (2011), que enquadra nessa categoria documentos
digitalizados, tais como livros, revistas, jornais e documentos oficiais, ou ainda
documentos produzidos diretamente em formato digital, como o conteúdo de
sites, blogs e redes sociais.

O autor analisa a relação do historiador do Tempo Presente com as fontes


digitais “primárias”. Em uma outra perspectiva, notamos uma aproximação da 201

questão das fontes digitais com algumas discussões de História Pública e até
mesmo de notícias falsas.

De acordo com Bruno Leal, as notícias falsas “apresentam-se como notícias


propriamente ditas, alertas salvadores e até mesmo como história” (LEAL, 2020).
Além disso, percebemos que algumas vezes quem não é familiar aos rigores e
métodos da pesquisa histórica pode emitir opiniões que induzem o público a
acreditar que a escrita da História é mero charlatanismo narrativo.

Por outro lado, conforme apontado por Malerba (2014), há conteúdos de história
formulados por pessoas sem comprometimento ético ou científico, muitas vezes
sem treinamento profissional adequado para lidar com questões do passado,
resultando num empobrecimento crítico e analítico dos temas. Algumas
estratégias comerciais adotadas por autores que se colocam como “diferentes e
superiores” aos historiadores profissionais são, na verdade, muito mais
perigosas do que isso, pois abrem caminho para farsas e revisionismo histórico.

As falsificações são particularmente alarmantes quanto mais se aproximam da


promoção do negacionismo de eventos com um violento impacto coletivo, como
guerras, ditaduras e pandemias. Entretanto, farsas e negligência em estudos
culturais, como os de História da Moda e da Indumentária, podem reforçar
estereótipos, preconceitos e equívocos proporcionalmente perniciosos.

Abordada sob uma perspectiva moralizante ou meramente estética por muito


tempo, na virada do século XIX para o XX a Moda começou a aparecer como
objeto nas reflexões de diversos intelectuais, como Georg Simmel, Thorstein
Veblen, Gabriel Tarde, Walter Benjamin, seguidos durante o século XX por
Fernand Braudel, Roland Barthes, Pierre Bourdieu, Gilles Lipovetsky e inúmeros
outros (HELLMANN, 2009). Desde a segunda metade do século, intelectuais
brasileiros também passaram a abordá-la, começando por Gilda de Mello e
Souza, passando por Gilberto Freyre e chegando às centenas de pesquisadores
que atualmente circulam por eventos como o Colóquio de Moda, que em 2021
chega a sua 16ª edição.

Contudo, não só o tratamento científico tem sido dado à Moda, à Indumentária e


sua história no século XXI. Com a emergência de blogs e redes sociais nos quais
qualquer pessoa com acesso à internet pode exteriorizar o que tiver vontade, é
possível localizar incontáveis publicações sobre o tema – o que em si não se
configura como um problema, mas como tudo que ganha demasiada
popularidade, há interpretações enviesadas, informações equivocadas e até
uma estranha tolerância acadêmica à citação de material virtual de forma
inadequada – não em relação à formatação, mas sim quanto ao tratamento dado
às informações localizadas em meios digitais.
202
O uso inadequado de fontes digitais em pesquisas relacionadas à História da
Moda e da Indumentária é uma de nossas preocupações mais constantes, uma
vez que amadores entusiasmados não raramente são alçados ao título de
“especialistas”, quando muitas vezes seu ponto forte é a avaliação do aspecto
mais público da História da Indumentária: os figurinos de época.

Um ponto importante a ser destacado é que figurinos de época não são trajes
históricos. Embora possa soar óbvio para alguns, há evidências de que nem
sempre a barreira entre ficção e realidade é nitidamente percebida por todos.
Recentemente, a Netflix foi questionada sobre a necessidade de informar que a
série “The Crown” é uma obra de ficção, ainda que baseada na família real
britânica (AVENDAÑO, 2020).

Trajes cênicos são pensados para cumprir uma função estética e narrativa, para
ambientar os personagens em um espaço e um período, e nos mostrar um pouco
da personalidade daquela figura. Por mais fiel a uma época que um figurino seja,
ele sempre vai contar com características contemporâneas, seja em suas cores,
formas, materiais, técnicas de confecção, compreensão histórica dos produtores,
e assim por diante.

Destacamos ainda que existem diferentes definições de História Pública, sendo


uma delas referente ao local de atuação profissional – os historiadores
acadêmicos seriam os que trabalham em universidades, enquanto os
historiadores públicos empregariam o método histórico fora da academia, em
contextos diversos. Outra definição apontaria para a formação universitária
comum às duas categorias, sendo o principal diferenciador a cultura de trabalho
“moldada por identidades, perspectivas, missão e valores distintos” (MALERBA,
2014). Em ambas as situações, a preparação profissional e o uso adequado de
metodologias são imperativas.

Por mais interessantes que alguns sites de entretenimento sejam em sua


abordagem da “história”, é de extrema relevância alertar e reiterar com
estudantes e pesquisadores que sua validade como fonte digital e como
referência histórica são coisas bem distintas.

Clube de Leitura: aprofundamento e ampliação


No início de 2021, implementamos a terceira das etapas que idealizamos: a
experiência de promover encontros mensais, semelhantes ao tradicional “Clube
do Livro”, no qual conversas e discussões são empreendidas a partir de uma
leitura pré-definida. Ao mesmo tempo, nosso Clube foi concebido para se
assemelhar aos seminários universitários, nos quais a mediação dos professores
auxilia no aprofundamento dos temas abordados, possibilitando outros tipos de
reflexão.

Utilizando as redes sociais para divulgar a iniciativa, pudemos atingir centenas


de pessoas, e recebemos dezenas de mensagens de interessados. Por nossas
experiências anteriores, sabíamos que haveria um afunilamento e o número de 203
participantes seria menor até do que o de inscritos na atividade. Ainda assim,
realizamos duas reuniões inaugurais, na metade de março e no início de abril de
2021, com o mesmo texto, para dois grupos diferentes.

No momento em que este texto está sendo finalizado, contamos com 15


participantes, desde graduandos a doutores, com formação não só em História
ou Moda, mas também em Artes e Economia – um grupo tão heterogêneo quanto
o próprio campo de estudos de Moda.

Embora nem todos os interessados tenham permanecido no Clube, toda a


movimentação em torno da atividade proposta reafirmou nossas suspeitas
iniciais, de que há um número relevante de estudiosos buscando embasamento
teórico para abordar da melhor forma possível os fenômenos do vestuário em
nossa cultura.

Estabelecemos que o Clube contará com ciclos temáticos, sendo o primeiro


dedicado aos clássicos da Teoria de Moda, não raramente citados em segunda
mão. A inauguração do ciclo foi baseada na dissertação "A moda no século XXI:
para além da distinção social?" de Aline Gazola Hellmann (2009), na qual são
traçados um panorama e comparações entre autores relevantes para a
compreensão do fenômeno social da moda. O segundo dos encontros mensais,
realizado no fim de abril, focou no texto “A Moda”, de Georg Simmel (1904/1911).
Em ambas as reuniões, os textos originais tiveram informações adicionadas,
para ampliar a compreensão de seu contexto de produção e outros aspectos e
práticas relevantes para o bom desenvolvimento de uma pesquisa científica.

Acreditamos que pesquisadores iniciantes ou independentes muitas vezes não


têm a oportunidade de discutir e ampliar suas percepções, e que além de
proporcionarmos este espaço, podemos contribuir também com a identificação
de fontes seguras na internet, consequentemente resultando na circulação mais
responsável de informações históricas sobre o vestuário.

Por meio do acesso às teorias elaboradas em diversas disciplinas, buscamos


ainda afastar a perspectiva cristalizada de que Moda e Arte estão eternamente
imbricadas, aproximando os pesquisadores de abordagens sociológicas,
filosóficas e de cultura material. Apesar de a arte ser um recurso indispensável
para os estudos históricos em Moda e Indumentária, sobretudo quando não há
outros vestígios materiais dos trajes das épocas, as teorias de arte e estética
não dão conta de explicar os aspectos de produção, consumo e circulação de
bens, se tornando, assim, limitadores para a compreensão das dimensões 204
materiais, sensoriais e funcionais dos objetos de estudo.

Até o momento, o retorno fornecido pelos participantes indica que nossa


abordagem tem sido pertinente e agregadora, embora consideremos cada um
dos encontros como uma oportunidade de aprimoramento de nossa própria
compreensão do fenômeno e de nossos métodos de ensino e mediação, de
maneira que a exploração científica de fenômenos culturais não seja abatida
pelas torrentes de informação da web.

Considerações finais
Embora a pandemia tenha estreitado as relações dos indivíduos com os recursos
digitais, não é um vínculo pacífico. Alguns dos problemas, como vimos, são o
esmaecimento dos limites entre o factual e o ficcional, a produção de discursos
anticientíficos que eventualmente obtém amplo alcance, além dos impactos
psicológicos em produtores e consumidores de conteúdo, que também podem
ser considerados como parte dessa equação.

Em nosso projeto estabelecemos parâmetros, em todos os aspectos que


pudemos conceber, quanto à velocidade de produção, profundidade e
credibilidade do conteúdo, de modo a nos contrapor à lógica frenética de
postagens e compartilhamentos, estabelecida nas últimas décadas, na qual a
quantidade muitas vezes se sobrepõe à qualidade.

Ainda enfrentamos contratempos quanto às ferramentas em si, com seus


algoritmos e outras variáveis, com o descrédito contra a ciência, promovido por
autodenominados "especialistas" em "desenvolvimento profissional", e mesmo
com nossos próprios leitores, quando têm sua atenção captada pela urgência de
ver ou participar do máximo de oportunidades oferecidas.

Contudo, até o estágio atual temos motivos para acreditar que fizemos boas
opções e que, ao longo do tempo, poderemos de fato impactar positivamente
pessoas de diversos locais e formações, uma vez que não temos a intenção –
nem a possibilidade – de abandonar o meio digital.
Entendemos que há desafios particulares de cada uma das áreas de
conhecimento que se encontram em nossa proposta, mas, apesar disso, nos
posicionarmos é fundamental, para que em alguma medida os mal-entendidos
quanto ao que é histórico e científico sejam desfeitos, sobretudo em um ramo 205
tão recente quanto o de estudos em Moda.

Referências biográficas
Jaqueline (da Silva de Oliveira) Tatanashvili é mestra em História pela PUCRS,
atualmente doutoranda pela mesma universidade, com experiência de pesquisa
internacional, em metodologias de História Oral e com publicações relacionadas
à Moda, à Imigração e à Cultura Escandinava. Membro do
grupo de estudos e pesquisa em História Oral (LAPHO/PUCRS).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/4269808283589873

Natália de Noronha Santucci é mestra em História pela PUCRS, graduada e


especializada em Moda, com experiência no trabalho com Imagens e pesquisas
sobre Moda Esportiva, a História da Moda Brasileira e o papel das culturas
Germânica e Oriental no campo do vestuário. Membro do grupo de pesquisa em
História da Arte e Cultura de Moda (UFRGS/CNPq).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5694944404847749

Ambas são fundadoras e conduzem as publicações e atividades do projeto


Costura & Texto, no ar desde outubro de 2020. Site: https://costuraetexto.com.br
Contato: costuraetexto@gmail.com

Referências
ALMEIDA, Fábio Chang de. O historiador e as fontes digitais: uma visão acerca
da internet como fonte primária para pesquisas históricas. Aedos, Porto Alegre,
v. 3, n. 8 (jan.-jul. 2018). Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/aedos/article/view/16776. Acesso: 03 Maio 2021.

AVENDAÑO, Tom C. Deveria a Netflix alertar que ‘The Crown’ não é real?
TOM C. El País, Madri, 06 dez. 2020. Cultura. Disponível em:
https://brasil.elpais.com/cultura/2020-12-06/deveria-a-netflix-alertar-que-the-
crown-nao-e-real.html. Acesso: 03 Maio 2021.
BARROS, José D'Assunção. História, espaço e tempo: interações
necessárias. Varia história, Belo Horizonte, v. 22, n. 36, (dez. 2006). Disponível
em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-
87752006000200012&lng=en&nrm=iso. Acesso: 03 Maio 2021.

206
BRIGGS, Asa; BURKE, Peter. Uma história social da mídia: de Gutenberg à Internet.
2ed. Tradução Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2006.

HELLMANN, Aline G. A moda no século XXI: para além da distinção social?


2009. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
Disponível em: https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/21459. Acesso: 03
Maio 2021.

LEAL, Bruno. Fake News na história: uma bibliografia comentada. Café


História, 2020. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/fake-news-na-
historia/. Acesso: 03 Maio 2021.

MALERBA, Jurandir. Acadêmicos na berlinda ou como cada um escreve a


História?: uma reflexão sobre o embate entre historiadores acadêmicos e não
acadêmicos no Brasil à luz dos debates sobre Public History. História da
historiografia, Ouro Preto, n.15, (ago. 2014). Disponível em:
www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/692. Acesso: 03 Maio
2021.

OLIVEIRA, Jaqueline; SANTUCCI, Natália. Costura & Texto, 2021. Disponível


em: https://costuraetexto.com.br/. Acesso: 03 Maio 2021.

SLOW CONTENT. Disponível em: https://www.slowcontent.org/. Acesso: 03


Maio 2021.

ZAGO, Gabriela da Silva; SILVA Ana Lúcia Migowski da. Sites de rede social e
economia da atenção: circulação e consumo de informações no Facebook e no
Twitter. Vozes e Diálogo, Itajaí, v. 13, n. 1 (jan.-jun. 2014). Disponível em:
https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/vd/article/view/5305. Acesso: 03 Maio
2021.
PESQUISA CENSITÁRIA E FORMULÁRIOS
ONLINE NO ENSINO DE HISTÓRIA NA
EDUCAÇÃO BÁSICA
207
João Gilberto Neves Saraiva
A realização de recenseamentos é uma prática com raízes históricas profundas.
Os grandes impérios da Antiguidade, como Roma e China, já utilizavam
pesquisas censitárias para saber número de habitantes, sexo, profissão, renda,
entre outros dados com o objetivo de nortear suas ações. Essa prática continua
desde então, conhecer em detalhes a distribuição social, étnica, espacial,
econômica, etc. das populações é cada vez mais uma informação vital para a
administração dos Estados. No caso do Brasil, data do terço final do século XIX
– na época de D. Pedro II – os primeiros censos da população brasileira. Ao
longo do século XX, notadamente após a criação do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística em 1936, a prática tornou-se sistemática e passou a
abranger temas cada vez mais amplos (IBGE, 1987, p. 20). A cada virada de
década, a população brasileira é recenseada em pesquisas com temas
diversificados, além de amplas e variadas amostragens. Dada a pandemia do
coronavírus desde o início de 2020, bem como diversas questões políticas e
econômicas, o censo desta década ainda não foi realizado. Recentemente, o
governo federal anunciou que ele também não será feito em 2021 (ROCHA,
2021). Isso é muito preocupante para o planejamento e execução de políticas
públicas em áreas como a saúde, a educação, o uso de recursos energéticos e
hídricos, entre outras.

Esse contexto motivou a utilização da pesquisa censitária em uma atividade da


disciplina de História na Escola Municipal Professora Ivanira de Vasconcelos
Paisinhos (Parnamirim/RN) e sua adaptação durante o ensino remoto
emergencial. O trabalho mobilizou os alunos dos 7º, 8º e 9º anos, sete turmas
do Ensino Fundamental Anos Finais matriculados na instituição no ano letivo de
2020. A atividade consistiu na realização de um censo sobre o acesso,
preferências e usos que membros diretos da comunidade escolar, além de
parentes e vizinhos dos alunos fazem da Arte, Cultura e Tecnologia. Uma vez
que a instituição tem matriculados estudantes de localidades variadas de
Parnamirim e também de um município vizinho, São José do Mipibu, as
pesquisas abarcam recortes urbanos e rurais diversos. Dado a conjuntura de
distanciamento social, o recurso utilizado para realização das entrevistas e
agrupamento dos dados obtidos foi o Google Formulários.

A atividade se vinculou em um projeto mais amplo de uso de tecnologias digitais


na escola (SARAIVA, 2020). O Projeto Arcada – https://0jonjo.github.io/arcada/
– trata da produção, atualização e uso de websites e blogs no ensino e na
aprendizagem de História na Educação Básica. É um projeto que atua sobre
duas frentes, de um lado aspectos técnicos e pedagógicos de produção da
produção de ferramentas digitais, do outro lado, examina a experiência do seu
uso no ensino híbrido (e no ensino remoto) na disciplina de História.

Há diversos modos de utilização dos formulários online no Ensino de História.


Comumente utiliza-se essas ferramentas nas escolas para que os alunos
registrem respostas objetivas e dissertativas, mas há outras possibilidades. O 208
uso educacional do RPG, game, revisões guiadas, aula expositiva interativa,
análise de fontes históricas e outros (CARVALHO, 2020; HISTORIAR-SE, 2021).
A escolha dos formulários online para a pesquisa censitária, é consonante com
competências diversas da Base Curricular Comum Nacional (2018, p. 9, 357 e
402) para Educação Básica. Elas afirmam a necessidade da compreensão crítica
e do domínio das linguagens das culturas e tecnologias digitais. Nesse sentido,
ao propor uma pesquisa censitária mobilizando ferramentas digitais, seja através
de smartphones ou desktops, o trabalho se aproximou da perspectiva dos
letramentos digitais (DUDENEY; HOCKLY; PEGRUM, 2016, p. 21). O uso do
plural identifica que existem múltiplos letramentos digitais interconectados. No
caso da atividade em questão, os alunos exerciam ações que envolviam os
letramentos impressos, em hipertextos, em dispositivos móveis, e o em
informação. O viés é que o simples acesso a um smartphone ou outra tecnologia
digital, não torna os alunos conscientes e proficientes nas suas diversas
possibilidades de uso, seja ele comunicativo, laboral, educacional, etc. É
necessário efetivos letramentos, e a escola tem um papel fulcral na construção
desses saberes.

Uma parcela considerável de alunos da escola – entre um quarto e um terço –


não possuem acesso à Internet, faixa semelhante à identificada pelo IBGE
(2020) para a Região Nordeste como um todo. Dentre os alunos que têm acesso,
parte considerável não tem possuem computadores de mesa ou notebooks, nem
disponibilidade de uso de banda larga (seja por cabo, rádio ou 4G). A maior parte
utiliza smartphones – seja de uso individual ou compartilhado entre familiares –
e muitos dependem exclusivamente de pacotes de telefonia (SARAIVA, 2020).
Dada essa conjuntura, se optou pelo Google Formulários por questões diversas.
Uma é que se trata de uma ferramenta leve (gasta poucos dados) e que não
exige cadastro para responder (só o do professor, na criação dos formulários),
outra é que ela é responsiva (acessível de qualquer formato de tela). Há também
o fato de boa parte dos estudantes já terem uma experiência prévia mínima com
a ferramenta necessária para o uso na atividade. Como uma possível solução
para os alunos sem acesso à internet, foram disponibilizadas na escola
formulários em papel que depois foram convertidos para a versão digital.

A escolha das temáticas Arte, Cultura e Tecnologia como mote da pesquisa


censitária vai de encontro ao tema anual da instituição no ano letivo de 2020. A
equipe pedagógica da escola, ainda antes da crise global provocada pela Covid-
19, escolheu esses três eixos para nortear e integrar os trabalhos das nove
disciplinas do Ensino Fundamental Anos Finais. O professor fez a opção por
organizar o censo de acordo com temáticas que já estavam sendo estudadas em
cada um dos anos letivos. Nesse caso, os 7º anos estavam examinando a
importância e múltiplas expressões da Arte no Renascimento, já os 8º anos
aprendendo o papel do Iluminismo no desenvolvimento das Ciências e os 9º
anos inteirados nas questões de Identidade e Cultura Negra do Brasil
Contemporâneo.

O plano inicial da atividade era discutir a importância das pesquisas de censo e 209
realizar um histórico do tema mobilizando dados de época dos temas que eles
estavam estudando, só então apresentar a metodologia da pesquisa censitária.
A ideia era que os alunos contribuíssem com o delineamento do tema e escopo
da pesquisa, por exemplo, delimitando que questões e opções de resposta
fariam parte ou não dos questionários. A produção de um censo exercita as
perguntas básicas da produção do conhecimento histórico e do pensamento
científico no geral: O quê? Onde? Quando? Como? E especialmente: por quê?
A produção dos questionários foi sensivelmente prejudicada por conta do fim das
aulas presenciais. A escola é o espaço central de encontro e debate dos alunos
e, como visto, o acesso à Internet é precário para muitos estudantes.

Diante desse cenário, o docente teve de organizar as questões iniciais a partir


de respostas de atividades anteriores em que os alunos foram indagados sobre
a importância dos temas do censo para si próprios. As turmas de 7º ano, por
exemplo, entrevistaram primeiro colegas, a seguir parentes e vizinhos sobre
idade, local de moradia, preferências sobre tipos de obra de Arte, a relevância
da arte para sua vida, a existência no bairro e na cidade de espaços como
museus, teatros, cinemas, etc., mídias que utilizam para acessar obras e
espetáculos artísticos, o que poderia ser modificado para ampliar acesso da
população as Artes, entre outras. O objetivo era mapear o modo como as
pessoas enxergam, como vivem e o que pensam sobre cada um dos temas.

A conjuntura de isolamento social tornou necessário diversas outras adaptações


nas atividades. O escopo do censo foi alterado, ele abarcava inicialmente as
pessoas que estudam e trabalham na escola no turno dos estudantes, o
vespertino. No contexto do ensino remoto, a pesquisa passou a ser realizada
entre colegas da escola e parentes e amigos sem vínculo direto com a instituição.
O enfoque anterior ensejaria uma análise mais aprofundada do público da
escola, a alteração proporcionou um exame menos autocentrado, uma vez que
ampliou e diversificou o recorte demográfico.

Uma das mudanças de maior relevância com a pandemia foi a priorização de


ferramentas digitais para obtenção, armazenamento e análise inicial dos dados.
Conforme já explicitado, a opção pelo Google Formulários se deu por conta -
entre outros aspectos - o fato do professor e alunos já terem alguma intimidade
com o serviço. Após o fim do ensino presencial, ele passou a ser utilizado na
escola em atividades de várias disciplinas. Além disso, este formulário online
específico, tem embutido algumas ferramentas de reunião e exibição dos dados,
porcentagens e gráficos simples e a possibilidade de exportá-los como tabela.
Foi necessário, é claro, adaptar o seu uso para os objetivos da atividade. Isso
incluiu a definição de respostas dissertativas curtas (por exemplo, para nome do
entrevistado e local de moradia) ou mais longas (para coleta de opinião) e
respostas com uma ou múltipla escolhas possíveis a depender do
questionamento. Os nove questionários utilizados (3 por ano letivo) também
foram configurados para receber centenas de respostas cada um a partir de
diversos dispositivos.
210
A primeira parte do trabalho consistiu em os alunos responderem eles próprios
questões sobre as temáticas do censo. Essa amostragem permitiu identificar
saberes e práticas dos estudantes dentro e fora da escola envolvendo Arte,
Cultura e Tecnologia. Em um segundo momento eles entrevistaram colegas de
outros anos sobre interesses e práticas na escola relativas aos três temas. A
perspectiva era que o aluno entrevistasse pessoas que apesar de matriculadas
na mesma escola e turno, cursam ano diferente, estudam temas e têm
professores também diversos. Na terceira parte eles entrevistaram pessoas da
sua convivência, mas sem vínculo direto com a escola. A maior parte dos
estudantes entrevistou parentes e vizinhos.

O objetivo das três etapas foi fazer com que os alunos conheçam e reflitam sobre
a Arte, Cultura e Tecnologia a partir de perspectivas diversas. Inicialmente eles
abordaram seus próprios interesses e visões sobre o tema, bem como, suas
práticas e opiniões sobre como eles estão presentes na escola e na sua
comunidade. A seguir, tomam contato com os pontos de vista de outros colegas
da escola que estudam em anos diferentes, experiências semelhantes (mesmo
corte etário, educacional, social, etc.), mas nunca idênticas. Depois partem para
um público mais diversificado (idade, profissão e escolaridade, por exemplo),
mas que compartilha alguma comunidade do aluno (mesmo bairro, condomínio,
associação, igreja, entre outras). Esse entrecruzamento permite o aluno
vislumbrar e questionar-se sobre perspectivas diversas relativas a um mesmo
tema, a atentar para similitudes e diferenças. A reunião dos dados dessas três
rodadas de entrevistas possibilitou a produção de panoramas de dados
relacionados à comunidade escolar em sentido amplo, os estudantes coletaram
cerca de 250 respostas no total (cada aluno foi orientado a realizar uma
entrevista a cada uma das três etapas).

O uso de pesquisas censitárias no ensino vai além da coleta dessa massa de


informações. O exame dela é uma das atividades mais relevantes do trabalho e
que permite inclusive práticas interdisciplinares. A produção e análise de tabelas
e gráficos, por exemplo, faz parte dos objetos de conhecimento e competências
da Matemática e Língua Portuguesa no Ensino Fundamental Anos Finais na
BNCC (2018). Já as formas como os grupos utilizam e transformam os espaços,
artes e tecnologias a partir de determinada identidade cultural é tema recorrente
nos estudos da Geografia e do Ensino Religioso.

Dada a pandemia, foram realizadas diversas alterações no calendário do ano


letivo de 2020 da rede municipal. Por conta disso, ele se estendeu sobre 2021 e
a análise dos dados dos censos ainda serão realizadas. O próximo passo é
justamente estabelecer elos com essas disciplinas para que, sob orientação dos
professores, os alunos utilizem os dados preliminares do Google Forms e
produzam suas próprias tabelas, representações gráficas e análises desse
extenso corpo de informações. A proposta é estabelecer as pontes no momento
em que os alunos estejam estudando assuntos que permitam uma conexão entre
temas e metodologias.
211
Cada uma das diversas etapas desde a formulação das questões até a análise
e apresentação dos dados finais, passando pela série de entrevistas e
lançamentos de dados no sistema de formulários online, permite a abordagem
de diversos pontos relevantes para o Ensino de História. Inicialmente a
compreensão das pesquisas censitárias como produtos históricos vinculados a
lógica de Estado e a importância da produção e acesso a dados para promoção
de políticas públicas. A produção dos questionários e realização dos
recenseamentos possibilita um confronto de perspectivas e a contextualização
de dimensões políticas, sociais e culturais da realidade a partir de questões
fundamentais da História. A adaptação de plataformas como o Google
Formulários e seu uso educacional para pesquisa é um investimento nos
diversos letramentos digitais envolvidos na apropriação crítica e domínio de
linguagens e culturas do mundo digital. Por fim, a apresentação e análise do
corpo informacional obtido permite diversas atividades interdisciplinares com os
saberes de áreas como a Matemática e a Geografia.

Referências biográficas
João Gilberto Neves Saraiva é professor de História na Rede Municipal de
Parnamirim-RN e desenvolve pesquisas em História e Educação sobre as
relações entre Poder, Mídia e Tecnologias. Possui Doutorado em História pela
UFF (2019), Mestrado (2015) e Graduação (2012) em História pela UFRN. É
também escritor e programador. https://0jonjo.github.io/0jonjo/

Referências bibliográficas
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. Brasília:
MEC/CONSED/ UNDIME, 2018. Disponível em
http://download.basenacionalcomum.mec.gov.br/ Acesso em: 10 jan. 2020.

CARVALHO, Bruno Leal Pastor de. Professor de História desenvolve jogo


inovador utilizando apenas formulário do Google (Notícia). In: Café História:
história feita com cliques. Disponível em:
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Disponível em https://simpohis2020midias.blogspot.com/p/joao-gilberto-neves-
saraiva.html Acesso em 10 dez. 2020.
HISTÓRIA & CINEMA: A II GUERRA MUNDIAL
E OS FILMES
João Matheus Ramos e David Antônio de
213
Castro Netto

Luzes, câmera, história... ação!


A presença de uma ampla historiografia versada acerca do contexto da Segunda
Guerra Mundial é indiscutível (HOBSBAWM, 1995), demonstrando que tal
temática se configura como uma das mais visitadas pelo campo historiográfico.
Tal massa de trabalhos, ajuda na expansão da pesquisa, ora revistando temas
consagrados, ora se debruçando sobre novas formas de compreensão do
período.

Um eixo de pesquisas consolidado é aquele que engloba a relação cinema e


História, sustentando o caráter das películas como fontes históricas a serem
utilizadas seja como fonte de pesquisa, seja sua aplicação no ensino, auxiliando
no processo ensino-aprendizagem.

O presente trabalho parte de uma fusão desses dois campos de pesquisa, ao


propor a análise de filmes versados, a saber, Dunkirk (2017), O destino de uma
nação (2017) e Jogo da imitação (2014) como fontes históricas e em seguida
apresentar algumas possibilidades da utilização em sala de aula

O destino de uma nação


O filme de Joe Wright, estrelado por Gary Oldman mostra os primeiros dias de
Winston Churchill na posição de primeiro-ministro numa conjuntura de crise
política. Com roteiro centrado no político e seu entorno das vésperas de sua
posse em 10 de maio de 1940 até o seu pronunciamento na Câmara dos
Comuns em 4 de junho do mesmo ano. Iniciando com a contextualização do
avanço nazista na Europa, o filme parte do dia 9 de maio. Traçamos alguns
apontamentos sobre a narrativa e suas relações históricas:

A posição assumida por Halifax, rival de Churchill, de apaziguamento com Hitler,


por meio de um armistício intermediado por Mussolini, era comum entre os
conservadores ingleses, porém seu fracasso é constatado com a queda de
Neville Chamberlain e a nomeação de Churchill, justamente por representar uma
alternativa de ruptura, o que claramente, não evitou controvérsias e oposições,
dentro mesmo do próprio partido. Halifax, conservador, como Churchill, é quem
melhor incorpora esta oposição, tentando negociar o armistício em troca de
“condições favoráveis” à Inglaterra. Churchill dispara dura máxima diante do
conselho de guerra: “Você não pode dialogar com um tigre com a sua cabeça na
boca dele!”.
Quando Churchill é avisado do quadro crítico francês e da constatação do
“colapso da Europa Ocidental nos próximos dias” e questionado se o público
deveria ser informado, afirma: “Ainda não. Primeiro despertaremos a resistência
heroica de nossos velhos amigos, a França deve ser salva”. Tal comportamento,
bastante recorrente no filme, evidencia um ponto interessante: o controle do
governo sobre o que chega até o povo, que naquele momento era essencial para 214
Churchill mantê-lo unido, emanando de um forte espírito combativo para o
prosseguimento de sua pauta.

Figuras 1 e 2 - Fonte: (1) O Destino de Uma Nação (2017); (2) The


Independent (14/10/2013)

Na cena, Churchill faz um símbolo que acreditava ser o de “vitória” para dizer ao
público que a situação era favorável, porém tal acontecimento gera uma situação
inversa, pois da maneira que faz o gesto, sem querer invertidamente, poderia
significar “Up your bum” [PT: “enfia na bunda”], ao lado uma cena real,
encontrada em uma matéria do jornal britânico “The Independent”.
O empasse de Dunkirk é uma das problemáticas centrais apresentadas no filme,
centenas de milhares de soldados aliados em uma situação extremamente
vulnerável. Assim nos são mostrados: o sacrifício da guarnição de Calais para
ganho de tempo, o insight que levou à elaboração da Operação Dínamo,
centrada no confisco de barcos civis para o resgate dos soldados em Dunkirk, e 215
finalmente sua execução com a cena dos barcos rumando para a costa francesa.

Outro momento interessante do filme se dá em uma conversa entre o primeiro-


ministro e o rei, quando o monarca demonstra pela primeira vez todo o seu apoio
a Churchill, justificando que, apesar de suas ressalvas ao nomeá-lo, seria
merecedor de sua confiança por conseguir despertar medo no coração de Hitler.
Tal argumento é reforçado por diversos historiadores que assinalam a nomeação
de Churchill como uma das chaves para a decorrente vitória aliada no conflito.

Na cena final, na Câmara dos Comuns, o primeiro-ministro pronuncia seu


discurso “We shall Fight on the Beaches” (“Lutaremos nas Praias”), obtendo
apoio geral – inclusive de Chamberlain e do partido – para fazer a Inglaterra
adotar uma postura combativa contra os nazistas abandonando o
apaziguamento (figura 3). Tudo isso ocorrendo no dia 4 de junho de 1940,
mesmo dia em que a Operação Dínamo fora concluída com sucesso, resgatando
mais de 338 mil soldados, evento assinalado por Gonçalves (2000) como marco
de virada na guerra, a primeira de várias vitórias após tantas derrotas.

Figura 3: Cena final em que Churchill é ovacionado após discursar no


Parlamento. Fonte: O Destino de Uma Nação (2017)

Importante lembrar que o filme é apenas uma representação da realidade e ainda


que acerte em grande parte (POLITIFACT), a obra não deixa de ser um retrato
portador de imprecisões históricas decorrentes de sua subjetividade inerente.
Portanto é imprescindível que o professor alerte este detalhe à turma, como
também aponte para o fato de que Churchill não foi apenas um herói imaculável
como pode parecer pelo filme, mas que ele também possui um aspecto racista
e colonialista em relação aos indianos dominados naquele tempo pelo Império
Colonial Britânico, o que pode ser realizado a partir da leitura do texto de
Domenico Losurdo (2017). Vale destacar, ainda, que o filme parece ter o objetivo
de elevar a figura de W. Churchill, numa narrativa heroica, digna da história
política de viés mais tradicional, ou seja, do homem-deus, o que tudo sabe, o 216
que faz previsões improváveis e que resiste quando todos querem desistir. Há,
de fato, a importância do sujeito na história, mas, no formato do filme,
aparentemente, Churchill venceria a guerra sozinho já que apenas sua
nomeação teria “gelado” o coração de Hitler.

Dunkirk
O filme de 2017 dirigido por Christopher Nolan, mergulha na realidade dos
soldados aliados encurralados pelos nazistas. A narrativa focada em diferentes
personagens fornece um panorama do drama daquela situação, desde oficiais
em uma posição vulnerável na costa norte francesa, a pilotos aliados incumbidos
de neutralizar aeronaves inimigas que sobrevoavam a região, até civis que com
seus barcos atendem o chamado e partem para a operação de evacuação.

A obra pode servir ao professor de diferentes formas, seja como instrumento de


representação junto aos alunos daquele momento pelo qual passaram tropas
aliadas em Dunkirk na metade de 1940, ou, despertar a discussão de outras
questões como o medo e os traumas da guerra. A situação é exemplificada na
personagem do “soldado arrepiado” (Cillian Murphy), piloto inglês cuja aeronave
é abatida e é então resgatado por um dos barcos civis que rumam a Dunkirk para
a evacuação planejada. O trauma do personagem é tamanho, que a todo
momento pode ser percebido tremendo e quando descobre que ruma à França
tenta, sem sucesso, evitar.

Nos momentos finais são mostradas embarcações civis chegando e atracando


em Dunkirk, resgatando os soldados aliados (figura 4), tanto ingleses como
franceses, o que se mostra bastante interessante, pois não são poucos os
momentos ali em que os ingleses discriminam os franceses. A ideia que vigorava
era que apenas cerca de 30 mil seriam salvos, e esses seriam ingleses. Tal
estimativa pode ser encontrada também em “O Destino de Uma Nação”, onde
Churchill revela à sua secretária que com o tempo nublado e um milagre, cerca
de 10% daqueles soldados poderiam ser evacuados. Entretanto pela dimensão
da Operação Dínamo e ampliação de possibilidades que esta fez pelo emprego
de barcos civis, todos os soldados sobreviventes em Dunkirk, ingleses e
franceses, estes últimos mais de 139 mil, foram resgatados e evacuados para a
Inglaterra em segurança, total de 338.226 salvos da morte.
217

Figura 4: Barcos chegando a Dunkirk para o resgate e evacuação. Fonte:


Dunkirk (2017)

‘O Jogo da imitação’
De 2014, o filme de Morten Tyldum, protagonizado por Benedict Cumberbatch,
tem sua história centrada na trajetória de Alan Turing, o gênio por trás do que
viria a ser considerado o primeiro computador da história. Enfocando o período
em que Turing participou do projeto militar destinado a vencer a Enigma,
máquina alemã de decodificação de mensagens considerada imbatível, o filme
também recorre a momentos da adolescência de Turing, caros à sua formação
pessoal, e a outros posteriores ao seu trabalho para o exército britânico na
Segunda Guerra.

O filme mostra que os aliados não conseguiam se sobrepor a máquina alemã,


pela limitação da mente humana, assim Turing sustenta que seria necessária
uma outra máquina mais desenvolvida e capaz de sobrepujar a Enigma. Apesar
de enfrentar resistência de sua divisão, escreve uma carta para o superior geral,
W. Churchill, responsável pelo projeto de inteligência ultra sigiloso que promove
e financia a proposta.

Apesar das dificuldades, o sucesso da máquina celebrado pela equipe de Turing


(figura 5), converte-se numa chave vital para a vitória aliada na guerra e por isso
tal informação é mantida em sigilo, com o sistema de informação inglês
empregando-a cautelosamente. Assim no final do filme é informado de que
graças à Máquina de Turing, milhões de vidas foram poupadas e a guerra
encurtada.
218

Figura 5:Turing e sua equipe no momento de sucesso de sua máquina. Fonte:


O Jogo da Imitação (2014)

Outras informações fornecidas no final do filme dizem respeito à condenação de


Turing após uma investigação policial, que tem espaço no filme, por ser
homoafetivo, restando a escolha de ser preso ou a castração química, que o
levou à morte pouco tempo depois, aos 41 anos. O projeto de Turing e sua
equipe fora mantido em sigilo por mais de meia década pelo governo inglês e
suas máquinas foram essenciais para a criação e desenvolvimento da
computação.

As formas de empregar o filme numa aula de história se mostram ricas, já que


possibilitam o debate de diferentes questões desde uma percepção aprofundada
da importância dos sistemas de informação na guerra, essenciais para o triunfo
aliado sobre o eixo, visto que tornava possível antever ações inimigas e
interceptá-las antes do ato.

Por fim, vale a pena destacar os malefícios da intolerância, Alan Turing fora
vitimado por esta por ser homossexual, isso ainda aos 41 anos de idade. Mostrar
aos alunos que sem ele talvez nem teríamos os computadores hoje, já que seu
trabalho é considerado a base do sistema de computação atual, é um bom
exemplo para demonstrar como políticas e até mesmo atitudes intolerantes
bastante recorrentes são extremamente nocivas e podem culminar numa severa
perda de potencial humano. Turing era um gênio que poderia muito ainda
oferecer, mas infelizmente não pôde.

Cinema e ensino: propostas de trabalho


Mediante a impossibilidade da exibição em horário de aula dos três filmes,
levantamos três propostas, pautadas em sua aplicação como fonte auxiliadora
no ensino de História:

Proposta I
Tendo o professor já apresentado o conteúdo da 2ª Guerra Mundial em sala,
este apresentaria os filmes por meio dos trailers ou imagens contextualizadas.
Recorre-se então a exibição de apenas um deles, a critério do professor,
podendo inclusive ser realizada uma votação junto à turma. Os outros dois
seriam cobrados então em forma de tarefa, de importante realização pois tal
conhecimento virá a ser solicitado em forma de atividade avaliativa 219
posteriormente, escrita, como em uma dissertação, ou mais prática, dividindo a
turma em três grupos com cada um destes ficando responsável por um dos
filmes e a formulação de um cartaz ou painel, com os principais pontos do filme
e sua relação com os conteúdos vistos em sala, acrescentados de pesquisas
complementares, auxiliadas pelo professor. Por fim com a apresentação
realizada pelos alunos de todo material produzido, haveria então a junção deste
numa espécie de grande mapa mental histórico.

Proposta II
Visando aquelas situações em que nem sempre o exposto acima demonstra-se
cabível, sugerimos aqui uma atividade mais dinâmica. Utilizando o filme “Jogo
da Imitação”, selecionar vinte minutos das cenas importantes para o conteúdo e,
utilizando o texto do livro didático propor um debate com os alunos sobre
questões fundamentais, como a importância da informação correta numa guerra,
as questões socioculturais que aparecem e a perseguição à população
LGBTQA+ que não aparecem no livro didático. O professor(a) também pode
fazer uma comparação entre as duas fontes disponíveis (livro didático e o filme)
apontar diferenças de forma, conteúdo e como os alunos e alunas podem ler tais
documentos.

Proposta III
Um pouco mais ousada, concebe a proposição de uma oficina adaptada da
proposta de Isabel Barca (NICOLIELO, 2013), provavelmente em contraturno.
Com maior liberdade de tempo, disponibilidade de espaço e recursos para tal, o
professor(a) exibiria um filme por dia, instigaria a discussão em cima do
conteúdo, propiciando o espaço necessário para maiores debates sobre temas
que aparecem em segundo plano nos filmes como a questão dos traumas de
guerra, dos veteranos, da intolerância, direitos humanos, a desconstrução do
“herói de guerra”, contrapondo a figura de Churchill em “O Destino de uma
Nação” com sua personagem real que apesar da categoria de “herói de guerra”,
era um forte símbolo do imperialismo britânico e de sua opressão.

Os debates entre os alunos, mediados pelo professor, cumprindo o papel de


instigador (BITTENCOURT, 2005), tomando nota dos apontamentos
apresentados, e também a entrega por parte dos alunos de um texto analisando
a experiência, do conteúdo histórico, dos filmes e das discussões, seja ao final
de cada reunião ou então uma síntese geral numa dissertação ao final da oficina,
contemplaria então o professor com um material suficiente para a avaliação e
uma rica experiência tanto para ele quanto para os alunos.
Essa proposta é a que melhor capitaneia nossos ânimos e perspectivas de
trabalho ideal para com os filmes apresentados. Os trâmites burocráticos, com a
coordenação do colégio para a organização de tal atividade, podem ser bastante
dispendiosos, e a participação dos alunos certamente é sempre uma incógnita,
porém tido sucesso nestes pontos que são os maiores complicadores, a
dinâmica proporcionaria uma riqueza no tocante à melhor experiência em sala 220
de aula. E ainda, decorrente de tal sucesso, a proposta poderia ser expandida
na forma de um projeto que faça amplo usufruto das múltiplas relações entre
história e cinema envolvendo os mais diferentes conteúdos históricos, e quiçá
até outras fontes de entretenimento da cultura jovem, como HQs e jogos
eletrônicos.

Considerações finais
Em se tratando de história, cinema e sua aplicação em sala de aula, as
possibilidades são infinitas e os caminhos os mais diversos. Entretanto é
importante, que tais iniciativas, sejam precedidas de preparação e no momento
de sua execução, o professor cumpra o papel de mediador do conhecimento
(SIMAN, 2015), enfatizando importantes pontos discutidos aqui, como a questão
da representação.

Para a proposta aqui explorada, sugerimos três produções mainstream do


universo da 7ª Arte, todavia outras poderiam também ser utilizadas com mesma
eficácia, dependendo apenas do enfoque da aula. Produções como “O Resgate
do Soldado Ryan” e “A Lista de Schindler”, para refletir outros aspectos da guerra
ou séries de sucesso como “O Homem do Castelo Alto” (2015) ou “Hunters”
(2020), documentários como “Grandes Momentos da Segunda Guerra em
Cores” e, ainda, fotografias e filmagens da época. Contudo, destacamos que
cada tipo de mídia exige um preparo específico, seja para a análise, seja para o
uso em sala de aula. Cabe ao professor(a) encontrar o material que mais se
encaixe com a turma. A bibliografia sobre o cinema em sala de aula, felizmente,
está em expansão. Aqui, tomamos a liberdade de indicar apenas o trabalho de
Napolitano (2005).

Referências biográficas
João Matheus Ramos, graduando de História da UEM

Dr. David Antonio de Castro Netto, Colegiado de História - Unespar - Paranavaí

Referências bibliográficas
BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de história. Cortez editora,
2005.

GONÇALVES, Willians da Silva. A segunda guerra mundial. In: REIS FILHO,


Daniel Aarão et. all. O Século XX. V.3: O tempo das dúvidas: Do declínio das
utopias às globalizações. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.
HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve séc. XX. Cia das Letras, 1995.

LOSURDO, Domenico. Stálin e Hitler: Irmãos gêmeos ou inimigos mortais? Le


Monde Diplomatique, 21-12-2017.

NAPOLITANO, Marcos. Como usar o cinema na sala de aula. Editora Contexto, 221
2003.

NICOLIELO, Bruna. Isabel Barca fala sobre o ensino de História. Nova Escola.
2013. Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/930/isabel-barca-fala-
sobre-o-ensino-de-historia?imprimir=truevoltar=/conteudo/930/isabel-barca-
fala-sobre-o-ensino-de-historia?imprimir=true#_=_>. Acesso em: 28 abr. 2021.

POLITIFACT. Fact-check: Darkest Hour movie gets Winston Churchill mostly


right. Disponível em: <https://www.politifact.com/article/2018/feb/26/fact-check-
darkest-hour-movie-winston-churchill/>. Acesso em 14 jun. 2020.
SIMAN, Lana Mara de Castro; RODRIGUES COELHO, Araci. O Papel da
Mediação na Construção de Conceitos Históricos. Educação & Realidade, v.40,
n. 2, 2015.
A HISTÓRIA QUE SE APLICA E QUE SE
JOGA: “SHOW DOS VARGAS” COMO MEIO
PARTICIPATIVO PARA INTERAÇÃO E
222
APRENDIZADO DOS ALUNOS
José Victor Ferreira Rocha dos Santos e Ana
Virginia de Andrade Lima

Introdução
A sala de aula contemporânea bem como as metodologias da educação
utilizadas no presente vem tendo constantemente a sua legitimidade e
aplicabilidade questionada. Conteúdos engessados, materiais didáticos
superficiais, apego ao velho, abandono e muitas vezes proibição das novas
tecnologias tais como aparelhos celulares, retroprojetores, exibição de filmes
e/ou caixas de som são algumas das mazelas que assolam o atual processo de
ensinar e aprender. O professor, participante direto deste processo, tem todo seu
ofício dado em cheque por tais fatores. Por tanto, faz-se necessário a partir do
levantamento de tais dados sobre a educação do mundo hodierno um processo
contínuo de mudança tanto das metodologias bem como do próprio material
didático utilizado em suas aulas.

O presente trabalho buscará a partir do uso do lúdico uma forma de revisão de


conteúdo passado previamente em sala de aula. Desta forma o aluno poderá a
partir do simples ato de brincar, fator determinante e essencial na fase inicial do
ensino escolar segundo o renomado Jean Piaget, conseguir fixar o conteúdo em
questão de uma maneira simples e completamente adequada a sua faixa etária.
Sobre o uso do lúdico, RIOS & SILVA afirmam a importância de salientar que as
atividades lúdicas não são restritas apenas a jogos e brincadeiras, mas uma
variedade de ideias que buscam o prazer e a aprendizagem dos sujeitos (2008).
Para execução dais ideias descritas à cima foi escolhido como temática central
a ser trabalhada no game em questão o conteúdo referente a história do Brasil,
Era Vargas ou Varguismo, onde segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais
para Educação Básica (DCN), tem-se como sala a ser trabalhada o 9ª(nono) ano
do ensino fundamental. “Show do Vargas” foi o nome pensado para intitular o
jogo lúdico elaborado com o objetivo de fazer uma revisão geral do conteúdo
previamente estudado. A partir do programa de software Power Point foram
elaboradas 9 perguntas de múltipla escolha em alusão ao supracitado tema, no
qual apenas 1 está correta. Ao responder as perguntas o aluno irá a partir de
uma maneira competitiva e instigante se esforçar ao ver de maneira simples e
recreativa aquilo que se dedicou horas lendo e estudando.
A abordagem do período na qual Vargas estava ao poder (1930 – 1945) foi
escolhida frente a grande importância que este momento tem para a
modernização ocorrida no país no século XX. O conteúdo permite trabalhar com
a criação dos direitos trabalhistas, o amplia mento da democracia a partir do
voto, a construção e a legitimação de uma ditadura, o populismo e até mesmo a
2ª Guerra Mundial. Contudo, pretende-se que a partir deste recurso o professor 223
possa adquirir novos recursos que venham a melhorar a qualidade de sua aula
de história na abordagem temática em questão.

Justificativa
A opção do tema ‘’ Era Vargas’’ foi baseada na importância da figura do Getúlio
Vargas para a história do Brasil, como também a necessidade de transmitir o
todo o processo histórico desde sua chegada e consolidação no poder,
pontuando as características principais e os grandes feitos do seu governo.
Dessa maneira, tal proposta é uma tentativa de entendimento dos fatos históricos
e compreensão da trajetória deste político, até pelo fato de ser uma das
competências exigidas pelos parâmetros curriculares, abordado muitas vezes de
forma muito sintética no âmbito escolar, pois ainda existe uma priorização para
debates temáticos voltados para questões da Europa, conflitos internacionais
etc. Por conseguinte, temas como este são transmitidos de forma superficial.

Getúlio Dornelles Vargas um dos personagens mais emblemáticos e polêmicos


de nossa história, assumindo o poder após um movimento que uniu oligarquias
tradicionais e facções de oligarquia situacionista em um cenário caótico de crise
econômico e social. Nesse sentido, Getúlio Vargas até os dias atuais é
considerado um dos presidentes mais importantes da história republicana do
país. Um governante multifacetado e articulado, conseguiu ao longo do seu
governo assumir várias posturas.

Contudo, este trabalho almeja construir um recurso paradidático, jogo, que


possibilite uma forma de aprendizagem mais interativa e menos tradicional, isto
é, pautado em um ensino de apenas reprodução, sem interação do aluno.
Consoante a isso, segundo Paulo Freire: “Ensinar não é transferir conhecimento,
mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.”
(FREIRE, Paulo. 1996. p.148 ) Assim sendo, a participação do estudante e a
transmissão do conhecimento é algo mútuo e realizado de maneira ampla. Assim
sendo, o jogo surge justamente dentro desse contexto, como também da
necessidade de momentos de ludicidade, pois é de grande relevância explorar
este ponto, pois são ocasiões as quais o aluno poderá explorar sua criatividade
e seus vários saberes concomitantes. A transformação e a renovação do ensino
de história são cruciais para construção do saber.

“A ação pedagógica muda porque mudam seus agentes: mudam professores,


mudam os alunos, mudam as convenções de administração escolar e mudam os
anseios dos pais(...) Bem, se estamos concluindo que o ‘fazer histórico’ muda
bastante se estamos concluindo que a escola muda também, é imperativo
pensar que a renovação de ensino de história deve ser trazida constantemente
à tona” (KARNAL, Leandro.2013.p.9 )

Debate teórico
As salas de aula do mundo contemporâneo apresentam grandes mazelas que
vêm sendo estudadas e discutidas há décadas. Renovar o ensino de história 224
bem como a própria historiografia é uma missão colocada em pauta pelos
historiadores insatisfeitos com o engessamento e superficialmente dos
conteúdos presentes no cotidiano do aluno através dos livros didáticos do ensino
básico. Ainda, tem-se que lhe dar cotidianamente com uma historiografia linear,
eurocêntrica que privilegia o Ocidente e os “vencedores” dos diversos conflitos
perpassados na história da humanidade.

Diante dos pontos apresentados faz-se necessário uma profunda mudança no


estudo e no ensino de história da contemporaneidade. Segundo PINSKY:” É
preciso, nesse momento, mostrar que é possível desenvolver uma prática de
ensino de História adequada aos novos tempos (e alunos): rica de conteúdo,
socialmente responsável e sem ingenuidade ou nostalgia.”( PINSKY & PINSKY,
2005, p. 19 ) Por tanto o presente trabalho busca como já dito, criar novos
recursos que venham dar possibilidades para criação de boas aulas para uma
sala de aula em mudança. Para realização de tal artífice foi escolhido o trabalho
com o lúdico nas series iniciais da educação básica, pois segundo RIOS &
SILVA:

“As atividades lúdicas nas series iniciais do ensino fundamental irão estimular os
conhecimentos já existente dos alunos, além da facilidade que o aluno terá para
adquirir certo conhecimento os jogos são essenciais para criar laços de
amizades, afeto, companheirismo, trabalho em equipe, solidariedade, tolerância
e respeito, pois vive o lúdico dentro da escola é uma forma de descoberta para
a o mundo.”( RIOS & SILVA .2018, p. 3 e 4 )

Para tanto “Show do Vargas” foi um game criado para discentes do 9ª ano, com
a premissa de ser uma revisão e uma possível avaliação lúdica, criativa e atrativa
do conteúdo previamente estudado no contexto da sala de aula. A utilização de
um game para realização de tais objetivos se dá pela melhor receptividade que
este tem o discente, constantemente preenchido com textos, livros, artigos e
avaliações formais que muitas das vezes não condizem com a própria carga
horária que o estudante tem para efetivá-las com êxito.

“Os jogos lúdicos oferecem condições do educando vivenciar situações-


problemas, a partir do desenvolvimento de jogos planejados e livres que
permitam à criança uma vivência no tocante às experiências com a lógica e o
raciocínio e permitindo atividades físicas e mentais que favorecem a
sociabilidade e estimulando as reações afetivas, cognitivas, sociais, morais,
culturais e linguísticas.” (RIOS & SILVA, 2018, p. 4)
No tocante a temática ao conteúdo que a supracitada atividade irá abordar deve-
se agregar para legitimar sua escolha a grande importância que o período
Varguista teve no desdenhar de toda República, representando determinada
ruptura com a chamada “República Velha” e iniciando um período de importantes
mudanças na história do país. Assim, ao longo de 09 (Nove) questões o aluno
irá de encontro com questões de múltipla escolha formuladas de maneira 225
específica sobre os aspectos mais relevantes do referido momento.

Fugindo do engessamento e do estudo do fato por si só, o desafio em formato


Power Point inicia abrangendo o contexto que levou ao golpe, ou, revolução de
30, considerando os grandes eventos acontecidos anteriormente ao mesmo
como os movimentos tenentistas e a crise da bolsa de NY. Ainda sobre este fato
abordamos de maneira extremamente sintética qual motivo levou ao estopim da
supracitada revolução, se referindo a morte do vice-presidente a chapa de
Getúlio, João Pessoa, como fator crucial no momento estudado. Entretanto, a
grande ênfase do game foi nos marcos que aconteceram sucessivamente a este
último, pois, segundo Lilia Maria Schwarcz :

“(..) a revolução de 1930, como a rebelião ficou conhecida, tornou-se um marco


decisivo para os historiadores – menos pelo movimento em si e mais pelos
resultados que produziu, nos anos seguintes, na economia, na política, na’
sociedade e na cultura, os quais transformaram radicalmente a história do país.”
(SCHWARCZ, Lilia. 2015, p. 361)

A posteriori começam a serem apresentadas questões sobre o período varguista


em si, iniciando por de maneira geral compreender suas divisões segundo a
historiografia contemporânea até o ponto de questionar especificamente os
mecanismos criados no período em que o país estava governado pelo gaúcho
tais como o Departamento de Imprensa e Propaganda (Dip) e Delegacia Especial
de Segurança Política Social. (Desp), típicos de um regime autoritário. A própria
SCHWARCZ (2015, p. 375), diz que num estado autoritário muito próximo ao
fascismo europeu onde a autora vem a chamar de “Pequeno Fascismo
Tupinambá”, era essencial que o seu principal líder, base do sistema em vigor,
conseguisse centralizar seu poder inibindo a capacidade de ação ou reação das
massas. Para tanto foram criados os mecanismos ditos acima à medida que a
constituição de 1934 ia se afrouxando.

Contudo, é por este mesmo caráter autoritário que se caracteriza a segunda


metade deste período, com políticas de centralização e legitimação do
totalitarismo utilizado por Vargas a partir do momento que ficara a posteriori
conhecido como Estado Novo. Assim, decidimos por dar ênfase ao centralismo
realizado por Vargas bem como a legitimação desta atitude durante as últimas
perguntas do jogo. Abordando o Plano Cohen, as políticas de valorização e
incentivo ao café e a própria participação do Brasil no conflito da 2ª guerra
mundial elaboramos as últimas perguntas centradas no debate sobre este
período específico do governo de Vargas. Os estudos de tais quais se fazem
essenciais perante a afirmação do José Murilo de Carvalho referente ao regime
do Estado Novo:

“De 1937 a 1945 o país viveu sob um regime ditatorial civil, garantido pelas forças
armadas, em que as manifestações políticas eram proibidas, o governo legislava
por decreto, a censura controlava a imprensa, os cárceres se enchiam de 226
inimigos do regime”.( CARVALHO, José. 2012, p. 109)

Portanto, percebe-se o intuito de criar um recurso didático pedagógico que sem


perder seu teor bibliográfico possa servir de base para uma exímia revisão das
aulas de história. A partir de renomados autores como Lilia Schwarcz e José
Murilo elaboramos as questões descritas de maneira objetiva e apropriada para
a classe escolar que a mesma deverá ser aplicada esperando assim poder
auxiliar na construção de aulas melhores numa sala de aula em mudança.

Método
O método empregado foi baseado em um guia de jogos desenvolvido por
Marcello Paniz Giacomoni (2013) e publicado no livro intitulado: ‘’ Jogos e ensino
de história’’. Dessa maneira, o autor aponta ferramentas fundamentais para
construção de um jogo, entre elas estão: Delimitação temática; A escolha da
superfície do jogo; A dinâmica do jogo, isto é, suas regras e narrativas; Layout
do jogo. Dito isso, esses elementos são expostos nos parágrafos seguintes.
A priori, atividade pedagógica proposta é um jogo desenvolvido no PowerPoint
intitulado por ‘’ Show do Vargas’’ com nove perguntas autorais (realizadas pelo
desenvolvedores desse projeto). Nesse sentido, para cada pergunta existem
quatro alternativas sendo apenas uma correta, o jogo deverá ser iniciado e
executado no modo ‘’apresentação de slides’’.

Figura 1: Iniciar jogo


(A parte destacada em vermelho corresponde ao modo de apresentação do jogo
que deverá ser usado para abertura do produto, ou é possível também utilizar a
própria tecla ‘’ F5’’ para mesma função.)

Por conseguinte, o jogador ao clicar em uma das respostas é automaticamente


levado a uma página, a qual irá apontar como erro ou acerto, a apresentação do
resultado é através de algumas imagens com um tom cômico, a fim de
proporcionar diversão e transmitir conhecimento. Este material de ensino se
deteve a analisar a período varguista apontando suas características principais,
forma política e etc.

227

Figura 2- Primeira pergunta do jogo

O jogador ao acertar se depara com a seguinte imagem:


228

Figura 3- Resposta correta

Por outro, quando resultado é negativo

Figura 4: Resposta errada

De maneira consequente, este jogo tem objetivo de contemplar determinadas


exigências curriculares, ou seja, conforme a Base Nacional Curricular (BNCC) no 9º
ano do ensino fundamental tem como objetos de conhecimento: ‘’ O período
varguista e suas contradições. A emergência da vida urbana e a segregação espacial O
trabalhismo e seu protagonismo político’’(BRASIL, BNCC.2017.p.428). A forma de
execução dessa ferramenta pedagógica consiste em diversas aplicações, tendo a
possibilidade ser algo individual, o professor disponibilizando este material para
turma e discutindo as dúvidas dos estudantes ou uma aplicação coletiva que poderá
entre várias possibilidades pedagógicas ser apresentado desta forma:

ETAPA 1: Ao iniciar a aula, preparamos a turma para o jogo que será vivido através 229
do uso de slides expostos no quadro para a turma. Dividindo ela em dois grandes
grupos.

ETAPA 2: Após ter dividido a turma em dois grandes grupos, convidamos um


representante de cada equipe para responder a pergunta que aparece no quadro.

Entre eles, acontece uma escolha de cada representante que responderá. Os mesmos
tem a opção de uso de consultarem a equipe para terem auxilio nas respostas. Porém,
é cronometrado pelo professor um tempo limite de 3 minutos para o grupo responder
a perguntar. Caso respondido errado, a questão passa para a equipe adversária. Cada
questão equivale 10 pontos. Se acontecer das duas equipes errarem, a questão é
pulada pelo próprio professor. Detalhe importante: Após cada resposta dada, o
professor explica o conteúdo que a envolve e o seu cenário dentro da Era Vargas.

Para elaboração dessa didática, foram utilizados alguns materiais, os quais foram
fundamentais para a construção da dinâmica no jogo:

- O programa ‘’Microsoft PowerPoint’’

- 1 imagem reconfigura do famoso ‘’Show do Milhão’’ e 19 imagens com


temáticas engraçadas(‘’memes’’) disponibilizados facilmente na rede de
navegação e alguns construídos durante o planejamento do projeto(para tal
criação: https://www.iloveimg.com/pt/gerador-de-memes

- 4 fundos musicais:
1) Primeiro slide com fundo musical da própria abertura do Show do Milhão
original: Baseada na música: "Planet Earth" (Duran Duran). Duração da
música (2:34)
2) Todas as perguntas possui uma música intitulada ‘’ Show do
Milhão/Suspense 1’’. Duração da música(1:28)
3) O slide com as alternativas corretas possui um fundo musical de aplausos
com nome de ‘’ MINIOS APLAUDIENDO’’ (00:06)
4) O slide com as alternativas incorretas possui um fundo musical triste com o
nome de ‘’ Naruto- Sandness and Sorrow’’(2:59)
- Para criação das perguntas foram utilizados dois livros bases: José Murilo 230
de Carvalho ‘’ Cidadania no Brasil: Longo caminho’’ e Lilia Moritiz SCHWARCZ
‘’ Brasil: uma Biografia.
- Modo de execução foi utilizado os próprios recursos do programa

Conclusão
Portanto, buscamos causar diversificação e inovar nos métodos usados para o
Ensino de História, cada vez se torna mais necessário quando entendemos a
escassez e ineficácia encontrada dentro desse cenário nos dias atuais. A
educação compacta, estruturada em uma linha de ensino ultrapassada e que
não se adapta ao inovar necessário com as constantes mudanças que
acontecem no cenário mundial e principalmente educacional. Com isso, nas
ausências de meios inovadores e sem o uso a favor da tecnologia, transformam
o Ensino de História em uma caixa de conteúdo sem surpresas e que não causa
a curiosidade necessária para que ela seja aberta. O nosso jogo, ‘‘Show do
Vargas’’, foi criado de forma consciente com o cenário educacional que estamos
inseridos, principalmente no meio da educação público, a qual não recebe
investimentos e incentivos governamentais suficientes, junto a ausente
participação de uma sociedade ativa nesse meio, para que aconteça o seu
aprimoramento.

Referências biográficas
Ana Virgínia de Andrade Lima é discente do curso de Licenciatura em História
da Universidade de Pernambuco (UPE), campus Mata Norte.
José Victor Ferreira Rocha dos Santos é discente do curso de Licenciatura em
História da Universidade de Pernambuco (UPE), campus Mata Norte.

Referências bibliográficas
BEZERRA, Holien G.. Ensino de História: conteúdos e conceitos básicos. In:
Leandro Karnal. (Org.). História na Sala de Aula: conceitos, práticas e propostas.
1ed.São Paulo: Contexto, 2003, v. 1, p. 37-47.

CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Saberes necessários à prática


educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. 148p.

GIACOMONI, Marcelo. Construindo jogos para o Ensino de História. In:


GIACOMONI, Marcello; Pereira, Nilton. Jogos e Ensino de História. Porto Alegre:
Evangraf,2013.p.87-112
PINSNKY, J.; PINSNKY, C. B. Abordagens. In: KARNAL, L. (Org.). História na
sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo: Contexto, 2005. p. 17-
36.

RIOS, Pedro; SILVA, Thaynara. O lúdico nas séries iniciais do ensino


fundamental: a brincadeira deve continuar. Recife: CONEDU, 2018. 231

SCHWARCZS, Lilia Moritz Brasil: uma biografia / Lilia Moritz Schwarcz e Heloisa
Murgel Starling — 1a - ed. — São Paulo : Companhia das Letras, 2015.
UM PROFESSOR DE HISTÓRIA EM TEMPOS
PANDÊMICOS: RELATO DE EXPERIÊNCIA E
REFLEXÃO SOBRE O ENSINO BÁSICO
232
REMOTO
José Ricardo Paulo de Lima

O presente texto tem como objetivo descrever minhas experiências enquanto


professor de História na Educação Básica, mais precisamente, no Ensino
Fundamental II - modalidade remota. Faço minhas reflexões a partir das
concepções de ensino, fruto de minhas experiências no âmbito acadêmico. A
necessidade de buscar formas para engajar os estudantes nas aulas online tem
sido a força motriz para muitos professores se reinventarem, mudarem suas
perspectivas e desenvolverem suas habilidades. E a energia empregada nessa
empreitada me rendeu retornos positivos, dos quais comunicarei nas linhas que
se seguirão, a partir das análises dos planejamentos, execuções e resultados
das aulas ministradas.

A princípio, uma contextualização


Em 26 de fevereiro de 2020 foi confirmado o primeiro caso de coronavírus em
nosso país, o “Sars - Cov - 2” chegou ao Brasil e seus impactos foram
catastróficos. A situação se agravou com o passar do tempo. Até o momento da
produção deste texto são 362.180 mortes e 13.677.564 casos confirmados, mas
não são apenas números. Esse montante corresponde a quantidade de sonhos
interrompidos, famílias vitimadas e vidas perdidas. O cenário é aterrador, as
perspectivas de futuro são nebulosas, por vezes nos pegamos refletindo o que
restaria no final dessa viagem tortuosa. Seguimos, com a esperança de que nas
pontas das agulhas que iniciam a campanha de vacinação (ainda pouco
abrangente), nas práticas de distanciamento social, uso das máscaras e
higienização das mãos conseguiremos vencer esse inimigo invisível.

Dito isso, registro aqui a atual vivência da educação brasileira. Em suas casas,
os alunos sofrem em meio ao processo de formação cidadã na modalidade
remota. Em frente às telas, os estudantes se esforçam para acompanhar as
aulas e, acima de tudo, compreender o conteúdo que está sendo trabalhado.
Outros fatores confirmam que o ensino online veio em um momento complicado.
Ainda não estávamos prontos para essa nova realidade, pesquisas apontam que
até o segundo semestre de 2020, 46 milhões de brasileiros não possuíam acesso
a internet. Essa realidade se mostra ainda mais preocupante ao pensarmos
especificamente na realidade das crianças e jovens atendidos pela rede pública.
As dificuldades de acesso e a falta de equipamentos adequados atrapalham o
desenvolvimento intelectual e a aprendizagem desses estudantes.
É essencial levarmos em consideração a situação do profissional de ensino. O
professor, figura fundamental na formação cidadã, também foi apanhado por
essa demanda. E para corroborar com a informação de que não estávamos
totalmente preparados, segundo uma matéria do portal de notícias G1, o ensino
seja de maneira totalmente remota ou na forma híbrida (com parte dos alunos
em sala de aula e outra parte em casa, acompanhando através de seus celulares 233
e computadores) acabou por se mostrar uma tarefa estressante e problemática.
O professor precisa se desdobrar para atender esses dois públicos e
desenvolver uma aula eficaz, capaz de construir o conhecimento com a turma, o
que nem sempre é possível.

Mas não devemos encarar o ciberespaço como uma zona de conflito, nem ver
os meios digitais como inimigos. Pois, na falta deles, lecionar seria impossível
neste momento de crise sanitária. A educação é uma ferramenta de construção
social, pertence a uma sociedade e precisa estar preparada para lidar com ela e
com os seus desafios. Se existem dificuldades por parte dos professores para o
uso dessas ferramentas, devemos observar a formação desses profissionais.
Aqui proponho pensarmos na formação dos professores de História, pois é essa
área na qual sou licenciado.

A formação
Entre os anos de 2015 e 2019 fui graduando do curso de História, modalidade
licenciatura, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Desde o
início tive o grande prazer em conhecer e integrar (entre 2015 e 2017) o corpo
de bolsistas do programa de iniciação à docência, o PIBID subprojeto História.
Essa oportunidade me garantiu vivências edificantes e, diferente de outros
colegas, pude conhecer a realidade escolar, na posição de professor, antes
mesmo do que eu esperava.

Devo evidenciar o trabalho desenvolvido pelas coordenadoras do projeto no


período em que estive atuante “as professoras doutoras do Departamento de
História da UFRN, Juliana Teixeira Souza e Margarida Maria Dias de Oliveira.
[...] Ao afirmarem que o professor de História deve ensinar História como se faz
História” (FERREIRA; LIMA, 2018, p 591). Despertaram, naqueles que fizeram
parte deste grupo, a vontade de transformar suas futuras aulas em ferramentas
de formação social. Por isso, entendo que conhecer os estudantes, e os meios
onde eles estudam, é essencial para o cumprimento da função das aulas de
história: formar cidadãos que estejam preparados para vida em sociedade e para
o mercado de trabalho.

Infelizmente tenho que pontuar o fato de que os graduandos em História da


UFRN, onde estive inserido, não encontram nas disciplinas oferecidas pelo
Departamento o preparo necessário para a vida docente. Como podemos
conferir no trabalho de FERREIRA e LIMA, 2018, onde se buscou pensar a
formação de professores de história. Segundo o texto, não existem reflexões
acerca de como o conhecimento e o método histórico devem promover um
Ensino de História significativo na educação básica. Uma boa parcela dos
professores doutores da academia se preocupavam mais em ler e interpretar
textos do que em pensar sobre como tornar o ensino efetivo e de qualidade.

Vejamos o problema encontrado a partir deste apontamento. Entre professores


acadêmicos conteudistas e os graduandos em formação (do ambiente já citado)
não existe uma construção coletiva de pensamentos, métodos e atitudes para 234
planejar suas futuras atuações. Então, como esperar que professores do Ensino
Básico busquem desenvolver e/ou adotar posturas e metodologias ativas se
essa não foi a formação recebida? Parafraseando a resposta proferida por um
dos professores do Departamento, quando o fiz essa questão, “Sejamos
Autodidatas”. Essa solução graciosamente oferecida pelo acadêmico, vai de
encontro ao que se pensa sobre ensino. Observe “Produzir conhecimento
histórico na dimensão do ensino escolar é construir coletivamente conhecimento
histórico (que serão novos apenas para alunos) a partir do conjunto de saberes
aceitos pela tradição historiográfica" (OLIVEIRA, 2010, p. 11).

Por fim, afirmo que é necessário ter uma formação de professores que, por si só,
os preparem para a prática de formação cidadã. Se hoje há quem tenha
dificuldades em produzir uma aula de qualidade para ser executada de forma
remota, a culpa não é deste profissional, mas sim de uma licenciatura carente
de diversidade metodológica. Devemos sempre lembrar que “Antes de ser uma
disciplina científica - segundo sua pretensão e, até certo ponto, conforme ela o
é efetivamente - a história é uma prática social” (PROST, 2015, p. 13). Espero
que todos nós estejamos preparados para exercê-la, seja na sala de aula física
ou remota.

A Nova Sala de Aula


A atual conjuntura tirou as aulas do espaço escolar e as levou para o espaço
virtual. Aplicativos e ferramentas para realização de reuniões online foram
adotados como principais plataformas de ensino. Nós professores encontramos
um novo meio de trabalho cheio de possibilidades. No entanto, para aqueles que
ainda não dominam as diversas tecnologias de informação e de comunicação
esse quadro se mostrou um pouco mais tortuoso.

Contudo, ferramentas como o Google Meet, que segundo o portal de notícias G1


chegou a atingir cerca de 600 milhões de usuários conectados em uma única
semana, estão possibilitando a realização das aulas a distância. O fácil acesso
e os controles simples garantiram aos alunos e professores o andamento de
seus trabalhos. A matéria aponta ainda que no Meet cerca de uma centena de
pessoas podem participar das reuniões ao mesmo tempo. Portanto, a plataforma
digital é a alternativa adequada para o ensino nesses tempos pandêmicos, mas
não deve ser a única.

É necessário que se faça um momento de reflexão. Até quando a Educação


precisará destes recursos? Quais serão os impactos do ensino remoto, a longo
prazo, na sociedade? E nós, professores, estamos preparados para esse “novo
normal”? Estas questões pairam sobre nós e, ao que tudo indica, ficarão por um
bom tempo.

Ainda assim, vale citar que o uso dos meios digitais me parece um caminho sem
volta. Pense bem, quantos canais educativos existem na plataforma YouTube?
A resposta é muitos, a plataforma passou a fazer uso de um selo que assegura 235
a qualidade do canal e seu comprometimento com a informação. Basta pesquisar
rapidamente que muitos canais surgiram, é possível estudar para exames,
concursos ou apenas para obter aquele conhecimento desejado. É um
verdadeiro festival de salas de aulas, disponível a um click. E se você acha que
nós professores não perderemos espaço, saiba que concordo com você. No
entanto, é necessário se qualificar e estar preparado para esse cenário.

Outra situação me chamou a atenção nesse período. O uso dos aparelhos como
celulares, tablets, notebooks entre outros que eram proibidos em sala de aula
agora se tornaram os meios pelos quais os alunos chegam até suas turmas. Mas
isso é extremamente interessante, não é mesmo? Algumas lições estão sendo
aprendidas, o que antes não foi incorporado agora se tornou indispensável.
Curioso também é o fato de que em alguns lugares os aparelhos (TICs) foram
barrados com força de lei como apontado no trabalho de SPINOSA (2020), ela
traz, entre outras coisas, o caso do Pará e sua proibição das posses desses
equipamentos por parte dos estudantes no espaço escolar.

Em um momento nefasto, meios que deveriam ser utilizados como ferramentas


facilitadoras de acesso ao conhecimento, e que foram banidos outrora,
ressurgem como veículo de conexão entre os atores do palco escolar. O meu
relato está inserido nessa conjuntura, na qual apesar das dificuldades da área e
do momento aterrador, uma pequena proposta pode transformar um verdadeiro
desafio em uma experiência exitosa.

A Ferramenta
A metodologia utilizada foi um jogo simples de questões objetivas com múltiplas
escolhas, que iam da letra A a D. E como um incentivo a mais, ofereci uma
premiação ao grupo vencedor, que deveriam escolher entre duas opções: a
primeira seria uma pontuação extra na média e a segunda seria uma ou mais
caixas de chocolate (a depender do tamanho do grupo). Além de estar a todo
momento representando a figura de um apresentador de TV a frente de um
desses famosos games shows, um verdadeiro mediador empolgado. Unindo isso
aos conteúdos trabalhados nas aulas anteriores, estava feito o “Quiz Histórico".

Como são “as perguntas que movem o mundo”, utilizei as questões como guias
para consultar as fontes disponíveis que eram as páginas do material didático.
Seguindo as diretrizes que apontam: “as etapas de produção do conhecimento
histórico [...] são também a base para o ensino de História” (OLIVEIRA, 2010, p.
11). E como já foi dito “Não existem fatos, nem história, sem um questionamento”
(PROST, 2015, p. 75).
Os conhecimentos organizados para formulação do Quiz foram os seguintes:
Estudo da História; Os Primeiros Grupos Humanos e A Mesopotâmia foram os
conteúdos do Quiz para as turmas de 6° ano. O Renascimento Cultural; Os
Estados Nacionais Modernos; As Grandes Navegações e As Reformas
Religiosas foram os assuntos do jogo para os 7° anos. Já para as turmas de 8°
ano, os temas foram A Revolução Inglesa e o Iluminismo. Por fim, temos os 9° 236
anos com os conteúdos de Brasil: Primeira República e A Primeira Guerra
Mundial. Porém, havia um objetivo maior que era conseguir o engajamento das
turmas nas aulas remotas.

Diário de Classe
A escola onde obtive essas experiências exitosas está situada no município de
Natal, no Rio Grande do Norte. Integrando a rede privada de ensino, o Eficácia
Colégio e Curso tem por objetivo formar cidadãos responsáveis, conscientes e
atuantes. Minha identificação com a escola se deu rapidamente, tanto pela sua
visão e valores, quanto por sua origem. Estando inserida na zona oeste, periferia
potiguar, posso dizer que tanto a escola quanto meus alunos basicamente são
meus vizinhos, e eu tenho muitos.

Agora irei expor minhas observações acerca dessa vivência, e começo com o 6°
ano. É com muita alegria que escrevo o fato de tanto a Turma “A” quanto a “B”
se mostrarem extremamente entusiasmadas, a euforia era perceptível, ainda
que eles não estivessem presentes de forma física. Isso se apresentava nas
diversas câmeras (webcams) ligadas, nos incontroláveis microfones e na chuva
de comentários no chat.

Sobre a execução do Quiz Histórico, vale apontar que as diretrizes estavam


claras, mas ainda assim eu as repetia a todo momento. No entanto, me
surpreendia quando, por vezes, aqueles espertinhos tentavam burlar as regras
do jogo. Existiam também muitos pedidos para que se alterasse uma regra ou
outra, obviamente com o intuito de beneficiar o grupo da rodada, fato que me
despertava risos.

O Quiz Histórico movimentou o alunado, a participação foi mais que satisfatória


e eu pude constatar que o aprendizado estava ocorrendo de maneira efetiva.
Com os acertos das questões, o sentimento de dever cumprido e proximidade
da vitória animava os estudantes. Enquanto o professor que redige este texto
mergulhava em um mar de contentamento, as duas turmas de 6° ano
demonstravam que mesmo com todas as dificuldades é possível seguir, e assim
nós devemos fazer.

Os 7° anos “A” e “B” também apresentaram excelentes participações, seja com


o uso do Chat ou através dos microfones. Foi muito bom ver os rostinhos ávidos
na tela, a diversão e a competitividade eram claras, todos queriam falar. Sob os
olhos de um professor empolgado, isso parece um verdadeiro engajamento com
o projeto.
A princípio, a turma do 7°A apresentou dificuldades para compreender ou aceitar
as regras, mas superamos isso e podemos seguir com a proposta. Apesar de
estarmos à distância, o plano correu como era esperado, a turma se empenhou
em resolver as questões e vencer o Quiz. Obviamente, a existência de uma
premiação fez toda a diferença. O jogo se configurou como uma atividade
diferente do que eles esperavam para a aula, mas saber que o grupo vencedor 237
seria recompensado despertou algo forte neles, a disputa foi acirrada.

Já sobre os 8° anos, foi extremamente gratificante notar a boa participação dos


alunos do 8° “B”, tidos como uma turma difícil de lidar, por parte dos outros
professores da escola. Ainda assim, preciso confessar que as turmas A e B de
fato foram um pouco menos competitivas que as demais. Se isso significa menos
engajamento, não sei, mas prefiro acreditar que os perfis são diferentes.

Alguns momentos de desordem surgiram durante a aula. A tentativa de desafiar


a minha presença em sala foi notada, mas mesmo com um clima não tão leve
consegui trazê-los para o jogo. Ao chegarmos aos momentos finais, foi possível
captar a competitividade entre eles. A escolha de uma das duas opções de
premiação também os animou.

Para nos encaminharmos até a conclusão dos relatos, trago aqueles que, talvez,
tenham sido os maiores exemplos de sucesso da minha proposta. As duas
turmas de 9° ano marcaram essa experiência de maneira extraordinária, com
empenho e competitividade.

Os concluintes do Ensino Fundamental II deram um verdadeiro show de


participação, para minha surpresa, pois acreditei que por se tratarem de grupos
mais velhos a aceitação seria menor. No entanto, a mesma euforia e energia dos
6° anos foram sentidas com eles, porém o nível de competitividade extrapolou o
esperado. O 9° ano, turma B, mostrou-se a verdadeira estrela desse show, ou
melhor, Game Show. Como se não fosse o bastante todo o empenho e todas as
pequenas disputas que fizeram a nossa aula fervilhar, a inconformidade com o
resultado desse jogo levou os alunos a um debate que nos fez transpor o horário
padrão da aula. Vale ressaltar que se tratava do último horário, e mesmo após
toda uma tarde de estudos eles continuaram.

Acredito que neste momento, existem dúvidas crescentes na mente do meu


leitor. Será mesmo que todas as turmas corresponderam tão bem assim ao Quiz
Histórico? Eu não julgarei mal aquele que duvidar da veracidade de minhas
palavras, afinal o quadro da educação durante esse período de pandemia é
caótico. Mas estamos aprendendo com tudo isso, mesmo com todas as
dificuldades. A partir disso, afirmo que o Quiz Histórico foi um planejamento que
se executou de maneira esplêndida. Um verdadeiro sucesso, fato pelo qual fico
extremamente satisfeito.

Conclusão
Apresentei neste texto alguns elementos referentes às condições das quais o
Ensino Básico se encontra durante o período de pandemia do novo coronavírus.
Trouxe um balanço da situação global, com foco no Brasil. Fiz observações
acerca da realidade dos professores, assim como de sua formação que carece
de atenção sobre as variedades metodológicas. Refleti, também, sobre os TICs,
as ferramentas digitais que antes eram repelidas, mas agora são recorridas. E 238
por fim, apresentei meu relato de experiência, junto as minhas ponderações
sobre os estudantes e nossas práticas conjuntas.

Trago aqui mais uma informação. Após a realização do Quiz Histórico o nível de
participação na aula e a interação dos estudantes cresceram nitidamente. O chat
do Google Meet é utilizado com mais frequência, mesmo que às vezes surjam
comentários banais, e suas câmeras e microfones também não ficam sem uso.
Posso inferir que as turmas estão mais entrosadas e que atingi meu objetivo de
engajar os estudantes. Ainda estou colhendo os frutos de meu trabalho e sei que
mais deles estão por vir, com mais atividades a partir do uso de metodologias
ativas. Acredito que dessa forma todos ganharão, e meus objetivos de tornar o
ensino interessante e significativo serão alcançados.

Referências biográficas
José Ricardo Paulo de Lima, professor formado pela Universidade Federal do
Rio Grande do Norte (UFRN). Atuante no Eficácia Colégio e Curso, escola da
rede privada de Ensino Básico.

Referências bibliográficas
DADOS estatísticos do coronavírus (COVID-19). Ajuda da Pesquisa do Google.
Disponível em:
<https://support.google.com/websearch/answer/9814707?p=cvd19_statistics&hl
=pt-BR&visit_id=637540909887834896-25389469&rd=1>. Acesso em: 15 abr.
2021.

‘ENSINO híbrido’: as dificuldades para o aprendizado com parte da turma on-


line e a outra na sala de aula. Portal do G1. Disponível em:
<https://g1.globo.com/educacao/volta-as-aulas/noticia/2021/03/10/ensino-
hibrido-as-dificuldades-para-o-aprendizado-com-parte-da-turma-on-line-e-a-
outra-na-sala-de-aula.ghtml>. Acesso em: 15 abr. 2021.

FERREIRA, Isabela da Silva; LIMA, José Ricardo Paulo de. Em Defesa da


Formação de Professores: a contribuição do PIBID na permanência
universitária. In: ANAIS DO ENCONTRO VII ENCONTRO ESTADUAL DE
HISTÓRIA DA ANPUH-RN E XIV SEMANA DE ESTUDOS HISTÓRICOS DO
CERES-UFRN: a história e o futuro da educação no Brasil. Caicó, RN. 2019.

GOOGLE Meet, ferramenta de videochamadas, amplia reuniões ilimitadas


gratuitas até março de 2021. Portal do G1. Disponível em:
<https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/2020/09/29/google-meet-
ferramenta-de-videochamadas-amplia-reunioes-ilimitadas-gratuitas-ate-marco-
de-2021.ghtml>. Acesso em: 17 Abr. 2021

MORTES e casos de coronavírus nos estados. Portal do G1. Disponível em:


<https://especiais.g1.globo.com/bemestar/coronavirus/estados-brasil-mortes-
casos-media-movel/>. Acesso em: 15 abr. 2021. 239

OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de. Introdução. IN: Coleção Explorando o


Ensino de História: Ensino Fundamental. Brasília: Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Básica, 2010.

PROST, Antoine. Doze Lições Sobre a História. 2 ed. 3 reimp. Belo Horizonte:
Autêntica, 2015.
QUEM são as pessoas que não têm acesso à internet no Brasil? Brasil de Fato.
Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2020/08/10/quem-sao-as-
pessoas-que-nao-tem-acesso-a-internet-no-brasil>. Acesso em: 15 abr. 2021.

SPINOSA, Vanessa. Ciberespaço, Letramento e Docência: experiência com


TDICS no ensino de história. IN: OLIVEIRA, Airan dos Santos Bordes de;
COSTA, Maria da Conceição da Silva (Org.) História em Jogo: as questões do
tempo presente e os desafios do ensino de História. São João de Meriti, RJ:
Desalinho, 2020.
INVESTIGANDO A HISTÓRIA: CULTURA
HISTÓRICA E PRODUÇÃO AUDIOVISUAL
Josias José Freire Júnior e Vívian Silva de
240
Medeiros

O texto a seguir propõe discutir relações entre a produção audiovisual


contemporânea e o conceito de cultura histórica. Parte-se dos campos da teoria
da história para analisar as versões da história apresentadas pela série televisiva
"Investigadores da História", veiculada pelo canal History a partir de 2020. As
considerações que se seguem são parte dos resultados da pesquisa
desenvolvida com apoio e financiamento do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia de Brasília (IFB), no âmbito do Edital N. 08/2020 -
RIFB/IFB, de fomento à pesquisas de Iniciação Científica (IC-EM), com bolsa de
iniciação científica do IFB. Inicialmente serão apresentadas algumas reflexões
sobre a relação entre produção audiovisual e conhecimento histórico, seguidas
de uma discussão do conceito de cultura histórica para, por fim, discutir as
possibilidades de se refletir sobre a cultura histórica contemporânea a partir da
série "Investigadores da História".

O consumo de produtos audiovisuais se ampliou consideravelmente nos últimos


anos com o avanço das chamadas novas mídias no bojo da revolução
informacional das últimas décadas. Essa ampliação contribuiu significativamente
com a diversificação de temas, gêneros, formatos e públicos, inserindo a
linguagem audiovisual em uma teia de relações que inclui suas tecnologias,
dinâmicas mercadológicas, impactos históricos e socioculturais, bem como seus
significados políticos. A produção do conhecimento histórico em âmbitos
acadêmico e escolar necessariamente precisa dialogar com o papel da
linguagem audiovisual nos modos de compreensão da história e da circulação
social do conhecimento histórico.

Desde o tradicional cinema de conteúdo histórico, o audiovisual de temática


histórica se ampliou e diversificou do mesmo modo; hoje há uma extensa gama
de produtos audiovisuais que tangenciam a história, de conteúdos e tema
históricos, que constroem e influenciam as percepções sobre a história. Ficções
históricas, documentários de história, materiais instrucionais para o ensino de
História, programas de curiosidades históricas, muitas vezes produtos de difícil
classificação estabelecem, cada um deles, complexas relações com a
experiência histórica contemporânea, seja no âmbito da produção teórico-
historiográfica acadêmica, do ensinar e aprender Histórias nas escolas, ou na
forma com que a história é compreendida, seja em suas versões, ou nos
significados de sua produção.
As produções audiovisuais com temática histórica, seja o cinema, a televisão ou
mesmo o audiovisual associado às novas mídias, cumprem, pois, diferentes
papéis em relação à compreensão que seus consumidores têm da história
(ROSENSTONE, 2015, p. 18). Desde sua compreensão como documento
histórico, testemunho de sua época, meio de representação de histórias
(NÓVOA, 2012, p. 34-38) como representações não acadêmicas do passado 241
humano, passando pela reformulação mesma de "como pensamos" o significado
da história (ROSENSTONE, 2015, 54), a linguagem audiovisual mantém
estreitas relações com a produção e disseminação do conhecimento histórico.

Se as produções audiovisuais, nas duas primeiras abordagens mencionadas,


indicam as "maneiras mais comuns de relacionar cinema e história" e "são
resultado da transformação de um dos termos em objeto do outro: história como
objeto do cinema, ou o cinema como objeto da história” (HAGEMEYER, 2012, p.
09), na terceira abordagem (do filme/audiovisual como influenciador de como
"pensamos" sobre a história) se amplia o debate da produção audiovisual em
direção à "dimensão transdisciplinar", voltada à compreensão da "conexão do
pensamento histórico científico com a vida humana prática" (RÜSEN, 2015, p.
33), ou como a vida cotidiana demanda e consome o conhecimento histórico - e,
por isso, o influencia significativamente. Essa dimensão é transdisciplinar na
medida em que exige, para compreensão das relações entre saber histórico e
vida, a mobilização de saberes diferentes ciências e disciplinas (história,
sociologia, antropologia, ciências política, ciências da comunicação, etc.).
Ademais, é necessário reconhecer que as formas "como pensamos" a história
contribuem de modo determinante com uma maior ou menor ênfase na
compreensão de sua cientificidade, de seus procedimentos racionais e de seu
papel na vida contemporânea. Um dos conceitos da teoria da história que pode
contribuir com a discussão sobre compreensão cultura da história, isto é, como
determinada sociedade compreende o conhecimento histórico - antes mesmo
dos estudos de conteúdos históricos específicos - é o conceito de cultura
histórica.

Compreende-se aqui a cultura histórica como "o modo como as pessoas ou


grupos humanos se relacionam com o passado", "formas pelas quais
elaboramos experiências situando-as no tempo e no espaço" (GONTIJO, 2019,
p. 66). Considerando-se, pois, que "toda forma de pensamento histórico está
inserida na cultura histórica" (MARTINS, 2019, p. 57), essa deve ser entendida
como fonte original das carências e funções de orientação, fatores do
pensamento histórico inseridos na dimensão da vida prática, no esquema da
matriz disciplina da ciência da história (RÜSEN, 2001, p. 35).

Os saberes históricos são fundamentais no processo de "orientação cultural"


(RÜSEN, 2015, p. 143) humana diante das experiências do tempo. Além da
história propriamente dita, a memória e a tradição constituem esse "acervo" de
interpretações da experiência temporal, de modo a conferir o duplo sentido da
orientação histórica, diante "das mudanças temporais de si e do mundo"
(RÜSEN, 2001, p. 58). Por isso, Jörn Rüsen considera a cultura histórica como
o "campo da interpretação do mundo e de si mesmo, pelo ser humano, no qual
devem efetivar-se as operações de constituição de sentido da experiência do
tempo" (RÜSEN, 2007, p. 121). O conceito de cultura histórica dialoga, pois, com
as diferentes dimensões da produção de conhecimento histórico, em estreito
diálogo com a ciência da história (RÜSEN, 2001, p. 45) e com a formação
histórica (RÜSEN, 2015). 242

Assim, entende-se que a cultura história se refere "às formas e dinâmicas da


recordação coletiva (da memória histórica) e ao seu papel na vida em
sociedade", fornecendo, pois, "uma espécie de substrato para a orientação no
tempo, para o fortalecimento de identidades coletivas, para a coesão de grupos
e a legitimação de domínios" (GONTIJO, 2019, p. 69). Ao passo que e "articula
sistematicamente o aspecto cognitivo da elaboração da memória histórica, com
o aspecto político e estético dessa mesma elaboração" (RÜSEN, 2007, p. 121),
as discussões sobre a cultura histórica e suas dimensões contribuem de maneira
significativa com a compreensão dos processos de produção de conhecimento
histórico e de como ele se relaciona com a vida cotidiana, como demanda por
orientação histórica e respostas a tais demandas.

No que se refere aos conhecimentos históricos, sabe-se que ao lado da história


acadêmica, da historiografia, e da história escolar, a instrumentalização do
conhecimento histórico ressignificados por uma cultura escolar específica, a
história pública cumpre um papel fundamental na composição do sentido
histórico da cultura histórica, enquanto "acervo' dos sentidos constituídos pela
consciência histórica humana ao longo do tempo" (MARTINS, 2019, p. 55). Tal
acervo reúne informações e experiências disponíveis em diferentes produtos
culturais, desde os explicitamente marcados por uma cultura histórica - como
museus, monumentos, livros de história - até aqueles que contribuem com a
construção da experiência histórica de maneira mais sutil. Os filmes que,
representando ou não histórias, contribuem com a formatação de nossos
interesses pela história, e da compreensão do papel social, da função prática da
história para a vida, são importantes constituidores de cultura histórica
contemporânea.

Acerca do reconhecimento da produção audiovisual como fonte para o


conhecimento histórico em geral, entende-se que, embora a historiografia seja
em sua origem predominantemente um tipo conhecimento vinculado à prática da
escrita (ROSENSTONE, 2015, p. 14), há algum tempo se reconhece a
importância da imagem como fonte de conhecimento, em primeiro momento na
história da arte (HAGEMEYER, 2012, p. 40) e, pelo menos desde a primeira
metade do século XX, como fonte para a produção da história em geral, isto é,
como material a partir do qual pode-se se extrair determinadas informações
sobre o passado com intuito de compreendê-lo historicamente. A compreensão,
pois, de que o século XX foi o "século da imagem", em referência à "força que
alcançou o mundo icônico no século passado, o seu crescente e progressivo
protagonismo na vida cotidiana" (MONTÓN, 2009, p. 32) indica que já não se
pode deixar de reconhecer a importância das "mídias visuais" na composição de
nossa imagem - e também de nossos conhecimentos - sobre o passado
(ROSENSTONE, 2015, p. 16-17).

O diálogo com outras formas de se produzir conhecimento não é, do mesmo


modo, uma questão recente para a educação em geral e para o ensino de
História em específico. Há algumas décadas se reconhece as imagens, os sons 243
e especialmente sua conjugação nos produtos audiovisuais, como fontes
importantes para a produção de conhecimento histórico e como recursos
profícuos para o ensino de História. A presença do audiovisual na produção
historiográfica coincide certamente com a difusão desse meio de comunicação.
No século XX o cinema passou a despertar o interesse de teóricos e
historiadores preocupados com esta forma particular de representação da
sociedade (ROSENSTONE, 2015, p. 13-25.). A televisão, por sua vez, embora
não tenha recebido a mesma atenção que o cinema, pode ser considerada como
"devoradora de histórias" (SORLIN, 2009, p. 46), na medida em que cumpre um
papel ainda hegemônico na disseminação de conteúdos.

No contexto brasileiro, abordagem da produção audiovisual como fonte para o


conhecimento histórico se tornou mais presente com as discussões da relação
entre cinema e história promovidas diferentes trabalhos, como as obras de Marc
Ferro (1992), Robert Rosenstone (2015) e Marcos Napolitano (2009), para ficar
apenas em alguns exemplos. Tais autores, a partir de tradições historiográficas
distintas, reconhecem o cinema não apenas como objetos de estudos da história,
mas como capazes de promover e rever compreensões específicas da história.
Assim, o cinema e, em geral, o audiovisual, pode ser compreendido “não é
apenas uma prática social, mas um gerador de práticas sociais”, isto é, “além de
ser um testemunho das formas de agir, pensar e sentir uma sociedade, é
também um agente que suscita certas transformações, veicula representações
ou propõe modelos” (LAGNY apud VALIM, 2012, p. 285). Naturalmente, além de
compreendido, como mencionado, como produtor, reprodutor e transformador
de práticas sociais, o audiovisual também deve ser reconhecido como
constituidor de determinadas visões do passado, como produtor de
determinados aspectos da cultura histórica.

Acerca da abordagem das relações entre produção audiovisual para a televisão


e o conhecimento histórico, ressalta-se, pois, a função política dessa mídia, já
em suas origens, por conta de suas características técnicas, como aponta
Friedrich Kittler, principalmente devido ao seu caráter doméstico/nacional e seu
alcance (KITTLER, 2016, p. 307), e consequentemente sua importância para
compreensão da história. Se a televisão assume outro papel no contexto atual,
diante das outras mídias digitais, certamente ela não abandona seu impacto
político de formação de opinião e difusão privilegiada de informações.

Embora de relevância inquestionável no mundo contemporâneo, as relações


entre a televisão e a produção do conhecimento histórico parecem interessar
menos do que o papel do cinema na história (SORLIN, 2009, p. 41). Essa
atenção menor à "instituição televisional", ainda para Pierre Sorlin (2009, p. 41),
se relacionaria à natureza da narrativa televisiva (ora "abrupta", ora indefinida) e
dificuldade de acesso aos arquivos televisuais - dificuldade também relatada por
Eugênio Bucci (2004, p. 191). Embora talvez não tenha despertado atenção
suficiente, de acordo com Faye Sayer, os conteúdos históricos na televisão
passaram nas últimas décadas por um processo de mistura de gêneros e
formatos, consolidando atualmente a TV como uma dos principais e mais bem 244
sucedidos meios de divulgação de histórias públicas (SAYER, 2015, p. 1120-
1123), e talvez mesmo de protagonista na formação da ideia de história de um
grande número de pessoas.

No que se refere especificamente aos produtos audiovisuais televisivos e suas


relações com a história, destacam-se também as reflexões de Eugênio Bucci
sobre o papel da televisão na memória coletiva. Esse papel da televisão na
formatação da compreensão da história que a sociedade brasileira tem,
naturalmente se transformou com a emergência das "novas mídias",
especialmente com a relativa descentralização da produção e reprodução do
audiovisual - especialmente com a ampliação da oferta e consumo dos canais
de TV "por assinatura", como é caso do History. Trata-se, portanto, de uma
ampliação e mesmo potencialização da capacidade da televisão de "reciclar o
legado histórico, transformando-o" (BUCCI, 2004, p. 206), o que torna também
bastante relevante o debate sobre não apenas quais histórias, mas qual
concepção de história é construída pela televisão. A televisão se especializou
em, além de reproduzir histórias, selecionar e adaptar essas histórias a partir das
demandas das audiências, ressignificando de maneira relevante também o que
se entende por história.

Com intuito refletir sobre de que modo a produção audiovisual contemporânea


veicula ideias sobre a produção do conhecimento histórico a partir do tema da
cultura histórica, esse texto propõe, pois, discutir a série brasileira
"Investigadores da História" (2020). Trata-se assim de se discutir como a série
representa a "descoberta" de determinadas histórias - antes de discutir se essa
representação da história está coerente com a historiografia científica sobre a
temática. Por isso, mobiliza-se o conceito de cultura histórica e busca-se
compreender como determinada série pode contribuir para compreensão do
como o conhecimento histórico é produzido.

A série intitulada "Investigadores da História", não apresentaria, nesse sentido,


apenas uma determinada releitura, portanto, uma versão sobre acontecimentos
históricos específicos. Dirigida por Tony Rangel e assinada pela produtora Bioma
Produções, "Investigadores da História" estreou em 09 de fevereiro de 2020,
embora tenha sido produzida entre 2016 e 2018. A série é apresentada por dois
"criminalistas", Mauro Yared e Celso Nenevê, que colocam "à prova toda a
experiência e técnicas de investigação dos especialistas" em treze episódios de
52 minutos de duração cada, segundo as informações de divulgação da série
(BIOMA, 2021).
Em "Investigadores da História" os seus dois protagonistas "reconstroem",
baseados em depoimentos, análise de documentos (relatórios, animações,
fotografias, etc.) e por meio de experimentos em laboratório, tais como testes
balísticos, simulações com bonecos e objetos, construção modelos em
computação gráfica, etc, crimes investigados pela Comissão Nacional da
Verdade (CNV), dentre eles, os acontecimentos associados aos assassinatos de 245
Gastone Lucia, Stuart Angel, Carlos Marighella, Vladimir Herzog, dentre vários
outros. Embora se classifique como "investigação policial" e "série factual"
(BIOMA, 2021) e tenha como foco de seus episódios acontecimentos violentos
do período da ditadura civil-militar, a abordagem da série vai além da
reconstrução dos referidos crimes, fornecendo uma leitura específica sobre os
contextos nos quais os eventos estão inseridos. Trata-se pois, explicitamente,
de uma versão sobre determinados acontecimentos e, implicitamente - e aqui,
principalmente - de uma versão de como a verdade da história pode ser
descoberta.

Desse modo, embora se utilize do mesmo pano de fundo da "polêmica" e da


"descoberta", característico de outros produtos audiovisuais veiculados pelo
History (FREIRE, 2020; 2019), percebe-se de imediato que "Investigadores da
História" propõe não apenas uma versão sobre determinados acontecimentos
históricos, mas se dedica explicitamente à comprová-los, através dos "vestígios
que faltavam" "para finalmente sabermos a verdade", por meio de experiências
que representam uma investigação criminal (INVESTIGADORES DA HISTÓRIA,
2020). "Investigadores da História" aproveita, assim, o conhecido apelo do
entretenimento audiovisual de temática policial e/ou investigativa e o associa à
curiosidade histórica aguçada pela possibilidade do telespectador visitar
acontecimentos do passado ainda não suficientemente "explicados".
Entrementes, "Investigadores da História" tangencia temas caros à produção do
conhecimento histórico, tais como as ideias de evidências, fontes e documentos
históricos, testemunho, investigação e explicação históricas.

Percebe-se, pois, que a série "Investigadores da História", ao buscar o


entretenimento, na esteira dos populares programas de investigação policial, no
qual uma equipe forense desvenda um crime, contribui com a construção de uma
versão da história como resultado de procedimentos técnicos e interpretativos,
baseados em evidências, documentos, análises e experimentos, a partir de um
conjunto de procedimentos que levam a um determinado resultado - a
descoberta da verdade sobre o caso, apresentado ao final de cada episódio.
Como qualquer pessoa que conheça a história recente do Brasil pode perceber
ao assistir seus episódios, "Investigadores da História" não descobrem nada de
novo sobre os casos investigados pela CNV, apenas representam
ficcionalmente, para fins de entretenimento comercial, essa descoberta. Trata-
se, assim, de uma série televisiva que, ficcionalmente, e visando exclusivamente
o entretenimento comercial, não adiciona dados novos aos conhecimentos
históricos sobre esses terríveis episódios da história recente do Brasil, mas os
coloca, em sua narrativa audiovisual, como resultado de procedimentos
técnicos-científicos que os alçaram ao patamar de verdade científica.
A série "Investigadores da História" pode oferecer, nesse sentido, uma
oportunidade para pensar questões relacionadas às dimensões teórico-
metodológicas da história, apresentadas por um produto audiovisual,
especialmente no que concerne às versões da história produzidas para além da
academia e da sala de aula, bem como de suas relações. Desse modo, um dos 246
grandes potenciais das reflexões apresentadas é a possibilidade de se
problematizar o papel de um produto audiovisual contemporâneo na formação
das concepções de história que estão nas motivações e nos resultados tanto da
história acadêmica quanto da história escolar. No que se refere à história
acadêmica, sabe-se a importância da cultura histórica na formação de carências
de orientação e funções de orientação, enquanto origem e retorno do
conhecimento histórico à vida prática (RÜSEN, 2001, p. 35); já no que tange à
história escolar, tanto as concepções prévias - levadas pelos estudantes à sala
de aula como parte de seu repertório cultural - quanto à formação histórica
(RÜSEN, 2001, p. 48) na função didática de orientação histórica (RÜSEN, 2001,
p. 50) e suas relações com os contextos da vida prática - naquilo que Jörn Rüsen
apresenta como "pragmática" dos saber histórico (RÜSEN, 2001, p. 53).

A problemática da discussão ora apresentada perpassa, pois, questões sobre


quais seriam os significados e características da ideia de história presente na
série pesquisada, bem como suas particularidades enquanto história não
acadêmica, além do papel da linguagem audiovisual e de suas estratégias
características e relações com uma concepção de ciência representada pela
série. Em suma, como as encenações presentes na série dialogam com os
fundamentos teórico-metodológicos da produção do conhecimento histórico e,
principalmente, como tais encenações podem contribuir com a construção de
determinada perspectiva sobre do que se trata ao se produzir conhecimento
histórico.

Referências biográficas
Dr. Josias José Freire Júnior, professor do Instituto Federal de Brasília (IFB),
campus Recanto das Emas.

Vívian Silva de Medeiros, estudante do Instituto Federal de Brasília, campus


Recanto das Emas. Bolsista de Iniciação Científica de Ensino Médio (IC-EM),
Edital 18/2020 RIFB/IFB.

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Ronaldo. Novos Domínios da História. Rio de Janeiro: Ed. Elsevier, 2012.
SEGUNDA GUERRA MUNDIAL: FILMES
COMO ESTRATÉGIA PARA O ENSINO DE
HISTÓRIA
249
Letícia da Silva Leite

Cada vez mais a linguagem audiovisual, por meio do crescente aumento ao


acesso à tecnologia, tem feito parte da vida das pessoas. E, do ponto de vista
pedagógico, acreditamos que o campo de ensino da História tem muito a se
beneficiar com essa inserção tecnológica no cotidiano. Entretanto, para que
esses artefatos sejam bem aproveitados no ensino, é necessário que o
professor, se arme de estratégias para melhor utilizá-las. Visto isso, a intenção
do presente texto é compartilhar a experiência do uso de filmes para ensinar
conteúdos relacionados à segunda guerra mundial, de modo mais específico, o
Stalinismo, através da análise do filme “A queda de Berlim” de 1950, em
contraponto ao filme “Stalin” de 1992. Todavia, para além do tema proposto,
compartilharemos estratégias que podem ser utilizadas para o trabalho de
utilização de filmes como fontes históricas para o ensino de diversos outros
temas, com o propósito de dar ferramentas ao aluno para que ele possa
desenvolver sua criticidade, e não apenas como ilustração do conteúdo.

Tornou-se visível para nós, uma não associação, por parte dos alunos, entre o
estudo da história e a relação do mesmo com a realidade a que estão ligados.
Pensamos essa falta de associação da história com a atualidade como resultado
do sistema de ensino positivista, narrativo, burocrático e repetitivo que acaba
desestimulando alunos e professores, dado a transmissão de conhecimentos e
experiências socialmente acumulados sem o estímulo ao desenvolvimento das
habilidades que tornam o aluno apto a aprender a conhecer. Uma possibilidade
eficaz de superação do conteudismo, anteriormente denunciado é a
incorporação e a utilização de fontes históricas nas aulas de história, posto seu
potencial enquanto instrumento de produção de conhecimento histórico na
educação básica. Os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) tratam por
documentos históricos “as mais diversas obras humanas produzidas nos mais
diferentes contextos sociais e com objetivos variados” (BRASIL, 1998, p. 83),
desta maneira, nesse texto, abordaremos a utilização de filmes como documento
histórico.

Para que o aluno veja o filme desta forma e construa um saber ao assisti-lo, é
necessário que o professor trabalhe como mediador do conhecimento, “o
professor de História pode ensinar o aluno a adquirir as ferramentas de trabalho
necessárias; o saber-fazer, o saber-fazer-bem, lançar os germes do histórico.
Ele é o responsável por ensinar o aluno a captar e a valorizar a diversidade dos
pontos de vista. Ao professor cabe ensinar o aluno a levantar problemas e a
reintegrá-los num conjunto mais vasto de outros problemas em problemáticas.”
(SCHMIDT, 2004, p.57), trabalhando com base em pesquisas, e referências
metodológicas, permitindo ao aluno criar seu próprio conhecimento e entender o
fazer historiográfico.

Sendo assim, é importante que, como outras fontes históricas, o filme seja
trabalhado no sentido de desenvolver habilidades para analisar, comparar, 250
formular hipóteses, problematizar, identificar diferenças e semelhanças, ou seja,
capacidades que facilitam “a compreensão do processo de produção do
conhecimento histórico pelo entendimento de que os vestígios do passado se
encontram em diferentes lugares, fazem parte da memória social e precisam ser
preservados como patrimônio da humanidade” (BITTENCOURT, 2004, p. 333).

Posto isso, demonstraremos a seguir como foram trabalhados os filmes


supracitados, bem como quais foram as estratégias utilizadas para o alcance de
bons resultados. Após o conteúdo ter sido ministrado, escolhemos dois filmes
que se relacionam a ele e é importante frisar que a escolha dos filmes seja feita
a partir do conhecimento do gosto dos alunos, para que assim, atraia ainda mais
sua atenção. Optamos por selecionar e recortar, dos filmes escolhidos, cenas
que seriam mais importantes para nossa discussão, uma questão de otimização
de tempo, para conseguirmos implementar um debate mais longo e mais focado,
ao invés de passar o filme como ilustração do conteúdo, dado que passar filmes
de maneira ilustrativa ou como meio conhecimento pronto não são técnicas que
contribuem para a formação crítica do aluno, logo que não o leva a reflexão,
incentivando portanto, uma visão estática da história onde a dinâmica da
aprendizagem se esgota em verdades prontas, não proporcionando que ele
tenha experiências de construção de conhecimento.

Consideramos também de extrema importância de diálogos prévios sobre o


universo incorporado ao cinema, para que ele não seja levado à desmotivação,
transformando, assim, uma atividade em momentos enfadonhos, o que
inviabilizaria a aprendizagem desejada. Quanto a isso, promovemos um diálogo
pré exibição dos filmes sobre o que é um filme, como é sua produção, quem está
envolvido na produção e qual é o valor monetário de um filme, na tentativa de
demonstrar a complexidade do mesmo.

Nosso próximo passo, de acordo com o que sugere Napolitano (2010), foi
elaborar um roteiro para subsidiar e situar o tema abordado, evidenciando as
partes técnicas da produção fílmica: nome do diretor, nacionalidade, ano de
produção, nome dos autores, gênero e tema central, sinopse da história. “Os
filmes constituem representações da realidade e, como tal, transmitem valores
ideológicos, políticos, sociais e culturais de quem os produziu. Como afirma o
historiador Marc Ferro, é necessário cautela ao analisar um filme: principalmente
a narrativa, o cenário, o texto, as relações do filme com o que não é filme: o
autor, a produção, o público, a crítica, o regime. Pode-se assim esperar
compreender não somente a obra como também a realidade que representa.
Assim, é recomendável orientar os alunos a buscarem informações básicas
sobre um filme antes de assistir a ele” (SERIACOPI et.al., 2013, p.287). É preciso
considerar que o conteúdo do filme não diz respeito efetivamente ao período do
qual trata, isto é, ele apenas faz referências a períodos históricos, mas está
carregado da visão do diretor e do estúdio que o produziu, bem como esses
estão carregadas das percepções do contexto em que estão inseridos, fazendo,
destarte, mais referências ao presente do que propriamente ao passado. Assim,
vale ressaltar que nenhum deles é o retrato fiel dos personagens ou períodos 251
históricos.

Sobre os filmes abordados aqui, temos os seguintes dados: O filme de origem


soviética “Queda de Berlim”, cujo título original é “Padeniye Berlina” foi produzido
em 1950 e dirigido por Mikheil Chiaureli, tem duração de 151 minutos e pertence
ao gênero de filmes sobre guerra. O filme está ambientado entre 1941 e 1945 é
considerado o ápice do culto a personalidade de Stalin, e o desenha como uma
figura extremamente simpática. O enredo se constrói em torno estacanovista
(Boris Andreyev) namorado de uma professora (Marina Kovaliova) e
condecorado por Stalin (Mikheil Gelovani) após a agressão nazista, participa na
batalha de Stalingrado. Durante a campanha da Alemanha reencontra a
namorada, que havia sido sequestrada, e por fim, enquanto Hitler (V. Savelyev)
se suicida, participa da tomada de Berlim, enquanto os povos libertados
celebram a vitória de Stalin e a queda do nazismo.

Já o filme “Stalin”, tem origem russo-hungaro-americana, foi produzido em 1992


e dirigido por Ivan Passer, tem duração de 166 minutos e pertence aos gêneros
de filmes de guerra, biografia e drama. O longa está ambientado entre 1917 e
1953 e é narrado pela filha de Stalin, Svetlana Alliluyeva, que escreveu um livro
chamado “Vinte Cartas a um Amigo”, trazendo a público os bastidores do poder
que vivenciou junto ao seu pai. O enredo segue a trajetória de Stalin, desde o
princípio da Revolução Russa até sua morte, explicitando os bastidores do terror
político soviético naquele período, e mostrando a personalidade dura e
controvertida de Stalin, que apesar de ter transformado a União Soviética numa
grande potência mundial, o fez à custa da destruição da própria família, bem
como da morte de milhões de pessoas do seu próprio povo. O filme mostra a
prática de terror e os crimes cometidos com astúcia e crueldade contra os
inimigos da URSS, bem como os seus próprios amigos.

Com uma primeira leitura dos roteiros relativos aos filmes, já conseguimos
observar o confronto entre a ideologia dos dois, a estratégia de mostrar 2 fontes
históricas sobre o mesmo tema, é uma tentativa de desconstrução da ideia de
história estática, já que, de acordo com Caimi (2008), o campo do ensino de
história propõe abarcar competências como: a compreensão da relatividade do
conhecimento histórico, fruto não de verdades definitivas, mas do olhar do
historiador, sempre seletivo, do método e das fontes; permitindo assim,
desenvolvimento de habilidades de pensamento que permitem a
desnaturalização do passado e o questionamento das tradições herdadas,
dando ainda mais ênfase na tentativa de substituição da memorização pela
reflexão histórica, favorecendo a aprendizagem pela construção do
conhecimento por meio do manuseio de fontes históricas, nesse caso, o filme.
Esses processos instigam os estudantes na construção de um olhar e do
pensamento crítico, para além dos parâmetros da escola, abarcando as relações
sociais que os cercam e como a história os afetam no seu dia a dia, levando a
construção daquilo que pode ser chamado de consciência histórica. “Assim, a
proposta do ensino de história passa a valorizar a problematização, a análise e
a crítica da realidade, transformando professores e alunos em produtores de 252
história e conhecimento em sala de aula, tornando todos “sujeitos históricos” do
cotidiano”. (Fonseca, 2005)

Contudo, para conseguir um resultado ainda mais completo é importante que o


professor tenha conhecimento sobre o que está sendo produzido pela
historiografia relativo ao tema que está disposto a propor, para assim, poder
participar ativamente na construção de raciocínio crítico dos alunos relacionando
os temas envolvidos nos filmes com o conteúdo a ser discutido, personagens,
valores históricos, políticos, existenciais em debates, bem como utilizar outras
atividades na avaliação do aluno e do processo para a exploração desse
raciocínio crítico, já que a ideia é desconstruir o filme e não apenas exibi-lo.

Sobre o Stalinismo, conteúdo cujo escolhemos para trabalhar e relatar a


experiência nesse texto, faremos alguns adendos de bibliografias renomadas
que lemos para preparar esta dinâmica. Um texto que descreve a mesma
sequência de fatos que os filmes, comprovando sua fidelidade a sequência e
periodização dos fatos é “A segunda guerra mundial” de Willians Gonçalves. O
texto afirma que na madrugada do dia 1 de setembro de 1939 as forças armadas
alemãs transpuseram a extensa fronteira comum e invadiram as planícies
polonesas com seus tanques. Não houve declaração de guerra. Um incidente
forjado na fronteira serviu como pressuposto para o ato agressivo, havia então
começado a segunda guerra mundial. Os historiadores até a década de 1950
estavam em consenso acreditavam que a responsabilidade da segunda guerra
era de Hitler. Seguiam duas correntes: a liberal e a marxista, para a primeira
Hitler encarnava o delírio do totalitarismo, do desumano poder capilar e total,
para a segunda Hitler representava a face mais impiedosa e agressiva do
imperialismo capitalista.

Entretanto, Gonçalves aponta que para o dirigente soviético Stálin, Munique era
a prova cabal de que todos no ocidente trabalhavam em favor de uma guerra da
Alemanha contra a URSS. Coerente a essa interpretação dos fatos, buscou
quebrar a suposta aliança da Europa ocidental com a Alemanha nazista. Para
tanto, aproximou-se de Hitler, em 1939 assinou o pacto de não agressão
Molotov- Ribentrop”. Do ponto de vista político, o pacto gerou grandes
problemas, o acordo desorientou completamente o movimento comunista
internacional. Ao pactuar com a Alemanha Stalin deixou os comunistas de todo
o mundo atônitos e desmoralizados. Essa situação só seria superada em 22 de
junho de 1941, quando Hitler pôs em prática a operação Barbarossa, invadindo
a União Soviética, momento representado no início do filme. Desfeito o pacto, os
comunistas voltaram à organização das frentes populares.
Outro texto estudado que pode acrescentar bastante ao debate dos filmes é o
artigo “Stálin e Hitler: Irmãos gêmeos ou inimigos mortais?”, no qual o autor
Domenico Losurdo pretende mostrar que os líderes totalitários do nazismo e do
bolchevismo tinham posições políticas antagônicas: A guerra de Hitler foi uma
guerra colonial, de base racial, bastante semelhante a política de conquistas dos
Estados Unidos. A União Soviética de Stálin se opôs de forma vigorosa e bem- 253
sucedida a essa guerra. Segundo esse autor, o que representou Hitler se
aproxima mais de Churchill que de Stalin, “os irmãos gêmeos de que fala a
categoria do totalitarismo se configuram como inimigos mortais à luz das
categorias do racismo e do colonialismo” (Losurdo, p. 178). Ao pôr em discussão
o sistema colonial, o bolchevismo provoca e agrava a “confusão do pensamento
branco europeu, para o autor, Hitler se propunha a retomar e radicalizar a
tradição colonial fazendo-a valer na própria Europa oriental e em particular na
Rússia, considerada bárbara após a vitória bolchevique. No lado oposto, desde
o início, Stalin convocava seu país a enfrentar o perigo da submissão colonial e
através dessa chave interpretativa lia a própria importância da revolução
bolchevique. Nesse contexto, “Stalin começava a perceber que, ao contrário das
expectativas, o que caracteriza o século XX era o confronto entre o colonialismo
e anticolonialismo (este último apoiado e promovido pelo movimento comunista”
(Losurdo, p. 181). O texto é importante para fomentar esse debate, porque o
autor segue demonstrando bastante questões referentes à posição política de
Stalin.

Voltando a questão das estratégias utilizadas para o trabalho com filmes para o
ensino de história, podemos afirmar, segundo Napolitano (2010) que o trabalho
com o cinema na pedagogia escolar tem como finalidade trazer à tona a
representação fílmica com elementos verossímeis de determinados períodos
históricos, incentivando o público alvo na pesquisa histórica até para fazer
críticas e problematizar as questões distorcidas relacionadas à imagem
representada, isto é, muitas representações fílmicas acabam projetando
elementos contemporâneos de fatos históricos em suas películas, o que são
conhecidos como anacronismos. Visto isso, a partir da apresentação das cenas
dos filmes, propomos algumas questões para iniciar um debate, que seguiu com
questões dos próprios alunos e se tornou bastante proveitoso. As perguntas
iniciais foram relacionadas às diferenças na maneira como Stalin é demonstrado
nos dois filmes, e relacionadas a haver ou não a influência do contexto de
produção do filme em seu enredo.

Tendo em vista, tudo que foi afirmado e relatado acima, parafraseamos Abud
(2003), com a visão de que o que é sugerido por ela, realmente se fez real em
nossa experiência: “pode-se afirmar que o filme promove o uso da percepção,
uma atividade cognitiva que desenvolve estratégias de exploração, busca de
informação e estabelece relações. Ela é orientada por operações intelectuais,
como observar, identificar, extrair, comparar, articular, estabelecer relações,
sucessões e causalidade, entre outras. 15 Por esses motivos, a análise de um
documento fílmico, qualquer que seja seu tema, produz efeitos na aprendizagem
de História, sem contar que tais operações são também imprescindíveis para a
inteligibilidade do próprio filme.” (ABUD, 2003).

E aproveitamos para ressaltar que ao proceder às operações mentais


necessárias para a inteligibilidade do filme, o aluno estará elaborando o seu
pensamento histórico na perspectiva de construção da consciência história, e 254
isto é de suma importância, pois significa que o aluno adquire ferramentas para
construir conhecimento histórico a partir de outros filmes que ele assistir de forma
independente, cumprindo assim o papel fundamental da história: “A história tem
como papel central a formação da consciência histórica dos homens,
possibilitando a construção de identidades, a elucidação do vivido, a intervenção
social e práxis individual e coletiva.” (FONSECA, 2003, p, 89)

Concluímos então, que a escola, juntamente com os professores/educadores,


pais e a comunidade escolar em geral, podem e devem ser capazes, de analisar,
refletir e compreender verdadeiramente, que o ensino de História vai além de
pequenos conhecimentos retirados dos livros didáticos, que muitas vezes, os
docentes ou a própria instituição de ensino oferece aos estudantes, e o uso de
filmes como fonte histórica sendo utilizados em sala de aula, são um bom método
para transformação. Incluindo que “trabalhar com o cinema em sala de aula é
ajudar a escola a reencontrar a cultura ao mesmo tempo cotidiana e elevada,
pois o cinema é o campo no qual a estética, o lazer, a ideologia e os valores
sociais mais amplos são sintetizados numa mesma obra de arte” (NAPOLITANO,
2003, p.11).

Referências biográficas
Letícia da Silva Leite, estudante de História da Universidade Estadual de
Maringá.

Referências bibliográficas
A QUEDA DE BERLIM. Direção de Mikheil Chiaureli. Rússia, 1950. (151 min.)

ABUD, Katia Maria. A construção de uma Didática da História: algumas idéias


sobre a utilização de filmes no ensino. História, Franca , v. 22, n. 1, p. 183-
193, 2003 .

AZEVEDO, Gislane Campos; SERIACOPI, Reinaldo. História em movimento.


São Paulo: Ática, 2013.

BITTENCOURT, Circe M. F. Ensino de história: fundamentos e métodos. São


Paulo: Cortez, 2004.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares


nacionais: história. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC /SEF,
1998.
CAIMI, Flávia Eloisa. Fontes históricas na sala de aula: uma possibilidade de
produção de conhecimento histórico escolar? Anos 90, Porto Alegre, v. 15, n.
28, p. 129-150, dez. 2008.

FONSECA, S. G.. Didática e Prática de Ensino de História: experiências,


reflexões e aprendizados . 7 ed. São Paulo: Papirus, 2003. 255

FONSECA, S. G. Didática e prática de ensino de história. Campinas, SP.


Papirus, 2005.

GONÇALVES, Willians da Silva. A segunda guerra mundial. In: REIS FILHO,


Daniel Aarão et. all. O Século XX. V.3: O tempo das dúvidas: Do declínio das
utopias às globalizações. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.

LOSURDO, Domenico. Stálin e Hitler: Irmãos gêmeos ou inimigos mortais? In:


1917: O ano que abalou o mundo. JENKINS, Ivana (org.), 2017.

NAPOLITANO, Marcos. Como usar o cinema na sala de aula. São Paulo:


Contexto, 2010.

SCHMIDT, M. A. A formação do professor de história e o cotidiano da sala de


aula. In: BITTENCOURT, Circe. O saber histórico na sala de aula. 9.ed. São
Paulo: Contexto, 2004.

STALIN. Direção de Ivan Passer. Estados Unidos da América, Hungria, Rússia,


1992. (166 min.)

VICENTINO, Cláudio; DORIGO, Gianpaolo. História para o ensino médio:


história geral e do Brasil. São Paulo: Scipione, 2010.
PLATAFORMAS DIGITAIS E ENSINO DE
HISTÓRIA: POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS
DO APLICATIVO KAHOOT
256
Lorena Michelle Silva dos Santos e Thaís
Vinhas
No cenário contemporâneo, significativamente demarcado por um processo
intenso de desenvolvimento da tecnologia digital e da ambiência virtual,
diferentes desafios são colocados ao exercício docente. Se antes a sala de aula
e o espaço escolar eram os redutos principais das práticas educativas escolares,
hoje esse espaço ampliou o seu alcance e suas possibilidades de interação.
Conectados à rede mundial de internet, docentes e discentes podem vivenciar
experiências interconectadas de aprendizagem, acessando conteúdos,
interagindo com sujeitos em diferentes espacialidades, tendo contato com
conhecimentos disponíveis em múltiplas plataformas virtuais e inserindo
aplicativos digitais nas estratégias metodológicas de ensino-aprendizagem.

Esse processo tem indicado novas formas de compartilhamento, produção e


difusão de saberes diversos, ao mesmo tempo em que se apresenta como um
desafio para docentes, pois requer, além de um conhecimento teórico
metodológico da sua área de atuação, um conhecimento técnico sobre um amplo
conjunto de plataformas, aplicativos e linguagens do mundo digital. No Brasil,
com a crise sanitária acentuada pela Covid-19 desde março de 2020, houve a
necessidade de organizar práticas educativas compatíveis com o ensino remoto
emergencial. Desse modo, os espaços virtuais e as tecnologias digitais
assumem um papel de centralidade na relação ensino-aprendizagem,
evidenciando a urgência de ressignificar práticas educativas que envolvem
conectividade, virtualidade, acessibilidade e noções básicas sobre o universo
tecnológico digital.

No campo específico do Ensino de História, atuar nessa realidade requer a


mobilização de conhecimentos relacionados às tecnologias e espaços virtuais
com os saberes primordiais para o exercício docente em História, definidos por
Flávia Caimi [2015, p.105] como:

“1) os saberes a ensinar, circunscritos na própria história, na historiografia, na


epistemologia da história, dentre outros; 2) os saberes para ensinar, que dizem respeito,
por exemplo, à docência, ao currículo, à didática, à cultura escolar; 3) os saberes do
aprender, que se referem ao aluno, aos mecanismos da cognição, à formação do
pensamento histórico, etc.”
Na realidade atual, a conexão entre esses saberes configura-se a base para a
construção dos sentidos e significados das práticas de ensino-aprendizagem em
História na experiência escolar, e diante das necessidades emergenciais
impostas pelo ensino remoto, é essencial identificar e conhecer aplicativos e
plataformas digitais que possibilitem a convergência entre os objetivos da
aprendizagem histórica com os recursos tecnológicos interativos. Assim, 257
propomos uma reflexão sobre o aplicativo Kahoot como campo de possibilidades
para o uso nas práticas de ensino de História.

O aplicativo Kahoot e a ferramenta Quiz

Kahoot é um aplicativo disponível na web para instalação e utilização de alguns


de seus recursos de forma gratuita, e oferece ferramentas dinâmicas de
aprendizagem, sendo utilizado como plataforma educativa. Desenvolvido em
uma universidade norueguesa no ano de 2013, o aplicativo possui uma estrutura
operacional no formato de game. Por seu caráter interativo, o Kahoot é uma
tecnologia potencial para a organização de estratégias de ensino-aprendizagem
em diferentes áreas do conhecimento, dentre elas a História.

De acesso e manuseio simples, o aplicativo disponibiliza recursos classificados


nas categorias Testar Conhecimento, Coletar Opiniões e Apresentar
Informações. Para cada categoria são apresentadas ferramentas onde os
professores podem formatar jogos a partir de conteúdos e temáticas trabalhadas
nas aulas. Dentre as possibilidades pedagógicas do aplicativo, a ferramenta Quiz
é a que tem uma maior projeção e utilização na educação básica [AMICO;
MORAES; PRÁ, 2017], e é um recurso disponível na versão gratuita do
programa, o que representa um fator de acessibilidade maior para os
professores.

O Quiz é uma atividade baseada em questionamentos que devem ser


respondidos sinalizando a alternativa correta, dentre as múltiplas escolhas
apresentadas em cada questão. Pretende-se que essa dinâmica incentive a
análise e seleção das afirmativas que sintetizam uma reflexão coerente sobre a
pergunta formulada. Esse exercício exige do discente conhecimento sobre o
tema e raciocínio lógico para identificar a resposta certa.

São múltiplas as possibilidades para a utilização do Quiz em aulas de História,


podendo ser inserido antes do estudo de determinada temática, ou após o estudo
de algum conteúdo. Entretanto, nesse percurso consideramos pertinente a
reflexão de Rüsen [2011, p.47], quando discute que:

“Ainda antes de qualquer determinação material do aprendizado histórico, isto é,


sua vinculação a tal ou qual acervo preciso de conteúdos, pode-se elaborar uma
projeção mais fundamental, mais abrangente e mais especificadora do caráter
histórico do aprendizado histórico.”
Dessa forma, a inserção do Kahoot como metodologia complementar para as
aulas de História deve estar articulada aos objetivos da aprendizagem, a partir
de uma perspectiva ampliada dos sentidos da cognição histórica enquanto
dimensão para os discentes desenvolverem a compreensão de si e do seu
tempo.
258
Para a montagem de um Quiz no Kahoot, o organizador do jogo, nesse caso o
professor, deve criar uma conta no aplicativo para que possa construir as
atividades. Para a interação dos discentes, é necessário que cada participante
esteja conectado a uma rede de internet, sem necessariamente possuir uma
conta no Kahoot. A criação da conta é um procedimento simples, baseado em
perguntas básicas e autoexplicativas, e requer apenas a indicação de um
endereço de e-mail e a definição de uma senha de acesso.

É possível ingressar na plataforma através do QR Code abaixo. Para a


realização dos procedimentos sinalizados, basta aproximar a câmera do celular
da imagem, onde poderá realizar o seu cadastro:

Fonte: Arquivo pessoal. QR Code produzido através


do site https://e-lemento.com/

Após essa etapa, o professor é direcionado para a página inicial do aplicativo,


onde é possível organizar atividades através da ferramenta Criar. Definido o
conteúdo ou temática que será trabalhada, a produção do game segue as
seguintes etapas: Inserção de imagem que será a capa do jogo [opcional],
Descrição, Título, Visibilidade [pra poder compartilhar e possibilitar o acesso dos
discentes, precisa selecionar a opção Público] e Adicionar perguntas. Nessa
etapa das perguntas, o professor vai indicar o tipo de jogo que irá utilizar dentre
as opções disponibilizadas pelo aplicativo, no caso específico que estamos
tratando nesse texto, indicamos a seleção do Quiz, pela potencialidade em
organizar aprendizagem de conteúdos de História de forma interativa. Após a
conclusão da atividade, um link é gerado para compartilhamento com os
participantes.

No Quiz do Kahoot, cada questionamento tem até quatro possibilidades de


resposta e o docente pode estabelecer o tempo de resposta de cada questão e
o período em que o jogo estará disponível para acesso e participação dos
discentes. Importante ressaltar que há limites de caracteres na construção
textual das perguntas e respostas, e que o aplicativo tem outras opções de
recursos, como a inserção de imagens e vídeos.
Na dinâmica de interação com o Quiz, o programa apresenta a modalidade de
pontuação dos participantes através de um ranking definido pela a conjunção de
acertos e tempo de resposta. Assim, cada participante tem a sensação de estar
sendo desafiado no jogo, onde a competição deve ser estimulada como processo
de aprendizagem colaborativa entre os discentes. 259

Como aplicativo que permite uma interatividade nas propostas de atividades


pedagógicas no modelo digital, o Kahoot apresenta também um potencial de
acessibilidade, pois o compartilhamento e a realização do jogo podem ser feitos
por meio de dispositivos móveis como o celular, que é um dos aparelhos
tecnológicos mais comuns utilizados pelos discentes da educação básica.

Assim, a facilidade de utilização e acesso do Kahoot como recurso de ensino-


aprendizagem é uma de suas características essenciais, pois tanto a produção
do material pelo docente, quanto a participação dos discentes pode ocorrer via
dispositivo móvel e ser compartilhado através de aplicativos de amplo uso e
conexão rápida entre as pessoas, como o WhatsApp. Esse fator coincide ainda
com o baixo uso de dados móveis que é necessário para a utilização da
plataforma, representando uma maior possibilidade de inclusão dos discentes,
que muitas vezes têm um acesso restrito à internet em modelos de
aprendizagem via tecnologia.

O Kahoot e a aprendizagem histórica: possibilidades pedagógicas


A utilização em larga escala das Tecnologias de Informação e Comunicação
[TIC] como forma de interrelação entre os sujeitos, a ampliação de acesso aos
meios digitais e a sincronicidade das interações via tecnologias virtuais tem
possibilitado a dinamização de diferentes atividades cotidianas, dentre elas, as
atividades educativas. Assim, “diante da pluralidade e complexidade das práticas
sociais e culturais que adentram a escola na contemporaneidade” [CAIMI, 2015,
p. 106], a inserção da tecnologia como instrumento pedagógico constitui uma
ponte entre o universo escolar e o universo de experiências de uma geração
imersa em uma realidade tecnológica.

No Ensino de História, o aplicativo digital, como qualquer recurso que seja


inserido no processo metodológico de ensino-aprendizagem, deve ser utilizado
tendo como base os princípios teóricos que fundamentam a prática pedagógica
da disciplina, especificamente as questões que envolvem os processos de
cognição histórica dos discentes, que são as relações que os sujeitos
estabelecem com a aprendizagem histórica.

Para Rüsen [2011, p. 79] a aprendizagem histórica “é a consciência humana


relativa ao tempo, experimentando o tempo para ser significativa, adquirindo e
desenvolvendo a competência para atribuir significado ao tempo”. Esse campo
de sentidos se manifesta na formação da consciência histórica e na expressão
narrativa da aprendizagem. A educação histórica escolar é um caminho para o
desenvolvimento dessa consciência e complexização da capacidade narrativa
dos discentes.

Dessa forma, é fundamental ressaltar o quanto é importante oferecer condições


para a compreensão histórica dos alunos, tomando como base a complexidade
dos seus processos, tais como mudanças, permanências, causas das ações 260
humanas no seu tempo, promovendo a tomada de consciência da historicidade
da sua vida e da vida daqueles que os cercam. As situações didáticas
provocadas na sala de aula podem desenvolver novas leituras dos fatos
históricos, reformulando seus conhecimentos a partir de novos saberes advindos
da ciência de referência. Como destaca Barca [2017, p.79]

“assim como na sociedade não existe um pensamento único e homogêneo,


também na narrativa histórica não haverá uma explicação fechada ou uma única
forma de olhar o passado. Em História há lugar para várias interpretações do
passado, que devem ser analisadas e avaliadas quanto à sua relativa
consistência empírica e lógica.”

Trabalhar com o ensino de história, independente dos recursos e métodos


utilizados, implica criar condições para articular, diferenciar e significar as
narrativas que vão surgir no decorrer da aula, muitas delas centradas nas
vivências dos alunos, e suas relações ou não, com os conteúdos históricos
sistematizados. Segundo Rüsen [2011], a aprendizagem histórica deve estimular
a capacidade analítica e interpretativa dos discentes através de três dimensões:
experiência, interpretação e orientação- processos que contribuem para a
construção de sentido prático à orientação temporal dos sujeitos e podem ser
estimulados através da mediação pedagógica professor-aluno.

Na dinâmica da mediação didática, o recurso Quiz pode auxiliar o professor de


História ao abordar os conteúdos, oferecendo possibilidades interativas através
das plataformas digitais, sem dissociar de questões essenciais dos fundamentos
e objetivos atuais do ensino da disciplina. Ilustraremos essa relação a partir de
um exemplo temático: o conteúdo “O contexto de Pós abolição no Brasil”. Nosso
objetivo não é, de forma alguma, esgotar um assunto tão complexo através da
utilização do Quiz do aplicativo Kahoot, mas propor algumas linhas de
abordagens que nos permitirão esboçar horizontes de indagação e compreensão
histórica a partir da organização dos processos de ensino-aprendizagem na
disciplina, como:

- sua utilização como instrumento para indagar os conhecimentos prévios


dos alunos sobre o contexto histórico: considera-se que a identificação
desses conhecimentos é etapa essencial para a organização da apresentação e
problematização dos conteúdos. Em relação ao exemplo citado, poderíamos
averiguar qual a ideia expressa pelo aluno em relação ao período de pós
abolição no Brasil, se há proximidades com uma ideia de liberdade baseada em
um processo automático da Lei Áurea, ou se compreende a complexidade em
torno do tema, a partir da concepção de uma liberdade restrita, baseada na
exclusão social, econômica e cultural das populações negras. A partir da
identificação dessas ideias prévias que o professor deve organizar suas aulas.

- pode ser usado como revisão do conteúdo trabalhado, sendo uma


ferramenta complementar para ampliar a discussão ou dirimir dúvidas do
que foi abordado em sala de aula: através da ferramenta, pode-se elaborar 261
questionamentos sobre valores e certezas historicamente construídas sobre o
fim da escravidão, apresentar conhecimentos que possibilitem a compreensão e
enfrentamento de desigualdades na vida prática, além da construção de um
conhecimento a partir de outras narrativas, e as relações estabelecidas entre a
temática e o contexto atual.

- no Estudo e reprodução de questões do Exame Nacional do Ensino


Médio- ENEM: para os estudantes que estão cursando principalmente o último
ano do Ensino Médio, o estudo de questões trabalhadas em exames anteriores
é uma prática comum nas unidades escolares, principalmente pra familiarizar os
discentes em relação ao modelo das avaliações. Perguntas do ENEM que
possuem uma estrutura semelhante ao formato Quiz e que tenham textos mais
curtos (por conta dos limites dos caracteres do aplicativo) podem ser trabalhadas
no Kahoot. O professor pode fazer uma seleção de questionamentos do ENEM
sobre a temática trabalhada e organizar sessões de Quiz no celular para serem
compartilhadas e respondidas pelos discentes

Diante das questões apresentadas e das possibilidades de inserção da


tecnologia digital no processo de ensino-aprendizagem em História,
especificamente na urgência imposta pelo ensino remoto emergencial,
ressaltamos três pontos que consideramos essenciais como eixos norteadores
para a nossa reflexão:

1) O conhecimento do professor sobre os recursos disponíveis e os seus


usos em sala de aula: envolve questões relacionadas ao processo contínuo e
permanente de atualização teórica e prática do professor, principalmente a
formação continuada dos docentes em exercício, ressaltando a responsabilidade
das instituições formativas e profissionais na oferta dessa atualização , uma vez
que muitas demandas colocadas pela realidade presente “não são subsidiadas
na formação inicial nem acompanhadas da necessária formação em serviço dos
professores” [CAIMI, 2015, p. 110]. Importante elucidar que essa formação não
se restringe ao mero aprendizado do uso técnico do aplicativo, como pode ser
entendido na demanda atual do ensino remoto emergencial, mas que as práticas
pedagógicas com os aplicativos sejam consideradas a partir da sua efetiva
relação com os significados do ensinar-aprender História.

2) A relação aplicativo e objetivos da aprendizagem: uma das questões


centrais para o uso do aplicativo como metodologia de ensino diz respeito aos
objetivos da aprendizagem em sua conexão com os processos de cognição
histórica dos discentes. Necessário identificar quais os campos de sentidos que
esses recursos podem trazer para a aprendizagem histórica, a partir dos
fundamentos que orientam a prática docente em História na atualidade.

3) Os processos de cognição histórica dos discentes: os recursos digitais e


a interação virtual são elementos inerentes as relações humanas
contemporâneas, e podem ser considerados essenciais para os processo de 262
aprendizagem de jovens que vivenciam a realidade de uma sociedade
tecnológica. Assim, as plataformas e aplicativos são recursos comuns a grande
parte dos estudantes, constituindo linguagem usual, atrativa e capaz de
incentivar a busca de conhecimentos. As dinâmicas de cognição histórica
também se relacionam com os recursos que podem estimular o desejo de
conhecer e aprender mais sobre o presente através do passado.

Para concluir, reflexões sobre caminhos possíveis


O desenvolvimento das tecnologias digitais e a ampliação de acesso ao universo
virtual via web, principalmente através dos dispositivos móveis como celulares,
tablets, notebook e da rede de conexão wi-fi, é um fator a ser considerado nas
práticas pedagógicas contemporâneas. Imerso em seu tempo, o professor deve
articular sua prática às teorias, metodologias e estratégias disponíveis na
realidade social que vivenciam, entendendo os caminhos e recursos possíveis
para efetivar a relação ensino-aprendizagem.

Entretanto, ser docente é também ter a capacidade de questionar essa realidade,


pesquisando, experimentando, avaliando e produzindo novas formas de ensinar
e aprender. Salientamos que “assim como outras ferramentas tecnológicas
utilizadas pelo professor, o Kahoot é utilizado com a finalidade de apoio à
organização e planejamento da aula, e não como uma ferramenta substitutiva
para o tratamento dos conteúdos lecionados pelo professor.” [AMICO; MORAES;
PRÁ, 2017, p. 4]. Entre a teoria, o método e a prática, a mediação pedagógica é
uma ação fundamental para a organização das dinâmicas de ensino de História
no espaço escolar. Assim, o uso do aplicativo deve ter uma característica autoral,
onde o professor constrói o seu recurso de ensino-aprendizagem tendo como
base as características e a realidade dos seus alunos.

Apesar da reconhecida necessidade de inserção dos recursos digitais como


ferramentas para as dinâmicas de ensino-aprendizagem, é inevitável dissociar
essa discussão das reflexões sobre acessibilidade e inclusão digital. O contexto
da pandemia da Covid 19 e a suspensão das aulas presenciais em todo território
nacional desde março de 2020, revelam as dificuldades enfrentadas por milhares
de professores e estudantes diante das incertezas sobre os caminhos da
educação, em um país fortemente marcado pelas desigualdades econômicas,
sociais e digitais.

Referências Biográficas
Me. Lorena Michelle Silva dos Santos, professora da Universidade do Estado da
Bahia (UNEB)- Campus XVIII.
Me. Thaís Vinhas, professora da Universidade do Estado da Bahia (UNEB)-
Campus XVIII.

Referências Bibliográficas
AMICO, Márcia Regina de Araujo; MORAES, Jhony Pereira; PRÁ, Raquel. As
aplicações do Kahoot! como tecnologia educativa. Revista Redin- Revista 263
Educacional Interdisciplinar v. 6 Nº 1. Outubro, 2017, p. 1-12.

BARCA, Isabel. História e diálogo entre culturas: contributos da teoria de Jörn


Rüsen para a orientação temporal dos jovens. Intelligere - Revista de História
Intelectual, vol.3, n.2, out. 2017, p.77-89.

CAIMI, Flávia. O que precisa saber um professor de História? História & Ensino,
Londrina, v. 21, n. 2, jul./dez. 2015, p. 105-124

RÜSEN, Jörn. Aprendizado Histórico. In: SCHIMIDT, Maria Auxiliadora; BARCA,


Isabel; MARTINS, Estevão Rezende.(Orgs.) Jörn Rüsen e o Ensino de História.
Curitiba: Ed. UFRP, 2011, p.41-49.
____________. Experiência, interpretação, orientação: as três dimensões da
aprendizagem histórica. In: SCHIMIDT, Maria Auxiliadora; BARCA, Isabel;
MARTINS, Estevão Rezende.(Orgs.) Jörn Rüsen e o Ensino de História. Curitiba:
Ed. UFRP, 2011, p. 79-91.
O ENSINO DE HISTÓRIA E O USO DA
TECNOLOGIA EM SALA DE AULA
Marcel Martins Guarezi
264

No mundo globalizado e com informações constantemente sendo consumidos


pelas mais diversas mídias: internet, televisão, celular, entre outros, desenvolve
ações dentro da sala de aula que podem ser utilizados como métodos que
compõem o ensino-aprendizado. A tecnologia se torna como forte aliada nesse
processo, juntamente com as concepções históricas de análises do
comportamento social e dos acontecimentos. Utilizada de maneira objetiva e
clara, a tecnologia pode possibilitar novas visões e direcionamentos mais
críticos, onde podem contribuir na inserção de novas ferramentas. É preciso
considerar as transformações que ocorrem na sociedade, sendo que “outro
aspecto pertinente à reflexão sobre as relações entre escola e tecnologia se
refere aos alunos, em especial às crianças e aos jovens. Discussões sobre as
tecnologias neste início de século precisam considerar as formas de apropriação
dos meios digitais por crianças e jovens.” (KRAMER; MOREIRA, 2007, p. 1049)

A interação por meio das tecnologias em sala de aula, e fora dela, deve
possibilitar o alcance nas mais variadas formas pedagógicas. Considerando os
aspectos avançados que constituem as mudanças constantes na interação do
aluno com o meio digital. O desenvolvimento cognitivo com novas ferramentas
de ensino, que está presente no cotidiano social do aluno, possibilita uma maior
interação didática-pedagógica em sala de aula. Porém, “não se suprimem formas
antigas de diversidade cultural por meio de condições tecnológicas avançadas.
A expansão uniformizada de aparatos tecnológicos não elimina a diversidade
das relações sociais entre indivíduos, assim como das relações desses
indivíduos com o conhecimento, com o dinheiro e com seus corpos. Tampouco
propicia o desaparecimento de desigualdades econômicas. Assim, as
diferenças, as desigualdades, as divergências e as discrepâncias persistem. É
nesse panorama que a fetichização das novas tecnologias, na sociedade e na
educação, insiste em perdurar.” (KRAMER; MOREIRA, 2007, p. 1043)

O ensino de História pode ter como ferramentas aliadas, mas não como forma
única de ensino, a utilização desses meios que possibilitam outros aspectos além
dos livros didáticos. A interatividade pode desenvolver habilidades que
permeiam os objetivos dentro da sala de aula, e, “quando nos utilizamos de
recursos tecnológico e/ou midiáticos devemos nos atentar sobre o que estamos
propondo para o ensino do conteúdo em questão, observar se os recursos
escolhidos vêm de encontro com nossa proposta, pois, de nada adianta usar
toda essa tecnologia sem nenhum propósito, usar só para se dizer adepto de
novos recursos. Nada adiantará se o professor não tiver um objetivo para
alcançar.” (DUARTE; PINHO, 2001)
O conhecimento histórico deve acompanhar as mudanças que ocorrem na
sociedade, com objetividade no aprendizado do aluno e com a clareza das
habilidades transcorridas em sala de aula. A Base Nacional Comum Curricular
(BNCC) destaca entre as competências específicas de História para o Ensino
Fundamental, que o aluno deve “produzir, avaliar e utilizar tecnologias digitais de 265
informação e comunicação de modo crítico, ético e responsável, compreendendo
seus significados para os diferentes grupos ou estratos sociais.” Por outro lado,
sabemos que a realidade das escolas públicas possui déficits tecnológicos, na
medida que cada vez a inserção dos alunos ao meio da tecnologia está mais
frequente.

As transformações e evoluções tecnológicas no último século e no início do


século XXI, permitiu dentro da interatividade social um consumo e necessidade
de informação e conectividade cada vez maior. A construção de novos métodos
de transmitir o conhecimento e no aprendizado, também alcançou, níveis de
experiências tecnológicas mais necessárias no contexto escolar. As relações
entre a educação e as variadas formas de interatividade de ensino-
aprendizagem se submetem ao processo das modificações sociais e
pedagógicas. “A disponibilidade de novas tecnologias, com o aumento do
conhecimento sobre os processos cognitivos, sobre a comunicação humana e a
comunicação homem-máquina, e a facilidade recente da manipulação da
informação, estão abrindo inúmeras perspectivas para a educação.” (DINIZ,
2001, p.4)

Essas transformações são sentidas dentro da sociedade com a mudança do


comportamento dos indivíduos que se estende às escolas. A conectividade e a
interação com a tecnologia são realidades presentes no cotidiano familiar, que
não se concretiza no ambiente escolar pela falta de incentivo, estrutura e
formação para a utilização das ferramentas tecnológicas. O espaço escolar pode
ser absorvido por essas mudanças, desde que seja de forma objetiva nas
propostas pedagógicas do alcance do conhecimento científico e que haja um
preparo continuado formativo na prática didática. “A acelerada mutação da
sociedade exige do indivíduo uma reciclagem constante e continuada de seu
estoque de conhecimento, na tentativa de corresponder ao ritmo da mudança.
Embora a tecnologia permita o acesso à informação, ela por si só não
operacionaliza o processo de conhecimento.” (SILVA et al, 2010, p.215)

São ferramentas que auxiliam no processo de ensino-aprendizagem, porém são


grandes os desafios nas escolas públicas e o direito ao acesso às tecnologias
em sala de aula. A falta de estrutura física, bem como, dos bens tecnológicos,
compreende na desigualdade social que a educação pública atravessa ao longo
da história. A limitação física em destinar espaços adequados para a realização
das atividades com interatividade tecnológica, revela a precariedade em
estabelecer parâmetros educacionais conforme as diretrizes curriculares. “A
informação deve ser vista como um bem social e, portanto, coletivo, interligada
com a universalização das tecnologias de informação e comunicação, a
qualificação dos indivíduos e o processo educativo como forma de “aprender a
aprender”. Compreendemos a informação como um processo que sempre
acontece num contexto situacional, dependente das experiências anteriores,
entre sujeitos cognitivos e sociais, gerando significações e novos
conhecimentos.” (SILVA et al, 2010, p. 216)
266
O conhecimento de novas práticas educativas pode desenvolver habilidades e
novas formas de se relacionar dentro das vivências escolares, e assim “estar em
sintonia com essas transformações significa compreender a dinâmica das
sociedades” (SILVA et al, 2010, p. 225). O processo da educação igualitária
transcorre na medida que as oportunidades são de acesso a todos dentro do
sistema educacional, com a garantia de qualidade e na realidade externa dos
educandos. No sistema educacional, as ações mediadas pelo poder público
adquirem interferências externas voltadas a massificação do mercado
capitalista, com objetivos sistemáticos engessadores da educação. No entanto,
“as formas assumidas pela globalização mostram-se distintas, complexas e
contraditórias. Assim, parece haver espaço para que, nas práticas pedagógicas,
se escolham objetivos e procedimentos, oriundos ‘de baixo’, dos grupos
subalternizados, excluídos e marginalizados, que desestabilizem os processos
hegemônicos. Pode também haver espaço para que se desafiem os modos
usuais de prescrição de políticas e de promoção de mudanças nos sistemas
educacionais.” (KRAMER; MOREIRA, 2007, p.1043)

Fundamentam-se nas estruturas sociais da educação brasileira as


desigualdades e o difícil acesso aos recursos onde “a função da escola tem sido,
dominantemente, enfraquecer as perspectivas ético-políticas que afirmam a
responsabilidade social e coletiva e a solidariedade e reforçar o ideário de uma
ética individualista, privatista e consumista.” (FRIGOTTO, 2005, p.234) A falta de
investimentos está diretamente ligada ao projeto tecnicista educacional, voltada
principalmente para mão de obra do mercado de trabalho. Desenvolvendo pouco
as habilidades do pensamento crítico social. Esse direcionamento pedagógico e
tradicional, expõem a falta de investimentos na educação pública.

As interações correlacionadas no processo de ensino, em consequência, a


utilização da tecnologia e metodologias como mediadores da aprendizagem,
fomentam no interesse das práticas mediadoras do conhecimento. A
contextualização dessas ferramentas promove novas visões da interação do
ensinar e aprender como critério de interpretação das formas históricas. Para
Diniz (2001, p. 06), “O prazer da descoberta por meio da aprendizagem é mais
motivador e a tarefa mais agradável, prazerosa e eficaz. Os alunos passam a
pensadores e pessoas capazes de resolverem problemas. Para exemplificar,
podemos citar como a tecnologia lhes oferece um ambiente conceituai no qual
eles podem coletar informações, organizá-las, visualizá-las, ligar e descobrir
relações entre fatos e eventos.” O aluno desenvolve a partir dessas interações
de comunicações, habilidades capazes de diluir o tradicionalismo escolar em
ferramentas de conhecimento crítico.
O modo atuante das práticas pedagógicas e a utilização dos meios didáticos
necessários para a promoção da informação em conhecimento, desenvolvem
ações concretas que estimulam a interação aluno-professor. Além disso, “o
conhecimento escolar apropriado é o que possibilita ao estudante tanto um bom
desempenho no mundo imediato quanto a análise e a transcendência de seu
universo cultural. Para isso, há que se valorizar, acolher e criticar as vozes e as 267
experiências dos alunos.” (KRAMER; MOREIRA, 2007, p.1044) As ferramentas
utilizadas devem levar em consideração toda a sua funcionalidade pedagógica
na participação e interpretação dos alunos.

A interação mediada pelo professor de história deve contemplativa na medida


que o sujeito-aluno possa realizar sua percepção do ensino de história. Assim
sendo, “atualmente entende-se que se necessita renovar e revisar a prática
educativa do ensino de História, tratando de uma memorização consciente, em
que é proposto para o aluno buscar e construir informações tendo o professor
como um mediador, estimulando-os a produzirem suas descobertas históricas.”
(GOMES, 2018, p.32) O papel do professor constitui assim um promovedor das
interações históricas com os alunos e facilitador das ferramentas utilizadas no
ensino-aprendizagem. Resultando na compreensão e autonomia do processo
crítico-histórico.

As abordagens desenvolvidas em sala de aula podem adquirir interesses


distintos aos alunos. O professor de História adquire as metodologias e didáticas
essenciais para o despertar do interesse do aluno em desenvolver as habilidades
necessárias. A inserção desses alunos no meio social fomenta a importância em
desenvolver práticas metodológicas, capaz de transformar o aluno de escola
pública em sujeito de sua própria realidade. Tornar o ensino de História mais
atrativo e com o resultado em transformar os conteúdos em ações de
pensamento coletivo, é um desafio que o professor encara na sala de aula.

Para Rays (2015, p. 34), “[...] nossa sociedade mantém-se dividida em classes
que ocupam posições antagônicas na estrutura social, resultando,
consequentemente, na hierarquia e na divisão do trabalho humano. Este fato
tem cercado às classes trabalhadoras, que se encontram em posições
subalternas (na hierarquia social e na hierarquia da experiência da humanidade
acumulada ao longo do processo histórico. Por essas razões, no processo de
escolarização, é preciso desenvolver o trabalho pedagógico no sentido de
propiciar condições objetivas a essas classes sociais de conhecerem
criticamente os motivos históricos pelos quais se encontram nessa posição
social.”

Além de despertar os alunos para sua realidade social, o professor deve


desenvolver dentro da sala de aula, o interesse do sujeito para a compreensão
da História como componente viabilizador do meio em vivem. As didáticas
pedagógicas são aliadas no interesse dos alunos por compreenderem a
importância do ensinamento, na objetividade de transmitir o conhecimento e o
sentido que se tem na sua vida, “[...] a separação da teoria e da prática no
processo formativo escolarizado subtrai ao educando a possibilidade de
desenvolvimento integral de suas potencialidades.” (RAYS, 2015, p.41)

O sentido da teoria em sala de aula em tornar amplo o seu conhecimento na sua


realidade, promove aos alunos um resultado que ultrapassa a sala de aula.
Desenvolver esse interesse pela História é uma tarefa árdua, que o professor 268
precisa mediar a partir das práticas pedagógicas. Utilizando-se de meios que
também estão inseridos no cotidiano de seus alunos. Para que isso ocorra, “a
preparação das crianças e jovens para a participação na vida social é o objetivo
mais imediato da escola pública. Esse objetivo é atingido pela instrução e ensino,
tarefas que caracterizam o trabalho do professor. A instrução proporciona o
domínio dos conhecimentos sistematizados e promove o desenvolvimento das
capacidades intelectuais dos alunos. O ensino corresponde às ações
indispensáveis para a realização da instrução; é a atividade conjunta do
professor e dos alunos na qual transcorre o processo de transmissão e
assimilação ativa de conhecimentos, habilidades e hábitos, tendo em vista a
instrução e a educação.” (LIBÂNEO, 2006, p.33)

Os aspectos didáticos-pedagógicos contribuem para o desenvolvimento das


relações do ensino-aprendizagem e facilitam na contribuição da escola no seu
papel social. A História como ciência importante na capacidade crítica do aluno,
realiza dentro de uma didática interativa e analítica uma interação mais efetiva.
Sendo que, “a discussão teórica sobre consciência histórica e as breves
pinceladas sobre alguns resultados de projetos como o Youth and History coloca
elementos importantes para pensarmos a agenda educativa e de pesquisa sobre
o ensino da história, pois, ao buscar recolher empiricamente dados da
consciência histórica, trouxeram uma série de dados que tanto confirmaram a
viabilidade do conceito para explicar os acontecimentos, quanto impuseram
novos problemas para as reflexões didáticas da história.” (CERRI, 2011, p.50)

A consciência histórica do sujeito diante de sua realidade social, contribui para o


processo de entendimento das análises subjetivas da História. As formas de
estudo e obtenção dos resultados são primordiais na construção do saber e
dentro de suas práticas intersociais, no interesse em aprender e compreender
as relações históricas. Os métodos de ensino e as metodologias empregadas
facilitam no interesse em se relacionar com as práticas históricas.

Referências biográficas
Marcel Martins Guarezi, estudante de História - Bacharel da UNISUL –
Universidade do Sul de Santa Catarina.

Referências bibliográficas
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comum curricular. Brasília/DF, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.
mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf. Acesso em: 25
jan. 2021.
DINIZ, Sirley Nogueira de Faria. O uso das tecnologias em sala de aula.
Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção – Programa de Pós-
graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa
Catarina. Florianópolis, p. 173. 2001.

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o uso da tecnologia. In. XXVII Simpósio Nacional de História, 2011, Natal. Anais
eletrônicos. São Paulo: Editora ANPUH-SP, 2011. Disponível em:
snh2011.anpuh.
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jan. 2021.

FRIGOTTO, Gaudêncio. Escola pública brasileira na atualidade: lições da


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Campinas: Editora Autores Associados, 2005. p.222-251.

GOMES, Giselma da Silva. Tecnologias digitais da informação e comunicação na


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Federal de Alagoas. Maceió, 98 p. 2018. Disponível em:
http://www.repositorio.ufal.br/bitstream/riufal/3775/1/Tecnologias%20digitais%20da%2
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a%C3%A7%C3%A3o%20b%C3%A1sica%3A%20utilizando%20hist%C3%B3ria%20e
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2021

KRAMER, Sonia; MOREIRA, Antônio Flavio Barbosa. Contemporaneidade,


Educação e Tecnologia. Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p.
1037-1057, out. 2007.

LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez Editora, 2006.

RAYS, Oswaldo Alonso. A relação teoria-prática na didática escolar crítica. In:


VEIGA, Ilma Passos Alencastro (Org.). Didática: o ensino e suas relações. 18.ed.
Campinas: Papires Editora, 2015. p.33-52.

SILVA, Alzira Karla Araújo da; CORREIA, Anna Elizabeth Galvão Coutinho;
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informação. Rev. Interam. Bibliot. Medellín (Colombia) Vol. 33, No. 1 enero-junio
de 2010.
O USO DE MAPAS CONCEITUAIS E
PODCASTS NA EDUCAÇÃO BÁSICA
REMOTA PARA UMA APRENDIZAGEM
270
SIGNIFICATIVA
Maria Luiza Vasconcelos Fernandes de Oliveira
e Nadir Andrade Nascimento

Considerações iniciais
O campo da História deve contribuir para que o aluno seja capaz de criar um
senso crítico sobre fatos passados e cotidianos, como de analisar ações
humanas no tempo e seus processos, deve também contemplar diferentes
linguagens, para desenvolver a capacidade de comunicação e diálogo, para o
respeito à pluralidade cultural, social e política, bem como para o enfrentamento
de circunstâncias conflituosas e tensas (BRASIL, 2017). Para isso a tecnologia
e a internet trazem diferentes linguagens importantes para serem trabalhadas
em sala de aula, pois apresentam variadas formas de expressividade que
permeiam o cotidiano do aluno, e que tornam o processo de aprendizagem
significativo, por essa razão o trabalho do professor e aluno é de “Compreender,
utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica,
significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as
escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir
conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida
pessoal e coletiva (BRASIL, 2017, p. 9)”.

A aprendizagem significativa ocorre quando um novo conteúdo é incorporado às


estruturas do conhecimento, o aluno adquire significado para ele a partir da
relação com seu conhecimento prévio. Existem algumas vantagens que
merecem destaque ao se utilizar esta metodologia, que são: 1. o conhecimento
adquirido assim é retido e lembrado por mais tempo; 2. aumenta a capacidade
de aprender outros materiais ou conteúdos relacionados de maneira mais fácil;
3. e se esquecida a reaprendizagem é facilitada. Assim o aluno aprende também
por meio da assimilação entre significados velhos e os novos, resultando em
uma estrutura diferente, ou seja, um novo aprendizado.

Neste sentido, os mapas conceituais são diagramas que representam ideias que
se relacionam com algum conteúdo específico, ajudam aos alunos no processo
de assimilação de informações, quando este é sujeitado a resumir o conteúdo
em conceitos, palavras-chaves, que ganham significado no processo da
execução e que obriga o estudante a revisar o conteúdo, contribuindo para um
maior entendimento e fixação do assunto. “Nesse contexto, o mapa conceitual,
criado na década de 1970 por Joseph Novak como técnica cognitiva para
aprender de modo significativo, baseia-se na teoria ausubeliana e constitui uma
estratégia pedagógica de grande relevância no ensino para a construção de
conceitos científicos pelos alunos, ajudando-os a integrar e relacionar
informações, atribuindo, assim, significado ao que estão estudando”.
(CARABETTA JÚNIOR, 2013, p.443).
271
Do mesmo modo os podcasts, que são áudios gravados transmitidos ou
distribuídos via dados/internet, presentes em plataformas de stream, onde cada
áudio é denominado de episódio, se demonstram uma tecnologia de auxílio
didático favorável tanto a educação à distância quanto presencial, visto que “o
podcast permite ao professor disponibilizar materiais didácticos como aulas,
documentários e entrevistas em formato áudio que podem ser ouvidos pelos
estudantes a qualquer hora do dia e em qualquer espaço geográfico.” (CRUZ,
2009, p. 67).

Seguindo esta linha de raciocínio, os jogos virtuais também se mostraram como


potenciais auxiliadores para o ensino de História. Pois o jogo ajuda a ativar e
desenvolver estruturas cognitivas do cérebro, favorecendo o desenvolvimento
de habilidades como identificar, comparar e classificar, observar, conceituar,
inferir e relacionar, igualmente desenvolve a criatividade, a sociabilidade e a
perseverança. (SCHERER; SILVA MIRANDA, 2013) Da mesma maneira que os
jogos, os quizzes são ferramentas semelhantes, porém estruturados em
questionários, mas que são dinâmicos e podem conter imagens, sons e GIFs. O
quiz instiga a participação e a colaboração dos alunos no andamento do ensino
e na aprendizagem. Além de contribuir para a aquisição de conhecimento, o quiz
pode ser um formidável método avaliativo.

No entanto, como se é colocado por Silva e Figueiredo (2013), "a introdução das
tecnologias no ensino perpassa obrigatoriamente a necessidade de instruir os
alunos quanto ao uso destes recursos tanto nas pesquisas escolares, quanto
como fonte para novas formas de aprendizado.” Por isso os profissionais de
educação precisam estar preparados e devem saber lidar com estes recursos,
inserindo-os de acordo com as necessidades educacionais diárias.

A educação brasileira, ainda hoje, possui uma instrução baseada em uma


abordagem tradicionalista e produtivista. Este modelo tradicional que percebe o
estudante como uma folha em branco esperando o conhecimento que será
transmitido pelo professor (LEÃO, 1999, p. 191), segue uma visão produtivista
que, de acordo com Singer (1996), visualiza a escola como um espaço de
formação de cidadãos trabalhadores e saudáveis, restringindo o espaço
educacional, portanto, a uma fábrica de operários letrados, favorecendo
desigualdades, já que este sistema educacional é constituído de sucessivas
seleções e somente aqueles que são considerados mais aptos são os que detém
capitais culturais e linguísticos elevados (PICANÇO E MORAIS, 2016).

Sendo assim, considerando a necessidade de um aprimoramento da educação


brasileira para adequar-se à atual conjuntura digital (imposta pela situação
pandêmica causada pela Covid-19), esse projeto se justifica na urgência de
inserção de novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC’s) na
educação, sendo essas, objetivamente, quizzes, mapas conceituais e podcasts,
tendo em vista seus caráteres pontuais, dinâmicos e de simples confecção e
difusão (GAVA, MENEZES e CURY, 2003; JESUS, 2014). Essa metodologia é
de grande importância visto, ainda, que a rede pública de ensino brasileira está 272
com grande dificuldade para garantir o direito à educação por conta do acesso
limitado à internet e tecnologias, portanto, muitas escolas optaram por utilizar o
aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp como sala de aula virtual,
espaço este que se mostra mais acessível aos alunos e um satisfatório meio de
difusão para jogos, áudios, podcasts e mapas conceituais digitais.

Materiais e métodos
A partir do quadro educacional visualizado no Brasil, onde mais de 50% dos
alunos se sentem cada vez mais desmotivados para as atividades remotas seja
pela impossibilidade de interação social ou por não conseguirem acompanhar a
aula no formato digital (OLIVEIRA, G1, 2020), essa metodologia de ensino busca
criar um ambiente de aprendizagem interativo remoto descontraído e dinâmico,
de modo que visa introduzir temáticas diversas através do uso de mapas
conceituais e podcasts.

É importante ressaltar que esse formato de ensino não tem como objetivo inicial
a aplicação em temas completos, tendo em vista o propósito do PIBID que visa
proporcionar a primeira experiência do aluno de licenciatura em sala de aula,
tendo como propósito a observação, reflexão e elevação da da qualidade inicial
do magistério de modo que posso contribuir na expansão de possibilidades
metodológicas inovadoras na sala de aula (CAPES, 2020). Desse modo,
trabalhou-se nas turmas do 9° ano da escola campo Colégio Professor Gonçalo
Rollemberg Leite, uma das temáticas possíveis no eixo da Ditadura Militar de
1964. Esse método foi aplicado através do grupo do WhatsApp da turma, onde
estavam sendo realizadas as aulas remotas.

Tendo em vista não apenas o material previamente visitado para a confecção


dessa sequência didática, aspirando melhor entendimento e aplicação dos
objetos escolhidos para compor esse método de ensino, adentrou-se, também,
a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Documento Curricular de
Sergipe, visando o aprofundamento e determinação de habilidades e
competências que regeram o projeto.

A metodologia aqui proposta se baseia nas competências 3 e 5 da BNCC do


setor específico de história para o ensino fundamental “3. Elaborar
questionamentos, hipóteses, argumentos e proposições em relação a
documentos, interpretações e contextos históricos específicos, recorrendo a
diferentes linguagens e mídias, exercitando a empatia, o diálogo, a resolução de
conflitos, a cooperação e o respeito. [...] 5. Analisar e compreender o movimento
de populações e mercadorias no tempo e no espaço e seus significados
históricos, levando em conta o respeito e a solidariedade com as diferentes
populações.” (BRASIL, 2018, p. 402).

Metodologia: música e censura durante a Ditadura Militar


Esse foi o primeiro momento de contato entre as bolsistas do PIBID e os
estudantes da escola campo, alunos das turmas do 9º ano do ensino 273
fundamental anos finais. Se teve como itens norteadores para o
desenvolvimento da atividade as habilidades EF09HI19 e EF09HI19 do
Documento Curricular de Sergipe “(EF09HI19) Identificar e compreender o
processo que resultou na ditadura civil militar no Brasil e discutir a emergência
de questões relacionadas à memória e à justiça sobre os casos de violação dos
direitos humanos. (EF09HI20) Discutir os processos de resistência e as
propostas de reorganização da sociedade brasileira durante a ditadura civil-
militar e compreender a deposição do governador sergipano Seixas Dória a partir
da resistência ao golpe de 1964” (SERGIPE, p. 467, 2018). Objetivando, desse
modo, a apresentação do que foi a ditadura militar, perpassando por pontos
como a tomada do poder, as ações empregadas durante o regime, a censura e
as violações dos direitos humanos, e encerrando com os processos de
resistência, tendo como enfoque principal a música como forma de expressão e
protesto.

Para a aplicação da integral da atividade serão utilizados:

● Dispositivo com internet;


● Link de website;
● Caderno e lápis ou caneta;
● Imagens e/ou gifs;
● Áudio.

Para realizar a atividade é necessário, primordialmente, que os alunos tenham


acesso à internet, mas não necessariamente durante a aula, pois os materiais
ficam disponíveis no grupo de WhatsApp juntamente com o debate realizado e
o link para a atividade avaliativa em formato de quiz. A metodologia adotada foi
empregada em dois momentos distintos, tomando, portanto, duas aulas, uma
síncrona e outra assíncrona.

1° momento: Atividade sincrônica. Debates, imagens e áudios


A aula iniciou com uma abordagem direta. O grupo de alunos recebeu e escutou
um áudio com a canção “É proibido Proibir” do cantor e compositor Caetano
Veloso e, após esse momento, iniciou-se um debate acerca da música. O
objetivo nessa primeira dinâmica é perceber o conhecimento prévio dos alunos
acerca da Ditadura Militar, o processo de censura da cultura e a contrapartida
dos artistas no período em questão.

Após o debate inicial, foi liberado um podcast que trabalhou a temática central,
explicando a música por completo e contextualizando-a no período ditatorial.
Juntamente ao podcast foi disponibilizado um mapa conceitual que expressou,
de forma escrita e desenhada, as principais temáticas trazidas no áudio. Esse
conjunto tem como intuito aplicar a disciplina teórica de forma mais dinâmica
tendo em vista o formato diferenciado do podcast que, podendo ser mais fluído
e divertido, dá ao aluno mais liberdade e o possibilita o interesse ao tema
(BARROS e MENTA, 2007), e os mapas conceituais, diagramas que
representam ideias que se relacionam com algum conteúdo específico, ajudam 274
aos alunos no processo de assimilação de informações, quando este é sujeitado
a resumir o conteúdo em conceitos, palavras-chaves, que ganham significado no
processo da execução e que obriga o estudante a revisar o conteúdo,
contribuindo para um maior entendimento e fixação do assunto (CARABETTA
JÚNIOR, 2013).

Quando todos finalizaram o estudo do conteúdo auditivo e visual foi estimulado


um novo debate acerca da temática, agora com perguntas norteadoras, de modo
que os alunos, com mais informações sobre a Ditadura Militar e a música “É
proibido proibir” de Caetano Veloso, podem desenvolver melhor o tema. Esse
segundo debate se vê necessário para, novamente, testar os conhecimentos dos
alunos com base no material disponibilizado e perceber o grau de aprendizado
em comparação ao primeiro debate.

2° momento: atividade assincrônica. Deveres para casa


Essa 2ª etapa foi introduzida ao final do debate e se caracteriza como uma
avaliação dos conhecimentos através de um questionário conhecido como quiz.
Desse modo, ao fim da atividade síncrona foi liberado um link direcionando a
página da web onde o quiz estava disponível. Optou-se pelo uso do quiz, pois
percebe-se que os alunos se sentem mais estimulados a realizarem o exercício
por ser algo mais lúdico e interativo, além de proporcionar um espírito de
competição saudável, registrando, portanto, alta taxa de aceitação e elevado
nível de desempenho (ALVES et al., 2015).

Também foi aplicada uma atividade extra não-obrigatória, onde o aluno


individualmente montaria seu próprio mapa conceitual com uma música de sua
escolha, tendo como critério apenas ser uma música produzida durante a
Ditadura Militar. Como trata-se de uma atividade opcional, os alunos que a
fizeram ganharam um prêmio, que será entregue quando o quadro pandêmico
permitir.

Acompanhamento e avaliação
O acompanhamento foi feito de forma contínua. Sendo observado a participação
dos alunos no debate e suas dúvidas.
A interação no debate foi o ponto-chave do processo avaliativo, mas, também,
ocorreu a quantificação dos resultados do quiz, não especificamente com a
pontuação final, mas, sim, com a participação na atividade, sendo esse o critério
avaliativo.

Resultados e discussões
Pesquisas apontam uma crescente desmotivação dos estudantes durante o ano
letivo de 2020. Dados demonstram que esses alunos já alcançam 54%
(OLIVEIRA, G1, 2020) e as razões para esse desestímulo são inúmeras, desde
a carga elevada de materiais para resolução até o cansaço mental ocasionado
pela situação pandêmica. Muitos professores também encontraram dificuldade
com esse novo contexto educacional, pois o Brasil é um país onde a educação 275
tradicional é priorizada nas salas de aula, mas que, dificilmente, consegue ser
posta em prática no ensino remoto.

Essa realidade foi atestada durante a aplicação da metodologia, pois alguns


alunos pouco interagiram durante o debate inicial proposto, a maior parte das
manifestações se davam a partir de expressões monossilábicas, respondendo
com “sim” ou “não”, de modo que a abordagem primária, que objetivava um
retorno, foi comprometida, tendo em vista o cansaço dos alunos, muito por conta
do final de ano letivo e da situação pandêmica.

No segundo debate, no entanto, esse quadro se modificou positivamente, a


começar pela maior participação dos estudantes na discussão e pelo aumento
da empolgação possibilitada pela inserção do podcast e do mapa conceitual,
acredita-se que essa mudança ocorreu por haver um arsenal teórico maior com
maiores explicações quanto ao assunto, já que no primeiro momento os
estudantes apenas ouviram a canção e a partir dela tentaram responder
questões relativas à temática com base em seus conhecimentos prévios.

Entretanto, com base na atividade aplicada e nos debates realizados


posteriormente, foi evidenciado que para que houvesse uma melhor
desenvoltura da metodologia seria interessante a montagem de um número
maior de questões para que o debate guiado se tornasse mais fluido. Além disso,
a organização de exemplos materiais como livros, músicas e filmes, tornaria a
aplicação da atividade mais proveitosa, pois faria os alunos revisitarem suas
memórias acerca do assunto gerando maiores discussões e participação, porém
a falta de preparo prévio gerou espaços vazios, pouca interação e uma leve
frustração. Sendo assim, essa experiência serviu como aprendizado para a
realização de futuras atividades e melhor desenvoltura em sala de aula.

Considerações finais
O ensino de História por ser factual, geralmente se é trabalhado com tendências
narrativas e métodos positivistas, sendo para muitos uma matéria tediosa e
desinteressante, o que acaba tornando o processo de aprendizagem repetitivo,
burocratizado, comprometendo o aprendizado dos alunos (MARQUES, 2010,
p.6).

A utilização de metodologias ativas é de tamanha relevância, visto que os


educandos são postos como sujeitos no centro do seu próprio processo de
aprendizagem, para isso o papel do professor é de mediador guiando os alunos
por meios que não são mais os tradicionais, utilizando metodologias didáticas
dinâmicas como mapas mentais e podcasts, no intuito de tornar a aprendizagem
significativa e menos entediante. Desse modo, a metodologia desenvolvida
demonstrou ser apta para aplicação em sala de aula, mas com as devidas
correções e aprimoramentos quanto ao uso de exemplos materiais e questões
como guia, adaptando-os para diferentes contextos e turmas.

Referências biográficas 276


Maria Luiza Vasconcelos Fernandes de Oliveira: Graduanda do curso de
história da Universidade Federal de Sergipe, marialuizacg@outlook.com.br.
http://lattes.cnpq.br/6430175889581663.

Nadir Andrade Nascimento: Graduanda do curso de história da Universidade


Federal de Sergipe, nadirnascimento16@outlook.com,
http://lattes.cnpq.br/7481490945023309.

Referências
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apresentação de um objeto de aprendizagem. In: XIII Congresso Internacional
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BARROS, G. C. MENTA, E. Podcast: produções de áudio para educação de


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Tecnologías de la Información y Comunicación. Acessado: www.eptic.com.br,
vol. IX, n. 1, jan/abr, 2007.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em:
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CINEMA E EDUCAÇÃO: POSSIBILIDADES E
LIMITES
Maria Talia Cordeiro e Ernando Brito
278
Gonçalves Junior

A utilização do cinema em sala de aula gera muitos debates em diversos


aspectos pedagógicos. Essas discussões, quase sempre, são geradas devido à
má utilização do cinema em sala, pois, muitas vezes, os filmes são utilizados
para entreter os alunos quando algum professor ou professora faltam ou, ainda,
sem o devido cuidado por parte do docente. Nesse sentido, nosso texto visa
problematizar o uso do cinema em sala de aula, apontando algumas questões
que devem ser levadas em conta quando pensamos em utilizar essa ferramenta
pedagógica. Gostaríamos de salientar que esse texto faz parte de uma pesquisa
em andamento que busca investigar como os filmes são utilizados na educação
infantil em algumas escolas de um município do interior do estado do Paraná.

Os filmes, ao serem incorporados em nossa sociedade no final do século XIX e


início do século XX, eram, quase sempre, pensados e produzidos com o objetivo
de entretenimento, no entanto segundo alguns autores, como Carmo (2003),
entendem o cinema como sendo dotados de uma cultura de massa voltados para
os fins do capital. Neste sentido, segundo o autor o cinema é como uma “práxis
social orientada pelo e para o mercado”. (CARMO, 2003, p. 85).

No entanto, as instituições de ensino podem utilizar o cinema como uma


ferramenta que auxilie na emancipação política e humana dos educandos, pois,
segundo Carmo (2003) “a escola (e outras instituições educativas) vai se
apropriar desses produtos culturais para seus fins específicos”. (CARMO, 2003,
p. 85). Por isso, o cinema pode se tornar uma ferramenta contra ideológica,
sendo uma prática que irá produzir novos conhecimentos e possibilidades de
transformação.

Desta maneira, o trabalho pedagógico desenvolvido pelo(a) professor(a)


mediador(a) é muito importante, pois segundo Leite (2012) “o processo de
mediação pedagógica é fundamental na relação que se estabelece entre o
sujeito/aluno e o objeto de conhecimento/conteúdos escolares, lembrando que
em sala de aula, o professor é o principal agente mediador, embora não o único”
(LEITE.2012, p.6). Neste sentido, compreendemos que o cinema utilizado de
forma crítica pelos(as) educadores(as) problematizando-o, faz com que o
educando experiencie o conhecimento e crie novas formas de ver o mundo.

Assim como afirma Carmo (2003), pois “aprender a ver cinema é realizar esse
rito de passagem do expectador passivo para o expectador crítico” (CARMO,
2003, p. 77). Essa forma de aprender a ver cinema pode possibilitar aos
educandos construir e ressignificar conhecimentos, não sendo um cinema que
transmite uma mensagem pronta e acaba, mas sim, aquele que possibilita a
reflexão, bem como a possibilidade de se reinventar, para que além de uma
ferramenta contra a ideologia da cultura do capital imposta na sociedade, permita
a emancipação ética e estética dos educandos.
279
É relevante destacar que neste trabalho estamos partindo da perspectiva de que
os alunos e alunas são entendidas como sujeitos históricos sociais e produtores
de cultura, ou seja, sujeitos ativos, que aprendem e também produzem novos
sentidos a todo conhecimento, são indivíduos, segundo Duarte (2005):

“[...] que interagem de forma ativa, na produção dos significados das mensagens,
ou seja, ele, sujeito expectador, não é vazio e tampouco tolo, pois suas
experiências, sua visão de mundo e suas referências culturais interferem no
modo como ele vê e interpreta os conteúdos da mídia (DUARTE apud.
BALBINOT 2017, p. 275).”

Dessarte, com um maior desenvolvimento das tecnologias, o cinema passou a


estar cada vez mais presente em nossa rotina adentrando todos os espaços
sociais, inclusive as instituições educativas. Desta maneira, é imprescindível que
seja debatido algumas questões que envolvem a temática, tais como: há relação
entre o cinema e a educação? Quais os benefícios para a aprendizagem
estabelecidos a partir dessa possível relação?

Ao incorporarmos o cinema em nossas práticas pedagógicas, como uma


ferramenta para o ensino e aprendizagem, é aberto aos docentes um leque de
possibilidades a ser explorada para o desenvolvimento integral dos educandos,
pois o cinema é abrangente em diversos aspectos sociais, viabilizando o contato
e reflexão crítica dos educandos sobre mundo a sua volta. Desta maneira,
salienta Duarte (2002) que, “ver filmes é uma prática social tão importante, do
ponto de vista da formação cultural e educacional das pessoas quanto à leitura
de obras literárias, filosóficas, sociológicas e tantas mais” (DUARTE apud
ALMEIDA 2017, s.p.).

Compreendemos que o cinema é fundamental para a aprendizagem e a visão


de mundo dos discentes, bem como, a ampliação da capacidade criativa dos
mesmos, pois o cinema, neste caso, coloca-se na condição de arte, com
conteúdo de importância cultural e formativa, tão relevante quanto as demais
linguagens artísticas.

No entanto, assistir filmes em instituições educativas não é a mesma coisa a


assistir filmes em casa ou em outros espaços, pois nos espaços educativos, o
filme estará dotado de intencionalidade pedagógica, buscando de forma didática
aprendizagem e o desenvolvimento crítico do educando. Desta forma, o filme
será pensado pedagogicamente, planejado e refletido pelo próprio educador
antes mesmo do contato com os discentes. Com isso destaca Napolitano (2009):
“Ver filme na escola não é como ver filme em casa e nem no cinema. O professor
tem que pensar o seu uso. É um exercício de aprender a ver filmes, mas também
de aprender a pensar sobre o mundo. O uso do filme na escola não pode partir
só da subjetividade, do “eu gostei”, “é divertido”, “quero ver pancadaria”. Dessa
forma os estudantes veem em casa. Na escola, o uso dos filmes precisa ter
conotação didática (NAPOLITANO, 2009, p.23).” 280

Deste modo, compreendemos como é fundamental o planejamento do educador,


já que o mesmo é o suporte para a prática em sala de aula, sendo imprescindível
que este seja pensado de forma crítica de modo a garantir e efetivar ainda mais
a aprendizagem de seus educandos. Com isso salienta BALBINOT (2017):

“[...] o professor, dentro de seu planejamento, precisa priorizar a utilização de


recursos integrados com os conteúdos e deve estar comprometido em fazê-lo de
forma responsável, oportunizando aos estudantes a visualização dessas obras
em sua integralidade, para que o estudante não fique com a sensação de ter
sido “enrolado”, descredibilizando o uso desse recurso. (BALBINOT; MIQUELIN
2017, p. 283).”

À vista disto Balbinot (2017) discute a questão de um planejamento responsável


por parte do docente, ou seja, filmes devem ser planejados e que estejam
realmente engajados com o aprendizado e desenvolvimento, que sirvam como
suporte para a emancipação dos educandos e não somente como enrolação ou
distração, em uma prática que não faça sentido na formação das crianças
envolvidas.

Levando em consideração, a relação cinema e educação como benéfica ao


desenvolvimento dos educandos, bem como uma prática social que abrange
além das paredes da sala de aula, que possibilita aos educandos o encontro com
novos conhecimentos, bem como, maior autonomia na criação de novos
sentidos. Neste sentido, [...] a utilização do cinema surge não só como um
recurso pedagógico de reflexão na sala de aula, mas também como um meio de
múltiplas possibilidades de criação e de produção do saber. (SHEID apud
BALBINOT; MIQUELIN, 2017, p. 285).

Segundo Silva (2012) o recurso cinematográfico proporciona inúmeros


benefícios ao processo de ensino e aprendizagem, mas é preciso ressaltar o
papel do professor que, além de mediador, precisa conhecer metodologia
aplicada. Cabe ao docente estudar e encontrar o melhor meio de utilizar o
recurso, analisando a faixa etária de suas crianças e encontrar formas de
abordá-lo, sabendo diferenciar o que é proveitoso, para que a exibição, não se
torne um mero passatempo e sim, ajude no crescimento e aprimoramento das
práticas pedagógicas.

Napolitano defende que o uso do cinema em ambientes educativos oferece


inúmeras vantagens ao trabalho pedagógico desenvolvido, pois no cinema,
estão contidos inúmeros valores sociais, viabilizando para a escola
possibilidades de práticas que levem ao conhecimento, diferentes, dos que está
acostumada, proporcionando reflexão eminente. Com isso, salienta Napolitano
(2003):

“Trabalhar com o cinema em sala de aula é ajudar a escola a reencontrar a


cultura ao mesmo tempo cotidiana e elevada, pois o cinema é o campo no qual 281
a estética, o fazer, a ideologia e os valores sociais mais amplos são sintetizados
numa mesma obra de arte. “Assim, dos mais comerciais e descomprometidos
aos mais sofisticados e “difíceis”, os filmes tem sempre alguma possibilidade ao
trabalho escolar.” (NAPOLITANO, 2003, p. 11).”

Compreende-se ainda a importância do cinema na escola como um todo, pois o


mesmo, se tratando de uma ficção, uma representação da realidade pode servir
à reflexão da própria sociedade, inclusive sobre a própria escola e suas práticas.
Com isso, a escola possui a possibilidade de se reinventar, de criar novas formas
de acesso ao conhecimento, transformando a mesma, ativamente, para além da
reprodução sem sentido, ampliando a possibilidade de desenvolvimento dos
educandos. Desta forma Almeida (2001) justifica a importância do cinema na
escola argumentando que:

“[...] é importante porque traz para a escola aquilo que ela se nega a ser e que
poderia transforma-la em algo vívido e fundamental: participante ativa da cultura
e não repetidora e divulgadora de conhecimentos massificados, muitas vezes já
deteriorados, defasados [...]. (ALMEIDA apud NAPOLITANO, 2003, p. 12).”

Assim, compreendemos a possibilidade que o cinema representa, como agente


mediador que pode auxiliar na transformação da postura da própria escola em
relação à educação, proporcionando a mesma, a reflexão sobre sua postura
muitas vezes passiva e possibilitando a sua emancipação ideológica, logo
também, sendo a agente mediadora de transformação e da emancipação dos
sujeitos educandos atendidos pela mesma.

Em relação à mediação do conhecimento proporcionada pelo educador e


educadora, é fundamental, pois este deve pensar o uso do cinema a fim de
fomentar a capacidade criativa dos educandos, bem como, a sua reflexão. Neste
sentido, sempre dentro de seu planejamento o professor ao escolher utilizar o
cinema, segundo Napolitano (2003), deve questionar-se sobre qual o uso
possível deste filme? A que faixa etária e escolar ele é mais adequado? Como
vou abordar o filme dentro da minha disciplina ou num trabalho interdisciplinar?
Qual a cultura cinematográfica dos meus alunos? A fim de perceber a melhor
forma de uso do mesmo.

Desta maneira, quando trabalhado o filme na escola, o professor ou professora,


possui o papel de mediar o conhecimento, explorando mais a fundo as
possibilidades a serem alcançadas com o filme, para além do conhecimento da
cultura cotidiana do educando, onde o mesmo possa sentir familiaridade, bem
como divertimento, mas também, possa experimentar o conhecimento de uma
nova maneira, olhando o pelo viés da reflexão crítica. Por isso, a importância do
professor mediador trabalhar com o cinema, pois segundo Napolitano ele:

“[...] deve propor leituras mais ambiciosas além do puro lazer, fazendo a ponte
entre emoção e razão de forma mais direcionada, incentivando o aluno a se
tornar um expectador mais exigente e crítico, propondo relações de 282
conteúdo/linguagem do filme com o conteúdo escolar. (NAPOLITANO, 2003, p.
13).”

Essa articulação entre os filmes e o conteúdo a ser trabalhado é um fator de


grande relevância. Pois o filme além do desenvolvimento do senso crítico
proporciona o desenvolvimento de muitas competências e habilidades que
ampliam ainda mais as capacidades dos educandos. Neste sentido, explicita
Napolitano (2003), que essas habilidades, aprimoram a capacidade narrativa e
descritiva; decodificam signos e códigos não verbais; aperfeiçoam a capacidade
de crítica sociocultural e político ideológico, sobretudo em torno dos tópicos
mídia e indústria cultural.

Ao docente utilizar os filmes em sala de aula, o educando e educanda poderá,


fazer relações entre a sociedade e os sujeitos, de modo a identificar-se com
aquilo que está assistindo, pois, em toda a sua vida, aquilo que vivencia em seu
cotidiano passa a fazer parte da sua subjetividade e compor a identidade do
indivíduo, por isso, o cinema é importante como ferramenta didático pedagógica,
pois irá possibilitar que o mesmo se veja no centro do processo, analisando o
cotidiano social em que está inserido, observando sua complexidade e
multiplicidade. Neste sentido, Linhares e Ávila salientam:

“Trazer a discussão da relação do sujeito com a sociedade através do cinema


permite de forma contundente ao professor penetrar na relação pedagógica das
imagens e da comunicação enquanto formadora das subjetividades.
Subjetividades que passam a ser percebidas, debatidas e refletidas a partir da
complexidade e multiplicidade do lugar onde são construídas: o cotidiano.
(LINHARES; ÁVILA, 2017, p. 96.).”

Neste sentido, o professor ou professora precisa estar preparado para trabalhar


com o cinema, não o utilizando de forma inadequada, ou seja, não fazendo
conexão do filme com o que se deseja desenvolver no aluno, bem como, utilizá-
lo com como distração ou passa tempo, não contribuindo para um conhecimento
aprofundado das crianças. Os filmes precisam ser planejados e organizados a
fim de contribuir com o aprendizado dos educandos. Deste modo, afirma Duarte
(2009), narrativas fílmicas falam, descrevem, formam e informam. Assim,
portanto, os filmes não são recursos utilizados quando não se pode ou não se
quer dar aulas. (DUARTE apud BALBINOT; MIQUELIN, 2017).

Novamente nos voltamos ao papel do professor mediador, pois a partir dele


seguirá os encaminhamentos com o filme, será ele que proporcionará às
crianças a oportunidade de uma leitura mais crítica do que está assistindo, para
além do lazer e do passatempo, também que o filme em sala de aula ultrapasse
o uso cotidiano reprodutor das mesmas leituras a que os mesmos já têm acesso.
Portanto, afirma Napolitano (2003):

“[...] mesmo reconhecendo que o uso do cinema na sala de aula procura


relacionar a escola à cultura cotidiana mais ampla, esse tipo de atividade não 283
deve se diluir nela, apenas reproduzindo expectativas, formas e leituras que já
operamos cotidianamente. Se fosse assim, a escola seria desnecessária. É
preciso que a atividade escolar com o cinema vá além da experiência cotidiana,
porém sem negá-la. A diferença é que a escola tendo o professor como
mediador, deve propor leituras mais ambiciosas. (NAPOLITANO, 2003, p. 13).”

Pensando então, em trabalhar com o cinema da melhor forma possível, levando


em consideração a realidade dos educandos e educandas, os seus interesses,
os objetivos de aprendizagem que se deseja alcançar, bem como, despertar na
criança uma leitura mais crítica do contexto cultural e histórico que está inserida,
é relevante que o educador conheça as formas inadequadas de utilizar os filmes,
de modo a não descredibilizar o uso desses tão importantes recursos. E assim,
de acordo com Moran (2005), as formas erradas de se trabalhar com os filmes
são denominadas:

“(I) Filme-tapa-buraco: quando falta professor, algumas vezes pode ser


produtivo, mas, se utilizado com frequência desvaloriza esse recurso
pedagógico; (II) Filme-enrolação: exibição do filme, sem articulação com o
conteúdo, com o tempo do estudante percebe a enganação; (III) Filme-
deslumbramento: o professor que descobre a facilidade de baixar filmes da
internet e começa a exibi-los em todas as aulas, usando exageradamente; (IV)
Filmes-perfeição: existem professores que questionam todos os filmes, por
existirem problemas técnicos e erros de informação, sendo que essas
dificuldades podem ser problematizadas e tornar a aula interessante; e (V) Filme-
só-exibição: exibe os filmes sem discuti-los, sem integrá-los com os conteúdos
das aulas. (MORAN apud BALBINOT; MIQUELIN, 2017, p. 281).”

Os filmes precisam ser trabalhados com um objetivo formativo pela escola,


pensando em relacionar os conteúdos científicos com os mesmos, sendo assim,
a criança precisa fazer relações socioculturais entre o seu cotidiano e o cinema
e deste modo, será mais significativo para a sua aprendizagem, com isso, nos
amparamos na Teoria da Aprendizagem Significativa de Ausubel, Novak e
Hanesian (1980), que apresenta suporte epistemológico para um trabalho mais
efetivo com o uso do cinema como contribuinte para a aprendizagem
significativa.

E quando a aprendizagem é significativa? A aprendizagem se torna significativa,


quando ela permite que a criança faça relações do novo conhecimento com
aqueles que já possuí, sendo deste modo, mais facilmente assimilado. Assim, a
Aprendizagem Significativa é importante, pois [...] o estudante consegue fazer
relações significativas (derivativa, correlativa, sobreordena e combinatória) não
arbitrárias tendo como ancorar o conteúdo, a ideia ou o tema proposto em
conceitos já existentes nas estruturas cognitivas. (AUSUBEL, NOVAK,
HANESIAN apud BALBINOT; MIQUELIN, p. 276.).

Com isso, é importante que compreendamos o conceito de Aprendizagem


Mecânica, que também faz parte da Teoria da Aprendizagem Significativa. Deste 284
modo, a aprendizagem mecânica acontece quando [...] o conteúdo, a ideia ou
tema é relativamente isolado e relacionado nas estruturas cognitivas de forma
arbitrária e literal, não permitindo relações significativas. (AUSUBEL, NOVAK,
HANESIAN apud BALBINOT; MIQUELIN 2017, p. 276). No entanto, convém
salientar, que o nosso posicionamento diante da proposta de se trabalhar com o
cinema como recurso pedagógico, é de que a aprendizagem seja o mais
significativa possível, aproximando o aluno e aluna de sua realidade, do
conhecimento cientifico e desenvolvendo-o nos aspectos éticos e políticos, a fim
de que a educação contribua para a sua emancipação.

Assim, devemos compreender a relevância de um trabalho mediado pelo


docente, de forma significativa. Sempre levando em consideração aquilo que a
criança já sabe e buscando um contato mais profundo com os novos
conhecimentos. Neste sentido, acreditamos que o cinema como recurso
pedagógico auxilia na aprendizagem significativa, sendo mais efetivo para o
desenvolvimento da criança, pois, como salienta Napolitano (2003), o uso do
cinema em sala de aula (incluindo os desenhos animados) não é uma atividade
isolada em si mesma, podendo estimular outros tipos de aprendizado de
conteúdos, habilidades e conceitos. (NAPOLITANO, 2003).

Por fim, acreditamos que o cinema pode trazer muitas contribuições para a
educação de maneira geral, entretanto, é necessário que o professor ou
professora, esteja ciente de que algumas questões precisam ser levadas em
conta, pois, para ser de fato uma ferramenta pedagógica, os filmes precisam ser
pensados dentro do conteúdo que será trabalhando, é necessário conhecer o
filme, olhá-lo de maneiro crítica, pensando seu contexto de produção, se é
adequado para faixa etária do público alvo, bem como desenvolver atividades
que apresentem uma relação clara entre o filme escolhido e o conteúdo em sala.

Referências biográficas
Dr. Ernando Brito Gonçalves Junior, professor da Universidade Estadual do
Centro-oeste - UNICENTRO.

Maria Talia Cordeiro, estudante do curso de Pedagogia da Universidade


Estadual do Centro-oeste - UNICENTRO.

Referências bibliográficas
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Paulo - Educ. rev. vol.33 Belo Horizonte 2017 Epub Apr 03, 2017.
BALBINOT, Maria Edilce, MIQUELIN, Charlie A. Cinema e Educação: A relação
entre o uso de filmes comerciais como recursos pedagógicos e a aprendizagem,
pelas percepções dos estudantes. Revista Travessias, v. 11, n 2, 2017.

CARMO, Leonardo. O cinema do feitiço contra o feiticeiro. Revista


Iberoamericana de Educação, Canoas, n. 32, p. 71-94, 2003. 285

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nacional de didática e práticas de ensino, xvi., UNICAMP, Campinas, 2012.

LINHARES, Ronaldo Nunes, ÁVILA Éverton Gonçalves. Cinema e educação


para além do conteúdo. Revista Tempos e Espaços em Educação, Sergipe, v.10,
n. 21, p. 89-100, Jan/Abr. 2017.

NAPOLITANO, Marcos. Como usar o cinema na sala de aula. São Paulo:


Contexto, 2003.
UMA “BELA E HIGIENIZADA CIDADE”:
ENSINO DA HISTÓRIA LOCAL DE PONTA
GROSSA POR MEIO DO ÁLBUM DA CIDADE
286
DE 1936
Maristela Sant’Ana de Oliveira
O texto apresenta um recorte da análise realizada na Dissertação de Mestrado,
defendida em 2020, no Programa Mestrado Profissional em História da UEPG –
Universidade Estadual de Ponta Grossa, em que se abordou o tema da História
Local e o Ensino de História. Na pesquisa foram utilizadas fontes jornalísticas
(uma série de crônicas) e fontes fotográficas (Álbum da Cidade), com o objetivo
de discutir a respeito das representações de civilidade e modernidade
construídas sobre a cidade de Ponta Grossa na década de 1930 e estabelecer
uma proposta contemplando o uso de fontes no ensino de história e a história
local por meio de textos e imagens. Nesse trabalho em questão, o objetivo é
estabelecer uma proposta sobre a utilização da fotografia como fonte no ensino
de História, mais especificamente na abordagem da História local, tomando
como exemplo a cidade de Ponta Grossa, no Paraná, durante a década de 1930.

Desde o advento da Escola de Annales, a historiografia vem reforçando a


importância do uso de fontes no estudo da História. De lá para cá só se fortaleceu
a discussão sobre como os documentos se constituem objeto importante na
compreensão do passado, não somente entre historiadores, mas no trabalho em
sala de aula, como aliados fundamentais do processo de ensino e aprendizagem
da História. O uso de documentos possibilita aos alunos a investigação do
passado a partir da problematização das fontes, dos questionamentos que os
mesmos possam colocar a elas. No trabalho com as fontes, segundo Caimi:

“é imprescindível o trabalho do professor e do aluno na problematização e


significação dos documentos, utilizando-os de modo a extrapolar meras funções
de ilustração, motivação, informação ou prova, ainda que estas possam ter
relativa importância. O desafio é, tomando os documentos como fontes, entendê-
los como marcas do passado, portadores de indícios sobre situações vividas,
que contêm saberes e significados que não estão dados, mas que precisam ser
construídos com base em olhares, indagações e problemáticas colocadas pelo
trabalho ativo e construtivo dos alunos, mediados pelo trabalho do professor.”
(CAIMI, 2008, p. 147)

Dentre as várias possibilidades do uso de fontes no ensino de história, optou-se


pelo trabalho com as imagens fotográficas. A sociedade contemporânea vive
mergulhada num mundo de forte apelo imagético. As mensagens decifradas
pelas pessoas são muito mais visuais, imagéticas, do que escritas. E os alunos
estão inseridos nesse universo visual que faz parte de seu cotidiano na
atualidade.

A tecnologia de produção da fotografia deu um grande salto. Cotidianamente se


posa para selfies, tiradas a todo instante por meio de smartphones que contam,
muitas vezes, com excelente qualidade de imagens. Grande parte das pessoas 287
com acesso a essa tecnologia gera inúmeras fotos e vídeos diariamente em seus
celulares que, podem ser compartilhadas em redes sociais, arquivadas ou
descartadas a qualquer momento. Vive-se na era do fotoshop, em que
sofisticados programas de computadores ou aplicativos permitem que as
imagens sejam melhoradas, alteradas, distorcidas a fim de agradar seu receptor.
Todo esse avanço tecnológico fez com que caísse em desuso, nas gerações
atuais, o ato de “revelar” ou imprimir as fotos. É muito mais comum que elas
permaneçam arquivadas em meios digitais. Por esse motivo, só o fato de uma
criança ou um adolescente visualizar uma foto antiga e se possível, manusear
uma foto sobre um suporte de papel, já se configura uma novidade. Assim,
perceber, através dessas fotografias como foi representada a cidade de um
século atrás, a ocupação do espaço urbano, a vida social, econômica, cultural
dessa cidade, constitui-se uma maneira privilegiada de aprendizado.

Acredita-se que o contato com imagens da cidade produzidas há mais de um


século permitem ao aluno compreender parte do processo de formação do
desenho urbano de sua cidade, identifique locais pelos quais ele costuma
passar, estabeleça conexões entre o passado e o presente do lugar em que ele
vive. Essa análise pode ser amparada pelo diálogo com outras fontes, caso o
professor opte por essa metodologia, porém, as fotografias constituem-se fontes
ricas e prazerosas de análise por si sós, desde que observadas informações
como autoria, contexto e técnicas de produção, por exemplo. As imagens não
devem ser pensadas somente como ilustração ou confirmação de um texto
escrito, mas a partir dos sentidos que ela, em si, oferece sobre uma determinada
realidade passada. Nesse sentido, Ana Valeria de Figueiredo da Costa afirma
que:

“uma imagem nunca é inocente retrato desprovido de significação. É documento


sócio-histórico de uma época, de um lugar, de um grupo social, atestado de usos
e costumes. É formadora de identidades que se constroem no cotidiano. Partindo
desse pressuposto, investigar imagens é construir um discurso visual de um
determinado tempo-espaço, com uma história prenhe de significações explícitas,
tanto quanto simbólicas” (COSTA, 2008, p. 15)

Dessa maneira, as fotografias analisadas devem ser investigadas a partir da


concepção de que o objetivo da foto era cristalizar, deixar para a posteridade
uma determinada imagem, guardar uma memória do objeto fotografado, e é,
portanto, carregada de significações. É necessário lembrar ainda que a imagem
é um instrumento que faz uma representação do real. Não é a realidade que se
expressa no papel fotográfico, mas uma fração do que foi real, em um tempo
passado que não pode mais ser alcançado, mas que está cristalizado na
fotografia. Porém, essa fração de realidade, embora pareça ao leitor que é real,
já que está ali, diante dos seus olhos, é fruto de uma construção que envolve o
momento, o fotógrafo e a técnica responsável pela elaboração da imagem.

Na pesquisa desenvolvida, a proposta foi a utilização das fotografias de uma


fonte específica. Tratava-se de um Álbum da cidade de Ponta Grossa, produzido 288
em 1936, por encomenda do prefeito da cidade, Albary Guimarães. Além das
fotografias, produzidas, senão em totalidade, ao menos em sua maioria pelo
fotógrafo Ewald Weiss, o Álbum também tinha algumas ilustrações e textos
informativos sobre o defendido avanço econômico, social e cultural da cidade,
sobretudo durante a gestão do então prefeito. Foram incluídas no Álbum mais
de trezentas fotografias que contemplavam diferentes paisagens do universo
rural, prédios de indústrias, casas comerciais, clubes esportivos e recreativos,
instituições escolares, hospitalares, religiosas, praças e ruas da cidade. Todas
essas imagens apresentadas como reflexo do desenvolvimento e progresso
supostamente vivenciados pela cidade ao longo de sua existência. Muitas
cidades, em algum momento ao longo de sua história, publicaram seus Álbuns
Fotográficos. Sobre essa prática de reunir fotografias em álbuns de cidades, Zita
Possamai destaca que:

“A fotografia opera de forma fragmentária e descontínua, seria impossível então


resumir ou condensar os diferentes espaços numa só foto. Assim, ao colocar
várias fotos num único lugar, como o álbum, cria-se a possibilidade de um
continuísmo, criando a ilusão de que a grandiosidade da cidade se encontra ali
de forma total, completa”. (POSSAMAI, 2005, p. 139)

Assim, portanto, criava-se a ideia de que toda a cidade cabia naquele Álbum, ou
pelo menos, os aspectos da cidade que eram considerados dignos de estarem
ali representados. Além disso, no seu próprio propósito, o álbum traz elementos
que atuam como transmissores de determinadas concepções a respeito de seu
conteúdo, como a noção de ordem, de verdade (que está contida nas
fotografias), de beleza, expressa também nas imagens, enfim, de construção de
uma cidade idealizada. Esse conjunto de elementos explica, em grande parte,
as intenções que permeavam sua elaboração. Ao encomendar a produção de
um Álbum da cidade, certamente o prefeito Municipal tinha consciência do poder
que as imagens constantes ali exerceriam sobre seus leitores, sobretudo se
considerarmos que havia uma forte tendência pra se pensar as imagens como
espelhos da realidade.

Por limitação de tempo e pelo recorte temático, foram selecionadas na pesquisa


prioritariamente imagens que se referiam ao espaço urbano da cidade,
colocadas no Álbum em páginas específicas, na categoria “Urbanismo”. Essas
fotografias retratavam a paisagem urbana da cidade, sobretudo as ruas mais
movimentadas, mais largas, praças remodeladas e arborizadas, destacando a
presença de construções maiores, com dois ou três pavimentos, prédios
comerciais, industriais, além da estação de trem, importante referência para a
cidade naquele momento, já que Ponta Grossa atuava então como um grande
entroncamento ferroviário ligando o sudeste ao sul do país. O conjunto de
imagens elencados nessa temática buscavam construir certas representações
sobre a cidade, divulgar visões sobre ela, criar o imaginário de uma cidade bela
e higienizada, em que os ideais de modernidade e civilidade estariam presentes,
buscando assim estabelecer determinados modelos que deveriam ser seguidos.
De acordo com Sandra Pesavento: 289

“[...] o imaginário – este sistema de ideias e imagens de representação coletiva


que os homens constroem através da história para dar significado às coisas - é
sempre um outro real e não o seu contrário. O mundo, tal como o vemos,
apropriamo-nos e transformamos é sempre um mundo qualificado, construído
socialmente pelo pensamento. Esse é o nosso ‘verdadeiro’ mundo, mundo pelo
qual vivemos, lutamos e morremos. O imaginário existe em função do real que o
produz e do social que o legitima, existe para confirmar, negar, transfigurar ou
ultrapassar a realidade. O imaginário compõe-se de representações sobre o
mundo do vivido, do visível e do experimentado, mas também sobre os sonhos,
desejos e medos de cada época, sobre o não tangível nem visível, mas que
passa a existir e ter força de real para aqueles que o vivenciam.” (PESAVENTO,
2006, p. 50)

As fotografias presentes no Álbum não foram selecionadas aleatoriamente,


foram resultado de um trabalho de escolhas que tinham um objetivo específico
junto ao seu público. Não se pode ignorar que havia um propósito por parte dos
grupos que estavam no poder, de criação e incorporação de alguns padrões de
comportamento por parte da população, criando assim um sentimento de
identificação e pertencimento a esses modelos. Durante a década de 1930,
assim como outras cidades do Brasil, Ponta Grossa passou por várias obras de
reordenamento urbano, com o remodelamento de várias praças, alargamento e
pavimentação de ruas. Segundo Micael M. Herschmann e Carlos Alberto
Masseder Pereira, áreas como a medicina, educação e engenharia, sobretudo
nas décadas de 1920 e 1930, adotaram medidas que buscavam implantar no
Brasil os princípios de higiene, ordem, sanitarismo, educação, dentro do que se
entendia por um mundo da modernidade e do progresso. Segundo os autores:

“A reformulação do espaço urbano foi uma das estratégias adotadas por este
Estado, no início do século XX. A cidade, com sua organização físico-espacial,
seus rituais de ‘progresso’ – como no caso das exposições nacionais e
internacionais – passa a ter um caráter pedagógico. Torna-se símbolo por
excelência de um tempo de aprendizagem, de internalização de modelos. Assim,
quando estes especialistas-cientistas se propunham a reformar, organizar,
mesmo em nível superficial, a esperança que tinham era de que essa projeção
externa, pública, citadina, pudesse atingir e orientar os indivíduos.
(HERSCHMANN; PEREIRA, 1994, p. 27)

Nessa perspectiva, acredita-se que as imagens exprimiam discursos


semelhantes aos mencionados por esses autores. As fotografias do Álbum
divulgavam imagens de uma cidade bonita, limpa e que investia em obras que
melhorariam ainda mais o espaço, como canalização de arroios, pavimentação
das ruas e arborização das praças, representando uma cidade que não
comportava o que não fosse compatível com ela, ou seja, o que era feio, sujo, o
que cheirava mal, e que, portanto, não eram dignos de serem lembrados naquela
publicação. Entretanto, cabe questionar-se sobre a quais pessoas essas obras
de fato atendiam. Quem, por exemplo, teve acesso a pavimentação na rua de 290
sua casa e assim pode usufruir de sistema saneamento criado? Qual parcela da
população deixaria de sujar seus sapatos de lama? A cidade não tinha outros
espaços que precisavam de reparos e investimentos? Onde estava a cidade da
periferia, das ruas estreitas, das casas que estavam fora dos padrões estéticos
pretendidos? Estes são alguns exemplos de questionamentos que devem ser
colocadas quando da análise das imagens impressas no Álbum.

A imagem inserida abaixo é uma das fotografias presentes no álbum analisado.


Ela mostra uma das áreas centrais da cidade e uma rua entre as mais
movimentadas naquela época e mesmo atualmente. Na imagem foi clara a
intenção do fotógrafo em enfatizar o monumental prédio construído ali,
posicionando a câmera defronte ele, mas a certa distância de maneira a capturar
toda sua extensão, que se agigantava ainda mais se comparada com o espaço
ao redor. Esse, certamente era um dos maiores prédios da cidade naquele
período. No espaço da Praça, não havia construções visíveis, nem árvores,
somente algumas carroças posicionadas. Se olharmos com atenção, se percebe
a presença de uma pessoa apoiada numa delas, quase imperceptível, diminuta
diante da grandeza do prédio ao fundo.

Rua Augusto Ribas. Fonte: Álbum de Ponta Grossa de 1936

Ao longo da rua, nota-se a presença de alguns automóveis (símbolos exímios de


modernidade naquela época), outras carroças próximas ao meio fio e algumas
pessoas na frente da porta de entrada do estabelecimento. Outro destaque fica
por conta dos postes de iluminação, que se impõe na imagem, e se estendem a
perder de vista, sugerindo que, em mais este espaço da cidade, as noites não
tinham mais a mesma escuridão e já não causavam medo.

O Álbum vinha carregado de fotografias como esta, com múltiplas formas de


análise e questionamentos. Dentre as possibilidades estão a de inserir a
discussão sobre o tema da modernização de cidades brasileiras no final do 291
século XIX e início do século XX, relacionando ao contexto local ponta-
grossense; a discussão sobre a própria história local, tão importante para o
aluno, pois favorece a compreensão de processo histórico na medida em que
aproxima o conteúdo trabalhado da sua realidade.

Do ponto de vista metodológico, as abordagens podem ser feitas partindo do


tempo presente, levantando questionamentos sobre os espaços que os alunos
conhecem da cidade em que moram para então dialogar com as representações
desses mesmos espaços no passado. O trabalho pode incluir, na medida do
possível, oficinas de produção de fotografias com visitação aos mesmos espaços
contemplados nas fotografias antigas. Enfim, há um leque de possibilidades que
podem ser exploradas pelo professor, sem esquecer-se de que é fundamental
que o mesmo conduza seu trabalho de maneira que os alunos consigam
perceber questões envolvidas em todo o processo de produção, circulação e
recepção dessas imagens no período em que foram produzidas e mesmo
atualmente, como objeto de estudo. Compreender como, quando, quais
objetivos que permearam a produção das fotografias impressas no Álbum são
questões essenciais para que o trabalho cumpra seu objetivo e permita ao aluno
tratar tais fontes de maneira crítica, problematizando-as, permitindo que o
conhecimento histórico produzido faça sentido para ele.

Referências biográficas
Maristela Sant’Ana de Oliveira é Mestra em Ensino de História pelo Programa
Mestrado Profissional em Ensino de História pela UEPG-Universidade Estadual
de Ponta Grossa. Atua como professora de História na Rede Estadual de Ensino
do Paraná

Referências Bibliográficas
CAIMI, Flavia Eloisa. Fontes históricas na sala de aula: uma possibilidade de
produção de conhecimento histórico escolar? Revista Anos 90, Porto Alegre, v.
15, n. 28, p.129-150, dez. 2008.

COSTA, Ana Valéria de Figueiredo. Imagens Fotográficas de Professoras: uma


trajetória visual do magistério em escolas municipais do Rio de Janeiro no final
do século XIX e início do século XX. 2008. Tese (Doutorado em Educação) -
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2008.
Disponível em: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/12305/12305_1.PDF.
Acesso em: 20 nov. 2018.
HERSCHMANN, M. M.; PEREIRA, C. A. M. (org.). A invenção do Brasil
moderno: Medicina, educação e engenharia nos anos 20 – 30. Rio de Janeiro:
Rocco, 1994.

PESAVENTO, Sandra Jatahi. Cultura e representações: uma trajetória. Anos 90,


292
v. 13, n. 23/24, p. 45-58, jan./dez. 2006. Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/anos90/article/view/6395. Acesso em: 06 mar. 2019.

POSSAMAI, Zita Rosane. Cidade Fotografada: Memória e esquecimento nos


álbuns da cidade: Porto Alegre, décadas de 1920 e 1930. 2005. Tese
(Doutorado em História) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre, 2005. Disponível em:
https://lume.ufrgs.br/handle/10183/2/browse?value=Possamai%2C+Zita+Rosane&type
=author. Acesso em: 01 jun. 2018.
CULTURA HISTÓRICA E A ARTE
QUADRINIZADA: REFLEXÕES SOBRE O
DIÁRIO DE ANNE FRANK EM QUADRINHOS
293
Mirielen Machado Rodrigues
O presente trabalho investiga a adaptação em quadrinhos do livro O Diário de
Anne Frank (1947) publicado em 2017 pela editora Record que trás uma nova
visão do testemunho de Anne Frank no período que esteve escondida durante a
Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O diário de Anne Frank, publicado em
1947 é um livro que ganhou vida através dos relatos cotidianos que ela escrevia
durante a guerra. A reflexão desta história será feita entorno do conceito de
cultura histórica de Jörn Rüsen, tendo como principal objetivo explorar e
problematizar o quadrinho enquanto elemento de uso público do conhecimento
histórico como junção da memória e do saber histórico com o fator de
entretenimento (Espírito Santo, J. D. P. 2018) uma vez que a junção do
pensamento histórico e do entretenimento constroem espaços para o
desenvolvimento do pensamento, possibilitando que o quadrinho histórico seja
encarado como ferramenta de trabalho didático e de construção de sentido
histórico.

O diário de Anne Frank


“O diário de Anne Frank”, postumamente publicado em 1947 é um livro que
ganhou vida através dos relatos cotidianos de Anne Frank no período que esteve
escondida junto com sua família durante a Segunda Guerra Mundial. Anne Frank
era uma menina de 13 anos judia que junto com sua família e milhares de judeus
foram vítimas do antissemitismo liderado por Adolf Hitler, na Alemanha. Naquele
período, diversas famílias judias estavam sendo oprimidas pelo estado nazista,
e muitas não conseguiam buscar refúgio em outros países, como foi o caso da
família Frank.

No dia primeiro de setembro de 1939, o exército alemão invadiu a Polônia e a


Segunda Guerra Mundial começou. Alguns meses depois, os alemães invadiram
a Holanda e ocuparam o país, foi assim que a Família Frank foi alcançada pelos
alemães, pois não era possível fugir, as fronteiras estavam todas cercadas.
Desta forma, como em outros lugares, os alemães tomaram medidas rigorosas
contra os judeus, como a demissão de cargos públicos, a “arianizaão” ou
“desjudiamento” tanto na economia quanto da sociedade, que levou a população
judia a perder seus direitos civis.

Em 1942 começaram a chegar às primeiras convocações dirigidas aos judeus,


onde deveriam ser enviados aos campos de trabalhos forçados, Margot, irmã
mais velha de Anne Frank acaba recebendo uma destas convocações, que faz
com que a família se apresse em adiantar a fuga para o anexo secreto que já
estava sendo organizada por Otto Frank, pai de Anne há algum tempo. Durante
mais de dois anos Anne Frank escreveu em seu dia, descrevendo os horrores
de um a pais em guerra, a última vez que escreveu em seu diário foi em 1 de
agosto de 1944, dia 04 de agosto de 1944 a Família Frank acabou sendo traída
e pega pelos nazistas e encaminhada aos campos de concentração.

Após a confirmação da morte de suas duas filhas e de sua esposa Edith, Otto 294
Frank volta para Amsterdã e recebe de Miep Gies, uma das pessoas que ajudou
a família a se esconder o diário que Anne escreveu durante todo o tempo que
esteve escondida. Logo após ver todos os relatos que a filha escreveu em seu
diário, Otto buscou publicar seus relatos e após sua primeira publicação em 1947
surgiram diversos estudos em relação ao diário de Anne. Com a
representatividade da história de Anne, a instituição Anne Frank Fonds, sediada
em Basileia, Suíça, procurou Ari Folman para fazer uma adaptação da história
de Anne para um quadrinho, com ilustração de David Polonky, o desafio agora
era em poucas páginas ilustrar e mostrar a história de Frank de uma nova forma,
e que chegasse a mais pessoas. O objetivo principal era trazer novamente todos
os relatos descritos por Anne em forma de quadrinho, trazendo uma nova
linguagem a sua história, visto que os quadrinhos trazem uma linguagem mais
atrativa e nova. Ao longo do tempo, os quadrinhos começaram a abordar em
suas histórias deferentes assuntos, desde econômicos, históricos, podendo ser
uma forte ferramenta metodológica e histórica para o desenvolvimento
conhecimento histórico.

Quadrinho e sua história


As histórias em quadrinhos são uma das manifestações do ser humano que se
desenvolveu ao longo do tempo abordando em suas histórias cada vez mais
temas sobre a sociedade, tendo como principal função comunicar ideias.
Imagens são informações recebidas, ninguém precisa de uma educação formal
para entender a mensagem dos quadrinhos, pois ela é instantânea (McCloud.
1995). Uma das primeiras manifestações dessa arte segundo Scott McCloud
foram primeiramente encontradas em desenhos feitos em cavernas pré-
históricas, onde o ser humano descrevia seu cotidiano em uma espécie de
“sequência” através da pintura rupestre, outra manifestação de desenhos
sequenciados segundo o autor eram também os vitrais das igrejas católicas no
período medieval, onde os desenhos em sequência possuíam a função de
ilustrar as passagens bíblicas que geralmente eram lidas em latim pelo padre e
que a grande maioria da população não.

Para definir e entrar em um consenso do que é ou não um quadrinho é preciso


passar por uma longa discussão, pois, para cada conceito existe uma definição
junto com diversos argumentos que caracterizam um quadrinho. Uma das
definições é a de Wiil Eisner que ao longo do seu livro “Desvendando os
quadrinhos” expõe as dificuldades de se fazer uma definição precisa dos
quadrinhos. Para ele os quadrinhos são “Imagens pictóricas ou de outra espécie
justapostas em uma sequência deliberada, com a intenção de transmitir
informações ou produzir uma reação estética no espectador/leitor”, onde quando
dispostas individualmente são apenas imagens que muitas vezes não possuem
significado, mais quando são colocadas em sequência elaboram uma narrativa
e desenvolvem uma história onde se torna fácil compreender sua mensagem.

Outra discussão assídua é onde as primeiras histórias em quadrinhos surgiram.


Vários países reivindicam para si a criação dos primeiros quadrinhos. Segundo
Nobu Chinen em seu livro “Linguagem HQ: conceitos básicos” em 1995 foi criado 295
um comitê de especialistas que se reuniram para estudar e chegar a um
consenso de onde haviam surgido as primeiras histórias em quadrinhos levando
em conta as características básicas. A série americana Yellow Kid criada em
1895 por Richard Felton Outcault, foi considerada a primeira história em
quadrinhos produzida, onde possuía personagens, uma narrativa com imagens
e diversas características que a colocavam na categoria de uma história em
quadrinhos. Para Waldomiro Vergueiro (2012) os quadrinhos podem introduzir
discussões, aprofundar conceitos, ilustrar pensamentos e concepções e
representar contraponto de ideias, sendo possível encarar os quadrinhos como
uma espécie de espaço mediador de experiências “históricas” como os relatos
de Anne Frank durante a Segunda Guerra Mundial transformados em um
quadrinho onde o passado histórico é apropriado em uma mídia do presente
situando como afirma Janaina (2018) algumas questões dentro de uma narrativa
histórica complexa que permite levantar uma série de questões políticas, éticas,
sociais e geracionais do nosso tempo e até de uma matriz comum no
entendimento da Segunda Guerra Mundial.

Cultura histórica como categoria de análise


No Brasil, a contribuição teórica do filósofo alemão Jörn Rüsen vem ajudando
em vários estudos sobre história, tendo várias obras e artigos traduzidos e
publicados no Brasil. Para Rüsen, o pensamento histórico está no cotidiano do
historiador. Estes fundamentos, definidos como “princípios”, seriam elementares,
gerais e comuns a todos os seres humanos. (BARON. 2017) O historiador estaria
em contato direto com o conhecimento histórico comum, que embora apresente
uma diferença com relação ao conhecimento histórico científico, o
complementaria. A ciência não é a superação do senso comum, mais a sua
metodização. (BARON. 2017)

“A metodização significa sistematização e ampliação dos fundamentos que


garantem a verdade. Não se trata, pois de uma divisão entre não-saber e saber,
mais entre saberes distintos que podem se relacionar produtivamente. Desta
forma, caberia a teoria da história lançar uma reflexão sobre este cotidiano do
historiador, de onde partem as angústias e anseios – substratos do pensamento
histórico –, identificando e problematizando esta relação entre o trabalho
metodológico e disciplinado e sua origem no pensamento comum, no cotidiano.”
(BARON. 2017)

Rüsen traz cinco princípios que estariam presentes no ofício do historiador, que
seriam fatores essenciais de todo pensamento e conhecimento histórico,
enraizadas na vida e no trabalho historiográfico. Seriam eles: Interesses, Ideias,
Métodos, Formas e Funções. Esta organização segundo Wilian Carlos Cipriani
Barom busca separar e dar visibilidade aos princípios e permite à teoria da
história criar uma estratégia metodológica para refletir sobre o modo específico
pelo qual tanto o pensamento histórico quanto a historiografia acadêmica
constituem sentido sobre a experiência do tempo, ou seja possibilitam à teoria
da história refletir sobre a ligação existente entre a história, como produto
historiográfico, e as carências de seu tempo. (BARON. 2017). Assim, a 296
contribuição mais marcante na teoria da história de Rüsen consiste na descrição
e explicação tanto no pensamento histórico quanto na historiografia acadêmica.
Rüsen constrói para dar fundamento a isso o conceito de matriz disciplinar da
ciência histórica. A matriz disciplinar busca abranger todos os elementos
essenciais presentes na produção de histórias pelos historiadores profissionais
que marcaram o debate sobre a história e o conhecimento histórico,
principalmente nos anos 80. (ASSIS. 2010)

Rüsen em sua teoria traz diferentes reflexões sobre a ciência histórica,


carências, métodos de pesquisa empírica, narrativa e consciência histórica, mas
a reflexão mais importante neste trabalho é sobre a Cultura Histórica. A Cultura
Histórica é um fenômeno coletivo que está em constante diálogo com uma
cultura mais ampla, se relacionando com meios mais eficientes de comunicação.

“Podemos apontar que a cultura histórica no presente diverge das anteriores (do
passado) por conter em si um sistema mais eficiente de meios de comunicação
de massa (televisão, rádio, revistas, internet, livros, cinema), produtos de uma
indústria cultural com maior amplitude de circulação, além de conter em si um
contexto social de maior acesso universitário e produtos e eventos que derivam
do conhecimento histórico científico (teses, dissertações, artigos, revistas,
revistas online, congressos, palestras, entrevistas, documentários, etc). Por isto
mesmo, não convém imaginarmos a cultura histórica como uma cultura
homogenia, da humanidade ou de uma época – dada a forma desigual como
esses produtos da cultura e dados da memória se distribuem no interior da
sociedade –, mas antes como nichos de cultura que se marcam e delimitam pelo
momento e lugar, numa combinação entre os arranjos herdados do passado e
as criações do presente.” (BARON. 2017)

A Cultura Histórica surge de 5 fatores: (1) pensar, (2) sentir, (3) querer, (4)
valorizar e (5) crer, e pode ser compreendida a partir de cinco dimensões: a
dimensão cognitiva, estética, política, moral e religiosa. A dimensão cognitiva é
caracterizada pelo conhecimento cientifica e de fundamentação empírica, a
dimensão estética traz critérios de sensibilidade, beleza, atração, a dimensão
política relaciona-se com a potencialidade de servir a interesses, jogos de poder,
a dimensão moral se caracteriza pelas normas éticas e morais do presente sobre
as representações/produtos relacionados ao passado e a dimensão religiosa que
se refere à subjetividade humana, quando as ideias históricas se apresentam,
ou são interpretadas, no presente, a partir de critérios transcendentais,
teleológicos, remetendo a noções tais como salvação, morte, céu, inferno,
espiritualidade. Desta forma, a cultura histórica é a articulação, percepção,
interpretação, orientação no tempo, sendo determinante na vida humana, uma
síntese dos conhecimentos históricos (comum e científico) como prática
dispostos no interior da sociedade e adquirido por diferentes meios, como em
uma história de quadrinho e como ocorre na história de Anne Frank sendo um
conhecimento histórico comum “não científico” que diz respeito a informações
não cientificas dispostas na sociedade e que orientam as pessoas no seu
cotidiano, por isso não apresentam o rigor da metodologia cientifica e que 297
auxiliam nas identificações do presente. Assim é possível refletir como a
narrativa histórica é apropriada no universo dos quadrinhos, onde os quadrinhos
constituem segundo Janaina (2018) uma espécie de “vulgata” – um elemento
facilitador, um dinamizador, uma ferramenta de mediação no processo de
construção do conhecimento “sério”, "real", “científico” – em nome de uma
possibilidade complementar: a de que artefatos culturais agem, também, no
processo de legitimação e difusão do saber científico em sua dimensão pública,
a cultura histórica, levando a novas reflexões de como as produções
quadrinizadas se relacionam com a ciência da história e até que ponto os
quadrinhos são produtores de conhecimento histórico e seu espaço na
mobilização da cultura histórica.

Referência biográfica
Mirielen Machado Rodrigues, graduanda do curso de Licenciatura em História
da Universidade Estadual de Ponta Grossa – Paraná. Atualmente
desenvolvendo pesquisa no Projeto de Iniciação científica voluntário da UEPG
(PROVIC) sob orientação do Prof. Dr. Luis Fernando Cerri, sendo também
integrante do Grupo de Estudos em Didática da História (GEDHI-UEPG)

Referências bibliográficas
ASSIS, Arthur. A teoria da história de Jörn Rüsen: uma introdução. Vol. 2. Ed.
UFG, 2010.

BAROM, William Carlos Cipriani. "Os principais conceitos da teoria da história de


Jörn Rüsen: uma proposta didática de síntese." Revista de História 9.18 (2017).

CARNEIRO, Maria Luiza Tucci. Holocausto: crime contra a Humanidade. São


Paulo: Ática, 2005.

CHINEN, Nobu, Linguagem HQ: conceitos básicos. Editora Criativo, São Paulo,
2011.

FRANK, A. O diário de Anne Frank. Edição integral. Rio de Janeiro: Ed. Record,
2000.

FOLMAN, Ari; POLONSKY, David. O diário de Anne Frank. 3. ed. Rio de


Janeiro/São Paulo: Record, 2017.

McCLOUD, S. Desvendando os Quadrinhos. São Paulo Makron Books, 1995.


RÜSEN , Jörn. Que és la cultura histórica?: Reflexiones sobre una nueva manera
de abordar la história. Tradução de F. Sánchez Costa e Ib Schumacher.
Disponível em: www.culturahistorica. es/ rusen.english.html.

SANTOS, Janaina de Paula do Espírito. Segunda Guerra Mundial em Mangá:


um estudo de Cultura Histórica. Tese de Doutorado em História. Universidade 298
Federal de Góis. 2018.
FÓRUM DE DIÁLOGO: UMA POSSIBILIDADE
DE APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA NAS
AULAS DE HISTÓRIA
299
Priscielli do Carmo Rozo Cerdeira da Rosa e
Ronualdo da Silva Gualiume

A disciplina de história tem a missão de estimular a criticidade na formação de


crianças e jovens em todas as fases da educação básica. Além disso, a história
tem como objetivo fundamental proporcionar a reflexão em torno das
perspectivas políticas, econômicas, sociais e culturais com o intuito de
oportunizar a compreensão do conhecimento histórico.

Para levar o conhecimento histórico para dentro da sala de aula, o professor


conta com o auxílio de diversas fontes e tipos de documentos que potencializam
a compreensão do conteúdo. Assim, subentende-se que “nessa dimensão, o
objeto histórico transforma-se em exercício, em laboratório da memória voltado
para a produção de um saber próprio da história” (BRASIL, 2018, p, 398). Isto
ocorre a partir do momento em que o professor compreende a perspectiva
histórica dos adventos, ou seja, desde o ponto de início onde “fareja carne
humana, sabe que ali está a sua caça” (BLOCH, 2001, p.54). Ou seja, mais na
qualidade da perspectiva histórica que no ofício do professor de história, onde
há a presença humana, há a interpretação do cerne do espírito; neste caso, tanto
aquele que emite o conhecimento histórico, quanto aquele que o absorve. Mas,
para que ambos reajam reciprocamente na qualidade empírica, se faz
necessária a compreensão do processo histórico tanto por parte do corpo
discente, quanto docente. Como este processo é possível?

De acordo com Paulo Freire o diálogo é essencial para a absorção do


conhecimento porque o processo de aprendizagem é uma via de mão dupla. O
autor relata que o diálogo “é o encontro em que se solidarizam o refletir e o agir
de seus sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e humanizado, não
pode reduzir-se a um ato de depositar ideias de um sujeito no outro, nem
tampouco tornar-se simples troca de ideias a serem consumidas pelos
permutantes”. (FREIRE, 2005, p. 91).

Deste modo, acreditamos que o diálogo é imprescindível para aproximar os


sujeitos, a fim de contribuir na edificação do conhecimento em sala de aula.
Entendemos, nesta perspectiva, que o professor não deve ser apenas um mero
transmissor de conteúdo, pelo contrário, o professor tem a missão de ser um
mediador do conhecimento. Pois quando o professor atua nesta concepção, é
possível articular os conhecimentos ao seu entorno e, proporcionar aos seus
alunos, a oportunidade de se sentirem sujeitos ativos no processo de ensino
aprendizagem.

Para que essa trilha do conhecimento histórico seja seguida, o professor pode
amparar-se de diversas metodologias que podem dinamizar o processo de
ensino e aprendizagem. Nesta abordagem, em específico, nos beneficiamos da 300
ótica da aprendizagem significativa. Esta abordagem “se caracteriza pela
interação entre conhecimentos prévios e conhecimentos novos, e que essa
interação é não literal e não arbitrária. Nesse processo, os novos conhecimentos
adquirem significado para o sujeito e os conhecimentos prévios adquirem novos
significados ou maior estabilidade cognitiva.” (MOREIRA, 2012, p. 2). Ou seja, a
abordagem significativa ocorre quando é possível partir do pressuposto que o
aluno possui conhecimentos prévios, e, a partir da mediação do professor, é
possível relacionar o que o aluno dispõe com uma ideia, conceito ou informação
nova.

Percebe-se que, neste processo, o estudante tende a despertar a percepção e


por sua vez, ampliar e atribuir novos significados aos seus conhecimentos. E,
nas aulas de história, subentende-se que este método permite aproximar ainda
mais o aluno do conhecimento histórico.

Contudo, para que tal prática seja possível, o docente deve contar com o auxílio
de materiais a serem utilizados de maneira estratégica, com o intuito de atrair a
atenção dos alunos e, por outro lado, o discente também deve demonstrar certa
predisposição para aprender, pois compreende-se que não é possível produzir
uma aprendizagem dinâmica de maneira unilateral.

Para que esta abordagem fosse possível de ser aplicada, tivemos que criar um
material significativo, que fosse capaz de dialogar de maneira relevante e
apropriada com os alunos. Assim, nos propusemos a utilizar o fórum de
discussão como uma ferramenta, geralmente aplicada em aulas no Ambiente
Virtual de Aprendizagem (AVA), adaptadas para o Ensino Médio, tendo em vista
a modalidade de ensino híbrido adotado nas escolas, mediante a pandemia da
Covid-19 a partir do ano de 2021. Devido a este momento em que vivemos,
evidencia-se ainda mais a necessidade de nos apropriarmos das tecnologias da
informação, pois estas nos permitem conduzir o processo de ensino e
aprendizado parcialmente mediado pela interface digital.

A utilização do fórum de discussão (no nosso caso, fórum de diálogo) auxilia a


aproximar o docente e os alunos, por meio de diálogos abertos acerca de temas
trabalhados durante o período letivo. Além de ensinar os alunos a utilizarem este
recurso para realização de atividades, tivemos também que estimular nos alunos
a colaboração, a união e encontrar os meios adequados para que cada um deles
conseguisse organizar as suas ideias. Compreendendo-se assim que a
responsabilidade do professor não é apenas assegurar que a atividade seja
realizada, mas sim que as temáticas elucidadas pelos fóruns de diálogo sejam
trabalhadas, discutidas e até mesmo criticadas, pois é desta maneira que
contribuímos para uma formação de cidadãos autônomos, capazes de
desenvolverem seu senso crítico.

Tendo isto em vista, as atividades propostas por meio dos Fóruns de Diálogo
foram aplicadas para a 1ª, 2ª e 3ª série do Ensino Médio. Cabe ressaltar que
este espaço para debate não consiste apenas em fazer com que o aluno 301
comente sobre o que ele aprendeu sobre o conteúdo, pelo contrário, permite com
que o aluno possa ser capaz de analisar, refletir e opinar sobre temas, além de
comentar a ideia dos demais colegas de classe. Com isto, percebemos que a
ferramenta pode vir a contribuir para despertar o senso de análise e criticidade
dos alunos.

Para que esta ferramenta se tornasse qualificada para atender às nossas


demandas educacionais no ensino de história, optamos por realizar a atividade
de diálogo após a finalização de cada temática abordada em aula, pois facilitaria
os alunos a articularem melhor as suas ideias. Além disso, para que os alunos
pudessem notar que a história não é algo linear e totalmente ‘presa ao passado’,
acabamos inserindo no escopo da nossa atividade sempre uma matéria,
reportagem ou artigo de opinião recente que comentasse (ao todo ou em partes)
sobre a temática estudada. Assim, mais do que o conteúdo presente nos
materiais didáticos e por meio da explicação promovida pelo professor, os alunos
puderam contar também com o foco jornalístico, a fim de aprofundar os seus
conhecimentos e notar que a história está numa constante construção.

Após a leitura do material jornalístico indicado, os alunos deveriam criticar


(negativamente ou positivamente) o texto, além disso, deveriam relatar como o
texto dialoga com o conteúdo abordado em sala de aula, ou seja, se possui um
olhar igual ou diferente do que foi exposto no decorrer das aulas. Outra questão
muito importante a ser comentada é que os alunos também poderiam inserir
informações adicionais, como leituras previamente realizadas, conhecimento
que possui ou até algo interessante que se relacionasse com a temática
elucidada. Compreendemos assim que esses diversos olhares sobre e além do
documento permitem uma complementação do aprendizado, além de incentivar
o compartilhamento de ideias e aguçar a curiosidade.

Posteriormente à prática realizada, coube ao professor realizar a leitura do


comentário dos alunos. Além disso, nos comprometemos a dar um feedback
para cada aluno, tanto para aqueles que realizaram a atividade, quanto para
aqueles que não realizaram. Acreditamos que este olhar direcionado do
professor a todos os sujeitos envolvidos na prática educativa deve proporcionar
ao aluno uma percepção reflexiva, não somente para o estudo da história, como
também para o modo de aprender de cada aluno.

Dito isto, percebemos que esta prática permitiu interagir pessoas e


conhecimentos. “As trocas entre colegas, os múltiplos posicionamentos diante
das informações disponíveis, os debates e as análises críticas auxiliam a sua
compreensão e elaboração cognitiva. As múltiplas interações e trocas
comunicativas entre parceiros do ato de aprender possibilitam que estes
conhecimentos sejam permanentemente reconstruídos e reelaborados
(KENSKI, 2002, p. 258). Com isso, partimos do pressuposto que aprender a
história se torna uma tarefa mais fácil de dinâmica a partir do momento em que
ambos os sujeitos (professor e aluno) se comprometem mutuamente no
processo de formação do conhecimento. 302

Ao aplicar esta atividade percebemos que o espaço oferecido proporcionou um


debate saudável e construtivo e que a maior parte dos alunos participaram desta
proposta interativa de debate e diálogo. Além do aprendizado do próprio
conteúdo, foi possível perceber que esta ferramenta demonstrou ser essencial
para: oportunizar o estímulo à discussão, contribuir para o incentivo à leitura e à
pesquisa, dialogar por meio do compartilhamento de opiniões e auxiliar no
estreitamento das relações entre professor e aluno e dos alunos entre si.

Acreditamos que esta ferramenta também nos aponta caminhos importantes a


serem trilhados que nos oportunizem pensar na avaliação do processo de ensino
aprendizagem. Além disso, esta atividade de cunho mais prático permitiu notar
maior engajamento por parte dos alunos, principalmente ao evidenciar que
muitos estudantes, que geralmente não argumentam verbalmente em sala de
aula presencial e/ou por vídeo chamada (por timidez, ou outros motivos)
puderam utilizar o fórum como alternativa para expor a sua opinião e
conhecimento.

Contudo, não podemos nos enganar e acreditar que tal prática só nos apontou
elementos positivos; pelo contrário, a aplicação dos fóruns de diálogo também
nos permitiu visualizar algumas fragilidades, principalmente na dificuldade que
muitos alunos possuem em conseguir expressar suas ideias de maneira escrita;
outra questão evidenciada foram os comentários que fugiam do assunto ou
abordaram a temática de maneira superficial. Com isto, a partir desta primeira
sondagem em torno da atividade, foi possível identificar as dificuldades
encontradas no decorrer da prática de diálogo por meio dos fóruns. Por meio
dessas observações, será possível criar estratégias que possam favorecer e
fortalecer os alunos que não conseguiram realizar a prática de maneira assertiva.

Nos propusemos com este texto demonstrar como a estratégia dos fóruns de
diálogo podem ser uma estratégia de uso do docente durante as aulas de ensino
híbrido. Através da nossa prática, nota-se que até o momento, a utilização
desses espaços de debate e diálogo se demonstraram majoritariamente
positivas, permitindo com que professor e alunos construam um ambiente digital
permeado pela aprendizagem e pelo conhecimento.

Entretanto, para que atividades como esta possam ser realizadas é preciso
quebrar alguns paradigmas, quanto às formas de aplicação ensino híbrido. Em
primeiro lugar, acreditamos que enquanto docentes devemos estar aptos a
aprender a lidar com diversas tecnologias da informação, e para que isso ocorra
é necessário um investimento em cursos de capacitação para o professor, a fim
de fazer com que novas ferramentas tecnológicas sejam utilizadas. Em segundo
lugar, precisamos ter em vista que a escola também precisa se adequar,
conferindo estrutura necessária para que o ensino híbrido possa ser realizado
de maneira mais eficaz.

Não podemos também deixar de comentar que tal prática também é um desafio 303
para o professor de história, principalmente para aquele que tenta utilizar a
criatividade para não seguir um roteiro de análise linear do conteúdo em suas
aulas. Acreditamos que a história, por meio desta abordagem, desempenha um
papel significante, na medida em que contempla a pesquisa e a reflexão dos
alunos, favorecendo a sua autonomia para aprender.

Este texto também tem o intuito de contribuir com outros professores,


proporcionando troca de ideias e de ferramentas que possam ser utilizadas em
aulas. Acreditamos que um dos objetivos deste texto é oferecer oportunidades
para debater a importância do cuidado e atenção sobre as práticas educativas
no ensino de história. Embora, neste texto tenhamos apontado apenas uma
prática de uso da ferramenta de fórum de diálogo, acreditamos que outras
práticas utilizando a mesma ferramenta poderão surgir adiante. Espera-se que,
com esta discussão, seja possível auxiliar outros docentes a utilizarem esta
ferramenta, pois a possibilidade de uso na sala de aula vai depender muito da
proposta definida pelo professor.

Em suma, nos propusemos através desta narrativa colocar em evidência a


importância do respeito e do diálogo entre professor e aluno. O desenvolvimento
de práticas educativas como esta, no ensino de história, tende a auxiliar na
formação de sujeitos críticos.

Referências biográficas
Priscielli do Carmo Rozo Cerdeira da Rosa, professora de Ensino Médio,
acadêmica do Mestrado Profissional em Ensino de História – ProfHistória -
UEPG. E-mail: prisciellirozo@gmail.com

Ronualdo da Silva Gualiume, acadêmico do curso de Pedagogia na Unicesumar.


E-mail: ronualdo_gualiume@hotmail.com

Referências bibliográficas
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2001.

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Espanha, 2012. Disponível em: <http://moreira.if.ufrgs.br/oqueeafinal. pdf>. Acesso em:
22/04/2021.
O PARADOXO HISTÓRICO DA TECNOLOGIA
NA EDUCAÇÃO
Rafael de Jesus Pinheiro Privado
305

Introdução
O esforço deste artigo é o de lançar um olhar sobre uma temática que nesse
momento é bastante discutida no meio educacional brasileiro, com o uso
frequente das tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC). No
contexto atual, o ensino e a tecnologia podem evoluir lado a lado, embora as
pessoas tendam a pensar que a educação vai estar sempre atrasada com
relação à tecnologia, há muitos casos em que a educação valeu-se da tecnologia
para desencadear transformações no campo educativo.

As transformações educacionais, políticas e socioeconômicas arroladas ao


longo da intitulada sociedade científica e tecnológica, tendo início na segunda
metade do século XX e expandida neste século XXI, têm estabelecido
proposições de como deve o professor lecionar e, o aluno, de como aprender,
mediados por tecnologias e o ensino da disciplina História não está isenta desse
processo.

No Brasil, a origem desse debate tem como contexto a década de 1970 com o
predomínio do tecnicismo, teoria educacional do período, que conferiu ao
expediente tecnológico o poder da efetividade e da preeminência em relação ao
ser humano. O avanço tecnológico permitiu o acesso rápido a inúmeras
informações no espaço temporal e geográfico a partir da dispersão da rede
global de computadores, internet, concedendo comunicação em tempo real, com
qualquer parte do país ou do planeta, excitando as diferentes organizações do
mundo do trabalho e atuando nos procedimentos de ensino dos professores, que
são reiteradamente desafiados a aprenderem a ensinar por meio de dispositivos
tecnológicos.

Assim sendo, não se pode opor-se a presença e a importância que a tecnologia


tem tido para a humanidade, no entanto, é preciso apontar tanto os efeitos
nefastos como a exclusão social, quanto as vantagens proporcionadas.

No século XXI, as tecnologias digitais se fazem presentes no dia a dia dos


discentes seja em seus lares e/ou em outros locais sociais. O seu uso decorre à
revelia da vontade dos professores e tal reivindicação os têm requerido, em
todos os níveis de ensino, que também façam uso dessas tecnologias, para que
os temas instruídos cheguem até os alunos, convertendo em conhecimentos
que serão apreciados em um formato totalmente diferente do que ocorre na
presença física de ambos no interior de uma classe.
Escola e cultura
As questões suscitadas pela reflexão sobre os problemas da educação
remontam desde a segunda metade do séc. XX, sendo a educação e a cultura
frutos de uma relação íntima no sentido amplo de formação e socialização do
sujeito/indivíduo. Toda reflexão sobre a educação e a cultura pode, assim, partir
do princípio segundo o qual o que justifica fundamentalmente o empreendimento 306
educativo é a responsabilidade de ter que transmitir e perpetuar a experiência
humana considerada como cultura, ou seja, não como a soma bruta de tudo o
que é vivido, pensado, produzido pelos os homens desde os primórdios. Nesse
sentido, pode-se afirmar que a cultura é o conteúdo essencial da educação, sua
fonte e sua justificação última: a educação não é indissociável da cultura e vice-
versa.

Em particular, toda educação do tipo escolar supõe sempre, na verdade, uma


seleção no interior da cultura e uma reelaboração dos conteúdos da mesma
destinados a serem transmitidos às novas gerações. Para Freitas (2008), a
autêntica integralização do computador/internet na realidade da escola presume
uma nova estruturação escolar, um programa versátil, a abertura de novos
tempos, menos rígidos, alterações no próprio ambiente da classe. Contudo, isso
não ocorre de um dia pra outro: exige tempo, suporte específico, subsídios, toda
uma reordenação.

É verdade que, num sentido fundamental, a educação consiste em introduzir os


membros das novas gerações no interior de uma aprendizagem social cujas
modalidades variam segundo as épocas e os contextos. No que tange,
particularmente, a educação do tipo escolar e a consciência de tudo o que ela
conserva do passado não deve encorajar a inconsciência de tudo o que ela
esquece, abandona ou rejeita. Sendo assim, a cada geração, a cada renovação
da pedagogia e dos programas, são partes inteiras da herança que desaparecem
da memória escolar, ao mesmo tempo em que novos elementos surgem, novos
conteúdos e novas formas de saber, novas configurações epistêmico-didáticas,
novos modelos de certezas, novas definições de excelência acadêmica ou
cultural e novos valores. Logo, em conformidade com os fatos supracitados, a
tecnologia que nos contempla na contemporaneidade facilitou o trabalho com as
imagens, os filmes e mesmo os documentos oficiais, possibilitando uma
aproximação dos discentes à evidência, fomentando profundamente a
compreensão e desenvolvimento da consciência histórica. No entanto, para que
muitas dessas perspectivas citadas acima se efetivem, é fundamental não
exclusivamente um planejamento pedagógico propício, como também suporte
material para sua efetuação. Nesse sentido, a tecnologia surge como uma via de
mão dupla, pois ao mesmo tempo que oportuniza esse contato não a
democratiza.

Ademais, atualmente, a tecnologia é um grande desafio na sala de aula. Além


de competirmos/concorrermos com o uso dos smartphones, a demanda pela
inclusão de dispositivos tecnológicos vem muitas vezes da escola. Assim, como
a demanda da interdisciplinaridade e da nova tecnologia pode acentuar o
conhecimento histórico, sem abandonar nossa metodologia? Quais as
expectativas e obstáculos encontrados em distintos espaços
educacionais/pedagógicos?

Os impactos do crescente uso da tecnologia na educação


A tecnologia desponta para beneficiar a vida humana e seus afazeres, a partir 307
do século XVIII com a Revolução Industrial e a escalada do capitalismo às
tecnologias pronunciam-se em um compasso frenético, até atingir aos dias
atuais onde vemos a tecnologia progressista.

O progresso tecnológico passa a ser aplicado em diversas áreas do


conhecimento humano, não ocorrendo distintamente no meio educacional. Os
últimos anos têm sido constituídos em nosso país, considerando-se que o nosso
país ainda possui um abismo de desigualdade socioeconômico, e no mundo por
mudanças educacionais que mostra como a predominância do uso de inovações
tecnológicas têm se salientado numa sociedade que tem como propósito a
construção do próprio conhecimento pelo discente.

Uma recente fase na Educação! Um mundo novo desdobra-se em um vertiginoso


processo de globalização. É uma sociedade notadamente dinâmica, instável e
progressista, onde o constituinte imprescindível e fundamental é a mudança de
paradigmas.

Analisar este cenário promissor, conforme o contexto profissional da educação


no mundo globalizado e informatizado acarreta na possibilidade de:
“testemunhar o desenvolvimento de uma capacidade até agora não imaginada
de ampliar o intelecto humano. O homem tem uma capacidade singular de
armazenar informação e utilizá-las para o seu progresso e bem estar. A
tecnologia da sociedade de informação amplia esta capacidade humana, bem
além de qualquer nível julgado possível a um quarto de século, colocando
conhecimentos à disposição dos que necessitam, quando necessitam e onde
quer que estejam.” (RANKINE, 1987, p.292).

Pôr o conhecimento à disposição de quem deles necessita acarreta numa melhor


comunicação. A tecnologia não é uma solução para a restauração do ensino,
mas ela pode ser um estimulante significativo para a mudança e uma ferramenta
para sustentar a indagação, composição, colaboração e comunicação dos
alunos. Por questionamento entende-se fato de o aluno ser capaz de procurar,
refletir e apreciar as informações que lhes estão sendo ofertadas. Esse discente
não mais consente em o professor ser o dono da verdade, isto é, o único
recipiente do saber. A composição nos leva àquele aluno que parte de
pesquisas, aumentando seu leque de informações, compondo o seu
conhecimento, isto é, estruturando seu próprio conhecimento.

A versatilidade de novas tecnologias, com o crescimento do conhecimento sobre


os processos cognitivos, sobre a comunicação humana e a comunicação
homem-máquina, e a facilidade atual de acesso a informação, estão abrindo
inúmeras possibilidades para a educação.

Sendo assim, é, pois, necessário uma nova postura para o grande desafio
educacional do presente e posteriormente visando o futuro, baseado na
tecnologia, que representa um processo interativo centrado no aluno. Para que 308
isso aconteça, é necessária a mudança de todos os constituintes básicos do
processo: professor, aluno e conteúdo. O professor deverá aderir a nova
tecnologia como um meio para novos fins, para uma instrução mais dinâmica,
porém sabendo-se que ela não deve ser a questão fundamental.

Perante as inovações, os professores apresentam duas sensações: um que é a


de incorporar as novas tecnologias ao seu dia-a-dia e outro que é a insegurança,
o medo, gerados pela falta de preparo para trabalhar com elas. “A escola não
deve temer nem subestimar o seu diálogo com os meios de comunicação e o
uso das novas tecnologias”, “Não vejo os meios de comunicação como
instrutores, quero pensa-los como produtores do conhecimento” (CITELLI, 2000,
p.7). É necessário apropriar-se da tecnologia na educação para “provocar uma
reflexão crítica e questionadora em relação à busca e elaboração da informação
articulada à produção social da vida individual e coletiva” (CORTELAZZO, 1996,
p.20).

Professores sabem que precisam mudar, mas não sabem como, o que acaba
gerando-lhes angústia. Por outro lado, cabe à escola, então, preocupar-se com
o conteúdo de ensino, para atender a esta desafiadora evolução da informática,
dessa nova tecnologia. A escola deve e precisa mudar continuadamente para
ajustar-se à sociedade na qual está inserida. Como a tecnologia da informação
é atualmente a força direcionadora da nova economia e cultura, faz-se
necessário que ela seja incorporada aos currículos, de uma forma bem
significativa.

Os docentes sabem que a filosofia da instrução e a maneira como os discentes


são instruídos mudaram bastante, os tipos de habilidades obtidas em sala de
aula, atualmente, são bem distintos da metodologia e do currículo de anos atrás.
A preocupação maior, porém, deve ser de como a tecnologia se integra à
estrutura curricular e instrucional de uma maneira enfática como ratificam os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN).

Transferência de Poder para o “Aprendente”


Neste começo de século XXI fala-se em uma nova expressão para designar essa
mudança, a sociedade de informação, um sistema amplamente baseado na
tecnologia e que, por meio de seus recursos, cria um novo paradigma repleto de
promessas de profunda alteração (WERTHEIN, 2000). Segundo Werthein, essas
promessas possuem justificadas expectativas positivas e reverberam para além
das ciências básicas e da área técnico-econômica: “Se a penetrabilidade das
novas tecnologias pode, por um lado, elevar o temor com possíveis efeitos
negativos […] e até reforçar a inevitabilidade das transformações que acarreta
[…] não deixa também de alimentar sonhos mais prosaicos – e não menos
significantes – como o de finalmente permitir a integração ensino/aprendizagem
de forma colaborativa, continuada, individualizada e amplamente difundida.”
(WERTHEIN, 2000, p. 73)

Se a constatação dos avanços tecnológicos da atualidade e as análises sobre 309


esses avanços criam a sensação de que a escola precisa incorporar as
novidades digitais ao método de ensino-aprendizagem, tal incorporação não é
unanimidade.

O termo tecnologia é de origem grega: tekne e significa arte, técnica ou ofício.


Já a expressão logos exprime conjunto de saberes. Por essa razão, a palavra
delibera conhecimentos que permitem produzir objetos, transformar o meio em
que se vive e instituir novas circunstancias para a resolução de problemas
provenientes da necessidade humana.

As ferramentas tecnológicas que os educandos transportam para a classe


podem amparar seu aprendizado. Inúmeros estudantes fazem uso de
ferramentas eletrônicas. Os mesmos, em sala de aula, seria um aceno à
distração, usados em demasia por vários alunos e muitas vezes prejudicando o
processo de aprendizado. É fundamental observar como pode ser aperfeiçoado
pedagogicamente o uso dos apetrechos eletrônicos para uma aula muito mais
proveitosa, mais crítica, que remeta melhor ao aluno reflexões sobre a temática
adotada pelos professores.

As inovações tecnológicas empregadas pelos docentes durante as aulas podem


auxiliar a instituir um elo entre conhecimentos acadêmicos, com os obtidos e
vivenciados pelos alunos, advindo assim transições de experiência e ideias entre
docente e discente.

Seguramente, em sala de aula, uma porcentagem relevante dos alunos possui


algum tipo de tecnologia, como celulares, reprodutores de MP3 e MP4, entre
outras ferramentas. É necessário, pensar em como trabalhar essas tecnologias
em favor da educação.

Se a inovação que os alunos levam para sala de aula serve como forma de
dispersão em relação ao conteúdo aplicado, há à necessidade de rever tais
atitudes, para que os estudantes possam aprender a pesquisar e analisar
informações assimiladas com os aparelhos que utilizam no cotidiano e assim o
ensino se tornará mais cativante.

Considerações sobre o Discurso Pedagógico Contemporâneo


A constituição do discurso pedagógico sobre os usos das tecnologias na
educação ainda é algo recente. Sendo assim, se os discursos sobre a extensão
didático-pedagógica do uso dos apetrechos tecnológicos tendem a apresentar
uma versão mais otimista, salientando os seus proveitos ou a perspectiva da
posse desse recurso tecnológico para o aperfeiçoamento da qualidade dos
processos de ensinar e de aprender, os textos que tratam da dimensão político-
pedagógica apresentam uma maior diversidade de abordagens. Pode-se
considerar a presença de textos que apontam a inserção de um modelo
democrático ou popular de comunicação mediada pelo computador, sustentado
notadamente em Freire e Lévy, porém também aqueles que sinalizam o
processo de massificação e resultante no isolamento humano e cultural 310
derivados da instauração de uma sociedade tecnológica e tecnocrática e, por
conseguinte oprime e salienta as diferenças sociais, apoiados em estudos de
Barreto, Belloni, Castells, a título de exemplo.

Um aspecto relevante a ser acentuado é que, na maior gama dos estudos que
discorrem sobre o uso da tecnologia na educação escolar, ainda que os
conceitos nos quais estes se alicercem e apresentem relação com os temas
trabalhados, nem sempre a associação dos abordados conceitos com o tema se
expressa de forma clara.

Em um decênio de estudos elaborados sobre o uso do computador na educação


escolar, as alegações utilizadas concordam com as orientações amparadas
pelos estudos pertinentes aos processos pedagógicos em geral. Os usos
pedagógicos do computador são apresentados seja sobre o prisma do
desenvolvimento humano por estágios, retomando Piaget, seja pela busca da
educação popular e libertadora, buscando Freire. Como seria de se presumir, os
estudos a respeito das teorias da educação e dos processos pedagógicos com
a aplicação das tecnologias levam as inclinações pedagógicas clássicas como o
construtivismo, o desenvolvimento por fases, de Piaget, o instrucionismo, de
Skinner e a educação popular, pensada por Paulo Freire.

Considerações finais
Em suma, essa atividade, para além de funcionar como uma ferramenta
educacional inovadora, tendo em vista que, para enfrentar os desafios de uma
era em que os alunos têm acesso ilimitado à informação através de seus
aparelhos digitais, como celulares, tablets, smartphones, bem como a realidade
socioeconômica de milhões de famílias brasileiras. À vista disso, o avanço
tecnológico assistido nos últimos quatro decênios do século XX tenha
elaborado/produzido objetos que além de servirem de veículos de disseminação
de informação e de comunicação, são recursos que possibilitaram novas formas
de vínculos capazes de promover modificações na responsabilidade individual,
na compreensão de mundo, na estruturação de novos conhecimentos, nos
princípios e nas formas de comportamento social, nenhum desses objetos possui
a habilitação de preencher a relação humana. Entre docente e discente existe
uma interação didático pedagógica efetiva e determinante que faz parte do
sentido e significado da docência comprometida e consciente da formação de
pessoas pautadas em ética, sensíveis, solidárias e essenciais neste século XXI.

Referências biográficas
Rafael de Jesus Pinheiro Privado- Graduando em História Licenciatura pela
Universidade Federal do Maranhão-UFMA. Foi integrante do Programa
Institucional de Bolsa de Iniciação Científica-PIBIC no projeto de pesquisa
intitulado "Caracterização fisico-quimica das águas coletadas por alunos do
curso técnico em meio ambiente do colégio universitário". Foi bolsista do edital
de Bolsa de iniciação científica júnior da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao
Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão-FAPEMA no projeto de
pesquisa intitulado "Elaboração de aulas alternativas e produção de vídeo aulas 311
para o ensino da química". Atualmente integrante do Programa Institucional de
Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID); do Programa de Educação Tutorial-PET
Conexões de Saberes Pesquisa e Extensão em Espaços Sócios Pedagógicos
(Campus de São Luís) e integra o grupo de estudo sobre Itinerários Formativos
no Ensino de História. E-mail: rafaelpinheirof08@gmail.com

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O USO DO RAP “ATLÂNTICO” DE THIAGO
ELNIÑO COMO UM RECURSO DIDÁTICO EM
SALA DE AULA
313
Reuther Henning Machado

Não se pode negar que o gênero musical RAP é um estilo que carrega a luta
social em suas letras de forma a provocar nos ouvintes reflexões. Em sua grande
maioria, os rappers procuram narrar as violências e preconceitos sofridos pela
grande maioria das pessoas que vivem nas periferias, principalmente pelos
negros, visando uma ação para o combate dos problemas sociais postos em
pauta no decorrer da letra do RAP. Desde a sua origem no Brasil, no decorrer
de 1980, seu objetivo é fazer o ouvinte pensar sobre os problemas estruturais e
sociais da sociedade brasileira, sendo o elemento principal da maioria das letras
deste gênero musical. Dessa forma, o RAP trilha seu caminho propondo uma
luta pela resistência e construção da identidade negra, principalmente em um
país como o Brasil que condenou as vidas negras ao sistema escravista por mais
de 300 anos, e que ainda cultiva elementos deste sistema em sua atual
sociedade.

O uso do RAP em sala de aula


Ao pensar sobre a letra deste gênero musical, podemos compreender que muitas
vezes ela se sobressai da questão harmônica da própria canção, isto é, ao
pararmos para ouvir um RAP que carrega uma forte mensagem em sua letra, a
harmonia do instrumental que faz parte da construção da canção não se torna
essencialmente o seu ponto alto. A atenção do ouvinte será atraída pelas frases
cantadas ou faladas pelos MC’s (mestre de cerimônias, como são chamados os
artistas), desta forma podemos realizar uma análise mais aprofundada da letra
e acabar enxergando o RAP como uma expressão artística que além de dar a
voz ao povo da periferia, pode ocasionar um desenvolvimento do senso crítico
dos ouvintes.

Partindo de que o RAP se tornou nos dias atuais um produto auditivo


popularizado, aonde não é difícil encontrar em diferentes ambientes pessoas
ouvindo canções deste gênero. E ao pensar no ensino de História e a
conectividade com os jovens, um dos principais desafios que é oferecido pela
disciplina é o de fazer com que os alunos se interessem por ela, isto é, buscar
caminhos didáticos e instrumentos que despertem o interesse dos estudantes
pelos assuntos desta disciplina. Ou seja, a utilização de novas ferramentas
dentro da prática de ensino de História tem se preocupado em tornar o
aprendizado do conteúdo cada vez mais didático. Deste modo, uma das práticas
que se torna mais recorrente e utilizada é o uso de músicas para o auxílio da
didática. A música carrega consigo o sentido de objeto e campo de
conhecimento, e o mais importante, como uma fonte histórica, de forma que ela
encaminha representações, manifestações, opiniões, culturas e hábitos. Ao
aplicar esse recurso didático, o professor tem em mente a música como fonte e
espera que o aluno compreenda o momento histórico ao qual o estudante está
inserido por meio da análise da música, de forma que desenvolva pra si um
pensamento social, político e ideológico.
314
Sendo assim, quando usada em sala de aula, a música tem o papel de levar o
aluno a épocas distantes, inserindo-o dentro daquele contexto que é posto para
que observe uma forma de manifestação cultural e ao mesmo tempo histórica.
“Busca-se para o aluno o despertar do senso crítico que o leve à compreensão
da sua realidade em uma dimensão histórica, identificando semelhanças e
diferenças, mudanças, permanências, resistências e que, no seu
reconhecimento de sujeito da história, possa posicionar-se.” (DAVID, 2012, p. 6).

Acredita-se na utilização do RAP em sala de aula, como um recurso didático


para a explicação de algum determinado assunto histórico associado a questões
sociais, políticas e culturais, e deve ser pensado e colocado como uma
ferramenta interessante e fundamental. Ao trabalhar com este tipo de música,
pode-se escolher analisar somente as letras, o que poderá acarretar discussões
e opiniões significantes por parte dos estudantes. Isso acaba nos levando a
pensar no estudo propriamente dito da letra do RAP, que para José d’Assunção
Barros o nosso papel enquanto historiador é realizar uma História da poesia
cantada, e não uma História da Música. “O exemplo mais conhecido é o da
música popular cantada, a qual traz junto de si, e integradamente, aquilo que
chamamos de ‘letra’. Não é raro que estudiosos abordem historiograficamente,
seja como objeto temático ou como fonte, aquilo que não é propriamente a
música, mas sim a ‘letra’ da música.” (BARROS, 2018, p. 27).

Porém, pensando no uso da música como fonte em sala de aula, acredita-se que
a realização de análise somente da letra, pode acabar por limitar o resultado do
uso desta ferramenta, pela possibilidade de afastar o interesse e participação
dos estudantes. “Atentando sempre para os objetivos propostos, o procedimento
didático na utilização da canção para o ensino da História deve privilegiar, além
da análise da letra, a escuta e a percepção musical, ou seja, a compreensão da
forma: exploração, análise e reflexão sobre o que musicalmente foi dito e como
foi dito: motivos melódicos e desenvolvimentos dos mesmos; pulso, ritmo,
instrumentos e arranjo.” (DAVID, 2012, p. 10). Através deste pensamento
resultamos que é necessário fazer a audição da música junto aos estudantes
para que eles expressem suas opiniões primárias referente a canção, desde as
questões sobre o ritmo até a própria letra, referente ao significado que ela pode
estar transmitindo. E após isto, é fundamental realizar a apresentação e leitura
da letra, para que assim se inicie uma análise aprofundada, buscando a
compreensão da realidade em uma dimensão histórica.

A letra do RAP como um veículo reflexivo


O estilo musical em questão pode conter em suas letras diversas discussões
históricas referente a determinados períodos da história do Brasil. Se buscarmos
músicas de diversos artistas brasileiros e, acabar escutando a canção e
consequentemente prestando atenção na letra que está sendo cantada,
poderemos captar diversas ideias que o artista transmite e que resultam
reflexões. Um exemplo de boas reflexões é o grupo Racionais MC’s, considerado
como os pioneiros e o maior grupo de RAP do Brasil, tendo diversas letras que
discute as condições da população negra brasileira, o racismo, a violência 315
policial, os preconceitos sofridos pelos jovens negros e pobres da periferia,
dentre outros problemas sociais. Essas letras que acabam instigando nos
ouvintes pensamentos que podem resultar em reflexões e posicionamentos
ideológicos referente aos problemas presente na sociedade.

“O rap, independentemente do seu ritmo acelerado, ensurdecedor e rebelde,


representa um instrumento político de uma juventude excluída.
Independentemente do seu conteúdo muitas vezes agressivo e provocador,
indica uma ação pedagógica de jovens em processo de escolarização ou mesmo
evadidos da escola. Quem observa o seu conteúdo, analisando a sua letra,
independentemente do seu gosto musical, vai encontrar uma leitura da vida
social, do ‘fazer’ da sociedade, comparada a muitos cientistas sociais que
apenas superam esses jovens na linguagem culta e especifica do universo
científico.” (ANDRADE, 1999, p. 86)

É neste caminho que este trabalho se idealiza, isto é, busca-se apresentar uma
música e analisar trechos específicos da canção, se aprofundando nas
dimensões históricas presente em sua letra. Sendo assim, será posposto um
RAP que pode ser usado futuramente em sala de aula. Esta música se chama
“Atlântico (Calunga Grande)”, do rapper carioca Thiago Elniño, lançada em 2019.
A canção faz parte de seu álbum intitulado “Pedras, Flechas, Lanças, Espadas
e Espelhos”, um trabalho que tem em seu elemento uma forte significância
ancestral, carregando em suas músicas as angústias que transcorre aos negros
e negras da escravidão até os dias atuais. Thiago Elniño é um artista que
provoca nos ouvintes sentimentos que perpassa a música, leva-os a reflexões
sob questões como o racismo, a luta negra, provocando o entendimento sobre
as religiões de matrizes africanas, não é por menos que além de rapper, ele é
um pedagogo e educador popular.

Música “Atlântico” e a sua utilização em sala de aula


A música a ser trabalhada a seguir, é composta por uma forte escrita ancestral,
havendo uma discussão importantíssima e impactante sobre a escravidão. Narra
a captura e retirada da população africana que foram colocados nos grandes
navios para atravessar o Atlântico, e que chegaram em uma terra desconhecida
para servirem a um sistema desumano, a escravatura, que durou três séculos
no Brasil. A canção reflete a angústia da vida negra ao observar o imenso mar
que separou milhares de famílias, que manteve milhões de homens e mulheres
vindos da África longe de sua casa, da sua terra. Thiago Elniño revive nesta
música a sensação daquela população negra sobre o seu não pertencimento a
aquele território, e a força de querer ter a liberdade de voltar para a casa. Está
presente além disto, questões da atualidade que atravessou os corpos negros
em diáspora, como o receio de trazer um filho a este mundo sabendo dos
preconceitos e impossibilidades que milhares de jovens negros sofrem.

Esta análise pode-se iniciar através do próprio título da música, pois ao falar
sobre o Atlântico podemos gerar uma discussão sobre o mar, o qual durante todo
o processo do tráfico negreiro os navios atravessavam para levar os negros da 316
África para as Américas. Pode-se realizar um trabalho com todos os dados
disponíveis sobre os comércios e tráficos de escravos que ocorreram,
apresentando descrições de como realizava-se as viagens, sobre como e aonde
os negros ficavam nos navios, quais as suas condições e alimentações, entre
outros aspectos.

Uma travessia que além de levar milhões de pessoas, sendo homens e


mulheres, crianças ou adultos africanos para as Américas, acabou resultando na
morte de muitas delas. “Embora os estudos quantitativos sejam raros, é possível
estabelecer ordens de grandeza para os séculos XVI e XVII baseados em casos
isolados e, para os séculos XVII e XIX, com base em estudos exemplares,
mesmo que limitados a alguns anos. Em 1569, Frei Tomé de Macedo cita o caso
de uma embarcação transportando 500 cativos que, em uma única noite, perdeu
120 deles, ou seja, um pouco menos de um quarto do carregamento (24%).”
(MATTOSO, 1982, p. 69-70).

Além do nome “Atlântico”, há mais duas palavras que formam o título da música,
que são: Calunga Grande. Que poderá servir como uma base para formular a
análise referente a travessia forçada dos africanos. Esta expressão era usada
para designar o mar, o que pode causar muitas curiosidades dentro da sala de
aula, assim como pode estimular uma reflexão e proporcionar uma explicação
sobre todo o lado simbólico de imensidão e vazio presente nesta palavra.
“Calunga grande é o mar, a enormidade de seu destino e de seu horizonte.
Calunga pequeno é a terra que recebe esses corpos e os transforma em
semente. Mas no caso da escravidão, reinventada no Novo Mundo, a terra tragou
os corpos desses milhares de cativos, que foram antes transformados em
prisioneiros, brutalizados pela violência desse sistema que supôs a posse de um
homem por outro.” (MOURA, 2000, p. 227).

Partindo para a análise da música, podemos trabalhar com a letra completa ou


com apenas trechos, visto que a letra não é tão extensa. Como dito
anteriormente, será interessante fazer com que os estudantes escutem a música
primeiramente, para que somente após seja feita a apresentação a eles da letra,
iniciando-se assim toda a construção historiográfica por trás da música.

A canção inicia-se pelo refrão cantado pela cantora Natache: “O mais próximo
de casa que eu estive foi o mar/Boto os meus pés na água e me lanço a
pensar/Como é a vida aqui, como é a vida lá/Sinto que eu não sou daqui, pra
casa eu quero voltar”. Este trecho pode ser trabalhado junto com o título da
música, pois há nesta passagem a referência ao mar. Este refrão tem a presença
de toda a discussão feita anteriormente neste texto, isto é, a angústia dos cativos
ao olhar para o mar e perceber que ele é o divisório entre a sua casa para esta
nova terra desconhecida por ele, a qual ele não se sente pertencido. Tendo sido
arrancado de suas origens, sendo inserido na sociedade como produto, como
escravo, desejando a liberdade e a volta para a sua casa.

“Por fim, a nova personalidade do escravo era criada pela inserção de homens 317
negros, ainda inspirado pelo modelo africano, numa sociedade dominada pelo
modelo do homem branco. Integração difícil, cheia de tensões contínuas que
construíram a vida do escravo, obrigado a se adaptar a relações sociais de tipo
escravista, sujeito a todos os esforços, todas as servidões, toda a obediência e
lealdade aos senhores infalíveis.” (MATTOSO, 1982, p. 129).

A professora ou professor pode aproveitar o momento para se aprofundar sobre


a Diáspora Africana. Para isso, pode assimilar o refrão com o seguinte trecho
cantado pelo Thiago Elniño: “Eu me sinto a um oceano de casa/É como se
faltasse um pedaço meu”. Essas duas frases poderão servir como ponto de
partida para a explicação referente a Diáspora Africana, que tem em seu conceito
a imigração forçada de africanos para as Américas, durante o tráfico
transatlântico de escravizados. A partir do momento que adentravam nos
tumbeiros (navio negreiro), os africanos deixavam sua vida, história, costumes e
religiosidade para trás, e passava a ter novas formas de identificação. Passariam
a construir uma sociabilidade a partir de um novo local, ou seja, a diáspora passa
a ser uma redefinição de identidade, criando novas formas de ver, ser e agir no
mundo.

No seguinte trecho da letra: “Eu já escolhi o nome dos meus filhos/Mesmo sem
saber se um dia vão nascer/Sinto medo de trazê-los a esse mundo/Onde eu
tenho tão pouco pra oferecer”. O entendimento é subjetivo, mas este trecho da
letra poderá gerar uma discussão em torno dessas complexidades da letra entre
os alunos e alunas. As duas últimas frases deste trecho podem ter dois
significados. O medo pode ser o resultado das discriminações, preconceitos e a
desigualdade racial sob toda a população negra do país, assim como Thiago
Elniño pode estar representando a consciência de ser um homem africano, que
tem tão pouco a oferecer aos seus filhos vivendo dentro de um sistema
escravista. “Uma vez nascida, a criança escrava estava já inserida na sociedade,
pois, diferentemente das crianças abastadas que passavam por um lento
processo de preparação para a vida de elite, as crianças negras desde muito
cedo iam às costas de suas mães cativas para as lides diárias.” (SILVA, 2013,
p. 123).

Além das questões sobre a imigração forçada dos africanos e a vida como
escravo no Novo Mundo, podemos seguir para o lado da religiosidade da
população negra no Brasil, a partir do seguinte trecho: “Roupas brancas cobrindo
os nossos corpos sexta-feira/Um café pro preto velho na janela/Um marafo e
uma vela, pra que Exú nos guarde da trunqueira”. Já neste trecho podemos gerar
o desenvolvimento histórico a partir das diferentes formas de cultos religiosos
dentro do espaço africano, mostrando aos estudantes que a ideia de “Deus” varia
de acordo com a cultura, e entre outros aspectos étnicos e regionais. Neste caso,
Thiago Elniño cita duas entidades pertencentes as religiões Candomblé, que foi
trazida pelos africanos escravizados, e da Umbanda, que foi uma religião criada
no Brasil com saberes africanos, porém mescla elementos do cristianismo e
outras religiões. É interessante propor através deste trecho da letra, uma
profundidade perante toda a ancestralidade africana no âmbito das religiões afro- 318
brasileiras, além de elaborar uma discussão referente aos estereótipos e
intolerâncias enfrentadas por essas religiões.

Sendo assim, através desta breve análise sob a letra da canção do Thiago
Elniño, podemos compreender que é possível sua utilização enquanto fonte em
sala de aula e, para aprofundar no âmbito histórico da canção. A união entre
ensinar História com o uso da música, em especifico do RAP é primoroso, pois
este gênero resulta em um desenvolvimento de um pensamento social, político
e ideológico, assim como o ensino de História tem a capacidade de contribuir na
formação de sujeitos críticos, além de despertar a concepção de identidade dos
estudantes em questão.

Considerações finais
Por fim, concluímos com a reafirmação de que o uso de música no ensino de
História, enquanto uma ferramenta e fonte histórica, tem a capacidade de
articular questões e discussões em volta da canção apresentada aos estudantes,
o que vai se constituir historicamente. Ressaltamos que a música é uma forte
aliada para o ensino de História, por conta da sua significância no cotidiano dos
alunos, e na sua utilidade como um recurso didático aos docentes, podendo
estimular e atrair o interesse dos alunos e alunas para a aula. Sobretudo, é
importante consolidar a convicção de que a música é uma fonte histórica, que
pode servir desta forma como um meio de compreensão tanto da história na
música, quanto outros aspectos no contexto dessa história, como a política, a
economia, a cultura e tantos outros elementos que podem ser extraídas através
de análises.

Pensando neste reinvento dos professores perante a utilização de músicas em


sala de aula, tomamos como referência especificamente o uso do RAP,
pensando na criação de novas estratégias didático-pedagógicas. Possibilita-se
assim criar uma concepção sobre como este gênero pode desenvolver
discussões e entendimentos diante de certos recortes históricos. Foi
demonstrado neste trabalho, de forma geral, como trabalhar junto aos
estudantes utilizando uma música em específico para extrair concepções
históricas presente na mesma e desenvolver uma aula prazerosa para o docente
e para os estudantes. Além disso, é possível compreender que o uso desta fonte,
pode ser importante para a formação argumentativa e opinativa, e o despertar
do senso crítico dos estudantes.

Conclui-se que o uso do RAP e a análise de suas letras dentro da sala de aula,
é fundamental, promissor e relevante para o desenvolvimento da percepção da
consciência histórica dos estudantes, considerando que eles realizam o
exercício de distanciar-se do passado para poder analisa-lo e deste modo,
formar uma identidade como agente histórico. Ou seja, a utilização da música
“Atlântico” auxilia o ensino de História, mais especificamente a aspectos e temas
relacionados a escravidão, em sua função de formar sujeitos através de sua
interação com a sociedade.
319
Referência biográfica
Reuther Henning Machado, acadêmico do 4º ano de História da Unespar –
Campus União da Vitória.

Referências bibliográficas
ANDRADE, Elaine Nunes de. (Org.). O Rap e Educação – O Rap é educação.
São Paulo: Summus, 1999.

BARROS, J. D. História e música: considerações sobre suas possibilidades de


interação. Revista História & Perspectivas, v. 31, n. 58, 11 jan. 2018.

DAVID, Célia Maria. Música e ensino de história: uma proposta. Disponível em:
<http://www.acervodigital.unesp.br/bitstream/123456789/46189/1/01d21t06.pdf
>. Acesso em: 17. fev. 2021.

ELNIÑO, Thiago. Atlântico (Calunga Grande). In: Thiago Elniño. Pedras,


Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos. Rio de Janeiro: Independent Records,
2019. Faixa 01. CD.

MATTOSO, Katia M. de Queirós. Ser escravo no Brasil: séculos XVI-XIX. Rio


de Janeiro, Ed. Vozes, 2016.

MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de. A travessia da Calunga Grande. Três


séculos de imagens sobre o Negro no Brasil. (1637-1899), São Paulo, Edusp,
2000.

SILVA, Rafael Domingos Oliveira. Negrinhas e negrinhos: visões sobre a


criança escrava nas narrativas de viajantes – Brasil, século XIX. Revista de
História, 5, 1-2, 2013, p. 107-134.
METODOLOGIAS ATIVAS: O USO DAS
LINGUAGENS IMAGÉTICAS NAS CIÊNCIAS
HUMANAS
320
Ronualdo da Silva Gualiume e Priscielli do
Carmo Rozo Cerdeira da Rosa

A intenção é explorar e discutir como as diferentes linguagens imagéticas, dentro


das metodologias ativas, fundamentas em bases teóricas são o aporte na
elaboração dos planos de aula dos professores da área de Ciências Humanas
para a construção do conhecimento em sala de aula, do estimular crianças,
jovens e adultos a se envolver com a construção do conhecimento permeado
pelas tecnologias da informação e da comunicação.

A construção do conhecimento a partir das linguagens imagéticas estão


fundamentados em uma perspectiva construtivista, compreendendo que a
aprendizagem ocorre na interação entre os indivíduos do processo, com o
objetivo de torná-la significativa. Entende-se por linguagens imagéticas as
imagens – esculturas, pinturas, cartazes, fotografias, anúncios publicitários,
capas de revistas, outdoors, propagandas, quadrinhos, cinema, grafites etc.,
portanto a escola tem o dever de levar o cotidiano para a sala de aula e trabalhar
a experiência dos alunos, bem como sua realidade, garantindo o
desenvolvimento das habilidades de leitura de imagens para promover a
alfabetização visual. É importante que os alunos compreendam as imagens em
seus contextos e tenham condições de conhecer melhor a sociedade em que
vive; e nesse processo poderão despertar o olhar observador, curioso e
investigador para fazer descobertas acerca de suas próprias concepções e
emoções ao observar uma imagem. Além disso, cabe à escola contribuir para a
formação de leitores autônomos e críticos de todos os textos que os cercam,
inclusive os imagéticos

“Se ainda há bem pouco tempo uma imagem valia por mil palavras (admitamos
que o estado de raridade que cria o valor), hoje em dia, em muitos casos, a
desmultiplicação imediata de cada imagem retira-lhe essa possibilidade de valer
(de valor)” (CALADO, 2000, p. 734).

Diante disso, uma pintura, um gráfico, uma fotografia ou qualquer outra imagem
podem permitir ao aluno a compreensão de um fato ou de um fenômeno com
mais objetividade. No contexto do processo de ensino-aprendizagem, essas
diferentes linguagens podem ser tratadas como conteúdos, como fontes de
informação, como fontes documentais, demandando uma observação cuidadosa
para prosseguir com uma descrição e análise. Essas análises podem ter cunho
histórico, que revelam situações sociais e culturais de uma época; podem levar
os alunos a imaginar, por exemplo, a vida das pessoas a quem pertenceu um
determinado objeto, como e para que era usado, bem como a localização
geográfica dessas pessoas e objetos. Esse tipo de questionamento introduz o
pensamento histórico a partir da ideia de um objeto como documento de uma
comunidade e de um estilo de vida. Compreender as fontes documentais como 321
objetos, fotografias, documentos etc. é muito importante para conhecer a
memória de um lugar e de um tempo, em uma investigação histórica.

É importante saber e questionar o que se ensina, para que se ensina, para quem
se ensina, como se ensina, a fim de entender a dinâmica dos processos
educativos e o papel da imagem na metodologia ativa. A imagem, seja fixa ou
móvel, deve ser um elemento problematizador e não uma mera ilustração para
um aluno observá-la. Ela deve estar atrelada ao conteúdo a ser trabalhado e
propiciar ao aluno o levantamento de hipóteses, a reflexão, a apreciação e até a
produção, a partir da análise, seja contextualizando o conteúdo, seja
desenvolvendo conceitos fundamentais como ângulo, composição, foco, luz,
movimento, perspectiva etc. Mas o que é imagem, afinal?

“São criadas e produzidas pelos seres humanos nas sociedades em que vivem.
São representações porque resultam das relações entre as experiências vividas
(campo sensível) e os pensamentos e reflexões (campo intelectual). E
demandam o desenvolvimento de habilidade, instrumentos, técnicas e
tecnologias para serem expressas” (SANTAELLA, 2012. p. 17).

A construção de sentido das imagens pode ser realizada por meios de diálogo,
sendo o aluno um agente e elaborador de hipóteses e o professor, o facilitador
na aprendizagem significativa. As atividades poderão impulsionar a descoberta
de conceitos simples até os mais complexos, de forma que a leitura das imagens
permita expandir os conhecimentos trazidos pelos alunos. Para o trabalho com
imagens em sala de aula, ao escolher a imagem a ser objeto de estudo, é
fundamental que o professor tenha muita clareza dos objetivos a serem
alcançados, de tal forma que o trabalho contribua para a apropriação do conceito
abordado, por parte do aluno, ou seja, para um processo de aprendizagem
significativo. A escola desempena um papel de estimular a formação crítica, fator
importante em um mundo repleto de imagens carregadas de mensagens e de
ideias. As escolas, atualmente, contam com os mais diversos recursos visuais,
desde os mais simples, oriundos dos livros didáticos ou projetados pelos
professores, até os mais complexos, presentes na internet ou em exposições.

Ernesta Zamboni, com o objetivos de discutir as representações no ensino de


História, afirmar: “Tratando-se das análises das representações construídas para
atender às exigências educacionais, o nosso olhar dirige-se a várias situações –
uma delas ligada à apreensão e construção do conhecimento em sala de aula,
isto é, à relação de aprendizagem existente entre os professores e os alunos, e
a outra, às múltiplas mercadorias produzidas pela indústria cultural, como
vídeos, livros, filmes, pinturas, gravuras, fotografias, enfim, todos os materiais
considerados didáticos” (ZAMBONI, 1998, p. 58).

Nesse sentido, a escola, como parte da sociedade, não está alheia às questões
criadas por essas representações, produtos culturais de uma época, e pode, sim,
empregá-las em aulas com objetivos diversos, seja para impulsionar um conceito 322
ou desenvolvê-lo, seja para proporcionar a visão crítica que certas produções
imagéticas trazem consigo. Ainda no contexto da análise de imagens, Calado
(1994) formula doze funções ou objetivos da comunicação por meio de imagem,
sendo: “função expressiva, função persuasiva, função poética, função
representativa, função organizadora, função interpretativa, função
transformadora, função decorativa, função memorizadora, função de
complemento, função dialética e função substitutiva” (MALVEIRO, 2014, p. 13).

A partir dessas funções, o professor poderá compreender quais são os tipos de


função atribuídos em sua aula, a partir de seus objetivos ao uso de uma
determinada imagem. Com base nessa linha teórica, metodologias ativas que
utilizem linguagem visual podem permitir a participação reflexiva do aluno. No
entanto, é importante ressaltar que a imagem é tão exigente quanto qualquer
outro sistema de representação. “A maneira de dispor os contextos de ensino e
aprendizagem a partir da imagem é normalmente aquela voltada à apresentação
de novos assuntos, para a interrogação de ideias, na perspectiva de realizar uma
síntese já apresentada, aplicações práticas com exercícios, avaliação e revisão
de matéria” (CALADO, 1994, p. 22).

Para que o uso da imagem seja positivo na metodologia ativa, é preciso que os
alunos façam perguntas, com base na observação, e que haja mediação do
professor quanto os comentário e respostas que surgirem, de modo que não
extrapolem o tema e nem cheguem a conclusões genéricas a partir de uma única
imagem. Sendo assim, segue alguns tipos de imagens utilizado como recursos
para o desenvolvimento dos conceitos científicos em sala de aula.

A fotografia como registro cultural ou artístico de uma época pode ser definida
como documento. A esse respeito, Santaella afirma que a foto documental
também necessita de um fundo histórico.

“Sem a referência ao campo contextual a que se aplicam, por mais eloquentes


que possam ser, as fotos documentais, por si mesmas, não conseguem limitar a
abertura a certa indefinição referencial que ronda toda imagem, uma indefinição
que, no caso da função documental, precisa ser sanada com o auxílio do texto”
(SANTAELLA, 2012, p. 90).

Entender as fotografias como documentos permitirá aos alunos, por exemplos,


obter uma leitura detalhada de uma paisagem que os auxiliará a ter uma visão
dos costumes de uma época.
Um exemplo é a pesquisa sobre a família e a origem do aluno, frequentemente
desenvolvida nos anos iniciais do Ensino Fundamental, com o objetivo de
contribuir com a formação da identidade. Os alunos podem pesquisar e
apresentar fotografias antigas dos avós ou bisavós e analisar as vestimentas ou
ambientes, buscando compreender suas origens a partir do documento
fotográfico. Outro bom exemplo é a utilização do registro fotográfico como fonte 323
histórica nas aulas de história do 6º ano dos anos finais do Ensino Fundamental
auxiliando na compreensão do que é fonte e como elas permeiam a construção
social de cada indivíduo. Já a fotografia pode ser utilizada nas aulas de Geografia
como conceito de paisagem. Geralmente, os alunos investigam as semelhanças
e diferenças em fotografias de lugares diferentes, desenvolvendo habilidades de
comparação e, também, compreendendo as representações de um mesmo lugar
ao longo do tempo.

A cartografia é considerada uma linguagem, um sistema de códigos de


comunicação, imprescindível em todas as esferas de aprendizagem em
Geografia. Ela consiste em uma linguagem que concretiza o pensamento
espacial, ou seja, é uma representação espacial, em um dado momento, por uma
pessoa ou sociedade. Entre os recursos da cartografia estão maquetes, plantas,
mapas, croquis, cada qual com suas exigências e possibilidade de
representação. Está fundamentada na leitura e na representação do espaço,
permitindo ao aluno uma visualização dos lugares, tanto do todo quanto de parte
de um território, dependendo, ainda, do quer observar pelo mapa ou por outra
representação. Os mapas são as representações aproximadas da realidade que
estão presente no dia a dia dos alunos quando leem ou assistem a noticiários
que apresentam mapas meteorológicos, populacionais ou áreas das cidades. Os
mapas podem ser também tratados como documentos ou fontes históricas,
auxiliando, por exemplo, nas discussões sobre o bairro, o entorno da escola, o
estado, a ocupação do território brasileiro, tanto para compreender
historicamente os fatos quanto para analisar a localização, a extensão e a
distribuição territorial da ocupação.

Os mapas mentais é uma representação aproximada do real para entender a


realidade e a linguagem. É uma representação simples ou um desenho que o
aluno elabora tendo como referência a memória de um lugar. Pode ser utilizado
em classe, por exemplo, para analisar a percepção que os alunos têm do lugar
de vivência deles. A partir dessa representação, iniciar-se-á um percurso
metodológico, possibilitando o estudo desse lugar, de modo mais significativo.
Nele se incluem elementos que fazem parte da paisagem e do ambiente, como
os trajetos, as ruas, os pontos de referências. Muito utilizado, por exemplo, nos
anos iniciais do Ensino Fundamental nas atividades que requer uma construção
lógica e representativa sobre o trajeto da casa até a escola.

A charge é uma ilustração, geralmente com teor humorísticos e satírico,


publicado em jornais, revistas, livros etc. Ela é elaborada a partir do cotidiano
que o cartunista capta e retrata em seus desenhos com criatividade, humor e
crítica. A linguagem empregada é a não verbal, mas às vezes a imagem é
acompanhada de texto. Ela costuma trazer uma reflexão acerca de algum
assunto ou personalidade da atualidade, e pode ser objeto de análise linguística,
o que a caracteriza como gênero textual. Um exemplo de utilização e análise das
charges são as perguntas direcionadas para a análise como: Qual é o cenário
da charge? Quão a ação do personagem? Qual a mensagem que a charge
transmite? Para uma charge seja compreendida e desenvolvida em atividades 324
de metodologia ativa, é necessário explicitar os elementos particulares desse
gênero textual, como cenário, personagens ou sujeitos conhecidos, título, balão
de diálogos, humor, ironia, criticidade e tema. Já as tirinhas são compostas de
linguagem verbal e não verbal, que, juntas, produzem o sentido do texto. São
normalmente caracterizadas pelo humor, texto e diálogos curtos, com sequência
de cenas, em uma ordem temporal, geralmente em formato retangular. Exemplo
de utilização nas aulas de Geografia associar a interpretação dos problemas
ambientais para a fauna e a poluição da água a partir das charges e tirinhas.

Os textos publicitários, por utilizarem diversas formas de linguagem e se


organizarem de modo a produzir diferentes efeitos de sentido, inclusive o poder
de persuasão, constituem um rico material para análise textual em sala de aula.
A leitura de um texto publicitário deve ter como objetivo não apenas perceber a
ideologia nela contida, mas, principalmente, captar o jogo feito com as palavras,
com os argumentos – que procuram mostrar, por exemplo, as vantagens de um
produto ou a necessidade de uma mudança de comportamento -, a ambiguidade
e a ironia da mensagem etc. A propaganda, os anúncios, os cartazes, os
fôlderes, por exemplo, propiciam a discussão sobre vários temas que podem ser
pertinentes e estar relacionados aos conteúdos estudados, tais como texto
informativo, figura de linguagem, tipo de produto, trabalho, cultura do consumo
e da informação, enfim, conteúdos que podem ser transversais e
interdisciplinares, levando os alunos, ainda, a perceber que, muitas vezes, a
mensagem pode ser ambígua e irônica.

Os objetos são fontes documentais porque são vestígios deixados pelas


diferentes sociedades, ao longo da história, e fornecem informações sobre
aquela população, sobre aquele momento e auxiliam na análise da compreensão
da história ou no processo ocupacional de um território. Exemplo, os pertences
de uma família migrante podem revelar a origem dessa família, seus costumes,
sua cultura, língua etc. Para investigar um objeto, geralmente pesquisadores de
diferentes áreas (historiador, geógrafo, arqueólogo etc.) se envolvem na análise
do material. Um dos exemplos em sala de aula é o estudo sobre as populações
tradicionais e os vestígios deixados sobre suas produções materiais ao longo do
tempo até a visita a um museu ou a construção de uma mostra artística de
objetos.

Os filmes como ideia de utilização em sala de aula é um recurso pedagógico


antigo. No entanto, só mais recentemente essa utilização se tornou uma prática
sistematiza e intensificada com o advento das mídias digitais e de comunicação.
Porém, é preciso elaborar um roteiro que sirva como ponto de partida para
direcionar o olhar dos alunos, levando-os a refletir, de forma ampla, sobre a obra
a que assistem. Propõe-se, dessa forma, um trabalho com um objetivo mais
amplo, que consiste na instrumentalização e na provocação para realização da
leitura de mundo. O papel do professor é fundamental na mediação entre ficção
e a realidade, bem como na conscientização de que o cinema, como
representação de uma narrativa, é dotado de determinada linguagem.
325
“O professor pode enfatizar que o filme é antes de tudo arte, proporcionando
também a apreciação e a leitura do mesmo enquanto linguagem artística,
chamando atenção para o gênero, a história e o contexto em que foi produzido,
as técnicas e meios de produção” (SOUZA; GUIMARÃES, 2013, p. 106).

Um exemplo de aplicação é um projeto a longo prazo com a utilização de filmes


e documentários para contextualizar temas históricos e abertura de conteúdos
específicos.

Pode-se concluir que as imagens não podem ser tratadas como meras
ilustrações para os conteúdos em sala de aula, até mesmo porque se está
falando de uma metodologia de aprendizagem ativa, que consiste no fato de o
aluno ser ativo, participante, seja perguntando, levantando hipóteses,
investigando, observando, refletindo, concluindo etc. Além disso, o trabalho com
as diferentes linguagens imagéticas contribui para a ampliação da bagagem
cultural dos alunos, à medida que eles deverão investigar seus autores e seus
contextos, contribuindo para a construção do saber histórico. Assim, as imagens
são vistas como portadoras de grande quantidade de conteúdos que devem ser
analisados, explorados.

As linguagens imagéticas tornam-se um importante recurso de expressão e


comunicação, que atinge dimensões importantes no cotidiano, seja ele escolar
ou pessoal. Por meio das imagens e das mensagens visuais que elas
transmitem, as atividades humanas são norteadas; e vale destacar que as
inovações tecnológicas têm contribuído muito nesse processo.

Diante disso, a escola, que ajuda a estabelecer os processos da sociabilidade


entre os indivíduos e prepara os estudantes para se integrarem à sociedade de
forma consciente e autônoma, deva valer-se dos recursos imagéticos aliados a
metodologias ativas, pois eles contribuem significativamente para o processo de
aprendizagem e interação social. Torna-se, portanto, necessária a utilização das
diferentes linguagens imagéticas para capacitar os alunos ao exercício crítico do
mundo.

Referências biográficas
Ronualdo da Silva Gualiume, acadêmico do curso de pedagogia na Unicesumar.
E-mail: ronualdo_gualiume@hotmail.com

Priscielli do Carmo Rozo Cerdeira da Rosa, professora do Ensino Médio,


Acadêmica do Mestrado Profissional em Ensino de História – ProfHistória-
UEPG. E-mail: prisciellirozo@gmail.com
Referências bibliográficas
CALADO, I. Algumas perguntas da educação face às modernas visualidades.
Comunicação e Sociedade 2, Cadernos do Noroeste, Série Comunicação, v. 14
(1-2), 2000, p. 727-739.
326
CALADO, I. A utilização educativa das imagens. Porto: Porto Editora, 1994.

MALVEIRO, J. R. L. Motivar para a aprendizagem. Relatório de estágio em


mestrado em ensino dos 1º e 2º ciclos do ensino básico. Departamento de
Educação da Escola Superior de Educação de Coimbra, 2014. Disponível em
https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/12994/1/JOANA_MALVEIRO.pdf.
Acesso em: 15 set. 2020.

SANTAELLA, L. Leitura de imagens. São Paulo: Melhoramentos, 2012.

SOUZA, F. R.; GUIMARÂES, L. B. Filmes nas salas de aula: as ciências em


foco. Textura, n. 28, p. 99-110, maio/ago. 2013.

ZAMBONI, E. Representações e linguagens no ensino de História. Revista


Brasileira de História. São Paulo, v, n. 36, 1998.
MÍDIA DIGITAL E ENSINO DE HITÓRIA:
USOS E POSSIBILIDADES A PARTIR DA
EXPERIÊNCIA DO PROJETO CONHECENDO
327
“MEU” BAIRRO EM CAXIAS DO MARANHÃO
Ruan David Santos Almeida

Considerações iniciais
Os meios digitais têm servido como suporte valioso para a maior eficácia da
educação em todos os níveis, guardadas as devidas proporções, os avanços
averiguados na tecnologia da informação proporcionam para o ensino novas
possibilidades e caminhos a serem enveredados por professores e
pesquisadores, visualizando isso lançamos uma indagação, como utilizar as
mídias digitais a serviço do ensino de história? Ou mesmo, de que maneira
introduzir nas redes um conteúdo considerado por muitos alunos como “velho”,
de pouca importância para a atualidade, ideologias que ainda rotulam a história
enquanto ciência e até mesmo como disciplina. Partindo de tal premissa,
entramos em um novo questionamento, seria possível avistar as mídias digitais
como ferramenta para alunos e cidadãos no autoconhecimento de sua própria
história? O presente ensaio busca tecer essa discussão a partir do que um
projeto vem realizando na cidade de Caxias do Maranhão.

Presenciando isso, este trabalho tem por objetivo analisar duas questões
importantes no campo do ensino de história. Primeiramente, serão observadas
as atuações do projeto de pesquisa e extensão intitulado “tem cor, tem vida e
compõe a teia urbana da cidade: conhecendo a cultura e a história do meu
bairro”, que vem coletando informações profícuas para o conhecimento da
cidade, já que o entendimento dos bairros enquanto lugar repleto de valores
conduz sua imagem a diferentes níveis. No segundo momento as análises serão
destinadas a mídia social “conhecendo meu bairro”; criada para disseminação
do conhecimento adquirido no decorrer das ações do projeto. Buscando
perceber o campo da tecnologia da informação na prática, questões como
estética da mídia, textos, imagens e público alvo serão vistos detalhadamente,
sabendo que toda essa conjuntura é pensada previamente, afim de atingir
resultados importantes na divulgação do conhecimento.

Conhecendo o “meu” bairro: Lugar de histórias, memórias e identidades


As conjunturas sócias, econômicas, políticas e culturais acabam chamando
muita a atenção do historiador no cenário da pesquisa, justamente por evidenciar
características intrínsecas a própria história do homem no tempo. No entanto,
este ensaio tem por objetivo disseminar o conhecimento a respeito do espaço de
vivência das pessoas, popularmente conhecidos como bairros. Para tanto, antes
mesmo de adentrar nesse espaço específico de histórias e memorias, devemos
conhecer a cidade na qual eles estão inseridos, Sousa [2015] vem nos ajudar
nessa perspectiva; descrevendo Caxias da seguinte forma:

O município tem, de acordo com IBGE, uma extensão territorial de 5.197,32 km2,
corresponde, aproximadamente a 1,55% do território maranhense, de 328
331.983,293 km2 (área do tamanho da Alemanha). Apresenta densidade
demográfica de 30,99 hab./ km2 e uma taxa de urbanização de 76,27%. Caxias
ocupa um lugar de destaque na rede urbana maranhense, é o quinto município
mais populoso de estado (São Luís, Imperatriz, São José de Ribamar e Timon)
e a 6° maior economia, considerado pelo PIB municipal de 2011. [SOUSA, 2015,
p.20].

Caxias apresenta um grande potencial dentro do estado do maranhão, isto não


se limita somente a extensão territorial e na finalidade econômica que fica nítido
a partir da fala citada. A conjuntura histórica e cultural encontrada nesse espaço
é em sua essência algo de extrema importância para ser pesquisado. Sabendo
disso, dentro da localidade foram selecionados alguns bairros de maneira
pensada, visto que dentro de estudos feitos recentemente concernente aos
espaços da cidade foi comprovado a escassez de fontes e dados relacionados
a formação histórica e cultural. A cidade pode ser melhor visualizada através do
mapa referenciado abaixo, que indica todos os espaços detalhadamente.

Sendo comprovado que esses “espaços de sociabilidades” tem grande


potencialidade de estudos e atuações, estão sendo promovidas visitas e
observações nos bairros: Cangalheiro, Centro (especificamente a área
referenciada como “Pé da ladeira”), Trizidela, Ponte e a Galiana. Os bairros nas
mais diversas compreensões, são entendidos como “lugares de memorias” e a
escolha inicial desses cinco, procedeu-se por dois motivos. Primeiramente, por
se tratarem de regiões pouco conhecidas nas pesquisas locais, acrescido a isto
tem, o fato de serem lugares antigos, que portanto podem nos mostrar diversas
gerações; tecendo todos os dias suas vidas naquele espaço.
329
Mesmo na atualidade, as percepções limitantes que conferem a eles apenas o
mérito de serem partes que compõe a cidade acabam promovendo a delimitação
para regiões que possuem um potencial enorme de conhecimentos e
ensinamentos. Esses lugares se diferenciam e ao mesmo tempo complementam
o sentido empregado a cidade, cada qual com suas particularidades únicas, algo
possível de se visualizar, nos demonstram uma rede de significados que podem
ser presenciados no cotidiano urbanístico local. Percebendo a profícua
importância da história caxiense o projeto de extensão intitulado, “tem cor, tem
vida e compõe a teia urbana da cidade: conhecendo a cultura e a história do meu
bairro”, tem por objetivo está disseminando informações acerca dos bairros da
cidade.

Todavia, tendo em mente que a pesquisa é algo processual, pensado com


antecedência, as ações realizadas, voltadas ao cunho analítico dos dados, são
projetadas de forma estruturada, visando adquirir fontes pela metodologia da
história oral, desta maneira a análise prévia, pensada e organizada, tem por
finalidade obter resultados precisos, ou seja, nos parâmetros exigidos. Os
direcionamentos para tais atitudes acabam sendo explicáveis, isto a partir da fala
de Verena Alberti [2005]:

Fazer história oral não é simplesmente sair com um gravador em punho, algumas
perguntas na cabeça, e entrevistar aqueles que cruzam nosso caminho
dispostos a falar um pouco sobre suas vidas. Essa noção simplificada pode
resultar em um punhado de fitas gravadas, de pouca ou nenhuma utilidade, que
permanecem guardadas sem que se saiba muito bem o que fazer com elas.
[ALBERTI, 2005, p. 29]

A memória da população local torna-se algo valioso, na medida que informações


de cunho escrito relacionados ao assunto são escassas, pouco encontradas nas
bibliografias escritas e até mesmo nos relatos de memorialistas, produzindo a
pouca compreensão dos caxienses a respeito de seu próprio espaço do cotidiano
da vivência, dos seus bairros. Na medida que, o sentimento de pertencimento
perpassa pelo conhecimento de si e da sua história, isso acaba se tornando um
problema. Assim encontramos uma oportunidade de utilização da técnica de
coleta das fontes orais, conduzidos por entrevistas. Nesta tessitura, os
mecanismos técnicos da história oral acabam por demonstrar novos ares a
serem enveredados pelo historiador, contudo, aqueles que adentram no campo
da memória local devem estar preparados para as dificuldades do ofício, pois o
trabalho do historiador nesse campo deve ser estratégico.
Imagem 1: Entrevista concedida por Edimée da Costa Leite
330

Arquivo Pessoal, 2019.

Imagem 2: Entrevista concedida por Josefa Sousa Oliveira

Arquivo pessoal, 2020.

As imagens 1 e 2 nos demonstram tal questão de maneira prática, foram


selecionados antecipadamente aqueles que poderiam ter as informações das
quais o projeto necessitava, moradores antigos dos bairros, pessoas que
possuem memórias riquíssimas acerca da formação histórica e cultural das
localidades. As ações também visam demonstrar o valor da memória local,
indicando que pessoas idosas possuem fortes lembranças a serem utilizadas
pela história na construção da identidade coletiva ou em outros assuntos
importantes para a sociedade.

Acrescido a isto, temos grandes fatos sendo descobertos, já que os relatos


coletados após a transcrição transformam-se em fontes valiosas para o
entendimento de questões sociais importantes. entretanto, as atenções voltadas
a técnica agora ganham notoriedade, na medida que os esforços para
desempenho nos primeiros passos proporcionam o resultado final desejado. As
localidades avistadas possuem grandes especificidades, visto que cada um dos
bairros possuem suas particularidades na formação, a visualização desta ideia
de forma geral também é presenciada na retratação de Ecléa Bosi [1998], no
tocante ao objeto de pesquisa descrito:

Os bairros têm não só uma fisionomia como uma biografia. O bairro tem sua
infância, juventude, velhice. Esta, como a das árvores, é a quadra mais bela,
uma vez que sua memória se constituiu. Nas histórias de vida podemos 331
acompanhar as transformações do espaço urbano; a relva que cresce livre, a
ponte lançada sobre o córrego, a divisão dos terrenos, a primeira venda, o
primeiro bazar. As casas crescem do chão e vão mudando: canteiros, cercas,
muros, escadas, cores novas, a terra vermelha e depois o verde umbroso.
Arbustos e depois árvores, calçadas, esquinas... uma casa pintada de azul que
irradia a luz da manhã, os terrenos baldios, as ruas sem saída que terminam em
praças ermas inacabadas por dezenas de anos [BOSI, 1998, p. 204].

Percebemos que vislumbrando os bairros nessa tessitura, os lugares acabam


por ganhar contornos diferentes, ecoam nos ouvidos de maneira poética, assim
tornando-os ambientes vivos e pulsantes, agradáveis até mesmo aos olhares
mais críticos. Os sentidos empregados a um espaço podem ser os mais variados
possíveis, a simbologia como pano de fundo encanta, ao passo que, reproduz
as diversidades encontradas no seio da vivência.

Em um sentido amplo, estão promovendo a valorização histórica de várias


maneiras, porém em meio ao avanço tecnológico uma delas chama atenção, já
que tem por funcionalidade atingir um público amplo, aqueles jovens e adultos
consumidores de notícias das mídias sociais. Além de aproximar as pessoas de
sua própria história, isto através das redes todos os dias visitadas por milhões
de pessoas.

A mídia social a serviço do ensino: Os bairros caxienses ganham as telas


A cultura de consumo acabou por alterar totalmente as relações sociais, na
medida que os contatos interpessoais estão sendo geridos em sua essência
através de aplicativos e redes sociais, desta forma, discursões podem ser tecidas
nesse sentido, porém nos cabe agora perceber como esse “novo” mecanismo
chamado internet pode auxiliar o professor em sala, ao passo que muitos ficam
perdidos quando o assunto é tecnologia da informação.

As análises em torno da temática mídias eletrônicas vêm sendo desenvolvidas


há bastante tempo, desde que ficou nítido o avanço constante dos mecanismos
de informação se discutem diversas formas para conseguir inserir tal tecnologia
a serviço da educação. É importante destacar que o projeto segue a linha de
raciocínio extensionista, então a divulgação torna-se uma ação fundamental, já
que visa levar para a sociedade pesquisas geridas no âmbito da universidade,
estreitando as relações entre ambos. A lógica da extensão guiada pela
universidade, é caracterizada por Marcelo Lamy [2018], da seguinte maneira:

Conjunto de práticas estruturantes da academia e da pedagogia institucional


que, associada ao ensino e a pesquisa, promove a interação dialógica entre a
instituição de ensino e outros setores da sociedade, com o objetivo de
transformar seus alunos (em cidadãos ancorados na responsabilidade social, na
solidariedade, na justiça, na democracia, no respeito aos direitos humanos; em
profissionais criativos e inovadores, capazes de conjugar olhares
interdisciplinares, de trabalhar em equipe e de atuar ativamente em uma
realidade sociocultural heterogênea, complexa e sujeita a frequentes mutações), 332
de superar os problemas sociais e de rever continuamente todas as práticas
institucionais. [LAMY APUD BARROS, 2018, p. 229]

Tendo em mente que a universidade é gerida, estruturada entre pesquisa, ensino


e extensão, temos na última citada um propósito importante a destacar, visto
que, promove atuações no ambiente social, com o objetivo de formar
profissionais melhores preparados através da prática, percebemos então o
ganho mútuo, tanto do encarregado do projeto que aprende atuando e buscando
soluções a problemáticas do cotidiano, quanto dos cidadãos inseridos nas áreas
de atuação. Justamente nesse sentido as redes ampliam o alcance das
atividades de extensão universitária, comtemplando mais pessoas.

Imagem 3: Interface da página “conhecendo meu bairro”


Print retirado no dia 15/02/2020

Visando propagar aquilo que vem sendo coletado de informações, o projeto tem
divulgado de maneira interativa através das redes sociais fatos importantes, isto
foi oportunizado com a criação de um perfil público no Instagram, escolhido
justamente por apresentar um fluxo constante de indivíduos registrados, algo
que evidentemente facilita para os ideais da pesquisa, de atingir a maior
quantidade de pessoas possível. Os seguidores são conduzidos ao auto
reconhecimento, uma vez que, compreendendo seu ambiente facilita o ensino
de questões como identidade, pertencimento e até podendo aproximar os
moradores locais da sua história. Outro fator importante é o fato dessa rede
social ser maioritariamente acessada pelo público jovem, ou seja aqueles que
normalmente não sabe que seu bairro tem uma “história”.
A imagem 3 mostra a interface da página criada, o designe foi pensado com o
intuito de chamar atenção da população para o objeto da pesquisa, algo que fica
nítido através da representatividade por trás do nome escolhido e as demais
informações iniciais, pois a seleção das próprias indicam familiaridade e ao
mesmo tempo despertam a curiosidade das pessoas, justamente o que
pretendemos causar no primeiro momento. Essa estética acaba sendo algo de 333
extrema importância, na medida que, através da “primeira impressão” teremos o
ganho ou não de seguidores. O historiador e administrador do blog digital Café
História, Bruno Leal, destaca em entrevista para a Revista História, Ciências,
Saúde – Manguinhos a seguinte questão:

Em geral, não há uma preocupação estética com esse tipo de material. E eu diria
que isso é essencial no trabalho de divulgação. Quando não consigo fazer esses
ajustes, peço para que a pessoa faça, se possível. É algo bem colaborativo.
Quando o material chega de novo, geralmente depois de passar por um
designer, a divulgação decola. Em vez de ter 15 curtidas, temos quinhentas, não
tem mais dois compartilhamentos, e sim quinhentos. Enfim, sempre tento
sensibilizar as pessoas para a importância da apresentação visual do conteúdo.
(BENCHIMOL, 2015, p. 4)

Nessa perspectiva, destaca-se também o conteúdo apresentado, pois na


modelagem final aquilo que prende a atenção dos navegadores são textos dentro
de uma linguagem simples em consonância com imagens representativas, algo
presenciado no “conhecendo meu bairro”; isto é notável nas imagens 4 e 5
abaixo, os seguidores da página tem contato com curiosidades, fatos
importantes, personagens representativos na formação e desenvolvimento do
lugar, tudo de forma digital.

Imagens 4 e 5
334

Print e Postagem, 15-10-2020

Haja vista que foi presenciado no decorrer das ações o forte “desinteresse” dos
jovens, algo relatado na narrativa dos próprios moradores, nesse sentido busca-
se enveredar por um meio bastante conhecido e muito utilizado pela “nova
geração”. Além disso, abrimos espaço para atuação do grande público, com
textos concernentes a realidade da população, então devemos perceber a
página não somente no viés unilateral, onde o discurso se origina apenas na
lógica do administrador/pesquisador e sim como um espaço democrático, pois
os seguidores podem dar opiniões e proporcionar um feedback importante
também para melhorias, algo sempre necessário. Os debates propostos através
das redes são reanalisados dentro da lógica de reflexão na ação, os erros fazem
parte e ajudam o administrador nas publicações seguintes, buscando sempre
gerar impacto nas ideologias que outrora rotulavam os bairros como “simples
lugares”, desta forma, criando novos saberes.

A tecnologia da informação nunca antes esteve tão acessível como nos dias
atuais. Conceitos como os de Manuel Castells de “sociedade em rede” chamam
atenção e pode endossar nossas discursões, pois as redes nesse caso
transcendem a ideia de apenas informar, ou seja, o alcance e a intencionalidade
final tornam-se diversas, uma vez que, dentro do ensino a informação guiada
pelo conhecimento transformam as pessoas em sujeitos pensantes e,
consequentemente, atuantes no meio social, proposta está novamente
relembrada, como sendo direcionada pela extensão universitária, mas podendo
ser utilizada por todos os campos da educação, na universidade e no seio
escolar. Cabe aos profissionais dessas áreas levarem mecanismos novos para
seus locais de trabalho, e o poder público estimular tal passo através de
especializações e capacitações.

De modo geral ainda percebe-se a pouca usabilidade dos meios digitais no


ensino de história, algo que fica mais evidente quando comparamos com outras
disciplinas, entretanto os indícios nos levam a indicar a maior frequência de
utilização dessa ferramenta, já que os “novos tempos” exigem tanto do
historiador como do professor de história, posturas diferentes no modo de fazer
pesquisa e ministrar as aulas, portanto comungando de tal ideia o campo das
redes sociais surgem como uma possibilidade de ensino importante, isto quando
são bem inseridas no âmbito educacional.

Considerações finais
Procurou-se no decorrer do texto abordar questões importantes relacionadas ao
ensino de história, neste caso especifico a história caxiense ganha notoriedade 335
através do entendimento dos bairros, como sendo lugares de memórias e
história. Foram apresentadas ações que vem sendo desenvolvidas pelo projeto
de pesquisa e extensão, isto dentro da localidade. Na medida que a população
ainda tem pouco conhecimento a respeito de seus espaços, entramos no
segundo momento debatido pelo texto, quando literalmente os bairros “ganham
as telas”, pois os trabalhos de extensão universitária destinam-se a atingir a
sociedade com intervenções, estreitando as relações entre a sociedade e a
academia. Ao passo que visualizamos tal questão, oportunizamos a criação da
página “conhecendo meu bairro”, onde os protagonistas são os próprios
residentes locais, demostrando que a história pode ser compreendida do micro
para ao macro e consequentemente os moradores estão a cada dia tendo o
sentimento de pertencimento e valorização renovados, quando enxergam seus
bairros com cores e vidas nas redes eletrônicas.

Referências
Ruan David Santos Almeida – É acadêmico do curso de Licenciatura em História
pela Universidade Estadual do Maranhão [UEMA], campus Caxias. Atua como
pesquisador-bolsista do programa institucional de bolsas de extensão-
PIBEX/UEMA. E-mail: ruandavid569@gmail.com. A pesquisa foi orientada pela
profa.
Dra. Mariangela Santana Guimarães Santos, que atualmente é professora
efetiva na Universidade Estadual do Maranhão [UEMA] e desenvolve pesquisas
nas áreas de Educação, História, Memória, Cidade e Patrimônio.

Referências
ALBERTI, Verena. Manual de história oral. 3.ed. Rio de Janeiro: Editora FGV,
2005, 236p. [Livro]

BARROS, Antônio Evaldo Almeida; BARBOSA, Viviane de Oliveira. Estudos


africanos e afro-brasileiros em perspectiva extensionista. Outros Tempos, vol.
15, n. 26, 2018, p. 225 - 244. [Artigo]

BENCHIMOL, Jaime et al. Divulgação científica, redes sociais e historiadores


engendrando novas histórias: entrevista com Bruno Leal. História, Ciências,
Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.22, n.3, jul.-set. 2015, p.1067- 1079.
[Entrevista]

BOSI, Ecléa. Cultura e desenraizamento. In: BOSI, Alfredo (Org.). Cultura


brasileira - temas e situações. São Paulo, Ática, 1987, p.16-41. [Capítulo de
Livro]
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. v.1. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1999. [Livro]

IBGE. Censo demográfico 2010. Características gerais da população, religião e


pessoas com deficiência. Brasília: IBGE, 2010. [Mapa da cidade]
336
SOUSA, Isaac Gonçalves; MENESES, Renato Lourenço de; VIANA, Jerônimo
Moreira (orgs.). Cartografias invisíveis: saberes e sentires de Caxias. Caxias:
academia caxiense de letras, 2015. [Livro]
A AUDIODESCRIÇÃO COMO PROPOSTA
DIDÁTICO-METODOLÓGICA NO ENSINO DE
HISTÓRIA PARA ALUNOS COM
337
DEFICIÊNCIA VISUAL NO CONTEXTO
EDUCACIONAL REMOTO
Sebastiana Valéria dos Santos Moraes

Introdução
Este texto está atrelado a uma pesquisa em andamento desenvolvida no âmbito
do Mestrado Profissional em História (ProfHistoria) da Universidade do Sul e
Sudeste do Pará (UNIFESSPA). O estudo tem como objetivo principal contribuir
para o debate historiográfico do ensino de História envolvendo as Tecnologias
Digitais na perspectiva da educação inclusiva e abrange um processo de
elaboração e desenvolvimento de uma proposta didática e pedagógica com
orientações metodológicas para o ensino de História em salas regulares do
Ensino Fundamental II. A inclusão certamente é um desafio social e educacional
em nosso país. É latente e urgente principalmente porque o debate acerca da
educação inclusiva em nosso país é notoriamente recente e durante séculos em
diferentes espaços geográficos as pessoas com deficiência foram invisibilizadas
e o capacitismo imperou (impera) a ponto de serem abandonadas e
exterminadas.

Nas últimas décadas o discurso de inclusão escolar tornou-se rotineiro,


assumindo um status de privilegio em cursos de especialização, jornadas
pedagógicas, formações continuadas e afins, o que não significa dizer que esse
status transformou a teoria em pratica de sucesso. Passado mais de vinte anos
da Declaração de Salamanca (1994) que instituiu os princípios, políticas e
práticas da educação especial, além da legislação vigente no Brasil como a
Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional
(LDBN), Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), decretos, portarias e
resoluções o que se percebe é um distanciamento entre a literatura, discurso e
pratica diária no “chão da escola”, dentro dos espaços educacionais. Não basta
só criar leis, decretos, declarações, pareceres etc., é preciso concretizar seus
objetos e metas para que a educação inclusiva seja uma realidade nítida e não
uma fotografia esmaecida.

É inegável que avanços aconteceram, principalmente a acessibilidade


arquitetônica, com a construção e reforma de instituições de ensino com rampas
de acesso, pavimentos táteis, portas mais largas, banheiros com assentos
diferenciados, salas multifuncionais e afins conquistas fomentadas e
asseguradas pela Lei 10.098, de 19/12/2000. Essas conquistas e avanços no
trato pedagógico no chão da escola, no dia a dia de sala de aula já se
apresentam menos vívidas. Saviani (2001) formula o conceito de que o professor
é um facilitador do ensino e da aprendizagem dos alunos e sendo ele esse
facilitador é necessário que sua prática seja constantemente revisada, avaliada
e aprimorada para que ele possa se adequar às mudanças e realidades do
tempo presente, por exemplo. Essa mesma constatação é apoiada pelos escritos 338
de Mantoan (2006) e Carvalho (2004) e para a efetivação de uma educação
inclusiva é fulcral que os docentes estejam em constante aperfeiçoamento.

Grande parte dos profissionais da educação demonstram e afirmam em rodas


de conversa possuir poucas habilidades ou nenhuma para o desenvolvimento de
um ensino transformador na vida dos alunos com deficiência e ainda assim
classificam suas instituições de ensino como inclusivas. E apesar das diversas
dificuldades apresentadas pouco se questiona os currículos, os métodos de
ensino e afins. Nas palavras de GLAT; BLANCO (2007):

“Embora as escolas privilegiem um discurso de aceitação à diversidade, na


prática não se modificam para dar conta das especificidades de aprendizagem e
desenvolvimento de todos os alunos, deixando aos profissionais e professores
dos serviços de apoio especializado, a responsabilidade pela resposta educativa
a ser dada àqueles que apresentam necessidades educativas especiais”. (GLAT;
BLANCO, 2007, p. 24).

No geral a pessoa com deficiência é um mero número nas salas de aulas


regulares. Oferecer acesso e não desenvolver um ensino que potencialize as
habilidades, conhecimentos e competências dos educandos de nada ou pouco
vale. Mas como desenvolver um ensino transformador para alunos com
deficiência visual (DV) inseridos em salas regulares no contexto educacional
remoto mediado por mídias? Como explicar conteúdo de história para deficientes
visuais? Qual ou quais metodologias usar?

A pessoa com deficiência visual, ensino de história e a educação inclusiva


A priori é importante saber quem é considerado deficiente visual (DV) no Brasil.
De acordo com o Decreto 3.298, de 20/12/1999, pessoa portadora de deficiência
é aquela que apresenta, em caráter permanente, perda ou anormalidade de uma
estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade
para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal. É
considerada pessoa com deficiência visual quando apresenta acuidade visual
igual ou menor que 20/200 no melhor olho, após a melhor correção, ou campo
visual inferior a 20º (tabela de Snellen), ou ocorrência simultânea de ambas as
situações (art. 3º, I e II, combinado com art. 4º, III). O deficiente visual pode ser
cego ou possuir baixa visão.

Segundo dados do censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e


Estatística (IBGE) de 2010, 18,6% da população brasileira possui algum tipo de
deficiência visual. Desse total, 6,5 milhões apresentam deficiência visual severa,
sendo que 506 mil têm perda total da visão (0,3% da população) e 6 milhões,
grande dificuldade para enxergar (3,2%), dessa totalidade o número de pessoas
com deficiência visual que estão em idade escolar e frequentam escolas
regulares é diminuto, cerca de apenas 0.8%.

No Brasil a década de 80 e os anos subsequentes apresentam-se como um


marco importante a respeito do ideário inclusivista com a fomentação de 339
cobranças sociais advindas de movimentos sociais e políticos nacionais e
internacionais. No âmbito político a bandeira salvacionista direcionava os
debates (Bezerra e Araújo, 2013) e a educação servia como bandeira neoliberal.
Sustentada nos princípios de equidade e em defesa de um mundo mais justo
onde as diferenças não sejam razão para que as pessoas deixem de usufruir de
seus direitos, a perspectiva atual de deficiência, avançou-se na efetividade de
algumas políticas e regulamentações legais que têm determinado o direito do
aluno com deficiência, transtorno do espectro autista e altas
habilidades/superdotação de aprenderem juntos com os demais alunos e
receberem os serviços em educação especial nas escolas regulares, em salas
de recursos multifuncional (BRASIL, 2008). Nesse contexto pró-inclusão, os
alunos com deficiência visual requerem um conjunto de serviços especializados,
recursos e tecnologias assistiva capazes de mediar o ensino na perspectiva
inclusiva. No ensino de História o trabalho pedagógico com alunos com
deficiência visual demanda um olhar atento e minucioso no que se refere à
transversalidade da educação especial.

Recentemente os profissionais da educação e a comunidade escolar em geral


foram aguilhoados para uma adaptação e inovação à sua rotina de trabalho e
estudo devido à pandemia do Covid-19. Muitos viviam suas vidas tranquilas e
suas rotinas seguiam o roteiro proposto, as aguas de março estavam prestes a
cair para fechar o verão e em muitas instituições de ensino o cronograma
apontava para o fechamento do primeiro bimestre de 2020 quando tudo mudou.
Aulas transmitidas via internet em tempo real, alunos estudando por
smartphones, tablet’s e notebooks? Coisa do futuro?!. Eis que o vislumbrado
para um futuro distante chegou e com o “futuro presente” ultrapassar e vencer
novos desafios tem sido a única opção. Novos debates, estudos e propostas
para o ensino de história estão no centro das discussões acadêmicas, assim
como tem acontecido na esteira da história da educação ao longo de sua
trajetória.

Segundo Bittencourt (2011) as décadas finais do século XX principalmente a


partir de 1980 foi palco de intensos debates, análises e pesquisas a respeito do
ensino de História, e o que era notório é que o que se convencionou a chamar
de história tradicional ainda era o principal meio de difusão do conhecimento
histórico nos estabelecimentos de ensino superior e espaços escolares de
ensino básico. Os grandes heróis e seus feitos, a busca pela construção de uma
identidade nacional espelhado ao que fizeram os franceses era o retrato do
ensino de história em nosso país, dentro ou fora das paredes da sala de aula.
Com todas as transformações ocorridas nas últimas décadas a Historiografia
tornou-se cada vez mais polissêmica e essa multiplicidade trouxe novos desafios
e campos de pesquisa para os profissionais da área, como por exemplo a
Historiografia ou História digital ainda que segundo Anita Lucchesi (2014) não
exista um consenso na historiografia sobre a definição de Historiografia ou
História Digital é indiscutível que este campo vinculado ao ciberespaço (espaço
de comunicação virtual) está presente em nosso dia a dia em todos os níveis de
educação em História e demais áreas. 340

O cenário atual nos incita a “ser tecnológicos” pois o nosso público, em sua
maioria, é formado por nativos digitais (termo criado pelo norte-americano Marc
Prensky) e até as ciências auxiliares do campo historiográfico ganhou novos
parceiros como por exemplo: a tecnologia da informação, com programadores
de bancos de dados, desenvolvedores de softwares, especialistas em websites.
Os diários são online, as tendências de gameficação do/no ensino são reais,
lecionamos de forma remota mediada por tecnologias, aplicamos testes, quizz e
até o principal exame de acesso ao ensino superior do Brasil, o Exame Nacional
do Ensino Médio – ENEM teve uma versão digital. Ser e fazer parte desse mundo
digital já não é uma escolha, é imprescindível.

A internet que surge em meio a disputas ideológicas entre Estados Unidos e a


extinta União Soviética no contexto da Guerra fria pelas mãos de cientistas norte-
americanos em 1967 se expandido em seu solo produtor para fins comerciais
por volta de 1987 chega ao Brasil comercialmente somente em 1995. No ano
seguinte em 20 de dezembro de 1996 era publicada e institucionalizada LEI No
9.394, a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN que em
seu corpo jurídico determina uma educação de qualidade em todos os
aspectos, sendo a educação um direito social indispensável, assegurado nos
arts. 6º e 205 da legislação suprema do Brasil.

Entretanto ao nos depararmos com a especificidade do ensino mediado por


tecnologias, e o ensino remoto implantado na maioria dos estados e municípios
brasileiros devido a pandemia do Covid-19 o que percebemos é uma ausência
de democratização do ensino, um certo despreparo de grande parte dos
profissionais da educação para lidar com mídias digitais e um quase total
esquecimento de grupos específicos como indígenas, comunidades periféricas
e ribeirinhas quilombolas e discentes da educação especial. Todavia esta
realidade de esquecidos e a existência de um ensino com pouca qualidade não
são exclusivos do atual contexto, infelizmente esse é um retrato envelhecido
afixado no memorial da educação brasileira.

O ensino mediado por mídias digitais no contexto educacional remoto e a


Audiodescrição como estratégia de ensino para alunos com deficiência
visual
As aulas remotas realizadas no contexto da pandemia do coronavírus são
atividades de ensino mediadas pela tecnologia ou não, na impossibilidade da
realização de aulas presenciais, mas que se orientam pelos princípios da
educação presencial. Na prática, o ensino remoto mediado por tecnologias é feito
por um professor que ministra aulas, sejam elas ao vivo ou gravadas, por meio
de videoconferência ou recurso similar seguindo o tempo de aula igual ou
próximo ao estipulado no modo presencial normal, em contra turno organiza
atividades a serem impressas para alunos que não possuem acesso a internet.
No geral acontecem atividades assíncronas (aquelas que não precisam de
conexão simultânea em tempo real) e síncronas (atividades em tempo real).
Porém a concentração, os recursos tecnológicos e pedagógicos para 341
desenvolver essas aulas tornam-se extremamente cansativos, rotineiros e por
vezes inviáveis. Nesse ponto concordamos com os estudos do neuroeducador
espanhol MORA (2013) que argumenta que a educação pode ser mais eficaz
reduzindo o tempo das aulas para que desta forma os alunos consigam manter
atenção. Autor de Neuroeducación. Solo se puede aprender aquello que se
ama (Neuroeducação. Só se pode aprender aquilo que se ama) também
desenvolve estudos que contemplam estratégias de ensino eficazes e afirma que
o professor deve sair da monotonia, aguçando a curiosidade de seus alunos com
perguntas norteadoras, frases chocantes entre outras estratégias.

É preciso aguçar a emoção do discente e com isso possibilitar o seu crescimento


pessoal, desenvolvendo suas potencialidades e autorrealização, como também
é proposto pela teoria humanista do historiador e psicólogo ROGERS (1985) e
em si tratando dos alunos com deficiência isso não é diferente, como postulava
VYGOTSKY (1997) ao defender e comprovar que a deficiência não é
impedimento para a aprendizagem. Em salas regulares, a audiodescrição para
alunos com deficiência visual, para além de estratégia de ensino e inclusão é
uma demonstração de respeito que certamente contribuirá para a inserção
efetiva do aluno DV e no contexto do ensino remoto é fundamental e necessário
para que a aprendizagem em seu sentindo mais amplo ocorra.

A audiodescrição é um recurso que traduz imagens em palavras, permitindo que


pessoas cegas ou com baixa visão consigam compreender conteúdos
audiovisuais ou imagens estáticas, como filmes, fotografias, peças de teatro,
entre outros e apesar de ser um recurso destinado ao aprendizado de pessoas
com deficiência visual ele contribui para o esclarecimento de outros grupos como
as pessoas com dislexia, deficiência intelectual e idosos por exemplo. Nas redes
sociais além da audiodescrição o uso de hashtags como #pracegover ou
#pratodosverem com descrições de imagens para tornar a internet mais
acessível é utilizado por perfis diversos como o de famosos, em Ig’s educativos
e comunidade geral do Instagram, por exemplo. A Audiodescrição é inclusive
uma profissão. O audiodescritor desde 2013 é registrada na CBO – Classificação
Brasileira de Ocupações do Ministério do Trabalho. De acordo com Motta (2010)
a audiodescrição:

“Transfere imagens da dimensão visual, por meio de informação verbal e sonora,


ampliando, desta forma, o entendimento e provendo o acesso à informação e à
cultura, possibilitam que pessoas com deficiência visual assistam a peças de
teatro, programas de TV, filmes, exposições e outros, em igualdade de condições
com as pessoas que enxergam, o que nos remete a ideia de acessibilidade
cultural. A audiodescrição assim, amplia o entendimento não só das pessoas
com deficiência visual, como também de pessoas com deficiência intelectual,
com dislexia e pessoas idosas”. (MOTTA; 2010, p 68)

O ensino de história desenvolvido por meio das Novas Tecnologias Digitais na


perspectiva da educação inclusiva demonstra-se como um desafio haja vista que
muitos profissionais da área não possuem formação especifica sobre o ensino 342
na perspectiva inclusiva, assim como sobre o uso das tecnologias digitais na
educação. Faltam orientações metodológicas, exemplos específicos e meios de
como desenvolver o ensino que contemple a todos como audiodescrição, que
contribui não apenas para a inclusão mais principalmente para a aprendizagem
de seus discentes não videntes e videntes. A educação de fato inclusiva é aquela
que acolhe o aluno em sua diferença, vendo sua diferença como uma
característica não incapacitante para seu potencial mas para que ela ocorra é
necessário contar com profissionais capacitados em suas múltiplas vertebras.
Ter profissionais da educação capacitados para a educação inclusiva talvez seja
um dos maiores desafios educacionais do novo milênio.

Considerações finais
O desafio da educação inclusiva e emancipadora está para além do “chão da
escola”, sobrevoa os muros institucionais de ensino e é preciso que a sociedade
desenvolva um olhar sensível, humano para o diferente. A educação deve ser
centrada na pessoa como postulou ROGERS (1985), pois ensinar é mais que
transmitir conhecimento, é despertar a curiosidade, é instigar o desejo de ir além
do conhecido. É contribuir para que o discente desenvolva a confiança em si
mesmo e essa segurança permita com que ele alcance novos voos, ocupe novos
espaços, ultrapasse limites impostos por ele ou pela sociedade que tende a
condenar pessoas com deficiência com um olhar e ações capacitistas. A
educação não deve ser centrada na falta. Muitos profissionais concentram suas
observações nas dificuldades e nas deficiências e acreditamos que ensino para
pessoas com deficiência visual no ensino fundamental II é inclusive facilitado
pois o discente já está alfabetizado e provavelmente mais independente do que
no estágio da educação infantil. Conforme Vygotsky (2011, p. 868):

“O importante é que a criança cega lê, assim como nós lemos, mas essa função
cultural é garantida por um aparato psicofisiológico completamente diferente do
nosso. [...] Dessa forma, o novo ponto de vista prescreve que se considere não
apenas as características negativas da criança, não só suas faltas, mas também
um retrato positivo de sua personalidade, o qual apresenta, antes de mais nada,
um quadro dos complexos caminhos indiretos do desenvolvimento”.

No modo de ensino remoto com aulas desenvolvidas através de plataformas


como Meet, Zoom, WhatsApp e outros meios digitais, dias letivos com carga
horaria regular e aulas normais de 45-50 minutos provavelmente se
apresentarão como cansativas e enfadonhas e por isso propomos amparar essa
construção de aulas com base nos estudos de MORA (2013) que postula o
desenvolvimento das atividades educacionais com um tempo menor e sempre
inovadoras com uma diversidade de estratégias que prendam a atenção dos
alunos a exemplo da audiodescrição que permite uma leitura e compreensão de
imagens e vídeos. Recursos constantemente utilizados nas aulas de história.

A conciliação do ensino de história ou de qualquer outra área do conhecimento


com as mídias digitais no contexto educacional remoto ou não é frutífero apesar
de muitos educadores possuírem dificuldades com as novas tecnologias, o que 343
é extremamente aceito sendo estes em sua maioria imigrantes digitais lidando
com nativos digitais usando aqui os temos de Marc Prensky (2001) e por vezes
estes desconhecerem as tecnologias assistivas como softwares e recursos
básicos como a audiodescrição aqui elencada como estratégia de ensino a ser
usada no ensino voltado para pessoas com deficiência visual.

Referências biográficas
Sebastiana Valéria dos Santos Moraes, mestranda no curso Mestrado
Profissional em Ensino de História (ProfHistoria) pela Universidade Federal do
Sul e Sudeste do Para- UNIFESSPA/Xinguara-PA

Referências bibliográficas
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______. Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei no 7.853,


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Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências<
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/dec3298.pdf> Acesso em: 20 fev. 2021.

______.IBGE. Censo Demográfico, 2010. Disponível em:<


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dezembro de 1996.

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O BRASIL COLÔNIA EM IMAGENS: USO DE
FERRAMENTAS DIGITAIS NA SALA DE AULA
Thiago Augusto dos Santos
345

O presente texto tem como objetivo discutir em que medida o uso de ferramentas
digitais, no caso documento compartilhado, contribuem para mobilizar a
aprendizagem histórica dos alunos. Para isso, busca-se apresentar uma
experiência pedagógica desenvolvida nas aulas de História em um colégio
estadual do município de Colorado/PR, em turmas do 2º ano do Ensino Médio,
durante o ano letivo de 2021.

Mobilizar a aprendizagem histórica sempre constituiu num desafio para os


professores de História. No entanto, tais desafios foram multiplicados diante do
cenário da pandemia do covid-19, pois houve mudanças substanciais no modo
de ensinar e aprender via aulas não presenciais, até mesmo da maneira de
manter contato com os alunos dentro das suas possibilidades de acesso e as
diferenças econômicas e sociais do público atendido pela escola pública.

Em relação ao Estado do Paraná, a rede estadual organizou o ano letivo citado


até o presente momento com aulas por meio da plataforma do Google Sala de
Aula e Google Meet seguindo a grade de horário do colégio. Além disso, a rede
estadual faz postagens de materiais e atividades na plataforma para serem
usados por professores e alunos de acordo com o currículo das disciplinas.

Na disciplina de História do 2º ano do Ensino Médio, o primeiro conjunto de


conteúdos postados envolvia o Brasil Colonial, da “chegada” dos portugueses à
expansão das fronteiras coloniais. No entanto, o material oferecido pela
Secretaria de Educação possui uma concepção um tanto tradicional da História,
além de atividades que priorizam a memorização de nomes e datas.

Diante disso, como professor decidi logo de início lançar questões aos alunos
problematizando os temas e conceitos presentes no material. Algo que chamou
muito minha atenção nesses materiais foi o uso de imagens sem as devidas
referências ou as mesmas por vezes incompletas, como por exemplo
imagens/quadros sem nomes dos pintores, contexto de produção, localização.

Conforme as pesquisadoras Schmidt e Cainelli (2010), numa concepção


tradicional do ensino de História as imagens, assim como outros documentos
históricos são utilizados como prova real do passado para legitimar o discurso
do professor, funcionando como um argumento de autoridade comprovando o
que se ensinava aos alunos. A partir da difusão de princípios e métodos da
pedagogia da escola nova, o uso do documento em sala de aula deixou de ser
pensado como um fim em si mesmo para tornar-se um ponto de partida para
indagações, responder a problematizações e propiciar um espaço de diálogo
entre professores e alunos, ancorado na perspectiva de retirar o aluno do papel
de receptor para o de atuante no processo de ensino-aprendizagem.

Considerando os materiais elaborados pela Secretaria de Educação, fica


evidente que uma concepção pedagógica não substitui a outra, sendo 346
perceptível a coexistência de várias delas no mesmo espaço educacional. Além
das mencionadas, é válido destacar também a concepção tecnicista, sucessora
da escola nova, na qual apresenta pressupostos da neutralidade científica,
racionalidade e produção como fim de minimizar influências subjetivas, para isso
coloca a ênfase do processo educativo nas máquinas e na tecnologia,
perspectiva que acabou ganhando mais evidência e sendo colocada à prova no
contexto atual da pandemia.

É importante salientar que os materiais didáticos muitas vezes apresentam


imagens com meras funções ilustrativas, figurativas sobre o fato histórico, ou
seja, sem problematizá-las. Nesse sentido, é imprescindível o papel do professor
à medida que este contribui para o diálogo entre o documento histórico, a
narrativa da história e o próprio aluno, contribuindo para a compreensão da
produção do conhecimento histórico.

“A utilização de documentos numa perspectiva pedagógica dialógica propicia o


desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem que tem como
pressupostos a pesquisa, o debate, a formação do espírito crítico e inventivo.
Isso implica dizer que professores e alunos podem estabelecer uma outra
relação com as fontes de saber histórico” (FONSECA, 2003, p. 217).

Desse modo, foi proposto às turmas que realizassem pesquisas de imagens


referentes ao Brasil Colônia, constando as referências delas, bem como
descrevê-las e compará-las à narrativa histórica sobre o fato retratado. Assim,
foi organizado um documento compartilhado de apresentações do Google
(slides) e liberado para edição de apenas alunos presentes na sala de aula virtual
do Google Sala de Aula. Para desenvolver a pesquisa, os alunos poderiam fazer
em grupos de até três pessoas, sendo sugerido devido ao contexto de pandemia,
o uso de ferramentas digitais para os possíveis grupos utilizarem (chamadas de
vídeo e o Google Meet). A fim de evitar a repetição de imagens e pesquisa no
documento compartilhado, foi organizado um espaço no “mural” da sala de aula
virtual para que cada aluno ou grupo comentasse o título da imagem escolhida
para pesquisar. Também foi sugerida o uso de imagens presentes no material
oferecido pela Secretaria de Educação.

Com relação a uma abordagem problematizadora de imagens como documento


no ensino de História de acordo com historiadora Leite (1993):

“É ilusório pensar-se que as imagens se comuniquem imediata e diretamente ao


observador, levando sempre a vantagem à palavra, pela imposição clara do
conteúdo explícito. Na maioria das vezes, ao contrário, se calam em segredo,
após a manifestação do mais obvio: por vezes, [...] em seu isolamento, se
retraem à comunicação, exigindo a contextualização, única via de acesso seguro
ao que possam significar” (LEITE, 1993, p. 12).

A utilização de imagem como documento histórico numa proposta de leitura e


pesquisa a partir dela desconsidera, portanto que as imagens falam por si só, 347
nesse sentido o historiador Paiva (2002) reforça:

“A imagem, bela, simulacro da realidade, não é a realidade histórica em si, mas


traz porções dela, traços, aspectos, símbolos, representações, dimensões
ocultas, perspectivas, induções, código, cores e formas nela cultivadas. Cabe a
nós decodificar os ícones, torná-los inteligíveis o mais que pudermos identificar,
seus filtros e, enfim, tomá-los como testemunhos que subsidiam a nossa versão
do passado e do presente, ela também, plena de filtros contemporâneos, de
vazios e de intencionalidades” (PAIVA, 2002, p. 18-19).

Assim, compreender o significado das imagens, exige do seu observador o


conhecimento dos elementos que a compõe. Nesse aspecto, encontra-se o
papel da escola e do ensino como meio de contribuir para a educação do olhar
dos estudantes, cidadãos para que estes aprendam a problematizar e
contextualizar as imagens que os são apresentadas ou aquelas que os mesmos
fazem contato ao longo de suas vivências. Ou seja, a escola deve contribuir para
a educação do olhar, muitas vezes as imagens apresentadas passam pela vida
do indivíduo, mas ele não consegue entender e extrair os seus sentidos de
acordo com a realidade na relação tempo e espaço permeado pela história e
memórias construídas e reproduzidas sobre o passado ou até mesmo de
passados sobrepostos e passados que se cruzam. “Fazer os alunos refletirem
sobre as imagens que lhes são postas diante dos olhos é uma das tarefas
urgentes da escola e cabe ao professor criar oportunidades, em todas as
circunstâncias” (BITTENCOURT, 2004, p. 89).

É necessário ponderar que nem todos os alunos possuem as ferramentas


tecnológicas adequadas para edição de textos, a maioria deles utilizam
aparelhos de celular para realização das aulas e tarefas, porém muitos tem uma
capacidade de memória limitada que dificulta a execução de alguns aplicativos,
além daqueles que necessitam compartilhar o mesmo aparelho com irmãos ou
responsáveis. Pensando nessas questões, foi sugerida a realização em grupos
virtuais para que uns ajudassem os outros, além da possibilidade de realizar o
trabalho por meio de documento do word, no qual os próprios alunos afirmaram
ter maior familiaridade de uso dessa ferramenta no aparelho celular, ou também
a realização da pesquisa e o envio desta por meio da caixa de texto do e-mail.
Dessa forma, foi possibilitado diversas maneiras de se realizar a pesquisa sendo
que a partir do acesso à internet o aluno conseguiria realizar atividade proposta.

Em relação a fazer trabalho em grupos no contexto de pandemia, vários alunos


afirmaram que utilizaram aplicativos de videochamada durante a atividade. Cito
o relato da aluna E. M. “Tive uma experiência muito boa com esse trabalho,
entendi que mesmo longe é possível trabalhar em grupo, que não importa a
distância sempre podemos estar juntos. O nosso grupo utilizou o Meet para fazer
o trabalho. Todos os dias depois das seis horas a gente se unia e fazia as leituras
em sites, íamos tirando partes importantes e colocando em tópicos. É claro que
a gente perdia um pouco o foco porque alguma de nós fazia uma gracinha. Mas
eu gostei muito de fazer esse trabalho em grupo.” 348

Para a execução do trabalho foi estipulado o prazo de três semanas, e durante


as aulas desse período sempre foi reservado um momento para que os alunos
compartilhassem as suas dúvidas, ou mesmo fossem sugeridos alguns ajustes
nos trabalhos realizados até então, de modo que o professor cumpria a função
de orientador do trabalho.

Desse modo, o trabalho visava estimular os alunos a questionarem o documento


histórico relacionado ao Brasil colonial escolhido livremente por eles. As
primeiras indagações propostas voltavam-se para a coleta dos dados externos
(quem produziu, quando produziu, sobre o que produziu e onde se encontra) e,
em seguida buscarem a interpretação da imagem.

Em relação, à educação do olhar e a possibilidade de aquisição de novos


conhecimentos, no desenvolvimento desta pesquisa a aluna I. R. descreve que:
“Fazer esse trabalho foi uma experiência muito agradável, com muitos
conhecimentos adquiridos. Descobri que por trás de um quadro tem muita
história, e com toda certeza olharei com outros olhos as próximas pinturas que
eu ver. No meu trabalho ‘Primeira Missa no Brasil’, de Victor Meirelles, percebi
que por trás de um quadro podem existir intensões, como a de mostrar o passado
de uma forma diferente, em uma forma de criar uma outra memória sobre o que
de fato aconteceu, achei isso muito interessante. No caso da obra citada, mostrar
a tentativa de catequização dos indígenas por parte dos portugueses como se
tivesse sido pacífica. Gostei muito do trabalho, principalmente da proposta de
editar os slides, que infelizmente não pude participar por problemas técnicos,
mas também gostei do fato de todos os trabalhos ficarem disponíveis num
mesmo documento, assim podendo ver o trabalho de meus colegas”.

Nota-se que a aluna menciona a mudança de olhar para com as pinturas,


quadros, imagens, além dificuldades, “problemas técnicos” que, por sua vez, não
impediu de realizar o trabalho, bem como particularidade do documento
compartilhado, no qual permite a construção coletiva e até simultânea do
trabalho. Em relação à imagem utilizada por ela trata-se de uma das imagens
que representam a “fundação do Brasil”, portanto faz parte da história pública,
da memória coletiva que é reproduzida em diversos momentos, sendo definidas
como imagens canônicas.

“[...] ícones canônicos, seriam aquelas imagens-padrão ligadas a conceitos-


chave de nossa vida social e intelectual. Tais imagens constituem pontos de
referência inconscientes sendo, portanto, decisivas em seus efeitos subliminares
de identificação coletiva. São imagens de tal forma incorporadas em nosso
imaginário coletivo que as identificamos rapidamente. Todos nós lidamos, a todo
momento, com imagens canônicas” (SALIBA, 1999, p. 437).

Em outras palavras, as imagens canônicas são utilizadas para a consolidação


da memória social e nesse processo os filtros dessa memória têm alguns
aspectos ressaltados e outros invisibilizados, sendo percebidos por meio de uma 349
leitura crítica delas e que deveras vezes não são estimuladas para evitar os
questionamentos referentes à formação da história nacional. Nesse percurso de
análise ocorre o aprendizado como lembra a aluna A. V.: “Fazer o trabalho foi
bem interessante, é uma forma diferente de aprender, porque toda vez que
pesquisamos algo acabamos aprendendo no caminho. Claro houveram algumas
dificuldades para achar algumas informações, até porque infelizmente nem tudo
que está na internet está correto. Mas no geral foi uma experiência nova e
interessante, fez com que saíssemos da nossa zona de conforto e
aprendêssemos de uma forma diferente e mais independente.”

Outro aspecto importante mencionado pela aluna A. V. é o de se preocupar com


as informações encontradas na internet. Alguns alunos indicaram encontrar
dados divergentes em diferentes sites. Um exemplo que ocorreu em mais de
uma turma foi em relação à datação do quadro: “Desembarque de Pedro Álvares
Cabral em Porto Seguro, 1500” de Oscar Pereira da Silva, no qual em alguns
sites e livros encontram com data de 1922 e outros com data de 1900, nesse
caso a pesquisa envolvia confrontar os dados e nesse caso como um quadro
notório e localizado no Museu Paulista da USP, no site do Museu encontrava a
informação correta, 1900 no contexto de celebrações do 4º centenário do
descobrimento do Brasil. Nesse sentido, foi reforçada a importância das
referências e de citá-las dentro de uma pesquisa, além de buscarem a relação
entre o contexto de produção e o contexto retratado na imagem.

Dessa forma, durante as aulas que antecederam a entrega por escrito do


trabalho, os alunos poderiam tirar dúvidas sobre a realização do mesmo e o
professor fazer alguns apontamentos sobre aspectos que poderiam ser
melhorados ou faltavam nos trabalhos, ou seja, o professor atuava como um
orientador e receptor dos trabalhos, principalmente daqueles que não
conseguiram editar o documento compartilhado para incluí-los num arquivo
único compartilhado com toda a turma. O momento final do trabalho consistiu na
apresentação de cada aluno ou grupo do resultado de suas pesquisas durante a
aula via plataforma do Google Meet com data previamente estabelecida a partir
sala de aula invertida como metodologia.

“Nessa abordagem, tanto professor quanto estudante devem mudar de postura.


O estudante deixa de ser um expectador e passa a atuar ativamente, tornando-
se o protagonista do seu aprendizado. Já o professor sai do palco, deixa de atuar
como palestrante e se posiciona próximo ao aluno, auxiliando-o no processo de
orientador e tutor” (SCHENEIDERS, 2018, p. 7-8).
Dessa maneira, extraclasse, os alunos realizavam a pesquisa, adquiriam
conhecimento, que por fim seria compartilhado com os colegas de turma após
encerrar o prazo de entrega da parte escrita do trabalho. Nas aulas, além do
conteúdo programado os alunos poderiam interagir com o professor para sanar
dúvidas eventuais. Por conseguinte:
350
“[...] observa-se que os métodos tradicionais, em especial na educação básica
ocorrem por meio da explanação dos conteúdos, precedida dos temas de casa,
enquanto que na sala de aula invertida esse processo inverte-se no sentido de
que o/a aluno/a se apropria do conteúdo em casa e nos momentos de aula
realiza trabalhos pertinentes ao preparo feito em casa, cabendo ao professor/a
fazer retomadas pontuais das dúvidas dos/as alunos/as” (PEREIRA; SILVA,
2018, p. 68).

Assim, foram descritos o contexto e as etapas do trabalho que permitiram


analisar imagens relacionadas ao Brasil Colonial com alunos do 2º ano do Ensino
Médio. As imagens mais escolhidas pelos alunos foram as relacionadas à
fundação da nação e da memória nacional, mas também apareceram quadros
de Debret, Rugendas, Frans Post, sendo possível ao final das apresentações
comparar quadros de diferentes artistas sobre um mesmo fato, mas em época
de produção diferente. Por fim, foi solicitado aos alunos que relatassem por meio
de uma questão do Google Formulário como foi a realização do trabalho, quais
as dificuldades, impressões, a qual possibilitou selecionar algumas para a
composição deste texto.

Na fala dos alunos foram unânimes em dizer que gostaram da experiência.


Alguns afirmaram que no início não entenderam, mas que durante a realização
foi ficando mais claro e fácil de entender. As dificuldades tecnológicas,
principalmente em editar o documento compartilhado pelo celular e o uso dos
meios digitais para fazer trabalho em grupo também foram muito citados pelos
alunos.

Para o aluno D. S. a experiência foi “Muito interessante, além de eu ter


descoberto esse site de slides do próprio Google, aprendi a fazer a leitura de
imagens e entender o que se passa nela.” Ou seja, demonstra que muitos alunos
e pode-se afirmar também que professores desconhecem o uso das ferramentas
digitais para o processo de aprendizagem.

Sobre essa maneira de aprendizado o aluno F. C. realizou a seguinte


observação: “Eu fiz o trabalho em grupo, foi uma experiência muito legal pois eu
podia ter uma interação com meus amigos (digitalmente). Gostei muito e também
aprendi bastante, pois tive que ter atenção para absorver o necessário do
conteúdo para a realização do trabalho, assim como meu colega. Com a
apresentação do trabalho dos outros grupos também consegui compreender
muito bem a essência do conteúdo.”
E a aluna K. M. relata que “Eu fiz o trabalho sozinha e achei super interessante
de ter que trabalhar com slides, foi uma experiência legal e inovadora, além de
despertar a curiosidade em aprender mais sobre a história por trás dos quadros
e pinturas, tive uma visão ampla sobre a história”.

Diante do exposto, pode-se concluir sobre a importância do uso de ferramentas 351


digitais e metodologias ativas no ensino de História como pontos consideráveis
para mobilização e envolvimento dos alunos na aprendizagem histórica. Além
disso, por meio deste texto, observa-se que tal experiência não se restringe a
uma determinada série ou conteúdo, pois o ponto de partida desse trabalho foi
a problematização de imagens. Por fim, espera-se que este texto contribua para
professores de História e sua prática docente no diálogo entre documentos e a
historiografia.

Referências
Me. Thiago Augusto dos Santos, professor de História da rede estadual de
educação do Paraná

Referências bibliográficas
BITTENCOURT, Circe Maria. Livros didáticos entre textos e imagens. In: ______
(org.). O saber histórico em sala de aula. 9. ed. São Paulo: Contexto, 2004.

FONSECA, Selva Guimarães. Didática e prática de ensino de história:


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LEITE, Miriam Moreira. Retratos de família: leitura da fotografia histórica. São


Paulo: Edusp,1993.

PAIVA, Eduardo França. História e Imagens. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

PEREIRA, Zeni Terezinha Gonçalves; SILVA, Denise Quaresma da Silva.


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SALIBA, Elias Thomé. As imagens canônicas e o ensino de história. In: ANAIS


DO 3° ENCONTRO PERSPECTIVA DO ENSINO DE HISTÓRIA. 1999. Curitiba:
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SCHNEIDERS, Luís Antonio. O método da sala de aula invertida (flipped


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COMUNIDADES AFETIVAS EM TORNO DO
ARTISTA TEIXEIRINHA E O ESPAÇO
DIGITAL COMO POSSIBILIDADE DE FONTE
352
HISTÓRICA
Vitória Duarte Wingert e Jander Fernandes
Martins

A presente pesquisa se origina da dissertação de mestrado intitulada “Nas telas


de cinema nasce a lenda: construção sócio histórica e lendária de Teixeirinha no
filme coração de luto”. Que buscou investigar o que levou o individuo histórico
Vitor Mateus Teixeira tornar-se o personagem lendário Teixeirinha, figura
constantemente evocada, principalmente dentro da cultura gaúcha do Rio
Grande do Sul. Ao percorrer os caminhos da investigação ficou evidente que a
linguagem áudio visual, não apenas propagou Teixeirinha para toda uma
geração, como continua sendo a principal responsável pela continuação da
repetição de seus feitos lendários. Ademais, foi observado que
contemporaneamente a comunidade afetiva do artista, reúne-se no cyber
espaço, através da rede social Facebook, não apenas divulgando materiais
relacionados a Teixeirinha, mas também atuando como guardiã de sua memória,
tornado suas fan pages ricos campos de analises e fonte histórica.

“Sou da geração mais nova; poeta bem macho e guapo, nas minhas veias
escorre o sangue herói de farrapo”, construindo um herói para o povo.
Vitor Mateus começou a despontar no cenário cultural brasileiro no ano de 1960,
quando lançou o disco: Gaúcho Coração do Rio Grande, pela gravadora
Chantecler. A música de sucesso estava no lado B do compacto, tratava-se da
canção autobiográfica Coração de Luto, a qual narra a infância pobre de Vitor
Mateus Teixeira, na figura do personagem Teixeirinha, marcado pela dor e
sofrimento após a morte de sua mãe. A canção se popularizou pelo Brasil e
exterior, sendo um fenômeno de vendas, recebendo inclusive, o título de Rei do
disco.

A partir de Coração de Luto, Vitor Mateus Teixeira passou a ser reconhecido


nacionalmente como Teixerinha. Gravou 49 discos inéditos, somando mais de
70, incluindo regravações, gravou mais de 758 músicas de sua autoria, deixando
um acervo superior a 1.200 composições, incluindo algumas inéditas. Deste
modo, não bastasse todo o sucesso na área musical, no ano de 1966 o artista e
músico estrelou seu filme biográfico, Coração de Luto, no qual ele mesmo
interpreta o personagem Teixeirinha cantado nos versos. O filme se tornou
recorde de bilheteria, assim como a música de mesmo título lançada anos antes.
Dentro da construção lendária e histórica do personagem Teixeirinha precisamos
levar em consideração outros atores de suma importância neste enredo: o povo.
Pois um herói ou uma história mítica cairá no esquecimento não fosse o povo,
que conta, reconta, revive e relembra a saga de seu personagem lendário. Eliade
(1992, p.44) afirma que, “[...] a memória popular devolve ao personagem
histórico dos tempos modernos o seu significado como imitador do arquétipo, 353
além de reprodutor dos gestos arquétipos”.

O arquétipo a que o autor se refere, é a figura do herói lendário, o qual o


personagem Teixeirinha se enquadra muito bem, como observamos no decorrer
desta pesquisa. Vitor Mateus, no filme Coração de Luto, conseguiu mitificar de
maneira prosaica, alguns acontecimentos de sua trajetória pessoal, de tal modo
que, para seu público a verdade histórica pouco importa, pois era o personagem
que Letra da música Querência Amada (1975) contava a história, familiar a
muitos. “Além do mais, não seria o mito ainda mais verdadeiro por permitir que
a história real adquirisse um significado mais rico e profundo revelando um
destino trágico?” (ELIADE, 1992, p. 46)

Além dos filmes, Vitor utilizou a letra de suas canções para refirmar seu lugar de
figura lendária dentro do panteão do Rio Grande do Sul, ele mesmo afirma que
“nas minhas veias escorre o sangue herói de farrapo” (Querência amada, 1975),
fazendo alusão a um dos arquétipos masculinos mais fortes dentro do imaginário
gaúcho, a do soldado farroupilha que lutou contra a tirania do império. O
personagem Teixeirinha em vários aspectos representa este herói para o povo,
o órfão, da terra, que desbrava os perigos do desconhecido, provindos do
urbano, tal como fizeram heróis mais antigos, em outras circunstâncias.
Campbell, afirma que este é o papel do herói, desbravar o desconhecido e limpar
o terreno: “O período em que o herói, numa forma humana, habita o mundo só
se inicia depois que as vilas e cidades se expandem pela terra. Muitos monstros,
remanescentes das épocas primevas, ainda habitam as regiões que estão além
e, por meio da malícia ou do desespero[...] Cumpre tirá-los do caminho”.
(CAMPBELL,1949, p.174)

É no contexto destas relações sociais que construímos as nossas lembranças.


Halbwachs (2006) relaciona a memória com a participação em um determinado
grupo social do qual ele denomina de comunidade afetiva. A cerca deste caráter
social da memória, podemos pensar o quanto dependemos de nosso coletivo
para ressignificarmos nossa história, que por sua vez, está impregnada das
memórias dos que nos cercam. Nossas lembranças se alimentam das diversas
memórias oferecidas pelo grupo e assim, vão surgindo as comunidades afetivas.
E, dificilmente, lembramos-nos de algo fora do nosso grupo de referências.

A comunidade afetiva de Teixeirinha


Compreendendo todo o imaginário, as relações sócio-históricas e de memória
coletiva em torno da figura da persona Teixeirinha, suscitou-me a curiosidade
em saber se ainda existia alguma comunidade afetiva, ativa, em torno deste
personagem, passados mais de cinquenta anos do lançamento de Coração de
Luto. Qual não foi minha surpresa ao descobrir que existem diversas Fan Pages
e Grupos de Discussão, dedicados ao artista no Facebook. Ao falar sobre
Teixeirinha na contemporaneidade, evocamos as mais diversas memórias
coletivas dos mais diversos grupos sociais. Teixeirinha ainda se faz presente
através do imaginário e memória afetiva de fãs. Suas músicas, filmes e histórias
passaram de pai para filho, de avô para neto. 354

Para a realização desta pesquisa, sobre como os fãs de Teixeirinha se conectam


na atualidade, optei por realizar a netnografia, que se trata de: O neologismo
“etnografia” (nethnography = net + ethnography) foi originalmente cunhado por
um grupo de pesquisadores/as norte americanos/as, Bishop, Star, Neumann,
Ignacio, Sandusky & Schatz, em 1995, para descrever um desafio metodológico:
preservar os detalhes ricos da observação em campo etnográfico usando o meio
eletrônico para “seguir os atores” (BRAGA, 2001, p. 05)

A netnografia, também é conhecida como a etnografia digital. Dentro de minha


pesquisa ela foi fundamental, uma vez que ela me permitiu a submersão neste
universo dos fãs de Teixeirinha. Pois me proporcionou vivenciar o que, os fãs
relembram do ídolo, que tipo de memórias evocavam e quais os feitos lendários
ainda rememoram na atualidade. Embora o termo netnografia tenha sido
cunhado na década de 80, potencializa-se cada vez mais em nosso contexto
digital e globalizado. Cada vez mais as pessoas criam comunidades no
ciberespaço, onde podem interagir de maneira online, a partir de grupos de
interesse. O Ciberespaço, acordo com Lévy (2000, p.13) [...] é o terreno onde
está funcionando a humanidade hoje. É um novo espaço de interação humana
que já tem uma importância profunda principalmente no plano econômico e
científico, e, certamente, esta importância vai ampliar-se e estender-se a vários
outros campos.

E neste espaço virtual, tanto os nativos digitais quanto os migrantes digitais,


interagem e se comunicam de maneira online através da rede mundial de
computadores. (PRENSCKY, 2001). Compreendendo a cultura e a cibercultura,
como um campo dinâmico de construção e reconstrução de significados, a partir
de seus atores sociais, considero que dentro destas fan pages, ocorram ritos de
sociabilização e compartilhamento entre seus membros. Da Matta (1977),
considera que os rituais dizem tanto quanto as relações sociais, pois apontam
valores que são construídos e partilhados.

Percebi, através da interação com as comunidades de Teixeirinha no Facebook,


que estas também possuem seus símbolos, valores e ritos, os quais são
construídos e compartilhados, dentro deste ciberespaço. Dentro deste ethos da
comunidade online, é perceptível, o quanto estes membros, estão engajados em
divulgar e compartilhar, fotos, vídeos, músicas e memes que auxiliam neste
processo de evocação da memória coletiva em torno da persona Teixeirinha.
Percebo também, que o campo de interatividade do Facebook, é um território
onde o poder e os embates de interesses atuam, constantemente. Em algumas
comunidades, os participantes só podem fazer postagens que sejam autorizadas
pelo dono na fan page. Este status de aprovação legítima a postagem do
“verdadeiro fã”, em contraponto com aquele que viria fazer uma crítica ou postar
um conteúdo considerado não relevante. Os embates também ocorrem em
relação a outros fãs clubes que sobrepõe seu ídolo, a Teixeirinha, ou o criticam
de alguma forma.
355
No dia 27 de março de 2018, resolvi criar uma conta no Facebook, para através
dela ter contato com fãs de Teixeirinha e observar se existem as chamadas Fan
Pages dedicadas ao artista. Qual não foi a minha surpresa ao descobrir que
existem dez páginas dedicadas ao artista, onde são compartilhadas fotos,
vídeos, música, reportagens e tudo que se relaciona ao universo musical e
fílmico.

As comunidades são as seguintes, por ordem de popularidade: • Teixeirinha com


16.000 curtidas • Teixeirinha Cantor e compositor com 11.822 curtidas 55 •
Teixeirinha Cantor e compositor com 8.200 curtidas • Fundação Teixeirinha com
7.300 curtidas • Eterno Teixeirinha com 4.100 curtidas • Fãs de Teixeirinha com
2.100 curtidas • Teixeirinha para sempre com 1.700 • Teixeirinha com 278
curtidas • Teixeirinha o gaúcho de Passo Fundo com 127 curtidas • Teixeirinha
o Rei do Disco com 27 curtidas.

Pelo número de curtidas das páginas percebemos que algumas foram recém-
criadas e ainda estão à procura de fãs para compartilharem conteúdos e
exaltarem seu ídolo. Através de alguns comentários postados nas páginas
podemos observar como as pessoas ainda se identificam e veneram o cantor.
Um dos muitos pseudônimos pelos os quais o artista era conhecido, era de Rei
do Disco. Desta forma muitos fãs se referem a ele como Rei. Em um dos
comentários, vemos o fã proclamando o lugar de realeza que o artista merece,
em sua opinião, “nunca existirá outro para ocupar seu trono de rei em nossa
música popular brasileira”. Em outro comentário, um fã põe em dúvida o título de
Rei, que Roberto Carlos possui, “Pra mim o rei não foi o Roberto Carlos, foi o
Vitor Mateus Teixeira o verdadeiro rei da música Brasileira, eterno em nossos
corações, grande Teixeirinha”. Na disputa pelo trono da música popular
brasileira, quem é o verdadeiro monarca? Não tenho dúvida, que quando se trata
dos fãs de Teixeirinha, era seu ídolo que deveria estar com status de majestade.
Percebo também, através dos comentários, que Teixeirinha não morreu! O
artista é eterno na memória de quem recorda através dos ritos de socialização
na fan page.

Através do Facebook, entrei em contato com algumas das comunidades para


saber um pouco mais sobre quem as administra e o que as motivou a criar a
comunidade. A página com quem mais tive contato e respondeu as mensagens
que enviei foi Eterno Teixeirinha, administrada por Paulo Moura. Quando iniciei
a conversa com o Paulo, pensei que se tratava se um senhor de idade, porém
descobri que ele é um jovem de 22 anos. Questionei como ele se tornou fã do
Teixeirinha e ele me enviou alguns áudios pelo Whatsapp, onde ele conta sua
história.
Paulo mora na cidade de Rio Pardo-RS, onde Vitor Mateus, também fixou
residência na época em que trabalhava no DAER, como operador de máquina.
Na época já fazia pequenas apresentações na cidade e nas redondezas. A casa
em que o artista morou, nesta época, fica ao lado da residência do Paulo, por
isso ele cresceu ouvindo que aquele já tinha sido o bairro do Teixeirinha. 356
Posteriormente Vitor se mudou para Passo Fundo e após fazer sucesso com a
música Coração de Luto, comprou sua casa no bairro Glória em Porto Alegre-
RS, que para o Paulo, é a casa mais linda da cidade.

O administrador de Eterno Teixeirinha, resolveu então pesquisar mais sobre seu


vizinho celebridade, que foi para Porto Alegre conhecer a Fundação Teixeirinha,
conheceu uma das filhas do cantor, passou em frente à casa no bairro Glória e
diariamente pública na fan page, tributos ao artista. Sua admiração por
Teixeirinha se deu em função de: “ele nunca esqueceu suas raízes, mesmo
tendo muito dinheiro nunca perdeu a humildade”. Como Paulo demonstrou
grande receptividade pela minha pesquisa, pedi que ele colocasse um pedido
em sua página, para que os fãs de Teixeirinha me enviassem fotos de itens ou
relatassem memorias que ainda tem de seu astro. A primeira foto que recebi foi
de Leandro Machado e sua coleção de Lp’s do Teixerinha. Segundo ele, esta
coleção começou com seu avô, posteriormente foi passada para seu pai e hoje
pertence a ele.

Outro depoimento que recebi, o qual me deixou bastante impressionada, em


primeiro lugar, pela memória relatada e como ela foi guardada com tanto carinho,
e em segundo lugar, pela disponibilidade do fã, de ter ido a um local realizar uma
filmagem e fotografias para me enviar, foi a de Raimundo Alberton, que me
escreveu o seguinte relato, seguido de um vídeo:

“Aqui um pouquinho da história ocorrida em Grão Pará-SC. Neste Salão que hoje
pertence a Agro-Pecuária Nutri Meurer, lá pelos Anos de 1967 teve um Bailão
em cima desse escritório, hoje bastante modificado, onde foi improvisado um
palco onde Teixeirinha e Mari Terezinha, na época se apresentaram, e fizeram
um Grande show. Eu vim de bicicleta da Invernada só para ver de perto
Teixeirinha e a Mari e assistir o show. Sempre que passo na frente desse Salão
Lembro do Teixeirinha e de como me criei na roça. Hoje com a permissão de um
dos proprietários e do Gerente Valmir Meurer Orbem, resolvi registrar! Pra mim
ficou a Lembrança e a saudade”.

Além do vídeo, o senhor Raimundo enviou uma fotografia de Teixeirinha e Mary


Terezinha e o seguinte relato:

“Essa foto foi tirada no mesmo dia do show, comprei logo após o show de um
fotografo daqui da cidade que fez. Essa foto tenho ela guardada a sete chaves
pois Teixeirinha marcou muito minha vida desde de guri acho que lá pelos anos
60 as primeiras músicas acho que foi briga no batizado. Aprendi muito com suas
músicas com a história de sua vida fui caminhoneiro por muitos anos Teixeirinha
foi meu companheiro em muitas noites de estradas me ajudava com suas
músicas, pelo Rádio ou pelo toca fita, a ficar acordado”.

A sociabilidade é uma importante ferramenta da interação social, desde os


primórdios da humanidade, diferentes grupos convivem mutuamente, auxiliando-
se ou disputando territórios. Percebemos que algumas relações dentro das 357
páginas do Facebook, transformam estas comunidades em comunidades
afetivas. Pois através da afetividade e memória compartilhada que possuem dos
objetos de seu ídolo, criaram uma mobilização em rede, para recuperar um bem,
que ficará com a família do artista.

Outra notícia que repercutiu muito dentro das fan pages, foi o ocorrido no mês
de fevereiro desde ano, onde um ouvinte da Rádio CS/FM Canoas-RS, pede
uma música de Teixerinha, e o diretor do programa, responde, ao vivo, que não
vai ressuscitar este tipo de música porque se não cai a audiência, que este tipo
de música só se escuta em Passo Fundo. A repercussão, negativa, deste
ocorrido foi tão grande, que mobilizou um vereador de Passo Fundo-RS a enviar
uma moção de repúdio à Assembleia Legislativa do Estado, bem como ao
Sindicato da Empresas de Rádio e Televisão no Estado do Rio Grande do Sul.

Outra movimentação que pude acompanhar pelas fan pages, foram relacionadas
ao Dia de Finados (02/11), onde vários grupos estavam se mobilizando para irem
até o túmulo de Vitor Mateus Teixeira, na cidade de Porto Alegre. Seria a morte
o esquecimento para o herói? Sem dúvida não! O último ato da biografia do herói
é a morte ou partida. Aqui é resumido todo o sentido da vida. Desnecessário
dizer, “o herói não seria herói se a morte lhe suscitasse algum terror; a primeira
condição do heroísmo é a reconciliação com o túmulo”. (CAMPBELL, 1949, p.
181) A morte da figura lendária, não significa seu esquecimento, pelo contrário,
é o desfecho de sua jornada que continuará a ser rememorada através dos ritos
de socialização de morte.

Durante esta pesquisa, descobri o local de sepultamento de Teixerinha, como


sendo um local de peregrinação, encontro e socialização entre os fãs, que vão
anualmente prestar suas homenagens. Para Campbell (1949, p. 180):

“As rememorações em torno do herói falecido são fundamentais para a


manutenção do mito: Estando além da vida, esses heróis também se acham
além do mito. Eles já não tratam do mito, da mesma forma que o mito não pode
tratar deles de modo adequado. Suas lendas são reapresentadas, mas os
piedosos sentimentos e lições das biografias são necessariamente impróprios,
pouco melhores que banalizações. Eles ultrapassaram o reino das formas, no
qual desce a encarnação e no qual permanece o Bodisativa, o reino do perfil
manifesto da Grande Face. Uma vez descoberto o perfil oculto, o mito é a
penúltima, e o silêncio a última, palavra. O momento do espírito passa para o
oculto e resta apenas o silêncio”.
Percebi, através das redes sociais, que os fãs estavam se organizando para irem
até o tumulo de Vitor/Teixeirinha, no Dia de Finados (02/11) a fim de prestarem
suas homenagens e rememorando assim seus feitos lendários. Seguindo a
movimentação proposta pelo meu grupo pesquisado, sai do online para o off-
line, e me desloquei para o túmulo, a fim de acompanhar os processos de
socialização e reforço da memória coletiva, que esta comunidade afetiva realiza. 358

Considerações Finais
A construção da narrativa de Teixeirinha a partir da obra fílmica Coração de Luto,
muito mais que evocar discursos presentes no imaginário da população,
rememorou os cenários iconográficos tão presentes na coletividade de seus
espectadores. Consideramos que além do filme, conhecer a comunidade de fãs
do atrista através do Facebook foi peça chave dentro da compreensão da
construção do personagem Teixeirinha, pois a partir dele conseguimos visualizar
e compreender a comunidade afetiva do artista. Que ainda hoje, reúne-se
através do ciberespaço online. Este trabalho de coleta de acervo dentro das
redes sociais. A partir deste contato, percebemos que apesar da morte do artista,
sua figura lendária continua sendo evocada, constantemente, uma vez que ela
se entrelaça as lembranças do passado rural distante da sociedade gaúcha em
direção ao processo de metropolização que hoje existe, ou seja, de uma
memória coletiva de sua comunidade de destino.

Referências biográficas
Ma. Vitória Duarte Wingert. Mestra em Processos e Manifestações Culturais,
Historiadora e Doutoranda em Diversidade Cultural e Inclusão Social na
Universidade Feevale. Professora da Rede Municipal de Campo Bom. E-mail:
vitoriawingert@hotmail.com
Me. Jander Fernandes Martins. Mestre em Processos e Manifestações Culturais,
Pedagogo e Doutorando em Processos e Manifestações Culturais na
Universidade Feevale. Professor da Rede Municipal de Campo Bom. E-mail:
martinsjander@yahoo.com.br

Referências bibliográficas
BRAGA, Adriana. Usos e consumos de meios digitais entre participantes de
weblogs: uma proposta metodológica. In: Anais do XVI Encontro da Compós, na
UTP, em Curitiba, PR, 2007.

CAMPBEL, Joseph. O herói de mil faces. Tradução: Adail Ubirajara Sobral. 10


ed. São Paulo, Cultrix Pensamento, 1997.

ELIADE, Mircea. O mito do eterno retorno. Tradução José A. Ceschin. São


Paulo: Mercuryo, 1992.

HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2006.

LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro: 34, 1993.


PRENSCKY, Marc. Nativos Digitais, Imigrantes Digitais. 2001. Disponível em:
https://pt.scribd.com/doc/55575941/Nativos-Digitais-Imigrantes-Digitais-Prensky
. Acesso em 20 de julho de 2018.

359
“ELE ESTÁ DE VOLTA”: NEOFASCISMO,
ENSINO DE HISTÓRIA E AS REDES SOCIAIS
Ygor Klain Belchior
360

No dia 13 de agosto de 2019, Joanna Schroeder, uma mãe norte-americana, fez


uma postagem no Twitter. Na publicação, expôs a sua preocupação com
conteúdos extremistas de fácil acesso na internet:

“Você tem filhos adolescentes brancos? Tenho observado o comportamento


online dos meus meninos e percebi que a mídia social [...] [está] ativamente
criando bases em adolescentes brancos para transformá-los em supremacistas
[...]. Veja como: é um sistema que acredito ter sido criado propositadamente para
desiludir os meninos brancos, afastando-os das perspectivas progressistas/
liberais. Primeiro, os meninos são inundados por memes com piadas sutilmente
racistas, sexistas, homofóbicas e antissemitas. Sendo crianças, eles não veem
a nuance e repetem/ compartilham. Essa narrativa permite que os meninos se
livrem da vergonha - substituindo-a por raiva. E com quem está a raiva deles?
Mulheres, feministas, liberais, pessoas de cor, gays, etc. etc. [...] E NINGUÉM
parece notar isso acontecendo - exceto, ao que parece, mães de adolescentes
que observam o assédio bizarro que suas filhas sofrem [...] A propaganda faz
com que pontos de vista extremos pareçam normais por pequenas quantidades
de exposição ao longo do tempo - tudo com o propósito de converter as pessoas
a pontos de vista mais extremistas [...]” (SCHROEDER, 2019).

O post viralizou. Para se ter uma ideia, até o dia 23 de abril do ano 2021, foram
registrados 75,7 mil Retweets, 14,2 mil Tweets com comentário e 171,3 mil
curtidas. Tamanha projeção chamou a atenção dos maiores veículos de
imprensa do mundo. Foi nesse sentido que a BBC News publicou a seguinte
reportagem: “Mãe de adolescentes alerta para perigos de extremismo online nos
EUA”. O texto traz ainda o relato de que os “jovens brancos nos Estados Unidos
têm se mostrado particularmente suscetíveis ao risco da radicalização online” e
“um indício nesse sentido é o perfil dos suspeitos dos últimos ataques a tiros no
país: são jovens, brancos e do sexo masculino” (PRASAD, 2021).

De acordo com o relatório de 2017 da Liga Anti-Difamação “todos os


assassinatos de extremistas nos Estados Unidos foram cometidos por um
supremacista branco ou extremista de extrema direita”. O documento ainda
chama atenção para as “evidências crescentes de grupos de extrema direita de
todo o mundo colaborando [...] online” para promover “uma ideologia de ódio
globalizada”. A infraestrutura ideológica na Internet é usada para recrutar e para
radicalizar os jovens, a partir de discursos de ódio (SCHATZ, 2019).

Discursos que não ficam apenas no mundo digital. Segundo reportagem


publicada pela Valor Econômico, os números de 2017 que mencionamos há
pouco estão crescendo. Dois terços das ocorrências terroristas nos EUA, em
2019, “foram realizadas por radicais americanos da extrema direita. Essa parcela
subiu para 90% nos cinco primeiros meses deste ano” (LUCE, 2020). Outros
extremistas acabaram sendo descobertos antes de praticarem atos de violência.
Dentre eles, estava Justin Olsen, um frequentador do site iFunny. Olsen era dono
de uma conta chamada ArmyOfChrist, a qual usava para promover posts 361
nacionalistas brancos e memes de extrema-direita comuns em fóruns como
esses. Segundo o BuzzFeed News, “nos 200 posts [...] se enfureceu contra
feministas, progressistas, a comunidade LGBTQ e minorias religiosas e étnicas,
e [...] pediu o estabelecimento de um etnostado cristão”. O intrigante é a
comunicação por meio de memes com conteúdo histórico, a exemplo das
Cruzadas, fantasiando sobre uma guerra particular como uma cruzada religiosa
entre cristãos e muçulmanos. Em outra postagem, ele escreveu: “O imperialismo
americano é a vontade de Deus e o hemisfério ocidental é um bom começo. Eu
morreria absolutamente para erradicar o socialismo e suas variantes”
(BRODERICK, 2019).

No artigo intitulado “How YouTube Radicalized Brazil” (Como o Youtube


radicalizou o Brasil), publicado pelo The New York Times, no dia 11 de agosto
de 2019, percebemos que esse fenômeno chegou por aqui. A reportagem relata
a atuação da equipe do Berkman Klein Center de Harvard, a qual testou a
ascensão meteórica da extrema-direita brasileira na plataforma do YouTube. De
acordo com o relatório produzido pelo grupo, o novo sistema de inteligência
artificial do YouTube passou a indicar conteúdo extremista a partir de uma
análise algorítmica do perfil do usuário, criando uma espécie uma espécie de
bolha, um comportamento esperado, por meio de recomendações para outros
vídeos com conteúdo semelhante. E os exemplos mencionados pelo estudo não
chegam a ser novos. Afinal, todos nós já ouvimos falar desses nomes em algum
momento.

Por exemplo, a publicação menciona os Youtubers Nando Moura, Carlos Jordy


e Bernardo Küster. Moura é lembrado pelos “discursos coloridos e paranoicos
de extrema direita, [nos quais] acusou feministas, professoras e políticos
tradicionais de travar grandes conspirações”. Jordy por postar vários “vídeos
acusando professores locais de conspirar para doutrinar estudantes no
comunismo”. E Küster por acusar “falsamente acadêmicos de esquerda de
conspirar para forçar as escolas a distribuir “kits gays” para converter crianças à
homossexualidade”. A reportagem ainda alude ao “marco zero para a política do
YouTube”: a sede paulista do Movimento Brasil Livre, cujos “membros são
jovens, de classe média, de direita”. Um dele é Renan Santos, o coordenador
nacional do grupo, e entrevistado pela reportagem. De acordo com os autores,
Santos “gesticulou para uma porta marcada como ‘a Divisão do YouTube’ e
disse: ‘Este é o coração das coisas’. Dentro da sala, “oito jovens cutucaram um
software de edição. Um estava estilizando uma imagem de Benito Mussolini”.
Por fim, o texto alerta que os Youtubers extremistas e os seus conteúdos estão
chegando às salas de aula: “a influência política da plataforma é cada vez mais
sentida nas escolas brasileiras”. Os “professores descrevem salas de aula
tornadas indisciplinadas por alunos que citam vídeos de conspiração do
YouTube ou que, incentivados por estrelas de direita do YouTube, gravam
secretamente seus instrutores” (FISHER; TAUB, 2021).

É importante entender e demarcar que a extrema-direita brasileira se apropriou


da linguagem virtual dos grupos da alt-right. E isso é percebido na utilização de 362
imagens com temas históricos para promover a agenda nacionalista, branca,
masculina e cristã. É o que observamos na entrevista com o medievalista
brasileiro Paulo Pachá, divulgada pela Agência Pública, na qual alertou para o
fascínio dos extremistas com uma referência cruzadista, expressa,
principalmente, nas inúmeras referências aos cavaleiros medievais, em especial,
os Templários. Um emprego que vem “estampando camisetas, textos, tatuagens
e tweets da extrema direita mundial desde que Donald Trump resolveu se lançar
candidato à presidência dos EUA, em 2016” e que no Brasil “tem sido utilizada
por bolsonaristas” (OLIVEIRA; RUDNITZKI, 2019).

Fonte: https://twitter.com/rosedbarros/status/1048926907113381889

A imagem foi retirada do perfil do Twitter de uma Youtuber. Aparentemente


inocente, não diz nada mais do que nós apoiamos lutaremos por nosso país.
Mas, como professores de História, não podemos deixar de atentar para a
existência de diversas camadas ideológicas que dizem mais do que essa
interpretação, digamos, um pouco rasa: há nacionalismo, há chauvinismo e há
Cristofascismo. A começar pelos dizeres: salvar o Brasil de quem? Dos grupos
privilegiados por governos anteriores: os negros, as mulheres, os indígenas e os
LGBTQ+. Uma luta que virou patriotismo cristão, coisa que certamente não
existia na Idade Média. Falamos, portanto, de um patriotismo religioso, voltado
à criação de um etnoestado cristão, branco e masculino.
Este texto, portanto, tem dois objetivos: o primeiro é servir como alerta para os
professores de História de que precisamos olhar com mais atenção para a
internet. E, sem segundo, apresentar uma sugestão de como trabalhar a relação
entre as redes sociais e a extrema-direita em sala de aula.

Metodologia e literatura 363


Segundo Marc Ferro (1992, p. 86), “os filmes, imagens ou não da realidade,
documento ou ficção, intriga autêntica ou pura invenção, é história”. Dentro
dessa perspectiva, o cinema deve ser entendido como um produto da sociedade,
uma imagem-objeto, para usarmos as palavras de Ferro. Sendo assim,
empreenderemos a análise do filme “Ele está de volta”, como uma fonte histórica
que fala menos do tema filmado e mais da sociedade que o produziu. A essa
noção de Ferro somamos a leitura de Abud (2003) que defende a função de
agente da história do cinema, pois os filmes têm a capacidade de transmitir
conceitos e valores do seu tempo, atuando como um produtor de sentidos. O
nosso filme visto por esses autores, portanto, tem dois papéis no ensino de
história: agente e documento.

Sendo assim, não avaliaremos o filme “Ele está de volta” como uma produção
sobre o nazismo da segunda guerra mundial. Mas como um produto da nossa
sociedade contemporânea, a qual, como vimos, é marcada pela circulação do
neonazismo, uma forma nova do antigo nazismo, com suas próprias
especificidades. E qual é a diferença entre os dois conceitos:

“Do ponto de vista cultural, o nazismo na Alemanha usou ostensivamente as


artes e a propaganda para atingir o público [...]. Para tal, suprimiu as liberdades
democráticas existentes. Os nazistas consideravam a democracia como a
‘muleta dos fracos’. Os fortes e resolutos ‘não precisam de democracia’. Todos
os meios de comunicação, como rádio, cinema e jornais, passaram para o
controle dos nazistas. O objetivo era destruir impiedosamente os oponentes ao
regime e consagrar como heróis os seus apoiadores. [...] Os nazistas
contemporâneos desviaram o foco da maledicência, de ódio e de preconceitos
contra os judeus para os negros africanos [...]; para os pobres em todos os
países; povos nativos da América Latina e atuais indígenas; mulçumanos e
refugiados de guerra e, também, a mulher moderna que conquistou certa
independência (MOURA, 2020).

Elucidada a diferença entre nazismo e o neonazismo, convém ainda prestar


alguns esclarecimentos antes de continuarmos o texto. Dividiremos esse
momento em dois: o primeiro diz respeito ao aspecto metodológico do texto e o
segundo ao acesso aos materiais aqui trabalhados. No que tange à metodologia,
escolhemos trabalhar o filme a partir do diálogo com notícias de jornais e
revistas, e não com artigos científicos. É claro que tomamos o cuidado para que
essa seleção não prejudicasse a nossa análise, pois a escolha das reportagens
foi feita com base em artigos científicos e livros da área. Já no que se refere ao
segundo esclarecimento, existe a oportunidade dos nossos leitores terem
acesso ao filme e a um material montado para esse fim, bastando apenas clicar
nessa palavrinha que está em negrito. Existe igualmente a possibilidade de ter
acesso às notícias, mesmo não sendo assinante de algum desses portais online.

Sobre a utilização de jornais em sala de aula, dialogaremos com a leitura de


Faria (2009; 2011). Para a autora, a metodologia que envolve o trabalho com os
jornais em sala de aula tem a vantagem de ofertar contato direto com uma fonte 364
histórica, o jornal, o que leva “o aluno a conhecer diferentes posturas ideológicas
frente a um fato, a tomar posições fundamentadas e aprender a respeitar os
diferentes pontos de vista” (FARIA, 2009, p. 11).

Ele está de volta


O filme “Ele está de volta”, em alemão “Er ist wieder da”, classificado
como comédia, foi escrito e dirigido por David Wnendt, com base no romance
homônimo de Timur Vermes. Estreou na Alemanha a 8 de outubro de 2015, e
no Brasil a 9 de abril de 2016 pela Netflix (ER IST WIEDER DA, 2021).
Basicamente, o enredo mostra como seria se Adolf Hitler voltasse para a
Alemanha do ano 2014 e, entre várias selfies, percebemos que o Führer seria
bem-vindo. É importante mencionar que essas cenas de apoio são reais. Por fim,
entendemos ainda o filme como uma crítica à indústria cultural e à mídia
comercial, as quais, para assegurarem audiências mais amplas, muitas vezes,
legitimam discursos de ódio.

Começando a nossa análise, é importante demarcar que não vamos avaliar o


filme seguindo a sua cronologia. Pelo contrário, dividimos a produção em dois
eixos temáticos, a saber, 1. As mídias; 2. O papel da História.

No que tange às mídias, a primeira observação a ser feita é a sutil sugestão


iconográfica entre o logo da emissora de televisão, responsável pela ascensão
de Hitler, e o Youtube. Vejamos:

Fonte: https://youtu.be/Mdvtsy41o1A
365

Fonte: http://aldeia.biz/blog/social-media/conheca-os-10-videos-mais-
importantes-youtube/

Para além do detalhe vermelho que se destaca nas logomarcas das duas
empresas, a relação entre os pronomes “my” e “you” não deixa dúvidas de que
existe a intencionalidade em ligar a ascensão midiática de Hitler ao fenômeno do
Youtube. Tal associação não ocorre somente nesse momento. Em outra ocasião
do filme, fica claro o papel dessa rede na promoção do nazista, quando diversos
Youtubers aparecem comentando as falas do Führer em uma linguagem jocosa,
acompanhada de muitas animações. Um detalhe chama atenção, a fala de um
youtuber: “você não sabe se é para levar a sério ou dar risada?”. Alguns se
questionam se a Alemanha está preparada para esse tipo de humor, enquanto
outros ponderam que muita coisa do que Hitler diz é verdade. Vejamos:

Fonte: https://youtu.be/T8Vshej-0-o
366

Fonte: https://youtu.be/T8Vshej-0-o

O elemento jocoso é o que nos importa. Em uma entrevista à BBC News Brasil,
o professor de Filosofia Moderna e Contemporânea na Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rodrigo Nunes, afirmou que essa tática é
uma das principais armas da extrema-direita nas redes. Conhecida como troll, é
a linguagem utilizada por Donald Trump e Jair Bolsonaro e que consiste em um
jogo dúbio, “entre o que é brincadeira e o que é sério". Na mídia, isso acontece
com a discussão de temas que são polêmicos, a partir de comentários racistas,
homofóbicos ou machistas, objetivando provocar a reação de indignação,
garantindo visibilidade. Nunes avaliou ainda que Bolsonaro já adotava a tática
em sua carreira como parlamentar, pois “era um político completamente sem
importância, cuja única visibilidade vinha disso" (VALLONE, 2020).

Fonte:
https://conteudo.imguol.com.br/blogs/2/files/2018/10/bolsonarosuperpop2.jpg
367

Fonte:
https://conteudo.imguol.com.br/blogs/2/files/2018/10/bolsonarocariocamito-
300x243.jpg

As duas imagens ilustram bem como a ascensão de Jair Bolsonaro pode ser
entendida em diálogo com o filme. Ao adotar a tática troll, o então candidato à
presidência tornou-se famoso. Como se fosse um comediante, virou um
fenômeno da internet e chamou atenção da televisão. Na primeira foto, aparece
no programa da Luciana Gimenez performando o sinal que marcou toda a sua
campanha: uma arma com os dedos. Aparentemente uma brincadeira
extrovertida, este sinal deve ser entendido para além do caráter cômico: é uma
alusão às suas bandeiras políticas extremistas, voltadas para a eliminação dos
seus adversários, tal como ele mesmo disse, quando afirmou "Vamos fuzilar a
petralhada", em campanha no Acre. (RIBEIRO, 2018). A segunda imagem é do
humorista “Carioca” do programa “Pânico na TV”. A imitação fazia parte de um
quadro intitulado “Mitadas do Bolsonabo”, com dezenas de episódios, nos quais
dizeres racistas, homofóbicos e machistas eram apresentados como humor.

No filme, um funcionário da emissora em que Hitler trabalha se incomoda com a


exposição de ideias nazistas. Revoltado, performa a Hitlergruß e prossegue com
dizeres “uma grande porcaria nazista” “e o povo gritando: ‘Hurrah!”. Insatisfeito,
questiona a diretora se ela estava realmente ciente do que estava promovendo,
pois, para ele, as pessoas gostam de Hitler por concordarem com tudo o que ele
diz. Por fim, afirma que a promoção dessa “merda nazista” é porque diretora
assumiu o papel de Goebbels. O intrigante neste trecho é justamente a
associação entre a propaganda nazista da década de 1930 com o papel das
mídias sociais. O que fica claro é a relação de casualidade: as redes são as
principais responsáveis pela normalização desses discursos.
Cabe mencionar ainda outro elemento. As pessoas gritando “Hurrah”. Essa
expressão era muito utilizada pelos partidários de Hitler para rememorar os
espartanos. Uma relação também vista aqui no Brasil:

368

Fonte: https://cdn.jornaldebrasilia.com.br/wp-content/uploads/2020/06/300-
protesto-stf-1024x683-1.jpg

De acordo com Dip e Franzen (2020), na Europa, os movimentos de extrema-


direita fazem frequentemente referência ao filme 300 e à Batalha das Termópilas,
entendendo o combate heroico dos espartanos contra persas como a atual luta
dos “europeus verdadeiros” contra os “invasores” refugiados. No Brasil, o uso do
discurso do sacrifício e do “sangue e suor” pela pátria tem relação direta com a
luta pessoal de Jair Bolsonaro: contra os comunistas, os LGBTQ+, o movimento
negro e assim por diante. O grupo de extrema-direita brasileiro ainda é liderado
por Sara Winter, “homônimo ao de uma socialite britânica que foi espiã de Hitler
e membro da União Britânica de Fascistas”. Na foto, observamos os militantes
aparecem usando uma máscara de caveira. “A máscara, que também é vendida
no Brasil, é muito popular na Europa e nos Estados Unidos entre neonazistas. A
máscara de caveira virou uma estética universal fascista.”

Considerações finais
Por fim, passaremos ao papel da História. Mas antes lembremos da famosa do
historiador britânico Peter Burke de que “a função do historiador é lembrar a
sociedade daquilo que ela quer esquecer". E, de fato, os historiadores foram os
primeiros a apontar o dedo a Bolsonaro e dizer: “ele está de volta”. Não é à toa
que os profissionais da área se tornaram objeto de críticas por parte do
presidente e dos seus apoiadores. Bolsonaro, candidato à época, foi ao Jornal
Nacional defender uma visão deturpada do Golpe Militar de 1964 e, ao fazer isso,
deixou claro o seu objetivo ao dizer: “deixa os historiadores para lá”
(BOLSONARO, 2018). E mais, os seus apoiadores nas redes iniciaram
conjuntamente uma campanha para descredibilizar os professores. Basta digitar
em algum mecanismo de pesquisa as palavras “o seu professor de História
mentiu”.

Diariamente os professores de História precisam disputar as suas narrativas


didáticas com as das redes sociais. De tal forma, queremos terminar este texto 369
propondo o exercício de trabalhar a História na sala de aula aproximando esses
dois mundos. Para tanto, é preciso pensar em estratégias de aprendizagem que
utilizem as redes em sala de aula que busquem: a) compreender as
comunidades virtuais como um ambiente onde narrativas históricas estão em
disputa; b) promover a autonomia perante à avaliação de tais narrativas; c)
entender como grupos extremistas manipulam essas comunidades virtuais como
ferramenta ideológica para a promoção do ódio contra pessoas.

No filme, a História assume o papel de uma senhora. Na cena, Hitler é convidado


para jantar na casa da namorada de Fabian Sawatzki. De ascendência judia, a
moça reside com a sua vó, uma sobrevivente do holocausto. Essa senhora já
havia aparecido anteriormente como portadora de “deficiência mental” e, mesmo
nessa condição, não demora a reconhecer a voz de Hitler. Ela então fica muito
nervosa e expulsa o Führer da casa. Enquanto isso, a neta tenta dissuadi-la,
argumentando que o personagem ali não era o verdadeiro Hitler, mas um
comediante. A senhora então diz: “pense na sua família. Tanta gente. Todos eles
mortos. [...] era câmara de gás!”. Encarando-o mais de perto continua: “ele não
mudou nada, diz as mesmas coisas. No começo as pessoas também davam
risada. [...] eu sei quem você é, nunca me esqueci”.

Fonte: https://youtu.be/6vIUgNRdCbU
370

Fonte: https://youtu.be/6vIUgNRdCbU

Sabemos que no Brasil há obstáculos relacionados à cobertura da internet.


Dificuldades que vão desde o acesso doméstico ou a existência de uma boa
conexão em muitas unidades de Ensino. Em outros casos, existe o preconceito
dos educadores para com as redes, as quais são bloqueadas nas escolas.
Todavia, não podemos esquecer que, mesmo sem o acesso contínuo, é fato que
os alunos já estão familiarizados com essas redes sociais e com o linguajar
digital. Porém, eles não são educados a perceber como os conteúdos presentes,
mesmo quando estão ali apenas para parecerem piadas, devem ser criticados e
avaliados de forma científica, com uma metodologia.

E esse trabalho se torna cada vez mais urgente, ao levarmos em consideração


o conteúdo deste texto: a extrema-direita global promove uma verdadeira guerra
de desinformação no sentido de implementar a sua agenda extremista e
ideológica, a qual vem ressuscitando alguns Hitlers.

E uma característica do Hitler e de seus seguidores é justamente o discurso


antidemocrático. Por exemplo, no filme, após a consolidação da sua imagem nas
mídias, o Führer vai a uma manifestação de neonazistas, os quais, segundo ele,
são as pessoas “determinadas a dar continuidade ao seu trabalho”. Chegando
ao encontro dos seus partidários, inicia uma conversa na qual dialoga com um
jovem a respeito de pedófilos e dos problemas com a democracia, um sistema,
segundo o rapaz, que falta quem dê a palavra final. E Hitler responde que esse
é exatamente o tipo de democracia que ele defende.
371

Fonte: https://youtu.be/UDdvJhuWJHU

Fonte: https://youtu.be/UDdvJhuWJHU

Para terminar nossa reflexão com mais um exemplo de publicação nas redes,
além da referência templária antidemocrática, mencionada na introdução deste
texto, comentaremos mais meme de internet que ilustra muito bem como ataques
ao sistema democrático são promovidos em diálogo com a História e com a
aparência de “brincadeira”. Vejamos:
372

Fonte: https://twitter.com/loukanos_/status/1380994032713748485/photo/1

A essa imagem, adicionamos os comentários feitos a ela. Louvores à


“autocracia”, ao “governo de um só”, assim como ataques à República e à
Democracia por serem “coisas desprezíveis”. O interessante é perceber que o
autor da postagem tenta fazer uma análise do meme. Ele diz: “A República [...]
tinha muitos erros nas estruturas”. O erro apontado, no caso, pode ser
facilmente percebido como um ataque direto às democracias modernas, uma vez
que a República Romana do meme é entendida como o governo do povo e isso,
em uma visão extremista, é muito ruim. Basta lembrarmos dos assuntos
comumente trabalhados no conteúdo República Romana: Tribunos da Plebe,
Reformas Agrárias, Revoltas de Escravos; Revoltas dos Italianos e a ascensão
de plebeus ao exército. Conteúdos que muito se aproximam do debate político
brasileiro. Afinal, acabamos de eleger um Presidente que ataca diretamente a
democracia e que não poupa tempo em elogiar a Ditadura justamente por
preferir o autoritarismo. E o intrigante é que no post há um comentário de uma
agência de Informações na internet que aproveita o tema romano para atacar
o STF, dizendo que os juízes dessa corte deveriam ver a imagem para aprender,
antes de viramos uma Pompéia.

Por fim, findamos nosso texto com um convite aos professores e professoras de
Ensino Básico e Médio: procurem conhecer como o conteúdo da História
ensinada nas escolas aparece nas redes. Busquem trabalhar as aulas a partir
desse cotidiano tão habitual dos jovens. Pois é lá que eles estão se informando
mais sobre a História do que nas salas de aula.

Referências biográficas
Dr. Ygor Klain Belchior, professor da Universidade do Estado de Minas Gerais,
Unidade de Campanha, e líder do Laboratório de Estudos e Pesquisas em
História Antiga, Medieval e da Arte (LEPHAMA).

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BRODERICK, Ryan. 10,000 Rounds Of Ammo And 25 Guns Were Seized From A
Teenager Posting Far-Right Memes On iFunny And Discord. BUZZFEED NEWS, Nova
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DIP, Andrea; FRANZEN, Niklas. Especialistas apontam semelhanças entre os 300 de


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semelhancas-entre-os-300-de-sara-winter-e-grupos-fascistas-europeus/>. Acesso em:
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375
376

“The Lovers,” by the Norwegian artist Pobel, in Bryne, Norway.Credit.

RESISTINDO!

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